palestra copypaste corpopop

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Palestra copypaste corpopop Performers (Adriana Macul, Laura Bruno, Tarcio Romão, Rafael Rodrigues e Marcos Souza). A - O espetáculo foi criado em 2008, mas a idéia de fazer esta peça veio em 2005. A nossa situação em 2005 era a seguinte: A gente tinha feito dois espetáculos. Nestes dois espetáculos não havia nenhum passo de dança. Porem nosso objetivo era a dança. Cada vez produzir uma dança. E nos dois espetáculos que fizemos não conseguimos isto. E isto se mostrou um problema pois a gente gosta muito de dança. Então a gente se perguntou: como conseguiríamos fazer um verdadeiro espetáculo de dança? Aí veio a idéia de “roubar” danças que a gente gostava muito. “Roubar as danças de outros coreógrafos e as organizar de modo a criar a nossa própria performance. Uma espécie de “sampling” na verdade. Ou da ferramenta copy paste. Ou de copiar & colar as nossas danças favoritas. Como a gente estava falando de cópia, eu reli “Bouvard e Pécuchet” de Gustav Flaubert, cujos heróis dos romances são dois copiadores, e que é bem conhecido por ser um romance sobre a tolice. Levando em conta que copiar é algo pejorativo. Tem um outro ‘copiador’ na literatura que se chama Bartleby no romance de Herman Melville. Também tem um copista no trabalho do Borges... B- O filme F for fake, que é um filme do Orson Welles. Ele explora as formas em que até mesmo os especialistas de mercado mais ilustres da arte podem ser enganados por um falsificador de arte, um mestre, como Elmyr de Hory, que pode reproduzir um Matisse durante o almoço. ou Clifford Irving , que começa como um biógrafo de Hory e cria sua própria falsificação, uma falsa biografia de recluso milionário Howard Hughes, que é aceita pelos meios de comunicação norte-americanos como sendo verdadeiro. Tem o Allen Zelig do Wood Allen. O Allen Zelig se torna uma figura de fascínio porque as pessoas reconhecem nele o seu próprio desejo de se transformar. Ele se torna uma ocasião, até mesmo uma desculpa, para que as pessoas se transformam, através da copia.

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Palestra copypaste corpopop

Performers (Adriana Macul, Laura Bruno, Tarcio Romão, Rafael Rodrigues e

Marcos Souza).

A - O espetáculo foi criado em 2008, mas a idéia de fazer esta peça veio em 2005. A

nossa situação em 2005 era a seguinte: A gente tinha feito dois espetáculos. Nestes

dois espetáculos não havia nenhum passo de dança. Porem nosso objetivo era a dança.

Cada vez produzir uma dança. E nos dois espetáculos que fizemos não conseguimos

isto. E isto se mostrou um problema pois a gente gosta muito de dança. Então a gente

se perguntou: como conseguiríamos fazer um verdadeiro espetáculo de dança?

Aí veio a idéia de “roubar” danças que a gente gostava muito. “Roubar as danças de

outros coreógrafos e as organizar de modo a criar a nossa própria performance. Uma

espécie de “sampling” na verdade. Ou da ferramenta copy paste. Ou de copiar & colar

as nossas danças favoritas.

Como a gente estava falando de cópia, eu reli “Bouvard e Pécuchet” de Gustav

Flaubert, cujos heróis dos romances são dois copiadores, e que é bem conhecido por

ser um romance sobre a tolice. Levando em conta que copiar é algo pejorativo. Tem

um outro ‘copiador’ na literatura que se chama Bartleby no romance de Herman

Melville.

Também tem um copista no trabalho do Borges...

B- O filme F for fake, que é um filme do Orson Welles. Ele explora as formas em que

até mesmo os especialistas de mercado mais ilustres da arte podem ser enganados por

um falsificador de arte, um mestre, como Elmyr de Hory, que pode reproduzir um

Matisse durante o almoço. ou Clifford Irving , que começa como um biógrafo de

Hory e cria sua própria falsificação, uma falsa biografia de recluso milionário Howard

Hughes, que é aceita pelos meios de comunicação norte-americanos como sendo

verdadeiro.

Tem o Allen Zelig do Wood Allen. O Allen Zelig se torna uma figura de fascínio

porque as pessoas reconhecem nele o seu próprio desejo de se transformar. Ele se

torna uma ocasião, até mesmo uma desculpa, para que as pessoas se transformam,

através da copia.

A- Então reli todos estes heróis, ou melhor, anti heróis da copia. Realmente na

maioria eles são anti heróis.

B - Uma vez no Brooklyn, em Nova York, em outubro de 2010, vi uma fila de bancas

de camelô em frente a grades cobertas de grafite. Bancadas cheias de mercadoria:

bolsas Louis Vuitton e carteiras, com seus familiares logos "LV" marrom, bege e

branco com desenhos multicoloridos de frutas. Você pode encontrar à venda na

Canal Street, em Nova York, nos mercados da rua 25 de março de São Paulo, em

Hong Kong e Singapura ou no mercado coberto da Cidade do México - artigos "LV

"empilhados ao lado de relógios de Patek Philippe, perfumes Chanel, jaquetas North

Face e Adidas. Cópias, fraudes, falsificações; baratos, reproduções mal feitas... ou

não?

B- A diferença é que, porém, você não está em um mercado de rua. Eu estava está em

pé dentro do Museu do Brooklyn, cercada de gente chique...; Kanye West estava

performando em uma outra sala ao lado. Enfim era a noite de abertura da exposição

COPYRIGHT_Murakami, uma retrospectiva dedicada à obra do artista–visual

japonês Takashi Murakami, incluindo suas colaborações com a Louis Vuitton, como a

bolsa monograma multicor que tinha acabado de ver. E as bolsas e os objetos nos

“camelôs” de rua eram mercadorias “verdadeiras”, fabricadas pela Louis Vuitton, à

venda a preços elevados.

A- As bolsas Vuitton são os objetos mais copiados no mundo. 1% da produção é legal

e 99% é ilegal.

A- O site Basic-replica.com, uma das muitas empresas onlines, criado em 2009,

oferece cópias de alta qualidade de Vuiton, junto com Dior, Marc Jacobs, e outras

grifes, proclamou:

B lê o seguinte texto:

“Sem qualquer tom de piada, podemos dizer sinceramente que nossas réplicas de

bolsas Louis Vuitton são absolutamente indistinguíveis das originais. Você pode levar

sua réplica a uma loja certificada Louis Vuitton e comparar; sentir o couro, testar as

costuras e conferir o forro. Nem mesmo um costureiro chefe da Louis Vuitton será

capaz de dizer qual é a original e qual a réplica Louis Vuitton da Basic-replica.com.

Réplica de bolsas Louis Vuitton com o revestimento de couro Alcântara da mesma

espécie de vaca da usada pela grife, com um acabamento que oxida na cor de mel

escuro, exatamente do mesmo jeito que o revestimento das bolsas originais oxidam à

medida que envelhecem.

Imitações autenticamente originais dos originais reais.”

Perguntas para platéia

1 - O que é uma "imitação autenticamente original"?

2 - O que significa dizer que algo é uma cópia de algo?

3 - Como se dá a alegação de que o objeto A é uma cópia do objeto B?

4 - O que queremos dizer quando dizemos que A é como B; que A imita B?

5 - Quando o original e a cópia são produzidos juntos na mesma fábrica, em

diferentes momentos, ela é uma copia.

6– Ou quando uma cópia é realmente conscientemente preferida em relação ao

original, devemos perguntar novamente: O que queremos dizer quando dizemos

"cópia"?

A - Comigo também aconteceu uma história. Em Paris tem uma rua chamada Rue

Louise Weiss com um monte de galerias, e a cada dois meses eu visitava estas

galerias. São galerias de arte contemporânea. E eu já tinha um trajeto. Ia na primeira,

depois na segunda, etc. E lá vou eu na primeira galeria e eu vejo uma instalação de

um artista belga que eu acho bem interessante que se chama Carsten Holler. Aí eu vou

lá e eu acho tudo super interessante... aí eu saio desta galeria e entro na próxima e me

dou conta que lá esta instalada exatamente a mesma instalação. Eu fiquei um pouco

surpresa. “Será que eu mudei mesmo de galeria?” Fiquei confusa. Aí eu vou olhar a

referência do artista e está escrito “Maurizio Cattelan”. Eu achei estranho e fui

perguntar ao galerista: “o que é isto?” E aí ele me diz que a idéia da instalação era a

cópia, copiar o trabalho do seu colega. Fazer exatamente a mesma coisa. (Jérôme)

Eu me interessei por isso pois é uma estratégia parecida com a nossa. Continuei

fazendo pesquisa sobre o trabalho do Maurizio Cattelan e vi que uma vez ele

pretendia fazer uma exposição em Amsterdam e um dia antes da sua exposição, não

tinha nada na galeria e seu galerista perguntou: “então, o que esta acontecendo?

Amanhã é a vernissage...” ele disse: “não se preocupe, não se preocupe...” e durante a

noite Maurizio Cattelan com alguns cúmplices, entram em uma outra galeria, roubam

os objetos de arte que estão expostos naquela galeria e os trazem para a sua galeria. E

no dia seguinte seria a vernissage com as obras “roubadas” de outro artista por

Maurizio Cattelan. Tudo isso me intrigou porque nos autorizou, estimulou a continuar

nosso projeto. Por um outro ponto de vista eu estava interessado no conceito

inventado por Julia Kristeva, que é uma filósofa e psicanalista francesa de origem

búlgara, e ela inventou um conceito muito interessante... para mim, que se chama

“intertextualidade”. A idéia resumidamente é que ela pensa que um texto de um autor,

de um escritor, pois ela trabalha principalmente com a literatura, na verdade é uma

composição, uma organização de autores anteriormente lidos por esse autor. Quer

dizer, a grosso modo, que cada trabalho nada mais é que uma composição, que um

entrelaçar de outras obras já lidas ou assistidas antes. Dá pra entender porque foi

super excitante pra gente este conceito da intertextualidade.

B Essa é uma boa resposta para a situação da arte hoje: encaramos uma quantidade

sem precedentes de obras, textos, disponíveis, o problema não é precisar escrever

mais, ao invés disso é importante aprender a negociar com a vasta quantidade de

textos, obras, que existem. (pausa) Tem aquele autor, Douglas Huebler, que fala: O

mundo está repleto de objetos mais ou menos interessantes, eu não quero adicionar

mais nenhum...”

A Enfim: como eu faço o meu caminho através de todas estas informações?

B Como eu lido com isso, como eu organizo e distribuo isso – é o que distingue a

minha escrita da sua.

B Tem também aquela crítica literária, Marjorie Perloff, que atualmente começou a

usar o termo ‘gênio não original ‘para descrever uma tendência que está emergindo na

literatura. A idéia dela é que, devido às mudanças trazidas pela tecnologia e internet,

nossa noção de gênio – uma figura romântica isolada, está ultrapassada. ... Perloff

cunhou um termo – moving information –

Ela aposta que hoje um escritor teria mais a ver com um programador do que com um

gênio torturado, brilhante, conceituando, construindo, executando, e mantendo a

máquina da escrita.

...como resultado, escritores estão explorando modos de escrever que estiveram fora,

tradicionalmente, do escopo da prática literária: Processamento de dados, database,

reciclagem, apropriação, plagio intencional, disfarce de identidade, programação

intensiva, dentre outros.

A Tem uma tendência de alguns jovens escritores que levaram este exercício um

pouco mais adiante; apropriando-se corajosamente de trabalhos de outros sem citarem

as referencias. Para eles, o ato de escrever é literalmente linguagem em movimento de

um lugar p outro, reforçando a máxima de que O CONTEXTO É O NOVO

CONTEÚDO.

B Enquanto pastiche e colagem começam a ser parte integrante da escrita, com o

surgimento da internet, a intensidade da prática de plágio foi levantada a níveis

extremos.

A Nos últimos cinco anos, temos visto obras como, por exemplo:

A re - digitação de Jack Kerouac, On the Road, em sua totalidade, uma página por

dia, todos os dias, em um blog por um ano;

Uma apropriação do texto completo da cópia de um dia da Nova Iorque Times

publicado como um livro 900 página;

Um poema que não é nada mais do que uma lista do diretório de reenquadramento de

lojas de um shopping center em uma forma poética;

Um escritor pobre que pegou todos as faturas de cartão de crédito enviadas para ele e,

em seguida, as organizou em uma impressão de 800 paginas constituindo um livro

tão caro que nem mesmo ele pode pagar por uma uma cópia;

Um poeta que submeteu o texto de um livro do século décimo nono a uma gramática

que segue seus próprios métodos, até mesmo o índice do livro;

Um advogado que representa os resumos legais de seu trabalho diário como poesia,

na sua totalidade, sem mudar uma palavra;

um outro escritor que passa os dias na Biblioteca Britânica copiando o primeiro verso

do Inferno de Dante de cada tradução Inglesa que a biblioteca possui, um após o outro

, página após página, até que ela esgotar a oferta da biblioteca;

Uma equipe de roteiristas que escava atualizações de status off sites de redes sociais e

atribui-lhes nomes de escritores já falecidos ("Jonathan Swift tem tickets para o jogo

desta noite Wranglers"), criando um épico. Uma interminável obra de poesia que se

reescreve com a mesma freqüência em que as páginas do Facebook são atualizadas;

Todo um movimento da escrita, chamado Flarf, que é baseado em pegar os piores

resultados de busca no Google: O mais ofensivo, o mais ridículo, mais ultrajante,

melhor.

B - Então falávamos de 2005, quando a gente teve esta idéia em 2005, nenhum dos

nossos espetáculos foram vistos... a não ser, talvez, dois, mas a gente era

desconhecida. A gente não tinha nenhuma responsabilidade artística dentro do campo

coreográfico... não era reconhecida por ninguém, então talvez tenha sido por isso que

tivéssemos tido este tipo de idéia. Pois era como se a gente estivesse fora da lei... e

poderíamos nos imaginar fazendo um espetáculo roubando performances dos outros...

mas foi justamente em 2005 que o trabalho começou a ficar conhecido... e fomos

convidadas pra um festival e a gente começou a viajar para mostrar estas duas

performances. E também recebemos convites, foi quando fizemos aquela performance

nos SESCs. E então a gente ficou sem tempo pra continuar este projeto, aí colocamos

ele entre parênteses, e só voltamos a ele em 2008. E ali nossa situação era totalmente

diferente. Tinham se passado três anos e passamos a ser identificadas... nosso trabalho

passou a ser comentado... visto... e quando voltamos a este projeto de “roubar” as

danças dos outros percebemos que teríamos dificuldades que não tínhamos imaginado

antes... por exemplo copyrights ou direitos do autor.

Me peguei lendo textos de propriedade intelectual dentro da lei brasileira, o que era

proibido... Que se eu fizesse aquilo eu teria que pagar 20 mil reais de multa ou ate

mesmo ficar 6 meses na prisão, então eu fiquei um pouco desapontada com esta

descoberta...

B A palavra "copyright" tem (cerca de 3,8 bilhões resultados no Google).

Só para colocar esse número em comparação: "liberdade" recebe apenas 315 milhões

de acessos do Google e "verdade" 312 milhões, uma proporção 10 vezes menor que

"copyright". Mesmo "sexo" recebe apenas 876 milhões de hits.

A Eu acho que os próprios artistas e responsáveis por suas obras caem na armadilha

de buscar recompensa para cada utilização possível delas atacando os próprios

membros de sua audiência pelo crime de exaltá-las, em nome de se consagrar os

artistas e seu trabalho. Estes, ou seus herdeiros, que caem na armadilha de atacar as

plagiários, sátiros e ‘samplers digitais’ de seu trabalho estão atacando a próxima

geração de criadores pelo crime de estarem sendo influenciados, pelo crime de

responder com a mistura de admiração e negação que caracteriza os sucessores

artísticos. Ao fazer isso, eles fazem o mundo menor, traindo o que parece ser a

principal motivação para fazer cultura, em primeiro lugar: tornar o mundo maior.

B: Sabia que tem um site chamado PhilosophyWriters.com nele, eles te aconselham

como escrever um “modelo”. Na introdução do site, está escrito assim: “Sem tempo

para escrever um documento, ou simplesmente muito ocupado: agente pode te

ajudar”.

Rafael: Minha universidade usa um serviço chamado Turnitin.com, um arquivo online

de textos e ensaios, para que um estudante ou um professor pode apresentar um papel

e que vai enviar, em resposta, uma leitura de originalidade do papel ou a falta dela.

Marcos: Como um monte de gente, eu também fiquei muito surpresa quando recebi a

mensagem no facebook sobre a presença das minhas duas coreografias no videoclip.

Me perguntaram se eu estava vendendo os meus espetáculos para o circuito

comercial... (risos). Mas quando vi o vídeo eu fiquei chocada pela semelhança das

coreografias e dos movimentos com as minhas coreografias.. alem dos figurinos.

Alem dos movimentos mais óbvios que foram copiados, tem muitos outros menos

visíveis por causa da diferença estética entre as duas produções.

Tarcisio - Legal, mas podiam pagar alguma coisa pra ela.

Marcos - Não, na verdade, Beyoncé quer ganhar crédito pelas danças... mas o que ela

faz... ela mesma declarou que ela surfa no YouTube em busca de inspiração.

Citar fontes significa abrir mão de dinheiro, e eu acho que ela não está a fim disso.

Rafael - Eu não estou defendendo a Beyoncé mas... será que alguém já parou pra

pensar que ela não sabia de onde os movimentos vieram? Ela tem um coreógrafo que

trabalha pra ela exatamente pra ensinar coreografias e danças... não é ela que faz isso.

O coreógrafo é um dos responsáveis, assim como os produtores, que estão lá pra

garantir que tudo seja feito legalmente.

Tarcisio - Sei lá, eu achei esse vídeo bem estranho...

Rafael - Michael Jackson foi inspirado por James Brown, mas você nunca vê ele

fazendo a mesma coisa ou as mesmas idéias...

Marcos - Errado, o vídeo da Beyoncé não exibe uma mistura de passos de dança

popular, ela usou sem autorização uma coreografia sofisticada que se encaixa com a

sua música (e quem sabe de onde suas canções vêm, de depois disso?) A coreografia

original foi criada pelo trabalho duro do Rosas, artistas bem conhecidos em todo

Europa. Beyoncé e sua equipe são apenas fazedores de dinheiro, sem ética, que

aprenderam a usar bem as máquinas de buisness doentio e tomar conscientemente

vantagem da ignorância das pessoas.

Tarcisio – Nojento.

Tarcisio - Gente, a Anne deve estar vendo a Beyoncé como uma “biscate", mas eu

acho que ela só se inspirou pelas coreografias dela... eu quero dizer que a Beyoncé

não usa os mesmos movimentos da tal dança. Afinal, ela só fez um vídeo usando de

um jeito mais criativo ainda...

Marcos - Eu gosto que ela está trazendo cultura de volta para essa atual geração de

zumbis, mas eu não gosto do fato de ter tanta campanha publicitária sobre sua dança.

Provavelmente ela deva royalties pra alguém... talvez não seja tão boazinha como

retratam que ela é, ela só deve pagar as pessoas por fora, tipo, 'aqui está um pouco de

dinheiro, e cala a boca'

A Voltando pra nossa realidade... O sistema da dança contemporânea, a grosso modo,

funciona assim: são alguns meses de ensaio, em seguida a gente segue em turnê, se

tudo der certo, e em seguida contrata-se novos bailarinos e desencanamos do

espetáculo e começamos a fazer um outro; é um sistema rápido de ciclo de produção,

e eu acho isso uma pena, pois tinham coisas que tinham sido formidáveis e que

poderiam durar mais.

B Então a nossa idéia de pegar danças que eu já tínhamos visto há alguns anos mas

que não existiam mais, que não estavam mais visíveis, e reativar estas velhas danças.

Sob essa outra perspectiva, o que foi interessante através desta idéia foi a reativação

de danças que foram perdidas.

Um outro ponto de vista interessante seria um ponto de vista ecológico, ao invés de

ficar produzindo novas danças reciclar danças antigas.

Revendo alguns textos, eu vi que existia uma possibilidade que se chamava “citação”

A E na verdade era isso o que a gente queria fazer, a gente queria roubar, mas dizer

que pegamos... que fizesse parte do espetáculo.. que a dança ou danças que estavam

no nosso espetáculo vieram de Anne Teresa de Keersmaeker ou da Trisha Brown ou

do Nijinsky ou de coisas assim... e de outras ainda... No fim das contas seria um

espetáculo de citação. Então a gente disse perfeito, estamos salvas, então vamos

continuar... Então nos demos conta de que não é a mesma coisa a citação na dança...

Não tem legislação... por exemplo em literatura é totalmente possível fazer um

trabalho de citação... eu posso dizer... em 1900 e tal Guimarães Rosa escreveu isto,

abre a marca de citação, abre aspas... blá, blá, blá, fecha aspas... é autorizado, eu não

preciso pedir os direitos de Guimarães e nem pedir autorização pra família dele... Na

música é a mesma coisa... eu posso dizer esta música de Villa-Lobos e vocês vão

escutá-la... Claro, tem um certo número de medida... eu não sei exatamente... um certo

número de medida permitido... o que se chama de direito de citação. E na dança, essa

coisa não existe... nos demos conta que a inexistência de regras de citação é na

verdade mais sintomática. E mais importante do que a gente vinha pensando... suas

conseqüências são muito mais sérias. Aí percebemos que a citação... por que falar de

Guimarães Rosa? Em um livro, por exemplo, se eu sou um escritor? Eu o utilizo

porque eu estou trabalhando sobre um problema e descubro que Guimarães falou

sobre este problema de maneira bem interessante... e eu estou de acordo com ele, por

exemplo, e então eu digo “como diria Guimarães...” quer dizer que eu não tenho

necessidade de redizer, de escrever de um modo diferente porque já foi muito bem

escrito... por Guimarães Rosa... então quer dizer que como escritor... eu me inscrevo

na historia... na história... melhor, quer dizer que tem gente em volta de mim, aliás,

antes de mim, predecessores que expressaram coisas muito boas... e então eu quero

utilizá-las. Então eu vou usar a pesquisa deles, eu vou fazer referência a estas

descobertas...

Então há uma história. Há um passado... Mas se não ha citação, se não há referência

possível...

Não tem história, isto quer dizer que eu tenho que recomeçar de novo, do zero, de

novo... E esta é a ideologia que domina na dança nessa época e nestes anos... seria que

se você quer se tornar um coreógrafo, o seu meio, as pessoas ao redor de você dizem

“vamos lá faça algo de original, de novo, de autêntico...” um outro termo bem

problemático... Resumidamente “esqueça o resto”, e isso eu acho completamente

nonsense. A gente não pode produzir alguma coisa, que se apóia ou que se refere a

um conhecimento passado... tanto para poder criticá-lo, para poder ir mais longe... se

referir implicitamente... é um pouco a idéia de intertextualidade de Julia Kristeva

quando ela diz que um autor escreve alguma coisa, a partir do que ele leu... A grosso

modo isto quer dizer que as referências que o formam, que vão guiá-lo, conduzi-lo a

uma re-apropriação e reorganização das coisas... E esta idéia se opõe totalmente à

idéia de autenticidade, do romantismo, de uma inspiração que vem quem sabe de

onde? Provavelmente do céu... é dramática a história da dança sem história...

Palestra copypaste corpopop

Performers (Adriana Macul, Laura Bruno, Tarcio Romão, Rafael Rodrigues e

Marcos Souza).

A - O espetáculo foi criado em 2008, mas a idéia de fazer esta peça veio em 2005. A

nossa situação em 2005 era a seguinte: A gente tinha feito dois espetáculos. Nestes

dois espetáculos não havia nenhum passo de dança. Porem nosso objetivo era a dança.

Cada vez produzir uma dança. E nos dois espetáculos que fizemos não conseguimos

isto. E isto se mostrou um problema pois a gente gosta muito de dança. Então a gente

se perguntou: como conseguiríamos fazer um verdadeiro espetáculo de dança?

Aí veio a idéia de “roubar” danças que a gente gostava muito. “Roubar as danças de

outros coreógrafos e as organizar de modo a criar a nossa própria performance. Uma

espécie de “sampling” na verdade. Ou da ferramenta copy paste. Ou de copiar & colar

as nossas danças favoritas.

Como a gente estava falando de cópia, eu reli “Bouvard e Pécuchet” de Gustav

Flaubert, cujos heróis dos romances são dois copiadores, e que é bem conhecido por

ser um romance sobre a tolice. Levando em conta que copiar é algo pejorativo. Tem

um outro ‘copiador’ na literatura que se chama Bartleby no romance de Herman

Melville.

Também tem um copista no trabalho do Borges...

B- O filme F for fake, que é um filme do Orson Welles. Ele explora as formas em que

até mesmo os especialistas de mercado mais ilustres da arte podem ser enganados por

um falsificador de arte, um mestre, como Elmyr de Hory, que pode reproduzir um

Matisse durante o almoço. ou Clifford Irving , que começa como um biógrafo de

Hory e cria sua própria falsificação, uma falsa biografia de recluso milionário Howard

Hughes, que é aceita pelos meios de comunicação norte-americanos como sendo

verdadeiro.

Tem o Allen Zelig do Wood Allen. O Allen Zelig se torna uma figura de fascínio

porque as pessoas reconhecem nele o seu próprio desejo de se transformar. Ele se

torna uma ocasião, até mesmo uma desculpa, para que as pessoas se transformam,

através da copia.

A- Então reli todos estes heróis, ou melhor, anti heróis da copia. Realmente na

maioria eles são anti heróis.

B - Uma vez no Brooklyn, em Nova York, em outubro de 2010, vi uma fila de bancas

de camelô em frente a grades cobertas de grafite. Bancadas cheias de mercadoria:

bolsas Louis Vuitton e carteiras, com seus familiares logos "LV" marrom, bege e

branco com desenhos multicoloridos de frutas. Você pode encontrar à venda na

Canal Street, em Nova York, nos mercados da rua 25 de março de São Paulo, em

Hong Kong e Singapura ou no mercado coberto da Cidade do México - artigos "LV

"empilhados ao lado de relógios de Patek Philippe, perfumes Chanel, jaquetas North

Face e Adidas. Cópias, fraudes, falsificações; baratos, reproduções mal feitas... ou

não?

B- A diferença é que, porém, você não está em um mercado de rua. Eu estava está em

pé dentro do Museu do Brooklyn, cercada de gente chique...; Kanye West estava

performando em uma outra sala ao lado. Enfim era a noite de abertura da exposição

COPYRIGHT_Murakami, uma retrospectiva dedicada à obra do artista–visual

japonês Takashi Murakami, incluindo suas colaborações com a Louis Vuitton, como a

bolsa monograma multicor que tinha acabado de ver. E as bolsas e os objetos nos

“camelôs” de rua eram mercadorias “verdadeiras”, fabricadas pela Louis Vuitton, à

venda a preços elevados.

A- As bolsas Vuitton são os objetos mais copiados no mundo. 1% da produção é legal

e 99% é ilegal.

A- O site Basic-replica.com, uma das muitas empresas onlines, criado em 2009,

oferece cópias de alta qualidade de Vuiton, junto com Dior, Marc Jacobs, e outras

grifes, proclamou:

B lê o seguinte texto:

“Sem qualquer tom de piada, podemos dizer sinceramente que nossas réplicas de

bolsas Louis Vuitton são absolutamente indistinguíveis das originais. Você pode levar

sua réplica a uma loja certificada Louis Vuitton e comparar; sentir o couro, testar as

costuras e conferir o forro. Nem mesmo um costureiro chefe da Louis Vuitton será

capaz de dizer qual é a original e qual a réplica Louis Vuitton da Basic-replica.com.

Réplica de bolsas Louis Vuitton com o revestimento de couro Alcântara da mesma

espécie de vaca da usada pela grife, com um acabamento que oxida na cor de mel

escuro, exatamente do mesmo jeito que o revestimento das bolsas originais oxidam à

medida que envelhecem.

Imitações autenticamente originais dos originais reais.”

Perguntas para platéia

1 - O que é uma "imitação autenticamente original"?

2 - O que significa dizer que algo é uma cópia de algo?

3 - Como se dá a alegação de que o objeto A é uma cópia do objeto B?

4 - O que queremos dizer quando dizemos que A é como B; que A imita B?

5 - Quando o original e a cópia são produzidos juntos na mesma fábrica, em

diferentes momentos, ela é uma copia.

6– Ou quando uma cópia é realmente conscientemente preferida em relação ao

original, devemos perguntar novamente: O que queremos dizer quando dizemos

"cópia"?

A - Comigo também aconteceu uma história. Em Paris tem uma rua chamada Rue

Louise Weiss com um monte de galerias, e a cada dois meses eu visitava estas

galerias. São galerias de arte contemporânea. E eu já tinha um trajeto. Ia na primeira,

depois na segunda, etc. E lá vou eu na primeira galeria e eu vejo uma instalação de

um artista belga que eu acho bem interessante que se chama Carsten Holler. Aí eu vou

lá e eu acho tudo super interessante... aí eu saio desta galeria e entro na próxima e me

dou conta que lá esta instalada exatamente a mesma instalação. Eu fiquei um pouco

surpresa. “Será que eu mudei mesmo de galeria?” Fiquei confusa. Aí eu vou olhar a

referência do artista e está escrito “Maurizio Cattelan”. Eu achei estranho e fui

perguntar ao galerista: “o que é isto?” E aí ele me diz que a idéia da instalação era a

cópia, copiar o trabalho do seu colega. Fazer exatamente a mesma coisa. (Jérôme)

Eu me interessei por isso pois é uma estratégia parecida com a nossa. Continuei

fazendo pesquisa sobre o trabalho do Maurizio Cattelan e vi que uma vez ele

pretendia fazer uma exposição em Amsterdam e um dia antes da sua exposição, não

tinha nada na galeria e seu galerista perguntou: “então, o que esta acontecendo?

Amanhã é a vernissage...” ele disse: “não se preocupe, não se preocupe...” e durante a

noite Maurizio Cattelan com alguns cúmplices, entram em uma outra galeria, roubam

os objetos de arte que estão expostos naquela galeria e os trazem para a sua galeria. E

no dia seguinte seria a vernissage com as obras “roubadas” de outro artista por

Maurizio Cattelan. Tudo isso me intrigou porque nos autorizou, estimulou a continuar

nosso projeto. Por um outro ponto de vista eu estava interessado no conceito

inventado por Julia Kristeva, que é uma filósofa e psicanalista francesa de origem

búlgara, e ela inventou um conceito muito interessante... para mim, que se chama

“intertextualidade”. A idéia resumidamente é que ela pensa que um texto de um autor,

de um escritor, pois ela trabalha principalmente com a literatura, na verdade é uma

composição, uma organização de autores anteriormente lidos por esse autor. Quer

dizer, a grosso modo, que cada trabalho nada mais é que uma composição, que um

entrelaçar de outras obras já lidas ou assistidas antes. Dá pra entender porque foi

super excitante pra gente este conceito da intertextualidade.

B Essa é uma boa resposta para a situação da arte hoje: encaramos uma quantidade

sem precedentes de obras, textos, disponíveis, o problema não é precisar escrever

mais, ao invés disso é importante aprender a negociar com a vasta quantidade de

textos, obras, que existem. (pausa) Tem aquele autor, Douglas Huebler, que fala: O

mundo está repleto de objetos mais ou menos interessantes, eu não quero adicionar

mais nenhum...”

A Enfim: como eu faço o meu caminho através de todas estas informações?

B Como eu lido com isso, como eu organizo e distribuo isso – é o que distingue a

minha escrita da sua.

B Tem também aquela crítica literária, Marjorie Perloff, que atualmente começou a

usar o termo ‘gênio não original ‘para descrever uma tendência que está emergindo na

literatura. A idéia dela é que, devido às mudanças trazidas pela tecnologia e internet,

nossa noção de gênio – uma figura romântica isolada, está ultrapassada. ... Perloff

cunhou um termo – moving information –

Ela aposta que hoje um escritor teria mais a ver com um programador do que com um

gênio torturado, brilhante, conceituando, construindo, executando, e mantendo a

máquina da escrita.

...como resultado, escritores estão explorando modos de escrever que estiveram fora,

tradicionalmente, do escopo da prática literária: Processamento de dados, database,

reciclagem, apropriação, plagio intencional, disfarce de identidade, programação

intensiva, dentre outros.

A Tem uma tendência de alguns jovens escritores que levaram este exercício um

pouco mais adiante; apropriando-se corajosamente de trabalhos de outros sem citarem

as referencias. Para eles, o ato de escrever é literalmente linguagem em movimento de

um lugar p outro, reforçando a máxima de que O CONTEXTO É O NOVO

CONTEÚDO.

B Enquanto pastiche e colagem começam a ser parte integrante da escrita, com o

surgimento da internet, a intensidade da prática de plágio foi levantada a níveis

extremos.

A Nos últimos cinco anos, temos visto obras como, por exemplo:

A re - digitação de Jack Kerouac, On the Road, em sua totalidade, uma página por

dia, todos os dias, em um blog por um ano;

Uma apropriação do texto completo da cópia de um dia da Nova Iorque Times

publicado como um livro 900 página;

Um poema que não é nada mais do que uma lista do diretório de reenquadramento de

lojas de um shopping center em uma forma poética;

Um escritor pobre que pegou todos as faturas de cartão de crédito enviadas para ele e,

em seguida, as organizou em uma impressão de 800 paginas constituindo um livro

tão caro que nem mesmo ele pode pagar por uma uma cópia;

Um poeta que submeteu o texto de um livro do século décimo nono a uma gramática

que segue seus próprios métodos, até mesmo o índice do livro;

Um advogado que representa os resumos legais de seu trabalho diário como poesia,

na sua totalidade, sem mudar uma palavra;

um outro escritor que passa os dias na Biblioteca Britânica copiando o primeiro verso

do Inferno de Dante de cada tradução Inglesa que a biblioteca possui, um após o outro

, página após página, até que ela esgotar a oferta da biblioteca;

Uma equipe de roteiristas que escava atualizações de status off sites de redes sociais e

atribui-lhes nomes de escritores já falecidos ("Jonathan Swift tem tickets para o jogo

desta noite Wranglers"), criando um épico. Uma interminável obra de poesia que se

reescreve com a mesma freqüência em que as páginas do Facebook são atualizadas;

Todo um movimento da escrita, chamado Flarf, que é baseado em pegar os piores

resultados de busca no Google: O mais ofensivo, o mais ridículo, mais ultrajante,

melhor.

B - Então falávamos de 2005, quando a gente teve esta idéia em 2005, nenhum dos

nossos espetáculos foram vistos... a não ser, talvez, dois, mas a gente era

desconhecida. A gente não tinha nenhuma responsabilidade artística dentro do campo

coreográfico... não era reconhecida por ninguém, então talvez tenha sido por isso que

tivéssemos tido este tipo de idéia. Pois era como se a gente estivesse fora da lei... e

poderíamos nos imaginar fazendo um espetáculo roubando performances dos outros...

mas foi justamente em 2005 que o trabalho começou a ficar conhecido... e fomos

convidadas pra um festival e a gente começou a viajar para mostrar estas duas

performances. E também recebemos convites, foi quando fizemos aquela performance

nos SESCs. E então a gente ficou sem tempo pra continuar este projeto, aí colocamos

ele entre parênteses, e só voltamos a ele em 2008. E ali nossa situação era totalmente

diferente. Tinham se passado três anos e passamos a ser identificadas... nosso trabalho

passou a ser comentado... visto... e quando voltamos a este projeto de “roubar” as

danças dos outros percebemos que teríamos dificuldades que não tínhamos imaginado

antes... por exemplo copyrights ou direitos do autor.

Me peguei lendo textos de propriedade intelectual dentro da lei brasileira, o que era

proibido... Que se eu fizesse aquilo eu teria que pagar 20 mil reais de multa ou ate

mesmo ficar 6 meses na prisão, então eu fiquei um pouco desapontada com esta

descoberta...

B A palavra "copyright" tem (cerca de 3,8 bilhões resultados no Google).

Só para colocar esse número em comparação: "liberdade" recebe apenas 315 milhões

de acessos do Google e "verdade" 312 milhões, uma proporção 10 vezes menor que

"copyright". Mesmo "sexo" recebe apenas 876 milhões de hits.

A Eu acho que os próprios artistas e responsáveis por suas obras caem na armadilha

de buscar recompensa para cada utilização possível delas atacando os próprios

membros de sua audiência pelo crime de exaltá-las, em nome de se consagrar os

artistas e seu trabalho. Estes, ou seus herdeiros, que caem na armadilha de atacar as

plagiários, sátiros e ‘samplers digitais’ de seu trabalho estão atacando a próxima

geração de criadores pelo crime de estarem sendo influenciados, pelo crime de

responder com a mistura de admiração e negação que caracteriza os sucessores

artísticos. Ao fazer isso, eles fazem o mundo menor, traindo o que parece ser a

principal motivação para fazer cultura, em primeiro lugar: tornar o mundo maior.

B: Sabia que tem um site chamado PhilosophyWriters.com nele, eles te aconselham

como escrever um “modelo”. Na introdução do site, está escrito assim: “Sem tempo

para escrever um documento, ou simplesmente muito ocupado: agente pode te

ajudar”.

Rafael: Minha universidade usa um serviço chamado Turnitin.com, um arquivo online

de textos e ensaios, para que um estudante ou um professor pode apresentar um papel

e que vai enviar, em resposta, uma leitura de originalidade do papel ou a falta dela.

Marcos: Como um monte de gente, eu também fiquei muito surpresa quando recebi a

mensagem no facebook sobre a presença das minhas duas coreografias no videoclip.

Me perguntaram se eu estava vendendo os meus espetáculos para o circuito

comercial... (risos). Mas quando vi o vídeo eu fiquei chocada pela semelhança das

coreografias e dos movimentos com as minhas coreografias.. alem dos figurinos.

Alem dos movimentos mais óbvios que foram copiados, tem muitos outros menos

visíveis por causa da diferença estética entre as duas produções.

Tarcisio - Legal, mas podiam pagar alguma coisa pra ela.

Marcos - Não, na verdade, Beyoncé quer ganhar crédito pelas danças... mas o que ela

faz... ela mesma declarou que ela surfa no YouTube em busca de inspiração.

Citar fontes significa abrir mão de dinheiro, e eu acho que ela não está a fim disso.

Rafael - Eu não estou defendendo a Beyoncé mas... será que alguém já parou pra

pensar que ela não sabia de onde os movimentos vieram? Ela tem um coreógrafo que

trabalha pra ela exatamente pra ensinar coreografias e danças... não é ela que faz isso.

O coreógrafo é um dos responsáveis, assim como os produtores, que estão lá pra

garantir que tudo seja feito legalmente.

Tarcisio - Sei lá, eu achei esse vídeo bem estranho...

Rafael - Michael Jackson foi inspirado por James Brown, mas você nunca vê ele

fazendo a mesma coisa ou as mesmas idéias...

Marcos - Errado, o vídeo da Beyoncé não exibe uma mistura de passos de dança

popular, ela usou sem autorização uma coreografia sofisticada que se encaixa com a

sua música (e quem sabe de onde suas canções vêm, de depois disso?) A coreografia

original foi criada pelo trabalho duro do Rosas, artistas bem conhecidos em todo

Europa. Beyoncé e sua equipe são apenas fazedores de dinheiro, sem ética, que

aprenderam a usar bem as máquinas de buisness doentio e tomar conscientemente

vantagem da ignorância das pessoas.

Tarcisio – Nojento.

Tarcisio - Gente, a Anne deve estar vendo a Beyoncé como uma “biscate", mas eu

acho que ela só se inspirou pelas coreografias dela... eu quero dizer que a Beyoncé

não usa os mesmos movimentos da tal dança. Afinal, ela só fez um vídeo usando de

um jeito mais criativo ainda...

Marcos - Eu gosto que ela está trazendo cultura de volta para essa atual geração de

zumbis, mas eu não gosto do fato de ter tanta campanha publicitária sobre sua dança.

Provavelmente ela deva royalties pra alguém... talvez não seja tão boazinha como

retratam que ela é, ela só deve pagar as pessoas por fora, tipo, 'aqui está um pouco de

dinheiro, e cala a boca'

A Voltando pra nossa realidade... O sistema da dança contemporânea, a grosso modo,

funciona assim: são alguns meses de ensaio, em seguida a gente segue em turnê, se

tudo der certo, e em seguida contrata-se novos bailarinos e desencanamos do

espetáculo e começamos a fazer um outro; é um sistema rápido de ciclo de produção,

e eu acho isso uma pena, pois tinham coisas que tinham sido formidáveis e que

poderiam durar mais.

B Então a nossa idéia de pegar danças que eu já tínhamos visto há alguns anos mas

que não existiam mais, que não estavam mais visíveis, e reativar estas velhas danças.

Sob essa outra perspectiva, o que foi interessante através desta idéia foi a reativação

de danças que foram perdidas.

Um outro ponto de vista interessante seria um ponto de vista ecológico, ao invés de

ficar produzindo novas danças reciclar danças antigas.

Revendo alguns textos, eu vi que existia uma possibilidade que se chamava “citação”.

A E na verdade era isso o que a gente queria fazer, a gente queria roubar, mas dizer

que pegamos... que fizesse parte do espetáculo.. que a dança ou danças que estavam

no nosso espetáculo vieram de Anne Teresa de Keersmaeker ou da Trisha Brown ou

do Nijinsky ou de coisas assim... e de outras ainda... No fim das contas seria um

espetáculo de citação. Então a gente disse perfeito, estamos salvas, então vamos

continuar... Então nos demos conta de que não é a mesma coisa a citação na dança...

Não tem legislação... por exemplo em literatura é totalmente possível fazer um

trabalho de citação... eu posso dizer... em 1900 e tal Guimarães Rosa escreveu isto,

abre a marca de citação, abre aspas... blá, blá, blá, fecha aspas... é autorizado, eu não

preciso pedir os direitos de Guimarães e nem pedir autorização pra família dele... Na

música é a mesma coisa... eu posso dizer esta música de Villa-Lobos e vocês vão

escutá-la... Claro, tem um certo número de medida... eu não sei exatamente... um certo

número de medida permitido... o que se chama de direito de citação. E na dança, essa

coisa não existe... nos demos conta que a inexistência de regras de citação é na

verdade mais sintomática. E mais importante do que a gente vinha pensando... suas

conseqüências são muito mais sérias. Aí percebemos que a citação... por que falar de

Guimarães Rosa? Em um livro, por exemplo, se eu sou um escritor? Eu o utilizo

porque eu estou trabalhando sobre um problema e descubro que Guimarães falou

sobre este problema de maneira bem interessante... e eu estou de acordo com ele, por

exemplo, e então eu digo “como diria Guimarães...” quer dizer que eu não tenho

necessidade de redizer, de escrever de um modo diferente porque já foi muito bem

escrito... por Guimarães Rosa... então quer dizer que como escritor... eu me inscrevo

na historia... na história... melhor, quer dizer que tem gente em volta de mim, aliás,

antes de mim, predecessores que expressaram coisas muito boas... e então eu quero

utilizá-las. Então eu vou usar a pesquisa deles, eu vou fazer referência a estas

descobertas...

Então há uma história. Há um passado... Mas se não ha citação, se não há referência

possível...

Não tem história, isto quer dizer que eu tenho que recomeçar de novo, do zero, de

novo... E esta é a ideologia que domina na dança nessa época e nestes anos... seria que

se você quer se tornar um coreógrafo, o seu meio, as pessoas ao redor de você dizem

“vamos lá faça algo de original, de novo, de autêntico...” um outro termo bem

problemático... Resumidamente “esqueça o resto”, e isso eu acho completamente

nonsense. A gente não pode produzir alguma coisa, que se apóia ou que se refere a

um conhecimento passado... tanto para poder criticá-lo, para poder ir mais longe... se

referir implicitamente... é um pouco a idéia de intertextualidade de Julia Kristeva

quando ela diz que um autor escreve alguma coisa, a partir do que ele leu... A grosso

modo isto quer dizer que as referências que o formam, que vão guiá-lo, conduzi-lo a

uma re-apropriação e reorganização das coisas... E esta idéia se opõe totalmente à

idéia de autenticidade, do romantismo, de uma inspiração que vem quem sabe de

onde? Provavelmente do céu... é dramática a história da dança sem história...

LEGENDA

Descrição da fala de Jerome Bel sobre o seu espetáculo “Le derniere spectacle”

publicada pelo Catalogue Raisonné em 1994.

Trechos do livro “In Praise of Copying” de Marcus Boon

Trechos do artigo “The Ecstasy of Influence” de Jonathan Lethem.

Descrição dos chats de comentários sobre a apropriação de coreografias de Anne Teresa de Keersmaeker por Beyonce disposto no seguinte site: http://theperformanceclub.org/2011/10/anne-teresa-de-keersmaeker-responds-to-beyonce-video/

Trechos do livro “Uncreative Writting” de Kenneth Goldsmith