região norte-

Upload: vinicius-fernandes

Post on 09-Jul-2015

106 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Cozinha Brasileira Regio Norte

5

1- INFORMAES GERAIS A maior regio do Brasil formada pelos estados do Acre, Amap, Amazonas, Par, Rondnia, Roraima e Tocantins. Sua grande extenso territorial, alm da localizao, proporciona fronteiras com seis pases sul-americanos (Bolvia, Peru, Colmbia, Venezuela, Guiana e Suriname, alm do territrio da Guiana Francesa).

1.1- Dados geogrficos e populacionais Apesar de ser a maior regio do pas (3.869.637,9 quilmetros quadrados), a segunda regio menos habitada, somente o Centro-Oeste possui quantidade de habitantes inferior. Conforme contagem populacional realizada em 2010 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE), a populao regional soma 15.864.454 habitantes, sendo a densidade demogrfica de 4,1 habitantes por quilometro quadrado. Dentro da regio existe uma grande disparidade entre os estados quanto concentrao da populao, por exemplo, o Par abriga cerca de 7.581.051 habitantes, isso lhe d a condio de mais populoso regionalmente, enquanto que Roraima possui apenas 450.479 habitantes. Um aspecto comum da populao desta regio, tanto habitantes do campo quanto das cidades, a incidncia de concentrao de pessoas s margens de rios. As principais cidades da regio se encontram estabelecidas s margens de rios, como Manaus, Belm, Porto Velho, Santarm, Marab e Altamira. Essa configurao recebe o nome de populao ribeirinha. O fato de a populao se concentrar s margens de rios proveniente de diversos fatores, sendo os principais a dificuldade de locomoo dentro da floresta Amaznica e a falta de infra-estrutura de transporte, como rodovias e ferrovias, sendo assim, a melhor alternativa a utilizao dos rios com via de circulao (hidrovia). A floresta Amaznica cobre a maioria do territrio dos estados que integram a regio, com predominncia do clima equatorial e temperatura elevada, alm dos

Cozinha Brasileira Regio Norte

6

altos ndices pluviomtricos. A hidrografia composta pelos grandes rios que formam as bacias hidrogrficas Amaznica e do Tocantins. H uma grande heterogeneidade na composio dos habitantes da Regio Norte: cerca de 128.149 ndios de diversas etnias; nos estados do Par, Amazonas e Tocantins. significativo o nmero de imigrantes nordestinos, em especial do Cear e do Maranho; no Acre e em Rondnia h grande concentrao de imigrantes paranaenses e gachos.

1.1.1- Pontos extremos do Brasil Ao norte, a nascente do Rio Ail, no Monte Cabura, Estado de Roraima, na fronteira com a Guiana; Ao sul, o Arroio Chu no Rio Grande do Sul, fronteira com o Uruguai;

O extremo leste da parte continental do Brasil a Ponta do Seixas, em Joo Pessoa, na Paraba; porm, os arquiplagos de Fernando de Noronha, Atol das Rocas, So Pedro e So Paulo e Trindade e Martim Vaz ficam ainda mais a leste, sendo o extremo leste absoluto do territrio brasileiro uma ponta sem nome na Ilha do Sul do arquiplago de Martim Vaz; A oeste, a serra da Contamana ou do Divisor, no Acre, na fronteira com o Peru. Na regio Norte esto dois dos quatro pontos extremos do Brasil. O extremo norte, nascente do rio Ail, e o extremo oeste, serra do Divisor.

1.1.2- Pontos mais altos do Brasil Os dois pontos mais altos do Brasil esto na regio norte.

Cozinha Brasileira Regio Norte

7

O Pico da Neblina, localizado no norte do Amazonas, na Serra do Imeri, o ponto mais alto (ponto culminante) do territrio brasileiro com 2993,78 metros de altitude (medio feita pelo IBGE em 2004). O nome "Pico da Neblina" deve-se ao fato do mesmo se encontrar praticamente o ano todo coberto de nuvens. O Pico 31 de Maro o segundo ponto mais alto do Brasil, com 2.972,66 metros de altitude. Localiza-se na Serra do Imeri. Situa-se a apenas 687 metros de distncia do Pico da Neblina, ponto mais alto do territrio brasileiro, apenas 21 metros mais alto, de cujo macio o Pico 31 de Maro faz parte e do qual pode ser considerado um cume secundrio.

1.2- Atividade econmica A ocupao humana e toda a atividade econmica da Regio Norte foi condicionado pela presena do rio Amazonas e da extensa floresta amaznica. No passado, as atividades econmicas desenvolvidas na regio eram apenas extrativas: borracha, castanha, plantas medicinais e ornamentais, aves, peixes etc. Nas ltimas dcadas, porm, tem-se intensificado o ritmo de ocupao, com o alargamento da fronteira agrcola, o estabelecimento de amplos projetos agropecurios, de explorao mineral e de extrao de madeira, levando abertura de rodovias de integrao. Tudo isso tem sido realizado em ritmo acelerado, sem levar em conta o equilbrio da natureza; a agresso fauna e flora constante atravs das queimadas, do desmatamento, da minerao intensiva, de caa e pesca predatrias. Alm de tudo est ameaada a sobrevivncia do ndio que sempre habitou essa regio. Cultiva-se, arroz, cana, coco, cacau, tomate, batata-doce, amendoim, caf, algodo, sisal, mandioca, juta e pimenta do reino. Estes trs ltimos produtos so os mais intensamente comercializados. A criao de bovinos no significativa, desenvolvendo-se a pecuria leiteira somente nas regies de Belm e Manaus, onde h bons pastos e ausncia de enchentes. A pecuria de corte concentra-se principalmente na Ilha de Maraj, que possui o maior rebanho de Bfalos do mundo.

Cozinha Brasileira Regio Norte

8

1.3 Tradio, cultura e folclore A populao bem miscigenada (indgenas, imigrantes: cearenses, gachos, paranaenses, nordestinos, africanos, europeus e asiticos), fator que contribui para a diversidade cultural da Regio. So vrias as manifestaes culturais realizadas pelas diferentes tribos indgenas distribudas pela Regio Norte. O ndio, por vaidade ou questes religiosas, se enfeita atravs de pinturas e acessrios durante suas celebraes. Uma dana de origem indgena muito praticada na regio o carimb. As duas maiores festas populares do Norte so o Crio de Nazar, que no segundo domingo de outubro rene mais de 2 milhes de pessoas em Belm (PA), e o Festival de Parintins, a mais conhecida festa do boi bumb do pas, que ocorre em junho, no Amazonas.

1.3.1 Crio de Nazar Realizado em Belm do Par h mais de dois sculos, o Crio de Nazar uma das maiores e mais belas procisses catlicas do Brasil e do mundo. Rene, anualmente, cerca de dois milhes de romeiros numa caminhada de f pelas ruas da capital do Estado, num espetculo grandioso em homenagem a Nossa Senhora de Nazar, a me de Jesus. No segundo domingo de outubro, a procisso sai da Catedral de Belm e segue at a Praa Santurio de Nazar, onde a imagem da Virgem fica exposta para venerao dos fiis durante 15 dias. O percurso de 3,6 quilmetros e j chegou a ser percorrido em nove horas e quinze minutos, como ocorreu no ano de 2004, no mais longo Crio de toda a histria. Na procisso, a Berlinda que carrega a imagem da Virgem de Nazar seguida por romeiros de Belm, do interior do Estado, de vrias regies do pas e at do exterior. Em todo o percurso, os fiis fazem manifestaes de f, enfeitam ruas e casas em homenagem Santa. Por sua grandiosidade, o Crio de Belm foi

Cozinha Brasileira Regio Norte

9

registrado, em setembro de 2004, pelo Instituto do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional (Iphan), como Patrimnio Cultural de Natureza Imaterial.

Curiosidade: o termo "Crio" tem origem na palavra latina "cereus" (de cera), que significa vela grande de cera. Tradio que se atualiza em um conjunto de rituais e expresses to diversas quanto as formas de devoo santa: as duas principais procisses crio e trasladao , mas tambm aquelas realizadas em barcos e motos, na capital e em cidades e ilhas prximas; os pagadores de promessas que puxam a corda atrelada berlinda da santa; os brinquedos de miriti; o almoo do crio; o arraial; a festa das Filhas da Chiquita; o arrasto do pavulagem. A Festa da Chiquita a maior manifestao profana e o mais tradicional encontro gay da Amaznia, no mesmo dia que ocorre a Trasladao do Crio de Nazar.

1.3.2 O boi-bumb O boi-bumb uma das variaes do bumba meu boi, largamente praticado no Brasil. uma das mais antigas formas de distrao popular. Foi introduzido pelos colonizadores europeus, sendo a primeira expresso de teatro popular brasileiro. O Festival de Parintins um dos maiores responsveis pela divulgao cultural do boi-bumb. No Bumbdromo apresentam-se as agremiaes Boi Garantido (vermelho), e o Boi Caprichoso (azul). So trs noites de apresentao onde so abordados, atravs das alegorias e encenaes, aspectos regionais como lendas, rituais indgenas e costumes dos ribeirinhos.

1.3.3- Dana do Carimb

Cozinha Brasileira Regio Norte

10

O Carimb uma sonoridade de procedncia indgena, aos poucos mesclada cultura africana, com a assimilao das percusses dos negros; e a elementos de Portugal, como o estalar dos dedos e as palmas, que intervm em alguns momentos da coreografia. O Carimb uma dana que tem influncia africana, indgena e portuguesa. , inclusive, conhecido nacionalmente (por estudiosos em folclore) como a nica dana brasileira, onde se percebe visivelmente a influncia dos trs povos que formaram a sociedade brasileira: o batuque africano; os instrumentos indgenas e coluna curvada, da forma como dana esse povo; e o estalar de dedos dos portugueses. A denominao da "Dana do Carimb" vem do titulo dado pelos indgenas aos dois tambores de dimenses diferentes que servem para o acompanhamento bsico do ritmo. Na lngua indgena "Carimb" - Curi (Pau) e Mb ( Oco ou furado), significa pau que produz som. Em alguns lugares do interior do Par continua o ttulo original de "Dana do Curimb". Mais recentemente a dana ficou nacionalmente conhecida como "Dana do Carimb", sem qualquer possibilidade de transformao.

1.3.4- Expresses orais e grficas dos ndios Wajpi: patrimnio imaterial Atravs da Segunda Proclamao a UNESCO editou uma lista das 28 obrasprimas do patrimnio oral e imaterial da humanidade. Dentre elas destacam-se as expresses orais e grficas dos Wajpi. Os Wajpi, populao indgena pertencente ao grupo cultural de tradies e lngua Tupi-guarani, conta hoje com 580 pessoas vivendo em pequenas aldeias dentro de um territrio protegido no estado do Amap. Estes indgenas desenvolveram uma linguagem nica, unindo a arte grfica da pintura e a verbal, a travs da qual transmitem conhecimentos e significados culturais, estticos e religiosos.

Cozinha Brasileira Regio Norte

11

Seus ornamentos, designados pelo termo kusiwa, so aplicados com tinturas vegetais em cuja composio esto sementes de urucum, gordura de macaco, suco de jenipapo verde e resinas perfumadas. A arte kusiwa compreende um repertrio de cdigos que tm como motivos mais freqentes animais como pssaros, peixes, borboletas, cobras, jacars, jabutis, etc.

1.3.5- Boto cor-de-rosa O Boto Cor-de-Rosa um dos mamferos aquticos mais caractersticos da Amaznia. Cresce at 2,5 metros de comprimento e pode pesar at 90 quilos. da famlia dos cetceos (Platanistidae), que antigamente teve grande distribuio pelo mundo, inclusive nos oceanos. Hoje seus membros so limitados a poucos rios de gua doce, inclusive o Amazonas/Solimes e o Orinoco. O Boto Cor-de-rosa vive especialmente em guas relativamente rasas, onde procura, de preferncia, peixes de couro tais como o tamuat e o bagre. Tambm no dispensa tartarugas jovens, recm sadas do ovo. A protuberncia na cabea um tipo de captador, utilizado para receber os reflexos dos sons que fazem parte do sistema de sonar que utiliza para navegar e encontrar sua comida. Assim, consegue nadar at dentro da floresta inundada na poca da cheia e se locomover sem problemas nas guas turvas da regio.

Figura 12: Boto cor-de-rosa

Conta a lenda que o boto, peixe encontrado nos rios da Amaznia, se transforma em um belo e elegante rapaz durante a noite, quando sai das guas conquista das moas. Elas no resistem sua beleza e simpatia e caem de amores por ele. O Boto tambm considerado protetor das mulheres, pois quando ocorre algum naufrgio em uma embarcao em que o boto esteja por perto, ele salva a vida das mesmas empurrando-as para as margens dos rios. As mulheres so conquistadas pelo boto s margens dos rios, quando vo tomar banho ou mesmo nas festas realizadas nas cidades prximas aos rios. Os Botos vo aos bailes e danam alegremente com elas, que logo se envolvem com

Cozinha Brasileira Regio Norte

12

seus galanteios e no desconfiam de nada. Se apaixonam e engravidam deste rapaz. por esta razo que ao Boto atribuda a paternidade de todos os filhos de mes solteiras. O Boto anda sempre de chapu, pois dizem que de sua cabea exala um forte cheiro de peixe. Quando chega festa geralmente desconhecido de todos, mas logo consegue conquistar uma moa bonita e com ela dana a noite inteira. Porm, antes que o dia amanhea, ele vai embora sem que ningum o veja mergulhando no rio. O Boto - "Dom Juan" das guas - figura popular do folclore amaznico. 1.3.6- Vitria-Rgia Os ingleses que deram o nome Vitria em homenagem rainha, quando o explorador alemo a servio da Coroa Britnica Robert Hermann Schomburgk levou suas sementes para os jardins do palcio ingls. Outros nomes: irup (guarani), uap, aguap (tupi). O suco extrado de suas razes utilizado pelos ndios como tintura negra para os cabelos. Sua flor branca e abre-se apenas noite, e expelem uma divina fragrncia noturna adocicado do abric, mantendo-se aberta at aproximadamente as nove horas da manh do dia seguinte. No segundo dia, ao da polinizao, a flor cor de rosa. Assim que as flores se abrem, seu forte odor atrai os besouros polinizadores, que a adentram e nelas ficam prisioneiros. Hoje existe o controle por novas tecnologias (adubao e hormnios) em que possvel controlar o tamanho dos pratos e com isso muito usada no paisagismo urbano tanto em grandes lagos e pequenos espelhos d'gua. Existe uma lenda indgena a respeito da vitria-rgia. Como suas flores abrem-se noite, os ndios a comparam lua e s estrelas. Segundo a lenda em uma tribo vivia uma bela ndia chamada Nai. Ela acreditava que a lua escolhia as moas mais bonitas e as transformava em estrelas que brilhariam para sempre no firmamento. A ndia Nai tambm desejava ser escolhida pela lua para ser transformada em uma estrela. Todas as noites ela saa de sua oca a fim de ser vista pela lua mas, para sua

Cozinha Brasileira Regio Norte

13

tristeza, a lua no a chamava para junto de si. Nai j no dormia mais. Passava as noites andando na beira do lago, tentando despertar a ateno da lua. Em uma noite, a ndia viu, nas guas lmpidas de um lago, a figura da lua. A pobre moa, imaginando que a lua havia chegado para busc-la, se atirou nas guas profundas do lago e morreu afogada. A lua, comovida diante do sacrifcio da bela jovem, resolveu transform-la em uma estrela diferente, daquelas que brilham no cu. E ainda resolveu imortaliz-la na terra, transformando-a em uma delicada flor: a VITRIA-RGIA (estrela das guas).

1.3.7- A Lenda da Mandioca A lenda de Mani foi registrada em 1876, por Couto de Magalhes. Em domnio pblico, este foi o registro do folclorista:"Em tempos idos, apareceu grvida a filha do chefe de uma tribo, que residia nas imediaes do lugar em que est hoje a cidade Santarm. O chefe quis punir no autor da desonra de sua filha a ofensa que sofrera seu orgulho e, para saber quem ele era, empregou debalde rogos, ameaas e por fim castigos severos. Tanto diante dos rogos como diante dos castigos a moa permaneceu inflexvel, dizendo que nunca tinha tido relao com homem algum. O chefe tinha deliberado mat-la, quando lhe apareceu em sonho um homem branco que lhe disse que no matasse a moa, porque ela efetivamente era inocente, e no tinha tido relao com homem. Passados os nove meses, ela deu luz uma menina lindssima e branca, causando este ltimo fato a surpresa no s da tribo como das naes vizinhas, que vieram visitar a criana, para ver aquela nova e desconhecida raa. A criana, que teve o nome de Mani e que andava e falava precocemente, morreu ao cabo de um ano, sem ter adoecido e sem dar mostras de dor. Foi ela enterrada dentro da prpria casa, descobrindo-se e regando-se diariamente a sepultura, segundo o costume do povo. Ao cabo de algum tempo, brotou da cova uma planta que, por ser inteiramente desconhecida, deixaram de arrancar. Cresceu, floresceu e deu frutos. Os pssaros que comeram os frutos se embriagaram, e este fenmeno, desconhecido dos ndios, aumentou-lhes a superstio pela planta. A terra afinal fendeu-se, cavaram-na e julgaram reconhecer

Cozinha Brasileira Regio Norte

14

no fruto que encontraram o corpo de Mani. Comeram-no e assim aprenderam a usar da mandioca."

Cmara Cascudo acrescenta que o nome mandioca advm de Mani + oca, significando casa de Mani.

2- HERANA INDGENAOs produtos naturais da Amaznia so exticos?! O Conceito de extico. Costumamos usar esse termo para definir, por exemplo, os ingredientes amaznicos. Segundo o Dicionrio Aurlio, extico o "que no indgena; estrangeiro" (ope-se a autctone). No seria uma inverso de valores classificar o cupuau como extico e no o cassis? (p. 12 - Guta Chaves. Larousse da cozinha brasileira)

Os ndios j habitavam a terra muito antes da chegada da esquadra de Cabral. J praticam o cultivo de razes, como a mandioca, base de tantos pratos. Alm da mandioca, os nativos comiam palmito, batata-doce, milho, amendoim e car. Dedicavam-se caa se abasteciam com a abundncia de peixes e das frutas que a natureza lhes oferecia. O condimento dos ndios por excelncia era a pimenta, e no o sal, ainda desconhecido por eles. A influncia indgena ainda ecoa em nomes dados a alimentos, a instrumentos e a muitos lugares. Sobrevive no folclore e na populao indgena concentrada na Amaznia Legal. Vrios desses processos e conhecimentos, o colonizador europeu os recebeu das mos da mulher indgena, elemento mais produtor que o homem nas culturas primitivas. Dela tambm foram transmitidas a organizao da famlia brasileira e valiosos mtodos de higiene infantil e domstica.

3- CULINRIA NOS ESTADOS 3.1- Acre A culinria do Acre muito prxima de outras partes da regio Norte, embora tenha uma maior influncia dos imigrantes vindos do Nordeste, que foram

Cozinha Brasileira Regio Norte

15

para o Estado, atrados pela riqueza gerada pela extrao do ltex. De herana nordestina h pratos como o vatap e a carne de sol com macaxeira. Os ingredientes mais apreciados so o pato e pescados como o tambaqui, o filhote e o pirarucu. A costela de tambaqui e o pirarucu de casaca esto entre as receitas mais consumidas. 3.2- Amap Por sua localizao, na foz dos rios Araguari e Oiapoque, o Estado do Amap possui uma culinria que, alm dos ingredientes mais utilizados na regio norte, como os pescados de gua doce, as frutas e a mandioca, conta com peixes e frutos do mar. De herana indgena h pratos como o tucunar ou gurijuba na brasa, peixe tpico do litoral norte do Brasil de colorao amarelada e que pode chegar a 1,5 metro. As preparaes com aa tambm so comuns, seja como mingau, doce, sorvete, ou, ainda para acompanhar camaro, charque ou peixe misturado com farinha de tapioca. Macap a capital do Estado conhecida como a "cidade do meio do mundo". 3.3- Amazonas A cozinha amazonense marcada pela utilizao de frutas, mandioca e peixes dos rios. A maior bacia hidrogrfica do pas abriga quase duas mil espcies de peixes, o que explica o fato de a maior parte das receitas tpicas ter como base os pescados. Entre as espcies mais apreciadas esto o tambaqui, o matrinx, o jaraqui, o pacu, o pirarucu, o surubim, o filhote e o tucunar. Eles so preparados assados na brasa ou no forno, em caldeiradas, cozidos ou fritos. O leite de castanha-do-par entra no preparo dos peixes cozidos e nas caldeiradas, assim como o leite de coco, embora este seja usado em menor escala. Para acompanh-los, h dois molhos tradicionais: o de tucupi, feito do sumo da mandioca-brava, e o arub, elaborado com o sumo de mandioca fervido, sal, pimenta-malagueta, alho e ervas aromticas. As farinhas tambm no faltam na mesa amazonense. A mais apreciada de todas a farinha de Uarini. Produzida no municpio de Uarini, ela feita com mandioca ralada e enrolada a mo para formar bolotas.

Cozinha Brasileira Regio Norte

16

3.4- Rondnia A cozinha do Estado de Rondnia baseada nos peixes dos principais rios da regio, com o Madeira, o Guapor, o Mamor e o Ji-Paran. Tucunars, tambaquis e surubins, entre outros, recebem temperos como o cheiro-verde, a cebolinha, a chicria, a alfavaca e as pimentas-malagueta e a murupi. Caldeiradas e peixes na brasa acompanhados de produtos obtidos da mandioca, como as farinhas e a manioba, so formas de preparo mas comuns na regio, que tem a maioria dos pratos tpicos em toda a regio Norte. 3.5- Roraima A culinria roraimense utiliza praticamente os mesmos ingredientes encontrados nos demais Estados da regio Norte, como as frutas regionais, a mandioca e os peixes de gua doce. Com a mandioca so preparadas receitas como a farinha de tapioca, o carim (derivado da tapioca, mas bem mais fino) e o bolo de macaxeira. Com os peixes so preparadas as caldeiradas de tucunar, a damorida, um peixe assado no espeto e regado em um caldo de folhas de pimenta-malagueta e passado na farinha de jiquitaia(pimenta-malagueta seca e moda), peixe moqueado e tambaqui recheado e assado na telha. 3.6- Tocantins A culinria do Tocantins difere das demais da regio Norte pelo fato de o Estado Sr, at 1988, parte de Gois. Recebeu influncias de mineiros e paulistas, alm dos indgenas, africanos e portugueses. As receitas tpicas so o arroz cozido com carne-seca (conhecido como arroz cerigado), o arroz com pequi, o feijo de tropeiro, a galinhada e o peixe na telha. O aafro-da-terra (crcuma) utilizado para temperar e dar cor ao arroz. Peixes como a corvina (espcie marinha que se adaptou gua doce), matrinx, o pintado e o tucunar que so as estrelas da culinria do Estado. 3.7- Par Diz-se que a culinria paraense a mais autntica do Brasil, pelo menos, a que sofreu a menor influncia do colonizador portugus e do africano, mantendo suas razes nativas. As tcnicas indgenas de assar e cozinhar os produtos naturais da fauna e da flora da regio Amaznica compem a maioria das receitas tpicas do

Cozinha Brasileira Regio Norte

17

Estado. No Par o uso da mandioca diferente. Enquanto na maior parte do pas reina a farinha, no Par impera o tucupi, um caldo amarelo extrado da raiz da mandioca por meio de um processo desenvolvido pelos ndios. Os paraenses apreciam frutos do mar, como mariscos, camares, avis, que so camarezinhos minsculos, siris, caranguejos e carnes de aves, como pato.

3.7.1- Ilha de Maraj Maraj a maior arquiplago fluviomarinho do mundo e abriga o maior rebanho de bfalos do pas e tambm cenrio do fenmeno da pororoca. Na ilha de Maraj h apenas duas estaes: inverno e vero. O inverno, prximo linha do Equador no de frio. Esta estao marca o momento da cheia, quando boa parte da ilha fica alagada e muitas vezes o nico meio de locomoo o barco, ou voadeira, como costumam chamar os prottipos de lancha. Durante metade do ano de dezembro a maio dois teros da ilha ficam alagados. Outra particularidade da ilha que a populao de bfalos supera o nmero de habitantes da regio. Simples, o prato local mais tpico o frito do vaqueiro, servido no caf da manh. Era a comida dos vaqueiros com pouca proviso que andavam pelos campos Uma curiosidade gastronmica o estranho turu, molusco comprido, de alto valor nutritivo, encontrado em cascas de rvores nos mangues e consumido cru pelos catadores de caranguejo. H diversas variedades de frutas, destacando-se o bacuri, cujas rvores se espalham por a ilha. H tambm o aa e a mangaba.

4- A VIDA COTIDIANA Barriga cheia, corao contente. (provrbio local). 4.1- O Caf da manh Em virtude do desgaste causado pelo clima mido, h a necessidade de

Cozinha Brasileira Regio Norte

18

refeies de alto valor energtico desde o caf da manh, em que so tradicionais a tapioca recheada com tucum e queijo coalho, o beiju, o mungunz e as variedades de paoca de charque com farinha (influncia nordestina), de amendoim, de castanha-do-par e de castanha de caju acompanhadas de banana. Tambm esto presentes a macaxeira cozida e passada na manteiga, com ou sem acar, o bolo de macaxeira, a canjica e muitos mingaus, como o de banana e de aa, e o peixe moqueado. Em Manaus aprecia-se ainda pupunha cozida e o p-de-moleque.

4.2- O Almoo Embora o prato smbolo da Amaznia seja o pato no tucupi, ele mais consumido em dias de festa (at mesmo por ser muito elaborado). A base da alimentao diria o peixe. Existem inmeros tipos de preparos preferidos pela populao amaznica, como embrulhados em folhas de banana-pacova, moqueados ou assados na telha ou na brasa, ao leite de coco, em caldeirada, ou cozido no tucupi.

4.3- O Lanche da tarde famoso o tacac das cinco, consumido em barraquinhas ao ar livre, principalmente em Belm. Tambm o crepe de tapioca, bem fininho e com recheios doces ou salgados, costuma ser consumido como quitute tarde. Versteis, esses crepes podem servir de base para coquetis, assim como a pupunha fruto da pupunheira -, vendida quente nas ruas e que compe requintados canaps. 4.4- O jantar No jantar comum consumir o que sobrou do almoo. No entanto, dependendo do poder aquisitivo das pessoas, consome-se o chib, aa com farinha de mandioca. 4.5- A qualquer hora do dia Tomado em qualquer momento, o aa prato de todas as refeies. Para a populao ribeirinha, o chib essencial.

Cozinha Brasileira Regio Norte

19

5- FRUTAS REGIONAIS 5.1- Aa O aa o fruto da palmeira do aaizeiro. Palmeira abundante na Amaznia. Conhecida pelos indgenas como "i-ai", a fruta que chora. O aa sustento e alimento de muitas famlias. No importa a classe social, o aa est presente em todas as mesas, seja como complemento ou prato principal. A polpa retirada por meio de mquinas apropriadas. O suco, com a densidade de um creme, chamado de vinho, normalmente consumido com farinha de mandioca ou de tapioca, s vezes com acar ou sal; com peixe frito ou camaro. Ou seja, tambm sobremesa ou acompanhamento de prato. Tambm usado na forma de mingau, pudim, mousse, sorvete, creme, gelia ou licor. Em Belm, o aa encontrado em quase todas as esquinas. OsFigura 17: Aa

pontos de venda so identificados com uma plaquinha vermelha.

5.1.1- Lenda do aa Conta a lenda que existia uma tribo indgena muito numerosa. Como os alimentos estavam escassos, era difcil conseguir comida para toda a tribo. Ento o cacique Itaki tomou uma deciso muito cruel. Resolveu que a partir daquele dia todas as crianas recm nascidas seriam sacrificadas para evitar o aumento populacional da tribo. At que um dia a filha do cacique, chamada Ia, deu luz uma menina que tambm teve de ser sacrificada. Ia ficou desesperada, chorava todas as noites de saudades. Ficando vrios dias enclausurada em sua oca e pediu a Tup que mostrasse ao seu pai outra maneira de ajudar seu povo, sem o sacrifcio das crianas. Certa noite de lua, Ia ouviu um choro de criana. Aproximou-se da porta de sua oca e viu sua filhinha sorridente, ao p de uma grande palmeira. Lanou-se em direo filha, abraando-a . Porm misteriosamente sua filha desapareceu.

Cozinha Brasileira Regio Norte

20

Ia, inconsolvel, chorou muito at morrer. No dia seguinte seu corpo foi encontrado abraado ao tronco da palmeira, porm no rosto trazia ainda um sorriso de felicidade e seus olhos estavam em direo ao alto da palmeira, que se encontrava carregada de frutinhos escuros. Itaki ento mandou que apanhassem os frutos, obtendo um vinho avermelhado que batizou de aa, em homenagem a sua filha (Ia invertido). Alimentou seu povo e, a partir deste dia, suspendeu a ordem de sacrificar as crianas.

5.2- Castanha-do-par A castanha-do-par, tambm conhecida como castanha do Brasil, amndoa saborosa e de elevado teor alimentcio, sendo usada em doces para recheios, confeitos, coberturas etc. A castanha-do-par no exatamente o fruto da castanheira, a amndoa que fica dentro da semente. Por seu potencial protico, a castanha-do-par muito nutritiva. Atualmente um dos principais produtos da economia extrativista do Par, destinada principalmente exportao. Da amndoa se extrai o leite de castanha, usado na preparao de diversos pratos e doces. Recentemente, a castanha-do-par vem sendo chamada de castanha-doBrasil. O motivo para a mudana que, no exterior, a semente conhecida como Brazil nut. Por motivos mercadolgicos, optou-se em cham-la pela traduo do nome em ingls em vez do nome tradicional que todos brasileiros j a conhecem.

Ao contrrio do que tantos pensam, a castanha no um fruto, e sim a amndoa da semente da castanheira. J o fruto, este conhecido pelo nome de ourio. De formato esfrico, achatado nas pontas, o ourio pode chegar a 20 cm de dimetro e pesar at dois quilos. Quando maduro, o fruto despenca da rvore, indicando que suas sementes esto prontas para o consumo ou plantio. Dentro de sua dura casca, aberta somente com uma serrilha, h entre 12 e 24 sementes. A amndoa que conhecemos como castanha-do-par est dentro dessas sementes.

Cozinha Brasileira Regio Norte

21

Tambm chamada de carne vegetal, a castanha possui quantidade protica equivalente a dois ovos altamente calrica. A castanheira uma rvore nativa da Amaznia. Sua altura pode alcanar 50 metros e seu valioso tronco chega a medir dois metros de dimetro. A nobre madeira excelente matria-prima para as construes civil e naval. A frondosa copa produz seus primeiros frutos apenas aps 12 anos de idade. Da em diante, por um perodo de no mximo 30 anos, cada castanheira produz, em mdia, 500 quilos de castanhas por colheita. O ourio da castanheira pode ser matriaprima para a confeco de peas de artesanato. Da semente, pode ser extrado o leite de castanha, usado na elaborao de iguarias ou na fabricao de sabes finos e cosmticos.

5.3- O guaran O guaran uma planta trepadeira cujo fruto possui casca avermelhada que, quando madura, se rompe revelando uma semente negra recoberta por uma polpa esbranquiada, lembrando um olho humano. O clima amaznico, quente e mido, propcio para o crescimento do guaran. No incio do sculo 20, na regio de Maus, no interior do Amazonas, os ndios Sater-Maw conseguiram domesticar o guaran fruta. Foram eles os primeiros a descobrir as propriedades energticas da fruta. A tribo passou a trabalhar o guaran secando suas sementes, torrando-as e depois processando-as em piles at virar uma pasta. Seguia-se ento um processo de lenta defumao em fogueiras, antes de se obter o p. Para isso, os ndios ralavam o basto de guaran em lngua de pirarucu. Ao misturar o p na gua e beberem, os ndios se sentiam fortes e tambm mais atentos para os perigos da floresta. Nas ruas do centro de Manaus comum encontrar o Guaran Batido, uma iguaria local. O preparo feito batendo no liquidificador: p do guaran, gua, xarope de guaran para adoar -, gelo e, conforme a preferncia do fregus, amendoim, castanhas ou algum suco de fruta regional como cupuau ou tapereb.

Cozinha Brasileira Regio Norte

22

Lembre-se que preciso maneirar na bebida uma vez que o guaran possui trs vezes mais cafena do que o caf.

5.4- Duas frutas, uma famlia A famlia a mesma: Sterculiaceae. Alm disso, ambos so Theobromas: se um Theobroma cacao, o outro Theobroma grandiflorum. Estas so apenas algumas das muitas semelhanas entre o cacau e o cupuau. Tanto o cacau quanto o cupuau so frutas nativas da Amaznia. Em ambas as polpas so brancas, carnudas e revestem suas sementes. Os dois so frutos alongados, grandes, pesados e de casca dura. 5.4.1- O cacau O cacaueiro uma rvore de altura mediana, com aproximadamente 6 metros de altura. De seu tronco pende o cacau, um fruto alongado que mede em torno de 20 cm de comprimento. Sua casca dura possui uma colorao amarelada ou vermelha quando madura. Bahia e Par so os maiores produtores brasileiros.

5.4.2- O cupuau O cupuazeiro uma rvore que alcana at 20 m de altura. Seu fruto, o cupuau, possui casca dura e castanho-escura. O peso pode chegar a 2 k e o tamanho a 30 cm de comprimento. O aroma do cupuau intenso e apresenta forte personalidade. O cupuau considerado por muitos paraenses como a fruta smbolo do estado. No mercado Ver-o-peso, comum ver senhoras sentadas em bancos de madeira, com tesoura em mos e bacia no colo. Todas fazem a mesma coisa: separam a polpa do cupuau das sementes. As mos no param. A tesoura abre e fecha sem parar. A massa pegajosa e carnuda do cupuau separada das sementes. Ao lado das senhoras, so vendidos os sacos plsticos que guardam a polpa pronta para ser transformada em doces, gelias, compotas, sucos, sorvetes, licores, ou recheio de bombons.

Cozinha Brasileira Regio Norte

23

5.4.3 - O que o cupulate? O cupulate um produto semelhante ao chocolate; mas ao contrrio deste, derivado do cupuau e no do chocolate. Para produzir o cupulate, os passos a serem seguidos so os mesmo do chocolate: as sementes do cupuau so despolpadas, fermentadas, secas ao sol, torradas, descascadas, prensadas e modas. Nessa fase, obtm-se os produtos que constituem a matria-prima da qual feita o cupulate. Assim como o chocolate, junta-se massa obtida acar, leite e a manteiga extrada da prensagem das sementes para obter o produto final. 6- CHEIROS, CORES E SABORES DO PAR A floresta amaznica - fonte de inspirao para os ndios em diversos setores tambm originou uma das mais tpicas e surpreendentes cozinhas do Brasil. Da natureza rica em ervas, frutos, sabores e cheiros nasceu a gastronomia paraense. considerada a mais autntica e extica do pas e responsvel por colocar o Par em destaque no roteiro turstico gastronmico nacional e internacional. Entre os pratos tpicos mais conhecidos esto a caldeirada, o caruru, a manioba e o pato no tucupi. Muitos deles levam como ingredientes o jambu e o tucupi. As frutas regionais complementam o cardpio. Uma diversidade que pode ser encontrada na Feira do Ver-o-Peso, em Belm, e, de quebra, consumida em doces e sorvetes, compondo maravilhosas sobremesas - um destaque a mais da culinria paraense. Como exemplos, o aa, o cupuau, o bacuri, o tapereb e a prpria manga, esta muito encontrada em feiras e nas ruas da capital. Vale lembrar que, apesar de toda a sua autenticidade indgena, a cozinha do Par mostra, quando menos se espera, influncias de fora. Mesmo na minioba, um guisado de folhas de mandioca, que leva alguns dias na fervura e to indgena quanto o arco e a flecha, a mo da cozinheira portuguesa andou colocando lingias e paios. E o pato no tucupi - at o pato no tucupi! - teve de aceitar novidades: temperado de vspera em vinha-d'alho. Mas justamente com esses arranjos e misturas que a cozinha paraense vai se tornando cada vez mais mestia, mais

Cozinha Brasileira Regio Norte

24

brasileira, mais nossa.

6.1- A mandioca No Par, o uso da mandioca diferente. Enquanto na maior parte do pas reina a farinha, no Par impera o tucupi, um caldo amarelo extrado da raiz da mandioca por meio de um processo desenvolvido pelos ndios. Nele a mandioca descascada e ralada, formando uma massa que depositada em um recipiente cilndrico chamado tipiti. O tipiti fica pendurado at que todo o lquido escorra para outro recipiente. Esse lquido ento colocado para descansar por um dia. Nesse perodo, a parte mais pesada fica no fundo da panela, e por cima fica o soro amarelo, que ento fervido, originando o tucupi. Com a parte mais pesada, que ficou no fundo, feita a tapioca, e com a parte que ficou no tipiti so preparadas farinhas sendo a farinha dgua a preferida.

6.2- O Tucupi Feito a partir do suco amarelado da mandioca brava, o tucupi seria um veneno mortal. Mas depois de cozido vrias perde o cido ciandrico. A cozido novamente, desta vez com os temperos (chicria, alfavaca e sal) e torna-se um saboroso molho amarelo, de gosto forte, que pode acompanhar carnes e peixes. D um sabor inconfundvel aos pratos com ele preparados, como o tacac, o pato, leito, frango, peixe e at alguns tipos de caa. O paraense costuma dizer que, com tucupi, at pedra fica bom. Alm das feiras, o tucupi pode ser encontrado em supermercados.

6.3- O Jambu Planta rasteira, companheira inseparvel do tucupi na preparao dos pratos paraenses, sobretudo do tacac e do pato no tucupi. Suas folhas, quando mastigadas, produzem leve tremor nos lbios e, talvez por isso, muitos o apontam como afrodisaco.

Cozinha Brasileira Regio Norte

25

6.4- O Tacac difcil definir o tacac. Seria uma espcie de bebida? Ou, quem sabe, uma espcie de mingau? Talvez um caldo? Sua definio varia de uma pessoa para outra. Porm, todos concordam que a marca registrada de Belm. O tacac uma espcie de caldo grosso servido em cuias e vendido em inmeras barraquinhas de Belm. As tacacazeiras as senhoras que preparam o tacac so uma instituio local. Os principais ingredientes do tacac so: o caldo de tucupi, as folhas de jambu, a goma da tapioca e a ardncia da pimenta-de-cheiro, todos produtos regionais da Amaznia. 6.5- A Caldeirada paraense Prato consumido tanto no cotidiano como em festas. A verso popular leva todos os tipos de peixes disponveis e preparada, como faziam os antepassados indgenas, com vinho de buriti e tucum e um toque ardente da pimenta-malagueta, servida acompanhada de beiju grosso. J na verso tradicional usado apenas um tipo de peixe por vez, como pescada-amarela ou filhote, os mais nobres para a ocasio. Coloca-se gua numa panela grande e, aos poucos, acrescentam-se os temperos, Preparada com diversos tipos de peixes, acrescidos de temperos, como cebolas, tomates pequenos inteiros, folhas de chicria, alfavaca, coentro, cebolinha e pimenta-verde. Por ltimo, adicionam-se as postas de peixe e uma poro de camaro. Em outra panela, cozinham-se os ovos e as batatas. Serve-se tudo junto numa travessa. A caldeirada paraense servida com piro de farinha-d'agua ou farinha seca, feito com o prprio caldo do peixe.

6.6- O Caruru paraense Feito com camares secos descascados, refogados com cebola, alho, cebolinha, pimento, pimenta-do-reino e azeite de dend.

Cozinha Brasileira Regio Norte

26

Aps o refogado, cozinha-se em gua, engrossando com farinha seca coada e bastante quiabo cortado em rodelas. Diferente do caruru baiano por no levar amendoim e castanha e ser engrossado com farinha de mandioca, aproximando de um piro.

6.7- A Manioba A manioba uma espcie de feijoada paraense em que folhas de mandioca conhecidas pelo nome de maniva - so usadas no lugar do feijo. Depois de lavadas, a maniva moda e cozida em gua abundante por dias at perder o cido ciandrico presente nas folhas. Depois de adicionar um pedao de paio, um p de porco, uma costelinha, surge a manioba. A iguaria costuma vir acompanhada de arroz branco, farinha de mandioca, e molho de tucupi com pimenta-de-cheiro. Por conter praticamente os mesmos ingredientes de uma feijoada completa, a manioba conhecida como a feijoada paraense.

6.8- O Pato no tucupi Depois de assado, o pato cortado em pedaos e fervido no tucupi, onde fica de molho durante algum tempo. O jambu aferventado em gua e um pouco de sal antes da preparao do pato. Depois de escorrido, o jambu colocado sobre o pato, coberto de tucupi. Curiosidade: O consumo de carne de pato era uma constante ao longo de todo o perodo do Brasil colonial. Era comum naquela poca um jogo que consistia em abater um pato amarrado a um toco de pau, decepando-lhe a cabea em troca de uma premiao. A pessoa que errasse o golpe pagava o pato para a pessoa que o acertasse. Da nasceu a expresso muito em uso hoje em dia: pagar o pato, significando arcar com o prejuzo, bancar a despesa.

6.9- O Pirarucu de casaca

Cozinha Brasileira Regio Norte

27

Prato amaznico que leva pirarucu, desfiado, azeitonas, ovos cozidos, banana frita e a farinha de uarini, feita com mandioca molhada. Pode ser preparado tambm com surubim ou tucunar.

6.9.1- Sobre o pirarucu O pirarucu (Arapaima gigas) o maior peixe do Brasil, chegando a alcanar 2 m de comprimento e pesar 100 quilos. Conta a lenda indgena que o pirarucu originou-se de um ndio guerreiro, que, por ser muito mau, foi castigado por Tup, que o transformou em peixe. O pirarucu possui uma colorao avermelhada, da a origem de seu nome em tupi "pira" (peixe) e "uruku" (vermelho). A lngua do pirarucu utilizada para ralar o guaran e as escamas para lixar unhas. Sua carne saborosa, e dela se fazem diversos pratos, muito apreciados, podendo ser usada dessecada (conhecida como pirarucu seco ou salgado), como o bacalhau, ou fresca.

6.10- O Caldo de turu O turu uma larva branca encontrada nos troncos de rvores dos manguezais, na Ilha de Maraj (PA). Nutritiva e afrodisaca, a larva aproveitada como alimento por quem vive na ilha. O turu parece uma gigantesca minhoca. Ou melhor, uma lombriga branca e leitosa que vive dentro de troncos apodrecidos nos mangue. Sua textura gelatinosa, pegajosa. Alguns chegam a alcanar um metro de comprimento; e os mais apetitosos, bem gordinhos, so da grossura de um polegar. Sua cabea dura e traz na ponta uns dentinhos que servem para raspar a madeira da qual se alimenta. O tronco que os turus habitavam encontra-se todo escavado, cheio de buracos, como se fosse um queijo suo. Na Ilha de Maraj, o turu apanhado por ribeirinhos para ser saboreado cru com algumas gotas de limo e um pouquinho de sal. Pode-se ainda prov-lo no

Cozinha Brasileira Regio Norte

28

caldo de turu, uma iguaria marajoara.

Cozinha Brasileira Regio Norte

29

7- O COMPLEXO VER-O-PESO Um dos principais pontos tursticos da capital paraense um smbolo. Smbolo cultural, smbolo arquitetnico, smbolo gastronmico. O Complexo Ver-oPeso , mais que um mercado, uma referncia de Belm. Criado pela Coroa portuguesa para controlar (e tributar) as mercadorias que saiam e entravam na regio, o Ver-o-Peso existe desde 1688 e carto postal da cidade. O que se chama, hoje, de Complexo do Ver-o-Peso uma espcie de ncleo histrico da cidade e abriga em sua extenso as construes mais antigas de Belm, representando a arquitetura militar, religiosa e comercial dos sculos XVIII, XIX e XX. No sculo XVII, onde hoje funciona o Mercado Ver-o-Peso, numa rea que era formada pelo igarap do Piri, os portugueses instalaram um posto de fiscalizao e tributos dos gneros trazidos para a sede das capitanias (Belm-PA). Este posto foi denominado Casa de Haver o Peso, que tambm tinha como atividade o controle do peso dos produtos comercializados. No incio do sculo XIX, o igarap Piri foi aterrado e, na sua foz, foi construda a doca do Ver-o-Peso. Situado s margens da Baa do Guajar, o complexo do Ver-o-Peso compreende o Mercado de Ferro (trazido da Inglaterra em 1901), Mercado de Carne (1908), Doca, Praa do Relgio, Feira do Aa, Ladeira do Castelo e o Solar da Beira. O Mercado do Ver-o-Peso conhecido como o maior mercado e feira ao ar livre da Amrica Latina. Ali vendido de tudo, desde peixes, carnes, frutas e legumes at artigos regionais, ervas medicinais, plantas ornamentais e razes aromticas. Os produtos do rio e da floresta so vendidos nas barracas e no ptio junto ao mercado de peixe e so levados pelos barcos que chegam s docas. Em 1977, todo o conjunto arquitetnico e paisagstico do Ver-o-Peso foi tombado pelo Instituto do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional (Iphan).

Figura 36: Complexo Ver-o-peso

Cozinha Brasileira Regio Norte

30

8- RECEITAS REGIONAIS 8.1 - Pato no tucupi de Paulo Martins O mais famoso dos pratos paraenses o pato no tucupi. facilmente encontrado nos cardpios de restaurantes regionais em Belm, e servido durante a festa do Crio de Nazar. Alm dos ingredientes que do nome iguaria, o preparo tambm exige folhas de jambu e gotas de pimenta-de-cheiro. Ingredientes 2 patos mdios (+ ou 3 kg cada) 6 litros de tucupi 6 maos de jambu 1 mao de alfavaca 1 mao de chicria 7 cabeas de alho 21 pimentas de cheiro Sal a gosto 5 limes 1/2 litro de vinagre de vinho branco ou vinho branco Modo de preparo Lavar os patos em gua corrente. Em um recipiente preparar a vinha dalho com o suco dos limes, 3 cabeas de alho socadas, o vinagre de vinho branco, 1 pimenta de cheiro, sal e gua a gosto. Temperar os patos na vinha dalho e deixar descansar de um dia para o outro na geladeira. Assar os patos em forno mdio por aproximadamente 90 minutos. Em uma panela colocar para ferver o tucupi com 3 pimentas de cheiro, 2 cabeas de alho, alfavaca, chicria e sal a gosto. Aps os patos esfriarem, cort-los em pedaos. Em uma panela colocar 2 litros do tucupi j temperado e ferver os patos em pedaos, at ficarem bem macios. Desossar e tirar a pele dos patos j macios.

Cozinha Brasileira Regio Norte

31

Modo de Preparo do Jambu Catar o jambu, separando as folhas com os talos mais tenros. Lavar em gua corrente. Em panela com gua fervente e sal a gosto escaldar levemente o jambu. Escorrer e reservar. Modo de Servir Em um alguidar de barro colocar os pedaos de pato e cobri-los com o jambu e o restante do tucupi que no foi usado para amaciar os patos. O molho de pimenta de cheiro: as pimentas que restarem devem ser amassadas com sal a gosto e um dente de alho socado, completando com um pouco de tucupi quente. O pato no tucupi servido com arroz branco, farinha dgua de mandioca e molho de pimenta. Normalmente usa-se prato fundo e colher de sopa.Disponvel em: http://www.brasilsabor.com.br/por/receitas/item/10 Acessado em 30 ago2011.

Cozinha Brasileira Regio Norte

32

8.2- Manioba de Paulo Martins A manioba uma espcie de feijoada paraense em que folhas de mandioca - conhecidas pelo nome de maniva - so usadas no lugar do feijo. Depois de lavadas, a maniva moda e cozida em gua abundante por dias at perder o cido ciandrico presente nas folhas. Depois de adicionar um pedao de paio, um p de porco, uma costelinha, surge a manioba. A iguaria costuma vir acompanhada de arroz branco, farinha de mandioca, e molho de tucupi com pimenta-de-cheiro. Ingredientes 2 paneiros com maniva (folhas de mandioca) 2 quilos de toucinho branco 2 quilos de toucinho defumado 2 quilos de p de porco salgado 2 quilos de orelha de porco salgada 2 quilos de lngua de porco salgada 2 quilos de rabo de porco salgado 2 quilos de lombo de porco salgado 2 quilos de costela de porco salgada 1,5 quilo de paio 1,5 quilo de chourio 1,5 quilo de lingia de porco 4 quilos de bucho de boi 4 quilos de charque Modo de preparo Pique as folhas de mandioca (maniva) sem os talos e moa muito bem em uma mquina de moer carne, at dar 6 quilos. Num panelo com bastante gua, leve a maniva moda ao fogo brando e deixe ferver durante 72 horas. Mexa de vez em quando, dando pelo menos trs boas mexidas por perodo: manh, tarde e noite. Isto feito para que as folhas no grudem na panela. Coloque sempre gua, pois a massa no pode ficar seca. Quando for dormir, complete a gua de novo e deixe o fogo mais o baixo possvel.

Cozinha Brasileira Regio Norte

33

Passadas as 72 horas, acrescente o toucinho branco (sem cortar) e o toucinho defumado (tambm inteiro). Deixe ferver por mais 24 horas, sempre em fogo brando, completando a gua e dando, no mnimo, trs boas mexidas por perodo. Com a maniva continuando a ferver na tarde do quarto dia, parte, ponha as carnes salgadas e o charque de molho para tirar o excesso de sal. Ficam de fora apenas o paio, o chourio, a lingia e o bucho de boi. No quinto dia, corte em pedaos do tamanho de servir o bucho de boi e escalde muito bem para tirar todo o cheiro. Corte tambm em tamanho de servir as carnes salgadas, lave bem e afervente. Junte tudo e ponha no panelo em que a maniva continua fervendo por mais 48 horas, desligando o fogo quando for dormir. No sexto dia, corte em rodelas o paio, o chourio e a lingia e ponha para ferver. No stimo dia, a manioba j esta pronta e fica como se fosse uma feijoada. A cor da maniva, que no incio do cozimento verde bem vivo, vai se transformando at ficar um verde muito escuro, quase preto. Sirva com arroz branco, farinha dgua de mandioca e uma pimenta de cheiro. Rendimento: 35 pessoas Observao: Por levar 7 dias de preparo, a receita costuma ser feita em grandes pores.Disponvel em: . Acessado em 30 ago2011.

8.3 - Filhote ao molho de tucupi do Restaurante O Estaleiro O filhote um peixe comum s guas do Amazonas. Possui sabor delicado e uma textura to macia que chega a desmanchar na boca. No restaurante O Estaleiro, em Macap, o peixe grelhado na manteiga e servido com molho de tucupi e arroz com folhas de jambu.

Cozinha Brasileira Regio Norte

34

Ingredientes 1 fil de 200 gramas de filhote 1 colher (sopa) de manteiga 2 ou 3 ramos de chicria 1/2 cebola picada 1 dente de alho amassado 2 xcaras de tucupi 1 xcara de folhas de jambu Coentro a gosto Sal a gosto Pimenta-do-reino a gosto Modo de preparo Numa panela, colocar o tucupi para ferver por 5 minutos junto com a cebola, o alho, a chicria e o coentro. Coar. Juntar as folhas de jambu e corrigir o gosto com sal. Temperar o filhote com sal e pimenta do reino. Numa frigideira, grelhar o peixe em manteiga. Montar o filhote em um prato e regar com o molho de tucupi e jambu. Servir acompanhado de arroz com salsinha.Disponvel em: . Acessado em 30 ago2011.

Cozinha Brasileira Regio Norte

35

9- REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS AQUINO, Marcia Rodrigues. Kusiwa: O corpo como mdia da vaidade, memria e resistncia cultural Wajpi. Instituio: Associaao Educacional da Amaznia , Faculdade SEAMA Macap /AP. Disponvel em: . Acessado em: 14 ago. 2011. BARBOSA, Virgnia. Mercado Ver-o-Peso. Fundao Joaquim Nabuco. Disponvel em: . Acesso em: 30 ago. 2011. CABRAL, Gabriela. Folclore brasileiro. Disponvel em: . Acessado em: 25 ago. 2011. CASCUDO, Lus da Cmara. Histria da Alimentao no Brasil. 3 ed. So Paulo: Global, 2007. CASCUDO, Lus da Cmara. Dicionrio do folclore brasileiro. 11 ed. So Paulo: Global, 2008. CAVALCANTI, Pedro. A ptria nas panelas. Histria e receitas da cozinha brasileira. So Paulo: Editora Senac, 2007. FRANCISCO, Wagner de Cerqueira. A Regio Norte. Disponvel em: . Acessado em: 14 ago. 2011. FREIXA, Dolores; CHAVES, Gutta. Gastronomia no Brasil e no mundo. 2 ed. Rio de Janeiro: Senac, 2008. FREIXA, Dolores; CHAVES, Gutta. Larousse da cozinha brasileira. 1 ed. So Paulo, 2007. GOMENSORO, Maria Lcia. Pequeno dicionrio de Gastronomia. Rio de Janeiro: Objetiva, 1999. LIMA, Cludia. Tachos e panelas: historiografia da alimentao brasileira. 3 ed. Recife: Razes Brasileiras, 2009. RIBEIRO, Luciana A E. Expresses orais e grficas dos ndios Wajpi: patrimnio imaterial. Disponvel em: . Acessado em: 14 ago. 2011. SOARES, Cyro Jos. Mercados do Brasil: de norte a sul. 1 ed. Belo horizonte, 2009. Amaznia/Editora Abril. So Paulo: Abril, 2009. Par/Editora Abril. So Paulo: Abril, 2009. Belm, festival de sabores. Disponvel em: . Acessado em: 31 ago. 2011. Museu ao Vivo. Informativo do Museu do ndio. Disponvel em: . Acessado em: 22 ago. 2011.