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Webcomunicacao: a comunicacao pensada a partir da WebTRANSCRIPT
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Ano VII - Nº 7 - Outubro 2006
Webcomunicação: a comunicação pensada a partir da Web
ResumoEste artigo se pauta numa pesquisa docu-
mental e bibliográfi ca de obras que abordam o
processo comunicacional no âmbito do ciberes-
paço e do ambiente Web, pretendendo mostrar
a construção de um conhecimento particular
que anuncia a necessidade da afi rmação de
uma nova disciplina, a Webcomunicação. Esta
demanda é afi rmada mediante a confi guração
deste particular processo de comunicação como
objeto de estudo, manifestado em obras de
autores fundamentais, na maturação de linhas
de pesquisa em programas de pós-graduação,
de seções e grupos de pesquisa em associações
científi cas da área e de artigos em revistas cien-
tífi cas na área de comunicação e afi ns.
* Adilson Cabral é professor do Curso de Comunicação Social da Universidade Federal Fluminense – UFF. Doutor e Mestre em Comunicação Social pela Umesp – Universidade Metodista do Estado de São Paulo
Palavras-chave:
Ciências da Comunicação
Teorias da Comunicação
Webcomunicação
Adilson Cabral*
Rastros - Revista do Núcleo de Estudos de Comunicação
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IntroduçãoEste artigo parte da necessidade de traçar
perspectivas de maturação de vertentes da Ciência
da Comunicação Social, a partir do desenvolvimento
de quatro grandes áreas, a saber: Comunicação de
Massa, Segmentada, Organizacional (contemplando a
vertente Comunitária), Grupal (contemplando a vertente
Interpessoal), tomadas como referência, a partir dos
macrodescritores disponibilizados pela Unesco em seu
Thesaurus de Comunicação e Informação, visando o
ajuste das subáreas analisadas na proposta de pesquisa
empírica.
O primeiro problema da proposta se evidenciou
diante da grade inicialmente apresentada: como en-
caixar, como dar visibilidade à abordagem da internet
e, em especial, do ambiente Web, no fazer comuni-
cacional? A comunicação produzida na internet e na
Web é destinada à massa? A qual segmento seria?
Quais organizações, comunidades, grupos e relações
interpessoais promovem? A busca por respostas a es-
sas perguntas ou a inviabilidade de suas formulações
é que tornou o trabalho mais fascinante, resultando no
desenvolvimento deste artigo.
A pergunta que não quer calarA internet potencializa uma nova forma de pensar
e fazer a comunicação na sociedade contemporânea.
Mais do que isso, trata-se de uma revolução paradig-
mática na comunicação, proporcionada a partir de um
avanço tecnológico, não de um novo postulado teórico
ou manifestação social, mas sim das características de
seu próprio suporte.
Não afi rmamos aqui a neutralidade da tecno-
logia a despeito do ser humano que a conduz, mas a
descoberta, a partir de sua crescente disseminação,
de usos que transcendem o controle daqueles que a
disponibilizaram. Comunidades, grupos, organizações
e também pessoas se formam a partir deste ambiente
comunicacional, afi rmando o sentido da rede na sua
formulação, na sua capacidade de formar interações dos
mais variados aspectos, abrangências e propósitos.
Os vários exemplos que poderíamos citar apenas
afi rmam o cenário traçado, evidenciando a simples
idéia de que, ao esgarçar as possibilidades existenciais
(constituição da massa, segmentos, organizações e
comunidades), a velha perspectiva de defi nições es-
quemáticas se estende e o sistema se rompe (v. CABRAL,
1999). Ao analisar a internet em geral e o ambiente
Web em particular devemos ter em mente a idéia de
que Massa, Segmentos, Organização e Comunidades,
Grupos e Interpessoalidade são permeadas pela pro-
dução e circulação de informações no contexto dessa
nova tecnologia.
A transversalidade de enfoques diz respeito à
redefi nição de aspectos relacionados à contemporanei-
dade no âmbito econômico, político, cultural e social,
abordados por autores como Pierre Lévy, Wilson Dizard,
John B. Thompson, Manuel Castells, dentre outros, que
passam a ser consumidos por professores e alunos nos
cursos de graduação em Comunicação Social. Relaciona-
se também com as alternativas de linguagem, produção
de conteúdo e perspectivas de interações que passam a
ser incorporadas por usuários de diferentes naturezas.
E assumem, em caráter irreversível, um novo modelo
de construção do conhecimento científi co relacionado
à Comunicação, que parte da concepção direcionada à
massa para assumir o seu caráter de rede, no qual a
World Wide Web tem um papel fundamental.
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Diante do desafi o de formatar toda uma comple-
xa rede estrutural de áreas e subáreas no campo das
Ciências da Comunicação, em relação à qual a Capes
nos apresenta uma referência fundamental, uma per-
gunta que se faz necessária impulsiona a busca que
se pretende empreender neste artigo: como podemos
defi nir e incorporar a Webcomunicação diante desse
contexto?
Diga-me com quem andas...Em primeiro lugar é preciso dizer que associar
a Comunicação a uma área no sentido de formar uma
nova subárea não confi gura uma iniciativa pioneira.
No primeiro encontro acadêmico do qual participei
como ouvinte, ainda estudante, em 1989, o professor
Ismar de Oliveira Soares abordava interfaces entre a
Comunicação e a Educação, propondo um esboço do
que mais tarde passou a ser chamado de Educomuni-
cação, uma disciplina que tem em sua especifi cidade
o pensamento sobre o saber comunicacional com o
caráter educacional.
Outras disciplinas específi cas e subáreas surgem
nestas interfaces e caminhos que os vários objetos e
as várias linhas de pesquisa e áreas de concentração
vão apontando. A Folkcomunicação reaparece nesses
últimos anos com novo fôlego, mobilizando professo-
res e pesquisadores em encontros próprios, tal como
também acontece com a Comunicação para a Saúde;
a Comunicação Comunitária ressurge em disciplinas e
laboratórios de pesquisa e produção em várias universi-
dades do país e, na área da tecnologia e da informática
em geral e da internet em particular, se desenvolvem
variadas experiências e pesquisas destituídas de uma
defi nição conceitual e disciplinar mais organizada.
Cabe reconhecer que o nome e o trajeto da dis-
ciplina Webcomunicação não é tão popular quanto os
anteriormente citados. O próprio termo é mais utilizado
no âmbito comercial do que propriamente apresentado
no contexto acadêmico de interseção de uma disciplina
com um objeto de estudo. No contexto que buscamos
apresentar, trata-se mais de uma proposta de visibili-
dade comum às particularidades que vêm sendo anali-
sadas atualmente, buscando-se a afi rmação do termo
Webcomunicação.
Web quer dizer teia em inglês. O recurso da
internet disponibilizado em 1989 por Tim Berners-Lee
é denominado World Wide Web, que signifi ca, em
português, teia do tamanho do mundo, o que está
mais do que popularizado nas revistas segmentadas e
artigos. O resgate dessas defi nições se faz necessário
para evidenciar que o nome de batismo proposto para
esta disciplina não se refere a nada mais nada menos
do que aquilo que ela representa: a comunicação no
ambiente da Web, um ambiente diferente dos tradicio-
nais meios de comunicação de massa ou comunitários
de natureza analógica, que em geral são formados
por suportes palpáveis (impresso) ou efêmeros (ondas
eletromagnéticas). Diferente também da comunicação
possibilitada pelo advento da informática ou da internet
de um modo geral.
Recortamos aqui essa “grande área” com o intuito
de nos restringirmos ao que realmente nos diz respeito
e ao que ressalta evidências de real diferenciação em
relação aos outros processos comunicacionais pelos
aspectos inerentes ao seu suporte. Daí se descarta
nomes mais em evidência, como CMC (Comunicação
Mediada por Computadores) ou TICs (Tecnologias de
Informação e Comunicação), e busca-se diferenciar de
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termos tais como Cibercomunicação ou Comunicação
Digital, por não se tratar da informática em geral, nem
mesmo de estar subsumida a ela.
Além disso, devemos salientar também que a
World Wide Web não é exatamente do tamanho do
mundo, e justamente por não ser e apresentar evidentes
e preocupantes disparidades em seu acesso é que se
abrem aspectos político-econômicos e sócio-culturais
relacionados à necessidade da inclusão digital, que
se entende pela oferta de possibilidades de acesso à
internet a um número cada vez maior de pessoas por
um custo cada vez menor.
A relevância e a emergência da visibilidade do
saber produzido em torno de uma disciplina é, portan-
to, mais do que válida, em virtude do surgimento de
articulações de pessoas, grupos e organizações das
mais variadas que produzem, na perspectiva da rede,
uma comunicação de diferente natureza, ressaltando a
necessidade de uma sistematização mais precisa.
Nesse sentido, defi nimos a Webcomunicação
como a comunicação produzida no ambiente da World
Wide Web, que possibilita o inter-relacionamento de
pessoas, grupos e organizações a partir dos mais va-
riados recursos, serviços e suportes oferecidos através
da rede.
... E com quem andouApesar da recente aplicação aos estudos dos
processos comunicacionais, a idéia de hipertexto é da-
tada de 1945, enunciada no artigo “As we may think”,
do físico e matemático norte-americano Vannevar
Bush, e cunhada posteriormente por Ted Nelson, em
1965, a partir da afi rmação do caráter associativo do
pensamento humano, formado, segundo Bush, por “tri-
lhas transversais e pessoais no imenso e emaranhado
continente do saber”.
Sua associação com a internet e, em especial,
com a World Wide Web, que impulsionou sua dimensão
comercial por oferecer um ambiente gráfi co agradável
e interativo com os usuários, vislumbrou novas possi-
bilidades de investigação teórica, resultando na elabo-
ração de paradigmas contemporâneos no campo da
comunicação, que viam no enredamento integrador de
várias pessoas e grupos um ambiente para a formação
de comunidades e a afi rmação de identidades.
A concepção de rede já estava contemplada nos
primórdios do seu desenvolvimento militar, ainda na
Arpanet, como uma integração entre computadores
que possibilitasse a circulação de informações em
longa distância, sem o conhecimento ou a intromissão
de inimigos existentes ou potenciais, concebida num
ambiente de trocas de informação descentralizado.
Mais tarde foi assimilada e dimensionada por
jovens especialistas de informática no início dos anos
70, principalmente na Califórnia, caindo nas graças de
alguns setores acadêmicos, que a incorporaram como
teia para circulação de informações, desenvolvimento
de pesquisas e maior articulação de pesquisadores, cujo
maior e mais recente trunfo foi o Programa Genoma
Humano, um consórcio mundial de pesquisadores que, a
partir de articulações via internet, vem se empenhando
no mapeamento do código genético de várias espécies,
dentre as quais o próprio homem.
Sua ampliação começou a ser ensaiada no come-
ço dos anos 90 e despontou no fi nal da mesma década.
Os principais fatores responsáveis pela motivação e
pelo descobrimento do potencial de mercado foram
a defi nição de uma interface gráfi ca, a expansão e o
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barateamento de microcomputadores e softwares, o
desenvolvimento de recursos, serviços e aplicativos dos
mais diversos, além da entrada de empresas pontocom
e versões virtuais de empresas já existentes.
O incentivo à utilização pessoal da internet abriu
novas frentes no mercado de trabalho, oferecendo
novas oportunidades de formação profi ssional. Novas
redes interpessoais e interculturais se formaram, es-
tabelecendo tanto o entretenimento na própria rede,
como intensifi cando o entretenimento on-line, na versão
de jogos, gincanas, quiz (sites de perguntas), chats,
entre outros.
A diversifi cação de ofertas de produtos e serviços
por parte das empresas originou uma série de investi-
gações e o amadurecimento de refl exões e pistas nos
mais variados campos do conhecimento:
– a forma e a linguagem que proporcionassem
uma maior navegabilidade ao usuário orientaram es-
tudos de design aplicado à Web, ou, ainda, o já con-
solidado webdesign;
– a produção editorial e a de conteúdo também
levaram a um campo do conhecimento ligado às expe-
rimentações e tendências de construção de textos em
associação a outros suportes;
– num primeiro momento, a carência, e atual-
mente o franco e plural desenvolvimento nas perspecti-
vas dos estudos sobre o marketing na internet (chamado
de webmarketing ou marketing on-line);
– a ausência de estudos de atendimento e
planejamento como áreas de Publicidade, tendo em
contrapartida um avanço no estudo sobre a mídia e a
averiguação dos usuários, calcanhar de Aquiles para a
sustentação e legitimação da Web junto aos investidores
em potencial;
Além disso, possibilitou também as mais variadas
formas de comércio na e a partir da rede, como:
B2B – business-to-business, negócios entre
fi rmas, interesses de mercado e de apoio na infra-
estrutura;
B2C – o convencional business-to-consumer, no
qual as lojas vendem seu estoque pela internet;
C2C – os leilões virtuais são um dos principais
modelos de empreendimento consumer-to-consumer,
além das várias comunidades que se formam pela
própria rede, estabelecendo elos de relacionamento
diferentes e dispersos;
C2B – o público é quem fornece produtos e ser-
viços para as empresas;
P2P – perdem-se as noções de intermediário
e cliente, estabelecendo relações de troca e mútuo
atendimento de necessidades a partir da articulação de
usuários que trocam produtos, serviços, informações,
estabelecendo uma nova rede de escambo em escala
global.
Contexto/ conjuntura do conhecimentoA descoberta de novos e diferentes usos por
parte dos vários usuários em todo o mundo levou à
formação das mais variadas redes formais e informais,
de trabalho ou lazer, de afi nidades e/ou encurtamento
de distâncias entre pessoas e organizações das mais
diversas: o meio acadêmico, a sociedade civil organi-
zada, a conseqüente apropriação da internet por parte
das empresas e o empenho dos governos em sua dis-
seminação (ou limitação), os movimentos que surgem a
partir da afi rmação de liberdade de expressão e outros
aspectos próprios da internet ou mesmo num contexto
político mais geral.
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Em contraponto, aspectos ligados à segurança
vêm à tona: os hackers, o ciberterrorismo e toda a
sorte de crimes virtuais, além do distanciamento e da
exclusão proporcionados pela indistinção entre o mundo
real e o mundo virtual, ou mesmo a substituição de um
pelo outro.
Estudos das mais variadas dimensões buscam
dar conta destas temáticas: linguagem, psicologia,
sociologia, direito, política e a própria comunicação
(seja através das concepções de design ou dos próprios
processos comunicacionais) apresentam um bom ma-
nancial para uma análise mais detida sobre essa varie-
dade de temáticas, oriundas da conexão hipertextual
de redes em todo o mundo.
A capacidade e o potencial que a comunicação
impõe nesse contexto é vital para o entendimento da
complexidade proporcionada pela internet, pois não se
trata de “saber se a comunicação pode corresponder a
um saber particular sem se reduzir aos conhecimentos
gerados a partir de outros saberes” (cf. MARTINO, L. C.,
2001) para a afi rmação de sua importância, mas sim
se a comunicação pode ser efetivamente autônoma a
despeito de outros saberes, mas podendo com estes
se articular.
Os dados coletados a seguir apontam, a despeito
do conhecimento produzido em outros campos, para o
surgimento de uma série de microáreas em torno do
tema da internet que buscam interfaces com outros
saberes, mas sem com estes se articular, afi rmando
o campo comunicacional numa perspectiva bastante
esclarecedora, não diretamente relacionada com os
meios de comunicação, mas sim com os processos de
construção de identidade e produção de sentido a partir
das mais variadas interfaces, dentre elas a internet.
Atravesse as ruas com cuidadoO momento pelo qual a academia atravessa
atualmente é tão delicado quanto próspero. A assim
chamada crise dos paradigmas proporcionou uma
refl exão sobre a contribuição e a prática científi ca em
dimensões nunca vistas na história da ciência. Obras
de referência e esboços de novos paradigmas em vá-
rias áreas do conhecimento vieram contribuir para o
enriquecimento desse debate.
O que prova que a prova é prova? A performance
é mais determinante da verdade do que a razão? Essas e
outras questões estão no cerne de um debate que movi-
mentou vários autores — Lyotard, Feyerabend, Thomas
Kuhn — e, a despeito de defi nir e afi rmar posiciona-
mentos, ainda prossegue demarcando ou expandindo
fronteiras sobre nossos espaços de atuação.
Na Comunicação o debate não poderia ser de
outra natureza. A começar pela idéia de que esta ciência
(ou saber? ou campo do conhecimento? ou objeto de
estudo?) é transdisciplinar por excelência. Tal forma de
ver, pensar e aplicar a Comunicação nos mais variados
contextos originou expressões tais como Teorias da
Comunicação, ou Ciências da Comunicação, indicando
um território neutro ou a total desterritorialização desta
matéria.
No caminho contrário, e em consonância com
certa linhagem de autores, acreditamos na essência
e na determinação da Comunicação como um campo
científi co próprio, cujo objeto fundamental se constitui
a própria natureza do processo comunicacional, ou
seja: a circulação de informações entre dois ou mais
agentes, visando a produção de sentido e a construção
de identidades.
Diante da necessidade manifesta de se aprofun-
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dar na defi nição e na visibilidade desse campo e, por
conseqüência, na defi nição do processo comunicacio-
nal, os autores que se arriscavam nessa empreitada se
utilizaram de três saídas: o caminho da fuga para outro
ramo do conhecimento, evidentemente sem disputas em
virtude de seu caráter original (caso da Midiologia, de
Regis Debray); o caminho de afi rmação da transdisci-
plinaridade como componente da identidade do campo,
ressaltando seu caráter dinâmico; e, por fi m, o caminho
que busca afi rmar e delimitar seu objeto de estudo,
localizando-o no tempo e nos mais variados contextos
sócio-culturais, políticos e econômicos.
Há de se distinguir, entretanto, o termo comuni-
cação do termo mídia, no sentido da defi nição de seu
marco refl exivo original. Não podemos conceber uma
determinação pela técnica como introdutória dos estu-
dos desta área, pois seria a limitação do rico e amplo
processo comunicacional à dimensão da mídia, que seria
um aspecto dentro do contexto comunicacional.
Sendo assim, cabe buscar as origens e defi nições
de um objeto que é próprio de uma dada ciência, deno-
minada Comunicação, que estabelece relações de con-
tato com várias outras — Sociologia, Política, Psicologia,
Semiologia, Direito etc. — mas nelas não se dilui. A aqui
defi nida Comunicação no ambiente da Web vai incor-
porar a transdisciplinaridade própria da Comunicação e
trabalhar na perspectiva de seus mais variados estudos
visando à compreensão de fenômenos específi cos das
interconexões possibilitadas pela rede.
Devemos ressaltar também que, quando falamos
da utilização de imagens, sons e animações nos e-mails,
abordamos um recurso possibilitado pela linguagem
HTML, desenvolvida para a Web e incorporada pelos
programas e servidores de e-mail. Entendemos, portan-
to, que não se trata de outro aspecto que não aquele
que cabe ser tratado no âmbito dessa disciplina.
A afi rmação da internet como ambiente comuni-
cacional e sua disseminação em escala mundial redefi ne
os mais diversos setores sociais: economia, educação,
saúde, direito etc., trazendo a necessidade da afi rmação
de uma nova linha de estudos específi cos, que viesse
a despontar no campo da comunicação, questionando,
ao mesmo tempo, as fronteiras que demarcam as defi -
nições correspondentes às suas áreas.
Surgem termos como Nova Economia, Web-
marketing, Cibercultura, dentre outros que procuram,
de certa forma, refazer uma história do ponto de vista da
incorporação do suporte digital e das tecnologias e dos
trabalhos e projetos em rede. Logo surgem os contadores
dessa nova era na história da Comunicação, das mídias
e, por que não dizer, da própria humanidade, na medida
de sua profunda transformação nos variados setores.
Ocupam os mais diversos espaços para a disseminação
do saber no contexto da comunidade acadêmica e, lon-
ge de afi rmar um consenso em relação a pressupostos,
tendências, olhares sobre os diversos objetos, trazem em
suas pesquisas, nos espaços em que circula a produção
desse saber, a demanda por novos e mais precisos con-
ceitos, que refl itam especifi camente as transformações
em curso a partir da disseminação dos suportes digital
e virtual.
Olhe com quem está falandoNesse sentido, procuramos aqui relacionar sis-
tematicamente alguns desses espaços no Brasil e no
exterior, que buscam afi rmar aspectos metodológicos
e de caráter epistemológico nas pesquisas que so-
cializam, situando as novas tecnologias no campo de
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conhecimento da Comunicação, a despeito da busca
determinada pela afi rmação de uma área do campo de
conhecimento comunicacional. Não cabe neste artigo
esgotar as referências possíveis, até porque o tempo
se encarrega de expandi-la, mas o propósito aqui é
justamente o de evidenciar o processo de maturação
desse conhecimento.
Dessa forma, tomando como ponto de partida as
ementas de grupos de pesquisa e setores de associa-
ções científi cas nacionais e internacionais que refl etem
diretamente essas interfaces, bem como os textos
disponíveis em suas bases de dados na própria Web,
chegaremos a evidenciar alguns autores e temáticas
que se afi rmam, construindo o caminho de consolidação
deste saber.
Entretanto, na medida em que se trata de uma
tecnologia com as mais variadas utilizações e apropria-
ções, percebe-se também uma preocupação de outros
grupos, a partir de seus temas geradores, em especial
nos GTs e seções relacionadas à teoria, metodologia e
epistemologia, no sentido de apreender sua importân-
cia para o campo, seja como ferramenta, seja como
objeto de estudo — o que demandaria uma pesquisa
mais extensa.
INTERCOM – http://www.intercom.org.br/
NÚCLEO DE PESQUISA
TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E DA COMUNICAÇÃO
Ementa: O Núcleo de Pesquisa sobre Tecno-
logias da Informação e da Comunicação tem como
objeto o desenvolvimento da Comunicação Mediada
por Computador (CMC) e seus efeitos sobre a indústria
de Comunicação e a sociedade. Uma primeira seção
temática concerne à internet e analisa a singularidade
de seu mecanismo de recepção e emissão, as novas
formas de mediação que autoriza e suas características
tecnológicas. A segunda seção concerne à sociabilidade
virtual, que analisa grupos de discussão, salas de bate-
papo, homepages e privacidade. A terceira seção é a
Hipermídia, que está focada no esforço social de cons-
truir a linguagem própria deste novo meio, analisando a
convergência, o hipertexto e a imersão. A quarta seção
discute abstratamente a relação entre tecnologias de
Comunicação e cultura, tomando como base a Comuni-
cação mediada por computador.
Seções temáticas: Internet; Hipermídia; Socia-
bilidade virtual; Tecnologia e cultura.
Palavras-chave: Internet; Mediação virtual;
Interatividade virtual; Comunidade virtual; Identidade e
cibercultura; Hipertexto; Imersão virtual; Convergência
tecnológica; Cibercultura (teorias e práticas); Mídias
digitais.
COMPÓS – http://www.compos.org.br/
GRUPO DE TRABALHO
COMUNICAÇÃO E CIBERCULTURA
Ementa: O GT Comunicação e Cibercultura
tem por objetivo debater trabalhos na interesecção da
comunicação e da cibercultura. Por cibercultura compre-
ende-se as relações entre as tecnologias informacionais
de comunicação e informação (TICs) e a cultura contem-
porânea, emergentes a partir da converggência informá-
tica/ telecomunicações. Busca-se, assim, compreender
o papel das TICs em interface com os problemas da
comunicação sob diversas perspectivas (histórica, so-
ciológica, fi losófi ca, política, estética, imaginária).
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IAMCR – http://www.iamcr.net/
COMMUNICATION TECHNOLOGY POLICY SECTION (CTP)
Ementa: O foco desta seção é em Políticas de
Comunicação, com interesse especial em aspectos
sócio-econômicos das mudanças tecnológicas. A seção
acolhe pesquisas que fazem a ponte entre teoria e prá-
tica, e estudos teóricos e práticos, oferecendo refl exões
científi cas bem como linhas para ação política. A seção
não adere a simples escola fi losófi ca ou teórica, mas
encoraja pesquisas críticas e contra-intuitivas.
ALAIC – http://www.eca.usp.br/associa/alaic/
COMUNICACIÓN, TECNOLOGÍA Y DESARROLLO
As problemáticas do desenvolvimento e da mu-
dança social, vinculadas às transformações técnicas
e científi cas, e o papel instrumental da comunicação
têm seus antecedentes nos clássicos estudos de difu-
são de informações e processos de modernização. As
críticas ideológicas e epistemológicas a essa corrente
e o replanteio constante da teoria para dar conta da
dinamicidade desta problemática requerem renovados
esforços para que as críticas e propostas de conheci-
mento sejam signifi cativamente superadoras. Este GT,
não obstante reconheça uma ampla gama de temas e
problemas que podem ser incluídos, centrará sua pre-
ocupação nas investigações e estudos que permitam
a discussão e a renovação do difusionismo clássico;
os enfoques sócio-históricos e culturais na análise da
difusão, circulação de informações e inovações sociais;
o papel da tecnología e do conhecimento na mudança
social e suas conseqüências nas dinâmicas de partici-
pação e modifi cação do ambiente natural e social; as
críticas comunicacionais às experiências de intervenção
para o desenvolvimento; a comunicação nas práticas
extensionistas e de promoção social; as inovações em
contextos locais e globalizados; as ideologias e ressig-
nifi cações do velho e do novo; a teoria e a prática de
comunicar o novo; a comunicação de inovações e o
meio ambiente; responsabilidades públicas e privadas
diante da inovação e da mudança técnica e científi ca
como centro de difusão e adoção de inovações.
ICA – http://www.icahdq.org/
COMMUNICATION AND TECHNOLOGY DIVISION
A Divisão de Comunicação e Tecnologia é co-
metida à excelência no desenvolvimento teórico e de
pesquisas envolvendo as causas, conseqüências, e/ou
contextos das velhas, atuais e novas tecnologias da
comunicação. Os estudos podem focar a análise da
relação intraindividual ou interindividual em pequenos
grupos, organizações, Estados-nação ou relações inter-
nacionais. Não há a necessidade de limitação aos para-
digmas clássicos, sendo bem-vindas contribuições que
conhecidamente usem paradigmas que incluam, mas
não sejam limitadas, a economia, a psicologia, a socio-
logia, as ciências políticas, a história e a teoria literária.
Métodos podem incorporar as abordagens quantitativa,
qualitativa, histórica, crítica, marxista, institucional e
humanística. A Divisão de Comunicação e Tecnologia
está relacionada com as formas existentes e emergentes
de comunicação mediada pela tecnologia entre pessoas
e/ou pessoas e recursos de informação interativos. A
divisão investiga, desenvolve e compartilha idéias e
recursos relacionados a: afi rmação e desenho de me-
todologias, implementação de estratégias, implicações
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políticas e econômicas das necessidades dos usuários,
avaliação de sistemas em curso, efeitos e implicações
para negócios, a casa e a sociedade, incluindo a medi-
ção da produtividade e a qualidade de vida e a difusão
tecnológica. A divisão procura teóricos, investigadores
experimentais e de pesquisa, além de práticos.
AOIR – http://www.aoir.org/
A associação de pesquisadores da internet se reu-
nirá em outubro deste ano, em Toronto, Canadá, para
realizar sua Conferência Internacional e Interdisciplinar.
Debate o modo como as redes de comunicação digital
estão mudando a maneira de as pessoas interagirem,
com efeitos profundos nas relações sociais e institui-
ções. Busca-se considerar quem é incluído ou excluído
e o que efetivamente se sabe sobre a composição e as
atividades das comunidades on-line. O tema encoraja
a participação estreita de diversas disciplinas, comuni-
dades e pontos de vista que são colocadas de forma
tópica no site da associação.
Além dessas, está sendo fomentada no Brasil a
criação da Socib – Sociedade Brasileira para o Estudo
da Cibercultura.
Partindo do princípio de que as ementas dessas
associações funcionam como convites à comunidade
acadêmica para encorpar a produção e o debate em
torno de temas comuns, que formam identidade de
grupo, sistematizam e dão continuidade à produção
científi ca, além do tema central que aglutina todas as
contribuições, esses núcleos, grupos, divisões e seções
assumem alguns aspectos interessantes.
Em primeiro lugar, apresentam uma perspectiva
de abordagem histórica (“novas com velhas tecnolo-
gias”, “mediadas pelo computador com tradicionais”
etc.) que posiciona o advento do suporte digital e do
virtual no contexto do desenvolvimento midiático.
Além disso, incorporam uma perspectiva de
abordagem multidisciplinar, propondo o suporte de ou
a interface com outras ciências, em especial no campo
das Ciências Humanas e Sociais, além da Psicologia,
e mais recentemente das Ciências da Cognição e das
Neurociências.
Nesse sentido, a afi rmação de disciplinas nestes
moldes contribui para a criação de desenhos mais pre-
cisos no campo de abordagem onde outros enfoques
se inserem, realçando a relevância e a pertinência dos
debates sobre o ambiente da Web no campo comuni-
cacional.
ConclusãoNovas identidades surgem de várias formas e a
partir de vários contextos. Surgem também da vontade
política ou a partir das evidências proporcionadas pelo
coletivo. Ao reconhecer a necessidade da afi rmação de
um campo do conhecimento comunicacional que con-
solide e sustente as interfaces entre a Comunicação e o
suporte digital e virtual materializados pelo ambiente da
Web, esta proposta resulta num convite à abordagem de
uma série de temáticas e objetos afi ns que se perdem
no meio das nomenclaturas e conceitos atualmente
dispostos. Até porque, outras divisões, recortes, olha-
res e propostas possíveis surgirão neste campo que,
de forma mais abrangente, incorpora a informática e a
internet em sua relação com a Comunicação, que por
sua vez ainda vem sendo considerada, do ponto de
vista da visibilidade da produção do saber acadêmico,
no mesmo contexto das Tecnologias da Informação e
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Comunicação, como se este fosse o locus mais apro-
priado para o debate.
Nesse sentido, nossa proposta é reivindicar aqui
um espaço mais pertinente para a abordagem da Co-
municação no ambiente da Web, que possibilita uma
nova dimensão de interatividade, de convergência de
suportes (texto e imagem, áudio, vídeo) e de efetiva
inter-relação entre agentes produtores de conteúdo
nunca vistos na história dos mídia. Tanto assim que a
internet promove o desgaste da própria idéia de meio
de comunicação, posto que se constitui num ambiente
comunicacional no qual a pessoa deixa de ser mero
espectador (leitor, ouvinte, telespectador) e passa a ser
usuário na medida de sua potencialidade de apropria-
ção, um dos temas centrais e de grande valia para o
entendimento e a afi rmação da Webcomunicação como
um possível e necessário encontro de preocupações
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