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AS IDEIASQUE ELAS NOS
DEIXARAM
HISTORIA
A propósito do Dia Internacional da Mulher, eis as marcase os legados de dez portuguesas que fizeram a diferença
em quase novecentos anos de história.TEXTOS DE ROSA FERREIRA
D. TERESA INDEPENDÊNCIA (10787-1130)
A «avó» de Portugal foi durante séculos vítima de uma «lenda negra» destinada a diminuir o seu papelhistórico. Na verdade, depois de enviuvar, continuou a desenvolver o projeto político do seu maridoD. Henrique visando o alargamento e a autonomia do Condado Portucalense, no âmbito da ReconquistaCristã da Península Ibérica. A derrota na batalha de Sâo Mamede significou o fim do poder pessoalde Teresa de Leão e da aliança tática galaico-portuguesa - mas o seu filho D. Afonso Henriquesmanteve e atingiu o objetivo estratégico: a independência de Portugal.
D. ISABEL DE ARAGÃO PAZ E CARIDADE (1269/12717-1336)
Para lá dos milagres que levaram à sua canonização como santa da Igreja Católica pelo papa Urbano VIIIem 1625, a rainha D. Isabel deixou um legado político e social assente em duas ideias: paz e caridade.Hábil diplomata, a sua influência conciliadora foi decisiva para a assinatura do Tratado de Alcanizes, em1297, que fixou as fronteiras entre Portugal e Castela. Em conjunto com o marido, D. Dinis, arbitrou o
conflito entre Castela e Aragão, em 1304. Foi ainda intermediária na guerra civil que opôs D. Dinis ao seu
filho, o futuro rei D. Afonso IV, entre 1322 e 1324. Usou boa parteda fortuna pessoal para obras de caridade:foi do seu celeiro que saiu a farinha destinada a alimentar os pobres durante a grande fome que assolouCoimbra em 1293 (provável origem da versão portuguesa do milagre das rosas); pagava os dotes de
raparigas pobres e a educação dos filhos de fidalgos sem dinheiro. Fundou vários hospitais, conventos eobras religiosas.
INÊS DE CASTRO AMOR TRÁGICO (C. 1325-1355)
A história de Pedro e Inés inspirou cronistas e poetas que a transformaram num mito nacional: o amorproibido que acabou em tragédia quando ela foi assassinada por ordem do rei, à frente dos filhos; a
vingança cruel do amante tresloucado pela dor; o macabro beija-mão ao cadáver daquela que «depoisde morta foi rainha». Por detrás da lenda, a realidade. A «união de facto» entre o príncipe herdeiro (viúvo)e a antiga aia da sua mulher tornou-se uma questão de Estado porque ameaçava arrastar Portugal parauma guerra com Castela, devido ao envolvimento da família Castro nos conflitos dinásticos locais e à suacrescente influência na corte portuguesa. Inês foi julgada, condenada e executada. Mas ao pé dos versosde Camões, os factos não tinham a mínima hipótese de ficar para a história...
D. FILIPA DE LENCASTRE EDUCAÇÃO (1360-1415)
Neta do rei Eduardo 111 de Inglaterra, D. Filipa de Lencastre nasceu e foi criada entre a fina-flor da altaaristocracia. Enquanto o pai, John of Gaunt, se distinguia como chefe militar na Guerra dos Cem Anos,
Filipa recebia uma educaçãoesmerada, beneficiando dofacto de a mãe ter sido uma das primeiras damasinglesasasaber escrever. O escritor ChaucereocronístaFroissart eram frequentadores dosseus palácios.
Quando se casou, aos 27 anos, com D. João I, trouxe para Portugal os seus «perfeitos costumes» (comolhes chamou Fernão Lopes), que presidiram à educação dos filhos no sentido do dever e da excelência.D. Duarte foi rei e escritor; D. Henrique impulsionou os Descobrimentos; D. Pedro viajou pela Europa,escreveu e governou como regente; D. Fernando, o «Infante Santo», fez o último sacrifício no cativeiro
marroquino. Os filhos de D. Filipa passaram à história como a «ínclita geração».
D. LEONOR MISERICÓRDIA TARDIA (1458-1525)
Fundadora das Misericórdias, a maior rede de assistência social do país, ativa há mais de cinco séculos,a rainha D. Leonor ficou marcada por uma «feiíssima falta de caridade», como lhe chamou o historiadorAnselmo Braamcamp Freire: abandonou no leito de morte o marido, D. João 1 1, numa agonia terrível, comfortes suspeitas de ter sido envenenado. D. Leonor vivia há muito destroçada pela morte do irmão,
apunhalado pelo próprio rei, e do filho, na queda de um cavalo, e ainda pela tentativa (falhada) de D. João II
legitimar um bastardo. Viúva aos 37 anos, a irmã do novo rei D. Manuel I tornou-se uma das pessoas maisricas de Portugal e passou os trinta anos seguintes a fundar obras de assistência aos pobres e doentes:
hospitais, albergarias e misericórdias, além de conventos e igrejas.
D. FILIPA DE VILHENAPATRIOTISMO(?-1651)
Filha do conselheiro de EstadoD. Jerónimo Coutinho e viúvade D. Luis de Ataíde, conde de
Atouguia, D. Filipa de Vilhena
passou à história como símboloda mãe patriota que se sacrificaao ponto de mandar os filhos
morrer se for preciso pela liber-dade do país. Informada da
conspiração de nobres marca-da para Ide dezembro de 1640,incitou os seus dois filhos,D. Jerónimo de Ataíde e D. Fran-cisco Coutinho, a participaremna revolta contra o domínio es-
panhol. Ela própria lhes entre-
go uasarmaseexortou- os a
lutarem pela restauração da
independência de Portugal
MARQUESA DEALORNA EMOÇÃO(1750-1839)
Figura maior da cultura portugue-sa como poetisa e escritora, Leo-
nor de Almeida Portugal de Len-
castre e Távora foi testemunha de
alguns dos mais trágicos aconte-cimentos da nossa história, comoo terramoto de 1755, o processodos Távoras ou as invasões fran-
cesas. Recusou vergar-se ao des-
potismo do marquês de Pombal,à tirania de Pina Manique, à auto-ridade do pai , à vontade do marido
e aos caprichos dos amantes.Conspiradora em sociedades se-cretas e lutadora pela liberdade,conheceuduranteas suas viagens
alguns dos protagonistas da Eu-
ropa das Luzes e do romantismo,
que ajudou a introduzir entre nós.
D. CARLOTAJOAQUINA AMBIÇÃO(1775-1830)
Uma das mulheres mais odiadasda História de Portugal, a rainhaD. Carlota Joaquina pagou caroo atrevimento de ter um papelpolítico ativo num mundo domi-nado por homens. Com uma
agravante: escolheu sempre o
lado «errado», isto é, o dos ven-cidos. E como a história é contada
pelos vencedores, estes não lhe
perdoaram, criando à sua volta
uma lenda negra que ainda hoje
perdura. Feia de meter medo,ninfomaníaca, adúltera, ignoran-te, fanática... a diabolização foi
total, mesmo se injusta. Na ver-dade, o seu grande pecado foi a
ambição. Quis conquistar o po-der e perdeu - na «Conspiraçãodos Fidalgos» em 1805, contra o
marido; na tentativa de se tornarrainha das colónias espanholasdo Rio da Prata, quando o pai e o
irmão estavam presos por Napo-leão (1808-1814); por fim, ao
apostar no filho D. Miguel e na
causa absolutista contra os libe-rais. Acaba por ser lembrada pelodesabafo chocarreiro do maridoD. João VI, incapaz de a encarar,gritando ao cocheiro quando a
via aproximar-se: «Volta paratrás, vem aia puta!»
ÇAROLINA BEATRIZANGELO PROGRESSO(1877-1911)
Figura destacadado movimen-to sufragista, passou à história
por ter sido a primeira mulhera praticar cirurgia e a exercero direito de voto em Portugal.Em 1902, Carolina Beatriz An-
gelo foi a primeira médica por-tuguesa a operar no Hospitalde São José, em Lisboa, sob a
orientação de Miguel Bombar-da. Membro da Maçonaria e da
Liga Republicana das Mulheres
Portuguesas, costurou, junta-mente com Adelaide Cabete, a
bandeira da República hastea-da em 5 de outubro de 1910.Com base na sua situação de
viúva e mãe - chefe de família,portanto -, requereu a inscri-
ção como eleitora para a As-sembleia Constituinte, emmaio de 1911. O requerimentocomeçou por ser recusado,mas Carolina Angelo recorreue ganhou, tornando-se a primei-ra mulher portuguesa a votar.
Morreu poucos meses depois,com apenas 33 anos. Para evitara repetição da «façanha», Afon-
so Costa fez publicar um novo
Código Eleitoral que clarificavao que o regime entendia por «ci-dadãos eleitores.» •
PELAS ARMAS, PELA PENA, PELASIDEIAS OU PELA DIPLOMACIA,ESTAS MULHERES CONQUISTARAMA PULSO 0 DIREITO A UM LUGARNA HISTÓRIA DE PORTUGAL