ouvir contar o lugar da história oral: o fasdnio doarpa.ucv.cl/articulos/olugardahistoriaoral.pdf12...
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12 Ouvir contar
Internacional de História Oral (ABHO e IOHA), de cujas diretorias
venho parÜcipando, por ampliarem enormemente o debate entre
pesquisadores e institui~óes da área. As institui~óes promotoras doseventos e cursos (cada urna mencionada em nota, no início dos
capítulos), que me obrigaram a sistematizar e a tornar inteligíveisminhas reflexóes em torno da história oral. E a Coordenac;ao de
Aperfei~oamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), o ConselhoNacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a
Funda~ao Carlos Chagas Filho de Amparo a Pesquisa do Estado do Rio
de ]aneiro (Faperj), que me concederam apoio financeiro para a
participa~ao nos eventos academicos fora do país. A Capes e o CNPqainda me concederam as bolsas de mestrado em antropologia social edoutorado em teoria da literatura, respectivamente, cursos fundamentais
para minha forma~ao e que me permitiram tra~ar rela~óes entre ahistória oral e temas como o papel central do indivíduo, a hermeneuticae os fundamentos da narrativa, entre outros.
o lugardahistóriaoral:o fasdniodovividoe as possibilidadesde pesquisa*
Ve ,f.X\ ó. #(f¡Q.rt)
eomecemo' com urna imagem ce"amente [amilim a muita, pe,-soas: se quiséssemos fazer um filme reproduzindo passo a passonossa vida, tal qual ela foi, sem deixar de lado os detalhes, gastaría-mos ainda urna vida inteira para assisti-lo: repelir-se-iam, na tela,os anos, os dias, as horas de nossa vida. Ou seja, é impossível assis-tir ao que se passou, seguindo a continuidade do vivido, dos even-tos e das emo~óes. E o que vale para nossas vidas vale evidente-
mente para o passado de uma forma geral: é impossível reproduzi-lo em todos os seus meandros e acontecimentos os mais banais, talqual realmente aconteceu. A história, como toda atividade de
;i
* Este capitulo reÚne questóes que venho discutindo há algum tempo. O fascinio do vivido,inclusive a imagem do filme de nossa vida, já foi objeto do texto "História oral: uma rcncxao
crítica", apresentado no paineI "Pesquisa, Memória e Documcnta<;ao", no VI Encontro Estadualde História da ANPUH - NÚcleo Regional de Minas Gerais, realizado na Universidade Federal de
Minas Gerais, em Belo Horizonte, emjulho de 1988. A relac;ao entre história oral e o paradigma
hermenéutico encontra-se resumida em "A vocac;ao totalizan te da história ora] e o exemplo daformac;ao do acervo de entrevistas do CPDOC", texto apresentado no X Congresso Internacional
de História Oral, realizado no Rio deJaneiro, de 14 a 18 dejunho de 1998. O papel do individuo
no traba]ho com a história oral, tambem tratado neste Último texto, ve~ me ocupando há muitotempo. A questao foi objeto da palestra "Individuo e biografia na história oral", proferida namesa-redonda "O documento em história da psicologia: o oral e o textual", durante o III
.9J.contro Clio-Psyché "Historiografia, psicologia e subjetividades", realizado pelo NÚcleo Cho-Psyché do Departamento de Psicologia Social e lnstitucional da Universidade do Estado do Rio
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pensamento, opera por descontinuidades: selecionamos aconteci-
mentos, conjunturas e modos de viver, para conhecer e explicar o
que se passou.
Urna entrevista de história oral nao é excer;ao nesse conjunto.
Mas há nela urna vivacidade, um tom especial, característico de do-
cumentos pessoais. É da experiencia de um sujeito que se trata; sua
narrativa acaba colorindo o passado com um valor que nos é caro:
aquele que faz do homem um indivíduo único e singular em nossa
história, um sujeito que efetivamente viveu - e, por isso dá vida a -as conjunturas e estruturas que de outro modo parecem tao distan-
tes. E, ouvindo-o falar, ternos a sensar;ao de ouvir a história sendo
contada em um contínuo, ternos a sensar;ao de que as descontinuida-
des sao abolidas e recheadas com ingredientes pessoais: emor;óes,
rear;óes, observar;óes, idiossincrasias, relatos pitorescos. Que in te-
ressante reconhecer que, em meio a conjunturas, em meio a estrutu-
ras, há pessoas que se movimentam, que opinam, que reagem, que
vivem, enfim! É como se pudéssemos obedecer a nosso impulso de
refazer aquele filme, de reviver o passado, através da experiencia de
nosso interlocutor. E sua presenr;a nos torna mais próximos do pas-sado, como se pudéssemos restabelecer a continuidade com aquilo
que já nao volta mais. Se our;o de um entrevistado um relato de seu
cotidiano vivido há 60 anos em minha cidade, acabo me identifican-
o lugar da hi\tlJlld (Jldl
do com ele, e, eu mesma,caminhando pelas ruas em meio a bundes l'senhores de chapéus.
Esse fascínio do vivido é sem dúvida em grande parte responsá-vel pelo sucesso que a história oral tem aicanr;ado nos últimos anos -sucesso que pode ser atestado pelo número crescente de pesquisado-
res, professores e estudiosos "fascinados" pela metodologia, que fre-qüentam os congressose seminários de história oral em todo o mundoe no Brasil especialmente.
É importante contudo saber que o que atrai, na história oral,nao Ihe é exclusivo e muito menos "novo" no mundo de hoje. Nestecapítulo procuro situar a história oral em relar;aoa alguns paradigmasque podem explicar o fascínio que ela exerce. Isso ajuda a estabelecerurna ViSaDcrítica do método e a identificar suas potencialidades emcasos em que ela pode valer a pena.
",
A naturezado fascínio
deJaneiro, de 27 a 29 de selembro de 2000. Também Iralci do assunto na conferencia "Hislória
oral e biograCia", proferida no Congresso de Hislória Oral, Fronteiras, Migrao;;óes e Culluras,realizado de 9 a 12 de julho de 2002, na cidade de Goiás, pelas universidades Federal e Estadualde Goiás, As possibilidades de pesquisa com história oral, arroladas aqui em nove itens, foram emparte desenvolvidas no texto "História oral na Alemanha: semelhano;;as e dessemelhano;;as na
constituio;;ao de um mesmo campo", apresen lado no Grupo de Trabalho Hislória e Memó.-ia, noXX Enconlro Anual da Associac;ao Nacional de Pós-Graduao;;ao e Pesquisa em Ciencias Sociais(ANPOCS), realizado de 22 a 26 deoutubro de 1996, em Caxambu (MG). Posteriormente, foram
apresentadas aos alunos do seminário "Arquivos e tradio;;óes orais", patrocinado pela Divisao de
Infomuo;;ao e de Informática da Uncsco, no ambilo do projeto "Reforo;;odas estruluras arquivísticas
nos paises lusófonos de África", ministrado por mim no Arquivo Histórico Nacional da Repúblicade Cabo Verde, na cidade de Praia, de 18 a 21 de novembro de 1996, e aos alunos do curso
"Fontes da história: prodUf;:ao e organizao;;ao de documentos", ministrado pelo CPDOC naFundao;;ao Getulio Vargas de outubro a dezembro de 1996. Finalmente, urna versao resumida
deste capítulo foi apresenlada na mesa-redonda "História oral: questóes teórico-metodológicas",no IV Encontro de História Oral do Nordeste "Espao;;o, Memória e Narrativa", realizado na
Universidade Federal de Campina Grande, Paraiba, de 23 a 26 de setembro de 2003.
Em muitos casos, a entrevista de história oral nos acena com a
chance, ou ilusao, de suspendermos, um pouco que seja, a impossibi-lidade de assistir a um filme contínuo do passado. Quando isso acon-
tece é porque nela encontramos a "vivacidade" do passado, a possibi-
lidade de revive-lo peJa experiencia do entrevistado. Nao é a toa que aisso muitos dao o no me de história (ou memória) "viva".
Mas concordamos todos que a impossibilidade de restabelecer
o vivido é coisa dada. Nao existe filme sem cortes, edir;6es, mudan~as
de cenário. Como em Um filme, a entrevista nos revela pedar;os do
passado, encadeados em um sentido no momento em que sao conta-
dos e em que perguntamos a respeito. Através desses pedar;os ternos a
sensar;ao de que o passado está presente. A memória, já se disse, é apresenr;a do passado.1
Em texto anterior, identifiquei essacombinar;ao entre, de um lado,a ilusao de restabelecimento do vivido e, de outro, o trabalho da memó-
ria em dar sentido ao passado como peculiaridade 'da história oral:
I Rousso, 1996, p. 94.
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o lugar da histÓII.10,,,1 1I
Mas acreditamos que a principal característica do documento
de história oral nao consiste no ineditismo de alguma informa-
~ao, nem tampouco no preenchimento de lacunas de que se
ressentemosarquivos de documentos escritos ou iconográficos,
por exemplo. Sua peculiaridade - ea da história oral como um
todo - decorre de toda urna postura com rela~ao a história e as
configura~oes sócio-culturais, que privilegia a recupera¡;:iiodo
vivido conforme concebidopor quemviveu.2
Ao combinar "vivido" e "concebido" tinha entao em mente duas
formas de apreensao do real que, segundo alguns autores, sao centrais
em nossa rela~ao com o mundo. "Concebemos" o mundo sempre de
modo descontínuo, agrupando e relacionando conceitas, justapondo
contradir;oes e procurando resol ve-las em sínteses. É o que o antropó-
logo Claude Lévi-Strauss chama de eixo "metafórico" de elaborar;ao
do real, especificamente aquele no qual operam os mitos. Dele nos
valemos em toda atividade do pensamento - seja o pensamento "sel-
vagem", seja o científico. Já o eixo contínuo de elaborar;ao do real
consiste num esforr;o de divisao infinitesimal da totalidade em partes,
como no caso da repetir;ao obstinada de gestos e palavras em um ri-
tUal. Esse eixo "metonímico", próprio do rito, segundo Lévi-Strauss,
procura recuperar a continuidade rompida pelo pensamento, refazen-do as pequenas unidades constitutivas do "vivido". Ainda que indis-
pensáve1 para a apreensao do real, esse esfor~o metonímico jamais
chega a seu termo; de acordo com Lévi-Strauss, ele está fadado ao fra-
casso - daí a rnistura de obstinar;ao e impotencia que o caracteriza.3
A identificar;ao dessasformas de eIaborar;aodo real pode ajud;tra compreender o fascínio da história oral. Repetir;oes e detalhes quefuncionam como divisoes infinitesimais em urna entrevista podem serparte do esforr;o obstinado e ao mesmo tempo impotente de refazer o
percurso do vivido. Por momentos podemos ter a impressao de que é
possível abolir as descontinuidades com o passado. Ao mesmo tempo,sabemos que o passado só "retorna" através de trabalhos de síntese damemória: só é possível recuperar o vivido pelo viés do concebido. É
claro que a história oral nao é a única manifestar;ao em que se combi-nam desse modo o contínuo e o descontínuo, mas, como já havia assi-nalado no texto citado, ela se ajusta a toda Urnapostura que valorizatal combinar;ao.
Passemos agora a dois paradigmas de nossa cultura nos quais ahistória oral encontra sustentar;ao, tao "infiltrados" em nosso modode ver o mundo que nem nos damos conta de sua existencia: o modode pensar hermeneutico e a idéia do indivíduo enquanto valor.
Hermeneutica:"compreenderé reencontrarOeu no tu"
A palavra "hermeneutica" designa um conjunto bastante diver-
sificado de questoes. Etimologicamente, remonta ao deus gregoHermes, representado com asas nos calcanhares, mensageiro entre osdeuses e os homens, mas também deus dos ladroes e das estradas.
Durante muito tempo, hermeneulica consistiu no esfon;o de interpre-tar;ao de textos - principalmente religiosos - e na definir;ao de regrasa serem seguidas para sua correta compreensao. Mais tarde, passou adesignar também urna pOstura filosófica. Importante, dentro desse
universo, é a nor;ao de círculo hermeneutico: a idéia de que o todofornece sentido as partes e vice-versa. Por exemplo: no processo decompreensao de urn texto, a palavra ganha sentido na frase, ao mesrnotempo em que a frase ganha sentido com as palavras.
Nas ciencias humanas, a hermeneutica passou a ter importan-cia a partir do final do século XIX, quando Wilhe)~n Dilthey 0833-1911), urn dos principais responsáveis pelo surgimento das ciencias
I1Ymanascomo universo distinto das ciencias naturais, a e1egeucomofundamento daquelas. Para Dilthey, as ciencias naturais tinham como
2 Albeni, 1990, p. s; grifado no original. A fórmula do "vivido conforme concebido por quem
viveu" já fazia pane do texto que apresentei no VI Encontro Estadual de História da ANPUH, emBelo Horizonte, em julho de 1988.
3Lévi-Strauss, 1971. Antes de Lévi-Strauss, Schopenhauer identificou duas formas de representa-910 pelas quais o sujeito apreende o mundo: a representa\;ao intuitiva, também chamada de
concreta, e a representar;ao abstrata, também denominada .pensado" (Gedachten). Nao sáo o
mesmo que o vivido e o pensado de Lévi-Strauss (ambas parecem ser da ordem do pensado), massua caracteriza9l0 é muito semelhante: de acordo com Schopenhauer, os conceitos da represen-
ta9l0 abstrata sáo como pequenas pe\;as de mosaico, que, por mais precisas e pequenas, nunca se
ajustarao á realidad e - ou seja, o pensado opera por descontinuidades. Já a representa\;aoconcreta assemelha-se a urna pintura (continua, portanto, em relar;ao ao que é representado)(Schopenhauer, 1818 e 1844).
o lugar da hi\\tJlloI("..1 ,q
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fundamento a explicac;ao, enquanto as ciencias humanas se baseavam
na compreensao. Dilthey teve influencia decisiva nas formas de estUdar
o passado que relacionam temas e acontecimentos as condil;óes histó-ricas de seu aparecimentO e desenvolvimento. Para compreender o
homem, dizia, é necessário compreender sua historicidade - noc,;ao es-
tranha as categorias estáticas das ciencias naturais. O modo de pensar
hermeneutico, que nao se resume obviamente a filosofia de Dilthey,
consiste em valorizar o movimentO de se colocar no lugar do outro
para compreende-Io e em acreditar que as coisas (o passado, os 50-nhos, os textoS, por exemplo) tem um sentido latente, ou profundo, a
que se chega pela interpretac;ao.4Vm dos pontos de contatO mais claros enrre hermeneutica e
história oral é a categoria da vivéncia - para Dilthey, a menor unidade
das ciencias humanas, que sao epistemologicamente atreladas a vida.
A vivencia concreta, histórica e viva é o próprio ato, nao algo de que
estejamos conscientes - da deixa de ser vivencia quando observada,
porque a observac;ao atrapalha o fluir da vida Cao tOmar consciencia,fixamos o momentO e o que era continuo se tOrna estático). Essa me-
nor unidade é um dos termos da fórmula que, segundo Dilthey, torna
acessiveis os objetos das ciencias humanas: vivencia-expressao-com-
preensao. As produc,;óes humanas exprimem a vivencia e cabe aOhermeneuta compreender essas expressóes, de tal forma que a compre-
ensao seja o mesmo que lornar a vivenciar. "Compreender", diz Dilthey,
"é reencontrar o eu no tU."5 É alargar nosSOS horizontes em relac,;ao as
possibilidades de vida humana, é vivenciar outras existencias. E ele dáum exemplo, o de vivenciar o religioso: "Posso nao ter, durante minhaexistencia, a possibilidade de experimentar o religioso. Mas, a medida
que \eio as cartas e os escritos de Lutero e de seus contemporaneos,vivencio o religioso com urna energia e for<;a tais que hoje em dia
seriam impossiveis.,,6
Ora, podemos dizer que a postura envolvida com a história
oral é genuinamente hermeneutica: o que fascina numa entrevista é
a possibilidade de tornar a vivenciar as experiencias do outro, a
que se tem acesso sabendo compreeender as express6es de sua
vivencia. Saber compreender significa realizar um verdadeiro tra-
balho de hermeneuta, de interpretac,;ao. No caso de textos antigos,esse trabalho requer um estudo histórico e gramatical prévio, que
nos coloque na posic,;ao de um leitor da época. No caso de entrevis-
tas de história oral, ele também requer urna preparac,;ao criteriosa,
que nos transforme em interlocutores a altura de nossos entrevis-
tados, capazes de entender suas expressóes de vida e de acompa-nhar seus relatos.
Mas, como no caso do filme, o tornar a vivenciar a experien-
cia do outro nunca será completo. A compreensao é um processo deelevado esforc,;ointelectual que jamais chega ao fim, diz Dilthey. Ocor-
re o mesmo que na leitura de um romance: as cenas que já li escure-
cem, o passado perde a clarcza e a definic;ao. Quando retenho o en-
redo, só me resta urna visao geral das cenas. E assim se passa com acompreensao da vida: a hermeneutica nunca produz a certezademons trável.
Observe-se que esse "jamais chegar ao [¡m" a que está fadada a
compreensao também está na base do fascínio da história oral. Como
nenhuma interpretac,;ao é completa, haverá sempre espa<;o para no-
vas possibilidades, que, novamente, nao darao conta da totalidade, e
assim por diante. Mas se tomannos esse infinito de possibilidades ao
pé da letra, corremos o risco de cair em um relativismo exacerbado,
que confere validade a toda sorte de interpretac;6es: tudo se torna
possível, já que nao há certeza demonstrável. Essa espécie de verti-
gem pode chegar ao ponto de isentar o pesquisador de todo esforc;o
hermeneutico: sob a alegac;ao de que toda interpretac,;ao é apenas
urna possibilidade, basta colher e divulgar as express6es do vivido(isto é, as próprias entrevistas). Creio, contudo, que as entrevistas
tem valor de documento, e sua interpretac;ao tem a func,;aode desco-
brir o que documentam.7
'\ Ver, a respeilO da.hermeneutica e de Dilthey, Alberti, 1996.5 "Entwürfe zur Kritik der hislOrischen Vemunft" ("Esbo~os para a crítica da razáo histórica"),
Dilthey, 1959-1962, v. VII, p. 191.6lbíd., p. 214.
LA.respeito do valor de documento das entrevistas de história oral, ver os capítUlos seguíntesdestelivro. Sobre os riscos de UI11relativismo exacerbado na hermeneutica, ver Alberti. 1996.
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o indivíduocomovalor
o segundo paradigma claramente "infiltrado" na história oral, a
idéia do indivíduo como valor, também está relacionado a compreen-
sao hermeneutica. Quando Dilthey afirma que compreender é tOrnara vivenciar, é claro que pressupóe o indivíduo como locusdas vivencias(as originais e as depois compreendidas) - de outrO modo parece difí-cil "reencontrar o eu no tU". Esse indivíduo, assim como a hermeneuticacomo modo de pensar, é específico a cultura ocidental moderna. To-mar o indivíduo como valor nao é apenas considerá-Io urna entidadevalorizada em nossa cultura "individualista". É considerar que, em urnaordem hierárquica, ele é o termo superior a englobar o(s) inferior(es),
possuindo, portanto, urna capacidade de totaliza,ao. Como a culturaocidental é LUdomenos hierárquica, pois, na racionalidade moderna,
o que se pressupóe é a igualdade, ao invés da hierarquia, dá-se com oindivíduo moderno um interessante paradoxo: ele já nasceu como va-
lor englobante, apesar de firmado na igualdade; como totalizador, ape-sar de nivelado e fragmentado. Dito de outra forma: a cren~a no indi-víduo autónomo e igual perante os outros, que é também o indivíduo
único e singular, o ser psicológico, dá sentido a urna série de concep-
~óes e práticas em nosSO mundo. Basta ver que, em outras culturas,
igualdade, liberdade, singularidade psicológica etc. nao dao sentido a
práticas e modos de ser, para reconhecer que esse indivíduo é umvalor em nossa cultura, nao tendo nada que ver com urna suposta"natureza humana".8
É conhecido o alerta de Pierre Bourdieu para o fato de a indivi-
dualidade ser, na verdade, urna "formidável abstra~ao", que construí-
mos para nos afastar da fragmenta~ao do eu. O nome próprio, a assi-natura e a individualidade biológica provocam aquilo que Bourdieuchama de "ilusao biográfica", a ilusao de urna identidade coerente e
específica, embutida na idéia de vida como estrada, que segue urnaordem cronológica (com urna lógica prospectiva e retrospectiva) eobedece ao postUlado do sentido da existencia?
8 Sobre essa discussao, ver Duarle, 1983; Dumonl, 1966 e 1983; e Castro &: Araújo, 1977.9 Ver Bourdieu, 1996.
o lugar da históri,j (", d
Nao é difícil perceber como a história oral está ligada a e~~,'paradigma. Muitos autores atribuem a ela urna capacidad e d"totaliza~ao, principalmente quando confrontada com a fragmenta<;Ü(1de documentos escritos. Urna entrevista de história oral teria a van la-
gem de falar, de saída, sobre o passado, interpretando-o logo em den-sidade. lsso pode ser visto, como efetivamente o é por alguns autores,como um paradoxo: quanto mais moderna é a sociedade, quanLO maisrápida e fragmentada é a comunica~ao, tanto mais precisamos, paraen ten de-la, de formas "tradicionais" de explica~ao, isto é, narrativasorais, transmitidas de gera~óes mais velhas para mais novas, de modoa conservar a "identidade" e a construir os significados da sociedade.
Há um detalhe crucial, porém: o fato de o sentido e a identidadeem sociedades modernas pressuporem o indivíduo como ancora e ele-mento constitUtivo. Ao tempo indistinto, linear e racional do mundomoderno contrapóe-se a densidade de significados da biografia, capazde sintetizar os significados do passado.1O Se a história oral represen-ta urna op~ao totalizadora frente a fragmenla~ao de documentos es-critos é porque ela está cenlrada no individuo, que funciona, em nossacultura, como compensa~ao lotalizadora a segmenla~ao e aonivelamento em todos os dominios.
},
Práticas e valores muito "infiltrados" em nosso modo de ver o
mundo correm o risco de parecer coisa dada, verdades absolutas, co-muns a todas as culturas. É o que acontece com os dois paradigmasaqui destacados, O modo de pensar hermeneutico, que privilegia a
interpreta,ao do mundo com vistas a busca de um sentido profundodas coisas, inclusive da história e das biografias, é lao difundido - nos
livros, nos filmes, nos meios de comunica<;ao, na academia, nas lera-
pias etc. - que mal podemos imaginar que possa haver oulras possibi-lidades. O mesmo se pass a com o indivíduo como valor. Ambos saototalizadores, fixam sínteses e sentidos.
10Arespeilo desse papel central da biograna cm rela~aoa própria hislória, cscreveu Luiz í-emando"1Juarle: "A vida de cada sujeilo passa a ser medida na linha da flecha 1do lempo linear] e passa a
eonsliluir um microtempo fundamentaL.. a Hislória" (Duarlc, 1983, p. 37).
22 Ouvir contaro Jugar da história or,,1 / I
o campo da história oral é acentuadamente totalizador; entre-vistado e entrevistadores trabalham conscientemente na elaborac;ao
de projetos de significac;ao do passado. II O esforc,;o é muito mais
construtivista do que desconstrutivista (inúmeras vezes ouvimos, com
efeito, que o entrevistado "constrói o passado"), e tem como base a
experiencia concreta, histórica e viva, que, grac;as a compreensao
hermeneutica, é transformada em expressao do humano. É importan-
te ter consciencia dessa "vocac;ao totalizan te" da história oral, em um
mundo em que a fragmentac;ao e a dissipac;ao de significados, o desa-
parecimento do sujeito e o privilégio da superficie (em detrimento da
profundidade) também estao na ordem do dia.12
Possibilidadesde pesquisa
Mas em que medida a experiencia individual pode ser represen-tativa? Até que pontO urna história de vida fornece informac,;óes sobre
a história da sociedade? Autores que defendem o uso da biografia noestudo da história consideram que as biografias de indivíduos comuns
concentram todas as características do grupo. Elas mostram o que é
estrutural e estatisticamente próprio ao grupo e ilustram formas típi-cas de comportamento. Mesmo urna biografia excepcional é capaz delanc;ar luz sobre contextos e possibilidades latentes da cultura - como
é o caso de Menocchio, o moleiro do livro O queijo e os vermes, de
Carlo Ginzburg. Como o próprio Ginzburg chamou a atenc;ao, a
excepcionalidade de Menocchio permite deduzir, "em negativo", o queseria mais freqüente.13
Biografias, histórias de vida, entrevistas de história oral, docu-
mentos pessoais, ennm, mostram o que é potencialmente possível em
determinada sociedade ou grupo, sem esgotar, evidentemente, todas
as possibilidades sociais. Mas o que faz um pesquisador procurar umindivíduo que tenha sido ator ou testemunha de determinado aconte-
cimento ou conjunLUra para fazer dele um entrevistado? Com certeza
a busca de alguma informac;ao e de algum conhecimento que aquele
indivíduo detém, e que o próprio pesquisador - mesmo que muito
bem informado e preparado - nao detém. Se nao, é evidente que naohaveria necessidade de se despender tempo e verbas na realizac;ao de
urna entrevista. Só convém recorrer a metodologia de história oral
quando os resultados puderem efetivamente responder a nossas per-guntas e quando nao houver outras fontes disponíveis - mesmo entre-vistas já realizadas - capazes de faze-Io.
E que tipo de informac;ao ou conhccimcnto sao esses que se
procuram em urna entrevista? Qual sua especifjcidade? Sem preten-der esgotar o rol, vejamos alguns campos de pesquisa em que a histó-.
l d . .1l4na ora po e ser Ul1 .
1. Histó,-ia do coudíano. Urna entrevista de história oral permitereconstituir decursos cotidianos, que geralmente nao esta o
registrados em outro tipo de [onte. O historiador Lutz Niethammer
Reconheceros paradigmas que estaona basedo sucessoda his-tória oral nao implica renunciar a sua capacidadede ampliar o conhe-
cimento sobre o passado.Ao comrário, saberem que lugar nos sitUa-mos ao trabalhar com determinada metodologia ajuda a melhor apro-
veitar seu potencial. A idéia de fundo aqui é: história oral nao é solu-c;ao para tudo; convém ter claro onde ela pode ser útil e delimitar
sobre o que vale a pena perguntar.
Urna das principais vantagens da história oral deriva justamente
do fascínio do vivido. A experiencia histórica do entrevistado torna o
passado mais concreto, sendo, por isso, atraente na divulgac;ao do
conhecimento. Quando bem aproveitada, a história oral tem, pois, um
elevado potencial de ensinamento do passado, porque fascina com a
experiencia do oUtro. Essemérito reforc;aa responsabilidade e o rigorde quem colhe, interpreta e divulga entrevistas.
11Nesse contexto, é bastante útil a nocao de projeto desenvolvida por Gilberto Velho como sendourna elaboracao conscienle e urna tentativa de dar sentido a experiencia fragmentada (Velho.1981).
12Aqui penso especificamente em movimentos opostos aos do paradigma hermeneutico que
surgiram a partir de fins do século XtX e mais acentuadamente no século XX,as vezes chamadosde "pós-modernos", e que lem em autores como Friedrich NielZsche, jacques Derrida, leanFrancois Lyotard, entre outros, seus expoentes.
13Levi, 1996.
H Sobre os campos e lemas que vem sendo estudadosa luz da história oral, ver tambémjanoni& Rosa, 1992/1993; Ferreira, 1994;joulard, 1996; e Alberti, 1997.
o lugar da história or,¡I ) '.
24 Ouvir contar
(1985) faz a esse respeito algumas observar,;oes interessantes. Em
primeiro lugar, reconstituir o cotidiano nao é muito fácil, diz ele,porque geralmente as pessoas se lembram mais das ar,;oesnao mui-to óbvias ou evidentes, que, por isso mesmo, ficam na lembranr,;a.Desse modo, ao solicitarmos do entrevistado que reconstitua seucotidiano, há o risco de o resultado acabar sendo determinado pe-
las perguntas, que só conseguem trazer a lembranr,;a alguns aspec-tos da vida diária. Além disso, é preciso ter claro que a descrir,;aodo cotidiano sempre vem acompanhada de certa nostalgia, mistu-rada a sentimentos de pesar ou de alívio, que acabam marcando o
sentido da narrativa. Mas é possivel a um bom entrevistador obter
descrir,;oes precisas de rotinas. De um lado, porque elas estao con-solidadas na memória do entrevistado, que precisava dominá-Ias
para viver e trabalhar. De outro, porque elas geralmente sao infor-mar,;oes "inofensivas" que nunca precisaram ser interpretadas oureavaliadas ao longo da vida, ao contrário dos valores ou das expe-
riencias problemáticas - e é por essa razao que muitas vezes oentrevistado nao entende o sentido de perguntas sobre o cotidiano,
assunto por demais trivial e sem ligar,;aocom o sentido da históriade vida.15 A meu ver, algumas perguntas sobre o cotidiano sao in-
teressantes, para situarmos o entrevistado e seu passado. Pergun-tas exaustivas e detalhadas, no entanto, só deveriam ser feitas seisso realmente for importante para os propósitos da pesquisa, poisa entrevista acaba se tornando muito longa. Sugestoes de pergun-
tas sobre o cotidiano podem ser encontradas no apendice do livro
A voz:do passado, de Paul Thompson, que abrange assuntos comocasa, familia, rotina doméstica, refeir,;oes,relar,;aocom os pais, lazer,escola e vida profissional.16
2. História política. A metodologia de história oral é especialmenteindicada para o estudo da história política, entendida nao comohistória dos "grandes homens" e "grandes feitos", e sim como estu-do das diferentes formas de articular,;ao de atores e grupos, trazen-
do a luz a importancia das ar,;óes dos individuos e de suas estraté-
gias. Através de entrevistas de história oral, é possivel reconstituir
redes de relar,;ao, formas de socializar,;ao e canais de ingresso nacarreira, bem como investigar estilos politicos específicos a indivi-
duos e grupos Y3. Padroes de socialíz:a¡;lio e de trajetórias. Entrevistas de história oral
permitem o estudo de padroes de socializar,;ao e de trajetórias deindividuos e grupos pertencentes a diferentes camadas sociais, ge-
rar,;óes, sexos, profissóes, religioes etc.184. História de comunidades.A história oral pode ser utilizada como
metodologia de pesquisa para a reconstituir,;ao de trajetórias de co-munidades específicas, como as de bairro, as imigrantes, as campo-
nesas etc. Ela pode auxiliar também na investigar,;ao de genealogiasde determinadas familias dessas comunidades.
5. História de institui¡;oes. A metodologia de história oral pode serempregada no estudo da história de instituir,;oes do Estado, de or-
ganismos públicos e de empresas privadas. Nesse universo, ela per-mite a reconstrur,;ao de organogramas administrativos, o esclareci-mento de funr,;oes de diferentes órgaos, a recuperar,;ao de processosde tomada de decisao e investigar,;oessobre o esprit de corps dosfuncionários e sobre as relar,;oes entre diferentes gerar,;óes de traba-
Ihadores.19 As entrevistas podem também ajudar a esclarecer o
conteúdo, a organizar,;ao e as lacunas de arquivos existentes nasinstituir,;óes.20
6. Biografias. A história oral pode auxiliar na reconstituir,;ao de traje-
tórias de vida de pessoas cuja biografia se deseja estudar.
7. Históriade experiencias.Entrevistas de história oral podem ser usa-das no estudo da forma como pessoas ou grupos efetuaram e elabo-
raram experiencias, incluindo situar,;óes de aprendizado e decisoesestratégicas. Essa nor,;ao é particularmente desenvolvida em texlOS
alemaes, onde recebe o no me de Erfahrungsgeschichte ("história deexperiencia"), e aparece em combinar,;ao com a idéia de mudanr,;ade perspectiva (perspehtivenwechsel). Em linhas gerais, essas no-
15Nielhammer, 1985, p. 423-55. Zimmermann, 1992, lambém deslaca a reconslru~o de decur-50S cotidianos como parle das pOlencialidades da hiSlória oral.
16Thompson, 1992, p. 367-378.
17Veja-se, a esse respeilo, Camargo, 1994; e Ferreira, 1994.18Ver Zimmermann, 1992.~ Ver Ferreira, 1994.20 Tourlier-Bonazzi, 1996, p. 244.
26 Ouvir contaro lugar da histón,¡ 01," JI
.'~:
c;óes significam o seguinte: entender como pessoas e grupos expe-rimentaram o passado torna possÍvel questionar interpretac;óes
generalizantes de determinados acontecimentos e conjunturas. UmestUdo de história oral sobre urna organizac;ao anarco-sindicalista
durante a guerra civil espanhola, por exemplo, desmistificou a idéia
antes predominante de autogestao operária, revelando clivagensinternas num período em que se supunha prevalecer a colabora-c;ao.21 E, na Alemanha, urna entrevista com um trabalhador que
ingressou no Partido Comunista Alemao nos anos 1920 revelou
que explicac;oes generalizantes dadas a influencia comunista sobreos trabalhadores da República de Weimar, corno a situac;ao do pro-letariado ou a influencia do aparelho partidário, podem nem sem-
pre corresponder as situac;oes específicas. A história desse entre-vistado mostra que, no processo de decisao que o levou a ingressar
no partido, importaram o exemplo do irmao mais velho e urna
posic;ao crítica com relac;ao ao catolicismo, em especial com rela-c;ao a determinado padre. Essa "história de experiencia" é, para
Niethammer, urna possibilidade de nos aproximarmos empirica-mente de algo como o "significado da história dentro da história" e
permite, de acordo com Zimmermann, questionar criticamente a
aplicac;ao de teorias macrossociológicas sobre o passado.22 A ca-pacidade de a entrevista contradizer generalizac;oes sobre o passa-
do amplia, pois, a percepc;ao histórica - isto é, permite a "mudanc;a
de perspectiva".
8. Registro de tradi(oes culturais. Entrevistas de história oral transmi-tem tradil;oes culturais, que vao surgindo a medida que o entrevis-tado delas se lembra: histórias, canc;oes, poemas, provérbios, mo-
dos de falar de um grupo, reminiscencias sobre antepassados e so-
bre territórios, informac;oes transmitidas de gerac;ao em gerac;ao
ou dentro de um mesmo grupo profissional etc. Há autores quefazem urna clara distinc;ao entre tradi<;:ao oral e história oral. A
primeira incluiria narrativas sobre o passado universalmente co-nhecidas em urna cultura, enquanto o testemunho ou a entrevista
de história oral se caracterizaria por versoes que nao sao ampla-mente conhecidas.23 Essa distinc;ao pressupoe, contudo, que a tra-
dic;ao oral seja imutável; ela nao considera que mesmo o passado"universalmente" conhecido é continuamente acumulado e disse-
cado. Assim, há todo um conjunto de pesquisadores que chama aatenc;ao para o fato de a tradi<;:aooral só se atualizar no momento
mesmo da narrativa, momento que determina, em grande parte,para que e como algo é narrado.24 Desse ponto de vista, tradic;aooral e história oral tem bastante proximidade, principalmente setomarmos as entrevistas como ac;óes (ou narra(oes), e nao somen-te como relatos do passado.
9. Históriade memórias.A metodologia de história oral é bastante ade-
quada para o estudo da história de memórias, isto é, de representa-<;:óesdo passado. Estudar essa história é estudar o trabalho de cons-
tiluic;ao e de formalizac;ao das memórias, continuamente negocia-das. A constituic;ao da memória é importante porque está atreladaa constrw;ao da identidade. Como assinala Michael Pollak, a me-
mória resiste a alteridade e a mudanc;a e é essencial na percepr;aode si e dos outros. Ela é resultado de um trabalho de organizac;ao ede selec;ao daquilo que é importante para o sentimento de unidade,
de continuidade e de coerencia - isto é, de identidade.25 E porquea memória é mutante, é possível falar de urna história das memó-rias de pessoas ou grupos, passível de ser estudada através de en-
trevistas de história oral. Observe-se que estudar a constituic;ao de
memórias nao é o mesmo que construir memórias. Muitos pesqui-sadores que trabalham com história oral acham-se imbuídos da
missao de construir memórias, sem atentar para o próprio proces-so de sua constitui<;:ao,que muitas vezes oferece material riquíssimode análise.26
21Ver Garrido, 1992/1993, p. 40-41.22Niethammer, 1985; e Zimmermann, 1992.
23 Essa é, por exemplo, a opiniao de David Henige, resumida e comentada por Cohen, 1989.24 Essa posi{:ao é defendida por Cohen, 1989; e Cruikshank, 1996. Sobre o tema, ver tambémTonkin, 1992.
25 Ver Pollak, 1989 e 1992.
26Ver, por exemplo, a análise de Alessandro Portelli sobre a história da memória de um massacre
.-"corrido em 1944 na Itália (PorteIli, 1996). Sobre a história de memórias, ver ainda Rousso,1996 e 1997. E sobre questóes relativas ao processo de constituÍl;:ao de memórias, ver o capítu-lo 2 deste livro.
...
28 Ouvir contar o lugar da história oral l')
Vale lembrar que as possibilidades de uso da história oral vaoalém das atividades de pesquisa e documenta~ao no ambito das cien-cias humanas. No ensino de história, por exemplo, alguns recursos
oferecidos pela história oral podem ser úteis: urna entrevista pode tor-nar o aprendizado mais fácil, porque trata de experiencias concretas,narradas de forma direta e coloquial, e os alunos também podem fazerentrevistas sobre as histórias da comunidade e das famílias. Além de
passar a conhecer essas histórias, o estudante desenvolve várias habi-lidades: o planejamento do trabalho, a prática de pesquisa e a capaci-dade de falar com pessoas desconhecidas.27 Entrevistas de históriaoral podem ser usadas com sucesso também em exposi¡;:óes, progra-mas de vídeo e em outros recursos de multimídia, como forma de
apresentar experiencias concretas sobre determinados acontecimen-tos e conjunturas.
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