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Programa de Estudos sobre a Civilização Indiana 2004-2005 Secretariado: Céu Diogo Coordenação Executiva: Teresa Lacerda e Zoltán Biedermann Projecto Científico e Coordenação - Ana Salema Faculdade de Ciências Sociais e Humanas Avenida de Berna, 26 C 1069-061 LIsboa Tel: (351) 217972151/ Fax: (351) 217977759 E-mail: [email protected] Sítio: http://www.cham.fcsh.unl.pt

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Programa de Estudos sobre a Civilização Indiana

2004-2005

Secretariado: Céu Diogo Coordenação Executiva: Teresa Lacerda e Zoltán Biedermann

Projecto Científico e Coordenação - Ana Salema

Faculdade de Ciências Sociais e Humanas

Avenida de Berna, 26 C 1069-061 LIsboa

Tel: (351) 217972151/ Fax: (351) 217977759 E-mail: [email protected]

Sítio: http://www.cham.fcsh.unl.pt

Da Índia conhecemos os elefantes, os faquires, o exotismo dos incensos, vagamente o

Yoga, Goa e as raves, cinema que nunca vimos, Tagore que nunca lemos e pouco mais. Das

Universidades portuguesas, os estudos da civilização indiana estão arredados. Todo o

trabalho de estudo de línguas, elaboração de dicionários, conhecimento dessa cultura que

foi desenvolvido séculos atrás está morto e arquivado. Orgulhamo-nos (?) da descoberta do

caminho marítimo para a Índia; somos todos Vascos da Gama e Afonsos de Albuquerque

de mares calmos mas nada sabemos do outro, daquele que supostamente descobrimos. A

Índia e a Ásia em geral são grandes blocos culturais e económicos de população jovem e

dentro de alguns anos vão absorver e potenciar enormes interesses do planeta. A Europa,

desde 1994 tem definida uma estratégia para a Ásia que contempla os vários aspectos da

actividade humana e alguns países europeus estão fortemente empenhados nesse futuro. A

Universidade tem um papel chave a desempenhar neste contexto e este Programa de

Estudos visa, primeiro que tudo, abrir uma porta para este Oriente multicultural e

multilinguístico.

Através de práticas e saberes queremos estudar para interagir com a civilização

indiana, conhecê-la para nos darmos a conhecer. Aqui, a Índia é o guru. Seremos

aprendizes dedicados e actuantes.

Fernando Cardoso 2004-10-07

Programa de Estudos sobre a Civilização Indiana O presente programa propõe manifestações de natureza diversa reunindo especialistas nacionais e estrangeiros - indianistas, antropólogos, historiadores, filósofos, linguistas, médicos, musicólogos, artistas: 1. Um conjunto de palestras integrando os três módulos de um Curso Livre: Índia – as

práticas e os saberes que abrange várias áreas da cultura indiana – tanto antigas como contemporâneas.

O primeiro módulo oferece uma introdução geral à história, pensamento e línguas desta civilização. O segundo módulo contemplará as práticas pelas quais invariância e mudança se cruzam e dinamizam. Será questão tanto de práticas médicas e rituais como daquelas que emergem de diferentes motilidades politicas do império, da diáspora, da globalização. O terceiro módulo compreenderá sabedorias e sapiências que, da filosofia à estética, se desdobram numa ampla paleta inteligível da natureza plural e plástica dos saberes e experiências pelos quais ainda hoje é determinada uma postura pan-indiana. 2. As Jornadas de Filosofia Indiana, contando com a participação de algumas das

figuras que na Europa mais se têm destacado neste domínio, oferecerão um espaço privilegiado de reflexão sobre questões e controvérsias que animam presentemente a filosofia indiana e comparada, tais como a doutrina do karman e a reencarnação, a proposta indiana de uma ecologia profunda, a grande controvérsia entre brâmanes e budistas, a representação grega da “filosofia dos bárbaros”, ou ainda a filosofia do ritual e do signo como novíssimas reflexões sobre as semiologias indianas.

3. Concerto de Miguel Coira e Goyo Irigoyen. De la aerofonía al sincretismo musical. 17

de Dezembro de 2004 – Lisboa, Mãe d'Água das Amoreiras 4. Três exposições Celebração da vida, exposição etnográfica sobre os warli Recolha de material e apresentação Dorothée Geffray 1 a 20 de Abril de 2005 – Lisboa, Casa do Registo da Mãe d'Água Exposição de fotografia: Cadernos de Viagem 2 − Fernando Cardoso 22 de Abril a 11 de Maio de 2005 – Lisboa, Casa do Registo da Mãe d'Água Exposição de Pintura: Índia: objectos, lugares, pessoas − Ana Mouga 13 a 31 de Maio – Lisboa, Casa do Registo da Mãe d'Água

Curso Livre Índia – as Práticas e os Saberes

Setembro de 2004-Maio de 2005

Introdução 23 de Setembro de 2004 Conferências de Abertura: Old and new StoryTelling in Índia − Anand Chabukswar

Once upon a time .... thus begins the journey of a word who found boons to weave myriad patterns called stories. In the colourful land of India, the tradition of stories old and stories told, spreads across vast tracks of Time. These stories are ancient and eternal, historical and universal, huge but light, dark and bright - they are so multidimentional that there is no guage to measure and hold them all. Yet, each single story holds the essence of all storytelling. Attention and imagination shape and alter through such stories. Some stories rule, some dies, and some get created. NOW, is the time of new stories. It also encapsules the story "losing stories" - stories of cultures and traditions that lived in orality; of consciousness that can be obliterated with stories gone amiss. Story-cicles are the spaces of storytelling in the now, in the new world, as it goes by. These are the spaces invested with the intention of "using stories" towards awareness and understanding of living. They explore existence and meaning through the oral word, listening and creativity in the context of the present. 18 de Outubro de 2004 Grandes Linhas da Civilizaçao Indiana Luis Filipe Thomaz (Universidade Católica Portuguesa) 19 de Outubro de 2004 Principais orientações do Pensamento Indiano Carlos Silva (Universidade Católica Portuguesa)

Da existência de uma ‘memória pensante’ (smriti) nesta tradição indo-ária e sua demarcação a partir do fundo védico. A inspiração brahmânica das Upanixadas e sua declinação ulterior na formação dos ditos “sistemas” da filosofia (darsana). Os graus de consciência e as diversas “escolas” (desde a “lógica” do Nyaya e da ‘cosmologia’ Vaisesika, até à moral de Mimamsa e ao “monismo” Vedanta, passando pelo “dualismo” Samkhya e pela “psicologia” do Yoga…). Mais do que a “visão oceânica”, ao modo da interpretação “hegeliana”, importa as clivagens do a fazer, do sentido até prático, pautadas pelo rito inteligente da Vida: ‘exóticos’ instrumentos do pensamento hindú, como sejam, o corpo, a respiração…, as emoções e os cheiros… a acção guerreira (tal no Bhagavad Gîta), e sobretudo sexo e amor (no dito “quinto Veda”, do Tantra), onde o esquecido hinduísmo pre-védico, em festa xivaíta se celebra ( e ainda nas formas 20 de Outubro de 2004 As línguas de uma civilização : o sãoscrito e os pracritos Margarida Lacerda (Instituto de Ciências Sociais e Políticas Ultramarinas)

As Práticas 9 de Novembro de 2004 Globalization and Difference: Cosmopolitanism Before the Nation-State − Akhil Gupta (Stanford University)

Is it possible to ask what a cosmopolitan history of cosmopolitanism might look like? More importantly, since the cosmopolite emerges as a category within Europe in the context of discovery (it is no surprise that Hakluyt is the first to use the term), is it in fact possible not to write a Eurocentric history of cosmopolitanism? As we seek to conceptualize discrepant cosmopolitanisms in the world today, we might well look to discrepant globalizations in and through which those cosmopolitanisms emerged. As the center of the world economy, the Indian Ocean trade routes connected places from the coast of East Africa and the southern Mediterranean on one edge to the Spice Islands, the coast of China, and the southwestern ports of Japan on the other end. These connections had a long history before the rise of Islam in the seventh century, but particularly thrived through the medium of Muslim seafarers from the seventh to the fifteenth centuries, ending when the Portuguese came and severely disrupted existing trade networks. Not only did these networks lead to an incredible exchange of ideas, technologies, and goods, they also brought people from different lands into contact with each other, often for extended periods of time. This created centers of cosmopolitanism that in their extensiveness and reach, were comparable, and perhaps even more intensive, than anything we can observe in the world today - at a very different moment of globalization. In this paper, I will draw upon some examples from the writings of some famous visitors to India in the fourteenth and fifteenth centuries, before the arrival of Vasco da Gama in 1498.

10 de Novembro de 2004 “A alteridade é uma mera ilusão”: algumas refexões sobre o poder criativo das tradições expressivas femininas na Diáspora Hindu − Susana Bastos (Faculdade de Ciências Sociais e Humanas) 11 de Novembro de 2004 Praticas que o Império tece: colonialismo e género na Índia − Rosa Perez (Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa) 13 de Dezembro de 2004 Pluralités rituelles et modalités d’action − Daniela Berti (Centre national de la Recherche Scientifique)

L'intervention présentera trois modèles rituels coexistant dans la même région pour déterminer les raisons qui font que les villageois recourent à l'un plutôt qu'à l'autre en cas d'affliction. La comparaison portera sur des séances de possession effectuées par le médium de la divinité de village ainsi que sur les expertises savantes du brahmane et sur les combats occultes du "magicien" tantrique. Le but de la comparaison est de montrer que le choix ne se fonde pas tellement sur l'efficacité attribuée à ces modèles or sur la nature des symptômes, mais plutôt sur la représentation que le consultant se fait de son propre rôle rituel dans les cadres thérapeutiques disponibles. 14 de Dezembro de 2004 L’astrologie et la transformation des rituels − Gilles Tarabout (École des Hautes Études en Sciences Sociales)

Dans une partie de l'Inde du Sud, au Kérala, les astrologues ne sont pas seulement sollicités pour établir les horoscopes et donner des conseils personnels à ceux qui viennent les consulter: ils sont aussi appelés par les comités de gestion des temples hindous pour tout projet d'agrandissement, ou pour remédier à certains problèmes. Dans ce cas, les astrologues ne font pas que répondre aux questions du comité, ils procèdent à une évaluation d'ensemble de la situation. Après avoir déterminé (astralement) le passé du temple, ses "défauts" actuels, ils indiquent les "corrections" qu'il convient d'apporter aux édifices et aux rituels. Par ce moyen, les temples et les rites se transforment

15 de Dezembro de 2004 Antyesti, o último sacríficio: morrer e ser cremado em Banaras − Mariana Caixeiro (Universidad Complutense de Madrid)

Esta conferência é a partilha de vivências e de procura de sentido sobre o significado da cremação e da atitude perante a morte no Hinduísmo. Procura dar um olhar panorâmico sobre os seus aspectos religiosos, filosóficos, sócio-culturais e económicos. Banaras, Varanasi ou Kaxi três topónimos para a cidade santa do hinduísmo onde os hindus vão morrer e ser cremados é o “cenário de fundo” a partir do qual tentaremos compreender o aparente paradoxo de uma morte tomada como parte integrante da vida e não um final- mas sim uma paragem de actividade física, um meio de reciclar jiva (a parte do ser que encarna), um recurso e uma oportunidade para este rever os seus “programas e politicas” - e a concretização da cremação no nada das cinzas finais enquanto prática social, momento de mobilidade e de afirmação social. 16 de Dezembro de 2004 Usos y contextualización de instrumentos musicales indo-asiáticos. − Miguel Coira (Universidad Complutense de Madrid)

El desarrollo de la conferencia pretende iniciar con una primera parte de introducción sobre la musica comparada y su relación con la utilización del aire como principio común en la mayor parte de la instrumentación musical. La aerofonía tiene para mi un especial interés para llegar a mostrar dos cosas: el proceso que subyace en el fenómeno del sincretismo en la música y como se están construyendo nuevas tradiciones y usos musicales en Europa a través de la importación de rasgos musicales procedentes de otras tradiciones culturales, como la asíatica, la oriental, pero también la aborigen australiana, etc. Una segunda parte, o bien combinada con la primera, consistiría en mostrar al público in situ como operan algunos de estos instrumentos, como por ejemplo, el shruti petti, la tampura, las arpas de boca, el canto difónico, los cuencos tibetanos y también el didgeridoo, que es el ejemplo por excelencia de los instrumentos aerófonos. 13 de Janeiro de 2005 The medical practices in the classical ayurvedic texts − Dominik Wujastyk (Wellcome Centre for the History of Medicine at UCL)

Ayurveda has been the dominant system of formal medicine in South Asia for most of the last two millennia. Greek medicine, transmitted through Islamic culture, became available in India during the reigns of the Sultans and Mughals, and also through the early Portuguese, Dutch, French and English colonial powers. The innovations in European medicine since the eighteenth century, have also been available in South Asia, and are now its main medical orthodoxy, although ayurveda continues to be funded and regulated at the government level and to be practised amongst many of the billion inhabitants of the sub-continent. This lecture will explore the theory of the earliest history of ayurveda, its chief

beliefs concerning the structure and function of the human body, and its doctrines of pathology and therapy. 14 de Janeiro de 2005 An introduction to contemporary practices of Ayurveda in India − Dagmar Benner (Cambridge University)

In India today, the ancient medical tradition of Ayurveda is part of the Government of India’s national health system. Ayurvedic education and practice are centrally controlled by the Central Council of Indian Medicine (CCIM) which belongs to the “AYUSH” Department of the Ministry of Health and Family Welfare. Government colleges teach an integrated system of Ayurveda, which combines ayurvedic with biomedical elements. The results of this approach have been widely criticised and discussions on how to reshape ayurvedic education are ongoing. In any case, government-regulated Ayurveda does not represent the full picture, as there exist at the same time traditional practices of Ayurveda that are not based on government-approved education. One of the most important and most respected of these traditions is the Keralan Ashtavaidya tradition. Their medical practice is based upon the teachings of the classical ayurvedic treatises but also incorporates therapies specific to the Keralan tradition that are not mentioned in the ancient texts. Further to the Ashtavaidya tradition, there are a variety of specialised folk medical traditions that are associated with Ayurveda. In this lecture, the different approaches to Ayurveda will be introduced with a brief sketch of their respective histories. A selection of documentaries that highlight the differences between the various approaches as well as their common ground will be shown and discussed. 15 de Janeiro de 2005 As praticas médicas do império: o caso de Goa − Cristiana Bastos (Instituto de Ciências Sociais)

Em 1842 o governo da Índia portuguesa aprovou os estatutos de uma Escola Médico-cirúrgica com um programa de estudos semelhante aos das Escolas do Reino. Cinco anos mais tarde o governo português reconhece oficialmente a instituição, que virá a ter um destino diferente das demais tentativas para organizar o ensino médico nas colónias portuguesas, as quais ou falharam ao fim de poucos anos (Luanda) ou nunca sairam do papel (Cabo Verde, Moçambique, de novo Luanda). Pelo contrário, a Escola de Goa virá a formar ininterruptamente gerações de médicos, cirurgiões e farmacêuticos que mais tarde virão a impôr-se nos serviços médicos coloniais portugueses. A sua continuidade institucional e posterior sucesso (já no século XX) não devem porém ocultar as reais fragilidades com que começou. É olhando para essas fragilidades que tentaremos obter um quadro sobre a diversidade e sobreposição de práticas médicas na Índia de administração portuguesa do século XIX

Os Saberes 21 de Fevereiro de 2005 A Sabedoria da India Antiga − Carlos Silva (Universidade Católica Portuguesa)

Ver (veda e “sadedoria”…). Do inventar de olhos e de cósmico eco em corpo imenso e por demais… à visão audível e só em sonho entrevista (ainda em sruti). Também um saber de saborear pelo seu contorno de palavra (sabda). Das muitas gramáticas imagéticas ao aforístico indicativo da sapiência da upanisad. A descoberta da mente (manas) na “mentira” (depois maya) do especular sem o si desse olhar luminoso (buddhi), desse sopro animante, a não confundir com o animado. Da miragem da reflexão (dos pramanas…) à evidência iluminativa de Atman – Brahman. Saber como auto-consciência (a questão da semântica de cit, citta…), ou união incônscia ?… As purificações desse “sabor” de ideal ser nos ‘amargos de boca’: dualização, pulverização ‘niilista’… Nirvana e anatta. Apesar de todo este “nada” ainda persiste o tat tvam asi de uma realização possível, no caminho yoguico que faz escala aquém e além do humano (então como prajña). Sabedoria cósmica, pois, nesse extremo cepticismo em relação à verdade, qual “gaia ciência” de via abrupta e ‘síntese’ só em lila. 22 de Fevereiro de 2005 As sapiências da India Moderna − Pedro Teixeira da Mota

É na Índia que sem dúvida se tem melhor preservado tradições espirituais milenárias, quer por via oral e escrita, quer por vivências possíveis com seres e locais ininterruptamente ligados com a experiência espiritual e a filosofia perene.

Os mestres e os ashrams, as sadhanas e os yogas são os pontos principais onde aflora esse imenso conhecimento e poder e que tem nos Himalaias e no Ganges as suas contrapartes físicas mais impressionantes.

Ao contrário das tradições espirituais de muitas das religiões mundiais (como o cristianismo e o islamismo, mais selectivos e obrigando a uma certa confessionalidade), ou ao contrário dos países modernos, dos quais o mais paradigmático é o Estados Unidos da América (que alberga como num supermercado do hamburger ao guru, desde que pouco se discrimine e se pague), a Índia moderna conserva os seus lídimos representantes das tradições mais puras, mais gratuitas e espontâneas, desde os parahamsas aos milhões de sannyasins e sadhus, seres que renunciaram ao mundo e vagueiam errantes em busca da iluminação, ou já na fruição da indescritível ananda, beatitude.

Descobrir os mestres, os ensinamentos e locais apropriados ao estado de consciência e de ser de cada um, iniciar as práticas conducentes à harmonização, ao silêncio, à iluminação, à libertação ou união torna-se então o principal desiderato daqueles que na busca das fontes do auto-conhecimento e da sabedoria peregrinam à Índia.

A presente comunicação visa transmitir alguns dados experienciais de várias penetrações nos domínios luxuriantes da Índia e testemunhar alguns ensinamentos e mestres que permanecem como faróis no Caminho que nos conduz da «ignorância ao conhecimento, das trevas à luz, do irreal ao real, do não ser ao ser». 29 de Março de 2005 Beautifying beauty: traditional paths − Ghanashyam Marda (Ayurvedya) 30 de Março de 2005 Atelier pratico sobre rangoli e mendi − Suraj Tapadiya (Deenanath Mangeshkar Hospital) A India e a fabricaçao da natureza humana − Ana Salema (Centro de História de Além-Mar) 4 de Abril de 2005 – O Ayurveda 5 de Abril de 2005 – O Yoga 6 de Abril de 2005 – O ritual A exploração das prescriçÿes, dos dispositivos e dos feitos da experiência psicagógica na fabricação de uma outra natureza humana tornará evidente a sua transgressividade. Partir-se-á de uma breve reflexão sobre o que é, em contexto indiano, a natureza humana (transnatureza) e do modo como são ultrapassados os supostos limites da experiência, para se observar o modo como pelas práticas psicagógicas se abrem as passagens que nos levam do "corpo próprio" ao "corpo impróprio" ou da pessoa à não-pessoa, e do modo como elas requerem uma experiência integral do corpo.

O ayurveda, o yoga e o ritual serão os domínios de estudo privilegiados para esta reflexão, cada um oferecendo diferente "manual de instruçoes" para a fabricação de um insólito humano, mas todos referindo ao mesmo instrumento : o corpo. Dele partindo e a ele chegando toda a acção (karman).

É justamente no domínio da experiência do corpo - com o corpo e pelo corpo - que a India nos mostra de modo singular o que falta aos nossos saberes, fundamentalmente representativos, para dissipar os obstáculos que, impedindo a sua integração no conjunto da experiência, impedem o acesso ao bem-estar que é, aqui, um bem-ser, um espaço feliz (sukha). 1. A confluência de orto e heteropraxias no ayurveda

A análise de algumas passagens da Carakasa¾hit¢ (Compêndio de Caraka, texto simultaneamente fundador e memorial do ayurveda) tentará mostrar a natureza da iconicidade da experiência do corpo, os modos como ela é trabalhada pelo vaidya -tanto para o diagnóstico como para o tratamento - e de que forma ela é a primeira e principal via de

acesso ao processo de cura. Principal mas não única pois cruza-se, toca e atravessa outras uma vez que o corpo humano se expande aos não humanos, aos deuses, à natureza, aos astros, a entidades várias com as quais as trocas - actuais ou virtuais - são constantes. Assim se reconhecerá que o ayurveda não é uma medicina stricto sensu. Ele é, literal e praticamente, um saber sobre a vida (que se quer sukha) nas suas múltiplas dimensÿes e fluires, não podendo excluir o ritual, o yoga, a astrologia, a ecologia ou a moral, do mesmo modo que não pode excluir a anatomia, a farmacologia, a botânica ou a fisiologia. Ele é ainda, e sem contradição, um saber sobre os modos de entrar na morte em vida niv²tti, mok¼a. 2. O corpo entre representação e experiência no yoga

Os gimnosofistas, sábios nus e despojados, como lhes chamavam os gregos, não são meros monumentos históricos de uma gloriosa audácia passada de solidarizar os três instrumentos pelos quais o acto (karman) se faz potência (¡akti) - corpo, mente, palavra. Eles são também, e ainda hoje, entidades vivas, talvez as únicas a par dos mestres do ritual, que vão assegurando a irredutibilidade ao movimento de integração e modernização de conhecimentos, práticas e experiências invariáveis e invariavelmente transmitidas. Hoje já não lhes chamamos gimnosofistas nem faquires. Chamamos-lhes yogis, sannyasis e s¢dhus. Através de um estudo introdutório de algumas passagens dos Yogas¦tra de Patañjali, texto igualmente fundador e memorial, procurar-se-á por um lado compreender o yoga na sua tripla dimensão de ponto de vista (dar¡ana), de prática (s¢dhana) e de experiência (sam¢dhi); e por outro lado mostrar o papel da imagem como operadora das transformaçÿes visadas. 3. A iconicidade da experiência do mundo no ritual

O ritual é indiscutivelmente o domínio mais presente e actuante na vida indiana, o melhor preservado e o mais preservável pela natureza própria do conjunto de saberes de onde emerge, das práticas que o realizam e das experiências que o ratificam, uma particular espécie de "sem-sentido" de que se procurará discernir o sentido.

Ritual é uma palavra que nós utilizamos para indicar realidades relativamente diferenciadas no tempo e nos grupos sociais : yajña, p¦j¢, medha, kratu, etc.

Explorar-se-á a incontornável oposição entre, por um lado, o sacrifício védico (ainda bramânico), e por outro lado a p¦j¢. Aquele sangrento, sem templo nem imagens, de submissa dominação no forçar a divindade a satisfazer necessidades interessadas, bem e largamente atestado nos textos (desde o Atharvaveda às Sa¾hit¢s e Brahma½¢s), em que o acto sacrificial (yajña) é mais importante que a própria divindade. A p¦j¢, rito de homenagem, de profunda aceitação e veneração, de hospitalidade (no duplo sentido de hospes), cuja devoção multiplica imagens e templos (privados ou públicos), espaços do espaço singularmente afectados à comunicação e trocas com as entidades divinas.

16 de Maio de 2005 Le temple et l’image: architecture et iconographie dans le monde indien − Bruno Dagens (Université de Paris III)

L’architecture des temples dans le monde indien est une architecture de sculpteurs. Vu de l’extérieur ces temples apparaissent le plus souvent comme de gigantesques masses sculptées qui leur font supposer une structure interne bien différente de ce qu’elle est en réalité: les uns en Inde du sud ou en Asie du sud-est feignent d’être des édifice aux étages multiples, alors qu’ ils ne comportent qu’un rez-de-chaussée surmonté par une sorte de longue cheminée sur l’habillage extérieur duquel sont sculptés des étages qui ne sont donc que de «faux-étages»; d’autres en Inde Nord – à Khajuraho par exemple – ont une superstructure qui donne l’illusion de la présence d’innombrables chapel les, alors qu’il ne s’agit que d’un simple décor sculpté. Dans un cas comme dans l’autre le procédé n’a pour but que de magnifier le temple et par là même son dieu titulaire. La sculpture ne se limite pas naturellement pas à ces fictions architecturales, et les images qui jouent une grand rôle dans la pratique religieuse occupent une grande place sur les murs du temple. Banalement, pourrait-on dire, elles viennent peupler les façades de façons très variées – statues dans des niches, frises de bas reliefs, personnages dans des motifs décoratifs etc. – qui témoignent de programmes religieux très clairement définis et imbriqués étroitement à l’architecture. Cependant les choses peuvent aller plus loin: ne se contentant plus d’habiller des façades avec des images, on fait parfois du temple lui même une image. Les procédés sont divers – ici le temple est un Linga, représentation symbolique de Siva, là il est le corps d’un dieu, tandis qu’ailleurs encore l’architecture laisse transparaître l’image à travers une claire-voie – mais il s’agit toujours de célébrer le dieu à travers la traduction de concepts théologiques très abstraits et parfois absconds, qui par la simple vertu de leur traduction architecturale gagnent une lumineuse clarté. 17 de Maio de 2005 Ícones na rua, templos de papel − Fernando Cardoso

Vestem-se e despem-se os deuses; abundam lingams à sombra das árvores; o grafismo provoca o nosso olho distante; a composição é regrada e antiga; puranas do olhar leêm a mitologia; fugas de perspectiva inquietam a geometria; darshana – exercícios de ver. 18 de Maio de 2005 Adopção e esquizofonias: o fascínio da “musica indiana” no discurso da pos-colonialidade − Susana Sardo (Universidade de Aveiro)

A música constitui hoje um dos testemunhos mais evidentes da poscolonialidade do planeta. Seja através de processos de invasão musical seja por meio de trocas culturais, as diferentes músicas têm agora pertenças limitadas e transformaram-se numa espécie de sons

esquizofónicos um conceito que Steven Feld define como o acto de afastar a fonte musical da sua origem. A “música indiana”, porventura um dos territórios musicais estruturalmente menos permeáveis ao diálogo com outras músicas, é hoje um ávido receptáculo de alguns paradigmas ocidentais (géneros musicais, contextos de desempenho, modelos de interpretação), e, sobretudo, transformou-se num importante inspirador dos músicos e compositores ocidentais em quase todos os domínios da música, desde o Jazz, ao Rock, ao Trance e à música erudita contemporânea. Mas este novo estado da música, em muitos casos designado por world music, não é mais do que uma relação quase neocolonial. Aqueles que se interessam pela música dos “outros” não o fazem pelo interesse que os outros lhe merecem enquanto músicos mas sim porque potencialmente detêm ingredientes musicais que podem reabilitar a sua própria música favorecendo-a perante as oportunidades do mercado. A minha contribuição procura reflectir sobre este problema e analisar o modo como a imagem musical da Índia, no passado quase sacralizada pelo ocidente, se redefine hoje no mundo pós-colonial constituindo um dos mais eficazes processos de diálogo inter-cultural.

Mulher da casta Dom em Varanasi

Estela a Nagexuar (Gokarna)

Sadhu

Sadhu tocando cancões devocionais

(Gokarna)

Kapila Vrshabhadhvajeshvara, um aspecto de Vixnu (Banaras)

Jornadas de Filosofia Indiana

26 a 27 de Abril de 2005

Introdução Pela primeira vez que se abre na paisagem universitária portuguesa um espaço de encontro e reflexão sobre a filosofia indiana e as possíveis abordagens comparatistas, antropológica e etnográfica. A sua ausência do ensino e da investigação tem favorecido, entre nós, a persistência daqueles preconceitos que no século XIX se erigiram em jeito de barricada face ao desconcertante exotismo da tradição filosófica indiana. A realização destas jornadas visa muito particularmente: 1. Melhorar o conhecimento o conhecimento e a compreensão de uma das

tradições filosóficas mais variada e complexa, tornando acessível ao meio filosófico e orientalista português alguns dos temas e questões que animam os trabalhos e investigações neste domínio.

2. Retomar, em termos simples, não só o esforço inaugural de Masson-Oursel de há seis ou sete anos decénios, datado mas não ultrapassado, de reconsuzir a estranheza da Filosofia Indiana à origem euro-asiática da Filosofia Grega, como ainda, o esforço mais recente de Michel Hulin, de no seu ensino da Filosofia Indiana e Comparada em Paris IV, criar numerosas pontes de inteligibilidade para a abordagem filosófica da filosofia indiana.

3. Discutir sobre o interesse e oportunidade da abordagem comparatista em Filosofia hoje – em que quadro, a partir de que fontes, com recursos a que métodos e instrumentos, por exemplo?

Interrogar a própria tradição filosófica europeia por intermédio da filosofia indiana. Não a montante, nem a jusante, não a de ontem, nem a do amanhã, mas a de hoje e aqui, em Portugal, em França, na Europa, na Universidade, na Investigação, nas escolas.

Gilles Tarabout e Roger-Pol Droit aceitaram a estimulante tarefa de interpelar e discutir as filosofias e a Filosofia tentando multiplicar os pontos de vista, os ecos de tantas vozes, as imagens compósitas que cada um de nós retraçará seguramente.

Espera-se que a viva participação dos filósofos, orientalistas e antropólogos portugueses neste debate contribua para alargar e aprofundar as múltiplas aberturas.

Programa La philosophie des barbares : la représentation grecque des philosophes indiens − Roger-Pol Droit (Centre National de la Recherche Scientific) O signo e os problemas da significação − Carlos Silva (Universidade Católica Portuguesa) Doctrine of karman and rebirth: origin and development in the Indian speculations − Paola Rossi (Università di Padua) La controverse sur l'âtman : 25 siècles de malentendu entre bouddhistes et brahmanes − Michel Hulin (Paris IV) La « Vie du Bouddha » : récit historique ou mise en scène de la doctrine à travers un modèle idéal ? − Victoria Lyssenko (Russian Academy of Sciences) Y-a-t-il une philosophie du rituel ? − Charles Malamoud (École Pratique des Hautes Études) Les philosophies de la nature et du vivant : l’écologie indienne ancienne − F. Zimmermann (École des Hautes Études en Ciences Sociales) Les perspectives ouvertes par une approche comparatiste en Philosophie Mesa redonda com a participação de: − Michel Hulin, − Jorge Croce Rivera, − Gilles Tarabout, − Roger-Pol-Droit

-Celebração da vida- Exposição etnográfica sobre os warli

Recolha de material e apresentação Dorothée Geffray

1 a 20 de Abril de 2005

Lisboa, Casa do Registo da Mãe d'Água

Os Warli habitam nas colinas do distrito de Thane (que se estende do norte de Bombaim até ao sul do Gujarat). Com vidas simples, inspiradas pelo ritmo da natureza, eles celebram as épocas das sementeiras e das colhei tas com pinturas simbólicas nas paredes das suas cabanas. Estas representam tais ocupações e festividades com a intenção de propiciar fertilidade e abundância da terra. Além deste trabalho de subsistência, a floresta é a principal fonte de rendimento dos Warli que se auto-denominam “povo da floresta”.

Porém, nestes últimos trinta anos, a desflorestação maciça e sistemática tem vindo a degradar drasticamente a sua relação especial com a floresta, obrigando-os assim a diversificar as actividades de subsistência e a ajustar as suas necessidades às novas condições.

A habilidade pictórica desenvolvida para as celebrações festivas, associada ao incentivo da politica governamental no sentido da preservação da cultura tribal, levam hoje os Warli a desviar as tradições figurativas do seu prévio contexto socio-cultural para um novo contexto económico, produzindo pinturas narrativas que retratam a natureza como enquadramento da gesta quotidiana, das quais se destacam principalmente as ocupações agrícolas.Esta exposição de pinturas, máscaras e fotografias, pretende mostrar os modos de vida e de expressão desta população tribal.

-Cadernos de Viagem 2-

Exposição de fotografia de Fernando Cardoso

22 de Abril a 11 de Maio de 2005 Lisboa, Casa do Registo da Mãe d'Água

O bronze e o bordão, ritmam o espaço próximo do açafrão suado na descida para a água. É a hora da madrugada.

Pequenos sóis despontam em archotes de manteiga. Camas de fogo onde repousam flores, cinzas, as almas dos peregrinos.

Danças de mãos em concha restabelecem laços mitológicos. Por sobre a água, rituais de panos e corpos molhados ligam o Cosmos às bocas.

Preces silenciosas saturam as paisagens ribeirinhas e os corvos riscam desenhos de dor. O sândalo, incendeia-se em libertação para não voltar a renascer.

É ainda a hora da madrugada. Da varanda sobre o Ganges irrompe o disco solar imenso, incansável, poderoso.

É a hora barroca. Começa mais um dia na cidade da luz.

Índia: objectos, lugares, pessoas

Exposição de Pintura de Ana Mouga

13 a 31 de Maio de 2005 Lisboa, Casa do Registo da Mãe d'Água

A viagem inicia-se levantado voo. O tempo recomeça para o olhar que larga o porto de Lisboa rumo à Índia.

Ao chegar é-se abraçado por essa terra-mãe mítica, viva e receptiva, fervilhante de formas e de seres e todos os conteúdos humanos.

Pessoas, lugares, objectos.

Hábitos diferentes daqueles do porto que se deixou. Padrões tecidos de movimento, cor, cheiros e som que nos trespassam e reconduzem a um lugar interno misteriosamente familiar. Lógicas e geometrias próprias, ritmos de vivência marcados pela presença dos deuses.

Os quadros recortados do filme que passa fixam-se apenas em linhas no papel. Fios desenrolados de memória que fazem a ponte para cá. Pecinhas caídas do caleidoscópio agora reanimadas...

Reencontram-se pessoas...

Revisitam-se lugares...

Objectos trazidos lembram o quotidiano ritual