processo nº 0023877.70.2013.8.19.0078

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Estado do Rio de Janeiro Poder Judiciário Tribunal de Justiça Comarca de Búzios Cartório da 2ª Vara Dois, S/N Estrada da UsinaCEP: 28950-000 - Centro - Armação dos Búzios - RJ e-mail: [email protected] 110 MACVILLAS Fls. Processo: 0023877-70.2013.8.19.0078 Classe/Assunto: Ação Civil de Improbidade Administrativa - Enriquecimento Ilícito / Improbidade Administrativa / Atos Administrativos Autor: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Réu: ANTONIO CARLOS PEREIRA DA CUNHA Réu: CARLOS HENRIQUE DA COSTA VIEIRA Réu: ANDRE GRANADO NOGUEIRA DA GAMA Réu: MUNICIPIO DE ARMAÇÃO DOS BUZIOS ___________________________________________________________ Nesta data, faço os autos conclusos ao MM. Dr. Juiz Marcelo Alberto Chaves Villas Em 05/12/2014 Sentença Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBLICA por ato de improbidade administrativa, de procedimento comum, de rito ordinário, que foi proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO em face de ANTÔNIO CARLOS PEREIRA DA CUNHA, CARLOS HENRIQUE DA COSTA VIEIRA, ANDRÉ GRANADO NOGUEIRA DA GAMA e MUNICÍPIO DE ARMAÇÃO DOS BÚZIOS. A exordial consta de fls. 02/35, tendo sido instruída com o respectivo Inquérito Civil Público n° 12/2008 instaurado no âmbito da Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva - NÚCLEO CABO FRIO - DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. O Parquet alegou sobre os fatos descritos na exordial, em síntese, que a municipalidade no período do mandato eletivo do primeiro réu como Prefeito do Município de Armação dos Búzios, entre janeiro de 2005 até dezembro de 2008, contratou diretamente através de atos ímprobos atribuídos a todos os demandados, mormente com autorização de pagamentos em processos administrativos de dispensa de licitação, em violação ao disposto contido no artigo 26 da Lei n° 8.666/93, que disciplina as Licitações e Contratações do Poder Público: serviços de diferentes empresas, em especial, da empresa BARNATO COMÉRCIO DE PEÇAS LTDA. ME, em manifesto fracionamento indevido do objeto contratado. Narra o Ministério Público ainda que tais serviços de manutenção da frota municipal de veículos lotados nas Secretarias de Governo, de Saúde e de Promoção Social, além de aquisições de peças, foram contratados com a utilização de dispensa de licitação e da modalidade de licitação "Convite", que é menos rigorosa. Obtemperando ainda o Parquet que as compras poderiam ter sido feitas conjuntamente, nos moldes do § 3° do artigo 15, da Lei de Licitações. Salientou o Parquet que tais atos foram perpetrados pelos agentes públicos acima mencionados, que eram detentores de uso de dinheiro público e ordenadores de despesa, em diversos processos administrativos. Frisando que tais fatos ocorreram mediante a participação direta do então Prefeito Municipal Antônio Carlos Pereira da Cunha, primeiro demandado, já que o mesmo autorizara expressamente, na qualidade de Chefe do Poder Executivo Municipal, as despesas conforme apurado na inquisa ministerial pelo cotejo dos diversos processos administrativos

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Improbidade Administrativa. Município de Armação dos Búzios. Comarca de Armação dos Búzios.

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Fls.

Processo: 0023877-70.2013.8.19.0078

Classe/Assunto: Ação Civil de Improbidade Administrativa - Enriquecimento Ilícito / Improbidade Administrativa / Atos Administrativos Autor: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Réu: ANTONIO CARLOS PEREIRA DA CUNHA Réu: CARLOS HENRIQUE DA COSTA VIEIRA Réu: ANDRE GRANADO NOGUEIRA DA GAMA Réu: MUNICIPIO DE ARMAÇÃO DOS BUZIOS

___________________________________________________________

Nesta data, faço os autos conclusos ao MM. Dr. Juiz Marcelo Alberto Chaves Villas

Em 05/12/2014

Sentença Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBLICA por ato de improbidade administrativa, de procedimento comum, de rito ordinário, que foi proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO em face de ANTÔNIO CARLOS PEREIRA DA CUNHA, CARLOS HENRIQUE DA COSTA VIEIRA, ANDRÉ GRANADO NOGUEIRA DA GAMA e MUNICÍPIO DE ARMAÇÃO DOS BÚZIOS. A exordial consta de fls. 02/35, tendo sido instruída com o respectivo Inquérito Civil Público n° 12/2008 instaurado no âmbito da Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva - NÚCLEO CABO FRIO - DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. O Parquet alegou sobre os fatos descritos na exordial, em síntese, que a municipalidade no período do mandato eletivo do primeiro réu como Prefeito do Município de Armação dos Búzios, entre janeiro de 2005 até dezembro de 2008, contratou diretamente através de atos ímprobos atribuídos a todos os demandados, mormente com autorização de pagamentos em processos administrativos de dispensa de licitação, em violação ao disposto contido no artigo 26 da Lei n° 8.666/93, que disciplina as Licitações e Contratações do Poder Público: serviços de diferentes empresas, em especial, da empresa BARNATO COMÉRCIO DE PEÇAS LTDA. ME, em manifesto fracionamento indevido do objeto contratado. Narra o Ministério Público ainda que tais serviços de manutenção da frota municipal de veículos lotados nas Secretarias de Governo, de Saúde e de Promoção Social, além de aquisições de peças, foram contratados com a utilização de dispensa de licitação e da modalidade de licitação "Convite", que é menos rigorosa. Obtemperando ainda o Parquet que as compras poderiam ter sido feitas conjuntamente, nos moldes do § 3° do artigo 15, da Lei de Licitações. Salientou o Parquet que tais atos foram perpetrados pelos agentes públicos acima mencionados, que eram detentores de uso de dinheiro público e ordenadores de despesa, em diversos processos administrativos. Frisando que tais fatos ocorreram mediante a participação direta do então Prefeito Municipal Antônio Carlos Pereira da Cunha, primeiro demandado, já que o mesmo autorizara expressamente, na qualidade de Chefe do Poder Executivo Municipal, as despesas conforme apurado na inquisa ministerial pelo cotejo dos diversos processos administrativos

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maculados. Prossegue na peça vestibular o Ministério Público aduzindo que, o segundo demandado, Sr. Carlos Henrique da Costa Vieira, na qualidade de Secretário de Governo, foi quem, além de ter solicitado os serviços e compras nos processos administrativos destinados à sua Secretaria, subscreveu notas de Empenho, ordenando as aludidas despesas, como inferido, por exemplo, no processo administrativo 1169/2007, com atos de dispensa de licitação para contratações diretas de serviços no processo administrativo acima mencionado, iniciando apenas com a solicitação de aquisição e serviços e notas de emprenho respectivas, sem a observação dos princípios e das regras jurídicas que norteiam a regular contratação da Administração Pública. Esclarece ainda o Ministério Público que terceiro demandado, Sr. André Granado Nogueira da Gama, então Secretário de Saúde, hoje atual Prefeito do Município de Armação dos Búzios, ordenou despesas em vários processos administrativos da mesma espécie sob a gestão de sua Secretária, com atos de dispensa de licitação para contratações diretas de serviços em diversos processos administrativos, iniciando apenas com a solicitação de aquisição e serviços e notas de emprenho respectivas, também sem qualquer observância dos princípios e das regras jurídicas que norteiam a regular contratação da Administração Pública. O Ministério Público na exordial especifica que a presente Ação Civil Pública tem por base o Inquérito Civil Público n° 12/2008, corroborado pelo parecer emitido no processo TCE n° 223.275-08/2005 tramitado no Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, que instrui ainda o Inquérito Civil Público n° 15/2010, no qual se encontra acostada decisão do aludido Tribunal de Contas condenando e notificando o Prefeito Municipal Antônio Carlos Pereira da Cunha do cometimento dos atos ilícitos ora analisados. O Parquet salienta, portanto, que as contratações diretas dos aludidos serviços e aquisições, assim como os correlatos pagamentos conduziram às violações das normas previstas nos artigos 23, 24, incisos II e IV e 26, todos da Lei n° 8.666/93, bem como importaram em afronta direta à regra constitucional da obrigatoriedade de licitação, insculpida no artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal, além de afrontarem às normas legais que regem a liquidação de despesas, previstas na Lei n° 4.320/64, que estatui Normas Gerais de Direito Financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. Prossegue na peça vestibular o Ministério Público aduzindo que, por exemplo, na análise do processo administrativo n° 03/05 F, os técnicos do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro constataram contratações com dispensas de licitação indevidas, para aquisição de peças e consertos de veículos. Discorre ainda o Parquet na presente Ação Civil Pública que, em relação ao segundo demandado, então Secretário Municipal de Governo, constatou-se que no ano de 2005 o mesmo, mediante autorização do então Prefeito Municipal e, sob os auspícios de um 'pseudo' argumento da existência de situação excepcional prevista no artigo 24, inciso IV, da Lei n° 8.666/93, realizou contratações diretas, sem que, contudo, a referida hipótese legal estivesse configurada, violando assim o dever geral de licitar insculpido no artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal. Destacando que o valor total apurado pela Corte de Contas nessas contratações levantadas pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro atingiu o patamar de R$ 156.991/07 (cento e cinquenta e seis mil, novecentos e noventa e um reais e sete centavos), não constando nos autos comprovação de efetiva apresentação de notas fiscais atestadas pela prestação dos serviços, embora a Corte de Contas informe sua emissão no processo de pagamento n° 3889/2005. Destarte, salienta o Parquet que o Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro reputou que os aludidos contratos administrativos foram justificados sob uma fundamentação equivocada, autorizando-se ilegalmente a contratações de serviços como sendo de natureza emergencial, que em nenhum deles restou configurada.

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O Ministério Público ressalta que em processo junto ao Tribunal de Constas do Estado do Rio de Janeiro, no ano de 2005, relativas às contratações ilegais acima narradas feitas pelo segundo demandado, o Prefeito Municipal, primeiro réu foi, então, multado e notificado pela aludida Corte de Contas, haja vista que cotejado que não houve qualquer ato formal para adjudicação de despesas ou ordem consequente para emissão de empenhos e de seus instrumentos, o que é gravíssimo. Ao invés, houve, tão somente, solicitação de serviços por parte do então Secretário Municipal Executivo de Transportes, a saber, do segundo réu, através de Memorando n° 07/2005, despachado imediatamente pelo então Chefe de Seção, sob os auspícios da manifestação da Procuradoria do Município de subsunção da hipótese ao disposto no artigo 24, inciso IV, da Lei n° 8.666/93. O Ministério Público também informou que dentre as irregularidades formais cometidas pelos réus foram destacadas pela Corte de Contas as ausências de justificativas dos preços contratados e a razão da escolha dos fornecedores, o que demonstra total desrespeito à observância de correição legal almejada para o processo interno de contratação do Poder Público, além de obtemperar o Ministério Público que o Tribunal de Constas do Estado do Rio de Janeiro constatou em tais contratações diretas e ilegais engendraram autorizações de despesas sem prévio empenho, violando-se assim o disposto no artigo 60 da Lei n° 4.320/64. O Ministério Público também ressalta que, apesar das constatações das manifestas irregularidades e subsequente notificação procedida ao Prefeito Municipal pela Corte de Constas haurida no bojo do processo TCE n° 223.275-08/2005, as condutas foram reiteradas nos anos seguintes, demonstrando-se assim um completo descontrole do setor e confirmando-se a falta de zelo nos processos administrativos de licitação e dispensa, com falta de numeração de páginas, escrituração adequada, processos autônomos derivados de um mesmo fornecedor, maculando-se, portanto, o controle eficiente conforme dispõem os artigos 37 da Constituição Federal e artigos 1°, 2° e 3°, da Lei n° 8.159/91, que dispõe sobre a política nacional de arquivos públicos e privados e dá outras providências. O Parquet aduz na exordial que em razão do descalabro administrativo narrado nas recomendações da Corte de Constas no processo TCE n° 223.275-08/2005, se verificou extremamente complexa a sua investigação, que, nesta demanda, contudo, concluiu de modo peremptório a efetiva existência de despesas fracionadas e sem licitação, com inúmeras dispensas ilegais a configurar atos de improbidade administrativa, apesar ainda do resultado genérico da Comissão Parlamentar de Inquérito instaurada no âmbito do Poder Legislativo Municipal da cidade de Armação dos Búzios para apuração dos mesmos fatos. Destacou então o Parquet que, desde 2005, os réus, agentes públicos municipais incorreram na prática de inúmeros atos ilegais ante a contratação de serviços de manutenção de frota de veículos e correlatos, sob os auspícios de situações emergenciais não configuradas na hipótese do artigo 24, inciso IV, da Lei de Licitações: quer pelo tempo decorrido desde o início da gestão do 1° réu, suficiente para promover certame durante quatro anos; quer pela natureza intrínseca do serviço, o que independentemente de grandes ilações para a conclusão de inexistência de situação emergencial ou calamitosa, assentou-se inicialmente na mera sucessão do governo municipal e constatação de veículos imprestáveis, muito embora as contratações diretas tenham, como apurado pelo órgão ministerial, continuado apesar das recomendações do Tribunal de Constas do Estado do Rio de Janeiro, nos idos de 2005, estendendo-se tais espúrias contratações aos anos de 2006 e 2007. O Ministério Público então sustentou que o dispositivo legal que permite a contratação direta amolda-se tão somente para os bens necessários ao atendimento de situação emergencial ou calamitosa, que pudessem comprometer a segurança das pessoas, obras e serviços, ou causar prejuízo e dano, o que na hipótese ressalta ainda não ter ocorrido. Destacando que a hipótese em tela de conserto de veículos não se amolda a previsão legal contida no artigo 24, inciso IV, da Lei

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de Licitações. Constando ainda como obtempera o Parquet dos autos do Relatório da Corte de Contas que o Município de Armação dos Búzios para liquidação das despesas de contratações diretas realizadas nessas contratações emergenciais fictas deixara de apresentar os procedimentos formais que deram ensejo a tais contratações diretas e a justificação para a realização de tais pagamentos. Assim, o órgão ministerial relata na peça vestibular que mesmo a par das recomendações do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro a partir das irregularidades verificadas em 2005, a Prefeitura de Armação dos Búzios continuou optando pela contratação direta, pelo fracionamento das compras e tendo realizado para consertos de carro uma única licitação convite a qual resultara a adjudicação do contrato administrativo a sociedade empresária Barnato Comércio de Peças Ltda. ME. Prossegue na peça vestibular o Parquet ao destacar que o vultoso montante despendido com conserto de veículos por meio de contratações diretas fraudulentas perpetradas em meio a um imenso descalabro administrativo fora objeto pelo órgão ministerial denominado de GATE Patrimônio, Corpo de Contadores do Ministério Público, conforme informação técnica n° 393/2013. Assim, apurado pelo Inquérito Civil n° 12/2008 que no âmbito da Prefeitura de Armação dos Búzios foram realizadas, ao menos, 32 processos administrativos de pagamentos fracionados realizados, em sua maioria com a contratação direta da empresa Barnato Comércio de Peças Ltda. ME. Destacando-se ainda a existência de outro processo administrativo que redundou na dispensa de procedimento licitatório 03/05 F, em favor de D.J Felipe Mecânica ME, no valor de R$ 7.999, 86 (sete mil novecentos e noventa e nove reais e oitenta e seis centavos), que por centavos se amoldou a hipótese de dispensa prevista no artigo 24, inciso II, da Lei n° 8.666/93. O órgão ministerial então aduz que em prosseguimento às investigações, restou ouvida a principal empresa responsável pelo fornecimento dos serviços de manutenção, empresa Barnato Comércio de Peças Ltda. ME, a qual anexou aos autos um enorme quantitativo de notas fiscais, além de notas de empenho e peças de processos de contratação com o Município. No entanto, ao analisar as referidas notas fiscais, foi constatado pelo órgão ministerial GATE, que o quantitativo de R$ 299.289,25 (duzentos e noventa e nove mil duzentos e oitenta e nove reais e vinte e cinco centavos) sequer possuía lastro nos processos e empenhos documentados nos autos, fato comprovador da concorrência para que terceiro se enriquecesse ilicitamente, bem como que, mesmo aqueles que foram autorizados por processos administrativos de dispensa, com indevido fracionamento de despesa, totalizando o valor de R$ 390.284,73 (trezentos e noventa mil duzentos e oitenta e quatro reais e setenta e três centavos), pelo seu montante daria já ensejo a adoção de procedimento licitatório escorreito na modalidade de concorrência ou pregão. Destaca, portanto, a vestibular que a par das irregularidades e ilegalidades mencionadas, todos os processos de solicitação e pagamento se iniciaram por solicitação do Secretário Municipal de Saúde ou de Governo, principais ordenadores de despesas, e mediante autorização expressa do Prefeito Municipal, já consciente, desde 2005, dos problemas detectados em sua gestão, consoante lhe fora alertada e recomendada a correção pela Corte de Contas, o que na visão ministerial evidencia a prática dos atos de improbidade administrativa perpetradas pelos réus. Cita a inicial em elucidação que conforme se depreende do item 03 do relatório técnico anexado aos autos pelo GATE, foram identificadas 464 (quatrocentas e sessenta e quatro) notas fiscais, relativas a mercadorias e serviços, emitidas pela sociedade empresária Barnato Comércio de Peças LTDA ao Município de Armação dos Búzios, no período de março do ano de 2005 a setembro de 2007, totalizando o valor total de R$ 557.885,04 (quinhentos e cinquenta e sete mil oitocentos e oitenta e cinco reais e quatro centavos). Citando que, além disso, foram emitidas 97 (noventa e sete) notas fiscais, pela sociedade empresária Lagos Tecno - Car Som e Acessórios LTDA, relativas a mercadorias e serviços ao referido ente político, no período de março de 2005 a

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agosto de 2007, totalizando o montante de R$ 123.689,08 (cento e vinte e três mil seiscentos e oitenta e nove reais e oito centavos). Isto tudo através de contratações realizadas quase que exclusivamente com dispensa de licitação, pois detectada apenas uma licitação através da modalidade licitatória "Convite", que sequer seria a apropriada, dado o fracionamento ilícito de despesas. Salientando também o Parquet a verificação da emissão de 07 (sete) notas fiscais, referentes a serviços prestados pela sociedade empresária D.J. Felipe Mecânica - ME ao Município de Armação dos Búzios, no período de março do ano de 2005, que totalizam o valor de R$ 7.999,86 (sete mil novecentos e noventa e nove reais e oitenta e seis centavos), que por centavos se amoldou a hipótese de dispensa prevista no artigo 24, inciso II, da Lei n° 8.666/93. Fato revelador de que os agentes envolvidos de modo livre e consciente fraudavam procedimentos licitatórios. Todavia, destaca o Ministério Público que no bojo deste manancial de emissão de notas de empenhos, ordens de pagamentos e cópias de cheques, apenas um procedimento licitatório foi identificado, a saber, o procedimento Convite nº 040/2005, efetuado por meio do Processo Administrativo nº 3979/2005. Conquanto, nas demais cópias de processos foram localizadas inúmeras contratações mediante dispensa de licitação, ao longo dos anos de 2005, 2006 e 2007, todas fundamentadas no art. 24, inciso II, da Lei Federal nº 8.666/93. Assim, aduz o Parquet que pelas circunstâncias de meios e modos empregados, indiciados o fracionamento de despesas, ato expressamente vedado pelos artigos 23, § 2º e § 5º e 25, incisos I e II, da Lei n° 8.666/93. O Ministério Público também ressaltou que com base na informação exarada pela equipe técnica ministerial diante da análise minuciosa dos documentos que compõem os anexos dos Inquéritos Civis nº 12/08 e 15/10, apurou-se uma diferença de R$ 99,62 (noventa e nove reais e sessenta e dois centavos), quando comparados os valores registrados nas notas fiscais de nº 559, 560, 561, 563, 1065, 1066, 1067, 1068, 1069, 1070 e 1071, emitidas pela Barnato Comércio de Peças e Veículos LTDA, com valores registrados nas Notas de Empenho nº 21 e 22/2006 que lhes dariam lastro. Ou seja, as notas de empenho, dos exemplos, possuem valores diversos daqueles constantes das correspondentes notas fiscais, como já destacado acima e que no conjunto do cotejo das notas fiscais emitidas pelas empresas contratadas, foi constatado pelo referido órgão técnico ministerial GATE, que o quantitativo de R$ 299.289,25 (duzentos e noventa e nove mil duzentos e oitenta e nove reais e vinte e cinco centavos) sequer possuía lastro nos processos e empenhos documentados nos autos. Assim, concluiu o corpo técnico ministerial que o valor total dos empenhos constantes dos autos é de R$ 390.284,73 (trezentos e noventa mil duzentos e oitenta e quatro reais e setenta e três centavos), porém, o valor total de notas fiscais constantes dos autos é de R$ 689.573,98 (seiscentos e oitenta e nove mil quinhentos e setenta e três reais e noventa e oito centavos), verificando-se, portanto, a existência de um quantum pago de R$ 299.289,25 (duzentos e noventa e nove mil duzentos e oitenta e nove reais e vinte e cinco centavos), sem que se tivesse sido feito o devido empenho, o que configura a concorrência para o enriquecimento ilícito das empresas agraciadas com as sucessivas contratações diretas. Salientou também o Ministério Público que, muito embora não tenha sido possível se apurar os valores totais pagos às pessoas jurídicas D.J. Felipe Mecânica - ME e Lagos Tecno - Car Som e Acessórios LTDA, logrou-se êxito em apurar o total dos valores pagos a partir das Notas Fiscais constantes nos autos emitidas pela Barnato Comércio de Peças e Veículos LTDA, qual seja, R$ 250.961,19 (duzentos e cinquenta mil novecentos e sessenta e um reais e dezenove centavos). Aduz, assim, o Ministério Público que de todo o contexto fático lançado conclui-se que, as inúmeras despesas realizadas em momentos distintos, caracterizam a real intenção do administrador público e seus auxiliares diretos de fraudar o dever de licitar, mediante o ilegal fracionamento da contratação de serviços e compra de peças destinadas à manutenção da frota municipal de veículos, na tentativa de ludibriar os administrados e os órgãos fiscalizadores

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mediante a falsa ideia de causa legítima de dispensa e/ou inexigibilidade de licitação. Como se não bastasse tais ilegalidades, esclarece o Parquet que ainda com fito de dificultar a apuração da malversação das verbas públicas empregadas na contratação dos referidos serviços, os gestores públicos, quando instados a acostarem a integralidade das notas fiscais emitidas pelas sociedades diretamente contratadas, bem como as notas de empenho destinadas ao seu pagamento, quedaram-se inertes em cumprir a solicitação Ministerial, e ao arrepio da lei, juntaram notas fiscais adulteradas, como se infere da peça técnica acostada. Sendo que os próprios valores totais apurados como pagamentos efetuados às empresas contratadas ilegal e diretamente já evidenciam que nem todas as notas fiscais e notas de empenho foram apresentadas ao órgão ministerial no Inquérito Civil Público. Ao Analisar os anexos compostos pelas Notas Fiscais destacou a parte autoral então a existência dos seguintes processos administrativos de dispensa de licitação, iniciados com mera solicitação de aquisição e serviços e notas de empenho respectivas: A. Secretaria de Saúde sob a gestão do Réu André Granado: 1. Processo 002500/2007, com Empenhos 243 e 244. Nesse processo houve pesquisa de preços. 2. Processo 2658/2007, com Empenhos 241 e 242. Fls. 95 do IC. 3. Processo 2415/07, com Empenhos 234 e 235. Fls. 95 do IC. 4. Processo 9375/2006, com Empenho 872. 5. Processo 10332/2006, Empenho 874. 6. Processo 2757/2006, Empenhos 338 e 337. 7. Processo 2008/2007, Empenhos 248, 249. 8. Processo 2309/2007, Empenhos 238. 9. Processo 23082007, Empenhos 252 e 253. 10. Processo 2538/2007, Empenhos 284 e 285. 11. Processo 2502/2007, Empenhos 237 e 236. 12. Processo 09377/2006, Empenhos 775. 13. Processo 2355/2007, Empenhos 339 e 340; 14. Processo 5004/2007, Sem Empenhos. 15. Processo 2243/2007, Sem Empenhos. 16. Processo 7197/2006, Sem Empenhos. B. Secretaria Municipal de Governo sob a gestão do Réu Carlos Henrique Vieira: 1. Processo 10264/2005, Empenhos 329, 3339. 2. Processo 10267/2005, Empenho 3338. 3. Processo 10265/2005, Empenho 329. 4. Processo 1169/2007, Empenho 560 e 561. Ademais, salienta a parte autoral que, nos autos, foram localizados empenhos sem conexão a processos, sob o número 395, 396, 397, 398, 401 e 402 todos de 2007, tendo ressaltado mais de uma vez a inicial que foram arrolados pelo Município-Réu, 32 processos administrativos de aquisição de peças e materiais e outros serviços de manutenção, sendo que, entre eles, somente no processo nº 3979/2005, foi realizada licitação sob a modalidade Carta Convite, conforme fls. 153, do Inquérito Civil nº 12/2008. Destarte, salienta-se que apesar das irregularidades e ilegalidades constatadas pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro no ano de 2005, no processo nº 223.275-08/2005, tais atos foram reiterados ao longo de 2006, 2007 e 2008 e consistiam em ausência formal de fundamentação legal e violação do artigo 26 da Lei de

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Licitações por ausência de justificativa do fornecedor escolhido e dos preços praticados na aquisição de peças de veículos, legitimando a dispensas de licitação e fracionamento de compras, que somadas ensejariam procedimento licitatório, para compras efetuadas especialmente a Barnato Cómércio de Peças Ltda. Isto, além de despesas pagas e liquidadas sem prévio empenho, inobservando, ainda, os artigos 60, 62 e 63 da Lei n° 4.320/64, destacando-se que o artigo 2º da Lei nº 4.717/65, que regula a Ação Popular, dispõe que são nulos os atos lesivos ao patrimônio dos Municípios, nos casos de incompetência, vício de forma, ilegalidade do objeto, inexistência dos motivos e desvio de finalidade, acentuando o órgão ministerial que o Tribunal de Contas, no exercício de seu poder fiscalizatório, já afirmou que, diante da situação exposta, não se tratava de hipótese de dispensa de licitação. Concluiu o Ministério Público que as irregularidades apresentadas são potencialmente causadoras de dano ao erário, diante da ausência do certame impedir a seleção da proposta mais vantajosa para a administração pública, além de violarem os princípios norteadores da Administração Pública, razão pela qual configuram atos de improbidade administrativa, destacando que caso em tela os agentes aprovaram contratações ilegais, bem como agiram de maneira omissa perante a ilicitude dos procedimentos que lá ocorriam, demonstrando total descaso com a coisa pública, não podendo alegar desconhecimento de leis que os obrigavam a agir, tendo sido violado assim o princípio da eficiência. No despacho de fl. 37 o juízo determinou a notificação dos demandados para apresentação de defesa preliminar. Não há nos autos qualquer manifestação do Município requerendo a sua admissão no pólo ativo da relação jurídico-processual, nos termos do artigo 17, § 3°, da Lei n° 8.429/92 e artigo 6°, § 3°, da Lei n° 4.717/65, como certificado à fl. 84. Defesa preliminar do 3ª réu às fls. 51/59. Defesa preliminar do 1ª réu às fls. 62/68. Defesa preliminar do 2ª réu às fls. 75/83. O juízo na decisão de fl. 84 v. recebeu a petição inicial e determinou a citação dos réus, destacando-se que a decisão de recebimento da admissibilidade da exordial da Ação Civil Pública proposta para apuração de ato de improbidade administrativa traduz-se em uma exigência processual e procedimental prevista no § 9° do artigo 17, da Lei n° 8.429/92, que dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências. Trata-se, portanto, de juízo perfunctório sobre a existência de indícios, ou não, de atos de improbidade administrativa praticados pela parte ré que são imputados na ação coletiva, procedido após a manifestação prévia dos agentes públicos demandados e eventuais extraneus, que obviamente como toda decisão interlocutória proferida por órgão jurisdicional deve ser exarada, sob a pena de nulidade, com a devida fundamentação da motivação jurídica, como determina o artigo 93, inciso IX, da própria Constituição Federal. Assim, para entendermos a validade do conteúdo de um juízo de prelibação é necessário perscrutar a própria noção do juízo de admissibilidade, que consiste em um juízo sobre a validade do processo, estando o procedimento inserto na teoria do fato jurídico (ramo da Teoria Geral do Direito), que demanda a análise da fenomenologia jurídica em três planos distintos: existência, validade e eficácia. Destarte, o procedimento é um ato-complexo, tratando-se de ato jurídico cujo suporte fáctico é complexo e formado por vários atos jurídicos, ou seja, no ato-complexo há um ato

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final, que o caracteriza, define a sua natureza e lhe dá a denominação e há o ato ou os atos condicionantes do ato final, sendo que os atos condicionantes e o final relacionam-se entre si, ordenadamente no tempo, de modo que constituem partes integrantes de um processo, definido este como um conjunto ordenado de atos destinados a certo fim. Enquadra-se o procedimento na categoria ato-complexo de formação sucessiva: os vários atos que compõem o tipo normativo sucedem-se no tempo. Em prosseguimento, o juízo de admissibilidade opera sobre o plano de validade dos atos jurídicos. Mais precisamente do ato jurídico complexo-procedimento, pois todo procedimento propiramente judicial instaura-se por um ato postulatório, tendo em vista que toda a postulação se sujeita a um duplo exame do magistrado: primeiro, verifica-se se será possível o exame do conteúdo da postulação; após, e em caso de um juízo positivo no primeiro momento, examina-se a procedência ou não daquilo que se postula. O primeiro exame tem prioridade lógica, pois tal atividade - a análise do conteúdo da postulação - só se desenvolverá plenamente se concorrerem os requisitos indispensáveis para tornar legítimo o seu exercício. Importante ressaltar, portanto, já no relatório tais apreciações dogmáticas feitas acerca do juízo de admissibilidade procedida na decisão interlocutória de fls. 84 v., que para receber ou rejeitar a inicial tinha que se debruçar sobre a exitência ou inexistência de indícios de atos de improbidade administrativa proventura perpetrada pelos réus, ante ao fato de que o terceiro réu em sua resposta, além de ter apresentado sua contestação às fls. 136/149, apresentou ainda exceção de suspeição deste magistrado no petitório de fls. 153/156, sob o único e pífio fundamento de que este Juízo ao exercer tal Juízo de Admissibilidade do recebimento, ou não, da petição inicial da Ação Civil Pública que imputa aos réus atos de improbidade administrativa teria fundamentado a decisão interlocutória citada com os dizeres abaixo transcritos: "Diante dos indícios veementes de atos de improbidade administrativa perpetrados pelos agentes públicos municipais, na gestão municipal do Ex-Prefeito Antônio Carlos Pereira da Cunha, mormente de prática de atos que em tese violam as disposições da Lei n° 8.666/93, recebo a inicial proposta pelo Ministério Público, nos moldes do art. 17, § 7°, da Lei n° 8.429/92." "Destarte, determino a citação de todos os réus, inclusive do Município de Armação dos Búzios, que notificado manteve-se inerte, não promovendo a defesa do patrimônio público e dos interesses estatais. Intime-se ainda o 2° réu para regularizar a sua representação." "Búzios, 26/09/2014". Assim, a única causa que o excipiente-réu aduz ter tornado este Magistrado suspeito seria o fato de ter-se utilizado, na decisão interlocutória, da acepção: "veementes"; fato que não guarda nenhuma conexão com as hipóteses contidas no rol taxativo expresso no artigo 135 do Código de Processo Civil, que trata das causas de suspeição do juiz. Aventando o excipiente-réu que o Juízo teria prejulgado a causa e assim suspeito tornado-se, única e exclusivamente, por ter-se utilizado deste vocábulo (veementes), para que recebesse a exordial ministerial. Ora, se os indícios não fossem fortes ou veementes, a decisão interlocutória seria a de rejeição e não a de recebimento da petição inicial, pois a frugaz existência de meros indícios não autorizaria sequer ao órgão ministerial a propor uma ação civil pública de improbidade administrativa, caso em que o órgão ministerial deveria continuar buscando a elucidação dos fatos através do Inquérito Civil Público, que é procedimento preparatório da presente ação, e, se tais indícios através da inquisa ministerial não se relevassem fortes ou veementes, a solução do Parquet teria sido outra, a saber, a promoção do arquivamento do respectivo Inquérito Civil Público. De igual modo, o Poder Judiciário ante a existência de meros indícios que não se revelassem vigorosos, fortes, enfáticos e veementes, na análise do juízo perfunctório deveria ter, então, rejeitado a inicial, conquanto, como os indicíos eram, de fato, veementes, recebeu-a, sem que com isto tal juízo de prelibação possa ser confundido com prejulgamento, pois prejulgamento é a antecipação do mérito propriamente dito e não a análise da validade do procedimento, a saber, se era viável a análise posterior do conteúdo da postulação ministerial.

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Assim, o Juízo reputa que o incidente provocado pelo 3° réu é malicioso e procrastinatório, porque por mais que o ajuizamento de uma ação de improbidade administrativa já se traduza, em termos ontológicos, em uma modalidade de ataque ao estado de inocência e o juízo de adminissibilidade, por sua vez, traduza-se uma periclitação mais contundente ao estado de não-culpabilidade por aferir a validade do conteúdo de uma postulação que busca a responsabilização de agente público por atos ímprobos, o mero juízo de prelibação exercido com os auspícios legais contidos e norteados pelo § 9° do artigo 17, da Lei n° 8.429/92 jamais pode vir a ser reputado como ato conspurcador da parcialidade do órgão jurisdicional, ou como ato de prejulgamento. Em especial, porque se a decisão interlocutória de recebimento não tivesse sido fundamentada, mesmo que laconicamente com a utilização de vocábulo derivado do substantivo 'veemência', conspurcada estaria, então, a regra cogente do artigo 93, inciso IX, da própria Constituição Federal e a decisão de recebimento seria nula por falta de fundamentação. Tal decisão jamais poderia vir a ser reputada como antecipação meritória, eis que sequer foram citados em seu conteúdo contextos fáticos ou as implicações jurídicas advindas de tais contextos descritos na exordial, tendo sido feito, portanto, singelo juízo perfunctório a partir do cotejo e da análise de tais descrições ministeriais, sem quaisquer reproduções. Ademais, se tais reproduções houvessem sido feitas nem assim haveria prejulgamento, pois há quem entenda em termos doutrinários que a fundamentação do Juízo de Admissibilidade, sob a pena de falta de fundamentação, demanda inclusive mais intensa e vigorosa motivação. Tal incidente, portanto, é absolutamente inadequado e se o inconformismo da parte excipiente é quanto ao recebimento da exordial procedido no juízo de admissibilidade, o remédio processual cabível seria o do recurso de Agravo de Instrumento, que é o recurso manejável contra decisões interlocutórias, jamais então poderia ter sido utilizado o incidente da exceção, pois o mero exercício da jurisdição e o proferimento de decisões judiciais com escopo técnico-jurídico e sob a égide legal não podem ser subsumidos a hipóteses de suspeição, não só por absoluta falta de enquadramento legal, como também por absoluta incoerência lógica. Destarte, o Juízo rejeita de plano a arguição procrastinatória já nesta sentença, já que o processo se encontra perfeitamente maduro para prolação de sentença. Contestação do 1ª réu às fls. 105/126, arguindo preliminares de ilegitimidade passiva ad causam, impossibilidade jurídica do pedido e de 'nulidade' dos inquéritos civis que instruem esta demanda. Na contestação do 3ª réu às fls. 137/149 também fora arguida preliminar de ilegitimidade passiva ad causam. Contestação do Município de fls. 121/123 elaborada pela Procuradoria do Município 'advogando que não houve nenhum prejuízo ao erário' e dizendo, ao contrário do que fora asseverado na exordial, que as contratações diretas se estenderam apenas pelos quatro meses iniciais da administração do 1° réu, quando o Parquet ressaltou não só que os fatos se estenderam pelos anos de 2005, 2006 e 2007, como houve claro prejuízo ao erário, mormente porque do cotejo fático no Inquérito Civil Público fora apurado por órgão técnico ministerial que, ab absurdum, o quantitativo de R$ 299.289,25 (duzentos e noventa e nove mil duzentos e oitenta e nove reais e vinte e cinco centavos) sequer possuía lastro nos processos e empenhos documentados nos autos. O Juízo no despacho de fl. determinou abertura de vista ao Parquet para que o órgão ministerial se manifestasse sobre a exceção de suspeição manejada pelo 3° réu. O Ministério Público às fls. 164/165 ofereceu réplica, pugnando pelo julgamento antecipado da lide.

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É o relatório. FUNDAMENTAÇÃO: DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE: Em prosseguimento, ante aos elementos já adunados aos autos, faz-se despicienda a produção de qualquer prova documental superveniente ou de qualquer prova oral, pois a questão em tela já se apresentou como sendo exclusivamente de direito e de fato que prescinde de prova em audiência ou de outras provas, além da farta produção probatória que se encontra inserta aos autos, bem como aos autos dos dois Inquéritos Civis Públicos em apenso, já tendo formado o Juízo a sua convicção. Apesar deste Juízo ter instado as partes a se manifestarem em provas, vislumbra o Juízo que tal medida se mostra desnecessária. Nestes termos, cabível o julgamento antecipado da lide, nos moldes do artigo 330, inciso I, do Código de Processo Civil. Ressaltando-se que em matéria de julgamento antecipado da lide, predomina a prudente discrição do magistrado, no exame da necessidade ou não da realização de prova em audiência ante as circunstâncias de cada caso concreto e a necessidade de não ofender o princípio basilar da ampla defesa, mas sopesando-se, contudo, os princípios da economia processual e da razoável duração do processo. Além do mais, constando dos autos do processo, elementos de prova documental suficientes para formar o convencimento do julgado, inocorre cerceamento de defesa se julgada antecipadamente a lide. Citando-se como precedentes jurisprudenciais para a posição ora adotada pelo Juízo os seguintes julgamentos: STJ - 4ª T., REsp 3.047, Min, Athos Carneiro, j. 21.8.90, DJU 17.9.90 e STJ - 4ª T, Ag 14.952-AgRg, Min. Sálvio de Figueiredo, j. 4.12.91, DJU 3.2.92. Outrossim, o preceito do artigo 330, I, do Código de Processo Civil, no que tange a prudente discrição do magistrado de procrastinar ou não o feito, com a realização de provas desnecessárias é limitado pelo próprio conceito de que o preceito em voga é cogente, mormente porque o caput do suso artigo utiliza a acepção "conhecerá", e não a expressão "poderá conhecer", assim, se a questão for unicamente de direito, como o caso em tela, nos quais os fatos apurados em inquérito civil público e demonstrados documentalmente revelam contratações diretas, sem prévia licitação pelo Poder Público, restando apenas a apreciação da violação à lei, não pode este juízo, portanto, por sua mera conveniência, relegar para fase ulterior a prolação de sentença, se houver absoluta desnecessidade de ser produzida prova em audiência. DO INCIDENTE DE EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO: Tal questão já fora enfrentada no próprio relatório desta sentença, sendo incabível na hipótese a utilização de incidente de suspeição do magistrado como mero substitutivo de inconformismo da parte com conteúdo lacônico de decisão interlocutória que meramente recebeu a petição inicial da Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público, para apuração de atos de improbidade administrativa, algo teratológico e conspurcador do princípio da boa-fé processual. A descrição feita na petição de exceção sequer se subsume ao rol taxativo previsto no artigo 135 do Código de Processo Civil, traduzindo-se em mero incidente procrastinatório, haja vista que o réu-excipiente (3° demandado), outrora auxiliar direto e Ex-Secretário Municipal de Saúde na chefia da administração municipal do 1° réu entre os anos de 2005 a 2008, exerce hodiernamente a própria Chefia do Poder Executivo Municipal da cidade de Armação dos Búzios, sendo que uma das penas requeridas pelo Parquet pela prática de atos de improbidade é justamente a perda do cargo eletivo. Destarte, o 3° réu busca apenas a procrastinação deste feito, com arguição de

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incidente infundado. Compete este Juízo rejeitar, então, de plano a arguição de sua suspeição, ante a teratologia dos argumentos despendidos na referida exceção, que não guardam abrigo sequer na legislação processual. O remédio a ser utilizado e manejado contra decisão de recebimento de petição inicial em Ação Civil Pública, que fora proposta para apuração de atos de improbidade administrativa, é o de Agravo de Instrumento, e não o de arguição de exceção de suspeição. Para elucidar ainda mais a questão do não cabimento do remédio intentado pela parte, ressalta-se mais uma vez que é a própria Lei de Improbidade Administrativa que exige para o prosseguimento do processamento da ação própria o exercício do Juízo de Admissibilidade prévio, após a notificação prévia da parte ré com oportunização de apresentação de defesa preliminar, e só após a apresentação desta defesa preliminar e recebimento da inicial, devidamente motivada, é que se autoriza a formação da relação jurídico processual pelo ato de citação da parte, cabendo, portanto, a transcrição dos dispositivos pertinentes da Lei n° 8.429/92, in verbis: Art. 17. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar. § 6o A ação será instruída com documentos ou justificação que contenham indícios suficientes da existência do ato de improbidade ou com razões fundamentadas da impossibilidade de apresentação de qualquer dessas provas, observada a legislação vigente, inclusive as disposições inscritas nos arts. 16 a 18 do Código de Processo Civil. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001). § 7o Estando a inicial em devida forma, o juiz mandará autuá-la e ordenará a notificação do requerido, para oferecer manifestação por escrito, que poderá ser instruída com documentos e justificações, dentro do prazo de quinze dias. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001). § 8o Recebida a manifestação, o juiz, no prazo de trinta dias, em decisão fundamentada, rejeitará a ação, se convencido da inexistência do ato de improbidade, da improcedência da ação ou da inadequação da via eleita. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001). § 9o Recebida a petição inicial, será o réu citado para apresentar contestação. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001). § 10. Da decisão que receber a petição inicial, caberá agravo de instrumento. Destarte, se há uma nova sistemática procedimental trazida pela Lei de Repressão a Improbidade no bojo do procedimento comum de rito ordinário, com exigência de notificação prévia para estabelecimento de um justo equilíbrio entre o amplo exercício do direito de ação no campo da tutela de defesa do patrimônio público e a honorabilidade da Administração Pública e do agente público demandado, a saber, um contraditório prévio, o Juízo de Admissibilidade consiste em um pressuposto de validade do próprio procedimento, a fim de que sejam evitadas lides temerárias, mormente ante a honorabilidade que deve ser conferida ao serviço público, sopesando que o Juízo pode inclusive rejeitar a ação se convencido nesse exame perfunctório da inexistência do ato de improbidade. Assim, como prelecionam os Doutrinadores Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves em sua obra "Improbidade Administrativa", o Juízo de Admissibilidade positivo feito nos moldes do § 9° do artigo 17, da Lei n° 8.429/92, se reveste de um instrumento de defesa da própria jurisdição, evitando lides temerárias, destacando que os dois autores, membros destacados do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, argumentam que tal juízo de admissibilidade assemelha-se

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ao juízo exercido na seara processual penal pelo Juiz quando recebe uma denúncia criminal que dá azo a instauração de processo-crime, quando se serve o Poder Judiciário do princípio in dubio pro societate. Há que se abrir um parêntese para asseverar que o inconformismo de uma parte com o conteúdo de uma decisão judicial, ou com a hermenêutica ou posição jurídica de determinado magistrado em relação a questões jurídicas, não é razão para objetar-se a imparcialidade do órgão jurisdicional, pois o remédio adequado para a insatisfação ou irresignação de uma parte com uma decisão judicial é o recurso, e não a provocação infundada do incidente de exceção de suspeição, mormente porque o nosso Ordenamento Pátrio já assegura, constitucionalmente, o duplo grau de jurisdição, havendo possibilidade ainda de interposição de recursos extraordinário e especial para o Pretório Excelso e para o Superior Tribunal de Justiça nas hipóteses de ofensa à Constituição Federal ou a negativa de vigência à Lei Federal ou na hipótese de dissenso jurisprudencial entre Tribunais. Deste modo, se a parte está inconformada com o recebimento da petição inicial da Ação Civil Pública que lhe imputa atos de improbidade administrativa, a própria Lei n° 8.429/92 lhe faculta expressamente a interposição do recurso cabível, a saber, o Agravo de Instrumento, como prevê o § 10° do artigo 17, da aludida legislação. A par de todo o cotejo jurídico acima exposto, este Juízo depreende que o excipiente em seu incidente agiu com inobservância ao princípio da boa-fé objetiva e em desprestígio a nobre função da Administração da Justiça, arguindo cavilosamente um incidente procrastinatório, única e exclusivamente, para suspender a marcha processual e com tal suspensão evitar o deslinde do feito, o que reforça então a tese para este Juízo de que se fosse adotada a providência de remessa da exceção para uma das Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, olvidando-se o julgamento de um feito que já está maduro para prolação de sentença e de fatos lesivos ao patrimônio público ocorridos nos idos de 2005, 2006 e 2007, estaria desprestigiada a nobre função jurisdicional, razão pela qual a providência prevista no artigo 310 do Código de Processo Civil é ora adotada em interpretação lógico-sistemática de toda seção III do capítulo II, do Título VIII do Livro I do Código de Processo Civil. Isto ao sopesar que tal incidente utilizado infundadamente pelo excipiente e por sua defesa técnica consiste em violação ao dever de lealdade processual que as partes devem observar em uma relação jurídico-processual, sendo clara conspurcação ao princípio da boa-fé objetiva, que se traduz em um primado basilar de todas as relações humanas e intersubjetivas, que pode muito bem ser transposto de sua normatização do âmbito do Direito Privado no que tange as relações contratuais, para o âmbito do Direito Processual, como integração da disciplina processual que trata da lealdade processual, pois, nos termos da boa-fé objetiva, exige-se mais do que mera lealdade, sob o aspecto subjetivo de não tencionar agir de forma temerária ou com dolo de conspurcar a verdade ou de pleitear pretensões ou deduzir defesas sem fundamento legal, mas se exige sim o dever de eticidade, como arquétipo social e civilizatório, pelo qual se impõe o poder-dever de ajuste do comportamento de cada pessoa a esse modelo, agindo como agiria uma pessoa honesta, escorreita e leal. Neste sentido, o próprio Superior Tribunal de Justiça tem sufragado em sua orientação jurisprudencial à aplicação do aludido princípio às relações processuais. O princípio da boa-fé se encontra presente em todo o Ordenamento Jurídico brasileiro, inclusive em decorrência de seu status constitucional. Desse modo, o principal dispositivo constitucional que alberga o princípio da boa-fé é, sem dúvida, o inciso I do artigo 3º, o qual prevê, expressamente, que a República Federativa do Brasil tem por objetivo "construir uma sociedade livre, justa e solidária". Interpretando-se tal dispositivo constitucional, pode-se dizer que o mesmo alçou a um grau máximo o dever de cooperação e lealdade no trato social.

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O princípio da boa-fé desempenha, portanto, uma função limitadora do exercício de posições jurídicas. O abuso de direito e, consequentemente, a teoria do combate à aparência de licitude, relaciona-se com essa função da boa-fé objetiva, função esta que é claramente limitadora do exercício de posições jurídicas aparentemente lícitas. Tendo, portanto, o princípio da boa-fé uma função intrínseca de imposição de limites ao exercício dos direitos em geral, exsurge, então, a diferença entre a ilicitude comum (não-abusiva) e a ilicitude advinda do abuso de direito, que de acordo com a teoria do combate à aparência de licitude, apresenta como traço diferenciador entre os ilícitos abusivos e os ilícitos não-abusivos, o simples fato de que os ilícitos abusivos têm uma falsa aparência de licitude. Em outras palavras, o caminho para aferir a ilicitude de um ato abusivo é mais complexo, pois, num primeiro momento, deve-se quebrar a falsa noção de licitude que paira sobre o referido ato. Desta forma, no ato abusivo encontra-se um direito aparente, um manto de licitude, em virtude do qual se torna mais difícil o trabalho hermenêutico, objetivando aferir o verdadeiro indicador da ilicitude do ato em contraposição ao direito formal, que induz à aparência de licitude. No ilícito não-abusivo, a ilicitude é aferida de modo mais simples, não se cogitando da aparência de licitude de tal ato. Como efeito, como a teoria do abuso de direito visa limitar direitos em decorrência de uma particular situação fática - a aparência de licitude -, impende verificar, então, que o ilícito abusivo recebe tratamento jurídico diverso do conferido à grande maioria dos ilícitos, pois se trata de um ilícito não culposo ou objetivo, isto é, para a sua configuração não se faz necessário aferir a presença de culpa lato sensu do agente que atua com abuso. Assim, a ilicitude decorrente do abuso de direito detém um caráter objetivo, sendo necessário estabelecer normas condutoras para o exercício do direito subjetivo, sem penetrar na intenção do sujeito ou em seus fins escusos. Destarte, há uma cláusula geral de tutela no Ordenamento brasileiro que impõe a todo aquele que estiver em situação de vantagem o dever de se portar de forma honesta e leal, conforme preceituado pela boa-fé objetiva, sob a pena de configuração do ato abusivo (ilícito objetivo). No direito processual civil, que também é aplicado subsidiariamente ao processo penal, há inúmeras espécies de ilícitos que visam reprimir condutas desleais, contrárias à boa-fé objetiva. Em decorrência, qualquer conduta processual que, a par de exercer uma posição de vantagem aparentemente lícita, venha a afrontar o princípio da boa-fé, deverá ser considerada ilícita (ilícito abusivo), cabendo sua censura pelo magistrado responsável pela condução do processo. Ocorre que a preocupação do legislador para com a eticidade no processo civil foi tão grande que várias condutas desleais foram transformadas em diversos ilícitos processuais não-abusivos. Quanto a tais condutas, não há falar-se em abusividade, haja vista que a ilicitude é aferida prima facie, pois sequer há aparência de ilicitude quando às mesmas. Como exemplos de ilícitos não-abusivos contra a lealdade processual, previstos no Código de Processo Civil, pode-se citar a litigância de má-fé (artigos 17 e 18), o ato atentatório ao exercício da jurisdição (parágrafo único do artigo 14), o ato atentatório à dignidade da justiça (artigos 600 e 601), o requerimento doloso de citação editalícia fora das hipóteses permitidas (artigo 233), a interposição de embargos declaratórios com intuito protelatório (artigo 538), a interposição de agravo manifestamente inadmissível ou infundado (artigo 557, § 2º), além de outros mais previstos no Estatuto Processual Civil. A figura do abuso de direito processual ostenta um caráter subsidiário, haja vista que terá seu campo de aplicabilidade restrito às hipóteses de condutas desleais não contempladas pelos ilícitos processuais não-abusivos, e desde que tais condutas ostentem uma falsa aparência de licitude, pois que contrárias à boa-fé objetiva. Cientificamente, nunca uma conduta processual será, ao mesmo tempo, um ilícito não-abusivo e um ilícito abusivo. O abuso de direito é verificado de forma

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subsidiária, somente quando a conduta não se subsumir a algum ilícito não-abusivo tipificado e, ao mesmo tempo, quando tal conduta ostentar uma falsa aparência de licitude que, na verdade, conspurca o princípio da boa-fé. Sem esses dois pressupostos, não há que se falar em abuso de direito. O artigo 14 do Código de Processo Civil elenca os deveres de conduta das partes, mormente os deveres de lealdade e boa-fé previstos no inciso II do aludido dispositivo. Todavia, a maioria das hipóteses elencadas no artigo 17 do Código de Processo Civil que diz respeito à litigância de má-fé traduz-se em ilícitos não-abusivos; entretanto, o inciso V do referido artigo, que reputa litigante de má-fé quem procede de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo, abriga o abuso de direito, que é verificado de forma subsidiária. Apesar do abuso de direito do 3° réu, despicienda seria a sanção do artigo 18 do Código de Processo Civil, vez que o incidente infundado maiores prejuízos não trouxe a jurisdição, dado que o mesmo é ora rejeitado de plano. Nesta senda, o Juízo se apoia no escólio do Mestre Humberto Theodoro Júnior extraído de sua obra "Curso de Direito Processual Civil", sobre a possibilidade de o magistrado rejeitar in limine a exceção de suspeição fundada única e exclusivamente na mera irresignação da parte com conteúdo de decisão judicial, que não se amolde ao rol taxativo do artigo 135 do Código de Processo Civil, vez que tal incidente não pode servir como sucedâneo de interposição de recurso. Assim, ora transcrevem-se as lições do Mestre sobre o tema, ipsis litteris: "A apreciação e julgamento do incidente tocam ao Tribunal Superior a que se acha subordinado o juiz impugnado. Quando, porém, ocorrer objetivamente o descabimento da exceção (por intempestividade ou invocação de fato que, à evidência, não esteja entre os previstos nos arts. 134 e 135 do CPC), poderá o próprio Juiz exceto denegá-la liminarmente, dentro do dever legal que lhe toca de 'velar pela rápida solução do litígio' e de 'prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da Justiça'(art. 125, II e III)". De igual modo, o Doutrinador Alexandre de Paula aduz em sua obra que a exceção de suspeição por importar o afastamento do magistrado de sua jurisdição e poder atentar contra a dignidade da justiça exige indispensável prova induvidosa, inexistindo, obviamente, tal parcialidade quando as razões alegadas sequer se subsumem as hipóteses taxativas descritas no rol do mencionado artigo 135 do Código de Processo Civil, assim veja-se o que preleciona o autor em seu "Código de Processo Civil anotado": "(...) por importar afastamento do magistrado do exercício da jurisdição e envolver matéria de ordem moral e de alta relevância, que pode afligir a pessoa do suspeitado e suscitar até menosprezo à própria dignidade da justiça, para acolhimento da exceção de suspeição 'é indispensável prova induvidosa'." A conduta do julgador, ao se deparar como uma exceção de suspeição, não pode se reservar a recebê-la laconicamente e processá-la como um autômato. Espera-se do juiz que analise a viabilidade de seu recebimento e processamento, pois para se alegar a suspeição de um magistrado, a lei exige fundada prova de que o julgador tenha ligação com uma das partes, seja por amizade ou inimizade; por dívidas, relação de subordinação ou ainda que seja interessado no julgamento da causa. Ou seja, que exista parcialidade. Assim como toda a causa que se leva ao Judiciário, a exceção de suspeição exige regras. A petição inicial deve se apresentar com os requisitos necessários, entre eles, a indicação "do fato e dos fundamentos jurídicos do pedido" de suspeição (CPC, art. 282, inc. IV). Portanto, a exceção de suspeição precisa, necessariamente, demonstrar que o juiz incorreu em algumas das causas

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de suspeição no processo, o que nem de longe se verifica na hipótese em tela. Como no caso do recebimento da petição inicial da Ação Civil Pública proposta pelo órgão ministerial o juiz-excepto fará também um Juízo de Admissibilidade prévio, que poderá ser positivo, ou negativo, como se dá por ora. Ressalte-se que nosso ordenamento jurídico adota o princípio da substanciação, que exige do autor da ação descreva a causa de pedir (causa petendi), apontando os fatos e sua relação com o direito pleiteado. Não basta simplesmente indicar causas previstas em lei, é necessário, portanto, que se demonstrem os fatos que se amoldam à lei. Outro fator que precisa ser assimilado pelo magistrado é que, se a lei fala que o juiz receberá a exceção (CPC, art. 306), a contrario sensu (em sentido contrário) ela também autoriza o não recebimento da exceção, quando não haja fundamentos para seu recebimento. Assim, não se vislumbrando nenhuma das causas elencadas nos artigos 134 e 135 do CPC, a exceção não deve ser recebida e, acaso recebida pelo Juiz de Direito, deve ser rejeitada liminarmente pelo Relator nos Tribunais. Destarte, não se pode deixar de se observar que o legislador menciona no artigo 306 a expressão 'Recebida a exceção', sinalizando a possibilidade de que ela pode não ser recebida, ainda que não haja disposição semelhante à do art. 310 do Código de Processo Civil em relação as exceções de impedimento e suspeição do juiz. Não é o caso do magistrado atacado adentrar no mérito da ponderação dos argumentos apontados, se tais argumentos se subsumirem, de fato, àquelas hipóteses previstas no rol taxativo do artigo 135 do Código de Processo Civil, pois esta é tarefa do Tribunal, mas sim de o magistrado sopesar a adequação do incidente aos casos previstos na legislação, sob a autorização da rejeição in limine da exceção. Assim, existem pressupostos formais à admissão da medida extrema no mundo jurídico, pois a razão está nos princípios que regem a atuação do magistrado, além da própria regulamentação técnica quanto às petições dos autos, prevista, dentre outros, no artigo 282 do Código de Processo Civil, sem falar nas causas de extinção do artigo 267, IV e VI do Código de Processo Civil, aplicáveis ao incidente por similitude. Há também decisões judiciais enquadradas na dogmática pós-positivista moderna que já se escoimam o Juiz de 1° grau de cercear in limine quaisquer chicanas ou provocações de incidentes infundados visando a macular o princípio do juiz natural e a célere solução dos processos judiciais, reconhecendo a possibilidade de o magistrado, em vista da falta de fundamento indeferir in limine a exceção de suspeição, in verbis: "(...) Assim, visando o juiz não apenas fazer-se justiça, mas também impor rapidez ao término do processo, é possível, excepcionalmente, indeferir de plano exceção de suspeição proposta contra ele." (2º TACv - SP MS 439.555-9ª Câm. - Rel. Juiz EROS PICELI - J. 13.9.95) O artigo 310 do CPC autoriza a rejeição liminar também da exceção de suspeição, com vistas ao seu conteúdo, quando manifestamente improcedente.( Agravo 159344. 8ª Câmara do 2º TAC/SP. Rel. Juiz Garreta Prats, JB 119, Ed. Juruá, p.112) O Juízo rejeita, portanto, de plano a arguição procrastinatória de exceção de suspeição já nesta sentença, já que o processo se encontra perfeitamente maduro para prolação de sentença, o que o faz com base na hermenêutica lógico-sistemática dos artigos 306 e 310 do Código de Processo Civil, com interpretação analógica dos artigos 282 e 267, inciso IV e VI, do Estatuto Processual Civil e, por fim, com base nos parâmetros teleológicos expressos nos artigos 14, II e 125, II, também do Código de Processo Civil e, sobretudo com base do artigo 5°, inciso LXXVIII, da Constituição Federal. DO CABIMENTO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA:

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Em prosseguimento, cabível a ação civil pública no âmbito da improbidade administrativa, pois sem embargo da regra contida no artigo 13 da Lei n° 7.347/85, que regula a ação civil pública, as regras cabíveis são do artigo 18 da Lei n° 8.429/92 e do artigo 17 da Lei da Ação Popular, aplicado analogicamente, conforme as quais a indenização pelo dano causado ao erário reverte ao ente lesionado e, não a um fundo de defesa dos interesses difusos, mormente porque, muito embora difusa a tutela do patrimônio público, é perfeitamente possível identificar, in casu, quem suportou, concretamente, os efeitos patrimoniais do ato de improbidade administrativa. Destarte, por se tratar da defesa do patrimônio público, objeto da Lei de Improbidade, um interesse difuso, incidirá a técnica de tutela prevista na Ação Civil Pública. Todavia, ainda que não superada a questão, não importa a definição do nomen iuris da ação como também o próprio procedimento a ser adotado que, atualmente, é o previsto no artigo 17 da Lei n° 8.429/92, com a redação dada pelas Medidas Provisórias n°s 2.088 e 2.225. DA RESPONSABILIZAÇÃO DOS PREFEITOS MUNICIPAIS POR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA: A maior subversão em nosso Ordenamento Jurídico hodiernamente quanto à responsabilização dos agentes públicos traduz-se na vetusta construção jurídica de que a Lei de Improbidade Administrativa não se aplica aos agentes políticos, algo absolutamente destoante com a moderna concepção Pós-Positivista e com o Princípio da Juridicidade, conforme o qual a evolução dogmática da Ciência Jurídica visa à concreção da própria noção de Direito, havendo que se ponderar em uma legalidade substancial e não meramente em uma legalidade clássica e formal. Assim, destaca-se a posição do Pretório Excelso no julgamento da Reclamação n° 2.138/DF, de 13.06.2007, que anuiu com o entendimento de que a Lei de Improbidade Administrativa não se aplica aos agentes políticos, por reputar que estes já podem vir a ser responsabilizados politicamente de acordo com a Lei dos Crimes de Responsabilidade. Assim, os agentes que poderiam ser responsabilizados por improbidade administrativa seriam apenas os agentes da administração. Porquanto, os agentes que têm as suas competências definidas na Constituição não poderiam ser responsabilizados por improbidade administrativa, mas somente aqueles agentes que têm as suas competências definidas na legislação infraconstitucional. Destarte, no âmbito das licitações e contratos da Administração Pública, quando houvesse violações dos princípios e normas que regem os certames para a contratação do poder público, os únicos agentes públicos que poderiam vir a ser responsabilizados são os agentes da administração, que são aqueles que especificam objetos, emitem pareceres técnicos ou jurídicos, conduzem os procedimentos licitatórios, praticam atos administrativos e até, os que ordenam despesas. Quanto aos ordenadores de despesa, não é sem razão que mais recentemente se constate que as organizações administrativas dos entes estatais estão se estruturando para que a ordenação de despesas no setor da contratação do poder público incumba aos agentes de chefia de órgãos públicos e titulares de pastas e secretarias de governo, que não sejam alcançados pela Lei de Responsabilidade, evitando-se que as despesas venham a ser ordenadas por agentes políticos, a saber, Presidente da República, Ministros de Estado, Governadores de Estado e Prefeitos Municipais, além de Senadores, Deputados e Vereadores, ante a controvérsia existente entre os Operadores de Direito, sem embargo da posição do Pretório Excelso, de que agentes políticos devam ser também responsabilizados na seara do controle a probidade, nos termos da Lei de Improbidade Administrativa. Assim, mantido o entendimento acima explicitado, haveria dois pesos e duas medidas, pois quando uma indevida despesa relativa a determinado contrato administrativo viesse a ser ordenada, por exemplo, por um Prefeito Municipal, depreendendo-se a responsabilidade deste ordenador, o mesmo não poderia ser atingido pelas sanções previstas na Lei n° 8.429/1992, mas tão somente estaria sujeito à instância política por infração político-administrativa perante a Câmara de Vereadores, nos termos do Decreto n° 201/67, que dispõe sobre os crimes de responsabilidade de Prefeitos e Vereadores, instância esta por deveras parcimoniosa e geralmente ungida a fatores propriamente políticos, não estando necessariamente premida por

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grandes preocupações com o controle preventivo da probidade. Diametralmente, se a mesma espécie de despesa indevida relativa a uma contratação administrativa tivesse sido ordenada por Secretário Municipal, como tal agente público não está submetido à instância política, nos termos do Decreto n° 201/67, cabível seria a imposição de sanções ao referido de acordo com as disposições contidas na Lei n° 8.429/1992. Na primeira hipótese acima exposta poder-se-á depreender, então, que a possibilidade de chancela da impunidade será grande, mesmo que o ordenador de despesa possa a ser responsabilizado na esfera penal e consequentemente na esfera civil, enquanto na segunda hipótese o sistema de responsabilização do agente por meio das mais diversas esferas, que se complementam entre si, sem dúvida funcionará de forma mais eficaz e profícua, de modo a expungir qualquer tipo de irresponsabilidade, algo incompatível com um regime democrático de direito. Ressaltando-se ainda que em relação ao controle externo, o julgamento de contas dos administradores também é realizado por duas órbitas diversas, pois os agentes políticos, que exercem cargos de chefia dos Poderes Executivos (Presidente da República, Governadores de Estado e Prefeitos Municipais) têm suas contas anuais apenas apreciadas tecnicamente de modo prévio pelos Tribunais de Contas, com julgamento e avaliação política pelos Poderes Legislativos respectivos. Enquanto, as contas dos demais administradores e responsáveis ficam adstritas à competência de julgamento pelos Tribunais de Contas. Assim, em relação às ordenações de despesas indevidas, como, por exemplo, o pagamento de obras não realizadas em contratações do setor público, a dualidade desse controle de contas também poderá dar ensejo à impunidade do agente político, ante as suscetibilidades encontráveis na instância política. É certo que há o instrumento legal de Tomada de Contas pelos Tribunais de Contas, nos moldes do artigo 84 da Lei Federal n° 4.320/64, que estatui normas gerais de Direito Financeiro para controle dos orçamentos da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, que atinge os agentes políticos, porém, como este controle se dá posteriormente em relação a tais agentes e de forma pontual através de processo de Tomada de Contas Especial, quando são, de fato, constatadas irregularidades, se o mesmo eventualmente não ocorrer nas hipóteses de malversações, o controle externo dependerá exclusivamente da instância política. Ante a tais questões, é necessário, então, que o controle dos atos dos agentes políticos, nas licitações e contratações do Poder Público, se faça também na seara do controle profilático da probidade, nos moldes da Lei de Improbidade Administrativa. É imperioso, portanto, que se perscrute previamente a natureza jurídica das sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa. Para alguns doutrinadores, a natureza jurídica de algumas destas sanções, como perdas de cargos e funções públicas e, mesmo, a suspensão de direitos políticos, tem natureza essencialmente penal, com consequências dessa definição e metodologia jurídica na fixação da competência do órgão jurisdicional, inclusive, com observância estrita às regras que preceituam o foro por prerrogativa de função. Para outros doutrinadores, a natureza jurídica da sanção prevista na Lei de Improbidade Administrativa que prevê a perda do cargo e da função pública, além da suspensão dos direitos políticos, é de índole político-administrativa, razão pela qual os agentes políticos não estariam adstritos ao controle da probidade por meio da Lei n° 8.429/1992, mas sim ao controle meramente político, sob o falso argumento de que os atos de improbidade dos agentes políticos estariam abrangidos pela tipologia da Lei n° 1.079/1950, que define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo, e também pela tipologia dos atos de improbidade definidos no Decreto n° 201/67, que dispõe sobre os crimes de responsabilidade de Prefeitos e Vereadores. Todavia, o instituto do impeachment desde a sua gênese, é tratado como um instituto de natureza político-constitucional que busca afastar o agente político de um cargo político que demonstrou inaptidão para ocupá-lo, destarte, a teleologia do processo para apuração de infração de natureza político-administrativa é a destituição do agente do cargo político. Já a teleologia do controle repressivo da improbidade administrativa é outra, ou seja, o objetivo perseguido é a consubstanciação e a efetivação da moralidade e da probidade administrativa através do processo

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de responsabilização do agente público na esfera do processo judicial no qual se apura a improbidade, sem qualquer perquirição ou preocupação com o aspecto político, que deve ser abordado tão somente na esfera de responsabilização política. As sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa, indubitavelmente, são dotadas de fortes caracteres próprios das sanções administrativa e penal, mormente quando dispõem sobre a possibilidade de perda do cargo ou de função pública, ou quando dispõem sobre a suspensão dos direitos políticos. Mas impende asseverar que tais sanções no âmbito da apuração da responsabilidade dos agentes públicos, nos moldes do artigo 37, § 4°, da Constituição Federal, regulado pela Lei de Improbidade Administrativa, possuem, em verdade, uma natureza jurídica totalmente diversa, consistindo em sanções de restrição à esfera jurídica do ímprobo. Assim, a partir da reprimenda prevista na Lei de Improbidade Administrativa, traça-se um paralelo com as demais esferas de responsabilização dos agentes públicos. As sanções de multa, de ressarcimento do dano e de perda de bens e valores têm natureza patrimonial. Já a sanção de perda do cargo ou da função pública, atinge no plano mediato também o patrimônio do ímprobo, e, no plano imediato, tem contornos administrativos e é marcadamente é influenciada pelo direito penal, embora tenha natureza extrapenal. Por derradeiro, a sanção de suspensão dos direitos políticos, que se restringe ao direito de votar e de ser votado, alijando o ímprobo do processo político, tem a mesma natureza política, contudo, a compreensão do designativo "política" deve ser subentendida no sentido do impedimento da participação do agente ímprobo nas estruturas estatais de poder, com consequências reflexamente também na sua esfera patrimonial, não mantendo esta sanção qualquer correlação com a sanção propriamente política aplicada pelos órgãos políticos, que estão afetos aos critérios de conveniência e oportunidade característicos dessa seara. Deste modo, pode-se argumentar que o ilícito da improbidade administrativa não tem natureza administrativa, penal ou política, e as suas sanções também não são propriamente administrativas, penais ou políticas, mas ostentam características cíveis, que resultam em uma série de restrições a orbita jurídica do ímprobo. Consequentemente, ao se reputar as sanções hauridas da Lei de Improbidade Administrativa como detendo características eminentemente cíveis, embora com peculiaridades próprias, não há como sufragar o entendimento de que os agentes políticos não possam estar submetidos também a esta esfera de responsabilização. Ao depreender-se a responsabilidade haurida da Lei de Improbidade Administrativa como de natureza eminentemente cível, tal dogmática e metodologia jurídica refoge as subversões do sistema que sufragariam a irresponsabilidade, fator destoante da democracia e do direito à boa administração e da gestão eficiente, tendo influência direta para não elisão do alcance das disposições da Lei n° 8.429/1992 aos agentes políticos, bem como para identificação do órgão jurisdicional competente para processar e julgar a lide e para a adoção do rito a ser seguido. Ad argumentandum tantum, se a Ordem Jurídica não pretendesse a adoção de um sistema de responsabilização da improbidade administrativa de modo complexo e autônomo e diverso das demais esferas de responsabilização cível, penal, administrativa e política, não haveria razão para o citado artigo 37, § 4°, da Constituição Federal, prever que os atos de improbidade administrativa importam na suspensão dos direitos políticos, na perda da função pública, na indisponibilidade de bens e no ressarcimento ao erário, sem prejuízo da ação penal cabível. Portanto, se tivessem natureza penal, as sanções de perda de cargos ou funções públicas preceituadas no artigo 37, § 4°, da Constituição Federal, para os atos de improbidade administrativa, seria despicienda a ressalva final do citado dispositivo constitucional, que não afasta a propositura da ação penal cabível em face do ímprobo na esfera penal. De igual modo, as sanções previstas no aludido dispositivo para a suspensão dos direitos políticos não se confundem com as sanções políticas preceituadas na Constituição Federal ou cominadas na Lei n° 1.079/1950, que define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo, ou no Decreto n° 201/67, que dispõe sobre os crimes de responsabilidade de Prefeitos e Vereadores. Especificamente, em relação aos crimes de responsabilidade dos Chefes dos Poderes Executivos, há que se recorrer ao escólio do Eminente Jurista Paulo Brossard, no sentido da natureza eminentemente política do instituto do impeachment. Pois, para Ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal, Dr. Paulo Brossard, o impeachment origina-se de causas políticas e tem objetivos

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políticos uma vez que o seu objetivo não é a aplicação de pena criminal ao acusado e sim somente seu afastamento do efetivo cargo, que é instaurado sob a ordem política, sendo o julgamento segundo critérios políticos. O entendimento de que os agentes políticos não estão submetidos à Lei de Improbidade Administrativa é uma clara subversão da complementariedade de nosso sistema de responsabilização de agentes políticos, e, permissa venia, ensejador de privilégios odiosos e destoados do princípio da isonomia, consistindo em verdadeira subversão da Ordem Jurídica que não transige com nichos de irresponsabilidade, tratando-se tal subversão hermenêutica e metodológica em uma violação ao princípio constitucional de vedação de proteção deficiente, vez que se prevalecer tal imunidade em relação aos agentes políticos, de difícil monta torna-se o combate ao fenômeno da corrupção, mormente a constatação de tal fenomenologia no âmbito estrito das licitações e contratações do setor público, que por muitas vezes envolvem a participação dos próprios agentes políticos, com a prática consciente e voluntária de atos comissivos e dolosos que vulneram o direito à boa administração. Há que se destacar, então, que a debilidade do sistema democrático e as subversões do sistema jurídico, bem como as subversões hermenêuticas e metodológicas, facilitam de sobremaneira o fenômeno da propagação da corrupção. Em suma, o campo fértil da corrupção aproveita-se das limitações dos meios de controle da atuação estatal e da inexistência de instrumentos aptos a manter a administração adstrita à legalidade, a moralidade e a probidade administrativa, especialmente quando se permite com imunidades ilógicas a supremacia dos interesses dos detentores do poder em face dos anseios coletivos. Assim, os intoleráveis índices de corrupção verificáveis em todas as searas dos Poder, que hoje impulsionam o descontentamento popular depreendido em recentes manifestações populares, é fruto de incongruências de nosso regime democrático as quais deitam suas raízes em séculos de práticas pouco republicanas, originadas de desvirtuamentos políticos já verificáveis no período colonial, tendo sido lento o processo de maturação dos padrões éticos ao longo desses séculos, se sedimentando às subversões que sufragam a impunidade, tanto nos períodos de exceção, como em períodos democráticos. Lembrando-se conforme o pensamento aristotélico que a degeneração da forma democrática de governo consubstancia-se na demagogia, degeneração esta que, por vezes, é mais perniciosa e mais desestabilizadora das instituições do que a própria ditadura, pois nessa forma desvirtuada de regime todos acabam se vendo em um inferno hobbesiano, em que homem acaba por se tornar o lobo do próprio homem, a saber, é a degeneração para um estado de natureza pernicioso em uma sociedade supostamente estruturada juridicamente, ou seja, é o risco de que os efeitos deletérios da corrupção e o menoscabo pela ética conspurquem as próprias instituições, as estruturas jurídicas e, por fim, o próprio tecido social pelo sentimento de descrédito, podendo desaguar tal situação até na anarquia, ou seja, em uma volta transversa ao estado de natureza, assim como definido pelo pensamento político que via nesse estado sem ordenação o pessimismo da existência humana, tal como o pensamento maquiavélico e hobbesiano. No que tange ainda a corrupção endêmica que assola o país, as subversões que são encontráveis no nosso sistema legal e as subversões no modo parcimonioso como as variadas instâncias, encarregadas do controle dos atos dos agentes políticos, atuam e interpretam a ordem jurídica, acabam todas, ao final, por possibilitar uma blindagem que inviabiliza a responsabilização dos altos escalões do poder. Podendo ser encontradas tais subversões inclusive na ordem constitucional quando se adota o foro por prerrogativa de função para as mais variadas ordens de agentes políticos, não anuindo, a jurisprudência pátria, com a tese já há muito agasalhada no Direito Comparado de subversão da ordem e da dogmática pós-positivista ante a possibilidade de normas constitucionais inconstitucionais, sendo tais normas que estabelecem foros privilegiados um bom exemplo da inaugural e basilar conspurcação do princípio da isonomia na Ordem Jurídica Pátria. Tais subversões escoimam, portanto, a classe política de diversas instâncias de responsabilidade, mormente na seara penal e na seara política, vez que as instâncias superiores, com competência originária para processo e julgamento de delitos perpetrados por agentes políticos, além de estarem inflacionadas por milhares e milhares de processos, não são, de fato, as instâncias mais indicadas para a realização de instruções processuais e condução de

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processos-crimes, pois ontologicamente estão estruturadas para funcionarem como órgãos jurisdicionais revisores das decisões judiciais das instâncias inferiores. Ademais, o sistema jurídico deve ter maior fé na atuação dos órgãos jurisdicionais de 1° grau, que em países civilizados são instâncias por deveras acreditadas e reverenciadas. Ressalta-se que, na seara das licitações e contratações do Poder Público, a obtusa impossibilidade de imposições de sanções hauridas do controle constitucional e legal da improbidade administrativa aos agentes políticos, além de uma antinomia com os próprios princípios e normas constitucionais, traduz-se em uma afronta ao primado da sustentabilidade nas licitações públicas, pois se chancela a blindagem de uma casta política em um período de extrema subversão do interesse público, quando não é incomum a vulneração da probidade e adoção da corrupção por diversos agentes políticos nesta seara, fato que por vezes eclode em cotidianos escândalos, expostos na mídia e por vezes ventilados em comissões parlamentares de inquérito que servem mais de palco para políticos oposicionistas do que medidas investigativas eficazes e ampliadoras e provocadoras do poder de controle das demais esferas de controle da atuação estatal. Instando ressaltar que por sustentabilidade não se entende somente a preservação dos recursos naturais do país, ou o estímulo aos produtos e serviços nacionais, mas todos os esforços econômicos que são envidados pela nação para a sustentação do desenvolvimento nacional, reputando-se ainda que a corrupção, o superfaturamento de obras, serviços e compras drenam os recursos do país, que deveriam ser aplicados em melhorias dos serviços públicos, recursos públicos estes que são em grande parte hauridos de receitas derivadas, ou seja, do poder de tributação do Estado sobre toda a riqueza da nação, sobre toda a sociedade e sobre toda a atividade econômica do país, donde se infere o grau de desperdício que engendra a fenomenologia da corrupção. Quanto à antinomia aparente desta linha hermenêutica que subtrai do controle judicial da probidade, os agentes políticos, curial que se destaque que ao poder legiferante não é defeso atribuir consequências criminais, cíveis, políticas ou administrativas a um mesmo fato, inclusive com identidade de tipologia. Assim, se o constituinte originário não impôs tal vedação ao dispor das sanções a serem impostas aos atos de improbidade administrativa, no § 4° do artigo 37 da Constituição Federal, sem prejuízo de demais sanções cabíveis, não será legítimo ao hermeneuta impor tal limitação à classe dos agentes políticos. Aliás, perscrutando-se não só a finalidade da Lei de Improbidade Administrativa, mas a mens legislatoris, o substitutivo ao Projeto de Lei n° 1446/1991, apresentado pelo Senado Federal e que redundou na Lei n° 8.429/92, era textual ao reconhecer que os atos de improbidade (principal) também configuravam crime de responsabilidade (secundário), sendo que a redação desse substitutivo previa que "a instauração de procedimento para apurar crime de responsabilidade não impede nem suspende o inquérito ou processo judicial referido nesta Lei". Assim, depreende-se claramente que a responsabilização política, feita nos moldes da Lei de Responsabilidade, e a responsabilização por ato de improbidade administrativa, processada nos moldes da Lei de Improbidade, são figuras distintas, podendo coexistir esferas distintas de responsabilização, que tomadas em conjunto complementam-se apenas para expungir quaisquer riscos de irresponsabilidade, algo que somente era imaginável no sistema absolutista, quando vigorava o brocardo: "The King cam not do wrong". Ademais, a Lei de Responsabilidade em relação à Lei de Improbidade deve ser reputada como lei especial. Por todas essas considerações é que gera perplexidade a adoção do entendimento de que a Lei da Improbidade Administrativa não possa alcançar aos agentes políticos, em especial quando o Pretório Excelso em relação à Lei n° 10.628/2002, que dava nova redação ao artigo 84 do Código de Processo Penal e aos seus parágrafos, firmemente, declarou inconstitucionais os aludidos parágrafos primeiro e segundo que dispunham a competência especial por foro por prerrogativa de função, relativa a atos administrativos do agente como prevalecente ainda quando o inquérito e a ação penal tivessem sido iniciados após a cessação do exercício da função, e que a ação de improbidade, de que trata a Lei n° 8.429/92, será proposta perante o tribunal competente para processar e julgar criminalmente o funcionário ou autoridade na hipótese de prerrogativa de foro em razão de exercício de função pública.

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Destarte, como a natureza complexa do ilícito da improbidade administrativa é, eminentemente, cível, estando afastadas as naturezas exclusivamente penais, administrativas e políticas desta espécie de ilícito, embora tais esferas de responsabilização também sejam moldadoras dos caracteres do ilícito da improbidade, há que se atribuir ao Juízo Monocrático do Poder Judiciário, a competência para processar e julgar os agentes políticos por atos que importem em improbidade administrativa. Com efeito, a doutrina, de forma amplamente majoritária, entende que a ação de improbidade administrativa tem natureza civil, sendo este, aliás, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, sendo que o próprio § 4° do artigo 37 da Constituição Federal, ao prever as sanções imputáveis aos atos de improbidade administrativa, expressa que sua aplicação em ação específica para tal fim não previne a ação penal cabível, donde se dessume que a ação de improbidade administrativa não tem natureza penal. Com base nas considerações acima, concludentes de que a irresponsabilidade hodiernamente alicerçada em dogmáticas contestáveis para os agentes políticos, na seara do controle da probidade administrativa, consubstancia-se em grave subversão da ordem democrática, além de grave vulneração ao princípio que veda a proteção deficiente e em uma grande brecha ao sistema de complementariedade das diversas esferas de controle da atuação estatal e de responsabilidade, este Juízo rejeita, então, qualquer construção dogmática que abstraia do Poder Judiciário, a possibilidade de processar e julgar um Chefe de Poder Executivo Municipal por prática de ato de improbidade administrativa, registrando-se ainda que se assim não fosse possível, o caso em tela sufragaria uma impunidade, vez que o 1° réu quando no exercício de seu mandato não fora responsabilizado politicamente pelo ato ora apurado e atualmente não exerce mais o poder. Registrando-se que o fundamento da responsabilidade é o descumprimento de um dever primário de conduta. Sendo que da ontologia da responsabilidade, independentemente da perscrutação científica e aprofundada de sua natureza, é da qual a ideia de sanção advém, a fim de restabelecer a ordem jurídica, o que em sede de probidade administrativa, está intimamente ligado ao conceito de republicanismo e a concepção de democracia participativa. DO SANEAMENTO DO PROCESSO: O 1° réu argui preliminar de ilegitimidade passiva ad causam sob o argumento de que não foi ele o ordenador da despesa ora contestada, explicitando que de acordo com os Decretos Municipais n°s 02/2005 e 241/2006 editados pelo próprio, ficara designada para os Secretários Municipais e aos titulares de órgãos equivalentes da estrutura administrativa do Poder Executivo Municipal, a competência para ordenar despesas nos limites das dotações orçamentárias e no âmbito das respectivas unidades orçamentárias. As despesas em voga foram, de fato, ordenadas pelo segundo e terceiro demandados, então Secretários Municipais de Governo e de Saúde. Nesta esteira, não é sem demasia a explicitação acima feita de que, não é sem razão que mais recentemente se constate que as organizações administrativas dos entes estatais estão se estruturando para que a ordenação de despesas no setor da contratação do poder público incumba aos agentes de chefia de órgãos públicos e titulares de pastas e secretarias de governo, que não sejam alcançados pela Lei de Responsabilidade, evitando-se que as despesas venham a ser ordenadas por agentes políticos, tudo em um espectro para ampliação das irresponsabilidades sufragadas para os agentes políticos. Contudo, in casu, foram depreendidos elementos suficientes de que o primeiro demandado sabia e estava perfeitamente cônscio da ordenação de despesas que foram então feitas pelos seus Secretários de Governo, despesas estas que ora são inquinadas. Além do fato de que o mesmo inclusive concorreu moralmente e de modo natural para os atos ordenadores por seus Secretários Municipais, vez que anuiu de modo espúrio todos os atos de dispensa de licitação. Ademais, a delegação de competência para ordenar despesas aos seus secretários, não exclui, necessariamente, a responsabilidade da chefia do executivo, quando tal chefia está ciente de que gastos espúrios estão sendo realizados por seus assessores diretos, mormente se for sopesado que o 1° réu ainda fora notificado e multado pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro em razão do descalabro administrativo verificado em sua administração resultante da liquidação de despesas com contratados diretos de aquisição e serviços da frota de veículos das Secretarias de Governo e de Saúde, sem que fossem realizadas licitações para tanto e sem que algumas despesas sequer tivessem sido liquidadas por meio de notas de empenho.

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Acresce-se que o Chefe do Poder Executivo Municipal presta um dever de juramento de fiel cumprir a Constituição, as Leis e, sobretudo, a Lei Orgânica do Município que administra, devendo, portanto, zelar e defender os interesses do erário. Razão pela qual uma infidelidade política e administrativa não pode ser meramente objetada sob os auspícios de que o ato inquinado o fora praticado por um delegatário. No caso concreto, o ato imputado ao primeiro demandado é comissivo, e não omissivo, imputando-lhe o Parquet que os atos administrativos espúrios, formalmente complexos, a saber, formados da conjugação de vontade de mais de um órgão administrativo, fora, em verdade, formado pela conjugação das vontades ilegítimas do então Prefeito Municipal e dos então Secretários Municipais de Governo e de Saúde. Porém, se não houvesse sido depreendida a anuência e concorrência do primeiro demandado para a prática do ato, só a sua ciência prévia, já importaria na prática de uma improbidade administrativa, vez que então seria depreendida a sua omissão no zelo da coisa pública. Sendo certo que competia á época ao chefe do Poder Executivo Municipal obstar e expungir de sua administração, quaisquer práticas espúrias por parte de seus assessores, que eram então seus subordinados hierárquicos. Ademais, no pertinente a improbidade por omissão, crível que de modo paradigmático a responsabilização dos ordenadores de despesas, haja também responsabilização do superior hierárquico, por falta de dever de cuidado e de fiscalização de agentes subordinados, quando efetuadas despesas indevidas, adotando-se igual entendimento balizado pelos Tribunais de Contas para tais agentes, também para os chefes de Poderes em relação aos seus secretariados, mesmo que tais agentes políticos não sejam os ordenadores de despesas, mas tão somente delegantes, ante a utilização das figuras hauridas do Direito Civil de culpa in elegendo e de culpa in vigilando. Entretanto, apesar da independência entre as instâncias de responsabilização dos agentes públicos, não há como deixar de olvidar também na seara da responsabilidade por prática de improbidade administrativa que a atuação da Corte de Contas em relação às contratações diretas descritas na exordial já é um elemento probatório suficiente para constatação de prática de atos de improbidade administrativa. A sujeição do agente público a cada uma das esferas de responsabilidade dependerá, portanto, não só da gravidade da conduta comissiva ou omissiva praticada pelo próprio, que seja violadora do seu dever de conduta, mas também a subsunção da violação da obrigação primária às hipóteses legais previamente definidas. Depreendendo-se uma tipificação estritamente fechada em relação às infrações penais e uma tipificação mais aberta em relação às infrações administrativas, políticas e aos atos que gerem responsabilidade perante aos órgãos de controle externo e aos atos consubstanciados em improbidade administrativa. Ressaltando-se ainda quanto às diferentes esferas de responsabilização que estas poderão ser invocadas de forma isolada ou cumulativa. Sendo que as condutas comissivas ou omissivas dos agentes públicos, violadoras da obrigação primária de conduta, deverão ser sempre apreciadas pelos órgãos e instâncias competentes para a aplicação de sanções com submissão estrita ao devido processo legal e aos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade. Nessa linha, em face do direito à boa administração de toda a coletividade, verdadeiro direito de caráter difuso e interesse de caráter metaindividual, o fenômeno da permissibilidade de atuação conjunta das diferentes esferas de responsabilidade em relação aos agentes públicos não deixa de apresentar também um aspecto de complementaridade, solidificando-se entre si todas essas esferas de responsabilidade para que seja olvidada, então, qualquer irresponsabilidade, pois o nosso Estado Democrático de Direito está comprometido com a eficiência da atuação estatal e com a eficácia dos resultados desta atuação. Trata-se, portanto, de um direito inserto na cidadania o dever do Estado de garantir o direito fundamental à boa administração, razão pela qual a ordem jurídica deve assegurar que tal direito se apresente de modo adequado. Para tanto, necessária faz-se a proteção eficiente desse direito fundamental, sopesando-se que a atuação da Administração Pública por órgãos públicos é imputada às pessoas jurídicas as quais eles integram e, por sua vez, a vontade psíquica dos agentes públicos expressa a vontade dos órgãos aos quais eles estão ungidos e subordinados, assim, quando os gestores públicos agem de modo a conspurcar o direito à boa administração,

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deve a ordem jurídica prever proficuamente às hipóteses de violação dos deveres desses agentes, e deve ainda a ordem jurídica prever os instrumentos adequados para a imposição das sanções cabíveis aos maus gestores, assegurando ainda que esses instrumentos sejam eficazes. Assim, as várias esferas de responsabilização dos agentes públicos apresentam entre si uma característica de complementariedade, para que não sejam sufragados nichos de irresponsabilidade, algo que seria incompatível com o regime democrático de direito. Com efeito, não vislumbra o Juízo haver ilegitimidade passiva ad causam em relação ao primeiro demandado. Aliás, mesmo que a hipótese fosse de eventual não responsabilização do agente político em face dos atos ora apurados, ainda assim não se verificaria a ilegitimidade aventada, ante a adoção da teoria da asserção em relação à análise das condições do exercício de ação. Desse modo, as condições do exercício de ação no que tange a pertinência subjetiva da demanda são analisadas à luz das afirmações que o autor faz em sua exordial, ou seja, a pertinência da relação jurídica deduzida em juízo é haurida in statu assertionis. Nessa linha, a eventual irresponsabilidade do agente ou a sua não participação no ato ora eivado de ilegalidade redundaria na improcedência da demanda, e não na extinção do processo, sem julgamento do mérito por ilegitimidade passiva. O 3° réu, Sr. André Granado Nogueira da Gama, atual Prefeito Municipal da cidade de Armação dos Búzios, também argui preliminar de ilegitimidade passiva ad causam, tendo aduzido que o processo administrativo n° 000305 F, iniciou-se pelo Memorando n° 07 de 03/01/2005, subscrito pelo 2° réu, então Secretário Executivo e de Transporte, ao qual fora solicitado ao Prefeito Municipal a contratação direta de várias empresas para manutenção de frota municipal de veículos que estaria em péssimo estado. Destacando que à época das aludidas contratações ele não era ainda Secretário Municipal. Todavia, tergiversa o terceiro demandado e ainda omite que ele próprio também autorizou despesas nos anos subsequentes, como o próprio Ministério Público obtemperou em sua exordial que, após o Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro ter notificado e multado o então Prefeito, as condutas foram reiteradas nos anos seguintes, tendo havido um total descontrole do setor de manutenção da frota de veículos com contratações diretas, inobservância da fase interna do processo administrativo, em especial de justificação de preço e escolha dos contratados diretos, inclusive com liquidação de despesas sem a devida emissão de notas de empenho, o que fortemente indica práticas claras de corrupção e prova cabal de concorrência para que terceiros as expensas do Erário Público Municipal, ilicitamente tivessem enriquecido. Não se sabendo se os agentes envolvidos ou demais agentes públicos também enriqueceram, mas sopesando-se o elevado número de Ações Civis Públicas relativas ao Governo Municipal do Prefeito Antônio Carlos Pereira da Cunha, entre os anos de 2005 e 2009, que tramitam perante este Juízo ante a quase sistemática contratação de bens e serviços sem licitação, indicia-se também o enriquecimento ilícito dos agentes ora demandados. Apenas para ilustrar, o 1° réu já fora condenado por atos de improbidade administrativa com base nas penas previstas no artigo 12 da Lei n° 8.429/92 por este Juízo em duas outras Ações Civis Públicas propostas pelo Ministério Público em razão de contratação direta de serviços no seu Governo, destacando-se que tais condenações se deram nos processos números 0000495-53.2010.8.19.0078 e 0000620-21.2010.8.19.0078, cabendo frisar que em relação ao processo n° 0000495-53.2010.8.19.0078, o 2° réu também fora condenado naquele feito por atos de improbidade administrativa e que os mesmo fatos na seara penal também ainda engendraram propositura pelo Ministério Público de ação penal n° 2009.078.002191-1 em face do ora primeiro e segundo demandados em razão de mais esta contratação sem licitação, o que também é crime capitulado no artigo 89 da Lei n° 8.666/93. Assim, no naquele processo-crime que também tramitou perante este órgão jurisdicional o primeiro demandado confessou inclusive em juízo que tinha plena ciência da contratação direta sem a devida licitação para veiculação da matéria de promoção pessoal, processo este no qual o 1° réu veio a ser então condenado a quatro anos de detenção, em regime inicialmente semiaberto, e pagamento de multa e o 2° réu a três anos de detenção, em regime inicial aberto, e pagamento de multa. Tendo sido tais condenações criminais confirmadas pelo 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em grau de recurso de apelação criminal, apenas sendo minoradas as penas e substituídas por prestação

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de serviços à comunidade e prestação pecuniária. O primeiro réu e o terceiro réu, o atual Prefeito Municipal desta cidade, ainda respondem conjuntamente e com outros réus a duas outras Ações Civis Públicas propostas pelo Ministério Público, distribuídas para este Juízo, envolvendo contratações diretas, sem a observância de procedimento licitatório na seara da Secretária Municipal de Saúde, a saber, os processos judiciais números 0003563-40.2012.8.19.0078 e 0003882-08.2012.8.19.0078, sendo que o primeiro processo envolve segundo aduz o Parquet um prejuízo ao erário de R$ 1.683.750,00 (um milhão seiscentos e oitenta e três mil e setecentos e cinquenta reais) e o segundo um prejuízo estimado ao Erário de R$ 2.022.189,44 (dois milhões vinte e dois mil e cento e oitenta e nove reais e quarenta e quatro centavos). Ações estas que engendraram inclusive pedidos de decretação de indisponibilidade de bens dos demandados e decisões deste Juízo decretando o bloqueio dos bens do Ex-Prefeito e do atual Prefeito do Município de Armação dos Búzios. Tais fatos que engendraram ainda prejuízos milionários ao Erário Público como salientara o Parquet nas iniciais das aludidas Ações Civis Públicas justamente na combalida seara da Saúde nesta cidade, na seara penal, ainda deram azo à propositura no final de 2012 pelo Ministério Público de três ações penais em face do Ex-Prefeito e do atual Prefeito do Município de Armação dos Búzios, além de outros réus, sendo que dessas ações penais, uma fora distribuída para este Juízo, a saber, a de n° 0004995-94.2012.8.19.0078 e duas outras para o juízo da 1ª Vara de Armação dos Búzios de números 0005009-78.2012.8.19.0078 e 0004897-12.2012.8.19.0078, sendo que todas a partir da diplomação e assunção do mandato do 3° réu foram imediatamente remetidas para a Procuradoria-Geral de Justiça e para o Egrégio Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Em prosseguimento, a mendaz arguição de ilegitimidade passiva do terceiro demandado, tentando induzir ao Juízo em erro, ao esclarecer que não era Secretário Municipal em 2005, mas omitindo que nos anos seguintes quando Secretário Municipal de Saúde autorizara contratações diretas, sem licitação, deve ser, portanto, cabalmente rejeitada. Para elucidar o terceiro réu ordenara despesas em contratos celebrados com terceiros, sem prévia licitação, consoante apurado em inquisa ministerial, nos seguintes processos administrativos abaixo elencados: 1. Processo 002500/2007, com Empenhos 243 e 244. Nesse processo houve pesquisa de preços. 2. Processo 2658/2007, com Empenhos 241 e 242. Fls. 95 do IC. 3. Processo 2415/07, com Empenhos 234 e 235. Fls. 95 do IC. 4. Processo 9375/2006, com Empenho 872. 5. Processo 10332/2006, Empenho 874. 6. Processo 2757/2006, Empenhos 338 e 337. 7. Processo 2008/2007, Empenhos 248, 249. 8. Processo 2309/2007, Empenhos 238. 9. Processo 23082007, Empenhos 252 e 253. 10. Processo 2538/2007, Empenhos 284 e 285. 11. Processo 2502/2007, Empenhos 237 e 236. 12. Processo 09377/2006, Empenhos 775. 13. Processo 2355/2007, Empenhos 339 e 340; 14. Processo 5004/2007, Sem Empenhos. 15. Processo 2243/2007, Sem Empenhos. 16. Processo 7197/2006, Sem Empenhos. Pela teoria da asserção há que se registrar, se o terceiro demandado não tivesse autorizado despesas em contratações diretas sem licitação consoante exemplifica o extenso rol de processos acima elencados, a hipótese poderia ser de improcedência da demanda e não de ilegitimidade passiva ad causam.

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Quanto ao que fora arguido pelo primeiro demandado de falta de interesse-adequação, sob a alegação de que o mesmo não pode vir a ser condenado a ressarcir o patrimônio público municipal, pois não teria sido ele quem ordenara as despesas, em que pese que o mesmo ainda estivesse ciente, inclusive por notificação, condenação a pagamento de multa e recomendação da Corte de Contas acerca do descalabro administrativo verificado por técnicos do Tribunal de Contas em sua polêmica administração, o 1° réu ainda autorizara, desde o início de sua gestão, os seus Secretários Municipais a contratarem diretamente serviços de manutenção da frota de veículos municipais, sem prévia licitação, e mesmo após ter sido o referido réu recomendado a mudar o rumo de sua gestão, para adequá-la aos ditames da Lei, ignorou todas as advertências, continuando a administrar os cofres públicos com o auxílio de seus subordinados, dentre eles o atual Prefeito desta cidade, como se tais cofres fossem privados e sujeitos meramente à realização de transações financeiras sob os auspícios da mera autonomia da vontade, pois sequer grande parte dessas despesas era liquidada após prévia emissão de notas de empenho. Todavia, mesmo que o primeiro réu estivesse insciente da conduta de seus subordinados, ainda assim verificar-se-ia a sua omissão da condução da chefia do Poder Executivo Municipal e a devida fiscalização dos atos administrativos perpetrados por seus auxiliares diretos, que contrariassem a ordem jurídica, constitucional e legal. Portanto, se não houvesse conduta dolosa para perpetração de ato de improbidade administrativa, haveria, ao menos, conduta culposa a merecer a devida sanção. Contudo, mesmo que não houvesse sequer conduta culposa, a hipótese não seria de extinção do processo, sem julgamento do mérito por carência do direito de ação, mas sim de improcedência da demanda. Urge esclarecer, portanto, que a possibilidade jurídica do pedido pode ser perquirida também a partir da legitimidade da parte para figurar no pólo da demanda, traduzindo-se a possibilidade jurídica do pedido (interesse-adequação) na necessidade e na utilidade da providência jurisdicional pleiteada, podendo a legitimidade ser perscrutada à luz das afirmações da parte autoral que são deduzidas na exordial, ou seja, in status assertionis. Assim, como para parte autorizada da doutrina o interesse-adequação se confunde com a própria possibilidade jurídica do pedido, o Juízo a analisa ainda sob o enfoque da possibilidade jurídica estrita do pedido, que deve ser perscrutada no aspecto da viabilidade do pedido imediato. Deste modo, não vislumbra o Juízo qualquer óbice para que o Parquet pleiteie pedido para a defesa do patrimônio público municipal. Frisando-se que a tutela pleiteada pelo Parquet é ainda condenatória, e não meramente declaratória, apesar de qualquer tutela jurisdicional que julgue um litígio trazer em si a ínsita declaração de um direito. Frise-se, então, que do exsurge da análise propriamente dita da pertinência subjetiva da demanda, a condição do exercício do direito subjetivo público de ação se verifica in statu assertionis. Para explicitar, na Teoria Concretista, acredita-se que o direito de ação pertence a quem é o detentor de fato do direito material. Ou seja, "a ação seria o direito de se obter em juízo uma sentença favorável" (CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, Vol. I, 10ª ed., p. 115). Aqui, falar em condições da ação significa tratar das condições para um julgamento favorável, logo, traduzem questões de mérito, relativas ao acolhimento ou não do pedido. Já a Teoria Abstrativista defende que o direito de ação é o direito ao processo, ao provimento jurisdicional, independentemente do resultado da causa. Neste sentido, os defensores desta corrente não falam em condições da ação. Entrementes dessas duas posições anteriores, a Teoria Eclética, adotada pelo Código de Processo Civil vigente e desenvolvida por Liebman, o direito de ação representa o direito a um julgamento de mérito, seja ele favorável ou não. Neste diapasão, o direito de ação fica restrito ao atendimento das condições

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da ação, sem as quais não se faz possível o exame de mérito. Essa doutrina defende que a análise dessas condições pode ser realizada a qualquer tempo, podendo, inclusive, serem preenchidas em momento superveniente ao da propositura da ação. Assim, há uma grande dificuldade em diferenciar as condições da ação de seu próprio mérito, até mesmo possibilitando a necessidade de produção de prova para sua análise (DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Bahia: jusPodivm, 2008, Vol.1, 9ª ed., p.172). Destarte, a tentativa de solucionar os problemas decorrentes da simples leitura do texto normativo, foi criada uma nova teoria, na esteira dos ensinamentos de Liebman, mas que dá nova interpretação ao Código de Processo Civil. Para seus defensores, as condições da ação devem ser aferidas pelo magistrado apenas da simples leitura da exordial, sem adentrar na análise do caso, sob o risco de apreciação meritória. Aqui, "o que importa é a afirmação do autor, e não a correspondência entre a afirmação e a realidade, que já seria problema de mérito" (MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas do processo civil. São Paulo: Malheiros, 1999, 3ª ed., p.212). Assim, como bem explica o professor Fredie Didier Jr., trata-se da análise feita "a luz das afirmações do demandante contidas em sua petição inicial" (DIDIER JR., FREDIE. Curso de Direito Processual Civil. Bahia: jusPodivm, 2008, Vol.1, 9ª ed., p.173). Por tais razões, o juízo não vislumbrou a carência da ação, não tendo depreendido, assim, a ilegitimidade de partes, a falta de interesse de agir e a impossibilidade jurídica do pedido, que foram aventadas na contestação das partes rés. Presentes, portanto, as condições do exercício de ação, bem como presentes os pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo. DA ALEGADA PRESCRIÇÃO: Não há que se falar em prescrição alegada pelo primeiro réu em sua contestação, pois, a priori, o Ministério Público aqui defende o interesse metajurídico de toda a coletividade na defesa do patrimônio público e do direito a boa administração, além de promover a defesa do próprio patrimônio público municipal a partir da renúncia do poder-dever de defesa e de fiscalização deste patrimônio pelo próprio ente municipal, que nesta demanda defende através da Procuradoria Geral os atos ilegais perpetrados pelos agentes demandados. A defesa do patrimônio público é imprescritível. NO MÉRITO: A priori, apesar da independência das instâncias criminal, civil e administrativa para responsabilização dos agentes públicos na seara das licitações e contratos administrativos do Poder Público, havendo ainda a instância da improbidade administrativa, nos moldes do artigo 37, § 4°, da Constituição Federal, bem como a responsabilização dos agentes perante os Tribunais de Constas, indiscutível, então, que a responsabilização do agente público na seara da Corte de Contas e a inquinação nesta instância dos contratos administrativos por ele intentados impliquem também no reconhecimento da responsabilidade do agente em outras instâncias, mormente na instância da improbidade administrativa. No âmbito das Licitações e Contratos da Administração Pública, a Lei n° 8.666/93 prevê inclusive condutas delituosas típicas em normas incriminadoras em relação aos agentes públicos. Normas estas que, por sua vez, cominam sanções penais em seus preceitos secundários. Assim, o citado artigo 89 da aludida Lei preceitua como tipo penal, dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade. Prevendo pena de detenção de 03 (três) a 05 anos, e multa. Trata-se de crime próprio, que somente pode ser cometido por quem está investido da função pública, muito embora o parágrafo único do aludido tipo penal preceitue que incorre nas mesmas penas quem tenha comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiando-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para contratação com o Poder Público. No que tange a improbidade administrativa consiste tal fenômeno em ação ou omissão vulneradora do dever de moralidade administrativa no exercício de função pública por agente público, incluindo o agente político, acarretadora de sanções civis, administrativas e penais, de

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modo cumulativo ou não, na forma definida na Lei. Desta maneira, o agente público que conspurca o princípio setorial da Administração Pública consubstanciado na moralidade administrativa, através de ação ou omissão, dolosa ou culposa, geradora de prejuízo ao Erário ou, mesmo que sem gerar prejuízo, vulnere tão somente de forma gravosa à ordem jurídica ou os princípios constitucionais e setoriais da Administração Pública, além de sujeitar-se a eventuais sanções cíveis, administrativas e penais, aplicadas isolada ou cumulativamente de acordo com a gravidade do fato, sujeitam-se ainda as sanções previstas para os atos de improbidade administrativa. Destaca-se, então, que a possibilidade de imposição de sanções aos agentes públicos por atos de improbidade administrativa liga-se intimamente ao interesse difuso de toda coletividade e de todos os administrados à boa administração. Portanto, é direito dos administrados obter da atuação dos Poderes Públicos, a escorreita administração e emprego dos recursos públicos, a saber, a boa governança dos recursos patrimoniais, orçamentários e financeiros do Estado. No caso vertente, inquestionável que os três primeiros réus, em comunhão de ações e desígnios, concorreram eficazmente para dispensar licitações fora das hipóteses previstas em lei, deixando ainda de observar as formalidades pertinentes aos processos internos para as contratações diretas de aquisições de peças de veículos automotores e de manutenção da frota de veículos do Município de Armação dos Búzios. O próprio Parquet em sua exordial destacou que fora dessumido dos Inquéritos Civis Públicos n°s 12/2008 e 15/2010 que, no caso em tela, não houve para a realização de contratações diretas: a realização escorreita de processos administrativos prévios para aquisições de peças de veículos automotores e de manutenção da frota de veículos do Município de Armação dos Búzios, consubstanciados na fase interna da contratação do Poder Público, de acordo com o devido processo legal sob o enfoque substantivo e formal, no qual a observância de etapas e formalidades se faz indispensável e no qual só seria lícito dispensar o certame público nas hipóteses estritas previstas em Lei. Em suma sequer havia justificativa do fornecedor escolhido e dos preços praticados para as contratações diretas. Destarte, assiste razão pelo cotejo dos fartos documentos que instruem os Inquéritos Civis Públicos de que as irregularidades constatadas pelo Tribunal de Contas no ano de 2005, no processo nº 223.275-08/2005, foram reiteradas ao longo de 2006, 2007 e 2008 e consistiam em ausência formal de fundamentação legal e violação do artigo 26 da Lei de Licitações por ausência de justificativa do fornecedor escolhido e dos preços praticados na aquisição de peças de veículos, legitimando a dispensas de licitação e fracionamento de compras, que somadas ensejariam procedimento licitatório, para compras efetuadas especialmente a Barnato Cómércio de Peças Ltda. Isto, além de despesas pagas e liquidadas sem prévio empenho, inobservando, ainda, os artigos 60, 62 e 63 da Lei 4.320/64, que Estatui Normas Gerais de Direito Financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. Começa-se, então, o descalabro administrativo quando o segundo demandado, na ocasião Secretário Municipal Executivo de Transportes, Sr. Carlos Henrique da Costa Vieira, solicita, ao então Prefeito Municipal, primeiro demandado, através do Memorando n° 07/2005, datado de 03 de janeiro de 2005, autorização para a realização de contratações de empresas de conserto de veículos, aduzindo que o novo governo municipal recebera a frota de veículos em péssimo estado, com problemas mecânicos, destarte, naquele documento que dá azo ao processo administrativo n° 000305 F (documento de fls. 133/134 do Inquérito Civil Público n° 12/2008 em anexo), o aludido Secretário já solicita a contratação direta com as empresas Barnato Comércio de Peças Ltda. ME., Largos Tecno Car Som e Acessórios Ltda., DJ Felipe Mecânica - ME, Jomago Auto Peças Ltda. ME, V.M. Vieira Peças e Serviços - ME, em valores respectivamente de R$ 33.147,46, R$ 103.791,38, R$ 16.770,71, R$ 1.439,50 e R$ 1.842,00, valores que somados impressionam, a saber, R$ 156.991,07 (cento e cinquenta e seis mil novecentos e noventa e nove reais e sete centavos), pois dependendo do veículo, se popular, daria para comprar, ao menos cinco veículos populares em valores atuais.

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Naquele documento inicial do descalabro administrativo no setor de contratação de manutenção de veículos, o segundo réu já salienta que as contratações são 'emergenciais' e, por isso, dispensadas a licitações, e sem qualquer justificativa dos preços ou das empresas escolhidas, em verdade, o segundo demandado já aventa que cada despesa sairá da dotação orçamentária concernente a cada específica Secretaria Municipal. Assim, como se vislumbra do documento de fl. 143 haurido do respectivo processo administrativo constante do Inquérito Civil Público n° 12/2008 em anexo, autorizada fora a liquidação de despesa e em seguida as despesas são ordenadas pelo próprio segundo réu, como se depreende do cotejo dos documentos seguintes de fls. 144/150. Através do Memorando n° 172/2005, no bojo do processo administrativo n° 3979, em 31 de março do ano de 2005, e reiterada como solicitação de contratação pelo segundo réu ao então Prefeito Municipal do conserto de uma retroescavadeira, conforme processo administrativo n° 3979/05, que dera azo à única licitação realizada na modalidade carta convite, aparentemente, por todo o período de contratação de serviços de manutenção de frota de veículos oficiais durante toda a gestão municipal do então Prefeito Municipal, Sr. Antônio Carlos Pereira da Cunha, a saber, a carta convite n° 40/2005, que se sagrou vencedora a empresa Barnato Comércio de Peças Ltda. ME.. A par daquela única licitação realizada para contratação de serviço de manutenção de veículo da frota municipal, as demais solicitações do Secretário Municipal Executivo de Transportes e posteriormente de Saúde, segundo demandado e terceiro demandados, já se assentavam em Decretos Municipais de número 02/05 e 241/05, da lavra do primeiro demandado, que previamente e de forma genérica já, ab absurdum, autorizava inúmeras contratações diretas por seus secretários municipais, em virtude de supostas situações emergenciais alicerçadas tão somente na desorganização administrativa encontrada quando da assunção daquele novo governo municipal. Em prosseguimento, no que pese o primeiro demandado ter sido notificado e multado pelo Tribunal de Constas do Estado do Rio de Janeiro no ano de 2005 no processo TCE n° 223.275-08/2005, como consta dos autos do Inquérito Civil Público n° 15/2010, nos anos seguintes o descalabro administrativo continuou, tendo sido detectado mesmo nos anos seguintes o prosseguimento de contratações diretas, sob a alegação de surgimento de situações 'emergenciais', quando já ultrapassados há muito os primeiro quatro meses da administração municipal do primeiro demandado junto a Prefeitura de Armação dos Búzios, quando se engendrou uma emergência ficta para contratação de serviços de manutenção de veículos da frota municipal, sob os auspícios de uma suposta precariedade mecânica desta frota engendrada pela Administração Pública Municipal anterior. Destarte, inviável que nos anos de 2006 e 2007, a situação relegada pela Administração Pública anterior perdurasse, pois talvez tivesse sido melhor mudar toda a frota de veículos - teria sido quiçá menos custoso, pois para ter-se uma singela idéia a Administração do Ex-Prefeito Antônio Carlos Pereira da Cunha gastou nos anos de 2005, 2006 e 2007 algo em torno de R$ 808.846,23 (oitocentos e oito mil oitocentos e quarenta e seis reais e vinte três centavos) em consertos de carro. Isto porque não deu para se apurar o valor exato gasto com tais manutenções de veículos, vez que na Administração Pública Municipal do primeiro demandando foram verificados pelo órgão ministerial que em vários processos administrativos não havia escrituração adequada, ante a falta de numeração de páginas e que havia ainda inúmeros processos autônomos engendrados de despesas realizadas com o mesmo fornecedor, contratado diretamente, sem licitação. Além do mais concluiu o corpo técnico ministerial que o valor total dos empenhos constantes dos autos é de R$ 390.284,73 (trezentos e noventa mil duzentos e oitenta e quatro reais e setenta e três centavos), porém, o valor total de notas fiscais constantes dos autos é de R$ 689.573,98 (seiscentos e oitenta e nove mil quinhentos e setenta e três reais e noventa e oito centavos), tendo-se verificado a existência de um quantum pago de R$ 299.289,25 (duzentos e noventa e nove mil duzentos e oitenta e nove reais e vinte e cinco centavos), sem que se tivesse sido feito o devido empenho, o que configura a concorrência para o enriquecimento ilícito das empresas agraciadas com as sucessivas contratações diretas.

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Para ter-se uma singela idéia de que houve concorrência para o enriquecimento de terceiros, não é demasiado esclarecer que o primeiro demandado responde hodiernamente perante este Juízo a Ação Civil Pública por enriquecimento ilícito. Assim, urge salientar que no período de março de 2005 a setembro de 2007, foram identificadas 464 (quatrocentos e sessenta e quatro) notas fiscais em favor da empresa Barnato Comércio de Peças Ltda. ME., que totalizaram R$ 557.885,04 (quinhentos e cinquenta e sete mil oitocentos e oitenta e cinco reais e quatro centavos). Enquanto as empresa Lagos Tecno - Car Som e Acessórios Ltda. e D.J Felipe Mecânica - ME, a partir das notas fiscais constantes dos autos, receberam juntas um total de R$ 250.961,19 (duzentos e cinquenta mil novecentos e sessenta e um reais e dezenove centavos). São valores, portanto, bem expressivos para gastos com manutenção de veículos ao longo de três anos do governo do primeiro demandado, em especial quando realizados sem licitação, sem justificativa de preços e das empresas escolhidas e com inúmeras despesas sequer realizadas com lastro em notas de empenho. Ressaltando-se que o Município de Búzios não detém mais de trinta mil habitantes e tem uma extensão territorial de apenas 70 km². O mais impressionante é que mesmo após a sanção aplicada ao primeiro demandado pela Corte de Contas, em razão dos expressivos valores gastos sem licitação para conserto de frota de veículos, nos idos de 2005, sem licitação, nos anos seguintes as mesmas práticas tenham sido reiteradas, só que, a partir de então, inclusive com autorizações de despesas sem a prévia emissão de notas de empenho, algo verdadeiramente absurdo, que revela o dolo dos agentes demandados, não só em autorizar contratações entre o Poder Público e particulares, sem licitação e sem qualquer observância das regras internas para a dispensa de procedimento licitatório, como justificativa real de situação emergencial, justificativa de empresa escolhida e dos preços contratados, como também se depreende o dolo dos agentes em enriquecer terceiros, pois havia ainda despesas realizadas sem a emissão de notas de empenho. Frise-se que no processo TCE n° 223.275-08/2005 foram constatadas irregularidades em diversos setores do Governo Municipal do primeiro réu, como aplicação de recursos para pagamento de pessoal com recursos dos royalties, ausência de justificativa de preço e da razão de escolha de contratados diretos, sem licitação, dispensa indevidas de licitação, impropriedade na falta de divulgação de certames, sonegação de documentos e etc. tudo como se depreende do Anexo I do Inquérito Civil Público n° 15/2010 (fls. 05/84), que instruiu a exordial, donde se dessume que apesar de todas as advertências da Corte de Contas, os desmandos e descalabros administrativos prosseguiram. Ressalta-se que no ano de 2007 a Câmara Municipal de Armação dos Búzios, através da Resolução n° 550/2007 instaurou Comissão Parlamentar de Inquérito para irregularidades no conserto e manutenção de veículos na Prefeitura de Armação dos Búzios com relação à empresa Barnato Comércio de Peças Ltda. ME., conforme anexo VIII do outro Inquérito Civil Público n° 12/2008, que instruiu a exordial, cujo Relatório assinado pelo Vereador Messias Carvalho da Silva, emitia parecer favorável pelo indiciamento do então Prefeito Municipal Antônio Carlos Pereira da Cunha e dos Secretários Municipais Carlos Henrique da Costa Vieira e André Granado Nogueira da Gama, além do então Chefe da Divisão de Veículos Públicos, Sr. Eduardo Pereira de Barros e o representante legal da empresa investigada, José Roberto Sansionato, por atos dolosos perpetrados contra o Município para desvio e favorecimento de terceiros, como se dessume do Relatório daquela Comissão Parlamentar de Inquérito, denominada de CPI do Parafuso, constante do IV do outro Inquérito Civil Público n° 12/2008. Apenas para ilustrar aquele profícuo relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito concluiu que houvera fraude nos procedimentos licitatórios, com a articulação de compra e venda entre fornecedores e agentes públicos, superfaturamento de preços e serviços, falta inclusive de contrato e de empenho prévio para realização de despesas, favorecimento de terceiros e dolo de todos os agentes públicos indiciados para que recursos públicos fossem desviados em prol de extraneus. Além do mais a CPI do 'Parafuso' foi constatado que em relação à única licitação realizada na modalidade carta-convite para contratação de manutenção de frota de veículos, na qual se sagrou vencedora a empresa investigada Barnato Comércio de Peças Ltda. ME., a empresa então escolhida tinha sua sede no Município de Rio Bonito, ou seja, sua sede sequer era situada em Município da Região dos Lagoa, donde se dessume que afrontava ainda o princípio da

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ecomicidade realizar reparos em veículos que em tese deveriam transitar dentro do território do Município de Armação dos Búzios em uma cidade que se situa ao menos a noventa dois quilômetros de distância desta Comarca, salvo nas situações de trânsito de veículos oficiais desta municipalidade no transportes de pacientes para outros nosocômios públicos municipais ou em relação ao protocolo de documentos afetos a processos de controle e judiciais que estivessem tramitando em Cortes de Contas ou no Tribunal de Justiça dos Estado do Rio de Janeiro, situados na capital do Estado. A balbúrdia administrativa era tanta e a intenção de desviar recursos públicos em prol de terceiros contratados era tão evidente que o segundo réu ouvido pelos integrantes da Comissão Parlamentar de Inquérito no âmbito da Câmara de Vereadores de Armação dos Búzios chegou a obtemperar que as despesas de veículos da frota municipal, a exceção dos veículos da frota da Secretária Municipal de Saúde, eram por ele ordenadas, mas explicitou apenas para os incautos que a existência de notas fiscais de lavagens de um mesmo veículo em uma mesma data se dava porque os processos de liquidações dessas despesas estariam irregulares, a saber, porque ao invés de empenho prévio para liquidação de despesas de manutenção de veículos, pagava-se dantes pelo serviço ao 'contratado' e para a regularização posterior da emissão da nota de empenho respectiva, emitia o fornecedor uma nota fiscal única, algo realmente teratológico e indiciário da má-fé dos agentes envolvidos, que assim desviaram recursos públicos em prol de terceiros contratados, sobretudo, sem a devida realização de licitação sob os auspícios de situações emergenciais, o que conspurcava a Constituição Federal, a Lei Geral sobre Licitações e ainda a legislação sobre Direito Financeiro para controle dos orçamentos dos entes públicos. Estranho ainda que em relação à empresa Barnato Comércio de Peças Ltda. ME., os veículos da frota municipal de Armação dos Búzios fossem lavados pela aludida empresa com sede na Comarca de Rio Bonito a mais de 92 Km de distância desta cidade e como não se evidenciou ao contrário das contestações apresentadas pelos réus, com serviços de limpeza de um mesmo veículo realizado na mesma data. Sobre a irregularidade dos serviços propriamente ditos constatada pela Comissão Parlamentar de Inquérito no âmbito da Câmara de Vereadores de Armação dos Búzios, que faz parte integrante do Inquérito Civil Público n° 12/2008, ouviu-se o representante legal da principal empresa investigada, a sociedade comercial Barnato Comércio de Peças Ltda. ME., Sr. José Roberto Sansionato, e o mesmo confirmou que veículos da frota da Secretária Municipal de Saúde eram consertados em caráter de urgência, mesmo sem licitação, 'porque não haveria como se esperar a realização de um procedimento licitatório, até porque a empresa em questão seria parceira do Município desde 1998' (sic), de igual modo aduziu que não havia como consertar um veículo que ficasse no aguardo de realização de empenho prévio e emissão regular de nota de empenho (sic), ou seja, liquidavam-se recursos públicos como se os cofres públicos sujeitassem as mesmas regras, por exemplo, da utilização de recursos depositados em conta corrente de um particular em instituição financeira, em suma, sem quaisquer observâncias dos princípios mais Comezinhos de Direito Administrativo e de Direito Fiscal. O aludido representante legal da sociedade comercial Barnato Comércio de Peças Ltda. ME., ouvido pela aludida Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o fato de sua empresa não lavar veículos, mas emitir notas de limpeza explicitou que empresa 'terceirizava' tais serviços, donde se dessume a evidência que o animus dos agentes públicos envolvidos e dos extraneus era de desviar recursos públicos, inclusive suspeitando-se como resta claro da emissão dessas notas fiscais referentes aos serviços de limpeza, que constam dos autos em apenso que tais notas fiscais fossem "notas frias", o que inclusive pode em tese configurar crime previsto no artigo 1° da Lei n° 8.137/90, que define os crimes contra a Ordem Tributária. Na aludida Comissão Parlamentar de Inquérito realizada no âmbito do Poder Legislativo Municipal e que servira também de suporte para o ajuizamento da presente Ação Civil Pública pra imposição de penalidades em face dos réus por pratica de evidentes atos de improbidade administrativa a par das investigações ministeriais conduzidas nos dois Inquéritos Civis Públicos que instruíram a petição inicial desta demanda, ouviu-se também um empregado da sociedade empresária, conhecido como "Dinho", que negou a realização naquela empresa de considerável parte dos serviços descritos nas notas emitidas pela empresa Barnato Comércio de Peças Ltda. ME., como

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limpeza de carros e manutenção de tacógrafos. Sendo que tais depoimentos foram transcritos no Relatório realizado pelo Vereador Messias Carvalho da Silva, da Câmara Municipal de Armação dos Búzios, que fora designado Relator da referida Comissão Parlamentar de Inquérito. Cabe destacar que a aludida Comissão Parlamentar de Inquérito fora denominada "CPI do Parafuso" porque uma nota fiscal emitida pela empresa Barnato Comércio de Peças Ltda. ME., fazia menção a um parafuso adquirido pela municipalidade de Armação dos Búzios, para um de seus veículos públicos, orçado em R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais); algo que já transparece ser bem acima do valor de mercado para o homo medius. No Relatório Final elaborado pelo referido Vereador Messias Carvalho da Silva, Relator da Comissão Parlamentar de Inquérito denominada "CPI do Parafuso" havia ainda referência ao cotejo de outra nota fiscal emitida pela empresa Barnato Comércio de Peças Ltda. ME., acerca da lavagem de um veículo da frota municipal de veículos da Prefeitura de Armação dos Búzios, orçada em R$ 189,00 (cento e oitenta e nove reais), algo surreal, pois para fatos que prescindem de comprovação probatória, fatos notórios, a limpeza completa de um veículo particular em um dos postos de gasolina desta cidade custa R$ 30,00 (trinta reais). Em prosseguimento, no aludido Relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito fora mencionado que a empresa Barnato Comércio de Peças Ltda. ME. emitira uma nota fiscal para pagamento de cerca de R$ 19.000,00 (dezenove mil reais), no ano de 2007, com a inclusão de um tacógrafo adquirido pelo valor de R$ 4.203,43 (quatro mil duzentos e três reais e quarenta e três centavos), que segundo investigado pela Comissão imbuída de poderes investigatórios próprios das autoridades judiciais apurou que a referida empresa não fornecia tacógrafos como peças de aquisição de veículos. Ouvido o terceiro réu pelos integrantes da Comissão Parlamentar de Inquérito, no âmbito do Poder Legislativo Municipal, Sr. André Granado Nogueira da Gama, então Secretário de Saúde, atual Prefeito Municipal do Município de Armação dos Búzios, o mesmo assumiu que era ordenador das despesas contestadas no âmbito da Secretária Municipal de Saúde referente aos serviços de manutenção contratados, sem prévia licitação, inclusive tendo aduzido que caso a CPI constatasse qualquer irregularidade, ele é quem deveria ser responsabilizado por ter sido ordenador das despesas realizadas com tais serviços na seara de sua Secretaria Municipal. No entanto, obtemperou naquele depoimento o terceiro réu que não tivera tempo hábil ante a convocação da Comissão para analisar os processos administrativos contestados para realização de despesas na frota de veículos afetos a sua Secretaria Municipal, assim, não explicitou o referido réu de forma adequada aos membros daquela Comissão Parlamentar de Inquérito porque havia gastos com reparos de manutenção, por exemplo, com um veículo Sprinter, placa KRN 0973, totalizando R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) e que continuava no depósito, como fora apurado pelos membros daquela Comissão, inclusive com a inclusão de um parafuso orçado em R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais). Nem tão pouco sobre explicitar o motivo pelo qual sua Secretaria adquirira da empresa Barnato Comércio de Peças Ltda. um tacógrafo pelo valor de R$ 4.203,43 (quatro mil duzentos e três reais e quarenta e três centavos), que, segundo investigado pela Comissão imbuída de poderes investigatórios próprios das autoridades judiciais, não fornecia dentre os seus serviços, tacógrafos como peças de aquisição de veículos, sendo tal despesa ainda inserta em uma nota fiscal emitida pela empresa Barnato Comércio de Peças Ltda. de cerca de R$ 19.000,00 (dezenove mil reais), no ano de 2007. As conclusões da Comissão Parlamentar de Inquérito, no âmbito do Poder Legislativo Municipal, em relação ao então Secretário de Saúde, Sr. André Granado Nogueira da Gama, atual Prefeito Municipal do Município de Armação dos Búzios, quando debruçada sobre a análise da documentação recolhida aponta ainda gravíssimos fatos envolvendo não só a realização de despesas no âmbito da Secretaria Municipal de Saúde sobre serviços, como efetivamente as suspeitas do pagamento de serviços não realizados, que cabem aqui suas transcrições in verbis: "- Fiat Uno, placa LOE 0943 (Processo n° 002310/2007 - COPIA ANEXA - e notas fiscais - ANEXAS, que apontam processos vinculados de n° 002757/2007, n° 002502/2007, n° 007453/2006 e n° 003898/2005, vinculados a Secretaria Municipal de Saúde - despesa total, entre Dezembro/2006 e Julho/2007, em torno de R$ 13.000,00 (treze mil reais) em serviços de lanternagem e pintura, entre outros. Atente-se para o fato de o carro aparecer em notas de serviço

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da Lagos Tecno-Car Som e Acessórios nos meses de Dezembro/2006 e Maio/2007, sem processo, e Barnato Comércio de Peças Ltda. - ME nos meses de Dezembro/2006 e Maio/2007. O que se constata é que o registro dos serviços realizados pelas duas empresas no mesmo carro tem um intervalo de apenas dois meses. O mais agravante é que em notas fiscais de serviços referentes ao carro aparecem notas descrevendo serviços de ar-condicionado, que o carro não possui, além de outras peças que constam como pintadas e lanternadas, sendo que o carro continua sem serviços de lanternagem e, segundo declaração de funcionário da Secretaria de Saúde, nunca saiu do município para tal". Anexo IV do Inquérito Civil Público n° 12/2008 que reproduz o Relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito, no âmbito do Poder Legislativo Municipal, da lavra do Vereador Relator Messias Carvalho da Silva, fls. 13/14. É certo que o Ministério Público em sua exordial destacou que as conclusões da aludida Comissão Parlamentar de Inquérito foram genéricas, eis que despidas de conclusões jurídicas mais específicas sobre os fatos apurados com suas devidas capitulações e eventuais consequências, tanto na seara da responsabilização de agentes públicos por atos de improbidade administrativa, quanto na seara do controle dos gastos públicos exercido pela Corte de Contas, bem como na seara criminal. Ao contrário das conclusões hauridas do processo de tomada de contas do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, que através do processo TCE n° 223.275-08/2005 constatou irregularidades em diversos setores do Governo Municipal do primeiro réu, como aplicação de recursos para pagamento de pessoal com recursos dos royalties, ausência de justificativa de preço e da razão de escolha de contratados diretos, sem licitação, dispensa indevidas de licitação, impropriedade na falta de divulgação de certames, sonegação de documentos e etc., dentre as quais irregularidades no processo administrativo n° 03/05 F, em que foram constatadas contratações diretas de serviços de compras, para aquisição de peças de consertos de veículos, ordenadas pelo segundo réu (cópias do processo TCE n° 223.275-08/2005 analisadas no Anexo I do Inquérito Civil n° 15/2010). Sendo que naquele processo não só o primeiro réu fora sancionado ao pagamento de multa imposta pela Corte de Contas, como diversos outros agentes públicos da Prefeitura de Armação dos Búzios. Porém, as conclusões da referida Comissão Parlamentar de Inquérito realizada no âmbito do Poder Legislativo Municipal alicerçadas na profusão fática de dados colhidos pelos parlamentares dotados de poderes investigatórios próprios de autoridades judiciárias que denotaram o inegável prejuízo acarretado ao Erário Público Municipal, em síntese, e de modo corajoso, asseveraram expressamente que fora constatada indubitável fraude perpetrada pelos indicados procedimentos licitatórios analisados dos, com a articulação de compra e venda entre fornecedores e agentes públicos para superfaturamento de preços e serviços, inclusive com falta formal de instrumentalização de contratos e de empenhos prévios para realização de despesas, bem como para, ao final, favorecer terceiros a enriquecerem ilicitamente, o que fez o Relator da aludida Comissão a depreender o dolo de todos os agentes públicos indiciados para que recursos públicos hauridos da contribuição dos tributos pagos pelos munícipes e demais contribuintes fossem, de fato, desviados dos cofres públicos em prol de extraneus, deixando assim tais recursos de serem aplicados em serviços públicos essenciais que a população desta cidade tanto precisa. Nesta esteira, não é demasiado salientar que grande parte das conclusões extraídas pelo Ministério Público em sua exordial também foram baseadas não só no processo de controle exercido pela Corte de Contas em processo de tomada de contas, mas também na fiscalização do Poder Legislativo Municipal, exercido, in casu, sobretudo pela aludida Comissão Parlamentar de Inquérito. Ao Poder Legislativo compete então fiscalizar os atos do Poder Executivo, competência esta do Poder Legislativo em todas as esferas federativas, que é haurida pelo princípio da simetria conforme dispõe o artigo 49, inciso X, da Constituição Federal, que trata da competência privativa do Congresso Nacional. De igual modo, a Lei Orgânica de Armação dos Búzios prevê no seu artigo 35, incisos VIII e IX, a competência privativa da Câmara de Vereadores para exercer a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do Município e julgar as contas do Prefeito Municipal, donde se dessume o seu poder de fiscalizar os atos do Poder Executivo Municipal, muito embora na Lei Orgânica deste Município inexista norma expressa de caráter genérico quanto ao poder fiscalização do Poder Legislativo Municipal sobre o Poder

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Executivo, a exemplo do citado artigo 49, inciso X, da Constituição Federal. Conquanto, é uma função típica do Poder Legislativo o exercício do controle parlamentar, por meio de fiscalização, que se consubstancia em um controle fiscalizatório de cunho político-administrativo e de cunho financeiro-orçamentário. Sendo tal poder um corolário do regime republicano e do sistema de freios e contrapesos, sem o qual não haveria contenção do poder e, por conseguinte, democracia. Desta forma, sem embargo da tese que reputa o poder estatal como sendo uno, havendo apenas separação de funções estatais, então, dividido o poder, constitucionalmente, e individuados seus órgãos, assim como superada a idéia da prevalência de um sobre o outro, através da compreensão da necessidade de equilíbrio e independência e harmonia entre eles, exsurge histórica e dogmaticamente a concepção de controle e vigilância recíprocos de um poder sobre o outro relativamente ao cumprimento dos deveres constitucionais e institucionais de cada um. Assim, os elementos essenciais caracterizadores do moderno conceito do princípio da separação dos poderes residem na idéia do controle, que é corolário do regime democrático de direito. Deste modo, reputa-se a idéia de CONTROLE, que se insere nas funções específicas de cada um dos poderes na dogmática tripartite e que tem por teleologia a contenção do poder estatal, seja qual for sua manifestação, dentro do quadro constitucional. Destarte, para que se efetive a função típica de controle parlamentar do Poder Legislativo sobre os atos do Poder Executivo, as Comissões Parlamentares de Inquérito se consubstanciam em um salutar instrumento democrático de controle legislativo sobre atos do Poder Executivo, sendo tal instrumento de controle previsto simetricamente em todas as unidades federativas que compõem o nosso Estado Federal, estando previsto este instrumento também na Lei Orgânica do Município de Armação dos Búzios, que é o arquétipo da regência da vida institucional no âmbito municipal, como prevê o artigo 29 da Constituição Federal. Deste modo, a Lei Orgânica do Município de Armação dos Búzios prevê que a função típica do Poder Legislativo de exercício de controle parlamentar do Poder Executivo Municipal, através do instrumento das Comissões Parlamentares de Inquérito, sobre fato determinado e inserto na competência da Câmara Municipal, dar-se-á sempre que pelo menos um terço dos seus membros assim o requererem. No caso em tela, tal controle exercido através da Comissão Temporária denominada de CPI do "Parafuso" subsidiou de sobremaneira a investigação ministerial, carreando, então, suas conclusões extraídas em 24 de julho de 2008 aos autos dos dois Inquéritos Civis Públicos, instaurados sobre as despesas executadas pela Prefeitura de Armação dos Búzios para manutenção de veículos da frota municipal: a) farta documentação atinente aos depoimentos dos réus e de demais agentes e extraneus envolvidos nas fraudes perpetradas ao longo da Chefia do primeiro réu à frente do Governo Municipal de Armação dos Búzios; b) cópias de processos administrativos maculados por indevidas dispensas licitatórias; c) demonstração de claro fracionamento de despesas para que fossem obstadas à observância dos procedimentos licitatórios previstos legalmente; d) demonstração da falta de formalização de instrumentos de contratos administrativos celebrados com particulares para a manutenção da frota de veículos; e) demonstração da falta de prévio empenho e de emissão de notas de empenho para liquidação de despesas; f) demonstração clara de superfaturamento de preços, sem que houvesse justificação prévia de preços e das empresas escolhidas para contratação sem licitação; g) demonstração de inexistência de situações emergenciais para contratações diretas; h) demonstração de que vários serviços liquidados, sem instrumentalização de contratos com dispensa de licitação e sem prévio empenho, sequer foram realizados; i) demonstração de práticas dolosas dos agentes públicos indiciados para celebração de ajustes espúrios com particulares contratados, a fim de que fossem desviados recursos públicos e enriquecidos ilicitamente tais particulares contratados ilegalmente. Acrescente-se que tais conclusões já haviam sido feitas pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro em processo de tomada de contas acerca do descalabro administrativo no governo municipal chefiado pelo primeiro réu, que fora multado consoante voto do Conselheiro Julio

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Rabello, Relator do processo n° 223.275-8/05, tendo sido recomendado ainda que a então administração municipal procedesse à mudança de rota, mas tal orientação não fora seguida, prosseguindo-se intencionalmente os agentes políticos com desmandos administrativos nos anos seguintes de 2006 e 2007, inclusive com a realização de despesas absolutamente indevidas na seara da saúde para manutenção de veículos da frota da Secretaria Municipal de Saúde, inclusive com realização de despesas inequivocamente superfaturadas, que afrontava o princípio da economicidade, e com a liquidação de despesas não realizadas, enriquecendo-se terceiros contratados indevidamente sem licitação pública, que denotava grave comprometimento do dever de fidelidade ao ente estatal lesado. Tais conclusões dos órgãos de controle do Poder Legislativo e do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro alicerçaram e legitimaram, portanto, as inquisas ministeriais, sendo que o Inquérito Civil n° 12/2008, que também traz em seu bojo as conclusões da Comissão Parlamentar de Inquérito da Câmara de Vereadores de Armação dos Búzios, enviadas ao Ministério Público, e do processo n° TCE 223.275-08/05, iniciou-se a partir de representação da Deputada Estadual Cidinha Campos. Apenas para ilustrar, como os atos notórios prescindem de comprovação, mormente sessões públicas de Poderes, como preceitua o artigo 334, inciso I, do Código de Processo Civil, em sessão da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, veiculada pela TV/ALERJ, a Deputada Estadual Cidinha Campos discursou que representara contra o então Prefeito de Armação dos Búzios, Sr. Antônio Carlos Pereira da Cunha, junto ao Procurador-Geral do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, justamente em razão das despesas da municipalidade realizadas na gestão do primeiro réu para manutenção da frota de veículos afetos aos serviços das Secretarias Municipais da Prefeitura de Armação dos Búzios, tendo destacado que numa nota fiscal de um serviço de manutenção em um dos carros da Prefeitura um parafuso custara algo em torno de R$ 260,00 (duzentos e sessenta reais) - o que na opinião da Deputada deveria ser o parafuso 'mais caro do mundo', mormente se comparado com pesquisas feitas por denunciantes informadas àquela parlamentar de que o parafuso mais caro adquirido pela Agência Espacial Norte Americana - NASA, responsável pelo programa espacial dos Estados Unidos, para aparafusar componentes do ônibus espacial, custaria no máximo trinta dólares; não esquecendo-se que na nota fiscal emitida por serviço prestado pela empresa Barnato Comércio de Peças Ltda. ME. no valor de R$ 19.000,00 (dezenove mil reais), no ano de 2007, com despesa liquidada por ordem emitida pelo então Secretário de Saúde, hodiernamente, atual Prefeito de Armação dos Búzios, estava inserta o controverso parafuso orçado em R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais), orçamento este dado pela empresa que segundo seu representante legal seria 'parceira' do Município desde 1998 e que, por isso, realizava os serviços a medida que os carros chegavam a oficina da empresa e depois é que a Prefeitura empenhava tais despesas. Isto enquanto a saúde neste município continua precaríssima. Ressaltando que o depoimento do Sr. José Roberto Sansionato, representante legal da principal empresa investigada pela Comissão Parlamentar de Inquérito, no âmbito da Câmara Municipal de Armação dos Búzios, baseara-se também em perguntas feitas pelos integrantes da aludida Comissão Temporária, instaurada para investigar irregularidades nas contratações de serviços de manutenção de veículos oficiais, que foram também alicerçadas em denúncias feitas pela Revista "Cidade", edição n° 21, de janeiro de 2008, que está inserta aos autos das apurações feitas pela respectiva CPI do "Parafuso" e do Inquérito Civil Público n° 12/2008, que traz na matéria intitulada burlescamente de "Rebinboca da Parafuseta", entrevista também com o referido representante da empresa investigada, na qual o mesmo obtemperara também de maneira burlesca que "o carro chegava, a gente fazia o serviço. Depois com o orçamento na mão a Prefeitura empenhava. Tudo isso demorava um pouco, mas dava agilidade para os consertos. Imagina se tivesse que esperar empenhar para executar o trabalho?". Indubitavelmente, tais declarações, que de certo modo foram confirmadas na CPI pelo próprio representante legal da empresa investigada e pela própria inquisa ministerial, ao menos que se traduza em alguma 'concepção moderna de administração pública', com a permissa venia, acabam se circunscrevendo ao ridículo, como o próprio nome jocoso apelidado à Comissão Parlamentar de Inquérito, que teve de debruçar-se sobre verdadeiros absurdos e descalabros

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administrativos perpetrados por agentes políticos na Prefeitura de Armação dos Búzios, o que fez a imprensa que acompanhou tais trabalhos recorrer ao humor, como forma de atrair a atenção do desatento contribuinte, a exemplo do título da citada revista, "Rebinboca da Parafuseta". A Deputada Estadual que representara tais irregularidades ao Ministério Público, após o Tribunal de Contas ter verificado na gestão do primeiro demandado um verdadeiro descalabro administrativo, ainda em sua fala na sessão da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro aduzira que os carros da Prefeitura de Búzios estavam sendo lavados, duas vezes, no mesmo dia, isto com lavagem orçada em R$ 189,00 (cento e oitenta e nove reais) e nota fiscal emitida pela empresa Barnato Comércio de Peças Ltda. ME., que se situa na cidade de Rio Bonito; serviços estes supostamente executados quando integrantes da Comissão Parlamentar de Inquéritos, investidos de poderes investigatórios próprios de autoridades judiciárias perscrutaram que a empresa citada sequer trabalhava com lavagem de veículos, pois prestava apenas serviços de manutenção mecânica, donde se dessume que tais notas eram frias, em que pese o mendaz argumento do representante legal da principal empresa investigada aos integrantes da CPI de que os serviços cobrados e não realizados por ela eram 'terceirizados', ou seja, o carro da Prefeitura de Búzios era enviado duas vezes no mesmo dia para o Município de Rio Bonito para ser lavado, com empresa contratada sem licitação para despesa realizada sem prévio empenho, ainda sem instrumentalização contratual, e tal empresa contratada ainda terceirizava o serviço a um subcontratado que ninguém sabe até hoje quem, de fato, seria, mas que realizava uma lavagem de veículo ao 'módico' custo de R$ 189,00 (cento e oitenta e nove reais). Não é sem razão que na fala da Deputada Estadual denunciante em sessão da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, televisionada pela TV/ALERJ a parlamentar elucubra que os carros da Prefeitura de Búzios 'são os mais limpos do mundo'. Ouvido pelo Ministério Público o Sr. José Roberto Sansionato, representante legal da principal empresa Barnato Comércio de Peças Ltda. ME., em 11 de agosto de 2010, conforme termo de declaração de fls. 142 dos autos do Inquérito Civil Público não 12/2008, já nega basicamente os fatos, aduzindo que primeiro fazia um orçamento do veículo a ser reparado para que a Prefeitura fizesse o procedimento do empenho da despesa, negando quanto a lavagem de veículos que tais serviços fossem realizados mais de uma vez nos veículos da frota municipal de Armação dos Búzios, aduzindo que houvera equívocos na emissão das notas fiscais, o mesmo ocorrendo com relação ao controvertido parafuso que fora orçado em R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais), mas que seria relativo a uma outra peça adquirida para veículo da Secretaria Municipal de Saúde. Todavia, a par de todas as questões fáticas depreendidas pela proficiente Comissão Parlamentar de Inquérito, o Ministério Público corretamente concluiu que os agentes demandados procederam aos pagamentos a sociedades empresárias, sem observar as formalidades legais, efetuando contratação direta para enfrentamento de situações emergenciais absolutamente inexistentes e fracionando o objeto contratado para se omitirem nas imposições constitucionais e legais de realização de procedimento licitatório prévio, procedendo ainda, apesar de alertados pelo Tribunal de Contas, a pagamentos aos contratados de modo indevido e em total desacordo com a legislação que regula o Direito Financeiro atinente ao controle da execução dos orçamentos dos entes de direito público. Quanto à inobservância de etapas e formalidades para a configuração da dispensa da adoção do procedimento licitatório nas hipóteses de emergência, deve se ressaltar que o parágrafo único, incisos II e III, do artigo 26 da Lei n° 8.666/93 preceitua que deva constar do processo administrativo pertinente: a razão da escolha do fornecedor ou executante do serviço e a justificativa do preço. No caso específico dos primeiros contratos administrativos realizados para manutenção da frota de veículos da Prefeitura de Armação dos Búzios iniciados através do Memorando n° 07/2005, datado de 03 de janeiro de 2005, elaborado pelo segundo demandado pedindo autorização ao então Prefeito Municipal para a realização de contratações de empresas de conserto de veículos, aduzindo que o novo governo municipal recebera a frota de veículos em péssimo estado, com problemas mecânicos, que deu azo então ao processo administrativo n° 000305 F (documento de fls. 133/134 do Inquérito Civil Público n° 12/2008 em anexo), para contratação direta com as empresas Barnato Comércio de Peças Ltda. ME., Largos Tecno Car Som e Acessórios Ltda., DJ

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Felipe Mecânica - ME, Jomago Auto Peças Ltda. ME, V.M. Vieira Peças e Serviços - ME, em valores respectivamente de R$ 33.147,46, R$ 103.791,38, R$ 16.770,71, R$ 1.439,50 e R$ 1.842,00, valores que somados totalizavam R$ 156.991,07 (cento e cinquenta e seis mil novecentos e noventa e nove reais e sete centavos), inexistira, portanto, qualquer justificativa dos preços executados nem tão pouco. A razão da escolha dos fornecedores, a par da declaração do representante legal da sociedade Barnato Comércio de Peças Ltda. ME. de que a sua empresa era 'parceira' do Município de Armação dos Búzios desde 1998. Depreende-se, por via de consequência, que não houve motivação plausível ou real para a escolha dos executantes dos serviços e de que não houve ainda justificativa real dos preços dessas contratações espúrias iniciais, que redundou, ao final, em um montante de R$ 156.991,07 (cento e cinquenta e seis mil novecentos e noventa e nove reais e sete centavos); valor este suficiente até para a aquisição de cinco a seis carros populares, dependendo da marca escolhida. Outrossim, pela análise do processo administrativo respectivo que consta dos autos em apenso não houve o cumprimento no disposto no artigo 26, caput, da Lei n° 8.666/93, que preceitua a obrigatoriedade para as hipóteses de dispensa de licitação, necessariamente justificadas, a comunicação dentro de três dias à autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de cinco dias subsequentes, como condição de eficácia dos atos. O caráter da norma em apreço destina-se a observância dos princípios da probidade, da publicidade e da autotutela. No caso vertente, apesar de comunicada a autoridade superior da justificativa da suposta situação emergencial, que ratificou de modo espúrio o ato de dispensa, não se infere da análise do procedimento que tal ato tenha sido publicado no Diário Oficial. In casu, se a contratação e ordenação de despesas foram promovidas pela Secretaria Municipal de Transportes, que meramente obtemperou a justificativa da contratação direta, desacompanhada de razões de escolha dos fornecedores e de justificativa dos preços executado, com comunicação a autoridade superior para o eventual exercício da autotutela, a saber, o próprio Prefeito Municipal, a par, portanto, da responsabilidade do segundo réu, ordenador dessas despesas, como o Chefe do Poder Executivo Municipal apenas se dignou de ratificar a indigitada dispensa, o mesmo dolosamente e de modo omissivo assentiu nas graves irregularidades. Assim, a teleologia da norma artigo 26, caput, da Lei n° 8.666/93 é de que mesmo nas hipóteses de desconcentração administrativa e delegação de ordenações de despesa, mesmo que desvirtuadas da finalidade pública para o mero resguardo de uma eventual responsabilização de um agente político, ainda assim o agente político deverá ser instado para eventualmente exercer o controle interno do ato administrativo através do exercício da autotutela administrativa, anulando, assim, eventuais atos administrativos eivados de vícios e ilegalidades, o que não ocorreu, como também não ocorreu a publicação de tão ímprobo ato na imprensa oficial. Em prosseguimento, não houve ainda formalização de instrumentos contratuais oriundos do processo administrativo n°000305 F, nos moldes do artigo 55 da Lei n° 8.666/93. Destaca-se ainda em relação ao processo administrativo n° 000305 F que as contratações iniciais diretas foram celebradas ainda nos idos de janeiro de 2005, para manutenção e concerto da frota de veículos, e após quando já havia transcorrido tempo mais do que suficiente para que a nova Administração Pública Municipal tivesse realizado uma licitação na modalidade Convite, que é uma das modalidades mais simples de licitação, a Administração então a realizou, licitação-convite n° 40/2005, sendo escolhida justamente e empresa 'parceira' Barnato Comércio de Peças Ltda. ME.. Aliás, esta fora a única licitação realizada em toda a administração pública municipal do primeiro réu, que pode contar ou não com licitantes já previamente cadastrados ou com meros convidados escolhidos pelo próprio Administrador, sopesando-se que já haviam transcorrido mais de dois meses daquele novo governo. Conquanto, nos idos seguintes todas as demais contratações para manutenção da frota de veículos da Prefeitura de Armação dos Búzios, inclusive dos veículos da frota municipal afeta aos serviços de saúde, fora realizadas inexplicavelmente de modo direto, sem licitação. Querendo este Juízo perscrutar, por exemplo, se os serviços de limpeza em um veículo por duas vezes no mesmo dia e a noventa e dois quilômetros ao menos da sede da Prefeitura de Armação dos Búzios se transveste de serviço de natureza emergencial, ou se, em outro exemplo, o conserto de um ar-condicionado de um veículo, que sequer detém ar-condicionado também detém natureza emergencial? Resta, portanto, claro

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com a resposta legal a tais indagações que os agentes envolvidos, intencionalmente, pretenderam burlar o processo licitatório. O Ministério Público bem salientou nesta demanda que as situações invocadas para as contratações diretas estavam dissociadas da realidade fática, tendo obtemperado que os serviços de conserto de veículos não se amoldam a hipótese legal prevista no artigo 24, inciso IV, da Lei de Licitações. Sendo certo que inexistiu qualquer estudo preliminar para levantamento da frota de veículos que, porventura, estivesse à disposição da Prefeitura Municipal. Ressaltando-se que todos os agentes políticos demandados nesta ação, restaram envolvidos na fabricação de situações de emergências fictas, com escopo de fraudar intencionalmente o procedimento licitatório exigido pela Constituição Federal e pela legislação pertinente, depreendendo-se ainda que a ausência de justificativas de preços e razão de escolha de fornecedores, que praticavam preços superfaturados, como apurados por órgão de controle dos gastos públicos através de Comissão Parlamentar de Inquérito e também pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, que constatou um verdadeiro descalabro administrativo na execução de despesas em todas as searas da gestão do primeiro demandado a frente da chefia da Administração Municipal, com ofensa clara ao princípio da economicidade. O mais curioso é que o Município ainda através de sua Procuradoria-Geral, ao invés de se dignar a defender o patrimônio público e buscar ingressar no pólo ativo para ressarcimento dos cofres públicos, demonstrando a independência do advogado público, ouse defender não ter havido quaisquer irregularidades que redundaram em prejuízo ao Erário, o que só revela o uso político deste órgão, cujos seus agentes públicos sequer foram selecionados através de Concurso Público, ressaltando-se ainda que o terceiro réu, atualmente, é o Prefeito de Armação dos Búzios. Não é sem razão que o Parquet ainda ressaltou que não havia nenhuma razão para que após a fiscalização da Corte de Contas e recomendação de mudança de rota, a Administração Pública Municipal continuasse nos anos de 2006 e 2007 praticando contratações diretas, sem realização de licitações. A essencialidade inicialmente aventada, no bojo do processo administrativo n°000305 F, desmorona pelo simples fato de os atos de dispensa terem continuado e terem sido anuídos pelo Chefe do Poder Executivo Municipal nos anos seguintes. Tanto os serviços não eram emergenciais que a administração prescindiu deles mantendo em depósito, por exemplo, um veículo da frota da Secretaria Municipal de Saúde, que em período de dois meses supostamente teria ido para oficina em duas ocasiões e que, segundo funcionário da aludida Secretaria jamais saíra, de fato, do Município para qualquer conserto na cidade de Rio Bonito. Assim, dessume-se claramente em relação a todos os serviços contratados que houve tempo suficiente inclusive para contratá-los por licitação em observância ao princípio constitucional insculpido no artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal. Com relação aos Decretos Municipais mencionados pelo primeiro réu em sua resposta, que foram autorizativos de uma verdadeira farra de contratações diretas, depreendeu-se, então, que na gestão do primeiro réu, seus subordinados diretos, Secretários Municipais poderiam muito bem ter adotado procedimentos licitatório, para que fossem contratados os serviços ora descritos permitindo-se a competição entre licitantes e a obtenção, através desta modalidade de certame, da proposta mais vantajosa para a Administração Pública Municipal, o que permitiria, assim, a observância do princípio da economicidade, e não a contratação de peças em patamares de preços claramente em muito superfaturados, o que só revelou a concorrência direta dos demandados para o desvio de recursos públicos e o enriquecimento de terceiros, mormente porque grande parte das despesas ainda era efetuada sem a observância mínima das regras mais comezinhas de Direito Financeiro e de execução orçamentária, tendo tratado os demandados como se seus fossem os recursos públicos municipais, proveniente das receitas derivadas do pagamento de impostos. Conclui-se, portanto, sob o aspecto formal que os agentes envolvidos deixaram de observar as formalidades pertinentes à dispensa de licitação para a contratação direta em pelo menos 32 processos administrativos, que em sua maioria foram adjudicados à empresa Barnato Comércio de Peças Ltda. ME., isto inclusive nos anos de 2006 e 2007 após o Prefeito Municipal ter sido multado pela Corte de Contas por irregularidades das mais diversas encontradas pela fiscalização

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por quase todos os órgãos do Poder Executivo Municipal no que se relacionava a contratações diretas, sem licitação. Instando asseverar que toda a atividade administrativa se desenvolve necessariamente sob a forma procedimentalizada, ou seja, para que haja o controle da atuação estatal e para que haja o aperfeiçoamento da atuação governamental. Desse modo, desenvolve-se a atuação estatal pelo instrumento da procedimentalização. Reputando-se o procedimento como uma sequência predeterminada de atos, cada qual com finalidade específica, mas todos dotados de uma finalidade última comum, em que o exaurimento de cada etapa é pressuposto de validade da instauração da etapa subsequente e em que o resultado final almejado guarda compatibilidade lógica com o conjunto dos atos anteriores praticados. No caso vertente, os procedimentos pelos quais se desenvolveram os processos administrativos resultantes de atos de dispensa de licitação e contratações diretas foram inteiramente viciados, bastando exemplificar que uma das contratações diretas com a empresa D.J. Felipe Mecânica ME, no valor de R$ 7.999,86 (sete mil oitocentos e noventa e nove reais e oitenta e seis centavos), apenas por centavos se amoldou a hipótese de dispensa de licitação prevista no artigo 24, inciso II, da Lei n° 8.666/93. No âmbito do devido processo legal substantivo, os processos administrativos ora inquinados resultaram inequivocamente da inobservância da Lei. O inciso IV do artigo 24 da Lei n° 8.666/93, invocado pela Administração e pelos segundo e terceiro demandados, só autoriza a contratação direta quando há casos de emergência ou de calamidade pública, sendo o estado de urgência caracterizado por situações que possam ocasionar prejuízos ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares. No caso em tela, como bem obtemperou o Parquet na sua petição inicial, as emergências aventadas são fictas, não sendo a manutenção ou limpezas de veículos serviços de natureza emergencial, o que revela à luz solar que os demandados intencionalmente olvidaram a adoção de processos licitatórios e ainda fracionaram despesas. Frisando-se que dois requisitos são indispensáveis para que possa o administrador, sem praticar qualquer ilegalidade, utilizar-se da exceção da contratação direta. O primeiro requisito é o da obrigatoriedade da emergência ser declarada em cada caso, e não alicerçada genericamente em um Decreto do próprio Chefe do Poder Executivo Municipal fazendo menção a uma suposta desorganização administrativa que autorizaria, indistintamente, qualquer contratação direta. O segundo requisito diz respeito à imprevisibilidade da situação dentro de um quadro de mediana percepção do administrador, sendo assim, serviços de manutenção de veículos, serviços de limpeza de carros e etc. não são serviços imprevisíveis para o administrador. Bem frisou o Parquet que em relação as primeiras contratações, únicas que talvez ludibriassem o julgador menos atento que o serviço de manutenção de veículos para atender às necessidades da administração em um governo sucessor não se insere por óbvio em hipóteses de emergência e calamidade pública, sobretudo se o argumento é o estado precário que estava a frota com o fim do mandato do Prefeito anterior, e mais não há dano potencial a ser prevenido em caso de não realização da licitação no prazo eventualmente disponível, o que descaracteriza por completo a legalidade da contratação direta. No entanto, a par da argumentação de emergência, para realização de contratações diretas de serviços de manutenção de veículos, nos termos do artigo 37 da Constituição Federal, tal contratação deveria ter sido impessoal, sendo um absurdo que, sem pesquisa de preços e justificativa de preços praticados e escolha de contratados, tivesse sido contratada sociedade comercial cujo representante legal em depoimento perante Comissão Parlamentar de Inquérito realizada na Câmara de Vereadores justifique a inobservância de ditames constitucionais e legais por considerar a sua sociedade empresária 'parceira' da municipalidade. Frise-se que de acordo com os princípios da impessoalidade e da moralidade administrativa, nortes para a atuação da Administração Pública: deve ser impessoal a atuação administrativa, tanto em relação ao tratamento isonômico que deve ser dispensado a todos os administrados, quanto ao não direcionamento de contratos pelos administradores e gestores da coisa pública, sendo ainda imoral a escolha pessoal de um contratante. Prática, aliás, que não é incomum, histórica, antropológica e culturalmente na condução da política brasileira, tendo a vertente do clientelismo político a sua expressão máxima, com efeitos deletérios ainda hodiernos na seara

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administrativa pública. Portanto, mesmo que houvesse ao longo do extenso período de contratações ilegais, um incremento de problemas mecânicos nos veículos da frota municipal, tal situação, por si só, não justificaria a dispensa de licitação. Havia, assim, seis fortes razões fáticas para que as contratações diretas e emergenciais fossem olvidadas. A uma, não havia situação de emergência real e justificada; a duas, inexistia sequer estudo técnico preliminar a justificar que a delegação do serviço revelar-se-ia mais eficiente para empresa situada em Comarca por deveras distante desta municipalidade; a três, ante a falta de realização de estudo técnico preliminar e ante a falta de projeto básico adequado, sequer a municipalidade detinha conhecimento prévio dos custos e da definição dos métodos e do prazo de execução dos serviços, ou sequer detinha conhecimento do conjunto de elementos necessários e suficientes, com nível de precisão adequado, para contratação dos serviços contínuos de manutenção de veículos da frota municipal; a quatro, a razão das escolhas das empresas contratadas não fora justificada, inclusive não fora justificadas suas propostas; a cinco, a situação atinente ao incremento da realização de manutenção periódica em veículos da frota municipal à época das contratações diretas era inteiramente previsível e os agentes públicos envolvidos na contratação detinham prévio conhecimento desta situação, pois o carro, bem durável, desgasta-se com o uso, mormente em logradouros públicos e vias mal pavimentadas; a seis, o incremento da manutenção de veículos da frota municipal no período não impedia que a Administração realizasse ao longo de três anos, procedimentos licitatórios. Destaca-se que além das dispensas da licitação terem provocado também a conspurcação do princípio da eficiência, pois a adoção de procedimentos licitatórios permitiria a escolha de propostas mais vantajosas para a Administração Pública ante a observância do princípio específico da licitação atinente a competividade, a escolha das empresas contratadas, sem qualquer justificação, gera a concepção inequívoca de que houve prejuízo ao Erário Público, depreendendo-se, com isto, também a violação, mais do que inequívoca, ao princípio da moralidade administrativa, princípio este geral para toda a atuação da Administração Pública, e também específico para as contratações do Poder Público. Ademais, como as escolhas das empresas contratadas não fora, justificadas para a prestação dos serviços contratados, os atos em voga de escolhas não foram, portanto, motivados, não detendo tais atos, em verdade, sequer motivos. Sendo um dos requisitos do ato administrativo a existência de motivo, donde se dessume o quão ilegal e o quão imoral foram os procedimentos adotados nos processos em voga para contratações diretas de manutenção de veículos pertencentes à frota municipal da Prefeitura de Armação dos Búzios. Neste passo, no Pós-Positivismo transcende-se da ideia do legalismo Kelseniano para a nova concepção de juridicidade, estando o conceito de moralidade administrativa açambarcado por esse novo conceito. Sendo o Pós-Positivismo uma terceira etapa do desenvolvimento da dogmática jurídica, após o jusnatunalismo exsurgido século XVI, que aproximou o Direito da razão, assentado no reconhecimento do Direito Natural, e do positivismo que daí emergiu, com seu ápice no século XIX e predominância até o final da Segunda Grande Guerra Mundial, assentado no exegetismo jurídico. Passou-se nessa terceira etapa, portanto, novamente a revalorização da Teoria da Justiça e na legitimação democrática, inspirada na axiologia do reconhecimento do constitucionalismo e da normatividade dos princípios, com nova reaproximação entre o Direito e Filosofia do Direito, sem que se recorra simplesmente aos auspícios de categorias metafísicas. Tal ocorre, então, após a decepção das respostas jurídicas encontráveis durante o surgimento de Estados Totalitários no século XX e as atrocidades cometidas neste regime, que acarretam, então, um corte epistemológico na Ciência do Direito com a doutrina exegeta exsurgida com cientificidade do Código Civil de Napoleão de 1808, que positivou os ideários hauridos do Direito Natural na eclosão da Revolução Francesa. Assim, este neoconstitucionalismo exsurgido da perplexidade do pós-guerra e da falta de uma normatização com principiologia axiológica fundada na ética e na dignidade da pessoa humana traduz-se em uma nova resposta da dogmática jurídica voltada para a busca do ideário da justiça, em contraste, por exemplo, com a fragilidade da república de Weimer e do constitucionalismo de então, que permitiu o surgimento do nazismo. Nesta nova dogmática, surge, portanto, a ideia de juridicidade, que é um conceito mais amplo do

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que o da legalidade. Assim, não é sem razão que o Doutor em Direito e Procurador do Estado do Rio de Janeiro, Professor Alexandre Santos de Aragão em sua obra "Curso de Direito Administrativo", ao discorrer sobre a moralidade administrativa sob o enfoque da juridicidade, preleciona que na atualidade a conduta do administrador público ofensiva da moralidade, atinge também a própria legalidade, escólio este que não é demasiado que se transcreva, in verbis: "Hoje, estando a legalidade ampliada pela ideia de juridicidade, e estando a própria moralidade (tal como vários outros princípios antes considerados como metajurídicos) positivada na Constituição, ela passou a integrar o bloco da legalidade. Assim, um ato administrativo imoral, que foge ao que seria o comportamento de 'um bom administrador', seria também um ato ilegal por violação à mais importante das leis, a Constituição" . O administrador deve em sua atuação observar o dever de probidade, dever este que está umbilicalmente adstrito a toda atuação da Administração Pública, sendo a observância estrita a este dever um pressuposto de legalidade e legitimidade de todos os atos administrativos. Destaca-se que além das dispensas de licitações em voga terem sido imorais e vulneradoras do princípio da impessoalidade, as mesmas também engendraram a conspurcação do princípio da eficiência, pois a adoção de procedimentos licitatórios permitiria a escolha de propostas mais vantajosas para a Administração Pública ante a observância do princípio específico da licitação atinente a competividade, assim, a escolha das empresas contratadas, sem qualquer justificação, mormente da empresa Barnato Comércio de Peças Ltda. ME. que praticava, como demonstrado preços abusivamente superfaturados, gera a concepção inequívoca de que houve prejuízo ao Erário Público e possibilitação de enriquecimento ilícito de terceiros, depreendendo-se, com isto, também a violação, mais do que inequívoca, ao princípio da moralidade administrativa, princípio este geral para toda a atuação da Administração Pública, e também específico para as contratações do Pode Público. A própria vulneração do princípio da economicidade restou cabalmente demonstrada pelos custos dos serviços apurados com proficuidade pela Comissão Parlamentar de Inquérito realizada no âmbito do Poder Legislativo Municipal, que redundaram em jocosas adjetivações dos fatos pelos organismos de imprensa que acompanharam as apurações conduzidas pelos integrantes das aludidas comissões, bem como pela profícua fiscalização realizada pela Corte de Contas que também constatou violações ao princípio da economicidade. Assim, em relação aos processos administrativos inquinados, sob o aspecto formal, os agentes envolvidos deixaram de observar as formalidades pertinentes à dispensa de licitação, sendo que sob o aspecto material foram inobservados os princípios da moralidade administrativa, publicidade, eficiência e, por conseguinte, também da economicidade, pois da falta de competição já se dessume o prejuízo para a Administração que deixou de obter a proposta mais vantajosa, o que se dirá quando os serviços de limpeza de veículos custam algo em torno de R$ 200,00 (duzentos reais), parafusos aparentemente são orçados ao custo de R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais) e ainda constatados que alguns dos serviços realizados sem licitação e sem prévio empenho e com dissonância entre as notas de empenho existentes nos autos e as notas fiscais emitidas, de fato, sequer foram executados. A par das dispensas de licitações indevidas para contratações diretas, constatou-se que as despesas ainda foram fracionadas, sub-repticiamente, para que fossem olvidadas as licitações exigidas. Como bem salientou o Ministério Público os demandados poderiam ter promovido licitação, sob a modalidade adequada aos valores orçados, sob o registro de preços previsto no artigo 15, § 3º, da Lei 8.666/93, e na medida em que fosse sendo necessário efetuar tal ou qual reparo ou adquirir tal ou qual peça, a Administração adquiriria a mercadoria do vencedor da ata de registros. Tal modo de gerir a coisa pública, inclusive, é praxe verificada notoriamente na Administração Pública brasileira que seja voltada para a satisfação do interesse público. Nesta senda, o § 1º do artigo 23, da Lei 8.666/93, dispõe que as obras, serviços e compras efetuados pela Administração serão divididos em tantas parcelas quantas se comprovem técnica e economicamente viáveis, procedendo-se à licitação com vistas ao melhor aproveitamento dos recursos disponíveis no mercado e à ampliação da competitividade sem perda da economia de escala. Já o § 5º do mesmo artigo é claro acerca da adoção caso os serviços sejam da mesma natureza e prestados no mesmo local, da modalidade licitatória mais rigorosa, conforme o somatório de suas parcelas.

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De acordo com o relatório do GATE, órgão técnico do Ministério Público, "ficou caracterizada a prática de fracionamento nestes contratos, levando-se em conta que o limite estabelecido no inciso II do artigo 23 da Lei 8.666/93 foi ultrapassado e houve continuidade na execução dos serviços e compras contratados na mesma localidade, apesar de serem distintas as épocas em que foram realizadas". Assim, a partir da análise dos objetos contratados, depreendeu o órgão ministerial que se tratava de serviços e compras da mesma natureza, no mesmo local com um objetivo único, manutenção da frota de veículos. Destarte, bem obtemperou o Parquet em sua peça vestibular que não se pode ter por imprevisível, a aquisição de serviços de manutenção e peças objeto de inúmeros pagamentos, se o Município detém uma frota de veículos a serem mantidos, justamente porque consistem em serviços de natureza periódica, necessários e programados pelo próprio fabricante dos veículos automotores. Não se negando por obviedade que eventual quebra de uma peça não usual poderia engendrar hipótese de dispensa de licitação, mas a maioria dos serviços, inclusive limpeza dos veículos eram previsíveis e de rotina, assim deveriam ter sido registrados os valores ao longo dos anos das peças usualmente objeto de revisão, com o lícito procedimento licitatório, registro este que obviamente com a realização de procedimento licitatório prévio não deveria inserir custos de parafusos em torno de R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais) e lavagens de veículos a custos médios de R$ 200,00 (duzentos reais), nem tão pouco conserto de ares-condicionados de veículos que não detinham tal conforto, pois tais despesas, além de superfaturadas, revelaram a realização de pagamentos relativos a serviços que sequer foram executados, algo que claramente demonstra que os réus, de modo comissivo e doloso, concorreram para enriquecer terceiros. Portanto, no caso em tela, verificou-se que o objetivo deliberado dos agentes demandados foi o de fracionar o objeto do contrato, para fugir do procedimento licitatório legalmente exigido, que seria muito mais eficaz e de melhor execução orçamentária. Aliás, na esteira de escorreita execução orçamentária, algo inexistente na hipótese em tela, apurou-se, consoante, profícuo relatório realizado pelo órgão ministerial GATE, que o quantitativo de R$ 299.289,25 (duzentos e noventa e nove mil duzentos e oitenta e nove reais e vinte e cinco centavos) não possuía lastro nos processos e empenhos documentados nos autos, bem como que, mesmo aqueles que foram autorizados por processos administrativos de dispensa, totalizam o valor de R$ 390.284,73 (trezentos e noventa mil duzentos e oitenta e quatro reais e setenta e três centavos), valor esse que, em seu total, daria ensejo a procedimento licitatório na modalidade de concorrência ou pregão. Isto provavelmente se deu porque muitas das despesas sequer tiveram prévio empenho, algo teratológico e revelador, se não de atos explícitos de corrupção, de um total desleixo com a res pública. Assim, os procedimentos administrativos eivados de vícios ainda ofenderam diretamente as normas legais que regem a liquidação de despesas, nos termos da Lei 4.320/64, que estabelece regras para o controle da execução orçamentária dos entes públicos, destacando-se os dispositivos abaixo que, de modo doloso, foram frontalmente conspurcados: Art. 61. Para cada empenho será extraído um documento denominado "nota de empenho" que indicará o nome do credor, a representação e a importância da despesa bem como a dedução desta do saldo da dotação própria. Art. 62. O pagamento da despesa só será efetuado quando ordenado após sua regular liquidação. Art. 63. A liquidação da despesa consiste na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito. § 1° Essa verificação tem por fim apurar: I - a origem e o objeto do que se deve pagar; II - a importância exata a pagar; III - a quem se deve pagar a importância, para extinguir a obrigação. § 2º A liquidação da despesa por fornecimentos feitos ou serviços prestados terá por base:

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I - o contrato, ajuste ou acordo respectivo; II - a nota de empenho; III - os comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço. Art. 64. A ordem de pagamento é o despacho exarado por autoridade competente, determinando que a despesa seja paga. Acrescenta-se ainda que o empenho da despesa consiste em ato emanado de autoridade administrativa competente que cria para o estado obrigação de pagamento pendente ou não de implemento de condição. (artigo 58 da Lei nº 4.320/64), assim, é vedada a realização de despesa sem prévio empenho. (art. 60 da Lei nº 4.320/64). Assim, são finalidades do empenho: a) - firmar um compromisso. Por isso é sempre prévio em relação à despesa; b) - dar garantia de que os recursos utilizados serão apropriados às despesas, pois dele consta da classificação orçamentária; c) - assegurar que o crédito próprio comporte a despesa. Depois da sua emissão, o saldo disponível para assumir novos compromissos fica diminuído de seu valor; d) - servir de base à liquidação da despesa; e) - contribuir para assegurar a validade dos contratos, convênios e outros ajustes financeiros, mediante sua indicação obrigatória em uma das cláusulas essenciais desses termos. O empenho é o instrumento de que se serve a Administração Pública para controlar a execução do orçamento, sendo através deste instrumento que o Poder Legislativo, na sua função de controle dos atos do Poder Executivo, certifica-se de que os créditos concedidos ao Poder Executivo estão sendo obedecidos. Assim, o empenho constitui um instrumento de programação, pois ao utilizá-lo racionalmente o Executivo tem sempre uma visão sistêmica dos compromissos orçamentários assumidos e das dotações ainda disponíveis. O conceito de empenho pressupõe anterioridade, sendo o empenho ex ante, destarte, como define o mencionado artigo 60 da Lei nº 4.320/64, o empenho ex post é ilegal, consistindo burla a lei orçamentária, sujeitando o administrador público inclusive a crime de responsabilidade. Não é a toa que diante de tal descontrole administrativo e orçamentário, havendo ainda total irregularidade nos processos administrativos para celebração de contratação direta e ilegal de serviços de manutenção na frota de veículos das Secretarias Municipais, o órgão ministerial GATE ao analisar as notas fiscais cotejada com as notas de empenho constantes dos autos verificou que o quantitativo de R$ 299.289,25 (duzentos e noventa e nove mil duzentos e oitenta e nove reais e vinte e cinco centavos) sequer possuía lastro nos processos e empenhos documentados pela administração pública do primeiro réu, fato comprovador da concorrência para que terceiro se enriquecesse ilicitamente. Diante, assim, das fartas considerações acima, reputo que os agentes públicos demandados perpetraram, portanto, atos de improbidade administrativa que causaram prejuízo ao erário, pois os mesmos de forma comissiva e dolosa deram ensejo à realização de despesas indevidas mediante contratações diretas em desacordo com o princípio da legalidade, dispensando indevidamente procedimento licitatório, permitindo assim, a manutenção mecânica de veículos e demais serviços correlatos a tais bens em valores superiores ao de mercado. Praticando ainda o segundo e terceiro demandados o fracionamento de despesas para intencionalmente burlar a exigência constitucional e legal de realização de licitação. Os segundo e terceiro demandados ainda atentaram contra os princípios da Administração Pública, mediante ação dolosa, praticando ato proibido por lei, vulnerando, especificamente, os princípios da legalidade, impessoalidade e moralidade administrativa, além do princípio da obrigatoriedade da realização de licitação para contratação de serviços, além de terem vulnerado

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os princípios da publicidade, eficiência e ecomicidade. Já o primeiro demandado após autorizar de modo comissivo que seus subordinados realizassem todo o tipo de contratações diretas, sem licitação e sob os auspícios de situações emergenciais inexistentes, ainda se omitiu no seu dever de autotutela, mesmo quando instado pela Corte de Contas, inobservando assim os seus deveres legais e os princípios basilares que regem Administração Pública, mormente os princípios que devem ser observados pelo Chefe de Poder Executivo, que é revelador de infidelidade para com os seus representados. Os agentes demandados ainda permitiram com as suas condutas dolosas que terceiros contratados ilegalmente enriquecessem com recursos públicos municipais, inclusive com despesas que sequer eram liquidadas de forma escorreita. Registre-se que na nova ordem Pós-Positivista os princípios deixaram de ser meros complementos das regras ou como elementos de integração de lacunas jurídicas, tornando-se as próprias formas de expressão das normas jurídicas, que contém princípios e regras. Em face da normatização dos princípios, no âmbito da atuação da Administração Pública exsurge toda uma deontologia que rege a atuação da atividade administrativa e a atuação de seus agentes, pressupondo, necessariamente, que todos os atos administrativos sejam valorados com as regras e os princípios que os informam. Tal deontologia vem expressa, assim, no já mencionado dever de probidade, Diante disto, a novel hermenêutica aponta que o princípio da probidade, no que concerne a boa gestão administrativa, tem uma amplitude ainda mais vasta que o próprio princípio da moralidade. Assim, quando o agente público deixa de observar a normatização existente, o que inclui toda a ordem de princípios, e não apenas o princípio da moralidade, age, então, como um gestor improbus, absorvendo o princípio da probidade, por sua amplitude, o próprio princípio da moralidade, além de outros princípios, mormente os princípios setoriais da Administração Pública. Probidade, por via de consequência, é o dever ético do agente público de observar na sua atuação à ordem jurídica como um todo, não se desviando da observância estrita à ordem dos princípios e a juridicidade haurida de toda a estrutura jurídica. Assim, em relação ao 1° réu reputo que o mesmo incorreu nos seguintes atos de improbidade administrativa: a) atos de improbidade administrativa que causaram prejuízo ao erário, mediante ação e omissão dolosas, nos moldes do artigo 10, caput, e incisos VIII e XII, da Lei n° 8.429/92; b) atos de improbidade administrativa, mediante condutas comissivas e omissivas que atentaram contra os princípios da Administração Pública, nos moldes do artigo 11, caput, e inciso II, da Lei n° 8.429/92. Em relação ao 2° réu reputo que o mesmo incorreu nos seguintes atos de improbidade administrativa: a) atos de improbidade administrativa que causaram prejuízo ao erário, mediante ação e omissão dolosas, nos moldes do artigo 10, caput, e incisos VIII e XII, da Lei n° 8.429/92; b) atos de improbidade administrativa que atentaram contra os princípios da Administração Pública, mediante ação e omissão dolosas, nos moldes do artigo 11, caput, e inciso II, da Lei n° 8.429/92. Em relação ao 3° réu reputo que o mesmo incorreu nos seguintes atos de improbidade administrativa: a) atos de improbidade administrativa que causaram prejuízo ao erário, mediante ação e omissão dolosas, nos moldes do artigo 10, caput, e incisos VIII e XII, da Lei n° 8.429/92; b) atos de improbidade administrativa que atentaram contra os princípios da Administração Pública, mediante ação e omissão dolosas, nos moldes do artigo 11, caput, e inciso II, da Lei n° 8.429/92. Não depreendeu o Juízo nestes autos que os réus tenham enriquecido ilicitamente em razão das contratações diretas ora inquinadas nesta demanda, todavia, o primeiro réu já responde a Ação Civil Pública, também distribuída para este Juízo, processo n° 0002967-85.2014.8.19.0078, no qual se apura o seu enriquecimento ilícito em razão do exercício do cargo de Prefeito de Armação dos Búzios entre os idos de 2005 a 2008. Assim, em relação aos demais réus o órgão do Ministério Público da Tutela Coletiva deverá ser instado para apurar se os demais agentes públicos também enriqueceram ilicitamente. Por derradeiro, como apurados nestes autos que todos os agentes demandados ajustaram-se entre si e com terceiros para fraudar procedimentos licitatórios e liquidarem despesas sem prévio empenho, em especial para beneficiar a empresa BARNATO COMÉRCIO DE PEÇAS LTDA. ME., com violação do princípio da impessoalidade e moralidade ante ao fato de sequer havia justificativa da escolha dos contratados ou prévia pesquisa de preços ou justificativa pertinente,

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como já havia sido apurado pela Comissão Parlamentar de Inquérito, no âmbito do Poder Legislativo Municipal, com relatório final elaborado nos idos de 2008, reputo que todos solidariamente são responsáveis pelo prejuízo estimado de R$ 808.846,23 (oitocentos e oito mil oitocentos e quarenta e seis reais e vinte três centavos) em consertos de carro. Isto porque não deu para se apurar o valor exato gasto com tais manutenções de veículos da frota municipal, vez que na Administração Pública Municipal do primeiro demandando foram verificados pelo órgão ministerial que em vários processos administrativos não havia escrituração adequada, ante a falta de numeração de páginas e que havia ainda inúmeros processos autônomos engendrados de despesas realizadas com o mesmo fornecedor, contratado diretamente, sem licitação. Ressaltando-se que o corpo técnico ministerial concluiu ainda que do valor total dos empenhos constantes dos autos, havia a importância total de R$ 390.284,73 (trezentos e noventa mil duzentos e oitenta e quatro reais e setenta e três centavos), porém, o valor total de notas fiscais constantes dos autos é de R$ 689.573,98 (seiscentos e oitenta e nove mil quinhentos e setenta e três reais e noventa e oito centavos), tendo-se verificado a existência de um quantum pago a mais de R$ 299.289,25 (duzentos e noventa e nove mil duzentos e oitenta e nove reais e vinte e cinco centavos). Destaca-se que a empresa Barnato Comércio de Peças Ltda. ME., recebeu em uma estimativa ministerial o total de R$ 557.885,04 (quinhentos e cinquenta e sete mil oitocentos e oitenta e cinco reais e quatro centavos). Enquanto as empresa Lagos Tecno - Car Som e Acessórios Ltda. e D.J Felipe Mecânica - ME, a partir das notas fiscais constantes dos autos, receberam juntas um total de R$ 250.961,19 (duzentos e cinquenta mil novecentos e sessenta e um reais e dezenove centavos). São valores expressivos para gastos com manutenção de veículos ao longo de três anos do governo do primeiro demandado, em especial quando realizados sem licitação, sem justificativa de preços e das empresas escolhidas e com inúmeras despesas sequer realizadas com empenho prévio e lastro em notas de empenho. DISPOSITIVO: Ex positis, JULGO PROCEDENTE EM PARTE A DEMANDA, extinguindo o processo com resolução do mérito, com fulcro no artigo 269, I, do Código de Processo Civil, reputando que o 1°, 2°, 3° réus perpetraram atos de improbidade administrativa que importaram em enriquecimento ilícito de extraneus, causaram prejuízo ao erário e atentaram contra os princípios da Administração Pública, notadamente os princípios da probidade, legalidade, impessoalidade, moralidade administrativa, publicidade, eficiência e economicidade, mediante condutas dolosas, que diretamente violaram o artigo 37, caput e inciso XXI, da Constituição Federal e os artigos 2°, 23, § 5°, 24, inciso II, 26, caput, e parágrafo único, incisos II e III e 55, todos da Lei n° 8.666/93, além de violarem também de sobremaneira os artigos 60, 61, 62 e 63, § 1° e § 2°, todos da Lei n° 4.320/64. O 1° réu, ANTÔNIO CARLOS PEREIRA DA CUNHA, incorreu nos seguintes atos de improbidade administrativa: a) atos de improbidade administrativa que causaram prejuízo ao erário, mediante ação e omissão dolosas, nos moldes do artigo 10, caput, e incisos VIII e XII, da Lei n° 8.429/92; b) atos de improbidade administrativa que atentaram contra os princípios da Administração Pública, mediante ação e omissão dolosas, nos moldes do artigo 11, caput, e inciso II, da Lei n° 8.429/92. Aplico-lhe, por via de consequência, as seguintes sanções que estão previstas no artigo 12 da Lei n° 8.429/92: a) Em decorrência dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sopesando que o aludido réu causou prejuízo ao erário, concorrendo e também se omitindo dolosamente para que seus Secretários Municipais dispensassem ilegalmente procedimentos licitatórios e liberassem verbas públicas mediante despesas indevidas, inclusive grande parte delas indevidamente liquidadas sem prévio empenho, para que terceiros se enriquecessem ilicitamente, condeno-o solidariamente com os demais a ressarcir integralmente o dano causado ao Município de Armação dos Búzios, consubstanciado no valor de R$ 808.846,23 (oitocentos e oito mil oitocentos e quarenta e seis reais e vinte três centavos), que corresponde ao valor total de todos os contratos de serviços de manutenção de veículos apurados nestes autos, quantia esta que deverá ser atualizado monetariamente desde o desembolso e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação, ex-vi do inciso II, do artigo 12 da Lei n° 8.429/92; b) Em decorrência dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sopesando que o

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aludido réu, na qualidade de Chefe do Poder Executivo do Município de Armação dos Búzios, afrontou, mediante ações e omissões dolosas, princípios reitores da Administração Pública, notadamente os princípios da probidade, legalidade, impessoalidade, moralidade administrativa, publicidade, eficiência e economicidade, condeno-o ao pagamento de multa civil correspondente a 50 vezes o valor do subsídio percebido pelo agente político à época dos fatos, que deverá ser acrescida ainda de juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação, ex-vi do inciso III, do artigo 12 da Lei n° 8.429/92; c) Sopesando que o aludido réu causou prejuízo ao erário, concorrendo e também se omitindo dolosamente para que seus Secretários Municipais dispensassem ilegalmente procedimentos licitatórios e liberassem verbas públicas mediante despesas indevidas, inclusive grande parte delas indevidamente liquidadas sem prévio empenho, para que terceiros se enriquecessem ilicitamente, condeno-o a perda de seus direitos políticos pelo período de oito anos, bem como a perda de cargo, função ou emprego público, que, porventura, o mesmo esteja hodiernamente exercendo, ex-vi do inciso II, do artigo 12 da Lei n° 8.429/92. O 2° réu, CARLOS HENRIQUE DA COSTA VIEIRA, incorreu nos seguintes atos de improbidade administrativa: a) atos de improbidade administrativa que causaram prejuízo ao erário, mediante ação e omissão dolosas, nos moldes do artigo 10, caput, e incisos VIII e XII, da Lei n° 8.429/92; b) atos de improbidade administrativa que atentaram contra os princípios da Administração Pública, mediante ação e omissão dolosas, nos moldes do artigo 11, caput, e inciso II, da Lei n° 8.429/92. Aplico-lhe, por via de consequência, as seguintes sanções que estão previstas no artigo 12 da Lei n° 8.429/92: a) Em decorrência dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sopesando que o aludido réu causou prejuízo ao erário, concorrendo para que se dispensasse ilegalmente o procedimento licitatório e tendo promovido o mesmo liberação de verbas públicas mediante despesas indevidas, inclusive grande parte delas indevidamente liquidadas sem prévio empenho, para que terceiros se enriquecessem ilicitamente, condeno-o solidariamente com os demais a ressarcir integralmente o dano causado ao Município de Armação dos Búzios, consubstanciado no valor de R$ 808.846,23 (oitocentos e oito mil oitocentos e quarenta e seis reais e vinte três centavos), que corresponde ao valor total de todos os contratos serviços de manutenção de veículos apurados nestes autos, quantia esta que deverá ser atualizado monetariamente desde o desembolso e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação, ex-vi do inciso III, do artigo 12 da Lei n° 8.429/92; b) Em decorrência dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sopesando que o aludido réu, na qualidade de Secretário Municipal Executivo de Transportes do Município de Armação dos Búzios, afrontou, mediante ações e omissões dolosas, princípios reitores da Administração Pública, notadamente os princípios da probidade, legalidade, impessoalidade, moralidade administrativa, publicidade, eficiência e economicidade, condeno-o ao pagamento de multa civil correspondente a 40 vezes o valor do subsídio percebido pelo agente político à época dos fatos, que deverá ser acrescida ainda de juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação, ex-vi do inciso III, do artigo 12 da Lei n° 8.429/92; c) Sopesando que o aludido réu causou prejuízo ao erário, concorrendo e também se omitindo dolosamente para que seus Secretários Municipais dispensassem ilegalmente procedimentos licitatórios e liberassem verbas públicas mediante despesas indevidas, inclusive grande parte delas indevidamente liquidadas sem prévio empenho, para que terceiros se enriquecessem ilicitamente, condeno-o a perda de seus direitos políticos pelo período de oito anos, bem como a perda de cargo, função ou emprego público, que, porventura, o mesmo esteja hodiernamente exercendo, ex-vi do inciso II, do artigo 12 da Lei n° 8.429/92. O 3° réu, ANDRÉ GRANADO NOGUEIRA DA GAMA, incorreu nos seguintes atos de improbidade administrativa: a) atos de improbidade administrativa que causaram prejuízo ao erário, mediante ação e omissão dolosas, nos moldes do artigo 10, caput, e incisos VIII e XII, da Lei n° 8.429/92; b) atos de improbidade administrativa que atentaram contra os princípios da Administração Pública, mediante ação e omissão dolosas, nos moldes do artigo 11, caput, e inciso II, da Lei n° 8.429/92. Aplico-lhe, por via de consequência, as seguintes sanções que estão previstas no artigo 12 da Lei

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n° 8.429/92: a) Em decorrência dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sopesando que o aludido réu causou prejuízo ao erário, concorrendo para que se dispensasse ilegalmente o procedimento licitatório e tendo promovido o mesmo liberação de verbas públicas mediante despesas indevidas, inclusive grande parte delas indevidamente liquidadas sem prévio empenho, para que terceiros se enriquecessem ilicitamente, condeno-o solidariamente com os demais a ressarcir integralmente o dano causado ao Município de Armação dos Búzios, consubstanciado no valor de R$ 808.846,23 (oitocentos e oito mil oitocentos e quarenta e seis reais e vinte três centavos), que corresponde ao valor total de todos os contratos serviços de manutenção de veículos apurados nestes autos, quantia esta que deverá ser atualizado monetariamente desde o desembolso e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação, ex-vi do inciso III, do artigo 12 da Lei n° 8.429/92; b) Em decorrência dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sopesando que o aludido réu, na qualidade de Secretário Municipal Executivo de Transportes do Município de Armação dos Búzios, afrontou, mediante ações e omissões dolosas, princípios reitores da Administração Pública, notadamente os princípios da probidade, legalidade, impessoalidade, moralidade administrativa, publicidade, eficiência e economicidade, condeno-o ao pagamento de multa civil correspondente a 40 vezes o valor do subsídio percebido pelo agente político à época dos fatos, que deverá ser acrescida ainda de juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação, ex-vi do inciso III, do artigo 12 da Lei n° 8.429/92; c) Sopesando que o aludido réu causou prejuízo ao erário, concorrendo e também se omitindo dolosamente para que seus Secretários Municipais dispensassem ilegalmente procedimentos licitatórios e liberassem verbas públicas mediante despesas indevidas, inclusive grande parte delas indevidamente liquidadas sem prévio empenho, para que terceiros se enriquecessem ilicitamente, condeno-o a perda de seus direitos políticos pelo período de oito anos, bem como a perda do mandato eletivo de Prefeito do Município de Armação dos Búzios que o demandado hodiernamente exerce, ex-vi do inciso II, do artigo 12 da Lei n° 8.429/92. Frise-se que a sanção do artigo 12 da Lei n° 8.429/92 fala em perda da função pública, não obstante a aparente restrição semântica, repetindo a terminologia utilizada pelo artigo 37, § 4°, da Constituição Federal é, em verdade, sanção passível de aplicação a todos aqueles que exerçam, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades referidas no artigo 1º da Lei nº 8.429/1992, o que alcança os que desenvolvam determinada atividade pública em razão de concessão, permissão, autorização etc., devendo tal vínculo ser dissolvido. O resultado dessa exegese, de natureza aparentemente extensiva, é encontrado a partir da teleologia da Lei nº 8.429/1992 e de sua interpretação lógico-sistemática. A denominada Lei de Improbidade objetiva, portanto, afastar da atividade pública todos os agentes que demonstraram pouco apreço pelo princípio da juridicidade, denotando uma degeneração de caráter incompatível com a natureza da atividade desenvolvida, o que tornaria no mínimo insensata a restrição dos efeitos da aludida Lei quando patente a necessidade de tal afastamento. Por outro lado, a própria Lei nº 8.429/1992, em seu artigo 2º, conferiu significado amplo à expressão agente público. Em razão disto, não é possível limitar a aplicação da sanção a determinada categoria quando a norma proibitiva é extensiva a todos os agentes públicos, inclusive a agentes políticos. O artigo 9º, caput, da Lei nº 8.429/1992, ao disciplinar a configuração do enriquecimento ilícito, é expresso no sentido de que este pode ocorrer "em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas atividades mencionadas no art. 1º desta Lei". E ainda, o artigo 12, caput, estabelece que "está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações...". Destarte, interpretação sistemática destes dispositivos, em conjunto com o alcance conferido à expressão agente público, denota que ao ímprobo, qualquer que seja a atividade desempenhada ou a forma de investidura, pode ser aplicada a penalidade de exclusão, denominada de "perda da função pública" pela Lei nº 8.429/1992. O argumento de que o afastamento dos detentores de mandato importaria em afronta à vontade popular, exteriorizada por intermédio do voto e que reflete a essência da soberania estatal, não

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merece ser igualmente prestigiado. Com efeito, a escolha popular permite que o agente desempenhe uma função de natureza eminentemente lícita e cujas diretrizes de atuação foram traçadas pelo ordenamento jurídico. Distanciando-se da licitude e rompendo o elo de encadeamento lógico que deve existir entre o mandato outorgado e a função a ser exercida, dissolve-se a legitimidade auferida pelo agente com a eleição, o que, a exemplo do que se verifica em qualquer país democrático, permite ao Poder Judiciário restabelecer a ordem jurídica lesada. Apenas a título de elucubração na senda do PODER GERAL DE CAUTELA o elevado número de ações civis públicas que o terceiro réu responde, inclusive com condenação já perante o Tribunal de Constas do Estado, já poderia dar azo até ao afastamento deste demandado do exercício do cargo de Prefeito de Armação dos Búzios, ante ao periculum in mora de reiteração hodierna das condutas ora apuradas e pelas quais o demandado é agora sancionado, inclusive, com a perda de seu mandato eletivo. Destaca-se que o primeiro réu e o terceiro réu, o atual Prefeito Municipal desta cidade, ainda respondem conjuntamente e com outros réus a duas outras Ações Civis Públicas propostas pelo Ministério Público, distribuídas para este Juízo, envolvendo contratações diretas, sem a observância de procedimento licitatório na seara da Secretaria Municipal de Saúde, a saber, os processos judiciais números 0003563-40.2012.8.19.0078 e 0003882-08.2012.8.19.0078, sendo que o primeiro processo envolve segundo aduz o Parquet um prejuízo ao erário de R$ 1.683.750,00 (um milhão seiscentos e oitenta e três mil e setecentos e cinquenta reais) e o segundo um prejuízo estimado ao Erário de R$ 2.022.189,44 (dois milhões vinte e dois mil e cento e oitenta e nove reais e quarenta e quatro centavos). Ações estas que engendraram inclusive pedidos de decretação de indisponibilidade de bens dos demandados e decisões deste Juízo decretando o bloqueio dos bens do Ex-Prefeito e do atual Prefeito do Município de Armação dos Búzios. Tais fatos que engendraram ainda prejuízos milionários ao Erário Público como salientara o Parquet nas iniciais das aludidas Ações Civis Públicas justamente na combalida seara da Saúde nesta cidade, na seara penal, ainda deram azo à propositura no final de 2012 pelo Ministério Público de três ações penais em face do Ex-Prefeito e do atual Prefeito do Município de Armação dos Búzios, além de outros réus, sendo que dessas ações penais, uma fora distribuída para este Juízo, a saber, a de n° 0004995-94.2012.8.19.0078 e duas outras para o juízo da 1ª Vara de Armação dos Búzios de números 0005009-78.2012.8.19.0078 e 0004897-12.2012.8.19.0078, sendo que todas a partir da diplomação e assunção do mandato do 3° réu foram imediatamente remetidas para a Procuradoria-Geral de Justiça e para o Egrégio Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Já como Prefeito de Armação dos Búzios, o terceiro réu ainda responde perante este Juízo a outra Ação Civil Pública por atos de improbidade administrativa, processo n° 0002216-98.2014.8.19.0079, em razão do descumprimento de Termo de Ajustamento de Conduta celebrado com o Ministério Público ante a recomendação ministerial anterior para que a Municipalidade interrompesse de imediato a política de contratação de pessoal temporário para o exercício de funções que houvessem concursados aprovados e para que os convocassem e os nomeassem, aduzindo, no entanto, que suas recomendações e instruções foram ignoradas pelo Poder Executivo Municipal. Esclareceu ainda o Parquet naquela demanda que em 15 de junho de 2008, nos autos do inquérito civil público n° 054.2011, reconhecendo a inegável afronta à Constituição Federal, o Município firmou, então, nos autos da referenciada inquisa, COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA com o Ministério Público no qual, dentre outras irregularidades, reconheceu o seu dever de realizar concurso público para o provimento do cargo de profissionais da saúde que atuam em todas as áreas da Municipalidade, bem como o de nomear aprovados no concurso público de 2012, consoante ordem de classificação e número de vagas existentes em seu quadro de pessoal, além de ter assumido a Municipalidade o compromisso de abstenção de contratações

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temporárias fora do permissivo constitucional inserto no artigo 37, inciso I, da Constituição Federal. O Parquet aduziu na exordial do processo n° 0002216-98.2014.8.19.007 que no Município há 3461 (três mil quatrocentos e sessenta e um) servidores, sendo que deste quantitativo: 1831 (mil oitocentos e trinta e um) são concursados, 355 (trezentos e cinquenta e cinco) são ocupantes de cargo em comissão e 1175 (mil cento e setenta e cinco) são contratados temporariamente. Destarte, advertiu o Ministério Público no bojo daquele processo judicial que a contratação de 1175 (mil cento e setenta e cinco) servidores temporários compromete o orçamento municipal e a própria capacidade de investimento do Município, não sendo demasiado asseverar que a população de Búzios é de pouco mais de 27.000 (vinte e sete mil) habitantes, sendo este número de contratados temporários um número por deveras expressivo para o universo de munícipes que ora é descrito, o que o Parquet obtempera também causar influência indevida no processo eleitoral, ante a plausibilidade da prática do clientelismo político. Tramita ainda na Câmara de Vereadores de Armação dos Búzios, Comissão Parlamentar de Inquérito instaurada a requerimento da minoria parlamentar para investigar supostas fraudes verificadas já na gestão do terceiro réu à frente da Chefia do Poder Executivo Municipal que teriam violado o princípio da publicidade por meio de supressão de editais de licitação para contratação com o Poder Público em Boletins Oficiais e afastamento intencional de competidores, que, contudo, insertos estariam, de modo sub-reptício, apenas nos boletins enviados aos órgãos de controle, como a própria Câmara de Vereadores de Armação dos Búzios. Destarte, o Município de Armação dos Búzios, através da Procuradoria do Município, órgão do Poder Executivo Municipal, que tem sido utilizada como um instrumento de defesa político do governo e que deveria ser independente, ajuizou ainda em litisconsórcio ativo com vereador da base do governo no poder legislativo municipal, ação de declaração de nulidade de instauração de Comissão Parlamentar de Inquérito, processo n° 0000914-34.2014.8.19.0078, distribuído para este Juízo, cujo pedido já fora julgado improcedente. Com efeito, poderia ser vislumbrado até a presença do periculum in mora para a decretação imediata do afastamento imediato do terceiro réu do Cargo de Chefia do Poder Executivo Municipal, a fim de que o descalabro administrativo e o desrespeito a Lei verificados na administração municipal do primeiro réu à frente da Prefeitura de Armação dos Búzios não fossem novamente reiterados, como aparentemente já se vislumbra da exposição dos fatos acima, com grave comprometimento do Erário Público. Sopesar-se-iam, assim, para a decretação de tal afastamento os fatos apurados nesta demanda, que estão sob o abrigo do Juízo de Certeza, como também os indícios de novos desmandos administrativos apurados pelo órgão ministerial em Ação Civil Pública em curso (processo n° 0002216-98.2014.8.19.007) sopesar-se-iam. Considerar-se-ia ainda para decretação de tal afastamento cautelar do terceiro réu do cargo eletivo que o mesmo hodiernamente ocupa o elevado número de ações civis públicas que o terceiro réu responde por práticas de atos de improbidade administrativa, além do fato de o mesmo ter sido também demandado em ações criminais pelo Ministério Público, tendo em uma delas este juízo remetido os autos ao Procurador-Geral de Justiça e ao Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, justamente por delito contra a Lei de Licitações. Apenas para ilustrar na data de ontem mais uma Ação Civil Pública por suposto ato de improbidade administrativa, porventura, perpetrado pelo terceiro réu fora ajuizada pelo Ministério Público e distribuída para este Juízo, a saber, o processo n° 0005552-13.2014.8.10.0078, no qual o órgão ministerial narra que o atual Chefe do Poder Executivo está intencionalmente descumprindo a Lei Orçamentária aprovada pelo Poder Legislativo Municipal, incluindo em sua publicação o Poder Executivo convênios, dotações e despesas não autorizadas pelo Legislativo. Frise-se que é possível a hermenêutica do artigo 20 da Lei nº 8.429/1992, que preceitua a possibilidade de afastamento do cargo de agente demandado para fins processuais, para que tal

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afastamento de agente público atinja mesmo agente detentor de mandato eletivo, com vista a evitar a repetição da conduta reprovável. O jurista Fábio Medina Osório em sua obra "Improbidade Administrativa" entende, portanto, que sim, pois, em sua visão, "a expressão instrução processual há de ser interpretada com máximo rigor". Assim, a possibilidade de afastamento do agente quando se possa presumir que "ficando em seu cargo, acarretará novos danos ao Ente Público e à sociedade" é plausível, porquanto, conforme o doutrinador aduz perfeitamente possível afastar o detentor de mandato eletivo: "Se esses novos danos pudessem estar enquadrados no objeto da demanda, vale dizer, consubstanciando reiteração de atos cuja repressão já se ambicionava no próprio processo, parece razoável sustentar que a instrução processual se estenderia a essa hipótese e, por conseguinte, também o alcance do art. 20, parágrafo único, da Lei nº 8.429/1992". Cabe transcrever, portanto, o que preceitua o artigo 20 da Lei de Improbidade Administrativa: Art. 20. A perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória. Parágrafo único. A autoridade judicial ou administrativa competente poderá determinar o afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução processual. Destarte, se, por qualquer forma, o agente público atuar no sentido de prejudicar a instrução probatória ou, até mesmo, encetar a prática de atos que possam colocar em risco a eventual aplicação das sanções da Lei de Improbidade, seu afastamento poderá ser determinado pelo juiz ou pela autoridade administrativa. Tanto a regra do artigo 147 do Estatuto (Lei nº 8.112/90), quanto a da Lei n° 8.429/92, ambas têm em mira o trânsito da investigação ou do processo, conforme o caso. Funda-se, é claro, no fumus boni juris e no periculum in mora. A Lei n° 8.429/92 indica a decretação pelo órgão jurisdicional ou autoridade administrativa. Pode ser de ofício, mas nada obsta que responda à postulação do representante do Ministério Público ou do Procurador do ente público interessado. Uma vez inaugurada, a ação civil de improbidade administrativa, o afastamento judicial do agente público a quem se imputa ato de improbidade administrativa será examinado e, eventualmente determinado, após a citação, portanto recebida que seja a petição inicial. Sem duvida, portanto, que o juiz pode decretar o afastamento independentemente de requerimento. O que importa é o reconhecimento judicial da existência de irregularidades cometidas pelo agente, comprometedoras da instrução processual. Nesta senda, a possibilidade de reiteração de atos que importem em novos atos de improbidade administrativa, autoriza também que o Juízo determine o afastamento cautelar do agente. Contudo, o Juízo obtempera que apesar de poder decretar o afastamento de ofício consoante a inteligência do parágrafo único do artigo 20 da Lei de Improbidade, não o fará ainda sem postulação ministerial. Destaco ainda, que os prazos de oito anos, de suspensão dos direitos políticos dos réus, começam a fluir da prolação desta sentença monocrática. O Juízo ainda obtempera que a suspensão dos direitos políticos dos réus somente se dá, efetivamente, com a confirmação desta sentença em segundo grau ou trânsito em julgado, o que ocorrer primeiro, conforme Lei Complementar que disciplina as inelegibilidades, ocorrendo o mesmo com a perda de eventuais cargos, funções ou empregos públicos, inclusive o mandato eletivo do terceiro réu à frente da Chefia do Poder Executivo Municipal. Inobstante, o afastamento do cargo do terceiro réu, se solicitado, poderia se dar cautelarmente, e não como medida de antecipação dos efeitos da tutela. Destarte, o afastamento cautelar, com base no artigo 20, parágrafo primeiro, da Lei n° 8.429/92, não conspurca tal afastamento preventivo da prefeitura a decisão do Supremo Tribunal Federal na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF n° 144), que assentou

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entendimento de que somente pode haver a suspensão dos direitos políticos com a superveniência do trânsito em julgado da condenação judicial. Embora o artigo 273, § 7°, do Código de Processo Civil estabeleça o princípio da fungibilidade entre as medidas antecipatórias e as medidas cautelares, tal se dá, única e exclusivamente, para fins de conhecimento quanto à postulação equivocada, pois o que aqui poderia ser inclusive determinado ontologicamente seria uma medida de natureza cautelar, de caráter acessório e instrumental ante ao poder geral conferido ao pelo Poder Judiciário em nossa sistemática processual com fundamento no princípio da efetividade do processo. Porém, sem ainda postulação a questão do afastamento tem que ser ponderada cum grano salis, mesmo com atendimento do princípio do contraditório, sendo certo que o artigo 20, parágrafo único, da Lei de Improbidade, se autoriza o afastamento até mesmo na hipótese de cognição sumária e initio litis, o que se dirá do presente momento processual, que é de cognição exauriente, após o regular devido processo legal e no qual houve ampla defesa. Todavia, apesar de se mostrar necessária e adequada a medida cautelar de suspensão do exercício do mandato eletivo, caberá ao Ministério Público verificar no futuro se o exercício hodierno do cargo pelo terceiro réu não está conspurcando de sobremaneira o direito à boa administração. Destaco que o ressarcimento do dano causado ao erário deverá reverter em prol do Município de Armação dos Búzios. Devendo a serventia oficiar à Procuradoria Geral do Município para que se cientifique deste decisum e tome as providências necessárias ao integral ressarcimento da Fazenda Municipal. Antecipando neste aspecto em razão do juízo de certeza os efeitos da tutela condenatória, devendo ser intimados imediatamente os réus, para ressarcirem os danos causados ao Erário, no prazo de 15 dias. Destaco que os valores das multas civis aplicadas aos réus deverão se destinar integralmente à Secretaria Municipal de Saúde da Prefeitura de Armação dos Búzios, devendo tal soma ser revertida em prol da combalida saúde deste Município. Ressaltando-se que o mal infligido pela sanção deve superar qualquer proveito porventura auferido com o ilícito. Saliento que a pluralidade de atos de improbidade importa em múltiplos feixes de sanções. Condeno ainda os réus ao pagamento, cada qual, das custas e da taxa judiciária, em prol do Fundo Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Condenando-os, cada qual, ainda ao pagamento de honorários advocatícios no percentual de 20% sobre o valor arbitrado à causa de R$ 299.289,25 (duzentos e noventa e nove mil e duzentos e oitenta e nove reais e vinte e cinco reais) em prol do Fundo Estadual do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. Deixo de condenar o Município de Armação dos Búzios, pois a condenação do ente estatal que fora quem, em verdade, sofrera com os recursos indevidamente desviados, engendraria, então, o fenômeno da dupla infringência de sanções à coletividade, pois é esta quem suporta com o pagamento de tributos o custeio da máquina administrativa estatal (recursos derivados), tendo sido a coletividade quem sofreu com a aplicação desviante de recursos públicos; sendo que a própria existência do Estado, sob a ótica pós-positivista, legitima-se para consecução dos direitos e garantias fundamentais de todos os cidadãos, assegurados constitucionalmente, bem como para a prestação eficiente de serviços essenciais para a coletividade. Providencie a Serventia a inserção desta sentença nos autos do incabível incidente de exceção de suspeição, que fora oposta com sucedâneo do recurso de Agravo de Instrumento. Ressalta o Juízo que o julgamento célere de Ações Civis Públicas consiste na Meta n° 18 do Conselho Nacional de Justiça, tendo tal meta especificamente como objetivo o julgamento, até o fim de 2013, de todos os processos contra a administração pública e de improbidade administrativa, que foram distribuídos até 31 de dezembro de 2011ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), à Justiça Federal e aos Tribunais de Justiça dos Estados. O presente processo fora distribuído no ano de 2013, no entanto, os atos ímprobos aqui relatados dizem respeito a fatos ocorridos em 2005, 2006 e 2007. Oficie-se ainda a Tutela Coletiva do Ministério Público, instruindo-o com cópia desta sentença. Oficie-se ao Tribunal de Contas do Estado para tomada de contas em razão da novel Ação Civil Pública distribuída na data de ontem.

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Decreto ainda a indisponibilidade dos bens dos primeiro, segundo e terceiro demandados, ante ao juízo de certeza. Devendo adotar o Gabinete do Juízo as medidas adequadas para o bloqueio dos bens desses réus, no montante das condenações respectivas. Oficiem-se ainda os órgãos da 1ª e 2ª Promotorias de Justiça desta Comarca, com cópia desta sentença, a fim de eventualmente promover ação penal em face dos demandados ora condenados por improbidade administrativa, pela prática em tese de delito previsto no artigo 89 da Lei n° 8.666/93. Por derradeiro, é com pesar que este Juízo, ora condena o atual Prefeito de Armação dos Búzios por atos de improbidade administrativa, sendo que nesses dois anos de exercício da titularidade da 2ª Vara da Comarca de Armação dos Búzios por parte deste signatário, já foram também condenados, por este mesmo órgão jurisdicional, os dois Prefeitos Municipais anteriores por atos de improbidade administrativa. Em suma, os três únicos cidadãos que exerceram a prefeitura desta cidade, o atual e os dois anteriores, já foram condenados por atos improbos, quando este Município, cujo território fora desmembrado do Município de Cabo Frio, possui apenas 19 anos de existência político-administrativa. Com o trânsito julgado e pagamento, dê-se baixa e arquivem-se. P. R. I.

Armação dos Búzios, 10/12/2014.

Marcelo Alberto Chaves Villas - Juiz Titular

___________________________________________________________

Autos recebidos do MM. Dr. Juiz

Marcelo Alberto Chaves Villas

Em ____/____/_____

Øþ

MARCELO ALBETO CHAVES VILLAS:000026187 Assinado em 10/12/2014 12:21:00Local: TJ-RJ