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ISSN 1982 - 0283
RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS NO CICLO DE
ALFABETIZAÇÃO
Ano XXIV - Boletim 9 - Setembro 2014
Resolução de PRoblemas no CiClo de alfabetização
SUMÁRIO
Apresentação .......................................................................................................................... 3
Rosa Helena Mendonça
Introdução .............................................................................................................................. 4
Ettiène Guérios
Texto 1: Que conta eu faço, professora? É de mais ou de menos? .......................................... 8
Jutta Cornelia Reuwsaat Justo
Texto 2: Resolução de problemas: possibilidades e reflexões a partir do espaço de sala
de aula! ................................................................................................................................ 16
Justina I. C. Motter Maccarini
Salete Pereira de Andrade
Texto 3: Princípio multiplicativo para os anos iniciais – desenvolvimento conceitual e
algoritmos em uma perspectiva de situações-problema .................................................22
Nilza Eigenheer Bertoni
3
Resolução de PRoblemas no CiClo de alfabetização
aPResentação
A publicação Salto para o Futuro comple-
menta as edições televisivas do programa
de mesmo nome da TV Escola (MEC). Este
aspecto não significa, no entanto, uma sim-
ples dependência entre as duas versões. Ao
contrário, os leitores e os telespectadores
– professores e gestores da Educação Bási-
ca, em sua maioria, além de estudantes de
cursos de formação de professores, de Fa-
culdades de Pedagogia e de diferentes licen-
ciaturas – poderão perceber que existe uma
interlocução entre textos e programas, pre-
servadas as especificidades dessas formas
distintas de apresentar e debater temáticas
variadas no campo da educação. Na página
eletrônica do programa, encontrarão ainda
outras funcionalidades que compõem uma
rede de conhecimentos e significados que se
efetiva nos diversos usos desses recursos nas
escolas e nas instituições de formação. Os
textos que integram cada edição temática,
além de constituírem material de pesquisa e
estudo para professores, servem também de
base para a produção dos programas.
A edição 9 de 2014 traz como tema a Resolu-
ção de problemas no ciclo de alfabetização
e conta com a consultoria de Ettiène Gué-
rios, Doutora em Educação pela UNICAMP,
Professora da Universidade Federal do Para-
ná e Consultora desta Edição Temática.
Os textos que integram essa publicação são:
1. Que conta eu faço, professora? É de mais
ou de menos?
2. Resolução de problemas: possibilidades e
reflexões a partir do espaço de sala de aula!
3. Princípio multiplicativo para os anos
iniciais – desenvolvimento conceitual e
algoritmos em uma perspectiva de situ-
ações-problema
Boa leitura!
Rosa Helena Mendonça1
1 Supervisora Pedagógica do programa Salto para o Futuro (TV Escola/MEC).
4
“- Que conta eu faço, professora? É
de mais ou de menos?”
Quem nunca ouviu estas perguntas
quando passou atividades com resolução de
problemas para seus alunos nos anos ini-
ciais do Ensino Fundamental?
“- Professores, como vocês selecionam, ou
escolhem, os problemas matemáticos que
passam para seus alunos resolverem? Quais
os critérios de suas escolhas?”
A pesquisadora Jutta Cornelia Reuwsaat Jus-
to fez esta pergunta para professores dos
anos iniciais do Ensino Fundamental e a
resposta mais comum que recebeu foi a de
que selecionam o problema pela operação
que o resolve. Em outras palavras, primeiro
pensam na “conta” que estão ensinando e
então apresentam um problema que é resol-
vido com aquela “conta”. Certamente, o fa-
zem pensando em colaborar com a aprendi-
zagem dos alunos esperando que percebam
uma aplicação prática para aquela “conta”.
Ou seja, se estou ensinando adição, o pro-
blema que passo para os alunos é resolvido
por uma “conta de mais”. Se estou ensinan-
do subtração, o problema é resolvido por
uma “conta de menos”.
Vocês também fazem assim? É pro-
vável que muito professores também façam
assim. Professores, vamos refletir sobre este
critério de escolha dos problemas para nos-
sos alunos resolverem? O artigo de Jutta Jus-
to, cujo título é a indagação que fiz para ini-
ciar esta apresentação - Que conta eu faço,
professora? É de mais ou de menos? - traz
uma reflexão sobre este critério de escolha
e propõe uma discussão sobre a metodolo-
gia da resolução de problemas matemáticos
aditivos, contribuindo para o conhecimento
do professor sobre a complexidade do cam-
po aditivo, a variedade semântica de proble-
mas que o compõem e suas representações.
Lembremos que os problemas aditi-
vos são aqueles que envolvem uma adição,
uma subtração ou uma combinação das
intRodução
oPeRações e Resolução de PRoblemas: PRovoCação
Ettiène Guérios1
1 Doutora em Educação pela UNICAMP. Professora da Universidade Federal do Paraná e Consultora desta Edição Temática. Email: [email protected]
5
duas operações. Aqui cabe uma indagação
fulcral para vocês, professores, pensarem: o
que é raciocínio aditivo? No decorrer deste
volume discorremos sobre esta indagação.
Justo nos desafia a aprimorar nossa
prática pedagógica e apresenta outra pers-
pectiva para subsidiar o critério de escolha
dos problemas matemáticos pelos professo-
res. Para o quê, apresenta estudos de pesqui-
sadores que classificam os problemas aditi-
vos segundo sua estrutura semântica e não
mais pelas operações matemáticas que os re-
solvem. Enfatiza o papel das representações
como amparo para o pensamento das crian-
ças no processo resolutivo dos problemas.
Este é um desafio para o qual convi-
damos vocês, professores, a conhecer o ar-
tigo da autora e mergulhar nos vinte exem-
plos de problemas aditivos, classificados
segundo a semântica e discriminados em ca-
tegorias de situações de transformação, de
combinação, de comparação e de igualação.
Eis que a recorrência da pergunta prévia das
crianças “É de mais ou de menos?” poderá
ser minimizada, quando não abolida, se a re-
solução não estiver vinculada a uma conta
imediata, e sim, à compreensão da situação
proposta em seu enunciado e à identifica-
ção, pela criança, da estratégia matemática
necessária para sua resolução.
Justo finaliza seu artigo destacando
a importância de um ensino comprometido
com a melhoria da aprendizagem matemá-
tica dos alunos, que proponha a diversidade
de situações pertencentes ao campo aditivo,
bem como o papel da representação na re-
solução de problemas aditivos e na metodo-
logia da resolução de problemas.
Um ensino assim, comprometido, co-
laborará para evitar que futuras perguntas se-
jam: “Que conta eu faço, professora? É de ve-
zes ou de dividir?” Certamente, se o trabalho
com o campo aditivo for desenvolvido consi-
derando sua estrutura conceitual e o trabalho
com Resolução de Problemas foi didaticamen-
te desenvolvido. Neste caderno, trataremos
também do Campo Multiplicativo.
Antes disso, no entanto, vamos refle-
tir sobre Resolução de Problemas como me-
todologia em um processo do ensinar, visan-
do a um aprender consubstanciado. Por isso,
o artigo que apresentamos a seguir é o de Jus-
tina I. C. Motter Maccarini e Salete Pereira de
Andrade, intitulado Resolução de Problemas:
possibilidades e reflexões a partir do espaço
de sala de aula! Com a experiência profis-
sional que as autoras têm em sala de aula,
conhecem bem as características dos alunos
dos anos iniciais. Aliam, a esta experiência,
conhecimentos teóricos acerca de metodolo-
gia de ensino e então, focalizam aspectos do
movimento didático necessário para um tra-
balho com Resolução de Problemas, que seja
consistente e que viabilize o desenvolvimen-
to do pensamento matemático dos alunos.
6
Surge, pois, outra indagação para
vocês, professores, nela pensarem: o que
a expressão “pensamento matemático”
significa sob o ponto de vista didático-
-pedagógico? Que relações podemos es-
tabelecer entre pensamento matemático
dos alunos e raciocínio aditivo, anterior-
mente abordado?
As autoras enfatizam a flexibilidade
que a Resolução de Problemas possibilita
na organização do trabalho em sala de aula
e explicam os aspectos que consideram im-
perativos na ação dos professores: Leitura
do problema, seja ele escrito em linguagem
materna ou por meio da apresentação de
imagens, compreensão do enunciado do pro-
blema, autonomia do estudante, identifica-
ção dos dados e informações significativas,
levantamento de hipóteses, estimativa de
resultados possíveis, identificação do cami-
nho e das estratégias mais adequadas para
a resolução, a resolução propriamente dita,
análise e verificação do resultado encontra-
do, confronto entre a resolução do estudante
e a de outros colegas, elaboração e proposi-
ção de problemas.
Embora tenhamos, nesta publica-
ção, os alunos do Ciclo de Alfabetização
como foco, não podemos ter, longe de
nosso horizonte, os alunos dos anos sub-
sequentes. Há décadas defendo que pro-
fessores das séries/anos iniciais devem
conhecer os conteúdos e a natureza das
atividades que os professores dos anos
subsequentes desenvolvem. O inverso é
verdadeiro. A aprendizagem dos alunos é
contínua e é interessante que professores
dos primeiros anos conheçam a importân-
cia do que ensinam para a continuidade do
desenvolvimento do pensamento matemá-
tico dos alunos. As ideias matemáticas de-
senvolvidas nesse Ciclo são estruturantes
para o pensamento matemático futuro. O
que afirmo pode ser percebido no exemplo
de duas produções diferentes de solução
para uma mesma problematização, realiza-
das por alunos de 5º ano, que Maccarini e
Andrade apresentam em seu artigo. Neste,
os modos como os alunos pensaram e suas
tentativas de solução foram exploradas.
Um deles resolveu o problema utilizando
técnicas operatórias com algoritmos con-
vencionais. O outro produziu registros de
seu raciocínio e não utilizou técnicas ope-
ratórias. Os processos resolutivos, os resul-
tados encontrados e a relação dos alunos
com os resultados encontrados são descri-
tos e analisados em uma perspectiva didá-
tica que pretende mais que a resolução al-
gorítmica na aprendizagem. Pretende, pelo
raciocínio, contribuir para que a aprendi-
zagem transponha as paredes da sala de
aula e auxilie os alunos na compreensão
do mundo que os cerca.
Vamos agora tratar do artigo intitu-
lado Princípio Multiplicativo para os anos
iniciais – desenvolvimento conceitual e
7
algoritmos em uma perspectiva de situa-
ções-problema, de autoria de Nilza Berto-
ni. Com fundamento na Teoria dos Campos
Conceituais de Vergnaud, aborda aspectos
teóricos das estruturas multiplicativas-
-divisivas e apresenta uma proposta didá-
tica dinamizada pela Resolução de Proble-
mas, ao mesmo tempo em que aposta na
dimensão lúdica com a utilização de jogos
em aulas de Matemática e discute a utiliza-
ção de material concreto. Durante o artigo,
articula a multiplicação e a divisão, crian-
do um movimento interessante em que o
raciocínio do aluno é valorizado. Tanto é
verdade, que sempre valoriza a construção
de estratégias resolutivas por eles. Mas não
só. Solicita que, aos alunos, seja dado tem-
po para que usem suas estratégias, possam
desenvolvê-las, possam analisá-las.
A autora não se encerra na apre-
sentação de uma proposta didática. Ela a
desenvolve, passo a passo, focando a ação
didática dos professores com vistas à com-
preensão das estruturas multiplicativas-di-
visivas pelos alunos.
Associada à ação didática dos pro-
fessores, está o raciocínio dos alunos, seus
acertos, erros e tentativas. Na verbaliza-
ção do aluno durante as atividades e nos
registros que faz, têm uma fonte para en-
tender seu raciocínio. Então, explica ma-
tematicamente o que está se passando e
como, quem está ministrando uma aula
de Matemática, explica como as ideias são
estruturalmente constituídas e se consti-
tuem sob o ponto de vista de quem as está
aprendendo. Constrói uma teia interligan-
do ação didática, aprendizagem dos alunos
e conhecimento matemático conceitual. A
autora trata de diferentes procedimentos
operatórios desenvolvidos pelos alunos e
algoritmos, considerando a “parte concei-
tual” e a “parte operacional”, sem dicoto-
mizá-los. Exemplifica utilizando situações
de divisão, pertencentes ao cotidiano das
crianças, que foram resolvidas apenas com
a realização de reflexão sobre a realidade.
Do dizer da própria autora, ressalto
que: “Perceber quando se faz necessário realizar
operações multiplicativas ou de divisão, e saber
realizá-las, seja mentalmente, por estimativas,
ou por cálculos escritos, é um instrumental útil
para a vida cotidiana e profissional, mesmo com
o uso cada vez mais comum das calculadoras.”
Eis aí uma perspectiva do hoje e do amanhã,
dos alunos e de seus professores.
Esperamos que os textos aqui apre-
sentados contribuam com a prática peda-
gógica dos professores nos anos iniciais do
Ensino Fundamental e, de modo especial, no
Ciclo de Alfabetização. Que os desafios aqui
lançados sejam aceitos e vencidos na conti-
nuidade da caminhada profissional e que as
interrogações possam ser respondidas.
8
Nos anos iniciais do Ensino Funda-
mental, a resolução de problemas matemá-
ticos se destaca por ser uma das áreas mais
evidentes das dificuldades das crianças.
Muitos professores desse nível de ensino,
quando solicitados a comentar as dificulda-
des de seus alunos, trazem que estes não sa-
bem interpretar os problemas matemáticos
e que apresentam muita insegurança em re-
conhecer qual operação matemática os re-
solve. Então, como ensinar a criança a inter-
pretar e resolver os problemas matemáticos
corretamente?
Ao questionarmos os professores
sobre como eles fazem para selecionar os
problemas matemáticos a serem propostos
aos seus alunos dos anos iniciais do Ensino
Fundamental, a resposta mais comum é que
selecionam o problema pela operação que o
resolve. Ou seja, escolhem os problemas pen-
sando na conta que o aluno terá que fazer.
Será esta uma opção adequada?
Vejamos, por exemplo, os seguintes problemas:
- Antônio tinha 22 figurinhas. Ganhou
de seu amigo Bruno mais 18 figurinhas.
Quantas figurinhas Antônio têm agora?
- Em uma partida perdi 22 bolas de gude,
ficando com 18. Quantas bolas de gude eu
tinha no início do jogo?
Os dois problemas se resolvem com
uma adição: 22+18=40. E, no entanto, o pri-
meiro se refere a ganhar e o outro a perder.
Vamos verificar os problemas na Figura 1:
Figura 1: Problemas aditivos resolvidos por subtração. Fonte: A autora.
texto 1
Que Conta eu faço, PRofessoRa?É de mais ou de menos?
Jutta Cornelia Reuwsaat Justo1
1 Doutora em Educação (UFRGS), Universidade Luterana do Brasil, [email protected]
9
Podemos dizer que os problemas são
iguais porque se resolvem pela mesma opera-
ção matemática? Será que eles têm o mesmo
grau de dificuldade para os alunos? Os exem-
plos nos fazem refletir que selecionar proble-
mas a partir da operação que os resolve pode
não ser uma boa estratégia.
A partir dessa reflexão inicial, propomos
uma discussão sobre a metodologia da resolu-
ção de problemas matemáticos aditivos. Pre-
tendemos contribuir para o conhecimento do
professor sobre a complexidade do campo adi-
tivo, a variedade semântica de problemas que o
compõem e suas representações, pois este co-
nhecimento é relevante para a aprendizagem
da resolução de problemas aditivos pelos alunos
dos anos iniciais do Ensino Fundamental.
Problemas aditivos
Os problemas aditivos são aqueles que
pedem uma adição, uma subtração ou uma
combinação das duas operações para serem
resolvidos. Vários pesquisadores (CARPENTER;
HIEBERT; MOSER, 1983; FAYOL, 1996; NESHER;
GREENO; RILEY, 1982; NUNES; BRYANT, 1997; RI-
LEY; GREENO; HELLER, 1983; VERGNAUD, 1990)
focaram seus estudos na aprendizagem destes
problemas, classificando-os segundo sua estru-
tura semântica e não mais pelas operações ma-
temáticas que os resolvem.
A classificação em categorias semânti-
cas ainda é pouco conhecida pelos professores
que ensinam matemática no Ensino Funda-
mental, sendo, portanto, pouco trabalhada nas
escolas (BRANDÃO; SELVA, 1999; JUSTO, 2009,
2007; MAGINA et al, 2001; MAGINA et al, 2010).
Duas situações-problema são consideradas pro-
totípicas de adição, pelas quais as crianças dão
um primeiro sentido a essa operação: a reunião
de duas partes em um todo e a transformação
de uma quantidade inicial (BRANDÃO; SELVA,
1999; MAGINA et al, 2001; VERGNAUD, 2011). As
figuras 2 e 3 ilustram essas situações.
Figura 2: Problema prototípico de adição, com reu-nião de duas partes em um todo, elaborado por uma criança de 6 anos em fase de alfabetização. (Fonte: JUSTO, 2000).
Figura 3: Problema prototípico de adição, com trans-formação de uma quantidade inicial, elaborado por uma criança de 6 anos em fase de alfabetização. (Fonte: JUSTO, 2000).
Considerando a semântica, podemos
discriminar vinte problemas aditivos em qua-
tro categorias de situações: transformação,
combinação, comparação e igualação. Duas
dessas categorias referem-se claramente a uma
ação - transformação e igualação, enquanto as
outras duas estabelecem uma relação estática
entre as quantidades do problema - combina-
ção e comparação. Cada uma das quatro ca-
tegorias semânticas de situações pode identi-
ficar distintos tipos de problemas dependendo
de quantidade, que é desconhecida. É impor-
tante que essas variações sejam conhecidas
pelos professores, porque indicam um proble-
ma diferente que exigirá da criança diferentes
estratégias de solução.
10
Vejamos as categorias semânticas dos proble-mas aditivos na figura 4:TRANSFORMAÇÃO (T) Expressam uma ação direta sobre uma quantidade que causa um aumento ou um decréscimo, ou seja, uma situação inicial sofre uma mudança e transforma-se em uma situação final.
1. Acrescentar. Resultado desconhecido. Antônio tinha 12 figurinhas. Ganhou de seu amigo Bruno mais 8 figurinhas. Quantas figurinhas Antônio tem agora?
2. Diminuir. Resultado desconhecido. Gláucia tinha 14 moedas. Ela deu 3 moedas para Mônica. Com quantas moedas ela ficou?
3. Acrescentar. Mudança desconhecida. Sara tinha 5 chaveiros. Então ganhou de Cristina mais alguns chaveiros. Agora Sara tem 12 chaveiros. Quantos chaveiros Sara ganhou de Cristina?
4. Diminuir. Mudança desconhecida. Janaína tinha 22 lápis de cores. Na escola, ela deu alguns para suas amigas. Janaína agora tem 8 lápis. Quantos lápis ela deu?
5. Acrescentar. Início desconhecido. No meu aquário, há alguns peixes. Então eu coloquei mais 4 peixes. Agora eu tenho 12 peixes. Quantos peixes eu tinha antes?
6. Diminuir. Início desconhecido. Em uma partida, perdi 12 bolas de gude, ficando com 21. Quantas bolas de gude eu tinha no início do jogo?
COMPARAÇÃO(CP)Comparam quantida-des. A relação entre os números do problema é estática, ou seja, eles não sofrem mudanças.
1. Mais que. Diferença desconhecida. Alice tinha 12 balas. Irene tinha 5 balas. Quantas balas Alice tem a mais que Irene?
2. Menos que. Diferença desconhecida. Meu tio tem 48 anos e minha tia tem 29. Quantos anos minha tia tem a menos que meu tio?
3. Mais que. Quantidade menor desconhecida. Luciana colheu 34 laranjas e ela colheu 16 a mais do que sua irmã. Quantas laranjas colheu sua irmã?
4. Menos que. Quantidade menor desconhecida. Minha mãe tem 42 anos e minha tia tem 14 anos a menos do que ela. Qual a idade da minha tia?
5. Mais que. Quantidade maior desconhecida. Roberto comprou uma lapiseira por 12 reais e um caderno que custou 9 reais a mais que a lapiseira. Quanto custou o caderno?
6. Menos que. Quantidade maior desconhecida. Joel ganhou em uma partida 43 bolas de gude. Ele ganhou 18 a menos do que André. Quantas bolas André ganhou?
I G U A L A Ç Ã O ( I ) Acarretam a compa-ração de duas quan-tidades e uma mu-dança de uma dessas quantidades para que uma igualdade seja estabelecida. Essa ca-tegoria de situações pode ser considerada como uma mescla das duas categorias ante-riores, comparação e transformação.
1. Acréscimo. Valor de igualação desconhecido. Na casa de Adriano existem 22 árvores e na de Roberto existem 14. Quantas árvores Roberto precisa plantar para ficar com a mesma quantidade de árvores que Adriano?
2. Decréscimo. Valor de igualação desconhecido. Na 4ª série, há 35 cadeiras e 26 crianças. Quantas cadeiras eu preciso retirar da sala para ficar com a mesma quantidade do que de crianças?
3. Acréscimo. Fazer o valor conhecido igualar. Marcelo tem 15 reais. Se a sua mãe lhe der mais 9, ele terá a mesma quantia que Davi. Quantos reais tem Davi?
4. Decréscimo. Fazer o valor desconhecido igualar. No ônibus que vai para POA, há 17 pessoas; se 6 pessoas descerem do ônibus que vai a Feliz, haverá o mesmo número de pessoas nele como no ônibus que vai para POA. Quantas pessoas estão no ônibus que vai a Feliz?
5. Acréscimo. Fazer o valor desconhecido igualar. Meu vestido tem 12 botões. Se o vestido de minha irmã tivesse 5 botões a mais, ele teria o mesmo número de botões que o meu. Quantos botões tem o vestido de minha irmã?
6. Decréscimo. Fazer o valor conhecido igualar. Neco tem 13 carrinhos. Se ele der 9 dos seus carrinhos, ele terá o mesmo número de carrinhos que Zeca. Quantos carrinhos tem Zeca?
COMBINAÇÃO(CB) Implicam situações es-táticas entre uma quan-tidade e suas partes.
1. Todo desconhecido. Alexandre tem 8 bombons e Leandro tem 14. Quantos bombons eles têm ao todo?
2. Parte desconhecida. Patrícia e Gabriel colecionam chaveiros. Eles têm, juntos, 22 chaveiros. Gabriel tem 14. Quantos chaveiros Patrícia tem?
Figura 4: Categorias Semânticas de Problemas Aditivos. (Adaptado de: JUSTO, 2009)
11
Quando o problema apresenta
uma situação aditiva e requer uma subtra-
ção para ser resolvido (ou vice-versa), ele
é mais difícil de resolver do que quando o
problema pode ser resolvido através da re-
presentação direta da situação apresentada
no problema, ou seja, a operação que o re-
solve é a mesma da situação apresentada.
Vejamos, na Figura 5, a classificação dos di-
ferentes tipos de problemas em canônicos
(mais fáceis) e não canônicos (mais difíceis):
TRANSFORMAÇÃO (T)Canônicos T1, T2, T4
Não canônicos T3, T5, T6
COMPARAÇÃO (CP)Canônicos CP1, CP3, CP6
Não canônicos CP2, CP4, CP5
IGUALAÇÃO (I)Canônicos I2, I3, I6
Não canônicos I1, I4, I5
COMBINAÇÃO (CB)Canônicos CB1
Não canônicos CB2
Figura 4: Categorias Semânticas de Problemas Aditivos (Adaptado de: JUSTO, 2009)
Assim sendo, o ensino da resolução
de problemas aditivos precisa levar em conta
a complexidade desse campo conceitual. Por-
tanto, o conhecimento do professor sobre o
campo conceitual aditivo é essencial para a
aprendizagem dos alunos.
Resolução de problemas aditivos
Enquanto a criança permanece ligada
ao contexto da situação apresentada no pro-
blema, ela tenta resolver pela operação que
o caracteriza, ou seja, se a situação é aditiva,
ela resolve pela adição, se a situação é sub-
trativa, ela usa a subtração (JUSTO, 2000). A
questão “É de mais... ou de menos?...” per-
meia a resolução dos problemas aditivos pe-
las crianças. A oscilação entre a adição e a
subtração aparece de forma explícita ou mes-
mo implícita em suas tentativas de solução.
Transparece nas suas falas, nas dúvidas apre-
sentadas, nas suas ações sobre os materiais,
nas estratégias de contagem, de composição
e de representação, assim como na escrita
das operações (JUSTO, 2004).
A dúvida das crianças “É de mais ou
de menos?” traduz-se como um problema de
ensino quando existe a ênfase excessiva nos
cálculos, o trabalho com “palavras-chave”,
por não se trabalhar com a compreensão dos
problemas, por não se identificarem nem se
analisarem as diferenças entre diversos tipos
de problemas e pelo uso indiscriminado de
material concreto (VASCONCELOS, 1998).
No entanto, não resolve apenas au-
mentar a variedade dos problemas propos-
tos aos alunos, incluindo os mais difíceis,
mas é fundamental proporcionar a eles a
aprendizagem de estratégias apropriadas
de compreensão e solução dos problemas.
Atualmente, a representação tem
sido considerada uma estratégia importan-
te na resolução de problemas aditivos. A
representação é concebida como o proces-
so pelo qual se estabelecem vínculos entre
a situação proposta no problema, a rede
12
semântica da pessoa (seu conhecimento
linguístico e de mundo), seu conhecimen-
to de procedimentos e seu conhecimen-
to geral acerca das relações matemáticas
e espaciais. Assim, utilizar uma forma de
representação física ou visual, não linguís-
tica, manteria a informação do problema
em um formato mais acessível ao aluno,
enquanto os cálculos são executados, re-
duzindo a carga da memória e, portanto, a
probabilidade de erros.
Para as situações apresentadas nos
problemas aditivos, pesquisadores preocu-
param-se em desenvolver representações
que auxiliassem os alunos a resolvê-las.
Vergnaud (2011, p. 26) reforça o papel do
professor no ensino da resolução de proble-
mas como “um mediador essencial”, cujo
“papel não se limita a acompanhar a ativi-
dade dos alunos”, mas é essencial na “esco-
lha das situações a serem propostas” e na
“representação de sua estrutura conceitual
por meio de formas simbólicas acessíveis”.
Nunes et al (2005) afirma que o ra-
ciocínio aditivo baseia-se na coordenação
de três ações entre si: juntar, separar e co-
locar em correspondência; portanto, enfa-
tiza que os alunos precisam utilizar essas
três ações ao resolver problemas do cam-
po aditivo. Em outro trabalho dessas pes-
quisadoras (MENDONÇA et al, 2007), elas
verificaram que, no 4º ano, os professores
costumam enfatizar o uso de cálculos para
resolver os problemas e proíbem o uso de
recursos de representação (dedos, dese-
nhos, etc.) e os alunos estagnam o seu de-
sempenho. Este resultado reforça que dife-
rentes usos de representação auxiliam na
resolução de problemas matemáticos.
Trabalhando com representações,
os pesquisadores Vergnaud (1990, 2009),
Orrantia (2006) e Justo (2009) pretendiam
que os estudantes usassem formas geo-
métricas para colocar as quantidades que
o problema apresenta e setas para indicar
as relações e sentidos existentes entre as
quantidades, conforme a semântica indi-
cada pelo problema. O exemplo trazido na
figura 6 ilustra o uso da representação:
Figura 6: Representação gráfica de um problema de comparação. Fonte: A autora.
Os questionamentos possíveis, a
partir da representação, e que serviriam
como auxílio à compreensão e resolução,
poderiam ser: “Quem tem mais laranjas?
Luciana ou Lúcia? Quantas laranjas ela
tem? O que temos que fazer para descobrir
quantas laranjas a Lúcia colheu? Se Lúcia
tem menos laranjas, que conta fazemos para
chegar à quantidade menor?” Ao refletir
13
sobre essas questões, a representação serve
como um apoio ao raciocínio e à escolha da
operação matemática, no caso, a subtração,
que leva ao resultado do problema.
A representação é fundamental no
ensino e na aprendizagem da resolução de
problemas. Segundo Vergnaud (1990, 2009),
sem palavras e símbolos, a representação e
a experiência não podem ser comunicadas.
A linguagem matemática desempenha um
papel muito importante na conceituação e
nos processos de raciocínio e, sendo assim,
as representações fornecem um amparo
para o pensamento na resolução de proble-
mas matemáticos.
Considerações finais
Voltando às reflexões do início des-
se texto, uma consequência da falta de
conhecimento do professor sobre a diver-
sidade de problemas aditivos pode ser vis-
lumbrada em uma das práticas escolares
mais tradicionais e importantes: a avalia-
ção. Os instrumentos de avaliação são uma
fonte de construção de crenças para os
alunos sobre suas próprias capacidades e
habilidades de aprender. Como destacamos
na reflexão inicial, se o professor não tem
conhecimento sobre a diversidade de situa-
ções e categorias semânticas que envolvem
o campo aditivo, ele entende que os proble-
mas podem ser classificados pela operação
matemática que os resolve. Assim, em uma
situação de avaliação, ele pode escolher
os problemas matemáticos segundo esse
critério, não considerando a amplitude de
conceitos e nem as diferenças em termos
de dificuldade que os problemas aditivos
apresentam. Isso pode implicar que o pro-
fessor escolha como atividade de avaliação
a resolução de um tipo de problema aditivo
que nunca havia sido proposto antes e, as-
sim, o aluno pode estar se defrontando pela
primeira vez com um problema aditivo dos
mais difíceis e, justamente em um momen-
to de avaliação. Neste caso, a dificuldade
não poderia ser atribuída ao aluno, pois ela
se encontra no desconhecimento do pro-
fessor sobre o conteúdo a ser ensinado.
O conhecimento matemático do
professor, ou melhor, a falta desse conheci-
mento, ainda é um dos fatores do insucesso
dos estudantes na Matemática. Destacamos
a importância de um ensino comprometido
com a melhoria da aprendizagem matemá-
tica dos estudantes do Ensino Fundamental
que, além de exercícios de cálculos, propo-
nha a diversidade de situações pertencentes
ao campo aditivo, o papel da representação
na resolução de problemas aditivos e a meto-
dologia da resolução de problemas.
Acreditamos que o segredo da apren-
dizagem pode estar na relação entre como se
ensina e como se aprende.
14
REFERÊNCIAS
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16
É importante ter a visão de que compreender
deve ser o principal objetivo do ensino, apoiados
na crença de que o aprendizado de Matemática,
pelos alunos, é mais forte quando é autogerado
do que quando lhes é imposto por um professor
ou por um livro-texto. Quando os professores en-
sinam Matemática através da resolução de pro-
blemas, eles estão dando a seus alunos um meio
poderoso e muito importante de desenvolver sua
própria compreensão. (ONUCHIC, 1999, p. 208).
Resolver problemas, no sentido
amplo da palavra, é uma ação constante
na vida dos cidadãos da sociedade con-
temporânea. Esse ponto de partida deve
impulsionar os profissionais da Educação
a pensar e repensar caminhos que propi-
ciem, desde a infância, a construção de
conhecimentos matemáticos que desen-
volvam habilidades e competências que
favoreçam o atuar conscientemente no
meio em que vivem, de modo a resolver os
problemas sob uma ótica que privilegie a
qualidade de vida pessoal e social.
No entanto, a formação acadêmica
dos profissionais que atuam na Educação,
como regentes que ensinam Matemática,
nem sempre correspondeu ou deu sub-
sídios suficientes para desenvolver um
trabalho com resolução de problemas de
forma consistente e adequada para o es-
paço de sala de aula frente às exigências
da sociedade contemporânea; por isso,
destacamos a importância da formação
continuada permanente, proporcionando
o desenvolvimento do trabalho pedagógi-
co com a Matemática de uma forma mais
próxima da realidade cultural e social,
atendendo à formação integral do indiví-
duo que atuará na sociedade.
texto 2
Resolução de PRoblemas: Possibilidades eReflexões a PaRtiR do esPaço de sala de aula!
Justina I. C. Motter Maccarini1 Salete Pereira de Andrade2
1 Mestre e especialista em Educação. Professora de Matemática do Ensino Fundamental. Docente em cursos de formação de professores. Autora de livros didáticos e paradidáticos de Matemática. 2 Especialista em Educação Matemática. Professora de Matemática do Ensino Fundamental. Docente em cursos de formação de professores. Autora de livro didático de Matemática.
17
O trabalho com resolução de pro-
blemas favorece o desenvolvimento da
leitura, compreensão, análise, reflexão,
levantamento de hipóteses e resolução,
colocando em movimento inúmeras habi-
lidades e formas de pensar.
O papel do professor, nessa perspec-
tiva, passa por modificações, já que uma
das suas grandes atribuições é a criação de
um ambiente favorável. A sala de aula deve
ser um ambiente onde haja interação so-
cial entre os estudantes e com o professor,
e onde todos os estudantes sintam-se enco-
rajados a correr riscos e expor suas ideias,
para que, de fato, estejam estimulados a
participar ativamente das aulas.
A resolução de problemas mostra
a riqueza do trabalho pedagógico com a
Matemática na medida em que o profes-
sor promove a leitura, a compreensão do
texto e do contexto, o debate, o confron-
to de ideias e opiniões e a percepção das
diferentes formas de pensar em torno das
possibilidades de resolução de cada pro-
blematização proposta.
De acordo com os PCNs (BRASIL,
1997), a resolução de problemas é fundamen-
tal no processo de desenvolvimento forma-
tivo do indivíduo e vai se consolidando na
medida em que o aluno elabora um ou vários
procedimentos de resolução, utilizando-se
de simulações, estimativas e formulação de
hipóteses, comparando seus resultados com
os dos colegas, validando seus procedimen-
tos de resolução e encontrando as estratégias
mais adequadas para cada situação.
A organização e o encaminhamen-
to do trabalho com a resolução de proble-
mas em sala de aula pode seguir diferentes
caminhos, dependendo do ano em que o
estudante está cursando, do tipo de pro-
blema, dos recursos manipuláveis envol-
vidos, da contextualização, entre outros.
No entanto, alguns aspectos são impres-
cindíveis e essenciais na prática diária do
professor, relacionados à resolução de pro-
blemas, dos quais cabe destacar:
- Leitura do problema, seja ele escrito em
linguagem materna ou por meio da apresentação
de imagens. A competência leitora perpassa a
resolução de problemas. Não há como resol-
ver problemas sem a leitura do seu enunciado.
- Compreensão do enunciado do pro-
blema. A compreensão é parte essencial da
leitura. O hábito de ler está intimamente re-
lacionado à compreensão do que está sendo
lido. Normalmente, durante o processo de
resolução de problemas, a principal dificulda-
de reside na densidade de informações apre-
sentadas, cabendo ao professor incentivar os
estudantes a reformular o problema com suas
próprias palavras, facilitando a compreensão.
- Autonomia do estudante. Um dos
18
grandes objetivos da Resolução de Proble-
mas é o desenvolvimento da autonomia do
aluno nas formas de pensar e de agir. A auto-
nomia é desenvolvida na medida em que são
propostas situações que favoreçam o pensar
e o agir do estudante, para que ele crie es-
tratégias próprias de resolução, análise e va-
lidação dos seus resultados.
-Identificação dos dados e informações
significativas. Na resolução de problemas, o
estudante desenvolve a autonomia na identi-
ficação de dados e informações importantes
e necessárias para encontrar a solução mais
adequada para a situação proposta.
-Levantamento de hipóteses. Na pers-
pectiva metodológica da Resolução de Proble-
mas, evidencia-se a importância do ambiente
investigativo em sala de aula. Cabe ao profes-
sor favorecê-la aos estudantes para que levan-
tem hipóteses sobre as situações propostas.
- Estimativa de resultados possíveis.
O desenvolvimento da estimativa e dos cál-
culos aproximados favorece a habilidade de
resolver problemas com maior assertividade,
pois permite uma reflexão mais consistente
sobre os resultados obtidos, canalizando os
esforços no que de fato o problema propõe.
- Identificação do caminho e das estra-
tégias mais adequadas para a resolução. Nor-
malmente, é possível utilizar diferentes es-
tratégias para resolução de um determinado
problema. Valorizar as diferentes estratégias,
identificando a mais adequada para cada pro-
blematização é uma habilidade que deve ser
desenvolvida nos estudantes. Nessa etapa, é
importante que o professor estimule seus alu-
nos, evitando intervir sobre suas ações.
- Resolução. Resolver adequadamente
um problema, chegando-se ao melhor resulta-
do, é o objetivo principal da resolução de pro-
blemas. No entanto, o sucesso na resolução de
um problema depende de vários fatores, colo-
cando-se em movimento todos os elementos
descritos aqui, além do ambiente investigativo
e criativo da sala de aula e do conhecimento
matemático construído (e em construção).
- Análise e verificação do(s)
resultado(s) encontrado(s). O(s) resultado(s)
encontrado(s) pode, ou não, ser o mais ade-
quado para a problematização proposta; por
isso, é essencial verificar e analisar esse re-
sultado, identificando a sua veracidade e, se
esse é, de fato, o resultado mais adequado
para a situação proposta.
- Confronto entre a resolução do estudan-
te e a de outros colegas. Ampliar o repertório
de possibilidades de resolução de problemas é
parte integrante de um ambiente investigati-
vo em sala de aula. Isso é favorecido quando
o professor desenvolve o hábito de comparti-
lhar, argumentar e confrontar ideias, opiniões
e possibilidades de resolução dos problemas.
19
- Elaboração e proposição. Durante o
processo de resolução de problemas, o estu-
dante identifica os elementos de cada tipo
de problema e suas contextualizações, favo-
recendo o contato com diferentes textos e
contextos; essas questões dão subsídios para
a elaboração e proposição de problemas.
Diante desses aspectos, cabe des-
tacar a importância da diversificação das
formas de organização dos estudantes ao
encaminhar o trabalho com a Resolução
de Problemas, podendo ser: individual; em
pequenos grupos; a turma toda, coletiva-
mente; individual com posterior plenária;
individual ou em pequenos grupos com
correção coletiva; entre outros.
De acordo com Onuchic (1999, p. 210-211),
Na abordagem de Resolução de Pro-
blemas como metodologia de ensino,
o aluno tanto aprende Matemática
resolvendo problemas, como aprende
Matemática para resolver problemas. O
ensino da resolução de problemas não
é mais um processo isolado. Nessa me-
todologia, o ensino é fruto de um pro-
cesso mais amplo, um ensino que se faz
por meio da resolução de problemas.
Ao propor a Resolução de Proble-
mas em sala de aula, podemos observar
inúmeras situações relacionadas à apren-
dizagem dos estudantes, tanto em termos
de conhecimento matemático, quanto em
relação ao desenvolvimento da competên-
cia de resolver problemas.
A problematização a seguir foi resolvi-
da por estudantes de 5º ano do Ensino Fun-
damental (Curitiba, ago/2013), das quais des-
tacamos duas soluções para refletir sobre as
formas como os estudantes pensaram e tenta-
ram encontrar a resposta à problematização.
Observe:
Ao analisarem-se as duas soluções
registradas por esses estudantes, alguns as-
pectos podem ser evidenciados. O estudante
A procurou resolver a situação por meio do
uso de algoritmos convencionais. Percebe-se
que o estudante A esteve atento a alguns itens
importantes, tais como: há um total de peixes
e nesse total há dois grupos: peixes peque-
nos e peixes grandes. É necessário identificar
a parte do total que corresponde aos peixes
grandes e a parte que corresponde aos peixes
pequenos. Ao identificar que o todo deveria
ser dividido em duas partes e demonstrando
20
domínio da técnica operatória da divisão, da
adição e da subtração, inclusive com núme-
ros decimais, o estudante aplicou de forma
inadequada esse procedimento para solucio-
nar um problema que exigia raciocínio além
da aplicação de técnicas operatórias diretas.
Outra questão que pode ser destacada na re-
solução do estudante A, é que parece que ele
não refletiu sobre o resultado encontrado; ou
seja, não é possível ter 5,5 peixes pequenos e
5,5 peixes grandes em um aquário.
Em contrapartida, o estudante B, de-
monstrou a não preocupação com a aplica-
ção de técnicas operatórias convencionais,
desenvolvendo o registro de raciocínios pos-
síveis que levassem a uma solução coerente e
assertiva para a problematização proposta.
De fato, a resolução de problemas
deve levar o estudante a pensar produtiva-
mente, desenvolvendo formas diferenciadas
de ver e perceber cada problematização que
se apresenta, dando soluções adequadas e sa-
tisfatórias ao contexto da situação.
21
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22
A ideia conceitual de multiplicação
e o conhecimento de produtos elementares
está na base dos raciocínios matemáticos,
da resolução de problemas e dos cálculos
mentais que fazemos no dia-a-dia. Intrinse-
camente associada a ela, e igualmente im-
portante, está a ideia de divisão. Perceber
quando se faz necessário realizar operações
multiplicativas ou de divisão, e saber rea-
lizá-las, seja mentalmente, por estimativas
ou por cálculos escritos, é um instrumen-
tal útil para a vida cotidiana e profissional,
mesmo com o uso cada vez mais comum
das calculadoras. Sob o nome de Princípio
Multiplicativo, esse texto trata de vários as-
pectos teóricos das estruturas multiplica-
tivas-divisivas, apresentando uma possível
transposição didática dos mesmos, con-
substanciada em linhas centrais de uma
proposta didática. Começaremos dando
ênfase à multiplicação e articulando-a com
a divisão. Em seguida, complementaremos
com a divisão propriamente dita.
O ensino-aprendizagem da multi-plicação nas últimas décadas
Nas últimas décadas, o ensino-
-aprendizagem da multiplicação apresen-
tou várias tendências. Após longa fase com
acentuada ênfase na memorização pura de
tabuadas e dos algoritmos, procurou-se, nas
décadas finais do século XX, dar um sentido
aos fatos multiplicativos, usando-se somas
de parcelas repetidas. Havia certa confusão
na parcela a repetir-se: alguns livros diziam
que 3x5 significavam 3 parcelas de 5 e, por-
tanto, 3x5 = 5+5+5; outros diziam que seriam
5 parcelas de 3 e portanto 3x5 = 3+3+3+3+3.
De qualquer modo, as crianças tiveram, en-
tão, um recurso, além da memória, para
saber resultados de multiplicações: podiam
contar (disfarçadamente, em algumas esco-
las), nos dedos. Para calcular 7x3, o jeito das
crianças era ir mostrando dedos, de um a
sete, e, a cada dedo, contar três unidades.
texto 3
PRinCíPio multiPliCativo PaRa os anos iniCiais – desenvolvimento ConCeitual e algoRitmos em uma PeRsPeCtiva de situações-PRoblema
Nilza Eigenheer Bertoni1
1 Doutora Honoris Causa em Educação Matemática pela UnB. Professora aposentada do Departamento de Matemática da Universidade de Brasília.
23
Já no fim do século, surgiram as
interpretações da multiplicação como or-
ganizações retangulares e combinações.
Não havia a preocupação de mostrar que
se tratava de um mesmo conceito em di-
ferentes formulações ou representações,
que as formas de descrevê-lo ou de cal-
cular os resultados se equivaliam, nem se
aprofundava a reflexão sobre o papel da
adição no processo multiplicativo.
A teoria dos Campos Conceituais de
Vergnaud2 distinguiu, na aprendizagem dos
números, o campo aditivo e o campo multi-
plicativo, agrupando as estruturas aditivas-
-subtrativas e as multiplicativas-divisivas.
A seqüência de aprendizagem
soma -> multiplicação passou a ser olhada com
certa reserva. Isso porque a soma e a subtra-
ção foram percebidas como indissolúveis, da
mesma forma que a multiplicação e a divisão,
na Matemática e na aprendizagem, não só no
sentido de operações inversas (como propa-
lado pela Matemática Moderna), mas pelos
esquemas específicos descritos por Vergnaud,
associados a cada uma dessas estruturas. Ape-
sar de certo conhecimento coletivo entre mui-
tos professores e autores de livros didáticos de
que é errado associar multiplicação a somas
de parcelas repetidas, muitos não conseguem
escapar a essa abordagem, e, de modo geral,
não está claro o que deverá substituí-la.
Associação um a muitos - uma pe-quena sutileza anterior à soma de parcelas repetidas
Vamos procurar mostrar, na con-
cepção atual, de que modo a soma de par-
celas repetidas se articula ao cálculo mul-
tiplicativo, e como esse cálculo requer a
percepção anterior de uma associação um
a muitos, a qual constitui-se na essência da
operação de multiplicação.
No processo apresentado para o cál-
culo de 7x3, houve, sim, a soma de sete par-
celas, todas iguais a 3. Entretanto, para que
esse processo desse certo, houve necessidade
de pensar em 7 dedos e associar a cada um a
contagem de 3 unidades, ou seja, fixar uma
quantidade inicial (sete) e, a cada uma des-
sas unidades, associar 3 unidades, contando
ou somando os resultados. Na aprendizagem
da multiplicação, essa concepção é muito
relevante. Em uma capacitação de professo-
res que desenvolvemos em São Luís do Ma-
ranhão3, discutíamos como, anteriormente
ao conhecimento de tabuadas, os alunos
poderiam calcular o total de laranjas em 11
caixas com 15 laranjas em cada uma. A filha
2 Gerard Vergnaud (1990) define campo conceitual como “um espaço de problemas ou de situações-problema cujo tratamento implica em conceitos e procedimentos de vários tipos que estão em estreita conexão.”
3 Não anotadas a escola, data e finalidade da visita, nem retida a produção, o que deixou de caracterizar o fato como um protocolo oportunístico, tornando-se apenas um relato de algo muito nítido em minha memória.
24
de 8 anos de uma das participantes come-
çou a procurar a resposta em seu pequeno
caderno de formato horizontal. Desenhou
bem grande uma caixa com 15 laranjas na
primeira página. Virou a página e desenhou
mais uma caixa. Em seguida contou as la-
ranjas nos dois desenhos e, na segunda pági-
na, escreveu, no canto inferior direito, o nú-
mero 30. Assim prosseguiu, página a página,
sempre colocando o resultado parcial: 45,
60, etc. Em certo momento, pareceu não sa-
ber se já havia feito suficientes desenhos, e
voltou para contá-los. De modo espontâneo,
a mãe sugeriu: marque aqui (canto superior
direito) o número do desenho. Ela numerou
as páginas: 1 – 2 – 3 ... e, daí para a frente, a
cada nova página com novo desenho, colo-
cava o número correspondente, até chegar
no 11. Nesse ponto, voltou à página anterior,
viu que já havia 150, e prosseguiu na conta-
gem, incluindo as 15 laranjas da última cai-
xa, chegando ao resultado 165.
Novamente, nota-se, no raciocínio da
criança, a presença das duas coisas anterior-
mente observadas: atenção a uma quantida-
de inicial de caixas (11) e a associação, a cada
caixa, de uma quantidade fixa de elementos:
15. A associação de cada um a muitos, a par-
tir de uma quantidade inicial, corresponde à
parte conceitual da multiplicação. A soma das
parcelas, calculada por contagem, serviu para
o cálculo do resultado da multiplicação e cor-
responde à parte operacional da mesma.
Fornecer situações significativas que
levem o aluno a fazer essa associação, anterior
à contagem ou soma, é importante para en-
tender a essência dessas novas situações (que,
em momento oportuno, serão denominadas
multiplicações). Ao fazer tal correspondência,
estabelece-se uma proporcionalidade: o núme-
ro final de objetos contados é proporcional ao
número de vezes em que foi contado.
Articulando com a divisão
Situações de multiplicação, como
essa, levam a duas situações de divisão:
- Se você tiver 165 laranjas, para dis-
tribuir igualmente em 11 caixas,
quantas você põe em cada caixa?
- Se você tiver 165 laranjas, e quiser ven-
der em caixas com 15 laranjas em cada
uma, de quantas caixa vai precisar?
Após o cálculo de uma situação-
-problema multiplicativa, o professor
deve verbalizar essas questões, mes-
mo sem intenção de introduzir a divi-
são, apenas para que os alunos perce-
bam a interrelação entre as situações.
No primeiro caso, em que se tem certa
quantidade e se quer distribuir igualmente
para pessoas, ou caixas etc, a divisão é cha-
mada partitiva. A resposta que se procura
é: quanto deu para cada pessoa, ou caixa?
No segundo caso, em que se tem
certa quantidade e se quer separá-la em
partes de tamanho pré-fixado, a divisão é
chamada quotitiva (separação em quotas)
ou de medida. A resposta que se procura é:
quantas parte (ou quotas) são obtidas? Ou:
quantas vezes cada parte cabe no todo?
25
Contagem por unidades múlti-plas ou compostas
Behr, Harel, Post e Lesh (HAREL e
CONFREY, 1994) associam o processo de
multiplicar à contagem de unidades múlti-
plas ou compostas, no qual a criança é le-
vada a contar por unidades compostas, ou a
“tratar um conjunto, uma coleção, como uma
unidade”. Por exemplo, 1 par de sapatos, 1
mão com 5 dedos. Na contagem, aparece: 1
par são 2 sapatos, 2 pares são 4, 5 pares são
10. Embora se apoie numa soma de parcelas
repetidas, essa abordagem não se reduz a
esse processo. A criança tem dois referen-
ciais - apoia-se na contagem dos números
naturais para definir o número de pares que
tomará, e tem uma unidade composta fixa,
que será tomada tantas vezes quanto indica
o natural, contando ou somando o total.
Muitas situações e jogos podem ser
criados visando levar a criança, de modo cla-
ro e interessante, à contagem por unidades
compostas. Por exemplo:
Trata-se de um jogo de tabuleiro com um cami-nho formado de casas, não necessariamente nu-meradas (80 ou 100 casas), no qual cada criança avança com um peão, jogando um dado para calcular quantas casas deve avançar. O cami-nho tem certas casas especiais, com a legenda “Número Oculto”. Ao cair numa dessas casas, a criança deverá pegar um cartão de uma pi-lha, que apresenta, na face visível, a legenda: “O número de casas que você deve andar é o mesmo que...” e virá-lo, para ler o outro lado. No verso, aparecem mensagens como “5 pa-res de sapatos”, “3 caixinhas com 2 chicletes”, “3 engradados com 4 refrigerantes”, “2 filas de 4 soldados”, “4 gaiolas com 4 passarinhos”. As crianças entendem logo que devem descobrir o número oculto naquela mensagem, ou seja, o número total de coisas, objetos ou seres sugeri-do pela mensagem, que será o número de casas que avançará, naquela jogada. Ganha quem pri-meiro atingir o fim do caminho.
Para a descoberta do número ocul-
to, as crianças recorrem à contagem por
unidade composta: “Uma gaiola são 4 pas-
sarinhos, duas são 8, 3...(pensa, conta real-
mente) são 12, 4 são... 16 (pode demorar al-
gum certo tempo).
Em Nunes et allii encontramos vá-
rias dessas situações (p. 90 a 96):
- número de tomates para um nú-
mero dado de panelas de sopa, se para cada
panela irão 2 tomates;
- número de balões para um número
dado de crianças, se cada criança recebe 3 ba-
lões (associar a cada criança 3 balões e somar);
- número de bolinhas de gude para
um número dado de jogadores, se cada jo-
gador precisa de 3 bolinhas (associar a cada
jogador 3 bolinhas e somar);
Os autores sugerem registrar os resul-
tados em tabelas de vários tipos, envolvendo
desenhos de fácil compreensão pelos alunos.
A questão do zero como fator da multiplicação
Mesmo antes de introduzir termi-
nologias como multiplicação e fator, con-
sideramos importante criar condições que
impliquem a inclusão do 0 como um dos
termos da multiplicação. O jogo exposto
26
permite isso, ao introduzirmos mensagens
como “2 gaiolas com 0 passarinhos”. As crian-
ças poderão parar para pensar e perceberão
que não devem andar nenhuma casa. Do
mesmo modo, pode aparecer a mensagem
“0 gaiolas com 8 passarinhos”, em que o to-
tal de passarinhos é 0, implicando ficar pa-
rada naquela jogada.
Articulação com a divisãoEm qualquer caso, em meio a várias perguntas de multiplicação, pode e deve aparecer uma de divisão (resolvida por desenho ou mentalmente)
Por exemplo: Se o cozinheiro tiver 8 tomates, quantas panelas dessa sopa poderá fazer?
Um jogo com registros
Na apostila Numerização, de Guidi e
Bertoni (1987), produzida no Departamento
de Matemática da UnB, no âmbito do proje-
to Um Novo Currículo de Matemática para o
1º grau, o conceito de multiplicação é intro-
duzido, de modo amplo, pela contagem de
unidades compostas ou múltiplas: total de
dedos em algumas mãos; total de rodas em
algumas bicicletas etc. Foi criado um jogo
para prosseguir no processo e possibilitar
a introdução de verbalização e símbolos. A
unidade composta 2, associada a um par, é
uma escolha inicial natural.
Neste texto, as expressões: fize-
mos, propusemos, os alunos resolveram,
referem-se a experimentos realizados com
alunos nesse Projeto.
Jogo do 2:
Material: caixas plásticas para ovos (apro-
ximadamente 15 caixinhas de 2 ovos), cortadas de 2
em 2, no centro da mesa; 1 dado.
Modo de jogar: todos os alunos do grupo (4 ou 5)
jogam o dado e guardam mentalmente o resultado
que tiraram; o que tirar o maior resultado nessa
rodada ganha uma caixinha “com dois ovos”. Caso
haja empate numa rodada, todos que tiraram o
maior número ganham uma caixinha. O jogo pros-
segue até acabarem-se as caixas. Vence quem tiver
ganhado o maior número de caixas.
O importante nesse jogo é o aprovei-
tamento do mesmo. Os alunos gostam de
contar “quantos ovos ganharam”. Há per-
guntas que levam a uma reflexão sobre a si-
tuação, como “quantas vezes você ganhou
(a caixinha com 2 ovos)? Quantos ovos são?
Essas perguntas conduzem a registros dos
resultados do grupo, em papéis preparados,
contendo 5 vezes a frase:
.............ganhou......vezes a caixa com 2 ovos. Fi-
cou com....ovos.
Cada membro do grupo preenche,
ao término do jogo, uma das frases com seu
nome e seus resultados, passando a folha a
um colega. Após alguns dias, a formulação
da folhinha de resultados será alterada para:
............. : ...... vezes 2 ovos = ...... ovos
27
Essa frase, preenchida, resulta em:
Fábio: 6 vezes 2 ovos = 12 ovos
Finalmente, o professor poderá expli-
car que, assim como temos sinais matemáti-
cos para as palavras “mais” e “menos” tere-
mos um sinal para a palavra “vezes”, que é “x”.
As frases na folha de resultados passam a ser:
................ : ........ x 2 ovos = ........ovos
Articulação com a divisão
Associadas à resposta de Fábio, existem
duas situações de divisão :
1-Fábio ganhou 2 ovos em cada rodada
que venceu e ficou com 12 ovos. Quantas
rodadas ele venceu?
Essa é do tipo quotitiva – devem-se
separar os 12 ovos em caixas de 2, para
saber quantas caixas (e portanto quantas
rodadas) foram ganhas.
2- Fábio ficou com 12 ovos. Ele ganhou 6
rodadas. Quantos ovos ganhou em cada uma?
Essa seria partitiva, mas não tem interesse
para o aluno, pois ele já sabe que, em cada
rodada, quem ganha recebe 2 ovos.
reforçar o entendimento de como funciona a
multiplicação se o primeiro fator for igual a
zero. De fato, algumas vezes pode ocorrer que
um aluno não ganhe nenhuma rodada, por-
tanto não receba nenhuma caixa. O registro
será 0 x 2 ovos = 0 ovos.
Outra vantagem desse trabalho com
as caixas de ovos é que alguns alunos, para
contar o total de ovos, organizam as caixas
em coluna, cada uma embaixo da anterior,
obtendo uma disposição retangular, associan-
do a soma de parcelas com o total de elemen-
tos em uma disposição retangular.
Repetir o multiplicador ou repetir o multiplicando?
No jogo do 2, as situações que apa-
recem são de uma contagem de 2 em 2. No
registro, o primeiro número indica o número
de partidas ganhas, que varia de aluno para
aluno; o segundo número é sempre igual a
2. Isso facilita o processo de contagem total
dos ovos de cada um como um processo de
recorrência, que apoia-se, a cada passo, no
resultado anterior. O aluno acrescenta sem-
pre a quantidade 2 em sua contagem. O pro-
cesso que fica subjacente é “Uma vez 2, duas
vezes 2, 3 vezes 2,...”.
Bem diferente e mais complicado é
o processo usualmente adotado por livros e
escolas: induz-se o aluno a pensar “2 vezes 1,
2 vezes 2, 2 vezes 3...”. Nesse caso, ele varia a
cada passo o tamanho do grupo considera-
do. Se o primeiro fator é 2, a situação não é
tão difícil, pois pode ser vista como uma du-
plicação. Já no caso do primeiro fator igual
a 6, por exemplo, teríamos: 6 vezes 1, 6 vezes
2, 6 vezes 3... No primeiro, o aluno imagina 6
grupos de 1 elemento, no segundo 6 grupos
28
de 2 elementos, depois 6 grupos de 3 elemen-
tos. Como muda a estrutura do processo e
a visualização mental do mesmo, a tendên-
cia do aluno será a de não aproveitar a con-
tagem anterior e recomeçar sempre uma
nova contagem (a não ser que lhe ensinem
a acrescentar 6, e ele faça isso sem entender
por quê). O processo de contagem por uni-
dade composta, que envolve a repetição do
segundo fator, possibilita uma compreensão
da multiplicação, em que fica claro o papel
diferenciado dos dois números envolvidos:
um deles, o segundo, indica o tamanho de
grupos que estão sendo tomados, o primeiro
indica quantos daqueles grupos serão toma-
dos. A explicitação dessa função dos termos
deve ser feita em fases mais adiantadas – nas
iniciais, o importante é fazer o aluno viver
essas situações...
Ampliação das situações abrangi-das pela multiplicação
Embora com aparência um pouco
diferente, a organização retangular encaixa-
-se na essência do processo multiplicativo
e não precisa ser tratada como uma outra
interpretação da multiplicação. Nessas situ-
ações, há um total de objetos apresentados
ou pensados em uma organização retangu-
lar, portanto certo número de filas com mes-
mo número de elementos em cada uma. Ou
seja, a correspondência de um para muitos
já está estabelecida: existe uma quantidade
inicial de filas e, em cada uma, comparece
um mesmo número de objetos. Para saber
o total, basta somar esse número tantas ve-
zes quantas são as filas. Por exemplo, 8 filas,
com 5 carteiras em cada uma, dá um total de
5+5+5+5+5+5+5+5 = 40 carteiras.
Do mesmo modo, a combinação dos
objetos de uma coleção com os objetos de
outra envolve princípio semelhante ao da
noção inicial de multiplicação. Se quere-
mos combinar 2 shorts e 4 camisetas de to-
dos os modos possíveis, podemos pensar na
quantidade inicial de dois shorts, a cada um
dos quais associamos 4 camisetas, obtendo
assim um total de 4 + 4 trajes possíveis. A
diferença está em que obtemos um total de
trajes (combinações short/camiseta) e não o
total de camisetas. Outro modo de resolver
via tabela de dupla entrada, ressalta a asso-
ciação com uma organização retangular. Do
mesmo modo, o número total de combina-
ções pode ser visto como um produto (do
número de linhas pelo número de colunas),
que também poderá ser obtido por somas
cujas parcelas são o número de elementos
de uma linha (tomadas tantas vezes quantas
são as colunas), ou vice-versa. Esses trata-
mentos superam um aspecto estanque des-
sas várias situações, estabelecendo vínculos
conceituais e procedimentais.
Se propusermos aos alunos tais si-
tuações, eles contam elementos das filas
ou desenham as combinações possíveis e
chegam a resultados corretos, desde que a
metodologia cotidiana os estimule a pensar
29
e lhes conceda tempo. Se a simbologia para a multiplicação já foi introduzida (por exem-plo, no jogo do 2), os alunos podem repre-sentar os resultados dessas situações, ainda que obtidos por somas, usando o símbolo para a multiplicação: 8 x 5 = 40; 2 x 4 = 8.
Os Parâmetros Curriculares Nacio-nais de Matemática (Brasil, 1997) apresen-tam várias situações de multiplicação e de divisão correspondentes, das quais retira-mos algumas e apresentamos em forma de tabela, com algumas variações.
Associadas a situações comparativasMultiplicação:
Pedro tem 5 reais e Lisa tem o dobro dessa quantia.
Quanto tem Lisa?
Marta tem 4 selos e João tem 5 vezes mais selos
que ela. Quanto selos tem João?
Situação de divisão correspondente: Lisa tem 10 reais. Ela tem o dobro da quantia de
Pedro. Quanto tem Pedro?
Na situação anterior, foi necessário dobrar a quantia de Pedro. Nesta situação, é necessário separar a quantia de Lisa em duas iguais.
Associadas à comparação entre razões (envolvendo proporcionalidade)Multiplicação:
Marta vai comprar 3 pacotes de chocolate, cada
um por 8 reais. Qual o preço dos 3 pacotes? Note-
se a proporcionalidade: 1 – 8 reais; 2 – 16 reais; 3
– 24 reais.
Dois abacaxis custam R$ 2,50. Qual o preço de
4 abacaxis? (Note que se pode obter primeiro o
preço unitário, mas isso não é necessário.)
Situações de divisão correspondente:
Marta pagou 24 reais por 3 latas de biscoito. Quanto custou cada lata?
Observação: divisão como partilha, isto é, separação de 24 reais em 3 partes iguais.
Marta gastou 24 reais comprando vários pacotes de biscoito que custavam 8 reais cada um. Quantos pacotes ela comprou? Observação: divisão como formação de grupos ou medida; procura-se saber quantas vezes o 8 cabe em 24.
Associadas a arranjos retangulares
Multiplicação:
Num auditório, as cadeiras estão arrumadas em
7 fileiras e 8 colunas. Quantas cadeiras há no
auditório?
Situações de divisão correspondentes:
As 56 cadeiras de um auditório estão dispostas em fileiras e colunas. Se são 7 fileiras, quantas são as colunas?
(O aluno poderá fazer, por tentativa:
Pondo só 4 cadeiras em cada fileira, seriam 28 cadeiras. Pondo mais duas em cada fileira, já são 42. Pondo mais duas novamente, chegará ao total 56.)
Associadas à ideia de combinações
Multiplicação:
Numa reunião, havia 3 moças e 4 rapazes, e
todas as moças dançaram com todos os rapazes.
Quantos casais diferentes dançaram?
Situações de divisão correspondentes:
Numa festa, foi possível formar 12 casais diferentes para dançar. Se havia 3 moças e todos os presentes dançaram, quantos eram os rapazes?
(O aluno poderá fazer, por tentativa:
São 3 moças. Se forem 2 moços, serão 6 casais. Se forem 3 moços, serão 9 casais.
Se forem 4 moços, serão 12 casais.
Eram 4 rapazes.)
30
Situações comparativas, arranjos retangulares e combinações: veja quantas situações associadas à multiplicação. Um quadro como esse ajuda você a planejar suas aulas, para se lembrar de desenvolver, em sala de aula, as diversas interpretações associadas à multiplicação e à divisão.
Tabuadas e algoritmos
As situações expostas até aqui fo-ram pensadas para serem resolvidas sem o auxílio de tabuadas ou de algoritmos, vi-sando apenas à resolução por contagem ou com algoritmos da adição. O aluno tem, na verdade, estratégias para obter o produto em qualquer multiplicação cuja contagem esteja ao seu alcance; em particular, pode calcular o produto de dois números com um dígito cada, embora não tenha pronti-dão ou rapidez em todos os casos.
Essa rapidez é usualmente adqui-rida por meio das tabuadas (quando che-gam a ser dominadas). Acreditamos que isso possa ser conseguido, mas requer tempo e cuidados especiais. Como os al-goritmos também devem ser construídos gradativamente, ao longo dos anos, opta-mos por desenvolver – tabuadas e algorit-mos - simultânea e gradativamente.
Adquirindo prontidão no resulta-do das multiplicações – um pro-cesso demorado
Na fase em que os alunos devem
adquirir habilidades multiplicativas, será
dada ênfase, a cada vez, a certa classe de
multiplicações, sempre apoiadas em situa-
ções significativas.
Uma primeira memorização fácil de
ser conseguida é a da tabuada do 2, pois o
“jogo do 2” propicia a memorização de mui-
tos desses resultados. Com o tempo e a re-
petição de partidas, os alunos começam a
dizer: “ganhei 4 vezes, fiquei com 8 ovos” e
é aconselhável que o professor confirme o
fato em uma frase mais completa: “é isso,
4 vezes 2 ovos dão 8 ovos”. Uma atividade
adequada a ser proposta nesse momento é:
Pense no jogo dos ovos e coloque os resultados:
0x2 = 1x2 = 2x2 =
3x2 = 4x2 = 5x2 =
6x2 = 7x2 = 8x2 =
9x2 = 10x2 =
Alguns alunos incluirão mais resultados:
11x2 =___ ; 12x2 = ___.
Articulação com a divisão
Propor uma linha final do tipo abaixo.
Pedir que ponham o número que falta:
___ x 2 = 16
A ordem de introdução das tabua-das - menos linear e mais cognitiva
O processo acima garante, pratica-
mente, que todas as crianças aprendam os
resultados da multiplicação por 2, já ao fim
do 2º ano. Como proceder em relação à mul-
tiplicação por 3, 4, 5 etc? É só repetir o mesmo
processo, fazendo-se as adaptações necessá-
rias? Sim e não. Novamente, nos reportamos
31
às experiências e observações realizadas com
crianças, de 85 a 89. Embora tenhamos pros-
seguido o processo dando o “Jogo do 3”, com
caixas de ovos cortadas de 3 em 3, percebe-
mos que a contagem pela unidade compos-
ta 3 tem pouca articulação com a contagem
pela unidade composta 2. Isto nos levou a
tentar outro caminho. Com outros grupos de
crianças, iniciamos, logo após o jogo do 2, o
“Jogo do 4”, com caixas de ovos de 4 em 4.
Logo de início, notamos que a conta-
gem dos grupos de 4 apoiava-se na contagem
anterior, dos grupos de 2. As crianças conta-
vam 1,2 ; 3,4; 5,6 ; 7,8 etc. Contar de 4 em 4
era como contar de 2 em 2, agrupando cada
duas contagens. As coisas realmente corre-
ram mais fáceis para as crianças e a aquisição
de habilidades foi mais exitosa. Nesse ponto,
nos indagamos qual contagem por unidade
composta seria mais fácil para as crianças ex-
plorarem, na próxima fase. Por observação do
cotidiano, fomos para a multiplicação por 5 e
depois por 10. Nisso gastamos quase 6 meses,
com as crianças já na 2ª série (3º ano atual).
Demos um tempo, trabalhando às vezes com
os mesmos jogos, algumas vezes inventando
outros, e principalmente misturando os fatos
da multiplicação por 2, 4, 5 e 10 - no Bingo, no
Jogo da Memória e no Dominó.
Inicialmente, esses jogos devem as-
sociar operações numéricas a representações
pictóricas, só depois associando resultados
numéricos. Assim, 3x4 será associado a um
desenho de 3 grupos de 4 objetos. No jogo
da memória, as cartas com os fatos multi-
plicativos devem ter um padrão (no verso),
distinto das cartas que têm respostas. Para
o dominó, sugerimos que as multiplicações
propostas fiquem na parte direita da peça e
os resultados (de outras multiplicações) à es-
querda. Assim uma peça colocada deixa em
aberto um fato multiplicativo. O aluno que
tiver o resultado, na sua vez, justapõe sua
peça à anterior. No Bingo, sugerimos que os
resultados estejam nas cartelas, o professor
deve cantar fatos como 3x4, 5x4, 1x4, 7x4 etc.
O aluno pensa no resultado e o marca em sua
cartela, caso o tenha.
Planejando o trabalho com as tabuadas ao longo do tempo
O trabalho das multiplicações por 2,
4, 5 e 10 foi intercalado com outros conteú-
dos matemáticos e com problemas envolven-
do proporcionalidade, arranjos retangulares
e combinações. Quando já ia completar-se
um ano, contado a partir do início do pro-
cesso, começamos a trabalhar a multiplica-
ção por 3, sem pressa. Isso significa que o
jogo do 3 (com caixas de ovos cortadas de 3
em 3) era dado uma ou duas vezes por sema-
na, durante cerca de 2 meses, intercalando
com outras atividades. Passamos do jogo do
3 ao dominó, bingo e memória com fatos da
multiplicação por 3 (3 como segundo fator),
finalmente a jogos que misturavam multi-
plicações por 2 e por 3. Os resultados foram
32
satisfatórios e iniciamos o processo da aqui-
sição de habilidades na multiplicação por 6
(apoiado na multiplicação por 3).
O conjunto dos estudos, experiên-
cias e observações realizados nos levam a
trazer alguns pontos para consideração,
e uma proposta, que pode parecer radical,
para atacar o problema das tabuadas, que
consiste em:
1. Começar por desenvolver o con-
ceito de multiplicação sem limitações. As-
sim, podemos propor, desde o 2º ano, situ-
ações que levem o aluno a calcular quantas
laranjas há em 6 cestas com 7 laranjas em
cada, ou mesmo em 4 caixas com 12 ovos.
Apenas teremos que lhes dar tempo para fa-
zer a contagem nas unidades compostas 7
ou 12, por estratégias próprias.
2. Desenvolver habilidades multipli-
cativas usando os jogos, conforme narrado
(sem exigência de memorização), do 2º ao
5º ano, assim distribuídas:
2º ano: Habilidades na Multiplicação por 2.
3º ano: Habilidades na Multiplicação por 2, 4, 5, e 10.
4º ano: Habilidades na Multiplicação por 3 e 6.
5º ano: Habilidades na Multiplicação por 8, 9 e 7.
Para chegar no 8, recordam-se al-
guns jogos da multiplicação por 4; para
chegar no 9, passa-se por jogos da multipli-
cação por 3 e por 6.
Deve-se lembrar que isso não restrin-
ge o uso de quaisquer fatores, desde o 2º ano
– deve-se apenas dar o tempo aos alunos para
que usem suas estratégias, pois não adquiri-
ram ainda habilidade nas tabuadas.
Concomitantemente, ao longo des-
ses anos, estariam sendo trabalhados pro-
blemas envolvendo interpretações variadas
da multiplicação e situações que levassem à
construção gradativa dos algoritmos.
Do nosso ponto de vista, erros a se-
rem evitados são:
- Dar todas as tabuadas, até o 3º ano, na or-
dem dos multiplicadores crescentes.
- Escrever as tabuadas com o primeiro fator
fixo, o que corresponde a duplicar, triplicar,
etc quantidades de 1 a 10.
- Ênfase opressiva ao estudo das tabuadas e
ambiente punitivo aos que falham.
Construção de processos mais ágeis para cálculo das somas associadas à multiplicação – os algoritmos
Ao invés de anunciar a aprendizagem
do algoritmo da multiplicação, é mais adequa-
do que se fale em dicas ou jeitos de obter mais
rapidamente o resultado de somas de parcelas
repetidas, pois isso dará ao aluno uma com-
preensão clara do que será trabalhado. Ao fi-
nal, pode-se chamar o processo de algoritmo
33
da multiplicação, e o aluno já terá percebido o
que pode obter com esse procedimento. Além
disso, as dicas servirão para explicitar, em boa
medida, o raciocínio matemático embutido
no algoritmo.
Por exemplo, no 3º ano, uma passa-
gem de estratégias iniciais para a constru-
ção do algoritmo pode ser feita propondo-
-se a situação: em 6 caixas de ovos, com 12
ovos em cada, quantos ovos há ao todo?
Deixando-os livres para resolver as estra-
tégias mais comuns utilizadas envolvem
desenhos ou somas. Abaixo, esquematiza-
mos o desenho de 6 dúzias e apresentamos
uma das formas possíveis de cálculo do to-
tal, apresentada pelos alunos:
12 + 12 + 12 + 24 + 24
12 12 12 24 24 24 24 72
Há todo um caminho a ser percor-
rido, partindo-se dessas estratégias iniciais,
em direção ao algoritmo usual. Um exemplo
é: separando-se os 2 ovos finais de cada dúzia,
obtendo, em cada caixa, 10 + 2 ovos. A con-
tagem total pode ser feita contando-se pri-
meiro os 10, depois os 2. Registros possíveis:
10 + 10 + 10 + 10 + 10 + 10 = 60 ou 6 x 10 = 60 60 +2 + 2 + 2 + 2 + 2 + 2 = 12 ou 6 x 2 = 12 12 72
Outras representações podem ser in-
troduzidas, não no sentido de aprender certo
procedimento, mas resumindo o que foi feito:
6 x 12 = 72 12 6x 72
Observação: A representação verti-
cal deve ser lida de baixo para cima, cor-
respondendo ao que será calculado: 6 ve-
zes a quantidade 12. A leitura de cima para
baixo – 12 vezes 6 – sugere contar 12 vezes
o número 6, que não é a situação propos-
ta. Colocamos o sinal à direita do multipli-
cador. Para ficar no sentido da leitura, 6x
será lido como seis vezes.
Um material que favorece essa sepa-
ração dos dez pode ser obtido pelo corte da
parte de 10 ovos nas caixas:
Ou pode ser usado, de maneira bem
explicada, o material dourado representan-
do os 12 ovos (como se fosse uma caixa com-
prida com os 12 ovos):
1 barra de 10 e 2 avulsos
34
Representando 6 materiais como es-
ses e agrupando os 2 ovos temos:
No concreto, dez cubinhos representando
ovos serão trocados por uma barra com 10
(enchem uma caixa de 10), obtendo 7 barras
de 10 e 2 avulsos.
Olhando o material, uma verbaliza-
ção adequada do professor seria (começan-
do da direita):
- 6 vezes 2 ovos dão 12 ovos, dá para
formar uma caixa com 10 e sobram 2;
- 6 vezes uma caixa são 6 caixas, mais
uma que formou são 7.
- 7 caixas com 10 e 2 ovos = 72
Essa decomposição concreta passa a
ser registrada numericamente:
12 -> 10 + 2 -> 12
6x 6x 6x 1 60 + 12 72
Verbalização final: 6 vezes 2, 12; for-
ma 10 ou uma dezena que eu reservo, marco
só o 2. 6 vezes 10 são 60 ou 6 dezenas, mais
uma reservada são 7. O dígito 7 nessa posição
quer dizer 7 dezenas ou 70 (recomendamos
verbalizar as equivalências sublinhadas).
Outras formas de calcular o total de-
vem continuar a ser aceitas, pois traduzem
compreensão do processo e serão úteis em
cálculos mentais.
Multiplicador com 2 dígitos
Uma situação-problema pode ser
proposta sem qualquer ensino preliminar:
O feirante vendeu 15 dúzias de ovos. Quantos
ovos ele vendeu? Podem surgir desenhos de
15 dúzias (e não de 12 conjuntos de 15 cada
um), com separação ou não da dúzia em 10 +
2 e registros variados de contagens parciais,
obtendo o resultado 180.
Alguns alunos deverão transpor para
o quadro de giz o que fizeram. Nesses dese-
nhos, o professor deve salientar a parte cor-
respondente a 10 dúzias e outra, correspon-
dente a 5 dúzias. Após isso, poderá trabalhar
no sentido de encaminhar para o algoritmo,
verbalizando, por exemplo:
Para contar 15 dúzias, posso contar 10 dúzias e mais 5 dúzias:
12 12 120 10x 5x + 60 120 60 180
(resultados já obtidos na contagem dos alunos)
Também posso separar a dúzia:
10 + 2 10 + 2 120 10x 5x +60 100 + 20 50 + 10 180 120 60
O professor pode dizer que, quem
quiser, pode fazer tudo junto. Deve es-
35
crever a conta e dizer que vai calcular 5
vezes uma dúzia e depois 10 vezes a dú-
zia (isso dá sentido ao procedimento):
12 15x 60
5x2,10... Marco 0 e reservo 1 dezena. 5x1 dezena = 5 dezenas, mais uma são 6.
120 180
(Lembrando que o 1 do 15 significa 10): 10
vezes o 12 são 120).
É importante, para a compreensão, o
registro do 0 na segunda parcela, ao invés do
mero recuo de uma casa. Além disso, alguns
alunos estranham que se possa fazer uma
adição sem alinhar os dígitos finais.
Fatores envolvendo mais do que uma dezena
Até agora, só trabalhamos com fato-
res que não atingiam 2 dezenas.
Situação-problema 1 (número maior
que 30 no multiplicando)
Dona Marli vai comprar 6 pacotes de
biscoito, cada um com 32 biscoitos. Quantos
biscoitos ela terá?
Após o acatamento de soluções dos
alunos, apresentação de várias alternativas:
32 30 + 2 180 ou diretamente 32 6x 6x 12 6x 180 + 12 192 192
No último caso, ao fazer a multipli-
cação entre os dígitos 6 e 3, não falar 6x3,
mas lembrar que o 3 nessa posição vale 30
ou 3 dezenas, 6 vezes 3 dezenas são 18 deze-
nas, mais uma na reserva, são 19 .
Situação-problema 2:
Para a festa da escola, a merendeira
abriu 24 pacotes de biscoito, com 32 biscoitos
em cada um. Quantos biscoitos ela obteve?
Novamente, chamar a atenção para
o fato de que temos 24 pacotes, e para cada
um serão contados 32 biscoitos, ou seja, va-
mos ter 24 vezes 32 biscoitos, e que há mui-
tos modos de contar o total, por exemplo: 20
vezes 32 biscoitos mais 4 vezes 32 biscoitos.
Cuidado ao calcular 20 vezes 32. Na verda-
de, a opção de falar em 2 dezenas vezes 32
é uma expressão que não faz sentido ao alu-
no, sugerimos desmembrar inicialmente em
10x32 + 10x32:
32 24x 128 (proceder da forma anterior para calcular 4x32) 320 (10 vezes 32) 320 (10 vezes 32) 768
Pode-se dizer que, para contar 20 ve-
zes 32, o que fizemos foi multiplicar 32 por
10 (obtendo 320), e depois por 2 (escrevemos
duas vezes o resultado). Mas também pode-
mos multiplicar primeiro 32 por 2, e depois
por 10. O aluno começa colocando o 0 da se-
gunda parcela (lembrando que terá que multi-
36
plicar por 10), depois faz a multiplicação 2x32).
32 24x 128 (proceder da forma anterior para cal-cular 4x32)
640 (20 vezes 32 – lembrar que vamos mul-tiplicar por 2 e depois por 10 – por o 0 778 logo no começo, ou reservar um lugar para ele, colocando-o depois)
A percepção correta de quantas
vezes será contado o quê, bem como essa
contagem de diferentes formas, obtendo
o mesmo resultado, torna a matemática
menos traumática, mais compreensiva e
lógica para o aluno.
Divisão
O conceito de divisão, tanto na inter-
pretação partitiva quanto quotitiva (ou de
medida), já deve ter sido formado, ao lon-
go do desenvolvimento da multiplicação. Os
alunos também já devem ter alguma ideia de
que multiplicação e divisão (em qualquer de
seus aspectos), envolvem reversibilidade. Ao
trabalhar com a divisão, realçaremos essa
noção. Uma questão que a aprendizagem da
multiplicação não propicia é a do resto, que
não aparecem nas divisões associadas a uma
multiplicação, mas consideraremos agora
situações em que ele aparece. Por meio de
situações-problema, vamos explorar ideias e
registros possíveis e chegar aos algoritmos.
Situações verbalizadas ou escritas iniciais
Existem situações que devem ser
propostas antes de qualquer introdução
formal da divisão e que contribuirão para
consolidar a formação inicial do conceito de
divisão. Para a colocação de resultados, os
alunos podem recorrer a desenhos ou mate-
riais concretos. Por exemplo:
1) 11 velas divididas para 2 bolos. Dão __ ve-
las em cada bolo. Sobra __ vela.
2) O professor deverá explicar que devem pôr
a maior quantidade possível de velas nos bo-
los, igual nos dois, e que talvez sobrem velas.
Articulação com a multiplicação
Após a solução das crianças, destacar que apareceram 5 velas em um bolo e 5 no outro, então são duas vezes as 5 velas, que são 10; mais uma que sobrou, dão as 11 velas que eles tinham para dividir. É importante ao professor observar que a descrição significativa da situação é dada por divisor x quociente + resto = dividendo. Isto é, o divisor aparece como primeiro fator. Isso ocorre em todas as divisões partitivas.
Observar que deve ser a maior quan-
tidade possível de bolinhas para cada aluno,
igual para todos, e que talvez sobrem bo-
linhas. Após a solução, fazer a articulação
com a multiplicação: Foram 4 bolinhas para
cada um dos três alunos, então apareceram
3 vezes as 4 bolinhas, que são 12; mais duas
que sobraram dão as 14 iniciais (divisor x
quociente + resto = dividendo).
Expostos a situações como essas, os
37
alunos percebem o significado e a maioria
chega a resultados corretos. Após fazerem
algumas situações, o professor pode apre-
sentar a representação das mesmas no es-
quema usado para a divisão, sem ensinar
qualquer cálculo:
11 velas 2 bolos
Sobra __ vela Dão __ velas em cada bolo
14 bolinhas 3 alunos
Sobram __ para cada um
Observamos experimentalmente o
surgimento de desenhos de 14 bolinhas,
bem como dos alunos que deveriam recebê-
-las (após o que era feita a distribuição e
marcados os resultados) :
14 | | | | | | | | | | | | | | 3
SobramKKK
__ para cada um
Uma próxima etapa será a supressão
de algumas palavras, dizendo que podem ima-
ginar 11 objetos quaisquer, divididos igualmente
para 2 alunos (ou 14 objetos, divididos para 3).
Algoritmos iniciais (livres) para as situações de partilha e de medida ou quotas
Foram dadas as situações: “Dividir
240 balas para 8 crianças” e “Com 120 ba-
las, forme pacotes de 4 balas”. Veja alguns
registros iniciais:
Desenhando todos os participan-tes em uma divisão
Você percebeu, no registro, o dese-
nho das 8 crianças que vão ganhar balas?
Foi uma estratégia inventada por crianças, e
logo aceita pelas outras. Ao fazer partilhas,
as crianças gostam de representar todas as
pessoas ou partes envolvidas. Isso lhes dá
um controle da situação - visualizam todos
os que vão receber, o que cada um está rece-
bendo, quanto do todo já foi gasto e quanto
240 balas 8 crianças
J J J J J J J J
10 10 10 10 10 10 10 10 80 10 10 10 10 10 10 10 10 80 160
10 10 10 10 10 10 10 10 80 30 30 30 30 30 30 30 30 240Os alunos desse grupo deram inicialmente
10 balas e depois mais 10 para cada criança;
viram que haviam gasto 160; deram mais 10
para cada uma e viram que gastaram todas
(240). Somaram os 10 e viram que deu 30 para
cada aluno. Podem efetuar 8x30 e ver que o
resultado é 240.
120 balasPara formar
pacotes de 4 balas
10 pacotes = 40 balas
10 pacotes = 40 balas
10 pacotes = 40 balas
30 pacotes = 120 balas
Os alunos de um grupo formaram inicialmente
10 pacotes, gastando 40 balas; formaram mais
10 e mais 10, e somaram tudo, dando as 120
balas. Viram que deu para formar 30 pacotes.
30 pacotes, com 4 balas em cada, são 30x4 = 120.
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resta. Só mais tarde concordam em mar-
car apenas uma delas. Do mesmo modo
que, em outras operações já exploradas,
esses processos não são ensinados a prio-
ri, mas são organizados depois dos regis-
tros livres dos alunos. Eles contribuem
realmente para o desenvolvimento do ra-
ciocínio, pelo uso da tentativa e de uma
compreensão clara da situação.
O uso de material concreto simbólico
As duas situações de divisão apre-
sentadas pertencem ao contexto cotidiano
e, para resolvê-las, os alunos fizeram uso
apenas da reflexão sobre a realidade. Não
foi utilizado material concreto. Será que
o uso de material concreto ajuda sempre?
Claro que pegar 12 palitos e dividi-los por 4
crianças é uma ação bem clara. Para núme-
ros maiores, como no caso de 240 balas para
8 crianças, pode ficar complicado pegar 240
palitos. Pegar um material representacional,
como material dourado, pode ser um faci-
litador aparente, mas também um afasta-
mento da realidade - como ver balas nas
placas ou barrinhas? Pensar diretamente em
distribuir as balas, controlando a distribui-
ção, é mais real. Ou usar o dinheiro de men-
tira, quando a situação envolver quantias.
Devemos refletir sobre o que ocor-
re com os algoritmos formais, que são im-
postos aos alunos, sem fazer sentido para
eles. Tornam-se responsáveis por boa par-
te das dificuldades sentidas pelas crianças
no processo de divisão usual da escola.
Ao contrário, quando as crianças tomam
parte na construção, raciocinando direta-
mente sobre a realidade ou fazendo uso
adequado de material manipulável, suas
dificuldades diminuem.
Divisões com dinheiro
Essas divisões levam a vários cálculos
mentais e representações alternativas. Devem
ser feitas inicialmente com dinheiro de menti-
ra (notas e moedas). Possibilitam a represen-
tação do raciocínio do aluno, de maneira livre.
24 reais 2 crianças
Sobram __ para cada um
Os alunos pegam 2 notas de 10 re-
ais e 4 moedas de 1 real. Percebem logo que
cada uma vai receber 1 nota de 10 reais e 2
moedas de 1 real e colocam 12 (para cada
um ) e 0 (após Sobram).
O dinheiro permite que soluções se-
jam encontradas para situações com apa-
rente dificuldade:
32 reais 2 crianças
Sobram __ para cada um
Uma solução encontrada foi:
32 reais 2 crianças
Sobram 0 1 de 10, 1 de 5, 1 de 1 = 16 reais
16 para cada um
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A explicação foi: 3 notas de 10, dá
uma para cada um e sobra uma; divide essa
nota pra dois e dá 5 pra cada um; divide os
dois reais e dá 1 pra cada um . Cada um re-
cebe 10 + 5 + 1 = 16 reais.
Essa etapa de propostas de situações e
soluções livres pelas crianças pode se prolon-
gar por um ou dois bimestres, trazendo mui-
to raciocínio, bem como confiança e prazer.
Tem a vantagem do 0 intercalado não repre-
sentar um problema – o aluno divide o que
tem, em qualquer ordem, e no fim, soma.
8205 4
Sobram 2 de mil, 1 de 50, 1 de 1
___ para cada um
Para explicar, os alunos imagina-
vam a existência de notas de 1000 e diziam:
8 de mil, dá 2 para cada um; 2 de 100... dá 50
para cada um; 5 de 1 real, dá 1 real para cada
um e sobra 1 real.
Podiam ocorrer casos mais difíceis:
7204 reais 3 crianças
Sobra 1000
Sobra 50
Sobra 1
2 de mil, 1 de 50, 1 de 1
3 de 100, 1 de 50
2 mil, 300, não, 400 e 1.
Deu 2401 pra cada um
A explicação foi: 7 de mil, dá 2 de mil
pra cada um (escreve 2 de mil), sobra mil (es-
creve); 2 de 100, (pensou um pouco) dá 50 pra
cada um (escreve 1 de 50), sobra 50 (escreve); 4
reais, dá 1 pra cada um (escreve 1 de 1), sobra
1. Mas, (segundo o aluno) tem que dividir as
sobras. 1000 tem que trocar tudo em 100, dá...
(um pouco de demora pra pensar) 3 de 100 pra
cada um, sobra 100; (nessa altura ele riscou
o 1000 e escreveu 100). Tem 100 e tem mais
50 (alegrou-se), dá 50 pra cada um; (riscou a
sobra de 100 e a de 50). Esse 1 se quiser dá mo-
edinha pra cada um.
Além de desenvolver cálculos men-
tais, essas estratégias permitem ao aluno
compreender o que ele busca no processo
de divisão. Como pode haver alguns resul-
tados distintos, os alunos querem saber se
acertaram. Uma saída para o professor é di-
zer: “Você mesmo pode ver se acertou: soma
o dinheiro que cada um ganhou mais o que
sobrou e vê se dá o que tinha para dividir.”
A validação pela estimativa é im-
portante: o professor pode questionar, por
exemplo, se não poderia ter dado 3.000
para cada um (não, porque só aí teria gas-
to 9000); ou por que não chegou a 2500
para cada um (3x2000=6000, 3x500 = 1500.
Somando, daria 7500, mas não tinha essa
quantia) levando a uma melhoria do cálcu-
lo mental e estimativas.
A construção do algoritmo da divisão
Como no caso da multiplicação, os
algoritmos serão anunciados como dicas
ou jeitos seguros de fazer a divisão, e que
podem facilitar os cálculos. São dois algo-
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ritmos mais usuais da divisão – um que faz
apenas trocas no sistema decimal, outro
por subtrações sucessivas.
Algoritmo das trocas decimais
Esse algoritmo faz mais sentido em
situações de partilha. Embora possa ser
usado em situações quotitivas, a associa-
ção dos procedimentos adotados com o
objetivo de formar quotas fica mais obs-
cura. Pensando em 112, dividido para duas
crianças (partilha):
112 2
10 1
5
De
dez
Novamente, optamos por tomar re-
presentação do dinheiro, em vez de falar em
centenas, dezenas e unidades, que é mais
abstrato para a criança.
Tem-se (ou ela pode pensar em): 1
nota de 100, 1 de 10, 2 moedas de 1.
Lembrar que podem trocar a nota
de 100 por 10 notas de 10. Ficam 11 de 10 e
duas de 1. Lembrar que 11 não dá para dividir
igualmente para 2, mas 10 dá - são 5 de 10
para cada um e ainda sobra uma. Marca 5
e embaixo, pequeno, escreve de dez. No iní-
cio, é adequado o registro das dez notas (de
10) já distribuídas e a subtração para indicar
a sobra de uma nota de dez.
Lembrar que podem trocar a nota
de 10 por 10 moedas de 1 e que ficam com
12 moedas de 1 (evitar a expressão abaixa o
2, que não tem significado para a criança).
E 12, dividido igualmente para 2, dá 6 moe-
das de 1 para cada um. Marca 6 e embaixo,
pequeno, escreve de um. Registra os 12 já
distribuídos e faz a subtração para indicar
quantas moedas de 1 sobraram.
112 2
-10
12 -12 0
5 6
de de
dez um
Algoritmo das subtrações sucessivas
Esse algoritmo é bem apropria-
do para as situações quotitivas ou de
medida – ou seja, formar partes de ta-
manho pré-determinado e contar quan-
tas foram formadas. Entretanto, com
uma verbalização adaptada, ele pode ser
entendido para a situação de partilha.
Com 112 chicletes, preencher caixinhas com
2 chicletes. Quantas caixinhas serão cheias?
112 CHICLETES Para 2 crianças
20 chicletes <-
20 chicletes <- 40
20 chicletes <- 60
20 chicletes <- 80
20 chicletes <- 100
10 chicletes <- 110
2 chicletes <- 112
10 (dá 10 chicletes para cada
uma, gasta 20 chicletes)
10 (dá mais 10 para cada uma,
gasta 20 chicletes)
Já gastou 40 chicletes
10 (dá mais 10 para cada uma,
gasta 20 chicletes)
Já gastou 60 chicletes
10 (dá mais 10 para cada uma,
gasta 20 chicletes)
Já gastou 80 chicletes
10 (dá mais 10 para cada uma,
gasta 20 chicletes)
Já gastou 100 chicletes
5 (dá mais 5 para cada uma,
gasta 10 chicletes)
Já gastou 110 chicletes
1 (dá mais 1 para cada uma,
gasta 2 chicletes)
Deu 56 chicletes para cada uma.
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A sequência de quanto vão dando a
cada criança pode variar, não havendo uma
ordem fixa. No final, ao verem que não po-
dem mais dar 10, a opção pode ser dar 2, 2 e
2, ou 1, 2, 1, 2.
Uma metodologia adequada é traba-
lhar ambos os algoritmos, sem exigir o do-
mínio dos dois. As crianças percebem que
ambos conduzem ao mesmo número (com
interpretações diferentes nas respostas), e
que, portanto, podem recorrer a qualquer
um deles. Algumas preferem o primeiro;
outras, o segundo. Com o tempo, mesmo
o segundo, que parece longo, vai sendo oti-
mizado, evoluindo para o algoritmo usual,
quando o aluno percebe que pode dar logo
50 e depois mais 6 a cada criança, e registra
no quociente: 5 (de 10) e 6.
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REFERÊNCIAS
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Structures. In: Harel, G. e CONFREY, J.(editores). The Development of Multiplicative Reasoning.
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Development of Multiplicative Reasoning. Albany: State University of New York Press, 1994.
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Setembro 2014