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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
ARTRÓPODES HIDRÁULICOS: UMA ABORDAGEM INTERDISCIPLINAR ENTRE FÍSICA E BIOLOGIA
Gisele Ramos Fagundes1 Marcelo Alves de Carvalho2
RESUMO As Diretrizes Curriculares Orientadoras da Educação Básica para a Rede Estadual de Ensino – disciplina de Física – destaca a importância da aplicação de atividades práticas e contextualizadas como estratégia para despertar o interesse do aluno. Com base nas diretrizes e partindo da premissa que as atividades práticas despertam um grande interesse no aluno, relatamos aqui a realização de algumas atividades lúdicas científicas, interdisciplinar, envolvendo os conceitos de hidrostática associados aos movimentos de alguns artrópodes, conteúdo abordado na disciplina de Biologia. Constatamos no decorrer da implementação o quanto nossos alunos são carentes de atividades lúdicas científicas e o quanto estas auxiliam os mesmos em uma aprendizagem mais efetiva. A indiferença, apresentada por nossos alunos, nas aulas teóricas, foi superada com a realização das atividades propostas. Ao término do projeto, observamos que os resultados foram muito satisfatórios, todos os participantes conseguiram “criar”, com materiais alternativos, seus artrópodes, com grande envolvimento e principalmente percebemos maior interesse pelas aulas de física.
Palavras-chave: Ensino de Física. Interdisciplinaridade. Atividade prática. Taxonomia de Bloom.
INTRODUÇÃO
As pesquisas realizadas nos últimos anos, Bonadiman e Nonenmacher
(2007), Moraes (2009), Ricardo e Freire (2007), mostram que os alunos encontram-
se cada vez mais desinteressados pela disciplina da Física.
A ausência de uma abordagem contextualizada dessa disciplina com a
realidade cotidiana dos alunos e a dificuldade de compreensão dos conceitos são
algumas das principais causas para essa falta envolvimento e dos problemas de
aprendizagem decorrentes dessa situação.
1 Professor de Física do Ensino Médio da rede pública do Estado do Paraná. Graduado em Ciências
Físicas e Biológicas com Habilitação em Física pela Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras de Jacarezinho – PR, hoje, Universidade Estadual do Norte do Paraná - UENP. Especialista em Ciências Naturais. Aluno do Programa de Desenvolvimento Educacional da Secretaria de Estado da Educação do Paraná / PDE. 2 Departamento de Física – Universidade Estadual de Londrina – professor orientador.
As Diretrizes Curriculares Orientadoras da Educação Básica para a Rede
Estadual de Ensino - disciplina de Física destaca a importância da aplicação de
atividades práticas e contextualizadas como estratégia para despertar o interesse do
aluno, assim como sugerem a utilização da interdisciplinaridade como uma
possibilidade de aprendizagem significativa dos conceitos da Física e dos demais
conteúdos envolvidos.
Com base nessa conjuntura e partindo da premissa que as atividades práticas
despertam um grande interesse no aluno, contribuindo de forma efetiva para o
ensino de Física, este trabalho relata a realização de atividades lúdicas científicas,
envolvendo os conceitos de hidrostática associados aos movimentos de alguns
artrópodes. A natureza interdisciplinar da atividade é devido ao conteúdo da
disciplina de Biologia que faz parte inerente da proposta. A aplicação da atividade
seguirá os passos descritos na Taxonomia de Bloom.
DE ARQUIMEDES A ARTRÓPODES
Em 1961 Gagarin admirado exclama “A Terra é azul!”, era a primeira vez que
alguém observa o planeta Terra por outro ângulo, entretanto, muito mais do que
beleza está o fato de que nosso planeta é formado de ¾ (três quartos) de água e
que dela depende nossa existência e sobrevivência (TALAVERA, 2004).
Pensando na importância deste assunto a nossa proposta era trabalhar os
conceitos relacionados à hidrostática e suas possíveis aplicações.
O termo hidrostática, oriundo do grego, (hidro = água e estática = corpos em
equilíbrio) deve ser entendido como resultado das interações entre o corpo e o meio
em que se encontra. Uma parte importante, dentro da hidrostática, é o estudo da
mecânica dos fluídos, entendido como algo que possui a propriedade de escoar e é
dividida em fluidos estáticos, quando se trata de fluidos em repouso, e fluido
dinâmico quando esse está em movimento.
A hidrostática esta presente em nosso cotidiano desde ao abrir uma torneira
ou até mesmo em situações mais complexas como nos freios ou no pouso de um
avião. Suas aplicações são facilmente percebidas nas eclusas que permitem a
navegação em rios, por exemplo, o Tietê e o São Francisco (TALAVERA, 2004).
Para que o tema proposto – hidrostática – fosse assimilado e compreendido
pelos alunos participantes do projeto, alguns conceitos eram de suma importância
tais como: pressão, massa específica, densidade, Princípio de Pascal, Leis de
Stevin, tensão superficial e capilaridade.
Desmitificar alguns conceitos errôneos e introduzir relações com o conteúdo
de hidrostática, principalmente no que diz respeito a fatores históricos, são
procedimentos de extrema relevância.
A interdisciplinaridade com a Biologia se faz presente, pois o trabalho em
questão foi realizado com alunos do segundo ano do ensino médio e neste período
são trabalhados os conteúdo da classe dos artrópodes que constituem o filo de
maior sucesso adaptativo da Terra, o qual se deve ao fato de suas diversas
estruturas, que permitem uma grande diversificação em ambientes aquáticos e
terrestres. Os artrópodes são classificados em insetos, crustáceos, aracnídeos,
quilópodes e diplópodes.
A diversificação na estrutura deste filo é que auxiliará a interdisciplinaridade e
facilitará a montagem dos artrópodes3. Para isso serão utilizados os conceitos de
Física supracitados, uma vez que o ensino de Física não deve ser pautado apenas
em acontecimentos específicos de sua disciplina, mas, sempre que possível, fazer o
elo para novas experiências entre as diversas áreas do conhecimento, visando
assim o aprendizado cognitivo e uma visão geral do todo. Nessa perspectiva as
Diretrizes Orientadoras Curriculares do Estado do Paraná indicam que
No ensino dos conteúdos escolares, as relações interdisciplinares evidenciam, por um lado, as limitações e as insuficiências das disciplinas em suas abordagens isoladas e individuais e, por outro, as especificidades próprias de cada disciplina para a compreensão de um objeto qualquer. Desse modo, explicita-se que as disciplinas escolares não são herméticas, fechadas em si, mas, a partir de suas especialidades, chamam umas às outras e, em conjunto, ampliam a abordagem dos conteúdos de modo que se busque, cada vez mais, a totalidade, numa prática pedagógica que leve em conta as
3 A estrutura de um artrópode, em específico um grilo, pode ser visualizada em :
<http://www.universitario.com.br/celo/topicos/subtopicos/anatomia/sistema_muscular/sistema_muscular.html>
dimensões científica, filosófica e artística do conhecimento. (PARANÁ, 2008)
TAXONOMIA DE BLOOM
A Taxonomia de Bloom é entendida como um processo de seleção e
classificação, o qual é desenvolvido mediante três domínios: cognitivo, afetivo e
psicomotor (LOMENA, 2006). Neste trabalho será abordado somente o domínio
cognitivo, o qual se refere à aquisição e à compreensão de conhecimentos, divididos
em seis categorias de domínio ordenadas da mais simples para a mais complexa,
podendo ser considerado níveis cumulativos onde um é pré requisto para o seguinte
(JESUS, RAABE, 2009). Esses níveis estão divididos em conhecimento;
compreensão; aplicação; análise; síntese; e avaliação (FERRAZ, BELHOT, 2010).
A Taxonomia de Bloom passou a ser definida, a partir da proposta de Lori
Anderson, nos seguintes níveis: lembrar; entender; criar; aplicar; analisar e avaliar
(JESUS; RAABE, 2009).
Figura 1 – Categorização atual da Taxonomia de Bloom proposta por Anderson, Krathwohl e Airasian, no ano de 2001. Fonte: Ferraz e Belhot (2010, p. 424).
ABORDAGEM DOS CONCEITOS EM SALA DE AULA
Por muito tempo o ensino de física esteve pautado na transmissão de
conceitos, ficando apenas para a pedagogia os aspectos relacionados ao
aprendizado (FILHO et al., 2009). Com isso os aspectos pedagógicos que envolvem
a contextualização e a interdisciplinaridade abordados no ultimo ano dos cursos
acabavam ficando em segundo plano e consequentemente a atuação do professor
se torna reflexo de sua formação profissional inicial, priorizando a aplicação de
fórmulas e resolução de equações matemáticas.
Uma possibilidade para sanar esta lacuna entre contextualização e ensino de
Física seria a utilização da Taxonomia de Bloom, que trata de uma estratégia
pedagógica organizada em 6 (seis) níveis de conhecimento a serem seguidos
cumulativamente:
1° nível - lembrar (relembrar informações, conceitos, teorias, métodos, entre
outros, ensinados anteriormente);
2° nível – entender (compreender os novos conceitos apresentados,
utilizando-os para fazer inter-relações em diferentes contextos);
3° nível - aplicar (aplicar os conhecimentos em situações concretas);
4° nível - analisar (identificar a utilização e a aplicação dos conteúdos);
5° - sintetizar (organizar as ideias e os novos conceitos adquiridos) e
6° nível – criar (só é capaz de criar quem realmente assimilou de forma
significativa o que foi apresentado).
Diante do exposto, nosso objetivo era buscar meios de despertar a
curiosidade e suscitar o interesse de nossos alunos por intermédio de atividades
lúdicas científicas visando à melhoria do processo de ensino aprendizagem dos
conceitos de hidrostática, através da interdisciplinaridade com a Biologia e utilizando
os passos da Taxonomia de Bloom. Neste ano, onde concretizamos os estudos do
PDE – Programa de Desenvolvimento Educacional, aplicamos o projeto de
intervenção com os alunos do segundo ano do Ensino Médio do Colégio Estadual
Cel Joaquim Pedro de Oliveira - EFM – Japira – PR conforme a seguinte proposta de
implementação, cujo material didático esteve composto das seguintes atividades:
1 – Do lembrar ao entender: Esta etapa tinha como meta a assimilação do
conteúdo de hidrostática, além de conceito como: pressão, massa específica,
densidade, Princípio de Pascal, Leis de Stevin, tensão superficial e capilaridade.
Para isto foram utilizadas questões do ENEM (Exame Nacional do Ensino
Médio) para uma sondagem dos conteúdos supostamente já adquiridos e a
introdução dos novos, citados acima. Além de buscar desmitificar alguns conceitos
errôneos e introduzir relações com o conteúdo de hidrostática, principalmente no que
diz respeito a fatores históricos. Alguns pré requisitos foram necessários, como
noções de dinâmica e de estática e a interdisciplinaridade com a Biologia,
abordando os conteúdos da classe dos artrópodes que constituem o filo de maior
sucesso adaptativo da Terra, o qual se deve ao fato de suas diversas estruturas, que
permitem uma grande diversificação em ambientes aquáticos e terrestres. Os
artrópodes são classificados em insetos, crustáceos, aracnídeos, quilópodes e
diplópodes. A diversificação na estrutura deste filo é que auxiliará a
interdisciplinaridade e facilitará a montagem dos artrópodes.
2 – Do aplicar ao sintetizar: Com os conteúdos assimilados chegou o
momento da aplicação do que os alunos aprenderam até aqui. Para tal foi construída
uma garra hidráulica4 utilizando os seguintes materiais: isopor, seringas, canos de
plástico, cola, parafusos, caixa de papelão, garrafa pet, martelo, tesoura, régua,
caneta e arame.
Inicialmente foram marcados e recortados os moldes da garra no isopor:
Figura 2 – Passo a passo – marcação dos moldes e recorte das peças no isopor.
4 O passo a passo da explicação dos conceitos envolvidos na garra pode ser visualizado no site
http://www.mecatronicaatual.com.br/artigos/1611-rob-hidrulico
Na sequência da atividade foram separadas as seringas e as respectivas
mangueirinhas, para a montagem dos elementos hidráulicos.
Figura 3 – Passo a passo – Montagem dos elementos hidráulicos.
Após deixar os elementos hidráulicos previamente montados, passamos para
a montagem da garra por inteira.
Figura 4 – Passo a passo – Montagem dos elementos da garra.
Continuando a montagem da garra, a mesma começou a ganhar o seu
aspecto real.
Figura 5 – Passo a passo – Reta final de montagem da garra.
Figura 6 – Visualização da garra finalizada.
3 – Interdisciplinaridade uma ferramenta mais que necessária: Durante esta
etapa os alunos participantes puderam assimilar os conceitos de hidrostática com a
construção da garra hidráulica e o respectivo estudo do filo de alguns animais
invertebrados, em específico os artrópodes. Ao realizarem pesquisas mais
aprofundadas sobre as estruturas desses animais, os alunos iniciaram os
procedimentos de montagem dos mesmos, aliando, a partir deste momento, os
conceitos da Biologia e da Física.
Figura 7 – Montagem de uma libélula.
Figura 8 – Montagem de uma barata.
Figura 9 – Montagem de um escorpião.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A busca de novas metodologias para um efetivo aprendizado de nossos
alunos esta cada vez mais intensa, sendo que a utilização de atividades lúdicas
científicas é apenas mais uma ferramenta que visa o ensino e a aprendizagem.
No inicio da implementação, nos deparamos com as primeiras dificuldades,
encontramos alunos totalmente despreparados, com sérios déficits de
aprendizagem, que começam na interpretação de texto, perpassam pela matemática
básica e culminam nos conteúdos de física. Para nossa surpresa não havia como ter
o nível “lembrar”, ou seja, nossos educandos se quer tiveram acesso no primeiro ano
do ensino médio aos conteúdos supracitados como pré requisitos, foi preciso
retomar e ensinar para também o "entender”.
Vencidos os entraves da primeira etapa, passamos para a segunda, a
montagem da garra. Nesta fase constatamos o quanto nossos alunos são carentes
em atividades lúdicas científicas e o quanto esta auxilia os mesmos para um
aprendizagem mais efetiva. Foi muito prazeroso e significativo confeccionar a garra
hidráulica, pois percebemos a assimilação dos conteúdos apresentados/ensinados
na primeira etapa. Não encontramos dificuldades nem na aquisição dos materiais
para a construção do experimento nem na participação do colegiado e dos alunos.
Na ultima etapa outro problema foi que ao tentar aplicar interdisciplinaridade,
embora tenha realizado a parceria com a professora de Biologia, havia uma falta de
sincronismo nos planejamentos, ou seja, tivemos que trabalhar os conteúdos da
Física e também os da Biologia, os quais foram sanados com pesquisas e
seminários.
Infelizmente o que se percebe é que além dos problemas já conhecidos como
o ensino de física desfragmentado, falhas na formação e falta de capacitação para
os professores, percebemos a indiferença de nossos alunos. Por esta razão
optamos pela realização deste trabalho, numa tentativa de contribuir com um
aprendizado significativo, contextualizado e humanizado.
Ao final da implementação das atividades, observamos que os resultados
foram muito satisfatórios, todos os participantes conseguiram “criar”, com materiais
alternativos, seus artrópodes, com grande envolvimento e principalmente ao terminar
o projeto percebemos maior interesse pelas aulas de física.
Gostaria de ressaltar que ao aplicar as atividades propostas em nosso projeto
do PDE cresci profissionalmente e também percebi o quanto posso contribuir para a
aprendizagem dos alunos que mesmo envoltos a tanta desigualdades, quando
expostos a abordagens diversificadas, respondem com resultados significativos e
gratificantes a toda comunidade escolar. E assim, espero continuar com essa
determinação e vontade de ensinar.
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