press review page - clipquick.com · abandonou um dos cargos mais apetecidos pa-ra ir para casa....
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Os alarmes soam quando uma mulher alta-
mente qualificada, com um lugar de topo na
Administração Obama, abandona tudo paracuidar dos filhos. Anne-Marie Slaughter es-
candalizou as feministas ao assumir que as
mulheres ainda não conseguem conciliar a
maternidade com a vida profissional. Nin-
guém ficou imune ao debate que começounos EUA e alastrou de forma virai pelomundo. Em Portugal há pela primeira vez
mulheres em simultâneo à frente da Procu-
radoria-Geral da República, do Parlamento
e do Ministério da Justiça, e a Universidade
Católica tem uma reitora, uma estreia. Mas,
numa altura em que a crise rebenta com
todas as costuras emocionais e financeiras,
o país percebe que são elas que resistem ao
desemprego de uma forma mais positiva.
TEXTOS DE CHRISTIANA MARTINS FOTOGRAFIAS DE JORGE SIMÃO
MULHERESQUE SE
DESDOBRAM...
FEMINISMO
Há mulheres em posições de destaque por todo
o mundo, universidades repletas de raparigas— já há quem defenda a necessidade de quotasmasculinas no Ensino Superior —
,o mercado
de trabalho está inundado por elas praticamen-te em todas as áreas... Quando tudo pareciabem encaminhado para o sexo feminino, o ver-niz estalou: uni dos símbolos da emancipaçãodesistiu do papel de supermulheT e largou tudn
para cuidar dos filhos.
Anne-Marie Slaughter escreveu um artigo
que rachou ao meio a opinião pública norte--americana. Com o provocador título de "Wo-
men still carft have it ali" (As mulheres ainda
não podem ter tudo), aquela que foi a primeiramulher a liderar o departamento de planeamen-to político da secretária de Estado Hillary Clin-
ton conta, num desabafo público, por que razão
abandonou um dos cargos mais apetecidos pa-ra ir para casa. Numa semana, atraiu mais de
um milhão de visitantes ao site ria revista "The
Atlantic". Foi substituída por um homem.
Em Portugal, as recentes escolhas de mu-lheres para liderar instituições como a Procura-
doria-Geral da República o Parlamento, o Minis-tério da Justiça ou a Universidade Católica fa-
zem parecer que a situação do lado de cá do
Atlântico é melhor. Estarão as portuguesas mais
confortáveis do que as americanas? Olhando de
perto percebe-se que nem por isso. Mesmo uma
pessoa como Assunção Cristas, ministra da Agri-cultura, Mar, Ambiente e Ordenamento do Terri-
tório, militante de um partido conservador
(CDS), que se assume como uma privilegiada, re-conhece que o equilíbrio dos papéis de mãe e
profissional está longe de ser simples.'As coisas têm a importância que as pes-
soas lhe dão. Determinante é não dramatizar",afirma. Por isso, com 38 anos e três filhos — de
11, 9 e 7 anos — ela trabalha por objetlvos, não se
deixa enredar nos labirintos da agenda oficial,
educa as crianças para a autonomia e, sobretu-
do, conta com a ajuda do marido e da família.
"O problema é como a sociedade vê os papéisdos homens e das mulheres e parte do segredo
para resolver a difícil conciliação da vida fami-
liar com uma profissão exigente passa pela valo-
rização dos homens que optem por ficar em ca-
sa. Para o empregador tinha de ser indiferente
se está a contratar um homem ou uma mulher",
explica a ministra com uma das pastas mais
alargadas deste Executivo. Mas a verdade é queainda não é indiferente. "As mulheres vivemnum espaço com teto de cristal: sobem até um
ponto e depois param. A questão é saber se são
elas que se colocam de fora porque se realizam
com outras dimensões da vida ou se é o sistema
que as exclui", questiona Cristas.
O tema da emancipação feminina conti-
nua quente, e nem todas as mulheres em posi-
ção de destaque gostam de abordá-10. Assun-
ção Esteves, presidente da Assembleia, porexemplo, não quis falar com o Expresso sobre o
assunto. Assim como gestoras de grandes em-
presas ou a nova procuradora-geral da Repúbli-ca. Entre os homens, a alergia também aconte-
ce. Porquê? "As mulheres que atingiram cargosde relevo e se recusam a falar dos problemasinerentes a uma vida profissional agressiva e à
manutenção de uma vida familiar exigente, fa-zem-no porque não querem abordar a fragilida-de da situação. É como se dissessem que não
querem que a fraqueza de outras mulheres en-
fraqueça a posição delas. Assim como falar em
...EMMUITAS
CADA MULHER PRO-CURA ENCONTRAR O
SEU PRÓPRIO CAMI-NHO PARA ALCANÇARO EQUILÍBRIO ENTREAS VIDAS DOMÉSTICAE PROFISSIONAL. AFAMÍLIA É FUNDAMEN-TAL PARA ANDREIACOUTO. DA LIGA DEFUTEBOL. PARA A
ATRIZ MARGARIDAMARINHO, ALTEROUO CONTRATO DE
TRABALHO QUANDOTEVE O SEGUNDOFILHO, PARA PODERESTAR MAIS PRESEN-TE. UM GRANDEPLANEAMENTO FOI A
ESTRATÉGIA DA
GESTORA ANA MARIAFERNANDES, QUE SEMUDOU PARA O
BRASIL PARA PROS-SEGUIR UMA CARREI-RA DE TOPO
AVIA PORTUGUESA
quotas é um assunto desconfortável, porque im-
plica falar em baixar os níveis de exigência
quando se quer sublinhar que os cargos de lide-
rança são conquistados pelo mérito", explica Isa-
bel Gil, que falou com o Expresso ainda enquan-to diretora da Faculdade de Ciências Humanas
mas que, há uma semana, foi empossada como
vice-reitora da Universidade Católica. E, assim,
refere que ao se resguardarem da polémica es-
tas mulheres ajudam a perpetuar o mito da hi-
perexigência. A própria Comissão Europeia
apresentou esta semana uma proposta de direti-
va para obrigar as maiores empresas da UE a
ter pelo menos 40% de mulheres entre os mem-bros não-executivos dos seus conselhos de ad-
ministração, mas a polémica entre os governosde vários países foi enorme, comprovando quenão há consenso nesta área.
Este dilema foi abordado há um mês num
artigo da "Newsweek" — "American women ha-
ve it wrong" (As mulheres americanas percebe-ram tudo mal), em que a presidente da Universi-
dade de Barnard diz que o "problema feminino"
é querer-se tudo e tentar resolver tudo sem aju-das. "Estão esgotadas", sintetiza Spar. Isabel Gil
vai mais longe ao discordar que a conciliaçãode uma família estável com metas profissionais
fixadas possa ser classificada como um proble-ma feminino: "A oposição vida familiar/traba-lho é uma falsa questão. É social, mas também é
política. E o ónus é colocado na mulher, mas
este é um problema da sociedade. O direito à
escolha foi-nos reconhecido, mas tem de ser
posto em prática e, para isso, é preciso alcançara verdadeira partilha de responsabilidades."Mas se os homens estão a ser chamados a parti-cipar, há uma terceira entidade que não podeficar de fora: o Estado. Para Anne-Marie Slaugh-
ter, a questão só será resolvida quando os Esta-
dos Unidos tiverem uma Presidente e 50 sena-
doras do sexo feminino. Já para Sofia Aboim, do
Instituto de Ciências Sociais da Universidade de
Lisboa, "a resolução destes problemas fica na
esfera privada e há pouca intervenção do Esta-
do, mas este deve e pode interferir. Não se pode
desresponsabillzar o Estado". Com investigaçãona área da partilha das tarefas domésticas em
Portugal, os inquéritos acompanhados pela so-
cióloga revelam de forma inequívoca que "a es-
magadora maioria dos homens reconhece quedeviam participar mais no trabalho em casa e
que as mulheres não desejam abandonar a vida
profissional".
TEMPO MACHO
Casada com um eminente professor da Univer-sidade de Princeton e também ela com uma im-
portante carreira académica Anne-Marie
Slaughter apanhava um comboio todos os fins
de semana para, depois de três horas de via-
gem, chegar a casa, onde se encontrava com os
dois filhos e o marido. Esta maratona, comum a
muitas mulheres em vários países, durou três
anos, mas, a meio de um Jantar de Estado ofere-
cido por Barack Obama a grandes personalida-des da política internacional, Slaughter perce-
beu porque não se conseguia concentrar: só
pensava nos problemas escolares do filho de 14
anos. Foi quando decidiu escrever o texto paraa "The Atlantic".
No artigo, critica o "tempo macho", em que
a dedicação ao trabalho assume o espaço priori-tário na vida de uma pessoa Fala de como as
tensões da conciliação da maternidade com a vi-da profissional estão longe de estar resolvidas e
da dificuldade para uma mulher em deixar cair
a bandeira da emancipação feminina para as ge-
rações seguintes. Mas Slaughter não se fica pelas
queixas, apresenta propostas concretas para me-
lhorar a situação das mulheres trabalhadoras:
maior flexibilidade do empregador na aceitação
de horários menos rígidos e maior facilidade pa-ra que os pais (homem e mulher) trabalhem a
meio tempo, de forma a que a competição com
quem não tem filhos seja mais equilibrada são
alguns exemplos. Em Portugal, também Assun-
ção Cristas defende uma maior elasticidade le-
gal de forma a facilitar a vida das famílias. Em
2007 colaborou na preparação de um relatório
do CDS em que defendia a possibilidade de se
permitir que outros membros da família, além
do pai e da mãe, beneficiassem de uma licença
para apoiar as crianças nos primeiros anos de
vida A demógrafa Maria João Valente Rosa, dire-
tora do projeto Pordata da Fundação Francisco
Manuel dos Santos, sublinha a importância do
trabalho a tempo parcial. "Os números indiciam
que a conciliação entre tempos de vida familiar
e profissional não está para as mulheres portu-
guesas suficientemente resolvida. A percenta-
gem de mulheres a trabalhar a tempo parcial no
país (16%) é metade da média da União Europeia
e muito distante dos valores observados na Ho-
landa (77%) ou na Alemanha (46%)."
O tema é polémico, principalmente quan-do milhões de mulheres em todo o mundo con-
tinuam a lutar por questões básicas como inte-
gridade física, cuidados de saúde e salários
iguais aos dos homens para as mesmas fun-
ções. Anne-Marie Slaughter não se esquece de-
las, mas explica que se dirige às mulheres comoela: altamente qualificadas e com expectativasde cumprirem o desígnio de ser boa profissio-nal, sem abrir mão da maternidade. E tão mais
complicado quando as próprias mulheres tei-mam em não se entender entre si. Exemplo dis-
so foi a batalha na opinião pública norte-ameri-
cana, quando o texto de Slaughter foi contrapos-to às posições de Sheryl Sanderberg, a diretora
executiva do Facebook. Sanderberg defende
que as mulheres devem ser mais agressivas no
ambiente profissional e que, se não chegam ao
topo, é porque lhes falta iniciativa, ambição e
competitividade. Uma questão de atitude, diz
ela, mãe de duas crianças pequenas, mas com
um salário suficientemente alto para suprir
qualquer dificuldade de conciliação da materni-
dade com o trabalho. Esta semana, a nova acha
foi o regresso ao trabalho de Marissa Mayer, di-
retora-geral do Yahoo. Contratada com três me-
ses de gravidez, avisou que não gozaria da licen-
ça de 12 semanas não pagas existente nos EUA
e que trabalharia enquanto ficasse em casa
As chamadas de atenção para estas dificulda-
des assustam as feministas tradicionais por per-mitirem uma leitura conservadora. A conceitua-
da filósofa americana Nancy Fraser alerta que é
preciso desconstruir o discurso sobre o direito
das mulheres à opção: "Neste momento o femi-
nismo tem de pensar grande, recuperar os seus
fundamentos e apontá-los na direção da Justiça
e não somente na do respeito ao género." Arme
Cova, historiadora do ICS, concorda Explica
que não existe um feminismo, mas muitas cor-
rentes, e que é preciso distinguir quem fala e
com que propósito. Diz que "o momento atual é
de vigilância porque, com a crise, os retrocessos
são possíveis e a batalha pelos direitos nunca
está acabada."
Na Alemanha, uma revista de grande circu-
lação entendeu o artigo de Slaughter como umincentivo para que as mulheres voltassem a ca-
sa e se dedicassem a tempo inteiro à maternida-
de. Mas, nas inúmeras entrevistas e nos muitos
debates que desde então ocupam a vida de An-
ne-Marie, ela explica que esta não é a sua men-
sagem. Pelo contrário, diz defender a existência
de maiores apoios sociais que permitam às mu-lheres exercer os mesmos direitos de escolha
que os homens. A dificuldade de abordar o te-
ma também é sublinhada por Sofia Aboim: "Há
que ter cuidado porque existe uma linha de umfeminismo conservador que defende a volta
das mulheres para casa e o texto de Slaughter
pode ser lido de forma incorreta" Mas os exem-
plos públicos repetem-se. Este verão, Louise
Mensch — menina bonita do Partido Conserva-
dor britânico — abandonou Londres e a sua
mais que promissora carreira política, para ir
para Nova lorque, acompanhar o segundo mari-do e os filhos.
O terceiro texto que completa a tríade da
polémica é o livro "The End of Men" (O fim dos
homens), de Hannah Rosin, que alerta para fac-
tos concretos, como o de serem os homens os
mais afetados pelo desemprego no âmbito des-
ta crise económica: três dos 7,5 milhões de pos-tos de trabalho que se perderam nos EUA desde
2008 em áreas como a construção civil, indús-
tria transformadora e alta finança pertenciam a
homens. Recorda ainda que, para cada homem,há três mulheres com mestrado naquele país, e
que nas 15 profissões projetadas como tendo
maior potencial de crescimento na próxima dé-
cada, 12 são ocupadas maioritariamente por mu-lheres. E ainda que, quando uma mulher sai de
casa para entrar no mercado de trabalho, abre
espaço para que outra a substitua de forma re-munerada nas tarefas domésticas. Rosin subli-
nha ainda que na índia as mulheres aprendem
inglês mais rápido do que os homens para aten-der às necessidades dos call-centers de todo o
mundo ali localizados e que na China elas já são
donas de 40% dos negócios privados.
E EM PORTUGAL?
Por cá, a crise económica não dá às mulheres aliberdade de largar os empregos e ir cuidar dos
filhos. Mas o problema mantém-se: conseguemelas ser supermulheres? O tema não deixou in-
diferente a Jornalista e escritora Clara Ferreira
Acaba de ser escolhida uma magistrada do
Ministério Público para as funções de
procuradora-geral da República. A Assem-
bleia da República é finalmente presidida
por uma mulher. As magistraturas, bastião
legalmente masculino até à Revolução de
1974, feminizaram-se nos últimos anos a
um ritmo ainda mais rápido do que porven-tura seria de esperar. As Universidades
estão cada vez mais femininas — nos seus
corpos discentes e nos docentes, mas aquiainda com notórias distorções de catego-rias (muitas professoras auxiliares, algumas
associadas, muito poucas catedráticas)— e cada vez é mais audível a necessidade
de quotas para os rapazes que, coitadinhos,
têm mais dificuldade em acompanhar as
exigências académicas no Ensino Superior(e já no Secundário, aliás). 0 que pelomenos nos levará a questionar o que é feito
da fácil aceitação secular de que os homens
são, em geral, intelectualmente mais capa-zes — desde os escritos de Aristótclcs ("De
Generatione Animalium") até aos ensina-
mentos do Direito Romano e do Direito
Comum que se lhe seguiu (a imbecillitas
sexus era uma das razões de capacidade
jurídica diminuída). A verdade é que hoje
se compreende melhor a razão pela qual aLei teve de proibir expressamente o acesso
a certas carreiras ou profissões às mulheres
(quando eu comecei o Curso de Direito, em
1968/1969, as principais carreiras jurídicasestavam vedadas por lei ao meu sexo). Hoje
que a Lei estabeleceu a igualdade, as mulhe-
res interrogam-se: Can we have it ali? Por
razões misteriosas, parece que o problemase não coloca aos homens.
No curto espaço que me é dado, limito-me
a enunciar algumas questões:
1. A categoria 'mulheres', sem considerar
clivagens sociais e de rendimento ou estatu-
TERESA PIZARRO BELEZA' to, é simplesmente inoperacional; como
posso comparar-me, professora catedrática
e diretora de uma Faculdade de Direito (da
Universidade Nova de Lisboa) à mulher
que encontro no meu caminho, imigrante
provavelmente ilegal da Europa de Leste,
que aparenta total miséria e abandono?
2. A partilha do poder na esfera pública só
é viável com a partilha das responsabilida-des na esfera privada; leis à parte, os
apoios sociais e as práticas profissionaistêm de se adaptar às circunstâncias de vidadas pessoas que têm responsabilidades
familiares. Hoje vivemos o absurdo supre-mo: as pessoas trabalham horas infindas,
espera-se que estejam disponíveis 24h
sobre 24h, mas boa parte da população não
tem qualquer trabalho remunerado, isto é,
está desempregada. As desigualdadessociais agravam-se e o remédio é que o
Estado se retire da Economia (1), porqueisso é que assegurará racionalidade e bom
aproveitamento de recursos. Imagino...3. As mulheres devem recusar-se a aceitar
o cargo, o encargo e a culpa. Exceto quantoà gravidez e à amamentação, nada há quenão possa ser feito igualmente por um ser
humano do sexo masculino ou feminino,transexual ou intersexo. Mas se a Constitui-
ção quer e manda igualdade e participação,se a democracia é também democracia de
relações sociais de género, então Portugalterá de mudar muitíssimo não só nos seus
quadros mentais mas sobretudo nas in-
fraestruturas de apoio familiar e na lógicadesumana da Economia. Parece-me alta-
mente improvável, nestes tempos cinzen-
tos de brutal desprezo pelos mais fracos e
vulneráveis. A maior parte destes são, com
uma inevitável probabilidade estatística,oficialmente identificados pela pertença ao
sexo feminino. Mulheres, o'Diretora da Faculdade de Direito
JOANA MARQUES VIDALPROCURADORA-CERAL DA REPUBLICA
ESPECIALIZADA NA ÁREA DE DIREITOS DAFAMÍLIA E MENORES, DESDE 2010 ERA A
PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DEAPOIO À VÍTIMA, UMA DAS NOTAS DO SEU
CURRÍCULO QUE MAIS MARCOU A NOMEAÇÃO
MARIA DA GLORIA GARCIAREITORA DA UNIVERSIDADE CATÓLICA
A DIRETORA DA FACULDADE DE DIREITO ERA HÁ
VICE-REITORA, MAS SERÁÃ PRIMEIRA MULHER ÃOCUPAR ESTE CARGO DESDE Ã CRIAÇÃO DA
INSTITUIÇÃO, EM 1967. PARA LÁ CHEGAR, O SEUNOME TEVE DE SER APROVADO PELA SANTA SÉ
SUZANNECOTTERDIRETORA DO MUSEU DE ARTE
CONTEMPORÂNEA DE SERRALVESESCOLHIDA NUM CONCURSO INTERNACIONAL
ENTRE 114 CANDIDATOS, ESTA AUSTRALIANA, DE
50 ANOS, MARCOU PELO FORTECOSMOPOLITISMO DA SUA CARREIRA
Alves: "Quando li o texto de Slaughter concor-
dei imediatamente com ela. Não, as mulheres
não podem ter tudo e eu mesma tenho escrito
isso. E vivido isso. Nem as mulheres que acham
que podem ter tudo, as que têm dinheiro parater tudo, se podem dar ao luxo de ignorar a famí-
lia, e sobretudo os filhos, para favorecer a profis-são. Quem trabalha num meio altamente com-
petitivo, como o académico (nos EUA), o empre-sarial ou o Jornalístico, sabe que uma mulher
que tenha sido mãe concluirá rapidamente quenão pode ter dois full-time jobs, o maternal e o
profissional. Manter uma profissão bem remu-nerada e construir uma carreira são coisas dife-
rentes. A construção de uma carreira implicasacrifício total, abolição de fins de semana, des-
prezo por horários, disponibilidade a tempo in-
teiro, dedicação que coloque o trabalho como
prioridade número um. Uma mãe sabe que isto
é impossível mesmo com um pai dedicado e
prestador de serviços domésticos. Muitas das
mulheres americanas bem-sucedidas são casa-
das com stay-Qt-home-dads, ou seja, pais que fi-
cam em casa. Homens que deixaram de traba-
lhar para cuidar dos filhos."
E aproveita a deixa para ir buscar o livro de
Hanna Rosin: "A autora chega à conclusão queexistem hoje muitas mulheres que são o ganha-
-pão da família e que para elas serem profissio-
nais, ou têm maridos que trabalham em casa
em coisas não muito exigentes, ou os maridos
não trabalham." Claro que esta proposição in-
verte o tradicional papel da mulher e do ho-
mem dentro de casa e muitas mulheres (paranão falar dos homens) se sentem desconfortá-
veis com isso, defende. "Em Portugal, onde as
mulheres com carreiras profissionais de alta
competição são uma minoria, embora estejamem força no mercado de trabalho, a questão
não se coloca. As mulheres ganham menos do
que os homens e são elas que mantêm o equilí-brio doméstico. Quando a mãe não está, entra a
avó em cena. Ou a empregada. Aconteceu comi-
go. Portugal é patriarcal e as mulheres deixam
que seja. Não existe muita solidariedade femini-
na no mercado de trabalho em Portugal", garan-te Clara Ferreira Alves. As estatísticas nacionais
já deram o alerta para poderem vir a ser as mu-lheres as principais contribuintes do rendimen-
to familiar. No fim do segundo trimestre, pela
primeira vez, a taxa de desemprego em Portu-
gal foi maior entre os homens do que entre as
mulheres.
Cada uma encontra o seu caminho como
pode. Num mundo fortemente masculino, An-
dreia Couto, diretora-executiva da Liga Portu-
guesa de Futebol, reconhece que é apenas com
a ajuda da família que encontra o equilíbrio: "As
minhas funções implicam que trabalhe fora do
horário laborai e que, por diversas vezes, me
ausente do Porto, onde vivo. E é fundamental
poder contar com um enorme apoio familiar. É
a minha fórmula para a conciliação dos diver-
sos papeis que desempenho."
Já Ana Maria Fernandes, presidente da
EDP Brasil e nome sempre recordado quando
se procura uma portuguesa com percurso rele-
vante no sector empresarial, não tem dúvidas
que "é necessária uma gigantesca capacidadede organização e planeamento para se gerircom eficácia a vida pessoal e profissional, mas
este é o desafio de qualquer mulher, indepen-dentemente do cargo, função ou área de traba-lho." E conclui, em tom de desafio: " Se ter tudo
significa vida profissional, familiar e social, por-
que não?"
A atriz Margarida Marinho encontrou o
seu caminho através de uma via mais formal.
Há 19 anos, da primeira vez que foi mãe, passa-dos três meses depois d co bebé nascer, voltou
logo ao trabalho. Mas com a filha mais nova,
agora com três anos, tudo mudou: "Estava mais
documentada sobre a maternidade e alterei as
minhas prioridades sem qualquer sentimento
de culpa. Até porque basta entrar num estúdio
de televisão para perceber que não está prepa-rado para receber uma família." E como acredi-
ta que "falta reorganizar a cultura das empresasem Portugal", Margarida Marinho explica que
na altura da segunda gravidez, era a protagonis-ta de uma novela líder de audiência mas conse-
guiu negociar um contrato de exclusividade
que lhe permitiu ter estabilidade financeira e
flexibilidade de horários. Ou seja, aquilo quemais necessitava para apoiar a nova criança:
"Tempo!". Mas nem todas chegam lá. o
camartinscaexpresso.impresa.pt