revista latino americana de cerveja · 2019. 6. 17. · tinham na cerveja uma parte importante da...
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REVISTA LATINO AMERICANA DE CERVEJA
EXPEDIENTE
A Revista Latino Americana de Cerveja tem periodicidade anual, sendo suas edições publicadas no
mês de maio. Faculdade Escola Politécnica de Inovação e Conhecimento Aplicado
Rua Elsbeth Feddersen, 72
Salto do Norte - Blumenau - SC
CEP: 89065-430
ISSN: 2526-8090
CORPO EDITORIAL
Prof. Me. Honorato Pradel – Editor Chefe
Prof. Dr. Carlo Enrico Bressiani – Comissão Editorial
Prof. Me. Eduardo Thiago Slomp – Comissão Editorial
2
APRESENTAÇÃO
O mercado de cerveja está em aceleração e a demanda por cursos e busca de conhecimentos vem
crescendo significativamente. Nasce aí uma nova exigência. É urgente que se produza mais conteúdo,
ampliem-se conhecimentos e realizem-se pesquisas que respondam as necessidades de mercado e de
avanço do conhecimento cervejeiro.
Nesse sentido, a Faculdade Épica, através de sua mantenedora a Escola Superior de Cerveja e Malte,
cuja missão é formar profissionais qualificados, éticos e humanizados, para atender às necessidades do
mercado de trabalho com inovação e capacidade de aplicar os conhecimentos, assume o compromisso
de contribuir com a produção e aplicação do conhecimento na área de cerveja por meio da Revista
Latino Americana de Cerveja.
Essa primeira edição da Revista Latino Americana de Cerveja contempla 10 artigos que trazem
importantes contribuições de estudos que abordam o processo produtivo, a utilização de ingredientes
diversos, processos de análises e pesquisas de mercado.
A todos uma boa e proveitosa leitura!
3
SUMÁRIO
4
A cerveja no Brasil Holandês: notas sobre a instalação da primeira cervejaria das Américas
Beer in Dutch Brazil: notes on the installation of the first brewery in the Americas
Resumo: O artigo discorre sobre a ocupação holandesa no Brasil, a primeira cervejaria fundada em
solo brasileiro e os processos de criação do imaginário em torno do período de permanência até hoje,
além da desmitificação dessas construções. O foco se dará sobre a questão da alimentação deste
período e sobre a instalação da primeira cervejaria do Brasil (consequentemente a primeira cervejaria
das Américas), durante o governo de Maurício de Nassau em Recife no século XVII. A ideia central é
contextualizar a abertura da cervejaria como uma parte de um projeto dos holandeses de melhorar o
abastecimento das tropas no Nordeste e diminuir as constantes crises em função da dependência de
alimentos e bebidas da metrópole. A cervejaria, instalada na casa de descanso de Nassau operou por
um período de quatro anos e teve suas atividades encerradas com a partida do governador de Recife.
Apesar de pequena na participação da história Brasileira os holandeses marcaram o imaginário do
povo pernambucano e a cerveja é parte do movimento que este trabalho percorre de retomada dos
aspectos sociais e culturais nos holandeses no Brasil. Desde modo, este é mais um dos elementos que
criaram a mística em torno do governo de Nassau no Recife, marcando o imaginário local que perdura
até hoje. Tal perspectiva pode ser desenvolvida por uma abordagem da geografia humanística.
Palavras chaves: Ocupação Holandesa, Governo de Nassau, Cerveja, Imaginário, Geografia
Humanista
Abstract: The article discusses the Dutch occupation in Brazil, the first brewery founded on Brazilian
land and the processes of creation of the imaginary around the period of permanence until today,
besides the demystification of these constructions. The focus will be on the feeding of this period and
the installation of the first brewery in Brazil (consequently the first brewery in the Americas), during
the government of Maurício de Nassau in Recife in the 17th century. The central idea is to
contextualize the opening of the brewery as a part of a project by the Dutch to improve the supply of
troops in the Northeast and to reduce the constant crises due to the dependence of food and drinks on
the metropolis. The brewery, installed in the rest house of Nassau operated for a period of four years
and had its activities closed with the departure of the governor of Recife. Although small in the
participation of the Brazilian history the Dutch marked the imagination of the people of Pernambuco
and the beer is part of the movement that this work traverses of resumption of the social and cultural
aspects in the Dutch in Brazil. Thus, this is one of the elements that created the mystique around the
government of Nassau in Recife, marking the local imaginary that lasts until today. Such a perspective
can be developed by an approach to humanistic geography.
Keywords: Dutch Occupation, Government of Nassau, Beer, Imaginary, Humanist Geography
5
Introdução
A história da cerveja no Brasil é mais antiga que podemos imaginar1. Desde tempos remotos,
havia entre os povos indígenas uma vasta tradição de produção e consumo de bebidas fermentadas.
Tanto o Cauim, como o Caxiri, fermentados a partir da mandioca ou do milho2, como os fermentados
a base de frutas, diversas etnias indígenas cultivavam o hábito de beber, e em algumas, as bebidas
fermentadas podiam, tal qual na Europa Medieval, até mesmo substituir o consumo de água34
.
Ainda que a produção de cerveja em escala maior seja algo que data apenas após a chegada da
família real no Brasil, em 1808, o hábito de se beber cerveja já encontrava nas terras brasileiras bem
antes desta data. Segundo Houaiss, ―D. João VI que, quando veio para cá, não se esqueceu de trazer
alguns tonéis de sua bebida preferida‖5. Contudo, antes de 1808 havia o contrabando de cerveja de
outros países, ainda que em quantidades tímidas, uma vez que a metrópole portuguesa era muito mais
devota ao vinho que a cerveja6.
Após a abertura dos portos, especialmente às ―nações amigas‖, isto é, o Reino Unido, a
comercialização de cerveja aumenta bastante no Brasil, sobretudo entre os habitantes ingleses, que
tinham na cerveja uma parte importante da sua dieta alimentar. A cerveja inglesa, mais escura, de alta
fermentação e importada em barris, tomou conta do cenário nacional até o final do século XIX quando
a cerveja alemã, mais clara, de baixa fermentação e importada em garrafas, ganha a preferência do
público7.
Em 1836, o Jornal do Commercio, da cidade do Rio de Janeiro, publica o primeiro anúncio
sobre produção de cerveja no Brasil.
1 Para Unger, a história da cerveja revela algo sobre a sociedade e a cultura. Mas não tem sido levada a sério uma
vez que sacrificou o rigor acadêmico em função do entretenimento (Cf. ―The history of brewing is oftem not
taken seriosly, one reason being that histories of brewing or specific breweries have sacrificed scholarly rigor
for entertainment of reader and author‖ (Unger, 2001, p. 6). 2 PINELI; GINANI, XAVIER (2010)
3 ALMEIDA 2015
4 Segundo Almeida: ―Um dos pontos centrais da interpretação realizada por Viveiros de Castro2002, p.249) é
que a derrocada dos Tupinambá pelos colonos europeus, em especial pelos jesuítas, deu-se à custa de um ataque
não só ao ritual canibalístico, mas também às próprias bebedeiras, sendo a tarefa de impedir as bebedeiras muito
mais complexa que a de impedir o canibalismo. Nesse sentido, tendo em vista os argumentos quanto aos
benefícios do consumo de fermentados, é interessante notar que a sabotagem dos jesuítas à vida ritual e às
bebedeiras dos Tupi-Guarani, resultando (entre outros aspectos) na quebra das redes existentes entre os grupos,
possui um contraponto ecológico: os Tupi-Guarani (adultos) voltaram a beber água. Aldeados, com escassas
possibilidades de movimento e sujeitos às mazelas de uma sedentarização forçada (Coimbra Jr. et al., 2004), os
Tupinambá perderam os benefícios vitamínicos dos fermentados e ficara expostos não só às impurezas de seus
dejetos, mas também a um coquetel de doenças europeias, muitas das quais transmitidas pela água‖ (ALMEIDA,
2015).
5 HOUAISS, 1986, p.76
6 SANTOS, 2004; HOUSAISS, 1986
7 SANTOS, 2004
6
Figura 1: Anúncio de venda de jornal no Jornal do Commercio do Rio de Janeiro
Fonte: https://opabier.com.br/blog/historia-da-cerveja-no-brasil-parte-2-cervejarias-artesanais/
Entretanto, a exceção dos fermentados indígenas, que já estavam presentes no Brasil por muito
tempo, o início da produção de cerveja no Brasil remonta à ocupação holandesa no Nordeste durante o
século XVII. Foi na cidade de Recife que se instalou a primeira cervejaria das américas e que foram
realizadas as primeiras execuções de receitas, boa parte delas, advindas da rica tradição de produção
de cerveja na Holanda.
Deste modo, este artigo, visa percorrer esta história, buscando entender a instalação da
cervejaria no Recife a partir tanto da necessidade frugal de embriagues das tropas holandesas, e
também, como um ato que visava acalmar os ânimos holandeses em face às dificuldades advindas do
projeto colonizador no nordeste brasileiro, dificuldades estas que envolviam a resistência holandesa
em se adaptar a terra, a rejeição da dieta alimentar da colônia e as dificuldades de produção e acesso a
alimentos no Recife do século XVII.
Isto contribuiu para formar um imaginário dos brasileiros em relação a invasão holandesa.
Seus componentes, envolvem diretamente a relação entre os brasileiros e holandeses e a ocupação dos
espaços na antiga cidade do Recife, já que durante o governo de Nassau o espaço urbano sofreu
transformações significativas8.
8 Segundo Claval (1999), a Geografia Cultural passou por um movimento de renovação e reforçou seu interesse
sobre os aspectos “não-materiais” que envolvem as questões que relacionam espaço e cultura. Dentro dessa ótica
entender a criação do imaginário e a relação com o espaço é um dos objetivos da, também chamada, geografia
dos imaginários, que em certa medida explica alguns processos da ocupação holandesa em Recife e a construção
dos imaginários em torno desse processo.
7
A criação do imaginário tanto holandês em relação ao Brasil, quanto dos brasileiros em
relação a invasão holandesa e seus componentes serão analisadas sob a perspectiva da Geografia
Humanista, buscando as relações entre o espacial e social na chamada Geografia dos Imaginários.
Além disso, o desenvolvimento da receita de cerveja realizada em Recife nos leva também a
remontar um capítulo da história da cerveja na Holanda, que tem no século XVII um momento
importante de transformação que, ao fim e ao cabo, levou ao desaparecimento um know how
cervejeiro construído durante toda a idade média na Europa. Assim, compreender este fato
aparentemente curioso da ocupação holandesa, implica em compreender tanto as condições materiais
desta ocupação como também uma parte da história da alimentação tanto no Brasil, como na Holanda.
A ocupação Holandesa em Recife e a alimentação da colônia:
A invasão holandesa no Brasil se deu por meio da Companhia Holandesa das Índias
Ocidentais (em holandês: West-Indische Compagnie ou WIC) criada em 1621 com o monopólio do
comércio colonial dos Países Baixos e de escravos com o Caribe, Brasil, América do Norte e também
partes da África Ocidental. O maior objetivo da nova Companhia era retomar o comércio do açúcar
produzido na Região Nordeste do Brasil, que já despontava com uma das principais áreas de produção
do mundo9.
A ocupação do nordeste brasileiro em cinco diferentes ocasiões: 1624-1625 - Invasão de
Salvador, na Bahia; 1630-1654 - Invasão de Olinda e Recife, em Pernambuco; 1630-1637 -
Resistência ao invasor; 1637-1644 - Administração de Maurício de Nassau; 1644-1654 - Insurreição
Pernambucana.
Em seu auge o Brasil Holandês se estendia, em seu litoral, por todo o Nordeste desde a Bahia até o
Maranhão. A primeira invasão em Salvador, capital da colônia, foi expulsa por frota espanhola10
, já a
tomada de Olinda e Recife foi mais duradoura. A resistência aos invasores se concentrou no Arraial de
Bom Jesus, mas não resistiu aos holandeses. O período do governo do conde alemão Johann Moritz
von Nassau-Siegen, mais conhecido como Maurício de Nassau (1637-1644) foi o tempo de relativa
paz. Entretanto, após o término do período de Nassau, as disputas pela colônia se intensificaram, e o
domínio holandês termina com a insurreição Pernambucana que culminou na Batalha dos
Guararapes11
, em que esses foram definitivamente expulsos do Brasil12
.
9 NASCIMENTO, 2008a
10 Neste momento existia o que a historiografia moderna chamou de União Ibérica, com a junção das monarquias
de Portugal e Espanha entre os anos de 1580-1640. Devido a esse fato a Espanha expulsou os Holandeses de
Salvador. 11
Essa batalha ocorrida no morro dos Guararapes nos arredores de Recife em 1648 é considerada o marco da
criação do exército Brasileiro e a sua data, 19 de abril, é hoje comemorada como o Dia do Exército. Contudo a
expulsão dos Holandeses se deu somente em 1654 com a rendição de seus comandantes. Ainda foi necessário o
governo português pagar aos Holandeses uma indenização pelo tratado de Haia em 1661.
8
Figura 2: Mapa do Brasil Holandês no século XVII, por P.M. Netscher, Haia 1853
Fonte: BUVE, 2011
A linha marcada reproduz a fronteira da colônia durante o governo de Maurício de
Nassau em 1641. O mapa oferece uma boa perspectiva, sobretudo, da região conquistada
entre São Luis, no Maranhão e a capitania de Sergipe. Os holandeses avançaram realmente
mais do delimitado por Netscher, porque em 1641, exploraram a foz do Rio Para e a Île de
Marajó, que está registrada como terreno para a cultura do tabaco. O mapa faz parte da
coleção Bodel Nijenhuis, Biblioteca da Universidade de Leiden13
.
Dos períodos destacados acima a permanência de Maurício de Nassau é sem dúvida a
mais impactante em termos culturais, arquitetônicos, políticos e administrativos. É justamente
neste período que a cidade do Recife floresce, e que também a cervejaria é instalada.
O governo de Nassau ficou conhecido pelos avanços urbanísticos da cidade, com a
criação do plano urbanístico da ilha de Antônio Vaz (atualmente o centro antigo do Recife),
pela liberdade religiosa, a documentação da paisagem local, criação do jardim botânico,
zoológico, observatório astronômico. Nassau ainda construiu dois palácios, uma igreja, a
12
MELLO Evaldo de, 1998 13
BUVE, 2011
9
primeira ponte14
da América Latina, pavimentou ruas; e remodelou urbanisticamente o Recife
que passou de 40 para 380 casas, o que na época era um número extraordinário. Os imóveis
compridos e estreitos da Rua Imperador Dom Pedro Segundo, no bairro de Santo Antônio, são
um exemplo desse legado15
.
Nassau ainda trouxe nomes das mais diversas áreas do conhecimento. Destacam-se os pintores
Zacharias Wagener, Frans Post e Albert Eckhout, o cientista Willem Piso, que veio à Nova Holanda
para estudar as doenças tropicais, o cartógrafo Cornelis Golijath e o astrônomo saxão Georg Marggraf,
que, com Piso, seria o autor da Historia Naturalis Brasilia em 1648, esta é considerada a primeira obra
de caráter científico sobre a natureza brasileira. Vieram ainda três vidraceiros e um entalhador16
.
Segundo Freyre:
Com o domínio holandês e a presença, no Brasil, do conde Maurício de Nassau [...]
o Recife, simples povoado de pescadores em volta de uma igrejinha, e com toda a
sombra feudal e eclesiástica de Olinda para abafá-lo, se desenvolvera na melhor
cidade da colônia e talvez do continente. Sobrados de quatro andares. Palácios de
rei. Pontes. Canais. Jardim botânico. Jardim zoológico. Observatório. Igrejas da
religião de Calvino. Sinagoga. Muito judeu. Estrangeiros das procedências mais
diversas. Prostitutas. Lojas, armazéns, oficinas. Indústrias urbanas. Todas as
condições para uma urbanização intensamente vertical. Fora esta a primeira grande
aventura de liberdade, o primeiro grande contato com o mundo, com a Europa nova
— burguesa e industrial — que tivera a colônia portuguesa da América, até então
conservada em virgindade quase absoluta. Uma virgindade agreste, apenas
arranhada pelos ataques de piratas franceses e ingleses e pelos atritos de vizinhança
e de parentesco, nem sempre cordial, com os espanhóis17
.
Para Abdala, os feitos dos Holandeses e principalmente de Nassau criaram marcas na cultura e
no imaginário dos brasileiros, especialmente dos pernambucanos. Entretanto, esta memória é apenas
no plano imaginativo, uma vez que a herança material sucumbiu, os prédios daquela época não
existem mais e nem a ponte original suportou o tempo18
.
Assim, podemos lançar luz, neste aspecto, para o campo da geografia humana no que se refere
a sua busca pelo entendimento da dimensão espacial dos contextos e fenômenos sociais. A chamada
geografia do imaginário, que na visão de Lindón e Hiernaux (2012), se debruça sobre as articulações
entre os imaginários espaciais com as respectivas formas espaciais e os contextos sociais. Ou seja,
para os autores, há uma dimensão imaginária entre o aspecto social e o aspecto espacial. Esta relação
14
Na inauguração da ponte, a fim de levantar recursos, Nassau falou ao público que quem fosse ao evento iria
ver um boi voar. No dia 28 de fevereiro de 1644 fez um boi andar por entre as casas e as pessoas e quando esse
boi fora escondido um couro de boi moldado cheio de palha, amarrado em cordas entre duas torres, sobre
roldanas rodou pelos ares de Recife. O evento que arrecadou milhares de florins, o fato gerou fama, virou livro
(O Príncipe Maurício de Nassau, o Holandês do Boi Voador de Guido Heleno e Jô Oliveira) e inspirou até
música (Boi Voador Não Pode, Chico Buarque) (MACHADO, 2009). MACHADO, Regina. Boi Voador.
Fundação Joaquim Nabuco, Recife. Disponível em: <http://basilio.fundaj.gov.br/pesquisaescolar>. Acesso em:
24/01/2018. 15
SOUZA, 2018 16
SOUZA, 2018 17
Apud. MELLO, Evaldo de. L. 22-25 18
ABDALA, 2008
10
espaço/sociedade, cria representações simbólicas que atravessam o tempo, contribuindo para a visão
contemporânea que temos dos elementos do passado
Neste contexto das ideias de uma geografia do imaginário que a visão popular sobre a invasão
holandesa gera imaginários, que na maioria dos casos estão mais associados a uma construção
mitológica que a uma construção real19
. Neste caso, podemos perceber que há muita construção
imaginária sobre a ocupação holandesa e pouco resgate dos fatos reais.
O resgate histórico, através de documentos e, narrativas, especialmente em relação a ocupação
holandesa, faz-se necessária exatamente porque a relação entre espaço- sociedade- imaginário, no
Recife holandês é muito profunda. Nassau foi responsável por transformações significativas no espaço
da cidade. Até hoje, ditos como ―o melhor prefeito de Recife foi Nassau‖ ecoam no imaginário
popular. É preciso ressaltar que o desenvolvimento urbano e social daquele período, em realidade foi
marcado pela exploração extensiva da monocultura, pela exploração do trabalho humano, e por
condições degradantes dos habitantes da região, tanto colonizadores, como também os nativos da terra,
seja eles os primeiros brasileiros ou os diversos grupos indígenas que habitavam o lugar. A cervejaria
no Recife deve ser entendida como um fruto deste processo, em que as inovações urbanas foram
construídas em meio a uma situação mais caótica que idílica.
Como já foi mencionado o interesse da Holanda no Brasil era o comércio do açúcar.
Enganam-se, contudo, aqueles que pensam que Pernambuco seria melhor se os Holandeses
governassem por mais tempo no lugar dos Portugueses20
. O objetivo de ambos os governos era o
lucro21
.
Contudo, ainda que durante a administração de Nassau alguns avanços tivessem sido
realizados, a vida cotidiana tanto dos habitantes de Recife quanto dos colonizadores holandeses, não
era fácil. Segundo Gonsalves de Mello, era comum ver soldados holandeses maltrapilhos pelas ruas do
Recife, os preços dos víveres eram altos, assim como dos alugueis (causando uma crise de moradia).
Eram constantes as crises de abastecimento, as doenças e a miséria entre as tropas holandesas2223
.
19
CLAVAL, 2012 20
Vale lembrar das outras experiências coloniais holandeses. Nas Antilhas, África do Sul ou Indonésia, por
exemplo, temos um legado bastante negativo da colonização holandesa. 21
Essa tese, por exemplo, é defendida pela historiadora Virginia Almoedo e pelo arquiteto José Luiz de
Menezes. Menezes comenta que os holandeses tinham a Guiana Holandesa (Suriname), terras na África, e que
tudo foi desaparecendo (mesmo hoje as possessões holandesas não estão bem (SOUZA, 2017)). Isto indica mais
um insucesso da experiência colonial holandesa que uma experiência frutífera. É deste modo que a ocupação
holandesa no Nordeste Brasileira deve ser compreendida. 22
MELLO, Gonsalves de, 1947 23
Mello transcreve um trecho de uma carta datada de 1650: ―é uma lástima e uma vergonha para o Estado ao
qual os soldados prestaram juramento, vê-los ir pelas ruas, todos esmolambados, com os trapos arrastando,
muitos sem poder cobrir o corpo, mais parecendo mendigos que soldados. Apanham as imundícies das ruas, que
nem os porcos querem comer, para acalmar sua grande fome; e como lhes falta o imprescindível para o sustento
são levados a condições abjetas; apanham trapos nas ruas e nos canais e consideram sorte quando encontram
algum farrapo ou graveto (stockje) para lenha no caminho. Procura cada um ao romper do dia, anteceder os
outros em percorrer as ruas e a praia a ver se encontra algo que lhe possa servir‖ (MELLO, 186-187).
11
Para Gonsalves de Mello,
―o período da dominação holandesa no Brasil foi uma época de altos e baixos:
períodos de prosperidade em que o Recife, segundo a expressão de certo documento,
era ―um monte de ouro‖, sucediam e antecediam outros de miséria negra, em que se
morria de fome pelas ruas. A palavra ―fome‖ é uma das mais comuns nas Generale
Missiven. Apesar da remessa constante de víveres da Holanda, no Recife e em
Maurícia os burgueses e o povo passaram momentos de fome‖24
.
Em termos alimentares, os problemas se repetiam. Para Freyre, o colonizador holandês não
revelou no Brasil jeito especial para se adaptar ao meio diferente25
. Ao contrário do Português, que tão
logo chegou ao Brasil aprendeu com os índios como se alimentar e como cultivar a terra, os
holandeses permaneceram presos aos seus hábitos mais arraigados. Mello destaca que os holandeses
permaneceram rigidamente dentro das mesmas atitudes, com a mesma dieta, o mesmo tipo de casa.
Mesmo a dieta do exército holandês era proveniente da metrópole. Ele escreve: ―Da Holanda
vinha-lhes todo o necessário à subsistência: a carne de boi e de carneiro salgada, toucinho, presunto,
salmão, bacalhau salgado e seco, arenque, farinha de trigo, vinhos da Espanha, francês e do Reno,
cerveja, queijo, manteiga, azeite, azeitonas, alcaparras, figos, passas, amêndoas, etc‖26
. Até os
soldados do interior eram alimentados com esta dieta.
Evaldo Cabral, por sua vez, destaca os problemas de abastecimento no Brasil Holandês,
―sobretudo no tocante à farinha de mandioca e à carne, não foram jamais resolvidos pelo governo
holandês, a despeito das suas tentativas de obrigar os proprietários rurais a plantarem determinado
número de covas‖27
.
Em 1639, Adriaan van der Dussen, membro do Alto Conselho que administrava o Brasil
relatava as crises de abastecimento e a dependência holandesa de víveres da metrópole: ―E se bem que
a falta de todos os outros víveres seja difícil de suportar, a falta de farinha [de trigo] foi a que causou
maior indignação. Suportamo-la por muito tempo e tivemos de procurar uma solução para isto.
Taxamos os moradores de todo o Brasil em certa quantidade de farinha de mandioca a ser entregue,
toda semana ou quinzenalmente, aos nossos comissários em cada guarnição. Assim poupamos por
muito tempo a farinha de trigo‖28
. Tal passagem ilustra a inadequação holandesa à alimentação no
Brasil, conforme a hipótese de Freyre, bem como as dificuldades de acesso aos víveres europeus.
Outra situação que reforça essa não adaptação dos holandeses à terra e aos costumes
brasileiros são os poucos relatos dos viventes daquela época, como o do soldado da WIC, Peter
Hansen Hajstrup, que em 18 de maio de 1646 chegando a Recife da Paraíba recebeu a
24
Idem, p. 186 25
FREYRE, 1947 26
MELLO, Gonsalves de, 1947: 144 27
MELLO, Evaldo de. L. 4067-4069 28
Apud. MELLO, Evaldo de. L. 2242
12
ração ou sustenti para uma semana: uma libra de bacalhau, uma libra de farinha de
trigo, uma caneca de azeite de palma e uma caneca de vinagre. Com isso nós
deveríamos [nos] contentar durante nove semanas. Por esse motivo, muita gente
passou para o inimigo e muitos morreram. Entretanto, nos arranjamos nos campos
com perrexil do mar e outras ervas e plantas. Também os cavalos, cachorros, gatos e
ratazanas foram a nossa melhor comida29
Ainda que a situação de abastecimento da cidade fosse bastante complexa, Nassau, por outro
lado não abria mão de determinados luxos. Recebia os comensais com muita fartura. Conforme
descrito no documento de 1644, para orientar o dispenseiro do Palácio de Vrijburg, uma das casas de
Nassau no Recife, eram entregues diariamente na cozinha do palácio:
―100 libras de carne verde ou 50 de carne salgada e 50 de carne verde; 20 ou 25
libras de toucinho, segundo a necessidade; 4 galinhas e pombos, segundo a
necessidade; 2 litros de vinho espanhol; 4 litros de cerveja; 11/2 litros de azeite; 4
litros de vinagre; 14 pãezinhos brancos e para cada uma das mesas tantos pãezinhos
quantas pessoas houver, exceto a mesa de S. Exa., onde haverá pão e bebida sem
conta certa. 2 litros de aveia; 5 litros de ervilha; 12 libras de carne de fumeiro‖30
.
É contrastante a fartura do Palácio de Nassau com as restrições enfrentadas pelas tropas e os
colonos. De certo modo, as medidas tomadas por Nassau e pelo Alto Conselho se mostraram tímidas e
muitas vezes inócuas. Em 1641, por exemplo, é publicado norma proibindo a derrubada de cajueiros31
,
em 1640, torna-se norma o plantio de roça de mandioca numa parte das terras dos engenhos com fins
de alimentação da Colônia (ainda que, como vimos, os holandeses resistissem ao consumo da
mandioca e seus derivados).
Para Gonsalves de Mello, tanto Nassau como o Alto Conselho fizeram esforços em
administrar a crise de abastecimento da cidade. No entanto, esses esforços não foram muito frutíferos.
Mello escreve: ―apesar dos esforços de Nassau e do Alto Conselho, nunca se chegou a um período de
equilíbrio em que o Nordeste pudesse atender suas próprias necessidades. A monocultura sempre foi o
principal entrave a este equilíbrio. Em certa ocasião o açúcar foi distribuído a população do Recife e
Maurícia em substituição a farinha, que faltara completamente. Diz a Dagelijksche que a cada morador
foi distribuída 1 libra de açúcar. Açúcar no lugar de pirão‖32
.
Podemos verificar que a imagem que os holandeses tinham do Brasil não era das melhores, já que não
conseguiram se adaptar a terra (espaço) e os costumes (alimentação). Por outro lado, se firmou um
forte imaginário na população local sobre o comando do holandeses no nordeste brasileiro que se
mostra até hoje, sobretudo em Recife.
29
TEENSMA; MIRANDA; XAVIER, 2016 30
MELLO, Gonsalves de, 1947, p. 144-145 31
“resolveu-se tornar pública a proibição de que nenhum senhor de engenho, queimadores de cal, oleiros,
fabricantes de cerveja (“brouwers”) ou quem quer que seja, permita-se derrubar algum cajueiro, sob multa de
cem florins” (MELLO, Gonsalves de, 1947, p. 160). 32
Idem, p. 182
13
A cerveja no Brasil holandês
Durante a administração de Nassau no Recife é instalada a primeira cervejaria das Américas.
A cervejaria foi instalada em uma das casas de Nassau, o palácio La Fonteine.
Segundo Mello, ―o cervejeiro chegou ao Recife em outubro de 1640 e trazia permissão do Conselho
do XIX para instalar aqui a sua fábrica ―na aldeia de Sua Excelência, utilizando para tal a casa da
Companhia, com o rio e o mais que se encontra nas proximidades e a lenha de que tiver necessidade,
tudo pelo tempo de seis anos próximos futuros‖. A casa da Companhia, que seria a La Fontaine de
Nassau, foi realmente entregue pelo prazo de quatro anos e pelo aluguel global de 1.500 florins33
. A
cerveja começou a ser fabricada e distribuída depois de abril de 1641, constando ser ―uma cerveja
forte‖34
.
Pouco se sabe sobre as atividades da cervejaria ou os motivos que levaram a sua criação. Os
historiadores da cerveja no Brasil são unânimes em afirmarem a sua existência35
. Não há relatos sobre
as razões que levaram Nassau para proporcionar a abertura da cervejaria. Podemos apenas inferir que
pudesse ser para aplacar as necessidades das tropas, para ter um produto mais fresco e de melhor
qualidade disponível (uma vez que no século XVII o transporte por longas distâncias acarretava na
deterioração da cerveja), ou se para abastecer seus próprios jantares no Palácio Vrijburg.
A cervejaria funcionava na casa de descanso de Nassau e devido o seu nome, La Fontaine,
diversas sites e fontes no Brasil assim denominam a cervejaria de Dicx, porém isso não se está
documentado. Segundo Mello, a casa de La Fontaine era usada como casa de descanso de Nassau, até
que em outubro de 1640, passou a ser usada como espaço para uma fábrica de cerveja: ―Nassau
provavelmente deixou de usá-la após a construção do parque de Vrijburg, de vez que desde outubro de
1640 ela passou a ser utilizada por uma fábrica de cerveja36
. Segundo o mapa de mapa de Cornelis
Golijath impresso em 1648 (figura 5), onde vê-se a indicação "Het Dorp Aldea hier is een Brouwerye
en Suycker Pas" o que traduzido seria "A vila Aldeia; aqui há uma fabricação de cerveja e um passo de
açúcar".
33
Atualmente o grande crescimento no número de cervejarias no Brasil de cerca de 200 em meados de 2006 para
quase 400 dez anos depois, ultrapassando 600 em 2017 (MARCUSSO; MÜLLER, 2017), também se verifica
com o aumento das cervejarias chamadas ciganas, aquelas que sem uma indústria aluga a planta cervejeiro de
terceiros. Neste contexto seria, então, a primeira cervejaria das américas uma cigana.
MARCUSSO, Eduardo. MULLER, Carlos. A Cerveja no Brasil: o ministério da agriculta informando e
esclarecendo. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA, 2017. 34
MELLO, Gonsalves de, 1976, p. 32-33 35
SANTOS, 2004; MORADO, 2009; BELTRAMELLI, 2014; MORADO, 2017 36
MELLO Evaldo de. Nassau governador do Brasil. L. 1194-1195
14
Figura 3: Mapa de Cornelis Golijath impresso em 1648 intitulado “TPerfect Caerte der
Gelegen theyt van Olinda de Pharnambuco Mauritsstadtendet'Reciffo”
Fonte: http://acervo.bndigital.bn.br/sophia/index.asp?codigo_sophia=14
O destaque no mapa mostra aparentemente onde se localizava a ―aldeia Nassau‖37
e a
cervejaria de Dirck Dicx. Outros mapas da época mostram que a aldeia de Nassau ficava entre São
José do Manguinho (Atual Parque Amorim) e o antigo Sítio das Freiras (Atual Bairro dos Aflitos).
Essa região viria a ser denominada de Bairro da Capunga38
no século XIX. A figura abaixo mostra
onde seria a cervejaria no traçado urbano recente do Recife:
37
A casa de La Fontaine era também chamada de aldeia Nassau por ficar muito próxima de uma aldeia de índios
Tapuias. 38
“[...] na área do primitivo sítio que começava na Camboa do Manguinho (Parque do Amorim) e se estendia até
à margem do Capibaribe, em área limitada pela Estrada do Manguinho (Avenida Rui Barbosa), Rua da Baixa
Verde e Rua da Ventura (Rua Joaquim Nabuco). O sítio veio a ser dividido em dois, denominados de “Capunga
Velha” (que tinha por eixo a atual Rua Joaquim Nabuco) e “Capunga Nova”, com início nos Quatro Cantos e
tendo por eixo a atual Rua das Pernambucanas”. DANTAS, Leonardo. Capunga (bairro, Recife). Pesquisa
Escolar Online, Fundação Joaquim Nabuco, Recife. Disponível em: <http://basilio.fundaj.gov.br/pesquisaescolar/>. Acesso em: 25/01/2018. Foi fundada em 2015 em Recife, a
cervejaria Capunga que homenageia o Bairro em função da provável localização da cervejaria de Nassau.
15
Figura 4: Possível atual localização da Aldeia Nassau
Fonte: Elaboração própria a partir do site MyMaps do Google.
https://www.google.com/maps/d/edit?mid=1DQ3g7mZUfCwQIO4wVP6tdPv2btS3i4S7&ll=-
8.04604633684232%2C-34.899208550000026&z=16
Contudo, em diversos autores podemos encontrar relatos do consumo de cerveja durante a
ocupação holandesa no Recife, tanto pelas tropas da Holanda, como por habitantes holandeses ou
mesmo portugueses. Segundo Evaldo de Mello, ―Ainda são procurados aqui cobre, ferro, aço, breu,
óleo de peixe, mas sobretudo os seguintes gêneros alimentícios: vinhos, cervejas, azeite, manteiga,
queijo, farinha de trigo fina, bacalhau, toucinho, presunto, línguas, carnes de fumeiro, peixes da Terra
Nova, sardinhas e tudo de bom que aparece‖39
.
Entretanto, ainda que hajam relatos de procura e de consumo de cerveja no Brasil Holandês,
era ainda um produto caro e de difícil acesso e cuja preferência estava mais ligada aos hábitos
holandeses que dos portugueses. Podemos ver nestas passagens de Evaldo de Mello: ―O que se fornece
de ração em carne e farinha é consumido muito mais rapidamente do que se a pensão [do funcionário
da WIC] e o rancho [do soldado] fossem pagos em dinheiro, porque os soldados quando recebem
dinheiro compram pouca carne, arranjam-se com um pouco de farinha e algumas frutas e o que podem
dispensar empregam em garapa para beber, porque cerveja e vinho são caros para eles‖40
.
39
MELLO, Evaldo de. L. 4161-4163 40
IDEM. L. 4098-4101.
16
E: ―As coisas tinham subido a um preço incrível: a libra de carneiro ou de vitela
estava a quarenta soldos; a de porco, que neste lugar é a mais sã e mais delicada,
custava três libras; um ovo fresco, dez soldos; uma galinha, dez libras; um leitão,
quinze libras; um peru, 25 libras; o par de pombos, três libras; o vinho de Espanha,
da França e a boa cerveja, cinco libras a pinta, a medida de Amsterdã, que não é
senão o quartilho de Dijon; o pano grosso, cinquenta soldos ou três libras41
.
A vinda do cervejeiro Dirk Dicx também é um capítulo bastante curioso. Dirk era filho dos
donos da cervejaria ‗t Scheepje, na cidade de Haerlem, na Holanda. Seu pai era membro do conselho
da cidade e um dos membros da guilda dos cervejeiros locais. Além disso, Dirk também trabalhou na
de Halve Maen‘t, outra célebre cervejaria da região. Dirck tinha patente militar, o que talvez justifique
seu aparecimento nas telas do pintor neerlandês Franz Hals42
. Em 1640 Dirck autoriza a venda de sua
casa em Haarlem e parte para o Brasil (fonte: Noord-Hollands Archief, consulta em dezembro de
2017).
A cervejaria ‗t Scheepje foi uma das mais duradouras e tradicionais da cidade de Haarlem, no
norte da Holanda. Fundada no século XVI, a ‗t Scheepje se tornou uma das maiores e mais
reconhecidas cervejarias da região. A importância histórica desta cervejaria advém, em especial, do
fato de que até 1913, quando ela encerrou as atividades, a ‗t Scheepje guardou processos, ingredientes
e receitas do modo tradicional de se fazer cerveja na Holanda43
.
O século XVII, também conhecido como século de ouro na Holanda, é um ponto de virada na
história da cerveja e dos processos cervejeiros neste país44
. Desde a baixa idade média, o fabrico de
cerveja no que veio a se tornar o território holandês, era atividade recorrente. Segundo o historiador R.
W. Unger:
―Brewing was rural in Holland until the late thirteenth century when urban
breweries appeared. The industry was transformed in the fourteenth century by
technical change which ushered in the golden age of brewing in the country. That
period of prosperity lasted from late in the fourteenth century down to the middle of
the seventeenth. While performance and practice were not uniform through the
entire golden age it was an era in sharp contrast to the long decline which set in
around 1650, a decline that was only to relieved when the industry went through a
41
Idem. L 4342-4345 42
Segundo Unger: “In many cases brewers were part of civic government in Holland from the fourteenth
throught the seventeenth century. The frequency of brewers taking public positions can be explained in part by
their prosperity and by their being tied to the town” (Unger, 2001, p. 6). 43
Boa parte deste material está preservado no arquivo público da Holanda do Norte. Algumas cervejarias atuais
já acessaram essas receitas antigas e reproduziram cervejas de época. O caso mais conhecido é da cervejaria
Jopen, situada também na cidade de Harlem. A Jopen já produziu uma versão de uma cerveja lupulada a base de
maltes de cevada, trigo e aveia, cuja receita é datada de 1501. Além disso, a própria fundação da cervejaria, em
1995, se deu em função da reprodução de uma das receitas tradicionais preservadas no arquivo público,
produzida para o aniversário de 750 anos da cidade de Harleem (Cf. www.jopenbier.nl). 44
Pouco se conhece sobre a história da cerveja na Holanda. Tradicionalmente, a grande maioria dos estilos de
cerveja existentes no mundo são divididos e classificados em quatro grandes escolas: a inglesa, a alemã, a belga
e mais recentemente, a norte-americana. Entretanto, é preciso considerar que a Bélgica apenas passou a existir
como país em 1830 e boa parte de seu território era de domínio holandês. Além disso, a Holanda faz fronteira
com a Alemanha. Ou seja, podemos dizer que a história da cerveja na Holanda é um híbrido entre as formações
da cervejaria belga e território de influência da cervejaria Alemã.
17
second great transformation in the 1860s and 1870s, establishing the foundation for
the prosperous contemporary Dutch brewing industry‖45
.
Assim, Unger destaca que compreender a passagem do processo de fabrico de cerveja desde o
final da idade média até a consolidação deste processo como atividade industrial é também
compreender a passagem de uma atividade doméstica para um empreendimento industrial. Neste caso,
a indústria cervejeira holandesa entre os séculos XIV, XV, XVI e XVII se constituía numa importante
atividade econômica, capaz até mesmo de patrocinar parte do chamado ―Século de Ouro na
Holanda‖46
.Muitos foram os estilos e processos de cervejas holandesas que foram ficando para traz
desde o século XVI e XVII até o século XIX, quando a revolução industrial trouxe, além de
maquinário e tecnologia, estilos ligados à escola de cerveja da Alemanha47
. As cervejas tradicionais
holandesas, no período do século XVII, estão praticamente extintas e salvo raríssimas exceções, como
a cervejaria Jopen, por exemplo, apenas são resgatadas em edições especiais ou comemorativas.
Estilos de cerveja como a Kuit48
, as Luiks, ou cervejas claras e escuras fabricadas na Holanda já não
existem mais. Há ainda relatos de cervejas tipo witbier (também chamadas de whitebiers). O uso de
variados tipos de grãos também era comum na época. Além do malte de cevada, os mestres cervejeiros
usavam malte de trigo, aveia, espelta e centeio. A adição de lúpulo na cerveja, elemento praticamente
obrigatório nas cervejas atuais, era também de uso bastante discreto no século XVII49
. O uso de
especiarias na cerveja era prática comum na Holanda. Esta prática está na origem ao que hoje
chamamos de gruit biers50
. Na Holanda, eram adicionadas diversas especiarias as cervejas, no intuito
45
UNGER, 2001, p. 7 46
Unger escreve: “They formed the basis for the prosperity of the Dutch economy in the seventeenth century, the
'Golden Age', and indeed for the prosperityof all of Europe in the years before the Industrial Revolution. Traders
imported raw materials from overseas, they were worked up in combination with domestic materials by native
workers and the final products were then exported by traders to markets throughout Europe. To understand the
success of the Dutch economy,its character and structure, and indeed to understand the pattern of economic
development from the late Middle Ages to the Industrial Revolution some appreciation of what happened in
brewing is a necessity” (Unger, 2001, p. 7). 47
A Heineken, por exemplo, foi fundada em 1864. 48
Esse estilo de cerveja consta no guia de estilos da Brewers Association (mais conhecido como Guia do BA),
editado em 26 de Abril de 2017. O Guia do BA mantém um “dutch style” que pode ser chamado de Kuit, Kuyt
ou Koyt. Na descrição fala em cor do ouro ao cobre (SRM 5-12.5 ou 10-25 EBC); com turbidez média por conta
de proporção dos cereais utilizados; corpo de baixo para médio; aroma maltado por conta do uso de 15% de
aveia e 20% de trigo, além do malte de cervada; notas de lúpulo são baixas quando utilizado no lugar do gruit, os
ésteres frutados são baixos, é aceitável baixo diacetil, mas não DMS e acidez. A densidade original varia de
1.050-1.080 (12.4-19.3 °Plato) e final 1.006-1.015(1.5-3.7 °Plato); o ABV varia de 4.7%-7.9% e o IBU de 25-35
(Cf. https://www.brewersassociation.org/resources/brewers-association-beer-style-guidelines/). O estilo também
foi contemplado no VI Concurso Brasileiro de Cervejas, ocorrido em 4 a 6 de março de 2017 na cidade de
Blumenau-SC. 49
Cf. www.lostbeers.com 50
Ainda que as Gruits não constem nos manuais de estilos, são conhecidas como as cervejas fabricadas e que
não levavam adição de lúpulo, sendo usado um conjunto de ervas e especiarias para saborisar a cerveja.
18
de conferir sabor: cardamomo, semente de coentro, anis, lavanda, alcaçuz, gagel51
e um infinidade de
raízes, ervas e especiarias eram amplamente usadas, especialmente até em torno do século XVII52
.
No Brasil não há relatos de que tipo de cerveja poderia ter sido feita na cervejaria operada por
Dicx. Sabemos que chegava trigo ao Brasil. Mas quanto aos demais insumos cervejeiros, não existe
referência. Entretanto, se somarmos as dificuldades enfrentadas para o abastecimento na colônia, a
vasta produção de açúcar no nordeste brasileiro, a experiência de um mestre cervejeiro como Dicx e a
tradição de cervejas na Holanda do XVII, talvez a primeira cerveja brasileira tenha contido uma
quantidade de malte de trigo e algum açúcar para facilitar a fermentação, o que de certa forma justifica
o fato da cerveja holandesa no Brasil ser considerada uma ―cerveja forte‖53
. As próprias dificuldades
com o abastecimento em Recife podem ter sido um fator que dificultou a produção em escala da
cervejaria de Nassau.
Conclusão
A invasão dos holandeses no nordeste brasileiro foi uma estratégia militar, econômica e,
sobretudo no governo de Nassau, social. Porém os grandes lucros auferidos pelo açúcar da cana não
superaram as dificuldades de adaptação dos holandeses ao espaço brasileiro e seus costumes.
Uma tentativa de adaptação foi a aventura cervejeira holandesa no Brasil, porém essa também
enfrentou seus próprios percalços. A pouca habilidade holandesa em solucionar os dilemas da
colonização, somados as várias formas de restrição da colônia em termos de alimentação dos
colonizadores, e a dependência da metrópole, foram, provavelmente os fatores definidores do pouco
sucesso da cervejaria.
Em termo de imaginário os holandeses não criaram uma boa relação com o espaço nacional,
por outro lado o imaginário o povo de Pernambuco, sobretudo o recifense, em relação ao comando
holandês foi tão marcante que perdura até hoje. Mesmo ele sendo erguidos sobre mais mitos que fatos.
Ademais ainda que que o projeto de Brasil holandês e sua cerveja tenha sido pontual e não
tivesse sido levado a diante, Recife guarda hoje o título do lugar em que um europeu pela primeira vez
fez uma cerveja nas Américas.
51
Um tipo de erva aromática bastante comum na Holanda. 52
Este período em alguns casos podia se estender também para o século XVIII ou início do XIX (Cf.
www.lostbeers.com). 53
A produção de cerveja em La Fontaine se iniciou em abril de 1641 e era além de forte uma cerveja encorpada
do tipo swaar fermentada com açúcar (PEREIRA, 2018). PEREIRA, Levy. "Acajúapáie". In: BiblioAtlas -
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http://lhs.unb.br/atlas/Acaj%C3%BAap%C3%A1ie. Data de acesso: 24 de janeiro de 2018.
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www.fundaj.gov.br. Acesso em 18/01/2018
www.bndigital.bn.gov.br/acervodigital/. Acesso em 19/01/2018
21
A ECONOMIA E O TERRITÓRIO DO LÚPULO:
A história, análise mercadológica e o desenvolvimento do lúpulo no Brasil e no mundo
Eduardo Fernandes Marcusso54
Carlos Vitor Müller55
Resumo: O lúpulo é um elemento fundamental para a cerveja e sua história remonta desde a Grécia
antiga, sendo utiliza na cerveja, provavelmente, pelos celtas no século 5 ou 6 a.c. no norte de Itália.
Por meio da revisão bibliográfica sobre o tema, dos dados do Ministério da Indústria, Comércio
Exterior e Serviços-MDIC, Relatório BATH-HASS e do Ministério da Agricultura, Pecuárias e
abastecimento-MAPA, este trabalho busca alcançar os seguintes objetivos: fazer um breve histórico do
lúpulo; explorar o conceito de desenvolvimento territorial; analisar o atual estado da cadeia de valor
do lúpulo no Mundo e Brasil e avaliar o papel a ser desempenhado por este cultivo no
desenvolvimento territorial. Após verificar as oscilações e correlações na produção de lúpulo no
planeta e em terras tupiniquins podemos verificar a importância dos alfa-ácidos neste cenário e como
as atividades ligado ao lúpulo no Brasil podem ser consideradas como vetores para o desenvolvimento
dos territórios onde a sua produção é organizada.
Palavras-chave: Lúpulo, Desenvolvimento territorial, Cerveja, Importação.
1. INTRODUÇÃO
O lúpulo é uma das matérias-primas características da cerveja, responsável por conferir
características organolépticas típicas da bebida, além de conferir vantagens na sua conservação e
estabilidade microbiológica (KUNZE, 2010). Segundo a legislação brasileira, o lúpulo é matéria-prima
característica da cerveja. Desta forma, não podem ser produzidas e tampouco importadas ao Brasil
cervejas que não contenham lúpulo em sua formulação (BRASIL, 2009)
Para seu uso e conservação, o lúpulo deve ser seco e processado logo após a sua colheita,
podendo ser comercializado em cones inteiros, em pellets e na forma de extratos (BRIGGS, 2004).
Atualmente estas duas últimas formas, pellets e extratos, tem sido majoritariamente utilizada pela
indústria cervejeira mundial devido à sua praticidade de emprego e melhor conservação (KUNZE,
2010).
54
Geógrafo do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento da Coordenação Geral de Vinhos e Bebidas,
Sommelier de Cerveja e Doutorando do programa de pós-graduação de Geografia na UnB com o projeto
intitulado “Os Territórios da Cerveja”. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA,
Esplanada dos Ministérios, Bloco D, Brasília/DF, Brasil, CEP: 70.043-900, Sala 348B Anexo, tel: 61-3218-
2909. [email protected]
55 Auditor Fiscal Federal Agropecuário do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Eng.
Agrônomo, Mestre Cervejeiro VLB-Berlim e Msc. Tecnologias Químicas e Biológicas pela Unb. Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA, Esplanada dos Ministérios, Bloco D, Brasília/DF, Brasil, CEP:
70.043-900, Sala 735, tel: 61-3218-3190. [email protected]
22
O Brasil, 3º maior produtor mundial de cerveja, (CERVBRASIL, 2016) não possui produção
expressiva de lúpulo dependendo exclusivamente da importação desta matéria-prima. Essa situação é
uma das justificativas do trabalho e, além dessa dependência, temos a florescência do mercado de
produção de lúpulo no Brasil. Esse cenário nos coloca a hipótese sobre a atividade do lúpulo no Brasil
como vetor do desenvolvimento territorial.
Este trabalho tem como objetivos: fazer um breve histórico do lúpulo e suas utilizações; trazer
o debate do desenvolvimento territorial; analisar o atual estado da cadeia de valor do lúpulo no Mundo
e Brasil e avaliar o papel a ser desempenhado por este cultivo no desenvolvimento territorial.
2. METODOLOGIA
Para alcançar o primeiro objetivo proposto foi feita uma revisão bibliográfica sobre a
utilização do lúpulo ao longo da história para posicionar o lúpulo na evolução da humanidade e
mostrar sua importância, principalmente, em relação à cerveja. A histórica do lúpulo no Brasil,
especificamente, ainda contou com questionário realizado com plantadores de lúpulo do país.
Já para entender os debates sobre o conceito de desenvolvimento territorial a revisão
bibliográfica se pautou em autores franceses que trabalham com a noção de território e
desenvolvimento, além das abordagens brasileiras sobre os temas. Esses autores formam a base para
analisar os dados além de uma visão puramente mercadológica.
Para análise dos dados foram consultadas as informações do comércio exterior
disponibilizados pela plataforma Comexstat, do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços-
MDIC, os dados do Relatório alemão sobre produção mundial de lúpulo BATH-HASS, em várias
edições, bem como dados do Ministério da Agricultura, Pecuárias e abastecimento-MAPA sobre
número de cervejarias. A legislação brasileira foi resgatada a parte que trata da cerveja e que cita o
lúpulo como matéria-prima característica da bebida.
Após a revisão bibliográfica e a coleta de dados foram feitas análise das atividades que
envolvem o lúpulo no Brasil e no Mundo para tirarmos conclusões sobre o potencial dessa atividade
como promotora do desenvolvimento territorial.
3. BREVE HISTÓRIA DO LÚPULO
A origem espontânea do Lúpulo (Humulus Lupulus L.) foi provavelmente a China de acordo
com análise de DNA de geneticista Russos, Americanos, Japoneses e Chineses. De lá as várias
espécies de lúpulo migraram para a Europa e América do Norte (BOUTAIN, 2014).
Os gregos usavam lúpulo, o qual chamavam de ―Keltoi‖, como salada. No passado, muitos
males do homem foram tratados por médicos com prescrições de lúpulo que tinha a reputação ajudar
23
no combate a várias doenças, com propriedades para ―limpar‖ o sangue de impurezas, curar coceiras e
outras doenças da pele, além de "aliviar o fígado" (EDWARDSON, 1952).
A evidência mais antiga de uso de Lúpulo em cerveja vem dos Celtas. Os celtas eram grandes
guerreiros e trabalhavam bastante a produção de armas a base de ferro, eles dominaram a Europa
Central de 2.500 a 3.000 atrás. Em escavações de suas tumbas, realizada na região do piemonte
italiano, se direcionava a um antigo assentamento celta na cidade de Pombia (aprox. 550 a.c.),
província de Novara. Uma das sepulturas abertas continha um pequeno recipiente, perfeitamente
preservado, com resquícios de cor vermelho violeta depositado junto a uma bebida muito simular a
cerveja (BARTH-HAAS, 2003)
A análise dos resquícios feita pelo laboratório paleobotânico do Museu de Arqueologia de
Como, próximo 70 km do Pombia, revelou substancial quantidade de grãos e polén de lúpulo.
Segundo o Dr. Gambari, diretor da agência de arqueologia de Turin, essa foi a primeira vez que se
pode verificar com clareza a composição de uma bebida de 5, 6 séculos a.c. da cultura Golasecca, que
dominou a região norte da Itália entre os séculos 4 e 9 a.c. (idem).
Apesar dessa descoberta ser apenas fortes indícios do uso de lúpulo na cerveja, o fato é que o
lúpulo provavelmente cresceu selvagem na área ao redor da Pombia e era conhecido pelas pessoas da
época. Assim esse depósito de uma grama de extrato de cerveja com traços de lúpulo se estabelece
como um grande marco na história do lúpulo. (idem).
O período celta foi seguido pelo domínio do império romano, cuja cultura de bebida era aquela
do vinho. Com o desaparecimento dos celtas, seus hábitos de consumo também foram esquecidos.
Seguindo a linha do tempo existe a citação de Plínio, o Velho (23-79 d.c., Como, Império
Romano) sobre o lúpulo. No capítulo 50 de seu livro/enciclopédia, História Natural, ele descreve as
plantas que nascem espontaneamente e o seu uso. Sobre o lúpulo Plínio comenta sobre o uso na
alimentação (PLINY THE ELDER, 1855).
O mais antigo registro do lúpulo como uma planta cultivada é datada de 760 d.C. quando o rei
Pepino o Breve, o pai de Carlos Magno, doou de presente, o que ele chamou de ―Humuloria‖ (Jardins
de Lúpulo) para a basílica de Saint-Denis, região de seu nascimento, atual Île-de-France, Paris
(EDWARDSON, 1952).
Nos primeiros anos do século IX o abade Irmino, de Saint-Germain-des-Prés, menciou em seu
Políptico um pagamento em cotas de lúpulos. Durante a Idade Média muitos mosteiros tornaram-se
famosos por suas cervejas lupuladas. A cerveja foi a principal bebida, naquele tempo, para café da
manhã, jantar e ceia.
Antes da famosa menção de lúpulo da cerveja de Hildegarda na Alemanha, o abade Adelardo,
na abadia de Corbie em Picardia, na região norte da França (Hauts-de-France) fez o primeiro registro
da história sobre utilização do lúpulo (idem).
24
O abade enumerava obrigações dos abades, sendo uma delas fornecer um décimo do malte e
do lúpulo colhido ao monge incumbido de fabricar a cerveja. ―The first historical mention of the use of
hops in beer was from 822 AD in monastery rules written by Adalhard the Elder, also known as
Adalard of Corbie, use plants other than hops for flavouring. (CORNELL, 2004). Interessante notar
que Abelardo era meio irmão de Pepino, o Breve, assim as peças vão se encaixando sobre o
conhecimento do lúpulo.
A fama de Hildegarda vem de sua vastíssima obra em geral e sua explicação das propriedades
de conservação que o lúpulo fornecia a cerveja. Hildegarda de Bingen56
(1098-1179) iniciou sua vida
eclesiástica aos 8 anos no mosteiro das beneditinas de Disibodenberg, onde foi se tornou abadessa em
1136 e já iniciava seus estudos sobre as plantas e curas. Cinco anos após, em 1141, teve sua primeira
visão mística, momento em teria recebido ―um encargo de Deus‖ para escrever e pregar. Assim
solicitou e recebeu da igreja autorização para peregrinação do papa Eugênio III. Hildegarda foi a
primeira mulher a conseguir tal autorização (COSTA, 2012).
Em meio a peregrinação na década de 1150 escreveu uma grande obra de medicina, Liber
subtilitatum diversarum naturarum creaturarum (Livro das sutilezas das várias naturezas da criação),
que, após sua morte, foi dividido em duas partes: Physica ou Liber simplicis medicanae (Física ou
Livro de medicina simples), que é um tratado de medicina naturalista, em nove livros, e Causae et
curaeou Liber compositae medicanae (Causas e curas ou Livro da medicina composta).
Nos seus escritos pode-se notar que ela tinha ampla conhecimento da medicina da época,
mesmo não tendo formação universitária, proibido às mulheres. Um ponto importante é o conhecido
que a monja tinha dos escritos de Plínio, o Velho, que já havia relatado o lúpulo em seu História
Natural, ainda no século primeiro depois de cristo (COSTA, 2012). Na passagem do livro Physica,
quando trata sobre o lúpulo, Hildergarda escreve:
―It is warm and dry, and has a moderate moisture, and is not very useful in
benefiting man, because it makes melancholy grow in man and makes the soul of
man sad, and weighs down his inner organs. But yet as a result of its own bitterness
it keeps some putrefactions from drinks, to which it may be added, so that they may
last so much longer.‖ (HILDEGARD VON BIGEN, 1998)
A bebida que se refere é a cerveja que era amplamente disseminada nos monastérios da Idade
Média. Sobre a cerveja Hildergarda (1998) destaque que ela ―positively affects the body when
moderately consumed […] beer fattens the flesh andlends a beautiful color to the face.‖
56
As menções à utilização de lúpulo na cerveja, na verdade, são um ínfima parte da obra de Hildegarda que, em
outros feitos, destaca-se: ―foi a primeira mulher a ser considerada uma autoridade em assuntos teológicos; a
única mulher medieval a quem se concedeu o direito de pregar a doutrina cristã em público; a autora do primeiro
auto sacro jamais escrito e o único dramaturgo no século XII que não permaneceu anônimo; a única mulher
medieval a ser lembrada como compositora de um extenso e qualificado corpo de obras musicais; o primeiro
autor a escrever sobre sexualidade e ginecologia de um ponto de vista feminino, e o primeiro santo a ter uma
biografia oficial que inclui trechos autobiográficos‖ (COSTA, 2012, p. 206).
25
Mais tarde no século 14 a cultura do lúpulo tornou-se importante na região do Flandres,
sobretudo Ghent, e região flamenca, além das cidades do norte da Alemanha, sobretudo Einbeck que
se tornaram ricas por meio da venda de sua cerveja lupulada. Na Boêmia do século XIV o Imperador
Carlos IV pessoalmente selecionava o local mais adequado para o crescimento de lúpulo
(EDWARDSON, 1952).
Lúpulos não foram introduzidos na Inglaterra até o final do Século XV. Henrique VII e
Henrique VIII da Inglaterra gostava de cerveja sem lúpulo e proibiram seu uso. Na Suécia o
direcionamento do governo eram exatamente o oposto, em 1440 existia regulamento que exigia que
todo agricultor tivesse 40 postes de lúpulo (idem).
Uma das mais propaladas normas que versam sobre lúpulo na história da cerveja é a
Reinheitsgebot ou lei da pureza da cerveja criadas pelos duques da Baviera, Wilhelm IV e Ludwig X,
no Parlamento Estadual de Ingolstadt, em 23 de abril de 1516. Esta lei instituiu que a cerveja deveria
ser fabricada somente com os seguintes ingredientes: água, malte de cevada e lúpulo (a levedura,
como o organismo responsável pela fermentação, foi mencionada pela primeira vez em 1551). Isto se
constitui em um dos mais antigos decretos alimentares do mundo (ESLINGER, H.; NARZISS, 2012).
Na época da promulgação da lei da pureza o principal ingrediente que era utilizado na cerveja
para lhe conferir mais sabores, além do malte e das leveduras, está última até então não descrita, era o
gruit57
. Porém a época a fabricação e comercialização desse ingrediente feito pelos senhores de
Gruuthuse, casa que detinham o monopólio da venda desse produto58
. Então, por uma questão muito
mais econômica do que alimentar, a lei da pureza veio colocar o lúpulo no lugar do gruit como
ingrediente da cerveja.
Em 1952 a lei de pureza alemã foi reafirmada pela Biersteuergesetz59
, lei fiscal da cerveja que
regula sua tributação e das outras providências, porém devido as regras de comércio entre os países
membros da União Europeia podem ingressar cervejas na Alemanha que não seguem a lei da pureza
(OPPENHEIMER, 1994).
O lúpulo chegou da Europa aos Estados Unidos pela Massachusetts Company em 1629 para
suprir a necessidade de lúpulo para as cervejas americanas e rapidamente o plantio se disseminou na
57
Além do gruit, outros ingredientes eram usados nas cervejas para baratear seu preço deixando-as de péssima
qualidade. A família real da Baviera para justificar também a promulgação da lei da pureza promoveu uma
pesquisa sobre as substâncias que eram adicionadas a cerveja durante sua fabricação e encontraram ingredientes
indigestos como cal, fuligem e até óleo de fígado de boi, além de cereais para o malte como feijões e ervilhas
(SLEMER, 1995). 58
Disponível em: https://www.visitbruges.be/en/gruuthusemuseum. Acesso em: 24/08/2018. 59
Em 1981 a cervejaria francesa, Brasserie du Pêcheur, processou o governo alemão por não permitir a entrada
de sua cerveja por não cumprir as normas descritas nos parágrafos 9 e 10 da Biersteuergesetz. A Comissão Europeia considerou que isso violava o artigo 30 da TEEC (tratado de Roma) e instaurou um processo por
infração contra a Alemanha por proibição a comercialização de cerveja e importação de cerveja com aditivos. O
Tribunal de Justiça da União Europeia, considerou que a proibição de comercialização era incompatível com os
Tratados de Comercio Europeu (OPPENHEIMER, 1994).
26
costa leste. Os puritanos, por exemplo, eram produtores tão bem-sucedidos que poderiam,
eventualmente, enviar o excesso de lúpulo para os quakers na Filadélfia60
.
Já em 1849 os estados da Nova Inglaterra e Nova York produziram quase 680 toneladas de
lúpulo. Depois da Guerra Civil, a indústria se desenvolveu em Wisconsin e o lúpulo avançou para a
costa do Pacífico entre 1859 e 1869, já em 1909 a região se tornou a principal produtora de lúpulo dos
Estados Unidos (EDWARDSON, 1952).
O lúpulo foi levado à África do Sul, em 1652, por Jan van Riebeeck, na Cidade do Cabona
província do Cabo Ocidental sudoeste do país. A primeira cerveja foi produzida em 1658. A Cidade do
Cabo, como escala na rota das Índias Orientais Holandesas, logo ficou conhecida como ―A Taverna
dos Mares‖61
.
Na Austrália o lúpulo foi levado, especificamente na terra de Van Diemen na tasmânia, em
1822 por William Shoobridge, que não conseguiu o mesmo sucesso que tinha no Reino Unido, em
Kent, sudeste de Londres. Foi o filho de Willian, Ebenezer, que teve êxito no plantio de lúpulo em
Derwent Valley, centro sul da Tasmânia62
.
Na Argentina o lúpulo chegou em 1865 em Golfo Nuevo, atual Puerto Madryn na província de
Chubut centro sul do país, com os imigrantes galeses. O repórter Lewis Jones, é considerado o
introdutor de lúpulo na patagônia argentina63
Já no Brasil a história do lúpulo é bem peculiar e decorre, também, da sua posição geográfica
e condições climáticas não apropriadas para o crescimento64
. A história mais divulgada do início da
plantação de lúpulo no Brasil é a do agrônomo Rodrigo Veraldi em São Bento do Sapucaí (SP),
município localizado na serra da Mantiqueira, Estância Climática do estado que oferece melhor
adaptação do lúpulo.
Em 2005, Veraldi começou a plantar lúpulo e em 2007, após muitos testes 20 plantas
nasceram com sucesso cultivas em estufa e em 2009 quando levou a plantação para o campo as chuvas
dizimaram a plantação. Foi quando Rodrigo jogou fora as mudas de lúpulos. Já em 2011, no local de
60
Disponível em: https://beerandbrewing.com/dictionary/Bo6daRoGE5/american-hops-history/. Acesso em:
23/08/2018. 61
Disponível em: http://www.sab.co.za/post/the-sab-story/a-brief-history-of-hops-in-south-africa. Acesso em:
23/08/2018. 62
Disponível emhttps://craftypint.com/news/1200/Beer_History_The_Kingdom_of_Hops. Acesso em:
23/08/2018. 63
Disponível emhttp://pulsocervecero.com/el-lupulo-en-la-argentina-historia-de-su-introduccion/. Acesso em:
23/08/2018. 64
Os lúpulos crescem com mais facilidades entre as altas de latitudes 35º e 55º, temperaturas amenas, uma
exposição a luz do sol em torno de 14 horas diária e necessitam de grandes aportes de água durante a fase
vegetativa de seu cultivo. Somente nestas condições alfa-ácidos e óleos essenciais se formam de maneira
satisfatória. Disponível em: http://www.ars.usda.gov/Research/docs.htm?docid=14772. Acesso em: 25/09/2018.
No Brasil temos médias na casa de 8, chegando a 10 horas de sol. Disponível em:
http://www2.aneel.gov.br/aplicacoes/atlas/energia_solar/3_2.htm. Acesso: 25/08/2018.
27
descarte, havia se desenvolvido as plantas abandonadas mesmo após intensas chuvas. Aparentemente
uma mutação genética fez o lúpulo se tornar resistente ao clima local.
Após essa obra do acaso o agrônomo investiu na plantação com clones da planta resistente e
expandiu a plantação. Em 2014 a Baden Baden, cervejaria artesanal de Campos do Jordão que
pertencia a Brasil Kirin65
, se interessou pelo cultivo e financiou a plantação de um hectare. O resultado
da safra foi usado na cerveja Heller Bock 15 anos da Baden Baden, em comemoração ao seu
aniversário66
. Em 2017 a colheita de Rodrigo foi de 2000 quilos de lúpulo, mas ainda falta
desenvolvimento genético para alcançar rentabilidade ao negócio67
.
Apesar da história do lúpulo da Mantiqueira ser a mais divulgada como o início da plantação
de lúpulo no Brasil, existem relatos de plantação que datam da década de 1950. Natanael Moschen
Lahnel, da empresa Lúpulo Gaúcho, localizada em Gramado-RS, nos conta que em 1955, na cidade de
Nova Petrópolis-RS, o lúpulo foi trazido pelos alemães imigrantes e era produzida em grande
quantidade para venda para a Cervejaria Antarctica na época. Com o passar dos anos tornou-se mais
barato importar o produto e o cultivo foi deixado de lado pelo fumo e milho.68
Outras experiências de plantação de lúpulo no Brasil estão aparecendo em várias partes do
Brasil, sobretudo nas regiões Sul e Sudeste, devido a questão climática e a notada concentração de
cervejarias.
Um marco na estruturação do mercado de plantação de lúpulo no Brasil foi a criação da
Associação Brasileira de Produtores de Lúpulo – APROLUPULO, em 19 de maio de 2018, na cidade
de Lajes, na serra de Santa Catarina. A associação foi criada com mais de 80 produtores. A sede fica
no Centro de Ciências Agroveterinárias da Universidade do Estado de Santa Catarina (CAV-Udesc),
instituição que faz pesquisas sobre a produção de lúpulo69
.
Como podemos verificar a história do lúpulo passa de alimentação à cerveja e de poucas
regiões produtoras à diferentes partes do mundo. No Brasil a pequena história do lúpulo ainda tem
grande caminho pela frente até se tornar uma atividade rentável e que forneça insumos em quantidade
e qualidade ao crescente mercado de cerveja no Brasil, sobretudo as artesanais.
65
Em 2017 a Brasil Kirin foi comprada pela Heineken por R$ 2.2 bilhões de reais com e a empresa holandesa
passou a dominar 17,4%. Disponível em: https://revistapegn.globo.com/Negocios/noticia/2017/05/compra-da-
kirin-pela-heineken-e-aprovada.html. Acesso em: 25/08/2018. 66
Disponível em: https://goronah.blog.br/2014/experimenta/baden-baden-comemora-15-anos-com-novo-rotulo-
e-site-de-harmonizacao. Acesso em: 25/08/2018 67
Disponível em: https://revistagloborural.globo.com/Noticias/Agricultura/noticia/2017/02/conheca-producao-
de-lupulo-brasileiro.html. Acesso em 25/08/2018. 68
Essas informações foram retiradas a partir de questionário, o qual ainda conta que existem registros históricos
fotografias, além de pessoas ainda vivas que trabalharam nessas plantações. Um documentário com entrevistas e
o detalhamento da história está sendo criado, diz Natanael que também é membro da APROLUPULO. 69
Disponível em: http://revistadacerveja.com.br/aprolupulo-a-uniao-dos-produtores-de-lupulo/. Acesso em:
25/08/2018.
28
Dessa forma entendemos que a produção de lúpulo no Brasil, assim como em outras partes do
mundo, pode se tornar um vetor do desenvolvimento territorial levando crescimento da renda das
pessoas e ações colaborativas pautadas nos territórios de inserção das plantações.
4. O DEBATE SOBRE O DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL
Na geografia econômica a discussão sobre o desenvolvimento tem posição importante e,
recentemente, analisam as transformações provocadas pela reestruturação produtiva no espaço. As
diferentes abordagens buscam interpretar como essas alterações tem sua distribuição espacial e como
isso afeta às pessoas em cada região, local e território.
A concepção territorial de desenvolvimento surge com uma dupla interpretação para Veiga
(2002), de um lado a noção de território não se restringe ao fenômeno ―local‖, ―regional‖, ―nacional‖
ou mesmo ―continental‖, podendo exprimir simultaneamente todas essas dimensões, por outro lado
apenas adjetivar o desenvolvimento como territorial não revela a real importância da dimensão
territorial do processo objetivo de desenvolvimento.
Na Europa o conceito de território foi importante referência para a criação da do bloco
continental e para sua união. Para Santinha (2014) o princípio da coesão territorial é um elemento da
coesão econômica e social, e é descrito por como um pilar do o desenvolvimento harmonioso dos
territórios valorizando a diversidade e cooperação dos agentes e políticas de base territorial e setorial.
O autor ainda explicita as três dimensões do princípio de coesão territorial, a saber: >
Heterogeneidade territorial (justiça espacial e capital territorial); > Organização territorial
(desenvolvimento urbano equilibrado e em rede e integração territorial de proximidade); >
Governança territorial (governança multinível, cooperação institucional e coerência de políticas).
Neste debate territorial Santos (1994) afirma que vivemos numa era de retorno ao território,
contudo a noção de território herdada da modernidade incompleta e do seu legado de conceito puros
traz uma ideia irreal de território uno e intocado, para o autor este conceito só pode ser entendido
como território usado e não território em si mesmo.
No mesmo sentido Pecqueur (2005) diferencia a ideia de território dado e território construído,
sendo esse último resultado da ação de um sistema local de atores que consegue revelar a
especificação do território. Essa noção de território construído e seu princípio de especificação são
para o autor umas das bases para o desenvolvimento territorial.
Nesse processo de revelação das especificidades de cada território nem todas as ações são
exitosas e existem regiões ―ganhadoras‖, aquelas que conseguem territorializar fenômenos como
elementos determinantes da competitividade dos sistemas territoriais de produção e outras regiões a
acabam perdendo (BENKO; LIPIETZ, 1992).
29
O desenvolvimento de baixo para cima é uma estratégia baseada na flexibilidade e promoção
dos recursos naturais e sociais do próprio território, visualizando um progresso da própria região, da
comunidade e da sociedade que nela vive (SANTOS,1996). Quando Milton Santos fala dos recursos
naturais e sociais do território Benko e Pecqueur (2001) chamam de Recursos e Ativos Territoriais. O
contexto dessa definição é sempre o da concorrência em que se lançam os territórios
os espaços tendem a construir ou a reforçar vantagens comparativas [...] esta análise
se funda sobre a redefinição da natureza da empresa, aquela, de lugar de combinação
ótima de fatores de produção genéricos, se tornaria um lugar de combinação de
competências e de aprendizagem de novos conhecimentos a partir de fatores
específicos (PECQUER; ZIMMERMANN, 1994, p.56).
Os territórios estão em situação de concorrência uns com os outros e para que um desses
espaços saia vitorioso é necessário, ativos e recursos, genéricos e específicos. Ativos, são os fatores
em ―atividade‖, enquanto que por recursos entendemos os fatores a revelar, a explorar, ou ainda a
organizar. Os recursos diferentemente dos ativos, constituem assim uma reserva, um potencial latente.
A característica de genérico define-se pelo fato que seu valor, ou potencial, é independente de sua
participação a um determinado processo produtivo (BENKO; PECQUEUR, 2001).
Os autores continuam a definição e abordam a características dos ativos e recursos como
genéricos por sua condição de transferência, ou seja, possuidores de um valor de troca, já os ativos e
recursos específicos são aqueles tem no valor de uso seu principal aspecto.
É neste campo de discussão que a noção de governança se insere e partimos da conceituação
de Storper e Harrison (1994) que a entende como uma forma de organização entre empresas que vai
além das relações mercantis e trata da divisão sócia do trabalho, das instituições e convenções e das
possibilidades de localização. Para Benko e Lipietz (1997) governança é o conjunto de modos de
regulação entre o mercado puro e a política pura.
Nesse contexto de desenvolvimento territorial, a governança aqui tem o seu conceito
expandido para compreendermos como se dá o desenvolvimento partindo de baixo comandado pelos
agentes locais territorializados, assim se tornando uma governança territorial.
[...] a governança se torna territorial quando se reconhece que o território é o recorte
espacial de poder que permite que empresas, Estados e sociedade civil entrem em
contato, manifestando diferentes formas de conflitos e de cooperação; direcionando,
portanto, o processo de desenvolvimento territorial. O território é reconhecido por
sua governança através da escala de ação político-econômico, sendo que as esferas
locais e regionais se destacam como materialização das potencialidades (humanas e
tecnológicas) da globalização. Neste sentido, a governança territorial, enquanto
conceito, instrumento e processo de ação, poderia ser conhecida como novo "piloto"
do desenvolvimento econômico e social descentralizado (PIRES, 2011, p.26-7).
Dessa maneira os territórios se tornam ―fonte de desenvolvimento‖ (AYDALOT, 1986) e uma
instância institucional de exercício de poder de forma simétrica no nível territorial. (DALLABRIDA,
2011). Ou seja, desenvolvimento e governança estão atrelados pela noção de território.
30
As estratégias competitivas da globalização têm o território como ator principal do
desenvolvimento e as políticas, as organizações e a governança são recursos específicos, a um só
tempo disponível ou a ser criado. Desse modo, o desenvolvimento territorial é o resultado de uma ação
coletiva intencional de caráter local, um modo de regulação territorial, portanto, uma ação associada a
uma cultura, a um plano e instituições locais, tendo em vista arranjos de regulação das práticas sociais
(PIRES; MULLER; VERDI, 2006).
De maneira sintética podemos elencar as principais conclusões de Veiga (2002) sobre a face
territorial do desenvolvimento e o seu potencial futuro para análises científicas:
1. O aproveitamento das vantagens competitivas depende do seu caráter empreendedorista e
endógeno, ligados a noção de “capital social”
2. A partir das transformações da política governamental fomentada pela globalização o caráter de
estruturas subnacinoais mostra a pertinência de uma abordagem territorial
3. A noção desenvolvimento territorial tende a substituir a tradicional expressão desenvolvimento
regional, pois permite uma referência simultânea a desenvolvimento local, regional, nacional, e até
continental (no caso da Europa), pelo forte debate entre as escalas do local e global
4. Apesar do avanço do conceito de desenvolvimento territorial ele não supera as divisões setoriais
(primário, secundário e terciário) e espaciais (cidade e campo).
5. As mudanças semânticas do debate público sobre o desenvolvimento mostram sua imprecisão,
fluidez e ambiguidade.
No debate sobre o desenvolvimento territorial percebemos a inserção de novos conceitos para
entender a realidade dos territórios e do seu desenvolvimento. Aqui percebemos que as formas de
articulação ou não dos atores locais é que dão o tom do caminho dos territórios na trilha do
desenvolvimento.
Tendo a base teórica do desenvolvimento territorial podemos passar as apreciações da atividade do
lúpulo para, ao final no artigo, elencarmos conclusões sobre indicativos para o desenvolvimento da
atividade no Brasil.
5. OS DADOS E AS ANÁLISES DO MERCADO DE LÚPULO NO MUNDO E NO
BRASIL
O lúpulo tem produção com grande representatividade na Europa, Estados Unidos e China,
sendo que Estados Unidos e Alemanha despontam com mais de 40000 toneladas produzidas
anualmente. Em um segundo patamar a China e a República Tcheca por volta de 7000, a Polônia e
Eslovênia na casa das 3000, a Inglaterra e Austrália com mais de 1000 e outros países abaixo desse
valor.
31
Tabela 1:: Produção de Lúpulo (ton) e Cerveja (1000 hl) em 2017, por países.
País Estados
Unidos
Alemanha China República
Tcheca
Polônia Eslovênia Inglaterra Austrália França Nova
Zelândia
Lúpulo 48190 41556 7044 6796 2993 2766 1780 1438 763 760
Cerveja 217753 93013 440150 20322 40500 1550 43300 15950 21300 2886
L/kg 452 224 6249 299 1353 56 2433 1109 2792 380
Fonte: Elaboração própria a partir dos Relatórios BARTH-HAAS 2017-2018.
Quando os números de produção de lúpulo são comparados com os de produção de cerveja
podemos ter uma relação de quantos litros de cervejas são produzidos a cada quilo de lúpulo, em uma
situação hipotética sem importação e exportação de lúpulo e cerveja.
Nessa situação podemos verificar a pequena proporção de quilo de lúpulo por litro de cerveja,
tendo nos dez países principais produtores de lúpulo uma média de 1.535 L/kg. Traduzindo para uma
escala menor são aproximadamente 1 grama de lúpulo a cada 15 litros de cerveja.
Claro que esse valor não traduz a realidade de maneira fiel, mas já é uma pequena referência
para depois avaliarmos a situação no Brasil.
A produção mundial de lúpulo tem dois aspectos fundamentais para serem observados, um é a
área plantada e o outro é a produção de alfa ácido, elemento fundamental na produção de cerveja. A
figura 1 traz o comparativo desses três elementos de forma didática.
Figura 1: Comparativo entre produção de lúpulo e alfa-ácidos em toneladas e área cultivada em hectares.
Fonte: Elaboração própria a partir dos Relatórios BARTH-HAAS, vários anos
32
Como podemos notar área plantada, produção de lúpulo e de alfa-ácidos apresentam uma
tendência de crescimento da década de 1970 até meados da década de 1990. Esse panorama muda por
volta de 1993 quando a área plantada tem expressiva queda passando de 91596 hectares (há), neste
ano, para 57427 em 1999, último ano de queda consecutiva nessa sequência70
.
Essa queda de 38% da área plantada, consequentemente, foi acompanhada pela redução na
produção de lúpulo em toneladas (ton), que saiu do patamar de 121.323 ton em 1994 para 118.401 ton
em 2017. A produção de alfa-ácido, contudo, apresentou uma tendência de crescimento passando de
da casa de 6.907 ton em 1994 para 11.248 em 2017, ou seja, é necessário menos espaço e cones de
lúpulo para produzir mais proporção de alfa-ácido71
.
Esse resultado da análise mostra que houve incremento na produtividade de alfa-ácidos por
área, advindo do aumento da produtividade de cones por planta e do incremento no teor de alfa-ácidos
nos cones. A proporção de alfa-ácidos em cada cone de lúpulo é obtida em função do melhoramento
genético realizado nas variedades com este fim72
.
O Brasil não possui produção expressiva de lúpulo, sendo, praticamente, toda a demanda da
indústria nacional abastecida por importações. Os principais fornecedores de lúpulo ao Brasil são
Alemanha e EUA com, respectivamente, 1.457 e 864 toneladas exportadas ao Brasil em 2017. O
Reino Unido ainda figura entre os maiores exportadores de lúpulo ao Brasil com 162 toneladas
exportadas em 2017.
Os primeiros postos do ranking de exportadores de lúpulo ao Brasil são invertidos quando os
valores financeiros das operações são levados em conta. Conforme demonstra a figura 3, os EUA
lideram a balança comercial do lúpulo com aproximadamente 19 milhões de dólares exportados ao
Brasil, enquanto a Alemanha, em segundo posto, exportou 15,7 milhões de dólares em 2017.
70
Além do aumento da produtividade, que reduziu a área plantada, os baixos preços pagos aos produtores
também contribuíram para essa redução. O diretor do Centro de Pesquisas do Lúpulo em Hüll, na Baviera, sul da
Alemanha, Bernhard Engelhard, expõe que depois de uma safra relativamente fraca em 2006 e do ingresso da
China como compradora no mercado mundial de lúpulo, o preço do ingrediente da cerveja triplicou em 2007.
Disponível em: https://www.dw.com/pt-br/l%C3%BApulo-o-ouro-verde-da-baviera/a-2720385. Acesso em:
28/08/2017. Este fato explica a forte oscilação que encontramos entre 2006 e 2007 na figura 1 71
Importante perceber que o gráfico mostra bem as naturais oscilações na produção de lúpulo, devido a
flutuações estacionais normais à demais cultivos agrícolas. Mesmo assim é possível observar a tendência de
queda na área plantada e produção de lúpulo e aumento na produção de alfa-ácido 72
Podemos corroborar com essa tese a partir do depoimento de Fritz Schmucker, diretor executivo da Sociedade
para a Pesquisa do Lúpulo (GfH) da Alemanha. O desenvolvimento da espécie de lúpulo Herkules foi um estudo
de anos para obter um melhoramento genético importante para o setor. Segundo Schmuker "Ela [a variedade de
lúpulo] é resistente a doenças e tem uma produtividade superior a qualquer outra [...] Em 1975, obtinha-se cerca
de 50 kg de ácido alfa de um hectare de lúpulo. Com a nova espécie Herkules, são 400 kg por hectare. Não há
nenhuma planta cultivada comparável que tenha tido um aumento de produtividade dessa ordem em tão pouco
tempo". Disponível em: https://www.dw.com/pt-br/l%C3%BApulo-o-ouro-verde-da-baviera/a-2720385. Acesso
em: 28/08/2018
33
Tabela 2: Importações brasileiras de lúpulo de acordo com sua origem (em milhares de dólares
americanos).
País/Ano 2015 2016 2017
Estados Unidos 18312,00 12426,79 18995,85
Alemanha 9284,12 11877,07 15700,48
Reino Unido 6092,15 7958,27 2830,36
Eslovênia 698,93 562,65 330,22
Austrália 143,54 95,35 281,05
República Tcheca 113,09 57,70 145,88
China 23,18 52,93 106,47
Nova Zelândia 24,24 0,00 19,71
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados COMEXSTAT/MDIC.
Tal relação entre o valor e quantidade do lúpulo exportado se deve ao tipo deste produto, e
consequentemente ao teor de alfa-ácidos do mesmo, pois enquanto os EUA exportam extratos
concentrados de lúpulo em maior quantidade ao Brasil, a Alemanha exporta majoritariamente lúpulo
em pellets73
. Isto acaba impactando drasticamente o valor e quantidade dos produtos exportados ao
Brasil, enquanto pellets de lúpulo raramente excedem 15% de conteúdo de alfa-ácidos, extratos podem
conter até 70% desta molécula. Extratos de lúpulo também são mais estáveis e se conservam melhor
que o lúpulo em pellets, tornando a escolha de melhor relação custo/benefício para as cervejarias.
Na figura 4 pode ser observada a relação descrita anteriormente, os EUA vêm se consolidando como
exportadores de extratos de lúpulo enquanto a Alemanha concentra suas exportações em pellets.
73
Pellets são estruturas que agregam o pó das flores do lúpulo. Segundo a European Brewery Convention - EBC
a produção de lúpulo deve seguir o Manual de boas práticas (ISBN3-418-00758-9) que descreve sua produção.
As flores da planta de lúpulo são limpas, secas e trituradas. O pó é homogeneizado e pressionado nas máquinas
peletizadoras, formando os pellets, os quais são resfriados e envasados sob atmosfera de gás inerte (N2 e CO2).
Disponível em: http://www.hvg-germany.de/images/stories/pdf/zertifikate/MSDS-HVG-Pellets_en.pdf. Acesso
em: 28/08/2018
34
Figura 2: Exportações em quilogramas de pellets e extrato de lúpulo ao Brasil oriundos da Alemanha (ALE) e
Estados Unidos da América (EUA).
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados COMEXSTAT/MDIC.
Fenômeno semelhante vem sendo observado nas importações brasileiras de lúpulo nos últimos
20 anos. A quantidade importada vem gradativamente caindo devido à mudança do perfil dos produtos
importados. À despeito da crescente produção cervejeira nacional a quantidade importada de lúpulo
pelo Brasil mantém-se estável. Tal fenômeno pode ser explicado pela mudança no perfil dos produtos
importados. A importação de extratos de lúpulo com alta concentração de alfa-ácidos (50-70%)
permite que a quantidade absoluta de lúpulo importado ao Brasil se mantenha inalterada mesmo com o
constante crescimento da produção cervejeira local.
Como pode ser observado na Figura 3a quantidade de lúpulo por hectolitro de cerveja vem caindo
gradativamente no Brasil, à medida que cresce o valor gasto em lúpulo por hectolitro de cerveja.
35
Figura 3: Comparativo entre a quantidade de lúpulo por Hectolitro de cerveja e preço do Kg de lúpulo em
dólares americanos no Brasil.
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados COMEXSTAT/MDIC.
Tal variação observada na figura anterior pode, também, ser atribuída à elevação na
concentração de alfa-ácidos dos produtos importados, elevando consequentemente o seu preço e
reduzindo a quantidade necessária para a obtenção do mesmo resultado organoléptico na cerveja.
Na última década houve no Brasil uma alteração significativa do mercado local de cervejas, com o
crescimento do segmento artesanal constituído por cervejarias pequeno porte que, em sua maioria,
produzem cervejas características distintas do mercado mainstream. Em geral cervejas artesanais são
entendidas como produtos que prezam pelo uso intenso de matérias primas, entre elas o lúpulo. Desta
forma o crescimento no número de estabelecimentos artesanais, evidenciado na figura 4, poderia
promover impactos no mercado nacional de lúpulo, devido a este maior emprego de lúpulo por litro de
cerveja promovido por estes estabelecimentos.
36
Figura 4: Número total de cervejarias registradas no Brasil. Fonte: Adaptado de MARCUSSO & MÜLLER, 2017
Porém não é possível identificar qualquer correlação ou impacto do aumento dos
estabelecimentos artesanais no mercado nacional de lúpulo. Isto se deve, provavelmente, à diminuta
parcela de produção de cerveja destes estabelecimentos frente ao mercado nacional de cerveja que
atualmente figura em 14 bilhões de litros anuais (BARTH-HASS, 2017).
6. CONCLUSÕES
O resgate histórico do lúpulo traz com mais clareza o porquê do cenário atual, além de se
mostrar um importante ponto dessa história para o Brasil, país de pouquíssimas pesquisas sobre essa
temática.
Como podemos notar o debate sobre o desenvolvimento territorial traz as bases teóricas para
verificarmos como a atividade do lúpulo pode ou não ser um vetor do desenvolvimento dos territórios
por onde essa atividade é desenvolvida.
A produção de lúpulo no mundo teve grande crescimento até a década de 1990, quando teve
considerada queda. Porém essa diminuição, sobretudo na área plantada e toneladas de lúpulo, não foi
verificada, como o mesmo grau de importância, na produção total de alfa-ácidos.
Esse fato se deve a maior proporção de alfa-ácidos em cada cone de lúpulo, resultado obtida
por meio do melhoramento genético realizado nas variedades destinadas a somente conferir amargor,
sendo este ainda, o uso responsável pelo maior consumo de lúpulo no mundo.
Sobre a importação de lúpulo pelo Brasil, podemos concluir que a quantidade de lúpulo
importada não tem relação direta com o valor total das transações, já que a modalidade de extrato de
lúpulo tem valor agregado muito superior ao lúpulo em pellets, o que explica os posicionamentos de
EUA e Alemanha na balança comercial do lúpulo no país.
37
Nos últimos 20 anos houve uma redução no uso em peso de lúpulo na formulação de cervejas
no Brasil. Tal fenômeno é em parte explicado pelo aumento no teor de alfa-ácidos dos produtos
utilizados, mas pode também significar a redução no amargor das cervejas produzidas localmente.
Até o momento o mercado nacional de lúpulo tem seu cenário definido pelo padrão de
consumo dos grandes grupos cervejeiros, tratando este produto quase que unicamente como uma fonte
de alfa-ácidos.
Apesar de crescer em escala expressiva e fazer intenso emprego de lúpulo, o segmento
artesanal do mercado cervejeiro nacional ainda tem consumo insignificante de lúpulo perante a
totalidade do mercado nacional.
Podemos concluir que a atividade de lúpulo, quando tiver uma integração forte com a cadeia
produtiva cervejeiro no Brasil, poderá ser um elemento de coesão territorial e como o lúpulo não
crescem em todos os lugares e climas, então sua produção pode ser considerada como um recurso do
território, podendo, junto do ambiente de industrialização da atividade, se configurar como uma
especificidade do território.
Em termos de governança podemos ver a organização da atividade do lúpulo, sobretudo com a
formação da APROLUPULO, como um passo importante na criação da autonomia dos atores
envolvidos, das empresas e uma configuração de regulação setorial nascente.
Por fim, entendemos que as atividades do lúpulo no Brasil está se baseando em uma ação
coletiva intencional de caráter local, assim a criação de uma cultura em torno do lúpulo, a organização
dos atores envolvidos e a formação de arranjos institucionais em torno dessa atividade fazem com que
o lúpulo, no Brasil, possa se configurar como importante elemento de desenvolvimento territorial no
Brasil.
7. REFERÊNCIAS
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40
CERVEJA DE JAMELÃO E ANÁLISE FÍSICO-QUIMICA
Leon Sacha Vieira Oliver¹*, Iuri Mira Barbosa²; Leonardo Fonseca Maciel³; Celso Duarte
Carvalho Filho4
Resumo: O Jamelão (Syzygium cumini) é um fruto com potencial fitoterápico, utilizado em pesquisas
como combate ao câncer e outras enfermidades, que apresenta alta atividade antioxidante, devido aos
compostos fenólicos presentes na sua polpa. A cerveja naturalmente já tem atividade antioxidante e
polifenóis vindos do malte utilizado, mas a proposta foi o acréscimo do Jamelão a uma formulação de
cerveja estilo Blonde Ale. Cervejas à base de frutas são comuns na Europa, em países como Bélgica e
Alemanha, que são grandes consumidores e produtores. O trabalho proposto foi elaborar e apresentar
as características físico-químicas e teor de compostos antioxidantes em cervejas artesanais elaboradas
com a adição de extrato de Jamelão. A produção artesanal da cerveja ocorreu no laboratório multiuso
físico-químico da Faculdade de Farmácia da UFBA. A partir de 20L de cerveja artesanal Blond Ale,
foram divididas 4 partes e incorporadas diferentes concentrações de extrato de Jamelão. Foram
avaliados parâmetros de cor, ph, graduação alcoólica, turbidez e teor de compostos fenólicos totais. O
aumento da concentração do extrato de Jamelão nas formulações foi proporcional ao aumento da
turbidez, aumento da graduação alcoólica, aumento do teor de compostos fenólicos totais e diminuição
do pH. As cervejas artesanais elaboradas com extrato de Jamelão sugerem ter potencial ação como
alimento funcional devido à presença de compostos antioxidantes que se mantém nas cervejas
produzidas.
Palavras-chave: Cerveja artesanal; Jamelão; fenólicos.
INTRODUÇÃO
Segundo a Instrução Normativa n° 54 (BRASIL, 2001), entende-se exclusivamente por
cerveja a bebida resultante da fermentação, mediante levedura cervejeira, do mosto de cevada
malteada ou do extrato de malte, submetido previamente a um processo de cocção, adicionado de
lúpulo. Uma parte da cevada malteada ou do extrato de malte poderá ser substituída por adjuntos
cervejeiros (BRASIL, 2001).
Pesquisas mostram que a cerveja surgiu no Egito ou Oriente Médio. Os primeiros campos de
cultivo de cereais surgiram por volta de 9000 a.c. na Ásia Ocidental, quando agricultores colhiam
grãos e produziam farinha. A cerveja surge paralelamente com fermentações de cereais, tais como
milho, centeio e cevada. Além disso, possui valor nutricional semelhante a dos cereais, e já foi
conhecida como ―pão líquido‖ (LIMA, 2011).
Após a Revolução Industrial, as fábricas na Europa (Alemanha, Inglaterra e Império Húngaro)
ficaram cada vez maiores. No Brasil, o hábito de tomar cerveja vem desde o império, com D. João VI,
no início do século XIX, época em que a cerveja era importada dos países europeus. Em 1988, foi
fundada na cidade do Rio de Janeiro a ―Manufatura de Cerveja Brahma Villigier e Cia.‖ e em 1891 na
cidade de São Paulo a companhia Antártica Paulista (LIMA, 2011).
41
Historicamente, várias espécies de ervas aromáticas, essências, frutas condimentos, temperos e
especiarias, tendo
Muitos estilos de cerveja usam outros aditivos, como ervas aromáticas, essências, frutas,
condimentos, temperos e especiarias, tendo características únicas de corpo, aroma gostou ou textura.
Historicamente, várias espécies de ervas e frutas foram utilizadas nas receitas de cerveja. Muitos
cervejeiros seguem essa tradição, como é o caso das famosas cervejas Lambic (com forte presença de
cereja ou de framboesa) e das Witbier (cervejas de trigo, com sementes de coentro e cascas secas de
laranjas). (MORADO, 2017)
Tradicionalmente, a adição de uma fruta ou seu suco é feita para provocar uma segunda
refementação mais intensa e incorporar novos sabores à cerveja. São chamadas Fruit Beer e têm boa
aceitação no mercado europeu. Entre frutas estão a cereja, a framboesa, o pêssego, a laranja, o limão e
maçã (MORADO, 2017)
O jambolão (Syzygium cumini) é uma planta pertencente à família Mirtaceae. É conhecido
popularmente como Jamelão, cereja, jalão, kambol, jambú, azeitona-do-nordeste, ameixa roxa, murta,
baga de freira, guapê, jambuí, azeitona-da-terra, entre outros nomes. Sua árvore é de grande porte e
muito bem adaptada às condições brasileiras, apesar de ser originária da Indonésia, China e Antilhas, é
também cultivada em vários países, pois cresce muito bem em diferentes tipos de solo (VIZOTTO e
FETTER, 2009)
Originário da Índia, é frequentemente cultivado no Brasil como árvore ornamental e de
sombra. Produz madeira resistente aos cupins e considerada durável, quando em contato com a água.
(MARCHIORI e SOBRAL)
A frutificação ocorre de janeiro a maio e os frutos são do tipo baga, assemelhando-se bastante
às azeitonas. Sua coloração, inicialmente branca, torna-se vermelha e posteriormente preta, quando
maduras. Sua semente fica envolvida por uma polpa carnosa e comestível, doce, mas adstringente,
sendo agradável ao paladar. No Brasil, o fruto é geralmente consumido in natura, porém esta fruta
pode ser processada na forma de compotas, licores, vinhos, vinagre, geléias, geleiadas, tortas, doces,
entre outras (VIZOTTO e FETTER, 2009).
No jambolão são encontradas algumas substâncias químicas denominadas fitoquímicos ou
compostos secundários. Estas substâncias são produzidas naturalmente pelas plantas para se
protegerem do ataque de pragas e doenças e também ajudam a suportar as condições adversas do
ambiente. Muitos destes fitoquímicos atuam na prevenção e no combate de doenças crônicas como o
câncer e as doenças cardiovasculares. Exemplos de fitoquímicos encontrados nas diferentes partes da
planta são flavonóides como as antocianinas, a quercetina, a rutina a mirecetina com seus glicosídeos
(açúcares) e os taninos hidrolisáveis. Ainda a presença do polifenol, Ácido Elágico, deve ser
42
considerada por ser uma substância comprovadamente eficaz na prevenção de doenças crônicas não
transmissíveis (VIZOTTO e FETTER, 2009).
A cerveja é uma bebida nutritiva que há muitos séculos faz parte da dieta humana. Conhecida
como ―pão líquido‖, não era associada aos malefícios do alcoolismo até a bem pouco tempo, quando
os movimentos religiosos da temperança, no final do século XIX, e o conhecimento dos efeitos do
álcool no organismo, já no século XX, a tornaram alvo de atenção de médicos e de políticas de saúde.
Entretanto, seu mérito como supridora de nutrientes e seus benefícios à saúde, desde que consumida
com moderação, não podem ser ignorados. (MORADO, 2017)
Entre as qualidades nutricionais da cerveja, pode-se destacar a presença do lúpulo, um
antibacteriano e sedativo suave e estimulante do apetite, e do Ácido Fosfórico, que tem bons efeitos
sobre a pele e era usado na antiguidade como cosmético. A cerveja também é rica em vitaminas do
complexo B, que atuam sobre o funcionamento de músculos, nervos e cérebro, sobre o metabolismo
das gorduras e a manutenção dos tecidos. Ela contém também minerais como cálcio e silício,
essenciais para a composição dos ossos; potássio, que junto com o cálcio ajuda no bom funcionamento
do coração; e cromo, que potencializa a insulina; além da alta concentração de polifenóis com efeitos
antioxidantes, anti-inflamatórios, antialérgicos, inibidores da oxidação do LDL e agregadores das
plaquetas, ajudando a diminuir o risco de infarto do miocárdio. A suave acidez (pH=4) e a presença de
gás carbônico aumentam a imunidade do organismo contra o desenvolvimento de microorganismos
patogênicos. (MORADO, 2017).
Conforme o artigo The Effects of moderate beer consumption (The Brewers of Europe, 2008)
citado por MORADO (2017, pg 175). ―Em comparação com o vinho branco, a cerveja possui o dobro
de compostos antioxidantes naturais, e em relação ao vinho tinto, a metade. Entretanto, a grande
maioria das moléculas antioxidantes do vinho é grande demais para ser absorvida pelo organismo, ao
contrário das pequenas moléculas encontradas na cerveja.
Os compostos fenólicos são estruturas químicas que apresentam hidroxilas e anéis aromáticos,
nas formas simples ou de polímeros, que os confere o poder antioxidante. Esses compostos podem ser
naturais ou sintéticos. (ANGELO e JORGE, 2006)
Os compostos fenólicos são originados do metabolismo secundário das plantas, sendo
essenciais para o seu crescimento e reprodução. Formam-se também em condições de estresse como
infecções, ferimentos, radiações UV, dentre outros. (ANGELO e JORGE, 2006)
As principais fontes de compostos fenólicos são frutas cítricas, como limão, laranja e
tangerina, além de outras frutas à exemplo da cereja, uva, ameixa, pêra, maçã e mamão, sendo
encontrados em maiores quantidades na polpa que no suco da fruta. Pimenta verde, brócolis, repolho
43
roxo, cebola, alho e tomate também são excelentes fontes destes compostos. (ANGELO e JORGE,
2006)
Existem pesquisas comprovando a presença de altas concentrações de compostos fenólicos na
sua polpa e antocianinas, sendo utilizados em pesquisa como combate ao câncer de colón e outras
enfermidades. (SIMAS,2017)
O objetivo do presente trabalho foi elaborar e realizar avaliação fisioquímica de formulações
de cerveja artesanal com incorporação de extrato de Jamelão (Syzygium cumini).
O trabalho foi realizado no projeto de iniciação cientifica PIBIC (Programa Institucional de
Bolsas de Iniciação Científica) pela UFBA, edital 2017/2018, com bolsa pelo CNPQ (Centro Nacional
de Pesquisa).
METODOLOGIA
Amostras
Durante o período de fevereiro a março de 2018 foram colhidos os frutos do Jamelão em
diversos pontos da cidade de Salvador – BA. Por ser um fruto de difícil acesso em estabelecimentos
comerciais, foi colhido manualmente e depois feito um extrato, no qual que separou a polpa do caroço.
Foi realizada filtração e reservado o extrato para ser adicionado à cerveja. Foram colhidos 15 kg de
Jamelão, com rendimento de 6kg de extrato.
No fim do mês de março de 2018 foram produzidos 20L de uma cerveja artesanal base, estilo
Blond Ale, no laboratório multiuso físico-químico da Faculdade de Farmácia da UFBA. A partir desta
cerveja base, foram divididas 4 partes e, em 3 destas, incorporadas diferentes volumes de extrato de
Jamelão.
Para cálculo da quantidade de sacarose, na forma de solução de açúcar comercial, a ser
adicionada a cada formulação, para carbonatação da cerveja (primming), foi considerado o volume de
cerveja base de cada formulação, onde haviam as leveduras remanescentes, após adição das diferentes
concentrações do extrato de Jamelão.
Devido ao fato do extrato de Jamelão conter também açúcares fermentescíveis, evitando a
supercarbonatação das amostras, à medida que foi aumentado o volume do extrato de Jamelão
adicionado, foi diminuída a quantidade de açúcar por litro de cerveja base a ser adiconada. Assim
foram calculadas diferentes quantidades de açúcar a serem adicionadas a 100mL de água mineral para
realizar o primming, conforme apresentado na Tabela 1.
44
Após adição das soluções açucaradas foi realizada avaliação do teor de sólidos solúveis, em
Graus Brix e as amostras foram envasadas em garrafas âmbar de 300mL e 600mL e mantidas em
processo de maturação por 7 dias, a 5°C.
Tabela 1. Formulações das amostras de cerveja artesanal adicionada de extrato de Jamelão.
Amostra Cerveja
Base
Extrato de
Jamelão Açúcar Envasado
Sólidos
solúveis
(L) (L) (g/100mL de água) (L) (°Brix)
C 2 0 14 (7g/L cerveja base) 2,1 7
J20 5,6 0,8 28 (5g/L cerveja base) 6,5 7
J30 4,9 2,1 19,6 (4g/L cerveja base) 7,1 8,4
J40 3 2 0 5 9
C: Contole; J20: Cerveja artesanal com 20% de extrato de Jamelão; J30: Cerveja artesanal com 30% de extrato de
Jamelão; J40: Cerveja artesanal com 40% de extrato de Jamelão.
As amostras receberam as seguintes codificações: ―C‖, para amostra controle, sem adição de
extrato de Jamelão; ―J20‖, para a amostra que passou a apresentar 20% de extrato de Jamelão em sua
composição; ―J30‖ para a amostra que passou a apresentar 30% de extrato de Jamelão em sua
composição e ―J40‖ para a que passou a apresentar 40% deste extrato na sua composição.
Para analisar a cerveja após o estágio de maturação, foram realizadas análises físico-químicas,
seguindo a Instrução Normativa do Ministério da Agricultura e Abastecimento (MAPA) Nº 54/2001
(BRASIL, 2001), que exige a realização de determinação de grau alcoólico, extrato primitivo e cor, e
adicionalmente foram avaliados outros parâmetros não exigidos por esta normativa. Foram realizadas
análises de cor por espectrometria, espaço de cor L*a*b*, acidez, turbidez, grau alcoólico, atividade
antioxidante e teor de fenólicos totais. Todas as análises foram realizadas em triplicata e apresentando
valores médios descritos em tabela.
pH
Na medição de pH foi utilizado um phmetro Kaski Bentchup, seguindo a calibração que o
aparelho exige, sendo utilizados os tampões recomendados a 20°C.
Cor
Para o padrão de análise de cor, foi utilizada metodologia que é referência no Programa de
Julgadores de Cerveja (BCJP). O programa se baseia no método padrão de referência (SEM) da
American Society of Brewing Chemist – ASBC (BJCP, 2015).
O método se baseia em medir a absorbância da mostra em cubeta de 1cm de de diâmetro, do
material quartzo, na leitura de 430nm e multiplicar o valor pela constante 12,7. Foi utilizado na
medição o Espectofometro UV-Vis, da marca Bel Photonics, modelo UV-MS1.
45
Espaço de cor L*a*b*
A medição de cor em curvas L*a*b* defindos pela CieLab, através do aparelho colorímetro
Konica Minolta, modelo CR-5. A medição L* determinam faixa de luminosidade; a*= coordenada de
vermelho/verde( + a indica vermelho e – indica verde); b* = coordenada (+b indica amarelo e -b
indica azul).
Graduação alcoólica
A partir de 100mL de cada amostra a 20°C, previamente descarbonatada, foi realizada
destilação simples em conjunto de destilação com balde de gelo para resfriamento. Cerca de 70mL do
destilado foi recolhido em balão volumétrico, completando-se o volume com água destilada para
100ml. Determinou-se a densidade relativa em picnômetro a 20°C. Foi realizada conversão de
densidade relativa para percentual de álcool em volume, seguindo os métodos 217/IV e 246/IV do
Instituto Adolf Lutz (IAL, 2004, p.388 e p.433).
Turbidez
Foi utilizado o turbidímetro portátil, aparelho DLTWV da DEL LAB. Foi realizada calibração
prévia, sendo realizadas medidas em NTU, sendo a ordem de 0.10, 10.0, 100.0, e 800.0 NTU. Os
resultados das amostras foram exibidos em NTU.
Compostos Fenólicos Totais
Para calcular a quantidade de compostos fenólicos totais, as amostras foram colocadas em
extração com solução de metanol. As amostras de cerveja passaram pela extração em solução de
metanol com 3% de bicarbonato de sódio. Foi utilizada a proporção de 50:50(v/v), para 20ml de
solução foram colocados 20ml de cerveja. Depois desse processo as amostras foram agitadas na
Incubadora Shaker Al-22 a 28°C por 2hr. Essas amostras passaram pela análise de fenólicos totais
seguindo o ensaio de Folin-Ciocalteu, conforme metodologia de Singleton e colaboradores (1965),
mas seguindo algumas modificações. Foram utilizados 0,5mL de cerveja, adicionada à solução de
metanol 3%, com 2,5mL solução de folin 10% e 2,0mL de carbonato de sódio 7,5%. As amostras
foram colocadas em ambiente fechado sem luz, mantidas por 2 horas, sendo em seguida realizadas as
leituras em espectrofotômetro na absorbância de 760nm. A medição foi comparada com curva de
ácido gálico e os resultados apresentados em GAE por litro de cerveja (mg GAE/L).
46
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados de graduação alcoólica, pH e turbidez das amostras são apresentados na Tabela 2.
Tabela 2. Avaliação de graduação alcoólica, pH e turbidez das amostras de cerveja artesanal
adicionadas de extratos de Jamelão.
Amostras Graduação alcoólica
pH
Turbidez
(% alc./vol.) (NTU)
C 4,5 4,45 45.4
J20 5,1 4,03 89.5
J30 5,3 3,92 184
J40 5,9 3,85 160
C: Contole; J20: Cerveja artesanal com 20% de extrato de Jamelão; J30: Cerveja artesanal com 30% de extrato de
Jamelão; J40: Cerveja artesanal com 40% de extrato de Jamelão.
Diante dos resultados apresentados, percebe-se uma correlação entre a concentração de
Jamelão adicionada e os resultados obtidos. As cervejas apresentam um pH menor quando há maior
concentração de Jamelão, mostrando uma variação de 0,60 da amostra C para a J40. O conhecimento
de acidez para cerveja é importante, pois a acidez dificulta a multiplicação microbiana na cerveja. As
cervejas com Jamelão apresentaram uma acidez superior à controle, mostrando ter maior poder
preservante da formulação frente a ação de microorganismos.
O aumento da concentração do extrato de Jamelão às formulações foi acompanhado do
aumento da turbidez, sendo a amostra J40 a que apresentou maior turbidez (160 NTU). Estes valores
altos de turbidez já eram esperados, visto que as cervejas artesanais não passam pelo processo de
filtração, comum na indústria cervejeira, nem adição de aditivos clarificantes. Extratos naturais
incorporados a formulações líquidas tendem a gerar depósitos de materiais no fundo dos recipientes e
manter material em suspensão, intensificando a turbidez das amostras, sendo, ainda, este fenômeno
proporcional à concentração.
O aumento da concentração de extrato de Jamelão foi acompanhado do aumento da graduação
alcoólica das amostras. Mesmo a amostra J40 não tendo recebido solução açucarada, esta foi a que
apresentou maior graduação alcoólica (5,9%). Isto leva suspeitar que, partindo de uma mesma cerveja
base já fermentada, o aumento da graduação alcoólica das amostras está relacionado à concentração do
extrato adicionado, ou seja, a composição do extrato de Jamelão, principalmente os carboidratos
fermentescíveis, colaborou positivamente na fermentação alcoólica durante o processo de maturação.
Seguindo os parâmetros do BCJP (BJCP, 2015), a amostra C apresentou cor âmbar, as
amostras J20 e J30 apresentaram cor cobre-claro, e a amostra J40 apresentou cor cobre. Evidente também
que quanto maior a concentração de Jamelão na cerveja, mais escura ficou a amostra.
47
Isso é decorrente do aumento de antocianinas, como cita (ZAHREDDINE, 2017) pigmento
natural encontrado no Jamelão, que confere a coloração.
Na Figura 1 são apresentadas as amostras Controle (sem adição de extrato de Jamelão), as
cervejas adicionadas de extrato de Jamelão em diferentes concentrações e o Extrato de Jamelão puro.
A Figura.1 mostras o resultados das amostras, na sequência tem as amostras ―C‖, J20‖, ―J30‖,
J‖40‖ e o extrato de Jamelão 100%.
Figura.1. Diferenciação de cor de cervejas artesanais sem extrato de Jamelão, cervejas
artesanais adicionadas de extrato de Jamelão em diferentes concentrações e Extrato de Jamelão puro
C: Contole; J20: Cerveja artesanal com 20% de extrato de Jamelão; J30: Cerveja artesanal com 30% de extrato de
Jamelão; J40: Cerveja artesanal com 40% de extrato de Jamelão; Ext: Extrato puro de Jamelão.
A Figura 2 mostra as diversas colorações que as amostras apresentaram após processo de
maturação.
Figura.2. Cervejas artesanais adicionadas de extrato de Jamelão em diferentes concentrações.
48
J20: Cerveja artesanal com 20% de extrato de Jamelão; J30: Cerveja artesanal com 30% de extrato de Jamelão; J40:
Cerveja artesanal com 40% de extrato de Jamelão.
Quanto à avaliação de cor utilizando o espaço de cor L*,a*,b* foram percebidas alterações nos
diversos parâmetros de cor. Na faixa L* que indica luminosidade, as cervejas conforme aumentadas a
concentração de Jamelão, o nível de luminosidade vai diminuindo. Comparando a amostra C com a
J40, a o valor de L* decresce de 90,07 para 73,21.
No parâmetro a* os níveis foram aumentando conforme aumento da concentração de Jamelão
na cerveja, ficando na faixa positiva que indica vermelho+/verde-. A amostra J40 apresentou o maior
valor de a*, +20,72.
No parâmetro b* que indica que valores mais negativos demonstram mais amarelado e mais
positivos demonstram azulado, as cervejas apresentaram aumento de valores quando maior
concentração de extrato de Jamelão. A amostra C registrou valor de b* +28,97 e a amostra J40
registrou 37,53.
Os resultados para análise de cor tanto em espectrofotometria quanto em colorímetro são
apresentadas na Tabela 3.
Tabela 3. Parâmetros de cor de amostras de cerveja artesanais adicionadas de Extrato de Jamelão.
Amostras Absorbância a 430nm SRM L* a* b*
C 0,542 6,8 90.07 +0.05 +28,97
J20 0,904 11,4 84.78 +8.12 +31.28
J30 0,264 13,4 79.31 +13.89 +31.42
J40 0,306 15,5 73.21 +20.72 +37.53
C: Contole; J20: Cerveja artesanal com 20% de extrato de Jamelão; J30: Cerveja artesanal com 30% de extrato de
Jamelão; J40: Cerveja artesanal com 40% de extrato de Jamelão.
Nas amostras J30 e J40, para leitura do espectrofotômetro, foi feita a diluição das amostras em 4
partes de água destilada.
Os resultados para teor de fenólicos totais são apresentados na Tabela 4.
Tabela.4. Teor de fenólicos totais em amostras de cerveja artesanais adicionadas de Extrato de
Jamelão.
Amostras Fenólicos Totais (mg
GAE/L)
C 254,52
J20 250,45
J30 253,74
J40 298,40
49
C: Contole; J20: Cerveja artesanal com 20% de extrato de Jamelão; J30: Cerveja artesanal com 30% de extrato de
Jamelão; J40: Cerveja artesanal com 40% de extrato de Jamelão.
Na análise de fenólicos as amostras J20 e J30 apresentaram médias de fenólicos próximas à
amostra C, evidenciando que não houve muita diferença nestes teores quando acrescentado acréscimo
do extrato do fruto nessas duas amostras. A amostra J40 mostrou apresentou média mais pronunciada,
apresentando diferença de 43,88mg de fenólicos em ácido gálico. Diferença de aproximadamente 15%
no teor de fenólicos totais.
Ao comparar estes dados com o trabalho elaborado por Lima (2012), observa-se que a amostra
J40 apresentou quantidade de fenólicos totais tão grande que quase alcança aquelas observadas em
vinhos tintos, que são ricos em fenólicos totais.
Lima (2012) em trabalho envolvendo testes de fenólicos totais em vinhos tintos com uvas da
variedade Goethe, mostrou teores de fenólicos totais entre 277,64 e 420,36 mg de polifenóis totais/L.
CONCLUSÃO
As cervejas artesanais produzidas com adição de extrato de Jamelão atenderam à expectativa
de produzir algo com características diferenciadas, como o grupo das artesanais pretende. O aumento
da concentração do extrato de Jamelão nas formulações foi proporcional ao aumento da turbidez,
aumento da graduação alcoólica, aumento do teor de compostos fenólicos totais e diminuição do pH.
As cervejas artesanais elaboradas com extrato de Jamelão sugerem ter potencial ação como alimento
funcional devido à presença de compostos antioxidantes que se mantém nas cervejas produzidas. O
produto merece especial atenção em estudos mais aprofundados, incluindo análise sensorial com
julgadores treinados.
REFERÊNCIAS
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50
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<http://periodicos.uefs.br/index.php/semic/article/view/2483> Acesso em: 16/07/2018.
51
DESENVOLVIMENTO DE CERVEJA ARTESANAL SEM ÁLCOOL
Iuri Mira Barbosa¹*; Leonardo Fonseca Maciel²; Celso Duarte Carvalho Filho³
Resumo: A grande variedade de opções de cervejas com álcool comercializadas no Brasil, não é
acompanhada no segmento de cervejas sem álcool. Mesmo com a crescente procura pelas cervejas
sem álcool, existem poucas opções de cervejas sem álcool comercializadas no Brasil, incluindo
aquelas produzidas por cevejarias artesanais. As marcas disponíveis apresentam-se com características
bem semelhantes e pouco atrativas ao consumidor. Este estudo buscou caracterizar algumas cervejas
comercializadas no Brasil, propondo uma nova formulação de cerveja artesanal sem álcool com
características diferenciadas daquelas comercialmente disponíveis. Buscaram-se amostras de cerveja
sem álcool em 8 estabelecimentos na região metropolitana de Salvador-BA, onde foram identificadas
apenas 3 marcas sendo comercializadas. Foram adquiridos aproximadamente 700mL de cada uma
destas 3 marcas, além das respectivas cervejas com álcool dos mesmos fabricantes. Além destas 6
amostras de cerveja clara, foram somadas 2 marcas de cervejas escuras, totalizando 8 amostras de
cervejas industrializadas. Na Faculdade de Farmácia da UFBA foram produzidos 17L de cerveja
artesanal, sendo denominada UfbaBeer. Dos 17L da UB produzida, foram separados 4L e este
montante foi submetido a aquecimento controlado a 80°C (±2°C) com objetivo de remoção do álcool,
produzindo a amostra intitulada UfbaBeerZero. Foram avaliados parâmetros físicos, físico-químicos e
os ingredientes das 10 amostras. Foi elaborada uma cerveja artesanal sem álcool, livre de aditivos,
com pH próximo às cervejas industrializadas porém com cor e corpo diferenciados, apresentado-se
como um produto com características diferenciadas, como o grupo das artesanais pretende, mostrando-
se um produto inovador e com mercado promissor.
Palavras-chave: Cerveja artesanal; cerveja sem álcool; variabilidade; consumidor.
INTRODUÇÃO
A cerveja é uma das bebidas mais antigas relatadas pela humanidade, com uma história de
6.000 a 8.000 anos (VENTURINI FILHO, 2016). Desde o século XIX, na época do Brasil Colônia, a
cerveja já era artesanalmente produzida e comercializada no Brasil (MEGA, 2011).
Os ingredientes básicos para a produção da maioria das cervejas, seguindo a lei da pureza
alemã, são: cevada maltada, água, lúpulo e levedura. Porém a maioria dos cervejeiros do mundo tem
uma flexibilidade na escolha de seus ingredientes, indo além desta composição alemã estabelecida. A
partir daí são utilizadas outras fontes de carboidratos que não somente a cevada maltada e outras
substâncias com propriedades aromáticas e antioxidantes além do lúpulo (VENTURINI FILHO,
2016).
1Iuri Mira Barbosa (*autor para correspondência) - Msc. em Ciência de Alimentos pela Universidade Federal da
Bahia(UFBA). Prof. da Faculdade de Farmácia da UFBA. Rua Barão de Jeremoabo, 147, Ondina. Salvador-BA,
Brasil. CEP: 40170-115. Tel.:71-99143-3062. E-mail: [email protected]. 2Leonardo Fonseca Maciel – Dr. em Ciência de Alimentos pela Universidade Estadual de Londrina.
Farmacêutico da Faculdade de Farmácia da UFBA. Rua Barão de Jeremoabo, 147, Ondina. Salvador-BA, Brasil.
CEP: 40170-115. Tel.:71-98835-0895. E-mail: [email protected]. 3 Celso Duarte Carvalho Filho - Dr. em Engenharia Agrícola pela Universidade Estadual de Campinas. Prof.
adjunto da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal da Bahia. Rua Barão de Jeremoabo, 147, Ondina.
Salvador-BA, Brasil. CEP: 40170-115. Tel.:71-99166-4747. E-mail: [email protected].
52
A grande variedade de opções de cervejas com álcool comercializadas no Brasil, não é
acompanhada no segmento de cervejas sem álcool. Existem poucas opções de cervejas sem álcool
comercializadas no Brasil e as disponíveis apresentam-se com características bem semelhantes e
pouco atrativas ao consumidor (KONO, 2014).
Conforme a Instrução Normativa nº 54/2001, entende-se cerveja sem álcool a cerveja cujo
conteúdo alcoólico é inferior ou igual a 0,5% em volume (BRASIL, 2001). Diante desta definição,
esta bebida pode apresentar certa quantidade de álcool na sua composição e legalmente ser
comercializada com o dizer ―cerveja sem álcool‖.
O consumidor que busca cerveja sem álcool geralmente o faz por duas razões principais:
Restrições à saúde ou Questão Social. Na primeira situação evita-se o álcool pois este causa reações
indesejáveis ao organismo, como aquelas provocadas em pacientes em uso de medicamentos que
interagem com o álcool ou estejam em uma condição de saúde que a substância deve ser evitada. Na
segunda situação estão os consumidores que não dispensam a ingestão da bebida, mas querem cumprir
o que é apresentado do Código Brasileiro de Trânsito quanto à proibição de dirigir após o consumo de
bebidas alcoólicas.
Com o aumento dos valores de multas de trânsito aplicadas nas blitzes de alcoolemia, vem
crescendo a procura pelas cervejas sem álcool, porém há pouca variedade do produto, incluindo
aquelas produzidas por cevejarias artesanais, limitando o consumidor a menos de meia dúzia de
produtos.
Segundo Venturini Filho (2016), a diferença mais importante entre cerveja produzida
industrialmente e artesanalmente está na liberdade em se criar receitas personalizadas, com diferentes
tipos de maltes, lúpulos, leveduras e adjuntos cervejeiros, além de experimentar variações no processo
produtivo, com equipamentos e utensílios diferenciados e novas combinações de tempo/temperatura
nas diversas etapas produtivas sem que isso afaste o artesão de seu objetivo, que é obter como produto
final cervejas de alto padrão.
De acordo com Ferreira et al. (2011), a produção de cervejas especiais é simples, mas seu
preparo é cuidadoso e exige qualidade na seleção da matéria prima e rigor no controle de processo, o
que adiciona valor aos produtos artesanais e os singularizam.
Nesse sentido, o presente estudo busca caracterizar algumas cervejas comercializadas no
Brasil, propondo uma nova formulação de cerveja artesanal sem álcool com características
diferenciadas daquelas comercialmente disponíveis.
MATERIAL E MÉTODO
Amostras
53
Entre o período de outubro a dezembro de 2017 buscaram-se amostras de cerveja sem álcool
em 8 estabelecimentos na região metropolitana de Salvador-BA, onde foram identificadas apenas 3
marcas sendo comercializadas. Foi realizada aquisição de 2 unidades (aproximadamente 700mL) de
cada uma destas 3 marcas, além das respectivas cervejas com álcool dos mesmos fabricantes. Visando
analisar outras características não presentes nas 6 primeiras amostras, todas de cerveja clara, foram
somadas 2 marcas de cervejas escuras, totalizando 8 amostras de cervejas industrializadas. As cervejas
sem álcool foram codificadas como AZ, BZ e CZ, enquanto que as respectivas marcas com álcool
receberam a codificação A, B e C. As cervejas escuras receberam os códigos D e E.
Na Faculdade de Farmácia da UFBA foram produzidos 17L de cerveja artesanal, a partir de
extrato de malte líquido lupulado, estilo Indian Pale Ale, marca Arte Brew, adicionado de levedura S-
04, marca Fermentis, com adição de lúpulo extra (dry hopping) da variedade Citra, marca Barth-Haas
Group. Esta amostra foi denominada UfbaBeer (UB).
Dos 17L da UB produzida, foram separados 4L e este montante foi submetido a aquecimento
controlado a 80°C (±2°C) com objetivo de remoção do álcool, produzindo a amostra intitulada
UfbaBeerZero (UBZ).
As 8 amostras industrializadas foram somadas às 2 amostras produzidas artesanalmente,
perfazendo um total de 10 amostras a serem analisadas.
Conforme Instrução Normativa do Ministério da Agricultura e Abastecimento - MAPA - nº
54/2001 todas as bebidas devem ser avaliadas quanto às seguintes características físico-químicas: grau
alcoólico, extrato primitivo e cor. Porém, para cálculo dos valores de extrato primitivo, faz-se
necessária a determinação do extrato real. Adicionalmente foram realizadas análises de turbidez, pH e
colorimetria no espaço de cor L*a*b*. Os rótulos das amostras industrializadas foram observados
quanto à graduação alcoólica declarada e presença de aditivos. Todas as análises quantitativas foram
realizadas em triplicata e os valores médios apresentados na forma de tabelas.
Grau alcoólico
A partir do destilado de 100mL da amostra a 20°C, em conjunto de destilação com banho de
gelo, completou-se o volume para 100mL em balão volumétrico e determinou-se a densidade relativa
em picnômetro a 20°C. Foi realizada conversão de densidade relativa para percentual de álcool em
volume, conforme métodos 217/IV e 246/IV do IAL (IAL, 2004, p.388 e p.433).
Extrato primitivo
O extrato primitivo foi obtido por cálculo envolvendo os valores de teor alcoólico (% álcool
em peso) e extrato real, segundo a fórmula de Balling, apresentado no método 251/IV (IAL, 2004,
p.440).
54
Conforme preconizado na Instrução Normativa MAPA nº 54/2001 (BRASIL, 2001), foram
realizadas análises para determinação da porcentagem de álcool em volume a 20°C (IAL, 2004, p.388)
e extrato primitivo (IAL, 2004, p.440), utilizando para cálculo a Equação 1.
Equação 1. Extrato primitivo, em % (m/m) = [(P x 2,066)+Er] x 100/[100 + (P x 1,066)]
P=% álcool em peso; Er=% extrato real
Extrato real
Para cálculo do extrato real foi utilizado o método 248/IV (IAL, 2004, p.435).
Em cápsula de níquel previamente tarada de 7cm de diâmetro e 2 cm de altura, foram
adicionados exatos 20mL da amostra descarbonatada. Após secagem em estufa a 100°C, foi calculado
o percentual de resíduo seco.
Cor
Para a análise de cor foi utilizada a metodologia utilizada pelo Programa de Certificação de
Julgadores de Cerveja (BJCP). Este programa se respalda no método padrão de referência (SRM) da
American Society of Brewing Chemists – ASBC (BJCP, 2015).
O método consiste em medir a absorbância da amostra em cubeta de 1cm de diâmetro a
430nm e multiplicar o valor pela constante 12,7. Foi utilizado Espectrofotômetro UV-Vis marca Bel
Photonics modelo UV-MS1. Conforme o BJCP (2015) a cor das cervejas foi caracterizada conforme
os valores de SRM apresentados: Palha 2-3; Amarelo 3-4; Ouro 5-6; Ambar 6-9; Ambar escuro/cobre
claro; 10-14; Cobre 14-17; Cobre escuro/castanho claro 17-18; castanho 19-22; Castanho escuro 22-
30; Castanho muito escuro 30-35; Preto 30+; Preto, opaco 40+.
Espaço de cor L*a*b*
Além da análise de cor preconizada na IN nº 54/2001 (BRASIL, 2001), foi realizada análise
dos parâmetros de cor L*a*b* definidos pelo espaço CieLab, com auxílio de colorímetro Konica
Minolta modelo CR-5.
Turbidez
Foi utilizado turbidímetro portátil marca Del Lab, modelo DLT-WV, para avaliação da
turbidez das amostras.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados de percentual de grau alcoólico, extratos real e primitivo, pH e turbidez são
apresentados na Tabela 1.
55
Tabela 1 – Avaliação de grau alcoólico, extrato real e primitivo, pH e turbidez de cervejas
Amostra % alc./vol
Ext.
Real
(%m/v)
Ext.
prim.
(%m/m)
pH Turbidez
A 4,7% 3,02 12,12 4,31 10,00
AZ 0,0% 4,40 4,40 4,42 10,00
B 4,5% 3,64 12,34 4,53 10,00
BZ 0,0% 6,57 6,57 4,24 10,00
C 4,8% 3,78 13,03 4,47 10,00
CZ 0,0% 6,06 6,06 4,01 10,00
D 4,6% 4,82 13,66 4,28 10,00
E 4,1% 9,67 17,38 4,51 10,00
UB 5,1% 5,93 15,62 4,79 494,67
UBZ 0,5% 9,66 10,64 4,70 241,33
A, B, C: Cervejas industrializadas claras com álcool; AZ, BZ, CZ: Cervejas industrializadas claras sem álcool.
D, E: Cervejas industrializadas escuras com álcool; UB: Cerveja artesanal escura com álcool; UB: Cerveja
artesanal escura sem álcool.
Todas as amostras industrializadas apresentaram grau alcoólico de acordo com o
descrito no rótulo, com variação máxima de 2%. A graduação alcoólica da cerveja que foi
submetida ao processo de remoção do álcool registrou 0,5% álc./vol., sendo então, de acordo
com a Instrução Normativa nº 54/2001 (BRASIL, 2001), classificada como cerveja sem
álcool.
Diante dos valores de extrato primitivo calculados, as amostras A, B, C e D, foram
classificadas como Cerveja Extra, com valores maiores ou iguais a 12,0% e menores que
14%. As amostra industrializada E e a artesanal UB foram classificadas como Cervejas
Fortes, por apresentar valores de extrato primitivo superior a 14%.
As amostras AZ, BZ e CZ apresentaram valores de extrato primitivo iguais aos valores
de extrato real, devido ao teor alcoólico destas ser igual a 0,0%. Remetendo à memória de
cálculo do extrato primitivo, este percentual está relacionado à graduação alcoólica.
Constatação similar foi exposta por Araújo et al. (2016), que afirmou em estudo com nove
marcas de cervejas comercias estilo Pilsen que as amostras que apresentaram teor de extrato
primitivo mais elevado foram as que apresentavam maior graduação alcoólica.
56
As amostras BZ e CZ foram classificadas como Cervejas Leves, por apresentar valores
entre 5,0% e 10,5%. A amostra AZ apresentou valor de extrato primitivo igual a 4,40, e
portanto inferior ao mínimo de 5,0% que trata a Instrução Normativa nº 54/2001 (BRASIL,
2001), não sendo possível sua classificação nem mesmo como cerveja leve.
Por outro lado, a amostra UBZ, por apresentar 0,5% de álcool, apresentou valor de
extrato primitivo, 10,64%, diferente ao de extrato real, 9,66. Diante deste valor de extrato
primitivo superior às demais cervejas sem álcool (AZ=4,40%; BZ=6,57%; CZ=6,06%), a
amostra UBZ, artesanalmente produzida, foi classificada como Cerveja (valores superiores a
10,5% e inferiores a 12,0%). Observa-se então que a cerveja artesanal sem álcool produzida
evidencia outro diferencial frente às cervejas sem álcool industrializadas, um produto mais
encorpado que as demais.
Dentre as amostras industrializadas, o pH variou de 4,01 (amostra CZ) a 4,53 (amostra
B). As amostras artesanais apresentaram valores de pH ligeiramente superiores (até 5,7%
maior). Diante dos valores encontrados, não é possível afirmar que o pH das cervejas sem
álcool é inferior ou superior às cervejas com álcool: as amostras BZ e CZ apresentaram
valores de pH inferiores à respectivas cervejas com álcool (B e C), enquanto a AZ apresentou
valor de pH superior à amostra A. Nas artesanais, a cerveja sem álcool apresentou pH inferior.
A turbidez de todas as amostras industrializadas avaliadas foi 10,0 UTB. A amostra
UB apresentou turbidez de 494,67 UTB e a amostra UBZ apresentou 241,33 UTB.
Conforme descrito por Siqueira et al. (2008), os ingredientes envolvidos na fabricação
da cerveja, principalmente o malte, geram uma natural instabilidade física da cerveja,
ocorrendo polimerização de compostos fenólicos e associação com algumas proteínas,
gerando uma turbidez característica ao processo. Alguns procedimentos podem prevenir ou
retardar o aparecimento da turbidez, como remoção de compostos fenólicos de maior peso
molecular através de processos de floculação e filtração, armazenamento da cerveja no estágio
de maturação a temperaturas mais elevadas ou uso de estabilizantes do tipo polivinil-
polipirrolidona, como ocorre nas indústrias cervejeiras.
As amostras produzidas artesanalmente, por não passarem por processos de
filtração/clarificação, nem adição de aditivos, apresentaram estes justificáveis valores de
turbidez superiores.
57
Todas as cervejas industrializadas avaliadas apresentam em seus rótulos aditivos
alimentares em sua composição. As cervejas artesanais foram produzidas sem uso de aditivos
alimentares. Dentre os aditivos utilizados nas amostras industrializadas foram identificadas as
seguintes substâncias: Corante caramelo III (INS 150c), com função de realçar cor; Sulfito de
sódio (INS 221), que tem as funções clarificante e preservante; Metabissulfito de sódio (INS
223) e Metabissulfito de potássio (INS 224), ambos com funções clarificante, antioxidante e
preservante; Isoascorbato de sódio (INS 316), com função antioxidante e o Propilenoglicol
alginato (INS 405), que exerce funções espumante e emulsificante (CODEX
ALIMENTARIUS, 2017). Na Tabela 2 é apresentada a ocorrência destes aditivos nas
amostras avaliadas.
Tabela 2 – Ocorrência de aditivos alimentares em amostras de cervejas.
INS 150c INS 221 INS 223 INS 224 INS 316 INS 405
A x x
AZ x x
B x x
BZ x x x
C x x x
CZ x x
D x x x
E x x x x
UB
UBZ
A baixa concentração de lúpulo na maioria das cervejas industrializadas força os fabricantes a
compensar as propriedades antioxidantes, preservantes e espumante do lúpulo por aditivos alimentares
sintéticos.
O uso destes aditivos alimentares pela totalidade das amostras industrializadas conferem maior
estabilidade e melhor aspecto sensorial ao produto, porém, conforme diversas orientações de boas
práticas de fabricação em alimentos, o uso de aditivos deve ser estritamente necessário ao processo
fabril, devendo ser evitado seu uso sempre que possível, visto à toxicidade potencial destes compostos
adicionados (BALDWIN e HAGENMAIER, 2011; CODEX ALIMENTARIUS, 2017).
Os resultados para as análises de cor das amostras, realizadas tanto em espectrofotômetro
quanto em colorímetro de bancada, são apresentadas na Tabela 3.
58
Tabela 3 – Características de cor das amostras de cerveja
Amostra SRM L* a* b*
A 3,5 98,43 -1,15 20,04
AZ 3,6 98,85 -1,19 20,70
B 3,2 99,50 -2,00 19,33
BZ 4,4 97,45 -2,11 24,28
C 3,1 97,84 -1,29 17,57
CZ 3,9 96,80 -0,94 21,10
D 71,8 37,00 39,99 55,59
E 136,1 23,24 37,02 32,14
UB 57,74 56,82 26,03 77,06
UBZ 81,89 39,71 36,82 60,70
De acordo com o BJCP (2015) todas as cervejas sem álcool industrializadas estão classificadas
como de cor amarelo (SRM AZ=3,6; SRM BZ=4,4 e SRM CZ=3,9), igualmente às suas respectivas
cervejas com álcool, na sua totalidade classificadas como de cor amarelo (SRM A=3,5; SRM B=3,2 e
SRM C=3,1). As amostras D e E, por apresentarem valores de SRM superiores a 40 foram
classificadas como de cor preto opaco. A cerveja artesanal sem álcool (UBZ) registrou SRM 81,89 e
assim foi classificada como de cor preto opaco.
O parâmetro de cor L* das cervejas amarelas foi igual ou superior a 96,80, o que reflete a
maior claridade destas amostras, enquanto que as amostras industrializadas de cor preta opaca, D e E,
apresentaram valores de L* 37,00 e 23,24, respectivamente. A cerveja artesanal sem álcool (UBZ)
registrou valor L* igual a 39,71, se aproximando muito mais das cervejas pretas industrializadas do
que das amarelas.
Comportamento similar ocorreu com o parâmetro de cor a*, que varia do verde (valores
negativos) ou vermelho (valores positivos). As cervejas amarelas industrializadas apresentaram
valores negativos para este parâmetro (-2,11 a -0,94), enquanto que as pretas opacas apresentaram
valores bastante positivos (37,02 a 39,99). A cerveja artesanal sem álcool (UBZ) registrou valor a*
igual a 36,82, dentro da faixa observada para as cervejas pretas opacas.
Os valores do parâmetro b* observados também acompanharam a diferenciação entre as
amostras amarelas e pretas opacas. Quanto mais negativo o valor, mais amarela a amostra, quanto
mais positivo, mais azulada. Observa-se que os valores do parâmetro b* das amostras amarelas
variaram de 17,57 a 24,28, enquanto que das amostras pretas opacas variaram de 32,14 a 55,59. A
amostra UBZ apresentou valor ainda superior, registrando valor b* igual a 60,70.
Diante dos resultados apresentados nota-se que a cerveja sem álcool produzida artesanalmente
(UBZ), apresenta características de cor bastante diferenciadas das cervejas sem álcool industrializadas
avaliadas.
59
CONCLUSÃO
As cervejas artesanais produzidas atenderam à expectativa de produzir algo com
características diferenciadas, como o grupo das artesanais pretende. O processo de remoção do álcool
mostrou-se satisfatório, culminando em teor alcoólico permitido pela legislação brasileira para
classificar o produto como cerveja sem álcool. A cerveja sem álcool elaborada (UBZ) é um produto
livre de aditivos, com pH próximo às cervejas industrializadas porém com cor e corpo diferenciados
destas, mostrando-se um produto inovador e com mercado promissor, visto que as cervejas sem álcool
industrializadas apresentam características bem similares deixando de ser atrativas aos consumidores
após certo tempo.
REFERÊNCIAS
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VENTURINI FILHO, W. G. Bebidas alcoólicas: ciência e tecnologia. 2.Ed. São Paulo: Blucher,
2016.
61
ESTUDO DE METODOLOGIA PARA CARACTERIZAÇÃO DE GASES
PRODUZIDOS PELA FERMENTAÇÃO DURANTE O PROCESSO DE
FABRICAÇÃO DA CERVEJA
Lucas Gonçalves Ferreira*,
Matheus Las Casas Cordeiro2,
Daniel Dumont Marques3,
Juliana Cristina
Teixeira4,
Vanessa de Oliveira Ferreira5,
Vinicius Mateó e Melo6,
Lucilaine Valéria de Souza Santos7,
Leonardo Mitre8
Resumo: Com o aumento do número de microcervejarias presentes no Brasil, a quantidade de dióxido
de carbono emitido na atmosfera por essas indústrias torna-se cada vez mais expressiva. Sendo assim,
há uma demanda cada vez maior pelo desenvolvimento de métodos para o reaproveitamento desse gás
residual do processo fermentativo da cerveja. No entanto, para que essas novas técnicas sejam criadas,
faz-se necessária uma minuciosa caracterização dos componentes desse efluente residual gasoso.
Para a metodologia de caracterização do gás, foram propostos métodos específicos para a
detecção de cada tipo de composto químico que se esperava estar presente na amostra. Nesse sentido,
utilizou-se o equipamento Orsat para a detecção e quantificação de dióxido de carbono (CO2). Por fim,
utilizou-se a cromatografia a gás acoplada ao espectrômetro de massas (CG-EM) a fim de identificar
os demais componentes químicos presentes na amostra. Esta última técnica confirmou a presença, em
quantidades traço, de H2S e de grandes quantidades de CO2, assim como era esperado, e revelou a
presença de etanol em quantidades significativas.
Dessa forma, o foco do presente estudo é o desenvolvimento de metodologias para caracterizar
gases provenientes da etapa de fermentação da cerveja e identificar possíveis contaminantes que
impediriam o reaproveitamento do CO2 na indústria.
Palavras-Chave: Cervejarias, dióxido de carbono, H2S, analisador de Orsat cromatografia a gás.
1. INTRODUÇÃO
A cerveja é uma das bebidas mais consumidas do mundo, sendo, portanto, produzida em
grandes quantidades. Além disso, a indústria cervejeira é uma grande contribuinte da economia
brasileira, sendo responsável por 1,6% do PIB. Este valor se deve ao expressivo número de cervejarias
presentes no território brasileiro.
*Estudante de Graduação Engenharia Química. Rua Maria Beatriz 73, Novo das Industrias. CEP: 30.610.670. Belo
Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Telefone: (31) 99453-0214. E-mail: [email protected]; 2Estudante de Graduação Engenharia Química. Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. E-mail: [email protected]; 3Estudante de Graduação Engenharia Química. Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. E-mail: [email protected]; 4Estudante de Graduação Engenharia Química. Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. E-mail: [email protected]; 5Estudante de Graduação Engenharia Química. Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. E-mail: [email protected] 6Estudante de Graduação Engenharia Química. Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. E-mail: [email protected]; 7Química, Mestre e Doutora em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos pela Universidade Federal de Minas
Gerais. Professora de Análises Instrumental da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Belo Horizonte, Minas
Gerais, Brasil. E-mail: [email protected]; 8Engenheiro Químico e Mestre em Ciência e Tecnologia de Materiais pelo Centro de Desenvolvimento de
Tecnologia Nuclear. Coordenador do curso de Engenharia Química e professor da Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais. Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. E-mail: [email protected]
62
Diante disso, a quantidade de gases poluentes sendo emitidos diretamente na atmosfera
devido ao processo de fermentação alcoólica do mosto da cerveja deve ser levada em consideração.
Esse processo consiste na conversão de açúcares presentes no malte em etanol e dióxido de carbono
(CO2), sendo esse gás um dos principais agentes causadores do efeito estufa.
O CO2 é utilizado em outras etapas no processo de fabricação da cerveja, podendo-se citar
como exemplo a fase de carbonatação da bebida e a pressurização dos tanques de fermentação. Mas
para que isso ocorra, há a necessidade de o gás estar purificado ou com o mínimo de contaminantes
possível. Porém, pouco se conhece sobre a composição do gás de fermentação, pois a decomposição
das leveduras e a atuação delas sobre a matéria prima leva à formação de compostos contaminantes,
cuja composição depende do tipo de matéria prima utilizada e do tipo de levedura, e que se misturam
ao CO2.
Surge assim a necessidade de desenvolvimento de métodos mais apropriados de descarte ou
reutilização desse efluente na própria indústria visando tanto uma melhoria no aspecto econômico da
empresa quanto o seu desenvolvimento sustentável.
O escopo do presente estudo abrange a análise de sulfeto de hidrogênio (H2S), dimetilsulfeto
(DMS), dióxido de carbono (CO2), oxigênio (O2), bem como a identificação de outros compostos cuja
presença não é conhecida a priori.
Os métodos abordados neste estudo foram a análise de CO2 utilizando o analisador de Orsat, e
a análise qualitativa de outros compostos por cromatografia a gás acoplada ao espectrômetro de
massas (CG-EM).
2. REVISÃO DA LITERATURA
2.1 Contextualização
Estima-se que o homem começou a utilizar bebidas fermentadas há 30 mil anos. Estudos
indicam que a produção da cerveja teve seu início por volta de 8000 a.C. Esta bebida foi desenvolvida
paralelamente aos processos de fermentação de cereais. Na antiguidade, difundiu-se lado a lado com
as culturas de milho, centeio e cevada, entre os povos da Suméria, Babilônia e Egito. Também foi
produzida por gregos e romanos durante o apogeu destas civilizações (CITINO, 2011).
Por volta de 1600 a.C., a técnica de produção da cerveja feita pelos sumérios foi aperfeiçoada
pelos egípcios, que acreditavam em sua correlação com suas divindades. A extrema relevância da
bebida para essa civilização pode ser ilustrada pela existência de hieróglifos referentes a atividades
relacionadas à sua produção e comercialização. Nesta época os egípcios também utilizavam a bebida
63
com intuitos medicinais para tratamento de algumas doenças, de acordo com documentos encontrados
por arqueólogos.
Segundo Teixeira (2016), na idade média, os monges tiveram papel essencial na conservação e
tradução dos manuscritos relacionados ao processo de fabricação e, por este motivo, muitos deles
aperfeiçoaram a técnica de produção desenvolvida nos tempos antigos.
Na Alemanha, Inglaterra, Bélgica e Tchecoslováquia, no período compreendido entre os
séculos XIV e XIX, foram desenvolvidas técnicas de processos fermentativos que culminaram na
produção de diversos tipos de cervejas. Pode-se citar como exemplo as cervejas Pilsen, Lager e Ale.
2.1.2 Importância da Cerveja na Economia Nacional
O desenvolvimento técnico e científico da civilização levou à invenção de novos instrumentos
científicos e às melhorias no processo de produção da cerveja, resultando no aprimoramento da bebida
até os padrões observados nos dias de hoje.
Desde então, a cerveja vem ganhando espaço no mercado mundial como uma das bebidas
mais consumidas no mundo. De acordo com o MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento), o Brasil, no ano de 2017, se tornou o terceiro maior produtor do mundo, tendo
produzido 14,1 bilhões de litros, perdendo apenas para a China e os Estados Unidos, e ficando na
frente de países como Alemanha e Bélgica, que são famosos por serem grandes produtores da bebida.
Por ser um mercado que vem gerando muito capital, este ramo vem crescendo não só na
quantidade de grandes indústrias como também na quantidade de pequenas cervejarias artesanais.
Como pode ser visto na figura 1, entre os anos de 2002 e 2017, tem havido um aumento exponencial
do número de pequenas cervejarias no Brasil.
Figura 5- Gráfico Representativo do número de cervejarias no Brasil
Fonte: MAPA
64
Também de acordo com o MAPA, este setor do mercado gerou 2,2 milhões de empregos. O
valor das arrecadações, equivalente a 23 milhões de reais por ano em impostos, correspondeu a 1,6%
do PIB nacional.
Figura 6-Consumo Per capta de cerveja no Brasil
Fonte: Euromonitor
Apesar da grande produção de cerveja em território nacional, observa-se que o consumo per
capita fica abaixo dos grandes consumidores, de acordo com os dados coletados pela empresa
japonesa de bebidas Kirin (2015). De acordo com CervBrasil (2015), no ano de 2015, observa-se que
o consumo por pessoa foi de 64,2 litros, muito abaixo do valor de consumo per capita de países como
República Tcheca (142,4 litros) e Alemanha (104,7 litros). Também é possível visualizar, pela figura
2, o consumo de cerveja no Brasil por pessoa entre os anos de 2010 e 2017, bem como a projeção para
o ano de 2018.
2.2 Processo de Produção da Cerveja
Conforme Rebello (2009), o processo de produção de cerveja é constituído por uma série de
etapas que transformam o malte, água e lúpulo no produto final. A descrição e a importância de cada
uma dessas matérias primas é descrita a seguir:
a) Malte: Grão de cevada que, por meio de condições de temperatura e umidade controladas, é
germinado. Dele, são obtidos os açúcares utilizados na fermentação.
b) Água: Ingrediente principal. Geralmente de 4 a 5 litros de água são utilizados na produção de 1
litro de cerveja. Para sua utilização, a água deve estar livre de contaminantes e deve conter
concentrações de cálcio e magnésio específicas (entre 200 e 350 ppm), pois estes elementos servem
65
de nutrientes para as leveduras. O pH ótimo da água é em torno de 5, pois as enzimas presentes no
grão de cevada atuam melhor neste intervalo.
c) Lúpulo: É um importante conservante da cerveja em razão do seu efeito bacteriostático, mas
principalmente possui funções flavorizantes e aromatizantes, variando suas quantidades de acordo
com a intensidade das propriedades desejadas.
Na figura 3, pode-se identificar onde cada ingrediente citado acima é utilizado durante a
fabricação da bebida.
Uma das etapas mais importantes é a fermentação, que é um processo anaeróbico de
decomposição dos açúcares presentes no malte em etanol e CO2, produzindo energia, no processo.
Figura 7 - Fluxograma do processo de produção de cerveja
Fonte: Cervejaria Dortmund
Este procedimento é realizado pela levedura Saccharomyces cerevisiae. Essa espécie pode ser
dividida em dois grupos: de alta e de baixa fermentação. Esta classificação é observada no final do
processo de fermentação: se as leveduras flotam até a superfície, elas são de alta fermentação e, se elas
decantam, são de baixa de fermentação.
2.2.1 Processo de Fabricação da Cerveja
Segundo Debatin (2017) O processo de produção da cerveja inicia-se com a seleção de seus
ingredientes (água, malte, lúpulo e levedura ou fermento), que passam por diversas etapas de
preparação até o processo fermentativo, uma das etapas cruciais na determinação da qualidade de uma
cerveja.
De acordo com Tozetto (2017), a fermentação alcoólica inicia-se quando se adiciona a
levedura ao mosto, que consiste em uma mistura ou ―caldo‖ rico em açúcares, provenientes do malte.
66
A técnica consiste na conversão, pela ação das leveduras e em condições anaeróbicas, da glicose em
etanol, CO2 e energia térmica. Na produção de cerveja, a levedura mais utilizada é a Saccharomyces
cerevisiae, que foi desenvolvida para que o processo de fermentação ocorresse de forma uniforme,
eficiente e rápida, no que se refere à produção de etanol.
Sobre o crescimento de microrganismos, de acordo com Zainasheff (2010), a etapa
fermentativa tem início com a adaptação dos microrganismos ao ambiente e com um crescimento
populacional discreto, na presença de oxigênio, caracterizando uma fase que é dominada pela
metabolização de nutrientes, denominada fase Lag. Posteriormente, o número de indivíduos começa a
aumentar exponencialmente, numa etapa denominada fase Log, e percebe-se um intenso
borbulhamento ocasionado pela liberação de CO2 proveniente da reação de fermentação. Devido à
intensa atividade do fermento, essa etapa é caracterizada pelo aumento de temperatura e grande
liberação de CO2, que empurra material particulado para a parte superior do fermentador, formando
flocos de leveduras. Na fase final, denominada fase estacionária, o crescimento líquido dos
microrganismos diminui a ponto de o número populacional permanecer estagnado, indicando que os
nutrientes estão se tornando escassos, o que pode ser percebido pela redução do aparecimento de
bolhas e pela precipitação de quase toda a levedura.
Vários fatores podem afetar esse processo metabólico e, consequentemente, o sabor da
cerveja, incluindo a linhagem de levedura, a temperatura e o pH do mosto, o tipo e a proporção de
adjunto, o modelo de fermentador e a concentração do mosto (OLIVEIRA, 2011).
De acordo com Oliveira (2011), no princípio da fermentação, o oxigênio no ambiente e no
mosto é totalmente consumido para que haja crescimento da população de leveduras e posteriormente
ocorrer a produção de álcool. Logo, depois de iniciada a reação de glicólise, deve-se evitar a entrada
do gás oxigênio no fermentador para se ter alto rendimento na produção do álcool etílico e manter
constante o número de leveduras.
De acordo com Vivian (2016), o pH ou a acidez deve ser corrigida sempre na faixa de
desenvolvimento da levedura que, no caso da Saccharomyces cerevisiae, deve estar entre 4 e 5. A
correção é feita com bicarbonato de sódio ou hidróxido de sódio, para pH mais ácido, ou com ácido
cítrico, para pH mais alcalino.
Segundo Oliveira (2011), outro fator importante que deve ser ressaltado é a temperatura, já
que a reação de conversão do açúcar é exotérmica, levando ao aumento da temperatura do sistema.
Com isso, podem ocorrer reações paralelas indesejadas e que, portanto, podem interferir na qualidade
final do produto.
67
Durante a fermentação, pode haver aparecimento de compostos que conferem alteração de
aroma e sabor da cerveja. Dentre eles, pode-se citar: O H2S e o DMS.
2.3 Principais Gases Liberados na Fermentação da Cerveja
Além do álcool e do CO2, durante a fermentação, outros compostos são formados em
pequenas quantidades, mas com grande impacto no sabor e/ou odor da cerveja. São produtos
secundários do metabolismo da levedura, que podem ter influência positiva ou negativa no aroma e
sabor das cervejas. Os subprodutos indesejáveis devem ser degradados ou eliminados durante a
maturação, etapa na qual ocorre a ―lapidação‖ da cerveja (DEBATIN, 2017). Dentre os subprodutos
encontrados, segundo Kuck (2008), estão os compostos como ácidos, álcoois alifáticos superiores,
ésteres, diacetil, acetoína, compostos com ligações de enxofre, etc.
O presente estudo irá abordar os seguintes gases produzidos durante a fermentação: CO2 e os
principais gases derivados do enxofre como H2S e DMS, conforme indicado em Vivian (2016).
2.3.1 Sulfeto de Hidrogênio
O H2S, em concentrações menores que 50 ppb, confere frescor à cerveja. Porém, se essa
concentração se tornar relativamente elevada, a bebida passa a apresentar sabor e cheiro de ovo podre,
o que é muito característico desse gás. De acordo com Wuttke (2018), o H2S é produzido na
fermentação e possui concentração baixa, tornando-se um off flavor apenas em concentrações
elevadas. Sabe-se que esse gás pode originar-se, no processo fermentativo, da contaminação do mosto
por microrganismos que competem com as leveduras pelo substrato. Além disso, as leveduras,
eventualmente, alimentam-se umas das outras, o que também acarreta na formação de H2S.
Conforme Mainier (2005), o HsS e os compostos reduzidos de enxofre (CRE) possuem grande
toxicidade, são corrosivos e causam danos ao meio ambiente se dispostos de forma irregular, tais
como a formação de chuva ácida e efeitos nocivos à saúde do ser humano que entra em contato com
esse gás, podendo causar a paralisia do sistema nervoso por intoxicação. Ressalta-se que o olfato
humano pode detectar o gás sulfídrico em níveis de concentração de 0,13 ppm (0,18 mg.m-3
)
(SCGHEIDER, 2012), mas torna-se insensível a esse gás em concentrações relativamente elevadas e,
portanto, com alto grau de toxicidade.
O sulfeto de hidrogênio reage facilmente com sais de metais como cobre, prata, ferro, chumbo,
cádmio e níquel, formando precipitados pouco solúveis. Tal característica auxilia na criação de
métodos de quantificação. Atualmente, a cromatografia a gás (CG) com detector de luminescência e a
técnica de formação de azul de metileno são os principais métodos para a análise desse gás.
68
2.3.2 Dimetil Sulfeto
O DMS é derivado do enxofre, um componente volátil que confere um sabor desagradável
para a cerveja, sendo, portanto, desejável sua remoção dos processos de produção da cerveja acima de
certas concentrações. Segundo Vivian (2016), A partir de 50 ppm o composto é perceptível
sensorialmente na bebida.
Na etapa de secagem do grão e na fervura do mosto encontra-se o DMS na forma ativa.
Durante a fervura também ocorre escurecimento do mosto devido à ação de açúcares com aminas
primárias (dos aminoácidos), formando pigmentos entre vermelho e marrom. Após a reação ocorrer,
deve-se resfriar o mosto rapidamente para evitar contaminação, oxidação e formação de DMS e, então,
remover o lúpulo e proteínas coaguladas em um processo conhecido como clarificação (VIVIAN,
2016).
2.3.3 Dióxido de Carbono
Alguns autores reportam que as emissões de CO2 podem ser responsáveis por
aproximadamente 70% do efeito estufa, que é um fenômeno atmosférico que possui direta relação com
as alterações do clima terrestre. Estima-se que mais de 20 bilhões de toneladas de CO2 são emitidos
anualmente a partir da queima de combustíveis fósseis. A magnitude dos ciclos biológicos do carbono
influenciado pelas atividades humanas sugere maiores níveis de gerenciamento e mitigação das
emissões deste composto para a atmosfera (LOPES, 2007). Diante desses dados, é evidente a
importância da detecção e quantificação do CO2 emitido nos diversos processos industriais para a
devida adequação dos procedimentos aos parâmetros ambientalmente corretos.
As principais etapas da produção da cerveja que envolvem a produção de CO2 são:
fermentação, maturação e carbonatação. Segundo Kuck (2008), a fermentação é um processo
anaeróbico, realizado pelas leveduras, onde há a conversão de carboidratos em etanol e CO2. A
maturação é um repouso prolongado da cerveja, onde os seguintes processos ocorrem: fermentação
secundária, saturação com CO2, clarificação e amadurecimento dos componentes de sabor e aroma
(KUCK, 2008). A carbonatação é a injeção de CO2 na cerveja para aumentar a formação de bolhas na
bebida.
Além das etapas citadas, o CO2 é necessário em outros pontos do processo de produção de
cerveja (tabela 1).
69
Fonte: Kunze (1996)
3 METODOLOGIA
3.1 Amostragem
A amostragem foi realizada mediante a utilização de uma montagem envolvendo seringas
convencionais, com volume de 20 ml, que foram conectadas ao ponto de amostragem do tanque de
fermentação por meio de uma mangueira de poliuretano e de uma válvula de três vias, conforme a
figura 4. A extração da amostra do interior do tanque para o interior da seringa ocorreu naturalmente
por ação de um gradiente de pressão entre o interior do tanque e da seringa.
Uma vez coletada a amostra, isolou-se o interior da seringa do meio externo com o auxílio da
válvula de três vias, conectas à saída do recipiente. Além disso, as seringas contendo a amostra foram
mantidas em condições controladas de temperatura no período anterior à análise, visando evitar
qualquer modificação nas amostras que seja proveniente de variações de temperatura. Para tanto,
utilizou-se uma caixa de isolada termicamente para este fim.
70
Figura 4- Montagem para procedimento de amostragem
Fonte: Autoria Própria
3.2 Analisador de Orsat
O sistema de análise do equipamento consiste em uma bureta graduada para medição de
volumes e três pipetas de absorção, cada uma contendo uma solução especializada na absorção de um
gás diferente (PEREIRA, 2011). Cada uma dessas vidrarias possui uma válvula de três vias, que
possibilita ao operador direcionar o gás injetado no sistema até a pipeta desejada, promovendo a
absorção de um ou mais constituintes da amostra. As reduções de volume da amostra resultantes da
absorção são medidas na bureta e são equivalentes a quantidade de gás que foi absorvido pela solução.
A figura 5 representa a estrutura de um tipo desse equipamento. Pode-se observar, à direita na
imagem, a bureta de medição do volume, e, à esquerda, as três pipetas de absorção. Nota-se também
que essas vidrarias se encontram conectadas umas às outras, sendo função do analista a regulação das
válvulas para estabelecimento de um caminho para a amostra.
Além das vidrarias anteriormente citadas, outras estruturas adicionais também estão presentes
no equipamento para seu melhor funcionamento. Uma bolsa de expansão de três compartimentos é
conectada às pipetas de absorção a fim de evitar a saturação das soluções absorventes em contato com
o ar. Similarmente, o fundo da bureta é conectado a um frasco de nivelamento, preenchido por uma
solução de ácido sulfúrico, de forma a evitar a solubilização da amostra nesse sistema. Esse frasco é
utilizado para regulação do volume de solução presente na bureta, visto que os ajustes na altura desse
recipiente regulam o volume dos gases em seu interior, devido às variações de pressão ocasionadas.
71
Figura 5: Esquema representativo do analisador de Orsat
Fonte: Manual Orsat Energética OST-2
3.2.1 Preparo das Soluções Inseridas no Equipamento
a) Pipeta de absorção de CO2
Dissolução de 45g de cristais de KOH em 150 mL de destilada.
b) Solução Bureta (Solução confinante)
Dissolução de 2mL de ácido sulfúrico concentrado em 250mL de solução de cloreto saturado
e 10 gotas de vermelho de metila.
3.2.2 Operação no Analisador
Para o uso do Orsat, é preciso remover todo o ar contido nas pipetas através dos balões que
estão acoplados nelas. Após a retirada do ar, a pipeta 1 é preenchida pela metade com a solução
preparadas de hidróxido de potássio, e a válvula presente na pipeta é fechadas. Após a adição da
solução a pipeta, é colocada a solução confinante na bureta em quantidade suficiente para que ela
possa sofrer um deslocamento de volume quando o gás passar por ela.
Após a pipeta e a bureta estarem cheias com suas respectivas soluções, é injetado o gás no
sistema. Ao passar pelos tubos, ele encontrará as válvulas das pipetas fechadas, indo, portanto, direto
para a solução confinante. Isso provocará uma alteração de volume na bureta. Com essa alteração de
volume é possível calcular o volume de gás (Volume do líquido após a introdução do gás no sistema –
Volume do líquido antes de se colocar o gás). E com o valor do volume é possível calcular o número
de mols total da amostra de gás sendo analisada, que será de grande importância para os cálculos
futuros da fração molar de CO2 presente na amostra.
Após verificar o volume que o gás deslocou no líquido, é aberta a válvula da pipeta 01. Após a
abertura, o gás irá passar pela solução de hidróxido de potássio, e a solução absorverá o CO2 presente
na amostra e, consequentemente, o volume na bureta será alterado. Com este novo volume é possível
72
calcular a quantidade de CO2 contido na amostra utilizando a equação de Van der Waals (equação 1).
Após a verificação do novo volume, a válvula da pipeta é fechada.
Figura 6- Analisador de Orsat
Fonte: Autoria própria
3.2.3 Cálculos
Para este caso, uma equação que apresenta uma boa aproximação, gerando poucos erros no
resultado é a equação de Van der Waals.
……………………………………………….. (1)
Onde:
P = Pressão (pressão atmosférica);
a e b representam as forças de repulsão e atração, respectivamente;
V = Volume de gás;
R = Constante dos gases;
T= Temperatura;
73
Com a equação é possível calcular o número de mols total e o número de mols de cada
espécie.
A partir desses valores, calcula – se a fração molar de CO2 :
…………………………………………. (2)
De posse dos valores de fração molar é possível calcular os percentuais dos gases analisados
de forma a concluir essa análise.
3.3 Metodologia para análise dos componentes utilizando GC-EM
A amostra inicialmente é transferida através de duas válvulas de 3 vias para a seringa gás-
tight, com a qual se introduz a amostra no equipamento. A coluna utilizada, modelo SH-Rtx-5MS,
possui 30 metros de comprimento e 25 mm de diâmetro.
Os parâmetros termodinâmicos utilizados no GC foram:
a) Temperatura da coluna: 35 ºC;
b) Temperatura do injetor: 110 ºC;
c) Pressão: 25 kPa;
d) Fluxo total: 9,5 mL/min;
e) Fluxo da Coluna: 0,72 mL/min;
f) Velocidade linear: 30,5 cm/s;
g) Fluxo de purga: 3,0 mL/min.
Figura 7 - GC-EM Fonte: Autoria Própria
Os parâmetros termodinâmicos utilizados no EM foram:
a) Temperatura da fonte de íons: 240 ºC;
b) Temperatura da interface: 240 ºC;
c) Não foi utilizado Solvent Cut Time.
74
4 RESULTADOS
4.1 Resultado da Amostragem
Dado que os resultados provenientes de testes de estanqueidade das seringas convencionais
adaptadas com válvulas de três vias mostraram-se positivos, assumiu-se que as seringas adaptadas
apresentaram comportamento satisfatório no que se refere ao acondicionamento das amostras em um
período inferior a 48 horas, uma vez isoladas termicamente do meio externo com o auxílio de um
recipiente térmico adequado. Ressalta-se, contudo, a importância da validação do método mediante a
realização sistemática de testes analíticos das amostras acondicionadas nas seringas, dada a
possibilidade de perdas de amostra pelos poros do recipiente, indetectáveis pelos métodos
convencionais de estanqueidade, e/ou mesmo por adsorção em suas paredes.
4.2 Resultado da Análise de CO2
A análise foi feita em Belo Horizonte, onde a pressão atmosférica equivale a 0,89 atm e a
temperatura, medida no dia, foi de 20°C. Os parâmetros de Van der Waals para o CO2, foram a= 3,61
atm L2 (mol
2) e b= 0,04286 L/mol. A constante universal dos gases utilizada foi igual a 0,082 L atm/
mol K, O número de mols total é igual 0,538 mol.
Os resultados das medições e dos cálculos estão apresentados na tabela 2.
Tabela 3- Resultados Analisador de Orsat
Fonte: Autoria Própria
Pela análise dos resultados, percebe-se que o analisador de Orsat não possui a sensibilidade
necessária para detecção precisa de CO2. O resultado obtido apresenta 100% da composição do gás
como CO2, mas, como pôde-se observar na seção 4.3, a amostra possui outros componentes.
4.3 Resultado da Análise dos Componentes
A partir do CG-EM foram gerados os cromatogramas e espectros representados pelas figuras
8, 9, 10 e 11. Foram detectados pela análise CO2, H2S e etanol.
As figuras 8, 9 e 10 mostram o pico gerado em comparação com o pico identificado pela
biblioteca NIST.
75
Figura 8 - Pico do espectro de massa referente ao CO2
Fonte: Autoria própria
Figura 9 - Pico do espectro de massa referente ao Etanol
Fonte: Autoria própria
76
Figura 10 - Pico do espectro de massa referente ao H2S
Fonte: Autoria própria
A figura 11 mostra o cromatograma gerado e as quantidades relativas. O H2S e o etanol são
representados pelas linhas identificadas como data 3 e data 1 respectivamente. O dióxido de carbono é
representado como data 2, pico grande, evidenciando que a amostra é composta por esta substância de
forma majoritária.
Figura 11 - Cromatograma
Fonte: Autoria própria
O método de caracterização apresentou quantidades relativas consistentes com o esperado de
um gás de fermentação, porém não identificou outros compostos desejados como, por exemplo, o
DMS, necessitando, assim de uma análise complementar para uma caracterização mais completa do
77
efluente gasoso. Desta forma, o método se mostrou eficaz, dentro das condições estabelecidas, para
identificação de CO2, H2S e etanol.
5 CONCLUSÃO A partir dos estudos realizados e dos dados experimentais obtidos, conclui-se que o método de
quantificação de CO2 proposto não possui a sensibilidade necessária para a análise em questão. Além
disso, através de análise no CG-EM, detectou-se nas amostras a presença de etanol e H2S,
contaminantes que impedem a reutilização do gás carbônico em outras etapas do processo de produção
da cerveja.
Para viabilização de desenvolvimento de métodos de purificação desse gás, ainda existe a
necessidade de se quantificar as impurezas detectadas pelas análises. Nesse sentido, sugere-se a
exploração e aprofundamento do método, além da proposta de novas maneiras de análise de CO2 e
etanol nas amostras.
Como resultado significativamente positivo ressalta-se a adaptação do processo de coleta de
gases da fermentação empregando materiais facilmente disponíveis e de baixo custo, tornando-o
acessível a cervejarias de qualquer porte que deseje conhecer a composição específica de cada lote ou
batelada produzida e, à partir destas análises inferir sobre a qualidade de seus produtos, bem como
podendo-se aprimorar os processos produtivos, de controle de matérias primas, bem como reduzindo-
se o descarte de materiais nocivos ao meio ambiente.
6 REFERÊNCIAS
CERVBRASIL- ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA INDÚSTRIA DA CERVEJA. CervBrasil Lança
Anuário de 2015. Disponível em <http://www.cervbrasil.org.br/paginas/index.php?page=anuario-
2015> Acesso em 28 Maio de 2018.
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Revista dos Estudos Acadêmicos Interdisciplinar, 2017.
DIAS, W. J. ORSAT- Manual de Procedimentos de Amostragem, Energetica,2012. Disponivel em
<http://www.energetica.ind.br/wp/env1/wp-
content/uploads/2016/01/Manual_Orsat_Rev_00.pdf>Acesso em abril, 2018.
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78
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Reutilização de seringas de coleta na metodologia para o estudo do metano emitido por corpos
hídricos. Revista Biociências, Taubaté, v. 18, n.2, 2012
SCHNEIDER, S. C. R. Métodos Para A Remoção De Sulfeto De Hidrogênio De Efluentes Gasosos
Aplicáveis A Reatores Anaeróbios. N. 1. Santa Cruz do Sul. Revista Jovens Pesquisadores. 2012. P
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SIQUEIRA, B. P. O Processo de Fabricação da cerveja e seus Efeitos na Presença de polifenóis.
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Sulfeto de Hidrogênio de Efluentes Gasosos Aplicáveis a Reatores Anaeróbios. N. 1, Santa Cruz
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WUTTKE, C. Estudo de caso: Avaliação da formação de SO2 na etapa de fermentação em uma
cervejaria do RS. UFRGS. Porto Alegre. 2018. 34 p.
79
OBTENÇÃO DE CERVEJA DE BAIXO TEOR ALCOÓLICO UTILIZANDO
BANANA COMO ADJUNTO DO MALTE
ELIAS, Amanda Monteiro1
BRANDÃO, Eduardo Haberbeck2
ALMEIDA e SILVA, João Batista de3
Resumo: A cerveja é tradicionalmente produzida com cevada malteada, água, lúpulo e
leveduras, Parte do malte pode ser substituído por adjuntos. Isso permite reduzir despesas
bem como acrescentando sabor, aroma e cor às cervejas. Avaliou-se os seguintes parâmetros
da banana Prata utilizada como adjunto: pH (4,8), sólidos solúveis totais (21,4ºBrix), acidez
titulável total (0,78% ácido málico/100g de polpa). Objetivando a produção de cerveja de
baixo teor alcoólico foram produzidas cervejas nas proporções malte/banana de 65/35 e 45/55
utilizando a temperatura de mosturação de 65ºC durante 1 hora. Todas as cervejas produzidas
apresentaram rendimento da fermentação semelhante (0,41 (g/g)), sendo a eficiência de
transformação dos açúcares em álcool de 82,7%. Os graus de fermentação aparente dos
mostos nas proporções malte/banana de 65/35, 45/55 e puro malte foram 83,3%, 81,9% e
67,2%, enquanto os graus de fermentação real foram 67,5%, 66,3% e 54,4%, respectivamente.
Os teores alcoólicos das cervejas obtidas ficou em torno dos 2% (v/v) (1,81% e 1,99%,
respectivamente) e o tempo de fermentação foi de aproximadamente de 144h para as duas
proporções estudadas. Foi verificado queda no valor do pH, o que é esperado durante a
fermentação devido a liberação de ácidos orgânicos produzidos. Analises de FAN mostraram
que os mostos com proporções malte/banana de 65/35, 45/55 e 100/00 apresentaram teores de
aminoácidos de 200,19, 112,08mg/L e 118,65mg/L respectivamente. Comprovando que não
houve carência na quantidade de aminoácidos livres disponível para a levedura nos mostos
com banana. Foi possível produzir uma cerveja de baixo teor alcoólico e não adocicada.
Palavras chaves: cerveja, baixo teor alcoólico, adjuntos, banana Prata.
1Amanda Monteiro Elias – Graduada em Engenharia Química pela FAENQUIL, Engenheira de Segurança pelo
PECE/PROMINP/POLI – USP, Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Biotecnologia Industrial da
Escola de Engenharia de Lorena da Universidade de São Paulo (EEL – USP), Campus Lorena/SP - Brasil.
[email protected] 2*Eduardo Haberbeck Brandão: Técnico em Química pela ECOMPO – Engenheiro de Alimentos pela UEPG –
Especialista em Gestão da Qualidade e Segurança dos Alimentos pela UNICAMP – Mestre em Processamento
de Materiais e Catálise pela UNIVAP – Engenheiro de Segurança do Trabalho Pela UNIP - Doutorando no
Programa de Pós-Graduação em Biotecnologia Industrial da Escola de Engenharia de Lorena da Universidade de
São Paulo (EEL – USP), Campus Lorena/SP - Brasil
Endereço postal: Rua Trajano Vieira de Macedo, 132 - CEP:12240-090 – Jd. das Industrias – São José dos
Campos/SP - Brasil – Tel: (12) 982386972 - [email protected] 3João Batista de Almeida e Silva – Engenheiro Químico pela pela FAENQUIL – Mestre em Ciência e
Tecnologia de Alimentos pela UFV – Doutor em Tecnologia Bioquímica Farmacêutica pela USP – Livre-
Docente pela Esalq – USP – Prof. Dr. da Escola de Engenharia de Lorena da Universidade de São Paulo (EEL –
USP), Campus Lorena/SP - Brasil. [email protected]
80
1. INTRODUÇÃO
O Brasil é o terceiro maior produtor de cerveja do mundo, atrás de Estados Unidos e China.
Na última década, a produção de cerveja no Brasil cresceu 61%, saltando de 8,2 bilhões para 13,4
bilhões de litros anuais, sendo a bebida preferida por 65% dos brasileiros (SICOBE, 2016). Mesmo
estando entre os 30 maiores consumidores de cerveja do mundo, o principal mercado consumidor da
cerveja brasileira é a América do Sul, especialmente Paraguai, Bolívia, Peru, Colômbia e Suriname
(CERVBRASIL, 2016).
No Brasil, as microcervejarias começaram a surgir na década de 90 e hoje já são mais de 300
companhias, atuando no mercado premium (em torno de 2% do mercado total de cerveja), com
estimativa de crescimento em torno de 20% para os próximos cinco anos (SEBRAE, 2016). As
denominadas cervejas premium utilizam ingredientes de melhor qualidade e possuem sabores
diferenciados por usarem ingredientes variados. Cervejas de baixo teor alcoólico/sem álcool também
têm obtido crescente procura, seja em função de questões relacionadas à saúde ou ainda considerando
a vigência da chamada ―Lei Seca‖ que proíbe o consumo de bebidas alcoólicas quando se está
dirigindo (VALENTE JUNIOR & ALVES, 2016). E embora o consumo de cerveja aconteça
principalmente em momentos de relaxamento e diversão, diversos estudos (BAMFORTH, RUSSEL &
STEWART, 2009; SOHRAVANDI, MORTAZAVIAN & REZAEI, 2012; GAETANO et al., 2016;
OLIVEIRA NETO et al., 2017) apontam seus benefícios para a saúde humana. A bebida possui
diversas substâncias antioxidantes, flavonóides, minerais diversos e vitaminas do complexo B.
A cerveja é uma bebida resultante da fermentação por leveduras cervejeiras, do mosto de
cevada malteada ou do extrato de malte, submetido previamente a um processo de cocção, adicionado
de lúpulo. Outras matérias-primas, denominadas adjuntos, também podem ser utilizadas, não podendo
ultrapassar 45% em relação ao extrato primitivo, segundo a lei brasileira. Consideram-se adjuntos a
cevada e os demais cereais aptos ao consumo humano, malteados ou não, bem como amidos e
açúcares de origem vegetal (BRASIL, 2009). O uso de adjunto na cerveja resulta em um produto com
alta estabilidade física, com maior brilho e resistência à formação de turbidez devido ao resfriamento,
além de acrescentar sabor às cervejas com baixos teores alcoólicos (BOTELHO, 2009). A elaboração
desse tipo de cervejas especiais vem se tornando uma solução de barateamento na produção de cerveja
devido à substituição de parte do malte, acrescentando, ainda, atributos sensoriais característicos aos
produtos obtidos (CARVALHO et al., 2011).
A banana foi escolhida como adjunto devido à grande importância econômica para o Brasil, e
além de ser uma matéria-prima fermentescível rica em carboidratos, vitaminas e outros nutrientes, é
uma fruta tropical com excelentes características de aroma, sabor e textura, tendo grande aceitação no
mercado mundial. Diante da grande oferta de um produto perecível, sujeito a flutuações de preços, a
implantação de unidades industriais nas regiões produtoras é uma prática necessária e viável para o
81
aproveitamento dos excedentes de produção, com geração de renda e emprego. Além disso, o
processamento da banana se apresenta como uma alternativa para o aproveitamento dos frutos
excedentes ou fora dos padrões exigidos pelo mercado, possibilitando a diminuição de perdas pós-
colheita, agregando valor ao produto (SEBRAE, 2017).
A produção de cerveja utilizando banana como adjunto de malte acrescenta características
sensoriais e nutritivas à bebida, principalmente em relação ao conteúdo de minerais como o sódio e
potássio. Assim, uma das propostas deste projeto é desenvolver uma bebida com menor teor alcoólico
que possa ser consumida por pessoas que praticam atividade física. Pesquisas desenvolvidas por
DESBROW et al. (2015) e WIJNEN et al. (2016) mostraram que após a prática exaustiva de atividade
física, a ingestão de quantidades moderadas de cerveja com baixos teores alcoólicos promove a
reidratação e recuperação mais rápida do atleta, se comparada com a ingestão de água.
Entretanto, um dos grandes problemas na produção de cerveja sem álcool ou com baixos
teores alcoólicos está relacionado ao sabor, e as pesquisas e desenvolvimento de cervejas buscam
soluções para este problema. A cerveja com baixo ou nenhum teor de etanol pode ser produzida por
dois métodos: 1) por meio da remoção desse composto a partir de cervejas normais, utilizando
métodos de destilação; 2) mosturação ou fermentação em situações adversas para limitar a formação
do álcool (SILVA et al., 2010; BRANYIK et al., 2012). Neste caso, podem ser utilizadas técnicas
adequadas durante a mosturação, que permitem menor liberação de açúcares fermentescíveis no
mosto, ou removendo-se as leveduras antes que o consumo de substratos seja total durante a
fermentação ou ainda são criadas condições que restrinjam o metabolismo microbiano (HENDGES,
2014). As cervejas sem álcool quando produzidas por fermentação interrompida são normalmente
caracterizadas por um sabor de mosto e pela perda do aroma frutal, esse último encontrado em
cervejas com teores alcoólicos maiores comercializadas. Tais defeitos podem ser originados de um
procedimento de fermentação que não reduz suficientemente as combinações químicas responsáveis
pelo sabor de mosto (aldeídos), e também pela produção limitada dos ésteres e dos álcoois superiores
(SILVA et al., 2010; BRANYIK et al., 2012).
Assim, o presente trabalho dá continuidade à linha de pesquisa iniciada em 1997 no grupo de
Microbiologia Aplicada e Bioprocessos do Departamento de Biotecnologia da Escola de Engenharia
de Lorena (EEL) da Universidade de São Paulo (USP), utilizando adjuntos não convencionais,
aromatizando ou não a cerveja, para a obtenção de cervejas especiais. Além disso, a escolha do
desenvolvimento de uma cerveja de baixo teor alcoólico utilizando como adjunto do malte banana foi
pensada para estudar alguns fatores do processo fermentativo para a produção de cervejas de baixo
teor alcoólico, criando uma alternativa a mais para a utilização da banana, agregando valor ao produtor
em um mercado específico em franco crescimento.
82
2. OBJETIVOS
Produzir cerveja com baixo teor alcoólico utilizando banana prata madura em diferentes
proporções como adjunto de malte, avaliando suas características físico-químicas, contribuindo assim
para o desenvolvimento de bebidas funcionais e para o aprimoramento da tecnologia de produção de
cervejas com adjuntos não convencionais.
3. MATERIAL E MÉTODOS
Os experimentos foram realizados na Planta Piloto de Bebidas do Departamento de
Biotecnologia da Escola de Engenharia de Lorena, da Universidade de São Paulo – campus I da EEL-
USP.
A água utilizada para a produção de cerveja é do poço artesiano localizado no campus I da
EEL-USP. O malte de cevada usado foi do tipo Pilsen. A moagem do malte foi realizada através da
passagem dos grãos por um moinho de rolos motorizado com um espaçamento de 0,7 mm entre os
rolos. O lúpulo utilizado foi o Zeus T-90, sob a forma de pellets, para amargor e aroma. A levedura
cervejeira utilizada foi a linhagem da espécie Saccharomyces cerevisiae de baixa fermentação (lager)
– PPB-01, pertencente ao banco da Planta Piloto de Bebidas da EEL-USP.
O adjunto de malte foi preparado a partir de bananas do tipo Prata (Musa SP), no estágio E7
de maturação, com base na escala de Von Loesecke (PBMH & PIF, 2006). As bananas foram lavadas
com água corrente e sabão neutro para remover resíduos e trituradas em um aparelho Walita Mixer
para incorporação na composição do mosto. Os sólidos solúveis da banana foram quantificados com
auxílio de um refratômetro digital portátil, utilizando a polpa após a trituração e diluição em água
destilada (1:1). Os resultados foram expressos em graus Brix (AOAC, 1992). A determinação do teor
de umidade foi realizado colocando-se 5g de polpa em balança da marca Denver Instruments IR-30 a
105ºC até massa constante (EBC, 2005). O procedimento foi realizado em triplicata. A determinação
do pH foi realizada com um pHmetro da marca MARCONI, modelo MA522. A determinação da
acidez titulável total (ATT) foi realizada colocando-se 5g da polpa homogeneizada em um béquer e
adicionado água destilada até um volume final de 100mL. A solução foi então titulada com hidróxido
de sódio 0,1M. A porcentagem de ácido málico (g de ácido málico/100g de polpa de banana fresca) foi
determinada de acordo com Instituto Adolfo Lutz (2008).
Serão produzidas cervejas com baixos teores alcoólicos utilizando diferentes proporções de
malte/banana, segundo a norma EBC (2005), com adaptações. A Tabela 1 mostra as condições de
mosturação e as proporções malte/banana que foram utilizadas. Mosto puro malte foi utilizado como
controle e os ensaios foram realizados em duplicata.
83
Tabela 4: Temperatura, tempo e proporções
malte/banana utilizadas na mosturação
Temperatura/Tempo Malte Banana
65ºC/1h 45% 55%
65% 35%
Fonte: Arquivo pessoal.
No processo de mosturação, inicialmente foi aquecida água primária a 35ºC e em seguida
adicionado o malte e a polpa de banana. Foram produzidos 5L de cada mosto em panela adaptada para
esse fim. Ao final de uma hora de mosturação a 65ºC, as temperaturas dos mostos foram elevadas a
78ºC durante 10 minutos para inativação das enzimas. Ao término da mosturação, o mosto primário
foi filtrado e a camada filtrante formada pela casca do malte de cevada foi lavada com água secundária
a 80ºC. A água secundária tem a função de extrair os açúcares residuais ainda presentes nas cascas do
malte. O mosto obtido após a filtração foi aquecido até a fervura e mantido nessas condições até que a
concentração de sólidos solúveis atingisse 3,5ºP de extrato original, calculado em função da obtenção
de uma bebida com teor de 2% (v/v) de álcool final. No início da fervura foi adicionado lúpulo na
forma de pellets na proporção de 0,9g/L de mosto e à aproximadamente 20 minutos do final da fervura
foi adicionado novamente lúpulo na mesma proporção. Após o término da fervura os mostos foram
resfriados até atingir 12ºC, temperatura que propicia a decantação do trub (complexo insolúvel
formado por proteínas do malte e polifenóis do lúpulo). Em seguida os mostos foram divididos e
transferidos para os recipientes de fermentação.
As fermentações foram realizadas em recipientes de PVC com capacidade para 2,5L, contendo
2,3L de mosto malte/banana a 3,5ºP de concentração. Os garrafões foram inoculados com a levedura e
mantidos em geladeira a 9ºC até que a concentração de açúcares atingisse uma concentração constante,
indicando o final do processo fermentativo. O rendimento aparente da fermentação foi calculado pela
diferença de extrato antes da fermentação (extrato original) e depois da fermentação (extrato aparente).
Durante o processo de fermentação foram retiradas 10mL de amostras, periodicamente a cada 6 horas,
durante as 48 horas iniciais e depois, a cada 12 horas. As amostras foram centrifugadas em tubos
falcon a 5.000rpm por 10min em centrífuga CIENTEC, modelo CT 5000d e transferidas para outros
tubos falcon.
Após o término da fermentação, as cervejas foram transferidas para outro recipiente
semelhante, tomando-se o cuidado de retirar o excesso de leveduras. A cerveja foi deixada maturar
durante 7 dias, em temperatura próxima a 0ºC, visando a sedimentação de células, colóides e outras
substâncias presentes. Após esse período, as cervejas foram engarrafadas e tampadas em garrafas de
vidro de 600mL, contendo solução de açúcar na concentração de 5g/L de cerveja. A cerveja
84
engarrafada sofreu uma fermentação secundária por um período mínimo de 14 dias a temperatura
ambiente, resultando na sua carbonatação.
As concentrações de extratos fermentescíveis e FAN – aminoácidos nitrogenados livres –
foram realizadas segundo a norma EBC (2005) e as análises de pH realizadas em pHmetro da marca
MARCONI, modelo MA522. As amostras foram centrifugadas em tubos falcon a 5.000rpm por 10min
em centrífuga CIENTEC, modelo CT 5000d e transferidas para outros tubos falcon. O fator de
conversão de extrato em álcool foi determinado segundo a Equação 1.
Y(p/s) =
[g/g] (1)
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A banana utilizada foi a da variedade Prata, muito madura com a casca completamente tomada
pelas manchas de coloração marrom. As medidas de pH, sólidos solúveis totais, acidez titulável total e
umidade da banana estão apresentadas na Tabela 2 abaixo.
Tabela 2. Características da banana utilizada como adjunto do malte
Parâmetros Medições
pH 4,8±0,2
SST 21,4±0,01 ºBrix
ATT 0,78±0,05 (% ácido málico/100 g polpa)
Umidade 73,3±0,45%
Fonte: Arquivo pessoal. SST – sólidos solúveis totais, ATT – acidez titulável total.
Os valores de pH e sólidos solúveis totais encontrados ficaram bem próximos aos valores
encontrados por outros pesquisadores (CANO et al., 1997; PINHEIRO, 2004; NASCIMENTO
JUNIOR et al., 2010; CARVALHO, 2009; TUFALO et al., 2010) para bananas do tipo Prata maduras.
O pH ácido do fruto maduro e a redução da adstringência também está associado ao acúmulo de
açúcares solúveis, precursores dos ácidos orgânicos, como o ácido málico, provenientes da
transformação do amido.
O teor de sólidos solúveis aumenta com o estágio de maturação do fruto em decorrência da
hidrólise do amido, precursor dos açúcares glicose, maltose e dextrinas. Na literatura foram
encontrados valores que oscilaram de 19,72 a 22,36°Brix para o fruto maduro. A intensificação da
doçura dos frutos decorre da hidrólise do amido, com consequente acúmulo de açúcares solúveis,
principalmente glicose, frutose e sacarose.
85
A acidez total titulável está associada ao aumento da concentração de ácido málico e mede o
grau de maturação do fruto. Segundo Bleinroth et al. (1995), a banana no estágio verde caracteriza-se
por apresentar uma baixa acidez, aumentando com o decorrer do amadurecimento, até atingir um
máximo, quando a casca está totalmente amarela, decrescendo em estágios mais avançados. Valores
encontrados na literatura por CANO et al. (1997) e NASCIMENTO JUNIOR et al. (2010) foram
menores do que os encontrados neste trabalho (0,57% e 0,66% por 100g de polpa, respectivamente).
Isso provavelmente pode ser devido ao grau de amadurecimento das bananas utilizadas, que foi muito
maduro. Segundo NASCIMENTO JUNIOR et al. (2010) em estágios muito maduros, quando começa
a senescência do fruto, há aumento substancial da liberação dos compostos voláteis, principalmente
ésteres da classe dos acetatos e butiratos, como por exemplo, o acetato de isoamila e o 3-metil-
butanoato, responsáveis pelo aroma característico da banana.
Com o decorrer do processo de maturação do fruto, a umidade na polpa da banana tende a
aumentar. Isso ocorre porque a hidrólise do amido em açúcar solúvel causa um aumento da pressão
osmótica na polpa, fazendo com que a água migre da casca, menos rica em açúcares, em direção à
polpa. CARVALHO (2009) encontrou valores de umidade menores (65,12%) para a banana madura,
provavelmente devido ao fato da banana utilizada estar em um estágio mais maduro. BLEINROTH et
al. (1995), MATTOS et al. (2010) e EMBRAPA (2012) relataram valores variando de 70% a 75% de
umidade quando completamente madura.
Ainda segundo CARVALHO (2009), a elevada viscosidade pode tornar a filtração após a
mosturação mais lenta. Isso de fato ocorreu durante as filtrações, principalmente no mosto contendo a
proporção de 45/55 malte/banana. A torta resultante possuía um aspecto viscoso, assemelhando-se a
um ‗mingau‘ de banana. A cor do mosto produzido com banana como adjunto é ligeiramente mais
escura do que aquela obtida por mosturações tradicionais com malte de cevada ou por processos
comerciais tradicionais. Essa observação está de acordo com CARVALHO (2009) e provavelmente é
resultado de enzimas presentes na própria fruta tais como a polifenol oxidase, responsável pelo
aparecimento da coloração escura. Ainda não está claro se existe uma relação direta entre a
concentração de banana como adjunto e a coloração do mosto obtido quando é utilizado o fruto.
Em todas as proporções malte/banana estudadas o rendimento da fermentação foi semelhante
(0,41 (g/g)), sendo a eficiência de transformação dos açúcares em álcool de 82,7%. Os graus de
fermentação aparente dos mostos nas proporções malte/banana de 65/35, 45/55 e puro malte foram
83,3%, 81,9% e 67,2%, enquanto os graus de fermentação real foram 67,5%, 66,3% e 54,4%,
respectivamente.
A Figura 1 apresenta a evolução da concentração do extrato original do mosto, da
concentração de etanol, do pH e do grau de fermentação aparente do mosto na proporção malte/banana
de 65/35, utilizando a levedura Saccharomyces cerevisiae PPB01 e temperatura de fermentação de
9ºC. Verifica-se o consumo de substrato desde o início do processo, com concomitante queda no pH
86
do mosto. Porém, com 84 h do início da fermentação, o valor do pH manteve-se constante. A queda do
pH é decorrente da produção de ácidos orgânicos, como o ácido lático, acético e succínico produzidos
como subprodutos e excretados pelas leveduras (AIZEMBERG, 2015).
Figura 1: Concentração de extrato, concentração de etanol, pH e grau de fermentação
aparente do mosto na proporção malte/banana de 65/35
Fonte: arquivo pessoal.
A formação de álcool na fermentação do mosto cervejeiro está diretamente ligada à ação das
enzimas α-amilase (degradação do amido em dextrinas) e β-amilase (hidrólise do amido em maltose)
que possuem atividade ótima nas temperaturas de 72º e 62ºC, respectivamente. Entretanto, conforme a
temperatura do mosto sobe, cerca de 1ºC/min, até alcançar a temperatura de 65ºC e em seguida a
temperatura de 78ºC, necessária para a inativação das enzimas presentes, as enzimas atuam mesmo
que não por tempos prolongados e nem na temperatura ótima de ação (KUNZE, 1999; TSCHOPE,
2001).
A Figura 2 apresenta a evolução da concentração do extrato original do mosto, da
concentração de etanol, do pH e do grau de fermentação aparente do mosto na proporção malte/banana
de 45/55, utilizando a levedura Saccharomyces cerevisiae PPB01 e temperatura de fermentação de
9ºC. Verifica-se o consumo de substrato desde o início do processo, com concomitante queda no pH
do mosto, como no mosto anterior. Entretanto, apenas com 96 horas do início da fermentação, o valor
do pH manteve-se constante. Quanto ao consumo de extrato aparente, a atenuação é mais acentuada.
87
Figura 2: Concentração de extrato, concentração de etanol, pH e grau de
fermentação aparente do mosto na proporção malte/banana de 45/55
Fonte: arquivo pessoal.
Em concordância com CARVALHO (2009) a banana prata muito madura confirmou a
presença de carboidratos disponíveis em quantidades substanciais demonstrando seu potencial como
adjunto do malte no processo cervejeiro, possibilitando a elaboração de uma cerveja com atributos
sensoriais característicos. A vantagem na utilização da banana é que ela possui um baixo teor de
amido quando nos estágios de maturação mais avançados, como é o caso deste estudo. Assim, devido
ao poder diastático do malte, o tempo de hidrólise do amido durante a mosturação não foi alterado, já
que as próprias enzimas do malte foram responsáveis pela hidrólise do amido da banana.
Entretanto, quando são utilizados adjuntos que acrescentam grandes porcentagens de
fermentescíveis ao mosto e em grandes proporções, o acentuado desvio da composição clássica do
mosto pode ocasionar efeitos negativos devido ao incremento desproporcional dos açúcares
fermentescíveis e a sensível diminuição do nitrogênio assimilável pela levedura, já que os adjuntos
podem ser considerados diluidores de todos os componentes do mosto cervejeiro, menos os açúcares
(VENTURINI FILHO & CEREDA, 2001; CARVALHO, 2009; CASTRO, 2014). Pela análise desses
resultados isso não ocorreu nos mostos estudados. A banana possui carboidratos como glicose, frutose
e sacarose, assimiláveis pela levedura, minerais e proteínas como a albumina, globulina e diversos
aminoácidos, dentre eles, a lisina, aminoácido fundamental no desenvolvimento celular (HENDGES,
2014). A Tabela 3 apresenta os valores de FAN para os mostos preparados nas diferentes proporções
malte/banana. Em média, a levedura utiliza de 10 a 14mg de nitrogênio amínico na forma de
aminoácidos e pequenos peptídeos por 100mL de mosto (KUNZE, 1999).
88
Tabela 3: Teor de aminoácidos livres (FAN) nos
mostos de diferentes proporções malte/banana
Tempo de
fermentação (h)
FAN (mg/L)
Proporção malte/banana
65/35 45/55
0 200,19 156,14
124,93
88,12
80,75
76,45
73,85
73,54
73,25
68,09
68,06
67,95
67,14
64,84
64,84
64,27
63,96
63,49
12 198,04
24 177,88
36 176,12
48 174,54
60 171,47
72 166,73
84 157,95
96 144,42
108 140,02
120 137,17
132 126,89
144 123,79
156 -
168 -
180 -
192 -
Fonte: arquivo pessoal.
O teor de FAN no mosto controle, puro malte, foi de 118,65mg/L, enquanto que nos mostos
nas proporções 65/35 e 45/55 foram 200,19 e 156,14mg/L respectivamente. Ou seja, em todas as
proporções estudadas a quantidade de aminoácidos livres estão dentro da quantidade adequada para a
levedura realizar a fermentação. A Figura 3 relaciona os teores de FAN durante a fermentação
realizada a 9ºC, confirmando que não houve desbalanceamento nutricional nos mostos estudados.
89
Figura 3: Tempo de fermentação x FAN nos mostos fermentados
a 9ºC
Fonte: arquivo pessoal.
Embora os teores de FAN tenham sido menores nos mostos com maiores proporções de
banana, não houve carência de aminoácidos livres para a levedura realizar a fermentação,
sendo que todas as cervejas produzidas apresentaram teor alcoólico próximo ao desejado.
5. CONCLUSÃO
A investigação dos parâmetros físico-químicos na produção de cervejas de baixos teores
alcoólicos em que são adicionados quantidades maiores de adjuntos é de relevância já que esse fator
irá determinar a quantidade de extrato original a ser adicionada para a obtenção do produto final.
Assim, a mosturação realizada a 65ºC favoreceu a atividade da enzima beta-amilase, proporcionando a
sacarificação do mosto pela liberação de extrato fermentescível em quantidade suficiente para a
levedura produzir a quantidade de álcool desejada, possibilitando a produção de uma cerveja de baixo
teor alcoólico, sem que a cerveja resultante ficasse com sabor adocicado.
Em concordância com Carvalho (2009) a banana prata muito madura confirmou a presença de
carboidratos disponíveis em quantidades substanciais demonstrando seu potencial como adjunto do
malte no processo cervejeiro, possibilitando a elaboração de uma cerveja com atributos sensoriais
característicos. Além disso, não houve carência de aminoácidos livres para a levedura realizar a
fermentação, sendo que todas as cervejas produzidas apresentaram teor alcoólico próximo ao desejado.
6. REFERÊNCIAS
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94
OTIMIZAÇÃO DO PROCESSO DE MOSTURAÇÃO UTILIZANDO FEIJÃO PRETO
(Phaseolus Vulgaris Black Turtle) COMO ADJUNTO PARA PRODUÇÃO DE
CERVEJA
BRANDÃO, Eduardo Haberbeck1
SANTOS, Gustavo Rodrigues dos2
ELIAS, Amanda Monteiro3
ALMEIDA e SILVA, João Batista de4
Resumo: Nas últimas décadas, houve um aumento notável no universo cervejeiro e, junto com isso, o
crescimento do mercado de cervejas especiais que utilizam diferentes adjuntos cervejeiros
convencionais e não convencionais (como trigo, arroz, banana, canela ou arroz preto), visando a
obtenção de características sensoriais diferentes, aliado à redução de custos pela diminuição do uso de
malte de cevada. Nesse cenário, o feijão surge como alternativa de adjunto para a produção de cerveja.
O mesmo possui aproximadamente 30% de amido, não possui glúten, possui baixo teor de gorduras e
possui cascas com compostos que podem conferir coloração e aromas diferenciados ao produto. O
principal objetivo deste trabalho foi desenvolver e otimizar um processo de mostura (também
chamado de sacarificação) (também conhecido como mosturação) utilizando feijão preto (Phaseolus
Vulgaris Black Turtle) como adjunto na produção de cerveja.
Foram realizados 10 testes de mosturação para volume final de 250 mL de mosto, todos com a
proporção feijão e malte de cevada de ⅓ e ⅔ respectivamente, variando-se os pré-tratamentos do feijão
e as rampas de mosturação. A secagem, a maceração e a remoção de cascas se mostraram ineficientes
na inativação de inibidores enzimáticos. Em contrapartida o pré-cozimento do feijão se mostrou de
suma importância para viabilizar a sacarificação. Das rampas de mosturação testadas a mais eficiente
foi: 52ºC por 20 min, 62ºC por 30 min, 70ºC por 30 min e 80ºC por 15 min. Foi possível extrair
aproximadamente 30% de sólidos solúveis do feijão.
Palavras-chave: Cerveja, mosturação, feijão preto, adjunto, Phaseolus vulgaris.
1*Eduardo Haberbeck Brandão: Técnico em Química pela ECOMPO – Engenheiro de Alimentos pela UEPG –
Especialista em Gestão da Qualidade e Segurança dos Alimentos pela UNICAMP – Mestre em Processamento
de Materiais e Catálise pela UNIVAP – Engenheiro de Segurança do Trabalho pela UNIP - Doutorando no
Programa de Pós-Graduação em Biotecnologia Industrial da Escola de Engenharia de Lorena da Universidade de
São Paulo (EEL – USP), Campus Lorena/SP - Brasil.
Endereço postal: Rua Trajano Vieira de Macedo, 132 - CEP:12240-090 – Jd. das Industrias – São José dos
Campos/SP - Brasil – Tel: (12) 982386972 - [email protected] 2Gustavo Rodrigues dos Santos - Cervejeiro Artesanal pelo INEAD - Graduando em Engenharia Bioquímica da
Escola de Engenharia de Lorena da Universidade de São Paulo (EEL – USP), Campus Lorena/SP - Brasil.
[email protected] 3Amanda Monteiro Elias – Graduada em Engenharia Química pela FAENQUIL, Engenheira de Segurança pelo
PECE/PROMINP/POLI – USP, Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Biotecnologia Industrial da
Escola de Engenharia de Lorena da Universidade de São Paulo (EEL – USP), Campus Lorena/SP - Brasil.
[email protected] 4João Batista de Almeida e Silva – Engenheiro Químico pela pela FAENQUIL – Mestre em Ciência e
Tecnologia de Alimentos pela UFV – Doutor em Tecnologia Bioquímica Farmacêutica pela USP – Livre-
Docente pela Esalq – USP – Prof. Dr. da Escola de Engenharia de Lorena da Universidade de São Paulo (EEL –
USP), Campus Lorena/SP - Brasil. [email protected]
95
1. INTRODUÇÃO
1.1. CERVEJA
De acordo com o decreto Nº 6.871, de 4 de junho de 2009, que regulamenta a lei n° 8.918, de
14/07/1994 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, a cerveja é definida como ―a
bebida obtida pela fermentação alcoólica do mosto cervejeiro, oriundo do malte de cevada e água
potável, por ação de levedura, com adição de lúpulo‖.
Na elaboração de cerveja, o malte de cevada e o lúpulo poderão ser substituídos por seus
respectivos extratos. Parte do malte de cevada pode ser substituído por adjuntos cervejeiros, cujo
emprego não pode ser superior a 45% em relação ao extrato primitivo, pois nesse caso a bebida não
pode mais ser chamada de cerveja.
Consideram-se adjuntos cervejeiros a cevada cervejeira e os demais cereais aptos para o
consumo humano, maltados ou não-maltados, bem como os amidos e açúcares de origem vegetal
(D‘AVILA et al, 2012).
A utilização de adjuntos na composição da cerveja possui o intuito de modificar suas
características sensoriais além de poder contribuir para diminuição do preço da bebida, uma vez que os
maltes utilizados em grandes cervejarias são importados de outros países.
1.2. PROCESSOS DE PRODUÇÃO DE CERVEJAS
O processo de produção de cerveja é composto pelas seguintes etapas: moagem, mosturação,
filtração ou clarificação do mosto, fervura, resfriamento do mosto, fermentação, maturação, filtração e
envase, que serão abordadas com mais detalhes a seguir (Figura 1).
96
Figura 8: Esquema simplificado do processo cervejeiro convencional
Fonte: Modificado (LINKO et al., 1998).
A primeira etapa consiste em quebrar os grãos de malte e de outros cereais com a finalidade de
expor e triturar o endosperma amiláceo, e assim facilitar a ação das enzimas na etapa seguinte
(TSCHOPE, 2001; MORADO, 2009).
Na mosturação, a água primária é adicionada ao malte moído e esta mistura é submetida a
temperaturas controladas para ação das diferentes enzimas do malte (Tabela 1) (TSCHOPE, 2001;
MORADO, 2009). Segundo Brandam et al. (2003), as principais reações enzimáticas que ocorrem
durante a mosturação são a hidrólise do amido em carboidratos fermentáveis, a hidrólise de proteínas
em aminoácidos livres e a degradação das cadeias de β-glucano.
97
Tabela 1: Temperaturas de ativação das enzimas presentes no malte de cevada.
Enzima
Temperatura
Ótima na
Mosturação (°C)
pH Ótimo na
Mosturação Substrato Produto
Hemicelulase 40 - 45 4,5 - 4,7 Hemicelulose Glucanos
Endopeptidases 45 - 50 3,9 - 5,5 Proteínas Peptídeos e
Aminoácidos Livres
Exopeptidases 40 - 50 5,2 - 8,2 Proteínas Aminoácidos Livres
α-amilases 65 - 75 5,6 - 5,8
α-Glucanos de
Baixo Peso
Molecular
Dextrinas
β-amilase 60 - 65 5,4 - 5,6 α-Glucanos Maltose
Dextrinase Limite 55 - 65 5,1 Dextrina Limite Dextrina
Fonte: Adaptado (TSCHOPE, 2001)
Para abranger o perfil de temperatura ótima de cada enzima, a mosturação é geralmente
operada com sucessivos descansos entre os aumentos de temperatura: primeiro descanso a 50°C para a
hidrólise de proteínas e de β- glucanos, segundo descanso a 65°C para a sacarificação, e aumento final
da temperatura a 76°C com o objetivo de assegurar a dissolução final de pequenos grãos de amido
(BRANDAM et al., 2003). No entanto, o perfil da mosturação varia de acordo com o estilo de cerveja
a ser produzido (TSCHOPE, 2001; MORADO, 2009).
Após a mosturação, o mosto primário é separado da fração insolúvel do malte (bagaço de
malte) através da filtração. O principal objetivo da filtração é obter um mosto clarificado e extrair
açúcares fermentescíveis dos materiais sólidos residuais através da lavagem do bagaço com a água
secundária (DRAGONE; ALMEIDA e SILVA, 2010). Nessa etapa, a temperatura da água não deve
exceder 80°C para não extrair polifenóis em excesso, o que prejudica o sabor da cerveja (MORADO,
2009).
Notamos, portanto, que a ação das enzimas é a ―alma‖ do processo de mostura. Caso haja
qualquer inibidor enzimático nas matérias primas utilizadas, o processo todo será comprometido.
98
1.3. FEIJÃO
Segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento, o Brasil é o segundo maior
produtor mundial de feijão com uma produção 2017/2018 estimada em 3,12 milhões de toneladas
(CONAB, 2018) e em cerca de 3,4 milhões de toneladas em 2015 (CONAB, 2016). O feijão é
cultivado em sistemas diversificados por pequenos e grandes produtores, em todas as regiões
brasileiras, devido à sua facilidade de adaptação. O cultivo ocorre em três ciclos de semeadura-
colheita, o que torna o Brasil um dos maiores produtores mundiais (AIDAR, 2003).
Como o feijão é produzido em três safras ao longo do ano, sempre ocorrem perdas durante a
colheita, secagem, armazenamento e também algumas alterações em sua qualidade. Por isso, é
crescente o interesse em pesquisas sobre novas aplicações tecnológicas para minimizar as perdas
destes grãos e também sobre propriedades nutricionais. RIOS et al. (2003) avaliaram o efeito da
estocagem e das condições de colheita sobre algumas propriedades físicas, químicas e nutricionais de
três cultivares de feijão. PROLIA et al. (2010) avaliaram se a qualidade nutricional do feijão é
influenciada pelas condições de armazenamento entre outros aspectos. Outros autores tentando
aproveitar o feijão reportam a produção de isolados proteicos, processos de descascamento e
maceração de grãos, extração de amido e outras tecnologias (BOYE et al. 2010; BRIGIDE;
CANNIATTI-BRAZACA, 2011; RUIZ-RUIZ et al. 2012; BEDIN, 2014).
Intentando diminuir o custo na produção de cervejas, a indústria cervejeira habitualmente
utiliza como fonte de carboidratos adjuntos como o arroz, trigo, milho, sorgo, e também os adjuntos
designados como não convencionais como a banana, o arroz preto e a pupunha. Os adjuntos
geralmente são escolhidos pela disponibilidade regional, o que contribui ainda mais na redução de
custos e confere características regionais ao produto.
No caso do feijão, o mesmo possui composição centesimal variável, dependendo de vários
fatores como condições de plantio, armazenamento, variedade genética e espécie e outros fatores. De
um modo geral, o feijão apresenta cerca de 20% de proteína, sendo rico em aminoácidos essenciais
como a lisina. Os carboidratos ficam em torno de 60%, sendo o amido seu principal constituinte, e a
parte fibrosa corresponde a cerca de 25% (FIGUEROA, 2016). O feijão ainda apresenta baixo teor
lipídico e é uma excelente fonte de minerais como ferro, cálcio, zinco, fósforo, potássio e magnésio
(BONETT et al., 2007; SILVA, ROCHA, CANNIATTI-BRAZACA, 2009; PROLLA et al., 2010;
BOYE et al., 2010). Mais pesquisas investigando suas influências nas cervejas são necessárias.
99
1.3.1. Fatores Antinutricionais
O feijão também apresenta alguns fatores antinutricionais, como fitatos, inibidores de
proteases, compostos fenólicos, fibras e amidos resistentes, que podem ser modificados após o
processo de maceração e cozimento dos grãos (MECHI, CANNIATTI-BRAZACA, ARTHUR, 2005;
BONETT et al., 2007; PROLLA et al., 2010).
ÁCIDO FÍTICO
Além de representar a principal forma de armazenamento de fósforo em sementes de cereais e
leguminosas, juntamente com seus sais, o ácido fítico possui fator antinutricional baseado na
capacidade de formar complexos insolúveis com minerais e proteínas, diminuindo a
biodisponibilidade destes, além de inibir enzimas proteolíticas e amilolíticas (SILVA; SILVA, 1999;
DOMÍNGUEZ; GÓMEZ; LÉON, 2002).
O efeito da cocção do feijão como forma de processamento doméstico, causa redução no teor
de fitatos principalmente quando cozido sem a água de maceração. A maceração dos grãos contribui
para a redução no conteúdo de fitatos, podendo ser explicada pela lixiviação dos íons fitatos na água
sob a influência de um gradiente de concentração (RAMÍREZ-CÁRDENAS; LEONEL; COSTA,
2008).
INIBIDORES DE PROTEASES
Um dos fatores envolvidos na baixa biodisponibilidade de proteínas do feijão é a presença de
inibidores de proteases digestivas humanas, tripsina e quimotripsina (LAJOLO; GENOVESE;
MENEZES, 1996). Existem dois tipos de inibidores de proteases: o tipo Kunitz e o tipo Bowman-Birk.
Os Kunitz são termoestáveis, enquanto os Bowman-Birk são estáveis sob condições de processamento
normal. Assim, em geral, as proteínas dos grãos de feijão tratadas pelo calor são mais digeríveis do
que os isolados proteicos naturais (DAMODARAN, 2010).
Após cocção em água a 90°C por 15 minutos, a atividade do inibidor de tripsina reduziu
drasticamente entre 5 a 20%. A inativação dos inibidores de tripsina ocorre nos primeiros minutos do
tratamento térmico (JOURDAN; NOREÑA; BRANDELLI, 2007).
INIBIDORES DA ALFA-AMILASE
As α-amilases são enzimas largamente distribuídas na natureza, produzidas por animais, vegetais
(principalmente em sementes amiláceas, especialmente durante a germinação) e microrganismos. São
endocarboidrases que hidrolisam ligações α-1,4, existentes na amilase e na amilopectina de forma
aleatória, na porção central das moléculas (KOBLITZ, 2013).
100
Os inibidores da α-amilase são glicoproteínas que inibem a ação catalítica dessas enzimas,
sendo capazes de retardar a ação das amilases de insetos e mamíferos (LAJOLO; GENOVESE;
MENEZES, 1996).
A extrusão em farinhas de feijão sobre o teor de antinutricionais, causa uma redução
significativa nos teores de inibidores de α-amilase (BATISTA; PRUDÊNCIO; FERNANDES, 2011).
COMPOSTOS FENÓLICOS - TANINOS
Compondo uma pequena parte de um amplo grupo de compostos fenólicos produzidos como
metabólitos secundários por plantas, os taninos são flavonóides poliméricos. Nos feijões, encontram-se
principalmente no tegumento e, juntamente com as antocianinas, determinam a tonalidade e
intensidade da cor das sementes (DÍAZ; CALDAS; BLAIR, 2010).
O feijão quando macerado, cozido em outra água, apresenta teores de taninos menores do que
os do feijão cozido na mesma água de maceração. Porém, o cozimento sem maceração prévia é mais
efetivo para redução do conteúdo de taninos, devido ao fato de ser maior o tempo de exposição das
amostras ao calor para cocção (TOLEDO, T. C. F.; CANNIATTI-BRAZACA, 2008).
2. OBJETIVO
Desenvolver um processo de mosturação (sacarificação) de feijão (Phaseolus Vulgaris Black
Turtle) como adjunto para produção de cerveja.
3. MATERIAL E MÉTODOS
O trabalho foi desenvolvido nas instalações da Planta Piloto de Bebidas do Departamento de
Biotecnologia da Escola de Engenharia de Lorena-USP.
3.1. MATERIAL
3.1.1. Água
A água empregada no processo de produção do mosto cervejeiro foi obtida do poço artesiano
localizado no Campus I da Escola de Engenharia de Lorena.
3.1.2. Malte de Cevada
O malte utilizado foi o malte claro tipo Pilsen, gentilmente doado pela Soufflet do
Brasil S/A, situada em Taubaté – SP, em sacos de 50 Kg.
101
3.1.3. Feijão
O feijão da variedade preto da marca ‖Fantástico‖ foi adquirido em um supermercado da
região.
3.2. MÉTODOS
3.2.1. Preparo das Matérias Primas
Para os testes o feijão foi submetido a 4 tratamentos:
1. Hidratado por 15 horas, trocando-se a água de 3 em 3 horas, visando retirar as anti enzimas do
mesmo e triturado junto com a água de mosturação utilizando um Hand Mixer da marca
Mondial (modelo: Versatile NM03 200W).
2. Hidratado por 15 horas, trocando-se a água de 3 em 3 horas, descascado manualmente visando
retirar as anti enzimas do mesmo, triturado junto com a agua de mosturação utilizando um
Hand Mixer da marca Mondial (modelo: Versatile NM03 200W).
3. Seco em estufa a 70ºC por 24 horas para facilitar a moagem do mesmo (testes preliminares
mostraram que o feijão é difícil de ser moído com sua umidade natural) e moído em um
moedor de grãos manual de bancada.
4. Seco em estufa a 70ºC por 24 horas para facilitar a moagem do mesmo (testes preliminares
mostraram que o feijão é difícil de ser moído com sua umidade natural), moído em um
moedor de grãos manual de bancada e cozido em banho maria a 90ºC por 15min visando
inativar os inibidores enzimáticos.
3.2.2. Mostura e Centrifugação
Visando abranger da melhor forma possível o pH ótimo e o perfil de temperatura ótima das
enzimas presentes no malte, o pH foi ajustado para 5,0 - 5,2 utilizando ácido sulfúrico 25%. A aferição
dos valores de pH e da temperatura foram realizadas com um pHmetro da marca MARCONI, modelo
MA522.
A mosturação foi operada com os seguintes descansos entre os aumentos de temperatura:
primeiro descanso a 52°C (ação das Hemicelulases, Endopeptidases e Exopeptidases), segundo
descanso a 62°C (ação das β-amilases e Dextrinases limite) para a primeira fase da sacarificação,
terceiro descanso a 70ºC (ação das α-amilases) para a segunda fase da sacarificação e aumento final da
temperatura a 80°C com o objetivo de inativar as enzimas.
Foram realizados 10 testes de mosturação para volume final de 250ml de mosto em um banho
de brassagem (Lochner Labor Tecnik), todos com a proporção feijão e malte de cevada de ⅓ e ⅔
respectivamente.
102
Em todos os testes haviam 4 copos de mosturação, 1 contendo apenas malte moído e água
(branco) e 3 contendo a mistura de malte de feijão.
As quantidades de malte utilizadas foram calculadas para um mosto com concentração de 8ºP
(⅔ do extrato) considerando o rendimento do malte como 76% e do processo como 90%. As
quantidades de feijão utilizadas foram calculadas para um mosto com concentração de 4ºP (⅓ do
extrato) considerando o rendimento do feijão como 30% e do processo como 90%,
As rampas de mosturação e os pré-tratamentos das amostras estão descritos na tabela a seguir.
Tabela 2: Pré-Tratamento das amostras de feijão e Rampas de Brassagem dos testes
Teste Pré tratamento submetido Rampas de Brassagem
52 °C 62 °C 70 °C 80 °C
01 hidratado por 15 horas (água trocada de 3 em 3 horas) triturado
com mixer 20 min 30 min 30 min 15 min
02 hidratado por 15 horas (água trocada de 3 em 3 horas) cascas
removidas manualmente e triturado com mixer 20 min 30 min 30 min 15 min
03 seco a 70ºC por 24 horas e moído 20 min 30 min 30 min 15 min
04 seco a 70ºC por 24 horas e moído 20 min 30 min 60 min 15 min
05 seco a 70ºC por 24 horas e moído 20 min 30 min 90 min 15 min
06 seco a 70ºC por 24 horas, moído e cozido a 90ºC por 15min 20 min 30 min 30 min 15 min
07 seco a 70ºC por 24 horas, moído e cozido a 90ºC por 15min 20 min 30 min 60 min 15 min
08 seco a 70ºC por 24 horas, moído e cozido a 90ºC por 15min 20 min 30 min 90 min 15 min
09 seco a 70ºC por 24 horas, moído e cozido a 90ºC por 15min 20 min 60 min 30 min 15 min
10 seco a 70ºC por 24 horas, moído e cozido a 90ºC por 15min 20 min 60 min 60 min 15 min
Fonte: Os Autores
Testes preliminares mostraram que não é possível filtrar o mosto de feijão + malte por meio de
filtração a vácuo ou por recirculação, portanto, volumes de 250ml e 300ml dos mostos produzidos
foram centrifugadas em tubos falcon a 5.000rpm por 6min em centrífuga CIENTEC, modelo CT
5000d.
Os volumes e as massas dos sobrenadantes foram medidos para calcular a % de precipitado
formado e foram avolumados para 250 mL.
103
Os sólidos solúveis do mosto foram quantificados com auxílio de um refratômetro portátil e os
resultados foram expressos em graus Brix.
A determinação do teor de umidade foi realizado colocando-se aproximadamente 1,5g de
amostra (matéria prima ou mosto) em uma balança de umidade da marca Denver Instruments IR-30 a
105ºC até massa constante.
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
As tabelas a seguir mostram os resultados obtidos nos testes de mosturação:
Tabela 3: Testes de Mostura 1 e 2
TESTE 01 TESTE 02
Copos de Mosturação Copos de Mosturação
A B C D A B C D
Malte
Massa Total (g) 32,77 33,61 34,01 33,60 33,10 33,26 33,52 33,77
Umidade (%) 8,70 8,70
Massa Seca (g) 29,92 30,69 31,05 30,68 30,22 30,37 30,6 30,83
Feijão
Massa Total (g) 0,00 78,20 78,03 78,75 0,00 78,15 78,48 75,60
Umidade (%) 52,00 46,42
Massa Seca (g) 0,00 37,50 37,50 37,80 0,00 41,90 42,00 40,50
Água (g) 100,23 189,00 188,11 188,24 99,81 169,86 170,98 171,72
pH Inicial 5,0 5,0 5,0 5,1 5,0 5,1 5,1 5,1
Temperatura Inicial (°C) 22,3 23,0 23,0 23,0 25,0 25,1 25,3 25,7
pH Final 5,7 5,5 5,3 5,4 5,7 5,5 5,6 5,5
Temperatura Final (°C) 21,0 21,0 21,0 21,0 23,0 22,6 22,3 22,4
Volume Final (mL) 250,63 252,10 251,15 251,76 251,24 250,12 252,1 251,44
°Brix Final 8,5 8,5 8,5 8,5 9,0 9,0 8,5 8,5
Umidade (%) 91,13 91,00 91,10 91,24 91,53 90,44 90,22 90,67
Sólidos Solúveis
Totais (%) 8,87 9,00 8,90 8,76 8,47 9,56 9,78 9,33
% Malte 8,87 8,87 8,47 8,47
em Massa de Malte (g) 22,23 22,36 22,28 22,33 21,28 21,19 21,35 21,30
% Feijão 0,00 0,13 0,03 -0,11 0,00 1,09 1,31 0,86
em Massa de Feijão (g) 0,00 0,33 0,08 -0,28 0,00 2,73 3,30 2,16
Rendimento Malte (%) 74,30 72,87 71,74 72,79 70,42 69,77 69,77 69,07
Feijão (%) 0,00 0,87 0,20 -0,73 0,00 6,51 7,85 5,34
Fonte: Os Autores
104
Tabela 4: Testes de Mostura 3 e 4
TESTE 03 TESTE 04
Copos de Mosturação Copos de Mosturação
A B C D A B C D
Malte
Massa Total (g) 33,35 33,38 33,46 33,29 33,06 33,12 33,53 33,55
Umidade (%) 8,90 6,59
Massa Seca (g) 30,38 30,41 30,48 30,33 30,88 30,94 31,32 31,34
Feijão
Massa Total (g) 0,00 40,80 40,76 40,72 0,00 40,80 41,01 41,11
Umidade (%) 4,47 4,81
Massa Seca (g) 0,00 39,00 38,90 38,90 0,00 38,80 39,00 39,10
Água (g) 105,30 224,70 223,04 222,46 201,62 190,27 191,40 190,00
pH Inicial 5,1 5,1 5,1 5,1 5,0 5,1 4,9 5,0
Temperatura Inicial (°C) 20,1 20,8 20,9 20,9 24,5 24,5 25,8 26,0
pH Final 5,8 5,4 5,4 5,4 5,8 5,4 5,2 5,4
Temperatura Final (°C) 22,0 21,3 21,5 21,1 25,2 25,4 26,0 26,5
Volume Final (mL) 250,54 250,33 250,16 251,45 251,50 250,80 250,95 251,15
°Brix Final 9,0 8,0 8,2 8,4 8,5 10,2 9,8 11,0
Umidade (%) 90,50 89,45 89,74 89,16 91,00 89,00 89,00 88,00
Sólidos Solúveis
Totais (%) 9,50 10,55 10,26 10,84 9,00 11,00 11,00 12,00
% Malte 9,50 9,50 9,00 9,00
em Massa de Malte (g) 23,80 23,78 23,77 23,89 22,64 22,57 22,59 22,60
% Feijão 0,00 1,05 0,76 1,34 0,00 2,00 2,00 3,00
em Massa de Feijão (g) 0,00 2,63 1,90 3,37 0,00 5,02 5,02 7,53
Rendimento Malte (%) 78,34 78,20 77,96 78,77 73,30 72,96 72,11 72,13
Feijão (%) 0,00 6,74 4,88 8,66 0,00 12,92 12,86 19,25
Fonte: Os Autores
Tabela 5: Testes de Mostura 5 e 6
TESTE 05 TESTE 06
Copos de Mosturação Copos de Mosturação
A B C D A B C D
Malte Massa Total (g) 32,31 32,33 32,41 32,31 32,80 32,59 32,68 32,66
Umidade (%) 5,79 6,70
105
Massa Seca (g) 30,44 30,46 30,53 30,44 30,60 30,41 30,49 30,47
Feijão
Massa Total (g) 0,00 40,91 40,41 42,38 0,00 40,84 40,82 40,73
Umidade (%) 3,20 4,37
Massa Seca (g) 0,00 39,60 39,10 41,00 0,00 39,06 39,04 38,95
Água (g) 101,41 175,91 176,50 177,11 100,15 196,08 196,68 198,16
pH Inicial 5,0 5,1 5,1 5,1 5,0 5,0 5,0 5,0
Temperatura Inicial (°C) 23,7 25,0 24,3 25,4 25,3 35,4 36,0 36,4
pH Final 6,0 5,4 5,5 5,4 5,9 5,3 5,4 5,4
Temperatura Final (°C) 23,7 23,9 23,8 23,8 23,3 24,4 24,7 26,8
Volume Final (mL) 253,12 251,12 250,16 250,94 251,03 253,38 250,19 250,03
°Brix Final 8,4 9,4 10,0 9,2 7,4 11,4 11,4 11,2
Umidade (%) 91,72 89,82 89,66 89,50 91,25 86,64 86,48 86,54
Sólidos
Solúveis
Totais (%) 8,28 10,18 10,34 10,50 8,75 13,36 13,52 13,46
% Malte 8,28 8,28 8,75 8,75
em Massa de Malte (g) 20,96 20,79 20,71 20,78 21,97 22,17 21,89 21,88
% Feijão 0,00 1,90 2,06 2,22 0,00 4,61 4,77 4,71
em Massa de Feijão (g) 0,00 4,77 5,15 5,57 0,00 11,68 11,93 11,78
Rendimento Malte (%) 68,85 68,27 67,84 68,26 71,78 72,91 71,80 71,80
Feijão (%) 0,00 12,05 13,17 13,58 0,00 29,91 30,57 30,23
Fonte: Os Autores
Tabela 6: Testes de Mostura 7 e 8
TESTE 07 TESTE 08
Copos de Mosturação Copos de Mosturação
A B C D A B C D
Malte
Massa Total (g) 33,10 32,54 32,74 33,08 30,67 30,77 31,01 31,02
Umidade (%) 6,39 7,10
Massa Seca (g) 30,98 30,46 30,65 30,97 28,49 28,59 28,81 28,82
Feijão
Massa Total (g) 0,00 41,38 41,13 41,35 0,00 41,20 40,71 40,71
Umidade (%) 5,26 4,45
Massa Seca (g) 0,00 39,20 38,97 39,17 0,00 39,37 38,90 38,90
Água (g) 101,07 220,47 199,73 197,72 96,61 191,45 191,68 190,71
pH Inicial 5,1 5,1 5,1 5,1 5,0 5,1 5,1 5,1
Temperatura Inicial (°C) 23,2 44,2 43,3 46,5 24,2 38,3 40,2 39,1
pH Final 5,9 5,7 5,7 5,6 6,0 5,6 5,6 5,5
106
Temperatura Final (°C) 23,0 23,1 23,2 24,4 25,2 27,0 28,0 29,0
Volume Final (mL) 250,59 250,23 250,22 250,44 250,66 250,03 251,72 255,74
°Brix Final 8,8 11,8 11,2 12,0 8,4 12,4 13,0 13,2
Umidade (%) 91,50 86,72 86,75 86,66 91,24 87,15 87,57 87,36
Sólidos Solúveis
Totais (%) 8,50 13,28 13,25 13,34 8,76 12,85 12,43 12,64
% Malte 8,50 8,50 8,76 8,76
em Massa de Malte (g) 21,30 21,27 21,27 21,29 21,96 21,90 22,05 22,40
% Feijão 0,00 4,78 4,75 4,84 0,00 4,09 3,67 3,88
em Massa de Feijão (g) 0,00 11,96 11,89 12,12 0,00 10,23 9,24 9,92
Rendimento Malte (%) 68,74 69,83 69,40 68,74 77,07 76,62 76,54 77,74
Feijão (%) 0,00 30,51 30,50 30,94 0,00 25,98 23,75 25,51
Fonte: Os Autores
Tabela 7: Testes de Mostura 9 e 10
TESTE 09 TESTE 10
Copos de Mosturação Copos de Mosturação
A B C D A B C D
Malte
Massa Total (g) 30,66 31,00 30,74 30,72 31,05 30,86 30,76 30,88
Umidade (%) 7,11 7,20
Massa Seca (g) 28,48 28,80 28,55 28,54 28,81 28,64 28,55 28,66
Feijão
Massa Total (g) 0,00 40,62 40,55 40,67 0,00 40,62 40,55 40,67
Umidade (%) 4,07 4,20
Massa Seca (g) 0,00 38,97 38,90 39,01 0,00 39,01 39,20 38,40
Água (g) 96,62 203,14 200,23 200,18 96,62 203,14 200,23 200,18
pH Inicial 5,1 5,1 5,1 5,0 5,1 5,1 5,1 5,0
Temperatura Inicial (°C) 24,3 44,3 44,4 44,7 24,3 44,3 44,4 44,7
pH Final 6,0 5,5 5,7 5,5 6,0 5,5 5,7 5,5
Temperatura Final (°C) 25,3 27,0 27,1 27,4 25,3 27,0 27,1 27,4
Volume Final (mL) 250,30 251,02 250,43 250,34 250,30 251,20 250,60 251,25
°Brix Final 8,00 11,20 11,00 11,00 8,00 11,10 11,00 11,00
Umidade (%) 91,27 86,34 86,33 86,42 91,54 86,90 86,70 86,86
Sólidos Solúveis
Totais (%) 8,73 13,66 13,67 13,58 8,46 13,10 13,30 13,14
% Malte 8,73 8,73 8,46 8,46
em Massa de Malte (g) 21,85 21,91 21,86 21,85 21,18 21,25 21,20 21,26
% Feijão 0,00 4,93 4,94 4,85 0,00 4,64 4,84 4,68
107
em Massa de Feijão (g) 0,00 12,38 12,37 12,14 0,00 11,66 12,13 11,76
Rendimento Malte (%) 76,72 76,10 76,56 76,59 73,49 74,21 74,27 74,17
Feijão (%) 0,00 31,76 31,80 31,12 0,00 29,88 30,94 30,62
Fonte: Os Autores
Os procedimentos de secagem, hidratação e remoção de cascas se mostraram ineficientes na
inativação dos inibidores enzimáticos uma vez que a concentração de sólidos solúveis foi menor que a
apresentada nos testes com pré cozimento do feijão.
Fica comprovado, também, que rampas de mosturação com descansos acima de 30 min a 62ºC
ou 70ºC são ineficazes e/ou desnecessários no processo de sacarificação em questão.
Notamos, inclusive, uma redução de sólidos solúveis extraídos em testes com descanso acima de 60
min a 62ºC ou 70ºC.
Essa redução de extrato pode ser imputada a reações de formação de compostos orgânicos de
alto peso molecular (ex: Maillard).
5. CONCLUSÕES
A maceração, a remoção de cascas e a secagem a 70ºC por 24 horas se mostraram ineficientes
na inativação dos inibidores enzimáticos. Porém, a secagem facilitou o processo de moagem.
O pré cozimento do feijão se mostrou de suma importância para viabilizar a sacarificação, o que está
de acordo com a literatura, visto que estudos mostraram que tal procedimento inativa a maior parte dos
inibidores enzimáticos.
Das rampas de mosturação testadas, a mais eficiente foi: 52ºC por 20 min, 62ºC por 30 min,
70ºC por 30 min e, 80ºC por 15 min.
Foi possível extrair 30% de sólidos solúveis do feijão, o que também está de acordo com o
previsto na literatura, visto que o feijão preto tem aproximadamente 30% de amido.
6. REFERÊNCIAS
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111
PERFIL DOS CONSUMIDORES E NÃO CONSUMIDORES DE CERVEJA
ARTESANAL DA CIDADE DE SALVADOR, BAHIA
Paula de Andrade Santos¹, Celso Duarte Carvalho Filho², Iuri Mira Barbosa3*
, Leonardo
Fonseca Maciel4
Resumo: O consumo de cerveja artesanal vem crescendo potencialmente no Brasil nos
últimos 10 anos. O setor cervejeiro é um dos que mais crescem no Brasil e, desde 2014,
aproximadamente R$ 2 bilhões por ano é faturado pelo mercado de cervejas artesanais.
Entretanto, seu crescimento ainda encontra o obstáculo do alto preço, devido aos custos
superiores aos da produção de cervejas massificadas. Faz-se necessário enfatizar a qualidade e
aumentar a divulgação através de estratégias baseadas no perfil dos consumidores e não
consumidores de cerveja artesanal. Com objetivo de traçar este perfil, foi realizada pesquisa
mercadológica na cidade de Salvador, Bahia, através da aplicação de questionário para
consumidores de cerveja, maiores de 18 anos. Os resultados foram avaliados através de
análise exploratória descritiva dos dados coletados. Dos 452 respondentes, 60,2% afirmaram
consumir cerveja artesanal, sendo possível afirmar que o consumo desse tipo de bebida está
presente em Salvador. O estudo revela que o consumo de cerveja artesanal está relacionado ao
prazer, apreciação de produtos de qualidade superior e aspectos sociais, como relaxar,
conhecer novos sabores e se divertir com familiares e amigos. Quando se trata dos não
consumidores de cerveja artesanal, observou-se que um dos principais motivos para o não
consumo de cerveja artesanal está relacionado ao baixo poder aquisitivo e/ou falta de
conhecimento sobre o produto. Além desse, o alto custo encontra-se dentre os maiores
obstáculos para a compra desse produto. A partir destes perfis torna-se possível desenvolver
estratégias para ampliar o mercado consumidor de cervejas artesanais na cidade de Salvador-
BA.
Palavras-chave: cerveja; artesanal; perfil; mercado; consumidor.
INTRODUÇÃO
Desde o século XIX, na época do Brasil Colônia, a cerveja artesanal é produzida e
comercializada no Brasil (MEGA, 2011). Segundo a Associação Brasileira da Indústria da Cerveja
(CERVBRASIL, 2015), o setor cervejeiro é um dos mais relevantes para a economia do país, tendo
um investimento de aproximadamente R$ 20 bilhões entre 2011 e 2014. O Brasil produziu 14 bilhões
¹Paula de Andrade Santos - Graduada em Farmácia pela Universidade Federal da Bahia. Rua Barão de
Jeremoabo, 147, Ondina. Salvador-BA, Brasil. CEP: 40170-115. E-mail: [email protected]
² Celso Duarte Carvalho Filho - Dr. em Engenharia Agrícola pela Universidade Estadual de Campinas. Prof.
adjunto da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal da Bahia. Rua Barão de Jeremoabo, 147, Ondina.
Salvador-BA, Brasil. CEP: 40170-115. Tel.:71-99166-4747. E-mail: [email protected].
³Iuri Mira Barbosa (*autor para correspondência) - Msc. em Ciência de Alimentos pela Universidade Federal da
Bahia(UFBA). Prof. da Faculdade de Farmácia da UFBA. Rua Barão de Jeremoabo, 147, Ondina. Salvador-BA,
Brasil. CEP: 40170-115. Tel.:71-99143-3062. E-mail: [email protected]. 4Leonardo Fonseca Maciel – Dr. em Ciência de Alimentos pela Universidade Estadual de Londrina.
Farmacêutico da Faculdade de Farmácia da UFBA. Rua Barão de Jeremoabo, 147, Ondina. Salvador-BA, Brasil.
CEP: 40170-115. Tel.:71-98835-0895. E-mail: [email protected].
112
de litros de cerveja em 2014 e, com isso, ocupa o terceiro lugar no ranking mundial de
produção, mantendo-se desde 2012 atrás apenas de China e Estados Unidos (SOBRAL, 2012;
VENTURINI FILHO, 2016).
Acompanhando a tendência de outros países e seguindo a ―onda de goumertização‖ que vêm
crescendo no país, o Brasil vem aumentando a produção de cerveja artesanal nos últimos dez anos
registrando crescimento de 20% a 30% ao ano e faturamento anual de aproximadamente R$ 2 bilhões
(RIBEIRO; PAMPLONA, 2014).
Segundo o Decreto nº 6.871/2009 (BRASIL, 2009), Cerveja é a bebida obtida pela
fermentação alcoólica do mosto cervejeiro oriundo de malte de cevada e água potável, por ação de
levedura, com adição de lúpulo. Cerveja artesanal, por sua vez, não é bem definida pela legislação
brasileira, mas segundo a Brewers Association a cerveja artesanal caracteriza-se por ser produzida em
pequena escala com um processo de fermentação relativamente lento (CARVALHO, 2015).
Segundo Venturini Filho (2016), a diferença mais importante entre cerveja produzida
industrialmente e artesanalmente está na liberdade em se criar receitas personalizadas, com diferentes
tipos de maltes, lúpulos e adjuntos cervejeiros, além de experimentar variações no processo produtivo,
com equipamentos e utensílios inovadores e novas combinações de tempo/temperatura nas diversas
etapas produtivas sem que isso afaste o artesão de seu objetivo, que é obter como produto final
cervejas de alto padrão.
Em Salvador, um forte centro de consumo de cerveja artesanal do país, já é possível observar
os efeitos desta nova cultura em torno da cerveja. Nos últimos anos, proliferou-se na capital baiana
uma grande quantidade de estabelecimentos que passaram a vender cervejas especiais (CARVALHO,
2016).
Um dos fatores que impedem o maior número de vendas das cervejas especiais é o preço. Por
conta do processo de fabricação e matérias-primas utilizadas, o custo dessas bebidas é maior que o das
cervejas massificadas. Outras estratégias precisam ser adotadas para superar o obstáculo preço.
Dessa forma, esse trabalho foi realizado com o objetivo de traçar o perfil do mercado
consumidor de cerveja artesanal da cidade de Salvador-BA, verificando as melhores estratégias para
expansão desse mercado.
MATERIAL E MÉTODOS
Foi realizada uma pesquisa de caráter exploratório e descritivo através de
questionários online com um grupo de consumidores de cerveja. Foi utilizado formulário com
43 questões online na plataforma Google Docs.
113
Para se enquadrar no estudo, os respondentes precisavam residir na cidade de
Salvador-BA e ter mais de 18 anos. Não foi necessária a identificação dos participantes, os
quais concordaram em participar através do aceite de um Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido.
O formulário aplicado foi subdividido em duas seções e, de acordo com a resposta da
primeira pergunta (―Você consome cerveja artesanal?‖), o entrevistado foi encaminhado para
seção destinada a consumidores de cerveja artesanal ou para a seção de não consumidores de
cerveja artesanal. Todas as questões foram objetivas, variando entre: Múltipla escolha, onde
apenas uma opção poderia ser escolhida; Caixas de seleção, onde poderiam ser escolhidas
mais de uma opção; Alternativas na forma de escala hedônica, nas quais o entrevistado
expressa o grau de preferência sobre o questionamento.
As perguntas e alternativas encontradas dos formulários foram baseadas em estudos
realizados com consumidores de cerveja artesanal encontrados na literatura. (CARVALHO,
2015; CERVBRASIL, 2015).
Os resultados foram avaliados através de análise exploratória descritiva dos dados
coletados por meio dos questionários. Essa análise visa examinar o comportamento referente à
distribuição, frequência e variabilidade dos dados. Além disso, mais de uma variável foi
correlacionada através de tabulações cruzadas a fim de averiguar a ligação entre diferentes
variáveis categóricas.
Os dados coletados foram tabulados e expostos na forma de gráficos e tabelas, gerados
pela ferramenta Google Docs. Foram avaliados o comportamento quanto à distribuição,
frequência e variabilidade dos dados.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram entrevistadas 452 pessoas que consomem cerveja, das quais 60,2% são
consumidores de cerveja artesanal. A pesquisa não foi direcionada apenas para consumidores
de cerveja artesanal, portanto pode-se afirmar que o consumo desse produto está
consideravelmente presente em Salvador.
Dentre os respondentes do questionário, 276 alegaram ser consumidores de cerveja
artesanal. Destes, 66,7% são do sexo masculino e 33,3% do sexo feminino, resultado similar
ao de outros estudos como o realizado por Carvalho (2015) com consumidores de cerveja de
114
Belo Horizonte, que observou que 65,2% dos consumidores de cerveja artesanal são homens;
e uma pesquisa realizada pelo SEBRAE (2014) com consumidores de cerveja artesanal de
Juiz de Fora na qual se observou que 57,0% dos consumidores da bebida são do sexo
masculino.
É possível observar na Figura 1 que a idade dos consumidores de cerveja artesanal é
bem variada, notando-se um destaque na faixa etária de 29 a 39 anos, com 31,9%. Ressalta-se
que a maioria destes consumidores são casados ou mantém união estável, o que pode
significar que beber cerveja artesanal pode estar ligado a hábitos familiares.
Figura 1: Perfil dos participantes consumidores de cerveja artesanal.
Mais da metade dos respondentes dessa seção tem nível superior completo; destes, muitos já
possuem pós-graduação ou especialização. Além disso, pode-se perceber que grande parte deles
(46,4%) afirmaram possuir renda familiar maior ou igual a nove salários mínimo e menos de 1,5%
estavam desempregados. Dessa forma, é possível concluir que a maioria dos apreciadores de cerveja
artesanal possui alto nível de instrução e elevado poder aquisitivo.
A definição de cerveja artesanal não é, por lei, bem determinada. Assim foi perguntado aos
consumidores como eles definem esse tipo de produto. O entrevistado pôde escolher até três opções de
resposta, então a frequência de resposta foi avaliada por cada item individualmente.
Como pode ser observado na Figura 2, os consumidores afirmaram que cerveja artesanal é
aquela produzida em pequena escala (64,5%), com melhor qualidade (63,8%) e sabor diferenciado
(60,1%). Essas são as características mais atribuídas à cerveja artesanal na literatura, significando que
os respondentes de fato entendem as principais diferenças entre essas cervejas e as tradicionais.
115
Figura 2: Características de cerveja artesanal segundo os consumidores.
A opção ―Cerveja não pasteurizada‖ não corresponde à totalidade das cervejas artesanais, pois
muitos cervejeiros optam por fazer esse procedimento no intuito de eliminar as atividades
microbiológicas existentes na bebida. A afirmativa ―Cerveja com aromatizante artificial‖ também não
é verdadeira, visto que o uso de aromatizantes e sabores artificiais é contra indicado na fabricação de
cervejas artesanais. Nenhum dos respondentes marcou essa opção, ratificando assim que a maioria dos
consumidores de cerveja artesanal sabe diferencia-las das demais bebidas.
O local preferido para consumo de cervejas artesanais de 72,5% dos entrevistados é em casa.
Seguido deste, o local de preferência é ―Casa de amigos‖, com 33,3%. O entrevistado pôde escolher
até três opções de resposta, então a frequência de resposta foi avaliada por cada item individualmente.
Resultados similares foram observados na pesquisa de Carvalho (2015). Esses dados podem
ser interpretados de duas formas: a primeira é que o prazer em consumir esse tipo de bebida está
relacionado com um ambiente familiar, onde o consumidor pode reunir sua família e amigos. A
segunda é que, com a ―Lei Seca‖ em vigor desde 2008 no Brasil, o número de pessoas que bebem em
casa aumentou significativamente. Esse dado mostra a importância da venda de cervejas artesanais não
só em bares e pubs, mas também em outros estabelecimentos como supermercados e lojas de
conveniência.
Existe uma associação entre o consumo de cerveja artesanal e elementos de cunho social; isto
pode ser percebido com a interpretação da Figura 3. Foi perguntado aos entrevistados quais elementos
estão ligados a essa prática. Cada consumidor escolheu até três opções, portanto a soma das
frequências é maior que 100. O resultado revela que a maioria dos consumidores relacionam cerveja
artesanal com amigos (57,2%), prazer (57,2%), qualidade (47,1%), lazer (28,3%), família (26,1%) e
convívio social (22,5%). Resultados semelhantes foram encontrados na pesquisa de Carvalho (2015),
invertendo apenas a ordem dos cinco itens mais votados: Qualidade > Prazer > Amizade > Lazer >
Convívio Social.
116
Há também uma parcela que relaciona a bebida com gastronomia (18,1%), podendo interligar
este dado com a crescente prática de produzir cerveja artesanal em casa não para fins lucrativos, mas
por satisfação pessoal.
Figura 3: Elementos ligados à cerveja artesanal de acordo com os consumidores.
A frequência de consumo também é algo relevante para traçar o perfil do consumidor.
Segundo a Figura 4 abaixo, 54,2% dos entrevistados bebem cerveja artesanal pelo menos uma vez por
semana. Este é um valor consideravelmente alto para Salvador, uma cidade onde o hábito de consumir
cerveja artesanal é relativamente recente. Comparando esse resultado com os dados de Belo Horizonte
coletados por Carvalho (2015), os soteropolitanos bebem cerveja artesanal com uma frequência
semelhante aos belo-horizontinos (50,3% consomem a bebida pelo menos uma vez na semana), sendo
que Minas Gerais ocupa o segundo lugar em produção de cervejas artesanais do país, perdendo apenas
para Santa Catarina (ROCHA, 2014). Essa estatística coloca Salvador como uma cidade cujo mercado
consumidor de cerveja artesanal tem grandes chances de aumentar ainda mais; além disso, pode-se
afirmar que este pode ser um potente fator para impulsionar a economia da cidade.
Figura 4: Frequência do consumo de cerveja artesanal.
117
Quando perguntado sobre os fatores que dificultam que essa frequência de consumo aumente ainda
mais, segundo os respondentes, são principalmente o preço (76,1% dos entrevistados) e a pouca
disponibilidade do produto no mercado (50,7%). É um desafio para os fabricantes de cervejas
artesanais fazer com que a qualidade superior dos seus produtos seja reconhecida e valorizada, assim
como fazer o possível para que seu preço de venda seja acessível ao mercado.
O segundo atributo apontado pelos entrevistados foi a pouca disponibilidade do produto do
mercado. Apesar de existir uma enorme variedade de cervejas artesanais, nem todas podem ser
legalmente comercializadas, pois o estabelecimento produtor de cerveja artesanal e seus produtos
devem ser registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), conforme
disposto na Lei nº 8.918, de 14 de julho de 1994 (BRASIL, 1994), e em seus regulamentos. Isso
diminui a disponibilidade e variedade desses produtos no mercado, visto que a grande maioria dos
produtores de cerveja artesanal não possui esse registro.
Dentre os principais estilos comercializados em Salvador, alguns foram colocados na pesquisa
para avaliar a preferência dos consumidores. O estilo mais apreciado foi o Indian Pale Ale (42%), que
se destacou consideravelmente perante as outras. Do segundo ao quinto lugar, os valores foram bem
similares: Stout (26,1%),Pales Ales em geral (25,4%), Pilsner (22,5%) e Weissbier (21,7%).
Existe uma série de elementos que motivam o consumidor a comprar um produto. A respeito das
embalagens, as opções preferidas dos consumidores são a garrafa de 600 ml (43,7%) e a garrafa de
355 ml (40,3%). Quando o aspecto é a rotulagem das cervejas, os entrevistaram demonstraram
preferência pelo nome e estilo criativo, contendo imagens relacionadas à cerveja ou insumos
cervejeiros, conforme apresentado na Figura 5. Cada consumidor escolheu até três opções, portanto a
soma das frequências é maior que 100.
Figura 5: Aspectos mais atrativos no rótulo de cervejas artesanais.
118
Na figura 6 estão apresentados os atributos que são levados em consideração na
compra da cerveja artesanal e o grau de importância atribuído a cada um deles pelos
entrevistados.
Figura 6: Atributos levados em consideração na compra de cervejas artesanais e seus respectivos graus
de importância.
Levando em consideração a escala hedônica utilizada na questão, o atributo que se destacou
como mais importante na hora da compra foi a Qualidade. Atributo este que não teve nenhuma nota
zero ou um (sem importância e pouco importante, respectivamente). 92% dos consumidores alegaram
que a qualidade é muito importante, sendo assim um atributo de grande influência na compra. Seguido
deste, o atributo Preço recebeu a nota três (muito importante) por 35,5% dos entrevistados e nota
quatro (importante) por 52,2%. Isso mostra que o preço é, de fato, um elemento influente no momento
da compra. Os atributos Embalagem e Rótulo tiveram pontuações similares, não demonstrando tanta
influência na compra. Por último, Marca foi o atributo menos considerável dentre todos, visto que teve
13,8% de nota zero (sem importância), somados a 31,2% de nota dois (pouco importante).
Na Tabela 1 são apresentadas as notas médias atribuídas pelos entrevistados para diferentes
variáveis motivadoras de consumo da cerveja artesanal. Cada consumidor escolheu até três opções,
portanto a soma das frequências é maior que 100. A variável Prazer é uma das principais motivadoras
com a segunda maior média (4,69%). Além deste, obtiveram médias altas os seguintes motivadores:
Apreciar um sabor diferenciado (4,73%); atributos relacionados a amigos (4,65%), família (4,09%),
convívio social (4,14%) e boa gastronomia (4,07%).
As opções ―Beber sozinho‖ e ―Cerveja artesanal faz mal à saúde‖ tiveram pouca importância
nos resultados, comprovando que o consumo de cerveja artesanal tem relação direta com aspectos
sociais e gastronômicos.
119
Tabela 1: Variáveis que representam motivações para o consumo de cerveja artesanal.
Variável Média
Bebo cerveja artesanal por hábito. 2,70%
Bebo cerveja artesanal por prazer. 4,69%
Bebo cerveja artesanal sozinho. 2,95%
Bebo cerveja artesanal e recomendo aos amigos. 4,65%
Bebo cerveja artesanal para apreciar um sabor diferenciado. 4,73%
Bebo cerveja artesanal em casa, com a família. 4,09%
Bebo cerveja artesanal fora de casa num momento de encontro com amigos. 4,13%
A cerveja artesanal me faz relaxar. 4,13%
A cerveja artesanal reúne as pessoas. 4,14%
Cerveja artesanal faz mal à saúde. 1,55%
O consumo de cerveja artesanal está associado a uma boa gastronomia. 4,07%
Produzo a cerveja artesanal para consumo próprio. 3,06%
Tenho interesse em produzir cerveja artesanal no ambiente doméstico. 3,79%
Considerar todos esses aspectos pode ser um grande diferencial para os produtores de cerveja
artesanal e estabelecimentos que as vende, já que fica mais fácil agradar, conquistar e/ou manter o
cliente quando seu perfil é conhecido.
Dos 39,8% de entrevistados que alegaram não consumir cerveja artesanal, 62,2% são do sexo
feminino, 47,8% têm entre 18 e 28 anos e 70,7% são solteiros. Esses dados permitem afirmar que
existe uma relação entre o não consumo de cerveja artesanal e a juventude, época na qual as pessoas
ainda não são financeiramente independentes e, muitas vezes, priorizam a quantidade de bebida a ser
ingerida, e não a qualidade da mesma.
Observando a Figura 7, pode-se perceber que esse grupo, na sua maioria, não tem o 3º grau
completo (79,9%) e têm renda mensal abaixo de 9 salários mínimos, sendo que 52,2% ganham até 4
salários. Isso confirma a relação entre o baixo poder aquisitivo e menor grau de instrução com o não
consumo de cervejas artesanais. Este perfil corrobora àquele apresentado por consumidores de cerveja
no município de Juiz de Fora-MG em 2014 (SEBRAE, 2014).
120
Figura 7: Perfil dos participantes não consumidores de cerveja artesanal.
Dentre os entrevistados não consumidores de cerveja artesanal, 45,6% afirmaram não
consumir cerveja artesanal por falta de hábito, seguido pelo motivo ―não conhecer‖ com 44,4%,
conforme apresentado na Figura 8. Cada consumidor escolheu até três opções, portanto a soma das
frequências é maior que 100.
Figura 8: Motivos para não consumir cerveja artesanal.
Este fato pode ser interpretado de duas formas. Primeiramente que o não consumo está
relacionado a aspectos de rotina, já que os brasileiros estão acostumados a beber cervejas tradicionais
e, dessa forma, os entrevistados não tem o hábito de consumir cervejas artesanais ou nem mesmo as
conhece. A segunda forma de interpretar este dado é que essas variáveis estão diretamente ligadas à
terceira opção mais votada, o preço. Diante da maioria dessa porção de entrevistados não possuírem
alto poder aquisitivo, o custo elevado das cervejas artesanais impede que estes desenvolvam o hábito
de bebê-las.
121
Diante da Figura 9, é possível constatar que 46,7% dos não consumidores de cerveja artesanal
não apreciam nenhum atributo dessa bebida. Ou seja, mais da metade dos entrevistados, mesmo não
sendo consumidores, apreciam alguma característica deste tipo de produto, destacando-se o sabor e a
produção diferenciada. Esse é um ponto a ser considerado pelos fabricantes de cerveja artesanal, já que
uma parcela grande dos não consumidores admira a bebida de alguma forma e, assim, são passíveis a
mudar seus hábitos quanto ao consumo da mesma.
Figura 9: Características da cerveja artesanal apreciadas pelos não consumidores.
Quando houve o questionamento quanto às possíveis modificações que poderiam ser
realizadas para aumento do consumo de cervejas artesanais, a modificação mais sugerida foi aumentar
a divulgação desses produtos, aumentando assim sua visibilidade no mercado. Isto poderia estimular
os não consumidores a tentarem experimentar a cerveja artesanal. Em segundo lugar, foi sugerida a
diminuição dos preços, porém este é um fator cuja modificação pode estar relacionada à alteração de
qualidade do produto.
Os dados apresentados pela Figura 10 são muito importantes para auxiliar os fabricantes e
vendedores de cervejas artesanais a atenderem expectativas de possíveis consumidores de seus
produtos.
Figura 10: Sugestões dos não consumidores de cerveja artesanais para aumento do consumo do produto.
Todos os resultados apresentados até então são relevantes para fabricantes e distribuidores de
cerveja artesanal, pois com eles torna-se possível desenvolver uma estratégia para tornar o produto
122
mais visível e disponível no mercado, assim como atender ao máximo às expectativas dos possíveis
consumidores destes produtos.
CONCLUSÃO
Os resultados obtidos revelam que o consumo de cerveja artesanal na cidade de Salvador-BA
está relacionado ao prazer, apreciação de produtos de qualidade superior e aspectos sociais, como
relaxar, conhecer novos sabores e se divertir com familiares e amigos. Estes mesmos fatores são os
que motivam a compra desses produtos e influenciam a manutenção do hábito de consumi-los. A
maioria dos consumidores de cerveja artesanal tem um nível de instrução alto e poder aquisitivo
elevado, mostrando-se um público a ser explorado, visto que a cerveja artesanal é um produto de
maior custo e qualidade, sendo mais acessível para pessoas com essas características.
Tratando-se dos não consumidores de cerveja artesanal, observa-se que os principais fatores
para o não consumo de cerveja artesanal possivelmente está ligado com o desconhecimento sobre o
produto e/ou, em segundo plano, ao baixo poder aquisitivo desse público. Esses resultados podem
nortear os fabricantes e vendedores a buscar as melhores estratégias para aumentar o mercado
consumidor das cervejas artesanais.
Considerando o obstáculo preço à expansão de mercado, as apostas de crescimento do
consumo das cervejas artesanais são depositadas no quesito qualidade. Para alavancar esse
crescimento, faz-se necessário desenvolver estratégias de marketing para divulgar melhor este produto
no mercado, investindo também em inovação na embalagem e rotulagem, visto que são aspectos que
podem destacar o produto em relação aos demais.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da Agricultura. Secretaria Nacional de Defesa Agropecuária. Decreto nº 6.871, de
4 de junho de 2009. Diário oficial da União. Poder executivo, Brasília, DF, 4 jun. 2009.
BRASIL. Lei nº 8.918, de 14 de julho de 1994. Diário oficial da União. Poder executivo, Brasília,
DF, 14 jul. 1994.
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136p. Tese. Doutorado em Ciência e tecnologia de Alimentos da Universidade Federal de Viçosa,
2015.
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123
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ano. Brasil Econômico, Rio de Janeiro, 2014. Disponível em:
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Disponível em: <http://www.mg.agenciasebrae.com.br/sites/asn/uf/MG/quem-consome-cerveja-
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SOBRAL, L. Os países que mais bebem e produzem cerveja. Exame, São Paulo, 2012. Disponível
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VENTURINI FILHO, W. G. Bebidas alcoólicas: ciência e tecnologia. 2.Ed. São Paulo: Blucher,
2016.
124
REAPROVEITAMENTO DO BAGAÇO DE MALTE NA INDÚSTRIA
ALIMENTÍCIA
Giovanni Souza Casella*
Thalles Stephan Leal Vilela2
Matheus Daniel Moreira Santos3
Ewerton Evangelista de Souza4
Igor Maciel Medeiros5
Paulo Rodrigues Tarabal6
Lucilaine Valéria de Souza Santos7
Fernanda Palladino Pedroso8
Resumo: Na fabricação de cerveja destaca-se entre os ingredientes o malte, proveniente da
germinação da cevada. O bagaço de malte é um dos principais subprodutos das indústrias cervejeiras,
sendo que na maioria das vezes ele é descartado ou utilizado para insumos, como ração animal.
Constituído de restos de cascas de malte, esse subproduto apresenta considerável valor nutricional que
pode ser utilizado na indústria alimentícia, porém ele apresenta elevado teor de umidade que, a
princípio, inviabiliza sua utilização, fazendo-se necessário um tratamento prévio. Diante disso, o
objetivo deste trabalho foi avaliar diferentes formas de obtenção da farinha de malte para ser utilizado
na indústria alimentícia. O primeiro passo foi estudar quatro métodos diferentes de secagem; após esta
etapa o malte foi moído objetivando a produção de uma farinha, para que pudesse ser utilizada na
fabricação de um pão com diferentes concentrações de malte (0%, 10%, 20%, 30%). Análises físico-
químicas foram realizadas para determinar quantitativamente as composições dos nutrientes no bagaço
de malte. O melhor método de secagem foi estufa com circulação de ar apresentando 65,67% de
umidade. Em relação aos resultados físico-químicos realizados no malte moído e seco encontrou-se
0,98% teor de Umidade, 6,18% Lipídeos; 2,06% Cinzas; 15,28% Proteínas Totais; 17,99% Fibras e
57,51% Carboidratos. Diante da quantidade de fibras e carboidratos, o pão com 10 e 20% de bagaço
de malte foi o que apresentou a melhor aceitação pelo público. Diante disso, este trabalho nos mostra
que o subproduto estudado apresenta um promissor potencial para seu reaproveitamento pelas
indústrias alimentícias.
*Estudante de Graduação Engenharia Química. Rua Felipe Drumond, 81, apto 95, Luxemburgo. CEP:
30.380.310. Belo Horizonte/MG, Brasil. Telefone: (31) 98447-1600. E-mail: [email protected]; 2Estudante de Graduação Engenharia Química. Belo Horizonte/MG, Brasil. E-mail: [email protected];
3Estudante de Graduação Engenharia Química. Belo Horizonte/MG, Brasil. E-mail:
[email protected]; 4Estudante de Graduação Engenharia Química. Belo Horizonte/MG, Brasil. E-mail: [email protected];
5Estudante de Graduação Engenharia Química. Belo Horizonte/MG, Brasil. E-mail:
[email protected]; 6Estudante de Graduação Engenharia Química. Belo Horizonte/MG, Brasil. E-mail: [email protected];
7Química, Mestre e Doutora em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos pela Universidade Federal de
Minas Gerais. Professora de Análises Instrumental da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Belo
Horizonte, Minas Gerais, Brasil. E-mail: [email protected]; 8Engenheira química (USP), Mestre em Biotecnologia (USP) e Doutoranda em Microbiologia, pela Universidade
Federal de Minas Gerais. Professora de Operações Unitárias I da Pontifícia Universidade Católica de Minas
Gerais. Belo Horizonte/MG, Brasil. E-mail: [email protected];
125
Palavras chaves: Bagaço de Malte; Cerveja; Caracterização; Industria alimentícia;
1. INTRODUÇÃO
A cerveja é uma bebida de ampla difusão e intenso consumo, conhecida em diversos países no
mundo. É obtida pela fermentação alcoólica do mosto cervejeiro oriundo do malte de cevada e água
potável, com adição de lúpulo para dar sabor e aroma e fermentada por ação de leveduras (REBELLO,
2009).
O processo de fabricação da cerveja começa com a brassagem, onde leveduras responsáveis
pela fermentação alcoólica convertem o amido, presente na cevada maltada, em açúcares menores,
como maltose, sacarose e glicose (KUNZE, 2014). O grão do malte é então moído e adicionado à água
formando o mosto cervejeiro. O bagaço de malte é obtido após uma filtração desse mosto, sendo
constituído principalmente de casca (material celulósico) e polpa de malte (KEMPKA et al., 2018).
Estima-se uma produção de 14 a 20 kg de bagaço a cada 100 litros de cerveja produzida (SANTOS et
al., 2005).
O Brasil é um dos grandes consumidores de cerveja do mundo. Em 2016 foram fabricados
14,1 bilhões de litros de cerveja por ano, segundo a CervBrasil, e isso coloca o país no ranking global
atrás apenas da China e dos Estados Unidos. Na última década, o consumo mundial aumentou a uma
taxa média de 5% ao ano, com destaque para o segmento de cervejas artesanais, que teve uma
evolução anual em torno de 20% (VASCONCELOS, 2017).
Além disso, atualmente, está evidente um interesse crescente em consumir comidas saudáveis
ou funcionais que provém benefícios para saúde respeitando requerimentos nutricionais básicos
(FÃRCAS, 2014). Sendo uma importante fonte de proteína e fibras (GUO, 2013), o presente trabalho
objetiva analisar e desenvolver alternativas para o reuso do principal resíduo sólido da produção
cervejeira. Para isso, se desenvolveu um projeto para construção de um leito fluidizado a partir de
materiais facilmente encontrados; caracterizou-se as propriedades nutricionais do bagaço de malte; e
desenvolveu-se pães caseiros, um popular produto alimentício, utilizando diferentes concentrações de
farinha de malte.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
A cevada, antes de ser utilizada como insumo para a elaboração de cerveja, passa por um
processo de malteação que tem por objetivo aumentar o conteúdo enzimático dos grãos para que o
amido seja quebrado pelas enzimas durante a brasagem, em açúcares fermentescíveis, necessários para
a produção da bebida. Essa transformação enzimática é dividida em três etapas básicas: a maceração
126
ou embebição, a germinação e a secagem ou clivagem (BELETI et al, 2012). Estas etapas têm como
objetivo a ativação e a produção de enzimas que agirão nas substâncias de reserva do grão
(MORADO, 2009; BELETI et al, 2012; KUNZE, 2014), como mostra na Figura 1:
Figura 1 - Etapas de preparação do malte para a processo cervejeiro
Fonte: (Adaptado - ENCYCLOPEDIA-BRITANNICA-INC., 2010)
Após a maceração e germinação, o grão passará pelo processo de secagem. Neste processo, a
degradação do amido e crescimento do embrião se cessam e ocorre a remoção de componentes
voláteis responsáveis por sabores indesejáveis do malte, além de promover a formação de aromas
oriundos das reações de Maillard. A reação de Maillard, que é uma reação de escurecimento não
enzimático que pode ocorrer em alimentos e organismos vivos (COSTA, 2017), é uma das reações
mais importantes na indústria de alimentos e os produtos dessas reações tem grande influência nos
atributos de aroma, sabor, cor e textura (BASTOS et al., 2012). Nos maltes, o processo de secagem em
maior intensidade irá promover também a coloração do grão e gerar diferentes variedades com
distintas especificações e características, como é visto na Figura 2 (BAMFORTH, 2003; BRIGGS et
al., 2004).
Figura 2 - Tipos diferentes de malteação
Fonte: (TÚLIO - BEER KING, 2016)
Depois de moído, o malte vai para a etapa de mosturação, que tem o com o objetivo de extrair
os açúcares das porções amídicas dos grãos pela ação das amilases. Esse processo ocorre misturando o
127
malte moído com água a temperatura controlada por volta de 68 -70º C para promover a dissolução
dos componentes do grão e ação das enzimas do malte, formando assim o mosto. Não só os açúcares,
mas também neste processo são obtidas certas proteínas, peptídeos e aminoácidos importantes para a
produção da cerveja e nutrição das leveduras (KUNZE, 2014). Após a mosturação, o líquido é
separado dos sólidos, que contem cascas do malte e possíveis adjuntos utilizados, este processo é
denominado clarificação ou filtragem, que pode ser realizado por filtros prensa, ou pode ser
recirculação utilizando como filtro o malte decantado e as cascas dos grãos que foram preservadas na
moagem. Em seguida, ocorre o processo de fervura que tem como objetivo inativar as enzimas que
atuaram no processo de mosturação (OETTERER et al, 2006).
A geração de grão do bagaço de malte, nas indústrias cervejeiras, gira em torno de 136 bilhões
de toneladas ao ano (GOMES, 2011), sendo que sua maior parte é descartada ou usada para insumos
na ração animal. Devido ao seu considerável valor nutricional e ao contexto supracitado, há uma
grande oportunidade de utilizá-lo na alimentação humana.
O uso do bagaço do malte tem sido restrito na alimentação humana, em parte devido à
ausência de uma adequada avaliação nutricional. No entanto, devido ao seu elevado teor de β-
glucanas, fibras e os resíduos de proteínas e açúcares tornam este bagaço com potencial de utilização
em produtos elaborados na panificação, como pães de forma e biscoitos, onde o incremento
principalmente em fibras traz benefícios ao consumidor do ponto de vista nutricional e de
funcionalidade. Portanto, há um interesse crescente neste cereal para consumo humano e usos
industriais.
2.1. Composição do bagaço de malte
O bagaço de malte apresenta em sua composição lipídeos, cinzas, um teor de umidade
característico, vitaminas e aminoácidos, além de claro, carboidratos (SANTOS, 2005). Segundo
LIMA, 2017, a composição básica do malte se dá pela proporção descrita na Tabela 1:
Tabela 1 – Análise da composição química das biomassas em porcentagem
Parâmetros (%) no bagaço de malte
Carboidratos Totais 47,43
Umidade 6,41
Cinzas 4,35
Proteína Bruta 16,84
Lipídeos 5,32
Fibras 10,65
Fonte: (Adaptado - LIMA, 2017)
128
2.1.1. Umidade
Valores de umidade considerados seguros para um adequado armazenamento do produto são
conhecidos e devem ser respeitados para que a qualidade dos grãos se mantenha durante a estocagem
(VALENTINI, 1998), podendo servir como um indicador da qualidade dos produtos, uma vez que
apresenta influência direta no seu armazenamento, causando rápida deterioração em sua embalagem e
seu processamento (RASCHEN, 2014; PINTO, 2015).
2.1.2. Lipídeos
Os lipídeos são compostos químicos cuja propriedade definidora é a insolubilidade em água e
funcionam como moléculas com armazenamento energético, sendo que a maior parte dos ácidos
graxos estão na conformação cis, mas os ácidos graxos trans sempre estiveram presentes na dieta
humana (JUN, 2016).
2.1.3. Cinzas
Cinzas de um alimento é o nome dado ao resíduo inorgânico que permanece após a queima da
matéria orgânica a altíssimas temperaturas (cerca de 600 ºC) a qual é transformada em CO2, H2O e
NO2 sendo o ponto de partida para a análise de minerais específicos (DELAPORTE, 2005). A cinza é
constituída principalmente de: macronutrientes (K, Na, Ca, P, S, Cl e Mg) requeridos em uma dieta em
grandes quantidades nos alimentos; micronutrientes (AI, Fe, Cu, Mn e Zn) requeridos em uma dieta
em pequenas quantidades na nutrição e; elementos traços (Ar, I, F, Cr, Co, Cd e demais elementos)
que se encontram em quantidades menores ainda que os micronutrientes (DELAPORTE, 2005).
2.1.4. Proteínas
As proteínas, outro importante componente nutricional no bagaço de malte, são as
biomoléculas mais abundantes nos seres vivos, estando presentes em todas as partes de uma célula. As
proteínas assumem uma diversidade de funções biológicas, com propriedades e atividades distintas,
como em músculos, cabelos, unhas, penas de pássaros, anticorpos e uma série de outros exemplos
(JUNIOR, 2006).
2.1.5. Fibras
A fibra alimentar desempenha papel regulador e remissivo nos distúrbios gastrointestinais e
nas doenças crônicas não transmissíveis. Fibra alimentar é a parede celular dos vegetais, que não é
digerida pelo organismo humano, por não possuir enzima específica, e tem propriedades funcionais
importantes no organismo humano. Portanto, são inegáveis os benefícios que a fibra alimentar
129
associada à dieta desempenha na saúde humana. São divididas em Solúveis e Insolúveis (MACEDO,
2012).
2.1.6. Carboidratos
Carboidratos são poliidroxialdeídos ou poliidroxicetonas ou substâncias que liberam tais
compostos por hidrólise. Os alimentos ricos em carboidratos, como pão, cereais, arroz e todas as
massas são uma forma de energia abundante para o organismo, no entanto, quando consumidos em
excesso, eles aumentam a quantidade de gordura corporal, pois o excesso de carboidratos armazena-se
no organismo como forma de gordura (POMIN, 2006).
3. MATERIAIS E MÉTODOS
O bagaço de malte pilsner utilizado no trabalho foi fornecido pela cervejaria KoalaBeer,
proveniente de uma empresa alemã chamada Bamberg, coletado logo após a etapa da brassagem e
armazenado em um freezer durante quatro dias. Esse malte continha cerca de 60% de pale, 18% de
trigo, 19% de aveia e 3% de extrato de malte desidratado, que é adicionado somente na fervura e não
na tina de mostura.
Para a utilização e caracterização do bagaço do malte fez-se necessário, primeiramente, secá-lo,
a fim de se retirar o máximo de umidade presente e diminuir a possibilidade de degradação do
material.
3.1. Secagem e Montagem do Leito Fluidizado
Este trabalho realizou testes de secagem em equipamentos diversos: estufa de laboratório
FANEM (São Paulo – Brasil) 520 sem circulação de ar, estufa com circulação de ar EL-80, banho de
areia Quimis e secador de leito fluidizado, sendo o último projetado pelos autores deste artigo.
Para esses testes, 100 g de bagaço de malte foram colocados nos equipamentos citados e, a
cada 30 minutos, a variação de massa foi determinada. A temperatura foi fixada em 100 ºC para todos
os equipamentos, com exceção do Leito Fluidizado onde a temperatura foi fixada em 37 ºC.
O projeto de construção do Leito Fluidizado foi pensado tendo em vista uma possível
aplicação deste em um projeto de extensão, desta forma priorizou-se materiais de fácil acesso e de
baixo custo para a população em geral. A Tabela 2 apresenta os materiais utilizados na montagem.
Tabela 2 - Materiais utilizados na montagem do Leito Fluidizado
130
Material Medida Quantidade
Cano PVC Ø 100 mm 1 metro
Luvas Simples Ø 100 mm 2 unidades
Coolers Ø 120 mm 2 unidades
Mdf 1 m2
1 unidade
Cola de madeira - 1 unidade
Lâmpada incandescente 100 W 1 unidade
Fonte: (Realizado pelos autores)
A montagem iniciou-se cortando-se 3 pedaços de cano PVC, com 20 cm de comprimento
cada. O restante foi colocado por 5 minutos no forno para que se torne mais maleável e que assim
possa ser planificado. Após a planificação, cortou-se 3 círculos de 98 mm de diâmetro e os perfurou
várias vezes, como representado na Figura 3 (a), utilizando uma broca de 2mm. Colou-se os círculos
como base dos canos de PVC. Após os canos de PVC serem devidamente colados, iniciou-se a
construção da base e do topo, como mostrado na Figura 3 (b). O cubo foi construído com arestas de 15
cm sendo que no lado superior manteve uma abertura circular de 120 mm de diâmetro para encaixe da
peça de PVC de 20 cm de altura. O esquema da montagem final pode ser visto na Figura 3 (b). Para o
encaixe das peças do cubo, usou-se cola para madeira e parafusos. Para o encaixe do cano PVC com a
peça de MDF foi usada resina epóxi. Foi necessário a construção de duas peças iguais a essa, uma para
a base e outra para o topo. Porém no cubo da base, em seu interior, colocou-se uma lâmpada
incandescente de 100 Watts para agir como um trocador de calor e aquecer o fluido de entrada.
Portanto, dois pedaços de cano PVC foram fixados na base e no topo, sendo um móvel, o encaixe
deles foi dado por luvas, como na Figura 3 (c). Ao final do desenvolvimento, o leito ficou na forma
representada pela Figura 3 (d).
Figura 3 – Montagem do Leito fluidizado
Fonte: (Realizado pelos autores)
131
3.2. Moagem
A moagem foi realizada de duas maneiras, a primeira foi realizada no moinho de rolo dentado
da empresa casa OLEC; e a segunda, foi realizada em um triturador doméstico, onde 100g de bagaço
foram moídos durante 1 minuto.
Com o intuito de comparar a granulometria dessas diferentes moagens como a granulometria
da farinha de trigo, 50g de bagaço de malte de cada um dos testes e 50g de farinha de trigo foram
peneirados em um jogo de peneira Tyler #9 (2,000 mm), #16 (1,000 mm), #28 (0,600 mm), #35 (0,425
mm) e #100 (0,150 mm).
3.3. Análise Físico-Química
Para caracterização físico-química da farinha obtida foram realizados ensaios para
determinação de carboidratos, lipídeos, umidade, cinzas (minerais), proteínas e fibras.
3.3.1. Determinação do teor de umidade
Para a determinação da umidade foi utilizada a metodologia proposta por SILVA, 2013a. Para
realização do citado ensaio foi necessária uma estufa sem circulação de ar com controle digital de
temperatura, pinça e placa de Petri. Com a ajuda de uma balança analítica, foi feita a determinação da
massa da placa e depois adicionou-se uma quantidade de 3,0g da farinha de malte. Transferiu-se
ambos para a estufa durante um período de 60 minutos e depois a amostra foi levada para um
dessecador até atingir a temperatura ambiente. Com a balança analítica, a nova massa de farinha foi
anotada e a porcentagem de umidade foi determinada a partir da equação (1), como descrito em
SILVA,2013a.
( )
(1)
Onde:
= Massa inicial de amostra
= Massa final de amostra
3.3.2. Lipídeos
Para determinação da concentração de lipídeos utilizou-se a metodologia proposta por Blight
& Dyer. Foram realizadas extrações a frio utilizando metanol, clorofórmio e água (MCA), na
proporção 1:2:0,8 (v/v). Posteriormente, a fase contendo clorofórmio e gordura foi isolada e levada
para quantificação do teor de lipídeos (BLIGHT,1959).
132
Para determinação do teor de lipídeos utilizou-se um funil de separação onde foram
adicionadas 2,5 g de amostra e 38,00 mL de solução MCA. Agitou-se por 10 minutos, permitindo a
liberação do gás formado pela solução durante este tempo. Adicionou-se mais 10 mL de clorofórmio e
10 mL de solução de sulfato de sódio 1,5% (p/v) e agitou-se por mais 2 minutos. Ao final, recolheu-se
a fração inferior no funil. Retirou-se uma alíquota de 5mL. O peso do óleo na alíquota foi mensurado
através da equação (2).
(2)
Sendo,
=Peso do Óleo na alíquota pesada;
=Peso do Óleo na amostra total;
O teor de lipídeos foi obtido pelo mesmo método citado anteriormente, mas utilizando a
equação (3) (BLIGHT, 1959).
(3)
Onde,
= Gramas de Lipídeos Totais em 100g da amostra, ou seja, valor percentual desse nutriente;
3.3.3. Cinzas
Para a determinação do teor de cinzas, em um cadinho de porcelana pesou-se aproximadamente
2 g do bagaço de malte (SILVA,2013b). Carbonizou-se então a amostra em mufla em uma
temperatura de 600ºC por 2 horas. Retirou-se da mufla o material e deixou resfriar em um dessecador,
até atingir a temperatura ambiente. A quantificação do teor de cinzas foi realizada através da equação
(4) (SILVA,2013b), partindo do princípio de que em uma carbonização em alta temperatura, o
material restante é totalmente composto pelos minerais (cinzas).
(4)
Onde,
= massa de bagaço antes da carbonização;
= massa de bagaço depois da carbonização;
133
Com isso, a quantidade percentual de cinzas na amostra pode ser mensurada através da
equação (5):
(5)
3.3.4. Proteínas
O método de Kjeldahl foi escolhido para quantificar o teor de proteínas no resíduo do bagaço
de malte. Com um bloco digestor, bureta, destilador de nitrogênio Kjeldahl e pipetas, o teste foi
efetuado. Para o cálculo da concentração de proteína foi utilizada a equação (6) segundo
(CAPOBIANGO, 2018):
(6)
Onde,
= Volume em mL de titulante;
= Concentração molar de HCl;
= Miliequivalente grama de nitrogênio;
= Peso da amostra;
= Percentagem de Proteínas Brutas;
3.3.5. Fibras
A determinação do teor de fibras foi realizada utilizando o método proposto por Henneberg,
1864. Pesou-se 1,00 g da amostra e transferiu 0para erlenmeyer, em seguida, adicionou-se 50 mL de
H2SO4, na concentração de 0,15 mol/L, ocorrendo uma digestão ácida. Deixou-se esfriar e, em
seguida, adicionou à amostra uma solução de 25 mL de NaOH (1,5 mol/L) para a digestão básica. Por
fim, a quantidade centesimal de fibras foi calculada tendo como referência a massa pesada de resíduo
de grão de Bagaço de Malte colocada anteriormente no erlenmeyer, na equação (7):
(7)
Sendo, mamostra, a massa do grão antes da digestão ácida e digestão básica.
134
3.3.6. Carboidratos
O teste para quantificação de carboidrato na amostra é realizado após todos os outros ensaios
terem sido realizados. O cálculo aconteceu de forma que a quantidade de carboidratos foi dada pela
diferença da massa total pela soma numérica de todos os testes. Este raciocínio é evidenciado na
equação (8).
(8)
Sendo:
PB = Quantidade Porcentual de Proteínas;
U = Quantidade Porcentual de Umidade;
Cz= Quantidade Porcentual de Cinzas;
LT = Quantidade Porcentual de Lipídeos;
FB = Quantidade Porcentual de Fibras.
3.4. Teste de aceitação
Para realização deste teste foram preparados pães, feitos através de uma receita padrão, na
qual foram utilizadas diferentes quantidades de farinha de malte, conforme Tabela 3:
Tabela 3 – Quantidades de farinha de malte
Amostra Farinha de malte
1 0%
2 10%
3 20%
4 30%
Fonte: (Realizado pelos autores)
As amostras, que foram codificadas e entregues à 227 entrevistados, foram avaliadas em uma
escala hedônica, como mostrada na Figura 4, para os fatores sabor, aroma, textura, visual e
aceitabilidade.
135
Figura 4 - Escala Hedônica
Fonte: (Adaptado - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação)
O resultado final pode ser avaliado de duas maneiras. Caso o somatório das porcentagens de
―Gostei‖ e ―Adorei‖ somem 85% ou mais, o produto foi aceito pelos entrevistados. Outra forma de
analisar, é calculando a média dos dados avaliados e comparar ao pão padrão (sem adição do bagaço
de malte).
4. Resultados e Discussão
4.1. Secagem
Os testes foram realizados em triplicata, obtendo os resultados apresentados na Tabela 4:
Tabela 4 – Processo de secagem
Tempo (min)
Estufa sem
circulação
(100°C)
Banho de areia
(100°C)
Estufa com
circulação
(100°C)
Leito fluidizado
(37°C)
Massa de bagaço de malte (g)
0 100,2 100,3 100,2 99,9
30 78,1 68,1 58,4 73,8
60 48,5 45,9 37,1 49,8
90 34,7 35,2 34,4 40,8
120 34,2 34,4 34,4 37,2
Fonte: (Realizado pelos autores)
Como é possível notar, todos os equipamentos apresentaram uma perda de massa de água
muito semelhante no tempo decorrido estudado. É importante notar que para secagem de quantidades
maiores do que a testada, os equipamentos mais indicados seriam a estufa com circulação de ar e o
leito fluidizado, uma vez que nestes equipamentos não há a saturação do ambiente.
4.2. Moagem
Como apresentado anteriormente, a moagem do bagaço de malte foi realizada de duas formas
diferentes. Os resultados desse teste se encontram na Tabela 5:
Tyler Abertura Malte não moído Moinho de rolo Triturador Doméstico Farinha de trigo
136
Tabela 5 – Teste de granulometria
Fonte: (Realizado pelos autores)
O moinho de rolo dentado não apresentou uma granulometria adequada para a utilização da
farinha, fato que não ocorreu durante o uso do triturador doméstico, que apresentou resultados bem
satisfatórios, sendo o que mais se aproximou dos resultados obtidos da granulometria farinha de trigo.
4.3. Umidade
A partir da metodologia de SILVA, 2013a e da equação (1) a quantidade de umidade da
farinha de malte foi determinada e com resultado obtido de 0,9724 g. A umidade relatada representa
toda a água presente no interior do bagaço de malte que não pôde ser retirada mediante os métodos de
secagem.
4.4. Análises físico-químicas
Comparando os resultados obtidos por este artigo com os resultados obtidos na base seca com
MAYER, 2007 e Cordeiro,2011 têm-se na Tabela 6.
(mm) dentado
Massa
(g)
Porcentagem
(%)
Massa
(g)
Porcentagem
(%)
Massa
(g)
Porcentagem
(%)
Massa
(g)
Porcentagem
(%)
#9 2,000 45,03 90,06 7,86 15,73 0,21 0,43 0,00 0,00
#16 1,000 4,75 9,50 28,93 57,86 0,75 1,50 0,00 0,00
#28 0,600 0,22 0,43 6,15 12,30 8,76 17,52 0,00 0,00
#35 0,425 0,00 0,00 2,62 5,24 9,29 18,59 0,00 0,00
#100 0,150 0,00 0,00 3,73 7,46 22,86 45,73 37,80 74,85
Coletor -0,150 0,00 0,00 0,71 1,41 8,12 16,24 12,70 25,15
137
Tabela 6 - Comparação com outros artigos
Porcentagem média
Parâmetros Autores Mayer, 2007 Cordeiro, 2011
Lipídeos 6,24 2,90 8,52
Cinzas 2,08 1,90 4,52
Proteínas 15,43 12,60 18,82
Fibras 18,17 22,20 13,95
Carboidratos 58,08 60,40 54,19
Fonte: (Realizado pelos autores)
Percebe-se, através dos dados apresentados na tabela 7, que os valores encontrados,
convertidos para base seca, corroboram com os resultados encontrados por Mayer et al (2007) e
Cordeiro et al (2011), validando os cálculos e a realização das metodologias utilizadas. As diferenças
apresentadas entre os valores obtidos neste estudo e os outros artigos são perfeitamente
compreensíveis quando se sabe que a composição centesimal do bagaço de malte é função de diversos
fatores, tais como: variedade da cevada, o tempo de colheita, os cereais utilizados na maltagem, o
processo tecnológico empregado na cervejaria, dentre outros.
4.5. Análise Sensorial
Para a análise sensorial, um total de 228 votos foram analisados. Os resultados obtidos para o
teste hedônico estão representados na Figura 5, demonstrando o nível de aceitação de cada tipo de pão.
Figura 5 - Teste Hedônico
Fonte: (Realizado pelos autores)
Percebe-se uma grande preferência para o pão com concentração de 20% de bagaço de malte.
Através dos dados obtidos, é possível afirmar que os pães que apresentavam 10% e 20% de farinha de
bagaço de malte foram aceitos pelos entrevistados.
138
5. CONCLUSÃO
A partir dos testes de secagem, realizados, é possível inferir que todos equipamentos
analisados apresentaram uma eficiência semelhante para as condições testadas. Apesar disso, como o
leito fluidizado apresenta um porte menor que dos outros equipamentos e devido ao seu menor gasto
energético, este se apresenta como a melhor alternativa para o processo em questão.
Além disso, é possível aferir que a caracterização físico-química do trabalho feito foi realizada
com êxito, estando de acordo com os dados na literatura e tendo uma concordância entre os valores. O
bagaço de malte se mostrou um insumo interessante para a alimentação humana devido,
principalmente, ao seu alto teor de fibras e carboidratos.
A análise da aceitação do produto formado apresentou altos índices de aprovação
demonstrando que a farinha malte pode ser utilizada como um aditivo alimentar.
6. REFERÊNCIAS
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142
USO DA RMN PARA O CONTROLE DE QUALIDADE NA INDÚSTRIA CERVEJEIRA
Flores, Igor Savioli1*
Annunciação, Daniel Luiz Rodrigues da2
Souza, Tainá Francisca Cordeiro de3
Jesus, Lázaro Sátiro de4
Lião, Luciano Morais5
Resumo: A técnica de Ressonância Magnética Nuclear é muito versátil na identificação de diferentes
espécies químicas. Há algum tempo vem sendo relatado o seu uso na análise de alimentos e bebidas,
como a cerveja, em que pode avaliar a matéria-prima, processo de produção e controle de qualidade. O
presente trabalho ilustra esta capacidade identificando aminoácidos essenciais e não essenciais,
carboidratos fermentescíveis ou não, ácidos orgânicos, álcoois superiores e outros, em diferentes
estilos de cervejas comercializadas na Cidade de Goiânia, Estado de Goiás, Brasil. Além disso, foi
realizada a identificação do perfil conforme o armazenamento e aminoácidos gerados conforme o tipo
de malte, pela extração em ultrassom. Os resultados mostram que a RMN de ¹H aliada ao processo de
produção é de grande valia para evitar problemas de qualidade da matéria-prima, monitoramento das
etapas e outros. Assim, ilustra brevemente as vantagens que podem ocorrer através da parceria com
instituições públicas de ensino, que apresentam um aporte instrumental maior, com o desenvolvimento
de processos do setor privado.
Palavras chaves: RMN, cerveja especial, maltes, controle de qualidade
1. Introdução
Nos últimos anos, devido ao crescimento do mercado nacional cervejeiro houve uma demanda
por produtos de estilos diferenciados e com elevada qualidade, capazes de atender consumidores cada
vez mais exigentes. Desta forma, essa demanda tem exigido dos fabricantes conhecimento do perfil
químico dos seus rótulos, bem como um rigoroso controle de qualidade da matéria prima, da água de
produção e das etapas envolvidas no preparo.
Neste sentido a Ressonância Magnética Nuclear (RMN) desponta como uma valiosa ferramenta
analítica para identificação e quantificação de substâncias de interesse. O seu princípio se baseia nas
medidas de absorção de radiação eletromagnética por parte de núcleos atômicos na região de
radiofrequência (4 a 750 MHz), sendo necessário expor as amostras a diferentes teslas de campo
magnético (MACOMBER, 1998; MENDHAM, DENNEY, et al., 2002; PAIVA, LAMPMAN, et al.,
2010).
1Químico. Prof. Dr. do Instituto Federal de Goiás - IFG, Campus Luziânia – GO, Brasil. [email protected]
2Químico. Prof. Dr. do Instituto Federal de Goiás - IFG, Campus Luziânia – GO, Brasil.
[email protected] 3Engenheira de Alimentos. Acadêmica do curso de mestrado na Engenharia de Alimentos da Universidade
Federal de Goiás - UFG, Campus Goiânia – GO, Brasil. [email protected] 4Engenheiro de Alimentos. Acadêmico do curso de doutorado na Engenharia de Alimentos da Universidade
Federal de Goiás - UFG, Campus Goiânia – GO, Brasil. [email protected] 5Químico. Prof. Dr. da Universidade Federal de Goiás, 74690-900, Goiânia, GO, Brasil. [email protected]
143
Diversos estudos empregam a espectroscopia de RMN para análises de espécies orgânicas na
indústria alimentícia, haja vista que isótopos como 1H,
13C e
31P, são sensíveis a essa técnica e muito
comuns na composição química dos alimentos (HILLS, 2010; LULIANELLI e TAVARES, 2011;
MINOJA e NAPOLI, 2014; LACHENMEIER, 2016; SUNDEKILDE, JARNO, et al., 2018;
CONSONNI, POLLA e CAGLIANI, 2018).
Assim, para análises envolvendo cerveja e sua matéria prima, a literatura descreve a
versatilidade e riqueza de dados fornecidos. Como exemplo se pode citar aplicações em que o método
foi utilizado para distinguir, através do perfil químico das cervejas, as regiões dos países de fabricação,
como também diferenciarem marcas, rótulos e tipos de insumos (MARTIN, BENBERNOU e
LANTIER, 1985; LACHENMEIER, FRANK, et al., 2005; LACHENMEIER, 2016; JEONG, CHO e
KIM, 2017). Além disso, da mesma forma em que foram determinados compostos orgânicos, é
possível também quantificar espécies inorgânicas, como cátions metálicos (Na+, K
+, Ca
2+. Mg
2+) em
água mineral, mostrando a versatilidade da RMN (MONAKHOVA, KUBALLA, et al., 2017).
Também merece destaque o fato de que as análises podem ser realizadas em matrizes sólidas (lúpulos,
maltes e etc.) sem qualquer etapa de preparo. No caso de matrizes líquidas, como as cervejas, são
necessárias apenas retirar o gás carbônico pelo auxílio do ultrassom e posterior adição de solução
tampão. Isso é uma grande vantagem frente a outros métodos instrumentais, como a cromatografia, em
que a etapa de preparo das amostras demanda tempo e grandes volumes de solventes, além de gerar
quantidades significativas de resíduos tóxicos e necessitar de um monitoramento em relação às perdas
dos analitos.
Portanto, torna-se evidente a aptidão da espectroscopia de RMN para emprego nos processos
de controle de qualidade da indústria cervejeira, onde pode atuar na caracterização e escolha da
matéria prima, no controle e identificação das espécies formadas ao longo dos processos e qualidade
do produto final. Observa-se também que as informações permitem determinar a ocorrência de
fraudes, tendo em conta que os resultados são capazes de diferenciar regiões de fabricação, estilos,
marcas, tipos de insumos e adição de adulterantes.
2. Objetivos
O objetivo deste estudo foi investigar as potencialidades de emprego da
Espectroscopia de Ressonância Magnética Nuclear (RMN) no controle de qualidade na
indústria cervejeira.
3. Materiais e métodos
144
As etapas envolvidas nesse estudo consistiram em análises de RMN para: (a)
caracterização dos principais compostos químicos presentes em treze estilos de cervejas; (d)
avaliação do perfil de degradação da cerveja em decorrência do armazenamento em cerveja
não pasteurizada e (c) identificação do perfil de aminoácidos presentes em extratos de
diferentes tipos de malte.
A seguir serão descritos os métodos utilizados para o preparo de amostras e condições
experimentais para as análises por espectroscopia de RMN.
3.1. Preparo das Amostras
3.1.1. Perfil químico conforme estilos de cerveja
Foram utilizadas amostras de cerveja especiais diversas comercializados na Cidade de
Goiânia, Estado de Goiás, Brasil. Os estilos avaliados são: 1. American Lager, 2. Belgian
Blond, 3. American India Pale Ale, 4. Sour, 5. Belgian Strong Golden Ale, 6. Strong Pale Ale,
7. American Wheat, 8. Munich Helles, 9. Hefe Weissbier, 10. Saison, 11. Imperial Stout, 12.
Session India Pale Ale e 13. Belgian Dark Strong Ale.
Assim, as garrafas foram abertas no dia da análise, sendo retiradas alíquotas de 500 μL
para desgaseificação em banho ultrassom por 10 minutos. Logo em seguida, 200 μL de
amostra foram solubilizadas em 400 μL de solução com água deuterada (D2O) e padrão
Trimetilsililpropionato de sódio (TSP) 0,1% (V/V).
3.1.2. Degradação com o tempo de armazenamento
Para investigação de possíveis alterações na composição química da cerveja em função do
armazenamento, foi utilizada a cerveja estilo Imperial India Pale Ale produzida artesanalmente pelo
método all-grain. Assim, análises foram realizadas em amostras de cerveja recém produzida e após 2
meses. O procedimento de preparo de amostras foi o mesmo utilizado para estudo da composição
química de cervejas, descrito no tópico anterior.
O intuito foi mostrar alterações no perfil químico quando a cerveja é comercializada como
―cerveja viva‖. Este procedimento pode ser empregado na otimização do processo de pasteurização
identificando qual a melhor condição para minimizar a alteração da cerveja neste processo, além de
garantir a manutenção das características após o armazenamento.
3.1.3. Perfil de aminoácidos obtidos com a extração de maltes em ultrassom
Os maltes foram adquiridos no comércio de Goiânia-GO e os tipos analisados foram: Arome,
Biscuit, Black, Café, Cara Blend, Cara Clair, Cara Gold, Cara Ruby, Cevada Torrada, Chocolate,
145
Crystal, Maris Olter, Melano, Melano Light, Munich Light, Pale Ale, Piastatic, Pilsen, Rye, Special B,
Spelt, Viena, Wheat Blanc, Wheat Crystal, Wheat Munich Light.
No intuito de verificar os principais componentes presentes em diferentes tipos de malte,
amostras desses foram homogeneizadas, sendo posteriormente retirada uma porção de 100 mg para
moagem, realizada com auxílio de almofariz e pistilo. Logo após, 100 mg desse material foi
adicionado a 600 μL de D2O para a extração em banho de ultrassom com aquecimento por 30 minutos.
A seguir, a mistura heterogênea foi centrifugada por 8 minutos, sendo retirado o sobrenadante para a
análise por RMN. Assim, foi usado capilar de vidro para a quantificação pelo sinal do Ácido Maléico
presente em solução 100 mmol.
3.2. Aquisição e processamento dos dados de RMN
As amostras foram analisadas em tubos de RMN de 5 mm, utilizando sonda Broad Band
Inverse – BBI, inserida em um equipamento Bruker Avance III 11,75 T. A sequência de pulsos usada
em ambos os casos foi a noesypr1d para a supressão do sinal da água. Os espectros foram processados
com line-broadening de 0,3 Hz e recurso zero-filling.
As análises quimiométricas foram realizadas no software AMIX Statistics versão
3.9.14 da Bruker. Foram usados buckets de 0,01 ppm avaliando as variáveis entre 3,1 a 4,2
ppm, região que compreende diversos sinais de carboidratos.
4. Resultados e discussão
4.1. Perfil químico conforme estilos de cerveja
Através das análises de RMN foi possível identificar os compostos químicos de grande interesse para
avaliação de qualidade da cerveja, sendo alguns desses apresentados na Figura 1, através dos espectros
de ¹H das amostras que representam os estilos American Lager e Belgian Blond.
146
Figura 1. Espectros de RMN de ¹H das amostras American Lager e Belgian Blond com a identificação de alguns
componentes orgânicos presentes na matriz cerveja. Sendo: (1) Alanina, (2) Ácido acético, (3) Glicose, (4)
Maltooligossacarídeos, (5) Tirosina, (6) Fenilalanina e (7) Feniletanol
Deste modo é possível identificar nos espectros os compostos: Alanina, Ácido acético,
Glicose, Maltooligossacarídeos, Tirosina, Fenilalanina e Feniletanol. A presença desses na matriz
cerveja também é descrita em alguns estudos em que a técnica foi utilizada como método instrumental
de análise (RODRIGUES e GIL, 2011; EDWARDS, 2016; JOHNSON, SOPRANO, et al., 2017).
O feniletanol está presente em boa parte das essências naturais e seu aroma floral de rosas dá
complexidade ao sensorial à cerveja (VIGNOTO e SCHNEIDER, 2015). Já a fenilalanina é um
aminoácido essencial, ou seja, não é produzido no organismo e deve ser obtida através da dieta
alimentar. Ao contrário deste aminoácido, a tirosina e a alanina são sintetizadas no organismo
humano, sendo que a tirosina pode ser encontrada em abundância em alimentos ricos em conteúdo
protéico, como amendoin e amêndoas.
Um fator de destaque nos resultados obtidos nos espectros para as amostras de cerveja é a
simetria dos picos, indicando a homogeneidade do campo magnético no qual os analitos são
submetidos para absorção de radiação eletromagnética. Além disso, o fato dos picos não se
apresentarem de forma sobreposta sugere a seletividade, ou seja, o método instrumental é capaz de
determinar esses compostos, em diferentes tipos de cerveja, sem a presença de interferentes.
147
Do ponto de vista quantitativo, também é importante destacar que os valores de integração dos
sinais nos espectros de RMN são proporcionais à concentração dos compostos. Deste modo, na Tabela
1 se encontram as proporções entre as concentrações de aromáticos, alifáticos e carboidratos,
identificadas nas 13 amostras de cerveja.
Tabela 1. Proporção relativa das áreas dos sinais compreendidos em regiões específicas dos
compostos orgânicos.
Essas espécies representam um conjunto de substâncias responsáveis pelas características
organolépticas das cervejas. Desta forma, torna-se evidente a capacidade da RMN em avaliar o perfil
de concentração desses compostos de interesse (antioxidantes, aminoácidos, carboidratos e etc.) para
avaliação da qualidade dos produtos.
Analisando a Tabela 1 é possível observar que a American Lager apresentou as menores
concentrações em toda faixa espectral indicando uma cerveja com menos corpo e menor quantidade de
extrato. A Belgian Blond apresentou uma maior quantidade de Glicose residual, juntamente com a
Saison e Belgian Dark Strong Ale. Isso pode ser observado na Figura 2, onde são apresentados os
espectros sobrepostos para as 13 amostras e os sinais ampliados para a Glicose.
148
Figura 2. Sinais ampliados em destaque correspondentes a Glicose nos espectros sobrepostos para as treze
amostras de cerveja.
A importância dessa avaliação se deve ao fato de que a cerveja pode ter identificado as fontes
que contribuem para o seu conteúdo calórico. Assim, a presença de carboidratos como a Glicose pode
ser corrigida em uma cerveja menos calórica ou monitorada a sua presença para chegar a uma
característica esperada para o atendimento a um determinado estilo. No que diz respeito às Dextrinas,
a Tabela 2 mostra os valores de integração das classes. Lembrando que estas são diretamente
proporcionais à concentração.
Tabela 2. Proporção relativa das áreas dos sinais referentes a quatro classes de dextrinas nas cervejas
investigadas.
149
De acordo com a Tabela 2, o estilo Saison foi a que apresentou a menores valores entre as
quatro classes de dextrinas. Os valores mostram que a dextrina α (14) apresentou baixíssima
proporção em relação às demais. Por outro lado, os valores mais elevados para as quatro classes foram
determinados para o estilo Belgian Dark Strong Ale.
Esse perfil de dextrinas pode ser usado para o controle do processo de mosturação, onde se
espera semelhança nos resultados de lotes referentes à mesma receita, cuja fonte de carboidratos seja
idêntica. Neste sentido, uma investigação dos sinais na região de carboidratos foi realizada para
análise multivariada dos dados. Esses resultados são apresentados na Figura 3.
Figura 3. A) Gráfico tridimensional de PCA gerado a partir do perfil de carboidratos e B) espectros das amostras
com perfis de carboidratos mais similares.
Assim, foi verificada a concordância dos resultados observados na análise de componentes
principais – PCA, com o perfil atribuído pelas integrações de sinais das dextrinas. No gráfico
tridimensional de PCA da Figura 3A, pode-se observar que as amostras com perfis de carboidratos
mais distintos são as que se encontram mais distantes da origem dos eixos (PC1, PC2 e PC3) e
também distantes entre si. Ainda na Figura 3A, percebe-se que as amostras destacadas com um círculo
vermelho (American Wheat, Hefe Weissbier e Session IPA) são aquelas que apresentaram similaridade
devido ao tipo de malte usado na sua produção. Na Figura 3B essa similaridade é confirmada pelo
perfil espectral obtido individualmente para estes três exemplares.
Porém, apesar da cerveja Session IPA não ser produzida com malte de trigo, é percebido que
este foi usado na produção e está de acordo com a descrição presente no rótulo. Cabe ressalta que esta
150
semelhança demonstrada na Figura 3 ocorreu apenas nesta região do espectro e em compostos
presentes em maior proporção.
Portanto, a análise da região espectral de carboidratos é muito útil para a diferenciação dos
estilos, tendo uma boa distância entre os pontos que representam as cervejas de cada estilo. Assim, é
possível visualizar as alterações no perfil conforme as características do estilo através de gráficos de
mérito gerados na análise quimiométrica. Contudo, essa estratégia não pode ser usada para diferenciar
estilos que se diferenciam principalmente pelo perfil de lúpulos.
Outro aspecto observado nos espectros das amostras American Lager, American IPA (Fruta),
American Wheat e Hefe Weissbier é a presença de um sinal em 9,6 ppm descrito pela literatura como
sendo do Acetaldeído. A formação desse composto durante antecede o etanol, e sua presença sugere a
necessidade de maior tempo de maturação (RODRIGUES e GIL, 2011).
Em relação aos ácidos orgânicos, a Figura 4 apresenta o espectro da cerveja estilo Sour, com
os sinais do ácido lático em destaque. Na mesma é possível verificar que os sinais são muito intensos
em relação aos demais o que comprova a sua presença em grande concentração. Este sinal não é
percebido em quantidades apreciáveis nas demais amostras.
Figura 4. Regiões espectrais de RMN de ¹H da cerveja estilo Sour que apresentam os sinais do Ácido Lático e
assinalamento dos grupos responsáveis pelos sinais.
Logo, esses resultados confirmam que a cerveja Sour apresenta, como principal característica,
um perfil de ácidos orgânicos que a difere dos demais estilos. Além disso, observa-se que além do
151
Ácido Lático, foi identificada a presença de Ácido Fórmico nas amostras de American Lager, Munich
Helles, Imperial Stout e Belgian Dark Strong Ale, sendo que na última, em maior concentração. A
presença deste pode ser justificada pela torra de maltes onde ele é gerado (JOHNSON, SOPRANO, et
al., 2017).
Para as espécies aromáticas, as amostras de Hefe Weissbier e Saison foram as que
apresentaram maiores concentrações. Os compostos identificados nesta região contemplam, por
exemplo, alguns aminoácidos como a Histidina, Uridina, Triptofano, Fenilalanina e Tirosina. Alguns
são identificados nos espectros da Figura 1. Esses aminoácidos são de grande importância para um
bom andamento da fermentação.
Já os álcoois superiores, na Tabela 3 se encontram as proporções entre as áreas dessas
espécies para os sinais das 13 amostras de cerveja. Esses valores correspondem aos compostos Iso-
Butanol, Iso-Pentanol e 1-Propanol, sendo provenientes de uma inadequada fermentação que
ocasionam alterações no aroma.
Tabela 3. Proporção relativa das áreas dos sinais referentes aos álcoois superiores presentes nas
amostras de cerveja.
Os valores de integração contemplam as áreas dos sinais de álcoois superiores Iso-Butanol,
Iso-Pentanol e 1-Propanol. Para isso foi integrada a região entre 0,85 a 0,91 ppm. Sendo que os
componentes variam as proporções em cada amostra de cerveja. O álcool 2,3-butandiol foi
identificado, mas seu sinal é sobreposto com o sinal intenso do etanol. O 1-propanol apresenta um
sinal em 1,5 ppm, o que permite conhecer a sua concentração de forma isolada.
152
Assim, as maiores proporções de álcoois superiores foram determinadas para as amostras
Saison (0,48), Belgian Strong Golden Ale (0,32) e Belgian Dark Strong Ale (0,30). Por outro lado, os
estilos American Lager (0,11), Munich Helles (0,11) e Imperial Stout (0,14), apresentaram os menores
valores.
A presença destes componentes pode indicar a performance da fermentação ou até mesmo o
perfil obtido conforme a cepa de levedura utilizada. Trata-se de uma informação útil para se otimizar
as condições de fermentação/maturação ou mesmo a levedura mais adequada às características
desejadas.
Outra informação de boa relevância é o teor de etanol que foi calculado para todas as amostras
(Tabela 4). A vantagem dessa informação é que se torna uma informação complementar contida nos
dados espectrais. Ou seja, em apenas um espectro de RMN de ¹H, é possível obter dezenas de
informações sobre as características químicas da amostra.
Tabela 4. Teor alcoólico calculado, informado no rótulo e diferença observada.
Os resultados mostram que a diferença média observada entre estes valores é, em média de
0,07%, e o desvio padrão de ± 0,02. Isso pode ser atribuído erro experimental e possíveis interferentes
minoritários que possam apresentar sinal na mesma região de integração. No entanto, devido
`diferença ser muito baixa, pode ser usada na verificação também deste parâmetro durante o
armazenamento. Claro que podemos inferir em alterações significativas somente quando possuírem
valores acima deste.
153
4.2. Composição química conforme o armazenamento
Para este estudo os espectros da Figura 5 foram obtidos da cerveja Imperial India Pale Ale
recém produzida e compara com a mesma armazenada durante dois meses sem refrigeração. A região
de sinais que mais apresentou diferença foi a de compostos aromáticos. Destaque para o nucleosídeo
Citidina (9), o aminoácido Uridina (10) e o antioxidante Kaempferol (11), identificados aqui e
descritos na literatura (SIQUEIRA, BOLINI e MACEDO, 2008; RODRIGUES e GIL, 2011).
Figura 5. Espectros de cerveja estilo Imperial India Pale Ale com diferentes tempos de armazenagem.
Além disso, observa-se também na Figura 5 uma variação no teor alcoólico, acrescida com o
tempo de armazenamento. Isto se deve a fermentação de açúcares residuais na presença de leveduras
remanescentes da filtragem.
4.3. Composição química dos tipos de Malte
Nesta parte do estudo, foram analisados maltes de grande demanda em receitas de estilos
comercializados no país. Na Tabela 5 seguem os principais compostos presentes nas análises
realizadas. As identificações dos aminoácidos se deram através de experimentos de RMN e foram
confrontados com a literatura (JOHNSON, SOPRANO, et al., 2017).
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Tabela 5. Composição química de Aminoácidos em diferentes extratos aquosos de maltes
comercializados no país.
O perfil químico de maltes após extração pode ser usado para atestar autenticidade ou mesmo
e atribuir equivalência entre empresas e marcas diferentes. Na Figura 6 o espectro dos maltes
intitulados como ―Chocolate‖ e ―Cevada Torrada‖ apresentam um perfil químico semelhante.
Figura 6. Espectros de RMN de ¹H de maltes em D2O após 30 minutos de extração em ultrassom.
Os espectros sobrepostos apresentam os sinais se compostos majoritários presentes nos
extratos aquosos, o que evidencia muita similaridade destes componentes. Lembrando que os
compostos minoritários podem alterar as características mesmo em casos de maltes como estes, pois o
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limite de percepção ao sabor percebido na língua, consegue identificar componentes na concentração
de partes por milhão – ppm.
5. Conclusão
A técnica de RMN se mostrou eficiente na identificação de compostos orgânicos presentes nas
cervejas e maltes. Os espectros foram adquiridos de forma rápida e com uma simples etapa de preparo
de amostra. Desta forma foi possível manter as características da matriz evitando transformações
indesejadas.
As análises permitiram uma visão ampla da composição química das cervejas conforme os
estilos e pode ser empregada para aprimorar processos e práticas de produção. A caracterização dos
maltes permite atestar autenticidade e/ou equivalência entre diferentes tipos e fornecedores.
Por outro lado, as análises dos produtos ao longo do tempo permitiram identificar alterações
na composição química, principalmente na região de compostos aromáticos. Sendo assim, esse
trabalho sugere que a RMN de ¹H pode ser utilizada como ferramenta de controle de qualidade na
indústria cervejeira, monitorando as transformações envolvidas em cada etapa do processo.
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