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PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ
FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE SÃO JOSÉ
CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ – USJ
CURSO DE GRADUAÇÃO BACHARELADO E LICENCIATURA EM
CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
SIMARA MAGALLI FERREIRA DA LUZ
A CURA NAS OBRAS DE ALLAN KARDEC
São José/SC
Junho/2012
PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ
FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE SÃO JOSÉ
CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ – USJ
CURSO DE GRADUAÇÃO BACHARELADO E LICENCIATURA EM
CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
SIMARA MAGALLI FERREIRA DA LUZ
Trabalho de Conclusão de Curso elaborado como
requisito parcial para obtenção do grau de
bacharel e licenciado em Ciências da Religião do
Centro Universitário Municipal de São José –
USJ.
Orientador: Prof. Dr. Sérgio Luiz Ferreira
São José
2012
Para Fábio, com amor.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente à força que me move e move o universo. Chamado, também, de
Deus, YHWH, Javé, Olorum, Brâman, Alá, Monã... Foi por essa energia, que hoje estou
aqui...
Aos meus pais, que são minha base, a eles eu sei que posso recorrer;
Ao meu esposo, por querer fazer parte de minha vida, e ter paciência comigo;
À minha irmã pelo companheirismo de sempre, para tudo;
Ao meu cunhado pelo incentivo e pela champagne;
Aos meus sobrinhos, Vinícius, Nathália, Arthur e Maria Eduarda, por todas as
brincadeiras e diálogos transcendentais;
À Andreza pela amizade e por discutir comigo assuntos relevantes ao curso;
Ao meu irmão, por me ensinar a gostar de ler;
À professora Marivone Piana por tornar este curso possível;
Ao professor Evandro Oliveira Brito, por toda a ajuda recebida;
Ao professor Sérgio Luiz Ferreira pela orientação na elaboração deste trabalho;
À professora Isabel Christiani Susunday Berois por sua dedicação, e
sensibilidade;
Ao professor Élcio Cecchetti por sua luta e determinação;
Ao professor Adecir Pozzer pelo empenho;
A professora Gisélia Antunes pela atenção;
Ao professor Marcelo Oliveira que fazia os alunos não faltarem às sexta feiras;
À professora Mirrian Elpo pelas aulas impactantes;
À professora Clarice Bianchezzi, pelo comprometimento;
Ao professor Felipe Buttelli, pelo entendimento;
Ao Coordenador do Curso Diógenes Braga, pelas conquistas adquiridas em prol
do curso;
Aos meus amigos de curso Andréa, Antônio, Ângela, Edson e Rosi. Por serem
sempre presente;
Ao colega de curso Valter pela disposição em ser-me útil na elaboração deste
trabalho;
Aos demais professores e colegas de curso, por todos os debates, entendimentos
e desentendimentos, por que esses últimos se tornam às vezes necessários para o
crescimento.
A todos que de uma forma ou de outra contribuíram ou torceram pela
concretização deste momento. Cada um me ensinou, orientou-me, ajudou-me, instigou-
me, se fez de bom exemplo de uma ou diversas maneiras. Sendo importante para a
minha formação enquanto estudante e mais que isso, enquanto ser. A todos me sinto
grata.
Permanentemente, preso ao presente
O homem na redoma de vidro
São raros instantes
De alívio e deleite
Ele descobre o véu
Que esconde o desconhecido,
O desconhecido
E é como uma tomada à distância
Uma grande angular
É como se nunca estivesse existido dúvida,
Existido dúvida
Evidentemente a mente é como um baú
E homem decide o que nele guardar
Mas a razão prevalece,
Impõe seus limites
E ele se permite esquecer de lembrar,
Esquecer de lembrar
É como se passasse a vida inteira
Eternizando a miragem
É como o capuz negro
Que cega o falcão selvagem,
O falcão selvagem
Se na cabeça do homem tem um porão
Onde moram o instinto e a repressão
(diz aí)
O que tem no sótão?
O que tem no sótão?
O que tem no sótão?
Se na cabeça do homem tem um porão
Onde moram o instinto e a repressão
(diz aí)
O que tem no sótão?
O que tem no sótão?
O que tem no sótão?
O que tem no sótão?
O que tem no sótão?
O que tem no sótão?
Olho de Peixe
Lenine
RESUMO
Não é de hoje que se percebe no Brasil a dinâmica entre o Espiritismo Kardecista e a
busca de cura a males que atingem o ser humano. Males estes físico, emocional ou
espiritual. Os pacientes buscam na medicina alternativa ou complementar resultados não
obtidos na medicina convencional. Diante disto, o objetivo de meu estudo foi verificar
como o Espiritismo Kardecista concebe a cura, as enfermidades e seus correlacionados.
Quais as bases para esse entendimento, com citação nas passagens que legitimam este
entendimento. Para isso elaborei uma pesquisa bibliográfica através dos cinco livros
alicerce do Espiritismo Kardecista e um sexto atribuído a Allan Kardec após seu
falecimento. Os livros são: O Livro dos Espíritos - Princípios da Doutrina Espírita; O
Livro dos Médiuns ou Guia dos Médiuns e dos Evocadores; O Evangelho Segundo o
Espiritismo com a Explicação das Máximas Morais do Cristo em Concordância com o
Espiritismo e suas Aplicações às Diversas Circunstâncias da Vida; O Céu e o Inferno
ou a Justiça Divina segundo o Espiritismo; A Gênese, Os Milagres e as Predições
Segundo o Espiritismo; e por fim: Obras Póstumas. Desta forma li, analisei, tabulei e
refleti sobre a presença de passagens que se referem à cura e correlatos nos livros
Espiritas Kardecistas. O resultado demonstrou que desde aquela época (1857), data do
primeiro livro do Espiritismo Kardecista, já havia uma forte inclinação à essa dinâmica
entre a religião e a saúde. Fato esse que se tornou intenso no Brasil, possivelmente, por
diversos motivos dos quais os principais são: a carência financeira, carência do ser
enquanto pessoa em um momento de fragilidade humana, a crença nesse método
alternativo de cura, carência governamental que pouco olha para os seus cidadãos ou a
busca de uma saída, seja ela alternativa ou complementar (ou ambos) para a cura do que
lhe aflige. Desta forma conclui que o entendimento Kardecista em relação à cura,
enfermidades e relacionados se faz presente desde seus primórdios e por isso há uma
aproximação entre saúde e religião. Percebe-se essa aproximação nas passagens dos
livros obras base do Espiritismo Kardecista onde esta relação religião/saúde se legitima.
Palavras-chave: Kardecismo, Cura, Espiritismo, Kardec, Religião.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 9
2 PALAVRAS INICIAIS SOBRE O ESPIRITISMO KARDECISTA ........................ 14
2.1 Manifestações Misteriosas na casa da Família Foxx.............................................14
2.2 Allan Kardec: o Codificador do Espiritismo ......................................................... 15
2.3 A Entrada do Espiritismo Kardecista no Brasil .................................................... 17
3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA .............................................................................. 18
3.1 Concepção de Cura, Kardecismo: Ciência ou Religião ........................................ 18
3.2 O Espiritismo Kardecista e as Personalidades em seus Livros Base.....................26
3.3 Chico Xavier ......................................................................................................... 29
3.4 A Cura como Foco da Pesquisa............................................................................. 31
4 ANÁLISE POR LIVRO...............................................................................................37
4.1 Análise do livro: O Livro dos Espíritos Princípios da Doutrina Espírita .............. 37
4.2 Análise do livro: O Livro dos Médiuns Ou Guia dos médiuns e dos Evocadores 41
4.3 Análise do livro: O Evangelho Segundo o Espiritismo com a Explicação das
Máximas Morais do Cristo em Concordância com o Espiritismo e suas Aplicações às
Diversas Circunstâncias da Vida. ............................................................................... 44
4.4 Análise do livro: O Céu e o Inferno ou a justiça Divina Segundo o Espiritismo .. 47
4.5 Análise do livro: A Gênese Os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo.. 50
4.6 Análise do livro: Obras Póstumas..........................................................................56
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................ 62
REFERÊNCIAS .............................................................................................................64
ANEXO 01. .................................................................................................................... 67
ANEXO 02. .................................................................................................................... 68
ANEXO 03......................................................................................................................70
9
1 INTRODUÇÃO
Procuro verificar neste trabalho a cura dentro da concepção Espírita, tendo em vista
que essa religião tem um lidar diferenciado em relação à questão da cura, enfermidades e
processos correlacionados.
Essa acepção, às dores da alma remetendo às dores do corpo, sempre me intrigou.
Principalmente quando ouvia relatos de pessoas1 que passaram por procedimentos em casas
de atendimento Kardecista. E muitas dessas pessoas descreviam maravilhas. Esta hora é um
momento de fragilidade do enfermo, e, não raro, faz com que ele busque alternativas de cura,
não aceita (ou quase não aceita) na medicina convencional. Como se fosse mais uma chance,
alternativa ou, muitas vezes, o complemento do tratamento da medicina convencional. Fiz,
inclusive, questão de conhecer uma dessas casas, procurando uma aproximação prática com o
fenômeno escolhido por mim como tema de conclusão de curso.
Desta forma, pesquisei como o Espiritismo Kardecista concebe a cura das
enfermidades e seus relacionados, pontuando o pensamento de Allan Kardec seu codificador.
Para isso, baseei-me em cinco obras basilares do Espiritismo Kardecista, que são O livro dos
Espíritos: Princípios da Doutrina Espírita, O Livro dos Médiuns ou Guia dos Médiuns e dos
Evocadores, O Evangelho Segundo o Espiritismo, com a Explicação das Máximas Morais do
Cristo em Concordância com o Espiritismo e suas Aplicações às Diversas Circunstâncias da
Vida, O Céu e o Inferno ou a justiça Divina segundo o Espiritismo, A Gênese: Os Milagres e
as Predições Segundo o Espiritismo. E para finalizar o livro Obras Póstuma onde li, listei,
analisei, tabulei e refleti, buscando o entendimento do Espiritismo Kardecista sobre a cura,
dialogando com vários autores consagrados e outros entendidos neste tema.
Como utilizei tradução de livros de mesmo ano de edição, para melhor entendimento
classifiquei de acordo com a ordem dos surgimentos das primeiras edições França com as
letras a, b e c. Acrescidos na referência. Ficando assim:
Para os livros de edição de tradução de 1995.
- O Livro dos Espíritos Princípios da Doutrina Espírita (1857) = a.
- O Céu e o Inferno ou a Justiça Divina segundo o Espiritismo (1865) = b
- A Gênese os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo (1868) = c
Para os livros de edição de tradução de 1996.
- O Livro dos Médiuns ou Guia dos Médiuns e dos Evocadores (1861)= a
1 Alguns colegas de curso, vizinhos, conhecidos, familiares e amigos.
10
- O Evangelho Segundo o Espiritismo com a Explicação das Máximas Morais do
Cristo em Concordância com O Espiritismo e suas Aplicações às Diversas Circunstâncias da
Vida (1864) = b
O livro Obras Póstumas não foi necessário classificar tendo em vista que a edição
utilizada por mim foi do ano de 2005 como nenhum outro utilizado neste trabalho.
Na elaboração deste me deparei com constantes complicações. De início, o tema de
meu projeto foi A Cura através do Espiritismo Kardecista no qual tinha como objetivo
analisar a contribuição dos tratamentos alternativos/complementares de cura no Núcleo
Espírita Nosso Lar. Seria uma pesquisa de campo. Naquele momento, eu tinha como ideia ir a
campo por acreditar que essa modalidade tornaria meu TCC (Projeto de Conclusão de Curso)
mais rico e preciso em informações. Para isso escolhi um Centro Espírita conceituado,
localizado na Grande Florianópolis e conhecido nacionalmente que é o referido Núcleo
Espírita Nosso Lar com sede em Forquilhinha. Nesta instituição inicie algumas observações
exploratórias e primeiros contatos.
Minhas visitas foram realizadas aos sábados, onde descobri que o ideal seria em dia de
semana, inclusive, para conseguir autorização para a realização da pesquisa. Um primeiro
problema tendo em vista a minha falta de horário disponível. Desta forma, em 17 de agosto de
2011 mandei um e-mail (Anexo 01), solicitando informações e autorização aos dirigentes da
casa. Tentei dialogar por telefone, devido à minha falta de tempo. Mas, com educação e
determinação a secretaria da casa me orientou a procurá-los pessoalmente em dia de semana.
O e-mail não foi respondido. Retornei a mandar. Sem sucesso. Até que um colega meu, de
curso, comentou que tinha contatos na Direção do Núcleo. Ele Fez, então, a mediação inicial.
Segundo ele, os dirigentes do Núcleo estavam dispostos a me receber, mas, gostariam de ter
meu projeto de pesquisa em mãos para ficar a par de meus objetivos no Núcleo. Sendo assim,
tive que adiar, pois, estava, justamente, em fase de produção do projeto. Não tinha ele em
mãos para a análise da Casa. Adiar e não desistir. Isso já era final de novembro de 2011. Tinha
a intenção de iniciar as minhas pesquisas, de fato, no início de 2012 a fim de ter tempo hábil
para concluir e apresentar o Trabalho de Conclusão de Curso. Meu orientador, desta forma,
passou-me como “deveres” de férias o fichamento das Obras basilares do Espiritismo
Kardecista de seu codificador Allan Kardec (os cinco livros base) e mais o Livro As
Variedades da Experiência Religiosa – Um Estudo sobre a Natureza Humana de Willian
James.
No início do mês de fevereiro, ainda durante as férias, recebi a notícia de que meu
orientador, Professor Dr. Evandro Oliveira Brito, tinha sofrido um ato de covardia (Anexo
11
02), ficando impossibilitado de me orientar, tendo, inclusive, que se afastar por tempo
indeterminado de suas funções na faculdade.
Meu próximo orientador, professor Dr. Sérgio Luiz Ferreira, tendo assumido a
minha orientação, em primeira conversa, sugeriu-me que fizesse uma pesquisa
bibliográfica, tendo em vista o material (leituras e fichamentos) que eu já possuía. No que
aceitei com bastante satisfação, pois, tudo, antes, demonstrou que a pesquisa em campo,
embora me parecesse mais proveitosa, dependia da vontade e disposição de outros, e
demandava um tempo disponível (dia útil) que eu não contava e outros pormenores... Desta
forma, minha pesquisa de campo se tornou bibliográfica onde eu dispunha de uma
quantidade de material e uma flexibilidade de tempo ideal para o meu cotidiano.
Devo, também, descrever as diversas “dores de cabeça” que minha escolha de tema
me trouxe, conforme diz Foucault (2011, p. 9), em uma sociedade como a nossa
conhecemos, é certo, procedimentos de exclusão.
Muitos colegas meus de curso, adeptos da religião de Kardec, não concordavam em
vários aspectos que eu comentava em sala sobre o assunto. Como por exemplo, a
aproximação do Espiritismo com o Catolicismo, Espiritismo religião ou não, revelações que
Kardec afirma em seus livros, enfim... Talvez os olhos de meus colegas fossem olhos
apaixonados.
Há uma tremenda diferença emocional e prática entre aceitarmos o universo da
maneira insípida e descolorida da estoica resignação à necessidade e aceita-lo com a
apaixonada felicidade dos santos cristãos. A diferença é tão grande quanto a que
existe entre a passividade e a atividade, entre a disposição de ânimo defensiva e a
disposição de ânimo agressiva (JAMES, 1935, p. 37).
No meu entender, não falei nada de mais há, está escrito, mas, eles (meus colegas) não
viam desta forma. O que me causou, em princípio, um sentimento de defesa do meu ponto de
análise das obras. Afinal, não li as obras na intenção de falar mal desta ou de qualquer religião
e sim, simplesmente, analisá-las. Chegou-se a dizer em sala de aula que eu lia e não entendia,
acreditavam que era um problema meu de interpretação. Para mim não, estava escrito, era só
ler. Esta frase retirada do primeiro livro Espirita Kardecista, onde a primeira edição francesa
é datada de 1857, por exemplo:
O Espiritismo se tornará crença comum, ou ficará sendo partilhado, como crença
apenas por algumas pessoas? Certamente que se tornará crença geral e marcará nova
era na história da humanidade porque está na Natureza e chegou o tempo em que
ocupará lugar entre os conhecimentos humanos (KARDEC, 1995, p. 372, a).
O que se pode interpretar desta, e de outras leituras, o que esta pergunta/reposta afirma
é que o Espiritismo como uma “verdade”, segundo esta religião, define-se como uma verdade
12
universal. Desta forma, o Espiritismo, assim como outra e qualquer religião, toma para si um
status legitimador, acima de qualquer outra teoria religiosa. Ela se percebe como a evolução
da religião, que aconteceria de qualquer maneira, seria apenas uma questão de tempo. A
própria definição como terceira e final verdade humana2: sendo a primeira, Moisés; a
segunda, Jesus e a terceira, o Espiritismo. Cada uma, de acordo com a época própria da
humanidade.
Mas, ao explanar o meu entendimento, recebi diversas críticas. Diziam que eu não
tinha compreendido o conteúdo, tendo sido aconselhada, por meus colegas, a reler,
novamente, as obras. Talvez, os colegas quisessem que eu visse o que eles viam. Eu não vi
outra coisa, eu somente vi o que os meus olhos de análise me permitiam ver. Nada mais do
que está escrito. Willian James, em As Variedades da Experiência Religiosa: Um Estudo
sobre a Natureza Humana, já levantava esta questão do viver a experiência e do analisar a
obra de forma menos analítica, sem os olhos da paixão. Sem querer desmerecer, nem mesmo
exaltar, apenas analisar. Desta forma como escreveu James:
Combinando-o com o nosso juízo existencial, podemos, com efeito, deduzir outro
juízo espiritual sobre o valor da Bíblia. Destarte, se a nossa teoria do valor da
revelação afirmasse que qualquer livro, para possuí-la, há de ter sido composta,
automaticamente ou não, pelo livre capricho do autor, ou que não pode conter nenhum
erro científico e histórico nem expressar nenhuma paixão local ou pessoal, a Bíblia,
provavelmente, ver-se-ia em má situação em nossas mãos. Mas se, por outro lado,
nossa teoria permitir que um livro seja uma revelação, em que pese aos erros e paixões
e à deliberada composição humana, bastando que seja um registro verdadeiro das
experiências íntimas de grandes almas em luta com as crises do seu destino, o veredito
será muito mais favorável. Como vêem os senhores, os fatos existenciais, por si
mesmos, são insuficientes para determinar o valor; e os melhores adeptos da crítica
superior, nessa conformidade, jamais confundem o problema existencial com o
espiritual. Com as mesmas conclusões de fato diante deles, alguns perfilham uma
opinião, outros outra, sobre o valor da Bíblia como revelação, de acordo com as
diferenças do seu juízo espiritual quanto ao fundamento dos valores. (JAMES, 1935,
p. 17).
Percebi que analisar religião não é algo muito seguro, no final resolvi calar. Não quero
dizer que as experiências de meus colegas nada trazem de valor, não é isso! Concordo com
James, são maneiras diferenciadas de olhar o fenômeno. Mas ambos não podem ser
desprezados. O olhar científico e o olhar da experiência como fiel. Ambos existem e ambos
devem ter seu espaço. A legitimação de fé de meus colegas não pode ser expressada por mim.
Para mim o Kardecismo é instrumento de meu objeto de estudo que é a cura no Kardecismo
segundo seu codificador. Procuro a isenção, a não emissão de juízos de valor, de modo que
2 “A primeira revelação teve a sua personificação em Moisés, a segunda no Cristo, e a terceira não tem indivíduo
algum. As duas foram individuais, a terceira coletiva [...]. A terceira é o Espiritismo (KARDEC, 1995, 35,c).
13
não haja prejuízos nos meus rumos e conclusões. A autoridade da instituição religiosa aqui
trabalhada, a mim não se aplica, pois meu foco é científico (JAMES, 1935, p.266).
Mais uma vez, portanto, repito que aos não místicos não corre nenhuma obrigação de
recorrer aos estados místicos a uma autoridade superior conferida a eles por uma natureza
intrínseca.
Desta forma, é nisto que se baseia a minha fundamentação e o meu entendimento,
procurando responder meu questionamento inicial. Perpassando por questões que eu
considerava relevante para entendimento do meu objetivo e outras pontuais que me chamaram
atenção. O capítulo 01 é de introdução à pesquisa e apresenta o tema, problemas, objetivos, os
procedimentos iniciais de pesquisa, os problemas enfrentados e a estrutura da pesquisa. No
capítulo 02 trago a introdução do Espiritismo desde seu início com as irmãs Foxx, Allan
Kardec e a chegada do Espiritismo no Brasil. No capítulo 03 pontuo questões que sempre me
chamaram atenção como a concepção de cura, Espiritismo: Ciência ou Religião, depoimentos
de personalidades nos livros Espiritas, Chico Xavier e meu foco de pesquisa que é a cura no
Kardecismo. No Capítulo 04 trabalho a descrição dos dados coletados na pesquisa
bibliográfica e uma breve análise desses e, finalmente, o capítulo 05 é de considerações finais.
Fiz desta forma, uma leitura não religiosa da crença, mas, científica. E isso é o que se segue
nas páginas seguintes...
14
2 PALAVRAS INICIAIS SOBRE O ESPIRITISMO KARDECISTA
Tradicionalmente, os autores afirmam a forte característica entre o Espiritismo
Kardecista e as práticas de cura que se fez presente no cenário Brasileiro, diferentemente no
imaginado pelo seu codificador Hippolyte Léon Denizard Rivail 3.
Aqui no Brasil o Espiritismo Kardecista deixou de lado o seu enfoque cientificista
para abraçar, aos moldes adequados, às necessidades nacionais.
Em 1857, data do surgimento do Espiritismo na França, a distância cultural, social e
política desses dois países foram determinantes para entender como se processou os diferentes
enfoques entre sua pátria mãe e o Brasil, país considerado hoje como principal expoente
mundial do Espiritismo Kardecista (SANTOS, 2004, p.08).
A França em 1857, época do surgimento do Espiritismo Kardecista, já contava com
uma sociedade desenvolvida, influenciadora, experiente e pensante. Já tinha passado por
revoluções, guerras e ditava teorias filosóficas como o Positivismo de Auguste Comte, base
esta que o Espiritismo Kardecista tomou como princípio em sua fundamentação. A Europa,
em si, estava em processo de desenvolvimento capitalista, onde a cientificidade era a palavra
de ordem. Diferentemente do Brasil que, segundo alguns autores4, somente, começou a ter
ares de pátria com a chegada da Família Real Portuguesa ao país em 1808 que veio fugida das
tropas de Napoleão Bonaparte, coincidentemente, um imperador Francês.
O Brasil de 1857 contava com apenas 35 anos de sua independência e tinha como seu
produto principal a exportação do café, sua industrialização era resultante desse comércio.
Seus habitantes eram, em sua maioria, índios - primeiros proprietários da terra que não se
permitiram serem escravizados pelo homem branco - escravos negros vindos da África para
trabalhar como mão de obra escrava e, já nesta época, imigrantes trazidos para substituir a
mão de obra escrava que se tornava cada vez mais escassa devido à proibição do tráfico
negreiro. A grande massa populacional nacional brasileira não era estimulada ao pensamento
crítico. Havia uma educação precária e um povo carente. Em contraposição ao cientificismo
europeu contestador, arrisco-me a dizer que o Brasil era um país, praticamente, constituído
por analfabetos (não querendo parecer preconceituosa) A carência tendo reflexo na educação.
2.1 Manifestações Misteriosas na Casa da Família Foxx
3 Hippolyte Léon Denizard Rivail – Pedagogo francês conhecido como o pseudônimo de Allan Kardec.
Propagador do Espiritismo. 4 Com base no livro 1822 - Laurentino Gomes, 2010.
15
A história do Espiritismo é anterior a Kardec, teve seu início em 1848, em Hydesville
nos Estados Unidos com as irmãs Foxx, Katherine e Margaretha e mais tarde Leah. Elas
afirmavam que na casa onde foram habitar em Hydesville aconteciam fenômenos
inexplicáveis como batidas, passos, arranhões... Logo, procurou-se estabelecer contato com os
sons inexplicáveis, atraindo pessoas curiosas, interessadas em desvendar os misteriosos
fenômenos ocorridos na casa.
Em dado momento, as irmãs Foxx foram acusadas de autoras dos sons. A explicação
que se deu aos fenômenos era a manifestação do espírito de um homem morto na casa, cujo
corpo se encontrava escondido na adega da casa antes das irmãs Foxx ali habitarem. Na
época, não se descobriu o esqueleto do homem, somente em 1904, encontrou-se o tal
esqueleto na parede da casa. A história das irmãs Foxx é controversa. Uma hora, as irmãs
afirmavam que os fenômenos eram reais, outra hora afirmavam que não passavam de fraude.
Colocavam-se, o tempo inteiro, em contradição. Pairava a incerteza sobre tais fenômenos.
Fenômenos como esses não eram relatados somente em Hydesville, mas, os de Hydesville
foram os mais famosos na história do espiritismo (HEERDT, 2008, p. 192).
2.2 Allan Kardec: o Codificador do Espiritismo
Hippolyte-Léon Denizard Rivail, mais conhecido como Allan Kardec, o codificador
do Espiritismo, era francês nascido em Lyon em 03 de outubro de 1804, desencarnou (como
diz a sua crença) em 31 de março de 1869. De família católica, pedagogo, poliglota, casado,
sem filhos, pertencia a uma família de juízes e advogados. Rivail foi convidado por um amigo
a visitar às tais “mesas girantes e falantes” que se manifestavam e divertiam a burguesia
francesa do século XIX, começando assim a história do Espiritismo Kardecista.
A história do Espiritismo de Kardec teve início na França no decorrer dos anos de
1850, através dos fenômenos das “mesas girantes ou falantes”. Uma brincadeira surgida nos
salões franceses que atraía os nobres da sociedade francesa. Eram mesinhas redondas sobre as
quais pessoas colocavam as mãos e, instantaneamente, começavam a girar, saltar sem que
ninguém assumisse tais acontecimentos. Tudo parecia magnético, os fenômenos começaram a
ganhar proporções cada vez maiores.
16
Em 1855, Hippolyte Rivail5 foi convidado a conhecer as tais “mesas”. De início
Hippolyte Rivail não acreditava nesses fenômenos, achava que todos os acontecimentos eram
produzidos pelas pessoas envolvidas na “brincadeira” e não uma possível intervenção
espiritual. Mas, logo os fenômenos começaram intrigá-lo. Notou que as respostas emitidas
através daqueles objetos inanimados fugiam do conhecimento cultural e social dos que faziam
parte do "espetáculo". Foi então, que ele recebeu uma mensagem de um espírito que se
identificava como Verdade que dizia que ele seria o codificador de uma nova doutrina
(HAMA, 2004, p. 20).
Aceitou assim, a tarefa que lhe foi incumbida6.
Ora, essa vontade de verdade, como os outros sistemas de exclusão, apoia-se sobre um
suporte institucional: é ao mesmo tempo reforçada e reconduzida por um compacto
conjunto de práticas como a pedagogia [...] (FOUCAULT, 2011, p. 17).
Rivail passa a estudar esses fenômenos. Ficou conhecido como Allan Kardec, o
codificador do Espiritismo.
Quando, pelo ano de 1855, as manifestações, novas na aparência, das mesas girantes,
das pancadas sem causa ostensiva, dos movimentos insólitos de objetos e móveis
começaram a prender a atenção pública, determinando mesmo, nos de imaginação
aventureira, uma espécie de febre devida à novidade de tais experiências, Allan
Kardec, estudando ao mesmo tempo o magnetismo e seus singulares efeitos,
acompanhou com maior paciência e clarividência judiciosa as experimentações e as
tentativas que então se faziam em Paris. Recolheu-se e pôs em ordem os resultados
conseguidos dessa observação e com eles compôs o corpo de doutrina que publicou
em 1857, na primeira edição de O Livro dos Espíritos. (KARDEC, 2005, p.27).
O Espiritismo tornou-se presença no Brasil, segundo Ortiz (1978), já no ano de 1853,
mas, somente, em 1865 com a formação de um grupo em Salvador, tornou-se,
verdadeiramente, uma religião.
5 Mais tarde passou a utilizar o pseudônimo de Allan Kardec, atribuído a um nome usado em sua encarnação
anterior como druida, como eram chamados os sacerdotes do povo Celta.(HAMA, 2004, p. 21). 6 Allan Kardec foi o codificador do Espiritismo e escritor dos cinco livros bases do Espiritismo. A forma que
escreveu os livros foi com o auxilio de seus irmãos que é como o espiritismo costuma classificar desencarnados
(mortos), principalmente, do espírito chamado verdade. A influência dos espíritos pode ser percebida nessa
passagem (e muitas outras) na página 26, ainda, na introdução do primeiro livro escrito do Espiritismo O Livro
dos Espíritos: “Os Espíritos se manifestam espontaneamente ou mediante evocação. “Podem evocar-se todos os
Espíritos: os que animaram homens obscuros, como os “das personagens mais ilustres, seja qual for a época em
que tenham vivido; os de nossos “parentes, amigos, ou inimigos, e obter-se deles, por comunicações escritas ou
verbais, “conselhos, informações sobre a situação em que se encontram no Além, sobre o que “pensam a nosso
respeito, assim como, as revelações que lhes sejam permitidas fazer-nos. “Os Espíritos são atraídos na razão da
simpatia que lhes inspire a natureza moral do “meio que os evoca. Os Espíritos superiores se comprazem nas
reuniões sérias, onde “predominam o amor do bem e o desejo sincero, por parte dos que as compõem, de se
“instruírem e melhorarem. A presença deles afasta os Espíritos inferiores que, inversamente, “encontram livre
acesso e podem obrar com toda a liberdade entre pessoas frívolas ou “impelidas unicamente pela curiosidade e
onde quer que existam maus instinto”. (KARDEC, 1995,26, a).
17
2.3 A Entrada do Espiritismo Kardecista no Brasil
Segundo Ortiz (1978), a introdução do Espiritismo no Brasil se fez em 1853, mas,
somente, em 1865 nasceu um grupo em Salvador/BA. O primeiro movimento espírita
organizado (1873) foi a sociedade de Estudos Espíritas do grupo Confúcio, no Rio de Janeiro.
No Brasil, a presença do Catolicismo era maciça na sociedade, crença esta
estabelecida pela Primeira Constituição (1824) como religião oficial do país, a religião do
império. Em contrapartida, a mesma Constituição dava margem para outros credos desde que
se fizesse de forma discreta. Beneficiavam-se não somente os espíritas Kardecistas, mas,
também, os protestantes que chegaram ao Brasil como mão de obra trabalhadora.
Começa assim, a história do Espiritismo Kardecista do Brasil e suas diferenciações em
relação a seu berço, a França. José Luiz dos Santos (2004), antropólogo estudioso e escritor
do Livro Espiritismo uma religião Brasileira aponta que desde início, o Espiritismo brasileiro
já demonstrava essa ênfase curandeirista, assim como afirma, também, (GREENFILD, 1999).
No Brasil, além disso, com forte influência de tradições africanas, os espíritos dos
mortos se dizem capazes de retornar ao mundo material e interagir com os vivos, sem
se reencarnarem, mas apenas se apossando dos corpos dos médiuns. Os médiuns
especiais, que recebem espíritos que na vida passada praticavam curas como médicos,
cirurgiões ou outros agentes de saúde, são chamados de médiuns curadores.
(GREENFILD, 1999, p. 121).
Em seu livro, os relatos de tais práticas relacionadas à prática de cura ou busca dela
aliada ao Espiritismo Kardecista se faz presente em todo o trajeto da religião7 no país.
7 Vale lembrar que se percebe em muitos discursos de adeptos Espíritas Kardecistas que o Espiritismo
Kardecista não é religião e sim uma doutrina. Segundo o dicionário On-line Michaelis em um de seus conceitos
Doutrina é conjunto de princípios em que se baseia um sistema religioso, político ou filosófico.Segundo o
mesmo dicionário em um de seus conceitos religião é a crença ou doutrina religiosa, sistema dogmático e moral.
Dicionário 0n-line Michaelis site: http://michaelis.uol.com.br/ disponível em: 24 de out. de 2011.
Kardec em seus livros afirma que mesmo demostrando o seu viés cientificista ele também acreditava que a
profissão de fé a sua crença era uma questão de tempo. Que logo mais, todos descobririam a verdadeira fé nos
Espíritos, fazendo do Espiritismo kardecista a verdadeira religião de Cristo. Para exemplificar: Na frase
constante no Livro A Gênese (1995 c ), páginas 45 e 136 respectivamente, “A moral que os espíritos ensinam é a
do Cristo, pela razão que não há outra melhor” “É a grande família dos Espíritos que povoam as terras celestes; é
a grande irradiação do Espírito divino que abrange a extensão dos céus e que permanece como tipo primitivo e
final da perfeição espiritual”.
No livro Obras Póstumas (2005 p. 444), A crença no Espiritismo já não será simples aquiescência, muitas vezes
parcial, a uma ideia vaga, porém uma adesão motivada, feita com conhecimento de causa e comprovada por um
título oficial, deferido ao aderente. Na frase do livro o Evangelho segundo o Espiritismo (1996, b) página 57: “A
Ciência e a Religião são as duas alavancas da inteligência humana: uma revela as leis do mundo material e a
outras as do mundo moral”, No livro Obras Póstumas (2005), página 338 “Deixará de haver religião e uma se
fará necessária, mas verdadeira, grande, bela e digna do Criador” Enfim, em muitas outras citações encontradas
nos livros bases Kardecistas oque facilmente dariam um tema de trabalho de conclusão de curso.
18
3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
3.1 Concepção de Cura, Kardecismo: Ciência ou Religião
Cura na perspectiva etimológica 8 quer dizer ação e efeito de cura, tratamento de
saúde, restabelecimento, melhora, regeneração... Essa significação pode ser entendida não,
somente, como a cura física. Aquela que se prova. Aquela que se vê. A palavra cura não se
desenvolve em um único sentido, mas, na plenitude do ser, tanto físico, quanto espiritual, e
emocional.
De acordo com a teoria Kardequiana, a cura segundo o livro A Gênese – Os Milagres e
as Predições Segundo o espiritismo se processa da seguinte maneira.
[...]o fluido universal é o elemento primitivo do corpo carnal e do perispirito, que dele
não são se não transformações. Pela identidade de sua natureza, este fluido
condensado no perispirito, pode fornecer ao corpo os princípios reparadores. O agente
propulsor é o Espírito, encarnado ou desencarnado, que infiltra num corpo deteriorado
uma parte da substância de seu involtório fluídico. A cura se opera pela substituição
de uma molécula sã a uma malsã. (KARDEC,1995, p.294-295 c) .
Essa presença “curandeirista” não perdeu foco. Pelo contrário se fortaleceu ao longo
dos anos. Tendo em vista que, atualmente, existem Centros Espíritas dedicados,
exclusivamente, a tais práticas, que atendem, inclusivamente, essa demanda de necessidade.
Com atendimento a pacientes que buscam apoio para o os diversos males, físico, emocional,
espiritual.
Ortiz (1978), mostra que no Brasil o Espiritismo tornou-se, verdadeiramente, uma
religião que se distancia, de certo modo, do pensamento racionalista de seu codificador Allan
Kardec. O primeiro movimento espírita organizado (1873), a sociedade de Estudos Espíritas
do Grupo Confúcio, no Rio de Janeiro, teve como palavra de ordem: Sem caridade não existe
Verdadeiros Espíritas. O que levava à prática da homeopatia e dos passes para doentes.
(ORTIZ, 1978).
8 Cura sf (lat cura) 1 Ação ou efeito de curar. 2 Tratamento da saúde. 3 Restabelecimento da saúde. 4 Emenda,
melhora, regeneração. 5 Processo de curar ou secar ao sol ou ao calor do fogo (queijo, chouriço etc.). 6 Constr
Molhadela repetida aplicada ao concreto, nas primeiras horas após o lançamento, para facilitar a pega.
Dicionário 0n-line Michaelis site: http://michaelis.uol.com.br/ disponível em: 10 de abril de 2012.
19
Diante desta premissa, e a fim de uma aproximação com o meu objeto de pesquisa,
visitei alguns Centros Espíritas Kardecistas 9e percebi que esses centros recebem pessoas dos
mais variados credos e problemas de toda e qualquer enfermidade. Mas, o que faz tantas
pessoas a recorrer a esses locais? Tomei esta informação em um vídeo Institucional disponível
na internet do Núcleo Espírita Nosso Lar, no qual, a princípio, pretendia desenvolver este
trabalho. Onde, pessoalmente, estive em 17 de setembro de 2011, tendo retornado mais
algumas vezes naquele mês e no próximo.
Em Nosso Lar, nós trabalhamos deste paciente. Nós tratamos o espírito do paciente.
Aquela parte inteligente que ordena a mente e que ordena o corpo. Então os espíritos
atuam no corpo físico através desta percepção extra sensorial que nós chamamos de
mediunidade. Neste processo existe a captação de informação que o médium procura
passar ao paciente, através de passes, através de envolvimento de toques,
principalmente, com o seu próprio pensamento positivo, com a sua onda pensante,
com o seu magnetismo pessoal e, também, com o magnetismo espiritual, ele consegue
então, influenciar o ser doente para levá-lo a um estado de equilíbrio.
(INFORMAÇÃO VERBAL)10
Quando nós não conseguimos nos adaptar à realidade que temos, que somos, que
estamos vivendo, nós começamos a ter problemas na compreensão, no entendimento e
principalmente no ato de viver. Então começam aparecer certas avarias emocionais,
energéticas, espirituais, como depressão, estado alterado de consciência, psicose,
comportamento alterado em criança, em jovem em adultos e isto é tratado em Nosso
Lar (INFORMAÇÃO VERBAL)11
.
São doenças mentais de uma maneira geral, transtornos obsessivos compulsivos,
esquizofrenia, enfermidades tipo, Alzheimer, Parkinson e também algumas doenças.
Enfermidades consideradas leves, não críticas, físicas (INFORMAÇÃO VERBAL) 12
.
Para Renato Ortiz (1978), o médium Espírita Kardecista, antes de tudo, é um
curandeiro. O autor aponta que o principal critério para o recrutamento de novos adeptos
Espíritas Kardecistas se dá, justamente, no âmbito da busca pela cura. Sandra Jacqueline Stoll,
estudiosa do assunto, ainda, completa do seguinte modo:
[...] O Espiritismo se disseminou rapidamente entre os seguimentos populares. Para
isso contribuiu a constituição de “centros” espíritas, que hoje se encontram
espalhados por todo o país, e o desenvolvimento da atividade doutrinária associada a
práticas de cunho assistencial, como a distribuição de roupas e alimentos entre
famílias que vivem em favelas e nas ruas. Através destes, deu-se também a criação de
9 Centro Espírita Amor e Humildade do Apóstolo, Centro Espírita Fé e Caridade ambos em Florianópolis e
principalmente Núcleo Espírita Nosso Lar situado em São José. Este último com reconhecimento e visibilidade
nacional. 10
José Álvaro Farias – Diretor do Núcleo Espírita Nosso Lar em vídeo disponível no endereço:
http://www.youtube.com/watch?v=hW2D90UVU6I. Disponível ás 00:13 de 06 de maio de 2012. 11
José Álvaro Farias – Diretor do Núcleo Espírita Nosso Lar em vídeo disponível no endereço:
http://www.youtube.com/watch?v=hW2D90UVU6I. Disponível ás 00:13 de 06 de maio de 2012.
12
Dr. Airson Stein – Neonatologista atendente do Núcleo Espírita Nosso Lar em disponível no endereço:
http://www.youtube.com/watch?v=hW2D90UVU6I. Disponível ás 00:13 de 06 de maio de 2012.
20
inúmeras instituições filantrópicas, cujas ações estão voltadas, principalmente ao
atendimento a doentes, idosos e crianças. Os espíritas também se destacam na prática
de cura. Além dos “passes” e da atividade receitista, as chamadas “cirurgias
espirituais” consistem uma das formas mais conhecida de divulgação doutrinária.
(STOLL, 2003, p. 51).
Mas será que essa ênfase na cura observada em solo brasileiro atendia às pretensões do
Espiritismo Francês idealizado pelo seu codificador Allan Kardec?
Habituando um inter-discurso marcado pela crença prometeica em uma ciência
redentora, o espiritismo reconhecia, evidenciando suas afinidades com o positivismo,
o papel de uma elite de sábios, capaz de dirigir os destinos da humanidade, acorde
com as leis da natureza, apreensíveis pelos cientistas. Daí o autor saudar ao mesmo
tempo, a “graciosa igualdade dos homens” e a existência de uma distinção “firmada
em seus reais merecimentos” (ISAIA, 2011, p.119).
Certo a preocupação de Kardec em se firmar como ciência. Todos os livros base
Kardecistas demonstram em diferenciados e constantes momentos. Para exemplificar, sem
parecer tedioso, apenas escolhi uma citação de cada livro base do Espiritismo partindo do
primeiro livro ao último.
O Livro dos Espíritos: Princípios da Doutrina Espírita:
Se tal fenômeno se houvesse limitado ao movimento de objetos materiais, poderia
explicar-se por uma causa puramente física. Estamos longe de conhecer todos os
agentes ocultos da natureza, ou todas as propriedades dos que conhecemos: a
eletricidade multiplica diariamente os recursos que proporciona ao homem e parece
destinada a iluminar a Ciência como uma nova luz. (KARDEC, 1995, p.17 a).
O Livro dos Médiuns: Ou Guia dos Médiuns e dos Evocadores:
Só com o tempo e o estudo se adquire o conhecimento de qualquer ciência. Ora, o
Espiritismo, que entende com as mais graves questões de filosofia, com todos os
ramos da ordem social, que abrange tanto o homem físico quanto o homem moral, é
em si mesmo, uma ciência, uma filosofia, que já não pode ser aprendidas em algumas
horas como nenhuma outra ciência. (KARDEC, 1996, p. 32, a).
O Evangelho Segundo o Espiritismo:
O Espiritismo fornece a chave das relações existentes entre a alma e o corpo e aprova
que um reage incessantemente sobre o outro. Abre, assim, nova senda a ciência com o
lhe mostrar a verdadeira causa de certas afecções, faculta-lhes os meios de as
combater. Quando a ciência levar em conta a ação do elemento espiritual na
economia, menos frequentes serão os seus maus êxitos. (KARDEC, 1996, p. 51, b).
O Céu e o Inferno – Ou a Justiça Divina Segundo o Espiritismo:
Os fenômenos espíritas de nossos dias, mais generalizados e mais bem observados à
luz da razão e com auxílio da ciência confirmaram, é certo, a intervenção de
21
inteligência ocultas, porém agindo dentro de leis naturais e revelando por sua ação
uma nova força e leis até então desconhecidas. (KARDEC, 1995, p.135, b).
A Gênese – Os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo:
Como meio de elaboração, o Espiritismo procede da mesma forma que as ciências
positivas aplicadas o método experimental. Fatos novos se apresentam, que não
podem ser explicados pelas leis conhecidas; ele os observa, compara, analisa e,
remontando dos efeitos às causas, chega à lei que os rege; depois deduz–lhes as
consequências e busca as aplicações úteis. Não estabeleceu nenhuma teoria
preconcebida; assim não apresentou como hipóteses a existência e a intervenção dos
espíritos, nem o perispírito, nem a reencarnação, nem qualquer dos princípios da
doutrina; conclui pela existência dos espíritos, quando essa existência ressaltou
evidente da observação dos fatos, procedendo de igual maneira quanto aos outros
princípios. Não foram os fatos que vieram a posteriori confirmar a teoria: a teoria é
que veio, subsequentemente, explicar e resumir os fatos. É, pois, rigorosamente, exato
dizer-se que o Espiritismo é uma ciência de observação e não produto da imaginação.
As ciências só fizeram progressos importantes depois que seus estudos se basearam
sobre o método experimental; até então, acreditou-se que esse método, também, só
era aplicável à matéria, ao passo que o é também às coisas metafísicas. (KARDEC,
1995, p. 20 c).
Obras Póstumas:
Não há milagres. Assistimos ao alvorecer de uma ciência desconhecida. Quem poderá
prever a que consequências conduzirá, no mundo do pensamento, o estudo positivo
desta nova psicologia? (KARDEC, 2005, p. 30).
Como se pode observar em seus livros havia a preocupação em se firmar como
ciência. Talvez influenciado pela época em que vivia (positivismo) Kardec demonstrava uma
frequente preocupação de fazer do Espiritismo algo menos místico e mais palpável. Algo
provável!
Separação historicamente constituída, com certeza. Porque, ainda, nos poetas gregos
do século VI, o discurso verdadeiro no sentido forte e valorizado do termo – O
discurso verdadeiro pelo qual se tinha respeito e terror, aquele ao qual era preciso
submeter-se, porque ele reinava, era o discurso pronunciado por quem de direito e
conforme o ritual requerido; era o discurso que pronunciava a justiça e atribuía a cada
qual sua parte; era o discurso que, profetizava o futuro, não somente anunciava o que
ia passar, mas atribuía para a sua realização, suscitava a adesão dos homens e se
tramava assim com o destino. (FOUCAULT, 2011, p. 14-15).
Desta forma, seu discurso apenas vem legitimar a pessoa que fala. E a esta pessoa
(Allan Kardec) bastava para legitimar as suas ideias. Tem-se por hábito de ver na fecundidade
de um autor, na multiplicidade dos comentários, no desenvolvimento de uma disciplina, como
recursos infinitos para a criação dos discursos. (FOUCAULT , 2011, p.36).
A preocupação de Kardec em firmar o Espiritismo Kardecista como ciência, reflexo de
sua época, não como religião, não passa despercebida a autores estudiosos do Espiritismo.
22
Assumindo uma visão evolucionista, o espiritismo pregava o aprimoramento do
destino humano. Tanto o homem individual tendia para o aperfeiçoamento contínuo,
como a sociedade encaminhando-se, naturalmente, nessa direção. A filiação aos
ideais iluministas e o reconhecimento de leis mantenedoras da ordem cósmica,
perfeitamente perceptíveis pelo homem, faziam com que o espiritismo encarasse a
pesquisa científica como aliada no afã de comprovar a veracidade da revelação
divina. Apresentando-se como “terceira revelação” sucessora da mosaica e da cristã, a
obra de codificação espírita defendia a pesquisa científica como caminho necessário
para o reconhecimento da divindade. (ISAIA, 2011, p. 113).
O século XIX é o período onde a crítica, o ceticismo e a experiência se fizeram base
para o firmamento de um conhecimento. Kardec é filho do século XIX, Assim como nós
somos reflexo de nosso tempo. A época de Kardec foi do secularismo13
, cientificismo, onde a
religião já não atendia às necessidades da época. Kardec buscava a libertação da religião. Isso
fica claro quando se define como ciência e não religião. Reflexo de seu século. Por isso, ainda
hoje, muitos de seus adeptos não conseguem responder, ou respondem, a princípio, de forma
negativa à pergunta se o Espiritismo Kardecista é religião ou não. Religião era tudo que
Kardec não queria que fosse, mas, algo provável e observável de acordo com seu momento.
No século XIX, o método científico sugerido por René Descartes (século XVII) que se
pautava na dúvida como método, surge revisado no positivismo de Augusto Comte, tendo o
Método Científico encontrado seu ápice nesse século. Para ser ciência era precioso não
somente crer, mais experimentar, fundamentar tendo a razão como norteadora. É neste século
que surgiram variadas ciências como sociologia, psicologia, antropologia... E as mais variadas
áreas de conhecimento. A partir do século XIX, em um saber sociológico, psicológico
médico, psiquiátrico: como se a própria palavra da lei não pudesse mais ser autorizada, em
nossa sociedade, senão por um discurso de verdade científica (FOUCAULT, 2011, p.19).
O século XIX foi, também, marcado pelo secularismo que é onde o Estado toma para
si a responsabilidade moralizadora e a religião parte para o campo privado. Onde a fé não é
mais determinante na vida e cotidiano do ser, mas, apenas parte de um todo.
A certeza do século XIX, como absoluto, somente começa a ser questionado com o
surgimento de outras possibilidades como a física quântica e a relatividade de Albert Einstein.
Pois a ciência é um mundo de transformação e não estagnação.
A relação de atribuição. O autor é, sem dúvida, aquele a quem se pode atribuir o que
foi dito ou escrito. Mas a atribuição – Mesmo quando de um autor conhecido – é o
resultado de operações complexas e raramente justificadas. A incerteza do opus.
(FOUCAULT 2001).
13
Época de afastamento da Igreja, nas esferas públicas, a separação entre Igreja e Estado.
23
Voltando a Kardec e seu tempo entende-se que a preocupação científica experimental
toma peso de valor, assim como as determinações de seu século ele (Kardec) procura
fundamentar o Espiritismo nos parâmetros base de sua época.
O eixo evolucionista dava, então, grande atualidade à proposta Kardecista. De fato, o
evolucionismo era o chão comum das principais teorias científicas do século XIX.
Apresentava a vida e a humanidade numa sequência de fases e etapas que vinham
desde aquela que supunham a mais antiga. (SANTOS, 2004, p.12).
O viés positivista, reflexo de influencia de Auguste Comte. O espiritismo, eles
argumentam, é baseado na ciência do futuro, uma ciência que nós norte-americanos e
europeus ainda não reconhecemos (GREENFIEELD, 1999, p. 123).
No Brasil a aproximação mística de acordo com o seu contexto histórico, torna-se
evidente. Embora haja discurso de não religião e sim doutrinação. Mas, o que é religião?
O mesmo interesse e vitalidade que não se verifica na França, onde e Espiritismo teve
origem, mas começou a desaparecer alguns anos depois da morte de Allan Kardec.
Apesar disso é ainda à sombra do modelo francês que se pensa a história e as
características do Espiritismo no Brasil. As comparações habituais remetem às
origens: quando surgiu, em meados do século XIX, a doutrina de Allan Kardec se
definia como sendo “antes de tudo uma ciência, embora com consequências morais”.
Transladado o Atlântico, passou a predominar a feição mística, conforma análise dos
autores que trataram do tema [...] (STOLL, 2003, p.17).
O que se entende por ciência? Ciência é a teoria, o método e o objeto. A teoria e o
método o Kardecismo atende. A teoria são os livros alicerce do Kardecismo, o Método é a
sistematização, a observação dos fenômenos. E o objeto? Não seria a crença, a fé, a
experiência? A crença e a fé e a experiência, também, não seriam a mesma base de qualquer
instituição religiosa? Então, seria correto dizer que toda e qualquer instituição religiosa
poderia ser tomada como ciência. Tendo a crença, a fé e a experiência do fiel como
fundamento de sua cientificidade.
É utilizarmos de procedimentos que nos permitem conhecer a intencionalidade do ser.
Tudo que se manifesta, suas afirmações fundamentadas, a consciência vale como
dado e pode ser chamado como objeto. A fenomenologia fundamenta todas as suas
afirmações na experiência vivida (em dados). (ALEXANDRE, 2009, p.62).
O Espiritismo se declara como a terceira revelação, assim como, Isaia (2011, p. 114)
observou em seu texto A Imprevisibilidade do Discurso, essa auto proclamação descrita no
Livro Alicerce do Espiritismo a Gênese desta maneira:
A primeira revelação teve a sua personificação em Moisés, a segunda no Cristo, e a
terceira não tem em indivíduo algum. As duas primeiras foram individuais, a terceira
coletiva; aí está um caráter essencial de grande importância. Ela é coletiva no sentido
24
de não ser feita ou dada como privilégio a pessoa alguma; ninguém por consequência,
pode inculcar-se como seu profeta exclusivo; foi espalhada simultaneamente, por
sobre a Terra, a milhões de pessoas, de todas as idades e condições, desde a mais
baixa até a mais alta escala [...]. (KARDEC, 1995, p.35, c).
Nesta última citação Kardec afirma que o Espiritismo não escolhia idades,
classes... Declara-se detentor da verdade, que será abraçada por todos, seria apenas uma
questão de tempo. O início do Espiritismo Kardecista já começa elitizado. Em sua história há
indícios claros que a ele pertencia somente a classe dominante da sociedade Francesa. Pois era
“brincadeira constante em seus salões”.
As classes e nações dominantes interpretavam o evolucionismo, a sua maneira,
usando-o para justificar a dominação e o colonialismo. A noção de avanço e
superioridade, ao longo das escalas de evolução, era muito comum nas teorias sobre a
cultura e a sociedade; no espiritismo, então ela é fundamental. (SANTOS, 2004, p.
12).
O Espiritismo de Kardec ia ao encontro dos interesses da sociedade abastada Francesa
da época, a quem ele pertencia. Tendo em seu conformismo a legitimação de sua posição
perante os menos favorecidos. Ou seja, o Espiritismo tem como máxima que todo e qualquer
sujeito é responsável por tudo aquilo que produz, desde suas atitudes, riquezas, posições... A
situação de toda e qualquer pessoa é determinada por mérito próprio. Excluindo, assim, das
classes mais favorecidas da sociedade, a culpa e responsabilidade sobre as mazelas do outro.
E, confirmando, sua posição privilegiada perante os demais.
No Brasil, o seu início, também não foi diferente, tendo em vista que os livros alicerce
do Espiritismo Kardecista eram escritos em Francês. E quem tinha acesso a livros importados
escritos em francês no Brasil de 1857? Apenas a elite da sociedade Brasileira.
No Brasil, foi forte a influência de autores evolucionistas do século XIX, continuando
pelas primeiras décadas do século XX. É notória a presença, na formação da
República, dos seguidores do filósofo francês, Auguste Comte (1798-1857), criador
do Positivismo e tido como pai da Sociologia (SANTOS, 2004, p.13).
Renato Ortiz (1978) cita o “empretecimento”, usando suas palavras, derivado do viés
curandeirista do Brasil. O espiritismo adquire, pois, um caráter de consolo dos sofrimentos e
moléstias; é sob essa forma lenitiva que ele penetra, como vimos anteriormente, nas classes
baixas da sociedade, onde se associa a outras práticas mágicas (ORTIZ, 1978,p.37). Sendo
desta forma o país território fértil a religião de Kardec.
Stoll (2003), ainda, completa,
Outros atribuem á familiaridade da população brasileira com as práticas mediúnicas,
especialmente as de origem africana, a ênfase dada pelo Espiritismo ao aspecto
25
taumatúrgico. É o caso de Silvia Damásio, quando afirma que “é compreensível que a
medicina mediúnica obtivesse sucesso nesse ambiente tradicionalmente impregnado
pela crença nos poderes psíquicos, e/ou sobrenaturais de cura”. O que leva a concluir!
O principal fator de expansão do Espiritismo [...] foi a prática da medicina mágica,
arraigada na cultura brasileira. (STOLL, 2003, p. 56).
Radicalizando um pouco mais, Sidney M. Greenfield, em seu livro: Cirurgias do
Além, pesquisa antropológicas sobre curas espirituais, define o Espiritismo Kardecista desta
maneira:
Quase que imediatamente, a crença na existência e na possibilidade da comunicação
com os espíritos dos mortos espalhou-se pela Europa, onde ainda em meados do
mesmo século foi codificada num sistema religioso e filosófico pelo professor francês
Hippolyte Leon Rivail, que publicou seu trabalho sob o pseudônimo de Alan Kardec.
No Brasil, depois da popularização dos escritos codificadores de Kardec, o sistema foi
codificado e adaptado para incluir a cura pelos espíritos por um médico, político e
empresário brasileiro, Adolfo Bezerra de Menezes.
[...]
No começo do século XX, quando as repúblicas sul-americanas entraram num
processo de urbanização, a variante espírita brasileira, também chamada Kardecismo
em homenagem a seu codificador, tornou-se popular entre as classes médias que
cresciam rapidamente dentro das cidades que se expandiram com a mesma
velocidade.
[...]
Graças a esta nova ênfase na cura, deixou de ser propriedade exclusiva dos ricos, e
tornou-se para a crescente população brasileira uma das tantas alternativas religiosa
ao catolicismo.
[...]
Os espíritas como observei aceitam a medicina moderna. Mas em sua visão ela é
limitada em sua capacidade de cura. Como é incapaz de entender, menos ainda de
tratar do espírito, a medicina, apesar das boas intenções, é muito limitada. Os
médicos, na melhor das hipóteses, são vistos como capazes de tratar dos sintomas que
se manifestam no corpo somático, não das causas dos sintomas oriundos do mundo
espiritual ou de problemas de inadequação entre os corpos somáticos e fluidos. Estes
tratamentos precisam de médiuns-curadores, os únicos capazes de conseguir ajuda do
mundo espiritual. (GREENFIELD, 1999, p.30, 31 e 36).
Assim, com base nesses autores define-se o Espiritismo Kardecista. Seus
entendimentos e aspectos relevantes á religião.
26
3.2 O Espiritismo Kardecista e as Personalidades em seus Livros Base
Fato que também me chamou atenção nos livros Kardequianos foram os textos
(recebidos em forma de pneumatografia ou psicografia14
) atribuídos a grandes e diversas
personalidades tais como:
Citação 01.
Ora, esta exatamente a ideias que estamos encarregados de eliminar do vosso íntimo,
visto desejamos fazer que compreendais esse futuro, de modo a não restar nenhuma
dúvida em vossa alma. Por isso foi que primeiro chamamos a vossa atenção por meio
de fenômenos capazes de ferir-vos os sentidos e que agora é que ditamos “O Livro
dos Espíritos” Santo Agostinho (KARDEC, 1995, p. 425, a).
Comentário:
Santo Agostinho foi um padre da Igreja Católica Apostólica Romana, e uma das
figuras mais importantes do Cristianismo. Intelectual que dedicou sua vida a propagação de
sua fé. Depois de morto escreveria Santo Agostinho para um livro de outra confissão
religiosa? Um problema, pois para responder a esta questão ter-se-ia que entrar em contato
com o pós-morte e descobrir os trâmites do além. De imediato, percebe-se que é mais uma
aproximação com a fé cristã, ou até uma disputa por espaço por se “utilizar” da fala de um
Doutor da Igreja Católica.
Vale lembrar que o Espiritismo não se considera não cristão. Pelo contrário, há todo
um cuidado para se legitimar como cristão e se declara, inclusive, continuação desta. Com
diferenciações consideráveis. Como por exemplo: a crença da reencarnação e não na
ressurreição. Cristo é um Espírito evoluído que pisou na terra, mas, como irmão e filho de
Deus como nós, Cristo é Deus filho para o Cristianismo. No Espiritismo não há propriamente
uma hierarquia e pouco ritualizado ao contrário do Cristianismo de modo geral. Essas são
apenas algumas diferenças entre o Kardecismo e o Cristianismo.
Citação 02.
Em face do atual extravasamento de egoísmo, grande virtude é verdadeiramente
necessária, para que alguém renuncie á sua personalidade em proveito dos outros, que
de ordinário, absolutamente lhe não agradecem. Fénelon. (KARDEC, 1995, p. 42, a).
Comentário:
Esta fala é atribuída a Fénelon, outro intelectual da Igreja Católica.
14
“A pneumatografia é a escrita produzida diretamente pelo Espírito, sem intermediário algum; difere da
psicografia, por ser esta a transmissão do pensamento do Espírito, mediante a escrita feita com a mão do
médium. (KARDEC, 1996,192)”
27
Citação 03.
Infelizmente, não é raro verem-se médiuns que, não contentes com os dons que
receberam, aspiram, por amor-próprio, ou ambição, a possuir faculdades
excepcionais, capazes de os tornarem notados. Essa pretensão lhe tira a qualidade
mais preciosa: a de médiuns seguros. Sócrates (KARDEC, 1996, p. 244, a)
Comentário:
Pensamento atribuído a Sócrates, pensador Grego considerado o pai do pensamento
Ocidental e divisor das águas na Filosofia, antes Sócrates e pós Sócrates. De uma coisa se
pode ter certeza, o método utilizado para a transmissão desse pensamento foi a psicografia,
pois vivo Sócrates nada escreveu, pelo menos naquela vida em que foi Sócrates.
Citação 04.
Humanidade! Humanidade! Não mergulhes mais os teus tristes olhares nas
profundezas da terra, procurando aí os castigos. Chora, espera, expia e refugia-te na
ideia de um Deus intrinsecamente bom, absolutamente poderoso essencialmente justo.
Platão (KARDEC, 1995, p. 467, a)
Comentário:
Fala atribuída a seu discípulo Platão.
Citação 05.
Assim resistireis aos ataques impotentes do mal, como o rochedo inabalável á vaga
furiosa. São Vicente de Paulo (KARDEC, 1996, p. 469, a)
Comentário:
São Vicente de Paulo, padre católico de grande influência, inclusive nas bases da
Igreja Católica. Considerado Santo da Igreja Católica.
Citação 06.
Espero que esta comunicação produza frutos e desejo que ela possa ajudar os médiuns
a se terem em guarda contra o escolho que os fariam naufragar. Esse escolho já o
disse, é o orgulho. Joana d’ Arc ( KARDEC, 1996, p. 462, a)
Comentário:
Joana d’ Arc, camponesa que se tornou soldada Francesa, afirmava ser guiada por
vozes. Foi atirada na fogueira, acusada de bruxaria. Joana dentro da Concepção Kardecista é
28
que me parece que viveu mais próximo à teoria Kardecista. Sua história é cercada de
fenômenos inexplicáveis. É válido lembrar que Joana morreu cerca de 420 anos antes das
teorias de Kardec.
Citação 07.
Compadecei-vos dos que não ganharam o reino dos céus; ajudai-os com as vossas
preces, porquanto a prece aproxima do altíssimo o homem; é o traço de união entre o
céu e a terra: não o esqueçais. Uma rainha de França. (KARDEC, 1996, p. 69, b)
Comentário:
Uma rainha da França.
Citação 08.
Homens e irmãos a quem amamos, aqui estamos junto de vós. Amai-vos, também,
uns aos outros e dizei do fundo do coração, fazendo as vontades do pai, que está no
Céu: Senhor!... e poderei entrar no reino dos céus. O Espírito de Verdade. (KARDEC,
1996, p. 23, b)
Comentário:
Este último á atribuído ao espírito chamado Verdade, espírito este que se revelou a
Kardec, demonstrando que ele seria o codificador do espiritismo15
.
Chico Xavier que foi grande personalidade nacional espírita kardecista, responsável
pelo reconhecimento nacional do Espiritismo e por pautar sua vida em prol do próximo. Autor
de mais de 418 títulos e mais de 25 milhões de exemplares publicados. Enfrentou processo
iniciado em 1937, referente aos direitos autorais da esposa do jornalista, político e escritor
Humberto de Campos, que tinha falecido três anos antes, onde Chico Xavier atribuiu ter
“recebido” em forma psicografa16
. Trata-se das Crônicas de Além Túmulo, que devido ao
caso, passou a ter uma projeção de público além do esperado. O final foi favorável a Chico e
se deu em 1944, onde o veredito dizia que o Sr Campos não poderia ter adquirido direitos
autorias pelo livro, pois o mesmo já se encontrava falecido, sendo que à sua esposa e
sucessores nada Chico devia. Mesmo com veredito favorável, Chico passou assinar ás obras
de Humberto de Campos como Irmão X17
(SANTOS, 2004, p. 85).
Devo admitir que não posso e nem tenho pretensão de afirmar que estas frases
atribuídas a grandes personalidades não foram ditadas por elas, especialmente, para os livros
15
Detalhes, no Livro Obras Póstumas (2005, p. 331-332). 16
Ver nota de rodapé da página 26 deste trabalho. 17
Informações deste paragrafo <http://clotildes.tripod.com/chico_xavier.htm> Acessado em 27 de maio de 2012.
29
base do Espiritismo Kardecista. Não há como saber. Minha intenção neste quesito não é
respondê-la, Não há meios palpáveis para isso. É questão de fé nesta crença. Ou se acredita,
ou não se acredita. Assim como não posso refutar, também, não posso ser impedida de
analisar, e acreditar ou não, conforme meu entendimento. Enfim, creio que essa vontade de
ser verdade, assim apoiada sobre um suporte e uma distribuição institucional, tende a exercer
alguma influencia sobre os outros discursos (FOUCAULT, 2011, p. 18).
O que de imediato se percebe é a utilização desses e de outros grandes nomes de
personalidades cristãs católicas. Não há frases de Lutero, por exemplo, ou Calvino em seus
livros (os seis estudados por mim) ou outro seguimento cristão, ou até mesmo não cristão.
Tendo em vista, Kardec ser de família Católica, seu enraizamento nesta religião é percebido
em seus textos. Quanto às outras personalidades como Sócrates, Platão, a adesão (ou
apropriação) desses, traria grande força para o movimento espírita.
Em todo caso, uma coisa ao menos deve ser sublinhada; a análise do discurso, assim
entendida, não desvenda a universalidade de um sentido; ela mostra à luz do dia o
jogo da rarefação imposta, com um poder fundamental de afirmação. (FOUCAULT,
2011, p. 26)
No mais, todas essas grandes personalidades citadas, tendo em vista haver muitas
outras citações nos livros base, não podem se pronunciar por motivo de falecimento.
3.3 Chico Xavier
Falar de Espiritismo Kardecista não se poderia deixar de falar de Chico Xavier. Como
Stoll (2003) o nomeou, o Best-Seller do Espiritismo. É interessante saber que Chico Xavier
tem sua aproximação com o Espiritismo Kardecista devido à pouca saúde de sua irmã. Stoll,
em seu Livro Espiritismo à Brasileira, narra que o primeiro contato que Chico Xavier teve
com o Espiritismo Kardecista foi justamente através da enfermidade de sua irmã Maria
Xavier18
. Ela não respondia ao tratamento da medicina convencional e fez com que seu pai,
um católico praticante, buscasse auxílio em um tratamento não convencional. Esse tratamento
era contrário, em muitos sentidos, aos ensinamentos de sua Igreja Católica Apostólica
Romana, que, no ano de 1927, era quase absoluta no cenário brasileiro. A partir deste
momento, Chico Xavier abraçou o Espiritismo Kardecista.
18
Maio 1927, Maria Xavier, uma de suas irmãs, ficou doente. Apresentando quadro de perturbações mentais. O
tratamento da medicina convencional não deu conta de atender. Seu pai João Candido, embora católico
fervoroso, busca tratamento para sua filha com um casal de “amigos espíritas”. Esses aplicam passes em Maria
Xavier que foi levada para um tratamento mais prolongado. Chico Xavier fica então fascinado com o que houve.
(STOLL, 2003).
30
Sugerimos em outra parte desse trabalho que o ideal de santidade católica foi o
modelo de racionalização ética adotado pelo Espiritismo no Brasil. Modelo que por
meio de Chico Xavier se popularizou, consolidando o “estilo brasileiro” de ser
espírita. (STOLL, 2003, p. 271).
Chico Xavier não ficou famoso como curandeirista como outros médiuns19
, embora há
relatos que ele, também, exercia a essa função recebendo o médico Bezerra de Menezes, mas
sim, como expoente literário do Espiritismo Kardecista no Brasil e no mundo (SANTOS,
2004).
Chico nasceu e morreu pobre, dedicou sua vida à intensa atividade mediúnica. De vida
e atitudes incontestáveis, Chico atendia em Uberaba, Minas Gerais, a inúmeras pessoas que
vinham até ele em busca de auxílio para as suas aflições, principalmente no que se diz
respeito a perda de um ente querido. Consolava, e trazia esperança do “além” a quem buscava
por isso através da psicografia 20
.
Até 1989, eram contabilizados 327 títulos de livros do médium Francisco Xavier,
alcançando o total de 15 milhões entre os 50 milhões de exemplares de livros espíritas
que se calculava tivessem circulando no Brasil até então. Esse total de superava em 3
milhões o número de exemplares dos livros de Allan Kardec, editado no país. Quando
de seu falecimento em 2002, estimava-se em 418 o número de seus títulos e em 25
milhões o de exemplares publicados. (SANTOS, 2004, p. 85).
Chico Xavier, ícone espírita, hoje é tema de livros, filmes, documentários. Tendo sua
vida regida pela assistência ao próximo, conseguiu a simpatia de espíritas e não espíritas ao
longo de sua vida. Chico faleceu com 92 anos de parada cardíaca, cumprindo uma promessa
que só iria morrer no dia em que o Brasil, estivesse feliz. Morreu no dia 30 de junho de 2002,
dia que o Brasil, ganhou o Penta Campeonato de Futebol (SUPERINTERESSANTE, 2010).
19
Dentro desses médiuns Kardecistas famosos por suas práticas curandeiristas posso citar: Antônio Gonçalves
da Silva, o batuíra, pessoa humilde que se tornou abastada, que, posteriormente, descobriu o Espiritismo ao qual
dedicou seu tempo e seu dinheiro à causa Espirita (mais ou menos 1904) responsável pela divulgação tipográfica
Espirita Kardecista, algo muito caro em sua época. Bezerra de Menezes, (por volta de 1886) tido como o mais
importante espirita brasileiro, médico de profissão, mas, que afirmava receber através de sua mediunidade
auxílio dos espíritos, chegou a presidir a Federação Espirita Brasileira (FEB) causou grande impacto em sua
sociedade, pois era um homem de ciência, um médico que se declarou “místico”, assim pode-se dizer. Mirabelli
(por volta de 1906) de vida polêmica e cercado de fatos mirabolantes como a sua presença, em dois lugares ao
mesmo tempo a uma distância de 90 quilômetros de um lugar ao outro. José Pedro de Freitas, o Arigó ( por volta
de 1940) este com reconhecimento nacional, dizia que recebia o, então, médico alemão da primeira guerra
mundial Dr. Fritz. Domingos Filgueiras, comandante da guarda da alfândega do Rio de Janeiro, que chegou a
atender em uma sala da alfândega. (SANTOS, 2004). 20
Segundo os Espiritas Kardecistas, a psicografia é a faculdade mediúnica, que o médium possui de escrever
mensagens, livros e outros ditada por espíritos.
31
3.4 A Cura como Foco da Pesquisa
No início de Janeiro de 2012, dei início às minhas leituras para a formação da base
teórica do meu Trabalho de Conclusão de Curso. As obras são: O Livro dos Espíritos
Princípios da Doutrina Espírita, O Livro dos Médiuns ou Guia dos Médiuns e dos
Evocadores, O Evangelho Segundo o Espiritismo, com a Explicação das Máximas Morais do
Cristo em Concordância com o Espiritismo e suas Aplicações às Diversas Circunstâncias da
Vida, O Céu e o Inferno ou a justiça Divina segundo o Espiritismo, A Gênese Os Milagres e
as Predições Segundo o Espiritismo. E mais, As Variedades da Experiência Religiosa - Um
estudo sobre a natureza humana de Willian James. Somando um total de 2.601 páginas
(Obras Espíritas 2.262 + As Variedades da Experiência Religiosa = 339 páginas).
E por minha conta li, também, o Livro Obras Póstumas, atribuído a Allan Kardec. Em
um apanhado de anotações encontradas pós-morte, ou conforme o Espiritismo Kardecista
costuma declarar desencarne, somando mais 478 páginas. Terminando com um total de 3.079
páginas, sem contar outros livros, artigos de autores utilizados por mim. Li e fichei os livros
solicitados por meu orientador conforme combinado.
Devo admitir que os Livros espíritas não são de difícil entendimento, talvez, por
Kardec ser um pedagogo por formação e desta forma dominar a arte do ensinar, ele pensou
em um tipo de leitura que fosse acessível a diferenciados públicos. Tirando diversos assuntos
que ficam sem respostas. Esses assuntos, de acordo com minhas leituras, são devido ao fato
de a humanidade não estar preparada para receber.
Como poderá o homem ser levado a reformar as suas leis?
“Isso ocorre naturalmente, pela força mesma das coisas e da influência das pessoas
que o guiam na senda do progresso. Muitas já ele reformou e muitas outras reformará.
Espera!” (KARDEC, 1995, p.372, a).
(...) encarregados por Deus de esclarecer os homens acerca de coisas que eles
ignoravam, que não podiam aprender por si mesmos e que lhes importa conhecer,
hoje que estão aptos a compreendê-las (KARDEC, 1995, p.19, c).
Respostas essas que serão respondidas no futuro... As invenções, as descobertas e todo
e qualquer tipo de respostas que a humanidade não sabe hoje, está reservado saber, de acordo
com o seu desenvolvimento intelectual e moral. Respostas que irão se descortinar aos poucos
de tempos em tempos... No mais, os livros são formatados de modo que qualquer pessoa
consiga acompanhar o raciocínio do codificador.
Decidi pesquisar a frequência sobre a temática da cura nas obras base do
32
Espiritismo Kardecista, sempre buscando dialogar com autores estudiosos do assunto como
Sandra Jacqueline Stoll, doutora em Antropologia pela Universidade de São Paulo.
Professora que, atualmente, trabalha na Universidade Federal do Paraná onde escreveu e
orientou diversos trabalhos sobre o Espiritismo Kardecista, tendo escrito o livro:
Espiritismo à Brasileira. José Luiz dos Santos, mestre pela Universidade de Capinas e
doutor pela Universidade de Londres, autor do livro Espiritismo: uma religião Brasileira.
Sidney M. Greenfield, americano, doutor pela Universidade de Colúmbia, pesquisador de
campo com diversas atuações no Brasil, autor de Cirurgias do Além. Perpassando por
outros autores consagrados como Renato Ortiz, Levi Strauss, Moacir Scliar e outros. E
mais as obras fichadas Espíritas Kardecistas (cinco livros alicerce do Espiritismo
Kardecista e mais Obras Póstumas). Ainda fiz a leitura de livros de Chico Xavier, peça
chave da literatura Espírita no Brasil. Com esta base e mais outros autores não menos
importantes permitiram-me firmar minhas conclusões com base sólida na teorização. O
Objetivo foi encontrar um resultado que possibilitou visualizar a temática da cura em suas
variadas formas encontradas nas Obras desta religião.
Como pesquisei? Primeiro lia a obra, que em média demorava uma semana, onde
dividia da seguinte forma: Por exemplo: O Livro dos Espíritos Princípios da Doutrina
Espírita com 494 páginas. Dividia 494 por 7 dias = 70 páginas por dia. Como o livro não
tem um formato longo e sim curto. Eram quase 35 páginas por dia, algo possível mesmo
com leituras em horário das 19h às 23h. E assim, fiz com todos os livros, menos o livro As
Variedades da Experiência Religiosa.
Esse por ter uma escrita mais densa e páginas mais longas utilizei duas semanas. No
total fiz minhas leituras das obras de Kardec e de As Variedades da Experiência Religiosa –
Um estudo sobre a Natureza Humana, de Willian James (última obra de acordo com meu
primeiro orientador) em oito semanas. Ficando somente a fundamentação teórica para a
leitura posterior. Neste trabalho apenas utilizei algumas citações de cada livro. As citações
completas sobre cura de cada obra se encontra no Anexo 03.
As obras são formatadas de forma diferenciadas, ficando complicado inclusive a
catalogação das mesmas. Onde fiz por assunto. Tive o cuidado de não cortar pensamento.
Do início ao fim naquele assunto, considerei como apenas uma citação. Ficando assim:
33
QUADRO: TABULAÇÃO DE DADOS NO QUE SE REFERE À CURA E CORRELATOS
NAS OBRAS KADEQUIANAS Obras Ano de
Publicação
Ano e
Edição
Nac.
utilizada
Número de Páginas
da tradução
pesquisada
Citações que se
referem a
temática da cura
na teoria
Kardequiana
Páginas das
citações
O Livro dos Espíritos
Princípios da Doutrina
Espírita
1857 1995
76ª
“a”
494 21 76-165-169-
230/231-251/252-
252-279- 279- 339-
341-342-344-
344/345-370-400-
421-435-447-469-
473-479
O Livro dos Médiuns
ou Guia dos Médiuns e
dos Evocadores
1861 1996
62ª
“a”
486 12 77/78-78-110-135-
172-172/173-
215/216-
217/218/219-232-
323-329-391
O Evangelho Segundo
o Espiritismo com A
explicação das
máximas morais do
Cristo em
concordância com o
Espiritismo e suas
aplicações ás diversas
circunstâncias da vida
1864 1996
112ª
“b”
435 18 51-99-101-106-
112-121-121-157-
301-306/307-363-
367-374-474-
430/431-431-432-
435
O Céu e o Inferno ou A
Justiça Divina
segundo o Espiritismo
1865 1995
40ª
“b”
425 8 141-146/147-205-
293-342-381-
388/389-423
A Gênese Os Milagres
e as Predições
Segundo o Espiritismo
1868 1995
36ª
“c”
422 23 33-199-266-287-
291-294/295/296-
304-305-305-307-
308-311-315/316-
317-318/319/320-
320 á 330
331 á 334
372-373
Obras Póstumas 1890 2005
37ª
478 13 57-81/82/83-83/84-
84-89/90-101/102-
114-119-152-153-
337-342-381
Fonte: Dados da pesquisa (2012)
Desta forma desenvolvi meu pensamento com base neste quadro. A fim de responder o
meu questionamento proposto. Vale a pena, citar que a primeira obra Espírita Kardecista
traduzida no Brasil foi parte da Obra: O Livro dos Espíritos - Princípios da Doutrina Espírita,
em 1866, por Teles de Menezes. E o primeiro periódico do Espiritismo no Brasil foi Eco de
Além-Túmulo, também por Teles de Menezes (SANTOS, 2004).
Entre 1873 e 1876, por tradução de Joaquim Carlos Travassos no Rio de janeiro, foi
completada a tradução das Obras: O Livros dos Espíritos - Princípios da Doutrina Espírita, O
34
Livro dos Médiuns – Ou Guia dos Médiuns e dos Evocadores, O Evangelho Segundo o
Espiritismo com a Explicação das Máximas Morais do Cristo em Concordância com o
Espiritismo e suas Aplicações ás Diversas Circunstâncias da Vida, O céu e o Inferno ou a
Justiça Divina Segundo o Espiritismo.
Atualmente, segundo informações da Federação Espírita Brasileira (FEB)21
, as obras
Kardequianas estão nas seguintes numerações de edições nacionais:
- O Livro dos Espíritos Princípios da Doutrina Espírita - 92 ª edição ano de 2011;
- O Livro dos Médiuns ou Guia dos Médiuns e dos Evocadores – 80ª edição ano de
2011;
- O Evangelho Segundo o Espiritismo com A explicação das máximas morais do
Cristo em concordância com o Espiritismo e suas aplicações às diversas circunstâncias da
vida – 130ª edição ano de 2011;
- O Céu e o Inferno ou a justiça Divina segundo o Espiritismo - 60ª edição ano de
2012;
- A Gênese Os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo - 52ª edição ano de
2012;
E por fim:
- Obras Póstumas - 40ª edição ano de 2010.
A FEB salienta que além desta edição que eles chamam de 18 cm, que é a que eu usei
para a produção deste trabalho dita, como a edição oficial. Também há a produção de edições
de 16 e 21cm, além da edição 23 cm do O Livros do Espíritos Princípios da Doutrina
Espírita. Todas estas edições possuem numerações de edições próprias de acordo com o
tamanho do livro.
Isto, também, é um demonstrativo de crescimento da religião, levando em
consideração que O Evangelho Segundo o Espiritismo com A explicação das máximas morais
do Cristo em concordância com o Espiritismo e suas aplicações às diversas circunstâncias da
vida obra de maior expressão dentro do Kardecismo, sendo que atual é do ano de 2011 -
edição número 130ª. Já passou por 18 edições desde a obra trabalhada por mim aqui, a 112ª
edição ano de 1996. Talvez isso a ver com a atual legião de céticos, livre pensadores,
espiritualistas e afins e observada em nossos tempos. Embora a crença Cristã esteja
21
Inicialmente através de contato telefônico no número (61)2101-6161, e posterior encaminhamento para á
edição no número (21)2187-8278 E terminado por e-mail no endereço: [email protected] entre os dias 15
de maio á 01 de junho de 2012.
35
preservada no nome desse livro por exemplo. Não perdendo de vista o discurso Kardecista de
não ser uma religião, mas, uma ciência ou filosofia.
Para o Espiritismo Kardecista, segundo Heerdt (2008), há três elementos fundamentais
na constituição da pessoa humana. São eles: o corpo, a alma e o perispírito. O corpo humano
é semelhante ao corpo do animal e ambos são animados pelo mesmo espírito vital. A Alma é
o espírito encarnado no corpo. Acaba sendo o local onde o espírito entra para a sua evolução.
O perispírito é o laço que une a alma e o corpo, uma espécie de invólucro semi-material.
Numerosas observações e fatos irrecusáveis, de que mais tarde falaremos, levaram a
consequências de que há no homem três componentes: 1º, a alma, ou espírito,
princípio inteligente onde tem sua sede e o senso moral; 2º, o corpo involucro
grosseiro, material, de que ele se revestiu temporariamente, em cumprimento de
certos desígnios providenciais, 3º, o perispírito, envoltório fluídico, semi material, que
serve de ligação entre a alma e o corpo. (KARDEC, 1996, p.77, a).
Segundo a concepção Kardecista, a morte destrói o corpo, mas não destrói o
perispírito, que acompanha a alma.
O homem, que procura nos excessos de todo o gênero o requinte do gozo, colocando-
se abaixo do bruto, pois que este sabe deter-se, quando satisfeita a sua necessidade,
abdica da razão que Deus lhe deu por guia e quanto maiores forem seus excessos,
tanto maior preponderância confere ele à sua natureza animal sobre a sua natureza
espiritual. As doenças, são, ao mesmo tempo, o castigo à transgressão da lei de Deus.
(KARDEC, 1995, p. 341, a).
Assim, as enfermidades que afetam o homem/mulher podem não ser de todo o mal e
constituem um caminho de purificação para a alma. Desta forma, poderíamos nos perguntar
por que a busca e oferta de cura em muitos estabelecimentos Espíritas Kardecistas, pois essas
enfermidades seriam, muitas vezes, necessárias para a evolução ser humano? Chico Xavier
nos responde dizendo que “o homem deve mobilizar todos os recursos ao seu alcance, em
favor do seu equilíbrio orgânico” (XAVIER, 1999). Para o Espiritismo Kardecista seria uma
negligência para com o corpo e para com a alma não cuidar de ambos, tendo em vista que as
enfermidades do corpo são um reflexo das enfermidades da alma.
Têm algumas pessoas, verdadeiramente, o poder de curar pelo simples contacto? A
força magnética pode até chegar até aí, quando secundada pela pureza dos
sentimentos e por um ardente desejo de fazer o bem, por que então os bons Espíritos
lhe vêm em auxílio. (KARDEC, 1995, p. 279, a).
Os fenômenos de cura, ou métodos alternativos ou complementares como muitos
centros22
preferem enfatizar, são citados em todos os livros alicerce do Espiritismo
22
Em pesquisa em campo realizada por mim.
36
Kardecista, mas nem perto com a proporção que tomou no Brasil. Será mesmo esta última
afirmação verdadeira?
Para saber até que ponto o Espiritismo Kardecista se ocupou da temática da cura
recorri aos cinco livros bases do Espiritismo Kardecista e a um sexto atribuído a Kardec
depois de seu falecimento. São eles:
- O Livro dos Espíritos Princípios da Doutrina Espírita - 1857;
- O Livro dos Médiuns ou Guia dos Médiuns e dos Evocadores -1861;
- O Evangelho Segundo o Espiritismo com a Explicação das Máximas Morais do
Cristo em Concordância com o Espiritismo e suas Aplicações às Diversas Circunstâncias da
Vida - 1864;
- O Céu e o Inferno ou a justiça Divina segundo o Espiritismo - 1865;
- A Gênese Os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo - 1868;
E por fim:
- Obras Póstumas - 1890.
Listei (Anexo 03.) e analisei a presença de passagens que se referem à cura e
correlatos propriamente dita nos livros alicerce do Espiritismo Kardecista e mais, o livro
Obras Póstumas. Por que propriamente dita? É que o tema enfermidade/saúde/cura é usado
constantemente como exemplo nos livros base Kardecistas.
Dá-se com Espírito o que verifica com a criança que por mais precoce que seja, tem
de passar pela juventude, antes de chegar à idade da madureza; e também com o
enfermo que, para recobrar a saúde, tem que passar pela convalescença. (KARDEC,
1995, p. 130, a).
Mas que em nada dizem além de uma comparação para um melhor entendimento do
sentido que se quer explanar. Desta forma, preocupei-me em listar as passagens que abordam
o tema em si, e não uma comparação apenas.
37
4 ANÁLISE POR LIVRO
4.1 Análise do livro: O Livro dos Espíritos Princípios da Doutrina Espírita
O Livro dos Espíritos Princípios da Doutrina Espírita foi o primeiro livro escrito do
Allan Kardec e sua equipe no ano de 1857. É em formato de perguntas e respostas, de leitura
acessível a qualquer público, tendo como base responder a 1019 questionamentos referentes
ao Espiritismo Kardecista. Perguntas que vão desde a explanação sobre a existência de Deus,
formação do mundo, do homem, vida e morte, alma, corpo, justiça, reencarnação, inferno,
purgatório, paraíso, imortalidade da alma, pluralidade dos mundos, conhecimento de si
mesmo... Provavelmente inspirado no Catecismo da Igreja Católica (mais uma aproximação)
que é um compêndio sobre fé e moral de mesmo formato, assim apresentado até hoje, como
se fosse um manual de consulta rápida.
Este livro apresenta a parte filosófica da teoria Kardecista. Esses dois trechos extraídos
da introdução do livro deixa clara a intenção de Kardec na estreia da literatura Kardequiana.
Vamos resumir, em poucas palavras, os pontos principais da doutrina que nos
transmitiram, a fim de mais facilmente respondermos a certas objeções. (KARDEC,
1995, p. 23, a).
Este Livro é repositório de seus ensinos. Foi escrito por ordem e mediante ditado de
Espíritos superiores, para estabelecer os fundamentos de uma filosofia racional, isenta
dos preconceitos do espírito do sistema. (KARDEC, 1995, p. 49, a).
Como primeiro livro base do Espiritismo Kardecista, muitas perguntas haveriam de
povoar a mente de pessoas simpáticas à causa. Esta edição do livro de tradução brasileira nº
76/1995, possui 494 páginas. Seu tradutor foi Guillon Ribeiro, que segundo este livro e
outros23
foi diretor da Federação Espírita por 26 anos consecutivos. Informação não clara ao
se verificar o sítio eletrônico da Federação Espírita Brasileira (FEB). Há referência ao
trabalho de Gullion em vários anos, e até décadas, mas há pausa entre um mandato e outro.
Análise das passagens:
Passagem 01.
23
Em nota da editora na contracapa da apresentação dos Livros das edições pesquisadas por mim (todos de
tradução de Guillon Ribeiro – O único que não aparece referencia a Guillon é o livro O Céu e o Inferno de
tradução de Manuel Justiniano Quintão). Os livros são: O livro dos Espíritos, O livro dos Médiuns, O Evangelho
Segundo o espiritismo, A Gênese, Obras Póstumas.
38
Os sofrimentos deste mundo independem, algumas vezes, de nós; muitas vezes,
contudo, são devidos à nossa vontade. Remonte cada um à origem deles e verá que a
maior parte de tais sofrimentos são efeitos de causas que lhe teria sido possível evitar.
Quantos males, quantas enfermidades não deve o homem aos seus excessos, à sua
ambição numa palavra: às suas paixões? (KARDEC, 1995, p.169, a).
Comentário:
Nesta passagem nada de fato quer dizer que não seja a realidade do homem/mulher.
Muitos sofrimentos (a maioria) dependem de nós mesmos de nossa própria força de vontade,
ou falta dela. Um exemplo disso é ficar esperando as coisas acontecerem sem nada fazer. É
esperar ser contemplado em um sorteio sem ao menos comprar o bilhete.
As atitudes em relação à saúde segue a mesma linha. Como esperar um coração
(órgão) bom, se nada se faz para tornar o funcionamento dele menos trabalhoso. Uma
alimentação adequada, a prática de exercícios físicos... Enfim medidas esta que toda e
qualquer pessoa tem conhecimento. Falta é, muitas vezes, atitude.
Passagem 02.
A prece é o meio eficiente para a cura da obsessão? “A prece é em tudo um poderoso
auxílio. Mas, crede que não basta que alguém murmure algumas palavras, para que
obtenha o que deseja. Deus assiste os que obram, não os que limitam a pedir. É pois,
indispensável que o obsidiado faça, por sua parte, o que torne necessário para destruir
em si mesmo a causa da atração dos maus Espíritos.”(KARDEC, 1995, p. 251-252,
a).
Comentário:
A obsessão dentro do Espiritismo Kardecista é visto como uma enfermidade. A cura
para isso, dentro da concepção Espírita Kardecista, é a mudança intima de ações, atitudes e
pensamentos. A prece seria neste caso um remédio ao doente. Empregada no intuito de fazer
com que o “espírito” obsessor se afaste pelo motivo de um desalinhamento de vibração.
Tendo em vista que para o Espiritismo Kardecista a atração de uma alma (ser vivo) por um
espírito (ser morto ou em estado desprendido do corpo, ex. dormindo) só há devido à mesma
frequência de pensamentos e ações que se denomina de atração ou vibração.
Passagem 03.
Têm algumas pessoas, verdadeiramente, o poder de curar pelo simples contato. A
força magnética pode chegar até ai, quando secundada pela pureza dos sentimentos e
por um ardente desejo de fazer o bem, porque então os bons espíritos lhe vêm em
auxílio. Cumpre, porém, desconfiar da maneira pela qual contam as coisas pessoas
muito crédulas e muito entusiastas, sempre dispostas a considerar maravilhoso o que
39
há de mais simples e mais natural. Importa desconfiar também das narrativas
interesseiras, que costumam fazer os que exploram, em seu proveito, a credulidade
alheia. (KARDEC, 1995, p. 279, a).
Comentário:
Aqui nesta passagem o Espiritismo não legitima somente a sua concepção. Ele não
afirma e nem descarta o alcance da cura através de um não espírita. Mas para que isso ocorra,
o Espiritismo Kardecista atribui à assistência de um espirito benfeitor que vem em auxílio da
pessoa curadora. Ou na sua concepção do médium curador. Ao final alerta as pessoas a quem
procurar dando desta forma margem para a sua própria legitimação.
Se os santos já não são capazes de fazer este serviço, talvez os espíritos esclarecidos
possam? Ou quem sabe, as divindades africanas? O Espirito Santo? Ou nos novos
sincréticos pretos velhos e caboclos? Ou outras entidades da umbanda? A variedade
de religiões (e de sistema de cura) competindo no mercado urbano brasileiro pode ser
vista como oferta de diferentes caminhos para Deus e seu poder absoluto através de
seus próprios intermediários cuja cooperação é a garantia por meio de suas práticas
rituais. (GREENFIELD, 1999, p. 87).
Passagem 04.
A higiene pública, elemento tão essencial da força e da saúde, a higiene pública, que
nossos pais não conheceram, é objeto de esclarecida solicitude. (KARDEC, 1995, p.
339, a)
Comentário:
Um conselho salutar, e não religioso, tendo em vista que a ausência de higiene é a
também causa de ausência de saúde.
O fato de haver um nome de autor, o fato que se possa dizer “isso foi escrito por tal
pessoa” ou “ tal pessoa é o autor disso” indica, que esse discurso não é uma palavra
cotidiana, indiferente, uma palavra que se afasta, que flutua e passa, uma palavra
imediatamente consumível, mas que se trata de uma palavra que se deve ser recebida
de uma certa maneira e que deve, em uma dada cultura, receber um certo status.
(FOUCAULT, 2001).
Passagem 05.
Por que de preferência não trabalham pelo bem de sues semelhantes? Vistam o
indigente; consolem o que chora; trabalhem pelo que está enfermo; sofram privações
para o alívio dos infelizes e então suas vidas serão úteis e, portanto, agradáveis a
Deus. Sofrer alguém voluntariamente, apenas por seu próprio bem, é egoísmo; sofrer
pelos outros é caridade: tais os preceitos do Cristo. (KARDEC, 1995, p. 344-345, a).
Comentário:
40
Aqui está mais uma vez exposta à aproximação como o Cristianismo que o
Kardecismo afirma ser continuação. Tomando como base seus preceitos. Posição esta
favorável. Levando em consideração a grande predominância cristã no século XIX na Europa
em seu nascimento. E consequentemente maior adesão.
Passagem 06.
Nem por isso, entretanto, constitui menos um progresso natural, necessário, que traz
consigo o remédio para o mal que causa. À medida que a civilização se aperfeiçoa,
faz cessar alguns dos males que gerou, males que desaparecerão todos com o
progresso moral. (KARDEC, 1995, p. 370, a).
Comentário:
Aqui a própria história do mundo. Sabe-se que doenças são muitas vezes reflexos da
época (higiene, por exemplo). O próprio avanço da ciência e suas descobertas na cura de
males que até pouco tempo dizimava populações. A sociedade burguesa que começava a se
firmar elaborava todo um discurso de higienização dos corpos, das casas e dos lugares
públicos nos séculos XVIII e XIX e cujo paradigma vem até a atualidade.
A epidemiologia utiliza métodos científicos para descrever padrões de saúde, de
doenças ou de mortalidade numa população, com base em características de pessoas
lugares ou épocas. (LEVIN, 2001, p. 22).
Passagem 07.
Conhecidas as causas, o remédio se apresentará por si mesmo. Só restará então
destruí-las, senão totalmente, de uma só vez, ao menos parcialmente, e o veneno
pouco a pouco será eliminado. Poderá ser longa a cura, porque numerosas são as
causas, mas não é impossível. Contudo só se obterá se o mal for atacado em sua raiz,
isto é, pela sua educação, não por essa educação que tende a fazer homens instruídos,
mas pela que tende a fazer homens de bem. (KARDEC, 1995, p. 421, a).
Comentário:
Para o Espiritismo a cura é devida a uma mudança de atitude, ações e pensamentos.
Esta causa primordial dos males do homem e consequentemente de toda a sociedade. Da
célula menor para a maior.
41
4.2 Análise do livro: O Livro dos Médiuns Ou Guia dos médiuns e dos Evocadores
O Livro dos Médiuns: Ou Guia dos médiuns e dos Evocadores é a parte prática da
teoria Kardecista. Ele abrange todo o gênero de manifestação com os espíritos, e ensina como,
segundo o Kardecismo, lidar com o mundo invisível. Foi o segundo livro escrito por Allan
Kardec, com data de 1861. O primeiro livro O Livro dos Espíritos cuida da parte filosófica,
enquanto o segundo livro: O Livro dos Médiuns cuida da parte prática. E o lidar com todas as
manifestações. Formando assim um a continuação do outro.
Seu objetivo consiste em indicar os meios de desenvolvimento da faculdade
mediúnica, tanto quanto o permitam as disposições de cada um, e, sobretudo, dirigir-
lhe o emprego de modo útil, quando ela exista. Esse porém, não constitui o fim único
a que propusemos. Ninguém, pois se surpreenda de encontrar nele instruções que, à
primeira vista, pareçam descabidas; a experiência lhe realçará a utilidade. Quem quer
que a estude cuidadosamente melhor compreenderá depois os fatos de que venham a
ser testemunha; menos estranha lhe parecerá a linguagem de alguns Espíritos.
[...]
[...] damos nesta obra a parte prática, para uso dos que queiram ocupar-se com as
manifestações, quer para fazerem pessoalmente, quer para se inteirarem dos
fenômenos que lhes sejam dados a observar.
[...]
O Livro dos Médiuns. Destina-se a guiar os que queiram entregar-se á prática das
manifestações, dando-lhes conhecimento dos meios próprios para se comunicarem
com os Espíritos. (KARDEC, 1996, p. 14,16 e 52, a).
Esta edição de tradução brasileira nº 62/1996, possui 486 páginas. Como o primeiro
livro, seu tradutor foi Guillon Ribeiro.
Análise das Passagens:
Passagem 01.
A morte é a destruição, ou, antes a desagregação do envoltório grosseiro, do invólucro
que a alma abandona. O outro se desliga deste e acompanha a lama que, assim fica
sempre com um envoltório. Este último, ainda que fluídico, etéreo, vaporoso,
invisível, para nós, em seu estado normal, não deixa de ser matéria, embora até o
presente não tenhamos podido assenhorear-nos dela e submetê-la á análise. Esse
segundo invólucro da alma, ou perispírito, existe, pois, durante a vida corpórea; é o
intermediário de todas as sensações que o Espírito percebe e pelo qual transmite sua
vontade ao exterior e atua sobre os órgãos do corpo. Para nos servimos de uma
comparação material, diremos que é o fio elétrico condutor, que serve para a recepção
e a transmissão do pensamento; é, em suma, esse agente misterioso, imperceptível,
conhecido pelo nome de fluido nervoso, que desempenha tão grande papel na
economia orgânica e que ainda não se leva muito em conta nos fenômenos
42
fisiológicos e patológicos. Tomando em consideração apenas o elemento material
ponderável, a medicina, na apreciação dos fatos, se priva de uma causa incessante de
ação. Não cabe, aqui, porém, o exame desta questão. Somente faremos notar que no
conhecimento do perispírito está a chave de inúmeros problemas até hoje insolúveis.
(KARDEC, 1996, p. 77-78, a).
Comentário:
Uma coisa interessante dentro da concepção Espírita Kardecista, é a preocupação de
descrever, passo a passo, como ocorrem os variados fenômenos existentes. Há uma clara
preocupação de Kardec com a linguagem utilizada para ser entendido. Percebe-se aqui o
pedagogo Kardec escrevendo. Nesta passagem há um reflexo dessa preocupação. Aqui
Kardec explica como ocorre o fenômeno da morte de maneira simples acessível a todos.
Passagem 02.
Tomando em consideração apenas o elemento material ponderável, a medicina, na
apreciação dos fatos, se priva de uma causa incessante de ação. Não cabe aqui, porém,
o exame desta questão. (KARDEC, 1996, p. 78, a).
Comentário:
Para o Espiritismo Kardecista a medicina poderia se beneficiar em muito se tivesse o
conhecimento de suas bases teóricas.
A medicina moderna é clara, trabalha exclusivamente no nível do corpo físico. Os
espíritas respeitam isto e consultam o que chamam de “médicos convencionais”
quando sofrem de doenças causadas no plano material que ainda não afetaram o
espírito e o perispírito. Mas a medicina moderna, para os espíritas apesar da sua
qualidade e progresso constantes, nunca terá capacidade de obter uma cura global,
pelo menos até reconhecer o mundo espiritual, as enfermidades cujas causas ai
residem, e as técnicas que os espiritas kardecistas aprenderam e recomendam para seu
tratamento. (GREENFIELD, 1992, p. 141).
Passagem 03.
Por que razão certas visões ocorrem com mais frequência quando se está doente?
“Elas ocorrem do mesmo modo quando estais em perfeita saúde. Simplesmente, no
estado de doença, os laços materiais se afrouxam; a fraqueza do corpo permite maior
liberdade ao espírito, que, então, se põe mais facilmente em comunicação com os
outros Espíritos.” (KARDEC, 1996, p. 135, a).
Comentário:
Para o Espiritismo Kardecista, a pessoa quando está doente, está em um estado não
pleno do ser, como quando se está sonhando ou sonâmbulo. Os laços que nos prendem à
43
materialidade ficam mais livres, soltos e desta forma mais sucessível a percepções antes não
alcançadas em estado normal ativo (acordado) do ser.
O sonâmbulo age sob a influência do seu próprio Espírito; é a sua alma que, nos
momentos de emancipação, vê, ouve e percebe, fora dos limites dos sentidos.
[...]
Médiuns Curadores: Os que tem o poder de curar ou de aliviar o doente, pela só
imposição das mãos, ou pela prece. (KARDEC, 1996, p. 215, 232, a).
Tratando o seu doente, o xamã oferece a seu auditório um espetáculo. Que
espetáculo? Com o risco de generalizar imprudentemente certas observações,
diríamos que esse espetáculo é sempre o de repetição pelo xamã, do “chamado”, isto
é, a crise inicial que lhe ofereceu a revelação de seu estado. Mas a expressão do
espetáculo não se deve enganar: o xamã não se contenta em reproduzir ou representar
mimicamente certos acontecimentos; ele os revive efetivamente em toda sua
vivacidade, originalidade e violência. E visto que ao termo da sessão, ele retorna ao
estado normal, podemos dizer, tomando emprestado da psicanálise em termo
essencial, que ele abrangeu. (STRAUSS, 1985, p. 209).
Passagem 04.
Médiuns receitistas: Têm a especialidade de servirem mais facilmente de interpretes
aos Espíritos para as prescrições médicas. Importa não os confundir com os médiuns
curadores, visto que absolutamente não fazem mais que transmitir o pensamento do
Espírito, sem exercerem por si mesmos influência alguma. Muito comuns.
(KARDEC, 1996, p. 239, a).
Comentário:
Médiuns curadores são diferentes de médiuns receitistas. O primeiro procede quase
como um médico convencional o segundo apenas como receitista. Mas ambos, médiuns
curadores e médiuns receitistas agem, concomitantemente, com espíritos que habitam outro
plano espiritual segundo a teoria Kardecista.
Conforme Santos (2004, p. 85), Chico Xavier foi também um médium receitista
deixando essa função em segundo plano em atendimento ao seu mentor Espírito Emmanuel,
colocando a literatura espírita como sua missão. Atendendo uma gama de estilos literários,
sempre com o intuito de fortalecer e embasar o Espiritismo Kardecista. Nos momentos de
médium receitista Chico era guiado pelo Espírito de Bezerra de Menezes.
O princípio de tudo é o Deus judaico-cristão, criador do mundo a partir do nada. A
oposição entre o espírito e a matéria, a primeira distinção, desdobra-se e funda o
movimento e o devir do mundo como os espíritas o concebem. Seres materiais
habitam o “Mundo Visível”, seres imateriais, o mundo Invisível”. (CAVALCANTI,
2004, p. 16).
44
Passagem 05.
Poderia um médico, evocando os Espíritos de seus clientes que morreram, obter
esclarecimentos sobre o que lhes determinou a morte, sobre as faltas que haja
porventura cometido no tratamento deles e adquirir, assim, um acréscimo de
experiência? Pode e isso lhe seria muito útil, sobretudo se conseguisse a assistência de
Espíritos esclarecidos, que supririam a falta de conhecimentos de certos doentes. Mas,
para tal, fora mister que ele fizesse esse estudo de modo sério, assíduo, com um fim
humanitário e não como meio de adquirir, sem trabalho, saber e riqueza. (KARDEC,
1996, p. 391, a).
Comentário:
Aqui um conselho espírita para os médicos, de sua maneira, é uma profissão que
poderia em muito se utilizar dos conhecimentos do além túmulo. Desde que não seja de
interesse privado.
4.3 Análise do livro: O Evangelho Segundo o Espiritismo com a Explicação das Máximas
Morais do Cristo em Concordância com o Espiritismo e suas Aplicações às Diversas
Circunstâncias da Vida.
O Livro O Evangelho Segundo o Espiritismo a Explicação das Máximas Morais do
Cristo em Concordância com o Espiritismo e suas Aplicações às Diversas Circunstâncias da
Vida. Este livro aproxima a teoria Kardecista da teoria cristã. Segundo Kardec, (1996, b) o
Cristianismo e o Espiritismo ensinam a mesma coisa.
Até no nome, desse terceiro livro: O Livro O Evangelho Segundo o Espiritismo A
Explicação das Máximas Morais do Cristo em CONCORDÂNCIA com o Espiritismo e suas
Aplicações ás Diversas Circunstâncias da Vida. Já é indício de uma aproximação cristã.
Aproximação esta sempre presente em suas obras. Até pela razão do Espiritismo Kardecista
se declarar a continuação do Cristianismo, como já citado anteriormente.
Este livro explana sobre os princípios, moral e doutrina do Cristianismo e o
Espiritismo, citando passagens do livro cristão e, logo em seguida, fazendo um contraponto
com a teoria Kardecista. Fazendo ponte com os pensamentos de filósofos como Sócrates e
Platão, que ao meu ver, não parecem dizer muita coisa, tendo em vista que esses dois
pensadores em especial são mais ou menos quase cinco séculos antes do Cristianismo, o que
dirá do Espiritismo. Se alguma influência houve da filosofia socrático-platônica, ela incidiu
sobre ambas as religiões visto a anterioridade daquela sobre estas.
Escrito em 1864, esta edição de tradução brasileira é de nº 112/1996, possui 435
páginas, tradutor original Guillon Ribeiro.
45
Quis Deus que a nova revelação chegasse aos homens por mais rápido caminho e
mais autêntico. Incumbiu, pois, os Espíritos de levá-la de um polo a outro,
manifestando-se por toda a parte, sem conferir a ninguém o privilégio de lhe ouvir a
palavra. Um homem pode ser ludibriado, pode enganar-se a si mesmo; já não será
assim, quando milhões de criaturas vêem e ouvem a mesma coisa. (KARDEC, 1996,
p. 29, b).
Análise da Passagens:
Passagem 01.
Se os médicos são malsucedidos, tratando da maior parte das moléstias, é que tratam
do corpo, sem tratarem da alma. Ora, não se achando o todo em bom estado,
impossível é que uma parte dele passe bem. (KARDEC, 1996, p. 51, b).
Comentário:
A cura constituiria, pois em tornar pensável uma situação dada inicialmente em
termos afetivos, e aceitáveis para o espírito as dores que o corpo se recusa a tolerar.
Que a mitologia do xamã não corresponda uma realidade objetiva, não tem
importância: a doente acredita nela, e ela é membro de uma sociedade que acredita.
(STRAUSS, 1985, p. 208)
Aqui recorro a uma narração de Levi-Strauss, sobre uma paciente tratada por um
xamã. Nome este que pode ser utilizado aos médiuns curadores. Pois são pontes entre o
universo natural e o sobrenatural. O ideal espírita seria desta forma a aliança entre as duas
“ciências”, a medicina humana e a medicina espiritual. Dessa forma, se obteria um resultado
efetivo nos tratamentos de enfermidades. Pois para o espiritismo, a maior causa dos males são
de procedência espiritual.
Passagem 02.
Por estas palavras: Bem-aventurados os aflitos pois que serão consolados, Jesus
aponta a compensação que hão de ter os que sofrem e a resignação leva o padecente a
bendizer do sofrimento, como prelúdio da cura. (KARDEC, 1996, p. 106, b)
Comentário:
Mais uma passagem de aproximação com o cristianismo notoriamente com o
Catolicismo. De desapego ao material, como caminho para Deus.
Os livros de Kardec traziam uma aproximação com o cristianismo notadamente, com
os valores morais presentes nos Evangelhos. Isso se tornou bem marcado na obra O
Evangelho Segundo O espiritismo (SANTOS, 2004, p. 13).
Importante perceber a expressão “bem-aventurados”, expressão de uso comum entre
as doutrinas cristãs. O próprio nome deste livro faz uma importante ligação entre o
Kardecismo e o Cristianismo. O terceiro livro base Kardequiano se chama O Evangelho
46
Segundo o Espiritismo com A Explicação das Máximas Morais do Cristo em Concordância
com o Espiritismo e suas Aplicações ás Diversas Circunstâncias da Vida. Fazendo uma alusão
aos Evangelhos dos quatro evangelistas contidos no segundo testamento da Bíblia Cristã.
Evangelho Segundo Mateus, Evangelho Segundo Marcos, Evangelho Segundo Lucas,
Evangelho Segundo João.
Ainda nesta mesma passagem, Kardec demonstra a enfermidade como caminho para a
purificação da alma/espírito. Sendo a enfermidade desta forma a cura dos males do corpo e da
alma/espírito de todo o ser. E caminho para Deus.
Perguntais se é lícito ao homem abrandar suas próprias provas. Essa questão equivale
a esta outra: é lícito, aquele que se afoga cuidar de salvar-se? Aquele em que um
espinho entrou retirá-lo? Ao que está doente, chamar o médico? As provas têm por
fim exercitar a inteligência, tanto quanto a paciência e a resignação. Pode dar-se que
um homem nasça em posição penosa e difícil, precisamente para se ver obrigado a
procurar meios de vencer as dificuldades. O mérito consiste em sofrer, sem
murmurar, as consequências dos males que lhe não seja possível evitar, em perseverar
na luta, em se não desesperar, se não é bem sucedido; nunca porém, numa negligência
que seria mais preguiça do que virtude (KARDEC, 1996, p. 121, b)
O Kardecismo vê a doença como possibilidade de purificação dos pecados, não caminho
exclusivo e prega a resignação diante dos infortúnios, nada de revolta ou revolução.
Para os seguidores da obra de Kardec, a saúde tinha um componente moral e estava
ligada à evolução dos espíritos. A doença, como outros sofrimentos, era entendida
como expiação de erros passados desta e de outras vidas, e também como provação,
oportunidade para a evolução espiritual (SANTOS, 2004, p. 26).
A doença/enfermidades é um dos meios de purificação dos pecados. O enfermo deve
aceitar a doença. Mas também deve buscar a sua cura ou melhora, diante as possibilidades
existentes. Não fazê-lo significa negligência com o corpo e sucessivamente com a alma.
Chico Xavier nos responde dizendo que “o homem deve mobilizar todos os recursos ao seu
alcance, em favor do seu equilíbrio orgânico” (XAVIER, 1999). Tendo em vista que as
enfermidades do corpo são um reflexo das enfermidades da alma.
Passagem 03.
A mediunidade é coisa santa, que deve ser praticada santamente, religiosamente. Se
há um gênero de mediunidade que requeira essa condição de modo ainda mais
absoluto é a mediunidade curadora. O médico dá o fruto de seus estudos, feitos,
muitas vezes a custa de sacrifícios penosos. O magnetizador dá o seu próprio fluido,
por vezes até a sua saúde. Podem pôr-lhes preço. O médium curador transmite o
fluido salutar dos bons Espíritos; não tem o direito de vendê-lo. Jesus e os apóstolos,
ainda que pobres, nada cobravam pelas curas que operavam (KARDEC, 1996, p.
367, b).
47
Comentário:
Nesta passagem se percebe o conselho espírita para o emprego da mediunidade
curativa. A alusão ao Cristianismo é clara. Também mostra como se processa a doação
fluídica curadora na concepção Kardequiana. Nesta passagem também aconselha a não
cobrança pela prática curativa, amplamente pregada pelos diferentes Espíritas e Centro
Espíritas brasileiros24
.
Não menos certo é que todas essas misérias resultam das nossas infrações às leis de
Deus e que, se as observássemos pontualmente, seríamos inteiramente ditosos. Se não
ultrapassássemos, o limite do necessário, na satisfação das nossas necessidades, não
apanharíamos as enfermidades que resultam dos excessos, nem experimentaríamos as
vicissitudes que as doenças acarretam. Se puséssemos freio à nossa ambição, não
teríamos de temer a ruína; se não quiséssemos subir mais alto do que podemos, não
teríamos de recear a queda; se fôssemos humildes, não sofreríamos as decepções do
orgulho abatido; se praticássemos a lei de caridade, não seríamos maldizentes, nem
invejosos, nem ciosos, e evitaríamos as disputas e dissensões; se mal a ninguém
fizéssemos, não houvéramos de temer as vinganças, etc. (KARDEC, 1996, p. 374, b).
Essas ideias tem também outro alvo: o conceito espírita de caridade. O exercício do
“amor ao próximo” entendido como instrumento de evolução espiritual perde
totalmente sentido no discurso de “auto-ajuda” A eliminação da intermediação social
como fonte de relação com o sagrado resulta, como se viu na transformação do bem
estar do indivíduo no alvo fundamental desse tipo de discurso. Portanto, ao invés de
dirigida para o “outro”, a ação do sagrado volta-se para si: É assim que se faz a
evolução; não pelo que se faz ao próximo mas o bem que se faz para si” (STOLL,
2003, p. 265).
Aparece aqui a ideia do conselho da caridade, cobrança, doença e cura.
4.4 Análise do livro: O Céu e o Inferno ou a justiça Divina Segundo o Espiritismo
O Livro O Céu e o Inferno ou A Justiça Divina Segundo o Espiritismo, como o próprio
título do livro afirma, é uma tentativa de explicar a justiça divina segundo o Espiritismo
Kardecista. Este livro é dividido em duas partes, a primeira parte se destina à explicação de
temas como anjos, demônios, temor da morte, o nada, o materialismo e toda gama ligada ao
não provável. A segunda parte é constituída de depoimentos que segundo o Espiritismo
Kardecista são de diversos espíritos que faleceram, ou como o Espiritismo Kardecista afirma
que já desencarnaram, suas experiências aqui na terra. Exemplos de espíritos sofredores a
24
Em visitas aos centros Espírita Amor e Humildade do Apóstolo, Fé e Caridade e Nosso Lar, os dois primeiros
no Centro de Florianópolis e o último em Forquilhinhas, em São José não há cobranças. O que há é pedidos de
doação de mantimentos, produtos de higiene, limpeza, ajuda financeira sempre frisando a destinação que de
maneira geral é para o auxilio de despesas dos centros e doação á necessitados.
48
espíritos felizes, de espíritos suicidas a espíritos em condições medianas, de criminosos,
sofredores, de toda e qualquer situação.
Vivemos, pensamos e operamos eis o que é positivo. E que morremos, não é menos
certo. Mas deixando a terra, para onde vamos? Que seremos após a morte? Estaremos
melhor ou pior? Existiremos ou não? Ser ou não ser, tal a alternativa para sempre ou
para nunca mais; ou tudo ou nada: Viveremos eternamente, ou tudo se aniquilará de
vez? É uma tese, essa que se impõem (KARDEC, 1995, p.11, b).
É o quarto livro da codificação Kardequiana. Escrito em 1865. Esta edição de tradução
brasileira é de nº 40/1995, possui 425 páginas, tradutor original foi Manuel Justiniano
Quintão.
Análise das passagens
Passagem 01.
Este não passou de um pobre israelita de Vilna, falecido em maio de 1865. Durante
30 anos mendigou com uma salva nas mãos. Por toda a cidade era bem conhecida
aquela voz que dizia: “Lembrai-vos dos pobres, das viúvas e dos órfãos!” Por essa
longa peregrinação Slizgol havia juntado 90.000 rublos, não guardando, porém para si
um só copeque. Aliviava e curava os enfermos; pagava o ensino de crianças pobres;
distribuía aos necessitados a comida que lhe davam (KARDEC, 1995, p. 381, b).
Comentário:
Uma narrativa de uma viva de doação ao próximo segundo os preceitos Kardecista, e
antes mesmo dele um princípio cristão. Vale lembrar que o Kardecismo se declara uma
continuação do Cristianismo. Em relação a Jesus Cristo, para os o Cristianismo é visto como
filho de Deus. Enquanto o Kardecismo vê Jesus Cristo, como um irmão muito evoluído para
os patrões da terra que nela veio para servir de bom exemplo.
Cristo foi um médium incomparável. Mandado por Deus à terra, veio ensinar-nos
como é que podemos nos aperfeiçoar. Cristo não é nosso salvador. O homem salva-se
a sim mesmo, seguindo o caminho de Cristo. Jesus morreu apenas para dar um
exemplo de conformidade à vontade divino (WILGES, 2008, p. 119).
A prática da cura, ou alívio dela, dentro da caridade é um caminho para a evolução do
espírito, Assim como a enfermidade. Neste caso para que ocorra a cura ou melhora do
enfermo o médium deve ter predisposição para o ato de curar e não alguma outra
mediunidade, como a psicografia por exemplo.
A natureza das comunicações guarda sempre relação com a natureza do Espírito e traz
o cunho da sua elevação, ou da sua inferioridade, de seu saber, ou de sua ignorância.
Mas em igualdade de merecimento, do ponto de vista hierárquico, há nela
49
incontestavelmente uma propensão para se ocupar de uma coisa preferentemente a
outra (KARDEC, 1996, p. 227, a).
Passagem 02.
Os dois doentes que curaste são a prova do que te afirmo, pois, no estado em que
estavam, com remédios nada terias conseguido. Quando implorares permissão a Deus
para que os bons Espíritos te transmitam fluidos benéficos, se não sentires um
estremecimento involuntário, é que a tua prece não foi bastante fervorosa para ser
ouvida. É só nestas condições que a prece pode tornar-se valiosa. Nem outra coisa
resulta de dizer: “Deus Todo- Poderoso, Pai de bondade e misericórdia infinita,
permiti que os bons Espíritos me assistam na cura de.... Tende piedade dele, Senhor;
restitui-lhe a saúde, por que, sem vós, eu nada posso fazer. Seja feita a vossa
vontade.” Tens feito bem em não desdenhar os humildes; a voz daquele que sofreu
resignadamente as misérias desse mundo, é sempre ouvida, e nenhum serviço deixa
jamais de ser recompensado. Agora, uma palavra a meu respeito, confirmativa do que
acima te disse: O Espiritismo te explica a minha linguagem de Espírito, sem que aliás
me seja preciso entrar em minúcias a tal respeito. Outros sim julgo inútil falar-te da
minha existência anterior (KARDEC, 1995, p. 388-389, b).
Comentário:
A prática espírita convencional, desde o tempo de Kardec, manda que os médiuns-
curadores recebam os espíritos de médicos falecidos e, com os conhecimentos e
técnicas que eles trazem do mundo dos espíritos, ajudam a curar os vivos.
(GREENFIELD, 1999, p. 65).
Ou seja, segundo o Espiritismo Kardecista, pode existir apoio do mundo espiritual
desde que haja entrega nos procedimentos. Para ficar mais claro, extraí do Livro dos Médiuns:
Ou Guia dos Médiuns e dos Evocadores a seguinte citação.
A magnetização ordinária é um verdadeiro tratamento seguido, regular e metódico; no
caso que apreciamos, as coisas se passam de modo inteiramente diverso. Todos os
magnetizadores são mais ou menos aptos a curar, desde que saibam conduzir-se
convenientemente, ao passo que os médiuns curadores a faculdade é espontânea e
alguns até possuem sem jamais terem ouvido falar de magnetismo. A intervenção de
uma potência oculta, que é o que constitui a mediunidade, faz-se manifesta, em certas
circunstâncias, sobre tudo se considerarmos que a maioria das pessoas que podem,
com razão, ser qualificada de médiuns curadores recorre á prece, que é uma
verdadeira evocação (KARDEC, 1996, p. 217, a).
Passagem 03.
“Eu vo-lo digo: antes de tudo, importa dizer que era a segunda vez que eu expiava a
privação da vista. Na minha precedente existência, em princípios do último século,
fiquei cego aos 30 anos, em decorrência de excessos de todo o gênero que,
arruinando-me a saúde, enfraqueceram-me o organismo. Note-se que era já isso uma
punição por abuso dos dons providenciais de que fora largamente cumulado. Ao
invés, porém, de me atribuir a causa original dessa enfermidade, entendi de acusar a
Providência na qual, aliás, pouco cria. Anatematizei Deus, reneguei-o, acusei-o,
acrescentando que, se acaso existisse, devia ser injusto e mau, por deixar assim penar
as criaturas. Entretanto, eu deveria dar-me ainda por feliz, isento como estava de
50
mendigar o pão, às feição de tantos outros míseros cegos como eu (KARDEC, 1995,
423, b).
Comentário:
O motor da trajetória espiritual é a relação que o mundo dos espíritos estabelece como
Mundo Visível ao longo de sucessivas encarnações. A encarnação, o Mundo Visível,
idealmente identificados à materialidade e a imperfeição, ocupam um lugar decisivo.
São a possibilidade de progresso do Espírito. Neles os Espíritos originalmente iguais
diferenciam-se, tornam-se mais ou menos imperfeitos, mais ou menos próximos da
perfeição. O mundo Visível é o lugar da produção de uma desigualdade justa, pois
que fundada no mérito (CAVALCANTI, 2008, p.29).
A encarnação é vista como necessária para a evolução do espírito. Como sendo um
estágio para o espírito, é o seu campo empírico, no qual não é facultada a passagem e onde
necessita a aprovação para ai sim, obter a evolução. Desta forma é o caminho e não um
caminho. Todos os espíritos passaram, estão passando ou passarão sem exceção até chegar em
um estado puro, através de encarnações sucessivas (de sucesso, mas não necessariamente uma
encarnação de sucesso após uma encarnação de sucesso, pode haver estagnação temporária
por exemplo). Tornando a criação mais próxima do criador. Nesta passagem sem o sentido da
visão foi a maneira dentro da concepção espírita de trazer o espírito para a conscientização de
seu papel enquanto criatura.
4.5 Análise do livro: A Gênese Os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo
O Livro A Gênese Os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo é dividido em
três partes, a primeira parte trata da existência de Deus, constituição formação da terra,
formação dos seres orgânicos e inorgânicos, constituição do universo, o princípio vital,
geração espontânea, cataclismos, etc... A Segunda parte apresenta questões relativas aos
milagres de toda ordem e os fluidos, citando os milagres atribuídos a Jesus Cristo, dado
seguida a explicação Kardequiana. A terceira e última parte são as narrativas do Evangelho
cristão com o olhar Kardequiano, assim com, a segunda parte, mas, com a diferença de não se
ater apenas aos milagres de Cristo, mas sim, trazer um desfecho a cinco obras bases do
Espiritismo Kardecista.
Hoje a humanidade está madura para lançar o olhar a alturas que nunca tentou divisar,
a fim de nutre-se de ideias mais amplas e compreender o que antes não compreendia.
A geração que desaparece levará consigo seus erros e prejuízos: a geração que surge,
retemperada em fonte mais pura, imbuída de ideias mais sãs, imprimirá ao mundo
ascensional movimento, no sentido do progresso moral que assinalará a nova fase da
evolução humana (KARDEC, 1995, p. 415, c).
51
Neste livro devido às narrativas de milagres atribuídos a Jesus Cristo, o tema cura se
faz presente de forma significativa.
O paralítico se levantou imediatamente e foi para sua casa. Vendo aquele milagre, o
povo se encheu de temor e rendeu graças a Deus, por haver concebido tal poder aos
homens (KARDEC, 1995, p. 317, c).
É o quinto e último livro da codificação Kardequiana, foi escrito em 1868. Esta edição
de tradução brasileira é de nº 36/1995, possui 422 páginas, tradutor original foi Guillon
Ribeiro.
Análise das passagens
Passagem 01.
As Próprias curas instantâneas não são mais milagrosas, do que os outros efeitos,
dando que resultam da ação de um agente fluídico, que desempenha o papel de agente
terapêutico, cujas propriedades não deixam de ser naturais por terem sido ignoradas
até agora (KARDEC, 1995, p. 266, c).
Comentário:
Para que a cura ocorra é necessário do elemento primitivo fluido universal. Presente
no ser encarnado ou desencardo. É mediante a transformação que esse opera no períspirito,
que a cura se processa. O magnetismo é a produção do fluido do homem. (presente no ser
encarnado e descarnado), e de papel fundamental para que haja o processo da cura Por onde o
médium curador doa o seu fluido ao ser enfermo. Quanto mais reta for a vida do médium
curador, desligado da matéria e possuidor de boas intenções, melhor fluidos ele produzirá. E
melhor resultado terá. É importante citar que Médium receitista não é o mesmo que médium
curador.
Passagem 02.
Quando se diz que um médico opera a cura de um doente, por meio de boas palavras,
enuncia-se uma verdade absoluta, pois que um pensamento bondoso traz consigo
fluidos reparadores que atuam sobre o físico, tanto quanto sobre o moral (KARDEC,
1995, p. 287, c)
Comentário:
O doente vê chegar o médico com maior satisfação do que aquele que está bem de
saúde; ora, os aflitos são os doentes e o consolador é o médico (KARDEC, 1995, p.
35, c).
52
É sabido que trabalhar a autoestima, é fundamental para todo e qualquer ser, enfermo
ou não. O enfermo costuma ter uma melhor resposta no seu tratamento. Pode até não trazer a
cura, mas trabalha como um aliado, um complemento, aumentado a defesa do sistema
imunológico. Desta forma também:
As pessoas que assistem regularmente a serviços religiosos apresentam taxas mais
baixas de doenças e de mortalidade do que aquelas que não frequentam regularmente
esses serviços ou que não os assistem (LEVIN, 2001, p. 19).
A maioria das pessoas, em nossa sociedade, quando doentes, busca um médico
convencional que age com a medicina científica, oficialmente aceita, porém, cada vez é mais
frequente encontrar pacientes que usam da medicina alternativa como um aliado, aí, incluída,
a medicina espírita. Esses pacientes diferentes procuram a medicina convencional, muitas
vezes, em conjunto com as medicinas alternativas. Há um campo vasto de predileções. Dessa
forma, o paciente vai ao que melhor se identifica. Assim, remetendo ao médium, pastor, padre
ou benzedeira, a responsabilidade de seu processo de cura e não somente o médico
tradicional. Campo vasto ao Espiritismo Kardecista que desde seus primórdios já demostrava
inclinação às práticas de medicina alternativa. Esta é uma das passagens presente no primeiro
livro de Kardec, O Livro dos Espíritos Princípios da Doutrina Espírita, datado de 1857,
marco do nascimento Espiritismo Kardequiano.
Poderá ser longa a cura, porque numerosas são as causas, mas não é impossível.
Contudo, ela só se obterá se o mal for atacado em sua raiz, isto é, pela educação, não
por essa educação que tende a fazer homens instruídos, mas pela que tende a fazer
homens de bem (KARDEC,1995, p. 421, a ).
Vale lembrar a dicotomia entre a ação moral ética que o espiritismo tem com a saúde.
Onde as enfermidades podem ter relação direta com as atitudes do ser. Pois, a cura perante o
Espiritismo Kardecista acontece em dois âmbitos, o corpo e o espírito. Se não for desta forma,
então, não houve a cura total, e sim, parcial. A cura que os médicos convencionais operam,
segundo a doutrina kardequiana, é apena da forma corporal e não da espiritual.
Passagem 03.
Assim como as enfermidades resultam das imperfeições físicas que tornam o corpo
acessível às perniciosas influências exteriores, a obsessão decorre sempre de uma
imperfeição moral, que dá ascendência a um Espírito mau. A uma causa física, opõe-
se uma força física: a uma causa moral preciso é que se contraponha uma força moral.
Para preservá-lo das enfermidades, fortificasse o corpo; para garanti-la contra a
obsessão, tem-se que fortalecer a alma; donde, para o obsidiado, a necessidade de
53
trabalhar a si próprio, o que as mais das vezes basta para livrá-lo do obsessor, sem o
socorro de terceiros. Necessário se torna este socorro, quando a obsessão degenera em
subjugação e em possessão, porque nesse caso o paciente não raro perde a vontade e o
livre- arbítrio (KARDEC, 1995, p.305, c).
Comentário:
Assim se explica como ocorre a obsessão. Que são vistas pelos Kardecistas como
doenças mentais.
A tese apresenta o espiritismo, não apenas como uma doutrina consoladora, mas
também com uma “psicoterapia transcendente”, procurando um novo caminho
etiológico para a doença mental, fora do materialismo organicista. (ISAIA, 2005, p.
186)
Enfermidade esta que pode ser evitada. Tendo em vista que a causa da obsessão é do próprio
obsediado (por atração) que permite que o espírito obsessor mantenha o controle sobre si.
Pode-se evitar com vigília de ações, pensamentos e atitudes... O fortalecimento da moral do
ser, e consequentemente de suas ações sociais, fortificando-se indo de encontro à evolução.
Os doentes mentais, que até a idade média eram relativamente tolerados e encarados
com religioso respeito e temor pela população – quem ouvia vozes podia ser louco,
mas, também, podia ser uma pessoa santa, como Joana D’Arc -, agora são recolhidos
em hospícios: ninguém pode ficar fora do processo de produção. No início do
Renascimento, a Naus dos Insensatos (Nef. des Fous, Narranschiff) percorre rios
europeus, levando os loucos que são expulsos das cidades e dos quais os barqueiros
são encarregados de se livrar. No século XVII muda a percepção social da loucura.
Predomina agora a visão de Blaise Pascal (1623-1662): pode-se conceber um homem
sem as mãos, sem os pés, sem a cabeça até, mas, não sem a razão. O doente mental
tornou-se uma criatura exótica. Na Inglaterra, as pessoas visitavam o hospício de
Bedlam como quem vai ao zoológico; a entrada custava um penny e dava ao visitante
o direito de atiçar os loucos (SCLIAR, 2002, p. 56).
A loucura em seu passado era vista como algo indigno de um olhar humano, mas sim
acusador. Algo desprezado e até mesmo engraçado25
.
25
Lembro-me quando pequena descobri que uma vizinha minha na época tinha uma filha com síndrome de
Down. Popularmente na época tida como doença, hoje se tem consciência que a Síndrome de Down como
próprio nome indica é uma síndrome decorrente de distúrbio genético causado pelo cromossomo 21, extra, total
ou parcial. E não uma doença. Coisa que só descobri muito tempo depois de frequentar a casa dela para ir brincar
com seus outros filhos. Causou-me espanto a descoberta. A menina tinha um temperamento calmo e adorava
olhar as revistas de moda (eu deveria ter uns 8 anos e ela uns 15 anos) A menina beijava as revistas e dizia que o
“galã” da revista ia casar-se com ela. Ela acreditava mesmo em seus sonhos. Ela bem vaidosa e sempre cheirosa.
Uma mocinha! Minha vizinha, a mãe da menina não a escondia por maldade, mas, por uma convenção. Pessoas
nessas condições eram escondidas da sociedade isto, ainda, nos anos 80. Hoje há uma abertura e conscientização
maior e sabe-se que nem mesmo doença é, muitos trabalham, estudam, casam. Enfim, levam uma vida normal.
Mesmo havendo alguns preconceitos a serem quebrados. De minha vizinha não tive mais notícia, ela foi morar
em outro lugar muito tempo depois, mas, quando saiu da rua, já se percebia um assumir da menina. Não
amplamente, mas, parcialmente. Quem sabe hoje, a menina já tenha um papel ativo na sociedade.
54
Durante o século XVIII as emoções eram vistas como expressão do lado animal do
ser humano; deviam ser, pois, dominadas. O tratamento dos doentes mentais era
verdadeiramente bárbaro: Cabeças raspadas, eles eram sistematicamente submetidos a
purga, à êmege, à sangria ou atirados sem aviso à água gelada, procedimentos que
tinham por objetivo “chocá-los”, trazendo-os de volta à razão. Na França essa
situação foi parcialmente revertida por Philippe Pinel (1745-1826), médico e escritor
que advogava uma conduta mais humana para com os loucos.
[...]
Uma verdadeira revolução psiquiátrica só viria a ocorrer no século XX, com a
psicanálise, os novos medicamentos e a instituição do tratamento ambulatorial da
doença mental. Quando Sigmud Freud (1856-1939) mostrou que a repressão das
emoções, e especificamente das emoções sexuais, pode ser um fator causador da
doença mental, estava de fato revertendo as expectativas negativas em relação ao
emocional, criadas pelo racionalismo dos séculos XVII e XVIII. (SCLIAR, 2002,
p.56, 57)
Episódios de obsessão tem por vezes tirar o juízo do obsediado. Causa delicada que
exige muito cuidado por se tratar do desequilíbrio do ser. E não somente o ser encarnado, mas
também, do ser desencarnado. O ideal é tratar ambos os seres, aconselhado-os para que ambos
prossigam no caminho do bem, pois, ambos têm responsabilidade sobre a enfermidade
(obsessão). O Kardecismo considera esse problema como (provável) decorrente de
circunstâncias de encarnações passadas. Dessa forma, estagnam-se os dois em seu caminho
para a evolução. O perdão mútuo, do obsessor ao obsidiado e vice versa, faz-se necessário.
O espírito mau espera que o outro, a quem ele quer mal, esteja preso ao seu corpo e,
assim, menos livre, para mais, facilmente, o atormentar, ferir nos seus interesses, ou
nas suas mais caras afeições. Neste fato reside a causa da maioria dos casos de
obsessão, sobretudo, dos que apresentam certa gravidade, quais os de subjugação e
possessão. O obsediado e o possesso são pois quase sempre vítimas de uma vingança
cujo motivo se encontra em existência anterior e a qual o que a sofre deu lugar pelo
seu proceder (KARDEC, 1996, p. 171, b).
Passagem 04.
São as mais das vezes individuais a obsessão e a possessão; mas, não raro são
epidêmicas. Quando sobre uma localidade se lança uma revoada de maus Espíritos, é
como se uma tropa de inimigos a invadisse. Pode então ser muito considerável o
número dos indivíduos atacados (KARDEC, 1995, p. 308, c).
Comentário:
Nesta passagem o Espiritismo aponta a obsessão e a possessão como causa de males
que não apenas atinge o indivíduo, mas uma localidade por exemplo. Poderia usar como
exemplo Sodoma e Gomorra com a diferença que os atos essas cidades não seriam feitos por
Deus como na Bíblia Judaico-Cristã. Mas sim por espíritos atraídos pela atmosfera negativa
da localidade. Causando ainda mais problemas (como doenças) a população que lá habita.
55
Passagem 05.
Apresentam então um possesso cego e mudo e ele o curou, de modo que o possesso
começou a falar e a ver: todo o povo ficou admirado preso de admiração e dizia: Não
é esse o filho de David? Mas os fariseus, isso ouvindo, diziam: Este homem expulsa
os demônios com o auxílio de Belzebu, príncipe dos demônios. Jesus, conhecendo os
pensamentos, disse-lhes: Todo reino que se dividir contra si mesmo será arruinado e
toda cidade ou casa que se divide contra si mesma não pode subsistir. - Se Satanás
expulsa a Satanás, ele está dividido contra si mesmo, como, pois, o seu reino poderá
subsistir? E, se é por Belzebu que eu expulso os demônios, por quem os expulsarão
vossos filhos? Por isso, eles próprios serão os vossos juízes. - Se eu expulso os
demônios pelo Espírito de Deus, é que o reino de Deus veio até vós (KARDEC, 1995,
p. 329, c).
Comentário:
Para o Espiritismo a faculdade de cura, bem como todas as outras, não são privilégio
dos médiuns que agem de boa fé. É presente no médium de ideias não tão elevadas. Isso se
explica devido ao livre arbítrio do ser. Seus atos serão medidos conforme a sua atuação dentro
do que lhe foi dado. Tomando para o ser a responsabilidade sobre os seus atos.
1ª O desenvolvimento da mediunidade guarda relação com o desenvolvimento moral
do médiuns? “Não; a faculdade propriamente dita se radica no organismo; independe
do moral. O mesmo, porém não se dá com o seu uso, que pode ser bom, ou mau,
conforme as qualidades do médium. (KARDEC, 1996, P. 283, a).
Passagem 06.
A ressurreição de Lázaro, digam o que disserem, de nenhum modo ínfima este
princípio. Ele estava, dizem, havia quatro dias no sepulcro; sabe-se porém, que há
letargias que duram oito dias e até mais. Acrescentam que já cheirava mal, o que é
sinal de decomposição. Esta alegação também nada prova, dado que em certos
indivíduos He decomposição parcial do corpo, mesmo antes da morte, havendo em tal
caso cheiro de podridão. A morte só se verifica quando são atacados os órgãos
essenciais à vida. E quem podia saber que Lázaro já cheirava mal: Foi sua irmã Maria
quem o disse. Mas como o sabia ela? Por haver já quatro dias que Lázaro fora
enterrado, ela o supunha; nenhuma certeza, entretanto, podia ter. (KARDEC, 1995, p.
334, c).
Comentário:
Fato interessante é de se notar que mesmo o Kardecismo procura uma legitimação
cristã. Salvo em alguns aspectos como, por exemplo, a crença na reencarnação e não na
ressurreição. O papel de Jesus Cristo e outros (WILGES, 2008).
Para o Espiritismo os milagres atribuídos a Jesus Cristo no que diz respeito à
ressurreição nas parábolas presentes do Novo Testamento são passam de apenas uma má
interpretação da situação real do ser tido como morto. Para ele (Espiritismo Kardecista) Jesus
56
não ressuscitou nem a outro fez. A ressurreição de Jesus Cristo, o seu corpo ressuscitado não
era o seu corpo carnal, mas sim, o seu perispírito. Este estado seria vivenciado pela pessoa
depois da morte. Não negam Jesus Cristo como um espírito de missão que veio a terra para
ensinar a filosofia de amor ao homem, servindo desta forma como bom exemplo. Mas,
enquanto corpo carnal/matéria era como qualquer pessoa. Justifica desta forma (KARDEC,
1995):
Se as condições de Jesus, durante a sua vida, fossem as dos seres fluídicos, ele não
teria experimentado nem a dor, nem as necessidades do corpo. Supor que assim haja
sido tirar-lhe o mérito da vida de privações e de sofrimentos que escolhera, como por
exemplo de resignação. Se tudo nele fosse aparentemente, todos os atos de sua vida, a
reiterada predição de sua morte, a cena dolorosa do Jardim das Oliveiras, sua prece a
Deus para que lhe afastasse dos lábios o cálice de amarguras, sua paixão, sua agonia,
tudo, até ao último brando no momento de entregar o Espírito, não teria passado de
vão simulacro, para enganar com relação á sua natureza e fazer crer num sacrifício
ilusório de sua vida, numa comédia indigna de um homem simplesmente honesto,
indigna, portanto, e com mais forte razão de um ser tão superior (KARDEC, 1995, p.
353-354, c).
Em relação à ressurreição, utiliza-se a parábola de Lázaro. Segundo, o Espiritismo
Kardecista não ocorreu ressurreição em Lázaro, nem a qualquer outro ressuscitado, não
ocorreu nem mesmo a morte deste. Lázaro estava em um estado de letargia26
que foi desperto
por Jesus Cristo que, como tinha o “dom” da cura, facilmente, operou em Lázaro. Quanto à
decomposição, esta ocorre em vida de acordo com a circunstância do ser, a necrose por
exemplo. Ainda, nesta passagem, a preocupação em desmitificar os milagres atribuídos a
Jesus. Há aqui a busca de Kardec de tornar o Espiritismo Kardecista ciência e não religião.
4.6 Análise do livro: Obras Póstumas
O Livro Obras Póstumas foi publicado após o falecimento de Allan Kardec, ou o
desencarne como a teoria Espirita Kardecista denomina a morte do ser. Começando com um
discurso lido em seu sepultamento.
26 sf (gr lethargía) 1 Med Sonolência mórbida. 2 Estado de sono profundo que se observa em várias doenças
mentais e principalmente na doença do sono. 3 Estado de vida latente em que caem certos animais, relacionado
com as estações ou em conseqüência de uma forte dissecação. 4 Estado de inércia ou indiferença; apatia. 5
Indolência, preguiça. 6 Estado de insensibilidade que constitui um dos passos do chamado transe mediúnico. L.
africana ou l. dos negros: doença do sono. Fonte: Dicionário Michaelis disponível no endereço:
http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-portugues&palavra=letargia
57
É ainda sob guante dor profunda que nos causou a prematura partida do fundador da
Doutrina Espirita, que nos abalançamos a uma tarefa, simples e fácil para suas mãos
sábias e experientes, mas, cujo peso e gravidade nos esmagariam, se não contássemos
com o auxílio eficaz dos bons Espíritos e com a indulgência dos nossos leitores
(KARDEC, 2005, p. 415).
Embora atribuído a Kardec o livro não monstra claramente a sua participação ativa27
, o
que se tem são relatos, escritos, e dados que Kardec deixou. Este livro não faz parte da
codificação Espirita Kardecista que são os cinco livros analisados, anteriormente, neste
trabalho. Fiz a leitura desta obra com o objetivo de entender toda a concepção kardequiana.
Ele está dividido em duas partes, a primeira com temas complementares ao Espiritismo
Kardecista, como expiações coletivas, música, manifestações. A segunda parte é destinada a
questões mais práticas como a iniciação de Allan Kardec no Espiritismo, constituição da
sociedade Espirita, as finanças da sociedade28
, estatutos, enfim toda a trajetória dos
primórdios do Espiritismo Kardecista.
A comissão terá por um de seus primeiros cuidados ocupar-se com as publicações,
desde que seja possível, sem esperar que o possa fazer auxílio das rendas. Os fundos a
isso destinados não serão, em realidade, mais que um adiantamento, pois que voltarão
à caixa, em virtude da venda das obras, cujo produto reverterá ao capital comum. É
um negócio de administração (KARDEC, 2005, p. 451).
É o sexto livro do Espiritismo Kardecista, foi escrito em 1890. Esta edição de tradução
brasileira é de nº 33/2005, possui 478 páginas, o tradutor original foi Guillon Ribeiro.
Análise das passagens
Passagem 01.
É assim que nas curas por imposição das mãos, o Espírito do médium pode atuar por
si só, ou com a assistência de outro Espírito; que a inspiração poética ou artística pode
ter dupla origem. Mas, do fato de ser difícil fazer-se uma distinção como essa não se
segue seja ela impossível. Não raro, a dualidade é evidente e, em todos os casos,
quase sempre ressalta de atenta observação (KARDEC, 2005, p. 14).
Comentário:
Aqui a explicação da participação do espírito do médium que às vezes atuam não
somente o corpo como instrumento, mas uma participação efetiva em todo o âmbito.
27
Tendo em vista, que a teoria Kardecista, se baseia na comunicação entre vivos e mortos. 28
No livro Obras Póstumas (2005, p.451) há uma defesa de Kardec, respondendo a críticas ao uso do dinheiro
da sociedade Espirita de Paris. Não estou de defendendo ou não Kardec, mas, acho desnecessária tal explanação
a cerca de assunto como este em um livro de doutrinação. Deselegante talvez. Hora, as pessoas adeptas do
Espiritismo veem os livros de Kardec, como livro sagrado. Para essas pessoas, os livros de Kardec, são como a
Bíblia cristã. Não cabendo ali tais explicações.
58
Passagem 02.
A ação fluídica, ao demais, é poderosamente secundada pela confiança do doente, e
Deus quase sempre lhe recompensa a fé, concedendo-lhe o bom êxito. 54. Somente a
superstição pode emprestar qualquer virtude a certas palavras e unicamente Espíritos
ignorantes ou mentirosos podem alimentar semelhantes ideias, prescrevendo
fórmulas. Pode, entretanto, acontecer que, para pessoas pouco esclarecidas e
incapazes de compreender as coisas puramente espirituais, o uso de uma fórmula de
prece ou de determinada prática contribua a lhes infundir confiança. Nesse caso,
porém, não é na fórmula que está à eficácia e sim na fé que aumentou com a ideia
ligada ao emprego da fórmula (KARDEC, 2005, p. 83).
Comentário:
Aqui nesta passagem, responsabiliza-se a fé do paciente ao resultado do procedimento.
É também uma forma simples de se isentar de resultados não esperados ou até mesmo de um
não resultado. A crença é fundamental para o sucesso do procedimento de cura.
Para a maior parte das doenças sempre foi difícil estabelecer relações de causa e
efeito; é um tipo de raciocínio que depende do grau de desenvolvimento da ciência e
da tecnologia. Privados desses recursos, os povos primitivos explicavam a doença
dentro de uma concepção mágica do mundo: o doente é vítima de demônios e
espíritos malignos, mobilizado talvez por um inimigo, ou seja, e a patologia como
faceta da mitologia (SCLIAR, 2002, p. 14).
E se a pessoa tratada no Centro Espírita não tiver fé? Não será digno de alcançar a cura
por meio de um tratamento alternativo/complementar ofertado em um Centro Espírita
Kardequiano? Seria excluir uma pessoa sem fé? Deste caso, será que o percentual de pessoas
que conquistaram a cura é formado por pessoas sem, com pouca fé ou muita fé? A cura desta
maneira dependeria mais do paciente do que do médium, do centro ou da técnica empregada?
Para o Espírita Kardecista (KARDEC, 1995) Deus não abandona um filho seu. Mas, o
caminho neste caso pode tornar-se longo. Quanto à cura, até poderá curar-se sem fé, mas, de
maneira geral, como no caso acima, não brevemente. Pois, no caso, o enfermo trabalharia em
sentido oposto a vontade de curar-se.
Passagem 03.
Todos os efeitos do magnetismo, do sonambulismo, do êxtase, da dupla vista, do
hipnotismo, da catalepsia, da anestesia, da transmissão do pensamento, a presciência,
as curas instantâneas, as possessões, as obsessões, as aparições e transfigurações, etc.,
que formam a quase totalidade dos milagres do Evangelho, pertencem àquela
categoria de fenômenos (KARDEC, 2005, p. 152).
Comentário:
59
Como se pôde observar na passagem acima, alguns estados do ser que para o
conhecimento geral nada tem a ver com fenômenos transcendental, como o sonambulismo,
ganha toda uma ressignificação dentro da concepção Espírita Kardecista.
Pode considerar-se o sonambulismo uma variedade da faculdade mediúnica, ou,
melhor, são duas ordens de fenômenos que, frequentemente, se acham reunidos. O
sonâmbulo age sob influência do seu próprio Espírito; é a sua alma que, nos
momentos de emancipação, vê, ouve e percebe, fora dos limites dos sentidos. O que
ele externa tira-o de si mesmo; suas ideias são, em geral, mais justas do que no estado
normal, seus conhecimentos mais dilatados, por que tem livre a alma. Numa palavra,
ele vive antecipadamente a vida dos Espíritos (KARDEC, 1996, p. 215, a).
Aqui é atribuído algo mágico a um estado do ser, definindo o sonambulismo29
como algo
especial. Ou alguém que tem maior facilidade de se comunicar com pessoas já falecidas.
Passagem 04.
Então, o círculo vicioso em que se metem os mestres da vã filosofia mostrar-se-á
completamente, porquanto os novos campeões levam consigo não só um facho, que é
a inteligência desimpedida dos véus grosseiros, senão também muitos dentre eles
gozarão desse estado particular, que é privilégio das grandes almas, como Jesus, e que
dá o poder de curar e de operar essas maravilhas chamadas milagres (KARDEC,
2005, p. 381).
Comentário:
Segundo KARDEC (1996), os espíritas acreditam ter um conhecimento além da
medicina convencional. Eles acreditam ser privilegiados porque dentro da sua concepção,
enxergam o enfermo em outras dimensões. E os médicos de formação e não adeptos do
espiritismo Kardecista?
Quando os médicos conhecerem bem o Espiritismo, saberão fazer essa distinção e
curarão mais doentes do que com as duchas. (KARDEC, 1996, p. 323, a).
Se os médicos são mal sucedidos, tratando da maior parte das moléstias, é que tratam
do corpo, sem tratarem da alma. Ora, não se achando o todo em bom estado,
impossível é que uma parte dele passe bem. (KARDEC, 1996, p. 51, b).
Por isso é que dizemos que estes estudos requerem atenção demorada, observação
profunda e, sobretudo, como, aliás, o exigem todas as ciências humanas, continuidade
29 Sonambulismo: 1 Estado ou doença dos sonâmbulos. 2 Fisiol Estado caracterizado pela facilidade de andar e
de repetir durante o sono certos movimentos contraídos pelo hábito, sem que de tal fique a menor lembrança ao
despertar. S. artificial ou s. magnético ou s. provocado: estado semelhante ao sonambulismo natural, mas devido
à ação do hipnotismo e caracterizado por insensibilidade exterior e, às vezes, pela exaltação de certas
faculdades.Fonte: Dicionário Michaelis, 2012.
60
e perseverança. Anos são precisos para forma-se um médico medíocre e três quartas
partes de vida para chegar-se a ser sábio (KARDEC, 1995, p. 38, a).
A oposição da medicina e da psiquiatria nunca levava em consideração as teorias
espíritas, mas, somente suas práticas. Para os psiquiatras, de fato eram criticáveis suas
sessões religiosas, em geral, associadas ou não a propósitos de cura (SANTOS, 2004,
p. 61).
Salvo os médicos adeptos ao espiritismo Kardecista (SANTOS, 2004), Bezerra de
Menezes30
, por exemplo - que inclusive presidiu a Federação Espírita Brasileira por volta de
1886, o que causou grande alvoroço na época - um médico, um homem de ciência, se deixar
acreditar em crenças sobrenaturais de um além comunicativo, era algo inusitado.
A controvérsia entre médicos e espíritas no Brasil foi estudada entre outros, por
Emerson Giumelli, que salienta a forma substantiva da condenação médica ao
espiritismo e também uma outra posição, típica do saber jurídico do século XX,
Apenas “baixo” espiritismo era criminalizado, enquanto o “alto” espiritismo,
praticado por uma elite letrada e familiarizada com o exercício do poder, era tolerado.
(ISAIA, 2005, p. 176).
Essa visão de “baixo” espiritismo31
ainda, faz-se presente. Não é raro escutarmos
pessoas se declarando espírita, mas em seguida, justificando-se que o seu é de Kardec, ou até
mesmo de Chico Xavier.
No Livro Obras Póstumas (atribuído a Kardec) há menção à necessidade de um
médico de formação, auxiliando os serviços sociais que o Espiritismo almejava desde aquela
época.
3º Um dispensário destinado às consultas médicas gratuitas e ao tratamento de certas
afecções, sob a direção de um médico diplomado;
4º Uma caixa de socorros e de previdência em condições práticas;
5º Um asilo; (KARDEC, 2005, p. 434).
Este ideal foi alcançado, pelo menos aqui no Brasil. Atualmente, o Espiritismo conta
com renomados médicos e instituições famosas por proporcionarem tratamento
alternativo/complementar a uma gama de pacientes, inclusive de outras concepções religiosas.
Ali atuam médicos de formação e, também, pessoas que possuem o “dom” da cura por
encarnações anteriores segundo o Espiritismo. Desta forma, esta cura se dá por conhecimento
de encarnações anteriores.
30 Mais tarde segundo SANTOS (2004) Ele foi um dos três mentores (André Luiz, Emmanuel e Bezerra de
Menezes) de Chico Xavier sob a influência de Bezerra de Menezes Chico Xavier atuava como médium
receitista, antes da adesão total de Chico a literatura Espirita Kardecista. Bezerra de Menezes vale lembrar
também em vida foi um político, médico e empresário influente do sec. XIX no Brasil. Sua adesão causou
grande alvoroço em seu meio, o meio da ciência (medicina). 31
Informação verbal de pessoas adeptas do Espiritismo Kardecista, onde ao se declarar Espirita, fazem questão
de frisar que é de Allan Kardec, não raro Espiritismo de Chico Xavier, ou, como já ouvi da escritora Espírita,
sucesso de vendas em livros de auto ajuda, Zíbia Gaspareto.
61
Quanto aos que tem uma aptidão especial para comunicações científicas, históricas,
médicas e outras, fora do alcance de suas especialidades atuais, possuíram, em
anterior existência esses conhecimentos, que permanecem neles em estado latente,
fazendo parte dos materiais cerebrais de que necessita o espírito que se manifesta; são
os elementos que a este abrem caminho para a transmissão de ideias que lhe são
próprias, portanto, em tais médiuns encontra ele instrumentos mais inteligentes do
que num ignaro (KARDEC, 1996, p. 239, a).
É, para estes, uma lembrança retrospectiva do que viram e souberam, quer na
erraticidade quer em suas existências anteriores, como alguns têm a intuição das
línguas e das ciências de que já foram conhecedores (KARDEC, 1995, p. 363, c).
Desta forma, o espiritismo segue hoje com mais variadas obras assistenciais como
asilos, hospitais e as mais variadas obras assistenciais. Fortalecendo o desejo de seu codificar
e fomentando o interesse e crença de seus adeptos e simpatizantes.
62
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O modo de conceber a doença e a cura é visto no Kardecismo como um meio para a
evolução do espírito. A doença não é, simplesmente, uma doença do corpo, mas, há toda uma
diferenciação permeada por questões éticas e morais evolucionistas, tal como aponta a
cosmovisão espírita.
Desta maneira, a forma de tratamento, também, é diferenciada. Busca-se tratar a
causa da doença na esfera, também, espiritual, tendo em vista que, para os Kardequianos, os
males do corpo são reflexos dos males da alma. Mediante esta concepção contam com ajuda
de “espíritos protetores” que atendem nos centros espíritas e em Casas de assistência como as
visitadas por mim para a complementação da elaboração deste trabalho. Lá tive a
oportunidade de me familiarizar com termos, técnicas e vivencias indispensáveis para um
conhecimento abrangente do tema desta pesquisa.
Fiz uma análise dos cinco livros alicerce do espiritismo Kardecista: O Livro dos
Espíritos Princípios da Doutrina Espírita, O Livro dos Médiuns ou Guia dos Médiuns e dos
Evocadores, O Evangelho Segundo o Espiritismo com a Explicação das Máximas Morais do
Cristo em Concordância com o Espiritismo e suas Aplicações ás Diversas Circunstâncias da
Vida, O Céu e o Inferno ou a justiça Divina segundo o Espiritismo, A Gênese Os Milagres e
as Predições Segundo o Espiritismo. E mais, Obras Póstumas.
Com as leituras, fichamentos, e observações, conclui que o que eu pensava sobre o
assunto antes da pesquisa não se confirmou. Os discursos, semelhantes ao meu, de muitos
adeptos e não adeptos do espiritismo kardecista, acreditavam que este viés curandeirista
somente havia se tornado forte no Brasil, sem fundamentação teórica nas obras de Kardec que
embasasse tal crença. Pude perceber que estava errada. Essa aproximação assistencial de
cura/enfermidades saúde e correlatos já é presença desde 1857, percebida desde o primeiro
livro de Kardec, O Livro dos Espíritos Princípios da Doutrina Espírita, com nada menos que
21 citações, seguindo de maneira variada conforme quadro32
de análise desde trabalho. Nestes
trechos de Kardec são apresentadas a sua concepção, relações, causas e soluções aos males do
corpo e aos males da alma.
É Verdadeira a afirmação que diversos fatores próprios do país, como falta de
condição financeira, falha no Sistema Nacional de Saúde, falta de perspectiva na medicina
convencional, carência emocional ou mesmo por crença, favoreceram que o Brasil desse
ênfase à cura e seus correlatos. Mas, Kardec, desde o primeiro ao último livro base da
32
Página de número 33 desde trabalho.
63
literatura Kardequiana, deixa clara a intenção desta nova concepção de cura e relacionados.
Isto não é e nem foi uma “invenção tupiniquim”. Adeptos usam e tomam como base obras
alicerces Kardequianas, legitimam-se, atribuem saberes e práticas à cura que se distingue da
concepção convencional.
Para Foucault (2011) essa legitimação já se dá pelo nome do autor, no caso aqui, Allan
Kardec. Isso, por si só, já basta para legitimar as suas ideias e formar base teórica do
Espiritismo Kardecista. É como em uma escolha de um livro, pelo nome do autor já se atribui
juízo de valor à obra. Onde o nome do autor tem destaque, muitas vezes, na própria capa da
obra, onde, nem sempre, se lê o título da obra, mas sim, quem o escreveu. Esta realidade
acontece com as obras de Allan Kardec, Chico Xavier e tantos outros escritores espíritas
famosos.
Voltemos ao tema principal, a temática da cura nas obras de Kardec. Ela se fez
presente em todos os livros base do Espiritismo Kardecista, merecendo o devido destaque o
livro A Gênese Os Milagres e as predições Segundo o Espiritismo. Nesta obra se encontram
o maior número de citações relativas ao assunto, mesmo que essas páginas no caso, sejam
narrativas dos milagres de Jesus Cristo descritas na Bíblia Cristã. Em seguida se explicita a
explicação dada pelo entendimento Kardecista. Para os Espíritas Kardecistas as curas
realizadas por Jesus Cristo são passes33
. Jesus Cristo, apenas, estendia suas mãos ao enfermo
e com a força de seu espírito, sua fé e determinação curava os enfermos. Para o Espiritismo
eram passes esses procedimentos tomados por Cristo. Como vimos, durante o percurso deste
trabalho, aconteceu uma aproximação entre Kardec e a Igreja Católica Apostólica Romana,
crença de sua infância. Essa influência foi tão forte a ponto de Kardec afirmar que o
Espiritismo era a continuação do Cristianismo, como se pode perceber em várias passagens
neste trabalho.
Por fim, devo admitir que a pesquisa tomou um rumo inesperado desde de seu início.
Inclusive nos resultados finais. Espero ter correspondido com o esperado para um trabalho de
Conclusão de Curso. A falta de tempo, infelizmente, fez-me recuar de assuntos por mim
pensados antes, durante e depois deste trabalho34
. Desta forma, dou por encerrado este
trabalho.
33
Segundo Xavier (1999) o passe é uma transfusão de energias psíquicas, essa transfusão pode ser utilizada no
tratamento de enfermos, ou ser transmitido para pessoas que se dispostas recebê-lo, mesmo estando saudável.
Simplificando o passe é uma transmissão fluídica/magnética. 34
O médium João de Deus. Atual médium curador de renome internacional que atua na casa Dom Inácio de
Loyola praticando curas espetaculares ao vivo.
64
REFERÊNCIAS
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UFSC, 2009.
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<http://seer.bce.unb.br/index.php/textos/article/viewFile/6043/5002> Acesso em: 25/04/2012
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humana. Tradução Octavio Mendes Cajado. São Paulo. Editora Cultrix, Tradução da editora
38º edição do número de 1935.
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Guillon Ribeiro. Rio de Janeiro; Federação Espírita Brasileira. 76 ª Edição. 1995, a.
65
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Tradução de Guillon Ribeiro. Rio de Janeiro; Federação Espírita Brasileira. 62 ª Edição. 1996,
b.
KARDEC Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo com a Explicação das Máximas
morais do Cristo em Concordância com o espiritismo e suas aplicações ás diversas
circunstâncias da vida. Tradução de Guillon Ribeiro. Rio de Janeiro; Federação Espírita
Brasileira. 112 ª Edição. 1996, b.
KARDEC Allan. O céu e o inferno ou a justiça Divina segundo o espiritismo. Tradução de
Manuel Justiniano Quintão. Rio de Janeiro; Federação Espírita Brasileira. 40 ª Edição. 1995,
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KARDEC Allan. A Gênese Os milagres e as Predições Segundo o Espiritismo. Tradução
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Eginardo Pires. Rio de Janeiro. Revisão Júlio Cezar Melatti. Tempo Brasileiro. 1985.
SUPERINTERESSANTE. São Paulo. Abril. nº 277. Abril. 2010.
66
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15. Novembro de 2004.
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<http://www.youtube.com/watch?v=hW2D90UVU6I> Acesso em: 06 de maio de 2012.
XAVIER, Francisco Candido. O Consolador. 20ª Edição. Rio de Janeiro: Federação Espírita
Brasileira, 1999.
XAVIER, Chico. Chico Xavier – A vida e suas Obras. Disponível em:
<http://clotildes.tripod.com/chico_xavier.html > Acesso em: 27 maio. 2012.
67
ANEXO 01.
Bom dia, meu nome é Simara e sou do curso de Ciências da Religião – USJ. Estou
desenvolvendo o meu TCC em cima da temática cura espiritual. E como o Centro de vocês é
referência no assunto gostaria de perguntar se tem há possibilidade de eu desenvolver o meu
trabalho TCC junto a sua casa? Se puderem me receber, agradeço muito! Respeitosamente,
Simara M. F. Luz
68
ANEXO 02.
Notícia vinculada no site: http://waves.terra.com.br/surf/noticia/violencia-gratuita-na-
ferrugem-(sc)/51276 em: 05 de fevereiro de 2012. Reportagem segue na íntegra.
Violência gratuita na Ferrugem (SC)
A madrugada da última quinta-feira quase terminou em tragédia para o professor universitário
Evandro de Brito, 41, e o amigo Érick Casarini, 39. Moradores da capital catarinense
Florianópolis, os dois saíam de uma casa noturna na praia da Ferrugem, Garopaba (SC),
quando foram espancados por três rapazes. Amigo de umas das vítimas, o fotógrafo Eduardo
Dutra envia um relato com detalhes absolutamente lamentáveis sobre o episódio absurdo
daquela noite. Infelizmente somos obrigados a divulgar uma notícia como esta, retrato da
pura violência, racismo e descaso com a vida. O episódio aconteceu na noite da última quarta-
feira, por volta das 5 horas da manhã. Ao que se sabe, Evandro de Brito, doutor em Filosofia
pela Universidade Federal de Santa Catarina, uma pessoa de bem, estava apenas se divertindo
na praia da Ferrugem. Evandro, que é negro, comia batatas fritas quando um dos agressores
chegou e meteu a mão no alimento dele, já com a pretensão de arrumar confusão. Foi o que
acabou acontecendo. Amigo de Evandro, Erick Casarin, músico de Florianópolis, outra vítima
desta tragédia, chegou para tentar separar o amigo da confusão. Erick começou a apanhar
também. Ele comentou depois que apagou já no terceiro golpe e os dois foram espancados ali
mesmo e largados no chão. Quando se recuperaram, saíram correndo em direção à Vila da
Ferrugem, quando os agressores, não contentes com o que já haviam feito, voltaram de carro
para finalizar a história, armados de chaves de rodas e desferiram vários golpes na cabeça e
corpos dos dois que já estavam imóveis neste momento. A intenção parecia ser de matar, em
um ato de absurda covardia e maldade pura. Largaram os dois desmaiados, que foram
encontrados no mesmo local, com vida. Foram hospitalizados em estado grave, mas sem risco
de morte. Já se sabe os nomes de dois dos agressores, caras que pegam onda na região. O
dono do carro é um tal Edinho, possui um Celta prata, placa de Cidreira (RS). Ele teria levado
no veículo os outros dois até o local da agressão. O segundo é conhecido pelos apelidos de
Rasta / Natural, tem cabelo rastafari. O terceiro agressor ainda é desconhecido e todos estão
foragidos de Garopaba. Foi instaurado inquérito policial na delegacia de Garopaba e o IML
(Instituto Médico Legal) fez exame de corpo de delito nos dois para registrar os danos
causados. Seguem aqui os telefones das delegacias de Garopaba e Cidreira para eventuais
contatos. Delegacia de Garopaba - A/C ALEX - (0xx48) 3254-3190 e Policia Civil de
69
Cidreira (RS) - (0xx51) 3681-1166. Qualquer informação ou fotos dos agressores, por favor
entrem em contato com as delegacias, Facebook, meios de comunicação. A princípio, o caso
está sendo investigado na delegacia de Garopaba. Agradecemos por todas as orações e
pensamentos positivos dedicados aos nossos irmãos, são pessoas de bem, vitimas de agressão,
tentativa de homicídio e racismo.
ANEXO 03.
Relação de passagens que se refere a cura/doenças e correlatos no
O Livro dos Espíritos Princípios da Doutrina Espírita
Data da Primeira Edição: 1857
Classificação adotada : a
Posição: 1º Livro
Edição traduzida para o português utilizada neste trabalho: nº 76
Ano: 1995
Tradutor: Guillon Ribeiro
Número de páginas desta edição: 494
Edição atual: 92ª/2011
Número de Citações: 21
Poder-se-ia comparar a morte à cessação do movimento de uma máquina
desorganizada? ―Sim; se a máquina está mal montada, cessa o movimento;
se o corpo está enfermo, a vida se extingue.‖
(KARDEC, 1995, p. 76, a).
O corpo é o instrumento da dor. Se não é a causa primária desta é, pelo
menos, a causa imediata. A alma tem a percepção da dor: essa percepção é o
efeito. A lembrança que da dor a alma conserva pode ser muito penosa, mas
não pode ter ação física. De fato, nem o frio, nem o calor são capazes de
desorganizar os tecidos da alma, que não é suscetível de congelar-se, nem de
queimar-se. Não vemos todos os dias a recordação ou a apreensão de um mal
físico produzirem o efeito desse mal, como se real fora? Não as vemos até
causar a morte? Toda gente sabe que aqueles a quem se amputou um membro
costumam sentir dor no membro que lhes falta. Certo que aí não está a sede,
ou, sequer, o ponto de partida da dor. O que há, apenas, é que o cérebro
guardou desta a impressão. Lícito, portanto, será admitir-se que coisa análoga
ocorra nos sofrimentos do Espírito após a morte. (KARDEC, 1995, p.165, a).
Os sofrimentos deste mundo independem, algumas vezes, de nós; muito mais
vezes, contudo, são devidos à nossa vontade. Remonte cada um à origem
deles e verá que a maior parte de tais sofrimentos são efeitos de causas que
lhe teria sido possível evitar. Quantos males, quantas enfermidades não deve
o homem aos seus excessos, à sua ambição, numa palavra: às suas paixões?
(KARDEC, 1995, p. 169, a).
Por meio de cuidados dispensados a tempo, podem reatar-se laços prestes a
se desfazerem e restituir-se à vida um ser que definitivamente morreria se não
fosse socorrido? ―Sem dúvida e todos os dias tendes a prova disso. O
magnetismo, em tais casos, constitui, muitas vezes, poderoso meio de ação,
porque restitui ao corpo o fluido vital que lhe falta para manter o
funcionamento dos órgãos.‖ A letargia e a catalepsia derivam do mesmo
princípio, que é a perda temporária da sensibilidade e do movimento, por
uma causa fisiológica ainda inexplicada. Diferem uma da outra em que, na
letargia, a suspensão das forças vitais é geral e dá ao corpo todas as
aparências da morte; na catalepsia, fica localizada, podendo atingir uma parte
mais ou menos extensa do corpo, de sorte a permitir que a inteligência se
manifeste livremente, o que a torna inconfundível com a morte. A letargia é
sempre natural; a catalepsia é por vezes magnética.(KARDEC, 1995, p. 230-
231, a).
A prece é meio eficiente para a cura da obsessão?
―A prece é em tudo um poderoso auxílio. Mas, crede que não basta que
alguém murmure algumas palavras, para que obtenha o que deseja. Deus
assiste os que obram, não os que se limitam a pedir. É, pois, indispensável
que o obsidiado faça, por sua parte, o que se torne necessário para destruir em
si mesmo a causa da atração dos maus Espíritos.‖ (KARDEC, 1995, p. 251-
252,a).
Depende da interpretação que se lhe dê. Se chamais demônio ao mau Espírito
que subjugue um indivíduo, desde que se lhe destrua a influência, ele terá
sido verdadeiramente expulso. Se ao demônio atribuirdes a causa de uma
enfermidade, quando a houverdes curado direis com acerto que expulsastes o
demônio. (KARDEC, 1995, p.252, a).
Têm algumas pessoas, verdadeiramente, o poder de curar pelo simples
contacto? ―A força magnética pode chegar até aí, quando secundada pela
pureza dos sentimentos e por um ardente desejo de fazer o bem, porque então
os bons Espíritos lhe vêm em auxílio. Cumpre, porém, desconfiar da maneira
pela qual contam as coisas pessoas muito crédulas e muito entusiastas,
sempre dispostas a considerar maravilhoso o que há de mais simples e mais
natural. Importa desconfiar também das narrativas interesseiras, que
costumam fazer os que exploram, em seu proveito, a credulidade alheia.‖
(KARDEC, 1995, p. 279, a).
Que sentido se deve dar ao qualificativo de feiticeiro?
―Aqueles a quem chamais feiticeiros são pessoas que, quando de boa-fé,
gozam de certas faculdades, como sejam a força magnética ou a dupla vista.
Então, como fazem coisas geralmente incompreensíveis, são tidas por
dotadas de um poder sobrenatural. Os vossos sábios não têm passado muitas
vezes por feiticeiros aos olhos dos ignorantes?‖ O Espiritismo e o
magnetismo nos dão a chave de uma imensidade de fenômenos sobre os
quais a ignorância teceu um sem-número de fábulas, em que os fatos se
apresentam exagerados pela imaginação.
(KARDEC, 1995, p. 279, a).
A higiene pública, elemento tão essencial da força e da saúde, a higiene
pública, que nossos pais não conheceram, é objeto de esclarecida solicitude.
(KARDEC, 1995, p. 339, a).
O homem, que procura nos excessos de todo gênero o requinte do gozo,
coloca-se abaixo do bruto, pois que este sabe deter-se, quando satisfeita a sua
necessidade, Abdica da razão que Deus lhe deu por guia e quanto maiores
forem seus excessos, tanto maior preponderância confere ele à sua natureza
animal sobre a sua natureza espiritual. As doenças, são, ao mesmo tempo, o
castigo à transgressão da lei de Deus. (KARDEC, 1995, p. 341, a).
A lei de conservação obriga o homem a prover às necessidades do corpo?
―Sim, porque, sem força e saúde, impossível é o trabalho.‖ (KARDEC, 1995,
p. 342, a).
―Dada a vossa constituição física, a carne alimenta a carne, do contrário o
homem perece. A lei de conservação lhe prescreve, como um dever, que
mantenha suas forças e sua saúde, para cumprir a lei do trabalho. Ele, pois,
tem que se alimentar conforme o reclame a sua organização.‖ (KARDEC,
1995, p. 344, a).
Por que de preferência não trabalham pelo bem de seus semelhantes? Vistam
o indigente; consolem o que chora; trabalhem pelo que está enfermo; sofram
privações para alívio dos infelizes e então suas vidas serão úteis e, portanto,
agradáveis a Deus. Sofrer alguém voluntariamente, apenas por seu próprio
bem, é egoísmo; sofrer pelos outros é caridade: tais os preceitos do Cristo.‖
(KARDEC, 1995, p. 344-345, a).
Nem por isso, entretanto, constitui menos um progresso natural, necessário,
que traz consigo o remédio para o mal que causa. À medida que a civilização
se aperfeiçoa, faz cessar alguns dos males que gerou, males que
desaparecerão todos com o progresso moral. (KARDEC, 1995, p. 370, a).
No que concerne à morte é que o homem se acha submetido, em absoluto, à
inexorável lei da fatalidade, por isso que não pode escapar à sentença que lhe
marca o termo da existência, nem ao gênero de morte que haja de cortar a
esta o fio. (KARDEC, 1995, p. 400, a).
Conhecidas as causas, o remédio se apresentará por si mesmo. Só restará
então destruí-las, senão totalmente, de uma só vez, ao menos parcialmente, e
o veneno pouco a pouco será eliminado. Poderá ser longa a cura, porque
numerosas são as causas, mas não é impossível. Contudo, ela só se obterá se
o mal for atacado em sua raiz, isto é, pela educação, não por essa educação
que tende a fazer homens instruídos, mas pela que tende a fazer homens de
bem. (KARDEC, 1995, p. 421, a).
Impacientemente suportamos as tribulações da vida. Tão intoleráveis nos
parecem, que não compreendemos possamos sofrê-las. Entretanto, se as
tivermos suportado corajosamente, se soubermos impor silêncio às nossas
murmurações, felicitar-nos-emos, quando fora desta prisão terrena, como o
doente que sofre se felicita, quando curado, por se haver submetido a um
tratamento doloroso. (KARDEC, 1995, p.435, a).
Ele traçou um limite; as enfermidades e muitas vezes a morte são a
consequência dos excessos. Eis aí a punição; é o resultado da infração da lei.
Assim em tudo.‖ (KARDEC, 1995, p. 447, a).
Quando sofremos de uma enfermidade duradoura, dizemos que o nosso mal é
eterno. Que há, pois, de admirar em que Espíritos que sofrem há anos, há
séculos, há milênios mesmo, assim também se exprimam? (KARDEC, 1995,
p. 469, a).
Que se deve entender por purgatório? ―Dores físicas e morais: o tempo da
expiação. Quase sempre, na Terra é que fazeis o vosso purgatório e que Deus
vos obriga a expiar as vossas faltas.‖ (KARDEC, 1995, p. 473, a).
Todos os fenômenos espíritas, sem exceção, resultam de leis gerais.
Revelam-nos uma das forças da Natureza, força desconhecida, ou, por
melhor dizer, incompreendida até agora, mas que a observação demonstra
estar na ordem das coisas. Assim, pois, o Espiritismo se apóia menos no
maravilhoso e no sobrenatural do que a própria religião. Conseguintemente,
os que o atacam por esse lado mostram que o não conhecem e, ainda quando
fossem os maiores sábios, lhes diríamos: se a vossa ciência, que vos instruiu
em tantas coisas, não vos ensinou que o domínio da Natureza é infinito, sois
apenas meio sábios. (KARDEC, 1995, p. 479, a).
Relação de passagens que se refere à cura/doenças e correlatos no
O Livro dos Médiuns: Ou Guia dos médiuns e dos Evocadores
Data da Primeira Edição: 1861
Classificação adotada : a
Posição: 2º Livro
Edição traduzida para o português utilizada neste trabalho: nº62
Ano: 1996
Tradutor: Guillon Ribeiro
Número de páginas desta edição: 486
Edição atual: 80ª/2011
Número de Citações:12
A morte é a destruição, ou, antes, a desagregação do envoltório grosseiro, do
invólucro que a alma abandona. O outro se desliga deste e acompanha a alma
que, assim, fica sempre com um envoltório. Este último, ainda que fluídico,
etéreo, vaporoso, invisível, para nós, em seu estado normal, não deixa de ser
matéria, embora até ao presente não tenhamos podido assenhorear-nos dela e
submetê-la à análise.
Esse segundo invólucro da alma, ou perispírito, existe, pois, durante a vida
corpórea; é o intermediário de todas as sensações que o Espírito percebe e
pelo qual transmite sua vontade ao exterior e atua sobre os órgãos do corpo.
Para nos servirmos de uma comparação material, diremos que é o fio elétrico
condutor, que serve para a recepção e a transmissão do pensamento; é, em
suma, esse agente misterioso, imperceptível, conhecido pelo nome de fluido
nervoso, que desempenha tão grande papel na economia orgânica e que ainda
não se leva muito em conta nos fenômenos fisiológicos e patológicos.
Tomando em consideração apenas o elemento material ponderável, a
Medicina, na apreciação dos fatos, se priva de uma causa incessante de ação.
Não cabe, aqui, porém, o exame desta questão. Somente faremos notar que
no conhecimento do perispírito está a chave de inúmeros problemas até hoje
insolúveis. (KARDEC, 1996, p. 77-78, a).
Tomando em consideração apenas o elemento material ponderável, a
Medicina, na apreciação dos fatos, se priva de uma causa incessante de ação.
Não cabe, aqui, porém, o exame desta questão. (KARDEC, 1996, p.78, a).
A Medicina não pode compreender estas coisas, por não admitir, entre as
causas que as determinam, senão o elemento material; donde, erros
freqüentemente funestos. A história descreverá um dia certos tratamentos em
uso no século dezenove, como se narram hoje certos processos de cura da
Idade Média. (KARDEC, 1996, p.110, a).
Por que razão certas visões ocorrem com mais freqüência quando se está
doente? "Elas ocorrem do mesmo modo quando estais de perfeita saúde.
Simplesmente, no estado de doença, os laços materiais se afrouxam; a
fraqueza do corpo permite maior liberdade ao Espírito, que, então, se põe
mais facilmente em comunicação com os outros Espíritos." (KARDEC, 1996,
p. 135, a).
Esta teoria nos fornece a solução de um fato bem conhecido em magnetismo,
mas inexplicado até hoje: o da mudança das propriedades da água, por obra
da vontade. O Espírito atuante é o do magnetizador, quase sempre assistido
por outro Espírito. Ele opera uma transmutação por meio do fluido magnético
que, como atrás dissemos, e a substância que mais se aproxima da matéria
cósmica, ou elemento universal. Ora, desde que ele pode operar uma
modificação nas propriedades da água, pode também produzir um fenômeno
análogo com os fluidos do organismo, donde o efeito curativo da ação
magnética, convenientemente dirigida. (KARDEC, 1996, p. 172, a).
Obs: A explicação do magnetismo, tipo como meio para a obtenção da cura
Kardecista.
Tanto quanto do Espírito errante, a vontade é igualmente atributo do Espírito
encarnado; daí o poder do magnetizador, poder que se sabe estar na razão
direta da força de vontade. Podendo o Espírito encarnado atuar sobre a
matéria elementar, pode do mesmo modo mudar-lhe as propriedades, dentro
de certos limites. Assim se explica a faculdade de cura pelo contacto e pela
imposição das mãos, faculdade que algumas pessoas possuem em grau mais
ou menos elevado. (KARDEC, 1996, p. 172-173, a).
Um de nossos amigos tinha como sonâmbulo um rapaz de 14 a 15 anos, de
inteligência muito vulgar e instrução extremamente escassa. Entretanto, no
estado de sonambulismo, deu provas de lucidez extraordinária e de grande
perspicácia. Excedia, sobretudo, no tratamento das enfermidades e operou
grande número de curas consideradas impossíveis. Certo dia, dando consulta
a um doente, descreveu a enfermidade com absoluta exatidão. Não basta,
disseram-lhe, agora é preciso que indiques o remédio. Não posso, respondeu,
meu anjo doutor não está aqui. Quem é esse anjo doutor de quem falas? - O
que dita os remédios. - Não és tu, então, que vês os remédios? - Oh! não;
estou a dizer que é o meu anjo doutor quem dita.
Assim, nesse sonâmbulo, a ação de ver o mal era do seu próprio Espírito que,
para isso, não precisava de assistência alguma; a indicação, porém, dos
remédios lhe era dada por outro. Não estando presente esse outro, ele nada
podia dizer. Quando só, era apenas sonâmbulo; assistido por aquele a quem
chamava seu anjo doutor, era sonâmbulo-médium. (KARDEC, 1996, p. 215-
216, a).
Unicamente para não deixar de mencioná-la, falaremos aqui desta espécie de
médiuns, porquanto o assunto exigiria desenvolvimento excessivo para os
limites em que precisamos ater-nos. Sabemos, ao demais, que um de nossos
amigos, médico, se propõe a tratá-lo em obra especial sobre a medicina
intuitiva. Diremos apenas que este gênero de mediunidade consiste,
principalmente, no dom que possuem certas pessoas de curar pelo simples
toque, pelo olhar, mesmo por um gesto, sem o concurso de qualquer
medicação. Dir-se-á, sem dúvida, que isso mais não é do que magnetismo.
Evidentemente, o fluido magnético desempenha aí importante papel; porém,
quem examina cuidadosamente o fenômeno sem dificuldade reconhece que
há mais alguma coisa. A magnetização ordinária é um verdadeiro tratamento
seguido, regular e metódico; no caso que apreciamos, as coisas se passam de
modo inteiramente diverso.
Todos os magnetizadores são mais ou menos aptos a curar, desde que saibam
conduzir-se convenientemente, ao passo que nos médiuns curadores a
faculdade é espontânea e alguns até a possuem sem jamais terem ouvido falar
de magnetismo. A intervenção de uma potência oculta, que é o que constitui
a mediunidade, se faz manifesta, em certas circunstâncias, sobretudo se
considerarmos que a maioria das pessoas que podem, com razão, ser
qualificadas de médiuns curadores recorre à prece, que é uma verdadeira
evocação.
Eis aqui as respostas que nos deram os Espíritos às perguntas que lhes
dirigimos sobre este assunto:
1ª a Podem considerar-se as pessoas dotadas de força magnética como
formando uma variedade de médiuns?
"Não há que duvidar."
2ª Entretanto, o médium é um intermediário entre os Espíritos e o homem;
ora, o magnetizador, haurindo em si mesmo a força de que se utiliza, não
parece que seja intermediário de nenhuma potência estranha.
"É um erro; a força magnética reside, sem dúvida, no homem, mas é
aumentada pela ação dos Espíritos que ele chama em seu auxilio. Se
magnetizas com o propósito de curar, por exemplo, e invocas um bom
Espírito que se interessa por ti e pelo teu doente, ele aumenta a tua força e a
tua vontade, dirige o teu fluido e lhe dá as qualidades necessárias."
3ª Há, entretanto, bons magnetizadores que não crêem nos Espíritos?
"Pensas então que os Espíritos só atuam nos que crêem neles? Os que
magnetizam para o bem são auxiliados por bons Espíritos. Todo homem que
nutre o desejo do bem os chama, sem dar por isso, do mesmo modo que, pelo
desejo do mal e pelas más intenções, chama os maus."
4ª Agiria com maior eficácia aquele que, tendo a força magnética, acreditasse
na intervenção dos Espíritos?
"Faria coisas que consideraríeis milagre."
5ª Há pessoas que verdadeiramente possuem o dom de curar pelo simples
contacto, sem o emprego dos passes magnéticos?
"Certamente; não tens disso múltiplos exemplos?"
6ª Nesse caso, há também ação magnética, ou apenas influência dos
Espíritos?
"Uma e outra coisa. Essas pessoas são verdadeiros médiuns, pois que atuam
sob a influência dos Espíritos; isso, porém, não quer dizer que sejam quais
médiuns curadores, conforme o entendes."
7ª Pode transmitir-se esse poder?
"O poder, não; mas o conhecimento de que necessita, para exercê-lo, quem o
possua. Não falta quem não suspeite sequer de que tem esse poder, se não
acreditar que lhe foi transmitido."
8ª Podem obter-se curas unicamente por meio da prece?
"Sim, desde que Deus o permita; pode dar-se, no entanto, que o bem do
doente esteja em sofrer por mais tempo e então julgais que a vossa prece não
foi ouvida."
9ª Haverá para isso algumas fórmulas de prece mais eficazes do que outras?
"Somente a superstição pode emprestar virtudes quaisquer a certas palavras e
somente Espíritos ignorantes, ou mentirosos podem alimentar semelhantes
idéias, prescrevendo fórmulas. Pode, entretanto, acontecer que, em se
tratando de pessoas pouco esclarecidas e incapazes de compreender as coisas
puramente espirituais, o uso de determinada fórmula contribua para lhes
infundir confiança. Neste caso, porém, não é na fórmula que está a eficácia,
mas na fé, que aumenta por efeito da idéia ligada ao uso da fórmula."
(KARDEC, 1996, p. 217-218-219, a).
Médiuns curadores: os que têm o poder de curar ou de aliviar o doente, pela
só imposição das mãos, ou pela prece. (KARDEC, 1996, p. 232, a).
"Pode, a uma espécie de loucura cuja causa o mundo desconhece, mas que
não tem relação alguma com a loucura ordinária. Entre os que são tidos por
loucos, muitos há que apenas são subjugados; precisariam de um tratamento
moral, enquanto que com os tratamentos corporais os tornamos verdadeiros
loucos. Quando os médicos conhecerem bem o Espiritismo, saberão fazer
essa distinção e curarão mais doentes do que com as duchas. (KARDEC,
1996, p. 323, a).
Médiuns receitistas: têm a especialidade de servirem mais facilmente de
intérpretes aos Espíritos para as prescrições médicas. Importa não os
confundir com os médiuns curadores, visto que absolutamente não fazem
mais do que transmitir o pensamento do Espírito, sem exercerem por si
mesmos influência alguma. Muito comuns. (KARDEC, 1996, p. 329, a).
Poderia um médico, evocando os Espíritos de seus clientes que morreram,
obter esclarecimentos sobre o que lhes determinou a morte, sobre as faltas
que haja porventura cometido no tratamento deles e adquirir assim um
acréscimo de experiência? "Pode e isso lhe seria muito útil, sobretudo se
conseguisse a assistência de Espíritos esclarecidos, que supririam a falta de
conhecimentos de certos doentes. Mas, para tal, fora mister que ele fizesse
esse estudo de modo sério, assíduo, com um fim humanitário e não como
meio de adquirir, sem trabalho, saber e riqueza. (KARDEC, 1996, p. 391, a).
Relação de passagens que se refere à cura/doenças e correlatos no
Análise do O Evangelho Segundo o Espiritismo com A explicação das máximas morais do Cristo
em concordância com o Espiritismo e suas aplicações ás diversas circunstâncias da vida.
Data da Primeira Edição: 1864
Classificação adotada : b
Posição: 3º Livro
Edição traduzida para o português utilizada neste trabalho: nº112
Ano: 1996
Tradutor: Guillon Ribeiro
Número de páginas desta edição: 435
Edição atual: 130/2011
Número de Citações:18
Se os médicos são malsucedidos, tratando da maior parte das moléstias, é que
tratam do corpo, sem tratarem da alma. Ora, não se achando o todo em bom
estado, impossível é que uma parte dele passe bem. (KARDEC, 1996, p. 51,
b).
Quantas doenças e enfermidades decorrem da intemperança e dos excessos
de todo gênero! (KARDEC, 1996, p. 99, b).
Mas, se há males nesta vida cuja causa primária é o homem, outros há
também aos quais, pelo menos na aparência, ele é completamente estranho e
que parecem atingi-lo como por fatalidade. Tal, por exemplo, a perda de
entes queridos e a dos que são o amparo da família. Tais, ainda, os acidentes
que nenhuma previsão poderia impedir; os reveses da fortuna, que frustram
todas as precauções aconselhadas pela prudência; os flagelos naturais, as
enfermidades de nascença, sobretudo as que tiram a tantos infelizes os meios
de ganhar a vida pelo trabalho: as deformidades, a idiotia, o cretinismo, etc.
(KARDEC, 1996, p. 101, b).
Por estas palavras: Bem-aventurados os aflitos, pois que serão consolados,
Jesus aponta a compensação que hão de ter os que sofrem e a resignação que
leva o padecente a bendizer do sofrimento, como prelúdio da cura.
(KARDEC, 1996, p. 106, b).
Que remédio, então, prescrever aos atacados de obsessões cruéis e de
cruciantes males? Só um é infalível: a fé, o apelo ao Céu. Se, na maior
acerbidade dos vossos sofrimentos, entoardes hinos ao Senhor, o anjo, à
vossa cabeceira, com a mão vos apontará o sinal da salvação e o lugar que
um dia ocupareis... A fé é o remédio seguro do sofrimento; mostra sempre os
horizontes do infinito diante dos quais se esvaem os poucos dias brumosos do
presente. Não nos pergunteis, portanto, qual o remédio para curar tal úlcera
ou tal chaga, para tal tentação ou tal prova. Lembrai-vos de que aquele que
crê é forte pelo remédio da fé e que aquele que duvida um instante da sua
eficácia é imediatamente punido, porque logo sente as pungitivas angústias
da aflição. (KARDEC, 1996, p. 112, b).
Perguntais se é licito ao homem abrandar suas próprias provas. Essa questão
eqüivale a esta outra: É lícito, àquele que se afoga, cuidar de salvar-se?
Aquele em quem um espinho entrou, retirá-lo? Ao que está doente, chamar o
médico? As provas têm por fim exercitar a inteligência, tanto quanto a
paciência e a resignação. Pode dar-se que um homem nasça em posição
penosa e difícil, precisamente para se ver obrigado a procurar meios de
vencer as dificuldades. O mérito consiste em sofrer, sem murmurar, as
conseqüências dos males que lhe não seja possível evitar, em perseverar na
luta, em se não desesperar, se não é bem-sucedido; nunca, porém, numa
negligência que seria mais preguiça do que virtude. (KARDEC, 1996, p. 121,
b).
Não enfraqueçais o vosso corpo com privações inúteis e macerações sem
objetivo, pois que necessitais de todas as vossas forças para cumprirdes a
vossa missão de trabalhar na Terra. Torturar e martirizar voluntariamente o
vosso corpo é coutravir a lei de Deus, que vos dá meios de o sustentar e
fortalecer. Enfraquece-lo sem necessidade é um verdadeiro suicídio. Usai,
mas não abuseis,tal a lei. (KARDEC, 1996, p. 121, b).
Meus bons amigos, para que me chamastes? Terá sido para que eu imponha
as mãos sobre a pobre sofredora que está aqui e a cure? Ah! que sofrimento,
bom Deus! Ela perdeu a vista e as trevas a envolveram. Pobre filha! Que ore
e espere. Não sei fazer milagres, eu, sem que Deus o queira. Todas as curas
que tenho podido obter e que vos foram assinaladas não as atribuais senão
àquele que é o Pai de todos nós. Nas vossas aflições, volvei sempre para o
céu o olhar e dizei do fundo do coração: "Meu Pai, cura-me, mas faze que
minha alma enferma se cure antes que o meu corpo; que a minha carne seja
castigada, se necessário, para que minha alma se eleve ao teu seio, com a
brancura que possuía quando a criaste." Após essa prece, meus amigos, que o
bom Deus ouvirá sempre, dadas vos serão a força e a coragem e, quiçá,
também a cura que apenas timidamente pedistes, em recompensa da vossa
abnegação. (KARDEC, 1996, p.157, b).
O poder da fé se demonstra, de modo direto e especial, na ação magnética;
por seu intermédio, o homem atua sobre o fluido, agente universal, modifica-
lhe as qualidades e lhe dá uma impulsão por assim dizer irresistível. Daí
decorre que aquele que a um grande poder fluídico normal junta ardente fé,
pode, só pela força da sua vontade dirigida para o bem, operar esses
singulares fenômenos de cura e outros, tidos antigamente por prodígios, mas
que não passam de efeito de uma lei natural. Tal o motivo por que Jesus disse
a seus apóstolos: se não o curastes, foi porque não tínheis fé. (KARDEC,
1996, p. 301, b).
O homem de bem que, crente em seu futuro celeste, deseja encher de belas e
nobres ações a sua existência, haure na sua fé, na certeza da felicidade que o
espera,a força necessária, e ainda aí se operam milagres de caridade, de
devotamento e de abnegação. Enfim, com a fé, não há maus pendures que se
não chegue a vencer. O Magnetismo é uma das maiores provas do poder da
fé posta em ação. É pela fé que ele cura e produz esses fenômenos singulares,
qualificados outrora de milagres. Repito: a fé é humana e divina. Se todos os
encarnados se achassem bem persuadidos da força que em si trazem, e se
quisessem pôr a vontade a serviço dessa força, seriam capazes de realizar o a
que, até hoje, eles chamaram prodígios e que, no entanto, não passa de um
desenvolvimento das faculdades humanas. (KARDEC, 1996, p. 306-307, b).
―Dai gratuitamente o que gratuitamente haveis recebido‖, diz Jesus a seus
discípulos. Com essa recomendação, prescreve que ninguém se faça pagar
daquilo por que nada pagou. Ora, o que eles haviam recebido gratuitamente
era a faculdade de curar os doentes e de expulsar os demônios, isto é, os
maus Espíritos. Esse dom Deus lhes dera gratuitamente, para alívio dos que
sofrem e como meio de propagação da fé; Jesus, pois, recomendava-lhes que
não fizessem dele objeto de comércio, nem de especulação, nem meio de
vida. (KARDEC, 1996, p. 363, b).
A mediunidade é coisa santa, que deve ser praticada santamente,
religiosamente. Se há um gênero de mediunidade que requeira essa condição
de modo ainda mais absoluto é a mediunidade curadora. O médico dá o fruto
de seus estudos, feitos, muita vez, à custa de sacrifícios penosos. O
magnetizador dá o seu próprio fluido, por vezes até a sua saúde. Podem pôr-
lhes preço. O médium curador transmite o fluido salutar dos bons Espíritos;
não tem o direito de vendê-lo. Jesus e os apóstolos, ainda que pobres, nada
cobravam pelas curas que operavam. (KARDEC, 1996, p. 367, b).
Não menos certo é que todas essas misérias resultam das nossas infrações às
leis de Deus e que, se as observássemos pontualmente, seríamos inteiramente
ditosos. Se não ultrapassássemos o limite do necessário, na satisfação das
nossas necessidades, não apanharíamos as enfermidades que resultam dos
excessos, nem experimentaríamos as vicissitudes que as doenças acarretam.
Se puséssemos freio à nossa ambição, não teríamos de temer a ruína; se não
quiséssemos subir mais alto do que podemos, não teríamos de recear a queda;
se fôssemos humildes, não sofreríamos as decepções do orgulho abatido; se
praticássemos a lei de caridade, não seríamos maldizentes, nem invejosos,
nem ciosos, e evitaríamos as disputas e dissensões; se mal a ninguém
fizéssemos, não houvéramos de temer as vinganças, etc. (KARDEC, 1996, p.
374, b).
Pela prece, obtém o homem o concurso dos bons Espíritos que acorrem a
sustentálo em suas boas resoluções e a inspirar-lhe idéias sãs. Ele adquire,
desse modo, a força moral necessária a vencer as dificuldades e a volver ao
caminho reto, se deste se afastou. Por esse meio, pode também desviar de si
os males que atrairia pelas suas próprias faltas. Um homem, por exemplo, vê
arruinada a sua saúde, em consequência de excessos a que se entregou, e
arrasta, até o termo de seus dias, uma vida de sofrimento: terá ele o direito de
queixar-se, se não obtiver a cura que deseja? Não, pois que houvera podido
encontrar na prece a força de resistir às tentações. (KARDEC, 1996, p.474,
b).
PREFÁCIO. As doenças fazem parte das provas e das vicissitudes da vida
terrena; são inerentes à grosseria da nossa natureza material e à inferioridade
do mundo que habitamos. As paixões e os excessos de toda ordem semeiam
em nós germens malsãos, às vezes hereditários. Nos mundos mais
adiantados, física ou moralmente, o organismo humano, mais depurado e
menos material, não está sujeito às mesmas enfermidades e o corpo não é
minado surdamente pelo corrosivo das paixões.
Temos, assim, de nos resignar às conseqüências do meio onde nos coloca a
nossa inferioridade, até que mereçamos passar a outro. Isso, no entanto, não é
de molde a impedir que, esperando tal se dê, façamos o que de nós depende
para melhorar as nossas condições atuais. Se, porém, mau grado aos nossos
esforços, não o conseguirmos, o Espiritismo nos ensina a suportar com
resignação os nossos passageiros males.
Se Deus não houvesse querido que os sofrimentos corporais se dissipassem
ou abrandassem em certos casos, não houvera posto ao nosso alcance meios
de cura. A esse respeito, a sua solicitude, em conformidade com o instinto de
conservação, indica que é dever nosso procurar esses meios e aplicá-los.
A par da medicação ordinária, elaborada pela Ciência, o magnetismo nos dá a
conhecer o poder da ação fluídica e o Espiritismo nos revela outra força
poderosa na mediunidade curadora e a influência da prece. (Ver, no Cap.
XXVI, a notícia sobre a mediunidade curadora.)
78. Prece. (Para ser dita pelo doente.) - Senhor, pois que és todo justiça, a
enfermidade que te aprouve mandar-me necessariamente eu a merecia, visto
que nunca impões sofrimento algum sem causa. Confio-me, para minha cura,
à tua infinita misericórdia.
Se for do teu agrado restituir-me a saúde, bendito seja o teu santo nome. Se,
ao contrário, me cumpre sofrer mais, bendito seja ele do mesmo modo.
Submeto-me, sem queixas, aos teus sábios desígnios, porquanto o que fazes
só pode ter por fim o bem das tuas criaturas.
Dá, ó meu Deus, que esta enfermidade seja para mim um aviso salutar e me
leve a refletir sobre a minha conduta. Aceito-a como uma expiação do
passado e como uma prova para a minha fé e a minha submissão à tua santa
vontade. (Veja-se a prece n° 40.) 79. Prece. (Pelo doente.) - Meu Deus, são
impenetráveis os teus desígnios e na tua sabedoria entendeste de afligir a N...
pela enfermidade. Lança, eu te suplico, um olhar de compaixão sobre os seus
sofrimentos e digna-te de pôr-lhes termo.
Bons Espíritos, ministros do Onipotente, secundai, eu vos peço, o meu desejo
de aliviá-lo; encaminhai o meu pensamento, a fim de que vá derramar um
bálsamo salutar em seu corpo e a consolação em sua alma.
Inspirai-lhe a paciência e a submissão à vontade de Deus; dai-lhe a força de
suportar suas dores com resignação cristã, a fim de que não perca o fruto
desta prova. (Veja-se a prece n° 57.)
80. Prece. (Para ser dita pelo médium curador.) -Meu Deus, se te dignas
servir-te de mim, indigno como sou, poderei curar esta enfermidade, se assim
o quiseres, porque em ti deposito fé. Mas, sem ti, nada posso. Permite que os
bons Espíritos me cumulem de seus fluidos benéficos, a fim de que eu os
transmita a esse doente, e livra-me de toda idéia de orgulho e de egoísmo que
lhes pudesse alterar a pureza. (KARDEC, 1996, p. 430-431, b).
A obsessão, como as enfermidades e todas as tribulações da vida, deve ser
considerada prova ou expiação e como tal aceita. (KARDEC, 1996, p. 431,
b).
Do mesmo modo que as doenças resultam das imperfeições físicas, que
tornam o corpo acessível às influências perniciosas exteriores, a obsessão é
sempre o resultado de uma imperfeição moral, que dá acesso a um Espírito
mau. A causas físicas se opõem forças físicas; a uma causa moral, tem-se de
opor uma força moral. Para preservá-lo das enfermidades, fortifica-se o
corpo; para isentá-lo da obsessão, é preciso fortificar a alma, pelo que
necessário se torna que o obsidiado trabalhe pela sua própria melhoria, o que
as mais das vezes basta para o livrar do obsessor, sem recorrer a terceiros. O
auxílio destes se faz indispensável, quando a obsessão degenera em
subjugação e em possessão, porque aí não raro o paciente perde a vontade e o
livre-arbítrio.
Quase sempre, a obsessão exprime a vingança que um Espírito tira e que com
freqüência se radica nas relações que o obsidiado manteve com ele em
precedente existência. (Veja-se: Cap. X, n° 6; cap. XII, n° 5 e n° 6.)
Nos casos de obsessão grave, o obsidiado se acha como que envolvido e
impregnado de um fluido pernicioso, que neutraliza a ação dos fluidos
salutares e os repele. É desse fluido que importa desembaraçá-lo. Ora, um
fluido mau não pode ser eliminado por outro fluido mau. Mediante ação
idêntica à do médium curador nos casos de enfermidade, cumpre se elimine o
fluido mau com o auxílio de um fluido melhor, que produz, de certo modo, o
efeito de um reativo. Esta a ação mecânica, mas que não basta; necessário,
sobretudo, é que se atue sobre o ser inteligente, ao qual importa se possa falar
com autoridade, que só existe onde há superioridade moral. Quanto maior for
esta, tanto maior será igualmente a autoridade.
E não é tudo: para garantir-se a libertação, cumpre induzir o Espírito perverso
a renunciar aos seus maus desígnios; fazer que nele despontem o
arrependimento e o desejo do bem, por meio de instruções habilmente
ministradas, em evocações particulares, objetivando a sua educação moral.
Pode-se então lograr a dupla satisfação de libertar um encarnado e de
converter um Espírito imperfeito.
A tarefa se apresenta mais fácil quando o obsidiado, compreendendo a sua
situação, presta o concurso da sua vontade e da sua prece. O mesmo não se
dá, quando, seduzido pelo Espírito embusteiro, ele se ilude no tocante às
qualidades daquele que o domina e se compraz no erro em que este último o
lança, visto que, então, longe de secundar, repele toda assistência, É o caso da
fascinação, infinitamente mais rebelde do que a mais violenta subjugação. (O
Livro aos Médiuns, 2ª Parte, cap. XXIII.)
Em todos os casos de obsessão, a prece é o mais poderoso auxiliar de quem
haja de atuar sobre o Espírito obsessor. (KARDEC, 1996, p. 432, b).
Observação. - A cura das obsessões graves requer muita paciência,
perseverança e devotamento. Exige também tato e habilidade, a fim de
encaminhar para o bem Espíritos muitas vezes perversos, endurecidos e
astuciosos, porquanto há-os rebeldes ao extremo. Na maioria dos casos,
temos de nos guiar pelas circunstâncias. Qualquer que seja, porém, o caráter
do Espírito, nada se obtém, é isto um fato incontestável pelo constrangimento
ou pela ameaça. Toda influência reside no ascendente moral. Outra verdade
igualmente comprovada pela experiência tanto quanto pela lógica, é a
completa ineficácia dos exorcismos, fórmulas, palavras sacramentais,
amuletos, talismãs, práticas exteriores, ou quaisquer sinais materiais.
A obsessão muito prolongada pode ocasionar desordens patológicas e
reclama, por vezes, tratamento simultâneo ou consecutivo, quer magnético,
quer médico, para restabelecer a saúde do organismo. Destruída a causa, resta
combater os efeitos. (Veja-se: O Livro dos Médiuns, 2ª Parte, cap. XXIII -
"Da obsessão". - Revue Spirite, fevereiro e março de 1864; abril de 1865:
exemplos de curas de obsessões.) (KARDEC, 1996, p. 435, b).
Relação de passagens que se refere à cura/doenças e correlatos no
Análise do livro O Céu e o Inferno ou A Justiça Divina Segundo o Espiritismo
Data da Primeira Edição: 1865
Classificação adotada : b
Posição: 4º Livro
Edição traduzida para o português utilizada neste trabalho: nº 40
Ano: 1995
Tradutor: Manuel Justiniano Quintão
Número de páginas desta edição: 425
Edição atual: 60ª/2012
Número de Citações: 8
―Por meio das operações da moderna magia vemos reproduzirem-se no
presente as evocações, as consultas, as curas e os sortilégios que ilustraram os
templos dos ídolos e os antros das sibilas."
(KARDEC, 1995, p. 141, b).
Quanto às curas, reconhecidas como reais na pastoral precitada, o exemplo
está mal selecionado como meio de evitar relações com os Espíritos.
Efetivamente, essas curas são outros tantos benefícios que levam à gratidão e
que todos podem experimentar. Pouca gente estará disposta a renunciar a
elas, mormente depois de haver esgotado outros recursos antes de recorrer ao
diabo. Depois, se o diabo cura, força é confessar que faz uma boa e meritória
ação.
"Quais são os agentes secretos de tais fenômenos, os verdadeiros autores
dessas cenas inexplicáveis? Os anjos, esses não aceitariam papéis indignos,
como também não se prestariam aos caprichos todos da curiosidade." O autor
quer falar das manifestações físicas dos Espíritos, no número das quais
algumas há evidentemente pouco dignas de Espíritos superiores. pois que
assim teremos exatamente o que diz o Espiritismo. Indignas, porém, dos bons
Espíritos, não se pode considerar uma multidão de comunicações dadas pela
escrita, pela palavra, pela audição, etc., pois que tais comunicações seriam e
são dignas dos homens mais eminentes da Terra. O mesmo poderemos dizer
quanto às curas, aparições e um sem-número de fatos que os livros santos
citam em profusão como obra de anjos ou de santos. Se, pois, os anjos e os
santos produziram outrora fenômenos semelhantes, por que não os
produzirão hoje? Por que serem idênticos fatos julgados bruxaria nas mãos de
uns, enquanto nas mãos de outros se reputam santos milagres? Sustentar
semelhante tese é abdicar toda a lógica.
O autor da Pastoral labora em erro quando afirma que tais fenômenos são
inexplicáveis. O que se dá é justamente o contrário, isto é, hoje esses
fenômenos são perfeitamente explicados, tanto que se não consideram mais
como maravilhosos e sobrenaturais. Dado, porém, de barato que assim não
fora, tão lógico seria atribuí-los ao diabo, quanto era lógico noutros tempos
dar a este as honras de todos os fenômenos naturais, cuja causa então se
desconhecia.
Por papéis indignos devemos entender os que visam o mal e o ridículo, a
menos que queiramos qualificar de tal a obra salutar dos bons Espíritos, que
promovem o bem, encaminhando os homens para Deus, pela virtude.
(KARDEC, 1995, p. 146-147, b).
Nota - Ainda de uma carta de Montauban extraímos a narrativa seguinte:
"Tínhamos ocultado à Sra. G..., médium sonambúlico e vidente muito lúcido
– a morte do Dr. Demeure, em atenção à sua extrema sensibilidade. Sem
dúvida, secundando o nosso intuito, o bom médico também evitou
manifestar-se-lhe. A 10 de fevereiro reunimo-nos a convite dos guias, que
diziam querer aliviar a Sra. G... de uma luxação, em conseqüência da qual
muito sofria desde a véspera. Nada mais sabíamos, e longe estávamos de
pensar na surpresa que nos aguardava. Logo que essa senhora se mediunizou,
começou a soltar gritos lancinantes, mostrando o pé. Eis o que se passava: "A
Sra. G... via um Espírito curvado a seus pés com a fisionomia oculta, a fazer-
lhe fricções e massagens, exercendo de vez em quando uma tração
longitudinal sobre a parte luxada, exatamente como faria qualquer médico. A
operação era tão dolorosa, que a paciente vociferava empregando
movimentos desordenados.
"No entanto, a crise não foi longa e ao fim de uns dez minutos desapareciam
a inflamação e os traços da luxação, retomando o pé a sua aparência normal.
A Sra. G... estava curada! (KARDEC, 1995, p. 205, b).
Pergunta (a S. Luís). Qual a causa de a educação moral dos desencarnados
ser mais fácil que a dos encarnados? As relações pelo Espiritismo
estabelecidas entre homens e Espíritos dão azo a que estes últimos se
corrijam mais rapidamente sob a influência dos conselhos salutares, mais do
que acontece em relação aos encarnados, como se vê na cura das obsessões.
Resposta (Sociedade de Paris) . - O encarnado, em virtude da própria
natureza, está numa luta incessante devido aos elementos contrários de que se
compõe e que devem conduzi-lo ao seu fim providencial, reagindo um sobre
o outro.A matéria facilmente sofre o predomínio de um fluido exterior; se a
alma, com todo o poder moral de que é capaz, não reagir, deixar-se-á
dominar pelo intermediário do seu corpo, seguindo o impulso das influências
perversas que o rodeiam, e isso com facilidade tanto maior quanto os
invisíveis, que a subjugavam, atacam de preferência os pontos mais
vulneráveis, as tendências para a paixão dominante. (KARDEC, 1995, p.293,
b).
Vendo-se um Espírito insensível à ação da prece, será motivo para que se
deixe de orar por ele? - R. Não, porquanto, cedo ou tarde, a prece poderá
triunfar do seu endurecimento, sugerindo-lhe benéficos pensamentos. O
mesmo sucede com certos doentes nos quais a ação medicamentosa só se
torna sensível depois de muito tempo, e vice-versa. Compenetrando-nos bem
de que todos os Espíritos são suscetíveis de progresso, e que nenhum é fatal e
eternamente condenado, fácil nos será compreender a eficácia da prece em
quaisquer circunstâncias. Por mais ineficaz que ela possa parecer-nos à
primeira vista, o certo é que contém germens em si mesma, bastante
benéficos, para bem predisporem o Espírito, quando o não afetem
imediatamente. Erro seria, pois, desanimarmos por não colher dela imediato
resultado. (KARDEC, 1995, p. 342, b).
Este não passou de um pobre israelita de Vilna, falecido em maio de 1865.
Durante 30 anos mendigou com uma salva nas mãos. Por toda a cidade era
bem conhecida aquela voz que dizia: "Lembrai-vos dos pobres, das viúvas e
dos órfãos!" Por essa longa peregrinação Slizgol havia juntado 90.000 rublos,
não guardando, porém, para si um só copeque. Aliviava e curava os
enfermos; pagava o ensino de crianças pobres; distribuía aos necessitados a
comida que lhe davam. (KARDEC, 1995, p. 381, b).
Os dois doentes que curaste são a prova do que te afirmo, pois, no estado em
que estavam, só com remédios nada terias conseguido. Quando implorares
permissão a Deus para que os bons Espíritos te transmitam fluidos benéficos,
se não sentires um estremecimento involuntário, é que a tua prece não foi
bastante fervorosa para ser ouvida. É só nestas condições que a prece pode
tornar-se valiosa. Nem outra coisa resulta de dizer: "Deus Todo-Poderoso,
Pai de bondade e misericórdia infinita, permiti que os bons Espíritos me
assistam na cura de... Tende piedade dele, Senhor; restitui-lhe a saúde,
porque, sem vós, eu nada posso fazer. Seja feita a vossa vontade." Tens feito
bem em não desdenhar os humildes; a voz daquele que sofreu
resignadamente as misérias desse mundo, é sempre ouvida, e nenhum serviço
deixa jamais de ser recompensado. Agora, uma palavra a meu respeito,
confirmativa do que acima te disse: O Espiritismo te explica a minha
linguagem de Espírito, sem que aliás me seja preciso entrar em minúcias a tal
respeito. Outrossim, julgo inútil falar-te da minha existência anterior.
(KARDEC, 1995, p. 388-389, b).
"Eu vo-lo digo: Antes de tudo, importa dizer que era a segunda vez que eu
expiava a privação da vista. Na minha precedente existência, em princípios
do último século, fiquei cego aos 30 anos, em decorrência de excessos de
todo o gênero que, arruinando-me a saúde, me enfraqueceram o organismo.
Note-se que era já isso uma punição por abuso dos dons providenciais de que
fora largamente cumulado. Ao invés, porém, de me atribuir a causa original
dessa enfermidade, entendi de acusar a Providência, na qual, aliás, pouco
cria. Anatematizei Deus, reneguei-o, acusei-o, acrescentando que, se acaso
existisse, devia ser injusto e mau, por deixar assim penar as criaturas.
Entretanto, eu deveria dar-me ainda por feliz, isento como estava de
mendigar o pão, à feição de tantos outros míseros cegos como eu.
(KARDEC, 1995, p. 423, b).
Relação de passagens que se refere à cura/doenças e correlatos no
Análise do livro A Gênese Os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo
Data da Primeira Edição: 1868
Classificação adotada : c
Posição: 5º Livro
Edição traduzida para o português utilizada neste trabalho: nº 36
Ano: 1995
Tradutor: Guillon Ribeiro
Número de páginas desta edição: 422
Edição atual: 52ª/2012
Número de Citações: 23
Tais são, entre muitos, os fenômenos da vista dupla, da visão a distância, do
sonambulismo natural e artificial, dos efeitos psíquicos da catalepsia e da
letargia, da presciência, dos pressentimentos, das aparições, das
transfigurações, da transmissão do pensamento, da fascinação, das curas
instantâneas, das obsessões e possessões, etc. Demonstrando que esses
fenômenos repousam em leis naturais, como os fenômenos elétricos, e em
que condições normais se podem reproduzir, o Espiritismo derroca o império
do maravilhoso e do sobrenatural e, conseguintemente, a fonte da maior parte
das superstições. Se faz se creia na possibilidade de certas coisas
consideradas por alguns como quiméricas, também impede que se creia em
muitas outras, das quais ele demonstra a impossibilidade e a irracionalidade.
(KARDEC, 1995, p. 33, c).
Segundo essa maneira de ver, o princípio vital não seria mais do que uma
espécie particular de eletricidade, denominada eletricidade animal, que
durante a vida se desprende pela ação dos órgãos e cuja produção cessa,
quando da morte, por se extinguir tal ação. (KARDEC, 1995, p. 199, c).
As próprias curas instantâneas não são mais milagrosas, do que os outros
efeitos, dado que resultam da ação de um agente fluídico, que desempenha o
papel de agente terapêutico, cujas propriedades não deixam de ser naturais
por terem sido ignoradas até agora. (KARDEC, 1995, p. 266, c).
Quando se diz que um médico opera a cura de um doente, por meio de boas
palavras, enuncia-se uma verdade absoluta, pois que um pensamento bondoso
traz consigo fluidos reparadores que atuam sobre o físico, tanto quanto sobre
o moral. (KARDEC, 1995, p. 287, c).
Manifesta-se em diferentes graus, nos Espíritos encarnados, pelo fenômeno
da segunda vista, tanto no sonambulismo natural ou magnético, quanto no
estado de vigília. Conforme o grau de poder da faculdade, diz-se que a
lucidez é maior ou menor. Com o auxílio dessa faculdade é que certas
pessoas vêem o interior do organismo humano e descrevem as causas das
enfermidades. (KARDEC, 1995, p. 291, c).
Como se há visto, o fluido universal é o elemento primitivo do corpo carnal e
do perispírito, os quais são simples transformações dele. Pela identidade da
sua natureza, esse fluido, condensado no perispírito, pode fornecer princípios
reparadores ao corpo; o Espírito, encarnado ou desencarnado, é o agente
propulsor que infiltra num corpo deteriorado uma parte da substância do seu
envoltório fluídico. A cura se opera mediante a substituição de uma molécula
malsã por uma molécula sã. O poder curativo estará, na razão direta da
pureza da substância inoculada; mas, depende também da energia da vontade
que, quanto maior for, tanto mais abundante emissão fluídica provocará e
tanto maior força de penetração dará ao fluido. Depende ainda das intenções
daquele que deseje realizar a cura, seja homem ou Espírito. Os fluidos que
emanam de uma fonte impura são quais substâncias medicamentosas
alteradas.
32. - São extremamente variados os efeitos da ação fluídica sobre os doentes,
de acordo com as circunstâncias. Algumas vezes é lenta e reclama tratamento
prolongado, como no magnetismo ordinário; doutras vezes é rápida, como
uma corrente elétrica. Há pessoas dotadas de tal poder, que operam curas
instantâneas nalguns doentes, por meio apenas da imposição das mãos, ou,
até, exclusivamente por ato da vontade Entre os dois pólos extremos dessa
faculdade, há infinitos matizes. Todas as curas desse gênero são variedades
do magnetismo e só diferem pela intensidade e pela rapidez da ação. O
princípio é sempre o mesmo: o fluido, a desempenhar o papel de agente
terapêutico e cujo efeito se acha subordinado à sua qualidade e a
circunstâncias especiais.
33. - A ação magnética pode produzir-se de muitas maneiras: 1º pelo próprio
fluido do magnetizador; é o magnetismo propriamente dito, ou magnetismo
humano, cuja ação se acha adstrita à força e, sobretudo, à qualidade do
fluido;
2º pelo fluido dos Espíritos, atuando diretamente e sem intermediário sobre
um encarnado, seja para o curar ou acalmar um sofrimento, seja para
provocar o sono sonambúlico espontâneo, seja para exercer sobre o indivíduo
uma influência física ou moral qualquer. É o magnetismo espiritual, cuja
qualidade está na razão direta das qualidades do Espírito; (1) 3º pelos fluidos
que os Espíritos derramam sobre o magnetizador, que serve de veículo para
esse derramamento. É o magnetismo misto, semiespiritual, ou, se o
preferirem, humano-espiritual. Combinado com o fluido humano, o fluido
espiritual lhe imprime qualidades de que ele carece. Em tais circunstâncias, o
concurso dos Espíritos é amiúde espontâneo, porém, as mais das vezes,
provocado por um apelo do magnetizador.
34. - É muito comum a faculdade de curar pela influência fluídica e pode
desenvolver-se por meio do exercício; mas, a de curar instantaneamente, pela
imposição das mãos, essa é mais rara e o seu grau máximo se deve considerar
excepcional. No entanto, em épocas diversas e no seio de quase todos os
povos, surgiram indivíduos que a possuíam em grau eminente. Nestes últimos
tempos, apareceram muitos exemplos notáveis, cuja autenticidade não sofre
contestação. Uma vez que as curas desse gênero assentam num princípio
natural e que o poder de operá-las não constitui privilégio, o que se segue é
que elas não se operam fora da Natureza e que só são miraculosas na
aparência. (KARDEC, 1995, p. 294-295-296, c).
A obsessão que é um dos efeitos de semelhante ação, como as enfermidades e
todas as atribulações da vida, deve, pois, ser considerada como provação ou
expiação e aceita com esse caráter. (KARDEC, 1995, p. 304, c).
Assim como as enfermidades resultam das imperfeições físicas que tornam o
corpo acessível às perniciosas influências exteriores, a obsessão decorre
sempre de uma imperfeição moral, que dá ascendência a um Espírito mau, A
uma causa física, opõe-se uma força física; a uma causa moral preciso é se
contraponha uma força moral. Para preservá-lo das enfermidades, fortificasse
o corpo; para garanti-la contra a obsessão, tem-se que fortalecer a alma;
donde, para o obsidiado, a necessidade de trabalhar por se melhorar a si
próprio, o que as mais das vezes basta para livrá-lo do obsessor, sem o
socorro de terceiros. Necessário se torna este socorro, quando a obsessão
degenera em subjugação e em possessão, porque nesse caso o paciente não
raro perde a vontade e o livre-arbítrio. (KARDEC, 1995, p. 305, c).
Nos casos de obsessão grave, o obsidiado fica como que envolto e
impregnado de um fluido pernicioso, que neutraliza a ação dos fluidos
salutares e os repele. É daquele fluido que importa desembaraçá-lo, Ora, um
fluído mau não pode ser eliminado por outro igualmente mau. Por meio de
ação idêntica à do médium curador, nos casos de enfermidade, preciso se faz
expelir um fluido mau com o auxílio de um fluido melhor.
Nem sempre, porém, basta esta ação mecânica; cumpre, sobretudo, atuar
sobre o ser inteligente, ao qual é preciso se possua o direito de falar com
autoridade, que, entretanto, falece a quem não tenha superioridade moral,
Quanto maior esta for, tanto maior também será aquela. (KARDEC, 1995, p.
305, c).
São numerosos os fatos deste gênero, em diferentes graus de intensidade, e
não derivam de outra causa muitos casos de loucura. Amiúde, há também
desordens patológicas, que são meras conseqüências e contra as quais nada
adiantam os tratamentos médicos, enquanto subsiste a causa originária.
Dando a conhecer essa fonte donde provém uma parte das misérias humanas,
o Espiritismo indica o remédio a ser aplicado: atuar sobre o autor do mal que,
sendo um ser inteligente, deve ser tratado por meio da inteligência.
(KARDEC, 1995, p. 307, c).
São as mais das vezes individuais a obsessão e a possessão; mas, não raro são
epidêmicas. Quando sobre uma localidade se lança uma revoada de maus
Espíritos, é como se uma tropa de inimigos a invadisse. Pode então ser muito
considerável o número dos indivíduos atacados. (KARDEC, 1995, p. 308, c).
Agiria como médium nas curas que operava? Poder-se-á considerá-lo
poderoso médium curador? Não, porquanto o médium é um intermediário,
um instrumento de que se servem os Espíritos desencarnados e o Cristo não
precisava de assistência, pois que era ele quem assistia os outros. Agia por si
mesmo, em virtude do seu poder pessoal, como o podem fazer, em certos
casos, os encarnados, na medida de suas forças. Que Espírito, ao demais,
ousaria insuflar-lhe seus próprios pensamentos e encarregá-lo de os
transmitir? Se algum influxo estranho recebia, esse só de Deus lhe poderia
vir. Segundo definição dada por um Espírito, ele era médium de Deus.
(KARDEC, 1995, p. 311, c).
Então, uma mulher, que havia doze anos sofria de uma hemorragia; - que
sofrera muito nas mãos dos médicos e que, tendo gasto todos os seus haveres,
nenhum alívio conseguira, - como ouvisse falar de Jesus, veio com a
multidão atrás dele e lhe tocou as vestes, porquanto, dizia: Se eu conseguir ao
menos lhe tocar nas vestes, ficarei curada. - No mesmo instante o fluxo
sangüíneo lhe cessou e ela sentiu em seu corpo que estava curada daquela
enfermidade. Logo, Jesus, conhecendo em si mesmo a virtude que dele saíra,
se voltou no meio da multidão e disse: Quem me tocou as vestes? - Seus
discípulos lhe disseram: Vês que a multidão te aperta de todos os lados e
perguntas quem te tocou? – Ele olhava em torno de si à procura daquela que
o tocara.
A mulher, que sabia o que se passara em si, tomada de medo e pavor, veio
lançar-se-lhe aos pés e lhe declarou toda a verdade. - Disse-lhe Jesus: Minha
filha, tua fé te salvou; vai em paz e fica curada da tua enfermidade. (S.
Marcos, cap. V, vv. 25 a 34.)
Estas palavras: conhecendo em si mesmo a virtude que dele saíra, são
significativas. Exprimem o movimento fluídico que se operara de Jesus para
a doente; ambos experimentaram a ação que acabara de produzir-se. É de
notar-se que o efeito não foi provocado por nenhum ato da vontade de Jesus;
não houve magnetização, nem imposição das mãos. Bastou a irradiação
fluídica normal para realizar a cura.
Mas, por que essa irradiação se dirigiu para aquela mulher e não para outras
pessoas, uma vez que Jesus não pensava nela e tinha a cercá-lo a multidão?
É bem simples a razão. Considerado como matéria terapêutica, o fluido tem
que atingir a matéria orgânica, a fim de repará-la; pode então ser dirigido
sobre o mal pela vontade do curador, ou atraído pelo desejo ardente, pela
confiança, numa palavra: pela fé do doente. Com relação à corrente fluídica,
o primeiro age como uma bomba calcante e o segundo como uma bomba
aspirante. Algumas vezes, é necessária a simultaneidade das duas ações;
doutras, basta uma só. O segundo caso foi o que ocorreu na circunstância de
que tratamos.
Razão, pois, tinha Jesus para dizer: «Tua fé te salvou.» Compreende-se que a
fé a que ele se referia não é uma virtude mística, qual a entendem, muitas
pessoas, mas uma verdadeira força atrativa, de sorte que aquele que não a
possui opõe à corrente fluídica uma força repulsiva, ou, pelo menos, uma
força de inércia, que paralisa a ação. Assim sendo, também, se compreende
que, apresentando-se ao curador dois doentes da mesma enfermidade, possa
um ser curado e outro não. É este um dos mais importantes princípios da
mediunidade curadora e que explica certas anomalias aparentes, apontando
lhes uma causa muito natural. (KARDEC, 1995, p. 315-316, c).
Tendo chegado a Betsaida, trouxeram-lhe um cego e lhe pediam que o
tocasse. Tomando o cego pela mão, ele o levou para fora do burgo, passou-
lhe saliva nos olhos e, havendo-lhe imposto as mãos, lhe perguntou se via
alguma coisa. – O homem, olhando; disse: Vejo a andar homens que me
parecem árvores. - Jesus lhe colocou de novo as mãos sobre os olhos e ele
começou a ver melhor. Afinal, ficou tão perfeitamente curado, que via
distintamente todas as coisas. - Ele o mandou para casa, dizendo-lhe: Vai
para tua casa; se entrares no burgo, a ninguém digas o que se deu contigo. (S.
Marcos, cap. VIII, vv. 22 a 26.)
Aqui, é evidente o efeito magnético; a cura não foi instantânea, porém
gradual e conseqüente a uma ação prolongada e reiterada, se bem que mais
rápida do que na magnetização ordinária. A primeira sensação que o homem
teve foi exatamente a que experimentam os cegos ao recobrarem a vista. Por
um efeito de óptica, os objetos lhes parecem de tamanho exagerado.
Tendo subido para uma barca, Jesus atravessou o lago e veio à sua cidade
(Cafarnaum). - Como lhe apresentassem um paralítico deitado em seu leito,
Jesus, notando-lhe a fé, disse ao paralítico: Meu filho, tem confiança;
perdoados te são os teus pecados.
Logo alguns escribas disseram entre si: Este homem blasfema. - Jesus, tendo
percebido o que eles pensavam, perguntou-lhes: Por que alimentais maus
pensamentos em vossos corações? - Pois, que é mais fácil dizer: - Teus
pecados te são perdoados, ou dizer: Levanta-te e anda? Ora, para que saibais
que o Filho do homem tem na Terra o poder de remitir os pecados: Levanta-
te, disse então ao paralítico, toma o teu leito e vai para tua casa.
O paralítico se levantou imediatamente e foi para sua casa. Vendo aquele
milagre, o povo se encheu de temor e rendeu graças a Deus, por haver
concedido tal poder aos homens.
Que significariam aquelas palavras: «Teus pecados te são remitidos» e em
que podiam elas influir para a cura? O Espiritismo lhes dá a explicação, como
a uma infinidade de outras palavras incompreendidas até hoje. Por meio da
pluralidade das existências, ele ensina que os males e aflições da vida são
muitas vezes expiações do passado, bem como que sofremos na vida presente
as conseqüências das faltas que cometemos em existência anterior e, assim,
até que tenhamos pago a dívida de nossas imperfeições, pois que as
existências são solidárias umas com as outras. Se, portanto, a enfermidade
daquele homem era uma expiação do mal que ele praticara, o dizer-lhe Jesus:
«Teus pecados te são remitidos» equivalia a dizer-lhe: «Pagaste a tua dívida;
a fé que agora possuís elidiu a causa da tua enfermidade; conseguintemente,
mereces ficar livre dela.» Daí o haver dito aos escribas: «Tão fácil é dizer:
Teus pecados te são perdoados, como: Levanta-te e anda.» Cessada a causa, o
efeito tem que cessar. É precisamente o caso do encarcerado a quem se
declara: «Teu crime está expiado e perdoado», o que eqüivaleria a se lhe
dizer: «Podes sair da prisão.»
Um dia, indo ele para Jerusalém, passava pelos confins da Samaria e da
Galiléia - e, estando prestes a entrar numa aldeia, dez leprosos vieram ao seu
encontro e, conservando-se afastados, clamaram em altas vozes: Jesus,
Senhor nosso, tem piedade de nós. - Dando com eles, disse-lhes Jesus: Ide
mostrar-vos aos sacerdotes.
Quando iam a caminho, ficaram curados.
Um deles, vendo-se curado, voltou sobre seus passos, glorificando a Deus em
altas vozes; - e foi lançar-se aos pés de Jesus, com o rosto em terra, a lhe
render graças. Esse era samaritano.
Disse então Jesus: Não foram curados todos dez? Onde estão os outros nove?
- Nenhum deles houve que voltasse e glorificasse a Deus, a não ser este
estrangeiro? -
E disse a esse: Levanta-te; vai; tua fé te salvou. (S. Lucas, capítulo XVII, vv.
11 a 19.)
Os samaritanos eram cismáticos, mais ou menos como os protestantes com
relação aos católicos, e os judeus os tinham em desprezo, como heréticos.
Curando indistintamente os judeus e os samaritanos, dava Jesus, ao mesmo
tempo, uma lição e um exemplo de tolerância; e fazendo ressaltar que só o
samaritano voltara a glorificar a Deus, mostrava que havia nele maior soma
de verdadeira fé e de reconhecimento, do que nos que se diziam ortodoxos.
Acrescentando: «Tua fé te salvou», fez ver que Deus considera o que há no
âmago do coração e não a forma exterior da adoração. Entretanto, também os
outros tinham sido curados. Fora mister que tal se verificasse, para que ele
pudesse dar a lição que tinha em vista e tornar-lhes evidente a ingratidão.
Quem sabe, porém, o que daí lhes haja resultado; quem sabe se eles terão se
beneficiado da graça que lhes foi concedida? Dizendo ao samaritano: «Tua fé
te salvou», dá Jesus a entender que o mesmo não aconteceu aos outros.
Doutra vez entrou Jesus no templo e aí encontrou um homem que tinha seca
uma das mãos. - E eles o observavam para ver se ele o curaria em dia de
sábado, para terem um motivo de o acusar. - Então, disse ele ao homem que
tinha a mão seca:
Levanta-te e coloca-te ali no meio. - Depois, disse-lhes: É permitido em dia
de sábado fazer o bem ou mal, salvar a vida ou tirá-la? Eles permaneceram
em silêncio. - Ele, porém, encarando-os com indignação, tanto o afligia a
dureza de seus corações, disse
ao homem: Estende a tua mão. Ele a estendeu e ela se tornou sã.
Logo os fariseus saíram e se reuniram contra ele em conciliábulo com os
herodianos, sobre o meio de o perderem. - Mas, Jesus se retirou com seus
discípulos para o mar, acompanhando-o grande multidão de povo da Galiléia
e da Judéia – de Jerusalém, da Iduméia e de além Jordão; e os das cercanias
de Tiro e de Sídon, tendo ouvido falar das coisas que ele fazia, vieram em
grande número ao seu encontro. (S. Marcos, cap. III, vv. 1 a 8.)
(KARDEC, 1995, p. 318-319-320, c).
Todos os dias de sábado Jesus ensinava numa sinagoga. - Um dia, viu ali uma
mulher possuída de um Espírito que a punha doente, havia dezoito anos; era
tão curvada, que não podia olhar para cima. - Vendo-a, Jesus a chamou e lhe
disse: Mulher, estás livre da tua enfermidade. - Impôs-lhe ao mesmo tempo
as mãos e ela, endireitando-se, rendeu graças a Deus.
Mas, o chefe da sinagoga, indignado por haver Jesus feito uma cura em dia
de sábado, disse ao povo: Há seis dias destinados ao trabalho; vinde nesses
dias para serdes curados e não nos dias de sábado.
O Senhor, tomando a palavra, disse-lhe: Hipócrita, qual de vós não solta da
carga o seu boi ou seu jumento em dia de sábado e não o leva a beber? - Por
que então não se deveria libertar, em dia de sábado, dos laços que a
prendiam, esta filha de Abraão, que Satanás conservara atada durante dezoito
anos?
A estas palavras, todos os seus adversários ficaram confusos e todo o povo
encantado de vê-lo praticar tantas ações gloriosas. (S. Lucas, cap. XIII, vv. 10
a 17.) Este fato prova que naquela época a maior parte das enfermidades era
atribuída ao demônio e que todos confundiam, como ainda hoje, os possessos
com os doentes, mas em sentido inverso, isto é, hoje, os que não acreditam
nos maus Espíritos confundem as obsessões com as moléstias patológicas.
Depois disso, tendo chegado a festa dos judeus, Jesus foi a Jerusalém. - Ora,
havia em Jerusalém a piscina das ovelhas, que se chama em hebreu Betesda,
a qual tinha cinco galerias - onde, em grande número, se achavam deitados
doentes, cegos, coxos e os que tinham ressecados os membros, todos à espera
de que as águas fossem agitadas - Porque, o anjo do Senhor, em certa época,
descia àquela piscina e lhe movimentava a água e aquele que fosse o primeiro
a entrar nela, depois de ter sido movimentada a água, ficava curado, qualquer
que fosse a sua doença.
Ora, estava lá um homem que se achava doente havia trinta e oito anos. -
Jesus, tendo-o visto deitado e sabendo-o doente desde longo tempo,
perguntou-lhe: Queres ficar curado? - O doente respondeu: Senhor, não tenho
ninguém que me lance na piscina depois que a água for movimentada; e,
durante o tempo que levo para chegar lá, outro desce antes de mim. - Disse-
lhe Jesus: Levanta-te, toma o teu leito e vai-te. - No mesmo instante o homem
se achou curado e, tomando de seu leito, pôs-se a andar. Ora, aquele dia era
um sábado.
Disseram então os judeus ao que fora curado: Não te é permitido levares o
teu leito. - Respondeu o homem: Aquele que me curou disse: Toma o teu
leito e anda. - Perguntaram-lhe eles então: Quem foi esse que te disse: Toma
o teu leito e anda? - Mas, nem mesmo o que fora curado sabia quem o curara,
porquanto Jesus se retirara
do meio da multidão que lá estava.
Depois, encontrando aquele homem no templo, Jesus lhe disse: Vês que foste
curado; não tornes de futuro a pecar, para que te não aconteça coisa pior.
O homem foi ter com os judeus e lhes disse que fora Jesus quem o curara. –
Era por isso que os judeus perseguiam a Jesus, porque ele fazia essas coisas
em dia de sábado. - Então, Jesus lhes disse: Meu Pai não cessa de obrar até ao
presente e eu também obro incessantemente. (S. João, cap. V, vv. 1 a 17.)
«Piscina» (da palavra latina piscis, peixe), entre os romanos, eram chamados
os reservatórios ou viveiros onde se criavam peixes. Mais tarde, o termo se
tornou extensivo aos tanques destinados a banhos em comum. A piscina de
Betesda, em Jerusalém, era uma cisterna, próxima ao Templo, alimentada por
uma fonte natural, cuja água parece ter tido propriedades curativas. Era, sem
dúvida, uma fonte intermitente que, em certas épocas, jorrava com força,
agitando a água. Segundo a crença vulgar, esse era o momento mais propício
às curas. Talvez que, na realidade, ao brotar da fonte a água, mais ativas
fossem as suas propriedades, ou que a agitação que o jorro produzia na água
fizesse vir à tona a vasa salutar para algumas moléstias. Tais efeitos são
muito naturais e perfeitamente conhecidos hoje; mas, então, as ciências
estavam pouco adiantadas e à maioria dos fenômenos incompreendidos se
atribuíam uma causa sobrenatural. Os judeus, pois, tinham a agitação da água
como devida à presença de um anjo e tanto mais fundadas lhes pareciam
essas crenças, quanto viam que, naquelas ocasiões, mais curativa se mostrava
a água.
Depois de haver curado aquele paralítico, disse-lhe Jesus: «Para o futuro não
tornes a pecar, a fim de que não te aconteça coisa pior.» Por essas palavras,
deu-lhe a entender que a sua doença era uma punição e que, se ele não se
melhorasse, poderia vir a ser de novo punido e com mais rigor, doutrina essa
inteiramente conforme à do Espiritismo.
Jesus como que fazia questão de operar suas curas em dia de sábado, para ter
ensejo de protestar contra o rigorismo dos fariseus no tocante à guarda desse
dia. Queria mostrar-lhes que a verdadeira piedade não consiste na
observância das práticas exteriores e das formalidades; que a piedade está nos
sentimentos do coração. Justificava-se, declarando: «Meu Pai não cessa de
obrar até ao presente e eu também obro incessantemente.» Quer dizer: Deus
não interrompe suas obras, nem sua ação sobre as coisas da Natureza, em dia
de sábado. Ele não deixa de fazer que se produza tudo quanto é necessário à
vossa alimentação e à vossa saúde; eu lhe sigo o exemplo.
Ao passar, viu Jesus um homem que era cego desde que nascera; - e seus
discípulos lhe fizeram esta pergunta: Mestre, foi pecado desse homem, ou
dos que o puseram no mundo, que deu causa a que ele nascesse cego? - Jesus
lhes respondeu:
Não é por pecado dele, nem dos que o puseram no mundo; mas, para que nele
se patenteiem as obras do poder de Deus. É preciso que eu faça as obras
daquele que me enviou, enquanto é dia; vem depois a noite, na qual ninguém
pode fazer obras. – Enquanto estou no mundo, sou a luz do mundo.
Tendo dito isso, cuspiu no chão e, havendo feito lama com a sua saliva, ungiu
com essa lama os olhos do cego - e lhe disse: Vai lavar-te na piscina de Siloé,
que significa Enviado. Ele foi, lavou-se e voltou vendo claro.
Seus vizinhos e os que o viam antes a pedir esmolas diziam: Não é este o que
estava assentado e pedia esmola? Uns respondiam: É ele; outros diziam: Não,
é um que se parece com ele. O homem, porém, lhes dizia: Sou eu mesmo. -
Perguntaram-lhe então: Como se te abriram os olhos? - Ele respondeu:
Aquele homem que se chama Jesus fez um pouco de lama e passou nos meus
olhos, dizendo: Vai à piscina de Siloé
e lava-te. Fui, lavei-me e vejo. - Disseram--lhe: Onde está ele? Respondeu o
homem: Não sei. Levaram então aos fariseus o homem que estivera cego. -
Ora, fora num dia de sábado que Jesus fizera aquela lama e lhe abrira os
olhos.
Também os fariseus o interrogaram para saber como recobrara a vista. Ele
lhes disse: Ele me pôs lama nos olhos, eu me lavei e vejo. - Ao que alguns
fariseus retrucaram: Esse homem não é enviado de Deus, pois que não guarda
o sábado. Outros, porém, diziam: Como poderia um homem mau fazer
prodígios tais? Havia, a propósito, dissensão entre eles. Disseram de novo ao
que fora cego: E tu, que dizes desse homem que te abriu os olhos? Ele
respondeu: Digo que é um profeta. - Mas, os judeus não acreditaram que
aquele homem houvesse estado cego e que houvesse recobrado a vista,
enquanto não fizeram vir o pai e a mãe dele - e os interrogaram assim: É este
o vosso filho, que dizeis ter nascido cego? Como é que ele agora vê? - O pai
e a mãe responderam: Sabemos que esse é nosso filho e que nasceu cego; -
não sabemos, porém, como agora vê e tampouco sabemos quem lhe abriu os
olhos. Interrogai-o; ele já tem idade, que responda por si mesmo. Seu pai e
sua mãe falavam desse modo, porque temiam os judeus, visto que estes já
haviam resolvido em comum que quem quer que reconhecesse a Jesus como
sendo o Cristo seria expulso da sinagoga. - Foi o que obrigou o pai e a mãe
do rapaz a responderem: Ele já tem idade; interrogai-o. Chamaram segunda
vez o homem que estivera cego e lhe disseram: Glorifica a Deus; sabemos
que esse homem é um pecador. Ele lhes respondeu: Se é um pecador, não sei,
tudo o que sei é que estava cego e agora vejo. - Tornaram a perguntar-lhe:
Que te fez ele e como te abriu os olhos? - Respondeu o homem: Já vo-lo
disse e bem o ouvistes; por que quereis ouvi-lo segunda vez? Será que
queirais tornar-vos seus discípulos? - Ao que eles o carregaram de injúrias e
lhe disseram: Sê tu seu discípulo; quanto a nós, somos discípulos de Moisés.
- Sabemos que Deus falou a Moisés, ao passo que este não sabemos donde
saiu.
O homem lhes respondeu: É de espantar que não saibais donde ele é e que ele
me tenha aberto os olhos. - Ora, sabemos que Deus não exalça os pecadores;
mas, àquele que o honre e faça a sua vontade, a esse Deus exalça. - Desde
que o mundo existe, jamais se ouviu dizer que alguém tenha aberto os olhos a
um cego de nascença.
- Se esse homem não fosse um enviado de Deus, nada poderia fazer de tudo o
que tem feito.
Disseram-lhe os fariseus: Tu és todo pecado, desde o ventre de tua mãe, e
queres ensinar-nos a nós? E o expulsaram. (S. João, cap. IX, vv. 1 a 34.) 25. -
Esta narrativa, tão simples e singela, traz em si evidente o cunho da
veracidade. Nada aí há de fantasista, nem de maravilhoso. É um cena da vida
real apanhada em flagrante. A linguagem do cego é exatamente a desses
homens simples, nos quais o bom-senso supre a falta de saber e que retrucam
com bonomia aos argumentos de seus adversários, expendendo razões a que
não faltam justeza, nem oportunidade. O tom dos fariseus, por outro lado, é o
dos orgulhosos que nada admitem acima de suas inteligências e que se
enchem de indignação à só idéia de que um homem do povo lhes possa fazer
observações. Afora a cor local dos nomes, dir-se-ia ser do nosso tempo o
fato.
Ser expulso da sinagoga eqüivalia a ser posto fora da Igreja. Era uma espécie
de excomunhão. Os espíritas, cuja doutrina é a do Cristo de acordo com o
progresso das luzes atuais, são tratados como os judeus que reconheciam em
Jesus o Messias. Excomungando-os, a Igreja os põe fora de seu seio, como
fizeram os escribas e os fariseus com os seguidores do Cristo. Assim, aí está
um homem que é expulso porque não pode admitir seja um possesso do
demônio aquele que o curara e porque rende graças a Deus pela sua cura!
Não é o que fazem com os espíritas? Obter dos Espíritos salutares conselhos,
a reconciliação com Deus e com o bem, curas, tudo isso é obra do diabo e
sobre os que isso conseguem lança-se anátema. Não se têm visto padres
declararem, do alto do púlpito, que é melhor uma pessoa conservar-se
incrédula do que recobrar a fé por meio do Espiritismo? Não há os que dizem
a doentes que estes não deviam ter procurado curar-se com os espíritas que
possuem esse dom, porque esse dom é satânico? Não há os que pregam que
os necessitados não devem aceitar o pão que os espíritas distribuem, por ser
do diabo esse pão? Que outra coisa diziam ou faziam os padres judeus e os
fariseus? Aliás, fomos avisados de que tudo hoje tem que se passar como ao
tempo do Cristo.
A pergunta dos discípulos: Foi algum pecado deste homem que deu causa a
que ele nascesse cego? revela que eles tinham a intuição de uma existência
anterior, pois, do contrário, ela careceria de sentido, visto que um pecado
somente pode ser causa de uma enfermidade de nascença, se cometido antes
do nascimento, portanto, numa existência anterior. Se Jesus considerasse
falsa semelhante idéia, ter-lhes-ia dito: «Como houvera este homem podido
pecar antes de ter nascido?» Em vez disso, porém, diz que aquele homem
estava cego, não por ter pecado, mas para que nele se patenteasse o poder de
Deus, isto é, para que servisse de instrumento a uma manifestação do poder
de Deus. Se não era uma expiação do passado, era uma provação apropriada
ao progresso daquele Espírito, porquanto Deus, que é justo, não lhe imporia
um sofrimento sem utilidade.
Quanto ao meio empregado para a sua cura, evidentemente aquela espécie de
lama feita de saliva e terra nenhuma virtude podia encerrar, a não ser pela
ação do fluido curativo de que fora impregnada. É assim que as mais
insignificantes substâncias, como a água, por exemplo, podem adquirir
qualidades poderosas e efetivas, sob a ação do fluido espiritual ou magnético,
ao qual elas servem de veículo, ou, se quiserem, de reservatório.
Jesus ia por toda a Galiléia, ensinando nas sinagogas, pregando o Evangelho
do reino e curando todos os langores e todas as enfermidades no meio do
povo. - Tendo-se a sua reputação espalhado por toda a Síria; traziam-lhe os
que estavam doentes e afligidos por dores e males diversos, os possessos, os
lunáticos, os paralíticos e ele a todos curava. - Acompanhava-o grande
multidão de povo da Galiléia, de Decápolis, de Jerusalém, da Judéia e de
além Jordão. (S. Mateus, cap. IV, vv. 23, 24, 25.)
De todos os fatos que dão testemunho do poder de Jesus, os mais numerosos
são, não há contestar, as curas. Queria ele provar dessa forma que o
verdadeiro poder é o daquele que faz o bem; que o seu objetivo era ser útil e
não satisfazer à curiosidade dos indiferentes, por meio de coisas
extraordinárias.
Aliviando os sofrimentos, prendia a si as criaturas pelo coração e fazia
prosélitos mais numerosos e sinceros, do que se apenas os maravilhasse com
espetáculos para os olhos. Daquele modo, fazia-se amado, ao passo que se se
limitasse a produzir surpreendentes fatos materiais, conforme os fariseus
reclamavam, a maioria das pessoas não teria visto nele senão um feiticeiro,
ou um mágico hábil, que os desocupados iriam apreciar para se distraírem.
Assim, quando João Batista manda, por seus discípulos, perguntar-lhe se ele
era o Cristo, a sua resposta não foi: «Eu o sou», como qualquer impostor
houvera podido dizer. Tampouco lhes fala de prodígios, nem de coisas
maravilhosas; responde-lhes simplesmente: «Ide dizer a João: os cegos vêem,
os doentes são curados, os surdos ouvem, o Evangelho é anunciado aos
pobres.» O mesmo era que dizer: «Reconhecei-me pelas minhas obras; julgai
da árvore pelo fruto», porquanto era esse o verdadeiro caráter da sua missão
divina.
O Espiritismo, igualmente, pelo bem que faz é que prova a sua missão
providencial. Ele cura os males físicos, mas cura, sobretudo, as doenças
morais e são esses os maiores prodígios que lhe atestam a procedência. Seus
mais sinceros adeptos não são os que se sentem tocados pela observação de
fenômenos extraordinários, mas os que dele recebem a consolação para suas
almas; os a quem liberta das torturas da dúvida; aqueles a quem levantou o
ânimo na aflição, que hauriram forças na certeza, que lhes trouxe, acerca do
futuro, no conhecimento do seu ser espiritual e de seus destinos. Esses os de
fé inabalável, porque sentem e compreendem.
Os que no Espiritismo unicamente procuram efeitos materiais, não lhe podem
compreender a força moral. Daí vem que os incrédulos, que apenas o
conhecem através de fenômenos cuja causa primária não admitem,
consideram os espírita". meros prestidigitadores e charlatães. Não será, pois,
por meio de prodígios que o Espiritismo triunfará da incredulidade será pela
multiplicação dos seus benefícios morais, porquanto, se é certo que os
incrédulos não admitem os prodígios, não menos certo é que conhecem,
como toda gente, o sofrimento e as aflições e ninguém recusa alívio e
consolação.
Vieram em seguida a Cafarnaum e Jesus, entrando primeiramente, em dia de
sábado, na sinagoga, os instruía. - Admiravam-se da sua doutrina, porque ele
os instruía como tendo autoridade e não como os escribas.
Ora, achava-se na sinagoga um homem possesso de um Espírito impuro, que
exclamou: - Que há entre ti e nós, Jesus de Nazaré? Vieste para nos perder?
Sei quem és: és o santo de Deus. - Jesus, porém, falando-lhe
ameaçadoramente, disse: Cala-te e sai desse homem. - Então, o Espírito
impuro, agitando o homem em violentas convulsões, saiu dele.
Ficaram todos tão surpreendidos que uns aos outros perguntavam: Que é
isto? Que nova doutrina é esta? Ele dá ordem com império, até aos Espíritos
impuros, e estes lhe obedecem. (S. Marcos, cap. I, vv. 21 a 27.) 30. - Tendo
eles saído, apresentaram-lhe um homem mudo, possesso do demônio. -
Expulso o demônio o mudo falou e o povo, tomado de admiração, dizia:
Jamais se viu coisa semelhante em Israel.
Mas os fariseus, ao contrário, diziam: É pelo príncipe dos demônios que ele
expele os demônios. (S. Mateus, capítulo IX, vv. 32 a 34.)
Quando ele foi vindo ao lugar onde estavam os outros discípulos, viu em
torno destes uma grande multidão de pessoas e muitos escribas que com eles
disputavam. - Logo que deu com Jesus, todo o povo se tomou de espanto e
temor e correram todos a saudá-lo.
Perguntou ele então: Sobre que disputáveis em assembléia? - Um homem, do
meio do povo, tomando a palavra, disse: Mestre, trouxe-te meu filho, que está
possesso de um Espírito mudo; - em todo lugar onde dele se apossa, atira-o
por terra e o menino espuma, rilha os dentes e se torna todo seco. Pedi a teus
discípulos que o expulsassem, mas eles não puderam.
Disse-lhes Jesus: Oh! gente incrédula, até quando estarei convosco? Até
quando vos suportarei? Trazei-mo. - Trouxeram-lho e ainda não havia ele
posto os olhos em Jesus, e o Espírito entrou a agitá-lo violentamente; ele caiu
no chão e se pôs a rolar espumando.
Jesus perguntou ao pai do menino: Desde quando isto lhe sucede? – Desde
pequenino, diz o pai. - E o Espírito o tem lançado, muitas vezes, ora à água,
ora ao fogo, para fazê-lo perecer; se alguma coisa puderes, tem compaixão de
nós e socorrenos.
Respondeu-lhe Jesus: Se puderes crer, tudo é possível àquele que crê. – Logo
exclamou o pai do menino, banhado em lágrimas: Senhor, creio, ajuda-me na
minha incredulidade.
Jesus, vendo que o povo acorria em multidão, falou em tom de ameaça ao
Espírito impuro, dizendo-lhe: Espírito surdo e mudo sai desse menino e não
entres mais nele. – Então, o Espírito, soltando grande grito e agitando o
menino em violentas convulsões, saiu, ficando como morto o menino, de
sorte que muitos diziam que ele morrera. – Mas Jesus, tomando-lhe as mãos e
amparando-o, fê-lo levantar-se. Quando Jesus voltou para casa, seus
discípulos lhe perguntaram, em particular: Por que não pudemos nós expulsar
esse demônio? - Ele respondeu: Os demônios desta espécie não podem ser
expulsos senão pela prece e pelo jejum. (S. Marcos, cap. IX, vv. 13 a 28.)
Apresentaram-lhe então um possesso cego e mudo e ele o curou, de modo
que o possesso começou a falar e a ver: - Todo o povo ficou presa de
admiração e dizia: Não é esse o filho de David?
Mas os fariseus, isso ouvindo, diziam: Este homem expulsa os demônios com
o auxílio de Belzebu, príncipe dos demônios.
Jesus, conhecendo-lhes os pensamentos, disse-lhes: Todo reino que se dividir
contra si mesmo será arruinado e toda cidade ou casa que se divide contra si
mesma não pode subsistir. - Se Satanás expulsa a Satanás, ele está dividido
contra si mesmo, como, pois, o seu reino poderá subsistir? - E, se é por
Belzebu que eu expulso os demônios, por quem os expulsarão vossos filhos?
Por isso, eles próprios serão os vossos juizes. - Se eu expulso os demônios
pelo Espírito de Deus, é que o reino de Deus veio até vós. (S. Mateus, cap.
XII, 22 a 28.)
Com as curas, as libertações de possessos figuram entre os mais numerosos
atos de Jesus. Alguns há, entre os fatos dessa natureza, como os acima
narrados, no nº 30, em que a possessão não é evidente. Provavelmente,
naquela época, como ainda hoje acontece, atribuía-se à influência dos
demônios todas as enfermidades cuja causa se não conhecia, principalmente a
mudez, a epilepsia e a catalepsia. Outros há, todavia, em que nada tem de
duvidosa a ação dos maus Espíritos, casos esses que guardam com os de que
somos testemunhas tão frisante analogia, que neles se reconhecem todos os
sintomas de tal gênero de afecção. A prova da participação de uma
inteligência oculta, em tal caso, ressalta de um fato material: são as múltiplas
curas radicais obtidas, nalguns centros espíritas, pela só evocação e
doutrinação dos Espíritos obsessores, sem magnetização, nem medicamentos
e, muitas vezes, na ausência do paciente e a grande distância deste. A imensa
superioridade do Cristo lhe dava tal autoridade sobre os Espíritos imperfeitos,
chamados então demônios, que lhe bastava ordenar se retirassem para que
não pudessem resistir a essa injunção. (Cap. XIV, nº 46.)
O fato de serem alguns maus Espíritos mandados meter-se em corpos de
porcos é o que pode haver de menos provável. Aliás, seria difícil explicar a
existência de tão numeroso rebanho de porcos num país onde esse animal era
tido em horror e nenhuma utilidade oferecia para a alimentação. Um Espírito,
porque mau, não deixa de ser um Espírito humano, embora tão imperfeito
que continue a fazer mal, depois de desencarnar, como o fazia antes, e é
contra todas as leis da Natureza que lhe seja possível fazer morada no corpo
de um animal. No fato, pois, a que nos referimos, temos que reconhecer a
existência de uma dessas ampliações tão comuns nos tempos de ignorância e
de superstição; ou, então, será uma alegoria destinada a caracterizar os
pendores imundos de certos Espíritos.
35. - Parece que, ao tempo de Jesus, eram em grande número, na Judéia, os
obsidiados e os possessos, donde a oportunidade que ele teve de curar a
muitos. Sem dúvida, os Espíritos maus haviam invadido aquele país e
causado uma epidemia de possessões. (Cap. XlV, nº 49.) Sem apresentarem
caráter epidêmico, as obsessões individuais são muitíssimo freqüentes e se
apresentam sob os mais variados aspectos que, entretanto, por um
conhecimento amplo do Espiritismo, facilmente se descobrem. Podem, não
raro, trazer conseqüências danosas à saúde, seja agravando afecções
orgânicas já existentes, seja ocasionando-as. Um dia, virão a ser,
incontestavelmente, arroladas entre as causas patológicas que requerem pela
sua natureza especial, especiais meios de tratamento. Revelando a causa do
mal, o Espiritismo rasga nova senda à arte de curar e fornece à Ciência eio de
alcançar êxito onde até hoje quase sempre vê malogrados seus esforços, pela
razão de não atender à primordial causa do mal. (O Livro dos Médiuns, 2ª
Parte, cap. XXIII.)
Os fariseus diziam que por influência dos demônios é que Jesus expulsava os
demônios; segundo eles, o bem que Jesus fazia era obra de Satanás; não
refletiam que, se Satanás expulsasse a si mesmo, praticaria rematada
insensatez. É de notar-se que os fariseus daquele tempo já pretendessem que
toda faculdade transcendente e, por esse motivo, reputada sobrenatural, era
obra do demônio, pois que, na opinião deles, era do demônio que Jesus
recebia o poder de que dispunha. É esse mais um ponto de semelhança
daquela com a época atual e tal doutrina é ainda a que a Igreja procura fazer
que prevaleça hoje, contra as manifestações espíritas.
(KARDEC, 1995, p. 320á 330, c).
Tendo Jesus passado novamente, de barca, para a outra margem, logo que
desembarcou, grande multidão se lhe apinhou ao derredor. Então, um chefe
de sinagoga, chamado Jairo, veio ao seu encontro e, ao aproximar-se dele, se
lhe lançou aos pés, - a suplicar com grande instância, dizendo: Tenho urna
filha que está no momento extremo; vem impor-lhe as mãos para a curar e lhe
salvar a vida.
Jesus foi com ele, acompanhado de grande multidão, que o comprimia.
Quando Jairo ainda falava, vieram pessoas que lhe eram subordinadas e lhe
disseram: Tua filha está morta; por que hás de dar ao Mestre o incômodo de
ir mais longe? - Jesus, porém, ouvindo isso, disse ao chefe da sinagoga: Não
te aflijas, crê apenas. - E a ninguém permitiu que o acompanhasse, senão a
Pedro, Tiago e João, irmão de Tiago.
Chegando a casa do chefe da sinagoga, viu ele uma aglomeração confusa de
pessoas que choravam e soltavam grandes gritos. - Entrando, disse-lhes ele:
Por que fazeis tanto alarido e por que chorais? Esta menina não está morta,
está apenas adormecida. - Zombavam dele. Tendo feito que toda a gente
saísse, chamou o pai emãe da menina e os que tinham vindo em sua
companhia e entrou no lugar onde a menina se achava deitada. - Tomou-lhe a
mão e disse: Talitha cumi, isto é: Minha filha, levanta-te, eu to ordeno. - No
mesmo instante a menina se levantou e se pôs a andar, pois contava doze
anos, e ficaram todos maravilhados e espantados. (S. Marcos, cap. V, vv. 21 a
43.)
No dia seguinte, dirigiu-se Jesus para uma cidade chamada Naim;
acompanhavam-no seus discípulos e grande multidão de povo. - Quando
estava perto
da porta da cidade, aconteceu que levavam a sepultar um morto, que era filho
único de sua mãe e essa mulher era viúva; estava com ela grande número de
pessoas da cidade. - Tendo-a visto, o Senhor se tomou de compaixão para
com ela e lhe disse: Não chores. - Depois, aproximando-se, tocou o esquife e
os que o conduziam pararam. Então, disse ele: Mancebo, levanta-te, eu o
ordeno. - Imediatamente, o moço se sentou e começou a falar. E Jesus o
restituiu à sua mãe. Todos os que estavam presentes ficaram tomados de
espanto e glorificavam a Deus, dizendo: Um grande profeta surgiu entre nós
e Deus visitou o seu povo. – O rumor desse milagre que ele fizera se
espalhou por toda a Judéia e por todas as regiões circunvizinhas. (S. Lucas,
cap. VII, vv. 11 a 17.)
Contrário seria às leis da Natureza e, portanto, milagroso, o fato de voltar à
vida corpórea um indivíduo que se achasse realmente morto. Ora, não há
mister se recorra a essa ordem de fatos, para ter-se a explicação das
ressurreições que Jesus operou.
Se, mesmo na atualidade, as aparências enganam por vezes os profissionais,
quão mais freqüentes não haviam de ser os acidentes daquela natureza, num
país onde nenhuma precaução se tomava contra eles e onde o sepultamento
era imediato (1). É, pois, de todo ponto provável que, nos dois casos acima,
apenas síncope ou letargia houvesse. O próprio Jesus declara positivamente,
com relação à filha de Jairo: Esta menina, disse ele, não está morta, está
apenas adormecida. Dado o poder fluídico que ele possuía, nada de espantoso
há em que esse fluido vivificante, acionado por uma vontade forte, haja
reanimado os sentidos em torpor; que haja mesmo feito voltar ao corpo o
Espírito, prestes a abandoná-lo, uma vez que o laço perispirítico ainda se não
rompera definitivamente. Para os homens daquela época, que consideravam
morto o indivíduo desde que deixara de respirar, havia ressurreição em casos
tais; mas, o que na realidade havia era rara e não ressurreição, na acepção
legítima do termo.
A ressurreição de Lázaro, digam o que disserem, de nenhum modo infirma
este princípio. Ele estava, dizem, havia quatro dias no sepulcro; sabe-se,
porém, que há letargias que duram oito dias e até mais. Acrescentam que já
cheirava mal, o que é sinal de decomposição. Esta alegação também nada
prova, dado que em certos indivíduos há decomposição parcial do corpo,
mesmo antes da morte, havendo em tal caso cheiro de podridão. A morte só
se verifica quando são atacados os órgãos essenciais à vida. E quem podia
saber que Lázaro já cheirava mal? Foi sua irmã Maria quem o disse. Mas,
como o sabia ela? Por haver já quatro dias que Lázaro fora enterrado, ela o
supunha; nenhuma certeza, entretanto, podia ter. (Cap. XlV, nº 29.) (1)
(KARDEC, 1995, p. 331 à 334, c).
3. - (Após a cura do lunático) - Todos ficaram admirados do grande poder de
Deus. E, estando todos presa de admiração pelo que Jesus fazia, disse ele a
seus discípulos: Guardai bem nos vossos corações o que vos vou dizer. O
Filho do homem tem que ser entregue às mãos dos homens. - Eles, porém,
não entendiam essa linguagem; ela lhes era de tal modo oculta que nada
compreendiam daquilo e temiam mesmo interrogá-lo a respeito. (S. Lucas,
cap. IX, vv. 44 e 45.) 4. - A partir de então, começou Jesus a revelar a seus
discípulos que tinha de ir a Jerusalém; que aí tinha de sofrer muito da parte
dos senadores, dos escribas e dos príncipes dos sacerdotes; que tinha de ser
morto e de ressuscitar ao terceiro dia. (S. Mateus, cap. XVI, v. 21.)
5. - Estando na Galiléia, disse-lhes Jesus: O Filho do homem tem que ser
entregue às mãos dos homens; - estes lhe darão morte e ele ressuscitará ao
terceiro dia, o que os afligiu extremamente. (S. Mateus, cap. XVIl, vv. 21 e
22.) (KARDEC, 1995, p. 372, c).
No mesmo dia, alguns fariseus vieram dizer-lhe: Vai-te, sai deste lugar, pois
Herodes quer dar-te à morte. Ele respondeu: Ide dizer a essa raposa: Ainda
tenho que expulsar os demônios e restituir a saúde aos doentes, hoje e
amanhã; no terceiro dia, serei consumado. (S. Lucas, capítulo XIII, vv. 31 e
32.) (KARDEC, 1995, p. 373, c).
Relação de passagens que se refere à cura/doenças e correlatos no
Análise do livro Obras Póstumas
Data da Primeira Edição: 1890
Classificação adotada : não necessário, única obra Kardequiana de edição 2005.
Posição: 6º Livro
Edição traduzida para o português utilizada neste trabalho: nº 37
Ano: 2005
Tradutor: Guillon Ribeiro
Número de páginas desta edição: 478
Edição atual: 40ª/2010
Número de Citações: 13
Sendo um dos elementos constitutivos do homem, o perispírito desempenha
importante papel em todos os fenômenos psicológicos e, até certo ponto, nos
fenômenos fisiológicos e patológicos. Quando as ciências médicas tiverem na
devida conta o elemento espiritual na economia do ser, terão dado grande
passo e horizontes inteiramente novos se lhes patentearão. As causas de
muitas moléstias serão a esse tempo descobertas e encontrados poderosos
meios de combatê-las. (KARDEC, 2005, p. 57).
Médiuns curadores — Consiste a mediunidade desta espécie na faculdade
que certas pessoas possuem de curar pelo simples contacto, pela imposição
das mãos, pelo olhar, por um gesto, mesmo sem o concurso de qualquer
medicamento. Semelhante faculdade incontestavelmente tem o seu princípio
na força magnética; difere desta, entretanto, pela energia e instantaneidade da
ação ao passo que as curas magnéticas exigem um tratamento metódico, mais
ou menos longo. Todos os magnetizadores são mais ou menos aptos a curar,
se sabem proceder convenientemente; dispõem da ciência que adquiriram.
Nos médiuns curadores, a faculdade é espontânea e alguns a possuem sem
nunca ter ouvido falar de magnetismo. A faculdade de curar pela imposição
das mãos deriva evidentemente de uma força excepcional de expansão, mas
diversas causas concorrem para aumentá-la, entre as quais são de colocar-se,
na primeira linha: a pureza dos sentimentos, o desinteresse, a benevolência, o
desejo ardente de proporcionar alívio, a prece fervorosa e a confiança em
Deus; numa palavra: todas as qualidades morais. A força magnética é
puramente orgânica; pode, como a força muscular, ser partilha de toda gente,
mesmo do homem perverso; mas, só o homem de bem se serve dela
exclusivamente para o bem, sem idéias ocultas de interesse pessoal, nem de
satisfação de orgulho ou de vaidade. Mais depurado, o seu fluido possui
propriedades benfazejas e reparadoras, que não pode ter o do homem vicioso
ou interesseiro. Todo efeito mediúnico, como já foi dito, resulta da
combinação dos fluidos que emitem um Espírito e um médium. Pela sua
conjugação esses fluidos adquirem propriedades novas, que separadamente
não teriam, ou, pelo menos, não teriam no mesmo grau. A prece, que é uma
verdadeira evocação, atrai os bons Espíritos sempre solícitos em secundar os
esforços do homem bem-intencionado; o fluido benéfico dos primeiros se
casa facilmente com o do segundo, ao passo que o do homem vicioso se junta
ao dos maus Espíritos que o cercam. O homem de bem, que não dispusesse
da força fluídica, pouca coisa conseguiria fazer por si mesmo, só lhe restando
apelar para a assistência dos Espíritos bons, pois quase nula seria a sua ação
pessoal; uma grande força fluídica, aliada à maior soma possível de
qualidades morais, pode operar, em matéria de curas, verdadeiros prodígios.
A ação fluídica, ao demais, é poderosamente secundada pela confiança do
doente, e Deus quase sempre lhe recompensa a fé, concedendo-lhe o bom
êxito. 54. Somente a superstição pode emprestar qualquer virtude a certas
palavras e unicamente Espíritos ignorantes ou mentirosos podem alimentar
semelhantes idéias, prescrevendo fórmulas. Pode, entretanto, acontecer que,
para pessoas pouco esclarecidas e incapazes de compreender as coisas
puramente espirituais, o uso de uma fórmula de prece ou de determinada
prática contribua a lhes infundir confiança. Nesse caso, porém, não é na
fórmula que está a eficácia e sim na fé que aumentou com a idéia ligada ao
emprego da fórmula. (KARDEC, 2005, p. 81-82-83).
Não se devem confundir os médiuns curadores com os médiuns receitistas,
que são simples médiuns escreventes, cuja especialidade consiste em
servirem mais facilmente de intérpretes aos Espíritos para as prescrições
médicas;absolutamente mais não fazem que transmitir o pensamento do
Espírito, sem exercerem, de si mesmos, nenhuma influência. (KARDEC,
2005, p. 83-84).
A obsessão consiste no domínio que os maus Espíritos assumem sobre certas
pessoas, com o objetivo de as escravizar e submeter à vontade deles, pelo
prazer que experimentam em fazer o mal. Quando um Espírito, bom ou mau,
quer atuar sobre um indivíduo, envolve-o, por assim dizer, no seu perispírito,
como se fora um manto. Interpenetrando-se os fluidos, os pensamentos e as
vontades dos dois se confundem e o Espírito, então, se serve do corpo do
indivíduo, como se fosse seu, fazendo-o agir à sua vontade, falar, escrever,
desenhar, quais os médiuns. Se o Espírito é bom, sua atuação é suave,
benfazeja, não impele o indivíduo senão à prática de atos bons; se é mau,
força-o a ações más. Se é perverso e malfazejo, aperta-o como numa teia,
paralisa-lhe até a vontade e mesmo o juízo, que ele abafa com o seu fluido,
como se abafa o fogo sob uma camada d’água. Fá-lo pensar, falar, agir em
seu lugar, impele-o, a seu mau grado, a atos extravagantes ou ridículos;
magnetiza-o, em suma, lança-o num estado de catalepsia moral e o indivíduo
se torna um instrumento da sua vontade. Tal a origem da obsessão, da
fascinação e da subjugação que se produzem em graus muito diversos de
integridade. (KARDEC, 2005, p. 84).
A ação magnética, no caso, tem por efeito introduzir no fluido do obsidiado
um fluido melhor e eliminar o do mau Espírito. Ao operar, deve o
magnetizador objetivar duplo fim: o de opor a uma força moral outra força
moral e produzir sobre o paciente uma espécie de reação química, para nos
servirmos de uma comparação material, expelindo um fluido com o auxílio
de outro fluido. Dessa forma, não só opera um desprendimento salutar, como
igualmente fortalece os órgãos enfraquecidos por longa e vigorosa constrição.
Compreende-se, em suma, que o poder da ação fluídica está na razão direta
não somente da energia da vontade, mas, sobretudo, da qualidade do fluido
introduzido e, segundo o que deixamos dito, que essa qualidade depende da
instrução e das qualidades morais do magnetizador. Daí se segue que um
magnetizador ordinário, que atuasse maquinalmente, apenas por magnetizar,
fraco ou nenhum efeito produziria. É de toda a necessidade um magnetizador
espírita, que atue com conhecimento de causa, com a intenção de obter, não o
sonambulismo ou uma cura orgânica, porém, os resultados que vimos de
descrever. É, além disso, evidente que uma ação magnética dirigida neste
sentido não pode deixar de ser muito proveitosa nos casos de obsessão
ordinária, porque, então, se o magnetizador tem a auxiliá-lo a vontade do
obsidiado, o Espírito se vê combatido por dois adversários em lugar de um.
Faz-se mister uma prece ardente, que seja ao mesmo tempo uma como
magnetização mental. Pelo pensamento, pode-se encaminhar para o paciente
uma corrente fluídica salutar, cuja potência guarda relação com a intenção. A
prece, pois, não tem apenas por efeito invocar um auxílio estranho, mas
exercer uma ação fluídica. O que uma pessoa, só, não pode fazer, podem-no,
quase sempre, muitas pessoas unidas pela intenção numa prece coletiva e
reiterada, visto que o número aumenta a potencialidade da ação. (KARDEC,
2005, p. 89-90).
A faculdade de expansão dos fluidos perispiríticos já está sobejamente
demonstrada pelas mais dolorosas operações cirúrgicas realizadas em doentes
adormecidos, quer pelo clorofórmio e o éter, quer pelo magnetismo animal.
Não raro, com efeito, estes últimos conversam de coisas agradáveis com os
assistentes, ou se transportam para longe, em Espírito, enquanto o corpo se
retorce com todas as aparências de estar experimentando as mais horríveis
torturas. A máquina humana, imobilizada no todo ou em parte, é retalhada
pelo escalpelo brutal do cirurgião, os músculos se agitam, crispam-se os
nervos e transmitem a sensação ao aparelho cérebro-espinhal; mas, a alma,
que é quem, no estado normal, sente a dor e a manifesta exteriormente,
afastada, por alguns momentos, do corpo sujeito à operação, dominada por
outras idéias, por outras ações, só muito surdamente é avisada do que se
passa no seu envoltório mortal e se conserva perfeitamente insensível.
Quantas vezes não se têm visto soldados gravemente feridos, absorvidos pelo
ardor do combate, a perder sangue e forças, combaterem por muito tempo
ainda, sem se aperceberem de seus ferimentos? Um homem vivamente
preocupado, recebe um golpe violento sem sentir coisa alguma, e só quando
cessa a abstração da sua inteligência, reconhece tê-lo atingido a sensação
dolorosa que experimenta. A quem não aconteceu ainda, durante uma
profunda contenção do Espírito, passar pelo meio de uma multidão
tumultuosa e ululante, sem nada ver, nem ouvir, embora o nervo óptico e o
aparelho auditivo hajam percebido e transmitido à alma as sensações? Pelos
casos que precedem e por uma imensidade de fatos que seria ocioso
reproduzir aqui, mas que a todos é possível conhecer e apreciar, torna-se fora
de dúvida que o corpo pode desempenhar suas funções orgânicas, estando
longe o Espírito, levado por preocupações de outra ordem. Indefinidamente
expansível, conservando ao corpo a elasticidade e a atividade necessárias à
sua existência, o perispírito acompanha constantemente o Espírito durante a
sua prolongada viagem pelo mundo ideal. (KARDEC, 2005, p. 101-102).
É assim que nas curas por imposição das mãos, o Espírito do médium pode
atuar por si só, ou com a assistência de outro Espírito; que a inspiração
poética ou artística pode ter dupla origem. Mas, do fato de ser difícil fazer-se
uma distinção como essa não se segue seja ela impossível. Não raro, a
dualidade é evidente e, em todos os casos, quase sempre ressalta de atenta
observação. (KARDEC, 2005, p. 114).
Esta se acha presa ao corpo por laços misteriosos que não nos fora dado
conhecer antes que o Espiritismo ouvesse demonstrado a existência e o papel
do perispírito. Tendo sido esta questão tratada de modo especial na Revista
Espírita e nas obras fundamentais da doutrina, não nos estenderemos aqui
sobre ela, limitando-nos a dizer que é pelos nossos órgãos materiais que a
alma se manifesta ao exterior. (KARDEC, 2005, p. 119).
Todos os efeitos do magnetismo, do sonambulismo, do êxtase, da dupla vista,
do hipnotismo, da catalepsia, da anestesia, da transmissão do pensamento, a
presciência, as curas instantâneas, as possessões, as obsessões, as aparições e
transfigurações, etc., que formam a quase totalidade dos milagres do
Evangelho, pertencem àquela categoria de fenômenos. (KARDEC, 2005, p.
152).
considerados sobrenaturais pela mesma razão que todos aqueles cuja causa
não se percebia. Isto explica por que todas as religiões tiveram seus milagres,
que mais não são que fatos naturais, quase sempre, orém, ampliados até ao
absurdo pela credulidade e reduzidos agora ao seu justo valor pelos
conhecimentos atuais, que permitem se destaque deles a parte devida à lenda.
A possibilidade da maioria dos fatos que o Evangelho cita como operados por
Jesus se acha hoje completamente demonstrada pelo Magnetismo e pelo
Espiritismo, como fenômenos naturais. Pois que eles se produzem às nossas
vistas, quer espontaneamente, quer quando provocados, nada há de anormal
em que Jesus possuísse faculdades idênticas às dos nossos magnetizadores,
curadores, sonâmbulos, videntes, médiuns, etc. Do momento em que essas
mesmas faculdades se encontram, em diferentes graus, numa multidão de
indivíduos que nada têm de divino, até em heréticos e idólatras, elas não
implicam, de maneira alguma, a existência de uma natureza sobre-humana.
(KARDEC, 2005, p. 153)
―Quando o bordão soar, abandoná-lo-eis; apenas aliviareis o vosso
semelhante; individualmente o magnetizareis, a fim de curá-lo. Depois, cada
um no posto que lhe foi preparado, porque de tudo se fará mister, pois que
tudo será destruído, ao menos temporariamente. (KARDEC, 2005, p. 337).
NOTA — B..., bem moço, era um médium escrevente muito maleável, mas
assistido por um Espírito muito orgulhoso e arrogante, que dava o nome de
Aristo e que lhe lisonjeava o amor-próprio. As previsões de Hahnemann se
realizaram. O moço, julgando ter na sua faculdade um meio de enriquecer, já
atendendo a consultas médicas, já realizando inventos e descobertas
produtivas, somente colheu decepções e mistificações. Passado algum tempo,
ninguém mais ouviu falar dele. (KARDEC, 2005, p. 342).
Então, o círculo vicioso em que se metem os mestres da vã filosofia mostrar-
se-á completamente, porquanto os novos campeões levam consigo não só um
facho, que é a inteligência desimpedida dos véus grosseiros, senão também
muitos dentre eles gozarão desse estado particular, que é privilégio das
grandes almas, como Jesus, e que dá o poder de curar e de operar essas
maravilhas chamadas milagres. (KARDEC, 2005, p.381).