sample filhos do vácuo: cartas ao homem-deus

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Sérgio Canarim Filhos do Vácuo Cartas ao homem-Deus

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Page 1: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

Sérgio Canarim

Sérgio CanarimFilhos do Vácuo

Filhos do VácuoCartas ao homem-Deus

Cartas ao hom

em-D

eus

SÉRGIO KROEFF CANARIM nasceu em 1980. Formou-se em Direi-to, porém procurava algo mais fundamental. Morou na Europa e escreveu muito lá, mas houve um acidente com as obras desse período. Ao final da aventura europeia escreveu os primeiros esboços do que viria a ser uma nova forma de pensar. No retor-no ao Brasil, cursou Filosofia e descobriu que todos os princí-pios fundamentais que buscam alicerçar o conhecimento são, na verdade, incertos. Baseiam-se na lógica do pensamento e não na realidade do mundo.

sentindo desse livro é abrir novas possibilida-

des de se pensar, de se construir a linguagem e até mesmo de se viver.

Quando a linguagem cruza com a poesia e a filosofia, explode e implode a si mesma.

A obra traz à tona pensa-mentos e escritos poético-filosóficos que vêm sendo desenvolvidos pelo autor nos últimos 15 anos. Nas cartas e poesias escolhidas existe a abertura seminal de uma nova filosofia, as quais levarão o leitor ao próximo livro.

www.facebook.com/SergioKCanarim

QUANDO SE DERRUBA MITOS O VÁCUO É O NOSSO CHÃO

ssim como na tradição de Heráclito, Epicuro, Nietzsche e Pessoa aqui nasce

uma nova poesia-metafísica ou será uma nova metafísica-poética?

O autor dialoga intensamente com os pen-sadores, dos pré-socráticos aos dias de hoje, parando principalmente diante de Nietzsche e Heidegger nesse novo arrombo tautológico.

O homem-Deus supera a si mesmo na lite-ratura de Sérgio Canarim.

Page 2: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus
Page 3: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

© Sérgio Canarim 2015

Editor: Rafael Martins TrombettaRevisão/copydesk: Arthur Beltrão Telló

Capa: Editora BuquiImagens de capa: Shutterstock permissão Gustavo Lima

Ilustrações: Jana InaEditoração: Cristiano Marques

www.buqui.com.brwww.editorabuqui.com.br

www.autopubli.com.br

C221f

Canarim, Sérgio Filhos do vácuo / Sérgio Canarim

1. ed. | Porto Alegre, RS | Buqui, 2015. 128p. | 21 cm

ISBN 978-85-8338-170-9

1. Literatura brasileira. 2. Poesia. 3. Cartas. 4. Conto. I. Título.

15-20738 | CDD: 869.91 | CDU: 821.134.3(81)-1

06/03/15 | 09/03/15

CIP-Brasil, Catalogação na fonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ

Page 4: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

Agradecimento

Às Zazás da minha vida,

Maria José Kroeff Canarim e

Alexandra Letícia Zanela.

Agradeço ao Arthur B. Telló

pela lapidação árdua que fizemos nos textos.

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Page 6: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

Filhos do Vácuo | 9

Etapas da percepção

Passei pelo consumismo Matrix.

Parei no humanismo por um tempo de três primaveras

[na idade convencionada para os homens serem “livres”

[dentro dos limites da fazenda

– com feitores e capitães do mato a postos.

Tive a visão da Unidade:

só a liberdade vale a pena

rejeito qualquer doutrina que não seja a razão

não devemos nem um níquel a quem nos deu de comer

não devemos nem um segundo a ninguém

somos flechas rumo ao super-homem

cada vez mais longe, a distância amplia a visão

é assim na física e na metafísica.

Portanto, desordenadamente marchem!

Page 7: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

10 | Sérgio Canarim Filhos do Vácuo | 11

Como se chega nela?

Transcendendo todas as coisas espaço tempo

tudo que pode ser universo

tudo que pode ser dimensão a não-existência

E aí olha-se para trás.......ela estará lá

A própria beleza a própria abonança geral de todas as coisas

que trasbordam em si mesmas

Quem são os nós-deuses?

A vida inteligente no futuro mais longínquo

que se pôde vislumbrar se ela futuro possuir

cujo cérebro é o ponto que é tudo e vê tudo e pode tudo

e sabe tudo e interage com tudo

ao mesmo tempo todo real e virtual

que não pode ser vislumbrado por nós

o todo além de regras-limites-fraquezas,

a-própria-intensidade-pura-concreta-palpável,

a-própria-luz-geral-de-todas-as-coisas,

a-própria-escuridão-geral-de-todas-não-coisas

A verdade geral de todas as coisas

Eu a vislumbrei num estado de vácuo além do espaço tempo

Só nós dois...

Ela ia vinha girava em todas as direções e depois se fechava

mas eu não a vi fechar

Nem ninguém verá antes do futuro longínquo

onde ela se fecha

Só os nós-deuses verão onisciente onipresente onipotente

todas as cores

mas eu a vi branco-cinza que fosforesce

Tudo isso significa que eu concretizei

o super-homem de Nietzsche

O que para ele era o abstrato para mim é o concreto

O caminho ficou claro

Ela é além dos métodos

Dialética não a explica

Dialética é só o começo

São todas as direções

É a semântica que não foi inventada

além de qualquer alphaville

Quais os instrumentos para vislumbrá-la?

Intuição sentimento razão

A união de todas as coisas

dos nossos pobres e primitivos cérebros

Page 8: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

Filhos do Vácuo | 1312 | Sérgio Canarim

Visão

Eu também tive a visão do trabalho novo de Rimbaud

com os sentidos encrapulados.

O super-homem coordenando o circo bizarro

ao fundo a música (dor prazerosa).

A consagração do prazer e repúdio do sofrimento gratuito.

O vento e seus filhos passando sem parar

tirando tudo do lugar

no eterno movimento das ideias novas.

A união mundial do fim das pátrias

e só a unidade mantendo as diversidades

que compõem a realidade

O macro O fora e O dentro do circo.

Uma inexorável mutação de aceitação rápida

levando aos picos dos picos onde o ar é gelado e rarefeito.

Mas os sentidos voltam do desconhecido

e a visão se dissipa como deve ser.

Cheguei, caro Aldous

Eu já cheguei em um lugar alto na colina

e profundo na fossa gigantesca da imaginação.

Agora posso tudo!

Percorrer todos os cantos da minha amada e odiada Matrix.

Mijar tomar o veneno de cada dia como uma gota de sangue

no dente do mitológico vampiro do eterno retorno.

É o estado: the Doors of Perception are open.

As portas estão abertas e sendo analisadas pela razão.

Just suck my integrity and you will see the truth,

the little truth,

never the old ugly truth.

Sou maculadamente chapado pela natureza

me fizeram já assim vivendo no ar insólito dos voos loucos

pela tal realidade possível de ser vista.

Tanto faz

é minha doutrina de desacreditar um sentido para existência.

Page 9: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

14 | Sérgio Canarim Filhos do Vácuo | 15

A guerra do ser

As covardias são mães do fracasso

da infelicidade

da falta de prazer

da alienação

do sofrimento

da dor.

A consciência das bobagens feitas condena o soldado ao

perecimento moral.

Por isso a luta interior é a guerra eterna onde dificilmente há

vencedores

são muitas batalhas muitos mortos muitas mutilações.

Ao futuro pertence o remoer de derrotas em átimos

ora na melancolia da insônia,

ora nas ocasiões mais impróprias.

O que torna a vida dificilmente interessante

nos eternos movimentos de estratégias sutis ou complicadas

de dor lancinante.

Mesmo que haja tréguas o soldado sofre por suas memórias de

guerra.

E o que fazer? Não lutar?

A pior covardia é acovardar-se diante da guerra contra a

covardia.

A utopia das utopias

A verdade nos tornará livres Mas ela virá?

Uma carga gigantesca de fogo Aguentaremos?

Uma teia de eterna direções Compreenderemos?

Uma punhalada de veneno Sobreviveremos?

O quase paraíso Quereremos?

Page 10: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

16 | Sérgio Canarim Filhos do Vácuo | 17

O Samadhi da pele contra pele

A pele nua toca a pele nua

num instante a mente muda

os olhos fecham

arco-íris moldam na mente formas elípticas,

geometria encantada,

porque os acordes rasgam o peito

as sinapses entram em colapso

toda a matéria escura brilha

todo o rosto esvaece num devaneio febril.

Joga-se a vida nas cartas do presente

que é um futuro quebrado a cada instante

passado.

Rever os rostos antigos transformados pelo tempo

a chaga imortal de cada ego

resvalando na relva

e tornando-se ar areia úmida selvagens leopardos.

Montanhas de espíritos nos trouxeram até aqui

Daqui pra onde vamos?

Suportamos, somos eternamente a mutação do mesmo

porque as partes não formam o todo nesse rosto antigo.

Acreditar que a unidade supera as partes;

nosso novo evangelho é o caos.

As moedas eram de ouro

agora são conjuntos binários de zero e um.

Infinitas combinações de dois dígitos.

Nesse mar elétrico eu brilhando quando eu penso em eu.

Soluços e gargalhadas lágrimas entrecortadas.

A serpentina serpenteia espirais sem nunca tocar o palpável.

Venham todos de um só trago,

a montanha de espíritos para ser o hoje,

muito sangue, muitos estandartes,

muitos evangelhos foram construídos

como no jogo de lego

e desmontados pelo o que veio a ser o vir a ser.

Encantados, relembramos que deus era o fogo, o sol,

a água e agora nem mesmo abstrato,

o ser vem do nada e não existem mais deuses,

só o choro de crianças esperançosas,

sonhando com um homem pós-orgânico,

pós-fraquezas, pós-medo do escuro.

Pós-necessidade de crenças pós-escrita pós-amor pós-apego.

E os soldadinhos finalmente largarão a bandeira

que os move inexoravelmente para o abismo.

Ou, lá sem sentir, pois não ser é não sentir também,

já estão sem dor sem prazer sem nada

ser nada já é alguma coisa.

Page 11: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

18 | Sérgio Canarim Filhos do Vácuo | 19

Verdade

Nietzsche,

quando pude refutá-lo

tive uma luz de ida até

o meu fim atual:

A verdade é finita.

Ao longo da história descobrem-se novos caminhos

tudo vai volta gira em todas as direções

mas ao final se fecha.

Só que o homem é mais finito.

Portanto, duvido de nós.

Não existiremos o suficiente

para conhecer toda essa teia.

Um espírito elevado de um espaço-tempo

é o somatório dos espíritos elevados que vieram antes.

Mas não vai dar tempo.

A verdade é finita, porém infinitamente gigantesca.

Construção

O passado já foi destruído.

As tábuas antigas serviram de armas

contra o Deus que insiste em viver.

O presente é destruído a cada instante.

Quero dar apenas o golpe de misericórdia.

Quebrar os restos do instante que passou.

Destruir, mas com esmero dos engenheiros mais lógicos,

calculistas de um capitalismo que exige

cada vez mais

pessoas-engrenagens-azeitadas

Manter a estrutura,

Como sempre,

os cálculos básicos estão corretos.

Senão o que passou não teria existido,

muito menos o que se passa.

Mas minha arquitetura não é esta que substitui o presente.

Minha arquitetura constrói o futuro longínquo.

O futuro das grandes

aventuras-racionais-sensorias-de-intensidade.

Page 12: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

20 | Sérgio Canarim Filhos do Vácuo | 21

Edgar Allan Poe

Havia algo nebuloso

Havia um enigma não resolvido

Um paradoxo:

Unidade versus Profundidade

Sabe quando uma informação derruba um muro?

Foi assim...

Poe pôs mais um muro

para minha visão da unidade

abaixo!

A verdade... Todas as minhas reflexões são baseadas na

distância e no contexto global (totalidade); por isso enxergo

com clareza.

Quando me referia à profundidade, não significava se ater

a detalhes, escolher um pequeno objeto e ir até o fundo

do poço. Isso é trabalho para cientistas e, mesmo assim,

nem eles devem se manter ligados nos detalhezinhos da

renda vermelha do papai Noel, e sim sempre unificar os

conhecimentos existentes para encaminhar seus estudos,

à distância deles, é bem verdade, é o espaço que separa os

pintores orientais de grandes planos do objeto a ser retratado

− um palmo.

Os amantes da verdade, da unidade devem ver o mundo como

um todo sempre. Formar sua argumentação visando toda

a paisagem. Caminhar até um ponto no espaço infinito e

olhar para trás; tudo ficará claro.

Sendo assim, talvez o erro dos conservadores não seja

exatamente superficialidade, mas especificações, examinar

um argumento sem perceber tudo que o cerca: O

Universo, seus lançamentos de dados, sua bizarra, incrível,

aparentemente infinita matéria.

Quando se está longe, percebe-se por que a verdade é

gigantesca. Ela vai, volta, gira em todas as direções e depois

se fecha, pois tem que interligar tudo, toda a gigantesca

absurda paisagem da existência.

Então, a distância é uma espécie de metafísica, pressuposto

para qualquer conhecimento, principalmente filosófico.

OBS: mas como não tenho certeza sobre a necessidade da

metafísica, e minha ideia pode estar errada ou incompleta,

talvez esse pressuposto possa ser quebrado em algumas

hipóteses, principalmente científicas.

Page 13: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

Filhos do Vácuo | 2322 | Sérgio Canarim

Verdade

A lógica pode tanto

fazer o caminho para verdade

quanto pode fazer qualquer caminho.

Os caminhos falsos

não duram

para sempre.

Só até que surja um criador com a vontade de potência gerada

por uma ideia nova,

que levará a outro caminho

errado ou

incompleto.

Ou se juntará com as ideias que se acumulam juntas no final

da verdade,

esperando o um ou uns,

tradutores e unificadores derradeiros.

Serão os pós-androides?

A montanha mágica

Os espíritos superiores ao concretizarem suas almas em obras,

tornam-se montanhas. E convidam-me a escalar-lhes os

corpos, suavemente dão suas mãos criadoras como apoio.

Subo, quero mais. Quero usar esses meus amigos mortos

para ultrapassá-los. Quero subir sobre seus ombros e saltar

para o voo infinito.

Voar

voar

voar

Depois construir uma casa sobre o topo de todas as

montanhas reunidas. Até que um amigo

que ainda não vive , meu amigo do amanhã,

construirá um arranha- céu sobre minha casa.

Page 14: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

24 | Sérgio Canarim Filhos do Vácuo | 25

História

Talvez seja apenas linear

mas a história humana não.

Essa é ciclicamente linear

1. Na pré-história o sexo era livre

2. Na passagem para a história repressão em prol da

civilização.

3. Agora, o sexo volta a ser livre

Evolução cíclica

1. Atitude livre e instintiva

2. Atitude cerceada por necessidade

3. Atitude livre e pensada

História (II)

Profecia de um futuro longínquo:

1. Criamos Deus

2. Matamos Deus

3. Somos Deus

É o ciclo

1. Deus existe − nas nossas cabeças

2. Deus não existe − atualmente

3. Deus existe − nos transformamos nele

1. Ideia mítica

2. Ideia racional

3. Ideia racional concretizada cientificamente1

1 Historia e História (II) se complementam independente da ordem

Page 15: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

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Chamada ao futuro

Cidadãos do universo

Espíritos livres

Libertadores

Criadores

Amorais na análise

Cumes da existência

EM FRENTE, MARCHEM!

A intensidade

A doação ao Universo

Deixar-se levar até os confins das trevas

A dor e o prazer

A paixão

O encrapulamento sensorial

Tem que ir até o fim

Só até o fim

Só lá

A verdade mostra seu caminho

Abre-se como uma mulher irracionalmente apaixonada

Tudo fica claro mas indizível

É tanta luz que fico tonto

Tonto extasiado apaixonado por ela

A existência...

Estressado exausto é ela

A intensidade que consome a vida

Mas a vida é feita para ela

e ela é feita para vida

É o sentido consumir tudo

As células até a última gota de DNA

Finalmente saber alguma coisa

e exausto das eternas viagens

morrer satisfeito em paz.

Page 16: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

28 | Sérgio Canarim Filhos do Vácuo | 29

... Atrevesse?

e se eu dissesse que não existe infinito

que eu sou o Universo e de mim ele prescinde

que eu sou um grão dos Universos bebês

e que haverá uma teoria única

(a união de todas as teorias)

que é todas e contradiz todas numa dialética alucinada

mas não se assustem a verdade é assim mesmo...

ela de tão complexa é quase caótica

ela de tão caótica só pode ser gigantesca

para um leigo, a paixão pela busca

essa fera cheia de tentáculos

simplesmente não existe

ou não pode ser alcançada

e se eu dissesse que no futuro teremos tudo

ou não existiremos,

e a sorte quântica terá sido jogada por água a baixo

[por meras crianças doutrinadas pelo medo

e se eu ainda dissesse que jamais,

nesse devaneio de futuro longínquo,

[precisaremos mover um dedo

Que seremos literalmente donos do espaço infinito que é finito

mas tudo bem...

alguém há de me dizer:

“porque perdes tempo buscando o que será superado?”

e eu logo direi:

“porque é divertido e me faz poder tudo!”

ou, para ser humanista, eu cuspirei:

“todos que puderem pôr um grão de areia

[nesta bendita verdade, a verdade bendita,

[serão bem vindos, pois o tempo é curto!?!”

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30 | Sérgio Canarim Filhos do Vácuo | 31

Ouvindo beethoven com a testa na escrivaninha

e chorando por dentro

por motivos que não quero expressar

ou sou fraco demais pra expressar

ao mesmo tempo tenho boas novas!

Os antigos discípulos vêm na marcha desgovernada de sangue

[escorrendo na boca por um lugar mais alto do que o sol

Eu devia estar feliz

mas não estou

Eles me perseguem por motivos incompletos e errados

enquanto me preocupo com fraquezas mundanas de dois dias

de dor

pierre boulet que mal conheço continua me assombrando

como quem não olha direito pra coisa nova da esquina

[do estado vizinho

A gramática é necessariamente quebrada

Não é aqui no verso anarquicamente &

simetricamente

assimétrico

& livre

que hei de expressar minha filosofia

Só meus sonhos visionários de um futuro possível e impossível

Horas de quebras morais

Sentidos do que é bom

A falta de uma explicação perfeita me absolve na poesia?

Não sei mas quem se importa

O vento me espera para rompê-lo num voo até a não-existência

Enquanto vivo fugindo desse voo

encontro tempo pra filosofar

[mas não pra registrar de modo preciso a minha filosofia

Page 18: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

32 | Sérgio Canarim Filhos do Vácuo | 33

Evolution Baby

Curvas quânticas

Pré-existência

Big bang

Oi planeta bizarro da essência

Viva os homos

Carnificina

– Brincadeira

Sapiens sapiens

– Extermínio

E o homem criou Deus

– Civilização

E o homem matou Deus

– Mas ele é Fênix renasce das cinzas

Evolução

Carnificina

Filosofia

Psicodelia

Brincadeira

Arte

– Sonhos

Deus permanece morto-vivo

Guerra dos sexos

Sexo livre

Camisa de vênus

Caos carnificina Deus psicodelia

Vitória dos bêbados

Vida longa

Comida à vontade

Desnutrição

Guerra guerrilha paz e amor

Doors

Tecno

Extasy

Workaholic

Vagabundos da nova geração

In out

Velhos de sobra

Jovens mesquinhos e loucos de vontades

Jovens idealistas e loucos de vontades

Álcool

Álcool

Álcool

U.S.A polícia terrena

Emergentes

Mari Juana

Mescalina

Dostoievski

Trotsky

Homero

Chico Cience Buarque da Rosa

Page 19: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

34 | Sérgio Canarim Filhos do Vácuo | 35

Amazônia em chamas!

Festa na floresta

Queimam na fogueira desvairada as verdades simples

Dança incandescente de luz e calor

lembrando as visões dos antípodas da mente

Queimam os animaizinhos indefesos

Quem se importa!

Queimaremos tudo se for necessário!

Acabaremos com a beleza natural do mundo!

A nossa sobrevivência é nossa única opção

Mas nossa sede por beleza poderá poupar a natureza?

E se não pudermos poupar a estética aleatória?

Não se preocupem faremos obras faraônicas

e assim aliviaremos a secura dos olhos humanos

e quem sabe não-humanos.

Tive prazer ontem, um prazer necessário

Proporcionei um prazer superfluamente necessário

Aliviei minha culpa, que não é minha culpa

Fui feliz, ó fui, melancolicamente, hipocritamente

Acreditem ou não

Ninguém virá nos salvar

Os filósofos os profetas ninguém

Abriram aumentam e aumentarão as trilhas

O caminho é infinito

Page 20: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

36 | Sérgio Canarim Filhos do Vácuo | 37

Volto na tarefa cotidiana do meu vício de nicotina à janela

de meu quarto. A paisagem estática do meu jardim não

me diz quase nunca muita coisa. Ao contrário, o céu e Ca-

mus me inspiram, o primeiro na sua estática e o segundo

na sua filosofia.

O céu neste fim de tarde de outono está livre de nuvens.

Sobre minha cabeça, o céu é turquesa e vai mudando seu

matiz à medida que se aproxima do horizonte, tornado-se

cada vez mais claro até assumir um branco acinzentado.

Camus, por outro lado, me relembra o total absurdo de viver,

a indiferença inexorável do mundo, a falta de sentido

original e, finalmente, a mais sombria das questões, o

único medo verdadeiramente terrível e invencível: a

finitude que nos espreita para um dia marcado sem volta.

Mas há muito tempo conheço tais questões, e também há

muito tempo dei-me o prazer e o luxo de elaborar um

sentido para minha existência. Não contente com isso,

ainda me permiti elaborar um sentido para a existência de

toda humanidade.

Os dois sentidos se ligam como tudo o mais se analisado com

a medida distância.

O sentido da vida pessoal só pode ser viver ao máximo

possível, buscar a intensidade. A mim busco no

pensamento e na vida prática. Sinto muito dos dois

modos, assim como também reflito igualmente.

Porém, ao contrário de outros pensadores racionais, os

que têm coragem para não crer em certezas falsas como

outra vida depois desta ou na existência de Deus para

nos salvar; ou dos demais que não aguentam a incerteza

de viver e se apegam a dogmas por medo do mistério e

do fim, eu descobri uma esperança para nós, racional

e possível, embora, como deve ser, sem certezas de seu

sucesso.

Este é o meu sentido para a humanidade como um todo:

uma chance para nos salvarmos através de nós mesmos

nesta vida, e não em sonhos de mitologias perdidas,

chama-se a busca pelo conhecimento nas suas últimas

consequências. Isto é, objetivar e dominar toda a verdade.

Eu sei, o quanto a qualquer consumidor da livre razão parece

ingênuo julgar possível conhecer toda verdade. Mas eu

conto com as novas descobertas. No ponto histórico

no qual nos encontramos, esta possibilidade surge no

horizonte, como que quebrando o necessário encontro

entre o céu e a terra onde enxergamos o fim da ilusão de

ótica. Então, encarar a limitação do homem atual como a

limitação do conhecimento possível é como crer na ilusão

onde o céu encontra a terra. É o que vemos, mas quem

disse que vemos tudo?

Quem disse que não podemos usar toda nossa capacidade

para chegar aos nossos limites e criarmos os seres que irão

além de nós?

Se nós não podemos chegar a todas as respostas de todas

as perguntas, isso não significa duas coisas: a primeira,

pelo fato de não sermos capazes de conhecer a verdade de

todas as coisas, não significa, absolutamente, que ela não

exista; segunda, não importa também, na impossibilidade

de seres mais avançados genética e ciberneticamente, os

Page 21: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

Filhos do Vácuo | 3938 | Sérgio Canarim

quais podem ser criados pelos nossos conhecimentos se

não pararmos de buscar, de serem eles capazes de chegar

ao conhecimento absoluto.

Ou seja, podemos, indo ao nosso máximo, criar nossos

sucessores, e estes, por sua vez, chegando ao seu limite,

poderão criar seus sucessores, e assim sucessivamente, até

o dia da compreensão e do domínio total do universo e

do que houver além dele. Isso, cabe sempre ressaltar, não é

um dogma, pois não é uma certeza e sim uma chance.

Mas, se a única certeza é que só podemos contar com esta

vida, então vale a pena tentar dominar a verdade para

dominar esta vida.

Se através dos tempos se chegar a esse fim, tudo será possível:

poderemos dominar as leis do universo e não mais nos

sujeitarmos a elas. O que resolve o nosso maior dilema: o

fim da vida. Uma vez dominado todos os segredos, tudo

pode ser feito. A imortalidade, a ressurreição se tornam

alternativas racionais e possíveis.

Então, o que nós intermediários dessa chance de salvação

poderemos fazer para ajudar a meta?

Simplesmente buscarmos os nossos limites.

O absoluto, diz Hegel, “só no final será o que ele é na

realidade”.

O pior da loucura

Os fantasmas não existem

O sexo nos comanda

Maldita natureza nos prega peças

A vida acaba

NIETZSCHE teve alguma razão

Page 22: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

40 | Sérgio Canarim Filhos do Vácuo | 41

A janela pro mundo

Estava na janela de meu quarto e de repente olhei a

imensidão da cidade, o horizonte do céu.

Percebi que existia e que ia existir por muito tempo! Na

verdade, não o percebi como se fosse a primeira vez,

já que há muito iniciei meus questionamentos sobre a

realidade e a verdade. Mas eu senti naquele instante a

existência se concretizando no meu pensamento.

Que o mundo estava aí imenso para mim e que eu iria

concretizar minhas obras e que iria aumentar minha

transcendência e veria mais claramente meus vislumbres!

Então, um arrepio percorreu todo meu corpo, e uma

felicidade invadiu minha essência meu cérebro meu ser.

E foi efêmera como um instante, é assim que eu sinto

o mundo, é assim que acontece o meu estar-aí, num

turbilhão de sensações que variam a todo instante de

sentido e intensidade. Estranho é que um sentimento que

significa o inverso, o antípoda ao movimento que um

turbilhão representa – o tédio – também ocorra de eu o

sentir!

Mas eu já encarei a finitude de frente, já admiti a não

existência como o fim inevitável que não pode ser

descartado.

Depois disso, não existem mais questões que não se possa

tentar resolver.

Quando se parte da premissa de que se pode não existir

algum dia, a coragem invade os pulmões como se as

fraquezas fossem questões temporais.

A liberdade escorre pela boca e não há mais volta, não há

como esquecer.

Quando se inicia o livre pensamento, toma-se a pílula

da visão da Matrix de fora, a caverna fica lá atrás com

suas sombras, o circo toma forma, a visão do todo fica

clara, mas não dizível, mas não compreensível, mas não

totalmente explicável. O que importa é que ela está lá e

não há nada que se possa fazer para impedir a unidade de

todas as coisas.

Sempre à frente, mesmo que humanamente limitado, sempre

à frente!

Page 23: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

42 | Sérgio Canarim Filhos do Vácuo | 43

O amor [second revolution of the mind (segunda revolução da

consciência)]

primeiro nível de transcendÊNCIA

AHHHHHHHHHHHHHHHHHH ........................................

...............................................................................................

...............................................................................................

..............................................................................................

Asçldka~dlçkas~dlçaskdãsklçdas~dlçkasdõçEIR[OPIER-

PWOERICM[]WE´RIOQW]E´R

ERDWERWEFRWERFWERWER

WER

WER

SDFSADGASDFG

Está descoberto!!!!!!!!!!!!!

Ficou claro de uma maneira espantosa

neste momento em que escrevo

Pode-se amar um número ilimitado de pessoas

ao mesmo tempo!!!!!!!!!

Pode-se ver quem se ama amando

um número ilimitado de pessoas

ao mesmo tempo

Sem ciúmes

Só sendo feliz pelo amor que faz flutuar

e que faz quem tu amas flutuar

mesmo quando estamos a amar outras pessoas.

O amor no sentido mais pleno de todos,

além de Jesus, compreendem isso!?

Além de Jesus!

Eu disse além de Jesus!!

Eu disse além do que já foi dito sobre o amor!!!

Eu disse além!

Eu disse além!

Eu disse além!

Eu disse além

Aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh

hhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhaaaaaaaaaaaaaaahhhhhhhhhh

hhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh

hhhhhhhhhhh.......................................................................

...............................................................................................

...............................................................................................

...............................................................................................

............................................................................................

Estou fraco.........

Transbordando deste amor por um instante

Second Moment of the second revolution of the mind (segundo

momento da segunda revolução da coNSCiência)

Já sóbrio daquele momento do amor absoluto, volto a escrever....

No futuro longínquo as pessoas poderão já nascer para amar

a todos assim como descrevi:

este amor completo (em todas suas formas, em todo seu

desapego) poderá vir impresso nos seres.

Page 24: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

44 | Sérgio Canarim Filhos do Vácuo | 45

A janela para a academia e

correção à poesia de Macintyre

Novamente, na mesma janela de meu quarto, súbito me veio

a certeza de que posso comprovar minhas teses diante da

inquisição da banca.

Partindo desta ideia, meu coração partiu acelerado para

batidas fortes e rápidas. Um arrepio percorreu o meu ser a

respiração tornou-se ofegante meus olhos encharcarem-se

embotados de cimento e lágrimas.

Enquanto lia minha tese, as últimas peças do quebra-cabeça

encontraram repouso no fechamento da figura que

presumia já estar completa, agora me sinto seguro e cheio

de potência e medo.

Descobri, também, que na minha última incursão poética

houve um pequeno erro quando afirmei que meus

vislumbres do futuro longínquo não me chegaram

pela linguagem. O que quis dizer, na verdade, é que

não partiam da tradição, pelo menos não diretamente

da tradição, ou seja, a história acumulada no mundo

serviu de comprovação, ou melhor, vem servindo de

comprovação, vem enchendo de sentido minhas ideias,

mas elas não existiam completamente fora de mim,

ou, como disse na outra poesia, não me chegaram

integralmente pela linguagem. É claro que as formulei

com a linguagem, apesar de haver pontos em que a

linguagem atual não consegue explicar os seus jogos de

sentido, e, assim, eu também não consigo explicá-los além

da minha intuição criativa.

Estou prestes a defender minha primeira tese filosófica. Não é

o fim do caminho, mas a primeira entrada acadêmica para

além do senso comum. Agora nada poderá me deter

o voo transcende

o espaço-tempo

o céu não é o limite!

Page 25: Sample Filhos do Vácuo: Cartas ao homem-Deus

46 | Sérgio Canarim Filhos do Vácuo | 47

Eu sou um maldito metafísico

que gosta, além de buscar o Absoluto,

de percorrer todos os cantinhos do pensamento.

Tornando, assim, a coisa mais interessante!

Sempre adiante numa busca interminável dos limites do Ser

A mente vive numa sinapse sem limite, onde algo,

que não posso expressar plenamente pela linguagem, acontece.

Chamarei esse algo de turbilhão por problemas linguísticos

O que posso dizer... quando se vive assim,

nada é importante,

nada é realmente importante

apenas a finitude vez que outra bate a minha porta

com seus dentes ferozes de noite, de nada.

Aí, a(o) maldita(o) costuma assustar-me por algum tempo.

Aos que vivem percorrendo o abismo do Ser e não Ser,

de tudo e de cada coisa,

as desgraças são questões temporais.

E a única verdadeira desgraça definitiva é:

a morte ou o fim da consciência.

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Sérgio Canarim

Sérgio CanarimFilhos do Vácuo

Filhos do VácuoCartas ao homem-Deus

Cartas ao hom

em-D

eus

SÉRGIO KROEFF CANARIM nasceu em 1980. Formou-se em Direi-to, porém procurava algo mais fundamental. Morou na Europa e escreveu muito lá, mas houve um acidente com as obras desse período. Ao final da aventura europeia escreveu os primeiros esboços do que viria a ser uma nova forma de pensar. No retor-no ao Brasil, cursou Filosofia e descobriu que todos os princí-pios fundamentais que buscam alicerçar o conhecimento são, na verdade, incertos. Baseiam-se na lógica do pensamento e não na realidade do mundo.

sentindo desse livro é abrir novas possibilida-

des de se pensar, de se construir a linguagem e até mesmo de se viver.

Quando a linguagem cruza com a poesia e a filosofia, explode e implode a si mesma.

A obra traz à tona pensa-mentos e escritos poético-filosóficos que vêm sendo desenvolvidos pelo autor nos últimos 15 anos. Nas cartas e poesias escolhidas existe a abertura seminal de uma nova filosofia, as quais levarão o leitor ao próximo livro.

www.facebook.com/SergioKCanarim

QUANDO SE DERRUBA MITOS O VÁCUO É O NOSSO CHÃO

ssim como na tradição de Heráclito, Epicuro, Nietzsche e Pessoa aqui nasce

uma nova poesia-metafísica ou será uma nova metafísica-poética?

O autor dialoga intensamente com os pen-sadores, dos pré-socráticos aos dias de hoje, parando principalmente diante de Nietzsche e Heidegger nesse novo arrombo tautológico.

O homem-Deus supera a si mesmo na lite-ratura de Sérgio Canarim.