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PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Registro: 2018.0000285184
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0071825-97.2006.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que são apelantes BM POINT DISTRIBUIDORA DE VEÍCULOS LTDA e MARCELO DE CARVALHO MAGALHÃES, é apelado BMW DO BRASIL LTDA.
ACORDAM, em 30ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Colhidos os votos do Relator sorteado e do 3º Juiz, que davam provimento parcial ao recurso, e da 2ª Juíza, que dava provimento parcial em maior extensão, foi estabelecida a divergência. Houve, nos termos do art. 942 do NCPC, a convocação de dois outros componentes da Câmara, Des. Carlos Russo e Des. Marcos Ramos, tendo o julgamento prosseguido, nos termos do § 1º do referido dispositivo legal, com o seguinte resultado final: por maioria de votos, deram provimento parcial ao recurso, vencida a 2ª juíza, que declarará voto.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores ANDRADE NETO (Presidente), MARIA LÚCIA PIZZOTTI, LINO MACHADO, CARLOS RUSSO E MARCOS RAMOS.
São Paulo, 18 de abril de 2018.
Andrade NetoRELATOR
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Apelante: BM Point Distribuidora de Veículos Ltda. Apelada: BMW do Brasil Ltda.Comarca: São Paulo - 7ª Vara Cível (Autos n.º 130.663/06)Juíza prolatora: Márcia Blanes
CONCESSÃO COMERCIAL CONTRATO DE DISTRIBUIÇÃO E VENDA DE VEÍCULOS IMPORTADOS DA MARCA BMW RESCISÃO DO CONTRATO AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA DA CONCEDENTE PARA PROMOVER A RUPTURA DO VÍNCULO DEVER DE INDENIZAR RECONHECIDO INTELIGÊNCIA DO ART. 24 DA LEI N.º 6.729/79 INDENIZAÇÕES DE NATUREZA DIVERSA DAQUELAS PREVISTAS NA LEI ESPECIAL DESCABIMENTO INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS IMPOSSIBILIDADE- DANOS MORAIS NÃO CARACTERIZADOS - AÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE.
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO
VOTO N.º 29139
Inconformados com a decisão de primeiro grau que
julgou improcedente ação objetivando o reconhecimento de culpa da ré
concedente na ruptura de contrato de concessão mercantil para
representação da marca BMW no Estado do Rio Grande do Sul e
consequente condenação ao pagamento das verbas indenizatórias prevista
na legislação de regência (Lei Ferrari), apelam os autores BM Point
Distribuidora de Veículos Ltda. e Marcelo de Carvalho Magalhães
pleiteando a inversão do julgado.
Argumentam, em síntese, que a ruptura do vínculo foi
provocada pela ré, quem além de atuar de forma abusiva e maliciosa em
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relação à concessionária, tendo, inclusive, descumprido condições pré-
estabelecidas (dentre elas manutenção de estoque de peças e veículos) para
incentivar o coautor a assumir o controle acionário da concessionária, agiu
de modo desastroso ao, negligentemente, ter permitido o vencimento de
seu cadastro de importadora, ensejando o desabastecimento de veículos e
peças à concessionária por período de mais de 56 dias, com prejuízo
imediato de mais de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) e perda de
faturamento da ordem de R$ 3.292.971,00 (três milhões duzentos e
noventa e dois mil e novecentos e setenta e um reais), além de ter noticiado
uma abrupta redução na importação dos veículos para o mercado brasileiro
(1600 para 600 unidades ano), ensejando-lhe significativa perda de receita
de faturamento. Acresça-se, ainda, o fato de faltar-lhe critério comercial
para fixação de preços de seus produtos um BMW 325i (entre outros) em
fevereiro de 2003 subiu de R$ 176.000,00 para R$ 190.500,00 e logo em
seguida, no mês de abril, foi vendido no mesmo valor de fevereiro.
O recurso foi recebido no duplo efeito e com
contrarrazões.
A ação, inicialmente proposta perante juízo civil da
cidade de Porto Alegre-RS, foi remetida para esta capital por força de
decisão do Superior Tribunal de Justiça, quem, validando cláusula de
eleição, decidiu ser esse o foro competente para dirimir a lide.
Sobreleva destacar, outrossim, que, no curso da ação
perante o foro gaúcho (7º Vara Cível do Foro Central de Porto Alegre),
houve a determinação judicial de realização de prova pericial contábil, a
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qual, no entanto, foi declarada imprestável pelo magistrado então condutor
do processo por suspeição do perito oficial, quem teria quebrado a
confiança nele depositada ante a parcialidade demonstrada em favor da ré.
É o relatório.
A autora e ré mantinham contrato de concessão
comercial, iniciado em 26/05/1993, com duas renovações por instrumento
formal, uma em 28/03/1996 e outra em 01/01/2001, mediante o qual foi
conferido à primeira o direito de comercializar com exclusividade em
determinada área territorial os veículos BMW 0 km. produzidos pela
segunda, além de obrigar-se a segunda à prestação de assistência técnica
necessária ao uso da marca.
Ocorre que, em fevereiro de 2003, a concessionária
enviou à concedente uma carta, na qual, manifestando preocupação com a
informação obtida de que a segunda iria diminuir acentuadamente a
comercialização de veículos para o Brasil no ano de 2003, o que reduziria à
metade seu volume previsto de venda anual (107 veículos no ano, segundo
conforme projeção prévia da própria concedente), reclamou
esclarecimentos a respeito, sob pena de se ter por inviabilizada a
continuidade da concessão. Apontou ainda que estava sem receber veículos
há mais de 50 dias, fato que lhe causava inegáveis prejuízos (fls. 431/432).
Em resposta, a concedente encaminhou uma
notificação extrajudicial à concessionária, na qual, após responder de modo
evasivo sobre a projeção do volume anual de venda, dizendo-a sujeita a
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fatores imprevisíveis, “tais como variação do câmbio e situação
econômica do mercado” (fl. 433), apontou fatos que teriam sido praticados
pela concessionária (falta de garantia das dívidas pecuniárias, instalações
não condizentes com o padrão BMW, alteração societária da BM Point
sem aprovação da concedente e recusa de pagamento complementar dos
veículos adquiridos entre março e maio de 2001), os quais caracterizariam
inadimplemento de obrigações contratuais, suficientes para justificar a
rescisão do contrato por justa causa, culminando por propor “ negociar de
forma amigável essa extinção “ (fl. 437).
A concessionária autora contra-notificou em 07 de
março de 2003, dizendo não aceitar as imputações que lhe foram dirigidas.
Refutou-as para ao final reconhecer ter havido quebra de confiança, a
ensejar a ruptura do contrato por parte da concedente (fls. 438/440).
Alguns dias após (26/03/2003), deduziram os autores a
presente ação, mediante a qual, imputando à concedente práticas
violadoras do contrato e da boa-fé contratual, reclamaram, em tutela
antecipada, a manutenção compulsória do vínculo pelo prazo de seis meses
e, no mérito, a declaração de rescisão do contrato por culpa da concedente,
com sua condenação ao pagamento de indenização prevista no art. 24 da
Lei Ferrari, além de outros itens especificados no inicial (fls 57/58 da
petição inicial), mais danos morais por prejuízo à imagem e ao bom nome
de ambos.
Sendo esse o quadro, possível reconhecer que a
iniciativa resolutória partiu da concedente, na medida em que foi ela quem,
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instada a fazer prevalecer sua projeção anual de vendas, acenou com a
ruptura do vínculo por justa causa, imputando à contraparte o
descumprimento de obrigações contratuais.
Dispõe o art.24 da Lei nº 6.729/79 (Lei Ferrari),
regente da matéria, que, em se tratando de contrato por prazo
indeterminado, como na espécie, se o concedente der causa à sua rescisão,
ficará obrigado a reparar a concessionária mediante a reaquisição de seu
estoque, a realização da compra prevista no art. 23, inc. II, e ao pagamento
de indenização por perdas e danos, nos moldes ali fixados (inc. III).
Resta claro, por conseguinte, que se a concedente
promover imotivadamente a rescisão do contrato, vale dizer, sem que haja
justa causa em razão de infrações cometidas pela concessionária, fica a
concedente obrigada a indenizar. Isso significa que, se demonstrado faltar à
concedente motivos e fundamentos jurídicos relevantes para reconhecer ter
a concessionária inadimplido suas obrigações, de modo a justificar a
ruptura do contrato, remanesce ela obrigada a ressarcir a concessionária,
nos moldes previstos na legislação de regência.
No caso presente, a ré manifestou intento resilitório
tendo por fundamento os fatos e circunstâncias descritos em sua
contranotificação de fls.433/438. Em assim sendo, cabe investigar se os
fatos alegados se prestariam ou não para justificar a ruptura do contrato por
culpa da concessionária.
Antes, porém, cabe observar que a lei de regência, em
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seu art. 19, previu uma convenção da marca sobre o regime de penalidades
gradativas como forma de garantir um tratamento uniforme das sanções
contratuais a serem aplicadas a todas as concessionárias de uma mesma
fabricante. Evitar-se-ia, assim, que fossem aplicadas penas diferentes para
concessionárias de um mesmo fabricante, em razão de idêntica infração
contratual.
Enquanto não celebrada a convenção, nada obsta às
partes disporem sobre a matéria em seus contratos individuais.
Por outro lado, o art. 22, § 1º, da mesma lei condiciona
a resolução do contrato por culpa à aplicação de penalidades gradativas,
praticamente exigindo que tais penalidades sejam pactuadas, pois elas
passaram a ser etapa necessária para a resolução do contrato por culpa.
O art. 22, § 1º, portanto, ao invés de ser "letra morta",
é um mandamento direcionado aos concedentes, no sentido de que incluam
em seus contratos uma gradação de penalidades, dada a impossibilidade de
resolução arbitrária do contrato.
Não havendo convenção da marca, nem cláusulas
contratuais válidas sobre as penalidades gradativas, como no presente caso,
surge uma lacuna normativa, cabendo ao juiz promover o seu suprimento.
Considerando ser o objetivo das penalidades
gradativas impedir a resolução arbitrária do contrato, caberá ao julgador,
atendendo à teleologia da lei, decidir, em cada caso concreto, se a infração,
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ou sequência de infrações, é grave o suficiente para justificar a resolução
do contrato, observado o caráter protetivo da Lei Ferrari.
Em síntese, nos contratos regidos pela Lei Ferrari, não
havendo pactuação de penalidades gradativas, caberá ao julgador não
apenas identificar eventuais irregularidades e descumprimentos das
obrigações contratuais assumidas no curso da relação contratual, mas,
principalmente, analisá-las e valorá-las, de modo a reputá-las
suficientemente graves para motivar uma ruptura do contrato.
É, portanto, nesse contexto que devem ser analisadas
as razões deduzidas pela concedente na contranotificação já referida, as
quais, forçoso convir, não se revelaram juridicamente convincentes para
justificar a rescisão do contrato por justa causa, consoante a seguir se
demonstra.
A concedente refere à existência de inadimplemento da
concessionária em relação a algumas dívidas, em especial, ao pagamento
de um contrato de mútuo celebrado entre as partes. Segundo
esclarecimentos prestados pela própria concedente, dívida anterior não
paga foi renegociada em julho de 1998, mediante celebração de escritura
pública de confissão de dívida (R$ 1.377.865,11), a ser paga em dezoito
parcelas mensais. A concedente aceitou suspender a cobrança dessa dívida
pelo prazo de doze meses, com reinício em julho de 2000. Posteriormente,
as partes culminaram por prorrogar o vencimento, tendo sido a
concessionária isentada do pagamento de juros e correção no período de
julho de 2000 a outubro de 2001. O pacto voltou a ser negociado em 06 de
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dezembro de 2001, tendo as partes celebrado um contrato de novação e
confissão de dívida, mediante o qual a concessionária reconheceu débito
no valor de R$ 994.349,04, a ser quitado em 24 parcelas sucessivas de R$
41.432,21. Esse contrato recebeu a sigla de APVD.
Esse contrato foi honrado parcialmente, tendo a
concedente afirmado ter a concessionária deixado de pagar a 12ª parcela,
vencida em dezembro de 2002, com solicitação de nova repactuação.
Afirma a concessionária que, embora tenha solicitado nova negociação,
pagou a referida parcela, conforme documentos anexados aos autos (fls.
480/481). Nova repactuação não ocorreu, tendo a concessionária deduzido
ação revisional, a qual foi parcialmente acolhida para reconhecer ilegal a
taxa de juros cobrada, reduzindo-a para 1% a.m.
Sendo esse o quadro, não se há falar na existência de
situação de inadimplência que justificasse a ruptura da concessão, mais
ainda quando se constata ter sido seu valor constituído mediante incidência
de taxa de juros tida como ilegal pelo poder judiciário. Ora, se estava sendo
cobrado mais do que se mostrava efetivamente devido, inexiste quadro de
inadimplência capaz de produzir a ruptura do vínculo contratual.
Imputou-se também à concessionária falta de
instalações condizentes ao padrão da clientela BMW. Não obstante tal
imputação, nenhum dado concreto e relevante foi especificado para
permitir conclusão de verdadeira deficiência das instalações, o que torna a
imputação leviana por falta de convincentes fundamentos fáticos.
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A questão relativa ao pagamento complementar em
razão de exigência do fisco gaúcho de alíquota de ICMS de 17% ao invés
de 12%, relativa ao período de março a maio de 2001, tampouco se presta
para autorizar o reconhecimento de justa causa para a ruptura do contrato.
No caso, manteve o fisco a alíquota maior durante o referido período,
cobrando o respectivo valor da concedente, considerada sua condição de
substituta tributária. A recusa da concessionária de reembolsar a
concedente não se qualifica como fato que justifique a cessação da relação
contratual entre as partes, traduzindo fato acessório, pretérito e episódico,
cuja solução, à mingua de acordo, poderia ser trazido à discussão perante o
judiciário, sem que tal servisse para afetar de morte a relação contratual
principal. Ademais, a concessionária chegou a admitir sua
responsabilidade, tendo pleiteado efetuar o pagamento em 60 meses,
conforme permite a legislação para parcelamento de débitos fiscais, o que
não foi aceito pela concedente.
A outra infração contratual descrita no sentido de ter
havido alteração societária da concessionária sem autorização da
concedente sequer ocorreu. Nesse caso, há farta documentação nos autos
historiando as várias e prévias negociações entre as partes, para efeito de
celebração do último contrato, cuja análise deixa clara a concordância
final da concedente com a transferência das cotas sociais da primitiva sócia
Juliana Slavieiro para o coautor Marcelo Magalhães, não sendo possível
entrever nenhuma conduta da concessionária que pudesse ser vista como
tendente a sonegar informação relevante á concedente.
Sobreleva observar que, em janeiro de 2001, a
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montadora alemã BMW, por meio de sua representante brasileira,
encaminhou missiva à concessionária autora, exigindo dela a assinatura de
um novo contrato de concessão para “modernizar as relações e trazer
mais certeza e eficiência ao negócio” -, sob pena de interrupção imediata
no faturamento de veículos.1 Esse novo contrato foi assinado em 01 de
janeiro de 2001.
Posteriormente, em maio de 2002, a sócia majoritária
(Juliana Slaviero) ofertou sua participação acionária (85% do capital
social) ao coautor (Marcelo Magalhães), sendo certo que tal negociação
somente foi concluída após várias reuniões entre o pretendente e
representantes da concedente.
Nessas reuniões, o pretendente e ora coautor Marcelo
apresentou plano formal de negócio para os próximos anos, incluindo a
projeção de vendas e estratégia de marketing para viabilizar o negócio,
sendo certo que, reunião realizada em 07.06.2002, ponderou sobre a
necessidade de realização de um série de sugestões, dentre elas, venda
inicial de 12 veículos/mês mais crescimento de 1% ao mês com margem
bruta de 2,5% e over-bônus de 2,5%; venda de usados no equivalente a
40% do faturamento dos novos, com margem bruta de 7%; faturamento
bruto de R$ 85.000,00/mês com crescimento de 0,17% ao mês; aprovação
de linha de crédito de R$ 500.000,00( quinhentos mil reais), a ser
amortizada em 36 meses, com taxa de 2% ao mês, para investimentos nas
novas instalações; aumento do limite de crédito de Floor Plan de
1 Ato ilegal e sem efeito, uma vez que nos termos do art. 21 da Lei Ferrari, a concessão firmada com o distribuidor de veículos automotores será de prazo indeterminando e somente cessará nos casos específicos previstos em lei
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R$1.900.000,00 (um milhão e novecentos mil) para R$ 2.700.00,00 (dois
milhões e setecentos mil), com liberdade para uso em novos e usados;
revisão do cronograma de pagamentos relativo aos parcelamentos em curso
junto à BMW Comercial, permitindo coincidir a quitação das parcelas com
o recebimento dos Bônus.
Em reunião realizada em 20 de junho de 2002, a ré
concedente, após avaliar o plano de negócios e sugestões do pretendente
coautor, culminou por concordar com as seguintes iniciativas: venda inicial
de veículos novos partindo de 10 unidades por mês, com crescimento de
1% ao mês, gerando um total de 127 para o 1º ano; 143 unidades no 2º ano
e 161 unidades no 3º ano; empréstimo de R$ 500.000,00 (quinhentos mil
reais) desde que com juros de mercado e não à taxa de 2%; elevação do
limite de crédito de Floor Plan desde que majorada a garantia para o
equivalente a 70% do valor do aumento; revisão do cronograma de
pagamentos relativo aos parcelamentos em curso junto à BMW Comercial,
permitindo coincidir a quitação das parcelas com o recebimento dos
Bônus, com manutenção do fluxo de fornecimento de serviços e peças
Verifica-se, por conseguinte, que poucos meses antes
da iniciativa rescisória, a concedente manifestava plena intenção de
prosseguir com o negócio, tendo, inclusive, acatado algumas das sugestões
do coautor. Ora, estivesse diante de uma parceira comercial inconfiável ou
que tivesse, ao longo do tempo, descumprido suas obrigações, de modo a
afetar os interesses da concedente, evidente que não teria ela a postura
cooperativa e propícia ao prosseguimento do negocia que houvera
demonstrado.
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Em realidade, a reação da concedente derivou da
reclamação feita pela concessionária sobre a possibilidade de não
cumprimento do volume de vendas prometido, traduzindo postura mais
preocupada em retaliar do que a defesa de seus interesses econômicos em
razão do inadimplemento da contraparte contratual.
Aqui, cabe acentuar que, conforme documento da
concedente ao coautor Marcelo, datado de 22 de janeiro de 2003, houve a
expressa previsão de comercialização de 1600 carros no ano, cabendo à
concessionária o direito de negociar 107 veículos (fl. 518).
Sendo assim, perfeitamente compreensível a
preocupação da concessionária quanto à possibilidade de revisão desses
números para menos, suspeitas que acabaram por se confirmar, dada a
resposta evasiva da concedente (fl. 433), conforme já antes realçado.
Nestas circunstâncias, forçoso convir que o
rebaixamento à metade da expectativa de faturamento anual da
concessionária já seria mesmo motivo suficiente para autorizá-la a romper
o vínculo, mormente quando falto motivo verdadeiramente relevante para
justificar tal grau de redução.
Assim sendo, poder-se-ia até mesmo identificar na
espécie não uma simples ausência de justa causa da concedente para
romper o vínculo, mas sim o reconhecimento à concessionária de rescisão
por justa causa, vale dizer, por culpa da concedente.
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Qualquer das duas hipóteses enseja a mesma
consequência jurídica, vale dizer, a aplicação do art. 24 da lei de regência.
Assim, merece o apelo provimento para esse fim.
Contudo, há que se obtemperar que, havendo regra
específica para a hipótese, a indenização devida há de se ater aos seus
estritos termos, não sendo possível indenizar de modo diverso ao que a lei
prescreve.
Nessa perspectiva, há que se afastar todas as
pretensões alheias ao texto legal, deduzidas pelos autores, ficando, por
conseguinte indeferidas os seguintes pedidos deduzidas na inicial : item
“g” (indenização á base de 5% do valor de cada peça, a cada pedido
emergencial que fez à ré e não foi atendido em 48 horas; item “h”
(indenização de 5% sobre o valor da peça para cada peça de estoque que
não foi entregue no prazo de 72 horas; item “i” (reembolso de despesas
com aluguel de veículos para clientes em virtude de não poder consertar os
veículos por falta de peças); item “j” (reembolso das despesas com
treinamento de seus funcionários); item ”l” (indenização pela clientela a
teor dos artigos 710 e seguintes do Código Civil); item “m” (recomposição
de margem subtraída quando da implantação do floor plan e bônus dos
veículos vendidos de julho/01 até o final do contrato). Acresça-se, em
relação a esse último item outro fundamento para seu indeferimento, vale
dizer, o fato de que essa alteração promovida pelo ter sido aceita pelo co-
autor Marcelo, ao assumir o controle acionário da empresa em junho de
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2002; item “ n” (margem bruta e bonificação dos 28 veículos não vendidos
no ano de 2002 por falta de produto e/ou bloqueio de fornecimento); item
“o” (perda da receita de assistência técnica provocada pela omissão da ré
na instalação e crescimento do mercado paralelo e homônimo).
Também mercê repulsa a pretensão dos autores de
indenização por danos morais. A hipótese apenas caracteriza conflito de
interesses econômico-materiais, passíveis de resolução no âmbito restrito
prejuízos materiais, inexistente situação que qualifique um atentado a
direito personalíssimo, capaz de configurar uma ofensa indenizável ao
patrimônio ético de qualquer dos autores da ação.
A relação contratual teve início em 26/05/1993 e,
considerando ter havido, no curso da ação, concessão de liminar,
determinando a manutenção compulsória do contrato (fl. 1375) por seis
meses, houve a prorrogação da vigência até 20/08/2003, devendo ser essas
as datas que devem ser utilizadas, respectivamente, como marco inicial e
rescisório do contrato.
Observo, ainda, que, conforme corretamente
deliberado no curso da ação, o laudo pericial produzido perante o juízo
gaúcho foi declarado imprestável pela juíza que conduzia o processo, com
determinação de restituição dos honorários recebidos e substituição por
outro perito. A substituição não se operou, tendo em vista a modificação de
competência, com remessa dos autos para esse estado, tendo a julgadora
paulista que os recebeu julgado desde logo a ação. Desse modo, havendo
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solução condenatória, o valor há de ser apurado em sede de liquidação.
Desse modo, fica a empresa ré condenada, nos
exclusivos termos da lei de regência, a readquirir dos autores o estoque de
veículos automotores e componentes novos pelo preço de venda à rede de
distribuição, vigente na data de reaquisição (art. 24, inc.I); comprar os
autores os equipamentos, máquinas, ferramental e instalações à concessão,
pelo preço de mercado correspondente ao estado em que se encontrarem e
cuja aquisição o concedente determinara ou dela tivera ciência por escrito
sem lhe fazer oposição imediata e documentada, excluídos desta obrigação
os imóveis do concessionário (art. 24, inc. II); e pagar-lhes perdas e danos,
à razão de quatro por cento do faturamento projetado para um período de
24 meses (soma de dezoito meses mais seis meses três por cada
quinquênio do contrato), devendo a projeção tomar por base o valor
corrigido monetariamente do faturamento de bens e serviços concernentes
à concessão, que o concessionário tiver realizado nos dois anos anteriores à
rescisão (art. 24, inc. III).
Ante o exposto, pelo meu voto, dou parcial
provimento ao recurso para julgar parcialmente procedente a ação e
condenar a ré ao pagamento da indenização, nos moldes supra aduzidos,
cujo valor, a ser apurado mediante liquidação por arbitramento em sede de
execução, deverá ser acrescido de juros mora de 1% a.m., contados a partir
da citação e correção monetária, a ser calculada mediante aplicação do
índices da tabela prática do tribunal, incidente sobre os valores históricos
vigentes e apurados a partir da rescisão do contrato (20/08/2003). Sendo
parcial a condenação, as custas e despesas processuais remanescem a
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cargo das partes, cada qual sendo responsável pelos valores que
desembolsou. Quanto aos honorários advocatícios, condeno a ré a pagar ao
patrono do autor o equivalente a 15% do valor da condenação, anotando-se
que tal valor já contempla a sucumbência parcial. Conforme já decidiu o
STJ, “... A verba honorária sobre o valor da condenação já leva em conta
a sucumbência parcial” (Resp. n.º 242.598/RJ, Rel. Min. Ruy Rosado de
Aguiar, DJ de 27.11.2000).
ANDRADE NETORelator
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Voto nº 22395Apelação nº 0071825-97.2006.8.26.0000Comarca: São PauloApelantes: Bm Point Distribuidora de Veículos Ltda e Marcelo de Carvalho Magalhães Apelado: Bmw do Brasil Ltda
DECLARAÇÃO DE VOTO
Vistos.
Respeitado o entendimento do Nobre Desembargador Relator, ousei
divergir parcialmente de suas conclusões, para reconhecer os pedidos de indenização
por dano material pleiteados na inicial, a serem fixados em fase de liquidação, por
arbitramento, e de indenização por dano moral.
Inconteste a culpa da concedente pela rescisão do contrato de concessão
mercantil, nos exatos termos do voto do i. Relator. Há vasto suporte probatório nos autos
que indica que a rescisão do contrato foi unilateral e injustificada por parte da
concedente; ausente justa causa, passível a indenização à concessionária, nos termos da
Lei Ferrari.
Contudo, no caso dos autos, a indenização não deve ser limitada ao
previsto no art. 24, III da Lei Ferrari, já que todos os danos alegados pela apelante
dizem respeito às consequências da relação jurídica mantida entre as partes, de modo
que, referidas perdas e danos devem ser indenizadas, como decorrência lógica do
reconhecimento da culpa pela rescisão.
A apelante indica como perdas e danos os seguintes itens: item “g”
(indenização á base de 5% do valor de cada peça, a cada pedido emergencial que fez à
ré e não foi atendido em 48 horas; item “h” (indenização de 5% sobre o valor da peça
para cada peça de estoque que não foi entregue no prazo de 72 horas; item “i”
(reembolso de despesas com aluguel de veículos para clientes em virtude de não poder
consertar os veículos por falta de peças); item “j” (reembolso das despesas com
treinamento de seus funcionários); item ”l” (indenização pela clientela a teor dos artigos
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710 e seguintes do Código Civil); item “m” (recomposição de margem subtraída quando
da implantação do floor plan e bônus dos veículos vendidos de julho/01 até o final do
contrato). Acresça-se, em relação a esse último item outro fundamento para seu
indeferimento, vale dizer, o fato de que essa alteração promovida pelo ter sido aceita pelo
co-autor Marcelo, ao assumir o controle acionário da empresa em junho de 2002; item “ n”
(margem bruta e bonificação dos 28 veículos não vendidos no ano de 2002 por falta de
produto e/ou bloqueio de fornecimento); item “o” (perda da receita de assistência técnica
provocada pela omissão da ré na instalação e crescimento do mercado paralelo e
homônimo).
Como se observa, os danos alegados não foram quantificados nos autos,
de modo que se torna imprescindível a realização de perícia contábil para apuração do
valor da indenização.
Cumpre relembrar que a ação, inicialmente proposta perante juízo civil da
cidade de Porto Alegre-RS, foi remetida para esta capital por força de decisão do
Superior Tribunal de Justiça, que, validando cláusula de eleição, decidiu ser esse o foro
competente para dirimir a lide. No curso da ação perante a 7ª Vara Cível do Foro Central
de Porto Alegre, houve realização de prova pericial contábil, a qual, no entanto, foi
declarada imprestável pelo magistrado então condutor do processo por suspeição
do perito oficial, quem teria quebrado a confiança nele depositada ante a parcialidade
demonstrada em favor da ré.
Após a declaração de nulidade daquela perícia, não foi realizada outra
prova capaz de quantificar os danos alegados. Por outro lado, considerando que o
processo já tramita há mais de 10 anos e que o objetivo da perícia NÃO É REDISCUTIR
A CULPA PELA RESCISÃO DO CONTRATO já que esta está sendo definida por esta
Turma Julgadora - entendo ser inviável e desnecessária a anulação da r. sentença,
tampouco a conversão do julgamento em diligência. Isso porque a fixação do quantum
devido a título de danos materiais poderá ser feita em fase de liquidação de
sentença, por arbitramento, nos termos do art. 510 do NCPC.
Por fim, forçoso reconhecer também a indenização por dano moral.
No caso, inquestionável que não se trata de “mero descumprimento
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contratual”, na medida em que a autora experimentou sérios prejuízos financeiros em
decorrência da quebra de expectativa e confiança que depositou na ré, como parceira
comercial.
O contrato de concessão mercantil é reconhecidamente um instrumento
que favorece às concessionárias, de modo que, em boa hora, foi necessária a edição da
Lei Ferrari, para regular as relações jurídicas entre as partes. Esta, ser um estatuto
protecionista da empresa concessionária, parte mais fraca da relação contratual, e,
portanto, a mais sujeita aos abusos perpetrados pela concedente, a Lei Renato
Ferrari prevê as formas de reparação pelos prejuízos por ela suportados, nos termos do
art. 24 do diploma.
Sendo presumida a vulnerabilidade das concessionárias frente às
concedentes no que tange o poder econômico e, no caso dos autos, reconhecida a culpa
da concedente pela rescisão contratual, torna-se inegável que a concessionária teve
sua honra objetiva e seu prestígio comercial abalados, em decorrência da conduta
abusiva da ré.
Deve ser destacado que foi ultrapassado o tempo em que dano moral
equivalia à dor, sofrimento e angústia da vítima em razão da ofensa. Os mais renomados
estudiosos da responsabilidade civil modernamente conceituam o dano moral de maneira
bastante clara e objetiva: trata-se de ofensa aos direitos da personalidade e, em sentido
mais amplo, à própria dignidade da pessoa humana. A consequência, os efeitos de
mencionada ofensa podem, estes sim, ser constituídos pela dor, sofrimento ou vexame
causado.
Fenômeno interno, portanto, o dano moral, em si mesmo, não se pode
exigir que seja provado. O que deve ser provado são fatos, condutas ou omissões que
ocasionem a mencionada ofensa aos direitos da personalidade e, por consequência,
sofrimento e dor ao prejudicado. A avaliação sobre quais fatos que causam dano moral
deve ser feita pelo juiz, segundo a jurisprudência e as regras da experiência.
No caso, entendo que a indenização deve ser fixada em R$30.000,00
(cinquenta mil reais), como suficiente para bem reparar os danos sofridos.
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Destarte, pelo meu voto, DOU PROVIMENTO ao recurso, para condenar a
ré ao pagamento de indenização por danos materiais, a serem fixados em fase de
liquidação, por arbitramento, através de perícia contábil, e indenização por danos morais
fixados em R$30.000,00 (trinta mil reais), nos termos da súmula 362 do STJ, bem como
acrescida de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação.
MARIA LÚCIA PIZZOTTIDesembargadora
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Este documento é cópia do original que recebeu as seguintes assinaturas digitais:
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1 17 Acórdãos
Eletrônicos
ALBERTO DE OLIVEIRA ANDRADE NETO 8424995
18 21 Declarações de
Votos
MARIA LUCIA RIBEIRO DE CASTRO PIZZOTTI
MENDES
792192D
Para conferir o original acesse o site: https://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/sg/abrirConferenciaDocumento.do, informando o processo 0071825-97.2006.8.26.0000 e o código de confirmação da tabela acima.