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A Ofensiva Verde: A Ação Integralista Brasileira no estado do Rio de Janeiro. (1932-1937)
Pedro Ernesto Fagundes
Tese de Doutorado apresentada ao Programa de
Pós-graduação em História Social da
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como
parte dos requisitos necessários à obtenção do
título de Doutor em História.
Orientador: Prof. Dr. Carlos Fico
Rio de Janeiro 2009
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2
Fagundes, Pedro Ernesto.
A ofensiva verde: a Ação Integralista Brasileira (AIB) no estado do Rio de Janeiro (1932-1937).
Pedro Ernesto Fagundes. - Rio de Janeiro: UFRJ/ IFCS/ PPGHIS, 2009.
xi, 254f: il.: 31 cm
Orientador: Carlos Fico
Tese (doutorado) – UFRJ/ Instituto de Filosofia e Ciências Sociais/ Programa de Pós-Graduação em
História Social, 2009.
Referências Bibliográficas: f 213-219
1. Integralismo. 2. Rio de Janeiro. 3. Década de 1930. 4. História Política. 5. Plínio Salgado. I.
Fagundes, Pedro Ernesto. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Filosofia e Ciências
Sociais, Programa de Pós-graduação em História Social. III. A ofensiva verde: a Ação Integralista Brasileira
(AIB) no estado do Rio de Janeiro (1932-1937).
3
Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em História Social da
Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção
do título de Doutor em História.
Aprovado por:
_____________________________________________________________
Prof. Dr. Carlos Fico (Orientador)
_____________________________________________________________
Prof. Dr. João Fabio Bertonha
_____________________________________________________________
Profª. Drª. Giselda Brito da Silva
_____________________________________________________________
Profª. Drª. Marieta de Moraes Ferreira
_____________________________________________________________
Profª. Drª. Silvia Alicia Martinez
Rio de Janeiro
2009
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Para Antonia, a principal responsável por eu ter conseguido chegar até aqui. Da mesma
forma que nossos filhos, essa tese pertence a nós dois.
5
AGRADECIMENTOS:
Um agradecimento especial a todos os professores e funcionários da UFRJ, na
pessoa do professor Carlos Fico. Orientador que esteve sempre atento aos caminhos da
pesquisa e, principalmente, da forma como estava sendo escrita essa tese. Aos funcionários
de todos os acervos em que estive ao longo dos últimos anos.
Ás professoras Lená Menezes e Luciá Bastos da UERJ que durante nossos
encontros acadêmicos contribuíram para minha formação teórica. A todos os meus colegas
professores da FDCI e do Centro Universitário São Camilo-ES. Saudações especiais para
Jaqueline Ramalho, Adilson Santos, Diogo Lube, Marcos Balbino e Marcos A. Borges
companheiros do departamento de história. Serei sempre grato ao professor Aldieris
Caprini que, gentilmente, foi um dos revisores desse trabalho.
Um especial agradecimento a todos os professores e funcionários da UENF, local
onde comecei a longa caminha na investigação sobre a AIB. Ainda em Campos contei com
a gentileza de Jorge Renato Pereira Pinto e Dr. Wellington Paes que, generosamente,
abriram seus acervos particulares.
Meus agradecimentos aos professores Marieta de Moraes Ferreira, João Fabio
Bertonha, Gisela Brito da Silva e Silvia Alicia Martinez que aceitaram participar da banca
de defesa da tese. A todos os meus alunos que nos últimos anos foram meus parceiros na
busca do conhecimento. E, finalmente, aproveito para agradecer à minha mãe pela torcida e
aos meus camaradas e companheiros de luta política.
6
“A luta de classes é o motor da História”
Karl Marx e Friedrich Engels. Manifesto do Partido Comunista (1848).
7
RESUMO
Objetivo do trabalho é analisar a atuação da Ação Integralista Brasileira (AIB) no estado do
Rio de Janeiro. Esse partido surgiu a partir da unificação de inúmeros movimentos e
organizações que se fundiram em 1932 e configurou-se como uma das mais importantes
agremiações partidárias, durante a década de 1930. Entre os anos de 1932-1937, os
integralistas conseguiram organizar núcleos em quase todas as regiões do país e atrair para
suas fileiras milhares de adeptos. Em sua trajetória os “camisas-verdes” fluminenses
criaram órgãos de imprensa e organizaram escolas, ambulatórios e consultórios médicos.
No estado o partido participou de algumas disputas eleitorais regionais e articulou a
campanha de seu chefe nacional, Plínio Salgado, ao cargo de presidente da república.
Palavras-chaves: Integralismo, Rio de Janeiro, década de 1930.
8
Abstract:
The aim of this work is to analyze the performance of the political party named Brazilian
Integalist Action in the state of Rio de Janeiro. This party came into existence after the
unification of innumerable movements and organizations that gathered together in 1932,
and became one of the most important political parties during the 1930’s. During the years
of 1932-1937, the integralists managed to form groups in almost all the regions of the
country, and attract millions of supporters. In its course of action, the “green-shirts” from
Rio de Janeiro created press agencies and organized schools and medical clinics and
offices. Still in the State, the party took part in some regional election contests and planned
the campaign of its national chief, Plínio Salgado, for president of the country.
Key words: Integralism; Rio de Janeiro; Decade of 1930.
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Lista de abreviaturas:
ABC: Associação Brasileira de Cultura
ABE: Associação Brasileira de Educação
AIB: Ação Integralista Brasileira
AIT: Associação Internacional dos Trabalhadores
ALERJ: Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro
ANL: Aliança Nacional Libertadora
APERJ: Arquivo Público do Rio de Janeiro
ASB: Ação Social Brasileira
BOC: Bloco Operário Camponês
C.J.P.I: Comissão Jurídica e Popular de Inquérito
CPP: Centro Político Proletário
DIP: Departamento de Imprensa e Propaganda
DNC: Departamento Nacional do Café
FUA: Frente Única Antifascista
FSRR: Federação Sindical Regional do Rio de Janeiro
IAA: Instituto do Açúcar e do Álcool
JC: Juventude Comunista
IC: Internacional Comunista
LC: Liga dos Comunistas
LCT: Legião Cearense do Trabalho
LEC: Liga Eleitoral Católica
LHC: Liceu de Humanidades de Campos
LSN: Lei de Segurança Nacional
PCB: Partido Comunista do Brasil
PRF: Partido Republicano Fluminense
PPR: Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
PRM: Partido Republicano de Minas Gerais
PRP: Partido Republicano Paulista
PRRJ: Partido Republicano do Estado do Rio de Janeiro
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PSF: Partido Socialista Fluminense
SEP: Sociedade de Estudos Políticos
TSN: Tribunal de Segurança Nacional
UDB: União Democrática Brasileira
UPF: União Progressista Fluminense
UTLJ: União dos Trabalhadores do Livro e do Jornal
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SUMÁRIO:
INTRODUÇÃO...............................................................................................................1
CAPÍTULO I
O ALVORECER VERDE..............................................................................................5
1.1 As origens da Ação Integralista Brasileira (AIB)........................................................5
1.2 As “bandeiras integralistas”.......................................................................................11
1.3 Quadro econômico e político fluminense no início da década de 1930....................17
1.4. O I Congresso Nacional da AIB...............................................................................27
1.5 A AIB e o conceito de partido político de massa.....................................................31
CAPÍTULO II
A OFENSIVA VERDE..................................................................................................40 2.1 O crescimento da AIB no interior do estado............................................................40
2.2 Os incidentes de 1º de maio de 1934........................................................................53
2.3 O crescimento dos camisas-verdes...........................................................................69
CAPÍTULO III
SOB FOGO VERMELHO............................................................................................75
3.1 Os integralistas nas eleições de 1934........................................................................75
3.2 O novo mapa da província integralista fluminense..................................................87
3.3 A frente ampla antifascista: ANL............................................................................91
3.4 O grande inimigo saiu do campo de batalha...........................................................113
CAPÍTULO IV
1936: O ANO VERDE................................................................................................118 4.1 A nova tática da AIB: a via eleitoral......................................................................118
4.2 A imprensa verde....................................................................................................123
4.3 A cruz-verde: o trabalho assistencial da AIB.........................................................138
4.4 As “blusas-verdes” e as escolas integralistas fluminenses......................................142
4.5 As caravanas-verdes e as eleições de 1936.............................................................150
12
CAPÍTULO V
O CREPUSCULO........................................................................................................160
5.1 A situação política brasileira pré-campanha presidencial.......................................160
5.2 Os candidatos..........................................................................................................163
5.3 Um dia sangrento....................................................................................................176
5.4 A construção dos mártires integralistas..................................................................183
5.5 O último desfile.......................................................................................................201
CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................................207
BIBLIOGRAFIA.........................................................................................................211
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................213
ANEXOS.......................................................................................................................220
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INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objetivo analisar a atuação da Ação Integralista Brasileira
no estado do Rio de Janeiro, durante parte da década de 1930. Esta pesquisa contextualiza-
se entre as novas investigações sobre a AIB, que concentram seus esforços de pesquisa nas
ações cotidianas e nas questões organizacionais desse partido político.
A pesquisa pioneira que conceituou a AIB como o primeiro partido político de
massa do país foi realizada por Hélgio Trindade, na década de 1970. Nas décadas seguintes,
os trabalhos sobre os “camisas-verdes” priorizaram os debates e a problematização sobre a
matriz política da organização. A ênfase era a definição sobre o caráter fascista do
movimento. Por suas opiniões antagônicas dois trabalhos destacaram-se nessa fase: o
primeiro foi o de Gilberto Vasconcelos que enquadrou a AIB como um movimento
“exótico” e estranho ao processo político do país. Divergindo dessa opinião Marilena Chauí
apresentou um trabalho em que destacou a importância dos integralistas na mobilização da
sociedade em busca de uma nova alternativa política durante a década de 1930. Ambos os
trabalhos contribuíram para manter em destaque as discussões sobre a organização.
Entretanto, as questões sobre o movimento integralista acabaram ampliando seus
enfoques e ganharam novos pesquisadores, tanto que os recentes trabalhos sobre o tema
têm centrado sua atenção em questões variadas como, por exemplo, o papel das mulheres
na AIB, a imprensa integralista, as manifestações de anti-semitismo e anticomunismo,
análises de imagens fotográficas e a presença de imigrantes europeus no partido.
Nos últimos anos foi produzida uma quantidade significativa de trabalhos sobre a
AIB. Importantes espaços e eventos de socialização dos debates foram criados, como o
Grupo de estudos sobre o integralismo (GEINT) e os grupos de trabalho na Associação
Nacional de História (GT’s da Anpuh). Frutos desses espaços de inovação, através do
lançamento de duas publicações específicas sobre o integralismo, surgiram novas
referências bibliográficas sobre os integralistas. Uma terceira publicação encontra-se em
fase de editoração.
Outro importante fator para o surgimento de novos trabalhos sobre os integralistas
foi a possibilidade de acessar novas fontes. Esses documentos encontravam-se em acervos
que apenas recentemente disponibilizaram seus arquivos para pesquisas. Para a
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investigação sobre a montagem da máquina partidária integralista no estado do Rio de
Janeiro utilizamos um amplo conjunto de fontes primárias que foram pesquisadas em
acervos de três estados (Rio de Janeiro, São Paulo e Espírito Santo).
Entre os materiais utilizados na pesquisa gostaríamos de destacar os documentos
encontrados nos acervos do Arquivo Público Municipal de Rio Claro – SP, Arquivo
Público Estadual do Rio de Janeiro – APERJ e do Arquivo Público Municipal de Campos
dos Goytacazes – RJ.
No Arquivo Público Municipal de Rio Claro – SP encontra-se depositado o maior
acervo sobre a trajetória político-partidária de Plínio Salgado. Nesse local, encontramos
uma importante coleção de órgãos de imprensa do movimento integralista. A maioria dos
periódicos citados no presente trabalho foi encontrada naquele local, com destaque para o
exemplar na revista Sigma, editada pelo núcleo municipal de Niterói. A importância do
acervo paulista reside no fato de reunir em um único espaço os mais variados documentos
da AIB.
Na APERJ concentramos nossos esforços na análise de documentos aprendidos pela
polícia política e que apenas recentemente foram liberados para as pesquisas. No setor
específico do integralismo encontram-se dezenas de caixas que preservam uma parte
significativa da memória política da AIB.
Dentre os inestimáveis documentos do acervo um foi fundamental para a construção
desta tese. Trata-se do relatório de atividades da província integralista fluminense. Através
da pesquisa realizada nessa fonte foi possível acessar informações que serviram para
desvendar a dimensão que os integralistas atingiram em nosso estado. O relatório contém
listagens de escolas, postos de saúde, ambulatórios, número de vereadores e total de
núcleos da AIB fluminense. Esse documento permitiu conhecer uma parte significativa da
estrutura montada pelos “camisas-verdes” da “Província integralista fluminense”.
A principal fonte encontra no Arquivo Municipal de Campos foi o inquérito
policial que apurou os mais importantes fatos do tiroteio no comício integralista de 15 de
agosto de 1937. Outras importantes fontes de informação do arquivo campista foram as
coleções de jornais da cidade.
O acesso a essas novas fontes foi fundamental para a ampliação dos objetivos
originais da pesquisa. Originalmente este trabalho concentraria sua investigação apenas na
15
atuação dos “camisas-verdes” da região norte do estado. A atenção estaria concentrada,
sobretudo no tiroteio durante o comício integralista em Campos dos Goytacazes, no dia 15
de agosto de 1937.
O interesse em relação ao tema foi despertado durante o período da pesquisa para
elaboração da dissertação de mestrado. Nessa época encontrei no arquivo do Liceu de
Humanidade de Campos (LHC) variados documentos sobre ex-alunos e ex-professores que
haviam militado nessa agremiação partidária. Contudo, por causa do grande volume de
informações coletadas o objetivo da pesquisa foi ampliado. Sua abrangência passou a ser
sobre a “Província integralista fluminense”.
Sendo assim, esta tese está dividida em cinco capítulos. Estruturamos esses
capítulos em ordem cronológica na apresentação dos principais episódios que marcaram o
movimento integralista. O primeiro capítulo visa analisar os acontecimentos que marcaram
a fundação, a ampliação nos estados e o primeiro congresso nacional da AIB, durante os
anos de 1932 e 1934.
Buscaremos, ainda, apresentar as organizações e movimentos políticos que surgiram
antes da criação do partido e que, posteriormente, acabaram contribuindo na consolidação e
crescimento da AIB. Nesse mesmo capítulo trataremos da fundação de núcleos da
organização nos estados durante as chamadas “caravanas verdes”. Também analisaremos o
quadro político do Rio de Janeiro durante os primeiros anos da década de 1930.
O objetivo do segundo capítulo é apresentar os passos inicias dos “camisas-verdes”
fluminenses. Nesse segmento enfatizamos os núcleos organizados no norte do estado pelo
fato da região ter sido palco dos mais relevantes enfrentamentos entre os integralistas e as
forças antifascistas, com destaque para os acontecimentos ligados à comemoração do dia do
Trabalhador de 1934, que repercutiram nacionalmente através do periódico A Offensiva.
O terceiro capítulo pretende situar a atuação dos integralistas fluminenses entre os
anos de 1934 e 1935, onde se destaca a participação da AIB nas eleições parlamentares para
a composição das bancadas de deputados federais e estaduais do estado. Buscamos analisar
as relações entre os integralistas e importantes membros do laicato católico fluminense. No
mesmo capítulo apresentamos dados sobre a fundação e atuação da Aliança Nacional
Libertadora no estado.
16
O crescimento do número de núcleos integralistas durante o ano de 1936 e a
ampliação do número de postos de saúde, escolas e ambulatórios médicos estão entre os
temas abordados no quarto capítulo, que tem, ainda, o objetivo de identificar o crescimento
da militância das chamadas “blusas-verdes” como uma singularidade da AIB entre os
demais partidos políticos da época, além de investigar a imprensa partidária como uma
outra ferramenta de divulgação e doutrinação da militância integralista.
Ainda no quarto capítulo buscamos estudar a mudança na tática política dos
“camisas-verdes” em relação às disputas eleitorais, na tentativa de averiguar como tal
reorientação refletiu nas práticas políticas cotidianas do partido. Também analisamos a
participação dos integralistas nas eleições municipais de 1936 no estado.
O ano de 1937 aparece destacado no quinto capítulo, sobretudo os preparativos e a
efetiva participação da AIB na campanha presidencial. Nesse tópico as atividades ligadas à
campanha eleitoral são destacadas, tais como o lançamento nos municípios, a utilização
dos meios de comunicação do partido e os comícios realizados no estado. Também são
apresentados os fatos relacionados aos trágicos acontecimentos que marcaram o comício
integralista na cidade de Campos dos Goytacazes. Analisamos, ainda, como os integralistas
utilizaram como instrumento de propaganda, as imagens e a memória dos seus militantes
mortos através de uma série de cerimônias e rituais. Por último, apresentamos os
acontecimentos finais que marcaram a existência legal da AIB e as perseguições que
ocorreram a partir da instalação do Estado Novo.
17
CAPITULO I
O ALVORECER VERDE 1.1 AS ORIGENS DA AÇÃO INTEGRALISTA BRASILEIRA (AIB)
O dia 7 de outubro de 1932 é considerado um dos mais importantes no calendário
político dos integralistas. Nessa data celebra-se a publicação do chamado Manifesto de
Outubro, primeiro documento assinado e lido publicamente pelos integrantes da Ação
Integralista Brasileira (AIB). O local de tão singular evento foi o tradicionalíssimo Teatro
Municipal de São Paulo.1
O ato de lançamento do manifesto marcou final da fase “pré-AIB” e lançou as bases
da organização que se constituiria no primeiro partido de massas do Brasil. A AIB foi
criada após a incorporação de inúmeros grupos, movimentos e organizações que
começaram a surgir a partir do final da década de 1920. Dessa forma, antes de relatarmos
os caminhos trilhados pelos integralistas na construção de uma entidade organizada em
nível nacional se faz necessário realizarmos alguns questionamentos: que organizações
foram essas? Quais suas lideranças e base militante? Quais suas propostas e projetos
políticos?
Provavelmente, as primeiras organizações dessa natureza foram: a Legião Cruzeiro
do Sul que, possivelmente, teve como principal fonte de inspiração o fascismo italiano2 e o
Cravo Vermelho, que era formado por policiais da cidade do Rio de Janeiro que eram
destacados para perseguir os militantes do movimento sindical. Suas fundações datam dos
anos iniciais da década de 1920, sendo que ambas as organizações se unificaram e,
posteriormente, acabaram desaparecendo.3
1 Para saber mais sobre a fundação da AIB, ver em: TRINDADE, Hélgio.Integralismo: o fascismo brasileiro na década de 1930.Porto Alegre: Editora UFRGS. São Paulo; Difel, 1974. 2 Em outro tópico desse capítulo falaremos de forma mais aprofundada das características do partido fascista italiano. 3Para realizarmos o levantamento histórico utilizamos os trabalhos de: TRINDADE, Hélgio, op cit e CARONE CARONE, Edgard. A República Velha. Evolução Política. 3º ed. Rio de Janeiro: Difel, 1977.
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Entre os grupamentos brasileiros que tentaram esboçar a organização de uma força
política inspirada no modelo dos regimes fascistas europeus podemos citar o Partido
Fascista Brasileiro. De obvia influência do fascismo italiano, a meta central desse partido,
estabelecida em seu manifesto de lançamento em 1930, era unificar todos os brasileiros em
um amplo movimento de defesa da pátria e da soberania nacional para barrar a ascensão do
que consideravam o grande perigo externo: o comunismo.
Em 1928 começou a ser articulada a criação do Partido Sindicalista Brasileiro. Seu
principal teórico e dirigente foi Olbiano de Mello que, em 1930, lançou sua obra-manifesto
intitulada República Sindicalista dos Estados Unidos do Brasil, bases para organização do
Estado Sindical Brasileiro.
Esse autor publicou mais duas obras, Comunismo ou Fascismo e Levanta-te Brasil,
que pretendiam dotar esse partido de uma teoria estruturada e de uma organização baseada
nas milícias, que teriam o papel de corpo de reserva do Exército. As obras de Olbiano de
Mello são repletas de referências positivas ao regime de Mussolini na Itália e, ao mesmo
tempo, fazem duras críticas ao modelo de Estado adotado pela URSS.
Outras questões defendidas no manifesto do Partido Sindicalista Brasileiro são o fim
do sufrágio universal e a adoção do voto profissional através de uma estruturação de órgãos
representativos de cada categoria de trabalhadores. Assim, acabando com as eleições
diretas seria possível a criação de um “Estado Sindical” com base na representação
corporativista.
Chama a atenção o espaço dedicado na publicação Levanta-te Brasil a pontos
relativos à organização e aos rituais elaborados em torno do Partido Sindicalista Brasileiro.
Também, na mesma obra, estava previsto que os membros da organização deveriam usar
uniformes formados por camisas, colarinho, gravata, casquete azul-marinho, calças e
coturnos pretos. Era estabelecida ainda a utilização de um emblema, em fundo amarelo, no
lado esquerdo da camisa, simbolizando o aperto de duas mãos e envolto por um circulo. O
juramento dos novos filiados seria marcado pelos seguintes termos: Pela Família, Pela
Pátria e Por Deus.
A Ação Social Brasileira (ASB) pretendia ser a base para a estruturação do futuro
Partido Nacional Fascista, que efetivamente nunca chegou a ser fundado. Seu idealizador
foi J. Fabrino. Essa organização também foi criada sob a influência do regime político da
19
Itália, tanto que sua meta principal era estabelecer, a partir de cada município, um
movimento corporativo semelhante ao existente na Itália.
O programa da ASB deixava ainda mais nítido seu caráter autoritário no ponto
relativo à “Disciplina”, onde eram estabelecidas as linhas mestras da organização. A
inspiração no modelo adotado pelos fascistas italianos fica evidente, por exemplo, no
estabelecimento de níveis organizacionais intitulados de patrícios, centúrias e legiões.
O poder absoluto e incontestável do chefe do partido é outro ponto presente no
programa da ASB. Na questão do uniforme as similaridades ficam mais nítidas: os
militantes do futuro Partido Fascista Brasileiro deveriam usar camisas azul celeste, com o
símbolo do cruzeiro do sul estampado sobre o coração, gravata azul marinho, calças cáqui,
meias e sapatos pretos e um chapéu em estilo escoteiro.
Outro movimento que surgiu nesse período, com atuação restrita no estado de Minas
Gerais, foi a Legião de Outubro ou Legião Três de Outubro. 4 Seus principais líderes foram
Francisco Campos, Gustavo Capanema e Amaro Lanari. Essa organização se estruturou a
partir de uma dissidência do Partido Republicano Mineiro (PRM). Em seu manifesto de
lançamento os legionários refutavam as velhas oligarquias mineiras, principalmente o
grupo do Partido Republicano mineiro ligado ao ex-presidente Artur Bernardes.
A Legião 3 de Outubro contou com o apoio público de setores do Exército e da
Igreja Católica. Sua ação mais destacada foi a realização de um desfile que reuniu milhares
de legionários no dia 21 de Abril de 1931 em Belo Horizonte. A organização tinha como
principais símbolos um barrete de dois bicos e uma camisa cáqui que juntos significavam a
união do lavrador e do soldado.
Veio do Nordeste do país a organização que conseguiu se estruturar e atrair um
amplo leque de filiados e militantes. Lançada oficialmente em outubro de 1931, a Legião
Cearense do Trabalho (LCT) foi idealizada pelo tenente Severino Sombra. Esse militar
sofreu forte influência do pensamento conservador católico, sobretudo das obras de Jackson
de Figueiredo. Tanto que muitos padres, entre eles Helder Câmara, 5 acabaram aderindo à
Legião por conta de seu discurso moderado sobre a relação entre patrões e trabalhadores.
Outra figura de destaque do movimento foi o tenente Jeovah Mota.
4 A Legião 3 de Outubro ou Legião de Outubro não teve nenhuma vinculação com o chamado Clube 3 de Outubro. 5 Em um próximo capítulo voltaremos a abordar a passagem de Hélder Câmara pelas fileiras da AIB.
20
A LCT surgiu graças à iniciativa de Severino Sombra de unificar as associações de
classe e sindicatos de Fortaleza. A concepção de sua estrutura tem como guia o modelo de
sindicalização traçado pelo Ministério do Trabalho da administração Vargas. Suas metas
eram congregar todos os trabalhadores em defesa de seus direitos através de uma forte
organização.
A Legião defendia a construção de um novo tipo de sociedade, baseada na
integração organizada das classes trabalhadoras na vida político-social brasileira. Entre suas
propostas básicas estão a defesa de um contrato coletivo de trabalho, a fixação de salário
relativo às horas de trabalho, repouso dominical, o estabelecimento de limite de horas de
trabalho para jovens e mulheres e a instituição de órgão de conciliação e arbitragem no
sentido de controlar a relação entre empregados e empregadores.
Essa organização chegou a contar com milhares de filiados representados por
dezenas de associações operárias que eram ligadas diretamente ao Conselho da associação.
Mesmo não sendo hierarquicamente tão rígida como as outras organizações dessa época os
legionários cearenses também realizavam paradas públicas, usavam uniformes e tinham
uma saudação entre seus membros.
seus militantes usavam também um uniforme: calças brancas e blusas de operário em algodão colorido. Na manga esquerda ostentavam uma insígnia representando o braço de um trabalhador empunhando a balança da justiça. A saudação habitual era a resposta coletiva “Pronto”, feita ao chefe no início de suas alocuções.6
O trabalho efetivamente realizado pela LCT conseguiu destaque em nível nacional.
Várias revistas e jornais abriram espaços para reportagens sobre as atividades e ações
desenvolvidas pelos legionários do Ceará. Em 1932, Severino Sombra mudou o nome da
organização para Legião Brasileira do Trabalho, como uma forma de possibilitar sua
expansão em outros estados do Nordeste.
Em decorrência dessas intensas atividades da LCT, o tenente Severino Sombra
começou a estabelecer contatos com outros membros de organizações semelhantes que
existiam pelo país. Nesse sentido, foi marcado um encontro no Rio de Janeiro, em 1932,
mais precisamente no dia 10 de julho, entre Sombra (Legião Cearense do Trabalho),
Olbiano de Mello (Partido Nacional Sindicalista) e o jornalista Plínio Salgado.
6 TRINDADE, Hélgio, op. cit. pg 107.
21
Entretanto, o início da chamada “Revolução Constitucionalista” em São Paulo,
exatamente no dia anterior, obrigou o adiamento do encontro. Pelo fato de ter apoiado a
causa paulista, o tenente Severino Sombra foi exilado e teve que assistir de longe a adesão
da Legião Cearense à AIB. Após o primeiro congresso nacional da AIB, em 1934, na
cidade de Vitória (ES), já de volta do exílio, Severino Sombra acabou perdendo espaço para
a liderança de Plínio Salgado, que se tornou o chefe supremo do movimento integralista.
Outro importante movimento organizado na década de 1920 foi a Ação Imperial
Patrianovista Brasileira. O movimento tinha como objetivo central restaurar a monarquia
tradicional através da estruturação de um sistema de apoio popular através da criação de um
corporativismo sindical no país. O restabelecimento dos privilégios da Igreja Católica era
outra bandeira dos Patrianovistas, que tiveram como um dos seus principais representantes
Sebastião Pagoano.
É importante destacar que essas organizações e partidos políticos foram
fundamentais para a introdução e circulação das propostas do ideário nacionalista7 e
autoritário no Brasil.8 Sua atuação se materializou através de seus manifestos, revistas,
jornais e paradas e serviram de inspiração e modelo para a criação da AIB.
Outro fator para o crescimento do partido foi o fato de parte dos líderes dos
movimentos políticos das décadas de 1920-1930 se engajado na AIB.9 Como dissemos
7 O clima de militarismo e nacionalismo incentivados, principalmente, depois da deflagração da Primeira Guerra Mundial (1914-1918. O clamor em relação à urgência de se “republicanizar a república”, foi um dos fatores que levou uma série de atores políticos, como educadores, profissionais liberais e militares, a se unirem para criar os primeiros movimentos de protesto contra a conjuntura política da época: as Ligas nacionalistas. Esses movimentos nacionalistas comungavam das mesmas preocupações: a urgência em resgatar os valores morais da população. O caminho para cumprir tal objetivo era incentivar o alistamento militar, combater o analfabetismo, os vícios da elite política e diminuir a influência estrangeira, principalmente, no sul do país. Nesse período surgiram grupos como a Liga de Defesa Nacional e a Liga Nacionalista de São Paulo. As ligas e seus dirigentes tinham como proposta atuar de forma direta nas questões políticas para solucionar os problemas nacionais. Para tanto, ambas desenvolveram uma série de campanhas através de seus programas e manifestos de combate às fraudes eleitorais, de defesa da língua nacional, inclusive promover seu ensino nas escolas estrangeiras, incentivar o estudo da História e da Geografia do Brasil nas escolas. Para mais informações, ver em: OLIVEIRA, Lúcia Lippi. A questão nacional na Primeira República. São Paulo: Brasiliense, 1990, pp. 146-147. 8 Sobre o pensamento autoritário na Primeira República, ver em: LAMOUNIER, Bolivar. Formação de um pensamento autoritário na Primeira República: uma interpretação. IN: BUARQUE DE HOLANDA, Sergio. (ORG) História Geral da Civilização Brasileira. III. O Brasil Repúblicano. 2 Sociedade e instituições (1989-1930). São Paulo: Difel, 1985. 9 O tenente Jeovah Mota (Legião Cearense do Trabalho), foi eleito deputado federal pela AIB nas eleições para a Assembléia Constituinte de 1934. Amaro Lanari (Legião 03 de Outubro) e Olbiano de Mello (Partido Sindicalista Brasileiro) tornaram-se membros da direção nacional da AIB, conhecida como Câmara dos Quarenta.
22
anteriormente, a origem da AIB está estreitamente ligada à formação de uma verdadeira
coalizão de organizações e movimentos políticos que existiam anteriormente.
O maior mérito dos primeiros dirigentes da AIB foi a capacidade de fundir em um
movimento unificado e centralizado características de cada uma das organizações que se
incorporaram ao partido. A aglutinação desses vários atores políticos de diferentes regiões
do país foi primordial para o crescimento do capital político dos integralistas.
Por conta dessa manobra a AIB já surgiu como uma força política de caráter
nacional com núcleos organizados em quase todas as regiões do Brasil. Mais qual teria sido
a origem especifica da AIB? E em que circunstancias a organização teria se tornado um dos
maiores movimentos de massa da história política brasileira?
O embrião da AIB foi a Sociedade de Estudos Políticos (SEP), entidade criada em
12 de março de 1932 por um grupo de profissionais liberais e estudantes na cidade de São
Paulo. Seus objetivos originais eram a realização de debates e discussões teóricas sobre a
realidade político e social brasileira. Sua primeira coordenação era chamada de Grupo de
Centralização, composto pelos seguintes membros: Ataliba Nogueira, Mário Graciotti,
Alpinolo Lopes Casali e José de Almeida Camargo. Coube a Plínio Salgado o posto de
primeiro presidente do SEP.
O perfil político do SEP era eminentemente o de uma entidade que agregava
elementos que defendiam teses antiliberais e nacionalistas. Suas discussões periódicas
pretendiam apontar alternativas para a realidade política brasileira que, segundo a visão de
seus membros, era controlada pelas antigas oligarquias e pelos remanescentes do
movimento Tenentista. Entretanto, após a fundação do SEP, Plínio Salgado começou a
desenvolver um intenso intercâmbio e articulações com outras organizações e movimentos
políticos nos estados do Nordeste, em Minas Gerais e no então Distrito Federal (RJ).
Dessa forma, antes mesmo do SEP lançar seu próprio manifesto oficial, já haviam
começado as manobras para modificar sua diretriz original de se ocupar apenas dos debates
teóricos. Isso porque, na análise de Salgado e da maioria dos membros do SEP, havia
chegado o momento da organização também se voltar para finalidades políticas práticas.
Mesmo enfrentando pequenas divergências internas,10 Plínio Salgado conseguiu
convencer a maioria dos membros do SEP e aprovar uma proposta de criação de uma
10 Os componentes do movimento patrionovista se recusaram a participar da AIB.
23
coalizão de partidos, organizações e movimentos que defendiam as mesmas propostas.
Com isso, após inúmeras reuniões e trocas de correspondências, foi fundada oficialmente,
no dia 7 de outubro, no teatro Municipal de São Paulo, a Ação Integralista Brasileira (AIB).
O primeiro ano de funcionamento da AIB foi marcado, sobretudo pela tentativa de
estruturação e afirmação da organização no cenário político nacional, tanto que a AIB
obteve seu registro no Tribunal Superior de Justiça Eleitoral e participou de maneira
discreta nas eleições para a Assembléia Constituinte de 1934.11 A primeira manifestação
pública de destaque da AIB foi realizada em São Paulo em abril de 1933.
A partir dessa primeira parada, que reuniu algumas centenas de integralistas
uniformizados com suas camisas-verdes e identificados com o símbolo do sigma nos
braços, os grandes desfiles da AIB passaram a ser um dos elementos mais marcantes e
característicos dos integralistas brasileiros. Outra estratégia utilizada pelos integralistas para
chamarem a atenção e atraírem a simpatia da população foram às chamadas “bandeiras ou
caravanas Integralistas”.
1.2 AS BANDEIRAS INTEGRALISTAS
Os principais dirigentes da AIB partiram em caravanas para várias cidades e regiões
do Brasil. Essas “bandeiras”12 tinham o objetivo de divulgar as idéias do movimento e ao
mesmo tempo fundar núcleos da AIB. Foi a partir dessas incursões que houve uma
expansão da organização para além dos limites do estado de São Paulo.
Pelo fato de ter sido o local que assistiu ao surgimento da organização, São Paulo
ocupou uma posição de destaque na estrutura organizacional da AIB. Isso porque a capital
do estado foi o local onde foram realizadas a primeira parada da história da milícia
integralista e a primeira reunião pública do movimento, durante o ano de 1933. Foi em solo
paulista que também surgiu o primeiro órgão informativo, os primeiros grandes conflitos
com as forças antifascistas – Bauru e a “Batalha da Praça da Sé” – ambas em outubro de
1934.13
11 Por exemplo, no estado do Rio de Janeiro a AIB não lançou candidaturas porque ainda não havia estruturado nenhum núcleo. 12 O termo bandeira foi uma clara apropriação das expedições dos chamados bandeirantes no período da colonização da América portuguesa. 13 No último capítulo trataremos de forma mais aprofundada essas questões.
24
Também pela sua posição de relevo em nível nacional a “Província integralista de
São Paulo” foi o local que contou com o maior contingente de adeptos do movimento
integralista. Uma centena de núcleos municipais e distritais foi organizada tanto na capital
quanto no interior. Outro ponto relevante na organização paulista foi o número de jornais,
postos de saúde e escolas criados pela AIB.14
Nas estatísticas do movimento publicadas na sua imprensa oficial – é sempre
importante relembrar que pela ausência de documentos oficiais estamos nos baseando em
informações dos próprios integralistas e que, portanto, devem ser consideradas como fontes
parciais e tendenciosas – o núcleo paulista era o que sempre aparecia com o maior número
de núcleos organizados no país.
Consolidada sua posição em São Paulo, em agosto de 1933 começou uma fase de
pleno crescimento da AIB em outras regiões do país, tendo em vista que foi nesse período
que a direção nacional resolveu intensificar seu trabalho de propaganda e organização.
Nesse sentido, inicialmente, as “bandeiras integralistas” seguiram nas direções norte e sul
do território nacional e passaram em centenas de cidades realizando conferências – quase
sempre em recintos fechados – e fundando núcleos.
Minas Gerais e Espírito Santo também tiveram importantes núcleos da AIB que
atuaram de forma intensa. Basta recordar que em 9 de outubro de 1932 foi organizado o
segundo núcleo da história dos integralistas na cidade mineira de Teófilo Otoni. O núcleo
foi comandado por Olbiano de Melo. Outro fato ímpar entre os núcleos integralistas
mineiros aconteceu no município de Juiz de Fora, local que teve seu núcleo organizado
após a passagem da “bandeira Integralista” em outubro de 1933. Nessa cidade, a base
principal de apoio à fundação e desenvolvimento das atividades dos “camisas-verdes” foi a
Igreja Metodista local.15
A presença da AIB na “Província integralista capixaba” teve início durante o
segundo semestre de 1933. A primeira cidade a receber uma reunião pública da organização
foi a capital, Vitória, com a passagem da “bandeira integralista”. Observa-se também que
14 Para mais informações sobre as escolas, jornais e postos de saúde da AIB no estado de São Paulo, ver: CAVALARI, Rosa Maria Feiteiro. Integralismo: ideologia e organização de um partido de massa no Brasil (1932-1937). Bauru: SP. EDUSC, 1999. 15 Mais informações em: GOLÇALVES, Leandro Pereira. Tradição e Cristianismo: o nascimento do Integralismo em Juiz de Fora. IN: Estudos do Integralismo no Brasil. (ORG). SILVA, Giselda Brito. Recife: PE. Editora da UFRPE, 2007.
25
nas disputas municipais de 1935, os militantes do ES elegeram um total de 26 vereadores e
2 prefeitos.16
Nesse estado a militância era composta, principalmente, por agricultores,
funcionários públicos e profissionais liberais. Os “camisas-verdes” capixabas chegaram a
eleger dois vereadores em Vitória, sendo um o dirigente provincial Jair Dessaune e o outro
o padre Ponciano Stanzel, fato que chamou a atenção.
Na capital federal – cidade do Rio de Janeiro – o primeiro núcleo integralista foi
fundado em abril de 1933 e teve como principais dirigentes Belmiro Valverde, Artur
Thompson Filho, José Madeira de Freitas, Thiers Martins Moreira, San Thiago Dantas,
Antonio Galloti, Hélio Viana e Américo Jacobina Lacombe.17
Nessa verdadeira cruzada os integrantes da direção nacional puderam entrar em
contato com a realidade do país, sobretudo o grupo liderado por Plínio Salgado, que teve a
incumbência de cruzar as cidades da região Nordeste e Norte. As “províncias integralistas”
começaram a surgir em quase todos os estados da região: os dados da AIB de 1937
apontam o estado da Bahia como o segundo em nível nacional em relação à quantidade de
núcleos organizados e ao número de filiados.18 Os baianos, liderados por João Alves dos
Santos, organizaram o primeiro núcleo integralista em novembro de 1932.
No Rio Grande do Norte a adesão do folclorista Câmara Cascudo foi amplamente
divulgada pela imprensa do partido. Ainda no Nordeste, cabe destacar as províncias
integralistas de Pernambuco, do Ceará e do Maranhão. Na cidade de Recife, um grupo de
acadêmicos do curso de Direito, empolgados com o teor do “Manifesto de Outubro de
1932”, publicou o que viria a se chamar “Manifesto de Recife”, que apoiava na íntegra
aquele documento.
Outro dado importante sobre a atuação dos “camisas-verdes” pernambucanos19 foi a
estreita relação com elementos da intelectualidade, com estudantes e com segmentos do
laicato católico.20 Entre os pernambucanos o integralismo teria sido apresentado como um
16Para mais informações, ver em FAGUNDES, Pedro Ernesto. Os Integralistas nas eleições de 1936 no ES. IN: XXIII Simpósio Nacional da ANPUH. História: Guerra e Paz. Londrina –PR. CDrom, 2005. 17 CARONE, Edgard. A op. cit pp. 206-207. 18 Monitor Integralista, pg. 4, 20/2/1937. 19 Para maiores informações sobre os integralistas em Pernambuco, ver: SILVA, Giselda B. O Integralismo em Pernambuco: uma história entre tantas da Ação Integralista Brasileira. IN: Estudos do Integralismo no Brasil. (ORG). SILVA, Giselda Brito. Recife: PE. Editora da UFRPE, 2007. 20 Em um próximo capítulo adensaremos as relações entre a AIB e o laicato católico brasileiro.
26
movimento de forte teor religioso e, por conta disso, a AIB teve uma grande aceitação entre
a intelectualidade católica do estado.21
Essa mesma proximidade entre integralistas e líderes católicos pode ser detectada
em outra “província integralista” nordestina. No estado do Ceará o movimento foi
oficializado em dezembro de 1932. Entre os “soldados de Deus” cearenses, uma das mais
importantes lideranças da AIB foi o padre Helder Câmara.
Mais do que a simples presença do religioso nas fileiras dos “soldados de Deus” as
relações amistosas entre católicos e integralistas foi reforçada com o apoio e a adesão da
Legião Cearense do Trabalho (LCT) à causa do sigma. Outro ponto de convergência foi a
presença de núcleos da AIB no interior do estado, que começaram a se multiplicar durante
o ano de 1934. Nessas áreas do estado – como em outras regiões do país – foram abertas
uma série de escolas e postos de atendimento para a população.22
Os meses de dezembro de 1933 e janeiro de 1934 marcaram a passagem da
“bandeira-verde” pela capital do Maranhão. Comandada por Gustavo Barroso e Miguel
Reale, a comitiva de dirigentes realizou, em 27 de dezembro, a primeira de uma série de
conferências em São Luís. Os principais dirigentes locais eram Cássio Miranda (médico),
padre Carlos Bacelar, Rubens Damasceno (professor), Olavo Leite, Warwick Trinta e
Clodoaldo Fontenelle.23
Os anos de 1934 e 1935 registraram uma importante fase de crescimento da AIB,
tanto na capital quanto no interior do estado. Em relação à penetração dos integralistas em
cidades de pequeno e médio porte do Maranhão é importante destacar que em alguns locais
– pode-se citar as cidade de Caxias e Pedreira – a adesão às fileiras do partido foi
referendada por grupos políticos tradicionais que dominavam as disputas locais.24
Vale ressaltar que, do mesmo modo como ocorreu em outros estados do país, os
“camisas-verdes” maranhenses receberam apoio de setores do clero, inclusive, com a
presença de religiosos nas atividades organizadas pelos integralistas.25 A sintonia entre os
21 SILVA, Giselda Brito. idem. 22 Sobre a presença da AIB no interior do Ceará, ver: REGIS, João Rameres. “Galinhas-verdes”: Memória e História da Ação Integralista Brasileira.. Limoeiro – Ceará (1934-1937). Dissertação de Mestrado apresentada no Centro de Humanidades da Universidade Federal do Ceará.Fortaleza, CE, 2002. 23CALDEIRA, João Ricardo. Integralismo e Política Regional: a Ação Integralista Brasileira no Maranhão (1933-1937). São Paul: Annablume, 1999, pg. 29. 24 Idem. 25 CALDEIRA. op. cit, pg.63.
27
integralistas do estado e segmentos católicos era tamanha que em 1937, ano da disputa
presidencial que contou com Plínio Salgado entre os candidatos, o arcebispo Carlos
Carmelo Mota pronunciou-se favoravelmente às atividades da AIB no estado do
Maranhão.26
Depois de meses de penosas viagens pela região Nordeste a comitiva da AIB
chegou, a bordo de barcos, aos longínquos estados do Pará, Amazonas e Acre. Como
aconteceu nos locais anteriormente visitados, os membros da “bandeira-verde” foram
calorosamente recepcionados. Em janeiro de 1934 Gustavo Barroso e seu séquito estiveram
nas cidades de Belém e Manaus para a realização de conferências com os simpatizantes e
filiados das respectivas cidades e organização de núcleos.
Na região Centro-oeste as atividades em Goiás estiveram sob a direção do tenente
Eduardo Bastos e do estudante Virgilio Gondier Fleury. No estado de Mato Grosso os
primeiros integralistas registrados estavam sendo comandados por Sebastião Lins e Fulvio
Mandeta.
Coube a Miguel Reale a tarefa de comandar as bandeiras que se dirigiram para a
região Sul do país. Durante o mês de agosto de 1933, realizaram-se conferências nos
estados do Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Dos três estados da região a AIB
conseguiu resultados mais significativos em Santa Catarina. Segundo relatos publicados em
1937 esse estado ocupava o terceiro lugar nacional em número de núcleos organizados.27
No Rio Grande do Sul a direção do movimento esteve a cargo de Dario Bitencourt,
Anor Butler Maciel e Nelson Contreiras. Nas eleições municipais de 1935 os integralistas
elegeram dois vereadores; um em Novo Hamburgo e um em Caxias do Sul.28 Também
houve o lançamento de candidaturas a prefeito em outras cidades importantes, sobretudo na
região norte e serrana do estado, entre elas Passo Fundo, Erechim e Carazinho.29
Na soma geral o resultado dos “candidatos-verdes” ficou muito abaixo das
expectativas, tento em vista que em quase todos os municípios nos quais a AIB lançou
candidaturas próprias para prefeito e chapas completas para vereador o resultado final
26 Op cit, pg. 99. 27 Monitor Integralista, pg. 4, 20/2/1937. 28 GERTZ, René. O Fascismo no sul do Brasil: Germanismo, Nazismo e Fascismo. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1987, pg. 113. 29 Sobre a atuação da AIB na região norte do Rio Grande do Sul, ver em: IRSCHLINGER, Fausto Alencar. Perigo Verde: o Integralismo no norte do Rio Grande do Sul (1932-1938). Passo Fundo: UPF Editora, 2001.
28
relegou os integralistas às últimas colocações. Entretanto, esses percalços eleitorais dos
“camisas-verdes” gaúchos não serviram como obstáculo para o crescimento de núcleos nos
dois estados que, como afirmamos anteriormente, ocuparam posição relevante no quadro
nacional da organização.
É importante frisar que, longe de indicar uma identificação espontânea ou natural
com o fascismo e o nazismo, o fato de os “camisas-verdes” obterem seus maiores êxitos em
regiões de forte presença de imigrantes e descendentes de imigrantes alemães e italianos, ao
contrário do que o senso comum indica, não decorreu de uma simples simpatia com
propostas fascistas ou nazistas. Muito pelo contrário, em cidades de Santa Catarina ocorreu
uma disputa entra os militantes da AIB e membros dos núcleos locais do Partido Nazista.30
Pesquisas recentes apontam que, em certa medida, aconteceram disputas e
divergências entre as duas agremiações. Os dirigentes do Partido Nazista defendiam e
divulgavam os limites nativistas e locais da AIB e mais: recomendavam que a comunidade
alemã e os seus descendentes ignorassem os integralistas.31
Ainda, em relação à presença da AIB nos estados do Sul, é necessário destacar que
uma das possíveis justificativas para o grande número de adeptos – a “província integralista
catarinense” foi a terceira mais numerosa do país – deve-se à postura dos integralistas em
relação às lideranças políticas tradicionais. Os partidários gaúchos de Plínio Salgado
ocuparam uma posição relevante na oposição ao governador Flores da Cunha. Da mesma
maneira que em outros estados, a AIB representou uma das alternativas políticas para
amplos setores que haviam ficado à margem das disputas durante a Primeira República.32
A trajetória da AIB no Paraná iniciou-se também no segundo semestre de 1933 com
a passagem da “bandeira” liderada por Miguel Reale. Entre os municípios do interior do
estado, destaque para o núcleo de Ponta Grossa. Nas eleições municipais de 1935, de um
total de oito parlamentares os “camisas-verdes” elegeram uma bancada de quatro
vereadores na Câmara Municipal.33
30 Idem. 31 DIETRICH, Ana Maria. Entre Sigmas e Suásticas: nazistas e integralistas no Sul do Brasil. IN: Estudos do Integralismo no Brasil. (ORG) SILVA, Giselda Brito. Recife: PE. Editora da UFRPE, 2007, pg. 215. 32 Para maiores informações sobre a presença da AIB, ver em: 32 GERTZ, René. O Fascismo no sul do Brasil: Germanismo, Nazismo e Fascismo. Porto Alegre: Mercado Aberto 33Para mais informações sobre os integralistas em Ponta Grossa, ver em: CHAVES, Niltonci Batista. “A saia verde está na ponta da escada”. As representações discursivas do Diário de Campos a respeito do integralismo em Ponta Grossa. IN: Revista de História Regional. Vol. 4 (1): 57 – 80. Ponta Grossa – PR, 1999.
29
Inegavelmente as “bandeiras-verdes” contribuíram de maneira decisiva para a
ampliação do número de filiados e núcleos organizados em todos os estados do país. O ano
de 1933 foi pródigo para os integralistas no que diz respeito à sua expansão e, sobretudo,
porque foi no segundo semestre desse ano e nos meses iniciais de 1934 que a AIB
efetivamente se consolidou como uma organização de nível nacional. Em 1937, às vésperas
da disputa presidencial, as projeções indicavam que os “camisas-verdes” contavam com um
milhão de brasileiros organizados em torno de milhares de núcleos municipais e distritais.34
Por mais tendenciosos ou exagerados que possam parecer os números apresentados
pela “imprensa-verde”, algumas questões são inegáveis: a AIB contou com um amplo
contingente de filiados em suas fileiras, esteve presente em todo o território do país e foi
uma organização política que atuou de forma unificada e centralizada.
Antes de apresentarmos os episódios que marcaram a fundação do primeiro núcleo
fluminense da AIB, gostaríamos de fornecer um quadro geral da situação econômica e
política do estado do Rio de Janeiro por se tratar do objeto principal da presente
investigação.
1.3 QUADRO ECONÕMICO E POLÍTICO FLUMINENSE NO INÍCIO DA
DÉCADA DE 1930.
No terreno econômico, o estado do Rio de Janeiro – como todo o país – nos
primeiros anos da década de 1930 ainda sentia os reflexos das duas grandes turbulências
que haviam abalado, respectivamente, a economia mundial e a do país: a chamada Crise de
1929 e a crise criada com os desdobramentos da “Revolução de 1930”.35 A situação
fluminense ficou extremamente delicada e os impactos, tanto da crise externa (1929)
quanto da interna, rapidamente repercutiram em nosso estado.36
O estado tinha no café produzido na região noroeste fluminense o carro chefe da
economia estadual. O pólo produtor de café situava-se na região da cidade de Itaperuna. 34 Relação dos núcleos da AIB em 1937, ver em: Anexos. 35 Sobre a “Revolução de 1930”, ver em: FAUSTO, Boris. Revolução de 1930. Historiografia e História. 10 ª Ed. São Paulo: Editora Brasiliense, 1986. 36 Todas as informações sobre o panorama da economia fluminense durante os anos iniciais da década de 1930 estão embasados nas seguintes obras: FERREIRA, Marieta de Moraes. Relatório de pesquisa apresentado à Fundação Ford, CPDOC. 1986, LAMARÃO, Sergio Relatório de pesquisa apresentado à Fundação Ford, CPDOC. 1986 e CASTRO, Silvia Regina Pantoja Serra de. Amaralismo e Pessedismo Fluminense: o PSD de Amaral Peixoto. Tese de (Doutorado em História. Universidade Federal Fluminense, Niterói, 1995.
30
Consequentemente, os abalos da crise geraram problemas em inúmeros segmentos
produtivos situados ao redor daquela localidade.
Infelizmente, para os fluminenses outra área que representava a base da economia
do estado também foi uma das mais afetadas pelas dificuldades da economia. Estamos
falando da agroindústria açucareira – concentrada na região norte do estado – que ocupava
o segundo posto na balança econômica do Rio de Janeiro. As dificuldades e sobressaltos
desses dois setores levaram a uma situação de crise em toda a economia fluminense durante
os anos iniciais da década de 1930.
A solução só veio a médio prazo através de uma maior intervenção do poder público
nas questões de natureza econômica. Em outras palavras, o governo federal assumiu uma
postura mais intervencionista, sobretudo a partir de 1937, nas questões relativas à
economia.37 Os problemas na economia levaram o governo a assumir uma postura ativa, ou
seja, o Estado passou a coordenar, planejar e incentivar as atividades do setor produtivo.
No sentido de garantir seu poder de interferência, a administração Vargas,
paulatinamente, foi criando agências e instituições que exerceriam o controle e
regulamentação de múltiplos setores da economia. Foi assim que surgiram, entre outros
órgãos: o Departamento Nacional do Café (DNC) e o Instituto do Açúcar e do Álcool
(IAA).38
Entretanto, é importante destacar que a atuação governamental, a princípio, teve
pouca capacidade de reverter os efeitos da crise econômica na região fluminense. No caso
da produção de café, a intervenção do governo federal gerou descontentamentos, haja vista
a obrigatoriedade da redução da produção que freou a expansão das áreas plantadas. O
estado do Rio de Janeiro voltou a equilibrar suas finanças somente com Amaral Peixoto
(1937-1945).
No quadro político a realidade regional seguia a mesma tendência nacional. Isso
porque nas eleições – de prefeitos, deputados e senadores – dificilmente quem estivesse na
mesma agremiação partidária dos presidentes das províncias saía derrotado de uma disputa
nas urnas. Um importante elemento criado ainda durante a Primeira República para garantir
essa situação foi a chamada “Comissão de Verificação de Poderes”.
37 Os debates sobre a maior participação estatal nas questões internas foram intensos também durante a década de 1920. 38 CASTRO, Silvia Regina Pantoja Serra de. Op. cit, pg. 59.
31
Essa instituição tinha a incumbência de apaziguar as disputas entre os poderes
Legislativo e Executivo nas discussões sobre a composição das bancadas de deputados.
Essa comissão passou a ter a função de proclamar, diplomar e empossar aqueles que, quase
sempre, já estavam no poder e eram aliados dos presidentes de províncias. 39
Em âmbito nacional essa dinâmica se reproduzia através da constituição de estreitos
laços de compromisso entre os governantes e a maioria das bancadas legislativas –
deputados federais e senadores. Dessa forma, a “Política dos Governadores” garantia que o
cargo de Presidente da República seria escolhido pelas elites políticas dos chamados
estados de primeira grandeza, especialmente, Minas Gerais e São Paulo.40 As duas
oligarquias mais influentes e ricas, a paulista e a mineira, num código de alternância,
monopolizavam as eleições presidenciais, configurando a chamada “política do café com
leite”.
Nos estados essa situação era garantida nas bases pelos chefes políticos municipais
através de um esquema de fraudes eleitorais, sistema que ficou conhecido pelo termo
“coronelismo”.41 Essa ampla rede de compromissos pode ser configurada “como resultado
da superposição de formas desenvolvidas do sistema representativo a uma estrutura
econômica e social inadequada”.42
A predominante estrutura agrária existente, pilar da economia do país na época,
baseada na desorganização dos serviços públicos locais básicos, criava e alimentava o
ambiente eleitoral onde os “coronéis”, através do “mandonismo”, do “filhotismo” e do
falseamento do voto, exerciam sua liderança.
Em nível político-partidário, cada estado contava com seu próprio sistema eleitoral,
com regras e normas eleitorais controladas e fiscalizadas, como já dissemos, pelos
representantes do próprio poder legislativo. No Rio de Janeiro, por exemplo, o Partido
39 Ao longo das primeiras décadas do período republicano as duas primeiras grandes manifestações intra-oligárquicas de descontentamento com o quadro político foram a eleição de Hermes da Fonseca e a “campanha civilista” de Rui Barbosa. 40 A propósito, ver: FERREIRA, Marieta de Moraes. A Reação Republicana e a crise dos anos vinte. Revista de Estudos Históricos, RJ, v. 6, nº 11, 1993. 41 Para saber mais sobre o “coronelismo”, ver em: LEAL, Vitor Nunes. Coronelismo, enxada e voto. São Paulo: Alfa-Ômega, 1986. 42 LEAL, Vitor Nunes. Op cit, pg. 20.
32
Republicano Fluminense (PRF) e, posteriormente, o Partido Republicano do Rio de Janeiro
(PRRJ), monopolizaram as disputas eleitorais durante toda a Primeira República.43
A partir do início da década de 1920, multiplicaram-se os movimentos de
contestação da situação de monotonia que havia tomado conta da arena política nacional.
Novos setores da população brasileira começaram a buscar formas alternativas para
expressarem sua insatisfação. Os reflexos dessas manifestações de descontentamento
afetaram diretamente o jogo político-partidário regional. Se, ao longo das primeiras décadas
do século XX, os políticos da região norte tiveram um papel destacado no estado e no
cenário nacional – Nilo Peçanha chegou a ocupar o posto de Presidente da Província, de
Presidente e Ministro da República – a situação mudou radicalmente após a participação
dos nilistas na disputa presidencial de 1922.44
Os debates sobre a sucessão presidencial de Epitácio Pessoa (1919-1922)
colocaram em lados opostos os chamados estados de primeira grandeza (São Paulo e Minas
Gerais) e os estados de segunda grandeza (Bahia, Rio Grande do Sul, Pernambuco e
Distrito Federal). Essa divisão intra-oligárquica pretendia criar um eixo alternativo de poder
no país como forma de “aumentar seu poder de negociação frente aos estados
dominantes”.45 Os estados dissidentes que formaram a chamada “Reação Republicana”
tinham como principais reclamações os desvios do federalismo e o “imperialismo” dos dois
grandes estados.
Apesar da vitória na disputa presidencial ter sido do candidato oficial, Arthur
Bernardes, a “Reação Republicana” originou inúmeras conseqüências no cenário político
nacional e estadual. Em nível nacional, conseguiu mobilizar e despertar amplas camadas da
população dos grandes centros urbanos, principal reduto dos partidários da “Reação
Republicana”, e também reintroduzir outros atores no palco político: os militares.
A participação de militares, principalmente os de baixa patente, originou uma série
de conflitos entre a alta hierarquia das forças armadas e os subalternos. Participar das
atividades da oposição, como comparecer a um comício, era motivo para punições e
perseguições aos sargentos e tenentes. Contudo, apesar das ameaças de punições, os
43A propósito, ver: FERREIRA, Em busca da idade de ouro: as elites políticas fluminenses na Primeira República (1889-1930). RJ, UFRJ, 1994. 44 Os aliados e os membros do grupo político de Nilo Peçanha eram conhecidos como Nilistas. 45 FERREIRA, op cit, pg. 21.
33
militares de baixa patente tiveram uma participação destacada nesse episódio, e a “Reação
Republicana” é interpretada como o berço do movimento Tenentista.46
Em nível estadual, a participação dos nilistas na “Reação Republicana” fez com que
o grupo entrasse em rota de colisão com a lógica política da Primeira República. Como era
de se esperar, a participação de Nilo Peçanha e de seu grupo gerou reflexos imediatos
depois da derrota na corrida presidencial. É importante destacar que, após as eleições
presidenciais de 1922, em que todas as esperanças dos nilistas caíram por terra junto com as
pretensões da “Reação Republicana”, a situação política no estado do Rio de Janeiro passou
por profundas transformações.
Como já ressaltamos, a figura de Nilo Peçanha ocupou, durante a Primeira
República, um lugar especial na cena política nacional e fluminense. Ao longo de vários
anos, os nilistas estiveram à frente da presidência do estado do Rio de Janeiro e ocuparam a
maioria esmagadora das cadeiras destinadas ao estado na Câmara dos Deputados e no
Senado Federal. Também na Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (ALERJ),
o PRF contava quase sempre com a maior bancada e com a presidência da casa.
Contudo, as oligarquias mineira e paulista passaram a conduzir a recomposição da
oposição fluminense como uma retaliação à “ousadia” dos nilistas em desafiarem a
situação. Sendo assim, essas articulações produziram efeitos já nas eleições estaduais de
1922, pois a nova conjuntura nacional – com a eleição de Arthur Bernardes – fez da antiga
oposição fluminense o braço político mais forte no estado do Rio de Janeiro, inclusive,
conseguindo apresentar chapas completas para os cargos majoritários e proporcionais. A
oposição fluminense conseguiu aglutinar-se em torno do nome de Feliciano Sodré.47
Apesar de tudo indicar que a vitória nas urnas foi do candidato Raul Fernandes,
ligado aos nilistas, uma série de mecanismos legais foram acionados no sentido de impedir
sua posse. Obviamente, outro ponto importante na perda de espaço desse grupo político foi
o falecimento de Nilo Peçanha, ainda no primeiro semestre de 1924. Após uma série de
46 O debate sobre as origens do Tenentismo não estão entre os objetivos desse trabalho. Para maiores informações ver: PRESTES, Anita Leocádia. Os Militares e a Reação Republicana: as origens do tenentismo. Petrópolis: Vozes, 1993 47 FERREIRA, (Coord.). A República na Velha Província. Oligarquias e crise no estado do Rio de Janeiro. (1889-1930). RJ: Rio Fundo, 1989, pg. 262.
34
debates sobre a legitimidade das eleições,48 inclusive com um período de intervenção
federal, a ALERJ confirmou o nome de Feliciano Sodré como Presidente do Estado.49
Dessa forma, nos anos finais da década de 1920, a cidade de Campos dos
Goytacazes, principal foco de atuação dos nilistas, passou a ocupar uma posição marginal
no cenário político estadual e nacional. Ao longo desse período, os antigos aliados de Nilo
Peçanha, agora aglutinados no Partido Republicano do Estado do Rio de Janeiro (PRRJ),
chegaram a apresentar candidaturas ao cargo de Presidente da Província, como o nome de
Luís Sobral, em 1929, sem obter êxito.
A disputa presidencial de 1930 representou um novo momento de ruptura intra-
oligárquica. No estado do Rio de Janeiro, a fratura política entre os nilistas e o grupo
político da situação ficou novamente exposta já que os nilistas apoiaram Getúlio Vargas da
Aliança Liberal e o grupo da situação, sob a liderança de Feliciano Sodré e Manuel Duarte,
apoiou a candidatura de Julio Prestes, do Partido Republicano Paulista (PRP).
Com os desdobramentos da chamada “Revolução de 1930”, as forças políticas do
estado, principalmente da região norte, voltaram a ficar em ebulição. Antigas lideranças
nilistas, como César Tinoco, Godofredo Tinoco, Cardoso de Mello e Gilberto Siqueira se
mobilizaram favoráveis ao golpe de Estado.
Como em diversas outras cidades do país, as notícias sobre a efetiva queda do
presidente Washington Luiz fizeram com que parcelas da população de Campos fossem
para as ruas. Ainda em novembro de 1930, informações sobre o deslocamento de tropas
oposicionistas em direção ao Distrito Federal serviram para agitar as forças políticas
fluminenses. No comando geral das ações militares da oposição estava o general campista
Christovão Barcellos. Suas tropas, depois de invadirem e dominarem todas as cidades do
norte fluminense, finalmente, chegaram a Campos.50
Na praça São Salvador, das sacadas das casas e dos prédios, a massa eufórica
balançava lenços vermelhos. Muitas pessoas acenavam com as mãos e com bandeiras
nacionais. De um palanque improvisado diversos oradores puderam fazer suas 48 FERRERIRA, op cit, idem. 49 Para maiores informações sobre a política fluminense na Primeira República, ver: FERREIRA, Marieta de Moraes. A República na velha província. Oligarquias e crise no estado do Rio de Janeiro (1889-1930). Rio de Janeiro: Riofundo, 1989. 50
Esse grupamento fazia parte do chamado Setor Leste das forças militares que apoiavam o golpe articulado pelos antigos membros da Aliança Liberal.
35
intervenções. Os mais aplaudidos foram Cardoso de Mello, César Tinoco e o comandante
da chamada “Coluna Gwyer”, chefiados pelo major Asbrúbal Gwyer de Azevedo. Os
“revolucionários” não enfrentaram qualquer tipo de resistência, tendo em vista que as
Forças Armadas já haviam declarado apoio ao governo provisório. Uma verdadeira festa
popular marcou o desfile das tropas pelas principais ruas do município.
A “Revolução de 1930” trouxe de volta a esperança para amplos setores da
sociedade brasileira, especialmente aqueles que estavam à margem do jogo político-
partidário oficial. O verdadeiro “carnaval em novembro” foi um reflexo da insatisfação
popular com o viciado esquema político que funcionou no país durante toda a Primeira
República.
Apesar de terem sido aliados das forças da Aliança Liberal, os nilistas ficaram
alijados da escolha do nome dos interventores estaduais. Para contornar possíveis
insatisfações, a forma encontrada pela administração Vargas para pacificar as disputas
estaduais foi nomear os chamados “interventores federais” para dirigir os estados, até a
realização de eleições para elaboração das constituições estaduais e federal.
Assim, a criação do sistema de interventorias foi uma alternativa do poder central
para controlar as disputas locais.51 Muitos interventores eram antigos participantes do
movimento tenentista, o que configurou uma “militarização das interventorias”.52 Contudo,
muitos membros das oligarquias locais permaneceram excluídos do jogo político, inclusive
aqueles que apoiaram o movimento de 1930, como no caso dos nilistas no estado do Rio de
Janeiro que permaneceram afastados do poder estadual. 53
Em outros estados, essa situação gerou insatisfações mais agudas entre as antigas
oligarquias. O caso mais conhecido foi o de São Paulo, que se levantou durante o ano de
1932 no movimento que ficou conhecido como “Revolução Constitucionalista”. Isolado, o
levante dos paulistas foi derrotado no campo de batalha, contudo, foi vitorioso no terreno
51 O estado teve como interventores federais nesse período: Demócrito Barbosa (1930), Plínio de Castro Casado (1930-1931), João de Deus Mena Barreto (1931), Pantaleão da Silva Pessoa (1931) e Ari Parreiras (1931-1935). 52 PANDOLFI, Dulce. Os anos 1930: as incertezas do regime. IN: O tempo do nacional-estatismo: do início da década de 1930 ao apogeu do Estado Novo. FERREIRA, Jorge e DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. RJ: Civilização Brasileira, 2003 (Coleção Brasil Republicano), pg. 18. 53 FERREIRA, op cit, pg. 301.
36
político, pois a administração Vargas acabou convocando eleições para a Assembléia
Constituinte. 54
Entre 1930 e 1934, ou seja, até a sua reconstitucionalização, o país passou por uma
fase extremamente complexa e cercada de incertezas.55 Existiam duas tendências
majoritárias que disputavam a hegemonia do processo político: de um lado, os
remanescentes do movimento tenentista agrupados no chamado “Clube 3 de Outubro” e na
outra margem os representantes das oligarquias dissidentes. Os partidários do “Clube 3 de
Outubro” manobravam para impedir a convocação de eleições, sobretudo porque temiam o
retorno das antigas oligarquias da Primeira República.56 A pressão feita pelos representantes das oligarquias dissidentes que apoiaram a
Aliança Liberal era exatamente no sentido contrário: queriam que o governo provisório
convocasse, o mais rápido possível, eleições para que o poder fosse entregue em suas mãos.
Para tornar o cenário mais conturbado, ainda existiam as articulações dos chamados
“carcomidos” ou “decaídos”, antigos representantes das oligarquias paulistas, mineiras e
seus aliados nos estados. Foi nesse contexto que ocorreram as eleições para compor a
Assembléia Nacional Constituinte e para eleger os representantes da ALERJ que iriam
elaborar, respectivamente, as constituições do país e do estado.
A indefinição política, somada a um clima de “euforia democrática” pela
possibilidade de participação de amplos setores nas decisões nacionais, abriu espaços para
que dez agremiações partidárias apresentassem cerca de 180 candidatos para a disputa de
1933. 57 No estado fluminense, estavam em jogo 17 cadeiras na Câmara dos Deputados. O
grande número de partidos que surgiu no Rio de Janeiro indica a criação de, por assim
dizer, um novo sistema político-partidário no estado, mas todos eles mantiveram – como os
antigos partidos da Primeira República – um caráter estritamente regional.58
54 Para saber mais sobre o quadro político dos anos iniciais da década de 1930, ver em: GOMES, Ângela de Castro. Regionalismo e centralização política. Partidos e constituinte nos anos 30. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980. 55 PANDOLFI, op cit, pg. 23. 56 GOMES, Ângela de Castro. Confronto e compromisso no processo de Constitucionalização (1930-1935). IN: O Brasil Republicano: Sociedade e política (1930-1964) . Tomo III, RJ: Bertrand Brasil, 1997, pg. 17. 57 Lista completa e informações sobre as agremiações partidárias, ver em Anexos. 58 GOMES, Ângela de Castro. Op. cit, pg. 32.
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Apesar da maioria dos deputados federais eleitos59 serem figuras conhecidas da cena
política fluminense60 que participaram do jogo partidário, como oposição ou situação,
durante a Primeira República.61 Uma questão se sobressaiu: havia sido criado um novo
cenário partidário no estado, agora com a presença de novos e múltiplos atores políticos. O
surgimento de várias de agremiações partidárias em certa medida representou o fim do
monopólio de apenas duas legendas no estado. Um número expressivo de candidaturas
lançadas na disputa de 1933 foi uma mostra desse novo cenário.
Como veremos a seguir, foi exatamente nesse processo que a AIB iniciou sua
efetiva organização no estado do Rio de Janeiro. A partir desse momento as energias e as
forças de amplos setores da sociedade que haviam ficado represadas durante a Primeira
República no nosso estado passariam a contar com uma agremiação que canalizaria todo
esse entusiasmo: a Ação Integralista Brasileira.
Niterói, 1º de junho de 1933. Esse município fluminense foi palco da primeira
conferência do líder máximo da Ação Integralista Brasileira (AIB), Plínio Salgado, no
estado do Rio de Janeiro.62 O local escolhido para a conferência foi o Liceu Nilo Peçanha,
59
No total foram eleitos 4 deputados federais e 4 estaduais da região norte fluminense. A União Progressista Fluminense, sigla organizada em torno do ex-prefeito Luis Sobral, elegeu três deputados estaduais (Mario Coelho Barroso, Olímpio da Silva Pinto e Luis Caetano Guimarães) e Arthur Lontra Costa para o cargo de deputado federal. O Partido Socialista Fluminense elegeu um deputado estadual (Antero Manhães) e Cezar Tinoco para deputado federal. Coube ainda uma vaga na Câmara dos Deputados para Cardoso de Melo, do Partido Popular Radical. 60Como o ex-governador “decaído” Manoel Duarte, que voltou à cena após um breve hiato, organizando no estado o Partido Constitucionalista. Outro exemplo foi o caso de ex-prefeito de Campos, Luis Sobral que uniu-se ao general Christóvão Barcelos, na União Progressista Fluminense, e juntos ajudaram a eleger para uma cadeira na Assembléia Constituinte o ex-presidente da ALERJ, Arthur L. Costa.Temos ainda o caso do ex-deputado nilista Raul Fernandes, que organizou o Partido Popular Radical. Sua região de atuação era a cidade de Valença. Advogado de formação e magistrado de profissão, Raul Fernandes ocupou os cargos de deputado estadual e federal. Nesses postos alcançou grande projeção e por isso foi indicado pelo grupo nilista para disputar a eleição para governador em 1923, pleito que perdeu para Feliciano Sodré.César Tinoco, outro antigo correligionário de Nilo Peçanha, organizou no Rio de Janeiro o Partido Socialista Fluminense para a disputa eleitoral de 1933. A origem desse partido está ligada às manobras de alguns ex-integrantes do movimento tenentista que apoiaram a “Revolução de 1930”, liderados por Miguel Costa, que se reuniram no Rio de Janeiro no Primeiro Congresso Revolucionário Brasileiro. A expectativa do grupo era organizar o Partido Socialista Brasileiro, organização que teria cunho nacional. Não se chegou a um entendimento, o que resultou na fundação de vários partidos socialistas estaduais, como o de São Paulo, dirigido pelo próprio Miguel Costa. No Rio de Janeiro, o “tenente civil” César Tinoco, foi um dos organizadores da legenda. E pelo papel destacado, junto com seu irmão Godofredo Tinoco, que desempenhou na região nos episódios “revolucionários” de 1930, conseguiu garantir sua vaga de deputado federal na Assembléia Constituinte. 61 A listagem completa dos deputados constituintes de 1933, ver em Anexo. 62 Todas as informações sobre essa primeira conferência de Plínio Salgado em Niterói estão baseadas em matéria publicada em: Revista Sigma, nº 1, ano 1,pg. 25 e 26. Setembro de 1937. Acervo Plínio Salgado do Arquivo Público de Rio Claro – SP.
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um dos prédios mais imponentes da região central da cidade. Localizado próximo à Praça
da República, esse estabelecimento de ensino tinha como traços marcantes de sua
arquitetura duas grandiosas torres que contribuíram para realçar a importância do colégio
como um dos estabelecimentos de ensino mais tradicionais do estado.
A conferência do dirigente dos “camisas-verdes” aconteceu no salão nobre do
colégio e atraiu a atenção de um público formado, em sua maioria, por professores e alunos
do Liceu. O evento, que marcou o início das atividades da AIB no estado, teve como ponto
alto a palestra, proferida por Plínio Salgado, intitulada “O que é o Integralismo”.
Poucas semanas depois, mais precisamente em 15 de junho, Salgado esteve na
cidade para, novamente no salão nobre do Liceu Nilo Peçanha, realizar uma segunda
conferência.63 Como reflexo do sucesso de sua primeira palestra, nessa nova passagem por
Niterói. Plínio Salgado foi recepcionado por dezenas de milicianos fluminenses
devidamente trajados com as inconfundíveis “camisas-verdes”.
O tema da palestra – que lotou as dependências do salão nobre – foi a “Exegese da
Revolução”. Durante sua intervenção, que durou aproximadamente duas horas, foram
ressaltadas as teses centrais que fundamentavam a base teórica da AIB. Em sua fala foram
expostas as opiniões e a interpretação dos integralistas sobre a situação política do país. No
final do evento, os integralistas presentes aplaudiram demoradamente as palavras do
conferencista e cantaram o hino nacional.
O sucesso alcançado pela AIB foi quase imediato, considerando-se que inúmeras
pessoas acabaram se juntando aos “seguidores do sigma”.64 Entre os militantes pioneiros
que vestiram a “camisa-verde” no estado podemos citar Alberto Lamego Filho, Alcebíades
Cunha, Amílcar Barcellos Marinho, Antonio da Cunha Motta, Benedito Silva, Getúlio
Macedo, Hermes Barcellos, Lacerda Nogueira, Lealdino Alcântara, Manoel Figueira,
Oswaldo Ferreira, Portugal Neves, Raul Stein, Thiers Moreira e Vital Menezes.
Assim, esses dois eventos representaram os primeiros passos da AIB em nosso
estado e significaram o início da trajetória do movimento na “Província integralista
fluminense” que, durante seus poucos anos de funcionamento legal (1933-1937), se
63 O Fluminense, pg. 1, 16/6/1933. 64 Idem.
39
converteria numa das províncias que somaria o maior número de militantes e núcleos
organizados.
Em 1937, a AIB, na “Província integralista fluminense”, segundo dados dos órgãos
de imprensa da própria entidade, contava com um total de 220 núcleos municipais e
distritais, teria 47 mil filiados, uma bancada de 30 vereadores, 11 postos de assistência
médica, uma rede de escolas, com 124 estabelecimentos de ensino e uma imprensa local
que chegou a editar uma dezena de informativos.65
Como dissemos – mesmo fazendo todas as ponderações possíveis sobre os “dados
oficiais” apresentados pelos integralistas – a proporção alcançada pelos “soldados de Deus”
no estado foi algo notável. Para atingir esse nível organizacional os “camisas-verdes” no
estado do Rio de Janeiro não perderam tempo, pois poucos meses após a fundação do
núcleo de Niterói os integralistas começaram a espalhar-se pelo interior do estado e a
fundar núcleos em dezenas de cidades e distritos.
Sendo assim, ao longo dos anos de 1933 e 1934, os integralistas fluminenses
ocuparam-se prioritariamente da organização e estruturação da AIB no estado. Durante esse
período, foram organizadas caravanas, “bandeiras”, desfiles, conferências, enfim, um
conjunto de atividades que visavam divulgar suas idéias e, assim, ampliar o número de
militantes no estado.
Durante o segundo semestre de 1933, os “camisas-verdes” fluminenses centraram
suas atividades na fundação de núcleos pelo interior do estado. Nesse período surgiram
núcleos nas cidades de Campos dos Goytacazes, Petrópolis, Cantagalo, Itaperuna e
Friburgo.66 O trabalho de organização visava preparar o núcleo regional para o Primeiro
Congresso Nacional da AIB que passaremos a abordar.
1.4 O I CONGRESSO NACIONAL DA AIB
Na manhã do dia 27 de fevereiro de 1934 partiu da Estação Mauá, no Rio de
Janeiro, um trem com destino a Vitória, capital do Espírito Santo. Entre seus passageiros
65
Monitor Integralista, pg 4, 20/02/1937. 66 Todas essas informações estão baseadas em matéria publicada no jornal: Monitor Integralista, pg. 1, Nº 1, Dezembro de 1933.
40
estavam centenas de militantes e dirigentes da AIB que ocuparam dois vagões enfeitados
com bandeiras e letreiros alusivos ao congresso na cidade capixaba.67
Durante, aproximadamente, dois dias esse “trem-verde” foi saudado por milicianos
da AIB em quase todas as estações pelas quais passou. Em várias cidades fluminenses os
membros da delegação foram saudados pelos militantes “camisas-verdes”, com destaque
para Macaé e Campos, locais onde foram realizadas rápidas cerimônias organizadas pelos
núcleos integralistas locais.
Em solo capixaba, a receptividade encontrada foi quase a mesma, sobretudo na
estação de Domingos Martins. Entretanto, na estação ferroviária de Cachoeiro de
Itapemirim, região sul do estado, ocorreu o episódio de maior tensão durante o trajeto: um
grupo de jovens passou em frente à estação gritando palavras de ordem contra a AIB.
Apesar desse incidente, era grande a expectativa na capital do estado em torno da chegada
do trem do DF, tanto que os dirigentes de Vitória preparavam uma “festiva recepção” para
a comitiva de Plínio Salgado. 68
Finalmente, na tarde do dia 28 de fevereiro, a delegação de integralistas chegou ao
seu destino final. Os ocupantes do “trem-verde” foram saudados por duas decúrias do
núcleo local, que “sob as mais vibrantes e contagiantes demonstrações de regozijo”69
apresentaram as boas-vindas aos principais dirigentes da organização, entre eles Plínio
Salgado, Madeira de Freitas, Jeová Mota, Olbiano de Mello e Miguel Reale..
Ainda na plataforma de desembarque da Estação Pedro Nolasco, os congressistas
foram recebidos por Arnaldo Magalhães, chefe provincial. Após a travessia da baía de
Vitória, feita em barcos e lanchas, os membros da comitiva puderam saudar os seus
companheiros de outros estados que já se encontravam na cidade. Entre as cerimônias de
boas-vindas, houve um desfile da milícia em frente ao hotel da comitiva de Plínio Salgado
e, por fim, o hino nacional foi cantado por todos.
Buscando agilizar os trabalhos do Primeiro Congresso Nacional da AIB, ainda na
noite de 28 de fevereiro ocorreram as primeiras atividades do evento. Nesse sentido, foram
nomeados por Plínio Salgado os dirigentes que iriam compor as mesas dos trabalhos do
67 Todas as informações apresentadas baseiam-se em matérias publicadas nos seguintes periódicos: Monitor
Integralista, Revista Vida Capichaba e Diário da Manhã (Vitória). 68 Diário da Manhã, pg. 4, 27/02/1934. 69 Revista Vida Capichaba, pg. 17, 15/03/1934, n º 360, ano 12.
41
congresso. Da mesma maneira, foram indicados os nomes dos dirigentes que iriam compor
as comissões criadas para organizar, elaborar e sistematizar as atividades. A solenidade de
abertura oficial do congresso estava marcada para o dia seguinte.
No dia primeiro de março de 1934, as ruas nas imediações da praça Costa Pereira,
região central de Vitória, ficaram inundadas de “camisas-verdes” que se deslocavam para
as dependências do tradicional Teatro Carlos Gomes. Do lado de fora do teatro, as decúrias
formadas para saudar os participantes do evento acabaram atraindo a atenção dos habituais
freqüentadores da praça. A curiosidade dos transeuntes aumentou muito quando, por volta
das 21 h, Plínio Salgado passou em revista a milícia e foi saudado pelos “anauês”.
Contudo, o momento de júbilo do futuro líder supremo da AIB ocorreu quando ele
adentrou o teatro e foi saudado por centenas de integralistas de todas as partes do país.
Outra vez, agora com muito mais eco, ouviu-se um triplo brado de “anauê” em saudação a
Plínio Salgado. Depois de conseguir atravessar toda parte inferior do recinto, Salgado subiu
ao palco para iniciar a abertura oficial do evento.
O palco estava completamente ornamentado com bandeiras da AIB, dos estados que
haviam enviado delegações e com palavras de ordem do movimento. No centro destacava-
se um imenso painel com os seguintes dizeres: “Pelo bem do Brasil – Anauê”. Antes de
iniciarem as atividades, os integralistas aproveitaram a privilegiada acústica do teatro para
cantarem o hino integralista.
A sessão iniciou-se com a leitura da ordem do dia e de inúmeros telegramas dos 22
núcleos provinciais da AIB. Logo em seguida, a palavra foi passada para Plínio Salgado
que fez o pronunciamento mais aguardado da noite.70 O discurso do líder integralista foi,
constantemente, entrecortado pelos aplausos dos seus.71 Depois da fala de Plínio Salgado, a
direção do congresso foi entregue a Arnaldo Magalhães – o mais velho entre os
congressistas.
Coube a esse dirigente franquear a palavra a Olbiano de Mello, membro da direção
nacional da organização, que realizou a leitura de um documento que se tornaria
fundamental para a história AIB. Tratava-se de um manifesto, assinado pelos delegados de
70 Ibdem. 71 Ibdem.
42
todas as províncias integralistas, que aclamava o nome de Salgado como o único e
insubstituível chefe dos “camisas-verdes” do Brasil.
Visando reafirmar os princípios de fidelidade e obediência, previstos nos
documentos e estatutos da AIB que seriam aprovados durante o evento, foi realizada uma
interessante cerimônia para reafirmar a posição de Salgado como chefe supremo dos
integralistas. Um a um, os nomes dos chefes provinciais foram sendo chamados. Ao escutar
seu nome o dirigente – com o braço direito em posição de saudação – respondia
solenemente: “Juro, Anauê, Plínio Salgado.”
Compreender o significado e a importância dessa cerimônia é vital para realizarmos
uma correta leitura do modelo de partido político que foi consagrado a partir de 1934 no
interior da AIB. O ato demarcou definitivamente o caráter organizacional do partido, ou
melhor, deu a feição definitiva que iria acompanhar a organização até seu fechamento em
1937. Pode-se afirmar também que ato de aclamação de Plínio Salgado durante as sessões
de instalação do congresso foi mais um dos momentos em que a política adquiriu
características de um verdadeiro espetáculo de poder.
Toda a teatralidade da cena teve como finalidade sepultar o modelo de direção
colegiada da AIB – originalmente existiram os triunviratos que comandavam as direções do
partido – e criar a figura do chefe nacional que, com o passar do tempo, adquiriu status de
onipresença.
Ficou evidente que Plínio Salgado passaria a encarnar a própria identidade do
partido, através da total submissão dos seus membros ao seu chefe nacional. Sendo assim, o
ato de fidelidade – demonstrada no episódio da aclamação do chefe nacional pelos chefes
provinciais da organização – serviu para ratificar dois traços fundamentais que passariam a
marcar a estrutura orgânica da AIB: a fidelidade ao chefe e o repúdio às dissidências e
tendências.
Como pontuamos, o I Congresso Nacional da AIB foi um marco na transição da
organização de uma associação cultural para um partido político. No entanto se isso ocorreu
de fato, de direito a transformação só ocorreria em 1935, durante o II Congresso Nacional,
realizado na cidade fluminense de Petrópolis. De qualquer forma, já durante o congresso de
Vitória, a aprovação dos estatutos, dos documentos e a consagração de Salgado como único
chefe nacional deram ao partido seu perfil definitivo.
43
Nesse encontro, mais do que nunca, os integralistas passariam a contar com um
partido organizado verticalmente. O ano de 1934 representou um momento de transição,
pois a AIB deixou de ser apenas mais uma organização – como tantas outras que surgiram
nos anos anteriores com a finalidade de apenas apresentar e debater seu corpo de idéias –
para se configurar de fato num partido político.
Contudo, para os integralistas e vários outros setores da população os partidos
políticos existentes até então eram meros arranjos e conchavos que tinham uma atuação
fechada e restrita. Mais ainda, os tidos “partidos tradicionais” cumpririam apenas o papel
de garantir os privilégios e vantagens de uma parcela minoritária da sociedade. Dito de
outra forma, a verdadeira tarefa dos partidos seria perpetuar o controle da máquina estatal
em torno dos mesmos donos do poder.
Entretanto, antes de afirmarmos que os integralistas assumiram uma postura e
prática de partido político é preciso responder a duas questões: quais as características do
sistema partidário brasileiro? E que tipo de partido político foi a ABI?
1.5 A AIB E O CONCEITO DE PARTIDO POLÍTICO DE MASSA
Como foi dito anteriormente, no Brasil o quadro político das décadas iniciais do
século passado foi marcado pelas agremiações estaduais que estavam, exclusivamente,
voltadas para as disputas eleitorais locais. Essa situação levou o sistema partidário a uma
situação de completa pulverização. Outro agravante foi o fato das legendas serem
monopolizadas por líderes regionais que representavam apenas os elementos da elite. Essa
realidade lembrava o chamado modelo de partidos de notáveis. Originário de países como a
Grã-Bretanha, a França e os EUA, o chamado “modelo de partidos de notáveis”, surgiu
durante o século XIX.72
Na Inglaterra, o acontecimento que marcou esse fato ocorreu a partir do Reform Act
de 1832 que introduziu modificações na vida política do país, sobretudo, no que dizia
respeito à ampliação do sufrágio.73 Nesse sentido, foi possível a ampliação da participação
72Esse movimento foi realizado para acomodar, principalmente, os membros da burguesia que pretendiam exercer uma maior intervenção e influência nas questões da administração do Estado. 73 Mais informações sobre Partidos Políticos, ver: Dicionário de Política. 5ª ed.Brasília, DF: Editora UNB, 1993, pg. 898-905.
44
de representantes da indústria e do comércio exercerem uma participação – em conjunto
com membros da nobreza – mais ativa nas questões públicas.
Essa nova conjuntura permitiu que passassem a ser criadas na Inglaterra, durante os
períodos eleitorais, organizações que tinham como finalidade principal trabalhar no sentido
do recolhimento dos votos dos seus candidatos.74 Essas organizações eram compostas,
dirigidas e financiadas por um restrito grupo de “notáveis locais, aristocratas ou burgueses
de alta sociedade” que faziam internamente a escolha dos possíveis candidatos.75 Ainda ao
longo do século XIX, esses modelos de partidos foram intensificando e aperfeiçoando suas
táticas eleitorais. Dessa forma, essas organizações acabaram construindo verdadeiras
“máquinas ou aparelhos” voltados apenas para cumprir uma finalidade: a vitória nas
eleições.76
Entretanto, a entrada em cena do movimento operário acabou refletindo na
organização do sistema partidário da época. Isso porque o amplo processo de
industrialização causado pela Revolução Industrial suscitou o aparecimento da massa de
trabalhadores. Dessa forma, no final do século XIX e início do século XX, a Europa foi
palco do surgimento do movimento social organizado dos trabalhadores.
Inicialmente, o principal objetivo dos primeiros partidos operário – mais do que
eleger representantes para o legislativo – era constituírem-se em espaços de convivência e
educação política para o proletariado. Outra importante tarefa dos partidos operários foi a
defesa do princípio do sufrágio universal: para cada homem um voto.
Contudo, com o passar do tempo essas estruturas foram mudando sua finalidade e
experimentando significativas mutações. Uma das mais relevantes foi o crescimento em sua
própria estrutura partidária. As contribuições dos filiados permitiram o aparecimento de
uma verdadeira rede de órgãos dentro dos partidos.77
Em suma, a estruturação dos partidos socialistas funcionava de maneira centralizada
e cotidianamente, independente das eleições. Nesses chamados “Partidos de organização de
Massa” até mesmo os seus representantes no parlamento deveriam respeitar e seguir as
74A dinâmica desse sistema partidário estava fundamentada no parlamento, tanto que, após as eleições os parlamentares tinham completa independência de ação em relação a estrutura das agremiações. Assim, esse tipo de partido foi denominado de Partido de “Notáveis” ou de “quadros”. 75 Op cit, pg. 899. 76 Idem. 77 Essas instâncias partidárias passaram a ocupar-se de maneira profissional da propaganda, das finanças, da busca de novas adesões, da assistência aos trabalhadores, entre outras atividades do dos militantes.
45
orientações da direção partidária. Esse tipo de partido articulava todos os seus integrantes
em uma estrutura piramidal, que acabou incluído todos os filiados em alguma de suas
instâncias – fosse na base ou na direção central – todos deveriam atuar num sentido
homogêneo, logicamente, seguindo as coordenadas traçadas pelo partido.
O modelo do “Partido de organização de Massa” passou por algumas adaptações
visando adquirir maior peso eleitoral. Em alguns casos, até partidos de caráter burguês
passaram a adotar algumas dessas práticas e elementos para restabelecerem sua hegemonia
nas disputas eleitorais. Essas experiências deram origem aos chamados “Partidos Eleitorais
de Massa”. Contudo, foram exatamente outros movimentos que souberam aproveitar as
lições extraídas dos “Partidos de organização de Massa”. 78
Entre esses partidos podemos citar organizações de caráter ideológico extremamente
distinto, entre eles: os comunistas, os fascistas e os Democratas Cristãos. Apesar das
diferentes linhas políticas todas essas organizações sofreram nítida influência dos
primeiros “Partidos de massa”.79
Os partidos comunistas – criados com mais intensida depois da Revolução Russa de
1917 – que nas décadas de 1920 e 1930 passaram a rivalizar com os primeiros partidos
socialistas. Uma característica singular dos partidos comunistas foi que, apesar de contarem
com um significativo número de filiados na base, suas direções eram compostas por uma
minoria de dirigentes.
A tese que norteava essa prática das legendas comunistas era a noção do papel de
vanguarda em meio à luta política. Os comunistas defendiam a proposta que, tanto a
78 O aparecimento dos “Partidos de organização de Massa” está intimamente ligado ao aparecimento do sufrágio universal. O surgimento desse fenômeno criou uma nova conjuntura na arena política dos países europeus, ou seja, a substituição do antigo sistema de sufrágio restrito representou um momento de passagem no sistema partidário moderno. A ampliação da participação no jogo eleitoral contribuiu para a construção de um modelo de partido que tinha como pilar central uma extensa estrutura que percorria um longo itinerário das bases locais, passando para as municipais, as regionais até, finalmente, chegar até a direção nacional da agremiação partidária. 79 Um outro traço comum aos partidos de massa de feição socialista era a preocupação constante em estruturar uma rede de instancias que se ocupavam de suprir as carências no terreno organizativo, da formação política e financeira de seus filiados e aderentes. Tendo em vista, a falta de experiência da maioria de seus militantes e quadros e, sobretudo, os escassos recursos financeiros dos segmentos que se originavam, os primeiros partidos socialistas tiveram que enfrentar uma infinidade de obstáculos para sua implantação e funcionamento. Como se julgavam isolados em meio as demais forças políticas foi necessário criar um gigantesco aparato de para cumprir a missão de recrutar, organizar, formar ideologicamente, divulgar e arrecadar fundos para sustentar todas essas atividades. Dessa feita, surgiu a chamada burocracia interna que tinha a incumbência de realizar esse trabalho. Outro elemento marcante dos primeiros partidos socialistas foi a sua desconfiança em relação aos limites e força de assimilação em torno da atmosfera parlamentar.
46
direção quanto a condução do processo revolucionário deveria ficar a cargo de apenas um
reduzido e altamente capacitado – política e ideologicamente – grupo de revolucionários.
Defendiam também a profissionalização de seus mais capacitados dirigentes. Em
suma, esses indivíduos deveriam ocupar-se integralmente das tarefas do partido, inclusive,
afastando-se de suas atividades profissionais. A meta era aperfeiçoar os métodos de
organização partidária. E apesar de contar com milhares de células ou bases de militantes,
para os comunistas caberia às direções superiores apresentarem a opinião final sobre todos
e quaisquer temas de interesse do coletivo partidário.
Outro modelo de partido de massa foram os partidos de orientação fascista. É
preciso salientar que um dos primeiros modelos de partido fascista surgiu na Itália.80 Sob a
direção e liderança de Benito Mussolini foi fundado em 1921 o Partido Nazionale Fascista
(PNF) que, em certos aspectos, teve sua estrutura organizacional inspirada nos dois outros
modelos de partidos de massa: o socialista e o comunista.
Entre as semelhanças podemos citar a noção de participação ativa, organizada e
respeito à hierarquia da agremiação. A forte centralização de poderes, concentrados nas
direções partidárias, foi outro ponto em comum entre as organizações, sobretudo, no
aspecto de uma orientação e direção de caráter vertical. Antes de apontarem para uma
simples similaridade de conteúdo ideológico, as semelhanças indicam que o modelo da
estrutura orgânica criada pelos segmentos da esquerda havia cumprido de forma eficaz e
eficiente suas tarefas, a ponto de se tornarem referencia para outras organizações políticas.
O Fascismo foi buscar ao comunismo a idéia de partido (...) e suas técnicas de organização: contextura rígida, forte centralização e ligações verticais. No entanto ainda que os movimentos fascistas tenham imitado os partidos da esquerda para melhor lutar contra eles, as diferenças permanecem, e muito nítidas.81
80 A primazia na criação de uma organização de caráter anticomunista, anti-semita e que utilizava táticas violentas no enfrentamento dos seus adversários surgiu na Hungria em 1919. O movimento ficou conhecido como Oficiais de Gömbös. Outras informações, consultar em: PAXTON, Robert O. A anatomia do Fascismo. São Paulo: Paz e Terra, 2007 (Tradução: Patrícia Zimbres e Paula Linhares), pg. 51. 81 SCHWARTZENBERG, Roger-Gérard. Sociologia Política. São Paulo - Rio de Janeiro: DIFEL, 1979, pg. 519.
47
Essas diferenças ficaram mais perceptíveis a medida que os partidos fascistas foram
progredindo seu nível de agressividade e intolerância.82 O enquadramento nos moldes
militares de sua militância foi outro importante instrumento empregado como mecanismo
de intimidação e auto-afirmação. A criação de milícias e uniformes fazia parte do cotidiano
dos partidos fascistas que também usavam outros aparatos que remetiam aos militares,
como: desfiles, hinos, marchas, insígnias, etc.83 Eram constantes as contramanifestações
dos seus opositores, tática que notabilizou seus militantes em virtude dos inúmeros
enfrentamentos de rua.
Longe de pretendermos enquadrar a AIB em qualquer dos modelos citados,
sobretudo no modelo fascista, a apresentação anterior teve o objetivo que aprofundar as
questões relativas a tipologia e os conceitos de partido. Dessa forma, tentando contrapor-se
à postura tradicional de partido eleitoral, os dirigentes da AIB começaram a afirmar e a
defender a idéia de que caberia aos “camisas-verdes” uma nova missão: levar um sopro de
renovação e oxigenação ao sistema partidário brasileiro. Essa situação foi causada pelo fato
de os integralistas – num primeiro momento – terem assumido uma postura plenamente
contrária às regras do jogo político vigente.
Como dissemos, é possível identificar posturas diferentes entre os integralistas entre
os anos de 1932 e 1934. Suas primeiras ações – entre os anos de 1932 e 1933 – tiveram
como marca mais notável o discurso e a postura “romântica”. Entretanto, a fase pós-1934
significou um amadurecimento da organização no sentido de que o partido passou a
defender e a justificar sua nova postura.
O saldo final do I Congresso Nacional foi que os partidários de Plínio Salgado
passaram a disputar, com os outros partidos, os pleitos sem maiores constrangimentos. Essa
mudança de atitude representou uma transformação notável na estratégia, ou melhor,
passou a significar que – finalmente – os integralistas haviam adotado uma estratégia de
poder.
Como vimos, os anos iniciais da AIB foram pontuados pela ausência de uma
definição mais nítida do caráter da organização. O próprio Manifesto de Outubro, que
82 Para garantirem seus espaços os fascistas simplesmente utilizavam dos métodos mais agressivos e violentos contra todos aqueles que foram identificados como possíveis ameaças. Quase sempre a utilização da força representou o principal “argumento” dos representantes do fascismo. 83 Op cit, pg. 520.
48
marcou o seu lançamento oficial em outubro de 1932, foi um documento caracterizado mais
pelo exercício de retórica do que por uma definição mais consistente das propostas e
objetivos da organização.
Nessa fase, que podemos chamar de “período romântico”, os integralistas ainda não
haviam formulado concretamente um projeto político. A organização carecia de uma
definição mais nítida de seu próprio perfil organizacional. Outro tema que foi tratado de
maneira extremamente superficial era a forma de chegar ao poder. Essa situação ficou
explícita no texto do Manifesto de Outubro de 1932, tendo em vista que o documento
basicamente criticava as eleições e os outros partidos políticos existentes.
O texto desse documento é um exemplo do proselitismo que marcou a primeira fase
da AIB. Nessa época os “seguidores do sigma” apresentavam um “vocabulário romântico”
sobre as questões nacionais. Seu discurso carecia de uma definição mais adensada sobre
questões chaves como forma de chegar ao poder e o caminho para construir o chamado
“Estado Integral”.
Mesmo com todas essas indefinições, a AIB iniciou sua marcha no sentido de
transformar-se em uma organização de caráter nacional e superar as limitações de seu
“período romântico”. Como observamos, essa tarefa só foi possível durante o ano de 1933 a
partir das bandeiras e caravanas que esquadrinharam todas as regiões do país.
Os jovens dirigentes se empenharam em conhecerem pessoalmente a realidade e os
problemas do Brasil. Essa aproximação com os problemas concretos da população foi
fundamental para que a organização parasse de “falar apenas para dentro” e desse início a
uma manobra que permitisse aos integralistas ampliarem seus objetivos e perspectivas
políticas. As bandeiras e caravanas também contribuíram no sentido de lançar as bases da
AIB em centenas de cidades localizadas em dezenas de estados diferentes.
Essas atividades foram fundamentais para conferir à organização uma dimensão
nacional. Ao longo dos meses, de norte a sul do país, a passagem das “bandeiras-
integralistas” suscitou conferências, fundações de núcleos municipais e estaduais da AIB.
Apesar de todas as limitações e dificuldades de transporte encontradas, o resultado final das
“bandeiras” foi a possibilidade dos dirigentes integralistas conhecerem o país, encontrarem
a população e “falarem para fora”, ou seja, para além de um grupo restrito de intelectuais.
49
Outro significativo ganho político foi a ramificação dos núcleos nos estados. Isto
ficou evidente durante a cerimônia de abertura do congresso de Vitória com a presença de
bancadas de “províncias integralistas” que representavam filiados de todos os cantos do
Brasil. A presença de delegações representando todas as regiões do país deixou evidente
que, já nos meses iniciais de 1934, a AIB contava com núcleos organizados e contatos em
todos os estados brasileiros.
Todos esses fatos servem para indicar que, diferentemente das outras organizações
que haviam surgido anteriormente, os “camisas-verdes” não ficaram apenas nas divagações
teóricas ou no proselitismo, muito pelo contrário, foram ao encontro das “massas” pelo
país. Já em seus primeiros anos de funcionamento, os integralistas procuraram desenvolver
um conjunto de atividades práticas, ou seja, apesar de não esqueceram seus pilares teóricos,
o que sustentou e possibilitou a distinção da AIB entre as outras agremiações políticas que
também foram fundadas nesse período foi a sua permanente procura em conjugar os
debates com as ações políticas concretas.
Nesse sentido, o crescimento das adesões e a ampliação dos quadros da organização
estiveram intimamente ligados a essas atividades cotidianas dos seus militantes. Tento em
vista que o Brasil experimentava um período de “euforia democrática” e redefinição das
forças partidárias – no período pós- Revolução de 1930 – a AIB teve êxitos incontestáveis
durante essa fase exatamente porque foi eficaz no sentido de atrair os setores que estiveram
quase que completamente excluídos do jogo político durante as décadas da chamada
Primeira República.
Diante desse quadro que oferecia amplas possibilidades políticas84 a AIB foi
saudada e encontrou ressonância em amplos segmentos da população.85No legue de
partidos, movimentos e organizações fundados ao longo dos primeiros anos da década de
1930, outro fator que também destacou a AIB foi a estratégia de expansão de suas
atividades através dos estados. Essa estratégia de crescimento permitiu que os integralistas
ultrapassassem a esfera de atuação do eixo Rio-São Paulo. Obviamente, esse “crescimento
84É importante destacar que nesse mesmo período surgiram inúmeras organizações políticas que pretendiam lançar as bases de um partido nacional. Como as chamadas “legiões revolucionárias” e o Clube 3 de Outubro, ambos ligados a antigos membros do movimento Tenentista. Outra iniciativa foi a criação do Partido Agrário, sob a lideranças de Góes Monteiro e João Alberto. Por fim, houve ainda a tentativa – igualmente frustrada - de organizar o Partido Socialista do Brasil. Sobre essas organizações consultar em: SOUZA, Maria do Carmo Campello. Estado e Partidos Políticos no Brasil (1930 a 1964). São Paulo: Editora Alfa-Omega, 1893. 85 Op. cit, pg. 81.
50
para fora” funcionou como estratégia para filiar, organizar e fazer propaganda entre
milhares de cidadãos e cidadãs nos estados pelos quais passaram.
Indubitavelmente, o período entre a sua fundação (1932) e as incursões feitas
durante as bandeiras (1933-1934), jogou um importante papel na legitimação e no
crescimento do movimento integralista. As “bandeiras-verdes” ofereceram para a
população uma nova alternativa política que – pelo menos durante essa fase – concentrou
suas energias na tarefa de denunciar os vícios e desvios dos chamados “políticos
profissionais” e, sobretudo, desqualificar as disputas eleitorais.
Outro elemento importante nessa primeira fase da AIB foi sua permanente
preocupação com a construção de um movimento articulado em nível nacional. Como
verificamos anteriormente, ao circularem por todas as regiões do país apresentando uma
proposta ousada e inovadora, um dos principais argumentos do discurso dos dirigentes da
AIB foi a urgência em romper com a tradição política regionalista e “estadualista”.86
Isso porque o sistema partidário existente no país entre 1889 e 1930, de um modo
geral, foi marcado por uma profunda descentralização. 87 Cada estado contava com seu
sistema eleitoral próprio, ou seja, cada unidade da federação contava com partidos estaduais
que eram controlados pelos líderes estaduais. Essas organizações se enquadram na
definição dos “partidos de quadros ou notáveis”.
Cientes dessa realidade, uma das maiores preocupações dos dirigentes da AIB foi a
sua constante preocupação em reafirmar sua diferença em relação às outras organizações
que militavam na arena política nacional.88 Como vimos, essa preocupação se justificaria
em virtude da crítica aos partidos políticos existentes durante a Primeira República.89
De certa forma, essas limitações democráticas e inconsistência do sistema partidário
do país podem ter sido uma das chaves para o crescimento da AIB durante seu período de
funcionamento legal. Sendo assim, a partir do próximo capítulo iremos apresentar o
itinerário de crescimento dos “camisas-verdes” em território fluminense.
86 Sobre as questões do regionalismo e os partidos políticos durante os anos iniciais da década de 1930, ver em: SOUZA, Maria do Carmo Campello. op cit. 87 Op cit, pg.76. 88 Op cit, pg. 77. 89 Tanto que um dos alvos preferências das críticas no período pós-Revolução de 1930 foram os representantes das antigas oligarquias, também conhecidos como “carcomidos”.
51
Porém, antes é preciso destacar que nesse primeiro capítulo a análise do quadro
geral partidário, especialmente no estado do Rio de Janeiro, permitiu concluir que, dentre as
agremiações fundadas em pleno período de “euforia democrática”, uma das poucas que
teve a capacidade de apresentar uma “nova agenda” de debates, atingiu uma abrangência
nacional e mobilizou milhares de militantes foi a AIB. Essas e outras conquistas permitiram
que o chefe nacional dos integralistas, Plínio Salgado, ampliasse seus horizontes políticos
para uma tarefa ainda mais ousada: a Presidência da República.
52
CAPÍTULO II
A OFENSIVA VERDE
2.1 O CRESCIMENTO DA AIB NO INTERIOR DO ESTADO
Na “Província Integralista fluminense”, após a fundação do núcleo na capital do
estado, os dirigentes passaram a concentrar todas as suas energias em expandir o
movimento pelo interior fluminense. Seguindo a experiência da direção nacional, foram
organizadas “bandeiras-verdes” que percorreram todas as regiões do estado. Nos
municípios mais importantes as atividades contaram com a presença do chefe nacional.
Como no caso da cidade de Campos dos Goytacazes.
Em setembro de 1933 era grande a expectativa em relação ao trem que havia
acabado de parar na estação do Saco, em Campos.90 De repente, as dezenas de pessoas do
lado de fora ergueram, quase ao mesmo tempo, os braços e gritaram a palavra Anauê.
Parado na porta de um dos vagões um homem baixo, magro, de cabelos e bigode negros –
vestindo uma camisa-verde – respondeu a saudação. Finalmente, Plínio Salgado, jornalista
e chefe nacional da AIB, pôde atender pessoalmente ao convite para realizar uma
conferência na cidade de 300 mil habitantes, mais populoso núcleo urbano do estado do Rio
de Janeiro.
Após muitos apertos de mãos, o grupo, formado em sua maioria por jovens, dirigiu-
se para o local escolhido para a realização da conferência: o Liceu de Humanidades de
Campos (LHC). Entre os ilustres visitantes também estava o escritor Gustavo Barroso. Ao
aproximarem-se do prédio do mais tradicional colégio da cidade os componentes da
caravana integralista começaram a ficar impressionados com a fachada do imponente LHC.
O palacete, construído na década de 1860, serviu de moradia para o mais rico dos barões do
açúcar: o barão da Lagoa Dourada.
90 Todas as informações apresentadas estão baseadas em relatos e nas memórias de ex-militantes da AIB, tais como: RODRIGUES, Hervé. Campos: na Taba dos Goytacazes. Niterói: Imprensa Oficial, 1988. Entrevista de Paulo Francisco Gomes, ex-militante da AIB em Campos, em entrevista publicada no jornal Folha da Manhã do dia 19/11/1996.
53
A edificação era conhecida como a mais luxuosa da região, tanto que o próprio
imperador D. Pedro II, em uma de suas quatro visitas a Campos, foi hóspede do barão. A
propriedade possui dois pavimentos com inúmeras portas e janelas. Logo na entrada do
primeiro pavimento chamam a atenção dois grandes e imponentes portões de ferro que dão
acesso às escadarias que levam para o segundo andar, os portões foram feitos e trazidos da
Inglaterra. Localizado atrás de um desses portões havia um sino que, no passado, servia
para convocar os escravos e depois era utilizado para marcar os horários do colégio.
Subindo todas as escadarias chega-se ao ponto mais alto da residência: o mirante.
Desse local era possível ter uma visão privilegiada da cidade, pois o palacete estava
localizado no ponto mais alto do centro do município. Ao descer do mirante chegava-se no
local onde ficava a sala de jantar. Esse cômodo especial do palacete está localizado no
segundo andar, do lado oposto da entrada, de frente para o salão nobre. Na sala de jantar
aconteciam os encontros e reuniões mais importantes da sociedade campista no final do
século XIX. Ali se reuniam as famílias mais ricas e abastadas da região. No passado, este
grupo era formado de outros “barões do açúcar”, deputados provinciais, ricos comerciantes
da cidade e representantes da Poder Judiciário e da Igreja Católica.
Os banquetes no palacete do barão eram oferecidos nesta ampla sala de paredes
pintadas com tinta cor de mármore e com portas de madeira, ricamente talhadas e
almofadadas. O que mais impressiona nesta sala é uma abertura do lado esquerdo, perto da
porta de entrada, que permitia a apresentação de um pequeno conjunto musical enquanto os
convidados jantavam. Este era o local perfeito para receber hóspedes ilustres, como a
Princesa Isabel, que foi a convidada de honra de um baile e hóspede do Barão na noite de
10 de Junho de 1868.
Apesar de na década de 1930 todas as dependências do antigo solar já terem sido
adaptadas91 para abrigarem as salas de aula, laboratórios e gabinetes do LHC uma parte
permanecia preservada exatamente como o barão da Lagoa Dourada havia deixado: o salão
nobre. No centro desse cômodo se destaca um imenso lustre de cristal; nas paredes existiam
espelhos de quase dois metros de altura e com molduras pintadas a ouro que devem ter
criado um efeito único entre os já deslumbrados visitantes integralistas. No teto do Salão
91 No próximo capítulo trataremos do processo de criação, instalação e funcionamento do LHC.
54
estão gravadas, também com ouro, as iniciais JM, de José Martins, nome de batismo do
barão.
A presença da caravana integralista, principalmente, de seus dois integrantes mais
conhecidos – Plínio Salgado e Gustavo Barroso – deve ter sido o motivo principal da
abertura do salão nobre, pois, uma das explicações para seu excelente estado de
preservação era que, raramente, suas dependências eram abertas ao público. Mesmo os
alunos do LHC entravam nesse espaço apenas nas suas próprias cerimônias de colação de
grau. Contudo, naquela tarde, uma platéia formada por dezenas de alunos e professores
reuniu-se para assistir a conferência do chefe integralista.
Com grande eloqüência e palavras duras contra os chamados “políticos
profissionais”, o discurso de Plínio Salgado empolgou os presentes, principalmente, os
jovens “liceístas”, como dissemos, maioria da platéia. O orador falou por volta de uma
hora, seus argumentos dirigiram-se contra os partidos políticos tradicionais, contra o
sistema político brasileiro e, sobretudo, contra a ameaça representada pelo regime
comunista da União Soviética. Ao final de sua intervenção os aplausos foram abafados pelo
som de dezenas de vozes gritando a saudação “Anauê”.
Após a conferência, os dirigentes da AIB dirigiram-se para o Hotel Gaspar
localizado na praça São Salvador, região central de Campos. Mesmo durante o restante da
tarde uma verdadeira multidão passou a acompanhar os integrantes da comitiva. Tanto que
dezenas de pessoas ficaram em frente ao hotel na expectativa de ver e ouvir Plínio Salgado,
que foi descansar e preparar sua segunda conferência na cidade, que seria realizada à noite
na sede da Associação Comercial de Campos.
Como na conferência no salão nobre do LHC, a sede da Associação Comercial
estava igualmente lotada, inclusive muitas pessoas tiveram que ficar de pé ou acomodadas
na escada. A alternativa foi o conferencista, depois de pedidos insistentes dos inúmeros
estudantes presentes, falar da sacada do prédio. Em sua fala Plínio Salgado lembrou o
passado glorioso de Campos durante o Império, falou também de campistas ilustres como
José do Patrocínio e Nilo Peçanha. Por fim, voltou a dirigir suas criticas ao sistema
político-partidário brasileiro.
Novamente no dia seguinte, ao se despedir na estação do Saco, os membros da
caravana foram saudados por dezenas de “camisas-verdes” e simpatizantes da AIB. O
55
público excepcional que compareceu às duas atividades deixou entusiasmados os militantes
integralistas de Campos. Durante as conferências, dezenas de pessoas, sobretudo
estudantes, solicitaram ingresso na organização.
A receptividade e a mobilização causadas pela presença dos dirigentes nacionais
em Campos deixaram nítido que, apesar de ainda conturbado pelos vários acontecimentos
que marcaram o período pós-Revolução de 1930, o cenário político da cidade oferecia
espaço para a AIB, pois o movimento integralista representava um sinônimo de renovação
no quadro político do país e do estado.
Depois da passagem da Caravana Integralista pela cidade, os cinco meses seguintes
foram marcados por uma série incessante de atividades do núcleo local dos integralistas,
tais como: desfiles, abertura de sua sede, conferências e filiação de novos militantes. O
núcleo campista foi o ponto de partida para a estruturação do movimento integralista em
todo o norte do estado. O nível de organização do núcleo campista dos camisas-verdes
podia ser medido, já em fevereiro de 1934, pela presença de dois elementos centrais
preconizados como fundamentais na estrutura orgânica da AIB: a milícia composta de
decúrias e pela existência de uma sede do núcleo funcionando, permanentemente, na praça
São Salvador, região central da cidade.
A milícia da AIB teve sua primeira oportunidade para realizar manobras
publicamente no final do mês de fevereiro, novamente, durante a passagem de uma
comitiva de dirigentes integralistas vindos de várias partes do país que rumavam para o I
Congresso Nacional da AIB, que se realizou na cidade de Vitória- ES. Em poucos dias
Plínio Salgado passaria duas vezes na cidade.
A primeira passagem de tal comitiva permitiu que a população da cidade tivesse a
oportunidade de acompanhar a “primeira exibição pública” da milícia integralista de
Campos.92 A milícia campista saiu da sede do núcleo e foi desfilando pelas ruas da cidade,
sob olhares curiosos, até a estação ferroviária.
Na estação formaram-se três decúrias para saudar os militantes e dirigentes
integralistas que passavam. Dentro de um contexto geral estas informações referentes à
existência de decúrias organizadas e sede funcionando podem parecer irrelevantes,
entretanto, se analisados a partir do modelo de organização estabelecido pelos protocolos e
92 Monitor Campista, pg. 1, 28/2/1934.
56
estatutos dos integralistas, estes seriam indicativos evidentes do alto nível de estruturação
da AIB em Campos, pois permitem avaliar que o núcleo de Campos estava em plena
sintonia com o modelo de estrutura organizativa da AIB.
A análise desses fatos deixa evidente que também em Campos a milícia foi um
destacado espaço de socialização do conjunto dos militantes integralistas. Um princípio
básico da organização estava na premissa de que todo militante que tivesse idade de 16 a 42
anos seria “obrigado a inscrever-se nas Forças Integralistas, optando pela categoria em que
deseja engajar-se”.93
Nesse sentido, a milícia ocupava uma posição fundamental na base da estrutura da
AIB, ou seja, era um espaço privilegiado que tinha como finalidade ocupar-se de vários
aspectos da formação de seus militantes, tais como: a cultura física, a formação moral e
atuar como divulgadora de valores cívicos. Entre 1934 e 1936, a milícia teve um caráter
francamente inspirado na hierarquia do exército como, por exemplo, o fato de que os
milicianos do sigma eram agrupados com as mesmas armas das forças armadas, ou seja,
infantaria, cavalaria, engenharia, artilharia e aviação.
A Milícia se organiza em quatro seções: a primeira seção ocupa-se da correspondência, controle da organização (estatística, efetivo, disciplina e justiça (inquéritos e promoções); a segunda seção, do serviço de informações; a terceira seção, da instrução militar e elaboração dos planos e operações militares; a quarta seção, do setor material e serviços. 94
Estas informações explicitam o perfil militar da organização, pois a milícia foi mais
do que um simples local para treinar e preparar os militantes para desfiles e paradas cívicas.
Em último grau, a finalidade da milícia integralista era desenvolver e implantar uma
verdadeira cultura, através de constantes treinamentos militares, que dariam suporte às
atividades dos “camisas-verdes”. A própria estrutura hierarquizada da AIB estava
fundamentada em uma série de categorias, escalões e postos de comando que serviam para
reproduzir e reafirmar este caráter. Basta lembrar que todo militante da organização tinha
como obrigação, até na hora da morte, estar trajando seu inconfundível uniforme verde.
Outro argumento para reforçar esta afirmação é o fato de que milícia dividia-se nas
seguintes categorias: militante de primeira linha, militante de segunda linha e juventude. As
normas aprovadas e estabelecidas nos protocolos e regulamentos da AIB também previam a
93TRINDADE, Hélgio. Integralismo: Fascismo brasileiro na década de 30. São Paulo: Difel. 1974. pg. 188. 94 Op cit, pg. 187.
57
divisão hierárquica da milícia em três escalões: os graduados (sub-decurião, decurião e
submonitor), os oficiais (monitor, bandeirante e mestre de campo), e os oficiais-generais
(brigadeiro-tenente e chefe nacional). Em 1934 a milícia integralista previa a sua sub-
divisão em várias unidades.95
Outro aspecto importante para referendar o grau de organização da AIB em Campos
era a existência de uma sede no município. Era um prédio do tipo sobrado, situada em
pleno coração da praça São Salvador, ao lado do Hotel Gaspar, próximo a avenida Beira
Rio e a rua Alberto Torres. No seu primeiro andar existia um amplo salão que servia de
espaço para as conferências e reuniões semanais da militância, sempre às quintas-feiras e
aos domingos.
Centenas de cadeiras ocupavam toda a área do salão. Nas atividades mais
concorridas as “blusas-verdes” e os plinianos96 tinham o privilégio de ficarem sentados e o
restante dos “camisas-verdes” se colocavam de pé nas laterais e parte de trás. Após subir
uma escada era possível chegar até a parte de cima da sede. Depois de atravessar um
corredor que dava para um terreno baldio que ficava nos fundos, chegava-se na área
reservada para as salas da direção e do chefe municipal. Na fachada da sede existia uma
placa identificando o local e duas bandeiras, uma do Brasil e outra da AIB, que ficavam
permanentemente hasteadas.
Para os integralistas a função de suas sedes era bem mais ampla que representar
apenas um mero local para encontros e reuniões. Sua finalidade era quase sacra, pois em
torno deste espaço eram realizados rituais e cerimônias de extrema importância. Segundo
os estatutos da AIB, a cerimônia em que o novo militante realizava seu juramento de
fidelidade antes de ser aceito como membro efetivo da organização deveria ser realizada
exatamente em frente à sede do núcleo local.
Igualmente, o espaço interno de todas as sedes da AIB pelo país deveria estar em
consonância com os protocolos estabelecidos. A preocupação em padronizar e uniformizar
o conjunto das sedes integralistas em todas as regiões do país era um reflexo que marcava a
unificação e a centralização que foram implantadas pelos “camisas-verdes”. Os estatutos
integralistas se ocupavam em estabelecer as regras que deveriam ser seguidas fielmente em
95 Idem. 96 Blusas-verdes eram as militantes do sexo feminino e Plinianos era os jovens entre 4 e 16 que atuavam na AIB. Em outra parte do capítulo iremos retornar a discussão sobre os plinianos.
58
qualquer local que passasse a ser utilizado como sede do núcleo da AIB. A preocupação em
formular regras de conduta para as sedes era extremamente semelhante com as ordens
estabelecidas sobre os uniformes dos militantes.
na sala principal é obrigatória a presença de um retrato do Chefe Nacional, colocada entre a bandeira integralista e a bandeira nacional, cruzadas; um mapa do Brasil sobre o qual e desenhado um sigma em preto, uma mesa longa, para que os dirigentes possam assistir as sessões, e disposta de tal forma que o retrato do Chefe lance seu olhar sobre a reunião.97
A análise de uma fotografia de uma conferência realizada na sede do núcleo
municipal de Campos nos fornece importantes indícios de como, na prática, as
determinações da direção nacional da AIB eram levadas a cabo. Assim, esta fotografia
reflete como as normas da direção nacional da AIB chegavam até os núcleos locais e eram
efetivamente executadas de maneira fiel pelos militantes e dirigentes regionais. Na imagem
podemos detectar todos os elementos indicados como fundamentais pelo estatuto e
protocolos da AIB.
Sede do núcleo campista da AIB.
Na sala central do núcleo campista, seguindo as orientações centrais, as bandeiras
do sigma e do Brasil estavam entrelaças e tendo ao centro um retrato do chefe nacional. O
crucifixo é outro elemento que ocupava um lugar especial na sede dos camisas-verdes
97 Idem, pg. 198.
59
campistas. Até mesmo a disposição das mobílias era seguida à risca pelos integralistas
locais, ou seja, uma imensa mesa ocupava um lugar de destaque no auditório do primeiro
piso da sede. Da mesma maneira, os mapas e cartazes com símbolos e palavras de ordem do
movimento também podem ser detectados espalhados pelas paredes da sede. Também
despertam maior atenção os dizeres localizados exatamente sobre as bandeiras e o
crucifixo.
Sobre este slogan, há uma diferença significativa em relação aos protocolos oficias
da AIB que estabeleciam que a frase escrita nas paredes deveria ser: “O Integralista é o
soldado de Deus e da Pátria, homem novo do Brasil que vai construir uma grande Nação”.
Contudo, na sede do núcleo campista os dizeres eram “Crêr, obedecer e perseverar” em
uma nítida referência às palavras de ordem utilizadas pelos fascistas, tais como a frase:
Obbedite perchê dovete obbedire.98
Dentro do ponto de vista simbólico a construção de uma série de signos no interior
das sedes da AIB tinha como objetivo reafirmar os pontos centrais da doutrina integralista.
A presença das bandeiras, dos cartazes e das palavras de ordem eram peças secundárias no
palco das representações políticas dos camisas-verdes. Contudo, o elemento que se
destacava no cenário simbólico da sede do núcleo campista era: o retrato do chefe nacional
e o crucifixo.99
Para os “camisas-verdes” a figura do chefe nacional era a viga mestra que
sustentava todo o movimento. A obediência e a submissão à figura do chefe se tornaram
mais acentuadas a partir do I Congresso Integralista de Vitória, que reafirmou que a
hierarquia seria um elemento insubstituível para a existência da AIB. Conforme
salientavam os estatutos, o personagem central da organização passou a ser o chefe
nacional. Como salientamos, foi exatamente neste evento que Plínio Salgado foi aclamado
líder supremo dos “soldados de Deus”.
Foi a partir da análise destas características da AIB, ou seja, da utilização de
uniformes, das milícias e da estrutura altamente hierarquizada e, principalmente, da
observação da posição da figura do chefe nacional como elemento central dos camisas-
verdes, que se tornou possível identificar as maiores similaridades entre os integralistas
98 “Obedeça porque você deve obedecer”. 99 Em outro capítulo trataremos das relações entre a AIB e parte do laicato católico.
60
brasileiros e o modelo de Estado elaborado e implementado pelos movimentos fascistas que
chegaram ao poder na Europa.
O tipo de estrutura organizativa do integralismo é outra característica importante para definir a natureza do movimento. Não se pode dissociar, num movimento fascista, a ideologia e a organização porque existe uma relação explícita entre estrutura desta e conteúdo da outra. Geralmente as organizações políticas autoritárias se estruturam hierarquicamente com o objetivo de enquadrar eficazmente seus militantes.100
Dessa forma, no topo da estrutura da AIB estava a figura do chefe nacional. Para o
conjunto dos militantes, Plínio Salgado passou a assumir uma posição especial e única.
Assim, todas as atividades passaram a orbitar em trono do seu chefe como elemento
unificador desta corrente política. Esta passou a ser uma característica basilar dos ”camisas-
verdes” brasileiros, demarcando seu perfil organizativo. Assim, o culto à personalidade, a
divinização do líder e a noção de inefabilidade do chefe nacional se constituíram nos traços
mais marcantes do integralismo.
O papel de relevo assumido na qualidade de chefe nacional permitia que Plínio
Salgado não apenas gozasse do poder de opinar sobre todas as questões ligadas a AIB,
como também garantia que ele seria o elemento que deveria dar a palavra final em qualquer
situação de impasse ou divergência. O estatuto aprovado no congresso de 1934 definiu que
a sede nacional do movimento estaria onde estivesse o chefe, ou seja, para os “camisas-
verdes” a primazia do seu chefe era incontestável e indiscutível, bem como não caberia
qualquer tipo de recurso ou apelo em relação às suas ordens e decisões.
O posto de chefe era perpétuo e sua figura era considerada onipresente e, por mais
incrível que possa parecer, intangível. A imprensa e as publicações integralistas tinham a
missão de reforçar essa posição de Plínio Salgado, apresentando sua imagem carregada de
signos religiosos ou nacionalistas.101 A presença de um retrato do chefe nacional na sede do
núcleo de Campos apenas ratifica essa prática dirigida obviamente para incutir entre os
militantes do sigma a imagem de Plínio Salgado como único e grande condutor dos
integralistas rumo ao “Estado Integral”.
100 Idem, pg. 169. 101 Sobre a simbologia integralista, ver em: SILVA, Rogério Souza. A política como espetáculo: a reinvenção da história brasileira e a consolidação dos discursos e das imagens integralistas na revista Anauê. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 25, nº 50, p. 61-95 – 2005.
61
No âmbito material essa prática era referendada pelos juramentos e saudações
durante as manifestações de rua dos integralistas. O caso da cerimônia de ingresso no
movimento é um exemplo típico, ou seja, todos os integralistas deveriam, antes de serem
aceitos nas fileiras do sigma, jurar obediência ao chefe nacional como mecanismo de
valorização da fidelidade. Nas manifestações públicas, conferências, bandeiras, enfim em
todos os eventos realizados, a única figura digna da saudação com três “anauês”, salvo em
momentos extraordinários, era o chefe nacional.
Se a concentração de poderes e atribuições levou Plínio Salgado a ocupar uma
posição de distinção como "comandante em chefe" dos integralistas toda essa série de
rituais e cerimônias contribuiu para criar a noção idealizada entre os seus seguidores e
acabou construindo uma imagem do chefe dissociada da realidade. Essa ação era
constantemente colocada em funcionamento em todas as ocasiões que Plínio Salgado
realizava suas “visitas” aos núcleos regionais e locais da AIB.
Um desses episódios aconteceu durante a realização da segunda conferência do
chefe nacional na cidade de Campos, em março de 1934, exatamente após o I Congresso
Nacional da AIB. Ainda em fevereiro de 1934, a comitiva do chefe nacional passou uma
primeira vez, rapidamente, pela cidade.
Assim, apesar da forte chuva, dezenas de pessoas com uniformes da AIB, na
maioria jovens, esperavam, disciplinadamente formados em decúrias, na plataforma da
estação o trem que vinha do Distrito Federal. O capitão Ernesto Martins, chefe da milícia
campista, passava em revista as três “colunas verdes” conferindo todos os detalhes e
repassava as informações para os membros do triunvirato municipal, formado pelos
dirigentes: Romeu Silva, Raul Landim e Cristóvão Devoto.
Finalmente, depois que todos os vagões pararam, um vibrante triplo “anauê” cortou
o silêncio da noite.102 A caravana integralista trazia os principais dirigentes da AIB que
rumavam para Vitória, sede do I Congresso Nacional dos integralistas. No trem estavam
Plínio Salgado, Jeovah Mota, Miguel Reale e uma centena de dirigentes e militantes dos
estados do sul do país. O chefe nacional cumprimentou cada um dos dirigentes locais e
chamou a atenção para a disciplina das “decúrias formadas”. Entre seus comentários,
102 Informações baseadas em matéria publicada no jornal Monitor Campista, pg. 1, 28/2/1934.
62
parabenizou o núcleo local pelo impressionante crescimento da organização em relação a
sua visita anterior.
Num movimento rápido e preciso, as decúrias se posicionaram e iniciaram, numa só
voz, as primeiras estrofes do hino nacional. Antes de despedir-se Plínio Salgado foi cercado
pelos dirigentes municipais e comprometeu-se a realizar, em poucos quando regressasse da
capital capixaba, uma nova conferência na cidade. Na partida do trem, mesmo debaixo da
chuva que insistia em cair, os integralistas presentes permaneceram com os braços
estendidos em saudação.
Como havia prometido, após o encerramento dos trabalhos do I Congresso
Nacional, Plínio Salgado voltou para reencontrar-se com os “camisas-verdes” fluminenses.
Foi na sede municipal que se concentraram as agitações que marcaram os preparativos do
núcleo integralista de Campos para a prometida e aguardada segunda conferência do chefe
nacional. Entre outras providências, reservou-se o espaço mais destacado da cidade para
servir de palco para recepcionar Plínio Salgado: o Teatro Trianon.
A preferência dos integralistas por espaços públicos privilegiados também foi uma
das características do movimento. É importante destacar que foi no teatro municipal da
cidade de São Paulo a reunião solene que marcou a leitura do manifesto de fundação da
organização. Durante seu I Congresso Nacional, na capital capixaba, as sessões de abertura
e encerramento ocorreram nas dependências do tradicional teatro Carlos Gomes. Em
dezenas de outras cidades pelo país os militantes da AIB tinham o hábito de realizarem suas
concentrações nesses mesmos tipos de espaços.
Apesar de pregar um discurso antiliberal e de oposição às oligarquias estaduais, a
AIB não se sentia desconfortável em ocupar os mesmo espaços que eram nitidamente
identificados com esses segmentos sociais. Em Campos eles repetiram essa mesma prática,
pois historicamente o Teatro Trianon foi um local extremamente requintado. Para marcar
esse evento ímpar os integralistas campistas também tiveram o cuidado de publicar um
convite no mais antigo jornal do município.
Convite - Convidamos os estudantes, os operários, os homens do comércio, da indústria, da lavoura, os magistrados, os funcionários públicos, os trabalhadores em geral e a todos os bons brasileiros para assistirem a conferência do Chefe Nacional, Plínio Salgado, terça-feira as 14:00h no Teatro Trianon. Aviso, os camarotes serão reservados exclusivamente às senhoras e às senhoritas sem distinção de classes. 103
103 Monitor Campista, pg. 1, 2/3/1934.
63
Na noite do dia 2 de Março de 1934, desembarcou na estação ferroviária de Campos
a comitiva dos dirigentes integralistas que retornava de Vitória. Novamente, mais de uma
centena de “camisas-verdes” locais esperavam a chegada do trem. Um grande número de
curiosos também se aglomerou na estação para observar os desfiles e o canto do hino
nacional. Os integralistas quebraram a rotina da noite e seguiram marchando pelas
principais ruas até chegarem à sede do núcleo.
Atendendo aos insistentes pedidos, Plínio Salgado acabou realizando uma breve
saudação da sacada do segundo andar da sede da AIB. Quase no final do discurso do líder
integralista algo inesperado aconteceu: do meio da multidão partiram gritos de “viva a
União Soviética e viva ao Socialismo”, no primeiro momento todos ficaram em profundo
silêncio, contudo, no instante seguinte os membros da milícia, armados com cassetetes,
começaram a distribuir pancadas em alguns elementos. A multidão rapidamente dissipou-se
pelas ruas centrais e os dirigentes puderam recolher-se no hotel.
No dia seguinte foram espalhados panfletos da Juventude Comunista (JC) que
atacavam os integralistas e seu chefe nacional. Em todos os locais os comentários giravam
em torno do conflito da praça São Salvador e da conferência no Trianon. Com a
aproximação do horário marcado para o início da conferência, a tensão foi aumentando.
Pouco antes das 14 h ocorreram novos incidentes em frente a sede da AIB. Com gritos,
vaias e “bombas chilenas”. Elementos “chefiados pelos comunistas” tentaram impedir o
início do desfile dos milicianos integralistas.
Os cassetetes dos “camisas-verdes” voltaram a funcionar até o momento em que a
Força Pública entrou em ação e conseguiu dispersar a multidão que se encontrava no local.
Esse segundo conflito teve como saldo três pessoas feridas com cortes na cabeça e mais
algumas detidas pela polícia, porém, nenhuma era da AIB. Temendo novos enfrentamentos
a polícia fez um cerco em torno do Trianon com carros e com o reforço da guarda
municipal, sendo deslocados homens para ocuparem pontos estratégicos do centro da
cidade. Todos que circulavam pelas imediações do teatro eram revistados, até mesmo a
cavalaria ficou de prontidão na rua do Conselho.
Porém, nem mesmo a violência dos conflitos e a resposta da polícia intimidaram e
afastaram a população campista do grande acontecimento político daquele dia. As
64
dependências do Trianon ficaram completamente tomadas por homens, mulheres e jovens,
inclusive muitas jovens vestindo blusas-verdes chamavam a atenção. Depois dos discursos
de chefes municipais e dirigentes nacionais a palavra passou a ser de Plínio Salgado. Em
vários momentos durante sua fala o orador foi interrompido pelas palmas da platéia.
No final da conferência a milícia entrou em forma e marchou novamente em direção
à sede, porém, dessa vez não foram registrados incidentes. Antes de entrar no hotel Gaspar,
atendendo a inúmeros pedidos, Plínio Salgado fez um novo discurso para a multidão que
acompanhou o desfile dos “camisas-verdes”. Antes de recolher-se o chefe nacional
entregou uma camisa-verde nova para um militante que teve seu uniforme arrancado pelos
“comunistas”. A polícia, durante todo o tempo, escoltou os integralistas.
Essa conferência integralista em Campos pode ser apontada como um dos eventos
que marcaram o início de um ciclo de crescimento da AIB em toda a região. Os impactos e
reflexos da visita de Plínio Salgado na cidade foram materializados nos meses seguintes
através da criação de inúmeros núcleos municipais e distritais nas cidades fluminenses.
O crescimento do movimento integralista nesse período também serviu para
aumentar os antagonismos entre integralistas e os antintegralistas. Os incidentes verificados
durante a presença da caravana da AIB foram apenas uma amostra dos muitos embates e
conflitos que passariam a ocorrer entre essas duas forças políticas. Infelizmente, esses
enfrentamentos posteriores assumiram caráter e dimensões muito mais violentos.
Outro evento chave que representou um marco no crescimento e ampliação do
circuito político da AIB foi uma parada operária ocorrida no dia 1º de maio. No caso
específico dos “camisas-verdes”, o desdobramento desse episódio deixou marcas
extremamente profundas na vida política da cidade. Portanto, a conferência de Plínio
Salgado, somada às manifestações de desagravo à bandeira nacional – ocorridas depois das
manifestações do Dia do Trabalhador – teve um resultado que propiciou os espaços
privilegiados para que os integralistas emergissem como uma grande força política e
ampliassem o número de adesões e núcleos nos municípios. Mas, quais os detalhes do 1º de
maio de 1934? Que acontecimento marcou essa data em Campos? O que se seguiu após a
parada dos operários?
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2.2 OS INCIDENTES DE 1º DE MAIO DE 1934
Após os problemas verificados na visita de Plínio Salgado, o núcleo integralista da
cidade continuou sua rotina de reuniões semanais nas noites de quinta-feira em sua sede. A
partir da segunda quinzena daquele mês a cidade começou a ser movimentada novamente,
agora pelo anúncio da realização de um comício para marcar a passagem do Dia do
Trabalhador.
Os “camisas-verdes” de Campos, ainda se recuperavam dos primeiros atritos com as
forças antintegralistas, quando foi anunciado, através do jornal Monitor Campista, que
militantes do movimento sindical da região estavam se mobilizando para realizarem uma
“grandiosa parada operária” para comemorar o dia 1º de Maio.104
O manifesto-convocação para o ato dos trabalhadores continha uma série de
reivindicações, entre elas o aumento de 50% nos salários em geral, jornada de 8 horas de
trabalho, pagamento de 50% sobre horas extras, pagamento em dinheiro nas usinas,
abolição do cartão de vales e lei de férias. Tal comunicado foi assinado por duas entidades:
o Comitê pró-1º de Maio e pela Federação Sindical Regional do Rio de Janeiro (FSRR).105
O Comitê pró-1º de Maio, grupo intersindical, era formado pelos seguintes
sindicatos, ligas e associações e seus representantes: Liga dos Padeiros (Timóteo Barbosa),
Sindicatos dos Pedreiros e Calceteiros (João Bento Leite), Sindicato dos Alfaiates (Amaro
Soares), Sindicato dos Gráficos (Duvitiliano Ramos), Sindicato dos Metalúrgicos (Rafael
Manhães), Sindicato dos Tecelões (José Alves) e Sindicato dos Trabalhadores das Usinas
de Açúcar (João Tavares).
A segunda signatária da convocação foi a Federação Sindical Regional do Rio de
Janeiro (FSRR), entidade que representava dezenas de sindicatos, associações e ligas de
trabalhadores. Uma análise mais aprofundada da convocação e, principalmente, de seus
signatários traz a tona algumas informações vitais que apontam diretamente para a atuação,
naquele período, de outra importante força política no estado: o Partido Comunista do
Brasil (PCB).
104 Monitor Campista, pg. 12, 17/04/1934. 105 A FSRR era uma entidade orientada politicamente e dirigida pelos militantes comunistas. Inúmeros dirigentes do partido ocuparam cargos em sua direção como, por exemplo, Minervino de Oliviera que ocupou o posto de secretário-geral da FSRR em 1929.
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A trajetória do PC do Brasil iniciou-se em 1922. Influenciados pela experiência da
Revolução Russa de 1917, um pequeno grupo de militantes reuniu-se em Niterói, nos dias
25, 26 e 27 de março, e fundaram o Partido Comunista do Brasil (PCB). Os 9 militantes106
presentes representavam várias organizações de caráter comunista das cidades de São
Paulo, Recife, Porto Alegre, Niterói, Cruzeiro (SP) e do Distrito Federal. Podemos citar a
“União Maximalista de Porto Alegre” dirigida por Abílio Nequete e o Grupo Comunista de
Recife sob a liderança de Cristiano Cordeiro.
Outra organização que participou das discussões preparatórias e dos trabalhos do
congresso de fundação do PCB foi o Grupo Comunista do Rio de Janeiro, que editava a
revista Movimento Communista importante instrumento para divulgação e mobilização dos
grupos comunistas do país. Dirigida pelo jornalista Astrogildo Pereira, a revista em seu
primeiro número em janeiro de 1922, conclamava a unidade do proletariado em torno das
idéias comunistas, deixando explícitas suas finalidades, “trilhamos o bom caminho e
cônscios de nossas responsabilidades, afirmamos nossa fé inquebrantável no triunfo final
do comunismo”.107
O PCB teve como principais desafios em seus primeiros anos de existência os
embates com os militantes anarquistas108 e as perseguições do governo do presidente Arthur
Bernardes que, praticamente durante seus quatro anos de mandato, governou um país em
permanente Estado de Sítio.109 Assim, ao longo da década de 1920, apesar de toda a
insipiência do movimento sindical, das disputas teóricas com os anarquistas e da repressão
do governo,110 o PCB conseguiu estabelecer núcleos organizados em várias cidades do país,
principalmente nos maiores centros urbanos.
Mesmo com todos os problemas enfrentados os comunistas brasileiros conseguiram
realizar seu II Congresso Nacional, em maio de 1925, novamente na cidade de Niterói.
106 Os delegados presentes na fundação do partido eram: Astrogildo Pereira (RJ), José Elias da Silva (RJ), Cristiano Cordeiro (PE), João da Costa Pimenta (SP), Joaquim Barbosa (DF), Luis Peres (DF), Hermogênio Silva (SP), Abílio Nequete (RS) e Manuel Cendon, Para maiores informações sobre a fundação do PCB ver em : DULLES, John W. F. Anarquistas e comunistas no Brasil – 1900 -1935. RJ: Nova Fronteira, 1977. 107 Revista Movimento Communista, I, janeiro de 1922. Apud: PEREIRA, Astrogildo. Construindo o PCB (1922-1924). (ORG). ZAIDAN, Michel. São Paulo :Livraria Editora Ciências Sociais, 1980, pg. 17. 108 A cisão entre anarquistas e comunistas chegou ao extremo das organizações criarem dois sindicatos rivais e de federações de trabalhadores da mesma categoria. DULLES, op cit, pg.152.. 109 Como conseqüência das restrições das liberdades democráticas, após sua fundação o PCB teve apenas três meses de funcionamento legal. 110 Em 1925 foi lançado o órgão informativo oficial A Classe Operária, que depois de apenas dez edições foi fechado pelo governo. A Classe Operária só retornou sua periodicidade pública em 1 de maio de 1928.
67
Nesse fórum partidário foram aprovadas resoluções políticas que apontavam para a
necessidade da intensificação dos trabalhos de organização e mobilização entre o
operariado.
No campo político o partido avaliava que depois dos dois primeiros levantes
tenentistas de 1922 e 1924, o clima de instabilidade e disputas havia estabelecido uma
divisão entre as elites do país que apontava para uma encruzilhada sobre o modelo de
desenvolvimento nacional: em uma direção os defensores do “industrialismo” – apoiados
pelo imperialismo dos EUA – e na outra direção os adeptos do “agrarismo” – apoiado pelo
imperialismo inglês. A contradição sobre a chamada “concepção dualista” da sociedade
brasileira, tese defendida e elaborada pelo intelectual Otávio Brandão, apontava para uma
“terceira revolta” que deveria contar com o PCB pronto para conduzi-la.111
Contudo, com o fim do governo de Arthur Bernardes veio também a suspensão do
Estado de Sítio. Isso possibilitou que, a partir de 1927, o PCB pudesse ter uma atuação
mais aberta e passasse a realizar, por exemplo, panfletagens e comícios com uma relativa
liberdade.112 Entretanto, após algum tempo a relativa liberdade dos comunistas sofreu um
duro golpe: foi apresentado o projeto Aníbal Toledo que, apesar dos protestos e várias
manifestações contrárias, contou com ampla maioria no Congresso Nacional e acabou
sendo aprovado em agosto daquele mesmo ano.113
Também conhecida como “Lei Celerada”, a nova legislação repressora previa a
ilegalidade dos partidos de oposição, prisões de dirigentes, expulsão de estrangeiros,
proibição de greves, de manifestações de trabalhadores, assim como o fechamento de
sindicatos e de organizações e entidades classistas. Novamente considerado ilegal, o PCB
precisou buscar alternativas para ampliar seus espaços políticos. Foi nesse contexto que os
dirigentes comunistas intensificaram a experiência da frente de massas, chamada de Bloco
Operário. Assim, surgiram em todo país os núcleos do Bloco Operário Camponês (BOC).
Foi exatamente nessa época que começaram as primeiras atividades do PCB no Rio
de Janeiro. As cidades de Niterói e Campos foram os dois mais importantes centros de
atuação comunista do estado. Tudo indica que o partido começou a atuar no município em
111 DULLES, op cit, pg. 225. 112 Nesse período o jornal A Nação passou a ser o órgão oficial do PCB, com direito a estampar em sua primeira página a foice e o martelo e a palavra de ordem do Manifesto Comunista: “Proletários de todos os países uni-vos”. 113 CARONE, Edgard. A República Velha. Evolução Política. 3º ed. Rio de Janeiro: Difel, 1977, pg. 406.
68
1926, mais especificamente na direção da greve dos condutores de veículos. No ano
seguinte, representantes dos trabalhadores gráficos de Campos participaram em Niterói da
fundação da Federação dos Trabalhadores Gráficos do Brasil.114
Com o intuito de ampliar e estreitar a ligação com as “massas”, os comunistas
começaram a participar dos encontros, cerimônias e palestras do Centro Político Proletário
(CPP).115 Essa organização funcionava nas duas cidades e tinha como finalidade congregar
as classes trabalhadoras, sendo que em Campos sua sede ficava na rua do Propósito, nº
94.116 Em 14 de julho de 1928, data comemorativa da Queda da Bastilha, a sede do CPP
ficou completamente lotada para as comemorações da data da Revolução Francesa, o
orador principal foi o jornalista Ulisses Martins.
A partir da militância dos comunistas no movimento social, as lutas políticas dos
trabalhadores da cidade tornaram-se mais intensas. Tanto que em várias ocasiões foram
deslocados dirigentes do Comitê Central (CC) do PCB para visitarem e atuarem em
Campos. Um exemplo desse fato ocorreu em março de 1929 quando Otávio Brandão,
dirigente do CC e recém eleito para o cargo de intendente do Conselheiro Municipal do DF,
visitou a cidade.117
Entre outras atividades, Brandão visitou durante o dia a garagem da Estrada de
Ferro Leopoldina e vários outros locais de concentração de operários com o objetivo de
divulgar a realização, naquela noite, de uma conferência no Cine Coliseu. O grande público
presente no ato foi uma demonstração do prestígio que o partido já havia conseguido
conquistar, pois, o cinema ficou repleto de trabalhadores da construção civil, de gráficos,
padeiros, ferroviários e inúmeros simpatizantes. O objetivo de Otávio Brandão era criar em
Campos um núcleo do BOC.
114 A Federação dos Trabalhadores Gráficos do Brasil foi fundada a partir de articulações da União de Trabalhadores Gráficos do RJ e com apoio dos gráficos de SP. Toda a discussão contou com a participação da Federação Sindical Regional do RJ, entidade criada e dirigida sob orientação do PCB. DULLES, 1977. pg. 241, 115 FERREIRA, op cit, pg. 286. 116 As informações sobre a trajetória do PCB em Campos tem como base as obras dos seguintes memorialistas: GOMES. Delso. História do Partido Comunista em Campos: Memórias de um partido revolucionário. Campos: Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima, s/d. FERREIRA, Avelino. Faria tudo outra vez. Campos: s/e, 1995. PENHA, Evaristo. Nina Arueira: resgate de uma memória. Campos: Folha Carioca Editora, 1985. SILVA, Osório Peixoto. 500 anos de Campos dos Goytacazes. Campos: Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima, 2004. 117 O cargo de Intendente do Conselho Municipal cumpria funções semelhantes as dos vereadores nas câmaras municipais..
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Também no mesmo mês esteve na cidade Minervino de Oliveira, outro intendente
eleito pelo BOC no DF e importante dirigente do partido. Veterano militante, recrutado a
partir de sua participação nas greves operárias da década de 1910, Minervino era
marmorista e havia entrado para o PCB em seus primeiros anos de fundação.
Colaborador do jornal A Classe Operária, foi lançado como candidato à Presidência
da República pelo BOC nas eleições de 1929. Na cidade cumpriu uma extensa agenda de
atividades junto às concentrações de trabalhadores, pois o objetivo de sua passagem pela
cidade foi divulgar a realização do V Congresso Operário Nacional e incentivar o
lançamento do comitê Pró-Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGT).118
Ainda durante esse mesmo ano o secretário-geral do partido, Astrogildo Pereira, um
dos membros fundadores do PCB, realizou outro ato político no Cine Coliseu. Nesse evento
o BOC recebeu inúmeras filiações de intelectuais, estudantes e trabalhadores de várias
categorias profissionais. Astrogildo Pereira visitou ainda a Fábrica de Tecidos, a Usina de
Queimados e a garagem da Estrada de Ferro Leopoldina. Em todos os locais as idéias e as
propostas do dirigente empolgaram os presentes.
Os reflexos das visitas dos dirigentes comunistas na cidade foram sentidos ao longo
dos anos iniciais da década de 1930. Entre 1929 e 1932 o PCB estruturou seu comitê
municipal e seus militantes contribuíram para a organização de diversas entidades, como: o
Comitê Antiguerreiro, na fundação e direção do Sindicato dos Trabalhadores da Construção
Civil, na criação do BOC, no início das atividades da Juventude Comunista e no
lançamento de uma seção do Socorro Vermelho em Campos.119
Nesse período o dirigente comunista de Campos mais ativo e destacado foi
Duvitiliano Ramos, conhecido também como “Freitas”.120 Gráfico, intelectual autodidata e
dirigente sindical, Duvitiliano Ramos concorreu pelo BOC nas eleições de 1930 a uma vaga
na Câmara dos Deputados, contudo, não obtendo êxito.121 Em 1932, auge da fase partidária
conhecida como “obreirismo”,122 numa demonstração da posição de destaque do dirigente e
118 GOMES, Décio, op cit, pg. 19. 119 Ver, sobre propósitos e finalidades da Juventude Comunista e do Socorro Vermelho. DULLES, op cit. 120 Como forma de preservaram suas identidades das perseguições dos órgãos de regressão do governo os militantes comunistas, por questão de segurança, adotavam nomes de guerra. 121 Ver, a propósito: PESSANHA, Elina Gonçalves da Fonte e NASCIMENTO, Regina Helena Malta (ORG). Partido Comunista Brasileiro – Caminhos da Revolução (1929 – 1935). AMORJ, IFCS, UFRJ, 1995, pg. 79. 122 No próximo capítulo iremos apresentar as principais características da fase do PCB conhecida como obreirismo, bolchevização ou proletarização.
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do PCB de Campos, Duvitiliano Ramos chegou ao posto mais importante da hierarquia do
partido: foi escolhido como Secretário-geral do Comitê Central do PCB.123
Em 1933 ocorreram eleições para a Assembléia Constituinte. A princípio o PCB
tentou garantir o registro legal junto ao Tribunal Eleitoral, porém, não obtendo êxito,
fazendo com que passasse a defender alianças políticas “apenas pela base”124 e, com essa
postura estreita e sectária, acabou refutando todas as possibilidades de coligações com
outras forças do campo da esquerda. Essa postura intransigente levou os comunistas a
disputarem o pleito isolados na União Operária Camponesa.
Sem considerarmos essa fracassada experiência eleitoral, o período entre 1933-1934
foi prodigioso no aspecto da organização dos comunistas em Campos. Ocorreram diversas
manifestações dirigidas por militantes do PCB, como os protestos dos ferroviários na
garagem da Leopoldina, a greves dos padeiros e a fundação do Sindicato dos Estudantes.
Liderado pelos acadêmicos Clovis Tavares (Faculdade de Direito), Adão Pereira Nunes
(Faculdade de Medicina) e Nina Arueira (jornalista), o Sindicato dos Estudantes atuou em
várias frentes, inclusive, contribuiu para a fundação do Sindicato dos Trabalhadores em
Usinas de Açúcar.
A apresentação do histórico do movimento comunista na cidade teve como
finalidade fornecer informações indispensáveis para compreensão dos eventos que
marcaram a comemoração do Dia do Trabalhador, pois podemos ver com mais nitidez qual
a ligação dos militantes comunistas nas entidades que estavam organizando e convocando a
manifestação de 1º de maio de 1934.
Obviamente, todos na cidade tinham conhecimento da tendência política dos
principais atores envolvidos nos preparativos da “parada operária”. As pessoas que estavam
à frente da organização da comemoração programada tinham notoriamente ligações com o
PCB. Alguns exemplos são Duvitiliano Ramos que foi candidato a deputado federal pelo
BOC – braço eleitoral legal dos comunistas – e Nina Arueira125 escrevia artigos nos jornais
da cidade defendendo as teses do partido, como a mobilização antiguerreira e o fim das
guerras imperialistas.
123 Duvitiliano Ramos assumiu o posto em maio e ficou no cargo até o final do ano de 1932. DULLES, op cit, pg. 403. 124 No próximo capítulo retomaremos discussão sobre a tática do PCB durante esse período. 125 Sobre Nina Arueira, ver: CARNEIRO, Juliana. O despertar de Nina Arueira: da disputa da memória à construção do mito. Campos dos Goytacazes: Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima, 2003.
71
Já Clovis Tavares, enquanto dirigente do Sindicato dos Estudantes, também
reproduzia as propostas do PCB através de uma revista cultural chamada A Rede. Lançada
em agosto de 1932, a publicação “estudantina” publicava artigos de diversos colaboradores
sobre vários temas. Seu quinto número, em dezembro de 1932, trouxe uma carta do José
Ferreira Landim,126 colaborador e assinante da revista, lamentando “o torto caminho que a
tolice ou a má fé lhe acabam de indicar”.127 O professor Landim protestava conta a
publicações de charges sobre Jesus Cristo no último número de A Rede.
Assim, inegavelmente, era evidente para todos, enfim, a polícia, os integralistas, os
usineiros, os diretores da Associação Comercial e os jornais que a força política que
articulava a manifestação do 1º de maio era o PCB.
Retornando aos “camisas-verdes” campistas, não podemos esquecer que a menos de
dois meses, durante a última passagem de Plínio Salgado pela cidade, eles tiveram que
enfrentar manifestações anti-integralistas na praça São Salvador e em frente do Trianon.
Como se vê, os militantes da AIB tinham motivos de sobra para estarem atentos aos
preparativos da “parada operária”.128 Assim, feitos os esclarecimentos dessas questões,
tratemos dos acontecimentos e desdobramentos do 1º de maio de 1934.
Logo cedo a cidade foi tomada por caravanas de trabalhadores que chegavam de
trem, a pé, de bicicleta ou de bonde para participarem dos atos programados. Dos diversos
bairros da cidade partiam comitivas. Também marcaram presença comitivas de
trabalhadores das usinas de açúcar de Cupim, Santo Antonio, Queimado, São José e outras.
A praça Nilo Peçanha (atual jardim São Benedito), serviu de ponto de concentração para os
trabalhadores de vários sindicatos e para os militantes da JC que traziam bandeiras
vermelhas e um grande retrato de Lênin com a seguinte inscrição: “Pai do proletariado
Universal”.
Mesmo antes da saída da comitiva em direção do centro começaram as primeiras
provocações e os tumultos. Militantes da JC e do Comitê Antiguerreiro propuserem que
apenas bandeiras vermelhas, que representavam o internacionalismo da luta dos
trabalhadores contra a opressão e as guerras, deveriam acompanhar a passeata. Depois de
126 José Ferreira Landim foi um dos mais destacados dirigentes da AIB na região. No segundo capítulo voltaremos a tratar de sua atuação. 127 Revista A Rede, nº 5, Campos dos Goytacazes, dezembro de 1932. 128 Fato que iremos comprovar adiante.
72
muita discussão os ânimos ficaram exaltados o que acarretou um desentendimento entre
Anorelino dos Santos – que carregava uma bandeira nacional – e Timóteo Barbosa, da Liga
dos Padeiros.
Dois policiais presentes conseguiram evitar que os atritos tomassem maiores
proporções. O episódio foi contornado de maneira conciliatória: desfilaram todas as
bandeiras, inclusive, a bandeira nacional, que durante o tumulto acabou sendo rasgada.
Finalmente, pouco depois das 13 h, animadas pelas bandas musicais Sociedade Musical
Operária Campista e pela Lira Conspiradora, a passeata saiu da praça Nilo Peçanha,
movimentou-se pela rua do Ouvidor, atravessou a avenida 7 de Setembro – sob os olhares
de muitos curiosos – e, por volta das 14 h, chegou ao seu destino: a praça São Salvador.
O primeiro orador a saudar o público, estimado em 2.000 pessoas, foi o médico
Custódio Siqueira. As provocações recomeçaram quando o segundo orador, o jornalista
Ulisses Martins – defensor de idéias anarquistas – reprovou a atitude dos defensores da
bandeira nacional. Por conta dessa atitude, o jornalista teve seu discurso interrompido
diversas vezes e não conseguiu concluir sua fala. Duvitiliano Ramos, dirigente comunista,
deixou de lado a polêmica sobre as bandeiras e, em sua intervenção, que recebeu muitas
palmas, atacou violentamente as injustiças sociais e a exploração dos trabalhadores no
sistema capitalista.
Representantes classistas se sucederam no palanque, inclusive, a jovem Nina
Arueira. Contudo, foi durante o discurso de outro dirigente do Sindicato dos Estudantes que
a situação ficou fora de controle. Clovis Tavares retomou a discussão sobre a bandeira
nacional, afirmando que esse símbolo servia apenas para a burguesia separar os
trabalhadores e lançá-los em guerras imperialistas. Esse argumento serviu de estopim para
reanimar os provocadores que começaram um grande conflito. No meio da confusão uma
bandeira vermelha foi atirada no palanque.
A cavalaria da força pública irrompeu com violência e investiu seus cascos e sabres
contra a grande massa humana formada na praça, inclusive, muitas mulheres e crianças. A
aglomeração rapidamente se dissolveu na avenida Beira-Rio e pelas ruas Santos Dumont e
Alberto Torres. Inúmeras pessoas foram presas e levadas para a delegacia. Entre os vários
presos estavam Clovis Tavares, Timóteo Barbosa e Duvitiliano Ramos. Além disso, outros
envolvidos no incidente tiveram que prestar depoimentos para o delegado local Herdy
73
Garchet.129 Por mais surpreendente que possa parecer, realizaram um exame de “corpo de
delito” na bandeira resgatada.
Após nove dias de prisão e muitos protestos dos sindicatos de Campos, todos os
detidos foram colocados em liberdade por ordem do Chefe de Polícia do Estado.
Entretanto, foi aberto um inquérito na Polícia Central em que Clovis Tavares e Timóteo
Barbosa foram acusados de atos impatrióticos. Entre as testemunhas chamadas estava
Anorelino dos Santos, o cidadão que segurava a bandeira nacional durante a concentração
na praça Nilo Peçanha.
Como já foi dito, todos esses acontecimentos estavam sendo monitorados pelos
“camisas-verdes” que prontamente responderam à convocação da Associação de Imprensa
Campista e do Tiro de Guerra para a realização de uma passeata de “Desagravo à Bandeira
Nacional” como reação a esse “innominável ataque ao pavilhão nacional, maior e mais caro
símbolo da nacionalidade”.130
No dia 3 de maio de 1934 vários seguimentos da população se juntaram na
manifestação promovida pelas duas entidades que, em tempo recorde, conseguiu reunir
cerca de oito mil pessoas. Uma questão fundamental para compreendermos o grande
número de presentes na cerimônia foi que muitos estabelecimentos de ensino suspenderam
suas aulas e levaram os estudantes para participarem do ato, inclusive a direção do LHC
chegou a publicar uma nota convocando todos os alunos e professores para participarem do
ato. 131
Participaram do “Desagravo à Bandeira Nacional” militares, funcionários do
comércio, empregados das repartições públicas e militantes da AIB que, devidamente
uniformizados, formaram diversas decúrias. A Lira Guarani e a banda do Orfanato São José
tocavam hinos e canções patrióticas enquanto a bandeira rasgada na “parada operária” era
levada na frente, como um “abre alas” do ato. Do alto da sacada da prefeitura foram feitos
os discursos. Entre os oradores podemos citar, Gastão Graça (membro da Junta de
129 Inclusive Nina Arueira que foi conduzida até a delegacia no dia seguinte. A propósito, ver: CARNEIRO, Juliana. op. cit. pg. 148. 130 Monitor Campista, pg. 1, 4/5/1934. 131 Inclusive, na mesma edição do Monitor Campista, é possível verificar que os alunos do turno vespertino do LHC tiveram aulas apenas até as 15:00, quando estas foram suspensas e todos se incorporaram à marcha de “Desagravo à Bandeira”.
74
Conciliação do Trabalho), Cláudio Borges, João Vianna, Joubert Moll e Jaime Landim.132
Por fim, todos juntos saudaram a bandeira nacional cantando o hino do Brasil.
Em face de todo o clima de indignação que se espalhou entre uma grande parcela da
população campista, os “camisas-verdes” fluminenses souberam explorar de maneira muito
rápida e eficaz esse momento político. E, como já dissemos, também foi uma ótima
oportunidade para uma revanche contra os militantes da esquerda que haviam organizado as
contramanifestações durante a conferência de Plínio Salgado, em fevereiro de 1934. Os
integralistas assumiram, através de declarações de um de seus dirigentes, no caso José
Ferreira Landim, que a AIB havia orientado seus “milicianos proletários” para que não
utilizassem as suas camisas-verdes durante a “parada operária”, pois essa medida poderia
evitar “agressões pessoais de comunistas o que viria exigir reação pronta”.
Não se pensou em desfile integralista, ordens superiores estavam garantindo a distribuição de boletins extremistas, de símbolos soviéticos e a palavra de agitadores remunerados. Seria então necessário que a milícia tomasse a iniciativa imediata de ataque, fosse contra quem fosse... a policia local só pode agir, e procedeu a altura, quando a Bandeira Nacional foi rasgada em praça pública. 133
No final de sua entrevista o dirigente integralista procurou colocar os integralistas
numa margem completamente oposta em relação aos responsáveis diretos pelos distúrbios.
O trecho final da matéria evidenciou isso quando, de maneira taxativa, o dirigente declarou:
“sabe agora a população de Campos a inteira verdade do que sempre afirmamos: os
inimigos dos integralistas se identificam com os inimigos da pátria”.134
Diante de tais declarações surgem algumas indagações: Se o núcleo da AIB sabia da
existência de “planos terroristas” por que não denunciou à polícia? E por que, mesmo
sabendo das finalidades do ato de 1º de maio, orientou seus milicianos proletários a
participarem de uma manifestação de “extremistas inimigos da pátria”? Como se vê as
informações apresentadas pelo dirigente da AIB são contraditórias em relação aos
procedimentos adotados pelos “camisas-verdes”.
Por outro lado, a resposta imediata aos incidentes ligados ao “conflito das
bandeiras” evidencia que diversos setores da população de Campos estavam em estado de
132 A maioria dos oradores era da AIB. Sendo que Jaime Landim foi membro do primeiro triunvirato do núcleo dos camisas-verdes. 133 Monitor Campista, pg. 1, 3/5/1934. 134Idem.
75
alerta quanto aos possíveis desdobramentos e conseqüências do crescimento do movimento
sindical. Esse fato fica claro quando constatamos que a Associação de Imprensa Campista –
entidade que representava os donos de jornais – convocou a manifestação do dia 3 de maio.
Os gráficos, através de seu sindicato e da União dos Trabalhadores do Livro e do Jornal
(UTLJ), integravam uma das categorias mais ativas no cenário classista da época. Tudo
leva a crer que, além da indignação patriótica, o receio pela maior politização da categoria
também serviu de combustível para a Associação de Imprensa.
Também se mobilizaram nessa “cruzada” os militares (Tiro de Guerra), a Igreja
Católica (banda do orfanato), setores do comércio (que fecharam suas portas) e escolas
públicas e particulares. Contudo, nenhuma outra organização da cidade contabilizou saldos
tão positivos desses acontecimentos quanto a AIB. Os desdobramentos dos atos que
marcaram as comemorações do 1º de maio e, sobretudo, a mobilização em torno da
cerimônia de “Desagravo à Bandeira” ultrapassaram os limites do município e repercutiram
em nível nacional.
Tanto que o episódio foi a matéria da primeira página do primeiro número do órgão
de imprensa nacional dos integralistas: o jornal A Offensiva.135 Esse acontecimento elevou
os integrantes do núcleo local dos “camisas-verdes” ao status de celebridades nacionais do
movimento. A edição número 1 do periódico da AIB foi lançada estampando a seguinte
manchete: “O desacato em Campos à bandeira brasileira”.
Em seu subtítulo a matéria destacava “a reação do povo campista contra os
anarquistas”.136 Frase que já sinalizava o teor da interpretação dos integralistas sobre o
ocorrido na cidade fluminense. O órgão nacional de informação dos “camisas-verdes”
também reservou a foto principal da primeira página aos integralistas de Campos. O
destaque maior ficou para a participação de “quase duzentos milicianos”, que se
incorporaram à “procissão cívica”.
O enfoque do jornal integralista obviamente procurou supervalorizar os
acontecimentos do desfile de 1º de maio ao qualificar os responsáveis pelos incidentes
como um grupo de “homens maus” e “elementos perturbadores estrangeiros” que haviam
atacado a honra da bandeira nacional. Esses elementos, ainda segundo o jornal, agiriam
135 Em outro capítulo trataremos da utilização dos meios de comunicação pelos integralistas. 136 A Offensiva, nº 1, p. 1, 17/5/1934.
76
“em nome do imperialismo de Moscou” com o claro intuito de executar “a tarefa sombria
de destruição da Pátria”. 137
Ambas as matérias dos periódicos – Monitor Campista e A Offensiva – reproduzem
um conjunto de termos em comum quando se referem aos responsáveis pelos distúrbios de
Campos. Expressões tais como extremistas, agitadores remunerados, comunistas, e
anarquistas que visavam claramente depreciar seus adversários. Outro recurso empregado
na retórica integralista foi associar esses eventos como possíveis tentativas de destruição
dos pilares patrióticos e nacionais arquitetados por países estrangeiros.
Essa tentativa pode ser verificada na utilização dos seguintes termos: perturbadores
estrangeiros, imperialismo de Moscou e símbolos soviéticos. Outra questão que pode ser
constatada nas páginas de ambos os periódicos é a sintonia entre os discursos elaborados na
cidade fluminense pelos dirigentes locais, que reproduziam argumentos encontrados na
publicação nacional dos “camisas-verdes”.
Essa sincronia entre os discursos dos núcleos locais em relação aos órgãos centrais
da AIB é mais uma evidência de como os integralistas conseguiram controlar e uniformizar,
através de uma rígida hierarquia centralizadora, até mesmo o discurso de seus milicianos.
Aliás, a necessidade de construir um discurso unificado e articulado em variados locais do
país foi um dos motivos que impulsionou a criação de um jornal de circulação nacional pela
AIB. A resolução sobre a criação do periódico A Offensiva foi uma das deliberações do I
Congresso Nacional dos “camisas-verdes”, realizado poucas semanas antes, como parte da
estratégia de sua expansão pelo país.138
Os argumentos, tanto do jornal oficial quanto da entrevista do dirigente local,
refletiam um dos pilares da doutrina integralista: o anticomunismo. Durante os anos de sua
existência os “camisas-verdes” procuraram sistematicamente divulgar a noção que o
inimigo maior do povo brasileiro seria o Comunismo, representado pelo “perigo vermelho”
que, de maneira sorrateira e covarde, conspiraria contra o conjunto da população. Até
mesmo os comunistas brasileiros eram vistos como espiões infiltrados para destruir a
nação. A leitura dos integralistas era que os comunistas representariam os interesses de uma
potência estrangeira que pretendia invadir e conquistar o Brasil.
137 Idem. 138 Em outro capítulo voltaremos a tratar dos órgãos de imprensa da AIB.
77
As teses anticomunistas tiveram na AIB, juntamente com a Igreja Católica e as
Forças Armadas, uma das mais importantes divulgadoras. No caso específico dos
integralistas, chama a atenção o espaço dedicado em suas publicações para o combate das
idéias e propostas de origem socialista.139
Entre os integralistas o anticomunismo foi um elemento catalisador e unificador e se
manifestava de três formas: na primeira os teóricos do movimento em seus livros e artigos
consideravam o liberalismo e o socialismo como manifestações da decadência da sociedade
capitalista, ou seja, ambas seriam manifestações do materialismo; a segunda interpretava o
socialismo como uma concepção sócio-econômica “fragmentária” que ainda estaria
baseada na realidade do século XIX e, portanto, já teria sido superada pelas experiências
fascistas.140
A terceira manifestação era aquela encontrada com mais freqüência nos panfletos e
matérias de propaganda da AIB onde, através de uma linguagem simples e direta, o
comunismo era apresentado de forma primária como um perigo que ameaçaria
permanentemente toda a sociedade. Claramente, o objetivo de tal apresentação era manter
todos em constante vigilância contra a “praga de Moscou”. Ao que parece esse tipo de
propaganda foi o que atraiu o maior contingente de militantes para as fileiras do sigma.141
Em relação ao integralismo uma questão é incontestável: o anticomunismo foi um
dos seus pilares políticos. Isso se deveu a eficácia na construção e divulgação de um
discurso político que foi um dos mecanismos utilizados pela organização para arregimentar
e mobilizar milhares de brasileiros durante a década de 1930, possibilitando que a AIB
tenha ocupado uma posição na vanguarda142 das manifestações de caráter anticomunista,
principalmente, após os levantes antifascistas de 1935.143
139 A AIB construiu uma ampla rede de jornais e revistas oficiais, tais como: os jornais A Offensiva e o Monitor Integralista e as revistas Anauê e Panorama. Também surgiram inúmeras publicações de caráter regional. 140 TRINDADE, op cit, pg. 249. 141 Uma pesquisa realizada entre ex-militantes da AIB pode referendar essa afirmação. Na pesquisa, realiza por Hélgio Trindade, foram listados os principais motivos que teriam levado os entrevistados a ingressarem na AIB. Entre os inúmeros ex-dirigentes e ex-militantes integralistas, a maioria esmagadora dos entrevistados, cerca de 65%, apontaram o anticomunismo do movimento integralista como fator primordial para se filiarem e engajarem na organização. 142 A AIB foi a primeira organização a propor celebrações em torno dos militares que faleceram durante os combates nos levantes antifascista de 1935. 143 No segundo capítulo iremos aprofundar a discussão sobre a trajetória histórica da Aliança Nacional Libertadora e as conseqüências dos acontecimentos de novembro de 1935.
78
Evidentemente, nenhum discurso seria apenas uma simples atividade individual. O
discurso representaria a utilização da linguagem como forma de prática social, assim
nenhum discurso seria neutro.144 Os discursos estariam ainda intimamente ligados com cada
um dos grupos sociais presentes e representados na estrutura social. Nesse sentido, em cada
contexto o discurso assume múltiplas implicações.
Por exemplo, em determinadas conjunturas o discurso pode assumir um viés mais
especifico ou geral, ou seja, em determinados ambientes e épocas ele pode assumir um
caráter mais econômico, cultural, ideológico ou político. O objetivo de todo grupo social
seria apropriar- se dessa ferramenta para estabelecer, transformar e manter as relações de
poder no interior das entidades coletivas, tais como: classes, blocos, comunidades e grupos.
Assim, a prática social seria uma dimensão do evento discursivo semelhante ao
papel desempenhado pelo texto. No interior da sociedade de massa o discurso pode ser
empregado tanto como elemento aglutinador em forma de um eixo de ligação entre os
militantes de uma mesma organização, como também, o discurso pode ser uma importante
arma para ser empregada contra os inimigos para omitir, distorcer ou radicalizar uma
interpretação em relação a esses adversários.
Dessa forma, essa prática pode contribuir para ampliar e aumentar os antagonismos
através da reprodução de noções, concepções e percepções presentes em linguagens e
idiomas políticos que teriam sido criadas para justificar os ataques aos oponentes. Na esfera
política a construção do discurso político segue a mesma direção, ou seja, determinados
atores políticos criam novas linguagens, ou recriam antigas, na expectativa de difundirem
seus discursos específicos com a intenção de transformá-los em linguagens correntes entre
outros setores. Nesse sentido, a linguagem política elaborada por uma determinada camada
social acaba sendo adotada por outras parcelas da população.
a difusão de uma linguagem por todo um campo de discurso em constante ampliação e mudança, até atingir o ponto em que se pode dizer que tal linguagem não é meramente o idioma partilhado por uma série de debatedores, mas um recurso difundido e disponível, a ponto de ser conhecido e poder entrar no discurso de pessoas envolvidas em discussões que não as pessoas para as quais ela fora originalmente criada.145
144 FAIRCLOGH, Norman. Discurso e mudança social. Brasília: Ed. UNB, 1994. 145 POCOCK, J. G. A. Linguagens do ideário político. São Paulo: Edusp, 2003, pg. 80.
79
Dessa maneira, o discurso político, elaborado por um grupo ou força política, pode
permear toda a sociedade e acabar influenciando múltiplas camadas da população. Assim,
se a linguagem é moldada em relação a cada conjuntura, o primeiro passo para a análise de
qualquer discurso é conhecer a realidade histórica em que ela foi efetivamente elaborada e
empregada. No caso dos acontecimentos analisados é importante conhecermos os
primórdios do anticomunismo em nosso país.
Pode-se dizer que o anticomunismo foi um movimento que surgiu em nível
internacional, sobretudo depois da Revolução Russa. O temor do conjunto dos setores
dirigentes, de modo geral, teve como ponto de partida os acontecimentos de 1917. A partir
dessa data a preocupação passou a centrar-se na tarefa de impedir que as teses dos
comunistas fossem espalhadas por outras regiões. Afastar as propostas dos “vermelhos” do
imaginário dos trabalhadores e da população em geral passou a ser a missão principal de
inúmeros setores da sociedade.
Ao longo do século XX teriam ocorrido duas grandes ondas anticomunistas de
maior intensidade no Brasil. Uma primeira onda se manifestou entre os anos de 1935-1937,
ou seja, logo após os Levantes Armados de 1935. Posteriormente, entre os anos de 1961 e
1964. Esses dois momentos de maior efervescência anticomunista tiveram desfechos
semelhantes, ou seja, a instalação de regimes ditatoriais: em 1937 o Estado Novo e em
1964 a Ditadura Militar.
Entre as estratégias empregas para refutar e desqualificar as propostas comunistas
assumiram destaque as que buscaram estabelecer uma dicotomia entre o bem e o mal, ou
seja, o Comunismo era apresentado com todo uma simbologia negativa e pejorativa.
Expressões como fantasma, espectro e sombra eram constantemente associados aos termos
relativos às ações dos comunistas.146
A visão dos comunistas como inimigos dos valores cristãos foi um dos pontos mais
utilizados no rico universo que alimentava o imaginário anticomunista. A Igreja Católica
foi a principal instituição que trabalhou no sentido de estabelecer um vínculo entre o
Comunismo com figuras demoníacas, satânicas e diabólicas. A própria Rússia era retratada
146 DUTRA, Elaine de Freitas. O ardil Totalitário: o imaginário político no Brasil nos anos 30. RJ: Editora UFRJ, MG: Editora: UFMG, 1997.
80
como um inferno na terra, lugar de pura devassidão e perturbação dos pilares fundamentais
da família e da religião cristã.
Em razão desse fato, caberia a Igreja o papel de comandar uma “cruzada” para
derrotar os novos “anticristo”. Outro recurso freqüentemente utilizado para negar a
possibilidade de implantação do comunismo no Brasil era apresentar os russos como seres
completamente diferentes, exóticos e, portanto, estranhos à realidade do nosso país. Eles
eram apresentados como bárbaros, vândalos, turcos e orientais.147
Entre os militares brasileiros a imagem do Comunismo como um perigo à soberania
nacional ganhou força, principalmente, depois dos Levantes Armados de novembro de
1935, que ficaram conhecidos pelo termo pejorativo de “Intentona Comunista”. O combate
aos comunistas passou a ser uma das tarefas prioritárias das Forças Armadas, pois ao
perseguir os comunistas os militares estariam defendendo a integridade nacional, a ordem
institucional, a hierarquia, a soberania nacional, enfim, a própria pátria.
O comunismo também foi acusado de perturbador da ordem e da saúde política do
país. Para atingir tais fins, constantemente eram utilizadas metáforas para identificar a
teoria comunista com moléstias ou doenças contagiosas. Os termos mais empregados eram:
teoria malsã, praga, peste, doença, vírus, germes, cancro, foco, câncer, veneno, contágio,
bacilo e infecção.
Assim, todo esse “arsenal” de metáforas foi utilizado pelos integralistas no período
posterior aos acontecimentos do “Dia do Trabalhador”. Dessa forma, passado o impacto
dos episódios que marcaram a conferência do início de março no teatro Trianon e o desfile
de desagravo de 03 de Maio, os militantes do núcleo integralista de Campos contabilizaram
os frutos dessas agitações para a organização. Como afirmamos, a partir desses relevantes
acontecimentos e de todos os seus desdobramentos em esfera regional, os “camisas-verdes”
de Campos começariam extrair o saldo positivo para o núcleo local.
Como dissemos anteriormente, os dois episódios ocorridos em Campos, a
conferência do chefe nacional e a parada de desagravo à bandeira nacional, foram
marcantes no processo de crescimento e ampliação do contingente de militantes
integralistas no município e em outras localidades fluminenses. É provável que o papel de
147 A expressão largamente utilizada de que “comunistas comem criancinhas” seria na verdade uma tentativa de imputar aos adeptos do Comunismo a imagem de seres bárbaros e selvagens que não respeitariam nem as inocentes e indefesas crianças.
81
destaque da AIB, principalmente, sua participação no desagravo e seu vocabulário
anticomunista tenham sido os principais fatores que serviram para atrair e aglutinar novos
adeptos nas fileiras dos “soldados de Deus”.
Como foi visto milhares de pessoas mobilizaram-se para reparar a bandeira nacional
que foi “rasgada em praça pública”, nesses eventos os integralistas procuraram ficar ao lado
dos “defensores da bandeira”, ou seja, exatamente no flanco oposto dos “inimigos da
pátria”. Assim, atraíram a simpatia da imprensa, dos católicos e da polícia. Dessa forma, a
atitude destacada dos integralistas nos episódios e desdobramentos da “parada operária”
permitiu que a AIB assumisse uma posição ofensiva, mesmo que momentânea, em relação
aos militantes esquerdistas.
Tendo em vista que, enquanto os “camisas-verdes” puderam desfilar pelas ruas com
seus uniformes durante o desagravo sem qualquer tipo de constrangimento, muito pelo
contrário, os “comunistas” estavam presos ou sendo interrogados pela polícia. Tudo indica
que a repercussão desses dois fatos foi o combustível que impulsionou, nos meses
seguintes, uma verdadeira arrancada do crescimento da AIB em toda a região.
Como podemos constatar, a partir do primeiro número do periódico nacional da
AIB, os “camisas-verdes” campistas acabaram assumindo uma posição de destaque, pelo
menos no espaço reservado no jornal para os núcleos municipais de todo o país. No
próximo tópico pretendemos analisar como ocorreu o crescimento AIB em outras regiões
do estado.
2.3 O CRESCIMENTO DOS CAMISAS-VERDES
Entre a intensa agitação dos núcleos integralistas podemos destacar o trabalho
desenvolvido pelos dirigentes integralistas campistas que comandaram o que se pode
qualificar de uma ofensiva verde que acabou atingindo vários municípios. Como podemos
observar no quadro nº 1, entre os meses de maio a agosto foram fundados exatamente doze
novos núcleos na região norte fluminense, ou seja, em um curto espaço de tempo o número
de núcleos da AIB na região cresceu significativamente.
No total surgiram núcleos municipais em 7 cidades diferentes e 5 sub-núcleos
distritais. O crescimento dos “camisas-verdes” passou a ser registrado, com entusiasmo, nas
páginas do veículo nacional de informação da AIB. Em sua edição n° 5 a A Offensiva
82
trouxe a informação de que Campos já contaria com "600 camisas-verdes". Nessa mesma
edição o jornal reproduziu um telegrama enviado pelo então chefe municipal das milícias
campistas, professor José Landim, relatando a realização de uma “bandeira” integralista em
um distrito campista.
Segundo o telegrama os integralistas do núcleo de Campos partiram em caravana
rumo ao interior do município para levar sua doutrina para a população do distrito de São
Gonçalo. A população desse distrito recebeu da melhor maneira possível a comitiva dos
“camisas-verdes”, segundo o texto do telegrama, com um “grande entusiasmo desfilamos
cidade ida e volta tropa aclamada. Nomes chefes provincial e nacional. Anauê, Jose F.
Landim. Chefe Campos”.148
QUADRO 1: Fundação de núcleos da AIB:
MUNICÍPIO NÚCLEO / SUBNÚCLEO DATA DA INSTALAÇÃO/ ORGANIZAÇÃO
CAMPOS Campos (Sede)
São Gonçalo (Distrito)
Cambucy (Distrito)
Guarus (Distrito)
Outubro – 1933 (Aproximadamente)
Junho – 1934
Julho – 1934
Julho – 1934
NATIVIDADE Natividade (Sede)
Julho – 1934
PORCIUNCULA Porciúncula (Sede)
Maio – 1934.
SÃO FIDELES São Fidelis (Sede)
Ernesto Machado (Distrito)
Julho – 1934
Agosto - 1934
MIRACEMA Miracema (Sede)
Venda das Flores (Distrito)
Julho- 1934
Julho – 1934
VARRI E SAI Varri - Sai (Sede)
Agosto – 1934
PUREZA Pureza (Sede) Agosto – 1934
148 A Offensiva, n 5, pg. 5, 14/6/1934.
83
ITAPERUNA Itaperuna (Sede)
Maio – 1934
MACAÉ Macaé (sede) Janeiro – 1935
Fonte: A Offensiva e Monitor Campista.
Ainda no mês de maio ocorreram cerimônias de fundação de núcleos da AIB nos
municípios de Itaperuna e de Porciúncula. As atividades desenvolvidas em Porciúncula
foram marcadas pela participação de centenas de pessoas que acompanharam o desfile da
milícia municipal. É importante salientar novamente que em todos estes eventos era
possível detectar a presença de dirigentes ou milicianos do núcleo campista.149
Entre julho e agosto foi a vez da cidade de Varre-sai passar a figurar no mapa das
cidades fluminenses com núcleos da AIB organizados. Duas decúrias da milícia de Campos
desfilaram pelas ruas e estiveram presentes nas cerimônias inicias do núcleo local. Ao
longo desses quatro meses também foi possível verificar a fundação do sub-núcleo de
Vendas das Flores, localidade do município de Miracema.150 A cidade de São Fidelis
também passou a contar com um núcleo distrital, em Ernesto Machado.151
Mesmo com uma intensa atuação na estruturação e acompanhamento dos núcleos de
toda a região, os integralistas de Campos também encontraram tempo para realizarem suas
atividades específicas, como o chamado “Domingo Integralista”, evento que reuniu o
conjunto dos militantes do núcleo local. Durante todo o dia a milícia integralista esteve
envolvida em uma série de atividades esportivas, culturais e de propaganda.
Ao longo do domingo "a cidade ficou movimentada"152 com a presença de
militantes integralistas de inúmeros núcleos e sub-núcleos, entre eles São Fidelis,
Porciuncula, Pureza, Ernesto Machado, Cambucy e Miracema. Os trens, ao chegarem à
estação do Saco, abarrotados com os integralistas de outras localidades, receberam a
saudação de um total de 34 milicianos de Campos. As atividades do “Domingo Integralista”
dos “camisas-verdes” campistas também contaram com o acompanhamento do tenente
Jaime Silva, chefe provincial do Rio de Janeiro, e pelo capitão Valdemar Cotta.
149 A Offensiva, n 3, pg. 4, 31/5/1934. 150 A Offensiva, n 14, pg. 5, 16/81934 151 Monitor Campista, pg. 1, 28/8/1934. 152 Monitor Campista, pg. 3, 11/9/1934.
84
Apesar da chuva, que castigou a cidade durante todo o dia, as instruções do chefe
provincial foram dadas para um grupamento de 148 milicianos, 25 “plinianos” e 13
”blusas-verdes”.153 As atividades desenvolvidas durante o “Domingo Integralista”
chamaram a atenção do conjunto da população campista. O ponto culminante do evento foi
a revista da milícia. Tal tarefa foi levada a cabo pelo chefe da AIB estadual, o único
integralista que estava montado a cavalo, durante toda a cerimônia. Sendo assim, o chefe
provincial recebeu de José Landim, chefe local, o comando da milícia que estava
disciplinadamente formada em frente à sede municipal.
É importante novamente registrar que, mesmo sob a chuva forte, animada pelos
acordes da Lira Guarani e pelas palavras de estimulo do chefe provincial, a milícia iniciou a
marcha pelas ruas centrais da cidade. Na frente da milícia marchavam uma moça
“empunhando uma bela bandeira integralista e um miliciano, o pavilhão nacional”.154 A
chuva que continuou a cair fez com que o comício programado para o final da tarde fosse
cancelado.
Contudo, a conferência noturna na sede municipal da AIB foi realizada e conseguiu
atrair centenas de milicianos que lotaram o auditório da sede. Entre os conferencistas, fez
uso da palavra, em primeiro lugar, José Ferreira Landim, em nome do núcleo campista.
Ainda, fizeram intervenções representantes dos núcleos de Pureza e São Fidelis. Por fim,
em resposta à grande expectativa do público, pois naquela noite “todas as cadeiras estavam
ocupadas em sua maioria por senhoras e senhoritas, vendo-se também advogados, médicos,
industriais, comerciantes, operários, empregados do comercio, estudantes, etc., falaram os
dirigentes provinciais da AIB. 155
Como podemos verificar, durante o “Domingo Integralista”, o núcleo de Campos
conseguiu mobilizar centenas de militantes. Entre esses milicianos um ponto de destaque
foi a grande presença de jovens que estiveram tanto na parada da tarde como também
estavam na assistência da conferência realizada na sede municipal. Um dos traços
característicos da AIB foi a sua centralização que sustentava uma complexa estrutura
orgânica, por conta disso, existia uma estratégia formulada para captar também essas
crianças e os jovens.
153 No quarto capitulo trataremos de questões relativas a militância feminina na AIB. 154 Monitor Campista, p. 1, 11/9/1934. 155 Idem.
85
Logo após o I Congresso Nacional da AIB, procurou-se estruturar um organismo
específico para se ocupar das questões relativas aos jovens e crianças, pois a princípio esse
setor estava ligado ao departamento de Milícia. Posteriormente, em 1935, esse setor passou
a ser denominado de Secretaria de Educação. A divisão dos jovens milicianos seguia a
seguinte ordem: a) Infantis - crianças entre 4 a 6 anos, b) Curupiras - crianças entre 7 e 9
anos, c) Vanguardeiros - de 10 a 12 anos e d) Pioneiros - de 13 a 15 anos. Em Campos, as
atividades específicas com os jovens tiveram inicio em 1934.
A juventude foi inaugurada com um chocolate oferecido às crianças campistas (...) em seguida as crianças fizeram uma visita ao hospital dos tuberculosos distribuindo vários doces e balas. No próximo dia 30 os estudantes integralistas de Campos realizarão o seu primeiro desfile. Tomarão parte as decúrias do Liceu de Humanidades, do Colégio Bittencourt, das escolas de direito e de farmácia, os acadêmicos do comércio do Instituto Comercial, do curso noturno e do ginásio.156
Assim, com essa atividade, o núcleo municipal iniciou sua atuação junto aos jovens.
Em Campos, como em outras cidades do país, o setor juvenil seguiu as orientações de
forma hierárquica, ou seja, a diretriz que era traçada em nível nacional era acompanhada
pela direção provincial e executada com extrema fidelidade pelos órgãos municipais. Um
elemento que comprova essa obediência pode ser verificado na divisão entre o setor infantil
e implantação de dois organismos separados por faixa etária: um para cuidar das crianças,
com distribuição de chocolates, e outro específico para os estudantes, que passou a
desenvolver atividades semelhantes aos da milícia, no caso, programar e executar uma
marcha em direção a um dos distritos da cidade.
Inicialmente, organizaram-se decúrias entre os estudantes das escolas secundárias e
de ensino superior no município, com destaque para o LHC e as Faculdades de Direto e de
Farmácia. Dessa forma, podemos supor que a AIB contava com um amplo contingente de
militantes entre os jovens e crianças. O objetivo dos integralistas ao organizar os chamados
“plinianos”, jovens entre 4 e 15 anos, era investir na a educação cívica e patriótica, pois
entendia-se que já a partir da infância os futuros militantes deveriam receber uma carga
doutrinária que os permitiria desenvolver os seus valores patrióticos, noções de disciplina,
de obediência e capacitação física para que pudessem crescer fortes e prontos para servir ao
chefe nacional. Como podemos verificar neste trecho da Cartilha dos Plinianos.
156 A Offensiva, p. 5, 27/9/1934
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Quais são os deveres do jovem integralista? Cumprir todos os compromissos, freqüentar o seu Núcleo, obedecer, sem discutir, os seus superiores, não vacilar diante de nada quando tratar de seu ideal e propagar onde estiver, corajosamente, a doutrina integralista. Deve ser motivo de orgulho pertencer a Juventude Integralista? - Sim. Deve constituir motivo de orgulho vestir a camisa-verde dos soldados de Deus e do Brasil e ser um dos obreiros da Pátria Nova. Qual deve ser a mais bela ambição de um jovem Integralista? - Morrer pela sua Pátria, pelo seu Deus, pelo seu ideal e pelo seu Chefe Nacional.157
Voltada para os jovens, essa cartilha seguia fielmente a tendência de todas as
publicações voltadas para a doutrinação. Escrita em estilo simples e direto com perguntas e
respostas este texto era de fácil assimilação entre os jovens, sobretudo os que haviam sido
alfabetizados recentemente e, portanto, estavam familiarizados com essa linguagem.
Obviamente, a finalidade central desse tipo de publicação era contribuir na tarefa de
apresentar de maneira sintética as bases da produção teórica dos integralistas.
Os jovens eram "catequizados" com perguntas que pretendiam reafirmar que a
tarefa primordial de todo integralista era defender, propagar e até mesmo morrer em nome
da causa que haviam acabado de abraçar. A cartilha visava ainda aprofundar seus laços e
compromissos com o movimento em geral e com o chefe nacional de maneira específica.
Dessa maneira, através do trabalho entre os jovens e crianças, os integralistas
diversificavam suas áreas de atuação pelo estado fluminense.
Como se vê, no espaço de poucos meses os “camisas-verdes” fluminenses passaram
a agir em inúmeros municípios, organizaram sua milícia, realizavam paradas e bandeiras e
também desenvolviam atividades entre os jovens, crianças e mulheres. Em outubro de
1934, seguindo orientações da direção nacional e contando com todo o suporte político que
haviam conseguido estruturar, os integralistas fluminenses participaram das eleições para
os cargos de deputado estadual e deputado federal, questão que trataremos a seguir.
157 Cartilha do Pliniano. In: Monitor Integralista, pg. 6, 15/5/1936.
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CAPÍTULO III
SOB FOGO VERMELHO
3.1 OS INTEGRALISTAS NAS ELEIÇÕES DE 1934
Em 14 de outubro de 1934 ocorreram as eleições estaduais que elegeriam os novos
representantes para o Congresso Nacional e para a ALERJ. Após a aprovação da
Constituição de 1934 caberia a essas novas legislaturas reassentar as bases do processo
político do país e do estado. Segundo as novas regras eleitorais o número de eleitores no
estado fluminense era de, aproximadamente, 150.000 eleitores inscritos e qualificados para
votarem. As cidades que concentraram os mais significativos volumes de alistamentos158
eleitorais foram: Campos (14.307), Niterói (11503) e Itaperuna (11190).159
Apesar da contradição em relação aos seus objetivos iniciais, estabelecidos no seu
Manifesto de Outubro, documento que marcou o lançamento da AIB em 1932, os
integralistas acabaram entrando na disputa eleitoral e, de certa forma, significaram a grande
novidade na disputa eleitoral no estado. Quando utilizamos o termo contradição é porque os
“camisas-verdes” colocavam-se numa posição crítica em relação à estrutura político-
partidária existente no Brasil.
Isso porque as disputas regionais entre os governadores de estados e os ”caudilhos
locais” eram abordadas nos textos da AIB de forma profundamente negativa. Dessa forma,
diante dessa situação desconfortável, os “camisas-verdes” deixavam nítida sua posição
num dos trechos do Manifesto de 1932: “não colaboramos com nenhuma organização
partidária, que vise dividir os brasileiros”.160 A crítica em relação à situação política, que
alijava parcelas significativas da população do jogo político, foi um dos argumentos
centrais utilizados para justificar a criação da AIB. Por esse motivo o papel dos “seguidores
do sigma” seria o de combater o “viciado sistema político” e não de simplesmente
participar e, indiretamente, referendar essa prática.
Ao lado do anticomunismo, o antiliberalismo da AIB formou a base doutrinária dos
integralistas. Como dissemos, se o anticomunismo foi o fator unificador, o discurso
158 É importante salientar que apenas maiores de 21 anos, de ambos os sexos e alfabetizados tinham o direito de procurarem a Justiça Eleitoral para se cadastrarem ou, segundo o termo usado na época, se alistarem para participar das eleições. 159 Monitor Campista, pg. 1, 6/9/1934. 160 Manifesto de Outubro - Ação Integralista Brasileira, 1932.
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antiliberal da AIB serviu para apresentar a organização como um diferencial entre os outros
partidos políticos da época. Assim, a aversão ao jogo político-partidário das oligarquias foi
o combustível que impulsionou o movimento integralista em seus primeiros anos de
existência, até mais que o próprio combate das idéias socialistas.161 Os integralistas já
apontavam a "hipocrisia do voto e o mito da soberania popular" como os maiores
problemas do sistema representativo do país. O sufrágio universal era encarado com igual
indignação.
O argumento central dos teóricos do movimento era que, ao pregar a igualdade e a
liberdade entre os homens, a sociedade liberal-democrática acabava privilegiando apenas
aqueles elementos que tinham autonomia econômica e, portanto, estariam verdadeiramente
livres para atuarem no campo parlamentar. Para os integralistas a liberdade no sistema
Liberal seria regulada de fato pelas contradições da relação Capital versus Trabalho. Nessa
dinâmica caberia aos “ricos e poderosos” as rédeas do sistema, enquanto a imensa maioria
dos eleitores teria apenas o papel de massa de manobra.
A única alternativa para romper esse círculo vicioso seria alcançada através de dois
instrumentos: o partido único e a representação corporativa. O antipluralismo partidário da
AIB estava fundamentado na convicção que o partido único era o instrumento mais eficaz
para combater os “políticos profissionais”, as facções regionais, os antigos “coronéis”,
enfim, garantir a estabilidade política, fundamental para o desenvolvimento do Estado
Integral.
Nesse esquema a representação deixaria de lado o sufrágio universal e adotaria a
opção corporativa através do sindicato único. Qualquer tipo de representação deveria partir
de eleições por categoria profissional que, reunidos em assembléias específicas, chamados
de Conselhos, elegeriam seus representantes para os Conselhos Municipais que teriam
como finalidade eleger, indiretamente, o prefeito. Em nível estadual e nacional essa
dinâmica se repetiria, ou seja, o Conselho Provincial elegeria o governador e o Conselho
Nacional escolheria o Presidente da República. Dessa forma, todo esse processo ocorreria
sem necessidade da interferência dos partidos políticos. O formato era fracamente inspirado
no modelo de Estado fascista da Itália.
161 Nos anos iniciais da AIB o combate aos preceitos do Liberalismo ou da sociedade Liberal-burguesa ocupavam mais espaços entre os dirigentes integralistas que os debates sobre o “perigo comunista”. TRINDADE, op. cit, pg. 238.
89
Entre os integralistas o mais destacado formulador das teses antiliberais foi o jovem
advogado Miguel Reale. Natural de São Bento de Sapucaia, tendo estudado na tradicional
Faculdade de Direito de São Paulo, onde formou-se em 1934, Reale iniciou sua militância
ainda na SEP. Na AIB contribuiu na elaboração teórica do movimento escrevendo
inúmeros livros, artigos e realizando conferências sobre a natureza e as contradições do
Estado Liberal.162 Ocupou posições de destaque nas fileiras do Sigma, sobretudo quanto foi
indicado e passou a atuar como Secretário Nacional da Doutrina. Entre outras atribuições,
assumiu a direção do jornal integralista A Açção, publicado pela direção provincial de São
Paulo.
Como dissemos, originalmente, a organização surgiu denunciando todos os partidos
políticos como instrumentos de divisão da sociedade brasileira e fonte de privilégios apenas
para as elites. Em seu manifesto de fundação os integralistas apresentaram sua opinião de
maneira cristalina sobre o conjunto de partidos existentes: “nosso ideal não nos permite
entrar em combinação com qualquer partido político, pois não reconhecemos partidos:
reconhecemos a Nação”.163
Tendo em vista as modificações introduzidas no partido após o I Congresso
Nacional, os integralistas fluminenses traçaram três metas a serem atingidas a partir de sua
entrada na disputa eleitoral de 1934. A primeira dizia respeito aos argumentos apresentados
para explicar a mudança de posição sobre a participação nas eleições. A segunda meta a ser
atingida era aproveitar efetivamente o período eleitoral e conjugar as tarefas de organização
de núcleos e angariar votos para os candidatos verdes simultaneamente. O terceiro objetivo
era ampliar seu nível de influência em determinadas parcelas da sociedade. Possivelmente,
como reflexo dos dilemas impostos pela primeira questão, a principal tarefa dos milicianos
da AIB foi buscar construir explicações para sua presença nas eleições.
No estado do Rio de Janeiro para cumprir tal tarefa os integralistas começaram
publicando uma nota da chefia nacional. O texto da nota apresentava as finalidades centrais
da participação da AIB no pleito, que seriam, resumidamente, realizar uma ampla
propaganda de sua doutrina política e combater o sufrágio universal e a liberal-democracia.
162 Entre essas obras podemos citar: O ABC do Integralismo. Sp: Ed. Revista Panorama, 19337. A formação Político-Burguesa. RJ. Civilização Brasileira, 1934. O Estado Moderno (Liberalismo, Fascismo e Integralismo). RJ: Livraria José Olympio, 1934. 163 Manifesto de Outubro, Ação Integralista Brasileira, 1932.
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A análise do teor da nota nos permite concluir que os integralistas encontraram uma série
de problemas para sustentar o lançamento de uma “chapa verde”.
Na maior parte da nota os integralistas preocuparam-se mais em explicar as razões
para AIB ter deixado de ser apenas uma “associação civil voltada para o estudo e o debate
das questões brasileiras” do que propriamente em pedir votos para seus candidatos.164
Mesmo disputando uma eleição com os outros partidos, pelo menos a princípio, a AIB
recusou-se a ser identificada como um partido político.
Pela primeira vez na história do Brasil, incluindo-se mesmo o tempo dos partidos do império, uma organização essencialmente nacional comparecerá a eleição inspirada pela mesma doutrina, animada pelo mesmo sentimento e dirigida por um único chefe. A Ação Integralista Brasileira não faz do voto e das eleições uma finalidade e sim um meio para combater o próprio sufrágio universal e a liberal-democracia. 165
A análise dos dois primeiros pontos da nota demonstra que os integralistas estavam
conscientes de que as engrenagens da máquina política da Primeira República ainda
estavam perfeitamente “azeitadas”. Nesse trecho eles afirmaram textualmente que o
lançamento das candidaturas integralistas, tento em vista a obrigatoriedade do voto, seria
uma forma de “evitar que os partidos estaduais se sintam com o direito de pedir votos aos
integralistas”.166
Aproveitar a ocasião para ampliar o nível de divulgação de sua “doutrina” entre os
seus simpatizantes e assim transformá-los em novos milicianos para as fileiras integralistas
foi o objetivo apresentado nos pontos três e quatro. Fica claro que para os “camisas-
verdes”, seria plenamente possível conjugar a campanha eleitoral de fato, ou seja, pedir
votos com a tarefa de debater, discutir e filiar novos integrantes na organização. Ainda
segundo a nota, os integralistas entendiam que o período da campanha eleitoral seria uma
ocasião oportuna para investir na propaganda da organização.
O ponto cinco demonstra que, mesmo em face de todas as adversidades, os
integralistas tinham a expectativa de eleger seus representantes, pois esse ponto trata
exatamente da postura que os prováveis representantes da AIB deveriam adotar nas tribunas
do parlamento. Contudo, sobre esse aspecto é interessante analisarmos a situação com base
164 De maneira resumida esses os objetivos apresentados no primeiro estatuto da AIB, aprovado em fevereiro de 1934 no seu I Congresso Nacional, em Vitória-ES. 165 Monitor Campista, p. 1, 7/10/1934. 166 Idem.
91
nos resultados do quadro eleitoral no município de Campos.167 Nessa cidade os integralistas
somaram apenas 263 votos para os cargos de deputados estadual e federal.
Se recordarmos que poucos meses antes o jornal integralista A Offensiva havia
afirmado que a cidade contava com mais de “600 milicianos” o resultado eleitoral dos
“camisas-verdes” ficou muito abaixo das expectativas da chefia provincial fluminense. O
choque entre esses dois números demonstra que nem sempre o que era divulgado pela
imprensa integralista estava em sintonia com a realidade.
Por outro lado, uma análise da relação das cidades onde os integralistas lançaram
candidatos no estado do Rio de Janeiro nos permite averiguar que se a soma total dos
“votos verdes” ficou aquém das expectativas, dentro do ponto de vista da ampliação da
estrutura da organização, houve um significativo crescimento das fileiras integralistas. 168
Dessa maneira, apesar dos “camisas-verdes” totalizarem 46 candidatos para os
cargos em disputa, na verdade foram apenas 44 candidatos. Isso porque os militantes José
Ferreira Landim, nesse período chefe do núcleo municipal de Campos, e o padre José
Tomás de Aquino Menezes, da cidade de Miracema, concorreram aos cargos de deputado
federal e deputado estadual. Os integralistas campistas contribuíram para o projeto eleitoral
da AIB do estado apenas com a candidatura de José Landim. E mesmo assim, como já
analisamos, essa candidatura teve uma votação extremamente discreta em relação ao
universo de eleitores da cidade, maior colégio eleitoral fluminense.
Entretanto, no cenário estadual a região norte fluminense contribuiu com 13
candidatos, ou seja, cerca de 30% das candidaturas integralistas do estado do Rio de Janeiro
tiveram sua origem nessa região. Assim, a região norte contou com quase o mesmo número
de candidatos da capital fluminense, na época a cidade de Niterói, com 14 candidatos.
Ainda em relação às eleições de 1934 pode-se observar que em todas as regiões do Rio de
Janeiro os ”camisas-verdes” conseguiram se articular e lançar candidatos.
Como já observarmos, se o resultado final ficou longe do coeficiente eleitoral, uma
questão que deve ser considerada em relação a essa experiência eleitoral foi o fato dos
integralistas terem conseguido lançar candidatos provenientes de 16 municípios diferentes.
Algo que nos possibilita concluir que em outubro de 1934 existiam núcleos da AIB
167 Quadro eleitoral, vide Anexos. 168 Ver em ANEXO o quadro geral de candidatos da AIB nas eleições de 1934.
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organizados em pelo menos 16 municípios do estado do Rio de Janeiro. Pois, para se
sustentar uma candidatura, mesmo que com o único objetivo de “divulgar a doutrina”, seria
necessário ter uma estrutura mínima de organização, em outras palavras, contar com
militantes e dirigentes dispostos a assumir tal tarefa.
Além de fundar novos núcleos, os integralistas procuraram atuar em outras frentes
para ampliar seus espaços políticos, o que era o terceiro objetivo da AIB. Para isso os
integralistas procuraram consolidar suas bases entre duas importantes instituições de
Campos: a Igreja Católica e entre o corpo docente e discente do LHC. O lançamento das
candidaturas de José Landim, professor do LHC, e do padre José Tomas de Aquino de
Menezes deixaram nítida essa estratégia.
No caso do LHC, essa instituição foi objeto de permanente preocupação dos
integralistas, pois qualquer organização que pretendesse ocupar uma posição de destaque
na cidade deveria começar pelas salas de aula do LHC. Isso porque o suntuoso palacete
construído no século XIX era a instituição mais respeitada pelos campistas. A história do
LHC está ligada ao seu construtor: João Martins, barão da Lagoa Dourada. Antes de ser
adaptado para funcionar como colégio esse prédio serviu de residência para o nobre.
Após o falecimento do barão, o palacete foi levado a leilão público para pagar as
dívidas do seu antigo proprietário e comprado numa espécie de mutirão popular para,
posteriormente, ser doado ao Estado para a instalação de um educandário. O Liceu de
Humanidades de Campos (LHC) foi criado em 1880, data da apresentação e assinatura do
Decreto Provincial Nº 2503, que autorizou a fundação do colégio na cidade, sendo que
começou suas atividades a partir de 1884.
Um dos fatos que merece grande destaque na história do colégio foi a sua
equiparação, em 1901, ao Colégio Pedro II. A partir dessa data todos que estudassem no
LHC poderiam prestar exames para obter acesso aos cursos superiores no próprio colégio,
sem ter que se deslocar para a cidade do Rio de Janeiro. Assim, o LHC juntou-se a um
seleto e reduzido grupo de estabelecimentos de ensino secundário do país que desfrutavam
do prestígio de funcionarem segundo as regras, disciplinas e matérias do colégio mais
tradicional do Brasil: o Pedro II.169 Depois de sua equiparação, o LHC passou a ser um
169 O Colégio Pedro II foi fundado em 1837, passaram pelas suas salas de aula figuras ilustres na vida nacional, podemos destacar os ex-presidentes do período da “Velha República”: Rodrigues Alves, Hermes da Fonseca e Washington Luis. Outras importantes personalidades da política e das letras que estudaram ou
93
ponto de referência para todos aqueles estudantes que pretendiam cursar o ensino
secundário. 170
Outro evento que contribuiu para ampliar a distinção do LHC foi a transferência das
atividades da Escola Normal de Campos 171 – segunda instituição pública e oficial de
formação de professores do Estado do Rio de Janeiro – para o prédio do colégio. Apesar de
ambos os estabelecimentos compartilharem professores e funcionários, no amplo recinto do
LHC, ao longo das primeiras décadas, foi mantida uma separação na distribuição espacial:
às mulheres era reservada a entrada pelo lado esquerdo do prédio da escola. Aos homens,
pelo direito. Os alunos do ensino secundário do Liceu ocupavam o prédio principal, o
aristocrático sobrado; as normalistas, o prédio que ficava atrás da “casa-grande”, a antiga
senzala.172
Assim, para a população o LHC representava um verdadeiro patrimônio da
região.173 Sendo que estudar e, sobretudo ser professor do colégio, era, naquela época, um
importante fator de distinção. Possivelmente, cientes do que representava o LHC o núcleo
integralista de Campos procurou organizar-se no interior desse estabelecimento de ensino.
Todo esse esforço parece ter surtido efeito quando constatamos o significativo número de
professores e estudantes do LHC nas fileiras da AIB.
Um exemplo de que a estratégia integralista de penetrar no LHC surtiu os efeitos
esperados foi a presença de dirigentes da AIB na solenidade de inauguração do novo prédio
lecionaram no colégio foram: Álvares de Azevedo, Joaquim Nabuco, Visconde de Taunay, Barão do Rio Branco, Manuel Bandeira, Afonso Arinos de Melo Franco, Gonçalves Dias, Barão Homem de Melo, Capistrano de Abreu, Euclides da Cunha, Sylvio Romero, Fausto Barreto e José Veríssimo. 170 Passar no exame de admissão e ser estudante, ou ter estudado no LHC, tornou-se uma marca de distinção entre os campistas. O fato de estar localizado no ponto mais nobre de Campos - na região central, perto do Fórum de Justiça e da Câmara de Vereadores - ou ainda por estar instalado em um dos prédios mais suntuosos da cidade, contribuiu para construir no imaginário da população a noção de ser esse o melhor colégio da região, comparado apenas ao Colégio Pedro II. Ao longo das primeiras décadas do século XX, passaram pelas salas de aula daquele estabelecimento de ensino inúmeros personagens ilustres da história campista, com destaque na galeria de ex-alunos para o ex-presidente da República Nilo Peçanha. 171 Sabe-se que no ano de 1894, pela Lei 164, de 26 de novembro, funda-se a Escola Normal de Campos,
sendo anexada ao LHC. Em 1900, o decreto de 25 de janeiro extinguiu a Escola Normal sendo que, em março de 1901, após funcionar como Escola Normal Livre e atendendo a um apelo da Câmara Municipal de Campos, o Governo Estadual regularizou oficialmente a Escola Normal, voltando a mesma a funcionar anexa ao LHC. 172 A questão desta distribuição espacial, assim como a perda da memória social acerca da Escola Normal de Campos foi trabalhado em: MARTINEZ, S. e BOYNARD, M. A.(2004, b) 173 Era comum que personalidades e autoridades públicas de passagem por Campos fossem visitar o LHC, entre as figuras mais conhecidas podemos citar: a princesa Isabel, o conde D’Eu, o presidente Getúlio Vargas, Plínio Salgado, o Dr. Miguel Couto, Gustavo Barroso e Alceu de Amoroso Lima,
94
do Fórum da cidade. Compareceram e esse evento Cristóvão Devoto, Homero Cruz,
Domingos Balbi Maretta e José Ladim, também estiveram presentes outros dois professores
do LHC e da Escola Normal: Célia Cruz e Alberto Lamego. Todos estavam devidamente
uniformizados, não só isso, na sessão solene promovida pela prefeitura coube ao professor
Alberto Lamego a tarefa de fazer o discurso oficial. Tarefa que cumpriu devidamente
uniformizado, pois ele "orou envergando a camisa-verde".174
Outro episódio que serviu para os integralistas demonstrarem sua sintonia com uma
parcela considerável do corpo docente do LHC foi durante a realização da “Semana do
Sigma”. Esse evento, que ocorreu em abril de 1937, foi organizado pelo núcleo da AIB e
teve como finalidade abrir espaço para que “uma elite intelectual”175 apresentasse uma série
de conferências sobre temas nacionais, regionais e municipais.176
É importante nesse momento relembrarmos que durante a primeira passagem de
Plínio Salgado pela cidade o local de sua palestra foi o LHC e que a maioria dessa sua
primeira platéia campista era formada por estudantes e professores do colégio. Outro dado
que deve ser considerado é a presença destacada do professor catedrático do colégio, José
Ferreira Landim, entre os dirigentes mais importantes da AIB no estado do Rio de Janeiro.
Entre outras tarefas, ele ocupou o posto de chefe municipal, foi secretário da doutrina,
concorreu ao cargo de deputado nas eleições de 1934, participou da fundação de diversos
núcleos de “camisas-verdes” em outras cidades e chegou a fazer parte da Câmara dos
Quatrocentos.
Indubitavelmente, entre os dirigentes integralistas fluminenses, o professor José
Landim ocupou uma posição de destaque. Entendemos ser de grande ajuda a apresentação
da trajetória desse dirigente – até seu ingresso na AIB – pois seu perfil possibilita que
tenhamos uma amostra da origem social e política dos elementos que ingressaram no
movimento integralista durante seu período legal de existência.177
Natural de Campos, onde nasceu em 1896, José Eduardo Ferreira Landim foi
educado no Colégio Anchieta, em Friburgo. Aprendeu latim e grego com os padres jesuítas
174 A Offensiva, pg. 6, 4/5/1935. 175 Folha do Comércio, 18/4/1937. 176Entre os professores que participaram, podemos citar: Rosa Butheu, padre Abelardo Falcão, Madalena Ribeiro de Castro, Dr. Colatino Gusmão, Célia Cruz e José Landim. 177 As informações sobre a trajetória de José Landim foram extraídas de uma matéria publicada no jornal campista A Noticia, pg. 5, 10/11/1985.
95
que dirigiam o estabelecimento de ensino. Posteriormente, por causa de sua inclinação pelo
desenho e pela matemática foi estudar engenharia.
Nesse período, acabou sendo convidado para participar de uma missão que
pretendia estabelecer os limites da Amazônia, região que estava em disputa entre Brasil,
Venezuela e as Guianas. Ao regressar para a cidade casou-se, em 1925, com Celita
Chement. No ano de 1927, prestou concurso para a cátedra de Português e Literatura no
LHC apresentando a tese "O uso, regra suprema da linguagem", que discutia a utilização
dos verbos infinitivo pessoal e impessoal.
Também ministrou aulas de latim e matemática no Colégio Bittencourt,
estabelecimento de ensino particular de Campos. O professor "Zé Landim", como era
conhecido por todos, encantava os alunos em suas aulas onde, costumeiramente,
interrompia uma explicação para declamar poemas inteiros ou contar suas aventuras no
período em que viveu entre as tribos indígenas na região norte do país.
Apesar de seu pai, Manuel Camilo Ferreira Landim, ter sido o segundo prefeito de
Campos, antes da fundação do núcleo da AIB, nem José Landim, muito menos nenhum dos
seus outros três irmãos – os advogados Raul e Jaime ou o médico Manuel – tiveram
qualquer participação mais direta em atividades político-partidárias. Dessa forma, podemos
verificar de fato que a AIB foi a primeira organização política que acolheu e permitiu que
elementos dos estrados médios da sociedade pudessem participar do jogo político
brasileiro.178
Em outra frente, ou seja, entre os católicos, o lançamento da candidatura do padre
Tomas Aquino pela AIB pode ter sido uma manobra para atrair a simpatia dos fieis
fluminense e das suas organizações, sobretudo, o apoio da Liga Eleitoral Católica (LEC).
Para compreender o que foi a LEC e qual o seu papel é imprescindível analisarmos o que
foi a chamada “Reação Católica”. Durante as primeiras décadas do século XX, sobretudo
após a Revolução Russa de 1917, a alta hierarquia da Igreja Católica procurou despertar e
cobrar de seus fiéis do mundo inteiro uma participação mais ativa nos debates e discussões
178 Tendo sido um dos maiores entusiastas da AIB, José Landim ocupou diversos cargos de direção na organização. Entre 1933 e 1937, o dirigente campista esteve à frente de várias atividades desenvolvidas pelos “camisas-verdes” na região. Como dissemos, contribuiu para a fundação de dezenas de núcleos e sub-núcleos, além de ter sido o dirigente destacado para assumir a responsabilidade da formação doutrinaria dos "soldados de Deus". Na década de 1940, a família Landim deixou sua residência na Rua Sacramento e mudou-se para Niterói.
96
relativas às questões de natureza política, econômica e social. A “Reação Católica”
pretendia realizar um verdadeiro chamado geral para que todos os católicos do mundo
ampliassem seus espaços de influência na sociedade moderna.
Essa mobilização teve seus primeiros sinais no Brasil a partir de 1916, com a
publicação da Carta Pastoral lançada por D. Sebastião Leme, na época arcebispo de Olinda-
PE. Esse documento tinha como finalidade alertar os católicos, religião da maioria da
população, para que os leigos brasileiros também passassem a ocupar uma postura mais
militante em relação aos grandes debates nacionais.179 Posteriormente, em 1921, D. Leme
deixou a cidade do nordeste para assumir o cargo de arcebispo-coadjutor do Rio de Janeiro-
DF.
O quadro histórico da década de 1920 representou um mosaico de manifestações em
variadas esferas da sociedade, como por exemplo: a Semana de Arte Moderna, a Reação
Republicana, o movimento Tenentista e a fundação do Partido Comunista do Brasil (PCB).
Foi exatamente como uma forma de intervir nesse cenário em transformação que uma
parcela da Igreja Católica assumiu tarefa de ampliar o nível de intervenção dos católicos
brasileiros na sociedade.
Podemos apontar como os sinais iniciais dessa mudança de postura da Igreja no
Brasil: o lançamento da revista A Ordem, a fundação do Centro Dom Vital e a organização
da Liga Eleitoral Católica (LEC). Essa tática empregada pela Igreja Católica que visava,
principalmente, se contrapor às teses comunistas tinha como objetivo primordial garantir
espaços para os católicos nas discussões e encaminhamento dos grandes temas e,
concomitantemente, tentar influenciar e garimpar adeptos entre as camadas dirigentes,
daquele período.
Sem dúvida a primeira manifestação clara de que os católicos pretendiam assumir
uma postura mais ativa foi o lançamento da revista A Ordem. Nesse mesmo sentido a
criação, em 1922, do Centro D. Vital teve a incumbência de estreitar o contato entre a
Igreja Católica e a intelectualidade leiga.180 Outros recursos utilizados foram à publicação
179 NAGLE, Jorge. Sociedade e educação na primeira república. 1994, pg. 58. 180Ainda com a missão de formar uma consciência cristã entre os intelectuais católicos foi fundada a Confederação Católica. Outras duas ações que refletiram a disposição dos católicos em assumir um maior protagonismo na cena política do país foram, em primeiro lugar, a publicação da Carta Pastoral do Episcopado Brasileiro, em comemoração ao centenário da independência.
97
de livros, sobretudo, dos líderes leigos do movimento: Jakson Figueiredo e Alceu Amoroso
Lima (Tristão de Athaide).
Em segundo lugar, entretanto não menos importante, a organização do Congresso
Eucarístico que pretendia apresentar inúmeras teses propondo uma tomada de posição dos
católicos em relação às questões do mundo leigo, especialmente as de caráter político e
educacional. Os católicos também tiveram uma participação destacada nos debates
educacionais das décadas de 1920 e 1930, especialmente, durante as discussões travadas
nas Conferências Nacionais de Educação, promovidas pela Associação Brasileira de
Educação (ABE).
Ainda no setor educacional, outro momento de grandes embates ocorreu nos debates
constituintes, entre 1933 e 1934. O intuito dos católicos era garantir a permanência da
obrigatoriedade do ensino religioso na grade curricular das escolas “em respeito à tradição
católica do povo brasileiro”.181 Os maiores opositores dos educadores católicos foram os
signatários do “Manifesto da Educação Nova”, 182 de 1932.
Entre outras ações práticas que surgiram como frutos da “Reação Católica”,
podemos citar o aparecimento das "emendas religiosas" na revisão constitucional de 1924,
a criação da Ação Católica Universitária do Rio de Janeiro e da Liga Eleitoral Católica.
Contudo, a revista A Ordem e o Centro D. Vital foram as iniciativas que tiveram maior
importância no sentido de despertarem os católicos para as questões práticas do cotidiano.
Entre os fundadores da revista e do Centro D. Vital, a figura de maior relevo foi,
sem dúvida, Jackson de Figueiredo. Posteriormente, em 1928, com o falecimento de
Figueiredo, quem assumiu a direção de ambas as instituições, da revista e do centro, foi
Alceu Amoroso Lima. Esses dois líderes imprimiram marcas distintas à frente das
organizações. A princípio, com Jakson de Figueiredo, as atividades foram mais no sentido
teórico, ou seja, de orientações no terreno da crítica como, por exemplo, no lançamento de
teses e manifestos, sobretudo durante a década de 1920.
Após o falecimento de Jakson de Figueiredo os católicos, sob a liderança de Alceu
A. Lima, assumiram uma posição mais prática. Desse modo, tanto a LEC quanto o Centro
D. Vital fizeram manobras no sentido de ampliarem seus espaços políticos. Apesar de
181 XAVIER, Libânia N. Para além do campo educacional: um estudo sobre o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932). Bragança Paulista: Edusf, 2002, pg. 58. 182 Para mais informações sobre os pioneiros da educação ver: XAVIER, op cit.
98
nunca ter se configurado como um partido político, a LEC publicava em jornais do país
listas com os nomes dos candidatos que estavam afinados com a doutrina católica.
Tais nomes referendados pela LEC passavam a ser “dignos” do voto dos católicos.
Assim, em 12 de outubro de 1934, foi publicada uma nota oficial da LEC apresentando um
elenco de nomes aprovados pela organização e que defendiam a “causa católica”. A lista
deveria receber o aval da Junta Eleitoral que funcionava na cidade de Niterói. É importante
destacar ainda que a nota foi assinada por Colatino Gusmão e M. Perlingeiro Netto,
respectivamente, presidente e secretario da LEC em Campos.
Por preencherem integralmente as condições estabelecidas pela Liga Eleitoral Católica, também são por ela recomendados aos sufrágios dos católicos, seja para deputados federais, seja para deputados estaduais no próximo pleito os nomes do reverendo cônego José Thomaz de Aquino Menezes, figura de real destaque no seio do clero desta diocese e ilustre vigário de Miracema; o professor José Ferreira Landim, esforçado e constante defensor dos interesses da Igreja e da religião. 183
Como se vê, inegavelmente, em termos de votos contabilizados, a participação dos
“candidatos verdes” foi muito discreta. Contudo, se observarmos pelo ângulo da
organização, da evolução e da consolidação do movimento – outros objetivos traçados
pelos integralistas – as eleições de 1934 podem ser apontadas como um momento ímpar na
trajetória de crescimento da AIB em todo o estado. Evidentemente, é importante insistir,
esse pleito possibilitou que os integralistas aumentassem seu capital político e estreitassem
definitivamente seus laços com os docentes do LHC e com os católicos da LEC.
Assim, a presença de figuras admiradas e respeitadas como os Landim, sobretudo o
professor José Landim, entre os principais dirigentes da AIB no município contribuiu para
legitimar e conferir um alto grau de distinção para os integralistas de Campos. Figuras tão
respeitadas – como professores do LHC e padres “batinas-verdes” – envergando a camisa-
verde serviu como uma demonstração da seriedade que envolvia essa força política, pois
naquele período histórico, em cidades do interior do país padres e professores estavam na
galeria das figuras mais respeitadas.
Os sinais dessa ampliação do capital político dos “camisas-verdes” podem ser
detectados imediatamente, como iremos apresentar a seguir, através de um considerável
183 Monitor Campista, pg. 8, 13/10/1934.
99
salto no crescimento tanto das atividades ligadas ao cotidiano do movimento como no
número dos militantes “camisas-verdes” no estado.
3.2 O NOVO MAPA DA PROVÍNCIA INTEGRALISTA FLUMINENSE
Como já salientamos, os integrantes da AIB tiveram um rápido crescimento durante
o ano de 1934 em todas as regiões fluminenses. Por conta disso, foi preciso readequar a
estrutura e a divisão da organização dos “camisas-verdes” em todo o estado. 184 A partir das
novas demandas criadas pela ampliação dos quadros e dos núcleos da AIB, foi realizado no
mês de novembro o I Congresso Provincial Integralista Fluminense.
Dezenas de delegações de “camisas-verdes” reuniram-se na cidade de Niterói com o
objetivo central de debater a nova realidade da AIB no estado do Rio de Janeiro. O I
Congresso Provincial Fluminense teve como principais resoluções questões relativas às
áreas de finanças e organização.
Na esfera da organização a mudança mais significativa foi à reordenação da divisão
das “regiões” da “província integralista do Rio de Janeiro”, ou seja, com esse rearranjo o
estado passou a contar com 9 regiões, que totalizavam 104 núcleos municipais e distritais.
Outra resolução do congresso foi a nomeação de Raymundo Padilha como novo chefe
provincial.185 Dessa maneira, o novo mapa da AIB no estado ficou assim:
QUADRO 2:
NÚCLEOS DA AIB NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO EM 1934:
REGIÃO NÚCLEO
1ª Região
Sede: Resende
Inspetor: Nestor Contreiras Rodrigues.
Núcleos: Amparo, Alagoas, Arantes, Barra
Mansa, Bocaína, Bom Jardim, Carvalhos,
Campo Belo, Engenheiro, Passos, Falcão,
Flores, Itatiaya, Liberdade, Mauá, Passa
vinte, Quatis, Resende, Rio Claro, santa
Tereza, Monte Alegre, S. Joaquim, Vargem
184 É importante destacar que após o I Congresso Nacional da AIB, em 1934, na cidade de Vitória - ES, a estrutura organizacional dos integralistas passou por inúmeras modificações, entre elas, os triunviratos foram substituídos pelas chefia provincial. Também ocorreu a divisão das províncias integralistas (estados) em regiões integralistas que passaram a contar com chefes regionais. 185 Além de Raymundo Padilha, nomeado chefe provincial, o evento também deliberou que cada região passaria a ter um inspetor regional que assumiria a tarefa de coordenar e acompanhar as atividades implementadas em seus respectivos núcleos.
100
Grande, Volta Redonda e Santa Clara.
2ª Região:
Sede: Barra do Pirahy
Inspetor: Frederico de Carvalho.
Núcleos: Barra do Pirahy, Dores do Pirahy,
Pinheiros, Mendes, Pirahy, Sant`ana, S. Jose
do Turvo, Vargem Alegre e Conservatória.
3ª Região:
Sede: Petrópolis
Inspetor: Raymundo Padilha.
Núcleos: Alto da Serra, Cas, Pedra do Rio,
Petrópolis, Quebra Frasco, São José do Rio
Preto, Sapucaya, Therezopolis e Entre Rios.
4ª Região:
Sede: Nictheroy
Inspetor: Luis de Sousa Miranda
Núcleos: Austin, Central de Nictheroy,
Fonseca, Marica, Nilópolis, Nova Iguasu,
Rio Bonito e Santa Rosa.
5ª Região:
Sede: Friburgo
Inspetor: Omar Freitas de Almeida
Núcleos: Bom Jardim, Cantagallo, Cordeiro,
Conselheiro Josino, Macuco, Nova Friburgo
e Duas Barras.
6ª Região:
Sede: Miracema
Inspetor: Sylvio de Campos Freire
Núcleos: Aperibé, Cambucy, Iataocará,
Miracema, S. Antonio de Pádua, S. Sebastião
da Bella Vista e Venda das Flores.
7ª Região:
Sede: Campos
Inspetor: Cristovão P. Devoto
Núcleos: Conselheiro Josino, Ernesto
Machado, Guarulhos, Largo do Garcia,
Macahé, Pimentas, Pureza, Rio Preto, S.
Fidelis, S. João da Barra, S. Gonçalo, S.
Sebastião, Travessão, Vila Nova.
8ª Região
Sede: Porciúncula
Inspetor: J. A. Viera da Silva
Núcleos: Arrozal de Sant’Anna, Bom Jesus
do Itabapoana, Bom Jesus do Querendo,
Caeté, Carangola, Divino, Itaperuna,
Jacutinga, Macuco, Natividade, Perdição,
Pociúncula, Retiro, Sant’Anna de Itaperuna,
101
São Lourenço, S. Sebastião da Vista Alegre,
Varre-sae e onça.
9ª Região
Em coordenação
Núcleos: Angra dos Reis e Paraty.
Total de regiões: 9 Total de núcleos: 104
Fonte: A Offensiva, pg. 7, 24/1/1935.
Como é possível constatar as regiões localizadas no norte fluminense (6ª, 7ª e 8ª)
juntas somavam 39 núcleos municipais e distritais. O cruzamento de dados apresentados
nos quadros 1 – que trouxe um levantamento relativo às ações implementadas pela AIB na
região durante o primeiro semestre de 1934, com as informações do relatório publicado em
janeiro de 1935 relativas às atividades desenvolvidas ao longo do segundo semestre de
1934 – permitem verificar a evolução dos “camisas-verdes” ao longo de todo o ano na
região.
A primeira constatação diz respeito ao visível crescimento do número de núcleos na
região que saltou de 14, no primeiro semestre, para 39, ou seja, pelos números apresentados
no relatório pode-se verificar que ocorreu um crescimento das forças integralistas de cerca
de 150%. No que tange ao panorama estadual (104 núcleos) a região norte fluminense
passou a representar em torno de 39 % da base orgânica do Rio de Janeiro. A sua divisão
pela região estava assim representada: Campos: 14 núcleos; Miracema: 7 núcleos e
Porciúncula: 18 núcleos.
A análise desses dados aponta para a cristalização de uma tendência de crescimento
da AIB no estado, que se manteve inalterada ao longo de todo o ano de 1934,
especialmente, na região norte, que passou a concentrar por volta de 40% das forças
integralistas fluminenses. No primeiro semestre de 1935 o crescimento da AIB continuou
acontecendo com a mesma velocidade.
Prova desse crescimento em âmbito regional foi à fundação de diversos núcleos
municipais e distritais. Através das páginas do periódico integralista A Offensiva,
especificamente, da coluna “Integralismo nas Províncias”, foram registradas as principais
atividades dos “camisas-verdes” na região fluminense como, por exemplo, a filiação de
novos militantes, encontros, reuniões, bandeiras e desfiles.
102
Ao longo do primeiro semestre de 1935 essa tendência de crescimento da AIB, ou
ofensiva verde, continuou inalterada. Diversos sub-núcleos foram elevados à categoria de
núcleos. Entre os novos núcleos (municipais e distritais) fundados ao longo de 1935,
podemos citar: Macaé, Paraokena, Palma, São Paulo de Muriahe, Areias, Lage de Muiahe,
Tombos de Carangola, Trajano de Moraes, Grumarim, Gruta D'agua, Conceição de
Macabu, Murundu e Morro do Coco.
Outro exemplo do continuo trabalho de organização dos integralistas no estado foi a
instalação de sub-núcleos em inúmeros distritos, como o de Conceição de Macabu, que
passou a ser dirigido pelo chefe distrital Oswaldo Santos.186 Também, por volta de maio de
1935, o núcleo de Bom Jesus do Itabapoana já contava com 56 membros cadastrados e,
também nesse mesmo mês, foi realizado na Câmara Municipal de Trajano de Moraes o ato
de instalação do núcleo local da AIB.187
Entre os novos núcleos fundados durante os meses iniciais de 1935 estava o da
cidade de Macaé. É importante destacar que os dirigentes da AIB de Campos tiveram um
papel fundamental na criação do novo núcleo, pois, os integralistas campistas estiveram
presentes nos primeiros passos do movimento em Macaé.
No dia 29 pp, o chefe do MDP, Castro Rubens, em companhia do inspector Miranda, chefe do núcleo de Santa Rosa, em nome do chefe provincial, fundou o núcleo de Macahe. Nessa cidade já se encontravam os companheiros Sylvio Romero e Vicente Vasconcellos, de Campos, que fizeram os trabalhos preparatórios para a fundação do núcleo.188
Nessa cerimônia o miliciano Antero Perligeiro foi nomeado chefe do novo núcleo
da AIB. Contudo, é importante destacar que os integralistas campistas – como responsáveis
pelos trabalhos na 7ª Região – continuaram participando de atividades em Macaé, mesmo
depois de fundado o núcleo. Nos meses seguintes, foram registrados diversos casos desse
intercâmbio entre dirigentes de Campos e militantes integralistas da cidade litorânea do
norte fluminense.
Ainda durante fevereiro de 1935 o dirigente campista José Landim esteve na cidade
de Macaé. Sua visita teve um caráter estritamente doutrinário, ou seja, visava a realização
de uma conferência na sede municipal da AIB. A matéria do periódico dos “camisas-
186 A Offensiva, pg. 9, 25/5/1935. 187 A Offensiva, pg. 6, 11/5/1935. 188 A Offensiva, pg. 6, 31/1/1935.
103
verdes” destacou ainda que compareceu ao evento uma “numerosa assistência, onde se
viam elementos de todas as classes sociais”.189
Contudo, um dos relatos mais surpreendentes sobre a AIB na província fluminense
foi sobre uma bandeira organizada pelos integralistas dos sub-núcleos campistas de Campo
Belo e Santana de Tocos. O destino dos “camisas-verdes” foi o distrito de Tocos, onde foi
realizada uma conferência doutrinária e, posteriormente, os milicianos degustaram “uma
ótima feijoada”.190 O fato pitoresco ficou por conta da informação de que depois da
feijoada os integralistas ainda tiveram condições e disposição de realizar uma marcha a pé
de 35 Km, até seus núcleos de origem. Prova que, durante esse período, os integralistas não
mediram sacrifícios para levarem suas idéias a todos os pontos do estado.
3.3 A FRENTE AMPLA ANTIFASCISTA: ANL
Até este momento, por opção de construir um texto que apresentasse
cronologicamente os principais eventos e acontecimentos que marcaram a trajetória dos
integralistas fluminenses, deixamos de lado as manifestações de natureza contrária ao
movimento. Buscamos apresentar as manifestações anti-integralistas dentro do contexto em
que ocorreram – como durante a visita de Plínio Salgado em Campos para a realização de
uma conferência no Trianon. Essa escolha pode ter deixado algumas falsas impressões, por
exemplo, que todos os membros do corpo docente e discente do LHC foram militantes da
AIB, que todos na cidade demonstravam simpatia pelo movimento integralista. Ou ainda,
que os “camisas-verdes” não tiveram opositores.
Ocorreram diversas manifestações anti-integralistas no estado do Rio de Janeiro,
sobretudo, durante o período de existência da Aliança Nacional Libertadora (ANL).
Simultaneamente à ampliação de seus quadros os integralistas começaram a deparar-se com
uma série de manifestações de oposição que partiram de inúmeros setores da sociedade,
inclusive dentro do próprio LHC. Em um movimento quase sincronizado, quanto mais a
AIB ampliava sua organização mais ostensivas ficavam as manifestações de caráter anti-
integralistas.
189 A Offensiva, pg. 6, 14/2/1935 190 A Offensiva, pg. 8, 24/8/1935
104
Nesse sentido, os “camisas-verdes” enfrentaram grandes percalços e tiveram que
superar muitos obstáculos para criar uma numerosa militância, divulgarem sua doutrina e
organizarem os jovens e as militantes. A princípio, o anti-integralismo manifestou-se em
dois níveis diferentes: em primeiro lugar os opositores que realizaram ações de maneira
mais franca e aberta foram os militantes das entidades sindicais e de esquerda. Em segundo
lugar o anti-integralismo surgiu no interior do próprio Governo do Estado que, como
iremos mostrar, de maneira velada passou a monitorar e coibir as atividades dos
integralistas dentro do LHC.
Um caso exemplar que serve para evidenciar a preocupação do poder público
estadual com a destacada presença dos integralistas no LHC ocorreu nas últimas semanas
do ano letivo de 1935. Mais precisamente, em 23 de dezembro de 1935, a direção do LHC
recebeu um ofício em resposta a uma reclamação feita em relação a um incidente ocorrido
durante as cerimônias que marcaram as festividades do final do ano letivo do colégio.
Liderados por José Landim, um grupo de professores e alunos – todos trajando seus
uniformes da AIB – teriam comparecido às dependências do LHC e tomado parte das
festividades programadas pela direção do colégio, até mesmo, cantado o hino nacional com
os braços estendidos em típica saudação dos “camisas-verdes”. Por fim, o grupo
concentrou-se nas escadarias centrais do colégio e, fazendo diversas posses, tiraram uma
série de fotografias.191 Entre os professores que compareceram com o uniforme do
movimento estavam: Euclires Belle de Campos, Célia Gomes Cruz e Marieta Lacerda
Souto.
A demonstração integralista dos professores e estudantes no interior do colégio
tornou-se pública apenas três anos depois, após a publicação da matéria no jornal Monitor
Campista, 192 em 1938, pouco antes dos episódios que ficaram conhecidos como “Pustch
Integralista”. O periódico chegou a publicar uma fotografia que teria sido apreendida na
casa do professor José Landim.193
A imagem publicada no jornal mostra um grupo de estudantes e professores, todos
vestidos com camisas-verdes, posando exatamente na escadaria interna do LHC. Podemos
191 Esses episódios narrados podem ser verificados no ofício nº 222 – 15/12/1936. Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos – Cx ofícios : 1935 192 Monitor Campista, pg. 4, 2/4/1938. 193 Em um próximo capítulo iremos analisar os desdobramentos e repercussão na região norte fluminense da Intentona Integralista de 1938.
105
concluir que, mesmo cientes de possíveis repreensões, os integralistas que estudavam e
trabalhavam no LHC deram uma grande demonstração de ousadia, sobretudo os professores
e, ao mesmo tempo, ocuparam e demarcaram aquele importante espaço público de Campos.
Na resposta ao ofício do professor Manoel Manhães, diretor do LHC, enviada à
direção do Departamento de Educação e Iniciação do Trabalho do governo do estado é
possível verificar a preocupação das autoridades com as ações da AIB e, até mesmo, notar
que os representantes do governo estadual estavam acompanhando e monitorando as
atividades dos “camisas-verdes” no estado do Rio de Janeiro.
Em sua resposta o órgão do Governo do Estado, ligado à Secretária de Educação,
classificou os fatos ocorridos no LHC como “graves ocorrências”. 194 E recomendou que a
direção do colégio procurasse “fazer sentir” aos professores e alunos “filiados ao partido
integralista” que eram vetadas todas as manifestações de “credo político” dentro dos
estabelecimentos oficiais de ensino do estado. Esse documento também indica que,
nitidamente, os “camisas-verdes” já estavam sendo considerados como um partido político.
Tanto a reação da direção do LHC quanto a do Departamento Estadual de Instrução
foram apenas os primeiros exemplos de que o crescimento numérico e do capital político,
fundação de novos núcleos e padres e professores assumindo publicamente sua militância,
da AIB começou a despertar reações. Contudo, as outras demonstrações de natureza anti-
integralista foram muito mais contundentes e violentas, principalmente após a organização
no município do núcleo da Aliança Nacional Libertadora (ANL).
Antes de apresentarmos a trajetória da Aliança Nacional Libertadora (ANL) é
fundamental observarmos que outras forças políticas do Brasil, além dos comunistas do
PCB, já procuravam formas de se mobilizar no sentido de criarem organizações de caráter
antifascista. Uma dessas organizações foi a Frente Única Antifascista (FUA), criada em
1933.195 Essa organização agregou em sua órbita inúmeras entidades e personalidades do
meio sindical e da esquerda. Entre as organizações que enviaram representantes na sessão
de fundação da FUA constavam, entre outros, o Partido Socialista Proletário do Brasil, o
194 Arquivo Histórico do Liceu de Humanidades de Campos – Cx ofícios : 1935. 195 Para maiores informações sobre a FUA, ver em: CASTRO, Ricardo Figueiredo. A Frente Única Antifascista (FUA) e o Antifascismo no Brasil. In: Topoi Revista de História. Rio de Janeiro: PPGHIS-UFRJ/ 7 Letras, set. 2002, nº 5, pp. 354-388.
106
Partido Socialista Brasileiro de São Paulo, a Legião Cívica 5 de julho e a Liga Comunista
(LC).196
O perigo representado pelo crescimento do fascismo na Europa mobilizou inclusive
os descendentes de italianos que viviam no Brasil. Foi muito intensa em nosso país a
mobilização antifascista entre os membros da colônia italiana, sendo que essas atividades
começaram a ganhar maior volume a partir da década de 1920. Aproximadamente, no meio
dessa década, começaram a surgir as primeiras manifestações antifascistas no Brasil,
sobretudo, em São Paulo. No caso da FUA, os antifascistas italianos tiveram uma
participação decisiva nas reuniões e discussões sobre sua fundação.
Outros exemplos da participação dos antifascistas italianos na formação da Frente Única Antifascista seriam abundantes: foi por sugestão do Gruppo Socialista Giacomo Matteotti que a Frente foi lançada publicamente no dia 11 de julho de 1933, nono aniversário da morte de Matteotti; foi na sede da Lega Lombarda (centro do antifascismo italiano em São Paulo) que muitas reuniões de criação da FUA foram realizadas, etc.197
Entretanto, apesar dessa massiva participação nas articulações para a criação de uma
frente antifascista, a princípio, os integrantes do Comitê Central do PCB foram contrários à
formação de uma frente com a participação de organizações de tendência trotskistas ou
anarquistas. Inclusive, oficialmente, o PCB recusou-se a participar da FUA. Essa polêmica
sobre a composição política de uma frente ampla foi fruto de uma interpretação sectária das
resoluções da Terceira Associação Internacional dos Trabalhadores, ou Internacional
Comunista (IC).
Mesmo que breve, julgamos oportuno realizarmos um levantamento histórico sobre
a chamada Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT), ou simplesmente, a
Internacional. A I Internacional funcionou entre 1864-1872 e serviu de palco para as
disputas de dois grupos políticos que pretendiam hegemonizar o movimento: os anarquistas
– liderados por Miguel Bakunin – e os marxistas – capitaneados por Karl Marx. Os choques
entre os dois grupos acabou sendo um dos fatores fundamentais para a falência da I
Internacional.
196 A insistência em construir uma “frente única pela base” e presença da Liga Comunista, de tendência trotskista, inicialmente, foram os motivos alegados para inviabilizar a participação oficial da direção do Comitê Regional do PCB na FUA. CASTRO, Op. cit., pg. 362. 197 BERTONHA, João Fábio. Sob a sombra de Mussolini: os italianos de São Paulo e a luta contra o Fascismo, 1917 – 1945. São Paulo: FAPESP: Annablume, 1999, pg. 102.
107
Na década de 1880 diversos partidos operários que haviam sido fundados na
Europa influenciados pelas teses marxistas resolveram reconstruir uma associação para
articular o movimento que, naquele momento, crescia também na América. A II
Internacional (1880-1914), teve como força política mais destacada os militantes do Partido
Social-Democrata Alemão (PSDA), essa organização serviu de modelo para outros
países.198
Contudo, em seus primeiros anos de existência a II Internacional ainda teve que
superar as discussões com as correntes anarquistas em torno da polêmica sobre a formação
de partidos políticos operários. Somente em Londres em 1896, durante os trabalhos do IV
Congresso Internacional Socialista dos Trabalhadores e das Câmaras Operárias foram
aprovadas resoluções que vetaram definitivamente a participação dos anarquistas nesses
eventos promovidos pela II Internacional.
Apesar de sua importância na construção e expansão do movimento operário, a II
Internacional entrou em crise durante o período pré-eclosão da Primeira Guerra Mundial
(1914-1918). A grande celeuma deu-se em relação ao não cumprimento das resoluções
aprovadas no IX Congresso Internacional Extraordinário. As resoluções debatidas e
aprovadas pelos delegados presentes indicavam que caberia ao movimento socialista
denunciar o perigo eminente de uma guerra entre as potências imperialistas e militares do
continente europeu (Inglaterra, Alemanha, França e Rússia).
Nesse contexto, o papel dos trabalhadores seria esclarecer o caráter imperialista do
conflito que levaria a uma gigantesca crise social e econômica e que sacrificaria,
especialmente, os trabalhadores. Com a palavra de ordem “Abaixo a Guerra” o congresso
aprovou um manifesto contra a guerra que em seu texto final indicava a utilização de
estratégias contra a guerra, como comícios, greves gerais. Também os deputados socialistas
no parlamento não votariam créditos para as forças armadas e, até mesmo, o recurso das
sabotagens poderia ser empregado para deter a onda bélica.
Contudo, apesar de todas as mobilizações dos seus dirigentes, a II Internacional
entrou em colapso a partir do início dos conflitos entre os países. Impulsionados pela
propaganda nacionalista que tomou conta do continente europeu, a maioria dos
198 A propósito, ver: CARONE, Edgard. A II Internacional pelos seus congressos (1889-1914). São Paulo: Editora Anita Garibaldi; EDUSP, 1933.
108
parlamentares ligados aos partidos associados da Internacional votou a favor da concessão
de créditos extras para sustentar o conflito. Assim, a opção de transformar a “Guerra
Imperialista em guerra contra o Capitalismo” ficou restrita apenas aos militantes da Rússia,
Hungria e da Sérvia.
Assim, foi exatamente na Rússia – onde os soldados e marinheiros organizados nos
soviets tiveram um papel fundamental no processo revolucionário – durante os primeiros
anos posteriores da Revolução de 1917, que os bolcheviques retomaram as articulações e
mobilizações para a reorganização da Associação Internacional dos Trabalhadores.
Segundo Vladimir Lênin, principal teórico bolchevique, o objetivo da chamada III
Internacional (1919), conhecida como Internacional Comunista (IC), seria organizar
partidos comunistas no maior número de países como tática para preparar a “Revolução
Mundial”.
Contudo, problemas internos na agora União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
(URSS) e, principalmente, dificuldades oriundas de um bloqueio internacional acarretaram
mudanças nos rumos da IC. A tese da “Revolução Mundial” foi colocada de lado,
sobretudo, apos a morte de Lênin. Os novos dirigentes que assumiram o poder na União
Soviética, com destaque para Joseph Stalin, estavam naquele momento mais preocupados
com a preservação da própria URSS, que havia acabado de sair completamente
desestruturada da Primeira Guerra, sofria um boicote diplomático de outros países europeus
e ainda enfrentada focos de resistência materializados através de uma guerra civil.
Assim, com o arrefecimento da perspectiva de uma “Revolução Mundial” a IC
passou a elaborar uma nova tese sobre o panorama político e social. Os principais eventos
que marcaram esse período foram: o IV Congresso da IC (1928) e a V Reunião do Pleno do
Comitê Executivo da IC (IC). As resoluções aprovadas nesses fóruns comunistas defendiam
que a luta dos trabalhadores estaria entrando em seu “terceiro período”. Essa teoria
considerava que a crise do sistema capitalista resultaria em uma nova guerra imperialista.
Nesse contexto, os comunistas de todo o mundo deveriam cumprir duas tarefas. A
primeira era evitar que a guerra imperialista se transformasse em um conflito contra a
URSS. A segunda seria lutar para transformar as contradições do capitalismo em guerras
revolucionárias de caráter socialista.199 Os comunistas deveriam ainda preocupar-se em
199 PRESTES, Anita L. op. ci., pg. 44-45.
109
isolar as forças políticas social-democratas, que passaram a ser alvo da IC pelo fato de
estarem no jogo político apenas para “iludir os trabalhadores” com suas propostas
conciliatórias. A orientação do IC indicava que até mesmo as outras forças de esquerda –
anarquistas e trotskistas - deveriam ser descartadas, sobretudo, na formação de frentes
políticas.
Contudo, em âmbito internacional a chamada virada tática da IC aconteceu a partir
do crescimento do movimento nazi-fascista na Europa, em especial na Itália (Fascismo),
Alemanha (Nazismo) e Espanha (Fraquismo). Assim, a IC realizou uma profunda revisão
em sua estratégia política e concluiu que a partir daquele momento os maiores perigos para
a classe operária seriam os regimes fascistas que começavam a ganhar corpo pelo
continente europeu.
Sendo assim, a partir de 1933 a luta antifascista capitaneada pela IC começou a
passar por uma releitura da conjuntura internacional. O ponto chave da mudança foi a
campanha internacional pela libertação dos comunistas alemães que haviam sido presos sob
acusações de natureza política e estavam sendo julgados por tribunais nazistas no chamado
”Processo de Leipzig”. Sem dúvida, o mais célebre dos dirigentes detidos foi J. Dimitrov.
Como dissemos, a situação dos militantes da esquerda ficou insustentável na
Alemanha depois da chegada dos nazistas ao poder. Contudo, o “Processo de Leipzag” foi
o elemento que despertou a IC sobre as potencialidades e, principalmente, perigos que
representavam os regimes fascistas na Europa. Em resposta ao chamado da IC, ainda em
1933, na capital francesa, reuniram-se membros de diversos partidos comunistas durante o
evento que ficou conhecido como Congresso Operário Antifascista que, entre outras
deliberações, apontou a necessidade da unificação das lutas dos comunistas em torno da
questão específica imediata: barrar os fascistas pelo mundo.
É importante salientar que durante seus primeiros anos a IC não manteve um
trabalho específico em relação aos países da América Latina, especialmente, em relação ao
Brasil. Dessa maneira, em nosso país em virtude de equívocos na interpretação das
resoluções do VI Congresso da Internacional Comunista (IC), que ocorrerá em Moscou, em
1928, no inicio da década de 1930 o PCB ainda sofria as conseqüências dessa fase de
extremo sectarismo.
110
Como já vimos, no Brasil essa fase da história do PCB, entre 1929 a 1934, ficou
conhecida como “processo de proletarização” ou “obreirismo”. Os comunistas do Brasil
passaram a defender em seus documentos e resoluções a formação de um “Governo
Operário e Camponês, a Ditadura Democrática baseada nos Conselhos de operários,
camponês, soldados e marinheiros”. Assim, fazendo uma leitura mecânica das novas
orientações da IC os membros do PCB passaram a defender apenas a formação de uma
frente política pela base, ou seja, apenas entre os trabalhadores. Toda e qualquer outra
forma de aliança política passou a ser considerada uma capitulação as forças
“reacionárias”.200
A política de ampliação dos espaços de atuação, como a experiência do BOC,
passou a receber criticas ferozes. A nova tática adotada pelo PCB previa uma série de
restrições aos militantes. A política de “frente ampla” foi abandonada, os militantes
intelectuais do partido passaram a ser “enquadrado”, ou seja, atividades simples como usar
gravatas, fumar, namorar pessoas de fora do partido passaram a ser vetadas, enfim, uma
serie de normas de condutas foram criadas. Militantes mais antigos de como Astrogildo
Pereira e Otavio Brandão passaram a enfrentar enormes resistências dentro do partido por
causa de sua formação intelectual. Foi também durante essa fase que o pedido de filiação de
Luiz Carlos Prestes foi negado pelo PCB.201
Todos os elementos que não tivessem como provar sua origem proletária foram
afastados do Comitê Central, ou seja, essa orientação estreita e dogmática provocou
inúmeros prejuízos para o PCB. Como observarmos, nas eleições de 1933, abandonando
definitivamente o BOC, os comunistas recusaram qualquer coligação com outras forças e
disputaram isolados no pleito e, sob a legenda da União Operário e Camponês, sofreram
uma fragorosa derrota. Entretanto, essa situação de isolamento do PCB começou a sofreu
uma mudança radical durante a realização da Terceira Conferência dos Partidos
Comunistas da América do Sul e do Caribe. A partir de 1934, os dirigentes de Moscou
começaram a se interessar pelo quadro político do país, inclusive, referendaram a filiação
de Luiz Carlos Prestes.
200 A propósito dos debates sobre a formação da “Frente Única”, ver: CASTRO, Ricardo Figueiredo. Op cit, pg. 354-388. 201 A propósito, ver: PRESTES, Anita L. Op. cit. pg. 35.
111
No decorrer da conferência a delegação brasileira, liderada pelo secretário geral do
PCB, Antônio Manoel Bomfim – codinome Miranda – teve um encontro separado com os
membros da direção da III Internacional. Nesse momento, Miranda apresentou um informe
político que descrevia um quadro completamente incompatível com a realidade do Brasil.
Contudo, os argumentos do Secretário Geral do PCB foram convincentes em relação a
emergência da revolução no Brasil. Tanto que o Birô Sul-Americano da Internacional,202
que funcionava em Montevidéu, foi deslocado para o Rio de Janeiro com a tarefa de
auxiliar os comunistas brasileiros.203
Entretanto, os ecos da luta antifascista, levada adiante pelos partidos de esquerda na
Europa, acabaram impulsionando a luta antifascista da militância comunista no Brasil.
Mesmo que, oficialmente, a postura do CC do PCB só tenha se alterado a partir VII
Congresso da IC, que incorporou as teses favoráveis à composição de “frentes amplas”,204
na prática, os militantes comunistas já haviam iniciado os trabalhos para fundação do
Comitê de Luta Contra a Guerra Imperialista, a Reação e o Fascismo, que ficou conhecido
como "Comitê Antiguerreiro".
Ao mesmo tempo, como já foi apontado anteriormente, a política estreita de frente única “pela base” já vinha sendo superada na prática pelo movimento comunista europeu e, em grande medida sob sua influência, pelo PCB. O Partido se inseria, cada vez mais, na luta contra a guerra imperialista, o fascismo e, em especial, o integralismo. Dessa forma, a nova orientação recebida de Moscou corroborava o que estava sendo feito na prática pelos comunistas brasileiros, embora em seus documentos oficiais permanecesse a concepção de uma frente exclusivamente de trabalhadores.205
Assim, a maioria dos militantes e dirigentes do “Comitê Antiguerreiro” era do PCB,
pois foram membros da JC, do PCB, da Federação Vermelha dos Estudantes, da
Confederação Geral do Trabalho, do Socorro Vermelho, entre outras, que lançaram um
manifesto convocando todos os setores da população para a formação de uma frente única
para lutar contra a ameaça de um conflito militar entre as grandes potências imperialistas.
As mesmas entidades signatárias do manifesto participaram do processo de
convocação e organização do I Congresso Antiguerreiro do Brasil. Após a realização de
202 Não esta entre os objetivos desse trabalho analisar o papel da IC nos Levantes Antifascistas de 1935. 203 PRESTES, Anita Leocádia. Luiz Carlos Prestes e a Aliança Nacional Libertadora - caminhos da luta antifascista no Brasil (1934/1935). Petrópolis, RJ: Vozes, 1997. 204 VIANNA, Marly de A. G. O PCB, a ANL e as insurreições de novembro de 1935. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, pg. 73. 205 PRESTES, Op. cit., pg. 63.
112
sessões estaduais preparatórias, em 28 de agosto de 1934, foi realizado o I Congresso
Nacional Contra a Guerra. O evento ocorreu em pleno centro do Rio de Janeiro, no Teatro
João Caetano. Como era possível prever, a polícia acabou dissolvendo o congresso de
maneira violenta.
A intervenção da força policial deixou dezenas de feridos e quatro mortos. A
repercussão sobre a intervenção policial e suas conseqüências fatais serviu para agitar os
ânimos dos militantes antifascistas no país. De diferentes estados surgiram protestos contra
as mortes e manifestações de solidariedade de diversas organizações do movimento
popular. De Campos dos Goytacazes partiu um manifesto assinado pela Federação
Vermelha dos Estudantes.
Nós estudantes pobres, vítimas da ditadura feudal-burguesa brasileira, explorados nas escolas e expulsos delas quando não temos dinheiro para pagar as taxas extorsivas com que o governo cobre as despesas armamentistas, nós, estudantes revolucionários, temos razão em protestar frente fuzilaria policial contra trabalhadores e o povo em geral, por ocasião da instalação do I Congresso do Comitê de Luta Contra o fascismo, a Reação e a Guerra.206
Visando manter na ordem do dia as mobilizações antifascistas e contra a
perseguição da força policial foi criado no DF, em novembro de 1935, a chamada Comissão
Jurídica e Popular de Inquérito (C.J.P.I). Tomaram parte da C.J.P.I dezenas de outras
organizações do movimento sindical e popular que se unificaram em torno da bandeira
antifascista. As mesmas entidades que participaram da C.J.P.I. foram as que meses depois
capitanearam as mobilizações para a fundação da ANL.207
Entretanto, a ANL "foi criada sob a influência decisiva do PCB",208 pois os
comunistas conseguiram ampliar o leque de simpatizantes e militantes “aliancistas”,
principalmente, pelo fato de apresentarem um programa que apontava para a necessidade
de conjugar várias bandeiras políticas, tais como: a luta anti-integralista, antifascista, anti-
imperialista e antilatifundiária. Entre os componentes de seu primeiro Diretório Nacional
Provisório estavam vários militares, profissionais liberais, estudantes e sindicalistas.
Entretanto, tiveram atuação destacada nessa organização os antigos membros do
movimento tenentista e os membros do PCB e da JC.
206 A Pátria, pg. 10, 1/9/1935. 207 PRESTES, op cit, pg. 61 208 Idem, pg. 70.
113
Ademais, momentaneamente deixando de lado a discussão sobre a gênese da
organização, é inegável que a fundação da ANL representou um marco no cenário político
nacional, pois “nunca, até então, um movimento tomara tal amplitude e força”.209 Dessa
maneira, as novas conjunturas, em níveis internacional e nacional, apontavam para a
necessidade da organização de frentes amplas que lutassem em defesa dos princípios
democráticos.
Em nível nacional a criação da ANL foi motivada, entre outros fatores, pela
radicalização política materializada, sobretudo, pelo crescimento dos conflitos de rua entre
militantes das organizações da esquerda e os integralistas. O conflito mais conhecido entre
forças da AIB e militantes antifascistas foi a chamada “Batalha da Praça da Sé”, ocorrida
em 1934, em pleno coração da capital paulista.210
Outro fator fundamental para a criação da ANL foi a tentativa da administração
Vargas de restringir a participação política das organizações populares e sindicais. O ponto
culminante desse processo foi a edição da Lei de Segurança Nacional (LSN), apelidada de
“Lei Monstro”. O argumento principal do governo era que o país estaria correndo perigo de
sofrer ataques de “elementos subversivos”, por conta disso o Estado passaria a controlar,
intervir e punir com maior rigor os setores oposicionistas.
Entre os artigos da “Lei Monstro”, poderíamos destacar os que atingiram
diretamente as liberdades democráticas e que, portanto, representaram atentados aos
direitos de livre manifestação e opinião pública, tais como: proibição de manifestações
públicas, intervenção em organizações sindicais, expulsão de estrangeiros envolvidos em
organizações políticas e vigilância e censura dos jornais. Foi nesse cenário que diversos
setores do movimento sindical, dos partidos de esquerda e das organizações democráticas
começaram a se mobilizar, entre 1933 e os primeiros meses de 1935, em resposta às
medidas tomadas pela administração Vargas e, principalmente, contra a atuação dos
integralistas.
O crescimento da ANL em todas as regiões do país, entre os meses de abril e julho
de 1935, foi um fenômeno impar na história política brasileira. Surgiram centenas de
núcleos municipais da ANL. Portanto, em nosso país, a rápida expansão da ANL deveu-se,
209 CARONE , op cit, pg. 256. 210 No quarto capítulo iremos realizar uma análise mais aprofundada sobre a chamada “Batalha da Praça da Sé”.
114
sobretudo, à aglutinação de diversificados atores políticos em torno de seu programa.
Assim, o ambiente de radicalização política do país, com o crescimento da AIB e pelo
endurecimento da repressão do governo Vargas – “Lei Monstro” – foi o combustível que
impulsionou milhares de brasileiros a marcharem defendendo as “bandeiras dos nacional
libertadores”.
O lançamento da frente aconteceu no Teatro João Caetano, no centro do Rio de
Janeiro, então capital do país. O nome do ex-líder tenentista Luis Carlos Prestes foi
aclamado como “presidente de honra” da organização. As palavras de ordem principais da
ANL apontavam no sentido de construir um movimento de mobilização permanente contra
o Imperialismo, contra o latifúndio e contra a escalada crescente do integralismo.
Entre as propostas apresentadas em seu Manifesto-programa assumiram lugar de
destaque aquelas que reivindicavam a realização de profundas transformações na realidade
político-social do país, o que só seria possível com a construção de um governo nacional e
popular. Nos meses seguintes a ANL desenvolveu uma intensa atividade de propaganda de
suas propostas pela imprensa e, principalmente, através das chamadas “Caravanas
Aliancistas”.
Durante os meses iniciais de 1935 as “Caravanas da ANL” permitiram que
lideranças da organização viajassem por vários estados brasileiros onde se realizaram
concentrações públicas, reuniões e comícios que tiveram um papel fundamental para
impulsionar a fundação de núcleos municipais. Nesse período, foram criados núcleos
“aliancistas” em centenas de cidades do país que chegaram a congregar milhares de
brasileiros em torno das bandeiras de lutas da frente ampla e, principalmente, da luta contra
os integralistas.
Provavelmente a rápida mobilização dos “aliancistas” fluminenses tenha sido um
reflexo do extraordinário crescimento obtido pela AIB, entre os anos de 1934/1935, no
estado. A partir do surgimento da ANL os “camisas-verdes” passaram a enfrentar uma série
de conflitos com, até aquele momento, seus mais combativos adversários. Inclusive,
ocorreram violentos conflitos entre militantes integralistas e “aliancistas” no estado.
Um desses confrontos aconteceu em Campos dos Goytacazes, uma das primeiras
cidades do estado do Rio de Janeiro onde se constituiu um núcleo da ANL. Em sua edição
de 6 de Abril de 1935, o jornal A Pátria, do Distrito Federal, fez uma primeira menção à
115
instalação do núcleo municipal da ANL em Campos. O texto, de maneira curta e direta,
informou que representantes de vários segmentos profissionais do município, tais como,
médicos, advogados, operários, trabalhadores rurais e também estudantes estariam
envolvidos na organização do núcleo da ANL na cidade.
O ato político de instalação do Diretório municipal provisório ocorreu no dia 10 de
abril de 1935. Os militantes “aliancistas” realizaram um conjunto de atividades de
propaganda visando articular e mobilizar o maior contingente de pessoas possível para
comparecerem ao ato político de fundação do núcleo dos “nacional libertadores”em
Campos. Como podemos ver na reprodução do texto elaborado para convocar a população.
Convocação
Será organizada, quarta- feira, dia 10 de abril, em nossa cidade, a diretoria municipal provisória da Aliança Nacional Libertadora. Tem como presidente de honra o capitão Luiz Carlos Prestes e como finalidade o combate ao imperialismo e aos latifúndios. Para que esta reunião tenha um caráter verdadeiramente popular convidam o povo de Campos a comparecerem, às 8 horas da noite, a Rua 13 de maio número 10, no dia 10 de abril, para aclamar o diretório municipal provisório da ANL. Operários, médicos, advogados, lavradores e pequenos comerciantes, pela grandeza do Brasil apóiem a ANL”.211
A cerimônia aconteceu na sede do Sindicato dos Varejistas que esteve
completamente lotada. Atendendo a convocação dos “aliancistas” compareceram ao ato
“centenas de admiradores e simpatizantes, entre os quais se viam vários elementos
femininos”.212 O grande público presente obrigou muitas pessoas a se sentarem nas
escadarias do prédio. O estudante Acir Pinto foi incumbido de fazer a leitura do Manifesto
Programa da ANL.
Outras intervenções foram feitas pelo médico Custódio Siqueira que falou contra a
pressão do sistema capitalista. Entretanto, o público vibrou com maior entusiasmo durante
o discurso do jornalista Oswaldo Tinoco. Em sua fala o jornalista foi muitíssimo aplaudido
e empolgou a todos, principalmente, quando direcionou seus argumentos contra os
“seguidores do Sigma”, comparando a AIB e o integralismo com o Fascismo.
Entre outros termos altamente pejorativos utilizados por Oswaldo Tinoco, o que
provocou maior reação – no caso muitos risos – foi quando chamou os integralistas de
“galinhas-verdes de Plínio Salgado”. O evento foi marcado por um ambiente de grande
211 A Pátria, pg. 8, 13/4/1934. 212 Idem.
116
entusiasmo que pode ser mensurado através do massivo engajamento de membros na ANL
local. O livro de adesões do núcleo campista recebeu em torno de 200 novos “aderentes”.
No final da cerimônia todos os presentes gritaram diversas palavras de ordem e
deram “inúmeros vivas a Luis Carlos Prestes”. Sendo assim, o diretório municipal
provisório teve a seguinte constituição: Dr. Custódio Siqueira (médico), Antonio B. Fristich
(comerciante), Oswaldo Tinoco (jornalista), Ayer Campos (estudante), Hugo Allemand
(comerciante) e Delllo Lemos (guarda-livros). Um fato de destaque na cerimônia de
lançamento da ANL em Campos foi a presença de um notável número de mulheres e jovens
no evento.
Se uma das chaves do crescimento dos integralistas no estado foi a abertura de
espaços específicos para os jovens e as mulheres, seria obvio que os membros da ANL
teriam que disputar nos mesmos espaços para ampliar seu nível de intervenção política. A
preocupação em organizar e atingir os jovens com suas propostas fez com que os
“aliancistas” lançassem um jornal próprio para esse segmento.
O jornal Juventude213 surgiu como um veículo de divulgação e preparação para o 1º
Congresso da Juventude do Brasil. Em sua edição número dois, em maio de 1935, o
periódico informou sobre a organização de um núcleo da ANL composto exclusivamente
por estudantes das escolas de Campos. Em outra edição do jornal, datada de julho de 1935,
foi apresentada uma relação de locais pelo país em que núcleos de estudantes haviam se
reunido para realizarem congressos municipais de jovens e, novamente, o município de
Campos foi citado com destaque.
Além de mobilizarem jovens e mulheres outra prática desenvolvida pelos membros
da ANL em sua disputa política com os integralistas foi a organização de núcleos e sub-
núcleos em outras cidades e distritos fluminenses. Como aconteceu em todo o Brasil,
também foi notável o crescimento da ANL entre os fluminenses, tanto que em julho de
1935, já existiam 44 núcleos da ANL organizados em todo o estado.214 Exemplos desse
213 Os exemplares do jornal Juventude foram pesquisados no Arquivo do Movimento Operário do Rio de Janeiro – AMORJ – IFCS – UFRJ. 214 O periódico A Marcha foi o órgão oficial do Comitê Municipal da ANL da cidade do Rio de Janeiro – DF. A Marcha, pg. 4. julho de 1935. Arquivo do Movimento Operário do Rio de Janeiro – AMORJ – IFCS – UFRJ.
117
crescimento pelo interior podem ser comprovados através da fundação de núcleos da ANL
em dois distritos campistas, entre eles, a localidade de Guarulhos.215
Entre março e julho de 1935, ou seja, em poucos meses de existência surgiram
núcleos da ANL em dezenas de municípios do estado do Rio de Janeiro. Os militantes da
ANL conseguiram se articular em praticamente todas as regiões do estado. Através dos
jornais pesquisados foi possível verificar que surgiram núcleos da ANL nos seguintes
municípios: Niterói, Campos, Petrópolis, Teresópolis, Resende, Friburgo, Macaé, São João
da Barra, Bom Jesus do Itabapoana, Barra do Piraí, Cabo Frio, Nilópolis, São Gonçalo,
Valença, Magé e Nova Iguaçu.216
No estado do Rio de Janeiro, em aproximadamente três meses, os membros da ANL
articularam-se com extrema rapidez e conseguiram construir uma série de núcleos de sua
organização. Outro ponto positivo alcançado pelos “aliancistas” foi que esses núcleos
espalhados pelo estado realizaram um conjunto de atividades públicas que tiveram como
finalidade divulgar suas propostas, atrair novos simpatizantes e, sobretudo, combater os
“camisas-verdes”.
Nesse sentido, as atividades de propaganda da ANL tinham como finalidade política
ocupar espaços públicos e representar um momento de contraposição com os seus
principais adversários: os integralistas. Em Campos essa intenção ficou nítida, como já
falamos, a partir da cerimônia de instalação do núcleo municipal. As outras três
oportunidades que os “aliancistas” utilizaram espaços públicos para realizarem
manifestações de caráter anti-integralista foram na cerimônia do dia 13 de maio, durante a
passagem de uma caravana da ANL e nas comemorações em torno do dia 5 de julho.
Em 13 de maio de 1935, centenas de militantes da ANL de Campos realizaram um
comício em comemoração à data de assinatura da Lei Áurea. No programa do evento estava
prevista uma série de palestras dos dirigentes do movimento. Entre eles os palestrantes que
participaram do ato estavam: Dr. Custódio Siqueira, Adão Pereira Nunes, Oswaldo Tinoco,
Acir Pinto e o deputado Antero Manhães.
Para ampliarem o seu número de núcleos e militantes os dirigentes nacionais da
ANL resolveram programar uma série de viagens pelo país. Assim surgiram as chamadas
215Idem. 216 As informações foram coletadas nos seguintes periódicos: Monitor Campista, A Pátria, A Manhã e A Marcha.
118
“Caravanas Aliancistas”, que no espaço de poucos meses percorreram milhares de
quilômetros pelo Brasil. Na noite de 31 de maio de 1935, depois de deixarem o Espírito
Santo, os integrantes da “Caravana Aliancista” foram recebidos festivamente na estação
ferroviária para a realização de um grande comício na cidade de Campos.217 Contudo, esse
clima amistoso durou pouquíssimo, tendo em vista que no dia seguinte a temperatura
política mudou completamente durante a realização de um comício da ANL na região
central da cidade.
Após um intenso trabalho de convocação e agitação – diversos boletins da ANL
foram espalhados por toda a cidade – às 19h teve inicio a maior atividade pública
promovida pelos membros da ANL em Campos, até aquele momento. A praça do Rosário
foi completamente ocupada pela multidão, pois "o número de pessoas presentes era maior
do que poderia conter a pequena praça da cidade”.218 Também chamou a atenção a grande
presença de “senhoras e senhoritas” que foram assistir ao ato. 219
O meeting da ANL corria dentro do programado com vários oradores se revezando
no palanque. O grande público aclamava a todo o tempo o nome de Luiz Carlos Prestes,
“presidente de honra” da ALN. Entre os presentes que discursaram estavam: o jornalista
Oswaldo Tinoco e os dirigentes nacionais da organização Ivan Pedro Martins, tenente João
Cabanas e o comandante Roberto Sisson.
Entretanto, no meio de um dos pronunciamentos iniciou-se uma confusão causada
por “emissários de Plínio Salgado” que insistiam em pedir apartes durante o discurso do
comandante Sissom. Para complicar a situação, uma bomba de gás lacrimogêneo explodiu
no meio da praça do Rosário, o que causou uma confusão generalizada e o comício da ANL
teria se encerrado em uma grande correria pelas ruas centrais da cidade.
Contudo, antes de prosseguirmos é fundamental ponderarmos sobre as formas
distintas como esses acontecimentos foram abordados por ambos os jornais pesquisados –
Monitor Campista e A Manhã. Tanto a seqüência dos acontecimentos quanto os
personagens principais dos fatos que ocorreram após a explosão da bomba de gás
lacrimogêneo tiveram versões opostas nos periódicos, claramente indicando as posições
simpáticas dos jornais por cada uma das organizações.
217 A Manhã, pg. 1, 1/6/1935. 218 Monitor Campista, pg. 1, 1/6/1935. 219 A Manhã, pg. 1, 2/6/1935,
119
A partir dessa visão parcial e tendenciosa, para a reportagem do jornal A Manhã a
tentativa de tumultuar e criar pânico durante o comício da ANL foi fruto de um plano
premeditado pelos componentes do núcleo integralista de Campos. Porém, a expectativa
dos “camisas-verdes” de criar uma contramanifestação acabou sendo frustrada, pois a
população que esteve presente na Praça do Rosário assumiu uma postura hostil exatamente
contra aqueles que foram identificados como os responsáveis pela explosão da bomba de
gás lacrimogêneo: os “agentes de Plínio Salgado”.
OS INTEGRALISTAS SÃO ENXOTADOS No meio da multidão foram, então, reconhecidos agentes do sr. Plínio Salgado. Estabelecendo-se pequeno tumulto e o povo avançando contra os integralistas, enxota-os violentamente. A massa procura então linchá-los, enquanto os fugitivos tentam refugiar-se nas casas próximas. É quando explode uma bomba de gás lacrimogêneo e o povo avança decidido e indignado.220
Depois da expulsão dos integralistas o comandante Sissom retomou a palavra e
finalizou seu discurso. Empolgados com os discursos e, sobretudo, com os acontecimentos
daquela noite os militantes da ANL realizaram, após o final do comício, uma passeata pelas
principais ruas de Campos. Em relação aos desdobramentos do tumulto, foram entregues ao
delegado “cacos de uma das bombas atiradas contra o povo pelos integralistas.”221 Por sua
vez, o representante do poder público prometeu abrir um inquérito para apurar os fatos.
Os principais lances do conflito entre componentes da AIB e da ANL, ocorridos da
praça do Rosário em Campos, continuaram a repercutir nacionalmente. Poucos dias depois,
os dois líderes da caravana da ANL – o tenente Cabanas e o comandante Sisson – que
haviam acabado de retornar ao Distrito Federal, concederam entrevistas relatando os
eventos que marcaram a “Batalha da praça do Rosário”. Segundo os dirigentes, em
Campos a ANL contaria com “mais de 2000 aderentes e simpatizantes”.222
Nas entrevistas os dirigentes da ANL destacaram os acontecimentos da cidade
fluminense e procuraram exaltar a coragem dos militantes campistas durante o conflito
ocorrido no comício do dia 31 de maio e, logicamente, denunciar os métodos traiçoeiros e
covardes empregados pelos “camisas-verdes”. Contudo, o comandante Sissom apresentou
220 A Manhã, pg. 1, 2/6/1935. 221 Idem. 222 A Manhã, pg. 1, 4/6/1935.
120
uma versão do conflito em que os acontecimentos assumiram um caráter extremamente
mais violento.
Os chefes integralistas mandaram atacar-nos a tiros. Um camisa-verde, colocado em ponto estratégico, alvejou os oradores e a massa que os ouvia. E sabe o que aconteceu? Nenhuma fuga. Nenhuma precipitação. Os libertadores avançaram sobre o lugar de onde partiam os tiros e prenderam e desarmaram um dos agressores, Alberto de tal, indo pegá-lo no quintal da residência do sr. Carvalho de Freitas, onde se refugiara. Outros integralistas atiraram bombas de gases lacrimogêneos, e tiveram o mesmo fim. Não imagina como foi difícil conter o povo e impedi-lo de linchar os integralistas. Uma gente admirável os campistas.223
Em sua edição de 1º de junho o periódico de Campos trouxe uma matéria que
apresentou uma versão completamente divergente em relação aos eventos narrados pelos
dirigentes nacionais da ANL. O jornal campista não relatou nada a respeito de tiros,
bombas, tentativa de linchamento e, principalmente, em nenhum momento citou a presença
de integralistas no comício da praça do Rosário. O fator que teria desencadeado o conflito
foi o tom agressivo dos discursos dos dirigentes da ANL.
Assim, a confusão teria se dado entre os “aliancistas” e o público presente, que
respondeu indignado com vários apartes. O clima tenso que se instaurou teria gerado a
correria pelas ruas da cidade. Fato que chamou a atenção da polícia que "para não perder o
hábito, entrou em ação e a cavalo pondo água na fervura em três tempos”.224 Somente após
a entrada da polícia em cena é que "atiraram uma bomba de gás lacrimogêneo". Entretanto,
o texto do jornal não identificou o autor de tal atitude.
Assim, o Monitor Campista deixou sem explicação algumas questões: de onde ou
por quem teria sido lançada à bomba? Pelos próprios “aliancistas”? Pelo público? Ou pela
força policial? O toque final da matéria foi cheio de ironia ao afirmar que tal conflito
resultou em muito "corre-corre" e que serviu para muita gente sair de "olho vermelho do
comício por haver chorando ‘mesmo sem querer’".
Poucos dias depois a própria direção do núcleo integralista de Campos apresentou a
sua versão em relação aos incidentes do comício da praça do Rosário. A nota,
extremamente agressiva, iniciava chamando os membros da ANL de mentirosos e de
comunistas. Outro trecho que chamou a atenção no comunicado do Departamento de
Propaganda dos “camisas-verdes” foi o comentário relativo ao número de presentes no 223 Idem. 224 Monitor Campista, pg 1, 1/6/1935.
121
comício da praça do Rosário. Os integralistas afirmaram que o ato da ANL “reuniu
quatrocentos curiosos”, ou seja, novamente foram apresentadas informações conflitantes
sobre o comício, pois, em suas entrevistas os dirigentes da ANL contabilizaram um público
em torno de cinco mil pessoas.
Prosseguindo, o ponto 2 da nota afirmava que uma militante da ANL foi deportada
por ser estrangeira e estar envolvida com a prostituição, ou seja, de uma só vez o texto
reproduz duas referências anticomunistas que eram utilizadas pelos militantes da AIB de
maneira recorrente para atacarem seus inimigos: associou a ANL a uma potência
estrangeira, no caso, a União Soviética e colocou em dúvida a questão moral – prostituição
– dos seus adversários.
A nota prossegue, entre os tópicos 3 e 8, responsabilizando a ANL pelos incidentes
ocorridos em Petrópolis e acusando os “nacional libertadores” de fomentarem o clima de
tensão política no município da região serrana do estado através de greves e ameaças de
morte aos militantes integralistas. Nos tópicos 9 e 10 da nota os integralistas voltaram a
utilizar todos os seus argumentos anticomunistas contra a ANL e seus dirigentes.
9- O ex-sargento Cabanas, manejando uma metralhadora, oculta em um edifício em construção no Largo da Sé, foi o autor em São Paulo das mortes dos operários Jaime Guimarães e Caetano Spinelli. 10- A Alliança dos comunistas não prega nenhuma doutrina, nenhuma idéia além da anarquia e do tumulto. Nasceu derramando sangue e continua derramando sangue em toda parte em que se apresenta.
Podemos observar que a notícia sobre os incidentes verificados no comício da ANL,
na Praça do Rosário, serviu para que os integralistas de Campos estabelecessem uma
ligação direta entre os eventos que marcaram o primeiro grande embate entre as forças da
AIB e as organizações antifascistas brasileiras – a chamada “Batalha da praça da Sé”225-
com os distúrbios ocorridos em 31 de maio na cidade. A nota tem evidente objetivo de
apresentar os “camisas-verdes” como vítimas da “sede de sangue” dos “comunistas”.
225 Em um outro capítulo iremos tratar especificamente de todos os enfrentamentos de rua envolvendo os integralistas, inclusive os detalhes dos conflitos de outubro de 1934, na Praça da Sé, em plena capital paulista
122
Sede da AIB em Petrópolis
FONTE: Revista Anauê, pg. 11, nº 2, maio de 1935.
O conflito da praça do Rosário foi apenas o primeiro entre outros que passaram a
ocorrer entre militantes da AIB e da ANL no estado. O enfrentamento de rua mais violento
entre integralistas e “aliancistas” fluminenses aconteceu em 9 de junho de 1935, na cidade
de Petrópolis. Nesse domingo estava programado um ato público da ANL na praça Pedro
II.
A concentração teria reunido uma assistência de 5.000 pessoas – segundo números
do jornal A Manhã – e foi marcada pela tranqüilidade. Os dirigentes da ANL revezaram-se
no palanque apresentando suas propostas. Depois do comício houve uma passeata que
cortou as principais ruas da cidade serrana. 226
Entretanto, quando os “aliancistas” passaram pela em frente à sede do núcleo
municipal da AIB, localizada na avenida 15 de Novembro, foram disparados tiros em
direção a multidão. O operário Leonardo Candu – militante da ANL – foi atingido pelos
disparos e faleceu. Após o sepultamento, ocorreram protestos de diversas categorias de
trabalhadores que realizaram uma greve geral na cidade.227
Os desdobramentos do conflito de Petrópolis fizeram com que surgisse uma onda de
manifestações contra os integralistas pelo país. A força policial do estado do Rio de Janeiro
entrou em estado de alerta permanente. Qualquer anúncio da realização de concentrações
226 A Manhã, pg. 1, 11/6/1935. 227 A Manhã, pg. 1, 12/6/1935.
123
envolvendo “camisas-verdes” ou elementos da ANL despertava preocupação entre os
responsáveis pela segurança pública.
Ainda com ambiente político carregado por causa do incidente em Petrópolis
aconteceu outro embate entre “aliancistas” e “camisas-verdes”. Dessa fez a cidade de São
João da Barra foi o palco do conflito. Tudo aconteceu durante uma tentativa frustrada de
militantes da ANL de realizar um contracomício durante um evento promovido pelo núcleo
local dos “soldados de Deus”.
Em 19 de junho, uma bandeira integralista partiu de Campos para "levar sua
doutrina a São João da Barra".228 Como resultado dos boatos e ameaças de reação dos
militantes da ANL que circulavam pela cidade, o proprietário de um cinema do município
recusou-se a ceder o local para a realização do ato dos “camisas-verdes”. Mesmo assim, o
comício foi realizado em plena praça pública. Logo no início do comício "um grupo de
vinte pessoas entrou a perturbar os oradores".
A situação foi ficando cada vez mais tensa a partir do momento em que uma
verdadeira chuva de insultos e pedras começou a cair sobre a concentração da AIB. Porém,
ao contrário do que se poderia esperar, os integralistas responderem aos insultos e ataques
de maneira peculiar – é evidente que qualquer cidadão comum ao se encontrar debaixo de
uma "chuva de pedras" teria a preocupação em procurar abrigo ou responder à agressão.
Entretanto, os integralistas, de maneira "heróica e patriótica", começaram a entoar o hino
nacional como forma de contra-atacar as animosidades daqueles identificados apenas como
os "conspiradores".
Obviamente, ao reproduzir tal feito extraordinário, mais uma vez a estratégia da
matéria do Monitor Campista foi de apresentar os “camisas-verdes” como elementos
extremamente corajosos, ou seja, como seres que não temem nada nem ninguém. O teor da
matéria se assemelha muito aos relatos do comandante Sissom, publicados no jornal A
Manhã, em que também os militantes da ANL teriam agido com grande coragem e
destemor quando marcharam "de peito aberto" contra balas de revólver, durante o conflito
da Praça do Rosário.
A temperatura política na região foi aumentando durante os meses de junho e julho.
Depois de registros de incidentes ocorridos em Campos, em São João da Barra e em
228 Monitor Campista, pg. 1, 22/6/1935.
124
Petrópolis, as duas organizações começaram a travar uma verdadeira "batalha verbal” pelos
jornais. Um exemplo foi à nota publicada pelo núcleo municipal da AIB de Campos. Dessa
vez os integralistas da cidade respondiam a um anúncio sobre o ingresso de um ex-militante
“camisa-verde” na ANL.
Comunicado: a) Não existe nenhum Francisco de Azevedo Bueno entre os integralistas inscritos e nem mesmo consta este nome no fichário de simpatizantes b) A declaração talvez se queira referir ao antigo miliciano Francisco Ramos c) Se assim for, esse departamento declara que tal nome se acha riscado pela expulsão das fileiras do sigma dês do mês de novembro do ano passado. d) Tendo solicitado perdão de suas faltas ao mesmo individuo acaba de ser negado a reinclusão no integralismo, muito embora houvesse permissão do chefe provincial para que ele fosse novamente aceito. e) Nada admira, portanto, seu festejado ingresso numa agremiação extremista. Consta ainda dos arquivos do núcleo a completa incapacidade mental do excluído Ação Integralista - Núcleo de Campos.229
Os tópicos da referida nota deixam explícito que os integralistas de Campos tiveram
uma grande capacidade organizativa, o que fica claro quando se observa a menção à
existência de dois tipos de fichários: um para filiados e outro para simpatizantes. Outro
aspecto relevante do documento é a informação de que a AIB tinha uma conduta severa em
relação às falhas e faltas de seus militantes, uma demonstração do nível da disciplina
interna dos “camisas-verdes”.
Também chamou a atenção a data da expulsão do ex-militante: novembro de 1934.
Foi exatamente esse o período de maior crescimento da AIB na região. Ou seja, é uma
mostra de que, além de se preocuparem com a ampliação de suas fileiras, os integralistas de
Campos também se ocupavam em “limpar e depurar” de seus quadros elementos que, nas
próprias palavras dos dirigentes da organização, tinham uma "completa incapacidade
mental".
Em comemoração à data dos dois primeiros levantes Tenentistas, 1922 e 1924, os
“aliancistas” escolheram exatamente o dia 5 de julho como dia mais importante em seu
calendário político. Em todo o país a data foi marcada por comícios, passeatas, cerimônias,
enfim, por concentrações promovidas pelos “nacional libertadores”.
229 Monitor Campista, 28/6/1935.
125
3.4 O GRANDE INIMIGO SAIU DO CAMPO DE BATALHA
Como foi possível verificar, durante os meses de maio, junho e julho a ANL
experimentou um rápido e vertiginoso crescimento de suas forças em todo o país. Uma
conseqüência imediata desse crescimento foi a intensificação dos conflitos com as outras
correntes políticas, sobretudo, com os membros da AIB.
A princípio, os embates ficaram apenas no terreno dos contracomícios, das notas de
jornais e dos ataques verbais. Entretanto, como vimos, as manifestações assumiram um
aspecto mais violento, principalmente, após os episódios ocorridos em Petrópolis, em 9 de
junho, quando um conflito entre integralistas e “aliancistas” resultou na morte do operário
Leonardo Cantu, militante da ANL.
Em Campos os reflexos do ambiente político passaram a ser sentidos com maior
intensidade com a aproximação da data comemorativa da ANL. Para tornar a situação mais
tensa, as comemorações do dia 5 de julho foram cercadas por boatos sobre conspirações ou
de golpe de Estado. Como a publicação dos planos de um suposto “complô comunista”,
articulado pelos membros da ANL, que apareceu nas páginas do jornal O Globo.
Dessa forma, o clima de “histeria política”, observado no Distrito Federal, acabou
chegando a outras regiões fluminenses. Um ambiente de tensão pairava sobre as cidades na
véspera do comício de 5 de julho.230 A imprensa repercutia os boatos que davam conta da
descoberta, por parte da força pública, de planos "terroristas" que seriam praticados por
"elementos extremistas" durante a data comemorativa. As informações divulgadas pelo
jornal O Globo – sem citar a fonte de tais informações ou apresentar provas concretas –
acabaram tornando mais carregado o clima político. Isso acarretou um aumento do
contingente policial em Campos.
Cientes da situação tensa, os dirigentes do núcleo da ANL apressaram-se e
publicaram uma nota informando, em primeiro lugar que – como em outras cidades do país
– em Campos também seria celebrada a data de 5 de julho. A concentração dos
“aliancistas” estava marcada para as 20 h na praça São Benedito. Em segundo lugar os
dirigentes da ANL aproveitaram o espaço para tentar refutar os boatos sobre planos
“extremistas”. No comunicado os dirigentes da organização, entre outras coisas,
230 As edições de 4 e 5 de julho do Monitor Campista deram ampla repercussão as informações publicadas no jornal O Globo.
126
informaram que não estavam programando nenhum desfile pelas ruas da cidade, avisaram
ainda que, em caso de chuva, o comício seria transferido para a sede da ANL, na rua 13 de
maio, número 10.
A Aliança Nacional Libertadora desmente todos os boatos espalhados na cidade que haverá perturbação da ordem depois do comício do dia 5 de julho. Alertamos para que todos os membros para que nenhum vá armado há Praça São Benedito para evitar provocações. No entanto, a ANL não deixa de responsabilizar os chefes integralistas por todos os distúrbios que se verificarem no decorrer do comício, conforme aconteceu na Praça do Rosário.231
Como se observa, a maior preocupação do comunicado foi apontar os integralistas
como principais responsáveis em relação a quaisquer incidentes ou conflitos que viessem a
ocorrer. Ainda no comunicado, os dirigentes da ANL aproveitaram para reiterar as
acusações aos “camisas-verdes” em relação aos problemas verificados durante a passagem
da caravana “aliancista” pela cidade.
Como podemos ver, apesar do empenho de parte da imprensa em procurar
tumultuar o clima político, as comemorações do 5 de Julho aconteceram sem maiores
incidentes ou “golpes extremistas” em várias partes do estado do Rio de Janeiro. Eventos
da ANL aconteceram em Niterói, Macaé, Campos, Barra do Piraí, Nova Iguaçu e Nilópolis
sem que houvesse se registrado “qualquer perturbação da ordem pública”.232
Pouco tempo depois, mesmo realizando os comícios sem maiores problemas, a
ANL foi declarada ilegal pelo governo Vargas. Provavelmente, por causa de seu rápido
crescimento, pelos enfretamentos de rua e pelo tom radical de seu último manifesto,
assinado pessoalmente por Luis Carlos Prestes, enfim, pelo perigo que representou para a
administração Vargas, em 11 de julho de 1935 a organização foi oficialmente fechada
através de um decreto do Ministério da Justiça. Como verificaremos a seguir, com o
fechamento da ANL e com a ausência momentânea de seus grandes adversários, os
integralistas passaram a executar suas atividades com um pouco mais de tranqüilidade.
A partir de julho de 1935, com a proibição das atividades públicas da ANL, houve
um arrefecimento dos conflitos, mesmo através dos jornais, entre integralistas e anti-
integralistas na região. Esse momento de aparente tranqüilidade permitiu que os “camisas-
verdes” de Campos continuassem, agora sem ser importunados, a desenvolverem suas
231 Monitor Campista, pg. 1, 4/7/1935. 232 A Manhã, pg. 2, 6/7/1935.
127
atividades. Durante esse período um dos acontecimentos mais inesperados na trajetória da
AIB ocorreu em São João da Barra, durante o mês de outubro de 1935.
O panorama político da cidade sofreu uma mudança radical a partir da chegada de
uma grande “bandeira integralista”, que havia partido de Campos. Às 14h do dia
16/10/1935, iniciou-se o desfile de 112 camisas-verdes, 53 de Campos e 59 locais, pelas
principais ruas de S. J. da Barra. Após o desfile "improvisou-se um comício" em que o
primeiro a discursar foi o dirigente da área juvenil da AIB, o estudante Sílvio Romero.
Porém, a intervenção que causou maior espanto e supressa aos presentes foi a proferida
após o término do discurso do jovem integralista.
O segundo orador provocou sensação, foi o sr. Batista Maia, fundador do núcleo aliancista de S. J. da Barra e principal orientador das atividades comunistas do local. Vem envergando a camisa-verde e analisou as doutrinas opostas do Comunismo e do Integralismo, terminando num apelo eloqüente a seus companheiros de véspera. Os aplausos prolongaram-se por muito.233
Depois da fala do ex-dirigente “comunista" – que deixou todos boquiabertos - o
comício foi encerrado por uma palestra de José Landim sobre a doutrina integralista. Por
fim, todos os presentes cantaram o hino nacional com os braços erguidos em sua saudação
típica. O saldo dessa bandeira foi o ingresso de 56 novos integralistas que passaram a
militar no núcleo da AIB de S.J. da Barra.
Contudo, a cerimônia deixou claro que a ANL pagou caro pelo fato de se configurar
como a força política que, durante aquele momento, colocou-se em uma posição
francamente oposta a AIB. A situação ficou ainda pior para os militantes “aliancistas”
depois dos Levantes ocorridos no Nordeste e no Distrito Federal, em novembro de 1935.
Dessa data em diante os ex-militantes da ANL passaram a ser alvo e sofrerem uma série de
ataques e acusações por parte dos “camisas-verdes”, dos meios de comunicação e, mais do
que nunca, da administração Vargas.
Como dissemos, ter sido membro ou simpatizante da ANL passou a pesar contra
milhares de pessoas. Os “aliancistas” passaram a ser vistos como espiões ou agentes a
serviço da URSS. Assim a partir dessa data, desencadeou-se uma gigantesca onda anti-
comunista pelo país por causa dos fatos que marcaram os levantes armados de novembro de
1935. A construção dessa leitura pejorativa dos acontecimentos em torno da ALN teve
233
Monitor Campista, pg. 1, 16/10/1935.
128
como principais artífices a administração Vargas, as Forças Armadas e, principalmente, os
integralistas.234 A própria trajetória histórica da ANL foi, por muitos anos, reduzida a uma
simples organização que, recebendo ordens orquestradas de Moscou, através de uma
"Intentona" pretendeu implantar o regime comunista no Brasil.235
Se com a decretação do fechamento da ANL o movimento anti-integralista em nível
nacional já havia sofrido um duro revés, a partir de novembro de 1935 a situação piorou
significativamente. Como reposta aos Levantes Antifascistas do nordeste e da cidade do
Rio de Janeiro, o nível da repressão em torno de todos aqueles que tinham alguma
identificação com a ANL atingiu seu ponto máximo.
Em Campos, a polícia, sob a chefia do delegado Tenente Galdino, realizou uma
verdadeira “caça aos comunistas”. Ocorreram diversas prisões de ex-militantes da ANL,
entre essas, a de um cidadão chamado Luis Grosmam, por possíveis ligações com o
“movimento extremista”. Tendo em vista o acentuado aumento do contingente policial na
cidade, novamente surgiram boatos, dessa vez sobre a possibilidade da presença de Luis
Carlos Prestes na região.236
Dessa forma, chegou ao fim a trajetória histórica da maior e mais importante
organização de cunho anti-integralista que havia se formado, até aquele momento, no
Brasil. Com o encerramento das atividades da ANL e, principalmente, depois dos Levantes
de novembro de 1935, os integralistas passariam algum tempo sem enfrentar adversários
políticos tão bem organizados. Como foi possível analisar, também no estado do Rio de
Janeiro a ANL desenvolveu-se em um curto espaço de tempo em inúmeras localidades.
Mais do que nunca, a partir da ilegalidade e das prisões dos ex-militantes e ex-
dirigentes da ANL, os integralistas puderam retornar suas atividades organizativas
cotidianas e colher os frutos da vitória nessa sua primeira grande batalha. Nesse momento
os integralistas puderam livremente responder todas as provocações de seus inimigos. Um
exemplo foi a, amplamente divulgada, adesão às fileiras do sigma de um ex-dirigente da
234 Ver, a propósito: MOTTA, Rodrigo Patto de Sá. Em guardo contra o “Perigo Vermelho”: o anticomunismo no Brasil (1917-1964). São Paulo: Perpectina; Fapesp, 2002. 235 Para mais informações sobre os Levantes Antifascistas de 1935, ver as seguintes obras: PRESTES, Anita Leocádia. Luiz Carlos Prestes e a Aliança Nacional Libertadora - caminhos da luta antifascista no Brasil (1934/1935). Petrópolis, RJ: Vozes, 1997 e 235 VIANNA, Marly de A. G. O PCB, a ANL e as insurreições de novembro de 1935. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. 236 Monitor Campista, pg. 1, 11/12/1935.
129
ANL de São João da Barra que, literalmente, virou a casaca e, abandonando o vermelho,
passou a vestir a “camisa-verde” da AIB.
130
CAPITULO IV
1936: O ANO VERDE
4.1 A NOVA TÁTICA DA AIB: A VIA ELEITORAL
Em março de 1936 os militantes do núcleo dos “camisas-verdes” de Resende,
município localizado no extremo sul do estado, aguardavam com muita expectativa a visita
de Plínio Salgado. O dirigente nacional iria realizar uma conferência na cidade durante os
trabalhos do Congresso da 1ª Região da “Província integralista fluminense”, evento que
reuniria centenas de militantes de toda a região sul do estado.
Durante semanas os integralistas locais se concentraram de maneira entusiasmada
na organização e preparativos em torno dos detalhes do evento. A grande mobilização
envolveu também milicianos de outros núcleos municipais e distritais próximos a Resende.
Sendo assim, a expectativa era reunir centenas de membros da organização, sobretudo
porque estava programada, como destacamos, a presença do chefe nacional em pessoa.
Contudo, poucos dias antes da realização do congresso, o dirigente Jorge
Boccanera, chefe municipal de Resende, trouxe a informação que deixou todos frustrados:
o Congresso da 1ª região não poderia acontecer. A justificativa apresentada pela nota oficial
do núcleo da cidade indicava que as autoridades estaduais haviam impedido a realização do
evento por causa do clima de incerteza e insegurança que ainda pairava sobre o país após os
levantes antifascistas de novembro de 1935.
Assim, nunca é demais recordar, esses acontecimentos precipitaram a aplicação da
chamada Lei de Segurança Nacional que, entre outras coisas, permitia que a administração
Vargas decretasse Estado de Sítio sempre que o país estivesse sobre a ameaça de tentativas
de golpes orquestrados pelas “forças a serviço de Moscou”. De fato, o texto da nota do
chefe municipal de Resende apenas ratificou esse como o motivo do cancelamento do
Congresso da 1ª Região.
Na nota o argumento utilizado era que o país passava por uma situação política
marcada pela anormalidade causada pela “última intentona comunista”.237 Ainda na nota, a
AIB procurou apontar os atores políticos de sempre como os principais responsáveis por
todos os distúrbios ocorridos no país: os comunistas. Para completar, ao usarem
237 A Offensiva, pg. 7, 28/03/1936.
131
especificamente o termo a “última intentona”, os integralistas deixaram evidente que os
“agentes do credo vermelho” já haviam, em outras ocasiões, tentado tomar o poder.
Por outro lado, a nota dos “soldados de Deus” de Resende buscava isentar as
autoridades locais de qualquer tipo de culpa pelo cancelamento do congresso. O teor da
nota, apesar de toda a frustração, destacava que os milicianos deveriam acatar a
determinação das “autoridades que respeitamos” e que iriam aguardar “com a calma dos
conscientes e o entusiasmo dos que têm fé” uma nova data para terem a oportunidade de
escutarem na cidade a palavra de Plínio Salgado.
Mesmo com o clima político conturbado durante os primeiros meses de 1936 –
reflexo dos acontecimentos de novembro de 1935 – poucas semanas após o cancelamento
do congresso de Resende os milicianos da Província do Rio de Janeiro voltaram a se reunir
em uma grande concentração de “camisas-verdes”. O evento que marcou a retomada das
concentrações públicas dos “seguidores do sigma” foi o Congresso da 7ª Região
Fluminense, na cidade de Campos dos Goytacazes, em março 1936.
Ao contrário do que havia ocorrido na cidade da Região Sul, ao longo de todo o dia
15 daquele mês, centenas de militantes compareceram o auditório da sede municipal da
AIB, durante todas as três sessões do evento.238 Entre os oradores que se sucediam nas
intervenções constavam chefes municipais de toda a região norte do estado além,
evidentemente, do representante do chefe provincial. A cerimônia final do evento foi
marcada pelas saudações dos dirigentes mais graduados da organização.
Sendo assim, a cada nova fala um barulho ensurdecedor de palmas preenchia o
auditório da sede municipal e ecoava em toda praça São Salvador. Os homens, mulheres,
jovens e crianças presentes – todos vestidos com seus uniformes verdes – aplaudiram as
intervenções dos oradores que se revezavam na mesa de trabalhos, ornamentada com uma
enorme bandeira do Sigma. Nesse sentido, a presença de centenas de integralistas durante
os trabalhos do I Congresso da 7ª Região foi, efetivamente, a primeira grande concentração
de militantes da AIB fluminense após os levantes antifascistas de novembro de 1935.
Os meses de janeiro e fevereiro foram marcados por uma grande expectativa em
torno das revelações e investigações sobre um suposto plano de uma “insurreição
comunista”, que teria sido planejada e executada em pessoa pelo homem mais procurado do
238 A Offensiva, pg. 5, 17/3/1936
132
Brasil na época: Luiz Carlos Prestes. Como dissemos no capítulo anterior, enquanto
funcionou legalmente a ANL se destacou como a organização política que esteve na
vanguarda do movimento anti-integralista.
Nesse sentido, para os integralistas nada melhor que assistir seus inimigos serem
presos sistematicamente e, sobretudo, acompanhar pelos meios de comunicação uma
verdadeira “caçada” a Prestes. Em suma, o comparecimento em massa e o entusiasmo
apresentado durante o encerramento do evento demonstravam o clima de empolgação que
havia tomado conta dos “camisas-verdes” fluminenses. Tanto que o congresso foi encerado
por volta de meia noite “com o hino nacional eletrizantemente cantado” pelos milicianos
presentes. 239
Ainda no decorrer desse evento que marcou o reinício das atividades da organização
no estado do Rio de Janeiro, algo de novo começou a ficar mais evidente na retórica dos
integralistas, sobretudo durante as intervenções dos principais dirigentes da AIB.
Obviamente, por causa dos poucos meses em relação aos levantes antifascistas de 1935, o
alvo principal das críticas durante os discursos continuava sendo a “ameaça bolchevique”
que, segundo os “camisas-verdes”, ainda representava um perigo iminente para o país.
Entretanto, outra questão começou a ocupar cada vez mais espaço na pauta e nos
discursos dos integralistas: as disputas eleitorais. Com os chamados “comunistas” fora da
cena política a AIB começou a dar mais ênfase e a implementar as resoluções extraídas
durante seu II Congresso Nacional, ocorrido em Petrópolis, ainda durante o ano de 1935.
Esse II Congresso representou um marco para os integralistas, pois serviu para
apresentação e aprovação de resoluções relativas à adoção de uma nova tática para atingir
os objetivos estratégicos da organização.
Pode-se afirmar que o II Congresso Nacional da AIB representou um marco na
trajetória do partido, sobretudo porque a partir desse evento os integralistas passaram a
adotar uma postura mais definida e incisiva em relação a um tema que sempre foi tratado
com muitas ressalvas pelos seus próprios dirigentes e militantes: a participação dos
“soldados de Deus” no processo eleitoral.
Apesar de terem participado das duas eleições anteriores (Assembléia Constituinte
de 1933 e eleições para a escolha do novo Congresso Nacional em 1934) os “camisas-
239 Idem.
133
verdes” sempre haviam adotado um discurso extremamente duro e crítico em relação às
práticas políticas dos chamados “partidos tradicionais”. Anteriormente, como já citamos, o
próprio Manifesto-Programa”de fundação da AIB procurou distanciar e separar ao máximo
os integralistas das legendas partidárias existentes no país.
Dessa forma, a AIB demonstrava dificuldades até mesmo em assumir um contorno
mais claro de partido político que, inclusive, possuía um projeto de poder. Podemos dizer
que em seus dois primeiros anos a organização – através de seus teóricos – defendia uma
tática política dita “revolucionária”. Nesse sentido, a estratégia era, obviamente, conquistar
o poder político. Contudo, a construção do chamado “Estado Integral” seria atingido
somente após um longo processo de amadurecimento e tomada de consciência do conjunto
da população.
Assim, no projeto original da AIB a conquista do poder político – que tomaria um
longo tempo – se daria através da criação de uma rede de organizações profissionais-
corporativas baseadas nas mais variadas categorias. Originalmente, os integralistas
pretendiam superar as debilidades do “Estado Liberal” pela educação e doutrinação das
“massas”. Como enfatizamos, as instituições vigentes, tais como o parlamento ou as
eleições, eram costumeiramente depreciadas nos documentos e discursos dos líderes
integralistas.
Apesar de se organizar, participar das eleições, eleger parlamentares, em suma, ter
uma estrutura muito semelhante a dos outros partidos, a AIB constantemente negava
qualquer semelhança ou vínculo com os demais partidos políticos. Sendo assim,
freqüentemente os dirigentes e militantes da AIB rechaçavam toda e qualquer tentativa de
comparação entre a organização e os “outros partidos”.
Tendo em vista todas as suas particularidades de partido de “novo tipo”, ou seja, de
uma agremiação política de massas, os integralistas preferiram sempre pontuar e ressaltar
que suas tarefas prioritárias eram: a organização e a educação doutrinária, a preocupação
com o desenvolvimento de uma consciência cívica nacional, a formação espiritual dos
cidadãos baseada nos princípios cristãos e o combate sem tréguas a todas as manifestações
das forças comunistas.
Contudo, essa nova concepção tática dos integralistas, apesar de incentivar seus
milicianos a continuar a atuar nessas tarefas, apresentava como grande diferencial em
134
relação à tática anterior uma sensível mudança de perspectiva política. Pode-se dizer que,
pela primeira vez – pelo menos publicamente – a direção da AIB passou a defender a tese
que apregoava a possibilidade de chegada e conquista do poder através da via eleitoral.
Sendo assim, para os integralistas, a partir da divulgação dessas novas resoluções, passou a
existir um “atalho” para a construção do “Estado Integral”: a alternativa das eleições.
Por conta dessa revisão tática o movimento integralista passou a concentrar todos
os seus esforços de mobilização e capital político no sentido de preparar o partido para as
futuras disputas eleitorais. Prioritariamente, os “camisas-verdes” deveriam eleger
numerosas bancadas de parlamentares e edificar uma ampla rede de prefeituras sob seu
controle. Seguindo sua nova tática eleitoral, toda essa estrutura serviria de suporte para a
manobra política mais ousada da AIB: ganhar a corrida presidencial de 1938.
Se durante o ano de 1935 os “camisas-verdes”, segundo seus próprios dirigentes,
haviam conseguido derrotar “os agentes de Moscou” – seus maiores adversários no campo
teórico – esse novo embate, ou seja, a disputa na arena eleitoral deveria passar a concentrar
todos os esforços dos integralistas. Contudo, para garantir um lugar no Palácio do Catete o
primeiro passo seria obter êxito nas eleições municipais de 1936.
Sem dúvida, o ano de 1936 foi pródigo para os integralistas, sobretudo seus
primeiros meses, marcados por uma onda de prisões de ex-militantes da ANL. Esse cenário
positivo favoreceu a emergência da AIB no tabuleiro político do Brasil. Isto é, a postura
dos “soldados de Deus” na campanha anticomunista que marcou aquele período240 foi
fundamental para atrair e cooptar amplos setores da população para as “fileiras do sigma”.
A partir do momento em que as forças antifascistas se encontravam em uma
posição completamente desfavorável e com seus mais destacados militantes presos ou
sendo perseguidos, os integralistas puderam concentrar suas forças nos preparativos para a
realização de novas “batalhas”, ou seja, as disputas das eleições municipais.
Já durantes os primeiros meses do ano de 1936 foram realizadas articulações que
evidenciaram essa mudança de postura em relação às disputas eleitorais. Para verificar
como essa nova tática chegou às bases do partido basta concentrarmos nossa atenção nos
240 Para mais informações sobre a grande onda anticomunista da década de 1930 e, principalmente, o papel da AIB nesse quadro político, ver: MOTTA, Rodrigo Pato Sá, op cit..
135
trabalhos do I Congresso da 7ª Região. Nesse fórum partidário tiveram destaque debates
sobre “assuntos relativos às próximas eleições”.241
Tanto que, apesar do caráter anticomunista do evento, as mais importantes
resoluções apresentadas tratavam exatamente das tarefas que deveriam ser executadas até a
data das disputas eleitorais. Os sete pontos aprovados no final do evento podem ser
apontados como um verdadeiro manual sobre as estratégias que os integralistas deveriam
desenvolver até as eleições municipais.
De maneira cristalina a AIB expôs sua “receita” para obter sucesso na disputa
eleitoral. Entre as tarefas apresentadas nas resoluções constavam as seguintes atividades:
promover debates do Código Eleitoral, arrecadação de fundos para campanha, listagem e
estatística de eleitores simpatizantes, organização de listas de candidatos, qualificação dos
integralistas não eleitores e realização de uma intensa propagando da AIB através dos
meios de comunicação.
Se esse novo confronto se desenrolaria num terreno mais prático, ou seja, no teatro
da disputa político-partidária, caberia a AIB adequar-se às regras do jogo político. Como se
vê, as diretivas aprovadas encaixavam-se exatamente na nova empreitada dos partidários de
Plínio Salgado e indicavam a necessidade dos integralistas ampliarem seu universo de
eleitores para ganharem volume eleitoral.
Como veremos a seguir, para cumprir tal tarefa foram acionados inúmeros
mecanismos que visavam, em primeiro lugar, ampliar o número de filiados ao movimento
e, em segundo lugar, atingir os mais amplos contingentes do eleitorado. Para ampliar seu
contingente de filiados-eleitores os “camisas-verdes” concentraram suas energias,
principalmente, nas seguintes frentes: os órgãos de imprensa, as atividades na área de
assistência social e na área educacional.
4.2 A IMPRENSA VERDE
Em relação às resoluções que deveriam nortear as atividades da AIB durante o
período pré-eleitoral – aprovadas durante o congresso dos integralistas da 7ª Região
Fluminense – gostaria de começar destacando o tópico 4. Esse ponto tratava exatamente do
emprego da propaganda política através dos meios de comunicação. Em relação à utilização
241 A Offensiva, pg. 5, 22/3/1936.
136
dos meios de comunicação é preciso sublinhar que os integralistas sempre manifestaram
uma preocupação em relação à divulgação de suas ações, mesmo antes de optarem pela via
eleitoral.
Tanto que ao longo de sua trajetória legal os “camisas-verdes” colecionaram uma
série de publicações, tais como jornais, revistas, panfletos e cartazes e foram uma das
organizações políticas pioneiras no emprego do rádio como um veículo de propaganda
política. Além das publicações de circulação nacional – jornais A Offensiva e Monitor
Integralista e das revistas Anaûe e Panorama – a AIB também contava uma rede de
publicações de caráter regional.242
É preciso destacar que “a palavra impressa”,243 ou seja, os livros e jornais sempre
estiveram entre as prioridades da AIB. Nessa perspectiva a tarefa do levar as teses dos
teóricos do movimento era dos livros e, por outro lado, caberia aos jornais a missão de
popularizar essas idéias. Para coordenar dezenas de publicações nacionais e regionais foi
criado um organismo denominado Sigma-Jornais Reunidas.
Essa estrutura, criada em 1935, ficava subordinada à Secretaria Nacional de
Propaganda que, por sua vez, estava ligada diretamente à chefia nacional.244 Posteriormente
em quase todas as “Províncias integralistas” surgiram publicações de caráter regional,
inclusive, na província fluminense. Entretanto, antes de analisarmos a “imprensa-verde” em
nosso estado, é importante apresentarmos algumas considerações sobre a utilização dos
meios de comunicação de massa como mecanismos de propaganda política.
Em relação a essa questão, é preciso afirmar que a preocupação dos integralistas em
divulgarem suas ações estava em sintonia com um fenômeno político da época: a utilização
da propaganda política de massa. Entre as décadas de 1930 e 1940 ocorreram inúmeros
avanços tecnológicos na área da comunicação que possibilitaram uma ampliação dos meios
de comunicação.245
Cientes dessa nova realidade, os regimes políticos instaurados, sobretudo na Itália
(Fascismo) e na Alemanha (Nazismo), empenharam-se em explorar ao máximo esse
242 Para maiores informações sobre a imprensa da AIB, ver: CAVALARI, Rosa M. F. Integralismo: ideologia e organização de um partido de massa no Brasil (1932-1937). Bauru, SP: EDUSC, 1999. 243 CAVALARI, op cit, pg. 79. 244 Idem, pg. 84. 245A popularização do cinema, das maquinas impressoras e do rádio permitiram uma rápida e monumental massificação dos meios de comunicação. Em diferentes países a propaganda política passou a ocupar um espaço cada vez mais destacado no cotidiano da população.
137
fenômeno. Os governos de ambos os países montaram todo um aparato estatal que passou a
ter a incumbência de planejar, organizar e executar os projetos de propaganda política. A
idéia central era despertar, emocionar e, principalmente, mobilizar milhares de militantes e,
simultaneamente, conquistar novos adeptos para suas causas.246
Na Alemanha, sob a égide da suástica, o rádio passou a ser utilizado como um
valioso instrumento na tarefa de difundir as propostas, atrair novos seguidores e fazer
propaganda política do governo chefiado por Adolf Hitler. Nesse processo de massificação
da propaganda de caráter partidário, sem dúvidas, os nazistas souberam utilizar esse veículo
de comunicação para ampliarem o raio de alcance de sua propaganda política,247 haja vista,
que um dos primeiros ministérios criados pelo regime do Nacional-socialismo foi
exatamente o Ministério da Informação Popular e Propaganda.248
Já na Itália fascista, apesar de também utilizar o rádio como instrumento de
propaganda política, o jornal “tornou-se o canal através do qual o regime transmitia às
massas as linhas de sua política interna”.249 Aliás, o Duce Benito Mussolini,250 antes de
fundar as primeiras células do fascismo, trabalhou como editor de jornais de tendência de
esquerda na Itália. Nesse país também houve uma ampla utilização de instrumentos de
propaganda política, tais como panfletos, jornais, livros, cartazes, etc.
Em nosso país a utilização de tais ferramentas com finalidade de arregimentação
política teve suas primeiras manifestações no início da década de 1930, mais precisamente
durante a administração de Pedro Ernesto Batista,251 então no cargo de interventor do
Distrito Federal.252 Durante sua administração o interventor teria utilizado o rádio e os
246 CAPELATO, Maria H. R. Multidões em cena. Propaganda Político no Varguismo e no Peronismo. Campinas: Papirus, 1999, pg. 65. 247 Idem, pg. 73 248 Sob a chefia de Joseph Goebbels, esse verdadeiro braço do Partido Nazista utilizou todo um arsenal de panfletos, cartazes e jornais que reproduziam as bases da doutrina do Nacional-Socialismo. 249 Idem, pg. 74 250 Sabe-se que Plínio Salgado, pouco antes de fundar a AIB, visitou a Itália e esteve pessoalmente como Mussolini. Provavelmente, a experiência de propaganda política empregado pelo fascismo italiano serviu de inspiração para o movimento integralista. 251 Para maiores informações sobre Pedro Ernesto Batista, ver: Dicionário Histórico Bibliográfico Brasileiro. 252 O interventor do Distrito Federal, Pedro Ernesto Batista, também teria utilizado os rádio e os jornais para divulgar as realizações de sua administração na capital do país. Para saber mais, ver em: GOMES, Ângela de Castro. A invenção do Trabalhismo. Rio de Janeiro: Relume Dumaré, 1994.
138
jornais para divulgar sua imagem popular de médico bondoso e solidário com os mais
carentes.253
Em nível nacional o emprego dos meios de comunicação como instrumentos de
mobilização ocorreu com maior destaque a partir da administração do presidente Getúlio
Vargas. Os primeiros passos nesse sentido ocorreram em 1931, com a criação do
Departamento Oficial de Propaganda. Em 1934, surgiu o Departamento Nacional de
Propaganda e Difusão Cultural. Mais tarde, em 1939, esse órgão recebeu a denominação de
Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), ligado ao Ministério da Justiça.
O rádio foi o veículo de comunicação mais utilizado pela administração Vargas para
realizar sua propaganda política. Sem dúvida, um dos elementos fundamentais para a
criação da mitologia política254 em torno da figura de Vargas entre a população foi a
construção de um poderoso aparato de propaganda estatal. Após a criação do DIP essa
tarefa experimentou uma profunda intensificação.
A administração Vargas desde seus primeiros momentos preocupou-se com essa
questão. Tanto que ainda em 1931 foi criado o programa radiofônico “Hora do Brasil”, que
teve o objetivo de explicitar as realizações da administração para as “massas”. Aliás, a idéia
de utilizar o rádio como veículo de propaganda estatal foi uma prática muito comum
durante esse período não só no Brasil como em vários países. 255
O importante do rádio não era exatamente o que era passado e sim como era passado, permitindo a exploração de sensações e emoções propícias para o envolvimento político dos ouvintes. Efeitos sonoros de massa podiam atingir e estimular a imaginação dos rádios-receptores, permitindo a integração, em variados tons entre emissor e ouvinte, para se atingir determinadas finalidades de participação política.256
Em nosso país o trabalho do DIP propiciou “uma encenação de caráter simbólico e
envolvente, estratagemas de ilusão participativa e de criação de um imaginário homogêneo
253 Em nenhum momento estamos fazendo qualquer paralelo entre Pedro Ernesto Batista e os lideres nazi-fascistas. 254 Para saber mais sobre o conceito de mitologia política, ver em: GIRARDET, Roaul. Mitos e Mitologias Políticas. São Paulo: Cia das Letras, 1987. 255 Além dos nazistas (Alemanha) e dos fascistas (Itália), o presidente Roosevelt também fez uso do rádio. O programa “conversa ao pé do fogo”, servia para o presidente norte-americano fazer uma prestação de contas de seu mandato para a população. Para saber mais, ver: OLIVEIRA, L.L. O Intelectual do DIP: Lourival Fontes e o Estado Novo. IN: BOMENY, Helena. Constelação Capanema: intelectuais e políticas. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2001. 256 LENHARO, Alcir. A Sacralização da Política. 2 Ed. Campinas: Papirus, 1986, pg. 41.
139
de comunidade nacional”.257 Ainda em relação ao DIP, suas funções não se restringiram
aos programas de rádio. Entre as outras atividades desenvolvidas pelo órgão estava a edição
de livros, cartilhas e panfletos voltados para as crianças e jovens – principais alvos dessa
verdadeira reeducação cívica.
No que diz respeito à AIB e à utilização dos meios de comunicação de massa para
realizar propaganda política é importante ressaltar que essa agremiação procurou adequar-
se a esse fenômeno político e, portanto, utilizar seus jornais, revistas, pronunciamentos no
rádio e panfletos como instrumentos de intervenção política. Entre inúmeros elementos que
permitem tipificar a AIB como um partido de novo tipo no cenário político brasileiro da
época um ponto assume maior destaque: a utilização da propaganda política.
Em meio ao mosaico de organizações que atuaram na esfera partidária do país
durante a década de 1930, a AIB foi a que soube utilizar de maneira mais ampla e
diversificada os meios de comunicação como ferramenta de legitimação de seu ideário e de
suas matrizes políticas. Para se distinguir entre os outros partidos políticos os “camisas-
verdes” utilizaram um amplo leque de materiais, entre eles: jornais, revistas, moedas,
medalhas, o rádio, o cinema, fotografias e cartazes.
Tudo indica que a passagem de muitos de seus dirigentes pela imprensa foi
importante para fundamentar a preocupação dos integralistas com os meios de
comunicação. É importante relembrar que, durante grande parte da década de 1920, Plínio
Salgado teve uma atuação destacada como jornalista e editor do Correio Paulistano, órgão
de imprensa que foi um verdadeiro porta-voz do Partido Republicano Paulista (PRP).
Outra experiência de Salgado na imprensa ocorreu em julho de 1931 quando o
futuro chefe nacional da AIB foi um dos fundadores do jornal A Razão.258 Nesse periódico
Plínio Salgado redigiu vários editoriais que já antecipavam inúmeras teses que seriam
encampadas pelo movimento integralista.
Os integralistas também preocuparam-se em difundir sua doutrina e suas propostas
utilizando outros veículos de comunicação. Especificamente os “soldados de Deus”
procuraram, sempre que possível, usar o rádio como espaço de mobilização e meio de
atingir o público externo. Como dissemos, visando atingir um público maior e mais
257 Idem, pg. 40. 258 CARONE, op cit, pg. 205.
140
diversificado, os “seguidores do sigma” não se importaram em comprar – em inúmeras
oportunidades – espaços no rádio para que seus líderes pudessem fazer pronunciamentos. O
próprio Plínio Salgado utilizou as ondas do rádio para realizar o lançamento oficial de sua
candidatura à Presidência da República em 1937.
Essa última informação é importante para demonstrar que a utilização dos meios de
comunicação de massa sempre fez parte do cotidiano político da AIB. Entretanto, é
fundamental ponderarmos que essa prática teve dois momentos bem distintos. Num
primeiro momento a preocupação central dos “camisas-verdes” era falar aos seus próprios
militantes, ou seja, unificar e uniformizar o discurso internamente.
Em um segundo momento, sobretudo durante períodos pré-eleitorais – eleições
municipais (1936) e campanha presidencial (1937) – toda a estrutura da “imprensa verde”
foi utilizada para um único objetivo: conquistar votos para as candidaturas integralistas.
Durante essa fase, como pretendemos demonstrar mais adiante, além de uma notável
ampliação dos periódicos regionais, todos os meios de comunicação da AIB passaram a ser
pautados em torno do seu projeto eleitoral.
Nesse sentido, a preocupação com a imprensa sempre esteve entre as prioridades da
AIB, tanto que os integralistas lançaram poucos meses após sua fundação, mais
precisamente em dezembro de 1932, seu primeiro órgão de informação: o jornal O
Integralista.259 Esse periódico estava vinculado ao Departamento Universitário da
“Província integralista paulista”. É importante ressaltar que o estado paulista foi um dos
mais destacados na publicação de jornais e revistas de caráter regional.260
Em âmbito nacional, coube ao jornal Monitor Integralista261 ser o pioneiro entre as
publicações da AIB. Esse primeiro jornal cumpriu a finalidade de divulgar para os
dirigentes e militantes as mais importantes resoluções e orientações do movimento
integralista. Publicado em papel jornal e com o tamanho “tablóide”, esse periódico serviu
como um importante canal de comunicação da organização durante seus primeiros anos de
existência.
259 DOTTA, Renato Alencar. A imprensa integralista de São Paulo e os trabalhadores urbanos (1932-1938). ORG: SILVA, Giselda Brito. IN: Estudos do Integralismo no Brasil. Recife: Ed. da UFRPE, 2007. pg. 164. 260 Para maiores informações sobre a “imprensa verde” em SP, ver: CAVALARI, Op, cit. e DOTTA, Op. cit. 261 Sobre os jornais de circulação nacional da AIB, ver: CARNEIRO, Maria L. Tucci e KOSSOY, Boris (ORG). A imprensa confiscada pelo Deops: 1924-1954. SP: Ateliê Editorial; Imprensa Oficial do Estado de São Paulo; Arquivo do Estado, 2003. (Serie Labirintos da Memória).
141
Como um partido que buscava se diferenciar das outras forças que militavam na
arena política brasileira, era imprescindível que os “camisas-verdes” utilizassem os meios
de comunicação como um instrumento de propaganda de suas atividades. Entretanto, com o
crescimento do número de núcleos e militantes, foi necessário empregar uma política de
agitação e propaganda mais agressiva.
Sendo assim, diferentemente do Monitor Integralista – que tinha uma finalidade de
órgão interno de informação – uma das mais importantes resoluções do I Congresso
Nacional da AIB, realizado em Vitória-ES em 1934, foi exatamente sobre a necessidade da
criação de um órgão de imprensa de circulação nacional que também fosse utilizado como
ferramenta de divulgação do movimento integralista. Respondendo a essa nova demanda
surgiu em maio de 1934 um novo periódico denominado A Offesiva.262
Impresso em papel jornal e editado em formato standard, inicialmente, esse
importante veículo de comunicação teve periodicidade quinzenal até chegar a ser um jornal
diário, exatamente durante o ano de 1936. A finalidade prioritária da A Offensiva foi
apresentar – em uma linguagem direta – os pilares da doutrina e, ao mesmo tempo, divulgar
o conjunto das atividades desenvolvidas pelas províncias, núcleos municipais e distritais
dos membros do partido.
Dessa forma, o novo jornal da AIB teve uma finalidade tripla. Em primeiro lugar
contribuiu para gerar recursos financeiros para o partido, pois era vendido nas bancas e
através de assinatura. A segunda finalidade era divulgar as atividades desenvolvidas nas
“Províncias Integralistas”. Como já afirmamos anteriormente, havia um espaço especifico
em A Offensiva chamado “Integralismo nas províncias” que apresentava relatos e informes
sobre as ações implementadas em todas as regiões do país. A terceira e, inegavelmente,
mais importante função da “imprensa-verde” foi de exercer o papel de instrumento de
unificação do discurso e padronizador das normas e condutas da organização. Isso porque
as páginas do jornal reproduziam frequentemente artigos e trechos das obras dos principais
teóricos integralistas, sobretudo de Plínio Salgado, Miguel Reale e Gustavo Barroso. O
diferencial era que esses fragmentos eram apresentados de forma didática e em linguagem
simples.
262 Idem.
142
Assim, quase todos os militantes alfabetizados podiam ter acesso aos pilares
elementares da AIB. Outra estratégia utilizada para ampliar o público leitor da A Offensiva
era a realização de leituras coletivas dos artigos dos dirigentes nacionais durante as sessões
semanais em todos os núcleos.263 Essa instrução era efetivamente passada pelas próprias
páginas do periódico, essa dinâmica possibilitava que até mesmo os “camisas-verdes” que
não eram leitores (crianças e analfabetos) tivessem a oportunidade de pelo menos serem
“ouvintes” da leitura do jornal.
Outro órgão de divulgação criado pelos integralistas foi a revista Anaûe. Lançada
em janeiro de 1935, esse veículo de comunicação guardava algumas peculiaridades em
relação aos outros periódicos da AIB. Em primeiro lugar tratava-se de uma publicação de
circulação nacional impressa em formato de revista e que utilizou amplamente as imagens
fotográficas como estratégia para divulgar o movimento integralista.
A linha editorial foi outro diferencial da Anaûe, pois seu conteúdo era claramente
mais leve se comparado aos outros órgãos da “imprensa verde”. Nas próprias palavras dos
editores o objetivo da revista era apresentar, em “linguagem acessível”,264 informações
sobre os trabalhos nas províncias, mensagens doutrinárias e artigos dos teóricos do
movimento. Para a época, outro importante e inovador recurso fartamente utilizado foram
as imagens fotográficas que ocuparam um espaço privilegiado na publicação.265
Se considerarmos o ano do lançamento da Anaûe – 1935 – e o seu grande interesse
em diversificar266 o público leitor – com especial atenção para as “blusas-verdes” – fica
nítido que, além de difundir as ações da AIB, esse meio de comunicação buscava se
adequar à realidade política imposta a partir da aprovação da nova legislação eleitoral, em
outras palavras, sua intenção era atrair a atenção e, principalmente, os votos femininos.267
263 CAVALARI, op.cit. 264 Revista Anaûe, pg. 3, 1935. 265 Sobre o tema, ver: BULHÕES, Tatiana da Silva. Fotografias, gênero e autoritarismo: representação de feminino pela Ação Integralista Brasileira. ORG: SILVA, Giselda Brito. IN: Estudos do Integralismo no Brasil. Recife: Ed. da UFRPE, 2007. 266 Essa opção em ser a publicação nacional da AIB voltada para todas as idades, sexos e profissões permitiu que a revista ampliasse o leque de seu público leitor. Sendo assim, esse periódico conciliava em suas páginas informações de caráter geral com notas, artigos e colunas que estavam voltadas para os temas mais gerais do movimento. Buscando se adequar a sua múltipla finalidade a variedade dos temas na pauta foi a marca mais forte dessa revista. 267Se, em relação as outras organizações políticas da época, a revista Anaûe representou a abertura de um espaço pioneiro para as militantes, por um lado, sua finalidade continuava sendo a de doutrinar os “seguidores e seguidoras do sigma” dentro da noção e concepção da AIB sobre o papel das mulheres na sociedade.
143
Tanto que, entre as matérias vinculadas pela revista, costumeiramente, constavam
informações sobre modelos de corte e costura de uniformes femininos, inclusive com
desenhos das peças. Outro espaço existente na publicação era uma coluna social que
informava a militância sobre cerimônias de casamentos, batismos e aniversários ocorridos
nos diversos núcleos do país. Em outros espaços a revista trazia artigos sobre a importância
das atividades físicas para todos os filiados, inclusive, para as “blusas-verdes”.268 Outros
temas que sempre eram relatados nas páginas da revista eram os relativos às atividades de
assistência social da AIB.269
Como frisamos anteriormente, a AIB procurou diferenciar-se das outras
agremiações políticas existentes no país em múltiplos aspectos. Dessa forma, a
preocupação em editar órgãos de informação próprios já se manifestou poucos meses
depois de sua fundação. Contudo, gostaríamos de chamar a atenção para um fato de
extrema importância: o período que registrou o maior número de lançamentos da
“imprensa-verde” ocorreu exatamente após a adoção da tática da via eleitoral.
Portanto, a nova tática política dos integralistas impôs aos partidários de Plínio
Salgado a tarefa de expandir o seu público leitor, pois cada novo consumidor das
informações da “imprensa-verde” poderia transformar-se em um eleitor do partido. Cabe
aqui uma questão: como o movimento integralista procurou cumprir essa missão?
Para dar conta desses novos desafios as províncias, os núcleos regionais e os
municipais passaram a editar uma ampla variedade de órgãos informativos locais. Tendo
em vista, provavelmente, as dimensões do país e as suas infinitas particularidades regionais,
a AIB novamente deu uma mostra de sua singularidade. Sendo assim, a partir de 1935, se
observou um aumento significativo no número de jornais e revistas vinculados aos núcleos
locais.270
Voltando agora às resoluções do Primeiro Congresso da 7ª Região fluminense –
mais precisamente ao tópico 4, que orientava sobre a utilização dos meios de comunicação
na campanha eleitoral – pode-se perceber que os dirigentes da “Província integralista
268 Para maiores informações sobre a revista Anaûe, ver em: SILVA, Rogério Souza. A política como espetáculo: a reinvenção da história brasileira e a consolidação dos discursos e das imagens integralistas na revista “Anaûe”. IN: Revista Brasileira de História. V. 25, n50, p. 61-95. 2005. 269 Em outro seguimento desse capítulo iremos apresentar questões especificas sobre o trabalho de assistência social desenvolvido pelos integralistas no estado do RJ. 270 Para uma análise completa da rede jornais e revistas da AIB, ver: CAVALARI. Op. cit.
144
fluminense” procuraram implementar uma rede de informativos. Basta constatar que
chegaram a circular no estado inúmeras publicações ligadas aos “camisas-verdes”.
Núcleos municipais de quase todas as regiões integralistas fluminenses tomaram a
iniciativa de editar algum tipo de informativo para divulgar as suas atividades. Vários
núcleos municipais chegaram a contar com órgãos informativos específicos. Conforme a
mesma prática adotada em outras “Províncias integralistas” do país, também no estado do
Rio de Janeiro os “seguidores do sigma” buscaram utilizar órgãos de imprensa como
instrumentos de mobilização de massa.271 Como observamos, nosso estado contou com
vários órgãos de informação que cumpriram o papel de reproduzir em âmbito local as
propostas políticas e teóricas da direção nacional do movimento integralista.
Entre esse conjunto de periódicos dos “camisas-verdes” gostaríamos de destacar
duas outras publicações que julgamos ser extremamente significativas em relação aos
órgãos de informação que foram editados no estado, são elas: a revista Falena (Campos dos
Goytacazes) e a revista Sigma (Niterói).
A revista Falena estava ligada aos integralistas do núcleo municipal de Campos. O
curioso em relação a essa publicação foi o fato dela ter sido lançada ainda no primeiro
semestre de 1935 como uma revista de caráter literário. Sua finalidade seria reunir em suas
páginas artigos, contos, crônicas e poemas, ou seja, seu objetivo original era apenas
divulgar a literatura. Ainda nessa fase, na galeria de seus idealizadores podemos citar, ente
outros, Barreto Filho, Vitor Manhães, F. A. Balbi e Antonio Barreto. Todas essas pessoas
atuavam na área das letras em Campos. 272
Contudo, a partir de janeiro de 1936, a revista passou por uma grande
“metamorfose”, como podemos observar no belo desenho de uma “borboleta integralista”
estampada na sua capa. Dessa forma, a partir de seu sétimo número, lançado em 15 de
janeiro de 1936, a revista passou a ser utilizada como veículo de “comunicação do
integralismo”.
271 Ver em Anexos lista de periódicos da AIB que foram editados no estado do Rio de Janeiro 272A sede da revista ficava na Rua 13 de Maio, ou seja, na região central da cidade. Sua impressão era feita em papel jornal, com o formado 26,5 x 18 e era utilizada, provavelmente, uma maquina impressora chamada Linotipo, ou seja, que permitia a publicação de textos e imagens fotográficas. No total, a edição pesquisada contava com 31 páginas, sendo que apenas, a capa era colorida. A periodicidade da publicação era irregular e a tiragem de sua sétima edição foi de 1.000 exemplares.
145
A justificativa para a mudança de rumo da publicação foi apresentada no editorial
intitulado “Mais vale tarde que nunca”. Assinado por Theodomiro Brum, um dos editores
da revista, o texto apresenta um breve histórico da AIB, a partir da sua fundação e destaca o
papel da organização na defesa do país contra a ameaça dos comunistas e na luta contra “as
mãos ásperas desses políticos sem consciência”. Por fim, o editor escreve assumindo a
responsabilidade pela associação da revista com o núcleo municipal dos “camisas-verdes”.
É importante ressaltar outro artigo publicado na página 8 – sem assinatura – que
apresenta outras razões que motivaram a mudança na linha editorial da Falena. O texto
afirma, entre outras coisas, que a partir desse número a revista iria se afastar do
“diletantismo literário e das divagações infrutíferas” e passaria a se concentrar nos debates
sobre “o problema nacional brasileiro”.273
O artigo prossegue citando uma série de mazelas do mundo moderno, tais como, o
ódio, a cólera, a hipocrisia, o mercantilismo e a melancolia. Para todos esses problemas era
indicado que as pessoas buscassem sentimentos de serenidade e de reflexão. O objetivo de
todos deveria ser o desenvolvimento dos “dotes espirituais” que contribuiriam para
“elevação cultural e moral”. Assim, o integralismo era apontado como único caminho para
“solucionar os conflitos sociais”.
273 Idem, pg. 8.
146
Como era comum em outras publicações estaduais e municipais da AIB a revista
apresentava uma série de fotografias sobre as atividades do núcleo local, questão que
trataremos melhor mais adiante. Já em relação ao conteúdo da Falena podemos verificar
que os argumentos utilizados na revista eram, em sua maioria, reproduções de textos
doutrinários dos dirigentes nacionais dos “camisas-verdes”.
Sendo assim, as matérias reproduzidas na Falena deixam nítido que os órgãos de
imprensa do interior cumpriam fielmente seu papel: serem reprodutores e divulgadores das
bases teóricas do movimento integralista. A prioridade dos órgãos de informação local era
retomar os temas amplamente difundidos pelos veículos de comunicação de circulação
nacional.
FONTE: Revista Sigma, número 1, 1937. Arquivo Público de Rio Claro – SP.
Em setembro de 1937, pretendendo cumprir essa mesma finalidade, foi lançada
pelos militantes do núcleo de Niterói uma revista chamada Sigma.274 Inegavelmente essa
edição teve um conteúdo e uma finalidade claramente eleitoral, pois o país estava em pleno
processo de campanha presidencial. A publicação contava com uma equipe formada pelos
274 Esse primeiro e talvez único número da revista, contou com uma edição de 36 páginas impressas em preto e branco, exceto a capa que era verde. A revista Sigma tinha um formato padrão com 26 cm de altura e 17,5 de largura. Sua redação ficava na rua Visconde de Rio Branco, n 337, sala 5 do edifício Odeon.
147
seguintes componentes: Antonio da Cunha Motta (editor), Luiz Souza de Miranda
(secretario) e Edmar de Figueiredo Orestes (gerente). Nessa primeira e, possivelmente,
única edição, a revista teve a indisfarçável função de ser um verdadeiro “panfleto” pró-
candidatura de Plínio Salgado.
Esse fato já ficou nítido no editorial da revista que apresentou um texto que, no
mínimo, colocava Plínio Salgado numa posição sacra. Isso porque o texto ao referir-se ao
chefe nacional simplesmente utilizava os termos “ELLE e NELLE”, escritos assim em
maiúsculo para se referir ao líder máximo dos integralistas. O editorial afirma, entre outras
coisas, que “ELLE é a alma de uma geração, ELLE e a imagem do chefe. ELLE é a
coragem. É a fé. É a renuncia. É o sacrifício”.275
O tom apologético continua ao longo do texto, voltado nitidamente para enaltecer a
figura do chefe/candidato. Nas outras matérias da revista são apresentados relatos sobre a
memória e a trajetória da AIB no estado e, sobretudo, na cidade de Niterói. Como uma
publicação lançada em setembro de 1937, obrigatoriamente, a Sigma teve que fazer
referência as vítimas fatais do tiroteio que aconteceu no comício integralista na cidade de
Campos dos Goytacazes, em 15 de agosto daquele ano.276
No restante da revista as matérias, em sua maioria sem assinatura, seguem a tônica
geral das outras publicações regionais da AIB: apresentar textos, mensagens e imagens
produzidas pelos órgãos nacionais da “imprensa-verde”. Contudo, nas duas publicações
analisadas (Falena e Sigma) uma questão se destaca: a utilização de imagens fotográficas
do chefe nacional da AIB.
A utilização das fontes fotográficas tem despertado, nos últimos anos, um grande
interesse nos meios acadêmicos.277 Pretendemos contextualizar a produção da fotografia
como algo semelhante à produção de um texto. Analisar, assim, o estoque de signos
presentes nas fotografias, consiste em observar que alguns desses signos estariam nos
gestos, atitudes, expressões, cores, efeitos especiais, enfim, cada fotografia estaria repleta
275 Revista Sigma, número 1, 1937. Arquivo Público de Rio Claro – SP. 276 No próximo capitulo iremos tratar de maneira mais aprofundada esse episódio. 277 Para mais informações sobre a utilização das fontes imagéticas, ver: nas seguintes obras: KOSSOY, Boris. Fotografia e História. São Paulo: Ateliê Cultural, 2001. MAUD, Ana Maria e CARDOSO, Ciro Flamarion. História e imagem: os exemplos da fotografia e cinema. IN: CARDOSO, Ciro F. e VAINFAS, R. Domínios da História. Rio de Janeiro: Campus, 1997.
148
de certos significados pertencentes a uma determinada prática social inserida em
determinado contexto histórico.278
O emprego de fotografias como instrumento de unificação da AIB não ficou restrito
aos seus órgãos de comunicação. Tanto que existiam orientações nos documentos oficiais
do partido para a utilização da imagem de Plínio Salgado em todos os locais do país que
servissem de sede da organização. Como dissemos no primeiro capítulo, havia uma
padronização em relação às sedes dos núcleos que determinava que uma fotografia de
Plínio Salgado – sempre de uniforme e de olhar fixo – deveria ocupar um espaço destacado
no recinto. A intenção era que todos tivessem a sensação de estarem sendo observadas pelo
líder da AIB durante as concentrações e reuniões.
FONTE: Revista Falena, janeiro de 1936.
Retomando as revistas publicadas na “Província fluminense”, apesar das duas terem
sido lançadas em cidades e épocas diferentes, ambas têm algo em comum: a farta utilização
de imagens fotográficas. Na revista Sigma de Niterói a própria capa era a reprodução de
uma imagem do chefe nacional. Quase como uma efígie, a imagem de Plínio Salgado de
perfil dominava a capa da publicação.
278 CARDOSO e MAUD, op cit, pg. 406.
149
Na Falena, apesar de não estar na capa, a imagem de Salgado ocupava um espaço
privilegiado na página cinco. Nessa publicação a fotografia era em preto-e-branco e media
13,5 x 8,5, claramente tratava-se de uma foto posada que pode ter sido produzida em algum
estúdio profissional. Esse detalhe é facilmente perceptível pelo fato do olhar de Salgado
estar firme e mirando algum ponto a sua frente. Outro importante detalhe é que apesar de
fisicamente ser franzino e de baixa estatura – o fato de estar de braços cruzados transmite a
impressão de grandeza e força ao líder dos integralistas.
Essa prática de difundir imagens monumentais de líderes políticos foi algo
amplamente empregado entre as mais diferentes organizações de caráter partidário durante
o século XX. Em vários outros regimes políticos – a Alemanha de Hitler foi o melhor
exemplo – nas fotografias os chefes políticos, frequentemente, vestem uniformes e estão
em poses triunfantes.279 Dessa forma, até mesmo as imagens foram utilizadas para estreitar
as relações entre a “massa” e o líder. Mesmo que para isso imagens fossem retocadas para
que os líderes parecessem maiores.280
Outra importante observação em relação a utilização das imagens era que nessas
fotografias ou quadros o dirigente retratado aparecia sozinho. Esse fato, obviamente
intencional, permitia que se realizassem os devidos retoques para que nenhuma
particularidade física atrapalhasse ou deturpasse a visão que deveria ser construída no
imaginário da população: a noção de perfeição e inefabilidade em torno da figura do chefe.
Nos casos das fotografias analisadas essa percepção é algo nítido.
No caso da fotografia de Plínio Salgado na revista Falena, a legenda da imagem
justifica sua inserção por um motivo simples: prestar uma homenagem ao aniversário do
chefe nacional. A mensagem prossegue na mesma linha de culto à personalidade de todas
as outras, ou seja, o chefe do partido era apresentado como “expressão singular das virtudes
morais e espirituais da raça”,281 além disso, seria ao mesmo tempo “intérprete mediúnico da
angústia nacional”.282
279 BURKE, Peter. Testemunha ocular: História e imagem. Bauru, SP: EDUSC, 2004, pg. 90. 280 Idem, pg. 90 281 Falena, número 7, pág. 5, 1936. 282 Idem.
150
As considerações em torno das incontáveis qualidades do líder do partido continuam
em tom cada vez mais exagerado. Os “camisas-verdes” da 7ª Região Fluminense, que
assinam a nota, chegaram ao cúmulo de pedir que “Deus conserve indefinidamente a vida
do grande condutor de almas”. Dessa forma, para os membros da AIB, a tarefa do
“condutor de almas” exigiria que Plínio Salgado vivesse eternamente. Assim, o “imortal”
Chefe Nacional seria o responsável por manter “cada vez mais pura, luminosa e intangível
a idéia integralista”.283
Como foi visto ao longo das últimas páginas, a AIB sofreu uma grande
transformação na sua tática política. O seu projeto estratégico continuava sendo dominar o
poder político do país, contudo, a sua “perspectiva” revolucionária sofreu uma significativa
mudança a partir do seu Segundo Congresso Nacional, em 1935. As atividades do partido
passaram a ter como prioridade uma finalidade mais prática, em outras palavras, garimpar
votos para seus candidatos, sobretudo visando a disputa presidencial de 1938.
Evidentemente, tendo em vista a conjuntura da época, os integralistas construíram
uma ampla estrutura de meios de comunicação – em nível nacional e regional – que deveria
justificar sua existência apenas se fossem constantemente (mensal, quinzenal, semanal e
diariamente) “alimentadas” por informações relativas às atividades dos dirigentes e
militantes. Sabendo que os “soldados de Deus” criaram uma verdadeira rede de jornais e
revistas, que foi ampliada a partir de 1936, surge uma dúvida: durante esse período quais
informações passaram a ser apresentadas com maior destaque na “imprensa-verde”?
4.3 A CRUZ-VERDE: O TRABALHO ASSITENCIAL DA AIB
Possuir uma ampla rede de órgãos informativos era algo que não garantia que os
integralistas tivessem fatos concretos para apresentar para seus leitores/eleitores.
Entretanto, a partir do momento que adotaram a via eleitoral os “soldados de Deus”
precisariam apresentar às “massas” mais do que apenas a sua retórica doutrinária ou
fotografias posadas de seu líder.
Nesse sentido, podemos verificar que foi exatamente nesse momento que ocorreu
um adensamento das atividades de caráter social dos integralistas. Os trabalhos
desenvolvidos nas escolas, ambulatórios, asilos, enfim, as atividades sociais passaram a
283 Idem.
151
ocupar – durante os períodos pré-eleitorais – cada vez mais espaços nos órgãos
informativos da AIB.
Obviamente, esse adensamento das atividades sociais, verificado a partir de 1936 –
como também foi visto na área da propaganda política – tinha como finalidade garantir a
ampliação do volume de votos dos seguidores de Plínio Salgado. Porem, antes de
prosseguirmos, é importante salientar que os integralistas já realizavam atividades no
campo da assistência social.
Contudo, inegavelmente, o que gostaríamos de ponderar mais uma vez é que essa
preocupação intensificou-se com a aproximação das eleições, ou seja, como na utilização
dos meios de comunicação, a área social da AIB também passou por uma transformação
para atender às demandas criadas a partir da adoção da sua nova tática eleitoral.
Novamente, antes de passarmos adiante, é fundamental levantarmos algumas interrogações,
tais como: Em quais áreas os “camisas-verdes” concentravam suas ações? Quais quadros da
AIB se ocuparam dessas tarefas? Como eram feitas essas ações?
Quanto à primeira interrogação, pode-se dizer que as ações de assistência social dos
integralistas abrangiam basicamente três áreas: a saúde, a educação e as obras de caridade.
É necessário destacarmos que enquanto partido político que afirmava ser diferente, a AIB
agiu de forma extremamente afinada com as necessidades de sua época, ou seja, procurou
intensificar sua atuação exatamente nas áreas de maior carência em relação às políticas
sociais do poder público: a saúde e a educação.284
Tratava-se, nitidamente, de uma estratégia que atingiu várias metas ao mesmo
tempo. Além de possibilitar uma ampliação dos contatos da AIB com a população, essa
atuação também serviu como um fator de mobilização interna e atração de novos militantes.
Isto é, para criar essa verdadeira “rede de solidariedade” foi preciso ampliar o número de
filiados e militantes.
Dessa maneira, a própria divulgação das ações dos “camisas-verdes” nos meios de
comunicação da organização teve a finalidade de demonstrar que a AIB era uma
organização política diferenciada em relação aos “partidos de gabinete”, isso porque,
284 Não está entre os objetivos desse trabalho, analisar sistematicamente as políticas públicas para a área social.
152
independentemente do sexo, da idade ou da condição financeira todos que ingressavam nas
“fileiras do sigma” passavam a ter tarefas.
Essa tônica na ação foi um dos pilares da organização. Ou seja, diferentemente das
outras agremiações partidárias, na AIB qualquer filiado ou, principalmente, filiada poderia
participar de quase todas as atividades. Isso posto, fica evidente que na AIB os militantes
não foram apenas meros espectadores/eleitores, pois existiria uma tarefa específica para
cada indivíduo que ingressasse no partido.
Dessa forma, o incentivo à militância ativa de seus membros foi outro dos traços
marcantes da cultura política dos “camisas-verdes”. O cidadão que ingressasse no
movimento integralista passava a ter sua agenda política repleta de atividades. Sobretudo
porque semanalmente aconteciam reuniões nas sedes, conferências, desfiles, churrascos e
excursões que envolviam todos os militantes.
Como pudemos verificar nos capítulos anteriores, os integralistas fluminenses
constantemente faziam viagens e visitas a outros núcleos. No caso dos trabalhos de
assistência social o conjunto dos militantes era convocado para periodicamente comparecer
nas atividades realizadas em asilos, orfanatos e hospitais. Com isso, o novo filiado passava
a ser cotidianamente encorajado a militar, estudar, contribuir financeiramente e,
principalmente, a filiar novas pessoas na AIB.
Nesse sentido, o incentivo da direção do partido em relação à militância constante
era tão importante para coesão e unidade do movimento quanto à utilização dos uniformes,
pois mesmo o elemento recém filiado encontrava espaços e tarefas que, por um lado,
ajudavam a capitalizar dividendos políticos para a agremiação e, ao mesmo tempo, também
contribuíam para criar um sentimento de “pertencimento” do novo integralista.
Assim a organização ampliava cada vez mais seu quadro de adeptos. Segundo essa
lógica, cada novo militante – ganho para a “causa” – tornava-se de imediato um recrutador
de novos filiados. Esse verdadeiro “círculo virtuoso” foi potencializado pela divulgação das
obras sociais da AIB, como destacamos anteriormente, por meio da rede de informativos da
“Sigma Jornais Reunidos”. Essa dinâmica funcionava como uma verdadeira corrente, ou
seja, quanto mais obras e atividades sociais realizadas, maior era a divulgação nos órgãos
de imprensa do partido.
153
Um exemplo desse processo, funcionando na prática, pode ser observado durante
uma “farta distribuição de prendas”285 que ocorreu durante as comemorações natalinas de
1935, no núcleo municipal de Pirai. O chamado “Natal dos Pobres” era um evento que fazia
parte do calendário nacional dos integralistas. Contudo, esses eventos – marcados pelas
visitas de “senhoras e senhoritas integralistas” que generosamente faziam uma “distribuição
de brindes aos pobres” – acabaram sendo apenas uma das inúmeras atividades sociais das
militantes do partido.
Se, anteriormente, os trabalhos na área social da AIB concentravam suas energias na
distribuição de brinquedos e balas no natal ou ainda na visita – mesmo que sistemática – a
asilos de idosos, orfanatos, hospitais e asilos de tuberculosos, com a aproximação das
eleições de 1936 houve uma significativa mudança no perfil das “obras sociais” dos
integralistas. Assim, com a aproximação do pleito essa prática passou por transformações
para adaptar-se à nova tática eleitoral dos “camisas-verdes”. Vejamos que mudanças foram
essas.
Em maio de 1936 centenas de militantes do núcleo municipal de Itaperuna
reuniram-se para celebrar uma tripla inauguração: uma escola (diurna e noturna), um
consultório médico e um posto odontológico.286 Todos os dirigentes durante suas
intervenções procuravam destacar as vantagens para a população da região, em especial
para os “militantes do Sigma”, no fato da sede da AIB passar a abrigar postos de assistência
médica e dentária. E mais, a sede também abrigaria em suas dependências mais duas
escolas da AIB que, para o início das atividades, já havia “matriculado 32 alunos”.
Se pensarmos unicamente na busca de votos e na atração de novos eleitores, meta
central da AIB, seria impossível comparar a distância entre os dividendos político-eleitorais
alcançados com a instalação de serviços médicos, dentários e educacionais com as
atividades desenvolvidas anteriormente – visitas a hospitais e distribuição de balas para as
crianças – pelos integralistas.
Outra das peculiaridades apresentada pelos integralistas em relação aos demais
partidos, foi a sua capacidade de unificar sua militância nas mais destacadas atividades,
inclusive, no trabalho de assistência social. Como dissemos, essa atividade servia para
285 A Offensiva, pg. 15, 15/03/1936. 286 A Offensiva, pg. 1, 26\5\1936.
154
mobilizar milhares de “camisas-verdes” que de maneira solidária contribuíam para
amenizar a situação da população fluminense.
Por outro lado, os dirigentes da AIB souberam utilizar esse trabalho como
propaganda política a favor do partido, sobretudo durante as campanhas eleitorais. Nesse
sentido, foram instalados um total de 12 consultórios dentários, ambulatórios e postos
médicos nos seguintes locais do estado: Joaquim Távora, Campos, São Sebastião do Alto,
Itaocara, Miracema, Teresópolis, Ponte Nova, Tristão Câmara, Jaguará, São José do Rio
Negro e dois postos em Petrópolis.
Podemos constatar que durante essa fase, apesar de não abandonarem as ações
esporádicas e pontuais, como o “Natal dos Pobres”, os integralistas passaram a imprimir
outra marca às suas atividades de cunho social, ou seja, elas passaram a ser permanentes e
duradouras.
Com a aproximação do período das disputas eleitorais esse mecanismo foi colocado
à prova como um importante instrumento para garantir a adesão de novos filiados e, claro,
os votos dos incontáveis cidadãos-eleitores assistidos pela “cruz-verde”. Outra atividade
que passou a ocupar cada vez mais atenção entre os integralistas foi a criação e manutenção
de escolas de alfabetização.
Como veremos a seguir, todas essas atividades tiveram as chamadas “blusas-verdes”
como principais responsáveis por sua manutenção. Dessa forma, para jogar algum peso de
fato no mercado político foi necessário que os integralistas agissem de maneira pontual e
planejada. Nesse sentido, o partido procurou atuar de forma pioneira em duas esferas: na
atração da militância feminina a na alfabetização de adultos. Entretanto, antes de tratarmos
das “escolas-verdes” se faz necessário destacarmos a importância das inúmeras militantes
que compuseram os “quadros partidários” da AIB.
4.4 AS BLUSAS-VERDES E AS ESCOLAS INTEGRALISTAS FLUMINENSES
Nesse período outras atividades que passaram a ocupar cada vez mais espaços entre
os integralistas foram as ligadas à criação e manutenção de creches, lactários e,
principalmente, escolas de alfabetização. Igualmente, como nos casos da “imprensa-verde”
155
e assistência social, é preciso destacar que – mesmo antes de adotar a via eleitoral – a AIB
já contava em sua estrutura organizacional com um Departamento Nacional Feminino.287
Contudo, é importante sublinhar que esse órgão servia para reproduzir, entre as
“blusas-verdes”, o mesmo modelo da estrutura hierárquica da organização, ou seja,
reproduzir a disciplina orgânica dos “camisas-verdes” entre suas militantes.
As divisões que compunham o Departamento Feminino possuíam programas e atividades com ampla atuação, que iam de aulas de ginástica e a prática de esportes para o sexo feminino, como atividades de alfabetização, enfermagem, puericultura, datilografia, culinária, corte e costura, boas maneiras, contabilidade caseira e economia doméstica. Cursos de especialização em Sociologia, Psicologia e Pedagogia poderiam ser oferecidos, além de um cronograma de conferências sobre economia social, geografia humana, literatura, arte e formação moral e cívica.288
As funções que ficaram a cargo do Departamento Feminino foram estabelecidas nos
protocolos, regimentos e estatutos dos “soldados de Deus”. Apesar de contar com um
departamento específico, a autonomia das mulheres dentro do partido terminava nesse
ponto.289 Dessa forma, a atuação das “blusas-verdes” no interior do movimento integralista
deveria refletir o papel previsto pelos teóricos da AIB sobre o tipo de mulher ideal no
“Estado Integral”: o de mãe e esposa, ou seja, o sustentáculo dos valores cristãos no interior
das famílias brasileiras.
Assim, apesar de atuarem com destaque no trabalho de assistência social e
educacional, a visão dos teóricos do integralismo era claramente preconceituosa em relação
à capacidade das mulheres. O papel das militantes era visto como menor e inferior ao dos
“camisas-verdes”, pois de certo modo, a divisão de funções da sociedade da época –
homem provedor e a mulher um ser passivo – eram reproduzidas, defendidas e aceitas pelos
principais dirigentes integralistas.
Portanto, existia uma verdadeira distinção de gêneros no interior da AIB, pois as
mulheres ocuparam um papel meramente secundário em atividades teóricas, em desfiles,
287 Mais informações sobre a participação das mulheres na AIB, ver: CAVALARI, Rosa Mº F. Integralismo: ideologia e organização de um partido de massa no Brasil. (1932- 1937). Bauru, SP: EDUSC, 1999. POSSAS, Lídia M. Vianna Possas. O Integralismo e a mulher. IN: Integralismo: novos estudos e reinterpretações. ORG: DOTTA, Renato Alencar, POSSAS, Lídia M. Vianna e CAVALARI, Rosa M. F. Rio Claro: Arquivo do Município, 2004. 288 POSSAS, Lídia M. Vianna. Op cit, p. 112 289 Idem..
156
nas marchas, nas eleições e nos enfrentamentos de rua.290 Feitas essas ponderações,
podemos voltar às articulações e preparativos para a participação dos integralistas
fluminenses nas eleições de 1936. Sendo assim, através de uma estrutura que tinha como
eixos a propaganda política, a “imprensa-verde” e a assistência social que os integralistas
procuraram diferenciar-se das outras agremiações partidárias.
A partir da opção pela via eleitoral, foi preciso adequar toda essa estrutura
organizacional aos novos objetivos do partido. Além dessas questões, gostaríamos de
incluir mais uma: a incorporação de milhares de novas militantes nas “fileiras do sigma”
foi, indubitavelmente, um dos fatores fundamentais para o crescimento vertiginoso da AIB
ao longo de seu período de existência legal. Assim, a militância no partido conferiu um
novo sentido ao cotidiano das pessoas.
Isso ocorreu porque, mais uma vez, os integralistas agiram de maneira
extremamente eficaz e inteligente ao terem sido uma das primeiras organizações partidárias
a criarem espaços específicos, mesmo que limitados, para a atuação das chamadas “blusas-
verdes”. Dessa forma, só foi possível ocorrer uma ampliação dos serviços de amparo social
e educação porque o partido acolheu e confiou em milhares de militantes que ingressarem
da AIB. Portanto, coube às “blusas-verdes” a grande responsabilidade de executarem, na
prática, os mais variados projetos de assistência social e educacional dos integralistas.
A presença das “blusas-verdes” no interior da AIB cumpriu na verdade um duplo
papel: primeiro possibilitou a implementação dos projetos de assistência social dos
integralistas e em segundo lugar aproximou milhares de mulheres da organização. Essa
segunda informação assume uma importância estratégica quando constatamos que, a partir
da criação do Código Eleitoral de 1932 e da aprovação da Constituição de 1934, foi
introduzida uma significativa inovação na legislação eleitoral brasileira: o voto feminino.
Dessa feita, a AIB passou a valorizar duplamente a presença em suas fileiras das
“blusas-verdes”, pois agora as militantes, além de assumirem o papel de protagonistas na
execução das tarefas na área social e educacional, também poderiam ser eleitoras dos
“candidatos-verdes”. Indiscutivelmente a AIB, uma força política estruturada em nível
nacional, ao oferecer espaços políticos que possibilitavam a militância de milhares de
290 É importante registrar que segundo as autoras citadas o número de militantes do sexo feminino no interior da AIB teve seu crescimento mais notável nos períodos de alistamento eleitoral.
157
mulheres, acabou acumulando um capital político de valor inestimável, sobretudo se
pensarmos na disputa presidencial que se aproximava.
Como afirmamos, a presença de um notável contingente de mulheres/eleitoras
representou mais um elemento diferencial entre a AIB e a maioria das outras agremiações
políticas da época. Por seu turno, as “blusas-verdes” atuaram como verdadeiras
multiplicadoras de votos, principalmente nas tarefas educacionais, ou seja, nas escolas
integralistas formando novos eleitores/alfabetizados.
Outro ponto a ser destacado em relação às militantes da AIB é que a criação de
espaços específicos para as mulheres dentro da estrutura orgânica serviu como um
incentivo para o recrutamento de novas militantes. Sem dúvida, nota-se que ao ingressarem
numa organização como a AIB todos os recém-filiados passavam a desenvolver novas
atividades de sociabilidade, tais como: usar uniformes, praticar atividades de educação
física, participar de desfiles e estudarem em conjunto.
No caso das “blusas-verdes” esse tipo de possibilidade representou algo inovador
para os padrões de comportamento feminino da época que, como acabamos de verificar, até
poucos anos antes impediam as mulheres de exercerem o mais elementar dos direitos do
cidadão: votar nas eleições. Assim, outra vez, a AIB agiu com habilidade ao procurar atrair
para sua órbita os mais amplos contingentes da população que, naquele momento,
buscavam espaços políticos para atuarem.
Sem dúvida, a militância das “blusas-verdes” abriu uma perspectiva pioneira para
milhares de novas filiadas poderem atuar, na prática, em uma organização político-
partidária. Nesse contexto, a missão prioritária das militantes do partido foi de se
converterem em educadoras e, principalmente, alfabetizadoras. A seguir, cientes da
importância das “escolas-verdes” para o projeto eleitoral da AIB, iremos apresentar como
foi a atuação dos integralistas fluminenses nessa área.
Em abril de 1936 centenas de milicianos da 9ª Região da “Província integralista
fluminense” realizaram uma grande concentração no núcleo distrital de Floresta, localidade
próxima ao município de Natividade. O ponto alto desse evento foi marcado pela
inauguração da escola de alfabetização denominada Alberto Sechin, que teria como
158
finalidade “alfabetizar e educar aqueles que são os verdadeiros sustentáculos da
nacionalidade: os lavradores”.291
A nova “escola-verde” deveria, pelo menos em tese, oferecer a oportunidade para
que inúmeros moradores da zona rural da cidade pudessem receber, pela primeira vez,
lições elementares de leitura e escrita. Durante as intervenções dos dirigentes as
justificativas apresentadas para a abertura da escola eram de que só através da instrução a
população deixaria de ser “ludibriada” pelo “canto da sereia” dos “políticos da liberal
democracia”. 292
Prosseguindo em sua “escalada educacional”, em junho de 1936, um núcleo dos
“soldados de Deus” foi organizado em Angra dos Reis. O feito foi celebrado com uma
grandiosa cerimônia que serviu para marcar a abertura da sede do movimento. Como em
outras localidades do estado, também nesse município, na sede do partido foi instalada mais
uma “escola-verde”.293
Durante seu inflamado discurso, Antonio Valentim de Carvalho, militante escolhido
para assumir a chefia do núcleo local, procurou sublinhar as dificuldades enfrentadas para
que o movimento integralista se instalasse na cidade, pois antes teria sido preciso expulsar
“os traidores demagogos a serviço do soldo de Moscou”.294 Na ocasião, os milicianos
presentes também ouviram uma conferência de um dirigente regional da AIB.
Contudo, um dos destaques do evento daquela tarde foi a inauguração da escola
integralista denominada Almirante Jaceguay, em uma evidente homenagem à Marinha do
Brasil. Para marcar o fim da cerimônia os integralistas de Angra dos Reis cantaram o hino
nacional. Esses casos relatados servem para exemplificar qual tarefa passou a ocupar a
função prioritária no projeto educacional da AIB: a alfabetização da maior quantidade
possível de cidadãos/eleitores.
Isso porque, sem dúvida, a abertura de postos de atendimento médico, consultórios
dentários e, sobretudo, “escolas-verdes” voltadas para a “alfabetização intensiva da
população”, como vimos nos casos de Itaperuna, Angra dos Reis e Natividade, são alguns
exemplos de como concretamente os integralistas passaram a atuar em função da questão
291
A Offensiva, pg. 13, 12\4\1936. 292 Idem. 293 A maioria das “escolas-verde” da província fluminense estavam instaladas nas sedes da AIB. 294 A Offensiva, pg 1, 20\6\1936.
159
eleitoral, ou seja, a poucos meses do pleito eleitoral a AIB estava centrando todas as suas
energias no sentido de aumentar seu volume de votos nas eleições municipais.
Como já registramos, a adoção da via eleitoral causou alguns efeitos nos métodos de
atuação do partido. Os “camisas-verdes” já haviam intensificado suas atividades nas áreas
de propaganda, assistência social, recrutamento de mulheres e também no campo
educacional. Nesse sentido, igualmente como em outras partes do país, a partir de 1936,
observou-se um crescimento nas atividades educacionais da AIB, 295 principalmente, no que
diz respeito a abertura de novas escolas de alfabetização de adultos no estado do Rio de
Janeiro.
No que se refere à atuação na área educacional, como em outras atividades
relatadas, é certo que os integralistas também já contavam com centenas de escolas
espalhadas por todos os estados do Brasil. Prova disso é que, no caso do estado fluminense,
a primeira escola integralista foi inaugurada no dia 19 de novembro de 1933, na localidade
de Fonseca, que fazia parte do núcleo municipal de Niterói.
Ainda na área educacional, os números apresentados pelo Relatório de Atividades
da “Província Integralista Fluminense”, datado de abril de 1937, espelham a intensificação
do trabalho educacional durante esse período. 296 O objetivo desse documento foi apresentar
um balanço das ações desenvolvidas pelos “camisas-verdes” em nosso estado durante o
chamado “ano-verde”. Os dados do relatório são referentes aos ambulatórios médicos,
consultórios dentários, núcleos municipais e distritais, além é claro das escolas sob
responsabilidade da AIB.297
Muito embora os integralistas mantivessem mais de uma centena de
estabelecimentos de ensino (escolas para crianças, cursos de corte e costura, cursos de
bordado, escola de enfermagem, cursos de trabalhos manuais, música e artes aplicadas) fica
evidente que a quantidade de escolas voltadas para a alfabetização de adultos sobressaía,
entre as demais. Cabe aqui uma indagação: por que tantas escolas de alfabetização?
A resposta dessa questão é simples, porque nunca é demais relembrar que entre as
mudanças introduzidas na legislação – a partir do novo Código Eleitoral de 1932 e da
295 Essa questão pode ser verificada no seguinte trabalho: CAVALARI, Op. cit 2004, pg. 90. 296 Relatório de atividades da Província Integralista Fluminense, abril de 1937. Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro (Aperj). Fundo: Polícia Política. Setor\serie: Integralismo. Caixa: 676. Pasta: 18. 297 Relação completa de escolas da AIB no estado, ver em Anexos.
160
Constituição Federal de 1934 – estava a proibição do direito de voto aos analfabetos. Em
torno dessa lógica podemos refletir com mais clareza e assim compreendermos o objetivo
por trás dessa “escalada educacional” dos integralistas.
Assim, paralelamente à criação de espaços específicos para as mulheres/eleitoras, o
partido também procurou mobilizar toda sua estrutura para fundar centenas de escolas em
nosso estado. Nesse sentido, o raciocínio era elementar: cada cidadão alfabetizado numa
“escola-verde”, teoricamente, se converteria em um voto a mais para os integralistas.
Longe de querermos realizar uma análise profunda do projeto pedagógico da AIB,
pode-se dizer que, na prática, sobretudo a partir de 1936, o objetivo central das “escolas-
verdes” foi preparar todos os integralistas, inclusive os analfabetos, para estarem aptos para
participar das eleições. Para comprovar isso basta recordarmos as resoluções debatidas e
aprovadas durante o Congresso da 7ª Região Fluminense.
Esse encontro realizado em março de 1936 na cidade de Campos dos Goytacazes
contou com a presença de dezenas de chefes de núcleos municipais e distritais. Sua
finalidade foi mobilizar o conjunto dos militantes para a tarefa prioritária para os
integralistas no ano: a participação nas eleições municipais de julho. Como vimos, o
documento produzido e aprovado ao final do congresso apontava as sete atividades que
deveriam nortear a vida partidária até a disputa eleitoral.
São exatamente o segundo e o terceiro ponto que gostaríamos de destacar: “2)
Qualificação intensa dos companheiros não eleitores e 3) Capacitação do eleitorado
simpatizante”. Essas duas resoluções servem para demonstrar o porquê da preocupação dos
integralistas com a abertura de novas “escolas-verdes”. É importante insistir nessa questão:
devido ao período pré-eleitoral termos como “capacitação” e “qualificação” de eleitores
nada mais eram que sinônimos para uma campanha urgente de alfabetização de militantes,
principalmente de adultos, que tinha uma única finalidade, transformar em poucos meses
analfabetos em eleitores da AIB.
Às vésperas das eleições o partido realizou inaugurações de postos de atendimento
médico e odontológico que funcionariam gratuitamente. Em segundo lugar, abriram
inúmeras escolas de alfabetização que deveriam, prioritariamente, “capacitar” os eleitores
analfabetos. Finalmente, em terceiro lugar, mesmo que demonstrando um imenso espírito
solidário ao visitarem hospitais, asilos de idosos e orfanatos, utilizavam fartamente seus
161
periódicos para realizarem a divulgação dessas ações sociais, ou seja, para os integralistas,
tão importante quanto realizar atividades de assistência social era divulgá-las através da
“imprensa-verde”.
Todos esses fatores somados – “imprensa-verde”, “blusas-verdes”, “cruz-verde” e
“escolas-verdes” – indicam que, ao longo do ano de 1936, os integralistas prepararam e
“azeitaram” toda a máquina partidária na direção de um único alvo: as disputas eleitorais.
Seus atos indicavam que a adoção da tática da via eleitoral foi rapidamente adaptada e
incorporada no sentido de atingir as metas necessárias para consolidar o projeto de poder da
AIB. Para muito além dessa primeira batalha, como veremos em breve, o objetivo final era
fincar as bases para o movimento que culminaria na manobra eleitoral mais ousada da
história dos integralistas: a candidatura própria para Presidente da República nas eleições
previstas para 1938.
Contudo, antes os “camisas-verdes” fluminenses tiveram que enfrentar a peleja
eleitoral de 1936. Como se viu, apesar de contar com toda uma estrutura de órgãos de
imprensa, uma verdadeira rede de assistência social, centenas de estabelecimentos de
ensino e uma numerosa militância, inclusive entre as mulheres/eleitoras, os integralistas
preocuparam-se ainda com, faltando algumas semanas para o pleito, a realização de uma
grande atividade para mobilizar seus militantes. Dessa feita, em junho uma “caravana-
verde”, comandada pessoalmente por Plínio Salgado, cortou as estradas, os trilhos e as
trilhas fluminenses.
4.5 AS CARAVANAS-VERDES E AS ELEIÇÕES DE 1936
Como dissemos, em um último esforço concentrado, faltando poucas semanas para
as disputas eleitorais, o chefe nacional do partido comandou uma mobilização que ficou
conhecida como “caravanas-verdes”. De norte a sul da “Província integralista fluminense”
as maiores e mais importantes cidades receberam a visita de Plínio Salgado.
Até mesmo algumas localidades menores tiveram a oportunidade de receber os
membros da caravana. Tanto que nesses locais os discursos e comícios do chefe nacional
foram improvisados, quase sempre, nas estações ferroviárias. A análise do itinerário da
caravana deixa evidente que a direção nacional da AIB programou esses eventos como
forma de “amarrar” os últimos votos antes da disputa eleitoral.
162
Em suma, as “caravanas-verdes” foram uma oportunidade de Plínio Salgado realizar
um verdadeiro “corpo-a-corpo” entre o eleitorado do estado em favor dos candidatos da
AIB. O fato de manter a mobilização de milhares de “adeptos do sigma” através de
cerimônias, comícios, viagens, carreatas, enfim, com um conjunto de atividades deixou
claro que o objetivo da direção nacional – as vésperas das eleições – era colocar toda a
militância de prontidão para a “batalha das urnas”.
Por conta disso, durante algumas semanas, as cidades fluminenses foram sacudidas
pela passagem do chefe nacional e seu séquito. Uma mostra desse entusiasmo pode ser
verificada na passagem da “caravana-verde” em Campos dos Goytacazes.298 Em 18 de
junho de 1936, os militantes do núcleo integralista local foram os anfitriões dos membros
da caravana. É importante destacar que dirigentes “camisas-verdes” de outras cidades da
região também se juntaram à comitiva.
Assim, a cidade foi tomada por militantes das localidades por onde a “caravana-
verde” já havia passado. Dessa forma, estavam em Campos dirigentes de Macaé, de
Natividade, de Porciúncula, de São João da Barra e também representantes dos inúmeros
núcleos distritais de Campos. Todos vieram saudar os componentes do “comboio-verde” e,
sobretudo, escutar as palavras de Plínio Salgado.
Vindo em um trem especial o líder máximo dos integralistas, logo que desembarcou
na estação, foi saudado por “três mil pessoas”299 que já aguardavam sua chegada. Como nas
oportunidades anteriores, assim que desceu de seu vagão, o líder da AIB foi saudado por
um triplo “anauê”. Finalmente, depois de muito esforço, Plínio Salgado rumou em direção
ao local onde ficaria hospedado durante aquela noite.
Mesmo após deixar a estação, foi a vez do veículo utilizado para transportar Plínio
Salgado ter encontrado muitas dificuldades para atravessar um verdadeiro “mar verde” de
milicianos que tomaram conta das ruas centrais da cidade. No meio do cortejo, milicianos
saudavam o chefe com muitos “anaûes” e canções do movimento.
O destino de Plínio Salgado foi a casa de Cristóvão Devotto, inspetor chefe da 7ª
região. Mesmo assim, o número de integralistas querendo saudá-lo continuou crescendo em
298 Todas as informações sobre a passagem da “caravana-verde” em Campos estão baseadas em matérias dos jornais A Offensiva e Folha do Comércio. 299 A Offensiva, pg. 1, 23/06/1936.
163
frente à residência do dirigente campista. A multidão ficou numa verdadeira vigília e só se
recolheu após o chefe nacional – da janela da residência – improvisar uma breve fala.300
Novamente, acompanhado pela multidão, os dirigentes foram à sede municipal do
núcleo da AIB, na praça São Salvador, para participarem de uma sessão especial. Mesmo
que se tenham grandes ressalvas sobre o número de espectadores e ouvintes concentrados
em torno da sede do núcleo, uma questão é incontestável: esse foi um dos eventos que
reuniu o maior contingente de “adeptos do sigma” na região.
À medida que se aproximava a hora da conferência o público foi aumentando na
região central da cidade. Por volta das 21h, tanto a área da sede como as ruas próximas,
ficaram abarrotadas de “camisas-verdes”. As primeiras intervenções ficaram a cargo dos
dirigentes José Landim, Cristóvão Devotto e Raymundo Padilha. Finalmente, após muita
expectativa, os milicianos que compareceram puderam ouvir o discurso de Plínio Salgado.
As reações dos presentes variaram de acordo com o tom da “inflamada oratória do
chefe nacional”.301 As palmas da multidão, durante toda a fala, marcaram os pequenos
intervalos entre uma colocação e outra..302Contudo, mesmo que esse clima de “histeria
coletiva” tenha sido mais um exagero da imprensa oficial do movimento, o que se
observou, como já pontuamos, durante essa nova passagem de Plínio Salgado na região, foi
que a AIB estava em uma fase de franca expansão e, mais ainda, demonstrando uma
evidente vitalidade política.
Apesar das ponderações necessárias sobre a conjuntura extremamente adversa por
que passavam as forças de esquerda, dessa vez não ocorreram manifestações de natureza
anti-integralista. O que serve para demonstrar o nível da difusão e crescimento da “doutrina
integralista” na região.
Essa mobilização em torno da visita do mais importante dirigente do partido serviu
para evidenciar o nível de crescimento das fileiras integralistas na “Província integralista
fluminense”. Da mesma forma, esse crescimento estava ligado e, ao mesmo tempo, era um
reflexo das atividades de natureza social desenvolvidas pela AIB no estado, da massiva
propaganda doutrinária dos órgãos da “imprensa-verde” e também uma demonstração da
euforia pré-eleitoral.
300 Idem. 301 Idem. 302 Idem.
164
Concretamente, a imensa assistência presente na conferência obrigou os “camisas-
verdes” a procurarem alternativas para que todos pudessem acompanhar a fala dos
dirigentes. Isso porque, como já frisamos o espaço do núcleo municipal não comportava o
número de presentes.
Por conta disso, alto-falantes tiveram que ser espalhados por toda a extensão da
Praça São Salvador para que todos pudessem, pelo menos, ouvir as intervenções. Nesse
ponto gostaríamos de destacar uma informação relativa a essa atividade: o fato do discurso
de Plínio Salgado ter sido retransmitido “para todo o país pelas ondas da PRF- 7”.303
Alto-falantes colocados na parte externa da sede estavam sintonizados na estação de
rádio da cidade que captou e transmitiu o discurso de Plínio Salgado. Nessa nova fase do
partido era preciso buscar canais alternativos para angariar a simpatia da maior quantidade
de pessoas que poderiam ser transformadas em futuros eleitores. Sendo assim, durante a
década de 1930, para atingir pleno êxito nessa missão – como já destacamos – o rádio era o
veículo mais indicado.
Como se observou na passagem da “caravana-verde” na cidade de Campos, os
integralistas estavam completando sua “metamorfose”, em outras palavras, deixando de
lado o discurso de “movimento de idéias e doutrina” e, concretamente, montando toda uma
máquina partidária em direção a um único objetivo: conquistar o poder político.
No dia 19 de junho de 1936 – dia seguinte da conferência – a estação ferroviária de
Campos ficou, novamente, completamente tomada por uma multidão. Por volta das 10 h da
manhã, centenas de homens, mulheres e crianças trajando o uniforme do partido
deslocaram-se até a plataforma de embarque de trens para prestar as últimas homenagens
aos membros da “caravana-verde”.
Enquanto os vagões deixavam lentamente a estação um coro de centenas de vozes
cantava o Hino Nacional. Quando o último carro da composição passou pela plataforma foi
saudado por três uníssonos brados de “anaûes”, que ecoaram pela estação. Ainda não
satisfeitos – como se quisessem prolongar ao máximo a estada dos ilustres visitantes –-
elementos do núcleo campista, em dezenas de automóveis, acompanharam o trem até o
distrito de Ururaí, naquilo que pode ter sido uma das primeiras “carreatas” registradas na
região.
303 Folha do Comércio, pg. 1, 20/06/1936.
165
O empenho e os investimentos realizados em torno da visita da “caravana” não
ficaram restritos à transmissão radiofônica dos discursos realizados na sede. Outro fato
importante foi que a direção regional dos integralistas precisou “fretar um trem especial”304
para possibilitar o deslocamento da comitiva de Plínio Salgado até as mais distantes regiões
do estado.
Esse fato possibilitou que em outros municípios e localidades – São Fidelis, Ernesto
Machado e Grumarim – a composição pudesse fazer paradas especiais. Nesses locais, como
destacamos, apesar da comitiva não ter realizado paradas mais prolongadas, os núcleos
integralistas chegaram a organizar cerimônias e atividades para recepcionar os dirigentes.
Dessa forma, os componentes da “caravana-verde” puderam realizar rápidas conferências
nas próprias estações de trem.305
Já Antonio Garchet dos Santos Reis, inspetor da 9ª Região, teve que esperar muitas
horas até que os integrantes da “caravana-verde” chegassem à Pureza. O problema foi a
necessidade dos dirigentes nacionais da AIB terem que realizar o deslocamento até esse
município utilizando automóveis. Para agravar mais a situação das já precárias condições
de transporte, as estradas da região estavam sendo castigadas por uma temporada de fortes
chuvas. Ao contrário do que poderia parecer, essa situação serviu para exaltar mais ainda o
espírito de sacrifício e a vontade dos integrantes da caravana de estar junto à militância,
independentemente de qualquer tipo de adversidade.
A disposição dos dirigentes integralistas foi destacada e muito bem explorada pela
imprensa da AIB. Nas páginas dos jornais a chuva que castigava a região ganhou adjetivos
quase bíblicos, tais como: “aguaceiro”, “enxurrada” e “temporal”. Os obstáculos naturais,
como a “mata virgem”, acabaram sendo retratados como desafios de proporções
gigantescas.306 E mesmo em meio à “escuridão da noite” e debaixo da tempestade os
membros da caravana prosseguiram sua marcha, interrompida apenas para Plínio Salgado
dirigir seu discurso à massa presente.
Sempre acompanhado por sua comitiva, Plínio Salgado também esteve em outras
regiões do estado, como por exemplo, a passagem marcante pela 11ª Região da “Província
integralista fluminense. Como nas outras cidades, a “caravana–verde” atraiu a atenção de
304 Idem. 305 Idem. 306 Idem.
166
uma grande massa humana em Porciúncula. Da mesma forma como ocorreu em outros
locais, Plínio Salgado e os outros dirigentes não tiveram um minuto para repousar,
simplesmente porque os “camisas-verdes” do município demonstravam durante todo o
tempo a sua euforia.
Até durante o almoço, os membros da caravana tiveram como acompanhamento um
“fundo musical”, pois o núcleo local preparou uma série de apresentações musicais de
hinos integralistas. A música serviu para encher “o recinto do mais quente entusiasmo”,307
enquanto as componentes do Departamento Feminino cuidavam dos detalhes relativos ao
almoço.
Mais tarde, na sede do núcleo municipal os “camisas-verdes” que vieram de todos
os núcleos municipais e distritais próximos, puderam ouvir a explanação do seu líder. O
contingente de milicianos obrigou que Sabino de Barros, um dos dirigentes do núcleo local,
providenciasse também a instalação de alto-falantes na área da sede e nas ruas próximas.
Ainda dentro da “jurisdição” da 11ª Região da Província Integralista, a “caravana”
passou pela cidade de Bom Jesus do Itabapoana. Localizada no extremo norte fluminense,
nesse município o núcleo da AIB tinha uma peculiaridade: uma de suas principais
lideranças era o padre Mello. Foi exatamente esse religioso que esteve à frente das
atividades e cerimônias de boas-vindas aos componentes da comitiva de dirigentes
“camisas-verdes”. Tanto que, coube a esse “batina-verde”, que também era poeta e
compositor, de maneira solene declamar “uma de suas últimas composições” antes de
Plínio Salgado realizar uma conferência para os milicianos locais.
Poucos dias depois de retornar de sua passagem pelas regiões norte e noroeste, a
comitiva de Plínio Salgado reiniciou seu giro pelo estado. A poucas semanas do pleito de
julho era preciso completar mais uma etapa do trajeto. Dessa vez o destino dos membros da
“Caravana-verde” eram os núcleos da região serrana. Para percorrer tais localidades o
transporte utilizado foi, novamente o “trem-verde”. O ponto de partida da caravana foi a
cidade de Niterói.
Numa manhã de junho uma multidão de “camisas-verdes” tomou conta da estação
ferroviária dessa cidade. Inúmeros milicianos e dirigentes compareceram para desejar boa
viagem a Plínio Salgado e sua numerosa comitiva, que reiniciavam as visitas pelas cidades
307 A Offensiva, pg. 1, 23/06/1936.
167
do estado. A direção da “caravana” foi a região serrana, mais precisamente, o núcleo de
Friburgo, sede da 5ª Região da “Província integralista fluminense”.308
Antes de partir Plínio Salgado fez um pronunciamento destacando a figura dos
“grandes vultos” nacionais, como a do ex-presidente Deodoro da Fonseca. Entretanto, as
saudações aumentaram quando foi evocada a memória do índio Araribóia – um dos heróis
da cidade fluminense.
A chegada à cidade serrana ocorreu durante a noite, porém, esse detalhe foi
desconsiderado pela milícia integralista do núcleo local. Tento em vista que a estação de
Friburgo estava completamente lotada, principalmente por “blusas-verdes” que em nome
do Departamento Feminino municipal presentearam Carmelia P. Salgado com um buquê de
flores.
Fonte: Revista Anauê, nº 4, pg. 47, 1935.
Quase como uma repetição do que ocorreu em outros municípios muito
recentemente, o caminho até a casa de Omar de Almeida – chefe municipal – estava
tomado por centenas de militantes da AIB. Durante várias horas os “camisas-verdes”
ficaram de prontidão em frente à casa do dirigente friburguense. Mais uma vez, somente
308 Todos esses relatos estão baseados em reportagens do jornal A Offensiva, 2ª seção, pg. 01 e 15. 28/06/1936.
168
quando Plínio Salgado fez seu pronunciamento os integralistas que esperavam cessaram os
cantos e palavras de ordem.
Como de costume, durante sua fala os “grandes personagens” da história do país
foram lembrados e reverenciados. Contudo, dessa vez, o que se destacou durante a fala de
Plínio Salgado foi o espaço reservado para as ações sociais da AIB.
Descreve o patriotismo sadio das suas populações. Conta dos milagres operados pelo integralismo, formando a nação sob o revigoramento físico, social e material, dando campo para exercícios esportivos, aula para alfabetização de crianças, velhos e moços. Amparando-lhes com assistência médica, lactários e despertando no homem da pátria um sentimento novo de energia propulsora em todas as suas atividades (...) O Integralismo tem duas atitudes em face da Pátria: a dignidade e a força. 309
Uma das considerações mais claras que podemos extrair desse discurso é que a
opção pela via eleitoral já havia produzido sensíveis modificações no teor da palavra do
dirigente máximo do movimento integralista. Como vimos anteriormente, durante seus
primeiros anos de existência, o vocabulário político da AIB sempre foi pautado por ataques
aos “políticos profissionais”, ao “perigo vermelho” e ao individualismo liberal. Contudo,
em Friburgo, o chefe nacional buscou ressaltar as atividades sociais desenvolvidas pelos
integralistas.
Dessa vez, por ocasião da passagem por Friburgo, em sua fala Plínio Salgado
adotou outra postura, pois durante seu pronunciamento em vez de atacar seus tradicionais
inimigos e apresentar a AIB como a única organização que poderia sanar os problemas
nacionais, preferiu adotar uma postura diferente. Nitidamente, seu intuito foi apresentar o
conjunto de atividades desenvolvidas nas áreas da educação, saúde e amparo social
desenvolvidas pela organização.
Falando de forma mais simples, preferiu destacar a abertura de lactários a desferir
ataques violentos contra as “perigosas e traiçoeiras hordas de Moscou”. Nessa lógica, após
combater os inimigos externos que ameaçavam o país, era chegado o momento dos
integralistas “mirarem todas as suas baterias” na próxima missão, que seria derrotar os
adversários internos: a fome, as doenças e o analfabetismo.
A mudança no vocabulário e, sobretudo, no teor do discurso constitui um claro
reflexo da nova tática política da AIB, uma vez que para atrair a simpatia e, principalmente,
309 Idem.
169
o voto das massas de eleitores, os integralistas precisavam ampliar e diversificar seus
horizontes políticos. Nesse sentido, nada melhor que apresentar realizações mais
“palpáveis”. A partir dessa constatação pode-se analisar e compreender as possíveis razões
de Plínio Salgado ter citado com tanta ênfase a abertura de escolas, postos de saúde e
lactários.
Fica evidente que, tendo em vista a nova conjuntura política e a sua nova tática
política, a AIB precisava readequar seu discurso se desejasse ampliar seu “lastro de votos”.
Para atingir essa meta, nada mais adequado que realizar uma atividade em um estádio de
futebol. Assim, indiscutivelmente, a cerimônia de maior relevo entre todas que marcaram a
passagem dos membros da “caravana-verde” por Friburgo ocorreu nas dependências do
campo de futebol da cidade.
Essa área esportiva foi palco de grandiosas e variadas manifestações e
demonstrações de “cultura física”, evoluções, manobras e desfiles da milícia da AIB. Essas
atividades, que tiveram a coordenação dos dirigentes locais, envolveram algumas centenas
de militantes – de ambos os sexos – do núcleo de Friburgo.
O dia ensolarado contribuiu para tornar mais animada a movimentação dos
“camisas-verdes” friburguenses, que logo cedo já haviam ocupado as ruas próximas à arena
esportiva. Entre o amplo programa de atividades elaborado para saudar a visita do chefe
nacional estavam previstos, entre outros: desfiles, cantos de hinos do movimento,
demonstrações de equipes esportivas e, como não poderia faltar, o desfile da milícia.
Contudo, entre todas as atrações programadas, uma em especial conseguiu superar
as demais em matéria de aplausos e elogios. Pouco depois, centenas de militantes ocuparam
a zona central do campo de futebol e, de maneira sincronizada, desenharam com seus
próprios corpos um gigantesco sigma. Durante a ordem unida fileiras de “plinianos” e
“blusas-verdes” ficaram localizados na parte da frente da “letra”.
Por sua vez, os milicianos “camisas-verdes” posicionaram na retaguarda da
evolução. Dessa forma, os integralistas formaram com seus corpos uma gigantesca letra
sigma. Para completar o espetáculo de ordem, disciplina e sincronia todos estenderam ao
mesmo tempo o braço direito e saudaram o chefe nacional com um uníssono brado de
“anauê”. Ainda em formação e junto com o restante dos presentes no campo, os militantes
em ordem unida cantaram o hino nacional.
170
Passada a euforia em torno das mobilizações que marcaram o percurso da
“caravana-verde” os integralistas fluminenses mobilizaram todo o aparato do partido para
as eleições municipais de julho de 1936. Como frutos da intensa militância em importantes
frentes – assistência social, educacional e propaganda – os “camisas-verdes” conseguiram
um feito impressionante antes mesmo da primeira urna ser aberta: lançaram candidaturas
para prefeito e chapas completas de vereadores em dezenas de cidades do estado.
Só esse fato já representava uma prova da capacidade de articulação e organização
que o partido havia conseguido atingir. Entre os municípios que os integralistas
apresentaram candidaturas podemos citar: Niterói, Campos, Sapucaia, São Gonçalo, Santa
Maria Madalena, Paraíba do Sul, Maricá, Mangaratiba, Macaé, Santo Antonio de Pádua,
Paraty, Nova Iguaçu, Magé, Cambuci, Itaperuna, Carmo, Bom Jardim, São João da Barra,
São Fidelis, Resende, São Sebastião do Alto, Sumidouro, Teresópolis, Petrópolis, Friburgo,
Piraí, Barra do Piraí, Barra Mansa e Valença.
A quantidade de cidades em que a AIB apresentou candidaturas foi uma
demonstração incontestável do crescimento experimentado pelo partido durante o chamado
“Ano-verde”. Ao contrario dos pleitos anteriores, 310 nesse processo eleitoral, os
integralistas participaram com um propósito bem definido: eleger a maior quantidade de
candidatos possível.
De posse dos resultados obtidos pelos candidatos da AIB devemos analisar os dados
considerando as questões regionais e nacionais.311 No âmbito regional podemos constatar
que no campo da estruturação do partido os “camisas-verdes” tiveram um saldo positivo
durante a campanha eleitoral, pois puderam mobilizar suas bases em todas as regiões do
estado. Por outro lado, mesmo com a criação de inúmeros ambulatórios, consultórios,
lactários, escolas e com todo esforço na área de propaganda a AIB não elegeu nenhum
prefeito,312 por outro lado, saiu do pleito com três dezenas de vereadores eleitos.
A bancada de 30 “vereadores-verdes” contava com parlamentares de 17 cidades
diferentes, o que evidencia a amplitude e poder de inserção da AIB em todas as regiões do
estado. A AIB também aumentou seu volume de votos para mais de 10.000 votos nas urnas
310 Eleições para a composição da Assembléia Constituinte (1933) e eleição para deputados estaduais e federais (1934). 311 Em anexo relação de parlamentares eleitos pela AIB nas eleições municipais de 1936 no Rio de Janeiro. 312 A UPF e da Coligação Radical Socialista conquistaram a maioria das prefeituras do estado.
171
– em um universo de cerca de 150.000 eleitores313 – o que representou algo em torno de
6% a 8% dos votos do estado. Se recordarmos que nas eleições parlamentares de 1934 o
partido somou algo em torno de apenas 2.000 votos, podemos afirmar que os esforços da
direção da AIB no ano de1936, em parte, atingiram seus objetivos.
No nível nacional, as eleições representaram mais um passo na consolidação da
“Província integralista fluminense” como uma das mais numerosas e organizadas do
Brasil.314 Se compararmos os números das bancadas de “vereadores-verdes” poderemos
constatar que os integralistas fluminenses conquistaram mais cadeiras nos parlamentos
municipais que os integralistas de estados tidos como referência do movimento, sobretudo
porque contavam com significativas colônias de descendentes de imigrantes europeus,
como por exemplo: Rio Grande do Sul, Espírito Santo e Paraná.
No geral, quanto ao número de “vereadores-verdes”, a bancada fluminense só foi
menor que a dos estados de São Paulo, Santa Catarina, Minas Gerais e Bahia. Dessa forma,
esse processo eleitoral representou um marco na trajetória da AIB em nosso estado. Assim,
após a participação nas disputas eleitorais municipais, os integralistas fluminenses
poderiam voltar a sua rotina organizacional. Superada a batalha no estado, estava dada a
largada para o próximo embate dos integralistas: a eleição para Presidente da República.
Dessa maneira, o lançamento de uma candidatura própria nas eleições presidenciais –
questão que trataremos no próximo capítulo – passou a ocupar a primazia na agenda
político-eleitoral dos integralistas.
313 Esse era o número de leitores cadastrados em 1934. 314Para um quadro geral de núcleos integralistas, ver em Anexos.
172
CAPÍTULO V
O CREPÚSCULO
5.1 A SITUAÇÃO POLÍTICA BRASILEIRA PRÉ-CAMPANHA PRESIDENCIAL
O clima político entre os anos de 1935 e 1937 no Brasil ficou marcado por
indefinições e incertezas. Não se sabia quanto tempo o país viveria sob o “Estado de
Guerra” – decretado por causa dos levantes da ANL nos meses finais de 1935. Da mesma
forma, era impossível prever se a Constituição de 1934 seria respeitada em relação à
previsão das eleições presidenciais de janeiro de 1938. A postura ambígua do presidente
Vargas em relação a sua sucessão também contribuiu para alimentar os temores de amplos
setores da sociedade.315
Os acontecimentos de novembro de 1935 tiveram a capacidade de unificar as mais
variadas forças políticas em torno da bandeira do anticomunismo. Entretanto, para alguns
setores – em especial para os militares ligados ao movimento tenentista – a saída pelas
urnas passou, mais do que antes, a ser vista como uma via perigosa. O presidente Vargas,
ciente desse desconforto, procurou protelar ao máximo a abertura dos debates e
movimentações visando a sua sucessão.316
Na raiz da questão estavam os debates em torno do modelo de Estado que deveria
ser adotado no país para criar barreiras contra novas investidas “extremistas”. Enquanto a
população começava a tomar conhecimento de todos os detalhes sobre os acontecimentos
de 1935, o governo Vargas conseguiu criar um ambiente de união nacional em defesa da
ordem. Foi exatamente nesse momento que surgiu a oportunidade para o governo realizar
uma série de reformas no interior das forças armadas. Dessa forma, Vargas conseguiu uma
importante aproximação com os altos escalões dos setores militares.317
Isso porque, para um significativo número de membros das forças armadas,
em especial para os componentes do Exército, o temor era de que a abertura da disputa
eleitoral fosse sinônimo do retorno dos mesmos vícios e desvios observados durante as
décadas da Primeira República.
315 Para saber mais sobre a conjuntura política do período, ver em: CAMARGO, Aspásia [et al]. O Golpe silencioso. Rio de Janeiro: Rio Fundo Ed. 1989 316Idem, pg. 88. 317Idem
173
Os laços entre o governo Vargas e os militares foram estreitados por diferentes
fatores como a desconfiança dos militares em relação aos partidos e aos “políticos
profissionais”, o anticomunismo e o trauma construído em torno da chamada “traição de
1935”. O clima de histeria anticomunista abriu a possibilidade para a instauração do
Tribunal de Segurança Nacional318 e para a decretação do Estado de Guerra, ambos em
1936.319
Tais medidas acabaram por criar um regime de exceção de fato – apesar da vigência
de direito da cada vez mais pálida Constituição de 1934. Como afirmamos, essa situação de
incerteza e indefinição permitiu que houvesse um consenso entre as principais forças
políticas em adiar o início do debate sucessório. Contudo, a partir de meados de 1936, o
temor de que Vargas estivesse buscando uma alternativa para permanecer no poder fez com
que a campanha eleitoral ganhasse fôlego e voltasse à pauta política.320
O reinício das articulações eleitorais tornava explícitos os principais focos de
oposição ao governo Vargas, que se concentravam em políticos dos estados de Minas
Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul. É importante destacar que os anos de governo
provisório (1930-1934) e constitucional (1934-1937) acabaram desgastando a relação de
Vargas com antigos aliados da época da Aliança Liberal.
Essa situação, em parte, justifica a postura oposicionista adotada pelo governador
gaúcho Flores da Cunha321 que, concretamente, transformou-se no principal foco de atrito
do governo durante os anos 1935-1937. Flores da Cunha procurou expandir sua influência
para além das fronteiras do Rio Grande. Um exemplo nítido dessa postura foi a sucessão do
governo fluminense.
Como dissemos anteriormente, o poder legislativo no estado do Rio de Janeiro foi
delineado após as eleições de 1934. Naquele pleito saíram vitoriosas as bancadas da União
Progressista Fluminense (UPF) e do Partido Popular Radical (PPR).
318 O Tribunal de Segurança Nacional, que havia sido inserido nos artigos da Lei de Segurança Nacional, foi efetivado entre agosto e setembro de 1936. Camargo, Aspásia. Op. cit. pg. 96. 319 O primeiro pedido de Estado de Guerra aprovado pelo Congresso Nacional ocorreu em março de 1936. 320Idem, pg. 102. 321 Para mais informações sobre Flores da Cunha, buscar em: ABREU, Alzira Alves de et al Dicionário Histórico Bibliográfico Brasileiro pós-1930. Edição Revista e ampliada. Rio de Janeiro: CPDOC-FGV, 2001.
174
Enquanto as forças políticas regionais não chegavam a um consenso a interventoria ficou a
cargo de Ari Parreiras.322
Apesar do clima político ainda carregado – por conta dos Levantes de 1935 – as
forças partidárias fluminenses procuraram se movimentar visando a eleição indireta para o
cargo de governador. Entre essas movimentações a mais significativa foi a formação da
chamada Coligação Radical Fluminense (CRF) que surgiu após a junção do PPR e do PSF,
liderado pelo deputado federal Cesar Tinoco.323
As eleições para governo do estado do Rio de Janeiro foram marcadas por
episódios de extrema violência. Na primeira tentativa de eleição, em 29 de setembro de
1935, ocorreram cenas inusitadas, tais como um tiroteio que chegou a ferir um dos
deputados estaduais.324 O saldo final desse primeiro pleito foi a eleição – com diferença de
apenas um voto – de Protógenes Guimarães325 para o cargo de governador.
A participação de Flores da Cunha no pleito aconteceu através do apoio dado aos
deputados da União Progressista Fluminense (UPF), que haviam sido derrotados.
322 Nascido em 17/10/1890, em Niterói, Ari Parreiras logo cedo ingressou na Marinha. Tanto que participou ativamente das articulações, em 1924, do segundo levante tenentista. Ainda durante o governo do presidente Artur Bernardes, foi preso. Como a maioria dos participantes do movimento, foi anistiada no governo de Washington Luís. Em 1930, esteve ao lado da insurreição de conduziu ao poder Getúlio Vargas. Depois de 1930 ocupou inúmeras funções no governo até ser nomeado interventor do estado do Rio de Janeiro, entre dezembro de 1931 e novembro de 1935. ABREU, Alzira Alves de et AL Dicionário Histórico Bibliográfico Brasileiro pós-1930. Edição Revista e ampliada. Rio de Janeiro: CPDOC-FGV, 2001. 323 A trajetória de Cesar Tinoco esteve sempre ligada a região de Campos dos Goytacazes, local em que nasceu em 02/12/1884. Nesse município Tinoco deu inicio a sua formação acadêmica como aluno do Liceu de Humanidades de Campos. Mesmo tendo graduando-se em direito a profissão que Cesar Tinoco exerceu foi o jornalismo, tanto que chegou a fundar os dois jornais em Campos (A Noite e Rio de Janeiro). Na política construiu sua carreira ligada ao ex-presidente Nilo Peçanha, político que o apoio nas suas eleições para vereador e prefeito de Campos. A aproximação com o grupo nilista levou Cesar Tinoco a apoiar a Reação República e, posteriormente, a ser preso como colaborador dos levantes tenentistas. Sua atividade política tornou-se mais intensa após a Revolução de 1930. Participou do Clube 3 de Outubro e foi um dos fundadores do Partido Socialista Fluminense. Nessa agremiação foi eleito deputado federal constituinte (1933) e deputado federal (1934) pelo estado do RJ. ABREU, Alzira Alves de et AL Dicionário Histórico Bibliográfico Brasileiro pós-1930. Edição Revista e ampliada. Rio de Janeiro: CPDOC-FGV, 2001. 324 CAMARGO, Aspásia. Op cit, pg. 80. 325 Natural de Florianópolis, local onde nasceu em 08/05/1876, Protógenes Guimarães ingressou na Marinha como aluno da Escola Naval. Depois de concluir seus estudos desempenhou várias atividades nos estados do pais e chegou a cumprir missões da Marinha na Europa. Em 1924 atuou destacadamente das articulações que visavam apoiar os Levantes Tenentistas de São Paulo. Por causa de sua atuação nesses episódios foi detido e ficou preso até 1927, quando foi reformado. Em 1930, esteve ao lado da insurreição de conduziu ao poder Getúlio Vargas. Foi anistiado e, em 1933, chegou ao posto de Ministro da Marinha, função que cumpriu até ser eleito governador do estado do Rio de Janeiro. Eleito em 1935 governador procurou concentrar seus esforços em pacificar as facções políticas do estado. Em 1937, muito doente, afasto-se do governo. Faleceu em 06/01/1937. ABREU, Alzira Alves de et AL Dicionário Histórico Bibliográfico Brasileiro pós-1930. Edição Revista e ampliada. Rio de Janeiro: CPDOC-FGV, 2001.
175
Posteriormente, os membros da UPF entraram com um recurso no Supremo Tribunal da
Justiça Eleitoral. Depois de muitos debates chegou-se a um acordo e novas eleições foram
realizadas em 12 de novembro de 1935, disputa que teve como resultado final uma nova
vitória de Protógenes Guimarães, agora com apenas um incidente: o rompimento da UPF
com o governo Vargas por conta do apoiou à chapa de seu ex-ministro da Marinha.
Dessa forma, o dirigente gaúcho procurou arregimentar todos os atores políticos que
estavam descontentes, no Congresso Nacional e nos estados, com os rumos do país. É
preciso destacar que o presidente Vargas não ficou imóvel em relação às manobras do
governador Flores da Cunha. Muito pelo contrário: o presidente utilizou todos os canais
possíveis para minar as bases de sustentação política de Flores da Cunha.
Nesse sentido houve um trabalho que se concentrou em duas frentes. Uma no
incentivo à criação de dissidências no interior do partido do governador e outra no
respectivo fortalecimento do maior grupo de oposição estadual de Flores da Cunha: a
Frente única Gaúcha (FUG).326 Ao mesmo tempo, no terreno militar, trabalhou para nomear
para as chefias localizadas na região sul elementos fiéis ao governo Vargas.327
Em Minas a oposição era capitaneada por Antonio Carlos de Andrade – ex-
governador e também ex-aliado de Vargas em 1930 – que teve um ensaio de lançamento do
seu nome na corrida presidencial, entretanto sua possível candidatura acabou perdendo
apoio graças, sobretudo, às investidas do governo Vargas em sua base de apoio estadual.328
A chegada do ano de 1937, mesmo com as tentativas de setores do governo Vargas
em minar todos os pontos de resistência e protelar a sucessão, fez reacender as
especulações e movimentações sobre a eleição presidencial. A própria suspensão do Estado
de Guerra – em junho daquele ano – foi a senha para que as três candidaturas postas
colocassem a campanha na rua.
5.2 OS CANDIDATOS
De uma maneira geral, pode-se dizer que a candidatura do ex-interventor paulista –
Armando Salles de Oliveira – representava os anseios da oligarquia paulista em retomar as
rédeas do país e atraía a simpatia dos demais setores descontentes com os
326 Idem, pg. 108. 327 Idem, pg. 118. 328 Idem.
176
encaminhamentos adotados pelo governo Vargas. Isso porque o mote central da sua
campanha foi a defesa do federalismo, ou seja, uma maior autonomia para os estados.
Outros pontos presentes em seu discurso eram a defesa da democracia liberal e o combate
aos extremismos políticos.329
Lançada inicialmente pelo Partido Constitucionalista de São Paulo, Armando Sales
procurou dar um caráter nacional a seu nome através da criação de uma agremiação
denominada União Democrática Brasileira (UDB). Assim, tanto a candidatura quanto a
plataforma eleitoral de Armando foram lançadas, oficialmente, em 16 de julho de 1937, em
um comício realizado no campo do América Futebol Clube, localizado no Rio de Janeiro
(DF).330
Ao longo dos meses de campanha foram realizadas diversas visitas de Armando
Sales a inúmeros estados. Visando impulsionar a candidatura, realizaram-se outros
comícios em Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Bahia e Pará. Também buscou-se atingir
amplos segmentos da população através dos meios de comunicação. Para tanto, Armando
Sales chegou a fazer pronunciamentos através do rádio e a conceder entrevistas em jornais,
principalmente, ao Estado de S. Paulo.331
Apesar da publicamente declarada neutralidade de Vargas, os setores ligados ao
presidente procuraram se movimentar em torno de um candidato na corrida presidencial.
Em 25 de maio de 1937, foi lançada a candidatura do paraibano José Américo de Almeida
para ocupar o Palácio do Catete. Em torno desse nome juntaram-se, principalmente, outros
representantes da política nordestina, em especial, Juarez Távora332 que arregimentou apoio
da Bahia e Pernambuco.
Contudo, apesar de receber o apoio de importantes figuras do cenário político
nordestino,333 a candidatura de José Américo de Almeida procurou não restringir seus
apoios apenas a essa região.334 Haja vista que contou com a colaboração de expressivo
329 Idem. 330 Idem, pg. 172. 331 Idem. 332 Para maiores informações sobre Juarez Távora, buscar em: ABREU, Alzira Alves de et AL Dicionário Histórico Bibliográfico Brasileiro pós-1930. Edição Revista e ampliada. Rio de Janeiro: CPDOC-FGV, 2001. 333 Idem, pg. 174. 334 Entre seus próprios aliados essa clivagem gerou críticas.
177
número de lideranças dos estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e
Espírito Santo.
O nome de José Américo também recebeu abertamente apoio de ministros do
governo Vargas.335 Isso colaborou para reafirmar o caráter quase oficial da candidatura.
Apesar disso, ocorreram momentos de atrito entre setores do governo e José Américo por
causa, principalmente, do tom e do teor dos discursos do candidato que, em algumas
ocasiões, chegou a fazer pesadas críticas à administração – da qual fez parte como ministro
da aviação.
No geral, suas propostas concentraram-se no combate à corrupção e em medidas
para melhorar a condição de vida dos trabalhadores.336 Sendo assim, as duas candidaturas
procuraram aglutinar a população no sentido de permitir que o país retomasse a
normalidade democrática.
Os reflexos dessa disputa rapidamente se manifestaram no estado do Rio de
Janeiro,337 como apresentado anteriormente: o período pós-Revolução de 1930 foi marcado
pelo aparecimento de novos atores e, ao mesmo tempo, pelo rearranjo das tradicionais
forças políticas fluminenses. Entretanto, um terceiro nome havia sido lançado para o pleito:
Plínio Salgado.
É preciso destacar que os “camisas-verdes”, durante os preparativos para essa
eleição, apresentaram uma inovação no mercado político nacional: a realização de
plebiscito entre os filiados para a escolha do candidato do partido. Em abril de 1937, a
“imprensa verde” publicou as resoluções que norteariam o chamado plebiscito nacional. O
documento, datado de 24 de abril, foi assinado pelo chefe nacional e tinha a finalidade de
regulamentar o funcionamento da consulta aos filiados do partido.
Já na justificativa da resolução a AIB afirmava, entre outras coisas, que os filiados
não “eram escravos”, pois seriam livres para escolher o que seria melhor para o país. Da
mesma maneira, o documento salientava que – apesar de ter plena consciência de seus
poderes – o chefe nacional compreendia que “possuía o poder de abrir mão desses poderes,
sem quebra de princípios”.338
335 Idem, pg. 175. 336 Idem, pg. 168. 337 Como ficou perceptível nos conturbados acontecimentos da secessão estadual de 1935. 338 A Offensiva, pg. 01, 25/04/1937.
178
Composto por nove artigos, a resolução sobre o plebiscito estabelecia ainda que o
nome do candidato dos “soldados de Deus” seria escolhido a partir de uma consulta entre
os filiados do partido. Indicava que o manifesto programa da AIB deveria ser a “única
orientação consciente” para a escolha de cada indivíduo. Estabelecia também que apenas os
elementos filiados anteriormente à data da publicação da resolução poderiam tomar parte
do plebiscito.
Entre os artigos da resolução, possivelmente, o mais curioso era o sexto, que
estabelecia a forma de voto. Cada integralista que participasse da consulta deveria votar em
aberto. Em outras palavras, a escolha individual teria que ser registrada por escrito no livro
de ata do núcleo e – apesar dos argumentos da justificativa da resolução afirmarem que os
“camisas-verdes” não eram escravos – o militante, após manifestar seu voto, publicamente,
por escrito, deveria fazê-lo novamente “em voz alta”.
Por fim, o último artigo das normas do plebiscito previa a organização das juntas
eleitorais, pois cada núcleo integralista deveria se converter em um ponto de apoio ao
candidato da AIB. O plebiscito foi realizado nos dias 23 e 24 de maio. Compareceram às
3.780 juntas eleitorais espalhadas pelos núcleos do país milhares de filiados para
escolherem o candidato à presidência da AIB. Segundo a imprensa do partido, o nome de
Plínio Salgado recebeu 846.356 votos.
A “vitória” do chefe nacional no plebiscito contribuiu para reafirmar a posição de
Salgado dentro do partido e foi uma demonstração da consolidação da opção pela via
eleitoral. Nesse sentido, a largada da corrida presidencial para os integralistas aconteceu em
12 junho de 1937, data do lançamento oficial – em nível nacional – da candidatura da AIB.
O passo seguinte da campanha eleitoral dos “camisas-verdes” aconteceu em 25 de
junho de 1937, isso porque a AIB foi o primeiro partido a obter o registro oficial junto ao
Tribunal Superior de Justiça Eleitoral. Para complementar todo o itinerário oficial, em 14
de junho de 1937, dois dias depois do lançamento oficial da candidatura de Salgado, uma
comitiva de dirigentes integralistas foi recebida em audiência pelo presidente Getúlio
Vargas. O objetivo do encontro foi comunicar oficialmente o lançamento da candidatura de
Plínio Salgado.
Como afirmamos anteriormente, esses acontecimentos atestam a completa
metamorfose em relação aos objetivos da AIB. Sobretudo se compararmos o teor do
179
“discurso romântico” presente na primeira fase dos “camisas-verdes” com a postura dos
dirigentes nacionais em 1937 que, tão logo lançaram sua candidatura à presidência,
trataram de comunicar tal fato ao presidente Vargas.
Apesar de todas as ponderações sobre a parcialidade dos “dados oficiais”
apresentados em relação aos milhares de filiados que compareceram aos núcleos da AIB e
participaram do plebiscito, uma questão é inegável: o plebiscito contribuiu para oxigenar o
partido e despertou o entusiasmo da militância. A forma diferenciada como foi feita a
escolha do candidato do partido permitiu que os integralistas passassem a apresentar-se
como uma organização diferenciada. Indiscutivelmente, o tema do plebiscito passou a ser
uma pauta recorrente nas publicações dos seguidores de Plínio Salgado.
Para cumprir essa missão todos os órgãos da imprensa do partido acabaram sendo
transformados em ferramentas de campanha. Um exemplo foi o editorial da revista Anauê,
que procurou apresentar o chefe nacional como o único e verdadeiro “candidato do povo”.
Nesse sentido, o texto da revista procurou exaltar o fato da AIB ter agido de maneira
profundamente democrática, pois, realizou a escolha de seu candidato através de um
plebiscito. 339
Outro trecho procurou ressaltar os mecanismos utilizados durante o processo de
escolha, inclusive destacando a forma como foi feita a manifestação de voto. O texto
enfatizava que, ao contrário do que poderia parecer, para os integralistas, a alternativa do
“voto em aberto”, assumiu uma característica positiva, pois, para cumprirem tal tarefa os
“camisas-verdes” do Brasil foram convocados “a dizer em alto e bom som, sem
constrangimentos de qualquer natureza, livremente manifestando seu pensar, qual o
companheiro que julgavam dever representá-los como candidato”.340
A fórmula do plebiscito, para a revista, teria outra particularidade em relação à
forma de escolha adotada no processo de indicação das outras candidaturas: Plínio Salgado
estaria isento dos favores e pressões de qualquer grupo político ou econômico. Dessa
forma, essa “vantagem” possibilitaria a Salgado e a seus seguidores continuarem suas ações
em prol das camadas menos favorecidas.
339 Revista Anauê, pg. 1, 1/07/1937. 340 Idem.
180
Esse entusiasmo da imprensa acabou repercutindo também entre os militantes e
dirigentes integralistas fluminenses. Isso porque, durante todo o processo de mobilização e
preparação para o lançamento oficial da candidatura de Plínio Salgado no estado, as
centenas de núcleos acabaram sendo mobilizados para cumprir, prioritariamente, tarefas na
campanha.
Entre essas tarefas, podemos destacar a organização de comitês em diversos
municípios do estado que congregavam profissionais liberais, operários, trabalhadores
rurais, mulheres e estudantes. Prioritariamente, logo depois de se constituírem, tais
organizações procuravam tornar pública sua existência através da imprensa do partido.
A partir das semanas finais do mês de junho começaram a surgir inúmeros comitês
como, por exemplo, o organizado pelos comerciantes de Friburgo que – através de um curto
telegrama – felicitaram o chefe nacional em seu novo desafio.341 As saudações não ficaram
restritas apenas a esses profissionais friburguenses, pois médicos e dentistas da cidade da
região serrana fluminense também providenciaram o envio de suas congratulações ao
candidato da AIB.
Pretendendo demonstrar a amplitude da candidatura de Plínio Salgado, um grupo de
militantes integralistas da Fábrica de Tecidos de Friburgo manifestou “vibrantes
saudações”342 ao chefe nacional. Outra categoria que foi a público empenhar sua total
confiança na capacidade de liderança do chefe nacional foi a dos operários da construção
civil de Friburgo que organizaram um comitê da categoria.343
O entusiasmo – pelo menos na imprensa oficial da AIB – repercutiu também entre
os ferroviários da Leopoldina Railway de Friburgo. Um comunicado assinado por Carvalho
Sobrinho, Thomas Benevenuto, Flávio Fonseca, Moacyr Eyer e Edmundo Barbeto afirmava
que a vitória do chefe nacional seria o caminho para conduzir o país aos seus “gloriosos
destinos”.344
Em outros municípios do estado os militantes da AIB adotaram a mesma estratégia
de campanha. Como podemos verificar no caso dos funcionários da fábrica de conhaque de
alcatrão do município de São João da Barra filiados ao partido que, além de saudarem o
341 A Offensiva, pg 3, 29/06/1937. 342 A Offensiva, pg. 3, 30/06/1937. 343 Idem. 344 Idem.
181
candidato, aproveitaram o espaço no jornal para reafirmarem sua fidelidade ao chefe
nacional.345 Em outros municípios surgiram comitês formados por farmacêuticos, padeiros,
alfaiates, professores, entre outros.
Entre os estudantes fluminenses que haviam aderido à AIB também ocorreram
manifestações pró-Plínio Salgado. Assim, alunos do Liceu Nilo Peçanha – local da primeira
reunião pública dos integralistas no estado – externaram suas saudações ao lançamento da
candidatura dos “soldados de Deus”.346
Os estudantes de Niterói pareciam sintonizados, pois os acadêmicos Guilherme
Furtado Portugal, Eugênio Francisco Pinto e Osmar Faria – da Faculdade de Odontologia
da capital fluminense – foram signatários de uma nota que ressaltava a “magnífica lição de
democracia” que representou o plebiscito que indicou o nome de Salgado. 347
Os parlamentares da AIB fluminense utilizaram o mesmo expediente e passaram a
usar as páginas dos periódicos para expressar suas congratulações. Foi o que fez Djalma
Monteiro, vereador da cidade de Teresópolis que, em seu telegrama – como fizeram os
acadêmicos de odontologia – destacou a fórmula democrática de escolha do candidato dos
“camisas-verdes”.348 Os parlamentares Álvaro Sardinha, Adolphe Lopes, Getúlio Borges e
Bernardo Gomes, que formavam a bancada integralista de Barra Mansa, da mesma maneira
que seu companheiro da região serrana, saudaram a indicação de Plínio Salgado.
Apesar do diversificado número de manifestações publicadas na imprensa um dos
traços marcantes da cultura política da AIB foi sua capacidade de mobilização e de efetiva
realização de ações práticas. Os exemplos observados nas áreas de atividades sociais
(escolas, ambulatórios, postos de saúde, etc.) são uma demonstração de como os
integralistas souberam conjugar o discurso teórico com as tarefas da rotina partidária.
Com a data do início oficial da campanha presidencial se aproximando, a direção
regional da AIB passou a concentrar todos seus esforços políticos na organização de uma
série de lançamentos simultâneos nos núcleos municipais e distritais. Aparentemente, havia
sido planejado um calendário eleitoral que deveria ser cumprido pelo conjunto da
militância. Assim, seria fundamental agregar a maior quantidade de militantes possível.
345 Idem. 346 A Offensiva, pg. 3, 09/07/1937. 347 A Offensiva, pg. 3, 30/06/1937. 348 Idem.
182
Para alcançar esses objetivos, Raymundo Padilha, chefe provincial, chegou a
realizar um pronunciamento através da Rádio Difusora da cidade de Petrópolis. Em sua fala
Padilha relembrou as responsabilidades que os integralistas fluminenses iriam assumir a
partir do inicio da campanha eleitoral.349 Dessa forma, em 4 de julho de 1937, estavam
programados desfiles, reuniões, pronunciamentos no rádio, enfim, um elenco de ações que
pretendiam demarcar – de uma só vez – em todas as regiões fluminenses, os primeiros
passos da campanha presidencial.
Entre as atividades previstas estava uma concentração dos integralistas da 6ª Região,
mais precisamente na cidade de Carmo. Nesse município estariam presentes delegações
representando militantes de outros núcleos da região, além do próprio chefe provincial que
lançaria pessoalmente a campanha naquela cidade.
Outra estratégia planejada pela Secretária Provincial de Propaganda era a realização
de sessões solenes em todas as sedes existentes no estado. Os oradores convidados
deveriam ser pessoas “respeitadas e cultas” que iriam proferir palestras que abordariam
questões relativas à importância da campanha eleitoral para o partido.
Alguns núcleos optaram por realizar as atividades programadas em locais públicos.
Um dos casos foi a cerimônia programada pelo núcleo municipal de Barra Mansa, na região
sul do estado. O ato que iria concentrar os militantes integralistas da cidade estava
programado para acontecer na praça Ponce de Leon, precisamente às 18:30. A expectativa
de todos os dirigentes da 1ª Região da “Província integralista fluminense” era contar com a
presença de autoridades políticas e religiosas locais.350
Os cuidados e preocupação da direção regional com as solenidades levaram-na a
designar militantes de outros municípios para supervisionarem as atividades de
determinados locais, como ocorreu nos casos dos núcleos de Pureza e Porciúncula que
receberam as visitas de Romeu Rodrigues Silva e José Landim, dirigentes da AIB da cidade
de Campos. Também em Miracema estava prevista a visita do dirigente baiano Araújo
Lima, que faria a saudação aos integralistas locais. O quadro de municípios fluminenses
programados para realizar o lançamento oficial, em 04 de julho de 1937, era o seguinte:
349 Idem. 350 Idem.
183
QUADRO 3
Lista de núcleos municipais que realizaram sessões solenes de lançamento da candidatura
de Plínio Salgado em 1937:
Município: Orador:
Petrópolis Prof. Alcebíades Delamare
Niterói Prof. San Thiago Dantas
Campos Dr. Thiers Martins Moreira
Porciúncula Prof. Jose Landim
Pádua e Miracema Dr. Araújo Lima
Pureza Dr. Romeu Rodrigues Silva
Resende Dr. Herberto Dutra
Barra Mansa Dr. Murilo Fontainha
Barra do Piraí Prof. Eurípides Cardoso Menezes
Valença Acadêmico Gerado Mourão
Teresópolis Prof. Loureiro Junior
Nova Iguaçu Acadêmico Jorge Pachá
São Gonçalo Dr. Toledo Piza
FONTE:A Offensiva, pg. 2,,29/06/1937.
O quadro de núcleos que estiveram mobilizados nas atividades de lançamento da
campanha de Plínio Salgado, se não chega a ser extenso – um total de 13 municípios –
serviu para demonstrar que os “camisas-verdes” de todas as regiões do estado estavam
trabalhando de maneira articulada e unificada. Contudo, outras atividades de campanha
acabaram sendo realizadas durante o mês de julho de 1937.
Procurando conciliar a agenda da campanha com as atividades de organização do
partido, as “blusas-verdes” do estado estiveram concentradas nos trabalhos do I Congresso
Feminino da Província Fluminense. O evento aconteceu na cidade de Petrópolis, entre os
dias 25 e 26 de julho. Aproveitando a estrutura do congresso aconteceu conjuntamente um
encontro estadual dos “plinianos”.351
351 A Offensiva, pg. 2,,29/06/1937.
184
O último dia do congresso foi marcado por uma série de desfiles e concentrações
em homenagem aos dirigentes presentes, em especial Gustavo Barroso, que esteve nessa
atividade representando o chefe nacional. A partir das 15 h as ruas centrais do município
acabaram sendo tomadas por mulheres e crianças que realizaram inúmeras apresentações.
O Automóvel Club de Petrópolis foi o local da sessão solene de encerramento do I
Congresso Feminino. Todas as atividades tiveram a cobertura da Petrópolis Rádio Difusora
que transmitiu as intervenções realizadas na cerimônia. Em nome das “Blusas-verdes”
usaram a palavra as seguintes militantes Rosa Buchal (Campos), Hercília Queiroz
(Petrópolis), Edith Soares do Pinho (Niterói) e a Inah Viard (representante da direção
regional).352
O recinto do clube encontrava-se completamente tomado pelos militantes da AIB
quando Gustavo Barroso fez sua intervenção que – segundo palavras da” imprensa verde”
– a todo o momento foi interrompida por aplausos dos presentes. Apesar de reunir
majoritariamente mulheres e crianças, o evento foi encerrado apenas após 1 h da
madrugada, com todos os presentes cantando o hino nacional.353
Ainda no intuito de “trazer para a campanha” um número maior de mulheres,
poucos dias depois as militantes de Niterói também organizaram uma sessão específica.
Realizada na sede do núcleo de Santa Rosa, o evento contou a presença de Maria Telles
Ferreira, dirigente da Câmara dos 400, que falou sobre – como não poderia deixara de ser –
da candidatura de Plínio Salgado.354
Antes da sessão ocorreu uma cerimônia interessante para o partido e, sobretudo,
para o seguimento da campanha. No referido evento ocorreu um ato de filiação de 30 novas
“blusas-verdes” que passaram a compor as fileiras da AIB. A preocupação dos integralistas
em realizar atividades para mulheres, durante o período eleitoral, justificava-se por conta da
inovação do voto feminino. Portanto, o voto das mulheres poderia pesar de forma decisiva
no resultado final da corrida presidencial.
No sentido de ampliar o alcance da campanha no estado, os integralistas passaram a
contar com o auxilio do professor Alcebíades Delamare que iniciou uma verdadeira
peregrinação em defesa da candidatura de Plínio Salgado. O professor Delamare –
352 Idem. 353 Idem. 354 Idem.
185
catedrático da Faculdade de Direito da Universidade do Brasil e dirigente nacional da AIB
– esteve em diversos municípios realizando conferências para arregimentar novos adeptos e
eleitores.
Os dias 1 e 2 de agosto marcaram a passagem do professor por Campos dos
Goytacazes. Na cidade foi cumprida uma agenda repleta de eventos e atividades
acadêmicas, religiosas e políticas. Na tarde de sábado aconteceu uma reunião entre o
professor Delamare e um grupo de advogados campistas.
Posteriormente, foi realizada uma conferência na Faculdade de Direito Clovis
Beviláqua. Nesse local foi a vez do professor explanar sobre a “missão do professor
universitário”.355 Naquele dia, ainda cumprindo a agenda jurídico-eleitoral, o professor
esteve do Fórum Municipal onde foi recepcionado por juízes e outros funcionários da
justiça. Em todas essas ocasiões militantes e dirigentes da AIB estiveram presentes.
No dia seguinte as atividades começaram na catedral da cidade, onde foi realizada
uma missa de ação de graças em homenagem ao chefe nacional, que foi acompanhada por
centenas de militantes uniformizados. Depois do encerramento da celebração, o prelado da
igreja foi um dos anfitriões dos integralistas em uma sessão especial do Centro Dom
Vital.356
Dom Otaviano de Albuquerque – arcebispo de Campos – conduziu os trabalhos da
solenidade em homenagem ao professor Delamare. A palavra foi franqueada a Romeu
Silva, que realizou as saudações e depois apresentou o convidado de honra que proferiu
uma conferência que teve como tema “A Eucaristia”. Mais tarde, por volta das 15 h, um
grande número de milicianos cobriu de verde as ruas centrais do centro de Campos. Uma
massa, segundo o jornal da AIB, de cerca de 1.000 pessoas desfilou em homenagem ao
dirigente nacional da organização partidária.357
Sempre acompanhado dos chefes locais, o professor Delamare passou em revista ”a
tropa verde” que estava formada na praça São Salvador, depois teve início o “grandioso
comício a favor da candidatura de Plínio Salgado”.358 Inúmeros dirigentes fizeram
355
A Offensiva, pg. 3, 9/7/1937. 356 Gostaria de destacar que de forma alguma estamos afirmando que os católicos ou os membros do Centro D. Vidal assumiram a campanha da AIB. Anteriormente, tratamos da proximidade dos integralistas com membros do laicato e do prelado católico. 357 A Offensiva, pg. 3, 9/7/1937. 358 Idem.
186
intervenções até que o visitante pudesse proferir seu discurso que, durante uma hora e meia,
prendeu a atenção dos espectadores. O regresso do dirigente nacional aconteceu no final do
dia e, novamente, mobilizou centenas de militantes que compareceram na estação
ferroviária.
Os comícios, as sessões solenes, os telegramas na imprensa, a reunião das “blusas-
verdes”, a cerimônia no Centro D. Vital são uma mostra das estratégias empregadas pelos
integralistas no sentido de divulgar o candidato da AIB no estado. Nessa fase inicial da
campanha, a passagem do dirigente nacional em Campos parece que repercutiu
positivamente em toda província integralista fluminense. Tanto que a direção regional do
partido havia programado uma nova atividade – em 15 de agosto – para o município de
Campos. Entretanto, dessa vez estava prevista a presença de um convidado muito mais
célebre: o chefe nacional.
No mês de agosto estavam programados os primeiros comícios dos “camisas-
verdes” que pretendiam realizar gigantescas concentrações. As duas primeiras
concentrações públicas estavam programadas para a mesma data, 15 de agosto, nas cidades
de Niterói e Campos dos Goytacazes.
Em Campos, a propaganda do evento começou ainda durante as mobilizações para a
passagem do professor Alcebíades Delamare, momento em que foi produzido um panfleto
que afirmava que, no dia 15 de agosto, Plínio Salgado desembarcaria na cidade para
encontrar-se com 10.000 militantes da região.359 Para cumprir a extraordinária meta de
reunir milhares de “camisas-verdes” no comício do chefe nacional, os dirigentes da AIB
concentraram todos os seus esforços ao longo dos primeiros dias de agosto no sentido de
mobilizarem todos os núcleos da região.
Concomitantemente aos preparativos dos “camisas-verdes”, outras forças políticas
da cidade também se mobilizaram para arregimentar seus partidários em torno de uma
manifestação que seria um ato público em defesa da democracia. Tal evento, marcado para
o dia 14 de agosto – véspera do comício da AIB – pretendia unir no mesmo palanque
representantes do PSF, da UPF e do PPR.
Nos dias anteriores ao comício integralista, a cidade foi tomada por panfletos de
diferentes organizações que tanto convocavam para o ato do dia 14, como serviam para
359 Panfleto anexado ao Processo Crime 1060, pg. 24.
187
lançar ataques aos integralistas. A possibilidade da presença do chefe nacional em Campos
motivou a elaboração de cartazes como os dizeres “Não desembarcará”, que foram afixados
em diversos postes e muros.360 Outros panfletos que circularam seguiam um vocabulário
igualmente agressivo em relação aos “soldados de Deus”.
Entre os panfletos, um convocava os cidadãos em nome dos partidários de José
Américo e Armando Salles361 Tal impresso afirmava ainda que o objetivo da concentração
era “a defesa do regime constituído” e contra os “extremismos”.362 No elenco dos oradores
previstos para o ato pró-democracia estavam figuras conhecidas do meio político da cidade,
entre eles Cardoso de Mello, César Tinoco, Godofredo Tinoco, Arthur Lontra Costa, Gil
Sobral Pinto, Alcindor Bessa e Gentil de Castro Farias.363
Outros dois panfletos – assinados pela comissão Democrática dos padeiros364 e
pelos Trabalhadores Antifascistas de Campos365 – adotaram um tom muito mais duro em
relação aos “camisas-verdes”. Em ambos a palavra de ordem era o pedido de fechamento
da AIB sob a acusação da organização defender propostas antidemocráticas.
Na noite marcada, centenas de pessoas se reuniram na praça São Salvador para
participar do comício antifascista.366 Os oradores que se sucederam centraram seus ataques
à candidatura de Plínio Salgado. O ato encerrou-se as 22h30min h. Logo a seguir os
presentes saíram em passeata pelas ruas do centro gritando palavras de ordem contra os
integralistas.
Indiferente ao clima político da cidade do interior do estado, na noite de 15 de
agosto foi realizado outro comício em Niterói. Por volta das 20 h, na região do núcleo de
Ingá, uma multidão de cerca de 4 mil militantes e simpatizantes da candidatura de Plínio
Salgado, se reuniu para participar daquele que seria o primeiro grande comício organizado
360 Cartaz anexado ao Processo Crime 1060, pg. 25. 361 No estado do Rio de Janeiro a Coligação Radical Fluminense (CRF), que contava com as maiores bancadas na ALERJ e no Congresso Nacional, acabou sendo minada diante da divisão dos seus principais quadros em relação a corrida presidencial. Assim, no PSF e na UPF ocorreram dissidências em torno das candidaturas de Armando Salles e José Américo. Em contrapartida, a maioria dos dirigentes do PPR permaneceu ao lado da candidatura de Armando Salles. Para ver mais: DHBB. 362 Panfleto anexado ao Processo Crime 1060, pg. 26. 363 Panfleto anexado ao Processo Crime 1060, pg. 29. 364 Panfleto anexado ao Processo Crime 1060, pg. 27. 365 Panfleto anexado ao Processo Crime 1060, pg. 29. 366 SILVA, Osório Peixoto. 500 anos dos Campos dos Goytacazes. Campos: Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima, 2004, pg. 214.
188
pelo núcleo municipal. 367 Antes das primeiras intervenções, ocorreu uma cerimônia em que
o partido recebeu 32 novos filiados.
O comício prosseguia com os militantes se revezando em discursos que centravam
ataques ao liberalismo e ao comunismo, taxados de regimes falidos. A situação transcorria
sem maiores incidentes até o momento em que chegaram as primeiras notícias sobre os
problemas no comício de Campos. Rapidamente, o chefe municipal de Niterói – José
Carlos de Souza – tomou a palavra e apontou “os asseclas assalariados por Moscou” como
os responsáveis pelo massacre.368O clima de comoção contagiou os presentes que, no
encerramento do evento, cantaram o hino nacional. Vejamos que fatos levaram essa data a
ficar tragicamente marcada no calendário político da AIB.
5.3 UM DIA SANGRENTO
Domingo, 15 de agosto de 1937, Jorge Renato Pereira Pinto, um jovem campista,
chega à sua casa na região central da cidade. Ele e seus irmãos haviam ido ao circo e,
quando retornaram, encontraram seu pai na sala com as suas bagagens prontas. O jovem
ainda tentou perguntar sobre o paradeiro de sua mãe.369 Seu pai apenas ficou em silêncio.
Naquela noite todos foram para a fazenda da família e só retornaram muitas semanas
depois.
Da janela de sua residência, Sílvia Silva pôde observar uma imagem que ficaria
gravada para sempre em sua memória. Dezenas de jovens – sem camisa – passavam
correndo em frente ao portão de sua casa. Alguns chegaram a jogar suas camisas-verdes no
jardim de sua residência ao mesmo tempo em que sua irmã – militante da AIB – entrou
abruptamente pelo portão e começou a trancar todas as portas e janelas. Apenas algumas
horas depois Silvia Silva soube exatamente o que havia acorrido.
O menino Hélvio Santafé estava na rua em frente à sua casa jogando futebol com
seus colegas. Repentinamente, seu pai surgiu completamente sujo de sangue e ordenando
que todos entrassem e trancassem as portas. Essa foi uma das cenas que mais marcou a
infância do menino. Seu pai, que todo domingo vestia o terno branco de linho para
367 Segundo números da edição do jornal A Offensiva, pg. 3, 18/08/1937. 368Idem. 369 Alcinda Pereira Pinto foi uma das vítimas fatias do tiroteio da praça São Salvador.
189
encontrar os amigos no centro da cidade, havia sido uma das testemunhas do tiroteio e
depois ajudou a transportar dezenas de feridos para a Santa Casa. 370
Todos os relatos apresentados têm em comum os trágicos desdobramentos do
comício da AIB que pretendia reunir milhares de militantes integralistas e simpatizantes da
candidatura presidencial de Plínio Salgado. Diante das primeiras informações sobre o
desfecho do comício integralista, uma única pergunta passou a ser feita: como um ato
político acabou virando um massacre?
As primeiras horas da manhã do domingo ensolarado passaram sem maiores
incidentes. A partir das 10 h, militantes da AIB dos núcleos distritais e de outros
municípios começaram a se concentrar nas imediações da sede municipal. Às 16 h,
centenas de milicianos desfilavam pelas ruas centrais com suas camisas verdes e bandeiras
azuis. Aproximadamente às 17 h, os “camisas-verdes” chegaram na praça São Salvador.371
Sob os olhares atentos da força policial e da multidão, concentrada em torno do
palanque armado em frente à sede municipal, usou a palavra o primeiro orador. Passados
menos de cinco minutos do discurso, teve início um tumulto na platéia quando, logo em
seguida, ouviu-se o primeiro disparo que marcou o início do tiroteio.
Durante alguns minutos o tiroteio foi intenso com balas sendo disparadas de vários
pontos. Próximo do chafariz da praça São Salvador, a força policial havia instalado uma
potente metralhadora e posicionado a maioria do seu efetivo. Segundo os relatos, a sede da
AIB serviu de abrigo para muitos militantes que teriam revidado com mais disparos.
Em meio ao caos, todos correram para todos os lados. A maioria se jogou no chão e
o pânico foi geral. Diante do fogo cruzado, parte da multidão correu, desesperada pelas ruas
estreitas do centro da cidade. Em poucos instantes as ruas 7 de setembro, Barão do
Amazonas, Santos Dumont e Treze de Maio viram passar centenas de pessoas correndo em
busca de proteção. Outros integralistas usaram a Beira-rio como rota de fuga.
Infelizmente, nem todos conseguiram abrigar-se ou correr. Vitimados pelos tiros,
caíram mortos e feridos homens, mulheres e crianças. Apesar da violência do tiroteio, o
comandante da força policial conseguiu interromper o tiroteio. Quando a fumaça baixou,
370 Todas as informações são baseadas em entrevistas realizadas com familiares de pessoas envolvidas no tiroteio de 15 de agosto de 1935. 371 Todas as informações apresentadas são baseadas, principalmente, no Processo Crime 1060. Outras fontes utilizadas foram os seguintes periódicos: O Globo, Diário da Noite, Monitor Campista, Folha do Comércio e A cidade.
190
foi possível perceber a extensão do massacre: dez mortos e mais de duas dezenas de
feridos.
Imediatamente, tiveram inicio os trabalhos de socorro aos feridos e recolhimento
dos mortos. Em poucas horas chegaram a Campos representantes da Secretaria Estadual de
Segurança – acompanhados de reforços policias. No dia seguinte, começaram as
investigações sobre os responsáveis pelo tiroteio.
Enquanto isso, os acontecimentos de 15 de agosto ocuparam as primeiras páginas
dos principais jornais do país. A cidade ainda enterrava seus mortos quando a imprensa
nacional trouxe em suas edições as primeiras versões da tragédia. Segundo matéria do
Diário da Noite, as provocações realizadas pelos integralistas em todos os estados eram
uma constante. Dessa forma, os incidentes durante os comícios da AIB seriam uma
demonstração de que o país estaria a beira de uma “noite de São Bartolomeu”.372
O periódico relatou que, segundo as autoridades policiais do estado, a temperatura
política na cidade andava tensa havia alguns dias. Mais precisamente, a partir da
confirmação da data do comício integralista no município, tanto que, na noite anterior ao
evento da AIB, aconteceu um comício de opositores aos “camisas-verdes”.
Na concentração, segundo o jornal, compareceram em torno de dez mil pessoas que
assistiram uma série de discursos que tinham como ponto em comum a defesa das
instituições democráticas e as criticas ao “extremismo verde”. No dia seguinte os incidentes
teriam começado após o tenente Coracy – representante da força pública – ter solicitado
que o primeiro orador da AIB diminuísse o tom de seus ataques as instituições da “liberal
democracia”.
O conflito generalizado aconteceu a partir de uma agressão sofrida pelo
representante da lei. Os polícias que acompanhavam o tenente Coracy teriam respondido à
agressão com tiros que, imediatamente, foram respondidos pela milícia integralista que se
refugiou na sede da organização. A população acabou ficando presa no fogo cruzado, o que
provocou a morte de dez pessoas.373
A reportagem apontou os integralistas como os principais responsáveis pelos
desdobramentos funestos do conflito e indicou a atuação da força policial, que precisou
372 Diário da Noite, pg. 1, 16/08/1937. 373 Idem.
191
interditar parte do centro da cidade para atender as vítimas e desarmar todos os milicianos
que haviam se refugiado na sede do partido. O jornal encerra a matéria divulgando a lista
dos mortos e fornecendo um boletim sobre os feridos.
Com título “Verdadeira batalha entre integralistas e a polícia”, a edição do jornal O
Globo apresentava os detalhes sobre o sangrento episódio.374 Na matéria surgiram mais
detalhes a respeito tanto do comício anti-integralista da véspera, quanto do comício da AIB
no dia 15. Segundo as informações de O Globo, a cidade amanheceu com um clima
extremamente carregado por conta dos conflitos que haviam acontecido na noite de sábado
na manifestação contrária à realização da concentração dos adeptos de Plínio Salgado.
O jornal informou que as autoridades policiais chegaram a solicitar aos dirigentes da
AIB que o comício fosse suspenso devido aos fatos ocorridos na noite anterior, inclusive
com a agressão perpetrada por militantes integralistas a um dos partidários da candidatura
de Pedro Américo.375
Apesar das solicitações das autoridades, a concentração e o comício programados
pela AIB foram mantidos. Infelizmente, segundo o órgão de imprensa, o “fogo no paiol de
pólvora” teve início já com as palavras iniciais do primeiro orador. Daí em diante a versão
de O Globo seguiu a mesma linha do outro jornal da capital federal – Diário da Noite –
com idêntica seqüência fatal de tiros e mortes.376
Em 17 de agosto começaram a surgir nos jornais campistas as primeiras notícias do
tiroteio. Entre os periódicos, a versão apresentada pelo jornal A Cidade foi a primeira que
procurou apontar a imperícia da força policial como responsável pela origem do massacre.
O texto fez uma ressalva sobre os disparos de dois tiros – um partindo das imediações da
Beira-rio e outro da agência do Banco do Brasil – que teriam causado a reação dos
policiais.377
Também destacou os telegramas enviados pelo presidente da Câmara Municipal da
cidade ao governador e ao presidente. É importante salientar que, em ambos, o vereador
apontou a permissão da realização de um comício integralista no centro da cidade como
elemento que teria gerado o conflito. Os depoimentos apurados na matéria reforçaram a
374 O Globo, pg. 1, 16/08/1937. 375 Idem. 376 Idem, pg. 03. 377 A Cidade, pg. 1, 17/08/1937.
192
tese do jornal sobre a origem do tiroteio: a precipitação da força policial. O jornal
apresentou uma série de detalhes sobre os feridos – em sua maioria com fraturas
provocadas pelo atropelamento da massa humana que fugiu das balas na Praça São
Salvador – e o velório das vítimas fatais.
Houve um registro no jornal da chegada de reforços da força policial do estado e do
exército. Outro trecho da reportagem fez um longo relato sobre a abertura de um inquérito
policial para apurar as causas e responsáveis pela tragédia e as providências do delegado
para levantar as primeiras informações da investigação.378
Entre as informações apresentadas por A Cidade, estava uma no mínimo curiosa.
Consta que, momentos depois do tiroteio, dezenas de militantes da AIB correram em
disparada pelas ruas do centro sem camisa. Isso porque muitas pessoas indignadas com as
primeiras notícias estariam espancando todos aqueles que estivessem trajando o uniforme
do partido. Alguns tiveram a sorte de receber dos moradores outras camisas, mas a maior
parte acabou livrando-se da camisa-verde nas ruas, na margem do rio, nos quintais, em
resumo, em qualquer lugar. Os militantes de outras cidades e dos distritos que tiveram mais
sorte acabaram se refugiado na estação ferroviária à espera de uma condução para
retornarem aos seus locais de origem.379
Poucos dias depois, os jornais de circulação nacional diminuíram a atenção sobre o
tiroteio de Campos. Contudo, periódicos locais continuaram a relatar os velórios,
sepultamentos e diversas missas e homenagens feitas às vítimas.380 A situação dos
sobreviventes que teriam ficado gravemente feridos – alguns mutilados pelas rajadas de
metralhadora – foi assunto que também ocupou espaço na imprensa regional.
Com o encerramento dos velórios e sepultamentos, o tema que passou a pautar os
órgãos de imprensa local foram os desdobramentos do inquérito policial. Dessa feita, as
atenções passaram para as investigações como, por exemplo, o laudo dos legistas que
indicou que a maioria dos tiros foi disparada por armas de calibre 32 e entraram de cima
para baixo nos corpos das vítimas. Possivelmente os tiros partiram de pessoas instaladas
nas janelas e sacadas da sede da AIB de Campos. Ainda segundo o jornal, os investigadores
378 O inquérito policial deu origem a um processo de acusação contra os policiais. Contudo, depois de dois o processo foi arquivado, em 1939, sem apontar culpados pelo massacre. 379 Idem. 380 Folha do Comércio, pg. 1, 19/08/1937.
193
nomeados pelo governo do estado reforçaram essa hipótese ao encontrarem várias cápsulas
deflagradas de revólver calibre 32 na marquise da sede da AIB.381
Diante das informações dos primeiros laudos policiais que indicavam que a origem
do tiroteio teria sido gerada por seus militantes, que responderam aos primeiros tiros da
força policial, a AIB contestou indicando que os responsáveis eram os “comunistas”. Tanto
em nível local como em nacional – através de A Offensiva – os integralistas pareciam
sintonizados em apontar seus velhos inimigos como os culpados pela tragédia do dia 15 de
agosto.
A versão dos “camisas-verdes” ficou nítida na manchete do seu periódico oficial
que não deixou margem para dúvidas: “Os comunistas praticam um bárbaro massacre na
cidade de Campos”.382 Segundo o jornal integralista, as “forças bolcheviques” haviam
criado um clima de terror na cidade durante toda a semana que antecedeu a concentração do
partido.
O primeiro tiro teria sido disparado momentos depois do primeiro orador ter
acusado os comunistas e seu líder, Luiz Carlos Prestes, de criar um ambiente de agitação
em torno da candidatura da AIB. A reação da força policial, depois de ouvir os primeiros
tiros, foi alvejar todos os presentes na praça São Salvador. Apesar das ordens de cessar-
fogo do comandante do destacamento, o tiroteio teria prosseguido guiado por “mãos
criminosas” a mando de Moscou.
Os dirigentes integralistas – apesar de correrem perigo de morte – teriam arriscado
as próprias vidas para socorrer os feridos e transportar todos os sobreviventes para os
hospitais. O texto relata a atitude de José de Barros Souza, chefe municipal de Campos que,
apesar de ter seu pai – Horácio de Souza – entre as vítimas fatais, continuou ajudando os
cidadãos que estavam feridos.
As cenas tocantes, segundo o jornal oficial da AIB, dos integralistas transportando
os feridos poderiam ser comprovada através das manchas de sangue encontradas nos
uniformes dos militantes. Essa atitude dos integrantes do partido teria despertado, como
reflexo imediato uma onda de simpatia da população em torno de Plínio Salgado e, como
era de se esperar em uma matéria da “imprensa verde”, uma revolta contra os comunistas.
381 A Offensiva, pg. 1, 17/08/1937. 382 Idem.
194
Desse modo, para a reportagem de A Offensiva, todos na cidade fluminense estariam unidos
em torno de uma causa em comum: punir os “comunistas”.383
As providências da direção nacional da AIB também acabaram sendo destacadas na
mesma edição. Uma resolução do chefe nacional determinava que, a partir daquela data,
todos os comícios e concentrações públicas do partido só poderiam acontecer com a
permissão das autoridades policiais locais. O objetivo da medida seria salvaguardar a
integridade e a segurança das famílias contra as “atividades conspiratórias dos agentes do
Soviet”.384
Para não parecer que tal atitude representaria um recuo ou demonstração de medo
por parte dos “camisas-verdes”, o trecho final da resolução indicava que os integralistas
passariam a redobrar sua vigilância em relação às ações dos que “estavam ao lado de
Moscou”. Nesse sentido, ante o perigo de um “golpe comunista”, os militantes do partido
teriam como missão proteger a integridade da nação, a honra das famílias e a causa de
Deus.385
No dia seguinte a “imprensa verde” voltou a destacar o tiroteio de Campos.
Contudo, os relatos de atos heróicos e bravura dos integralistas ficaram em segundo plano
porque a maior preocupação do veículo de comunicação da AIB foi desqualificar as
informações divulgadas em outros órgãos de imprensa.
Foi publicado um documento intitulado “A imprensa e a chacina de Campos” que,
resumidamente, destacou os seguintes pontos: 1) que os integralistas não agrediram
nenhum membro da força policial. 2) que a população de Campos não teria agredido ou
despido de seus uniformes os militantes do partido e 3) que a população brasileira saberá
julgar e ficar ao lado dos integralistas contra as versões caluniosas da imprensa que sofreria
de “uma grave infiltração bolchevique”.386
Outro recurso empregado foi publicar uma nota oficial que teve duas finalidades. A
primeira, informar que a chefia nacional baixou uma resolução proibindo, temporariamente,
a utilização de uniformes e insígnias do partido. A justificava era que elementos comunistas
383 Idem. 384 Idem. 385 Idem. 386 A Offensiva, pg. 1, 18/08/1937.
195
estavam se disfarçando de militantes da AIB para cometer atos violentos.387 A segunda
finalidade era indicar os verdadeiros culpados pelos acontecimentos de 15 de agosto. Como
de praxe, os integralistas procuraram colocar a responsabilidade pelo incidente,
exclusivamente, na ação dos “comunistas”. Como se sabe, o Partido Comunista da Brasil
estava na ilegalidade e, com a maioria de seus membros presos, seria impossível apresentar
sua defesa.388
Nitidamente preocupada com as informações veiculadas através da imprensa
nacional, regional e municipal sobre o tiroteio de Campos, a direção nacional da AIB
passou a ocupar-se cada vez mais em apresentar sua versão do caso. Ao mesmo tempo,
utilizou seu jornal para transmitir tranquilidade aos seus filiados. O objetivo era passar a
idéia que a população campista estava solidária aos dirigentes da AIB. Uma reportagem
informava ter havido um protesto “popular” na estação ferroviária do município no
momento que os jornais de outras cidades e estados chegaram. Um grupo de comerciantes
teria organizado um meeting na rua da Quitanda para protestar, principalmente, contra as
matérias dos jornais O Globo e Diário da Noite.389
Sem poder usar seus uniformes ou realizar comícios, proibidos pelas autoridades
estaduais,390os rituais fúnebres de seus militantes foram utilizados como propaganda. Dessa
forma, a utilização da morte de militantes como instrumento de propaganda do partido foi
uma das cerimônias, celebrações e rituais políticos criados ou recriados pela AIB. Para
alcançar toda a extensão dessas práticas é necessário conhecermos os ritos políticos
integralistas.
5.4 A CONSTRUÇÃO DOS MÁRTIRES INTEGRALISTAS
No dia 3 de abril de 1933, a população da capital paulista assistiu ao início de uma
das cerimônias que se tornou uma das características marcantes da AIB. Nessa data, a
população da cidade testemunhou um grupo de milicianos, sob o comando de Gustavo
387 Folha do Comércio, pg. 4, 19/08/1937. 388 Folha do Comércio, pg. 4, 19/08/1937. 389 Idem. 390 Até as atividades da Semana da Pátria, comemoradas em alusão ao dia 7 de setembro, estavam suspensão. No máximo, podendo acontecer em recintos fechados com a autorização da força policial.
196
Barroso, marchar com seus uniformes e bandeiras. A partir desse primeiro desfile, onde
houvesse um núcleo integralista, haveria uma cerimônia ou ritual da organização.391
Assim, os momentos da vida dos militantes passariam a contar com ritos e símbolos
que cumpririam a tarefa de padronizar e unificar as ações do partido, através da construção
de uma mística do movimento.392 Os documentos da AIB previam que, em todas as fases da
vida, os militantes deveriam contar com rituais específicos, tais como no batismo, no
ingresso no partido, no casamento e até no velório.
É interessante destacar que, historicamente, em vários países e épocas diferentes, o
Estado, movimentos e partidos políticos utilizaram uma série de rituais e comemorações no
sentido de mobilizar os cidadãos em geral e, especialmente, os jovens e os estudantes.
Novos feriados, cerimônias, heróis e símbolos do poder buscavam marcar esses momentos
para fazer verdadeiros espetáculos de propaganda e exaltação.393
A forma mais comum de celebração era a realização de desfiles e paradas públicas.
Algo comum que, ao longo da história, as mais diversas sociedades foram incorporando às
suas tradições nacionais.394 Essa forma de comemoração e celebração seria herdeira dos
desfiles triunfais das legiões da Roma antiga, das grandes procissões medievais, dos
desfiles militares dos exércitos de Napoleão pelo Arco do Triunfo, até chegar na forma
mais moderna dos desfiles: a parada norte-americana.395
Durante a década de 1930, o país que realizou de maneira mais monumental
comemorações cívicas foi a Alemanha. O grande número de cerimônias e comemorações
realizadas na Alemanha durante esse período foi uma tentativa do Estado interpretar ou
391 TRINDADE, op cit. 392 CAVALARI. Rosa M. F. Integralismo: ideologia e organização de um partido de massa no Brasil (1932-1937). Bauru: SP. EDUSC, 1999, pg. 163. 393 Para mais informações sobre esse assunto, ver em: HOBSBAWN, Eric. A produção em massa de tradições: Europa, 1870 a 1914. IN: HOBSBAWN, Eric e RANGER, Terence. A invenção das tradições. RJ: Paz e Terra, 1997, pp. 271-316. 394 Para mais informações sobre esse assunto, ver em: RYAN, M. A Parada Norte-Americana: representações da ordem social do século XIX. IN: HUNT: L (ORG). A Nova História Cultural. 2 ed. SP: Martins Fontes, 2001, pp. 177-209. 395 A forma e a estruturação dos desfiles surgidos durante o século XIX na América do Norte acabou transformando-se no padrão dos desfiles e paradas. Os desfiles realizados, principalmente, nas datas religiosas e cívicas, com os participantes organizados em colunas, empunhando estandartes de suas agremiações e acompanhados por uma banda de música acabou tornando-se modelo para outros países.
197
reinterpretar acontecimentos históricos marcantes, sobretudo tentando estabelecer uma
ligação desses fatos com a história do partido nazista.396
A apropriação de datas pelo regime do nacional-socialismo foi uma das
características mais fortes das cerimônias políticas modernas.397 Além da tentativa de
sugerir uma continuidade com o passado, essas comemorações pretendiam afirmar uma
verdadeira ligação entre as forças políticas do presente com a tradição histórica reconhecida
e celebrada pela população.
Assim, as forças políticas nazistas procuraram de forma sistemática incorporar e
redimensionar fatos e acontecimentos ligados ao passado do país com o intuito de
estabelecer uma ponte entre as realizações do regime nazista com os grandes feitos do
passado do país. Tento em vista a situação da Alemanha no período pós-Primeira Guerra,
houve uma nítida tentativa de criar e recriar rituais como instrumento de afirmação
política.398
Para esses regimes399os rituais eram momentos em que o povo e, principalmente, os
militantes eram chamados a demonstrar e a reafirmar sua fidelidade com a causa. No caso
dos rituais políticos uma das mais importantes tarefas era atrair e conquistar simpatia do
conjunto da população.
A tarefa de comunicar crenças e valores para o coletivo era facilitada pela
linguagem performática – importante característica dos rituais políticos. Nesse contexto, o
ritual representava uma espécie de texto coletivo simbólico que se expressava por meio de
uma linguagem corporal. 400
Em um ritual político cada gesto corporal cumpria uma determinada finalidade no
sentido de transmitir uma “verdade” que deveria ser assimilada por todos.401 Mais do que
isso, a repetição gestual402 era um elemento que explicitava a unidade e a aceitação das
diretrizes do partido. Levantar o braço, desfilar, repetir uma saudação, enfim, significava
396 CONNERTON, Paul. Como as sociedades recordam. SP: Celta Editora. 1993. 397 Um exemplo evidente foi a reintrodução da cerimônia da Tocha Olímpica nas olimpíadas modernas, durante a edição dos jogos na cidade de Berlim, em 1936. 398 Idem, pg. 62. 399 Refiro-me especificamente ao nazismo e ao fascismo. 400 Idem, pg. 60. 401 Idem, pg. 62. 402 Idem, pg. 83.
198
mais que simples ações físicas. Representava estar enquadrado e em sintonia com as idéias
e ideais defendidos.
De fato, o ritual assumiu um papel que extrapolava a dimensão da subjetividade. No
terreno da política as cerimônias e celebrações atingiam um caráter objetivo, pois,
concretamente buscava-se atingir a plena subordinação dos filiados. Para isso a necessidade
das liturgias políticas que hipnotizavam as “massas”. Garantindo ao partido/condutor a
primazia na tradução do ritual e efetivo controle do poder.403
No Brasil, visando atingir de maneira uniforme o conjunto da militância, coube aos
integralistas a criação e implementação de uma série de ritos e cerimônias. No intuito de
cumprir tal tarefa, foi criado um conjunto de documentos que passou a nortear
nacionalmente os “soldados de Deus”. Conhecidos como “Protocolos e Rituais
Integralistas’, esses documentos eram constantemente atualizados pela “imprensa verde”,
especialmente nas edições do Monitor Integralista. Eles registravam todas as regras de
comportamento dos integralistas, tais como uso de uniformes, de símbolos e procedimentos
durante as cerimônias.
Os integralistas souberam utilizar fartamente cerimônias, rituais e celebrações como
instrumento de arregimentação de novos adeptos e unificação dos antigos filiados. Tais
solenidades cumpriam uma dupla função: uma interna e outra externa.404Sem dúvida, no
plano interno a finalidade mais destacada era a transmissão ilusória de participação política.
A edificação dos rituais só foi possível porque a massa de filiados que participava
das cerimônias o fazia de forma organizada e controlada, ou seja, havia um roteiro pré-
estabelecido que determinava o papel de cada elemento no cenário. Esse roteiro eram os
chamados Protocolos e rituais que previam cada detalhe sobre as solenidades e símbolos
dos “camisas-verdes”.
A obediência durante os desfiles era um sinal de fidelidade com as diretrizes
traçadas pela direção nacional. O cumprimento de tais orientações acabava indicando o
grau de comprometimento do filiado com o partido, em suma, para se criar um sentimento
de unidade seria fundamental eliminar todas as manifestações individuais.
403 Para mais informações, ver em: KUSCHENIR, Karina e CARNEIRO, Leandro P. As dimensões subjetivas da política. Revista de Estudos Históricos. Rio de Janeiro: v. 24, pp. 227- 301, 1999. 404 BERTONHA, João Fábio. Sobre a direita: estudos sobre o fascismo, o nazismo e o integralismo. Maringá: EDUEM, 2008, pg. 246.
199
Nesse universo uma das mais destacadas armas de identidade coletiva dos
integralistas foi a letra grega sigma maiúscula.405 Esse símbolo ocupou lugar de destaque
no movimento integralista, juntamente com a saudação com o levantamento do braço
direito acompanhado da palavra “Anauê”. Entre os militantes era comum uma única
saudação, já o brado de três “anauês” era restrito ao chefe nacional.406 As palavras “Deus,
pátria e família” compunham o lema dos seguidores de Plínio Salgado.
O uniforme verde foi outra marca ímpar dos integralistas. Tal vestimenta deveria ser
usada obrigatoriamente durante as reuniões, desfiles e cerimônias do partido.407 O
fardamento – símbolo maior da uniformização da AIB – deveria acompanhar o militante
em todas as suas atividades, até mesmo durante as viagens. Em caso de falecimento, o
integralista seria sepultado com seu uniforme.
De maneira semelhante aos outros símbolos, os Protocolos estabeleciam as cores e
dimensões da bandeira dos “camisas-verdes”. As cores escolhidas foram o azul –
significando a dimensão nacional da organização – e o branco – que representava a paz que
marcaria a pureza e sinceridade do movimento.408
Como se observa, cada passo e ação dos militantes eram meticulosamente
planejados para envolver todos os filiados. Até os recém-nascidos poderiam ser batizados
seguindo as instruções dos Protocolos. Previa-se que, depois do batismo religioso
tradicional, os filhos dos militantes passariam por um rito que representaria o primeiro
contato com o partido.
Nos casamentos dos militantes também estavam previstos atos no civil e no
religioso. Em ambos, a utilização do uniforme era obrigatória para o noivo, padrinhos e
convidados. As noivas trajariam seus vestidos portando as insígnias. Durante os atos no
civil e no religioso, o dirigente mais graduado do núcleo deveria estender o braço e dizer,
em voz baixa, que o chefe nacional estava presente.409
Importante mencionar ainda as marchas, desfiles e hinos da AIB que, semelhante
aos outros momentos da vida partidária, também estavam previstos nos Protocolos. Todos
405 O sigma além de representar na matemática a soma de todos os elementos tinha outro significado: era a letra com a qual os primeiros cristãos da Grécia identificavam Deus. 406 Excepcionalmente, em algumas cerimônias solenes os três “anauês” eram empregados. Os Protocolos também previam que Deus teria direito a quatro “anauês”. 407 Para mais informações, ver em: CALAVARI, Op. cit., pg. 191. 408 Idem, pg. 192. 409 Idem, pg. 176.
200
esses rituais contribuíam para reafirmar, na prática, os ideais do partido, ou seja, entre os
integralistas havia um permanente estímulo à ação.
Das manifestações da AIB, participavam todos os militantes, independentemente da
idade, do sexo, da condição financeira, do grau de instrução, enfim, sem distinção de
qualquer natureza. No meio da massa que desfilava pelas ruas do país desapareciam,
momentaneamente, as diferenças e as particularidades. A sensação de deixar de ser apenas
“mais um na multidão” passava pela noção – insistentemente divulgada – de que todos
tinham um denominador em comum, em outras palavras, durante os desfiles e celebrações
desapareciam os indivíduos e surgia algo muito mais poderoso e maior: o partido.
No caso específico da AIB, como dissemos, o processo de socialização foi
construído, elaborado e planejado pela direção nacional. Todas as diretrizes estavam
previstas e estabelecidas por uma série de resoluções compiladas no chamado “Protocolo de
Rituais integralistas”. Entre os mais importantes rituais ordinários do partido podemos
citar: A Vigília da Nação, A Noite dos Tambores Silenciosos e as Matinas de Abril.
Previsto para acontecer no mês de fevereiro, como homenagem ao congresso de
fundação da AIB, a cerimônia da Vigília da Nação seria marcada por uma sessão solene nas
sedes dos núcleos. Às 21h, todos os presentes deveriam fazer um minuto de silêncio em
respeito a Deus, à pátria e ao chefe nacional. No encerramento, depois dos
pronunciamentos previstos,410 haveria um juramento coletivo de fidelidade a Plínio
Salgado.
As Matinas de Abril deveriam ser realizadas, anualmente, no dia 23 de abril em
comemoração ao primeiro desfile integralista – realizado em 1933 na capital paulista. Os
militantes deveriam procurar uma praça, antes do nascer do sol, para cumprirem os
requisitos necessários dessa cerimônia.
Tudo tinha início quando o sol começasse a se levantar, a partir daí os Protocolos
estabeleciam que, após um breve pronunciamento, os presentes deveriam – em silêncio –
410 As palavras eram a seguintes: “O Integralismo está vivo em todo o território da Nação Brasileira. A Pátria despertou. Pelo Brasil grande e forte, ergamos três anauês”. Protocolos e Rituais, art. 163 e 170, Monitor Integralista, n 15, outubro de 1936. Apud TRINDADE, op cit, pg. 202.
201
ficar com braços levantados durante alguns minutos. Após um breve pronunciamento411 de
quem dirigisse a cerimônia, o som de clarins deveria soar na alvorada.
Entre os rituais de socialização um dos mais impressionantes era A Noite dos
Tambores Silenciosos, que deveria ocorrer todos os anos no dia 7 de outubro. Os objetivos
do rito eram múltiplos,412 pois pretendia homenagear uma série de datas e fatos marcantes
da trajetória histórica da AIB. Os trabalhos deveriam ter início às 21h na maior quantidade
possível de núcleos do país.
A presidência da sessão deveria ficar a cargo do integralista mais pobre e humilde
que representaria o chefe nacional. Os trabalhos seriam iniciados com o canto dos hinos –
nacional e da AIB. Outro ponto previa a chamada dos mártires do movimento que seriam
saudados com o grito “presente”. A leitura de trechos do “Manifesto de 1932” e o
pronunciamento de discursos também estavam programados.
O ponto máximo da cerimônia aconteceria à meia-noite, quando, depois de breves
palavras, o som de tambores deveria soar por 3 minutos.413 No momento seguinte o
presidente da sessão lembraria a todos que na capital do país o chefe nacional estava
discursando. A leitura do poema “A Noite dos Tambores Silenciosos”, de autoria de Jaime
de Castro, marcava o ponto final do ritual.
No âmbito externo os sinais de coesão pretendidos com a uniformização dos ritos
da AIB ficavam mais nítidos nas imagens reproduzidas e divulgadas através da imprensa da
organização. 414 Costumeiramente, as fotografias dos jornais e revistas mostravam cenas de
desfiles, paradas, casamentos e concentrações públicas. Contudo, não bastava aos núcleos
411Nessa cerimônia as palavras proferidos eram: Camisas-verdes. Este sol iluminou quatro séculos da História do Brasileira, iluminou a primeira marcha dos integralistas e iluminará a vitoriado sigma. Assim como esperamos hoje esta alvorada, aguardamos confiantes o Dia do Triunfo. Pelo bem do Brasil. Pelo Estado Integral, três anauês! Protocolos e Rituais, art. 169, Monitor Integralista, n º 15, outubro de 1936. Apud TRINDADE, op cit, pg. 205. 412 O principal significado estava ligado a comemoração do lançamento do Manifesto de Outubro, em 1932.Entretanto, com o passar dos anos a cerimônia revestiu-se de outras finalidades, entre elas: protestar contra o fechamento da milícia pelo governo,em memória aos mortos do partido e em culto a Deus, a Pátria e a família. Ibdem, pg. 203. 413 As palavras proferidas eram: É meia-noite. Em todas as cidades da imensa pátria , nos navios em alto mar, nos lares, nos quartéis, nas fazendas e estâncias, nas chopanas do sertão, nos hospitais e nos cárceres, os Integralistas do Brasil vão se concentrar três minutos em profundo silêncio. É Noite dos Tambores Silenciosos. Atenção. Protocolos e Rituais, art. 86, Monitor Integralista, n 15, outubro de 1936. Apud TRINDADE, idem, pg. 203. 414 Sobre a utilização das imagens na imprensa pelos integralistas, ver no capítulo anterior.
202
realizarem os rituais. Em muitos casos o mais importante era comunicar as solenidades
realizadas. O objetivo era evidente: criar um sentimento de unidade.
A preocupação em externar, via imprensa, as celebrações realizadas ficavam mais
perceptíveis em rituais como a “Noite dos Tambores Silenciosos”. Após realizarem suas
cerimônias, a preocupação dos dirigentes dos núcleos regionais e locais da AIB era
telegrafar à chefia nacional informando sobre o sucesso da atividade.
As edições dos jornais da AIB dos dias subseqüentes ficavam repletas de informes
dos mais distantes núcleos do país, inclusive de vários núcleos do nosso estado,415 todos
dando ciência das cerimônias. Tais procedimentos acabaram se transformando em rotina no
partido. A mesma prática foi repetida durante o lançamento oficial da candidatura de Plínio
Salgado.
No geral, as celebrações, rituais, desfiles, símbolos e insígnias se revertiam em
espaços de reafirmação da importância do partido para o coletivo. O controle sobre a
elaboração dessas manifestações pertencia à direção da AIB que, ao construir o calendário e
regras, acabava por exercer o pleno domínio sobre a militância. Assim, controlar os rituais
era controlar a massa e deter o monopólio sobre todos os dogmas, noções e concepções que
circulavam no interior do partido.
Propositalmente, deixamos para apresentar os rituais ligados aos funerais e aos
mártires integralistas por último. Isso porque, como afirmamos anteriormente, o período de
exceção, que passou a vigorar depois do tiroteio de 15 de agosto, levou os integralistas a
utilizar seus militantes mortos como instrumento de propaganda.
Dessa forma, as informações sobre as mortes de militantes em confrontos de rua
também ocuparam um espaço privilegiado nos órgãos da imprensa integralista. Essa
espécie de luto político que envolvia todo o conjunto do partido estava prevista nos
“Protocolos Integralistas”, pois todos os detalhes que envolviam o velório dos “camisas-
verdes” estavam meticulosamente previstos.
Na verdade, a preocupação com os rituais que envolviam os mortos tinha um
objetivo claro: criar os mártires da AIB. No que tange aos rituais fúnebres, os “Protocolos”
apresentavam uma série de procedimentos que deveriam ser adotados, como, por exemplo,
415 Como exemplo, podemos citar a edição do jornal A Offensiva do dia 18/10/1936, que em sua pg. 13 trouxe uma relação com dezenas de cidades fluminenses que realizaram o rito A Noite dos Tambores Silenciosos, entre os municípios podemos citar: Niterói, Teresópolis, Petrópolis, Resende, Porciúncula e Campos.
203
o caixão deveria ser coberto pela bandeira do partido.416Haveria um momento em que um
dirigente solicitaria um minuto de silêncio das pessoas presentes.
Na seqüência, era realizada a chamada do nome do falecido. Os companheiros
deveriam responder ao mesmo tempo: “presente”. O próximo passo era um dos mais
surpreendentes, pois o dirigente que comandasse os trabalhos deveria proferir as seguintes
palavras: “No integralismo não se morre! Quem entrou nesse movimento imortalizou-se no
coração dos camisas-verdes.”417
A idéia de imortalidade estava intimamente ligada aos casos de falecimento dos
militantes, ou seja, ao morrer o integralista continuaria servindo ao partido só que agora
com algumas peculiaridades: o espaço de organização no post-morten seria a chamada
“milícia do Além” e o comandante seria ninguém menos que Deus.
Se considerarmos que a maioria dos militantes era composta por católicos, podemos
afirmar que essas liturgias tinham a finalidade de reforçar a fidelidade à causa, sobretudo
através da insistência em destacar o papel daqueles que sacrificaram suas vidas pelo
partido. Todo o esforço em publicar matérias na imprensa sobre os velórios, sepultamentos
e homenagens visava algo como uma sacralização da política.418 A intenção dos dirigentes
era cristalizar entre os membros do partido e, sobretudo, no público externo uma imagem
positiva em relação aos mártires.
Essa intenção ficava clara ao observar que imagens de militantes mortos e feridos
em combates de rua ocupavam os mesmos espaços nas publicações da AIB que cenas de
desfiles, casamentos, sessões solenes e atividades de caráter social. As cenas de caixões,
velórios, cadáveres e sepulturas eram divulgadas sem cortes ou censura pelos órgãos da
imprensa verde. Os integralistas chegaram a compor um panteão de mártires.
416 TRINDADE, Op. cit., pg. 202. 417 Monitor Integralista, n 6, maio de 1934, pg. 9. 418 No Brasil período entre as décadas de 1930 e1940 testemunhou uma prática que se tornou comum: as imagens políticas tiveram uma associação ligadas as questões religiosas. Naquela época a administração Vargas desenvolveu um amplo projeto de comunicação que procurou associar todos os fatos positivos do governo a sua imagem pessoal. Para incutir a idéia do líder preocupado as questões sociais, o Pai do pobres, foram usadas fartamente imagens, cartazes, bustos e estatuas com a finalidades de criar um verdadeiro culto cívico entre a população. Para saber mais, ver: LENHARO, Alcir. A Sacralização da Política. 2º edição. Campinas: Papirus Editora, 1986.
204
QUADRO 4
Relação de Mártires integralistas:
Nome: Local: Data:
Nicola Rosica Bauru – SP 03/10/1934
Jaime Barbosa Guimarães Praça da Sé – São Paulo-SP 08/10/1934
Caetano Spinelli Praça da Sé – São Paulo-SP 23/11/1934
José Luis Schroeder São Sebastião do Cahy - RS 24/02/1935
Alberto Sechin Cachoeiro de Itapemirim - ES 01/11/1935
Juvenal Falcão Panelas – PE Sem data
José Gertrudes Sobral – CE 20/11/1935
Fernando de Andrade Maragogipe – BA 04/09/1936
Ricardo Strelown Jaraguá – SC 07/10/1936
Germano Sacht Jaraguá – SC 07/10/1936
João Seixas Brito Piranhas – AL 26/10/1936
Manuel Duarte da Silva Teresópolis RJ 19/09/1936
Amadeu Faustino Pau Gigante –ES 06/09/1936
Vicente Bernardino de Senna Nova Lima – MG 18/03/1937
José Firmino dos Santos Nova Lima – MG 19/03/1937
Ricardo Gruenwaldt Jaraguá – SC 13/08/1937
Amaro Miranda Campos – RJ 15/08/1937
Jose Antenor de Paula Barreto Campos – RJ 15/08/1937
Amaro Tavares Campos – RJ 15/08/1937
Antonio Bernardes Domingos Martins – ES 30/08/1937
Fonte: Monitor Integralista. Ano V, nº 22, 07/10/1937, pg.03.
Os conflitos que geraram os primeiros mártires integralistas ocorreram apenas em
1934, ou seja, quando a organização estava prestes a completar dois anos de fundação. Uma
explicação pode ser o fato de que somente a partir dessa data a AIB alcançou um nível de
organização e um número de filiados que passou a incomodar seus opositores.
Outro ponto a se destacar é que o número de mortos cresceu com o passar dos anos:
1934 (3 mortos), 1935 (4 mortos), 1936 (6 mortos) e 1937 (7 mortos). O crescimento do
número de filiados e núcleos organizados foi acompanhando por uma escalada no número
205
de vítimas fatais. É importante destacar que 1937 – ano da campanha presidencial – foi o
ano que registrou mais casos de falecimentos em combates de rua
A completa ausência de “blusas-verdes” na relação de mártires serve para reafirmar
o papel e a função das mulheres no partido. Na luta política caberia aos militantes a tarefa
de enfrentar e derrotar os inimigos nos combates de rua. Já em relação às mulheres, como
observamos anteriormente, o “campo de batalha” seria as escolas, os postos de saúde, os
consultórios e os lactários da AIB.
Militantes de quase todas as regiões do país tiveram o “privilegio” de compor o
panteão de mártires. A diversidade regional dos integralistas que partiram como heróis
para a “milícia do além” também serviu para reforçar o caráter nacional do partido. Isso
porque não interessava se o mártir era do norte ou do sul. Todos passaram a ser
reverenciados igualmente na imprensa integralista.
Essa prática já ficou perceptível no caso do primeiro militante morto em um
combate com opositores da AIB. O papel de primeiro mártir dos “camisas-verdes” pertence
ao militante Nicola Rosica 419 do núcleo municipal de Bauru, que morreu em 3 de outubro
de 1934, vitima de um disparo de arma de fogo durante um conflito envolvendo militantes
do movimento sindical da cidade. Poucos dias depois a imagem do velório do militante
circulou nacionalmente através do jornal oficial dos “soldados de Deus”.
Como destacamos anteriormente, a imagem inaugural de um militante morto em um
conflito de rua foi publicada no periódico do partido. Na edição do jornal pode-se observar
que os militantes de Bauru seguiram todas as orientações dos “Protocolos Integralistas”,
pois as bandeiras do Brasil e da AIB cobriam parte do caixão.420Poucos dias depois um
conflito de proporções muito maiores voltou a ocupar as manchetes do jornal da AIB. Os
trágicos resultados da chamada “Batalha da Praça da Sé” atraíram também a atenção da
imprensa nacional, principalmente por conta do saldo final de cinco vítimas fatais.
Novamente, o conflito envolveu integralistas que pretendiam realizar um desfile na
região central de São Paulo e forças antifascistas que se mobilizaram para impedir a
419 Para maiores informações sobre o conflito de Bauru, ver em: POSSAS, Lídia M. V. O trágico três de outubro: estudo histórico de um evento. Bauru: SP. Universidade do Sagrado Coração, 1993. 420 A Offensiva, pg. 3, 10/10/1934.
206
manifestação.421 A escalada da violência e o aumento do número de mortos gerou muitas
manchetes e fotografias nos jornais integralistas.
A “imprensa” verde reservou espaços generosos em suas publicações onde
sobraram imagens de mortos, feridos e manchetes de natureza anticomunista. Os detalhes
do desfile, do conflito, dos atos heróicos dos militantes da AIB e a relação dos mortos e
feridos no conflito estiveram nas primeiras páginas do jornal A Offensiva.
Fonte: Anauê, pg. 9, maio de 1935.
O conflito da praça da Sé marcou profundamente a trajetória dos integralistas, algo
como uma espécie de batismo de sangue. Todos os personagens e fatos ligados a data de 7
de outubro de 1934 assumiram um teor sacro entre os militantes. O culto aos mártires que
tombaram nesse enfrentamento de rua repercutiu por anos no interior do partido e gerou um
conjunto de homenagens registradas em cartazes, reportagens especiais, fotografias e
muitos nomes de escolas.422
Constantemente as imagens e referências aos militantes que tombaram em conflitos
de rua retornavam à imprensa da AIB. Seus exemplos eram apresentados como verdadeiros
421 Para maiores informações sobre a Batalha da Praça da Sé, ver em: MAFFEI, Eduardo. A Batalha da Praça da Sé. Rio de Janeiro: Philobilion, 1984. (Coleção Redescobrimento do Brasil). 422 Mais adiante trataremos especificamente do batizado de escolas com nomes de mártires integralistas.
207
modelos de perfeitos militantes que, apesar de estarem na “milícia do além”, continuariam
“produzindo tantas centenas de milhares de companheiros”.423
Os rostos e histórias de seus martírios apareciam nas publicações do partido de
forma semelhante aos vitrais das igrejas católicas. Como verdadeiros textos icônicos424 o
propósito era cultivar a noção de morte sacrifical como modelo a ser seguido pelo conjunto
da militância. Os mártires integralistas e, principalmente, o cultivo dessas imagens serviam
como importantes instrumentos de coesão e como potencializador de atos de coragem da
militância .
O culto aos acontecimentos da capital paulista originou um verdadeiro padrão de
comportamento no interior da AIB, tanto que, três anos depois do conflito da Praça da Sé
ainda haviam homenagens na imprensa do partido. Uma edição da revista Anauê, de 1937,
trouxe uma matéria que destacou a coragem dos integralistas que enfrentaram, sem
demonstrar medo, os “comunistas” que teriam praticado um ato covarde em nome da “hidra
de Moscou”.425
A reportagem prossegue destacando que os militantes não mediariam esforços ou
poupariam sacrifícios em sua missão: edificar uma pátria baseada nos preceitos cristãos.
Afirmava que “selariam com sangue a sua fé no integralismo”. A revista destacou duas
fotos, a primeira mostra um integralista ferido nas pernas que estava sendo carregado por
um enfermeiro e um outro “camisa-verde”. Vê-se também um grande número de policiais
que estavam mobilizados para apaziguar o conflito. Na sequência da reportagem outra
imagem apresenta uma cena que, possivelmente, foi captada durante a troca de tiros. Na
foto aparecem muitos integralistas correndo desesperadamente, outros se protegendo atrás
de postes e alguns caídos na praça.426
Entre as homenagens aos mártires produzidas pela imprensa da AIB, uma das mais
interessantes foi uma gravura em preto e branco. Publicada em janeiro de 1936, era
assinada por A.G. Gouveia e tinha como característica principal o tom dramático. O cenário
era algo como um cemitério coberto por cruzes típicas de sepulturas.
423 Anauê, Maio de 1935, pg. 09. 424 Sobre texto icônico, ver capítulo anterior. 425 Anauê, pg. 11, 10/07/1937. 426 Foram exatamente essas cenas de integralistas correndo desesperados que inspiraram os militantes antifascistas a criarem a frase que depois virou um apelido, eram eles: “Um integralistas não corre, voa” e o apelido de galinhas-verdes.
208
Fonte: Anauê, jan. 1936, Ano II, n 6, pg. 1.
Contudo, a imagem que dominava a cena era uma mulher vestindo uma mortalha
negra e em posição de saudação com o braço direito estendido. Sobre a figura feminina
pairavam os sobrenomes dos mártires: Falcão, Guimarães, Rosica, Schroeder, Spinelli e
Sechin. Em baixo do desenho, em letras grandes, estava a palavra presente.
Apesar de ser apenas um desenho, a intenção da publicação era evidente: transmitir
a idéia de perenidade apesar da morte. Não faltaram oportunidades para a imprensa da AIB
reproduzir imagens impressionantes. O assassinato do militante capixaba Alberto Sechin,
por exemplo, em 1935, ocupou um espaço de destaque na galeria de imagens fúnebres dos
seguidores de Plínio Salgado.427
De fato, o que chamava a atenção nas primeiras fotos e reportagens publicadas
sobre o conflito na cidade de Cachoeiro de Itapemirim eram as cenas do cadáver e do
velório de Alberto Sechin.428 No jornal da AIB, em meio a manchetes que acusavam os
427 Para maiores informações sobre a assassinato de Alberto Sechin, ver em: FAGUNDES, Pedro E. Sangue nos trilhos de Cachoeiro de Itapemirim –ES: Integralistas e comunistas e a disputa pela memória do conflito de 1935. IN: CD ROOM dos Anais eletrônicos do V Encontro Regional da Anpuh-ES. Estado e Sociedade. Vitória:ES, 2004. 428 A Offensiva, pg. 1, 9/11/1935.
209
“comunistas”, estava uma foto do cadáver do militante em cima de uma cama e com roupas
do hospital.
Na mesma página os integralistas publicaram uma imagem mais forte ainda. Isso
porque, não houve nenhum tipo de constrangimento em publicar uma fotografia que
apresentava claramente detalhes do cadáver do militante capixaba, inclusive, focalizando
os ferimentos ainda sangrando. Na parte de baixo da mesma página, outra fotografia retrata
o velório do jovem militante. Dessa vez, contrariando inclusive os Protocolos Integralistas,
o corpo estava completamente coberto por uma imensa bandeira do partido. Ao seu redor
dezenas de militantes velavam o cadáver. As imagens publicadas não deixam dúvidas sobre
seus objetivos: causar comoção. Em ambas as fotografias e o texto que narra os
acontecimentos são aspectos reveladores da dinâmica desenvolvida pela AIB para demarcar
esse incidente de rua como mais uma página na história de lutas heróicas da organização
contra as forças “sombrias do comunismo”.
Fonte: Anauê, jan. 1936, Ano II, n 6, pg. 36.
A exposição de uma imagem forte no jornal do partido poderia ser justificada pela
pressa em relatar o incidente ou a indignação causada pela morte de um jovem. Contudo, a
publicação da mesma foto, meses depois, com muito mais destaque e nitidez na revista
Anauê não deixa margem a dúvida em relação às intenções dos dirigentes integralistas .429
429 Revista Anauê, jan. 1936, Ano II, n 6, pg. 36.
210
Quanto às imagens lutuosas, em especial a da revista Anauê, configuram a
existência de um padrão que, ao focalizar e ressaltar as chagas do militante alvejado,
pretendia fixar certas marcas no imaginário social dos militantes do partido. A tendência
era que a repercussão da matéria e das fotos promovesse a imediata notoriedade do
militante e alimentassem a veneração do seu martírio.
O próprio convite para a missa de sétimo dia do militante capixaba é um exemplo
claro da prática política adotada em casos de militantes mortos em combates de rua. A AIB
agiu rápido no sentido de sacralizar a memória desses “camisas-verdes”, pois o texto do
convite referia-se ao jovem militante como “mártir glorioso”. O vocabulário empregado
não deixava dúvidas sobre sua intenção: criar um culto aos seus mártires.
As homenagens ao militante morto prosseguiram mesmo 12 meses após sua morte.
Em novembro de 1936, centenas de “camisas-verdes” marcharam vários quilômetros entre
a localidade de Duas Barras e São Vicente, em Cachoeiro de Itapemirim. Portando
bandeiras e coroas de flores, dessa vez a parada teve outra finalidade: homenagear a
passagem de um ano da morte de Alberto Sechin.430
A peregrinação até esse túmulo foi destaque na “imprensa verde” e reforça a tese de
que as informações sobre os mártires integralistas recebiam uma ampla cobertura dos
órgãos de imprensa da AIB. É importante destacar a competência dos integralistas em criar
e construir rituais, cerimônias, enfim, um amplo e complexo elenco de eventos que tinham
como finalidade destacar não apenas seus mártires individualmente, mas acima de tudo
colar essas imagens e representações de sacrifício e heroísmo ao movimento integralista em
geral.
Outro aspecto emblemático que pode servir para sintetizar o esforço dos
integralistas em cristalizar na memória coletiva de seus militantes as lembranças de seus
mártires foi a prática de batizarem inúmeras escolas integralistas com os nomes desses
militantes mortos.
No estado do Rio de Janeiro podemos constatar que do universo de 124 escolas e
cursos profissionalizantes mantidos pela AIB, doze foram batizadas com nomes de
430 A Offensiva, pg. 3, 8/11/1936.
211
“camisas-verdes” mortos em conflitos de rua.431A postura da AIB em construir um
verdadeiro panteão de mártires e, principalmente, utilizar a memória desses militantes
como instrumento de coesão interna e propaganda externa foi outra marca do integralismo.
As práticas elaboradas e desenvolvidas pelo partido de organizar romarias, batismo
de escolas, publicação de gravuras, fotografias e textos, além de contribuírem como fonte
de vestígios da memória integralista, indicam que a AIB investiu bastante na construção
daquilo que hoje chamaríamos de “lugares de memória”.432 Nesse sentido, a chamada
vigilância comemorativa433 seria manifestada através das cerimônias. Os integralistas
chegaram ao extremo de tentar criar um novo calendário político, com o ano de 1932 sendo
o marco do primeiro ano da “Era Integralista”.434
Com isso, as festas, os museus, os cemitérios, os arquivos, os aniversários, os
tratados, os monumentos, enfim, os lugares de memória desempenham os papéis de marcos
testemunhais de outra era. Para que todo o esforço atingisse seu objetivo deveria haver uma
vontade de memória que no caso da AIB se manifestou, principalmente, no batismo de
escolas.
Com seus rituais e cultos em homenagem aos militantes mortos os integralistas
pretendiam legitimar o próprio partido. A necessidade de construir e vincular sua imagem
ao sacrifício desses mártires constituiu um importante instrumento de propaganda e, ao
mesmo tempo, de estímulo para seus – novos e antigos – militantes em todo o país.
A concepção de que um integralista seria eterno na “milícia do além” foi usada pela
imprensa da AIB para estimular e encorajar os novos militantes no sentido de se mirarem
no exemplo de martírio de seus companheiros. Essa situação ficou evidente na batalha
travada através da imprensa para construir uma versão sobre os fatos que marcaram o
tiroteio de Campos. Essa preocupação apresentou uma prática comum entre os “camisas-
verdes”: transformar seus militantes mortos em conflitos de rua em mártires. Como
431 Em relação as escolas nos núcleos municipais e distritais estavam assim divididas: Jaime Guimarães (Barra Mansa, Ribeiro Grande , Santa Maria Madalena, Teresópolis e Serrana), Nicola Rosica (Campos, Floresta e Valença), Caetano Spinelli (Guarulhos e Moselha), Juvenal Falcão (Alto Teresópolis) e Alberto Sechin (Floresta). Uma relação completa das escolas e cursos mantidos pela AIB no estado pode ser consultada no Anexo. 432 Para mais informações sobre esse conceito, ver em: NORA, Pierre. Entre Memória e História. A problemática dos lugares. Projeto História. São Paulo, nº 10, 1993, pp. 07-28. 433A vigilância comemorativa seria uma espécie de valorização dos elementos e dos sinais que lembram o passado. Seria um dos únicos meios que garantiria que a História não fosse varrida. 434 Segundo o calendário integralista, 2009 seria o ano 77 da Era Integralista.
212
podemos verificar na edição de setembro da revista Anauê que apresentou uma das
primeiras homenagens aos militantes que faleceram no conflito.
Mártires de Campos! Presentes! Mais cinco “camisas-verdes” transferidos para a milícia do além. Mais cinco embaixadores do integralismo foram contar ao Cristo as angústias de uma pátria que quer ser D’Ele a todo custo. Eles dirão ao Senhor nossos sacrifícios. As nossas torturas. A indiferença que nos salpica. As perseguições que nos espezinham. A certeza que temos na vitória porque Ele está conosco. E o exemplo dos que foram, alenta os que ficaram.“Camisas-verdes”: o sangue dos mártires é semente de integralistas! 435
Apesar do esforço dos seus dirigentes fluminenses em situar os militantes mortos no
conflito de Campos no ponto mais alto do altar político dos integralistas, as restrições
impostas pelas autoridades obrigaram a modificações profundas na mística da AIB. Essa
situação ficou explicita durante uma homenagem programada pelos adeptos de Plínio
Salgado do núcleo de Fonseca. Os integrantes desse local mandaram celebrar, em 21 de
agosto, uma missa de sétimo dia em memória dos seus companheiros campistas.436
Seguindo as recomendações, todos os militantes estavam despidos de símbolos ou
insígnias da AIB. Contudo, a imagem mais significativa ficou por conta da ausência de
uniformes, o que tornou a concentração em um simples grupo de indivíduos. Ao
aparecerem em público sem seus uniformes, símbolos, signos, gestual e insígnias os
integralistas perderam sua identidade política e ficaram no nível das outras agremiações
partidárias.
O luto político em torno dos integralistas mortos em Campos tornou-se o único
instrumento de coesão dos militantes, pois todos passavam a se identificar com o
companheiro morto. Os símbolos tinham a finalidade de tornar mais popular as propostas e
idéias do partido, ou seja, seu objetivo era servir como um instrumento de atração de novos
filiados.
Sem seu elenco de símbolos e gestos, o culto aos mártires foi utilizado para unificar
os “soldados de Deus”. Entretanto, sem saberem o que acontecia em breve, a fotografia
publicada na revista dos milicianos fluminenses apresentava uma imagem que brevemente
se tornaria normal: integralistas sem uniformes e enquadrados como os outros partidos
políticos do país.
435 Revista Anauê, Ano III, nº 19,pg. 36, 01/09/1937. 436 Revista Sigma, nº 1, set. 1937, pg. 27.
213
5.6 O ÚLTIMO DESFILE
Capital Federal, 1º de novembro de 1937. Milhares de “camisas-verdes” se
concentravam nas imediações do Palácio do Catete. Os milicianos, dos mais diversos
estados, desfilavam exibindo seus uniformes e bandeiras naquela que foi uma das maiores
demonstrações públicas da AIB. Da sacada do palácio o presidente da República em pessoa
saudava os integralistas que desfilavam em homenagem ao chefe de Estado e
demonstravam publicamente a sintonia entre o partido e o governo. Naquele momento o
país vivia a expectativa da aprovação de um novo pedido de Estado de Guerra, que tornaria
mais nítidos os contornos de um regime de exceção.437
A campanha presidencial foi perdendo espaço, o que acarretou o cancelamento de
comícios438 e até a hipótese da retirada coletiva das candidaturas. Proporcionalmente,
enquanto esfriava o ímpeto dos candidatados na campanha eleitoral, as notícias sobre
conspirações circulavam em todos os setores da sociedade aumentando em muito a
temperatura política.
Em meio aos rumores sobre um golpe de Estado, avançaram as articulações entre
Plínio Salgado e o governo Vargas.439 Esses contados haviam se intensificado durante os
meses de outubro e novembro, chegando ao caso do chefe integralista ter sido consultado
sobre o conteúdo na nova Carta Constitucional.440
O chefe nacional chegou a ser convidado para coordenar o Ministério da Educação do
futuro regime ditatorial. Os integralistas vislumbravam a possibilidade de ocupar uma
posição privilegiada no novo quadro partidário. Outro dado importante foi a afinidade dos
discursos da administração Vargas e AIB, no que dizia respeito ao combate às forças
comunistas.441
437 Para mais detalhes sobre a situação política pré-Golpe do Estado Novo, ver em: CAMARGO, Aspásia [et al]. Op cit. 438 Um comício de partidários de José Américo, marcado para 15 de outubro, foi cancelado na cidade de Campos. 439 Tais contados foram confirmados posteriormente por Plínio Salgado em uma carta enviada para o presidente Vargas. Uma versão integral da carta pode ser vista em: SILVA, Hélio. 1938 – Terrorismo em Campo verde. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1971, pp. 361-382. 440 Idem, pg. 198. 441 Para saber mais sobre o clima de histeria anticomunista do período, ver em: MOTTA, Rodrigo Patto Sá. Op cit.
214
Em 10 de novembro de 1937, o Estado Novo foi formalmente instalado, sem maiores
reações e manifestações contrárias e, sobretudo, contando com a colaboração passiva dos
“camisas-verdes”. O nebuloso episódio que teria levado Vargas a instalar o Estado Novo
foi baseado em um falso documento de um judeu-comunista conhecido como Cohen, daí o
nome “Plano Cohen”.442
A partir do Estado Novo o poder legislativo, os partidos políticos, os governos
estaduais, os sindicatos, enfim, o país passou a viver um período de intervenções e
suspensão dos direitos democráticos. Com o objetivo de manter a lei e a ordem, ameaçadas
por um suposto plano dos “comunistas” de tomar o poder, o presidente Vargas tornou-se o
único intermediário entre o povo e o governo.443
Com o pretexto de resguardar o Brasil de um possível golpe de estado, comandado
pelos comunistas, Getulio Vargas conseguiu se manter no poder. O movimento que
propiciou a instalação do Estado Novo foi uma tentativa de dar uma resposta àquilo que
seus idealizadores qualificavam como situação de anarquia política, sobretudo para salvar a
nação do “perigo vermelho”.
A releitura que a administração fez do contexto brasileiro de 1937 teria muitas
semelhanças com o de 1889.444 Em ambos os momentos foi difundida a idéia de que era
preciso que se criasse uma nova estrutura e cultura para banir e eliminar todos os
segmentos políticos que estariam impedindo o progresso da nação.445
Com o apoio dado ao golpe do Estado Novo, a direção da AIB chegou a pensar que
finalmente dominariam o poder político do país. Como “pagamento” ao apoio dos
integralistas, a Administração Vargas decretou o fim das atividades da AIB, bem como de
todos os outros partidos políticos brasileiros, permitindo apenas que essas organizações
sobrevivessem como sociedades civis.
442 Maiores detalhes sobre a elaboração do Plano Cohen, ver em: CAMARGO, Op cit. 443 Sobre a implantação do Estado Novo, ver em: GOMES. Ângela de Castro. Op cit. 444 Se em 1930 a “Revolução” enterrou todos os resquícios da atrasada cultura política da Velha República, a missão de 1937 foi recuperar as idéias da própria Revolução de 1930 que haviam se perdido em meio aos desvios das intrigas e vícios da política. O Estado Novo teria como grande finalidade reafirmar os compromissos do passado para garantir as conquistas do presente e salvaguardar as vitórias do futuro. A leitura que a administração pretendeu imprimir ao Estado Novo era de que esse evento marcaria um novo começo da história do Brasil. Para seus defensores, o Estado Novo representava uma evolução da dinâmica política do país. A criação de uma estrutura altamente centralizadora e autoritária seria a única garantia de que o Brasil passaria por todas as tormentas da época sem sofrer os abalos políticos, que estariam assolando outros países. 445 GOMES. Ângela de Castro. Op cit, pg. 174.
215
O problema maior para os “camisas-verdes” foi que o Decreto Lei nº 37, que
estabelecia as regras para o funcionamento das ditas sociedades civis, vetava toda e
qualquer utilização de uniformes, insígnias, símbolos e gestos das antigas agremiações
partidárias.446 Houve ainda a tentativa de buscar uma alternativa através da criação da
Associação Brasileira de Cultura (ABC).
Essa obscura organização nunca conseguiu fazer sombra à antiga AIB,
principalmente porque, sem a mística, os símbolos e os ritos servia apenas como a última
tentativa de preservar a coesão e o capital político do primeiro partido de massas do país.
Assim, chegou ao fim o sonho da construção da “Quarta Humanidade” pretendido por
Plínio Salgado e seus seguidores.
Se a reação da direção nacional ao fechamento do partido foi a criação da ABC,
outros setores da AIB apresentaram respostas mais contundentes: vários núcleos
integralistas nos estados prepararam tentativas de levantes armados. Apesar da polícia e as
forças de segurança da administração Vargas terem agido rápido e sufocado o chamado
“Pustch Integralista de 1938”, ocorreram outros casos de prisões de ex-militantes e
apreensões de material bélico, como o que aconteceu em Niterói, em 31 de janeiro de 1938 e
consistiu na apreensão de grande quantidade de armas nas residências de dois militares que
haviam militado na AIB. Poucos dias depois, também na capital do estado, a polícia
encontrou uniformes e armas em uma padaria.447
Em março de 1938, elementos descontentes ligados aos ex-governadores Flores da
Cunha e Armando Salles começaram uma articulação em conjunto com setores
remanescentes mais radicais da AIB visando a organização de um golpe de estado. A
proposta era começar um movimento armado em todo o país e tomar o poder .448
Entretanto, antes que os golpistas disparassem o primeiro tiro, a conspiração foi
descoberta. O plano previa a prisão do presidente Vargas quando de sua visita à Escola
Naval. O passo seguinte seria o restabelecimento da Constituição de 1934 e a nomeação de
juntas provisórias nos estados.449 Entre os detalhes da operação planejada estava a
446 VICTOR, Rogério Lustosa. O Integralismo nas Águas do Lete. História, memória e esquecimento. Goiânia: Editora da UCG, 2005, pg. 30. 447 Para maiores informações, ver em: SILVA, Hélio. Op. cit. 448 Idem. 449 Os estados que estariam mais mobilizados para o levante eram: Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro e Pernambuco.
216
informação de que o número 3 450seria o sinal para o início do levante.451 Essa foi a senha
para que a polícia política de Vargas pudesse agir livremente contra seus antigos aliados, até
mesmo contra aqueles que não tomaram parte no planejamento do levante. O saldo final
foram centenas de militantes presos ou foragidos.452
No estado do Rio de Janeiro, as primeiras prisões começaram a repercutir no dia 20
de março de 1938. Os relatos das autoridades apresentavam informações sobre as prisões,
confisco de documentos e armas dos núcleos da AIB espalhados pelo interior do estado. As
diligências que buscavam capturar Raymundo Padilha – chefe provincial da AIB –
mobilizaram policiais em todas as regiões do estado.453
No interior do estado, as autoridades policiais realizaram incursões em diversos
municípios, entre eles Campos, Petrópolis, Teresópolis, São João da Barra e Barra do Piraí.
Em Campos, os principais dirigentes acabaram sendo presos e levados para Niterói, com
exceção de José Barros de Souza, ex-chefe regional, que até aquele momento estava
foragido.454
Enquanto procurava os dirigentes que estavam foragidos, a polícia política
apresentava os principais produtos recolhidos nas casas dos militantes e nas sedes do
partido. Quase que diariamente a imprensa do estado relatava a apreensão de uma coleção
de artefatos curiosos, entre eles armamentos pesados, punhais com cabos de caveiras,
plantas de repartições públicas, mimeógrafo e livros.455
Um caso interessante aconteceu na casa de José Ferreira Landim, dirigente do núcleo
de Campos. Nesse local as autoridades polícias afirmaram que encontraram um verdadeiro
arsenal enterrado no quintal. Na mesma residência foram apreendidos um mimeógrafo e
centenas de livros integralistas, o que motivou a prisão e envio do dirigente para a capital do
estado.456
450 Assim, três dedos estendidos, três apitos, três sinos, três tiros e, por fim, com a deposição do presidente três aviões cruzariam os céus das cidades como sinal da vitória do movimento. 451 Monitor Campista, pg. 1, 20/3/1937. 452 Para saber mais sobre a perseguição da polícia política aos integralistas, ver em: SILVA, Giselda Brito. A Ação Integralista Brasileira e a ditadura de Vargas. IN: O corporativismo em português: Estado, política e sociedade no salazarismo e no varguismo. PINTO, Antonio Costa et al (ORG). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. 453 O Fluminense, pg. 1, 20/3/1938. 454 Monitor Campista, pg. 1, 31/3/1937. 455
O Estado, pg.1, 29/3/1937. 456 Monitor Campista, pg. 1, 22/3/1937.
217
As investigações do estado fluminense prosseguiram até a prisão de Raymundo
Padilha, que aconteceu somente em 12 de maio. O curioso é que, ao ser preso, o dirigente
integralista fluminense teria tentado cometer suicídio.457 Apesar dessa atitude extremada, o
ex-chefe provincial acabou sendo encarcerado.
Apesar de declarar não ter absolutamente nada com o planejamento do levante de
março, Plínio Salgado viu sua situação ficar muito mais delicado a partir de 11 de maio de
1938. Esse dia marcou a data de um movimento armado que tinha uma meta extremamente
ousada: tomar o Palácio Guanabara, residência oficial do presidente, e aprisionar Getúlio
Vargas.458
Com toda a repercussão negativa em torno dos episódios de 11 de maio, a situação
de Plínio Salgado e, especialmente, dos ex-dirigentes da AIB nos estados, ficou muito pior.
Centenas de antigos quadros do partido que haviam sido detidos em março acabaram sendo
enquadrados na Lei de Segurança Nacional e processados por crimes políticos no Tribunal
de Segurança Nacional (TSN).
Ironicamente, pelo menos nas prisões, o Estado Novo foi “democrático” e não
demonstrou qualquer tipo de discriminação, pois a maioria dos ex-integralistas foi cumprir
pena dividindo cela, privações e torturas com os seus “companheiros” da ALN. Ambas as
organizações passaram a ser apresentadas como exemplos dos perigos dos “extremismos
políticos”, ou seja, agora haveria o “perigo vermelho” e o “perigo verde”.
Quanto a Plínio Salgado, apesar de negar ligações com quaisquer movimentos
insurrecionais dos seus ex-companheiros, acabou sendo detido para prestar depoimento em
26 de janeiro de 1939. Poucos meses depois, mais precisamente em maio de 1939,
enquanto muitos integralistas ainda estavam presos, o chefe nacional partiu em exílio para a
Europa.459
No Velho Mundo – onde sobreviveu graças à colaboração financeira de ex-
companheiros de partido – esteve em Portugal até 1945. Naquele país teria feito uma
revisão crítica da experiência da AIB e acabou abraçando a Democracia Cristã. Com o fim
457 SILVA, idem, pg. 37 458 SILVA, idem. 459 TRINDADE, op cit.
218
da ditadura do Estado Novo retornou ao Brasil e retomou a vida política partidária
fundando outra sigla: o Partido de Representação Popular (PRP).460
No seu novo partido, Plínio Salgado procurou retomar os antigos contatos da época
da AIB. Finalmente, em 1955 o ex-chefe nacional disputou uma eleição presidencial e
atingiu uma marca significativa: cerca de 5 % de votos. Em 1964 o PRP foi um dos
articuladores das Marchas pela Família e apoiou o golpe civil-militar.
Com as modificações implementadas no sistema político-partidário, Plínio Salgado
filiou-se a sua última legenda: a Aliança de Renovação Nacional (ARENA). Quando estava
em pleno exercício do mandato de deputado federal, em 1975, Plínio Salgado foi chamado
para unir-se aos seus companheiros na “milícia do Além”.
460 Sobre a atuação de Plínio Salgado no PRP, ver em: CALIL, Gilberto Grassi. O Integralismo no pós-guerra: a formação do PRP (1945-1955). Porto Alegre: EDIPUCRS, 2001. (Coleção história).
219
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo deste trabalho apresentamos os acontecimentos que marcaram a
montagem da estrutura organizacional de um dos partidos políticos mais singulares da
história política do país: a Ação Integralista Brasileira. Procuramos enfatizar nesta tese a
presença dos integralistas no Rio de Janeiro.
No estado a primeira reunião pública visando a organização da AIB aconteceu em
junho de 1933. A cerimônia política aconteceu no salão nobre do Liceu Nilo Peçanha,
importante colégio de Niterói, com a participação de algumas dezenas de participantes.
Aproveitando os espaços criados a partir da nova configuração partidária do Rio de
Janeiro, os integralistas começaram a fundar núcleos em diversos municípios fluminenses.
Constatamos que, entre os anos de 1933 a 1936, ocorreram eleições quase que anualmente
no estado. O clima de permanente disputa eleitoral serviu de incentivo para o surgimento de
dezenas de novas agremiações partidárias. Nessa época a AIB adotou a via eleitoral como
tática política.
O que diferenciou os integralistas das demais forças políticas presentes no quadro
partidário fluminense foi que, enquanto as demais organizações eram meras legendas de
abrangência regional que visavam as disputas eleitorais, a AIB surgiu como um partido
político centralizado e organizado nacionalmente.
Destacamos que a AIB atraiu para suas fileiras milhares de homens, mulheres e
crianças o que permitiu a essa organização ser o primeiro partido de massa do Brasil. Em
1934, os integralistas do Rio de Janeiro compareceram, pela primeira vez, com chapa
própria nas disputas das cadeiras na ALERJ e no Congresso Nacional. Apesar de não
elegeram representantes, essa disputa permitiu à AIB ampliar o número de núcleos
municipais e distritais. Ainda nesse ano foram registrados os primeiros enfrentamentos de
rua entre integralistas e militantes antifascistas.
Ao longo do trabalho verificamos como o ano de 1935 foi pontuado pelo
acirramento das disputas entre integrantes da AIB e da ANL. O crescimento do movimento
integralista foi um dos fatores que levaram à criação da frente ampla antifascista. Nesse
sentido, os aliancistas fundaram vários núcleos municipais no estado, fato que serviu para
220
aumentar a temperatura política no Rio de Janeiro. Procuramos demonstrar como o
anticomunismo foi um dos componentes principais da cultura política integralista.
A perseguição imposta pelas forças de repressão do governo Vargas contra os
aliancistas, sobretudo após os levantes antifascistas de novembro, é uma das explicações
para o significativo crescimento da AIB durante o ano seguinte. Dessa forma, durante o ano
de 1935, os militantes da “Província integralista fluminense” estiveram envolvidos num
ambiente de constantes disputas ideológicas com seus adversários da ANL.
A pesada repressão imposta aos militantes de esquerda permitiu uma relativa
tranqüilidade para os “camisas-verdes” fluminenses. Essa situação permitiu que o partido
consolidasse sua posição entre as organizações anticomunistas. Como efeito, houve um
significativo crescimento no número de núcleos integralistas no estado.
O ano de 1936, conhecido como “Ano-verde”, marcou o adensamento das
atividades de caráter social e da preocupação com as questões ligadas à propaganda
política. Todas as ações dos integralistas estavam voltadas para as disputas eleitorais em
nível municipal.
Todos os esforços dos “camisas-verdes” nesse pleito tiveram como saldo final foi a
eleição de uma bancada de trinta vereadores, totalizando algo em torno de 6% a 8% dos
votos no estado. Apesar desses números os integralistas não elegeram nenhum prefeito.
Contudo, internamente as atividades de caráter social possibilitaram a criação de espaços de
militância específicos para as “blusas-verde”.
O estímulo permanente às ações práticas de seus militantes foi outro aspecto
realçado no trabalho. Levar seus filiados e filiadas para desfiles, paradas, viagens a outros
núcleos foi um importante instrumento de atração de novos integrantes para a AIB. Atuar
nas escolas, postos de saúde e lactários estimulou a idéia de pertencimento ao partido. Mais
do que ser um simples filiado, no movimento integralista todos tinham alguma atividade
prática para executar.
Outro importante mecanismo empregado para construção e crescimento da AIB
foram os meios de comunicação. No Rio de Janeiro foram editados jornais e revistas em
variados núcleos municipais, destaque para a revista Sigma, lançada pelos militantes de
Niterói durante a campanha presidencial de 1937.
221
Entre os “camisas-verdes” fluminenses os meios de comunicação da AIB
cumpriram a dupla função de informar e formar os militantes do partido. Para os
integralistas os periódicos constituíram um importante elemento de unificação e
centralização política. Também observarmos como as imagens fotográficas presentes nos
jornais, revistas e sedes integralistas contribuíram para consolidar a figura de Plínio
Salgado como único chefe nacional da organização.
Analisamos, ainda, o complexo tabuleiro político-partidário do país e seus reflexos
na montagem dos grupos de apoio às candidaturas de Armando Salles Oliveira e José
Américo. O ano de 1937 começou sob a perspectiva da sucessão presidencial, evento que
mobilizou o conjunto de núcleos integralistas no Rio de Janeiro.
Todos os esforços desenvolvidos nos anos anteriores pelos integralistas na
montagem da sua máquina partidária estavam voltados para a campanha de 1937. No
âmbito eleitoral a manobra mais ousada dos integralistas foi apresentar uma candidatura
própria na disputa presidencial. Esse episódio consolidou a AIB como uma agremiação
partidária de abrangência nacional. O fato de unir nacionalmente sua militância em torno de
uma única candidatura conferiu aos integralistas a posição de primeiro partido eleitoral de
massa do Brasil.
Durante a campanha de Plínio Salgado toda a estrutura partidária foi colocada em
movimento na tarefa de levar para todas as regiões fluminenses a propaganda do
“candidato-verde”. Núcleos foram mobilizados para realizarem lançamentos em nível local
da candidatura. Um segundo momento da campanha eleitoral no estado foi marcado por
concentrações públicas e comícios.
Foi exatamente durante um comício integralista, realizado em 15 de agosto de 1937,
na cidade de Campos dos Goytacazes que ocorreu o evento mais violento envolvendo os
“camisas-verdes”. O tiroteio na Praça São Salvador que resultou em 10 mortos e dezenas de
feridos. Os fatos envolvendo o trágico desfecho da concentração integralista nunca foram
plenamente desvendados pelas investigações. O processo crime foi arquivado em 1939,
sem indicar possíveis culpados.
A gravidade do ocorrido na praça central do município fluminense repercutiu
nacionalmente através da imprensa. Essa situação permitiu que os integralistas tomassem
duas atitudes: a primeira foi apontar os “comunistas” como os responsáveis pelo massacre,
222
enquanto a segunda atitude foi tentar utilizar a memória dos seus militantes mortos para
fazer propaganda.
Durante seus anos de funcionamento legal os militantes integralistas envolveram-se
em inúmeros conflitos de rua com forças adversárias. O resultado foi a criação de uma
galeria de mártires do partido. As imagens desses militantes mortos foram apropriadas pela
AIB como ferramenta de propaganda e símbolo de coragem e resistência na luta contra os
“inimigos da pátria”.
Com muita habilidade os dirigentes integralistas apresentavam as imagens dos
mártires do movimento nos órgãos de imprensa oficiais da AIB. A simbologia política do
partido reforçava, através de cerimônias e rituais, a concepção de que nem a morte poderia
diminuir a vontade dos integralistas de cumprirem seu “destino histórico”.
Essa idéia de glorificação do martírio era reforçada com o hábito de batizar escolas
integralistas com os nomes daqueles que haviam morrido lutando em defesa do “sigma”. Os
órgãos de imprensa da organização contribuíram nessa tarefa publicando imagens
fotográficas, poemas e desenhos que pretendiam “sacralizar” os mártires da AIB.
A primeira experiência integralista no Brasil deixou de existir legalmente em 1937.
Entretanto, a AIB deixou marcas na história política do país que ainda na atualidade
despertam interrogações. O crescimento no número de trabalhos e pesquisas sobre o tema é
um indicativo de que o integralismo foi uma organização muito mais complexa do que um
simples “mimetismo” de outras organizações européias.
Esta tese tratou de alguns aspectos da atuação dos integralistas no Rio de Janeiro.
Certamente, muitos outros vestígios da presença integralista no estado serão analisados nos
próximos anos, sobretudo a partir das novas fontes documentais. Cabe destacar ainda que
os estudos em âmbito regional, evidenciando também todas as disputas locais, possibilitam
confirmar que a AIB foi o primeiro partido de massa do Brasil.
223
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232
ANEXOS
233
ANEXO 1
RELAÇÃO DOS INTERVENTORES FEDERAIS DO RIO DE JANEIRO 1930-1935
Interventores Fluminenses Período
(Cel.) Demócrito Barbosa Outubro de 1930.
Plínio de Castro Casado Outubro de 1930 à Maio de1931.
(Gal.) João de Deus Mena Barreto Maio de 1931 à Novembro de 1931.
(Ten. Cel.) Pantaleão da Silva Pessoa Novembro de 1931 à
Dezembro de 1931.
(Ten.) Ari Parreiras Dezembro de 1931 à
Novembro de 1935
FONTE: ABREU, Alzira Alves de et AL Dicionário Histórico Bibliográfico Brasileiro pós-1930.
Edição Revista e ampliada. Rio de Janeiro: CPDOC-FGV, 2001.
234
ANEXO 2
RELAÇÃO DOS PARTIDOS POLÍTICOS FLUMINENSES DURANTE AS
ELEIÇÕES CONSTITUINTES DE 1933
Partido Lideranças Período
Partido Aliancista Renovador
do Rio de Janeiro. Não elegeu
nenhum representante para a
Assembléia Constituinte de
1933.
Artur Vitor e antigas lideranças da
Aliança Liberal
Fundado em janeiro de
1933.
Partido Democrático do Rio de
Janeiro. Não concorreu as
eleições de 1933.
Apoio a Aliança Liberal. Sua comissão
executiva em 1931 era composta por:
Cel. João de Moraes Martins
(Presidente), Nóbrega da Cunha,
Murilo Melo, João Queirós e José de
Oliveira Campos Júnior.
Fundado em 1930 teve
atuação até 1933.
Partido Economista do Rio de
Janeiro. Não elegeu nenhum
representante para a
Assembléia Constituinte de
1933.
Comissão executiva: Ramon Alonso,
Carlos Castrioto, Rubem Braga, Edgar
Beauclair, Alberto Fortes, Arlindo
Pinto, José Augusto Mendes e Nilo
Valentim.
Fundado em 14 de
fevereiro de 1933. Em
1934 fundiu-se com a
União Progressista
Fluminense.
Partido Liberal Social do Rio
de Janeiro. Não elegeu nenhum
representante para a
Assembléia Constituinte de
1933.
Dissidência do tradicional Partido
Republicano Fluminense. Faziam parte
de sua direção: Alfredo Backer
(Presidente), vice-almirante Augusto
Carlos de Sousa e Silva (primeiro-
secretário), Antonio Brás de Morais
Barbosa segundo-secretário) e Alfredo
Baltazar da Silveira (tesoureiro).
Criado em 4 de junho de
1932.
Partido Nacional Fluminense.
Não elegeu nenhum
Um dos seus mais importantes
dirigentes foi Leonel Magalhães
Partido fundado em 20 de
março de 1933.
235
representante para a
Assembléia Constituinte de
1933.
(presidente) que criou essa agremiação
partidário após se afastar da Liga
Eleitoral Católica.
Outros dirigentes: Lealdino Soares de
Alcântara (vice-presidente), Durval
Batista Pereira (primeiro-secretário) e
Guilherme Eppinphaces (segundo-
secretário).
Partido Operário-Camponês do
Rio de Janeiro. Não elegeu
nenhum representante para a
Assembléia Constituinte de
1933.
Organização criada sobre a influência
do Partido Comunista do Brasil (PCB)
que teve seu registro eleitoral negado.
Fundado em 1933.
Partido Evolucionista do Rio de
Janeiro. Fundado em maio de
1934 por dissidentes do Partido
Republicano Fluminense
(PRF).
A disputa pelo domínio da direção do
PRP levaram Manuel Duarte, Galdino
do Vale Filho, Miguel de Carvalho e
Acúrio Torres a romperem com essa
agremiação partidária.
Extinto em 2 de
dezembro de 1937.
Partido Popular Radical do Rio
de Janeiro (PPR). Em 1933
elegeu a maior bancada do
estado contabilizando 10
deputados federais
constituintes.
Agremiação política criado por antigos
Nilistas. Principais lideres: Raul
Fernandes, João Guimarães, José
Eduardo de Macedo Soares, Veríssimo
de Melo e José Monteiro Soares Filho.
Fundado em 10 de março
de 1933.
Partido Proletário do Rio de
Janeiro. Apesar de concorrer
em uma coligação com o
Partido Socialista Fluminense,
o Partido Proletário não elegeu
nenhum representante.
O Partido Proletário foi organizado por
dirigentes do movimento sindical do
estado, entre eles podemos citar: José
Fernandes Monteiro (Presidente da
Federação Proletária do Rio de
Janeiro), Sílvio Donade Jorge (da
União de Trabalhadores de Livros e
Partido fundado em
março de 1933
236
Jornais de Niterói), Acir Medeiros (do
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Porciúncula), Isaltino da Costa (da
União de Trabalhadores da Construção
Civil de Niterói), Leitão Fernandes de
Carvalho (do Sindicato da Construção
Civil de São Gonçalo), Jéferson
Meneses Ávila, Heitor Leal, Orêncio de
Freitas e Benoit Certaim
Partido Social Agrário do
Rio de Janeiro. Não elegeu
nenhum representante para a
Assembléia Constituinte de
1933.
A principal liderança do Partido Social
Agrário Fernando Soares Brandão
(Presidente).
Fundado em março de
1933.
Partido Socialista Fluminense Agremiação organizada e liderada por
Cezar Tinoco.
Fundado em março de
1933.
União Progressista Fluminense. Sob a liderança de Manoel Duarte e do
Gel. Cristóvão Barcelos a UPF foi uma
das mais importantes agremiações do
estado até o golpe do Estado Novo.
Fundado em março de
1933.
FONTE: ABREU, Alzira Alves de et AL Dicionário Histórico Bibliográfico Brasileiro pós-1930.
Edição Revista e ampliada. Rio de Janeiro: CPDOC-FGV, 2001.
237
ANEXO 3
Deputados fluminenses eleitos para a Assembléia Constituinte de 1933:
Nome do deputado Partido
Nilo Alvarenga União Progressista Fluminense
Prado Kelly União Progressista Fluminense
Cristóvão Barcelos União Progressista Fluminense
Gwyer de Azevedo União Progressista Fluminense
José Alípio Costallat Partido Socialista Fluminense
César Tinoco Partido Socialista Fluminense
Acúrcio Torres Partido Republicano Fluminense
João Guimarães Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Raul Fernandes Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Fernando Magalhães Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Oscar Weinschenk Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Macedo Soares Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Fábio Sodré Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Oswaldo Cardoso de Melo Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
José Monteiro Soares Filho Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Buarque Nazaré Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Lemgruber Filho Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
FONTE: ABREU, Alzira Alves de et AL Dicionário Histórico Bibliográfico Brasileiro pós-1930.
Edição Revista e ampliada. Rio de Janeiro: CPDOC-FGV, 2001.
238
ANEXO 4
Candidatos integralistas nas eleições de 1934
Cargo: Deputado Federal
NOME DO CANDIDATO MUNICÍPIO
José Ferreira Landim Campos dos Goytacazes
José Tomas de Aquino Menezes Miracema
Lealdino Soares de Alcântara Niterói
Rodrigo Carlos de Abreu de Souza Niterói
Fonte: Monitor Campista, 07/10/1934.
239
ANEXO 5
Candidatos integralistas Candidatos integralistas nas eleições de 1934:
NOME DO CANDIDATO MUNICÍPIO
Alceni Alves São Fidelis
Álvaro de Oliveira Santos Cambuci
Álvaro Ferreira Nogueira São Fidelis
Antral Pavor de oliveira Campos Teresópolis
Ana Pereira da Cruz Pirai
Antonio Faustino Barra do Pirai
Antonio Paulo Soares de Pinho Niterói
Adulfo Coimbra Resende Porciúncula
Antonio Silva São Fidelis
Cilda Correia Guerra Cambuci
Crisotino Pires Gonçalves São Fidelis
Edecio Barbosa da Silva Porciúncula
Ernesto de Oliveira Resende
Francisco Dias Brandão Barra do Pirai
Glauco da Cruz Ribeiro Niterói
Gilberto Ferreira da Silva Niterói
Gilberto Gomes da Silva Niterói
Godiano Avelar Barra do Pirai
Konrad Van Hermem Niterói
Hernane Coelho Legay Niterói
Jaci Rodrigues Seixas São Fidelis
João da Silva Lopes Cambuci
João A. de Lara Vilela Niterói
José Coelho dos Santos Macuco
José Garcia Duarte Barra do Pirai
José Ferreira Landim Campos dos Goytacazes
240
Fonte: Monitor Campista, 07/10/1934.
José Ferreira M. Coutinho Nova Friburgo
José Santiago Moreira Niterói
José T. de Aquino Menezes Miracema
José Viera de Souza Niterói
Julio Ferreira Cabloco Nova Friburgo
Galdino Soares de Alcântara Niterói
Leoni Leonides Cordeiro
Manoel Fernandes da Silva Nova Iguaçu
Leôncio Caminha de Arruda Niterói
Norvam da Silveira Barreto Nova Iguaçu
Orsevalde Fillipone Farula Nova Iguaçu
Oscar de Souza Azevedo Niterói
Rodolfo Ferreira Bastos Natividade
Raul de Souza Breves Barra do Pirai
Rubens Ferraz Breves Barra do Pirai
Silvério Mota Junior Barra Mansa
241
ANEXO 6
Deputados eleitos para a ALERJ – legislatura 1934/1937
Nome do deputado estadual Partido
Antonio José Romão Jr. União Progressista Fluminense
José Luis Erthal União Progressista Fluminense
Luiz Palmier União Progressista Fluminense
José Maximo Baliero União Progressista Fluminense
Cezar Ferola União Progressista Fluminense
José Moraes e Souza União Progressista Fluminense
Olympio S. Pinto União Progressista Fluminense
Mario Barroso União Progressista Fluminense
Cristovão Barcelos União Progressista Fluminense
Ernani Couto União Progressista Fluminense
Luiz C. G. Sobral União Progressista Fluminense
Mario Alves União Progressista Fluminense
Oscar Przemodowski União Progressista Fluminense
Sosthenes Barbosa União Progressista Fluminense
Bernardo Bello União Progressista Fluminense
Luperio Santos União Progressista Fluminense
Adalpho Klotz União Progressista Fluminense
Clodomiro Vasconcelos União Progressista Fluminense
Nelson Kemp União Progressista Fluminense
Nelson Pinheiro Andrade União Progressista Fluminense
Arlindo Leite Pinto União Progressista Fluminense
Paulo Araújo Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Imar Grey Tavares Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Luis Frederico Carpenter Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Quinto Ferrari Partido Popular Radical do Rio de Janeiro,
João Herdy Barchat Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
242
Heitor Collet Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Nicolau Bastos Filho Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Mario Guimarães Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Jayme Figueiredo Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Cezar Figueiredo Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Jerônimo Dias Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Antonio Roussoulieres Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Celso A. Guimarães Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Francisco Lima Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
José Ignácio R. Weneck Partido Popular Radical do Rio de Janeiro
Ruy Gimarães Almeida Partido Socialista Fluminense
Julio Vieira Zamith Partido Socialista Fluminense
Moacyr Paulo Lobo Partido Socialista Fluminense
Alvaro Ferraz Fernandes Partido Socialista Fluminense
Anthero Manhães Partido Socialista Fluminense
Capitulano Santos Partido Evolucionista do Rio de Janeiro
Arnaldo Tavares Partido Evolucionista do Rio de Janeiro
Godofredo C. Leão Partido Republicano Fluminense
FONTE: O Fluminense, pg. 2, 1/3/1935
243
ANEXO 7
RELAÇÃO DE VEREADORES INTEGRALISTAS ELEITOS NAS ELEIÇÕES DE
1936 NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
Nome do parlamentar: Cidade:
1) Jorge Boccanera Resende
2) Getúlio Borges Montes Barra Mansa
3) Dr. Álvaro Sardinha Barra Mansa
4) Bernardo de Mattos Gomes Barra Mansa
5) Adolpho Lopes Barra Mansa
6) Dr. Pedro José Ferreira Tavares Piraí
7) Oscar Pereira da Silva Piraí
8) José Antonio Ribeiro Sobrinho Piraí
9) Emanuel Severino da Silva Piraí
10) Pedro Hess Petrópolis
11) João Mosna Petrópolis
12) Nestor Fernandes Ribeiro Paraíba do Sul
13) Mendo Correa da Silva Paraíba do Sul
14) Alberto Alves Vieira Mage
15) Djalma Monteiro Teresópolis
16) Dr. Frederico Carlos de Abreu Souza Niterói
17) Manoel Soares Benevides Rio Bonito
18) Julio Ferreira Cabloco Frigurbo
19) Diego Hynino Chermont Sumidouro
244
FONTE: Relatório de atividades da Província integralista fluminense de abril de 1937. APERJ. Fundo Polícia Política. Setor/série: Integralismo. Cx. 676. Pasta 18
20) Maria Golçalves Sumidouro
21) Demerval Teixeira de Castro Sumidouro
22) Julio Bastos Monerat Bom Jardim
23) Pedro Spangenberg Pires Filho Carmo
24) Dr. Osório Alves Tavares São Sebastião do Alto
25) Dr. Hermes Baptista Ferro São Sebastião do Alto
26) Thucydides de Toledo Piza São Sebastião do Alto
27) Aurélio Gomes Dias São Sebastião do Alto
28) Julio César Campos São Fidélis
29) Antonio Antunes Siqueira Miracema
30) Rodolpho Moreira Bastos Itaperuna
245
ANEXO 8
ESCOLAS DA AIB NA PROVÍNCIA INTEGRALISTA FLUMINENSE
LOCAL FINALIDADE E NOME
1) Alto Teresópolis Escola de Alfabetização (EA)
Juvenal Falcão
2) Arraial Novo Escola de Alfabetização (EA)
3) Barra de Angra EA Silveira Duarte
4) Barra Mansa EA Jaime Guimarães
5) Barra Mansa Escola de datilografia
6) Barra Mansa Escola de costuras e bordados
7) Barra do Piraí Escola de Alfabetização
8) Barreto Escola de Alfabetização
9) Barreto Escola de bordados, arte aplicadas,
ensino comercial e música
10) Belfort Roxo E.A Tiradentes
11) Bingen Escola de costura
12) Bom Jesus do Querendo Escola de Alfabetização
13) Cachoeiras Escola de Alfabetização
14) Cachoeiro Escola de Alfabetização
15) Campina Escola de Alfabetização
16) Campos EA Nicola Rosica
17) Campos Curso de Preparação Elias Bouchal
246
18) Campos Escola de Alta Costura
19) Campos Escola Secundária
20) Cordeiro EA 1 de Maio
21) Carangola EA Silveira Duarte
22) Capoeirão Escola de Alfabetização
23) Cardoso Moreira EA Marcílio Dias
24) Córrego da Chica Escola de Alfabetização
25) Casadinha Escola de Alfabetização
26) Destino EA Integralista
27) Destino Escola de Costura e artes aplicadas
28) Dona Emília Escola de Alfabetização
29) Dona Mariana Escola de Alfabetização
30) Ernesto Machado Escola de Alfabetização
31) Floresta EA Alberto Secchin
32) Fonseca EA Fernão Dias
33) Fonseca Escola de costura Maria José
34) Friburgo EA 3 de Outubro
35) Friburgo Escola de costura
36) Friburgo Escola de musica
37) Gruta dágua Escola de Alfabetização
38) Guarulhos EA Caetano Spinelli
39) Ibipeba Escola de Alfabetização
40) Ingá Escola de Alfabetização
247
41) Ingá Escola de desenho
42) Itamaraty Escola de Alfabetização
43) Itamaraty Escola de costura
44) Itaperuna EA Nicola Rosica
45) Mage Escola de Alfabetização
46) Malagueta Escola de Alfabetização
47) Mangueiras EA. Castro Alves
48) Miracema EA Jaime J. Silva
49) Miracema Trabalhos manuais
50) Morro do Coco Escola de Alfabetização
51) Mosella EA Caetano Spinelli
52) Mosella Escola de corte e costura
53) Murrinelli Escola de Alfabetização
54) Murundu Escola de Alfabetização
55) Murundu Escola de Alfabetização
56) Natividade Escola de Alfabetização
57) Natividade EA Marcilio Dias
58) Natividade Escola de música
59) Niterói Um orfeão
60) Niterói Escola de Alfabetização
61) Ouro Fino Petrópolis
62) Pracamby EA Almirante Barroso
63) Paraíba do Sul EA Capitão Mattos
248
64) Paraíso do Tobias EA Duque de Caxias
65) Pendotiba EA Marcilio Dias
66) Petrópolis Escola de Alfabetização
67) Petrópolis Escola de corte e costura
68) Petrópolis Escola de enfermagem
69) Pimenta EA Silveira Duarte
70) Piraí Escola de alfabetização
71) Piraí Escola de música
72) Piraí Escola de alfabetização
73) Porciúncula Escola de alfabetização
74) Porciúncula Escola de música
75) Porciúncula Escola de bordados
76) Pureza 1 Escola de alfabetização
77) Pureza 2 Escola de alfabetização
78) Pureza 3 Escola de alfabetização
79) Queimados Escola noturna de alfabetização
80) Retiro Saudoso Escola de alfabetização
81) Resende Escola de alfabetização
82) Ribeiro Grande EA Jaime Guimarães
83) Rio Bonito Escola de alfabetização
84) Rio Preto EA Capitão Mattos
85) Santa Bárbara EA José Perrisse
86) Santa Clara EA Jackson Figueiredo
249
87) Santa Fé Escola de alfabetização
88) S M Madalena EA Jaime Guimarães
89) Santa Rosa Escola de alfabetização
90) São Sebastião do Alto Escola de alfabetização
91) Santo Antonio dos Milagre Escola de alfabetização
92) São Gonçalo Escola de alfabetização
93) São Gonçalo (7 região) Escola de alfabetização
94) São João da Barra EA Duque de Caxias
95) São Joaquim Escola Sigma
96) S. José do Rio Preto EA Capitão Mattos
97) S. José do Rio Preto EA 1 de Setembro
98) S. José do Rio Preto EA Fazenda Conceição
99) São Miguel EA Tenente Bragança
100) S. Sebastião da Onça EA Alberto Torres
101) S. Sebastião da Vista Alegres EA. Tenente Paladino
102) Sapucaia (11ª região) EA. Abelardo Reis
103) Sapucaia (Região Especial) Escola de Alfabetização
104) Saudade Escola de Alfabetização
105) Sumidouro Escola de Alfabetização
106) Sumidouro Escola profissional
107) Teresópolis EA. Alberto Torres
108) Teresópolis EA. Jayme Guimarães
109) Teresópolis Escola de enfermagem
250
110) Teresópolis Escola profissional Maria José
111) Três Rios Escola de Alfabetização
112) Valão do Barro Escola de Alfabetização
113) Valença EA. Nicola Rosica
114) Vargem Alegre Escola de Alfabetização
115) Varre-e-sai EA. Marcílio Dias
116) Vieira Escola de Alfabetização
117) Vila Nova EA. Capitão Mattos
118) Werneck EA. Capitão Mattos
119) Macaé EA. Castro Alves
120) São Gonçalo (Região
especial)
EA. Vital Negreiros
121) Queimados EA. Alberto Torres
122) Paulo de Frontin EA. Marcilio Dias
123) Mesquita EA. Euclides da Cunha
124) Serraria EA. Jaime Guimarães
FONTE: Relatório de atividades da Província integralista fluminense de abril de 1937. APERJ. Fundo Polícia Política. Setor/série: Integralismo. Cx. 676. Pasta 18
251
ANEXO 9
MAPA DE NÚCLEOS DA AIB EM 1937
ESTADO NÚCLEOS
Acre 10
Amazonas 16
Para 19
Maranhão 23
Piauí 10
Ceará 152
Rio Grande do Norte 17
Paraíba 18
Pernambuco 110
Alagoas 62
Sergipe 47
Bahia 419
Espírito Santo 85
São Paulo 613
Minas Gerais 373
Paraná 155
Santa Catarina 385
Rio Grande do Sul 147
Goiás 16
Mato Grosso 28
Guanabara 34
Província do Mar (Marinha) 6
Fonte: Monitor Integralisra, pg. 4, 20/02/1937
252
ANEXO 10
Jornais e revistas da Província Integralista do RJ:
PUBLICAÇÃO CIDADE – LOCAL
Bandeira Integralista Barra do Pirahy
O Sapucaia Sapucaia
Anauê Resende
Alvorada Nova Friburgo
O Sigma Valença
A Flâmula (revista) Valença
A Marcha Petrópolis
A Ordem Niterói
O Acadêmico Integralista Niterói
Gazeta de Nova Iguaçu Nova Iguaçu
O Theresópolis Teresópolis
O Aço Verde Estrela
Fonte: CAVALARI (1999)
253
ANEXO 11
Relação de Mártires integralistas:
Nome: Local: Data:
Nicola Rosica Bauru – SP 03/10/1934
Jaime Barbosa Guimarães Praça da Sé – São Paulo-SP 08/10/1934
Caetano Spinelli Praça da Sé – São Paulo-SP 23/11/1934
José Luis Schroeder São Sebastião do Cahy - RS 24/02/1935
Alberto Sechin Cachoeiro de Itapemirim - ES 01/11/1935
Juvenal Falcão Panelas – PE Sem data
José Gertrudes Sobral – CE 20/11/1935
Fernando de Andrade Maragogipe – BA 04/09/1936
Ricardo Strelown Jaraguá – SC 07/10/1936
Germano Sacht Jaraguá – SC 07/10/1936
João Seixas Brito Piranhas – AL 26/10/1936
Manuel Duarte da Silva Teresópolis RJ 19/09/1936
Amadeu Faustino Pau Gigante –ES 06/09/1936
Vicente Bernardino de
Senna
Nova Lima – MG 18/03/1937
José Firmino dos Santos Nova Lima – MG 19/03/1937
Ricardo Gruenwaldt Jaraguá – SC 13/08/1937
Amaro Miranda Campos – RJ 15/08/1937
Jose Antenor de Paula
Barreto
Campos – RJ 15/08/1937
Amaro Tavares Campos – RJ 15/08/1937
Antonio Bernardes Domingos Martins – ES 30/08/1937
Fonte: Monitor Integralista. Ano V, nº 22, 07/10/1937, pg.03.
254
ANEXO 12:
CRESCIMENTO DO NÚMERO DE NÚCLEOS DA AIB NO RIO DE JANEIRO:
FONTE: Relatório de atividades da Província integralista fluminense de abril de 1937. APERJ. Fundo Polícia Política. Setor/série: Integralismo. Cx. 676. Pasta 18
104 Núcelos:1935
280 Núcleos:1937
0
50
100
150
200
250
300
Livros Grátis( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download: Baixar livros de AdministraçãoBaixar livros de AgronomiaBaixar livros de ArquiteturaBaixar livros de ArtesBaixar livros de AstronomiaBaixar livros de Biologia GeralBaixar livros de Ciência da ComputaçãoBaixar livros de Ciência da InformaçãoBaixar livros de Ciência PolíticaBaixar livros de Ciências da SaúdeBaixar livros de ComunicaçãoBaixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNEBaixar livros de Defesa civilBaixar livros de DireitoBaixar livros de Direitos humanosBaixar livros de EconomiaBaixar livros de Economia DomésticaBaixar livros de EducaçãoBaixar livros de Educação - TrânsitoBaixar livros de Educação FísicaBaixar livros de Engenharia AeroespacialBaixar livros de FarmáciaBaixar livros de FilosofiaBaixar livros de FísicaBaixar livros de GeociênciasBaixar livros de GeografiaBaixar livros de HistóriaBaixar livros de Línguas
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