revista nós nº 3

60
NÓS Nº.03 Junho de 2011 ISSN 2236-0425

Upload: rede-cultura-jovem-rcj

Post on 29-Mar-2016

243 views

Category:

Documents


8 download

DESCRIPTION

Revista colaborativa sobre arte e cultura jovem capixabas lançada em junho de 2011 pelo Programa Rede Cultura Jovem - SECULT ES.

TRANSCRIPT

Page 1: Revista Nós nº 3

PARCERIA: REALIZAÇÃO:

N Ó S N º. 0 3 • J u n h o d e 2 0 1 1

I S S N 2 2 3 6 - 0 4 2 5

Jun

ho

de

20

11

n

º3

Rev

ista

sIS

SN 2

23

6-0

42

5

Page 2: Revista Nós nº 3
Page 3: Revista Nós nº 3

A revista Nós chega a seu terceiro número e se consolida como um importante veículo de comunicação das juven-tudes do Espírito Santo. Dentre as várias ações imple-mentadas pelo Programa Rede Cultura Jovem (PRCJ), a repercussão alcançada pela revista tem sido especialmente relevante e nos estimula a investir cada vez mais em po-líticas que fomentem a participação ativa dos jovens na construção de uma sociedade mais igualitária e que forta-leçam as diversas expressões culturais das novas gerações.

A partir deste número, a Nós desdobra-se por meio de conteúdos multimídias disponibilizados no Portal YAH!. Desse modo, é ampliada a participação dos leitores que podem acessar, sugerir e comentar textos, fotos e vídeos que compõem a publicação. Vale mencionar que a equi-pe do PRCJ incentiva o envolvimento de jovens de todo o Estado na elaboração dos temas e em todo o processo de criação da revista.

Acreditamos que o trabalho contínuo em prol das juventu-des realizado pela Secretaria de Estado da Cultura do Espí-rito Santo, com foco na arte e na cultura, tem contribuído para o avanço social, político e cultural de nosso Estado.

Boa leitura a todos!

José Paulo ViçosiSecretario de Estado da Cultura do Espírito Santo

Page 4: Revista Nós nº 3

Caro Leitor,

A partir da ação colaborativa, a revista Nós promove a visibilidade das diversas expressões das juventudes do Espírito Santo. Um corpo de 28 colaboradores foi mobilizado para criar abordagens nos mais diferentes formatos. O resultado é uma publicação recheada de entusiasmo e inventividade.

Nessa terceira edição, temas como trabalho, par-ticipação e experimentação estão presentes em quase todas as pautas. Aqui, a produção artístico-cultural protagonizada por jovens capixabas é abordada por meio de textos, fotos e ilustrações cuja autoria per-tence a articulistas e criadores igualmente jovens.

Com mais páginas, a Nós também irá estender a sua ação editorial para o ambiente web. Em breve, além de ser disponibilizada na internet, a construção da publicação também poderá ser acompanhada pelo meio virtual. Com isso, o processo editorial da revista estimula uma permanente atmosfera de colaborativi-dade por meio da veiculação de conteúdos multimídia.

Repercurta a Nós e contribua com a expansão desse espaço dedicado à arte e à cultura jovem capixaba!

EDITORIAL

Page 6: Revista Nós nº 3

09

27

12

06

07

08

16

02

* Os perfis e os contatos dos colaboradores desta edição estão na página 55.

6 · COLABORADORES

01. André Arçari02. Ariny Bianchi03. Brunella França04. Dayane Freitas05. Fabiano de Oliveira (Alemão)06. Felipe Puff Gomes 07. Felipe Mourad08. Filipe Mecenas09. Gustavo Senna Azeite10. Henrik Carpanedo11. Isabella Mariano12. Ivo Godoy13. Karina Viega14. Laíssa Costa Gamaro15. Lívia Corbellari16. Lorena Regattieri17. Luara Monteiro18. Marianna Schmidt19. Natássya Carvalho20. Nina Uyttenhove21. Paula Dorsch22. Rafael Lobo23. Rodrigo Hipólito24. Saulo Pratti25. Savya Alana26. Sthefany Frassi27. Wérllen Castro28. Yury Aires

Page 7: Revista Nós nº 3

14

24

25

11

17

20

18

15

10

13

05

03

22 01

21

04

19

28

26

23

Page 8: Revista Nós nº 3

Lançado no final de janeiro deste ano, o álbum CMDO Guatemala, de Fepaschoal, se destacou em im-portantes plataformas digitais de distribuição da música indepen-dente. No final de fevereiro, uma das faixas do disco ocupou o pri-meiro lugar entre as 40 mais aces-sadas do Trama Virtual e chegou

Sustentabilidade, colaborativismo, produção cultural e economia solidária são os elementos básicos que regem o Circuito Fora do Eixo. Atualmente, o Circuito articula e gera visibilidade para iniciativas espalhadas em cidades que estavam à margem da circulação artístico-cultural do Brasil.

Faz um ano que essa rede fortalece sua atuação no Espírito Santo e tem desenvolvido diversas ações com

A CULTURA CAPIXABA ESTÁ DENTRO DO FORA DO EIXO foradoeixoes.wordpress.com

um grande poder de mobilização. Por aqui, foi aberta a sede do Escritório FDE/ES e realizado o Festival Grito Rock Vitória já nos primeiros meses de 2011.

Nas terras capixabas, o Fora do Eixo trabalha com vários coletivos multi-artísticos, além de agregar cineclubes e bandas em torno de um objetivo comum: movimentar a cena capixaba e criar mais espaços e oportunidades para quem trabalha com cultura.

a fazer parte da lista com as dez músicas recomendadas pelo site. A boa repercussão rendeu o convite para o músico participar, no final de maio, de uma edição do En-saio Ao Vivo pela TV Trama. Antes disso, o CMDO Guatemala tam-bém havia ganhado a home do site norte-americano ONErpm.

CIRCUITO

O COmANDO DIgITAL DE FEPAS

FOTO LUARA MONTEIRO

Page 9: Revista Nós nº 3

ARTE URBANA CAPIXABA

O graffiti capixaba ganha espaço pela qualidade dos trabalhos e pelo seu poder de articulação. A Semana do Graffitti, realizada entre 27 de março e 02 de abril deste ano, apresentou uma extensa programação e envolveu Vitória, Vila Velha, Serra e Guarapari. Nessas cidades aconteceram exposições, intervenções urbanas, bate-papos, exibição audiovisual, palestras e apresentações musicais.

Esse calendário em torno da arte urbana movimentou um público de cerca de mil pessoas. No próximo ano, o evento deve ser ampliado e ter uma participação ainda maior de grafiteiros de outros estados; o que gera uma projeção para a cena local, além do intercâmbio de estilos e de técnicas.

No mês anterior à Semana do Graffiti, a galera também havia colocado seus sprays para funcionar em Cachoeiro do Itapemirim, mais especificamente, na rua onde fica a casa na qual o cantor e compositor Roberto Carlos passou sua infância. Desenhos sobre a carreira do Rei agora ocupam o entorno da residência.

PARA APRENDER A gOSTAR DE mÚSICA

www.fames.es.gov.br

No último mês de abril, a Orquestra Pop Jovem da Faculdade de Música do Espí-rito Santo (Fames) deu início à tempe-rada 2011 dos Concertos Didáticos. As apresentações fazem parte do projeto Cultura na Escola, iniciativa da Secreta-ria de Estado da Cultura do Espírito San-to (Sedu) voltada para os alunos da rede estadual de ensino.A série de concertos acontece sempre com grupos da Fames que são renoma-dos pelo destaque no cenário da música nacional. Nessas apresentações, a músi-ca é abordada e narrada de maneira di-dática, dando a oportunidade dos alunos apreciarem e aprenderem sobre a obra, o autor e os instrumentos musicais.Para saber sobre o projeto e o calendário de concertos acesse o site ou entre em contato com a assessoria de comunica-ção da Fames pelo telefone 3636-3611.

POLÍTICA DE JOVEm PARA JOVEm

No último dia 14 de maio, foi lançada a Frente de Políticas Públicas de Ju-ventude do Espírito Santo. Constituí-da por entidades preocupadas com a efetivação das políticas voltadas aos jovens, esse espaço de articulação visa mobilizar as diversas juventudes capi-xabas para a 2ª Conferência Nacional de Políticas de Juventude, prevista para dezembro deste ano. A Frente também reivindica a instituição do Plano e do Conselho Estadual de Juventude, pre-vistos pela Lei Estadual nº 8.594/07. Não fique de fora desse processo!

Entre os dias 21 e 24 de abril deste ano, Vitória foi sede do 7º Encontro Regional de Estudantes de Design ES/RJ: o RDesign. O evento abordou a importância da cultura material e influência da memória gráfica e dos processos técnicos mais rudimentares do design na sociedade contemporânea.

O encontrou contou com 370 participantes vindos de várias partes do País. Essa diversidade proporcionou um ambiente de discussão, intercâmbio e enriquecimento intelectual. O Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes), em Jucutuquara, foi o local do 7º RDesign. A programação contou com apresentações de trabalhos acadêmicos, oficinas, palestras e, claro, festas descoladas e bem animadas!

Um POUCO DO 7º RDESIgN

CIRCUITO · 9

Page 10: Revista Nós nº 3

10 · CIRCUITO

PARA mEXER O CORPO

Entre os próximos dias 7 e 10 de julho, acontece o Festival ES de Dança. O evento, que vai ocupar os palcos do Theatro Carlos Gomes e do Teatro do Sesi, em Vitória, visa fortalecer o mercado de trabalho artístico na área da dança no Espírito Santo.

A programação do Festival contará com oficinas, mesas de debate, apresentação de coreografias de novos coreógrafos, espetáculos de dança de companhias locais, espetáculos nacionais de dança contemporânea para público infantil, além de dança urbana. A coreógrafa, bailarina, professora e pesquisadora de dança Angel Vianna será homenageada e também participará de uma das oficinas oferecidas pelo evento.

Até o final de maio, as companhias de dança e os coreógrafos locais puderam inscrever seus trabalhos para serem apresentados durante o Festival. O resultado desse cadastramento será divulgado este mês. A iniciativa é uma realização da Secretaria de Estado da Cultura (Secult), em parceria com o Instituto Sincades e o Sesi.

A gALERA NO TEATRO POPULARteatroencenacao.wordpress.com

Um público formado por cerca de 1.900 jovens, adolescentes e crianças do município de São Mateus assistiu à programação do I Festival de Teatro Araçá (Festa). A mostra, realizada entre 23 de maio e 3 de junho deste ano, apresentou textos feitos a partir de contos populares e aconteceu no Salão Benedito e nas escolas públicas de ensino fundamental da região.

Ao fim de cada apresentação, a galera participou de rodas de conversas sobre os detalhes da montagem e sobre a atuação do elenco. As peças foram produzidas a partir de oficinas de teatro amador desenvolvidas pelo projeto Lê Melhor Quem Lê a Vida, uma ação do Centro Cultural Araçás.

XVIII FESTIVAL DE INVERNO DE DOmINgOS mARTINSfestivaldomingosmartins.com.br

Entre os próximos dias 22 a 31 de julho, as montanhas capixabas ouvirão muita música clássica e popular. Nestes dias acontece o XVIII Festival de Inverno de Domingos Martins cuja edição celebra o bicentenário de nascimento do compositor húngaro Franz Liszt e também homenageia o compositor e poeta Nelson Antônio da Silva, Nelson Cavaquinho.

O evento é uma oportunidade para jovens músicos aperfeiçoarem seus conhecimentos, pois o corpo docente do Festival é formado por músicos de alto nível técnico e de reconhecimento internacional. Por lá também circula gente de várias partes do Espírito Santo e do Brasil, o que possibilita um excelente intercâmbio de experiências musicais.

As inscrições para 27 oficinas oferecidas este ano já estão abertas e podem ser feitas até o dia 15 de julho pelo site do evento.

Por inclinação artística ou pelo sim-ples divertimento, é comum os jo-vens formarem bandas com amigos para tocarem seus estilos preferidos. Muitos deles sonham em saírem da garagem e se apreasentarem para um público maior. A partir desse in-teresse, o Centro de Referência da Juventude de Vitória (CRJ) criou o projeto Ensaio Aberto, que incenti-va grupos independentes dando a

oportunidade de se apresenta-rem gratuitamente no espaço do próprio CRJ.

Os shows acontecem quinzenal-mente às sextas-feiras. Por lá, já passaram diversos gêneros musi-cais como rock, hip hop e reggae. O CRJ também mantém um estú-dio popular onde as bandas po-dem ensaiar de graça. Saiba mais pelo telefone 27-3132-4042.

SAIA DA gARAgEm!

Page 11: Revista Nós nº 3

A revista online Graciano traz resenhas, entrevistas, debates e publicações de textos literários. A publicação é uma realização do Cronópio – Discussão e Produção Literária, iniciativa vinculada ao Departamento de Comunicação da Universidade Federal do Espírito Santo e à RELer&Fazer – Rede de Experiências em Leitura, e lança um olhar jovem sobre a produção literária contemporânea capixaba. Nas páginas a seguir, Isabella Mariano, integrante da equipe editorial da Graciano, apresenta o poema de Sidney Spacini e a prosa de Brunella Brunello.

As seis edições da revista Graciano estão disponíveis em issuu.com/revistagraciano

CROCHê LITERáRIO · 11

Page 12: Revista Nós nº 3

Dois comprimidos redondos, redondospra eu dormir feito um nenémdoente de refluxome remexendo, contorcendo, masenfimdormindo o sono dos injustos. Quase 5:00 da manhã eu entreguei os pontos e fui até a prateleira das delícias tarja-preta encontrar qualquer coisa que me desse uma pancada tão forte, mas tão forte, que eu esquecesse a maldita dor auto-imposta e fosse dormir. Vide bula.Alucinações, tonteira, redução dos batimentos cardíacosParar o coração. Meti dois na boca de uma vez, joguei o último gole da última lata da última cerveja que havia em todo o univer-so do meu apartamento vazio mal iluminado. Amassei a lata contra a parede, quase um murro, me joguei na cama. Caixas de som cuspiam tango.Tudo pra mim era tango.Tomem conta de mimAgentes secretosintra-venosos.Supram-me de tudo que eu posso desejar:Paz Minha cama me dá nojo. É uma massa de sentimentos, palavras e gestos indeléveis ali feito almas penadas me assombrando.Talvez devesse mudar de cama.De apartamento.De corpo. A cabeça pulsa como se cansado de tudo.Entrego os pontos,e os prantos me erremque eu quero dormir.

Rivotril Sidney Spacini

12 · CROCHê LITERáRIO

FOTO FRANCISCO NETO

Page 13: Revista Nós nº 3

Era assim a moça dos olhos: tinha cabelos longos, um vestido bonito, uma sandália que não sei explicar. Ela deve, bem que deve gostar de praia, e agora está com muito calor. Vi a moça, pela primeira vez, no ônibus. Ela entrou e eu já estava lá, de frente para ela. Nós em pé, segurando na mesma barra, perto da porta. O dia era de sol e acho que nem eu, nem ela, queríamos pegar aquele ônibus, nem ônibus nenhum. Os olhos? Não sei se eram os dela, ou se eram os

meus. Sei que fui olhando e olhando aquilo tudo. Só não perdia o ponto porque a viagem da moça termi-nava antes da minha. Na primeira vez, desci, atônito, e fui fazer o que era de fazer. Na volta, no mesmo lugar que ela desceu, ela subiu. E lá estava ela, outra vez, na minha frente. Me percebeu e sorriu. Eu sorri também. Mas não sei se sorri do jeito certo, porque foi meio assim, de surpresa, meio atrapalhado. Mas sorri. Quis falar, mas coragem me faltou. A ela não. Era simpática, faladeira. Dava bom dia, oi, tchau, boa

tarde. Eu respondia e ela sorria. Ou ria. De mim, ou comigo. Não sei. Era dona da situação. Os encontros ficaram freqüentes e eu sempre quis perguntar, mas nunca consegui. As palavras paravam dentro da minha boca, ou a minha boca prendia as palavras. Não sei. Alguns dias ela estava impecável. Outros dias eu

ficava olhando, entre tanta gente, ela em outro canto, sem nem saber que eu estava ali. Às vezes nem sem-pre tão arrumada. A unha ficava sem esmalte, uns pê-los lhe cresciam nas pernas, sempre soltas. Mas não por muito tempo. Logo se arrumava toda e voltava, no outro dia, cheia de beleza. As pernas, fugindo de dentro daqueles vestidos,

frescos, coloridos, no comprimento exato para ficar curto, mas ficar bem. Os vestidos curtos, por onde o vento passava, sem nem mexer.

Moça dos OlhosBrunella Brunello

CROCHê LITERáRIO · 13

FOTO GUSTAVO SENNA

Page 14: Revista Nós nº 3

Comumenteexcêntricos

Isabella Mariano

O mais interessante, talvez, de analisar textos de al-guém, que faz parte do seu cotidiano ou que, pelo menos, já fez algumas raras aparições nele – como no caso da Brunella –, é que é possível, e quase in-controlável, encontrá-lo no enredo, nas linhas, nas entrelinhas. Não como um alguém escondido, pre-cisando não ser encontrado, mas uma forma escan-carada e me chamando pelo nome.

Por exemplo, a narração em primeira pessoa, com pensamentos em versos nem um pouco alea-tórios, e a rotina descrita na prosa toda dramática do remédio como escape me rememoram pedaços do Sidney. Pedaços dos olhos caídos, pedaços do cansaço por trás dos óculos.

“Rivotril” me lembrou também – sim, eu havia esquecido – de que é possível usar a prosa e o ver-so (não digo ”a poesia”, porque é um hiperônimo muito abrangente) concomitantes, como habitantes complementares de um mesmo espaço. Comple-mentares e interdependentes, nesse caso.

A narrativa descreve, limitada a seu papel de contar sem ser um relato, com algumas pitadas poéticas do drama do “último gole da última lata da última cerveja que havia em todo o universo do apartamento vazio mal iluminado”. E os versos vo-mitam, desabafam, gritam o cansaço, choram uma sutil angústia e cospem uma subjetividade desespe-rada por encontrar algo que o eu-lírico chama de

“paz”. É esse o objetivo, é esse o título. Os agentes secretos e o veneno antimonotonia como a busca da cura. Seria, quem sabe, o resumo do que se quer dizer, quando dizem, ‘nada como um dia após o ou-tro’. Dormir e esquecer o resto.

Em “Moça dos olhos”, apesar de não ter sido tão nítido, é claro, tive a ligeira impressão de ver a Bru-nella que vi no início de março, na Ufes, falando so-bre o Cronópio. “Era simpática, faladeira. Dava bom dia, oi, tchau, boa tarde”. O conto é, na verdade ou obviamente, um recorte feito por mãos delica-das de uma situação comum. Não digo que seja um relato, posto que existe muito sentimento grudado em cada gesto em cada letra. Não há nomes, não há passado e muito menos um futuro. Há o agora sendo contado por alguém encantado, declarada-mente encantado – pude ler no olhar – não por mu-lher, nem por uma menina, mas por uma moça. Que também me encantou.

Só em um momento do texto é que se vê de-nunciado o gênero do narrador. Se eu não tivesse lido “atônito”, no segundo parágrafo, talvez mi-nha imaginação tivesse produzido frutos diferentes. Mas estava ali denunciado um homem trabalhador iludibriado pelo carisma de uma capixaba mais sim-ples do que foi vista, quebrando com toda força a sua irritante e calorenta rotina. Uma ruptura que pode ter se transformado em cotidiano, mudando a história de um trabalhador cansado no ônibus para a de um trabalhador cansado no ônibus que, sem ser notado, ”ficava olhando, entre tanta gente”, a moça dos olhos.

Os textos têm um assunto em comum: o diá-rio, o dia-a-dia, o que sempre acontece. E o que eu gosto é encontrar um cotidiano que não seja o meu e uma rotina que, ao apenas conhecê-la, possa quebrar a minha própria. Claro! Escrever uma re-senha sobre textos de pessoas próximas certamen-te não faz parte do meu cotidiano e é justamente essa simplicidade do diário que tornam esses textos excepcionais: um olhar masculino escrito por mãos femininas em versos descontrolados dançando em cima da prosa são características com traços inco-muns utilizadas na tradução daquilo que é habitual. Não quis dizer excepcionais no sentido magnífico da palavra, mas na própria denotação que chama de excepcionais, as exceções.

14 · CROCHê LITERáRIO

Page 15: Revista Nós nº 3

NOVELO 16, Criadores de brincadeiraMatéria sobre o trabalho minucioso dos jovens profissionais que desenvolvem jogos de computador.

18, Fã clube dos nossos temposO infinito mundo ficcional da literatura fanfiction na primeira pessoa.

20, Blogosfera com estiloO uso da mídia virtual para aproximar a moda do cotidiano e empreender!

23, Democratização do cinemaO protagonismo juvenil tem espaço no movimento cineclubista capixaba.

26, Frenesi urbanoFlertes entre a cidade, a arte e o esporte são tema do ensaio que encerra a seção.

Page 16: Revista Nós nº 3

CONhEçA O TERRITóRIOUm quarto escuro. Entre roupas sujas espalhadas, exercí-cios de álgebra indecifráveis e bonequinhos de Star Wars está um sujeito magro, cheio de espinhas, com óculos e com sorriso metálico que clica freneticamente nos coman-dos de um jogo. Esse é o típico “nerd”, sujeito facilmente encontrado em filmes antigos de Sessão da Tarde.

Agora, o estereótipo antes tão pejorativo tem condicio-nado jovens a se tornarem verdadeiros mestres dos games – não como players (aquele mesmo magrelo compulsivo, que ficava dias trancado no quarto até vencer todas as fases no novo game), mas sim como produtores. Quem quer atuar nesse ramo tem que gostar muito de jogar e ficar por dentro de tudo na área. Além disso, é preciso ter raciocínio lógico apurado e sacar de Matemática e de Física, pois são conhecimentos fundamentais para o desenvolvimento de jogos de computador. Se uma bola quica, há uma explica-ção física de como isso deve ser feito. gANhAR A VIDA BRINCANDONas terras capixabas, divertir é a responsabilidade de jovens como Victor Abreu (24), que deixou seu traje de executivo e sua futura carreira em São Paulo para se dedicar profis-sionalmente à paixão pelos games – e eles não abrem mão das camisetas nerds e tudo mais. “Cursava Tecnologia da

Informação e tranquei no último período quando descobri o curso de Tecnologia em Jogos Digitais, em Vitória. Não me via de terno e gravata”, conta Victor.

A vida de professor também não interessou a Fabiano de Paula (21), que deixou a faculdade de Física também em São Paulo e agora desenvolve jogos casuais – aqueles feitos para redes sociais. Fabiano acredita que o Espírito Santo tem potencial para ser pólo desenvolvedor. Por isso, os pro-gramadores já estão se articulando.

No Estado, o curso de Tecnologia em Jogos Digitais é oferecido apenas pela Faesa. Recentemente, a faculdade firmou parceria com a Associação Comercial, Industrial e Cultural de Games (Acigames), entidade representante do mercado de games no Brasil e que tem promovido a cultura de jogos digitais no país. Iniciativas como a Asso-ciação Brasileira das Desenvolvedoras de Jogos Eletrônicos (Abragames) e o Simpósio de Games da Sociedade Brasilei-ra de Computação (SBGames) são também uma demon-stração de que, aos poucos, o Brasil deixa de ver os jogos digitais como mero entretenimento. AS FASES DO JOgOA criação de um jogo se parece com uma produção cin-ematográfica. Primeiro, são pensadas as ações dos per-

Conheça as experiências de jovens desenvolvedores que dedicam muito tempo e estudo para garantirem a sua diversão!

16 · NOVELO

Não é (só) brincadeira, não!

DAYANE ASSIS & NINA UYTTENHOVE

Page 17: Revista Nós nº 3

AVATAR INFECTADO

A evolução da tecnologia permite que os jogos sejam cada vez mais fieis ao mundo real, parecidos com produções de cinema. “Em 2005, jogadores de World of Warcraft levaram um susto com uma epidemia que infectou milhões de avatares (perfis) e, coincidência ou não, era semelhante (tanto em número de casos quanto em sintomas) à gripe suína de 2009.

PRODUçãO CAPIXABA

Até o fim do ano, a Extinto Gamer, equipe de Victor, deve lançar na loja virtual da Microsoft o jogo para Xbox 360 Los Santos Mexican Trap. A produção aborda a rivalidade entre duas facções na fronteira do México com os Estados Unidos.extintogamer.blogspot.com

Fabiano de Paula e sua equipe, a Freiya Games, está trabalhando no jogo CPI – Corrida Presidencial Infinita. O objetivo é lutar contra os candidatos à presidência. Para vencer o adversário, você pode usar munição pesada: santinhos e dossiês.freiyagames.com

Bruna Brum desenvolveu o jogo educativo Monstros Atacam. Aqui, a proposta é promover a conscientização ambiental junto ao público infantil. O desafio é manter a ordem ecológica ao atirar plástico, vidro, papel e metal em sacolas de lixo malignas.brunabrum.com

Para elaboração desta matéria contamos com a contribuição do

professor e coordenador da Unidade de Engenharia, Computação

e Sistemas da Faesa, Rober Marcone Rosi.

NOVELO · 17

sonagens; depois, em qual plataforma se executará (web, console ou celular), se será casual, educativo ou sério (com estratégia). Esse é o game design: o projeto.

A partir daí, as equipes de produção se dividem: uns de-finem o roteiro, os personagens, o ambiente em que vão estar e os níveis de dificuldade; é o concept art. Depois, o programador trabalha a inteligência artificial do jogo, ou seja, os sentimentos de um personagem, a forma de vencer um desafio. O processo pode levar de oito meses a um ano, dependendo da capacidade de cada equipe.

Segundo a designer Bruna Brum (27), criar um jogo exige tempo e dedicação: “o programador tem que estar a postos para qualquer falha. Ao ser lançado, o jogo pode ser cor-rigido, o que leva mais tempo e dinheiro. Isso depende tam-bém do tipo e da plataforma em que é desenvolvido. Jogos em flash são mais simples, diferentes dos 3D ou dos social games, que têm muitos usuários”. Recentemente, Bruna desenvolveu um game como seu trabalho final de gradu-ação no curso de Desenho Industrial da Ufes. O projeto começou a ser pensado em meados de 2009 e ficou pronto em dezembro de 2010. ENCARANDO O ChEFãONo Espírito Santo, a falta de profissionais especializados e de investimentos são os principais obstáculos para atuar nesse cenário. Segundo o designer Thommy Lacerda (29),

“é preciso computadores potentes e caros para criar jogos, o que está fora da realidade dos estudantes”. Já Victor Abreu

– aquele que fugiu do terno e da gravata – acredita que é possível ser um desenvolvedor de sucesso, desde que o pro-jeto seja bem elaborado. “Se for criativo, você consegue até ficar milionário”, brinca.

Em território nacional, há cerca de 12 faculdades que ofe-recem o curso de Jogos Digitais. É por isso que o desen-volvimento de games é difícil: trata-se de um campo ainda novo. “O Brasil está avançando, mas em âmbito estadual, ainda engatinhamos e a maioria das empresas só tem foco nos jogos casuais, pelo baixo custo de produção”, é o que analisa o concept artist Cassiano Pinheiro (28).

Não é (só) brincadeira, não!

O mUNDO é O LImITEAlém do casual (entretenimento em redes sociais), o ad-vergame – jogo feito para a publicidade – também é de-senvolvido no estado. Mesmo sendo supostamente mais simples de produzir, não é facilmente distribuído. É preciso chamar a atenção das empresas proprietárias das platafor-mas, criando jogos tão criativos a ponto de serem interes-santes para brasileiros e, também, para estrangeiros.

Quem atua com jogos não pode visar só o mercado lo-cal, porque o sucesso depende do volume e da frequência de acessos dos usuários. Dá para ganhar dinheiro até com jogos gratuitos. Nesse tipo de game, o usuário faz peque-nas transações financeiras de R$1 ou R$2 para melhorar seu personagem no jogo e o desenvolvedor pode embolsar uma grana.

Page 18: Revista Nós nº 3

18 · NOVELO

BRUNELLLA FRANçA

Page 19: Revista Nós nº 3

NOVELO · 19

Para criar minha fanfic, a sétima temporada da série de TV the L word, assisti três vezes às seis temporadas,dessa produção estadunidense que retrata o universo lésbico. Fiz anotações sobre o perfil dos personagens e sobre assuntos ou situações mal resolvidos na trama. Só quando me senti dona das vidas daquelas mulheres é que comecei a escre-ver.Foram quatro meses de dúvidas, alegrias, choro, orgu-lho e prazer. Resultado: 410 páginas digitadas. À medida que os capítulos eram escritos, eram também publicados no site abcLES.com.

Ao publicar os capítulos online, recebi dicas dos Estados Unidos acerca de West Hollywood (onde se passa a série) e dos costumes naquela região, comentários e críticas de di-versos estados do Brasil, além de beijos de Lisboa, Portugal. Todo o meu processo de criação e de desenvolvimento da narritiva só foi possível graças à internet. E, no meio da produção, quando vinha o cansaço e a

história, eu não rendia mais. Chegavam recados dizendo o quanto aquela fic estava se tornando importante. Pude sentir muitas leitoras por perto, querendo mais um capítulo, mais um pouco do universo the L word que partilhávamos. Com elas, a fic ganhou mais vida e mais colorido. E já são quase 70 mil leituras da minha temporada. Quer experimentar? Que tal continuar a história do início deste texto? Mãos ao teclado!

Está achando tudo isso uma grande loucura ou algo que não tem a menor possibilidade de acontecer? Então é hora de conhecer o universo das fanfictions!

Escrever histórias com personagens, cenários e aconteci-mentos baseados em outras obras é a proposta das fanfics ou, simplesmente, fics, abreviação da palavra inglesa fan-fiction (ficção criada por fã).

TUDO SE TRANSFORmA

Quando um livro, uma história em quadrinhos, um anime, um mangá, um filme, uma novela ou um seriado chega ao fim, muitas vezes é criado um vasto universo narrativo (o cânone), com tantas histórias que nem mesmo os autores dessas produções poderiam imaginar. Há fãs que pratica-mente respiram esses mundos ficcionais ao ponto de pode-rem escrever sobre tão bem quanto o autor original. Essas histórias não-oficiais são as fanfictions cujos for-

matos mais comuns são os contos e os romances. No Brasil, admiradores de Star Wars, Star Trek e Sailor Moon foram os primeiros a compartilharem seus textos em fanzines. Po-rém, a distribuição desse material era limitada. Na década de 1990, com a expansão da internet, começaram a surgir sites especializados em hospedar fanfics. Isso popularizou o hábito de criar novas histórias em cima de algo pré-exis-tente e facilitou o acesso dos leitores. O boom veio com a série literária Harry Potter, da escri-

tora britânica J.K. Rowling. O maior acervo de fics na rede, o site fanfiction.net, tem mais de dois milhões de textos. Sobre a série Harry Potter são mais de 300 mil. No maior portal brasileiro dedicado a fanfics, o Nyah, as histórias ba-seadas no garoto bruxo também são maioria.

PAIXãO ARREBATADORA

Para ser um ficwriter, ou escritor de fanfiction, é preciso muita criatividade e paixão, porque dá trabalho. O primeiro passo é um incômodo com o produto oferecido pelo au-tor original. Alguns ficwriters preferem seguir o rumo das obras-gênese, cobrindo espaços deixados ou dando conti-nuidade ao ponto final. Outros, por sua vez, criam enredos bem diferentes, mudando até seus desfechos.

Lá, numa terra bem além da tietagem, fica o mundo ficcional dos criadores de fanfiction

FANFICTION.NET

FANFICTION.COm.BR

ABCLES.COm.BR

NOVELO · 19

Page 20: Revista Nós nº 3

Empreendedorismo, dedicação, criatividade e, claro, muito estilo na blogosfera capixaba

PAULA DORSCH & SAVYA ALANA

20 · NOVELO

 CONHEçA OS BLOGS

Style-a-Holic: style-a-holic.comNão resisto!: naoresisto.com.brMeu Mundinho Importado: meumundinhoimportado.com Inventando Moda: thai-angelo.blogspot.comCut Club: cutclub.wordpress.comCosmopolytan: cosmopolytan.wordpress.com

“Fica linda que o amor não passa” é o slogan do

Cut Club, blog mantido por Juliana Dadalto

FOTOS LUARA MONTEIRO

Page 21: Revista Nós nº 3

Da esquerda para a direita: Antonia (Naàa), Leandra (Não Resi), Ja-

mely (Still)

-Holic, do estilista e produtor de moda Marcos Eduardo Altoé (27, foto acima). Seu blog aborda moda, comportamen-to, lifestyle, música, arquitetura e de-coração e surgiu do interesse do blo-gueiro por jornalismo de moda. Dudu, como é conhecido na blogosfera, viu nesse espaço virtual um espaço para exercitar sua redação e aprofundar seus conhecimentos em moda e com-portamento. O sucesso foi tanto que hoje Marcos é referência como blo-gueiro capixaba, o que atraiu parceiros e anunciantes para o Style-a-Holic.

Outro bom exemplo é o das blo-gueiras Brunela Simões, tatuadora e make up artist, e Lys Freire, estilista e designer, ambas com 26 anos. Atu-almente seu blog Não Resisto! possui dois anúncios de marcas de cosméticos internacionais. Mas as meninas, ainda que tenham anunciantes do ramo de beleza, falam um pouco de tudo: “a gente muda, e o blog muda junto com a gente. Antes, falávamos muito de consumo e coleções novas das lojas de roupas e acessórios. Hoje em dia, preferimos criar conteúdo, sobre lifes-tyle ou qualquer outra coisa que faça o leitor refletir. Temos colaboradores que abordam diversos assuntos, como música, decoração, filmes. Adoramos dar dicas de DIY (“Do It Yourself”, ou “Faça você mesmo”), maquiagem e estudos na área de Moda”.

Lucrar com espaços publicitários não é a única maneira de ganhar dinhei-ro com um blog. Há também outras formas de fazer o blog ser uma fonte de renda. A publicitária pós-graduada

NOVELO · 21

Blog de moda é o termo que definiu durante algum tempo o espaço onde as blogueiras costumavam falar so-bre o universo feminino. Ultimamen-te, muito mais do que isso, os blogs evoluíram e falam de lifestyle (estilo de vida). E, para falar sobre tal, mistu-ram-se linguagens diversas – música, arte, moda, cinema, comportamento, beleza e o que a imaginação mandar. Hoje a festa do pijama é na internet e todo mundo está convidado!

Mais do que discutir feminices, os blogs também são ambientes para reflexão de moda, difusão de lifesty-les, autoconhecimento e, porque não, fonte de renda. Nesses espaços com-partilhar é a palavra-chave. Fora dos padrões de beleza apresentados nas mídias tradicionais, os blogueiros se aproximam da realidade de seu públi-co de influência.

Manter um blog requer trabalho e demanda tempo. E ganhar dinheiro com ele é uma forma de unir o útil ao agradável, foi o caso do blog Style-a-

Page 22: Revista Nós nº 3

22 · NOVELO

em Comércio Exterior Camila Coelho (26), autora do blog Meu Mundinho Importado, é desses exemplos. Em seu site, Camila vende maquiagens e produtos de beleza e, para isso, con-ta com a parceria de Thai Angelo (23, foto abaixo), maquiadora profissional do blog Inventando Moda, que faz um tutorial toda sexta para o espaço.

Há quem não busca monetizar o seu espaço virtual, como é o caso do Cut Club. Para Juliana Dadalto (27), a au-tora do site, a falta de interesse em lu-crar com o blog é em parte “burrice”, mas também uma atitude anti-mer-cantilista. Para ela, o blog pode ser um negócio, uma bandeira, uma rebe-lião, uma política, uma forma de renda ou um hobbie; basta você escolher o rumo que quer dar-lhe. O Cut Club, por exemplo, começou com a veicula-ção de conteúdos sobre maquiagem e cabelo e, atualmente, aborda a temá-tica da beleza sob a forma mais ampla e colaborativa possível.

A receita de um blog bem sucedido consiste em muita dedicação. É pre-ciso buscar informações e pesquisar bastante. A bióloga Polyana Polycar-

po (26) é dona do Cosmopolytan. Ela conta que anda sempre com um ca-derninho na bolsa onde anota tudo o que vê durante o dia e que lhe é inspi-rador. Além disso, ela lê muitos blogs e revistas e liga para os estabelecimen-tos em busca de informações.

Em seu espaço, ela aborda moda, beleza, achados e compras e já avisa: “tudo sem afetação, sabe? Não sou formada em moda, então não curto esses posts com análises de tendên-cias, os looks do Oscar. Escrevo para mulheres reais, com vidas reais”.

As blogueiras em sua maioria não são modelos de padrão de beleza. Na verdade, são mulheres do dia a dia que precisam pôr a mão na chapinha e escolher roupas e maquiagem que

realcem seus atributos positivos e dis-farcem aquilo que as desagrada.

Além da dedicação, outro ingre-diente de sucesso é diferenciar-se dos demais. A rede está cheia de blogs motivados por “mimos” de empre-sas e convites regados a espumante e cupkakes. O glamour alcançado pelos espaços mais badalados tem seus cus-tos e responsabilidades. É difícil escre-ver uma opinião sincera, rodeado de atenções, exclusividades e lançamen-tos. Para sair do mar de clichês – unha, look e make do dia – é preciso pensar à frente de seu tempo, ousar, propor novas ideias, confiar no seu estilo e investir na criatividade.

Tensões à parte, há muita coisa boa envolvida em ter um blog; entre elas, conhecer pessoas que compartilham os mesmos interesses que você, trocar conhecimento e aprender a se relacio-nar mais e melhor. Afinal, trata-se de espaços de interatividade e você vai precisar de bom humor para receber as criticas. E tem mais: nessa festa do pijama, há muito mais do que as ami-gas do bairro, pois o alcance dos blogs é só do mundo inteiro!

Page 23: Revista Nós nº 3

OS CINECLUBISTAS ESTÃO CHEGANDO

NOVELO · 23

LAíSSA COSTA GAMARO & FABIANO DE OLIVEIRA

MAS O QUE VEM A SER UM CINECLUBE?Cineclube é uma associação que visa a promover a cultura cinematográfica. Trata-se de um grupo or-ganizado que promove sessões de cinema e debates sem fins lucrativos para um público aberto. Entretan-to, não basta exibir filmes para ser um cineclube. É preciso seguir alguns princípios, como a defesa da democratização do acesso à informação – onde en-tram os direitos do público e o compromisso com a promoção da cultura.

Infelizmente, nem todo mundo que começa a fazer cineclubismo se dá conta de que a sua prática está fundamentada nesses princípios. A partir do momento em que experiências isoladas demonstram que a sua ação pode ser fortalecida a partir da articulação com outros cineclubes e com um movimento organizado, o cineclubista compreende a importância da sua prática para a sociedade.

Desde 1959 acontecem no Brasil as Jornadas Na-cionais de Cineclubes, congressos anuais ou bianuais que buscam organizar o movimento cineclubista na-cional. Em 1961, em ocasião da III Jornada Nacional

de cineclubes, ocorrida no Rio de Janeiro, foi fundado o Conselho Nacional de Cineclubes (CNC).

Existem muitas razões pelas quais o movimento cine-clubista emergiu, organizou-se e seguiu contagiando. Falemos um pouco sobre as suas principais motivações:

CINEMAPRA QUEM? Nosso país dispõe de salas de cinemas. Mas onde? Atualmente, dos 78 municípios capixabas apenas 16 deles contam com esse tipo de espaço cultural. Isso é muito pouco. Para Alex Reblin (25), morador de Afon-so Cláudio e um dos fundadores do Cineclube Lagoa, a prática cineclubista atendeu a uma grande carência de seu município: “ouvíamos muitas pessoas dizendo que, antigamente, aqui tinha um cinema, que era ma-ravilhoso e todos gostavam de frequentar”. Hoje, o Cineclube Lagoa é bem atuante e tem movimentado a cena cultural de Afonso Cláudio e da região. “Circu-lamos por diversos espaços, debatemos muitas temá-ticas e já estamos até planejando fazer um festival de vídeos independentes”, conta Alex.

Em contrapartida, ainda que existissem cinemas co-merciais em um número mais expressivo de cidades brasileiras, não necessariamente contaríamos com o

Em salas apertadas, nos cantos escuros da cidade e do campo, movimen-tando o cenário cultural de bairros de periferia, de escolas etc., trazendo consigo seus DVDs, datashows, filmes e mais filmes debaixo do braço, lá vêm eles, exibindo em plataformas convencionais ou inusitadas, velas de barcos, em lençóis estendidos em varais – por que não? –; “Pacientes, as-síduos e perseverantes” , os jovens cineclubistas capixabas estão por toda parte, ocupando, provocando e ressignificando o cotidiano. Sim, os cine-clubistas estão chegando, ou melhor, não param de chegar.

Page 24: Revista Nós nº 3

gráfica independente. E o cinema capixaba dispõe de produções independentes representativas e de quali-dade. O Cineclube Cine Kbça, que funciona em Vi-tória, destaca-se por ser um espaço de exibição que estimula a circulação dessa produção local.

Em 2010, o Cine Kbça promoveu uma mostra iti-nerante chamada Curta no Circuito que passou por 14 comunidades de Vitória exibindo apenas obras produzidas em solo capixaba. “Procuramos priorizar vídeos produzidos por jovens capixabas, no intuito de estimular as pessoas que participam das sessões a produzirem. Não importa o tamanho da produção, o importante é criar, compartilhar e incentivar a mul-tiplicação da prática cineclubista”, diz Tatiany Volker (27), integrante do Cine Kbça desde 2007.

CINECLUBISMO ENQUANTO FERRAMENTA DIDáTICA Nos últimos anos, cresce a prática cineclubista en-quanto importante ferramenta utilizada na educação formal e informal de crianças, jovens e adultos. Histo-ricamente algumas instituições levantam esta bandeira e desenvolvem belíssimos trabalhos. Temos exemplos como do Cineduc, projeto que, em parceria com a Pre-feitura do Rio de Janeiro, estimula hoje a existência de cerca 250 cineclubes funcionando dentro de escolas publicas municipais cariocas.

No Espírito Santo, temos bons exemplos dessa ver-tente cineclubista. O Cineclube Central, em funcio-namento desde 2006 em Vila Velha, realizou muitas ações de formação e de capacitação cineclubista em escolas públicas de seu município. O Cine Kbça tam-bém promoveu a difusão da prática cineclubista, mas com o foco em grêmios estudantis de escolas públicas de Vitória e desenvolveu a cartilha Cineclubismo na escola: Uma alternativa de expressão das juventudes.

Além de constituírem um importante circuito de exibição para a produção cinematográfica local e nacional, os cineclubes são espaços que promovem os direitos do público e democratizam o acesso aos bens culturais.

acesso democrático à produção cinematográfica. É preciso levar em consideração que apenas uma por-centagem bem pequena da população brasileira e ca-pixaba pode pagar o valor do ingresso para assistir a uma sessão em um cinema comercial. Em 2009, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Es-tatística (IBGE), a média nacional de pessoas que não frequentavam regularmente as salas de cinema era de assustadores 86%.

Pode parecer aceitável que as salas de cinema cobrem o acesso aos bens culturais, afinal, o cinema comercial é uma empresa de entretenimento fundamentada no lucro. Mas para os cineclubistas a cultura não deve ser tratada apenas como um bem mercantil. Para Pedro da Cunha (28), integrante do Cineclube Central de Vila Velha desde 2006, a questão do acesso é um debate que se faz urgente: “temos que nos ater à realidade brasileira. As pessoas não têm acesso aos bens cultu-rais e é papel do Estado promover esse acesso”.

CINEMA CAPIXABA E CINECLUBISMO: FORTALECIMENTO MúTUOA ação cineclubista também tenta dar conta de um ou-tro gargalo: a distribuição da produção cinematográfica nacional e local. Os filmes hollywoodianos ocupam a maior parte da programação dos cinemas comerciais brasileiros. Não se trata de fazer juízo de valor sobre a produção norte-americana, mas sim de garantir espa-ços e de valorizar outros modos de se fazer cinema que representem outras visões de mundo e outras propos-tas estéticas.

Além de reforçar a necessidade de tornar o cinema nacional acessível a todos os brasileiros, o movimento cineclubista também valoriza a produção cinemato-

NOVELO · 24

Page 25: Revista Nós nº 3

O Cine É da Hora!, projeto que funciona na Pró-Rei-toria de Extensão da Ufes, propõe-se a produzir um DVD contendo quatro curtas metragens, além de uma cartilha que oriente alunos e professores na utilização da prática cineclubista para discutir direitos humanos.

UMA CASA NOVAPARA OS CINECLUBISTAS Um fato histórico importantíssimo para a articulação do movimento cineclubista capixaba aconteceu em junho de 1981 com a fundação da Federarão de Cine-clubes do Espírito Santo, cujas ações permaneceram até a década de 1990, quando houve uma interrupção do movimento organizado no estado. Hoje, segundo Bruno Cabús (29), um dos fundadores do Cineclube Central de Vila Velha e atual sub-coordenador de acervo do Conselho Nacional de Cineclubes, “é um momento promissor para os jovens cineclubistas ca-pixabas e para aqueles que já vêm colaborando para o fortalecimento do movimento no Espírito Santo há muitos anos”.

E uma grande novidade surgiu em dezembro de 2010, durante a 28ª Jornada Nacional de Cineclubes, em Recife-PE: os cineclubistas capixabas presentes de-ram à luz uma entidade representativa do movimento cineclubista capixaba. Quando esta matéria começou a ser esboçada, seu nome ainda estava em discussão. Mas no último dia 16 de abril aconteceu o primeiro reencontro das diretorias eleitas na 28ª Jornada que reuniu cineclubistas de diversos cantos do Espírito Santo para debater, entre outros assuntos, a escolha do nome da nova entidade.

Agora, a organização representativa dos cineclubes capixabas – ou poderíamos também dizer, nossa nova casa – chama-se OCCa - Organização dos Cineclubes Capixabas. Dentre as funções da OCCa, que está em

processo de registro formal, destaca-se a formação e a capacitação cineclubistas, o fortalecimento do movi-mento junto ao setor político-cultural e a organização de encontros regionais.

Os cineclubes capixabas não param de se multipli-carem, de se articularem e de se fortalecerem mutu-amente. Aos poucos, as pessoas têm percebido que esse lance de fazer cineclubismo não é algo tão dis-tante. Para Eliane Correia (28), que faz parte do Ci-neclube Badaró em Guaçuí, a prática tem se mostra-do cada vez mais acessível: "dois anos atrás, vim até Vitória à procura de alguém que pudesse me ensinar a como montar um cineclube. Quando cheguei, a sur-presa não poderia ter sido maior: descobri que já fazia cineclubismo e não sabia!”.

A promoção do protagonismo e de espaços de au-tonomia, a defesa dos direitos do público, a luta pela democratização do acesso à informação e a movimen-tação do cenário cultural local são ações que fazem parte do fazer cineclubista. Já é sabido que "a gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte"[2], mas o movimento cineclubista demonstra que a gente não quer só cinema, a gente quer cinema gratuito para toda a comunidade. A gente não quer só lazer, a gente quer debater e refletir à vontade. A gen-te não quer só assistir, a gente quer propor com liber-dade. Sim, “a gente quer inteiro, e não pela metade”.

Este é o espírito. Cineclubismo é de todos e para to-dos, é uma prática acessível e convidativa. E bola pra frente, juventude capixaba, que essa história ainda está sendo escrita, ou melhor, projetada.

[1] BEN JOR, Jorge. “Os alquimistas estão chegando”. In: A Tábua de Esmeralda. São Paulo: Philips. 1974.[2] TITÃS. “Comida”. In: Jesus não Tem Dentes no País dos Banguelas. São Paulo: WEA, 1987.

O cineclubismo acontece em diferentes formatos e com finalidades diversas. No Espírito Santo, o movimento cineclubista está articulado e desenvolve ações que visam ao fortalecimento e à multiplicação dessa prática cultural.

NOVELO · 25

Page 26: Revista Nós nº 3

26 · NOVELO

Page 27: Revista Nós nº 3

Tempos, espaços e expressões formam uma trama inacabada e mutante: as possibilidades

de encontro do corpo com a cidade

Costura-movimento

LíVIA CORBELLARI & HENRIK CARPANEDO

NOVELO · 27

Page 28: Revista Nós nº 3

28 · NOVELO

FOTO YURY AIRES

iver na cidade é estar em intensidade e em su-perficialidade, em contato e em separado, é es-tar no escuro e no claro, no fechado e no aberto.

Urbano é o nome das pessoas. É o nome que relaciona o vazio com o cheio. Esses contrastes impulsionam as pessoas a intervirem na cidade como algo que se pode fazer por si, ou pelo outro. E a arte vai muito mais do que a obra de um artista ou o artista de uma obra. Arte é um nome que existe em si mesma. Qualquer um pode ter na arte uma forma de expressão.

A produção se dá de maneiras mil: vídeos mostrando a paisagem do lugar, enquadrando a cidade pela câmera; in-tervenções do andar pela cidade atraindo olhares curiosos para graffitis-colagens. Skates, bicicletas e parkour, ativi-dades-esportes que não são tratados como arte, pois não há uma intencionalidade intrínseca do participante. Porém, não podemos ignorá-las no pensar estético da cidade. Ao contrário disso, podemos notar que há possibilidade de elas serem ações performáticas e também acontecimentos.

Arte que não é estática. Arte que se constrói-desconstrói--reconstrói, pois a cidade é viva e esses artistas se expres-sam seguindo essa lógica efêmera. Não há controle sobre a obra urbana que é efêmera. Por isso, ela é viva e dinâmica como a cidade.

Carretéis

A arte é uma coisa grande que existe, quer aceitamos, quer não. Ela é como um grande novelo de lã ou como um car-retel que, cheio de linha, encaixa-se na máquina de costura, alinhava-se de acordo com quem manuseia e toma as mais diferentes formas no tecido.

Page 29: Revista Nós nº 3

NOVELO · 29

Se a cidade fosse um tecido, seria um tecido rasgado de tanta costura e descostura. O artista é mais um pon-to dessa trama, é uma das agulhas. A cidade não é estática, nem é uma paisagem que deva ser apenas con-templada, ela pode ser moldada e nos moldar também. A paisagem muda com a arte, sendo arte permanente ou de momento. Uma hora está ali, outra hora não, curtindo sua efemeridade.

O que passa e o que movimenta sua sombra na calçada é público e também parte da ação, seja esta qual for. Temos um novo artista-obra, o transeunte. O transeunte não só olha como também esbarra com o artista e tropeça na sua obra e com ela faz li-gações inconscientes. É paisagem ce-nário e cenário paisagem; e não pode não o ser.

Transeuntes e interventores, o que eles fazem na cidade? Cores, sons, ações, ângulos, movimentos. Alguns não entendem, outros se chocam com a velocidade, com a força crítica de uma imagem-forte, outros se auto--convidam a participar e assim constro-em uma realidade comum. A cidade é, ao mesmo tempo, inspiração e objeto, é notar e interferir simultaneamente.

ilha, linha e agulha

O território da cidade é um ponto a ponto de uma agulha, tendo esta o aspecto de perpassar linhas para juntar partes diferentes. Tecidos com propriedades diferentes que deixam rugosidades são partes semiabertas e de muitas combinações possíveis. Va-mos passar direto ou deixar tropeçar pelos fios em falso?

Em Brasília há aquele céu e mais nada, há aqueles grandes espaços verdes, secos, entre os edifícios. Ali, o corpo é visitante e está alheio à paisa-gem e parece resistir a tudo, à falta de praia, à falta de cruzamento nas ruas,

à falta de pedestres, à falta de um pé ativo que conhece seu próprio territó-rio. Em Brasília, onde o parkour é for-te, sendo ele esporte ou não, parece uma forma de resistir e de apropriar--se do espaço da cidade de uma forma holística e intensa, sendo uma ativida-de operativa e estética.

Já em Vitória, quantas praças cata-lisam essa paisagem-corpo-esporte a fim de produzirem uma cotidianidade? Esse corpo faceiro, mar, porto, via de carros, muros, distanciamentos e frag-mentos de passado presentes para o

futuro se conectam à mão do artista que tenta organizar-se como discurso--acontecimento, como performance. A rapidez do dia a dia pode ter o po-der de gerar expressões alternativas, mas o carretel caiu e rolou no chão e seus fios se espalharam. Não tem como organizá-lo, pois seus fios se sujam de mundo.

emaranhar-se

A arte vem como a possibilidade de produzirmo-nos de uma forma atualiza-da, colocando na (feliz)cidade pontos de

articulação, criando uma rede de reco-nhecimentos e de produtividades. Arte como atividade inseparável do homem, sua capacidade de transformar a si e a seu meio.

Organizar encontros na cidade em locais incomuns também é uma forma de resistir. A potência de resistência hoje está no corpo, no próprio vestir--se e no deslocar-se; o corpo como ilha na ilha, como território de ações. Os corpos postos e dispostos são par-te da imagem e a ação-arte neles se insere, ou melhor, neles interfere.

Organizados no caos, esses olhares se transpassam encontrando novas palavras e novos rostos. A arte e o esporte são acontecimentos, são pro-dução de singularidades, diferentes expressões do mesmo, num repetir de movimentos e instaurando a poe-sia do momento: a ação performática está além da ordem homogênea. Que papel a arte possui para aguçar o sen-tido de pertencimento do habitante com o lugar?

Parece ser muito otimismo colocar a arte como promovedora de tudo, de transgressora do controle e da persua-são dominante. O burburinho de uma cidade está dentro de um shopping ou de um museu onde as pessoas, de forma geral, ficam guardadas? O que Vitória quer da arte? O que a arte quer da gente de Vitória? Vitória quer ser pertencida, queremos ter Vitória, realmente, conosco?

Descosturam-se tudo, fios que são feitos de fios menores se desfiaram e se emaranham nos artistas-passantes. Confundimos: barulho, pessoas ali, outras atrás dessas, escadaria ao lado – passou um caminhão e escondeu tudo. Uma parede pintada com spray e uma lata de lixo revirada por um ca-chorrinho sujo. O canino corre em dis-parada. Malucos com bicicletas, com skates ou com a roupa do corpo cor-rendo do silêncio ao movimento.

se a Cidade fosse um teCido,

seria um teCido

rasgado de tanta

Costura e desCostura

Page 30: Revista Nós nº 3

30 · ENTREVISTA

Mais do que estar no palco, a paixão pelas artes cênicas é o que orienta a trajetória da

jovem atriz do sul capixaba

Paulo Gois Bastos

De maneira geral um espectador de teatro conhece ape-nas o resultado final do trabalhoso processo que antecede a realização de um espetáculo. Talvez por isso, para muitas adolescentes, tornar-se uma atriz seja um sonho romântico cercado de glamour. Mas, em cidades mais afastadas dos centros urbanos, esse sonho é logo confrontado com a falta de espaços adequados para apresentações e com a carência de atividades para a formação nessa área artística. Mesmo diante dessa realidade e conhecendo a dura lida do fazer teatral, Carolina Salvador Areias (27 anos) escolheu seguir um caminho profissional nos palcos.

Assumidamente apaixonada pelo fazer teatral, Carol reú-ne em seu currículo diversas atividades relacionadas às artes cênicas. Como atriz, entre 1998 e 2011, participou de 21 peças e de cerca de dez produções audiovisuais, entre cur-tas-metragens, vídeo-artes, um longa e alguns comerciais de TV. Conta com sete trabalhos de direção e foi professora em oficinas de teatro e de dança para jovens e adolescentes. Na infância e na adolescência, também fez balé e jazz, mas Carol tem a dança como uma prática complementar quando comparada com o seu envolvimento com o teatro.

A ideia de ter um filho exercendo uma carreira artística é algo pouco comum para as famílias de Muniz Freire, cidade do sul capixaba onde Carol nasceu e morou a maior parte de sua vida. única mulher entre cinco irmãos, ela conta que nunca faltou o apoio familiar para a sua escolha profissio-nal. “De vez em quando, eles falavam: ‘Não tá na hora de você arrumar um emprego não?’. Minha mãe um dia che-gou para mim e disse ‘Carol, eu nunca vou falar para você

não ir porque o meu sonho é fazer o que você faz’. A família sempre me apoiou, mesmo naqueles momentos em que as coisas não estavam dando certo, que eu não tinha dinheiro pra nada, porque teatro não dava dinheiro. Se não fossem eles, eu não teria continuado fazendo teatro”, conta.

Aos 14 anos Carol entrou para um grupo de teatro ama-dor chamado Grito Jovem que fazia apresentações em Mu-niz Freire e em municípios das redondezas, como Guaçuí, Alegre, Brejetuba, Iúna e Castelo. As apresentações eram gratuitas e não havia remuneração para a equipe. “As pre-feituras pagavam apenas o transporte e um lanchinho. Foi uma experiência muito boa, pois a gente conhecia lugares diferentes. Mesmo sem saber o que era, nós queríamos era fazer teatro”. Do Grito Jovem, apenas Carol seguiu adiante no teatro. A ImPORTâNCIA DA FORmAçãOAlguns anos depois, Carol passou a frequentar espaços de formação teatral que lhe exigiram uma intensa dedicação para o aprendizado de técnicas que são a base do trabalho de uma atriz. Mas, antes enveredar de vez pela arte teatral, foi para o Rio de Janeiro e cursou a graduação de Direito por três anos e meio. Segundo ela, esse foi o seu “ato de rebeldia adolescente” e admite que, naquela época, a sua percepção do fazer teatral ainda era muito limitada.

Ao retornar, ela ingressou na Escola Itinerante de Artes Cênicas, iniciativa da Secretaria de Cultura do Estado do Espírito Santo com o objetivo de atender à demanda de formação na área das artes cênicas no interior do estado.

PROFISSÃO TEATRO

Page 31: Revista Nós nº 3

“Mesmo sem saber o que era, nós queríamos era

fazer teatro”

Page 32: Revista Nós nº 3

32 · NOVELO

Com a duração de sete meses, o cur-so acontecia aos finais de semana e oferecia aulas de preparação corporal, voz, prática de montagem, interpreta-ção, história do teatro, entre outras. “A partir daí, eu percebi que o teatro era muito mais do que eu imaginava. Eu achava que teatro era chegar lá e falar o texto. Há outras coisas: tem uma história por trás, tem técnicas, tem voz, tem relaxamento. Eu fui es-tudar as diferentes linhas de teatro, as suas várias técnicas. Isso que me abriu para o que eu realmente queria. Por isso, eu sempre falo que a minha vida no teatro se resume em fazer teatro e começar a estudar teatro”.

Depois desse aprendizado, Carol decidiu que queria viver do teatro e aceitou o convite de um dos professo-res do curso para atuar. “Larguei meu emprego em uma construtora e fiquei um mês trabalhando em espetáculos infantis no município da Serra. Foi o meu primeiro emprego no teatro”. Em segui-da, foi para Cachoeiro de Itapemirim e integrou o Grupo Ela de Teatro, que ainda existe na cidade. Essa época não foi nada fácil, pois o Grupo não conseguiu sua sustentabilidade “Fiquei três meses em Cachoeiro. Por falta de recursos fi-nanceiros, a montagem acabou não acontecendo”. Apesar das dificuldades, Carol considera muito positiva a experiên-cia desse período.

A partir daí, ela conta que se tornou uma atriz itinerante, pois passou por diversos grupos de teatro do sul capixaba. Entre os trabalhos, encenou peças infantis, comédias, tex-tos espíritas e dramas. Ainda em 2007, realizou o sonho de se apresentar no Theatro Carlos Gomes, em Vitória, com o espetáculo Hoje é dia de Rock, sob a direção de Carlos Ola. “Quando eu tinha 14 anos, imaginava que o ápice da minha carreira seria atuar no palco do [Theatro] Carlos Gomes. Depois disso, percebi que queria ir mais além!”, diz.

Carol buscou sempre se aperfeiçoar por meio de cursos relacionados ao teatro. Para ela, participar dessas atividades foi um meio de estar em um palco com mais frequência e também de estabelecer contatos profissionais. “Quando eu fazia um curso, geralmente era dentro de um teatro. Essa era a oportunidade que eu tinha de subir no palco, não po-dia perder aquilo. Assim, a formação supria minha necessi-dade de expressão”. A PROFESSORA DE TEATROEssa jovem atriz é apaixonada pelo mundo do teatro, não apenas pela emoção de estar no palco atuando, mas pelo fazer teatral com um todo. Uma semana antes da entrevis-ta, ela havia participado do Festival de Teatro de Curitiba, não como atriz e sim como sonoplasta e iluminadora. “Uma

iluminação e uma sonoplastia bem feitas garantem metade do espetáculo, por isso, eu sempre quis aprender”, justifica.

Parte desse conhecimento mais amplo sobre os elemen-tos das artes cênicas se deveu à carência de mão-de-obra especializada para a montagem dos espetáculos que Carol já dirigiu. Entre 2009 e 2010, ela atuou como professora no Projeto Resgate em Cena, iniciativa promovida pela Pre-feitura Municipal de Muniz Freire que ofereceu oficinas de teatro e de dança para um público de 150 jovens do muni-cípio. Ao final das duas edições do Projeto, foi montado um espetáculo como resultado das oficinas.

Para garantir a qualidade, Carol conta que foi preciso cuidar de todos os aspectos técnicos das apresentações. “Eu tive que montar a iluminação e a sonoplastia. Para a sonoplastia, conseguimos um programa bem simples que os próprios alunos operavam, mas a iluminação era intei-ramente por minha conta. Além disso, havia o cenário e o figurino. Éramos apenas eu e meus alunos, sem equipe técnica ou de apoio. Por isso, aprendi de tudo um pouco. Muniz Freire, até então, nunca havia feito um espetáculo com iluminação”.

Carol fala emocionada sobre o Resgate em Cena. Ape-sar de a iniciativa não ter tido uma continuidade, a experi-ência do Projeto lhe rendeu uma compreensão do quanto a vivência artística pode gerar impactos positivos na vida dos jovens. Por isso, ela acredita que a prática e o ensino da arte deveriam receber tratamento semelhante ao dis-pensado a outros saberes. “É a mesma forma que estudar matemática, mas não querer ser matemático. Eu aprendo porque vai ser importante para minha vida. A arte, de uma maneira geral, deveria ser encarada desse jeito. Eu posso aprendê-la, mesmo não querendo ser um profissional da arte no futuro”, argumenta.

32 · ENTREVISTA FOTOS LUARA MONTEIRO

Page 33: Revista Nós nº 3

CRíTICA EMARANHADA · 33

O Salto do Gesto ao Afeto - Olhos Atentos sobre Corpos em Movimento

Karina Viega

O Trampolim - Plataforma de Encontro com a Arte da Performan-ce, programa de eventos concretizado pelo Laboratório de Ação & Performance (LAB!), desdobrou-se no empurrão que faltava para o Espírito Santo saltar ao circuito da arte performática. Cer-ca de 50 artistas, com suas diferentes experiências e nacionalida-des, marcaram o ritmo das seis edições realizadas entre outubro de 2010 e março de 2011. A reunião dessa herança genética va-liosa, e melhor: distinta, transformou as ruas da ilha-capital em uma galeria viva.

Os trabalhos exploraram o potencial afetivo contido nas recor-rentes ações e no material mais rudimentar: o próprio corpo, matéria-prima com grande poder de modificar e de sintetizar as contradições que coexistem sobre uma única pele. Poder eviden-ciado por Victor de La Rocque. Sua performance “Gallus Sapiens” explicitou a sobre-existência do corpo natural, ainda humano e essencialmente animal, em contraponto ao corpo permeado por tecnologias, limitado pela intolerância e que, a cada dia, perde espontaneidade e liberdade na vida cotidiana.

A temática do corpo desvinculado dos padrões predominou na programação e, portanto, testou a (in)tolerância do público peran-te à alteridade. Artistas como Felipe Bittencourt investigaram os limites da resistência corporal. Gestos repetitivos, reproduzidos na série de Ignácio Pérez Pérez, converteram ações em rituais. Certas exibições foram do mundano ao evocativo e questionaram a concepção do “real” adquirida nas experiências convencionais. Tal ruptura de convencionalismos provém da linguagem experi-mental da performance; princípio pouco aplicado com a mesma destreza da dupla Verena Stenke & Andrea Pagnes.

O vanguardismo presente nesta prática fez com que alguns es-pectadores emitissem errôneas classificações. A pretensão gran-diloquente do evento também ajudou a confundir, pois, em prol do montante quantitativo, reproduções de happenings, inter-venções urbanas e vídeos-arte foram expostos sob a alcunha de “performances”. Seria igualmente errôneo estreitar limites con-ceituais para uma vertente artística que busca, simultaneamente, romper e fundir preceitos estéticos. Sua proposta de “work in progress” (algo em contínua construção) anula prévias definições. A performance e o vídeo-arte dividem referências, ambos se inse-rem no contexto da experimentação e, enquanto a performance desconstrói os cânones vigentes nas artes plásticas e no teatro tradicional, o vídeo-arte desloca os parâmetros do cinema e da fotografia. Embora o hibridismo e a intertextualidade façam parte da arte performática, o vídeo pode ser empregado na sua compo-sição, entretanto não pode ser considerado performance caso o conteúdo componha-se apenas por imagens tecnológicas. Houve

Page 34: Revista Nós nº 3

34 · CRíTICA EMARANHADA

quem qualificasse essas construções como vídeos-performance, trabalho no qual ocorre a interdependência do corpóreo com o tecnológico, ou seja, um sem o outro é exatamente aquilo que o seu nome diz: ou vídeo, ou performance.

Uma performance só se desenvolve mediante interação, pois não há delineações entre onde começa a criação profissional e onde finda o exercício amador da criatividade. O público deve re-ceber um convite para participar e intervir. A relação interativa no evento, ora não formulada de forma profícua, ora não respondida de forma imediata, atingiu seu ápice com a performance “Territó-rio Flutuante” de Wagner Rossi Campos. Esse trabalho mobilizou universitários munidos de cadeiras metálicas em uma passeata peculiar, a qual assaltou os olhos desavisados nos arredores da Universidade Federal do Espírito Santo. A ação impulsionou re-flexões sobre a interação do imaginário artístico no espaço urba-no ao explorar as propriedades metafóricas de um ato “comum” (sentar-se em uma cadeira) deslocado da sua ocorrência cotidiana.

Apesar de ser uma vertente com frágil enraizamento no Es-tado, jovens performers capixabas efetuaram contribuições tí-midas, mas dignas de nota: destaque para o banho excêntrico de Alexandra Bertoli e para os passeios nada convencionais de Amanda Freitas e Clarice Helmer. A atuação dos capixabas, de fato, conteve-se mais na organização do que na movimentação do Trampolim.

Mesmo com falhas, inerentes ao resultado inicial de qualquer projeto, o Trampolim representou um salto artístico-cultural para o Espírito Santo, afinal, disseminou a arte da performance e pro-vocou discussões a seu respeito. As apresentações certamente deixaram rastros de novas idéias nos olhos afetados pelos gestos que (res)saltaram da Plataforma.

Feu Rosa é o caldeirão, mas é família

Rafael Lobo O imaginário sobre a expressão do funk no bairro Feu Rosa, no município da Serra, é carregado de preconceitos e justifica as percepções negativas e reducionistas acerca das relações entre o ritmo, o lugar e as pessoas que fazem parte dele. As notí-cias em tons polêmicos veiculadas pela mídia e o conhecimento raso sobre a cena funk contribuem para esse tipo de raciocínio. Não se trata de negar aspectos polêmicos dessa cultura musical, como o proibidão ou o funk do sexo, mas de mostrar que, para além da imagem midiática estereotipada, os funkeiros estabe-lecem relações com a sua comunidade legitimando esse ritmo enquanto expressão autêntica e pertencente àquele lugar. Essa legitimação confere identidade e promove espaços de sociabi-lidade e entretenimento ao bairro. O caldeirão do funk em Feu Rosa ferve e, notadamente, constitui-se enquanto um circuito vivo, familiar e comunitário.

A associação do funk à violência não se sustenta em todos os contextos. A partir da prática e do discurso de DJ’s, MC’s e de pessoas envolvidas com o ritmo em Feu Rosa, fica evidente a não

Page 35: Revista Nós nº 3

CRíTICA EMARANHADA · 35

existência de brigas ou de confusões constantes nos bailes re-alizados no bairro. Os agentes do funk em Feu Rosa fazem de seu ritmo o mais popular do local, sendo veiculado em diversos ambientes e nos mais diversos espaços: nos próprios bailes, nos celulares, nos carros, no comércio, nas casas e nas vozes jovens que circulam pelas ruas do bairro. Em que pese essa constatação, vale lembrar que os bairros mais populares e de periferia, em sua maioria, não dispõem de aparelhos culturais de qualidade.

Tal popularidade e aceitação contrastam com a visão deturpa-da de quem vê de fora essa cena, incluindo aí a mídia, alguns segmentos da sociedade civil capixaba e, muitas vezes, o poder público. Não podemos associar o funk de Feu Rosa à cultura da violência, à marginalidade e à apologia ao sexo sem incorrermos no risco de estigmatizarmos e criminalizarmos os seus agentes e a sua comunidade. Não devemos, portanto, propagar a “his-tória única” ideologicamente formulada sobre o funk, pois essa percepção não permite defesa, não confere voz aos atores desse ritmo e não respeita a diversidade cultural local.

O funk em Feu Rosa é criador de ambientes sociáveis, ou seja, ele propicia espaços lúdicos para a comunidade e oxigena os la-ços sociais dela. A história do MC Luan Galáctico caracteriza o que estamos falando. Este jovem viu e curtiu os “bailes funk de corredor” em seu bairro, cantou e produziu ritmos taxados de apologia ao crime e à violência e sofreu retaliação da mídia e da polícia. Hoje, ele é o único MC em atividade no bairro e traz outra proposta para o ritmo. Atualmente, ele caminha na onda pacífica e divertida – por vezes sensual – que o funk tem trilhado. Assim como Luan, outros jovens sustentam a bandeira em Feu Rosa e fa-zem a galera da comunidade pular em seus eventos. São eles: DJ’s Júnior Cruel, Espeto, Márcio, Rafinha, Pedrinho, Fabinho e Murilo DJ; as equipes de som Top Mix Treme Tudo e a Equipe Búfalo Bill; além dos grupos de dança Os Danados e Os Galácticos.

Mas o que torna esse circuito algo comunitário, por vezes fa-miliar, e, sobretudo, legítimo? Vale notar que a construção de uma identidade é feita de “fragmentos” que formam um todo, ou seja, o funkeiro também é trabalhador, estudante, amigo, fi-lho, neto etc. Assim, aniversários, festas de criança, “rocks” de adolescentes, churrascos de fim de semana, chás-de-panelas, casamentos e demais eventos festivos no bairro com frequência são regados a muito funk em alto e bom som. Os jovens que produzem a cena funk em Feu Rosa são os mesmos que agitam tais ambientes, levam seus equipamentos (caixas de som, me-sas, amplificadores, notebooks, pendrives etc.), apresentam as suas músicas (próprias ou de outros) e mobilizam seus amigos e parentes para estarem em tais eventos.

Os jovens que trabalham e/ou se divertem com o ritmo são, ao mesmo tempo, o motor e o resultado de sua própria movi-mentação. Simultaneamente, eles produzem suas músicas e são os ouvintes do funk e frequentadores dos bailes. Esse ritmo e seus atores estão inseridos nas esferas comunitárias e familiares de sociabilidade dentro do bairro. Nas festas, DJ’s são convidados e crianças, adolescentes, jovens, tios, avós, pais e mães dançam e curtem as músicas que esses jovens produzem, importam, tro-cam, editam ou cantam. Feu Rosa é, portanto, um caldeirão, um caldeirão muito família!

Contribuíram para a produção deste texto o sociólogo Cícero Frechiani, o DJ Espeto e o MC Luan Galáctico.

Page 36: Revista Nós nº 3

36 · CRíTICA EMARANHADA

Diálogos lomográficos: da construção à desconstrução fotográfica

André Arçari

Enquanto passeavam por Praga, adentrando em uma pequena loja, uma dupla de estudantes vienenses de Artes Visuais encon-trou uma câmera analógica que resolveram adquirir. A princípio, fotografavam com experimentalismo e de diversas maneiras, sem estarem preocupados com as regras da fotografia. Após revelarem seus filmes, logo viram os resultados apresentados nas imagens. As fotos continham as mais diversas variações de contrastes, saturações, granulações, vinhetas, borrões, riscos, dentre outros comportamentos ímpares. O modelo que haviam descoberto, a Lomo LC-A, era um equipamento robusto e sen-sível à luz. A máquina, inspirada na japonesa Cosina CX-1, era fabricada na década de 1980 pela indústria Lomo, a pedido do governo russo, para ser vendida a baixo custo aos cidadãos que mostrariam o cotidiano da Rússia.

Com a ascensão de um novo mercado, o dos computadores pes-soais nos anos 1990, a fotografia analógica começaria a desapare-cer como consequência das mudanças tecnológicas. A lomografia (neologismo criado a partir da fusão das palavras Lomo e fotogra-fia) nasce com uma intencionalidade inversamente proporcional a estes processos automatizados já que privilegia a utilização de câmeras analógicas de baixo custo. A predileção por essa forma de fazer fotos acabou constituindo um novo estilo de vida. Esse impulso de atos e ideias passa a ter visibilidade internacional so-mente após a criação da Sociedade Lomográfica em 1994 na cida-de de Vienna que em seu primeiro evento criou uma mostra de fotografias compostas em murais e em paredes das cidades de Moscou e de Nova York.

Há quem caracterize tal vertente visual apenas pela estética composta nas imagens. É claro que não há como negar esta im-portância, todavia ela pode ser vista como um estilo único de cria-ção de fotos. A espontaneidade da fotografia tirada no cotidiano, ao acaso, permanece em memória impressa no papel por anos. As câmeras ostentam uma desconstrução entre o ver fotográfico e o que posteriormente é apresentado no fotograma, criando assim uma dupla de experiências únicas de olhar para cada um dos dois momentos. A produção fotográfica analógica diminuiu considera-velmente, tanto que a Sociedade Lomográfica surge com o intuito de preservar esse algo esquecido, quase morto.

O caminhar contrário ao processo digital é persistente e possi-bilita uma permanente reflexão crítica. A máquina, o objeto utili-zado, se associa ao fotógrafo tornando-se uma extensão da visão. O contato manual com o foco e a criação de uma paisagem a ser fotografada abre espaço para uma relação intimista entre o fotógrafo e o seu tema. O lomógrafo se apresenta como um ex-perimentador que tenta fugir do lugar comum em busca de lugar nenhum. A prática fotográfica surge com o contato entre o ser e seu eu interior. A busca pela inspiração de poéticas artísticas tem início com a observação do cotidiano pessoal. A abertura para lemas do próprio movimento como “não pense, apenas clique”, “o futuro é analógico” e “deixe o digital para trás” fazem da lomo-

Page 37: Revista Nós nº 3

CRíTICA EMARANHADA · 37

grafia um diário pessoal. A câmera não deve ser vista como uma interferência, mas sim como parte da sua vida, tornando-se um hábito natural transportá-la para todos os lugares.

Devido à expansão da internet, o movimento da fotografia lomo se tornou mais conhecido e os seus adeptos puderam dialogar e compartilhar suas experiências com mais facilidade. Ainda hoje, há aqueles que encaram a lomografia como um simples ato de fotografar, uma composição fotográfica limitada a um padrão vi-sual ou a um modismo moderno. Tal status duvidoso da fotografia como arte ou como registro gera questionamentos e discussões que permanecem sem definições concretas até hoje.

Humor e Humor em vida animada

Rodrigo Hipólito

No começo era o papel em branco, vazio. No instante em que tudo aguarda o primeiro traço, uma forma, um desenho, surge a ideia da imagem dinâmica. Depois é trabalhar incessantemente para se criar uns segundos de movimento. Esse é o esforço de quem se presta à preciosa prática da animação. Mas esta simpli-ficação é injusta, pois não são apenas segundos de movimento. Melhor seria dizer segundos de vida animada.

As tecnologias digitais propiciam um aumento considerável dos segundos de vida animada em relação aos meses trabalhados e também dão um caráter de nobreza à clássica animação 2D. Ain-da assim, lá está o criador com cada frame tatuado na retina e imerso numa alquimia da imagem em movimento. Seu percurso é árduo: é necessário ver o mundo em duas velocidades e obter a melhor saída para o produto final. Mesmo sendo espinhoso, esse é o caminho escolhido por muitos jovens que seguem com a energia que somente a vontade de criação lhes confere.

“Metal Agropecuário” (1’30’’, 2010) é um exemplo de criativida-de posta em ação. Em 2010, a produção do coletivo Eye Move (então composto por Bruno Nogueira, Arthur Perin, Gustavo Ro-drigues, Gabriel Busato e Davi Cáo) foi escolhida na categoria Panorama da mostra de vídeo do AnimaMundi, ganhou a mostra de Vídeo do NDesign e foi selecionada para o 17º Vitória Cine Vídeo. A antiga técnica de recortes, adaptada à realidade digital, agilizou o trabalho e serviu muito bem a um vídeo esteticamente limpo que veicula a mensagem de forma direta. Visual e música são equacionados como um conteúdo sintético, dando acesso imediato a uma discussão sobre a expansão e sobre os possíveis usos das novas mídias. O roteiro, feito de pequenas surpresas, traz imagens que se multiplicam em telas dentro de outras telas, mostrando as amplas possibilidades de encontro da imagem di-gital com o espectador.

Essa dinâmica de subsequentes mergulhos na virtualidade é algo comum aos usuários de novas mídias. Lidar com a informação por meio de links é entrar em telas que lhe transportam para outras telas. E em cada mudança, uma novidade acontece. É interessan-te perceber que acessamos o conteúdo por meio de um humor leve e despretensioso. Está aí o humor que vem do “contraste

Page 38: Revista Nós nº 3

38 · CRíTICA EMARANHADA

súbito” propiciado pelo roteiro ágil e bem dividido. Isso se dá quando ocorrem situações inesperadas e de pequena magnitude, as quais, aliadas à incongruência entre as práticas esperadas das personagens e o tema do vídeo, constituem o embrião do bem--sucedido humor de “Metal Agropecuário”.

Em grau diferente surge o humor de “As Descobertas de Fifi” (1’20”, 2010). Na produção da TV Quase, assinada por Yuri Cus-tódio, com colaboração de Juliano Enrico e com trilha sonora de Chico Cuíca, todo o reino é dado ao nonsense. Incluem-se no ma-terial as personagens, que são cães antropomorfizados. A anima-ção, que também participou do 17º Vitória Cine Vídeo, provém de uma história em quadrinhos protagonizada por uma cadela/menina/mulher publicada na Revista Quase nº 5.

A excentricidade de animais que fazem a vez de humanos é tática eficiente como geradora do cômico e também de estereó-tipos. Tal aspecto permite a agressividade crítica e mordaz sem a necessidade de justificação. O nonsense não é uma voz de opo-sição, mas é um dedo indicador de onde pinga o sarcasmo mais descarado. Bergson aponta que “o riso não tem maior inimigo que a emoção”[1] e é essa insensibilidade que a TV Quase pede ao espectador para que a aspereza de sua comicidade apareça em seu lado positivo.

Em O Ato da Criação, Arthur Koestler mostra que as condi-ções do humor e da criatividade têm muito em comum. Captu-rar elementos da realidade para os quais damos pouca atenção (ou atentamos em exagero) e dispô-los de maneira a formar um conjunto revelador é, talvez, o papel mais positivo do cômico sar-cástico. Assim, o ato de organizar elementos é próximo daquilo da chamada composição. Ao inserir no jogo compositivo uma in-tenção externa à natureza dos elementos utilizados adentramos na esfera da força criativa.

Não é exagero falar de alquimia da imagem em movimento ao compreendermos as exigências criativas do fazer animação. Para se criar uma animação é preciso pensar simultaneamente a quan-tidade de imagens por segundo e a impressão de movimento re-sultante da união dessas imagens. E, quando assistimos à vida animada no cômico de sutilezas e de agressividades desses dese-nhos criados para o movimento, só podemos concordar com uma demonstração: funciona.

[1]BERgSON, h. O Riso. São Paulo: Martins Fontes, 2001, p. 104.

Page 39: Revista Nós nº 3

Se nos atentarmos de maneira rápida para o perfil de Felipe Mourad (28) e de Marianna Schmidt (20) tende-remos a perceber certo antagonismo no modo como esses dois jovens criadores se preocupam com o pro-cesso artístico. Porém, o resultado da interação entre Felipe e Marianna, assim como o bate-papo que os dois artistas tiveram, remete muito mais a uma noção de complementariedade do que a qualquer provocação moti-vada pela busca em sentidos opostos do fazer artístico de ambos.

Fotógrafa e estudante de Design, Marianna tem procurado experimen-tar diferentes suportes para a criação de imagens a fim de testar as poten-cialidades e os limites do analógico e do digital na fotografia. Já a trajetória de Felipe, que é músico e artista--plástico, busca uma arte que requei-ra o suporte mais acessível e efêmero possível, por isso as suas investidas na dança e na performance. Enquan-to ela pesquisa formas de fixar o ob-jeto imagético, ele quer independer de qualquer materialidade.

Moradora de Vitória, Marianna fez duas seleções de fotos para essa cria-ção em parceria. O primeiro grupo de imagens são com os seus traba-lhos considerados mais bem feitos, e outro com os experimentos de uma pesquisa estético-conceitual que ela vem desenvolvendo sem maiores compromissos. Felipe optou por criar a partir desse segundo grupo.

Marianna diz que, há cerca de dois anos, tem produzido fotografias com duplas exposições. Essas imagens são retratos de pessoas sobrepostas pelo lugar que elas consideram como par-te de si. “A fusão das imagens é uma metáfora que busca mostrar como o ambiente, a paisagem ou outros obje-tos são percebidos pelas pessoas en-quanto algo que as constituem. Mas acho que esse trabalho ainda não está amadurecido”, completa.

Apesar de pertencer a uma geração cada vez mais imersa no mundo da manipulação e da produção digital das imagens, a jovem fotógrafa não coloca esses modos tecnológicos em oposição. “Há uma ideia de que a

MARIANNA SCHMIDT FELIPE MOURAD

O ARTISTA PLÁSTICO JUNTA UMA CAMADA DE IMAGENS E POESIA À CRIAÇÃO DA FOTÓGRAFAtecnologia analógica vai ser suplan-tada pelo meio digital. Discordo. Na criação fotográfica, há um momento para cada coisa”, diz.

Cachoeirense e atualmente mora-dor de Vitória, Felipe Mourad tem alguns projetos inconclusos, cursos de Cinema, de Filosofia e de Música. Com uma postura assumidamente anti-artística, ele diz se sentir inco-modado com o excesso de imagens dos dias atuais e, por isso, busca manter uma relação com materiais mais orgânicos em suas criações.

Segundo Felipe, a perda da indivi-dualidade foi o tema que lhe assal-tou ao ter contato com as fotografias em dupla exposição de Marianna. “Gosto de pensar uma subjetividade que é produzida ao se misturar com o mundo, ao perder a sua forma”, diz. Uma das marcas do trabalho de Felipe é a presença figurativa de ca-beças. Por isso, as intervenções nas imagens de Mariana, como é pos-sível ver nas páginas a seguir, aca-baram direcionando a continuidade dessa temática.

FOTOS ARINY BIANCHI COSTURA A DOIS · 39

Page 40: Revista Nós nº 3

40 · NOVELO

sou cego e não sossego. / tudo me impele à pele. / uma cegonha anormal me trouxe em uma trouxa de carne frouxa. / a foto em feto, em bola branca. / não se trata de origem nem germe temperado de história / mas de dobrar a anatomia em um origami de orgasmo / ateando fogo à luz. / fui convidado sim. / quando tentei entrar fui expulso. / camadas incômodas de dádivas adiadas / foram acumula-das durante o aprendizado. / corpo corroído por vícios ridículos. / vírgulas envergadas em direção do vazio. / é na invenção do fim que a tempestade retorna / e a estrada se bifurca em fábrica. / cora-ções ridicularizados por cupidos de genitálias bronzeadas. / cegonhas, cupidos. que merda. / perdi a coerência do desiquilíbrio / embora ainda tenha me restado esta coletânea de horrores. / meu vocabulário é pobre como um pobre. / as meias furadas da minha língua / incapazes de coar o café do tempo. / minha mão receptáculo de cacarecos com graxa / hipnotizando sombras sobrepostas. / onde é preferível um suspiro à um soneto habito e trabalho. / há um modo de moldar o medo. / o máximo que pode acontecer é a morte. / os pensamentos se enfraquecem como espermatozóides na fronha. / é hora de dormir, de domar intensidades. / viver é como tirar o anzol da boca de um peixe / devolvê-lo ao mar / e ver que ele não nada. / nada mais. (Felipe Mourad)

Acima, fotrogafias de Marianna Schmidt. Abaixo, imagens com intervenções e poema feitos por Felipe Mourad.

Page 41: Revista Nós nº 3

NOVELO · 41

Page 42: Revista Nós nº 3

42 · NOVELO

Cada VeZ mais arte e Cultura JoVem

42 · PRCJ

Em seu segundo ano, o Programa Rede Cultu-ra Jovem (PRCJ) tem buscado aperfeiçoar sua metodologia de funcionamento e ampliar o alcance de suas ações. A experiência de 2010 mostrou o quanto as diferentes juventudes ca-pixabas são inventivas e capazes de desenvol-verem suas propostas artístico-culturais. Esse otimismo não é à toa, pois tivemos a chance de acompanhar passo a passo a materialização bem sucedida de diversas ideias concebidas e protagonizadas por jovens do estado.

Sendo uma iniciativa inédita no Espírito Santo, o PRCJ caminha para se constituir en-quanto um modelo de política cultural dire-cionada aos jovens para o resto do País. Parte desse sucesso e do pioneirismo se deve à ado-ção de uma base tecnológica que aposta na dinâmica da produção colaborativa presente nas redes sociais da internet e, principalmente, ao respeito à autonomia juvenil.

Para 2011, a convergência desses movi-mentos presenciais e virtuais será intensifi-cada. Isso se dará por meio da permanente instrumentalização das iniciativas diretamente vinculadas ao PRCJ, da disponibilização de tec-nologias que fortaleçam a dinâmica da REDE

CULTURA JOVEM e da promoção do intercâm-bio entre os jovens envolvidos com a arte e a cultura no estado.

FOTO LUARA MONTEIRO

Page 43: Revista Nós nº 3

PARCERIA DE SUCESSO COm O mAES

O PRCJ tem buscado estabelecer parcerias que gerem conte-údos para o Portal Yah! e movimentar a cena cultural local. Um bom exemplo disso foram as atividades realizadas junto com Museu de Arte do Espírito Santo Dionísio Del Santo (Maes) durante a exposição Edital 11 que esteve aberta até o último dia 8 de maio. Além de veicular a agenda do Maes, algumas das ações do Programa de Arte-Educação que fize-ram parte da mostra foram transmitidas ao vivo pelo Portal.

A coordenadora do setor de Arte-Educação do Maes, Melina Almada, conta que essas ações de comunicação cumprem um papel importante, pois ampliam as discus-sões promovidas pelo Museu, principalmente, junto ao público jovem. “A veiculação online amplia nossa atuação uma vez que o auditório do Museu dispõe apenas de 40 lugares. Isso também possibilita que as pessoas acompa-nhem as atividades, independente de seu deslocamento até o Museu”, diz Melina.

Para se ter uma ideia, a transmissão de uma dessas pales-tras contou com um total de 73 visitas, ou seja, o público vir-tual foi quase o dobro da capacidade do auditório do Maes. Além disso, os internautas podem intervir com perguntas e comentários por meio das redes sociais, como o Twitter ou o Facebook, no momento em que a atividade acontece.

Antes da exposição Edital 11, o Portal Yah! já havia rea-lizado transmissões audiovisuais ao vivo de outros eventos realizados pelo Maes. Comparado a essas primeiras experi-ências, o número de acessos à página das transmissões teve um aumento de 80%. Melina explica: “esse crescimento se dá por agora contarmos com uma pessoa que se dedica exclusivamente a divulgar essas programações na internet, utilizando especialmente as redes sociais”.

O calendário de transmissões da exposição Edital 11 foi iniciado no dia 23 de março. Nesta data foi realizado um bate--papo com Bernadette Rubim, organizadora da mostra, com os artistas expostos e com seus respectivos orientadores. No

FOmENTO PARA A CRIAçãO JOVEm No início de maio, foi divulgado o resultado da seleção dos Editais Rede Cultura Jovem 2011. Além de receberem apoio financeiro para serem executados, os 82 projetos contemplados serão estimulados a dialogarem entre si e construírem conjuntamente um espaço virtual no Portal YAH! por meio do qual será feito o acompanhamento de seu desenvolvimento.

O Subsecretrário de Estado da Cultura do Espírito Santo e Coordenador do PRCJ, Erlon José Paschoal, conta que a troca de experiências possibilita o crescimento das propos-tas “ao entrarem em contato com os diferentes jeitos de experimentar a arte e a cultura, as iniciativas amadurecem suas metodologias criativas, afirmam suas singularidades e ampliam o repertório de soluções para as suas fragilidades”.

A perspectiva é a de que o sucesso individual de cada projeto dependa da capacidade de mobilização da inicia-tiva dentro da Rede Cultura Jovem. Isso acontece a par-tir do estabelecimento de ações colaborativas em que as iniciativas agem de maneira complementar. As propostas farão o relato do desenvolvimento de suas atividades em um blog coletivo. Automaticamente, essas postagens se tornam conteúdos do Portal Yah! gerando visibilidade para os próprios projetos.

CURTO-CIRCUITO

Uma variada programação artístico-cultural inteiramente gratuita. Esse foi o Curto-Circuito realizado na última sema-na de novembro de 2010 em Vitória. Foi um momento para celebrar o fechamento do primeiro ano de ações do PRCJ e para divulgar o resultado dos projetos contemplados pelos Editais Rede Cultura Jovem 2010. O público pôde participar de oficinas, encontros, exposições, apresentações e lança-mentos que ocuparam vários espaços da Capital.

O ponto alto desse calendário de atividades foi o Espe-táculo Curto-Circuito, apresentação que levou uma intensa mistura de expressões artísticas para o palco do Theatro Carlos Gomes na noite do dia 27. O Espetáculo, sob a di-reção de Claúdio Baltar deu ênfase à diversidade cultural presente nas iniciativas juvenis que estiveram diretamen-te vinculadas ao PRCJ ao longo de 2010. Acrobacia, funk, capoeira, arte circense, danças tradicionais, dança urbana, balé clássico, projeções audiovisuais e locução radiofônica foram algumas das linguagens que entraram em cena.

PRCJ · 43

FOTO

YU

RY A

IRES

Page 44: Revista Nós nº 3

44 · PRCJ

dia 04 de maio aconteceu o Ciclo de Palestras com Ricardo Basbaum que buscou discutir a relação curador-artista. Esta foi última atividade da exposição a ser veiculada pelo Portal.

A partir de agora, o PRCJ espera aperfeiçoar a metodo-logia empregada nas transmissões e firmar novas parcerias que gerem conteúdos artístico-culturais para o Portal Yah!. Se você quiser ter o seu evento transmitido, entre em conta-to com a nossa equipe e apresente a sua proposta.

Para mais informações:[email protected]@redeculturajovem.com.br.

mOSTRAS CAPIXABAS DE AUDIOVISUAL 2011

O registro da diversidade cultural do Espírito Santo feito por jovens de diferentes regiões capixabas. Esse é um dos desdobramentos das Mostras Capixabas de Audiovisual (MCA), eventos que acontecerão no segundo semestre des-te ano. Além de exibirem produções realizadas por estu-dantes em oficinas de audiovisual, as Mostras geram inten-so intercâmbio artístico-cultural e promovem a visibilidade das expressões culturais locais.

Em 2011, essa rede de realizadores será ampliada com a MCA Histórico-Cultural. A edição com a nova temática terá região sul do Estado como sede. Juntamente com as versões Rural, Ambietal e Etnográfica, essa ação do PRCJ passa a envolver 53 municípios capixabas em um circuito de produção e exibição audiovisual no qual os jovens são os protagonistas.

FOTO LUARA MONTEIRO

Page 45: Revista Nós nº 3

PORTAL YAh!: PROgRAmANDO UmA CULTURA Em COmUNIDADE

PRCJ · 45

“Criar é dar forma ao próprio destino”.Albert Camus Mudamos! Em menos de 16 meses de vida o Portal Yah! vi-veu intensamente o conflito que é se pautar como iniciativa cultural no ambiente da internet. Seu relativo sucesso em 2010 foi devido à implementação de uma série de códigos e de funções que não permitiram a constituição de um ver-dadeiro ambiente colaborativo, digo, na essência do fazer, da prática em comunidade. Apesar de a primeira versão do Portal dispor de uma interface compartilhada, a tecnolo-gia empregada em sua programação atendia a uma lógica privada e protecionista do conhecimento. Diante disso, o Programa Rede Cultura Jovem (PRCJ) optou por migrar para uma plataforma desenvolvida em código aberto ou open source, mudança tal que tornou a plataforma tecnológica coerente com os valores que orientam o PRCJ.

Para entender melhor esse passo importante é preciso conhecer algumas diferenças entre o código fechado e o código aberto. É uma prática comum entre empresas priva-das de desenvolvimento web cobrarem pelo uso e pela ma-nutenção dos softwares desenvolvidos em código fechado com o intuito de manterem a propriedade intelectual das funcionalidades desenvolvidas, assegurando que o uso des-sas tecnologias fique restrito aos clientes por meio de esta-belecimento de contratos. É por conta dessas restrições que muitos usuários de softwares vivem uma dicotomia entre a ilegalidade dos programas piratas que fazem uso de “cra-cks” de ativação e a migração para softwares livres que, por algum motivo, ainda não caíram no gosto do público.

Quando o usuário burla um mecanismo de ativação de um software proprietário, ele está infrigindo um conjunto de leis que protegem a atividade lucrativa. Por outro lado, quando fazemos a opção pelo uso de um software livre, estamos rompendo com a lógica de apropriação do conhe-cimento imposta pelo código fechado e, ao mesmo tempo, superando os limites que impedem um desenvolvimento tecnológico amplamente democrático, ou seja, o código aberto supera e subverte o fluxo de trocas orientadas pela lógica do lucro.

Ao migrar para o código aberto, o Portal Yah! se insere na pauta internacional de políticas de desenvolvimento de tecnologia para web passando a fazer parte de uma co-munidade que disponibiliza um aporte de conhecimento altamente qualificado compartilhado por grandes desen-volvedores web do mundo inteiro: a Wordpress.org. Esta plataforma oferece uma interface de navegação dinâmica com um sistema administrativo de nada menos 14.040 plu-gins gratuitos, que realizam as mais diversas funções, que vão desde a criação de uma simples agenda até a integração de postagens a partir de dispositivos móveis. A Wordpress.org também dispinibiliza mais de 1.300 temas gratuitos que dão flexibilidade e tornam mais práticas as alterações de aparencia dos blogs. E o mais importante: a possibilidade de implementar melhoramentos no código de programação que está disponível para qualquer usuário da plataforma. Bendito seja o open source! "Conte-me e eu vou esquecer. Mostre-me e eu vou lem-brar. Envolva-me, e eu vou entender".Confúcio

Na página de apresentação do wordpress.org há a se-guinte frase: “nós gostamos de dizer que o WordPress é livre e inestimável, ao mesmo tempo” e segue adian-te “existem milhares de plugins e temas disponíveis para transformar seu site em quase qualquer coisa que você pos-sa imaginar”. Para quem trabalha com arte e cultura, ouvir as palavras livre, inestimável, transformar e imaginar é algo bem sedutor. E foi nessa linha de inspiração que o Portal começou a pautar suas novas diretrizes.

O Yah! é hoje uma plataforma multi-sites onde cada ação da rede pode ter um ambiente (blog, site ou hotsite) perso-nalizado e customizado de acordo com a sua especificidade. Um exemplo disso são os blogs de colunistas colaboradores. Nesses espaços, jovens mobilizadores antenados veiculam conteúdos multimídia de assuntos ligados à arte e à cultura. A partir disso, é possível traçar panoramas e anseios críticos dos jovens capixabas sobre artes plásticas, música, dança, teatro, audiovisual, design, quadrinhos, comportamento,

IVO GODOY

Page 46: Revista Nós nº 3

46 · PRCJ

entre outros assuntos. O modo de operação em multi-site facilita o ato de tecer a virtualização das ações na rede, pois a dinâmica de veiculação e de indexação de conteúdos é customizada de acordo com as especificidades da atividade em desenvolvimento. Cada ação ganha um ambiente per-sonalizado e integrado à arquitetura de navegação dinâmica do Portal como um todo.

Não podemos esquecer que o Portal Yah! continua sen-do uma rede social virtual onde cada integrante tem total liberdade de levantar sua bandeira e deexpressar suas ideias por meio da criação de grupos temáticos, do compartilha-mento de links, do envio de mensagens, da postagem de conteúdos diversos, de comentários sobre as postagens de outros usuários da rede, “favoritando” conteúdos e conec-tando-se à cabeças criativas.

Enquanto um híbrido de portal de informação com rede social, o Yah! se torna um espaço latente de diversidade e de significações. As informações compartilhadas tanto pela equipe editorial do PRCJ quanto pelos membros colabora-dores formam uma massa de dados que apresenta o que a cultura jovem do Espírito Santo está produzindo para o mundo web. A parcela de rede social do Portal é o que am-plia a cobertura de ações a cada novo membro com novos conteúdos e proposições que surgem de forma espontânea.

A sua plataforma aberta dispõe de ferramentas que pro-porcionam a visibilidade e o compartilhamento das ideias e muitos já as utilizam para mobilizar a arte e a cultura no es-tado, pois é isso que o Yah! propõe: uma rede colaborativa de arte e cultura capixaba. Este foco é que nos aponta para as diferenças e para as conformidades conceituais com ou-tras redes como o Facebook, Orkut, Youtube, entre outros. O Portal não propõe uma concorrência com estas redes de relacionamento. Ao contrário disso, a integração com elas por meio de APIs e Plugins é o que possibilita a veicula-ção de vídeos do Vimeo e do Youtube ou de galerias de imagens do Flickr nas atividades dos usuários, assim como as funções de compartilhamentos com outras redes (share this) que estão presentes nas postagens de blog.

O Yah! é uma interjeição capixaba com sotaque web. Sa-bemos que cada rede social trabalha um conceito de utilida-de de acordo com o perfil e com a necessidade do usuário. Dessa forma, o Portal surge com o intuito de identificar, co-nectar e dar visibilidade a jovens produtores de arte e cultu-ra do Espírito Santo. Este sotaque reverberá com muito mais força na web a partir deste ano com atividades na área de desenvolvimento open source e de produções audiovisuais para web que serão incentivadas pelas Bolsas Cultura Tech e pelos Núcleos Web TV – ações inovadoras trazidas pelos Editais Rede Cultura Jovem 2011.

A Bolsa Cultura Tech incentiva a pesquisa e a produção de softwares e de aplicativos a serem distribuídos livremen-te. Uma forma de incentivar os jovens a pensarem soluções de tecnologia web para conteúdos artístico-culturais. Já, por meio dos Núcleos Web TV, serão criadas séries audiovi-suais inéditas para fazerem parte da programação da Web

TV do Portal veiculando um conteúdo autoral e alternativo produzido por jovens.

A possibilidade de se experimentarem novas linguagens é da natureza juvenil. Em se tratando de revolução digital, culturas e internet, os jovens tiveram um papel fundamental na conquista desse espaço e da liberdade de expressão que ele proporciona. Os agentes que promoveram esta revo-lução eram todos hackers da comunicação que pensaram em soluções para uma cultura compartilhada. Augusto de Franco em seu texto “Como se tornar um Netweaver” diz que a mentalidade hacker não é confinada a esta cultura do hacker-de-software e que é possível encontrá-la nos níveis mais altos de qualquer ciência ou arte.

“O termo hacker tem a ver com aptidão técnica e um prazer em resolver problemas e superar limites”.Eric Raymond

Temos hoje no portal Yah! uma possibilidade de experi-mentar a cultura digital sob a mediação da dinâmica cola-borativa. A estrutura de programação apresenta uma mobi-lidade em sua arquitetura modular em que conjuntamente podemos “dar forma ao próprio destino”, ou seja, o futuro desta ferramenta está a cada dia mais próximo da ação co-munitária e isso parte de cada indivíduo que se envolve na causa. Pensar dinâmicas culturais da juventude é o verda-deiro código que programa este portal; e assim descobrimos a cada dia que somos todos programadores hackers da cul-tura, assim como o foram Albert Camus, Confúcio, Pierre Lévy, Eric Raymond, Fernando Sabino e tantos outros.

Participe do Fórum “Rumos do Portal Yah!: programando a cultura em comunidade” e dê a sua contribuição. Acesse:portalyah.com/groups/rumos-portal-yah/forum Para saber mais sobre as funcionalidades do portal, acesse:portalyah.com/suporte

aPi: é um conjunto de rotinas e de padrões estabelecidos por um software para a utilização das suas funcionalidades por programas aplicativos que não querem envolver-se em detalhes da implementação do software, mas apenas usar seus serviços.

Plugin: também conhecido por plug-in, add-in, add-on. É um programa de computador usado para adicionar funções a outros programas maiores, realizando alguma funcionalidade especial ou muito específica. Geralmente pequeno e leve, é usado somente sob demanda.

Fonte: Wikipédia - www.wikipedia.org

Page 47: Revista Nós nº 3

NOVELO · 47

Saulo Pratti

Dia-a-dia, bit-a-bit smeira.blog.terra.com.br

Silvio Meira não fala (só) sobre design e tampouco fala para designers. É sobre o estado atual do mundo e das coisas e como nos relacionamos com tudo e com todos. É coisa que deveria ser comida todos os dias no café-da-manhã, junto a aveia e o Toddynho.

ISO50 iso50.com

Todo mundo tem a sua fonte de referência preferida: aquele lugarzinho de onde brotam novas ideias e vibrações. Nisso o ISO50 é fonte inesgotável: de modernismo retrógrado, em cores e formas.

The Fox Is Black thefoxisblack.com

Inspiração é o que não falta: arte, design, arquitetura e música é o que alimenta a raposa do The Fox Is Black que, inclusive, é casa do sensacionalíssimo Desktop Wallpaper Project.

Ironic Sans ironicsans.com

Falando em fonte inesgotável, parece não haver limites para David Friedman, um dos caras com o senso de humor mais sagazes da internet, e suas inúmeras ideias malucas.

Do sumoao suCo

OBSERVATóRIO · 47

Em meio a tantas referências de se perder de clique, ninguém mais pode ser só aquilo que consome; o suco, a mistura disso tudo. O designer de hoje tem que ser sumo, essência. A essência que carrego com esses links, amigos, é de que o mundo – ao menos o dos designers – é um só: o da criatividade.

52 weeks of UX 52 weeksofux.com

O enredo de 52 weeks of UX não poderia ser mais simples: Josh e Josh falam com sinceridade — e simplicidade — sobre as questões e processos do design para cair na real.

Signal vs. Noise 37signals.com/svn

Acredite em mim, a 37signals não é, de longe, uma empresa qualquer. Conhecer as histórias e as experiências deles é de abrir os olhos e os ouvidos pra muitas outras coisas, especialmente se você sabe que ser designer é muito mais do que a soma de tudo isso que escrevi ai atrás.

Page 48: Revista Nós nº 3

Ao falar da juventude brasileira, alguns questiona-mentos perpassam o nosso cotidiano, tais como: de qual juventude estamos falando? Qual o lugar do

jovem nas políticas sociais? Como entender a juventude nos espaços públicos destinados a ela? Quais os princípios nor-teadores das ações destinadas aos jovens? Quais têm sido os espaços destinados aos jovens na cidade?

Esse arcabouço de questões faz parte da rotina dos es-tudiosos das políticas públicas para juventude no Brasil e orientam a pauta da agenda pública para a necessidade real do planejamento e da implementação de políticas constru-ídas a partir do levantamento das diversas demandas do jovem. É fundamental que as diversas juventudes partici-pem efetivamente de todo esse processo de concepção, de execução e de avaliação de ações do Estado, pois se trata de algo que lhes interessa e lhes afeta de alguma maneira.

No município de Vitória, a juventude esteve presente e se utilizou de um mecanismo de gestão participativa em 2005, o Orçamento Participativo da Juventude (OPJ), para apontar suas demandas políticas e sociais. Foi a partir dessa atuação juvenil em um espaço de definição de ações do poder público que surgiu o Centro de Referência da Juven-tude (CRJ). Atualmente, no Espírito Santo, o CRJ é um dos únicos espaços mantido pelo poder público exclusivamente destinado ao jovem. O Centro conta com equipe técnica e com educadores sociais e oferece variadas oficinas cultu-rais, acesso a cursos profissionalizantes, além de apoiar e promover eventos de dança, arte, graffiti, cinema etc.

 diVersas JuVentudes

São várias as classificações e as noções atribuídas ao que é ser jovem. Tal variedade dificulta um consenso em torno do conceito de juventude. Podemos dizer que, de modo geral, a sociedade encara esse momento como uma pre-paração e uma espera para a entrada no mundo adulto, emprestando aos próprios jovens esse entendimento em relação à etapa juvenil.

Frente às múltiplas faces da juventude, muitos autores a denominam no plural: juventudes. Isso é feito para não perder de vista as diferenças que se apresentam de diversas formas: gênero, etnia, classe, orientação sexual, religião, entre outras. É preciso levar em conta as particularidades e

LORENA LUCAS REgATTIERI

Juventude e participação,para fazer acontecer!

Page 49: Revista Nós nº 3

ARTIGO · 49

Artigo adaptado do Trabalho de Conclusão de Curso inti-tulado “Olhares da Juventude - A Trajetória das políticas públicas de juventude do município de Vitória na Assistên-cia Social: Desafios do Centro de Referência da Juventude (CRJ)”, de autoria de Lorena Lucas Regattieri e Sabrina Lú-cia P. da Silva, apresentado ao Departamento de Serviço Social da Universidade Federal do Espírito Santo no dia 17 de julho de 2009.

as singularidades próprias dessa fase da vida, embora não devamos cair em uma perspectiva fragmentada sobre a ju-ventude. Nesse sentido, os jovens com características di-ferenciadas (sociais, econômicas, culturais etc.) constituem um ser social que se apresenta de múltiplas formas. Entre-tanto, possui em comum com outros o tempo da juventude, ou seja, a demarcação de uma fase da vida.

É preciso observar como os jovens expressam o seu modo de agir e como percebem as concepções de juven-tude que lhes são atribuídas. Nesse sentido, a produção de imagens do que é ser jovem, construídas ora pela sociedade, ora por eles próprios, permite embasar as políticas públicas para esse segmento. O esforço expressivo na realização do debate sobre as políticas para a juventude tem possibilitado a compreensão do jovem enquanto sujeito social diverso, o que garante a valorização da diversidade juvenil e permite a obtenção de uma identidade pessoal e coletiva.

 suJeito PolÍtiCo

As políticas públicas voltadas à juventude estão sendo construídas a partir das demandas dos jovens por meio de orçamentos participativos da juventude, dos conselhos de juventude, dos fóruns e de outros mecanismos de partici-pação. Esses canais de participação têm possibilitado mu-danças no tratamento dispensado aos jovens ao perceber que esses sujeitos são capazes de formular proposições que originem ações a serem planejadas e direcionadas para o atendimento de suas demandas.

No Brasil, nos últimos seis anos, começaram a tomar for-ma e conteúdo as políticas públicas para a juventude a par-tir das articulações da sociedade civil com o poder público. Paralelamente, com a inserção dessa temática nos diversos níveis de governo, percebeu-se a necessidade de se com-preender o jovem como sujeito social possuidor de direitos e de deveres singulares a esta etapa de vida.

A ampliação do olhar sobre a juventude tem resultado na identificação de novas questões, como a relação dos jo-vens com a cultura e com a vida comunitária. Com isso, faz-se o reconhecimento de um universo que está além das representações jovens observadas até o momento, como movimento estudantil e político-partidário, e da ideia de juventude como preparação para a fase adulta.

Esse novo olhar resulta em desafios para a elaboração de novas estratégias de trabalho para a atuação pública junto a esse segmento. O diálogo entre os movimentos sociais, as ONGs, os partidos políticos, entre outros, tem viabili-zado o debate político do tema e tencionado a criação de uma agenda pública na qual estejam pautadas ações para os jovens que ultrapassem o tradicionalismo das políticas voltadas a esse público.

Com base nos novos conceitos de juventude, as polí-ticas públicas têm buscado respeitar as particularidades e também levar em consideração a participação do jovem na

implementação dos serviços, proporcionando, assim, mu-danças no desenho das políticas. O debate sobre o tema juventude deve considerar as diversas significações que esse público apresenta. Portanto, é preciso ter clareza das ne-cessidades reais (lazer, cultura, emprego, saúde, educação, segurança etc.) que compreendem a condição juvenil.

Diante da histórica carência de políticas públicas inte-gradas, que atendam os jovens em sua totalidade e em sua diversidade, é imprescindível que o Estado crie mecanismos que garantam direitos a esta parte da população. Por mais que existam ações desenvolvidas com objetivo de atender à juventude, elas ainda são executadas pontualmente.

Ao tratar de políticas públicas para a juventude, não se pode perder de vista a relevância da participação dos sujeitos jovens. Por isso, é preciso tornar possível e garantir a contri-buição dos jovens na elaboração e na execução das políticas públicas que lhes dizem respeito como forma de promove-rem o seu reconhecimento enquanto sujeito de direitos.

 e agora, Como PartiCiPardas deCisões?

Para garantir efetivamente políticas públicas integradas e coerentes com os interesses da juventude, é preciso com-preender e aproximar-se da realidade dos jovens. O que eles estão pensando? Como descobrir o que se passa na cabeça do jovem? Seus interesses, a relevância dos serviços presta-dos pelo Estado para sua vida e para seu cotidiano, enfim, qual a real demanda da juventude?

A resposta está na criação de mecanismos de participa-ção e no incentivo do Estado para que a juventude atue e colabore no processo de identificação, de criação e de ava-liação das políticas públicas. Este ano, teremos a 2ª Confe-rência Nacional da Juventude, prevista para ocorrer de 9 a 12 de dezembro em Brasília. É fundamental que, localmen-te, os jovens participem dos debates e apresentem as suas demandas para que as propostas feitas nos níveis municipal e estadual pautem a formulação da política nacional.

Vale ressaltar que, além da realização das conferências de juventude, o Plano Nacional da Juventude estabelece como proposta de trabalho a criação de espaços que garan-tam a participação do jovem na tomada de decisões das po-líticas públicas. Essas tarefas devem ser elementos primor-diais na consolidação das ações voltadas a esse público.

Page 50: Revista Nós nº 3

50 · NOSSA GALERIA

1. Sann Gusmão

 VEJA MAIS FOTOS

Sann Gusmão: flickr.com/sanngusmaoRoberta Zouain: flickr.com/rzouainBárbara da Silva Santos: flickr.com/drunken__butterflyCarol Vargas: flickr.com/carolinevargasMarianna Rosa: flickr.com/colorsbleed

2

3

São indiscutíveis as facilidades que os equipa-mentos digitais trouxeram para a técnica foto-gráfica. Um fato intrigante é que, assim como a chegada dos CDs e de tantos outros suportes para reprodução musical deixou no ar certo sau-dosismo em relação aos vinis (os bolachões) e a seus sedutores chiados, na fotografia as máqui-nas digitais abriram espaço para fazer nascer um sentimento semelhante.

A eliminação do processo de revelação é uma das consequências da tecnologia digital. Esse imediatismo na visualização das imagens – uma das grandes vantagens dos equipamentos digitais

– afeta o próprio ato de fotografar. Com a aboli-ção do fator surpresa, das expectativas quanto ao produto final e do custo de revelação, a tendência é que o fotógrafo seja muito menos criterioso ao disparar o clique. Quem observa um fotógrafo trabalhando tem a impressão de que sua ação é um frenético disparador automático.

Outra implicação é que as fotografias não de-pendem mais do suporte material para existirem. As imagens estão guardadas nos computadores, nos celulares etc e não mais nos tradicionais ál-buns. Fotos importantes acabam sendo perdidas de forma irreversível. Sem falar na não mais con-templação do objeto por meio de contato físico e direto. Imagine ver fotos do seu próprio casamen-to somente no computador. É como ler “Grande Sertão: Veredas” pelo celular!

Sim, é ainda um apego ao passado (passado?), um grito nostálgico abafado pela cega reverência ao novo. Ou, simplesmente, um jeito de lembrar como era bom esperar intermináveis horas para a revelação das fotos daquela festa, de ver o álbum da família na casa a vovó com os primos apontan-do-se uns aos outros aos risos.

O PASSADO VIVODOS hALOgENETOSSthefany Frassi

Page 51: Revista Nós nº 3

2. Roberta Zouain, 3. Barbara Santos

2

34

Page 52: Revista Nós nº 3

4

5

4. Barbara Santos, 5. Carol Vargas

Page 53: Revista Nós nº 3

7

6

6. Carol Vargas, 7. Marianna Rosa

Page 54: Revista Nós nº 3
Page 55: Revista Nós nº 3

55

 ANDRé ARçARI Artista que caminha livremente pelos seg-mentos da performance, da videoarte e da fotografia. Cursa Artes Visuais na Ufes. Ama café, cinema europeu, gatos e passa-rinhos, exatamente nesta [email protected]/profile.php?id=71215206

 ARINY BIANChIFotógrafa, produtora e agitadora cultural, cursa Artes Visuais na Ufes. Dialoga com a produção fotográfica, trabalha na área de marketing e manutenção das redes sociais do Museu de Arte do Espírito Santo - De-lnísio Del Santo. Participou da segunda turma dos Agentes Cultura Jovem do Pro-grama Rede Cultura Jovem.flickr.com/[email protected]

 BRUNELLA FRANçAJornalista, escritora, colunista, blogueira, metida a fotógrafa e a twitteira. Vencedo-ra do Prêmio Direitos Humanos de Reda-ção em 2004. Menina da Lua. Aquariana. Apaixonada por livros. Ama música grega e celta, chuva fina e dias nublados. Nasceu no prazer primaveril das histórias infantis. Seu castelo tem paredes de grandes histó-rias e teto de poesias. As janelas são feitas de crônicas e as portas de contos de fadas. É assim, inteira, amor e letras. E quer as consequências. A inevitabilidade. A inten-sidade. A liberdade de [email protected]@brullsradioleszone.com.br/thelwordfics

 DAYANE FREITAS Jornalista e especialista em Linguagens Audiovisuais e Multimídia pela Ufes. É ro-teirista de vídeo e áudio e redatora de cur-sos a distância do Senai-ES. Curte cinema, cibercultura, narrativa transmídia, educa-ção a distâ[email protected] facebook: Dayane Freitas

 FABIANO DE OLIVEIRA (ALEmãO)Quando fez parte do CineKbça desenvol-veu atividades de formação cineclubista em escolas públicas e de produção audio-visual, promoveu exibições itinerantes em

comunidades de Vitória e colaborou com Revista FalaKbça. Também atuou na área de produção audiovisual pelo Projeto Ati-tude Jovem. É membro da equipe gestora do Cine é da Hora: Cineclubismo e Edu-cação em Direitos Humanos - atividade de extensão da [email protected]

 FELIPE PUFF gOmESCarnavalesco do bloco Regional da Nair e Designer gráfico.@felipe_puff

 FELIPE mOURADÉ dançarino de butô, poeta, compositor musical, artista plástico e massoterapeuta.grupodeexterminiodasartes.blogspot.com myspace.com/vitrolade3

 FILIPE mECENASCursa Desenho Industrial na Ufes, desen-volve trabalhos nas áreas de animação, en-cadernação, ilustração e vídeo e pesquisa sobre a integração de técnicas manuais e digitais no [email protected]/filipemecenas desenhoblablabla.blogspot.com

 gUSTAVO SENNA AzEITE Designer e expurgador.@ztones

 hENRIk CARPANEDOArquiteto, paisagista e poeta, não na mes-ma ordem e se tivesse câmera, fotografaria também.taxiparataxi.blogspot.comfacebook.com/henrikcl

 ISABELLA mARIANOEstudante de Jornalismo da Ufes, bailarina na horas vagas e cristã em tempo integral. Amante das artes cênicas, dos livros, do cinema e da boa mú[email protected]

 IVO gODOYArtista multimídia formado em Artes Plás-ticas pela Ufes desde 2007. Desenvolve atualmente dois projetos de poéticas digi-tais: o AXIDIOMA.com e o projeto Vídeo--Críticas. Trabalha atualmente como web

design no Programa Rede Cultura Jovem. Compõe, junto com um grupo de artistas e pesquisadores, a molécula HnA - Molécula Multiplicadora de Arte.axidioma.comportalyah.com/videocriticas

 kARINA VIEgAGraduanda em Letras-Português pela Ufes, é escritora, revisora, tradutora e intérprete. Desenvolve criação, produção e pesqui-sa em artes plásticas, audiovisual, moda e eventos culturais. Integra a Equipe de Mon-tagem de Exposições Artísticas Tuca Sar-mento. Ex-hippie, encontrou um concurso no meio do caminho e tornou-se funcioná-ria pública. Disfarça o canto dos pássaros em palavras jogadas num singelo [email protected]

 LAÍSSA COSTA gAmAROIlustradora, publicitária, cineclubista e compositora nas horas vagas. É co-funda-dora do Estúdio Cosmonauta, um estúdio gráfico digital que trabalha com base na valorização dos direitos humanos e no conceito de desenvolvimento social pauta-do na promoção da cidadania e da cultura.flickr.com/laissagamaroestudiocosmonauta.com.br

 LÍVIA CORBELLARIÉ jornalista em formação pela Ufes e uma das criadoras do blog AgitoCult. É colabo-radora da Revista Graciano, onde se arrisca a escrever poemas e participa da criação do projeto gráfico. Também colabora com a re-vista Srombolli na qual escreve sobre filmes.liiviacor.blogspot.comtwitter.com/liiviacor

 LORENA REgATTIERIÉ assistente social e mestranda em Comuni-cação. É uma ativista pela efetivação dos di-reitos da juventude, principalmente através do empoderamento. Acredita que a infor-mação, a colaboração e o compartilhamen-to de conhecimento são ferramentas únicas para transformações significativas na rotina do jovem. Estudiosa em cibercultura, dedi-ca-se a entender as mudanças na participa-ção da sociedade com o uso da [email protected]@followlori

COLABORADORES

Page 56: Revista Nós nº 3

56 · NOVELO

nhos, colagens e [email protected]/revistastrombolli

 WéRLLEN CASTRODesigner Gráfico monazita e expurgador.flickr.com/werllenwerls.tumblr.com@werls

 YURY AIRESGraduando em Artes Plásticas pela Ufes, fotógrafo, aspirante a cinema, experimen-tador de técnicas audiovisuais, editor de vídeos, trabalha eventualmente em comer-ciais de TV como assistente de direção de arte. Assíduo pesquisador, criou a vídeo--instalação ]Ensaio sobre Ausência[. É de-senhista gráfico nas horas vagas e sempre pratica suas ideias.vimeo.com/user1615670 [email protected]

 LUARA mONTEIROArtista plástica, fotógrafa e designer. Par-ticipou de diversas exposições pelo Espírito Santo. Em 2010, teve o projeto Rota 101/ES contemplado pelo Edital Bolsa Cultu-ra Jovem. Trabalha no Programa Ponte na OSNSG. Reside na Casa nº16 e busca novos encontros para produções colaborativas.flickr.com/[email protected]

 mARIANNA SChmIDTCursa Desenho Industrial na Ufes onde pes-quisa em design da informação. Seu foco é o design editorial e a fotografia e se mete com isso sempre que pode. Publicou duas edições de uma revista digital, a mmag, e vem colaborando em outras publicações. Gosta de música, moda e chocolate, mas não sabe fazer nada disso. Maníaca por post-its e marcadores coloridos, adora coi-sas bonitas e quer fotografar você.flavors.me/[email protected]

 NATÁSSYA CARVALhOEstudante de Artes Visuais na Ufes, traba-lha como fotógrafa freelancer e editora de imagem. Entusiasta da fotografia, valoriza a liberdade estética em relação a proposta fotográfica e considera a importância do tratamento fotográfico como forma pes-soal de interpretação [email protected]

 NINA UYTTENhOVETransita entre linhas tortas de poesia e imagem. Cursa Língua Portuguesa na Ufes e muitas outras nos lugares onde esteve. Belga pela metade, brasileira por comple-to. “Tupi or not Tupi”: Antropófaga. Can-ceriana. Daquelas que tatuam as iniciais das amigas de infância na costela e casas (muito engraçadas) no pulso. Assobia para aliviar a ansiedade constante. Maior so-nho: corrigir erros ortográficos como pro-fissão. Maior medo: [email protected]

 PAULA DORSChMineira, pisciana e graduanda em Publici-dade e Propaganda pela Ufes. Atualmente se divide entre faculdade, posts para o Blog Laboratório, pesquisa sobre fashion blogs e a organização do evento [email protected]  RAFAEL LOBOÉ sociólogo de formação, mestre em so-ciologia política, poeta, boleiro, ciclista, boêmio e, às vezes, contador de lorotas. Mineiro, perambulou pelo Brasil por anos, mas escolheu Vitória para morar... por hora. Trabalha(ou) com crianças, adoles-centes e jovens em projetos sociais. Par-ticipou de coletivos autônomos de poetas

publicando em livretos marginais e até jor-nal, sob a alcunha de “Fael du lobo”.@faeldulobo faeldulobo.blogspot.com

 RODRIgO hIPóLITOÉ artista plástico, crítico e poeta atuante no Coletivo Monográfico. Atua como co-lunista do Portal Yah! e redator do blog Seleta Envelhecida.seletaenvelhecida.blogspot.comportalyah.com/objetoquadrado

 SAULO PRATTINamora a web mas tem uma paixão secre-ta pelo papel. Trabalha na Giran Soluções e Ensino como web designer e escreve de vez em quando em seu [email protected]

 SAVYA ALANAAspirante a jornalista, graduanda pela Ufes, seus primeiros passos foram na equipe de reportagem da Rádio Espírito Santo. Em paralelo, devido à paixão pelo jornalismo cultural idealizou o Blog Agi-to Cult juntamente com amigas movidas pelo mesmo sentimento. Logo depois, se encantou por escrever crônicas e registrar impressões sobre o cotidiano e suas trans-formações. Graças a este gênero textual se tornou colaboradora da Revista Strombolli. Atualmente se dedico ao jornalismo multi-mídia e está trabalhando com redes sociais e TV na web.www.twitter.com/[email protected]

 SThEFANY FRASSIFormada em Comunicação Empresarial. Trabalha com design gráfico. Produtora da Revista Strombolli. Apaixonada por dese-

Revista Nós / Secretaria de Estado da Cultura / Programa Rede Cultura Jovem / Instituto Sincades. – n. 3 (jun. 2011). Vitória, 2011.v. : il. : 20,2 x 26,4 cm.

Semestral.Editor: Paulo Gois Bastos.ISSN 2236-0425

I.Bastos, Paulo Gois.

CDD 050

Page 57: Revista Nós nº 3

NOVELO · 57

gOVERNO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

Renato Casagrande – Governador

Givaldo Vieira – Vice-Governador

SECRETARIA DE ESTADO DA CULTURA DO ESPÍRITO SANTO

José Paulo Viçosi – Secretário

Erlon José Paschoal – Subsecretário

Joelma Consuêlo Fonseca e Silva – Subsecretária de Patrimônio

Cultural

INSTITUTO SINCADES

Idalberto Luiz Moro – Presidente

Dorval Uliana – Gerente Executivo

PROgRAmA REDE CULTURA JOVEm

Erlon José Paschoal – Coordenador

Danilo Pacheco – Coordenador Administrativo-Financeiro

Marcelo Maia – Coordenador da Plataforma Digital

Vânia Tardin de Castro – Coordenadora da Plataforma de

Projetos

Equipe Técnica:

Fernanda de Castro Barbosa

Filipe Alves Borba

Gustavo Rocha Pereira de Souza

Ivo Godoy

Kênia Lyra

Maira Rocha Moreira

Paulo Gois Bastos

Estagiária:

Larissa Fafá

REVISTA NóS

Jornalista Responsável e Editor

Paulo gois Bastos (mTB/ES 2530)

Projeto Editorial – Orlando Lopes e Paulo gois Bastos

Projeto gráfico Original – Alex Vieira e Vinícius guimarães

reVista nós edição Nº 3

Design gráfico, Diagramação e Capa – Felipe Gomes, Gustavo

Senna e Wérllen Castro

Ilustração da seção Crítica Emaranhada – Filipe Mecenas

Textos – André Arçari, Brunella Brunello, Brunella França, Dayane

Freitas, Fabiano de Oliveira, Felipe Mourad, Henrik Carpanedo,

Isabella Mariano, Ivo Godoy, Karina Viega, Laíssa Costa Gamaro,

Lívia Corbellari, Lorena Regattieri, Nina Uyttenhove, Paula

Dorsch, Paulo Gois Bastos, Rafael de Almeida, Rodrigo Hipólito,

Saulo Pratti, Savya Alana, Sidney Spacini e Sthefany Frassi.

Revisão de textos – Luiz Cláudio Kleaim

Direção de Fotografia – Luara Monteiro

Fotos – Ariny Bianchi, Bárbara da Silva Santos, Carol Vargas,

Francisco Neto, Gustavo Senna, Luara Monteiro, Marianna Rosa,

Marianna Schmidt, Natássia Carvalho, Roberta Zouain, Sann

Gusmão e Yury Aires.

Ficha catalográfica – Ana Lúcia Smazaro Siqueira (CRB 296)

Conselho Editorial da revista Nós nº 3

Alex Reblim, Carolina Ruas Palomares, Juliana Lisboa, Karina

Moura, Luiz Carlos Cardoso, Max Lander e Vitor Lopes.

especificações gráficas

Tipografia – Emona, Syntax LT, LT Finnegan

Papéis – Offset e Pólen

Impressão – Grafitusa

Tiragem – 5 mil exemplares

A revista Nós é uma publicação do Programa Rede Cultura Jovem.

Rua Abiail Amaral Carneiros, nº 191, sala 505, Ed. Arábica –

Enseada do Suá – Vitória-ES, CEP: 29.055-220.

(27) 3026-2507 / [email protected]

redeculturajovem.com.br

Vitória-ES

Junho de 2011

Page 58: Revista Nós nº 3

58 · NOVELO

Page 59: Revista Nós nº 3

NOVELO · 59

UM ANIVERSÁRIO PARA A DANÇA URBANA

Realizado pela União de Dançarinos do Espírito Santo (Udes), o Encontro de Danças Urbanas acontece na Praça dos Namorados, em Vitória. No último sábado de cada mês, praticantes dos diversos estilos da dança urbana da Grande Vitória se reúnem para mostrarem suas coreogra-fias. Esta imagem foi produzida no último dia 30 de abril, durante a edição comemorativa dos três anos de Encontro.

urbanudes.blogspot.com

FOTO NATÁSSYA CARVALHO

Page 60: Revista Nós nº 3

PARCERIA: REALIZAÇÃO:

N Ó S N º. 0 3 • J u n h o d e 2 0 1 1

I S S N 2 2 3 6 - 0 4 2 5

Jun

ho

de

20

11

n

º3

Rev

ista

sIS

SN 2

23

6-0

42

5