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INTERIOR

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Page 1: Portfólio | Interior

INTERIOR

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Boa noite a todos, sejam bem-vindos. Em nome do Bagaceira eu agradeço a presença e, por favor, fiquem à vontade, recebam com carinho esse espetáculo, certo? Ele é cheio de afeto, que nem o bolo das avós todas. A gente passou pelo menos dois anos imaginando como seria a peça. Nesse tempo, o Bagaceira viajou por algumas cidades do interior do Ceará, que é o nosso estado, e nessas viagens a gente pôde ver paisagens, conviver com outros artistas, conhecer pessoas e histórias, um monte de histórias que são deles, mas são nossas e de vocês também, são de quem quiser, é só chegar... Precisa nem bater palma, basta entrar porque as portas estão abertas, sempre. Lá no interior é assim. E, como é impossível para o Bagaceira dar conta de tantas histórias lindas, a gente resolveu trazer essas velhas, porque elas, sim, dão conta de tudo. Elas são fogo, viu? De coitadinhas, elas não têm nada! Essas duas se embolaram tanto por gerações e gerações, que já nem sabem mais o que são, uma da outra. Avó e neta? Comadres? Vizinhas? Pra entender, só indo ao interior. Vamos?

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O Projeto Interior teve a duração de dois anos. Nesse período, o Bagaceira dividiu sua rotina de apresentações com viagens por algumas cidades do interior do Ceará. Foi um período de grande convivência do grupo com outros artistas, criando vínculos afetuosos, conhecendo pessoas e histórias, mergulhando no universo cultural que viria a inspirar o espetáculo. Patrocinado pelo Programa Petrobras Cultural, o projeto foi também composto por intercâmbios, apresentações no interior, mostras de repertório em Fortaleza (Rebagaça), manutenção da sede do grupo, montagem e estreia do espetáculo, dentre outras diversas atividades. Além das trocas com artistas cearenses, o grupo recebeu o ator francês Maurice Durozier (Théâtre du Soleil) e a atriz e diretora paulista Georgette Fadel, dois respeitados artistas que trouxeram provocações e contribuíram para a montagem da peça.

Entre novembro de 2012 e agosto de 2013 o grupo entrou em sala de ensaio para a montagem do espetáculo. Foram mais de 800 horas de ensaio. O processo foi colaborativo, os atores improvisavam cenas individuais e coletivas, e o dramaturgo Rafael Martins, criava o texto com esse material.

Depois de muita discussão, fechamos o foco temático do espetáculo na capacidade de resistir. Vimos que todos os agrupamentos visitados estão em busca de sobreviver, seja perpetuando uma tradição como os dramas e o reisado, seja existir para a sociedade, como os grupos de teatro de Tauá e Icó.

Para fechar o mote, percebemos que o teor dos encontros proporcionados pelas viagens foi sempre de conversa na beira da calçada, aquele jeito acolhedor que tornou o cearense famoso por todo o país. Yuri Yamamoto,o diretor do espetáculo, optou por uma encenação bem próxima da plateia, para manter a sensação que tivemos a cada encontro nas cidades. O público sentaria do lado dos atores numa relação intrínseca entre assistir e estar em cena ao mesmo tempo.

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Em todas as cidades a figura feminina sempre foi forte. Seja as dramistas, ou as líderes do assentamento da Lagoa do Mineiro.

Em Tauá,uma visita na casa de uma das avós da atriz Rebeca Lima, foi determinante para o espetáculo: o espetáculo iria contar a história de duas velhas que teimam em não serem enterradas pelo tempo ou pela morte.

Assim como a Igreja do distrito de Almofala em Itarema,que passou 50 anos coberta pelas dunas e foi desenterrada pelos índios Tremembés,essas velhas teimavam em fugir da sepultura.

O teor absurdo e fantástico da história remete também aos inúmeros “causos” nos relatados no Icó, como o da baleia adormecida na praça central da cidade e do vento que vem do Aracati para refrescar a população.

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Como seria impossível dar conta de tantas histórias lindas, o Bagaceira resolveu trazer para a cena duas velhinhas que insistem em não morrer. Essas velhinhas já cruzaram diversas gerações e sabem tudo a respeito da vida. Elas, sim, dão conta de todas as histórias possíveis e impossíveis. O resultado é um espetáculo irreverente e ao mesmo tempo singelo. Cheio de afeto, que nem o bolo das avós. As duas velhinhas conversam com plateia, cantam e contam histórias engraçadas. Uma peça que busca aconchegar, fazendo com que o público se sinta em casa. Uma homenagem do Grupo Bagaceira de Teatro aos artistas e à cultura do interior.

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O grupo Bagaceira de Teatro estreia amanhã (5) seu novo espetáculo, Interior. Com direção, cenário e figurino de Yuri Yamamoto, texto de Rafael Martins e patrocínio da Petrobras, o espetáculo foi desenvolvido com base nas andanças do grupo, durante dois anos, por quatro cidades do interior do Ceará: Itarema, Icó, Tauá e Beberibe.

Nesses municípios cearenses, o Bagaceira conviveu com outros artistas e conheceu pessoas e histórias novas. Em meios a tantos causos colhidos e observados, o grupo trouxe para a cena a história de duas velhinhas que insistem em não morrer. São senhoras que cruzaram várias gerações e sabem tudo a respeito da vida.

Durante o espetáculo, as velhinhas interagem e dialogam com a plateia, cantam e contam coisas engraçadas, dando conta de várias histórias possíveis e impossíveis. A ideia é uma apresentação irreverente e ao mesmo tempo singela. Uma peça que busca aconchegar, fazendo com que o público se sinta em casa.

A estreia do espetáculo aconteceu em Itarema, no final de setembro, e também circulou pelos outros municípios visitados pelo grupo. A peça traz no elenco os atores Samya de Lavor, Tatiana Amorim, Rafael Martins e Rogério Mesquita, que também assina a direção de produção. A preparação vocal do grupo foi feita pelo maestro Luis Carlos Prata.

O Projeto Interior teve a duração de dois anos, composto por intercâmbios, apresentações no interior, mostras de repertório em Fortaleza (Rebagaça), troca com importantes artistas, criação do espetáculo, dentre outras diversas atividades. Nesse período, o grupo recebeu o ator francês Maurice Durozier (Théâtre du Soleil) e a atriz e diretora paulista Georgette Fadel, dois respeitados artistas que trouxeram provocações e contribuíram para a montagem da peça.

Jornal O POVO04/10/2013

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A resistência dos afetos: Bagaceira estreia espetáculo "Interior"O grupo Bagaceira estreia hoje, em Fortaleza, novo espetáculo.

Interior é fruto de dois anos de pesquisa e laboratórios em quatro municípios do CearáImagens do novo trabalho do Bagaceira: espetáculo que vem "cheio de afeto", "que nem bolo de avó"om as cadeiras na calçada a desfiar histórias e afetos – de tanto se deparar com a imagem, vista com alguma facilidade nas paragens remotas do Ceará, o Grupo Bagaceira de Teatro desenvolveu ao longo de dois anos o espetáculo Interior, com estreia em Fortaleza marcada para as 19h de hoje.

A peça foi apresentada pela primeira vez no município de Itarema no último dia 22 e já passou por Icó, Tauá e Beberibe. Na Capital, fica em cartaz na sede do grupo, a Casa da Esquina, sempre aos sábados e domingos deste mês e de novembro. O projeto, aprovado no edital de manutenção de grupos e companhias da Petrobrás, foi financiado pela estatal e incluía uma fase de pesquisa e outra de montagem. Durante cerca de um ano e meio, o Bagaceira fez uma série de visitas a quatro cidades do interior – as mesmas que já receberam o espetáculo – onde foram realizados intercâmbios com artistas desses municípios.Nesse processo a gente viu que a questão da avó era muito latente, porque traz o clima do Interior, a coisa da cadeira na calçada, as conversas, os encontros. O espetáculo tem muito disso: a figura da avó, da nostalgia e da resistência”, diz Rogério Mesquita, ator e produtor da peça. Segundo ele, a persistência dos grupos que se mantêm em cidades cujo incentivo é rarefeito ganha alusão na peça quando as protagonistas, duas velhinhas já mortas, recusam-se a ser enterradas. A memória aparece nas narrativas partilhadas entre elas, cheias de causos e referências ao imaginário do Interior. O foco na figura feminina, matriarcal, remete às líderes de muitos dos grupos que o Bagaceira teve contato na fase de pesquisa. Caso das dramistas de Beberibe, das quais duas canções foram introduzidas ao espetáculo.

“A apresentação em Beberibe foi muito emocionante porque a gente canta duas músicas do grupo Acasos das Dramistas e, quando estivemos lá, elas foram assistir e cantaram junto com a gente”, conta Rogério. Ele ressalta ainda o contato com o reisado no assentamento Lagoa do Mineiro, em Itarema, com os índios Tremembés de Almofala, além da companhia de teatro Artes Cínicas, de Tauá.

A troca com esses grupos foi tão intensa que, se quisesse, o Bagaceira podia ter pensado um espetáculo para cada município. No entanto, a ideia era somar referências e aprendizados. “Nós tivemos a preocupação de não chegar nessas cidades para catequizar. ‘Somos de Fortaleza, viemos ensinar’. Não. Em cada lugar foi uma técnica diferente, uma troca, nós aprendemos muito com cada um. A gente viu que de fato temos uma cultura popular muito forte”, observa Rogério. “E o nosso interior não é aquele da visão romântica, que as pessoas são ingenuazinhas. Na verdade elas estão muito antenadas”, completa.

Estética

Além das músicas emprestadas das dramistas, há outros elementos em Interior baseados no período da pesquisa. Um dos mais relevantes diz muito da estética do espetáculo: as máscaras que envelhecem os atores. “Fiquei muito encantado com os caretas, os figurinos deles, as caracterizações que eles fazem com camisas, coco, borracha. São agricultores idosos, já, mas quando colocam as máscaras viram meninos”, explica Yuri Yamamoto, diretor do espetáculo e responsável pelo figurino. “A partir disso, eu quis fazer também uma máscara dessas velhas dentro dessa coisa da precariedade”, diz ele.

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O tempo contado por históriasEm Interior, o público é acolhido para uma experiência de busca do significado do envelhecimento

Dos espetáculos autorais do grupo Bagaceira de teatro, eu havia visto apenas O Realejo, no Theatro José de Alencar, e Lesados, no teatro do Centro Dragão do Mar. De ambos saíra tomado pela poética, pela sutileza da construção cênica, pela força dramatúrgica e pela expressividade dos atores. Agora, tive a agradável oportunidade de ver, na Casa da Esquina, a envolvente peça Interior, na qual o público é acolhido para uma experiência de busca do significado do envelhecimento por meio da transmissão da memória e da proximidade da morte.Com o cuidado de não idealizar a velhice, nem insinuar que a convivência com os mais velhos é coisa fácil, o Bagaceira trabalha com as personas da avó e da neta, ambas em faixas etárias caricaturalmente avançadas, para fazer girar conceitos sociais e aspectos da cultura do povo. Olhando para si mesmas, teimando em saber quem são, e não concordando com a condição de invisibilidade socialmente imposta aos idosos, as protagonistas têm na resistência à morte por inutilidade o centro da sua existência.

Essa impactante representação do descompasso entre as perspectivas de aceitação e de rejeição na vida humana é o resultado de interrogações que começaram sobre as razões de fazer teatro e avançaram, com apoio cultural da Petrobrás, para um encontro de perguntas e respostas em dois anos de residências artísticas vivenciadas no interior do Ceará com o Grupo de Teatro Ribeira, do Icó, a Companhia Artes Cínicas, de Tauá, a Casa das Dramistas de Beberibe e, em Itarema, com índios Tremembé e atores do assentamento Lagoa do Mineiro.

Com graciosa simplicidade e sofisticado impulso de emancipação emocional, a montagem, com texto de Rafael Martins e direção de Yuri Yamamoto, faz da interatuação dos atores com o público uma possibilidade de escuta do sussurro, do gemido e da inquietação das protagonistas para demonstrar que viver na velhice não é uma perda de tempo. As duas idosas, avó e neta, muito bem interpretadas pelas atrizes Samya de Lavor e Tatiana Amorim, embora vivam sempre de birra uma com a outra, não aceitam serem empurradas para a morte, com o conhecimento de quem cruzou várias gerações.A figura da avó, evocada pelo Bagaceira, colhida na ambiência interiorana, ganha universalidade quando evidencia aspectos do desperdício da experiência acumulada. O jogo cênico move as velhas e o tempo, como quem bate na porta de uma casa onde de presença fixa só há a pessoa idosa, enquanto o restante da família, no caso das tataranetas animadas por Rafael Martins e Rogério Mesquita, tem na casa apenas um lugar de passagem. O peso dessa realidade está representado por uma indumentária constituída de elementos que vão desde instrumento musical, tênis e bolsas com toda sorte de apetrechos, até máscaras de reisado.A fim de não serem enterradas vivas no caixão do esquecimento, elas apelam para a memória. O palco da peça é propício para esse tipo de ocupação na vida social, pois atores e público sentam lado a lado em arquibancadas, como se estivessem sentados em um banco de alpendre, comum nas casas do interior. O grupo Bagaceira oferece com esse recinto chegado um espaço de ação onde todos passam a ser personagens, quando o que está em cena é a necessidade dos velhos de contarem histórias. Mais do que causos, o ombro a ombro permite que se ouçam as subjetividades do que o outro tem para contar das suas verdades e mentiras.No esforço de contar do passado para se justificar no presente, as velhinhas da peça Interior solicitam às pessoas da plateia que anotem em um papel o nome de suas avós e onde elas nasceram. Colocam em um pequeno baú e fazem circular com fotografias e fatias de bolos, na tentativa de provar ao público que estão vivas. Descoladas, elas não repetem o padrão social do discurso de vítima; querem dizer que a experiência da velhice não é de incapacidade, que, mesmo produzindo limitações biológicas, o envelhecimento não é uma doença, e que o ancião não é um morto que ainda respira. Desvendando traços dessa relação complexa com a idade avançada, as personagens mostram que gente não tem data de validade a vencer. A plateia se emociona e ri um riso nervoso e amoroso de identificação e de reconhecimento.Em Interior, a avó e a neta, também centenária, foram crianças, adolescentes, adultos, velhos e chegaram ao estágio dos idosos, quando o tempo passa a ser contado não pelo calendário, mas por histórias. O espetáculo do grupo Bagaceira mexe com a verdade das nossas recordações, ao instigar a noção de que o idoso tem direito de se encontrar com a sua própria idade, sem necessariamente ficar confinado no passado.

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