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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO EDIFICADO EM CURITIBA:
AS UNIDADES DE INTERESSE DE PRESERVAÇÃO
CURTITIBA
2012
2
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
SETOR DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
ANITA MARIA DA COSTA FÉLIX
PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO EDIFICADO EM CURITIBA:
AS UNIDADES DE INTERESSE DE PRESERVAÇÃO
Monografia apresentada como requisito parcial
para conclusão do Curso de Licenciatura e
Bacharelado em História, do Setor de Ciências
Humanas Letras e Artes, da Universidade Federal
do Paraná.
Orientador: Prof. Dr. Dennison de Oliveira
CURITIBA
2012
3
RESUMO
O presente trabalho dispõe-se a analisar a instituição do Setor Especial
Unidades de Interesse de Preservação em Curitiba, na década de 1970, e sua
repercussão. O objeto de estudo é o processo destinado a anular o decreto que
institui as UIP´s movido contra a prefeitura por alguns proprietários de imóveis
classificados neste rol. Serão analisados a relação entre poderes institucionais e
população envolvida, os interesses ligados a política de preservação em Curitiba e o
modo como se dá este processo neste momento em relação a criação de uma
identidade para Curitiba. Para tanto será realizada uma contextualização acerca do
conceito de patrimônio, das políticas de preservação internacionalmente, no Brasil e
no Paraná e dos planos de urbanização da cidade de Curitiba. As fontes utilizadas
serão periódicos das décadas de 1970 e 1980, selecionados a partir de material
encontrado na Casa da Memória de Curitiba; artigos da revista Paraná em Páginas,
de propriedade do Sr. Cândido G. Chagas; legislação referente à política de
preservação de patrimônio histórico.
Palavras-chave: Patrimônio Cultural; Urbanismo; Gestão Pública
4
SUMÁRIO
Introdução........................................................................................................05
1.O conceito de patrimônio e sua trajetória
1.1 Breve trajetória do conceito.........................................................................12
1.2 Breve trajetória da política de preservação no Brasil...................................15
1.3 Breve trajetória da preservação do patrimônio no Paraná e em Curitiba...18
2. A política de preservação do patrimônio histórico em Curitiba
2.1 O primeiro plano – Agache..........................................................................24
2.2 A cidade cresce e chega o Serete...............................................................25
2.3 O patrimônio não estava nos planos...........................................................28
3. Governo e população nas políticas patrimoniais de
Curitiba.............................................................................................................33
Considerações finais......................................................................................41
Referências bibliográficas..............................................................................43
Anexos..............................................................................................................45
5
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem a intenção de pesquisar a respeito do processo de
desenvolvimento das políticas públicas de preservação do Patrimônio Cultural em
Curitiba, especificamente o patrimônio edificado. O recorte escolhido trata das
Unidades de Interesse de Preservação, categoria criada pelo município como uma
das maneiras de preservar o patrimônio arquitetônico da cidade a partir da década
de 1970. A questão que se apresenta quando estudamos esta categoria e as
políticas de preservação do governo municipal é o entrelaçamento que se dá entre
as políticas e planos de urbanização, a criação de uma nova identidade para o
município e o resgate da memória e história da cidade.
É a partir daí que, analisando fontes periódicas principalmente, percebemos
uma espécie de contradição ou mesmo não assimilação destas políticas por parte de
totalidade da população, como costuma se apresentar.O objetivo central deste
trabalho é, através do estudo de um caso ocorrido a partir de 1979, a manifestação
contrária de um grupo de pessoas com imóveis classificados como Unidades de
Interesse de Preservação (UIP´S), perceber em qual sentido a população, neste
caso apenas uma pequena parcela, diretamente afetada por estas políticas se
relaciona e participa deste processo. O enfoque se dará, portanto no recorte
temporal de 1965 a 1989, ampliando a discussão em termos de contextualização,
para os primórdios dos planos de urbanização de Curitiba e no Paraná, abrangendo
assim desde o Plano Agache ao do conceito de Patrimônio Cultural.
O conceito de patrimônio tem uma trajetória histórica que remonta a Roma
Antiga – sentido de propriedade do cidadão - e que ao longo do tempo foi somando
significados, aproximando-se do conceito de monumento, monumento histórico e de
pertencimento a um grupo determinado de pessoas. é a partir da Revolução
Francesa e da formação dos Estados Nacionais que o conceito se aproxima do
significado que atribuímos hoje, de patrimônio cultural, associado sempre a uma
idéia de identidade e memória especificas1. Pode-se afirmar que a concepção de
patrimônio é estabelecida por um determinado grupo para um outro determinado
1 CHOAY, Françoise. Alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação liberdade, 2006
6
grupo com uma intenção; seja ela de nacionalidade, de pertencimento ou de
legitimação de um governo. O conceito de patrimônio cultural, ao longo de seu
processo de institucionalização e formação passa abarcar também conceitos
imateriais, valorizando assim também a cultura não edificada de um povo, tal como
costumes, modos de fazer, culinária, música, etc.
No Brasil,não por acaso, a idéia de preservação do patrimônio surge nos anos
1930, a princípio a partir de debates gerados por grupos de intelectuais e
modernistas, visando à busca de uma “identidade nacional”, buscando raízes e
tradições genuinamente nacionais – o reencontro com a cultura do barroco brasileiro
faz com que Ouro Preto seja tombada em 1933. Mário de Andrade é o responsável
pelo anteprojeto apresentado ao governo, em 1936 para a constituição de um órgão
e de uma política de preservação a nível federal.Com uma visão que antecipa
diversos conceitos, Mário de Andrade incluía diversas manifestações culturais, além
das edificações, como patrimônio. O projeto chega a ser aprovado, mas com o golpe
e instituição do Estado Novo, outro projeto é institucionalizado priorizando uma
política de proteção enfocada na memória oficial e em bens edificados. O Serviço de
Proteção Histórico e Artístico Nacional, SPHAN, é criado em 1937 e em 1960 se
torna Instituto de Proteção Histórico e Artístico Nacional.
O desenvolvimento da política de preservação no Brasil acompanha,
podemos afirmar,a política do governo federal2. Sendo assim, a priorização de uma
história formalé predominante até fins da ditadura, cerca de 1985, e período de
redemocratização, quando começam a surgir diversos movimentos democráticos e
sociais que além de trazer a discussão da heterogeneidade social, aproximam a
questão do patrimônio aos debates como os de pluralidade cultural, conservação do
meio ambiente e da qualidade de vida3 . Estes movimentos passam a ocorrer
principalmente a partir da década de 80, quando o projeto de Mário de Andrade é
retomado. Nos anos 90, este movimento alia-se a políticas de preservação que
valorizam a questão turística e o incremento econômico das cidades.
2MACHADO, Alisson Bertão. Políticas culturais e patrimônio histórico: o processo de
tombamento do setor histórico da Lapa-PR como um estudo de caso. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Estadual de Maringá. Maringá, 2007, p. 62. 3Idem,P.70
7
Já no Paraná, o debate sobre preservação do patrimônio também se
desdobra a partir de discussões relacionadas a criação de uma identidade, no caso
uma identidade tipicamente paranaense, já que o estado, de desmembramento
recente da província de São Paulo, é étnica,cultural e socialmente heterogêneo.No
inicio do século XX é criado o Instituto Histórico e Geográfico do Estado do Paraná e
desenvolve-se o movimento Paranista, em busca de um Paraná autêntico.
Tentativas de criação de órgãos de proteção ao patrimônio ocorrem sempre em
sintonia ou subordinação a órgãos federais, de maneira normativa e consultiva. Os
tombamentos seguem sendo realizados neste momento diretamente pelo governo
federal4. É a partir de 1948 que o conselho do Patrimônio Histórico, Artístico e
Cultural é criado e a partir de 1960 que efetivamente passa a realizar tombamentos,
seguindo a política federal, de priorizar a preservação de uma História formal.
Enquanto a política de preservação estadual efetuava tombamentos no
estado e na capital, Curitiba ainda não dispunha de mecanismos próprios de
proteção. Isso ocorre de maneira legal,ainda que superficialmente,em 1953, através
da lei 699 que dispõe sobre o Código de Posturas e Obras do Município. Mesmo
ainda não estando claro quais seriam as medidas de defesa e preservação, esta lei,
através dos parágrafos quarto e quinto, já demonstra a preocupação em evitar a
perda de imóveis considerados de importância histórica ou arquitetônica.
A ausência de uma identidade única que permeasse o estado refletia-se
também na sua capital. Curitiba até a década de 1960 era tida como uma cidade
sem características próprias, “Curitiba era a última cidade do Brasil sem qualquer
característica especial. O próprio curitibano era um cara que não tinha sua marca,
não tinha uma expressão, isto porque a cidade nada tinha a oferecer”5.
Em meados da década de 1960, tendo em vista a necessidade de soluções
para problemas estruturais da cidade que não eram mais resolvidos pelo Plano
Agache - plano diretor da cidade da década de 1940 - o então prefeito Ivo Arzua
abre concorrência para um novo plano diretor. Nesta concorrência são selecionadas
as empresas Serete e Jorge Whilelm Arquitetos Associados para realizar o plano
4 MACHADO, Alisson Bertão. Políticas culturais e patrimônio histórico: o processo de
tombamento do setor histórico da Lapa-PR como um estudo de caso. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Estadual de Maringá. Maringá, 2007, P.78 5 ASSAD, Abrão. Boletim Informativo Casa Romário Martins:Fundação Cultural de Curitiba. V. 23
n. 114, Curitiba: 1996, P.08
8
que daria conta de equacionar o crescimento da cidade com propostas de
modernização.
Juntamente com o processo de crescimento de Curitiba, devido, em grande
parte ao ciclo do café, outro fator que interfere no processo de desejar um plano
diretor para a cidade que além de resolver questões estruturais, dê uma nova
identidade, mais moderna e cosmopolita para a cidade, é a criação do curso de
Arquitetura e Urbanismo na Universidade Federal do Paraná. Não apenas pela
confluência de arquitetos para formação do corpo docente na cidade, mas também,
e mesmo principalmente, por este jovem grupo de estudantes, formado também por
engenheiros que tinham interesse em obter o grau de arquitetos em sua formação,
gerar uma onda de debates relacionados a soluções para a cidade que é renovado e
proposto com entusiasmo6.
O plano preliminar proposto pela empresa ganhadora aposta então em uma
criação participativa com um grupo local e é criada a Assessoria de Planejamento e
Pesquisa em Urbanismo, mais tarde transformado em Instituto, o IPPUC. Não sem
críticas, este projeto consegue crescer graças a esta postura participativa, aliada a
uma proposta do prefeito de debater as questões do plano preliminar junto a
população, criando o seminário Curitiba de Amanhã7, onde diversas reuniões, em
diversos locais da cidade apresentavam o projeto e abriam para criticas e sugestões,
chegando ao limite do prefeito oferecer a quem apresentasse um outro plano a
chance de substituir o apresentado pela Serete. Em 1965 o projeto Serete se
transforma em lei.
Com o fim da gestão do prefeito Ivo Arzua, o plano não é aplicado
imediatamente por outros prefeitos. Apesar disso, o IPPUC continua trabalhando, a
margem do governo municipal, em projetos para viabilização do Plano Serete8. É em
1971, a partir da nomeação para prefeito de Jaime Lerner, um dos mais notáveis
arquitetos do IPPUC, que o projeto começa a ser aplicado na cidade, já
completamente estruturado e preparado pelo IPPUC. Também é a partir deste
6 OBA, Leonardo T. Marcos urbanos e a construção da cidade: A identidade de Curitiba. Tese
(Doutorado Estruturas Ambientais Urbanas).Universidade de São Paulo,1998. p.240 7 Depoimento de Jorge WHILHELM.IPPUC Memória da Curitiba urbana.Curitiba, dezembro de
1990. (Depoimentos 5) 8 Depoimento de Jorge WHILHELM.IPPUC Memória da Curitiba urbana.Curitiba, dezembro de
1990. (Depoimentos 5). P . 31
9
momento que se forma, em Curitiba, uma espécie de “elite intelectual” representada
pelo grupo de engenheiros e arquitetos do IPPUC, que, com a gestão de Jaime
Lerner, assumem diversos cargos no governo executivo9.
E é principalmente dentro do IPPUC, desse momento em diante, que as
políticas de preservação do patrimônio serão debatidas, mesmo que futuramente
surjam órgãos como Fundação Cultural e Casa Romário Martins, responsáveis pelo
setor cultural, artístico e histórico da cidade. Quando o plano diretor é publicado
como lei, já dispunha a respeito de “setores históricos tradicionais” e objetivos de
preservação. Com a Lei de Zoneamento de Uso do Solo, em 1971, este setor fica
delimitado; no mesmo ano é publicado o Plano de Revitalização do Setor Histórico,
pelo arquiteto Cyro Correa Lima. Diversas medidas são tomadas neste momento
relativas a preservação de bens considerados de importância histórica ou
arquitetônica, seja através de leis que colocam os proprietários como cooperadores
do processo ou com a prefeitura ocupando e reciclando espaços para usos culturais,
como é o caso do Teatro Paiol, Centro de Criatividade e a própria Casa Romário
Martins.
Neste momento começa a ser aplicada a política de pedestrianização da
cidade, com o fechamento da Rua XV, desde a Praça Osório a Universidade Federal
do Paraná, medida polêmica que se revelou como um dos maiores sucessos da
gestão de Lerner. É considerado como um momento de euforia e entusiasmo o
período que se segue a aplicação dos projetos do plano diretor, com uma equipe
renovada na administração municipal e contando com apoio estadual, somando
diversos sucessos e diversos equívocos, tanto em nível estrutural como em nível de
preservação patrimonial10.
Em 1979 é então decretada a classificação de 586 imóveis como Unidades de
Interesse de Preservação, constituindo-se principalmente pelo Acervo da Região
Metropolitana, realizado em 1977 através do COMEC11-IPARDES12. Estes imóveis
9 CARVALHO, André de Souza. Curitiba, imagem do planejamento ou planejamento da imagem?
Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado em História) Universidade Federal do Paraná, Curitiba. 2008. P.39 10
Depoimento de Francisca RICHBIETER. IPPUC. Memória da Curitiba urbana. Curitiba, Maio de 1990. (Depoimentos 3) 11
COMEC é a Coordenação da Região Metropolitana de Curitiba, entidade pública criada em 1974 12
IPARDES é o Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social. Instituição de pesquisa vinculada a Secretaria de Estado do Planejamento e Coordenação Geral – SEPL. Sua
10
passam então a ter seu uso restringido pela legislação, com o intuito de preservar e
conservar sua estrutura, escala e fachadas. Este fato gera repercussão na cidade,
tanto positiva quanto negativamente, e alguns moradores que tiveram seus imóveis
classificados promovem uma ação e reivindicam a retirada de seus imóveis de tal
lista13. Este momento, em que o decreto é revogado, repensado e substituído por
outro, que começa a considerar cada caso de UIP individualmente, é o ponto de
chegada deste trabalho.
Movimento liderado por Cândido G. Chagas, proprietário de um imóvel na
região do Setor Histórico e também proprietário do jornal Paraná em Páginas, esta
manifestação questiona a justificativa de interesse de preservação e a autoridade
pública sobre a propriedade. Servindo como uma janela para observarmos de que
modo se deu a relação do governo municipal com a população durante a realização
das diversas reformas e alterações da cidade, este caso reflete e auxilia em algumas
considerações que podemos fazer sobre de que modo a identidade de Curitiba é
construída neste momento e de que modo se dá a participação da população
diretamente envolvida, se de maneira democrática e participativa, como costuma-se
pensar a respeito da construção da imagem da cidade ou se de maneira
verticalizada, idealizada por um grupo apenas.Para a reflexão deste processo, as
fontes analisadas serão bibliográficas,periódicas e a legislação do período.
Principalmente no que diz respeito à coleta de informações sobre o processo de
urbanização da cidade e instituição de órgãos municipais ligados a cultura, as fontes
serão basicamente os volumes da coleção Memória da Curitiba Urbana, que reúne
depoimentos de diversos participantes deste momento (aplicação do Plano Diretor
até cerca de 1990), desde arquitetos e engenheiros a ex-prefeitos e funcionários das
instituições.
A análise do modo como a população lidou com o andamento das mudanças
na cidade serão analisados sobremaneira através de periódicos encontrados na
Casa da Memória em pastas organizadas por temas: Unidades de Interesse de
Preservação, Patrimônio Histórico e Setor Histórico. É considerável a quantidade de
função é estudar a realidade econômica e social do Estado para subsidiar a formulação, a execução, o acompanhamento e a avaliação de politicas públicas. In: http://www.ipardes.gov.br/index.php?pg_conteudo=1&cod_conteudo=32. Acesso em: 08 de janeiro de 2012 13
JORNAL ESTADO DO PARANÁ, Curitiba. 09 de janeiro de 1980
11
manifestações populares, através de notas de jornalistas ou mesmo cartas e
reclamação dos cidadãos em jornais do estado, principalmente da capital. As
discussões, reclamando por proteção de patrimônio e de locais públicos se
intercalam com questionamentos e críticas sobre o modo como esta proteção era
feita, revelando-se como fontes bastante ricas para o aprofundamento deste
debate.Aliada ao uso destas fontes será a utilização da legislação, que demonstra
de que maneiras legais o processo foi se constituindo.
Neste trabalho a análise da relação entre apropriação e uso da memória e
identidade também serão debatidos, para compreender de que modo isso se dá em
Curitiba, neste momento de construção de uma identidade para a cidade. É
necessário compreender que tipo de memória se pretende cristalizar e preservar,
como nos apresenta Oliveira: “Cabe destacar que esse esforço de celebração dos
valores das etnias mencionadas [européias] continua rendendo lucros, haja vista sua
importância na veiculação da imagem da cidade como “européia” de “primeiro
mundo”, etc.”14·
14
OLIVEIRA, Dennison, Curitiba, o mito da cidade modelo. Curitiba: Editora UFPR: 2000. p.56
12
CAPÍTULO 01
O CONCEITO DE PATRIMÔNIO E SUA TRAJETÓRIA
1.1 BREVE TRAJETÓRIA DO CONCEITO
Considerando o patrimônio como um campo de estudo que trabalha
sobremaneira no campo interdisciplinar, convém localizar as origens do termo e os
modos com que a sociedade ocidental vem se relacionando com sua utilização e
proteção. Não pretendemos aqui traçar uma história completa ou aprofundada sobre
o termo, mas pinçar momentos que consideramos mais determinantes para sua
formação.
As origens do termo “patrimônio” remetem à concepção jurídica do conceito,
que tem suas raízes na Roma Antiga, significando o conjunto de bens que o cidadão
possuía. Teve por base também, ao longo de sua construção, o conceito de
Monumento e Monumento Histórico, agregando valores de rememoração, identidade
e perpetuação do passado. O início da aplicação de seu significado tal como o
conhecemos hoje se dá em finais do século XVIII e começo do século XIX, como
uma das repercussões da Revolução Francesa15.
Paralelamente à destruição de diversos bens que representavam um
passado que deveria ser apagado, houve uma tentativa de proteção dos bens que
subitamente passaram a pertencer ao Estado, advindos do clero, monarquia e
emigrados. O cuidado com o que deveria ser feito com estes bens da nação fez com
que surgisse pela primeira vez uma comissão que pensasse sobre os cuidados,
estratégias e fins que os imóveis deveriam ter. Uma lista com critérios e definições
do que deveria ser preservado, estipulando principalmente elementos como valor
arquitetônico, histórico e beleza écriada, pela primeira vez16. Também é neste
momento que o termo patrimônio começa a ser utilizado de uma maneira próxima a
que usamos hoje.
essa fabulosa transferência de propriedade e essa perda brutal de destinação eram sem precedentes e trouxeram problemas também sem precedentes. O valor primário do tesouro assim devolvido a todo o povo é
15
CHOAY, Françoise. Alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação liberdade, 2006. P.12 16
Idem. P.107
13
econômico. Os responsáveis adotam imediatamente, para designá-lo e gerenciá-lo, a metáfora do espólio. Palavras-chave: herança, sucessão,
patrimônio, conservação17
Podemos afirmar em relação a Revolução Francesa e o modo com a qual
ela lidou com seus monumentos, que a importância ideológica desses bens é
decisiva. Sua apropriação ou destruição cabem a decisões de teor político, além do
teor econômico, no caso de destruição para construção de armas ou venda para
arrecadar dinheiro para o tesouro. Quando da conservação de um bem por parte da
comissão, seja por motivos estéticos ou arquitetônicos, seu fim é o pedagógico.
A primeira comissão de defesa dos monumentos históricos é criada em 1837
na França, dividida ainda em apenas três categorias: remanescentes da antiguidade,
edifícios religiosos da Idade média e alguns castelos.18 No início do século XIX, não
apenas a França, mas outros países passam a preocupar-se com seu “patrimônio
nacional”, representando o que nos diz Silva:
para que o Estado moderno exista,não basta que este seja uma unidade política autônoma, mas que engendre uma ação integradora sobre seu próprio território e população, bem como um arcabouço cultural e simbólico que lhe confira uma identidade nacional coesa
19
Perpassando o século XIX, além da questão política dos Estados, existem
dois outros fatores que engendram definições acerca de patrimônio, são eles a
Revolução Industrial e o Romantismo:
a industrialização do mundo contribui, por um lado para generalizar e acelerar o estabelecimento de leis visando à proteção do monumento e, por outro, para fazer da restauração uma disciplina integral, que acompanha os progressos da historia da arte.
20
Já o Romantismo altera a percepção do patrimônio para uma sensibilidade
estética de nostalgia, de passado perdido que não poderia ser recuperado, diferente
da percepção até então, que considerava o passado como fonte de
conhecimentos.21
17
CHOAY, Françoise. Alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação liberdade, 2006,P.98 18
Idem, P.12 19
SILVA, Rodrigo; OLIVEIRA, Carlos Eduardo França.Memória da cidade, História e patrimônio urbano no Brasil. São Paulo: Conceito Humanidades.2011 P. 67 20
CHOAY, Françoise. Alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação liberdade, 2006 p.127 21
FONSECA, Maria Cecília Londres. O patrimônio em processo: trajetória da política federal depreservação no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ; MinC – IPHAN, 2005, P.61
14
No início do século XX surgem conferências e debates sobre a categoria
Monumento e suas formas de preservação. A primeira foi a Conferência de
Atenasem1931,organizada pela Sociedade das Nações, do Escritório Internacional
dos Museus, cujo documento oficial – a carta de Atenas - serve como referência
para preservação em diversos países, com princípios e recomendações não apenas
acerca de preservação mas também sobre a restauração. A princípio apenas países
europeus participam desta conferência. Ao longo do tempo, comparecem
participantes de outros continentes, como foi o caso da Conferência de Veneza de
1964 que contou com países como Tunísia, México e Peru, além dos europeus.
Após a II Guerra Mundial há uma ampliação da noção de patrimônio, indo
além das “grandes obras arquitetônicas” de “grande valor artístico ou estético”. Isso
se deve em grande medida, segundo Fonseca,
as produções dos “esquecidos”, que passaram a ser objeto principal de interesse da história das mentalidades: os operários , os camponeses, os imigrantes, as minorias étnicas etc. A partir de 1945, os nacionalismos que emergem nas ex-colônias, sobretudo as francesas, nos continentes africano e asiático, começam a se apropriar da noção européia de patrimônio.
22
Em 1964, através da Carta de Veneza, percebemos que a noção de
monumento extrapola o monumento isolado e já abarca sítios e conjuntos. Em 1985,
a Declaração do México já considera o “patrimônio Cultural”, considerando bens
móveis, imóveis, materiais e imateriais. É a partir deste período, portanto, que as
discussões relacionadas a patrimônio extrapolam o domínio da “pedra e cal”,
partindo para termos como patrimônio imaterial ou intangível, valorizando “modos de
fazer”, culturas regionais, ampliando o debate do que deve ou não ser preservado e
de que modo.
A partir da segunda metade do século XX, o conceito de patrimônio se alargou, passando a abarcar as diversas representações culturais, não se limitando ao patrimônio arquitetônico. O patrimônio passou a ser visto não somente como testemunho e documento do passado, principalmente por seu aspecto físico, mas como portador de fazeres sociais, suporte de memória e inserido na dinâmica urbana e ambiental
23
Outra discussão que percebemos ao observar as cartas e recomendações
internacionais sobre patrimônio, foi o crescimento da preocupação em relação ao 22
Idem. P. 70 23
GONZÁLEZ-VARAS, Ignácio. In: MACHADO, Alisson Bertão. Políticas culturais e patrimônio histórico: o processo de tombamento do setor histórico da Lapa-PR como um estudo de caso. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Estadual de Maringá. Maringá, 2007. P.32
15
turismo e o patrimônio edificado. Objeto de polêmica, o turismo pode ser um
elemento positivo e agregador ao patrimônio, como também vetor de sua destruição.
Como observamos nas Normas de Quito, de 1967, produzidas em Quito, no
Equador, através da Reunião sobre Conservação e Utilização de Monumentos e
Lugares de Interesse Histórico e Artístico, a preocupação em relação ao abandono
relegado aos monumentos devido ao empobrecimento acelerado dos países
americanos trouxe como solução a utilização dos próprios monumentos como
atrativos para incremento do turismo, “como uma tentativa de se angariar recursos
para o financiamento de obras necessárias a preservação de monumentos,
conjuntos de monumentos e cidades históricas.”24 Através desta medida, porém,
como nos lembra Kersten, “ a recomendação extremamente pragmática não
considerou que ao transformar os bens em produtos capitalistas deixava-os sujeitos
às oscilações das regras de mercado”25
1.2 BREVE TRAJETÓRIA DA POLITICA DE PRESERVAÇÃO NO BRASIL
A política de preservação do patrimônio no Brasil tem seu início efetivo e
formal a partir do começo do século XX, através da preocupação de intelectuais em
relação a degradação e perda de bens considerados importantes para a constituição
do passado e da identidade nacional. É crucial a participação de intelectuais do
movimento modernista neste processo, através da figura central de Mário de
Andrade. A intenção deste movimento em localizar a identidade e especificidades da
cultura brasileira, fez com que viagens fossem empreendidas para identificar as
características nacionais através de seus monumentos, edificações e costumes.
Localizando em Minas Gerais uma cultura Barroca abandonada, este grupo passa a
combater pela sua preservação. Paralelamente, Ouro Preto é tombada como
monumento nacional, em 1933. Em 1936 Mário de Andrade é convidado pelo
ministro da Educação e Saúde, Gustavo Capanemaa escrever um anteprojeto para
a criação de um serviço de proteção ao patrimônio; o projeto feito por ele engloba na
concepção de patrimônio e preservação outras expressões da cultura, além da
cultura erudita e das edificações.
24
KERSTEN, Márcia Scholz de Andrade. Os rituais do tombamento e escrita da história: bens tombados no Paraná entre 1938-1990. Curitiba: Editora UFPR, 2000, P.96 25
Idem. P.96
16
Sem dúvida, no seu anteprojeto Mário de Andrade desenvolveu uma concepção de patrimônio extremamente avançada para seu tempo, que em alguns pontos antecipa, inclusive, os preceitos da Carta de Veneza, de 1964. Ao reunir num mesmo conceito – arte – manifestações eruditas e populares, Mário de Andrade afirma o caráter ao mesmo tempo particular nacional e universal da arte autêntica, ou seja, a que merece proteção.
26
Apesar destas características, o projeto não é aprovado. Neste momento há
o golpe e fase inicial do Estado Novo e o projeto que é aprovado em 1937 focaliza a
questão monumental do patrimônio, “enfatizava a dimensão formal do objeto urbano,
não contemplando sua dimensão social, econômica, simbólica e funcional”27,
diferentemente de projeto criado por Mário de Andrade.
É interessante observar que até a instituição do Estado Novo, as políticas de
preservação esbarravam no empecilho da Constituição não prever a supremacia do
interesse coletivo sobre propriedades privadas, o que complicava a participação
efetiva do Estado sobre a preservação de bens. Com o Estado Novo, este problema
se resolve, já que com a instituição da intervenção do Estado no domínio econômico
e social, fica autorizada a intercessão deste na ordem econômica e a função social
da propriedade28. O problema da intervenção do Estado na propriedade privada já
estava previsto desde a Carta de Veneza de 1931, que “aprovou de maneira
unânime a tendência geral que consagrou nessa matéria um certo direito da
coletividade em relação a propriedade privada”29
Após o Estado Novo, os debates sobre preservação se multiplicam devido a
perda de patrimônio europeu gerada pela II Guerra Mundial. No Brasil, a
Constituição de 1946 reafirma a responsabilidade do Estado sobre a manutenção do
patrimônio. Com o retorno de Getúlio Vargas,na década de 50, as expressões da
cultura popular são apropriadas pelo governo.30
O desenvolvimento das políticas patrimoniais acompanha de certo modo o
desenvolvimento da política nacional e das medidas internacionais, tais como a
Carta de Veneza e as Normas de Quito, por exemplo. Com o golpe militar, houve a
26
FONSECA, Maria Cecília Londres. O patrimônio em processo: trajetória da política federal de preservação no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ; MinC – IPHAN, 2005, P.99 27
Idem. P.102. 28
MACHADO, Alisson Bertão. Políticas culturais e patrimônio histórico: o processo de tombamento do setor histórico da Lapa-PR como um estudo de caso. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Estadual de Maringá. Maringá, 2007. P.55 29
CARTA DE VENEZA, In: http://portal.iphan.gov.br/portal/baixaFcdAnexo.do;jsessionid=B983A608D19709B5F2634CA049E82712?id=232 Acesso em : 29 de novembro de 2011 30
KERSTEN, Márcia Scholz de Andrade. Os rituais do tombamento e escrita da história: bens tombados no Paraná entre 1938-1990. Curitiba: Editora UFPR, 2000, P.92 e 96
17
regulamentação do patrimônio natural brasileiro e a Lei dos Sambaquis. No final da
década de 1960 o Serviço de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN) é
transformado em Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN)l e em
1970 é realizado o Compromisso de Brasília, que sugere relacionamento da esfera
federal com estados e municípios, além de sugerir envolvimento com o clero e
instituições religiosas, para a preservação de bens religiosos.
É, então, neste período que são criados órgãos estaduais e municipais para
proteção de patrimônio. Ao fim dos anos 1970 este patrimônio começa a ser
abordado sob o viés de bem cultural, não sendo necessariamente material,
valorizando-se também manifestações e expressões da cultura popular, refletindo
aqui a tendência das discussões mundiais a este respeito. 31.
É partir da década de 1980, segundo Machado32, que pensa-se em uma
política de patrimônio que valorize a heterogeneidade do país, fugindo de uma
padronização. Com isso o projeto iniciado por Mário de Andrade é retomado, assim
como a tendência em pensar-se bens intangíveis é aprofundada. Assim como
Rodrigo Mello é figura central na administração do SPHAN desde sua fundação ao
ano de sua morte, em 1969, na década de 1980 é a figura de Aloísio Magalhães que
se destaca. Propondo diversas mudanças na estrutura física e na concepção do
IPHAN:
ao mesmo tempo em que criticou a preservação de bens de pedra e cal, Aloísio demonstrou que a instituição não descuidaria dos bens já tombados. Alertou porém, para a importância de outros bens culturais imóveis, de natureza histórica, religiosa ou leiga, dentre os quais sítios e conjuntos arquitetônicos relevantes. Para abrangê-los, definiu um conceito mais amplo que abarcou o ecológico e o saber fazer das populações.
33
Este momento coincide com o processo de redemocratização do país e com
a formulação da nova Constituição de 1988. Nesta Constituição fica claro que a
preservação deve acontecer independentemente do tombamento e propôs diversas
formas de incentivo à cultura. 34 O patrimônio imaterial passa a ser reconhecido pela
constituição e a diversidade cultural também é valorizada.
31
SILVA, Rodrigo; OLIVEIRA, Carlos Eduardo França. Memória da cidade, História e patrimônio urbano no Brasil. São Paulo: Conceito Humanidades.2011. 32
MACHADO, Alisson Bertão. Políticas culturais e patrimônio histórico: o processo de tombamento do setor histórico da Lapa-PR como um estudo de caso. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Estadual de Maringá. Maringá, 2007, P.66 33
KERSTEN, Márcia Scholz de Andrade. Os rituais do tombamento e escrita da história: bens tombados no Paraná entre 1938-1990. Curitiba: Editora UFPR, 2000, P.96, 103 34
Idem. P. 106
18
Nos anos 90 a esperança em relação a desburocratização e modernização
do Estado aliado ao ressurgimento de movimentos sociais de diversos aspectos faz
com que a discussão a respeito de patrimônio acabe congregando discussões como
pluralidade cultural, conservação do meio ambiente e da qualidade de vida35.
1.3 BREVE TRAJETÓRIA DA PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO NO PARANÁ E
EM CURITIBA
Para abordarmos o tema da preservação do patrimônio no Paraná, devemos
lembrar da fundação da província, que se dá em 1853, desmembrando-se de São
Paulo. A partir da formação da província, o território que já era social e culturalmente
heterogêneo, com cultura autóctone, portugueses e paulistas, adquire ainda novas
matizes, com a chegada dos imigrantes no final do século XIX36.
Havia naquele momento, por parte de lideranças políticas e intelectuais, a
preocupação em dar um contorno a esta diversidade cultural, formando uma
identidade regional tipicamente paranaense, portanto, desde meados do século XIX
ao inicio do século XX esta preocupação refletiu-se na criação de instituições ligadas
a cultura e história da província, visando à valorização do espaço e povo locais. São
exemplos desta postura a criação do Museu Paranaense, o Arquivo Público e
oInstituto Histórico e Geográfico do Paraná, para citar apenas algumas das
realizações deste período. Outro reflexo dessa busca por uma identidade
tipicamente paranaense é o desenvolvimento do movimento Paranista, tendo na
figura de Romário Martins – historiador e político paranaense - um de seus principais
expoentes:
Paranista é todo aquele que tem pelo Paraná uma afeição sincera, e que notavelmente demonstra em qualquer manifestação de atividade digna, útil a coletividade paranaense. Paranista é aquele que em terras do Paraná lavrou um campo, cadeou uma floresta, lançou uma ponte, construiu uma máquina, dirigiu uma fábrica, compôs uma estrofe, pintou um quadro, esculpiu uma estátua, redigiu uma lei liberal, praticou a bondade, iluminou
35
MACHADO, Alisson Bertão. Políticas culturais e patrimônio histórico: o processo de tombamento do setor histórico da Lapa-PR como um estudo de caso. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Estadual de Maringá. Maringá, 2007, P.70 36
MACHADO, Alisson Bertão. Políticas culturais e patrimônio histórico: o processo de tombamento do setor histórico da Lapa-PR como um estudo de caso. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Estadual de Maringá. Maringá, 2007, p. 75
19
um cérebro, evitou uma injustiça, educou um sentimento, reformou um perverso, escreveu um livro, plantou uma árvore
37
O movimento paranista contava com políticos, artistas e intelectuais que
construíram uma imagem idílica da região e uma série de símbolos identificadores e
agregadores tais como o pinheiro, a erva-mate. “Como um inventor de tradições,
Romário concebeu ainda os principais símbolos do Estado, a bandeira e o brasão
(somente alterados em 1990)”38 Além de contar com políticos em suas fileiras, “a
busca de uma identidade paranista foi sutilmente apropriada pelo governo que
financiou a complementação de estudos, projetos, pesquisas e publicações de
muitos artistas locais dentro e fora do país.”39 Este movimento perdura até meados
da década de 1940.
No ano de 1935 é criado o Conselho Superior de Defesa do Patrimônio
Paranaense, mas com a implementação do Estado Novo, em 1937, ele é extinto e
só volta a existir após o fim deste regime, em 1948. Neste ínterim os tombamentos
federais realizados no estado do Paraná obedecem à política da história oficial e
dominante, sendo tombadas edificações ligadas à cultura luso-brasileira e do tipo
eclético, tais como Igreja Matriz da Lapa e Colégio dos Jesuítas de Paranaguá,
ambos tombados em 1938, entre outros.40
Com a queda do Estado Novo, uma nova carta Constitucional é produzida
para o Estadoem 1947 e em 1948 é criado dentro da Secretaria de Educação e
Cultura a Divisão de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural. A Divisão
nasce com o intuito de auxiliar o Departamento do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional, e dentro da divisão, é criado o Conselho Consultivo do Patrimônio
Histórico e Artístico do Paraná. O Conselho neste momento “é constituído por
representantes da Igreja, Estado, Militares e assessorados por representantes da
Intelligentsia paranaense.”41 Apesar desta medida, na década de 1950, nenhum
37
MACHADO, Alisson Bertão. Políticas culturais e patrimônio histórico: o processo de tombamento do setor histórico da Lapa-PR como um estudo de caso. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Estadual de Maringá. Maringá, 2007, P.76 38
KERSTEN, Márcia Scholz de Andrade. Os rituais do tombamento e escrita da história: bens tombados no Paraná entre 1938-1990. Curitiba: Editora UFPR, 2000, P.96 e117. 39
KERSTEN, Márcia Scholz de Andrade. Os rituais do tombamento e escrita da história: bens tombados no Paraná entre 1938-1990. Curitiba: Editora UFPR, 2000.P.96 e 118 40
MACHADO, Alisson Bertão. Políticas culturais e patrimônio histórico: o processo de tombamento do setor histórico da Lapa-PR como um estudo de caso. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Estadual de Maringá. Maringá, 2007. P. 78 41
KERSTEN, Márcia Scholz de Andrade. Os rituais do tombamento e escrita da história: bens tombados no Paraná entre 1938-1990. Curitiba: Editora UFPR, 2000, 132
20
processo de tombamento é realizado no estado e o Conselho fica apenas com o
caráter consultivo, sem autonomia para tomar medidas em relação a política de
preservação.
Entretanto, durante a década de 1950, na gestão de Bento Munhoz Rocha
(1951-1955) um discurso de “paranidade” é proposto, procurando retirar o estado do
provincianismo e reinventar sua identidade, o que fica claro principalmente através
da comemoração do centenário do estado:
as festividades aconteceram no centro da cidade, com espetáculos públicos, de fundo político, em que foi reinventada e recontada a historia da formação do estado, procurando reafirmar o triunfo de uma determinada visão de mundo
42
É em 1953 também que é aprovada lei referente ao patrimônio histórico
sendo, porém, regulamentada apenas em 1977. Na década de 1960, 21 unidades
são tombadas pela Divisão de Patrimônio, utilizando-se os critérios análogos aos do
governo federal, relacionando o patrimônio a legitimação de uma história formal e
concentrando os tombamentos na região do litoral e da capital, o que “ressalta a
região do litoral e do planalto curitibano como detentoras de bens históricos
referenciais”. 43
Na década de 1970 esta postura geral do governo do Estado alia-se a uma
perspectiva de eficiência e competência em nível de governo federal.44 É desta
década a carta do Compromisso de Brasília, que advém da reunião de governadores
e prefeitos aliados ao governo federal e que visava uma integralização entre
governos estaduais e municipais. Também é sugestão do Compromisso de Brasília
a ocupação de imóveis históricos e artísticos tombados por repartições públicas de
âmbito cultural e promoção de cursos de especialização para o pessoal
administrativo ligado ao patrimônio.Também é desta década o slogan Paraná de
todas as gentes:
o slogan, fartamente veiculado pelo governo estadual, alterou os discursos e a ação preservacionista [...] a imagem do estado multiétnico apontava para características consideradas modernas e democráticas, acionando padrões historiográficos, já discursivamente construídos, tais como; a
42
Idem. P.136 43
KERSTEN, Márcia Scholz de Andrade. Os rituais do tombamento e escrita da história: bens tombados no Paraná entre 1938-1990. Curitiba: Editora UFPR, 2000, 141 44
MACHADO, Alisson Bertão. Políticas culturais e patrimônio histórico: o processo de tombamento do setor histórico da Lapa-PR como um estudo de caso. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Estadual de Maringá. Maringá, 2007, p. 82
21
colonização em pequenas propriedades agrícolas, a predominância da população branca e a prioridade à urbanização.
45
Apesar de diversas medidas positivas para a preservação, até 1975 um bem
poderia ser tombado passando ao largo da decisão do Conselho, indo do
proponente para o secretário e para o governador. A lei 6.292 deste mesmo ano
modifica isso. Em 1979 é criada a Coordenadoria do Patrimônio Cultural, em
substituição à antiga Diretoria de Assuntos Culturais e a ampliação da noção de
patrimônio, incluindo patrimônio natural e setores históricos46, sendo tombados neste
período locais como a orla marítima de Matinhos e a Ilha do Mel.
A década de 1980 trás consigo diversas mudanças em nível patrimonial.
Além de mudanças políticas, com o fim do regime militar, a administração de Aloísio
Magalhães no SPHAN-Pro-Memória faz com que diversas concepções sejam
alteradas no âmbito estadual. “essa conjuntura refletiu-se na prática e nas ações do
conselho do patrimônio paranaense, que optou por trabalhar em torno de linhas
culturais, seguindo os ciclos históricos da economia.”47 Diversos projetos foram
desenvolvidos tendo em vista esta nova perspectiva de patrimônio, dentre eles “A
história do tropeirismo no sul do Brasil”. Também deve-se considerar a forte
urbanização deste período, caracterizando mudanças estruturais nas cidades, e a
possível destruição de bens para vazão a este crescimento.
Em 1987, o governo do Estado cria dentro da Coordenadoria do Patrimônio
as curadorias do patrimônio natural e do patrimônio cultural e em 1988 uma nova
carta Constitucional é pensada para o estado. O principal benefício para o
patrimônio nesta nova carta é a lei que dispõe que todo município com mais de 20
mil habitantes deve ter um plano diretor.
Percebe-se que a trajetória traçada pelo estado, que visava uma integração
de sua identidade, acaba ocorrendo em partes, utilizando-se de discursos culturais e
históricos para traçar uma homogeneização das diferenças e um discurso oficial
democrático. A utilização do patrimônio foi neste caso utilizada de maneira explícita
45
KERSTEN, Márcia Scholz de Andrade. Os rituais do tombamento e escrita da história: bens tombados no Paraná entre 1938-1990. Curitiba: Editora UFPR, 2000, 145 46
MACHADO, Alisson Bertão. Políticas culturais e patrimônio histórico: o processo de tombamento do setor histórico da Lapa-PR como um estudo de caso. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Estadual de Maringá. Maringá, 2007p.86 47
KERSTEN, Márcia Scholz de Andrade. Os rituais do tombamento e escrita da história: bens tombados no Paraná entre 1938-1990. Curitiba: Editora UFPR, 2000, 146
22
para este fim, valorizando etnias, criando espaços de socialização e imagens de
convivência ausente de conflitos.
Já no âmbito municipal da capital, percebe-se um entrelaçamento entre as
políticas de preservação e a política de urbanização, principalmente no que diz
respeito ao período posterior a aplicação do Plano Diretor de 1966. É através dele,
com a criação do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba, o
IPPUC, em 1965, criado para auxiliar e organizar a aplicação do Plano Diretor, a
parceria com a Fundação Cultural de Curitiba (criada em 1971) e a Prefeitura que
são estabelecidas medidas de preservação. Apesar de algumas medidas pontuais
em relação ao patrimônio terem sido tomadas em período anterior, é com a
aplicação do Plano Diretor e destas instituições que cria-se verdadeiramente uma
política para geri-lo
Algumas das medidas tomadas para preservar o patrimônio edificado da
cidade foram a delimitação do Setor Histórico de Curitiba em 1971, compreendendo
a região das ruas São Francisco, Mateus Leme, do Rosário e Largo Coronel Enéas.
Nesse conjunto ambiental, o processo de preservação é iniciado com a restauração do antigo Paiol de Pólvora, entregue a população como Teatro (1971), a Casa Romário Martins (1973), uma antiga fábrica de cola transformada no Centro de Criatividade de Curitiba (1975), os quais serviram de modelo para a ação restauradora de vários outros imóveis, sendo revitalizada toda uma área do setor histórico que com o esforço do poder público e da iniciativa privada pôde moldar uma consciência coletiva de preservação e uma renovada fisionomia urbana.
48
É também realizado o “Plano de Acervo da Região Metropolitana de
Curitiba” em 1977, identificando e classificando 363 edificações significativas, o que
leva em 1979, ao decreto que define as “Unidades de Interesse de Preservação”. As
Unidades de Interesse de Preservação, ou UIP´s,são imóveis considerados pela
Prefeitura como importantes para serem protegidos, o que os coloca com diversas
restrições em relação ao seu uso, para sua devida conservação. Através deste
decreto, 586 bens passam a ser protegidos. Após questionamentos que serão
levantados no desenvolvimento deste trabalho, o decreto é revogado e em 1984 os
imóveis passam a ser analisados caso a caso49 pelos órgãos competentes da
Prefeitura: IPPUC e Fundação Cultural de Curitiba.
48
LEONE, Milna Maria Oliveira; CIFFONI, Ana Lucia Pontes de Souza; BINDO, Ricardo Antonio Almeida. Patrimônio Edificado de Curitiba. Curitiba: Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba, 1996. P.6 49
Dados retirados da pasta “Unidades de interesse de preservação” da Casa da Memória- Curitiba.
23
As grandes características das medidas municipais de preservação da
década de 1970, levadas a cabo principalmente pelo governo de Jaime Lerner ou
sucessores, é em primeiro lugar a reconstituição e reciclagem dos usos dos bens
tombados, como foi o caso de um paiol de pólvora, transformado em Teatro Paiol,
do Centro de Criatividade, antiga fábrica de cola, entre outros. Em segundo lugar a
postura humanista de urbanização:
Promover a “integração do homem à cidade”, fazer com que “o cidadão tivesse orgulho de sua cidade”, integrar “o homem no projeto de revitalização dos valores tradicionais da cidade”, fazer “de cada curitibano um urbanista”, e fazer uma cidade “humana” eram objetivos recorrentemente colocados pela elite do planejamento. Assim, a criação de um leque de oportunidades de cultura e lazer, utilizando ao máximo os equipamentos disponibilizados pela reforma urbana, além da política de preservação do patrimônio histórico, foram instrumentos acionados recorrentemente pelos administradores para a consecução desses objetivos.
50
Em terceiro lugar, é perceptível a “faceta étnica” desta política, priorizando a
faceta européia imigrante nas políticas de preservação. Isso teria se dado por alguns
fatores, como explica Oliveira:
essa parte era aquela de origem européia, notadamente daquela onde se originou a elite dirigente do período.Claro que a celebração dos valores alemães, poloneses, italianos – os mais privilegiados pela política vigente – também fazia parte, indiretamente, do projeto de “modernização” urbana, pela associação recorrentemente feita na cultura nacional entre progresso e imigração européia. Cabe destacar que esse esforço de celebração dos valores das etnias mencionadas continua rendendo lucros, haja vista sua importância na veiculação da imagem da cidade como “européia” de “primeiro mundo”, etc.
51
A política realizada nesta cidade, apesar de postura aparentemente
renovadora e inédita, assume contornos pautados em resoluções e políticas já
definidas, sugeridas ou aplicadas. Caso da reutilização dos bens históricos para
repartições culturais do governo,já sugerida pelo Compromisso de Brasília, caso da
etnização cultural, já realizada pelo Estado em escala ainda maior e dentro do
próprio município de Curitiba, buscando harmonizar as diferentes culturas dentro do
estado. Isso não questiona o sucesso ou insucesso destas medidas, o modo como
elas foram aplicadas em Curitiba são o objeto de estudo deste trabalho, e não
necessariamente seus resultados. Para tanto nos aprofundaremos nesta política e
em como desenvolveu-se.
50
OLIVEIRA, Dennison. Curitiba e o mito da cidade modelo.Curitiba: Editora UFPR,2000. P.56
51 Idem, p.56
24
CAPÍTULO 02
A POLÍTICA DE PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO EM
CURITIBA
2.1 O PRIMEIRO PLANO – AGACHE
Conforme já citado no capítulo anterior, a política de preservação em
Curitiba esteve atrelada a política de gestão urbana e urbanismo da cidade, sendo
que as preocupações em relação à preservação se mostraram mais patentes de
uma maneira formal quando da discussão de planos e mudanças na estrutura do
município. É importante, portanto, aprofundarmo-nos no histórico destas políticas
urbanísticas para compreender de que modo a construção de uma identidade para a
cidade é criada, considerando que identidade e preservação da história de uma
cidade estão atrelados, assim como os usos que são feitos dos espaços públicos ou
privados interferem na imagem que se pretende de um espaço e de uma sociedade.
O primeiro plano urbanístico da cidade, o Plano Agache de 1942, visava
disciplinar e conter o crescimento da cidade, além de dividi-la em zonas de
atividade: zona militar (Bacacheri), zona esportiva (Tarumã), zona industrial
(Rebouças),zona administrativa (Centro Cívico), entre outras e destinava espaços
abertos e áreas reservadas para receber o crescimento da cidade52.
A cidade, a medida que consiga implementar as ações sugeridas no Plano, gradativamente obterá mais identidade, firmando-se como Cidade equipada e organizada, destacando-se entre as capitais brasileiras. Curitiba, a partir da superação da fase dos melhoramentos pontuais, entra na fase do planejamento urbano, integrando-se no mundo das cidades pensadas.
53
O Plano Agache não foi aplicado em sua totalidade mas apenas
parcialmente e com o crescimento acelerado da cidade na década de 1950,
principalmente devido a expansão da economia cafeeira, logo precisou ser adaptado
e repensado. Em 1953 é criada a lei 699 que dispõe sobre o Código de Posturas e
Obras do Município que, entre outras atribuições que discutem as medidas que se
52
CARVALHO,André de Souza. Curitiba, imagem do planejamento ou planejamento da imagem? Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado em História) Universidade Federal do Paraná, Curitiba. 2008. P.22 53
CAROLLO, Braulio. Alfred Agache em Curitiba e sua visão de Urbanismo. Dissertação de Mestrado. (Faculdade de Arquitetura) Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre. 2002P. 171
25
adaptam a este crescimento, também dispõe, pela primeira vez em lei municipal,
sobre a proteção do Patrimônio Histórico da cidade, através dos parágrafos 4º e 5º
da lei:
§ 4º - O Departamento competente poderá constituir uma comissão para, em cooperação com elementos dos serviços do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado ou do Município, examinar e indicar os locais para os quais se torne conveniente, como medida preventiva,a adoção das providências estabelecidas por este Art. e organizar os necessários projetos. § 5º - A Prefeitura, em colaboração com os elementos referidos no parágrafo precedente, ou independentemente dela, porá em prática todas as providências ao seu alcance no sentido de preservar e defender as construções de caráter típico, histórico, artístico ou tradicional, desapropriando-as quando forem de propriedade particular, no caso de se tornar necessário para evitar sua destruição, demolição ou transformação, solicitando, para isso, dos poderes competentes, os recursos que se tornarem precisos.
54
2.2. A CIDADE CRESCE E CHEGA O PLANO SERETE
Em 1965, na gestão do prefeito Ivo Arzua, em decorrência da necessidade
gerada pelo crescimento e a insuficiência do Plano Agache e medidas pontuais em
resolver os problemas estruturais da cidade que se desenvolvia, um novo plano é
solicitado. Através de concurso, a empresa selecionada para realizá-lo é a empresa
de São Paulo, Serete, em parceria com o escritório Jorge Whilhelm Arquitetos
Associados.
Outro fator que podemos observar como confluente deste processo foi a
instituição em 1962 do curso de Arquitetura e Urbanismo na Universidade Federal
do Paraná, como nos apresenta em depoimento Onaldo Pinto, um dos integrantes
do Departamento de Urbanismo no período de criação do plano diretor, engenheiro
que cursava arquitetura neste momento:
Das tertúlias acadêmicas nasceu o primeiro sonho, o mais sério e mais importante dos sonhos, o de contribuir a reformulação da cidade de Curitiba e seu conseqüente desenvolvimento, adaptando-a aos novos tempos que se prenunciavam em suas vidas e na vida de Curitiba. De repente nasceu e frutificou a idéia de um plano diretor para Curitiba. O Brasil, sob este aspecto de desenvolvimento urbano, esse estava parado e com ele todas as cidades brasileiras, inclusive nossa capital. O prefeito (Ivo Arzua Pereira) à época, 1965, foi levado por uma conscientização geral a elaborar ou mandar elaborar um plano para a cidade
55
54
CURITIBA, Lei Ordinária de Curitiba nº699 de 16 de julho de 1953. Disponível em: http://www.leismunicipais.com.br/legislacao-de-curitiba/884190/lei-consolidada-699-1953-curitiba-pr.html. Acesso em 10 de novembro de 2011 55
Depoimento de Onaldo Pinto,IPPUC Memória da Curitiba urbana.Curitiba, dezembro de 1990. (Depoimentos 5) P. 42
26
Com a chegada de arquitetos de outros estados convidados a integrar o corpo
docente e com fundação da secção local do Instituto de Arquitetos do Brasil a
discussão sobre a cidade ganhava um ambiente propício56.
Houve desconfiança em relação a pessoas estranhas a realidade e
necessidades do município juntamente com a questão do porquê contratar fora o
que poderia ser produzido dentro de Curitiba. Já no período de seleção do projeto,
surgiram algumas criticas em relação à escolha da empresa, mesmo que o dono e
fundador da empresa paulistana Serete, Isaac Milder fosse curitibano. A URBS já
existia e projetos já eram debatidos antes da contratação da Serete, o que
aumentava o desconforto por parte de alguns envolvidos.
esse pessoal (depto de urbanismo da prefeitura) era francamente avesso a idéia de se contratar um consultor para o plano diretor. À época, o departamento de urbanismo tinha como diretor TheodocioAtherino . A segunda pessoa lá era a DúlciaAuriquio. Com Atherino o contato não era muito fácil, porque ele realmente resistia a idéia de um consultor, achava isso uma interferência no trabalho normal do depto de urbanismo. Mas acho que esta não era a idéia do prefeito
57
O plano foi desenvolvido com a metodologia de criação de um grupo local
institucionalizado para acompanhamento e elaboração dos projetos, o que resultou
na criação da Assessoria de Planejamento e Pesquisa de Curitiba, posteriormente
transformada em Instituto de Planejamento e Pesquisa de Curitiba, o IPPUC. Esta
metodologia teria sido decisiva para a escolha do projeto, entre outros, na
concorrência:
creio, - depois andei conversando com o prefeito, com a Dúlcia (Auriquio) – que uma das razões que nos fez ganhar esta concorrência foi a metodologia proposta.Consistia de se fazer um plano básico, envolver-se profundamente os técnicos locais e a Prefeitura e criar um grupo local de acompanhamento.
58
Para que a aplicação e aceitação do plano se desse de maneira ainda mais
eficaz, considerando as críticas surgidas desde o começo do processo, o prefeito Ivo
Arzua cria o Seminário “Curitiba de Amanhã”, onde o projeto é apresentado a
diversas camadas da sociedade civil, em diferentes datas e locais, convocando a
população a participar com sugestões, críticas e mesmo propondo que se um novo
56
OBA, Leonardo T. Marcos urbanos e a construção da cidade: A identidade de Curitiba. Tese (Doutorado Estruturas Ambientais Urbanas).Universidade de São Paulo,1998. P.240 57
Depoimento de Jorge WHILHELM. IPPUC Memória da Curitiba urbana.Curitiba, dezembro de 1990. (Depoimentos 5). p 28 58
Depoimento de Jorge WHILHELM.IPPUC Memória da Curitiba urbana.Curitiba, dezembro de 1990. (Depoimentos 5), p.27
27
projeto fosse apresentado, seria encarado como uma proposta possível de substituir
o plano Serete. Mesmo que de cunho político, esta decisão colocou o projeto ao
alcance da população, envolto em uma aura democrática, mesmo considerando o
período em que foi realizado.
Outra coisa acertada, a meu ver: quando terminamos o plano, havia muita polêmica na cidade contra ele. Havia muita pouca gente que discutiu isso, mas a discussão era através da imprensa, porque se tratava de um problema político. E o Ivo Arzua Pereira teve uma idéia que me pareceu genial, de discutir o futuro de Curitiba: “ A prefeitura apresenta seu plano, mas aceitaremos qualquer outro plano que seja apresentado a discussão”. Então, na verdade, não é que ele tenha blefado: provocou quem fosse contra a apresentar alguma coisa melhor. E é claro que isto não aconteceu no debate. Os contrários só o eram porque o plano estava sendo apresentado pelo Ivo
59
O projeto, aprovado pela lei nº2828 de 1966, não é aplicado de maneira
imediata, já que o prefeito Ivo Arzua estava em seu último ano de gestão e a gestão
seguinte não o aplica, deixando o IPPUC à margem das funções municipais. Este,
porém, não deixa de continuar a trabalhar e elaborar projetos de aplicação do plano
diretor. Segundo Whilhelm, a aplicação do plano se dá com a nomeação de Jaime
Lerner para prefeito, justamente pela sua participação na sua elaboração:
E, durante os anos em que o IPPUC trabalhou um pouco à margem da administração municipal, tendo como líder já o Jaime Lerner, foi possível consolidar o plano e traduzi-lo em projetos. Quando o Ney Braga perguntou ao IPPUC qual era a situação de Curitiba e o que fazer, já havia lá o plano, detalhes dele e até projetos. E quando o Jaime apresentou tudo aquilo, a primeira coisa que o Ney
60 fez foi dizer: “bem, então eu o nomeio prefeito e
nós vamos implantar isto”.61
É a partir da gestão de Lerner, sem sombra de dúvidas que o plano é posto em prática, o “maestro” do planejamento urbano de Curitiba da década de 1970.62 É também neste período que o IPPUC se torna uma espécie de elite.
Um local em excelência para assistência, cooperação e o intercâmbio técnico nas áreas de pesquisa e planejamento urbano. Atinge reconhecimento como centro de estudos urbanos, formador de urbanistas, administradores urbanos e até prefeitos, ganhando a alcunha de Sorbonne do Juvevê
63
59
Depoimento de Jorge WHILHELM.IPPUC Memória da Curitiba urbana.Curitiba, dezembro de 1990. (Depoimentos 5) P. 31 60
Na verdade, o governador que nomeia Jaime Lerner prefeito é Haroldo Leon Peres, cuja gestão se estendeu de março a novembro de 1971. 61
Depoimento de Jorge WHILHELM. IPPUC. Memória da Curitiba urbana.Curitiba, dezembro de 1990. (Depoimentos 5), p. 31 62
CARVALHO, André de Souza. Curitiba, imagem do planejamento ou planejamento da imagem?Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado em História) Universidade Federal do Paraná, Curitiba. 2008, P. 39 63
Idem. P.31
28
A equipe nomeada por Jaime Lerner para ocupar os principais cargos do
executivo é justamente composta por integrantes do IPPUC, que participaram do
desenvolvimento do Plano Serete.64
2.3 O PATRIMÔNIO NÃO ESTAVA NOS PLANOS.
Como o plano entregue pelo Serete era um plano amplo, diversas medidas
foram tomadas diretamente pelo IPPUC, os projetos criados para solucionar as
demandas do plano advieram do Instituto. É o caso do tratamento do patrimônio
histórico, que não constava no plano preliminar.
Todo programa de atividades de valorização de edifícios históricos , o IPPUC fez fora, - ou além - do plano (Serete), não havia previsão do Setor Histórico como tal, isso foi identificado posteriormente. Apenas, na pedestrianização que abrangia um pedaço do Setor Histórico, descrevia-se, localizava-se este setor: Rua XV, a velha prefeitura na Praça Generoso Marques, a Praça Tiradentes. Descrevia-se parte do hoje Setor Histórico de Curitiba e convidava-se a atividades
65
No Plano Diretor concluído, publicado na lei, já encontramos então a
preocupação com a preservação através da seção V, que trata da “Preservação e
revitalização de setores históricos tradicionais”, que apesar de ainda não especificar
em detalhes qual seria a política já esclarece quais são seus objetivos.
1 - fixar uma escala urbana de determinada época. 2 - garantir, na medida do possível a imutabilidade das edificações e dos logradouros quanto a alargamentos, tratamentos dos passeios e leito das ruas. 3 - recuperar edificações características de determinada época, destinando-as a usos adequados. 4 - orientar e incentivar nesses setores, usos e atividades compatíveis com suas características. 5 - incrementar o turismo
66.
Estes objetivos seriam realizados através de incentivos tributários e
penalidades para o que não cumprissem estas medidas.
Já a criação e delimitação do Setor Histórico se deu ao longo do processo de
Zoneamento de uso do solo, já no início da década de 1970, sendo que o decreto
64
OBA, Leonardo T. Marcos urbanos e a construção da cidade: A identidade de Curitiba. Tese (Doutorado Estruturas Ambientais Urbanas).Universidade de São Paulo,1998, P.242 65
Depoimento de Jorge WHILHELM. IPPUC Memória da Curitiba urbana.Curitiba, dezembro de 1990. (Depoimentos 5), p.36 66
CURITIBA. Lei Ordinária de Curitiba nº 2828 de 31 de julho de 1966. Disponível em http://www.leismunicipais.com.br/legislacao-de-curitiba/886957/lei-consolidada-2828-1966-curitiba-pr.html Acesso em 10 de novembro de 2011.
29
1.160 de 1971 é que estabelece e delimita diversos setores considerados Setores
Especiais e inclusive este, “De valor histórico em razão de suas características
urbanas e pelas edificações do fim do século XIX e início do XX, originários do
processo de ocupação da cidade”67 É dentro deste processo que o Plano de
Revitalização do Setor Histórico é criado, em 1971, pelo arquiteto Cyro Correa de
Oliveira Lima.Segundo ele, a partir de um trabalho anterior realizado por Jaime
Lerner em 1966:
O primeiro estudo para o Setor Histórico de Curitiba foi elaborado em 1966, no IPPUC, sob coordenação do arquiteto Jaime Lerner. Coube àquele trabalho a delimitação do Setor, bem como as idéias básicas que se constituíram no ponto de partida deste Plano.
68
Outras realizações nesse sentido foram a restauração do paiol, transformado
em Teatro Paiol, em 1971, que representou grande importância como conquista
neste momento, se tornando inclusive o logotipo da Fundação Cultural de Curitiba,
criada oficialmente em 1973 e responsávelpor assumir a animação da cidade, até
então promovida pelo departamento de Relações Públicas e Promoções da
Prefeitura Municipal de Curitiba, dirigido pelo jornalista AramisMillarch.69
Também é nesse período (1972) que ocorre o fechamento da Rua XV,
previsto desde projetos iniciais do Plano Serete, transformando a região que se
estende da Praça Osório a Universidade Federal do Paraná em um calçadão para
pedestres. O fechamento da XV para carros, bastante polêmico no período, gerou
debates por parte dos comerciantes, principalmente, mas após a sua implementação
revelou-se um dos sucessos da gestão de Lerner, caracterizando o processo de
pedestrianização do centro da cidade.
Toda a agitação proveniente das mudanças realizadas na cidade causou um
alvoroço sem precedentes até então. Havia por parte dos participantes deste
processo um sentimento de euforia em relação às possibilidades que se
apresentavam em oposição aos anos em que pouco ou nada estava sendo feito pela
cidade – em seu sentido físico e cultural. Sendo assim, pode-se dizer que algumas
das medidas tomadas foram equivocadas, talvez por esta euforia, talvez por
67
IPPUC. Evolução do planejamento urbano. Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba. Curitiba: 1996. P. 15 68
LYRA, Cyro Correa O. Plano de revitalização do Setor Histórico de Curitiba, 1970. In: OBA, Leonardo T. Marcos urbanos e a construção da cidade: A identidade de Curitiba. Tese (Doutorado Estruturas Ambientais Urbanas ). Universidade de São Paulo, 1998, p. 253 69
Boletim Informativo Casa Romário Martins: Fundação Cultural de Curitiba. V. 23 n. 114, Curitiba: 1996. P. 3
30
inexperiência dos envolvidos como nos sugere Francisca M. G. Rischbieter, a
“Franchette”, uma das engenheiras que participa dos primórdios do IPPUC e com a
gestão Lerner, se torna sua assessora técnica :
Houve uma porção de coisas boas e uma porção de ruins, porque nós, Prefeitura, estragamos todo o centro histórico da cidade, com a passagem daquela ligação com a Augusto Stellfeld. Foi meio criminoso aquilo, feito ali, mas também decorreu da falta de vivência. Poderia até ter havido outro jeito, mas o entusiasmo era tanto em fazer alguma coisa de verdade, depois de 10 anos de marasmo, que as estruturais foram implantadas.
70
Através da Fundação Cultural de Curitiba é criada a Casa Romário Martins
em 1973:
O resgate da memória era outra preocupação. Por isso saiu logo a Casa Romário Martins. Encaramos a memória – ou a História no sentido lato – levantando-a através daqueles cadernos (a série “Boletim Informativo da Casa Romário Martins”), toda a memória popular.
71
A casa Romário Martins, instalada na última e única unidade imóvel de
alvenaria de pedra de estilo português do século XVIII e desapropriada pela
Prefeitura de Curitiba em 1970, foi inaugurada em 14 de dezembro de 1973.
Idealizada para funcionar como um centro de informações sobre a cidade, centro de
exposições e, provisoriamente, como Arquivo Histórico do Município, também tinha
como função a coordenação geral do serviço de bibliotecas da FCC, a elaboração
do calendário de promoções da cidade, a recuperação de filmes e a realização de
cursos.72Sendo assim, a Casa Romário Martins auxilia e participa no processo de
levantamentos de acervo para preservação.
Em 1977 executa-se o Plano de Preservação do Acervo da Região
Metropolitana de Curitiba, através da COMEC e IPARDES73. Trata-se de um
levantamento de edificações consideradas significativas e dignas de preservação,
totalizando, neste momento, 363 imóveis.74 O levantamento classifica os imóveis
pelas suas características, estado de conservação, intervenções ocorridas e
necessárias, uso atual e uso proposto, dados complementares, localização, grau de
70
RICHBIETER,Francisca M. G. Memória da Curitiba urbana.Curitiba, maio de 1990. (Depoimentos 3), p. 06 71
PACIORNIK, Maria Elisa Ferraz. Depoimento manuscrito. Boletim Informativo Casa Romário Martins: Fundação Cultural de Curitiba. V. 23 n. 114, Curitiba: 1996 72
Boletim Informativo Casa Romário Martins: Fundação Cultural de Curitiba. V. 23 n. 114, Curitiba: 1996. P.46 73
Coordenação da Região Metropolitana de Curitiba e Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social, respectivamente. 74
LEONE, Milna Maria Oliveira; CIFFONI, Ana Lucia Pontes de Souza; BINDO, Ricardo Antonio Almeida. Patrimônio Edificado de Curitiba. Curitiba: Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba, 1996. P. 08
31
importância, imagem e responsáveis pela pesquisa histórica e arquitetônica, não
constando, necessariamente a razão do imóvel ser considerado de interesse de
preservação, seja pela questão arquitetônica ou histórica.
Em 1979, através do decreto nº1.547, 586 imóveis são classificados e
declarados como Unidades de Interesse de Preservação, as UIP´s, tendo, por lei,
seu uso restringido a decisões da prefeitura – pintura, reformas, alterações. A
intenção deste decreto seria o de preservar a memória da cidade, considerando
imóveis que fossem representativos de fatos notáveis da cidade e também
representativos de diversos momentos da arquitetura da região. No rol dos imóveis
selecionados constava desde igrejas e imóveis públicos a residências e imóveis
abandonados. Logo após a instituição do decreto, porém, a manifestação de um
proprietário insatisfeito com a decisão coloca como pauta a necessidade de
preservação dos imóveis relacionados e os prejuízos que este decreto traria aos
donos de UIP´s. Além da movimentação através da imprensa e da proposição de um
abaixo-assinado, este proprietário, Sr. Cândido Gomes Chagas, promove uma ação
contra o município, para derrubar o dito decreto.
Deste modo o IPPUC se vê obrigado a promover ações que tragam
benefícios aos proprietários. Para este fim, o incentivo da preservação através do
interesse dos próprios donos dos imóveis, e não através da prefeitura, que é
instituído um decreto em 1981isentando os proprietários que preservam e
revitalizam seus imóveis de imposto imobiliário. Esta medida não evitou, porém, que
o proponente ganhasse a causa em todas as instâncias e já em 1982 o decreto que
instituía as UIP´s é revogado e um novo decreto estabelece um número menor de
Unidades. Também é em 1982 que institui-se o beneficio do “Incentivo Construtivo”
aos proprietários de UIP´s, através da lei 6337. Trata-se de um benefício em que o
proprietário pode negociar o direito de construir em seu próprio terreno (sem afetar o
imóvel, ou sua escala, dependendo do caso) ou em outros terrenos.
Apesar destas concessões e medidas, em 1984 três decretos que
deliberavam sobre as UIP´s são revogados-nº1547, de 1979; nº414, de 1982 e
nº161 de 1981 – decretos estes que instituíam as Unidades de Interesse de
Preservação e benefícios concedidos aos proprietários. A partir deste momento os
32
casos passaram a ser julgados individualmente pelo IPPUC e FCC e uma
atualização do acervo da cidade passa a ser produzida, ficando pronta em 198975.
75
LEONE, Milna Maria Oliveira; CIFFONI, Ana Lucia Pontes de Souza; BINDO, Ricardo Antonio Almeida. Patrimônio Edificado de Curitiba. Curitiba: Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba, 1996.P.10
33
CAPITULO 03
GOVERNO E POPULAÇÃO NAS POLÍTICAS PATRIMONIAIS DE CURITIBA
A partir de considerações contextuais e históricas a respeito do processo de
construção do conceito de patrimônio no mundo e suas políticas de preservação no
Brasil, estado do Paraná e Curitiba, partimos para a análise do problema que se
aplica. Trabalharemos a partir daqui com os conceitos de patrimônio e identidade em
co-relação, aplicando-os ao estudo do caso da ação promovida por moradores de
Curitiba contra a classificação de suas propriedades como Unidades de Interesse de
Preservação. Para tanto, o capítulo será iniciado localizando o caso a ser estudado,
em qual sentido e abordagem os conceitos patrimônio e identidade serão utilizados,
a partir de quais referenciais e sua análise teórica.
Na década de 1970, percebemos através de periódicos, por um lado o
interesse, por parte da população em ter patrimônios históricos e arquitetônicos de
Curitiba com sua preservação assegurada. Nos jornais daquele período e mesmo de
anos anteriores já se observava areclamação de que diversas casas e monumentos
estavam se perdendo pela ação do tempo sem intervenção do governo municipal.
Como podemos observar neste exemplo, um artigo de 1977:
e hoje? Basta uma rápida circulada pelo dito “setor histórico” de Curitiba (ruas São Francisco, Mateus Leme, do Rosário, 13 de maio e adjacências) para que se conclua o seguinte: na verdade, o “setor histórico” foi instituído a fim de delimitar a parte mais antiga da cidade, geograficamente, e não para preservá-la (...) Na rua São Francisco, mais duas antiqüíssimas casas (estão tombadas?) também estão sendo demolidas e o antigo Hotel São
Jorge foi abaixo76
Estas reclamações eram recorrentes, já que naquele período, diversos
imóveis estavam sendo derrubados para novas construções devido, principalmente
ao crescimento da cidade e sua conseqüente valorização imobiliária. A própria
conservação do Largo da Ordem, com reclamações pela sua “desordem”, era
questionada e solicitações de mudanças naquele local eram comuns tanto por parte
de moradores como de proprietários de estabelecimentos comerciais.
É de 1979 o decreto que cria as Unidades de Interesse de Preservação
(UIP´s) que estabelece primordialmente:
76
Estado do Paraná, 07 de maio de 1977
34
Art. 1º - Fica criado o Setor Especial das Unidades de Interesse de Preservação, constituído por edificações que, de alguma forma, possam concorrer significativamente para marcar as tradições e a memória da
cidade.77.
A classificação dos imóveis como Unidades de Interesse de Preservação teve
por base o Acervo da Região Metropolitana, realizado em 1977, mas agregou ainda
mais imóveis, totalizando 586. Sua seleção foi realizada de maneira verticalizada,
sendo que o aparelho legislativo não participou da decisão, assim como também não
participaram os moradores, que foram informados através de correspondência e
edital no jornal que a partir daquele momento seus imóveis teriam seu uso
restringido. A carta, assinada por Jaime Lerner explica aos moradores que a partir
daquele momento sua propriedade faz parte do rol de imóveis a serem preservados,
que não devem ser alterados sem anuência de uma comissão e que incentivos
serão propostos a câmara legislativa para que o imóvel seja mantido intacto. Junto a
estas informações acrescenta-se que “ Com isto pretendemos assumir de fato a
paisagem da cidade”78, proposta esta que se conjuga com todo o planejamento
urbanístico da cidade – a idéia de uma reformulação geral do município.
Em relação a classificação dos imóveis, o decreto não traz os critérios ou
razões pela qual ele esta sendo relacionado, nem mesmo no Plano de Acervo da
Região Metropolitana este cuidado é observado, não constam os estudos realizados
que justificam sua escolha como de importância histórica.
Houve, portanto, quando da aplicação deste decreto, questionamento se o
“tombamento” daqueles imóveis era realmente necessário e interessante para o
município. A grande quantidade de imóveis, as incorreções em sua descrição e
ausência de critérios que os mantivessem como UIP, faziam com que fosse
duvidosa sua real importância enquanto bem a ser preservado e talvez denotede
acordo com alguns pontos de vista do período, interesses outros que o sentido de
memória, tais como especulação imobiliária e marketing pessoal.
É a partir desses questionamentos que um dos proprietários, Sr. Cândido
Gomes Chagas,organiza-se em conjunto com outros moradores em uma ação
contra o município, para evitar que suas propriedades fossem “tombadas”. O autor
77
CURITIBA, Lei nº1547 de 20 de dezembro de 1979. In: Revista Paraná em Páginas. Curitiba: Abril de 1980 78
Carta de Jaime Lerner aos moradores de Unidades de Interesse de preservação. Disponível na Casa da Memória - Curitiba
35
do processo, com auxílio de seu advogado, René Dotti, move a ação com mais sete
interessados. É conhecida a atuação do Sr. Cândido G. Chagas na política da
cidade através de sua revista, Paraná em Páginas e sua crítica contundente ao
governo Lerner. Várias reportagens e notas sobre o decreto e o processo
subseqüente foram publicadas entre 1980 e 1984, denunciando os erros do decreto
e questões de especulação envolvidas.
Estes erros e inexatidões foram fundamentais para que a ação fosse vitoriosa
e o decreto derrubado, em 1983. Alguns dos erros do decreto estavam em classificar
imóveis já demolidos, imóveis bastante depredados, classificar duplamente imóveis
e classificar imóveis sem numeração, como estes, por exemplo: “492 – R. Raposo
Tavares, s.nº ; 546 – R. Toaldo Túlio, s\nº , casarão ; 547 - R. Toaldo Túlio, s\ nº.,
fato inaceitável em um documento deste porte.Além das inexatidões, outra
justificativa foi o fato de o decreto invadir o direito de propriedade dos proprietários,
garantido pela constituição:
(...) em verdade o malsinado Decreto Municipalcriador do Setor Especial da Unidade de Interesse de Preservação (art. 1º - do Dec. 1547 – fls.194), não atingiu aos reais objetivos sociais e , além disso, ao estipular expressamente no art. 4º a proibição da alteração física ou de uso, das unidades (prédios) indicadas, “sem a prévia anuência da Comissão Especial” (sic), invadiu o direito de propriedade dos Autores, protegida pela Carta Magna, notadamentea garantia individual do uso, gozo e disposição
da propriedade.79
O decreto e processo movido contra ele promovem uma onda de debates
através dos periódicos que envolvem, por parte dos contrários ao decreto,
principalmente acusações de cunho político, acusando que aquele havia sido
proposto com intuito de especulação imobiliária – incluindo aqui questões ligadas a
construção do Shopping Mueller, por exemplo -e de marketing pessoal e não de
efetiva preservação histórica. Junta-se a estes fatores, o fato de se caracterizar
como anti-democrático, já que para a sua formulação apenas uma equipe liderada
por Lerner foi responsável, excluindo-se vereadores e mesmo a população
interessada .
Já por parte dos favoráveis, houve a percepção de que finalmente medidas
que protegessem o patrimônio arquitetônico e histórico da cidade estavam sendo
tomadas, com diversas reportagens que tratam da explicação e saudação do novo
decreto, dando a entender inclusive que tentam modificar a idéia de pessoas
79
Sentença do Dr. Antonio Gomes da Silva, juiz de direito da 4ª Vara da fazenda Publica, falências e concordatas de Curitiba. In: Revista Paraná em Páginas,Curitiba:set. de 1983.
36
contrárias, como é o caso deste artigo, que após explicação sucinta sobre o decreto
e sobre as modificações que podem ser implementadas nos imóveis finaliza desta
maneira: “Segundo o arquiteto Sérgio Pires, do IPPUC, está havendo uma grande
compreensão por parte dos proprietários dos imóveis relacionados no decreto
assinado por Lerner no ano passado.”80 É algo como uma competição entre a
prefeitura que visava legitimar seu decreto e grupos opostos, que defendiam
interesses de propriedade e eram contrários ao modo de gestão do governo de
Lerner e seus meandros.
Este governo – gestão Jaime Lerner - agrega em si questões bastante
polêmicas. Uma delas tange a sua gestão antidemocrática. Mesmo tratando-se de
um período de ditadura, sua gestão caracteriza-se por uma centralização nas
decisões, que também caracteriza o decreto nº1547, aqui tratado. A gestão do
prefeito subseqüente a segunda gestão de Lerner, Mauricio Fruet (1983-
1986),inclusive se utiliza disso em seu governo, criando programas de democracia
participativa, em contraposição ao seu antecessor.Atendo-nos ao universo da
urbanização e preservação de patrimônio histórico, podemos indicar alguns dos
pontos questionáveis da gestão de Lerner, tais como nos indica Carvalho:
Jaime Lerner é presença constante, principalmente em publicações e estudos que apontam para o “sucesso” de Curitiba, mas também àquelas que fornecem críticas e revelações sobre favorecimento de grupos capitalistas da cidade,inquéritos judiciais, manobras políticas, econômicas (utilizando, sobretudo, do planejamento e zoneamento urbano da cidade)
81
A ligação de Lerner com grupos capitalistas e o suposto favorecimento a
estes é relatado em diversos momentos e um dos casos mais próximos ao nosso
objeto é o ligado a construção do Shopping Mueller. Com um grupo interessado em
construir um Shopping no imóvel da antiga fábrica Mueller82, localizada no Centro
Cívico, alterações deveriam ser substanciais no que tange ao recuo, reduzindo sua
área. Com a inclusão do imóvel na classificação das Unidades de Interesse de
Preservação, sua fachada não poderia mais ser alterada, devido ao “interesse
histórico e mesmo sentimental” desta para o município, acrescentando cerca de 4
80
Gazeta do Povo, 4 de fevereiro de 1980. 81
CARVALHO, André de Souza. Curitiba, imagem do planejamento ou planejamento da imagem?Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado em História) Universidade Federal do Paraná, Curitiba. 2008, P. 39 82
Empresa Same – Administração e empreendimentos Ltda, que conseguiu a autorização para ocupação da integridade do terreno em 1980. OLIVEIRA, D. Curitiba, o mito da cidade modelo. P.170
37
mil metros quadrados aos incorporadores.83 Este é apenas um dos aspectos ligados
a construção deste Shopping, outras infrações foram observadas e investigadas
posteriormente, ligando também o prefeito sucessor da primeira gestão de Jaime
Lerner, Saul Raiz (1975-1979).
A partir desta breve contextualização pertinente a situação política do período
e ao modo como transcorreu a aplicação e posterior derrubada do decreto das
UIP´s, partimos para a apreciação teórica no que se refere à cidade e sua
identidade, relacionando o conceito de patrimônio a esta questão.
Como nos aponta Barreira,
as cidades aparecem também, no contexto mais recente, como lugar de articulação de interesses, econômicos e tecnológicos, apresentando uma revalorização de espaços internos considerados como fontes de investimentos vindos de vários campos da atividade social. É nesse contexto que se revela a cidade-síntese que, de acordo com a pesquisa de Ribeiro e Garcia (1996) feita em Curitiba, expressa um território conjugado de práticas baseadas em interesses econômicos e políticos acompanhados de investimentos simbólicos que lhes servem de suporte
84
É perceptível no caso de Curitiba, e mais especificamente nas gestões
Lerner, a consideração acima. Diversas propostas de seu governo se aplicam a esta
idéia. Toda a cidade de Curitiba foi “moldada” em seu governo de modo que
refletisse uma determinada imagem.
Hoje sabemos que Curitiba, mais que um signo, é a simbiose, se é que o termo soe apropriado, do criador com a criatura. Não se analisa Curitiba sem se analisar Jaime Lerner, seu discurso e seus desejos. A cidade é e tem a cara do arquiteto e urbanista.
85
É importante salientarmos a presença de Jaime Lerner no governo neste
momento para compreendermos além da questão da memória - no que se refere a
políticas de preservação - e observarmos que, muito além da preservação de uma
tradição, há um jogo político e econômico intrincado que define estas políticas
estabelecidas em Curitiba.
Repensar a cidade sob a ótica de sua “memória” ou sob o prisma de significados atribuídos a noção de patrimônio supõe compreender a lógica das prioridades sobre o uso e valorização de espaços efetivados ao longo
83
CÂMARA MUNICIPAL DE CURITIBA. Relatório de processo legislativo n.15\83. Curitiba, 1983, p.11. In: OLIVEIRA, D. Curitiba e o mito da cidade modelo, p.172 84
BARREIRA, Irlys Alencar F.. A cidade no fluxo do tempo: invenção do passado e patrimônio. Sociologias, Porto Alegre, n. 9, Jan. 2003 . Disponível em :<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-45222003000100011&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 20 de dezembro de 2011. P.319 85
DIAS.S.I.S. A Arquitetura do desejo. O discurso da nova identidade urbana de Curitiba. Cascavel:UNIOESTE, 2005. p.6 In: CARVALHO, , André de Souza. Curitiba, imagem do planejamento ou planejamento da imagem?Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado em História) Universidade Federal do Paraná, Curitiba. 2008
38
do tempo. Prioridades que aparecem como coletivamente construídas, embora sejam objeto permanente de disputas simbólicas que revelam interesses de diferentes atores sociais. O que preservar, como mudar ou o que mudar são questões que vem a tona atualmente com mais evidência, alimentando o plano das representações sobre a cidade, que orientam diferentes discursos.
86
São definidas aqui então três facetas para a política de preservação de
patrimônio em Curitiba na gestão Lerner, além da questão de avivamento cultural e
histórico da cidade: a criação de uma cidade européia, com vistas a exportar para
outras regiões uma imagem de primeiro mundo, consagrando às tradições
preservadas arquitetonicamente, primordialmente, este papel. A manipulação de
influência política para interesses de grupos investidores ligados ao prefeito e a
vinculação do marketing pessoal do político ao sucesso da urbanização e imagem
da cidade.
Em termos de criação de uma imagem européia para a cidade, principalmente
através de seus elementos arquitetônicos e criação de espaços urbanos que
primassem por esta cultura, a participação do governo estadual também estava
presente, desde o final da década de 1970, com a criação da proposta “Paraná de
todas as gentes”, que retratava um estado multiétnico, com predominância da
população branca, alicerçada pelas políticas de preservação da Coordenadoria do
Patrimônio Cultural. 87 Firmando-se esta imagem ao longo dos anos,temos como
exemplo a criação dos portais étnicos em Curitiba, na década de 1990:
a diversidade foi enfocada sob a perspectiva do mito da harmonia pluralista, buscando, mais uma vez, disfarçar tensões sociais e camuflar preconceitos. A multiculturalidade étnica foi inventada e construída num trabalho que apontou para continuidade social, em que fragmentos das diferentes culturas – objetos materiais, valores e práticas sociais – foram reunidos para distinguir e diferenciar cada grupo étnico, reinventando tradições e patrimônios culturais.
88
Assim como a proposta estadual, dentro de Curitiba a idéia foi construir uma
cidade que camuflasse tensões sociais, valorizando a diversidade como um fator
positivo e harmonioso para a cidade.
86
BARREIRA, Irlys Alencar F.. A cidade no fluxo do tempo: invenção do passado e patrimônio. Sociologias, Porto Alegre, n. 9, Jan. 2003 . Disponível em :<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-45222003000100011&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 20 de dezembro de 2011. P.315 87
KERSTEN, Márcia Scholz de Andrade. Os rituais do tombamento e escrita da história: bens tombados no Paraná entre 1938-1990. Curitiba: Editora UFPR, 2000. P. 145 88
Idem, p. 151
39
Em relação a manipulação de influências, como já foi citado, é em diversos
casos observado e alvo de diversos estudos, o envolvimento de Lerner em ações
que beneficiem determinados grupos e empresas em transações econômicas no
município.
Mesmo investigações de Comissões Parlamentares de Inquérito foram
realizadas envolvendo o nome de Lerner, gestão do espaço urbano e o IPPUC89,
relacionando principalmente sua gestão a favorecimento de determinados grupos de
investidores ou incorporadoras.
No que se refere a ampliação do marketing pessoal de Jaime Lerner através
da sua atuação como administrador de Curitiba, podemos observar a ampliação do
marketing da cidade e a sucessão de prêmios que ele recebeu após seus
mandatos. Através de obras marcadas por sua expressão e evidência, Jaime Lerner
consegue aliar sua imagem a esta imagem de modernidade, competência e
inovação, vinculadas a imagem que Curitiba adquiriu.“De todos personagens
envolvidos com a administração pública da cidade em tempos recentes, o que
melhor soube se aproveitar das oportunidades de consecução de um ambicioso
projeto político foi, sem dúvida, Jaime Lerner.”90 Ele, através de sua atuação
política, consegue promover-se em outros cargos, tais como consultor da ONU e
presidente da União Internacional de Arquitetos91, ganhando evidência dentro e fora
do país.
Através destas três facetas, observamos que a questão da memória foi
menos importante do que outras, no que se refere ao patrimônio, mesmo
encontrando no discurso de Lerner daquele momento esta preocupação, podemos
considerar que a importância em se ter um patrimônio arquitetônico especifico e
naquele momento, daquela forma, era mais importante do que o que eles realmente
significavam para a população em termos de história e pertencimento, a importância
encontrava-se muito mais na imagem da cidade, ou como cita Lerner em sua carta
89
OLIVEIRA, Dennison. Curitiba e o mito da cidade modelo.Curitiba: Editora UFPR,2000. P. 170 90
OLIVEIRA, D. A política do planejamento urbano: o caso de Curitiba. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Setor de Ciências Sociais, Universidade Federal de Campinas, Campinas, 1995. p.176, IN CARVALHO, , André de Souza. Curitiba, imagem do planejamento ou planejamento da imagem?Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado em História) Universidade Federal do Paraná, Curitiba. 2008, P.41 91
CARVALHO, André de Souza. Curitiba, imagem do planejamento ou planejamento da imagem?Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado em História) Universidade Federal do Paraná, Curitiba. 2008, P.41
40
aos proprietários das Unidades de Interesse de Preservação, “o que se pretende é
uma melhoria da paisagem da cidade”92.
92
LERNER, Jaime. Carta aos proprietários de Unidades de Interesse de Preservação
41
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Analisar a conformação de uma cidade em relação ao seu patrimônio e
população é tarefa grandiosa, se não houver um recorte temporal, espacial e
metodológico específicos. A partir do estudo deste breve período, a década de 1970
a 1984, significativo para o município de Curitiba em seu caráter de inovação ou
renovação urbanística, esbarramos impreterivelmente na figura do “maestro” desta
inovação, a figura que levou as transformações propostas por gestões e planos
anteriores às vias de fato.
Acreditamos que em nenhum local ou período a defesa do patrimônio se dê
de maneira imparcial. Como observamos ao longo da contextualização do trabalho,
a escolha do que deve ou não ser lembrado pelas futuras gerações ou pelo outro
sempre está carregada de interesses por parte do grupo que a desenvolve.
Acreditamos que encontramos aqui um caminho dos interesses que levaram a
conformação do patrimônio edificado em Curitiba, e neste caminho encontra-se a
figura central de Jaime Lerner.
Não era nosso interesse, no principio do trabalho, enfocar de maneira direta
esta figura. Foi, porém, marcante sua participação e inevitável perceber que as
políticas de preservação tem a marca indelével deste governante e que não se
desenvolve de maneira imparcial em relação a esta figura e sua gestão. Pelo
contrário, assim como a urbanização em Curitiba não foi realizada apenas por ele,
mas carrega a sua imagem, o patrimônio edificado protegido em Curitibas e não
carrega a imagem de Lerner, carrega a imagem construída por ele para a cidade.
Quando abordamos então sua figura, devemos abordar seus parceiros
políticos e também suas inimizades políticas. As posições políticas ficam bastante
claras quando analisamos o caso da revogação do decreto e observamos que os
personagens envolvidos contrariamente a ele possuem um histórico de participação
política, de envolvimento nas questões da cidade claramente contra a figura de
Lerner.Também através deste caso podemos observar o grupo circundante de
apoiadores de Lerner e de sua política, um grupo amplo e influente, conformado nos
primórdios do IPPUC.
Também esbarramos na possibilidade de trabalho com fontes orais, visto que
muitos personagens ainda estão acessíveis a entrevistas. Foi excluída esta opção
justamente para não ampliar o leque e a pesquisa de maneira a não ser possível dar
42
conta em um trabalho desta envergadura. As possibilidades estão abertas para
eventuais pesquisas e o tema desenvolve-se de maneira ainda mais polêmica visto
que ainda faz parte do firmamento político da cidade.
Sendo assim, as fontes periódicas foram de vital importância, assim como os
cadernos de depoimentos de integrantes deste processo de urbanização, a coleção
Memória da Curitiba Urbana,editada pelo IPPUC, que nos trás informações valiosas
em relação ao modo como o processo todo era visto ainda naquele momento, ou
muito próximo aquele momento, antes que conjugações políticas fossem alteradas e
ainda com muito do entusiasmo que moveu aquelas pessoas para as mudanças na
cidade.
É perceptível, porém, a amplitude que ainda apresenta-se no que diz respeito
a continuidade do trabalho com este tema. O desfecho da questão e seu
desenvolvimento após a revogação do decreto é cabível de mais estudos,
considerando-se as razões de o decreto ter sido revogado apenas após a saída de
Lerner do governo e quando outro grupo político está no governo municipal.
Também pode ser analisada a consequente forma com que a gestão posterior –
Mauricio Fruet- passa a lidar com o tema.
Foi desta maneira então, que este trabalho foi pensado, tentando observar os
fatos de uma maneira o mais próxima possível do tempo e da mentalidade daquele
período, procurando encontrar nas nuances das decisões e escolhas daqueles
personagens um caminho para observar suas razões.
43
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ANEXOS
Revista Paraná em Páginas – Ed. 182 – Abril de 1980
Fac-Símile do decreto n°1547 de 1979 com anotações do Sr. Cândido Gomes
Chagas
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Carta de Jaime Lerner aos proprietários de Unidades de Interesse de Preservação.
1980. Disponível na Casa da Memória – Curitiba
Revista Paraná em Páginas – Ed. 223 – Setembro de 1983
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Fac- Símile da sentença que derruba o decreto n°1547
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