revel 16 relacoes possiveis entre a linguistica da enunciacao e a clinica de linguagem

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ReVEL, v. 9, n. 16, 2011 ISSN 1678-8931 356 SUREAUX, Luiza Milano; LIMA, Tatiane Machado. Relações possíveis entre a linguística da enunciação e a clínica de linguagem. ReVEL, v. 9, n. 16, 2011. [www.revel.inf.br]. RELAÇÕES POSSÍVEIS ENTRE A LINGUÍSTICA DA ENUNCIAÇÃO E A CLÍNICA DE LINGUAGEM Luiza Milano Surreaux 1 Tatiane Machado Lima 2 [email protected] [email protected] RESUMO: O presente artigo propõe relacionar lingüística da enunciação e clínica de linguagem como dois campos que dialogam quando se lida com a forma singular de um sujeito estar na linguagem. Parte-se de uma retomada das abordagens saussuriana e benvenistiana no campo da linguística para fundamentar a de análise de dados de fala desviante oriundos da clínica fonoaudiológica. As análises apontam que é necessário levar em consideração, além do funcionamento da ordem própria da língua, o modo singular como o sujeito dela se apropria. PALAVRAS-CHAVE: clínica de linguagem; fonoaudiologia; linguagem desviante; linguística da enunciação INTRODUÇÃO “Não atingimos jamais o homem reduzido a si mesmo e procurando conceber a existência do outro. É um homem falando que encontramos no mundo, um homem falando com outro homem, e a linguagem ensina a própria definição do homem” Benveniste, E., 1991: 285 Neste vasto universo chamado linguagem é que o homem constitui-se como homem, ela está em sua natureza e não pode ser extirpada. No entanto, existem muitos casos em que os padrões esperados de funcionamento da linguagem desviam-se do que seria previsto. Instaura-se, portanto, uma das tarefas mais complexas para o estudioso da linguagem, seja ele terapeuta de linguagem ou linguista: produzir uma escuta que envolva as produções de falas desviantes. 1 Professora do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS – e integrante do Grupo de Pesquisa Enunciação e Sintoma na Linguagem – IL/UFRGS. 2 Graduanda do Curso de Fonoaudiologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS.

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Relacoes Possiveis Entre a Linguistica Da Enunciacao e a Clinica de Linguagem

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  • ReVEL, v. 9, n. 16, 2011 ISSN 1678-8931 356

    SUREAUX, Luiza Milano; LIMA, Tatiane Machado. Relaes possveis entre a lingustica da enunciao e a clnica de linguagem. ReVEL, v. 9, n. 16, 2011. [www.revel.inf.br].

    RELAES POSSVEIS ENTRE A LINGUSTICA DA ENUNCIAO E A CLNICA DE LINGUAGEM

    Luiza Milano Surreaux1 Tatiane Machado Lima 2

    [email protected] [email protected]

    RESUMO: O presente artigo prope relacionar lingstica da enunciao e clnica de linguagem como dois campos que dialogam quando se lida com a forma singular de um sujeito estar na linguagem. Parte-se de uma retomada das abordagens saussuriana e benvenistiana no campo da lingustica para fundamentar a de anlise de dados de fala desviante oriundos da clnica fonoaudiolgica. As anlises apontam que necessrio levar em considerao, alm do funcionamento da ordem prpria da lngua, o modo singular como o sujeito dela se apropria. PALAVRAS-CHAVE: clnica de linguagem; fonoaudiologia; linguagem desviante; lingustica da enunciao

    INTRODUO

    No atingimos jamais o homem reduzido a si mesmo e procurando conceber a existncia do outro. um homem falando que encontramos no mundo, um homem falando com outro homem, e a linguagem ensina a prpria definio do homem

    Benveniste, E., 1991: 285

    Neste vasto universo chamado linguagem que o homem constitui-se como homem, ela est em sua natureza e no pode ser extirpada. No entanto, existem muitos casos em que

    os padres esperados de funcionamento da linguagem desviam-se do que seria previsto. Instaura-se, portanto, uma das tarefas mais complexas para o estudioso da linguagem, seja ele terapeuta de linguagem ou linguista: produzir uma escuta que envolva as produes de falas desviantes.

    1 Professora do Departamento de Letras Clssicas e Vernculas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul

    UFRGS e integrante do Grupo de Pesquisa Enunciao e Sintoma na Linguagem IL/UFRGS. 2 Graduanda do Curso de Fonoaudiologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul UFRGS.

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    Nesse sentido, esse trabalho tem como objetivo refletir acerca da importncia terico-clnica de um dilogo entre dois campos que buscam pensar o lugar do sujeito na linguagem - a lingstica da enunciao e a clnica dos distrbios de linguagem.

    Da surge uma importante pergunta, que brota no mbito da clnica: em que sentido a

    lingustica poderia auxiliar a reflexo acerca dos distrbios de linguagem? em busca dessa resposta que organizaremos este trabalho.

    1. POR UM DILOGO ENTRE A LINGUSTICA E A CLNICA DE LINGUAGEM

    Iniciamos lembrando a significativa afirmao de Jakobson, que desde a lingstica, aponta o compromisso do linguista com as diferentes formas da linguagem:

    A lingstica interessa-se pela linguagem em todos seus aspectos pela linguagem em ato, pela linguagem em evoluo, pela linguagem em estado nascente, pela linguagem em dissoluo (Jakobson, R.,1963: 34).

    Inspiradas nas palavras de Jakobson, temos, nesse artigo, a inteno de buscar entender as formas atravs das quais um sujeito que apresenta uma fala dita desviante organiza-se em relao estrutura e funcionamento de sua lngua.

    Para dar conta de nossa tarefa, buscaremos os aportes da lingstica saussuriana e benvenisteana.

    Em Saussure, encontramos o conceito de signo lingstico. Segundo o mestre genebrino,

    Chamamos de signo a combinao do conceito e da imagem acstica. [...] Propomo-nos a conservar o termo signo para designar o total, e a substituir conceito e imagem por significante e significado (Saussure, F. 1974: 81).

    No entanto, em situaes de distrbio de linguagem, pode ocorrer de os significantes no encontrarem o significado, ou produzirem um encontro desarranjado.

    J a busca pelos aportes de Benveniste, relaciona-se com o fato de encontrarmos no campo da lingstica da enunciao uma possibilidade de pensar o indito que a situao

    clnica apresenta em termos de linguagem. Essa teoria supe que cada sujeito apropria-se da lngua e a realiza de maneira nica, irrepetvel e singular. Sendo assim, falas desviantes

    apontam para a forma singular com que o indivduo relaciona-se com a lngua. Assim, abordar a singularidade do sujeito na linguagem uma tarefa nada fcil por vrios motivos. Um deles porque justamente falar de singularidade implica em no generalizarmos padres apriorsticos, visto que estamos considerando a particularidade

    atravs da qual um determinado falante far seu percurso na apropriao de uma dada lngua.

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    1.1 O FIO DO DILOGO ENTRE OS CAMPOS

    Aps uma breve contextualizao de nosso ponto de partida, pretendemos agora detalhar nossos pontos de ancoragem nos pressupostos tericos dos estudos de linguagem. O

    que teriam Ferdinand de Saussure e mile Benveniste a contribuir com o seguinte interrogante, que se origina na clnica: o que fazer/pensar quando o significante no encontra

    significado, ou a forma no encontra o sentido? Recorreremos a esses importantes lingistas para ajudarem-nos a pensar sobre esta inquietante questo acerca dos distrbios de linguagem.

    Saussure, o fundador da lingstica moderna, preocupou-se em evidenciar que seu objeto de estudo era a lngua. No entanto, no rejeita o fato de que a lngua no est completa em nenhum [indivduo] apontando, assim, a noo de fala, e continua dizendo que s na massa ela [lngua] existe de modo completo (Saussure, F.,1974: 21). Saussure contextualizou o que regular, homogneo entre os falantes, porm respaldou que a fala uma ato individual de vontade e inteligncia (op.cit.: 22).

    A fala representa nesse sentido a forma como cada indivduo organiza os signos de uma dada lngua. O signo, como j destacamos acima, a unio de um significante e de um significado, ou seja, de uma imagem acstica e de um conceito. Segundo Saussure, o signo arbitrrio, pois a unio entre as suas estruturas uma abstrao convencional e aleatria.

    Porm, cabe destacar, que o termo arbitrariedade no permite a livre associao de significados a significantes no correspondentes, pois todo meio de expresso aceito numa sociedade repousa num hbito coletivo ou, o que vem a dar na mesma, na conveno (op. cit.: 82). Em casos de distrbios de linguagem, quando h excessivo afastamento entre significante e significado, o que evocado no relacionado a nenhum conceito, para o interlocutor. Muitas vezes o signo produzido perde-se no vazio e limita-se ao entendimento do enunciador, pois no cumpriu o que padro para a sociedade (ou para a massa, como destaca Saussure). Contudo, levemos em conta que o que pode no representar um signo para o ouvinte, pode o ser para o falante, o que pode acentuar a incompreenso entre os

    interlocutores.

    Tambm de Saussure a noo de eixos sintagmtico e associativo. As relaes

    sintagmticas ocorrem em presena atravs do encadeamento dos elementos da frase os termos estabelecem entre si, em virtude de seu encadeamento, reaes no carter linear da lngua [...] Estes se alinham um aps o outro na cadeia da fala (op. cit.: 142). J, as relaes associativas, ocorrem em ausncia, na memria. a seleo, dentre os diversos signos lingsticos existentes, de um especfico e no outro: uma palavra qualquer pode sempre

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    evocar tudo quanto seja suscetvel de ser-lhe associado de uma maneira ou de outra (op. cit.:146). Por intermdio da seleo, no eixo associativo, e da combinao, no eixo sintagmtico, nasce a noo de valor lingstico. Esse pode ser entendido como a oposio entre os termos

    desencadeados, os precedentes, os antecedentes, ou ambos. O valor est determinado por aquilo que o rodeia (op.cit.: 135). Atravs do conceito de valor que se torna possvel a compreenso do contexto de, por exemplo, uma frase, durante um dilogo entre os falantes. Benveniste deixa evidente sua herana em relao teoria saussuriana. Segundo ele no h um s lingista hoje que no lhe deva algo (1991: 34). Contudo, para alm de Saussure, Benveniste preocupou-se em estudar a instncia do homem na lngua3. Para ele,

    quando o sujeito apropria-se da lngua, a sua converso em discurso (enunciao) d-se por um ato individual de utilizao. Portanto, no h uma nica maneira de apropriao, mas sim,

    tantas quantas o nmero de falantes. Esta apropriao aponta para aquele que fala em sua fala (Benveniste, E.,1989: 84), e, durante o dilogo, ocorre o entendimento da forma e do sentido por cada um dos locutores:

    ...por uma forma convencional de enunciao que se volta sobre si mesma, que se satisfaz em sua realizao, no comportando nem objeto, nem finalidade, nem mensagem, pura enunciao de palavras combinadas, repetidas por cada um dos enunciadores (op. cit.: 90).

    Cabe, portanto, contextualizar o que forma e o que sentido para Benveniste. No

    texto A forma e o sentido na linguagem, Benveniste apresenta duas possibilidades de anlise da lngua: semitica e semntica. A perspectiva semitica (o signo) pode ser definida como aquela de significar (1989: 229). O semitico aponta para as relaes intralingsticas. J a perspectiva semntica, pode ser definida como aquela de comunicar (op. cit.: 229), pois permite verificar a lngua em funcionalidade e em ao. Conforme Benveniste, estes dois sistemas - semitico e semntico - se superpem na

    lngua. Para ele, somente na situao de discurso que possvel observar a referncia da frase4, no sendo possvel, prev-la ou fix-la. A frase um acontecimento que desaparece,

    pois est limitada ao instante de sua enunciao. E o sentido altera-se a cada nova frase. Sendo assim, a forma e o sentido renovam-se a cada enunciao.

    3 Concordamos com Flores (2004:229), ao situar a concepo de linguagem que ancora seus estudos: ... uma

    lingstica que nada mais do que um ensaio sobre a singularidade do homem na lngua e, por ele, poder abordar a fala daqueles que a lingstica excluiu para se instituir. 4 Cabe lembrar que para Benveniste frase liga-se ideia de discurso e referncia referncia ao ato de fala (e

    no ao mundo).

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    Autorizamo-nos a dizer que tanto Saussure quanto Benveniste apontam que a fala uma produo imprevisvel, nica e individual, e, embora exista um conjunto de convenes necessrias, tomada em seu todo, a linguagem multiforme e heterclita (Saussure, F.,1974: 17). As regularidades e as combinaes estabelecidas pela lngua, entre significante e significado, entre forma e sentido proporcionam entendimento, porm no total, entre os interlocutores. Dizemos que o entendimento no total, pois a partir do momento em que a

    lngua convertida em fala, manifesta-se o que cada sujeito tem de singular. Segundo as sbias palavras de Saussure a sua execuo jamais feita pela massa; sempre individual e dela o indivduo sempre senhor (op. cit.: 21). Estabelece-se o clmax das relaes dialgicas, afinal, se no existe um s modo de apropriao da lngua e se cada sujeito tem a sua singularidade, neste momento que, muitas vezes, deparamo-nos com falas em que h predominncia da incompreenso, classificadas geralmente como errneas. Benveniste (1989: 82-3) diz que para o mesmo sujeito, os mesmos sons no so jamais reproduzidos exatamente. O que dizer sobre as imprecises de quem manifesta alteraes de linguagem? O afastar-se da lngua previsto e compem a dinmica da fala. Afirmamos, portanto, que em distrbios de linguagem tambm ocorrem afastamentos que dizem da especificidade de uma

    dinmica bastante peculiar. Esses afastamentos (ou subverses) so percebidos em episdios em que o significante parece no encontrar o significado, que a forma parece no encontrar o

    sentido. Por mais que a fala apresente-se deveras desarrumada para o interlocutor - porm com sentido para o falante -, a funcionalidade da dinmica da lngua faz-se presente tambm nesses casos. Assim como em falas ditas corretas, que o sujeito seleciona o signo lingstico que usar, por meio das relaes associativas, encadeia-o em uma seqncia linear, relaes sintagmticas, e atravs da relao entre os signos produzidos surge a noo de valor de uma enunciao, tambm h o desenvolvimento dessa seqncia de episdios em falas ditas desviantes. Ou seja, a seleo e a combinao efetuadas, respectivamente, nos eixos associativo e sintagmtico realizam-se e, sendo assim, surge o valor dessa seqncia fnica.

    No entanto, o estabelecimento do valor de um enunciado muitas vezes compreendido apenas por aquele que o enuncia, pois durante a seleo signo (conceito e imagem acstica), ocorrem variaes que se desviam do padro comum massa. Sendo assim, a unio entre os elementos do signo lingstico d-se como lgico para o falante, mas no para quem o escuta, gerando, portanto, incompreenso entre os interlocutores. Fazemos nossa as palavras de Flores (2009: 189):

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    ...em dados de distrbios de linguagem, facilmente se percebe que um elemento lingstico uma palavra, por exemplo pode ser considerado estvel do ponto de vista do locutor que o enuncia sem, no entanto, ser reconhecvel pelo interlocutor.

    A desunio entre os componentes do signo lingustico pode soar estranha ao interlocutor, mas no quele que fala. A forma estabelece-se conforme o sentido que o falante

    vai dando ao seu dizer. A relao entre forma e sentido pode ser muito evidente para aquele que enuncia (o eu), sem, no entanto, cumprir essa funo para o interlocutor passivo (o tu). Retomando Benveniste (1989: 224-5),

    Nas cincias da natureza, as unidades so em geral pores idnticas convencionalmente recortadas de um contnuo especfico; h assim unidades quantitativas, idnticas e substituveis, em cada disciplina da natureza. A linguagem bem outra coisa, ela no releva do mundo fsico; ela no nem do contnuo nem do idntico, mas bem ao contrrio, do descontnuo e do dessemelhante.

    exatamente nesta heterogeneidade da fala que surgem as produes mais inusitadas e que o terapeuta de linguagem (ou o linguista que analisa falas ditas desviantes) depara-se com a questo mais instigante: a evidncia no apenas de um desvio, de um distrbio de linguagem, mas sim a manifestao da singularidade do locutor e da relao existente entre ele, sujeito, com a lngua. O recorte e a combinao realizam-se singularmente em cada indivduo, e apresentam aquele que fala em sua fala. Sendo assim, conclumos que em distrbios de linguagem, muitas vezes a relao

    significante/significado, forma/sentido soa como desviante para o interlocutor, sem, no entanto, repercutir como alterada para o falante. Essas realizaes partem dos mesmos princpios de seleo e de combinao que falas ditas normais. Contudo, devido substncia fnica escolhida divergir do recorte comum massa, surgem as incompreenses

    entre os interlocutores. Caber ao estudioso da linguagem (fonoaudilogo ou linguista) a misso de aventurar-se nesta heterogeneidade, descobrindo a singularidade do sujeito na linguagem e, desta forma, tentar saciar suas indagaes mediante a incompreenso, frente ao no-saber. A se encontra o sujeito que fala em sua fala, ou seja, o modo singular dele relacionar-se com a lngua.

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    2. EM BUSCA DE UMA FORMA DE ANLISE

    Aliceradas nos referenciais saussurianos e benvenistianos elencados, passaremos agora a nos ocupar da tarefa de anlise da fala de um sujeito que apresenta distrbio de linguagem.

    2.1 SOBRE OS DADOS

    O material que ser apresentado nesta anlise consiste em um recorte de uma sesso de atendimento fonoaudiolgico ocorrido na Clnica de Atendimento Psicolgico da

    Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Os dados analisados integram o Banco de Dados Enunsil (Enunciao e sintoma na linguagem) da pesquisa Enunciao e Distrbios de Linguagem, coordenada pelo Prof. Dr. Valdir do Nascimento Flores, junto ao Instituto de Letras da UFRGS. A paciente tinha onze anos poca desta filmagem e apresentava quadro de retardo de linguagem associado Sndrome de Down. Durante a transcrio e a anlise a seguir, utilizaremos as seguintes abreviaes: T,

    referindo-se terapeuta, D referindo-se paciente e F referindo-se ao pesquisador que realizava a filmagem. Os comentrios do transcritor sero colocados entre parnteses duplos.

    Quanto transcrio, cabe ressaltar, que ela a tentativa de transformar dados verbalizados em dados escritos. No entanto, durante esta passagem, algumas informaes perdem-se, como tambm recebem marcas do transcritor. Portanto, ela tem como caracterstica no ser completamente fiel aos dados enunciativos. Conforme Aresi e Flores (2008: 91), o ato enunciativo, uma vez transcrito, sofre uma mudana em sua condio original, j que a transcrio se configura numa enunciao sobre outra enunciao.

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    TERAPEUTA (T) PACIENTE (D) PESQUISADOR (F)

    1. Que qui tu t comendo? 2. Ur ((erre retroflexo)) 3. Que qui tu t comendo?

    4. Petem. 5. Que qui tem aqui dentro qui tu t comendo?

    6. No sei, T ((parecendo estar irritada)).

    7. Hum... Arroz e feijo? 8. . 9. ? 10. Comi toso. 11. Quem foi que fez? 12. A cu, fuma. 13. Quem foi qui fez u arroz e feijo?

    14. h, fogo. 15. O fogo que fez? 16. . 17. No foi a D? 18. . 19. Huum, t gostoso! 20. 21. Que qui esse? 22. Af. 23. Ah, cafzinho. T bem, muito obrigada. V tom teu cafzinho.

    24. T faltando acar!

    25. Acuca! ((primeira letra A, produz alongada)).

    26. Esqueci do acar. Onde que t acar?

    27. ((coloca o acar na xcara da terapeuta)).

    28. Ah, brigada, v mex aqui.

    29. Huum, agora t bom ((simula estar experimentando o caf)).

    30. Tem o bio ((aponta para o pesquisador, que est filmando)).

    31. Agora t uma delcia. 32. Tu no vai tom? 33. Prbo ((fala junto com a

    fala 32 da terapeuta)).

    34. Laranja.

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    35. Suco de laranja? 36. Tu no vai tom?

    37. . 38. Laranja. 39. No vai tom um cafzinho?

    40. De laranja, T. 41.Ah, o suco de laranja? 42. . 43. Ah, ento t, o suco de laranja.

    44. Ah, o Pbio. Bbe Pbio. 45. Tu vai d pro Fbio tom o suco de laranja?

    46. No. h... Fri. Fri Prbo. 47. o refri. 48. Prbo. 49. Ento t. 50. Prbo ((entrega xcara ao

    pesquisador)).

    51. Eu quero. 52. Ele vai tomando aos pouquinhos ali, t?

    53. E a D, o que qui a D vai tom?

    54. ((silncio)). 55. Hein D? 56. . 57.Que qui tu vai tom? 58. eu ((aponta para si)). 59. Que qui tu vai tom? 60. Tom ((faz gesto como se

    tomasse algo)).

    61. Que tu vai tom? 62. eu, eu, eu! 63. tu! 64. ((risos)).

    2.2 UMA PROPOSTA DE ANLISE DE FALA DESVIANTE NA PERSPECTIVA DA LINGSTICA DA ENUNCIAO

    Verifica-se que a terapeuta (T) inicia o dilogo com uma pergunta. Essa talvez no tenha por finalidade instaurar uma conversao livre entre T e D, pois se nota que ela espera uma resposta especfica. Segundo Aresi e Flores (2008: 87), cada pergunta comporta um tipo de resposta que a satisfaa, restringindo e direcionando seu sentido. Assim, devido resposta apresentada por D, em 2, no ser coerente com a esperada por T, em 3, ela insiste

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    com a pergunta. Assim, em 4, D altera a resposta que havia apresentado. Devido no coincidncia entre o esperado por T e o realizado por D, em 5, a pergunta novamente proposta. Porm, talvez pelo fato de T no reconhecer a tentativa anterior como sendo uma resposta (tanto em 2 como em 4), D em 6 parece desistir e anuncia no saber o que est comendo. Finalmente, em 7, T oferece um padro, talvez a forma que desejasse como resposta. Nessas passagens observa-se que T est interessada na produo da forma de D.

    Vale ressaltar que durante as perguntas Que qui tu t comendo? (em 1, 2 e 5), ambas as interlocutoras esto observando panelas de brinquedo vazias, ou seja, a resposta depender da criatividade do que D, naquele momento, imagina estar comendo. Os enunciados ur e petem podem referir-se a algo que ela tenha criado naquele momento, como resposta para

    aquela brincadeira, afinal o ato de inventar previsto (e esperado) durante as atividades de faz-de-conta. Ao T produzir arroz e feijo, ocorre uma restrio da resposta, momento em que se manifesta a imaginao e a criatividade de T e no de D. Esse fato parece indicar que a preocupao d-se com o uso da forma, da nomeao dita adequada (ou esperada), no tendo como objetivo manter um dilogo e observar instncias de fala possveis para D. Observa-se que nos enunciados 11, 13, 15 e 17, T novamente procura suscitar, por meio das perguntas, a nfase no uso da forma. Ao dizer Quem foi qui fez?, T parece descartar todo o tipo de resposta que possa surgir que no seja eu, D. Esse fato pode ser observado ao analisarem-se as demais falas. Em 14, nota-se que D produz a palavra fogo de maneira precisa, correta, inteligvel e bem articulada, no entanto, T parece ignorar essa produo. Em 15, a pergunta O fogo que fez? parece indicar Tem certeza que foi o fogo que fez?, pois quando D confirma (16) sua resposta, T oferece a resposta que esperava, ao enunciar No foi a D?. D, em 14, oferece uma resposta inteligente, afinal, dentre os utenslios existentes, o fogo um dos que tem como funo cozinhar o alimento. Contudo, sua resposta foi desconsiderada. Entretanto, ao observarmos as falas de 20 a 23, nota-se que T (em 23), ao receber a xcara da D, sente-se satisfeita com esse ato atribuindo-lhe a ao de ter realizado o preparo

    do caf Vou tomar teu cafezinho, sem perguntar quem o fez. Destacamos que durante o dilogo anterior, de 11 a 18, T insiste demasiadamente para que D responda quem havia feito

    o arroz e o feijo. Porm, devido ao contexto, torna-se evidente que do conhecimento de T e de D que D havia preparado o alimento durante a brincadeira. Sendo assim, apontamos que T, ao perguntar, esteja preocupada novamente com a forma com que D ir articular determinadas palavras por ela selecionadas, no tendo como objetivo saber, realmente, o que ela est comendo, ou quem preparou a comida. Mais uma vez lembramos Aresi e Flores (op. cit.: 93),

  • ReVEL, v. 9, n. 16, 2011 ISSN 1678-8931 366

    ao analisarem uma situao clnica fonoaudiolgica na qual a terapeuta tambm demonstrava uma preocupao insistente com a forma do dizer do paciente: Por solicitar um uso de forma, a pergunta coloca tambm a resposta numa posio especfica, a da nomeao. Em algumas respostas de D, verifica-se a ocorrncia do enunciado , mesmo que nem todas ocorrncias indiquem afirmao, ou concordncia. Por exemplo, em 8 e em 18, parece que D utiliza-se dessa como uma palavra coringa, sem necessariamente confirmar a

    pergunta antecedente. O objetivo desse acontecimento parece estar associado tentativa de finalizar o excesso de perguntas que estavam ocorrendo no dilogo. Oferecendo, desta forma, uma resposta cabvel que no gerasse a ocorrncia de novas e insistentes indagaes. Esta proposta de anlise faz-nos lembrar de uma importante reflexo de Benveniste (1991:286):

    A linguagem s possvel porque cada locutor se apresenta como sujeito, remetendo a ele mesmo como eu no seu discurso. Por isso, eu prope outra pessoa, aquela que, sendo embora exterior a mim, torna-se o meu eco - ao qual digo tu e que me diz tu.5

    Ou ainda (op.cit.: 292):

    A terceira pessoa a forma do paradigma verbal (ou pronominal) que no remete a nenhuma pessoa, porque se refere a um objeto colocado fora da alocuo. Entretanto existe e s caracterizada por oposio pessoa eu do locutor que, enunciando-a, a situa como no-pessoa. Esse o seu status. A forma ele... tira o seu valor do fato de que faz necessariamente parte de um discurso enunciado por eu.6

    Quando algum enuncia, o eu estar presente nessa pessoa, e, obrigatoriamente, dirigir-se- a um tu, fazendo referncia a um ele. Assim, em 17, o eu desta fala T. No entanto, ao enunciar No foi a D, T coloca D em uma condio de alienao, ou seja, a exclui do dilogo, atribuindo-lhe o papel de no-pessoa ele. D o assunto que est sendo referido no instante, aquilo sobre o que se fala. Sendo assim, D no tem possibilidade de resposta, pois est fora da relao eu-tu. Sendo assim, quem portar o papel de tu? Sugerimos que, nesta passagem, T no apenas o eu que est enunciando, mas tambm, o tu que est

    recebendo a mensagem. Seu dizer dirige-se a si, o que caracterizaria um monlogo. Esse constitudo pela presena da relao eu-tu, entretanto encarnados em uma nica pessoa.

    Conforme Benveniste (1989: 87-8),

    O monlogo um dilogo interiorizado, formulado em linguagem interior, entre um eu locutor e um eu ouvinte. s vezes, o eu locutor o nico a falar; o eu ouvinte permanece entretanto presente; sua presena necessria e suficiente para tornar significante a enunciao do eu locutor.

    5 Grifos do autor.

    6 Grifos do autor.

  • ReVEL, v. 9, n. 16, 2011 ISSN 1678-8931 367

    Observa-se que por diversas vezes T tende a conduzir o dilogo de maneira que prope a D a funo de enunciar produes que contenham a forma de articulao almejada, uma posio exclusiva de resposta passiva. Inicialmente, D parece aceitar a posio de nomeadora, produtora de formas (falas predominantes de 1 a 25), sem opor-se ao que sugerido por T como dilogo para cada instante7. J, nas falas que ocorrem entre 27 e 64, D produz um deslocamento, ao ocupar uma posio de recusa em nomear somente o esperado

    por T. D coloca-se no dilogo, persiste em seu dizer. Igualmente significativo nesse deslocamento a insero de um terceiro elemento, o que observamos em 30. Em 31 e 32, parece ocorrer uma recusa enunciao de D, atravs da insero de uma pergunta com outro foco. A seguir observa-se que D enuncia recusando, diversas vezes, a posio

    proposta por T. D, neste momento, torna-se uma falante participativa, a qual manifesta seu

    desejo no dizer, afinal, como diz Benveniste (1991: 286), na linguagem e pela linguagem que o homem se constitui como sujeito8.

    H reversibilidade dos papeis entre os interlocutores, de modo que cada um coloca-se como eu durante suas falas, o que altera o modo como D coloca-se determinando o sentido que almeja constituir.

    Em 57, T modifica sua fala e utiliza-se do pronome tu ao referir-se a D. Neste momento tem-se um eu (T) falando para um tu (D), o que caracteriza um dilogo no qual envolve T e D. Sendo assim, em 58, D certifica-se de que a pergunta est sendo dirigida a ela, de que est no dilogo e de que a pergunta refere-se a ela. O que justifica o fato de dizer eu, (certificando-se de que T fala com ela e pergunta para ela) e apontar para si. Para Benveniste (1991: 278), eu significa a pessoa que enuncia a presente instncia de discurso que contm eu, e Flores (2009: 186) completa eu e tu so mutuamente constitutivos, tu implcito ao dizer de eu. A categoria de pessoa sempre dual, um par lingstico que tem existncia concomitante.

    Em 59, em que T pergunta Que qui tu vai tom?, D parece estar consciente de que de que a fala est sendo dirigida a ela e, aps dar-se conta disto (momento em que ela foi colocada como tu no discurso), a repetio na fala 59 parece ter como objetivo que D responda o que est sendo solicitado.

    Pode-se, portanto, reconhecer dois momentos nessas falas: o primeiro referente fala 57 e o segundo fala 59, com seus respectivos tus. No primeiro momento, o tu utilizado na

    7 Ocorrem enunciaes em que D ocupa uma posio no apenas passiva, por exemplo, em 10. Porm, tais

    ocorrncias no predominam durante o trecho referido. 8 claro que sua condio passiva de 1-25 tambm compe sua forma singular de estar na linguagem.

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    pergunta tem como objetivo que D reconhea que a pergunta est sendo dirigida a ela e reconhea tambm o seu lugar no dilogo. A reversibilidade dos papeis eu-tu, entre T e D, estabelece-se durante o dilogo. No segundo momento, o objetivo da pergunta que D responda o que havia sido perguntado. Aps reconhecer-se como estando no dilogo (e no ser mais um ele), ela poder, assim, responder, enunciar como um eu. Quanto aos signos produzidos nas falas 10, 22 e 46, respectivamente, toso, af e fri, D apresenta significantes que permitem que T compreenda o significado. Nota-se que esses no se distanciam das palavras alvo, que so gostoso, caf e refri. D conservou a slaba tnica das palavras e, no entanto, apagou os elementos tonos. Devido a essa ocorrncia, T conseguiu seguir a pista do enunciado e entender o significado relacionado ao

    significante em questo. Nestas ocorrncias, a compreenso do signo no se compromete. So significantes diferentes que remetem ao mesmo significado, ou a um significado muito

    prximo. Mesmo o signo sendo arbitrrio no deve dar a idia de que o significado dependa da livre escolha do que fala; queremos dizer que o significante imotivado, isto , arbitrrio em relao ao significado, com o qual no tem nenhum lao natural na realidade (Saussure, F., 1974: 83). Assim, para que um significante venha a ser aceito pela massa, ele no deve sofrer variaes drsticas em relao ao que regra. Ele possui flexibilidade, pois cada sujeito manifesta suas particularidades em seu dizer. Entretanto, esta flexibilidade possui regras e

    limites para que a produo sonora seja aceitvel e relacionada ao significado desejado. Contudo, h momentos em que o significante realizado por D no encontra um significado interpretvel por T. Pode-se observar nas passagens de fala 2, 4 e 12, D realiza produes sonoras que no deixam marcas, pistas que possam ser relacionados a algum significado. D distancia-se do significante significativamente do previsto pela lngua, o que impossibilita a compreenso do enunciado. Para Flores et. al. (2009: 63), de acordo com a teoria benvenisteana,

    ...compreenso entende-se todo o trabalho que os participantes do dilogo executam com a lngua, uma vez que formas, ao integrarem o discurso, passam a expressar sentidos relativos atitude do sujeito e enunciao enunciativa. Desse modo, compreenso pressupem reconhecimento da lngua como sistema de signos distintivos, os quais, em uma situao enunciativa, tem referncia nica, relativa a eu-tu-aqui-agora, indicadores das categorias de pessoa, espao e tempo.

    T no reconhece essas passagens como signos da lngua, sendo assim, indaga D para que ela retorne ao seu dizer de maneira que ocorra compreenso entre elas. O signo

    lingstico possui certa mutabilidade, porm o que domina, em toda alterao, a persistncia da matria velha; a infidelidade ao passado apenas relativa. Eis porque o

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    princpio de alterao de baseia no princpio de continuidade (Saussure, F., 1974: 89). Portanto, existe uma lgica durante as modificaes previstas na lngua e, dentre elas, est a conservao parcial do antigo. Devido produo de uma materialidade sonora amorfa e distante de qualquer significante previsto pela lngua, essas falas no so direcionadas a

    nenhum significado existente. A singularidade neste ato de fala restringe-se ao entendimento da enunciadora (D). Flores (2009.: 189) afirma que

    ...em dados de distrbios de linguagem, facilmente se percebe que um elemento lingstico uma palavra, por exemplo pode ser considerado estvel do ponto de vista do locutor que o enuncia sem, no entanto, ser reconhecvel pelo interlocutor. Isso pode significar que um signo aparentemente sem valor pode implicar o no entendimento global do enunciado no qual se insere. Ou seja, um problema de reconhecimento do lxico, portanto, originado em um nvel de anlise, o lexical, produz um problema de reconhecimento global do enunciado, que pertence a outro nvel, o do enunciado.

    Sendo assim, propomos que o entendimento de T em relao aos signos apresentados

    por D, ocorre quando no h distanciamento acentuado na relao entre significante/significado apresentado pela menina e a relao significante/significado comum massa. Quando h muita divergncia, o significante produzido por D perde-se no vazio do enunciado, pois no encontra um significado que o complete, para que, por meio da unio

    destes (significante e significado), formem um signo lingstico. Eis o abismo da comunicao que no raramente experimenta o sujeito que apresenta distrbio de linguagem.

    3. ENCAMINHAMENTOS FINAIS

    O presente artigo buscou apontar caminhos que auxiliem o estudioso da linguagem a refletir acerca do funcionamento de falas idiossincrticas. O dilogo entre a lingustica da enunciao e a clnica de linguagem, apesar de estar recm comeando, demonstra ser um terreno bastante frtil para aqueles que se interessam pela singularidade do homem na lngua. Os caminhos j trilhados por Ferdinand de Saussure e Emile Benveniste iluminaram nossa trajetria nessa reflexo. Os deslocamentos que operamos nas bases tericas desses mestres tiveram o objetivo de estender as consequncias de seus ensinamentos realidade transgressora que surge na fala de sujeitos com distrbios de linguagem. Tentamos aqui empreender uma leitura que auxilie linguistas e fonoaudilogos a pensar na particularidade do ato de fala de um sujeito que sofre ao tentar se comunicar com o outro. Novos desdobramentos tericos sero necessrios para que se possa seguir tentando escutar

    singularidade da fala daqueles que apresentam falas desviantes.

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    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS:

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    2. BENVENISTE, E. Problemas de lingstica geral I. Campinas: Pontes, 1991. 3. ____. Problemas de lingustica geral II. Campinas: Pontes 1989. 4. FLORES, V. N. Por que gosto de Benveniste? (Um ensaio sobre a singularidade do

    homem na lngua). Porto Alegre: Letras de Hoje, v. 39, n4, p.217-230, dezembro, 2004. 5. ____. A enunciao e os nveis de anlise lingstica em dados de distrbio de linguagem.

    Porto Alegre: Organon, v. 23, n 46, p. 177-190, 2009. 6. FLORES, V. N. & et. al. Dicionrio de lingstica da enunciao. So Paulo: Contexto,

    2009. 7. JAKOBSON, R. Lingstica e comunicao. So Paulo, Cultrix, 1963. 8. SAUSSURE, F. Curso de lingustica geral. So Paulo: Cultrix, 1974.

    ABSTRACT: The present article aims at relating enunciative linguistics and language clinic as two fields that establish a dialogue when what is at stake is the unique way a subject relates to language. It starts from a review of saussurian and benvenistian approaches to language in the field of Linguistics in order to set the fundaments for the analysis of data of deviant language derived from the context of speech therapy clinic. The analyses point that it is necessary to take into consideration the unique way a subject appropriates language, as well the peculiar functioning of language itself. KEY-WORDS: language clinic; speech therapy science; deviant language; enunciative linguistics

    Recebido no dia 29 de novembro de 2010. Artigo aceito para publicao no dia 28 de fevereiro de 2011.