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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
POSSIBILIDADES PEDAGÓGICAS DIALÓGICAS NAS PRÁTICAS DE ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA E AFRICANA
BRAGA, Rose Mary de Oliveira Pacenko1 RAMOS, Odinei Fabiano. (ORIENTADOR)2
RESUMO O artigo que se apresenta, é resultado de uma pesquisa-ação pertinente à História e Cultura Africana e Afro-brasileira, implementada com educandos de 7° (sétimo) ano do Ensino Fundamental, do Colégio Estadual Prefeito Joaquim da Silva Mafra, Guaratuba, Paraná, no ano de 2014. No primeiro momento houve a reflexão teórica quanto a questão curricular e mudanças desencadeadas pela Lei 11.645/março de 2008, como também a questão da transposição didática do conteúdo relacionado, principalmente em práticas de ensino de história e conscientização. Diante desse contexto, surgiram algumas indagações, como complementar os conteúdos dos livros didáticos com práticas de ensino metodológicas que venham a favorecer a valorização da importância da cultura africana na cultura brasileira, incorporando outras fontes de informações? Em sequência, foi elaborado uma unidade didática com atividades referentes à História e Cultura Africana e Afro-brasileira, para serem trabalhadas paralelamente ao conteúdo trazido no livro didático de história do sétimo ano. Através dessa unidade, possibilitou-se práticas de ensino diferenciadas que ultrapassavam a visão da vinda do negro escravizado, perpassando a história do seu continente, suas relações com o mundo no passado e no presente, até o estabelecimento de relações pessoais mais positivas no sentido de respeito, fortalecimento de identidades, reconhecimento da importância da cultura africana e afro-brasileira na formação cultural brasileira, entre outras questões importantes para a formação crítica do educando na contemporaneidade. Assim, a sequência didática propôs atividades dialógicas com diferentes linguagens, estimulando o desenvolvimento social e compreensão da importância da Cultura Afro-brasileira na constituição da sociedade como um todo. PALAVRAS-CHAVE: História. Cultura Afro-brasileira. Livro didático. Atividades diferenciadas.
1 INTRODUÇÃO
Com a promulgação da Lei nº 9.394/96; modificada pela Lei 10.639/03;
alterada por sua vez, pela Lei 11.645/março de 2008, a inclusão do tema História e
Cultura Afro-brasileira e Africana nos currículos das escolas se tornou um
direcionamento significativo, para o reconhecimento da influência dessa cultura no
Brasil. Dessa forma, a Lei 10.639/03 alterou a LDB, incluindo no currículo oficial da
rede de ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira",
seguidamente em 2008, com a Lei 11.645, acrescentou-se no currículo oficial a
obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”.
1 Professora da rede estadual de ensino do Paraná, graduação em História pela FAFIPAR e
especialista em Distúrbios de Aprendizagem pela FAFIPAR ([email protected]). 2 Professor Adjunto da UNESPAR – campus Paranaguá. Doutor em História pela UNESP – Franca.
No entanto, somente a inclusão nos Projetos Políticos Pedagógicos não
garante que as práticas de ensino têm sido efetivas e significativas, pois não basta
estar no papel com propostas a serem trabalhadas, com práticas metodológicas
apenas em datas especiais, ou semanas específicas para refletir sobre tal cultura.
Os conteúdos propostos pelos documentos legais necessitam de um trabalho mais
contextualizado e, principalmente, há uma necessidade de material de apoio nos
livros didáticos de História, como também um trabalho interdisciplinar. Só assim,
serão amenizados e modificados hábitos viciosos que levam à prática cotidiana do
racismo.
Uma vez que, o conteúdo História e Cultura Afro-brasileira e africana foi
abordado nos livros didáticos ao longo das últimas décadas de maneira superficial,
restrito apenas a condições que estimulavam ainda mais o racismo, deixando de
lado a valorização da importância da cultura afro-brasileira e africana. Segundo Oliva
(2003, p. 429) “Silêncio, desconhecimento e representações eurocêntricas (...)” são
palavras que definem a utilização da História da África nas coleções didáticas de
História no Brasil.
O trabalho com a Cultura Afro-brasileira e Africana é complexo, por uma
infinidade de fatores advindos não somente do contexto escolar. Dentre as
problemáticas relacionadas à efetivação desse trabalho, destacam-se os livros
didáticos de história que após a promulgação das leis passaram a dar maior
importância, onde se tem uma melhor abordagem da história e cultura afro-brasileira
e africana com textos, imagens, mapas, obras de arte e literatura, entre outras
explorações dos diferentes subtemas e linguagens relacionados.
Percebe-se que essa nova abordagem distancia-se de como eram
trabalhados os conteúdos de História da África, que se voltavam à escravidão ou
tráfico de negros, a questão entre trabalhos braçais (para os negros) e trabalhos
intelectuais (destinados aos brancos). Dessa forma, alguns livros, já estão
enquadrados com a nova perspectiva de ensino e conforme os ditames da Lei
11.645/08, entretanto, considera-se que ainda há pouco material de apoio para o
professor e para o educando.
Diante dessa constatação, a pesquisa objetivou trabalhar práticas de ensino
que venham a complementar os textos dos livros didáticos sobre a História e Cultura
Afro-brasileira e Africana com aspectos relacionados à realidade contemporânea da
população negra no Brasil com o intuito de resgatar a cidadania.
Como objetivos específicos, ateve-se em proporcionar conteúdos voltados à
história, cultura e aspectos relacionados à realidade da população negra no Brasil,
complementando os textos do livro didático que contribuem para a construção de
uma sociedade livre de preconceito étnico-racial; por fim, possibilitar práticas de
ensino diferenciadas indo além da vinda do negro escravizado e perpassando a
história do seu continente, valorizando o conhecimento histórico, a valorização de
tal cultura e a conscientização da importância da cultura africana e afro-brasileira na
formação cultural brasileira.
Para uma melhor apresentação desse artigo, inicialmente é apresentada a
fundamentação teórica, a respeito da Lei, entre outras particularidades que norteiam
o currículo das escolas estaduais do Paraná. Em seguida, há apontamentos que
esclarecem sobre a metodologia seguida para desenvolver o trabalho, a pesquisa-
ação e suas particularidades, por fim são discutidos os resultados da implementação
das atividades da unidade didática.
2 DETALHAMENTO DAS AÇÕES
2.1 LEI 11.645/2008 NO CONTEXTO ESCOLAR: UM ESFORÇO COLETIVO
DERECONHECIMENTO, AMPLIAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO
Na história da Educação Brasileira, várias leis foram sancionadas, baseadas
na prevalência dos Direitos Humanos, sobretudo, na tolerância às diferenças e
repúdio a quaisquer formas de discriminação. Nesse contexto, tem-se em vigor no
que diz respeito ao ensino de história e cultura afro-brasileira, a Lei 11.645, de 10 de
março de 2008, que estabeleceu para as diretrizes e bases da educação nacional, a
inclusão no currículo oficial da rede de ensino da temática “História e Cultura Afro-
brasileira e Indígena”.
Para uma melhor especificação, cabe observar o que está prescrito em seu
art. 26-A, parágrafo 2º:
Os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira e dos povos indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de educação artística e literatura e histórias brasileiras (BRASIL, 2008).
Assim, entre os discursos implícitos que se obtém na interpretação desta lei,
observa-se uma reorganização de informações acrescentando conhecimentos que
por um bom tempo mantiveram-se encobertos.
Dessa forma, a efetivação da Lei 11.645 retomou reflexões que desbancaram
a centralidade da cultura hegemônica e europeia, da superioridade de povos e
culturas, ampliando espaços e sobretudo garantindo os direitos constitucionais:
“igualdade de direitos, oportunidades e possibilidades de concorrer pelos mesmos
espaços” (SANTOS, 2011, p. 5).
Na tentativa de se amenizar as desigualdades no contexto escolar, o estado
do Paraná, ateve-se em ações formativas e políticas afirmativas desenvolvidas pela
Secretaria Estadual de Educação do Paraná – SEED refletindo o compromisso de
ampliar e implementar o que está prescrito na Lei 11.645. Nesse processo de
implementação além da obrigatoriedade do Ensino da História e Cultura Afro-
brasileira e Indígena, encontram-se discussões pertinentes à Educação das
Relações Étnico-Raciais abordados em três momentos: Apontamentos sobre
Racismo, Discriminação e Preconceito no Brasil; Políticas Afirmativas e, finalmente,
Ações Formativas (SANTOS, 2011).
Uma questão importante iniciada com a Lei 10.639 de 9 de janeiro de 2003,
anterior à Lei que está em vigor, foi a criação do parecer intitulado de “Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o
Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana” em 2004, que veio regimentar
as alterações desencadeadas pela Lei, o mesmo sofreu algumas alterações como
alguns artigos a partir das reformulações em 2008.
O parecer procura oferecer uma resposta, entre outras, na área da
educação, à demanda da população afrodescendente, no sentido de políticas de
ações afirmativas de reconhecimento e valorização de sua história, cultura,
identidade (BRASIL, 2004).
Nesse repertório conflituoso de ampliação e implementação das referidas
Leis em estudo, deparou-se com a necessidade de capacitação dos educadores
para compreenderem as relações étnico-raciais no contexto histórico, e de criarem
estratégias pedagógicas adequadas no auxílio da reeducação, bem como prover as
escolas, professores e alunos, de material bibliográfico e outros materiais didáticos
necessários para a educação.
Nemi (2009) explica sobre a importância do ensino da história e cultura de
outros povos, e sua abordagem enquadra-se nas perspectivas do ensino de história
e cultura afro-brasileira e africana:
[...] promover o estudo da História e a compreensão da cultura de outros povos oferece acesso a um repertório de grande riqueza. Especificamente no que diz respeito à dinâmica da organização política, econômica e social, essa riqueza de repertório é de grande valia para a formação de jovens críticos e conscientes de seu papel como sujeitos participativos da sociedade contemporânea (NEMI, 2009, p. 5).
Destaca-se que a obrigatoriedade da inclusão da temática em estudo nos
currículos escolares da Educação Básica, reflete decisões políticas, com fortes
repercussões pedagógicas, inclusive na formação continuada de professores.
Lima (2006, p. 39) complementa a respeito, discutindo que a forma de
pensar o currículo no Brasil sempre revelou a trajetória de legitimação de uma
educação monocultural que ignorou as matrizes culturais dos povos africanos e
indígenas, cumprindo o papel da desvalorização e reprodução negativa dos seus
repertórios culturais.
Em uma pesquisa de campo na rede municipal de ensino de Campo Grande,
MS em 2011, sobre as dificuldades da implementação da Lei 11.645/08, Santos
(2011) constatou que realmente é necessário um esforço coletivo para que as
prescrições saiam dos documentos e superem a dicotomia teoria e prática. Uma vez
que, o referido autor abstraiu que as ações pedagógicas desenvolvidas são
fragmentadas, nem sempre há nexos entre objetivos propostos e metodologias
utilizadas.
Outro resultado silencioso desse processo de mudanças está na publicação
dos livros didáticos, o que para muitos autores já é reservado um capítulo inteiro
para o estudo da História da África, porém há muito o que se fazer, para que novas
práticas educativas possibilitem a exploração de temas como: preconceito,
discriminação, ética, valores, religiosidade entre outros.
2.2 LIVROS DIDÁTICOS DE HISTÓRIA E A SUPERFICIALIDADE DIANTE DA
HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA E AFRICANA
Conforme discutido no item anterior, as lacunas existentes em práticas
descontextualizadas quanto à questão multicultural só começaram a ser repensadas
por meio da LDB – Lei de Diretrizes e Bases Da Educação Brasileira, Lei 9.394/96,
quando destacava no 4° parágrafo do artigo 26: § 4º. O ensino da História do Brasil
levará em conta as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do
povo brasileiro, especialmente das matrizes indígena, africana e europeia (BRASIL,
1996).
Em seguida com a publicação dos 10 (dez) volumes dos PCN’s –
Parâmetros Curriculares Nacionais em 1997 houve uma atenção à temática
pluralidade cultural, numa tentativa de trazer para o contexto escolar, discussões
sobre as diferenças raciais e culturais (ALVES, 2007).
Sobre essas mudanças curriculares da década de 1990, Santos (2011)
discute:
Na década de 90 houve a submissão dos livros didáticos à avaliação, os Parâmetros Curriculares Nacionais trouxeram em seu bojo a inclusão de conteúdos sobre diversidade cultural e racial brasileira a partir dos temas transversais, dentre outras ações. Não obstante, inúmeras propostas foram introduzidas no Plano Nacional de Direitos Humanos visando a valorização da população negra e em 2001, com a III Conferência Mundial contra o Racismo, a Xenofobia e Formas Correlatas de Intolerância m Durban, África do Sul (SANTOS, 2011, p. 4).
Percebe-se com a citação anterior, algumas mudanças significativas, de
onde obteve-se uma constante conquista de conhecimentos por meio da educação
formal, cursos de pós-graduação entre outros fatores, que favoreceram na
construção de uma identidade “afro”, baseada não somente em conceitos
eurocêntricos, mas em pesquisas desenvolvidas por estudiosos empenhados,
muitos deles por negros. Principalmente nos meios acadêmicos, onde os
movimentos foram significativos.
Os próximos passos de ruptura são marcados na história em 2003, quando
diversos setores da sociedade reuniram-se e apresentaram um pedido de Lei, ao
Congresso Nacional, resultando na aprovação da inclusão no currículo oficial da
Rede de Ensino a obrigatoriedade da Temática “História e Cultura Afro brasileira”.
Gentile (2005), em um artigo para a revista Nova Escola, destaca a questão
da desvalorização dos conteúdos referentes à temática:
O pouco caso com a cultura africana se reflete na sala de aula. O segundo maior continente do planeta aparece em livros didáticos somente quando o tema é escravidão, deixando capenga a noção de diversidade de nosso povo e minimizando a importância dos afrodescendentes (GENTILE, 2005, p. 42).
Em acordo com as colocações de Gentile (2005), é perceptível a grande
diferença de abordagens quanto a história da África diante de outros conteúdos nos
livros didáticos, o que tem sido melhor pensado desde as leis e pareceres legais.
A reformulação dos livros didáticos tem acontecido lentamente, como nos
outros setores da educação após a promulgação das leis. O fato é que o professor
não deve ficar preso ao trabalho com o livro didático, restringindo-se apenas a essa
fonte nas suas práticas metodológicas de ensino. Dessa forma, é fundamental que
nas avaliações do PNLD - Plano Nacional do Livro Didático sejam inseridas
questões no tocante à legislação educacional, verificando os conteúdos e
abordagens quanto à África, história dos povos africanos e afro-brasileiros, para que
sejam proporcionadas cada vez mais, a desconstrução de estereótipos e pré-
conceitos construídos e perpetuados no imaginário popular.
Logo, o educador utilizará o conteúdo do livro didático como base,
complementando suas práticas de ensino, adequando-as com a realidade dos
educandos e usando-se das variadas linguagens para que haja uma aprendizagem
significativa.
Também é importante compreender os livros didáticos, considerando-se
historicamente os contextos em que foram produzidos e a adequação em que foram
passando conforme as leis e políticas editoriais e principalmente educacionais.
Nesse contexto, se a lei referente à história e cultura africana e afro-brasileira é algo
que vem sendo adaptado na prática das escolas brasileiras, as edições dos futuros
livros didáticos vão favorecer cada vez mais na real implementação e efetivação do
que está prescrito nas leis 10.639/2003 e 11.645/2008.
Para finalizar a discussão sobre os processos de ensino de história do
professor contemporâneo, é fundamental abordar o conceito de “transposição
didática” dos conteúdos, conceito esse que vai além dos limites da escola.
Nesse contexto, a transposição didática dos conteúdos e dos procedimentos
históricos é explicada por Schimidt e Cainelli (2009) como:
[...] um processo de transposição científica, didática até sua tradução no campo escolar. Ela permite pensar a transformação de um saber científico e social que afeta os objetos de conhecimento em um saber a ensinar, tal qual aparece nos programas, manuais, na palavra do professor, considerando não somente científicos. [...] Isso significa, então, um verdadeiro processo de criação e não somente de simplificação, redução [...] (SCHIMIDT e CAINELLI, 2009, p. 35).
Portanto, é fundamental a participação e postura do professor na atualidade,
na percepção e identificação de questões sociais do universo dos alunos, seja na
escola, no bairro, no município, ampliando as reflexões para que eles possam atuar
visando a transformação da própria realidade, como por exemplo, em questões de
preconceito e diversidade sociocultural.
2.3 A IMPLEMENTAÇÃO: CONEXÃO DE DIFERENTES PRÁTICAS DE ENSINO
DE HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA E AFRICANA
2.3.1 A METODOLOGIA DA PESQUISA-AÇÃO
Os pressupostos teóricos seguidos para desenvolver o artigo final, em todas
as suas etapas, foram os da pesquisa-ação em educação.
[...] um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo (THIOLLENT, 2005, p.16).
Destaca-se, na pesquisa-ação o professor assume a postura de pesquisador
em uma ação concretizada através da implementação/intervenção empenhando-se
na transformação do grupo envolvido, no caso em estudo, dos educandos.
Assim as atividades/ações implementadas, estavam voltadas centradas em
possibilitar práticas de ensino diferenciadas complementares ao conteúdo do livro
didático de história, para no fim, fortalecer identidades, e o reconhecimento da
importância da cultura africana e afro-brasileira na formação cultural brasileira.
2.3.2 A IMPLEMENTAÇÃO
As atividades implementadas foram organizadas em oficinas, atendo-se às
informações mais simples mudando gradativamente para mais complexas,
estimulando assim no aluno subsídios para compreender melhor sobre a
problemática das raízes da história e cultura afro-brasileira e africana no Brasil.
Assim, o processo de implementação aconteceu por meio de 9 (nove)
oficinas, implementadas ao longo do 1° (primeiro) semestre de 2014, iniciadas com a
apresentação do Projeto de Intervenção na Semana Pedagógica, para apreciação
da direção, equipe pedagógica, corpo docente e agente educacionais. No início das
aulas foi apresentado aos educandos de uma maneira compreensível, alertando que
estariam envolvidos em atividades teóricas de sistematização, como também,
práticas de percepção, visualização e conscientização.
Iniciou-se com a Oficina intitulada: Contextualização do racismo através da
música (Racismo é burrice, Gabriel o Pensador) (APÊNDICE A). Após uma conversa
informal foi passado o vídeo da música para os alunos, onde ouviram sem
compromisso, após esse momento, foi dada a letra da música impressa onde foram
selecionadas partes importantes relacionadas à origem do racismo e a sua
perpetuação na sociedade brasileira entre outras percepções importantes. Para
finalizar essa atividade os alunos registraram os seus comentários em folhas para
serem expostas na sala.
Na sequência foi a oficina: Importância histórica sobre os estudos
relacionados à África, onde o ponto de partida novamente foi o diálogo informal para
checar os conhecimentos prévios dos alunos, sobre as particularidades da África,
compreendendo que essas fazem parte da cultura brasileira e desconstruir
preconceitos, tais como, África continente de negros pobres e que vivem em um tipo
de organização tribal, era um dos principais objetivos dessa oficina.
Para isso, após o diálogo eles assistiram um vídeo chamado “A África que
nunca vimos, ou que ninguém nos mostra”, e no final responderam algumas
perguntas, e através de desenho mostraram a África que não conheciam. Destaca-
se que essa atividade foi realizada com êxito, percebeu-se que a maioria dos alunos
entenderam o propósito da tarefa.
Na terceira e quarta oficinas, o tema englobado era: Um pouco de História, e
buscava-se despertar a sensibilização e a compreensão do processo de Escravidão.
Embora tenha se explorado a questão da escravidão, não se limitou a ela, apenas
foi usada para demonstrar como vieram as influências africanas para o Brasil.
Dentro desse contexto, foi passado um trecho do filme Amistad de Steven Spielberg,
1997; para complementar esta atividade, distribuiu-se um trecho da poesia Navio
Negreiro de Castro Alves.
Na relação, do trecho do filme com o trecho do poema Navio Negreiro, os
educandos destacaram o que havia em comum e também selecionaram versos que
retratavam o processo de escravização dos negros entre outras questões.
Na quinta ação desenvolvida os alunos assistiram um curta-metragem
chamado “Vista minha pele” e após houve a discussão de questões importantes,
relacionadas ao filme, como a questão da inversão de valores. Por fim, responderam
algumas perguntas sugerindo como amenizar o racismo e preconceitos dentro das
escolas do mundo atual.
A sexta ação desenvolvida, era sobre o poema informal intitulado “Magia
Negra” o qual estimulava o conhecimento de diferentes nomes de negros que se
destacaram na sociedade brasileira em diferentes ramos, como: arte, música,
esporte, televisão, entre outros. Os educandos deveriam pesquisar sobre as
celebridades que não conheciam e a sistematização foi através de perguntas de
interpretação.
Na sétima ação, a turma foi dividida em 5 (cinco) grupos que pesquisaram
sobre os temas: música, palavras de origem africana presentes no vocabulário
brasileiro, danças, culinária e religião. Após a pesquisa elaboraram cartazes
explicativos sobre cada tema (APÊNDICE A), que foram apresentados na sala de
aula para os colegas e exposto no mural do Colégio.
A penúltima ação desenvolvida, partiu de slides explicativos, quanto as
principais características da arte afro-brasileira e suas formas de expressões
autônomas, além disso oportunizou algumas leituras de imagens, demonstrando os
traços marcantes da arte e os estilos de alguns artistas. Os alunos receberam
papel, tintas, giz, lápis e fizeram uma releitura inspirados nas características da arte
afro-brasileira, com auxílio da professora de Artes do Colégio. A atividade foi bem
criativa e ficou exposta na sala de aula, posteriormente expôs-se o trabalho na
Semana de Integração Família na Escola (APÊNDICE B).
Por fim, a última e nona ação desenvolvida, foi um passeio ao museu de
Arqueologia e Etnologia – MAE, da UFPR, Paranaguá, o qual o ônibus foi
disponibilizado pela Secretaria Municipal de Educação. O objetivo foi estimular o
conhecimento e a percepção da influência da cultura africana por meio de elementos
históricos construídos pelos escravos e a importância desses na constituição
histórica de Paranaguá. Após a viagem fizeram um relatório descrevendo o passeio.
Destaca-se que as atividades e exemplos propostos anteriormente podem ser
desenvolvidos em qualquer ano do Ensino Fundamental, entretanto, o professor
deve ater-se ao saber prévio dos educandos e assim, ao nível de complexidade da
atividade, para que essa realmente venha a complementar e facilitar o processo de
ensino-aprendizagem.
A implementação da unidade didática, entra em conformidade com a citação
de Felinto (2012):
A Lei 10.639/2003 obriga a inclusão de conteúdos da história e da cultura afro-brasileira nas disciplinas de História, Língua Portuguesa e de Artes na escola. Desde aquele ano tem aparecido no mercado um número significativo de produções didáticas, voltadas para o Plano Nacional de Implementação da referida Lei (FELINTO, 2012, p. 9).
Compreende-se que a partir de 2003, a educação brasileira vem passando
por esse período de implementação e adequação de acordo com os ditames da
referida Lei. Mais do que isso, o silêncio dos intelectuais sobre as artes negras e a
falta de material ainda reflete a forma preconceituosa com que foram tratadas as
tradições não-europeias e não cristãs no Brasil.
Para uma melhor compreensão de outras realidades escolares, a seguir
tem-se algumas contribuições do GTR – Grupo de Trabalho em Rede, onde as
etapas do PDE, projeto de intervenção, unidade didática, implementação, estiveram
postadas a disposição no moodle3 do Portal do Dia a Dia Educação, para troca de
experiências e opiniões com relação a outras escolas e professores da rede
estadual de ensino do Paraná.
2.3.3 CONTRIBUIÇÕES DO GTR – GRUPO DE TRABALHO EM REDE, 2014
O GTR, 2014, veio a favorecer ainda mais o processo de reflexão sobre a
prática de ensino de história na contemporaneidade. Karnal (2010) explica na
citação a seguir, sobre particularidades do educador na atualidade:
Diversos educadores têm refletido sobre os caminhos do educar [...] No entanto, a autonomia da condução do processo educacional é do professor. Considerando a diversidade e a pluralidade da realidade brasileira [...] é possível partilhar reflexões e experiências sobre o ensino de História (KARNAL, 2010, p. 11).
3 Moodle é o acrónimo de "Modular Object-Oriented Dynamic Learning Environment", um software livre, de apoio à aprendizagem, executado num ambiente virtual (ver ambiente virtual de aprendizagem). A expressão designa ainda o Learning Management System(Sistema de gestão da aprendizagem) em trabalho colaborativo baseado nesse programa, acessível através da Internet ou de rede local. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Moodle>. Acesso em: 24 set. 2014.
Em acordo com a citação, o GTR possibilita esse partilhar de reflexões e
experiências relacionadas aos trabalhos que ficam postados para as atividades.
Assim, professores de outras escolas e realidades da rede de ensino do Paraná,
podem opinar, compartilhar e favorecer, tanto na prática da sala de aula, como na
pesquisa histórica, entre outras questões do universo educacional.
Neste curso inscreveram-se 17 (dezessete) professores, atraídos pelo tema,
sendo que 16 (dezesseis) concluíram o mesmo, 01 (um) dos cursistas inscritos não
iniciou as atividades e nunca acessou o ambiente virtual Moodle/e-escola.
No Grupo de Trabalho em Rede nota-se que os professores indicaram a
viabilidade dessa proposta das práticas complementares ao conteúdo de História da
África:
Após a leitura do projeto, que é apaixonante, especialmente pelo público-alvo, senti vontade de participar da aplicação e ainda questões como a facilidade para a constatação dos objetivos, e escassez de bibliografia referentes a esses enfrentamentos dão certo ineditismo ao projeto (PROFESSOR GTR, 2014).
O tema é de suma relevância para a formação dos nossos educandos. É triste constatar que que o estudo da cultura afro-brasileira e africana nas escolas teve que ser imposto por lei, mesmo sabendo que muitos professores, dentro de suas possibilidades, já trabalhavam o tema em sala. Precisamos formar pessoas que respeitem e admirem a diversidade (PROFESSOR GTR, 2014).
.
Como se vê, diferentes opiniões permitem compreender que outros
professores também enfrentam os mesmos desafios diários no contexto escolar,
preocupam-se com práticas de ensino de histórias diferenciadas, com também da
necessidade do educando de visualizar-se como sujeito histórico.
Oliveira et al (2012), comenta que o Ensino de História sofreu, nos últimos
trinta anos, sucessivas transformações de ordem didático-pedagógica,
principalmente em relação as abordagens temáticas e procedimentos.
Enfim, os depoimentos e opiniões foram variados, alguns destacaram
problemas quanto a escassez de material em suas escolas, outros quanto ao tempo
disponível nas aulas, mas de alguma forma todos apontaram a viabilidade da
proposta dialógica aqui apresentada, e ainda destacaram que usariam/adaptariam
as práticas para implementá-las com suas turmas:
Com relação as novas possibilidades pedagógicas de ensino de história e cultuara-afro brasileira e africana propostas neste projeto, com certeza eu usaria em sala de aula, não só com os 7º anos, como também usaria para com outros anos. Pois se trata de uma sequência de atividades que atendem ao objetivo da Lei 10639/03. [...] O trabalho com musicas é agradável e desperta no educando um interesse maior pela cultura afro-brasileira. Entre os temas o que mais me despertou interesse foi a aplicação da letra da música “Racismo é burrice”, de Gabriel Pensador. (PROFESSOR GTR, 2014).
Enfim, percebe-se que os professores que participaram desse GTR,
demonstram-se comprometidos e interessados em práticas diferenciadas de ensino
de história que venham a facilitar, favorecer no processo de ensino-aprendizagem
como também na questão da conscientização da importância da cultura africana e
afro-brasileira.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao final de todo o processo de pesquisa, escrita, reflexão e compreensão
proporcionado pelo PDE, a clareza perpetua quanto a necessidade de projetos que
trabalhem temáticas e práticas diferenciadas de ensino, tanto na disciplina de
História, quanto nas outras áreas. Pois, no mundo contemporâneo, as aulas a escola
competem com as altas tecnologias, com o grau de informação e atração das novas
tecnologias que mudam continuamente.
Por outro lado, a escola tem múltiplas funções, desde o desenvolvimento
intelectual à construção da cidadania, porque o educador, adquire a complexa tarefa
de lidar com os conflitos sociais, econômicos, construídos por ideias
preconceituosas e comportamentos discriminatórios. Nada como, trabalhar práticas
de ensino dialógicas que favoreçam tanto no conhecimento, quanto na
conscientização da importância das outras culturas na constituição do povo
brasileiro, como também em condições de pertencimento dessas origens e respeito
à diversidade.
Percebe-se ao final desta etapa, que não existe uma fórmula mágica para
ensinar a partir da proposta da Lei 10.639/03, um exemplo são os resultados
alcançados nos alunos a partir de práticas dialógicas de ensino, envolvendo formas
diferentes de complementar o conteúdo. Os resultados foram positivos e o objetivo
de complementar o conteúdo obre História da África do livro didático, tornou ainda
mais significativo o processo de ensino e aprendizagem desse conteúdo, como
também a conscientização das particularidades e o pertencimento quanto à cultura
afro-brasileira.
Quanto ao resultado do GTR, a troca de discussões e experiências com
outros professores da rede de ensino, mostra que essa possibilidade dialógica gerou
interesse por ser viável de se trabalhar tanto no ensino fundamental, como no ensino
médio, favorecendo assim em um material a mais para a complementação das
práticas de ensino dos professores da rede estadual de ensino do Paraná.
Por fim, particularmente o trabalho com músicas e poemas tornou a aula
mais interessante, valorizou a cultura africana e afro-brasileira, favorecendo na
percepção do papel dos africanos e seus descendentes, na formação da sociedade
brasileira. Este tipo de trabalho, é uma das formas, entre tantas, de se construir uma
imagem positiva desta cultura.
REFERÊNCIAS
_______. Parâmetros Curriculares Nacionais de Educação para temas
Transversais: pluralidade cultural. Brasília (DF): MEC, 1997.
_______. Ministério da Educação. Lei nº 10.639, de 9 de Janeiro de 2003.
Disponível em:
<http://www.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=236171>. Acesso
em: 11 jun. 2013.
_______. Parecer nº CNE/ CP 003/2004 de Diretrizes Curriculares Nacionais
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APÊNDICES
APÊNDICE A Foto 1: Apresentação e Contextualização do Racismo através da música
FONTE: A Autora (2014).
Foto 2: Cartazes feitos a partir de pesquisa sobre a influência da cultura africana.
FONTE: A Autora (2014)
APÊNDICE B
Foto 3: Releituras artísticas feitas pelos alunos a partir da Arte Africana. FONTE: A Autora (2014)