reportagem sobre ocupações na cidade de são paulo

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REPORTAGEM SOBRE A OCUPAÇÃO DE PRÉDIOS ABANDONADOS NA CAPITAL PAULISTA. PRÁTICAS DE REDAÇÃO EM REVISTA UNINOVE 2013 OBS. A MATÉRIA COMEÇA NA PRÓXIMA PÁGINA FOTO: SANDRA SELES TRABALHO ACADÊMICO SEM FINS LUCRATIVOS

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Matéria sobre personagens dos movimentos sem teto. Texto e diagramação de Wellinton Augusto

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Page 1: Reportagem sobre ocupações na cidade de São Paulo

REPORTAGEM SOBRE A OCUPAÇÃO DE PRÉDIOS ABANDONADOS NA CAPITAL

PAULISTA.

PRÁTICAS DE REDAÇÃO EM REVISTA

UNINOVE2013

OBS. A MATÉRIA COMEÇA NA PRÓXIMA PÁGINA

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TRABALHO ACADÊMICO

SEM FINS LUCRATIVOS

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MINHA CASA é MINHA LUTA

Reportagem

A pressão por uma moradia aumenta e recente levantamento mostra que cerca de quarenta prédios estão ocupados por moradores sem teto na capital paulista. Quem são as pessoas que moram nas ocupações e o que elas reivindicam?

por ALINE LIMA, ALINE MATTOS, ANALU VICTORIO, DANIELA RIBEIRO, LYDIANE QUEIROZ, GENIZE SOUZA, SANDRA

SELES e WELLINTON AUGUSTO.

Milhares de pessoas caminham apressada-mente entre a esquina da Rua Marconi e a Barão de Itapetininga,

no centro de São Paulo, reflexo da “Paulicéia Desvairada” dos dias atuais. É a correria de trabalhado-res, estudantes, desempregados para chegarem a seus destinos a tempo. Diante da multidão, os rostos das pessoas passam desper-cebidos iguais às causas sociais. Durante a noite, já em casa depois de um dia corrido, todos assistem os telejornais das diferentes emis-soras. Logo se ouvem manchetes como: “Polícia cumpre reintegração de posse no centro de São Paulo”, “Reintegração de posse deixa mais de 90 famílias nas ruas”. Essas reportagens não abordam o lado dessas pessoas e o que elas defen-dem. Por esses motivos, os repór-teres Wellinton Augusto e Sandra Seles visitaram duas ocupações na capital paulista, e eles nos contam como foi a reportagem. Chegamos por volta das duas da tarde, no antigo edifício São Mano-el, localizado na Rua Marconi,

número 138, em esquina com a Barão de Itapetininga, no centro de São Paulo. O porteiro nos atendeu muito bem juntamente com alguns moradores da ocupação. Conver-samos com Manuel Moruzzi, um dos Coordenadores do Movimento Moradia Para Todos (MMPT), que está na ocupação desde outubro de 2012. O prédio antigo de 13 andares abriga cerca de 150 famílias sem teto. Ele nos recebeu no pequeno apartamento que ocupa com sua companheira no terceiro andar e afirmou que o movimento social é organizar pessoas para melhorar a sociedade, cada uma dentro da própria temática. “No nosso caso, nós focamos a moradia porque acreditamos que é um dos núcle-os mais importantes de luta! Sem moradia você não tem saúde boa. Você não vai ter educação boa e não vai ter uma cidade de qualidade”, diz Moruzzi. Todos os moradores do edifício São Manoel trabalham em empre-gos fixos. E quando sobra tempo, eles se revezam na cozinha comuni-tária, portaria e limpeza dos

andares. O prédio foi construído com o objetivo de abrigar diversos escritórios na década de 40, e a maioria dos apartamentos não tem banheiro. Cada andar da ocupação abriga um lavabo com chuveiro, e todas as quize famílias do andar se revezam nessa utilização. O coordenador da ocupação nos revela que cada mo-rador contribui com R$ 120 para a associação Movimento de Moradia Para Todos. Existem regras para todos os ocupantes, como: são proibidas bebidas alcoólicas; uso de drogas; violência doméstica; roubo; outra regra é o horário da portaria, no qual ela é fechada a meia-noite e reaberta às quatro e meia da manhã, para os moradores irem trabalhar e estudar. A atual gestão na prefeitura de São Paulo foi elogiada pelo coorde-nador. “[O] Haddad tem conver-sado muito com gente, e a gestão passada do Kassab e Serra, nunca fizeram uma reunião com a gente!”, reclama. De acordo com Moruzzi, a maio-ria das pessoas vem para uma ocu-pação com objetivo de reconstruir

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suas vidas, pois não estavamaguentando pagar mais aluguel. “Nosso objetivo é que e elas cami-nhem com as próprias pernas!”, afirma o coordenador. Todos os integrantes do MMPT participam de palestras e reuniões semanais de conscientização política. O proprie-tário do edifício São João, moveu na justiça dois processos para rein-tegração de posse.

Os cidadãos com posi-ções progressistas em relação a direitos civis e individuais estão alinhados com alguns

movimentos sociais. Sempre reivin-dicando melhorias em diferentes temáticas segundo José de Almeida Amaral Junior, professor univer-sitário, economista e especialista em Sociologia. O MST (Movimento Sem Terra) são extremamente bem organizados discutindo o problema do latifúndio, no qual se assemelha com o problema urbano dos movi-mentos sem teto, emenda Amaral. “A proposta desses grupos é travar uma luta contra o capitalismo a

Manuel Moruzzi, coor-denador da ocupação na Rua Marconi, 879. Na sala de reuniões, palestras e oficinas culturais para os mo-radores do prédio.

você chegar numa transformação da sociedade [num todo] que atinja um processo de revolução (...). Por enquanto, no horizonte isso ainda não é possível, então o que eles podem conseguir são [importan-tes] vitórias pontuais”, argumenta Amaral. Um das moradoras do edifício São João é Lindalva José de Barros, que vive na ocupação há 10 meses. Ela conta que trabalha como salgadeira em uma Universidade, e devido às dificuldades financeiras, veio para o edifício São Manoel. “Eu morava em quarto pequeno em Pirituba, e pagava 400 reais de aluguel. E a metade do meu salário era só o alu-guel!”, afirma Lindalva. O princi-pal objetivo da moradora é ter a sua casa própria. Fachada do edifício São João

A pesquisadora Rosa Aparecida dos Santos está na ocupação há um ano e é estudante do 5° período de Direito na Universidade Zumbi dos Palmares. Mesmo com a agenda corrida de trabalhar durante o dia, e estudar a noite, Rosa se reveza com os moradores na limpeza dos corredores do andar que ocupa. A universitária se expressa bem, e articula com clareza seus argu-mentos, “(...) a moradia digna não é sonho de consumo, é [sim] uma necessidade básica garantida pela Constituição (...) o governo pode investir em moradias populares, mas precisa frear a especulação imobiliária imposta pelo mercado”, enfatiza ela.

Inês Magalhães, Secretária da Habitação do Ministério das Ci-dades, afirma que o planejamen-to urbano é o instrumento mais importante da implementação

habitacional nas grandes metrópo-les. “Qual é o desafio que a cidade tem hoje, (sic) que a distribuição da moradia de interesse social obe-deça à oferta da mobilidade e dos serviços, trazendo cada vez mais a moradia de interesse social para as áreas já consolidadas da cidade”, declarou Inês no Seminário Na-cional da Habitação, realizado em Setembro na Câmara Municipal de São Paulo.

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Pesquisa realizada em 2012 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), mostra que o déficit habitacional no país caiu 12% em cinco anos, os pesqui-sadores concluíram que a deficiên-cia de 5,6 milhões de habitações, registrada em 2007, caiu para 5,4 milhões em 2011. O crescimento econômico, e a ascensão de boa parte da população possibilitou que muitas famílias conquistassem o seu imóvel. A presidente Dilma na abertura da 5° Conferência Nacional das Cidades, na última quarta (20/11), afirmou que o programa Minha Casa Minha Vida entregou 2,7 milhões de casas. A expectativa até o fim de 2014, é que sejam entregues mais 750 mil novas moradias. Heloisa Soares, formada em Ciên-cias Sociais, é uma das coordenado-ras da Frente e Luta por Moradia, segundo ela, “A Frente de Luta, organiza vários eventos e atividades culturais com as crianças e os mo-radores das ocupações”. O prédio localizado na Avenida Prestes Maia, 911, é a maior ocupação vertical da América Latina, ele abriga cerca de 420 famílias.

Durante a tarde em visita a ocupação na Aveni-da Ipiranga, n° 879, e fomos recepcionados por Tânio Leonardo, es-

tudante de Ciências Sociais, um dos moradores e líder da ocupação. Ele tomava conta da portaria, no qual quatro ocupantes do prédio que fazem o revezamento. O prédio está ocupado desde Outubro de 2012, são cerca de 130 famílias que vivem lá. Leonardo orgulha-se em dizer que “O nosso objetivo é incluir as pessoas”. Todos os moradores da ocupação foram atenciosos e recep-tivos durante nossa reportagem.

ALGUMAS REGRAS DAS OCUPAÇÕES:

- É proibido ingerir bebidas alcoólicas dentro do prédio

- Horário de silêncio a partir das 22 horas

- O morador deve participar das reuni-ões e atos públicos

- É proibido fumar dentro da ocupação

- Os pais devem colocar as crianças nas oficinas de cidadania.

- É proibido brigas, roubo é tráfico de drogas.

- Não pode haver preconceito e amea-ças entre moradores

- Todos devem se revezar na limpeza, cozinha e portaria.

“A moradia digna é uma necessidade básica ga-

rantida na Constituição”.Rosa Aparecida dos Santos

“ Pagava 400 reais de alu-guel. E a metade do meu

salário era só o aluguel!”Lindalva José de Barros

“ O nosso objetivo é in-cluir as pessoas”.

Tânio Leonardo ao lado uma moradora na ocupação da Avenida

Ipiranga.

Algumas placas de orientação encontradas na ocupação do edifício São João.

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Suelem dos Santos Alves vive no prédio da Ipiranga com o marido e quatro filhos, ela trabalha em uma Loja de Materiais para construção. A moradora revela já ter sofrido preconceito por estar na ocupação, “Na empresa que eu trabalho, no começo disseram, olha onde você está enfiando seus filhos!”. Até du-rante uma reunião de pais na escola dos filhos, Suelem conta que “uma mãe de aluno afirmou que uma ocupação é uma bagunça, e só tem bandido (...) eu moro em ocupação e não é assim! (...) lá todo mundo trabalha!”, afirma ela.

“Na empresa que eu trabalho, no começo disseram, olha onde você está enfiando seus filhos!”

Suelem dos Santos Alves

Acima, prédio ocupado na Avenida São João, N° 288. No alto, sala da ocupação na Rua Marconi, N° 138. A esquerda

no alto, corredor do prédio na Rua Marconi.

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13,4% foi o aumento dos imóveis na cidade de São Paulo no último ano segundo a FIPE.

O senador Eduardo Amorim (PSC-SE) afir-mou em Brasília que há um déficit habita-cional no Brasil, muito

alto. Para ele a maior parte dos cidadãos ainda não têm suas casas, devido ao alto custo. “A maior parte desses trabalhadores recebem de zero a três salários mínimos, ou seja, precisam de incentivos”, afirma o congressista. Na cidade de São Paulo o preço do metro quadra-do apresentou um crescimento de 13,4% nos últimos 12 meses, con-forme foi divulgado pela FIPE. O valor médio do m² no décimo mês de 2013 ficou em R$ 7.631,00. Com a elevação do valor dos imóveis, por consequência aumenta os aluguéis, condomínios e IPTU. E os cidadãos que recebem até três salários mínimos acabam sendo os mais prejudicados. “Os trabalha-dores de modo geral estão cada vez mais empurrados para as pontas periféricas das cidades, é onde se podem conseguir moradias com preços adequados as suas ren-das”, avalia Edson Rildo Penha de Alencar, mestre em Sociologia pela Universidade de São Paulo. Uma das soluções apontadas por ele é, a prefeitura mapear os imóveis vazios, quantifica-los e notificar os proprietários. Estabelecendo um valor de indenização para transfor-ma-los em moradias populares.

Lúcio Flávio Rodrigues de Almei-da, professor de Ciência Política da PUC-SP, em aula pública na Ocupação Margarida Alves (Rua General Couto Magalhães, n°381, Luz), afirmou que não falta espaço no país para que todos tenham vida digna com habitação de qualida-de. Para ele é preciso enfrentar a especulação imobiliária. “Talvez seja a primeira vez que essa nova geração que participa desses movi-mentos, assumindo um problema social, como algo a ser resolvido coletivamente e não como cada um individualizando (...) quanto mais unir o povo, mais as lutas populares terão chance de sucesso!”, salienta Almeida.

Segundo a Secretaria Municipal de Ha-bitação, o déficit na cidade de São Paulo é cerca de 230 mil

domicílios e atualmente há cerca de 890 mil famílias em assentamen-tos precários (cortiços, loteamen-tos irregulares, favelas), vivendo condições inadequadas. O prefeito Fernando Haddad estipulou como meta 55 mil unidades habitacionais até o final de seu mandato. Cerca de 130 mil famílias estão cadastra-das na secretaria de habitação. O advogado João Antônio, secretário de relações governamentais da Prefeitura, recebe alguns líderes dos movimentos sem teto na sede da prefeitura, e intermedeia nego-ciações com alguns proprietários dos imóveis. “A gente encaminha tudo, hoje mesmo recebemos grupo chamado Anchieta, na Zona Sul. Já era a quarta reunião que fize-mos. Ocuparam a área particular. Os donos pediram a reintegração e ganharam. Nós intermediamos a negociação entre o dono e os acampados. Vamos construir 800 unidades de moradia. Fizemos

OS PROTESTOS

a proposta de 250 dessas, atende-rem ao movimento da ocupação e as outras ficarem para atender a lista geral”, diz o secretário.

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