relevância da atuação das policiais militares femininas na pmdf
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1 POLÍCIA MILITAR DO DISTRITO FEDERAL DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO E CULTURA DIRETORIA DE APERFEIÇOAMENTO E EXTENSÃO CENTRO DE APERFEIÇOAMENTO E EXTENSÃO A RELEVÂNCIA DA ATUAÇÃO DAS POLICIAIS MILITARES FEMININAS NO CONTEXTO CORPORATIVO DA PMDF CAP QOPM CLEIDE QUELE ALVES CASTELLAR Brasília-DF, Agosto de 2011 2 A RELEVÂNCIA DA ATUAÇÃO DAS POLICIAIS MILITARES FEMININAS NO CONTEXTO CORPORATIVO DA PMDF CAP QOPM CLEIDE QUELE ALVES CASTELLAR Trabalho Técnico Científico Profissional apresentado coTRANSCRIPT
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POLÍCIA MILITAR DO DISTRITO FEDERAL
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO E CULTURA
DIRETORIA DE APERFEIÇOAMENTO E EXTENSÃO
CENTRO DE APERFEIÇOAMENTO E EXTENSÃO
A RELEVÂNCIA DA ATUAÇÃO DAS POLICIAIS MILITARES
FEMININAS NO CONTEXTO CORPORATIVO DA PMDF
CAP QOPM CLEIDE QUELE ALVES CASTELLAR
Brasília-DF, Agosto de 2011
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A RELEVÂNCIA DA ATUAÇÃO DAS POLICIAIS MILITARES
FEMININAS NO CONTEXTO CORPORATIVO DA PMDF
CAP QOPM CLEIDE QUELE ALVES CASTELLAR
Trabalho Técnico Científico Profissional apresentado como requisito de conclusão do Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais da Polícia Militar do Distrito Federal – 2011. Orientador Metodológico: Professor MSc Rodrigo Rodrigues de Souza Orientadora de Conteúdo: Professora Doutora Sônia Marise Salles Carvalho Co orientador: Maj QOPM Emílio Castellar
Brasília 2011
3
TERMO DE APROVAÇÃO
A RELEVÂNCIA DA ATUAÇÃO DAS POLICIAIS MILITARES
FEMININAS NO CONTEXTO CORPORATIVO DA PMDF
AUTORA: CAP QOPM CLEIDE QUELE ALVES CASTELLAR Data: ____ de ____________ de 2011. Trabalho Técnico Científico Profissional avaliado por:
VERÔNICA LÚCIA DANTAS – TC QOPM Presidente
KARLA CRISTIAN R. DE MENEZES - MAJ QOPM Membro
ELIANE CAVALCANTE QUEIROZ - MAJ QOPMA Membro
Publicado no Boletim Interno nº ___ de ___ de _____________ de ______.
COORDENAÇÃO DE CURSO
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Aos meus amados filhos Talita, Aurélio e
Yasmin (que ainda carrego em meu
ventre) dedico esta conquista, pois eles
são as maiores de todas as vitórias de
minha vida.
5
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, pela minha vida e por todas as
oportunidades que coloca diante de mim, se transformando em bênçãos.
Aos meus amados pais, Onildo e Maria Eldinoura, sem os quais não estaria
aqui e por terem sido exemplos de amor e desprendimento, ao longo de minha vida.
Agradeço a todos os familiares que souberam compreender os momentos de
ausência para a elaboração deste trabalho.
Agradeço em especial ao meu marido Emílio Castellar, companheiro dedicado
de todas as horas, principal incentivador de minhas conquistas.
Agradeço aos meus orientadores, Professora Drª Sônia Marise, de conteúdo e
Professor MSc Rodrigo Rodrigues, de Metodologia, pela disponibilidade e por
compartilhar seus conhecimentos, por meio de suas orientações que viabilizaram a
realização deste trabalho.
Agradeço aos oficiais e praça entrevistados, que colaboraram com suas
experiências, enriquecendo sobremaneira o trabalho.
Finalmente, agradeço a todas as policiais militares femininas da PMDF por se
doarem a cada dia para uma polícia melhor e por terem contribuído com todas as
informações que formaram a espinha dorsal desta pesquisa.
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RESUMO
Esta monografia apresenta o resultado de uma pesquisa sobre a relevância da atuação das policiais militares femininas no Distrito Federal, trazendo os históricos da inserção internacional, no Brasil e local, demonstrando o perfil das policiais militares femininas do DF, sob os aspectos da adaptação na Corporação e nas funções exercidas por elas, abordando também aspectos como discriminação, absenteísmo, disciplina, e critérios diferenciados de ingresso enfocados sob a luz da Constituição da República Federativa do Brasil, por meio de pesquisa bibliográfica e documental, além de apresentação de estatísticas levantadas a partir de questionários (survey), entrevistas a pessoas que participaram do processo de inserção e pesquisa de campo, onde foram consultados bancos de dados e acervos fotográficos, a fim de melhor ilustrar a pesquisa, trazendo resultados que levam à conclusão de que a atuação das policiais femininas na PMDF é muito relevante, mas a Corporação não aproveita totalmente esse potencial porque limita por lei a quantidade de efetivo militar feminino, o que a impede de utilizar mais e melhor essas policiais. Palavras-chave: Gênero, PMDF, Polícia Feminina, Critérios de ingresso.
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ABSTRACT
This monograph presents the results of a research on the relevance of the female police officer’s work in the Military Police of the Federal District (PMDF), bringing the history of international insertion, and place in Brazil, showing the profile of the female police officers of the Federal District under the aspects of adaptation on the Corporation and on the functions performed by them while also addressing issues such as discrimination, absenteeism, discipline, and different criteria for admission under the focused light of the Constitution of the Federative Republic of Brazil, through bibliographical research, documentary and presentation of statistics complied from questionnaires (survey), interviews with people who participated in the insertion process, and field research, where databases and photographic collections were consulted, in order to better ilustrate the research, bringing results that lead to the conclusion that the actions of female police in the PMDF are very relevant, but the Corporation don’t takes full advantage of this potential because the amount of military women is limited by law, preventing the use of these female police officers more and better. Key words – Gender, PMDF, Female Police, Criteria of admission.
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LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 – Unidades Policiais Militares (UPM) das respondentes....................... 64 Gráfico 2 – Postos e Graduações das respondentes............................................ 65 Gráfico 3 – Idade das Policiais Militares respondentes......................................... 66 Gráfico 4 – Tempo de serviço das Policiais Militares respondentes..................... 66 Gráfico 5 – Estado Civil das Policiais Militares respondentes............................... 67 Gráfico 6 – Se os cônjuges são Policiais Militares................................................ 68 Gráfico 7 – Posto ou graduação dos cônjuges Policiais Militares......................... 68 Gráfico 8 – Se possui filhos................................................................................... 69 Gráfico 9 – Quantos filhos possui.......................................................................... 69 Gráfico 10 – Grau de Escolaridade das policiais militares respondentes................ 70 Gráfico 11 – Porque escolheu a Polícia Militar?...................................................... 71 Gráfico 12 – O que sente por ser integrante da PMDF?......................................... 72 Gráfico 13 – O que significa vestir a farda?............................................................. 72 Gráfico 14 – Faz planos para deixar a PMDF antes de se aposentar? .................. 73 Gráfico 15 – Você apoiaria a decisão de seus filhos de serem Policiais Militares? 73 Gráfico 16 – Está satisfeita com a função que desempenha atualmente em sua
UPM?.....................................................................................................
74 Gráfico 17 – Que atividade especificamente desenvolve atualmente em sua
UPM?.....................................................................................................
75 Gráfico 18 – Tipo de UPM onde trabalham as respondentes.................................. 76 Gráfico 19 – Caso lhe fosse dada oportunidade de escolher, em que atividade
gostaria de trabalhar?............................................................................
76 Gráfico 20 – Por quantos anos trabalhou no Serviço Operacional da PMDF?....... 78 Gráfico 21 – Quanto gosta do Serviço Operacional?.............................................. 79 Gráfico 22 – Na sua opinião, em que área a mulher seria melhor empregada na
Corporação?...........................................................................................
79 Gráfico 23 – A UPM em que trabalha possui instalações adequadas à presença
feminina?................................................................................................ 81
Gráfico 24 – Houve mudanças na Corporação após o ingresso das policiais militares femininas?................................................................................
82
Gráfico 25 – Porque houve mudanças? ................................................................. 83 Gráfico 26 – Qual é a melhor coisa em ser Policial Militar?.................................... 84 Gráfico 27 – Qual é a pior coisa em ser policial militar?.......................................... 85 Gráfico 28 – As policiais militares femininas possuem os mesmos direitos dos
policiais militares masculinos?...............................................................
86 Gráfico 29 – Já sofreu algum tipo de discriminação na PMDF pelo fato de ser
mulher?..................................................................................................
87 Gráfico 30 – Já sofreu algum tipo de assédio no âmbito da PMDF?....................... 90 Gráfico 31 Qual deveria ser o critério para o cálculo do percentual de vagas para
ingresso na PMDF de mulheres e homens?..........................................
91 Gráfico 32 Total de afastamentos por motivo de saúde na PMDF de 2001 a 2010
excluindo Licença Maternidade..............................................................
93 Gráfico 33 Total de afastamentos por motivo de saúde na PMDF de 2001 a 2010
incluindo Licença Maternidade..............................................................
93 Gráfico 34 Afastamentos masculinos em 2010 por número de dias....................... 94 Gráfico 35 Afastamentos femininos em 2010 por número de dias.......................... 95
9
Gráfico 36 IPMs instaurados em 2010 .................................................................... 97 Gráfico 37 Envolvidos em amostra de sindicâncias instauradas em 2010 por
gênero ...................................................................................................
99 Gráfico 38 Punições resultantes de Sindicâncias instauradas em 2008, 2009 e
2010........................................................................................................
1100
10
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 Policiamento feminino (1983) acompanhado pelos primeiros comandantes (Estação Rodoviária de Brasília)
56
Figura 2 Tenente Bernadete (PMESP) junto ao policiamento feminino no DF em 1983 (Shopping Conjunto Nacional)
57
Figura 3 Policiamento Feminino / Identificação Infantil em 1983 (Conjunto Nacional)
58
Figura 4 Viatura com guarnição feminina no DF em 1983 (Conjunto Nacional) 59 Figura 5 Primeiro curso de Motociclista feminino em 1988 63
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LISTA DE QUADROS E TABELAS
Quadro 1 Homens e mulheres no mercado de Trabalho no Brasil...................... 26 Quadro 2 Fontes de Publicações na Internet consultadas................................... 40 Quadro 3 Participação feminina nas forças policiais de 52 países em 2000....... 45 Quadro 4 Ingresso, unificação de quadros e limites à participação feminina nas
PMs brasileiras.....................................................................................
54 Tabela 1 Respondentes por posto e graduação em relação ao efetivo
existente em maio/2011.......................................................................
65
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LISTA DE SIGLAS
APMB Academia de Polícia Militar de Brasília BD Banco de Dados BMRS Brigada Militar do Rio Grande do Sul CAP Capitão CB Cabo CEL Coronel CFB Constituição Federal Brasileira CFC Curso de Formação de Cabos CFO Curso de Formação de Oficiais CFP Curso de Formação de Praças CFS Curso de formação de Sargentos Cia PM Fem Companhia de Polícia Militar Feminina CID Código Internacional de Doenças DCC Departamento de Correição e Controle DF Distrito Federal DITEL Diretoria de Telemática EB Exército Brasileiro EUA Estados Unidos da América FIBGE Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística GEPES Sistema de Gestão de Pessoal da PMDF IGPM Inspetoria Geral das Polícias Militares MAJ Major OCDE Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico PCS Posto Comunitário de Segurança PM Polícia Militar PMAM Polícia Militar do Amazonas PMDF Polícia Militar do Distrito Federal PMERJ Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro PMESP Polícia Militar do Estado de São Paulo PMMG Polícia Militar do Estado de Minas Gerais PMPR Polícia Militar do Paraná QOPM Quadro de Oficiais Policiais Militares QOPMF Quadro de Oficiais Policiais Militares Femininas RR Reserva Remunerada SD Soldado SGT Sargento ST Sub Tenente STF Supremo Tribunal Federal TC Tenente Coronel TEN Tenente TTCP Trabalho Técnico Científico Profissional UF Unidade Federativa UPM Unidade Policial Militar
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 15 1. APRESENTAÇÃO............................................................................................... 15 2. DELIMITAÇÃO DO TEMA.................................................................................. 15 3. JUSTIFICATIVA E RELEVÂNCIA DO TEMA..................................................... 15 4. OBJETIVOS........................................................................................................ 16 5. DISTRIBUIÇÃO DOS ASSUNTOS..................................................................... 17 6. MÉTODO............................................................................................................. 18 CAPÍTULO I – A QUESTÃO DO GÊNERO E A REALIDADE DA MULHER NO MERCADO DE TRABALHO MODERNO.................................................................
19
1.1 O QUE É GÊNERO?.......................................................................................... 19 1.2 A REALIDADE DAS MULHERES NO MERCADO DE TRABALHO MODERNO...............................................................................................................
22
1.3 A QUESTÃO JURÍDICA DA INSERÇÃO MULHER NAS POLÍCIAS MILITARES À LUZ DA CONSTITUIÇÃO DE 1988..................................................
29
CAPÍTULO II – METODOLOGIA.............................................................................. 34 2.1 TIPO DE ESTUDO.............................................................................................. 34 2.2 SELEÇÃO DOS SUJEITOS PARA O LEVANTAMENTO DE DADOS............. 36 2.2.1 CRITÉRIOS DE ELEGIBILIDADE PARA O ESTUDO..................................... 36 2.2.2 CRITÉRIOS PARA INCLUSÃO....................................................................... 37 2.2.3 CRITÉRIOS PARA EXCLUSÃO...................................................................... 37 2.2.4 CRITÉRIOS ÉTICOS....................................................................................... 37 2.3 INSTRUMENTOS UTILIZADOS NO LEVANTAMENTO DE DADOS............... 37 2.3.1 QUESTIONÁRIO SOBRE A RELEVÂNCIA DA ATUAÇÃO DAS POLICIAIS MILITARES FEMININAS NA PMDF.........................................................................
37
2.3.2 ENTREVISTA ESTRUTURADA SOBRE A RELEVÂNCIA DA ATUAÇÃO DAS POLICIAIS MILITARES FEMININAS NO CONTEXTO CORPORATIVO DA PMDF........................................................................................................................
38 2.3.3 COLETA, ARMAZENAMENTO E ANÁLISE DOS DADOS DO LEVANTAMENTO.....................................................................................................
38
2.3.3.1 Coleta........................................................................................................... 38 2.3.3.2 Armazenamento.......................................................................................... 39 2.3.3.3 Análise dos dados...................................................................................... 39 2.4 OUTROS PROCEDIMENTOS UTILIZADOS NA PESQUISA............................ 39 2.4.1 PESQUISA BIBLIOGRÁFICA.......................................................................... 39 2.4.1.1 Critérios adotados para a seleção bibliográfica...................................... 39 2.4.1.2 Fichamento da bibliografia consultada.................................................... 39 2.4.2 WEBGRAFIA.................................................................................................... 39 2.4.2.1 Alertas de publicações.............................................................................. 39 2.4.2.2 Bases de consulta Webgráficas................................................................ 40 2.4.3 PESQUISA DE CAMPO................................................................................... 41 CAPÍTULO III – HISTÓRICO E PERFIL DAS POLICIAIS MILITARES FEMININAS DA PMDF ............................................................................................
42
3.1 A IMPORTÂNCIA DO CONHECIMENTO DA HISTÓRIA PARA O ENTENDIMENTO DO PRESENTE...........................................................................
42
3.2 ANTECEDENTES HISTÓRICO MUNDIAL........................................................ 42
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3.3 HISTÓRICO DA INSERÇÃO DE MULHERES NAS POLÍCIAS MILITARES BRASILEIRAS.........................................................................................................
45
3.3.1 POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO ......................................... 48 3.3.2 POLÍCIA MILITAR DO PARANÁ ..................................................................... 49 3.3.3 POLÍCIA MILITAR DO AMAZONAS ............................................................... 50 3.3.4 POLÍCIA MILITAR DE MINAS GERAIS .......................................................... 51 3.3.5 POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO................................. 53 3.4 HISTÓRICO DA INSERÇÃO DA MULHER NA PMDF...................................... 55 3.4.1 O INÍCIO DE TUDO......................................................................................... 55 3.4.2 AS PRIMEIRAS OFICIAIS............................................................................... 59 3.4.3 PRIMEIRA TURMA DE FORMAÇÃO MISTA.................................................. 60 3.4.4 A EXTINÇÃO DA CIA PM FEM E A UNIFICAÇÃO DOS QUADROS............. 61 3.4.5 CONQUISTAS................................................................................................. 62 3.5 PERFIL DAS POLICIAIS MILITARES FEMININAS DA PMDF......................... 63 3.5.1 ESTRUTURA FAMILIAR.................................................................................. 67 3.5.2 ESCOLARIDADE............................................................................................. 70 3.5.3 ANÁLISE VOCACIONAL................................................................................. 70 3.5.3.1 Adaptação das policiais militares femininas à PMDF............................. 71 3.5.3.2 Existem funções específicas para mulheres na PMDF?......................... 74 3.5.4 ADAPTAÇÃO DA PMDF ÀS POLICIAIS MILITARES FEMININAS................. 81 3.5.4.1 Discriminação.............................................................................................. 86 3.5.5 ABSENTEÍSMO............................................................................................... 91 3.5.6 AS QUESTÕES CRIMINAL E DISCIPLINAR.................................................. 96 CONCLUSÃO........................................................................................................... 102 REFERÊNCIAS......................................................................................................... 106 APÊNDICE A - QUESTIONÁRIO SOBRE A RELEVÂNCIA DA ATUAÇÃO DAS POLICIAIS MILITARES FEMININAS NA PMDF.......................................................
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APÊNDICE B – ROTEIRO PARA ENTREVISTA ESTRUTURADA SOBRE A RELEVÂNCIA DA ATUAÇÃO DAS POLICIAIS MILITARES FEMININAS NO CONTEXTO CORPORATIVO DA PMDF.................................................................
115 APÊNDICE B1 - ENTREVISTA COM CORONEL DA RESERVA REMUNERADA DA PMDF..................................................................................................................
117
APÊNDICE B2 - ENTREVISTA COM CORONEL DA RESERVA REMUNERADA DA PMDF..................................................................................................................
121
APÊNDICE B3 - ENTREVISTA COM CORONEL FEMININA DA PMDF................. 127 APÊNDICE B4 - ENTREVISTA COM SUB TENENTE FEMININA DA PMDF 136 APÊNDICE C - ACERVO FOTOGRÁFICO DA INSERÇÃO DAS POLICIAIS FEMININAS NA PMDF.............................................................................................
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15
INTRODUÇÃO
1 APRESENTAÇÃO
A inserção das mulheres nas Polícias Militares no Brasil em geral e na PMDF,
em particular, é fato relativamente recente tendo em vista o tempo de existência da
instituição que é de 202 anos, em face ao ingresso das policiais militares femininas
que ocorreu há pouco mais de 28 anos (jul/1983).
Por esse motivo a relevância da atuação feminina no contexto corporativo da
PMDF ainda não foi profundamente estudada e presume-se que a Corporação ainda
esteja em adaptação à presença feminina e, conseqüentemente, não esteja
empregando o efetivo feminino da maneira mais eficaz.
A participação feminina na Corporação vem aumentando gradualmente tanto
qualitativa quanto quantitativamente e hoje se vê mulheres nas mais diversas áreas
de atividade da PMDF, conforme ficou demonstrado nesta pesquisa, cujos dados
são apresentados em capítulo próprio.
Entretanto, o quantitativo de efetivo feminino admitido na Corporação é fixado
pela Lei Federal Nº 9.713 de 1998 em 10% (dez por cento) do efetivo previsto para
cada Quadro e desde então esse percentual nunca foi alterado. Porém a fixação de
número de vagas, em função de gênero, não é respaldada pelo inciso I do artigo
quinto e inciso XXX do artigo sétimo da CFB de 1988.
Nesse contexto, o presente estudo busca verificar a relevância da atuação das
policiais militares femininas na PMDF, buscando também correlacionar essa
relevância com a necessidade de alteração do percentual fixado de vagas para o
efetivo feminino.
2 DELIMITAÇÃO DO TEMA
O tema está delimitado, portanto, na observação do histórico e no
desempenho das policiais militares femininas na PMDF.
Antes de ser uma tentativa de provar o desempenho feminino, é uma tentativa
de mensurá-lo, por meio da observação de fatos concretos cotidianos, como índices
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de absenteísmo, indicadores disciplinares, aptidões específicas, exclusividade de
competências, entre outros.
O presente estudo não tem a pretensão de ser um tratado completo sobre a
presença feminina na PMDF, mas um apanhado histórico e contextualizado da
atuação feminina na PMDF, sua gênese e conseqüências.
3 JUSTIFICATIVA E RELEVÂNCIA DO TEMA
Uma das questões principais que justifica a realização do presente estudo
refere-se à adaptação da PMDF à presença feminina em suas áreas de atuação,
seja operacional (especializada ou não), administrativa ou de ensino. Está o efetivo
feminino alocado em unidades onde se necessita de serviços exclusivamente
destinados ao efetivo feminino? Existem tais serviços? A alocação desse efetivo
obedece a critérios técnicos ligados às necessidades da Corporação, ou obedece a
critérios pessoais mais ligados às preferências e necessidades das policiais militares
femininas? Ou essa alocação ocorre de forma aleatória?
A presente pesquisa pretende responder qual foi o objetivo da inserção da
mulher na PMDF e se ele foi alcançado. Teria sido essa inserção um fato aleatório?
Ou se buscou a objetivos específicos? O emprego, como é feito atualmente, tem
atingido tais objetivos? O que pode ser modificado? A limitação do quantitativo de
efetivo feminino por lei age a favor ou contra ao melhor aproveitamento das
potencialidades femininas no contexto corporativo?
Partindo-se da premissa de que o reconhecimento da relevância do
desempenho das policiais militares femininas é diretamente proporcional ao
quantitativo de efetivo feminino admitido e empregado na Corporação, e de que esse
fato pode ser mensurado pelo percentual de policiais femininas em relação ao
efetivo total, verificar o aumento ou declínio desse percentual pode demonstrar
indiretamente essa relevância.
As respostas a essas perguntas podem subsidiar a otimização do emprego do
efetivo feminino na PMDF em todos os níveis, desde o estratégico até o operacional.
4 OBJETIVOS
4.1 GERAL
17
Nesse contexto, o objetivo geral do presente estudo é verificar a relevância da
atuação das policiais militares femininas no contexto corporativo da PMDF.
4.2 ESPECÍFICOS
a) Realizar levantamento bibliográfico sobre a questão de gênero e
polícia, a fim de comparar as realidades já estudadas com a realidade da PMDF.
b) Realizar levantamento documental sobre a inserção da mulher na
PMDF, com Leis, Decreto, Portarias, Editais, Diretrizes e/ou demais documentos que
se referem ao assunto.
c) Elaborar um diagnóstico organizacional no que tange ao emprego de
efetivo feminino, abordando aspectos tais como: média de idade, percentual do
efetivo feminino em relação ao efetivo total, prevalência de área de atuação,
percentual de absenteísmo, percentual de procedimentos disciplinares em relação
ao total, por meio de pesquisa de campo nos departamentos da PMDF.
d) Levantar o perfil da policial militar feminina da PMDF, abordando
aspectos tais como: média de idade, média de tempo de serviço, grau de
escolaridade, quantidade de filhos, adequação das instalações da PMDF à presença
feminina, grau de satisfação das policiais femininas com a profissão, prevalência e
preferência de área de atuação, adequação em relação à função desempenhada,
etc.
5 DISTRIBUIÇÃO DOS ASSUNTOS
A fim de cumprir o objetivo geral proposto, foi criada uma seção para delinear
os métodos empregados, os quais são apresentados no Capítulo II.
Foram realizadas pesquisas bibliográfica e documental sobre o histórico da
inserção das mulheres nas polícias militares de diversas Unidades Federativas (UF)
e na PMDF a qual será apresentada no capítulo III.
Paralelamente, foi realizado levantamento bibliográfico sobre a questão do
gênero e mercado de trabalho feminino, a qual é apresentado no Capítulo I.
As informações carreadas colhidas no Capítulo I e no Capítulo III – Perfil das
Policiais Militares Femininas na PMDF formaram a base para a investigação, onde
se procurou por meio de entrevistas e questionários (survey) traçar paralelos entre
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os aspectos considerados como pontos chave na pesquisa bibliográfica e a
realidade na PMDF.
Finalmente, são apresentadas nas considerações finais, as conclusões a que
se chegou com as informações levantadas durante a pesquisa.
6 MÉTODO
De acordo com Santos (2002), estudos desse nível têm três tipos
fundamentais, a saber: Segundo os objetivos, segundo as fontes de dados e
segundo os procedimentos de coleta. (SANTOS, 2002, p.26/32).
Para o autor, segundo os objetivos, as pesquisas subdividem-se em
exploratórias, descritivas e explicativas.
Nesse contexto, o presente trabalho classifica-se, segundo os objetivos, como
pesquisa do tipo exploratória.
Já segundo as fontes de dados, podem ser de campo, de laboratório e de
bibliografia. Quanto às fontes de dados, a presente pesquisa é bibliográfica e de
campo, pois procurou observar as questões relativas ao tema por meio de coleta de
dados nos diversos Departamentos da PMDF. Ainda segundo Santos (2002),
“Normalmente a pesquisa de campo se faz por observação direta, levantamento e
estudo de caso”. Nesse estudo foi por meio de levantamento. (ibidem, p. 28)
Quanto aos procedimentos de coleta de dados, existem as experimentais, ex-
post-facto, levantamentos, estudos de caso, pesquisas-ação, documentais e
bibliográficas. (ibidem, p. 32)
Em relação aos procedimentos de coleta, a presente pesquisa classifica-se
como bibliográfica e documental, uma vez que utilizou métodos de consulta
bibliográfica em diversos títulos sobre o assunto e também verificou em leis,
decretos, portarias, instruções normativas no âmbito da PMDF assuntos
relacionados ao tema da pesquisa.
Pode ser considerado também um levantamento de dados que, segundo
Santos (2002), é: “[...] perguntar diretamente a um grupo de interesse a respeito dos
dados que se deseja obter”, o que foi feito por meio de aplicação de questionários e
entrevistas.(ibidem, p. 30)
Os métodos empregados encontram-se pormenorizadamente descritos no
Capítulo II.
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CAPÍTULO I
A QUESTÃO DO GÊNERO E A REALIDADE DA MULHER NO
MERCADO DE TRABALHO MODERNO
1.1 O QUE É GÊNERO?
Antes de se mostrar a realidade específica das Polícias Militares em relação
ao gênero, é necessário demarcar-se qual é sua conceituação e as implicações das
questões de gênero para o mercado de trabalho.
Ao elucidar a questão do gênero, Citeli (2001) classifica didaticamente os
estudos sobre mulheres, gênero e ciências desenvolvidos nos países de língua
inglesa nos últimos quarenta anos em três grandes linhas:
(1) os que se dedicam a dar visibilidade, interpretar e analisar a presença (ou a ausência) das mulheres nas atividades científicas; (2) as investigações epistemológicas que levantam perguntas relativas às implicações do que se entende por empreendimento científico (incluindo aí a autoridade epistêmica e cognitiva atribuída aos cientistas) para as clivagens de gênero vigentes, sugerindo dúvidas quanto à possibilidade e às capacidades explicativas das ciências em relação à natureza; e (3) os estudos que focalizam os contextos sociais em que se estrutura o conhecimento científico, procurando identificar os vieses e as metáforas de gênero, presentes no conteúdo do conhecimento produzido por diversas disciplinas, especialmente a Biologia. (CITELI, 2001, p.1)
Dentro desse contexto, procurou-se investigar se há realmente diferenças
biológicas (presentes no corpo) significativas entre homens e mulheres que
justifiquem exclusividade de habilidades, capacidades, padrões cognitivos e
sexualidade ou se as diferenças estão nos arranjos sociais em várias épocas
específicas.
Charles Darwin, em 1859, publicou seu livro “A origem das espécies” com os
principais conceitos sobre a evolução, onde atribuiu proeminência à evolução
masculina tanto em relação à evolução animal quanto à evolução humana.
Ainda de acordo com Citeli (2001), Antoinette Blackwell, em 1875, publicou o
livro “Os Sexos em toda a natureza”, afirmando que havia igualdade entre os sexos,
refutando observações de Darwin, argumentando que ele havia deixado de
20
considerar que, para cada característica desenvolvida pelos homens no processo
evolutivo, as mulheres haviam desenvolvido outras, complementares. (CITELI, 2001,
p. 2)
Conforme nos ensina a mesma autora, em 1893, Elisa Gamble, uma das
poucas mulheres cientistas da época publicou “Um inquérito sobre o Dogma da
inferioridade delas ao Homem”, defendendo a superioridade feminina. Ao
reinterpretar as observações de Darwin, Gamble afirmava que a divisão sexual do
trabalho conduziu homens e mulheres por linhas evolutivas divergentes, que
resultaram no desenvolvimento, pelas mulheres, das mais altas qualidades sobre as
quais repousa o destino da humanidade. Apenas os preconceitos masculinos
poderiam ter impedido o cientista de constatar essa superioridade feminina,
expressa na superioridade moral e de inteligência. Ambas as autoras aceitavam a
premissa da divisão do trabalho entre homens e mulheres. (idem)
Desde então, desclassificar as hierarquias de poder baseadas em diferenças
de sexo tem sido um dos eixos centrais dos estudos de gênero. (ibidem)
Para a autora, é necessário estabelecer a distinção entre os componentes,
natural ou biológico em relação a sexo e social ou cultural, em relação a gênero para
descartar teorias que há séculos sustentam argumentos que tendem ao biológico
pelos estudos de gênero para desqualificar as mulheres, corporal, intelectual e
moralmente. (ibidem)
Segundo Scott (1990), “Mais recentemente – [...] – as feministas começaram a
utilizar a palavra “gênero” mais seriamente, no sentido mais literal, como uma
maneira de referir-se à organização social da relação entre os sexos.” (SCOTT 1990,
p.1)
Para a autora a palavra gênero foi introduzida a fim de que a pesquisa não se
restringisse apenas ao estudo das distinções feitas em relação à mulher, mas nas
relações entre os sexos, não apenas biologicamente:
No seu uso mais recente, o “gênero” parece ter aparecido primeiro entre as feministas americanas que queriam insistir na qualidade fundamentalmente social das distinções baseadas no sexo. A palavra indicava uma rejeição ao determinismo biológico implícito no uso de termos como “sexo” ou “diferença sexual”. O “gênero” sublinhava também o aspecto relacional das definições normativas de feminilidade. As que estavam mais preocupadas com o fato de que a produção dos estudos femininos centrava-se sobre as mulheres de forma muito estreita e isolada, utilizaram o termo “gênero” para introduzir uma noção relacional no nosso vocabulário analítico. Segundo esta opinião, as mulheres e os homens eram definidos em termos recíprocos e nenhuma compreensão de qualquer um poderia existir através de estudo inteiramente separado. (SCOTT 1990, p.1)
21
Para Rago (1998), o estudo de gênero deve ser encarado como uma ciência,
pois sistematizou a pesquisa feminista:
[...] Afinal, se considerarmos que a epistemologia define um campo e uma forma de produção do conhecimento, o campo conceitual a partir do qual operamos ao produzir o conhecimento científico, a maneira pela qual estabelecemos a relação sujeito objeto do conhecimento e a própria representação de conhecimento como verdade com que operamos, deveríamos prestar atenção ao movimento de constituição de uma (ou seriam várias?) epistemologia feminista, ou de um projeto feminista de ciência. O feminismo não apenas tem produzido uma crítica contundente ao modo dominante de produção do conhecimento científico, como também propõe um modo alternativo de operação e articulação nesta esfera. (grifos originais) (RAGO, 1998, p.3)
Portanto, gênero, muito além de que um conceito é uma ciência, opondo-se
ao entendimento anterior de que esse estudo referia-se apenas às mulheres, o “ser
oprimido”, passando a abordar a questão de uma forma muito mais ampla a partir
das relações sociais entre os indivíduos de sexos distintos.
Acerca dessa abrangência, a mesma autora destaca o conceito fornecido por
Joan Scott, da dimensão relacional e epistemológica de gênero:
No caso dos estudos feministas, o sucesso da categoria do gênero se explica, em grande parte, por ter dado uma resposta interessante ao impasse teórico existente, quando se questionava a lógica da identidade e se decretava o eclipse do sujeito. Categoria relacional, como observa Joan Scott, encontrou campo extremamente favorável num momento de grande mudança das referências teóricas vigentes nas Ciências Humanas, e em que a dimensão da Cultura passava a ser privilegiada sobre as determinações da Sociedade. Assim como outras correntes de pensamento, a teoria feminista propunha que se pensasse a construção cultural das diferenças sexuais, negando radicalmente o determinismo natural e biológico. Portanto, a dimensão simbólica, o imaginário social, a construção dos múltiplos sentidos e interpretações no interior de uma dada cultura passavam a ser priorizadas, em relação às explicações econômicas ou políticas. (RAGO, 1998, p. 15)
A contribuição da nova perspectiva do gênero foi a inserção da não
exclusividade feminina nesse tipo de estudo, uma vez que não se concebe mais a
mulher como ser isolado na sociedade, mas sim o produto das relações entre os
sexos, admitindo-se também os estudos da masculinidade, sobre o que a autora
assim ensina:
Em relação aos estudos feministas, e a despeito das inúmeras polêmicas em curso,vale notar que a categoria do gênero abre, ainda, a possibilidade da constituição dos estudos sobre os homens, num campo teórico e temático bastante renovado e radicalmente redimensionado. Após a “revolução feminista” e a conquista da visibilidade feminina, após a constituição da área de pesquisa e estudos feministas, consagrada academicamente em todo o mundo, os homens são chamados a entrar, desta vez, em um novo solo epistêmico. É assim que emergem os estudos históricos, antropológicos, sociológicos - interdisciplinares - sobre a
22
masculinidade, com enorme aceitação. Cada vez mais, portanto, crescem os estudos sobre as relações de gênero, sobre as mulheres, em particular, ao mesmo tempo em que se constitui uma nova área de estudos sobre os homens, não mais percebidos enquanto sujeitos universais. (Gifo original) (RAGO, 1998, p.16)
As citações inseridas acima demonstram de forma irrefutável que o conceito
de gênero modificou radicalmente a maneira de pensar as relações entre os sexos.
Não apenas um conceito, mas uma nova abordagem que modificou a perspectiva do
papel da mulher na sociedade, com enfoque relacional, deixando de focalizar
apenas o feminismo, mudando o rumo da ciência feminista e criando um novo
campo do conhecimento, o qual é essencial seja entendido, para se compreender o
papel da mulher em qualquer meio social.
1.2 A REALIDADE DAS MULHERES NO MERCADO DE TRABALHO
MODERNO
Após a conceituação da questão do gênero, verifiquemos a realidade atual
das relações de trabalho referentes ao gênero para constatar que a questão central
deste estudo está relacionada a um fenômeno mundial ocorrido a partir do século
passado que ficou conhecido como feminização do trabalho.
Nesse contexto, a título de exemplificação, COSTA et all (2008) afirmam que
na França em quatro décadas as mulheres chegaram a quase metade da população
ativa naquele país (47%). Enquanto em 1962, constituíam um terço da população
ativa (34%). As autoras destacam que enquanto no início da década de 1960 havia
12,6 milhões de trabalhadores homens e 6,7 milhões de trabalhadoras mulheres no
mercado de trabalho, já em 2006 havia 14,6 milhões de homens e 12,9 milhões de
mulheres ativos. Ou seja, enquanto a população economicamente ativa (PEA)
masculina cresceu 16% a feminina cresceu 94%. (COSTA et all, 2008, p. 38)
Essa feminização do trabalho ocorreu concomitantemente com o aumento da
escolaridade da mulher, segundo asseveram as autoras, a progressão da
escolaridade feminina constituiu um fato marcante do fim do século passado:
Os anos que assistiram ao impulso da feminização da população ativa foram os mesmos que conheceram o avanço da escolaridade feminina. Nem é preciso dizer que não se trata de uma coincidência temporal, mas de acontecimentos sociais fortemente correlacionados. Quanto mais as mulheres são instruídas, mais elas são ativas. O fato se verifica em toda a parte. (ibidem, p. 41)
23
Calil (2007) ressalta que na década de 1950, o Brasil experimentou um
período de alto crescimento urbano com grande industrialização, que motivaram um
aumento no número de vagas escolares e também no de postos de trabalho, fatores
que pressionaram por mudanças sociais. (CALIL 2007, p. 33)
De acordo com a autora, com o advento dessa intensa urbanização e
industrialização, concomitantemente houve desvalorização do trabalho doméstico
que foi sendo substituído por utensílios surgidos para facilitar o trabalho no lar,
tornando-o mais rápido, pois a produção industrial absorveu grande parte do que
anteriormente era produzido domesticamente como roupas, pães, laticínios, carne
de frango, entre outros que passaram a ser encontrados nas lojas ou nos
supermercados. Logo, para suprir as necessidades da família com esses bens de
consumo seria necessário dinheiro. Houve, dessa forma, uma mudança no papel da
mulher na sociedade, pois a nova realidade a incentivava a procurar o mercado de
trabalho, desejando maior independência. (idem, p 35.)
Ainda segundo Calil, em 1962, a Lei n.º 4.121./62, conhecida como Estatuto
da Mulher Casada, entre outras coisas, excluiu do ordenamento jurídico brasileiro a
condição de relativamente incapaz da mulher casada, constante até então no
Código Civil de 1916, o qual previa que o marido deveria autorizar o trabalho de sua
esposa. (ibidem)
Conforme ensina a autora, as décadas de 1970 e 1980 foram muito
influenciadas pelo recrudescimento do regime militar e pela crise econômica,
marcada por intensa recessão e aumento da inflação, que assolaram toda a
sociedade, principalmente a sua parcela mais pobre. A presença de mulheres no
mercado de trabalho, que havia começado nos anos 50, aumentou e a proporção de
famílias abaixo da linha da pobreza também, assim como as desigualdades
socioeconômicas, fazendo com que mais mulheres saíssem em busca de trabalho
para complementar o orçamento familiar. Essa crise econômica foi o impulso final
para que a mulher brasileira abandonasse o ambiente doméstico e buscasse postos
de trabalhos. (ibidem, p. 37)
Foi em áreas como comércio e serviços que a mulher encontrou maior
receptividade à sua mão-de-obra em virtude de uma alteração na estrutura setorial,
com a diminuição dos postos de trabalho no setor secundário da economia, tais
como a construção civil, a produção de bens, tanto na indústria de transformação
como na agricultura e aumento no setor terciário, em áreas como comércio e
24
prestação de serviços. Havia poucos postos de trabalhos para mulheres na indústria,
por causa da legislação que proibia sua atividade em ambientes insalubres, e
também porque as diferenças morfológicas entre homens e mulheres impediam que
maquinários fossem utilizados independentemente do gênero. (ibidem, p. 39)
Sobre essa particularidade morfológica, a autora assevera que criou
verdadeiros nichos femininos em determinados setores de produção, fenômeno
conhecido como feminilização do trabalho, acentuando nas fábricas a já existente
divisão por gênero. (ibidem, p. 40)
Desde então, houve grande diminuição, em termos relativos, do número de
empregados assalariados e, conseqüentemente, aumento de trabalhadores por
conta própria ou sem carteira assinada. Nesse contexto, muitas mulheres se viram
forçadas a procurar uma ocupação para contribuir na renda familiar, quando não
supri-la integralmente. Deste modo, ocorreu uma total reformulação das relações
familiares e de trabalho em que a mulher se via inserida, completando-se mais um
ciclo na história do trabalho da mulher no Brasil. (ibidem, p. 41)
Entretanto, Rago (1998) ao citar Scott (1991, p.428) discorda do pensamento
de Calil (2007), apresentado anteriormente. Para a primeira, Scott, ao procurar
explicar alternativamente o problema da trabalhadora, a divisão sexual do trabalho e
a oposição entre o lar e o trabalho, inverte o caminho tradicional da interpretação
histórica, destacando a importância do discurso na constituição de uma questão
sócio econômica. A divisão sexual do trabalho é, segundo ela, percebida como efeito
de um discurso. Conforme ensina Rago, Scott explica que “a diferença sexual
inscrita nas práticas e nos fatos é sempre construída pelos discursos que a fundam e
a legitimam, e não como um reflexo das relações econômicas”. (RAGO 1998, p.7)
Ainda segundo ensina Rago, ao comentar o pensamento de Scott:
Considera insustentável a difundida tese de que a industrialização provocou uma separação entre o trabalho e o lar, obrigando as mulheres a escolher entre o trabalho doméstico e o assalariado. Para ela, o discurso masculino que estabeleceu a inferioridade física e mental das mulheres, que definiu a partilha: “aos homens, a madeira e os metais” e “às mulheres, a família e o tecido” provocou “uma divisão sexual” da mão-de-obra no mercado de trabalho, reunindo as mulheres em certos empregos, substituindo-as sempre por baixo de uma hierarquia profissional, e estabelecendo seus salários em níveis insuficientes para sua subsistência. (idem)
Bruschini (2007) apresenta um diagnóstico da presença das mulheres no
mercado de trabalho brasileiro, baseado em estatísticas oficiais da Fundação
25
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (FIBGE) e do Ministério do Trabalho e
Emprego.
Em seu artigo, a autora mostra que de um lado, a intensidade e a constância
do aumento da participação feminina no mercado de trabalho tem ocorrido desde a
metade dos anos 1970 e de outro, o elevado desemprego das mulheres e a má
qualidade do trabalho feminino é uma realidade. E ainda outro paradoxo: De um lado
a conquista de bons empregos, o acesso a carreiras e profissões de prestígio e a
cargos de gerência e mesmo diretoria, por parte de mulheres escolarizadas e de
outro, o predomínio do trabalho feminino em atividades precárias e informais.
(BRUSCHINI, 2007, p. 2)
Em paralelo aos dados trazidos por Costa et all (2008), relativos à participação
das mulheres no mercado de trabalho francês, apresentados no início deste item,
Bruschini (2007) faz a análise do avanço da participação das mulheres no mercado
de trabalho brasileiro na última década do século passado e metade da primeira
década do século atual:
A primeira questão a destacar é a intensidade e constância do crescimento da atividade feminina. Nesse caso, os indicadores para o Brasil revelam que, no período considerado, a População Economicamente Ativa – PEA – feminina passou de 28 para 41,7 milhões, a taxa de atividade aumentou de 47% para 53% e a porcentagem de mulheres no conjunto de trabalhadores foi de 39,6% para 43,5%. Isto significa que mais da metade da população feminina em idade ativa trabalhou ou procurou trabalho em 2005 e que mais de 40 em cada 100 trabalhadores eram do sexo feminino, na mesma data. Apesar do considerável avanço, no entanto, as mulheres ainda estão longe de atingir, seja as taxas masculinas de atividade, superiores a 70%, seja o número de ocupados ou de empregados, nessa data, como se pode constatar também na tabela 1. (BRUSCHINI, 2007, p.3)
O Quadro 1, transcrito a seguir, mostra um aumento de 49% na PEA feminina
em apenas doze anos, enquanto a PEA masculina cresceu 26,6%. E ainda, que
dentro da PEA feminina o número de mulheres efetivamente empregadas cresceu
58%, enquanto o número dos homens efetivamente empregados na PEA masculina
cresceu 28%.(idem)
Ressalta-se que, de acordo com a autora, pelos critérios da FIBGE, a
População Economicamente Ativa inclui os ocupados e os desocupados. Os
ocupados são aqueles que estão efetivamente empregados, no setor formal ou no
informal, enquanto os desocupados são aqueles à procura de emprego na ocasião
da pesquisa. Já a População Economicamente Inativa inclui os aposentados, os que
26
estão em asilos, os estudantes, os que vivem de renda e os/as que cuidam de
afazeres domésticos. (ibidem)
Quadro 1 – Homens e mulheres no mercado de Trabalho no Brasil Fonte: BRUSCHINI (2007)
Ainda segundo a autora apud FIBGE (2006), a tendência demográfica mais
significativa, que vem ocorrendo desde 1980 é o crescimento acentuado de famílias
chefiadas por mulheres as quais, na data da pesquisa, chegaram a 30,6% do total
das famílias brasileiras residentes em domicílios particulares em 2005. (ibidem)
Além desse fator, outros fenômenos citados pela autora foram o declínio da
taxa de fecundidade que atingiu 2,1 filhos por mulher e o aumento da expectativa de
vida de mulheres para 75,7 anos contra 67,9 anos para os homens. (ibidem)
A taxa de fecundidade continua decrescendo no Brasil. Em matéria publicada
em O Estado de São Paulo, em abril de 2011, Chade afirma que a taxa de
fecundidade de mulheres brasileiras é, em média, de 1,8 filho e o índice entre as que
moram em nações ricas é de 1,7, segundo dados da Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). (CHADE, 2011, p.1)
De acordo com o autor, segundo a OCDE, a consequência será o
envelhecimento da sociedade e a necessidade de garantir uma maior participação
da população ativa no pagamento de impostos.(idem)
Segundo Bruschini (2007) todos os fatores demonstram crescimento da
atividade feminina e as suas transformações no perfil da força de trabalho. As
mulheres trabalhadoras, que, até o final dos anos 70, em sua maioria, eram mais
jovens, solteiras e sem filhos passaram a ser mais velhas, casadas e mães. Em
27
2005, a taxa mais alta de atividade feminina, que era de 74%, era encontrada entre
mulheres de 30 a 39 anos, 69% das mulheres de 40 a 49 anos e 54% das mulheres
de 50 a 59 anos também eram ativas. (BRUSCHINI, 2007, p. 5)
Ainda de acordo com a autora, a estrutura ocupacional do mercado de
trabalho brasileiro apresenta tendências recorrentes que se alteraram pouco nos
últimos 30 anos. No emprego formal, há continuidade no padrão de ocupação das
mulheres, como a elevada presença feminina em ocupações de setores tradicionais
da indústria, como costureiras na indústria da confecção, bem como a persistência
de enorme contingente de mulheres em ocupações dos serviços de cuidado
pessoal, higiene e alimentação, como cabeleireiras e especialistas em estética em
geral, das faxineiras, arrumadeiras em domicílios e hotéis, lavadeiras, tintureiras e
cozinheiras. Persistem também os tradicionais guetos femininos, como a
enfermagem (89% dos enfermeiros, 84% dos técnicos de enfermagem e 82% do
pessoal de enfermagem eram do sexo feminino em 2002), a nutrição (93% dos
nutricionistas eram mulheres), a assistência social (91%), a psicologia (89% de
mulheres), o magistério nos níveis pré-escolar (95%), fundamental (88%) e médio
(74%), além das secretárias (85%), auxiliares de contabilidade e caixas (75%).(idem)
Sobre esse assunto, Carvalho (1990), enfatiza que:
Os critérios de diferenciação das tarefas femininas e masculinas apoiadas em argumentos de tipo naturais, que introduzem a divisão de papéis entre homens e mulheres pela atribuição de sexo, reforça a dicotomia produção/reprodução, esfera pública/privada, homem produtivo/mulher não produtiva e introduz a imagem do feminino exercendo tarefas que são um continuum do espaço doméstico, tarefas que exigem qualidades “naturais” como enfermeiras, psicólogas, secretárias, etc. (Carvalho, 1990, p.18)
Entretanto, a participação de mulheres em ocupações tradicionalmente
masculinas ainda é pequena, dada a recente inserção feminina nessas ocupações.
Este é o caso das funções militares, policiais, pilotos, petroleiras, operadores do
setor elétrico, entre outros.
Nesse contexto, somente na década de 1950, houve ingresso de mulheres em
funções de polícia. A inserção das mulheres nas polícias, outra ocupação
tradicionalmente masculina, conforme será visto amiúde em capítulo posterior, se
deu em 1955, na então Guarda Civil, tendo sido criado assim o primeiro Corpo de
Policiamento Especial Feminino, primeira polícia uniformizada feminina no Brasil,
segundo Musumeci e Soares (2005). Posteriormente, nas décadas de 1970 e 1980
as demais polícias brasileiras inseriram contingentes femininos em seus quadros.
(MUSUMECI E SOARES, 2005, p.5)
28
Na década de 1980 houve a inserção das mulheres nas Forças Armadas,
conforme podemos verificar no artigo “Nossas Marias Quitérias” de Nanci Leonzo
(2000):
No caso do Exército, por exemplo, a inclusão do segmento feminino ocorreu através da Lei 7.831, de 2 de outubro de 1989, que deu origem à criação do Quadro Complementar de Oficiais, com a finalidade de suprir, com pessoal de formação superior, “as necessidades das Organizações Militares (OM)” [...] O pioneirismo, contudo, cabe à Marinha brasileira. Já em 7 julho de 1980 foi criado, através da Lei nº 6.807, regulamentada pelo Decreto nº 85.238 de 7 de outubro do mesmo ano, o Corpo Auxiliar Feminino da Reserva da Marinha (CAFRM) (LEONZO, 2000, p. 12)
Segundo Musumeci e Soares (2004), a pequena participação da mulher
nesses campos profissionais, como será detalhado no Capítulo III, é imposta por
normas corporativas ou leis que restringem a porcentagem de mulheres nos efetivos
policiais, em algumas polícias, por exemplo, em percentuais iguais ou inferiores a
10%:
Em alguns países houve significativos avanços ao longo das últimas décadas – fruto de pressões feministas pela eliminação de barreiras de gênero- da necessidade de preencher lacunas deixadas por guerras no efetivo masculino, ou de estratégias de inclusão de mulheres para melhorar a imagem e reduzir a brutalidade e a corrupção policiais. Mas, como registram diversas pesquisas, as resistências contra uma abertura maior desse espaço à participação feminina continuam cerradas. É um espaço visto quase universalmente (mesmo onde as taxas de criminalidade são ínfimas) como de alta exposição ao perigo e à incerteza, que requer dos seus operadores coragem e força física – características pouco comuns nas mulheres, segundo os estereótipos subjacentes à segmentação de papéis de gênero no mercado de trabalho em geral. O Brasil não representa, portanto, nenhuma grande exceção à regra, embora, com uma parcela feminina estimada em 8,2% de todos os efetivos policiais (militares, civis e federais), fique abaixo da média dos outros 51 países incluídos na Tabela 3 (10,4%). Como vimos, são sobretudo as PMs que “derrubam” o nosso índice de feminização policial e é nelas, aparentemente, que se encontram as mais fortes resistências ao aumento da participação de mulheres. O quadro anexo a este artigo mostra que, em pelo menos oito UFs, essa participação está limitada por lei a porcentuais que variam entre 4 e 10%. E, mesmo onde não existem limites legais, os concursos de entrada normalmente são diferenciados por gênero: oferecendo um número de vagas femininas muito inferior ao das masculinas, ou simplesmente abrindo sucessivos concursos só para homens, grande parte das PMs mantém deliberadamente baixa a feminização do seu efetivo. (MUSUMECI E SOARES, 2004, p.8)
O quadro e a tabela 3, citados pelas autoras foram citados e reproduzidos no
capítulo III do presente estudo.
Essa restrição, conforme veremos no próximo item, não é recepcionada pela
Constituição Brasileira de 1988.
29
Ocorre que, embora esteja havendo um avanço na participação da mulher no
mercado de trabalho, isso se deve a uma demanda reprimida, visto que até a
década de 1950 essa participação era diminuta. Então, o que está ocorrendo agora
é a gradual inserção das mulheres em todos os campos profissionais, mesmo
naqueles que eram tradicionalmente masculinos. E as adaptações ainda estão
ocorrendo, de forma lenta, para que atenda aos anseios de uma sociedade mais
justa, com oportunidades iguais para todos, independente de raça, credo ou gênero.
1.3 A QUESTÃO JURÍDICA DA INSERÇÃO DA MULHER NAS POLÍCIAS
MILITARES À LUZ DA CONSTITUIÇÃO DE 1988
Segundo Viana e Unbehaum (2004), nenhuma referência à palavra gênero
aparece na CF/1988, e isso se deve ao contexto da época. Naquele momento,
gênero não era um conceito familiar. Até mesmo entre as feministas daquele período
a distinção entre sexo e gênero estava ainda sendo forjada. Assim, mesmo quando
se trata da ausência da palavra gênero na Carta Magna, ainda reporta-se alusão às
mulheres e seus direitos, ou às diferenças entre os sexos. (VIANA E UNBEHAUM
2004, p.1)
Nesse sentido, observa-se que a Constituição da República Federativa do
Brasil (1988), com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), que é a
corte responsável por verificar a constitucionalidade das leis e atos, verificando-se
inicialmente o que traz o artigo terceiro: “Art. 3º: Constituem objetivos fundamentais
da República Federativa do Brasil:I- [...], II- [...], III- [...], IV - promover o bem de
todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras
formas de discriminação.” (CFB, 1988) (grifo nosso)
Dessa forma, ao considerar que o acesso ao trabalho e ao emprego e
principal e especificamente a proteção do mercado de trabalho da mulher é um bem
tutelado pelo Estado, fazer restrições de percentuais de vagas nos postos de
trabalho em empregos públicos em razão do sexo do candidato, no caso das
Polícias Militares, é uma prática não recepcionada pela Carta Magna brasileira.
A CFB/88, considerada a Constituição cidadã, é conhecida por privilegiar os
aspectos relacionados aos direitos e garantias individuais e traz em seu artigo
quinto:
Art. 5º- Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
30
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição; (CFB, 1988) (grifo nosso)
Prosseguindo na análise da Carta Magna, observa-se o Art. 7º que diz:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: [...] XX - proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei; XXX - proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil; (CFB, 1988) (grifo nosso)
Estes três dispositivos por si só já seriam suficientes para vedar qualquer tipo
de distinção de critérios de admissão baseados em sexo do candidato,
principalmente em casos de cargos públicos.
A esse respeito, em acórdão, assim manifestou-se o eminente relator Ministro
do STF Marco Aurélio:
Concurso público – critério de admissão - sexo. A regra direciona no sentido da inconstitucionalidade da diferença de critério de admissão considerado o sexo - artigo 5º, inciso I, e par. 3º do artigo 39 da Carta Federal. A exceção corre à conta das hipóteses aceitáveis, tendo em vista a ordem sócio constitucional. (STF/RE 120.305, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 09/06/95)
Na Seção II da Carta magna, que trata dos Servidores Públicos, encontra-se o
art. 39, parágrafo 3º, citado pelo Min. Marco Aurélio, que assim determina:
Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão conselho de política de administração e remuneração de pessoal, integrado por servidores designados pelos respectivos Poderes. [...] § 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir. (CFB, 1988) (grifo nosso)
O citado parágrafo confirma o anseio social e a vontade do legislador quando
inseriu na Constituição o Inciso I do Art. 5º e os incisos XX e XXX do art. Art. 7º, que
é a proteção do trabalho da mulher e a garantia de direitos iguais.
Conforme será visto no Capítulo III, as mulheres hoje em dia estão presentes
em todos os campos de atuação policiais. Hoje se vê mulheres pilotos policiais,
mulheres no policiamento ostensivo, em tropas especiais, em missões de paz da
Organização das Nações Unidas (ONU), em atividades de segurança de
autoridades, em atividades administrativas e operacionais, etc, provando que as
mulheres são capazes de desempenhar qualquer função dentro de uma Corporação
policial militar.
31
Os quadros específicos criados na PMDF, por exemplo, para abrigar as
policiais militares femininas foram extintos porque elas já estavam trabalhando nas
diversas unidades da Corporação, desempenhando as mesmas atividades antes
desempenhadas somente por efetivo masculino, entretanto viam sua ascensão
funcional frustrada em virtude da pequena quantidade de vagas naqueles quadros.
Assim, foram integradas aos respectivos quadros de policiais militares
existentes na Corporação, em igualdade de condições com o efetivo masculino,
sujeitas ao mesmo regulamento disciplinar, desempenhando as mesmas atividades
e sujeitas ao mesmo regime de escala. Nada mais justo, pois “deveres iguais,
direitos iguais”.
Se os quadros femininos não tivessem sido extintos, ou seja, se as mulheres
fossem contratadas para desempenhar apenas funções específicas dentro da
Corporação, justificar-se-ia limitar a quantidade de vagas, mas o fato de
desempenharem as mesmas funções, em paridade com o efetivo masculino, exclui a
parte final do parágrafo 3º do artigo 39 que autoriza “requisitos diferenciados de
admissão quando a natureza do cargo o exigir”. Ora, se as mulheres já
desempenham as mesmas funções e estão sujeitas aos mesmos regulamentos e
regimes de escala, provaram que a natureza do cargo policial militar não exige
requisitos diferenciados de admissão.
O entrevistado R.F.A.1, um dos oficiais que conduziu o ingresso feminino na
PMDF, em entrevista à autora, referente a esta pesquisa, assim se manifestou:
Em relação ao percentual, o entrevistado frisou que nunca acompanhou os estudos (pois era tenente), para saber exatamente o porquê de definirem 10% e não 15% e nem 5%. Mas, de qualquer forma, entende que já se refletia na época uma preocupação de que de repente houvesse uma polícia militar de maioria mulheres. Eles pensavam assim, provavelmente: “se isso ocorrer, como vamos enfrentar o crime?” De qualquer forma esse percentual ainda existe, mas entende que é um percentual basicamente por referência, pois não se sustenta legalmente. Já passou da época de ter um estudo sobre isso. Se alguém entrar na justiça, alegando que foi impedida de ingressar por causa dos 10%, vai ter ganho de causa. É óbvio que eles não colocam lá 10%, mas um número tal de vagas que correspondem a 10% do total das vagas.
A entrevistada V.N.O.A.2, integrante da primeira turma de policiais femininas e
única mulher a ocupar o posto de Coronel na PMDF, sobre esse assunto, em
entrevista concedida à autora, referente a esta pesquisa, afirmou:
1 Nome suprimido pela autora. Ver entrevista completa no Apêndice B2 2 Nome suprimido pela autora.Ver entrevista completa no Apêndice B3
32
A Constituição de 1988 é muito clara, ela diz que todos são iguais perante a lei, homens e mulheres. Agora mesmo na solenidade do CFP I, Curso de Formação de Praças I, as três primeiras colocadas foram mulheres. A entrevistada acredita que esse percentual não deveria existir, acredita que poderia ser feita uma pesquisa sobre isso. A entrevistada acredita que a Corporação não pode ser só de mulheres. Sabe que hoje o que a mulher faz (não é um discurso feminista), consegue fazer bem feito e consegue até passar os limites as vezes do efetivo masculino. Vê-se isso pelas nossas Universidades. Onde tem cursos que se acha que é só de homens, como Engenharia e Agronomia, por exemplo, vê-se o percentual de mulheres muito maior. Talvez na Corporação o ideal seria que se fizesse um estudo científico mesmo que respondesse à pergunta: Que percentual queremos ter? Ou se não precisa de percentual? A entrevistada acredita que esse percentual de 10% é injusto. Mas o que é que a Corporação precisa? Ela precisa de 1000 Homens e 100 mulheres só? A entrevistada não acredita nesse percentual de 10%. Também não acredita que a Corporação precisa de 14.000 mulheres. Precisa de uma igualdade e isso precisa ser estudado. Acredita que limitar o percentual não é o adequado, até porque as interpretações desse percentual vão além da inclusão na Corporação. E isso aí que é danoso.
Na porção quantitativa desta pesquisa, onde foram aplicados questionários a
200 (duzentas) policiais militares da PMDF, que representam cerca de 20% do
efetivo total de mulheres na Corporação, ao serem perguntadas sobre qual deveria
ser o critério para o cálculo do percentual de vagas para ingresso na PMDF de
mulheres e homens, 43,5% das respondentes responderam que não deveria haver
nenhum limite, ou seja, todos homens e mulheres deveriam concorrer livremente por
todas as vagas, enquanto 20,5% acreditam que deveria ser 50% de vagas
masculinas e 50% de vagas femininas. O critério atual, de 10% de vagas femininas
foi defendido por apenas 6% das respondentes no espaço destinado a outras
respostas, conforme se pode verificar no gráfico nº 31, no capítulo III.
Para concluir este capítulo, verifica-se que a questão de gênero e mercado de
trabalho é muito mais que uma questão retórica ou filosófica, mas acima de tudo, é
uma questão de direito.
Recorre-se ao Artigo de Bruschini (2007) para relembrar que as mulheres têm
sido especialmente atingidas pelo desemprego. Segundo a autora, têm-se verificado
maiores taxas de desemprego entre elas do que entre os homens e um dos fatores
que contribui para esse resultado é o contínuo aumento da população
economicamente ativa feminina, ou seja, de mulheres que ingressam no mercado de
trabalho à procura de emprego. No período entre 1991 e 2002 houve um aumento
da participação das mulheres entre os desempregados, que passou de 39% em
1991 para 46% em 2002. Para as seis regiões metropolitanas do país, o diferencial
de gênero persiste na população brasileira, no que diz respeito às taxas de
33
desemprego: em 2005, no período de janeiro a abril, enquanto a taxa feminina de
desemprego foi de 13,5%, a masculina foi de 8,3%. (BRUSCHINI, 2007, p.32)
Limitar a quantidade de vagas femininas em qualquer tipo de ocupação é
aumentar o desemprego das mulheres e vai de encontro aos princípios
constitucionais citados.
Não se está defendendo ou sequer questionando o mérito das ações
positivas, onde se defende a criação das polêmicas cotas raciais nos concursos
públicos e em vestibulares das Universidades Públicas.
No caso em tela, a ação positiva seria “simplesmente” cumprir o que prevê o
texto constitucional, não se fazendo critérios distintos de admissão em razão do sexo
em ocupações ou cargos que não exigem essa distinção.
34
CAPÍTULO II
METODOLOGIA
2.1 TIPO DE ESTUDO
O Anexo “J” da Portaria PMDF N° 598/2008, que regula as normas para
confecção, apresentação e avaliação de Trabalho Técnico-Científico Profissional
(TTCP) para o Curso de Aperfeiçoamento de Oficias e de Altos Estudos determina
que o TTCP seja apresentado em forma de monografia.
Costa (1998) diferencia o tipo de estudo produzido na graduação e nos vários
níveis de pós-graduação, afirmando que:
Nos trabalhos de pós-graduação, procura-se incentivar a produção da pesquisa científica propriamente dita. É oportuno, para melhor elucidação do assunto, esclarecer sobre os níveis dos cursos de pós-graduação. São dois esses níveis: lato sensu e strictu sensu. O primeiro degrau da pós-graduação é o lato sensu, cuja a finalidade é a especialização ou o aperfeiçoamento do educando. [...] Evidentemente, as exigências quanto à utilização da metodologia e das técnicas de pesquisa são maiores do que as dos cursos de graduação e bem menores, em grau de profundidade e originalidade, das do nível stricto sensu. Os cursos de pós-graduação neste nível compreendem os cursos de mestrado e doutorado. Enfim, este “é um trabalho sistemático e completo sobre um assunto particular, usualmente pormenorizado no tratamento, mas não extenso no alcance”. (COSTA, 1998, p.02/03)
Sobre a importância das características qualitativas do trabalho científico,
Severino (2003) destaca:
Quaisquer que sejam as distinções que se possa fazer para caracterizar as várias formas de trabalhos científicos, é preciso afirmar preliminarmente que todos eles têm em comum a necessária procedência de um trabalho de pesquisa e de reflexão que sejam pessoais, autônomos, criativos e rigorosos. Estas considerações já antecipam mais uma característica do trabalho científico, em nível de pós-graduação: ele deve cada vez mais ser criativo. Não se trata mais de apenas aprender, de apropriar-se da ciência acumulada, mas de colaborar no desenvolvimento da ciência, [...] (SEVERINO, 2003, p. 145)
Esta monografia foi elaborada tendo como fontes básicas de informações, as
seguintes:
a) As publicações bibliográficas sobre gênero em segurança pública;
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b) A opinião das próprias policiais militares femininas da PMDF;
c) A opinião de profissionais de segurança pública que acompanharam a
inserção das mulheres na PMDF;
d) Pesquisa documental em leis, decretos, portarias, boletins e outros que
continham informações relevantes sobre o tema.
Santos (2002) classifica estudos dessa natureza em três tipos:
Segundo os objetivos, segundo as fontes de dados e segundo os
procedimentos de coleta. (SANTOS, 2002, p.26).
Segundo os objetivos, as pesquisas científicas subdividem-se em
exploratórias, descritivas e explicativas. (ibidem)
Já segundo as fontes de dados, podem ser de campo, de laboratório e de
bibliografia. (ibidem)
Por fim, quanto aos procedimentos de coleta de dados, são subdivididas em
experimental, ex-post-facto, levantamento, estudo de caso, pesquisa-ação,
documental e bibliográfica. (ibidem)
Nesse contexto, esta monografia pode ser classificada segundo os objetivos,
de pesquisa do tipo exploratória, de acordo com Santos (2002):
Explorar é tipicamente a primeira aproximação de um tema e visa criar maior familiaridade em relação a um fato ou fenômeno. Quase sempre se busca essa familiaridade pela prospecção de materiais que possam informar ao pesquisador a real importância do problema, o estágio em que se encontram as informações já disponíveis a respeito do assunto, e até mesmo revelar ao pesquisador novas fontes de informação. Por isso a pesquisa exploratória é quase sempre feita como levantamento bibliográfico, entrevistas com profissionais que estudam/atuam na área, visitas a web sites etc. (ibidem, p.27)
A classificação desta, quanto aos procedimentos de coleta, é bibliográfica e
documental, pois utilizou métodos de consulta bibliográfica aliada ao levantamento
de dados que, segundo Santos (2002), é: “[...] perguntar diretamente a um grupo de
interesse a respeito dos dados que se deseja obter”, realizado aqui por meio de
aplicação de questionários de opinião e entrevistas estruturadas e semi-
estruturadas.(ibidem, p. 30/32)
Segundo Lakatos e Marconi (1986), para esse tipo de estudo utiliza-se duas
técnicas: a observação e a entrevista. Observação pode ser direta ou indireta e
nesse caso recorreu-se à observação indireta (documental e bibliográfica), além das
entrevistas. (LAKATOS E MARCONI, 1986, p. 176)
36
2.2 SELEÇÃO DOS SUJEITOS PARA O LEVANTAMENTO DE DADOS
A fim de levantar a importância do tema proposto, utilizou-se como fontes de
dados, além das fontes bibliográficas primárias e secundárias, as opiniões das
seguintes pessoas:
a) Policiais militares femininas pertencentes à PMDF na pesquisa quantitativa;
b) Policiais militares femininas ou masculinos que acompanharam a inserção
das Mulheres na PMDF na pesquisa qualitativa;
Ao pesquisar sobre a inserção da mulher na PMDF foi necessário e
fundamental ir além dos registros legais e documentais disponíveis, já que registros
acadêmicos sobre esse tema são raros no Distrito Federal. Nesse contexto,
recorreu-se a fontes orais, por meio de entrevistas com pessoas que foram
testemunhas desse processo e, mais que isso, vivenciaram-no.
Goldenberg (1997) assevera que, “anteriormente, as ciências pautavam-se
apenas em um modelo quantitativo de pesquisa em que a veracidade de um estudo
era verificada pela quantidade de entrevistados”. (GOLDENBEERG, 1997, p. 7)
Para fugir a esse método mecanicista que mede tudo apenas pelos números,
procurou-se utilizar a pesquisa qualitativa utilizando-se também as fontes orais
disponíveis para entender as relações sociais de então e as percepções individuais
dos personagens que vivenciaram todo o processo.
Para o atendimento do fim pretendido, mesclaram-se questionários para aferir
dados estatísticos e entrevistas que fornecessem aprofundamento aos temas
percebidos nos questionários. Nas entrevistas, o mais importante não foi a
representatividade estatística da amostra mas sim o grau de comprometimento que
os entrevistados tiveram com o processo estudado.
2.2.1 CRITÉRIOS DE ELEGIBILIDADE PARA O ESTUDO
Foram considerados elegíveis para os questionários todas as policiais
militares femininas pertencentes à PMDF.
Da mesma forma, foram considerados elegíveis para as entrevistas os
profissionais da PMDF que testemunharam a entrada das policiais militares
femininas na Corporação. Nesse aspecto, procurou-se entrevistar pessoas de
ambos os sexos, de graus hierárquicos diferentes para que não houvesse viés
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parcial no resultado e se pudesse avaliar o processo de inserção das mulheres na
PMDF por perspectivas diversas.
2.2.2 CRITÉRIOS PARA INCLUSÃO
Os critérios para inclusão no estudo foram presunção de veracidade das
informações prestadas e o voluntarismo dos respondentes.
2.2.3 CRITÉRIOS PARA EXCLUSÃO
O critério para exclusão foi o não voluntarismo, explicitado pela não assinatura
do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, constante no instrumento próprio
de levantamento.
2.2.4 CRITÉRIOS ÉTICOS
Foi garantida a confidencialidade dos dados pessoais prestados pelas
participantes.
Em relação às entrevistas, foi solicitada a autorização para a publicação,
inclusive, dos dados pessoais informados, pois exatamente na identidade dos
entrevistados reside o peso das informações.
2.3 INSTRUMENTOS UTILIZADOS NO LEVANTAMENTO DE DADOS
2.3.1 QUESTIONÁRIO SOBRE A RELEVÂNCIA DA ATUAÇÃO DAS POLICIAIS
MILITARES FEMININAS DA PMDF
Composto por 30 (trinta) questões, distribuídas da seguinte forma (ver
Apêndice A):
a) Sete (07) questões sobre dados pessoais das respondentes com a
finalidade de traçar um perfil da amostra.
Da oitava à vigésima nona questões foram questionados temas considerados
importantes, utilizando-se em algumas a Escala Likert com 5 (cinco) graduações,
com múltipla escolha e em outras apenas sim ou não, com exceção das questões 21
e 22, que eram perguntas específicas para respostas subjetivas.
Na trigésima questão foi dado às respondentes um espaço para escrever o
que desejassem sobre o assunto.
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2.3.2 ENTREVISTA ESTRUTURADA SOBRE A RELEVÂNCIA DA ATUAÇÃO DAS
POLICIAIS MILITARES FEMININAS NO CONTEXTO CORPORATIVO DA
PMDF
Composta por dez questões, a partir das quais os entrevistados discorreram
livremente sobre os temas inseridos nas questões (Apêndice B).
2.3.3 COLETA, ARMAZENAMENTO E ANÁLISE DOS DADOS DO
LEVANTAMENTO
2.3.3.1 Coleta
As entrevistas estruturadas foram feitas pessoalmente, por meio de uma
câmera filmadora e anotações tendo sido os dados degravados e transcritos, a
posteriori.
Foram precedidas de uma preparação, quando foi informado ao entrevistado
os objetivos da pesquisa e as questões da entrevista estruturada, às quais se
respondeu seqüencialmente.
As entrevistas semi-estruturadas seguiram a mesma metodologia das
entrevistas estruturadas, porém não foram formuladas questões, mas sim uma
proposição geral, a partir da qual os entrevistados discorreram livremente sobre o
tema proposto.
Os questionários foram aplicados pessoalmente, por meio do preenchimento e
assinatura de próprio punho do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e
formulário com questões;
2.3.3.2 Armazenamento
Os dados inseridos nos formulários de questões foram digitados em planilhas
utilizando-se o Software Microsoft Excel, tendo sido armazenados. Foi criada uma
planilha geral como base de dados, onde inicialmente foram transcritas as respostas,
tendo nas colunas as perguntas e uma linha para cada respondente.
Posteriormente as quantidades de respostas em cada questão foram
contabilizadas e transferidas para uma segunda planilha, onde os dados foram
consolidados e em um terceiro momento foram gerados gráficos para apresentação
estatística dos dados levantados, que serão apresentados no próximo capítulo.
39
2.3.3.3 Análise dos dados
A análise dos dados foi realizada por meio de operações simples de soma das
respostas em cada gradação e cálculo da correspondente porcentagem em relação
ao número de respondentes ou respostas.
As porcentagens indicaram a tendência de opinião das respondentes.
Em algumas questões foram dadas mais de uma resposta, portanto a
porcentagem foi calculada em relação ao número de respostas válidas e não em
relação ao número de respondentes.
2.4 OUTROS PROCEDIMENTOS UTILIZADOS NA PESQUISA
2.4.1 PESQUISA BIBLIOGRÁFICA
2.4.1.1 Critérios adotados para a seleção bibliográfica
Foram adotados os seguintes critérios para a seleção do material bibliográfico
consultado:
Aceitos somente documentos autênticos, fontes primárias e secundárias;
As primárias foram selecionadas dentre as leis, decretos, portarias, manuais,
boletins, fotografias e outros documentos existentes no arquivo da PMDF.
As secundárias foram selecionadas aquelas em que fosse possível identificar
a fonte, o autor e o ano de publicação, havendo livros, teses, dissertações, artigos
científicos, monografias e artigos em periódicos ou web sites.
2.4.1.2 Fichamento da bibliografia consultada
As seguintes Palavras-chave foram buscadas no fichamento da bibliografia:
A - Gênero em Segurança Pública;
B - Policiamento Feminino;
C - Mulheres nas Polícias;
D - Policiais Militares Femininas
2.4.2 WEBGRAFIA
2.4.2.1 Alertas de publicações
O recurso google alerts do site da Internet Google Mail foi configurado com as
mesmas palavras-chave utilizadas no fichamento bibliográfico. Esse recurso, emitiu
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links para o electronic mail ou correio eletrônico da pesquisadora a partir de qualquer
nova publicação na rede internacional de computadores sobre o tema configurado.
Após o recebimento diário dos links, eles foram vistos e os conteúdos que foram
considerados válidos, conforme critérios estabelecidos no item anterior, foram
catalogados e consultados. Isso permitiu constante atualização.
2.4.2.2 Bases de consulta Webgráficas
Foram consultados bancos de publicações e sítios de armazenamento livre
on-line na rede internacional de computadores (internet), especificados no quadro 2.
Os títulos considerados conforme os critérios descritos no sub item 2.4.1.1
foram baixados e arquivados em uma pasta digital, onde permaneceram separados
segundo a categoria, sendo incluídas teses de doutorado, dissertações de mestrado,
artigos científicos, ensaios, entre outros.
Este método foi descrito originalmente por Castellar (2010), que o chamou de
“biblioteca digital”.
Banco de
Publicações
Tipo de Sítio de disponibilidade Necessidade
de Conta e Log
in
Google (site) Sítio de busca na Internet
http://www.google.com.br
não
Google livros Banco de livros eletrônicos (e-books)
http://books.google.com.br/bkshp?tab=mp
não
Acadêmico
Banco de Publicações Acadêmicas
http://scholar.google.com.br/schhp?hl=pt-BR
não
Scribd Sítio de Armazenamento livre
http://www.scribd.com/
sim
Universia Banco de Publicações Acadêmicas
http://www.universia.com.br/
sim
4Shared Sítio de Armazenamento livre
http://www.4shared.com/
sim
Quadro 2 – Fontes de Publicações consultadas na Internet Fonte: CASTELLAR (2010) adaptado pela autora
41
2.4.3 PESQUISA DE CAMPO
Foram visitados, no âmbito da PMDF, o Arquivo Geral, o Museu, a Diretoria de
Telemática, o Departamento de Controle e Correição e o Departamento de Saúde e
Assistência ao Pessoal. Nessas visitas procurou-se documentos, fotos, textos, entre
outros, relacionados ao tema.
Nas visitas foram copiados fotografias e documentos, a fim de que fossem
juntados ao texto final em forma de anexos para ilustrar e enriquecer o trabalho.
Nessas visitas também foram levantados dados que se transformaram em
informações inseridas na monografia.
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CAPÍTULO III
HISTÓRICO E PERFIL DAS POLICIAIS MILITARES FEMININAS
DA PMDF
3.1 A IMPORTÂNCIA DO CONHECIMENTO DO PASSADO PARA O
ENTENDIMENTO DO PRESENTE
Para bem compreender o contexto atual de emprego das policiais militares
femininas no DF é necessário entender o contexto histórico em que o Brasil estava
inserido na época em que houve essa admissão, pois verificamos que tais
admissões em nível nacional ocorreram em série, a partir de 1977, iniciadas com a
publicação de uma Portaria pela Inspetoria Geral das Polícias Militares (IGPM),
órgão do Ministério do Exército autorizando a inclusão de efetivo feminino nas
Corporações.
Nesse contexto, várias corporações militares adotaram o modelo da co-irmã
Polícia Militar do Estado de São Paulo (PMESP), a qual já possuía polícia feminina
desde 1955.
Por sua vez, a PMESP adotara o modelo de implantação de policiamento
feminino europeu, ocorrido no início do século XX.
É essencial conhecer esse contexto porque muitas características observadas
atualmente têm origem na gênese dessa implantação e, como as organizações
militares são fechadas e têm alguma resistência a mudanças, muitos dos critérios
inicialmente concebidos permanecem até os dias atuais.
Para entender a realidade no DF e a brasileira, é mister verificar como se deu
essa inserção em termos mundiais e, de forma didática, traçar um paralelo.
3.2 ANTECEDENTE HISTÓRICO MUNDIAL
Conforme ensina Calazans (2003), apud Prenzler (2000), o precedente
histórico mais antigo se deu nos Estados Unidos da América (EUA):
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As mulheres entraram para a polícia nos EUA no meio do século XIX, [...] Na maior parte do século XX, as mulheres atingiram 1% do efetivo de pessoal e foram limitadas a trabalhos parecidos com suas atribuições na sociedade, trabalho de secretária ou com jovens e mulheres. Ainda em 1972 o percentual de mulheres chegava a 2% e em 1997, havia chegado apenas a 12% do efetivo total. (CALAZANS, 2003, p.38)
Segundo Brown (1997), em termos mundiais, o processo de inserção da
mulher nas polícias possui datas de admissão variando de acordo com o país, mas a
oposição à sua admissão era quase universal. O papel das mulheres na polícia era
para ser uma extensão da esfera doméstica e, organizacionalmente, elas deviam ser
mantidas em linhas separadas de gestão. A entrada das mulheres era muitas vezes
precedida por lobby, mas os sucessos foram provavelmente devido a concessões
feitas por razões pragmáticas, em resposta a alguma crise contemporânea.
(BROWN, 1997, p.2)
A autora cita como exemplo, que na Europa a Inglaterra foi um dos primeiros
países a permitir a entrada de mulheres na polícia por necessidade, pois a maioria
dos homens foi enviada para a primeira grande guerra (1914-1918). (Idem)
Já na Holanda, a mulher foi empregada na polícia pela primeira vez em 1911
e em 1925 foi criada uma Brigada de Policiamento Feminino para o combate ao
tráfico de mulheres e crianças e também pelo crescente número de prostitutas
naquele país. (Ibidem)
Na França, a inserção das mulheres na polícia se deu em 1915, porém
somente em 1935, elas começaram a desenvolver atividades operacionais, por
ingerência do prefeito de Paris. A expansão dos papéis das mulheres dentro da
polícia, muitas vezes ocorreu através da intervenção de defensores chave que
faziam lobby pela atividade. (Ibidem)
Um catalisador significativo para a inserção de mulheres nas polícias
européias foi a legislação de direitos iguais, como o Ato da Discriminação Sexual de
1975 e o Ato de Discriminação Racial de 1976, os quais determinavam que os
critérios para seleção no recrutamento e promoção deveriam ocorrer por méritos,
não relacionados ao gênero ou raça. (Ibidem)
Na União Européia, os países estão sujeitos a diretrizes de igualdade salarial
e de tratamento para homens e mulheres. Entretanto o apelo da lei européia não
tem sido bem sucedido em vários países da União. Por exemplo, o Ministro da
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Defesa na Bélgica excluiu as mulheres de sua Gendamerie3 porque se acreditava
que o trabalho “oferecia muitos riscos físicos e morais para mulheres”. (Ibidem)
Ainda de acordo com a autora, existem algumas pesquisas que sugerem
evidências da emergência de uma cultura policial feminina, uma distinção nas
policiais femininas e seu policiamento, essa diferença está ligada ao “toque suave”
que somente as mulheres possuem. Isto pode ser ilustrado pelas seguintes citações:
1- "Era esperado que a policial feminina, graças às suas qualidades pessoais traria
para o trabalho da polícia novos métodos, ao mesmo tempo mais social e mais
humano e que se tornaram particularmente indispensáveis". 2- "A Polícia Judiciária
tem pouca experiência com mulheres no combate ao crime organizado, no entanto
podemos afirmar que essas poucas mulheres têm uma motivação enorme, uma
perspectiva diferente sobre este tipo de trabalho, que pode ter uma experiência
enriquecedora e um efeito suavizante." (Ibidem)
A primeira observação foi feita por uma policial polonesa em 1925 e a
segunda por uma policial belga quase 60 anos mais tarde. (Ibidem)
No entanto, ambos os comentários expressam o mesmo sentimento sobre as
diferenças de estilo e método que as mulheres podem trazer para o policiamento, e
a inferência de que houve, portanto, dificuldades dentro dessas respectivas polícias
que as habilidades das mulheres poderiam corrigir. (Ibidem)
A autora comenta o ato de ter sido apontado anteriormente que várias crises
que afetaram as polícias européias estavam associadas com o aumento do
recrutamento de policiais mulheres em maior número. Por outro lado, o recrutamento
de mulheres foi visto como uma solução em um período de baixa moral e baixos
salários. (Ibidem)
Com a nova ênfase no policiamento comunitário e a qualidade do serviço
evidente na polícia britânica, é de se salientar que os movimentos para mudar a
cultura policial adotaram o que poderia ser considerado influências feminizantes.
(Ibidem)
O quadro 3 mostra a participação feminina em termos percentuais em vários
países e no Brasil em relação ao efetivo masculino. Vê-se que a participação
feminina ainda é pequena e veremos a seguir que as polícias militares brasileiras
3 Gendamerie- Força militar, presente em alguns países europeus, encarregada da realização de funções de polícia no âmbito da população civil. Os seus membros são designados "gendarmes".(Wikipedia)
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também possuem baixa participação feminina, em geral devido à limitação imposta
por lei.
Quadro 3 – Participação feminina nas forças policiais de 52 países em 2000 Fonte: Musumeci e Soares (2004)
3.3 HISTÓRICO DA INSERÇÃO DE MULHERES NAS POLÍCIAS MILITARES
BRASILEIRAS
É imprescindível entender quando houve a inserção das mulheres nas polícias
militares brasileiras e o que motivou essa inserção, isto é, qual era o contexto
histórico para entender-se o modelo adotado no Brasil, tendo em vista que a maioria
das polícias seguiu, mais ou menos, os mesmos parâmetros.
No Brasil, a inserção da mulher nas polícias militares se deu em contexto
histórico diferente em um lapso temporal muito posterior em relação à Europa e
EUA.
Segundo Capelle (2006, apud Listgarten, 2002), a Polícia Feminina no Brasil
foi criada com base nas experiências européia e americana, nas quais se constatou
satisfatório desempenho feminino na solução de questões relacionadas a missões
assistenciais e de polícia preventiva. Partindo dessas experiências, manifestou-se a
proposta de criação da Polícia Feminina no Brasil, em 1953, no I Congresso de
Criminologia e Medicina Legal. (CAPELLE, 2006, p.165)
Aqui, cabe ressaltar que somente em 1932 foi concedido à mulher brasileira o
direito ao voto, segundo Ferreira (2004), como resultado da luta contínua do
movimento sufragista, que emergiu, no Brasil em 1919 e culminou com a conquista
do direito ao voto pelas mulheres. (FERREIRA 2004, p.1)
46
Não é de se estranhar que o ingresso de mulheres nas polícias militares
brasileiras tenha ocorrido com um lapso temporal de mais de 40 anos em relação à
Europa.
Ainda segundo Capelle (2006), a primeira polícia feminina uniformizada
brasileira foi criada no Estado de São Paulo, em 1955, por meio do Decreto nº
24.548, o que foi posteriormente seguido por outros estados brasileiros: No Paraná
em 1977, no Amazonas em 1980, em Minas Gerais em 1981. (CAPELLE, 2006,
p.165)
De acordo com Musumeci e Soares (2004), a inserção das mulheres nas
polícias civis se deu na década de 1980, como resultado de reivindicações do
movimento feminista a fim de minimizar a violência contra a mulher, com a criação
das Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAM). Já a inserção de
efetivo feminino nas polícias militares estaduais também ocorrida ao longo da
década de 1980 se deu, por um propósito interno de “humanizar” a imagem dessas
corporações, fortemente marcadas pelo seu envolvimento anterior com a ditadura
militar. (MUSUMECI E SOARES, 2004, p. 2)
Segundo Schactae (2009) a mudança nas relações de gênero dentro dos
quartéis só foi possível após a publicação, em janeiro de 1976, do texto que dizia
respeito à Organização das Policias Militares e dos Corpos de Bombeiros Militares,
onde se indicou a necessidade de policiais militares femininas. Essas mudanças
estão relacionadas às tensões sociais, políticas e culturais da década de 1970, pois
naquela década, a ONU passou a adotar políticas de defesa dos direitos das
mulheres e instituiu a década da mulher (1975-1985). (SCHACTAE 2009, p. 14)
Ainda de acordo com a autora, a partir da intervenção da ONU nas políticas
de gênero, o governo Geisel foi influenciado a dar início a ações governamentais,
“visando à erradicação da desigualdade com base em gênero, e permitiu que as
mulheres brasileiras organizassem encontros, conferências e passeatas em
comemoração ao Dia Internacional da Mulher.” Esse período também foi marcado
pelo movimento feminista, que influenciou ações políticas e transformações
comportamentais, atuando contra o regime autoritário e a favor das questões sociais
e políticas que influenciavam a organização social das mulheres.(Ibiden)
Segundo R.F.A., ex Comandante Geral da PMDF e um dos oficiais que
conduziram o processo de inserção das mulheres, em entrevista concedida à autora,
vigorava naquela época um movimento chamado “Whoman’s Liberation” que era um
47
movimento pela liberdade da mulher no mundo todo que já discutia a presença da
mulher na vida social quer nas grandes empresas, quer no governo, ou nos órgãos
públicos.
De acordo com Calazans (2003), com a entrada de mulheres nas polícias,
contextualizou-se a iniciativa de uma maior aproximação com a comunidade e
coincidia, sobretudo, com um momento de crise da própria instituição policial que,
por sua vez, refletia uma crise mais ampla do próprio modo de organização do
trabalho nas sociedades contemporâneas. (CALAZANS, 2003, p.66)
Ainda segundo Calazans (2003), apud Zamakona, (2000) a progressiva
incorporação da mulher nas Polícias e as modernizações das organizações policiais
são fenômenos emparelhados, pois o trabalho policial, que era visto
necessariamente como uma atividade masculina, apresenta uma estrutura que
estava sofrendo mudanças, onde entraram em crise os valores característicos da
organização, como a força física e a identificação tradicional com a figura masculina
e a busca de novos arranjos organizacionais. Assim, passou-se a buscar outros
valores mais de acordo com a realidade atual, como a inteligência, a capacidade de
resolução de conflitos, a inovação e o trabalho em equipe. Afrontam-se novas
situações em que não é tão necessária a força física, tais como reduzir situações
potencialmente violentas e conflituosas, atender a grupos que exigem tratamento
diferenciado e demandas não-criminais. Observa-se que a inserção feminina nas
polícias do Brasil dá-se na atividade operacional, mas, sobretudo em tarefas
burocráticas, ou em atividades que envolviam exclusivamente personagens do
mundo “doméstico”, como crianças, idosos e mulheres. (idem)
Segundo Neves (2008) apud Musumeci e Soares (2005), as Corporações
Policiais Militares, Forças Auxiliares e Reservas do Exército Brasileiro (E.B.)
desempenham sua atividade constitucional – Segurança Pública - organizadas com
base na hierarquia e disciplina, seguindo a orientação do E.B.. Este, por sua vez,
regulamentou por meio da Portaria 027, de 16/06/1977 da Inspetoria Geral das
Policiais Militares (IGPM) a admissão de mulheres nos quadros de carreira das
polícias militares brasileiras. Em 1984, o texto do Decreto-lei Federal 667, de
2/07/1969, que regula a Organização das Polícias Militares Estaduais foi modificado
pelo decreto 2.106/1984, que autorizava a inclusão de efetivo feminino nas polícias
militares, se consolidando definitivamente como base legal para a incorporação de
policiais militares femininas nos quadros regulares das PMs. (NEVES, 2008, p.37)
48
Sobre a referida portaria, Schactae (2006) destaca que o documento trazia em
seu texto elementos da diferença entre o espaço masculino e feminino nas polícias
militares. Segundo a autora, o texto trazia a informação de que nas atividades
normais de policiamento verificavam-se acentuadas dificuldades para a efetiva ação
no trato com menores delinqüentes ou abandonados e com mulheres envolvidas em
ilícitos penais. A portaria autorizava, após a adoção de instrumentos legais, a criação
de organizações de polícia feminina com determinados graus hierárquicos,
assemelhados ao da hierarquia militar. Segundo a autora, houve uma preocupação
de se criar outra organização, subordinada à organização já existente, sendo que os
graus hierárquicos seriam assemelhados mais não iguais, já que a igualdade
resultaria em transmissão do poder simbólico da instituição para as mulheres, dessa
forma ocorreria uma perda do domínio masculino sobre a instituição. (SCHACTAE,
2006, p.2)
Segundo Musumeci e Soares (2005), tal documento tem grande relevância no
contexto da inclusão feminina nas PMs em todo o Brasil, pois foi a partir de sua
publicação que as polícias passaram a providenciar “a adoção de instrumentos
legais” para a efetiva inserção, sendo que os regulamentos e portarias de criação em
vários estados o copiaram e, por esse motivo, o modelo de policiamento feminino no
Brasil em geral não difere, principalmente no tocante às missões destinadas ao
efetivo feminino. (MUSUMECI E SOARES, 2005, p.28)
3.3.1 POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO
Segundo Musumeci e Soares (2005), iniciou-se em 1955 uma experiência de
incorporação de 13 (treze) mulheres à Guarda Civil, tendo sido criado, assim, o
primeiro Corpo de Policiamento Especial Feminino, primeira polícia uniformizada
feminina no Brasil. O argumento era de que a formação psicológica feminina traria
vantagens para a atuação policial junto às mulheres, idosos e menores delinqüentes
ou abandonados. (MUSUMECI E SOARES, 2005, p.27-28)
Ainda de acordo com as autoras, em 1959, ainda como parte integrante da
guarda civil, o Corpo de Policiamento Especial Feminino foi denominado como
Polícia Feminina, subordinada à Secretaria de Segurança Pública, passando a
chamar-se Superintendência de Polícia Feminina em 1969. Em 1970 a Força Pública
de São Paulo se fundiu com a Guarda Civil, originando a Polícia Militar do Estado de
49
São Paulo (PMESP) que transformou a Superintendência em Quadro Especial
Feminino, rebatizado em 1975 como 1º Batalhão de Policiamento Feminino. (idem)
Portanto, a Polícia Militar do Estado de São Paulo foi pioneira na entrada de
mulheres no policiamento porque “herdou” o corpo feminino da extinta Guarda Civil,
mas a inserção somente foi autorizada a partir de 1977, com a publicação da
Portaria do Estado Maior do Exército conforme especificado no sub-ítem anterior.
Entretanto, por sua precedência histórica, a PMESP foi utilizada como modelo
para a implantação nos demais estados, como se verá adiante.
3.3.2 POLÍCIA MILITAR DO PARANÁ
Segundo Schactae (2004), o Paraná foi o segundo Estado do país a permitir o
ingresso de mulheres na Polícia Militar, uma instituição com mais de um século de
existência, que tradicionalmente era um espaço de homens, permitiu o ingresso de
mulheres em 1977. (SCHACTAE, 2004, p.2)
De acordo com a autora, apud Oliveira (2004), “o Estado é uma construção
masculina, bem como as instituições militares, que são uma materialização do poder
e da violência do Estado”. Em um momento em que o Brasil era governado por
militares e o Estado e as instituições militares se confundiam, o ingresso de
mulheres na Polícia Militar, a qual estava subordinada ao Exército, era uma
realidade que entrava em conflito com a representação de polícia e de militar. (idem)
Moreira e Stadnik (2008), ao analisar a inserção das policiais militares
paranaenses indicam que “a legislação produzida entre 1975-1979 justifica
simbolicamente a inserção de mulheres na Corporação policial militar através do
discurso da “natureza feminina”, do “ser para o outro”, (...), constituintes da vocação
ao cuidado com o outro...” (MOREIRA e STADINIK,2008, p.4)
Ao analisarem a diretriz Nº 048/77, criada dois meses após o início da
primeira turma feminina, para normatizar as atividades das recém admitidas policiais
militares, as autoras demonstram que as missões destinadas àquelas profissionais
de segurança pública eram o policiamento de trânsito em estabelecimentos
escolares e policiamento ostensivo em ações relacionadas à mulher, menores e
anciãos. (idem)
Continuam as autoras, na demonstração da vocação básica das policiais
militares femininas, in verbis:
50
Tais características, monopolizadas no discurso pelo sexo feminino que, devido à sua natureza, fortaleceriam a imagem da Polícia Militar. A aptidão de cuidar e proteger com gentileza, sutileza, carinho e afeto são vistas como parte da atividade policial militar em meio ao contingente viril, representativo de uma força bruta. (ibiden, p. 5)
Concluem as autoras que as mulheres vieram “sanar lacunas” e não competir
com os homens. Essa frase, presente na legislação reguladora e no discurso dos
policiais masculinos e femininos entrevistados por elas, além dos jornais da época,
significam que a inclusão das mulheres foi utilizada como base para a reformulação
da Polícia Militar do Paraná, tornando-a mais humana com função menos repressiva
e mais preventiva (ibidem)
Como já foi frisado e será destacado adiante novamente, a maioria das
polícias adotou esse modelo para a atuação das policiais militares femininas.
3.3.3 POLÍCIA MILITAR DO AMAZONAS
Segundo matéria publicada no jornal “A Crítica” de Manaus, em 28 de Janeiro
de 1980, a Polícia Militar do Amazonas (PMAM) abriu naquela data as inscrições
para o concurso de seleção da Polícia Feminina, tornando-se a terceira instituição no
Brasil a congregar as mulheres em seu efetivo. Entre os pré-requisitos para o
concurso estavam ter altura mínima de 1,60 m, possuir segundo grau completo e ter
vocação policial militar.
De acordo com Mendonça (2010), Coronel RR da PMAM, a criação da Polícia
Feminina se deveu em parte à senhora Amine Lindoso, esposa do ex governador
José Lindoso (1979-1982). Ao final do primeiro ano de governo, em viagem ao
estado de São Paulo, o casal foi recepcionado pela casa militar naquele estado e a
primeira dama amazonense foi acompanhada por policiais femininas, que cuidaram
de sua segurança. (MENDONÇA, 2010, p.1)
Ao retornar a Manaus, o Governador a pedido da esposa determinou os
estudos necessários à criação de corporação similar no Amazonas. O Comandante
Geral da PMAM era o coronel Wilson Ribeiro Raizer, o qual, evangélico convicto,
pelo cuidado na admissão das primeiras mulheres, cuidou pessoalmente da
formação das policiais, escolhendo os comandantes entre os melhores oficiais da
época.(idem)
Segundo outra matéria publicada no jornal “A Crítica” de Manaus, em 14 de
dezembro de 1980, o curso teve encerramento, com 32 sargentos femininos. Em
51
retribuição à PMESP, presidiu à solenidade de encerramento a Coronel Janete
Ribeiro Fiuza, comandante do 1º Batalhão de Policia Feminina da PMESP à época.
De acordo com o tablóide, as policiais seriam empregadas em logradouros
públicos como o aeroporto internacional, estação rodoviária, centro de triagem de
menores e maternidades, entre outros.
No ano seguinte, segundo Mendonça (2010), a PMAM enviou a São Paulo as
duas primeiras colocadas para realizarem o Curso de Formação de Oficiais. O
Pelotão P. Fem, assim denominado, atuou até 1986, quando foi alçado ao nível de
Companhia, constituindo um quadro separado. Três anos após, entretanto, o
comando da PMAM, entendendo que as mulheres deveriam possuir os mesmos
direitos e obrigações do efetivo masculino, decidiu incorporá-las em um quadro
único. (MENDONÇA, 2010, p.1)
3.3.4 POLÍCIA MILITAR DE MINAS GERAIS
Segundo Capelle e Melo (2010) a Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG)
também foi uma das pioneiras a permitir o Ingresso de mulheres destacando que
isso fez parte do esforço no processo de reestruturação da PM.
Segundo as autoras, em 1981, foi criada a Companhia de Polícia Feminina de
Minas Gerais, para a qual foram recrutadas moças de idade entre 18 e 25 anos, com
formação secundária, altura acima de 1,56 m e solteiras que se formariam na
posição de terceiro-sargento. (CAPELLE e MELO, 2010, p. 3 e 5)
As autoras afirmam apud Pereira (1981) que a Companhia de Polícia
Feminina tornou-se responsável pelo policiamento ostensivo feminino da capital,
suprindo limitações do policiamento ostensivo masculino e com um caráter
estratégico de transformar a percepção que a população tinha acerca da PMMG,
portanto a humanização é uma justificativa na PMMG para o ingresso de mulheres
em seus quadros operacionais. (idem apud PEREIRA, 1981).
Segundo Lima (2002), que foi integrante da primeira turma de policiais
femininas naquele estado, elas foram vistas como indesejáveis naquela Corporação
no momento de sua inserção, in verbis:
”Evas” da Polícia Militar, nossa Companhia foi criada a partir de vagas retiradas do quadro de sargentos. Mas a dor na costela repercutiu em todos os postos e graduações. De repente a nossa briosa PM, impoluta entre as demais polícias estaduais, masculina há quase dois séculos, mulheres!...por que, Deus meu?
52
Nossa alegria e entusiasmo não permitiram que percebêssemos que éramos um estorvo para a Polícia Militar... (LIMA, 2002, p. 8)
Ainda segundo a autora, a importação de modelo, foi um erro estratégico da
PMMG, in verbis:
Uma das falhas estratégicas da Polícia Militar Mineira foi basear-se na experiência do Corpo Policial paulista para subsidiar a implantação de sua polícia feminina, haja visto que, até recentemente, a de São Paulo vivia um apartheid em relação aos policiais masculinos. Durante anos a Polícia Militar paulista exportou, para as demais polícias, a teoria de que o policiamento feminino se constituía em uma especialização. Acreditava que as mulheres estavam aptas a atuar principalmente junto aos idosos, às mulheres e aos jovens, se possível de baixa periculosidade. E deveriam manter-se afastadas dos policiais masculinos, para garantir a unidade de doutrina (pois tratava-se de uma especialização) em batalhões centralizados. Sob este enfoque as policiais paulistas eram uma espécie de assistentes sociais fardadas, que até teriam tido mais êxito se as teorias de policiamento comunitário japonesas e canadenses já tivessem sido importadas pela polícia paulista. (LIMA, 2002, p. 16-17)
É necessário salientar que embora a autora seja oficial superior da PMMG,
conforme ela própria esclarece: “Este livro não reflete o pensamento oficial da
PMMG nem tampouco de seus integrantes. É um relato da vida, do processo de
socialização e do dia-a-dia na caserna sob a perspectiva da autora.” (idem, p. VII)
Sobre o fato de, em 1991, ter sido extinta a Cia P. Fem e seu efetivo ter sido
incorporado às unidades operacionais, após o fenômeno da descentralização do
efetivo para atender às demandas das diversas unidades da corporação, a autora
transcreve trecho de parecer que fundamentou o fato, o qual é aqui citado, por
possuir a lógica, que por sinal também levou a outras polícias como a do Amazonas
e a própria PMDF a “desespecializar” o policiamento feminino:
[...] A existência da Cia P Fem com autonomia é inconveniente em diversos aspectos: a) inviabiliza a formação da policial militar feminino em conjunto com o masculino, diminuindo-lhe a possibilidade de assimilação de doutrinas e características da Unidade que serve; b) demanda gasto com estrutura física e humana para um efetivo reduzido; c) dificulta o empenho operacional da policial militar feminino, principalmente em conjunto com masculino, o que, conforme comprovamos, é inconveniente; [...] (LIMA, 2002, p. 31)
Sobre isso, a grande dificuldade de aceitação do policiamento feminino pela
tropa naquele estado, conforme citado pela autora, entre outros, foi o fato de que as
120 vagas utilizadas para criação da Cia P Fem foram remanejadas do quadro de
Sargentos, além disso as policiais militares femininas freqüentavam durante o curso
de formação na Academia de Polícia Militar, um alojamento melhor inclusive do que
53
o dos cadetes e, ainda por cima, foram associadas ao clube de oficiais e não ao de
sargentos, o que seria natural. Com tanto afastamento da tropa masculina, não é de
se estranhar que ela as rejeitasse (ibidem).
Concluindo esse tema, a autora cita ainda outro motivo da dificuldade de
integração, o desnível intelectual:
A despeito de termos saído na vanguarda brasileira na formação conjunta de policiais femininos e masculinos, perdemos tempo, dinheiro e neurônios discutindo se devíamos juntar ou não. Mas o que verdadeiramente perdemos foi a oportunidade de termos, já naquela ocasião, elevado o nível da qualificação para toda a instituição, exigindo, no mínimo, que os sargentos masculinos tivessem também o segundo grau. (LIMA, 2002, p. 17)
Contudo, a autora demonstra ao longo de seu livro que a PMMG superou as
dificuldades iniciais e integrou totalmente as policiais militares femininas ao seu
efetivo, inclusive tendo unificado os quadros por opção delas próprias.
3.3.5 POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
A Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro (PMERJ) foi outra instituição
pioneira na inserção de mulheres em suas fileiras, segundo Musumeci e Soares
(2005). Criada pela Lei Estadual Nº 746 de 11/11/1981 sob o Governo Chagas
Freitas, a Companhia de Polícia Militar Feminina iniciou a formação da primeira
turma de 150 soldados em março de 1982. No ano seguinte, foram abertas 14 vagas
para cadetes que cursaram o CFO por 03 anos na então Escola de Formação de
Oficiais. (MUSUMECI E SOARES, 2005, p.29/30)
A Companhia possuía efetivo fixado em 200 policiais e admitia policiais
masculinos que permaneceriam no comando até que se formassem oficiais
femininas. A estrutura hierárquica da companhia ia até capitão e é muito semelhante
ao modelo adotado posteriormente no Distrito Federal.(idem)
O quadro 4 traz a síntese das datas de inclusão de policiais militares
femininas em 20 Unidades da Federação (UF), tendo sido apresentadas
detalhadamente aqui somente as 05 primeiras, de forma ilustrativa, até porquê os
modelos adotados na maioria das UF não diferem muito.
54
Quadro 4 – Ingresso, unificação de quadros e limites à participação feminina nas PMs brasileiras Fonte: Musumeci e Soares (2004)
Conforme citado pelas autoras, este quadro foi produzido a partir de dados
enviados pelas próprias Corporações. Verifica-se que certas datas não conferem
com registros históricos, como a inclusão na PMAM que se deu em 1980 e não em
1982, no entanto o quadro traz outras informações úteis tais como a situação de
unificação de quadros e limitação percentual de efetivo. (ibidem)
Observa-se que das 27 UFs existentes, PMs de apenas 20 UFs enviaram os
dados solicitados na pesquisa das autoras. Dentre essas, 40 % restringem o efetivo
das policiais femininas e em 15% os quadros sequer são unificados.
Em 75% das UFs que enviaram os dados, a inclusão de mulheres ocorreu na
década de 1980 e 5% se deu na década de 1970 (PMPR). Em apenas 15% das UFs
a inclusão se deu nas décadas de 1990 e 2000 e em 5% esse fato se deu na década
de 1950 (PMESP).
Como ressaltaram as autoras, a média de efetivo feminino nas polícias de 52
países (Quadro 3) é de 10,4% enquanto no Brasil essa média é de 8,2%. Portanto,
55
restrita por lei ou não, a participação feminina nas polícias brasileiras ainda é
pequena.
3.4 HISTÓRICO DA INSERÇÃO DA MULHER NA PMDF
3.4.1 O INÍCIO DE TUDO
Segundo Brito (2008), a inserção da mulher na PMDF ocorreu em 1983, com
a criação da Companhia de Policia Militar Feminina (Cia PM Fem) depois de seis
anos da autorização concedida pelo Ministério do Exército, por meio da portaria
citada no item anterior. (BRITO, 2008, P. 59 e 131)
Segundo R. F. A., que à época era sub-comandante da Cia PM Fem,
entrevistado pela autora, vigia no Brasil naquela época o chamado “Governo
Autoritário”, que já tinha dado sinais claros para a sociedade de que haveria uma
abertura, ainda no Governo Geisel, que começou esse processo. Quando assumiu o
Governo Figueiredo, ele confirmou esse processo e houve um intenso movimento
social chamado de “diretas já”. Isso foi um sinal muito claro de que se sucederia aos
governos autoritários nos próximos anos um governo democrático. A cúpula da
PMDF na época percebeu isso com muita clareza, que a Polícia Militar teria em um
tempo muito breve que se desvincular de uma polícia denominada “de Estado” para
uma polícia de segurança pública, imbricada com os desejos, necessidades e
demandas da sociedade. O primeiro passo para essa mudança de paradigma foi
inserção de mulheres na PMDF.
Segundo o entrevistado, foi trazida da Polícia Militar de São Paulo (PMESP),
uma oficial (2º Tenente), chamada Maria Bernadete Melo Silva, que auxiliou no
processo de seleção e formação da primeira turma de policiais militares femininas. A
oficial conduziu o processo com muito rigor e disciplina, a exemplo do que era feito
em seu estado de origem. Muitas regras, as quais foram impostas eram muito antigas
e já estavam até ultrapassadas naquela época na PMESP, mas existiam e faziam
parte da metodologia adotada pela oficial.
O entrevistado afirma que tais regras causaram impacto até para os policiais
masculinos, por exemplo, as policiais militares femininas tinham uma posição de
descansar (na Ordem Unida Militar) diferente da masculina4. A posição de descansar
tradicional era com as pernas abertas na largura dos ombros e as mãos para trás,
4 Ver foto no Anexo C
56
mas a feminina era com uma perna à frente da outra, pois não “ficava bem” para
uma mulher parar com as pernas abertas, segundo a oficial paulista.
Além disso, havia um cabedal de regras de etiqueta social, penteados,
maquiagens, cor de esmalte para cada semana entre outras que obrigaram a PMDF
a contratar uma esteticista, uma cabeleireira e uma manicure para ensinar as
policiais militares a cuidarem da parte estética.
Isso se deu, de acordo com o entrevistado, devido ao fato de que a inserção
das mulheres na PMDF foi tratada como um marco, inclusive pela mídia e as
policiais femininas eram muito requisitadas para participarem de eventos diversos,
então tiveram que criar um padrão e adaptar a grade curricular do primeiro curso a
fim de inserir tais instruções.
Muitas policiais incorporadas jamais tinham se maquiado ou pintado as unhas
e não estavam acostumadas a lidar com esses detalhes estéticos.
A grande preocupação com a estética, referida pelo entrevistado, revela a
importância da apresentação pessoal, e reforça a teoria do marketing corporativo
apontado por Brito (2008). (BRITO, 2008, p.15)
Figura 1 –Policiamento feminino (1983) acompanhado pelos primeiros comandantes (Estação Rodoviária de Brasília) Fonte: Acervo do Museu da PMDF
A figura 1 mostra o 1º Comandante da CIA PM Fem e 1º sub-comandante,
supervisionando o policiamento feminino na Capital Federal em 1983.
57
Segundo V. N. O. A., Coronel da PMDF e integrante da primeira turma de
policiais femininas de 1983, entrevistada pela autora, durante a formação as policiais
femininas eram proibidas de terem contato com os policiais masculinos, viviam,
segundo a entrevistada, em uma redoma dentro da Cia PM Fem.
Uma das exigências que mais chamou a atenção no edital de ingresso da
primeira turma era a de ser solteira sem dependentes, além de que tinha que ter o
peso compatível com a altura, ou seja, ser magra.
Conforme a entrevistada, o trabalho, após a formação era realizado em
grandes centros comerciais, como o Conjunto Nacional, a Estação Rodoviária, o
Aeroporto e alguns shoppings que existiam na cidade. E, posteriormente, o efetivo
passou a ter 02(duas) viaturas, nas quais trabalhavam em guarnições compostas por
três mulheres.
Isso indica, a exemplo do que foi citado por Lima (2002) em relação à PMMG
que a PMDF também adotou o modelo da PMESP, que as policiais femininas eram
empregadas inicialmente como uma espécie de assistente social fardada ou “cartões
de visita” em locais de grande fluxo de pessoas, para apoio a menores, mulheres e
idosos.
Figura 2 – Tenente Bernadete (PMESP) junto ao policiamento feminino no DF em 1983 (Shopping Conjunto Nacional) Fonte: Acervo do Museu da PMDF
A figura 2 mostra a então Tenente Bernadete, supervisionando o primeiro
policiamento feminino na Capital Federal em 1983.
58
Esse modelo, herdado da PMESP foi observado em várias polícias militares
no Brasil. Ele é fruto da teoria que explica o emprego das mulheres em áreas onde
pode utilizar suas habilidades “naturais”, como cuidar e proteger, atributos ligados à
maternidade. Na verdade, esse era o discurso por trás das relações de poder.
No Manual Básico de Policiamento (1990), a PMDF classifica o policiamento
feminino como um tipo de policiamento especializado, onde as principais funções
eram o auxílio às senhoras, velhos e enfermos, atendimento às pessoas extraviadas
e migrantes, menores e portadores de enfermidades contagiosas ou no combate à
mendicância e ao meretrício. (PMDF, 1990, p. 228)
A figura 3 mostra o trabalho de uma guarnição de policiamento feminino em
um shopping da cidade realizando identificação infantil, que é comum nos períodos
pré carnavalescos.
Figura 3 – Policiamento Feminino / Identificação Infantil em 1983 (Conjunto Nacional) Fonte: Acervo do Museu da PMDF
A entrevistada, na época ainda praça, citou que era escalada como
comandante de uma dessas guarnições. Havia algumas dificuldades e até
brincadeiras na época que a primeira viatura trabalhou na escala 12X36h à noite,
pois por volta de meia-noite retornava para a base, que era na Cia PM Fem e o
efetivo masculino chamava as policiais femininas de “Cinderelas”, porque à meia-
noite desencantavam. O efetivo feminino não queria isso, mas queria essa proteção.
Começou-se assim nesse momento, a lidar com o efetivo masculino.
59
Segundo a entrevistada, talvez pela forma como o efetivo feminino foi tratado
durante o curso, dentro da redoma, alguns policiais masculinos sofreram repressões
por tentar ter contato com policiais femininas. Havia até exigência de que nem o
namorado ou noivo, poderia buscar a namorada policial militar na frente da Cia PM
Fem de carro ou a pé. Então, houve esses dois lados: O lado paternalista, protetor e
o outro de rejeitar inicialmente as policiais femininas pela forma como foram tratadas
no início, durante o curso.
Essas arestas foram aparadas com o decorrer do tempo, segundo a
entrevistada.
A figura 4 mostra a composição típica de uma guarnição de policiamento
feminino citada pela entrevistada.
Figura 4 – Viatura com guarnição feminina no DF em 1983 (Conjunto Nacional) Fonte: Acervo do Museu da PMDF5
3.4.2 AS PRIMEIRAS OFICIAIS
De acordo com a entrevistada, em 1984 houve o primeiro Curso de Formação
de Cabos (CFC) e posteriormente o primeiro Curso de Formação de Sargentos
(CFS) para a Cia Pm Fem e em 1986 foram selecionadas duas sargentos femininas
e uma cabo para freqüentar o Curso de Formação de Oficiais (CFO) na Academia de
5 Ver mais fotos do acervo no apêndice C
60
Polícia Militar de Minas Gerais, uma vez que naquela época ainda não havia
academia de polícia militar em Brasília. Entre as três policiais selecionadas estava a
entrevistada.
As três cadetes freqüentaram o CFO na polícia mineira, uma das mais
austeras instituições de ensino policial militar do Brasil. Lá freqüentaram o mesmo
curso com cadetes masculinos.
Segundo Lima (2002), que também é oficial da PMMG, da primeira turma
feminina naquele estado (1980), e também da primeira turma de oficiais femininas
(1985), quando foram selecionadas em 1983 havia previsão de uma turma
totalmente feminina, porém por falta de quorum, acabou se fundindo à turma
masculina ainda no início do primeiro ano. (LIMA, 2002, p. 34)
Após a sólida formação obtida na PMMG, em 1988 a PMDF recebeu suas
primeiras oficiais, Aspirantes a Oficial Vanuza, Solange e Soraia.
3.4.3 PRIMEIRA TURMA DE FORMAÇÃO MISTA
Em 1990, houve a primeira turma de formação mista. Naquele ano houve três
turmas de formação de soldado na PMDF, uma somente feminina na Cia PM Fem e
as outras duas mistas.
Esse foi um importante passo na direção da total integração das policiais
femininas na PMDF.
A formação centralizada, “na redoma” da Cia PM Fem não contribuía para a
integração uma vez que não propiciava a assimilação de conteúdos comuns e
experiências integradoras, fazendo com que as policiais femininas formassem uma
casta à parte dentro da PMDF, principalmente por causa das medidas de proteção
adotadas pelos oficiais no início, quando os policiais militares masculinos e
femininos eram praticamente proibidos de se relacionarem.
Com o advento da formação mista, as policiais formadas a partir de então
serviram em outras UPM que não a Cia PM Fem, durante e após a formação.
Essa tentativa de proteção e separação não se sustentaria, como veremos no
próximo item, neste capítulo, onde foi verificado na pesquisa quantitativa referente
ao presente estudo, que 49,3 % das policiais militares entrevistadas (n=200) têm
cônjuges policiais militares.
61
Fenômeno semelhante foi relatado por Calazans (2005), onde foi constatado
que na Brigada Militar do Rio Grande do Sul (BMRS), “...a união afetiva de policiais
teve impacto sobre as leis, rotinas e regras da instituição, mas também leva a marca
institucional para resolução de situações.” (CALAZANS, 2005, p.9)
3.4.4 A EXTINÇÃO DA CIA PM FEM E A UNIFICAÇÃO DOS QUADROS
De acordo com a entrevistada V.N.O.A., ao retornar do CFO, ela e as outras
primeiras oficiais femininas da Corporação, com suas experiências e conhecimentos
adquiridos no curso, redigiram um requerimento solicitando a unificação dos
quadros. Achavam que com o requerimento e tendo concluído o CFO poderiam
unificar, dessa forma, os quadros masculinos e femininos e foram até ameaçadas de
serem detidas, por que esse tipo de requerimento não poderia ser feito. O que
queriam era entrar na última turma de oficiais masculinos da época (como é
aspirante de 1988), turma de 1988. Mas, com receio da pressão que sofreram na
época, desistiram do requerimento.
Conforme afirmou a entrevistada, alguns oficiais que haviam sido
comandantes de Cia PM Fem, montaram um processo bem elaborado, através de
um projeto de lei pra que houvesse a unificação dos quadros, já nos meados de
1990, mas o projeto ficou parado no Congresso. A entrevistada trabalhou
pessoalmente junto a esse processo e percebeu que existiam duas correntes: os
oficiais masculinos realmente não queriam e eles tinham seus motivos para não
quererem as oficiais femininas no seu quadro e algumas das próprias oficiais
femininas também não queriam que houvesse a unificação desses quadros. Essa
luta pela unificação durou quase uma década.
Segundo Brito (2008) em 1996 houve a extinção da Cia PM Fem, por meio da
Portaria PMDF nº 117, de 01/11/96, e as policiais militares femininas foram
distribuídas em todas a Unidades da PMDF. (BRITO, 2008, P 131).
Cabe ressaltar que embora a Cia PM Fem somente tenha sido extinta em
1996, desde 1990 com o advento da primeira turma de formação mista, as policiais
militares femininas já passaram a freqüentar as outras diversas UPMs da PMDF.
Em 1998 houve a unificação dos quadros feminino e masculino que, até
então, eram distintos, por meio da Lei Federal Nº 9.713 de 1998, regulamentada
Portaria PMDF nº 209, de 15/12/98. Esse fato veio a reparar uma diferenciação que
62
causava atraso na ascenção funcional feminina, uma vez que o quadro de oficiais e
praças policiais militares femininos possuía vagas limitadas e, portanto, os policiais
masculinos eram promovidos antes das policiais femininas em uma mesma turma.
Essa distinção de gênero provocava discriminação, por exemplo entre as oficiais
policiais militares que não podiam ser promovidas aos postos do oficialato superior
(major, tenente coronel e coronel), visto que o quadro de Oficiais Policiais Militares
Femininas (QOPMF) somente tinha sido previsto até o posto de capitão. Com a sua
extinção, naquele ano, as policiais militares femininas puderam concorrer em
igualdade de condições em todas as promoções.
Segundo Neto (1999), duas oficiais receberam homenagens na Academia de
Polícia Militar de Brasília (APMB) em abril daquele ano por terem ascendido ao
posto de major. Segundo o autor, as Majores Vanuza e Solange foram as primeiras
oficiais superiores femininas na PMDF, graças à publicação da lei em 25 de
novembro de 1998, que permitiu a promoção das mulheres aos postos do oficialato
superior. Ainda no mesmo artigo, o autor traz a opinião do Coronel João Coelho
Vítola, comandante da APMB na época: “Elas são tão capazes quanto os homens e
têm esse direito porque são competentes”. (NETO, 1999, p.1)
3.4.5 CONQUISTAS
Ao longo do tempo as mulheres foram gradualmente conquistando seus
espaços dentro da Corporação.
Já em 1988, houve o primeiro curso de motociclista feminino, conforme ilustra
a figura 4. Vê-se que as policiais militares femininas já buscavam as atividades
especializadas, embora no início o próprio policiamento feminino fosse, em tese, um
policiamento especializado.
Conforme se pode verificar no Boletim Interno (BI) da Cia PM Fem 045, de 09
de março de 1988, houve indicação de três policiais femininas para frequentarem o
Estágio de Operações Especiais da PMDF, com duração de 50 dias, na então Cia de
Polícia de Choque, tendo concluído o mesmo a então 3º SGT PM Fem Graças e a
então Sd PM Fem Célia.
63
Figura 5 – Primeiro curso de Motociclista feminino em 1988 Fonte: Acervo do Museu da PMDF
Posteriormente, em outubro de 1999, a então Tenente Cintyane completou em
1º lugar o Curso de Operações Especiais da PMDF. Essas três policiais militares
fizeram história na PMDF por serem as únicas a terem realizado tal façanha.
Em 2004, a então Tenente Cleide tornava-se a primeira policial militar piloto
do sexo feminino da PMDF, sendo promovida em 2010 a comandante de aeronave
policial. Até hoje é a única piloto feminino da PMDF.
Também em 2004 a Sd Carla Junker tornou-se a primeira tripulante
operacional do sexo feminino a realizar o curso e operar no Grupamento de
Operações Aéreas (GOA/PMDF).
Todos esses fatos apenas resumem as incontáveis conquistas dessas bravas
guerreiras que escreveram indelevelmente seus nomes na história da Polícia Militar
do Distrito Federal.
3.5 PERFIL DAS POLICIAIS MILITARES FEMININAS DA PMDF
Para traçar o perfil, foi aplicado um questionário com 30 questões a 200
policiais militares femininas de todos os postos e graduações, englobando todas as
atividades policiais militares e pertencentes a 53 (cinqüenta e três) Unidades
Policiais Militares (UPM), obtendo-se uma boa estratificação amostral, conforme se
pode ver nos gráficos 1 e 2.
64
A estratificação da amostra é importante porque elimina ou minimiza a
possibilidade das opiniões apresentadas representarem uma opinião parcial de um
grupo isolado dentro do conjunto estudado. Isso ocorreria, por exemplo se fossem
entrevistadas apenas oficiais, ou de apenas uma unidade ou atividade.
O perfil da amostra foi analisado segundo a unidade, posto ou graduação,
idade e tempo de serviço.
Em relação às UPMs, a dispersão por tipo de unidade apresentou 43% das
respondentes em UPMs administrativas, 25% em UPMs operacionais, 16% em
UPMs de Ensino, 10% na área de Saúde e 6% em UPMs especializadas,
representando uma boa dispersão da amostra.
Qual é sua Unidade?
3
12 2
9
2
4
2 23
1 1 1
54
2 21 1
3 3
1
9
12
13
1
5
3
12
5
1 1 12
1 1 1
11
1
10
15
5
1 1
6 6
2
22
10
1 1
0
5
10
15
20
25
1º BP
ES
C1º B
PM
1º BP
TR
AN
11º BP
M12º B
PM
13º BP
M14º B
PM
16º BP
M17º B
PM
19º BP
M2º B
PM
20º BP
M24º B
PM
26º BP
M27º B
PM
28º BP
M3º B
PM
4º BP
M6º B
PM
7º BP
M8º B
PM
9º BP
MA
PM
BA
SP
AR
BO
PE
C. M
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C.O
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CD
IPC
DIT
EL
DLF
DO
PD
SE
ME
SF
PQ
CG
RO
TA
NR
PM
ON
Unidade Policial Militar
Qu
anti
dad
e
Gráfico 1 – Unidades Policiais Militares (UPM) das respondentes Fonte: Apêndice A
O tipo de UPM, no entanto, não encerra o tipo de atividade, como veremos,
pois há policiais em UPMs operacionais em funções administrativas e vice-versa.
Em relação aos postos e graduações, ao comparar os resultados obtidos
(Gráfico 2) com a quantidade existente em cada posição (Tabela 1), verifica-se que
as percentagens de policiais consultadas confirmam a representatividade e a
estratificação da amostra.
65
Qual é o seu Posto ou Graduação?
Cel0,5%
TC2,5%
Maj3,0% Cap
8,5%
Ten.6,0%
Asp0,5%
Cad1,0%
St4,5%
Sgt24,0%
Cb17,0%
Sd21,5%
Sd 2ª Clas11,0%
Cel
TC
Maj
Cap
Ten.
Asp
Cad
St
Sgt
Cb
Sd
Sd 2ª Clas
Gráfico 2 – Postos e Graduações das respondentes Fonte: Apêndice A
Posto/Gr. Cel TC Maj Cap Ten. Asp Cad St Sgt Cb Sd 2ªCl. Total
Existente 1 9 25 58 23 1 4 50 306 192 216 125 1010
Consult. 1 5 6 17 12 1 2 9 48 34 43 22 200
% 100 55,6 24 29,3 52,2 100 50 18 15,7 17,7 19,9 17,6 19,8
Tabela 1 – Respondentes por posto e graduação em relação ao efetivo existente em maio/2011 Fonte – Base de dados do Sistema GEPES/PMDF
Conforme consulta realizada no sistema de Gestão de Pessoal da PMDF
(GEPES), o efetivo feminino atualmente é de 1.010 policiais, equivalentes a 6,51%
do efetivo total existente (15.500 policiais), bem abaixo do que autoriza a Lei 9. 713
de novembro de 1998, que são até 10% do efetivo em cada quadro.
Não deixa de ser um avanço, pois analisando a Lei 7.491/86, que fixou o
efetivo da PMDF pela primeira vez, após a inclusão de efetivo feminino, verifica-se
que o efetivo total era de 8.647 policiais e fixava 196 vagas para o efetivo feminino, o
que equivalia a apenas 2,27% do total.
Nesse caso, a alta defasagem de efetivo feminino poderia ser corrigida por um
planejamento de re completamento que previsse, em vez de atribuir-se 10% do total
de vagas para os próximos concursos, a atribuição de uma porcentagem da
quantidade defasada, que hoje é de 480 policiais militares femininas.
Isso, enquanto perdurar a restrição de percentual para ingresso que, como
vimos anteriormente, é inconstitucional.
O número de respondentes dentro do efetivo feminino foi de 200, o que
equivale a 19,80% do total de 1.010 policiais femininas existentes nos quadros da
PMDF, o que nos dá uma boa representatividade.
66
A média de idade das respondentes foi obtida somando-se as idades e
dividindo-se pelo número de respostas, o que permitiu verificar-se tratar de 38,9
anos, sendo a máxima de 52 anos e a mínima de 22 anos, conforme se vê no gráfico
3 (N= 200).
Castellar (2010), em pesquisa interna na PMDF, aferiu em sua amostra uma
média etária de 39 anos para o efetivo em geral, coincidindo com a aqui
apresentada. (CASTELLAR, 2010, p. 118-120)
Qual é a sua idade?
12
1
5
3
67
9
5
78
5
7
4
7
2
56 6
4
1718
22
15
1110
4
2 21
0
5
10
15
20
25
22A
23A
24A
25A
26A
27A
28A
29A
30A
31A
32A
33A
34A
35A
36A
37A
38A
39A
40A
41A
42A
43A
44A
45A
46A
47A
48A
49A
50A
51 52A
Idade
Quan
tidad
e
Gráfico 3 – Idade das Policiais Militares respondentes Fonte: Apêndice A
Seis anos sem concursos de admissão, por motivos diversos, ocasionaram o
envelhecimento do efetivo como um todo.
A média de tempo de serviço é de 15,6 anos , sendo o máximo de 28 anos e o
mínimo de 1 ano e é apresentado no gráfico 4 (N= 200).
Qual é o seu tempo de serviço?
0
10
20
30
40
50
60
1a 2a 6a 8a 9a 11a 12a 13a 14a 15a 16a 17a 18a 19a 20a 21a 24a 25a 27a 28a
Tempo de serviço
Quan
tidad
e
Gráfico 4 – Tempo de serviço das Policiais Militares respondentes Fonte: Apêndice A
67
A média aferida por Castellar (2010) em sua amostra foi de 14 anos. (idem)
3.5.1 ESTRUTURA FAMILIAR
Quanto ao Estado Civil, os dados são apresentados no gráfico 5.
Qual é seu Estado Civil?
Solteira21,0%
União estável10,0%
Casada57,0%
Divorciada10,5%
Viúva1,5%
NR0,0%
Solteira
União estável
Casada
Divorciada
Viúva
NR
Gráfico 5 – Estado civil das policiais militares respondentes Fonte: Apêndice A
Observa-se o predomínio das casadas com 57%, que somados às que
possuem união estável, perfazem o total de 67% das respondentes (N= 200).
Além disso, foi perguntado se os cônjuges eram policiais militares, sendo o
resultado apresentado no gráfico 6.
O objetivo dessa pergunta era identificar a prevalência ou não de
relacionamentos nascidos na Corporação, pois dadas as características específicas
da profissão, não raras vezes a policial militar feminina passa mais tempo em serviço
do que em outras atividades sociais, propiciando, naturalmente, a intensificação das
relações interpessoais.
Observa-se que 49,3% das respondentes têm cônjuges policiais militares, o
que demonstra um alto índice.
Entre essas, 65% têm cônjuges praças e 30% têm cônjuges oficiais. Isso
demonstra uma prevalência de relacionamentos entre pares, o que seria esperável
dentro de uma organização vertical.
68
O seu cônjuge é Policial Militar?
Sim49,3%
Não50,0%
NR0,7%
Sim
Não
NR
Gráfico 6 – Se os cônjuges são policiais militares Fonte: Apêndice A
O fato de as policiais femininas se casarem com policiais masculinos parece
estar ligado à maior compreensão que esses têm acerca das dificuldades da
profissão, como escalas, prontidões, serviços extras e etc.
De Araújo (2008), ao referir-se a uma policial feminina entrevistada, relata que
“o fato de ser casada com PM e receber apoio de seus familiares parece funcionar
como variável positiva e potencializadora de seu entusiasmo pela profissão.” (DE
ARAÚJO, 2008, p. 71)
Se PM, qual é o posto ou graduação de seu cônjuge?
Oficial30%
Praça65%
NR5%
Oficial
Praça
NR
Gráfico 7 – Posto ou graduação dos cônjuges Policiais Militares Fonte: Apêndice A
69
Aliado ao estado civil, foi perguntado se possuem filhos e a quantidade.
(N=145)
Possui filhos?
Sim 72,5%
Não26,0%
NR1,5%
Sim
Não
NR
Gráfico 8 – Se possui filhos Fonte: Apêndice A
O gráfico 9 apresenta dados coligidos nos questionários, onde podemos
verificar que há predomínio de mulheres com 2 filhos, sendo a média de 1,9 filhos
por mãe, coincidindo com a taxa de fecundidade da mulher brasileira apresentada
no capítulo I.
Quantidade de filhos
1F30%
2F45%
3F21%
4F3%
5F1%
1F
2F
3F
4F
5F
Gráfico 9 – Quantos filhos possui Fonte: Apêndice A
70
3.5.2 ESCOLARIDADE
Quanto ao grau de escolaridade, os dados são apresentados no gráfico 10.
Qual é seu nível de escolaridade?
Médio11,5%
Superior73,0%
Pós-Grad14,0%
Doutorado0,0%
NR0,5%
Mestrado0,5%
Fundam.0,5%
Fundam.
Médio
Superior
Pós-Grad
Mestrado
Doutorado
NR
Gráfico 10 – Grau de escolaridade das policiais militares respondentes Fonte: Apêndice A
Observa-se o predomínio do nível de ensino superior com 73% das
respondentes. Destacam-se ainda os 14% com o nível de pós-graduação e apenas
0,5% com mestrado.
Nesse quesito, os números, em composição com os números do sub item
anterior também confirmam os dados apresentados por Bruschini (2007), que
demonstram o avanço da escolaridade das mulheres e os fatores que levam à
segunda e, por vezes, terceira jornada:
Ao mesmo tempo, a expansão da escolaridade e o ingresso nas universidades viabilizaram o acesso delas a novas oportunidades de trabalho. Todos esses fatores explicam não apenas o crescimento da atividade feminina, mas também as suas transformações no perfil da força de trabalho. As trabalhadoras, que, até o final dos anos 70, em sua maioria, eram jovens, solteiras e sem filhos, passaram a ser mais velhas, casadas e mães. (BRUSCHINI, 2007, p.5)
3.5.3 ANÁLISE VOCACIONAL
Para a análise das próximas questões, os dados foram tabulados
separadamente com os resultados de oficiais e de praças, entretanto, como os
resultados são muito similares, optou-se por apresentar a tabulação consolidada.
Isso demonstra que os dados não foram mascarados por aspectos hierárquicos.
71
Nas questões com múltipla escolha, algumas respondentes deram mais de
uma resposta, logo os percentuais apresentados referem-se ao número de respostas
e não ao número de respondentes.
3.5.3.1 Adaptação das policiais militares femininas à PMDF
Entre os critérios utilizados para verificar a relevância do desempenho das
policiais femininas da PMDF, foi feita a análise vocacional sob o aspecto da
adaptação das policiais femininas à PMDF e a da Corporação às suas
trabalhadoras, evidenciadas por fatores como adaptação física das instalações,
discriminação, assédio, sentimentos das policiais em relação à Corporação e etc.
Foi verificado também se existe alguma função específica a ser
desempenhada pelas policiais femininas, por meio da análise das funções
desempenhadas atualmente, bem como histórico e preferências.
Para cada pergunta do questionário foi gerado um gráfico, dentro dos tópicos.
Porque escolheu a Polícia Militar? (N=209)
Porque escolheu a Polícia Militar? (Consolidado)
Salário20,3%
Carreira16,9%
Estabil.40,6%
Status2,6%
Outra18,0%
NR1,5%
Salário
Carreira
Estabil.
Status
Outra
NR
Gráfico 11 – Porque escolheu a Polícia Militar Fonte: Apêndice A
Estabilidade (40,6%), salário (20,3%) e carreira (16,9%) lideram a lista de
motivadores principais pela escolha da profissão.
Entre as respostas atribuídas a outras (18%), foi dado um espaço para
escrever livremente os motivos, nos quais foram listados 37 motivos diferentes e
entre esses, “sonho”, “oportunidade” e “ter parentes militares” foram os mais
recorrentes com 5 respostas cada.
72
O que sente por ser integrante da PMDF? (N=240)
Questão 09 (Consolidado)
Orgulho66,7%
Prazer19,6%
Medo1,3%
Ansiedade5,0%
Outra6,3%
NR0,4%
Contrariedade0,8%
Orgulho
Prazer
Medo
Ansiedade
Contrar.
Outra
NR
Gráfico 12 O que sente por ser integrante da PMDF Fonte: Apêndice A
Nessa questão, a grande maioria respondeu que sente orgulho e prazer por
serem policiais militares, dois sentimentos positivos perfazem 83,6% dos
sentimentos citados, demonstrando que as policiais militares estão bem adaptadas e
satisfeitas com a Corporação.
O que significa vestir a farda? (N= 253)
Questão 10 (Consolidado)
Orgulho59,7%
Prazer20,2%
Elegância9,1%
Receio da Opinião Pública3,2%
Outra7,5%
NR0,4%
Orgulho Prazer Elegância Receio da Opinião Pública Outra NR
Gráfico 13 – O que significa vestir a farda Fonte: Apêndice A
Esta questão tem a ver com a auto-imagem das mulheres, enquanto policiais
militares e, confirma a questão anterior, pois a maioria (79,9%) relatou sentimentos
positivos ao vestir a farda, demonstrando que as policiais femininas têm uma boa
imagem de sua profissão, enquanto sentimento negativo como receio da opinião
pública ocupa apenas 3,2 % das respostas.
73
Musumeci e Soares (2005), em pesquisa similar a esta na PMERJ,
constataram resultado idêntico: “Vestir a farda, significava para a maioria, motivo de
orgulho, sensação de importância” (MUSUMECI E SOARES, 2005, p. 50)
Faz planos para deixar a PMDF antes de se aposentar? (N= 200)
Questão 14 (Consolidado)
Sim24%
Não75%
NR1%
Sim Não NR Gráfico 14 – Faz planos para deixar a PMDF antes de se aposentar? Fonte: Apêndice A
Você apoiaria a decisão de seus filhos de serem policiais militares? (N= 200)
Questão 21 (Consolidado)
Sim82%
Não13%
NR5%
Sim Não NR
Gráfico 15 – Você apoiaria a decisão de seus filhos de serem policiais militares? Fonte: Apêndice A
Essas questões corroboram com o resultado das questões 09, 10 e 14, pois
os índices estatísticos coincidem, demonstrando que as policiais militares femininas
têm boa aceitação e adaptação à Corporação.
Da maneira como são empregadas hoje em dia, pode-se dizer que as policiais
militares femininas estão bem adaptadas à Corporação, entretanto o mesmo não
pode ser dito em relação à Corporação, como será visto no item 3.5.4.
74
3.5.3.2 Existem funções específicas para mulheres na PMDF?
Inicialmente, o decreto 2.106/1984, que autorizou a inclusão de efetivo
feminino nas polícias militares, assim versava:
Art 2º - Os Estados, Territórios e o Distrito Federal poderão, se convier às respectivas Polícias Militares: a) admitir o ingresso de pessoal feminino em seus efetivos de oficiais e praças, para atender as necessidades da respectiva Corporação em atividades específicas, mediante prévia autorização do Ministério do Exército. (grifo nosso) (DECRETO LEI 2.106, 1984)
Nos 13 anos de Cia PM Fem, as policiais militares femininas foram
empregadas de forma específica, em apoio ao efetivo masculino, na esfera
operacional e desempenharam funções administrativas normais na sede da Cia.
Entretanto, a partir de 1996, a PMDF extinguiu a Cia PM Fem e as policiais militares
foram distribuídas nas diversas unidades da Corporação, onde passaram a
desempenhar as mesmas funções que anteriormente eram desempenhadas
somente por policiais masculinos.
Está satisfeita com a função que desempenha atualmente em sua UPM?
Questão 15 (Consolidado)
Sim88%
Não9%
NR3%
Sim Não NR
Gráfico 16 – Está satisfeita com a função que desempenha atualmente em sua UPM? Fonte: Apêndice A
Como parte da reflexão sobre a relevância do desempenho das policiais
militares femininas, objetivou-se investigar em que tipo de funções as mulheres mais
se adaptaram na Corporação, uma vez que, aparentemente, já não exercem funções
específicas, mas como foi visto, estão inseridas em todas as atividades.
Nessa questão, verificamos que 88% das policiais militares femininas estão
satisfeitas com sua atual função, o que corrobora com a tese de que as policiais
militares femininas se adaptaram em suas unidades.
75
Nesse sentido, após verificar que a maioria está adaptada às suas funções,
verificamos que 47,2 % estão sendo empregadas em atividades administrativas,
18,5% estão sendo empregadas em atividades operacionais, 15% estão em
atividades especializadas, 8,2% estão em atividades de ensino e 9,9% estão em
outras atividades. É importante ressaltar que o número de respostas é maior do que
o número de respondentes, de onde se infere que algumas policiais deram mais de
uma resposta, conforme se vê no gráfico 17.
Que atividade especificamente desenvolve atualmente em sua UPM? (N=
233)
Questão 12 (Consolidado)
Admnistrativa47,2%
Operacional18,5%
Especializada15,0%
Ensino8,2%
Outra9,9%
NR1,3%
Admnistrativa Operacional Especializada Ensino Outra NR
Gráfico 17 – Que atividade especificamente desenvolve atualmente em sua UPM? Fonte: Apêndice A
Conforme demonstrado no item 2.5, gráfico 1. sobre as UPMs onde servem
as policiais femininas entrevistadas, verificou-se que o tipo de UPM não determina a
função ou atividade desempenhada, pois se pode servir em UPM operacional ou
especializada na atividade meio (administrativa).
Da mesma forma, é possível servir em diretorias de departamentos
administrativos, por exemplo, e ainda exercer funções operacionais pois com o
advento do serviço voluntário gratificado criado na PMDF, policiais militares de
qualquer UPM, exceto dos quadros de saúde e algumas outras exceções, podem
exercer atividades operacionais (de rua) em seus horários de folga. Dessa forma, é
possível desenvolver mais de uma atividade nas UPMs. Isso explica o fato de
algumas terem dado mais de uma resposta.
76
Por isso, foi feito um cruzamento dos dados referentes às funções
desempenhadas com as UPMs às quais pertencem as policiais consultadas, onde se
verificou predominância de atividades administrativas e também de UPMs
administrativas.
Segundo D.S.P.6, ex-Comandante Geral e primeiro Comandante da Cia PM
Fem (1983-1986), assim como existem homens especializados em atividades
administrativas e operacionais, também há mulheres especializadas em atividades
operacionais e administrativas. O entrevistado acredita que as mulheres podem ser
empregadas em qualquer atividade dentro da Corporação.
Tipo de Unidade
Operacional25%
Especializada6%
Admnistrativa43%
Ensino16%
Saúde10%
Operacional Especializada Admnistrativa Ensino Saúde Gráfico 18 – Tipo de UPM onde trabalham as respondentes Fonte – Apêndice A
Caso lhe fosse dada oportunidade de escolher, em que atividade gostaria de
trabalhar? (N= 214)
Questão 13 (Consolidado)
Admnistrativa31,3%
Operacional21,5%
Especializada26,6%
Ensino11,2%
Outra7,9%
NR1,4%
Admnistrativa Operacional Especializada Ensino Outra NR
Gráfico 19 – Caso lhe fosse dada oportunidade de escolher, em que atividade gostaria de trabalhar? Fonte: Apêndice A 6 Nome suprimido pela autora. Ver entrevista completa no Apêndice B1
77
Entretanto, embora a grande maioria tenha respondido que está satisfeita com
a função desempenhada e a atividade administrativa tenha sido constatada como
predominante, com 43%, ao se verificar a preferência das respondentes com a
pergunta 13, observa-se nessa questão que há uma diminuição em atividades
administrativas e um aumento em relação às atividades especializadas em relação
às funções efetivamente desempenhadas, conforme se verifica no gráfico 19.
Verificamos anteriormente que 67% das policiais militares femininas são
casadas, porcentagem similar à apresentada na preferência de atividades não
operacionais. Realmente, a atividade operacional da PMDF com serviços por escala
exige o afastamento do lar por períodos longos de tempo. Tais atividades dificultam
e são dificultadas pela dupla jornada feminina.
Conforme foi observado, grande parcela das policiais militares optaram pela
profissão em busca de estabilidade e sendo a maioria casada (67%) e com filhos
(72,5%) é natural que optem por atividades administrativas, que proporcionam
facilidade de horários e menor tempo de ausência do lar, principalmente nos
períodos noturnos.
Ainda na busca por respostas sobre o perfil ocupacional das policiais militares
femininas na PMDF, procurou-se identificar se essa primazia da atividade
administrativa sobre a operacional sempre ocorreu, ou seria um fato moderno.
A esse respeito, De Araújo (2008), em seu livro “Mobilidade social,
multiculturalismo ou discriminação na Polícia Militar: Um estudo sobre estigmas e
preconceitos na Corporação” destaca:
As falas demonstram uma inclinação, que parece existir, em utilizar a mulher em funções administrativas, onde o perigo de confronto com a marginalidade é menor. Ao mesmo tempo a fragilização simbólica do feminino faz, necessariamente, aparecer o protetor (masculino) que, com sua “superioridade”, tem a tarefa de guardar e preservar a parte mais frágil. (DE ARAÚJO, 2008, p. 75)
Capelle (2010), sobre esse assunto, referindo-se à PMMG, (para fins de
comparação), assevera:
A inserção de mulheres na organização, principalmente as do oficialato, tem ocorrido, predominantemente, em funções administrativas e de relações públicas – tidas como atividades-meio e não atividades-fim da Polícia –, percebendo-se maior dificuldade de inserção daquelas policiais que optam por seguir carreira no policiamento operacional. (CAPELLE 2010, p. 4)
78
Por quantos anos trabalhou no serviço operacional da PMDF? (N= 200)
Questão 11 (Consolidado)
1 a 5 anos22,0%
5 a 1025,0%
10 a 1516,5%
Mais de 1520,5%
NR1,5% Menos de 1
14,5%
Menos de 1 1 a 5 anos 5 a 10 10 a 15 Mais de 15 NR
Gráfico 20 – Por quantos anos trabalhou no serviço operacional da PMDF? Fonte: Apêndice A
Nessa questão demonstra-se que do efetivo entrevistado, 62% trabalharam no
serviço operacional por mais de 5 anos, sendo que dessas 16,5% trabalharam por
mais de 10 anos e 20,5% trabalharam por mais de 15 anos, desmistificando a
questão da primazia da atividade administrativa sobre a operacional na PMDF e
demonstrando que as policiais femininas também têm vocação operacional.
Cabe ressaltar que a PMDF adotou o modelo paulista, onde de acordo com
Lima (2002), as policiais militares femininas eram uma espécie de assistentes
sociais fardadas. (LIMA, 2002, p. 16-17)
E, como no início, foram empregadas dessa forma na PMDF, verifica-se uma
situação bem diferenciada atualmente, onde há uma grande diversificação de
funções.
Esse assunto é bastante relevante para os objetivos dessa pesquisa, pois ao
conhecer se existe uma área ou atividade em que as mulheres sejam melhor
empregadas na PMDF, poder-se-ia desenvolver planejamentos no sentido de alocar
esse efetivo nessa ou naquela atividade.
Entretanto, ao que parece, as policiais femininas foram se encaixando nas
atividades em que melhor se adaptaram, independentemente de gênero. Com tão
pequeno efetivo, proporcionalmente, o efetivo feminino diluiu-se em meio ao efetivo
79
masculino, tanto que estão presentes nos mais diversos tipos de UPM, nas mais
diversas atividades, mesmo que em maior número na administrativa.
Quanto gosta do serviço operacional? (N= 200)
Questão 25 (Consolidado)
Razoavelmente30,5%
Muito52,0%
Indiferente2,0%
Nada2,0%
Pouco11,0%
NR2,5%
Muito Razoavelmente Pouco Nada Indiferente NR
Gráfico 21 – Quanto gosta do serviço operacional? Fonte: Apêndice A
Nesta questão, a grande maioria (52%) respondeu que gosta muito do serviço
operacional, contrapondo novamente às respostas das perguntas 12 e 13 quando
responderam que apenas 18,5 % atualmente trabalham na atividade operacional e
apenas 21,5% optariam por essa atividade, se pudessem escolher.
Na sua opinião, em que área a mulher seria melhor empregada na
corporação? (N= 213)
Questão 23 (Consolidado)
Admnistrativa4,2%
Ostensivo Geral1,9%
Especializada6,1%
Ensino4,2%
Toda e Qualquer82,6%
NR0,5%
Específica0,5%
Admnistrativa Ostensivo Geral Especializada Ensino Específica Toda e Qualquer NR
Gráfico 22 – Na sua opinião, em que área a mulher seria melhor empregada na corporação? Fonte: Apêndice A
80
Nessa questão, a grande maioria (82,6%) acredita que as mulheres podem
ser empregadas em toda e qualquer área na Corporação, o que leva a crer que as
policiais militares femininas sentem-se preparadas para o desempenho das mais
diversas funções, contrapondo-se às questões 12 e 13 que apontaram uma
tendência de preferência e adesão às atividades administrativas.
As respostas que apontaram a atividade administrativa somam apenas 4,2%,
contra 6,1% que apontaram a atividade especializada como o melhor emprego da
mulher na Corporação.
É um fato notório que a função de secretária (pessoal) na PMDF geralmente é
desempenhada por mulheres. De Araújo (2008) a esse respeito destacou:
Baseado nesse relato, visitei quinze gabinetes de comandantes, chefes e diretores e pude constatar que invariavelmente a pessoa que faz o trabalho de secretariar estes oficiais é uma mulher e branca. A justificativa apresentada é de que a presença feminina humaniza o ambiente. Não houve respostas sobre incompetência masculina para a função, mas sim de que, em regra, a mulher é mais organizada do que o homem. (DE ARAÚJO 2008, p.81)
O autor relata que o fato de as mulheres serem secretárias na PMDF
descontenta os policiais masculinos, que as acusam de serem beneficiadas:
Por outro lado o efetivo masculino reclama do tratamento privilegiado que as mulheres ocupam na corporação. A principal é em relação à escala de serviço. Geralmente o efetivo feminino é empregado nos serviços administrativos. Quando são secretárias de comandantes, chefes e diretores as escalas são ainda mais diferenciadas. Há oficiais que possuem duas secretárias estas se revezam por dia e não concorrem ao serviço extra. Certos oficiais chegam a possuir quatro secretárias de maneira que se revezam por meio expediente em dias alternados.” (idem, p. 75)
Para o autor, até os supostos benefícios são uma forma de dominação:
Assim, o chefe exterioriza seu poder pela quantidade de secretárias que possui, ao mesmo tempo em que facilitar a vida profissional da mulher que com ele trabalha serve para reafirmar sua superioridade e dominação. Vários discursos discriminadores coletados na pesquisa permitem inferir essa possibilidade. A mulher é tratada por muitos chefes como “algo” que deve ser protegido, não exposto aos perigos da profissão. Isto é confirmado pela utilização de efetivos femininos principalmente em atividades administrativas. Ela deve estar a serviço do chefe, próxima dele, protegida por ele. (ibidem)
A Coronel policial militar feminina, entrevistada na presente pesquisa, afirmou
que, como comandante, conheceu muitos policiais masculinos que gostariam de
ocupar tais funções. A entrevistada apresentou opinião pessoal de que em algumas
vezes, algumas mulheres gostam de ser apadrinhadas. Segundo ela, alguns dizem:
“As policiais femininas têm que ser secretárias (de comandantes, chefes e
diretores)”. Secretária é uma profissão que existe no mundo civil e que na PMDF
81
algumas mulheres se dedicam a esse tipo de missão, mas não tem que ser
exclusivamente feminina. A entrevistada acredita que a capacidade feminina está
muito além de ser secretária. Então, não é esse o papel da policial militar feminina.
Para ela, o papel da mulher na Corporação é igual ao papel do homem.
Concluindo, as mulheres na PMDF estão mais presentes em UPMs
administrativas (41,3%), nas atividades administrativas (47,2%), preferem essa
atividade (31,3%) mas acreditam que podem ser empregadas em toda e qualquer
atividade (82,6%), pois também gostam muito da atividade operacional (52%).
3.5.4 A ADAPTAÇÃO DA PMDF ÀS POLICIAIS MILITARES FEMININAS
É necessário verificar não só a adaptação das policiais à Polícia, mas também
o contrário, como foram recepcionadas, pois há lógica em se pensar que uma coisa
depende da outra. Ou seja, quanto mais se adapta a PMDF às suas policiais
femininas, mais favorece a adaptação de suas trabalhadoras.
A UPM em que trabalha possui instalações adequadas à presença feminina
(alojamento, banheiro)? (N= 200)
Questão 16 (Consolidado)
Sim50%
Não48%
NR2%
Sim Não NR
Gráfico 23 – A UPM em que trabalha possui instalações adequadas à presença feminina? Fonte: Apêndice A
Após 28 anos da inclusão das mulheres na PMDF, ainda temos 50% das
UPMs não adaptadas à sua presença, denotando que a adaptação das policiais
militares à Corporação não é recíproca.
Esse dado é alarmante e pode estar ligado ao percentual de mulheres no
efetivo, que hoje em dia é de 6,51%. Certamente, devido ao pequeno número, não
se tenha tomado a decisão de investir em uma estrutura física mais adequada.
82
Segundo De Araújo (2008), que é oficial superior da PMDF, “A arquitetura dos
quartéis, com alojamentos e banheiros coletivos, equipamentos e armamentos
adaptáveis ao físico do homem, hinos e canções enaltecedores do caráter militar,
tudo faz lembrar o padrão masculino”. (DE ARAÚJO, 2008, p.68)
Destaca-se que, além de não serem adaptados à presença feminina do
público interno, os quartéis também não estão aptos a receber a comunidade,
também constituída por mulheres.
Mas as adaptações físicas não são as mais importantes e nem onde houve os
menores avanços na adaptação da PMDF às policiais femininas.
Verificar-se-á isso facilmente quando se tratar do preconceito e discriminação
em razão do gênero.
Na sua opinião, houve mudanças na Corporação após o ingresso das policiais
militares femininas? (N= 200)
Questão 22 (Consolidado)
Sim93,0%
Não2,5%
NR4,5%
Sim Não NR
Gráfico 24 –Houve mudanças na Corporação após o ingresso das policiais militares femininas? Fonte: Apêndice A
Na questão 22, havia apenas duas opções de respostas para a pergunta se
houve mudanças na Corporação após o ingresso das policiais militares femininas
(gráfico 24) e um espaço para explicação do porquê das mudanças (gráfico 25).
Dentre as respondentes, 93% responderam que houve mudanças, e entre
essas, 25% não quiseram ou não souberam responder quais mudanças, mas 30%
responderam que houve mais humanização e 7% responderam que houve melhoria
83
da opinião pública, corroborando com o resultado da questão 19 e demonstrando
novamente a vocação mais humanitária das policiais femininas, o que aliás era o
objetivo inicial com a inserção feminina. Outros quesitos diretamente ligados à
questão de gênero, somaram 26% das respostas.
Questão 22-b
Respeito2%
Outras2%
Flexibilidade nas relações humanas
1%
Quebra de paradigmas1%
Em todos os sentidos1%
Atendeu necessidade institucional
5%
Melhora da Opinião Pública7%
Igualdade de gêneros8%
Melhoria na Organização pela Competência feminina
8%
Conquista de espaço10% NR
25%
Humanização30%
Gráfico 25 – Porque houve mudanças? Fonte: Apêndice A
Sem dúvida, essa foi a maior contribuição das mulheres para a PMDF, a maior
humanização no trato com a população. Em uma sociedade que clama pelo respeito
aos direitos humanos e em uma polícia que procura se aproximar da sociedade por
meio do policiamento comunitário, a vocação feminina de cuidar e proteger vem bem
a calhar. Afinal, o lema do Curso de Direitos Humanos da Polícia Militar do Distrito
Federal é “para servir e proteger”.
Essa questão permite inferir qual seria a função em que a mulher poderia ser
melhor empregada na PMDF, o que será objeto do próximo sub-item, pois
demonstra, na opinião das próprias policiais femininas, corroborada pela bibliografia
consultada e pelas entrevistas coletadas a vocação humanizadora da mulher.
Nesse sentido, o policiamento comunitário seria uma atividade apropriada,
pois seria potencializado pela natural vocação humanizadora da mulher.
De fato, alguns Postos Comunitários de Segurança (PCS) no Distrito Federal
têm policiais militares femininas como gestoras, conforme foi apurado na pesquisa
quantitativa.
84
A inclusão de maior efetivo feminino na PMDF, inclusive permitiria maior
emprego operacional na atividade-fim em contato com a comunidade e possibilitaria
a exploração de todo o potencial dessa característica humanizadora, em proveito da
comunidade.
Qual é a melhor coisa em ser policial militar? (N= 200)
Questão 19 (Consolidado)
Superação1%
Realização Profissional12%
Reconhecimento11%
Estabilidade Carreira e Salário
11%
Moral1% Usar farda
1%
Gerenciamento de Conflitos
1%
Combate da Criminalidade
1%
Respeito dos colegas3%
Status5%
NR8%
Diversidade de Funções4%
Cumprimento da Lei1%
Ajudar ao próximo39%
Dar Segurança3%
Patriotismo2%
Responsabilidade1%
Gráfico 26 - Qual é a melhor coisa em ser policial militar? Fonte: Apêndice A
Nesta questão as respostas também foram totalmente subjetivas e as
respondentes puderam escrever espontaneamente sobre o tema, não tendo sido
dadas opções, corroborando com os resultados das questões anteriores sobre
vocação nata da mulher em proteger, cuidar.
Ajudar o próximo (39%) foi o fato mais citado como melhor coisa em ser
policial militar. Essa questão reforça a teoria da vocação feminina de zelar e proteger
e corrobora com o arquétipo feminino de cuidadora. O fato é que essa característica
não se contrapõe à missão da PMDF. Realmente se o lema é “para servir e
proteger”, essa característica feminina se encaixa bem na tendência de polícia
comunitária, defensora dos direitos humanos.
Embora aspectos relacionados ao ideal não tenham sido elencados na
questão referente aos motivos para a escolha da profissão, a realização profissional
aparece aqui como segundo fato considerado como melhor coisa em ser policial
militar.
85
Confirmando o que foi apontado no gráfico 11, estabilidade, carreira e salário
foram apontados por 11% das respondentes, enquanto reconhecimento (status) foi
respondido também por 11% das policiais femininas.
Qual é a pior coisa em ser policial militar? (N=200)
Questão 20 (Consolidado)
Má Adm da Corporação3%
Não existem coisas ruins4%
Falta de recursos 3%
Amadorismo dos colegas2%
Responsabilidade da farda 2%
Não solucionar a criminalidade 1%
Outras3%
Normas ultrapassadas1%
Ser observada2%
Desgaste físico e mental
1%
Falta de rotina2%
Hierarquia1%
Serviço extra1%
Ausentar da Família1%
Ser julgada 1%
Corrupção1%
Falta de reconhecimento da sociedade
18%
Risco da profissão15%
Preconceito da sociedade12%
Falta de reconhecimento da Corporação
9%
NR8%
Opinião Pública negativa8%
Discriminação Interna8%
Gráfico 27 – Qual é a pior coisa em ser policial militar? Fonte: Apêndice A
Destaca-se que as respostas a essas questões foram espontâneas e escritas
de próprio punho, dando mais importância ainda ao resultado encontrado.
A falta de reconhecimento da sociedade, preconceito da sociedade, opinião
pública negativa, falta de reconhecimento da Corporação e discriminação interna,
juntas, somam 55% dos fatores desmotivadores das policiais militares femininas.
Todos esses aspectos estão ligados à auto-imagem e a aceitação da sociedade e da
Corporação. Em segundo lugar, vem o risco inerente da profissão com 15%.
Embora a grande maioria tenha demonstrado orgulho de ser policial militar e
de usar a farda, a maioria reclama exatamente de aspectos referentes à auto-estima
enquanto policial militar, o que demonstra que esse orgulho citado existe não por
fatores exógenos, mas é um sentimento inato das policiais militares, pois 12%
reclamaram de preconceito da sociedade, 18% reclamaram de falta de
reconhecimento da sociedade e 8% reclamaram de opinião pública negativa,
86
enquanto 9% se queixaram de falta de reconhecimento da Corporação e 8% de
discriminação interna.
3.5.4.1 Discriminação
A discriminação em função do gênero é a maior inadaptação da PMDF à
presença de policiais femininas. Embora não reconhecida por muitos dentro da
Corporação, inclusive mulheres, foi identificado que existe discriminação e o motivo
pode estar associado exatamente ao critério diferenciado para admissão. Com um
efetivo bem menor, as mulheres são literalmente uma minoria e, assim, ficam
sujeitas a uma série de vicissitudes no contexto corporativo.
Na sua opinião, as policiais militares femininas possuem os mesmos direitos
dos policiais militares masculinos? (N= 200)
Questão 26 (Consolidado)
Sim60,5%
Não36,0%
NR3,5%
Sim Não NR
Gráfico 28 – As policiais militares femininas possuem os mesmos direitos dos masculinos? Fonte: Apêndice A
Nessa questão, a maioria (60,5%) acredita que as policiais femininas possuem
os mesmos direitos dos policiais masculinos, embora uma quantidade considerável
(36%) ainda acredite que não possui os mesmos direitos. Ao se observar que a
quantidade de policiais femininas é limitada por lei, verificamos que os direitos não
são iguais desde o concurso para ingresso na Corporação, quando ainda nem eram
policiais militares.
Na questão anterior, 8% reportaram à discriminação interna como uma das
piores coisas em ser policial militar. Ao longo desse item, foram verificadas várias
fontes de informação, tanto bibliográficas, quanto entrevistas que reportam à
87
discriminação e ao preconceito como barreiras à total adaptação da PMDF à
presença feminina.
Já sofreu algum tipo de discriminação na PMDF pelo fato de ser mulher? (N=
200)
Questão 29 (Consolidado)
Sim62,0%
Não36,5%
NR1,5%
Sim Não NR
Gráfico 29 – Já sofreu algum tipo de discriminação na PMDF pelo fato de ser mulher? Fonte: Apêndice A
Essa questão demonstra que 62% das policiais militares femininas já sofreram
algum tipo de discriminação pelo fato de serem mulheres, o que já havia sido
constatado por De Araújo (2008), que demonstrou serem as mulheres o quarto
grupo mais discriminado, com 53,3% das respostas para a pergunta sobre minorias
e grupos discriminados na PMDF. (DE ARAÚJO, 2008, p.89)
Uma questão realçada pelo entrevistado R.F.A., seria a verificação dos
motivos de as oficiais femininas que preenchem requisitos para Comando não
ocuparem essas funções.
Verifica-se no organograma da PMDF, a existência de quarenta e seis UPMs
operacionais subordinadas ao Departamento Operacional, das quais trinta e duas
UPMs são comandadas por Tenente Coronel QOPM (TC) e 14 UPMs comandadas
por Major QOPM (Maj). Como foi visto no início do item 3.5, a PMDF possui nove
mulheres que ocupam o posto de TC e vinte e cinco mulheres que ocupam o posto
de Maj, entretanto nenhuma UPM é comandada efetivamente por uma mulher. Em
que pese haver em agosto de 2011, cinco TCs femininas realizando Curso de Altos
Estudos (CAE) na PMDF, portanto afastadas das atividades, antes do curso apenas
88
uma ocupava a função de Comandante de UPM, função que agora é ocupada
interinamente por uma oficial feminina (Maj).
Efetivamente, apenas uma mulher comanda uma unidade com autonomia
administrativa na PMDF e é uma Diretoria.
Nesse quesito, a entrevistada V. N. O. A, única mulher a ocupar o posto de
Coronel na PMDF, destacou que teve experiência de comandar UPMs e não pôde
perceber boa receptividade da tropa em relação ao Comando feminino. Segundo a
oficial: “De uma forma não ostensiva, mas velada ainda existe discriminação. Os
homens ainda não sabem lidar com o comando feminino. As policiais militares
femininas sabem lidar com os homens e comandá-los.”
A entrevistada afirmou que nas vezes em que comandou unidades, havia a
expectativa (da tropa) de que a UPM toda ia ser só de mulheres mas a proposta
sempre foi de que o subcomandante fosse um homem, até porque se precisa desse
equilíbrio dentro da Corporação. Na visão da entrevistada, segurança pública é uma
questão de cidadania, de humanidade e de se identificar com o cliente e isso vai
muito além do gênero.
Segundo a entrevistada, hoje em dia está na função de Diretora de Inativos e
Pensionistas, mas poderia estar e tem capacidade para ser a chefe do
Departamento Operacional da Corporação que comanda cinco grandes comandos
regionais com quarenta e seis UPMs, pois possui qualificações para tal, foi
doutrinada e ensinada para isso, mas hoje está na Diretoria de Inativos e ocupa bem
esse espaço. Muitos dizem assim: “_Está no lugar certo porque sabe receber bem o
inativo, porque trata bem as pessoas”. Mas isso é próprio da mulher. Se for para
uma unidade operacional, saberá dar o tratamento operacional necessário.
Nas palavras da entrevistada, hoje em dia a mulher faz a diferença, não de
gênero, mas na forma de agir. A entrevistada já ouviu isso de policiais masculinos,
de como é diferente o tratamento das comandantes mulheres. Não que as
comandantes mulheres deixaram de lado a capacidade de lidar com a disciplina e a
hierarquia dentro do contexto exclusivamente masculino.
De Araújo (2008), em capítulo referente aos “Aspectos Arquetípicos do Policial
Militar”, destina um item à análise da situação da mulher na PMDF, no contexto da
discriminação. Em relação a este tema, o autor destaca:
Identifiquei, também, que há descontentamentos de algumas policiais pelo tratamento recebido por alguns comandantes, Não há confiança de que elas
89
sejam capazes de desempenhar a função policial militar. Este desconforto aumenta quando a função é de comando. (DE ARAÚJO, 2008, p. 73)
O autor deixa bem claro, por meio de citações de trechos de entrevistas feitas
em um grupo focal a existência do preconceito e discriminação na PMDF:
Assim, identifico que no serviço operacional a mulher é discriminada, porém, nos serviços administrativos super protegidas pelo efetivo masculino. Por outro lado, há uma parcela do efetivo feminino que aceita esta condição e prefere estar acomodada em uma zona de conforto. Este posicionamento não é pacífico, pois há muitas entrevistadas que discordam do tratamento dispensado pelos homens, tanto o protetor quanto o discriminador.(idem, p.77)
De acordo com C.R.7, que é praça da PMDF e uma das primeiras mulheres a
possuir o Curso de Operações Especiais, entrevistada pela autora, certa feita ouviu
comentário de um ex comandante da Cia de Polícia de Choque, estranhando o fato
de haver mulheres em sua UPM quando assumiu o comando, de que lugar de
mulher era em casa para cozinhar e limpar e não em sua unidade, demonstrando
uma discriminação não velada, mas explícita, sofrida pela policial feminina.
Conforme foi verificado nas estatísticas extraídas de questionário de opinião
das próprias policiais femininas da PMDF, em várias citações bibliográficas e na
visão de entrevistados, existe a discriminação de gênero na Corporação. As citações
feitas são apenas algumas, pois não seria exagero escrever um livro inteiro somente
sobre esse assunto e obviamente não caberia neste trabalho, nem é o seu objeto de
estudo, entretanto ressalta-se a importância desse tema, quando se procura
determinar a relevância da atuação feminina na Corporação, pois o preconceito e a
discriminação podem anular a relevância mesmo do mais importante dos
desempenhos. Necessário se faz, então, enfrentar essas práticas discriminadoras de
frente, não fingindo que não existem, mas com ações positivas no sentido de
garantir à policial militar feminina o acesso justo aos diversos postos de trabalho no
contexto corporativo.
Já sofreu algum tipo de assédio no âmbito da PMDF? (N=200)
Nessa questão, verifica-se que a maioria não foi assediada (57,5%), mas a
quantidade de policiais assediadas é alta (40,5%).
Em qualquer organização ocidental esse fato é uma realidade (infelizmente) e
demonstra que ainda há pouco respeito aos direitos das mulheres em pleno século
XXI, embora não tenha sido encontrado nos dois últimos anos nenhum
7 Nome suprimido pala autora. Ver entrevista completa (copy desk) no apêndice B4.
90
procedimento apuratório ou criminal por esse motivo nos registros do Departamento
de Controle e Correição (DCC/PMDF), demonstrando que as mulheres assediadas
talvez não tenham coragem de denunciar tais abusos.
Questão 27 (Consolidado)
Sim40,5%
Não57,5%
NR2,0%
Sim Não NR
Gráfico 30 – Já sofreu algum tipo de assédio no âmbito da PMDF Fonte: Apêndice A
Por outro lado, foi observado que 49% das entrevistadas são casadas com
policiais militares e esse fato já demonstra uma grande quantidade de
relacionamentos nascidos dentro da Corporação, evidenciando o quanto esse
convívio entre sexos opostos gera intensificação das relações interpessoais.
Calazans (2003) relata, em sua dissertação sobre a inserção de policiais
femininas na BMRS, que “Quando as mulheres chegaram à instituição uma das
maiores mobilizações foi de ordem sexual, havia um controle no intuito de impedir os
envolvimentos afetivos das mais diversas formas, há relatos de cumprimentos de
penas de prisão dados a supostos envolvimentos.” (CALAZANS, 2003, p. 97)
Fato semelhante ocorreu na PMDF quando houve a inserção feminina, onde
as policiais femininas eram proibidas até de serem vistas acompanhadas por
homens.
Como deveria ser o critério para o cálculo do percentual de vagas para
ingresso na PMDF de mulheres e homens? (N=200)
91
Questão 24 (Consolidado)
Sem limite43,5%
50M 50H20,5%
30M 70H18,0%
20M 80H11,0%
Outra6,0%
NR1,0%
Sem limite 50M 50H 30M 70H 20M 80H Outra NR
Gráfico 31 – Qual deveria ser o critério para o cálculo do percentual de vagas para ingresso na PMDF de mulheres e homens? Fonte: Apêndice A
Nessa questão, propositalmente, não foi incluída a opção de 10% para
mulheres e 90% para homens, que é o critério atualmente utilizado, conforme a Lei
Federal 9.713 de 1998, entretanto foi dada opção de “outra resposta”, em que 6%
marcaram esse item e justificaram que o critério atual deveria ser mantido.
Entretanto, a grande maioria (43,5%) das respondentes acredita que não
deveria haver qualquer tipo de limite, o que estaria mais em consonância com a
Constituição Federal do Brasil de 1988, conforme demonstrado no Capítulo I, pois a
imposição desse limite pode ser considerada discriminatória, tendo em vista que as
mulheres, hoje em dia, estão presentes em todas as áreas da corporação,
demonstrando que possuem capacidade e habilidades para isso. Portanto, não
haveria qualquer argumento que justificasse a imposição desse limite.
Esse é o principal sinal de que a adaptação da PMDF às policiais militares
femininas ainda não está completa, pois em quase três décadas de atuação
feminina, como Corporação, ainda não explora todas suas potencialidades,
resquícios de preconceito que impedem ou dificultam o seu aproveitamento total.
3.5.5 ABSENTEÍSMO
Existem alguns mitos que são utilizados para justificar a menor presença de
efetivo feminino na Polícia Militar. Um deles é de que as mulheres seriam mais
92
sujeitas às doenças e teriam um índice alto de absenteísmo, também em função dos
longos afastamentos em virtude de licenças maternidade.
Absenteísmo é uma palavra com origem no latim “absens, absentis”= ausente
e é o ato de estar ausente do local onde se deveria estar presente por obrigação
contratual, em virtude de um motivo interveniente. O absenteísmo pode ser medido
pelas faltas ou atrasos ao trabalho. Nesse estudo serão consideradas somente as
faltas.
O absenteísmo pode ter vários motivos, mas os mais comumente observados
e facilmente verificáveis são os afastamentos por motivo de saúde.
Para os fins desse estudo foi realizada visita à Diretoria de Telemática da
PMDF (DITEL) que gerencia o Banco de Dados (BD) do Departamento de Saúde
(DS), onde são lançados todos os afastamentos de policiais militares por motivos de
saúde.
O objetivo era de comparar a taxa de absenteísmo feminina com a taxa
masculina, a fim de verificar se havia diferenças significativas que justificassem a
crença nesse mito.
Foram extraídos do BD todos os afastamentos por motivo de saúde de 2001 a
2010, onde foi verificado que houve 2.305.633 dias de afastamento de todo o efetivo
em todo o período. O número é tão grande que assusta.
Entre esses afastamentos foram separados os do efetivo feminino e os do
efetivo masculino e ainda os Códigos Internacionais de Doenças (CID) mais
freqüentes em cada grupo.
Além disso, foi realizada consulta em separado dos afastamentos em virtude
de licenças maternidade, a fim de verificar qual seria o impacto desses na taxa do
efetivo feminino.
Devido ao grande volume de dados, optou-se por apresentá-los apenas
percentualmente a fim de facilitar a compreensão.
Constatou-se que o absenteísmo feminino em relação ao masculino por
motivo de saúde é proporcional à relação dos efetivos masculino e feminino, não
havendo dados que comprovem ser o feminino ou o masculino maiores.
Como destacado anteriormente, o absenteísmo pode ter vários motivos. Como
exemplos, segundo a Portaria PMDF 578, de 22 de outubro de 2007, tem-se o luto
que é o afastamento temporário do serviço por oito dias por motivo de morte de pais,
cônjuges, filhos, irmãos e sogros e os afastamentos por núpcias, de oito dias quando
93
contraem matrimônio. É importante notar que esses afastamentos também causam
absenteísmo sem, contudo, estarem relacionados ao estado de saúde do policial
militar.
Total de afastamentos 2001 - 2010 (por nº de dias)
Feminino9,18%
Masculino90,82%
Feminino Masculino
Gráfico 32 – Afastamentos por motivo de saúde na PMDF de 2001 a 2010, excluindo licença maternidade Fonte – Banco de Dados da DITEL/PMDF
Total de afastamentos 2001 - 2010 (por nº de dias) incluindo Licença Maternidade
Masculino90,4%
Feminino9,6%
Feminino Masculino
Gráfico 33 – Total de afastamentos por motivo de saúde na PMDF de 2001 a 2010 incluindo Licença Maternidade Fonte – Banco de Dados da DITEL/PMDF
Da mesma forma, embora haja CIDs para designar estado gravídico, esse
estado não é uma doença e também muito embora as mulheres grávidas necessitem
de apoio médico e dêem à luz em hospitais, o seu afastamento, via de regra, não é
motivado por motivo de doença. Portanto, foi feito a correlação de um com o outro,
94
apenas para fins de reflexão do impacto desses afastamentos como forma de
comparação, apenas para se ter uma referência, haja visto que a licença
paternidade para os policiais masculinos é de apenas cinco dias e para as policiais
femininas a licença maternidade é de 180 dias, segundo a Portaria PMDF 662, de 20
de agosto de 2004.
Verificou-se que o impacto desses afastamentos é muito pequeno,
equivalendo a apenas 0,4% dos afastamentos femininos por motivos de saúde na
Corporação, até porque conforme os gráficos oito e nove, 72,5% das policiais
femininas são mães e dessas, 75% possuem um ou dois filhos, ou seja, durante 30
anos de serviço, ficam afastadas por no máximo 360 dias por esse motivo.
Portanto, a crença de que há mais absenteísmo entre as mulheres por
motivos de saúde e por licença maternidade não encontra respaldo nas estatísticas
e deve ser fundada na própria discriminação citada no item anterior.
Para fins de ilustração serão apresentados, para caracterização de perfil, os
dados referentes aos motivos de afastamentos (CID) entre homens e entre mulheres
no ano de 2010. Os percentuais dizem respeito apenas à amostra dos dias de
afastamento referentes aos onze CIDs mais freqüentes em cada grupo. Isso porque
entre os CIDs do grupo masculino encontraram-se 1776 diferentes, enquanto entre
as mulheres foram encontrados 511 diferentes. A tentativa de apresentar um gráfico
consolidado com todos esses dados mostrou-se impossível.
Afastamentos masculinos em 2010 por CID (onze mais frequentes) por nº de dias
5,91%
5,75%5,65% 5,03%
5,94%
18,17%
22,14%
6,09%6,32%
8,19%10,81%
Z09.0 Exame seguim apos cirurgia p/outr afeccoes Z54.0 Convalescenca apos cirurgia
F10.2 Sindr de dependencia M51.1 Transt disco lombar outr intervert radiculop
M54.5 Dor lombar baixa Z76.3 Pessoa em boa saude acompanh pessoa doente
Z54.0 Convalescenca apos cirurgia I10 Hipertensao essencial
S93.4 Entorse e distensao do tornozelo F32 Episodios depressivos
F43.8 Outr reacoes ao stress grave
Gráfico 34 – Afastamentos masculinos em 2010 por número de dias Fonte – Banco de Dados da DITEL/PMDF
95
É importante ressaltar que esses não são os motivos que mais se
apresentam, mas sim os motivos que provocam os maiores afastamentos, uma vez
que são medidos em número de dias.
Afastamentos femininos em 2010 por CID (onze mais frequentes) por nº de dias
19,17%
10,36%
10,20%
9,80%8,47%
8,04%
7,50%
7,13%
6,50%
6,49%6,33%
Z54.0 Convalescenca apos cirurgia Z09.0 Exame seguim apos cirurgia p/outr afeccoes
F33.1 Transt depress recorr episodio atual moderad F32.2 Episodio depressivo grave s/sint psicoticos
Z76.3 Pessoa em boa saude acompanh pessoa doente F41.2 Transt misto ansioso e depressivo
M79.0 Reumatismo NE F33.2 Trans depr recor epis atual grav s/sint psic
F31 Transt afetivo bipolar F43.2 Transt de adaptacao
F32 Episodios depressivos
Gráfico 35 – Afastamentos femininos em 2010 por número de dias Fonte – Banco de Dados da DITEL/PMDF
Observou-se entre os homens que a predominância de maior tempo de
afastamento está relacionado a cirurgias, síndrome de dependência, problemas de
coluna e entorses de membros inferiores e hipertensão arterial, entre outros.
Já entre as mulheres, há predominância de maior tempo de afastamentos
relacionados ou associados à depressão em vários estágios (55%) e a cirurgias (29
%), além de licença para tratamento de pessoa da família (8,47%).
Esse é um fenômeno que merece ser estudado, embora não seja objeto de
estudo dessa pesquisa, é alarmante a diferença entre os dois grupos no tocante aos
problemas relacionados à depressão, enquanto as mulheres apresentam 55% entre
a amostra dos onze CIDs com maior número de dias de afastamento relacionados à
depressão, esse percentual entre os homens é de apenas 5%. Estudos mais
aprofundados devem ser feitos para determinar as causas e prevenir esse grave
problema de saúde da mulher policial militar.
Uma constatação, não menos interessante, é que embora o número de dias
de afastamento seja correlato à relação proporcional entre o efetivo feminino e
masculino, a quantidade de enfermidades (CID) é totalmente desproporcional, sendo
96
apresentados 1776 no grupo masculino, enquanto no grupo feminino foram
encontradas 511 enfermidades, ou seja, apenas 29 % do número apresentado no
grupo masculino.
3.5.6 AS QUESTÕES CRIMINAL E DISCIPLINAR
Nas análises sobre a inserção feminina nas polícias, em várias esferas, tanto
na bibliografia consultada, quanto nas entrevistas degravadas, uma questão foi
levantada amiúde. Vários questionamentos foram feitos sobre a suposta menor
incidência de delitos criminais e disciplinares entre as policiais femininas.
A esse respeito, a entrevistada V.N.O.A, que é a policial feminina mais antiga
da PMDF, destacou em sua entrevista, o seguinte:
Em algumas atividades policiais, a repressão é necessária e as mulheres sabem ser repressivas da melhor forma possível quando é necessário, pois a maioria é intransigente e não compactua com a corrupção. Nas estatísticas da corregedoria, quantas mulheres estão envolvidas em corrupção?. Então, a austeridade de uma mulher passa por sua postura, como ela se apresenta em sua atividade.
Para afastar a suspeição do discurso, pois a entrevistada é policial feminina,
então é mister conhecer a opinião dos homens a esse respeito. O entrevistado
D.S.P. assim se manifestou:
Isto aí é a pergunta mais fácil de responder. Por que todas as PM`s hoje têm policiais femininas. Me diga qual foi o momento em que uma policial feminina matou gente na rua, atropelou menores, invadiu casas dando tiros. É só homem que faz. Em todas as polícias nós estamos tendo problemas hoje em dia, é só assistir as reportagens, a todo o momento está o PM de São Paulo envolvido, o PM do Rio envolvido, o PM do Amazonas, o PM de Minas, o PM de Brasília. E todos eles envolvidos com um trabalho mal feito, um trabalho de agressividade junto à população. Onde que tem uma mulher, é só dizer que tem que eu vou ver. Por que eu não assisti ainda nenhuma reportagem. Todas as polícias militares têm policiais femininas na rua. Trabalhando na rua dentro de guarnições. Está aí essa resposta, está aí. Então eu vejo a mulher na Policia Militar com outros olhos, melhor do que o trabalho feito pelos homens. Na minha visão.
Calazans (2003), ao abordar esse assunto, enfatiza que as mulheres têm
maior propensão a um maior rigor disciplinar:
Apesar do impacto da instituição sentido pelas mulheres, ao ingressarem na Polícia Militar, de um modo geral, elas se sentem e também são vistas como mais rigorosas que os homens em relação à hierarquia e na incorporação de normas disciplinares, ainda que exista a idéia recorrente de que, por desempenharem um papel mais humanizador, permitiriam uma quebra da rigidez hierárquica. (CALAZANS, 2005, p. 8)
97
Musumeci e Soares (2005) demonstraram que no Estado do Rio de Janeiro foi
feita uma experiência de alocar as policiais femininas no controle de trânsito,
exatamente por serem menos propensas à corrupção:
De acordo com vários depoimentos e com um certo mito que se constituiu em torno desse fato, a corrupção diminuiu quando as mulheres assumiram o controle do trânsito. Elas teriam agido de forma rigorosa, transmitindo à população carioca a imagem de uma polícia honesta, correta e cumpridora da lei – que ao mesmo tempo funcionava como um cartão postal para a PM e legitimava o lugar das mulheres no interior da corporação. (MUSUMECI E SOARES, 2005, p. 58)
Em que pese haver (muito) menos mulheres do que homens nas corporações,
lembrando que a proporção de efetivo feminino em relação ao masculino na PMDF é
de apenas 6,51%, naturalmente, em termos absolutos é de se esperar que houvesse
(muito) menos transgressões praticadas por mulheres.
Mas, então, como foi verificado em relação ao absenteísmo, esse número
deveria estar correlacionado à proporção do efetivo feminino em relação ao
masculino. Ou seja, a quantidade de transgressões femininas em relação ao total
deveria ser proporcional à quantidade de efetivo feminino em relação ao efetivo total.
Entretanto, conforme dados levantados no BD do Departamento de Controle e
Correição da PMDF (DCC), os índices de envolvimento de mulheres em delitos
criminais apurados por inquéritos policiais militares no ano de 2010 é quase zero.
O gráfico 36 mostra o total de procedimentos instaurados.
Tipos penais mais frequentes de IPMs em 2010, por nº de PMs do sexo masculino envolvidos
Ameaça3%
Homicídio3%
Crime contra Adm Púb2%
Difamação2%
Lesão Corporal57%
Peculato13%
Falsidade ideológica1%
Furto1%
Diversos18%
Lesão Corporal Peculato Diversos Ameaça Homicídio Crime contra Adm Púb Difamação Furto Falsidade ideológica
Gráfico 36 – IPMs instaurados em 2010 por número de envolvidos Fonte – Banco de Dados do DCC/PMDF
98
Em todos os 233 procedimentos instaurados, houve 349 policiais militares
masculinos envolvidos e apenas duas policiais femininas.
Ao analisar-se o desgaste da imagem da Corporação quando há notícias
veiculadas na mídia do envolvimento de policiais militares em delitos criminais,
verifica-se que os delitos mais freqüentes (gráfico 35) retratam genericamente o
estigma de violentas das polícias brasileiras no imaginário coletivo. Imagem que se
torna difícil de modificar, se novas notícias de violência policial ocorrem a cada ano.
Conforme o entrevistado R.F.A., o objetivo da inclusão de mulheres na PMDF
foi modificar a imagem da Corporação e promover uma aproximação com a
comunidade, deixando o papel de polícia de estado para uma polícia de segurança
pública:
Aí entra aquela questão histórica, a sociedade captou o gesto da Polícia Militar. Elas foram primeiro passo da Polícia Militar em busca da aproximação com a comunidade. Foram as mulheres aqui da PMDF, embora isso não se falasse, embora os homens não compreendessem o processo que estava ocorrendo de mudança, mas era isso que estava acontecendo. A Polícia Militar pela via da presença feminina iniciava um processo de aproximação com a comunidade, de vinculação com a questão do policiamento preventivo e de afastamento da Polícia de Estado, a Polícia Autoritária. Foi justamente nessa época. Se você perguntar para a maior parte dos homens que trabalhavam naquela época, se isso ocorreu? Ele vai dizer que não sabe que não se apercebeu. Mas era justamente isso que se buscava. Então, eu acho que a maior relevância da presença feminina foi justamente essa de se aproximar da comunidade.
A Polícia Militar tem conseguido melhorar, com algum custo, sua imagem
perante a sociedade, embora seja um processo lento pois se dá dois passos para a
frente e um para trás. São feitos vários trabalhos sociais junto à comunidade escolar,
a exemplo do PROERD8 e do Teatro Rodovia, ao mesmo tempo em que se insere
nos currículos dos cursos de formação a disciplina de direitos humanos, bem como
se faz cursos de especialização em direitos humanos na PMDF, aliados a tentativa
de implantação do policiamento comunitário, tudo no intuito de ser uma polícia mais
voltada para os anseios da comunidade, melhorando a sua imagem, mas toda vez
que aparece na mídia notícia de envolvimento de policiais em delitos criminais, isso
deteriora essa imagem mais uma vez e dificulta a percepção da sociedade civil à
cerca desse processo de mudança iniciado na era pós-ditadura.
É um senso comum que a policial feminina tem essa característica
humanizante, inclusive foi inserida por esse motivo, e foi dito por elas próprias que
8 PROERD – Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência
99
52% gostam muito do serviço operacional, há evidências de que as policiais
femininas têm pouca propensão ao cometimento de práticas delituosas e houve
intenção da PMDF em melhorar sua imagem com a inclusão de efetivo feminino,
então é correto afirmar que a Corporação, hoje em dia, não está a par desses fatos,
pois emprega pouco a mulher na atividade fim, no serviço operacional, em contato
com a comunidade.
Se empregasse mais, ou se tivesse efetivo feminino suficientemente grande
para ser empregado em atividade fim, poderia ter menores índices de cometimento
de delitos criminais, melhorando sua imagem e promovendo maior aproximação com
a comunidade. Ao cercear o ingresso de efetivo feminino por meio de limitação
percentual de efetivo, a PMDF está agindo contra a melhoria de sua própria imagem,
enquanto Corporação.
No viés disciplinar, verificou-se em uma amostra de 439 sindicâncias
instauradas pelo Departamento de Correição e Controle (DCC) no ano de 2010, que
565 envolvidos eram policiais militares do sexo masculino, 37 procedimentos eram
para apurar fatos em que não era possível identificar os envolvidos e 14 tinham
policiais femininas como envolvidas, conforme gráfico 37.
Total de envolvidos em amostra de sindicâncias (2010), por gênero
Homens91,72%
Não identificados6,01%
Mulheres 2,27%
Homens Mulheres Não identificados
Gráfico 37 – Sindicâncias instauradas em 2010 por gênero e por número de envolvidos Fonte – Banco de Dados do DCC/PMDF
100
Novamente, verificou-se que a participação feminina em transgressões
disciplinares também é ínfima, muito inferior proporcionalmente do que o próprio
efetivo feminino é em relação ao masculino.
Novamente, se infere que se poderia diminuir a quantidade de procedimentos,
se os efetivos masculino e feminino fossem numericamente mais equilibrados. Esse
processo de equilíbrio tem que ser lento e gradual, pois não seria factível modificar
essa cultura organizacional repentinamente, mas se não houvesse essa limitação
desde a inserção feminina na PMDF, certamente hoje em dia o equilíbrio quantitativo
já teria sido completado e esse aspecto já poderia estar trazendo efeitos positivos
com a diminuição de procedimentos apuratórios disciplinares. Mas, nunca é tarde
para se iniciar. Caso o equilíbrio quantitativo do efetivo seja iniciado hoje, poderá
gerar efeitos em médio prazo.
Ao analisar o gráfico 38 verifica-se que de todos os procedimentos
instaurados em 2010, apenas 77 resultaram em punições e esse número vem
decaindo anualmente. Se por um lado, esse fato pode ser considerado positivo pelo
declínio das punições sofridas por policiais militares, por outro lado, verifica-se o
quanto custa para a PMDF a instauração desses procedimentos. São trinta dias,
prorrogáveis, em que o encarregado tem que ouvir testemunhas, interrogar os
envolvidos, produzir documentação para instruir o procedimento, produzir relatório,
etc. Muito tempo é gasto na elaboração desses procedimentos, tempo que seria
melhor empregado na atividade fim. Menos procedimentos, então, seria uma
situação desejável para a PMDF.
Gráfico 38 – Punições resultantes de Sindicâncias instauradas em 2008, 2009 e 2010 Fonte – Banco de Dados do DCC/PMDF
101
O efetivo feminino parece menos predisposto ao cometimento de ilícitos
penais e infrações disciplinares, o que por si só já recomendaria o emprego dessas
policiais em maior escala na atividade fim do que se emprega hoje em dia.
Aliadas a todas as demais constatações anteriores, essas demonstram que o
perfil das policiais femininas se encaixa como muito relevante para os objetivos da
PMDF, enquanto Instituição destinada à preservação da ordem pública. A
Corporação só não utiliza mais mulheres por falta de efetivo feminino, provocada
pela limitação imposta por lei, que pode e deve ser modificada.
102
CONCLUSÃO
Ao iniciar esta pesquisa, tinha-se em mente que se tratava de um assunto
referente apenas à Polícia Militar, mas ao se aprofundar um pouco mais na questão
do gênero e mercado de trabalho, pôde-se verificar que é uma questão universal.
Conforme foi demonstrado, a inserção das mulheres no mercado de trabalho ainda é
um fato relativamente recente e ainda traz consigo as barreiras de séculos de
subjugação da mulher. Na Polícia Militar não é diferente.
Partindo da premissa de que se trata, de fato, de uma questão referente ao
direito da mulher trabalhadora e pelo fato de em vários títulos consultados e em
entrevistas, ter sido identificada como unânime a opinião de que a limitação do
percentual do efetivo feminino para ingresso na Polícia Militar seria inconstitucional,
foi realizada uma pesquisa no texto da Carta Magna, onde se constatou que tal
distinção realmente não foi recepcionada. O artigo terceiro e inciso primeiro do artigo
quinto, além dos incisos XX e XXX do artigo sétimo são uníssonos em afirmar que
não se pode fazer distinção em critérios de admissão em função do gênero e o artigo
trinta e nove somente autoriza esse tipo de distinção, quando a natureza do cargo
exigir.
Ficou claro que a natureza da função policial militar não exige critérios
distintos, uma vez que há mulheres desempenhando todas as atividades, hoje em
dia na PMDF, em igualdade de condições com o efetivo masculino, conforme foi
demonstrado pelo perfil das policiais militares femininas, provando-se que o critério
percentual está incorreto, sob o aspecto jurídico.
Verificou-se também com esta pesquisa que a inserção das mulheres nas
polícias militares brasileiras foi um fenômeno nacional desencadeado a partir da
publicação de Portaria Normativa do Ministério do Exército que autorizou tal
ingresso, o que foi gradativamente sendo adotado pelas polícias estaduais a partir
de 1977. Essa inserção se deu concomitantemente a outras conquistas femininas e
da sociedade como um todo que clamava por mais democracia e igualdade.
Nesse contexto, o objetivo da inserção da mulher na PMDF foi, segundo
extraído das entrevistas com os oficiais que coordenaram a inserção de proporcionar
uma maior proximidade da Corporação com a comunidade e melhorar a imagem da
Polícia Militar.
103
Para tanto, o policiamento feminino foi instituído como um policiamento
especializado que existia principalmente para ser empregado em contato com a
comunidade em missões de apoio às minorias, mas com o decorrer do tempo, essa
idéia foi suprimida, com a extinção da Cia PM Fem e a unificação dos quadros.
Dessa forma, inicialmente o objetivo foi alcançado, porém ao se abandonar o modelo
de policiamento feminino, as policiais militares femininas passaram a ser mais
utilizadas em funções administrativas (dentro dos quartéis), tendo sido verificado que
47,2 % delas desempenham essa atividade.
Embora isso ocorra, as mulheres acreditam que podem ser empregadas em
toda e qualquer atividade dentro da PMDF (82,6%), pois foi demonstrado que 52%
gostam muito da atividade operacional e 62% trabalharam no serviço operacional
por mais de 5 anos, sendo que 16,5% dessas trabalharam por mais de 10 anos e
20,5% trabalharam por mais de 15 anos, o que desmistifica a questão da preferência
da atividade administrativa sobre a operacional pelo efetivo feminino.
A adaptação das policiais militares femininas à Corporação verifica-se
satisfatória, observando-se que a maioria está satisfeita com a função exercida, sente
orgulho de ser policial militar, orgulho e prazer em vestir a farda, que apoiaria a
decisão de seus filhos em serem policiais militares e não faz planos de deixar a
PMDF antes de se aposentar.
Em relação à adaptação da PMDF à presença feminina, verificou-se que ainda
está em curso e pode ser considerada pequena, quando se observa que apenas
50% das UPMs possuem instalações adequadas e, além disso, foi notória a
discriminação de gênero, sentida e relatada pelas próprias policiais femininas e
também por outros pesquisadores e entrevistados, demonstrando que essa é uma
barreira que ainda precisa ser transposta, para que a inserção se dê de forma
completa.
Sobre as áreas de atuação, o efetivo feminino está alocado onde mais se
adaptou e onde a Corporação achou por bem em utilizá-lo, uma vez que não
existem mais serviços exclusivamente destinados ao efetivo feminino. A alocação
desse efetivo não obedece somente a critérios técnicos ligados às necessidades da
Corporação, mas a critérios pessoais ligados às preferências e necessidades das
próprias policiais femininas, que foi demonstrado ser mais relacionado às atividades
administrativas.
104
Ao se traçar o perfil das policiais militares femininas do DF, verificou-se que a
maioria delas é casada e possui filhos, fazendo com que a dupla jornada feminina as
incentive ou obrigue a escolher essa atividade.
Entretanto, foi constatado que há uma parcela considerável desenvolvendo
atividades operacionais e especializadas (33,5%), o que aliado ao fato de a maioria
ter relatado que aprecia muito o serviço operacional e que já atuou nele por pelo
menos cinco anos, indica que a maioria das policiais femininas está na atividade
meio, mas não porque não gostem da atividade fim, ou porque não tenham se
adaptado.
Em relação ao absenteísmo, verificou-se que o feminino é equivalente
proporcionalmente ao masculino, mas entre as mulheres é muito mais motivado por
fatores ligados à depressão do que entre os homens, o que enseja outras pesquisas
mais aprofundadas sobre o tema, por não ser o objetivo desta.
Outra constatação é de que os afastamentos por licença maternidade
equivalem a apenas 0,4% do total de afastamentos o que desmistifica essa questão.
Sobre os aspectos criminais e disciplinares, verificou-se que as mulheres têm
menor propensão a esse tipo de envolvimento do que os homens.
Observando-se o perfil das policiais militares femininas da PMDF, conclui-se
que não há qualquer aspecto que desaconselhe a utilização de efetivo feminino em
qualquer atividade dentro da Corporação, muito pelo contrário. Logo, a limitação do
quantitativo de efetivo feminino age contra o melhor aproveitamento das
potencialidades femininas no contexto corporativo, pois não permite utilizá-lo em
atividades operacionais com maior frequência, devido ao pequeno quantitativo.
Quanto às atividades administrativas, verificou-se que o critério adotado para utilizá-
las em maior escala nessas funções, além da conveniência devido à dupla jornada,
é o fato de serem mais organizadas e de “humanizarem” o ambiente.
Observa-se que um maior emprego de efetivo feminino, em todos os sentidos,
poderia contribuir com a eficácia e efetividade da Polícia Militar, na sua a
aproximação com a comunidade e na melhoria de sua imagem, entretanto esse
maior emprego não é visto, pois o efetivo feminino representa apenas 6,51% do
efetivo existente e apenas 18% desse pequeno grupo atua na atividade operacional.
Para resolver esse problema, é necessário inicialmente recompletar pelo
menos o percentual definido em lei, que é de 10 % do total. Isso representa um
acréscimo de 480 policiais femininas, atualmente. Mas, como critérios distintos de
105
admissão em função de gênero para uma mesma função são proibidos, também não
se poderia fazer um concurso apenas para mulheres nem com mais vagas femininas.
Dessa forma, a solução inicial seria o provimento dos claros femininos em cada
quadro, com o estabelecimento em editais dos próximos concursos não de 10% das
vagas a serem preenchidas, mas da quantidade necessária para fazer com que o
percentual de 10% do efetivo seja cumprido, respeitando-se 50% das vagas para
ambos os gêneros.
Posteriormente, o simples cumprimento da CFB 88 seria a única solução, com
a proposição da revogação do artigo quarto da Lei 9. 713 de 1998 que restringe o
efetivo feminino em 10% do efetivo total. Não havendo mais nenhum dispositivo
restringindo e tendo a própria Constituição como amparo legal, poder-se-ia publicar
editais com 50% das vagas previstas para mulheres em todos os concursos, daí por
diante.
Paralelamente, deve ser feito um planejamento para o emprego desse efetivo,
em atividades operacionais, no policiamento comunitário, onde foi identificado que as
potencialidades femininas seriam melhor empregadas em contato com a
comunidade. Estudos mais aprofundados devem ser feitos sobre tal emprego, uma
vez que esse tema merece grande atenção dos planejadores estratégicos da
Corporação e visto que atualmente não há critérios claros sobre a utilização de
efetivo feminino na PMDF.
Conforme foi constatado nesta pesquisa, a atuação das policiais militares
femininas é relevante, mas encontra as barreiras da discriminação em vários
sentidos. Quando não houver mais essas barreiras, todos os aspectos abordados
como, a ação mais humanizada e humanizadora, a menor propensão a delitos
criminais e disciplinares e o melhor tratamento para com o público poderão ser
utilizados como potencializadores do efeito preventivo da ação policial, melhorando a
imagem da polícia militar, que sendo uma instituição que existe para ser instrumento
de justiça não pode carregar dentro de si a prática injusta de tratar os iguais com
desigualdade.
106
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111
APÊNDICE A
QUESTIONÁRIO
GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL
POLÍCIA MILITAR DO DISTRITO FEDERAL DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO E CULTURA
CENTRO DE ALTOS ESTUDOS E APERFEIÇOAMENTO
Instituição de Ensino – Centro de Altos Estudos e Aperfeiçoamento
Curso – Especialização em Gestão da Segurança Pública – C.A.O.
Autora do Estudo – CAP QOPM Cleide Quele Alves Castellar – Aluna do CAO 2011
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Senhora Policial Militar, estamos desenvolvendo um trabalho de pesquisa
monográfico que tem por objeto de estudo “A RELEVÂNCIA DA ATUAÇÃO DAS
POLICIAIS MILITARES FEMININAS NO CONTEXTO CORPORATIVO DA
PMDF”.
Para atingir os objetivos propostos, estamos entrevistando as policiais militares
femininas da PMDF, a fim de verificar a abrangência e a relevância do tema. É extremamente
importante a sua opinião para que possamos atingir tais objetivos.
A participação nesse estudo é totalmente voluntária e para que possamos validar suas
opiniões é necessário que assine esse termo de consentimento livre e esclarecido.
O resultado desse trabalho será publicado, porém sua identidade não será revelada, sob
qualquer hipótese. Portanto, o consentimento que estará sendo concedido refere-se apenas à
utilização dos dados para a consolidação dos resultados da pesquisa.
Muito obrigada pela sua participação!
Nome completo da entrevistada__________________________________________
Posto/Graduação__________________
UPM ______________________________________________________________
_______________________________________
Assinatura da entrevistada
112
Qual é a sua idade? _________________
Em que ano ingressou na PMDF?__________________________________________________
Qual o seu estado civil?
( ) Solteira ( ) União estável ( ) Casada ( ) Divorciada ( ) Viúva
Se possui cônjuge, o mesmo é policial militar?
( ) SIM ( ) NÃO
Se policial militar, seu cônjuge é:
( ) Praça ( ) Oficial
Possui filhos? _________Quantos?__________________
Qual seu grau de escolaridade?
( ) Fundamental ( ) Médio
( ) Superior (Área de Formação)______________________________________)
( ) Pós Graduação ( ) Mestrado ( ) Doutorado
Por que escolheu a carreira Policial Militar?
( ) Salário ( ) Carreira ( ) Estabilidade ( )Status
( ) Outra ___________________________________________________________________
O que sente por ser integrante da PMDF?
( ) Orgulho ( ) Prazer ( ) Medo ( ) Ansiedade ( ) Contrariedade
( )Outro
______________________________________________________________________
O quê significa vestir a farda?
( ) Orgulho ( ) Prazer ( ) Elegância ( ) Receio da opinião pública
( )Outra ___________________________________________________________________
Por quantos anos trabalhou/trabalha no Serviço Operacional da PMDF?
( ) Menos que 01 ( ) 01 a 05 ( ) 05 a 10 ( ) 10 a 15 ( ) mais de 15
Que tipo de atividade especificamente você desenvolve em sua unidade?
( )Administrativa ( )Operacional ( )Especializada ( )Ensino
( )Outra____________________________________________________________________
Caso lhe fosse dado oportunidade de escolher, em que atividade gostaria de trabalhar?
( )Administrativa ( )Operacional ( )Especializada ( )Ensino
( )Outra____________________________________________________________________
Faz planos para deixar a PMDF antes de se aposentar?
( ) Sim ( ) Não
Está satisfeita com a função que desempenha atualmente em sua unidade?
( ) SIM ( ) NÃO
A UPM em que trabalha possui instalações adequadas à presença feminina (alojamento,
banheiro)?
113
( ) SIM ( ) NÃO
Quando está portando arma de fogo qual é a sensação?
( ) Poder ( )Responsabilidade ( )Preocupação ( ) Risco
( )Outra____________________________________________________________________
Porta arma de fogo nos períodos de folga?
( ) SIM ( ) NÃO ( ) AS VEZES
Na sua opinião, qual é a melhor coisa em ser policial militar?
___________________________________________________________________________
Na sua opinião, qual é a pior coisa em ser policial militar?
___________________________________________________________________________
Apoiaria a decisão de seus filhos de serem policiais militares?
( ) SIM ( ) NÃO
Na sua opinião houve mudanças na Corporação após o ingresso das policiais militares
femininas? Porquê?
( ) SIM ( ) NÃO
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
Na sua opinião em que área a mulher seria melhor empregada na Corporação?
( ) Serviço Administrativo
( ) Policiamento Ostensivo Geral
( ) Policiamento Especializado ( Trânsito, Turístico, Ambiental, Montado, Aéreo...)
( ) Educação e Ensino
( ) Algum específico_________________________________________________________
( ) Em toda e qualquer área.
Na sua opinião, como deveria ser o critério para o cálculo do percentual de vagas para
ingresso na PMDF de mulheres e homens?
( ) Sem limite percentual, todos concorrendo, sem distinção.
( ) 50% para mulheres e 50% para homens
( ) 30% para mulheres e 70% para homens
( ) 20% para mulheres e 80% para homens
( ) Outra ___________________________
Quanto gosta do serviço operacional?
( ) Muito ( ) Razoavelmente ( ) Pouco ( ) Nada ( ) Indiferente
Na sua opinião as policiais militares femininas possuem os mesmos direitos dos policiais
militares masculinos?
( ) Sim ( ) Não
114
Já sofreu algum tipo de assédio no âmbito da PMDF?
( ) Sim ( ) Não
Caso seja Oficial, ingressou na PMDF como praça?
( ) Sim ( ) Não
Já sofreu algum tipo de discriminação na PMDF pelo fato de ser mulher?
( )Sim ( ) Não
Se desejar, escreva no verso o que pensa sobre o assunto, mas não foi perguntado.
Muito Obrigada!
115
APÊNDICE B
ENTREVISTA ESTRUTURADA
GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL
POLÍCIA MILITAR DO DISTRITO FEDERAL DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO E CULTURA
CENTRO DE ALTOS ESTUDOS E APERFEIÇOAMENTO
Instituição de Ensino – Centro de Altos Estudos e Aperfeiçoamento
Curso – Especialização em Gestão da Segurança Pública – C.A.O.
Autora do Estudo – CAP QOPM Cleide Quele Alves Castellar – Aluna do CAO 2011
ROTEIRO PARA ENTREVISTA ESTRUTURADA
Trabalho de pesquisa monográfico que tem por objeto de estudo “A RELEVÂNCIA
DA ATUAÇÃO DAS POLICIAIS MILITARES FEMININAS NO CONTEXTO
CORPORATIVO DA PMDF”.
O resultado desse trabalho será publicado, portanto, solicito o consentimento para a
utilização das informações para a consolidação dos resultados da pesquisa.
Muito obrigada pela sua participação!
Nome: Posto/Graduação: UPM:
QUAIS FORAM AS EXIGÊNCIAS DO EDITAL PARA INGRESSO DAS POLICIAIS FEMININAS NA CORPORAÇÃO?
QUAIS FORAM AS MAIORES DIFICULDADES NO PROCESSO DE INSERÇÃO DAS POLICIAIS FEMININAS NA PMDF?
QUAL FOI A REAÇÃO DO EFETIVO DE POLICIAIS MASCULINOS DURANTE ESSE PROCESSO?
QUE ATIVIDADES ERAM DESEMPENHADAS PELAS POLICIAIS NOS PRIMEIROS ANOS?
COMO FOI O PROCESSO DE UNIFICAÇÃO DOS QUADROS NA CORPORAÇÃO?
O PERCENTUAL LIMITE FIXADO DE EFETIVO FEMININO NA PMDF É O MAIS ADEQUADO? POR QUÊ?
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EXISTE ALGUMA ATIVIDADE EM QUE A POLICIAL FEMININA PODE SER MELHOR APROVEITADA OU DEVE SER EMPREGADA EM TODAS AS ATIVIDADES EXISTENTES NA PMDF?
FALE SOBRE A RELEVÂNCIA DO DESEMPENHO DAS POLICIAIS MILITARES FEMININAS NA PMDF?
O QUE MUDOU NO CONTEXTO CORPORATIVO COM A PRESENÇA FEMININA?
NA SUA OPINIÃO AS MULHERES CONQUISTARAM SEU ESPAÇO NA PMDF E ATUALMENTE POSSUEM OS MESMOS DEIREITOS DOS POLICIAIS MASCULINOS OU AINDA EXISTE ALGUM TIPO DE DISCRIMINAÇÃO?
117
APÊNDICE B1
ENTREVISTADO Nº 1 – CEL QOPM RR DANIEL DE SOUZA PINTO
Nós fizemos o edital com base no edital masculino. Era altura de 1,65 m, 2º
grau, tinha que ser aprovada no psicotécnico, exame médico e exame intelectual.
Mas foi exatamente o critério do edital masculino.
As dificuldades que essas meninas tiveram para o ingresso foi o exame físico.
Elas não estavam muito acostumadas a fazer “Cooper” nas horas de folga em casa.
Eram meninas estudantes que não estavam acostumadas a fazer física. Sofreram
muito e talvez um grau de desistência que nós tivemos após o início do curso foi por
sentirem muita dificuldade para o regime militar da época.
Hoje eu posso dizer que nós cometemos talvez, uma pequena falha, nós
deixamos de preparar o pessoal masculino para o recebimento das femininas. Mas a
meu ver, mesmo sem essa preparação eles tiveram um comportamento perfeito.
Alguns casinhos foram todos eles resolvidos pelo Comandante Geral e por mim na
época, mas não houve nenhum fato que desagradasse a Polícia Militar e a
comunidade da nossa cidade.
Quando nós formamos a primeira turma, nós optamos por policiamento
ostensivo de duplas nos grandes pontos de Brasília, Aeroporto, Conjunto Nacional,
rodoviária, rodoferroviária e tínhamos também uma viatura que fazia ronda a quatro
nessas áreas. Uma viatura própria da polícia feminina. Então elas faziam o serviço
de policiamento ostensivo nas grandes áreas de circulação do público.
A comunidade e a população de Brasília receberam bem as moças e elas
estavam bem preparadas. Nós trouxemos para o nosso quadro na época, uma
tenente da Polícia Militar de São Paulo que acompanhou a primeira e segunda
turma. Então a própria Tenente Bernadete ia junto e ensinava no local do serviço
como era a postura, o andar, o trato com a população, a conversação. Foi muito bom
na época, foi um grande sucesso.
Olha, a unificação, eu tive um encontro quando assumi o Comando Geral da
Polícia Militar, em 97, com a hoje coronel Vanuza, com a hoje reformada coronel
Solange, e nós tratamos do assunto da unificação. Porque o quadro realmente
estava parado, não tinha como andar. A gente sabia até que iria haver uma
insatisfação por parte dos homens. Mas na distribuição de postos, na hierarquia
quem estiver melhor, tem o direito de sair promovido na frente do outro. Isso é da
118
Polícia Militar desde Caxias. Bem, então nós mantivemos contato na época com o
senador Romeu Tuma, explicamos para ele o que a gente queria, fizemos uma
documentação e ele levou para o Presidente da República Fernando Henrique
Cardoso e fizemos essa unificação que foi um grande sucesso e hoje nós temos
coronel e já, já uma Comandante Geral da Polícia Militar.
Quem escolhe o momento de aumentar ou de diminuir o percentual, ainda não
teve a visão do que é uma mulher na rua. Eu não posso te afirmar de que a mulher é
mais honesta do que o homem, eu não posso te afirmar isso, mas eu vou te dizer o
seguinte, eu pessoalmente gostaria que fosse meio a meio, 50% mulher, 50%
homem. Eu tenho certeza, pela minha experiência de 37 anos, a força que nós
iríamos ter, um sucesso maior com relação a aceitação do público com a Polícia
Militar. A mulher é muito mais bem aceita, isso em qualquer lugar do mundo, isso já
está comprovado. Não sou eu quem está falando.
Todas. Como nós temos homens que são especialistas em computador, ele
senta ali, a escala sai perfeita, as relações saem perfeitas. Nós temos o homem
certinho para o BOPE, para invadir uma residência, apanhar alguém armado,
fortemente armado dentro de casa. Então, são homens diferentes, nós tínhamos
mulheres especialistas em tratar com crianças de uma creche, como tem uma
mulher para saltar pára-quedas, prá invadir residências com seqüestro. Eu acredito
que a mulher, ela tem condições de estar em todas as funções da Polícia Militar.
Isto aí é a pergunta mais fácil de responder. Por que todas as PM`s hoje tem
policiais femininas. Me diga qual foi o momento em que uma policial feminina matou
gente na rua, atropelou menores, invadiu casas dando tiros. É só homem que faz.
Todas as polícias nós estamos tendo problemas hoje em dia, é só assistir as
reportagens, a todo o momento está o PM de São Paulo envolvido, o PM do Rio
envolvido, o PM do Amazonas, o PM de Minas, o PM de Brasília. E todos eles
envolvidos com um trabalho mal feito, um trabalho de agressividade junto à
população. Onde que tem uma mulher, é só dizer que tem que eu vou ver. Por que
eu não assisti ainda nenhuma reportagem. Todas as polícias militares têm policiais
femininas na rua. Trabalhando na rua dentro de guarnições. Está aí essa resposta,
está aí. Então eu vejo a mulher na Policia Militar com outros olhos, melhor do que o
trabalho feito pelos homens. Na minha visão.
Eu posso falar isso porque eu vivi durante 10 anos dentro da Corporação, 5
anos de Exército, ou seja 15 anos dentro de quartéis masculinos só. Muito árido
119
muito assunto fora do comum. Só homem falta um pouco de sensibilidade, muito
palavrão, muita mitidez como a gente diz: o cara é o rei do mundo; o policial militar é
o dono é o Deus.
Com a entrada da mulher o homem teve que mudar o seu jeito de ser, mais
respeitoso, falar mais baixo, respeitar mais as pessoas que estão próximas a ele. A
entrada da mulher trouxe um clima de tranqüilidade para todas as polícias militares.
Isso também, se for perguntado para todas as PM`s vão falar: A entrada das
mulheres trouxe um ambiente mais calmo, mais tranqüilo, equilibrado para o setor
militar. Inclusive no Exército, na Marinha e na Aeronáutica.
Eu acho ainda que não, falta um pouco ainda. Mas não está longe não. Eu
tenho uma impressão de que quando uma mulher assumir o Comando Geral de uma
Corporação seja ela qual for e isso não vai demorar ainda. Quem diria que nós
iríamos ter uma Presidente da República feminina. Se falasse isso há 10 anos o cara
era morto: Isso é mentira, é mentira. Então, escrevam bem, no momento em que
tivermos uma coronel comandante geral, ela vai ter tudo na mão prá começar, prá
fazer algumas modificações, colocar as tenentes coronéis nos comandos dos
quartéis. A mulher tem muito mais controle para falar com a comunidade, com uma
prefeitura, os prefeitos, os síndicos. Muito óbvio. Isso É fácil de ver é só fazer o
teste. Então eu creio que isso aí é por pouco tempo, mas ainda, a mulher, falta um
pouquinho para ter uma presença plena como deveria ter.
Eu acho que exista ainda um pouquinho de discriminação. Na parte financeira
não há como, tem que ser igual por que aí é um investimento padronizado, então
não tem jeito. Mas na parte de serviços, eu, por exemplo, acompanhei a Coronel,
desde de Major o que fizeram com ela quando era major, o que fizeram com ela
quando era tenente coronel e o que estão fazendo com ela como coronel. Ela hoje
está numa DIP- Diretoria de Inativos... é função de coronel o posto, mas tem outros,
Comando de Policiamento. Se puser vai trabalhar, vai fazer direitinho. Às vezes você
tem cinco coronéis e um é talhado para aquilo. Se ela não for trabalhar vai ter outra.
E elas estão aí prontas para poder exercerem essas funções. Tenho certeza que
será um sucesso é só tentar.
Sobre a disciplina e desligamento das policiais.
Nós sentimos um pouco de dificuldade na parte disciplinar porque elas eram
meninas muito novas e a maioria delas estavam com 18, 19 anos. Eram meninas
que viviam em casa com os pais, com o pai, com a mãe e irmãos e de repente ela
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sai de casa, vem para o quartel, uma ordem unida, educação física, tiro de 38. Um
grande número não suportou isso e desistiram. A desistência foi grande parte por
esse motivo. Não se acostumaram com o regime militar, a disciplina, o respeito ao
cabo, pelo sargento, pelos oficiais. Então, elas estranharam um pouco. Algumas
delas já estavam mais ou menos delineadas para serem psicólogas, enfermeiras,
advogadas. Quando entraram aqui, prestaram o vestibular e passaram, eram
meninas aplicadas e foram fazer o curso. Muitas delas eram também isso.
Disciplinarmente nós tiramos algumas, foram poucas que cometeram erros
disciplinares. Talvez não chegasse a 10 de um número de 200. Não chegou a 10 e
isso é 0,5 %.
Eu fui contemplado para ser o Comandante da primeira turma, da segunda
turma, eu fiquei 4 anos na polícia feminina, de 83 a 86 e acredito ter feito um bom
serviço para a polícia militar. A nossa idéia era colocar policiais na rua com um bom
porte físico, respeitadoras, sérias. Nunca eu soube até hoje, olha que eu não tenho
acompanhado mais as nossas policiais femininas aqui em Brasília, mas eu ainda
desconheço qualquer ato de corrupção envolvendo uma policial. Agora, podem
dizer: Ah! É que elas não trabalham. Como não trabalham? Eu vejo na rua. Para o
BOPE ali e desce uma. Para a tropa da ROTAM em Taguatinga, para as viaturas e
desce um monte de gente, ninguém mais sabe que eu fui policial, eu vejo tem umas
duas ou três mulheres correndo junto com os homens, prendendo junto com os
homens e não são corruptas, não se envolvem, não quebram galho de carteira
vencida para motorista, não espancam pessoas na rua. E não é só aqui em Brasília
é no Brasil inteiro, pelo mundo inteiro. Quando sai uma policial lá no Canadá, ou na
Alemanha que espancou alguém é uma notícia gigantesca, por que ninguém
acredita: Não, não! Não pode ser. Agora homens são todos os dias no Brasil, todos
os dias 3, 4 casos. É só pegar as reportagens: menino morreu, foi o PM que matou,
o carro veio com tanta velocidade, o PM estava no meio, estão destruindo os caixas
eletrônicos dos bancos de São Paulo, a gangue da PM está no meio. Vê se tem
mulher, não tem. Por isso, a mulher para mim é o futuro do nosso Brasil e do mundo.
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APÊNDICE B2
ENTREVISTADO Nº 2 – CEL QOPM RR RENATO FERNANDES DE AZEVEDO
A PMDF foi a segunda ou terceira organização a aceitar mulheres em seus
quadros. A pioneira foi a Polícia Militar de São Paulo, então a PMDF foi uma das
pioneiras nesse avanço.
A Companhia de Polícia Feminina foi criada em 1983, com o seguinte contexto
histórico: vigia no Brasil o chamado “Governo Autoritário”, que já tinha dado sinais
claros para a sociedade de que haveria uma abertura, isso ainda no governo Geisel
que começou esse processo de abertura. Quando assumiu o governo Figueiredo, ele
confirmou esse processo e houve um intenso movimento social chamado “diretas já”.
Isso foi um sinal muito claro de que se sucederia aos governos autoritários nos
próximos anos um governo democrático. A cúpula da PMDF na época percebeu isso
com muita clareza que a polícia militar teria em um tempo muito breve que se
desvincular de uma polícia denominada de polícia de estado para uma polícia de
segurança pública imbricada com os desejos, necessidades e demandas da
sociedade.
É importante entender também que vigorava naquela época um movimento
chamado “Whoman’s Liberation” que era um movimento pela liberdade da mulher
que no mundo todo já se discutia a presença da mulher na vida social quer nas
grandes empresas, quer no governo, nos órgãos públicos. Isso já se discutia na
época e no Brasil.
No Brasil, por exemplo, a participação da mulher ativamente na sociedade é
recente. Porque a Constituição Brasileira que deu o poder de voto à mulher foi a de
1932. Então, são recentes os direitos das mulheres. Isso tudo foi colocado em
discussão na época. E o comando da corporação entendeu que seria uma
mensagem muito interessante de que a polícia militar poderia dar à sociedade e ela
estava consciente dos novos tempos que surgia e que estava predisposta a assumir
essa nova responsabilidade. A responsabilidade de sair de uma polícia autoritária
para uma polícia democrática. E a outra, sair de uma organização fechada em que só
homens trabalharam para uma organização aberta, com a participação feminina,
ressaltou o entrevistado.
Essa foi a mensagem que o comando da corporação da época quis passar para
a sociedade ao implantar a polícia feminina. Então esse contexto histórico, é
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importante ser situado porque a polícia militar feminina não decorreu de uma vontade
repentina de um comandante, esse processo foi bastante maturado.
Uma das questões que a entrevistadora coloca foi qual a reação do público
masculino. Dentro desse contexto histórico de uma polícia autoritária, hão de convir
que houve reações de um lado porque o movimento feminista se antepunha ao
machismo explícito e as polícias brasileiras daquela época eram polícias machistas.
Então, houve uma reação dos policiais masculinos. Não de todos, mas de uma boa
parcela que entendia que se ia aplicar recursos substanciais na formação de um
quadro feminino. Que esse quadro necessariamente não teria condições de se
defrontar com a criminalidade. Que a mulher não estava apta a enfrentar o crime.
Que a mulher seria uma donzela na polícia militar a absorver recursos públicos que
seriam melhor canalizados se ao invés de “X” mulheres, colocassem “X” homens.
Segundo o entrevistado, isso ocorreu mas o comando da corporação estava
muito consciente dessa questão histórica e não se permitiu que esse grupo de
descontentes influenciasse o processo decisório dentro da PMDF. Eles
permaneceram descontentes, mas como todo o regime militar tem os descontentes,
hoje nem tanto, mas na época era assim, “guarde seu descontentamento para si
próprio”.
Foi criada a polícia feminina nesse contexto, uma dificuldade muito grande
porque não tínhamos parâmetros no Brasil. Nosso parâmetro era a PMESP que já
existia há muitos anos (a polícia feminina). Foi trazida para Brasília a Tenente
Bernadete da PMESP para ajudar na formação. Foi complexo porque a PMESP tinha
regras muito claras e muito antigas, mas que não eram cumpridas mais. Eram regras
que existiam, mas quando havia assim uma necessidade, um enquadramento
disciplinar mais forte se buscava essas regras, mas na prática a sociedade já estava
muito a frente dessas regras. A Bernadete trouxe essas regras já antigas,
absolutamente rígidas e isso foi um choque até para os homens. Por que as
mulheres tinham posição de descansar diferente, por exemplo. A nossa posição de
descansar é com as pernas abertas e na época a Bernadete dizia que isso era
incompatível e não ficava bem para a mulher. Então, a posição de descansar
(feminina) era com uma perna para a frente. Foi isso que enfrentamos e ficamos
chocados, mas as regras eram essas. Posição de sentar, a policial feminina não
podia sentar de qualquer maneira, então elas tinham que se sentar com as pernas
juntas voltadas para um lado, na pontinha dos pés. Tudo isso a Bernadete trouxe
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para a formação da primeira turma, além de coisas que colocamos porque
entendemos que era necessário.
Outra questão que se coloca é de: Quem eram essas policiais? Algumas eram
da classe média de Brasília, filhas de militares, que viam na abertura da PM
proporcionada uma possibilidade de seguir a carreira. Outras da classe pobre e que
viam na carreira militar, um viés para a subsistência.
Isso não preocupava, essa estratificação de onde viriam as policiais. A
preocupação era que ao final do curso de formação se tivesse um grupo homogêneo
e com uma mentalidade muito bem definida. Mentalidade no sentido de terem
maneiras comuns de pensar e agir. Isso é o que era buscado. Isso fez com que fosse
inserido na grade curricular do curso matérias que hoje são entendidas como um
verdadeiro absurdo. Foi contratada uma esteticista para ensinar às policiais a se
maquiarem, porque existia uma maquiagem padrão para o dia, outra para a noite.
Como pintar as unhas porque muitas sequer tinha pintado as unhas, algumas nunca
tinham se maquiado na vida. Isso tudo teve que ser ensinado. Foi contratada uma
cabelereira para ensinar como prender o cabelo, porque o cabelo somente era
permitido preso, para tratar o cabelo, pois era na base do gumex. E esse produto
deteriorava muito o cabelo, tinha que haver uma compensação em relação a esse
produto.
Todas as policiais tinham que usar a mesma cor de esmalte em uma mesma
semana. Só que o esmalte claro, por exemplo, tem certas propriedades ou uma
substância que torna as unhas muito quebradiças, então tinha que mesclar com o
esmalte escuro para fortalecer as unhas. Isso tudo se teve que aprender. A questão
de como se portar, de etiqueta, isto é, como se portar na rua, como comer, jantar,
almoçar em restaurantes, tantos talheres... Porque no início elas eram muito
requisitadas para eventos e tinha que haver um padrão de qualidade. Enfim, teve-se
que inserir tudo isso, mas não foi simples aceitar, pois estava saindo de uma regra de
formação essencialmente militar autoritária. Aquele negócio: “Está ruim? Pede para
sair!” Essas coisas.
Houve a necessidade de contratar psicólogas porque a mulher na época tinha
uma personalidade muito diferente do homem. Foi necessário trabalhar a questão da
menstruação, da tensão pré-menstrual (TPM), pois a mulher que menstruava não
podia ficar muito tempo em forma e havia aquelas formaturas longas e era necessário
controlar para poder tirá-las de forma e etc. A mulher com TPM, por exemplo, às
124
vezes chorava do nada, se ela visse alguém na rua e lhe dissessem coisa, ela saía
em prantos ou ia para o extremo oposto. Essa questão foi muito bem trabalhada pela
mulher, hoje a mulher não tem mais essas reações, ainda se fala mais em tom de
brincadeira, mas hoje a mulher controla mais essas tensões. Isso ela incorporou.
Isso tudo foi necessário administrar, a questão de alojamento, pois muitas
moravam no quartel e os homens não podiam simplesmente entrar para fazer
inspeção. Dentro do alojamento, era separada uma parte só para a questão de
maquiagem e manicure. Foi contratada uma moça que ficava dentro do quartel, para
auxiliar na questão do cabelo e unha, pois algumas policiais às vezes chegavam em
cima da hora para entrar de serviço e ainda tinha que ir para frente do espelho
porque isso era muito exigido.
Isso tudo fez um curso diferente, em compensação ao final do curso, nós
tivemos uma turma das melhores já formadas em nível de praças na PMDF. Uma
turma que se manteve. E era sabido que elas seriam o sustentáculo do que seria a
polícia feminina. Se elas se constituíssem em um desastre para a PMDF enterrariam
junto com elas a idéia de existir uma polícia feminina, mas elas compreenderam essa
responsabilidade histórica e tiveram um desempenho muito bom. Souberam
administrar os ventos da modernidade.
Porque a polícia feminina começou como uma unidade independente e depois
acabou e elas foram incorporadas na tropa normalmente. Elas souberam administrar
muito bem e é uma turma que está ai hoje completando 28 anos e que não deu
trabalho para a PMDF. Se buscarem nos registros da primeira turma, encontrarão
excelentes policiais. Certamente tiveram traumas, quando entrou a quinta, sexta,
sétima turma que elas já comparavam com a formação que elas tiveram e viram que
era completamente diferente. Certamente elas tiveram que administrar isso, mas
souberam.
Que trabalho elas desempenhavam inicialmente? O Comando da Corporação
não queria colocá-las de frente para o crime, pois achava que estávamos em um
processo delicado e era necessário preservar ao máximo as policiais femininas.
Porque se fossem colocadas já de pronto, tão logo se formassem, no enfrentamento
da criminalidade, se poderia simplesmente acabar com a polícia feminina se
acontecesse alguma tragédia. Não iam colocar a questão como sendo de um policial,
mas sim de uma mulher. Então, procurou preservar isso até que elas tivessem uma
experiência profissional.
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Nesse contexto, elas trabalhavam em locais de grande público da chamada
classe média e média alta. Aeroporto, shoppings, Rodo-ferroviária, Rodoviária, onde
tinha apoio de policiais masculinos. Tinham uma viatura que possuía uma maca, pois
os bombeiros ainda eram muito incipientes em atendimento para-médico, então elas
faziam esse tipo de atendimento, fizeram um curso no Hospital das Forças Armadas
(HFA). Esse era o trabalho delas. Isso foi evoluindo e hoje em dia o trabalho é
praticamente igual ao dos homens.
Em relação ao percentual, não acompanhei os estudos (pois era tenente), para
saber exatamente o porquê de definirem 10% e não 15% e nem 5%. Mas, de
qualquer forma, entendo que já se refletia na época uma preocupação de que de
repente houvesse uma polícia militar de maioria mulheres. Eles pensavam assim,
provavelmente, se isso ocorrer, como vamos enfrentar o crime? De qualquer forma
esse percentual ainda existe, mas entendo que é um percentual basicamente por
referência, pois não se sustenta legalmente. Já passou da época de ter um estudo
sobre isso. Se alguém entrar na justiça e alegando que foi impedida de ingressar por
causa dos 10%, vai ter ganho de causa. É óbvio que eles não colocam lá 10%, mas
um número tal de vagas que correspondem a 10% das vagas. Acredito que a mulher
provou, não só na PMDF, mas em todo o mundo a sua capacidade. Hoje em dia, se
tem mulheres astronautas, pilotos de caça, pilotos de helicóptero, mulheres
trabalhando em pesquisas científicas da maior relevância. Então, não se justifica
mais qualquer preocupação, a não ser muito pontualmente quanto à presença da
mulher.
Pode-se perguntar assim: A mulher poderia constituir um batalhão de choque só
de mulheres? O entrevistado tem suas dúvidas quanto a isso, porque o pressuposto
de um batalhão de choque, antes de mais nada, é a força física. Mas esse negócio
de que a mulher não pode, não representa uma posição de preconceito. É uma
questão técnica, assim como acredita que o batalhão de choque não pode ser
constituído apenas por mulheres, também não pode ser constituído por jovens
magros de 1,60m. Existe um perfil que se deve atender. O entrevistado acredita que
esse percentual já passou da época de ser estudado. A mulher está apta a
desempenhar qualquer função dentro da polícia militar.
Guardados esses perfis para determinadas funções específicas, a mulher está
em condições de desempenhar qualquer função. Não vê qualquer dificuldade,
sobretudo no policiamento comunitário. Acredita que a mulher tem um papel muito
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importante a desempenhar. Porque pode-se acreditar que a policial feminina é
desrespeitada na rua mas não é. A policial feminina é mais respeitada do que o
policial masculino pelo cidadão. O que se comentava na época, logo que elas
começaram a trabalhar em trânsito, e o entrevistado viveu no trânsito, é que a policial
feminina era muito mais rígida que os policiais masculinos. Que se um condutor fosse
abordado por um policial masculino por ter ultrapassado um sinal vermelho e se
desculpasse, dissesse que estava com problemas, etc. era capaz de o policial
adverti-lo e liberá-lo, mas a mulher não. A mulher diria: “Eu compreendo seu
problema, mas está aqui a sua multa.”
O entrevistado afirma que pode discutir esse assunto com quem quer que seja,
porque viu a mulher atuar dentro da PMDF, viu-a atuar bem, nos mais de 30 anos de
serviço nunca viu nenhuma função que se diga que a mulher não pode entrar.
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APÊNDICE B3
ENTREVISTADA Nº 3 - CEL QOPM VANUZA NAARA DE OLIVEIRA ALMEIDA
A entrevistada reporta que em março de 1983 foi lançado um edital para
ingresso de mulheres na PMDF. Nesse edital constava altura mínima de 1,65m, o
que causou apreensão, pois essa altura não é um padrão da mulher brasileira.
Além disso, havia uma exigência de ser solteira. A candidata não poderia ser
casada, nem ter nenhum dependente legal. Quando foi para o CFO, essa exigência
de ser solteira ainda permanecia. A idade limite era de 25 anos.
Ao ingressar na polícia militar, a entrevistada e as demais candidatas tiveram
que fazer alguns exames médicos depois do concurso pronto, entre eles existia o
exame ginecológico, o que causou estranheza às candidatas que se questionaram
porque queriam esse exame.
Uma das exigências que mais chamou a atenção nesse edital foi ser solteira
sem nenhuma dependência, a altura e o peso, pois tinha que ter um peso
compatível com a altura.
No início não se sentiu quais eram as dificuldades. A Corporação se
apresentou para as recém ingressas como algo acolhendo a mulher, mas não se
tinha conhecimento do que estava acontecendo na corporação. Eram cercadas de
cuidados. As mulheres tinham a sua própria Unidade. Foi feita uma unidade para a
policial feminina. Alguns coronéis contam à entrevistada de que aquela área onde foi
feita a CPFem era para ter sido a DAL, DIF e acabaram trazendo o pessoal para o
anexo do QCG e direcionando aquele local para as policiais femininas.
Posteriormente, quando terminou o curso de formação de seis meses, se
tomou conhecimento de alguns fatos que ocorreram dentro do universo masculino.
Os homens não podiam se dirigir às mulheres. Eles não podiam transitar e
passar na frente da CPFem numa velocidade que fosse muito baixa. A mulher teve
sua inserção dentro da corporação, mas formaram um universo para o efetivo
feminino, onde num primeiro momento foram tratadas como bibelôs. Bibelô com
relação à corporação, mas houve muita exigência no curso.
No primeiro curso da caserna, o efetivo feminino foi muito exigido. Foi trazida
uma policial militar do estado de São Paulo extremamente rígida e disciplinadora.
Era a Tenente Bernadete que veio ajudar na formação da policial feminina do Distrito
Federal. Ela trouxe o lado feminino, mas com muita disciplina. Determinava a cor do
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esmalte que deveria ser usado na semana, o penteado. Havia algumas regras de
que não se podia dirigir-se ao efetivo masculino.
Só depois de concluído o curso é que se começaram as ocorrências e houve
dificuldade até mesmo de poder lidar com o efetivo masculino e se sentia que a
corporação não estava preparada pra receber esse contingente feminino. Preparada
no sentido de que talvez não soubesse o que fazer. “O que nós vamos fazer com as
mulheres na corporação? ”Elas vão trazer esse lado humanizado para dentro da
corporação, mas o que nós vamos fazer com elas? O que é que elas vão poder
fazer? Então, houve algumas dificuldades de adaptação num primeiro momento, de
o quê exercer, o quê fazer.
O comando da corporação destinou o efetivo feminino para trabalhar em vários
locais. Na época, quando foi publicado o Decreto da Criação da Companhia de
Polícia Militar Feminina, já existia polícia feminina no Brasil e Brasília foi uma das
últimas polícias a incorporar a mulher no seu efetivo. No decreto está dizendo que a
missão seria atuação em ocorrências envolvendo mulheres, crianças e idosos.
Nesse primeiro momento sentiu-se a necessidade, não só de atender esse tipo
de ocorrência. O trabalho era realizado em grandes centros comerciais, como o
Conjunto Nacional, a Rodoviária, o Aeroporto, alguns shoppings que existiam na
cidade. E posteriormente o efetivo passou a ter 02(duas) viaturas, onde poderiam
exercer o radiopatrulhamento, que era uma viatura composta de três mulheres, a
motorista era policial feminina, a patrulheira e a Comandante também eram
mulheres.
A entrevistada, na época ainda praça, foi escalada como uma dessas
comandantes de guarnição. Havia algumas dificuldades, pois houve até brincadeira
na época que a primeira viatura trabalhou 12X36 a noite, por volta de meia-noite
retornava pra base, que era na CPFem e o e efetivo masculino chamava as policiais
femininas de Cinderela, porque à meia-noite desencantavam. Mas o efetivo feminino
não queria isso, mas queria essa proteção. Começou-se assim nesse momento, a
lidar com o efetivo masculino.
Com essa recepção e a formação dentro desse universo, sem se comunicar
com o efetivo masculino no período de formação, nos seis primeiros meses, e de
repente tinha que se partir para a rua e precisava se comunicar com os policiais
masculinos. Muitas vezes em ocorrências, necessitava-se de apoio não no sentido
129
de que a mulher não tivesse capacidade de fazer, mas de apoio no sentido de que
aquela ocorrência necessitava de um homem.
Uma das primeiras ocorrências, o efetivo feminino precisava fazer uma revista
em um homem no Conjunto Nacional porque havia uma notícia de furto em uma
joalheria. Era um homem que tinha furtado. E como se ia fazer uma revista pra ver
se estava junto com o homem o objeto furtado? Tentou-se a comunicação com o
efetivo masculino e viu-se dificuldade de eles virem apoiar.
Talvez pela forma como o efetivo feminino foi tratado durante o curso. Então,
alguns policiais masculinos sofreram algumas repressões por lidar com mulheres
policiais. Havia exigência de que nem o namorado ou noivo, poderia pegar a
namorada policial militar na porta da CPFem de carro ou a pé.
Então, houve esses dois lados. O lado de tratar de forma paternalista, e o outro
lado de ter resquícios de não gostar da policial feminina pela forma como ela era
tratada. Não se queria esse tratamento a princípio. Então houve muita dificuldade,
não no sentido de que eles as aceitassem, e sim de chegar até eles e eles
entenderem de que cada uma das policiais militares femininas estava disposta a
trabalhar no operacional. Queriam ter o seu espaço e esse espaço aos poucos foi
conquistado. Tanto que durante alguns meses a entrevistada, naquela época
trabalhou na viatura à noite e começou a ter companheiros de farda que respeitavam
as policiais femininas como profissionais. Que entendiam o fato de que a mulher era
uma realidade na corporação e ela era necessária. Tanto que em algumas
ocorrências alguns companheiros de radiopatrulha transmitiam pelo rádio: -
“Necessito de uma policial feminina para fazer uma revista em mulheres”. Então foi
aí que se começou a conquistar o público masculino muito devagar e se integrar
com o público masculino e a corporação começar a entender o papel da mulher
dentro da sua estrutura, dentro da Instituição, porque na época com apenas 28
anos, ainda precisava demonstrar e conquistar esse espaço.
Talvez tenha sido um tanto conflitante e um tanto aflitivo quando fomos pro
CFO, curso de formação de oficiais, que não era feito aqui no Distrito Federal, mas
na academia de Minas Gerais. Foi uma experiência muito boa no sentido de que lá
em Minas Gerais a mulher já tinha seu espaço. Tinha as dificuldades que as policiais
militares femininas do DF tinham, mas elas tinham o seu espaço. O curso durou
3(três) anos.
130
Foi criada a CPFem e nos disseram que a carreira das policiais femininas ia até
capitão. Que o posto maior que a mulher poderia alcançar na Polícia Militar seria o
posto de capitão. A entrevistada se questionava: então porque estava fazendo o
curso de formação de oficiais junto com os homens, sofrendo as mesmas exigências
que um homem, respeitada as características femininas e só iria até capitão? Então,
quando voltaram do CFO, a entrevistada e as outras oficiais da corporação, com
suas experiências, entraram com um requerimento solicitando a unificação dos
quadros. Achavam que com o requerimento e tendo o curso de formação de oficiais
poderiam unificar dessa forma os quadros masculinos e femininos.
A entrevistada não queria ir apenas só até capitão, queria chegar até coronel,
porque assim foi ensinada e doutrinada dentro de uma academia de formação de
oficiais. Achavam que isso poderia resolver o problema. Depois descobriram que
teria que ser um decreto federal já que a Polícia Militar do Distrito Federal tem toda
uma legislação no Poder Executivo Federal.
Com esse requerimento foram até ameaçadas de serem presas, detidas, por
que esse tipo de requerimento não existia. O que queriam era entrar na última turma
de oficiais masculinos que à época, como é aspirante de 1988, queriam entrar na
turma de 1988. Só que a turma de 1989, eles já se sentiram discriminados, se as
policiais femininas entrassem ali partindo a turma de oficiais que eram oriundos do
Exército. As oficiais femininas ficaram com receio dessa ameaça de prisão e
deixaram como estava. Alguns oficiais que foram comandantes de companhia
feminina entraram com um processo todo bem elaborado, através de um projeto de
lei para que houvesse a unificação dos quadros, já nos meados de 1990, mas
engavetaram esse projeto lá no Congresso. Então, levamos 10 anos pra que essa
unificação realmente ocorresse. A entrevistada trabalhou junto a esse processo e
percebeu que existiam duas correntes: os oficiais masculinos realmente não queriam
e eles tinham os motivos deles de não querer oficiais femininas no quadro deles e as
próprias oficiais femininas também não queriam que houvesse a unificação desse
quadro. Então, existia essa dicotomia de que algumas pensavam assim: - “Não, se a
gente for para o quadro masculino vamos morrer capitães, não vamos chegar a ser
coronel, não vamos poder disputar com eles para ser coronel, porque nós somos
poucas.” E houve no processo de unificação realmente algumas oficiais que ficaram
prejudicadas, mas nada que esse prejuízo não tenha nos dado esse conforto de
uma competição justa dentro da corporação.
131
Porque o que queriam era isso: uma competição justa dentro da Corporação, a
igualdade. Porque todas passaram por um processo de formação de soldado igual
aos homens, de cabo, de sargento e de oficial. Então nada mais justo que a
unificação dos quadros. Então, conseguiram e muitos deles não acreditavam. Na
época as policiais militares femininas chegaram a conversar com o Presidente do
Congresso que era o Senador Antônio Carlos Magalhães. Quando ele viu o
processo foi dito a ele: - “Senador, esse processo está aqui há mais de 10 anos”. Ele
disse que aquilo era uma injustiça com as mulheres. Ele reconheceu que a
unificação dos quadros era um direito das mulheres. As policiais femininas
conquistaram esse espaço dentro da Instituição.
A Constituição de 1988 é muito clara, ela diz que todos são iguais perante a
lei, homens e mulheres. Agora mesmo na solenidade do CFP II, Curso de Formação
de Praças II, as três primeiras colocadas foram mulheres. A entrevistada acredita
que esse percentual não deveria existir, acredito que poderia ser feita uma pesquisa
sobre isso. A entrevistada acredita que a corporação não pode ser só de mulheres.
Sabe que hoje a mulher faz (não é um discurso feminista), consegue fazer bem feito
e consegue até passar os limites às vezes do efetivo masculino. Vê-se isso pelas
nossas Universidades. Onde tem cursos que se acha que é só de homens, como
Engenharia e Agronomia, por exemplo, vê-se o percentual de mulheres muito maior.
Talvez na corporação o ideal seria que se fizesse um estudo científico mesmo que
respondesse à pergunta: Que percentual queremos ter? Ou se não precisa de
percentual?
Eu acredito que esse percentual de 10% é injusto. Mas o que é que a
corporação precisa? Ela precisa de 1000 Homens e 100 mulheres, só? Não acredito
nesse percentual de 10%. Também não acredito que a corporação precisa de
14.000 mulheres. Precisa de uma igualdade e isso precisa ser estudado. Acredito
que limitar o percentual não é o adequado, até porque as interpretações desse
percentual vão além da inclusão na Corporação. E isso aí que é danoso. Esse
percentual só tem validade para a incorporação, não nos cursos internos. Se tiver
que acontecer que um dia tenha 50 coronéis femininas, tem que ter 50 coronéis
femininas e um masculino.
Porque esse alcance profissional é todo um histórico das policiais militares
femininas. Trabalhar dentro da Instituição já não é um fato exclusivo do homem.
Trabalhar em todos os campos dentro da Instituição não é um fato exclusivo do
132
homem, também uma qualificação maior que foi dada para as policiais femininas que
tiveram a capacidade de executá-las. Todas as missões que foram dadas até hoje
como mulher e como profissional de segurança pública conseguiram fazer com que
fosse levada a contento.
A entrevistada acredita que ser profissional não é questão de gênero, é uma
questão de postura. Acredita que qualquer atividade que as policiais militares
femininas desempenham são bem desempenhadas, com características femininas.
Podem ser aproveitadas em várias atividades. Tem coisas que as mulheres fazem
muito bem dentro da Instituição e que talvez não seja tão bem feita por homens, mas
não por uma questão de gênero, mas por causa de habilidades específicas da
mulher.
A entrevistada se recorda que nas vezes em que comandou unidades, havia a
expectativa de que a UPM toda ia ser só de mulheres. O subcomandante ia ser uma
mulher e não foi essa a proposta. A proposta sempre foi de que o subcomandante
fosse um homem, até porque se precisa desse equilíbrio dentro da corporação. Não
há missões que não possam ser desenvolvidas por mulheres.
A entrevistada apresentou uma opinião pessoal de que algumas vezes,
algumas mulheres gostam de ser apadrinhadas. As policiais femininas em algumas
situações gostam de ser apadrinhadas. Alguns dizem: “As policiais femininas têm
que ser secretárias (de comandantes, chefes e diretores)”. Secretária é uma
profissão que existe no mundo civil e que na PMDF algumas mulheres se dedicam a
esse tipo de missão, mas não tem que ser exclusivamente feminina. A entrevistada
acredita que a capacidade feminina está muito além de ser secretária. Então, não é
esse o papel da policial militar feminina. O papel da mulher na corporação é igual ao
papel do homem. Como comandante, a entrevistada pode afirmar categoricamente
que há homens que gostariam de ser secretários.
Na visão da entrevistada, segurança pública é uma questão de cidadania e de
humanidade e de se identificar com o cliente, é saber o que ele quer e isso vai muito
além do gênero.
Segundo a entrevistada, hoje em dia está na função de Diretora de Inativos e
Pensionistas - DIP, mas poderia estar e tem capacidade para ser a chefe do
departamento operacional da corporação, pois possui qualificações para tal, foi
doutrinada e ensinada para isso, mas hoje está na diretoria de inativos e ocupa bem
esse espaço. Muitos dizem assim: -“Está no lugar certo porque sabe receber bem o
133
inativo, porque trata bem as pessoas”. Mas isso é próprio da mulher. Se for para
uma unidade operacional, saberá dar o tratamento operacional necessário. Não
passa mais na PMDF a idéia de que o policial é aquele carrancudo, repressivo.
Acredita que em algumas atividades policiais a repressão é necessária e as
mulheres sabem ser repressivas da melhor forma possível quando é necessário,
pois a maioria é intransigente e não compactua com a corrupção. Nas estatísticas da
corregedoria, quantas mulheres estão envolvidas em corrupção?. Então, a
austeridade de uma mulher passa por sua postura, como ela se apresenta em sua
atividade.
Em relação à relevância, acredita a entrevistada que as policiais militares
femininas passaram por um processo construtivo. Que essa relevância foi se
construindo a cada dia e hoje a mulher tem um papel extremamente definido na
corporação. Talvez ainda faltem algumas conquistas necessárias, pois ainda existem
alguns processos discriminatórios, mas a relevância da mulher é aquilo que ela faz.
Hoje em dia a mulher faz a diferença, não de gênero, mas na forma de agir. A
entrevistada já ouviu isso de policiais masculinos. Como é diferente o tratamento.
Não que as comandantes mulheres deixaram de lado a capacidade de lidar com a
disciplina e a hierarquia dentro do contexto exclusivamente masculino.
Hoje tem mulheres que conquistaram o espaço em unidades , embora a
presença feminina seja relativamente nova na PMDF, tem apenas 28 anos,
enquanto no estado de São Paulo tem 50 anos. Entretanto, lá as mulheres ocupam
apenas o espaço destinado às mulheres, por exemplo, não podem alcançar o posto
de comandante geral, pois pertencem ao quadro de Policiais Militares Femininas (lá
não é unificado). Então essa relevância das policiais militares femininas na PMDF
passou por momentos históricos, por exemplo, quando houve a unificação, quando a
primeira mulher foi para o grupo de operações especiais e fez um curso de caveira,
quando a primeira mulher assumiu o comando de uma unidade operacional. Então,
esses espaços foram aos poucos sendo conquistados e essas conquistas foram
alcançadas de forma responsável e de forma extremamente competente.
A entrevistada acredita que o que levou a criar esse universo feminino que foi
alcançado na corporação foram as competências de cada uma das silenciosas e
trabalhadoras policiais femininas. Temos a prova disso que a entrevistadora é a
primeira piloto de helicóptero da corporação e de uma maneira competente alcançou
o seu espaço. Então, a relevância das policiais militares femininas está aí, na
134
responsabilidade e competência. A entrevistada sente muito orgulho por verificar que
muitas mulheres conquistaram o seu espaço pelo trabalho. Não só no quadro de
oficiais como também no de praças, existem mulheres que estão trabalhando
operacionalmente, porque são necessárias e a guarnição a que pertencem não abre
mão de seus serviços.
A entrevistada acredita que houve muitas mudanças na corporação com a
presença feminina, mas pela forma como é conduzida a corporação hoje em dia.
Quando a mulher está no seu espaço profissional há uma diferença no tratamento,
essa diferença não é exclusivamente pela forma como tratam as pessoas mas pela
forma como trabalham. A mulher faz a diferença no sentido de dar um tratamento
melhor, de forma mais humanizada às nossas instituições. As mulheres tentam
organizar o trabalho como administram o seu lar, como administram os filhos e
maridos e a forma como lidam com o cotidiano. Então a Corporação mudou no
sentido de que hoje existe um espaço destinado à atuação feminina.
A entrevistada externou um ponto de vista muito próprio de que a mulher ainda
não alcançou todos os espaços. Falta o comando geral da corporação, não poderia
deixar de mencionar tal fato, porque as oficiais policiais militares foram doutrinadas e
capacitadas para assumir essa função, então esse espaço ainda é devido. Mas com
toda a competência feminina, com certeza, ainda há de haver uma comandante
geral mulher. Hoje em dia, apenas a entrevistada possui os requisitos para assumir
essa função, mas em breve outras também terão os requisitos. Esse espaço
pertence ao quadro de oficiais policiais militares, o qual as oficiais policiais femininas
fazem parte. Certamente o triângulo hoje formado pelo Comandante Geral, Chefe do
Estado Maior e Subcomandante Geral da PMDF, será alcançado por uma mulher. Já
existe mulher que chegou ao posto de coronel, esse espaço as policiais militares
femininas já alcançaram.
De uma forma não ostensiva, mas velada ainda existe discriminação. Os
homens ainda não sabem lidar com o comando feminino. As policiais militares
femininas sabem lidar com os homens e comandá-los. Os homens da corporação
ainda não sentiram a necessidade de ter uma mulher comandante geral. Mas essa
discriminação aos poucos será suplantada porque as policiais militares femininas
mostrarão que seu papel é de integração.
A opinião da entrevistada, para finalizar, é a de que a mulher não veio à
corporação para competir com os homens, mas sim porque a corporação
135
necessitava e necessita de mulheres. Então, para que não haja mais processos
discriminatórios, isso culminaria com a assunção do mais alto posto que é de
comandante geral da PMDF por uma mulher. Acredita que a conquista de ser uma
coronel de polícia não é uma conquista só da entrevistada, mas de todas as policiais
militares femininas, com as quais divide essa conquista, então não será a
discriminação que vai negar às policiais femininas galgarem a esse posto máximo.
Com certeza, a primeira comandante geral terá a obrigação de estender esse
comando geral à mulher, mas isso não quer dizer que não se terá o olhar para toda
a corporação, homens e mulheres. A primeira mulher Comandante Geral terá a
responsabilidade de ter essa visão institucional.
136
APÊNDICE B4
ENTREVISTADA Nº 4 - ST QPPMC CÉLIA REJANE Minha família é militar e eu sempre tive vontade. Eu era atleta, vim para
Brasília passar umas férias e foi aí que eu conheci a Polícia Militar de Brasília, o
BOPE em específico. Vim como atleta civil e fiquei alojada no ginásio da PM, a
convite de um primo meu. Conheci o Coronel Adair, foi quem me convidou para ficar
competindo na equipe. Eu fazia 400m com barreiras. Eu estava de férias da seleção
e ele me convidou para fazer algumas corridas de rua e durante esse tempo que eu
permaneci no ginásio eu fazia as refeições no Batalhão de Operações Especiais que
era a CPChoque. Fiquei apaixonada pela CPChoque e pelo pessoal que eu conheci
que era de operações especiais e a outra condição para eu permanecer na equipe
de atletismo com o patrocínio que a gente tinha, você tinha que ser policial militar.
Então eu tinha que entrar para a polícia militar. Só que, por exemplo, eu queria
entrar para o BOPE e não tinha vaga para o BOPE, no Choque na época, tinha que
entrar para a polícia militar. E a única condição que eu tinha para servir no BOPE era
fazer o curso de operações especiais. Então quando eu entrei para polícia eu já
entrei com o foco voltado para o curso de operações especiais, direcionada, já tinha
o objetivo. E tinha convicção de que eu passaria nas provas, no TAF. Fiz o curso em
87 na CPFem e logo que formei, um ou dois meses depois, abriu as inscrições para
o Curso de Operações Especiais (COE). Não tinha nenhuma mulher e nem tinha
vagas, mas aí eu tinha um amigo que falava para mim o seguinte a condição é ser
policial militar e eu era. Então nós fomos ao comandante geral e apresentamos que
todo aquele TAF, tudo o que eles pediam como requisitos para o curso de
operações especiais eu fazia e se ele me deixasse fazer se possível eu fazia duas
vezes. Na época eu estava no triátlon já competia, eu entrei na seleção brasileira de
triátlon em 87. Fiz o TAF e passei, eu convidei também várias policiais femininas, a
Cap Graça, na época SGT Graça, a Ramires e a Gisele. Elas ficaram em alguns
módulos, uma teve problema na parte de mergulho. E foi aí que começamos no
curso de operações especiais, totalmente diferente de tudo que alguém possa
imaginar fisicamente e psicologicamente. Você tem que ter muita convicção e
determinação para você passar, para você cursar, formar no curso de operações
especiais. Não pode ser só físico e nem só psicológico, você tem que ter uma visão
e realmente o principal é ter convicção daquilo que quer ter um foco. Quando eu fiz,
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eu não me importava de perder um braço, uma perna, eu queria me formar, nada me
tirava, só Deus. Por que essas coisas materiais, de sofrimento não me tiravam do
curso. Pedi prá sair nunca, só se for morta. Então nunca passou pela minha cabeça,
nem nunca pedi para sair. “Cada dia seu próprio mal”, você terminava mais um dia,
você passou. Era sempre essa idéia de conseguir mais um dia.
É uma coisa quase que natural você era submetido a todas as coisas
igualmente. Não justificava e nem dava pra você ter um cabelo grande, como é que
vai fazer todas as atividades com o cabelo grande? Quando se entra em curso, logo
se percebe que é uma coisa natural, não existe aquela coisa de que se cobrou ou
exigiu mais da mulher, foi igual para todo mundo. Cada um tinha que vencer suas
etapas, é mais difícil para uns é menos para outros. O curso na totalidade é muito
difícil, você formar e cumprir todos esses módulos. Todos os cursos de operações
especiais são de quatro meses, esse agora de 2011 está sendo a inovação, está
sendo de seis meses com mais especialidades. Tem o módulo de montanha que
antigamente fazia depois.
A parte física eu não tinha dificuldades, eu competia triátlon e sempre fiz
atividade física, para mim a única coisa que foi diferente e de certa forma me trouxe
medo, foi o módulo que tinha de ofidismo, com cobras, eu não me sentia a vontade,
eu não gostava realmente. Mas no final você não tem outra opção, você tem que
passar. Então tudo aquilo que parece uma coisa assustadora você começa a ver
que é natural, por que se outras pessoas conseguem você também consegue.
Durante esse tempo todo que eu estou na polícia só teve um fato que foi
desgastante, não foi traumático, mas a única coisa que eu observei de negativo,
porque eu nunca tive nenhum problema com nenhum policial, mas eu já tive um
comandante aqui na antiga CPChoque que ele no dia em que assumiu o comando
ele se espantou ao ver mulher na companhia de choque e falou que não dividia o
comando dele com mulheres. Que mulher para ele era lavando, passando,
cozinhando e cuidando de crianças. Para mim não disse muita coisa, permaneci. Eu
achava estranho a concepção dele com relação à mulher, já que tinha tantas
mulheres e ele ainda não está acostumado. Mas nada que tivesse me deixado
magoada, eu não tenho esse problema de ficar chateada com o que as outras
pessoas pensam.
138
A maioria desse tempo eu passei toda no BOPE e nunca tive nenhum
problema com nenhum policial, que possa registrar nada, nenhuma afronta, muito
pelo contrário eu recebo bastante incentivo.
Eu acho difícil para uma pessoa se propor em fazer o Curso de Operações
Especiais (COE), a policial feminina tem que ser atleta, tem que estar muito bem
fisicamente, psicologicamente. Não existe falar que os homens não deixaram, todo
curso de operações policiais é aberto e qualquer mulher pode se inscrever e fazer só
que é difícil passar. É muito difícil passar porque exige bastante e também no
estágio inicial, até o próprio TAF já é um problema se a pessoa não estiver
direcionada para o objetivo, com as atividades voltadas para fazer o curso. Por que
não é muito comum a mulher subir em corda, fazer barra, então geralmente as
mulheres não treinam muito essa parte, mas eu creio se tiver um propósito passa,
assim como eu passei, como a Cap Graça passou e a TC Cintyane.
A entrevistada diz que ficou muito feliz com a questão da unificação, foi um
avanço gigante não só para a polícia feminina, mas também para a polícia militar.
Foi importante no contexto até mesmo por que a figura da policial feminina é muito
importante dentro da Polícia Militar em todas as áreas. Eu acho que a mulher deve
atuar em todas as áreas, ela serve de equilíbrio em muitas coisas que são
necessárias ter a mulher, pelo nível de organização. São tantas coisas que eu acho
que a mulher desempenha muito bem e também na parte operacional, deveria ter
mais mulheres na rua. Para remediar conflitos, deveria ter uma procura maior.
Na minha visão é muito difícil para a mulher trabalhar na área operacional,
até mesmo porque no contexto geral, ela é dona de casa, é ela quem cuida das
crianças, quem leva e pega no colégio e tem que administrar tantas coisas. E para
você trabalhar na área operacional você tem que ser um pouco livre, por exemplo,
você vai para uma ocorrência à noite e não sabe que horas chega, para quem tem
filhos é muito difícil. Não vou dizer que a mulher se acomode, mas é uma ginástica,
ela tem que dispor de tantas coisas e nem sempre ela vai ter um marido
compreensivo que possa suportar, que possa aceitar, já que ela tem a possibilidade
de trabalhar em outra área. Que pode conciliar, que pode ser mais fácil, até mesmo
porque é uma coisa muito pessoal. Eu sempre trabalhei na área operacional e é um
preço muito alto para pagar, você tem uma exclusividade. Os homens cobram muito
e meu esposo também cobra, mas eu gosto, eu pago esse preço e acredito que
muitas pagam, mas seria mais fácil fazer outra coisa.
139
Por exemplo, eu trabalho no que eu gosto, tem muitas policiais que
trabalham no que gosta, porque a gente tem muitas opções no trabalho, não só a
mulher, mas os homens também de trabalhar, onde quer, como quer, bem
diversificado. A cada dia estamos melhorando mais, tem melhor qualidade de vida,
são tantas coisas que já evoluíram e mudaram para melhor a polícia militar e aí que
entra essa questão da unificação. Acho que melhorou para todo mundo. É tanto que
acho que ninguém nem se lembra do passado, quando era separado.
Todos os setores da corporação têm mulheres que passaram e deram sua
colaboração 100% e não deixou a desejar como aqui no canil a gente já teve, no
choque, no GOA. Eu não vejo nenhum setor, tem no gerenciamento de crises, em
tudo que eu não consigo ver essa separação, ou onde o homem teria mais
vantagem ou seria melhor. Tudo que o homem faz a mulher pode fazer.
Fisiologicamente, é claro, há algumas diferenças, mas se ela quiser também
consegue trabalhar em qualquer área. Existe só a questão de querer, de pagar o
preço.
Eu acredito que tudo que o Homem busca e quer, Deus sempre abençoa e
eu hoje sou feliz e satisfeita dentro da minha Unidade, dentro do meu trabalho como
muitas pessoas que eu conheço, homens e mulheres mas isso é obra de Deus na
vida do Homem.
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APÊNDICE C
ACERVO FOTOGRÁFICO
FONTE: MUSEU DA PMDF E ACERVOS PARTICULARES
Primeira turma de Policiais Femininas da PMDF – 1983
Instrução de Tiro – Aluna da primeira turma / Cia PM Fem – 1983
141
Instrução de Comunicações – Primeira turma – 1983
Pista de Maneabilidade – Out/1984
142
Posição de descansar para policiais femininas na PMDF - 1983
143
Atletas de salto em distância da primeira turma Cia PM Fem - 1983
144
Primeiro policiamento feminino em Brasília foi coberto pela imprensa local. Dez/1983
Policiamento Feminino no Shopping Conjunto nacional - Brasília. Dez/1983
145
Atletas da Companhia de Polícia Millitar Feminina
Confraternização na Companhia de Polícia Feminina
146
1ª equipe feminina de Segurança de Autoridades /PMDF – Revista Veja – 5/11/ 1988
Primeira turma de Formação Mista – 1990
147
Desfile Cívico da Independência – Turma Mista Batalhão Escolar - Set/1990
Turma de Formação Mista – 1990
148
Passagem de Comando na Cia PM FEM – Fev/1991
Desfile da tropa na passagem de Comando Cia PM Fem – Fev/1991
149
Formatura do Curso de Formação de Cabos
Primeira Piloto da PMDF – Grupamento de Operações Aéreas - 2004