pró-reitoria acadêmica escola de educação, tecnologia e … · 1 pró-reitoria acadêmica...

19
1 Pró-Reitoria Acadêmica Escola de Educação, Tecnologia e Comunicação Curso de Pedagogia Trabalho de Conclusão de Curso A NEUROCIÊNCIA E O PROCESSO ENSINO E APRENDIZAGEM NAS CLASSES DE ALFABETIZAÇÃO DA REDE PARTICULAR DO DF Autora: Tauana Ferreira Militão Orientador: Msc. Olimpo Ordoñez Carmona Brasília - DF 2017

Upload: voque

Post on 14-Nov-2018

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

1

Pró-Reitoria Acadêmica

Escola de Educação, Tecnologia e Comunicação

Curso de Pedagogia

Trabalho de Conclusão de Curso

A NEUROCIÊNCIA E O PROCESSO ENSINO E

APRENDIZAGEM NAS CLASSES DE

ALFABETIZAÇÃO DA REDE PARTICULAR DO DF

Autora: Tauana Ferreira Militão

Orientador: Msc. Olimpo Ordoñez Carmona

Brasília - DF

2017

TAUANA FERREIRA MILITÃO

A NEUROCIÊNCIA E O PROCESSO ENSINO E APRENDIZAGEM NAS

CLASSES DE ALFABETIZAÇÃO DA REDE PARTICULAR DO DF

Artigo apresentado ao curso de graduação

em Pedagogia da Universidade Católica

de Brasília, como requisito parcial para

obtenção do Título de Licenciado em

Pedagogia.

Orientador: Msc. Olimpo Ordoñez

Carmona

Brasília – DF

2017

Artigo de autoria de Tauana Ferreira Militão intitulado, A neurociência e o processo

ensino e aprendizagem nas classes de alfabetização da rede particular do DF,

apresentado como requisito parcial para obtenção do grau de Licenciado em Pedagogia

da Universidade Católica de Brasília, em 13 de junho de 2017, defendido e aprovado

pela banca examinadora abaixo assinada:

Prof. MSc. Olimpo Ordoñez Carmona (Orientador)

Pedagogia - UCB

Prof.a MSc. Tatiana Da Silva Portella (Examinadora)

Pedagogia - UCB

Brasília

2017

4

A NEUROCIÊNCIA E O PROCESSO ENSINO E APRENDIZAGEM NAS

CLASSES DE ALFABETIZAÇÃO DA REDE PARTICULAR DO DF

TAUANA FERREIRA MILITÃO

RESUMO: Este artigo pretende investigar e compreender como se dão os princípios

neurológicos na apreensão da leitura e escrita da língua no processo de alfabetização

infantil. A questão norteadora é balizada em inquietações que indagam sobre as

contribuições da neurociência para o processo de ensino e aprendizagem, mais

especificamente no processo de alfabetização de crianças. E as contribuições que a

neurociência pode trazer para complementar a formação de educadores que atuam nas

classes de alfabetização, visto que, o processo de leitura e escrita é resultado de atividades

neurais intensas. A pesquisa procurava saber se os professores de uma escola particular

utilizavam os conhecimentos da neurociência no processo de alfabetização em crianças

com seis anos. Através das observações de campo foi possível verificar que efetivamente

as crianças da escola particular, apresentam um aprendizado significativo, que possibilita

o processo de alfabetização. No sentido que o professor está fazendo um constante

bombardeio sináptico, permitindo que os estudantes se apropriem, de forma natural, de

todos os instrumentos que permitem a interiorização e exteriorização do processo de

leitura e escrita. Ficou claro em todas as observações que as estratégias metodológicas

estão amparadas na neurociência, uma vez que o professor potencializa a plasticidade

cerebral, levando em conta a realização das atividades de forma interativa.

Palavras-Chave: Neurociência. Alfabetização. Ensino e aprendizagem.

1 INTRODUÇÃO

O processo de alfabetização é complexo e progressivo. Por ser uma competência

recente para a humanidade, se faz necessário uma instrução orientada para a

aprendizagem da língua escrita, o que requer estratégias pedagógicas para o

desenvolvimento da apreensão de tais habilidades.

A alfabetização consiste em um exercício cerebral que exige concentração,

atenção, memória e muitas outras atividades neurais, e, por isso, considera-se pertinente

a colaboração da neurociência junto à educação. Ressalta-se, também, a importância de o

professor conhecer as etapas de estruturação cerebral, para ter melhor aproveitamento

deste processo com as crianças, que se constitui pelo reconhecimento visual da palavra,

codificação dos estímulos gráficos e definição pela via lexical (DEHAENE, 2012). Essas

etapas formam um conjunto com a decodificação, pré-leitura, fixação e o reconhecimento

dos traços das letras e sua articulação (SCLIAR-CABRAL, 2009).

Todo esse procedimento é segmentado em componentes neurológicos essenciais

para a concretização da aquisição da língua. Sendo assim, torna-se primordial o

conhecimento da organização cerebral que é responsável por essa habilidade, pois dessa

5

forma ampliam-se as possibilidades para que a alfabetização aconteça com a configuração

correta, decorrendo em resultados significativos na aprendizagem.

O conhecimento sobre como o cérebro processa a aprendizagem e quais as

melhores ferramentas para aquisição da escrita, tornou-se indispensável na sociedade

contemporânea. Conforme Cosenza e Guerra (2011, p.142), entende-se hoje que “o

cérebro é o órgão da aprendizagem”.

A alfabetização é um momento crucial na vida escolar do aluno, pois a partir

dela decorre todo o desenvolvimento educacional e cognitivo que são extremamente

importantes para o desenvolvimento das demais áreas do conhecimento. Paulo Freire

(1982, p. 9), define esta etapa como um “processo que envolve uma compreensão crítica

do ato de ler, que não se esgota na decodificação pura da palavra escrita ou da linguagem

escrita, mas que se antecipa e se alonga na inteligência do mundo”. Além da sua

relevância pedagógica, também possui um valor social expressivo para a participação do

aluno na sociedade.

Para isso, se requer organização didática, conhecimentos pedagógicos, de

metodologias, de desenvolvimento sociocultural, mas também o conhecimento do que os

estudos na área das ciências trazem para auxiliar no processo de ensino aprendizagem. A

neurociência muito já descobriu e pode auxiliar neste processo.

Acredita-se que o conhecimento sobre a neurociência poderá contribuir para o

avanço da ação pedagógica e para o processo de ensino e aprendizagem, uma vez que, as

mudanças contemporâneas, o avanço da ciência poderá nos mostrar novas estratégias de

ensino. Dessa forma, surge então a seguinte problemática: Como as descobertas da

neurociência podem contribuir no processo de alfabetização e na formação de

profissionais de educação?

Por ser justamente no cérebro que ocorre todo o desenvolvimento e etapas da

cognição, este estudo tem como objetivo geral analisar como os profissionais de

educação utilizam os conhecimentos da neurociência no processo de alfabetização.

Os objetivos específicos são: identificar os elementos científicos apontados

pela neurociência que contribuem para a alfabetização de crianças, conhecer e

descrever os componentes neurocientíficos que desenvolvem a habilidade de leitura

e escrita do ser humano.

O vínculo existente entre neurociência e educação pode proporcionar um leque de

possibilidades para descobertas nas ciências, tanto para a ciência da mente, como também

para a Pedagogia. Oliveira (2011, p. 21), ressalta que “A neurociência se constitui como

a ciência do cérebro, a educação como ciência do ensino e da aprendizagem e ambas têm

uma relação de proximidade porque o cérebro tem uma significância no processo de

aprendizagem da pessoa”. O entendimento de tais fatores que transcendem no cérebro,

como as células processam as informações, a sinapse e a eficiência da plasticidade

cerebral, motivam o aprendizado da linguagem oral e escrita, quando o profissional de

educação tem esses conhecimentos e auxilia no processo de alfabetização.

Esta pesquisa pretende envolver conhecimentos sobre alfabetização de crianças;

estudos da neurociência sobre o processo de apreensão da língua por meio de investigação

em escola de ensino fundamental anos iniciais, onde serão envolvidos profissionais de

educação e alunos em processo de alfabetização.

O corpus de análise da pesquisa, além de levantamento bibliográfico sobre

alfabetização e neurociência, foi realizada uma análise em uma escola particular do

Distrito Federal, em que foram observados os educadores e os alunos em processo de

alfabetização. O referencial teórico e metodológico deste estudo teve como base

6

bibliográfica os pesquisadores Dehaene (2012); João Batista Araújo e Oliveira (2004);

Leonor Scliar-Cabral (2013); Michael S.Gazzaniga; Richard B.Ivery, George R.Mangun

(2006); e Paulo Freire (1982), entre outros que, no decorrer da pesquisa, serão

consultados.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 CONCEPÇÕES SOBRE A ALFABETIZAÇÃO

De acordo com a Lei 9.394 (BRASIL, 1996), Art. 21, a escolarização brasileira

se divide em “educação básica, formada pela educação infantil, ensino fundamental e

ensino médio e educação superior’. Um dos objetivos da Educação Básica é o preparo do

aluno para a prática de cidadania, visando a promoção futura no meio profissional e

acadêmico. O Art. 23 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), declara que a

forma de organização do ensino pode ser baseada em vários critérios, composto por

períodos semestrais, ciclos, idade ou, por competências, pretendendo sempre a melhor

condução do ensino e aprendizagem.

A Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (BRASIL, 1996) estabelecera que o

aluno só deveria ser inserido no 1o ano do Ensino Fundamental - anos iniciais - com 7

anos de idade. Isso também mudou com a instauração da Lei no 11.274, de 6 de fevereiro

de 2006, que inclui crianças a partir de 6 anos no primeiro ano do ensino fundamental.

Esta mesma Lei determinou a matrícula obrigatória a partir dos 6 anos de idade, ou seja,

o Ensino Fundamental passou a ter duração mínima de 9 anos. Modificou também os

procedimentos de alfabetização, já que o aluno inicia o exercício funcional da

alfabetização mais cedo e, portanto, uma das finalidades do acréscimo de mais um ano

foi para dar a oportunidade a alunos que não frequentaram a pré-escola.

As Diretrizes Pedagógicas do Bloco Inicial de Alfabetização de 2012, impede a

reprovação nos anos iniciais de alfabetização, em razão de que este processo não ser

finaliza no primeiro nível de ensino, sendo a continuação de um ciclo, onde o aluno passa

por fases de instrução da leitura, escrita e cálculo. Por conseguinte, se tem a avaliação,

de forma processual na alfabetização, com um olhar para uma progressão da

aprendizagem. Neste sentido, o aluno, apesar de ser avaliado, não será retido.

É inquestionável a importância da alfabetização no cenário atual e com isso

várias medidas e leis são pautadas para ascensão da compreensão do sistema de escrita.

Por exemplo, a instituição do Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa compete

em:

Um compromisso formal assumido pelos governos federal, do Distrito Federal,

dos estados e municípios de assegurar que todas as crianças estejam

alfabetizadas até os oito anos de idade, ao final do 3º ano do ensino

fundamental (BRASIL, 2012, p.11).

Espera-se que o aluno no final do 3º ano do ensino fundamental, reconheça a

relação grafema e fonema, além também de entender e elaborar pequenos textos.

Conforme o Art. 5o, do Pacto Nacional, alguns dos objetivos consistem na garantia da

alfabetização em Língua Portuguesa e Matemática no final do 3o ano do ensino

fundamental; na diminuição da defasagem entre a idade e o ano; na melhora nos índices

7

do IDEB; e no incentivo á formação continuada dos professores alfabetizadores e

desenvolver estratégias para aprendizagem do aluno nos três anos do Ensino

Fundamental.

Percebe-se a magnitude e a responsabilidade do professor alfabetizador para o

comprimento de tais objetivos educacionais e sociais. Seu papel não fica limitado apenas

à reprodução de conteúdos para assimilação de códigos linguísticos, é fundamental que

sua atuação seja metódica e explícita com sua definição de alfabetização, pois dessa

forma, pode-se contribuir para realização plena de cidadania do aluno.

Alfabetizar é se apropriar de um sistema de escrita por meio da codificação e

decodificação dos signos linguísticos, ou seja, é o aprendizado da língua não como meros

símbolos, mas como representação do mundo, e com o propósito primordial de se

comunicar e pensar (MORAIS, 1996). Além da apreensão da língua como uma

ferramenta de comunicação, esta apropriação é de cunho social e cultural, pois todos

somos sujeitos de linguagem e essa se dá também por meio da leitura e escrita. Para o

sujeito ser considerado incluso na sociedade é necessário este ser letrado.

Diante da complexidade que é atividade de leitura e escrita, este conhecimento

necessita de metodologias de ensino, que desenvolvam habilidades cognitivas e

mobilizem estruturas neurais importantes para o ensino e aprendizagem. Portanto, além

das metodologias e estudos na área de educação de pesquisadores renomados como Piajet,

Vygotsky e Wallon, recentes pesquisas na área de neurociência também podem contribuir

nesta tarefa tão complexa que é a aprendizagem e, mais precisamente, a alfabetização.

Muitas são as concepções de didática da alfabetização que já foram usadas e

ainda estão em vigência. Algumas décadas atrás a ação de ler e escrever acontecia

exclusivamente por meio do método fônico e silábico que, segundo Sebra e Dias (2011),

envolve o estudo dos elementos menores das palavras, fonemas e sílabas, muito

empregado nas cartilhas, prosseguindo para o estudo das unidades maiores, linguagem

escrita, sentenças e textos.

Outra metodologia utilizada na alfabetização é o método analítico, em que, “ao

contrário, as unidades apresentadas inicialmente são unidades de significado, sejam elas

palavras, frases ou textos” (SEBRA, DIAS, 2011, p. 307). Portanto, nessa metodologia

expõem-se primeiro o todo para depois ir para as partes.

Manifesta-se no ambiente escolar, uma nova linha pedagógica que torna o aluno

participante no processo de aprendizagem, denominada a teoria construtivista. Surge

assim alfabetização baseada no Construtivismo, mudando alguns conceitos sobre a forma

de alfabetizar que, de acordo com Ferreiro e Teberosky (1985), a aquisição da leitura e

escrita é diferente de um aluno para outro por que cada um tem um processo de

aprendizagem com evoluções e recuos.

Estas autoras dividiram o processo de alfabetização em quatro fases: a pré-

silábica – em que o aluno ainda não tem compreensão das letras e sons, apenas faz traços;

a silábica – é o nível de escrita em que eles representam as palavras por letras conhecidas,

normalmente, do seu próprio nome, entretanto, ainda não diferem totalmente letras e

números; a silábica alfabética - surge a tentativa de atribuir um som a cada letra, e a fase

alfabética – que abrange uma parcela bem significativa da relação grafema-fonema,

porém, ainda se tem algumas dificuldades ortográficas.

Neste sentido, retira-se o foco apenas dos aspectos fônicos e silábicos, e se

reconhece que o raciocínio e cognição são construídos pelo aluno, sendo ele agente

importante de sua aprendizagem. O professor, portanto, não é mais considerado como o

8

único detentor do conhecimento, agora é atribuído a ele o título de mediador, onde no

Construtivismo, o conhecimento é construído com a exposição do sujeito ao meio.

Outro aspecto importante da teoria construtivista, que foi incorporado e

aperfeiçoado na psicogênese da língua escrita, é a questão do erro como agente de

formação. Ferreiro e Teberosky (1985) relatam que durante o aprendizado da escrita e

leitura, os alunos erram, de forma comum a todos, e estes constituem um processo

gradativo de aprendizagem, possui um caráter construtivo.

Diante de todas as abordagens apresentadas aqui, não é comum aprender a ler e

escrever sem que haja um estímulo e uma motivação. Nesse sentido, é preciso que o

educador mediador desenvolva estratégias para que o aluno se sinta instigado a despertar

o interesse pela escrita e pela leitura. Também é necessário um ambiente que propicie

desafios para provocar a geração de pensamentos críticos e produção de exercícios

cognitivos. A neurociência surge para somar meios de auxiliar os educadores na missão

de escolarizar com maior eficiência e qualidade.

2.2 A CONTRIBUIÇÃO DO CONHECIMENTO DA NEUROCIÊNCIA PARA A

EDUCAÇÃO

O cérebro é o órgão vital do sistema nervoso, responsável pelas ações do

pensamento, sentimento, atenção e muitas outras competências complexas, ele também

interpreta as percepções do meio ambiente. Para que o sistema nervoso decifre as

informações e oriente uma reação para uma determinada parte especializada do corpo, é

indispensável as atuações dos neurônios. Lent (2005, p. 13) descreve os neurônios como

células:

Cuja morfologia está adaptada para as funções de transmissão e processamento

de sinais: tem muitos prolongamentos próximos ao corpo celular (os

dendritos). Que funcionam como antenas para os sinais de outros neurônios, e

um prolongamento longo que leva as mensagens do neurônio para sítios

distantes (o axônio).

É essa cadeia de neurônios interligados que formam o circuito neural,

responsável pela execução das funções decisivas para o aprendizado. Outro fenômeno

essencial para que a aprendizagem ocorra é a sinapse. “Quando o potencial de ação

alcança um terminal axional, este induz a liberação de mediadores químicos em uma

região especializada, a sinapse, onde o neurônio faz contato com outro neurônio”

(GAZZINGA; IVRY; MANGUN, 2006, p.78).

Em outras palavras, a sinapse é onde acontece a transferência de informações

entre um neurotransmissor e outro. Assim acontece o mecanismo de mensagem, que

permite o ser humano aprender, e por isso é importante que as didáticas pedagógicas

provoquem o maior número de sinapses possíveis para a consolidação das ideias.

É vantajoso que o professor utilize de estratégias pedagógicas que favoreçam

alterações na estrutura cerebral, pois o ambiente influencia na organização funcional. Ele

intensifica a plasticidade cerebral e a capacidade de mudança neural frente a estímulos

(GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006). No momento que se aprende algo novo,

associado com as informações e conhecimentos já pré-existentes, o cérebro se torna cada

vez mais plástico e se ajusta ás modificações motivadas pela aprendizagem. Oliveira

(2014, p. 16) destaca que “As mudanças estruturais, chamadas de períodos críticos,

incluindo a sinaptogênese e a poda neuronal, são eventos relevantes na educação”. Nesses

9

períodos, as estimulações para determinadas aprendizagens são importantes para o

desenvolvimento educacional da criança.

Segundo Vygotsky (1998), o aprendizado está vinculado com o

desenvolvimento, sendo que, a aprendizagem poder ser maior que o desenvolvimento

biológico. O autor explica essa competência com a zona de desenvolvimento proximal:

que é a distância entre o desenvolvimento real e o desenvolvimento potencial, e se

concretiza com a habilidade de resolver problemas sozinhos. O desenvolvimento

potencial seria a capacidade de resolução de novos problemas com a mediação de um

outro sujeito. Desse jeito, Vygotsky, já trabalhava com a plasticidade cerebral, ao afirmar

que o ser humano é capaz de aprender através dos estímulos ambientais e não

necessariamente só por meio biológico, ao contrário de Piaget, que se “concentra em

encontra o liminar inferior de uma capacidade de aprendizado, ou seja, a idade ideal na

qual um tipo particular de aprendizado se torna possível pela primeira vez” (VYGOTSKY

1998, p.104).

Oliveira (2011, p. 66) define a neurociência “como o conjunto de ciências

envolvidas no estudo do sistema nervoso, especialmente do cérebro humano, tem por base

a interdisciplinaridade”. Há, portanto, uma intercomunicação com a educação e tem

como parâmetro a interdisciplinaridade dos conhecimentos e constituição humana.

Compreende-se aqui a importância de explorar essa combinação e o quanto é relevante

que o professor conheça o funcionamento do cérebro para impulsionar os processos de

aprendizagem.

O discernimento de como o cérebro funciona e de quais maneiras esses

fundamentos podem ser empregados na educação, indicam mudanças de referências para

o desenvolvimento da aprendizagem. Com o surgimento de novos parâmetros, ampliam-

se os campos de estudos que investigam a neurociência e a educação. Para Hennemann

(2015) a neuroeducação se trata da conjunção dos saberes da psicologia, educação e

neurociência, surgindo assim, um novo entendimento dessa reunião, onde o aprender é a

causa de transformações nos comportamentos.

A educação nesse contexto não se constitui apenas na obtenção de novos

conhecimentos, mas na reorganização e alteração das metodologias de ensino e na forma

como o aluno aprende. Ainda segundo Hennemann (2015), essa mudança de

comportamento ou aprendizagem pode ser tanto cognitiva, quanto motora ou emocional.

Para conseguir tais objetivos de modificações na educação, é preciso oferecer

uma formação de professores voltada para inclusão da neurociência na formação básica

do docente. Silva e Morino (2012, p. 47) destacam essa nova concepção como “nesta

perspectiva futurista, não se pode deixar de mencionar o papel do neuroeducador, o

professor do futuro, a partir de um currículo de formação de professores adequado a essa

inevitável esfera”. Os autores ressaltam ainda que é essencial um currículo que abarque a

neuroeducação para inserção dos progressos cognitivos na metodologia e teoria. Noronha

(2012, p.1) aprofunda ainda mais as colaborações da neurociência para a prática

pedagógica:

A imaginação, os sentidos, o humor, a emoção, o medo, o sono, a memória são

alguns dos temas abordados e relacionados com o aprendizado e a motivação.

A aproximação entre as neurociências e a pedagogia é uma contribuição

valiosa para o professor alfabetizador. Por enquanto os conhecimentos das

Neurociências oferecem mais perguntas do que respostas, mas cremos que a

Pedagogia Neurocientífica está sendo gerada para responder e sugerir

caminhos para a educação do futuro.

10

Aprendizagem consolidada com a neurociência, ou a neuroeducação, possibilita

potencializar as habilidades dos alunos, visto que, são desenvolvidas as aptidões

cognitivas para a expansão da inteligência e não meramente memorização temporária.

Segundo Izquierdo (2002), a memória é a consecução, elaboração, continuação e a

recordação de experiências. Portanto, só se aprende com efetividade quando concepções

novas são intermetidas com informações ascendentes.

Para Fonseca (2014, p. 5) “a interatividade e a inseparabilidade dinâmica da

cognição, da conação e da execução permitem a emergência e a sustentação do processo

da aprendizagem humana”. Essa movimentação só é possível devido à circulação de

informações entre as células (neurônios), que são propícias ao aprendizado. O cérebro

humano é formado por partes especializadas em realizar determinadas atividades, onde

todos os circuitos e sistemas participam para seu funcionamento.

Segundo Noronha (2012) o cérebro humano é dividido em dois hemisférios e o

jeito de cada pessoa sofre influência de forma direta a partir do lado que a mesma utiliza.

As pessoas que usam mais o hemisfério esquerdo, tender a ser racionais e lógicas,

enquanto que o lado direto é encarregado da imaginação e criatividade, geralmente as

pessoas que utilizam esse lado, possuem facilidade para oratória.

É importante que exista equilíbrio entre os hemisférios esquerdo e direito do

cérebro e a constante estimulação das capacidades. Também é notória a diferença de

aprendizagem entre os alunos, já que cada um tem seu tempo de aprender e apresenta

formas distintas para apreensão dos conhecimentos. O entendimento das funções

cerebrais resulta na necessidade de excitar e intensificar o potencial de aprendizagem de

forma integrada para a totalidade do aluno.

Para Maricato (2013) a educação cognitiva faz parte da edificação do

conhecimento, do pensamento crítico e reflexivo; uma temática que está sendo debatida

na tentativa de progredir na qualidade da educação. Por esse motivo, é preciso uma

reconfiguração pedagógica para avançar nos processos de desenvolvimento e

aprendizagem, pois, conhecendo as particularidades dos alunos, o professor pode se

tornar um agente atuante na aprendizagem, e desse modo, alternar sua atuação para áreas

diversificadas, com utilização de procedimentos e ferramentas múltiplas.

Diante dos fundamentos apresentados, são evidenciados os benefícios da

apreensão das descobertas da neurociência na educação, para revelar os princípios que

comprometem o cérebro na aprendizagem, bem como preparar o aluno para uma

educação que está em sucessiva transformação, pois as mudanças de comportamento são

produtos de um exercício cerebral ativo.

2.3 A ALFABETIZAÇÃO E AS CONTRIBUIÇÕES DA NEUROCIÊNCIA

A linguagem é usada pela humanidade para comunicação, diálogo, troca de

ideias e pensamentos, é um conjunto de símbolos que possibilita a interlocução entre os

sujeitos. A habilidade da fala é inata, pois todas as crianças aprendem e expressam essa

competência de maneira semelhante (GAZZINGA; IVRY; MANGUN, 2006). Dessa

forma, a linguagem caracteriza-se por ser uma manifestação cultural (VYGOTSKY 1998)

que, por meio, primeiramente da fala de uma língua, insere o sujeito numa determinada

cultura e essa inclusão é estendida quando esse sujeito apreende a versão simbólica desta

língua que se dá na alfabetização.

11

Dessa forma, a habilidade de ler e escrever também é uma forma de divulgação

de informação e comunicação, além de ser um meio de a sociedade se desenvolver. Sem

dúvidas é a criação humana que mais mudou o pensamento e existência do ser humano,

modificando também suas estruturas sociais e neurais. Morais (1996, p. 43), enfatiza que

“a escrita é uma aquisição muito recente. O primeiro traço de escrita tem apenas seis mil

anos”. Devido à escrita ser uma inovação, ícones que foram e são construídos pela

sociedade (LIMA, 2013) precisam ser ensinados, ao contrário da linguagem oral, a escrita

não é uma habilidade inata, necessitando ser aprendida.

Em virtude da sua complexidade, a escrita e a leitura alteram as redes neurais.

A criança necessita compreender que a linguagem oral é formada por fonemas, orações e

pensamentos que configuram os elementos do diálogo. Morais (1996, p. 109) define a

leitura como “a capacidade de reconhecimento de palavras escritas, isto é, a capacidade

de identificar cada palavra como forma ortográfica que tem uma significação e atribuir-

lhe uma pronuncia”. Em consequência da estrutura complexa que é o ato de ler, este

assunto é bastante pesquisado, devido a sua importância para a evolução da civilização.

A leitura e a escrita proporcionam que os alunos tenham acesso a essa cultura do

conhecimento, que é desenvolvida pelas e para as pessoas.

É preciso reforçar a necessidade do conhecimento neurocientífico para o ensino

da leitura e escrita, pois a aptidão para essas habilidades manifesta-se diretamente no

cérebro. Lima (2013) diz que “quando a docência da escrita integra várias das

contribuições da neurociência, observamos que se tornam mais concretas e complexas as

aprendizagens da criança pela realização de memórias de longa duração” (p.9). São

defendidos os benefícios de uma abordagem pedagógica com enfoque na neurociência

para o ensino da leitura e escrita, podendo aprimorar esse processo e até torná-lo mais

rápido e eficaz.

Hoje em dia nas salas de alfabetização, principalmente nas escolas públicas, é

adotada a teoria do construtivismo, onde deve-se respeitar a evolução de cada criança,

indo ao oposto do que é evidenciado pela zona de desenvolvimento proximal e a própria

neurociência, já que revelam que o nível de maturação da criança está muito além de seu

desenvolvimento. É por meio da estimulação precoce que o cérebro realiza as sinapses,

sendo que a patir dos primeiros anos de vida até a adolescência é quando ocorre o maior

número de sinapses. Portanto, como Vygotsky (1998, p.154) já argumentava, “se as

crianças mais novas são capazes de descobrir a função simbólica da escrita, então o ensino

da escrita deve ser de responsabilidade da pré-escola” e não apenas uma capacidade

atribuídas as crianças de seis anos em diante.

De acordo com Morais e Kolinsky (2013), e Oliveira (2004), considerando os

processos de aprendizagem da leitura, para que o aluno aprenda a ler é necessário entender

algumas etapas: a primeira etapa consiste em identificar o princípio alfabético, que é

formado pela correlação fonemas e grafemas, ou seja, os fonemas são unidades de som

que são representadas por letras (grafemas); a segunda condição equivale à apropriação

sucessiva das regras comuns de decodificação grafofonológica e fonográfica, pois

dependendo da localização das letras e do contexto, a mesma pode expressar sons

diferentes, grafemas distintos para um mesmo fonema e as regras complexas de

morfossintáticas (classes gramaticais); a terceira situação é a construção dos conceitos

mentais da ortografia, quando o léxico mental ortográfico, já bem desenvolvido,

identifica automaticamente as palavras.

Identifica automaticamente as palavras, e, dessa forma, torna-se fluente e pode

concentrar sua atenção no texto e no contexto. O bom leitor usa o contexto para

12

facilitar a compreensão, não para identificar a palavra. O mau leitor, ao

contrário, utiliza o contexto para identificar a palavra, comprometendo a

memória, atenção e concentração nessa tarefa, o que afeta a sua leitura e

compreensão. Para identificar automaticamente uma palavra é preciso

aprender, antes, a decodificá-la. O alfabeto é um código, é artificial, foi

inventado. (OLIVEIRA, 2004, p. 24)

A alfabetização necessita seguir um processo de valorização de etapas. As etapas

inicias, são importantes para o desenvolvimento de fases futuras. Quando a criança

aprende os princípios da leitura, as demais fases tornam-se descomplicadas, a

compreensão do texto vai sendo construída no cotidiano quando a leitura se torna

espontânea.

A legitimação dos preconceitos e conceitos que são cruciais para a habilidade de

ler é baseada em pesquisas que realizaram perguntas de natureza exploratória, como por

exemplo de como se aprende a ler. Dehaene (2013) e Oliveira (2004) questionam quais

organizações cerebrais são responsáveis por esse processo e como a leitura modifica

nosso cérebro (DEHAENE,2013; SCLIAR-Cabral (2010).

Cosenza e Guerra (2011) afirmam a existência de circuitos especializados no

processamento da linguagem, localizados no hemisfério esquerdo, denominados de áreas

de Broca (responsável pela fala); e a Wernicke (vinculada à compreensão da linguagem).

No entanto, para a decodificação da escrita, não se encontra uma área cerebral já

predeterminada para tal função, no momento da aprendizagem da leitura e da escrita

ocorre à plasticidade cerebral, os neurônios se reorganizam para decifrar os estímulos e

originar aprendizagem, decorrente da transformação de algumas redes neurais (SCLIAR-

CABRAL, 2010).

Os princípios neurobiológicos da leitura são comuns para todas as línguas e

sujeitos. Segundo Dehaene (2013) e Oliveira (2004), o processo de leitura se inicia nas

vias corticais, em que a retina captura o estímulo gráfico e o divide em pequenas unidades

que são enviadas para o cérebro, especificamente para a região occipitotemporal ventral

esquerda. Após o reconhecimento da palavra, os neurônios acessam o chamado dicionário

mental de formas das palavras, onde os grafemas são relacionados com seus respectivos

fonemas, construindo, desse modo, a consciência fonológica.

Em seguida, é feita a interpretação da palavra pela via lexical , atribuindo-lhe

um sentido. Coltheart (2013, p.21) reforça a importância das duas vias para o

reconhecimento da letras e significação da leitura.

Existem duas rotas da palavra impressa a fala: uma rota lexical e uma rota não

lexical. De forma ampla, a rota lexical envolve analisar a pronúncia de uma

palavra armazenada em um léxico ou dicionário mental. Em contrapartida, a

rota não lexical envolve traduzir os grafemas (letras ou grupos de letras) em

fonemas e gerar a pronúncia da palavra a partir dessa sequência de fonemas.

Apesar das mudanças que o cérebro é submetido para apreensão da escrita e

leitura, mesmo assim permanece delimitações fisiológicas para o processo. Dehaene

(2013) relata que só é possível identificar entre 10 e 12 letras, em cada fase, onde 3 a 4

são reconhecidas à esquerda do olho e 7 a 8 à direita. Essa região é denominada de campo

da percepção visual da letra. Além disso, todo esse mecanismo é executado em questões

de milésimos de segundos, fomentado em uma competência multifacetada que demanda

um envolvimento conjunto de todo o cérebro, que requer também capacidades superiores

de atenção, concentração, compreensão e memória.

13

Embora se tenha poucas informações e descobertas, a ciência neurocognitiva

evolui de forma excepcional, resultando em diversos conhecimentos que contemplam a

vivência escolar em um dos períodos principais, que é a alfabetização, pois é a partir dela

que se vinculam todos os outros aprendizados e conhecimentos.

3 METODOLOGIA

O presente artigo é baseado em uma abordagem qualitativa que, para Malheiros

(2011, p. 31) “tentam compreender os fenômenos pela ótica do sujeito. Neste sentido, têm

como premissa que nem tudo e quantificável e que a relação que a pessoa estabelece com

o meio e única e, portanto, demanda uma análise profunda e individualizada. ”

Esse tipo de pesquisa tem um caráter qualificador e social, já que a investigação

é focalizada no sujeito e sua realidade. A finalidade da pesquisa foi de analisar as

estratégias de alfabetização, e as contribuições da neurociência para esse processo,

o que demandou, além de levantamento bibliográfico sobre o tema, a análise, por meio

de observações do cotidiano pedagógico de uma turma de alfabetização da rede particular

do Distrito Federal.

Esta pesquisa tem um caráter bibliográfico e exploratório, que para Cervo, Brian

e Silva (2007, p.61) se define como “ o procedimento básico para os estudos

monográficos, pelos quais se busca o domínio do estado da arte sobre determinado tema.”

Já a investigação exploratória é definida como uma pesquisa que não necessita a

verificação de hipóteses, delimita-se a buscar mais informações sobre um tema estipulado

(CERVO; BERVIAN; SILVA, 2007). Por ser um tema contemporâneo, necessitou de um

estudo intrínseco para familiarizar-se com a temática.

O objetivo de analisar se as estratégias de alfabetização têm fundamentação com

a neurociência, apresenta, assim, algumas características de estudo de caso simples.

Segundo Gil (2002) o estudo de caso é um método qualitativo, utilizado para investigar

situações da vida real e explicar as variadas causas de um fenômeno complexo.

A pesquisa foi realizada em uma única escola, onde a coleta de dados se deu em

um ambiente real. A pesquisa de campo e mais uma técnica que se relaciona muito mais

a forma de coleta de dados do que propriamente ao modelo metodológico de condução

da pesquisa. Como o próprio nome diz, nesta técnica a coleta de dados e realizada em

campo, sendo este uma delimitação no espaço e no tempo (MALHEIROS, 2011).

Os dados analisados são de natureza primária, que se refere a “dados coletados,

em primeira mão, como pesquisa de campo, testemunho oral, depoimentos, entrevistas,

questionários, laboratórios, conferências gravadas etc.” (MICHEL, 2009, p.65). As

informações foram reunidas por meio de 10 observações diretas, realizadas em uma classe

de alfabetização da rede particular do Distrito Federal.

4 ANÁLISE GERAL DAS OBSERVAÇÕES

A pesquisa foi realizada em uma escola particular do Distrito Federal, na turma

de 1o ano do Ensino Fundamental I, com crianças na idade de 6 anos, totalizando 11

alunos. A observação abrangeu o conjunto de 10 aulas com a somatória de 40 horas, entre

os dias da semana de terça-feira, quinta-feira e sexta-feira.

O critério escolhido para a realização das observações nessa determinada escola,

foi de verificar como os profissionais de educação utilizam os conhecimentos da

neurociência no processo de alfabetização.

14

De forma geral, é surpreendente como as crianças da escola particular,

apresentam um aprendizado significativo, que possibilita o processo de alfabetização, no

sentido que o professor está fazendo um constante bombardeio sináptico, permitindo que

os estudantes se apropriem de forma natural, de todos os instrumentos que permitem a

interiorização e exteriorização do processo de leitura e escrita.

A proposta de alfabetização da professora inicia-se pela organização da sala.

Cada espaço é identificado com seu devido nome e há livros em todos os lados da sala:

em uma estante pequena, em um baú e armários. São variados tipos de livros e revistas

ao alcance das crianças, onde elas podem pegar e apreciar a leitura. Além disso, a escola

possui um projeto de leitura chamado Ciranda do Livro, no qual as crianças escolhem um

livro para ler e levar para sua casa, e a cada história lida, elas realizam uma atividade para

consolidar a aprendizagem e compreensão do texto. Oliveira (2004, p. 65) confirma a

importância dessa estruturação da sala de aula e materiais:

Numa classe bem organizada deve haver materiais para o professor, para

leitura compartilhada, para leitura individual e para atividades a serem

desenvolvidas pelo o aluno. Deve haver também materiais de leitura e trabalho

que o aluno leve para casa e fazer deveres.

O habito da leitura diária é essencial para o desenvolvimento das habilidades de

ler, escrever e para o aumento do vocabulário das crianças. Ademais, ouvir histórias

também é essencial nesse processo de formação de leitores. A professora da classe

observada, sempre começava a aula com a leitura de um livro e logo depois dialogava

com os alunos sobre a história. Souza (2009, p.45) evidência a relevância dessa prática:

“Hoje sabemos que, antes da criança começar a ler, é preciso que ela escute histórias, pois

a palavra falada é um agente estruturante das funções superiores da mente porque é o

início da aprendizagem para que a pessoa seja um leitor”.

Outro recurso utilizado na sala para a o aprimoramento da leitura são as fichas

de leiturinha que contêm diversos gêneros textuais. As crianças escolhem uma ficha e

realizam a leitura durante toda a semana ou até sua aprendizagem. Oliveira (2004)

defende a memorização de textos como sendo um importante modo de fortalecer a

memória, ajudando também na identificação de palavras e fluência verbal.

Na observação do nono dia, a professora leu várias parlendas e trava-línguas para

as crianças e ainda pediu que as próprias crianças narrassem as parlendas conhecidas por

elas. Ora, a leitura de textos como parlendas e trava-línguas por exemplo, enriquece a

competência de consciência fonológica nas crianças. Segundo Cassela, Amaro e Costa

(2011, p.39-40):

A unidade da escrita conhecida como grafema é o correspondente da unidade

sonora, denominada fonema, e esta consciência é fundamental na aquisição da

leitura. Esta capacidade é denominada consciência fonológica e está presente

de forma estável em crianças a partir de cinco anos de idade. Este tipo de

percepção representa um passo inicial para o desenvolvimento de circuitos

neurais em regiões específicas do cérebro, que desde a idade pré-escolar já se

mostram presentes, localizando-se principalmente em áreas do hemisfério

esquerdo do cérebro.

Durante todas as aulas, a professora sempre incentivava as crianças a pronunciar

primeiramente a palavra, identificando os sons de cada letra e em seguida elas teriam que

escrever, reforçando mais uma vez a relação fonema-grafema, de acordo com Dehaene

(2012, p. 221) “Em definitivo, o melhor modelo de aprendizagem fonológica é, sem

15

dúvida, o de uma interação recíproca entre o desenvolvimento dos grafemas e fonemas”.

Como consta, a todo instante elas trabalham essa importante relação de som e letra.

A compreensão textual é desenvolvida juntamente com a leitura e escrita. Além

da contação de história diária, no sexto dia tendo como exemplo, a professora pediu que

as crianças contassem a história da “Bela Adormecida”, e em seguida ela fez a relação

com a música “A Linda Rosa Juvenil”, as crianças entenderam que as duas se referem á

mesma história. No mesmo dia, ela explicou para as crianças a diferença entre parlenda e

cantiga. Na quarta observação, houve uma atividade com o livro “Camilão, o comilão”,

as crianças escolheram um animal e pesquisaram sobre ele, quer dizer, que as crianças

não só ouviram a história, como também falaram sobre o que apreenderam e ainda

escreveram sobre um animal de sua preferência, trazendo novos conhecimentos para

história.

Conforme Oliveira (2004), algumas competências importantes para a

compreensão do texto seriam: identificar o princípio, meio e fim de histórias lidas pelo

professor; identificar as principais características dos gêneros literários; resumir a história

e compreender o objetivo da leitura.

A escrita é otimizada com exercícios de copiar do quadro os deveres, agenda e

textos. Outras vezes a professora dita as palavras, espera as crianças escreverem e depois

escreve no quadro para que elas corrijam, e elas também revisam os textos dos outros

colegas. Oliveira (2004) refere-se aos ditados e cópias, quando usadas de maneira correta,

como instrumentos para o conhecimento da ortografia e evolução da leitura. Elas também

produzem pequenos textos com suas próprias palavras, como foi visto no decorrer do

sexto dia, quando as crianças deveriam escrever sobre o significado da páscoa para elas.

Segundo Hennemann (2012), o exercício de escrever à mão é tão fundamental para

aperfeiçoamento da ação motora, quanto para o cérebro e o desenvolvimento cognitivo,

isto é, desenvolve a expressão de ideias mais rapidamente.

Na apreciação do terceiro dia, a professora introduziu a letra cursiva. Ela

escrevia no quadro a palavra e pedia para as crianças traçarem com dedo o formato da

letra na folha e só depois escrever com o lápis. Dehaene (2012, p. 246) ressalta que

“Escrevê-las ou traça-las com o dedo contribui certamente, a transpor, com sucesso, esta

importante etapa”. Também foi solicitado às crianças que, ao ler uma palavra, elas

acompanhassem cada letra com seu dedo, um recurso muito importante no momento da

leitura, pois nossos olhos capturam as palavras por meio de sacadas, envia ao cérebro,

onde desintegra essa palavra em pequenos elementos. Então, ao acompanhar com o dedo,

a criança focaliza a palavra que deve ler, facilitando assim as sacadas dos olhos no

reconhecimento visual da palavra (DEHAENE, 2012).

Um outro recurso utilizado pela professora para o processo de ensino e

aprendizagem são os desafios semanais propostos aos alunos. Toda semana é lançado um

desafio ás crianças - problemas que elas tentam resolver apenas com ajuda de uma outra

pessoa - mas que devem conseguir solucionar sozinhos. Essa habilidade é importante para

a memória, aprendizagem, e muitas outras funções do cérebro, evidenciando a contínua

plasticidade cerebral de alguns circuitos neurais com o aprendizado (CASSELA;

AMARO; COSTA, 2011). Além da resolução de problemas, o incentivo incessante a

realizar atividades que superam seus limites, reforça a ideia de zona de desenvolvimento

proximal.

A zona de desenvolvimento proximal permite-nos delinear o futuro imediato

da criança e seu estado dinâmico de desenvolvimento, propiciando o acesso

16

não somente ao que já foi atingindo através do desenvolvimento, como

também aquilo que está em processo de maturação (VIGOTSKY, 1998,

p.113).

As perguntas também fazem parte das estratégias de aprendizagem na sala

observada. A cada ação realizada pelas crianças, a professora faz diversas perguntas sobre

aquela atividade, promovendo, desta forma, uma grande realização de sinapses,

estimulando de modo similar a plasticidade cerebral. De acordo com Silva e Morino

(2012, p.40):

As perguntas enfatizam importantes elos da informação semântica. Uma

maneira de abordá-la é fazer perguntas abertas que dão a todos os níveis de

estudantes a oportunidade de responder “corretamente”. Outra maneira é dar

as respostas e deixar que os estudantes deem as perguntas.

Em síntese, todos os procedimentos aplicados no processo de ensino e

aprendizagem são advindos das afirmações da neurociência, ou seja, estão de acordos

com os mecanismos do cérebro, proporcionando uma aprendizagem mais significativa e

eficaz.

Lembrando as palavras de Vygotsky (1998) o bom aprendizado é aquele que se

adianta ao desenvolvimento. Desta forma, a escola pesquisada propicia memórias de

longo prazo, aproveitando o processo de mielinização e preparando os cérebros das

crianças, para uma interconexão sináptica que permite a efetividade da plasticidade

neuronal.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir dos estudos das correntes de pensamentos que apoiam a neurociência

como colaboradora no processo de alfabetização, e com base nas observações realizadas

nesse trabalho, compreende-se que o processo de ensino e aprendizagem necessita ser

pautado de acordo com os conhecimentos científicos, ou seja, os professores devem ter

uma atenção especial para Pedagogia Científica aliada à neurociência, com a finalidade

de potencializar a aprendizagem dos alunos.

Por isso, as crianças que são alfabetizadas desenvolvendo as competências

propostas pela neurociência, conquistam uma aprendizagem de uma maneira mais ativa

e duradora. Diante do que foi apresentado, a alfabetização de crianças pode ocorrer em

idades precoces, visto que, Segundo Cassela, Amaro e Costa (2011), crianças em idade

pré-escolar já possuem as estruturas cerebrais adequadas para o aprendizado da leitura e

escrita. São durante os primeiros anos de vida que ocorrem o maior número de sinapses,

ou seja, o cérebro é mais plástico na infância, o momento propício para a alfabetização.

A obtenção de novos conhecimentos e o aperfeiçoamento da aprendizagem

depende, em grande parte, das estruturas cerebrais e da mediação do professor, desse

modo, esta pesquisa reafirma a importância de os educadores entenderem a relevância da

neurociência para as práticas pedagógicas na alfabetização, pois a instrução da leitura e

escrita demanda uma metodologia condizente com componentes neurológicos e

neurocientíficos que desenvolvem a habilidade de leitura e escrita do ser humano.

Dessa forma, verificou-se os elementos essenciais para a habilidade de leitura e

escrita , descritos por Morais e Kolinsky (2013), e Oliveira (2004): a apropriação da

relação grafema-fonema, construção da consciência fonológica, compreensão do contexto

e acesso a ortografia.

17

Portanto, quando o ensino é realizado em conformidade com a neurociência, este

proporciona ás crianças uma aprendizagem que estimula a realização de sinapses,

impulsiona a plasticidade neural e, consolida a memória, promovendo, assim, uma

atenção e concentração fixa, isto é, são os elementos neurológicos primordiais não só no

processo de alfabetização, mas como em qualquer outro processo de aprendizagem.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei no 11274, de 6 de fevereiro de 2006. Disponível em:

<https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11274.htm>.

Acesso em: 21 de set. 2016.

________. Lei no 9394, de 20 de dezembro de 1996. Disponível em:

<https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm>.

________. Ministério da Educação. Portaria no 868, de 4 de julho de 2012. Disponível

em: <http://pacto.mec.gov.br/images/pdf/port_867_040712.pdf>. Acesso em: 22 set.

2016.

CASELLA, E. B.; AMARO, E. Jr.; COSTA, J. C. As Bases Neurológicas da

Aprendizagem. IN: Aloisio Araujo (Coord.). Aprendizagem infantil: uma abordagem

da neurociência, economia e psicologia cognitiva. Rio de Janeiro, RJ: Academia

Brasiliense de Letras, 2011. p.37-78.

CERVO, Amado Luiz; BERVIAN, Pedro Alcino; DA SILVA, Roberto. Metodologia

Científica. 6. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007.

COSENZA, Ramon M; GUERRA, Leonor B. Neurociência e Educação: como o

cérebro aprende. Porto Alegre: Artmed, 2011.

COLTHEART, Max. Processos de reconhecimento de palavras na leitura. IN: Margaret

J. Snowling, Charles Hulme. Org(s). A ciência da leitura. Porto Alegre: Penso, 2013.

p.19-24.

DEAHAENE, Stanislas. A aprendizagem da leitura modifica as redes corticais da visão

e da linguagem verba. Letras de Hoje. Porto Alegre, v. 48, n. 1, p. 148-152, jan./mar.

2013.

__________.Os neurônios da leitura. Porto Alegre: Penso, 2012.

DISTRITO FEDERAL. Diretrizes pedagógicas: Bloco inicial de alfabetização. 2. ed.

2012. Versão Revisada. Disponível em:

<http://www.cre.se.df.gov.br/ascom/documentos/public/diretrizes_pedag_2012.pdf>.

Acesso em: 29 sets 2016.

FERREIRA, V.J.A. Dislexia e Outros Distúrbios da Leitura-Escrita. In: Zorzi, J.;

Capellini, S. Organização Funcional do Cérebro no Processo de Aprender. 2 ed. São

José dos Campos: Pulso, 2009.

FERREIRO, Emilia; Teberosk, Ana. A Psicogênese da língua escrita. Porto Alegre:

Artes Medicas 1985.

18

FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. São

Paulo: Cortez ; Autores Associados, 1982.

GAZZANIGA, Michael S.; IVRY, Richard B.; MANGUN, G. R. Neurociência

cognitiva: a biologia da mente. 2. ed. Porto Alegre, RS: Grupo A Educação S/A, 2006.

GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002.

HENNEMANN, Ana Lúcia. O ato de escrever a mão é um exercício para o cérebro.

Neurociências em Benefício da Educação. Disponível em

<http://neuropsicopedagogianasaladeaula.blogspot.com.br/2012/10/o-ato-de-escrever-

mao-e-um-exercicio.html>. Acesso em: 28 de mai 2017.

__________.O surgimento da Neuroeducação. Meu cérebro. Disponível em:

<http://meucerebro.com/o-surgimento-da-neuroeducacao/#comments> . Acesso em: 15

out 2016.

IZQUIERDO, Ivan. Memória. Porto Alegre: Artmed, 2002.

LENT, Roberto. Cem bilhões de neurônios: conceitos fundamentais de

neurociência. Edição revista e atualizada. São Paulo, SP: Atheneu, 2005.

LIMA, Elvira Souza. Escrita para todos - a aplicação da neurociência na docência e na

aprendizagem. São Paulo. CEPAOS - Centro de Estudos e Pesquisas Armando de

Oliveira Souza. Jan. 2013. Disponível em:

<http://media.wix.com/ugd/f084a8_be376c678c6afa7c93a5be4743e2d3fc.pdf>. Acesso

em: 16 out 2016.

MALHEIROS, Bruno Taranto. Metodologia da pesquisa em educacao. Rio de

Janeiro: LTC, 2011.

MARICATO, Cristiane Carminati. Educação cognitiva: do que se trata? Portal da

Educação. Jan. 2013. Disponível em:

<https://www.portaleducacao.com.br/pedagogia/artigos/30088/educacao-cognitiva-do-

que-se-trata>. Acesso em: 16 out 2016.

MEDEIROS, Mário; BEZERRA, Edileuza de Lima. Contribuições das neurociências ao

processo de alfabetização e letramento em uma prática do Projeto Alfabetizar com

Sucesso. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. 2015, v.96, n.242, pp.26-41.

ISSN 2176-6681. Disponível em:

<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_abstract&pid=S2176-

66812015000100026&lng=en&nrm=iso&tlng=pt>. Acesso em: 18 jun 2016.

MICHEL, Maria Helena. Metodologia e pesquisa científica em ciências sociais. 2.

ed. São Paulo: Atlas, 2009.

MORAIS, José; KOLINSKY, Régine. Letramento e mudanca cognitiva. IN: Margaret J.

Snowling, Charles Hulme. Org(s). A ciência da leitura. Porto Alegre: Penso, 2013.

p.202-222.

NORONHA, Fátima. Contribuições da Neurociência para a Formação de

Professores. Neurociências em Benifíco da Educação, 27 de set. 2012. Disponível em:

19

<http://neuropsicopedagogianasaladeaula.blogspot.com.br/2012/09/contribuicoes-da-

neurociencia-para.html>. Acesso em: 15 out 2016.

OLIVEIRA, Gilberto Gonçalves. Neurociência e os processos educativos: um saber

necessário na formação de professores. Uberaba, 2011. Disponível em:

<http://www.uniube.br/biblioteca/novo/base/teses/BU000205300.pdf> . Acesso em: 29

set 2016.

__________.Neurociências e os processos educativos: um saber necessário na formação

de professores. Educação Unisinos. V. 18, n. 1, janeiro/abril 2014. Disponível em:

<http://revistas.unisinos.br/index.php/educacao/article/viewFile/edu.2014.181.02/3987>

. Acesso em: 25 de mai 2017.

OLIVEIRA, João Batista Araújo e. Alfabetização de crianças e adultos novos

parâmetros. Belo Horizonte: Alfa Educativa, 2004.

SCLIAR-CABRAL, L. Evidências a favor da reciclagem neuronal para a alfabetização.

Letras de Hoje. Porto Alegre, v. 45, n. 3, p. 43-47, jul./set. 2010.

SEBRA, Alessandra Gotuzo; DIAS, Natália Martins. Métodos de alfabetização:

delimitação de procedimentos e considerações para uma prática eficaz. Revista

psicopedagogia. V. 28, n.87. São Paulo, 2011. Disponível em:

<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-

84862011000300011>. Acesso em: 13 set 2016.

SOUZA, Neiva Veiga. A leitura na escola. Como a escola motiva nos educandos o

prazer pela leitura? 2009. Disponível em:

<http://www.uff.br/ciclosmemoriasdocentes/images/stories/monografias/Monografia_N

eiva_Veiga_Souza.pdf>. Acesso em: 25 mai 2017.

SILVA, Fiderisa da; MORINO, Carlos Richard Ibãnez. Importância das

neurociências na formação de professores. Momento, Rio Grande, 21 (1): 29-50,

2012. Disponível em: <https://seer.furg.br/momento/article/viewFile/2478/2195>.

Acesso em: 16 out 2016.

VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo. Ltda. 1998.