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PRIMEIRA SEÇÃO

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PRIMEIRA SEÇÃO

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EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL N2 56.666-3 - SP

(Registro n 2 95.0019208-0)

Relator: O Sr. Ministro Hélio Mosimann

Embargante: Fazenda do Estado de São Paulo

Advogado: Elias Alasmar Junior e outros

Embargado: Rossafa Veículos Ltda.

Advogado: Mário Coraini Junior

EMENTA: Embargos de divergência. Tributário. ICMS. Venda de veículos automotores. Recolhimento antecipado. Regime de substi­tuição tributária. Convênios 66/88 e 107/89. Legitimidade da exigên­cia. Votos vencidos.

Não obstante a controvérsia existente em torno do tema, consi­dera-se legítima a exigência do recolhimento antecipado, do ICMS, na venda de veículos automotores, pelo chamado regime de subs­tituição tributária.

Embargos de divergência recebidos, por maioria de votos.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Ministros da Primeira Seção do Superior 'llibunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas a se­guir, por maioria, vencidos os Srs. Ministros Demócrito Reinaldo (voto­vista), Humberto Gomes de Barros,

Milton Luiz Pereira e Cesar Asfor Rocha, receber os embargos nos ter­mos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Peçanha Martins, América Luz, Antônio de Pádua Ri­beiro e Garcia Vieira (voto-desempa­te) votaram com o Sr. Ministro-Re­lator.

Brasília, 20 de junho de 1995 (da­ta do julgamento).

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 15-68, fevereiro 1996. 17

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Ministro GARCIA VIEIRA, Presi­dente. Ministro HÉLIO MOSIMANN, Relator.

Publicado no DJ 09-10-95.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO HÉLIO MOSI­MANN: Cuida-se do problema rela­tivo à substituição tributária, discu­tindo-se quanto à inexigência do re­colhimento antecipado do ICMS, so­bre operações de vendas de veículos automotores (Convênios 66/88 e 107/89).

Divergindo as duas 'furmas da Se­ção de Direito Público na solução do litígio, como ficou claramente de­monstrado, admiti os embargos, pa­ra discussão, na forma regimental, abrindo vista para impugnação.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO HÉLIO MOSI­MANN (Relator): Sendo a questão conhecida e já tendo proferido diver­sos votos a respeito, reporto-me, en­tre outros, ao voto proferido nos Em­bargos de Divergência no Recurso Especial n!! 30.269-0-SP, fazendo juntada de cópia a estes autos.

Em conclusão, e pelos mesmos fundamentos, recebo os presentes embargos.

É como voto.

"ANEXO

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL

N!! 30.269-0-SP

VOTO

O SR. MINISTRO HÉLIO MOSI­MANN: Discute-se, nestes autos, quanto à legitimidade da Fazenda do Estado de São Paulo para inte­grar relação jurídica, na qual se ob­jetiva a inexigência do recolhimen­to antecipado do ICMS, sobre opera­ções de vendas de veículos automo­tores, em decorrência do regime de substituição tributária.

A divergência está, realmente, de­monstrada pelos acórdãos trazidos a confronto.

Matéria idêntica, analisando o mesmo dissídio, já foi trazida a exa­me desta Seção de Direito Público, em pelo menos duas vezes, no julga­mento dos Embargos de Divergência nos Recursos Especiais n"ºª" 50.884-SP (reI. Min. Cesar Rocha) e 51.967-SP (reI. Min. Gomes de Barros).

Em ambas as oportunidades (Ses­são de 18.04.95), mantive o entendi­mento que tem prevalecido, invaria­velmente e por votação uniforme na Segunda 'Duma. Votei acolhendo o recurso manifestado pela Fazenda do Estado.

Os acórdãos trazidos a confronto oferecem as razões do entendimento.

18 R. Sup. 'frib. Just., Brasília, a. 8, (78): 15-68, fevereiro 1996.

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A exigência do pagamento anteci­pado do ICMS nada tem de ilegal ou inconstitucional, concluiu no voto pe­rante a 'furma o Ministro Peçanha Martins - "A uma, porque o Decre­to-Lei n'! 406168, reconhecido como lei complementar, está recepcionado na Nova Carta. A duas, porque am­parada nos Convênios 66188 e 1071 89, editados de acordo com o art. 34, § 82, do ADCT".

O voto do Ministro José de Jesus, por sua vez, após se apoiar na deci­são do tribunal de origem, deixou bem claro:

"lenho como irretorquÍvel a v. de­cisão supratranscrita posto que em consonância com a jurisprudência desta Corte que, ao apreciar o Re­curso Especial n2 35.547-8/SP, ReI. o eminente Ministro Garcia Viei­ra, in DJ de 11.10.93, decidiu ma­téria semelhante, conforme se vê de sua ementa, verbis:

"ICMS - Véículos - Substitui­ção tributária - Sujeitos pas­sivos - Ocorrência do fato ge­rador.

O industrial, o comerciante ou o prestador de serviço, relativa­mente ao imposto devido pelas anteriores ou subseqüentes saí­das de mercadorias ou presta­ções de serviço, são sujeitos passivos por substituição.

Com o pagamento antecipado não ocorre o recolhimento do imposto antes da ocorrência do

fato gerador. O momento da in­cidência da lei não se confunde com a cobrança do tributo. O fato gerador do IeM é a saída da mercadoria do estabeleci­mento do contribuinte.

Recurso provido."

"Naquela aportunidade, assim se pronunciou o preclaro Relator:

"O regime de substituição tri­butária é previsto pela própria Constituição Federal vigente (artigo 155, inciso XII, letra b), nas leis e convênios firmados pelos Estados, com base no ar­tigo 34, parágrafos 32 e 82 do ADCT. No Estado de São Pau­lo, o regime de sujeição passi­va, de pagamento antecipado é previsto pelo artigo 82, item XII, segundo o qual, são sujei­tos passivos por substituição:

"o industrial, o comerciante ou o prestador do serviço, re­lativamente ao imposto devi­do pelas anteriores ou subse­qüentes saídas de mercado­rias ou prestações de serviço, promovidas por quaisquer outros contribuintes."

Já o convênio n2 66/88, artigo 25, item I, estabelece que a lei poderá atribuir a condição de substituto tributário a:

"industrial, comerciante ou outra categoria de contribuin-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 15-68, fevereiro 1996. 19

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tes, pelo pagamento do im­posto devido na operação ou operações anteriores."

Este Convênio, com força de lei complementar (ADCT, artigo 34, parágrafo 8~), autorizou os Estados a "exigir o pagamento antecipado do imposto, com a fixação, se for o caso, do valor da operação ou da prestação subseqüente a ser efetuada pe­lo próprio contribuinte" (artigo 2~, parágrafo 3~).

A lei estadual e o convênio ci­tados não contrariam os artigos 121 e 128 do CTN e com eles se harmonizam, na instituição des­ta substituição tributária, sen­do legítima a exigência fiscal, com base na lei estadual edita­da com suporte no citado Con­vênio n~ 66/88. Neste sentido o Recurso Especial n~ 9.587-SP, Relator Eminente Ministro Il­mar Galvão, hoje membro do STF, DJ de 10/06/91. A Excel­sa Corte, nos Recursos Extraor­dinários nQ§. 108.104, DJ de 14/08/87 e 107.104-0-ES, DJ de 14/08/84, Relator Eminente Mi­nistro Célio Borja, em casos de mercadorias destinadas a ou­tros Estados, entendeu legítimo o pagamento antecipado do ICM, previsto na legislação es­tadual.

Com o pagamento antecipado, não ocorre o recolhimento do imposto antes da ocorrência do fato gerador. Não se pode con­fundir momento da incidência

do tributo com a sua cobrança. Ocorre o fato gerador do ICM na saída da mercadoria do es­tabelecimento do contribuinte. No caso, quando são vendidos

. os veículos automotores ou suas peças. A sua cobrança é a última fase concreta. Nos ter­mos da Lei Estadual n~ 6.374/ 89, artigo 2~, inciso I e o do Convênio n~ 66/88, artigo 2~, in­ciso V, ocorre o fato gerador do imposto na saída da mercado­ria do estabelecimento contri­buinte. É claro que esta substi­tuição e antecipação, acolhida pela doutrina e por nossos Tri­bunais, tem de ser autorizada por lei (artigo 121, inciso II do CTN) e a terceira pessoa deve ser vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação (artigo 128 do CTN), mas, no caso em exame estas condições estão amplamente satisfeitas.

Com base nos poderes amplos a eles conferidos pelo artigo 34, parágrafo 3~ e 8~ do ADCT, os Estados têm "competência le­gislativa plena" (artigo 6~ do CTN) e podiam estabelecer o pagamento antecipado do ICM, inclusive na venda de veículos automotores e suas peças. Es­te pagamento antecipado é, também, adotado no IPI e já era no antigo IVC. Este Sup~­rior Tribunal de Justiça, no Re­curso Especial n~ 1.562-0-PR, DJ de 17/12/92, Relator Emi­nente Ministro Peçanha Mar­tins, entendeu que:

R. Sup. 'Ii:ib. Just., Brasília, a. 8, (78): 15-68, fevereiro 1996.

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"A exigência antecipada do ICMS, na venda de veículos automotores, não se reveste de ilegalidade ou abusivida­de."

Quando a lei atribui a condição de sustituto tributário, ao co­merciante, como no caso con­creto, a base de cálculo do ICM é o ''preço máximo, ou único de venda do contribuinte substi­tuído, fixado pelo fabricante ou pela autoridade competente, ou na falta deste preço, o valor da operação praticado pelo substi­tuído ... " (Convênio ne:! 66/88, ar­tigo 17). Com isto previu a substituição tributária e auto­rizou a adoção do pagamento antecipado, previsto também nos seus artigos 2e:!, parágrafo 3 e:! , e 15 e na Lei Estadual ne:! 6.374/89, artigos 24, parágrafo 4e:! e 60."

Diante do exposto, conheço dos embargos e os recebo, para prevale­cer a posição da Segunda Turma."

É o voto.

VOTO

O SR. MINISTRO PEÇANHA MARTINS: Senhor Presidente, meu voto é idêntico ao proferido nos EREsp ne:! 39.413-7-SP, da relatoria do Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, julgado nesta assentada. Acompanho o Relator.

VOTO-VISTA

O SR. MINISTRO DEMÓCRITO REINALDO: Senhores Ministros, data venia, fico vencido. Farei jun­tar voto proferido nesta assentada.

É como voto.

"ANEXO

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL

Ne:! 34.781-3 - SP

VOTO - VISTA

O SR. MINISTRO DEMÓCRITO REINALDO: Senhores Ministros:

A hipótese configura um recurso de embargos, em que as egrégias Primeira e Segunda Turmas diver­gem sobre a conhecida questão da Substituição 'Iributária, na venda de veículos automotores, ou, em outras palavras: se o industrial é ou não sujeito passivo por Substituição, re­lativamente ao ICMS devido pelas subseqüentes saídas de mercadorias ou prestação de serviços, em face do Convênio ne:! 66/88 (e 107/89) e de le­gislação dos Estados da Federação.

O Ministro-Relator recebe os em­bargos, para que prevaleça o enten­dimento da Colenda Segunda Tur­ma, que entende com possível com a legislação federal vigente (Dec. Lei ne:! 406/68 e CTN) a denominada substituição tributária para frente, em que, as montadoras de automó­veis ficam obrigadas ao pagamento

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do tributo (ICMS) correspondente às saídas desses veículos, quando da alienação aos consumidores (como responsáveis por substituição, con­comitantemente com essas saídas, estão compelidos ao recolhimento do ICMS relativo às operações futuras (ou presumidas) que subseqüente­mente se realizarão entre os reven­dedores e os consumidores finais).

Pedi vista do processo por se me afigurar ilegal a exação. É o enten­dimento que venho sustentando na egrégia Primeira 'furma, a começar o julgamento do REsp n2 39.195-4, que restou assim ementado:

"Constitucional. Tributário. ICMS. Leis complementares (De­creto-Lei n!? 406/68 e Código Tri­butário Nacional). Preexistentes à Constituição Federal e por ela re­cepcionadas. Convênios estaduais disciplinando a substituição tribu­tária (66/88 e 107/89) e conflitan­do com a legislação em vigor. Im­possibilidade.

No sistema jurídico-constitucio­nal brasileiro, a promulgação de nova Constituição não acarreta, ipso facto, a ineficácia (ou revo­gação) da legislação preexistente, derrogando só aquela que, com ela, se mostre incompatível.

Por não conflitarem com a Car­ta Política de 1988, continuam em vigor, com hierarquia de Leis Complementares, o Decreto-lei n2

406/68 e o Código Tributário Na­cional, no pertinente à disciplina do ICM (ICMS), o respectivo fato

gerador e a base de cálculo (§ 52, do artigo 34 do ADCT).

Consoante a legislação em vi­gor (recepcionada pela Constitui­ção), o sujeito passivo da obriga­ção tributária, em princípio, deve ser aquele que praticou o ato des­crito como núcleo do "fato gera­dor" - ao qual é imputável a au­toria do fato imponível.

O substituto tributário, em fa­ce da disciplina da legislação tri­butária (CTN, artigo 128), deverá ser sempre alguém "vinculado" ao "fato gerador", sendo de todo inca­bível que algum devedor ("estra­nho" em relação ao ato imponível) substitua outro que ainda não se­ja contribuinte relativamente à operação considerada.

O Convênio n2 66/88 (e 107/89), a pretexto de disciplinar o institu­to da substituição tributária, já definido em Lei Complementar (CTN, artigo 128), institui hipóte­se de "antecipação" do ICMS, nas operações de venda de veículos automotores, em que: a) a base de cálculo é fundada em fictício e es­timado valor da tabela; b) o paga­mento do tributo (ICMS) é exigi­do antes da ocorrência do fato ge­rador, em concreto; c) o substitu­to tributário é um terceiro estra­nho ao fato imponível.

Ao instituir, in casu, a subs­tituição tributária, mediante a antecipação do recolhimento do ICMS, o Convênio n 2 66/88 des­bordou-se da legislação de regên­cia (Decreto-lei n 2 406/68, arti-

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vi:

go I!!, § I!! e artigos 52 e 128 do CTN), quando se sabe, que por determinação de regra transitó­ria da Carta Política (artigo 34, § 8!! do ADCT), tem a função de re­gulamentar provisoriamente a in­cidência do ICMS tão-só no di­zente às lacunas existentes (na legislação recepcionada) e sobre matéria tratada em Lei Comple­mentar não recebida, no todo ou em parte, pela Constituição Fede­ral.

Recurso improvido, por unani­midade".

E, no contexto do acórdão, escre-

"O artigo 34, § 8!! do ADCT es­tabeleceu que, em caráter provi­sório e até a promulgação de Lei Complementar, os Estados edita­riam convênio, necessário à ins­tituição do ICMS, nos termos da Lei Complementar n!! 24/75. Com base nessa disposição, os Estados e o Distrito Federal firmaram o Convênio n!! 66/88, que, dentre outras providências, definiu os casos de "substituição" tributária. No Estado de São Paulo, o Decre­to n!! 31.578/90, embasado em lei daquela Unidade Federativa, criou a hipótese de substituição.

Ocorre que, o Convênio n!! 66/ 88 (como o de n!! 107/89) criou, a pretexto de disciplinar o institu­to da substituição tributária, uma hipótese de "antecipação" do ICMS, nas operações de venda de veículos automotores, em que:

a) a base de cálculo (do ICMS) é fundada em fictício e estimado valor de "tabela",

b) determinou a exigência do tributo antes da ocorrência do fa­to gerador, em concreto;

c) definiu, como substituto tri­butário, um terceiro sem qual­quer vínculo com o fato imponí­vel.

O ponto nodal da questão con­siste em saber-se se as disposi­ções do Convênio 66/88 (107/89) encontram base legal (e, até, cons­titucional) para a instituição da substituição tributária, nos moldes em que foi disciplinada. O meu en­tendimento, aliás, já esposado quando do julgamento do REsp n 2

31.386-0-SP, com o apoiamento da unanimidade da 1~ Turma é o de que, nem o convênio, nem a lei es­tadual poderiam dispor sobre a ocorrência do fato gerador do im­posto, nem alterar a sua base de cálculo e determinar-lhe o recolhi­mento antecipado (para momento anterior à ocorrência do fato im­ponível), contrariando dispositivos do Decreto-lei n 2 406/68 e do Có­digo Tributário Nacional (artigos 121 e 128). Na ausência da Lei Complementar (artigo 34, § 82 do ADCT), os Estados poderão cele­brar convênios para regulamentar provisoriamente o ICMS, mas, tão-só, no que diz respeito às "la­cunas" existentes e sobre matéria tratada em dispositivos de Lei Complementar (Decreto-lei n 2 406 e CTN) que não foi recepcionada,

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no todo ou em parte, pela Carta Magna.

Com efeito, no sistema jurídi­co-constitucional brasileiro, a pro­mulgação de nova Constituição não acarreta, ipso facto, a inefi­cácia da legislação preexistente, mas, somente derroga aquela que, com ela, se mostre incompa­tível. Embora essa concepção constitua um princípio de herme­nêutica, o legislador constituinte, em relação às questões tributá­rias, foi cauteloso, ou, até mesmo redundante, ao estabelecer no pa­rágrafo 5~ do mesmo artigo 34 do ADCT, verbis:

"§ 52 - Vigente o novo sis­tema tributário nacional, fica assegurada a aplicação da le­gislação anterior, no que não seja incompatível com ele e com a legislação referida nos §§ 32 e 42."

o Constituinte, ao editar o pa­rágrafo citado (52) pretendeu dei­xar absolutamente claro o princí­pio da "recepção", isto é, que a le­gislação tributária preexistente continua em vigor, salvante na­quilo que conflitasse com a nova ordem. Portanto, o Decreto-lei n2

406/68 e o Código Tributário Na­cional, que são Leis Complementa­res Federais estão em vigor, por determinação mesma da Constitui­ção (salvante nos pontos que, com ela, foram incongruentes). Destar­te, a teor de regras constitucionais,

somente a Lei Complementar po­derá estabelecer normas gerais sobre o fato gerador e base de cálculo, não podendo a competên­cia para legislar sobre estas ma­térias, ser conferida aos Estados, pela via do Convênio. Neste sen­tido estão cônsones a doutrina e a jurisprudência, inclusive do Su­premo Tribunal Federal, como se verá, adiante.

Na falta de Lei Complementar, escreveu Ives Gandra Martins, "editada para a instituição do ICMS no prazo de sessenta (60) dias contados da promulgação da Constituição, as Disposições Tran­sitórias autorizam os Estados a fi­xar normas para regular proviso­riamente a matéria. 'Thl autoriza­ção, à evidência, só pode versar so­bre as lacunas existentes e sobre os dispositivos de lei complemen­tar anterior não recepcionados. Entretanto, o dispositivo entusias­mou de tal forma os Senhores Se­cretários da Fazenda dos Estados que eles produziram um convênio inconstitucional (66/88), com ca­racterísticas de confuso regula­mento. Não há nele nem estrutu­ra, nem perfil de Lei Complemen­tar (in Sistema Tributário na Constituição de 1988, Saraiva, 1989, pág. 288). Com igual enten­dimento, preleciona Alcides Jor­ge Costa:

''Vigente o novo sistema tri­butário, fica assegurada a apli­cação da legislação anterior no que não seja incompatível com

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ele ou com a legislação nova que for feita. Vejam que aqui já está dada a competência ex­pressa aos Estados para editar as leis necessárias, mesmo ine­xistentes as Leis Complemen­tares. Mais ainda, em matéria de ICM, há um dispositivo es­pecífico que me parece alta­mente perigoso que é o § 82 do artigo 34 das Disposições 'fran­sitórias: se no prazo de 60 dias, contados da promulgação da Constituição, não for editada a Lei Complementar necessária à instituição do ICM, os Estados e o Distrito Federal, mediante convênio celebrado nos termos da Lei Complementar n2 24, de 1975, fixando normas para re­gular provisoriamente a maté­ria. Ou seja, imprudentemente a meu ver, o constituinte deu ao Poder Executivo dos Estados (pois, a Lei Complementar 24/ 75 exclui o Poder Legislativo) a possibilidade de fazer um cor­po de normas gerais que deve­ria constar de uma Lei Com­plementar. É verdade que se diz: normas para regular provi­soriamente a matéria. Mas não sabemos quanto tempo vai du­rar o provisório. E acho que is­so foi uma imprudência por duas razões: primeiro porque é incompatível com todo o resto da Constituição que restabele­ce as prerrogativas do Poder Legislativo. Segundo porque in­felizmente muitas vezes os Executivos Estaduais deixam-

se levar por considerações me­ramente arrecadatórias sem olharem um pouquinho à fren­te para ver os efeitos econômi­cos dos impostos ou da forma pela qual pretende cobrá-los" (A Constituição Brasileira de 1988, págs. 324/325).

Essa é a exegese mais consen­tânea com o sistema tributário vi­gente. A Constituição, prevê a possibilidade de convênios, na ór­bita dos Estados, se refere à omis­são de Lei Complementar para a "instituição" do imposto de que trata o art. 155, I, b. Instituir sig­nifica "criar, fundar, estabelecer, organizar". Só se cria o que "ine­xiste". A Constituição, por isso mesmo, ao permitir, aos Estados, a fixação de normas, através de Convênio, referiu-se a impostos "novos", previstos na própria Carta e que, por essa razão, não tinham disciplinamento em Lei Complementar ou ordinária. E o artigo 155, I, b, atribui, aos Esta­dos, não só o ICMS, como o "im­posto sobre prestação de serviços de transporte intermunicipal e de comunicação". Foi em relação a esse último tributo - a incidir so­bre serviços de transporte e comu­nicação - somente nascido com a promulgação da Carta, que o cons­tituinte outorgou a regulação pro­visória, através de convênio. En­tretanto, em relação ao ICM, já existia, antes da Constituição, to­da uma legislação disciplinadora (Código 'fributário Nacional e De-

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creto-Iei n!! 406/68), dispensando­se, por óbvio, a regulamentação por convênio. E essa legislação foi re­cepcionada (art. 34, § 5!! do ADCT). Nesta Corte, as 1~ e 2~ 'furmas já se manifestaram em igual sentido:

"'llibutário. Importação. ICMS. Recolhimento. Momento do Fa­to Gerador. Convênio ICM 66/ 88. Art. 34, § 8!! do ADCT. De­creto-lei n!! 406/68.

Não prevalece, diante do que preceitua o artigo I!! do De­creto-lei n!! 406/68, diploma legal recepcionado pela atual Constituição Federal, a exigên­cia do recolhimento do tributo em questão por ocasião do de­sembaraço aduaneiro, introdu­zida pelo convênio acima aludi­do.

Recurso provido. " (REsp n!! 7.582-0-RJ - ReI. Min. Améri­co Luz - DJU de 27.5.91, pág. 6.948).

Em igual sentido o REsp n!! 14.410-0-RJ, ReI. Min. Garcia Vieira.

Também, o STF já se pronun­ciou, vezes seguidas, contraria­mente à antecipação do ICM:

"ICM. Venda à ordem ou a prazo para entrega futura. Pa­gamento antecipado.

I - O art. I!! do Decreto-lei n!! 406/68, igual ao art. 52 do CTN, estabelece taxativamen­te três situações para caracte-

rizar o fato gerador do ICM, nelas não incluindo negócio ju­rídico de venda à ordem para futura saída, que pode aconte­cer ou não.

II - Exigindo antecipação do pagamento do ICM, antes da saída, porque negociada a venda para futura entrega, o art. 79 do Decreto-lei n!! 47.763/67-SP, negou vigência ao art. I!!, § I!!, do Decreto-lei n!! 406/68 ou art. 52, § I!! do CTN, pois a tanto equivale fazer o que a lei veda.

III - Instituir antecipação de pagamento de imposto, an­tes de constituir-se o crédito respectivo, porque ainda não ocorreu o fato gerador da obri­gação fiscal, é o mesmo que de­cretar o Estado empréstimo compulsório inconstitucional, porque negado à sua competên­cia (CF de 1969, art. 18, § 3!!). (RTJ, voI. 67/445)."

Parece-me, ainda, que, em face das disposições legais em vigor (Decreto-lei n!! 406/68 e arts. 121 e 128 do CTN), o Convênio não poderia criar a figura do "substi­tuto" tributário, na forma preco­nizada.

Como afiançam os juristas, in­terpretando a legislação tributá­ria citada, o sujeito passivo da obrigação tributária, em princípio "deve ser aquele que praticou a situação descrita como núcleo do fato gerador, aquele a quem pode

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ser imputada a autoria ou titula­ridade passiva do fato imponível". Em outras palavras: "deve ser a pessoa ligada à situação descrita como fato gerador". Em princípio, a própria pessoa que realizou, mas, se condições técnicas exigi­rem a eleição de outrem, ainda assim deverá ser alguém "vincu­lado" àquela mesma situação (sentença, fls. 146). Como bem sa­lientou o arguto Juiz de primeiro grau, no contexto de sua judicio­sa decisão, "o "substituto" tribu­tário poderá ser qualquer pessoa vinculada ao fato gerador. Deve participar da operação que desen­cadeia a incidência da norma tri­butária (art. 128 do CTN). Assim, poderá ser qualquer pessoa liga­da ao fato gerador, cabendo à lei eleger quem melhor atenda aos seus anseios". E, continuando o seu raciocínio, preleciona o douto juiz: "o substituto legal tributário não pode ser pessoa dissociada, estranha e sem relação com o fa­to gerador. Deve guardar estreita ligação com este, pois, o nosso or­denamento consagrou o princípio da capacidade tributária, não só como norma programática, mas como verdadeiro parâmetro limi­tador da atuação do legislador or­dinário. No caso sub examine, o fabricante vende o produto e des­taca na "nota fiscal" o imposto so­bre o valor da operação, e, além disto, destaca o ICMS sobre o va­lor da margem de lucro estimada do revendedor (valor da tabela). O Decreto tenta fazer com que a in-

dústria substitua o revendedor na sua tarefa de recolher o tributo aos cofres públicos. Identifica-se, ao caso, a vinculação jurídica e econômica entre as pessoas envol­vidas. No entanto, forçoso é reco­nhecer que tal vinculação não po­de se dirigir para o futuro, para operações "subseqüentes", sendo de todo incabível que algum con­tribuinte substitua outro que ain­da não seja contribuinte em rela­ção à operação considerada" (fls. 148)".

Acrescento que, na hipótese, não está em causa a Emenda Constitu­cional n~ 3/93, visto como, todos os casos de substituição tributária jul­gados, nesta Corte, são anteriores àquela Emenda. A pendenga, assim, há de lograr desate com base na in­terpretação da legislação comple­mentar (Dec. Lei 406/68 e Código Tributário N acionaI) recepcionada pela C. Federal e dos Convênios edi­tados por força de normas das Dis­posições Transitórias da Lei Maior.

Desvaliosa, ainda, a falaciosa ar­gumentação sobre concluir que, na "substituição tributária para a fren­te", não existe antecipação do tribu­to, que é exigido antes da ocorrência do fato gerador.

Com efeito, de acordo com a legis­lação estadual (e os Convênios n illi 66 e 107), as montadoras, que comercia­lizam veículos automotores, estão obrigadas ao pagamento antecipado do ICMS, na saída de veículos novos e com destino a outros estabeleci­mentos, ficando, ademais, responsá-

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veis (na condição de substitutos tri­butários) pelo pagamento do ICMS incidente nas subseqüentes saídas. O ICMS é exigido sobre as operações entre as revendedoras e os consumi­dores [mais, operações estas ainda não ocorridas (mas, que, hipotetica­mente, poderão se realizar).

Como é curial, "se o fato gerador do ICMS, no caso, é a saída da mer­cadoria do estabelecimento do contri­buinte, as montadoras não podem recolher esse tributo em relação às operações que, no futuro, se verifica­rão entre as revendedoras e o consu­midor final. Do contrário, estar-se­ia a exigir tributo sem fato gerador e, de conseguinte, sem obrigações tributárias.

Fato gerador, na definição legal (art. 114 do CTN) é a situação defi­nida em lei como necessária e sufi­ciente à sua ocorrência". A incidên­cia, como ensinam os tributaristas, pressupõe a ocorrência (a efetivação do fato gerador). "O recolhimento do tributo não incidente, nem ocorrido seu fato gerador, seria flagrante­mente inconstitucional" (Ives Gan­dra Martins - Pareceres, pág. 157).

Sobre a tormentosa questão, es­clarece Gilberto de Ulhôa Canto:

"A substituição tributária é permitida pelo Código Tributário Nacional, nos arts. 121 e 128. Ou­tra coisa, entretanto é a chamada substituição para frente, em que o legislador elege o contribuinte natural de uma obrigação tributá-

ria já ocorrida responsável por um crédito que poderá resultar de obrigação tributária futura e in­certa, como na hipótese de trans­ferência, ao fabricante, da respon­sabilidade pela operação que o va­rejista for realizar com o produto na fase de sua entrega ao consu­midor final. Nesse caso, a lei de­fine, por antecipação, o sujeito passivo de uma obrigação tributá­ria não ocorrida, e obriga o fabri­cante a pagar tributo sobre uma base de incidência irreal, também de operação mediante estimativa. O STF teve oportunidade de se pronunciar sobre a questão ... No RE n!! 77.462 prevaleceu o enten­dimento do Relator, Xavier de Al­buquerque, de que, após a revoga­ção do art. 58, § 2!! do CTN pelo Decreto-Lei n!! 406/68, somente restou a possibilidade de atribui­ção a terceiro de responsabilidade tributária nos termos do art. 128 do CTN, que subordina a existên­cia de relação entre esse terceiro e o fato gerador da obrigação, si­tuação que não se verifica na substituição para a frente" (RTJ, voI. 73/507; voI. 73/530; voI. 75/ 177; voI. 82/260).

Em trabalho doutrinário - Des­locamento do Fato Gerador - o tri­butarista Antônio Fernando Sea­bra escreveu:

"A substituição tributária des­natura o imposto sobre circulação de mercadorias, pelos motivos abaixo expostos:

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A venda feita pelo industrial ou atacadista, ao varejista, é distin­ta da posteriormente realizada por este, ao consumidor, não po­dendo a última gerar responsabi­lidade tributária para o industrial ou atacadista.

Os fatos imponíveis não se con­fundem, pois são isoladamente perfeitos e acabados, encontrando­se o industrial e o atacadista des­vinculados do fato gerador surgi­do com a operação de venda do varejista ao consumidor.

Ao exigir do substituto o reco­lhimento do tributo relativamen­te à operação subseqüente, antes da ocorrência do fato imponível, está o Estado instituindo um em­préstimo compulsório inconstitu­cional, porque negada a sua com­petência" .

N a mesma linha de entendimen­to, proclamou Roberto Siqueira Campos:

"à luz da Constituição e do CTN não há empecilho para que o legislador institua a figura do responsável tributário. 'Ibdavia, o que não se pode admitir, sob pe­na de desrespeito às normas de estrutura do ordenamento jurídi­co, é que este responsável fique obrigado, por antecipação, à ocor­rência de um futuro fato gerador, a calcular o imposto sobre grande­zas econômicas não definidas, tal­vez até estampadas, e em seguida efetuar o seu recolhimento, sem que os pressupostos do nascimen-

to da obrigação tributária tenham ocorrido" (Revista de Direito Tri­butário, n!! 52/239).

Ricardo Mariz de Oliveira é mais incisivo:

"Pudesse o legislador instituir tributo para ser devido antes de verificada existente a materialida­de do fato de tributação, ruiria to­do o sistema tributário constitu­cional de rendas. Uma tal exação substancialmente se caracteriza­ria como verdadeiro empréstimo compulsório, cuja instituição so­mente se legitima nos estreitos li­mites do art. 148 de C. da Repú­blica. É pelas mesmas razões que seria inviável a pretensão de co­brança do ICMS em momento an­terior à ocorrência de qualquer circulação mercantil ou prestação de serviços" (Repertório IOB de Jurisprudência, 390/42).

Hugo de Brito Machado, dis­sertando, especificamente, sobre a substituição tributária, adverte:

"O princípio da não cumulativi­dade, ao qual, em nosso direito, submetem-se o IPI e o ICMS, não autoriza a cobrança antecipada do imposto".

Gustavo Miguel de Mello, mes­mo analisando a legislação comple­mentar, relacionando-a com a E. Constitucional n!! 3/93, prelaciona:

"O dispositivo acima, se valida­do, destruiria completamente o

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sistema constitucional tributário, ao eliminar a ocorrência do fato gerador como pressuposto essen­cial para a atribuição de compe­tência tributária, identificação do momento em que nasce a obriga­ção tributária principal, determi­nação do seu sujeito passivo, fi­xação da ocorrência ou não ocor­rência de incidência, não incidên­cia e isenção, do regime jurídico da obrigação tributária: alíquota, base de cálculo etc" (Princípios Constitucionais Tributários, pág. 139).

Marçal Justeu Filho preleciona:

"A antecipação da exigibilidade do tributo se faria sob a forma da chamada substituição tributária para frente, utilizada freqüente­mente no âmbito de distribuição de combustíveis, de bebidas, de veículos, etc. Na substituição tri­butária para frente, um determi­nado sujeito torna-se devedor da prestação tributária própria e, ademais, daquela correspondente a operações futuras e incertas que envolverão o mesmo bem ou ser­viço. Ao instituir a substituição tributária para frente, o Fisco dis­ciplina a base imponível, estiman­do valores para as futuras opera­ções. Isso é inconstitucional e inadmissível, encontrando três or­dens de impedimentos jurídicos: a) a desnaturação da hipótese de incidência tributária;

b) a exigência do pagamento da prestação tributária em momen-

to anterior à ocorrência do fato gerador, enfrentando enormes obstáculos jurídicos;

c) a hipótese de incidência é nem todo incidível e insecionável" (Cadernos de Pesquisa 'fributária, vol. 18, págs. 151/152).

Desmerece consideração, também, a alegação de que a Lei Complemen­tar n!! 44/83 acrescentou um 3!! ao art. 6!! do Decreto-Lei n!! 406/68, pos­sibilitando a substituição tributária. Admitindo-se, todavia, que a referi­da Lei Complementar não estivesse eivada dos defeitos que os Tributa­ristas apontam, ainda assim, um único parágrafo seria manifestamen­te insuficiente para a instituição dessa figura tributária. É que, mal­grado acrescentar dispositivo ao De­creto-Lei 406, passou ao largo quan­to ao CTN, sem alterá-lo, em seus artigos 116, 121 e 128 para, com as suas regras, compatibilizar essa for­ma de responsabilidade tributária.

Valdir de Oliveira Rocha, ao comentar o artigo 25 do Convênio n!! 66, assim se manifestou:

"Trata-se, aqui, da chamada substituição tributária, que lem­bra a Lei Complementar n!! 44/83, que acrescentou (ou pretendeu acrescentar) o § 3!! ao artigo 6!! do Decreto-Lei n!! 406/68 - Lei Com­plementar formalmente inconsti­tucional porque sua votação (pelo voto de liderança) não observou a exigência de aprovação por maio­ria absoluta (conforme mostrei no texto ICM - Substituição e In­constitucionalidade da Lei Com-

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plementar n!! 44/83 - publicado no Repertório rOB de Jurispru­dência n!! 16/88, cad. 1, pág. 232). Salvo a hipótese prevista no § 9!! do artigo 34 do ADCT, não cabe a aplicação de substituição tributá­ria para o ICMS até que su:rja Lei Complementar válida. Essa lei te­rá que observar o conceito consti­tucional dado ao instituto" (Sim­pósio Nacional rOB Direito Tribu­tário, págs. 30/31).

o Tributarista Alcides Jorge Costa, ao se referir à Lei Comple­mentar n!! 44/83, esclarece:

"A exposição antes feita sobre a sujeição passiva e substituição, aplicada aos parágrafos acrescen­tados ao artigo 6!!, mostra que, no caso, inexiste substituição e que esta denominação só pode ser re­sultado de equívoco do legisla­dor. Na verdade, nem o industrial nem o atacadista, nem o produtor têm qualquer espécie de vínculo com as operações que o varejista realize com terceiros. Está, pois, ausente, uma nota característica da substituição. Desta maneira, é possível afirmar, com certeza, que o § 3!!, acrescentado ao artigo 6!! do Decreto-Lei n!! 406/68 não cria a figura do substituto" (Revista de Direito Tributário, pág. 64/43).

E, adiante, com juridicidade e cla­reza, demonstra, o Tributarista, que, no sistema preconizado pela Lei Complementar 44/83, desconfigurou­se o rCM, subvertendo-se a sua ba­se de cálculo, arremata:

"A lei Complementar n!! 44/83 prescreve para as operações men­cionadas no § 9!! uma base de cál­culo que nada tem a ver com a operação em si. É bastante claro que a base de cálculo que a Lei Complementar n 2 44/83 manda adotar nas operações que mencio­na não compõe a operação realiza­da pelo produtor ou pelo comer­ciante atacadista. A margem de lucro do comerciante varejista é totalmente estranha à operação que o produtor, o industrial ou o comerciante atacadista realizam. Descaracterizada a base de cálcu­lo, descaracterizado estará o tri­buto. Nestas condições, a Lei Complementar n2 44/83 é contrá­ria ao texto constitucional. O tri­buto que dela resulta não é, cer­tamente, o rCM, tal como configu­rado na C. Federal" (Revista de Direito Tributário, vol. 44/44).

Geraldo Ataliba e Cleber Gior­dano, manifestando-se sobre o tema - Substituição Tributária - adver­tem que a substituição, mesmo fun­dada na Lei Complementar n2 44/83, "viola a Constituição, eis que, a mol­dura constitucional do rCMS não se afasta à própria concepção básica da substituição para a frente, em espe­cial, o enunciado constitucional que caracteriza o imposto e sua incidên­cia sobre operações de circulação de mercadorias efetivamente realiza­das, não se podendo admitir que elas sejam tributadas antes de sua ocor­rência" (Revista de Direito Tributá­rio n 2 34/204).

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Como se vê, conquanto a Lei Com­plementar n!! 44/83 tenha pretendi­do instituir a substituição tributária para frente, ela foi parcimoniosa, omitindo-se em alterar, em essência, outras regras de lei de igual hierar­quia, inseridas no CTN (arts. 116, 121 e 128), empecilhando a consecu­ção de seu desiderato. A substituição tributária, no sistema jurídico vigen­te, é só aquela que obedeça aos câ­nones do CTN.

Por último, no caso específico do ICMS, em decorrência da legislação de regência, a base de cálculo é o va­lor da operação (Dec. Lei n!! 406/68). 'lbdavia, para justificar a substitui­ção tributária, tomou-se como base de cálculo não o valor da operação (mesmo porque ainda não existe), mas, um valor previsto em tabela, de certo modo arbitrário e presumi­damente estabelecido, que nunca coincidira com o preço de comercia­lização final do veículo. O sistema é, assim, assemelhado à exigência do tributo através de pautas fiscais, considerado ilegal por esta e pela Suprema Corte.

Tão evidente configurou-se a im­possibilidade de os Estados legisla­rem sobre substituição (ou responsa­bilidade) tributária, com a antecipa­ção do pagamento do ICMS, que o Congresso Nacional, apreciando emenda da iniciativa do Poder Exe­cutivo, introduziu o parágrafo 7!!, no artigo 150 da C. Federal, com a re­dação a seguir:

§ 7!! - "A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tribu­tária a condição de responsável

pelo pagamento do imposto ou contribuição, cujo fato gerador de­va ocorrer posteriormente, assegu­rada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador pre­sumido" (Emenda Constitucional n!! 3/93).

Da inteligência do dispositivo su­pra, é fácil de compreender que a substituição tributária, nos moldes preconizados nos Convênios (e legis­lação dos Estados), só será possível de instituição por lei posterior à Emenda Constitucional n!! 3/93. Es­sa Emenda é que tornou viável o co­metimento, a terceiro, de responsa­bilidade pelo pagamento do ICMS, mesmo antes de se aperfeiçoar a si­tuação constitutiva do fato gerador. Em face do princípio da legalidade ou da tipicidade estrita, que norteia o sistema jurídico-tributário, inexis­te obrigação tributária sem fato ge­rador.

Com estas considerações, rejeito os embargos, para que prevaleça, no caso, o entendimento consolidado na Colenda Primeira Turma.

É como voto."

VOTO

O SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ: Sr. Presidente, o meu voto é idêntico ao proferido nos Embargos de Divergência no Recurso Especial n!! 34.781-3-SP.

VOTO DE DESEMPATE

O SR. MINISTRO GARCIA VIEI­RA (Presidente): Srs. Ministros: ini-

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cialmente, na Primeira Turma, votei de acordo com o Ministro-Relator, depois comecei a ser vencido e a res­salvar entendimento. Como a ques­tão está para ser decidida nesta Se­ção, volto ao meu entendimento an­terior, que é no mesmo sentido do Ministro-Relator. Farei juntada de cópia do meu voto que tenho a res­peito (REsp 35.547-8/SP).

"ANEXO

RECURSO ESPECIAL N~ 35.547-8 - SP

(Registro n~ 93.0015227-0)

VOTO

O SR. MINISTRO GARCIA VIEI­RA (Relator): Vários dispositivos le­gais, versando sobre questões devi­damente prequestionadas, são apon­tados como violados.

Conheço do recurso pela letra a.

O regime de substituição tributá­ria é previsto pela própria Constitui­ção Federal vigente (artigo 155, in­ciso XII, letra b), nas leis e convê­nios firmados pelos Estados, com ba­se no artigo 34, parágrafos 3~ e 8~ do ADCT. No Estado de São Paulo, o regime de sujeição passiva, de paga­mento antecipado é previsto pelo ar­tigo 8~, item XII, segundo o qual, são sujeitos passivos por substituição:

"o industrial, o comerciante ou o prestador do serviço, relativa-

mente ao imposto devido pelas anteriores ou subseqüentes saídas de mercadorias ou prestações de serviço, promovidas por quaisquer outros contribuintes."

Já o Convênio n~ 66/88, artigo 25, item I, estabelece que a lei poderá atribuir a condição de substituto tri­butário a:

"industrial, comerciante ou ou­tra categoria de contribuintes, pe­lo pagamento do imposto devido na operação ou operações anterio­res."

Este Convênio, com força de lei complementar (ADCT, artigo 34, pa­rágrafo 8~), autorizou os Estados a "exigir o pagamento antecipado do imposto, com a fixação, se for o caso, do valor da operação ou da prestação subseqüente a ser efetuada pelo pró­prio contribuinte" (artigo 2~, pará­grafo 3~).

A lei estadual e o convênio citados não contrariam os artigos 121 e 128 do CTN e com eles se harmonizam, na instituição desta substituição tri­butária, sendo legítima a exigência fiscal, com base na lei estadual edi­tada com suporte no citado Convênio n~ 66/88. Neste sentido o Recurso Es­pecial n~ 9.587-SP, Relator Eminen­te Ministro Ilmar Galvão, hoje mem­bro do STF, DJ de 10/06/91. A Excel­sa Corte, nos Recursos Extraordiná­rios n M 108.104, DJ de 14/08/87 e 107.104-0-ES, DJ de 14/08/84, Relator

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Eminente Ministro Célio Borja, em casos de mercadorias destinadas a outros Estados, entendeu legítimo o pagamento antecipado do ICM, pre­visto na legislação estadual.

Com o pagamento antecipado, não ocorre o recolhimento do imposto an­tes da ocorrência do fato gerador. Não se pode confundir momento da incidência do tributo com a sua co­brança. Ocorre o fato gerador do ICM na saída da mercadoria do es­tabelecimento contribuinte. No caso, quando são vendidos os veículos au­tomotores ou suas peças. A sua co­brança é a última fase concreta. Nos termos da Lei Estadual n~ 6.374/89, artigo 2~, inciso I e o do Convênio n~ 66/88, artigo 2~, inciso V, ocorre o fa­to gerador do imposto na saída da mercadoria do estabelecimento con­tribuinte. É claro que esta substitui­ção e antecipação, acolhida pela dou­trina e por nossos 'Tribunais, tem de ser autorizada por lei (artigo 121, in­ciso II do CTN) e a terceira pessoa deve ser vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação (artigo 128 do CTN), mas, no caso em exame es­tas condições estão amplamente sa­tisfeitas.

Com base nos poderes amplos a eles conferidos pelo artigo 34, pará­grafos 3~ e 8~ do ADCT, os Estados, têm "competência legislativa plena"

(artigo 6~ do CTN) e podiam estabe­lecer o pagamento antecipado do ICM, inclusive na venda de veículos automotores e suas peças. Este pa­gamento antecipado é, também, ado­tado no IPI e já era no antigo IVC. Este Superior Tribunal de Justiça, no Recurso Especial n~ 1.562-0-PR, DJ de 17/12/92, Relator Eminente Ministro Peçanha Martins, entendeu que:

"A eXlgencia antecipada do ICMS, na venda de veículos auto­motores, não se reveste de ilega­lidade ou abusividade."

Quando a lei atribui a condição de substituto tributário, ao comercian­te, como no caso concreto, a base de cálculo do ICM é o "preço máximo, ou único de venda do contribuinte substituído, fixado pelo fabricante ou pela autoridade competente, ou na falta deste preço, o valor da opera­ção praticado pelo substituído ... " (Convênio n~ 66/88, artigo 17). Com isto previu a substituição tributária e autorizou a adoção do pagamento antecipado, previsto também nos seus artigos 2~, parágrafo 3~, e 15 e na Lei Estadual n~ 6.374/89, artigos 24, parágrafo 4~ e 60.

Dou provimento ao recurso.

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MANDADO DE SEGURANÇA N2 1.361-0 - DF

(Registro n 2 91.0022120-1)

Relator: O Sr. Ministro Peçanha Martins

Impetrante: Walter Pereira Lisboa

Advogado: Philadelpho Pinto da Silveira

Impetrados: Ministro de Estado da Marinha, Ministro de Estado da Ad­ministração Federal e Reforma do Estado e Presidente da Caixa Econômica Federal

EMENTA: Mandado de segurança. Imóvel Funcional. Militar. Le­gitimidade da ocupação. Direito de preferência. Precedentes.

1. Comprovada a legítima ocupação, por militar, de imóvel funcio­nal relacionado para alienação, assiste-lhe o direito de preferên­cia para a aquisição do bem, pelo preço da avaliação devidamen­te atualizado.

2. Segurança parcialmente concedida.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Ministros da Primeira Seção do Superior 'lli.bunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas a se­guir, por unanimidade, conceder parcialmente o mandado de segu­rança. Votaram com o Relator os Mi­nistros Demócrito Reinaldo, Hum­berto Gomes de Barros, Milton Luiz Pereira, Cesar Asfor Rocha e Amé­rico Luz. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Antônio de Pádua Ri­beiro. Impedido o Sr. Ministro Hélio Mosimann.

Brasília, 06 de junho de 1995 (da­ta do julgamento).

Ministro GARCIA VIEIRA, Presi­dente. Ministro PEÇANHA MAR­TINS, Relator.

Publicado no DJ de 09·10-95.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO PEÇANHA MARTINS: Mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado por Walter Pereira Lisboa, militar da ativa, contra atos omissivos delibe­rados do Ministro da Marinha, do Secretário da Administração Federal e do Presidente da Caixa Econômi­ca Federal, que obstaculizam o direi­to líquido e certo do Impetrante à aquisição de imóvel funcional que le-

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gitimamente ocupava, até junho de 1990, conforme documentos de fls. 09/11, 15 e 16.

Pede que, em decorrência da or­dem requerida, o primeiro dos impe­trados deverá proceder ao recadas­tramento do apartamento sito na SQN 412, bloco "d", n~ de porta 308, e encaminhar o respectivo documen­to ao segundo impetrado que deverá formalizar, de imediato, o processo a ser remetido ao Presidente da CEF que, a seu turno, deverá pro­mover a venda do imóvel pelo preço da avaliação realizada em dezem­bro/90 (Cr$ 6.251.480,05).

O processo foi despachado, no meu impedimento, pelo Exmo. Min. Demócrito Reinaldo que negou a li­minar e determinou fossem oficiados aos impetrados (fl. 22).

As autoridades ditas coatoras res­ponderam aos pedidos de informa­ções, alegando o Ministro da Mari­nha, preliminarmente, decadência do direito à impetração porque trans­corridos mais de 120 dias da data em que o requerente desocupou o bem e a em que ajuizou a ação e que o imóvel pretendido destina-se à ocupação por militares, por isso que excluído, na forma da lei, da possi­bilidade de venda, não tendo, a refe­rida autoridade, praticado qualquer ato comissivo ou omissivo em detri­mento do direito do autor, impugná­vel através de MS. No mérito, repe­tindo os mesmos argumentos pug­nou pela denegação da segurança. Anexou prova de que o imóvel em referência é administrado pelo Mi­nistério da Marinha e que, a partir

de agosto/90, passou a ser ocupado por outro militar, Antonio César Loureiro (fls. 28/40, notadamente os de fls. 33/36).

O Secretário da Administração Federal teceu consideração sobre a pretensão deduzida, deixando entre­ver que o imóvel em causa não se in­clui nas exceções previstas na Lei 8.025/90, sendo passível de aliena­ção, admitindo a viabilidade da ação, tão-só, em relação ao encaminha­mento dos dados cadastrais (fls. 41/49).

Finalmente, o Presidente da CEF argüiu preliminar de ilegitimidade passiva para figurar no feito, reque­rendo o indeferimento do pedido quanto ao mérito (fls. 51/58).

A Subprocuradoria-Geral da Re­pública manifestou parecer contrá­rio ao acolhimento da pretensão, fi­xando-se nos dispositivos da Lei 8.025/90 que desautorizam a venda de imóveis destinados à ocupação por militares, fazendo remissão a precedente desta Corte que negou pedido idêntico (fls. 61/62).

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO PEÇANHA MARTINS (Relator): Trata-se de mandado de segurança não conheci­do por esta Primeira Seção e que re­tornou para apreciação do seu méri­to, em decorrência do provimento de recurso ordinário pelo Egrégio Su­premo Tribunal Federal.

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Mantenho o relatório de fls. 65/66, qU€ passa a integrar o presente jul­gado.

Preliminarmente:

Walter Pereira Lisboa, Militar da ativa, impetrou mandado de segu­rança contra o Ministro da Marinha, o Secretário de Administração Fede­ral da Presidência da República e o Presidente da Caixa Econômica Fe­deral para que dessem continuidade ao processo de alienação do aparta­mento n2 308, bloco "D", da SQN 412, permitindo-lhe adquiri-lo pelo preço da avaliação (Cr$ 6.251.480,05), co­mo publicado no DOU de 07.12.90.

Os dois primeiros impetrados, au­toridades da mais elevada hierar­quia da União e cujas informações gozam da presunção de veracidade, afirmaram que o imóvel em questão está sob a Administração dos órgãos que encabeçam, alegando o primei­ro deles que, destinandQ-se ao uso de militares, estaria excluído da auto­rização de venda e, o segundo, que o referido bem não se inclui nas exce­ções previstas na lei, sendo, por is­so, passível de ser alienado.

Em face da discrepância dessas informações e, também, do doc. de fl. 33 atestar que, em data anterior à publicação da Portaria 504 do Secre­tário da Administração Federal, o imóvel em causa já se encontrava sob a responsabilidade do Comando Naval de Brasília, entendi - no que fui acompanhado pelos eminentes integrantes desta Egrégia Seção -que a matéria demandaria instrução probatória incompatível com a via

estreita da ação mandamental, mo­tivo pelo qual não conheci da impe­tração, ressalvando ao autor socor­rer-se das vias ordinárias.

Inobstante isso, curvo-me à deci­são do Excelso Pretório e passo a examinar o mérito da questão.

Através da Portaria n2 504, publi­cada no DOU de 07.12.90, o Secretá­rio da Administração Federal divul­gou os preços mínimos de venda dos imóveis funcionais situados nas Asas Sul e Norte dessa Capital, dentre os quais se inclui o apartamento acima citado, acrescentando que, para efei­to do exercício do direito de prefe­rência, os legítimos ocupantes dos imóveis elencados seriam notifica­dos, por três dias consecutivos. Va­le assinalar, que à época, o imóvel já se encontrava sob a responsabilida­de do Comando Naval de Brasília e que o Impetrante o desocupou em 12.07.90 (fls. 32).

A Lei n2 8.025/90, em seu art. 62,

dispõe:

"Ao legítimo ocupante de imó­vel funcional dar-se-á conheci­mento do preço de mercado do respectivo imóvel, calculado na forma do artigo 22, inciso I, pre­viamente à publicação do edital de concorrência pública, podendo adquiri-lo por esse valor, caso se manifeste no prazo de 30 (trinta) dias, mediante notificação, e des­de que preencha os seguintes re­quisitos:

"I - ser titular de regular ter­mo de ocupação;

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II - estar quite com as obriga­ções relativas à ocupação;

III - ser titular de cargo efeti­vo ou emprego permanente, lota­do em órgão ou entidade da Ad­ministração Pública Federal ou do Distrito Federal.

§ 12• A legitimidade da ocupa­ção será evidenciada em recadas­tramento dos atuais ocupantes, a ser promovido pela Secretaria da Administração Federal da Presi­dência da República com base na legislação vigente.

§§ 22, 32 e 42 omissis".

o Decreto 99.266/90, que regula­mentou a lei, preceitua:

"Art. 52. Ao legítimo ocupante do imóvel residencial funcional , que estiver quite com as obriga­ções relativas à ocupação, é asse­gurado o direito de preferência à sua compra, nos termos do artigo 62 da Lei 8.025/90, observado o disposto neste Decreto.

§ 12 - Consideram-se legítimos ocupantes aqueles que, em 15 de março de 1990, mesmo que no transcurso do prazo de desocupa­ção, atendiam às exigências legais para a ocupação e, cumulativa­mente:

a) eram titulares de regular ter­mo de ocupação;

b) eram titulares de cargo efe­tivo ou emprego permanente, lo­tado em órgão ou entidade da Ad­ministração Pública Federal ou do Distrito Federal.

§§ 22, 32 e 42 omissis".

Com base nesses dispositivos e tendo em vista a publicação, no DOU de 07.12.90 (fls. 12/13), de que o imóvel fora avaliado e incluído no rol dos expostos à venda, o impe­trante pretende seja reconhecido o seu direito líquido e certo de prefe­rência para compra do referido bem pelo preço da avaliação, motivo pe­lo qual as autoridades impetradas devem ser compelidas a adotar as providências necessárias para tanto.

Não há dúvida quanto ao fato de que, até junho de 1990, o requeren­te ocupou o imóvel e estava quite com suas obrigações. De outra par­te, é também indiscutível que o "'ler­mo de ocupação de unidade residen­cial" fora celebrado entre o requeren­te e a Diretoria Administrativa da Presidência da República (fls. 9/11), passando o imóvel, posteriormente à desocupação (fls. 32), a ser gerido pelo Ministério da Marinha (fls. 33/36).

Dos documentos acostados aos au­tos, verifica-se que o impetrante foi dispensado da função de Assistente no Departamento de Comunicações da Presidência da República em 15.03.90 e permaneceu no aparta­mento até junho daquele ano, estan­do comprovada a legitimidade da ocupação nesse período. A publicação da relação dos imóveis avaliados e expostos à venda só ocorreu porém , , seis meses depois, em dezembro de 1990, não havendo prova pré-consti­tuída de que teria sido feito o reca­dastramento e evidenciada a mani-

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festação de interesse na compra do referido imóvel. É de presumir-se que o recadastramento se deu depois da desocupação, pelo impetrante, pe­lo que a SAFIPR não o teria notifica­do para manifestar o seu interesse na compra, como lhe impunha fazer.

Sendo, pois, o impetrante, legíti­mo ocupante do imóvel em 15 de março de 1990 e não tendo sido no­tificado para exercer o seu direito de preferência à aquisição, tem direito a fazê-lo, por isso mesmo que dito bem estava, então, afetado à Admi­nistração da Presidência da Repúbli­ca, somente passando ao Ministério da Marinha após a desocupação, pe­lo requerente.

E nestas hipóteses o Pretório Ex­celso já consolidou a jurisprudência pela possibilidade de compra, pelo militar ou civil, com exercício no EMFA, de imóvel ocupado legitima-

mente a 15.03.90 e administrado pe­la Presidência da República e não por Ministério Militar (Recursos em MS n~ 21.769-7-DF, I!': 'furma, Plená­rio: 21. 772-7 e 22.814-1).

Reconhecendo, pois, ao Impetran­te o direito de preferência à aquisi­ção do imóvel pelo preço da avalia­ção, não posso deferir-lhe a preten­são de adquirir o apartamento pelo preço histórico. É que, de então a es­ta data a inflação se agudizou e o padrão monetário foi alterado. Im­põe-se, por isso, a atualização da ex­pressão monetária da avaliação do imóvel, sem o que estaria o Estado sofrendo grave prejuízo.

À vista do exposto, concedo par­cialmente a segurança para declarar o direito de preferência do impetran­te à compra do imóvel pelo preço da avaliação devidamente atualizada mediante a utilização do IPC, edita­do pelo IBGE. É como voto.

MANDADO DE SEGURANÇA N~ 3.318-2 - DF

(Registro n~ 94.0003012-6)

Relator: O Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro

Impetrante: Universidade Braz Cubas - UBC

Advogados: Drs. Ada Pellegrini Grinover e outros

Impetrado: Ministro de Estado da Educação e do Desporto

EMENTA: Universidade Braz Cubas. Curso de Odontologia. Fecha­mento por inobservância da legislação de regência. Portaria n!! 196, de 3-2-94, do Ministro da Educação e do Desporto.

I - O ato ministerial atacado, apoiado no art. n~ 209, n, da Cons­tituição Federal, no art. 2!? do Decreto n!? 359, de 9-Jl2-91, no art. 2~

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do Decreto n~ 98.377, de 8-11-89, e no art. 3~ do Decreto n~ 77.797, de 9-6-76, está ao amparo da legislação de regência e os decretos que lhe servem de fundamento não infringem o princípio da legalida­de, não violam o princípio da autonomia universitária, nem exor­bitam o poder regulamentar.

11 - A autonomia universitária, prevista no art. 207 da Consti­tuição Federal, não pode ser interpretada como independência e, muito menos, como soberania. A sua constitucionalização não te­ve o condão de alterar o seu conceito ou ampliar o seu alcance, nem de afastar as universidades do poder normativo e de controle dos órgãos federais competentes.

111 - Ademais, o ensino universitário, administrado pela inicia­tiva privada, há de atender aos requisitos, previstos no art. 209 da Constituição Federal: cumprimento das normas de educação nacio­nal e autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público.

IV - Mandado de segurança denegado.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, em que são partes as aci­ma indicadas:

Decide a Primeira Seção do Supe­rior 'fribunal de Justiça, na confor­midade dos votos e das notas taqui­gráficas anexas, por unanimidade, denegar o mandado de segurança, nos termos do voto do Sr. Ministro­Relator.

Os Srs. Ministros Garcia Vieira, Hélio Mosimann, Peçanha Martins, Demócrito Reinaldo, Milton Luiz Pe­reira, Cesar Asfor Rocha e América Luz votaram com o Sr. Ministro-Re­lator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Humberto Gomes de Bar­ros.

Brasília, 31 de maio de 1994 (da­ta do julgamento).

Ministro JOSÉ DE JESUS FILHO, Presidente. Ministro ANTÓNIO DE PÁDUA RIBEIRO, Relator.

Publicado no DJ de 15-08-94.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO ANTÓNIO DE PÁDUA RIBEIRO: O parecer da douta Subprocuradoria Geral da Re­pública, da lavra do Dr. José Arnal­do da Fonseca, ilustre Subprocura­dor-Geral, assim expôs a controvér­sia (fls. 211-215):

"A Universidade Braz Cubas im­petra o presente mandamus em face da Portaria 196, de 03/02/94, ato do Ministro da Educação e do Desporto que determinou o ime­diato fechamento do Curso de Odontologia por ela criado.

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2. Alega que em maio de 1989 criou o Curso de Odontologia, ho­mologado pelo Reitor através da Resolução n~ 1, e na plena obser­vância de seu estatuto - arts. 4~, § 1~, lI, e, 8~, VII; época em que vigia o Decreto 97.223/88, que ne­nhuma eficácia tendo ele em suas regras restritivas quanto às Uni­versidades, e de acordo com o es­tipulado na Resolução 15/84 do Conselho Federal de Educação, a UBC não dependia de prévia au­torização do MEC.

3. Após tomadas as devidas provi­dências, o Conselho Universitário autorizou o início do funciona­mento do discutido Curso para ja­neiro de 1994, tendo sido comuni­cado tal fato ao Presidente do Conselho Federal da Educação (nos moldes do Decreto supra), que por sua vez, acusando recebi­mento, informou terem sido efe­tuados registros em seus cadas­tros.

4. Assim, ocorreram o vestibular e as matrículas dos candidatos aprovados, tendo posteriormente, a UBC recebido correspondência do Sr. Secretário de Educação Su­periorlMEC indagando se a cria­ção de tal Curso obedecera ao dis­posto nos Decretos 98.377/89 e 359/91, no sentido de submeter o assunto ao Conselho Nacional de Saúde, se não, que se suspendes­sem as provas (que no entanto já haviam se realizado).

5. Após troca de correspondências e faltando 3 dias para o início das aulas, sobreveio a malsinada Por­taria.

6. Sobre a validade da criação do Curso, dispõe a respeito da auto­nomia universitária inserida no art. 207 da Constituição Federal, salientando que continua tranqüi­la a orientação do CFE que só ad­mite sua própria autorização pa- . ra criar cursos quando se tratar de Universidade que ainda se en­contre em período probatório, en­tendendo que a criação de novos cursos por universidade já reco­nhecida, deve apenas submeter-se a reconhecimento posterior (des­de o enunciado da Lei 5.540/69-art. 47).

7. Que o Decreto 93.594/86 reco­nheceu que a autonomia universi­tária vedou expressamente ao Po­der Executivo estabelecer a proi­bição para as Universidades (art. 1~, § 1~).

8. O Decreto 97.223/88, prorro­gando a vigência daquele, esten­deu a suspensão da criação de no­vos cursos às Universidades (art. 2~) - disposição essa, manifesta­mente inconstitucional sob triplo aspecto:

a. infringência ao princípio da legalidade - o Decreto 8.791/82, ao regulamentar o art. 47 da Lei 5.540/69, esclarece que a criação de novos cursos seria autorizada pelo Presidente da República após parecer favorável do Conselho de Educação competente;

b. violação da autonomia uni­versitária - nenhuma limitação existindo na lei à criação de novos

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cursos, o Decreto que a impôs se­ria inconstitucional por vulnerar a autonomia universitária;

c. exorbitância do poder regula­mentar - não havia como estabe­lecer, por decreto, a regulamenta­ção proibitiva porque inexistia lei possibilitando ao Poder Executivo sustar a criação de novos cursos. Houve, ainda, abuso do Executivo em "ordenar ou proibir o que a lei não ordena ou não proíbe."

9. Alega que os Decretos invoca­dos pela autoridade ministerial fundamentadores da Portaria ata­cada, foram posteriores à criação do novo curso, não podendo se aplicar ao caso, pelo princípio da irretroatividade das leis e atos normativos, impedindo que seja alcançado pela norma posterior o ato jurídico perfeito e o direito ad­quirido que deste se origina.

10. Não pode confundir a criação de curso - situação passada -com o momento da instalação do curso - que diz respeito ao exer­cício do direito adquirido - po­dendo exercer-se a qualquer mo­mento.

11. Traz jurisprudência que o apóia.

12. Requer liminarmente a sus­pensão do ato. Pedido indeferido às fls. 208.

13. A autoridade ministerial, transcrevendo parecer de Conse­lheiro do CFE, afirma que a auto­nomia universitária não pode ser interpretada como independência

ou soberania, lembrando que" ... o cumprimento de diplomas legais é obrigatório, não cabendo escu­sas ... ". Alegando que essa posição concretizou-se após as citadas pe­lo impetrante, não sendo então tranqüila a orientação do CFE em só admitir a autorização para a criação de novos cursos por uni­versidades ainda não reconheci­das.

14. Que nessa mesma linha de entendimento, já se pronunciou o também conselheiro Adib Jate­ne, em artigo publicado no Jornal do Brasil de 06/02/92, o qual além de outras alegações, é pelo cum­primento dos Decretos 98.377/89 e 359/9l.

15. Quando consultado pelo Exmo. Sr. Presidente da República sobre prorrogar ou não a vigência do Decreto 93.594/86 sem excluir do âmbito de sua incidência as Uni­versidades, face o art. 207 CF, o então Consultor-Geral da Repúbli­ca, Dr. Saulo Ramos, afirma que a autonomia universitária objeti­va assegurar às universidades um grau razoável de auto-governo, sempre sob controle estatal em função da sua destinação: ensino, pesquisa e extensão.

16. E mais, que é dever do Esta­do controlar administrativamen­te as universidades, sendo de ple­na convivência o instituto da au­tonomia de um lado, e os poderes de ordenação e de controle do Es­tado de outro.

17. Que se pelo art. 209 CF obri­ga-se ao ensino de iniciativa pri-

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vada o cumprimento das normas gerais de educação e autorização e avaliação de qualidade pelo Po­der Público, com muito mais pro­priedade tal submissão devem as universidades mantidas pelo Es­tado, entendendo, afinal, que a vedação de se criarem novos cur­sos superiores deveria se estender às universidades.

18. Referido Parecer passou a ter força normativa porque devida­mente aprovado pelo Presidente da República.

19. 'Th.mbém esclarece que os arts. 6 e 7 da Lei 4.024/61 atribuem po­der de polícia ao Ministro da Edu­cação, já que tem a velar pela ob­servância das leis de ensino e pe­lo cumprimento das decisões do CFE.

20. A decisão ora impugnada foi proferida em razão da absoluta falta de entendimento das normas dos Decretos 98.377/89 e 359/91 pela impetrante, por ter deixado de submeter o projeto de implan­tação do curso aos órgãos compe­tentes para a análise, e deu-se em conseqüência do exercício pleno do munus público de que é detentor o Ministro da Educação.

21. A autonomia didático-científi­ca proclamada no art. 207 CF não induz à ilação de que as Univer­sidades podem criar cursos à re­velia da política governamental de expansão do ensino superior e do Plano Nacional de Educação, on­de o controle da qualidade do en-

sino constitui preocupação domi­nante.

22. Que o dispositivo supra care­ce de regulamentação não há dú­vidas, a fim de coibirem os abusos que vêm se cometendo em seu no­me."

Após examinar as questões susci­tadas' concluiu o citado parecer pe­la denegação da ordem (fls. 223).

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO (Relator): Ao opi­nar pela denegação da ordem, argu­mentou o parecer do douto órgão do Ministério Público Federal (fls. 215-223):

"23. À época da criação do curso vigia o Decreto 97.223/88, que as­sim dispunha:

"Art. 12 Fica prorrogada, até 30 de junho de 1989, a vigência do Decreto n2 93.594, de 19 de novembro de 1986, alterado pe­lo Decreto n 2 95.003, de 5 de outubro de 1987.

Art. 22 A suspensão a que alude o Decreto n 2 93.594/86 aplica-se pelo prazo estabeleci­do no artigo 12 deste Decreto, a todas as Universidades.

Art. 32 Não se admitirá o funcionamento de cursos cria­dos sem observância das exi­gências legais.

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Art. 4~ omissis.

Art. 5~ omissis."

24. O Decreto 93.594/86, reporta­do pelo diploma legal supra, dis­punha sobre a sustação de criação de novos cursos superiores de gra­duação em todo o território nacio­nal, só que não aplicava tal sus­pensão às Universidades.

Assim, a criação do curso de odontologia pela UBC, conforme suas próprias informações, em 20/05/89, deu-se dentro do prazo proibitivo estipulado pelo Decre­to 97.223/88. E note-se bem, que o referido Diploma não falava so­bre qualquer tipo de condicionan­te para criação de novos cursos qual seja aprovação pelo Presiden~ te da República ou outras, ele sim­plesmente sustava a criação pelo prazo que se prorrogava até 30.06.89.

25. A impetrante, ao criar o novo curso encontrava-se totalmente em afronta aos princípios legais respectivos. Ela alega:

24 - É certo que posterior­mente veio a lume o Decreto n~ 97.223/88 que, além de pror­rogar a vigência do Decreto n~ 93.594/86, com as alterações sucessivas, pretendeu estender a suspensão da criação de no­vos cursos às Universidades determinando, no art. 2~: '

Art. ~: "A suspensão a que alude o Decreto n~ 93.594/86 aplica-se, pelo prazo estabe-

lecido no artigo 1~ desse de­creto, a todas as Universida­des."

Mas essa disposição era ma­nifestamente inconstitucional.

Sua flagrante inconstitucio­nalidade decorria de três vícios: a infringência ao princípio da le­galidade, a violação da autono­mia universitária e a exorbitân­cia do poder regulamentar." (fls. 09 e 10 - grifamos)

26. Pretende, nada mais nada me­nos, a Universidade impetrante com tais alegações, escusar-se do cumprimento da lei. Ora, o Decre­to não "pretendeu" apenas, ele efe­tivamente estendeu a aludida sus­pensão às Universidades, e jamais foi considerado inconstitucional foi somente revogado pelo Decret~ de 25 de abril de 1991, que mantinha o reconhecimento de cursos e au­torizações vigentes.

27. Sobre a criação de novos cur­sos, veio o Decreto 359, de 9/12/91 (reportado pelo ato atacado) que, regulamentando o art. 47 da Lei 5.540/68, dispôs sobre a autoriza­ção pelo Presidente da República na criação de novos cursos.

28. Com relação à alegação de ser o Decreto inconstitucional em ra­zão de autonomia universitária in­serida no art. 207 da Constituição Federal, valem transcritos trechos do Parecer SR-78/88, da Consul­toria-Geral da República, publica­do no DOU de 16.12.88, verbis:

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A questão que ora se coloca, pois, consiste em analisar -tendo presente o que dispõe o artigo 207 da nova Constituição brasileira - a possibilidade de o Presidente da República pror­rogar, ou não, a vigência do De­creto n" 93.594, de 1986, sem ex­cluir, porém, do âmbito de sua incidência, as Universidades.

Em suma: a autonomia uni­versitária, hoje constitucionali­zada, impediria o Chefe do Po­der Executivo da União de es­tender às Universidades o co­mando vedatório da criação de novos cursos superiores de gra­duação?

Entendo que não, pois se me afigura lícito, em face do orde­namento constitucional, prorro­gar a vigência do ato presiden­cial referido, fazendo-o incidir também sobre as Universidades, as quais ficarão, em conseqüên­cia, proibidas de criar novos cur­sos superiores de graduação, quaisquer que eles sejam.

A Constituição brasileira, pro­mulgada em 5 de outubro de 1988, proclamou a autonomia universitária como um dos prin­cípios fundamentais do ensino no País.

A Carta Federal dispôs, em seu artigo 207, verbis que:

"As universidades gozam de autonomia didático-cien­tífica, administrativa e de gestão financeira e patrimo-

nial, e obedecerão ao princí­pio de indissociabilidade en­tre ensino, pesquisa e exten­são."

Operou-se, na realidade, a constitucionalidade de um prin­cípio já anteriormente consagra­do na legislação ordinária de en­sino, que se erigir a - ao tem­po da reforma Francisco Cam­pos (Decreto n" 19.851, de 11 de abril de 1931, artigo 9") - como expressiva garantia de ordem institucional das Universidades (v. Fábio Prado. "A autonomia das Universidades estaduais e a competência para baixar seu estatuto e regimento", in Vox Legis, vol. 147/65, 1981: Ana Cândida da Cunha Ferraz. "O regime especial das autar­quias educacionais, in Revista da Procuradoria-Geral do Esta­do da São Paulo, vol. 17/203-204, 1980).

Não há, porém, uma nova au­tonomia universitária. O que existe, isso sim, é uma nova rea­lidade no panorama do direito constitucional positivo brasilei­ro. Se, antes, a autonomia das universidades configurava ins­tituto radicado na lei ordinária - e, portanto, supressível por mera ação legislativa ulterior -, registra-se, agora, pelo maior grau de positividade jurídica que a ele se atribuiu, a elevação desse princípio ao plano do or­denamento constitucional. Mas a palavra autonomia continua tendo o mesmo sentido e signi-

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ficado, quer escrita em lei ordi­nária, quer escrita no texto fun­damentaL

O conteúdo intrínseco desse postulado não se alterou. Da constitucionalização desse prin­cípio, a única conseqüência que se pode extrair é, sem dúvida, a eficácia derrogatória e irrecu­sável de norma que o contempla, cuja supremacia se impõe à ob­servância necessária do legisla­dor ordinário. Esta, portanto, a única - embora relevantíssima - modificação gerada pelo pre­ceito consubstanciado no artigo 207 da Lei Maior.

Há, pois, sob esse aspecto, apenas uma diferença de grau entre o princípio da autonomia universitária, anteriormente consagrado em lei, e o princípio da autonomia universitária, ago­ra proclamado em sede consti­tucional, onde reforçou-se a de­fesa contra a hipótese de sua re­vogação. O sentido, porém, é o mesmo e, por isso, são os mes­mos os efeitos jurídicos de sua aplicação nas situações em que incide.

A noção de aut01wmia univer­sitária, contudo, não se confun­de com a de independência, pos­to que supõe o exercício limita­do de competência e de poderes, consoante prescrições e regras estabelecidas pelo ordenamen­to jurídico.

A gestão de bens e interesse próprio e o poder de auto-admi-

nistração e desempenho de fun­ções específicas não afetam a possibilidade jurídica de contro­le administrativo do Poder PÚ­blico sobre as universidades, nem subtraem, a este, a compe­tência para autorizar-lhes o fun­cionamento, reconhecê-las e fis­calizar-lhes as atividades. É de­ver do Estado, diz a Constitui­ção.

O regime de tutela que disci­plina as relações entre o Esta­do e as universidades não impe­de que estas sejam submetidas à fiscalização de ordem institu­cional, ou de ordem político-ad­ministrativa ou ainda, de ordem econômico-financeira.

A esse poder de vigilância não é oponível o princípio da au­tonomia universitária, posto que o exercício da prerrogativa es­tatal visa, tão-somente, à rea­lização, por meios regulamen­tares e conformes ao ordena­mento jurídico, dos fins institu­cionais para que a universida­de foi concebida, idealizada e criada.

O sentido da cláusula cons­titucional referente à autonomia universitária - inextensível aos estabelecimentos isolados de en­sino superior - não despoja o Estado de seu poder de tornar efetivos, mediante ato do Poder Executivo da União, após pare­cer favorável do Conselho de Educação competente, a autori-

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zação para funcionamento e o reconhecimento da universidade.

o grau de autonomia conce­dido ao ente universitário sequer priva o Estado - nos casos de violação do ordenamento jurídi­co - de até intervir na Univer­sidade, suspendendo-lhe, em conseqüência desse ato radical, o gozo e o exercício da própria autonomia, a teor do que dispõe o artigo 48 da Lei n~ 5.540, de 1968, verbis:

"O Conselho Federal de Educação, após inquérito ad­ministrativo, poderá suspen­der o funcionamento de qual­quer estabelecimento isolado de ensino superior ou a auto­nomia de qualquer universi­dade, por motivo de infrin­gência da legislação do ensi­no ou de preceito estatutário ou regimental, designando-se Diretor ou Reitor pro tem­pore." (Grifei).

Em suma: o exame deste te­ma evidencia a possibilidade de plena convivência entre o insti­tuto da autonomia universitária, de um lado, e os poderes de or­denação e de controle do Esta­do, de outro. Não se negam, não se repelem e nem constituem deux choses qui hurlent de se tro­ver ensemble.

Configuram, pelo contrário, situações só aparentemente an-

tagônicas, posto que, na reali­dade, complementam-se, no in­terior do nosso sistema de direi­to positivo, em harmoniosa in­teração." (grifos nossos)

29. É compreensível a situação constrangedora pela qual a Univer­sidade atravessou com a suspen­são do curso às vésperas do início das aulas, mas isso foi apenas re­flexo de sua desídia, de sua infrin­gência às normas legais pertinen­tes.

Lembrando, mais uma vez, à época da criação do seu curso de odontologia, a criação de novos cur­sos estava terminantemente sus­tada, nos moldes do Dec. 93.594/86, onde o mesmo também não admi­tia o funcionamento de cursos que tivessem sido criados inobservan­do-se as exigências legais.

30. Posteriormente sobrevieram os Decretos aludidos pela Portaria atacada, que, em suma, liberavam a criação de novos cursos, desde que obedecidos os requisitos de: pa­recer favorável do Conselho de Educação competente, devidamen­te homologado pelo Ministro da Educação e autorizado pelo Presi­dente da República.

O de n~ 98.377/89 era mais es­pecífico, tratando de cursos cria­dos na área de saúde, dispunha o Conselho Nacional de Saúde deve­ria fazer a avaliação.

31. Não restando dúvidas quan­to à criação do novo curso da UBC não ter obedecido aos ditames le­gais; e sendo pacífica a orientação

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de que não se deve confundir "au­tonomia universitária" (art. 207, CF) com "independência", não há falar-se em afronta a direito líqui­do e certo da impetrante.

32. Este E. STJ já decidiu:

"Universidade. Lei de Dire­trizes e Bases da Educação Na­cional. Transferência de servi­dor público - A Lei de Diretri­zes e Bases da Educação N acio­nal é de caráter nacional. Não se confunde com lei federal. Vincu­la a União, os Estados, os Muni­cípios e todos os estabelecimen­tos de ensino. Autonomia das universidades não significa independência ... " (RESPDM 5.862/SP, DJ 17.12.90 - grifa­mos).

o ato atacado observou o dis­posto na norma legal aplicável, e como o seu antecessor, foram en­viadas correspondências, confor­me alega a própria Universidade, indagando se os preceitos legais haviam sido observados pela im­petrante. Não há falar-se, sequer, em ato arbitrário, muito menos lesivo de direito líquido e certo."

Os transcritos fundamentos estão corretos. Convém, porém, que se lhe acrescentem lúcidos argumentos aduzidos nas informações (fls. 154-160):

"A seguir faremos uma demons­tração de que o ato ministerial é juridicamente inatacado e, para

tanto, impõe-se o adentrar-se no exame da legalidade dos Decretos 98.377/89 e 359/91, e na questão da autonomia universitária sob a ótica constitucional, notadamen­te em relação às Universidades mantidas pela iniciativa particular que, na Carta Magna, têm trata­mento diverso daquele dado às Universidades Públicas.

Às folhas 8, de sua peça inau­gural, afirma a impetrante que continua tranqüila "a orientação do CFE, que só admite sua pró­pria autorização para criar cursos quando se trate de Universidade que ainda se encontre num perío­do probatório, porquanto ainda não reconhecida".

A bem da verdade, essa orien­tação do CFE não é pacífica. Com efeito, no ano de 1992, a Secreta­ria Nacional de Educação Supe­rior solicitou um pronunciamento do Conselho Federal de Educação acerca dos cursos de Medicina criados pelas Universidades de Ijuí e de Cruz Alta, ambas do Rio Grande do Sul, tendo em vista as disposições contidas no Decreto 98.377/89, reafirmado pelo Decre­to 359/91, obtendo, como resposta, o parecer da lavra do Conselhei­ro Genaro de Oliveira, aprovado pela Câmara de Legislação e N or­mas em 17 de fevereiro daquele ano, o qual deixou assente:

"Assim e de logo vale a ad­vertência de que ao Parecer n. 673/91 CFE não pode ser dada

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a interpretação simplista e equi­vocada: "desde que reconhecida, pode a Universidade, em razão da autonomia, livremente, ao seu talante, criar ou implantar os cursos que quiser."

Já pensamos de um modo um tanto diverso; mas, diante das inúmeras situações verdadeira­mente abusivas que se vêm re­petindo por todo o País e a um estudo amplo do nosso sistema de leis, é de concluir-se que, em verdade, 'autonomia universitá­ria' não pode ser interpretada como independência nem, mui­to menos, como soberania. O texto constitucional (art. 207) não transformou as Universi­dades em 'enclaves soberanos'. Acolher-se a interpretação elas­tecida que alguns pretendem, significaria emprestar aos Con­selhos Universitários ilegal e inadmissível competência para, em causa própria, decidir igno­rando não apenas as leis de di­retrizes e bases da educação nacional, mas até toda a legis­lação codificada, eis que a Car­ta também fala em autonomia administrativa e de gestão fi­nanceira e patrimonial" (grifos do original).

E continua discorrendo o nobre parecerista sobre a questão enfo­cada:

"Não conhecemos, pessoal­mente, as duas instituições e

não temos motivos para duvi­dar da seriedade de propósitos de seus dirigentes. Mas, o que se questiona é a igualdade de todos, perante a Lei, e a inafas­tável necessidade e dever de proceder-se, para a implanta­ção de novos cursos na área de saúde, à prévia verificação de existência dos parâmetros de­terminados pelos citados diplo­mas legais.

Ao nosso ver, a Sra. Secretá­ria Nacional de Educação Su­perior agiu com correção e opor­tunidade quando determinou a suspensão do concurso vestibu­lar para os cursos de medicina criados pela Universidade de Ijuí e de Cruz Alta - face à não observância obrigatória do procedimento disciplinado pe­lo Decreto Federal 98.377, de 08.11.89, reafirmado pelo De­creto Federal 359, de 09.12.91". (grifos nossos).

E segue dizendo o ilustre Con­selheiro em seu relato:

"Certamente haverá opiniões respeitáveis no sentido de que esses Decretos padeceriam do 'vício da ilegalidade', por colisão com a 'autonomia universitária' de que fala o art. 207, da Carta, ou porque estariam podando ou restringindo a competência dos Conselhos de Educação (Federal ou Estaduais), estatuída pelas Leis de Diretrizes e Bases.

Sem embargo da atenção de­vida a essas opiniões em con-

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trário, ao relator não parece haver ilegalidade alguma. So­bre a 'autonomia universitária' já falamos ... Quanto à compe­tência legal dos Conselhos de Educação não vemos restrições.

Os decretos reafirmam, ex­pressamente (art. I!!) a indis­pensabilidade de parecer favo­rável deste CFE, para que pos­sa o Presidente da República autorizar novos cursos na área de saúde. As relevantes inova­ções relativas à instrução dos processos para a criação desses cursos, ao relator parecem úteis e oportunas. Aliás não são pro­priamente inovações, mas o aco­lhimento e a oficialização, a ní­vel de Decreto Federal, de re­quisitos há muito tempo defini­dos em sucessivas resoluções e Pareceres desse colegiado, tais como a aferição da necessidade social do curso, a comprovada disponibilidade de recursos hu­manos e financeiros, com espe­cial ênfase na qualificação do corpo docente e dos dirigentes, instalações permanentes e ade­quadas de manutenção, como vistas ao regular e contínuo fim­cionamento do curso e a garan­tia do seu padrão de qualidade, etc". (grifos nossos).

E conclui o digno relator:

"Finalmente, lembra o rela­tor que o cumprimento de di­plomas legais é obrigatório, não cabendo escusas ou recusas, mormente no âmbito da Admi-

nistração Pública, salvo se o Judiciário vier a declará-los in­constitucionais, o que, supõe-se, neste caso não ocorrerá."

Esclareça-se que a posição do Conselho Federal de Educação, consubstanciada no Parecer do Conselheiro Genaro de Oliveira, a que nos referimos acima, é poste­rior a todos os outros citados pe­la Impetrante, o que põe por ter­ra a sua afirmativa de que "con­tinua tranqüila orientação do CFE" em só admitir a autorização para a criação de novos cursos por universidade ainda não reconhe­cida.

N a mesma linha defendida pe­lo Conselheiro Genaro de Olivei­ra, enfática é a lição do eminente Conselheiro Adib Jatene, em ar­tigo publicado no diário Jornal do Brasil, em sua edição de 06.02.92, intitulado "A tragédia da saúde", que em certo trecho assinala:

" ... Na verdade, o que corre no Brasil, na área de ensino su­perior, é que é tragédia maior. Nenhuma nação pode ter futu­ro se os profissionais que forma hoje não estiverem realmente preparados.

Há gente de respeito neste país que defende a tese de for­mar o maior número possível de profissionais, que depois o mercado seleciona. Nesta visão, só realmente os competentes prosperariam. Já estamos can­sados de saber que não é ver-

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dade. É, até, mais provável que o atrevido irresponsável e cor­rupto prospere, enquanto o ho­nesto responsável assiste, per­plexo, a um sistema que se vai cristalizando e do qual se recu­sa a participar. Os princípios, o respeito, a ética não têm sido o paradigma de muitos.

A melhoria da qualidade do ensino e da qualificação dos profissionais deve ser defendi­da por toda a sociedade, inclu­sive, é claro, pelas associações e conselhos profissionais cons­cientes das suas responsabili­dades, não só com a profissão, mas com toda a comunidade.

... O ensino superior está sendo entregue, pelo estrangu­lamento da Universidade Pú­blica, à iniciativa privada. Não sou contra essa participação, mas é inegável a inconveniên­cia como muitos atuam, sem atender, mesmo, às recomenda­ções dos órgãos responsáveis pe­la orientação do ensino e pela autorização do funcionamento. Confiam na incapacidade da fis­calização, largamente demons­trada e que precisa ser corrigi­da.

Valendo-se da autonomia uni­versitária que existe há muito tempo e que foi inserida na no­va Constituição, reinterpretam essa autonomia de tal modo que permitisse criar o curso que qui­sessem, com o número de vagas

que pretendessem, sem audiên­cia de autoridade alguma.

Não é centralismo nenhum, mas responsabilidade dos Con­selhos apreciar a conveniência dessa criação.

Agora mesmo, no Rio Gran­de do Sul - que tem pouco mais de nove milhões de habi­tantes e possui nove Faculda­des de Medicina, cinco delas fe­derais - duas cidades, distan­tes 36 Km uma da outra, deci­diram criar cursos de medicina com cem vagas cada um, à re­velia do Poder Público e des­cumprindo os Decretos núme­ros 98.377/89 e 359/91 e a por­taria interministerial 01/90, ba­seados, todos, no art. 200 da Constituição.

Depois irão fazer pressão po­lítica, utilizando, inclusive, o argumento do fato consumado, presença de alunos, etc., pelo reconhecimento dos mesmos.

... "A democracia não pode ser confundida bom bagunça" ... Deve ser uma ordenação ju­rídica, leis a serem seguidas, organismos dirigentes respon­sáveis".

Ora, é fácil certificar-se da ve­racidade do que foi dito pelo dig­no Dr. Adib Jatene, basta, para tanto, verificar o número elevado, até mesmo assustador, de proces­sos em tramitação no próprio Conselho Federal de Educação en­volvendo Faculdades de Medicina

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e outras na área da saúde, por motivos de sérias acusações de de­ficiência dos cursos ministrados, dentre outras impropriedades."

Em conclusão: o ato ministerial atacado observou a legislação de re­gência e os decretos em que se apóia não infringem o princípio da legali­dade, não violam a autonomia uni­versitária, nem exorbitam o poder regulamentar. Ademais, o ensino universitário, administrado pela ini­ciativa privada, há de atender aos requisitos previstos no art. 209 da Constituição Federal: cumprimento das normas de educação nacional e avaliação de qualidade pelo Poder Público.

Isto posto, denego a ordem.

ESCLARECIMENTOS

O SR. MINISTRO MILTON LUIZ PEREIRA: Senhor Ministro-Presi­dente, tomo a liberdade de solicitar ao eminente Relator um esclareci­mento. Acompanhei o seu erudito voto, entretanto uma questão jurídi­ca ainda continua me confundindo: dá-se relevo, na impetração, à irre­troatividade dos decretos atacados. Muito apreciaria, para o meu con­vencimento, ouvir a fundamentação do seu voto a respeito da irretroati­vidade, porque, efetivamente, cons­titui aspecto significativo.

Rogo, por isso, ao eminente Rela­tor a elucidação, ainda que sucinta, se possível. Se S. Exa. entender que é complexa pedirei vista.

O SR. MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO (Relator): Vou ve­rificar se consigo. A petição inicial é longa, com quase trinta páginas ...

O SR. MINISTRO MILTON LUIZ PEREIRA: Refiro-me à irretroativi­dade dos Decretos ni1§. 98.377 e 359, de 1981, violando o direito adquirido.

O SR. MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO (Relator): Exato. Há essa argumentação, mas enten­di que não procedia.

Diz o seguinte:

"Somente após a criação do Curso de Odontologia da UBC veio a lume o Decreto n~ 98.377, de 08.11.89, que prescreveu a ne­cessidade de os novos cursos da área da saúde, a serem ministra­dos por estabelecimentos isolados ou por universidades, passarem pela autorização prévia do Presi­dente da República, após parecer favorável do Conselho de Educa­ção competente e manifestação do Conselho Nacional de Saúde (art. 2~).

Posteriormente, aos 09/12/91, o Decreto n~ 359, embora reconhe­cendo a autonomia universitária quanto à criação de novos cursos (art. 1~), no art. 2~ remete às exi­gências do Decreto n~ 98.377/89 para os cursos na área da saúde, mesmo para as Universidades~

É nos arts. 2~ de ambos os De­cretos que se apóia a Portaria Mi­nisterial n~ 196/94, atacada por esse Mandado de Segurança.

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No entanto, não se aplicam tais decretos ao Curso de Odontolo­gia da Universidade Braz Cubas, criado anteriormente à edição dos referidos decretos, ou seja em maio de 1989.

Impede sua incidência, em pri­meiro lugar, o princípio da irre­troatividade das leis e dos atos normativos secundários, impedin­do que seja alcançado pela norma posterior o ato jurídico perfeito e o direito adquirido que deste se origina".

Portanto, esse é o argumento, o qual entendi que improcede.

Logo, na sua parte inicial, o pare­cer cita:

"À época da criação do curso vi­gia o Decreto 97.223/88, que as­sim dispunha:

"Art. 1~ - Fica prorrogada, até 30 de junho de 1989, a vi­gência do Decreto n~ 93.594, de 19 de novembro de 1986, alte­rado pelo Decreto n~ 95.003, de 05 outubro de 1987.

Art. 2~ - A suspensão a que alude o Decreto n~ 93.594/86 aplica-se pelo prazo estabeleci­do no art. 1~ deste Decreto, a todas as Universidades.

Art. 3~ - Não se admitirá o funcionamento de cursos cria­dos sem observância das exigên­cias legais.

Art. 4~ - omissis

Art. 5~ - omissis".

O Decreto n~ 93.594/86, repor­tado pelo diploma legal supra, dis­punha sobre a sustação de criação de novos cursos superiores de gra­duação em todo o território nacio­nal, só que não aplicava tal sus­pensão às Universidades.

Assim, a criação do curso de odontologia pela UBC, conforme suas próprias informações, em 20.05.89, deu-se dentro do prazo proibitivo estipulado pelo Decre­to 97.223/88. E note-se bem, que o referido Diploma não falava so­bre qualquer tipo de condicionan­te para criação de novos cursos, qual seja aprovação pelo Presiden­te da República ou outras, ele sim­plesmente sustava a criação pe­lo prazo que se prorrogava até 30.06.89".

VOTO

O SR. MINISTRO MILTON LUIZ PEREIRA: Senhor Presidente, a re­missão feita pelo Senhor Ministro­Relator me esclareceu a respeito do conteúdo geral da fundamentação da impetração. Mas, como bem argu­mentou e demonstrou o Senhor Mi­nistro-Relator, na seqüência dos di­plomas legais de regência, observa­se que houve continuidade e não descontinuidade, esclarecimento que afasta a minha dúvida quanto à alu­dida irretroatividade, que poderia fe­rir o direito adquirido. Como não ocorreu a irretroatividade, não se constituiu e não ficou ferido o direi­to adquirido.

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o outro aspecto que foi enfatiza­do na impetração - e não passou desapercebido na sustentação oral -foi o aspecto social. E, evidentemen­te, até se poderia fazer uma rápida incursão, numa invocação possível, quem sabe, do art. 52, da Lei de Ins­trução ao Código Civil, para uma aplicação em benefício deste interes­se, ou aplicação voltada a este aspec­to social. Mas há, douta Advogada, um contrapeso, porque, se é certo que nos defrontamos com a amargu­ra dos candidatos que, aprovados, não podem se matricular, esse inte­resse é relevante. Mas ele ganha, na verdade, uma projeção mais econô­mica do que social. É mais restrito a um grupo coletivo, com os quais co­mungo pela frustração. Mas, entretan­to, há a superposição de outro: o in­teresse público, surgido da saúde pú­blica. Ora, se a Faculdade de Odon­tologia não ganhou ainda o alento de prévia verificação do Conselho Fede­ral de Educação, quanto às condições mínimas de funcionamento, estaria a se propiciar, pelo menos em tese, um caminho perigosíssimo, com a in­suficiente formação de profissionais, colocando em risco a saúde pública. E, sopesando os dois interesses, ape­sar da amargura do cidadão, no Bra­sil, onde poucos chegam a um curso universitário, não diviso como ultra­passar o óbice difícil, favorecendo a matrícula, que certamente foi feste­jada logo após, com a publicação do resultado e das listas de aprovação. Nesse passo, como cidadão e pensan­do como Juiz, diante dos referidos interesses, entendo que o interesse público tem maior significação e de-

ve prevalecer, mesmo que os alunos possam verter as lágrimas, porque não vão poder se matricular. Mas, entre essas lágrimas passageiras de uma juventude que se recuperará no próximo vestibular e as daqueles que chorarão para sempre, com o sa­crifício da sua saúde, quem sabe co­locada de modo irreversível e sem solução, prefiro chorar com os alunos momentaneamente para não chorar permanentemente com as vítimas de um tratamento inadequado.

Por outro lado, há que se pensar - e o eminente Relator ressaltou com muita presteza - que, lem­brando o Rio Grande do Sul com no­ve Faculdades de Medicina e mais duas que estavam para surgir. Isto me faz lembrar do Brasil da Corte, onde tudo era ao redor do poder do Rei: os cursos, os órgãos, a centrali­zação desmedida. Era, na verdade, o fluxo e o refluxo dos interesses pes­soais e não dos superiores interesses coletivos.

E o Rio Grande do Sul já foi uma espécie de sub corte do Brasil, pela importância, é verdade, dos seus lí­deres políticos. Mas grandes obras se realizaram concentradamente.

Hoje a educação moderna está apregoando com muita intensidade - a douta Advogada, como uma das maiores juristas deste País, profes­sora sensível, Advogada brilhante, com certeza deve comungar do mes­mo pensamento - que os cursos su­periores ou profissionalizantes de­vem ser criados segundo a vocação da própria comunidade. Ainda há pouco, a imprensa detalhou a cria-

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ção de uma faculdade de pesca no Centro do Brasil, onde não havia nem rio, nem mar e, muito menos, pescador. Evidentemente, tudo isso é um desastre. Cria-se, muitas ve­zes, uma Faculdade de Agronomia à beira do mar, ou numa praia, não se sabe para que e nem por quê.

Pelo vinco do exposto, quanto ao interesse social, que é outro, pode­riam me levar a uma aplicação so­cial da lei (art. 5~, LICC), também não encontro nenhuma esteira sóli­da para me convencer.

Com tudo o que disse - na ver­dade, desnecessário era, porque a fundamentação jurídica trazida pe­lo Senhor Ministro-Relator é convin-

cente -, prestando homenagem à nobre Advogada, que, inclusive, atua pela primeira vez perante esta Se­ção, manifestando-lhe respeito, voto acompanhando o eminente Ministro­Relator.

VOTO

O SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ: Sr. Presidente, todos os ele­mentos inerentes à questão suscita­da na impetração pelos eminentes Ministro-Relator e Milton Luiz Pe­reira, convencem-me da inexistência de direito líquido e certo na espécie.

Acompanho o Sr. Ministro-Rela­tor.

MANDADO DE SEGURANÇA N~ 3.600-9 - DF

(Registro n~ 94.0025296-0)

Relator: O Sr. Ministro Demócrito Reinaldo Impetrantes: Merchants Companhia de Comércio Exterior e outros Impetrado: Ministro de Estado da Indústria e Comércio Advogados: Marco Antônio Mundim e outros, e Sérgio Sahione Fadel e

outro

EMENTA: Mandado de segurança. Exportação de café. Portarias ministeriais n!lJi. 239,240,253 e 728/91. Indeferimento de pedidos e cancelamentos de outros já autorizados. Inexistência de direito ad­quirido. Segurança denegada.

A fiscalização e controle das exportações de produtos nacionais se subsume no âmbito da conveniência da Administração, com a prevalência do interesse da coletividade a ser tutelado.

O Estado intervém na atividade econômica, no interesse nacio­nal, tendo como objetivo a preservação da soberania e a defesa do consumidor.

Inexistência de direito adquirido. Segurança denegada. Decisão por maioria de votos.

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ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas, decide a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, de­negar o mandado de segurança, ven­cido, em parte, o Sr. Ministro Milton Luiz Pereira (voto-vista) que o con­cedia parcialmente, na forma do re­latório e notas taquigráficas constan­tes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julga­do. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Américo Luz, Antônio de Pádua Ri­beiro, Hélio Mosimann e Peçanha Martins. Não participou do julga­mento o Sr. Ministro Humberto Go­mes de Barros.

Brasília, 14 de fevereiro de 1995 (data do julgamento).

Ministro GARCIA VIEIRA, Presi­dente. Ministro DEMÓCRITO REI­NALDO, Relator.

Publicado no DJ de 16-10-95.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO DEMÓCRITO REINALDO: O ilustre Subprocura­dor-Geral da República, assim resu­miu a controvérsia:

"Merchants - Companhia de Co­mércio Exterior e outras empresas exportadoras de café investem con­tra as Portarias do Ministro da In­dústria, do Comércio e do 'furismo, de n.Q§. 239 e 240, de junho último e 253/93, que dispuseram de forma re­troativa:

a) Cancelando todos os registros de venda de café em grão baseados nas cotações de 27/6/94 (Portaria 239);

b) Indeferindo todos os pedidos de venda de café em grão, baseados na cotação de 27/06/94;

c) Estendendo esses cancelamen­tos e indeferimentos ao registro de venda de café solúvel (Portaria 240).

Aduzem que essas medidas con­trariam os artigos 170 e 174 do Es­tatuto Fundamental, por impedirem o livre exercício da atividade econô­mica e malferirem o seu direito de promoverem a venda no exterior, pois que satisfizeram os requisitos da Portaria n~ 27/93 e obtiveram as confirmações do órgão competente -Sistema Integrado de Comércio Ex­terior SISCOMEX -, com expe­dição do registro de venda, desca­bendo o desfazimento de vendas já efetuadas.

Pedem o restabelecimento de ple­na eficácia de registro de venda de café, anulando-se os atos impugna­dos.

A autoridade coatora prestou as informações, suscitando preliminar de incabimento do writ.

O Dr. Procurador-Geral da Repú­blica opinou pelo indeferimento do pedido.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO DEMÓCRITO REINALDO (Relator): Merchants

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Companhia de Comércio Exterior e outras empresas com atividades con­gêneras impetraram mandado de se­gurança contra ato do Ministro da Indústria, do Comércio e do 'furismo (Portarias 239, 240 e 253), alegando: que promoveram contratos com em­presas do exterior o registro prévio de diversas vendas de café, no perío­do de 24 a 27/06/94, no SISCOMEX (Sistema de Integração de Comércio Exterior), na forma da Portaria n~ 728/91, do Ministro da Economia, Fazenda e Planejamento, e esses re­gistros geram direito à exportação. No entanto, foram surpreendidas pe­las Portarias de n.2§. 239 e 240, que dispuseram de forma retroativa:

a) Cancelar todos os registros de venda de café em grão baseados nas cotações de 24/06/94;

b) Indeferindo todos os pedidos de venda de café, inclusive o café solú­vel.

Pedem a concessão da segurança para que se assegure a plena eficá­cia dos registros pertinentes à expor­tação do café, porquanto, os atos im­pugnados foram expedidos em mal­trato ao direito adquirido e em des­conformidade com o disposto nos ar­tigos 170 e 174 da Constituição Fe­deral.

A autoridade coatora sustenta, entretanto, tratar-se de segurança contra lei em tese. Com efeito, as Portarias Ministeriais (239 e 240), ao cancelar os registros de venda de café e indeferir os registros de pedi­dos de exportação subseqüentes, im­plicaram, desde logo, em restrição às

atividades dos impetrantes, produ­zindo efeitos imediatos, constituin­do atos concretos, susceptíveis de controle pela via judicial.

Afasto a preliminar.

Quanto ao mérito, não me pare­cem, com a razão, os impetrantes. A questão, porém, não é nova nesta Corte. Em outras oportunidades já se proclamou que, a fiscalização e controle das exportações de produtos nacionais e importações, se subsu­mem no âmbito do interesse, conve­niência e oportunidade, cuja aprecia­ção ficará a critério da Administra­ção. O interesse público deve ser as­segurado com prevalência e, para tanto, com outorga de poder à Admi­nistração, quando houver interesse da coletividade a ser tutelado.

De ressaltar, desde logo, "que os atos administrativos, qualquer que seja a sua categoria ou espécie, nas­cem com a presunção de legitimida­de, independentemente de norma le­gal que o estabeleça. A presunção de legitimidade transfere o ônus da pro­va de inviabilidade do ato adminis­trativo para quem a invoca" (Conf. Hely Lopes Meirelles, Direito Ad­ministrativo Brasileiro, páginas 134/ 135).

As impetrantes invocam, em seu favor, as disposições dos artigos 170 e 174 da Constituição Federal (e ar­tigo 5~, XXXVI), sob color de que, a atividade estatal não poderia chegar ao ponto de impedir o legítimo exer­cício das respectivas atividades, afrontando a garantia do direito ad­quirido e do ato jurídico perfeito e, para tanto, aduzem:

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"Havendo os impetrantes solicita­do os registros de venda, mencio­nando-os com os requisitos e ca­racterísticas referidos pelo § 1 ~ do artigo 1~ da Portaria 27/93 e ha­vendo obtido as confirmações das vendas da parte do SISCOMEX, conforme documentos expedidos por esse órgão, não poderiam tê­los unilateralmente desfeitos, tan­to mais que se tratava de venda no exterior, com prazos e datas de embargos confirmados" (fl. 9).

Como se observa das próprias afirmações dos impetrantes, não é certo, nem legal, que estejam ampa­radas pelo direito adquirido e o ato jurídico perfeito. É que, como é cedi­ço - e se contém em textos expres­sos das Portarias 728/91 e 27/93 -"as exportações de café estão sujei­tas a registro "prévio de venda", a ser solicitada pela empresa. E, das próprias alegações das requerentes exsurge, estreme de dúvida, a con­clusão de que o "registro das vendas" ainda não teria "se aperfeiçoado", na data da proibição, pelo Ministério, das exportações do café. O registro - consoante deflui da própria mani­festação dos impetrantes - foi, ape­nas, requerido e não deferido. Ultra­passada teria sido tão-só a primeira fase - a do requerimento instruído com a documentação necessária. Au­sente, pois, a segunda, em que a au­toridade competente apreciaria o pe­dido, deferindo-o ou não. Só, aí, o ato administrativo se aperfeiçoaria e, em caso de deferimento do "registro das vendas", poder-se-ia falar em direi-

to adquirido. Antes, porém, era pos­sível a proibição da exportação me­diante o simples indeferimento do registro. Inexiste, ao meu sentir, di­reito adquirido (e ato jurídico perfei­to) a invocar. Vale, na oportunidade, transcrever, em excertos, o que in­formou a autoridade coatora:

"Urge assinalar que no contexto de suas afirmações, todas de cará­ter inexato, os impetrantes omi­tem deliberadamente a circuns­tância de que ocorreu, no final de semana compreendido no período de 24 a 26 de junho de 1994, for­te geada nas regiões produtoras de café, fato público e notório que culminou com cenas de devasta­ção de plantações de café. Real­mente, os impetrantes deram en­trada entre a noite de 24/06 e a manhã de 27/06, em registro de venda de café, amparando um to­tal de exportações atípico, num montante de 800.000 sacas, o que equivale a cerca de 12% das ope­rações efetivadas em um semes­tre. Imputou-se, à espécie, a ne­cessidade de avaliação dos danos causados pela geada à lavoura e conseqüentemente, ao desenvolvi­mento da política nacional de ex­portação do café, com vistas a que o mercado interno não sofresse com o desabastecimento do produ­to, como no que concerne ao efeti­vo prejuízo cambial numa época em que a inflação era da ordem de 50%. Assim é que, a exporta­ção do café deveria atender às ra­zões de oportunidade e conveniên-

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cia de tal forma que não sacrifi­casse os legítimos interesses na­cionais, com uma exportação des­necessária de mercadoria brasilei­ra a preços ínfimos. Os contratos de exportação, se realizados aos preços previstos no registro, im­plicariam em perda cambial con­siderável para o País" (fi. 409).

Como bem se vê, os atos impug­nados tiveram o viso de evitar, não só o desabastecimento do produto, no mercado interno, como a perda cambial de certa monta. 'Ibrnou-se, aí, inevitável a intervenção do Esta­do, no exercício de sua atividade dis­cricionária e ao qual compete avaliar as questões sobre a conveniência e oportunidade, na preservação maior dos interesses nacionais. A adminis­tração aqui dentro dos confins que a lei e a Constituição lhe assegura, sem afrontar direitos de quem quer que seja, para sobreguardar os inte­resses do povo brasileiro. E é ao Po­der Executivo, através de seus ór­gãos, que compete disciplinar e fis­calizar as exportações de produtos nacionais e importação de produção externa, já que, o Estado intervém na atividade econômica, como seu agente normativo e regulador e, a ordem econômica, na dicção de pre­ceitos constitucionais, é fundada na valorização do homem e na livre ini­ciativa, mas, tendo como "meta op­tada" a preservação da soberania nacional e a defesa do consumidor (artigos 170 e 174 da Constituição Federal).

A simples entrada de dados (ou o simples requerimento), como acen-

tuou a autoridade impetrada, "não pode ser utilizado, pelos impetran­tes, como argumento para garantir o direito ao registro de venda. Cabe, ainda, a análise, pelo órgão compe­tente, que poderá aprová-lo ou negá­lo. E a Portaria 239 indeferiu todos os pedidos de registro de venda de café baseados na cotação de 27/06 e determinou a suspensão de novos re­gistros" (fi. 430).

No dizente à inobservância do dis­posto no § 3~ do artigo 2~ da Lei de Introdução ao Código Civil, pelo qual há impedimento de restauração da lei revogada por ter o diploma legal revogador perdido a vigência, escla­rece o Dr. Subprocurador-Geral da República: "Cancelados os registros e indeferidos os pedidos de registro de venda de café (artigo 3~ da Porta­ria 240/94), a revogação dessas Por­tarias (239 e 240) pela de n~ 249/94 não alcança os efeitos prescritos de cancelar e indeferir os registros e os pedidos de registro de venda de ca­fé. Esses efeitos já se operaram. Por outro lado, o artigo 1~ da Portaria 253/94, que tornou sem efeito o ar­tigo 2~ da Portaria 249/94, realmen­te, não restaura as Portarias revoga­das (239 e 240) por si, tanto que o Ministério da Indústria e Comércio e do Turismo expediu a Portaria 261/94, cujo artigo 2~, dispõe: "per­manecem em vigor as disposições contidas nos artigos 2~ e 3~ das Por­tarias n~ 239 e 240, ambas de 27 de junho de 1994 e das Portarias nQ§. 258 e 259, ambas de 11 de junho de 1994". Inexistiu, pois, aplicação re-

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troativa de normas de instruções mi­nisteriais, para alcançar situações já pré-constituídas ou indenes de alte­ração - em face de pretenso direito adquirido. Demais disso, a revogação dos atos ministeriais - cancelando ou indeferindo registros - não tem o condão de restabelecer os registros cancelados ou indeferidos - eis que os efeitos já se exauriram.

Por último, tem-se como induvido­so que a administração agiu nos li­mites da lei e da Constituição, no resguardo de relevantes interesses nacionais e para obstar danos irre­paráveis à economia do País. Os seus atos ficam, pois, forros de apre­ciação pelo Judiciário, porque envol­vem juízo de conveniência e oportu­nidade, como já se afirmou, alhures.

Denego a segurança.

É como voto.

RATIFICAÇÃO DO VOTO

O SR. MINISTRO DEMÓCRITO REINALDO (Relator): Senhor Presi­dente, com a devida venia do emi­nente Sr. Ministro Milton Luiz Pe­reira, mantenho, na sua integralida­de, o méu voto, pelas próprias razões expendidas pelo eminente Ministro, com citações de juristas. A revogação dos registros foi feita através de ato genérico, de portarias instrutórias para que todos as cumprissem e não se dirigiram direta e especificamen­te a uma determinada pessoa, mas aos exportadores de café.

Direito adquirido poderia existir se a lei ou a Constituição o estabele-

cesse, ou, então; se já houvesse, pe­lo menos, o embarque da mercadoria ou se se tivesse efetivado a exporta­ção. Se isso não aconteceu, se as por­tarias, mesmo revogatórias, alcança­ram o ato administrativo, ainda, an­tes de seu começo, o que poderia ha­ver era prejuízo que a parte teria que provar em ação, nas instâncias ordinárias, e não no âmbito do man­dado de segurança.

Como se trata de um ato genéri­co e não específico, portarias que traçavam instruções para efeito de exportação do café; como se tratam, também, de questões de interesse público, de interesse da Nação, em que cabe ao Presidente da Repúbli­ca discipliná-las; como se trata da exportação de oito mil sacas de café, que, agora, com o câmbio atual, re­presenta prejuízo considerável à Na­ção, é impossível conceder-se a segu­rança, nestas circuntâncias.

Mantenho o meu voto, denegando a segurança em seu todo, por enten­der que não existe, absolutamente, direito adquirido. Se prejuízo houve, que se demande nas instâncias ordi­nárias.

É como voto.

VOTO - VISTA

O SR. MINISTRO MILTON LUIZ PEREIRA: Perturbado pelas dúvidas que soaram no meu juízo, para o convencimento, com o propósito de fazer a inspeção das peças informa­tivas, fixando as pertinentes refle­xões sobre a causa de pedir e o pedi­do, solicitei vista dos autos.

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Finalizado o voluntário exame, fa­ce ao tempo decorrido pela interme­diação das férias, desejando facilitar a compreensão, recordo que o litígio teve por nascedouro os procedimen­tos administrativos afeitos às expor­tações de café, com sujeição a regis­tro prévio de venda, alcançados pe­las Portarias n llli 239 e 240, expedi­das pela autoridade impetrada, con­forme noticiado na inicial:

omissis

"22 ... havendo as impetrantes solicitado os registros de venda, mencionando-os com os requisitos e características referidos pelo pa­rágrafo 1~ do art. 1~ da Portaria n~ 27/93, e havendo obtido as confir­mações das vendas da parte do SISCOMEX, conforme expressa­mente consignado nos documentos oficiais expedidos por esse órgão, não mais poderiam tê-los simplis­'ta e unilateralmente desfeitos, co­mo ocorreu, tanto mais quanto se trata de vendas efetuadas no ex­terior e com prazos e datas de embarques confirmados".

"25. Tratando-se, no caso, de atividade estatal de caráter mera­mente indicativo, como expressa o texto constitucional, o procedi­mento do poder público não pode­ria jamais ir até o ponto de impe­dir o exercício legítimo das ativida­des dos impetrantes que se obriga­ram com as empresas estrangei­ras, pelas vendas de café livre­mente contratadas, com base em

registros regulares no órgão com­petente, mercê de atos jurídicos perfeitos e acabados."

"27. No caso presente a evidên­cia da aplicação retroativa dos atos impugnados, os arts. 2~ e 3~ das Portarias 239 e 240, da auto­ridade impetrada, fica caracteri­zada quando se considera que os registros de venda cancelados já tinham sido objeto, anteriormen­te, de regular emissão, a eviden­ciar não só o direito adquirido da transportadora como também o ato jurídico perfeito da emissão do registro (rectus, licença de expor­tação)". - fls. 9 elO.

Noutra perspectiva, enfocando ou­bras fatos, as Impetrantes alvoroça­ram:

omissis

" ... o indeferimento sumário dos pedidos de registro apresentados em 27.6.94 é igualmente injus­tificável, dado que se trata de pos­tulações apresentadas e relativas a vendas efetivadas antes da aber­tura dos pregões das Bolsas de Nova Iorque e de Londres. Basta ver que os registros foram pleitea­dos em 27.6 e o ato indeferitório só foi publicado e, pois, só teve vigên­cia em 28.6.94.

29. Portanto, havendo as mal­sinadas portarias entrado em vi­gor apenas em 28.6.94, data da respectiva publicação no Diário Oficial a teor do disposto no seu

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art. 42, não eram mais suscetíveis de produzirem efeitos pretéritos para atingir atos regulares que surtiram conseqüências jurídicas, retirando a eficácia de registros de vendas procedidos regularmen­te". (fi. 10).

N esse cenáculo de situações fáti­cas e do enredo jurídico, o eminente Relator, afastando a preliminar de que se cuida de impetração contra lei em tese, com suas percucientes observações, para denegar a segu­rança, expôs:

omissis

" ... não é certo, nem legal que estejam amparadas pelo direito adquirido e o ato jurídico perfeito. É que, como cediço - e se contém em textos expressos das Portarias 728/91 e 27/93 - 'as exportações de café estão sujeitas a registro 'prévio de venda', a ser solicitada pela empresa. E, das próprias ale­gações das requerentes exsurgem estreme de dúvida, a conclusão de que 'registro das vendas' ainda não teria 'se aperfeiçoado', na da­ta da proibição, pelo Ministério, das exportações do café. O regis­tro - consoante deflui da própria manifestação dos impetrantes­foi, apenas, requerido e não defe­rido. illtrapassada teria sido tão­só a primeira fase - a do reque­rimento instruído com a documen­tação necessária. Ausente, pois, a segunda, em que a autoridade competente apreciaria o pedido, deferindo-o ou não. Só, aí, o ato administrativo se aperfeiçoaria e,

em caso de deferimento do 'regis­tro das vendas', poder-se-ia falar em direito adquirido. Antes, po­rém, era possível a proibição da exportação mediante o simples in­deferimento do registro. Inexiste, ao meu sentir, direito adquirido (e ato jurídico perfeito) a invocar. Vale, na oportunidade, transcre­ver, em excertos, o que informou a autoridade coatora:

'Urge assinalar que no con­texto de suas afirmações, todas de caráter inexato, os impe­trantes omitem deliberadamen­te a circunstância de que ocor­reu, no final de semana com­preendido no período de 24 a 26 de junho de 1994, forte gea­da nas regiões produtoras de café, fato público e notório que culminou com cenas de devas­tação de plantações de café. Realmente, os impetrantes de­ram entrada entre a noite de 24/06 e a manhã de 27/06, em registro de venda de café, am­parando um total de exporta­ções atípico, num montante de 800.000 sacas, o que equivale a cerca de 12% das operações efe­tivadas em um semestre. Im­putou-se, à espécie, a necessi­dade de avaliação dos danos causados pela geada à lavoura e conseqüentemente, ao desen­volvimento da política nacional de exportação do café, com vis­tas a que o mercado interno não sofresse com o desabasteci­mento do produto, como no que concerne ao efetivo prejuízo

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cambial numa época em que a inflação era da ordem de 50%. Assim é que, a exportação do café deveria atender às razões de oportunidade e conveniência de tal forma que não sacrificas­se os legítimos interesses nacio­nais, com uma exportação des­necessária de mercadoria bra­sileira a preços ínfimos. Os contratos de exportação, se rea­lizados aos preços previstos no registro, implicariam em perda cambial considerável para o País' (fI. 409).

Como bem se vê, os atos im­pugnados tiveram o viso de evi­tar, não só o desabastecimento do produto, no mercado interno, co­mo a perda cambial de certa mon­ta. 'Ibrnou-se, aí, inevitável a in­tervenção do Estado, no exercício de sua atividade discricionária e ao qual compete avaliar as ques­tões sobre a conveniência e opor­tunidade, na preservação maior dos interesses nacionais. A admi­nistração aqui dentro dos confins que a lei e a Constituição lhe as­segura, sem afrontar direitos de quem quer que seja, para sobre­guardar os interesses do povo bra­sileiro. E é ao Poder Executivo, através de seus órgãos, que com­pete disciplinar e fiscalizar as ex­portações de produtos nacionais e importação de produção externa, já que o Estado intervém na ati­vidade econômica, como seu agen­te normativo e regulador e, a or-

dem econômica, na dicção de pre­ceitos constitucionais, é fundada na valorização do homem e na li­vre iniciativa, mas, tendo como 'meta optada' a preservação da so­berania nacional e a defesa do consumidor (artigos 170 e 174 da Constituição Federal).

A simples entrada de dados (ou o simples requerimento), como acentuou a autoridade impetrada, 'não pode ser utilizado, pelos im­petrantes, como argumento para garantir o direito ao registro de venda. Cabe, ainda, a análise, pe­lo órgão competente, que poderá aprová-lo ou negá-lo. E, a Porta­ria 239 indeferiu todos os pedidos de registro de venda de café ba­seados na cotação de 27/06 e de­terminou a suspensão de novos registros' (fI. 430).

No dizente à inobservância do disposto no parágrafo 3~ do artigo 2~ da Lei de Introdução ao Código Civil, pelo qual há impedimento de restauração da lei revogada por ter o diploma legal revogador perdido a vigência, esclarece o Dr. Subprocurador-Geral da Repúbli­ca: 'Cancelados os registros e in­deferidos os pedidos de registro de venda de café (artigo 3~ da Porta­ria 240/94), a revogação dessas Portarias (239 e 240) pela de n2 249/94 não alcança os efeitos pres­critos de cancelar e indeferir os registros e os pedidos de registro de venda de café. Esses efeitos já se operaram. Por outro lado, o ar­tigo 1~ da Portaria 253/94, que tornou sem efeito o artigo 2~ da

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Portaria 249/94, realmente, não restaura as Portarias revogadas (239 e 240) por si, tanto que o Mi­nistério da Indústria e Comércio e do Turismo expediu a Portaria 261/94, cujo artigo 2~, dispõe: 'per­maneçam em vigor as disposições contidas nos artigos 2~ e 3~ das Portarias n2§. 239 e 240, ambas de 27 de junho de 1994 e das Porta­rias n2§. 258 e 259, ambas de 11 de junho de 1994'. Inexistiu, pois, aplicação retroativa de normas de instruções ministeriais, para al­cançar situações já pré-constituí­das ou indenes de alteração - em face de pretenso direito adquirido. Demais disso, a revogação dos atos ministeriais - cancelando ou in­deferindo registro - não tem o condão de restabelecer os registros cancelados ou indeferidos - eis que os efeitos já se exauriram."

Como se percebe, frente à Porta­ria 239, duas situações são detalha­das: uma, referenciando os registros de vendas, com base nas cotações de 24 de junho de 1994; a outra, gera­da pelo indeferimento dos pedidos de venda, conseqüente às cotações de 27 de junho de 1994. Outrossim, foi dado relevo que a Portaria 249/94 revogou as Portarias 239 e 240 (es­ta afetando os registros da venda de café solúvel), por fim, emergindo a Portaria 253/94, tornando sem efei­to o art. 2~ da Portaria 249/94.

Feito o necessário memento, à mi­nha vez, penso que as diferenciadas situações, reclamam delineamentos e desate correspondente, porque re-

velam conseqüências jurídicas dis­tintas.

Portanto, de logo, comungando com a rejeição da preliminar, seqüen­cialmente, submeto a atenção aos prévios registros de venda (RV) regu­larmente emitidos (Decreto 27.173/ 49 e Portarias n2§. 728/91 e 27/93 -MICT - fls. 36 a 39).

Nessa vereda, dúvidas inexistem de que, após a emissão dos aludidos registros, advieram as Portarias n2§. 239 e 240 de 27.06.94 (in DOU de 28.06.94), com a suspensão dos re­gistros futuros e abruptamente can­celando os registros de venda do ca­fé em grão, baseados nas cotações de 24.06.94 (arts. 1~ e ~ - fi. 20). A Por­taria 240/94, com iguais disposições, cuidou do "café solúvel".

Eis aí a questão: poderia legal­mente a autoridade administrativa agir, como agiu, modificando unila­teralmente condição regularmente constituída com a emissão do regis­tro prévio?

Para a resposta no plano inaugu­ral de observações, não se põe à de­cisão o aspecto da sua competência, como agente normativo e regulador de atividade econômica de manifes­to interesse do Estado, fiscalizando, incentivando e planejando (art. 174, Constituição Federal). A preocupa­ção fulcral, no caso, reside na averi­guação da legalidade no exercício de atividades que não refogem às gerais estipulações da lei.

Por essas estrias, de pronto, des­cogitando-se das vendas correlatas aos pedidos não deferidos, depara-se

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que os registros emitidos, foram alcançados pelos efeitos retroativos das Portarias 239 e 240, de 1994, deixando vislumbrar que não foram inspirados sob o apanágio da lega­lidade, embora possam escudar-se em sadio planejamento econômico. 'lbdavia, as boas intenções não fo­mentam a legalidade do ato admi­nistrativo.

Com efeito, quanto aos registros emitidos, incontrovertido o efeito re­troativo das Portarias, sublinha-se desfeita ao ato jurídico antecipado e perfeitamente constituído. Nesse toar, ganha estridência anotar que a Portaria 249/94, prenunciando a dis­tonia legal de antagônicas disposi­ções, revogou as multicitadas Porta­rias 239 e 240 (fl. 21), surpreenden­do com a Portaria 253/94, no giro de perplexidades, reavivando as Porta­rias revogadas, além de dispor con­traditoriamente no seu art. 2~ a re­vogação de específicas disposições da Portaria 239/94, por inteiro, revoga­da pelo art. 2~, Portaria 249/94. 'fu­do de um dia para o outro - 7 e 8 de julho de 1994 - , embaraçando a compreensão das suas razões ou mo­tivos, com prejuízo à vigência e com­prometendo a estabilidade das nor­mas (fls. 21 e 22), no meu sentir, tis­nando o art. 2~ e parágrafo 3~, Lei de Introdução ao Código Civil. Sim, porque, a trato dos registros emiti­dos, favorecendo o criticado "cance­lamento", revelou efeitos ex tunc. Junte-se, incensando a confusa sem cerimônia na sucessão de atos, côn­sono lembrete do douto Subprocura­dor-Geral, a edição da Portaria 261/ 94, dando vigência às disposições

dos arts. 2~ e 3~ das mencionadas Portarias 239 e 240.

No estuário das ocorrências, a fo­co dos registros emitidos, objeto do criticado cancelamento, desengana­damente, os efeitos obstaculizaram os atos de mercancia, até então, de­sembaraçados, sem oportunidade de defesa, ferindo o direito dos Impe­trantes concluírem autorizadas ope­rações de exportação.

Por essa linha de pensar, aperfei­çoados os demandados registros nos termos da legislação de regência, só poderiam ser alterados, sem ofensa ao direito gerado, com a observância do devido processo legal, com os pro­cedimentos cabíveis, assegurando-se às Impetrantes oportunidade para a defesa da autorização concretizada, constituída em ato jurídico perfeito e não precário.

Em contrário, será reconhecer à Administração Pública o poder abso­luto de revogar ou anular os próprios atos, malferindo direitos constituídos. Sim, as Súmulas 346 e 473/STF opor­tunizam a revogação e declaração de nulidade dos atos administrativos. Contudo, anote-se que a supressão de um ato administrativo, fundado no poder discricionário, pode ser ditado pelo juízo da conveniência, oportuni­dade e razoabilidade de seus próprios atos,

" ... mas motivos óbvios de inte­resse na estabilidade das relações jurídicas e de respeito aos direitos adquiridos pelos particulares afe-

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tados pelas atividades do Poder Público, impõem certos limites e restrições a essa faculdade da Ad­ministração.

Neste ponto é de se relembrar que os atos administrativos po­dem ser gerais ou regulamentares (regulamentos e regimentos) e es­peciais ou individuais (nomeações, permissões, licenças, etc.). Quan­to aos primeiros são, por nature­za, revogáveis a qualquer tempo e em quaisquer circunstâncias, desde que a Administração respei­te os seus efeitos produzidos até o momento da invalidação. E com­preende-se que assim sej a, porque estes atos (gerais ou regulamen­tares) têm missão normativa as­semelhada à da lei, não objetivan­do situações pessoais. Por isso mesmo, não geram, normalmente, direitos subjetivos individuais à sua manutenção, razão pela qual os particulares não podem opor-se à sua revogação, desde que sejam mantidos os efeitos já produzidos pelo ato.

Quanto aos atos administrati­vos especiais ou individuais são também, em tese, revogáveis, des­de que seus efeitos se revelem in­convenientes ou contrários ao in­teresse público, mas ocorre que esses atos se podem tornar ope­rantes e irrevogáveis desde a sua origem ou adquiriu esse caráter por circunstâncias supervenientes à sua emissão. E tais são os que geram direitos subjetivos para o

destinatário, os que exaurem des­de logo os seus efeitos e os que transpõem os prazos dos recursos internos, levando a Administração a decair do poder de modificá-los ou revogá-los. Ocorrendo qualquer dessas hipóteses, o ato adminis­trativo se toma irrevogável, como tem entendido pacificamente a ju­risprudência.

Em qualquer dessas hipóteses, porém, considerou-se válidos os efeitos produzidos pelo ato revoga­do até o momento da revogação, quer quanto às partes, quer em re­lação a terceiros sujeitos aos seus efeitos reflexos.

"A revogação - ensina Seabra Fagundes - opera da data em diante (ex nunc). Os efeitos que a precederam, esses permanecem de pé. O ato revogado, havendo revestido todos os quesitos legais, nada justificaria negar-lhe efeitos operados ao tempo de sua vigên­cia". (Hely Lopes Meirelles -in Direito Administrativo Brasi­leiro - págs. 179 e 180 - 15:!: ed. - Ed. Rev. Tribs. - grifei).

Ora, em assim compreendendo, no caso, indiscutido que os prévios re­gistros de venda inteiramente, sub­meteram-se às exigências da ativida­de estatal, a desconstituição do ato não pode desconhecer e negar os seus legítimos efeitos, decorrentes da sua emissão, gerando direitos preceden­tes à revogação (intitulada de "can­celamento").

R. Sup. 'frib. Just., Brasília, a. 8, (78): 15-68, fevereiro 1996.

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Sequer, para a súbita decisão ad­ministrativa, salvaguardou-se a ga­rantia da ampla defesa (arts. 52, lI, 37 e 84, IV, C.F.), tisnando o direi­to adquirido, não pela afirmação da ilegalidade, mas por discutível jus­tificativa da necessidade de ser ava­liada a "quebra de safra" e pelo re­curso de ações especulativas ("consi­derandos" - fi. 20).

Como decifrado, pois, a revogação resultou de acontecimentos telúricos, com efeitos retroativos nas situações constituídas por ato pretérito perfei­to e acabado.

Enfim, objeta-se a potestade dis­cricionária da Administração Públi­ca, uma vez que feriu o capital prin­cípio da legalidade administrativa, na apoteose do Estado de Direito.

Pelo mirante da exposição, pres­tando homenagem à legalidade, con­siderando que a retroatividade dos atos censurados, cujos efeitos do seu conteúdo e finalidade, quanto aos re­gistros de venda emitidos, só podem operar ex tunc, afirmo que deve ser reconhecido o direito líquido e certo, nos limites da licenças concedidas, para que as Impetrantes exercitem as atividades cativas às programa­das exportações.

No tocante e, tão-somente, aos pe­didos de venda indeferidos, não con­cluída a atividade administrativa -vale dizer, ainda não aperfeiçoado os registros de venda-, portanto, pre­viamente àquelas Portarias, não constituído o direito às pretendidas exportações de café, manifesto ade­são à primorosa argumentação teci-

da pelo eminente Relator, finalizan­do pela existência da violação altea­da pelas Impetrantes.

Conclusivamente, pois, bem dis­tinguidas as situações ocorrentes, nas fincas da interpretação desen­volvida, convencido de que, restrita­mente aos registros de vendas emi­tidos, por afetação de efeitos retroa­tivos, houve ofensa ao direito líqui­do e certo das Impetrantes, parcial­mente, voto concedendo a segurança, com a finalidade de assegurar o exer­cício dos direitos transpostos daque­les registros. Obvia-se a denegação quanto à pretensão baseada nos pe­didos indeferidos.

É o voto-vista.

ESCLARECIMENTOS (VOTO - VISTA)

O SR. MINISTRO MILTON LUIZ PEREIRA: Senhor Presidente, dian­te das observações feitas nos votos que se seguiram, para não parecer que fui desatento no meu voto, lem­bro que não foi pedido ressarcimen­to ou reparação de dano. Está unica­mente em causa o exame da legali­dade do cancelamento pelas Porta­rias. No meu voto procurei distin­guir duas situações: uma em que os registros autorizativos de venda se completaram; a outra, restringiu-se a pedidos que foram indeferidos.

Enfim, cingi-me às concretas si­tuações, concluindo pela ilegalidade no pertinente aos registros emitidos.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 15-68, fevereiro 1996. 67

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VOTO

O SR. MINISTRO CESAR ASFOR ROCHA: Sr. Presidente, também en­tendo, data venia do eminente Mi­nistro Milton Luiz Pereira, como foi exposto pelo eminente Ministro De­mócrito Reinaldo, uma vez que não reconheço direito líquido e certo às postulantes em nenhuma das situa­ções que foram bem diferenciadas pelo Ministro Milton Luiz Pereira e, também, como o eminente Ministro Demócrito Reinaldo, entendo que se o prejuízo adveio para as impetran­tes, que elas demonstrem em ação própria, buscando assim a reparação desses danos porventura sofridos.

Por isso, data venia do eminen­te Ministro Milton Luiz Pereira, acompanho o eminente Ministro-Re­lator, denegando a segurança.

VOTO

O SR. MINISTRO AMÉRICO LUZ: Sr. Presidente, entendo que o direito líquido e certo não está con­figurado nas circunstâncias. Apesar das sempre competentes razões ex­pendidas no voto do Eminente Mi­nistro Milton Luiz Pereira, fico de acordo com o Sr. Ministro-Relator, acompanho, também, as colocações do Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha, data venia.

VOTO-VOGAL

O SR. MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO: Sr. Presidente, ouvi atentamente o voto do Eminen­te Ministro Milton Luiz Pereira, mas não me convenci, data venia, da existência de direito líquido e certo. Na verdade, o ato de exportação não havia ocorrido quando sobrevieram os atos impugnados e, por isso mes­mo, creio que se algum dano decor­reu, é matéria a ser apreciada nas vias ordinárias. Seja como for, pen­so que direito líquido e certo, no ca­so, não se acha configurado, data venia.

Acompanho o Sr. Ministro-Relator.

VOTO

O SR. MINISTRO PEÇANHA MARTINS: Senhor Presidente, acom­panhei com atenção o brilhante vo­to do eminente Ministro Milton Luiz Pereira, mas também não vislumbro direito adquirido pelos exportadores. Entendo que não se configurou a per­missão da exportação, razão por que acompanho o eminente Ministro-Re­lator. Se houve prejuízo deverá ser provado em ação própria, e não no mandado de segurança.

Denego a segurança.

68 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 8, (78): 15-68, fevereiro 1996.