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A D IVERSIDADE DA G EOGRAFIA B RASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO 6328 REVITALIZAÇÃO DO SISTEMA PORTUÁRIO NACIONAL E A REVALORIZAÇÃO DA CABOTAGEM NO BRASIL MARIANA DE BARROS ZEFERINO 1 Resumo: O presente trabalho aborda o descaso apresentado durante longos anos pelo sistema portuário nacional, bem como a retração no transporte de cabotagem, destacando as possíveis causas, consequências e o momento em que começa a se recuperar. A crise esta relacionada com o precário desenvolvimento dos portos frente ao mercado mundial, sentido até hoje, prejudicando demasiadamente o desenvolvimento econômico do país. Os portos são um mecanismo vital para a economia, onde pulsa o desenvolvimento, desta maneira, entende-se a necessidade de se revitalizar e modernizar o setor para que haja o crescimento econômico do Brasil. Palavras-chave: Portos; transporte de cabotagem; desenvolvimento. Abstract: This study addresses the neglect shown for many years by the national port system, as well as the decrease in coastal shipping, highlighting possible causes, consequences and the moment he begins to recover. The crisis is related to the precarious development of ports across the world market , meaning today , too hampering the country's economic development . Ports are a vital mechanism for the economy, which beats the development in this way means the need to revitalize and modernize the sector so that there is economic growth in Brazil. Key-words: Ports; coastal shipping; development. 1 Introdução O sistema portuário brasileiro durante um longo período esteve em condições precárias, provocado pelo descaso de uma administração ineficiente e carência de recursos. O abandono em que os portos estavam submetidos evidenciava as lacunas nas infraestruturas, os equipamentos obsoletos, a escassez de tecnologias e ineficiência nas atividades portuárias, principalmente a partir da introdução dos contêineres como peça fundamental na movimentação de mercadorias portuárias, provocando mudanças profundas nas atividades desenvolvidas no cais e criando novas necessidades, como a utilização de novos equipamentos especializados. Essas situações refletiam diretamente no desempenho da economia do país diante do cenário mundial. 1 - Acadêmica do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail de contato: [email protected]

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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO

DE 9 A 12 DE OUTUBRO

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REVITALIZAÇÃO DO SISTEMA PORTUÁRIO NACIONAL E A REVALORIZAÇÃO DA CABOTAGEM NO BRASIL

MARIANA DE BARROS ZEFERINO1

Resumo: O presente trabalho aborda o descaso apresentado durante longos anos pelo sistema portuário nacional, bem como a retração no transporte de cabotagem, destacando as possíveis causas, consequências e o momento em que começa a se recuperar. A crise esta relacionada com o precário desenvolvimento dos portos frente ao mercado mundial, sentido até hoje, prejudicando demasiadamente o desenvolvimento econômico do país. Os portos são um mecanismo vital para a economia, onde pulsa o desenvolvimento, desta maneira, entende-se a necessidade de se revitalizar e modernizar o setor para que haja o crescimento econômico do Brasil.

Palavras-chave: Portos; transporte de cabotagem; desenvolvimento.

Abstract: This study addresses the neglect shown for many years by the national port system, as well as the decrease in coastal shipping, highlighting possible causes, consequences and the moment he begins to recover. The crisis is related to the precarious development of ports across the world market , meaning today , too hampering the country's economic development . Ports are a vital mechanism for the economy, which beats the development in this way means the need to revitalize and modernize the sector so that there is economic growth in Brazil.

Key-words: Ports; coastal shipping; development.

1 – Introdução

O sistema portuário brasileiro durante um longo período esteve em condições

precárias, provocado pelo descaso de uma administração ineficiente e carência de

recursos. O abandono em que os portos estavam submetidos evidenciava as

lacunas nas infraestruturas, os equipamentos obsoletos, a escassez de tecnologias

e ineficiência nas atividades portuárias, principalmente a partir da introdução dos

contêineres como peça fundamental na movimentação de mercadorias portuárias,

provocando mudanças profundas nas atividades desenvolvidas no cais e criando

novas necessidades, como a utilização de novos equipamentos especializados.

Essas situações refletiam diretamente no desempenho da economia do país diante

do cenário mundial.

1 - Acadêmica do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Santa

Catarina. E-mail de contato: [email protected]

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Com os avanços portuários que foram ocorrendo entre os portos do mundo, a

situação do setor no Brasil se agravou, revelando o atrasado e a dificuldade para

competir com os demais, tornando imprescindível a revitalização do setor. Tais

medidas começam a ser tomadas no início da década de 90, através da extinção da

Portobrás em 1990 e posteriormente por meio da criação da Lei 8.630 em 1993,

conhecida como Lei de Modernização dos Portos, provocando uma descentralização

na administração dos portos, novas definições entre as competências do setor

público e privado, entre outras mudanças profundas. A introdução do setor privado

por meio de concessões nos portos brasileiros constituiu um passo bastante positivo

à medida que foram destinados significativos investimentos no setor, criando

condições favoráveis para a modernização dos terminais portuários, atuando como

impulso a sua recuperação. A utilização recorrente das rodovias também provocou

um declínio na atividade de cabotagem, tal comportamento, representou uma

redução rigorosa na frota mercante brasileira, bem como na falência de muitos

armadores, tornando a situação oportunista para a monopolização do setor por meio

de armadores com bandeiras estrangeiras. Junto com a modernização dos portos

brasileiros, houve também a imprescindibilidade de recuperar a frota de navios do

país, através de incentivos e programas que desencadearam o surgimento de novos

estaleiros.

Assim, compreende-se que as atividades portuárias evidenciam a conjuntura

econômica de um país e através dos portos pulsa o desenvolvimento da economia

nacional, portanto justifica-se a importância da revitalização do setor portuário à

medida que a maior parte das exportações nacionais dependem deste modal para

serem escoadas. Para tanto, o presente artigo visa demonstrar a importância dos

portos e do transporte de cabotagem para o desenvolvimento econômico de um

país, abordando o início da crise no setor portuário, bem como suas possíveis

causas, consequências e momento de recuperação dos portos e a revitalização da

navegação de cabotagem.

Para o desenvolvimento do presente trabalho os procedimentos

metodológicos utilizados foram inicialmente a pesquisa bibliográfica constituindo o

embasamento teórico e dados históricos. O segundo momento da pesquisa se deu

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através da consulta a materiais mais atualizados, como sites institucionais ligados ao

setor portuário e navegação, constituindo os dados estatísticos. Em seguida foi feita

a organização dos dados e a redação do artigo.

2 – O descaso do setor portuário brasileiro

O princípio das atividades portuárias no Brasil é condizente com a

colonização europeia, primeiramente portuguesa, responsável por criar uma

atividade de exploração na colônia e consequentemente à comercialização dos

produtos com a metrópole. Posteriormente a abertura dos portos as nações amigas

ocorrida em 1808, foi significativamente importante para o setor marítimo, momento

em que o Brasil abre-se para o comércio internacional, através das exportações de

ouro, madeira, entre outras mercadorias.

No fim do século XIX e início do século XX, iniciam-se as concessões para a

construção dos portos pelo país. Outro marco importante foi a criação da Inspetoria

Federal de Portos, Rios e Canais e a Inspetoria Federal de Navegação pelo governo

federal no ano de 1911 com o objetivo de regular o sistema portuário. Em 1932,

houve a união dessas inspetorias para a formação do Departamento Nacional de

Portos e Navegação que posteriormente, em 1975, por meio da Lei nº 6.222, é

extinto dando origem a Empresa de Portos do Brasil S.A., Portobrás, que vinculada

ao Ministério dos Transportes tinha função de coordenar todas as atividades

relacionadas aos portos e vias navegáveis interiores, segundo Secretária dos Portos

(2015).

A Portobrás atuou na administração portuária brasileira por 15 anos, e este

intervalo de tempo resultou no desleixo e deterioração alcançado pelo setor. Esta

administração foi marcada por escassos investimentos públicos, evidenciando um

cenário hostil, carência operacional e de infraestrutura existente em muitos portos do

país.

Mamigonian (1999) afirma que na década de 70, houve fortes investimentos

em infraestruturas, mas também a política do governo brasileiro foi de emprestar

dinheiro às empresas privadas nacionais de equipamentos, ficando prisioneiro da

elevação de juros dos empréstimos estrangeiros e depois dos empréstimos internos,

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e assim os investimentos que estavam sendo feitos em ferrovias, usinas de

eletricidade, portos, rodovias, etc, foram todos paralisados, formando o que ele

chama de “nós de estrangulamentos” nestes setores, como é o caso do setor

portuário.

Com a mundialização do capital, o comércio entre os países aumentou

significativamente resultando no crescimento das atividades portuárias e o próprio

desenvolvimento dos portos. Segundo Chesnais (1996) a integração internacional,

resulta principalmente das políticas de liberalização e desregulamentação,

proporcionando a abertura nacional. O atraso dos portos brasileiros em relação ao

cenário mundial esta ligado também ao advento dos contêineres, que foi um marco

revolucionário no transporte marítimo de cargas, porém, para o Brasil, este

progresso de início se tornou um obstáculo para o desenvolvimento dos portos

nacionais, tendo em vista que as atividades conteinerizadas modificaram

completamente o cotidiano portuário. Zeferino (2012) comenta que os contentores

facilitaram as operações de cargas em todos os modais, ao proporcionar a

multimodalidade dos transportes, além de conferir mais segurança para as cargas

transportadas. Além de que a evolução ocorrida com o uso de contêineres no

transporte marítimo de cargas serviu para expandir ainda mais as relações

comerciais entre os países, é o que esclarece Levinson (2009) ao comentar que a

nova geografia a que os contêineres criaram permitiu à aquelas empresas que

tinham apenas interesses de comercializar seus produtos internamente tornarem-se

empresas reconhecidas mundialmente, através da facilidade de transportar,

proporcionada pelos contentores. O advento dos contêineres também foi

responsável por modificar completamente o cenário portuário, provocando a

especialização do setor, com a introdução de equipamentos como os guindastes,

pontes rolantes, entre outros, desencadeando na mecanização, ou seja, substituição

de grande parte da mão de obra existe.

A falta de investimentos na área portuária por meio do poder público brasileiro

impossibilitou a reforma das estruturas portuárias necessárias a movimentação de

contêineres. É claro, que foram registradas algumas mudanças neste sentido, mas

não da maneira como deveria ter sido efetuada de fato, através de investimentos

pesados em tecnologias, obras nas infraestruturas entre outros aspectos. O que

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houve na realidade foram reajustes, não havendo uma mudança verdadeiramente

estrutural. O resultado é o quadro encontrado até hoje nos portos brasileiros,

péssimas condições de acessos, berços com calado baixo, estando dependente do

processo de dragagem e dificultando a entrada de navios maiores, que são

consequência das novas demandas de mercado, além da carência de espaço para

armazenar as cargas, excesso de burocracias entre outros obstáculos.

2.1 – O processo de revitalização do sistema portuário nacional

Com a extinção da Portobrás em 1990, foram criados a Secretária Nacional

de Transportes e o Departamento Nacional de Transportes Aquaviários, e através do

advento da lei 8.630 de 1993, também conhecida como lei de Modernização dos

Portos nota-se o início da recuperação do setor portuário nacional.

A execução de fato da lei passou por alguns obstáculos para sua

concretização, como por exemplo, a resistência das Companhias Docas que tiveram

suas atribuições destinadas a inciativa privada, causado desconfortos entre os

servidores públicos. A lei provocou mudanças na estrutura portuária existente até

então, modificando as operações, administrações e relações trabalhistas. De acordo

com a Secretária dos Portos (2015) uma das principais mudanças foi a parceria com

o setor privado através de arrendamentos e concessões, ocorrendo também

transformações no regime de exploração dos portos organizados e instalações

portuárias, com a maior participação de estados, municípios e do próprio setor

privado.

Nota-se, que a alternância entre o poder público e o privado, é uma situação

recorrente na história econômica do Brasil, percebe-se também que a distribuição de

administração de alguns setores, ora nas mãos do Estado, ora controlada por

grandes empresários, é condizente com o andamento da economia nacional,

permeando entre investimentos de recursos e a escassez dos mesmos. Rangel

(2005) comenta que o estado tem um papel importante na economia, mas não quer

dizer que sua intervenção seja sempre efetiva e consciente, apontando que em

grande parte, suas ações são feitas para remediar de imediato, e causadas algum

efeito logo são esquecidas. Porém sua importância está no papel de comerciante,

que segundo Rangel (2005, p. 353) “é indispensável para que o capitalismo se

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consolide e se reforce no interior, na indústria como na agricultura”. Ainda relata que

é comum então em momentos de crise a redistribuição das atividades econômicas

entre os setores público e privado.

As mudanças causadas pela Lei 8.630, foram positivas no sentido de

introduzir mais investimentos ao setor que até então estava sucateado. Desde

então, o cenário nos portos nacionais tem se modificado, através da modernização

das atividades portuárias, com a aquisição de novos equipamentos, tecnologias,

obras de infraestrutura, tanto nos portos quanto nos acessos a eles, além de

estimular a competição entre os próprios portos do Brasil e claro a redução de

custos operacionais. Segundo Oliveira (2011) a lei estabeleceu o espírito de

competição, através da melhoria dos serviços, e assim os portos e terminais

privados começaram a disputarem cargas, inclusive de outros estados.

Assim, nas últimas duas décadas sentiu-se a necessidade profunda de

realizar mudanças estratégicas no setor portuário nacional, entendendo como este é

um organismo vital para o próprio desenvolvimento da economia do país. Surgem

novas políticas desenvolvimento, investimentos e projetos que desencadearam em

um novo quadro portuário. A lei 8.630, foi de extrema importância para o início das

mudanças. Com a maior participação do capital privado nos portos, notou-se, que

este estava começando a se recuperar. Foram introduzidas novas tecnologias, tanto

na área de infraestruturas, através de equipamentos modernos de movimentação de

carga, como também houve uma evolução da logística aplicada aos portos, com a

utilização de softwares. Segundo Monié (2011), a precariedade obrigou as empresas

deste ramo a desenvolverem novas estratégias de expansão, assim como o acesso

aos dispositivos logísticos, constituindo um fator de competitividade. Um bom plano

logístico pode interferir, nas operações portuárias, no preço final dos produtos e

consequentemente no desempenho econômico do país.

Dentre o planejamento para a recuperação do setor portuário brasileiro, pode-

se destacar alguns investimentos previstos no Programa de Aceleração do

Crescimento (PAC 1 e 2), que têm como objetivo reduzir a ineficiência em

infraestruturas no Brasil, um grande entrave para o desenvolvimento do país. No

PAC 1, foram aplicados cerca de 1,88 bilhão nos portos nacionais, e dessa quantia

745 milhões utilizados no Programa de Dragagem (PND) e o restante em obras de

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melhorias relacionadas a infraestruturas portuárias. Segundo o PAC (2014), algumas

das obras de grande relevância no setor realizadas pelo programa foram: a

ampliação dos Molhes do porto de Rio Grande, ampliação do píer de Vila do Conde,

dragagem e aprofundamento no porto de Santos, entre outras obras.

Além do PAC, também pode ser destacado o Programa de Investimentos em

Logística (PIL).2 Segundo o PIL serão investidos o total de 198,4 bilhões e desse

total, 69,2 bilhões entre este ano e 2018 e o restante a partir de 2019. No setor

portuário, o investimento será na base de 37,4 bilhões de reais. Dentre esses

investimentos estão previstos concessões portuárias, incluindo 50 novos

arrendamentos (11,9 bilhões), 63 novas autorizações para terminais de uso Privado

(14,7 bilhões) e mais renovações antecipadas de arrendamentos (10,8 bilhões).

O diagnóstico da situação portuária brasileira já está dado, o quadro ainda

apresenta atrasos significativos em relação a outros países, como a própria

burocracia, a saturação dos portos do Sul e Sudeste, que concentram grande parte

das cargas, as más condições nos acessos aos portos, carência de ferrovias, que

possam contemplar juntamente com o transporte rodoviário e marítimo a

multimodalidade. Atualmente percebe-se indícios da recuperação do setor, porém é

notório, que o caminho a se percorrer é longo e trabalhoso, em busca de maior

funcionalidade e modernização.

3 – A navegação de cabotagem

Uma análise do transporte marítimo no Brasil revela uma valorização e

predominância do transporte de longo curso3, tal processo desencadeou em um

oligopólio estrangeiro que só se consolidou de fato pelas iniciativas neoliberais

criadas a partir da década de 90, enfraquecendo o transporte de cabotagem.

Segundo Moreira (2011) a cabotagem4 teve papel muito importante quando as

condições das estradas eram ainda muito precárias, tendo como auge o final do

2 Tem como objetivo a modernização da infraestrutura nos transportes nacionais.

3 A navegação de longo curso é uma categoria do transporte marítimo realizada internacionalmente, ou

seja, além da costa nacional e países vizinhos como Argentina e Uruguai que também entram na categoria

de cabotagem mais precisamente denominada de grande cabotagem. 4 A terminologia “Cabotagem” remete ao transporte realizado somente entre os portos de um mesmo

país.

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século XIX e também a década de 30 até os anos 70, demonstrando um período de

grande crescimento e integrando as cidades regionais litorâneas. Em 1982, juntam-

se alguns dos capitais mercantis do Rio de Janeiro e criam a Companhia de

Navegação Costeira, responsável pelo transporte de muitas pessoas no sentido

norte sul do Brasil e também pelo escoamento da produção de carvão realizada no

sul de Santa Catarina para os mercados consumidores. As companhias de

cabotagem, criadas no século XIX, ou até nos anos 30, não sobreviveram as

políticas de isenções praticadas as embarcações estrangeiras e que concediam um

preço muito acessível para circularem pelos portos brasileiros, fazendo com que a

cabotagem brasileira se tornasse quase que insignificante e nossa frota de navios

obsoleta.

Boa parte do descaso com os portos brasileiros justifica-se pela dependência

nacional do transporte rodoviário de cargas. Esta dependência inicia-se no governo

de Juscelino Kubisctheck, que priorizou a construção de rodovias, e não alimentou

por meio de investimentos os outros setores como o modal ferroviário e marítimo,

deixando-os completamente abandonados. Com um litoral extenso como o do Brasil,

é inaceitável que a maior parte do transporte de cargas seja realizada por modal

rodoviário, sendo que é o transporte mais caro, dentre as opções marítimas e

ferroviárias. Para George (1973) o transporte marítimo é maciço e é capaz de

transportar grande quantidade de mercadoria por longas distâncias e por um valor

de frete relativamente baixo. Para tanto, não desconsidera-se a importância do

transporte rodoviário, somente através dele a cadeia de produção e distribuição se

faz completa, e os produtos podem ser distribuídos quase/se não diretamente aos

consumidores.

O Brasil agiu erroneamente ao não gerar estímulos necessários à navegação

de cabotagem. O transporte de cabotagem, assim como o ferroviário são

demasiadamente utilizados em muitos outros países. Além da falta de estímulos por

meio de políticas públicas e investimentos, registra-se isenções a embarcações

estrangeiras, tornando inviável os navios brasileiros competirem com esses países,

comenta Rodrigues (2011).

Felipe Junior (2012) enfatiza que com a Lei 8.630/93 houve uma

descentralização do sistema portuário, e maior participação da iniciativa privada,

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essa abertura para o capital privado abriu as portas para entrada de muitas

empresas internacionais como a Maersk Line, a MSC, CMA CGM, Cosco, China

Shipping, formando um oligopólio estrangeiro. Esse oligopólio de empresas

estrangeiras torna-se um entrave para o crescimento das empresas brasileiras de

cabotagem, que possuem dificuldades em competir com as internacionais.

Outros obstáculos ao desenvolvimento do transporte de cabotagem no país

são os altos preços nos combustíveis, que na cabotagem é cerca de 30% a mais do

que o rodoviário e 37% mais caro que os praticados para a navegação de longo

curso. O preço do combustível se torna um entrave para o desenvolvimento do setor

já que representa 15% do custo total das operações dos navios, impactando

consideravelmente o preço final dos produtos transportados. Outro fator a se

destacar é o custo operacional nos portos do Brasil, o que torna inviável muitas

empresas optarem por esse modal de transporte. Além é claro de custos elevados

na atividade de praticagem portuária que representa 40% dos custos portuários, de

acordo com Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ (2012).

3.1- O processo de revalorização da navegação de cabotagem

A revalorização do transporte de cabotagem no Brasil iniciou-se nas últimas

décadas, momento também em que os portos nacionais clamaram por

modernização. Com uma costa tão extensa seria estranho que o governo não se

atentasse para uma questão tão importante para o desenvolvimento da economia

brasileira. O transporte de cabotagem vem apresentando um crescimento nos

últimos anos, mas a sua utilização ainda é muito pequena comparada com a

capacidade que o país possui.

A falta de infraestrutura nas regiões com menos dinamismo é um dos entraves

para o crescimento da cabotagem nacional, predominando apenas nos locais onde

há mais fluxo de movimentação que é sul e sudeste, ou seja, nas regiões

concentradas, conceito utilizado por Santos e Silveira (2010). Nos últimos anos

houve um investimento neste setor por parte do PAC, que destinou alguns recursos

para melhorias e construções de diversos portos nacionais, inclusive no Nordeste.

Segundo a ANTAQ (2011) houve um aumento da frota de cabotagem brasileira em

2011, tal crescimento é justificado pelo auxílio do Fundo de Financiamento da

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Marinha Mercante, além dos investimentos do PAC. Criado em 2004, o Programa de

Modernização e Expansão da Frota – PROMEF foi elaborado com o intuito de

aumentar a produção de navios no país, através da melhoria e inovação dos

estaleiros brasileiros. No período entre 2011 e o primeiro semestre de 2014 a frota

de navios com bandeira brasileira na cabotagem passou de 156 navios para 183.

Com isso a movimentação de mercadorias transportadas pelo segmento também se

elevou, em 2011 foi responsável por transportar 138.645.183 toneladas e em 2014

este número passou para 147.141.320 toneladas, registrando um crescimento de

17,2% desde 2010, sendo o granel líquido a principal carga transportada pelo

através da cabotagem, que no primeiro semestre de 2014 representou 56,05% do

total de cargas, segundo ANTAQ (2014).

Segundo Moreira (2011) o crescimento verificado na construção naval se deu

devido principalmente à extração de offshore5 de óleo e gás, porém essas políticas

ainda não reativaram por completo o complexo marítimo brasileiro e todo o cenário

que o envolve, como os armadores de cabotagem e a própria indústria de peças de

navios, deixando o país ainda dependente de empresas estrangeiras e de fretes

altíssimo, resultado de uma série de carências no setor.

4- Considerações finais

Com a mundialização do capital e o aumento da comercialização entre os

países, os portos tornam-se mecanismo vitais para a economia. Sendo um dos

principais setores ligados a infraestruturas que avaliam o desenvolvimento de um

país. Atualmente o governo vem se alertando quanto a importância de se investir no

setor, através de políticas e programas públicos, com a destinação de investimentos,

visando a modernização e funcionalidade do setor portuário, por meio de obras de

infraestruturas, soluções logísticas entre outros ajustes. Porém, há que se destacar

que a realidade apresentada em termos de tecnologias, acessos ferroviários, fluviais

entre outros ainda é precária.

Desta maneira, percebe-se uma revalorização do setor portuário nacional, que

busca diminuir as adversidades e entraves para o desenvolvimento, à medida que

5 Termo inglês designado para caracterizar empresas de exploração petrolífera que operam na costa do

país.

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tenta acompanhar a demanda mundial. Verifica-se um estímulo ao transporte de

cabotagem nos últimos anos, porém é evidente que o caminho a se percorrer é

longo e trabalhoso. Entende-se a necessidade de se estimular ainda mais a

cabotagem, possibilitando vantagens as empresas brasileiras, por meio de

incentivos fiscais, redução dos custos operacionais nos portos, entre outras

estímulos para que elas possam competir com as demais estrangeiras que atuam no

ramo marítimo dentro do país.

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