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" JOSÉ RENATO NALINI / ETICAGERAL E PROFISSIONAL 6." edição revista, atualizada e ampliada EDITORA l'i1 REVISTA DOS TRIBUNAIS ! . r. - . ". - .. .. 4 J,,,,,,n,,, i N' ,. ,OI«L, ;, (.6!o2 .... . 5 O BIODIREITO E A BIOÉTICA SUMARIO: 5.1 o biodireito ca bioétiCJ: conccito- 5.2 A vid; humana: 5.2. 1 A vedação ao aborto; 5.2.2 Planejamcnto familiar e patemidJde responsável; 5.2.3 Trallsplanlt! de ôrgãos e tecidos humanos; 5.2.4 Eutanásia - 5.3 Engenhnria genética e gcnoma humano - 5.4 Qucslúcsctil'as Ui\ fecundação artificial: 5.4.1 A dignidade da pessoa humana : a defesa do embrião; 5.4.2 Novos conceitos de pafemidade e maternidade ; 5.4.3 Bebê de proveta: a identidade do doador de sêmen; 5.4.4 Inseminação artificial homôloga c hcteróloga; 5.4.5 Inseminação artificial post nlortem; 5.4.6 Fecundação in vitro e manipulação genética; 5.4.7 tnfase na tutela do embrião - 5.4.8 A questão das células-tronco - 5.5 __ ______ .. ___ _ 5,1 O bioclircilo c a bioéliLa: conceito Profundas modificações no campo das ciências mêclil'as, da engenhar ia genética e dos avanços do conhecimenlO impõem contínua revisão conceituai e adensamento da reflexão ética nCSS3 área de crescen le i11ll'rrssl' . Maria Ilelen3 Diniz indica as novidades mais evidentes no c:.unpo do biodireito: a) o progresso cientifico; b) a socialização do alcndillll'llI () lI1éuicn, lia rea lidauc da tr l(,llledicina, dos Jone-med, uos prontuârios méuicos digitalizados, dos llO/tI/" unes: c) a univer- salização da saúde; d) a progressiva rnedicalizaçào da vida: c) ii emancipação do paciente: O a criação c o fUtleionamCl1l0 doscolllilês de él iea hospitablre dos comitês de ética para pesquisas em seres humanos: g) o advcllIu de vários ins[ilUtos não governamentais preocupados com a expansão dos problemas éticos nesse campo; h) a necessidade de padrãO moral a ser compartilhado po,. ' ultur.s heterogêneas; i) o crescente interessc da ética IIlosóFi ca ·e tcológica nns Icmas alusivos a vida, reprodução e morte: do ser humano. I A expressão bioêtica foi utilizada em 1971 nos Estados Unidos pelo cance- rologista Van Rensselder Potter} e designa um projeto de utilização das ciências 1 Mi\ItIA II I U NA I )INI /, () n /fll lo/III IIII hi odl lt"ÍIO . p I I ti 2 E. BoNÉ, hintrattn bioclhiques, p. 21 , apudJAt .l}UEI.lNt: op . dI. , p. 138. A etimulogia enfatiza a ambigüidade da ética, conjugando visão inslrumental e visão Essa dualidade transparece quando du exame ti l! ddinit;lll:s: p.ml () jurisHI PibRE (I) ,

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JOSÉ RENATO NALINI

/

ETICAGERAL E

PROFISSIONAL

6." edição revista,

atualizada e ampliada

EDITORA l'i1 REVISTA DOS TRIBUNAIS

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i N' ,. ,OI«L,;,(.6!o2 lF"~. N ~Ó5 ------ -----~-_ .... .

5

O BIODIREITO E A BIOÉTICA

SUMARIO: 5.1 o biodireito ca bioétiCJ: conccito- 5.2 A i~violabiiid;&d; vid; humana: 5.2. 1 A vedação ao aborto; 5.2.2 Planejamcnto familiar e patemidJde responsável; 5.2.3 Trallsplanlt! de ôrgãos e tecidos humanos; 5.2.4 Eutanásia - 5.3 Engenhnria genética e gcnoma humano - 5.4 Qucslúcsctil'as Ui\ fecundação artificial: 5.4.1 A dignidade da pessoa humana: a defesa do embrião; 5.4.2 Novos conceitos de pafemidade e maternidade; 5.4.3 Bebê de proveta: a identidade do doador de sêmen; 5.4.4 Inseminação artificial homôloga c hcteróloga; 5.4.5 Inseminação artificial post nlortem; 5.4.6 Fecundação in vitro e manipulação genética; 5.4.7 tnfase na tutela do embrião - 5.4.8 A questão das células-tronco

- 5.5 ~Ig~~~para~elr~~_étic~~. :. __ ~ ~ ______ .. ___ _

5,1 O bioclircilo c a bioéliLa: conceito

Profundas modificações no campo das ciências mêclil'as, da engenharia genética e dos avanços do conhecimenlO impõem contínua revisão conceituai e adensamento da reflexão ética nCSS3 área de crescen le i11ll'rrssl' . Maria Ilelen3 Diniz indica as novidades mais evidentes no c:.unpo do biodireito: a) o progresso cientifico; b) a socialização do alcndillll'llI () lI1éuicn, lia rea lidauc da tr l(,llledicina, dos Jone-med, uos prontuârios méuicos digitalizados, dos llO/tI/" unes: c) a univer­salização da saúde; d) a progressiva rnedicalizaçào da vida: c) ii emancipação do paciente: O a criação c o fUtleionamCl1l0 doscolllilês de él iea hospitablre dos comitês de ética para pesquisas em seres humanos: g) o advcllIu de vários ins[ilUtos não governamentais preocupados com a expansão dos problemas éticos nesse campo; h) a necessidade de padrãO moral a ser compartilhado po,. ' ultur.s heterogêneas; i) o crescente interessc da ética IIlosóFica ·e tco lógica nns Icmas alusivos a vida, reprodução e morte: do ser humano. I

A expressão bioêtica foi u tilizada em 1971 nos Estados Unidos pelo cance­rologis ta Van Rensselder Potter} e designa um projeto de utilização das ciências

1 Mi\ItIA II I U NA I ) INI /, () n /fl l lo/IIIIIII ,,~ . hi od llt"ÍIO . p I I ti

2 E. BoNÉ, hintrattn bioclhiques, p. 21 , apudJAt.l}UEI.lNt: Ru~~ , op. dI. , p. 138. A et imulogia enfatiza a ambigüidade da ética , conjugando visão inslrumental e visão ref\extv~ Essa dualidade transparece quando du exame ti l! a!gultla~ ddinit;lll:s: p.ml () jurisHI PibRE

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1'12 (;T I( '{\ GliRAI. E PR< )J ;ISSI< lNA L

hh)logll'ol~ \~C"'I'I1.:lll11 .1 Illd ~1II1 dr .1 q u a I idade de vIJ,1 o u , s implesmenle, "a cienc ia da sohn'VI\'t'llI ' la . ) l'I lI l~l' 1I0 ~c ampliou pa ra significar a clica das ciências da vida. O Ü lt lflhll.'UlIll' lI ll lbl' l !ill1:t j-ncK lopcd ia de Uioclica é O de "estudo sistemático d~s d llll t l hOl':- mur,u.., d.l 'i ne ncias da vida c d u c u iJado tb saúde, li tili zando uma \'3r1 t.:d.lde til- IIH'!odd!ogl:l''' (;Ik;l~ il um co n texto IIlUllldisci plina r".l Pa ra Volnei <"m .d.l , d 1I1I1\'11I,t..,c dl\HI\ \' 111 I) hJtll' ll la d;t~ :- iI U.I(oL'''' pn ... l s 1l.:1lI C~. an..'.t ucsli ­IlJJ a;J h : 1lI. 1 ~ IlT nn l' l ltl' :-:.l' .lp.m • .' 1l 1t 11ICIl l l' IlIsol uvcb, q U<HS o aho no, a t: lIla n .is ia , o

raC I ~IIl{), .11',\( 111...,;10 ~UC 1;\ll' ii dl~lri 111 ilWção e 2) bl oe l lca d a:, ~ iLUa<,:õcs em ergentes, \ o lladd .I l' .\;1 1 II I /la r =t:-. l i III! rnn~rS la s s urgid .t::. d o ri t 111 0 acel erado das d escobertas hi\)l lled Il ,h ~' 1 1l n H II fll11 ti) tutll U~ I i 111 11(':; da l: 1d:Hb ll ia l' do~ din:i tu~ humanos. Aqui cab~l l .l t'~t ud,LI .1 kcu IHIa(iIO ,1')SiSl lt l,I, a dOJç~lu c o t rat lsplante de ó rgãos c tccidos, ii cllgcl1h.lIl.ll· ,11ll, lI I1PUI.U:,IO gC I1 Ctl O , ~ clo nage lll c u LH roS lemas dcsronhccidus 1)('10 honlllll ,1111 19n l.unhL' III..,t: d i\ id(' a hlol.' t ica cm ri.: 111 m w bioclica , ii cOlllcmpla r <I., q lh.·~ [ Ol'';) l'llllllgll .h . lia ("\)lbl"( II ~'50 du obj rt i v() de prese rva r a vida humana , c a 111 ;noIJioi"1 jl II. a elud,u da:; re lações en t I"e medico t: paciente , ins tituiçóes de saúde púhh (~I ';; 011 pj 1\' ;Ld,h l' CllIrc L'~ l as ins til t! IÇÓl'S c os pro ri ss ionais da saúdc. -+

:\ hiol' ! iCI , p;lr,l ddl i ) d,.:'::I te e n ~aio , eSIUlb "a mo ralidade da conduta humana 11;1 .1n"L d,,,", f..: il'IH.i,l'" d,1 vid ,l " 'i Sc c vad:uk qu I.? a c i('Jl(ia somente se desenvolve Itlcd la lltc :-ou pc r d (;hl t!u..., prCl'tll ll'cj 1I)S, r ia lIall é 0 11 j pOI..: n II.:. OS próprios cicntistas cSlào c i..: 11 I l''i d I...,..., {I . .. Na L"! ){lC;l (' II I qu e os N~II lona II n SI iI lI{es of I-Iealt h nos Estados 1 J Il idll., 111 111 1 tI,lI.1 1I 1 II..., , l lli h Il)i}() d I.,' ' I }el.".lda do CL'rl'lH"tI ', 0:-0 progrctoso::o lia genética c nas IIm.h IL'I .. llo l 11g l ,t~ rl'l)Jodll l i \'a~ j a l'O I11 t::\,; a Vi.l1ll a g..:ra r preoc upações éticas. Nos an os IlJ 70 , q ll<l mlo "iurgl ram as pOSSIbilidades de manipulação genética de microorgallblllllS - t'Jll hura 11 :1U de matlll fc ros -, genet ic i s ta~ apreensivos convoca­ram IIllJa t (l1I /c I c l\(" i.1 l ' lI1 As i I n lll ~lr, 11<1 Cal i rum ia , para pe nsar !lJS illlplicações da Iluva lcc lIologl,l c n al.,:lr d i rei rizc ~ q uan to ao seu li SO, Eles pediram uma morató ria ICll1 pO ran ,l 1).11.1 :\ pl'::oq uba, I' fl4u ó.l nl O os pl'r igo':i pOIC rH.: i ~lis eram inve::.ligados".6

D~ ... ( 11.1"\11 '..,, ' hllldll,1 I.' ,I UCIlU.1 110 1 m .l II Va <.l o compo n ament o humano aceitável no campo ii.! \ Id.l C d ,1 m Ull e" (<:itado por Gil" I)URA NIJ, Lu biot lhiqul. p. 30) , DAVID Roy

l"IlIll'i'iIIl,1 hilll't ila lomo "I) c~tudo in t(' rd iSci plinar do <:ulljunlo das condiçôes que

lI m,1 gl'::>l.h) 1l'::'pOl b.IVd lI.l \ Id a hu mõllu ..:x igc, no 4uatl ro ti os progre~sos rápidos e {'ompli:xtl::. (II. :..lbl'f ... d .l~ lI.'c l1úlogi a::. biumél.l i<:as". Finalmente , G UY D URANO salienta que a hlOélka ~ Jcslgna a investigação do conjunw das cx igtn cias do respeito e da pro 11lLlç.lu 0:1 Vida hUlIlana (' da pessoa, no SClUr hiomt d ico" ,

3 M<\RIA 1-11 IlN~ D INIL, () c.slUtln altw l .. dt., p . 11 , ao ei lar Etlcycl0l'cclia oJ bjoell,ics , Nt'!w York, 1{ (' Kh : I <.,l45, v. I , p, 21.

" M AIIIA ti ni NA OINIL, () fS / fll lo IHlw l , .. CII. , p. 1 3, ao ci tar VOJ NU GARRAf A, Reflexôes bioé­! ICI't ~ohll' nrlll' i, l , "'n\"k \' nd •• rlani:a . B JO!,/ j t'll , n. 7, p. 14 C M ARCO S EGRE, Definição de h WClll', l~' " ,l,lld,I\:,1I1 \UIll .léIU;!, lh:olllologi:l t.: d ill"o htgi,l. Uiotf it'd. p. 22 ·29, 1995,

5 ANDKI \" C. \'\II{!I\ , PI~ ,IJ/,'''\(IS dfl h iot'II((I, apud ~h)NrcA SAlH URI 5cARPARO, FCf' ilização 1".~hf" l" .. t)II(""I.LIJ :d ll.' n ,1 - ;\';p h: ltlS d~'ll1 l rIl"U~ f.' kg;ti~, p . I H.

6 SI! VI N f{\J-.I, () t" ~'It ' IIIf) ,I" ~Ú II /li XXl- e mito t ' /llt 'JJd, ' I, IIIt lll/ flui/1r \' tlcs/.'II\'lIl vt'r" ltIerl/,', p 31S. Importanle fn~ar q U E' J moratóna não dur0U, roi::> o aceno de fama e rl4ueza a

o BIODIREITO EA UIOÉTICA 103

Uma vez mais lembrand o JOSé Sa ra mago, não ha verdadeiro p rogresso se não houver progresso moral.

Aperfeiçoar a ciência não implica cunseqüelHe aprimoram ento do homl' lll . Chega-se a "analisar o atual progresso cientifico, inclusive, como O resultado de um m ovimento de conquista da verdade, de uma verd ade obj etiva inconl esl<Íve l, que propugna quc o mundo das fa lOs seja lo talm cnte ind epcndcnl c do mundo d t,') valores. E, assim, os d escobrimentos científicos sugeriram um o timismo e ufórico sobre a possibilidade do homem de estabelecer o próprio do mínio n o mundo cons­truindo a verdade cicntifira c conquis tando a verdade com leis próprias" ,7

Todavia , nem Ludo aquilo que científica e tec nicamente é p ossivel L1zl'I" se pod e afirmar eticamente irrepreensivel. A bio mcdicina tem avançado de maneira indizível e produzido realidades só previstas na fi CÇão científi ca. A quem Incumbe dizer se tal desenvolvimento se va lida à luz da moral cOlllempo rãnca? Prin Cipal­mente nos domínios da transmissão da vida, as ques tões cOlltinuam passand o pelas crenças humanas,

Os juristas têm o desafio de enfrenLar novassiluações ueri vad as dcsse ll1und t) novo, É o DireiLO a cH~ncia encarregada de harmonizar confliLOs ou perplexida­des delas decorrentes. E tempo de se lembrar, como Nico la Ucrdiacff, que "~l vid:l marcha através a utopia , E talvez um século novo começa; um scculn no qual os intelectuais c a classe culta pensarão nos meios para evilar as 1Il o piil~ f ITlllrtl:lr a uma sociedade não Ulo pística, menos perfeita c mais Iivre".H

São os mais diversos os campos que a bioética envolve. A ê nfasc, nest a~ re fl e­xões, é centrada na perspectiva ética, sem demasiado apego ã ciência e à tecnoc racia. Assim é que um novo conceiLo, esboçado por j 'lcquelinc Russ, paul' allxi li :lr lia melhor compreensão dessa ót ica. Para a mestra de França , a biaética desigll<! "a expressão da respons~lbilidade em face da humanidade fUllIra e distanl c que eSlá confiada à nossa guarda, e a busca das fo rmas ue rc:;pcito uevidas à pessoa - qll CfSC

tratede outrem ou de si mesmo-, busca que se efelUa particlllannente considefantlo o selor biomédico e suas aplicações" ,!} Dessa compreensão se eximi um aspccto relevante da bioética: é a tentativa de garanti r um w ,ltrole <lo wnnule nu ullll'oc/('r sobre o poder, nos três principais campos de sua inserção: a esfera do contro!c da reprodução , a esfera do controle da hereditariedade e aquela corresponde nte ao poder sobre o sistema nervoso.

serem ganhas a partir das novas tecnol ogias se [Ornaram tentadoras demais, os pe rigo .. pareceram exagerados e se: ingressou na era cOl1lemporánl!a da come rcIalização da bio logia.

7 MARIA Jl~U::' MI J~ll AI M,"RAl, p , 20, IIlVOCandll E. $t,lIlllll\, II progn:::>!>o !'>lk ll t iliw tn IIII

logico di rro nte all 'ctica, Medicina c moral , p. 337,

8 Citado por 1"1 KNA NI)I} SA NTO~Uo.':iSO, I.a (cf Olula ;:. joll '· llrf i(Je;"k "dia a01H1I' - Cnn '>t ').!II I' J\ZI·

ddl'insem ináziollc anili ciatc per ii Jirillo civile , pena le e I,."UlUllli,:O, paguHl lluu:tI

9 Dp. dI. , p. 140.

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"'.'. ' J .' , ;. ,

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Il)~ I ~TICA (jURAI. E PROFISSIO NA l.

São tallla~ as questõt's suscitadas pela bioé li ca e tão instiganles, que ela se torna por si insuficieme para enfrentar lodos os desafios. Surge. assim, "uma nova disciplina, o biodircito , estudo jurídico que, tomando por fontes imediatas a bio­ética e a hh1grllclka. leria a \l ula por objeto principal, salientando que a verdade Cic llIili l'a IIJlI ptJdL:I.1 subn.:pt)r-::.c;1 êtica e ao dirc llo, assim como o progresso cie ntifico Ido pod er.! acohe rtar crimes con tra a dignidade humana , nem traçar, SOIl li 1ll1lC'l I II [ [li I( "..." ll~ dl'~l i II \IS da hUIIl3nidauc ". lU

'3..2 "ill\'itlLthilid .~dl' da \'ida humana

() olljrll\'cl haJie 'c) (ln hi ndircito r a tut ela (h} vida humana . Há quem s ustente .I dl'k",,\ d.1 \ id.\ c'l ll gt'lid . II III Ila COI\l'Cpl.:Jo Iltll! ~ lica inc lusi va de toda c. qualquer espéCie dr 11l111!;\! I VII .II t'. 1 erl'ce ria l1l prOll'!.'ão plantas e animais , ao lado da criatura humana, () C.\.IIHe (ti o rdem constitucIOnal vige nt e restringe a área d e incidência dessa IUll' l.1 pdr.l ,I \'hht hum ana r: esse o va lor im'io lj"c l de acordo co m o texLO fundam€'

N.I \'cld.llh', ,I \ Id.1 {' UlIl pressuposto ã fnti~'ão de tod os os direitos, Tanto que os (IIrCllo., tundal11l'llI.lIs podem ser tambem traduzidos por bens da vida, Ou ~l'j;l. (h.IIlh' d.I 1.:l''''''I. I \'~it) d .. 1 ex istclKia , não hJ St ' fal a r cm libe rdade, igualdade, propried,HIc t' "Iq!,lIr;\Il~' ;1 p,H.l qUl'm jJ não é IItular da vida ,

:\ COJl':,.Il1ulI;ão cO Jlsagra a inV IO labilidade da vida humana Cont ra todas as amcaç:lS l'úll(' r\' t:l ::i 0 11 virt uaiS, E vid2. e um processo que tcm infcio com a concep· ção, Essl' C l) 1lI01lll':lltO csprci llco, cientifi camente co mprovado, da formação da pesso:l,Il:\ l' llI11. T P Çjo l' a lese adorada pel o Pacto de Sào J osé da Costa Rica, em

seu art . "L", dn qu.d II l3 ra~il c signa l.iri o , Cu mpre kmbrar qu e desde a Emenda COI !s li IlI Cio 11.l11l , 45, de 08. 12 ,2004 ,OS tralados e cOllvençõcs imcrnacionaissobre direit(ls hlll1lal lO~ que r{l rem aprovados, cm cada Casa do Congresso Nacional, em dOIS lurno~, PI)!' In:~ qu i nH)sdo~ votosuos rcspe<..:tivos mcmbros,serão equivalemes âs C I1lCl\d,.I ~ l'U Il ~ 1 i IlI l'ioIl3i s,ll I U quem sustente a desneccssiclade de os tratados alH(rio rl'~ a pnllnll l ga~':i o d,1 Emenda 11 . 45 se re lll aprovados com esse quórum qualificado, p,!r;.) revesltrem a calegoria de emendas a Constituição .

O 1ll0 1lH'llto ua (olll:ep,-ão como u uo ~u rgimc ntoda vida econsiderado o pilar do sis tema íllllCrlCanO de d ireitos humanos Y Essa o ricmação provém do direito

10 M ARIA I II II NA DlNI.l, O ('S lado aluaI , .. cit., p. 9, c também vcrbelc biodirt:ilO, na obra Diciondrio jurldico, v, 1. p. 40,

11 M "'H,\ ll lllN\ n lNI/,Ontrulollltw / , l'i! " P, 23

11 ~ "3 ", ,U I 'j ", d,l C Il l l"ll illl1"HI da Repúhllca , .1tTc .;,n-llIadu pda Emenda Constitucional 1\ ' I ';, II.' tlH 12 2í}(l-!

I i !\ 111t11 H I l , \lh I \ 11, 11(1;1" " I.!IH ,I :-' •. \1 \, I I/ IUld(/ ,k III \ "/11 (,,',/k d IIWIIU'1I 10 ,Ir III IO/I(C'I' ­

(1(\11 , I'!I II/ (11'1 ,\I~( nllil ",,,n II mIO de dLlt'l Il l IS hUIIIIHh lS, apuJ I VI:s GANPII.A DA SIL.VA MARr!N~, j)j rn l cl JIIII<I,/lIII'II/ ,1/ , / dell/, p, lj..j c Ss

o BIOOIREITO EA UIOÉTICA 1'J5

romano, inicialmente restrita aos cidadãos de Roma e. por influencia estóica , au i­buído a todas as pessoas, pelo mero fato dese inserirem na espécie_ Os fundamentos para legitimar a opção de tutela da vida humana desde a fecundação - encon tro do óvulo pelo espermatozóide - estão n o direito natural , no direiLO POS iLi vo c na dOULrina dos direitos humanos.

Essa opção constitucional encontra re flexo conseqüente no Código Civil, ~t.: a personalidade civil da pessoa humana começa do nascimenlO com vida, a lei pàe a sa lvo, desde (~concepção, 05 direitos do nascituro, ParaJ osé Carlos Barbosa Mordra, a cxpress,10 "direi tos" n:l0 roi usada impensadamente, "sem compromisso com ii propriedade tenninolôgica", li O legislador "poderia ter dito 'i nteresses'; não o fez , prdl'l'iu clizcr 'direitos' , l: a opção não podL' deixar de tcr Significação. 'Dircill\s' é

lermo técnico , e em princípio deve ser emenuido na 3l:cpção lt:cllI<..:a; ~ohre quem O conteste, em todo caso, recai rá o õnus da prova" ,15

5.2. 1 A veJaçdo ao aborlo

A tUlela da vida inviabiliza a prática do abono. Abono é o correspondeme cm ponuguês para aborl"s , palavra latina derivada de aboli li , com v significado de morrer ou perecer. Signifi ca a interrupção da gravidez an tes de seu termo normal, seja espontânea ou provocada, com expulSãO ou não do reto morto, A dOUlrin'l também usoujetictdio como expressão intercambiáve l com abono. Só que antes de ser reto,já existe um ser humano, O zigo1O, fase an terior ao relO , é gente , Tem direitos assegurados pela Constituiçào e respeito garamido pela ética.

Importante enfatizar que a lfuestão leminológica se presta a servir à falta J e ética em temas tão relevantes como o do homicldio de sert:s inocentes, Falur·sL' cm óvulo fecundado , embrião, zigoLO, feto, é convelH.;ão humaníl, São fases que não d escaracterizam o gradual desenvolvimen to daquele ser que é gente . O essencial é

compenetrar-se ue que esse minúsculo ser, resultante do encontro de dois códigos genéticos diversos , passará po r todas3s etapasalé nascer com vida. Guarda perfeita identidade , individualidade de criatura da espécie humana que, se não vier a se r agredida pela intervenção de outro humano em estágio lemporal mais avançado , evolui rá e nascera , Qualquer intervenção sobre esse processo é vulnerador de UIlI

direito que a Constituiçào garante: a inviolabilidade da vida. Pareceria contra-senso a Constituição do Brasil assegurar a dignidade da vida humana e negar ao nascituro o pressuposlO à fruição dessa dignidade: a própria vida.

14 JOSE CAItI.O~ BAItIK):::.A M OItUII.A, O direito UO nasd!uru ~ v ida . Djlt'illl (uncltHllt'flllll fi VII/ii ,

p. 115.

15 Jo~F. C AItIO .. BAII.1I0"A M. lIu 1\tA, op, dI., p , 1\ 'l, :\11 dlar !'\lN II .. III MIII'\NIM l' l 'AlIh t 1 )1111 t'"

CUlilllU t:UIlIII partid:ln os d~1 mesma posi~·ào. ·talllbem Ivl ':l ( j "NIlRA OA SII "" M ... lU lN", M ARIA HELf,NA ()INIZ, M AR!,\ GARCIA e o utros dnulnna<!Ort.:s " {II1l I1I1~;lIn dl'~~t: t llll' lld i ·

IllCnlD ,

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196 ÉTICA GERAL E PROFISSIONAL

r\ cJa!)!:>ifira,:ão de aborto de Maria Helena Dmiz é elucidativa: quanto ao seu objelo, o abono a) ovular, se pralicado aré a 8,' semana de gestação; b) embrio­nário, se operado ale a 15.3 semana de viua intra-uterina, ou seja, até o 3. 0 mts de gravidez e c) felal. se ocorrer após a 15.a semana ue gesração. 1b A lei considera o abono provocado um crime. Pois é homicidio tirar a vida de uma pessoa, seja fora do útero , st'J<l ainJa no útero materno . O denominado aborto legal é aquele tole­rado pl'lo orucllarncl1lo como medida de política criminal. Não se pune o aborto Ilccc:-.~árl\ I, (II 1\' t' aquele cm quI.: não hã alternar iva , para salvar a vida da mãe, senão sacriflGlr a vida do Ila~dluro, e () ~f'n time nw.l , que e o abono resultamede estupro. Todos o!:> dctlldi"l sün ílhl lrt( IS crimi nosos cm scmido l:~(rilu . Em semido amplo, toda illlcrrup~'ao dU!...lsa da gravidez pode ser considerada crime, eis que a ratificação, pelo Urasll , dn Pacto de S.10 JOSé da Costa Rica, leria derrogado o permissivo do Codlgo PCllal p;lra lI 'IU punir o abono necessário e o abono senlil11e~1tal.

AIIJ 'i , com propriedade e lucidez , Maria l Iclcna Diniz arirma que o abortu ne. (es!>w ia hoje poderi..l ser chamado dCSl1fCt:ssdriu , injusli licável diamc dos progressos

lecnologko:-. . POIS a) exis tem Olllros meios para lentar salvar a vida da gestante; b) nunca ha\'l.' ra ct.:rll.:za ahsoltlla sobre o êx ito lelal ; c) a prática abortiva poderã

causar UIII dano .tinJa maior para a vida da gestalllc do que O prosseguimento da gestaçao; d ) {) ll1al causado 11.1.0 é inferior ao suposto mal evitado. 17

Um deh.Hc ailllb inconcluso ê a possibilidade de abortamento do anencéfalo. PorancC1cefalia \'ntenclt-se "urna falha no processo ue formação do embrião, entre o 16.'" e o 26.'" uia de ge5 I a~'ão, cm razào da qual se ve rifi ca ausência variável da calota crtmiani1, dos teddos que a ela se sobrepõem, dos hemisfé rios cerebrais e cerebelo" .18

ló O (' !I/CHio (/lIhd . UI., p. 35.

17 MARI " II lLENA DI Nll, O ntado aluaI .. dI., p. 61 a 65. Por sinal que os perigos do abolt\! na IIIH'grul.ldc fi si ca da mulher são por ela indicados à p. 101·102 e precisam sef ;Hkqu,ltlalllt'tllc sopesados: <)) infecção crÕnic.J balpingitc) e traumatismo, que resuhalll cm uhslru ,óes nas trompas ; b) problemas no ulero causados por hemorragia, infecção 011 cndolllelriose. Casos graves podem levar a perda do útero, ante a neces­sidad~ dI.: Im,taeuomia, es terilidade Oll morte. A curctagem malfeita poderá provocar perflll.II,;)U uu.:nna ou o calamento enlrc uma f.lce e outra do utera; c) incompetência istmo-eervie;!l . na hlpótcse de aborlo retido, ou seja, quando o ovo morre, mas não é expelido: d) gravc mfecção vaginal , em razão de produtos colocados na vagina; e) queda súhlla de coagulação s.mgulnea, provocando hemorragia interna e mone, se o aborto se deu por injeção de sal , O morte por embolia , pois pode suceder que o liquido amnióticu, ped<lços de te lidos e coágulos enlrem no aparelho circulatório ou pulmões; g) ;lder~m:la da phll:ent" à parede do útero; h) surgimento de pólipos; i) tétano; p peri. tOIllI\' ; k ) .1I1t:1I1 .... I) irreglllaridaue nos perfodo!. menstruais. al:ompanhadas de fones ('OIJ(,;h , JIl) In).\lIk;: :-'I'XII,!! : II ) ('/Iv('lhl.'CIIIICIlIo pn:I <ln'; o) pron',Ssos l:iUlCl' rfgenos; p) ('tI .. t::'lhlll.IIK,I'i~ ql illll;lIn ;I~'flO dos ovários (onlmild.

18 P AUl O SIlVIIK~ M\lIlI N~ Lr .. \o JI!NlOR, O direito fundamcntal à vida dos embriões e anen­ccfalo'l /li/fI/o fWIíI(/Jllt"lfa l I/ vidd , r H4 .

O BIODIREITO E A BIOETICA 197

Invoca-se uma série de motivos para a prálica do aborto nessas hipóteses. Dentre elas, o sofrimento da mãe,a inviabilidade da vida do nasciruro. Chega-se asusremar que, na verdade, não se interromperia a vida, pois ser humano desprovido de cérebro não seria pessoa.

Indaga Maria Hel ena Diniz: "Como negar a dignidade do anencéfalo , ~ue possuí todos os caracteres da espécie humana? Não mereceria respeito o seu direito de viver o lempo que a natureza lhe concederia? Não seria preferível um parto se­guido de morte do anencéfalo a submeter a mãe a um aborto sclctivo, que poderi a provocar.lhe alguma seqüela?"IQ

O temaépolêmicoe emocional . Reconhece-sea 3.ngúsliada mãe-e lamhém UO pai-do anencéfalo. Mas também está presenleem toda a discussão. osintol11<l claro de uma sociedade hedonista, que fez opção pelo prazer e que recusa o sofrimento, como se ele não se inserisse na condição nalUral dos seres vivos. O desre~peilO tl vida, a insensibilidade, o egoísmo, ludo auxilia na formação de uma mel1laliJade que escolhe o pragmatismo, em lugar de preservar valores,

O lemaesrásubmetidoaoSupremo Tribunal Federal, por onde tramiraa ques­Ião de ordem em arguição de descumprimemo de preceilo fundamemal 54-8, do DistrilO Federal. A Corre Constitucional ainda decidiráse há direiloconstitucional da gestante de submeter-se à operação terapêutica de partos de fetos anencéfalos. Estão "em jogo valores consagrados na lei Fundamental - como o são os da dig, nidade da pessoa humana, da saúde, da liberdade e auronomia da manifestação da vomade e da legalidade -, considerados a interrupção da gravidez de fe IO anencéLdo e os enfoques diversificados sobre a configuração do crime de aborto", lll por isso que adequada a arguição de descumprimento de preceito fundamenlal.

O STF, por maioria, referendou a primeira parte da liminar do Relator, Minbtro Marco Aurélio, quanto ao sobrestamento dos processos e decisões nos processos criminais em curso, em face da interrupção da gravidez no caso de anencefalia , vencido o Ministro Cezar PelU50. Também por maioria, o STF revogou a liminar deferida na segunda parte, em que reconhecia o direilo const itucional da gestan­te de submeter-se à operação terapêutica de pano de fetos anencefáHcos. Neste ponto , foram vencidos os Ministros Marco Aurélio, Carlos Britto, Celso de Mello e Sepúlveda Penence, Pela arguente, Confederaçao Nacional dos Trabalhadores na Saúde-CNTS, sustentou oralmente o constirucionalisra luis Roberto Barroso , epelo Ministério Público Federal , o então Procurador-Geral da República Cláudio lemos Fonteles,

19 MARIA HEl.I:.NA DINtz, O tstado an~al ... cit .• p. 57 .

20 STF, QueStão de ordem t:m Argüiçãn ele DeSl:UOlprimentn dc Pn:nilo fundalll l'lll;t! ').t -H - Distrito Federal, primei ra ementa do acórdão do MIOl!itro MAR( o Alnu:u\). 27 .0·f .100'i, Diário da Just i~'a de 31.08.2007, cujo andamento é disponfvcl em <:h!lp:l/www,sILgov. br/portaVproccsso>, ADPF 54-8-Df

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198 ÉTICA GERAL E PROFISSIONAL

o M 1Il1~1 rn tvtln,:o AUI t.:illl II t1l J us CX(l'pt.: 10Il'Ü.s talentos hum3111sticos postos a aluar na rtliS~,lU da gU:lrda precirua da Consti tu ição, abriu oporluniclacle para a COIl1\llJllI.H.k ll('J11 diLl ~t' l11allirc~tar cm pionei ra auuiência pública. Em sua uecisão . () rctatllr ,1,>,>l'V\.'wu : "A mltlnia cm analise (ksâgua cm qut'stionamentos múlllplos A n.'pl' ftUS ... :w do que decidido soh o ãngulo precário e efémero da me­dida Ii millar fL'dumltlll na e ll1l ::.são ue cl1ll' IH.li mcntos diversos, atuando a própria soclnladc. 1),1I,1(: tlIlVen icllcia dI." 3C1onar-sr odispOSlO noarl. 6.(), § l.°,da Lei 9.882, c.k 03. 12. 19l )L) hll,1l1, lenho como oportunu ouvi!, cm Juuiênda pública , não só

as enudades que re4uacran\ a ad missão no processo como amícus (ttriac, como também as Sl'g\1ill l l'll'nlidaJt.:~ : Federação Brasileira de Ginecologia c Obstetrícia, Sociedauc tlra~I1clr;1 dr Ge néli ca Clínica, Sociedade Brasileira de Medicina Felal .

Consdho Federallk' t-.h:dlcl lla, R~(k aC lonal fCIIlitlisla de Saúde , DireitosSociais c Dirrllos Rcprc,,>en 1,11 1\ o~ , L~coJa d(> Gente, Igreja Universal , I nstituto de Biotéc­llIel , DlrClh) ... 1 1111 11.11 III!"- l' (,CIll'l ll , Deplllado Fl'deral José ArislUdcnlo Pinotti" ,H U tl' 111.1 l ' l,ln\ k Ilh' ~ ' ~ 0111111 u.lra ~\ lk~pcrl(!,r u 111Il' Il'~~e de todos, As <.I II erações na l 0111 P()~ I I,·.H I di I ~ll pJ": lIIu 'I, lhunal Feda;.!1 lalll bL:1tI se mostram relc::va lltes para que a llótClO llahd,lde 'ie pflHlU lICi l: pdu ó rgão maximu duJ udiciario, enriquecido pL'b Illlll! 1\'1">,11) L'IIl ' i)' j llrtd iCI ora desaliada , Em t l'I"l11 os juríd icos, a Cons[Í lUiçào da Rqmhht'.1 J-1 .... C Ill)!'>llhJllOU na Illviolahilidadl' da Vida. Ninguclll negaria que o :1 1l1'lIccLtllll' 1I1I1!"Jl"I iiI! 111.1110 \ '1\'0. QUl'S I iunar-se-a l1 coteJl1 cntre os va lores etices: a vida do I'l:bt, 1)Jl.'lk~tln.ldv~1 uma tu na cxistéllLla l' a vioada mãe -e dosgcnitorcs - CO I11 certeza ~uh u torllll?nto dessa perspectiva.

Um do~ argumentos u til izados pe los adeptos do abortamento terapêutico restou Cll r raqucc ido COIll o nasci 111 e 11 lo com vida e o prolongamento da exis tenda de um bebê <lncllcé hllo que j<i ultrapassou nove meses de existência , Também é paradoxal que i) ParlallH:1I10 propon ha uma conlribui\~ão financeira para a mulhe r

gráviua c Se i 1ll"lllle por legitimar o anOrlamCIllO, Ou protege-se a vida. em todas as

suas vicissilUdc~, ou -.10 se abrir espaço para a qualificação da Vida humana - ela resta rj desprotcglda ,

5.2.2 PlcH\cjalllt'lIw fam iliar e parernidade responsctvel

Em lugar dl' 5" ;\dotar o aborto como sollH.;.10 pragmática para uma série de problemas qUl' alligl'lIl a sociedade contel11porãnea, esta deveria pensar em pres­tigiar a vida. O lIIilagre da vida é u m dom gratuito , Cumpre ser encarado hoje c semp re comu verdadeiro milagre. Pela vida ha de se dar graçascontfnuas. E mágica a cxiSlênda hurnarw C:l poesia a traduz de maneira muito singela: isso não impede C/IH' t'1! ,rpltel' I' ",,,",,,, t' hill/i'" j' t' hOJ\i," ..

21 Despachu tlll j\·tlll\Slru ~c1J.tur, M AIU.U AURtuo MU.LO, em 28.09 .2004, nos autos da ADPFH

O BIODlREITO E A HIOÉTICA Il)l)

Cada criança que vcm ao 1ll1llHlt 1 e () all:~wJLl dL: l{UC LI hU I11un id3de aind.lll·'11 futuro . Deus não desis tiu da criatura, Por isso, cumpre fazer com que ela len ha um destino propiciador das condições de vida digna . A dignidade humana é o prindpio inspirador de lodos os demais, e guia para o poder públic:) em todas as suas expressões e paradigma dc conduta obrigatório illOdo~ os se res da l:~pccic, Impõe-se permitir que os seres desabrochem e atinjam a plenitude possivel. Para isso, é necessário p lancjar o seu futuro , muito antes de que eles nasçam .

A ideia de r1al1cjamcuto familiar é essencial, Prrcisa ser uma política púhl ica mais consis ten te, pois envolve Ulna promessa do co nstitui nte,H Sem euuG",:ào integral , não haverá condições para exercício efici ente dessa política. As pessoas precisam ser consdcntizadas de que lrazer filhos ao mundo é um compromisso permanente. Quem gera é responsável pelo alimemo físico e espiri tual, pela fur­mação, pelo amor e pela realização integral do ser gerado.

A su perpopulação é um fenômeno preocupan te. Há lima evidente cono tal,;iio en lrc a falt a de condições materiais de sustento da pro le c sua extensão. Os casais que teriam cOlllliçõcsdc propiciar bani nível de ex istcncia a seus filhos, são módi cos ;}n trazê-los a es te mundo, Aqueles que não dispõem de quase nada, contillllalllll1Jis prolíficos. O que dizer, então. dos filh os sem genitor, das adolescentes que prot.:riam sem saber ao certo a quem suas crianças cha marão de "pai"? Não há como deixar de se constatar cena ambigÜidade en tre uma po lítica vol taeb a promover valores humanos e a fazer com que as pessoas se desenvolvam até à plenitude passivei e o verdadeiro estímulo à procr iação com a outorga 3ssistencialista de au xí!ro cm dinheiro para cada criança que nasce, Isso leva a ado lescência, cada vez menos alicerçada em valores, a procriar para vive r às expensas do Erário, Por sinal que essa política pública evidencia outro paradoxo: a mes ma sociedade que admite um subsidio em dinheiro, desvinculado de qualquer obrigação, lambém prega o abortamento, Não há um antagonismo entre as duas posições?

O planejamenlo familiar é premenle e essencial e precisa ser disciplina ubri ga lória da esco larização formal e dos processos de educação informal permanenl e. As taxas de crescimen to demográfico no Brasil ainda sào por demais elevadas. Se:.l populaçãO crescesse apenas 1 % ao a no -e. infelizmente. cresce mais do que isso-, o país teria 1.800,000 novos brasileiros a cada doze meses. Onde encontra r escolas, trabalho, moradia e infra-estrutura para todos?

O crescimento populacional é uma das ameaças mais séria~ ao Plancln . N:lo se iludam os oti mistas com a notída de ({ue a taxa ue nascimemos se reduz. Nem

22 Are 226. § 7,°, da Constituição da Rcpliblll.:a. "Fundado nos prnlClpios d;j tltgllldatk d,1 pessoa hum:103 e da paternidade responsável, o planejamento familiar ê livre decisão do casal, l"tlmpclmdo ao Estado propiciar H'curso:"> fdllc,u:lon.l b l' l'Íl'llllrll'o'" p:lr.l ~) '·lI.l' r­cicio desse direito , vedada qualquer forma coercit iva p~lr panl' de ill " liIUI~·Úl·!> oltda i ... ou privadas". O dispositivo conslitucional foi objeto de disciplina ua l.ei Federal 9.263, de 12 .0 1.1996.

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·. 200 ÉTICA GERAL E PROFISSIONAL

que o mundo possa .ll2ollloJ<1r ainda mais gente <1 consumir e a gerar residuos. "In­formações sobre a :,audc nacional demonstram que a alegação de que mais gente Significa 1l13h I 1'1 U LZ.! (: U opoSto do corre io. Os 10 p;lbes com mais gente (mais de 100 l1lilhOc!:> lada) , ~ã o, elll ordelll t.lccn.:~cente de popu!Jção, China, lndia, EUA, 1 /l(.h)nt~la , Bra"l ,l , P,Hilll " tât) , Hü~sia, Japão, Bangladt'::.h C Nigéria " .1'0 pioré que os 1>31!:>t'S 1ll;t1'3 1111pulo ... us saoüs lnais pohres. A CXCCç<.lO é os Estados Un idos. Os países

r\('05 lêlll ptHI l: d gell te 7 dns 10 1(-111 popula<;ôcs ahnixo de Y milhões e 2 abaixo de 500 mil h.lbitélllles !H A::. taxas ue crescimento são elevadas 110S países pobrcs- fruto da ignorância - e a cxce<.;ão é inadmissíve l: a China impõe abortos e a Rússia tem problemas de !:>autlc calastróficos , No mais, con linua o crescimento indisciplinado, com luuasas nelastasconsequêlKias dai decorrentes: falIa dceducação,de moradia, de saneamento h<ls ico , Je empregos, de perspecliva ue vida, Mais candidatos ao lumpesinatu nranle, a descumprir, no Brasil, a opção do constituime ao eleger a dig'lidadc ela \ ida humana como valor fundamental da República,

O poder PIII)IICO (' ubrigado a propiciar os mcio~ de esclareci meI1lO das pessoas 1 rcspci to Ju plallej.IIlH:' ll to da farnilia, sobrei udo em relação ao momento adequado para tnlzcr Iltl\ II', ... Cll· ... ;111 IlllllHlo , a~ rcsptlllsahilidadesdus pais e a cOntenção do furor prolill(,o do~ l11;J.i s jovclls e 1l1CnOS preparados. Se o Estauo não alua nessa área , IIlcumbe ~ so( It'd,1(lc esc hllccida cobr:\r dele e lalllbêm suprir suas deficiências.

Uma ~.td 1;1 polll ica de planej.\1J101l0 familiJ·r é lllU ilO m.lÍs cficienle cm termos jc edilicar a ~lH..: il'(.I.\(Jc que o Brasil espera e merece do que multiplicar práticas tssistcnciali~ta '\ t: acreditar que a pubreza seja erradicada mediante distribuição :le dinheiro ou de gCllew<.i. A indigência menlal é muito mais séria do que a insu­ic icncia 111;1 tCrlal N.\ cldiciêllcia da formaçã o vah Irai iva das pessoas é que se deve nvcslir. [\"idcIlClar JS obrigações que os pais titularizarn em relação aos filhos é a t1trrnativa para refrear um crescimento populacional que condena o Brasil a ser una pronll: ~sa descumprida ou um povo que tende a eternizar carências crônicas : declina scm ter atingido o seu ápice .

Há um vaslo campo ue atuação para a cidadania que assume seu compro­nisso êlico de implcllll:lltar a democracia participativa e que se sente c hamada I tran~forl1lar n pJI ~. A partIr de um elenco de sllgc~lões ro rmuladas por Maria -lclena Diniz , p0de-~e alvitrar que as pessoas acio nem sua criatividade e capaci­lade vo liti v'l para I>rc rcccrsolul.;ôcs mcnos reducionistas e cruêis do que o abono : colaburcllI p.II ... c ria r li ma 1I1entaliJadc voltada ao planejalllcn to da famflia e ao 'xcrcicio hlgido de suas rcc;;ponsabilicladcs. As soluções de Icge Jerenda seriam:

I) s implificar c disseminar a normalização sobre planejamento familiar com c~pu lI~ah ilid :tdc (' h.I"'l'ada na livre dl'l:b:io do cas.ll;

23 JAkl.U [)I \,,1> ,:.1', t n/,/v») LUlutI .\.., ~iH Kdadc~ c!>nlllh'JIll\ fraca~~{) ou O suct:s~o. p. 611 .

24 Idem. 0:-. mal.!> flCOS sao. pela ordem: Luxemburgo, Noruega, Estados Unidos, Sufça, Dinaman ,I . I-.J:ifHiI:I, All!>lria, Canad:i, Irlanda e Paises Baixos.

O BIODlREITO E A BIOÉTICA 201

2) aperfeiçoamento de métodos publicitários para promovere divulgar planeja· menta ramihar,saúde maternal e infantil, mediante Ulilizaçãodas midias, palcstrascm escolas, produção e difusão de material educaLivo para con~ci e lllizar a população;

3) publicação e distribuição gratuita de informativos sobre a sexualidade humana c técnicas contraceptivas eticas~

4) coordenação de todas as atividades voltadas ao plancjamcnto familiar, por um grande Comitê de que façam parte Governo, ONGs, instituições, empresariado, clubes de serviço, confissões religiosas, para faze r chegar a todas as localidades e micro~regiões as técnicas de saúde pública , m edicina preventiva, psicologia e assistência social, com vistas ao controle ético da natalidade e prevenção de DST - doenças sexualmente transmissíveis;

5) formar educadores que alertem as mães e ruturas mães sobre os riscos do aborto e das alternativas à sua prática;

6) uso de cllnicas ambulantes, nas periferias e áreas rurais, " .,ra prestar in· formações de ordem sexual e médica à população e oferecer serviços pré ~ natais

gratuitos às mulheres;

7) integração dos serviços de planejarncnw familiar nasdínicas ginccolugicas e nos departamentos obstétricos de todos os hospitais públicos ou particulares;

8) incentivo à formação de associações c ONGs para o desenvolvimcl1Io d~ programas de preparação para o sexo, para o casamento, assistência pré- lIatal, orientação pós-pano, incentivo ao aleitamento materno e outros análogos. 2'i

Todas as propostas de conscientização da cidadania para assumir um plane­jamento [amiliar consistente e uma paternidade/maternidade responsável hão de ser consideradas. Para isso, é preciso estimular a criatividade e fazer com que mais esse problema sério do Brasil seja considerado por sua cidadania e não con~ado apenas à boa vontadedo Governo. O Governo é instrumento insuficiente e apenas serve para fazer cumprir a vontade do povo. ESle é o verdadeiro titularda soberania. Enquanto não se conscienLizar disso , não haverá futuro digno para o país.

5.2.3 Trallspla,,!e de órgãos e fecidos huma" os

O debate instaurado em torno à remoção de órgãos, fecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento orerece também contornos éticos. l !!

25 São 33 as propostas de MARIA HELENA DINIZ em sua obra (O tswdo aluaI ... cit. . p. 120-126), todas elas voltadas à conscient izaca.o da cidadania. Assim como o constituinte previu uma cducaçt20 ambiental , ainda nao eft:tivamerue imple.mentada em todos os "!vels, t inadi:ivel o desafio de uma t:ducaçdt) inlt'gral para Ih: rmiti r que os n(lvo!,; habi­tantes do planeta encontrem um ambiente familiar e cívico menos comprometido t:UIll

a supe.rficialidade, com:1 matéria e com o egofsmo. 26 É o objeto da Lei Federal 9.434, de 04.02.1997, complementada pelo Decreto 2.268, de

30.06, 1997, e pela Portaria do Ministro da Saúde 3,407, de 05,08.1998, que aprova o

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·. 202 lollCA GERAI. E PROfiSSIONAL

fr.lI1spla lllc l' ",IIIlIHlli.I(ilO ou dbLlt;ào de orgão, (o m função própria , de um or­~anismo para ':la 11I ~ 1:.dado em OUlro e exercer as mesmas funções",17 É também Jwmadodt' l'1I.\n/n \'i/dl . M,lr;a I klcua Diniz o da~sili(a cm ' I . Autotransplante ou IUlO-l'11Xt.:ll i),.\ 11'11l~ll·I .. : IKI.l de órgão ou teCido de uma parle do organismo para

lUlrJ, cOlllndllhl";j flgUlcl d I.> doado r c a do recep to r. É a hipótese da conhecida 'o/Ue ,k sCllt' ,,,, I kpllHk ,k àlllurizaçàll da propria pt.'ssoa , com registro em Seu )mll l lIal li) \' ",' II II ,' p.! ::. d.1 1'l'rIIlIS:..io c0l1cL:did.1 pl'in:, p:li~ ou n,:spollsavd legal. ! . bOI rall :,pl.lIll l' I' .. ) I Lllbpl,lIItC' d e I t:CH.los ou órgãos C 111 gêmeos univilclinus, ou

it:ja, illu i\'ldlH h ll)lll 1<1 (' 111 icos l'il racl crcs genel kns. 3. A lotransplante, ausência de d('rtt ,d ;ld ~' tI.1'- C. II ;h ' trll~ 1 h 'a~ gClléllCIS el1tre dO~l(.I1 Ir c recep tor. -I. Xcnotransplame, ItranskrCIl l"l .1 de u r gí!!1 lHI tccido d e animal para ~cr humano .2t1

_ A I ri kdl:l.!I lJ 1 _H, de (H .02.19Y7, ao estabelcccr a doação presumida dos )rgaos de pC!"J~U. I '" Illtlrt .. b, prcli.'ndcu instiluir a so/idLlricdClde legal c foi bastante :rilicada. 1

'1L) I'l'tlsador Gi lbenode Mello Kujawski observou que a lei , de finalidade

lObrc e humanluna , consagruu a cxpropria(ão dos órgãos do morto. Para ele, "o 1101'1 0 descall!'>a , mas 11,10 descansa da vida (como se diz) ; descansa em si mesmo. \Ir que \'l'1II (I r~Lulo (' se apodera cio corpo, tlissccand<H) órgão por órgão".JO

As cfll iC<h Il' lll'n:: utlralll e (l Executivo eoitou medida proLsória tornando obri­~atôria a consulta a fallulia <..lo falecido para viabilizar a remoção de parcelas de seu :orpo. II E~~~I prm1d C: Ilna pi vinha sendo adOla<..la por médicos providos de consistente 'o llsciê nda 011C.1 . r~HO rcssalrado por Ricardo Dip, para quem a família deveria ser . empre ouvida ' "/\ l~llt1nia do cloadoratuarâ ora como testemunha corroboradora do 'onsclllimCIlI O ou dtsst'lllimen!o, ora agirá como sucessora hereditária".)l

O Icm:l 1i.'~ 10l1 paulicado com o advento da Lei 10.211, de 23.03.2001. Ela ond irl onil li I CII rac.l,t dc tccidos , órgãos e partes do corpo de pessoas fa leridas para

Rcgul.ulH:UIO ., ('[I]lCO ~obrt: <IS <ltividaJes de transplantes e dispõe sobre a Coordenação Nacional de Transportes .

27 ANTONIO CII.-'.\ I \, Dtfl'ilO à vida e ao proprio corpo , p. 213 , apud MARIA HELEN.' D1NIZ , O rSfado afilai .. UI. , p. 329.

28 Idem, p. 330·331.

29 "Tornando· nos Juatlur{'~ universais. estamos apenas co locando a lei em obedi~ncia às Clr(pect31lVilS éti cas c Iflorais dos brasileiros ~ , proclamou o senador Lucia Alcântara autor do projeto da lei 9. -04/97, As razÓes de um projeto. Folha de S. Paulo. 03.02.1997.

30 GU8ERTO OE M I:II() KUJAW~KI , Nota dissonante . O Estado ,Ic S. Paulo de 01 .03.1997. No mesmo t'spaço. oulras crHicas lambém foram lecidas por Jose ARISTODEMO PLNonl Mais uma lei Ctluivocada, 28.01.1998, CELSO RIBEI RO BASTOS e ANORE RAMOS TAVARES' 31.01.\998. . ,

31 A p:J~lÍr d .. M(',lLd,1 P~IlVISÓrt;1 n, 1.7 IR, de 06, 10,1998, DO de 07. 10.1998, reedi­latb IIIUlllcr.IS V"U!. , IIIHllmcnlc , a cdic,:~o 2.0H3-32 loi convertida na lei 10.211 de nOl .2001. DO de 21.03.2001 .

32 RI CARDO HENRY MARI.,lU IS 011'. DIlaçâo post -mortrm: a indispensável consulta à famflia do passivei t1oa,hlr. I/lfaa(clo, 11. 4.

_ .... ~._~ .... __ ..... , _.:. - ;

o BIODlREITO EA BIOÉTICA 203

transplantes ou outra finalidadc lcrapéutica a au torização do cônjuge ou parCllIt ,

maior de idade, firmada em documenlo subscrito por duas testemunhas presentes

à verificação da morte.11

Esta é uma contribuição efetiva da ctica par'! cúnlerir súlw,,:âo adequada a um problema grave. São milhares os que aguardam por um gesto generoso dos sobreviventes, em condições psicolâgicas naturalmente adversas, dispostos a ceder panes do corpo do familiar falecido.

MuilO ainda hã ue sc caminhar para implementar transforma ção 4uc lIau

depende de normatividade, masde renovação da consciência. Embora o Brasil seja responsável por 40% dos transplantes realizados na América Latina , em números absolutos, situa-se cm posição inferior relativamente ao Chile (9,7%), Cuha (8,6%) e Porto Rico (8%) a se considerar a proporção aritmética. Pois o Brasil realiza somente 7,5 transplantes por milhão de habitantes, quando o número adequado seria o de 20 por milhão. Estados-Nação mais desenvolvidosjá atingiram a relação de 45 transplantes por milhão de habitantes. li

I nlcnsificar a efetiva utilização do transplantr é decorrência de uma I"cl1 ov;1çfu)

cuhural, csseneialmenle derivada de nova postura élica. As questões de inrra-cs­trutura scriam resolvidas se houvera pressão comunitária por um sistema de maior eficiência. Tecnologia jâ existe. O que falta é vomade para conferir consequência em plenitude ao que parece derivar do bom senso .

Éque o tema reveste-sedesingulardclicadeza. Envo\vea pretensão humana da infinitude ffsica, a pouca intimidade com a única realidade incontornável da vida, que é a morte. A reflexão de Marcelo Coelho pode auxiliar a desaneslesiaras consciências: "A escolha, como bem disse um senador, e entre fazer co m que os rins de alguêm si rvam para salvar uma vida ou sirvam para alimentar lesmas e rormigas. Entre um vcnne e um ser humano, creio que ninguêm hesitará em favorect:r o segundo. Ser

pilhado 'pelo Estado' e salvar uma vida é melhor do que ser pilhado pelos bichos. É a minha modesta opinião. Mas o problema desse raciocínio é que ele é macabro

33 O parente deverá ser maior de idade, obedecida a linha sucessória . rela ou coLHeral , até o segundo grau inclusive , conforme dispõe o art. 4.° da lei 9 .434. de 04 .02.1997, cuja rcdação foi dada pela Lei 10.211, de 23 .03.2001 , puhllcada no DO dc 24.03 2001. O art. 9 .° da lei 9.434, de 04 .02.1997, com a redação conferida pela lei 10.2 11. dt' 23 .03.2001 , permite à pessoa juridicamente capaz dispor gratuitamente de Icddos, órgãos c parlcs do próprio corpo vivo. para fins teraptuticos ou para transplante em cOnjugc ou parentes consanguíneos até o quarto grau, inclusive. O art. 2.° da lei 10.211 , de 23.03.2001, decretou a perda de validade das manifestações de vontade relativas ã retirada poS! mortem de tecidos, 6rgl1os e panes, constantes de Carteira de Identidade Civil e da Carteira Nacional de Habilitaçào, ;l partir dt:: 22 de dezcmbro de 2000.

34 A fonle é o Dr. MARCOS !JJNA, médico, R~'S('arch jdlpw da Harvard Medical Sl hoo l, assessor da comissão de transplantes do Ilupes/UHla, D(m~'do de urgdos presumida. OESP, 04.02.1997 .

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'. 04 ETICA GERAL E PROFISSIONAL

crnais. Ninguém quer se imaglllar comido por vermes; ninguém quer morrer. Aí está · lado compreensfvel das rcaçOes ao projeto. É que as pessoas se vtem proprietárias !e si meSlH;'\S, ilte depois da monco 'Meu rim! Meu coração!' Esquecem que, depois le monas , o (orpo não será mais propriedade delas L.) . Todo o horror diante do )rojelO é, na verdade , o horror a contemplar a própria mone" . ~~

Meditar ~uhrt: a morte não é algo nocivo para o ser humano . Dessa medita­ào poderâ frutificar uma correçào de rumos na condu la. Ela demonstra apego a nesquinhan <l!:l, J arrogãllcia , prepotência. insensibilidade? A vida é uma aventura 'ápida dem ~l:::' para ~c perder cm quireras. O corpo ê impunanlc , mas é parcela, lpenas , de lIm:! c() lllpl~xidadc rnullO mais abrangentc, que é o ser humano,

PtHH_kn.:-!>l' qut: 11:1 0 e apenas em rtlac.:ão ao~ 1lI0 ri us que o tema interessa . llá lossibiliJaJe Je remoção de órgãos e tecidos de pessoas vivas, São frequentes as loações entn: f.\lllilian.'s, prova do avanço da medicina e também de certa densi­icação da ~olid;1riedaJL'. Alinal, é preciso grande desprendimento para se privar le um rim, por eXL'mplo , p;tr3 d O<i -Io a quem dele necessita, Mesmo ao se tralar de 3milial'. O desapego é llI,tis (omUIll entre pais c filhos . Os pais amam incondicio­tall1lCllll' ~l' U~ filho'>l' , ~e pudessem, lbriill1\ não apenas um órgão, mas a própria ' iua para sah'<1I' ,1 cria ,

Com o intuito de prupiciar reflexão maior sobreo tema, invoque-se ainda uma 'ez o magisler io de Maria Helena Diniz , para mencionarsuas recomendações ante a rescen te i Illl lOrtâllcia do tema JL' t ransplanles . 1. Para ela, o lransplante represen ta :rande ri ~co, [)eve ser le\ ado a efeito somente: quando for a única alternativa. 2. A quipe medicu-C1 nlrgica deverâ ter muita experiência e sólido conhecimento. 3, :ormação de C(lllil't.:S espeCializadas não só para a cirurgia, como para o pré e pós­Iperatôno. 4. O diagllostiCo da realidade da mUTle do doador deverá ser seguro e enu, 5. A finalidade precípua uo transplante deverá ser o bem-estar do paciente, I. A eleição uo uoador deverá basear-se nas perfeitas condições do órgão ou tecido toado e 110 estudo imunológico da sua compatibilidade com o receptor. 7. lnexis­ência de disl:fIlHiní.\c.;ào na esculha do receptor. 8. Obtenção uo consentimento lo doador ou de sL'u~eprL'sclltal\le legal. 9 . Co nsentimento livre e esclarecido do cceptor, pois impos ivcl dispor de sua vida sem alertá-lo dos riscos cirúrgicos e ondiçóes de éxito. O. Boa preparação psicológica do receptor e até mesmo do loador, quando ~e tratar de transplante inler vivos, II , Gratuidade na doação. Trá­ico de órgãos é cnme. 12, Garantia de sigilo, rccomcndâvcl até , em certos casos, Ireservação do anonimato do doador. 13. Imposição de responsabilidade civil e )enal da cq\lipe méuico·cirúrgica pelos danos advindos ao doador e ao receptor, !lesmo que Il' llha ha\' ido anuência dt::les,l6

35 M,>, IHJ II) l.1 'I t!l, l, A Joa~·.h) d~ org;lUs e o horror à própria morte , Folha de S. Paulo. 29.01.l~Y 7

36 MA RIA 11 1.1 E' .... DINIl, O t·s ttU/O aruaf . d i , p , J 13- 315.

O BIODlREITO E A BIOETICA LO)

5.2.4 Eutandsia

Morte, a unica certeza para os vivos, Ame a inevitabilidade da morte, seria natural que as pessoas pensassem mais nela. Aceitassem-na como fato natural , culminância da existência, Passassem a se preparar para ela.

Não é o que acontece, ao menos em regra, Existe um temor até inconsciente em relação à morte. Vive-se como se ela não existisse . Tema-se camuflá-Ia. Nada obstante todos os dias ela se maniresta, Leva pessoas queridas e leva pessoas ues­conhecidas. Leva individual e coletivamente, Estes últimos anos lêm sido pródigos em enormes tragédias, com a eliminação simultânea de milhares de vidas. Resposta natural para o crescimento indiscriminado da população mundial?

Ao homem não é dado dispor de sua vida. Precisa mantê-Ia elll t:ur~o , nll ll

a higidez possível, até que a ceifadeira venha colhê-Ia. O que é .inexorável. Por isso é que o suicídio não é aceitável C só não se pune quem o praltca. por abso.lu~a impossibilidade, Ausente o fenõmeno vida, inviável qualquer espéCIe de puolçao para O morto. Ao menos no momento histórico em que se vive.

Já a indução ao suicídio é punida. É crime previstu no Código Penal. n Fácil e compreensfveljustificar-se a punição, à luz da tutela a vida, Tomás de AqUinO la afirmava no século XIII: "( .. . ) a vida é uma dádiva de Deus dada ao homem e e~IC submete-se ao poder daquele que 'mata e faz viver' (compare DeuteronOmio 32,39). Quem, portanto, tira a própria vida ofende a Deus; assim como aquele que mata o escravo de outrem, ofende o senhor a quem o escravo pertence; também , .co,mo aquele que se arroga de uma decisão sobre uma coisa a qual não lhe é conlenda . De forma que a Deus somente penence a decisão sobre a vida e morte, segundo Deuteronômio 32,39: 'Eu sou aquele que mata e faz viver'" '"

A ninguém é dado dispor da própr ia vida. Menos ainda, da vida alheia. O pré-suicida precisa de auxílio. "Em muitos casos, um ato de suicí~iO tambél~l é um grito de ajuda para indic-ar que o suicida não quer a morte. e. Sim, uma Vida sob outras circunstâncias. "39

Não convence a explicação de que o suicídio reside na aULOnomia ua vontade do suicida e desmerece repúdio ético, O primado da vida faz tornar reprovável qualquer ato contra ela praticado. É comum encontrar-se na literatura a expressão

37 An, 122 do Código Penal. Induzimento, instigação ou auxilio a SUicídio, "Induzlr ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar.lhe auxilio para que o faça: Pena - red.usão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de I (um) a 3 (tres) anos, se da tentativa de suicldio resulta lesão corporal de nalureza grave~,

38 T OMÁS DE AQUINO, 5umma Theologica, 11 -11, q. 64 a, 5, O Papa Jo.~o P,>,UlO II qualificara o suiddio como "um ato gravemente: imoral ~ , na Enclclka Evangchum Vilile, 1995, Cap, 111. parte 66.

39 HEINRlCll GANTH,>,I FR, O direito à \lida tia medicina - Uma investigação moral c filosMil3, p.28.

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206 ÉTICA GFJ<AI. E PROFISSIONA l.

~ Ili ( ic]ioll\\/\f1do c m qUl'.1 II hJrtC C I ruto tia vO lllilJl: du ~ukÍlla c por ele praticada , ~oh Orll'n l ;u,.ltI 011 ,lllXlho dt: Icrn: lrl) , geralnu.'nH: IlIl'dll"o.

O ll: IIl<l t<lI llh~m IL ves tl' 1I11cn:s::,e ético ao se examinar a problemática da eu­t;U l,bi,1 l'ala · ""l' l' IllllU xIII O (/ nlOrlc o u ellt(ullhia sem IHulla propriedade terminoló­gica . "Na~ r('glõ('') de UOTllI 11 10 da hngua alemã, sobretudo com relação à expressão cutaná~ia . qUl' <,:í lTil c l tnza , segllndo o radica l grego, uma bela ou suave morte, formou -se UIJ\ pcr~ l ~ tcIllC I.'UU devido a seu uso es tar relaFionado ao genocidio d I.: PCSSO;lS dt..'hcir ntes, pralH:aoo pelos nJZisLas. Na literatura alemã, a expressão eUlanasia foi 3m pia 111 C Ilt c sub~t it uída por 'auxilio â morte' -' ,, ~ o De qualquer forma , e las sãll int e rLJmblí.1Vci ~ ou sinónimas.

Ouvt;-~r a L'x pJ'e~s;\o "Illone com dignidad e" para caract erizar a eutanásia aUva , tall1hc rn dt: ~ ign,tda bt'ncmvrtiÍslQ ou sanicidio, que para Maria Helena Diniz não passad c lh lllliL"lllio l: lll que , por piedade , abrevia-se a mortede doente terminal ou cm co ma irI evLT'ilvd .

Au xillO:\ I1lnrt r ou 1,:11I.1I 1:ls i~ , 110 cO\llexln medico, ê "Ioda ação ou omissão que lenha pt II IlIn .Ihl t'\ 1.lr;l vida de um paciente para evitar o sofrimento ou na qual se aceila a rcdu,'all da vida de um padenle com o fim de evitar o sofrimento" .~I Ela pode ser vo ll1ll wriJ - rcsullõ\nlc ue exigência ou ucsejo expresso da pessoa capaz de decisão - {' Ill vollllllaria - aquela sem exigcncia , no caso de pessoas incapazes de decidir PL·:,~,I.L~ iIlL·u n~c jL'IIIi.' S ou que ,,'-io l'~I<i,1 elJ\ cl)J\dit\"'õe~ de cl\lenuer í.t decisão entre vida c morte.

Ortown"!'l ia ou IX\raclltanásia é a ajuda oferecida pelo médico ao processo nalural da morte . Oa-~e com a suspensão de medicamentos ou de outras provi­dências qu e a longuem a vida do pacienle. E tambem chamada eutanásia passiva, ou t'utalJ(lsill 1'0 1' omissão, enquanlo a ctllanásia cm sentido estrito é a eutanásia alivel . Concei tua -se ortolanjsia comu "o ato ue deixar morrer em seu tempo ceno, sem abreviação o u prolongamento desproporcionado , mediante a suspensão de uma medida vll;1I nu d i.' desligamento de máquinas sofis ticadas, que substituem e con tro lam ó rgaos que entram cm disfum:ionarnenlO".H

. Exislc ainda .l dislfllldsia , o u "bslinaçllo Ic rapclIl;cu ou, ainda futilidade médica . E o prulungalll l' nto ((;, vida mesmo com o sofrimento a lroz do paciente, Visa pro­longar a Vida vcgclilliva ou a lentidão do processo rumo à morte . Há quem condene essa prática . por se (OnSlilllir em método inútil de se adiar a morte, infligindo ao padentc c a ~lIa blllllia J llguSI iill~ dores. Além dos a~peclOs prál icos dos dispendios desnecessários c irrecuperáveis.

40 !l I;INMIUI LAN IIIAL Ht , U tltn:lw â vida na medicina - Uma investigação moral e filosófica, p. 29.

41 Idem. p. 30. 42 MARIA H ELeNA DINIZ. O eSfado aflUi! .. cil., p. 393.

o BIODIREITO EA nJOÉTICA

Sob O aspecto é tico , a problemática admite qUí.tITO ponlo~ til' vbta e.ssem.: i.tb. O primeiro. e adoulrina da sClgraçãoda vida em sentido r.lifriw, para a qual nenh ullw das modalidadc~ de eutanásia ê aceil<lvcl . O ~l'gHl1(h, e a ,IOit/r illa do S(l,g r(l((/t) tlu vida em sentido moderado e corresponde às concepções ético-medicas hahituais. Ou seja , proíbe-se toda forma de eUlanJsia dircI3-<:ltiva , bem co mo IOda forma de assistência ao suicídio. Mas, sob cerlas circunstâncias , permite-se a eUlanâsia indireta: deixar morrer um paciente no sentido da eutanás ia-passiva.

O terceiro pomo de vista ê a posiÇãO liberal moderada, a permitir a eulanasia indireta-ativa ou deixá-lo morrer no semido da eutanásia passiva, mas 'também permite o suicfdio do paciente. Mas proibe se preste a um paciente assistência ,10

suicídio ou se pratique a eutanásia direta-ativa.

O último e quarto po nlO de vista ê a posiçãu jOllemcllI e liberei! permite a assis­têncir: ao suiciuio e também todas as formas de eutanásia , inclusive a direta-ativa , ~ l

Em termos éticos, apenas as duas primeiras posiçõl:s se riam admissíveis. As demais colidem com o valor insuperável da vida, (ondição para o estabelcdmclllo mesmo da esfera axiológica. Vida é prcssuposlo a que uma co isa possa ler valor. Nada tcm valor para um sujeito sem a vida dele .

Mencione-se, ainda, a ordem de ndo reanimar, ou seja , ni10 temar, de todo~ os meios, ressuscitar aquele que leve parada cardíaca ou respiratória. Deixar a morte atuar naturalmente. Sabe-se que a parada cardiocirculatória não significa ainda a morte lotaI. Mediante uso de equipamentos, pod~r-se·úl m:'ltllcr UIlI quadrodc sillais vitais do paciente. Mas alguns há que previamente intercedem juntO aos médicos para que não sejam artificialmente reanimados . Em hospitais do primeiro mundo é comum se coloque à cabeceira do paciente com mal incurável a indicação DNR (do not ressuscitate) ou TBR (n01 to be ressusdtated).H Quantas pessoas, cm final de percurso de longos padecimentos , imploram ao médico não as conduzam à UII e as deixem morrer no conforto doméstico?

Por fim. saliente-se o conceito de hospice. ou filosofia do asilo. É a imple· mentação da medicina humana e paliativa. Ajuda a pessoa terminal a morrer com dignidade, atenuando seus sofrimentos e dores, de forma a fazê-la aceitar a pas­sagem com tranqüilidade. "' Para a filosofia do hospice : a) deve· se aceitar a morte como episódio natural do ciclo vital; b) não se dt!ve antecipar, ncm prolongar a vida se a morte é inevitável~ c) o paciente deve fi car unido a seus familiares ~ entes queridos; d) deve a equipe interdisciplinar cuidar da dor psicológica. espiritual e ftsica; e) o objetivo clinico pretendido é controlar a dor e atenuar os sintomas da moléstia; O deve-se darassistcncia ao paciente, independentemente das cOlltli~:ues

de pagamento.""

43 HEINRICH GANTHALER, op. cit., p. 32.

44 MARIA HELENA DINIZ, O estado atuai ., cit , p . 407 .

45 Idem. p. 410.

9

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208 ÉTICA GERAL E PROFISSIONA L

Pensa r n,\ mone deveria ~er exe rcíciu diár io. Exatarnen te porque Se morre é

que se p()d~ c-nlllerir intensidade a cada dia que se vive. Cada dia vivido é um d ia a menos n;! uajelnrialcrrt'na. Ningucm deixa rá de morrer. E a mais democrática das ocorrencias para LI hurnJnidaue. A inseparável, a in evitável , a indesejável está aí, à cs prcJt,L Vi ver com élIca e pensar sohre o que se acumula nesta breve trajctória Itrn:llJ e devLr ético que , hem exercido , faria C0111 que as pessoas se

relacionasselll Illt.:lhor. Dei xassem as insignificâ ncias c o supérfluo para pensar no fundamental.

Hoje, !{>sc a n.:spdto da mone suave, da mone digna , como se fora lema 10n­ginquo. Amanhã, a cada qual poderá estar reservado vivenciar essa realidade por si mesmo ou CIll relação a uma pessoa muilO querida. Enrão haverá necessidade de dcfinic,:õt:~ e de adequada (ompreensão daquilo ora exposto, pa.ra que não se acrescentem aTlgú s t ia ~ fi carga já naturalmente cometida a cada qual.

5 .] Engc llh ariJ gr nét ica e gc noma humano

Denomina-sl' engenharia genética o emprego de técnicas científicas preorde­nadas a modificação da constiwição genética de cêlulas e organismos, mediante rnanipulaçüo de gt.::ltl'S . ~ h

O genoma e o onjunto de in rormações contidas nos cromossomas de uma célula . O DNA - ,k do desoxirribonucléico - possui a mensagem genética indi­vidualizado ra de cada ~cr. A elucidação do DNA veio a demonstrar que todos os

homens são m uiLO mai s semelhantes entre si doque diferentes. E que , na realidade , não há lanla difcr(' n ~' J entre a criatura humana e as demais espécies de vida . Fato

~ut: Jevcn .t !Illphur nll 1ll:lior humildade do g~n('ro humano, convicto de sua un ipotêll<' 13 c cada Vt.:Z llIab Je~t ruiJDr da hiodivt:Tsidaue . Ai incl uldo o processo de deSlrUl(ã o de se u proximo , seja mediante a violência em sentido estrito , sob muitas modalidades , seja mediante a violê ncia da indiferenc,:a e da insensibilidade, a matar hU[1l('opaticamentc o semelhante.

O DNA rcco mbinantc c o rransgên iw , o u o OGM - organ ismo geneticamente modificado , tão polêmico em suas manifestações, mas do qual se aguarda uma nova realidade para o ucsvcndamento de tantos mistérios da biologia humana.

A modilicaçâo laboratoria l do genoma de uma célula viva, é um dos desafios da engenharia gené tica. Ela permitirá a identificação , o isolamento e mesmo a multiplicaçãO lIas ge nes. "Ê uma tecnologia ur ilizada em nivellaboratorial, pela qual o cientis ta poderá mod ificar o genoma dc lima célula viva para a produção de

46 SUZUI-:l (! I\. N\I]J [ ~ON , Gt:l1 eIICQ - Conflilos entre a engenharia genélica e os valores humanos. Madrid, Tecnos, 1991 , p , 103. apud MAR!A HELENA D!NIZ. O estado atual. ,ctt., p.447. I

O BIODlREITO E A BIOÉTlCA 20')

produtos quimicos ou até mesmo ue novos seres, ou seja, de organismos gCIIl'l i­

cam ente modificados (OGM)."i7

Criar transgênicos hoje é previsto em lei - lei 11.10512005, an o 1.", IV c V, §§ 1.0 e 2.° -, mas isso acarreta mais dúvidas éticas do que certezas. Alguma~ das illdagações de Maria Helena Diniz são instigantes: "Haveria, nessas técnicas , ve r­dadeira melhoria na qualidade de vida no momento presente? Garantiriam elas uma existência realmente digna às futuras gerações? O ser humano, ao empregar a biotecnologia, não es taria assumindo um risco à sua saúde e sobrevivência? Seriam tais técnicas biotecnológicas responsáveis pela preservação da vida para o futuro da humanidade? Estar-se-ia respeitando a d ignidade humana ao fazer experimentações com material genético humano? Não violariam elas o direito de todo homem de ser único e irrepetível se a clonagem de ser humano tornar-se uma realidade? Como garantir a preservação da privacidade de um patrimônio genético se ele for violado ? Como admitir juridicamente uma seleção hipotética de pessoas, fazendo com que tenham alto nível intelectual, sejam dotadas de grande força físi ca ou tenham determinada contextura física ? Tais avanços biotecnológicos não nos levariam a um perigoso e arriscado caminho sem retorno?""S

Somente a comunidade científica, em conjunto com o pensamento humanista , poderá responder a essas questões. Por enquanto, deveria inspirar os cientistas o princípio da precaução. Evitara experimentação genética, limitaua esla à utilização de material não humano. Caminhar com cautela e segurança num terreno ainda inexplorado e que poderá reservar surpresas não desejadas pelos exploradores. Não se descarta a intervenção do Direito Penal , pois os organismos geneticamente modificados com cenezaafetam a vida humana . Na visão tradicional , o crimcafeta uma vítima. Os "delitos de biossegurança (ans. 27, 28 e 29 da Lei de Biossegu­rança) ameaçam todo o entorno ecossistêmico (vida humana, vegetal, animal e respectivas interações)" . i'l

O Projeto Genoma Humano - PGH é um enorme empreendimento ciclltifico iniciado no final do século passado e que se encontra em plena expansão neste século XXI. Genoma é a coleção de genes de uma espécie. Há uma enorme expec­tativa nesse experimento. "Após 13 anos de pesquisa, a ciência obtém a seqüência completado genoma humano. O mapa está completo, falta ndo apenas a idelllifica­ção da localização de cada um dos genes e a função exata por eles desempenhada. Com a decifraçãO do genoma humano, a próxima etapa é o proteoma, ou seja, a descoberta e a sistematização das proteínas codificadas pelo DNA. Com o mape­amento do genoma humano, a expec tativa de vida será de 90 anos, as doenças serão diagnosticadas antes do surgimento dos sintomas, mui tas pessoas poderão

47 MARIA HELENA DINIZ, O e5tado aluai .. cil. , p. 449, ao cilur a Lei de Biossegurança, Lu Feder.11I.105nOO5

48 Idem, p. 450. 49 D ENISE H AMMERSCHMIDT, Transgtnicos e Dire.lto Penal. RT 853/411 . J O

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: 10 ÉTICA GF.RAL E PROFISSIONAL

cr gene! ica l11l'1H 1? I11nu IfiLadJ.s e O~ pat:iclltcs cum moléstias graves serão lralados Oln recellas adequadoib a sua constituição genética. Com isso, deverão advir leis [ue evilem a di-,cnmlll,lç5o genética c LI criação de uma subclasse sem direito á ssiSlência Il1 CdIGt , a seguro saúde ou de vida, ao emprego etc., em face de suas olldi\ .. ó('~ gt'lll'l II iI'-. '''>11

E CXlrf'II1:lllll' llIl' vc luz. o nlnw d,} evolução nu campo da biolecnologia e da fio~scguran\a. Em 1973 , descobriu-se o DNA rccombinante; em 1975, rcalizou­e a Co nfcrt: llu a dI' Asllol11:\r - primeiras recomendações de biossegurança; em 983. o prilll cilo produto rrcolllbi nilnte - a insulina produzida em Escherichia oU: CIIl I LJH5 . I) dl'~CIlV()lv l 11 11.: 11 to ue plallt as ge nel ica mente modificadas; em 1992 ('a l izoll~sc a ( :onlc rcllc ia Rio ~42 - UNCED -Agenda 21, cujo art. 15 adota O Prin­fpio Prc<':<lUI O!"lo ; }lN.) /"\) i (l ano da ratifi ca<;'-io da cnnvenção sobre diversidade ,jo!ógira ; e 111 100'3, a LCI de Biosscgurança 8.974, de 05.01.1995 , mesmo ano em ue tiveram ini cIO os culllvos comerciais de transgénicos no mundo; 1996: UNEP Cuide/nus suhn: a hio~scgllraTH:a de OGM.; 1997: reunião das Panes da CDB e

(citação da l JN I:P - GuieJdines; 1l)9H; aprov<lç.:fto da soja RR para comercializa­ão pela CTNf3I (); 2000; proposiç .. 10 do PrOlOcolo de f3iossegurança - movimento 'a lls fronteiri ço de OGMs; 200 I: desenvolvimelllo de plantas GM de 2.' geração. "m melhor qualidade nUlrirional ; 2003: entra em vigor em 11 .09 o Protocolo de iossegurança ; 2004: r ultivus Iransgênicos atingem81 milhões de heclares; 2004: esenvolvime nt u de Plantas Geneticamente Modificadas de 3.' geração (fármacos); 005: aprovação do algodão Bollgard resistente a inselOs (CTNBio) e nova Lei de iossegurança - 11 .105. de 24 .03.2005"

A riêl1ci:l :-,(111 1) rc av,lnça m:lis rapidamente doque a normalização. Numa fase c esgilrçamelllo moral , é imponante que se procure fazer incidir o princípio da ignidade da pes~oa humana sobre todos os experimentos c que o fim econômico as projelOs não ofusque a visão dos limites éticos. Diante dessa indissolúvel rela­io entre gcnétka lo: moral , não há como d esconsiderar lcmas os mais desafiadores oSlOs à pondera\'ão da comunidade dos pensadores de todas as áreas. Uma vez nda a recorrer à lucidez de Maria Helena Diniz, ê de se questionar: "(. .. ) em que ledida se poueria a tingir O bem da human idade por meio de emprego de técnicas ! engenharia genetica? Como acatar juridIcamente experitncias geneticas sobre i corpos das pessoas em situação de vulnerabilidade, em nome do 'bem-estar' ;a humanidade? Em que condições a privacidade gcnética poderia ser violada n benefício da saúde alheia ou da humanidade? Como será possível a avaliação )5 resultados da experiência genética se seus efeitos, em regra, manifestar-se-ão

iO ANllItI W SIMI''otIN . CI AII<I FII .""I!!~' bUI I JIII.Nt,'> 1 ;.qltld MA!!tA 11I 1l:NA DtI'lIL , O cstllclo aluaI... cit., p. 455.

ii T OMAZ I .AIIINtol\( II, LI nA C. MI NP()N~ ... ~H M;lI'. C Rt:("INAI DI) MINA !!!;, A biodiversidade e os marcos legaiS I.h: hio~wgurallça para a biotecuulogia molecular. Dimensões humanas da biodivtr sldadt - () desafio de novas re lações socicdadc-n:uureza n o século XXI, p. 146.

O BtODlREtTO EA BIOÉTICA 2 11

em gerações futuras? Quais os critérios determinantes dos riscos e das vantager~s de uma experimentação genética? Poderia o homem ser produto da engenharia biológica? Será possível a criação de um ser humano biodeterminado? Pod<r-se· ia admitir a interferência no código genético para eliminar moléslIas? Dever-se~la incentivar a terapia gênica em embriões, nascíturos ou recém-nascidos? Quais as enfermidades genéticas que deverão submeler~se adiagnóstico pré-n~tal , tendo ~)nr fim interromper a gravidez? Seria admissível o aborto eugênico? Qual~ as fron~e ,ras da eugenia? Quais os limites da pesquisa voltada à alteração genOtlllca de relulas getminais? Quais os princípios norteadores da alteração do g~noma .de_ un.l ser aInda não nascido 7"52 As perguntas não cessam. Na verdade, são InlerrnmavelS e outras tantas poderãO ser extraídas da mera enunciação dessas dúvidas bem concrelas.

A Lei da Biossegurança hoje vigente - 11 .205/2005 - . veda. no seu arl. 6:". III , engenharia genética em célula germinal humana , z.igoto h~l1l.ano c l'mhnao humano. Mesmo assim, não estão superados, ao cont râno , mulllpllcam-se os pro~ blemas ético-jurfdicos resultantes da velocidade com que as descobertas se fazem c as tecnologias se aperfeiçoam. Já existe condição para t~staras pessoas e (kln:tar ne las genes deletérios causadores de enfermidades jnconv~nienles para o mercado de trabalho. A partir daí . poderão ser elas excluídas dos empregos e dos planos de saúde e de seguro de vida. Como é que se conciliará o conhecimento integral da infonnaçào genética. quase um mapa de desvendamento do futuro da pessoa e a proteção de sua dignidade e de sua vida?

Adiagnosegenéticajâ produz imensos benefícios na área pré-natal c a terapia gênica é uma realidade. Essa técnica, também chamada gcneterap~a, "visa a trans­ferência de informação gcnética, ou melhor, de genesde um organismo para outro para curar ou diminuir distúrbios, molés tias genéticas ou mlo gcnélicas".~j Já se pratica a terapia génica de células somáticas humanas do paciente. em qualquer fase de sua vida. à exceção da pré-embrionária. para curá-lo de uma enfcnntdade. Isso não afronta a ética. Mas a experimentação que se quer fazer com os embriões? Eles são pessoas humanas e pessoas são fins , nunca meios para a obtenção d e ou~ros fins, por mais nobres que estes possam ser. A terapia genética de células gcrmtna­{ivas ocorre na fase pré-implanlatória, quando o zigoto apresema algumas ccllllas, ou antes da fertilização . Aqui , deveria atuar sobre o espermatozóide, o óvulu ou o prt-embrião que ainda não atingiu desenvolvimento celular d!ferenciado. O obje!ivo de corrigir urna anomalia genética já não é solução eticamente pacífica. Aqui já ocorre alteração definitiva do genoma . Altera~se a pessoa. Cria-se uma nova identidade genética.

A engenharia genética se vincula à idéia de eugenia, que passou à história recente como a tentativa de se conferir pureza à raça . A idéia eugt!nica, em si. não é

52 MARIA lIt:l.l:NA DINll , O estudo utlHlI .. de , p. 464 ·465.

53 Idcm, p. 474. /1

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.• 2 I 2 ETICA GERAL EPRDFlSSIDNAL

nefasta. E a in[en~ãodc se ulilízardo conhcci melllo cic l1(ífico ecle medidashigiêni­cD-sanitá rias para gerar filh os saudáveis.Já a "eugené[jca e urna tecnociênciagerada do encontro entre gellé tica, biologia molecular e engenharia genética. Pode ser negativa , se \'o llada para a cura e a prevenção de doenças e malfo rmações genéticas, ou positiva , se ouscar a melhoria das competências humanas, como inteligência, I~ cmõ:la, cria ' lvldalc, traç?s do ~aráter ou outros característicos psicofísicos". ~i EugcnIsmo , por ~ua 'CZ, é lorma Ideológlca c utópica de eugenética, ou a certeza de que os gcnt~ (on. idcrado5 maus ou inconvenientes, possam ser trocados por gCIll:S CU II !'>l dt' l :.Idu,> bo ns, dl.' ,leordo cu m u pun l o de vista do intt!ressauo.

O ~on h u dI..' Ulllil humallldade pcrh:ita , conform ada a padrões físicos impostos por uma vOl1lad~ prcplllldcrallte, não se ria impo~sív cl pMa a ciência. 50 que isso ~ inadlll] .... ~ I\"d l'[1l It'lllln~ (>tll·lh. i\ plllralidadc e ii IH.' Il"ft>gc llciuade con~ lilu em a · Iqlll..'za d.II..' .... 'll·Ul· 11l1I1l,IIl<l . lJma CtJ lllullluaut: robor izaua, ainJa qu e fi sicamente .em tkk ll {l::" II,IU n'p ll'~C lll afla o l:O!l~p lexo Ue diversidades de ~ue se co mpõe o ~êncro h li II I:l 110 .

:\ telH.lllv.\ IlIlIlI.lIl.! de ln ,,,, ar(!t- IJfU~ não c Idlcxo da onipolênda com que >rc~tlnço::"H111'n IL' alguns se l:om ponam , Em sua granulosidade. o Projeto Genoma -Iuma no de lxuu Cril ahl..'rto Oiuitas questões. S Ui.1S buscas fo ram insuficientes para espoIlucr "pU I que apCll,b 3~) dos genes exercem uma função específica (codi­ica ntc) c por que O~ restJ. m es 97% são não cod ificant es, ou seja, aparentemente l1úteis. Mais : U~ ( 11..'111 i51<15 411e respondt ram pclo m ega projclO chegaram a falar de nancira depr~(t.llivJ. do~ 97% de ge nes não codifica ntes, referindo-se a eles como ixo genel ico '. Ilojt', ape nas quatro anos depois do encerramento do megaprojeto,já e sabe que ac.{Ildc 'li xo' carrega ul l1 s igo uma gigamcrnôria que possibilita recompor li iSlória C\) llI pil.'t.\ de IlIll i ndi vicluo t' da cspêcie tanto para o passado quanto para prc~cntc qll ,ltllO pal íl u futuro (. .. )" . ~~ Desl:u briuMse tambem que o numero de

cnes mIu !)i.lu I l)O Illil , Illas m e llOS doquc 20 mil na cspécie humana. Além de não er o 1101I~el11 lao difcrl: IHl' . d (~~ seus semelhamcs, não.é l a ml;>ê~l muito difer~nte a~ demais c~pCl: le ~ ;lIl1llJ a IS. Isto sugere que, por maiS marAvilhosos que sejam, enhul11 do~ rm.:gaprojelOs conseguiu descobrir tudo, muito menos organizar o it:lvo diada Cria,:ão. Um longo caminho já foi feito . Um caminho be m mais longo moa d eve strpercorriuo para se chegar verdadeiramentcao lesouro que comanda ão apenas a \ idJ humana , mas todas as formas de vida . "$O

Os riscos de p red ominãncia da lex mercatoria são evidentes, Steven Rose bserva que , ··em I Y90. quando o Projeto Genoma Humano (PGH) foi lançado,

)4 FERMI N ROI.ANO SU!llo\MM. Eugcnia. eugenctica e o espectro do eugenismo: consideraçóes atuais sobre biotccnociência e bioetica. Bioécica, v. 5, p. 203· 204, apud MARIA HELENA DINl z, O nwt1() (/lua l . cil.. p. 4H4.

>5 ANIO/'o.l( l M lhJ II (' Al'.tJlu MAIlLlJ () M SO .... llh, BiuCl i( U - Du ctJnsenso ao bom se nso, p. 175.

,6 Idem ,lhIJ t'1H

o BIDDlREITO EA BIDÉTICA 213

agências de financiamento dos Estados Unidos e Internacio nais - ~o contrario dos financiamentos privados contra os quais elas estavam competIndo - ado­taram O passo sem precedentes de reservar cerca de 3% do orçamento do PGH para pesquisas sobre o que eles definiram como as implicações éticas,jurfdicas e sociais do projeto. A sigla gerada por isso, ELSI (Elhical , Legal, Social ImpllcallOlls - Implicações éticas, jurfdicas e SOCiais), entrou para o dicionário dos bioéticos (embora os europeus prefiram substituir o T de implicações por 'N. de aspectos). Assumidamenle, alguns daqueles responsáveis por delimitar esses financiament os tinham motivos ambíguos para fazê· lo. No centro do projeto inleirv ~stavaJamc5 Walson co-descobridor da estrutura do DNA e durante meio século a eminência parda d~ biologia molecular, que, com a brusquidão característica, se r~feriu a i~so como uma maneira de cooptar os ciemisLas sociais e os éticos e, aSSim , d t.:~v lar possiveis criticas". H

O ncurocientista Steven Rose , autor do clássico da li leratura contra o d etc rlll i­nismo biológico - NO! in Our Genes - Biology, Ideology, arul Hum"" Nalu" (1984), é cético em relação a tais estratégias. É que o ritmo da pesquisa genética e a falta de qualquer (oOlrole nos projetas das empresas de biolecnol~gia é extremamente acelerado, ante o formalismo burocrático dos Comitês d e Etica. O único s inal alentador é o surgimento de um novo termo na literatura bioética e filosófica : a neuroética . Ela se propõe a discutir as implicações da gené tica do comportamento, os intensificadores ue cognição e estimulação cerebral, com abertura para outros temas nessa área em contínua e profunda mutaçào.

Asquestões levantadas "vão desde o mais amplo ao mais especifico. É possivel, por exemplo, inferir algum código de ética universal a partir de um conhecimento dos processos evolutivos? Quais os limites entre tem pia c melhoramento - e ~crá que isso importa? Até que ponto a b'iotecnologia pode ajudar na busca da felicidJ.d e? Pode-se - deve·se - tentar evitar o envelhecimento, e até a morte? Até que ponlo as provas neurocientfficas podem ser relevantes , ao consiuerar responsabilidade jurídica para crimes de violência? Deveria haver controles quamo ao uso de inten­sificadores de cognição por estudantes que prestam concurso? Sobre que questões os governos e entidades supranacionais devem legislar?"sg

As novas gerações enfrentarão o mundo novo e não se pode ter garallli.l ab~ soluta de que ele será admirdveJ. A fi cçãO cienttfica, a cinematografia futuristica , as previsões dos que se arriscam a desvendar a incerteza do porvir podem sugerir algo. Há uma vasta bibliografia disponível, assim como alguns filmes se prestam a motivar a meditação a respeito. Pense-se, por exemplo. em Elenzal 5unshinc oJ lhe SpodessMind (Brilho etemo de uma mente sem lembranças), de Charlie Kauffman , lançado em 2004, sobre a possibilidade de uma companhia de neurotecnologia

57 STEVEN RO:>l: , op.dl.. p. 326

58 ld,m, p. 327. ,.,

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214 ÉTICA GERAL E PROFISSIONAL

- Lacuna 1,1( . - se cspct..:iaIIZJ.r cnl <lpagar kmbrallç<ls indesejáveis via estimulaçào transcraniana do cérebro. Área de extremo interesse para o continuo reescrever da História, habito concreto e rrcqüenle da vida pública brasileira.

A ahordagem superficial do lema nàoexaure a sua amplitude e complexitlade. l~ importallte que os ill teressados se abcberem de fontes mais completas e se man­tenham vigilanles, puis o mundo novo chegou. O futuro é hoje. E para quem não prcslar al(,I1(;10 l' pnder \) controle da siluação, o futuro lerá sido OlHem.

5.4 Quesl õcs ti icas na fecundação arrjficial~Y

o inicio do lOilenio propüe verdadeira revolução biológica.60 O homem mo­derno, Illcrcê dü avan\nua cienci<.l l1lcclica c ua engenharia genética, (em condições de procria r de !nrlllit II.-io 1l~1 (li raJ . A tt:cno!ogül ua rcprodllç.l0 levou O Prof. Botella L1usiá a Jl1rmJr que a c ivilização <'SIava a caminho de fazer desaparecer a união

S9 Ilá lilUlbcl1I Lüllllllll ullllza~'üo da expressão fcolllc1ti1;ão asshtida, não artificial, pois seu processo e natural, embora a união dos gameras decorra da intervenção de um espe. Clalista. A~ .... illl, o civilista francês G. CORNU, Droit civil: la famillc, Paris, Montchrestien, 1984, c:Jp . Ir , IlH.: rll.:iollado por MAIH .... JESUS Mm.o AlMARAl., op. cit., p. 50. Na verdade, "se o ovuln feminino resulta feeund3.do no co rpo da mãe pelo sémen masculino intro. duzido de maneira artificial, estar·se·á diante de fccundaçólo natural, F.a.lso, portanto, fabr de fe~lIll daçâo artificial. Igualmente falso falar em crianças artificiais, como ocorre amilülc " (I r l..ull(.H<:, A/Cllkilla y dnedJO penal, apud MAIU .... )I'SÚS MORO ALMARAZ, op. eil., p . 50). lia grandt.: impn::dsfio terminológica no assunto: fala·sc em fertilizaçào rxtmcorp01!'I1 c cm l'u{e/CJ~nl(: si(l, exprt::ss:io utilizada por R. DE VEClANA, La eutelegenesia atiCe d dl 'ln/1O ((//JemiUl, Rarce!ona, Bosch, 1957, p. 26, citado por M .... Rt .... DEJESÚS MORO AlM .... 'Ul, 0r. ell. , p 51, nota 1.)1. Qlu:m se Jl'livcr sobre o aSSUlllO encontrará menção a ma(' (' Fal ,~(' IIi'(J Uh, aqudl'~ que fornecem suas célu las germi nais, Mãe portadora ou gl'stanu é 3 que suporia a gravidez:, seja ou não a mãt' It:gal. Pais legais são aqueles assim conSiderados pelas regras jurídicas da filiação . De fecundação anificíal se distinguem outros pwn'dimCJllos: 1. A partenogCr\('se, iSlO é , () desenvolvimento do ovo sem preven. tiva fccundac;iio , alraves da segmentação do ôvulo com est ímulos elélricos ou químicos (fenómeno qut:: por ora não parece passivei no campo humano); 2. O transplante de 11m ovo f"ccu ndado dJ. matriz de uma mulher a outra; 3. A fecundação exrra.uterina ou iI! vifro; c 4. Os cxrcrimento~ de inseminação anificial voltados a estudar os efeitos do cruzamento enlre o ser humano e animais irracionais (FERNANDO S."NTOSUOSSO, op. cit., p. J).

60 O fenômen o (h! HI~ /'lIIilw~eio wlifl(Ía/ não é recente. M .... IHAJESUS M ORO ALMAR..U (op. cit ., p. 26) faz um exame da e\lolução do tema, com início há vários séculos. Os primeiros tempos constituem a fronteira entre a realidade e <llegenda e. mais tarde, uma primitiva etapa exp('rin1('lIIal Panl. quem tiver interesse , examinar também R. OE VEClANA OE LA

CUAORA, 1(/ ""ldCJ'/li'Sicl C/n/c: d d.-:n-cJlO ((món;co, Barcelona. Bosch, 1957: T. HERRERO DEL elll Al-" I. 1(/ 111WH III/lI Wn IlI"Ii{id,,/ hUnllltltI tulft: ("/ J/I'tt 'i 110 Pl'nli/, Granada, 1969; M . E. R\ l!~ ~ \lI 1'11 "1/, ,I IIl \t'mltlclli ,\1I IUIUlna! {j1'1"(,fi-':,lllI)/lIt'HII't'IJt ic,,)jn'I,lc ,II O.-rec:ho , BogOlJ. , POIl(III~1 l Jlllvcrsltbd Javaiana , 1981 ; c D. DAVID, Lltlstmination anificielle humuUh' Un \lOll\'l'all illodl: de filiation, Puis, ESF. 1984

O BIODlREITO EA BIOÉTICA 215

do homem e mulher como parelha lipic<1, como união básica na vida , de ~Ollc a perder o sentido que o sexo masculino eo feminino lerão ~1a sociedade d.o f~[~ro.o , O acesso às novas lecnologias reprodutivas e a ideologia da escolha lnt.hvlClual permitiram a criação do que se chama eugenia do consumidor.61 Escolher sexo, caraclerísticas físicas e até o perfil psicolôgico da criança passou a ser um lema de mercado. Como tal, acessível a quem tiver dinheiro para custear o seu projeto pessoal de procriação.

Emboraauimensão biomêdicaseja importante, é essencia l ocn ruque antn)IJu· lógico, psicológico,jurídico e, sobretudo, a concepção ética. A preocupação moral pode ser o ponto redutor de todas as considerações interdisciplinares envolvidas. Este é um ca mpo bastante peculiar para o exame da intimidade entre moral c direito. Afinal, o direito atua na ordem deontológica - o que deve ser - c lião na ordem ontológica - o que é.

5.4.1 A digllidade da pessoa humana: a de]esa do embrião

Há de se perseguir a vivência de uma ética baseada na pessoa humana , ,cuja dignidade é princípio fundamental positivado pelo constituinte de 1988. Etica fundada no "respeito ao embrião, aseu inelutável direito ao nascimento e, por isso, à exclusão lôgica da destruição dos embriões, pois consLituem eles vida humana, merecedora da tutela jurisdicional" .63 A vida humana não pode ser convcnida em uma operação laboratorial.

A conclusão se extrai do sistema jurídico, inspirado por va lores assimilauus pelo constituinte de 1988. Essa a posição mais coerente com a nossa concepção de direito, muito embora não se disponha de uma lei expressa, com a nitidez da Lei francesa de 24.05.1984. Seu art. 10 dispôe: "Desde o momento da concepção, a criança concebida ê sujeito de direito, sua vida é aquela de um ser humano c deve ser respeitada como tal".Convém assinalar que o art. 2.° do Código Civil, ao assegurar os direitos do nascituro, prestigiou a tese concepcionista, em detrimento da teoria natalista,M Os que assim não pensam deveriam lembrar que, se ti. ordem pública desempenha função primordial no exercício dos direitos fundamentais , ela

61 FRANCISCO LLEOO YAGÜE, FecundadOn arlificial y derrcho, p. 15, mencionando a mani · (estação do Prof. BaTEllA LLUSlÁ na sessão de 26.09 .1985. ante a comissão especial de estudos sobre a fertilizaçào extracorpórea (Diário de Sessóes do Congresso de Depu. tados, II Legislatura) .

62 Expressão de Hn.ARY ROSE, citada por STE.YEN R OSE, op.cit ., p . 291.

63 FRANCISCO LLEOO VA.GÚE, op. cil., p. 17,

M Código Civil, art. 2.°: "A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei póe a salvo. desde a concepção, os direitos do nascituro". A discussão enlre o concepcional is mo e () natalismo tambem mereceu reforço, em f:Jvor da primclr;l tl"~l' , com a ratificação. pelo Brasil. do Tratado de San Jose da Costa Rica. A vida tcm iníciO j .) com a fecundação ou com a concepção. não com o nasdmento . O nasdm!!nto é o marco . 2)

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.. 216 ÉTICA GERAL E PROFISSIONA L

1I .1() pud \.' Il t'1l 1 deve \ lhl' lp l ltl.lr ludos o::. a~pC L( O!) d ,1 vlua. Exis tem Outras normas,

postas pela ~o(' it'dad l' c pelos COSllImes. Assim , "os limites de rivados da moral e da on.km pllhhn t ~ao IIg urJ.::> auxlilaresd c Interpre taçào cujfls manifestações mais irnpo rra n lt''\ l' '> lI ;l o hst:r\'ã llcia Sl' l>roduzem na ;uuaçào dos juízes " . b~ E a moral ha de se r c lll l'lHJida IW !leu se ntido objetivo , n<io apenas no subjctivo de quem Se p ro pOl';1 HilIar CO Il1 ,lnilllO dis posto ao bem. "N;io cOlllraria r os bons COstumes n :10 se tradu .: 11.\ exigl' IH.: ia ue uma hunc!<".le ou moralidade de intenção, senão ClllllIIl.1IiIlIlI 'I~clll CX lflllStl.l fundada por uma mo ra l positiva que condena certos co mponalllClltos, alllda que o muti \'0 da realização seja intimamente bom. "66Tamo o DireilO rO~ ili vo comO::l moral coletiva e os bons costumes vedam a destruição <..los clllbriúl'S.

5.4.2 No\'u.\ ( O/l tt' iIO S de pa ternidade e matcrnida<..le

OUlra~ Cjl1 CSIÔrS bastanle complexas já su rgiram c ldemandam res poslas. Demrc e las , L·abe responder se a côpula e essenc ial ou não ao conce ito de paterni­dade e se a doação de óvulos desnatura o princípio malcr semper certa est.67 Pois o princípio d a determinação legal da filiação paterna e marerna observa, de um lado, a regm (Li cert eza da mate rni<..lade. De ourra, o da presunção de paternidade do marido a,1 mal' .ÍI.'j

A lll "I ~, lradi n ll l\;!lIIlL'IllC , cr;\ a mulher 4ue gerou e , após gestação, deu à

luz u filho . II"J" se admite já um conflito de maternidades , quando se dissocia o eletneIll o gCllét iro d o binlÓgico. Pode-se então fa lar em "maternidade genéti­ca (quem "puna o ovulo) e maternidade biológica (quem suporta a gestação) . Ev uJentcmcntc , .1 mulher pode haver dado â luz o filho em queStão e não ser s ua mã e gcnclic l (,10 haver-sI.: implan tado um óvulo alheio); não obstanle, bio­logicamente n<1o (al>e dúvida de que scrâ sua màe" ,b" É a hipótese dos úteros de ~l,ug.ucl ou do contrato por incubação em útero alheio. Pode-se desde negar legItim Idade a ta is pactos, pois a capacidade de procria r é indisponível e íntu itu personae , até reconhecer a mais valia de qualquer das duas mães _ a bio lógica ou a genética, 70

ini.cial da "personalidade civil da pessoa", o que nao se confunde com a vida, ciclo vital cUJo começo é a concepçilo.

65 MAkIAJ ""U5 M ORIl A I MARAl, op. cit ., P 73. Isso nilo impede que o conceito de moral e de ordem l)úblt CCl sigam sendo de cOPllcúcl.J indfltt minado, flexCvel e va riado.

66 Idem, p. 75.

67 ~ A mãe é se mpre rcna.M

68 E () aft)II~ IlI.ll)atn h ,/Ut'lIl lIupfitlt.' cleltlonSfrtmt ,

69 FI{A N(L~( () I II P(l YAI,III , op. ci l. , p. 25.

70 fR~N( l ~( I) LI H k.) y ,\ (,UI·, pO,r excmp.lo, I,em a opiniâo de que a maternidade biológica tem mais v310r eh, que a gClléUfQ, parudáno, pois, da rl:gra segundo a qual partus sequitur vrnttt'lll

o BIODlREITO E A BIOÉTICA 217

No concernente ao pa i, a regra parece haver se alterado de patfr is quem nupliat: demonstrant'J para pater is quem sanguis demonslrat. 72 Mais adiante se chegará a um concei to de paternidade que se afas te do critério biológico para se aproximar do cri tério aCetivo. Pai será aquele responsável pelo carinho e pelos cu idados dis­pensados ao filho, que poderá não ser seu produto hiológico.

A possibilidade de doação de sêmen conduz a cogitações interessantes na ordem da pate rnidade , com rencxos é ticos imprcvisiveis há alguns anos. "Do ponto de vista eugenético deve recorda r-se que um só doador, com uma do;}çào por semana, pode permitir400 inseminações semanais (0,01 de centímelro cúbico de sêmen sendo suficiente para Cecundar) . Ponamo, um sO doador pode tornar-se em um 56 ano o pai de cerca de 20.000 crianças, se todas as ÍI1lcrvençõcs fossem exitosas. Mesmo se limitadas as doações ou o uso do esperma de um mc:smo doador para número não superior a uma centena de gestações , não se exclui que estes cem bebês de proveta possam conhecer-se, especialmen le se viverem num ambiente restrito, e , ignorando o genilor comum, entre eles possam se casar, com as danosas conseqüências que os eugenistas comumente prevêem para os (ilhos incestuosos, E não se exclui que uma filha nascida de inseminação artificial possa se casar com o doador, is to é, com seu pai. "7) E o tema não é destitu(do d e alguma probabilidade. Já se nOliciou que noventa rapazes , nascidos do mesmo pai-doador, viviam cm um só quarteirão dcJoanesburgo, em lima â re;} rl'l .Hivamen tc Pc-QUl' I1;I ,

sem saber que os times formados para jogos podiam se r constituídos apenas de irmãos sangüíneos, H

5.4.3 Bebe de proveta: a identidade do doador de stmell

Outro terna conexo a merecer reflexão concerne com a identidade do doador dos gametas ou dos embriões. Adote-se o anonimato e não se poderá vedar que () se r gerado in vitro, ao atingir a maioridade, tenha acesso à informação sobre a maneira pela qual concebido e às características do doador. É direito inalienável do filho saber quem são seus pais. Ninguém lhe pode recusar chegue à sua raiz genética e à real personalidade do doador do esperma de que sua exis tência dt'rivou.

Uma lei brasileira que consagrasse oanonimaloabsoluto dodoadorde espcrmo ou de ôvulo padeceria de inconstitucionalidade, A Constiluição ampliou o elenco dos direitos fundamentais e dentre eles se insere o dire ito à filiação . A mesma

71 ~O pai é aquele que as nupcias demonstram", ou seja, o pai é o marido da mãe .

72 "O pai é aquele que o sangue demonstra", ou seja, o pai é aquele que forneceu o espnma para a inseminação,

73 FERNANDO SANro.sUlnt'>< I, op . ciL. p , 17.

74 A nolkia rOi publicada em La Naz.ionc de 1M jan, 1959 c c mCllcLon<.ld<.l p~lr h \{N,\N II\)

SANTOSUOSSO, op, cit ,. p, 17. Acrescenta o autor q ue MARflNl:l VAl, La eutdc:gcllI.:sia y su traWmietlto penal, Madrid, 1954, p. 11, observa que, teoricamente, bastariam 35 II, doadores para os 594.936 nascidos na Espanha no 3no dI! 1949. ""- ...,

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218 ÉTICA GERAL E PROFISSIONAL

Carta fundant e ahrigoll o principio da inafastabilidade do controle jurisdicional r , dessa forma , Ioda pessoa pode exercer o direito a alcançar suas ra(zes genéticas , pois integra ~u, patrilllônio Jurídico chcg,u à SUa origem fenotlpica.

5.4. 4 In~Cmlll(/(, (lo (li {i{rfÍ(rl/lOlIló logl! e heterologa

N CIll IIH 1;1 h )1 111 a til' i Ibt.:lllinac.;ão arl i (leia I humana 7' gera problemas éticos. ~ insemina(;ão a rtiIlClall ll <Hh."quadamt:nte chamada homóloga não os apresen ta . E aquela t.:tll que II (;''-,JI, l'1Il\)OT;l não estéril, não pode gC'rar. A mulher é anificial­menle fCC UIl(bd.l nHll () ~trnrll do prúprio marido. Em contraposição, a inscrnína­~:â\) anifl l"j;ll ht'lcrúloga c .Iquela l'ln qlle a rccund;\ (ôo se bz com sémen de outro home m, qll e 11;\\) {\ 1ll;lridll.

A UniGl ill(bgJ<::l.n, na inst'lllinação homóloga, seria saber se tais técnicas de­veriam ser rese rvadas apenas a casais unidos sob o casamento. E a resposta parece ser ncgali vil. Uma Co nstitui(ão que confere o sratus de entidade familiar à união de homem e mulher nàu casados sem dúvida a eles também garante o direi to à maternidade c a paternidade.

Na insemina çãu a rtificial heteróloga, o sêmen do varão será substituído por sêmen alheio. diante ue impotência coeundi egenerandi. O pai é o doador do sêmen e estt' poderi;'l, l11:lIS rarck , reclamar o seu estado de paternidade. Assim como o filh o pod erá , qU;lIldl) maior, ple itear a averiguação da identidade do doado r, seu pai genético .

5.-L5 Illscm irlt/ ((j{) artificial post martem

Ouno prohlema ;\ ser enfrentado é o da inseminação pos t mortem, Essa expressão, uu aquela IWrlnalmente Ulilizada para significar a m esma realidade - fecundação post martem - pode ser tomada em vários sentidos, de acordo com as situações possíveis. Assim, O doador do sêmen ou 'os doadores do embrião faleceram antes de seu emprego e se procede, com posteridade, à sua utilização ou implantação na tulher receptora . Implantação em mulher viúva de embrião humano alheio. OUlscja, cm cuja formação não lomou parte o esposo falecido. O

75 Sobre a noção de IfIst'l1linaçdo elrlificiell , ver que RllW ND R1Z, 11 tnmamento medíco e le cause di ~i~ , slijicazjo/l(" p . J 33, invoca o magistério de AU:.sSANOil.O SlGI5MON01, lnsemina­none aru flClalt: . Endt /ul'nlia cId ,lirilto , Giuffre, 1971, v. 21. p. 766: "O fe nô meno objeto de estudu é a IlIl rut!u,,':io do gam(,la masculino (cspamatozóide) de um homem n os órgãos gl'l1!1,II~ Je um.! mulhe r sem a natural conjunção carnal , a flln d e tornar possfvel () enronllO ltllll tl g,ll l\(·l.l ! "llllllin~) ('lvulo) d,l mulh\:(. Tal fenômeno é distinlo daquele d .• Ilhl'IIIHI .I~, "I.llldh l.1! III "111'(1', qu,' m 'O! ll' qU<llHh, n \.:IHontro d,) ~.lm{,lilllIasr.:ulill() ,'(\(' g,UI Il"U knllll llh ! ,h' ,I("· 11,1 I'luvd,l, ~,! I1l ,J l.lHlh\' nl d"'IlIt'l..' d.lll;ln~ll'r~nda d\' UIII

o\'ulo ll ,h ' k cund.ulu ti l' Ulll.1 lHulher ~. Olltl'J, p" r;l ~uprir um deleito especifico dt'5t .. e IOrn.lr Ihh~!vd ,\ Il·~"IHHIaÇ.l, ) ( .. ) . FiliO de todo d lVt:rSl> é ;}(!uc!c da transferência do Óvu!.) J.I /t- . !ln.! ,I.!U dI' lItU.1 lIlul h.-r. nutra q w.' lc\'<\ a L'ondu.'ião a gravidez".

O BIODIREITO E A BIOÉTICA 219

mesmo cnfoque haverá de ser conferido quando essa mulher for solteira, separada ou divorciada. E ainda se considere a inseminação em mulher viúva com sêmen de seu marido falecido . Ou implantaç.ão na viúva de embrião fecundado por sêmen

do morto. 7b

Atrevo-me a afirmar que, se a viúva dispunha do sêmen do fal~cido marido ou companheiro, apto a gerar-lhe um filho, ela pode se utilizar dessa substância vital c o filho será legit imo. A questão carecerá de rdevo ~e houver: 1. O COlIscn­tímento do marido em testamento ou documento público, com referência aos gamelas depositados em determinado estabelecimento autorizado; 2. A prov~\ de que neste estabelecimento se fez a fecundação com os gametas identificados~ 3. Que o nascimento se produza em prazo prudencial e que não concorra presunç;)o de paternidade derivada de novo matrimônio da viúva ; 4. A notificação a quem tCllha direitos que devam desaparecer ou diminuir dian te desse nascimento.

77

Entretanto, quando isso inocorrer, há necessidade de encaminhamenLO de uma solução. A cole ta prévia de sêmen estaria a indicar a intençào do pré-morto de iniciar ou prosseguir na prole. E presumir-se-ia também a sua concordância com a inseminação artificia l, sem grandes dificuldades, salvo as decorrentes de oposição de outros herdeiros. Esta só poderia ser formulada em pleito jurisdicional , assegurado ao inimputável uma curadoria especial, direcionada a preservar-lhe o

estado de fi lho.

5.4 .6 Fecundação in vi~ro e manipulação genética

Diversa da inseminação artificial em sua dúplice forma é a fecundação in vi­tro, produzida median te extração do óvulo maduro humano para que se fec~unde , dentro de um recipiente, com o sêmen do marido , companheiro ou daador. ' tI Essa fecundação pode dar-se quando a mulher não tenha condições de ser fecundada , com utilização do sêmen do próprio marido. Ou pode ocorrer entre pessoas não

casadas e mesmo pOSl morLem do marido.

Muitas as situações possíveis na fecundação ill vitro, conforme examina Maria Jesus Moro Almaraz: fi lho do óvulo e sêmen do casal sob lralamentO, gestado pela própria mulher; fi lho do óvulo da mulher do casal, geslado por ela c de sêmen de doador; filho de gamelas do casal, gestado por uma segunda mulher; fi lho de óvulo

76 A classificação é do Prof. E DUARDO SERRANO ALONSO, Magist rado , ca tt:drático de Jtrt:ito civil da unive rsidade de Oviedo, cm El depósito de esperma o de embrioncs t.:O uge ­lados y los problemas de la fecundación pOSl morrem, La filiación a finales dei siglo XX , p. 377.

77 Silo as condll~{)l":> dn grupo de trahalho do Minisltno da ]Il:-.Iil,:a I: 'ipanhul, 1"I1 ;,d""lwl" Prol. EIlUAIHKI SERRANO AI.ON~O , op. dt " p. J7~ .

78 Essa é a fecundação extracorpórea, dl'signando knõnwn n cienUfi(.:u n:alizado nn lah,, ­ratório, fora do claustro materno.

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220 ÉTICA GERAL E PROFISSIONAL

da Inulher do casal, stmen d I.: doadur c geslauo por uma segunda mulher; filho de ôvulodoado, sêmen do varão do casal e gestado pela mulher; filho de óvulo doado, sêmen uocompdnheiru l' ge~lado pela mulherdo cJsa l; filh o cle óvulocloado,sêmen

do companheiro, gc .... tado po r le rcei ra mulher; filho de óvulo doado por terceira

mulher e sé mell do v,lrão do casal, geslado pela doadora do óvulo ; filho de óvulo e sêmen dr doadu rt's, ges tado pela mulher do casa l. 79

Algo de l'x l r('lllamClltc ill s l iga lltc resulta de qllt 1Il:~sa espécie ue fe cundação 00 gamela (OVlll l) mais :,ê lllcn ) pode úcrivar não Jpenas um , mas vários embriões.5O

Um só di.'l<:!> ~l'r. 1 o l1j (, lo Ja tntnsferên<:ia embrionária, operação de traslado do produt u d,1 k ( nlld,I~'Jll .11i.' IJ 11[(' 10 IllilICflIO .!O () quc Iilz <.' r do~ cmhriões não uri ~ Itz<ldtls? P,II CL~' IIIIUI(1 (I L'(lIIl ,IIHlu u)II~liILH. iunat protegendu a vida humana ali

gerada . I ab C l llbflUL'~ Il í.iu podem ser ubjclO de mallipulações genéticas não orien­

,ada> ii procr ia\·ã<>." Na visão de Rolalld Riz, "eSle campo é pleno de incógnilas e apresenta uma p roblc lll.ilica ex tremamente d elicada . A lécnica chegou ao pomo

de a de rilllção InanipuJaçào genética enconlrar sua correspond~ncia no possível

resulrado: a ( Iênda pode construir iII viera não só um ser perCeito , mas também

um monstro" .e ) Po is o nasciruro pod~ , quando na proveta, ser submetido aos mais impensáveis I f:1tarnentos científicos, alte rando-se a sua herança genética mediante especial d(,Sl' I1 Vulviml~ nlO de alguns caracteres e at é com eliminação de outros,

5 .4. i É/I){/'t' '/tI lU/da do 011/1/ ido

A IUlela ao emb rião é algo que não deriva apenas do direilO. A Real Acade­mia de Dowores de Espanha já assegurou que "o co ncebido não é uma parle do organismo matc rno senão um detivo ser humano, perCeitamente individualizado ,

que, ponanto , não pode ser obje to de disposição nem sequer de seus progenito­res; ninguém , portanto, tem direito a destruí-lo" .8~ Desde a concepção existe uma 311lemica pessoa po rque a fecundação determina a personalidade , E embora não

tenha o rccé lll -cu llct,hid o uma personalidade plena , pois ela se determina pelo

79 MARIA Jt~V) l-.hJRU AI MARAZ, op. eH., p. 213.

80 "Embrião é o produlO da concepção desde as primeiras modificações do óvulo fecun­dado. Na e~pêcie humana, este produto se chama embrião durante os lrl:s primeiros meses, a panir dos quais loma o nome de feto. Fala-se ainda em blastócito quando a célula embrionária não se diferenciou , embora já tenha ocorrido a fecundaçao" (Diccio­narlo l tmlln%gico tte hlS ciencias médicas , 11 . ed ., Barcelona , Salvar, 1984, p. 316, apud M ARIA I ' ... ' · ... M ll lW AI MARAl. oro cil. , p. 52).

~I Id":))) , lh ulem

82 E a opinLlo l k I IIANll'o{ II L( 1 110 YM,lll, op. cit. , p. bO. 83 R DI AND RII, o p l"it. , p. 1J~.

84 DOtUlIh'llhl - lnl l )rlIh' de 25.0-+.19R3 , apud MARJAJI"'JJ~ MORO AI.MARAZ, op. dI., p. 133.

O BIODIREITO EA BIOÉTICA 221

nascimento, ele tem uma personalidade: especial , o u antecipada, condicional , fu tura ou provisionaLB)

O embrião é sujeito de direito com capacidade condicional e. qualquer que S~jíl sua situação - no útero malerno ou in vitro-, é IUlelado pelo direilO, cujo triphce objetivo ê: "assegurar sua existên~ia: condicionar e . p~~,t~er seu livre ~esenv~l~ vimento e rcco nhccer~lhe certos dueltos na ordem CIvil. Essa defesa e exerclda contra todos , inclusive contra os próprios pais genéticos ou legais.

Nem cabe distinguir essa proleção, diante das diversas c lapas do dcscn vo l vi~ me nto do embrião. Todas essas fases, a partir da concepção, integram um pro<.:esso contínuo. A debilidade nos primeiros dias - ou até nas primeiras semanas - não deve constituir justificativa para interromper-lhe a exiSléncia humana .

Tal proleção deriva da norma posiliv<tda na Constituiçãu: o direitu a vida . r\ vida humana é "um processo que começa com a gestação, no cu rso da qual uma realidade biológica vai tomando, corpórea e sensitivamente, configuração huma­na"" O dircÍlo à vida , com sua signir,cação física e moral , é a projeçãu de urn valur superior do ordenamento constitucional. ~ o ~ai.s rundame~tal rl(\~ d~rei~os , p~i.s é o suposto ontológico sem o qual os demaiS dueHos não teflam eXlstencla pO~SI~ vel. Como assinala Mariajesús Moro Almaraz, "o direiLO à vida é o único que tem prctcnsão de absoluto, porque a vida não é graduávcl e seus limites máximos coincidem com o conteúdo essencial".68

85 Personalidade antecipada ê expressão de PI ..... NIOl, Trafado c/ementai de deltcho ~h' il. .11lIr() ~ ducción, familia, matrimonio, p. 195: "Por exceçào à regra, o filho não naSCido ,unJa (' capaz de adquirir direitos desde a época de sua concepção. Por anfecipado se co~sidera que figura no número das pessoas. Já o afirrn:wa Juliano: Qui i'1 utero sunt iflldtlg{'n lur ill rerum na/ura esse". Condicional decorre da visllo de BON ECASSE, Eltll1tn·tos de dcn:dlo civil , Puebla, Cajlca, 1945, l.I, p. 237:"A personalidade humana existe e produz cOl1se~ quências jurídicas desde anles do nascimento, a partir do momento da concepção com a condiçdo de que nasça vivo e viável". Personalidade fU/ura, di-lo MI:SSINl:O, MWllwle di dirltto clviJe t commtrriale, Milano, Giuffre , 1957 . v. 1, p. 208: "Antes do nascimelllo o sujeito t inexistente e não adquire personalid<lde, nem direitos. ~e~ preju lzo, .no perlodo de tempo an terior ao nascimento há pre.ocupação com os. direitos do ~uJcJtu, porque se o considera esperança de homtm" . Provisional , ou provis6na, no enu:ndllnemo de HENlE , Lehrbuch der burgerJichen. Rechls I. AlIgemciner teil , Berlin, Verlag von Franz Dãhlen, 1926, § 56, p. 392, tudo apud MARIA JBÚS MORO AlMARAZ, op. CiL, p. 135.

86 MARIAJESúS MORO ALM .... RAZ, op. cit. , p. 136. invocando M .... NRESA (Comenldrios ao C)( /igo Civil espanhol, 1.1, p. 267-271 ), para quem não são meras expectali~as, pois con!>til~em propriamente direitos lm lstado dl J>(ndtncia Produzido o nascmlemo, tem efeitos declarativos.

87 Tribunal Constitucional Espanhol , apud MAIIJA Ir<;f), M(l~{l AIM .... ItAl . up l il .. P 141 . Invocando DE ANGEl YAGÜEZ-ZOItRIlLA RUll, Significado dei dcre:tho a 1.1 vida I cy dr! aborto, Bilbao. Universidade Deuslo, 1985, p. 96:.

88 Idem, p. 148, citando L ARROYO Z .... PATERO, Proldhlt ' ÓIl cid abor/a y W l1 stilu(iôlt. RI)! leM, 1980, monografico 3, p. 200.

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--222 I::IICA GERAL E PROFISSION,\L

Ne:-:.tt.: GUlIpO, I.:UI110 l'1H outro,:; que em ergl ral1l com o progresso cientffico, ::umpre não olvida r ;l tlclvcrté ncia de Karl Olivecrona, no semido de que a "série :te ideia!:> sol)! (' cI .lq tll ~I( .. Jo dI.: Ul l l direito , sua rx bll:11 ci;lI; suas conseqüênc ias Lorn

rcspcilo à condula do~ Jcmais se acha firmemente estabelecida no que. se rdereaos direitos amigos c bem cunhecidos c quando, mediante a legislação, se inlroduzem direitos novos , Sl' IIws Jplicam as mesmas pautas memais" .dQ O intérprele há de ('s lar~l('nl () ; \11., falI IS IlUVOS, utilizando-se da rnnccp~ào tridimensional do direito. O 110vO bto, valorizado pelu \x'IlSaml'lHO predominJ11IC, merecerá a normativa adequada :lL'ss:l vaha.

O pequellll ser cm projl'IO de forma(,,:ão é tão Il1crccedor da prOleção jurídica, COlllll () :.-ão I):; dCIll'ü~ se res. E não há necessidade de novas leis para o proclama­rem. CarbOllll tCr, por exemplo , é parlidário de não se legislar mais nessa área. "Os juízes com sua .. decisões e o direito comum podem preencher os vazios que se produzaln . , .. ~! l1il-;tD II raciocínio tonst iI ucional, () exame do ordenamento a partir

dus l.lri IKlpi \lS t: ~ I~n!~dnS pda CUllstilUiç.'l.o e nela implícita ou explicitamem e conwJos. Ela Il,lú C o fundamento de valIdade de Ioda a normatividade que lhe é inferior Aklll d e arámelrc interpretativo das demais normas, ela é a norma primeira ,.1 Pll.:::.t.'illdi, de kgl~ laç;1o cm tudo aquilo que puder disciplinar sem a iIltCTIlI('lha, .)n dl' I"L'gr.h !'- uhall cma::. . E t' llllll i:llt.:1 ia (I!.: prult'çãuà ,'ida, seu:; preceitos cs tà ll a di ~ pl' II .... 11 IhI/IlU! 1:;hJltl Jo IJarlalllentu .

N CIll c d l'H I. I! .., l\"lllhr"r qUl' , depois da l"atiflcl,',lo , pelo Brasil, da Cunvenção <.k ')'.IIlJo .:,~ d.1 (.0 ... !.1 I ~ IG I , a Vida humana fOI Illlclada pelo ordenamento positivo de maneira plena , a parlir da fccurH.lac;ão. Vale dizer: todas as manifestações em fa vo r tln ~ I bortu l' d" t.'lIlill1:ls i:\ vulneram o Jircito bra~ilciro c as tentativas de sua i 11\ P la 111 a ~'{i o \'L' l1l I ii I II 111l<lt1 a~ dr i 11 cu I1St i t udt) na I idad e .

Exempln de 111;\ tt'cnica na elaboração legislativa, a lei Brasileira de Biosse­gurança - Lei II . IOS, de 24 .03 .2005 -cuida tanto das atividades que envolvam o uso de org'lIllsmos gcneticamente modificados quanto da utilização das ctlulas­tronco embrion.\ria!t .

A celu!a-lronc\) e uma cél ula ill(jiferenciada. Co mo tal , é suscetível de dife­renciar-se ('m m uros lipos de célula, a fonnar tecidos nervosos. epiteliais e con­juntivos. Por I ::'~ l) () tnteresse em sua ulilização para tratar de doenças em que a reposição Je telul.ts degenerativas c a alternativa. "Desde há muito se constatava o potencial eX I raordlnârio das células embrionárias. Algumas delas são denominadas

I

89 }<AII.I. Ull'd' J.:llf'oA. li ddt:dtu WllItl IIfdtv - La t.:struuura uel oruen;\l1liemo Ju rfdico, p. l t10 .

90 J. C ARII(JNNIH •. A( ln dl.l wl//I'IUC: génétÍt.lue, procréatioll C( uroit, Paris, ACles Sud, 1985, p. 79-84, 'IPUU MAlUA JbUS MORU AU.t..I,RAZ, op. cit. , p. 201.

o BIODIREITO E A BIOÉTICA 223

de unipotentes, por exercerem uma única IUllçau uetcrminada; outra.s :;(!tl pllll"l­potentes, por poderem exercer várias funções ao mesmo tempo; outras ainda sào lotipotentcs, por poderem, teoricamente , ser encaminhadas para qualquer rUllção. Maso que mais surpreende é que um ccrto nümeTtl de c..:lu las-t ronco,que mantem seu poder regenerador, possam ser cncontradas no cordão umbilical. na medula óssea c em outras panes do corpo. Estas células são denominadas de adultas ou maduras" .91

As ce.1ulas-tfOnco embrionárias são obtiJas ii pari ir ue cmhl iões ue até ri IKlI dias . Podem dar origem a todos os tipos de células que compõem oorganismo huma­no. Elas poJem ser extraídas dos embriões excedentes dos processos de fertilização in vitro, armazenados nas clinicas de fertilização ou produzidos pela c1onagcm.'H A Lei 8.974, de 05.01.1995, proibia a manipulação genética de células germinais humanas, "ou seja, veda qualquer interferência no material genético dos gamelas (óvulo e espermatozóide) humanos. O objetivo dessa vedação é impedir todo o tipo de clonagem humana realizada a panir de gamelas. Dessa forma , é proibid<1 a obtenção de células-tronco embrionárias a partir da clonagem humana" . 'll A lei também proibia o armazenamento e a manipulação de embriões humanos desti­nados a servir como material biolõgico disponível. Vedada, portanto, a utilização de embliões humanos para a prorlllçãO de células-tronco embrionárias, ainda que para fins terapêuticos. Outra não é a leitura da vedação expressa no art . 6.u

, III . da Lei 11.105/2005: "Fica proibido: ( ... ) JIl-engcnharia genetica cm célula )\cnninal humana, zigoro humano e embrião humano".

OpçãO conseqüente com a ordem constiludorw1. "O blo c que, jllSI .. Ullcntl'

com os avanços da genética, já. não há como negar que o embrião é portador de um código genético próprio e completo. Con cretamente isto significa: ocorrida a con­cepção, pouco importandoaIravés de que método, o código gené tico já contém em si Iodas as informações necessárias para dar sequência ao processo de uma vida. Se não houver interferência externa, o embrião passa a ser feto, depois criança , depois adolescente, depois adulto, depois ancião Em oul ros termos: todos os seres humanos já foram simples embriões um dia . "\01-+

Ocorre que a lei de Biossegurança permite a Ulilização das células-troncu embrionárias resultantes de processos de fertilização in vitro e não utilizadas no

91 ANTONIO MOSER c: ANDItJ: M .-\RCElO M. SoARES, Bloêlicu - Do Consenso ao Bom-SLII!>u, p 51.

92 FARIA, C.R.S.M., ROMERO, LC.P. , Clonagem humana: um panorama da questão Sftwdo Consultoria Legislativa, Brasília , 2003, disponível em <www.senado.gov.br/web/conlegl arligoslpolilicasociaVClonagc:m Humana.pdf>. acesso em 04.10.2007.

93 GUS1AVU HJ.:NIIIQUli FIOJ.:lCS TALUAlH;NA c PAIH O AIONS() FMANUSCU DI; CAIlVAt 111), Alu;li,ao de grupos de pressão na tramitação do Projeto de lei de Biossegurança. ReviSla de InJol"­maçdo legislllLiva, Brasília, ano 43, n. 169, p. 172.

94 ANTONIO MOSER e ANDRE MA~CEI o M. SOARES, op.cil., p. 63.

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respectivo pruceullnclllo , desde que os embriões sejam inviáveis ou, sendo viá­veis, estejam congl'lauus hâ 3 anos ou mais, na data da publicação da lei ou que, jâ congclado~ 11..1 rTll' 'Orna data , depois de completarem 3 anos, contados a partir do congelanwllto '"

O argulnl'1I1O de qu cm defende a utilização uns embriõessupra-numerãrios e ill~lIficifIllL' p.tra ;urrda!' o conflito ju rídico e ético decorrente dessa opção. Ovulo fecundado ·" L'lllhriüll- l' gell te . Em siw<)\"au Ji vcrsa daquda do já nascido, mas pessua human.\, Nau c 11 lalo dt: sua dl' snecessiuad e para atenuer às expectativas dos que opiaram pela fec undação artificial por uma gama enorme de motivos, que justifica a sua conversão cm mdo de atender a outros objetivos. A vida do enfermo não é mais qualilícada do que a vida do embrião . Vida é vida, sem qualificativo.

O utilitari smo dcsscrve a jusrincar esse aproveiramento dos embriões que rl'~larão congel:ldt):') É passivei que a ciência se valha das células-tronco adultas. Ou daqllcla~ l'xlr,lJdil~ do L'ordüo umbilical, assim que nasça a criança ou antes mesmo, Sl' 1 ...... 0 11,1\1 il1l t' 1 rnlr co m a gl'~ laçil() . lia d I.' se desenvolver a tecnologia para quI..' 11,1 0 ~1.'1, 111I bhncado'i I.'lllbnõcs descartáveis . A vida não C descartáveL A viua, ~cm qualqlll:r ljualificaçào , foi o bem mais prestigiado pelo constituinte e considc rad n o prcssupo<., to a frui(ilo ue qualquer outro direito . Por isso é que os direitos ::.e Ch:lll1il1ll bi'l" dei videl.

EIllhl1ra rC::'Pl'lll' u::' ptll1lt)S <.lt: vbla cUll lrJrios, (: <.Iiflcil concordar com quem sustcnta serem tais t..:mhr iões simples material biológico.9ó É verdade que a situação entre o embrião no ventre materno c aquele congelado é distinta. O primeiro se desenvolverá , o segundo não. Na verdade , inexisle distinção ontológica entre ambos. Os doi s são gumcns de vida. Uma situação de contingência não retira ao embriào a sua tligniu;lCle de ser hwnmw, com todas as potencialidades para vir a nascer e ii <Itingir a plenitude d{' cr ialllra perfectível.

5.5 Alguns parâmelros élicos

A consciência há de estar atilada para o exame ético de todas as situações derivadas do progresso cll'nt ífico. Um critério não dogmático nem materiaUstico para distinguir um meio lícito de um ilícito poderia ser: 1. Deduziraconformidade com a natureza soboaspccto ohjelivo (est rutura anatômica , funcional , psicológica doser humano) c ~l)h () a~rCl:LO finalislico (a rcHio que determinou essa estrutura). 2. Avaliar St', ..,oh {) primeiro aspecto, outros meios concehidos pelo homem vão practer e não contra ii t:~tru tll ra natural e, sob o aspecto linalístico, se os mesmos

1)5 AI'I ") ". III< 1'>11 II , .1.1 I , ' 1 J I IOinoo'} 1'111 qll.d~IIIl· 1 , ';1'>0, é m'(,'(:s!oàrio () l'onscnliml'n1o d O ... gl'LIIIUI'·~-(~ I."Joan '5." J" Lc.:i 11.105110(5).

96 ED:,IIN l ' ll~nllfj \ lIA ~II \ /\, t\ Lei de Biossl'gurança C a polémica quanlo ao uso de embriões hUlll :1 Ll ll'> l'lIl pt.: !oqU\5,b IIH'(,li c J.::' i.' práticíls lerap~ulit.:as com ctlulasMlroneo. CadenlOS )U/idl(os d(1 Escola PcHlllSla da Mergisrracura, São Paulo, ano 6, n. 25 , p. 78.

O BIODlREITO EA BIOÉTICA 225

escopos da ratio que preside os meios naturais resu ltam igualmente atingidos através da anormal intervenção na natureza.

Um meio que fosse conforme aos requisiloS indkac.los sob número I , seria evidentemente lícito porque resuhante expressamente da natureza; um meio que atendesse aos requisitos sob número 2 poderia ainda considerar-se licito em virtude de uma espécie de excepcional aplicação analógica. Fora dai , os meios dever iam ser considerados ilfdtos.97 Esse raciocfnio é váltdo não para exaurir, mas para aUM xiliar a indagação de ordem moral que preside a condula de quantos parlicipam das alternalivas contemporãneas de suprir a aluação da nalureza.

O debale ético eSlá aberto e as religiões contribuem bastame para o seu apro­fundamento. Mas ainda é longo o caminho a ser trilhado , até se atingir o consenso a respeito das práticas e de suas conseqüências, sobretudo para os seres nelas gerados.

A fertiliz.ação com gametas de doadores já tem siJu enca rada sob () ellr~lqlle das exigências éticas. Andrew Varga entende com elas compatível a "inseminação artificial, realizada com esperma do marido , obtido com a participação da esposa e com a finalidade de alender a um desejo de procriação por parle de ambos, o qual, não satisfeitos, constitui motivo de frustração e sofrimento" .<.IH Não assim a inseminação heleróloga. realizada com esperma rl'tirado de doador eSlnmho , contra a qual alinha dez razões, iniciando pela contrariedade à estrutura büsic;l do matrimónio, fome única e legitima da filiação .

Essa primeira razão já pode ser contestada num sistema juridico onde a filiação já não pode ser qualificada de legítima ou ilegilima. A proteção ao filho, principalmente quando menor, insere-se dentro da democrática lutela dos direilOs dos mais fracos e das minorias. .

Todas as questões poslas por essa nova realidade háo de ser Ilorteadas pelo interesse do pleno desenvolvimento - principalmente moral e emocional - do filho gerado em lais circunstancias. A função social da palernidade é superior à

dimensão física da reprodução. O intérprete há de assumir a consciência de que paternidade e maternidade "são mais que pura procri3ção , que pura genética. O homem depende de seus fatores genéticos, mas está muito mais influenciado pela qualidade das relações inlerpessoais" ." Se a inseminação oferece problemas apa­rentemente insolúveis, ostenta como beneficias quest ionar o mito da paternidade

97 FERNANDO $ANTOSUOSSO, op. dl., p. 33, nota 9. 98 MONtCA SARTORI SCARPARO. op. cit., p. 19M 20.

99 MARLA Jf~lJ!I 'MI1Rtl AL~"'HAZ, op. eh., p . 21'), que cila I. G"I \I: "Podcro!)c· ão ('olliar a '>

dezenas de milhares d~ genes de um sn humano, mas nUnl.:3 ~c poderol. inllliir Ind.1 ;L

riqutza das relaçMs inter·humanas que vilo formar a personalidade do indiVIduo" (I a manipulación dei hombre. Nuevos eauees de reprodueción humana , R{l.zon y fe, II..JH -t , p. 365).

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'. 226 ÉTICA GERAI. E PROPISSIDNAL

biolôgica , priorizando a verdadeira paternidade, que é a afctiva, a educativa e a arlotiva. Quem "dota (,'3(;:\ acolhendo na sua intimidade e vinculando a seu futuro algucm que pode ln GWlClCri~lic~s genéticas diferentes, mas que será fruto da assimilação d t.' 'ise projeto educatívo.

"A vrnLldt'ir,l fi I bt;ilo r: n amor" -diz Maria !C!)lIS Moro Al maraz. "Recorde-se tlJIIJ Vl"Z II la h (Ilh' .lc ..; lc GlIllPOI)$ conce itos cslri lamente jurldicns se suavizam em

função <1;1 (ll lldl\,:h) d:1 Irl;lll' ria regulada, on(k nH1tam lllais os sentimentos que os rl'quisilO ~ !fg, \i<-" Nunca se poderá impor (1 afeto ao progenitor auttntico". 100

O 11';1 I <1l11l'1l10 a ~n conferido 30 complexo dl' questões dcrivadasdo conheci­lI1ento deltl1 fll'O t\Índa llíin t cm receítJs definitivas. Estados que já Incursionaram

legislativalllclll c por essas a Ilernalivas nào dcsconheceram a dificuldade no manejo

ético das ressoas c va lores envolvidos. Estudos prévios do parlamento espanhol

foram anali sados pel o Prof. Francisco de Asís Sancho Rebullida, catedrático de di­

re ito civil da universidade de Navarra, que neles encontrou uma postura relativista

nas rcfcrência~ 1l10rJi~ .10 1 Ao mesmo tempo, a realidade há de ser enrremadadesde um lalanl c Cl ico at~alizado , elaborado sem eufemismos nem reservas, contrário

às vi:llnraçõl'~ ;llh lrJtas e 3 prinCipias preestabelecidos pouco ou nada receptivos a

l1lodili l"a r-~t: , 1."\1I11 po~t lira aconrcs,sional e evolutiva . ·· Em suma, adota o que chama Clica civil , dLfilll(.!.t U Hl1l ) 'aquL 1<1 cuja v<1lldadc radica 1101 aceitação da realidade uma

vez con f ronlad,l n 1111 cn tenos de r.lciu n:1 liuadc e prm.:ctJência a serviço do interesse

geral' ." 1112 RC!o.I.t .,CIll dcflll i r quais cri terios dJ êtica ou dos diversos modelos éticos

- naLUra!i st,l, l',·o l ucioll bta , utili tarista, c.:onsensualista etc. - foram os cfetivamente assumid()!o. )ld.1 (.Oll~lllll i(an .

100 Op. 01 , P 1.10 Nu tunJo, é a velha questãu sobre os fatores dcterminanles da ime­hgénua. A mais simplista das respostas sustenta o predomínio da herança biológica como unica innuência . A transmissãu genética dos gcns dos progenitores condiciona o ser InU:lcUI\'U da em.nça. Tese defendida por Platào, Aristóteles , Rousseau, Galton , GohincJu (. J C II ~c n , entre outros. A segunda confere primazia ao meio ambiente . Este innuenci~l e com.hciolla o d~seO\'olvimenlo do cén'bro c da personalidade da criança. A educaçc\o é transcendente. Paternidade é conceito de conteúdo educacional, formativo c afctivo. Pais são os que se ocupam em dar entorno afetivo e educativo à criança. Uma posiÇão ecle u ca uu mista procura enxergar innulncia conjunta de ambos os fatores. Cada s('r na ... c(' com ~cnotipo Itlldectual dcterminado, mas n;1o t senão potência de reaIiZ,lç,h) dn.:>l' 1I1dl \ it.luu. E i~so dependcra do meio ambieme.

101 O informl' dOI comis~;io p:ulamenl3r que fo rmara para eSlUdar a Fenili:l::ação Extra­corpórea (IInl inh,1 ,I "lllln:l\·<1(1 'IIH' segll ~: ~N:'io ~endo 11-; atitudes ou juízos elicos ou mO I~LI " p.IIIIIIIOIIlIl ,11 )",. lul n ~' IItlIVt·r:-.11 dt ullla ~ '\l· ll',I.hlc , c mbi lo IllCIIUS de um grupo

ou tl1dl \' Hhlll, !t,IO pUlkm Lllljlor-:-l' .'1 l"illllUnid;tth: ~l.'IIJ,\ ~tlh II t'Xl' rch::iu de um poder danoso,' ,HUtlIll.LI LIl , ~ lI hhL lllllar 'lU eVldl.'llh:' '' (Ltl::> c~ ludIU ::> pn'"ios y las !inca.:. previsi­bles de la Itnur'l n.'gllladon espallola. La Fili(lciotl a JlIwles dei siglo XX, p. 100) .

102 FRANCI~nll)l :\ ~h SANOlll RI Il lJ l I lDA, op. cil., p. 101.

D BIDDIREITO EA BIDÉTICA 217

Viu~se que derivam queslões lQrmentosas dessa procriação não derivada uo ato sexual. Os próprios concei tos básicos sobre que se assenta o direito de familia estão sendo repensados. Não existe, com perspec liva hislórica e comparatista, um conceito unitário e invariável das ca tegorias jurídicas chamadas filiação , pater­nidade e maternidade . Contudo, reconhece-se a "evolução que , sem prejuízo de favorecer cm muitos casos a husca da verdade real , vai acellluando , na filia ç;l ,), os componentes ou demcntos culturais (social, alctivo, voluntarista, funcionaL .. ) ,·m detrimentodo puramente biológico- com frcquen te e progressivo desdobramen to dos conceitos de pai e progenitor, sobretudo" . 101 Tais lermos c valores jurídicos, confluentes na relação de filiação ao modo clássico, são bem distintos, conceituai c realmente , daqueles que resultam de algumas das situ ações derivadas de rccu n­dações assistidas. E o aspecto ético nelas sobreleva de maneira preponderante.

É imprescindível a permanente renexão él ica em torno a esse tema e a todos os demais contidos na biomedicina e na engenharia genética . Joaquim Clotet adverte que "a renexão e práticas éticas aplicadas a estes temas são Ião importantes que o fato de prescindir de ambos facilmente conduziria à au todestruição da humanida­de" .104 Como enfatiza Mônica Sartori Scarparo, "deve-se aceitar, por eSla razão , a título de premissa, o principio de que 'a medicina é uma ativ idade inerentemente moral'. Jacques Testart , pai do primeiro bebê de provela frances, junto com René de Frydman, e autor de 'roeuf transparent', afirma taxativamente que 'o seculo XXI ou será ético ou não existirá'" .105

A humanidade ainda engatinha eticamente por esse lema c lodos os outros propiciados pelos avanços da biologia, a serviço da bioética .]á se falou em gênio militar, gênio marítimo, gênio político c agora se fala em gê11ío genético. Este ti "o conjunlo de métodos que permitem acede.rao conheci mento di reto e à modificação do material genético". IIXi A possibiliclaclcde manipulação gendica já foi considerada uma caixa de Pandora , prestes a espalhar todos os males sobre a Terra.

Depoisde uma moratória, obtida no colóquio de Asilomar, em 1974, prosseguiu­se na linha das pesquisas no ano seguinte. A humanidade não sabe deter-se, mesmo depois de alertada sobre as inesperadas conseqüéncias desses experimenlos.

O tema é árduo e merecerá contínua e atenta meditação. Cumpre distinguir entre uma terapia genética parcial, mera extensão corretiva, e, de outro, as inves~ tigações tendentes a metamorfosear a totalidade do indivíduo. Ninguém , elica­mente, poderia opor resislências consistenles à primeira. Já seria difícil justificar, eticamente, o prosseguimento das segundas.

103 fRANCI::>CO RIVHtn I h ·ICNÁNUU, l.a investigadun de la mera rclación hio lógica eH I .. {lli:,-

clón derivada de fecundadOn arllficial. La li/iudOn (I ]inales dtl siglo XX, p. 143 104 MÓNIC ... S ... IClllIU Sc.Mlr ... lCo, op. dt., p. 23. 105 Idem, ihidem. 106 J"'CQVELIi'lE Russ , op. cit., p. 142.

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" 228 ÉTICA GERAL E PROFISSIONAL

PARA REfLEXÃO EM GRUPO

L Qll~t1 a IlÜt ~licarntn te responsável pela c riança: a mãe biolôgica ou a mãe subslituta?

2. H<1\'clldo dlL~ l1Iãc~ biológicas, uma ovular e uma ulerina, de qual delas e a responsahi lidade 1ela formação ética d a criança?

3 . É 1l1Or,t1l11cllll: I q.!,H i 111 a a modificação, pelo gén io genético, do palrtmônio h Cfaht<1l'1tl dc , llgUl; IIl ~)

4. Seria i.:tI(' ;UJl cn t l' ,Kfilãvcl a comen.:ializil ç.lo de embriões humanos para fi Il~ Il'l.qH'U I iro" dr ,>' i nada a vfTha ~ ssim a uferida ao projeto ue: co ntinuidade das pesljuls.I ... :'

5. (JU,II', lh' ... ,dIP '" .1111 1' ,1\" . 1111 ,I rclo~.lll de llllla 1I1l'[ ;11IIOfill t: tl ll ~Jgrij(la;:b, mu -I .I\,,' \.H: "; Ilg.ld.I !:. ..... 1.."il'IH. I;t ~ Ja vida ?

ó . E.\.htl' .dguUlaco lltro"l'rs ia ClIGI cm re IJ<;iiO ;'15 l'c lul<1::Hrum:u?

7 O qUl' Llzl'r (lHJ) u~ l'mb riOes eX lra· numerários?

A. (Jlltlll l' qUl' dc\'t' pcrllllllr a inseminação POS! munem do doador de sê­men ?

9 . COIIJ U 1I h..l'll tl \.Ir.1 dua~a() Jt..' orgãu::,?

10 . O c.\Lhlldo lk"t'ria le r o direito de vender seus ó rgãos ou tecidos?

6

ÉTICA E SOCIEDADE

SUMÁRIO: 6.1 Deveres f(lt.:OS na sociedack: 6.1.1 lh: que sociedade se Imla ?

6. 1.2 A tlka e a fome - 6.2 A ~ lica c o Estado: 6 .2. 1 A Êllca pública e a Etica pri vada; b .L2 A !:tica c a p \}l ílka - 63 A J': ti<.:;! c.t Idigd'l - h.4 A (: til"a C;I Inidi:l : 6.5 A_ ~tiC~t !'!'p'~! i cida~~ __

6.1 Deveres éticos na sociedade

A sociedade e uma união moral estável de uma pluralidade de pessoas proposta~ ao atingimento de finalidades comuns, mediame utilização de meios próprios.

É umagrupamentopennanente, não (ransitório. Ê uma união moral , vinculada por laços rortes de solidarkdade, nãu merameme acidental. A sociedade surge de maneira natura l, pois o homem é o animal político por excelência e só realiza seus objctivos individuais se conseguir aliar a própria [orça à dos demais.

O primeiro grupo social já roi examinado: ê a ramilia. A ou Ira sociedade a ser examinada, por sua ilnpOrtância, e o Estado. O Estado é a fo rma ~·i)da l mais abran­gente, a sociedade de fins gerais que permi(c o desenvolv imento, em se u srio, da~ individualidades e das demais sociedades, cham<'ldas de fins paniculare~ .

6.1.1 De que sociedades, trata?

A Sociedade brasilei ra é baslante complexa . Já se tornou comum afirmar-se que o Brasil é integrado por ilhas meditvais, ilhas prt-modernas , ilhas modernas e ilhas pós-modernas , Iodas num único espaço. Fortunas imensas convivem com a miséria mais indigna. Todos os padrões, todos os hábitos, lodos os usos podem ser encontrados neste mislo sociológico denominado Brasil.

A educação deficiente produz uma SOciedade voltada para o imediatismo. Parcela considerável da população vive nos limites da pobreza e depende de assis­tencialismo. Nada obstante, mergulha na mesma c única realidade produzida pela mfdia . Notadamente a televisiva. Tangida pelo consumismo.

Ê instigantc verificar como a ampliluJe e a simultaneidade das cOllluniGI('-)l'S

mudaram a fisionomia do comportamento brasileiro. A gradação econômka não impede cena homogeneização de valores. Alguns pensadores, quando analisam ,. cultura contelnporãnea com enfasc nesse lapso temporal t~Il11C denominado prC:StlllC:

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