resenha critica do fedro (caio grimberg)

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“Pode me dizer, por favor, que caminho devo seguir para sair daqui? Isso depende do lugar para onde você deseja ir – respondeu o Gato.

O lugar para onde desejo ir? Francamente, para mim tanto faz. Nesse caso, tanto faz o caminho que você seguirá.

Contanto que eu chegue a algum lugar... Chega, na certa! Contanto que ande o tempo necessário.

Alice viu que não era possível negar isso”

(CARROLL, p. 60-61).

Diferente da resposta de Alice (CARROLL, Lewis. Alice no País nas Maravilhas), no caso da Filosofia, o

lugar para onde e por onde se quer caminhar, faz toda a diferença. Com certeza, como

da mesma forma, não somente o destino, mas também o caminho a ser empreendido,

bem como, com quem e como se irá caminhar.

Aliás, esta não deve ser uma preocupação apenas na Filosofia, mas de todas as

áreas do conhecimento. Como da mesma forma, na sociedade e organizações,

enquanto em um momento ainda há espaços privilegiados para poucos,

intencionalmente organizados para que se efetive o processo de aprendizagem,

devemos colocar duas questões fundamentais de nossa existência: para e/ou por onde

devemos ir? Que caminho ou caminhos seguir?

Assim, saber para onde ir e que caminho seguir faz toda a diferença. Trata-se

de pensar sobre o que se pretende com o conhecimento e como adquiri-lo. E, neste

sentido, definir que função social deve-se cumprir: adaptar os indivíduos à sociedade

na qual está inserida ou formar para o esclarecimento, a emancipação e a autonomia?

Par e passo, ao se definir a função social do conhecimento, o projeto político, bem

como o currículo e a seleção de atividades e seus respectivos conteúdos, como da

mesma forma o processo de aprendizagem estarão determinados.

Trata-se agora de legitimar a realidade, ainda que as condições não sejam tão

seguras, ainda que possa questionar os equívocos, no entanto, demonstra exatamente

que companhia não é nem consensual, nem segura. Ora, isto não é novidade na

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história. A produção do saber, quanto o conhecimento caminharam sob o fio da

navalha. São 25 séculos de investigações filosóficas ininterruptas, apesar dos muitos

percalços. Importante é como este será transmitido e, neste sentido, esta é a reflexão

que se pretende aqui: a partir do conceito de Filosofia como crítica, pensar uma

metodologia específica para o conhecimento filosófico, tomando o texto filosófico

como elemento central deste processo, apresentando as características e a natureza.

Desta forma espero contribuir para a legitimação da Filosofia, esta reflexão se

fundamenta no dialogo “Fedro de Platão”, principalmente, na prática de ensinar

(Filosofia e filosofar) neste propósito, uma vez que das duas alternativas que se

propõem atender esta demanda, não o fazem a contento; quando não, servem apenas

a uma racionalidade instrumental que objetiva adaptar os indivíduos a uma sociedade

de menoridade, munidas de um belo canto, capaz de seduzir os "Novos Ulisses".

Mesmo os textos de Filosofia, apesar de ter diretrizes muito claras e objetivas de

como deveria ser construído, apresenta diversas deficiências que, direta e

indiretamente podem contribuir para uma não legitimação do ato de Filosofar, ou até

mesmo a rejeição ou banalização da transmissão do Conhecimento, justamente

Sócrates se contra põe ao método da retórica (Lísias), limita a arte de filosofar e passa

a uma ciência de analise somente prendendo a razão a um único caminho de pensar.

Talvez por isso, o mesmo tenha tido uma boa rejeição por parte dos

intelectuais da época. Antes de refletir sobre uma metodologia específica para o a

Filosofia, faz-se necessário assumir e explicitar um determinado conceito de Filosofia,

indicando o lugar de onde se está, ao mesmo tempo em que refletir sobre o que seja

uma reflexão filosófica, ambos fundamentos desta mesma metodologia.

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Fedro - Platão

O diálogo Fedro se passa fora dos muros de Atenas, debaixo de uma árvore e

ao lado de um rio. Os interlocutores deste diálogo são dois: O velho e irônico Sócrates

e o “jovem” entusiasta, Fedro. Duas outras figuras aparecem no diálogo: Lísias, um

logógrafo, causídico e Sócrates, amigo de Platão, é o orador grego dotado de certo

espírito filosófico que falta a Lísias.

Este diálogo pode ser subdividido em três partes: em primeiro lugar, aquela

em que se dão os discursos de Lísias e Sócrates sobre o tema do amor; em segundo

lugar, a marcada pelo segundo discurso de Sócrates sobre o tema do amor, onde ele

apresenta várias informações sobre a alma; em terceiro lugar, a parte em que há a

discussão entre Sócrates e Fedro sobre a arte da retórica.

Sócrates: Não precisa a retórica de conhecer a natureza das coisas, mas tão-somente de encontrar um meio qualquer de persuasão que a faça aparecer aos olhos dos ignorantes como mais entendida que os entendidos (459b-c)

.

A técnica do discurso, a mais perfeita, que por isso atinge o prazer inteligível do Belo, é a que tem por base a Verdade, a Sabedoria alcançada pela dialéctica, e é só essa, que, excluindo os formalismos, se pode transformar em obra de Arte ao alcançar o Belo no patamar da noética superior, na técnica do discurso, na Retórica. O Belo é aqui um resultado da dialéctica, uma consequência de um discurso dialéctico, feito com Sabedoria. Assim, aquele que pretender escrever um discurso vivo, deve considerar ser a escrita muito semelhante à pintura, pois como os produtos desta, os textos escritos permanecem como seres vivos. (…). Mas, se lhes perguntares alguma coisa, respondem‑te com um silêncio cheio de

gravidade (…). Poderá parecer‑te que o pensamento como que anima o que dizem;

no entanto, se movido pelo desejo de aprender, os interrogares sobre o que acabam de dizer, revelam-te uma única coisa e sempre a mesma. E, uma vez escrito, todo o discurso rola por todos os lugares, apresentando-se sempre do mesmo modo, tanto a quem o deseja ouvir como ainda a quem não mostra interesse algum, e não sabe a quem deve falar e a quem não deve. Além disso, maltratado e insultado injustamente, necessita sempre da ajuda do seu autor, uma vez que não é capaz de se defender e socorrer a si mesmo (275d-e).

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BIOGRAFIA PLATÃO

Um dos filósofos que mais influenciaram a cultura ocidental, Platão, cujo nome

verdadeiro era Aristócles, nasceu de uma família rica, envolvida com políticos. Muitos

estudiosos de sua obra dizem que o grego ficou conhecido como Platão por causa do

vigor físico e ombros largos ("platos" significa largueza). A excelência na forma física

era muito apreciada na Grécia antiga e os seus "diálogos" estão repletos de referencias

às competições esportivas.

Ainda na juventude, tornou-se discípulo de Sócrates, com quem conviveu

durante oito anos, iniciando-se na filosofia. Depois de acompanhar todo o processo

que condenou o seu mestre (Sócrates, acusado de corromper a juventude e de não

acreditar nos "deuses", foi obrigado a beber o veneno cicuta, que o levaria à morte),

Platão, desiludido com a democracia ateniense, viaja para outras cidades da Grécia,

Egito e sul da Itália, e começa a escrever.

Platão teve uma educação semelhante à dos jovens aristocratas da sua época,

recebendo aulas de retórica, música, matemática e ginástica. Em 387 AC, funda em

Atenas uma escola chamada Academia, com uma exigência, escrita na fachada: "Que

aqui não entre quem não for geômetra".

Em pouco tempo, esta escola tornou-se um dos maiores centros culturais da

Grécia, tendo recebido políticos e filósofos como Aristóteles, Demóstenes, Eudoxo de

Cnido e Esquines, entre outros.

A sua obra conta com 28 diálogos (alguns historiadores dizem que foram 30)

basicamente centrados em Sócrates, onde procura definir noções como a mentira

(Hípias menor), o dever (Críton), a natureza humana (Alcibíades), a sabedoria

(Cármides), a coragem (Laques), a amizade (Lísis), a piedade (Eutífron) e a retórica

(Górgias, Protágoras).

Entre 387 e 361 AC, escreveu Menexeno, Ménon (sobre a virtude), Eutidemo

(sobre a erística), Crátilo (sobre a justeza dos nomes), O banquete (sobre o amor),

Fédon, a república (sobre a justiça), Fedro, Teeteto (sobre a ciência) e Parmênides.

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Os diálogos da maturidade são, O sofista (sobre o ser), O político, Timeu (sobre

a natureza), Crítias (sobre Atlântida), Filebo (sobre o prazer) e As leis. O filósofo

também deixou algumas cartas.

Pela tradição familiar, o seu destino deveria ser a política. Mas, a experiência

dos políticos que governaram Atenas por imposição de Esparta (404AC/403 AC), entre os

quais estavam dois de seus tios, fez Platão afastar-se dessa forma de política. De

acordo com o filósofo, uma cidade-modelo deveria distribuir os seus habitantes em

três segmentos: os sábios deveriam pertencem à ordem dos governantes, os

corajosos, que deveriam zelar pela segurança, à ordem dos guardiões, e os demais,

responsáveis pela agricultura e comércio, fariam parte da ordem dos produtores.

O filósofo também não concordava que os políticos mais votados assumissem

os principais cargos em uma cidade ou país. Para Platão, nem sempre o mais votado

era o mais bem preparado.

Dentro deste contexto, era necessário criar uma alternativa para impedir que a

corrupção e a incompetência tomassem conta do poder público.

A forma dos escritos platônicos é o diálogo, transição espontânea entre o

ensinamento oral e fragmentário de Sócrates e o método estritamente didático de

Aristóteles.

No fundador da Academia, o mito e a poesia confundem-se muitas vezes com

os elementos puramente racionais do sistema. A atividade literária do filósofo grego

compreende mais de cinqüenta anos da sua vida: desde a morte de Sócrates até a sua

morte.

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FEDRO

O diálogo se inicia com um convite de Fedro a Sócrates para a leitura de um

discurso de Lísias sobre o amor. Sócrates descalço aceita ir para fora dos muros de

Atenas e se recolhem à beira de um riacho à sombra de um plátano. Sócrates prefere

deitar e diz a Fedro para escolher a posição que julgar melhor para a leitura. Sócrates

se mostra ansioso para ouvir a leitura: “Assim como se conduz uma res faminta

mostrando-lhe um ramo ou um fruto, também a mim se me acenares com um discurso

ou um manuscrito, poderás levar-me por toda Ática ou por qualquer lugar aonde me

queiras arrastar” (Fedro, 230)

Fedro então começa a ler o discurso de Lísias sobre o amor. Após a

leitura do discurso Fedro percebe que Sócrates demonstra-se desapontado após ouvir

a leitura do discurso, pois lhe parece que Lísias se preocupa somente com o estilo e

não com o tema em si, poderia até possuir certa beleza, mas falta com a verdade (Fedro,

235).

Não possui originalidade, pois outros já o fizeram melhor, Safo e Anacreonte

talvez, somente um espírito menos avisado me daria crédito. Fedro não concorda e

“força” Sócrates a pronunciar um discurso melhor sobre o amor, no qual deverá

sustentar a tese de que o homem apaixonado é mais doente do que o não apaixonado. (Fedro, 236)

Após indicar o tema do discurso, Sócrates insiste que qualquer diálogo

pressupõe a definição dos conceitos sobre os quais discorrerão, do contrário, o que se

verá são os equívocos, por isso, ocorre indicar a essência e a existência do que se trata

(Fedro, 237): o que é o amor é um desejo. Sócrates define o amor como desejo. A idéia

central do discurso de Lísias é a de que quem ama, está fora de si. É, portanto,

considerado um louco.

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Sócrates demonstra com seu discurso que nem toda loucura é negativa. Por

exemplo, quando a profetisa de Delfos é inspirada pelos deuses, ela entra em delírio e

presta favores a Grécia em tal estado. Quando os profetas estão lúcidos, fazem coisas

que não possuem importância. Mas se inspirados pelas Musas, fazem novos poemas.

“Eis meu caro, Fedro, o que se torna necessário ter presente: saber que as boas

intenções de um apaixonado não têm por base a amizade, mas que, tal como o apetite

de comer, nascem da necessidade de o satisfazer.

A ternura de um lobo por cordeiro, eis a imagem exata do amor que os

apaixonados sentem pelo jovem amado” (Fedro, 241d).

Assim Sócrates termina o seu primeiro discurso, condenando o amor como

algo libidinoso e execrável, pois o discurso de Lísias, e agora o seu, forçam a realidade

através das artimanhas da retórica, zombando os dois do amor. Por isso, Sócrates

sente-se mal. Seu demônio interior leva-o a uma reparação. “Se o amor é um deus,

não pode ser origem das coisas más” (Fedro, 242).

Sócrates inicia um segundo discurso oposto ao primeiro. Agora de cabeça

descoberta.

Sócrates entra em um assunto que à primeira vista parece não ter nada a ver

com os capítulos anteriores. Irá falar da alma. Um corpo com a finalidade de conduzir a

alma (psicagogia) e não um puro jogo de palavras objetivando a persuasão (logografia) (Fedro, 242)

.

O amor pode atingir a alma de várias maneiras e parece que esse deus ou semi-

deus não pode ser aferrado diretamente, ele é demoníaco, não se deixa apanhar

facilmente, por isso deve-se verificar seus efeitos na alma que vai desde o delírio das

profetizas e sibilas, à inspiração poética das musas, etc.

A natureza da alma é movimento. A alma é princípio de movimento, é aquilo

que move a si mesmo (Fedro, 245). “A alma pode ser comparada com uma força natural e

ativa que unisse um carro puxado por uma parelha alada e conduzido por um cocheiro”

(Fedro, 246).

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Sócrates retoma a questão do amor (Fedro, 250). O último dos delírios provocado na

alma pelo amor é o da beleza (Fedro, 250). A beleza fulgura ao lado das Idéias Puras. Somente

a alma do filósofo saberá apreciá-la corretamente, por possuir asas elevar-se-á das

belezas materiais aparentes, para a beleza em si. “A beleza brilha entre todas as idéias

puras e na nossa estada na terra ela ainda ofusca, com seu brilho, todas as outras

coisas. A visão é o mais sutil dos nossos sentidos. Mas não poderia perceber a

sabedoria. A beleza tem a ventura de ser a coisa mais perceptível. As outras almas por

não alcançarem para o além, se comportam como quadrúpedes, entregando-se ao

prazer sensual inclusive contra a natureza” (Fedro, 251) .

Sócrates termina o segundo discurso afirmando o valor do verdadeiro amor

que consiste no amor à sabedoria e convida Fedro e Lísias a se dedicarem a este

exercício, mesmo sabendo que este último é um logógrafo que, a semelhança dos

governos, preocupa-se mais com a vaidade que com a verdade.

Sócrates dá continuidade ao diálogo contando a Fedro o mito das cigarras.

Estas eram homens que outrora se apaixonaram pela música, esquecendo-se do resto.

Sócrates também aponta as musas da poesia épica, Calíope; Terpicose, da dança; e

Urânia, da astronomia e da matemática, como dignas de serem ouvidas para saber o

que seja recitar ou escrever bem um discurso, assim como os seus contrários.

A primeira regra não seria aquela do orador saber o que de fato é a verdade.

Diz-se que o importante é saber o que parece ser tal, pois é pela aparência que se

consegue persuadir e não pela verdade, explica Fedro.

Por isso, reconhece Sócrates, a retórica assim usada não é arte, baseia-

se na aparência e não na realidade: o espaço do discurso retórico é aquele dos

tribunais e das assembléias do povo. A retórica é entendida como a arte de conduzir as

almas por meio das palavras. As palavras, ferramentas da retórica, referem-se não às

coisas objetivas, mas às opináveis, cujos fundamentos são as semelhanças e

dissemelhanças dos objetos; o movimento discursivo se faz gradualmente, passando

de uma coisa para o seu contrário, o que permite facilmente a ilusão.

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Sócrates não nega o valor do discurso em si, sabe muito bem que a palavra

tem uma instância própria, é aquela de conduzir a alma assim como a medicina ordena

o corpo. Mas, como usá-la?

O primeiro pressuposto é o conhecimento da realidade e não somente o jogo

das aparências. Depois, o discurso deve ser visto como algo vivo, algo que movimenta

com partes ordenadas. “Todo discurso deve ser formado como um ser vivo, ter o seu

organismo próprio, de modo a que não lhe faltem nem a cabeça, nem os pés, e de

modo a que tanto órgãos internos como os externos se encontrem ajustados uns aos

outros, em harmonia com o todo.”. Para tal fim existe um método, um processo que

permitirá mostrar a essência das coisas para a alma de quem ouve. “A primeira etapa

desse método consiste em abarcar de uma só vez, graças à visão de conjunto, as idéias

disseminadas, a fim de que, pela definição de cada uma dessas idéias, as possamos

resumir em uma só idéia geral do assunto que se tem em vista tratar… A segunda

etapa é um processo inverso, consiste dividir novamente a idéia geral nas idéias

particulares suas constituintes.”

Isto é o que se denomina método dialético, aquele que ensina como falar e

pensar com acerto na composição de decomposição de conceitos. A retórica seria

substituída pelo método dialético ou simplesmente subordinada a ele? O que pode

resultar da retórica e onde ela é necessária? Nas aglomerações populares. É ai que tal

discurso se dá, pois o que a multidão deseja e realiza é a frouxidão, mas nem por isso o

discurso do orador pode perder sua missão condutora. Desde que acrescente a ele

saber e exercício como fizeram Péricles e Anaxágoras.

Portanto, se a retórica pretende ser uma arte, deverá se subordinar a certas

regras. O seu objetivo é persuasão da alma por parte do orador. Assim Sócrates indica:

se o terreno no qual o orador se move é a alma, tendo seu objeto o convencimento,

sua ferramenta são as palavras; O passo primeiro a tomar é aquele de conhecer a

alma. E esta é simples ou multiforme? E de quantas maneiras pode influenciar e ser

influenciada?

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Como Sócrates já havia mencionado, agora com ênfase repete que a arte de

discursar diz respeito à capacidade de conduzir as almas, mediante a psicogogia, disso

decorre a necessidade de conhecer a variedade dos caracteres. E, além disso, saber

usar o discurso apropriado para cada caráter a retórica sendo um discurso usado nas

aglomerações populares e tribunais, deve descobrir qual é a alma própria do povo. Isto

é evidente para Sócrates e Fedro. O povo não se interessa pela verdade, mas só por

aquilo que é verossímil. Segue-se que quem quer fazer discurso com arte para o povão

deve dirigir a atenção ao que é provável. Esta é a alma do povo. A verossimilhança

domina o espírito da grande massa pela semelhança que tem com a verdade. Assim, o

autentico retórico, à diferença do povo, deve saber distinguir com exatidão o que é

verdadeiro do que e provável. Portanto, existe uma autentica retórica, uma arte

diversa daquela ensinada por Tísias e Lísias. Agora resta saber o que convém e o que

não convém escrever e quando essa arte é bem ou mal empregada.

Sócrates entra na conclusão do diálogo e para responder a essas questões,

introduz o mito de Thoth, o deus egípcio inventor da matemática, da escrita e da

astronomia.

A escrita, diz Thoth, é uma arte que tornará os homens mais sábios,

fortalecendo-lhes a memória. Tamus o ouve medindo-lhes as pretensões e colocando

os limites da nova arte. “Tu, neste momento e como inventor da escrita, espera dela, e

com entusiasmo, todo o contrário do que ela pode vir a fazer! Ela tornará os homens

mais esquecidos, pois que, sabendo escrever, deixarão de exercitar a memória,

confiando apenas nas escrituras, e só se lembrarão de um assunto em si mesmos. Por

isso, não inventasse um remédio para a memória, mais sim para a rememoração.

Quanto ã transmissão do ensino transmites aos teus alunos, não a sabedoria em si

mesma, mas apenas uma aparência de sabedoria, pois passarão a receber uma grande

soma de informações sem a respectiva educação! Hão de parecer homens de saber,

embora não passem de ignorantes em muitas matérias e tornar-se-ão, por

conseqüência, sábios imaginários, em vez de sábios verdadeiros”. Não é o fato de um

discurso estar pura e simplesmente escrito que esse será útil e comunicará a verdade.

A escrita por si só não garante a verdade, é um simulacro da realidade e, portanto, não

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auxiliará a memória dos homens, mas poderá, inclusive, desviá-los da verdade, uma

vez que colocarão a atenção sobre a aparência e não mais a realidade.

O discurso verdadeiro é aquele escrito conscientemente pela ciência da alma,

capaz de defender a si mesmo e que sabe quando convém ficar calado ou intervir. O

sábio é como o agricultor, sabe o tempo da colheita e onde lançar as sementes. As

sementes de que o sábio dispõe é o conhecimento da justiça, da beleza e da bondade,

e somente estas produzem um discurso capaz de ensinar a verdade. A técnica de

semeadeira é aquela da dialética e não a literatura logográfica.

Sócrates, assumindo uma postura de professor, recapitula tudo o que foi dito

desde o inicio e indica a finalidade própria desse Diálogo: “A análise que fizemos

demonstrou, entre o mais, o seguinte: não é possível elaborar discursos naturais com

arte, seja para ensinar, seja para persuadir, quando se ignora a verdade sobre os

objetos nos quais incide o que se diz, ou escreve, isto é, quando não se está em

posição de definir e dividir os objetos em espécies e gêneros, quando não se estudou a

natureza da alma e não se determinou os gêneros de discursos apropriados à

persuasão de cada alma, e se, enfim, o discurso não tiver sido orientado de tal maneira

que ofereça um teor complexo ou um teor simples, consoante a alma for, também,

complexa ou simples.”

Conseguir o apoio das multidões, como faz Lísias, não é o critério da verdade,

portanto, não justifica nem o escrever discursos. “Os melhores de todos os discursos

escritos são os que têm por fim servir de memorandos aos que conhecem tais

discursos e somente nas palavras cujo fito é a instrução, assim se gravando na alma

sobre o que é justo, belo e bom, somente nessas encontramos uma perfeição digna

dos nossos esforços. Apenas estes discursos e só estes, merecem o nome de filhos

legítimos do orador, primeiro, porque ele mesmo os gerou sob a força da inspiração,

segundo, porque são capazes de gerar, nas almas dos outros homens, irmãos que se

mostrem dignos da família de que descendem. Quanto às demais espécies de

discursos, tanto tu, Fedro, como eu, bem os podemos desprezar. Mais isto é obra só

do filósofo, que nem mesmo Sócrates realiza, mas poderá um dia chegar lá! O calor já

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abrandou-se. Após uma oração de gratidão a Pã, Sócrates e Fedro retornaram à

cidade.

Fedro — [...] Mas vamos embora, porque o calor já não está tão forte.

Sócrates — Não convém que façamos uma prece a esses deuses, antes de seguir o caminho?

Fedro — Por que não?

Sócrates — Querido Pã e outros deuses que estais neste lugar, concedei-me a beleza interior e fazei que meu exterior se harmonize com tudo o que carrego dentro de mim. Que eu possa considerar rico o sábio e possa ter uma quantidade de ouro que só o temperante conseguiria tomar para si ou levar consigo. Precisamos de outras coisas, Fedro? Creio que pedi o suficiente.

Fedro — Esta oração é também a minha, pois os amigos têm tudo em comum.

Sócrates — Vamos, então! (Fonte: REALE, Giovane. O Saber dos Antigos: Terapia para os Tempos Atuais. São Paulo: Loyola, 1999, p. 254.)

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Validado pelo programa kantiano do esclarecimento, não se tem como

resistência apenas os que não querem os indivíduos esclarecidos, mas os próprios

indivíduos talvez oponham alguma resistência a um sistema. Ora, diante de tais

desafios e do momento atual, de ter que legitimar-se enquanto um conteúdo que

requer um espaço próprio, mais ainda se faz necessário refletir sobre uma

metodologia de transmissão do conhecimento.

Da mesma forma, há que se fazer do uso da dialética não somente ao uso

privado da razão, como também às discussões superficiais, arremedos de reflexão.

No entanto, para que a Retórica cumpra o papel de mediador da reflexão

filosófica há que tomar ainda outros cuidados: escolher um tema; o grau de dificuldade

de compreensão do mesmo esteja à altura do amadurecimento psicológico de quem

se destina; que o tempo despendido, interpretação e síntese seja adequado e não

aligeirado; que se tenha à mão recursos para esclarecimento de possíveis dúvidas que

surjam; que o mestre se coloque à disposição para orientar e esclarecer suas dúvidas.

Tomando-se estes cuidados, será mediação para ensinar/aprender Filosofia/filosofar, e

não um fim em si mesmo. E, desta forma, estar-se-á contribuindo sobremaneira para o

programa de esclarecimento proposto por Kant no século XVIII, reafirmado por Adorno

e Horkheimer no século XX e, mais do que nunca necessário em pleno século XXI.