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  • Perfil Socioprofissional e Concepes de Poltica Criminal do Ministrio Pblico Federal

    Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo

  • Perfil Socioprofissional e Concepes de Poltica Criminal do Ministrio Pblico Federal

  • Repblica Federativa do BrasilMinistrio Pblico da Unio

    Procurador-Geral da RepblicaRoberto Monteiro Gurgel Santos

    Diretor-Geral da Escola Superior do Ministrio Pblico da UnioNicolao Dino de Castro e Costa Neto

  • Perfil Socioprofissional e Concepes de Poltica Criminal do Ministrio Pblico Federal

    ESCOLA SUPERIOR DO MINISTRIO PBLICO DA UNIO

    CoordenadorRodrigo Ghiringhelli de Azevedo

    Braslia, DF2010

  • ESCOLA SUPERIOR DO MINISTRIO PBLICO DA UNIOSGAS Av. L2-Sul, Quadra 604, Lote 23, 2o andar70200-640 Braslia-DF

    Tel.: (61) 3313-5114 Fax: (61) 3313-5185

    Copyright 2010. Todos os direitos reservados.

    Diviso de Apoio DidticoAdriana Ribeiro Ferreira Tosta

    ElaboraoRodrigo Ghiringhelli de Azevedo CoordenadorEduardo Pazinato da Cunha Assistente de pesquisaFernanda Bestetti de Vasconcellos Assistente de pesquisa

    Ncleo de EditoraoCecilia Fujita

    Setor de RevisoLizandra Nunes Marinho da Costa Barbosa ChefiaConstana Lazarin Reviso de provasRenata Filgueira Costa Reviso de provasLara Litvin Villas Bas Preparao de originais e reviso de provas

    Projeto grfico e diagramao Lucas de vila Cosso

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)Biblioteca da Escola Superior do Ministrio Pblico da Unio

    Azevedo, Rodrigo Ghiringhelli de Perfil socioprofissional e concepes de poltica criminal do Ministrio Pblico

    Federal / Coordenador: Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo ; assistentes de pesquisa: Eduardo Pazinato da Cunha, Fernanda Bestetti de Vasconcellos. Braslia : Escola Superior do Ministrio Pblico da Unio, 2010.

    108 p.

    ISBN 978-85-88652-31-6Disponvel em:

    1. Ministrio Pblico histria. 2. Ministrio Pblico aspectos constitucionais. 3. Ministrio Pblico poderes e atribuies I. Ttulo. II. Cunha, Eduardo Pazinato da. III. Vasconcellos, Fernanda Bestetti de.

    CDD 341.413

    A994

  • SUMRIO

    Introduo 8

    1. Evoluo histrica do Ministrio Pblico no Brasil 11

    2. A redemocratizao e o Ministrio Pblico na Constituio de 88 17

    3. Princpios institucionais de organizao e funcionamento do Ministrio Pblico 21

    4. Resultados da pesquisa 27

    4.1 Perfil socioprofissional 27

    4.2 Funes e eficcia do sistema penal 41

    4.3 Questes procedimentais 54

    4.4 Execuo penal 78

    5. Questes institucionais 81

    Referncias 97

    Anexo A. Questionrio 99

    Anexo B. Roteiro para entrevistas semiestruturadas 103

    Anexo C. Tabela de mdias 106

  • Introduo

    A presente publicao apresenta os resultados da pesquisa Perfil Socioprofissional e Concepes de Poltica Criminal do Ministrio Pblico Federal.

    Em um primeiro momento, foram sistematizadas algumas referncias bibliogrficas a respeito do Ministrio Pblico no Brasil, contextualizando-o, no seu histrico e atual momento, em relao ao Ministrio Pblico Federal.

    Encerrada essa primeira etapa de pesquisa, partimos para a aplicao de questionrio estruturado, em meio eletrnico, para o qual foram convidados a responder todos os membros ativos do Ministrio Pblico Federal no perodo de junho a julho de 2008.

    O questionrio foi composto de 52 questes, a maioria delas fechadas e de escolha nica, algumas de escolha mltipla e uma questo aberta ao final. As questes foram estruturadas em cinco grandes grupos: 1) Perfil socioprofissional; 2) Funes e eficcia do sistema penal; 3) Questes procedimentais; 4) Execuo penal; 5) Questes institucionais.

    Ao final, foi obtido um total de 168 questionrios respondidos, que correspondem a 20% do total de integrantes do MPF (852).

    Grfico 1 . Universo pesquisado e respondentes

  • A amostra obtida bastante representativa do universo pesquisado, com alguns desvios que puderam ser verificados a partir da comparao com dados, como sexo, ano de nascimento, ano de ingresso, regio judiciria e grau de atuao, que nos foram enviados pelo Ncleo de Pesquisa e Ps-Graduao da ESMPU, referentes ao total de integrantes do MPF.

    A ltima etapa da pesquisa constou de entrevistas semiestruturadas, com 3 Subprocuradores e 12 Procuradores Regionais da Repblica, atuantes nas 5 regies judicirias da Justia Federal, preferencialmente na rea criminal, de acordo com a tabela a seguir. Conforme estabelecido com os respondentes, estes no esto identificados na pesquisa, mas, ao final dos trechos reproduzidos no presente relatrio, informada a regio de sua atuao. As entrevistas, com durao mdia de uma hora, foram gravadas e transcritas na ntegra, sendo posteriormente selecionados os trechos que se encontram transcritos no relatrio, em seguida aos dados produzidos a partir da tabulao dos questionrios.

    Entrevistado Regio Data

    SBPR1 Subprocurador(a) 19.9

    SBPR2 Subprocurador(a) 7.10

    SBPR3 Subprocurador(a) 1o.10

    PRR1A 1a Regio 14.10

    PRR1B 1a Regio 11.11

    PRR2A 2a Regio 20.10

    PRR2B 2a Regio 20.10

    PRR3A 3a Regio 6.10

    PRR3B 3a Regio 6.10

    PRR3C 3a Regio 6.10

    PRR4A 4a Regio 16.9

    PRR4B 4a Regio 30.9

    PRR4C 4a Regio 6.10

    PRR5A 5a Regio 4.10

    PRR5B 5a Regio 24.10

    Introduo

  • 10

    Nas pginas que seguem, so apresentados os resultados da pesquisa. Pela abrangncia dos temas tratados e pelo retorno alcanado, esperamos que estes possam contribuir para o aperfeioamento institucional do Ministrio Pblico Federal e a definio das linhas de atuao da instituio no mbito criminal no prximo perodo, assim como para a qualificao dos mecanismos de formao e deliberao coletiva da instituio.

    Introduo

  • 1. Evoluo histrica do Ministrio Pblico no Brasil

    No Brasil, o Ministrio Pblico encontra suas razes no direito lusitano, vigente no pas no perodo colonial. As Ordenaes Manuelinas, de 1521, j mencionavam o Promotor de Justia e suas obrigaes perante as Casas de Suplicao e nos juzos das terras. O Promotor de Justia atuava basicamente como um fiscal da lei e de sua execuo. Nas Ordenaes Filipinas, de 1603, foram definidas as atribuies do Promotor de Justia nas Casas de Suplicao, que ficava incumbido, alm das atribuies de fiscal da lei, do direito de promover a acusao criminal (Macedo Junior, 1995, p. 40).

    Na poca colonial, at 1609, apenas funcionava no Brasil a Justia de primeira instncia e nela ainda no existia rgo especializado do Ministrio Pblico. Os processos criminais eram iniciados pela parte ofendida ou pelo prprio Juiz, e o recurso era interposto para a Relao de Lisboa. A figura do Promotor de Justia surgiu no Brasil em 1609, quando foi regulamentado o Tribunal de Relao na Bahia, sob a vigncia das Ordenaes Filipinas.

    Em 1751, foi criada a Relao do Rio de Janeiro, que viria a se transformar em Casa de Suplicao do Brasil em 1808, cabendo-lhe julgar os recursos da Relao da Bahia. Neste novo tribunal, os cargos de Promotor de Justia e de Procurador dos Feitos da Coroa e da Fazenda separaram-se e passaram a ser ocupados por dois titulares, dando o primeiro passo para a separao total das funes da Advocacia-Geral da Unio (que ir defender o Estado e o fisco) e do Ministrio Pblico.

    A Constituio Imperial de 1824 limitou-se a atribuir aos membros do Ministrio Pblico, por meio dos Procuradores da Coroa, a promoo do processo criminal, exceto nas hipteses de crimes de autoria dos Ministros e Conselheiros de Estado. No havia, no entanto, uma organizao eficiente e um mnimo de unidade do Parquet, que funcionava de forma desarticulada e sem controle centralizado. O recrutamento de seus integrantes era rudimentar, por influncia poltica, incorporando leigos sem as mnimas condies tcnicas para o exerccio das funes.

  • 12

    A instituio somente mereceu ateno maior com a edio do Cdigo de Processo Criminal (1832), que, ao descrever os primeiros requisitos para a nomeao dos Promotores e suas principais atribuies, iniciou a sistematizao das aes do Ministrio Pblico. O art. 37 daquele cdigo j afirmava pertencerem ao Ministrio Pblico as seguintes atribuies: denunciar crimes pblicos e policiais, crime de escravido de pessoas livres, crcere privado, homicdio ou tentativa, ferimentos com qualificaes, roubos, calnias, injrias contra pessoas vrias, bem como acusar os delinquentes perante os jurados; solicitar priso e punio dos criminosos e promover a execuo das sentenas e mandados judiciais; dar parte s autoridades competentes das negligncias e prevaricaes dos empregados na administrao da Justia (Macedo Junior, 1995, p. 40).

    A Lei n. 261, de 3 de novembro de 1841, que reformou o Cdigo de Processo Criminal, deu ao Imperador e aos presidentes das provncias competncia para nomear os Promotores de Justia para as comarcas, escolhidos em lista trplice proposta pelas Cmaras Municipais. Por outro lado, a subordinao dos Promotores aos Juzes de Direito, assim como a remunerao por ordenado arbitrado, acrescido de ganhos por tarefa, reduzia-os a simples prestadores de servio, despidos de mnus pblico prprio do ofcio. Exerciam, sem qualquer independncia, simples funes auxiliares da Justia (Sawen Filho, 1999, p. 111).

    A reforma de 1851 previu que os Promotores poderiam ser demitidos a qualquer tempo, de acordo com a convenincia do servio pblico, significando um retrocesso institucional, uma vez que retirou do Ministrio Pblico a legitimidade que lhe era conferida pela elaborao de lista pelas Cmaras Municipais, colocando a nomeao e a demisso do Promotor pblico sob exclusivo arbtrio dos chefes do Poder Executivo (Macedo Junior, 1995, p. 41).

    A primeira Constituio republicana (1891) no tratou do Ministrio Pblico como instituio, apenas fez referncia escolha do Procurador-Geral, entre os integrantes do Supremo Tribunal Federal, pelo Presidente da Repblica. O Ministrio Pblico passou a ser tratado como instituio pelo Decreto n. 848, de 11 de outubro de 1890, que organizou a Justia do Distrito Federal. Em um de seus captulos, o referido decreto disps sobre a estrutura e as atribuies do Ministrio Pblico no mbito federal, em que se destacam a indicao do Procurador-Geral pelo Presidente da Repblica e a atribuio da instituio do Ministrio Pblico para atuar como

    Evoluo histrica do Ministrio Pblico no Brasil

  • 13

    advogado da Lei, o fiscal de sua execuo, o procurador dos interesses geraes, o promotor da ao pblica contra todas as violaes do direito, o assistente dos sentenciados, dos alienados, dos asylados e dos mendigos, requerendo o que for a bem da Justia e dos deveres de humanidade (art. 24, alnea c).

    J o Cdigo Civil de 1917 deu ao Ministrio Pblico atribuies at hoje vigentes, como a curadoria de fundaes (art. 26), a legitimidade para propor ao de nulidade de casamento (art. 208), a defesa dos interesses de menores (art. 394), a legitimidade para propor ao de interdio (art. 447, III), a de promover a nomeao de curador de ausente (art. 463), entre outras.

    A Constituio de 1934, em um captulo parte (Ttulo I, Cap. VI, Seo I, arts. 95 a 98 Dos rgos de Cooperao nas Atividades Governamentais), dispensou ao Ministrio Pblico ateno maior que a anterior. A Carta de 1934 previa que lei federal organizaria o Ministrio Pblico na Unio, no Distrito Federal e nos Territrios e que leis locais organizariam o Ministrio Pblico nos Estados. A Constituio de 1934 introduziu a participao do Senado na escolha do Procurador-Geral da Repblica, a garantia de vencimentos iguais aos dos Ministros da Corte Suprema, as garantias dos membros do Ministrio Pblico Federal, os primeiros impedimentos dos Procuradores-Gerais e a organizao do Ministrio Pblico nas Justias Militar e Eleitoral.

    A Carta de 1934 estabeleceu, ainda, a estabilidade funcional para os membros do Parquet, que passaram a ingressar nos quadros da carreira mediante concurso pblico e, uma vez nomeados, s poderiam perder o cargo nos termos da lei e por sentena judicial ou deciso proferida em procedimento administrativo, no qual lhes fosse assegurada ampla defesa. Embora essas disposies constitucionais dissessem respeito apenas ao Ministrio Pblico Federal, foram incorporadas pelas legislaes estaduais, consagrando o princpio da estabilidade na carreira aps a nomeao.

    No entanto, a dependncia do Parquet ao Poder Executivo continuava bastante acentuada e at mesmo defendida por juristas da poca, como pelo Presidente Getlio Vargas. Pelo menos at a promulgao da Consti-tuio de 1946, o Ministrio Pblico seria considerado, tratado e utilizado pelos governantes como instrumento de sua poltica e, muito embora houvesse na doutrina vozes discordantes desse entendimento, o fato que a maioria dos autores aceitava essa situao como fato consumado (Sawen Filho, 1999, p. 142).

    Evoluo histrica do Ministrio Pblico no Brasil

  • 1

    A ampliao de atribuies e prerrogativas do Ministrio Pblico dada pela Constituio de 1934 foi bastante reduzida com a Constituio do Estado Novo (1937). A ditadura de Vargas imps um retrocesso instituio, suprimindo a regra constitucional que condicionava a nomeao do chefe do Parquet aprovao de sua indicao pelo Senado Federal, conferindo ao Presidente da Repblica a mais ampla discricionariedade na escolha do Procurador-Geral da Repblica. Em contrapartida, introduziu a possibilidade de os membros do Ministrio Pblico concorrerem ao preenchimento do quinto constitucional da composio dos tribunais superiores, pelo disposto em seu art. 105.

    O Cdigo de Processo Civil de 1939 estabeleceu a obrigatoriedade da interveno do Ministrio Pblico em diversas situaes no mbito cvel, visando basicamente proteger os valores e interesses sociais considerados indisponveis. Para Macedo Junior,

    a partir deste perodo o Promotor vincula-se basicamente defesa dos valores centrais de uma ordem social e econmica burguesa de forte predominncia rural e agrria. Deste modo, inicia-se o fenmeno do parecerismo que marcar toda uma tradio de praxis jurdica do Ministrio Pblico (Macedo Junior, 1995, p. 41)1.

    Ainda sob a vigncia da Constituio de 37, foi com o advento do Cdigo de Processo Penal de 1941 que o Ministrio Pblico conquistou o poder de requisio de inquritos policiais e diligncias nos procedimentos de apurao de delitos, passando a ser a regra a sua titularidade na promoo da ao penal pblica (Sawen Filho, 1999, p. 148).

    Com o restabelecimento da democracia, a Constituio de 1946 voltou a dar relevo ao Ministrio Pblico, em ttulo prprio (Ttulo III, Do Ministrio Pblico). Estabeleceu a organizao do Ministrio Pblico da Unio e dos Estados em carreira, com ingresso mediante concurso pblico, conferindo

    1 Ainda segundo Macedo Junior, o parecerismo o fenmeno pelo qual os Promotores de Justia passam a elaborar pareceres cada vez mais em tudo semelhantes a sentenas judiciais, atendendo a todos os requisitos formais de uma sentena e esquecendo-se, por vezes, da prpria finalidade com que intervinham no feito. Assim, o Promotor que intervinha em favor de incapaz j devidamente defendido esforava-se para elaborar um parecer que deixava de ter um carter subsidirio no sentido de garantir o equilbrio processual que fundamentava a sua interveno e emitia um longo e muitas vezes desnecessrio parecer. Mais uma vez, o Promotor de Justia buscava apresentar-se como algum capaz de exercer as mesmas atividades tpicas do magistrado. Muito comum nesta fase, foi a assemelhao do Promotor de Justia figura muitas vezes chamada pejorativamente de mini-juiz. O Promotor de Justia atuava com a mesma independncia, compromisso e fundamento do magistrado e emitia um parecer em tudo semelhante a uma sentena, razo pela qual caracterizava-se, muitas vezes, como um mini-juiz, um magistrado que elaborava pareceres em forma de sentena mas que desta ltima se diferenciavam por no serem vinculantes (Macedo Junior, 1995, p. 44).

    Evoluo histrica do Ministrio Pblico no Brasil

  • 1

    a seus membros as garantias de estabilidade, aps dois anos de exerccio, e de inamovibilidade, salvo representao motivada pelo chefe do Ministrio Pblico. Tambm atribuiu ao Procurador-Geral da Repblica a representao de inconstitucionalidade e imps a obrigatoriedade de ser ouvido o chefe do Ministrio Pblico nos pedidos de sequestro de verbas pblicas. A Lei Federal n. 1.341/1951 criou o Ministrio Pblico da Unio e seus ramos. Consolidou-se assim a independncia do Parquet em relao aos demais rgos governamentais, afastando-o da esfera de abrangncia dos Poderes do Estado, salvo no tocante nomeao e demisso discricionria de seu chefe, tanto na esfera federal como nos estados, pelo chefe do Poder Executivo.

    A Constituio seguinte, de 1967, j no perodo dos governos militares, deslocou a seo do Ministrio Pblico para dentro do captulo do Poder Judicirio e manteve o regime jurdico estabelecido na Carta de 1946. Alm disso, criou a regulamentao do ingresso na carreira mediante concurso pblico de provas e ttulos, abolindo os concursos internos que davam margem a influncias polticas. O texto constitucional de 1969 outorgado por uma junta militar, sob a forma da Emenda Constitucional n. 1, que alterou significativamente a Carta de 1967 retrocedeu em relao independncia da instituio, inserindo o Ministrio Pblico no captulo do Poder Executivo, e previso de equiparao de condies de aposentadoria e vencimentos dos Juzes.

    Embora o regime militar tenha privado o Ministrio Pblico da possibilidade de maior independncia, submetendo-o vontade poltica do Poder Executivo, a instituio acabou por se fortalecer e crescer em importncia no universo dos rgos governamentais, despertando em seus integrantes uma unidade de aspiraes que se manifestaria mais tarde, quando dos trabalhos da Assembleia Constituinte, que ps fim ao perodo autoritrio.

    J em 1973, o novo Cdigo de Processo Civil deu tratamento siste-mtico ao Ministrio Pblico, conferindo-lhe papel de rgo interveniente (custos legis) nas causas de interesse pblico ou que envolvessem interesse de incapazes.

    Em 1977, a Emenda Constitucional n. 7 deu nova redao ao art. 96 e seu pargrafo nico da Constituio. Pelo novo texto, passou-se a prever a edio de lei complementar, de iniciativa do Presidente da Repblica, para estabelecer normas gerais a serem adotadas na organizao do Ministrio Pblico dos Estados. Com amparo nessa redao, foi editada a Lei Complementar n. 40, de 1981, a primeira Lei Orgnica do Ministrio Pblico,

    Evoluo histrica do Ministrio Pblico no Brasil

  • 16

    que definiu seu estatuto jurdico, com suas principais atribuies, garantias e vedaes. Nela, o Ministrio Pblico definido como instituio permanente e essencial funo jurisdicional do Estado e responsvel, perante o Poder Judicirio, pela defesa da ordem jurdica e dos interesses indisponveis da sociedade, pela fiel observncia da Constituio e das leis, definio que viria a ser praticamente repetida pela Constituio de 88.

    Evoluo histrica do Ministrio Pblico no Brasil

  • 2. A redemocratizao e o Ministrio Pblico na

    Constituio de 88

    A redemocratizao foi, para o Ministrio Pblico, um perodo de ampliao de sua rea de atuao. A Lei da Ao Civil Pblica (Lei n. 7.347/1985) atribuiu ao Ministrio Pblico a funo de defesa dos interesses difusos e coletivos (meio ambiente; consumidor; patrimnio histrico, artstico e paisagstico; pessoas portadoras de deficincia; crianas e adolescentes; comunidades indgenas e minorias tnico-sociais). A partir dessa lei, o Ministrio Pblico ganhou legitimidade para constituir-se como canal institucional para o encaminhamento judicial dos novos conflitos sociais coletivos, de carter notadamente urbano.

    A Constituio de 1988 promoveu a ampliao de prerrogativas do Ministrio Pblico brasileiro, em termos bastante inovadores. Em captulo prprio, e atendendo s caractersticas federativas do Estado brasileiro, trata do Ministrio Pblico da Unio e do Ministrio Pblico dos Estados da Federao. Declara o Ministrio Pblico como instituio permanente e essencial Justia, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurdica, do regime democrtico e dos interesses sociais e individuais indisponveis (art. 127).

    Para Castilho e Sadek,

    a anlise das mudanas e prerrogativas introduzidas pelo Constituinte de 88 em relao ao Ministrio Pblico permite sustentar que configuram a maior novidade consagrada pela nova Constituio do ponto de vista institucional, pois nenhuma outra instituio sofreu to profunda modificao e teve igualmente alargada a sua possibilidade de atuao (Castilho; Sadek, 1998, p. 7).

    A Constituio de 88 assegurou ao Ministrio Pblico autonomia funcional e administrativa (art. 127, 2o) e previu que o Procurador-Geral da Repblica seja nomeado pelo Presidente da Repblica, para mandato de dois anos, permitida a reconduo, somente podendo ser afastado de

  • 18

    seu cargo por deciso do Senado Federal, mediante votao para a qual exigida a maioria qualificada de seus membros.

    Os princpios institucionais afirmados agora constitucionalmente (art. 127, 1o) so os seguintes:

    Unidade: capacidade de os membros do Ministrio Pblico constiturem um s corpo, de forma que a manifestao de qualquer deles valer sempre, na oportunidade, como manifestao de todo o rgo;

    Indivisibilidade: caracteriza-se pelo fato de que os membros da instituio podem substituir-se reciprocamente, sem que haja prejuzo para o exerccio do ministrio comum;

    Independncia funcional: os membros do Ministrio Pblico no devem subordinao intelectual ou ideolgica a quem quer que seja, nem mesmo ao superior hierrquico. Atuam segundo os ditames da lei, do seu entendimento pessoal e da sua conscincia.

    Na rea criminal, a Constituio de 88 conferiu ao Parquet a tarefa privativa de promover a ao penal pblica. Alm disso, conferiu-lhe o controle externo sobre a atividade policial, na forma da lei complementar de organizao de cada Ministrio Pblico (art. 129, VII), podendo requisitar diligncias investigatrias e determinar a instaurao de inqurito policial, com o dever de indicar os fundamentos jurdicos de suas manifestaes processuais (art. 129, III).

    Na rea cvel, alm da j existente promoo da ao de inconstitucionalidade, passou a ser funo institucional do Ministrio Pblico a defesa em juzo dos direitos e interesses das populaes indgenas (arts. 129, V, e 232), bem como a promoo do inqurito civil e da ao civil pblica, para a proteo do patrimnio pblico e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos (art. 129, III).

    Do ponto de vista doutrinrio, tem-se procurado sistematizar em trs as causas interventivas da instituio ministerial em juzo: a) defesa de hipossuficientes, quando visa compensar o desequilbrio das partes (acidentados do trabalho, comunidades indgenas etc.); b) defesa de interesses indisponveis, ligados a uma pessoa ou a uma relao jurdica; c) defesa do interesse pblico ou de interesses difusos e coletivos (ao penal, aes ambientais ou defesa de grande parcela de consumidores). Sua atuao processual depender ora da natureza do objeto jurdico da demanda, ora da qualidade de uma das partes. Em suma,

    A redemocratizao e o Ministrio Pblico na Constituio de 88

  • 1

    desde que haja alguma caracterstica de indisponibilidade parcial ou absoluta de um interesse, ou desde que a defesa de qualquer interesse, disponvel ou no, convenha coletividade como um todo, a ser exigvel a iniciativa ou a interveno do Ministrio Pblico junto ao Poder Judicirio (Mazzilli, 1993, p. 151).

    O Constituinte de 88 optou por conferir um elevado status constitu-cional ao Ministrio Pblico, autonomizando-o em relao aos demais poderes: desvinculou a instituio dos captulos do Poder Legislativo, do Poder Executivo e do Poder Judicirio, atribuindo-lhe a responsabilidade pelo efetivo respeito dos Poderes Pblicos e dos servios de relevncia pblica aos direitos assegurados na Constituio, promovendo as medidas necessrias sua garantia (art. 129, II). Erigiu, ainda, condio de crime de responsabilidade do Presidente da Repblica os atos que atentem contra o livre exerccio do Ministrio Pblico, carreira e garantia dos seus membros (art. 68, 1o, I).

    Em termos de garantias para o exerccio das funes, a Constituio de 88 conferiu aos agentes do Parquet desvinculao do funcionalismo comum, no s nas garantias para escolha do seu Procurador-Geral, como para a independncia de atuao (arts. 127, 1o, e 128), conferiu-lhes iniciativa do processo legislativo, bem como da proposta oramentria (arts. 61, 127, 2o e 3o, e 128, 5o). Asseguraram-se aos seus membros as mesmas garantias dos magistrados (vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos art. 128, 5o, I), impondo-lhes iguais requisitos de ingresso na carreira e idntica forma de promoo e de aposentadoria, bem como semelhantes vedaes.

    vedado aos membros do Ministrio Pblico receber, a qualquer ttulo e sob qualquer pretexto, honorrios, percentagens ou custas processuais; exercer a advocacia; participar de sociedade comercial; exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra funo pblica, salvo uma de magistrio;

    A redemocratizao e o Ministrio Pblico na Constituio de 88

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    exercer atividade poltico-partidria e receber, a qualquer ttulo, auxlios ou contribuies de pessoas fsicas, entidades pblicas ou privadas, ressalvadas as excees previstas em lei (art. 128, 5o, II, alterado pela Emenda Constitucional n. 45, de 8 de dezembro de 2004).

    Instituiu, ainda, a CF/88, em seu art. 128, 5o, que leis complementares da Unio e dos Estados estabelecero a organizao, as atribuies e o estatuto de cada Ministrio Pblico. o que foi feito com a edio da Lei Orgnica do Ministrio Pblico da Unio (Lei Complementar n. 75/1993) e da Lei Orgnica Nacional do Ministrio Pblico dos Estados (Lei n. 8.625/1993), como veremos a seguir.

    A redemocratizao e o Ministrio Pblico na Constituio de 88

  • 3. Princpios institucionais de organizao e funcionamento do

    Ministrio Pblico2

    De acordo com o art. 128 da Constituio de 88, a instituio do Ministrio Pblico no Brasil abrange o Ministrio Pblico da Unio, que compreende: a) o Ministrio Pblico Federal, b) o Ministrio Pblico do Trabalho, c) o Ministrio Pblico Militar, d) o Ministrio Pblico do Distrito Federal e Territrios, e o Ministrio Pblico dos Estados. A organizao, as atribuies e o estatuto do Ministrio Pblico da Unio divergem do Ministrio Pblico dos Estados. Enquanto o Ministrio Pblico da Unio regido pela Lei Complementar n. 75/1993, o Ministrio Pblico dos Estados rege-se pela Lei n. 8.625/1993.

    A partir da Emenda Constitucional n. 45, de 2004, foi institudo o Conselho Nacional do Ministrio Pblico (CNMP), integrado pelo Procurador-Geral da Repblica, por quatro membros do Ministrio Pblico da Unio, por trs membros do Ministrio Pblico dos Estados, por dois

    2 Os organogramas constantes deste captulo foram retirados do site do Ministrio Pblico da Unio: .

  • 22

    Juzes indicados um pelo Supremo Tribunal Federal e outro pelo Superior Tribunal de Justia , por dois Advogados indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e por dois cidados de notvel saber jurdico e reputao ilibada indicados um pela Cmara dos Deputados e outro pelo Senado Federal.

    Os membros do Conselho oriundos do Ministrio Pblico so indicados pelos respectivos Ministrios Pblicos, na forma da lei. Todos os conselheiros so nomeados pelo Presidente da Repblica, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal, para um mandato de dois anos, admitida uma reconduo.

    Compete ao CNMP o controle da atuao administrativa e financeira do Ministrio Pblico e do cumprimento dos deveres funcionais de seus membros, cabendo-lhe:

    I zelar pela autonomia funcional e administrativa do Ministrio Pblico, podendo expedir atos regulamentares, no mbito de sua competncia, ou recomendar providncias;

    II zelar pela observncia do art. 37 e apreciar, de ofcio ou mediante provocao, a legalidade dos atos administrativos praticados por mem-bros ou rgos do Ministrio Pblico da Unio e dos Estados, podendo desconstitu-los, rev-los ou fixar prazo para que se adotem as providncias necessrias ao exato cumprimento da lei, sem prejuzo da competncia dos Tribunais de Contas;

    III receber e conhecer das reclamaes contra membros ou rgos do Ministrio Pblico da Unio ou dos Estados, inclusive contra seus servios auxiliares, sem prejuzo da competncia disciplinar e correcional da insti-tuio, podendo avocar processos disciplinares em curso, determinar a re-moo, a disponibilidade ou a aposentadoria com subsdios ou proventos proporcionais ao tempo de servio e aplicar outras sanes administrativas, assegurada ampla defesa;

    IV representar ao Ministrio Pblico, no caso de crime contra a administrao pblica ou de abuso de autoridade;

    V rever, de ofcio ou mediante provocao, os processos disciplinares de membros do Ministrio Pblico da Unio ou dos Estados julgados h menos de um ano;

    VI elaborar relatrio anual, propondo as providncias que julgar necessrias sobre a situao do Ministrio Pblico no Pas e as atividades do Conselho, o qual deve integrar a mensagem prevista no art. 84, XI.

    O Conselho Nacional do Ministrio Pblico nomeia, em votao secreta, um Corregedor Nacional, dentre os membros do Ministrio Pblico que o integram, sendo vedada a reconduo. Compete ao corregedor:

    Princpios institucionais de organizao e funcionamento do Ministrio Pblico

  • 23

    I receber reclamaes e denncias, de qualquer interessado, relativas aos membros do Ministrio Pblico e dos seus servios auxiliares;

    II exercer funes executivas do Conselho, de inspeo e correio geral;

    III requisitar e designar membros do Ministrio Pblico, delegando-lhes atribuies, e requisitar servidores de rgos do Ministrio Pblico.

    Se as questes em que couber a interveno do Ministrio Pblico forem relacionadas Unio, sero de competncia do Ministrio Pblico da Unio. Caso contrrio, sero tratadas pelo Ministrio Pblico dos Estados.

    A especificidade de cada ramo do Ministrio Pblico da Unio est relacionada com as divises do mbito do Poder Judicirio perante o qual atua, assim como matria ou s partes envolvidas.

    Alm de estar dividido em quatro ramos (Federal, do Trabalho, Militar e do DF e Territrios), o Ministrio Pblico da Unio possui em sua estrutura alguns rgos que abrangem todos os ramos. Esses rgos so: a) o Conselho de Assessoramento Superior do Ministrio Pblico da Unio; b) a Escola Superior do Ministrio Pblico da Unio; c) a Auditoria Interna; d) a Secretaria do Ministrio Pblico da Unio.

    A estrutura do Ministrio Pblico da Unio pode ser mais bem visualizada a partir do organograma a seguir:

    Princpios institucionais de organizao e funcionamento do Ministrio Pblico

  • 2

    Ao Ministrio Pblico da Unio assegurada autonomia funcional, administrativa e financeira, sendo as carreiras dos membros dos diferentes ramos independentes entre si.

    So atribuies do Ministrio Pblico da Unio: a defesa da ordem jurdica; a defesa do patrimnio nacional, do patrimnio pblico e so-cial, do patrimnio cultural, do meio ambiente, dos direitos e interesses da coletividade, especialmente das comunidades indgenas, da famlia, da criana, do adolescente e do idoso; a defesa dos interesses sociais e individ-uais indisponveis; o controle externo da atividade policial.

    Para tanto, pode utilizar-se dos seguintes instrumentos: a) promover ao direta de inconstitucionalidade e ao declaratria de constitucio-nalidade; b) promover representao para interveno federal nos Estados e Distrito Federal; c) impetrar habeas corpus e mandado de segurana; d) promover mandado de injuno; e) promover inqurito civil e ao civil pblica para proteger os direitos constitucionais, o patrimnio pblico e social, o meio ambiente, o patrimnio cultural e os interesses individuais indisponveis, homogneos e sociais, difusos e coletivos; f) promover ao penal pblica; g) expedir recomendaes, visando melhoria dos servios pblicos e de relevncia pblica; h) expedir notificaes ou requisies (de informaes, de documentos, de diligncias investigatrias, de instaurao de inqurito policial autoridade policial).

    O Procurador-Geral da Repblica o chefe do Ministrio Pblico da Unio e do Ministrio Pblico Federal. Ele , tambm, o Procurador-Geral Eleitoral. Nomeado pelo Presidente da Repblica, aps aprovao do Senado Federal, cabe a ele, entre outras atribuies, nomear o Procurador-Geral do Trabalho, o Procurador-Geral da Justia Militar, dar-lhes posse, e dar posse ao Procurador-Geral de Justia do Distrito Federal.

    O Ministrio Pblico Federal atua nas causas de competncia do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justia, dos Tribunais Regionais Federais, das Varas da Justia Federal e dos Tribunais e Varas Eleitorais. Atua tambm na defesa de direitos e interesses das populaes indgenas, do meio ambiente, de bens e direitos de valor artstico, esttico, histrico e paisagstico, integrantes do patrimnio nacional.

    O Ministrio Pblico Federal dispe de uma estrutura que inclui di-versos rgos, tanto para desenvolvimento de atividades administrativas quanto para executar as funes para as quais est legitimado. A estrutura principal do Ministrio Pblico Federal est definida por meio da Lei Com-plementar n. 75, de 20 de maio de 1993, a Lei Orgnica do Ministrio Pblico da Unio, que d ao Ministrio Pblico Federal os seguintes rgos:

    Princpios institucionais de organizao e funcionamento do Ministrio Pblico

  • 2

    I o Procurador-Geral da Repblica;

    II o Colgio de Procuradores da Repblica;

    III o Conselho Superior do Ministrio Pblico Federal;

    IV as Cmaras de Coordenao e Reviso do Ministrio Pblico Federal;

    V a Corregedoria do Ministrio Pblico Federal;

    VI os Subprocuradores-Gerais da Repblica;

    VII os Procuradores Regionais da Repblica;

    VIII os Procuradores da Repblica.

    Fazem parte ainda dessa estrutura, de acordo com o Regimento Interno do Ministrio Pblico Federal, as Procuradorias Regionais da Repblica, as Procuradorias da Repblica nos Estados, no Distrito Federal e nos Municpios, alm da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidado, com grande importncia na defesa dos direitos constitucionais.

    O ingresso na carreira de membro do Ministrio Pblico Federal se d no cargo de Procurador da Repblica. O nvel seguinte o de Procurador Regional da Repblica. O ltimo nvel da carreira o cargo de Subprocurador-Geral da Repblica.

    Os Procuradores Regionais da Repblica oficiam perante os Tribunais Regionais Federais, rgos da segunda instncia da Justia Federal. Seus rgos administrativos so as Procuradorias Regionais da Repblica na 1a Regio (sede em Braslia), na 2a Regio (sede no Rio de Janeiro), na 3a Regio

    Princpios institucionais de organizao e funcionamento do Ministrio Pblico

  • 26

    (sede em So Paulo), na 4a Regio (sede em Porto Alegre) e na 5a Regio (sede em Recife).

    Os Procuradores da Repblica oficiam perante as Varas da Justia Federal de primeira instncia, nos inquritos policiais e nos ofcios de defesa do meio ambiente, do patrimnio pblico e cultural, dos direitos constitucionais. Seus rgos administrativos so as Procuradorias da Repblica nos Estados e nos Municpios.

    A Procuradoria-Geral da Repblica definida pelo art. 81 da Lei Orgnica do Ministrio Pblico da Unio como unidade de lotao e administrao, como tambm o so as Procuradorias Regionais da Repblica e as Procuradorias da Repblica nos Estados, no Distrito Federal e nos Municpios. Na Procuradoria-Geral da Repblica atuam, alm do Procurador-Geral da Repblica, os Subprocuradores-Gerais da Repblica. Da mesma forma, nas Procuradorias Regionais da Repblica atuam os Procuradores Regionais e nas Procuradorias da Repblica nos Estados, no Distrito Federal e nos Municpios atuam os Procuradores da Repblica.

    Princpios institucionais de organizao e funcionamento do Ministrio Pblico

  • 4. Resultados da pesquisa

    4.1 Perfil socioprofissional

    Os dados a seguir apresentados refletem os resultados encontrados a partir da aplicao de questionrio via Internet, com retorno de 20% do total da categoria. Os dados iniciais so confrontados com dados fornecidos pela Procuradoria-Geral da Repblica sobre o conjunto dos integrantes da insti-tuio, permitindo assim identificar as diferenas entre os respondentes e o total de integrantes do MPF.

    Quanto ao sexo dos respondentes, a amostra corresponde quase exatamente ao universo pesquisado, conforme possivel verificar nos Grficos 2 e 3, com ligeira variao de 2% a mais de homens entre os respondentes da pesquisa.

    Grfico 2 . Sexo do total de integrantes do MPF

  • 28

    Grfico 3 . Sexo dos respondentes

    Quanto ao ano de nascimento, houve maior percentual de respondentes nascidos entre os anos de 1970 e 1982 em relao ao universo total do MPF, uma representao mais ou menos proporcional entre os nascidos na dcada de 1960, e um nmero de respondentes nascidos antes de 1960 (6,6%) bem inferior representatividade dessa faixa etria no total de integrantes do MPF (21,4%).

    Grfico 4. Ano de nascimento dos integrantes do MPF

    Resultados da pesquisa

  • 2

    Grfico 5. Ano de nascimento dos respondentes

    Da mesma forma, em relao ao ano de ingresso, entre os respondentes h uma presena maior dos que ingressaram na carreira a partir de 2005 (30,5%), os quais representam 19% dos integrantes do MPF no universo total da pesquisa. Houve uma adeso mais ou menos proporcional entre os ingressantes dos anos 1990 e 2000, e uma menor adeso pesquisa dos que ingressaram na carreira na dcada de 1980, conforme se pode verificar nos grficos a seguir.

    Grfico 6. Ano de ingresso do total de integrantes do MPF

    Resultados da pesquisa

  • 30

    Grfico 7. Ano de ingresso no MPF dos respondentes

    Quanto regio judiciria de atuao, constata-se que houve maior adeso pesquisa entre os integrantes da 1a Regio (27% do total e 35% dos respondentes), uma adeso relativamente menor entre os integrantes da 3a Regio (20% do total e 16% dos respondentes) e bem menor entre os Subprocuradores da Repblica (7% do total e 2% dos respondentes). Nas demais regies, a adeso foi proporcional ao universo da pesquisa, como se pode verificar nos grficos a seguir. De qualquer forma, o resultado final contempla de forma bastante equilibrada a representao do MPF nas regies judicirias do pas.

    Grfico 8. Regio judiciria

    Resultados da pesquisa

  • 31

    Quanto instncia de atuao, constatou-se uma representatividade maior dos que atuam em primeira instncia entre os respondentes e menor dos atuantes nos tribunais superiores, correspondendo aos dados anteriores sobre ano de nascimento e ano de ingresso na carreira.

    Grfico 9. Instncia de atuao

    Resultados da pesquisa

  • 32

    Foi possvel, ainda, verificar, de acordo com os dados fornecidos pela ESMPU, o estado de origem do total de integrantes do MPF (Grfico 10). No entanto, como essa questo no constava do questionrio, no possvel estabelecer uma comparao com o estado de origem dos respondentes da pesquisa. Constata-se uma representatividade maior dos Estados de So Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, que somados representam a origem de 46% do total de integrantes do MPF.

    Grfico 10. Estado de origem dos integrantes do MPF

    Resultados da pesquisa

  • 33

    A seguir, so apresentados os dados recolhidos exclusivamente nos questionrios a respeito do perfil socioprofissional dos respondentes, alm daqueles anteriormente apresentados. Os dados mostram que, entre os respondentes, a maioria casada (63,5%), de cor branca (79,6%), tendo pai com ensino superior completo e/ou ps-graduao (68,3%) e me com ensino superior completo (34,7%) ou ensino mdio completo (25,7%).

    Grfico 11. Estado civil

    Grfico 12. Cor

    Resultados da pesquisa

  • 3

    Grfico 13. Grau de instruo do pai

    Grfico 14. Grau de instruo da me

    Analisando-se a tabela a seguir, com dados sobre as universidades em que os respondentes concluram o ensino superior, aparecem nos primeiros lugares duas universidades estaduais a USP (7,9%) e a UERJ (7,3%) e duas universidades federais a UFRGS (7,3%) e a UFBA (6,7%). Em seguida, aparece a primeira universidade particular a PUCRS, com 4,9%, o mesmo percentual que a UFMG. Seguem-se as demais.

    Resultados da pesquisa

  • 3

    Tabela 1. Formao superior

    Em que universidade obteve o ttulo de bacharel em direito?

    USP 13 7,9%

    UERJ 12 7,3%

    UFRGS 12 7,3%

    UFBA 11 6,7%

    PUCRS 8 4,9%

    UFMG 8 4,9%

    UFRJ 7 4,3%

    UFCE 6 3,7%

    UFRN 6 3,7%

    UNICEUB 6 3,7%

    UFPR 5 3,0%

    UFF 4 2,4%

    UNB 4 2,4%

    UNIFOR 4 2,4%

    Faculdades Unidas Catlicas de Mato Grosso 3 1,8%

    UFES 3 1,8%

    UFJF 3 1,8%

    UFPE 3 1,8%

    Universidade Estadual de Londrina-PR 3 1,8%

    FMU 2 1,2%

    Instituio Toledo de Ensino 2 1,2%

    UCSAL 2 1,2%

    UFAM 2 1,2%

    UFMA 2 1,2%

    UFPI 2 1,2%

    UFSC 2 1,2%

    Resultados da pesquisa

  • 36

    UPF-RS 2 1,2%

    Associao Catarinense de Ensino 1 0,6%

    Candido Mendes 1 0,6%

    Centro Educacional de Vila Velha 1 0,6%

    Faculdade de Direito de Itu 1 0,6%

    Faculdade de Direito de Macei (FADIMA) 1 0,6%

    Faculdade de Direito de Varginha 1 0,6%

    Fundao Valeparaibana de Ensino 1 0,6%

    PUCRJ 1 0,6%

    UFGO 1 0,6%

    UFMT 1 0,6%

    UFPA 1 0,6%

    UFPB 1 0,6%

    UFPEL 1 0,6%

    UFRO 1 0,6%

    UFSE 1 0,6%

    Universidade da Amaznia (UNAMA) 1 0,6%

    UNESP 1 0,6%

    Unio das Escolas do Ensino Superior Capixaba (UNESC)

    1 0,6%

    UNICEUMA 1 0,6%

    UNISINOS 1 0,6%

    Universidade Catlica Dom Bosco (UCDB-MS) 1 0,6%

    Universidade de Cruz Alta-RS 1 0,6%

    Universidade de Franca (UNIFRAN) 1 0,6%

    Universidade do Vale do Itaja (UNIVALI), na poca, FEPEVI

    1 0,6%

    Universidade Estcio de S-RJ 1 0,6%

    Universidade Federal de Uberlndia 1 0,6%

    Universidade Federal de Viosa (UFV) 1 0,6%

    Resultados da pesquisa

  • 3

    Os dados a seguir mostram que, entre os respondentes, 35,3% concluram a faculdade a partir do ano 2000. A maioria (95,2%) exerceu atividade remunerada antes de ingressar na carreira, predominando a advocacia pblica ou privada, a atuao como serventurio da Justia ou, ainda, outras profisses jurdicas. Dos respondentes 41% possuem parente prximo em carreira jurdica e destes apenas 9,6% desempenham ou desempenharam atividade no Ministrio Pblico Estadual ou Federal.

    Grfico 15. Ano de concluso do curso

    Grfico 16. Atividade profissional anterior ao ingresso

    Resultados da pesquisa

  • 38

    Grfico 17. Qual atividade profissional desempenhou anteriormente

    Grfico 18. Parente em atividade jurdica

    Resultados da pesquisa

  • 3

    Grfico 19. Qual atividade jurdica

    A tabela a seguir apresenta os dados sobre os motivos que levaram os respondentes a optarem pela carreira de Procuradores da Repblica. A questo era de mltipla escolha, em ordem de prioridade. Dos respondentes 26,9% indicaram como primeira opo a Realizao da justia e 23,4%, a Possibilidade de transformao social. Quanto ao grau de associativismo, a totalidade dos respondentes associada ANPR.

    Quanto atividade acadmica, 16,2% dos respondentes exercem ativi-dade docente e 46,1% possuem diploma de ps-graduao, destes, 54,1% so mestres e 6,8% so doutores.

    Tabela 2. Motivos para optar pela carreira

    Motivos que o (a) levaram a optar pela carreira no Ministrio Pblico Federal:

    (assinale, em escala de prioridade, at cinco itens)

    A questo de 5 respostas mltiplas ordenadas.

    A tabela fornece as frequncias para cada ordem e para a soma.

    A ordem mdia de citao de cada categoria est indicada entre parn-teses na penltima coluna.

    A quantidade de citaes superior quantidade de observaes devido s respostas mltiplas (5 no mximo).

    Resultados da pesquisa

  • 0

    Grfico 20. Integrantes da ANPR

    Grfico 21. Exercem atividade docente

    Grfico 22. Possuem diploma de ps-graduao

    Resultados da pesquisa

  • 1

    Grfico 23. Ttulo de ps-graduao

    4.2 Funes e eficcia do sistema penal

    As questes a seguir relacionam-se com as funes e a eficcia do sistema penal. Conforme a tabela abaixo, a pena teria como funo pri-mordial, em ordem de prioridades, prevenir o delito (55,7% como primeira opo e 29,3% como segunda opo), aparecendo em seguida a funo de retribuio (21% como primeira opo e 21% como segunda opo) e de res-socializao (18,6% como primeira opo e 26,3% como segunda opo).

    Tabela 3. Funes da pena

    Na sua opinio, em uma escala de importncia, quais seriam as funes mais importantes da pena?

    (assinale por ordem de importncia)

    A questo de 4 respostas mltiplas ordenadas.

    A tabela fornece as frequncias para cada ordem e para a soma.

    A ordem mdia de citao de cada categoria est indicada entre parn-teses na penltima coluna.

    Resultados da pesquisa

  • 2

    A quantidade de citaes superior quantidade de observaes devido s respostas mltiplas (4 no mximo).

    Quanto idade de imputabilidade penal, 58,1% dos respondentes consideram adequada a atual previso legal de imputabilidade a partir dos 18 anos, porm um percentual significativo considera necessrio reduzir para 16 anos (31,7%), para 14 anos (9%) ou, ainda, para 12 anos (1,2%).

    Grfico 24. Idade de imputabilidade

    A idade de imputabilidade penal atual (18 anos) deve ser:

    Quanto criminalizao da pessoa jurdica, a maioria considera adequada e necessria a previso de criminalizao por dano ambiental, num percentual de 46,7% totalmente de acordo e 34,1% mais de acordo.

    Grfico 25. Criminalizao da pessoa jurdica

    Avalie a seguinte afirmao. A criminalizao da pessoa jurdica por dano ambiental um instrumento necessrio e adequado para a proteo do meio ambiente.

    Resultados da pesquisa

  • 3

    Tambm obteve aprovao da ampla maioria a ideia de federalizao dos crimes contra os direitos humanos, prevista pela EC n. 45/2004, estando 36,5% totalmente de acordo e 46,7% mais de acordo.

    Grfico 26. Federalizao dos crimes contra os direitos humanos

    Avalie a seguinte afirmao. A federalizao dos crimes contra os direitos humanos contribui para a reduo da impunidade em crimes desta natureza.

    As duas prximas questes relacionavam os problemas do sistema

    penal com a legislao e com a estrutura institucional. Dos entrevistados 40,1% esto totalmente de acordo com a ideia de que a legislao exces-sivamente branda e 27,5% esto mais de acordo com esta afirmao. No entanto, quando perguntados sobre problemas de estrutura institucional, 17,4% esto totalmente de acordo e 48,5% esto mais de acordo com a ideia de que esse o maior problema, demonstrando uma certa diviso de opinies a respeito do tema.

    Grfico 27. Legislao penal

    Avalie a seguinte afirmao. Em geral, a legislao penal e processual penal brasileira excessivamente branda, dificultando a conteno da criminalidade.

    Resultados da pesquisa

  • Grfico 28. Funcionamento das instituies

    Avalie a seguinte afirmao. A legislao penal brasileira , no geral, adequada, sendo o mau funcionamento das instituies responsveis pelo controle penal o que dificulta a sua aplicao.

    Para aprofundar essa contradio, foram realizadas entrevistas com 15 Subprocuradores ou Procuradores Regionais da Repblica, para os quais foi perguntado, entre outras coisas, como explicariam essa aparente contradio. A seguir, so transcritos alguns trechos representativos das respostas formuladas nas entrevistas:

    Na verdade, depende de como se interpreta isso. Eu no acredito que a legislao seja branda. A fixao da pena eu no vejo como branda, mas o processo penal sim. O processo penal admite tantas artimanhas dos Advogados que se torna praticamente impossvel aplicar uma pena. Mas tambm o funcionamento, porque at 2005 o Supremo entendia que a aplicao da pena ocorreria depois do duplo grau de jurisdio. Isso at 2005, interpretando o CPP e a Constituio. Ento, uma corrente formada por Advogados e pelo IBCCrim de So Paulo e por outros juristas mais liberais e em face da mudana de composio do Supremo, passou a prevalecer que s depois do trnsito em julgado, ou seja, h um inciso no art. quinto da Constituio que diz que s se considerar culpado depois do trnsito em julgado da sentena penal condenatria. E quando isso acontece? Depois do julgamento do recurso extraordinrio. Ora, dessa forma, tudo acabou: tudo prescreve. Porque dessa forma vem a legislao processual penal e vem a liberalidade dos tribunais, principalmente do Supremo e, por maioria, hoje, essa questo est em discusso, mas ambas as turmas, por maioria, entendem que s depois do trnsito em julgado. Ento, ningum vai para a cadeia, porque tudo prescreve. Existem tantas artimanhas [...] completamente louco isso, porque de um lado tem a legislao

    Resultados da pesquisa

  • e de outro tem a interpretao dos tribunais. H, atualmente, no meu entender, um liberalismo a toda prova. Por que, o que aconteceu com o nosso sistema? Ns viemos de um sistema fechado pela ditadura onde, por um determinado tempo, como no AI-5, se suspendeu at o direito de requerer o habeas corpus, prises arbitrrias, tortura, tudo isso que ns bem conhecemos. E veio a Constituinte e, numa nsia de revirar a pgina, mas voc no revira a pgina, voc s pe uma outra em cima da misria da sociedade. Foi feita uma constituinte superliberal, com direitos individuais amplssimos. At a, tudo bem, mas no podemos fazer uma interpretao que leve a inviabilizao do sistema. o que est acontecendo: o sistema est em xeque. Porque os Advogados tm em suas mos tantos recursos e, queira ou no, os tribunais esto admitindo isso, que as demandas penais se eternizam. Ento, por exemplo, sabe quando Pimenta Neves vai para a cadeia? Nunca. Dantas vai para a cadeia? Nunca! Desde que eles possam pagar bons Advogados. E essa a decepo que a gente sente no MP. O Supremo j tem sentido isso na pele e tem aplicado multa de 1%, de 5% nos agravos regimentais impertinentes, mas no tem sido suficiente para resolver a questo. Outro problema o habeas corpus. Eles permitem o HC o tempo todo para tudo! J houve caso de eu pegar HC e a pessoa estar entrando com o vigsimo quinto HC. No h trnsito em julgado para HC. Mas a eu discuto assim: HC acaba sempre sendo discutido e, se o sujeito consegue uma liminar, muda tudo. Ento, eu acho que esses dois parmetros de interpretao se complementam. Eu no diria que as penas so baixas, no posso dizer isso. Mas o funcionamento do Judicirio eterniza as demandas, leva decepo e impunidade. (SBPR3)

    Na verdade, parece-me que a questo da criminalidade tem mais de uma causa, mais de uma razo determinante. Eu acredito que seja um conjunto de causas que atue para uma percepo de que a criminali-dade e a impunidade, que talvez seja uma coisa que determina essa percepo de que esteja sem controle, ou seja, de que as instituies no deem respostas. Eu acredito que o funcionamento das instituies tenha uma parcela de responsabilidade bem importante como causa da percepo de que a criminalidade bastante elevada. Talvez a legis-lao penal e a legislao processual penal em algum ponto necessitem de um ajuste, mas me parece que a percepo da criminalidade tem um pouco a ver com o tipo de resposta que as instituies do para a apli-cao da lei. E eu tenho visto vrios nmeros, dados e estudos sobre a percepo da criminalidade e a criminalidade em si e talvez em alguns casos a percepo seja mais elevada do que a prpria criminalidade. Eu lembro que h pouco tempo eu li um estudo da ONU sobre a criminali-dade na frica e depois de vrias entrevistas, ele passou a partir de um ponto em que a corrupo que era muito elevada, de que as pessoas acreditavam que as instituies no funcionavam, e acreditavam que

    Resultados da pesquisa

  • 6

    todas as pessoas das instituies eram corruptas. No final, ele acabou vendo que a instituio que era lenta em dar a sua resposta e que o nvel de confiana era baixssimo. Ento, eu acho que talvez seja o mesmo tipo de confuso acerca do que se tem sobre o nvel de cor-rupo, do nvel de criminalidade, do nvel de resposta das instituies no Brasil. Talvez um pouco mais de transparncia sobre o que e o que no feito ajude a melhorar essa percepo da impunidade, da corrupo e da criminalidade que hoje domina o senso comum das pessoas de um modo geral. (PRR1A)

    Eu acho que eles so convergentes, mas acho que a legislao excessi-vamente branda. Em prol do direito de defesa, cria-se na nossa legislao processual penal uma srie de enredos que no af de defender esses tais direitos prejudica a persecuo correta do processo. Ento, o processo tende a demorar, porque as partes defendentes tendem a encontrar uma srie de recursos e expedientes para atrasar o processo penal, o que por si s j um problema, porque a prestao jurisdicional no responde com imediatidade o anseio da populao que no quer im-punidade, como tambm esse atraso propicia a ocorrncia do fenmeno da prescrio. A prescrio permite que as pessoas, pelo atraso no an-damento do processo, fiquem isentas de punibilidade, j que o Estado no conseguiu cumprir sua funo de reconhecer, processar e julgar um crime que o legislador considerou, em um certo espao de tempo, razovel. Eles entendem que se o Estado no razovel, que a pessoa no obrigada a ficar indefinidamente a responder um processo pelo qual ele isenta de punibilidade. Mas isso s se presta, e por isso eu disse que os fenmenos so convergentes, lentido da ao da justia, que est a propiciar esse evento. (PRR1B)

    [...] E outro problema a possibilidade de recursos. Hoje, para voc confirmar o grande mote de o que julgado ou no julgado so embar-gos de declarao. Ns temos casos histricos j: voc fica interpondo e nesse nterim prescreve, visto que uma pena de dois anos no precisa de muito para prescrever. Mesmo uma pena maior que prescreva em oito anos, que uma pena muito pesada, no muito difcil. Ento, eu acho que no mudar o Cdigo de Processo e nem tornar as penas maiores: a questo da prescrio que devia ser revista e pensada. Eu acho que isso poderia ajudar enormemente, porque enquanto existir essa possibilidade de prescrever durante o curso da ao, em nome da ampla defesa e do contraditrio, os recursos sero usados para a impunidade. (PRR3A)

    Eu acho que alm destes problemas da lei e da estrutura, a gente tem um terceiro problema que o da interpretao da lei. Para mim, o

    Resultados da pesquisa

  • problema hoje a interpretao que os tribunais superiores vm fazendo da lei. Claro que ns temos problemas legislativos e como exemplo eu lhe digo da prescrio retroativa. uma questo que s existe no Brasil e que voc faz a prescrio em concreto e depois voc gasta um tempo e vem a prescrio retroativa, que talvez no fosse um problema se voc tivesse mais marcas retroativas da prescrio. Agora, a questo de voc usar habeas corpus para tudo no Brasil, que um recurso usado sem contraditrio, sem a produo da prova, esse no o problema da garantia do habeas corpus na Constituio que tem que existir, esse no um problema do habeas corpus nas normas do CPP ou na legislao especfica, mas esse um problema de interpretao das cortes superiores que aceitam o habeas corpus para tudo. O Supremo se transformou em uma corte criminal, revisora do STJ, e no numa anlise constitucional. Ento, eu acho que isso uma questo de interpretao. E outras questes de embate com o STF que so pblicos e o que acontece hoje um problema de interpretao. E essa questo da interpretao eu acho que hoje se torna mais grave e que deve ser objeto de anlise na medida em que o Supremo, a partir de um ou dois casos, sumula uma matria, como a gente tem no caso das algemas. Ento, o problema das algemas no um problema da lei, no um problema da Constituio: um problema de interpretao. (PRR3B)

    Agora, o maior problema que eu vejo hoje em termos de efetividade e que acaba trazendo impunidade, est nos habeas corpus, de como esse instrumento que basicamente uma garantia do cidado acaba sendo usado de uma forma contrria. Refora-se tanto a garantia do acusado, do condenado, e se esquece das garantias da sociedade. Existe toda uma outra gama de garantias e direitos da sociedade que deveria ser respeitada. No em detrimento a essa garantia individual do preso, mas tambm a recproca tem de ser verdadeira. Os direitos do preso, do condenado, no podem ser maiores do que os da sociedade. Parece-me que existe hoje um descompasso entre esses direitos individuais do preso e os direitos individuais de todos aqueles outros que compem a sociedade. E isso faz com que o habeas corpus tenha uma dimenso imensa, d para utiliz-lo para tudo, ou nos ltimos tempos temos visto isso, est nos jornais todos os dias os HCs cangurus, que o cidado preso aqui e no mximo em uma semana, voc vai ver que o HC j vai estar no STF, superando todos os graus de jurisdio e chegando diretamente ao Supremo onde a gente tem 11 Ministros que em ltima anlise esto ditando o que vale e o que no vale, quem processado e quem no e o que pode e o que no pode. Ministros que nem sempre tm em mos o conjunto que deveriam ter para decidir, e que no veem isso como uma restrio para o trabalho deles, mas pelo contrrio: j ouvi Ministro dizendo que o Supremo o ltimo bastio da moralidade, da legalidade e que tem mesmo que ultrapassar todas as barreiras que

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    tiverem de ser ultrapassadas para a justia ocorrer em ltima anlise. Isso a gente tem sentido na pele. (PRR3C)

    Estes dois problemas existem e eles convivem. Ento, eu acho que exis-te uma carncia estrutural forte do controle da execuo de medidas. Falando s sobre o controle, tentando desconectar de outros proble-mas que envolvem outras polticas pblicas e outras questes sociais, existe uma carncia de estrutura e eu vejo isso especialmente hoje na questo das polcias estaduais. Por exemplo, a Polcia Federal, ela est hoje se aparelhando, se estruturando, se organizando mais, para poder dar uma resposta adequada. Em relao lei, o que eu posso dizer, o que eu percebo, que ns convivemos com uma lei muito antiquada do Cdigo Penal, muitos de seus dispositivos so antiquados, esto defasa-dos. Ns convivemos com leis assim, que eu entendo, muito duras para al-guns tipos de crimes que eu diria at que a patologia destes crimes muito mais socioeconmica do que qualquer outra; e leis mais brandas para o que eu consideraria macrocriminalidade: criminalidade econmica, crimi-nalidade que envolve os cofres pblicos. Eu acho que essas duas vari- veis esto presentes. (PRR4A)

    Na verdade, eu acho que a contradio apenas aparente, porque os dois problemas esto intimamente ligados. H um aspecto de deficincias generalizadas na legislao, tanto no campo da legislao penal mate-rial, digamos assim quanto no campo da legislao processual penal, e h tambm deficincias graves nas instituies. Esses, na minha opinio, so dois aspectos que levam ineficincia geral no sistema penal bra-sileiro. Mas no so os nicos: haveria problemas muito mais amplos e profundos que remontam at o sistema eleitoral, porque problemas no sistema eleitoral levam a deformaes da vontade do eleitorado, gerando representao legislativa de baixa qualidade, o que gera uma legislao problemtica, com deficincias na legislao penal e pro-cessual penal a que me referia. Ento no diria que h contradio. As deficincias da legislao e do funcionamento das instituies so duas das causas do mesmo problema.

    [...] No campo da legislao, eu diria que o problema no tanto de suavidade da legislao no que diz respeito s penas: existe uma con-cepo que frequentemente vista entre legisladores e outros atores sociais de que, diante de uma crescente criminalidade, a soluo seria aumentar as penas. E isso acontece em alguns casos, mas na minha viso no esse o problema da legislao brasileira. Ns temos muitos problemas graves na legislao processual penal, como, por exemplo, a profuso de recursos que o sistema oferece, temos casos de problemas na legislao material como a prescrio, o sistema prescricional, que na

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  • minha opinio favorece e estimula a procrastinao dos processos. Os Advogados de defesa com alguma experincia sabem bem que certos crimes so de punio praticamente impossvel, como o caso do abuso de autoridade, como crimes contra honra. Temos tambm um problema no conjunto de interpretaes que a jurisprudncia criou que a meu ver so excessivamente tolerantes com o fenmeno da criminalidade no Brasil. Eu no sou contrrio defesa ampla dos direitos fundamentais, muito pelo contrrio, eu entendo que estes direitos devem ser defendidos, mas eu acredito que tem havido certos exageros na viso jurispruden-cial de como deve ocorrer a defesa desses direitos. Um dos exemplos disso a atual utilizao de jurisprudncia em relao ao habeas corpus. O habeas corpus hoje tolerado pela jurisprudncia como uma panaceia contra qualquer tipo de defeito do processo penal. Os cidados impetram habeas corpus de uma maneira totalmente indiscriminada e com isso, muitas vezes, voc tem um processo que se iniciou no primeiro grau e em poucos dias o Advogado consegue levar uma deciso do primeiro grau ao STF, com um total desprezo estrutura orgnica do Poder Ju-dicirio. Ento, ns temos problemas muito extensos e de vrias or-dens. (PRR5A)

    Quanto mudana introduzida na Lei dos Crimes Hediondos, passando a permitir a progresso de regime, h uma clara diviso interna, estando 51,5% contrrios mudana e 48,5% favorveis.

    Grfico 29. Lei dos Crimes Hediondos

    Avalie a seguinte afirmao. A alterao introduzida na Lei dos Crimes Hediondos, que passou a permitir a progresso de regime, reparou uma situao anterior de inadequao aos ditames constitucionais.

    Questionados sobre o papel do MPF na persecuo penal, 84,4% manifestaram-se contrrios ideia de que s interessa ao MPF a punio do acusado, sendo problema da defesa os direitos e garantias do acusado.

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    Significativo, no entanto, o percentual de 15,6% favorveis a essa ideia, constituindo quem sabe um ncleo mais claramente vinculado a uma perspectiva punitivista no interior da categoria.

    Grfico 30. Atuao em matria penal

    Avalie a seguinte afirmao. Em matria penal, o MPF deve atuar prioritariamente de forma a favorecer a punio dos acusados, sendo problema da defesa as questes referentes aos direitos e garantias do acusado.

    Quanto ao tema da expanso do direito penal, a ampla maioria de 71,2% favorvel ampliao ante os novos riscos sociais. No entanto, praticamente a metade dos respondentes reconhece, na questo seguinte, que essa expanso acaba gerando a vulgarizao da alternativa punitiva, que acaba perdendo em eficcia.

    Grfico 31. Expanso do direito penal

    Avalie a seguinte afirmao. O direito penal deve servir para a proteo de bens jurdicos ameaados, ampliando seu raio de abrangncia ante os novos riscos sociais.

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    Grfico 32. Vulgarizao do direito penal

    Avalie a seguinte afirmao. A utilizao do direito penal para a proteo de bens jurdicos nas mais diversas reas, mesmo que relevantes, acaba por vulgariz-lo, reduzindo a sua eficcia como mecanismo de controle social.

    Procurando ampliar este tema, foi perguntado aos Subprocuradores e Procuradores Regionais da Repblica entrevistados como viam essa ques-to. Seguem as respostas mais representativas das opinies coletadas:

    Essa uma questo que no s brasileira, mas global. E fica difcil continuar sustentando uma fragmentao do direito penal ou do direito penal mnimo nos tempos atuais. E o fato que tambm no d para ficar mais no modelo de criminalidade individual, baseado na conduta individual de risco, porque a globalizao, as novas tecnologias e o fim das fronteiras no mundo todo, que agora so virtuais, mudaram a criminalidade. E os mercados tambm tm relao. Eu acho que h novos bens jurdicos que so sim merecedores de tutela penal. As vtimas so difusas, muito mais difcil explicar uma conduta que exponha risco. Ento, as condutas so outras e eu acredito que o direito penal deva acompanhar este momento, porque as categorias tradicionais no podem ser pura e simplesmente aplicadas ao que a gente vive hoje. Eu acho que o direito penal est ultrapassado e que precisamos repensar novas questes, mas que no redundem em perda de garantias ou de que se perca a ideia do que um tipo penal, por exemplo, de critrios para configurar um delito. Ento, so questes muito difceis. Sem dvida eu acho que h uma expanso e que ela necessria e devida. Acho que necessrio, mas que temos que tomar cuidados com exageros, como a questo do direito penal de emergncia. (PRR4B)

    Em primeiro lugar, eu acho que o direito penal no precisa ter vrias velocidades. Precisa ter apenas uma velocidade, desde que ns apliquemos racionalmente para tudo. Eu defendo muito a ideia do

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    Silva Sanchez quando ele fala na expanso do direito penal quando for um movimento racional. O que ns temos no Brasil uma expanso irracional do direito penal, o que ns temos, muitas vezes, no pode ser considerado crime. Ontem eu at recebi uma pergunta de uma colega: abandono de servio pblico crime? isso est l no CP, mas no h na Constituio qualquer conformao penal para isso. Ento, o que eu acho que deve haver uma expanso racional do direito penal, porque hoje em dia muitos dos crimes com os quais ns trabalhamos tem muita ligao com o sistema financeiro, porque a volatilidade dos capitais muito grande. E o que necessrio so meios de apurao efetivos para esses casos, assim como uma punio efetiva. A, nesses casos, o direito penal tem que ser expandido, mas, em outros casos, o contrrio. (PRR4C)

    Essa linha de pensamento tem um contedo ideolgico muito forte, porque para voc ir para esse caminho deve ter marcada qual a expan-so do direito penal. E isso algo absolutamente pessoal, absoluta-mente discricionrio. Eu concordo com uma afirmao que diga que o direito penal no deve ser banalizado, que deve ser utilizado para a pro-teo de bens jurdicos de importncia essencial para a sociedade. Mas de uma forma geral, eu no vejo que no direito brasileiro ocorra esse tipo de abuso. Eu no vejo esse como sendo um problema do sistema crimi-nal, ainda mais com a lei dos Juizados Especiais Criminais que difere os crimes de menor potencial ofensivo, tornando-se uma barreira impor-tante para descongestionar o sistema. (PRR5A)

    Em seguida foi perguntado aos respondentes se tinham vnculo com alguma das correntes de poltica criminal apresentadas. Predominou a adeso chamada Defesa social (34,7%), seguida do Funcionalismo penal (15%), do Garantismo penal (13,2%), da Tolerncia zero (12,6%) e do Abolicionismo penal (0,6%). 22,8% declararam no ser adeptos de nenhuma delas e 1,2% declarou-se adepto de outras posies. A seguir, so reproduzidos trechos de entrevistas em que foi exposta a compreenso dos entrevistados sobre a corrente da qual se consideram adeptos.

    Grfico 33. Correntes de poltica criminal

    Com qual destas correntes de pensamento sobre a criminalidade e o sistema penal voc mais se identifica?

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    Eu estaria mais voltado defesa social. Porque eu acho que a criminalidade tem a ver com a impunidade. Ela no um fato isolado, ela um fato inerente a uma comunidade, a uma sociedade, ao ensino, ao nvel de vida, ao acesso ao poder pblico. Tanto assim que se voc pega uma comunidade e resolve o problema de esgoto, de escola, coloca a polcia l dentro, d lazer, educao, o nvel de criminalidade cai tremendamente. Quando voc s fica na represso, na tolerncia zero, num pas com tanta diferena social, voc vai ficar na pancada. E so eles os nossos rus. Para eles o processo rpido, o processo curto, clere. No se questiona a algema para ele. Agora, aquela macrocriminalidade organizada, essa sai do sistema. A voc diz resolver os problemas sociais termina com a criminalidade?. No, nesse caso no. Agora, o que eu acredito que causa criminalidade so todas essas variveis sociais e a impunidade. (SBPR3)

    Tolerncia zero. J que passou pelo Congresso Nacional que tem que ver o sol nascer quadrado, vai ver o sol nascer quadrado. No o Poder Judicirio que vai mudar a deciso poltica do legislador. Se o legislador criou uma pena e deu ao Juiz um espectro para ele negociar essa pena, ou seja, dependendo da circunstncia, voc aplica a pena mnima ou a pena mxima, j foi transferida uma determinada discricionariedade ao Poder Judicirio. Agora, da a voc abolir a pena ou aplicar totalmente os princpios do garantismo e ferir esse espectro que o legislador lhe deu, ferir a independncia entre os poderes. Eu acho que quem tem o poder mais legtimo que existe, em funo da nossa forma de representao, o Legislativo, que representado pelos Deputados, pelos Senadores que ns elegemos, mal ou bem. Ento, se eles assim decidiram, eu acho que o Judicirio no tem como inovar no. (PRR1B)

    Eu no diria que sou abolicionista, porque acredito que o direito penal deva ser preservado, mas para aqueles casos tpicos, aqueles casos em que ele ainda possa funcionar. Poderia se dizer uma concepo mais garantista, apesar de eu fazer um comentrio em relao ao garantismo, porque o garantismo acaba sendo interpretado, como tudo no direito, como uma maneira de voc inviabilizar a persecuo penal para determinados praticantes de crimes. E, na verdade, o garantismo seria meio que isso no meu entender. Seria voc procurar dar ao acusado todo aquele arcabouo de direitos e garantias no sentido de que ele vai ter uma ampla defesa e de que vai ser acusado dentro do estritamente necessrio. Ento, eu acho que, se sigo alguma corrente, seria essa. (PRR2A).

    Na verdade, eu vou admitir o meu desconhecimento aprofundado acerca destas teorias. No entanto, a gente ouve muito falar sobre o garantismo hoje. Eu te admito isso, porque eu no atuo diretamente com o direito penal. Bom, mas se fala sobre o garantismo e, falando

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  • do garantismo, bvio que acaba se falando do constitucional, que eu tenho alguma identidade. Eu vejo que hoje existem dois discursos assim: o discurso de que o garantismo um vale-tudo e um outro discurso de que o garantismo nada mais do que uma interpretao razovel da Constituio em matria penal. Eu vou por essa segunda linha: eu me considero um garantista, no sentido de que a matria penal est diretamente ligada com a Constituio. E isso no significa que no se deva ter um enfrentamento de questes da criminalidade, no isso. Eu acho que a aplicao da Constituio para os princpios penais algo que no tem mais como se fugir num Estado Democrtico de Direito. Ento, de certa forma, eu posso dizer que sigo a linha do garantismo, mas de um garantismo que significa a utilizao do direito penal atravs da Constituio. (PRR4A)

    Abolicionismo. que, na verdade, h vrios abolicionismos. Mas o que eu acredito no abolicionismo como um norte, at mesmo um norte utpico, mas voc tem que trabalhar para isso. Porque o garantismo, ele parte do direito penal mnimo, mas ele trabalha no sentido de manter aquilo. Eu no acho que v acabar o sistema penal, inclusive acho que vai perdurar por muito tempo, mas eu tenho que trabalhar com esta ideia de persistir em superar por outros tipos de interveno. Mas acho que tenho que trabalhar com essa ideia, porque se no trabalhar com essa ideia, vou estar sempre trabalhando para melhorar aquela estrutura. (SBPR1)

    4.3 Questes procedimentais

    Neste tpico dos questionrios, os respondentes foram indagados sobre questes relacionadas com os procedimentos do processo penal. Quanto ao inqurito policial, a ideia de que o Ministrio Pblico deve coordenar diretamente o processo de produo probatria na fase pr-processual obteve a adeso total ou parcial de 82,6% dos respondentes. Da mesma forma, a ideia de que o Ministrio Pblico deve desenvolver investigaes paralelas ou complementares obteve a adeso total ou parcial de 95,8% dos respondentes. Em seguida, so reproduzidos trechos das entrevistas que abordam a questo do inqurito policial e das relaes entre Ministrio Pblico Federal e Polcia Federal.

    Grfico 34. Coordenao do inqurito policial

    Avalie a seguinte afirmao. A atuao do Ministrio Pblico deveria ser ampliada no mbito da investigao criminal, passando ele a coordenar diretamente o processo de produo probatria na fase pr-processual.

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  • Grfico 35. MP investigador

    Avalie a seguinte afirmao. Mesmo sendo o inqurito policial atribuio da Polcia Judiciria, deve o Ministrio Pblico promover investigaes paralelas ou complementares.

    Eu s no concordaria com paralelos, o que significa dizer que l e aqui se estaria fazendo a mesma coisa. A, eu no chegaria a tanto. No sentido de complementar, sim. Inclusive na minha atuao eu sempre fiz isso quando os inquritos me eram encaminhados, eu no mandava se faltasse algum elemento, porque sabia que ele ia ficar mais cento e vinte dias com um carimbo na prateleira, aguardando uma nova baixa, o que levaria, muitas vezes, ao descrdito, e no raro a prescrio daquelas infraes. Eu acho sim que o MP tem o dever de investigar, e no uma faculdade, um dever, s no concordo que essa investigao no tenha prazo para sua finalizao. Deveriam existir prazos a serem respeitados, mas evidente que se a investigao demanda um pouco mais de tempo, preciso criar algum mecanismo de reforo a este

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    procedimento para que no caiamos na mesma malha do retardo e da no concluso, da impunidade que todos ns repudiamos. (SBPR2)

    Eu pessoalmente sempre trabalhei nesse sentido. Eu fui presidente da Associao dos Procuradores em 1993 e 1995, quando se falava da reviso constitucional. Hoje, falar de reviso constitucional balela, porque ela no se realizou. Mas essa discusso foi para a reviso constitucional e ns apresentamos vrias emendas e uma das questes que chegamos a discutir com o Procurador-Geral, na poca, eu advogava que ns deveramos absorver a Procuradoria Judiciria, a Polcia Judiciria Federal, no mbito do MP. E nos foi dito para criarmos a nossa prpria Polcia Judiciria, porque haveria uma Polcia Judiciria j comprometida que ns desconhecamos. Mas eu continuei acreditando que ns do MP devemos ter a capacidade de investigar. Mas eu no descarto o papel da polcia. Hoje, mais velho, e no tendo conseguido avanar mais nesse tema, e tendo uma ameaa do prprio Supremo, dizendo que a gente no pode investigar, e essa ameaa eu no acho que seja s jurdica, mas poltica tambm. Isso porque h muitas correntes dentro do Congresso e do prprio Judicirio de a investigao ser realizada pelo MP. Mas o que a gente nota que quando a PF vem trabalhar junto com o MP, o resultado do trabalho outro: bem melhor. E por que isso acontece? No porque a gente seja melhor. Acho que temos muitos defeitos, assim como a polcia tem muitos defeitos. A questo que a gente conhece os meandros do judicirio, a jurisprudncia etc., e at mesmo o cuidado que se tem que ter com a formao da prova, porque, seno, eles sempre esto anulando. E, s vezes, a polcia acha que o papel dela termina no indiciamento, termina com o inqurito. No esse o papel da polcia, assim como o nosso no termina com a denncia. O nosso termina com a priso da pessoa, com a execuo da pena. No s com a condenao. Como tambm com a polcia. Ento, este rgo, esta instituio hoje tem que trabalhar junta, s tem bons resultados quando trabalha junta. Vou lhe dar um exemplo: crime financeiro, crime que envolve corrupo, crime que envolve a lavagem de dinheiro, ns poderamos fazer totalmente, sem a ajuda da polcia. Mas com os rgos responsveis: Banco Central, Coaf, Receita Federal, porque todos esses rgos investigam. Ento, com relao s investigaes, eu sou totalmente a favor de o MP ter o controle e s em algumas investigaes se precisaria do envolvimento da polcia. (SBPR3)

    Eu vejo esse resultado de dois modos: em primeiro lugar, ele diz claramente que o protagonista de uma poltica criminal para a rea federal para o pas o MPF. Por outro lado, ele parece demonstrar uma desconexo, j que a prova produzida pelo inqurito policial no

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  • bem realizada para levar uma pessoa a responder em juzo. Talvez seja por isso que uma grande parte dos colegas tenha respondido que a prova precisa ser complementada pelo MPF antes de ser levada a juzo. Na minha experincia de 21 anos de casa, e na maior parte do tempo trabalhando na rea criminal, eu vejo do mesmo modo. Eu vejo que, muitas vezes, a prova quase que insuficiente at mesmo para o requerimento da priso preventiva. E eu acho que esse rigor da Justia brasileira, e esse rigor do MPF, muito importante para que sejam asseguradas liberdades. Voc no constitui uma sociedade sadia, um Estado de Direito, sem que voc saiba que aquela pessoa autora de um fato criminoso que realmente aconteceu. Voc precisa demonstrar a materialidade e a autoria de uma forma inequvoca. E isso nem sempre ocorre em relao prova produzida pela PF. No s no ocorre no sentido de qualidade como tambm no ocorre a tempo. O que eu tenho observado uma demora na produo da prova e uma seletividade nos inquritos que sero instrudos. Se essa seletividade est sendo produzida pela PF e no pelo MPF, e sem uma lgica clara, transparente e que seja debatida com a sociedade, significa que no se est baseado em uma poltica criminal a que o MPF corresponde. Eu acho isso grave do ponto de vista dos interesses pblicos e do interesse das garantias individuais. Selecionar o inqurito que vai ser instrudo por atuao da PF ou dar nfase, destinando para uma nica investigao vrios Delegados e de vrios Agentes policiais, significa selecionar a atividade policial que ir produzir uma determinada prova e essa uma atitude tpica de quem desenha poltica criminal. Eu acho que isso no est correto e concordo com o que os colegas falam: preciso complementar as provas, j que elas no esto sendo bem feitas. preciso produzir a prova, j que a mesma no est sendo produzida e preciso selecionar de acordo com o interesse de quem o titular da ao penal, selecionando casos que a polcia no est selecionando. Mas, em princpio, eu acredito mesmo que seja necessrio, por parte do MPF, o desenho de uma poltica criminal de atuao pblica. Uma poltica pblica de curto, mdio e longo prazo que possa ser discutida com a sociedade, que possa ser avaliada pela sociedade, cujos resultados possam ser medidos e trazidos s vistas. Ento, o que ns queremos decidir se queremos punir os crimes mais violentos com mais nfase ou se queremos punir os crimes de colarinho branco, ou seja, que tipo de criminalidade ns queremos punir com mais nfase, j que no temos como punir todos os crimes do pas. So essas escolhas que eu chamo de desenhar uma poltica criminal. (PRR1A)

    Eu sou favorvel. Porque, se o inqurito vai voltar para o MP, afinal, se ele no for bem feito, o trabalho do MP que fica prejudicado. E quando a gente acompanha a investigao desde o comeo, a tendncia a de que as coisas cheguem mais consistentes. Eu sei o que eu preciso para oferecer a denncia e por mais que o Delegado esteja empenhado

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    e interessado, no ele quem vai formalizar a denncia, quem vai formalizar a denncia uma outra pessoa. (PRR3A)

    Eu acho que deve haver s uma investigao: ou pelo MP, que hoje regulamentada, ou voc tem o inqurito. Ou nem tem o inqurito. importante dizer que hoje, nas grandes investigaes, na verdade, o que se trabalha com a fora tarefa. Voc no tem o inqurito. So procedimentos criminais que j so judicializados. At porque nessas grandes operaes, voc tem as buscas e apreenses, interceptaes telefnicas e prises. E tudo isso judicializado. Ento, no que o MP pode atuar, no incio da investigao: a funo do MP muito mais a de estar ligado no trabalho dessas foras tarefas do que ele mesmo conduzir essas investigaes. Pode at ser que ele comande uma investigao, mas vai precisar da autorizao judicial e do auxlio da polcia, at porque no tem como fazer uma busca e apreenso sem o auxlio da polcia, uma priso sem polcia, ou uma interceptao telefnica sem polcia. Ento eu acho que vale muito mais as foras trabalhando juntas do que cada um comandando uma investigao diferente. Investigao paralela eu sou contra. (PRR3B)

    Eu sou amplamente favorvel investigao pelo MPF, mas eu acho que as duas instituies andam juntas. Isso de dizer que o papel da investigao s da polcia ou s do MPF uma bobagem, porque na verdade as duas instituies tm que se complementar. Toda a investigao feita para que o MPF possa estabelecer uma denncia bem feita, slida, bem fun-damentada. Porque uma denncia bem feita meio caminho andado pra gente conseguir sucesso na ao. Agora, o MPF, por mais que coordene as investigaes, que queira ter a polcia sobre o seu comando, isso j em parte verdadeiro, porque o destinatrio final da denncia o MPF e toda vez que o inqurito vem pro MPF a gente est dando as coordenadas. Eu tenho experincia de investigaes feitas exclusivamente pelo MPF, principalmente em tutela coletiva, e na tutela a gente faz a investigao, s o MPF, porque no tem a ver com a instruo criminal e, portanto, no tem a ver com a Polcia Federal. E a lei nos d esses instrumentos pra investigao. O que no existe estrutura para isso. Em matria de inves-tigao criminal, a gente tem uma necessidade hoje de medidas de ltima gerao, como interceptao telefnica, escuta ambiental, que a polcia quem tem que fazer. As diligncias de campo, de ir atrs, de descobrir, eminentemente atividade policial, da qual o MPF no tem como dar conta. Ento, eu acho que no tem cabimento voc falar em investigao com-pleta pelo MPF e tambm no tem como falar na polcia agir totalmente independente, sem a interferncia do MPF. At porque, se a prova tem que vir pra gente, me parece lcito que a gente tambm possa conduzir es-

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  • sas investigaes. Eu nunca tive problemas e as experincias que eu tive com a Polcia Federal so as melhores possveis, ns tivemos a operao Themis, que aqui em So Paulo foi deflagrada em abril do ano passado, que envolveu seis ou sete Juzes, ns trabalhamos muito prximos com a polcia durante mais de seis meses, acompanhando escutas e dilign-cias e nunca houve nenhum problema. Foi uma atuao absolutamente harmoniosa. (PRR3C)

    Se no estou enganado, em Portugal e na Alemanha, o MP dirige a PF, o que no como o sistema nosso. Eu tenho a concepo de que o inqurito policial deve ser feito pela Polcia Federal, com o controle externo e aberto do MP. Porque eu no tenho dvidas de que o que ela est fazendo l para o MP e ela pode estar at apurando um fato que seja estadual, mas a vai mandar para o MPE. Eu acredito sim que a PF deva comandar o inqurito policial, sim, mas isso no significa que o MP no possa ter o poder investigatrio. No h nenhum impedimento legal de eventualmente o MP investigar e ser o acusador, at porque eu no vejo o MP como um acusador sistemtico. Ele est l agindo at em funo do prprio interesse do ru de dar paridade de armas, porque eu j vi casos em que o ru estava completamente sem defesa. Eu acho que isso uma garantia para o ru. Mas ter um controle maior vem, inclusive, em prol de uma viso garantista. Ento, acho que a PF deve continuar com o inqurito policial, mas o MP deve ter um poder de controle suplementar por ele mesmo. No h incompatibilidade. So duas coisas que podem andar concomitantemente. Agora, a polcia no quer isso, porque considera como uma luta de poder. E o MP no quer tirar o poder da polcia, eles devem sim agir juntos. (PRR4C)

    Temos uma dificuldade no dilogo com a PF que decorre da prpria estruturao do inqurito policial brasileiro. A Constituio diz que compete ao MP a titularidade da persecuo penal, mas a legislao d um papel de protagonismo polcia que no observa atentamente essa titularidade do MP. Ento, o Delegado de polcia acaba tendo uma autonomia que no deveria ter, no sentido de que ele pode investigar, muitas vezes independentemente de entendimento com o rgo do MP que ser responsvel pela acusao. Ento, muitas vezes, o Delegado extremamente competente, extremamente honesto e dedicado, mas em uma linha de investigao que no harmnica com a linha de investigao que o membro do MP que vai atuar naquele caso considera mais apropriada. E isso gera perda de tempo, descompasso entre o trabalho das instituies. Eu penso que o MP deveria ter o controle funcional direto do trabalho da polcia, no como controle administrativo nem disciplinar da polcia, que disse caber aos seus prprios rgos, mas

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    o controle do trabalho de investigao da polcia, na minha opinio, evidentemente, tinha que ser do MP, j que o MP que vai ajuizar ou no a ao penal. (PRR5A)

    Quanto garantia da participao da defesa do investigado durante as fases do inqurito policial, a maioria est em total desacordo (34,7%) ou mais em desacordo com esta possibilidade, que para alguns vista como constitucionalmente assegurada. Com relao s provas ilcitas, a maioria est em total desacordo (24,6%) ou mais em desacordo (37,7%) com a ideia de que estas devam ser descartadas do processo, podendo ser utilizadas em determinadas situaes.

    Grfico 36. Defesa no inqurito

    Avalie a seguinte afirmao. Durante todas as fases do inqurito policial, deve ser garantida a participao da defesa do investigado.

    Grfico 37. Provas ilcitas

    Avalie a seguinte afirmao. Provas obtidas de forma ilcita devem ser descartadas do processo criminal, sendo incabvel verificar a proporcionalidade da medida em face da violao praticada e do delito investigado.

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    Para ampliar essas questes relacionadas com a atuao da polcia e a produo probatria, nas entrevistas questionou-se a avaliao dos entrevistados sobre a atuao da Polcia Federal em episdios mais recentes, que envolveram inclusive manifestaes do STF. Seguem-se os trechos mais representativos das opinies coletadas:

    Eu sempre entendi que a atuao policial deve ser uma atuao que deve ser marcada pela discrio. Eu acho que s em determinados tipos de delitos, como crimes ambientais, que deve haver uma grande reper-cusso da atuao do Estado, seja atravs dos rgos de investigao ou atravs dos prprios rgos de represso, entenda-se Polcia Federal ou Civil. Eu entendo que polcia cabe apenas e to somente aquilo que a lei instrumental estabelece no artigo sexto, que reunir os elementos e provas necessrias da prtica da atuao penal, descobrir a sua auto-ria, elaborar as provas tcnicas, atravs de organismos especificamente tcnicos. Mais do que isso, uma atuao que pode desnaturar a inves-tigao que se quer sigilosa e me parece leviano colocar ao alvorecer de uma investigao, seja pobre ou seja rico, um indivduo suspeito e que no passa disso, nas pginas dos jornais ou nos rgos de comuni-cao de massa com grande estardalhao e grande alvoroo. E quando os resultados desses procedimentos vm, muitos anos depois, so, em regra, absolutamente pfios. No estou querendo dizer com isso que no acho importante a atuao da Polcia Federal, estabelecida Cons- tituio e disciplinada pela lei, mas ela deve ser absolutamente dis-creta. No cabe sequer polcia ou seus agentes qualificar condutas, fazer construes de ordem doutrinria e entendo que as operaes so extremamente importantes quanto ao envolvimento dos agentes das prprias corporaes. E a sim, nessa atuao, deve estar presente o MP sempre, para evitar excessos, abusos e vazamentos inclusive de informaes ou dados que possam impedir a prpria investigao ou a divulgao daquilo que no se quer, daquilo que no se pretende. Portanto, se justifica montar uma operao simultnea em vrios esta-dos, a polcia com apoio dos rgos de segurana, do Exrcito, se pre-cisar, as Foras Armadas, que tm essa atribuio tambm de dar esse apoio, mas com a presena do MP, e eu iria at alm: com a presena do prprio Poder Judicirio. No se concebe que, quando ns temos uma Constituio cidad que tem j agora mais de vinte anos, que os di-reitos individuais sejam entregues a agentes mal formados, a policiais famintos, agentes sem salrio, sem adestramento, nem preparo e ne- nhuma fiscalizao do poder pblico, ou atravs do papel pelo chama-do controle externo da atividade policial que se faz muito a distncia e de forma muito franciscana, eu diria, para concluir. (SBPR2)

    Resultados da pesquisa

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    Eu acho que ns no podemos vilipendiar a PF, no momento em que ela, inclusive atingindo algumas pessoas do Executivo, passou a ter uma atuao mais eficaz nos ltimos anos. A PF de hoje totalmente diferente da era FHC, da poca de Romeu Tuma, totalmente diferente. Agora, h o problema miditico, e isso tem polticos e ministros que cobram e eu acho que eles tm razo na questo da filmagem das prises, a questo d