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INSTITUTO OSWALDO CRUZ Pós-Graduação em Biologia Celular e Molecular Poliana Deolindo EXPOSIÇÃO DE FOSFATIDILSERINA EM AMASTIGOTAS INTRACELULARES DE Leishmania (L) amazonensis E SEU PAPEL NA MODULAÇÃO DA RESPOSTA MACROFÁGICA Tese apresentada ao Instituto Oswaldo Cruz como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutor em Biologia Celular e Molecular Orientador: Prof. Dr. Marcello André Barcinski RIO DE JANEIRO 2008

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INSTITUTO OSWALDO CRUZ Pós-Graduação em Biologia Celular e Molecular

Poliana Deolindo

EXPOSIÇÃO DE FOSFATIDILSERINA EM AMASTIGOTAS INTRACELULARES DE Leishmania (L) amazonensis E SEU PAPEL NA

MODULAÇÃO DA RESPOSTA MACROFÁGICA

Tese apresentada ao Instituto Oswaldo Cruz como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutor em Biologia Celular e Molecular

Orientador: Prof. Dr. Marcello André Barcinski

RIO DE JANEIRO 2008

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Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca de Ciências Biomédicas/ ICICT / FIOCRUZ - RJ

D418

Deolindo, Poliana

Exposição de fosfatidilserina em amastigotas intracelulares de leishmania (L) amazonensis e seu papel na modulação da resposta macrofágica / Poliana Deolindo. – Rio de Janeiro, 2008.

viii, 128 f. : il. ; 30 cm. Tese (doutorado) – Instituto Oswaldo Cruz, Biologia Celular e

Molecular, 2008. Bibliografia: f. 112-128

1. Leishmania amazonensis. 2. Mimetismo Apoptótico. 3. Fosfatidilserina. 4. Modulação Macrofágica. I. Título.

CDD 616.9364

INSTITUTO OSWALDO CRUZ Pós-Graduação em Biologia Celular e Molecular

AUTORA: Poliana Deolindo

EXPOSIÇÃO DE FOSFATIDILSERINA EM AMASTIGOTAS INTRACELULARES DE Leishmania (L) amazonensis E SEU PAPEL NA MODULAÇÃO

DA RESPOSTA MACROFÁGICA

ORIENTADOR: Prof. Dr. Marcello André Barcinski Aprovada em: 12/06/08 EXAMINADORES: Profa. Dra. Valéria de Matos Borges - Presidente Prof. Dr. Renato Augusto DaMatta Profa. Dra. Tecia Maria Ulisses de Carvalho Rio de Janeiro, 12 de junho de 2008.

Ao Bruno, meu companheiro,

meu amigo, meu porto.

ii

AGRADECIMENTOS

Ao Marcello. Pelo cientista: entusiasta, atualizado, realizado. Pelo turbilhão de idéias

despertado por ele em cada reunião de grupo, de onde era difícil sair sem pensar em fazer no

mínimo 3 novos experimentos. Pelo orientador, por embarcar comigo no caminho da biologia

celular, mesmo com tantas questões imunológicas que tinha curiosidade de ver resolvidas.

Pelo amigo, por acreditar em mim em momentos em que eu não consegui acreditar. Por me

fazer achar que valia a pena continuar.

Ao João Luiz. Difícil agradecer esse cara sem esquecer de alguma coisa que ele tenha

feito... parceiro de experimentos, de discussões, de indignações, de NY. Você é mais que um

colega de trabalho, é um grande amigo. Mengo!!!

Ao amigos do grupo PS: Jessica, Lúcia, Luíze, Fernando, Cassiana. Foi muito bom

trabalhar com vocês.

Às pessoas que colaboraram com a realização deste trabalho. À Jessica, meu braço

direito em vários experimentos, ao Fernando Real pelo auxílio nos experimentos para

demonstrar a exposição de PS em amastigota, ao Pedro Paulo e Bernardo pelo auxílio nos

experimentos com confocal, ao Rubem pelo empréstimo do microscópio com câmara

fotográfica, à Dra. Aldina Barral por preparar as lâminas de histopatologia de lesões em

camundongos.

Aos Bonomianos, por serem minha família quando cheguei ao Rio de Janeiro.

Aos amigos do peito Aline, Ana Paula, Gustavo, João Paulo, Júlia e Rafaela, Romulo

Areal (em ordem alfabética e não de importância). Esses estão guardados pra sempre e estarão

sempre perto, não importa quantos quilômetros de distância nos separe.

À Suely pelo carinho e pela eficiência com que faz o seu trabalho.

À minha família, minha base sólida e meu refúgio. À Suely, a extensão desta família

aqui no Rio de Janeiro.

Ao Bruno por seu carinho e compreensão e por aguentar as variações de humor

características do período pré-tese.

Aos colegas de laboratório, por manterem um ambiente harmonioso e divertido, onde

trabalhar se torna mais prazeroso.

iii

“... Há um lado lindo do conhecimento, que é o seu caráter indomável. É isso que, de certa maneira, encanta as pessoas que são pesquisadoras.

Você não tem como controlar o conhecimento, não tem como colocá-lo dentro de uma gaiola.

Ele é sempre explosivo, de uma potencialidade impressionante. Este é o lado bonito do pensamento:

de ser o hino eterno à liberdade do ser humano...”

Pedro Demo

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INSTITUTO OSWALDO CRUZ

EXPOSIÇÃO DE FOSFATIDILSERINA EM AMASTIGOTAS INTRACELULARES DE Leishmania (L) amazonensis E SEU PAPEL NA MODULAÇÃO DA RESPOSTA MACROFÁGICA

RESUMO TESE DE DOUTORADO Poliana Deolindo

Os macrófagos são as células preferenciais para a infecção e a proliferação de parasitas do gênero Leishmania. A sobrevivência do parasita e o desenvolvimento da infecção são resultado direto da evasão do parasita dos mecanismos microbicidas do hospedeiro. As formas amastigotas de Leishmania (L) amazonensis isoladas de lesões em camundongos expõem o fosfolipídio fosfatidilserina (PS) na face externa da sua membrana plasmática, um fenômeno descrito como Mimetismo Apoptótico. O reconhecimento deste fosfolipídio pelo macrófago induz a internalização do parasita por um mecanismo de macropinocitose, a produção de citocinas anti-inflamatórias IL-10 e TGF-β e inibe a produção de óxido nítrico (NO), contribuindo para o aumento da infectividade do parasita e sua proliferação na célula hospedeira. A exposição de PS na superfície das amastigotas pode ser modulada pelo hospedeiro: amastigotas isoladas de lesões em camundongos BALB/c expõem mais moléculas de PS na superfície que aquelas isoladas de camundongos C57BL/6. Neste trabalho demonstramos que amastigotas purificadas de macrófagos de camundongos BALB/c e C57BL/6 infectados in vitro não apresentam diferenças significativas na exposição de PS na superfície, sugerindo que as diferenças observadas no modelo in vivo são dependentes de uma ativação diferencial dos macrófagos no hospedeiro. Amastigotas isoladas de lesão em camundongos BALB/cnu/nu expõem menos PS na superfície que aquelas isoladas de lesões em camundongos BALB/c, indicando um papel das citocinas produzidas pelas células T na modulação da exposição de PS pelo parasita. Durante o processo de diferenciação de promastigota para amastigota no interior do vacúolo parasitóforo ocorre aumento na exposição de PS na superfície externa da membrana do parasita. Neste período, observamos indução de macropinocitose nos macrófagos infectados e fusão das vesículas macropinocíticas com o vacúolo contendo os parasitas, sugerindo que a exposição de PS pela amastigota intracelular pode sinalizar, via membrana do vacúolo parasitóforo, para maior aporte de nutrientes no vacúolo. Este processo é inibido após a alcalinização do vacúolo com cloroquina. A exposição de PS pela amastigota intracelular também induz a síntese de TGF-β e inibe a produção de NO pelos macrófagos infectados. Estes resultados reforçam a hipótese de sinalização por este fosfolipídio a partir da membrana do vacúolo parasitóforo, modulando a atividade microbicida e favorecendo o crescimento do parasita no interior dos macrófagos. Amastigotas com alta exposição de PS na superfície apresentam esta molécula organizada em forma de agregados na membrana, preferencialmente localizados na região posterior do parasita. Esta região é onde acontece a adesão do parasita à membrana do vacúolo parasitóforo e a presença dos agregados de PS pode favorecer o reconhecimento e a sinalização pelo parasita a partir da membrana desta organela. Nossos resultados demonstram que a exposição de PS representa um importante mecanismo de virulência para as formas amastigotas de L. amazonensis. A sinalização por este fosfolipídio é importante não apenas durante o reconhecimento das amastigotas na superfície dos macrófagos, mas também a partir da membrana do vacúolo parasitóforo. A exposição de PS pelas amastigotas intramacrofágicas permite a modulação dos mecanismos de ativação da célula hospedeira mesmo após longos períodos de infecção.

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INSTITUTO OSWALDO CRUZ

EXPOSIÇÃO DE FOSFATIDILSERINA EM AMASTIGOTAS INTRACELULARES DE Leishmania (L) amazonensis E O PAPEL NA MODULAÇÃO DA RESPOSTA MACROFÁGICA

ABSTRACT TESE DE DOUTORADO Poliana Deolindo

Macrophages are host cells for Leishmania infection. Their intracellular survival depends on mechanisms of parasite evasion from the host microbicidal mechanisms. Previous work from our group showed that amastigotes of Leishmania (L) amazonensis, purified from lesions in mice, expose phosphatidylserine (PS) on their surface, a mechanism described as Apoptotic Mimicry. Macrophage recognition of PS on amastigote surface induces parasite internalization by macropinocytosis, increase in the synthesis of anti-inflammatory cytokines, TGF-b and IL-10, and inhibition of Nitric Oxide (NO) production, contributing to the enhancement of amastigote infectivity and proliferation inside host cell. The amount of exposed PS on amastigote surface is modulated by the host: parasites purified from BALB/c mice expose higher amounts of PS than those purified from C57BL/6 mice. Now we show that no differences in PS exposure can be detected in amastigotes purified from in vitro cultivated macrophages derived from the two different mouse strains. In addition, amastigotes derived from T-cell deficient mice BALB/cnu/nu display significant less PS exposure than the wild-type strain. These results strongly indicate that PS exposure on parasite purified from in vivo lesions is induced by T-cell activation of the host macrophage. The in vitro kinetics of PS exposure during promastigote to amastigote differentiation inside parasitophorous vacuole (PV) is independent of the genetic origin of the macrophage. An increase in PS exposure by the parasite that correlates with an enlargement of the PV and an increase in macrophage macropinocytic activity is observed. Macropinocytic vesicles fuse with the PV membrane suggesting that the increased macropinocytic activity by macrophages can provide nutrients for the intracellular parasites. PV alkalinization inhibits macrophage macropinocytic activity. As the PS exposure increases inside PV a concomitant increase of TGF-b synthesis and inhibition of NO production by infected macrophages are observed. This comprises a mechanism of interaction between Leishmania and host cell in which the capacity of the amastigotes to signal, from within the PV, through exposed PS mediates the establishment of the infection by this parasite. Amastigotes with high amounts of exposed PS display these molecules in patches, preferentially localized on the posterior end of cell. Parasites interact with PV membrane by this region, and the PS exposure in patches may contribute to recognition and signaling by this molecule on PV membrane. This mechanism of interaction between parasite and host cell mediates down-regulation of macrophage anti-parasitic activity and thus contributes to the establishment of the infection .

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SUMÁRIO

I – INTRODUÇÃO ............................................................................................................................... 1 1 – Aspectos gerais da infecção por Leishmania .................................................................................... 1 1.1 - Epidemiologia ................................................................................................................................ 1 1.2 – Características gerais do parasita e ciclo de vida .......................................................................... 2 1.3 – Aspectos clínicos em humanos ..................................................................................................... 3 1.4 - Leishmania spp e diferenças na resposta imune em modelo murino ............................................. 5 1.5 - Interação Leishmania X macrófago ............................................................................................. 11 1.6 - A vida em um vacúolo parasitóforo – caracterização do vacúolo de L. amazonensis ................. 17 2- Papel do fosfolipídio fosfatidilserina em diferentes modelos biológicos ......................................... 23 2.1 – Estrutura e composição da membrana plasmática ....................................................................... 23 2.2 – Perda da simetria de membrana – O modelo de células apoptóticas ........................................... 23 2.3 – Reconhecimento de fosfatidilserina ............................................................................................ 26 2.4 – Conseqüências da externalização de PS no reconhecimento de células apoptóticas ................... 29 2.5 – Reconhecimento de células apoptóticas em mecanismos de infecção parasitária e apoptose em

organismos unicelulares ............................................................................................................. 31 2.6 – Fatores de virulência em Leishmania .......................................................................................... 33 2.7 - Mimetismo apoptótico em Leishmania amazonensis ................................................................... 34 II – OBJETIVOS .................................................................................................................................. 37 III – MATERIAIS E MÉTODOS ......................................................................................................... 38 III – RESULTADOS ............................................................................................................................ 47 A - Papel do macrófago no controle da exposição de PS em amastigotas intracelulares ..................... 47 A.1 - Exposição de PS em amastigotas de L. amazonensis purificadas de macrófagos de BALB/c e

C57BL/6 infectados in vitro ....................................................................................................... 47 B - Papel da resposta imune no controle da exposição de PS em amastigotas intracelulares .............. 52 B.1 - Indução da exposição de PS em amastigotas intracelulares utilizando modelo de “resposta

imune” in vitro ou sobrenadante de linfonodos drenantes de lesão ........................................... 52 B.2 - Papel do sobrenadante de linfócitos de BALB/c na ativação da produção de poliaminas e

inibição da produção de óxido nítrico em macrófagos infectados ............................................. 54 B.3 - A exposição de PS por amastigotas no modelo in vivo é modulada pela presença de células T. 55 B.4 - Investigação de citocinas responsáveis pelo aumento da exposição de PS nas amastigotas

intracelulares - evidências sobre a participação do IFNγ .......................................................... 57 C- Efeitos da externalização de PS na formação do vacúolo parasitóforo de L. amazonensis ............. 61 C.1 - A densidade de moléculas de PS expostas na superfície do parasita se correlaciona com o

aumento do tamanho do vacúolo parasitóforo ........................................................................... 61 C.2 - A importância da exposição de PS para a formação dos vacúolos parasitóforos característicos de

L. amazonensis pode ser confirmada no modelo de infecção in vivo ........................................ 65 D- Efeitos da externalização de PS na interação Leishmania:macrófago ............................................ 67 D.1 - A densidade de moléculas de PS expostas na superfície do parasita intracelular se correlaciona

com o aumento da atividade macropinocítica nos macrófagos infectados e define a morfologia dos vacúolos parasitóforos ......................................................................................................... 67

D.2 - A síntese de TGF-β e a inibição da produção de óxido nítrico (NO) em macrófagos infectados com L. amazonensis se correlacionam com o aparecimento de PS na superfície do parasita intracelular ................................................................................................................................. 71

E - A alcalinização do vacúolo parasitóforo inibe a sinalização para a macropinocitose induzida pela amastigota intracelular ............................................................................................................... 75

F- Distribuição do PS na membrana das amastigotas purificadas de lesão em camundongos BALB/c .......................................................................................................................................... 78 F.1 – A distribuição de PS na membrana das amastigotas não é aleatória e segue uma organização

preferencial em forma de agregados .......................................................................................... 78 IV – DISCUSSÃO ............................................................................................................................... 84 V – CONSLUSÕES E PERSPECTIVAS .......................................................................................... 105 VI – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................................... 107

I – INTRODUÇÃO

1 – ASPECTOS GERAIS DA INFECÇÃO POR Leishmania

1.1 - EPIDEMIOLOGIA

As Leishmanioses são causadas por protozoários flagelados da família Trypanosomatidae,

pertencentes ao gênero Leishmania. Os aspectos clínicos da doença podem variar de um estado

inaparente em que a doença não é detectada, até manifestações que variam de lesões cutâneas

localizadas à infecção disseminada, caracterizada por múltiplas lesões cutâneas, lesões em

mucosas ou lesões viscerais. As manifestações clínicas dependem da espécie do parasita

infectante e da resposta imunológica do hospedeiro no decorrer da infecção.

Segundo o último relatório da Organização Mundial da Saúde, cerca de 350 milhões de

pessoas habitam áreas onde existe risco de contrair a doença, em 88 países, e cerca de 12 milhões

de pessoas são atingidas pela doença. Os principais países atingidos pela forma cutânea são:

Afeganistão, Paquistão, Síria, Arábia Saudita, Algéria, Iran, Brasil e Peru e, juntos, são

responsáveis por 90% dos casos registrados. A forma visceral ocorre principalmente na Índia,

Bangladesh, Nepal, Sudão e Brasil, também responsáveis por 90% dos casos registrados. A cada

ano no mundo, aproximadamente 2 milhões de crianças e adultos desenvolvem a doença

sintomática (sendo que 1,5 milhão desenvolve a forma cutânea e 0,5 milhão, a forma visceral)

(OMS, 2004). Com ocorrência em todos os estados brasileiros, cerca de 400 mil casos foram

registrados no Brasil nos últimos dez anos (Ministério da Saúde, 2007).

O número crescente de casos/ano faz com que as leishmanioses ocupem uma posição de

destaque no ranking das principais doenças parasitárias. Recentemente, episódios clínicos de co-

infecção Leishmania/HIV indicam a emergência da doença como uma importante infecção

oportunista ao vírus e têm mudado a epidemiologia da leishmaniose no Brasil e no Mundo

(Molina et al., 2003). Além deste fator, Shaw (2007) aponta os principais fatores responsáveis

pelo aumento do número de casos de leishmaniose no mundo, dentre eles: a migração não

controlada de pessoas para áreas urbanas por pressões econômicas ou guerras, o aumento no

número de casos em soldados em guerra em regiões endêmicas, o aquecimento global mudando a

distribuição geográfica dos vetores, a facilidade do transporte aéreo e a contaminação pelo

sangue entre usuários de drogas.

1

1.2 – CARACTERÍSTICAS GERAIS DO PARASITA E CICLO DE VIDA

Os protozoários do gênero Leishmania são parasitas flagelados pertencentes à ordem

Kinetoplastidae e à família Trypanosomatidae. Estes protozoários caracterizam-se pela presença

de uma estrutura denominada cinetoplasto, formada de minicírculos e maxicírculos de ácido

desoxirribonucléico (DNA) altamente compactado dentro da única mitocôndria da célula (Stuart,

1983). Existem aproximadamente 21 espécies de Leishmania, agrupadas em dois grandes

subgêneros: Leishmania e Viannia (Lainson et al., 1987). As espécies também podem ser

classificadas de acordo com a distribuição geográfica das áreas endêmicas como espécies do

Velho Mundo (Europa e Ásia) e do Novo Mundo (Américas).

Durante o seu ciclo de vida, o parasita apresenta duas formas evolutivas: promastigotas,

presentes em insetos vetores e amastigotas intracelulares, encontrados em hospedeiros

vertebrados (Figura 1). As formas promastigotas são transmitidas por fêmeas de insetos

hematófagos da subfamília Phlebotominae (Diptera, Psychodidae), denominados genericamente

de flebótomos. Os insetos estão representados por centenas de espécies, ocupando extensas áreas

geográficas nos diversos continentes. Flebótomos do gênero Lutzomyia estão mais associados à

transmissão de espécies de Leishmania do Novo Mundo, enquanto que flebótomos do gênero

Phlebotomus, estão mais associados com as espécies do Velho Mundo.

A infecção do inseto ocorre no momento da alimentação, quando ele suga o sangue

contendo macrófagos infectados com amastigotas. No trato digestivo, ocorre rompimento da

membrana dos macrófagos e as amastigotas liberadas diferenciam-se na forma promastigota.

Estas formas são afiladas, apresentam flagelo externalizado e são capazes de se multiplicar no

intestino. Após a digestão do sangue, as promastigotas migram para a região anterior do intestino

e sofrem um processo de diferenciação, denominado metaciclogênese (Sacks e Perkins, 1984).

Durante a metaciclogênese, as promastigotas apresentam redução de tamanho do corpo celular,

tornam-se extremamente móveis e altamente infectivas a passam a ser denominadas de

metacíclicas. As formas metacíclicas migram para a probóscide e são transferidas ao hospedeiro

vertebrado no momento da picada, durante um novo respasto sangüíneo do inseto. No local da

picada, as formas metacíclicas são fagocitadas por células do sistema fagocítico mononuclear

presentes na derme. No interior dos fagossomas, as formas promastigotas se diferenciam em

amastigotas, células arredondadas e com flagelo internalizado. Este período de diferenciação

pode levar de 2 a 5 dias (Courret et al., 2002). Os fagossomas que contêm o parasita fundem-se

2

com vesículas endocíticas e com lisossomas. As amastigotas são resistentes às enzimas e ao pH

ácido do fagolisossoma, conseguindo se multiplicar no interior desta organela. Após diversas

multiplicações, os macrófagos ficam superinfectados e rompem-se, liberando as amastigotas que

são rapidamente fagocitadas por novos macrófagos, estabelecendo e disseminando a infecção.

Figura 1 – Ciclo de vida da Leishmania. (Modificado de Sacks & Noben-Trauth, 2002)

1.3 – ASPECTOS CLÍNICOS EM HUMANOS

Baseado nos sintomas e nas manifestações clínicas mais freqüentes observadas em

infecções com as várias espécies de Leishmania, a doença pode ser classificada em:

Leishmaniose Cutânea, que apresenta as seguintes formas clínicas: Cutânea Localizada, Cutânea

Disseminada e Cutânea Difusa; Leishmaniose Mucocutânea e Leishmaniose Visceral. As

principais espécies, suas associações com a doença em humanos e as manifestações clínicas

apresentam-se demonstradas na Figura 2.

A Leishmaniose Cutânea é a forma clínica mais freqüente da doença e pode ser causada

por diferentes espécies características do Velho Mundo e do Novo Mundo. A lesão surge no local

da picada do inseto e pode demorar de 1 a 3 meses para se desenvolver. Tem como característica

bordas bem delimitadas com formato arredondado, elevadas, edemaciadas e com fundo

granuloso, com processo inflamatório ativo na periferia. O curso das lesões tende a ser benigno,

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curando-se espontaneamente num período de meses ou anos, ou após terapêutica específica.

Forma Cutânea Localizada: Representa o acometimento primário da pele. A lesão é geralmente

do tipo úlcera, com tendência à cura espontânea e apresentando boa resposta ao tratamento,

podendo ser única ou múltipla (até 20 lesões). Forma Cutânea Disseminada: Forma relativamente

rara da doença que pode ser observada em 2 % dos casos, causada principalmente por L.

braziliensis e L. amazonensis. É caracterizada pelo aparecimento de múltiplas lesões papulares e

de aparência acneiforme que acometem várias partes do corpo. Posteriormente ao

desenvolvimento das lesões primárias ocorre a disseminação do parasita, provavelmente por via

sangüínea ou linfática, causando lesões em locais distantes da picada. O número de lesões pode

alcançar as centenas. Os pacientes apresentam títulos elevados de anticorpos anti-Leishmania e

poucos parasitas no local da lesão. Forma Cutânea Difusa: Forma clínica rara, porém grave, que

ocorre em pacientes com anergia e deficiência específica na resposta imune celular a antígenos de

Leishmania. É causada pela espécie L. amazonensis. Inicia com lesão única e má resposta ao

tratamento e evolui de forma lenta, com formação de placas e múltiplas nodulações não ulceradas

recobrindo grandes extensões cutâneas. Observa-se uma abundância de parasitas na lesão e uma

depressão da resposta imune específica aos antígenos do parasita. A resposta à terapêutica é

pobre ou ausente (Ministério da Saúde, 2007).

A Leishmaniose Mucocutânea é causada principalmente por parasitas da espécie L.

braziliensis. Na maioria dos casos é resultante de Leishmaniose Cutânea de evolução crônica e

curada sem tratamento ou com tratamento inadequado. A lesão inicia na pele, no local da picada

do inseto, mas a infecção desenvolve para as cavidades oral e nasal. As lesões mucosas são

infiltradas, eritematosas, podendo ser altamente desfigurantes e causar mutilações na face.

Infecções secundárias e complicações respiratórias aliadas à dificuldade de alimentação podem

levar o paciente a óbito. Em geral estas lesões não tendem a evoluir para resolução espontânea

(Ministério da Saúde, 2007).

A Leishmaniose Visceral, também conhecida como Calazar, é causada principalmente

pelas espécies L. donovani, L. infantum e L. chagasi e eventualmente pela L. amazonensis (Barral

et al., 1991). O parasita é inoculado na pele e migra, via circulação linfática e sangüínea,

infectando células do sistema fagocítico mononuclear de diferentes órgãos como baço,

linfonodos, fígado e intestino. O período de incubação dura geralmente de 2 a 4 meses. O

primeiro sintoma da doença é febre, seguida de alterações funcionais nos órgãos afetados:

linfoadenopatia, hepatoesplenomegalia, anemia com leucopenia. A forma visceral é a forma mais

4

letal da doença e se não tratada leva a óbito em um período de 2 a 3 anos. Em formas mais

agudas da doença o óbito pode acontecer entre 6 e 12 meses após a infecção (Prata e Silva, 2006).

Figura 2 – Principais espécies de Leishmania e sintomas clínicos observados em humanos (Fonte: McMahon-Pratt e Alexander, 2004; Manual de Vigilância da Leishmaniose Tegumentar Americana, Ministério da Saúde, 2007).

1.4 - Leishmania spp E DIFERENÇAS NA RESPOSTA IMUNE EM MODELO MURINO

A susceptibilidade ou resistência à doença causada por diferentes espécies de Leishmania

é regulada por uma gama de citocinas e moléculas co-estimulatórias produzidas pelo hospedeiro

vertebrado e uma outra variedade de fatores de virulência característicos de cada espécie

infectante. O modelo murino mais estudado de resistência ou susceptibilidade a Leishmania é o

da infecção com a espécie L. major. Neste modelo, a dominância de uma resposta de células T

CD4+ com fenótipo Thelper1 (Th1) geralmente resulta na cura da lesão e eliminação do parasita,

contrastando com a resposta Thelper2 (Th2), que se correlaciona com a susceptibilidade à doença

5

(Heinzel et al., 1989, Scott et al., 1988). Muitas linhagens de camundongos (C57BL/6, C3H,

CBA) desenvolvem lesões autolimitantes com L. major, sendo a resolução da infecção mediada

pelas células Th1, com a produção de IFNγ. Em contraste, a linhagem de camundongo BALB/c

desenvolve uma resposta do tipo Th2, sendo susceptível à infecção com L. major.

O modelo de resistência de camundongos à infecção primária com L. major está

relacionado à produção de IL-12 e conseqüente expansão de células Th1 CD4+ reativas ao

parasita (Heizel et al., 1993; Sypek et al., 1993). Células dendríticas derivadas da pele de

camundongos C57BL/6 produzem IL-12 in vitro quando estimuladas com antígenos de L. major

(von Stebut et al., 1998). A administração de IL-12 recombinante em camundongos BALB/c na

primeira semana de infecção reduz a carga parasitária da lesão, enquanto que camundongos

C57BL/6 tratados com anti-IL-12, ou com deleção do gene que codifica esta citocina (IL-12-/-), se

tornam suscetíveis à infecção (Sypek et al., 1993, Park et al., 2000). Foi demonstrado nestes

trabalhos que o efeito protetor da IL-12 está relacionado à produção de IFN-γ e conseqüente

estabilização do fenótipo Th1 de linfócitos T CD4+.

A importância do IFNγ para a resistência à infecção com L. major já foi demonstrada em

diferentes linhagens de camundongos. Camundongos C3H produzem IFNγ no momento da

interação entre o parasita e a célula hospedeira (Belosevic et al., 1989). O tratamento com anti-

IFNγ induz um fenótipo Th2 nas células T CD4+ e os camundongos desenvolvem lesão cutânea

que evolui para a visceralização. Camundongos C57BL/6, com deleção do gene que codifica

para a molécula de IFNγ (IFNγ-/-), não são capazes de curar a lesão de L. major. As células T

CD4+ destes animais também adquirem um fenótipo Th2, com produção de IL-4, IL-5 e IL-13

(Wang et al., 1994). Lesões em camundongos 129 com deleção para o gene que codifica o

receptor de IFNγ (IFNγR-/-) possuem até 15 vezes mais parasitas que aquelas em animais 129 de

fenótipo selvagem (Swihart et al., 1995).

Além das células T CD4+, células NK e células T CD8+ também podem contribuir para a

produção de IFNγ em infecções com L. major (Scharton e Scott, 1993; Belkaid et al., 2002;

Uzonna et al., 2004). Esta citocina é importante na ativação da síntese da enzima Oxido Nítrico

Sintase induzida (iNOS), responsável pela produção de óxido nítrico (NO), um potente agente

leishmanicida do macrófago. A ativação da iNOS nos tecidos está diretamente relacionada com a

diminuição da carga parasitária. Lesões cutâneas e linfonodos de camundongos resistentes

C57BL/6 apresentam mais atividade de iNOS do que os de camundongos susceptíveis BALB/c.

Após a cura da lesão, camundongos C57BL/6, C3H e CBA, quando tratados com um inibidor

6

específico da iNOS, apresentam recidiva de lesão e aumento da carga parasitária (Stenger et al.,

1994, 1996).

A susceptibilidade dos camundongos à infecção com L. major em modelo murino está

relacionada com o desenvolvimento de uma resposta Th2, com participação importante de IL-4

nas fases iniciais da infecção. Intervenções imunológicas em camundongos BALB/c que

revertem o fenótipo das células T CD4+ e os tornam resistentes à infecção têm efeito principal na

diminuição da expressão de IL-4 (Sypek et al. 1993; Heinzel et al., 1993). Camundongos

BALB/c infectados com L. major pela via endovenosa apresentam alta expressão de mRNA para

IL-4 nas células do baço, 16 h após a infecção, o que não é observado em camundongos

resistentes C3H, CBA e C57BL/6 (Launois et al., 1995). Em BALB/c a detecção de mRNA para

IL-4 ocorre até 48 h após a infecção e, neste período, o tratamento com anti-IL4 é capaz de

redirecionar a resposta para Th1 (Sadick et al., 1990). Cinco semanas após a infecção ocorre

outro aumento na expressão de mRNA para IL-4 que se mantém estável em todo o curso da

infecção, refletindo o direcionamento de resposta para Th2 normalmente observada neste

camundongo (Launois et al., 1995). Camundongos BALB/c com deleção do gene que codifica

para a IL-4 (IL-4-/-) são resistentes à infecção, levando à cura da lesão (Kopf et al., 1996). Um

dos efeitos da IL-4 na susceptibilidade de camundongos BALB/c é resultado da regulação

negativa da cadeia β2 do receptor de IL-12 (IL-12Rβ2) em células T CD4+ (Himmelrich et al.,

1998). Os linfócitos se tornam refratários à IL-12 que é fundamental para a manutenção da

produção de IFNγ e direcionamento da resposta para Th1. Em camundongos C57BL/6 não é

observado aumento da expressão de mRNA para IL-4 durante a infecção com L. major,

tampouco as células CD4+ perdem a expressão da cadeia β2 do receptor de IL-12 (Himmelrich et

al., 1998).

A citocina IL-10 também é importante na susceptibilidade à infecção com L. major.

Camundongos BALB/c apresentam maior produção desta citocina nas primeiras horas de

infecção quando comparados a camundongos C3H (Chatelain et al., 1999). Além disso,

camundongos BALB/c com deleção do gene que codifica esta citocina (IL-10 -/-) desenvolvem

lesões menores e com menos parasitas quando comparadas às lesões em animais selvagens (Kane

& Mosser, 2001). O papel da IL-10 durante a infecção com L. major pode estar relacionado com

a inibição da ativação macrofágica. Foi demonstrado que amastigotas opsonizadas com

anticorpos do hospedeiro induzem maior produção de IL-10 nos macrófagos, através da

sinalização pelo receptor de Fc (FcγR), que leva ao aumento da infecção pelo parasita (Kane &

7

Mosser, 2001). Experimentos utilizando a cepa LV39 de L. major mostraram que a IL-10

apresenta efeito aditivo a IL-4 na supressão da resposta imune. Esta cepa apresenta resistência a

morte mediada por IFNγ e desenvolve lesão mesmo em camundongos BALB/c deficientes para o

gene que codifica a cadeia α do receptor de IL-4 (IL4Rα-/-). No entanto, o tratamento destes

animais com anti-IL-10 induz a redução do tamanho da lesão e da carga parasitária, conferindo

resistência parcial à infecção com LV39. Esta resistência parcial também foi observada em

camundongos BALB/c duplo knock-out, deficientes para os genes que codificam a cadeia α do

receptor de IL-4 (IL4Rα-/-) e a citocina IL-10 (IL-10-/-) (Noben-Trauth et al., 2003).

O TGF-β representa outra citocina imunossupressora importante durante a infecção com

Leishmania. Os efeitos do TGF-β na progressão da infecção estão relacionados à sua capacidade

de inibir a expressão de iNOS e à diferenciação das células T para um fenótipo Th1 ou Th2

(Vodovotz et al., 1993; Gorelik et al., 2002). Camundongos BALB/c que expressam um

dominante negativo para o receptor desta citocina exclusivamente em células T (CD4-

dnTGFβRII) apresentam perfil de resposta semelhante ao observado em camundongos C57BL/6,

com alta produção de IFNγ pelas células T CD4+ mutadas (Gorelik et al., 2002). A injeção de

anti-TGF-β em camundongos F1 (resultantes do cruzamento de BALB/c e C57BL/6) infectados

com L. major induz uma rápida redução da carga parasitária e cura da lesão. O efeito protetor do

anti-TGF-β não está relacionado à mudança na produção de IL-4 ou IFN-γ, mas no aumento da

produção de NO nos tecidos infectados (Li et al., 1999).

Diferente do que ocorre nos modelos de resistência e susceptibilidade em infecções com

L. major, a maioria das linhagens de camundongos é susceptível à infecção com L. amazonensis.

No entanto, a susceptibilidade não está relacionada a um perfil de resposta Th2 bem estabelecido.

Por exemplo, camundongos BALB/c são muito suscetíveis à infecção com L. amazonensis e

apresentam uma produção importante de IL-4 no decorrer da infecção. No entanto, a quantidade

de IL-4 produzida é insuficiente para polarizar a resposta e citocinas como IFNγ e TNFα são

produzidas constantemente, caracterizando uma resposta mista entre o perfil Th1 e Th2 (Ji et al.

2002).

O que os modelos murinos de susceptibilidade à infecção com L. amazonensis sugerem é

que a interação entre o hospedeiro e o parasita resulta em ineficiência de polarização para um

perfil Th1. Camundongos C57BL/6, quando infectados com L. amazonensis, desenvolvem lesões

que, embora diminuam de tamanho no decorrer das semanas, raramente curam, tornando-se

persistentes como infecção crônica. Em estudo comparativo de infecção com L major e L.

8

amazonensis nestes camundongos, Ji e colaboradores (2003) demonstraram que a

susceptibilidade à L. amazonensis está relacionada à redução da produção de mediadores pró-

inflamatórios (citocinas e quimiocinas), bem como de seus receptores, nas primeiras semanas

após a infecção. Estas alterações, juntamente com a presença de baixos níveis de citocinas do tipo

Th2, previnem o desenvolvimento de células Th1 específicas para o parasita. Camundongos C3H

também não controlam a infecção com L. amazonensis e a adição de IL-12 não leva à cura da

lesão nem ao direcionamento da resposta para um perfil Th1 (Jones et al., 2000). A

susceptibilidade de camundongos C57BL/10 à infecção com L. amazonensis está relacionada à

baixa produção de IFNγ no decorrer da infecção e produção de IL-4 apenas nos momentos

iniciais, revelando que também nestes animais a susceptibilidade está mais relacionada à ausência

de resposta Th1 do que a presença de uma resposta Th2 bem estabelecida (Afonso & Scott,

1993).

Citocinas importantes para a susceptibilidade de camundongos BALB/c durante a

infecção com L. major parecem apresentar um papel menos central na susceptibilidade de

camundongos C57BL/6, C3H e C57BL/10 à infecção com L. amazonensis. O tratamento de

C57BL/10 com anti-IL4 não induz cura da lesão nestes animais (Afonso & Scott, 1993).

Camundongos C57BL/6 com deleção do gene que codifica para esta citocina (IL-4-/-)

permanecem suscetíveis à infecção, mesmo após a administração de IL-12. As células T CD4+

destes animais apresentam diminuição da expressão de mRNA para a cadeia β2 do receptor de

IL-12 (IL-12Rβ2), de forma independente da presença de IL-4. Por isso as células T CD4+ são

menos responsivas à IL-12 e, como conseqüência, ocorre diminuição da produção de IFNγ e dos

níveis de mRNA para INFγ nos linfonodos destes animais (Jones et al., 2000). A citocina IL-10

parece estar relacionada com a inibição da resposta inflamatória no modelo de susceptibilidade à

infecção com L. amazonensis. Camundongos C57BL/6 com deleção do gene que codifica para

esta citocina (IL-10-/-) apresentam até 10 x menos parasitas nas lesões quando comparadas às de

camundongos C57BL/6 selvagens (Jones et al., 2002; Ji et al., 2003). A ausência da IL-10 nesta

linhagem de camundongo induz a produção de citocinas e quimiocinas pró-inflamatórias nos

linfonodos drenantes e nas patas infectadas (Ji et al., 2003). Além disso, a ausência de IL-10

também induz o aumento da atividade de iNOS na lesão, resultando em necrose do tecido

infectado (Jones et al., 2002). A citocina TGF-β parece contribuir para a inibição da resposta

inflamatória durante a infecção com L. amazonensis e a produção desta citocina é aumentada em

modelos de infecção de macrófagos in vitro e em lesões em camundongos BALB/c (Barral-Netto

9

et al., 1992). O tratamento de camundongos BALB/c com anti-TGF-β impede o aparecimento de

grandes lesões e aumenta os níveis de mRNA para IFNγ nas células do linfonodo drenante da

lesão. Desta forma, a indução da produção de TGF-β pela L. amazonensis pode estar envolvida

no controle da resposta imune, mantendo níveis baixos de IFNγ e favorecendo o estabelecimento

da infecção.

Diferentemente do que ocorre em infecções com L. major em que camundongos

deficientes em células T CD4+ sucumbem à infecção (Holaday et al., 1991), a progressão da

doença no modelo de infecção com L. amazonensis é dependente da presença de células T CD4+

ativadas para um fenótipo Th1 (Soong et al., 1997). Em camundongos C57BL/6, com deficiência

na sinalização pelo MHC-II, o desenvolvimento da lesão é significativamente reduzido.

Camundongos C57BL/6nu/nu e C57BL/6 RAG-/- apresentam aparecimento de lesão muito mais

tardio do que os camundongos selvagens. A transferência de células T CD4+ para camundongos

C57BL/6 RAG-/- resulta na progressão da doença, com crescimento de lesão dependente da

quantidade de células transferidas. Os autores sugerem que a presença de células T CD4+ ativadas

no local da infecção pode ser importante para a produção de citocinas que regulam o

recrutamento de monócitos, favorecendo o estabelecimento da infecção do parasita em

macrófagos imaturos.

Camundongos de linhagens resistentes à L. major apresentam, comparativamente,

produção mais baixa de IFNγ, quando infectados com L. amazonensis (Afonso & Scott, 1993;

Jones et al., 2000). A falta de polarização para Th2 em modelo de susceptibilidade de

camundongos BALB/c à L. amazonensis mostrou que concomitante à produção de IL-4, ocorre

uma produção baixa e contínua de IFNγ no decorrer de toda a infecção (Ji et al., 2002). Diferente

da alta produção de IFNγ responsável pela polarização da resposta para Th1 e cura da lesão em

infecções com L. major, a presença de concentrações baixas desta citocina durante a infecção

com L. amazonensis pode favorecer a sobrevivência do parasita. Comparativamente com outras

espécies, L. amazonensis apresenta maior resistência à ativação do macrófago (Scott & Sher,

1986). Qi e colaboradores (2004) demonstraram que concentrações de até 100 ng/ml de IFNγ

adicionadas em culturas de macrófagos infectados induzem maior proliferação das amastigotas

intracelulares, sugerindo que esta espécie pode ter evoluído mecanismos de subverter a ativação

macrofágica e a resposta imune do hospedeiro.

Os modelos de infecção murina apontam para diferenças importantes na biologia e na

interação entre as diferentes espécies de Leishmania e seus hospedeiros. Os resultados

10

demonstram que, durante a infecção com L. amazonensis, ocorre ativação mínima e constante da

resposta imune, resultando na ausência da polarização da resposta para Th1 nos camundongos

mais resistentes e para Th2 nos modelos de susceptibilidade. O controle da infecção com L.

amazonensis pode ser conseqüência da participação ativa de uma resposta imunossupressora.

Durante a infecção com L. amazonensis, células T CD4+CD25+ podem ser encontradas na lesão e

no linfonodo drenante da lesão (Ji et al., 2005). Estas células são conhecidas como células T

regulatórias (Treg) e são capazes de inibir a ativação de células T efetoras (Sakaguchi, 2005) e de

induzir a ativação alternativa de monócitos (Tiemessen et al., 2007). A transferência de células

Treg de animais infectados para camundongos C57BL/6 resulta no desenvolvimento de lesões

menores quando estes são infectados com L. amazonensis (Ji et al., 2005). Foi observada

diminuição na produção de IFNγ pelas células T não regulatórias CD4+CD25- presentes no

linfonodo destes animais. Utilizando o mesmo modelo de transferência de Treg em infecções

com L. major estes camundongos apresentam susceptibilidade ao parasita e desenvolvimento da

lesão, sem mudança da resposta para um perfil Th2 (Belkaid et al., 2002). Estes resultados

sugerem que o equilíbrio entre a resposta imune regulatória e efetora pode ser o fator

determinante para o desenvolvimento da infecção com L. amazonensis. A maior resistência ao

IFNγ, observada nos diferentes modelos de infecção, sugere o desenvolvimento de mecanismos

de sobrevivência característicos desta espécie. Estes mecanismos desenvolvidos pelo parasita

permitem o estabelecimento da infecção em diversas linhagens de camundongos, mesmo

naquelas mais resistentes à infecção com L. major.

1.5 - INTERAÇÃO Leishmania X MACRÓFAGO

Os parasitas do gênero Leishmania infectam e se multiplicam intracelularmente em um

tipo celular preferencial, os macrófagos. Macrófagos são células fagocíticas derivadas de

monócitos sangüíneos que possuem papel importante na resposta imune inata e adaptativa, bem

como na remoção de restos celulares, mantendo a homeostase dos tecidos.

Durante os processos infecciosos, o reconhecimento de microorganismos pelos

macrófagos resulta em fagocitose e na eventual destruição destes por enzimas lisossomais,

intermediários reativos de oxigênio e nitrogênio e/ou por mecanismos de deprivação de

nutrientes. Durante o processo de eliminação dos microorganismos, os macrófagos podem ainda

liberar citocinas inflamatórias e apresentar antígenos às células T, potencializando a resposta

11

imune. A sobrevivência da Leishmania e o desenvolvimento da infecção são resultado direto da

evasão do parasita aos mecanismos microbicidas apresentados pela célula hospedeira.

As primeiras evidências da interação das células imunes na ativação da atividade

leishmanicida do macrófago foram demonstradas no final da década de 70. Estudos com a

espécie L. enrietti demonstraram que macrófagos peritoniais de camundongos cultivados in vitro,

sem estímulo, são suscetíveis à infecção com formas promastigotas ou amastigotas. No entanto, o

tratamento dos macrófagos com linfocinas (sobrenadante de linfócitos estimulados com

Concanavalina A ou sobrenadante de culturas linfocitárias mistas) induziu a destruição do

parasita intracelular após 48 h de cultura (Mauel et al., 1978; Buchmüller & Mauel, 1979). Os

autores demonstraram ainda que a atividade do sobrenadante poderia ser potencializada na

presença de produtos bacterianos como o lipopolissacarídeo (LPS). Posteriormente, a

susceptibilidade de outras espécies de Leishmania aos macrófagos ativados com linfocinas foi

observada (Murray et al., 1982a; Oster & Nacy, 1984), demonstrando a importância da relação

entre o macrófago e outros componentes da resposta imune no combate à infecção.

O controle da infecção de macrófagos por Leishmania foi demonstrado por dois

mecanismos: dependente e independente do metabolismo oxidativo (Murray & Cartelli, 1983).

Nakagawara e colaboradores (1982) demonstraram que o tratamento de monócitos humanos com

linfocinas induz a produção de espécies reativas de oxigênio, de forma dose e tempo-dependente.

O aumento da produção de peróxido de hidrogênio (H2O2) em macrófagos ativados com

linfocinas foi demonstrado como sendo um dos principais mecanismos dependente do

metabolismo oxidativo para o combate à infecção com Leishmania (Murray, 1982a; Murray,

1982b; Haidaris & Bonventre, 1982). Mecanismos leishmanicidas independentes do metabolismo

oxidativo foram demonstrados em macrófagos isolados de pacientes com doença crônica

granulomatosa, que apresentam defeito na produção de espécies reativas de oxigênio. Em

infecções com formas promastigotas de L. donovani estes macrófagos conseguem diminuir em

aproximadamente 40% o número de parasitas após 48 h de infecção (Murray & Cartelli, 1983). A

atividade leishmanicida é potencializada na presença de linfocinas, sugerindo um mecanismo

alternativo ao estresse oxidativo no controle da infecção por Leishmania nestes macrófagos.

O IFNγ foi identificado primeiramente como o principal fator presente no sobrenadante de

linfócitos responsável pela ativação dos macrófagos. O tratamento de macrófagos com

sobrenadantes pré-incubados com anti-IFNγ mostrou inibição da produção de H2O2 e aumento da

infecção por L. donovani (Murray et al., 1983b). Experimentos utilizando INFγ recombinante em

12

modelos de ativação de macrófagos in vitro e in vivo confirmaram a importância desta citocina na

indução do metabolismo oxidativo e da atividade leishmanicida de macrófagos (Murray et al.,

1985). Posteriormente outros fatores presentes no sobrenadante foram identificados como

atuando de forma sinérgica com o IFNγ e as primeiras citocinas identificadas foram a IL-2, IL-4 e

o GM-CSF (Granulocyte and Monocyte Colony Stimulating Factor) (Hoover et al., 1986;

Belosevic et al., 1988). O TNF-α (Tumor Necrosis Factor-alpha) também foi identificado como

uma citocina importante na sinergia com o INFγ durante a ativação dos macrófagos. Através de

exprimentos in vitro, Bogdan e colaboradores (1990) demonstraram que concentrações sub-

ótimas de IFNγ, na presença de TNF-α ou LPS, levavam a uma rápida eliminação das formas

amastigotas em macrófagos infectados.

Com esses trabalhos, a ativação de macrófagos por citocinas, especialmente o IFNγ,

durante o controle da infecção por Leishmania estava caracterizada. Faltava elucidar o

mecanismo responsável pela morte dos parasitas intracelulares. O aumento do metabolismo

oxidativo com produção de H2O2 durante a infecção foi demonstrado como um importante

mecanismo no controle de formas promastigotas. No entanto, a forma amastigota era mais

resistente à produção de espécies reativas de oxigênio e apresentava altos níveis endógenos de

enzimas como catalase, peroxidase e superóxido dismutase (Murray 1981a, Murray, 1982b).

Além disso, macrófagos deficientes na produção de espécies reativas de oxigênio eram capazes

de combater a infecção com L. donovani após a estimulação com linfocinas. Hibbs e

colaboradores (1987) demonstraram que macrófagos ativados induziam a morte de células

tumorais a partir de mecanismo independente do metabolismo oxidativo do macrófago. Os

autores descreveram que o efeito anti-tumoral era dependente da produção de óxidos de

nitrogênio inorgânicos derivados do aminoácido L-arginina, com a produção final de óxido nítrico

(NO). A partir deste trabalho, Green e colaboradores (1990) demonstraram que a morte de L.

major em macrófagos ativados com IFNγ era inibida na presença de NGMMLA (NG-monomethyl-

L-arginine), um inibidor da síntese de NO. Nesse trabalho os autores mostraram uma relação

direta entre a produção de NO e a atividade leishmanicida, caracterizando um novo mecanismo

importante para o combate à infecção em macrófagos. Os autores mostraram, ainda, que o

tratamento dos macrófagos com IFNγ e LPS induzia aumento da produção de NO, reforçando a

importância da presença de fatores externos para a ativação dos mecanismos microbicidas do

macrófago.

13

Diferente dos produtos presentes no sobrenadante de linfócitos responsáveis pela ativação

do macrófago, o TGF-β foi a primeira citocina descrita como importante regulador negativo desta

ativação (Nelson et al., 1991). A adição de TGF-β em culturas de macrófagos infectados com L.

major inibiu a ativação dos mecanismos microbicidas e favoreceu o crescimento dos parasitas,

mesmo após o tratamento dos macrófagos com linfocinas ou IFNγ (Nelson et al., 1991). Os

autores demonstraram um papel direto do TGF-β na inibição da produção de NO. Posteriormente

a citocina IL-10 também foi descrita como inibidora da produção de NO (Cunha et al., 1992).

A partir de estudos demonstrando o papel de citocinas na interação com macrófagos, Stein

e colaboradores (1992) descreveram que a citocina IL-4 induz um fenótipo de ativação

macrofágica diferente do observado após o tratamento com IFNγ. Este fenótipo caracterizou-se

pela redução da produção de citocinas pró-inflamatórias e pelo aumento da capacidade endocítica

a partir do receptor de manose. Para diferenciar do fenótipo de “Ativação Clássica” observado

após o tratamento dos macrófagos com IFNγ, este fenótipo foi descrito como “Ativação

Alternativa de Macrófagos” (Stein et al., 1992).

As vias de ativação macrofágica descritas estão centradas no metabolismo do aminoácido

L-arginina. Os macrófagos apresentam duas vias metabólicas que competem por este aminoácido.

A via de Ativação Clássica é caracterizada pelo processamento da L-arginina pela enzima Óxido

Nítrico Sintase induzida (iNOS). Esta via é ativada por citocinas características de resposta imune

do tipo Th1, como o IFNγ e o TNFα. O aumento da síntese da enzima iNOS induz maior

produção de NO ativando os mecanismos microbicidas e inibindo o crescimento de parasitas

intracelulares. A via de Ativação Alternativa por sua vez envolve o processamento de L-arginina

pela enzima Arginase 1 (Figura 3). Esta via é ativada por citocinas características de resposta

imune do tipo Th2 como IL-4, IL-10 ou prostaglandinas E2 (PGE2) (Modolell et al., 1995). A

atividade da Arginase 1 leva a produção de ornitina, um importante precursor da via de

poliaminas, compostos essenciais durante o crescimento e a proliferação de células (Figura 3).

A sobrevivência da Leishmania está diretamente relacionada ao metabolismo do

aminoácido L-arginina. A importância da ativação de Arginase para a sobrevivência de várias

espécies de Leishmania foi demonstrada em modelos in vitro. Formas amastigotas de L. major e

L. infantum proliferam mais em macrófagos incubados com citocinas do tipo Th2, IL-4, IL-10 e

TGF-β, que induzem aumento da atividade de Arginase 1 (Iniesta et al., 2001). Formas

promastigotas de L. mexicana com deleção do gene que codifica pra Arginase 1 (Δarg) não

sobrevivem em cultura axênica sem a adição de poliaminas no meio (Roberts et al., 2004).

14

Posteriormente o papel da Arginase 1 na proliferação de Leishmania foi confirmado em modelo

de infecção in vivo. Camundongos suscetíveis BALB/c infectados com L. major apresentam

níveis elevados de atividade desta enzima na lesão durante todo o período de infecção enquanto

que em camundongos resistentes C57BL/6, o aumento de atividade ocorre apenas nas primeiras

semanas de infecção. Após este período é observado a indução da atividade da enzima iNOS que

coincide com o momento de início de redução do tamanho da lesão (Iniesta et al., 2005). Juntos

estes trabalhos elucidam novos mecanismos de interação entre a Leishmania e a célula

hospedeira. Em resposta ao ambiente de citocinas na qual os macrófagos estão inseridos, a

ativação do metabolismo de L-arginina pode favorecer o crescimento das amastigotas

intracelulares, através da produção de poliaminas, ou induzir a morte dos parasitas, como

resultado da produção de NO.

Fig. 3 – Representação esquemática das vias de metabolismo da L-arginina. Neste esquema estão

ilustradas as vias das enzimas óxido nítrico sintase induzida (iNOS) e Arginase 1. Linhas sólidas representam as vias enzimáticas principais. Linhas pontilhadas representam vias metabólicas alternativas (Adaptado de Bronte e Zanovello, 2005).

Além da captação de poliaminas, importantes para a proliferação no ambiente intracelular,

a Leishmania ainda precisa entrar em contato com outros componentes que são indispensáveis

para a sobrevivência. O Fe2+ é um íon divalente importante como co-fator para a atividade de

diversas enzimas. Para a sobrevivência e a proliferação da Leishmania dentro do macrófago é

necessário que as amastigotas consigam captar este íon dentro do vacúolo parasitóforo. Os

macrófagos internalizam o ferro por endocitose, na forma de Fe3+ acoplado a glicoproteína

15

transferrina. A partir da acidificação do endossoma o Fe3+ é liberado da transferrina e convertido

em Fe2+ por redutases endossomais. O Fe2+ é um composto reativo e tóxico que é transportado

para o citoplasma, onde sofre oxidação para Fe3+ e é conjugado a ferritina. Desta maneira é

armazenado no citoplasma na forma de um composto menos reativo. Os macrófagos previnem o

acúmulo de Fe2+ nos endossomas através da atividade de bombas para o efluxo de íons divalentes

chamadas Nramp (Natural Resistance-associated Macrophage Protein). Camundongos com

deleção para o gene que codifica para o transportador Nramp1 são mais suscetíveis à infecção

com Mycobacterium bovis (BCG), Salmonella typhimurium e Leishmania donovani, sugerindo a

importância da disponibilidade de Fe2+ no interior do vacúolo para a sobrevivência e proliferação

destes parasitas (Vidal et al., 1995).

Formas amastigotas intracelulares de L. amazonensis possuem um transportador de Fe2+

na membrana plasmática denominado LIT1, que apresenta características semelhantes aos

transportadores de ferro da família ZIP, descritos em Arabidopsis thaliana (Huynh et al., 2006).

Dentro do vacúolo, as amastigotas têm que competir pelo Fe2+ livre antes que ele seja bombeado

para o citoplasma do macrófago pelo Nramp. L. amazonensis com deleção do gene que codifica

para o transportador LIT1 (Δlit1) não proliferam em macrófagos e não são capazes de

desenvolver lesão em camundongos suscetíveis BALB/c. A expressão de LIT1 exclusivamente

em amastigotas intracelulares sugere um mecanismo de adaptação da Leishmania para a

sobrevivência em um ambiente onde a concentração de Fe2+ disponível é limitada.

O sucesso da infecção com Leishmania não depende apenas da interação entre o parasita e

a célula hospedeira. Macrófagos infectados são potenciais candidatos a apresentarem antígenos

do parasita para linfócitos T. Desta forma, peptídios do parasita associados a moléculas de MHC

de classe II expostas na superfície dos macrófagos podem ativar células T CD4+ específicas para

Leishmania, potencializando a resposta imune. Diversos trabalhos têm demonstrado que a

infecção com Leishmania interfere negativamente na apresentação de antígenos pelos

macrófagos. Em infecção com L. major e L. amazonensis os macrófagos têm a capacidade de

apresentação diminuída tanto para antígenos do parasita como para outros antígenos (Fruth et al.,

1993, Prina et al., 1993). Trabalhos do grupo de Jean-Claude Antoine demonstraram que

moléculas de MHC de classe II são retidas no vacúolo parasitóforo de L. amazonensis e L.

donovani (Lang et al., 1994a; Lang et al., 1994b). Utilizando inibidores de proteases este grupo

conseguiu observar que as formas amastigotas de L. amazonensis internalizam as moléculas de

MHC-II do macrófago, degradando-as em organelas equivalentes aos lisossomos, denominadas

megassomas (Leao et al., 1995). A molécula H-2M, envolvida nos processos de apresentação de

16

antígenos e com função importante no momento da ligação dos peptídios à molécula de MHC-II,

também é internalizada por amastigotas de L. amazonensis e L. mexicana (Antoine et al., 1999).

A ativação das células T efetoras durante o reconhecimento do antígeno requer a presença de

moléculas co-estimulatórias. A B7.1 é uma molécula co-estimulatória presente na superfície de

macrófagos estimulados com microorganismo ou com LPS. Kaye e colaboradores (1994)

demonstraram que a infecção de macrófagos com L. donovani, em modelo in vitro e in vivo, inibe

a expressão da B7.1 na superfície do macrófago infectado, mesmo após o estímulo de LPS.

Até esse momento, os fatos apresentados deixam clara a idéia de que a interação da

Leishmania com o macrófago é um processo extremamente complexo e regulado. A

sobrevivência do parasita dentro do vacúolo envolve mecanismos de captação de nutrientes e de

controle da ativação dos macrófagos e da resposta imune mediada pelas células T.

1.6 - A VIDA EM UM VACÚOLO PARASITÓFORO – CARACTERIZAÇÃO DO VACÚOLO DE L.

amazonensis

A fagocitose constitui o passo inicial de uma célula para a degradação de partículas

inertes, células mortas ou agentes infecciosos. Após a internalização, os compostos fagocitados

ficam envolvidos pela membrana plasmática, formando uma organela na qual é denominada

fagossomo. A maturação do fagossoma acontece a partir de eventos dinâmicos de pequenas

fusões e fissões do vacúolo com vesículas endocíticas, processo descrito como “kiss and run”

(Desjardins, 1995), em que o fagossomo adquire novos marcadores de membrana e novo

conteúdo luminal. Receptores presentes na membrana plasmática e internalizados no fagossoma

no momento da fagocitose podem ser reciclados para a superfície da célula. Por outro lado,

proteínas características de endossomas como o receptor de manose-6-fosfato e proteínas

associadas à membrana de lisossomos (Lamp) são adquiridas durante a fagocitose. A

transformação do fagossoma também é caracterizada pela associação e dissociação de proteínas

da família de pequenas GTPases, conhecidas como Rab (Ras-related small GTP-binding

proteins), que estão envolvidas nos processos de fusão de membranas. O estágio final de

maturação é caracterizado pelo recebimento de enzimas lisossomais, passando então a ser

denominado de fagolisossoma. O fagolisossoma é hidrolítico, capaz de limitar a replicação de

bactérias e, em muitos casos, de matar microorganismos internalizados. Um desenho esquemático

da maturação do fagossoma contendo as principais proteínas envolvidas está representado na

figura 4.

17

Os endossomas participam ativamente de diferentes processos de sinalização. Durante a

formação destas estruturas, a internalização de receptores presentes na membrana plasmática

impede a ligação de novas moléculas sinalizadoras, inibindo a sinalização. Endossomas também

podem contribuir para o prolongamento do sinal gerado pela interação ligante/receptor na

membrana plasmática, através da sinalização continuada a partir do citoplasma da célula. Os

endossomas podem participar ainda de mecanismos de comunicação célula-célula. A sinalização

pode ser repassada de uma célula para a vizinha a partir de processo de transcitose de

endossomas. Vesículas endocíticas liberadas no espaço extracelular por exocitose também podem

ser internalizadas por células mais distantes no tecido, propagando a sinalização (Revisado em

González-Gaitán, 2003).

Fig. 4 – Desenho esquemático da maturação de um fagossoma contendo uma partícula de látex

opsonizada com IgG. A maturação do fagossomo acontece através da fusão e fissão com vesículas da via endossomal, processo descrito como “kiss and run” (Desjardins, 1995). Após a internalização o fagossoma apresenta proteínas características de endossomas recentes como o receptor de transferrina (Tf), EEA1 (Early endosomal antigen 1) e Rab 5 (Ras-related small GTP-binding proteins 5). Com o tempo, o fagossoma adquire proteínas características de compartimentos endossomais tardios, algumas transportadas através da via trans do Golgi, como a procatepsina D. A fusão com os lisossomas caracteriza a formação do fagolisossoma. O pH ácido ativa enzimas fagolisossomais como a catepsina D, demonstrada no esquema. LAMP1 (Lysosome-associated membrane glycoprotein 1) (Adaptado de Russell, 2001).

A maturação do fagossoma e seu destino no citoplasma podem ser regulados pela

partícula ou microorganismo presente em seu interior. Enquanto uma partícula inerte encontra a

via de degradação até a formação do fagolisossoma, alguns patógenos intracelulares evoluíram

mecanismos que interferem ou impedem a maturação do fagossoma, evitando o encontro com

18

muitos, ou mesmo todos, os mecanismos da via de degradação. Microorganismos como a bactéria

Listeria monocytogenes e o protozoário Trypanosoma cruzi escapam do fagossoma,

estabelecendo-se diretamente no citoplasma da célula hospedeira (Gaillard et al., 1987; Brener,

1973). Este mecanismo evita a permanência em um endossoma rico em proteases lisossomais e

permite aos parasitas a metabolização dos nutrientes presentes no citoplasma. O Toxoplasma

gondii tem seu desenvolvimento dentro de um fagossoma, descrito então como vacúolo

parasitóforo, que não é rompido após a internalização. Este vacúolo é caracterizado pela ausência

de proteínas de membrana da célula hospedeira, que são retiradas pelo parasita em um processo

ativo durante sua entrada na célula (Mordue et al., 1999). Este processo confere ao vacúolo

características não fusogênicas, evitando dessa forma a interação desta organela com as vesículas

da via endocítica. Outros parasitas que se desenvolvem em vacúolos parasitóforos podem

apresentar diferentes níveis de interação entre esta organela e os endossomas. O desenvolvimento

da bactéria Brucella abortus acontece em um vacúolo que interage e funde com membranas do

retículo endoplasmático. No entanto a fusão com as vesículas endocíticas e com lisossomas é

inibida (Celli et al., 2003). O vacúolo da bactéria Mycobacterium tuberculosis apresenta

características pré-fagolisossomas. No entanto o processo final de maturação que envolve a fusão

do vacúolo com os lisossomos é inibido, evitando assim o contato da bactéria com as enzimas

presentes no conteúdo lisossomal (Russell, 2001).

Diferente dos microorganismos descritos acima, o estabelecimento da Leishmania na

célula hospedeira acontece em um vacúolo que se funde com endossomas e apresenta

propriedades fagolisossomais. Entre as espécies de Leishmania podem ser observadas diferenças

significativas na morfologia do vacúolo (Fig. 5). Isto pode ser resultado de velocidades distintas

de fusão e fissão de endossomas e organelas no vacúolo parasitóforo ou diferenças nas interações

entre as espécies de Leishmania e a célula hospedeira. Amastigotas de espécies do Velho Mundo,

como L. donovani e L. major, sobrevivem em um vacúolo caracterizado como “justo” que

apresenta vários pontos de contato com a membrana do parasita e apenas uma amastigota em seu

interior (Castro et al., 2006). No entanto, espécies do Novo Mundo, como L. amazonensis e L.

mexicana, induzem a formação de vacúolos parasitóforos com um grande lúmen, descritos como

“largos”, que podem apresentar vários amastigotas, aderidas à membrana preferencialmente pela

região posterior (Benchimol e De Souza, 1981).

19

A Bn

n*

*

A Bn

n*

*

Fig. 5 – Diferenças morfológicas entre os vacúolos parasitóforos de espécies de Leishmania do Novo Mundo e do Velho Mundo. A) Vacúolos de Leishmania major (setas). A membrana do vacúolo é bem próxima à membrana do parasita, o que caracteriza o vacúolo como “justo”. Não há expansão do vacúolo nem mesmo no momento da divisão do parasita (*). B) Vacúolos de Leishmania amazonensis. É possível observar um grande lúmen (*), o que caracteriza o vacúolo como “largo”. As amastigotas ficam aderidas na membrana preferencialmente pela região posterior (setas). n = núcleo do macrófago. Barras = 1 μm. (Imagens retiradas de A) Castro et al., 2006; B) Shepherd et al., 1983).

Além de influenciar no formato do vacúolo as espécies de Leishmania também podem

influenciar na velocidade de maturação deste. Infecções com promastigotas de L. donovani são

caracterizadas por apresentar amadurecimento lento do vacúolo parasitóforo, conseqüência da

presença do LPG na superfície do parasita (Desjardins e Descoteaux, 1997; Scianimanico et al.,

1999). O LPG interage com microdomínios de lipídios presentes na membrana do vacúolo,

desorganizando estas estruturas e tornando o vacúolo menos fusogênico (Dermine et al., 2005).

Este processo fornece tempo suficiente para que o parasita diferencie para amastigota, forma

mais resistente às enzimas lisossomais que serão liberadas no vacúolo posteriormente. Em

infecções com L. mexicana, a participação do LPG não parece ter um papel importante durante a

diferenciação da forma promastigota para a amastigota no vacúolo parasitóforo. Ilg (2000)

demonstrou que promastigotas desta espécie com deleção do gene lpg1, que codifica para a

síntese de LPG, são capazes de infectar e proliferar em macrófagos de forma tão eficiente quanto

os promastigotas selvagens.

Em conseqüência da morfologia peculiar que os vacúolos das espécies de Leishmania do

Novo Mundo apresentam, há diversos trabalhos na literatura caracterizando a composição e a

dinâmica de formação destas estruturas. Vacúolos de L. amazonensis são altamente fusogênicos

com lisossomos, podendo depletar estas organelas do citoplasma da célula infectada nas

primeiras horas após a infecção (Barbieri et al., 1985; Antoine et al., 1990). Devido a esta

20

dinâmica, os vacúolos apresentam pH entre 4,74 e 5,26 (Antoine et al., 1990) e diversas proteases

lisossomais como as catepsinas B, H, L e D (Prina et al., 1990). Além da fusão com os

lisossomas, os vacúolos desta espécie também adquirem proteínas características de endossomas

tardios (Courret et al., 2002). Schaible e colaboradores (1999) demonstraram que vacúolos de L.

mexicana podem se fundir com autofagossomas. A fusão entre os vacúolos de Leishmania e

diferentes compartimentos do citoplasma da célula hospedeira fornece aos parasitas um

importante aporte de nutrientes dentro do vacúolo parasitóforo.

A velocidade de maturação do vacúolo parasitóforo de L. amazonensis é semelhante em

infecções com promastigotas metacíclicos ou amastigotas (Courret et al., 2002). As proteínas

características de endossoma tardio e lisossoma: Rab7, catepsinas B e D, macrosialina e Lamp1,

já são observadas no vacúolo parasitóforo após 30 min. de infecção. Estas proteínas podem ser

observadas no vacúolo, mesmo após grandes períodos de infecção, indicando que a interação do

vacúolo de L. amazonensis com endossomas tardios e lisossomas não é um processo transiente.

Mesmo apresentando características altamente fusogênicas, a interação entre o vacúolo de

L. amazonensis com vesículas da via endocítica não parece ser um processo aleatório. Veras e

colaboradores (1992) demonstraram que vacúolos contendo amastigotas podem fundir com

endossomas contendo zimozan, β-glicana e leveduras mortas pelo calor. Real e colaboradores

(2008) também demonstraram que vacúolos de macrófagos infectados com amastigotas de L

amazonensis fundem com vacúolos recentes de uma nova infecção, tanto de promastigotas como

amastigotas. No entanto, a fusão com endossomas contendo partículas de látex, eritrócitos

fixados e eritrócitos opsonizados com IgG é inibida. A bactéria Coxiella burnetti apresenta

vacúolo morfologicamente semelhante ao de L. amazonensis, também bastante fusogênico. No

entanto, diferente do observado para L. amazonensis esta bactéria não parece controlar

seletivamente a fusão do vacúolo com as vesículas endossomais (Veras et al., 1994). A

alcalinização dos vacúolos de L. amazonensis com cloroquina, cloreto de amônia ou monensina,

faz com que ocorra mais transferência de zimozan para o vacúolo parasitóforo (Veras et al.,

1992), sugerindo que o aporte de vesículas no vacúolo parasitóforo é um processo finamente

regulado pela amastigota.

Apesar da presença do conteúdo lisossomal no vacúolo de L. amazonensis, as formas

amastigotas desenvolveram diversas estratégias para sobreviverem neste ambiente de pH ácido.

Devido à ação de uma H+-ATPase na membrana das amastigotas, o pH intracelular é mantido em

torno de 6,36, o que não compromete a atividade das enzimas citoplasmáticas (Marchesini,

2002). Além disso, transportadores importantes para a aquisição de nutrientes como prolina,

21

glicose e poliaminas estão presentes na superfície das formas amastigotas e apresentam atividade

ótima em pH próximo ao do vacúolo parasitóforo (Glaser e Mukkada, 1992; Burchmore e Hart,

1995; Basselin et al., 2000).

Como descrito anteriormente para L. amazonensis, a velocidade de fusão dos vacúolos

com endossomas tardios/lisossomas é semelhante em infecções com as formas promastigotas

metacíclicos ou amastigotas. No entanto, a formação dos vacúolos grandes característicos desta

espécie apresenta cinéticas diferentes durante a infecção com as duas formas do parasita. Em

infecções com promastigotas, o vacúolo formado é justo e acompanha o corpo do parasita, sem

apresentar lúmen. Durante a diferenciação do parasita para a forma amastigota, o vacúolo sofre

redução de tamanho, acompanhando a perda do flagelo (Courret et al., 2002). Somente após 18 h

de infecção é possível observar uma expansão discreta da membrana do vacúolo parasitóforo.

Infecções com formas amastigotas, no entanto, induzem a formação de um vacúolo com lúmen

aparente detectável logo após 2 h de infecção. Moléculas expostas na superfície ou liberação de

fatores podem explicar a diferença na velocidade de expansão do vacúolo entre as duas formas

evolutivas do parasita.

22

2- Papel do fosfolipídio fosfatidilserina em diferentes modelos biológicos

2.1 – ESTRUTURA E COMPOSIÇÃO DA MEMBRANA PLASMÁTICA

Membranas de células de mamíferos podem apresentar mais de 1000 diferentes tipos de

fosfolipídios, com a diversidade originada a partir de uma grande variedade de cadeias de ácido

graxo que são esterificadas nas posições sn-1 e sn-2 do esqueleto de glicerol. A diversidade dos

fosfolipídios define a fluidez da membrana que, por sua vez, regula as propriedades das proteínas

presentes nela. O fosfolipídio mais abundante nas membranas de células de mamíferos é a

fosfatidilcolina (PC), representando de 40 a 50% do total de fosfolipídios. Outros como a

fosfatidiletanolamina (PE), fosfatidilserina (PS), fosfatidilinositol (PI) e esfingomielina (SM)

também apresentam quantidades significativas na composição de membranas de células

eucarióticas (Vance e Steenbergen, 2005). A localização de cada fosfolipídio na membrana é

fundamental para o desempenho das funções celulares. Células viáveis apresentam assimetria na

composição de fosfolipídios entre os dois folhetos da bicamada lipídica. Aproximadamente 100%

do PS e 80% do PE são encontrados na face interna e 75% do PC e 80% da SM são encontradas

na face externa da membrana plasmática (Diaz e Schroit, 1996). A distribuição assimétrica é

mantida através de enzimas denominadas translocases, que catalisam o movimento vertical de

fosfolipídios na membrana, chamado flip-flop ou translocação bidirecional, redirecionando as

moléculas para o seu sítio habitual. Essas enzimas são denominadas fosfolipídio-translocases,

sendo que as flopases direcionam os lipídios para a face externa enquanto que as flipases

induzem o movimento contrário (Diaz e Schroit, 1996).

O PS representa quantitativamente a menor porção de fosfolipídios da membrana. Em

células de mamíferos ele representa de 2 a 10% do total de fosfolipídios, com esta porcentagem

variando em diferentes tecidos ou tipos celulares (Vance e Steenbergen, 2005). Apesar da pouca

quantidade de PS observada na composição da bicamada lipídica, sua distribuição assimétrica na

membrana plasmática e seu envolvimento em vias de sinalização representam um importante

papel deste fosfolipídio em processos biológicos.

2.2 – PERDA DA SIMETRIA DE MEMBRANA – O MODELO DE CÉLULAS APOPTÓTICAS

A apoptose é um tipo de Morte Celular Programada (MCP) que apresenta um importante

papel no desenvolvimento, mantém um número estável de células e controla funções em vários

sistemas como o imune, o nervoso e o sangüíneo (Welburn et al. 1997). Diferente de uma célula

23

necrótica que apresenta ruptura na membrana e liberação do conteúdo intracelular, uma célula

apoptótica é rapidamente fagocitada como corpos apoptóticos intactos por células do tecido ou

por fagócitos como os macrófagos e células dendríticas imaturas. Desta forma células auto-

reativas, que já desempenharam sua função, que foram infectadas ou que sofreram algum tipo de

estresse físico ou químico, são eliminadas sem iniciar um processo inflamatório danoso ao tecido

adjacente (Savil e Fadok, 2001).

A morte por apoptose pode ser desencadeada por diversos estímulos que vão desde o

estresse em organelas intracelulares até a sinalização mediada por receptor. Uma importante

característica bioquímica deste processo é a ativação de diversas cisteíno proteases, conhecidas

como caspases. As caspases são secretadas como zimógenos e posteriormente convertidas em

proteases ativas. A clivagem proteolítica de diferentes substratos celulares pelas caspases

determina as principais características do processo de morte celular por apoptose (Sun et al.,

1999). Dentre estas características estão: condensação da cromatina, degradação

oligonucleossomal do DNA com fragmentação do núcleo, arredondamento da célula com

redução do volume e formação de extrusões da membrana plasmática (blebs) (Kroemer et al.,

2005).

As modificações bioquímicas sofridas por uma célula em apoptose resultam na exposição

de múltiplos ligantes na superfície. Eles podem ser reconhecidos por diversos receptores na

membrana dos fagócitos, atuando de modo redundante e otimizando a capacidade do organismo

em remover rapidamente estas células (deCathelineau e Henson, 2003; Moreira e Barcinski,

2004). Estes ligantes diferenciam as células apoptóticas das viáveis, facilitando o reconhecimento

pelos fagócitos, e foram descritos na literatura como “eat-me signals” (Fig. 6). Outras moléculas

de superfície, como o CD31 e o CD47, foram descritas como “don´t eat-me signals”, servindo

como sinalizadoras de inibição da fagocitose destas células (Brown et al., 2002; Gardai et al.,

2005). Um dos mais bem caracterizados “eat-me signal” apresentado por células apoptóticas é o

fosfolipídio PS, exposto na superfície da célula em conseqüência da perda de simetria da

membrana plasmática (Fadok et al., 1992; van der Eijnde, 1998). A exposição do PS na

superfície da célula apoptótica não compromete a integridade da membrana e precede os eventos

de degradação do DNA (Venhoven et al., 1995). O PS exposto serve como um sinal para a

remoção não-inflamatória das células apoptóticas, que será descrito com mais detalhes a seguir

(Fadok et al. 1992, Venhoven et al., 1995; Fadok et al., 2001).

24

Fig. 6 – Diferença de exposição de moléculas de superfície entre células viáveis e células apoptóticas. A

exposição de “eat-me signals” na superfície da célula apoptótica favorece seu reconhecimento e remoção pelos

fagócitos (Modificado de Lauber et al., 2004).

A exposição de PS é resultado de dois eventos que ocorrem simultaneamente: (1) ativação

de uma proteína integral de membrana denominada escramblase (scramblase), dependente de

Ca++, que aumenta o movimento bidirecional dos lipídios através da bicamada (conhecido como

“flip-flop” ou translocação bidirecional) e, (2) inativação de uma aminofosfolipídio translocase

que normalmente retorna o PS para o lado citoplasmático da membrana (Verhoven et al. 1995;

Bratton et al., 1997). O PS na superfície da célula apoptótica pode ser detectado utilizando

anexina V, proteína que se liga ao fosfolipídio de forma dependente de Ca2+, ou utilizando

anticorpos que reconhecem o PS diretamente ou conjugado a outra proteína (Mourdjeva et al.,

2005; Ran et al., 2005). A exposição do fosfolipídio na membrana não ocorre de forma

homogênea, mas em locais preferenciais formando agregados de fosfolipídios ou patches,

especialmente na região dos blebs (Henson et al., 2001, Gardai et al., 2005). A figura 7 mostra a

dinâmica do processo de exposição de PS em células Jurkat tratadas com H2O2, um potente

indutor de apoptose (Mourdjeva et al., 2005).

25

Fig. 7 – Dinâmica do aparecimento de fosfatidilserina (PS) na superfície de células apoptóticas.

Microscopia de fluorescência de células Jurkat tratadas com 0,15 mM de H2O2 durante 1 h, a 37oC. Após a incubação

as células foram lavadas, mantidas em meio RPMI e marcadas com anticorpo monoclonal 1H6, específico para PS,

nos tempos respectivos (Retirado de Mourdjeva et al., 2005).

2.3 – RECONHECIMENTO DE FOSFATIDILSERINA

O PS exposto na superfície da célula apoptótica pode ser reconhecido a partir da ligação de

fatores séricos que possuem afinidade por este fosfolipídio e fazem a ligação entre a célula

apoptótica e o fagócito. A proteína S, por exemplo, descrita inicialmente pela atividade

anticoagulante, através da sua propriedade de ligação a fosfolipídios aniônicos é capaz de se ligar

ao PS exposto na superfície de células apoptóticas, estimulando a fagocitose destas (Anderson et

al., 2003). O produto do gene gas6 (Growth arrest specific gene 6) apresenta afinidade pelo PS

exposto na célula apoptótica (Nakano et al., 1997). Através da ligação ao seu receptor tirosina

quinase Mer, presente na membrana do fagócito, o Gas6 é capaz de aumentar em duas vezes a

fagocitose de células apoptóticas e de lipossomas contendo PS (Ishimoto et al., 2000). A

glicoproteína β2-GPI (β2-glicoprotein) também reconhece PS na superfície da célula apoptótica e

interage com a membrana de fagócitos (Balasubramanian e Schroit, 1998). Recentemente foi

demonstrado que o complexo β2-GPI-célula apoptótica é internalizado através de um receptor

pertencente a família dos receptores de LDL (Low Density Liprotein) (Maiti et al., 2008). A

glicoproteína MFG-E8 (Milk Fat Globule-EGF-factor 8), produzida por macrófagos estimulados

com tioglicolato, reconhece a fosfatidilserina e se liga a células apoptóticas. Por possuir um

domínio RGD (arginina-glicina-aspartato), a MFG-E8 se liga à integrinas αvβ3 em fagócitos,

26

servindo assim de molécula-ponte para a internalização de células apoptóticas (Hanayama et al.,

2002). O PS exposto em células apoptóticas também pode ser reconhecido por componentes do

sistema complemento. Païdassi e colaboradores (2008) demonstraram que a região globular do

C1q interage com o domínio de fosfoserina do PS. A interação entre estas duas moléculas é

inibida na presença de anexina V e pode ser observada nos estágios iniciais de apoptose, quando

a exposição de PS está organizada em forma de patches na membrana.

Outra forma de reconhecer o PS na superfície das células apoptóticas é através de

receptores específicos presentes na membrana dos fagóticos. O primeiro receptor foi descrito por

Fadok e colaboradores (2000). Neste trabalho os autores identificaram um anticorpo monoclonal

que bloqueia a fagocitose de células apoptóticas de forma dependente de PS. O epítopo

reconhecido por este anticorpo foi isolado pela técnica de phage display e o gene que codifica

para este epítopo foi identificado como sendo o receptor de PS (PSR). O PSR foi descrito como

uma proteína transmembrana e a expressão deste receptor em células não fagocíticas aumentou a

eficiência de fagocitose destas células (Fadok et al., 2000). A partir da caracterização da estrutura

protéica e gênica do PSR, diversos grupos desenvolveram camundongos homozigotos com

deleção do gene psr (Li et al., 2003; Kunisaki et al., 2004; Böse et al., 2004). Como consenso, foi

observado que a deleção deste gene é letal para os camundongos. Experimentos posteriores com

substituição dos primeiros exons do gene psr (de um total de 6 exons) por um gene de resistência

a neomicina levaram a resultados conflitantes entre estes grupos. Li e colaboradores (2003)

observaram anomalias no pulmão, no sistema nervoso central e redução da fagocitose de células

apoptóticas por macrófagos derivados de precursores retirados do fígado de fetos homozigotos

para a mutação. As alterações observadas por Kunisaki e colaboradores (2004) foram

relacionadas com defeito na eritropoiese, anemia intensa e atrofia tímica, resultando em falhas no

desenvolvimento de linfócitos T. Os autores demonstraram acúmulo de células apoptóticas no

fígado e no timo, porém sem a presença de inflamação, sugerindo que a fagocitose destas células

não estava inibida, e sim retardada. Böse e colaboradores (2004) observaram que os

camundongos mutados apresentavam retardo na diferenciação terminal de rins, intestino, pulmão,

fígado e olhos. No entanto, não foi encontrado acúmulo de células apoptóticas em nenhum destes

órgãos e macrófagos derivados do fígado fetal não apresentaram dificuldades em fagocitar

células apoptóticas. Os autores concluíram então que o PSR possui funções essenciais durante a

embriogênese, mas que não está envolvido na fagocitose de células apoptóticas. Mais

recentemente, Mitchel e colaboradores (2006) desenvolveram uma linhagem de fibroblastos a

partir de células de camundongos deficientes para o PSR. Os autores demonstraram que a

27

ausência do PSR nos fibroblastos não influencia no reconhecimento, na fagocitose ou na resposta

às células apoptóticas. Em experimentos de fusão do PSR com a proteína GFP os autores

demonstraram que a localização deste receptor é nuclear. A localização nuclear do PSR já havia

sido demonstrada anteriormente em células de mamíferos (Cui et al., 2004) e em Hydra (Cikala

et al., 2004) e foi descrita recentemente em Drosophila (Krieser et al., 2007), contradizendo os

resultados apresentados por Fadok e colaboradores (2000).

Recentemente, outros trabalhos têm demonstrado a caracterização de receptores específicos

para PS na superfície de fagócitos, não relacionados ao gene psr. Miyanishi e colaboradores

(2007) identificaram um anticorpo monoclonal capaz de inibir a fagocitose de células apoptóticas

por macrófagos de camundongos. Esta identificação foi realizada a partir da análise de uma

biblioteca de anticorpos monoclonais de hamster capazes de reconhecer macrófagos peritoniais

de camundongo. O antígeno reconhecido pelo anticorpo foi identificado por expressão clonal

como uma proteína transmembrana denominada Tim4 (T-cell immunoglobulin and mucin

domain-containing molecule). Através do seu domínio imunoglobulina o Tim4 reconhece

especificamente o PS, não interagindo com PC, PI ou PE. Tim4 é expresso em células Mac1+ de

vários tecidos incluindo fígado fetal, linfonodos e baço de camundongos. A transfecção de Tim4

em fibroblastos NIH3T3 aumentou a fagocitose de células apoptóticas. No entanto, o bloqueio

deste receptor com anticorpo específico inibiu este efeito de forma dose-dependente. Em outro

trabalho, Park e colaboradores (2007) caracterizaram a proteína stabilin-2, um receptor descrito

anteriormente como scavenger receptor, com função de reconhecimento de PS. Utilizando a

técnica de RT-PCR os autores demonstraram que este receptor é expresso na superfície de

diferentes linhagens de macrófagos, em macrófagos alveolares e em macrófagos humanos

derivados de monócitos (HMDM). O receptor stabilin-2 reconhece o PS na superfície de

hemácias senescentes e de células apoptóticas, aumentando a fagocitose. O bloqueio com

anticorpo anti-stabilin-2 ou a inibição da expressão desta molécula utilizando técnica de short

harpin de RNA inibe a fagocitose de células apoptóticas. O reconhecimento de PS por este

receptor é estéreo-específico e o tratamento com anticorpo anti-stabilin-2 induz a produção de

TGF-β por células HMDM. Posteriormente, foi identificado outro receptor de PS envolvido no

reconhecimento e fagocitose de células apoptóticas, o BAI1 (Park et al., 2007). BAI1 (Brain

specific angiogenesis inhibitor 1) é uma proteína transmembrana da família dos receptores

acoplados à proteína G. Os autores demonstraram que a ligação do PS ao receptor BAI1 induz a

ativação do complexo citoplasmático ELMO/Dock180/Rac, já bem caracterizado pelo

envolvimento na fagocitose de células apoptóticas. Até o momento estes são os receptores

28

descritos para o reconhecimento específico da molécula de PS na superfície da célula apoptótica.

Devido à importância que o reconhecimento e a rápida remoção destas células apresentam para a

manutenção da viabilidade dos tecidos, é muito provável que novos receptores de PS sejam

descritos no futuro.

2.4 – CONSEQÜÊNCIAS DA EXTERNALIZAÇÃO DE PS NO RECONHECIMENTO DE CÉLULAS

APOPTÓTICAS.

A fagocitose das células apoptóticas modula o perfil de expressão de citocinas secretadas

pelos fagócitos, contribuindo para a remoção silenciosa destas células do tecido. Experimentos in

vitro demonstram que macrófagos que fagocitam células apoptóticas secretam citocinas como

TGF-β e IL-10, prostaglandina E2 (PGE2) e PAF (Platelet-activating factor) que podem

potencialmente inibir o processo inflamatório (Voll et al., 1997; Fadok et al., 1998). Entre as

citocinas pró-inflamatórias que são inibidas após o reconhecimento das células apoptóticas,

destacam-se o TNF-α, IL-1β, IL-8 e IL-12. A inibição da produção destas citocinas é observada

mesmo após o tratamento dos macrófagos com LPS (Voll et al., 1997; Fadok et al., 1998).

A exposição do PS na célula apoptótica tem sido demonstrada como importante

moduladora da resposta de fagócitos a estas células. A produção de TGF-β pelos macrófagos

ocorre de forma dependente do reconhecimento de PS na superfície da célula apoptótica (Huynh

et al., 2002) e sua ação autócrina/parácrina está envolvida na inibição da produção de citocinas

pró-inflamatórias (Fadok et al., 1998). Kim e colaboradores (2004) demonstraram que o contato

da célula apoptótica induz no fagócito a ligação de GC-BP (uma proteína com domínio zinc

finger) ao promotor da IL-12, inibindo a produção desta citocina. Este efeito também foi

observado com a adição de lipossomas de PS, indicando que o reconhecimento deste fosfolipídio

na membrana da célula apoptótica é responsável pela inibição da produção de IL-12. Além da

modulação da produção de citocinas pelos macrófagos, o sinal do PS também é capaz de inibir a

maturação de células dendríticas. Células dendríticas derivadas de monócitos humanos

apresentam diminuição na expressão das moléculas HLA-A, B e C, HLA-DR, CD80, CD86,

CD40 e CD83 após incubação com células apoptóticas ou lipossomas de PS (Chen et al., 2004).

Experimentos realizados in vitro indicam que estas células possuem a capacidade diminuída de

apresentação de antígenos, produção de IL-12 e ainda inibição do potencial de ativação de célula

T.

29

O processo de internalização de células apoptóticas apresenta características especiais e

envolve a ativação de diferentes vias no citoplasma do fagócito. Dois grupos de genes envolvidos

em duas vias redundantes de internalização foram caracterizados em Caenorhabditis elegans. A

primeira via envolve os genes CED-1, CED-6 e CED-7 e a segunda via os genes CED-2, CED-5

e CED-12. As proteínas homólogas destas vias foram identificadas em células de mamíferos. Na

primeira, foram identificadas as proteínas LRP1/MEGF10 (um receptor scavenger

transmembrana), GULP (uma proteína adaptadora) e os transportadores ABCA1/ABCA7. A

segunda via apresenta as proteínas CrkII (uma proteína adaptadora), Dock180 e ELMO

(complexos trocadores do núcleotídeo guanidina) (Revisado por Kinchen e Ravichandran, 2007).

Estas duas vias atuam independentemente resultando na ativação das Rho GTPases CED-10 em

C. elegans e Rac-1 em células de mamíferos (Kinchen et al., 2005). Estas GTPases apresentam

função importante na organização do citoesqueleto de actina, no momento da internalização da

célula apoptótica. A ativação de Rac-1 induz a formação de ondas (ruffles) na membrana do

fagócito. Desta forma a célula apoptótica é internalizada por macropinocitose, um tipo de

endocitose caracterizado pela internalização de partículas em vesículas grandes, com

aproximadamente 5 μm de diâmetro, resultando na internalização conjunta de soluto extracelular

(Swanson e Watts, 1995).

A participação do PS na indução da macropinocitose de células apoptóticas foi descrita

por Hoffmann e colaboradores (2001). O processo envolve dois mecanismos: “tether”, quando

ocorre a adesão da célula apoptótica na membrana do fagócito por meio de diversos receptores e

ligantes que já foram descritos anteriormente; e “tickling”, quando ocorre a interação do PS com

ligantes na superfície do fagócito. O reconhecimento do PS induz a ativação do citoesqueleto, um

intenso ruffling de membrana e a macropinocitose da célula apoptótica. Fluidos e partículas

adjacentes à célula também são internalizados por este processo. Um desenho esquemático com

as etapas deste mecanismo está demonstrado na figura 8.

30

Figura 8 – Internalização de célula apoptótica por mecanismo de “tether and tickling”. O fosfolipídio

fosfatidilserina exposto na célula apoptótica é um ligante de sinalização que induz o ruffling da membrana

(Modificado de Henson et al., 2001).

2.5 – RECONHECIMENTO DE CÉLULAS APOPTÓTICAS EM MECANISMOS DE INFECÇÃO

PARASITÁRIA E APOPTOSE EM ORGANISMOS UNICELULARES

A partir das características não inflamatórias induzidas durante a internalização de células

apoptóticas, alguns trabalhos mostraram a participação destas células como facilitadoras da

infecção por diferentes parasitas. Van Zandbergen e colaboradores (2004) demonstraram um

mecanismo descrito como “Cavalo de Tróia” em infecções com L. major. Neste modelo, formas

promastigotas infectam neutrófilos que, por sua vez, entram em apoptose e são fagocitados por

macrófagos. A internalização através do reconhecimento do neutrófilo apoptótico evita o contato

direto do parasita com receptores macrofágicos e induz a produção TGF-β. Desta forma, a

entrada do parasita no macrófago é facilitada e a ativação desta célula inibida, resultando no

estabelecimento da infecção. Durante a infecção experimental com T. cruzi, Lopes e

colaboradores (1995) observaram grande número de células T CD4+ apoptóticas no baço de

camundongos infectados. Posteriormente os autores demonstraram que a presença de células T

apoptóticas em culturas de macrófagos infectados resulta em aumento da infecção. O

reconhecimento das células apoptóticas pelos macrófagos facilita o crescimento do T. cruzi

intracelular através da indução da produção de TGF-β, poliaminas e prostaglandina E2 pela célula

31

hospedeira (Freire-de-Lima et al., 2000). Nestes modelos, as interações entre as células

apoptóticas e os macrófagos indicam mecanismos parasitários de inibição da resposta

inflamatória e evasão da morte no momento da infecção da célula hospedeira.

Na final da década de 90, diversos trabalhos demonstraram características de morte

celular programada em vários organismos unicelulares, sugerindo o aparecimento deste tipo de

morte na escala evolutiva antes mesmo do desenvolvimento da multicelularidade. Utilizando

diferentes mecanismos para a indução de morte, como restrição de nutrientes ou adição de

drogas, características do processo de morte celular programada foram descritas em diversos

microorganismos, com destaque para os tripanosomatídeos Trypanosoma cruzi (Ameisen et al.,

1995), T. brucei brucei (Ridgley et al., 1999), T. brucei rodhesiense (Welburn et al., 1996),

Leishmania donovani (Das et al., 2001; Lee et al., 2002), L. amazonensis (Moreira et al., 1996),

L. mexicana e L. major (Zangger et al., 2002). A vantagem deste tipo de morte celular para a

homeostase e o desenvolvimento de organismos multicelulares é inquestionável e falhas nos

mecanismos de reconhecimento ou endocitose destas células resultam no aparecimento de

tumores ou de doenças auto-imunes. No entanto, a partir destes trabalhos, várias discussões sobre

as vantagens do processo de morte celular programada para um organismo unicelular foram

levantadas. Analisando a população com um todo, a morte controlada ou induzida de alguns

indivíduos poderia ser importante no controle populacional em um ambiente com restrição de

nutrientes, manutenção da viabilidade do hospedeiro evitando uma infecção exacerbada ou na

eliminação de indivíduos não funcionais, mantendo o potencial infectivo e a sobrevivência da

população. Semelhante ao que ocorre no reconhecimento de células apoptóticas foi demonstrado

que um microorganismo apoptótico pode se beneficiar dos processos antiinflamatórios induzidos

no momento do seu reconhecimento. Van Zandbergen e colaboradores (2006) demonstraram que

o sucesso da infecção com promastigotas de L. major, em modelos in vitro e in vivo, depende da

presença de parasitas apoptóticos no inóculo no momento da infecção. Durante a fase

estacionária de culturas de promastigotas, aproximadamente 50% dos parasitas morre por

apoptose com arrendondamento do corpo celular, desorganização da estrutura do cinetoplasto,

condensação da cromatina nuclear e exposição de PS. O reconhecimento dos parasitas

apoptóticos induz a produção de TGF-β pelos neutrófilos criando um ambiente anti-inflamatório

que propicia a sobrevivência das formas não apoptóticas. Mecanismos semelhantes de

cooperação entre promastigotas apoptóticos e viáveis no momento da infecção também foram

observadas em promastigotas de L. amazonensis (Wanderley et al., manuscrito em preparação).

Em populações de Toxoplasma gondii purificadas do peritônio de camundongos, células que

32

expõem PS na superfície representam aproximadamente 50% da cultura. A exposição de PS é um

fator de virulência importante durante a infecção por este parasita e resulta em mecanismos de

evasão da ativação macrofágica, com inibição da produção de NO e aumento da produção de

TGF-β pelos macrófagos (Seabra et al, 2004). Em experimentos com diferentes formas

evolutivas do T. cruzi, foi observado que apenas as formas infectivas deste parasita, ou seja, as

tripomastigotas, apresentam exposição de PS na superfície (DaMatta et al., 2007). O

reconhecimento dessa molécula na superfície das tripomastigotas também está relacionado à

inibição da produção de NO por macrófagos. Esses trabalhos sugerem que a habilidade em

induzir uma resposta antiinflamatória utilizando características de células apoptóticas parece ser

um mecanismo comum entre parasitas intracelulares, que precisam lidar com mecanismos

microbicidas da células hospedeiras.

2.6 – FATORES DE VIRULÊNCIA EM Leishmania

No interior do trato digestivo do inseto vetor, as formas promastigotas proliferam e

passam por um processo de diferenciação que resulta na formação de células altamente

infectivas, os promastigotas metacíclicos (Sacks e Perkins, 1984). Estas formas são inoculadas no

hospedeiro vertebrado no momento do repasto sangüíneo do inseto, permanecendo diretamente

em contato com o sangue do hospedeiro. As promastigotas precisam evitar a destruição pelo

sistema imune antes de serem internalizadas por monócitos sangüíneos ou neutrófilos. Por isso,

apresentam moléculas na superfície que auxiliam no escape do mecanismo de lise pelo

complemento e ainda atuam de forma a facilitar a entrada do parasita na célula hospedeira. A

principal proteína antigênica presente na superfície das formas promastigotas é a glicoproteína

gp63, ou MSP (major surface protease), uma metaloprotease ancorada em

glicosilfostatidilinositol (GPI). A gp63 cliva C3b em iC3b, prevenindo a ativação do complexo de

ataque à membrana (MAC) e inibindo a lise mediada pelo complemento. O iC3b também

opsoniza as promastigotas e favorece o reconhecimento destas pelos receptores CR3 (complement

receptor 3) e Mac-1 dos macrófagos (Brittingham et al., 1995). Outro fator de virulência

importante para a infecção de promastigotas é o lipofosfoglicano (LPG), um complexo

glicolipídico formado por unidades repetidas de galactose (β1-4) e manose (α1) ancoradas a uma

cauda de GPI. Formas promastigotas metacíclicas apresentam um alongamento da molécula de

LPG, o que protege o parasita da lise mediada pelo sistema complemento (Puentes et al., 1988).

Proteínas ligadoras de manose (MBP) ou proteínas C reativas de fase aguda também podem se

33

ligar à molécula de LPG, aumentando o reconhecimento pelos macrófagos e facilitando a

fagocitose das formas promastigotas (Descoteaux e Turco, 1999). Após a fagocitose, o LPG pode

retardar a fusão entre o vacúolo contendo a Leishmania e os endossomas e lisossomas da célula

hospedeira (Desjardins e Descoteaux, 1997). Este processo fornece tempo suficiente para que o

parasita diferencie para amastigota, forma mais resistente às enzimas lisossomais que serão

liberadas no vacúolo posteriormente.

As formas amastigotas de Leishmania são liberadas dos macrófagos após a lise daqueles

altamente infectados, mecanismo responsável pela disseminação da infecção no hospedeiro

vertebrado. Moléculas importantes para a infectividade das formas promastigotas, como o LPG e

gp63, apresentam um papel menos central na virulência das formas amastigotas (Bahr et al.,

1993). Para estas células, a opsonização por anticorpos e o reconhecimento via receptor de Fc

parece ser o mecanismo mais importante durante a internalização (Guy e Belosevic, 1993; Kima

et al., 2000). Além do papel na opsonização, os anticorpos também podem apresentar funções

importantes na ativação de células T CD4+ específicas ao parasita. Recentemente Soong e

colaboradores (2008) demonstraram que a opsonização de amastigotas de L. amazonensis na

presença de células B ou de soro de animais imunizados induz uma maior ativação de células T

CD4+ específicas para o parasita. As amastigotas opsonizadas induzem maior estimulação das

células dendríticas e estas, por sua vez, induzem maior ativação e migração de células T CD4+

para os sítios de infecção. Devido à importância da presença de células T CD4+ ativadas durante

a patogênese desta espécie, os autores demonstram um papel crucial da presença de anticorpos

opsonizantes para o estabelecimento da infecção com L. amazonensis.

2.7 - MIMETISMO APOPTÓTICO EM Leishmania amazonensis

Formas promastigotas de L. amazonensis morrem por apoptose quando submetidas a

choque térmico. Isto foi observado em experimentos de transferência dos parasitas da

temperatura de crescimento in vitro, para a temperatura de crescimento in vivo (de 22oC para

37oC, respectivamente) (Moreira et al., 1996). Durante este processo, os parasitas apresentam

mudanças morfológicas características de uma célula apoptótica como fragmentação da

cromatina e clivagem de DNA (Moreira et al., 1996). Formas amastigotas desta espécie, quando

purificadas de lesões em camundongos, expõem PS na superfície (Balanco e Moreira et al.,

2001). No entanto, estas células são viáveis, altamente infectivas e replicam em macrófagos após

a infecção, o que sugere que não estão morrendo por apoptose. Os autores observaram que,

34

semelhante ao que ocorre durante o reconhecimento de células apoptóticas, o reconhecimento

destas amastigotas pelo macrófago induz um fenótipo anti-inflamatório, com produção de TGF-

β, IL-10 e inibição da produção de NO (Balanco e Moreira et al., 2001). Por estas características,

o mecanismo de exposição de PS em amastigotas de L. amazonensis purificadas de lesão foi

denominado Mimetismo Apoptótico, demonstrado esquematicamente na figura 9 (Balanco e

Moreira et al., 2001).

A exposição de PS na superfície das amastigotas pode variar de acordo com o perfil

genético do camundongo infectado. Quando isoladas de lesões em camundongos BALB/c

(suscetíveis à leishmaniose), as amastigotas expõem significativamente mais PS na superfície que

quando isoladas de camundongos C57BL/6 (resistentes à doença) (Wanderley et al., 2006). A

quantidade de PS exposta na superfície do parasita contribui significativamente para a

infectividade. Amastigotas isoladas de camundongos BALB/c desenvolvem lesões maiores em

camundongos F1 (BALB/c x C57BL/6) que amastigotas isoladas de camundongos C57BL/6.

Estes resultados foram confirmados em experimentos in vitro com infecção de macrófagos

isolados também de camundongos F1 (Wanderley et al., 2006). A exposição de PS nas

amastigotas induz a internalização destas células por processo de macropinocitose, assim como

demonstrado para células apoptóticas. A ativação da macropinocitose, a indução da produção de

TGF-β e IL-10 e a inibição da síntese de NO são processos diretamente dependentes da

quantidade de PS exposta na superfície das amastigotas. Todos estes processos podem ser

revertidos através do bloqueio do reconhecimento deste fosfolipídio com Anexina V (Wanderley

et al., 2006).

A necessidade de invadir células hospedeiras fez com que as formas infectivas de

Leishmania desenvolvessem estratégias para este fim. A exposição de PS facilita tanto a

internalização como a sobrevivência e proliferação do parasita no interior dos macrófagos. A

exposição deste fosfolipídio nas formas promastigotas e amastigotas apresenta características

diferentes. Nas formas promastigotas aparece como parte de um processo de morte celular, após

os parasitas alcançarem a diferenciação terminal como metacíclicos (Wanderley et al.,

manuscrito em preparação). Nas formas amastigotas, a exposição pode ser modulada pelo

hospedeiro e ainda não está elucidado se ela faz parte de um processo de morte ou se é transiente,

acontecendo apenas no momento da infecção do macrófago.

35

Figura 9 – Mimetismo apoptótico em amastigotas de Leishmania amazonensis. Semelhante ao que ocorre

durante o reconhecimento de células apoptóticas, a exposição de fosfatidilserina na superfície da amastigota induz a

produção de citocinas anti-inflamatórias pelo macrófago, como o TGF-β. Desta forma, os mecanismos microbicidas

são inibidos, favorecendo o crescimento do parasita. (Ilustração: Fernando Real).

36

II – OBJETIVOS

A exposição de PS na superfície de amastigotas de L. amazonensis representa um

importante mecanismo de virulência, modulando a ativação macrofágica e, como conseqüência,

permitindo a sobrevivência do parasita no interior dos macrófagos. Devido a importância deste

processo na infecção por esta espécie, este trabalho tem como:

OBJETIVO PRINCIPAL:

Determinar os mecanismos envolvidos na interação L. amazonensis/célula hospedeira que

resultam na exposição de PS pelo parasita, bem como as conseqüências desta exposição para o

estabelecimento da infecção.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS:

1 – Devido às diferenças na exposição de PS observadas em amastigotas isoladas de lesões em

camundongos C57BL/6 e BALB/c, caracterizar a contribuição macrofágica para a exposição

diferencial de PS pelas amastigotas, utilizando modelos de infecção in vitro de macrófagos

isolados destes camundongos;

2- Definir o papel de produtos da resposta imune na modulação da exposição de PS pelas

amastigotas em lesão de camundongos, utilizando como modelo camundongos BALB/cnu/nu;

3 – Determinar a contribuição de produtos da resposta imune na modulação da exposição de PS

pelas amastigotas através de ensaios in vitro utilizando células de linfonodo drenante de lesão em

camundongos BALB/c ou o sobrenadante destas estimuladas previamente com antígenos do

parasita;

4 – Em vista da exposição de PS induzir processo de macropinocitose durante a internalização

das formas amastigotas, determinar a contribuição da sinalização por este fosfolipídio para a

formação dos grandes vacúolos parasitóforos característicos de infecção com L. amazonensis;

5 – Determinar se a exposição de PS na superfície das amastigotas intracelulares está envolvida

na modulação da atividade macrofágica como indução da produção de TGF-b e inibição da

produção de óxido nítrico;

6 – Verificar se o PS exposto na superfície das amastigotas apresenta uma conformação

preferencial ou é distribuído uniformemente por toda a superfície do parasita.

37

III - MATERIAIS E MÉTODOS

PURIFICAÇÃO DE AMASTIGOTAS DE LESÃO EM CAMUNDONGOS

Camundongos BALB/c, BALB/cnu/nu, 129 ou 129 IFNγ-/- com 8 semanas de idade foram

infectados no coxim plantar com 2 x 106 promastigotas de Leishmania (L) amazonensis, cepa

LV79 (MPRO/BR/72/M 1841-LV-79) ou Leishmania major cepa Friedlin

(MHOM/IL/80/Friedlin). A partir da 5ª semana após a infecção os animais foram sacrificados e a

lesão na pata foi removida em condições estéreis. Tecido necrosado, nervos e ossos foram

retirados e a lesão foi macerada em um homogenizador de vidro tipo potter (Thomas Scientific)

contendo 5 ml de DMEM (Dulbecco's Modified Eagle's Medium – Gibco, Califórnia, EUA). O

material foi centrifugado a 50 g, 4oC, durante 10 min. para retirar os restos de tecido. O

sobrenadante contendo os parasitas foi transferido para um novo tubo, centrifugado (1.500 g, 17

min., 4ºC) e o pellet foi lavado 3 x em meio DMEM. Ao final da última centrifugação as

amastigotas foram incubadas durante 2 horas em meio DMEM contendo 4% de SFB (soro fetal

bovino – Gibco, Califórnia, EUA), sob agitação, a 34ºC. Após a incubação os parasitas foram

lavados novamente em meio DMEM (3x), ressuspendidos em DMEM contendo 4% de SFB e

permaneceram em estufa 34ºC durante 12 horas. Antes de serem utilizadas nos experimentos as

amastigotas foram lavadas 3x em meio DMEM.

OBTENÇÃO DE FORMAS PROMASTIGOTAS

Amastigotas isoladas de camundongos foram mantidas em estufa a 26oC, em meio DMEM sem

bicarbonato de sódio e contendo 10% de SFB. Após 3 dias nesta temperatura as formas

amastigotas já estão diferenciadas para promastigotas. As culturas de promastigotas foram

utilizadas até um máximo de 8 passagens in vitro, com repiques realizados entre 4 e 5 dias de

cultura.

OBTENÇÃO DE MACRÓFAGOS PERITONIAIS

Camundongos receberam injeções intraperitoniais de 2 ml de tioglicolato (Sigma, Saint Louis,

EUA) diluído em 3% de PBS (Phosphate Buffer Saline – Gibco, Califórnia, EUA). Após 5 dias

os camundongos foram sacrificados e as células foram obtidas após lavagem da cavidade

peritonial com 10 ml de HBSS (Hank´s Balanced Salt Solution – Sigma, EUA) contendo 3 mM

de EDTA. As células foram lavadas em meio DMEM, centrifugadas a 450 g, 4oC, 5 min., e

ressuspensas em meio DMEM contendo 10% de SFB.

38

INFECÇÕES DE MACRÓFAGOS

As células do lavado peritonial de camundongos foram contadas e plaqueadas de acordo com a

necessidade de células para cada experimento. Após 2 horas de incubação em estufa a 34ºC e 5%

de CO2, as culturas foram lavadas 2x em PBS para a retirada de células não aderentes e

permaneceram em estufa por um período de 12 horas. As infecções foram realizadas nas

proporções de 1:1 (amastigota:macrófago) e 3:1 (promastigota:macrófago). Após 2 horas de

infecção os macrófagos foram lavados em PBS para a retirada dos parasitas não internalizados e

as monocamadas de células infectadas foram mantidas em meio DMEM contendo 10% de SFB,

34ºC e 5% CO2.

PROTOCOLO DE PURIFICAÇÃO DE AMASTIGOTAS DE CULTURAS DE MACRÓFAGOS

Macrófagos isolados da cavidade peritonial de camundongos foram plaqueados e infectados com

formas amastigotas ou promastigotas de L. amazonensis. Após diferentes intervalos de infecção,

os macrófagos foram lavados em 5 ml de PBS e foi adicionado 3 ml de tampão de lise (Hepes 20

mM, Sacarose 0,25 M, EDTA 5 mM, Aprotinina 0,3 μM, E-64 10 μM, Pepstatina 1 μM, pH 7,2).

As garrafas permaneceram sobre o gelo durante 5 min. Após este período os macrófagos foram

raspados da garrafa e lisados mecanicamente em um homogenizador de vidro (Thomas

Scientific). As células foram centrifugadas a 50 g durante 5 min. para retirar macrófagos não

lisados. O sobrenadante contendo as amastigotas foi centrifugado a 1.500 g, 17 min., 4ºC. O

pellet de amastigotas foi ressuspendido em meio DMEM contendo 4% de SFB e os tubos

permaneceram 2 horas sob agitação a 34oC. Os parasitas foram lavados 2 vezes em PBS e

marcados para análise em citometria de fluxo (Figura 10).

DETERMINAÇÃO DO ÍNDICE DE INFECTIVIDADE

Um total de 1 x 105 macrófagos aderidos em lamínulas de vidro redondas e previamente

infectados foram fixados em metanol 100% e corados com Giemsa (Merck, Germany). Após uma

série de desidratação em acetona:xilol (10:90, 30:70, 70:30 e 100% acetona), as lamínulas foram

montadas em Entelan (Merck, Germany). O índice de infectividade foi determinado através da

contagem de 200 macrófagos por lamínula em microscópio óptico utilizando objetiva de imersão

em óleo (100x). O índice de infectividade foi determinado a partir da fórmula: Índice de

Infectividade = (porcentagem de macrófagos infectados X número de amastigotas por

macrófago)/100.

39

Figura 10 – Protocolo de purificação das amastigotas de culturas de macrófagos.

40

ANALISE DA EXPOSIÇÃO DE FOSFATIDILSERINA (PS) POR CITOMETRIA DE FLUXO

MARCAÇÃO COM ANEXINA-V: Os parasitas foram incubados com PBS contendo 2% de soro

normal de camundongo (SNC) e depois marcados com anticorpo 2A3-26 conjugado a Alexa-488

(gentilmente cedido pelo prof. Eric Prina - Instituto Pasteur, França). Este anticorpo é específico

para antígenos da superfície das amastigotas e foi utilizado para diferenciar os parasitas dos

restos celulares resultantes da lise dos macrófagos. Após a marcação com o anticorpo, os

parasitas foram lavados em tampão de anexina (10mM Hepes, 150 mM NaCl, 2,5 mM CaCl2, pH

7,2) e marcados com anexina V conjugada a Cy5. No momento da leitura no citômetro (FACScan

- BD Biosciences) foi adicionado 0,6 μg/ml de Iodeto de Propídio, para diferenciar células

viáveis de células mortas. A análise da exposição de PS foi feita apenas nos eventos positivos

para 2A3-26 (Figura 10).

MARCAÇÃO COM ANTICORPO ANTI-FOSFATIDILSERINA (α-PS): O anticorpo Bavituximab foi

descrito por reconhecer fosfolipídios aniônicos e se ligar ao PS exposto na superfície de células

do endotélio vascular de tumores (Jennewein et al., 2008). Uma alíquota deste anticorpo nos foi

gentilmente cedida pelo pesquisador Philip Thorpe (University of Texas Southwestern Medical

Center). Este anticorpo reconhece o PS quando associado à β2-glicoproteína. Devido a esta

característica, as amastigotas foram lavadas em PBS contendo 10% de SBA (soro bovino adulto).

As amastigotas foram incubadas em solução 1:100 deste anticorpo conjugado com o fluorocromo

Alexa-488. A marcação foi realizada em intervalos de 15 min., no gelo. Logo após foram lavadas

em PBS contendo 10% de SBA. A análise da exposição de PS foi determinada por citometria de

fluxo, adicionando Iodeto de Propídio no momento da leitura. Os eventos foram analisados no

programa CellQuest Software (BD Biosciences) (Figura 10).

PREPARO DE ANTÍGENO SOLÚVEL DE LEISHMANIA: Um total de 7 x 107 promastigotas obtidas de

culturas axênicas com 6 dias de crescimento foram centrifugadas (1500 x g – 10 min.) e lavadas

3x em PBS. As células foram ressuspendidas em 1 ml de PBS e lisadas em 5 ciclos de freeze and

thaw, mergulhando os microtubos em nitrogênio líquido seguido de mergulho em banho a 37oC.

Após a lise, as amostras foram sonicadas durante 10 min., aliquotadas e congeladas em freezer –

80oC. A concentração de proteína no lisado foi determinada utilizando dosagem pelo método de

Bradford.

41

PREPARO DE SOBRENADANTE DE CÉLULAS DE LINFONODO DRENANTE DE LESÃO: Linfonodos

drenantes de lesões de 5a semana em camundongos BALB/c foram retirados e macerados em tule

estéril. As células foram centrifugadas (500 g – 10 min.) e lavadas 2 x em meio DMEM. Após a

contagem, as células foram colocadas em placas de 96 poços num total de 4 x 105 células/poço e

incubadas em meio DMEM contendo 10% de SFB e 25 μg/ml de antígeno solúvel de

Leishmania. A placa permaneceu em estufa 37oC durante 3 dias. Após este período, o

sobrenadante da cultura foi centrifugado, aliquotado e armazenado em freezer – 20oC.

ANÁLISE DO PAPEL DE CITOCINAS NA EXPOSIÇÃO DE PS PELA AMASTIGOTA INTRACELULAR:

-ADIÇÃO DE CÉLULAS DE LN DRENANTE DE LESÃO: linfonodos drenantes de lesões de 5a semana

em camundongos BALB/c foram retirados e macerados em tule estéril. As células foram

centrifugadas (500 g – 10 min.) e lavadas 2 x em meio DMEM. Após a contagem, as células

foram adicionadas em culturas de macrófagos previamente infectados com amastigotas nas

relações de 1:1; 0,5:1 e 0,25:1 (células linfonodo:macrófago). Após 24 h de incubação a 34oC, as

amastigotas foram purificadas dos macrófagos e a exposição de PS foi determinada por

citometria de fluxo.

-ADIÇÃO DE SOBRENADANTE DE CÉLULAS DE LN ESTIMULADOS in vitro: O sobrenadante de

células de linfonodo drenante de lesão em camundongos BALB/c, previamente incubadas com

antígeno solúvel de Leishmania, foi adicionado em culturas de macrófagos infectados com

formas amastigotas. Após 24 h de incubação a 34oC, as amastigotas foram purificadas dos

macrófagos e a exposição de PS foi determinada por citometria de fluxo.

DETERMINAÇÃO DA ATIVIDADE DE ORNITINA DESCARBOXILASE (ODC): OS macrófagos foram

lavados 3x em PBS e incubados em tampão de lise para ODC (Tris-HCl 20 mM, EDTA 50 μM,

ditiotreitol (DTT) 2,5 mM e piridoxal fosfato 25 μM, pH 7,1). Os macrófagos foram raspados da

placa de cultura e transferidos para microtubos. Após 3 ciclos de congelamento e

descongelamento as amostram foram congeladas em freezer – 80oC. Para a análise da atividade

de ODC, um volume de 200 μl de cada amostra foi transferido para um tubo de ensaio e foi

adicionado 20 μl de tampão quente (tampão de lise para ODC contendo 0,4 μCi de 14C-ornitina).

Os tubos foram fechados hermeticamente com tampa de borracha e incubados a 37oC durante 1 h

e 15 min. Após este período, 200 μl de ácido tricloroacético (TCA – 10%) foi adicionado aos

tubos para interromper a reação. O TCA foi adicionado com uma agulha conectada à uma seringa

42

para evitar o escape de CO2 do sistema. Em uma cestinha presa na parte interna do tubo, foi

adicionado 300 μl de hidróxido de hiamina, capturador de CO2, e os tubos foram incubados

novamente a 37oC durante 30 min. Após a incubação, um volume de 200 μl de hidróxido de

hiamina foi transferido para tubos de cintilação e foi adicionado 2 ml de líquido de cintilação.

Após 24 h, a radioatividade das amostras foi determinada em cintilador Beckman. Paralelamente,

a dosagem de proteína das amostras foi determinada por método de Bradford. A atividade de

ODC foi descrita como cpm/mg ptn/min.

QUANTIFICAÇÃO DOS VACÚOLOS GRANDES EM MACRÓFAGOS INFECTADOS: Um total de 1 x 105

macrófagos peritoniais de camundongos BALB/c foram plaqueados em lamínulas de vidro. Os

macrófagos foram infectados com promastigotas ou amastigotas que apresentavam diferente

quantidade de PS exposto na superfície: amastigotas isoladas de lesão em camundongos BALB/c

ou BALB/cnu/nu, ou ainda, amastigotas tratadas com anticorpo anti-PS. Após intervalos de 10

min., 30 min., 1 h, 2 h, 6 h e 24 h as células foram fixadas com metanol e coradas com Giemsa. A

porcentagem de macrófagos contendo vacúolos parasitóforos grandes foi determinada através da

contagem de 300 células infectadas por ponto experimental. Foram caracterizados como vacúolos

grandes, aqueles em que foi possível observar um espaço (lumen) entre o parasita e a membrana

do vacúolo, utilizando objetiva de 100x microscópio óptico (Zeiss).

PATOLOGIA DAS LESÕES. Patas de camundongos BALB/c e BALB/cnu/nu infectadas com 2 x 106

promastigotas de L. amazonensis foram removidas postmortem após 1, 3 e 5 semanas de

desenvolvimento da lesão. As patas foram fixadas em 10% de paraformaldeído durante 12 horas.

Os tecidos foram processados, embebidos em parafina e cortados com uma espessura de 5 μm.

Os cortes foram corados com hematoxilina e eosina e analisados em microscopia óptica.

MEDIDA DA ATIVIDADE MACROPINOCÍTICA DOS MACRÓFAGOS INFECTADOS

Como controle positivo de atividade macropinocítica, macrófagos não infectados foram

incubados durante 2 h com 80 nM de PMA. Para controle negativo as células foram incubadas

durante 2 h com 80 nM de PMA e 1,5 mM de Hidrocloreto de Amiloride. Macrófagos infectados

não sofreram tratamento prévio ou foram tratados com 1,5 mM de Amiloride durante 2 h. Para

medida da atividade macropinocítica os macrófagos foram incubados com 250 μg/ml de Lucifer

Yellow (LY) durante 20 min. a 34oC. Após este período as células foram lavadas 5 vezes em PBS

para retirada do LY não internalizado e lisadas com solução de 1% de SDS. A captação de LY foi

43

medida através da leitura da fluorescência no lisado dos macrófagos, em espectofotômetro de

fluorescência (F-4500 – Hitachi).

Para experimentos de microscopia de fluorescência os macrófagos foram plaqueados em

lamínulas (1 x 105 células) e os mesmos tratamentos descritos anteriormente foram realizados.

Após 20 min. de incubação com 250 μg/ml de LY as lamínulas foram incubadas com 50 μM de

DAPI durante 10 min., montadas em lâminas contendo 10 μl de DABCO e analisadas

imediatamente em microscópio confocal Meta LSM-500 (Zeiss).

ALCALINIZAÇÃO DO VACÚOLO PARASITÓFORO COM CLOROQUINA

Macrófagos infectados com promastigotas de L. amazonensis foram incubados com 5 μM de

Cloroquina durante 2 h a 34oC. Para confirmar a alcalinização do vacúolo parasitóforo os

macrófagos infectados foram tratados com 3 μM de Laranja de Acridina, um indicador

fluorescente de pH. Após incubação com Laranja de Acridina durante 10 min. os macrófagos

foram observados imediatamente em microscópio de fluorescência (Olimpus), utilizando objetiva

de 100x.

QUANTIFICAÇÃO DA SÍNTESE DE TGF-β1 E MEDIDA DA PRODUÇÃO DE ÓXIDO NÍTRICO (NO)

A produção de TGF-β1 foi quantificada através de teste de ELISA (DuoSet kit; R&D Systems).

Macrófagos infectados com promastigotas e não infectados foram incubados em meio DMEM

suplementado com Nutridoma-SP (Roche – USA). A análise da produção de TGF-β1 foi

realizada nos intervalos de 24, 48, 72, 96 e 120 h de infecção. Vinte horas antes da coleta do

sobrenadante os macrófagos foram tratados com 100 ng/ml de LPS de Escherichia coli, serotipo

026:B6 (Sigma-Aldrich) (Desenho experimental mostrado na Figura 11). A concentração de

TGF-β1 em cada experimento foi determinada pela comparação com a curva padrão de TGF-β1,

iniciando em 2 ng/ml. Para a determinação da produção de NO, macrófagos infectados e não

infectados foram estimulados com 100 ng/ml de LPS de E. coli, serotipo 026:B6 (Sigma-Aldrich)

e 50 ng/ml de IFN-γ murino recombinante (Peprotec), 20 h antes da coleta do sobrenadante

(Figura 10). A concentração de NO foi determinada pela reação de Griess (Sigma-Aldrich) e os

valores comparados com uma curva padrão contendo diferentes concentrações de NaNO2.

44

Infecção promastigotas

20h

24 72 9648Tempo pós infecção (horas)

Adição de:100 ng/ml LPS (TGF-β1)100 ng/ml LPS + 50 ng/ml IFNγ (NO)

Infecção promastigotas

20h

24 72 9648Tempo pós infecção (horas)

Adição de:100 ng/ml LPS (TGF-β1)100 ng/ml LPS + 50 ng/ml IFNγ (NO)

Figura 11 – Desenho do protocolo para experimento de análise da síntese de TGF-β1 e produção de óxido

nítrico (NO) em macrófagos infectados com promastigotas e não infectados. A cada 20 h antes da coleta do

sobrenadante foram adicionados em poços independentes 100 ng/ml de LPS, para determinação da produção de

TGF-β1, ou 100 ng/ml de LPS e 50 ng/ml de INFγ, para análise da produção de NO.

MARCAÇÃO DO PS NA SUPERFÍCIE DAS AMASTIGOTAS E ANÁLISE EM MICROSCÓPIO DE

FLUORESCÊNCIA: Amastigotas purificadas de lesões em camundongos BALB/c foram incubadas

em solução de PBS contendo 10% de soro adulto bovino (SAB) e 20 μg de anticorpo

Bavituximab (α-PS) conjugado ao fluorocromo Alexa-488. Após 1 h de marcação em gelo, as

amastigotas foram lavadas 1 x em PBS e fixadas em solução de PBS contendo 3,5% de

formaldeído e 5 % de sacarose, durante 1 h. As células foram lavadas 5 x em PBS e incubadas em

solução de PGN (PBS contendo 0,1% de azida e 0,15% de gelatina) durante 12 h. As células

foram marcadas em solução contendo 50 μM de DAPI durante 15 min.. Um volume de 10 μl de

suspensão de amastigotas contendo 2 x 105 células foi colocada sobre uma lâmina, coberta com

lamínula e selada com esmalte incolor. Após a secagem do esmalte, as lâminas foram observadas

em microscópio de fluorescência.

DETERMINAÇÃO DA POLARIZAÇÃO DAS AMASTIGOTAS DENTRO DO VACÚOLO PARASITÓFORO:

Macrófagos infectados com promastigotas, após 48 h de infecção, foram fixados em solução

contendo 3,5% de formaldeído e 5 % de sacarose durante 1 h. Após a fixação, as lamínulas foram

lavadas 5 x em PBS e incubadas em solução de PGN durante 12 h. Os macrófagos foram

permeabilizados em solução de PGN contendo 0.1% de saponina durante 1 h e, posteriormente,

marcados com 50 μM de DAPI durante 15 min. As lamínulas foram montadas sobre lâminas,

seladas com esmalte e observadas em microscópio de fluorescência.

45

ANÁLISE ESTATÍSTICA: Para determinar a significância estatítistica das diferenças entre os

grupos experimentais, análises de variância (ANOVA) foram realizadas utilizando o programa

GraphPad Prism 4.0 (GraphPad Software Inc., USA). Após a análise de significância ANOVA

one-way foi utilizado o pós-teste de Dunnett para comparar os grupos tratados com o grupo

controle. O pós-teste de Bonferroni foi utilizado após a análise de significância ANOVA two-

way. As diferenças entre os grupos foram consideradas significantes para os valores de P <0,01.

46

III - RESULTADOS

A - PAPEL DO MACRÓFAGO NO CONTROLE DA EXPOSIÇÃO DE PS EM AMASTIGOTAS INTRACELULARES. A.1 - Exposição de PS em amastigotas de L. amazonensis purificadas de macrófagos de BALB/c e C57BL/6 infectados in vitro

Leishmania spp são capazes de evadir o mecanismo microbicida do macrófago e se

estabelecerem como parasitas intracelulares. Trabalhos anteriores do nosso grupo demonstraram

que, semelhante ao que ocorre durante o processo de morte celular por apoptose, formas

amastigotas de L. amazonensis expõem PS na superfície, um mecanismo descrito como

Mimetismo Apoptótico (Balanco, Moreira et al. 2001). Os autores demonstraram que esta

exposição de PS é importante para modular a atividade leishmanicida do macrófago. O

reconhecimento desta molécula induz a produção das citocinas anti-inflamatórias, IL-10 e TGF-

β, e inibe a produção de óxido nítrico, favorecendo o estabelecimento da infecção. Em modelo

murino, nosso grupo demonstrou que a exposição de PS pela L. amazonensis é modulada pelo

hospedeiro. Formas amastigotas purificadas de lesão em camundongos suscetíveis BALB/c

expõem mais PS na superfície que aquelas purificadas de camundongos C57BL/6, menos

suscetíveis a esta espécie (Wanderley et al. 2006).

Os macrófagos são as células hospedeiras preferenciais para a infecção e proliferação de

parasitas do gênero Leishmania. A partir das diferenças observadas na exposição de PS em

amastigotas isoladas de camundongos das linhagens BALB/c e C57BL/6 o objetivo inicial deste

trabalho foi demonstrar qual a participação do macrófago hospedeiro na exposição de PS pela

amastigota intracelular. Para isso utilizamos o modelo de infecção de macrófagos de

camundongos infectados in vitro com as formas amastigota e promastigota de L. amazonensis. Os

macrófagos foram obtidos de lavado peritonial após 5 dias de injeção de tioglicolato e plaqueados

em garrafas de culturas ou lamínulas. A cada 24 horas de infecção, os macrófagos foram lisados e

a exposição de PS na superfície das amastigotas purificadas foi determinada através de citometria

de fluxo. Juntamente com a exposição de PS foi observada a cinética da infecção pelos parasitas

através da determinação do índice de infectividade.

Nossos resultados demonstraram que as cinéticas de proliferação e de exposição de PS do

parasita intracelular variam de acordo com a forma evolutiva utilizada para a infecção do

macrófago. Quando os macrófagos foram infectados com as formas amastigotas de L.

47

amazonensis foi possível observar um aumento no índice de infectividade logo após as primeiras

horas de infecção, ou seja, de 24 a 72 h (Figura 12A). Diferente da forma promastigota que

necessita se adaptar ao ambiente intramacrofágico, as amastigotas são totalmente adaptadas para

sobreviverem em um vacúolo citoplasmático que se funde com endossomos e lisossomos

(Courret et al. 2001), recebe várias enzimas lisossomais e proteases (Prina et al. 1990) e acidifica

o pH do lúmen (Antoine et al. 1990). Este aumento do índice de infectividade indica proliferação

do parasita já nas primeiras horas pós-infecção.

Concomitante à análise da proliferação das amastigotas, observamos a exposição de PS na

superfície do parasita purificado após diferentes intervalos de infecção. As amastigotas utilizadas

nos experimentos foram obtidas de lesões em camundongos BALB/c que, como descrito

anteriormente por Wanderley et al. (2006), apresentam alta exposição de PS na superfície.

Nossos resultados mostram uma correlação negativa entre a proliferação e a exposição de PS na

superfície das amastigotas (Figura 12 B). Nos momentos em que se observa aumento no índice de

infectividade é observada queda nos valores de exposição de PS. Após 72 h a infecção estabiliza

e os valores de exposição de PS aumentam e ficam estáveis.

É importante salientar que, diferente do observado nas amastigotas isoladas de lesão em

camundongos BALB/c e C57BL/6, não houve diferença nos perfis de proliferação e de exposição

de PS pelos parasitas ao compararmos os resultados obtidos em macrófagos isolados destes

animais e infectados in vitro.

Segundo Courret et al. (2001) as formas promastigotas metacíclicas de L. amazonensis

necessitam de um período que varia de 2 a 5 dias para diferenciarem para amastigota dentro do

vacúolo parasitóforo. Este tempo de diferenciação foi observado em nosso modelo experimental

através da estabilidade no índice de infectividade durante as primeiras 72 ou 96 h após a infecção

com a forma promastigota (Figura 13A e 13C). Neste intervalo em que o índice de infectividade

permaneceu estável, observamos aumento gradual na exposição de PS pelo parasita intracelular

(Figura 13B e 13 D). O valor máximo de exposição durante o momento da diferenciação variou

entre 72 e 96h nos experimentos realizados. Nos tempos de infecção relativos ao início do

aumento no índice de infectividade, observamos diminuição nos valores de exposição de PS,

sugerindo novamente uma relação inversa entre proliferação e exposição de PS na superfície das

amastigotas.

48

A

B

Figura 12 – Cinética de proliferação e exposição de PS em amastigotas isoladas de macrófagos de BALB/c e C57BL/6 infectados in vitro. Macrófagos peritoniais de camundongos foram infectados com amastigotas de L. amazonensis (1:1), durante 2 horas. A) Índice de infectividade = porcentagem de macrófagos infectados X número de amastigotas por macrófago/100 (desvio padrão relativo à triplicata de um experimento). B) Cinética de exposição de PS nas formas amastigotas purificadas de macrófagos infectados. Análise da exposição de PS com anexina-V em citômetro de fluxo. Foram analisadas apenas as células 2A3-26 positivas e PI negativas. ΔMFI = Média de intensidade de fluorescência. Os gráficos representam os valores obtidos em 1 experimento representativo de três repetições na qual os resultados apresentaram perfis de curvas semelhantes.

49

A

C

B

D

Figura 13 – Cinética de proliferação e exposição de PS em amastigotas isoladas de macrófagos de BALB/c e C57BL/6 infectados in vitro. Macrófagos peritoniais de camundongos foram infectados com promastigotas de L. amazonensis (1:3 – MO:promastigota), durante 2 horas. A, C) Índice de infectividade = porcentagem de macrófagos infectados X número de amastigotas por macrófago/100 (desvio padrão relativo à triplicata de um experimento). B e D) Cinética de exposição de PS nas formas amastigotas purificadas de macrófagos infectados, referentes aos gráficos A e C, respectivamente. Análise da exposição de PS com anexina-V em citômetro de fluxo. Foram analisadas apenas as células 2A3-26 positivas e PI negativas. ΔMFI = Média de intensidade de fluorescência. Experimentos representativos de 8 repetições na qual os resultados apresentaram perfis de curvas semelhantes a estes demonstrados.

Durante a análise em citômetro de fluxo das amastigotas purificadas de macrófagos de

BALB/c no experimento demonstrado na figura 13B observamos uma diminuição sincronizada

do tamanho das amastigotas no período correspondente a 96 h após a infecção (Figura 14). Neste

experimento, este período representou o início da proliferação pelos parasitas intracelulares

(Figura 13A). Exatamente neste momento, observamos baixa exposição de PS na superfície das

amastigotas purificadas, indicando novamente que durante o processo de divisão celular, não

ocorre exposição de PS na superfície das formas amastigotas.

50

Figura 14 – Gráficos de tamanho (forward scatter) x granulosidade (side scatter) das amastigotas purificadas de macrófagos infectados in vitro. Macrófagos peritoniais de camundongos BALB/c foram plaqueados e infectados com promastigotas de L. amazonensis na proporção de 1:3 (MO:parasita). A cada 24 horas as amastigotas foram purificadas e analisadas em citômetro de fluxo. No ponto correspondente a 96 horas após a infecção (seta) ocorreu uma diminuição no tamanho dos parasitas de forma sincronizada em toda a população. Obs: Uma sincronia absoluta, como a deste experimento, não se repetiu em outros experimentos.

Em infecções de macrófagos com as formas promastigotas também é importante ressaltar

que não houve diferença nos perfis de proliferação e de exposição de PS pelos parasitas obtidos

de macrófagos de BALB/c e C57BL/6 infectados in vitro. Este resultado sugere que a diferença

na exposição de PS observada após a purificação de amastigotas de lesões in vivo é uma resposta

decorrente de um estado diferencial de ativação dos macrófagos nos dois hospedeiros. A ativação

destes macrófagos pode depender das interações entre as células e as moléculas produzidas

durante a resposta imunológica no ambiente da lesão, o que não ocorre no modelo de infecção in

vitro.

51

B - PAPEL DA RESPOSTA IMUNE NO CONTROLE DA EXPOSIÇÃO DE PS EM AMASTIGOTAS INTRACELULARES.

B.1 - Indução da exposição de PS em amastigotas intracelulares utilizando modelo de

“resposta imune” in vitro ou sobrenadante de linfonodos drenantes de lesão.

A infecção de macrófagos in vitro com L. amazonensis demonstrou que, isoladamente,

esta célula não é capaz de modular a diferença de exposição de PS observada in vivo, quando as

amastigotas são purificadas de lesões em camundongos C57BL/6 e BALB/c. Para determinar a

contribuição de moléculas produzidas durante a infecção na modulação da exposição

desenvolvemos um protocolo de “resposta imune in vitro”. Este protocolo consiste na adição de

células de linfonodo drenante de lesão em BALB/c sobre uma cultura de macrófagos infectados.

As células do linfonodo foram adicionadas nas proporções de 1:1, 0,5:1 e 0,25:1 (LN:MO), após

24 h as amastigotas foram purificadas e a exposição de PS observada.

Nossos resultados demonstram que a ativação dos macrófagos em resposta as células

purificadas de linfonodo drenante de lesão é capaz de induzir aumento na exposição de PS nas

amastigotas intramacrofágicas (Figura 15). Este efeito é sensível ao numero de células

acrescentadas à cultura e gera uma curva em forma de sino, sendo observado na relação 0,5:1. e

não observado nas relações 0,25:1 e 1:1. Este resultado sugere fortemente um papel da ativação

macrofágica na modulação da exposição de PS pelas amastigotas intracelulares. Esta ativação

aconteceria em resposta às células presentes ou às citocinas produzidas durante a resposta imune

do hospedeiro e explicaria as diferenças observadas na exposição de PS de amastigotas isoladas

de lesões em camundongos BALB/c e C57BL/6.

Outra estratégia para analisar a contribuição de componentes da resposta imune na

modulação da exposição de PS por amastigotas intramacrofágicas foi realizada utilizando

sobrenadante de linfócitos. Este sobrenadante foi preparado estimulando-se in vitro células de

linfonodo drenante de lesão de 5a semana em camundongos BALB/c com antígenos de L.

amazonensis. Diferentes concentrações de sobrenadante foram adicionadas em culturas de

macrófagos infectados e, após 24 h, as amastigotas foram purificadas e a exposição de PS na

superfície observada. Os resultados demonstram que componentes produzidos durante o estímulo

dos linfócitos in vitro com antígenos de L. amazonensis induzem aumento da exposição de PS

pela amastigota intracelular (Figura 16). A incubação dos macrófagos infectados com 50% do

sobrenadante de linfócitos adicionado ao meio de cultura aumentou a exposição de PS na

superfície das amastigotas em aproximadamente 80%. O efeito do sobrenadante no aumento da

52

exposição de PS pela amastigota também é diretamente dependente da concentração adicionada

às culturas de macrófagos.

Figura 15 - Indução da exposição de PS em amastigotas intracelulares em modelo de “resposta imune” in vitro. Macrófagos de BALB/c após 2 h de infecção com amastigotas de L. amazonensis foram incubados com células de linfonodo drenante de lesão de 5a semana em camundongos BALB/c. As células permaneceram em estufa 34o C durante 24 h, as amastigotas foram purificadas e a exposição de PS foi determinada em citômetro de fluxo, utilizando Anexina-V e Iodeto de Propídio. Os resultados estão expressos em % de exposição em relação ao controle. Valores referentes à média ± desvio padrão de 4 experimentos realizados. (*) p<0,01. Figura 16 - Sobrenadante de culturas de células de linfonodo drenante de lesão em camundongos BALB/c induzem aumento da exposição de PS em amastigotas intracelulares. Células de linfonodo drenante de lesão de 5a semana em camundongos BALB/c foram estimuladas in vitro com 25 μg/ml de antígeno solúvel de L. amazonensis. Após 3 dias de estímulo a 37oC, o sobrenadante destas células foi recolhido e adicionado à culturas de macrófagos previamente infectados durante 2 h com formas amastigotas do parasita. Após 24 h de incubação as amastigotas foram purificadas e a exposição de PS foi determinada em citômetro de fluxo, utilizando Anexina-V e Iodeto de Propídio. Resultado expresso em valores de ΔMFI de 1 experimento, representativo de 2 realizados.

53

B.2 - Papel do sobrenadante de linfócitos de BALB/c na ativação da produção de

poliaminas e inibição da produção de óxido nítrico em macrófagos infectados

As poliaminas são sintetizadas a partir do metabolismo do aminoácido L-arginina em uma

via antagônica à produção de óxido nítrico (NO). Elas representam compostos essenciais durante

o crescimento e a proliferação celular e o aumento da síntese destas em macrófagos infectados

com Leishmania favorece o crescimento do parasita (Iniesta et al., 2001; Iniesta et al., 2002). Em

modelo de infecção murina com L. major, Iniesta e colaboradores (2005) demonstraram que

camundongos suscetíveis BALB/c apresentam maior atividade de Arginase 1, a enzima

precursora da via de poliaminas, do que camundongos resistentes C57BL/6. Os autores

demonstraram que o aumento da atividade desta enzima na lesão é simultâneo ao início da

progressão da infecção nos camundongos BALB/c. As poliaminas podem estar envolvidas no

processo de externalização de PS por células apoptóticas. Bratton e colaboradores (1999)

demonstraram que células HL-60 tratadas com inibidores da síntese de poliaminas e irradiadas

com luz ultravioleta entram em apoptose sem expor PS na superfície. Neste modelo, a presença

das poliaminas é importante para o movimento de translocação bidirecional dos fosfolipídeos na

membrana.

Em nossos resultados anteriores demonstramos que o sobrenadante de células de

linfonodos drenantes de lesão em camundongos BALB/c induzem aumento da exposição de PS

nas amastigotas intramacrofágicas (Figura 16). Em virtude deste resultado, resolvemos investigar

a participação deste sobrenadante na indução da atividade da enzima Ornitina Descarboxilase

(ODC) envolvida na via de biossíntese de poliaminas em macrófagos infectados. Para este

experimento, macrófagos infectados com amastigotas foram incubados com diferentes

concentrações do sobrenadante e, 24 h depois, a atividade da ODC foi analisada no lisado destas

células. A produção de óxido nítrico (NO), sintetizado em uma via antagônica à via de produção

de poliaminas, também foi quantificada neste experimento. O sobrenadante de células de

linfonodo drenante de lesão induz aumento da atividade da enzima ODC, também de forma

dependente da concentração (Figura 17A). Utilizando 50% de sobrenadante, concentração em

que ocorre aumento da exposição de PS pela amastigota intracelular, observamos aumento

significativo da atividade desta enzima. Como esperado para compostos presentes em vias

antagônicas, o tratamento com 50% do sobrenadante inibiu a produção de NO nos macrófagos

infectados (Figura 17B).

54

A

Figura 17 - Sobrenadante de culturas de células de linfonodo drenante de lesão em camundongos BALB/c induzem aumento da atividade de ODC e inibição da produção de NO em macrófagos infectados de forma dose-dependente. Células de linfonodo drenante de lesão de 5a semana em camundongos BALB/c foram estimuladas in vitro com 25 μg/ml de antígeno solúvel de L. amazonensis. Após 3 dias de estímulo a 37oC, o sobrenadante destas células foi adicionado a culturas de macrófagos infectados previamente com formas amastigotas do parasita durante 2 h. Após 24 h de incubação os macrófagos foram lisados e a atividade da enzima ODC foi determinada utilizando o substrato radioativo 14C-Ornitina (A); O sobrenadante das culturas foram recolhidos e a produção de NO foi determinada utilizando método de reagente de Griess (B). Os gráficos mostram os resultados de 1 experimento representativo de 2 realizados. B.3 - A exposição de PS por amastigotas no modelo in vivo é modulada pela presença de

células T

Nossos resultados indicam que a ativação dos macrófagos em resposta a fatores

produzidos durante a infecção com L. amazonensis é responsável pela modulação da exposição

de PS nas amastigotas intracelulares. Para caracterizar a importância da presença de células T

nesta modulação comparamos o perfil de exposição de PS das amastigotas isoladas de lesões em

camundongos BALB/c com o de amastigotas isoladas de animais imunodeficientes BALB/cnu/nu

(Os resultados obtidos com camundongos BALB/cnu/nu foram confirmados em um único

experimento realizado com animais BALB/c SCID – dados não mostrados).

Os resultados mostram que as lesões no coxim plantar de animais infectados com formas

promastigotas de L. amazonensis apresentam um crescimento mais lento nos animais

imunodeficientes (Figura 18). Em BALB/c já é observado o aumento de lesão nas primeiras

semanas de infecção. No entanto, camundongos BALB/cnu/nu apresentam aumento significativo

apenas a partir da 5a semana pós-infecção. Após a 7a semana, BALB/cnu/nu apresenta aumento

progressivo e rápido da lesão enquanto que em BALB/c este crescimento se torna mais lento ou

estável. O desenvolvimento da lesão em BALB/c SCID apresenta o mesmo perfil do observado

em BALB/cnu/nu (resultado não mostrado). A partir da 8a semana após a infecção, o tamanho da

lesão se iguala em BALB/c e nos animais imunodeficientes.

55

Figura 18 - Desenvolvimento da lesão em camundongos BALB/c e BALB/cnu/nu após infecção com L. amazonensis. Grupos de 10 camundongos BALB/c e 10 camundongos BALB/cnu/nu foram infectados no coxim plantar com 2 x 106 promastigotas. A cada semana as patas foram medidas com paquímetro digital e um animal de cada grupo foi sacrificado para a retirada da pata e purificação das amastigotas da lesão. Os valores em mm2 representam a média ± desvio padrão das diferenças de tamanho entre as patas infectadas e as não infectadas. O gráfico apresenta os valores de 1 experimento representativo de 3 repetições realizadas.

O perfil de exposição de PS das amastigotas isoladas de lesão em BALB/c e BALB/cnu/nu

está demonstrado na figura 19. É possível observar valores semelhantes entre as amastigotas

isoladas de lesões de 4 semanas após a infecção. No entanto, a partir da 5a semana, as amastigotas

isoladas de BALB/c apresentam aumento de exposição PS, enquanto que as amastigotas isoladas

de BALB/cnu/nu apresentam exposição baixa. A partir da 5a semana, as diferenças observadas nos

valores de exposição das amastigotas purificadas destes camundongos são mantidas nas semanas

seguintes de infecção. Os resultados de infecções em camundongos BALB/c SCID apresentam

perfil semelhante ao observado nos experimentos com BALB/c nu/nu (resultado não mostrado).

56

Figura 19 – Perfil de exposição de PS em amastigotas de L. amazonensis isoladas de lesões em camundongos BALB/c e BALB/cnu/nu. Grupos de 10 camundongos BALB/c e 10 camundongos BALB/cnu/nu foram infectados no coxim plantar com 2 x 106 promastigotas. A cada semana um animal de cada grupo foi sacrificado para a retirada da pata e purificação das amastigotas da lesão. Amastigotas purificadas foram marcadas com Anexina-V FITC e Iodeto de Propídio e analisadas em citômetro de fluxo. ΔMFI = Média de Intensidade de Fluorescência. O gráfico apresenta os valores de 1 experimento representativo de 3 repetições realizadas. B.4 - Investigação de citocinas responsáveis pelo aumento da exposição de PS nas amastigotas intracelulares - evidências sobre a participação do IFNγ

Os resultados observados nas amastigotas purificadas de lesões em camundongos BALB/c

e camundongos imunodeficientes sugerem fortemente um papel de citocinas do hospedeiro na

modulação da exposição de PS. A partir destes resultados, vários experimentos foram realizados

para tentar identificar a(s) citocina(s) e os mecanismos macrofágicos responsáveis pelo efeito

modulador da exposição nos parasitas intracelulares. Resultados anteriores do nosso grupo

demonstraram que lesões em camundongos 129 que apresentam deleção do gene que codifica

para o receptor de IFNγ (IFNγR-/-) são menores que as lesões em camundongos 129 selvagens

(Figura 20). O reconhecimento de IFNγ pelo macrófago é importante para a modulação da

exposição de PS na superfície das amastigotas: amastigotas purificadas de lesões em

camundongos 129 IFNγR-/- apresentam menor exposição de PS na superfície quando comparadas

às amastigotas isoladas de lesões em camundongos selvagens (Figura 21). A partir da 10a semana

após a infecção, camundongos 129 IFNγR-/- começam a apresentar lesões maiores que os

57

camundongos selvagens. Neste momento, as diferenças na exposição de PS nas amastigotas

purificadas das lesões nestes camundongos podem ser observadas.

Figura 20 - Desenvolvimento da lesão em camundongos 129 e 129 IFNγR-/- após infecção com L. amazonensis. Grupos de 20 camundongos 129 e 20 camundongos 129 IFNγR-/- foram infectados no coxim plantar com 2 x 106 promastigotas. A cada semana as patas foram medidas com paquímetro digital e um animal de cada grupo foi sacrificado para a retirada da pata e purificação das amastigotas da lesão. Os valores representam o tamanho da lesão em mm2 ± desvio padrão. O gráfico apresenta os valores de 1 experimento representativo de 3 repetições realizadas.

Os resultados observados em camundongos 129 e 129 IFNγR-/- sugerem uma participação

importante da sinalização pela citocina IFNγ para a exposição de PS pelas amastigotas de L.

amazonensis. A ativação dos macrófagos em resposta a esta citocina em modelos de infecção de

camundongos BALB/c e C57BL/6 pode ser responsável pelas diferenças de exposição de PS

observadas nas amastigotas isoladas destes animais. Mills e colaboradores (2000) demonstraram

que macrófagos de camundongos BALB/c e C57BL/6 apresentam perfis diferentes de ativação

em resposta ao IFNγ. Na presença de concentrações semelhantes desta citocina, macrófagos

isolados de camundongos BALB/c induzem maior atividade da enzima Arginase 1, responsável

pela síntese de poliaminas. Por outro lado, macrófagos de camundongos C57BL/6 apresentam

mais produção de NO, em resposta ao mesmo estímulo. Neste trabalho os autores classificaram

os macrófagos como M1 e M2, em relação ao protótipo de resposta imune dos animais de perfil

Th1 (C57BL/6) e perfil Th2 (BALB/c) da qual foram isolados.

58

Figura 21 – Perfil de exposição de PS em amastigotas de L. amazonensis isoladas de lesões em camundongos 129 e 129 IFNγR-/-. Grupos de 20 camundongos 129 e 20 camundongos 129 IFNγR-/- foram infectados no coxim plantar com 2 x 106 promastigotas. A cada semana um animal de cada grupo foi sacrificado para a retirada da pata e purificação das amastigotas da lesão. Amastigotas purificadas foram marcadas com Anexina-V FITC e Iodeto de Propídio e analisadas em citômetro de fluxo. ΔMFI = Média de Intensidade de Fluorescência. O gráfico apresenta os valores de 1 experimento representativo de 3 repetições realizadas.

Amastigotas de L. amazonensis apresentam maior proliferação em culturas tratadas com

baixas concentrações de IFNγ (Qi et al., 2004). A partir dos resultados apresentados neste

trabalho, desenvolvemos um experimento para confirmar a diferença de sensibilidade ao IFNγ

entre os macrófagos de camundongos C57BL/6 e BALB/c. Macrófagos isolados do peritônio

destes animais foram plaqueados e infectados com promastigotas de L. amazonensis. Após 2 h de

infecção, diferentes concentrações de IFNγ foram adicionadas às culturas. A proliferação das

amastigotas foi determinada pela contagem das células e análise do índice de infectividade após

72 h de cultura. Nossos resultados demonstram que macrófagos de camundongos C57BL/6

tratados com 0,1 ng/ml de IFNγ induzem maior proliferação da amastigota intracelular (Figura

22A). A partir desta concentração é possível observar diminuição no crescimento do parasita de

forma dose-dependente. Em macrófagos de camundongos BALB/c o aumento mais significativo

na proliferação das amastigotas só é observado após o tratamento com 0,5 ng/ml de IFNγ (Figura

22B). A partir desta concentração também observamos diminuição no índice de infectividade dos

macrófagos tratados. A diferença de sensibilidade ao IFNγ nos macrófagos destes camundongos

sugere ativação diferencial destas células por esta citocina.

59

A

B

Figura 22 – Cinética de proliferação de amastigotas em macrófagos de camundongos C57BL/6 e BALB/c tratados com IFNγ. Macrófagos peritoniais foram infectados com promastigotas de L. amazonensis (1:3 – MO:promastigota), durante 2 horas. Após a infecção foi adicionado IFNγ nas concentrações descritas acima. Após 72 h de infecção as células foram fixadas e coradas com Giemsa. Índice de infectividade = porcentagem de macrófagos infectados X número de amastigotas por macrófago/100 (desvio padrão relativo à triplicata de um experimento). Foram contadas 300 células para cada ponto experimental. (A) Macrófagos de camundongos C57BL/6; (B) Macrófagos de camundongos BALB/c. Resultados referentes a 1 experimento representativo de 2 realizados.

60

C- EFEITOS DA EXTERNALIZAÇÃO DE PS NA FORMAÇÃO DO VACÚOLO PARASITÓFORO DE L. amazonensis

C.1 - A densidade de moléculas de PS expostas na superfície do parasita se correlaciona

com o aumento do tamanho do vacúolo parasitóforo.

Infecções de macrófagos com L. amazonensis apresentam um vacúolo parasitóforo

característico, de tamanho grande e com os parasitas aderidos na membrana interna do vacúolo.

A cinética da formação destes vacúolos é diferente quando os macrófagos são infectados com as

formas promastigotas ou amastigotas do parasita (Courret et al. 2002). Nossos resultados

mostraram uma relação direta entre a exposição de PS pelo parasita (Figura 13B e D) e o

aumento de tamanho do vacúolo parasitóforo (Figura 23). Em infecções com as formas

amastigotas purificadas de lesão em camundongos BALB/c, que expõem PS no momento da

infecção, grandes vacúolos contendo um único parasita são observados logo após 2 horas de

interação com os macrófagos (Figura 23a). Em infecções com as formas promastigotas, os

parasitas são internalizados em vacúolos justos, nos quais o lumen não consegue ser observado

por microscopia óptica (Figura 23b). Após 48h de infecção com promastigotas, a grande maioria

dos macrófagos infectados apresentam os parasitas em vacúolos maiores que aqueles observados

imediatamente após a internalização (Figura 23c). A partir de 96h, a maioria dos macrófagos

apresenta um vacúolo único, com vários parasitas em seu interior (Figura 23d).

A cinética de formação de grandes vacúolos após a infecção com as formas amastigotas

ou promastigotas do parasita foi quantificada através da análise das lâminas infectadas. Os

vacúolos foram caracterizados quanto ao tamanho em grandes, aqueles em que foi possível ver

um lúmen (não importando o tamanho do vacúolo ou a quantidade de parasitas em seu interior) e

justos, aqueles em que não foi possível observar o lúmen, como demonstrado na figura 23b.

Durante a quantificação da porcentagem de macrófagos contendo vacúolos grandes foram

contabilizados apenas os vacúolos que apresentavam parasitas em seu interior.

A infecção com as formas amastigotas induz a formação de vacúolos grandes já nos

primeiros 30 min. de interação com os macrófagos (Figura 24). É importante lembrar que estas

amastigotas foram purificadas de camundongos BALB/c, portanto, expõem PS na superfície. Esta

exposição pela amastigota contribui para a sua internalização através de processo de

macropinocitose, como descrito anteriormente por Wanderley e colaboradores (2006). Em

infecções com as formas promastigotas, a internalização dos parasitas acontece em um vacúolo

61

justo e a presença de vacúolos grandes é raramente observada nos primeiros 30 min. de infecção

(Figura 24). Nos primeiros dias após a infecção, quando ocorre aumento gradativo na exposição

de PS na superfície, podemos observar aumento progressivo no aparecimento de vacúolos

grandes nos macrófagos infectados. Após 48 horas de infecção a porcentagem de macrófagos que

apresentam vacúolos grandes se iguala entre aqueles infectados com as formas promastigotas e

amastigotas.

Figura 23 – Característica morfológica dos vacúolos de macrófagos de BALB/c infectados com L. amazonensis. Macrófagos peritoniais de BALB/c após 2 horas de infecção com formas amastigotas (a) e 2 horas (b), 48 horas (c) e 96 horas (d) de infecção com formas promastigotas. É possível observar o aumento no tamanho do vacúolo parasitóforo ao longo do tempo de infecção com a forma promastigota do parasita. Seta pequena = vacúolo após 2 h de interação com amastigotas. Seta grande = vacúolo contendo vários amastigotas em seu interior. Coloração com corante de Giemsa. Barra = 25 μm.

62

Figura 24 – Quantificação da formação de vacúolos grandes após a infecção com L. amazonensis. Macrófagos peritoniais de camundongos BALB/c infectados com as formas amastigota (1:1) e promastigota (3:1 – Leish:MO) foram corados com corante de Giemsa e o número de macrófagos com vacúolos grandes foi quantificado por microscopia óptica utilizando objetiva de 100x. Os vacúolos grandes foram caracterizados como aqueles em que foi possível observar o lumen, independente do número de parasitas em seu interior. Desvio padrão relativo à triplicata de um experimento. Foram contados 300 macrófagos infectados por ponto experimental. O gráfico representa os valores de 1 experimento representativo de 2 realizados.

Para confirmarmos a contribuição do PS na formação dos vacúolos grandes de L.

amazonensis realizamos experimentos nos quais as amastigotas foram incubadas previamente

com anticorpo Bavituximab, que reconhece PS (α-PS). Este anticorpo, ligado à membrana da

amastigota, inibe a interação do macrófago com este fosfolipídio no momento da internalização

do parasita. Como controle utilizamos amastigotas que não foram incubadas previamente com o

anticorpo e comparamos a formação dos vacúolos em intervalos de tempo pequenos pós-

interação parasita/macrófago. O tratamento das amastigotas com o α-PS resultou em retardo no

aparecimento dos vacúolos maiores (Figura 25). Durante os primeiros 10 min. de interação, a

inibição do sinal do PS na membrana do macrófago foi capaz de reduzir a formação de vacúolos

grandes em até 7 vezes. Até o período de 1 h de infecção ainda foi possível observar diferenças

na quantidade de macrófagos que apresentaram vacúolos grandes após a infecção com as

amastigotas tratadas ou não com o α-PS. Com o aumento do período de incubação, estas

diferenças foram se tornando menores e 24 h após a infecção, 100% dos macrófagos infectados

apresentavam amastigotas em vacúolos grandes. Amastigotas marcadas com α-PS e incubadas

por 1 h a 34oC em meio DMEM com pH ácido (4.0), perdem a marcação do anticorpo da

63

superfície (Figura 25 inset). A acidificação do vacúolo após 1 h de infecção com estas

amastigotas pode desligar o anticorpo da superfície do parasita, permitindo a sinalização pelo PS

a partir do interior do vacúolo resultando na expansão desta organela. A relação entre a exposição

de PS e o aumento do vacúolo parasitóforo foi confirmada em experimentos utilizando

amastigotas purificadas de lesão em camundongos BALB/c e BALB/cnu/nu. Neste, em intervalos

de até 24 h após a infecção, ainda foi possível observar diferenças relativas ao tamanho do

vacúolo em resposta à infecção com as amastigotas que apresentam diferentes quantidades de PS

expostas na superfície (Figura 26). Estes resultados em conjunto sugerem fortemente que a

sinalização pelo PS contribui para a formação dos grandes vacúolos característicos de infecções

com L. amazonensis.

Anti-PS Alexa - 488

Figura 25 – Importância do PS na formação de grandes vacúolos durante a infecção com amastigotas de L. amazonensis. Macrófagos peritoniais de camundongos BALB/c foram infectados com amastigotas (1:1) isoladas de lesão em camundongos BALB/c (ΔMFI = 25), incubadas previamente ou não com anticorpo Bavituximab (ama + a-PS). As células foram coradas com Giemsa e o número de macrófagos com vacúolos grandes foi quantificado por microscopia óptica utilizando objetiva de 100x. Os vacúolos grandes foram caracterizados como aqueles em que foi possível observar o lumen, independente do número de parasitas em seu interior. Desvio padrão relativo à triplicata de um experimento. Foram contados 300 macrófagos infectados por ponto experimental. O gráfico representa os valores de 1 experimento representativo de 2 realizados. Inset: incubação das amastigotas tratadas com a-PS Alexa-488 em meio DMEM com diferentes valores de pH contendo 10% SAB. Análise em citometria de fluxo após período de 1 h de incubação a 34oC.

64

Figura 26 – Importância do PS na formação de grandes vacúolos durante a infecção com amastigotas de L. amazonensis. Macrófagos peritoniais de camundongos BALB/c foram infectados com amastigotas (1:1) isoladas de lesão em camundongos BALB/c (ΔMFI = 32,85) ou BALB/cnu/nu (ΔMFI = 5,79). As células foram coradas com Giemsa e o número de macrófagos com vacúolos grandes foi quantificado por microscopia óptica utilizando objetiva de 100x. Os vacúolos grandes foram caracterizados como aqueles em que foi possível observar o lumen, independente do número de parasitas em seu interior. Desvio padrão relativo à triplicata de um experimento. Foram contados 300 macrófagos infectados por ponto experimental. O gráfico representa os valores de 1 experimento representativo de 2 realizados.

C.2 - A importância da exposição de PS para a formação dos vacúolos parasitóforos

característicos de L. amazonensis pode ser confirmada no modelo de infecção in vivo

Como demonstrado nos modelos de infecção de macrófagos in vitro, a exposição de PS na

superfície de L. amazonesis parece ter um papel importante na formação dos grandes vacúolos

característicos desta espécie. A partir destes resultados fomos investigar como estaria a formação

dos vacúolos parasitóforos em macrófagos de lesão em camundongo BALB/cnu/nu, que

apresentam baixa exposição de PS a partir da 5a semana de infecção. Para este experimento,

lesões em patas de camundongos BALB/c e BALB/cnu/nu foram processadas para patologia nos

tempos correspondentes a 1, 3 e 5 semanas após a infecção. Nas lesões da primeira semana de

infecção em BALB/c já é possível observar um intenso infiltrado inflamatório. As lesões de 5

semanas apresentam o tecido pouco compactado, com macrófagos que possuem grandes vacúolos

e diversos parasitas em seu interior aderidos às membranas (Figura 27A e A*). As lesões em

camundongos imunodeficientes BALB/cnu/nu se caracterizam pela ausência de infiltrado

inflamatório nas primeiras semanas após a infecção. Nas lesões correspondentes a 5 semanas o

tecido apresenta aspecto bem mais compacto que aquele observado em lesões de 5 semanas em

65

camundongos BALB/c. Várias amastigotas podem ser observadas, mas os grandes vacúolos

parasitóforos característicos da lesão em BALB/c não foram observados (Figura 27B e B*). O

aspecto da lesão de camundongos BALBnu/nu apresentou uma patologia semelhante à lesão de

camundongos BALB/c SCID, esta também com muitos parasitas mas sem a presença de grandes

vacúolos parasitóforos (resultado não mostrado).

Figura 27 – Patologia das lesões de camundongos BALB/c e BALB/cnu/nu infectados com L. amazonensis. Os camundongos foram infectados no coxim plantar com 2 x 106 promastigotas. As fotos correspondem a lesões de 5 semanas. A) Lesão em camundongo BALB/c. B) Lesão em camundongo BALB/cnu/nu. A* e B* representam as regiões delimitadas pelo quadrado branco nas fotos A e B, respectivamente. Experimento representativo de duas repetições. Barra = 100 μm.

66

D- EFEITOS DA EXTERNALIZAÇÃO DE PS NA INTERAÇÃO LEISHMANIA:MACRÓFAGO

D.1 - A densidade de moléculas de PS expostas na superfície do parasita intracelular se

correlaciona com o aumento da atividade macropinocítica nos macrófagos infectados e

define a morfologia dos vacúolos parasitóforos

Durante o processo de internalização de células apoptóticas Hoffmann et al. (2001)

demonstraram que o PS exposto na superfície destas células é capaz de induzir macropinocitose

nos fagócitos. Ele funciona como uma molécula sinalizadora, responsável por ativar o ruffling de

membrana, que leva a internalização da célula apoptótica. Assim como descrito para as células

apoptóticas, Wanderley et al. (2006) demonstraram que o PS exposto na superfície das

amastigotas de L. amazonensis também sinaliza para a internalização destes parasitas através de

processo de macropinocitose. Esta atividade é significativamente inibida quando as amastigotas

são tratadas previamente com anexina-V, inibindo o reconhecimento do PS pelo macrófago.

Durante a internalização das amastigotas, os autores mostraram a formação de grandes vacúolos

característicos de macropinocitose e contendo os parasitas em seu interior.

Os resultados até aqui expostos mostraram que o reconhecimento do PS na superfície do

parasita é importante para a formação de grandes vacúolos parasitóforos. Durante a infecção do

macrófago, a diferenciação da forma promastigota para a amastigota resulta em aumento da

exposição de PS na superfície do parasita (Figura 13), coincidindo com a expansão do vacúolo

parasitóforo (Figuras 23 e 24). A partir destes resultados resolvemos investigar se a exposição de

PS pelo parasita no interior do vacúolo estaria sinalizando para a indução da atividade

macropinocítica nas células infetadas. Para analisar esta hipótese, realizamos um experimento de

comparação da atividade macropinocítica de macrófagos não infectados e comparamos com a

atividade de macrófagos infectados com formas promastigotas. Foi observada a captação de

Lucifer Yellow (LY) durante vários intervalos consecutivos de 24 h após a infecção. Os

resultados mostram que no período correspondente a 2 h de infecção não há indução da atividade

macropinocítica durante a interação das formas promastigotas com os macrófagos (Figura 28),

diferente do observado em infecções com as formas amastigotas (Wanderley et al., 2006). A

partir de 24 h após a infecção, é possível observar captação de LY pelos macrófagos infectados.

No intervalo de 48 h pós-infecção, curiosamente, não foi observada macropinocitose pelos

macrófagos infectados. Embora este comportamento não tenha se repetido em todos os

experimentos realizados, na maioria deles a atividade macropinocítica em 48 h não foi observada.

67

A partir de 72 h de infecção, no entanto, é possível observar novamente a captação de LY pelos

macrófagos infectados. Esta atividade apresenta aumento gradual nas horas seguintes de infecção,

com intensa atividade em 120 h após a infecção (Figura 28). É importante lembrar que o ponto de

72 h ou 96 h corresponde ao momento de pico de exposição de PS pela amastigota intracelular

após a infecção com a forma promastigota.

Figura 28 – Captação de Lucifer Yellow por macrófagos infectados com promastigotas de L. amazonensis. Macrófagos peritoniais de camundongos BALB/c foram plaqueados e infectados ou não com promastigotas de L. amazonensis. A cada 24 horas as células foram incubadas com 250 μg/ml de Lucifer Yellow (LY) durante 20 min. A captação de LY foi analisada após a lise dos macrófagos, em espectofotômetro de fluorescência. Os valores representam a razão entre a quantidade de LY internalizada pelos macrófagos infectados e não infectados. O gráfico representa os valores obtidos em 1 experimento representativo de 5 realizados.

A captação de LY pelos macrófagos foi observada também através de microscopia

confocal (Figura 29). Como controle positivo de macropinocitose os macrófagos foram tratados

com PMA (Phorbol Myristate Acetate), um agente ativador de proteína quinase C. Esta ativação

induz o ruffling de membrana em diversos tipos celulares e, como conseqüência, as células

tratadas com PMA fazem macropinocitose. Após incubação de 2 h com 80 nM de PMA

observamos pequenas vesículas contendo LY no citoplasma. Como controle negativo de

macropinocitose os macrófagos foram tratados com PMA e 2,5 mM de Amiloride, uma droga

que inibe a proteína trocadora de íons Na+/H+ na membrana plasmática. Segundo Swanson &

Watts (1995) o Amiloride atua diminuindo o pH citoplasmático e a acidificação do citoplasma

produz uma dramática diminuição do movimento de ruffling de membrana em macrófagos. Por

isso o Amiloride é usado como inibidor específico de atividade macropinocítica. Em macrófagos

68

tratados com PMA e Amiloride não foram observadas vesículas contendo LY no citoplasma,

indicando inibição do processo de macropinocitose (Figura 29). Macrófagos infectados com as

formas promastigotas, após 48 h, apresentaram vesículas de LY no citoplasma, muito

semelhantes àquelas observadas após a ativação das células com PMA (Figura 29). Estas

vesículas indicam indução da atividade macropinocítica neste período apesar de, como descrito

acima, este período pós-infecção não apresentar captação de LY na maioria dos experimentos

(medida fluorimétrica) (Figura 28). Após 72 h de infecção, as vesículas no citoplasma da célula

infectada já não se apresentavam tão evidentes. No entanto foi possível observar as amastigotas

marcadas com LY no interior dos vacúolos (Figuras 29, 30 e 31). Este resultado confirma a

indução da atividade macropinocítica em macrófagos infectados e sugere um direcionamento das

vesículas endocitadas para o vacúolo contendo o parasita. A captação de LY pelos macrófagos

infectados durante 72 h foi completamente inibida quando estes foram incubados com Amiloride,

reforçando a hipótese de que o mecanismo induzido pelo parasita seja mesmo macropinocitose.

Após 120 h de infecção é possível observar macrófagos com muitos parasitas em um único

vacúolo, característico de infecção com L. amazonensis (Figura 30). Neste período após a

infecção, alguns parasitas apresentam marcação para LY enquanto outros não estão marcados,

indicando que a captação deste corante não é um evento sincronizado entre todas as amastigotas

dentro do vacúolo.

Para melhor análise do ponto correspondente a 72 h pós-infecção fizemos uma

reconstrução tridimensional utilizando os cortes ópticos obtidos na formação da imagem pelo

confocal. Nesta reconstrução é possível ver claramente a marcação do cinetoplasto da amastigota

com DAPI e a marcação do citoplasma do parasita com LY, indicando o direcionamento das

vesículas macropinocitadas para o vacúolo e a internalização do conteúdo destas pelo parasita

(Figura 31).

69

Figura 29 – Captação de Lucifer Yellow por macrófagos infectados com promastigotas de L. amazonensis. Controle = Macrófagos não infectados; PMA = Macrófagos tratados com 80 nM de PMA durante 2 h; PMA + AML = Macrófagos tratados com 80 nM de PMA + 1,5 mM de Amiloride durante 2 h. Leish 48h e Leish 72h = macrófagos infectados com promastigotas, indicando o tempo de infecção; Leish + AML = macrófago infectado com promastigotas durante 72 h e incubados com 1,5 mM de Amiloride nas últimas 2 h de infecção. A captação de LY foi analisada após 20 min. de incubação das células tratadas ou infectadas em meio DMEM contendo 250 μg/ml de LY. Barras = 10 μm. Figura 30 – Captação de Lucifer Yellow por macrófagos infectados com promastigotas de L. amazonensis. Observação dos macrófagos após 120 h de infecção e 20 min. de tratamento com 250 μg/ml de LY. Os macrófagos estão fusionados e apresentam um vacúolo grande, característico deste tempo de infecção. Note que nem todos os parasitas estão marcados com LY. Barras = 10 μm.

70

Núcleo do Macrófago

Amastigota

DAPILucifer Yellow

Núcleo do Macrófago

Amastigota

DAPILucifer Yellow

Figura 31 - Captação de Lucifer Yellow (LY) pelo amastigota intracelular. Reconstrução tridimensional de um macrófago não infectado e outro infectado com amastigotas, 72 h após a infecção com formas promastigotas. Os macrófagos foram incubados com 250 μg/ml de LY durante 20 min. Pela marcação do cinetoplasto com DAPI é possível observar o citoplasma do parasita marcado com LY.

O aumento simultâneo da exposição de PS pelo parasita intracelular e da macropinocitose

pelo macrófago infectado sugerem um mecanismo de sinalização pelo PS a partir da membrana

do vacúolo parasitóforo. Este mecanismo poderia ser controlado pelo parasita para aumentar o

aporte de nutrientes pelo macrófago, favorecendo o estabelecimento da infecção. Apesar de

trabalhos demonstrarem que as formas amastigotas podem ter um papel na modulação de vários

mecanismos macrofágicos, como por exemplo, na inibição da apresentação das moléculas de

MHC de classe II na superfície (Antoine et al. 1991), e na inibição da produção de radicais de

oxigênio, como o O2- e o H2O2 (Murray, 1986), mecanismos de sinalização a partir da membrana

do vacúolo parasitóforo para a macropinocitose ainda não foram demonstrados.

D.2 - A síntese de TGF-β e a inibição da produção de óxido nítrico (NO) em macrófagos

infectados com L. amazonensis se correlacionam com o aparecimento de PS na superfície do

parasita intracelular

Fadok et al. (2001) demonstraram que a exposição de PS em células apoptóticas é

importante durante o reconhecimento e a remoção destas pelos fagócitos. O reconhecimento deste

fosfolipídio induz a produção de citocinas anti-inflamatórias como o TGF-β, prostaglandina E2 e

PAF (Fadok et al., 1998). A indução da produção de TGF-β inicia com a ligação da célula

71

apoptótica ao macrófago, independente da sua fagocitose posterior. O TGF-β produzido durante

este reconhecimento pode atuar de forma parácrina nos macrófagos vizinhos, que ficam

refratários a esta citocina (Lucas & Stuart et al., 2006), suprimindo a resposta inflamatória

durante a fagocitose destas células.

Da mesma forma que o observado durante o reconhecimento de células apoptóticas,

Balanco & Moreira et al. (2001) demonstraram a produção de citocinas anti-inflamatórias por

macrófagos após o reconhecimento de PS na superfície de amastigotas de L. amazonensis. Os

autores detectaram a produção de TGF-β e a síntese de IL-10 após a fagocitose de formas

amastigotas, processos que são inibidos quando o parasita é incubado previamente com Anexina-

V. Posteriormente Wanderley et al. (2006) demonstraram que a produção destas citocinas anti-

inflamatórias é diretamente dependente da quantidade de PS exposto na superfície do parasita,

comprovando a atividade funcional desta molécula.

Nossos resultados anteriores demonstram que as formas amastigotas intracelulares de L.

amazonensis expõem PS dentro do vacúolo parasitóforo. Vimos também indução da atividade

macropinocítica por estas formas ao longo do tempo de infecção, sugerindo a sinalização por esta

molécula, a partir da membrana do vacúolo parasitóforo. Estes resultados nos levaram a analisar

se a exposição de PS pela amastigota intracelular estaria envolvida na sinalização para a

produção de TGF-β nos macrófagos infectados. Para este experimento, macrófagos peritoniais de

BALB/c foram infectados com formas promastigotas. No decorrer da infecção, 20 horas antes da

coleta do sobrenadante, foram adicionados 100 ng/ml de LPS. A Figura 32 mostra a razão entre a

produção de TGF-β por macrófagos infectados sobre a produção desta citocina por macrófagos

não infectados. A medida em que ocorre a diferenciação para a forma amastigota e conseqüente

aumento da exposição de PS na superfície do parasita é possível observar um aumento gradual na

produção de TGF-β em macrófagos infectados. Após o ponto correspondente a 72 h pós-

infecção, momento em que o parasita intracelular expõe quantidade significativa de PS na

superfície, a produção de TGF-β nos macrófagos infectados é mais elevada e se mantém mais ou

menos constante até 120 h após a infecção. Estes resultados sugerem que, semelhante ao que

acontece durante o reconhecimento de PS no momento da fagocitose, o reconhecimento desta

molécula exposta na membrana da amastigota intracelular pode sinalizar para a produção de

TGF-β nos macrófagos infectados.

72

Figura 32 – Razão entre a produção de TGF-β por macrófagos infectados com promastigotas de L. amazonensis e não infectados. Macrófagos de BALB/c foram ativados com 100ng/ml de LPS por um período de 20 h antes de cada ponto experimental. O TGF-β foi dosado por ELISA no sobrenadante da cultura. Os valores representam a média ± desvio padrão das razões entre a quantidade de TGF-β produzida por macrófagos infectados e macrófagos não infectados, obtidas de 4 experimentos independentes.

Outra abordagem para verificar a sinalização através da membrana do vacúolo

parasitóforo foi realizada medindo-se a produção de NO em macrófagos ativados, infectados ou

não com formas promastigotas de L. amazonensis. O NO é a principal molécula leishmanicida

produzida por macrófagos e, como demonstrado anteriormente, a exposição de PS por

amastigotas de L. amazonensis é importante na modulação da produção deste composto por

macrófagos. Durante a infecção, o reconhecimento do PS exposto na membrana das amastigotas

inibe a produção de NO (Balanco, Moreira et al., 2001) de forma dependente da concentração de

PS exposta pelo parasita (Wanderley et al., 2006).

Os resultados demonstrados na Figura 33 sugerem a participação do PS exposto pela

amastigota intracelular na modulação da produção de NO por macrófagos infectados e ativados

com IFNγ e LPS. Durante as primeiras 24 h após a infecção foi observada baixa produção de NO

pelos macrófagos. No tempo correspondente a 48 h de infecção a produção de NO nos

macrófagos infectados foi aproximadamente 3 vezes maior àquela dos macrófagos não

infectados, sugerindo a ativação do mecanismo leishmanicida do macrófago.

Surpreendentemente, no ponto correspondente a 72 h de infecção, quando a exposição de PS pelo

parasita intracelular atinge um valor alto, a produção de NO é inibida nos macrófagos infectados.

73

A partir deste momento, a inibição da produção de NO é sempre menor nos macrófagos

infectados, sugerindo a modulação da produção deste composto pelo parasita.

Figura 33 – Inibição da produção de Óxido Nítrico em macrófagos infectados com L. amazonensis. Macrófagos de BALB/c foram infectados com as formas promastigotas do parasita (3:1 leish:MO) durante 2 h. Vinte horas antes de cada ponto experimental, foi adicionado à cultura 100 ng/ml de LPS e 50 ng/ml de IFNγ. A produção de NO foi detectada no sobrenadante da cultura, utilizando o método de Griess. Desvio padrão relativo à triplicata de um experimento. Experimento representativo de três repetições na qual os resultados apresentaram perfis de curvas semelhantes.

Estes resultados mostram uma contemporaneidade entre o pico de exposição de PS pelo

parasita intracelular, 72 h ou 96 h após a infecção, a estabilização na produção de TGF-β e

inibição da produção de NO em macrófagos infectados com formas promastigotas. Semelhante

ao que ocorre durante o reconhecimento das amastigotas no momento da internalização, estes

resultados mostram uma associação entre a exposição de PS pela amastigota no interior do

vacúolo parasitóforo e a modulação da atividade microbicida dos macrófagos, sugerindo um

mecanismo de sinalização por este fosfolipídio a partir da membrana do vacúolo parasitóforo.

74

E - A ALCALINIZAÇÃO DO VACÚOLO PARASITÓFORO INIBE A SINALIZAÇÃO PARA A

MACROPINOCITOSE INDUZIDA PELA AMASTIGOTA INTRACELULAR

A correlação direta entre o aumento da exposição de PS pelo parasita intracelular e o

aumento da atividade macropinocítica nos macrófagos infectados exigiu o desenvolvimento de

um protocolo em que fosse possível inibir especificamente o sinal do PS do parasita intracelular.

Como não foi possível desenvolver protocolos capazes de promoverem a internalização de

moléculas inibidoras da atividade de PS (vide discussão), nossa estratégia foi tentar causar uma

alteração no ambiente no interior do vacúolo, para então analisar a contribuição do parasita na

indução do processo de macropinocitose. Em virtude do pH ácido do lúmen do vacúolo de L.

amazonensis (Antoine et al. 1990), utilizamos como estratégia a alcalinização do vacúolo

parasitóforo. Macrófagos infectados com formas promastigotas foram incubados com 5 μM de

cloroquina e a atividade macropinocítica detectada após este tratamento. A cloroquina é um

composto que inibe a atividade das bombas de prótons na superfície do vacúolo, impedindo a

troca de íons e conseqüentemente a acidificação do vacúolo. A alcalinização do vacúolo foi

confirmada por microscopia de fluorescência, utilizando como indicador de pH a laranja de

acridina. Este composto, em pH ácido, assume uma conformação dimérica que após a excitação

com o laser emite fluorescência no comprimento de onda do vermelho. Quando em

compartimentos alcalinos, a laranja de acridina se apresenta em sua forma monomérica e emite

fluorescência no comprimento de onda do verde. Na Figura 34 é possível observar que 5 μM de

cloroquina, dose utilizada no experimento, foi suficiente para causar a alcalinização do vacúolo

parasitóforo. O tramento com esta concentração de cloroquina não aumentou o número de

amastigotas PI positivas, tampouco alterou os valores de exposição de PS na superfície (Figura

34), indicando que a concentração utilizada não induziu a morte das amastigotas intracelulares.

O tratamento de macrófagos não infectados com cloroquina não apresentou nenhum efeito

ativador da atividade macropinocítica (Figura 35). Neste experimento, observamos alta atividade

macropinocítica no período de 96 h após infecção com promastigotas. No entanto, a alcalinização

do vacúolo de macrófagos infectados após 96 h resultou na inibição desta atividade. A inibição

da captação de LY após este tratamento foi comparável aos valores de captação observados no

controle não infectado e após o tratamento de macrófagos infectados com amiloride, o inibidor

específico de macropinocitose (Figura 35). Apesar da exposição de PS pelas amastigotas não ser

alterada durante a alcalinização do vacúolo, este experimento sugere que as amastigotas

75

intracelulares dependem das condições ideais do vacúolo parasitóforo para induzirem os efeitos

de macropinocitose observados nos macrófagos infectados.

Controle Cloroquina 5 μMControle Cloroquina 5 μMControle Cloroquina 5 μM

Controle

Cloroquina

5 μM Figura 34 - Alcalinização do vacúolo parasitóforo de L. amazonensis após o tratamento com Cloroquina. Macrófagos infectados com promastigotas durante 48 h foram tratados ou não com 5 μM de Cloroquina durante 2 h. Após este período as lamínulas foram incubadas com 3 μM de laranja de acridina e observadas imediatamente em microscópio de fluorescência. No controle é possível observar um vacúolo marcado em vermelho, indicando pH ácido (seta). O tratamento com cloroquina tornou o vacúolo básico, indicado pela cor verde (seta). Os gráficos de citometria indicam que o tratamento com cloroquina não aumenta o número de células positivas para Iodeto de Propídio tampouco modifica a quantidade de PS exposta na superfície das amastigotas. Barra = 10 μM

76

Figura 35 – Inibição da atividade macropinocítica após alcalinização do vacúolo parasitóforo com cloroquina. Macrófagos de BALB/c não infectados ou infectados com promastigotas de L. amazonensis durante 96 h foram tratados com 5 μM de cloroquina ou 1,5 mM de amiloride durante 2 h. Após este período, foram incubados com 250 μg/ml de LY. A atividade macropinocítica foi determinada através da leitura do lisado dos macrófagos em espectofotômetro de fluorescência. O gráfico representa os valores obtidos em 1 experimento representativo de 3 realizados.

77

F- DISTRIBUIÇÃO DO PS NA MEMBRANA DAS AMASTIGOTAS PURIFICADAS DE LESÃO EM

CAMUNDONGOS BALB/C

F.1 – A distribuição de PS na membrana das amastigotas não é aleatória e segue uma

organização preferencial em forma de agregados.

Nossos resultados demonstram a importância da sinalização de PS pela amastigota

intracelular para o estabelecimento da infecção de L. amazonensis em macrófagos. Sugerem

ainda, um papel importante desta molécula na formação dos vacúolos característicos desta

espécie, como demonstrado nas patologias de lesão em camundongos BALB/c e BALB/cnu/nu

(Figura 27) e nos experimentos de infecção de macrófagos in vitro com amastigotas isoladas de

lesão nestes camundongos (Figura 26). Apesar das diferenças de exposição observadas,

amastigotas isoladas de camundongos imunodeficientes ainda apresentam uma exposição basal e

constante de PS na superfície durante todo o curso da infecção (Figura 19). Este resultado nos

levou a investigar se as diferenças observadas na formação dos vacúolos seriam conseqüência de

como o PS é distribuído na superfície das amastigotas. Amastigotas com alta exposição, como as

isoladas de camundongos BALB/c, poderiam apresentar as moléculas de PS agrupadas, o que

facilitaria o reconhecimento por um receptor e a sinalização. Amastigotas com baixa exposição

poderiam distribuir o PS exposto de forma mais homogênea em toda a membrana, dificultando

seu reconhecimento e a sinalização.

Para a análise do padrão de exposição de PS pelas formas amastigotas, observamos

parasitas purificados de lesões em camundongos BALB/c marcados com anticorpo Bavituximab

(α-PS) conjugado ao fluorocromo Alexa-488. Em citometria de fluxo observamos que o perfil de

marcação de PS na superfície das amastigotas após a marcação com o anticorpo e com anexina-V

é bastante semelhante (Figura 36). Como a anexina é dependente da presença de Ca2+ para que

ocorra a ligação ao fosfolipídio, optamos por fazer as imagens com o anticorpo porque

possibilitou a posterior fixação das amastigotas. Desta forma foi possível utilizar um protocolo de

permeabilização para marcar as estruturas intracelulares como núcleo e cinetoplasto com DAPI,

permitindo observar a polarização das células analisadas em microscópio de fluorescência. Os

resultados demonstram que a distribuição do PS na membrana das amastigotas não acontece de

forma aleatória. Ela apresenta uma organização preferencial na forma de agregados de moléculas

ou patches. Resultados semelhantes foram observados em experimentos anteriores, na qual

78

amastigotas purificadas de lesão em camundongos BALB/c foram marcadas com Anexina-V

conjugada ao fluorocromo Cy5 e observadas em microscópio confocal (Figura 37).

A B

Figura 36 – Comparação entre o perfil de exposição de PS em amastigotas marcadas com Anexina-V e o anticorpo Bavituximab (α-PS). Amastigotas isoladas de lesões de 5 semanas em camundongos BALB/c foram marcadas com (A) Anexina-V conjugada a FITC (1:20) ou (B) anticorpo Bavituximab (α-PS - 1:100). As análises representam valores de exposição de PS em células negativas para Iodeto de Propídio (PI). ΔMFI = Média de Intensidade de Fluorescência.

Figura 37 – Perfil de exposição de PS na superfície de amastigotas purificadas de lesão em camundongos BALB/c. As amastigotas foram purificadas de lesões de 5a semana e marcadas com Anexina-Cy5 (1:20). Células viáveis foram observadas em microscópio confocal. A seta indica a região preferencial de exposição de PS em uma das extremidades da amastigota. Barra = 2,5 μm.

Em amastigotas marcadas com α-PS e posteriormente fixadas, após a marcação do núcleo

e do cinetoplasto com DAPI foi possível identificar o local da membrana onde ocorre a exposição

preferencial de PS. Foram observados 4 padrões de marcação: 1) parasitas não marcados; 2)

marcação pontual na região da bolsa flagelar; 3) marcação na região posterior e; 4) marcações

duplas na região da bolsa flagelar e na região posterior. Os padrões de marcação observados no

experimento estão demonstrados na Figura 38.

79

Figura 38 - Perfis de distribuição de PS na superfície das amastigotas de L. amazonensis purificadas de lesão em camundongos BALB/c. Amastigotas purificadas de lesão de 8 semanas foram marcadas com DAPI (azul) e com anticorpo anti-PS conjugado a Alexa-488 (verde). a) Amastigotas negativas para a marcação; b) Marcação de agregados de PS na região da bolsa flagelar; c) marcação de agregados de PS na região posterior; d) dupla marcação de agregados de PS na bolsa flagelar e na região posterior. Células observadas em microscópio de fluorescência com objetiva de 100x. k = cinetoplasto; n = núcleo. Barras = 2,5 μm.

80

As análises de exposição de PS por citometria de fluxo demonstram que as populações de

amastigotas não se dividem em células PS positivas e PS negativas. O que observamos é um

deslocamento da população como um todo para a região de marcação. Durante o curso da lesão

de L. amazonensis em camundongos BALB/c, por exemplo, as amastigotas apresentam valores

menores de exposição nas semanas iniciais e valores maiores nas semanas mais tardias de

infecção (Figura 39). A partir destes resultados, investigamos se as diferenças nos valores de

exposição de PS observadas por citometria de fluxo refletem os diferentes perfis de agregação

das moléculas na superfície das amastigotas. Para isso, quantificamos por microscopia de

fluorescência a marcação dos agregados de PS em amastigotas de L. amazonensis isoladas de

lesões de 4a e 8a semanas de infecção em camundongos BALB/c (ΔMFI = 9,24 e 32,85,

respectivamente). O perfil de exposição destas amastigotas foi comparado ao perfil apresentado

por amastigotas de L. major isoladas de lesões de 4a semana neste mesmo camundongo (ΔMFI =

3,79). Resultados recentes do nosso grupo têm demonstrado que a exposição de PS nas formas

amastigotas de L. major purificadas de lesão em camundongos BALB/c é baixa e constante

durante todo o curso da infecção (Zarattini et al., manuscrito em preparação). Por isso, para esta

espécie, foram analisadas apenas as amastigotas purificadas da 4a semana após a infecção. A

quantificação dos agregados de PS na superfície em relação à posição onde aparecem na célula

está representada na Figura 40. Muitas amastigotas de L. major (aproximadamente 65%) não

apresentaram marcação de PS na superfície (Figura 40A). A marcação observada apenas na

região da bolsa flagelar é semelhante para as 3 amostras analisadas. Como esta marcação é

pontual e não se estende por uma grande região de membrana, ela pode explicar os valores de

exposição de PS baixos observados na população de L. major. As amastigotas de L. amazonensis

isoladas de 4a e 8a semana após infecção apresentaram marcação importante na região posterior

do parasita (Figura 40B). Esta região é onde acontece a ligação da forma amastigota à membrana

do vacúolo parasitóforo (Figura 41). A exposição de PS direcionada para esta região pode ser

importante durante a sinalização dos eventos de inibição da atividade macrofágica (vide

discussão). Diferente do observado em amastigotas isoladas de lesão de 4a semana de infecção, as

amastigotas de 8a semana apresentam mais exposição de PS na superfície (Figura 39), com

diferença significativa no número de células com dupla marcação na superfície, ou seja, na região

da bolsa flagelar e na região posterior (Figura 40B). Os resultados observados em microscopia de

fluorescência refletem as diferenças nos valores de exposição de PS observadas por citometria de

fluxo. A observação de sítios preferenciais de exposição sugere que o aumento da quantidade de

81

PS exposta no decorrer das semanas de infecção é um processo controlado pelo parasita, não

ocorrendo de forma aleatória.

Ama BALB/c 8 s.p.i.Ama BALB/c 4 s.p.i. Ama BALB/c 8 s.p.i.Ama BALB/c 8 s.p.i.Ama BALB/c 4 s.p.i.Ama BALB/c 4 s.p.i.

ΔMFI = 32,85ΔMFI = 9,24

Figura 39 - Exposição de PS na membrana de amastigotas de L. amazonensis purificadas de lesões em camundongos BALB/c. As amastigotas foram purificadas de lesões de 4 e 8 semanas pós-infecção (s.p.i.). As células foram marcadas com anticorpo Bavituximab (α-PS) e analisadas em citômetro de fluxo. As análises representam valores de exposição de PS em células negativas para Iodeto de Propídio. ΔMFI = Média de Intensidade de Fluorescência.

Figura 40 – Quantificação da região de aparecimento dos agregados de PS na superfície de amastigotas purificadas de lesão em camundongos BALB/c. As amastigotas foram purificadas de lesão em camundongos BALB/c, marcadas com anticorpo Bavituximab (α-PS), DAPI e observadas em microscópio de fluorescência com objetiva de 100x. La –L. amazonensis; Lm - L. major; spi – semanas pós-infecção. (A) Comparação das regiões de marcação entre La e Lm purificadas de lesão de 4 semanas. **<0,001. (B) Comparação das regiões de marcação entre La purificadas de lesões de 4 e 8 semanas. *<0,01. Os valores representam a média ± desvio padrão de 1 experimento realizado em triplicata. Valores de exposição de PS determinados por citometria de fluxo (ΔMFI): La 8spi = 32,85; La 4spi = 9,24; Lm 4spi = 3,79.

82

Figura 41 - As amastigotas de L. amazonensis aderem à membrana do vacúolo parasitóforo pela região posterior. Macrófagos de camundongos BALB/c foram infectados com formas promastigotas na relação de 1:3 (MO:promastigota) e permaneceram em estufa a 34oC durante 48 h. As células foram fixadas em paraformaldeído 2% e coradas com DAPI. As imagens foram obtidas em microscópio confocal e analisadas no programa de processamento de imagens ImageJ. a) Microscopia de contraste de fase. b) Sobreposição da imagem de campo claro com a imagem da marcação de DAPI obtida no programa ImageJ. c) Imagem de marcação de DAPI em maior aumento mostrando a polarização das amastigotas (setas amarelas em a). n = núcleo, k = cinetoplasto. As amastigotas direcionam a região da bolsa flagelar para o lúmen do vacúolo. Barras = 20 μm.

83

IV – DISCUSSÃO

O ciclo de vida de parasitas do gênero Leishmania envolve passagens em hospedeiros

invertebrados e vertebrados onde o parasita apresenta duas formas evolutivas: promastigotas e

amastigotas. A progressão da infecção no hospedeiro vertebrado depende do estabelecimento do

parasita no interior de células fagocíticas, preferencialmente macrófagos. Para isso, mecanismos

característicos de virulência, incluindo a capacidade de internalização, sobrevivência e

multiplicação, são utilizados por formas promastigotas e amastigotas no momento da interação

com a célula hospedeira.

Desde a década de 90 diversos trabalhos têm demonstrado a morte de organismos

unicelulares pelo processo de morte celular por apoptose, com a apresentação de fenótipos

característicos como, por exemplo, exposição de PS na superfície e degradação oligonucleosomal

do DNA (Moreira et al., 1996; Ridgley et al., 1999; Welburn et al., 1999; Das et al., 2001; Lee et

al., 2002). Algumas vantagens deste processo de morte para os organismos unicelulares têm sido

descritas. Em modelos de interação parasita-hospedeiro, ele aparece como fator importante no

controle de uma infecção exacerbada que poderia resultar na morte do hospedeiro. Em

populações de organismos de vida livre, a morte por apoptose de alguns indivíduos poderia

disponibilizar nutrientes para a população. Resultados já descritos e mais recentes do nosso grupo

demonstram uma nova função da apoptose para L. amazonensis: a exposição de PS na superfície

como um mecanismo de virulência, modulando a resposta macrofágica para um perfil anti-

inflamatório após o reconhecimento e a fagocitose destes parasitas. Dados recentes do nosso

grupo (Wanderley et al., manuscrito em preparação) e da literatura (van Zandbergen et al., 2006)

indicam que a exposição de PS na superfície constitui um importante fator de virulência para

promastigotas de L. amazonensis e L. major. Em culturas de promastigotas cultivadas in vitro e

em populações isoladas do intestino de flebótomos, cerca de 30 a 50% das formas metacíclicas

expõe PS na superfície. Estas células são apoptóticas e apresentam outras características deste

tipo de morte celular como clivagem de DNA e arredondamento do corpo celular. A cooperação

entre promastigotas metacíclicas PSpos e PSneg no inóculo infectivo garante o estabelecimento e a

progressão da infecção. O reconhecimento das células PSpos pelos macrófagos estimula os

processos de internalização e inibe a atividade microbicida, facilitando a sobrevivência e a

proliferação das formas PSneg no interior da célula. A importância deste mecanismo de

cooperação entre as duas populações foi confirmada em modelo de infecção in vivo.

Camundongos infectados com formas metacíclicas PSpos ou PSneg isoladamente não desenvolvem

84

lesão ou apresentam lesões significativamente menores que aqueles infectados com as duas

formas do parasita.

Para as formas amastigotas de L. amazonensis, a exposição de PS na superfície também

representa um importante fator de virulência (Balanco e Moreira et al., 2001). No momento da

infecção, o reconhecimento deste fosfolipídio pelo macrófago induz mecanismos que permitem o

estabelecimento do parasita na célula hospedeira, tais como a produção das citocinas anti-

inflamatórias IL-10 e TGF-β1, e inibição da produção de NO, composto extremamente tóxico ao

parasita (Wanderley et al., 2006). A sinalização para estes eventos é diretamente dependente da

quantidade de PS exposta na superfície das amastigotas e pode ser inibida utilizando anexina V.

Diferentemente do que observamos durante a exposição de PS em formas promastigotas,

a exposição deste fosfolipídio na superfície das amastigotas pode eventualmente não estar

relacionada com processo de morte celular. Após serem purificadas de lesões em camundongos,

amastigotas mantidas em culturas axênicas a 34oC não sobrevivem e apresentam fragmentação de

DNA característica de processo de morte por apoptose a partir de 24 h de cultura (Moreira e

Barcinski, 2004). No entanto, quando cultivadas na presença de macrófagos, estas amastigotas

são altamente infectivas e sustentam a infecção por vários dias, não apresentando evidências de

que estejam em processo de morte. Formas amastigotas de L. amazonensis quando mortas no

interior dos macrófagos são rapidamente degradadas (Prina et al., 2007). Através da análise de

macrófagos infectados e tratados com L-leucine ester por microscopia confocal e PCR em tempo

real, foi demonstrado que 1 h após o tratamento ocorre redução no número de amastigotas no

vacúolo e na quantidade de DNA do parasita no interior do macrófago. Em nossos experimentos

de infecção de macrófagos com formas amastigotas sempre observamos aumento do índice de

infectividade entre o período de 2 h de internalização e 24 h após a infecção (Wanderley et al.,

2006). Este resultado confirma que após a internalização as amastigotas não estão sendo

degradadas, mas que são células viáveis capazes de sustentar a infecção e proliferar no interior

dos macrófagos. A manutenção da viabilidade das amastigotas após a internalização pelos

macrófagos sugere a existência de mecanismos de interação entre a célula hospedeira e o parasita

que são capazes de reverter o processo de morte celular. Estes mecanismos serão discutidos em

maiores detalhes posteriormente.

Assim como observamos que amastigotas de L. amazonensis podem expor PS na

superfície sem evoluírem necessariamente para a morte por apoptose, diversos trabalhos na

literatura demonstram que a exposição de PS na superfície nem sempre está relacionada ao

processo de morte celular. A exposição deste fosfolipídio é um fenômeno que antecede a

85

degradação de DNA (Venhoven et al., 1995), pode ser revertido antes do comprometimento da

célula (Yang et al., 2002) e pode estar envolvido em processos de sinalização durante as

interações celulares. Hemácias senescentes, por exemplo, podem expor PS na superfície por um

longo período de tempo e esta exposição facilita a remoção destas células (Connor et al. 1994).

Durante a embriogênese, mioblastos viáveis apresentam exposição de PS na superfície de forma

transiente, não relacionada à processos de morte (Eijnde et al., 2001). A exposição deste

fosfolipídio acontece nas regiões de contato célula-célula durante a formação de estruturas

musculares embrionárias denominadas miotubos. Em alguns modelos celulares, a exposição de

PS pode ser modulada através da ligação de outras proteínas à membrana plasmática. A ligação

de agregados de IgE ao receptor de FcεRI em mastócitos induz degranulação e externalização

temporária de PS na membrana (Martin et al., 2000). Também em mastócitos, Smrz e

colaboradores (2007) demonstraram que a dimerização de proteínas de membrana ancoradas em

GPI (Glicosilfostatidilinositol) induz exposição transiente de PS na superfície. Esta exposição

utiliza mecanismos moleculares diferentes daqueles demonstrados durante a sinalização por

FcεRI e não induz a degranulação dos mastócitos. Os autores sugerem que, em virtude de

proteínas ancoradas em GPI estarem envolvidas em processos de adesão célula-célula ou célula-

matriz extracelular, a exposição de PS poderia modular processos como adesão ou migração de

mastócitos. Em neutrófilos ativados, a ligação de Galectinas 1, 2 ou 4 (β-galactosidade binding

protein) na superfície induzem exposição de PS, favorecendo o reconhecimento destas células

pelos fagócitos e a rápida remoção dos tecidos (Stowell et al., 2007).

Uma das características mais bem descritas durante a sinalização por PS é a produção de

citocinas anti-inflamatórias pelos fagócitos. O reconhecimento desta molécula é importante

durante a remoção de células apoptóticas dos tecidos, induzindo a produção de TGF-β, IL-10 e

PGE2 (Voll et al., 1997; Fadok et al., 1998). A participação do PS também foi demonstrada em

modelos tumorais como importante molécula indutora de imunossupressão. Células tumorais que

expõem PS na superfície ou liberam vesículas que expõem PS foram descritas como responsáveis

pela produção de citocinas anti-inflamatórias ou pelo bloqueio de respostas imunes antitumorais

(Lima et al., manuscrito submetido; Kim et al., 2006). Durante a infecção com as formas

promastigotas e amastigotas de L. amazonensis foi demonstrada a importância da exposição de

PS na superfície destas células para a modulação da resposta macrofágica. A exposição deste

fosfolipídio aparece como um mecanismo de virulência comum entre as duas formas do parasita.

Através de mecanismo de cooperação entre as formas promastigotas metacíclicas PSpos e PSneg,

86

ou pela exposição em formas amastigotas viáveis, a sinalização por este fosfolipídio contribui

para a infecção e a sobrevivência destes parasitas no interior dos macrófagos.

Diferente do observado para as formas promastigotas, a exposição de PS nas formas

amastigotas parece ser conseqüência de um processo de morte celular que ainda pode ser

revertido após a internalização destas pelo macrófago. A partir desta observação, algumas

questões de como seria a dinâmica de exposição de PS nas amastigotas após sua internalização

pelo macrófago foram levantadas: O PS é exposto na membrana do parasita durante todo o tempo

de infecção contribuindo de alguma forma para a sinalização pelo parasita intracelular? A

amastigota internalizada deixa de expor PS dentro do vacúolo parasitóforo? Ou ainda, a

amastigota deixa de expor PS após a internalização e volta a expor apenas quando o vacúolo

apresenta uma grande densidade de parasitas em seu interior, como um mecanismo de “quorum

sensing”? Neste último caso, o rompimento dos macrófagos contendo amastigotas expondo PS

poderia favorecer a infecção de novos macrófagos. A partir destas questões investigamos a

cinética da exposição de PS na superfície de amastigotas purificadas de macrófagos infectados in

vitro.

Nossos resultados demonstram que as amastigotas de L. amazonensis expõem PS dentro

do vacúolo parasitóforo. A cinética de exposição deste fosfolipídio na superfície do parasita é

dependente da diferenciação da forma promastigota para amastigota e da proliferação dos

parasitas no interior do vacúolo. Quando os macrófagos são infectados com as formas

amastigotas, observamos proliferação dos parasitas nas primeiras horas após a infecção (Figura

12A), com conseqüente diminuição dos valores de exposição de PS na superfície (Figura 12B).

Formas promastigotas, no entanto, precisam se adaptar às condições do vacúolo parasitóforo, se

diferenciando em amastigotas. Este processo leva de 2 a 5 dias para acontecer (Courret et al.,

2001) e pôde ser observado em nossos experimentos através da estabilidade nos valores do índice

de infectividade durante as primeiras horas após a infecção (Figura 13A). Durante o processo de

diferenciação, a exposição de PS na superfície destes parasitas aumenta de forma gradual (Figura

13B), sugerindo que a exposição deste fosfolipídio seja uma característica intrínsica das formas

amastigotas. Ao final da diferenciação, após 72 ou 96 h de infecção, observamos aumento de

proliferação do parasita intracelular (Figura 13A). Neste momento observamos valores baixos de

exposição de PS na superfície destas células, indicando novamente uma correlação inversa entre

a proliferação e a exposição de PS na superfície (Figura 13B). Efeito semelhante a este é

observado durante a formação de estruturas musculares embrionárias denominadas miotubos

(Eijnde et al., 2001). As células musculares embrionárias expõem PS na superfície como um

87

processo independente de morte celular, que é importante para os mecanismos de adesão célula-

célula no momento da formação dos miotubos. No entanto, quando estas células entram em

mitose, a exposição de PS na superfície é interrompida, sendo retomada novamente após a

divisão celular. Os mecanismos responsáveis pela inibição da exposição de PS na superfície no

momento da proliferação ainda não foram descritos. As escramblases de membrana são

dependentes de Ca2+ para a atividade de translocação bidirecional (flip-flop) dos lipídios e a

inibição da exposição de PS durante a proliferação celular pode estar relacionada com a

disponibilidade deste íon. Durante o processo de divisão, diversas enzimas citoplasmáticas são

dependentes de Ca2+ para sua atividade. A utilização do Ca2+ por estas enzimas poderia diminuir

a disponibilidade deste íon para as escramblases de membrana diminuindo a ativação destas

translocases e, conseqüentemente, a exposição de PS na superfície da célula em divisão.

Macrófagos isolados de camundongos BALB/c e C57BL/6 e infectados in vitro não são

capazes de modular diferencialmente a exposição de PS na superfície das amastigotas

intracelulares (Figuras 12B e 13B). Este resultado sugere a participação de diferentes estímulos

ativadores de macrófagos no modelo de infecção in vivo, modulando diferencialmente a

exposição de PS na superfície das amastigotas purificadas das lesões. Nossos resultados

demonstraram evidências que confirmam o papel de citocinas produzidas durante a infecção de

camundongos BALB/c na modulação da exposição de PS pela amastigota intramacrofágica.

Células de linfonodo drenante de lesões de 5a semanas nesses camundongos, quando adicionadas

em culturas de macrófagos infectados, induzem aumento da exposição de PS na superfície das

amastigotas (Figura 15). Este efeito é estreitamente regulado pela concentração dos fatores

produzidos pelas células visto que é diretamente dependente da relação de células adicionadas à

cultura de macrófagos. A adição do sobrenadante destas células, previamente estimuladas in vitro

com antígenos do parasita, também resulta em aumento da exposição de PS pelas amastigotas

intramacrofágicas (Figura 16). A adição de 50% de volume deste sobrenadante em meio de

cultura dos macrófagos infectados induz aumento de exposição ainda mais significativo que o

observado para as células do linfonodo. No entanto, quando adicionamos uma concentração de

25%, o aumento de exposição na superfície das amastigotas não foi observado, o que indica que o

efeito deste sobrenadante também é dependente da concentração utilizada. O papel das citocinas

na modulação da exposição de PS na superfície das amastigotas foi confirmado também em

experimentos in vivo, a partir da infecção de camundongos imunodeficientes BALB/cnu/nu e

SCID. A ausência das citocinas produzidas pelas células T nestes animais tem como

conseqüência uma baixa exposição de PS na superfície das amastigotas purificadas das lesões

88

(Figura 19). Com exceção das primeiras semanas de infecção, amastigotas purificadas de lesões

em camundongos BALB/c apresentam maior exposição de PS na superfície do que aquelas

purificadas dos camundongos imunodeficientes. Em vista destes resultados, sugerimos que a

exposição de PS pelas amastigotas intracelulares pode ser dependente do estado de ativação do

macrófago. As diferenças de exposição observadas em amastigotas purificadas de lesões em

camundongos C57BL/6 e BALB/c podem ser conseqüência direta de diferenças no perfil ou na

quantidade de citocinas produzidas por estes camundongos em resposta à infecção.

A sobrevivência da Leishmania no interior dos macrófagos está diretamente relacionada

ao metabolismo do aminoácido L-arginina e é resultado do balanço entre as atividades das

enzimas Arginase-1, envolvida no metabolismo de poliaminas, e iNOS, responsável pela síntese

de NO. Em infecções com L. major, camundongos BALB/c apresentam mais atividade de

Arginase-1 nas lesões, o que favorece a sobrevivência dos parasitas e contribui para a

susceptibilidade deste camundongo (Iniesta et al., 2005). Em contrapartida, lesões de

camundongos C57BL/6 apresentam pouca atividade da enzima Arginase-1 e, em semanas mais

tardias de infecção, o aumento da atividade de iNOS resulta na cura da lesão neste camundongo.

As diferenças na ativação destas enzimas no modelo de infecção in vivo com L. major são

conseqüência das diferenças no perfil de citocinas produzidas por estes camundongos,

polarizadas para Th1 em camundongos C57BL/6 e Th2 em camundongos BALB/c. Diferente do

que acontece em infecções com L. major, a resposta de camundongos BALB/c à infecção com L.

amazonensis apresenta produção de citocinas com perfil de resposta misto entre Th1/Th2. Apesar

da suscetibilidade destes camundongos a esta espécie, citocinas como IFNγ e TNFα são

produzidas durante a resposta à infecção (Ji et al., 2002). Nossos resultados demonstram que as

citocinas produzidas durante a infecção de camundongos BALB/c podem ativar a via de

biossíntese de poliaminas nos macrófagos. A adição do sobrenadante das células de linfonodos

drenantes da lesão nestes camundongos induziu, de forma dose-dependente, aumento de atividade

da enzima ODC nos macrófagos infectados (Figura 17A). Utilizando a concentração de 50% do

sobrenadante observamos um aumento importante na atividade da ODC, com inibição na

produção de NO, sugerindo o direcionamento da via de degradação da L-arginina para a

produção de poliaminas (Figuras 17A e 17B). Esta concentração também é importante na indução

de aumento da exposição de PS pelas amastigotas intracelulares (Figuras 16). Este resultado

indica uma possível participação das poliaminas no processo de exposição de PS pelas

amastigotas intracelulares. A participação de poliaminas na exposição de PS no modelo de

células apoptóticas já foi sugerida na literatura. Bratton e colaboradores (1999) demonstraram

89

que o tratamento de células apoptóticas com um inibidor da síntese de poliaminas inibe a

exposição de PS na superfície, embora todos os outros efeitos característicos de morte por

apoptose sejam observados. Segundo estes autores, a ausência de poliaminas intracelulares

interfere na translocação bidirecional dos lipídios de membrana, resultando na inibição da

exposição de PS na superfície. Este efeito pode ser revertido com a adição de poliaminas

exógenas. Estes dados foram demonstrados em células de linhagem leucêmica humana HL-60 e

não foram confirmados em outros modelos. Embora as poliaminas possam participar do processo

de translocação bidirecional dos lipídios de amastigotas de L. amazonensis, uma outra função

para estes compostos no modelo de exposição de PS por estes parasitas será sugerida a seguir.

Nossos resultados demonstraram a importância da ativação dos macrófagos por citocinas

para a modulação dos efeitos de exposição de PS na superfície das amastigotas e produção de

poliaminas em macrófagos infectados. No entanto, identificar qual a citocina presente no

sobrenadante utilizado em nossos experimentos, responsável pela indução destes eventos, é uma

questão ainda a ser respondida. Experimentos anteriores do nosso grupo demonstraram que a

sinalização de macrófagos infectados com a citocina IFNγ é importante para a indução da

exposição de PS em amastigotas de L. amazonensis (Figura 21). Amastigotas isoladas de lesões

em camundongos com deleção do gene que codifica para o receptor desta molécula (IFNγR-/-)

apresentam menos exposição de PS na superfície que aquelas purificadas de camundongos

selvagens (Figura 21). Apesar de não estar demonstrado experimentalmente em nossos

resultados, é muito provável que outras citocinas atuem em conjunto com o IFNγ modulando a

exposição de PS pela amastigota intramacrofágica. Em infecção com L. major, a presença do

IFNγ é importante para a polarização da resposta para Th1 em camundongos resistentes

(Belosevic et al., 1989; Wang et al., 1994; Swihart et al., 1995). No entanto, no modelo de

infecção com L. amazonensis a presença desta citocina apresenta características muito peculiares.

A polarização pelo IFNγ para o perfil Th1 não é tão nítida e camundongos suscetíveis BALB/c

apresentam produção constante desta citocina durante todo o curso da infecção (Ji et al., 2003).

Além disso, o tratamento de macrófagos com baixas concentrações de IFNγ favorece a

proliferação das formas amastigotas intracelulares (Qi et al., 2004). Nossos resultados

demonstram que macrófagos isolados de camundongos BALB/c e C57BL/6 apresentam diferença

de sensibilidade a esta citocina (Figura 21). Em macrófagos de camundongos C57BL/6, o

tratamento com 0,1 ng/ml de IFNγ induz aumento de proliferação das amastigotas. Em

90

macrófagos de camundongos BALB/c, este efeito só é observado utilizando uma concentração 5

x maior de IFNγ (Figura 21).

A partir dos resultados até aqui apresentados, formulamos um modelo para explicar um

dos possíveis efeitos da sinalização pelo IFNγ na via de metabolismo da L-arginina e na

exposição de PS em amastigotas de L. amazonensis. Um desenho esquemático representando

infecções a partir da 5a semana está demonstrado na figura 42.

Infecções de camundongos BALB/c e C57BL/6 com L. amazonensis são caracterizadas

pela falta de polarização de resposta para um perfil Th1 ou Th2, apresentando um perfil misto

Th1/Th2. Camundongos BALB/c, por exemplo, apresentam produção de IL-4, IFNγ e TNF-α no

decorrer de toda a infecção, mesmo com um fenótipo de susceptibilidade (Ji et al., 2002).

Camundongos C57BL/6 apresentam redução da produção de mediadores pró-inflamatórios e

baixos níveis de citocinas do tipo Th2 (Ji et al., 2003). Uma produção mais significativa de IFNγ

acontece em semanas mais tardias de infecção (Ji et al., 2003) e, apesar de apresentarem lesões

menores que aquelas observadas em camundongos BALB/c, estes camundongos não são capazes

de curar a lesão. Nossos resultados demonstraram que macrófagos isolados de camundongos

C57BL/6 e BALB/c apresentam sensibilidade diferente a presença de baixas concentrações de

IFNγ (Figura 21). A sinalização por IFNγ é importante para a exposição de PS pelas amastigotas

intracelulares, como demonstrado nos experimentos de infecção em camundongos 129 IFNγR-/-

(Figura 21). A partir destes resultados, sugerimos que diferenças na ativação dos macrófagos em

resposta à concentrações de IFNγ podem modular diferencialmente a exposição de PS na

superfície das amastigotas isoladas de lesão de camundongos C57BL/6 e BALB/c.

Macrófagos de camundongos BALB/c e C57BL/6 apresentam perfis diferentes de

ativação e produção de citocinas e metabólitos frente aos mesmos estímulos. Em vista das

diferenças de ativação observadas entre os macrófagos destes camundongos, Mills e

colaboradores (2000) classificaram estas células como M1, macrófagos provenientes de linhagens

com perfil Th1, e M2, macrófagos de linhagens com perfil Th2. Os autores demonstraram que na

presença de IFNγ ou LPS, macrófagos de camundongos C57BL/6 produzem maiores

concentrações de NO, enquanto que macrófagos de camundongos BALB/c induzem maior

atividade da enzima Arginase-1.

A produção constante de IFNγ no modelo de infecção de camundongos com L.

amazonensis poderia modular de forma desigual a ativação dos macrófagos infectados. Na

infecção de camundongos BALB/c, a presença desta citocina poderia modular preferencialmente

91

a atividade da enzima Arginase-1. Desta forma, a produção de poliaminas estaria favorecida em

detrimento da produção de NO. Evidência que confirma esta hipótese está demonstrada

experimentalmente na Figura 17, onde a adição de sobrenadante de células de linfonodo drenante

em culturas de macrófagos induz a atividade de ODC e inibe a produção de NO. Wanasen e

colaboradores (2007) demonstraram que amastigotas de L. amazonensis são capazes de

sobreviver a uma ativação moderada do macrófago e altos níveis de NO são requeridos para que

ocorra a morte do parasita. A produção de pequenas quantidades de NO pelos macrófagos das

lesões de camundongos BALB/c poderia induzir a exposição de PS na superfície das amastigotas

intramacrofágicas, como característica do início do processo de morte destes parasitas. No

entanto, as poliaminas produzidas por estes macrófagos poderiam estar envolvidas na proteção

das amastigotas dos mecanismos microbicidas, conferindo mais resistência a estes parasitas.

Poliaminas são compostos catiônicos que podem se ligar à estrutura do DNA protegendo esta

molécula da clivagem por nucleases e radicais livres (Rowlatt e Smith, 1981; Ha et al., 1998).

Desta forma, as amastigotas em lesões de camundongos BALB/c poderiam expor PS na

superfície em resposta a baixa produção de NO, como início de um processo de morte por

apoptose. No entanto, este processo seria interrompido através da proteção da clivagem do DNA

induzida pelas poliaminas. Isto explicaria a alta exposição de PS na superfície das amastigotas

purificadas das lesões nestes animais.

Em camundongos C57BL/6, a presença de IFNγ induziria nos macrófagos de perfil M1

uma maior produção de NO, com baixa produção de poliaminas. Hollzmuller e colaboradores

(2006) demonstraram que, em infecções com L. amazonensis, camundongos C57BL/6

apresentam maior produção de NO do que camundongos BALB/c. Os autores demonstraram que

o NO induz a morte das amastigotas por apoptose e que as lesões de camundongos C57BL/6

apresentam mais parasitas positivos para TUNEL do que as lesões de camundongos BALB/c. As

baixas concentrações de poliaminas nos macrófagos destes animais seriam insuficientes para

proteger os parasitas da morte induzida pelo NO. A rápida remoção dos parasitas apoptóticos

pelos macrófagos das lesões de camundongos C57BL/6 poderia então ser responsável pela baixa

exposição de PS observada nas amastigotas purificadas destes animais. Desta forma, apenas as

amastigotas mais resistentes seriam analisadas quanto à exposição de PS na superfície. Além

disso, em nossos experimentos, o protocolo de purificação de amastigotas que utilizamos possui

uma incubação de 12 h a 34oC. Durante esta incubação, as células que entram em apoptose em

resposta ao NO produzido pelo macrófago podem tornar-se permeáveis em virtude da evolução

do processo de apoptose e, conseqüentemente, são marcadas para Iodeto de Propídio. Estas

92

células seriam então excluídas da análise da exposição de PS e, novamente, os parasitas mais

resistentes à ação do NO estariam sendo analisados, o que explicaria a baixa exposição de PS

pelas amastigotas purificadas das lesões em camundongos C57BL/6.

Em camundongos imunodeficientes BALB/cnu/nu a ausência de citocinas produzidas pelas

células T, com a conseqüente falta de estímulos microbicidas, poderia influenciar de forma

positiva a proliferação das amastigotas intracelulares. Os macrófagos destes camundongos são

mais propensos à ativação de Arginase-1 do que os macrófagos de camundongos BALB/c

selvagem e, mesmo na ausência de estímulo, apresentam grande atividade desta enzima (Mills et

al., 2006). Desta forma, uma alta produção de poliaminas poderia favorecer a proliferação mais

intensa das amastigotas, o que explica a quantidade maior de parasitas observada nas lesões de

camundongos BALB/cnu/nu em relação aos camundongos selvagens. A intensa proliferação das

amastigotas neste modelo poderia resultar em baixa exposição de PS, visto que nossos resultados

demonstraram uma correlação inversa entre a exposição de PS na superfície das amastigotas e a

proliferação destas células (Figuras 13B e 14B). Curiosamente, nas semanas iniciais de infecção,

as amastigotas de BALB/cnu/nu apresentam exposição de PS na superfície em níveis comparáveis

aos observados nas amastigotas de BALB/c. Isto pode ser resultado da presença de IFNγ

produzido pelas células NK nos momentos iniciais da infecção (Scharton e Scott, 1993). Neste

momento, a presença de IFNγ poderia induzir os mesmos mecanismos descritos anteriormente

nas lesões de camundongos BALB/c.

93

Figura 42 – Desenho esquemático mostrando hipóteses sobre as diferenças de exposição de PS em amastigotas de L. amazonensis purificadas de lesão em camundongos. Camundongos BALB/c e C57BL/6 produzem IFNγ em resposta à infecção com L. amazonensis (Ji et al., 2002; 2003). Os esquemas sugerem ativações diferenciais da via do metabolismo de L-arginina pelos macrófagos destes camundongos (Mills et al., 2000) onde, em resposta ao IFNγ, diferentes concentrações de poliaminas e óxido nítrico são produzidas. Neste esquema estão representados macrófagos de lesões a partir de 5 semanas.

94

A formas amastigotas de Leishmania sobrevivem nas células hospedeiras no interior de

vacúolos parasitóforos. Estas organelas possuem características fusogênicas, podendo interagir

com vesículas endossomais e lisossomas, fornecendo aos parasitas um importante aporte de

nutrientes dentro do vacúolo parasitóforo. Os mecanismos que fazem com que as espécies do

complexo L. mexicana manipulem a formação de grandes vacúolos parasitóforos ainda não estão

bem caracterizados. Existem evidências de que amastigotas de L. mexicana secretam

proteofosfoglicanas no interior do vacúolo parasitóforo (Peters et al., 1997). Estes compostos

polianiônicos induzem a formação de grandes vacúolos nos macrófagos, mesmo na ausência do

parasita, sugerindo que possam contribuir para a formação dos vacúolos característicos desta

espécie. Mecanismo semelhante a este, no entanto, não foi descrito para outras espécies do

complexo L. mexicana.

Trabalhos anteriores do nosso grupo demonstraram que os grandes vacúolos formados

durante a internalização das formas amastigotas de L. amazonensis são conseqüência de um

processo de macropinocitose induzido pelo parasita. Este processo é diretamente dependente da

quantidade de PS exposta na membrana: amastigotas purificadas de lesão em camundongos

BALB/c expõem mais PS na superfície e induzem mais macropinocitose que aquelas purificadas

de camundongos C57BL/6 (Wanderley et al., 2006). A indução da formação dos vacúolos

característicos de L. amazonensis através da sinalização pelo PS exposto na membrana das

formas amastigotas foi confirmada em nossos experimentos. O aparecimento de vacúolos grandes

foi quantificado após a infecção de macrófagos com amastigotas que apresentam alta exposição

de PS e amastigotas incubadas previamente com o anticorpo anti-PS. Nossos resultados

demonstram que o bloqueio da sinalização por PS no momento do reconhecimento do parasita

induz um retardo na formação dos vacúolos grandes (Figura 25). Estas diferenças foram

observadas até o período de 1 h de infecção. Amastigotas marcadas com anti-PS e incubadas em

meio ácido (pH 4,0), em temperatura de 34oC e durante 1 h, perdem a marcação com o anticorpo

na superfície (Figura 25 inset). Portanto, a diminuição na diferença de tamanho dos vacúolos

observadas após 2 h de infecção pode ser conseqüência do desligamento do anticorpo da

superfície do parasita, o que sugere que o PS exposto pela amastigota no interior do vacúolo

parasitóforo pode sinalizar para a expansão desta organela.

A participação do PS no processo de formação dos vacúolos foi confirmada em

experimentos de infecção de macrófagos com amastigotas isoladas de lesão em camundongos

BALB/cnu/nu (Figura 26). Também neste experimento, a diminuição da sinalização de PS no

momento da infecção resulta em atraso na formação dos grandes vacúolos, com diferenças

95

observadas em intervalos de até 24 h após a infecção. A exposição de PS também é importante

para a formação dos vacúolos característicos de L. amazonensis em modelos in vivo.

Histopatologias de lesões de camundongos BALB/c apresentam células contendo grandes

vacúolos parasitóforos com muitas amastigotas aderidas à membrana. Em contraste, lesões de

camundongos BALB/cnu/nu são mais compactas e, embora as células estejam muito infectadas,

raramente observamos macrófagos com vacúolos grandes (Figura 27). Estes resultados reforçam

a participação do PS exposto na superfície das amastigotas de L. amazonensis na indução da

formação dos grandes vacúolos característicos desta espécie. Os resultados observados na

patologia das lesões indicam que a exposição deste fosfolipídio é importante não somente no

momento do reconhecimento da amastigota, mas também após o estabelecimento do parasita por

um longo período de infecção. A indução de macropinocitose foi confirmada em um modelo viral

de exposição de PS (Mercer e Helenius, 2008). Neste trabalho, os autores demonstraram que uma

forma infectiva não envelopada do vírus Vaccinia expõe PS na superfície. O reconhecimento

desta forma do vírus induz sua internalização pelo processo de macropinocitose. Esta

internalização é dependente do PS exposto pelo virus e este mecanismo também foi descrito

como Mimetismo Apoptótico (Mercer e Helenius, 2008).

Promastigotas de L. amazonensis são internalizadas em um vacúolo justo e o crescimento

desta organela mostra uma relação direta com o aumento da exposição de PS na superfície do

parasita. Este resultado indica que a participação do PS na formação dos grandes vacúolos pode

não ser um evento restrito ao reconhecimento desta molécula na membrana plasmática. Durante a

diferenciação para a forma amastigota observamos aumento da atividade macropinocítica nos

macrófagos infectados. Este aumento acontece de forma mais constante e crescente após 72 h de

infecção, período em que observamos alta exposição de PS na superfície das amastigotas (Figura

13B). A sincronia destes eventos sugere um papel da exposição deste fosfolipídio na sinalização,

a partir da membrana do vacúolo parasitóforo, para a indução da atividade macropinocítica em

macrófagos infectados. A fusão de vesículas endocíticas com o vacúolo de L. amazonensis é um

importante mecanismo de aquisição de nutrientes pelo parasita. A indução de macropinocitose ao

longo do tempo de infecção e a fusão das vesículas macropinocíticas com o vacúolo (Figuras 28,

29, 30 e 31) indicam um mecanismo adicional para a aquisição de nutrientes pelas amastigotas

intracelulares. Este processo pode ainda estar envolvido na formação dos grandes vacúolos

parasitóforos, característicos desta espécie de Leishmania.

Além da indução de macropinocitose, a exposição de PS pela amastigota no interior do

vacúolo parasitóforo é capaz de modular outros mecanismos, semelhantes aos observados durante

96

o reconhecimento da amastigota no momento da infecção. Em nossos experimentos observamos

uma correlação direta entre a inibição de mecanismos de ativação macrofágica e o aumento da

exposição de PS pelo parasita no interior do vacúolo. Macrófagos infectados com promastigotas

induzem aumento gradual na produção de TGF-β ao longo da infecção que, nas primeiras horas,

acompanha o aumento na exposição de PS na superfície do parasita (Figura 32). Após 72 h de

infecção, os macrófagos infectados passam a produzir esta citocina em maiores concentrações e

de forma mais constante. Barral e colaboradores (1992) demonstraram que infecções com L.

amazonensis induzem a produção de TGF-β em macrófagos infectados in vitro ou em lesão de

camundongos. Esta citocina é importante para permitir a sobrevivência das amastigotas e a

adição de TGF-β em lesões de camundongos C57BL/6 exacerbam a infecção. Nossos resultados

demonstram que a infecção de macrófagos com L. amazonensis pode modular a produção desta

citocina de forma concomitante com a exposição de PS pela amastigota intracelular. O papel do

PS na indução da produção de TGF-β foi demonstrado durante o reconhecimento de células

apoptóticas (Fadok et al., 1998) e lipossomos de PS por macrófagos (Otsuka et al., 2004; Otsuka

et al., 2007). Desta forma, através da exposição de PS na superfície, a amastigota no interior do

vacúolo poderia modular a produção de citocinas importantes para a sua sobrevivência e para a

manutenção da infecção.

O aumento de exposição de PS pela amastigota intracelular também é capaz de modular a

produção de NO em macrófagos infectados. Após a infecção com as formas promastigotas, esta

modulação é observada somente a partir de 72 h de infecção (Figura 33). Curiosamente, os

experimentos de macropinocitose demonstram que em períodos de 48 h após a infecção a

internalização de LY por macrófagos infectados ainda pode ser inibida. Estes resultados sugerem

que durante os momentos iniciais da infecção com promastigotas os macrófagos ainda são

capazes de responder à infecção pelo parasita, inibindo o processo de macropinocitose e

produzindo NO quando ativados com IFNγ e LPS. No entanto, o aumento da exposição de PS na

superfície da amastigota serve como modulador negativo da produção de NO. O aumento mais

significativo da exposição de PS na membrana da amastigota, após 72 h de infecção, pode ser

conseqüência da produção de NO, visto que este composto induz a apoptose de Leishmania

intracelulares (Holzmuller et al., 2006). No entanto, a amastigota consegue se estabelecer e, após

72 h de infecção, a inibição da síntese de NO se mantém constante, sugerindo uma modulação

efetiva desta resposta pela presença do parasita no interior do vacúolo.

97

O sucesso da infecção com Leishmania depende de interações que favorecem a

sobrevivência do parasita no interior da célula hospedeira. Mecanismos de modulação da resposta

macrofágica durante o reconhecimento do parasita, no momento do contato com a membrana

plasmática da célula que será infectada, têm sido demonstrados (Revisado em Kima, 2007). No

entanto, amastigotas de Leishmania precisam sustentar a infecção no interior do macrófago por

longos períodos e mecanismos que atuam no momento do reconhecimento podem não

permanecer ativos durante o progresso da infecção. Por isso, é natural imaginarmos que o

parasita apresente mecanismos que possibilitem a interação com o ambiente citoplasmático,

modulando diferentes vias da célula hospedeira. Alguns autores demonstraram que proteínas

secretadas pelas amastigotas podem ser exportadas do vacúolo para o citoplasma, influenciando

na ativação de diferentes vias de sinalização. Amastigotas de L. donovani secretam a molécula

EF-1α (enlongation factor 1-alpha) que interage com SHP-1 no citoplasma da célula hospedeira

(Nandan et al, 2002). SHP-1 está envolvida na sinalização induzida por citocinas e a ligação ao

EF-1α inibe esta sinalização. Os autores demonstraram que a exportação de EF-1α de L.

donovani para o citoplasma e a ligação ao SHP-1 da célula hospedeira inibe a atividade de iNOS

induzida pelo tratamento destas células com IFNγ. Cisteíno peptidases produzidas por

amastigotas de L. mexicana também podem ser exportadas para o citoplasma e degradam

subunidades de NF-κΒ, impedindo a ligação deste fator de transcrição ao núcleo da célula

hospedeira (Cameron et al., 2004). Em resposta a esta clivagem, macrófagos infectados e tratados

com LPS têm a produção de IL-12 inibida, o que favorece o estabelecimento da infecção por este

parasita.

Modelos clássicos de sinalização em células eucarióticas descrevem receptores na

membrana plasmática que, após o reconhecimento de um ligante na superfície da célula, ativam

mensageiros secundários no citoplasma, que são os responsáveis pela propagação do sinal. Até

pouco tempo, os endossomas eram reconhecidos como estruturas responsáveis pelo término da

sinalização por degradarem complexos receptor/ligante internalizados. No entanto, diversos

trabalhos têm demonstrado que estas estruturas podem ser importantes para a propagação ou

amplificação dos sinais iniciados na membrana plasmática. A sinalização do TGF-β, por

exemplo, só ocorre após a endocitose da molécula ligada a seu receptor, a partir do endossoma já

localizado no citoplasma da célula. Quando a internalização ligante/receptor é realizada em

endossomas cobertos por clatrina, o complexo é direcionado para a via de sinalização. Por outro

lado, a endocitose deste complexo em endossomas cobertos por caveolina direciona as moléculas

98

para a via de degradação (Guglielmo et a., 2003). Moléculas como o NGF (Nerve Growth

Factor) ligam ao seu receptor TrkA no local da sinapse e são transportadas em endossomas até o

corpo celular do neurônio. O movimento destes “endossomas de sinalização” permite a

sinalização para a mudança de expressão de genes no núcleo (Grimes et al., 1997). Além da

sinalização pelos endossomos, outros modelos de sinalização a partir de compartimentos

citoplasmáticos têm sido descritos. Receptores Toll (TLR), envolvidos no reconhecimento de

patógenos, são capazes de ativar vias citoplasmáticas após o reconhecimento de estruturas

característica de microorganismos. Atualmente, são descritos 13 receptores TLR sendo que o

TLR3, TLR7 e TLR9 estão localizados em compartimentos intracelulares, onde reconhecem

ácidos nucléicos de origem viral e bacteriana (Krishnan et al., 2007). A sinalização para os

eventos de ativação de mecanismos microbicidas por estes receptores inicia em vesículas

localizadas no citoplasma da célula. Segundo Barton e colaboradores (2006), a localização

intracelular do TLR9 é importante para a especificidade do reconhecimento e ativação da

resposta. O reconhecimento de CpG DNA de bactérias dentro do endossomo discrimina-o do

DNA próprio, evitando uma resposta contra a própria célula ou organismo.

Sinalizações a partir da membrana de vacúolos parasitóforos também podem ser

observadas em processos de interação entre o parasita e a célula hospedeira. Vacúolos de T.

gondii são caracterizados por não apresentarem proteínas de membrana da célula hospedeira, que

são retiradas em um processo ativo modulado pelo parasita durante a internalização (Mordue et

al., 1999). No entanto, proteínas secretadas pelo parasita na membrana destes vacúolos podem

interagir com vias de sinalização e com vias endossomais no citoplasma da célula. Molestina e

Sinai (2005) demonstraram que vacúolos de T. gondii apresentam o complexo IKK na superfície,

responsável pela degradação de proteínas que impedem a migração do NF-κB da célula

hospedeira para o núcleo. Através deste complexo o T. gondii pode interferir temporariamente na

ativação do NF-κB, regulando a expressão de diferentes genes na célula que está parasitando. Em

outro trabalho foi demonstrado que proteínas secretadas pelo T. gondii induzem a invaginação da

membrana do vacúolo (Coppens et al., 2006). Estas invaginações são sustentadas por

microtúbulos que, através de um processo dinâmico, interferem no sistema endo-lisossomal da

célula hospedeira. Os microtúbulos formam verdadeiros condutos para a entrada de endossomas e

lisossomas no vacúolo parasitóforo e desta forma o parasita obtém nutrientes através do seqüestro

de vesículas da via endocítica.

99

Diferente dos vacúolos de T. gondii, os vacúolos de Leishmania são fusogênicos e

apresentam proteínas características de endossoma tardio e lisossoma como Rab7, catepsina B e

D, macrosialina e Lamp1. Estas proteínas podem ser observadas mesmo após longos períodos de

infecção, indicando que a interação do vacúolo parasitóforo com endossomas tardios e lisossomas

não é um processo transiente (Courret et al., 2002). Além destas proteínas, vacúolos de

Leishmania podem apresentar proteínas características de retículo endoplasmático, indicando a

associação também entre estas organelas (Kima e Dunn, 2005). Em vista da complexidade de

proteínas que podem estar presentes no vacúolo de Leishmania é natural sugerirmos que

moléculas presentes na membrana desta organela possam reconhecer sinais do parasita e

participar da modulação de atividades no citoplasma da célula hospedeira. Em modelos de

fagocitose de partículas de látex por células J774, Garin e colaboradores (2001) identificaram,

por análise proteômica, mais de 140 proteínas presentes na membrana ou no lúmen de

fagolisossomas. Recentemente, Stuart e colaboradores (2007) identificaram 617 proteínas

associadas ao fagossoma de células S2, uma linhagem derivada de hemócitos de embriões de

Drosophila melanogaster, também em modelo de fagocitose de partículas de látex. Nesse

trabalho, estas proteínas foram organizadas de acordo com as suas interações, gerando um

“interactoma do fagossoma” e diversos reguladores de fagocitose foram identificados. Os autores

descreveram 122 proteínas que apresentaram domínios transmembrana, podendo ter função de

receptores ou proteínas sinalizadoras na membrana do fagolisossoma (Stuart et al., 2007). Entre a

diversidade de proteínas existentes no vacúolo parasitóforo de L. amazonensis, poderia haver

moléculas responsáveis pelo reconhecimento de PS, permitindo a sinalização por esta molécula

exposta na superfície da amastigota. De fato, a glicoproteína MFG-E8, já descrita como

envolvida no reconhecimento de PS de células apoptóticas, está presente no fagolisossoma de

células J774 (Garin et al., 2001). Outras proteínas de membrana, ou mesmo os receptores de PS

recentemente descritos (Miyanishi et al., 2007; Park et al., 2007; Park et al., 2007), poderiam ser

internalizados no momento da infecção ou trazidos até esta organela durante o processo de fusão

com as vesículas da via endocítica, permitindo então a sinalização a partir da membrana do

vacúolo parasitóforo.

Nossos resultados sugerem um novo mecanismo de interação entre amastigotas de L.

amazonensis e macrófagos. Através da exposição de PS dentro do vacúolo parasitóforo as

amastigotas parecem orquestrar os mecanismos de inativação da célula hospedeira, mesmo após

longos períodos de infecção. A partir destes resultados pensamos em como desenhar um

experimento em que fosse possível inibir especificamente o sinal de PS exposto pela amastigota

100

no interior do vacúolo. Não se trata de um protocolo simples visto que, por estar localizada

dentro do vacúolo, para ocorrer a ligação com o inibidor (anexina-V ou anticorpo anti-PS) este

teria que atravessar a membrana do macrófago e do vacúolo parasitóforo. Uma estratégia

utilizada foi diluir a anexina-V no meio de cultura dos macrófagos infectados. Durante a

atividade macropinocítica, a anexina-V seria internalizada em vesículas e, no momento da fusão

destas vesículas com o vacúolo parasitóforo, seria liberada no lúmen da organela, permitindo sua

ligação com as moléculas de PS expostas na superfície das amastigotas. Infelizmente, a análise

deste experimento demonstrou que as amastigotas no interior do vacúolo não estavam marcadas

com anexina-V e a inibição da sinalização para a atividade macropinocítica também não foi

observada. Provavelmente o pH ácido do vacúolo ou a ausência de concentrações suficientes de

Ca2+ impediram a ligação da anexina-V ao PS da amastigota.

Apesar de não ser possível demonstrarmos a inibição específica do sinal de PS dentro do

vacúolo parasitóforo, os experimentos de alcalinização desta organela mostram que a indução da

atividade macropinocítica é dependente de um sinal fornecido pela amastigota. A alteração das

condições ideais do vacúolo parasitóforo inibiu a macropinocitose de macrófagos infectados em

níveis comparáveis ao tratamento com o inibidor específico deste processo (Figura 35). É

importante ressaltar que o tratamento com 5 μM de cloroquina durante 2 h não é suficiente para

matar a amastigota intracelular. Análises em citometria de fluxo demonstraram que após este

tratamento as células são negativas para Iodeto de Propídio, indicando que as amastigotas

continuam viáveis (Figura 34). Desta forma, a alcalinização do vacúolo pode influenciar o

processo de sinalização pela amastigota. Uma das conseqüências da alcalinização poderia estar

relacionada com mudanças na interação entre a amastigota e a membrana do vacúolo

parasitóforo. A alteração de pH poderia interferir na afinidade entre as moléculas responsáveis

pela sinalização, comprometendo a indução da macropinocitose e inibindo todo o processo.

A quantidade de PS exposta na superfície das amastigotas purificadas de camundongos

BALB/c é dependente do tempo de desenvolvimento da lesão. Amastigotas purificadas de lesão

de 4 semanas geralmente apresentam menos exposição de PS na superfície que aquelas

purificadas de lesões mais tardias. Em citometria de fluxo observamos que a diferença de

marcação não é relativa à divisão da população em células PSpos e PSneg. O que observamos é um

aumento na intensidade de marcação da população como um todo, sugerindo um aumento da

quantidade de PS exposta na superfície do parasita (Figura 37).

Através da análise em microscópio de fluorescência observamos que a exposição de PS na

membrana das amastigotas ocorre a partir de uma organização preferencial, e não é distribuída

101

por toda a superfície do parasita (Figura 38). Amastigotas isoladas de lesões em camundongos

BALB/c apresentam marcações pontuais na bolsa flagelar e formação de agregados de PS

preferencialmente localizados na região posterior (Figura 38). As amastigotas estão aderidas à

membrana do vacúolo parasitóforo pela região posterior, com a bolsa flagelar voltada para o

lúmen do vacúolo (Figura 41). A bolsa flagelar é a região do parasita onde ocorrem os processos

de endocitose e este posicionamento facilita o contato da região endocítica com os nutrientes

presentes no interior do vacúolo. A exposição de PS na região posterior do parasita também

sugere que este posicionamento seja importante para facilitar a sinalização por este fosfolipídio a

partir da membrana do vacúolo parasitóforo.

Em nossos experimentos observamos que amastigotas purificadas de lesões de 8 semanas

comumente apresentam duas marcações na superfície: uma na forma de agregados na região

posterior e a outra pontual na região da bolsa flagelar (Figuras 38d e 40B). Em amastigotas

purificadas de lesões de 4 semanas, a freqüência de parasitas que apresentam dupla marcação é

significativamente menor (Figura 40B) . Estes perfis de exposição podem explicar as diferenças

nos valores observados em citometria de fluxo. A exposição diferencial de PS em momentos mais

recentes ou tardios de infecção pode ser uma resposta aos processos inflamatórios que acontecem

no desenvolvimento da lesão. Lesões de 4 semanas são pequenas enquanto que lesões de 8

semanas são bem maiores, mais intensamente inflamadas e podem, eventualmente, apresentar

necrose. Visto que a exposição de PS pelas amastigotas pode ser modulada por citocinas

(Wanderley et al., 2006), diferenças no processo inflamatório no decorrer da infecção poderiam

influenciar diretamente a exposição das amastigotas purificadas de lesão.

Resultados recentes do nosso grupo demonstram que amastigotas de L. major não

apresentam aumento na exposição de PS ao longo da infecção em camundongos BALB/c. Estas

amastigotas também não induzem macropinocitose em macrófagos infectados in vitro (Zarattini,

manuscrito em preparação). As amastigotas desta espécie apresentam exposição de PS baixa e

constante ao longo das semanas de infecção. A análise destas amastigotas marcadas com anti-PS

revelou marcação pontual apenas na região da bolsa flagelar (Figuras 38b e 40A) que não difere

quantitativamente de amastigotas de L. amazonensis. Agregados de PS na região posterior

raramente foram observados em amastigotas de L. major. Estes resultados sugerem que a

formação dos vacúolos justos, característicos de infecção com L. major, pode ser conseqüência

da baixa exposição de PS na membrana destes parasitas. Sugerem também que a exposição na

região da bolsa flagelar, observada de forma semelhante entre as amastigotas analisadas, não é

importante na sinalização para a formação de grandes vacúolos parasitóforos.

102

A exposição de PS na região de adesão da amastigota à membrana do vacúolo

parasitóforo pode ser importante para a indução da sinalização. A organização destes

fosfolipídios na forma de agregados pode facilitar o reconhecimento pelo receptor ou molécula

responsável pela sinalização. As amastigotas de L. amazonensis apresentam uma forte interação

com a membrana do vacúolo parasitóforo. Esta característica poderia sugerir que a exposição de

PS pelas amastigotas é conseqüência de membranas do vacúolo parasitóforo que permanecem

aderidas após o processo de purificação dos parasitas. Diversas evidências em nossos

experimentos e na literatura são contra esta hipótese e indicam que o PS exposto na superfície é

proveniente da externalização dos fosfolipídios do parasita. Promastigotas de culturas axênicas,

que não estabeleceram contato com macrófagos, podem expor PS na superfície como parte de um

mecanismo de morte por apoptose (van Zandbergen et al., 2006; Wanderley et al., manuscrito em

preparação). Translocases de fosfolipídios foram descritas em promastigotas de L. tropica e L.

donovani, e são responsáveis pela translocação de lipídios na membrana destes parasitas (Tripathi

e Gupta, 2003; Pérez-Victoria et al., 2003). A modulação da exposição de PS em amastigotas não

é um processo aleatório. Utilizando o mesmo protocolo de purificação, observamos

sistematicamente que amastigotas isoladas de lesão em camundongos BALB/c expõem mais PS

na superfície que amastigotas isoladas de camundongos C57BL/6 (Wanderley et al., 2006) e

BALB/cnu/nu (Figura 19). Além disso, a exposição de PS nas amastigotas purificadas das lesões

nestes animais pode ser modulada pelas citocinas produzidas durante a resposta à infecção. Em

experimentos in vitro, as amastigotas purificadas apresentam perfis de exposição de PS diferentes

quando os macrófagos são infectados com as formas amastigotas ou promastigotas (Figuras 12B

e 13B). Dificilmente estes perfis de exposição seriam tão repetitivos se representassem restos de

membranas de macrófagos aderidas à superfície do parasita. Em conjunto estas observações

sugerem fortemente que o PS exposto na superfície das formas amastigotas é conseqüência da

externalização deste fosfolipídio pelo parasita.

Nossos resultados demonstram que, em modelos de infecção in vivo, a exposição de PS é

modulada pela ativação macrofágica em resposta a citocinas produzidas durante a infecção dos

camundongos. A exposição de PS neste modelo parece acontecer em virtude de um balanço entre

a resposta a um mecanismo de tentativa de combate à infecção, através da produção de NO, e um

mecanismo de proteção do parasita, com a produção de poliaminas. Nas lesões em camundongos

BALB/c o balanço entre estas atividades induz aumento de exposição de PS na superfície das

amastigotas. Variações neste equilíbrio podem levar à uma maior atividade macrofágica e à

morte do parasita, como observado em infecção de camundongos C57BL/6, ou à inativação que

103

permite a proliferação exacerbada das amastigotas, como observado em infecção de

camundongos BALB/cnu/nu. Em modelos de infecção de macrófagos in vitro, na ausência de

estímulo, a exposição de PS na superfície das amastigotas parece acontecer de forma intrínseca,

como característica da diferenciação da forma promastigota para a amastigota. Macrófagos de

diferentes linhagens de camundongos, na ausência de estímulos ativadores, não são capazes de

modular diferencialmente a exposição de PS pelos parasitas.

A exposição de PS na superfície das formas amastigotas pode ser importante também no

desenvolvimento das lesões e modular a ativação da resposta imune em humanos. Lesões de

Leishmaniose Cutânea Localizada (LCL) apresentam tendência à cura espontânea, enquanto que

pacientes com Leishmaniose Cutânea Difusa (LCD) apresentam baixa produção de citocinas

inflamatórias e demonstram um quadro de anergia. A resposta imune durante a LCD em humanos

é caracterizada por um perfil de citocinas do tipo Th2, com baixa produção de IFN-γ, TNF-α e

IL-12 e níveis elevados de IL-4 e IL-10. Os macrófagos nas lesões de LCD são altamente

infectados, refletindo o estado permissivo destas células à infecção pelo parasita. Resultados

recentes de França-Costa (comunicação pessoal) demonstraram que cepas de L. amazonensis

isoladas de pacientes com LCD apresentam mais exposição de PS na superfície que cepas da

mesma espécie isoladas de pacientes LCL. Estas diferenças foram observadas em amastigotas

purificadas de culturas de macrófagos infectadas in vitro e sugerem que a exposição deste

fosfolipídio pelas amastigotas pode ser importante no desenvolvimento da infecção e na

modulação da resposta em hospedeiros humanos.

Em conjunto, nossos resultados demonstram que a exposição de PS na superfície das

amastigotas representa um importante mecanismo de virulência, contribuindo para a infecção,

formação do vacúolo parasitóforo característico desta espécie e modulação da ativação

macrofágica. A sinalização por este fosfolipídio é importante não apenas durante o

reconhecimento das amastigotas na superfície, mas é capaz de sinalizar também a partir da

membrana do vacúolo parasitóforo. A exposição de PS pela amastigota no interior do vacúolo

parece orquestrar os mecanismos de inativação da célula hospedeira, mesmo após longos

períodos de infecção. A formação de agregados de fosfolipídios na membrana da amastigota

sugere que esta distribuição é importante durante a sinalização pelo parasita dentro do vacúolo

parasitóforo.

104

VI – CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS

- Amastigotas de L. amazonensis podem expor PS no interior do vacúolo parasitóforo. O perfil da

exposição ao longo do tempo é dependente da forma do parasita utilizada no momento da

infecção, se promastigota ou amastigota, e da proliferação do parasita no interior do vacúolo.

- A exposição de PS na superfície das amastigotas purificadas de macrófagos pode ser modulada

por fatores produzidos durante a resposta imune. Células de linfonodos drenantes de lesão em

camundongos BALB/c induzem aumento de exposição de PS nas amastigotas purificadas de

macrófagos infectados in vitro. Estes resultados foram confirmados em modelos in vivo

utilizando camundongos imunodeficientes BALB/cnu/nu, nos quais as amastigotas purificadas da

lesão apresentam baixa exposição de PS na superfície. Como perspectiva futura resta caracterizar

as células que participam desta modulação e definir o seu mecanismo de ação.

- Entre a(s) citocina(s) que podem estar envolvidas na modulação da exposição de PS pelas

amastigotas intramacrofágicas destaca-se a participação no IFNγ. A ausência de sinalização por

esta molécula em camundongos 129 IFNγR-/- resulta em amastigotas de lesão com menor

exposição de PS na superfície. Diferenças na sensibilidade de macrófagos de BALB/c e C57BL/6

à esta molécula sugerem a sua participação nas diferenças de exposição de PS observadas em

amastigotas purificadas da lesão destes animais. Experimentos in vitro utilizando anticorpo

neutralizante de IFNγ no modelo experimental de incubação dos macrófagos com linfonodos

drenantes de lesão devem ser realizados para elucidar melhor o seu papel na indução de

exposição de PS pela amastigota intramacrofágica.

- O PS exposto na superfície das amastigotas é importante para a formação dos grandes vacúolos

parasitóforos característicos desta espécie. O bloqueio do reconhecimento deste fosfolipídio pelo

macrófago no momento da fagocitose resulta na formação de vacúolos menores. A exposição

deste fosfolipídio também é importante para a formação dos vacúolos em macrófagos de lesão.

Camundongos BALB/cnu/nu apresentam amastigotas com pouca exposição de PS na superfície e

lesões contendo macrófagos com vacúolos parasitóforos pequenos.

- Os nossos resultados sugerem fortemente que o aumento da exposição de PS pelas amastigotas

no interior do vacúolo parasitóforo sinaliza, a partir da membrana desta organela, para indução da

105

atividade macropinocítica nos macrófagos infectados. Alterações no ambiente intravacuolar

através da alcalinização do vacúolo inibem este processo, indicando a participação do parasita na

indução desta atividade.

- As correlações observadas entre o aumento da exposição de PS pelas amastigotas intracelulares

e a inibição da atividade microbicida em macrófagos infectados sugerem mecanismos de

sinalização da amastigota através da exposição deste fosfolipídio, a partir da membrana do

vacúolo parasitóforo. A partir da exposição de PS dentro dos vacúolo as amastigotas são capazes

de induzir a produção de TGF-β e inibir a produção de NO em macrófagos infectados, mesmo

após longos períodos de infecção. Moléculas envolvidas na sinalização originada nos vacúolos

parasitóforos ainda precisam ser melhor definidas.

- As formas amastigotas apresentam o PS distribuído na superfície na forma preferencial de

agregados de moléculas. Estes agregados podem estar localizados na região da bolsa flagelar ou

na região posterior do parasita. A organização destas moléculas expostas na superfície do parasita

pode favorecer a sinalização a partir da membrana do vacúolo parasitóforo. Apesar de ainda não

se poder caracterizar definitivamente a origem do PS exposto na superfície, as evidências

experimentais sugerem fortemente que este resíduo é de origem parasitária e não fruto de uma

transferência do hospedeiro. Independente de sua origem, a capacidade de se apresentar em

agregados parece ser fundamental para a sua capacidade de sinalizar.

- Amastigotas isoladas de lesão de 4 e 8 semanas em camundongos BALB/c apresentam

diferentes quantidades de fosfolipídio expostas na membrana. Utilizando anticorpo α-PS

verificamos que amastigotas de lesões de 8 semanas, apresentam mais células com marcação na

bolsa flagelar e na região posterior. Por outro lado, amastigotas purificadas de lesão de 4

semanas, apresentam marcação preferencialmente na região posterior.

- A região posterior do parasita, importante sítio de marcação dos agregados de PS na superfície,

corresponde à região de adesão do parasita à membrana do vacúolo parasitóforo. Esta

conformação pode ser importante para facilitar a sinalização pelo amastigota intracelular a partir

da membrana desta organela. Um estudo mais detalhado da ultraestrutura e das moléculas

envolvidas na junção entre os amastigotas de Leishmania amazonensis e a membrana do vacúolo

parasitóforo, precisa ser realizado.

106

VII - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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