o_profissional_invisivel.pdf
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Este livro é uma narrativa das realidades complexas do mercado de trabalho e da rotina de acesso e permanência nas organizações. Como estas relações costumam ser desiguais, resolvi disponibilizar na web e oferecer para os profissionais, um pequeno manual de boas práticas e estratégia para a carreira e recolocação. São histórias que trazem um pano de fundo de inteligência comportamental, que é a chave para se conseguir desde um bom emprego, até ser promovido e liderar um departamento. Na época, havia muita denúncia de golpes do emprego e outras fraudes contra as pessoas, de modo que listei muitos sites informativos que hoje já não existem. Então na edição eletrônica, retiramos as páginas e nos focamos no conteúdo e sua discussão sobre como ser aprovado nas seleções e, depois de empregado, “ser visível” no contexto do ambiente de trabalho. Espero que estas dicas e análises possam ser de utilidade às pessoas em sua vida corporativa, no mínimo podemos dar nossa versão otimista e bem humorada sobre o assunto. Boa Leitura! Prof. Luís Sérgio Lico Apoio Cultural A Consultive Labs é uma empresa jovem, inovadora e dinâmica. A cada dia encantamos mais profissionais e empresas com nosso trabalho: Palestras, Cursos e Soluções em Treinamento. Oferecemos abordagens eficientes, alinhando soluções à necessidades específicas. Buscamos solucionar as lacunas na relação entre pessoas e organizações, convergindo competências, afetos, modelos mentais e capacitação profissional. Facilitamos a integração entre os saberes, fazeres e comportamentos das pessoas, em relação às demandas e objetivos das corporações. Manter altos níveis de comprometimento e motivação não é somente importante para administrar conduzir bem uma empresa: é a melhor condição para uma rentabilidade sustentável! Para se obter resultados consistentes, equipes devem ser orientadas e estimuladas a agir na superação dos desafios. Para isso desenvolvemos projetos e soluções 100% customizadas para alcançar melhores índices de desempenho. Ações estratégicas eficientes, além de causar impacto, devem aumentar competências e melhorar o relacionamento. Devem ser sinceras e buscar resultados. Consulte nossas soluções para Educação Corporativa!
Central de Atendimento: (11) 5011-9852 - [email protected] - www.consultivelabs.com.br Empresa certificada pelo Selo Wec de Qualidade em Treinamento - WEC - ISO 10015
O PROFISSIONAL INVISÍVEL
Lico, Luís Sérgio.
O profissional invisível: um manual prático para desempregados. Luís Sérgio Lico. Guarapari-ES. Ex Libris, 2007.
Bibliografia
1. Empregabilidade 2. Formação Profissional 3. Desemprego
ISBN 8590 287-17-3
Tudo na natureza é bipolar, ou tem um pólo positivo e um pólo
negativo. Há um macho e uma fêmea, um espírito e um fato, um norte e
um sul. O espírito é o positivo, o fato é o negativo. A vontade é o norte, a
ação é o pólo sul. O caráter pode ser classificado como tendo seu
natural lugar no norte. Distribui as correntes magnéticas do sistema.
Os espíritos fracos são atraídos para o pólo sul, ou pólo negativo. Só
vêem na ação o lucro, ou o prejuízo que podem encerrar. Não podem
vislumbrar um princípio, a não ser que este se abrigue noutra pessoa.
Não desejam ser amáveis, mas amados. Os de caráter gostam de ouvir
falar de seus defeitos; aos outros aborrecem as faltas; adoram os
acontecimentos; vinculam a estes um fato, uma conexão, uma certa
cadeia de circunstâncias e daí não passam. O grande homem sabe que
os eventos são seus servos: estes devem segui-lo... (e que) Nenhuma
mudança de circunstâncias pode mudar um defeito de caráter.
Emerson, Caráter.
Lico, Luís Sérgio.
O profissional invisível: um manual prático para desempregados. Luís Sérgio Lico. Guarapari-ES. Ex Libris, 2007.
Bibliografia
1. Empregabilidade 2. Formação Profissional 3. Desemprego
ISBN 8590 287-17-3
Tudo na natureza é bipolar, ou tem um pólo positivo e um pólo
negativo. Há um macho e uma fêmea, um espírito e um fato, um norte e
um sul. O espírito é o positivo, o fato é o negativo. A vontade é o norte, a
ação é o pólo sul. O caráter pode ser classificado como tendo seu
natural lugar no norte. Distribui as correntes magnéticas do sistema.
Os espíritos fracos são atraídos para o pólo sul, ou pólo negativo. Só
vêem na ação o lucro, ou o prejuízo que podem encerrar. Não podem
vislumbrar um princípio, a não ser que este se abrigue noutra pessoa.
Não desejam ser amáveis, mas amados. Os de caráter gostam de ouvir
falar de seus defeitos; aos outros aborrecem as faltas; adoram os
acontecimentos; vinculam a estes um fato, uma conexão, uma certa
cadeia de circunstâncias e daí não passam. O grande homem sabe que
os eventos são seus servos: estes devem segui-lo... (e que) Nenhuma
mudança de circunstâncias pode mudar um defeito de caráter.
Emerson, Caráter.
INTRODUÇÃO
A Tempestade no Horizonte
A última vez havia sido em Janeiro e, de lá para cá a tempestade se
formara. Eu já desconfiava, pelas constantes argüições, perguntas e
comentários que algo estava por vir. No entanto acreditava que
aquilo deveria ser apenas mais uma daquelas reuniões
improdutivas, mas a realidade era outra. Quando os dois
encarregados me chamaram, com aquela expressão simpática, veio
a pancada:
- Bem, esta tarefa não é fácil. Então, vou direto ao assunto. Não é nada
pessoal, mas você está demitido!
- Olhe não fique ressentido com a gente, disse o outro. Na verdade a
empresa está se reestruturando e a diretoria industrial acredita que o
produto não precisa de promoção. Enfim, nós estamos apenas
cumprindo ordens. Vai haver mudanças e você sabe que o pessoal de
vendas não tem força para mudar nada e que as coisas estão difíceis.
Lembro de ter ficado olhando para aqueles dois e estoicamente
perguntado:
- Sem problema. Mas pensei que o Datake me diria isto e não vocês.
- Ele só volta de férias na segunda e vai direto para a fábrica, na posse do 1novo chatiô , disse o primeiro. Bom, na verdade ele não vai sair, fica no
conselho e vai continuar mandando em tudo, do mesmo jeito. Os
1 Presidente em japonês.
1312
papéis estão aqui. Você precisa assinar e semana que vem você faz a
homologação. Eles queriam que você devolvesse os tiques e o vale
transporte, mas aí eu achei sacanagem e, portanto, pode ficar com os
excedentes. Com desconto, claro.
- Obrigado, foi muita gentileza sua, emendei irônico.
- E você como está? O que pretende fazer? Disse o segundo. Você é
muito qualificado, acho que consegue coisa melhor. Até uma gerência.
Eu mesmo só não saio daqui porque não tenho nada em vista, mas se
aparecer nem penso duas vezes. Fui!
- Olha, o negócio agora é procurar outro emprego, respondi. Espero
que em algum lugar onde seja mais reconhecido. Mas a vida é assim
mesmo e vamos tocar para frente. Se vocês quiserem, eu posso passar
as previsões, os arquivos do forecast e deixar tudo arrumado.
- Desculpe, mas a instrução é que você deixe imediatamente a empresa.
Pode ir pegar suas coisas, se quiser, se não temos que acompanhá-lo
agora até a saída.
- Posso pegar minhas coisas? Puxa! Obrigado. Dá para esperar uns dez
minutos e depois me despedir do pessoal?
- Tudo bem, mas vai rápido que se na fábrica eles ficarem sabendo,
podemos ter problemas. Mas vem de lá um abraço e desejamos boa
sorte.
Fiquei ali pensando como as coisas mudaram em três anos. Logo
depois que eu entrei na fábrica, estava saindo um funcionário e o
pessoal mandou até buscar frango assado para a despedida. O
faturamento era de menos de um milhão mensal e havia pouca
gente ralando para cumprir as tarefas do departamento. Houve,
com o passar do tempo, outros desligamentos e sempre o mesmo
ritual do almoço. Agora eu dispunha de apenas alguns minutos
antes de ser enxotado, depois de trabalhar para que o faturamento
mensal chegasse à casa dos quatro milhões. Será que havia alguma
relação de causa e efeito entre as duas situações? Não saberia dizer,
exceto que as primeiras conquistas sempre são comemoradas,
depois tudo vira obrigação e as relações sociais acabam
desaparecendo no torvelinho das previsões de lucro.
De certa forma, após ouvir a ignominiosa expressão you're
fired, fica-se um pouco anestesiado. Na hora só se pensa em sair com
dignidade. Mas tem gente que acha divertido fazer isso, chegando
mesmo a obter orgasmos na televisão, posando de líder iluminado, 2portador de um ethos absoluto. Mas na verdade, o mundo
corporativo é de instância sempre eticamente inferior ao patamar
que o senso comum imagina, oscilando entre dois arcabouços
conceituais: punição e incompatibilidade. A primeira visa a
restabelecer uma ordem no discurso empresarial e é largamente
utilizado para com os desafetos, sendo baseada no preceito vigiar e 3punir. A segunda é de caráter mais sutil e se deve ao fato de, na
maioria dos casos, afastar o elemento impertinente que, no dia a dia,
questiona a modorra e a incompetência gerencial ou a ameaça por
deter melhores qualidades.
Enfim, era hora de dar no pé: Game over! Enquanto
buscava nas gavetas da mesinha antiga, recolher os poucos
pertences, era ladeado de pessoas, ali olhando, atemorizadas a
questionar quem seria o próximo. Então eu pensava que realmente
merecia coisa melhor. Afinal, eu ganhava pouco, trabalhava como
um escravo, aturava a bílis negra da grosseria gerencial, detinha
responsabilidades de um diretor, coordenava equipes, desenvolvia
a gestão operacional, corrigia as mancadas dos superiores, sugeria
estratégias vencedoras, tirava o lixo... Pois é! E lá na carteira de
trabalho estava estampado o acinte: assistente. Com certeza, com
minhas competências eu poderia, finalmente, encontrar uma
empresa socialmente responsável que me franqueasse a
oportunidade de receber um salário condizente com minha
experiência e, principalmente, um registro na carteira que retratasse
a realidade das funções que eu desempenhava. Naquele instante eu
acreditava que isso seria possível.
Então, após alguns abraços, demonstrações de afeto e boa
sorte (algumas sinceras), botei a viola no saco e saí para a rua. Peguei
mais uma última vez a lotação clandestina em direção ao metrô e,
dali, direto para casa. Recebi os meus direitos, faltou uma
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
2 Aqui, com sentido de moral inatacável (?).3 Sobre isto é interessante ver a obra homônima do filósofo Michel Foucault.
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papéis estão aqui. Você precisa assinar e semana que vem você faz a
homologação. Eles queriam que você devolvesse os tiques e o vale
transporte, mas aí eu achei sacanagem e, portanto, pode ficar com os
excedentes. Com desconto, claro.
- Obrigado, foi muita gentileza sua, emendei irônico.
- E você como está? O que pretende fazer? Disse o segundo. Você é
muito qualificado, acho que consegue coisa melhor. Até uma gerência.
Eu mesmo só não saio daqui porque não tenho nada em vista, mas se
aparecer nem penso duas vezes. Fui!
- Olha, o negócio agora é procurar outro emprego, respondi. Espero
que em algum lugar onde seja mais reconhecido. Mas a vida é assim
mesmo e vamos tocar para frente. Se vocês quiserem, eu posso passar
as previsões, os arquivos do forecast e deixar tudo arrumado.
- Desculpe, mas a instrução é que você deixe imediatamente a empresa.
Pode ir pegar suas coisas, se quiser, se não temos que acompanhá-lo
agora até a saída.
- Posso pegar minhas coisas? Puxa! Obrigado. Dá para esperar uns dez
minutos e depois me despedir do pessoal?
- Tudo bem, mas vai rápido que se na fábrica eles ficarem sabendo,
podemos ter problemas. Mas vem de lá um abraço e desejamos boa
sorte.
Fiquei ali pensando como as coisas mudaram em três anos. Logo
depois que eu entrei na fábrica, estava saindo um funcionário e o
pessoal mandou até buscar frango assado para a despedida. O
faturamento era de menos de um milhão mensal e havia pouca
gente ralando para cumprir as tarefas do departamento. Houve,
com o passar do tempo, outros desligamentos e sempre o mesmo
ritual do almoço. Agora eu dispunha de apenas alguns minutos
antes de ser enxotado, depois de trabalhar para que o faturamento
mensal chegasse à casa dos quatro milhões. Será que havia alguma
relação de causa e efeito entre as duas situações? Não saberia dizer,
exceto que as primeiras conquistas sempre são comemoradas,
depois tudo vira obrigação e as relações sociais acabam
desaparecendo no torvelinho das previsões de lucro.
De certa forma, após ouvir a ignominiosa expressão you're
fired, fica-se um pouco anestesiado. Na hora só se pensa em sair com
dignidade. Mas tem gente que acha divertido fazer isso, chegando
mesmo a obter orgasmos na televisão, posando de líder iluminado, 2portador de um ethos absoluto. Mas na verdade, o mundo
corporativo é de instância sempre eticamente inferior ao patamar
que o senso comum imagina, oscilando entre dois arcabouços
conceituais: punição e incompatibilidade. A primeira visa a
restabelecer uma ordem no discurso empresarial e é largamente
utilizado para com os desafetos, sendo baseada no preceito vigiar e 3punir. A segunda é de caráter mais sutil e se deve ao fato de, na
maioria dos casos, afastar o elemento impertinente que, no dia a dia,
questiona a modorra e a incompetência gerencial ou a ameaça por
deter melhores qualidades.
Enfim, era hora de dar no pé: Game over! Enquanto
buscava nas gavetas da mesinha antiga, recolher os poucos
pertences, era ladeado de pessoas, ali olhando, atemorizadas a
questionar quem seria o próximo. Então eu pensava que realmente
merecia coisa melhor. Afinal, eu ganhava pouco, trabalhava como
um escravo, aturava a bílis negra da grosseria gerencial, detinha
responsabilidades de um diretor, coordenava equipes, desenvolvia
a gestão operacional, corrigia as mancadas dos superiores, sugeria
estratégias vencedoras, tirava o lixo... Pois é! E lá na carteira de
trabalho estava estampado o acinte: assistente. Com certeza, com
minhas competências eu poderia, finalmente, encontrar uma
empresa socialmente responsável que me franqueasse a
oportunidade de receber um salário condizente com minha
experiência e, principalmente, um registro na carteira que retratasse
a realidade das funções que eu desempenhava. Naquele instante eu
acreditava que isso seria possível.
Então, após alguns abraços, demonstrações de afeto e boa
sorte (algumas sinceras), botei a viola no saco e saí para a rua. Peguei
mais uma última vez a lotação clandestina em direção ao metrô e,
dali, direto para casa. Recebi os meus direitos, faltou uma
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
2 Aqui, com sentido de moral inatacável (?).3 Sobre isto é interessante ver a obra homônima do filósofo Michel Foucault.
1514
merrequinha, mas não valia a pena discutir e dei o caso por
encerrado. Dia seguinte, acessei a internet e assinei um portal de
empregos, destes que iludem os desempregados contando que 4tiveram 222.219 visitantes ontem , e comecei a garimpar a tão
sonhada oportunidade. O que se passou nos meses posteriores foi
um festival de obscenidades, que de tanta mediocridade, mereceu
ser registrado em livro.
Para melhor compreensão, eu separei a narrativa
conceitual dos tópicos de ajuda para recolocação. De modo que, ao
final deste volume além de ter se divertido com o que me aconteceu,
você possa ter um manual que permita evitar as armadilhas que
certamente serão colocadas no seu caminho, caso fique
desempregado. Na primeira parte o objetivo é o relato das etapas
básicas do quotidiano da busca de emprego, onde utilizo - sempre
que possível - reflexões críticas sobre o assunto, de modo a
desvincular ciência dos dogmas da seleção de pessoal. Na segunda
parte estará uma relação das dicas, tabelas e procedimentos para
que você possa, de forma prática, conhecer melhor como se portar
nas avaliações e evitar a destruição de sua auto-estima.
Quero deixar claro que as minhas teses não são construídas
com base em qualquer instância vingativa ou rancor pessoal, pelo
ano que passei desempregado. E que se em alguns momentos
existam declarações ácidas estas refletem apenas a descrição
apaixonada da indignação. No contexto metodológico, tudo o que
fiz foi efetuar pequenas séries de reflexões sobre a micro-condição
da ação humana nas práticas profissionais instituídas, avaliando
como se processam estas relações.
O que mostrarei é como se constituiu uma perversa
estrutura de desqualificação do indivíduo, com base em discursos e
procedimentos pseudo-científicos, que está a favor de uma espúria
orientação mercantilista, administrativamente obsoleta e custosa. A
denúncia também abrange a validade ética de conceitos e ações de
Responsabilidade Social, que não incluam em seu escopo a
diminuição do assédio moral infringido aos candidatos nos
processos de contratação.
Trata-se de mascaramento obter certificados ou
marquetear ações nas comunidades, se o tratamento dispensado ao
“capital humano” a ser adquirido o transforme em cidadão de
segunda classe. Talvez seja a miopia das gestões modernas, igual à
compra de créditos-carbono ao invés da aquisição de tecnologias
não poluentes. Talvez seja endêmico, mas de forma nenhuma é
incontornável. Caso consiga demonstrar corretamente o viés
desnaturado das relações corporativas, a ineficácia de seus
instrumentos de seleção e sua daninha influência na sociedade me
sentirei satisfeito.
Antes de começar, relembro aqui um trecho do Professor
Gerárd Lebrun, grande pensador, que em uma de suas análises
sobre Michel Foucault, esbarrou profeticamente no tema que ilustra
este livro, décadas antes que fosse escrito, conforme reproduzo
abaixo:
Uma nova “economia do poder”... ainda grosseira e lacunar... Um
Leviatã que, em vez de simplesmente forçar os homens ao respeito,
trata de prevenir a sua turbulência, de constituí-los de antemão como
súditos maleáveis. Desta forma insidiosa de poder, Foucault já dizia
que era impossível descrevê-la em termos negativos (reprime,
recalca, censura...). “Na verdade, o poder produz; produz algo de
real; produz domínios de objetos e rituais de verdade”. Frase que
poderíamos encompridar indefinidamente. O poder produz, por
exemplo, os testes psicológicos que permitem - e aqui em São Paulo de
maneira particularmente escandalosa - colocar aos candidatos a
qualquer emprego questões grotescas sobre sua vida sexual etc... É
inesgotável a lista do que é produzido pelo poder disciplinar e 5inquisitorial. (Lebrun, p.80/81,1983)
O magistral ensaio de Lebrun foi publicado originalmente no Jornal
da Tarde de 14/07/1979. Já dá para perceber que o cerco se fechou
mais e mais, nos restando pouco ar para respirar. Em nosso mundo
atual e nas relações que regulam o mercado, a pessoa
desempregada é um ser invisível que luta para não perder sua
identidade, integridade e auto-estima. Hoje não se pode mais estar
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
4 A avaliação destas ferramentas milagrosas encontra-se na segunda parte. 5 Gerard Lebrun. Passeios ao Léu. Brasiliense, 1983.
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merrequinha, mas não valia a pena discutir e dei o caso por
encerrado. Dia seguinte, acessei a internet e assinei um portal de
empregos, destes que iludem os desempregados contando que 4tiveram 222.219 visitantes ontem , e comecei a garimpar a tão
sonhada oportunidade. O que se passou nos meses posteriores foi
um festival de obscenidades, que de tanta mediocridade, mereceu
ser registrado em livro.
Para melhor compreensão, eu separei a narrativa
conceitual dos tópicos de ajuda para recolocação. De modo que, ao
final deste volume além de ter se divertido com o que me aconteceu,
você possa ter um manual que permita evitar as armadilhas que
certamente serão colocadas no seu caminho, caso fique
desempregado. Na primeira parte o objetivo é o relato das etapas
básicas do quotidiano da busca de emprego, onde utilizo - sempre
que possível - reflexões críticas sobre o assunto, de modo a
desvincular ciência dos dogmas da seleção de pessoal. Na segunda
parte estará uma relação das dicas, tabelas e procedimentos para
que você possa, de forma prática, conhecer melhor como se portar
nas avaliações e evitar a destruição de sua auto-estima.
Quero deixar claro que as minhas teses não são construídas
com base em qualquer instância vingativa ou rancor pessoal, pelo
ano que passei desempregado. E que se em alguns momentos
existam declarações ácidas estas refletem apenas a descrição
apaixonada da indignação. No contexto metodológico, tudo o que
fiz foi efetuar pequenas séries de reflexões sobre a micro-condição
da ação humana nas práticas profissionais instituídas, avaliando
como se processam estas relações.
O que mostrarei é como se constituiu uma perversa
estrutura de desqualificação do indivíduo, com base em discursos e
procedimentos pseudo-científicos, que está a favor de uma espúria
orientação mercantilista, administrativamente obsoleta e custosa. A
denúncia também abrange a validade ética de conceitos e ações de
Responsabilidade Social, que não incluam em seu escopo a
diminuição do assédio moral infringido aos candidatos nos
processos de contratação.
Trata-se de mascaramento obter certificados ou
marquetear ações nas comunidades, se o tratamento dispensado ao
“capital humano” a ser adquirido o transforme em cidadão de
segunda classe. Talvez seja a miopia das gestões modernas, igual à
compra de créditos-carbono ao invés da aquisição de tecnologias
não poluentes. Talvez seja endêmico, mas de forma nenhuma é
incontornável. Caso consiga demonstrar corretamente o viés
desnaturado das relações corporativas, a ineficácia de seus
instrumentos de seleção e sua daninha influência na sociedade me
sentirei satisfeito.
Antes de começar, relembro aqui um trecho do Professor
Gerárd Lebrun, grande pensador, que em uma de suas análises
sobre Michel Foucault, esbarrou profeticamente no tema que ilustra
este livro, décadas antes que fosse escrito, conforme reproduzo
abaixo:
Uma nova “economia do poder”... ainda grosseira e lacunar... Um
Leviatã que, em vez de simplesmente forçar os homens ao respeito,
trata de prevenir a sua turbulência, de constituí-los de antemão como
súditos maleáveis. Desta forma insidiosa de poder, Foucault já dizia
que era impossível descrevê-la em termos negativos (reprime,
recalca, censura...). “Na verdade, o poder produz; produz algo de
real; produz domínios de objetos e rituais de verdade”. Frase que
poderíamos encompridar indefinidamente. O poder produz, por
exemplo, os testes psicológicos que permitem - e aqui em São Paulo de
maneira particularmente escandalosa - colocar aos candidatos a
qualquer emprego questões grotescas sobre sua vida sexual etc... É
inesgotável a lista do que é produzido pelo poder disciplinar e 5inquisitorial. (Lebrun, p.80/81,1983)
O magistral ensaio de Lebrun foi publicado originalmente no Jornal
da Tarde de 14/07/1979. Já dá para perceber que o cerco se fechou
mais e mais, nos restando pouco ar para respirar. Em nosso mundo
atual e nas relações que regulam o mercado, a pessoa
desempregada é um ser invisível que luta para não perder sua
identidade, integridade e auto-estima. Hoje não se pode mais estar
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
4 A avaliação destas ferramentas milagrosas encontra-se na segunda parte. 5 Gerard Lebrun. Passeios ao Léu. Brasiliense, 1983.
1716
fora das relações de produção, sob pena de perder o direito à
própria existência. Nos fios, teias e redes do poder se perde o
homem que não se encontra alojado nos cubículos de uma posição
laboral. Não dá mais para ir a outra província oferecer seus
préstimos a um novo senhor, que lhe permita usar suas terras para
tirar seu sustento. Muito menos pode almejar a vida autárquica ou
qualquer ataraxia.
Tudo se passa em uma tridimensionalidade escalar vista
como queda: O profissional que desaba em desempregado perde
mais que o emprego, perde uma máscara vital de trágica
essencialidade trans-histórica e, por definição alguns traços de sua
individualidade. Do profissional ao desempregado e daí ao
candidato, opera-se esta descaracterização, esta “morte do sujeito”,
agora capital humano, que passa a ser validado e analisado por
padrões utilitários e competenciais visando exclusivamente o
preenchimento de um dado perfil ou modelo estratégico. Eis a
redução ao absurdo.
A mecanização dos processos industriais, a absurda
maximização do retorno, a tecnologia e as bases econômicas que
envolvem nossa civilização determinam o que se entende por
emprego e excluem da sociedade quem não tem acesso ao trabalho.
Fora do mercado parece não haver condição de sobrevivência e,
dentro dele sofre-se, impotente, o jugo de todas as patologias
sociais.
Como consultor experimentado, posso perguntar sobre o
tempo de sobrevida deste modelo administrativo suicida, do “mais
por menos”, onde o que importa é “ganhar mercado” e maiores
margens com menores custos. Até quando esta sincronia se
sustenta? Como pensador me angustia a possibilidade em
perspectiva de que nada será tentado até que as economias políticas
de mercado entrem em colapso e o clima terrestre esteja
irremediavelmente degradado. Nas páginas seguintes vocês verão
estes reflexos como num espelho e também algumas possíveis saídas
deste labirinto, pois o cristal que aponta a sombra, também reflete o
sol. E se há um momento de tentarmos fazer algo é agora!
Boa leitura!
Desemprego e Subjetividade
Alguns dias depois de ter sido demitido, encarei a primeira cena de
competição na ante-sala de uma agência de empregos. Fazia um
calor insuportável e o local estava cheio de pessoas, vibrações e
pensamentos. Era difícil se esquivar das irradiações que permeavam
o ambiente. Pode parecer meio místico ou metafísico, mas não é
raro encontrar-se em situações como esta, onde, de repente se pode
sentir a densidade do ar. Um dia a ciência poderá explicar as
relações desta memória magnética, que tem origem nas emanações
dos organismos, pensamentos e sentimentos em grande diversidade
de graus. Como ainda não chegou o tempo desta grande fusão e
vivemos o auge da era das especialidades, por ora, basta dizer que
por esta conectividade de transferência, às vezes, até as mentes se
tornam visíveis. Porém, o mais funesto não era a vibração, mas os
métodos da agência.
Apesar de ter marcado hora, a secretária me disse que a
entrevista ainda tardaria uns vinte minutos para ocorrer, então,
saquei um livro da pasta e me pus a ler. De vez em quando, parava
para me arrumar nos almofadões do sofá da sala de espera, olhando
para os lados, como que a tentar espantar os olhares de viés. Eu era o
único sem paletó e gravata e, embora aquilo cheirasse a uma 6agência de recolocação , parecia estar no Circo Máximo, bem na
jaula das feras. O ser humano médio ainda não é capaz de desejar o
bem, de forma regular e contínua, muito menos quando está
concorrendo a algo, com alguém. A melhor expressão desta
egolatria é a atitude que se toma em sociedade, onde todos
procuram aparentar serem frios, calculistas, capazes e distantes.
Porém, para quem conhece o que se passa na alma, os olhares não
podem mentir, jamais. E muitos ali eram de puro pavor!
Finalmente chegou a minha vez. Fui colocado de frente a
uma pessoa, que imediatamente passou a verificar meu currículo e
fazer comentários sobre a necessidade de o mesmo estar elaborado
de forma objetiva, pois o mercado assim exigia. Disse que o meu não
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
6 Veja a classificação das agências nos tópicos da segunda parte.
1716
fora das relações de produção, sob pena de perder o direito à
própria existência. Nos fios, teias e redes do poder se perde o
homem que não se encontra alojado nos cubículos de uma posição
laboral. Não dá mais para ir a outra província oferecer seus
préstimos a um novo senhor, que lhe permita usar suas terras para
tirar seu sustento. Muito menos pode almejar a vida autárquica ou
qualquer ataraxia.
Tudo se passa em uma tridimensionalidade escalar vista
como queda: O profissional que desaba em desempregado perde
mais que o emprego, perde uma máscara vital de trágica
essencialidade trans-histórica e, por definição alguns traços de sua
individualidade. Do profissional ao desempregado e daí ao
candidato, opera-se esta descaracterização, esta “morte do sujeito”,
agora capital humano, que passa a ser validado e analisado por
padrões utilitários e competenciais visando exclusivamente o
preenchimento de um dado perfil ou modelo estratégico. Eis a
redução ao absurdo.
A mecanização dos processos industriais, a absurda
maximização do retorno, a tecnologia e as bases econômicas que
envolvem nossa civilização determinam o que se entende por
emprego e excluem da sociedade quem não tem acesso ao trabalho.
Fora do mercado parece não haver condição de sobrevivência e,
dentro dele sofre-se, impotente, o jugo de todas as patologias
sociais.
Como consultor experimentado, posso perguntar sobre o
tempo de sobrevida deste modelo administrativo suicida, do “mais
por menos”, onde o que importa é “ganhar mercado” e maiores
margens com menores custos. Até quando esta sincronia se
sustenta? Como pensador me angustia a possibilidade em
perspectiva de que nada será tentado até que as economias políticas
de mercado entrem em colapso e o clima terrestre esteja
irremediavelmente degradado. Nas páginas seguintes vocês verão
estes reflexos como num espelho e também algumas possíveis saídas
deste labirinto, pois o cristal que aponta a sombra, também reflete o
sol. E se há um momento de tentarmos fazer algo é agora!
Boa leitura!
Desemprego e Subjetividade
Alguns dias depois de ter sido demitido, encarei a primeira cena de
competição na ante-sala de uma agência de empregos. Fazia um
calor insuportável e o local estava cheio de pessoas, vibrações e
pensamentos. Era difícil se esquivar das irradiações que permeavam
o ambiente. Pode parecer meio místico ou metafísico, mas não é
raro encontrar-se em situações como esta, onde, de repente se pode
sentir a densidade do ar. Um dia a ciência poderá explicar as
relações desta memória magnética, que tem origem nas emanações
dos organismos, pensamentos e sentimentos em grande diversidade
de graus. Como ainda não chegou o tempo desta grande fusão e
vivemos o auge da era das especialidades, por ora, basta dizer que
por esta conectividade de transferência, às vezes, até as mentes se
tornam visíveis. Porém, o mais funesto não era a vibração, mas os
métodos da agência.
Apesar de ter marcado hora, a secretária me disse que a
entrevista ainda tardaria uns vinte minutos para ocorrer, então,
saquei um livro da pasta e me pus a ler. De vez em quando, parava
para me arrumar nos almofadões do sofá da sala de espera, olhando
para os lados, como que a tentar espantar os olhares de viés. Eu era o
único sem paletó e gravata e, embora aquilo cheirasse a uma 6agência de recolocação , parecia estar no Circo Máximo, bem na
jaula das feras. O ser humano médio ainda não é capaz de desejar o
bem, de forma regular e contínua, muito menos quando está
concorrendo a algo, com alguém. A melhor expressão desta
egolatria é a atitude que se toma em sociedade, onde todos
procuram aparentar serem frios, calculistas, capazes e distantes.
Porém, para quem conhece o que se passa na alma, os olhares não
podem mentir, jamais. E muitos ali eram de puro pavor!
Finalmente chegou a minha vez. Fui colocado de frente a
uma pessoa, que imediatamente passou a verificar meu currículo e
fazer comentários sobre a necessidade de o mesmo estar elaborado
de forma objetiva, pois o mercado assim exigia. Disse que o meu não
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
6 Veja a classificação das agências nos tópicos da segunda parte.
1918
estava bom, que precisava destacar alguns itens e daí, passou a fazer
um discurso sobre o mercado e as dificuldades de recolocação.
Insistiu na necessidade de se ter um perfil adequado e sobre a 7importância dos laudos comportamentais na admissão de uma
pessoa, apresentou um panorama do mercado atual em detalhes,
enfatizando vivamente suas dificuldades e a necessidade de
estratégias. Enfim, fiquei ali uma meia hora só a ouvindo falar e pude
contar que ela usou umas trinta e cinco vezes as palavras mercado,
perfil e laudo. Depois, pediu que eu falasse sobre minha experiência
e eu relatei toda minha trajetória profissional. Ela se disse encantada
e que havia duas ou mais vagas com o meu perfil e que a
remuneração era alta, os benefícios atraentes e ela iria, então, me
encaminhar para estas empresas, caso fosse de meu interesse.
Até aí era só felicidade. Eu sabia que me haviam
subestimado na fábrica, mas agora o mundo iria abrir suas portas e
todos veriam meu sucesso. Não durou muito a ilusão. Assim que
aceitei me candidatar à vaga, ela buscou uns papéis, me olhou
firmemente dentro dos olhos e disse que iria me explicar o
funcionamento do “processo”. E eu ali, atento a tudo o que ela fazia
ou dizia, pois não se pode deixar passar as oportunidades. Enquanto
isso a tensão psíquico-orgânico-emocional se elevava me fazendo
respirar fundo. Mas, nem bem ela começou a dizer que o
investimento era compensador e pouparia meses de espera por um
emprego, algo em mim perguntou: investimento? Tentei objetar
algo, sem que a conseguisse interromper. Sua atenção estava fixada
em controlar a situação, em me dominar a vontade. Como se fosse
uma paranormal do rapport, ela gesticulava nas ênfases, buscando
approach com meu consentimento interior. De forma a legitimar sua
atividade de intermediária se empenhava em mostrar que o
investimento era realmente compensador.
Desconfiado, recusei a oferta, mesmo porque fazia pouco
tempo que estava desempregado e não queria “apelar” logo de
cara. Foi um custo para eu conseguir terminar aquela entrevista. A
mulher não me deixava contra argumentar e muito menos sair. Cada
vez que eu me opunha e tentava levantar da cadeira, ela me
segurava no braço e com um tom de voz tipo “você precisa saber
antes que seja tarde”, me instava a permanecer. Ficou ali a desfiar seu
rosário de possibilidades, oferecendo descontos e parcelamento,
até que eu me enchi e fui curto e grosso, dizendo que nem me
interessava e precisava ir embora. Só respirei aliviado ao ganhar a
rua.
Aquilo tudo me deixou muito mal. Foi um desgaste muito
grande ter enfrentado esta situação, ter ido lá, ter me iludido,
gastado gasolina e estacionamento. Eu tinha esquecido de como era
procurar emprego, das coisas pelas quais se passa e tudo o que se
encontra nesta busca.
De repente, me dei conta de que poucos têm sensibilidade
o suficiente para compreender como estes e outros processos
afetam a personalidade de quem se encontra desempregado.
Afinal, a situação em si já é bem desconfortável - para dizer o mínimo
- para ser objeto de exploração através de um discurso de mercado.
Com tempo, as recusas e submetido a processos de avaliação
desconcertantes, abre-se um grande buraco na camada de ozônio
da auto-estima e através desta brecha agem os aproveitadores.
As condições estruturais da sociedade colaboram para que
isto ocorra desta maneira, afinal a massa de desempregados é tão
vasta, as oportunidades tão fechadas, as exigências cada vez
maiores, a distância entre o candidato e o empregador é tão grande,
que fica realmente cada vez mais difícil para o ser humano médio
conseguir uma nova oportunidade, a despeito de seus méritos.
Isto, porque a segmentação estratificada das funções no
trabalho, cada vez mais determina perfis de atuação específicos e
excludentes. Ou seja: na função a ser contratada deve-se fazer isto,
deste modo e não de outro. Para tanto se precisa da competência x,
da experiência y e da pessoa z. Meu São Bergson! Se não se pode
falar em espacialização do tempo como sendo a própria realidade
objetiva, quanto mais postular uma dimensão funcional enquanto
existência ideal, preconcebida para suprir determinada
necessidade!
As pessoas não são perfis construídos a partir de
necessidades práticas e empíricas, muito menos podem ser
reduzidas a isto. A busca de eficácia funcional e da multiplicidade
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
7 Veja o glossário no final da segunda parte, com todas as definições destes conceitos. A venda destes e outros “laudos” são ilegais, mas na prática alimentam uma indústria de picaretagem que se amplia a cada dia.
1918
estava bom, que precisava destacar alguns itens e daí, passou a fazer
um discurso sobre o mercado e as dificuldades de recolocação.
Insistiu na necessidade de se ter um perfil adequado e sobre a 7importância dos laudos comportamentais na admissão de uma
pessoa, apresentou um panorama do mercado atual em detalhes,
enfatizando vivamente suas dificuldades e a necessidade de
estratégias. Enfim, fiquei ali uma meia hora só a ouvindo falar e pude
contar que ela usou umas trinta e cinco vezes as palavras mercado,
perfil e laudo. Depois, pediu que eu falasse sobre minha experiência
e eu relatei toda minha trajetória profissional. Ela se disse encantada
e que havia duas ou mais vagas com o meu perfil e que a
remuneração era alta, os benefícios atraentes e ela iria, então, me
encaminhar para estas empresas, caso fosse de meu interesse.
Até aí era só felicidade. Eu sabia que me haviam
subestimado na fábrica, mas agora o mundo iria abrir suas portas e
todos veriam meu sucesso. Não durou muito a ilusão. Assim que
aceitei me candidatar à vaga, ela buscou uns papéis, me olhou
firmemente dentro dos olhos e disse que iria me explicar o
funcionamento do “processo”. E eu ali, atento a tudo o que ela fazia
ou dizia, pois não se pode deixar passar as oportunidades. Enquanto
isso a tensão psíquico-orgânico-emocional se elevava me fazendo
respirar fundo. Mas, nem bem ela começou a dizer que o
investimento era compensador e pouparia meses de espera por um
emprego, algo em mim perguntou: investimento? Tentei objetar
algo, sem que a conseguisse interromper. Sua atenção estava fixada
em controlar a situação, em me dominar a vontade. Como se fosse
uma paranormal do rapport, ela gesticulava nas ênfases, buscando
approach com meu consentimento interior. De forma a legitimar sua
atividade de intermediária se empenhava em mostrar que o
investimento era realmente compensador.
Desconfiado, recusei a oferta, mesmo porque fazia pouco
tempo que estava desempregado e não queria “apelar” logo de
cara. Foi um custo para eu conseguir terminar aquela entrevista. A
mulher não me deixava contra argumentar e muito menos sair. Cada
vez que eu me opunha e tentava levantar da cadeira, ela me
segurava no braço e com um tom de voz tipo “você precisa saber
antes que seja tarde”, me instava a permanecer. Ficou ali a desfiar seu
rosário de possibilidades, oferecendo descontos e parcelamento,
até que eu me enchi e fui curto e grosso, dizendo que nem me
interessava e precisava ir embora. Só respirei aliviado ao ganhar a
rua.
Aquilo tudo me deixou muito mal. Foi um desgaste muito
grande ter enfrentado esta situação, ter ido lá, ter me iludido,
gastado gasolina e estacionamento. Eu tinha esquecido de como era
procurar emprego, das coisas pelas quais se passa e tudo o que se
encontra nesta busca.
De repente, me dei conta de que poucos têm sensibilidade
o suficiente para compreender como estes e outros processos
afetam a personalidade de quem se encontra desempregado.
Afinal, a situação em si já é bem desconfortável - para dizer o mínimo
- para ser objeto de exploração através de um discurso de mercado.
Com tempo, as recusas e submetido a processos de avaliação
desconcertantes, abre-se um grande buraco na camada de ozônio
da auto-estima e através desta brecha agem os aproveitadores.
As condições estruturais da sociedade colaboram para que
isto ocorra desta maneira, afinal a massa de desempregados é tão
vasta, as oportunidades tão fechadas, as exigências cada vez
maiores, a distância entre o candidato e o empregador é tão grande,
que fica realmente cada vez mais difícil para o ser humano médio
conseguir uma nova oportunidade, a despeito de seus méritos.
Isto, porque a segmentação estratificada das funções no
trabalho, cada vez mais determina perfis de atuação específicos e
excludentes. Ou seja: na função a ser contratada deve-se fazer isto,
deste modo e não de outro. Para tanto se precisa da competência x,
da experiência y e da pessoa z. Meu São Bergson! Se não se pode
falar em espacialização do tempo como sendo a própria realidade
objetiva, quanto mais postular uma dimensão funcional enquanto
existência ideal, preconcebida para suprir determinada
necessidade!
As pessoas não são perfis construídos a partir de
necessidades práticas e empíricas, muito menos podem ser
reduzidas a isto. A busca de eficácia funcional e da multiplicidade
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
7 Veja o glossário no final da segunda parte, com todas as definições destes conceitos. A venda destes e outros “laudos” são ilegais, mas na prática alimentam uma indústria de picaretagem que se amplia a cada dia.
2120
das competências é uma nova forma de opressão histórica, somente
comparável à ditadura do relógio, instituída pela Revolução
Industrial. Este entendimento, que reduz o indivíduo à determinada
forma e o predispõe a determinado trajeto é fruto de décadas de
distanciamento progressivo nas relações patrão-empregado e do
excesso da oferta de mão de obra. Isto facilitou a criação de micro
redes de poder que atuam hoje através da intermediação
terceirizada, de forma a suprir os empregadores de recursos
humanos, tal como se tratasse de verdadeiras commodities.
O pensamento dominante é o de que deve existir total
adequação à função, o que em outros termos quer dizer: o que era
sonho na República de Platão tornou-se pesadelo hardcore
corporativo. Hoje é real a estratificação em castas funcionais de
acordo com o perfil, que teimam em conceber o ente humano
apenas como justaposição, somatória de competências, inatas ou 8identificáveis.
Mesmo desconstruíndo o mito da adequação como
instrumento da felicidade e considerando a constatação como uma
advertência profética, continuamos a não acreditar que um
sapateiro possa fazer bem outra coisa que não seja sapatos e,
portanto está fadado a esta atividade.
Duvidamos também que uma pessoa “de humanas” possa
se dar bem em funções comerciais; que um operário possa ter mais
criatividade que o diretor de marketing ou pretende-se idealidades
inexeqüíveis. Exigimos que haja múltiplas competências, diversos
níveis de formação, mas estranhamos aqueles que conseguem ser
bons em duas coisas ao mesmo tempo. Não são confiáveis as
pessoas que não se pode determinar para que servem ou que sejam
competentes em mais de uma realidade ou função.
Este fundacionalismo sistemático baseado num suposto
índice mágico para o valor da pessoa funcional relega milhões ao
ostracismo econômico (se é que não é parte imanente dos perversos
mecanismos de desemprego estrutural, necessários, segundo Marx
para que a máquina de consumo funcione.
Mas até ele revirou-se mais de uma vez na tumba), pelo
simples fato de apresentar-se como prática perversa e que ninguém
controla. Psicológica, política ou economicamente, vivemos em
plena ditadura dos indicadores.
Mas poderá ser discursivo-cultural o que é vendido como
científico? Em outras palavras, chegou-se agora a uma
especialização dos perfis de adequação homem x função x ambiente
funcional, em termos da técnica de aplicação. Pode-se, claramente,
analisar um sujeito, esquadrinhando seus componentes instintivos,
mentais, cognitivos e sensoriais; planilhando suas reações e
reduzindo sua essência a dados mensuráveis. Behaviorismo
administrativo?
O problema não é questionar como se processa a aplicação
da técnica, em razão de convenções éticas aceitas pelo “mercado”,
ou de seus instrumentos de tortura: dinâmicas e testes abertos,
situações limite, non-sense, entrevistas, avaliações. O problema é
como crer que possa existir uma neutralidade de paradigmas na
interpretação.
Quem interpreta já traz consigo sua própria interpretação,
seu momento que contamina qualquer isenção. Portanto, como se
escapa à crença em diagnósticos conclusivos, adequação,
construção de perfis, correta identificação do conteúdo sensório-
mental? Como se escapa do “assim aprendi, assim dizem os doutos,
portanto assim deverá ser?” Seja dito o mesmo do “assim pediu o
diretor da empresa”, ou da mediocridade funcional do “como
selecionador eu ganho menos do que este aí e ele vai ter que ralar
para me impressionar”, seja ele simpático à escola de Freud, Caligari
ou fã de gurus de auto-ajuda?
Calma! Prometo que logo depois da próxima parte, vamos
falar o português claro e ir direto ao assunto de como driblar as
dificuldades do desemprego. Antes há coisas importantes a dizer,
pois o que ocorre na verdade é que somos levados a acreditar que os
processos de avaliação pelos quais passamos representam o esforço
da empresa em realmente selecionar aqueles indivíduos que serão
adequados ao trabalho disponível.
Existe um “direito” aqui, que é o do empregador escolher o
melhor empregado, tal qual a dona de casa escolhe as melhores
frutas na banca do supermercado.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
8 Entre estes mitos encontra-se o CHA Competências, Habilidades e Atitudes, que é o cânone sagrado dos consultores e especialistas em RH. Através deste conceito santo - dizem - pode-se determinar o que se é, onde se é feliz, para que serve o indivíduo e até quanto tempo dura na evolução corporativa. As palavras de ordem são adequação e eficácia e eles canhestramente agem como se realmente acreditassem nisto como uma verdadeira mathesis universalis.
2120
das competências é uma nova forma de opressão histórica, somente
comparável à ditadura do relógio, instituída pela Revolução
Industrial. Este entendimento, que reduz o indivíduo à determinada
forma e o predispõe a determinado trajeto é fruto de décadas de
distanciamento progressivo nas relações patrão-empregado e do
excesso da oferta de mão de obra. Isto facilitou a criação de micro
redes de poder que atuam hoje através da intermediação
terceirizada, de forma a suprir os empregadores de recursos
humanos, tal como se tratasse de verdadeiras commodities.
O pensamento dominante é o de que deve existir total
adequação à função, o que em outros termos quer dizer: o que era
sonho na República de Platão tornou-se pesadelo hardcore
corporativo. Hoje é real a estratificação em castas funcionais de
acordo com o perfil, que teimam em conceber o ente humano
apenas como justaposição, somatória de competências, inatas ou 8identificáveis.
Mesmo desconstruíndo o mito da adequação como
instrumento da felicidade e considerando a constatação como uma
advertência profética, continuamos a não acreditar que um
sapateiro possa fazer bem outra coisa que não seja sapatos e,
portanto está fadado a esta atividade.
Duvidamos também que uma pessoa “de humanas” possa
se dar bem em funções comerciais; que um operário possa ter mais
criatividade que o diretor de marketing ou pretende-se idealidades
inexeqüíveis. Exigimos que haja múltiplas competências, diversos
níveis de formação, mas estranhamos aqueles que conseguem ser
bons em duas coisas ao mesmo tempo. Não são confiáveis as
pessoas que não se pode determinar para que servem ou que sejam
competentes em mais de uma realidade ou função.
Este fundacionalismo sistemático baseado num suposto
índice mágico para o valor da pessoa funcional relega milhões ao
ostracismo econômico (se é que não é parte imanente dos perversos
mecanismos de desemprego estrutural, necessários, segundo Marx
para que a máquina de consumo funcione.
Mas até ele revirou-se mais de uma vez na tumba), pelo
simples fato de apresentar-se como prática perversa e que ninguém
controla. Psicológica, política ou economicamente, vivemos em
plena ditadura dos indicadores.
Mas poderá ser discursivo-cultural o que é vendido como
científico? Em outras palavras, chegou-se agora a uma
especialização dos perfis de adequação homem x função x ambiente
funcional, em termos da técnica de aplicação. Pode-se, claramente,
analisar um sujeito, esquadrinhando seus componentes instintivos,
mentais, cognitivos e sensoriais; planilhando suas reações e
reduzindo sua essência a dados mensuráveis. Behaviorismo
administrativo?
O problema não é questionar como se processa a aplicação
da técnica, em razão de convenções éticas aceitas pelo “mercado”,
ou de seus instrumentos de tortura: dinâmicas e testes abertos,
situações limite, non-sense, entrevistas, avaliações. O problema é
como crer que possa existir uma neutralidade de paradigmas na
interpretação.
Quem interpreta já traz consigo sua própria interpretação,
seu momento que contamina qualquer isenção. Portanto, como se
escapa à crença em diagnósticos conclusivos, adequação,
construção de perfis, correta identificação do conteúdo sensório-
mental? Como se escapa do “assim aprendi, assim dizem os doutos,
portanto assim deverá ser?” Seja dito o mesmo do “assim pediu o
diretor da empresa”, ou da mediocridade funcional do “como
selecionador eu ganho menos do que este aí e ele vai ter que ralar
para me impressionar”, seja ele simpático à escola de Freud, Caligari
ou fã de gurus de auto-ajuda?
Calma! Prometo que logo depois da próxima parte, vamos
falar o português claro e ir direto ao assunto de como driblar as
dificuldades do desemprego. Antes há coisas importantes a dizer,
pois o que ocorre na verdade é que somos levados a acreditar que os
processos de avaliação pelos quais passamos representam o esforço
da empresa em realmente selecionar aqueles indivíduos que serão
adequados ao trabalho disponível.
Existe um “direito” aqui, que é o do empregador escolher o
melhor empregado, tal qual a dona de casa escolhe as melhores
frutas na banca do supermercado.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
8 Entre estes mitos encontra-se o CHA Competências, Habilidades e Atitudes, que é o cânone sagrado dos consultores e especialistas em RH. Através deste conceito santo - dizem - pode-se determinar o que se é, onde se é feliz, para que serve o indivíduo e até quanto tempo dura na evolução corporativa. As palavras de ordem são adequação e eficácia e eles canhestramente agem como se realmente acreditassem nisto como uma verdadeira mathesis universalis.
O problema não é a lógica, mas o princípio ético envolvido:
os que não se “adequam” ao perfil, simplesmente não servem para
nada (nem outra função na empresa, o que é absurdo!) e, portanto
devem ser descartados. Ora! Para uma maçã, tudo bem!
Os critérios de podridão são claros, mas e nos seres
humanos: o que eu posso afirmar (com certeza) sobre eles? Quais os
indícios que dizem que este e não aquele irá trazer benefício ou
prejuízo à empresa? Como não confundir situação psicológica com
a ontologia do ser que é examinado? Como saber quais as
competências reais?
Resumão: É um samba do crioulo doido. Na maioria das
vezes, ideologia e senso comum temperada com a falácia dos
“modelos de gestão”. E como tal, criada pelas nossas próprias
crenças, estrutura econômica e modos de aceitar o mundo. Estar
preparado para lidar com esta situação é imprescindível para se
obter sucesso ao enfrentar as selvas dogmáticas dos recursos
humanos e das contraditórias lógicas da produção. Este estar
preparado, significa se por a salvo do modo superficial com que
avaliam os desempregados e manter a auto-estima e a capacidade
de reagir a qualquer situação. Nisto, a filosofia sempre pode ajudar!
Uma Saída Filosófica
Usaremos uma aproximação com a tese da “redução
fenomenológica”, que é a que mais se adapta à realidade sui generis
do mercado. Isto quer dizer que partiremos já de um mundo que
existe e está dado, no qual também estamos imersos. De modo que
não ficaremos perguntando se é bom ou mau, mas que existe sem
dúvida, ao mesmo tempo em que é construído pela nossa ação
direta nele. Portanto, em grande medida fruto de nossa liberdade.
Esta preexistência já instala de início uma conclusão: Existe uma
irredutibilidade lógica e ontológica entre razão e comportamento.
Ninguém pode ser reduzido a instâncias psicológicas, pois
seu construto interno não é meramente comportamental, 9psicobiológico, mas também vontade e autoconsciência. Existem
óbvios padrões de resposta emocional e comportamental, onde
podem ser testadas as nossas reações, indicados desvios, porém
estas análises não determinam a qualificação do indivíduo: somente
constatam tendências que atuam no presente, que é o momento da
própria análise. No entanto, o “mercado” acredita que não. Assim
fica claro que o buraco é mais fundo, pois além de termos que lidar
com um ecossistema social agressivo, cujo primeiro motor é
invisível e caprichoso (mercado: um verdadeiro deus grego), os
próprios instrumentos que são aprovados para nossa avaliação, a
priori não são capazes de nos avaliar, senão muito imperfeitamente.
Tentaremos resolver esta sinuca de bico, e demoraremos um pouco
mais, em respeito à sua inteligência. Mas nem por isso deixe, se
quiser, de ir já lendo os próximos capítulos, que são mais práticos.
Depois de alguns alemães do passado, acreditar que
existam valores fixos e benéficos, atrás de determinados discursos
ficou muito difícil. Hoje já distinguimos entre forma e conteúdo, mas
isto também não significa que somos capazes de reagir a alguma
coisa melhor que o ceticismo ou ao utilitarismo preferencial. No
entanto, existe uma sociedade estruturada em valores e sem a
crença neles é quase impossível conviver em sociedade. Até aí tudo
bem: o que nos propomos é: não ouvir o discurso tecnocrático com
os ouvidos do homem de bem. Ouçamos as vozes que nos dirigem,
nos oferecem coisas e soluções, mas de maneira a compreender,
além do conteúdo, o sentido. Somente com estas indicações, 10podemos surfar sobre as ondas de informação, normas, leis,
costumes, expectativas, desejos, modos de ser, exigências e o non-
sense de nossa cultura, evitando nos arrebentar contra os recifes das
doenças e neuroses urbanas.
Para isso, é preciso lembrar a cada instante, de ter cuidado 11antes de ofertar o coração com intensidade fatal ou julgar-se um
inútil só porque bateu com a cara no muro. Uma maneira de se
interpretar um dado contexto, evitando quaisquer armadilhas
retóricas à sua compreensão é perguntar a si mesmo duas coisas
simples:
2322
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
9 E para bilhões, além de mim, também com a crença racional justificada de que somos portadores de uma alma.
10 Fluctua nec mergitur...11 Proíba-se de jogar pérolas aos porcos... Aprenda que porcos gostam de milho, lama e ração.
O problema não é a lógica, mas o princípio ético envolvido:
os que não se “adequam” ao perfil, simplesmente não servem para
nada (nem outra função na empresa, o que é absurdo!) e, portanto
devem ser descartados. Ora! Para uma maçã, tudo bem!
Os critérios de podridão são claros, mas e nos seres
humanos: o que eu posso afirmar (com certeza) sobre eles? Quais os
indícios que dizem que este e não aquele irá trazer benefício ou
prejuízo à empresa? Como não confundir situação psicológica com
a ontologia do ser que é examinado? Como saber quais as
competências reais?
Resumão: É um samba do crioulo doido. Na maioria das
vezes, ideologia e senso comum temperada com a falácia dos
“modelos de gestão”. E como tal, criada pelas nossas próprias
crenças, estrutura econômica e modos de aceitar o mundo. Estar
preparado para lidar com esta situação é imprescindível para se
obter sucesso ao enfrentar as selvas dogmáticas dos recursos
humanos e das contraditórias lógicas da produção. Este estar
preparado, significa se por a salvo do modo superficial com que
avaliam os desempregados e manter a auto-estima e a capacidade
de reagir a qualquer situação. Nisto, a filosofia sempre pode ajudar!
Uma Saída Filosófica
Usaremos uma aproximação com a tese da “redução
fenomenológica”, que é a que mais se adapta à realidade sui generis
do mercado. Isto quer dizer que partiremos já de um mundo que
existe e está dado, no qual também estamos imersos. De modo que
não ficaremos perguntando se é bom ou mau, mas que existe sem
dúvida, ao mesmo tempo em que é construído pela nossa ação
direta nele. Portanto, em grande medida fruto de nossa liberdade.
Esta preexistência já instala de início uma conclusão: Existe uma
irredutibilidade lógica e ontológica entre razão e comportamento.
Ninguém pode ser reduzido a instâncias psicológicas, pois
seu construto interno não é meramente comportamental, 9psicobiológico, mas também vontade e autoconsciência. Existem
óbvios padrões de resposta emocional e comportamental, onde
podem ser testadas as nossas reações, indicados desvios, porém
estas análises não determinam a qualificação do indivíduo: somente
constatam tendências que atuam no presente, que é o momento da
própria análise. No entanto, o “mercado” acredita que não. Assim
fica claro que o buraco é mais fundo, pois além de termos que lidar
com um ecossistema social agressivo, cujo primeiro motor é
invisível e caprichoso (mercado: um verdadeiro deus grego), os
próprios instrumentos que são aprovados para nossa avaliação, a
priori não são capazes de nos avaliar, senão muito imperfeitamente.
Tentaremos resolver esta sinuca de bico, e demoraremos um pouco
mais, em respeito à sua inteligência. Mas nem por isso deixe, se
quiser, de ir já lendo os próximos capítulos, que são mais práticos.
Depois de alguns alemães do passado, acreditar que
existam valores fixos e benéficos, atrás de determinados discursos
ficou muito difícil. Hoje já distinguimos entre forma e conteúdo, mas
isto também não significa que somos capazes de reagir a alguma
coisa melhor que o ceticismo ou ao utilitarismo preferencial. No
entanto, existe uma sociedade estruturada em valores e sem a
crença neles é quase impossível conviver em sociedade. Até aí tudo
bem: o que nos propomos é: não ouvir o discurso tecnocrático com
os ouvidos do homem de bem. Ouçamos as vozes que nos dirigem,
nos oferecem coisas e soluções, mas de maneira a compreender,
além do conteúdo, o sentido. Somente com estas indicações, 10podemos surfar sobre as ondas de informação, normas, leis,
costumes, expectativas, desejos, modos de ser, exigências e o non-
sense de nossa cultura, evitando nos arrebentar contra os recifes das
doenças e neuroses urbanas.
Para isso, é preciso lembrar a cada instante, de ter cuidado 11antes de ofertar o coração com intensidade fatal ou julgar-se um
inútil só porque bateu com a cara no muro. Uma maneira de se
interpretar um dado contexto, evitando quaisquer armadilhas
retóricas à sua compreensão é perguntar a si mesmo duas coisas
simples:
2322
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
9 E para bilhões, além de mim, também com a crença racional justificada de que somos portadores de uma alma.
10 Fluctua nec mergitur...11 Proíba-se de jogar pérolas aos porcos... Aprenda que porcos gostam de milho, lama e ração.
2524
1 - O que diz este dizer, este discurso ou signo que acabei de ouvir, ver ou
apreender?
2 - O que não disse este dizer, este discurso, isto que acabei de ouvir e
apreender?
Normalmente dizemos que “entendemos” ou “compreendemos”
uma frase, um gesto, uma situação, sem a menor noção do que
estamos afirmando. Outras tantas, dizemos a nós mesmos que
estamos de “acordo” com tal e qual modo de ação, mesmo não
sabendo bem sobre todas as conseqüências que poderá advir no
tempo e no espaço. Enfim, parece da natureza dos humanos,
assentir que se compreende tudo, quando apenas apreende uma
parte, talvez pelas cobranças de nossa cultura, acreditamos que
“devemos” compreender e, de pronto, responder a esta
compreensão, afirmando alguma coisa de essencial sobre o que foi
compreendido. No entanto, compreender significa mais que
apreender, pois envolve complexas operações racionais,
emocionais e comportamentais.
Não pode ser confundido com a mera sensação do
conhecimento, mesmo porque conhecimento não é sensação:
aquilo que eu vejo ou apreendo não significa que eu compreenda o
que vejo ou sinto. Deste modo, a fórmula acima pode nos tirar de
muitos apuros e evitar grandes melindres ulteriores, caso sigamos
sua aplicação. Pode acreditar que funciona na maioria dos casos.
Mas o que significa o primeiro item? E o segundo então?
Que raios quer dizer aquilo que não se disse? Como assim? Certo!
Vamos ao manual de instruções:
Em primeiro lugar, devemos deixar claro que existem em
nós duas forças atuando em conjunto: razão e inteligência. Uma é
diferente, mas complementar a outra, não sendo a mesma e nem
agindo de igual maneira. A inteligência é a sublimação do instinto e
opera em vista à utilidade, portanto, descartando tudo aquilo que
não é imediatamente necessário ou construindo ferramental
adequado para se lidar com determinada situação ou dificuldade. A
inteligência parte da análise: decompõe para descobrir, quantificar
e regulamentar a generalização.
Trata-se de um princípio de seleção, de um instrumento de
ação sobre o mundo que age com vistas a controlá-lo, a submetê-lo
às nossas vontades e necessidades. A razão, por seu lado é reflexão,
que partindo da síntese das multiplicidades em uma
autoconsciência, incorpora a linguagem, a expressão, a
conceituação, a memória, a compreensão de todas as percepções,
instrumentos e, principalmente suas finalidades. A razão é capaz de
transcender aos mecanismos de controle da matéria e desenvolve 12um ethos , com o qual se inter-relaciona com o mundo e norteia
suas ações e escolhas. Dito isso, vamos em frente.
Quando alguém diz, por exemplo, que hoje vai chover,
normalmente não corremos a comprar um guarda-chuva, mas
antes arriscamos um prognóstico, baseados em algum indício ou
crença. Poucas vezes analisamos as possibilidades de que isto
realmente ocorra, ou seja: quais as probabilidades de que este dizer
se refira, em seu sentido, a uma urgência ou realidade imediata. Na
maioria das vezes nossas respostas são precárias. Atuamos em
relação a crenças pessoais e projeções, dando-lhes ar de ciência:
confiamos ou não na pessoa que disse aquilo, olhamos para o céu,
apostamos se é possível ou não que chova. Mas paramos por aí: não
desejamos saber realmente se irá chover. E se isto ocorrer, não
queremos estender a análise às áreas de risco da cidade, aos pontos
de alagamento, às possíveis vítimas de afogamento, em cobrar do
Estado uma solução para as enchentes, no que isto significa em
termos de qualidade de vida e saneamento, não estudamos os
custos e benefícios de forma racional e generalizada em busca de
soluções que possam ser aplicadas: simplesmente nos atemos ao
nosso trajeto, interesses e expectativas pessoais. Isto significa que
selecionamos utilitariamente as conseqüências em função de nossas
necessidades, através da função inteligente de nosso ser, mormente
se restringido a pálido uso: se não nos importunar, não nos interessa.
Isto prova que, a despeito de nossas iluminadas crenças, ciência,
moral e cidadania não são sinônimos. Nem andam lado a lado rumo
a um futuro brilhante de progresso e conforto. Assim, mesmo que
chova forte, diminuiremos os inconvenientes, de qualquer maneira
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
12 Aqui com sentido de caráter.
2524
1 - O que diz este dizer, este discurso ou signo que acabei de ouvir, ver ou
apreender?
2 - O que não disse este dizer, este discurso, isto que acabei de ouvir e
apreender?
Normalmente dizemos que “entendemos” ou “compreendemos”
uma frase, um gesto, uma situação, sem a menor noção do que
estamos afirmando. Outras tantas, dizemos a nós mesmos que
estamos de “acordo” com tal e qual modo de ação, mesmo não
sabendo bem sobre todas as conseqüências que poderá advir no
tempo e no espaço. Enfim, parece da natureza dos humanos,
assentir que se compreende tudo, quando apenas apreende uma
parte, talvez pelas cobranças de nossa cultura, acreditamos que
“devemos” compreender e, de pronto, responder a esta
compreensão, afirmando alguma coisa de essencial sobre o que foi
compreendido. No entanto, compreender significa mais que
apreender, pois envolve complexas operações racionais,
emocionais e comportamentais.
Não pode ser confundido com a mera sensação do
conhecimento, mesmo porque conhecimento não é sensação:
aquilo que eu vejo ou apreendo não significa que eu compreenda o
que vejo ou sinto. Deste modo, a fórmula acima pode nos tirar de
muitos apuros e evitar grandes melindres ulteriores, caso sigamos
sua aplicação. Pode acreditar que funciona na maioria dos casos.
Mas o que significa o primeiro item? E o segundo então?
Que raios quer dizer aquilo que não se disse? Como assim? Certo!
Vamos ao manual de instruções:
Em primeiro lugar, devemos deixar claro que existem em
nós duas forças atuando em conjunto: razão e inteligência. Uma é
diferente, mas complementar a outra, não sendo a mesma e nem
agindo de igual maneira. A inteligência é a sublimação do instinto e
opera em vista à utilidade, portanto, descartando tudo aquilo que
não é imediatamente necessário ou construindo ferramental
adequado para se lidar com determinada situação ou dificuldade. A
inteligência parte da análise: decompõe para descobrir, quantificar
e regulamentar a generalização.
Trata-se de um princípio de seleção, de um instrumento de
ação sobre o mundo que age com vistas a controlá-lo, a submetê-lo
às nossas vontades e necessidades. A razão, por seu lado é reflexão,
que partindo da síntese das multiplicidades em uma
autoconsciência, incorpora a linguagem, a expressão, a
conceituação, a memória, a compreensão de todas as percepções,
instrumentos e, principalmente suas finalidades. A razão é capaz de
transcender aos mecanismos de controle da matéria e desenvolve 12um ethos , com o qual se inter-relaciona com o mundo e norteia
suas ações e escolhas. Dito isso, vamos em frente.
Quando alguém diz, por exemplo, que hoje vai chover,
normalmente não corremos a comprar um guarda-chuva, mas
antes arriscamos um prognóstico, baseados em algum indício ou
crença. Poucas vezes analisamos as possibilidades de que isto
realmente ocorra, ou seja: quais as probabilidades de que este dizer
se refira, em seu sentido, a uma urgência ou realidade imediata. Na
maioria das vezes nossas respostas são precárias. Atuamos em
relação a crenças pessoais e projeções, dando-lhes ar de ciência:
confiamos ou não na pessoa que disse aquilo, olhamos para o céu,
apostamos se é possível ou não que chova. Mas paramos por aí: não
desejamos saber realmente se irá chover. E se isto ocorrer, não
queremos estender a análise às áreas de risco da cidade, aos pontos
de alagamento, às possíveis vítimas de afogamento, em cobrar do
Estado uma solução para as enchentes, no que isto significa em
termos de qualidade de vida e saneamento, não estudamos os
custos e benefícios de forma racional e generalizada em busca de
soluções que possam ser aplicadas: simplesmente nos atemos ao
nosso trajeto, interesses e expectativas pessoais. Isto significa que
selecionamos utilitariamente as conseqüências em função de nossas
necessidades, através da função inteligente de nosso ser, mormente
se restringido a pálido uso: se não nos importunar, não nos interessa.
Isto prova que, a despeito de nossas iluminadas crenças, ciência,
moral e cidadania não são sinônimos. Nem andam lado a lado rumo
a um futuro brilhante de progresso e conforto. Assim, mesmo que
chova forte, diminuiremos os inconvenientes, de qualquer maneira
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
12 Aqui com sentido de caráter.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
e não temos que ficar pensando nos “problemas dos outros”. Isto é o
que faz o homem comum, pois não é um assunto de grande
importância e afinal quem está na chuva é para se molhar, diz o
néscio. Amanhã é outro dia.
Mas esta situação simples, levada a um outro contexto
pode resultar em acidentes graves. É o caso de quando vamos
assinar um contrato ou financiamento e uma das muitas cláusulas
impõe sanções exorbitantes em caso de não cumprimento e, mesmo
lendo o documento, acreditamos que não é o caso de preocupação,
pois nossa situação imediata é confortável. Além do mais,
acreditamos poder contestar depois na Justiça ou fazer algum
acordo se as coisas derem errado. Mas e se você, de repente, perder
o emprego? Sequer lembrou de fazer um seguro? Não? E agora?
Descobriu relendo o contrato que a dívida passa de pai para filho? O
banco não quer negociar? Não tem nenhum acesso ao STF? Pode
perder a casa e todos os bens? Não consegue emprego porque o seu
nome está no SPC? Ai, Jesus!! O mundo está contra mim!! Deus me
abandonou!! Eu sou um azarado!!
Nada disso! Você ajudou a construir o mundo, seja agindo
ou ficando na moita cuidando da própria vida. É horroroso?
Lamento, mas em alguma instância ele possui sua chancela, sua
autorização para ser assim e não de outro modo. Poucas vezes
refletimos sobre o que realmente significam aquelas sanções que
ignoramos a extensão ou procuramos responder quais suas reais
conseqüências - na prática -, daquilo que acreditamos e aprovamos.
A especulação dourada do reducionismo hedonista-materialista se
esvai quando se pergunta: Até onde poderia o infrator ser atingido?
E se o infrator for eu? Deveremos ou não assinar? Em que medida
existem direitos que me protejam? Existe isonomia entre as
garantias? Quem é ingênuo a ponto de acreditar que um credor não
utilizará todos os instrumentos ao seu dispor para receber o que foi
acertado, que leia o Mercador de Veneza, de Shakespeare ou fique
devendo dinheiro a um banco que ouve você. Portanto, eis um caso
prático onde é importante saber exatamente o que quer dizer aquilo
que se disse: quais as reais implicações, os significados, as
conseqüências, as implicações, os desdobramentos, as ações agora,
durante e depois! O filósofo age assim: procura saber antes para não
ter que se lamentar mais tarde!
Claro que não precisamos ser assim tão dramáticos, mas
ajuda a ilustrar o que nos acontece quando tentamos utilizar uma
maneira única de abordar várias situações. No emprego e também
fora dele somos vítimas de nosso modo de encarar as coisas: de
como compreendemos os contextos, do modo como reagimos a
determinadas situações, de nossa falta de precaução ou de tato, da
maneira pela qual acreditamos que as coisas sejam assim ou assado,
dos valores que aceitamos, da distância entre nosso discurso e a
prática, dos problemas que nos ocorrem nas relações humanas e no
trabalho, de nossas opiniões, projeções e conhecimentos. Enfim,
muito do que nos acontece é porque, de certo modo, deixamos que
acontecesse ou contribuímos para isso. E nada dói mais do que
sentir que ninguém nos avisou sobre os perigos ali na frente. Mas, eu
pergunto: será que realmente não houve algum tipo de aviso ou
fomos nós mesmos que não demos atenção a sinais claros,
empenhados que estávamos em fazer valer nossas próprias
conjecturas? Antes de nos sentirmos magoados por situações
inesperadas ou olhares irônicos carregados com mensagens do tipo:
agora você sabe de tudo e tá na rua, mané! Vejamos o que podemos
fazer para nunca mais cairmos tão facilmente nas armadilhas
corporativas, mantendo a auto-estima, o profissionalismo e
reconstruindo a carreira.
No segundo item, a avaliação é um pouco mais imprecisa e
intuitiva, mas muito importante em seus termos de negatividade, ou
seja: o que foi excluído? Esta é a instância da negação de algo, um
não-vir-a-ser. Mas, antes pode significar também a exclusão pela
afirmação. Como? Simples: se dissermos que isto é azul, então não é
verde, ou seja, ao afirmar algo é automático aceitar que este algo
não é outro, mas somente este algo. Não é um silêncio de leis, onde
reina a mais absurda liberdade, porém uma norma contrária: se não
dissemos, não se pode fazer!! Por outro lado, pode ser entendido
que a negação também é uma condição de desconstrução do que
foi dito, buscando verificar se no intervalo aberto pelo que não foi
afirmado ou determinado, existe ou não algum tipo de mensagem,
de compromisso tácito, sutil, subliminar que pressupõe algo que
deveríamos saber. É como perceber a função das pausas na música:
elas são o elemento de ligação entre as notas que constroem a
2726
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
e não temos que ficar pensando nos “problemas dos outros”. Isto é o
que faz o homem comum, pois não é um assunto de grande
importância e afinal quem está na chuva é para se molhar, diz o
néscio. Amanhã é outro dia.
Mas esta situação simples, levada a um outro contexto
pode resultar em acidentes graves. É o caso de quando vamos
assinar um contrato ou financiamento e uma das muitas cláusulas
impõe sanções exorbitantes em caso de não cumprimento e, mesmo
lendo o documento, acreditamos que não é o caso de preocupação,
pois nossa situação imediata é confortável. Além do mais,
acreditamos poder contestar depois na Justiça ou fazer algum
acordo se as coisas derem errado. Mas e se você, de repente, perder
o emprego? Sequer lembrou de fazer um seguro? Não? E agora?
Descobriu relendo o contrato que a dívida passa de pai para filho? O
banco não quer negociar? Não tem nenhum acesso ao STF? Pode
perder a casa e todos os bens? Não consegue emprego porque o seu
nome está no SPC? Ai, Jesus!! O mundo está contra mim!! Deus me
abandonou!! Eu sou um azarado!!
Nada disso! Você ajudou a construir o mundo, seja agindo
ou ficando na moita cuidando da própria vida. É horroroso?
Lamento, mas em alguma instância ele possui sua chancela, sua
autorização para ser assim e não de outro modo. Poucas vezes
refletimos sobre o que realmente significam aquelas sanções que
ignoramos a extensão ou procuramos responder quais suas reais
conseqüências - na prática -, daquilo que acreditamos e aprovamos.
A especulação dourada do reducionismo hedonista-materialista se
esvai quando se pergunta: Até onde poderia o infrator ser atingido?
E se o infrator for eu? Deveremos ou não assinar? Em que medida
existem direitos que me protejam? Existe isonomia entre as
garantias? Quem é ingênuo a ponto de acreditar que um credor não
utilizará todos os instrumentos ao seu dispor para receber o que foi
acertado, que leia o Mercador de Veneza, de Shakespeare ou fique
devendo dinheiro a um banco que ouve você. Portanto, eis um caso
prático onde é importante saber exatamente o que quer dizer aquilo
que se disse: quais as reais implicações, os significados, as
conseqüências, as implicações, os desdobramentos, as ações agora,
durante e depois! O filósofo age assim: procura saber antes para não
ter que se lamentar mais tarde!
Claro que não precisamos ser assim tão dramáticos, mas
ajuda a ilustrar o que nos acontece quando tentamos utilizar uma
maneira única de abordar várias situações. No emprego e também
fora dele somos vítimas de nosso modo de encarar as coisas: de
como compreendemos os contextos, do modo como reagimos a
determinadas situações, de nossa falta de precaução ou de tato, da
maneira pela qual acreditamos que as coisas sejam assim ou assado,
dos valores que aceitamos, da distância entre nosso discurso e a
prática, dos problemas que nos ocorrem nas relações humanas e no
trabalho, de nossas opiniões, projeções e conhecimentos. Enfim,
muito do que nos acontece é porque, de certo modo, deixamos que
acontecesse ou contribuímos para isso. E nada dói mais do que
sentir que ninguém nos avisou sobre os perigos ali na frente. Mas, eu
pergunto: será que realmente não houve algum tipo de aviso ou
fomos nós mesmos que não demos atenção a sinais claros,
empenhados que estávamos em fazer valer nossas próprias
conjecturas? Antes de nos sentirmos magoados por situações
inesperadas ou olhares irônicos carregados com mensagens do tipo:
agora você sabe de tudo e tá na rua, mané! Vejamos o que podemos
fazer para nunca mais cairmos tão facilmente nas armadilhas
corporativas, mantendo a auto-estima, o profissionalismo e
reconstruindo a carreira.
No segundo item, a avaliação é um pouco mais imprecisa e
intuitiva, mas muito importante em seus termos de negatividade, ou
seja: o que foi excluído? Esta é a instância da negação de algo, um
não-vir-a-ser. Mas, antes pode significar também a exclusão pela
afirmação. Como? Simples: se dissermos que isto é azul, então não é
verde, ou seja, ao afirmar algo é automático aceitar que este algo
não é outro, mas somente este algo. Não é um silêncio de leis, onde
reina a mais absurda liberdade, porém uma norma contrária: se não
dissemos, não se pode fazer!! Por outro lado, pode ser entendido
que a negação também é uma condição de desconstrução do que
foi dito, buscando verificar se no intervalo aberto pelo que não foi
afirmado ou determinado, existe ou não algum tipo de mensagem,
de compromisso tácito, sutil, subliminar que pressupõe algo que
deveríamos saber. É como perceber a função das pausas na música:
elas são o elemento de ligação entre as notas que constroem a
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melodia, ao mesmo tempo em que são como os pilares desta mesma
construção. Retirem-se as pausas e temos apenas um amontoado de
ruídos sem sentido. Verificar o que não foi dito significa antecipar-se
a qualquer má interpretação, a qualquer “eu achei que fosse
diferente”. Usar estas regrinhas pode auxiliar muito nas relações de
compreensão que constituem nossa vida.
Mas, como dizem os que sabem, a obra uma vez lançada
distancia-se do autor e adquire realidade própria, além do querer
dizer existe a necessária mediação pelo interlocutor, em uma
relação de interpretação. Sendo assim, são vocês que devem tirar as
conclusões sobre o que vou relatar acerca do que realmente
aconteceu...
CAPÍTULO I
DOCES ENTREVISTAS
São Paulo, Janeiro de 2005 - Início da Saga
As semanas se passavam e nada parecia acontecer. Depois de passar
por várias entrevistas, senti que alguma coisa estava empacando
meus objetivos. Normalmente era chamado por telefone para um
processo seletivo, marcavam uma primeira visita, eu comparecia,
falava sobre minha história, meu perfil, minhas metas, como havia
sido dispensado, o porquê da minha formação educacional e por aí
caminhava a conversação. Invariavelmente eram sempre as
mesmas perguntas, quase que na mesma seqüência e feitas de forma
semi-mecânica. Eu procurava responder com empenho, colocando
ênfase nas partes que tinha mais experiência ou conhecimento,
inclusive destacando pontos relevantes e citando exemplos e
situações. Procurava demonstrar o maior interesse, embora quase
nada sobre as vagas me fosse dito - mistério insondável e que é
normal, na maioria dos casos. Mas como os processos não iam para
frente, fiquei desconfiado, pois parecia que eu não agradava logo de
cara. Foi quando eu me toquei que havia algo errado: eu estava
sendo sincero demais!
De repente, ficou claro que eu devia fazer correções na
rota. Afinal, eu estava há alguns anos fora do contingente que está aí
no esforço insano para arrumar outro emprego. Tinha que me
adaptar, urgentemente ao novo padrão, se quisesse conseguir uma
oportunidade em breve. E isto não deveria ser problema, pois
LUÍS SÉRGIO LICO
28
melodia, ao mesmo tempo em que são como os pilares desta mesma
construção. Retirem-se as pausas e temos apenas um amontoado de
ruídos sem sentido. Verificar o que não foi dito significa antecipar-se
a qualquer má interpretação, a qualquer “eu achei que fosse
diferente”. Usar estas regrinhas pode auxiliar muito nas relações de
compreensão que constituem nossa vida.
Mas, como dizem os que sabem, a obra uma vez lançada
distancia-se do autor e adquire realidade própria, além do querer
dizer existe a necessária mediação pelo interlocutor, em uma
relação de interpretação. Sendo assim, são vocês que devem tirar as
conclusões sobre o que vou relatar acerca do que realmente
aconteceu...
CAPÍTULO I
DOCES ENTREVISTAS
São Paulo, Janeiro de 2005 - Início da Saga
As semanas se passavam e nada parecia acontecer. Depois de passar
por várias entrevistas, senti que alguma coisa estava empacando
meus objetivos. Normalmente era chamado por telefone para um
processo seletivo, marcavam uma primeira visita, eu comparecia,
falava sobre minha história, meu perfil, minhas metas, como havia
sido dispensado, o porquê da minha formação educacional e por aí
caminhava a conversação. Invariavelmente eram sempre as
mesmas perguntas, quase que na mesma seqüência e feitas de forma
semi-mecânica. Eu procurava responder com empenho, colocando
ênfase nas partes que tinha mais experiência ou conhecimento,
inclusive destacando pontos relevantes e citando exemplos e
situações. Procurava demonstrar o maior interesse, embora quase
nada sobre as vagas me fosse dito - mistério insondável e que é
normal, na maioria dos casos. Mas como os processos não iam para
frente, fiquei desconfiado, pois parecia que eu não agradava logo de
cara. Foi quando eu me toquei que havia algo errado: eu estava
sendo sincero demais!
De repente, ficou claro que eu devia fazer correções na
rota. Afinal, eu estava há alguns anos fora do contingente que está aí
no esforço insano para arrumar outro emprego. Tinha que me
adaptar, urgentemente ao novo padrão, se quisesse conseguir uma
oportunidade em breve. E isto não deveria ser problema, pois
LUÍS SÉRGIO LICO
28
bastava me atualizar, fazer uma reciclagem dos conhecimentos,
reescrever o currículo, colocar uma fatiota combinando com a
gravata para os devidos efeitos práticos (a aparência transmite
seriedade, profissionalismo, postura moral, adequação, capacidade
e outros delírios) e logo, logo, teria bons resultados. Não foi bem
assim que correram as coisas, como veremos no restante deste
capítulo, onde me dedico a relatar todos os incidentes de percurso
que devem ser evitados.
1 - O Perigo Objetivo:
Numa entrevista não se procura saber o que realmente se é. Aquele
papo quebra gelo de “vamos nos conhecer melhor” é apenas um
impulso inicial para a conversa. Tenha sempre em mente que aquela
pessoa que está lhe entrevistando faz isto, pelo menos, 50 vezes ao
dia - todos os dias! Desse jeito, é normal que à tarde esta pessoa nem
lembre mais com quem falou há duas horas atrás. Sua importância
como indivíduo praticamente inexiste, o que interessa e preencher a
vaga para o cliente que aguarda o candidato ideal.
Além disso, considere que existe absurdo excesso de
pretendentes ao emprego, e isto fez com que esta pessoa tenha
passado antes de falar com você horas na internet garimpando
currículos ou abrindo e lendo uns 250 e-mails para selecionar 5 ou 6
possíveis eleitos. Neste contexto, a objetividade é a regra de ouro, que
como tudo possui exceções.
Assim que constatei que não podia ficar perdendo
preciosas oportunidades porque não conseguia responder com
clarividência aos questionamentos, decidi mudar de estratégia. Eu
deveria, a partir de agora, deixar de falar com tanta ênfase nas
minhas competências e passar a tentar responder de forma clara,
concisa e objetiva às perguntas. Foi outro desastre! Se antes o
excesso de entrelinhas não me dava chance, porque o mala do
entrevistador “não conseguia achar um foco”, agora o discurso
sintético fazia com que fosse avaliado como um inepto
desinteressado ou com horizontes estreitos. A situação desafiava
minha razão e, então, procurei auxílio especializado.
Buscar emprego era uma questão de técnica. Dali para
diante eu rebateria com precisão quaisquer argumentos, sendo
assertivo, deixando claro que minhas aptidões me levavam a ser
proativo, “empregável”, pluridisciplinar. Busquei as ferramentas e
opiniões aceitas e dei com os burros n'água. Ser objetivo requer
cuidado! É preciso avaliar muitas outras coisas, além das respostas
que se dá numa entrevista. Uma das últimas vezes que tentei seguir
as instruções dos artigos de jornais e palestrantes genéricos resultou
no caso abaixo:
- Em que sua formação em filosofia pode contribuir para o crescimento
da empresa? Porque você decidiu escolher esta carreira? Perguntava a
entrevistadora.
- Uma formação superior em áreas do conhecimento pode ser útil em
muitos casos, é importante possuir condições de refletir e planejar com
razoável índice de eficiência para poder cumprir as metas. Para
organizar as coisas é preciso ter métodos. Dominar os processos de
apreensão permite determinar linhas de atuação para o que se quer
conseguir. Esta visão ajuda até nas análises de redução de custos e
possibilita criar canais de interatividade para integração com a equipe.
- Mas se você se interessa pela área do conhecimento, porque está aqui?
Não vejo como isto pode ajudar o departamento comercial a vender
mais. Você tinha que ter feito administração em função de seus cargos
anteriores. Você mudou de rumo ou mudaram suas expectativas?
- Como assim? Titubeei. Estas minhas experiências e formação superior
só vêm a somar...
- Seu perfil foge da descrição do cargo. Você passou por muitas
empresas, disse que gosta de refletir, que acha importante ter método e
planejar. Não consigo fechar um foco em você. Só sei que preciso é de
alguém que se dedique a construir tabelas em Excel, conheça
marketing, promoção e dê suporte ao gerente. Não alguém que faça
perguntas ou que fique viajando no horário de expediente. Veja bem:
não sou eu que falo isso, as pessoas são assim.
- Justamente! Eu já atuei com tudo isso e pode ter certeza que um
profissional com a minha trajetória consegue planilhar um
departamento! O que eu não vejo é uma relação de causa e efeito com
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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bastava me atualizar, fazer uma reciclagem dos conhecimentos,
reescrever o currículo, colocar uma fatiota combinando com a
gravata para os devidos efeitos práticos (a aparência transmite
seriedade, profissionalismo, postura moral, adequação, capacidade
e outros delírios) e logo, logo, teria bons resultados. Não foi bem
assim que correram as coisas, como veremos no restante deste
capítulo, onde me dedico a relatar todos os incidentes de percurso
que devem ser evitados.
1 - O Perigo Objetivo:
Numa entrevista não se procura saber o que realmente se é. Aquele
papo quebra gelo de “vamos nos conhecer melhor” é apenas um
impulso inicial para a conversa. Tenha sempre em mente que aquela
pessoa que está lhe entrevistando faz isto, pelo menos, 50 vezes ao
dia - todos os dias! Desse jeito, é normal que à tarde esta pessoa nem
lembre mais com quem falou há duas horas atrás. Sua importância
como indivíduo praticamente inexiste, o que interessa e preencher a
vaga para o cliente que aguarda o candidato ideal.
Além disso, considere que existe absurdo excesso de
pretendentes ao emprego, e isto fez com que esta pessoa tenha
passado antes de falar com você horas na internet garimpando
currículos ou abrindo e lendo uns 250 e-mails para selecionar 5 ou 6
possíveis eleitos. Neste contexto, a objetividade é a regra de ouro, que
como tudo possui exceções.
Assim que constatei que não podia ficar perdendo
preciosas oportunidades porque não conseguia responder com
clarividência aos questionamentos, decidi mudar de estratégia. Eu
deveria, a partir de agora, deixar de falar com tanta ênfase nas
minhas competências e passar a tentar responder de forma clara,
concisa e objetiva às perguntas. Foi outro desastre! Se antes o
excesso de entrelinhas não me dava chance, porque o mala do
entrevistador “não conseguia achar um foco”, agora o discurso
sintético fazia com que fosse avaliado como um inepto
desinteressado ou com horizontes estreitos. A situação desafiava
minha razão e, então, procurei auxílio especializado.
Buscar emprego era uma questão de técnica. Dali para
diante eu rebateria com precisão quaisquer argumentos, sendo
assertivo, deixando claro que minhas aptidões me levavam a ser
proativo, “empregável”, pluridisciplinar. Busquei as ferramentas e
opiniões aceitas e dei com os burros n'água. Ser objetivo requer
cuidado! É preciso avaliar muitas outras coisas, além das respostas
que se dá numa entrevista. Uma das últimas vezes que tentei seguir
as instruções dos artigos de jornais e palestrantes genéricos resultou
no caso abaixo:
- Em que sua formação em filosofia pode contribuir para o crescimento
da empresa? Porque você decidiu escolher esta carreira? Perguntava a
entrevistadora.
- Uma formação superior em áreas do conhecimento pode ser útil em
muitos casos, é importante possuir condições de refletir e planejar com
razoável índice de eficiência para poder cumprir as metas. Para
organizar as coisas é preciso ter métodos. Dominar os processos de
apreensão permite determinar linhas de atuação para o que se quer
conseguir. Esta visão ajuda até nas análises de redução de custos e
possibilita criar canais de interatividade para integração com a equipe.
- Mas se você se interessa pela área do conhecimento, porque está aqui?
Não vejo como isto pode ajudar o departamento comercial a vender
mais. Você tinha que ter feito administração em função de seus cargos
anteriores. Você mudou de rumo ou mudaram suas expectativas?
- Como assim? Titubeei. Estas minhas experiências e formação superior
só vêm a somar...
- Seu perfil foge da descrição do cargo. Você passou por muitas
empresas, disse que gosta de refletir, que acha importante ter método e
planejar. Não consigo fechar um foco em você. Só sei que preciso é de
alguém que se dedique a construir tabelas em Excel, conheça
marketing, promoção e dê suporte ao gerente. Não alguém que faça
perguntas ou que fique viajando no horário de expediente. Veja bem:
não sou eu que falo isso, as pessoas são assim.
- Justamente! Eu já atuei com tudo isso e pode ter certeza que um
profissional com a minha trajetória consegue planilhar um
departamento! O que eu não vejo é uma relação de causa e efeito com
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
3130
minha formação. Conhecimento não é importante? Minha experiência
é clara, inclusive, já fui responsável por equipes de grande porte e
administrava alto valor de budget.
- Sei. Bom, como eu dizia, eu estou aqui para ver se há adequação do
candidato ao perfil da vaga. Você parece ser proativo, questiona as
circunstâncias, mas não sei se esta postura é a que o cliente precisa...
Veja bem, se o candidato não se encaixa completamente em um mapa
característico, depois ele não vai se sentir feliz trabalhando, não é
mesmo? Mais importante que um emprego é estar bem consigo mesmo!
Não adianta eu selecionar alguém e ele não se realizar no emprego.
Você sabe que o foco na carreira é 100% da vida de um profissional.
- Olha! Veja...O que eu quero dizer... Tentei cortar, desesperado, pois
não conseguia entender como se pode ficar bem consigo mesmo
estando desempregado, mas sem sucesso.
- Bom, esta é apenas uma primeira etapa e se você for aprovado
entraremos em contato.
- ...é que posso contribuir com minhas competências, tanto para tarefas
operacionais, quanto interagindo com a equipe ou a gerência. Enfim,
procuro ser útil em todos os momentos e tento estar informado sobre as
diversas tendências e ferramentas.
- Sei. Você tem uma formação generalista, suspirou ela. Bom, eu não
posso adiantar mais nada sobre a vaga, nem os vencimentos, pois a
vaga é fechada, mas de qualquer jeito, o próximo passo é encaminhar
seu currículo para a empresa. Obrigado por ter vindo. Aguarde um
contato!
O exemplo acima é coisa comum a todos os que estão a procura de
emprego: como responder se você serve ou não ao cargo se não
dizem nada sobre ele. Tudo parece uma série infindável de peneiras
e a pior coisa que você pode fazer é usar dos conselhos de
especialistas.
O ponto aqui é saber sondar a entrevistadora para que ela
abra possibilidades de você interagir e não ser analisado e
descartado por um perfil estreito demais. Se não for assim o contato
para uma segunda fase ou o famoso “feedback” só virá na primeira
quarta-feira depois do dia de São Nunca. Veja a seguir como ser
“objetivo”, na acepção mercadológica do termo que significa algo
como “cumprir os requisitos exigidos” e que não consiste somente
em dar respostas racionais e eficazes:
- Em que sua formação em filosofia pode contribuir para o crescimento
da empresa? Porque você decidiu escolher esta carreira?
- Primeiro porque tenho interesse na área do conhecimento e a razão
sempre deve ser aplicada tanto na vida profissional ou pessoal. Outra
coisa é que, há tempos eu sentia a necessidade de complementar meus
estudos, de me atualizar. Outro ponto é como recusar as oportunidades
conquistadas? Eu fui um dos melhores colocados no vestibular e por
isso a universidade me ofereceu uma bolsa integral. Eu procuro
aproveitar o que aprendi no dia a dia. Foi um grande desafio voltar a
estudar, mas com determinação e disciplina conciliei bem as coisas.
Agora pretendo fazer uma pós em alguma área promissora, talvez mais
próxima de minhas atividades.
- Certo! O ideal era você ter feito administração em função de seus 13cargos anteriores. Mas o importante é estar disposto a aprender e a se
atualizar constantemente. Bom. Formação superior completa, este
item já foi. Me fale agora um pouco mais sobre seus conhecimentos em
Excel, sobre esta sua experiência em marketing e suas expectativas em
relação à função.
- Conheço bem o pacote Office, atuei por anos em marketing, vendas e
sou bilíngüe. Além do que está no currículo e do que já falamos, o que
mais eu posso dizer é esperar contribuir com minhas competências,
tanto para tarefas operacionais, quanto interagindo com a equipe ou a
gerência. Enfim, procurar ser útil em todos os momentos, me
dedicando ao máximo.
- Sei. Resumindo você procura ser abrangente, sem ser generalista.
Panorâmico, mas mantém um foco determinado na função.
Experiência, interesses, formação acho que já vimos tudo. Bem! Eu não
13 Ah! A estupidez humana! Quem é o recrutador que não sentiu vontade de dar palpites os mais disparatados na vida das pessoas, sem nenhum critério! O que impede um filósofo de ser um bom administrador ou um administrador de ser um excelente poeta? Somente a ignorância, a mediocridade e o preconceito dos que vivem sob o jugo do senso comum e das abomináveis tecnocracias é que pode ser tão infeliz ao considerar as capacidades alheias...
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
3332
minha formação. Conhecimento não é importante? Minha experiência
é clara, inclusive, já fui responsável por equipes de grande porte e
administrava alto valor de budget.
- Sei. Bom, como eu dizia, eu estou aqui para ver se há adequação do
candidato ao perfil da vaga. Você parece ser proativo, questiona as
circunstâncias, mas não sei se esta postura é a que o cliente precisa...
Veja bem, se o candidato não se encaixa completamente em um mapa
característico, depois ele não vai se sentir feliz trabalhando, não é
mesmo? Mais importante que um emprego é estar bem consigo mesmo!
Não adianta eu selecionar alguém e ele não se realizar no emprego.
Você sabe que o foco na carreira é 100% da vida de um profissional.
- Olha! Veja...O que eu quero dizer... Tentei cortar, desesperado, pois
não conseguia entender como se pode ficar bem consigo mesmo
estando desempregado, mas sem sucesso.
- Bom, esta é apenas uma primeira etapa e se você for aprovado
entraremos em contato.
- ...é que posso contribuir com minhas competências, tanto para tarefas
operacionais, quanto interagindo com a equipe ou a gerência. Enfim,
procuro ser útil em todos os momentos e tento estar informado sobre as
diversas tendências e ferramentas.
- Sei. Você tem uma formação generalista, suspirou ela. Bom, eu não
posso adiantar mais nada sobre a vaga, nem os vencimentos, pois a
vaga é fechada, mas de qualquer jeito, o próximo passo é encaminhar
seu currículo para a empresa. Obrigado por ter vindo. Aguarde um
contato!
O exemplo acima é coisa comum a todos os que estão a procura de
emprego: como responder se você serve ou não ao cargo se não
dizem nada sobre ele. Tudo parece uma série infindável de peneiras
e a pior coisa que você pode fazer é usar dos conselhos de
especialistas.
O ponto aqui é saber sondar a entrevistadora para que ela
abra possibilidades de você interagir e não ser analisado e
descartado por um perfil estreito demais. Se não for assim o contato
para uma segunda fase ou o famoso “feedback” só virá na primeira
quarta-feira depois do dia de São Nunca. Veja a seguir como ser
“objetivo”, na acepção mercadológica do termo que significa algo
como “cumprir os requisitos exigidos” e que não consiste somente
em dar respostas racionais e eficazes:
- Em que sua formação em filosofia pode contribuir para o crescimento
da empresa? Porque você decidiu escolher esta carreira?
- Primeiro porque tenho interesse na área do conhecimento e a razão
sempre deve ser aplicada tanto na vida profissional ou pessoal. Outra
coisa é que, há tempos eu sentia a necessidade de complementar meus
estudos, de me atualizar. Outro ponto é como recusar as oportunidades
conquistadas? Eu fui um dos melhores colocados no vestibular e por
isso a universidade me ofereceu uma bolsa integral. Eu procuro
aproveitar o que aprendi no dia a dia. Foi um grande desafio voltar a
estudar, mas com determinação e disciplina conciliei bem as coisas.
Agora pretendo fazer uma pós em alguma área promissora, talvez mais
próxima de minhas atividades.
- Certo! O ideal era você ter feito administração em função de seus 13cargos anteriores. Mas o importante é estar disposto a aprender e a se
atualizar constantemente. Bom. Formação superior completa, este
item já foi. Me fale agora um pouco mais sobre seus conhecimentos em
Excel, sobre esta sua experiência em marketing e suas expectativas em
relação à função.
- Conheço bem o pacote Office, atuei por anos em marketing, vendas e
sou bilíngüe. Além do que está no currículo e do que já falamos, o que
mais eu posso dizer é esperar contribuir com minhas competências,
tanto para tarefas operacionais, quanto interagindo com a equipe ou a
gerência. Enfim, procurar ser útil em todos os momentos, me
dedicando ao máximo.
- Sei. Resumindo você procura ser abrangente, sem ser generalista.
Panorâmico, mas mantém um foco determinado na função.
Experiência, interesses, formação acho que já vimos tudo. Bem! Eu não
13 Ah! A estupidez humana! Quem é o recrutador que não sentiu vontade de dar palpites os mais disparatados na vida das pessoas, sem nenhum critério! O que impede um filósofo de ser um bom administrador ou um administrador de ser um excelente poeta? Somente a ignorância, a mediocridade e o preconceito dos que vivem sob o jugo do senso comum e das abomináveis tecnocracias é que pode ser tão infeliz ao considerar as capacidades alheias...
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posso adiantar mais nada sobre a vaga, nem os vencimentos. Eu vou
encaminhar hoje mesmo para a empresa e depois dou um retorno.
Obrigado por ter vindo.
Notaram a significativa diferença de rumo que a conversa tomou?
Se existe uma ordem nos discursos, que os limitem ou determine seu
protocolo, ele ao mesmo tempo é totalmente variável em suas
direções. Isto é porque todo diálogo também segue uma orientação
psicológica, ou seja: o que mudou o rumo da conversa foi ter
“aceitado” a opinião implícita do entrevistador e levado a situação
não para o âmbito da formação, mas para a da oportunidade.
Prof iss ionais comprometidos não desperdiçam
oportunidades e se elas demonstram algum grau de esforço e
concentração para serem realizadas, você será visto com melhores
olhos ainda. Se no primeiro caso o descarte fora imediato, no
segundo existe uma real chance de acontecer um retorno. Foi
necessário mentir? Não! Apenas adequar o discurso à objetividade
aberta das inúmeras possibilidades.
Isso, porém, só vem com o tempo e é a razão de ser deste
Manual: levar ao seu conhecimento coisas que poderiam demorar
meses ou anos para você se dar conta.
2 - A Armadilha do Fale sobre Si mesmo
Invariavelmente você terá que passar por isso: falar sobre si mesmo.
Mas o que significa isso? Formalmente, querem saber suas
inclinações, o que faz nas horas vagas, ver como se diverte, se presta
algum serviço voluntário, do que gosta ou não gosta, enfim compor
um quadro de sua personalidade fora do escritório.
Na prática querem saber se existe alguma tendência,
hábito incompatível ou que se relacione negativamente com algum
ponto chave do perfil. Normalmente agimos de um jeito ou outro,
conforme o local e circunstância, ou seja: não vamos trabalhar de
bermuda e camiseta, nem arrotamos cerveja no intervalo do jogo,
como fazemos em casa. E mesmo se gostarmos de ficar descalços ou
meditar na sala sem roupa, no trabalho a coisa é diferente.
O caso é que nem todos pensam assim, há que se lidar tanto
com os discursos dos psicólogos, quanto com o que é aceito ou não,
medianamente pela nossa sociedade e cultura. A reta razão nos
informa sobre nosso livre arbítrio, mas as pessoas nem sempre agem
racionalmente. A Constituição garante liberdade de expressão, de
culto, ir e vir e tudo o mais, mas não vá se fiando muito nisso. A lei
proíbe aos empregadores qualquer discriminação por raça, sexo,
preferência sexual ou convicções pessoais e nem por isso eles
deixarão o preconceito de lado. Se você tem Orkut então, delete ou
modifique completamente: eles vão olhar, pode ter certeza! Lembre
do método de perguntar o que quer dizer a pergunta. O perigo
reside justamente aí: ser franco! Ai daquele que achar que suas
inclinações pessoais são inofensivas ou irrelevantes para o processo
seletivo.
O que importa ao selecionador é poder compor um quadro
de seus afetos, percepções e interesses, de forma que ele possa
mapear sua personalidade e dar seu veredicto. Veja só um exemplo
do que pode acontecer ao falar-se ingenuamente de si mesmo:
- Me fale um pouco mais de seus interesses pessoais. Me diga quem é
você!
- Eu gosto de jogar bola, reunir os amigos no fim de semana, assistir
televisão. Vez por outra vamos ao cinema, na saída vamos a um
barzinho ou algum evento. Eu sou muito sociável, faço amigos com
facilidade, gosto de estar em grupo e aproveitar as horas de lazer. Sou
bem humorado e otimista. Acredito que não teria dificuldade em me
adaptar a qualquer serviço.
- Entendo...Mas o que motiva você. O que faz a vida valer a pena?
- Tudo isso! Eu quero é buscar formas de ser feliz, de me realizar, ter
prosperidade, fazer uma carreira, um dia ter filhos e constituir família.
- Mas você não acha que valeria mais a pena estar buscando se
aprimorar?
- ?!?
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3534
posso adiantar mais nada sobre a vaga, nem os vencimentos. Eu vou
encaminhar hoje mesmo para a empresa e depois dou um retorno.
Obrigado por ter vindo.
Notaram a significativa diferença de rumo que a conversa tomou?
Se existe uma ordem nos discursos, que os limitem ou determine seu
protocolo, ele ao mesmo tempo é totalmente variável em suas
direções. Isto é porque todo diálogo também segue uma orientação
psicológica, ou seja: o que mudou o rumo da conversa foi ter
“aceitado” a opinião implícita do entrevistador e levado a situação
não para o âmbito da formação, mas para a da oportunidade.
Prof iss ionais comprometidos não desperdiçam
oportunidades e se elas demonstram algum grau de esforço e
concentração para serem realizadas, você será visto com melhores
olhos ainda. Se no primeiro caso o descarte fora imediato, no
segundo existe uma real chance de acontecer um retorno. Foi
necessário mentir? Não! Apenas adequar o discurso à objetividade
aberta das inúmeras possibilidades.
Isso, porém, só vem com o tempo e é a razão de ser deste
Manual: levar ao seu conhecimento coisas que poderiam demorar
meses ou anos para você se dar conta.
2 - A Armadilha do Fale sobre Si mesmo
Invariavelmente você terá que passar por isso: falar sobre si mesmo.
Mas o que significa isso? Formalmente, querem saber suas
inclinações, o que faz nas horas vagas, ver como se diverte, se presta
algum serviço voluntário, do que gosta ou não gosta, enfim compor
um quadro de sua personalidade fora do escritório.
Na prática querem saber se existe alguma tendência,
hábito incompatível ou que se relacione negativamente com algum
ponto chave do perfil. Normalmente agimos de um jeito ou outro,
conforme o local e circunstância, ou seja: não vamos trabalhar de
bermuda e camiseta, nem arrotamos cerveja no intervalo do jogo,
como fazemos em casa. E mesmo se gostarmos de ficar descalços ou
meditar na sala sem roupa, no trabalho a coisa é diferente.
O caso é que nem todos pensam assim, há que se lidar tanto
com os discursos dos psicólogos, quanto com o que é aceito ou não,
medianamente pela nossa sociedade e cultura. A reta razão nos
informa sobre nosso livre arbítrio, mas as pessoas nem sempre agem
racionalmente. A Constituição garante liberdade de expressão, de
culto, ir e vir e tudo o mais, mas não vá se fiando muito nisso. A lei
proíbe aos empregadores qualquer discriminação por raça, sexo,
preferência sexual ou convicções pessoais e nem por isso eles
deixarão o preconceito de lado. Se você tem Orkut então, delete ou
modifique completamente: eles vão olhar, pode ter certeza! Lembre
do método de perguntar o que quer dizer a pergunta. O perigo
reside justamente aí: ser franco! Ai daquele que achar que suas
inclinações pessoais são inofensivas ou irrelevantes para o processo
seletivo.
O que importa ao selecionador é poder compor um quadro
de seus afetos, percepções e interesses, de forma que ele possa
mapear sua personalidade e dar seu veredicto. Veja só um exemplo
do que pode acontecer ao falar-se ingenuamente de si mesmo:
- Me fale um pouco mais de seus interesses pessoais. Me diga quem é
você!
- Eu gosto de jogar bola, reunir os amigos no fim de semana, assistir
televisão. Vez por outra vamos ao cinema, na saída vamos a um
barzinho ou algum evento. Eu sou muito sociável, faço amigos com
facilidade, gosto de estar em grupo e aproveitar as horas de lazer. Sou
bem humorado e otimista. Acredito que não teria dificuldade em me
adaptar a qualquer serviço.
- Entendo...Mas o que motiva você. O que faz a vida valer a pena?
- Tudo isso! Eu quero é buscar formas de ser feliz, de me realizar, ter
prosperidade, fazer uma carreira, um dia ter filhos e constituir família.
- Mas você não acha que valeria mais a pena estar buscando se
aprimorar?
- ?!?
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Se houvesse uma câmera registrando as anotações do
entrevistador poderíamos ver que o diagnóstico pessoal seria
desanimador: nenhum “risquinho” positivo no canto de seu
currículo. Caso pudéssemos ler sua mente o que ali encontraríamos
poderia oscilar entre “bebum e sedentário” “integrante de torcida
organizada”, “frívolo e superficial”, “sexopata delirante”, “pretende
ter filhos e gozar de licença maternidade” se for mulher ou “faltar
para ir ao médico” se for homem”. No mínimo terão a certeza de que
você não entendeu a pergunta.
Quando um entrevistador não questiona exatamente sobre
seus hábitos no lazer, o que ele quer saber é como você se vê: como
se descreve. Evitar mencionar planos futuros que se choquem com a
intenção do empregador também é saudável.
A resposta mais acertada na situação seria:
- Me fale um pouco mais de seus interesses pessoais. Me diga quem é
você!
- Sou uma pessoa dinâmica, procuro estar sempre em atividade. Tenho
um raciocínio ágil, mas reflito antes de emitir uma opinião. Gosto de
estar informado sobre o que se passa ao meu redor. Sou sincero, leal,
determinado e persistente. Procuro acertar logo da primeira vez em
qualquer tarefa e procuro atuar em equipe. Nas horas de lazer, gosto de
esportes, estar com a família, de encontrar amigos e, quando posso, vou
ao cinema ou outro programa.
- Se pudesse faria algum curso ou outra atividade?
- Sim claro. Inclusive, sou voluntário em uma instituição, a cada quinze
dias.
- É sempre bom estar realizando coisas, não é mesmo? Pretende ter
filhos?
- Acho que não é o momento, meu objetivo agora é estruturar minha
carreira, quem sabe fazer uma especialização. Daqui a alguns anos e
havendo condições, quem sabe?
- Você está certíssimo! É preciso estar primeiro preparado.
A diferença é notável, concorda? A mesma câmera oculta
agora nos daria a imagem de alguns pontos positivos marcados no
currículo, ao passo em que na mente do entrevistador haveria estas
conjecturas: “comprometido e sociável”, “responsável”, “saudável
com gosto pela cultura”. Mas o que foi dito de diferente da primeira
vez? Muito pouca coisa. O importante é o “modo” pelo qual se
abordou o mesmo assunto, a maneira diferente. Trocamos o futebol
e os amigos, pelo conceito esporte e falou-se mais de si mesmo,
proporcionando a continuidade do diálogo e evitando qualquer
ameaça ao empregador. Um dos motivos desta abordagem é saber
se você não está enganando na entrevista, pois os hábitos e
expectativas revelam muito sobre como você provavelmente se
comportaria numa função. Tenha por regra que não é a coisa isolada
que você diz que determina ou não a continuidade da entrevista. É o
cruzamento das informações que fornece ao avaliador um quadro 14geral da situação, trata-se de uma Kpi sinistra. O que quer que diga
sobre si mesmo, o faça de maneira assertiva, pontual e positiva.
Deste modo as palavras-chave para o sucesso nesta fase do
diálogo são os conceitos. Definir-se conceitualmente significa ter
domínio de suas representações, ou seja: saber quem se é e poder
dizer de forma clara e sucinta seus interesses e objetivos. Seja
persuasivo e aja com naturalidade e não se esqueça de que além de
avaliar o que diz o discurso, deve-se não fugir do senso comum, a
não ser que a situação exija. Não é um jogo de truco, mas de pôquer.
3 - De Frente ao Desconhecido
Estar na posição de entrevistado não é uma condição confortável.
Muitas vezes nem mais lembramos para quem enviamos o currículo
e de repente nos chamam e pronto: aqui estamos nós em frente a
alguém que pode mudar o rumo de nossas vidas. Este estranho que
nos faz as mais disparatadas perguntas é o início de nossa
caminhada, rumo ao novo emprego: luz no fim do longo túnel de
nossas contas atrasadas e ansiedades diversas. O que fazer nestas
situações?
14 Indicadores de performance são as construções gráficas resultantes no cruzamento de vários aspectos.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
3736
Se houvesse uma câmera registrando as anotações do
entrevistador poderíamos ver que o diagnóstico pessoal seria
desanimador: nenhum “risquinho” positivo no canto de seu
currículo. Caso pudéssemos ler sua mente o que ali encontraríamos
poderia oscilar entre “bebum e sedentário” “integrante de torcida
organizada”, “frívolo e superficial”, “sexopata delirante”, “pretende
ter filhos e gozar de licença maternidade” se for mulher ou “faltar
para ir ao médico” se for homem”. No mínimo terão a certeza de que
você não entendeu a pergunta.
Quando um entrevistador não questiona exatamente sobre
seus hábitos no lazer, o que ele quer saber é como você se vê: como
se descreve. Evitar mencionar planos futuros que se choquem com a
intenção do empregador também é saudável.
A resposta mais acertada na situação seria:
- Me fale um pouco mais de seus interesses pessoais. Me diga quem é
você!
- Sou uma pessoa dinâmica, procuro estar sempre em atividade. Tenho
um raciocínio ágil, mas reflito antes de emitir uma opinião. Gosto de
estar informado sobre o que se passa ao meu redor. Sou sincero, leal,
determinado e persistente. Procuro acertar logo da primeira vez em
qualquer tarefa e procuro atuar em equipe. Nas horas de lazer, gosto de
esportes, estar com a família, de encontrar amigos e, quando posso, vou
ao cinema ou outro programa.
- Se pudesse faria algum curso ou outra atividade?
- Sim claro. Inclusive, sou voluntário em uma instituição, a cada quinze
dias.
- É sempre bom estar realizando coisas, não é mesmo? Pretende ter
filhos?
- Acho que não é o momento, meu objetivo agora é estruturar minha
carreira, quem sabe fazer uma especialização. Daqui a alguns anos e
havendo condições, quem sabe?
- Você está certíssimo! É preciso estar primeiro preparado.
A diferença é notável, concorda? A mesma câmera oculta
agora nos daria a imagem de alguns pontos positivos marcados no
currículo, ao passo em que na mente do entrevistador haveria estas
conjecturas: “comprometido e sociável”, “responsável”, “saudável
com gosto pela cultura”. Mas o que foi dito de diferente da primeira
vez? Muito pouca coisa. O importante é o “modo” pelo qual se
abordou o mesmo assunto, a maneira diferente. Trocamos o futebol
e os amigos, pelo conceito esporte e falou-se mais de si mesmo,
proporcionando a continuidade do diálogo e evitando qualquer
ameaça ao empregador. Um dos motivos desta abordagem é saber
se você não está enganando na entrevista, pois os hábitos e
expectativas revelam muito sobre como você provavelmente se
comportaria numa função. Tenha por regra que não é a coisa isolada
que você diz que determina ou não a continuidade da entrevista. É o
cruzamento das informações que fornece ao avaliador um quadro 14geral da situação, trata-se de uma Kpi sinistra. O que quer que diga
sobre si mesmo, o faça de maneira assertiva, pontual e positiva.
Deste modo as palavras-chave para o sucesso nesta fase do
diálogo são os conceitos. Definir-se conceitualmente significa ter
domínio de suas representações, ou seja: saber quem se é e poder
dizer de forma clara e sucinta seus interesses e objetivos. Seja
persuasivo e aja com naturalidade e não se esqueça de que além de
avaliar o que diz o discurso, deve-se não fugir do senso comum, a
não ser que a situação exija. Não é um jogo de truco, mas de pôquer.
3 - De Frente ao Desconhecido
Estar na posição de entrevistado não é uma condição confortável.
Muitas vezes nem mais lembramos para quem enviamos o currículo
e de repente nos chamam e pronto: aqui estamos nós em frente a
alguém que pode mudar o rumo de nossas vidas. Este estranho que
nos faz as mais disparatadas perguntas é o início de nossa
caminhada, rumo ao novo emprego: luz no fim do longo túnel de
nossas contas atrasadas e ansiedades diversas. O que fazer nestas
situações?
14 Indicadores de performance são as construções gráficas resultantes no cruzamento de vários aspectos.
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Seguindo a regra do verificar os dizeres, vamos ao segundo
caso, que é analisar o que está implícito na descrição de um
componente. As funções de recrutamento e seleção, além do
escopo das técnicas de verificação dos perfis adequados, também
inclui a atmosfera de quem realiza a função. Embutido no cargo
temos que considerar o ”não dito”, aqui, como a rotina estafante que
é normal, hoje em dia, em qualquer empresa. Um exemplo clássico é
a situação em que ao anunciar a vaga, o selecionador recebe de
volta um número muito grande de currículos, nos mais diversos
formatos e contendo as mais variadas informações.
Ele deve então, proceder à análise e separação de todo este
material. Se a empresa for grande, quem entrevista recebe os
currículos e um parecer, se não, é a mesma pessoa que
seleciona/entrevista e até aplica os testes. Imagine então este sujeito
tendo que verificar - por vaga ou por dia - 300 vezes a mesma grade
de textos, caçando por entre eles, as informações necessárias e
diferenciais. Além disso, ele deve ter outras tarefas, portanto torna-
se motivo de irritação, caso seu currículo não seja fácil de ler e de 15localizar aquilo que ele deseja , bem como possua excesso ou falta
destas mesmas informações. Sem mencionar fatores gramaticais ou
estilísticos. Um bom começo pode determinar uma boa entrevista,
mesmo que por simpatia.
O passo seguinte é estar em frente à pessoa, na hora e dia
marcados. Sempre possível, chegue com antecedência, para que
possa respirar e acalmar-se; colocar o pensamento em dia, tomar
um café, ir ao banheiro, enfim: ter tempo para analisar a situação em
sua volta e estar livre de pressões. Ao aguardar, não demonstre sua
impaciência, pois você pode estar sendo observado, mas sem
neurose: muitas empresas simplesmente são desorganizadas e você
ainda tomará muito chá de cadeira. Certifique-se de perguntar se
não haverá custos ao candidato e toda a informação que puder lhe
ser adiantada. Se já souber do que se trata a vaga e possuir o nome
da empresa, entre na internet e pesquise sobre suas atividades,
valores e missão. Isto demonstrará seu interesse e oferecerá canais
de conversação.
Caso contrário procure sondar qual a ênfase que o
entrevistador dá à descrição do cargo e procure focar suas
competências nas suas habilidades e experiências correlatas. Se
nem isso for possível, mantenha-se atento e cordial, buscando
mostrar uma imagem coerente e objetiva de si mesmo. Na sala de
espera, procure sentar-se confortavelmente e dissipar as tensões.
Ao ser chamado, encaminhe-se imediatamente em
direção à pessoa que o receberá, com passos firmes e seguros.
Mantenha contato visual e aperte as mãos, tomando cuidado para
retribuir a força do aperto, na mesma proporção em que recebe,
evitando ser efusivo ou demorado demais. Uma vez convidado a
entrar, seja solícito e polido, acomode-se bem na cadeira e fixe os
olhos na pessoa. Evite ficar sorrindo todo o tempo ou fazendo gestos
excessivos, pois não é o caso, no entanto não é para ficar de cara feia
e esquecer o senso de humor.
Busque ser natural, sem perder a concentração no que está
sendo dito, nesta hora, por três linguagens específicas: a
argumentativa; a gestual; a intuitiva ou empática. Na primeira, trata-
se de se expressar, raciocinar e argumentar, bem como analisar
corretamente o que é exigido, dito ou não dito pelo interlocutor; na
segunda, trata-se do indicador de suas emoções, postura e estado
psicológico; a terceira é uma questão metafísica, mas importante: há
um elã vital que nos une, e que está além do campo da razão, no
entanto pertence ao domínio da percepção. A intuição é capaz de
penetrar no absoluto da situação e encontrar (ou não) uma
“simpatia”, uma aproximação entre dois seres ou objetos de nosso
conhecimento.
Por isso é recomendável que você esteja atento não
somente ao que vai dizer, mas principalmente “como” vai fazê-lo.
Discorrer longamente sobre suas habilidades em ser direto e
conciso é, por exemplo, um contra-senso: quem é direto usa poucas
palavras e quem é conciso consegue atingir o nervo, com
freqüência, logo na primeira vez. Falar é uma arte que deve ser
levada a sério.
Outro ponto é o exagero nos exemplos: se pedirem para
você ilustrar determinada situação, como suas realizações ou o
porquê foi demitido, não se perca em minúcias ou queira construir 15 Veja quais são as informações importantes sobre de currículos, no apêndice.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
3938
Seguindo a regra do verificar os dizeres, vamos ao segundo
caso, que é analisar o que está implícito na descrição de um
componente. As funções de recrutamento e seleção, além do
escopo das técnicas de verificação dos perfis adequados, também
inclui a atmosfera de quem realiza a função. Embutido no cargo
temos que considerar o ”não dito”, aqui, como a rotina estafante que
é normal, hoje em dia, em qualquer empresa. Um exemplo clássico é
a situação em que ao anunciar a vaga, o selecionador recebe de
volta um número muito grande de currículos, nos mais diversos
formatos e contendo as mais variadas informações.
Ele deve então, proceder à análise e separação de todo este
material. Se a empresa for grande, quem entrevista recebe os
currículos e um parecer, se não, é a mesma pessoa que
seleciona/entrevista e até aplica os testes. Imagine então este sujeito
tendo que verificar - por vaga ou por dia - 300 vezes a mesma grade
de textos, caçando por entre eles, as informações necessárias e
diferenciais. Além disso, ele deve ter outras tarefas, portanto torna-
se motivo de irritação, caso seu currículo não seja fácil de ler e de 15localizar aquilo que ele deseja , bem como possua excesso ou falta
destas mesmas informações. Sem mencionar fatores gramaticais ou
estilísticos. Um bom começo pode determinar uma boa entrevista,
mesmo que por simpatia.
O passo seguinte é estar em frente à pessoa, na hora e dia
marcados. Sempre possível, chegue com antecedência, para que
possa respirar e acalmar-se; colocar o pensamento em dia, tomar
um café, ir ao banheiro, enfim: ter tempo para analisar a situação em
sua volta e estar livre de pressões. Ao aguardar, não demonstre sua
impaciência, pois você pode estar sendo observado, mas sem
neurose: muitas empresas simplesmente são desorganizadas e você
ainda tomará muito chá de cadeira. Certifique-se de perguntar se
não haverá custos ao candidato e toda a informação que puder lhe
ser adiantada. Se já souber do que se trata a vaga e possuir o nome
da empresa, entre na internet e pesquise sobre suas atividades,
valores e missão. Isto demonstrará seu interesse e oferecerá canais
de conversação.
Caso contrário procure sondar qual a ênfase que o
entrevistador dá à descrição do cargo e procure focar suas
competências nas suas habilidades e experiências correlatas. Se
nem isso for possível, mantenha-se atento e cordial, buscando
mostrar uma imagem coerente e objetiva de si mesmo. Na sala de
espera, procure sentar-se confortavelmente e dissipar as tensões.
Ao ser chamado, encaminhe-se imediatamente em
direção à pessoa que o receberá, com passos firmes e seguros.
Mantenha contato visual e aperte as mãos, tomando cuidado para
retribuir a força do aperto, na mesma proporção em que recebe,
evitando ser efusivo ou demorado demais. Uma vez convidado a
entrar, seja solícito e polido, acomode-se bem na cadeira e fixe os
olhos na pessoa. Evite ficar sorrindo todo o tempo ou fazendo gestos
excessivos, pois não é o caso, no entanto não é para ficar de cara feia
e esquecer o senso de humor.
Busque ser natural, sem perder a concentração no que está
sendo dito, nesta hora, por três linguagens específicas: a
argumentativa; a gestual; a intuitiva ou empática. Na primeira, trata-
se de se expressar, raciocinar e argumentar, bem como analisar
corretamente o que é exigido, dito ou não dito pelo interlocutor; na
segunda, trata-se do indicador de suas emoções, postura e estado
psicológico; a terceira é uma questão metafísica, mas importante: há
um elã vital que nos une, e que está além do campo da razão, no
entanto pertence ao domínio da percepção. A intuição é capaz de
penetrar no absoluto da situação e encontrar (ou não) uma
“simpatia”, uma aproximação entre dois seres ou objetos de nosso
conhecimento.
Por isso é recomendável que você esteja atento não
somente ao que vai dizer, mas principalmente “como” vai fazê-lo.
Discorrer longamente sobre suas habilidades em ser direto e
conciso é, por exemplo, um contra-senso: quem é direto usa poucas
palavras e quem é conciso consegue atingir o nervo, com
freqüência, logo na primeira vez. Falar é uma arte que deve ser
levada a sério.
Outro ponto é o exagero nos exemplos: se pedirem para
você ilustrar determinada situação, como suas realizações ou o
porquê foi demitido, não se perca em minúcias ou queira construir 15 Veja quais são as informações importantes sobre de currículos, no apêndice.
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um “panorama”, para depois concluir. Freqüentemente isto leva a
perder o foco no assunto que está sendo tratado e enveredar a
conversa para a trivialidade ou - o que é pior - aborrecer
profundamente o interlocutor.
A questão dos gestos também é importante. Se você está
tentando passar a imagem de alguém responsável, que não se
intimida com a pressão, mas suas mãos e pés não conseguem ficar
quietos no lugar, pode estar certo de que o considerarão mentiroso,
mesmo que esteja apenas ansioso. Se os gestos forem muito bruscos,
pode passar a impressão de que é autoritário ou descontrolado,
mesmo que sua ingênua intenção tenha sido apenas a de dar
“ênfase” em algum aspecto. Ficar quieto, encorujado e responder
somente se for perguntado, também não é bom: afinal, você está ali
para se vender como a melhor opção para o emprego e, portanto,
deve possuir iniciativa. A regra aqui é a do conforto: sente-se
confortavelmente, se quiser mudar de posição faça de forma
natural, não exagere nos gestos, não se reprima a ponto de parecer
um boneco de pau, não avance sobre a mesa ou fique mexendo nos
objetos em cima dela, não abaixe a cabeça ou fique agarrado no
braço da cadeira, evite cruzar braços e pernas, enfim: fique
confortável, pois você é o convidado!
O caso da intuição merece uma atenção especial, pois
versa também sobre os seus sentimentos. Se você considera o
interlocutor seu inimigo, poderá estar criando um no momento em
que pensa assim. Mesmo que o seu entrevistador lhe pareça
excessivamente rigoroso, ou, por outro lado, um completo
despreparado para o cargo, quer o trate bem ou trate mal, lembre-se
de que ele é humano e por isso partilha da faculdade intuitiva de
“pressentir” hostilidade, desprezo ou insegurança. Esta linguagem
se dá tanto em nível intelectivo quanto no campo das afecções.
Nunca ouviu a célebre frase: Não fui com a cara de fulano,
meu santo não bate com o dele. Porque será? Crendice?
Superstição? Negativo: Exceto nos casos em que identificamos
ameaça ou nos sentimos excluídos, o que mais abominamos nos
outros é nos vermos refletidos neles, ou seja, identificar nos
interlocutores aqueles defeitos que possuímos, mas que nunca
admitimos como pertencentes a nós. Já a intuição é capaz de
penetrar na duração e, ali, apreender uma multiplicidade de
sentidos que não podem ser verbalizados, mas que existem no
objeto de nossa atenção. Em outras palavras, além das linguagens
corporal e racional, temos também uma linguagem da consciência e
da cultura.
Mas também não considere que este momento é de vida ou
morte, lembre-se de que você e apenas uma parte do material de
trabalho do selecionador, com o qual se relacionará por algum
tempo, sendo muito provável que nunca mais venha a vê-lo de
novo. Deste modo, não exagere a importância de uma entrevista
frustrada para sua auto-estima: você não está sendo avaliado “em
si”, mas somente se é adequado ou não à determinada função, por
critérios que nem sempre são os melhores, mais justos ou mais
aceitáveis. Claro que todo mundo espera de um Manual, as
respostas corretas, mas tenha sempre em mente que isto não é um
conceito aceitável: não existem respostas prontas! De qualquer
forma, procuramos fazer o melhor, em caso de dúvidas consulte os
anexos. Também não se esqueça que a realidade empregatícia dos
que trabalham em RH não é um mar de rosas, portanto, cuide-se
para não ser o “alvo” das frustrações destes profissionais. Mas a
grande crítica é com relação à especialização e tato: muito poucos
são competentes nestes quesitos.
4 - Perfil e Postura
Na seqüência das semanas, fui chamado para uma entrevista, bem
cedo. Cheguei ao local meio em cima da hora, nem pude tomar
café, estava com fome, esbaforido e então, fui colocado numa
cadeira desconfortável dentro de uma saleta abafada. O escritório
estava todo escuro, parecia que as pessoas ainda não tinham
chegado. Fiquei ali um bom tempo até que fui chamado por uma
entrevistadora, que logo me indicou uma sala envidraçada mais
adiante. A pessoa sequer me olhou, encaminhando-se rápida para
lá, na minha frente.
Nem bem ela fechou a porta, eu já ouvi a fatídica pergunta:
- Qual é o seu perfil? Disse isso, enquanto olhava para os papéis em
cima da mesa, provavelmente meu currículo. Fiquei maluco. Ela
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
4140
um “panorama”, para depois concluir. Freqüentemente isto leva a
perder o foco no assunto que está sendo tratado e enveredar a
conversa para a trivialidade ou - o que é pior - aborrecer
profundamente o interlocutor.
A questão dos gestos também é importante. Se você está
tentando passar a imagem de alguém responsável, que não se
intimida com a pressão, mas suas mãos e pés não conseguem ficar
quietos no lugar, pode estar certo de que o considerarão mentiroso,
mesmo que esteja apenas ansioso. Se os gestos forem muito bruscos,
pode passar a impressão de que é autoritário ou descontrolado,
mesmo que sua ingênua intenção tenha sido apenas a de dar
“ênfase” em algum aspecto. Ficar quieto, encorujado e responder
somente se for perguntado, também não é bom: afinal, você está ali
para se vender como a melhor opção para o emprego e, portanto,
deve possuir iniciativa. A regra aqui é a do conforto: sente-se
confortavelmente, se quiser mudar de posição faça de forma
natural, não exagere nos gestos, não se reprima a ponto de parecer
um boneco de pau, não avance sobre a mesa ou fique mexendo nos
objetos em cima dela, não abaixe a cabeça ou fique agarrado no
braço da cadeira, evite cruzar braços e pernas, enfim: fique
confortável, pois você é o convidado!
O caso da intuição merece uma atenção especial, pois
versa também sobre os seus sentimentos. Se você considera o
interlocutor seu inimigo, poderá estar criando um no momento em
que pensa assim. Mesmo que o seu entrevistador lhe pareça
excessivamente rigoroso, ou, por outro lado, um completo
despreparado para o cargo, quer o trate bem ou trate mal, lembre-se
de que ele é humano e por isso partilha da faculdade intuitiva de
“pressentir” hostilidade, desprezo ou insegurança. Esta linguagem
se dá tanto em nível intelectivo quanto no campo das afecções.
Nunca ouviu a célebre frase: Não fui com a cara de fulano,
meu santo não bate com o dele. Porque será? Crendice?
Superstição? Negativo: Exceto nos casos em que identificamos
ameaça ou nos sentimos excluídos, o que mais abominamos nos
outros é nos vermos refletidos neles, ou seja, identificar nos
interlocutores aqueles defeitos que possuímos, mas que nunca
admitimos como pertencentes a nós. Já a intuição é capaz de
penetrar na duração e, ali, apreender uma multiplicidade de
sentidos que não podem ser verbalizados, mas que existem no
objeto de nossa atenção. Em outras palavras, além das linguagens
corporal e racional, temos também uma linguagem da consciência e
da cultura.
Mas também não considere que este momento é de vida ou
morte, lembre-se de que você e apenas uma parte do material de
trabalho do selecionador, com o qual se relacionará por algum
tempo, sendo muito provável que nunca mais venha a vê-lo de
novo. Deste modo, não exagere a importância de uma entrevista
frustrada para sua auto-estima: você não está sendo avaliado “em
si”, mas somente se é adequado ou não à determinada função, por
critérios que nem sempre são os melhores, mais justos ou mais
aceitáveis. Claro que todo mundo espera de um Manual, as
respostas corretas, mas tenha sempre em mente que isto não é um
conceito aceitável: não existem respostas prontas! De qualquer
forma, procuramos fazer o melhor, em caso de dúvidas consulte os
anexos. Também não se esqueça que a realidade empregatícia dos
que trabalham em RH não é um mar de rosas, portanto, cuide-se
para não ser o “alvo” das frustrações destes profissionais. Mas a
grande crítica é com relação à especialização e tato: muito poucos
são competentes nestes quesitos.
4 - Perfil e Postura
Na seqüência das semanas, fui chamado para uma entrevista, bem
cedo. Cheguei ao local meio em cima da hora, nem pude tomar
café, estava com fome, esbaforido e então, fui colocado numa
cadeira desconfortável dentro de uma saleta abafada. O escritório
estava todo escuro, parecia que as pessoas ainda não tinham
chegado. Fiquei ali um bom tempo até que fui chamado por uma
entrevistadora, que logo me indicou uma sala envidraçada mais
adiante. A pessoa sequer me olhou, encaminhando-se rápida para
lá, na minha frente.
Nem bem ela fechou a porta, eu já ouvi a fatídica pergunta:
- Qual é o seu perfil? Disse isso, enquanto olhava para os papéis em
cima da mesa, provavelmente meu currículo. Fiquei maluco. Ela
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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nem sequer tinha me dado bom dia ou se apresentado e queria
saber qual era o meu perfil? Que raio de espelunca era aquela?
Resolvi dar o troco:
- Bom dia! Meu nome é Luís, você deseja especificar qual parte de meu
currículo?
- Vamos direto ao ponto: Me fale sobre seu perfil, interesses e
habilidades.
- Bom! Ajudaria saber qual é a vaga em questão, pois você já deve ter
verificado que possuo muitas competências e sou experiente em uma
boa gama de setores;
- A vaga é fechada e falaremos dela depois. Eu estou perguntando pelo
seu perfil.
- Certo, mas pode me esclarecer melhor o que considera relevante?
16- Você não esta entendeeeendooou? Mi dê o seu perfil! Qual sua
dificuldade nisto?
- Mas como eu posso reduzir meus conhecimentos, habilidades e
interesses a um perfil? Eu sou um profissional e, se não me engano
também sou um ser humano, tenho múltiplas competências e
experiências, opiniões formadas, longa trajetória de vida, de modo que
sou irredutível a uma mera preposição. Ora! Respondi, já com a
adrenalina a mil.
- Você não tem preposições? Olha aqui! E aqui! E também aqui! Este
currículo está cheio de preposições! Disse ela, marcando raivosamente
todos os itens gramaticais de meu currículo.
- Você deve estar brincando, retruquei. Afinal o que se passa aqui? O
que isso tem a ver?
Para resumir, depois nos acalmamos e conversamos mais um pouco,
porém o estrago já havia sido feito e era irremediável para mim -
para ela eu não sei -, mas também não lhe foi agradável, pois eu
dissera algumas poucas e boas. Pior para mim, pois até hoje nem sei
que vaga era aquela. Mas num panorama geral a posteriori, deu para
verificar o plano-seqüência dos erros que resultou no desastre: a
conjunção da pressa, fome e má acomodação aliada ao descaso e
excesso de objetividade tinha sido explosiva. No mais, eu também
era novato como desempregado e não atinei para o sentido da
pergunta. Quando um entrevistador pede o seu perfil, o que ele
quer é um resumão estruturado de suas atividades mais relevantes,
em ordem cronológica linear ascendente, seguido de
considerações pertinentes sobre sua conduta e hábitos, mais
algumas informações relevantes (que somente são relevantes para
ele: vai saber quais são!). E tudo o mais sintético, prático e rápido
possível, ou seja: sua autobiografia profissional em poucas e
convincentes palavras. Padrãozão!
Eu havia levado as coisas para o lado pessoal, emocional,
cósmico, plural e me senti ofendido com o tratamento recebido.
Fora a cena ridícula de ela rasurar meu currículo, não sei se causada
pela minha intempestiva defesa da natureza e condição humana, ou
por que ela era desabotinada mesmo, o caso é que tudo podia ter
sido contornado. Sim, caso eu soubesse exatamente o que era o raio
do perfil e tivesse uma postura mais centrada, não deixando que
minhas opiniões pudessem interferir ou como ocorreu: ser
dominado completamente pela bile e chutar o pau da barraca, as
coisas iriam se passar de outra maneira. O exemplo acima reforça a
tese de que não se deve encarar as impertinências e imprevistos
como um ataque pessoal a nosso já dolorido ego de desempregado.
No mais das vezes o procedimento de se formar uma idéia
da soma das capacidades e qualidades do entrevistado é saudável.
Afinal, se você fosse um empregador, gostaria de saber o mais
possível se este ou aquele determinado profissional é ou não
adequado para as funções. Só que aqui não se trata de adquirir uma
mercadoria qualquer: estamos lidando com pessoas. Assim, o
raciocínio deve se orientar por uma instância ética mínima e não se
ater apenas nos dados mensuráveis do “produto”. Depois,
considere que não se trata de um jogo de quebra-cabeças, onde se
procura a peça que se “encaixa”, mas ter-se em mente a
possibilidade de adaptação. Lamentavelmente, com a velocidade
dos processos modernos, ninguém mais quer perder tempo 16 Aquele tom de voz irritadiço, anasalado, agressivo e completamente desrespeitoso.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
4342
nem sequer tinha me dado bom dia ou se apresentado e queria
saber qual era o meu perfil? Que raio de espelunca era aquela?
Resolvi dar o troco:
- Bom dia! Meu nome é Luís, você deseja especificar qual parte de meu
currículo?
- Vamos direto ao ponto: Me fale sobre seu perfil, interesses e
habilidades.
- Bom! Ajudaria saber qual é a vaga em questão, pois você já deve ter
verificado que possuo muitas competências e sou experiente em uma
boa gama de setores;
- A vaga é fechada e falaremos dela depois. Eu estou perguntando pelo
seu perfil.
- Certo, mas pode me esclarecer melhor o que considera relevante?
16- Você não esta entendeeeendooou? Mi dê o seu perfil! Qual sua
dificuldade nisto?
- Mas como eu posso reduzir meus conhecimentos, habilidades e
interesses a um perfil? Eu sou um profissional e, se não me engano
também sou um ser humano, tenho múltiplas competências e
experiências, opiniões formadas, longa trajetória de vida, de modo que
sou irredutível a uma mera preposição. Ora! Respondi, já com a
adrenalina a mil.
- Você não tem preposições? Olha aqui! E aqui! E também aqui! Este
currículo está cheio de preposições! Disse ela, marcando raivosamente
todos os itens gramaticais de meu currículo.
- Você deve estar brincando, retruquei. Afinal o que se passa aqui? O
que isso tem a ver?
Para resumir, depois nos acalmamos e conversamos mais um pouco,
porém o estrago já havia sido feito e era irremediável para mim -
para ela eu não sei -, mas também não lhe foi agradável, pois eu
dissera algumas poucas e boas. Pior para mim, pois até hoje nem sei
que vaga era aquela. Mas num panorama geral a posteriori, deu para
verificar o plano-seqüência dos erros que resultou no desastre: a
conjunção da pressa, fome e má acomodação aliada ao descaso e
excesso de objetividade tinha sido explosiva. No mais, eu também
era novato como desempregado e não atinei para o sentido da
pergunta. Quando um entrevistador pede o seu perfil, o que ele
quer é um resumão estruturado de suas atividades mais relevantes,
em ordem cronológica linear ascendente, seguido de
considerações pertinentes sobre sua conduta e hábitos, mais
algumas informações relevantes (que somente são relevantes para
ele: vai saber quais são!). E tudo o mais sintético, prático e rápido
possível, ou seja: sua autobiografia profissional em poucas e
convincentes palavras. Padrãozão!
Eu havia levado as coisas para o lado pessoal, emocional,
cósmico, plural e me senti ofendido com o tratamento recebido.
Fora a cena ridícula de ela rasurar meu currículo, não sei se causada
pela minha intempestiva defesa da natureza e condição humana, ou
por que ela era desabotinada mesmo, o caso é que tudo podia ter
sido contornado. Sim, caso eu soubesse exatamente o que era o raio
do perfil e tivesse uma postura mais centrada, não deixando que
minhas opiniões pudessem interferir ou como ocorreu: ser
dominado completamente pela bile e chutar o pau da barraca, as
coisas iriam se passar de outra maneira. O exemplo acima reforça a
tese de que não se deve encarar as impertinências e imprevistos
como um ataque pessoal a nosso já dolorido ego de desempregado.
No mais das vezes o procedimento de se formar uma idéia
da soma das capacidades e qualidades do entrevistado é saudável.
Afinal, se você fosse um empregador, gostaria de saber o mais
possível se este ou aquele determinado profissional é ou não
adequado para as funções. Só que aqui não se trata de adquirir uma
mercadoria qualquer: estamos lidando com pessoas. Assim, o
raciocínio deve se orientar por uma instância ética mínima e não se
ater apenas nos dados mensuráveis do “produto”. Depois,
considere que não se trata de um jogo de quebra-cabeças, onde se
procura a peça que se “encaixa”, mas ter-se em mente a
possibilidade de adaptação. Lamentavelmente, com a velocidade
dos processos modernos, ninguém mais quer perder tempo 16 Aquele tom de voz irritadiço, anasalado, agressivo e completamente desrespeitoso.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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“ensinando o serviço”, a pessoa deve já começar correndo contra o
tempo e pegar o ônibus andando. Nem integrações ou explicações
mais detalhadas sobre a função e estrutura são fornecidas e o fulano
já é colocado lá na mesa para “produzir”.
Se estrategicamente isto é inadmissível, acrescente-se que
também é um verdadeiro tiro no pé das próprias conceituações de
T&D (Treinamento e Desenvolvimento) atuais. Normalmente o
perfil é sempre aproximado ou imagético, o que exclui a maior parte
dos candidatos com alto potencial para capacitação posterior, uma
vez que não considera potencialidades e curso de vida. Além do
mais, a empresa que contratou a consultoria de RH vai também
pagar outros consultores para treinar as suas equipes e então,
quando descobrem que os “perfis” contratados não “respondem”
adequadamente ao treinamento ou ficam presos a uma suposta 17“zona de conforto” eles se ressentem. Magoam-se: Surpresa! A
equipe não é a “ideal”, estamos investindo sem ter retorno... Não
adianta treinar... Então, um dia de baixa no mercado, alguém olha as
planilhas de custo vem a idéia brilhante: vamos demitir quem não se
adapta, “reestruturar” o departamento, criar novos perfis e
atribuições para resolver o problema...analisar gaps de
competências...assim vamos produzir mais. É a típica atitude-coisa
que alimenta o processo infernal da incoerência, dos erros não
localizados. Na outra ponta o pessoal de R&S (Recrutamento e
Seleção) não conseguirá identificar lhufas...
Enfim: podemos definir perfil como o escopo das
competências e experiências que formam a trajetória do
profissional, aliado ao seu aspecto comportamental. Cada um
construiu a sua trajetória e possui experiências - no mais das vezes -
únicas, de modo que cada um tem seu próprio perfil. Não é disso
que estamos falando. Falamos da somatória, das escolhas, das
formações, dos interesses que levam alguém a ser engenheiro ou
poeta, bem como aquilo que desenvolveram em suas carreiras, as
funções exercidas e que se enquadram ou não em determinados
cargos. A trajetória de cada indivíduo não é linear, nada impedindo
que haja retrocessos ou mesmo desenvolvimento de novas 18capacidades, mas defender a meritocracia não significa que todos
possam fazer qualquer coisa. Por exemplo: de nada adianta você ser
competente como auxiliar de escritório e pleitear uma vaga de
químico industrial: você não se encaixa no perfil, pelo menos até
que adquira conhecimento técnico, experiência e postura. Deu
para entender? Não? Bom, vamos aos detalhes.
O que se chama genericamente de perfil é um vocábulo
que se encontra meio gasto pelo uso excessivo, aplicação
inadequada e pretensão de ser conceito final de uma dada situação
de coisas. É como o hórrido a nível de: inexistente, forma
gramaticalmente incorreta e muita gente pensa que ao dizer esta
excrescência está falando bonito... Ai, meus sais! Mas não fiquemos
parados aqui, vamos à fonte. Segundo o dicionário Aurélio significa:
S.m. 1.Contorno de um rosto de uma pessoa vista de lado; 2.O aspecto
ou representação gráfica dum objeto que é visto só de um lado; 3.
Contorno, silhueta; 4. Descrição de uma pessoa com traços mais ou
menos rápidos. Como podem ver, não há nada na etimologia da
palavra que afirme se tratar de algo completo, mas ao contrário,
parcial.
Entretanto, nem sempre as palavras traduzem o que se vê
na prática, deste modo, para um psicólogo e/ou um profissional de
recursos humanos, a palavra transforma-se em conceito,
transforma-se em todo e vem a significar, literalmente o seguinte: A
um dado conjunto de características e de impulsos desencadeantes de
comportamentos existentes e atuantes em cada pessoa dá-se o nome de
perfil psicológico.
Justificativa para o uso do perfil nas empresas: adequar o
indivíduo às funções de forma mais produtiva. A crença básica é a de
que quando um profissional exerce uma atividade condizente e
17 Citação preferida dos instrutores quando notam que seu “treinamento revolucionário” não surtiu efeitos. Quando não se levantam indicadores pré-evento e a coisa desanda é melhor culpar a equipe e salvar os honorários. Pior que isso só os execráveis Power Points motivacionais com flores, citações de almanaque e trechos de filmes como “A Vida é Bela”.
18 Filósofos da bioética, como Singer, afirmam com propriedade, não existir igualdade de oportunidades, mas somente igualdade de interesses. Este é o panorama triste que nos leva a hipérbole da instrumentalização do uso. Uma saída possível seria a formação de sistemas de recompensas baseados tanto no mérito - que é a verificação da competência explícita - quanto na sua adequação em função da ordem social, sem desprezar a características da subjetividade.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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“ensinando o serviço”, a pessoa deve já começar correndo contra o
tempo e pegar o ônibus andando. Nem integrações ou explicações
mais detalhadas sobre a função e estrutura são fornecidas e o fulano
já é colocado lá na mesa para “produzir”.
Se estrategicamente isto é inadmissível, acrescente-se que
também é um verdadeiro tiro no pé das próprias conceituações de
T&D (Treinamento e Desenvolvimento) atuais. Normalmente o
perfil é sempre aproximado ou imagético, o que exclui a maior parte
dos candidatos com alto potencial para capacitação posterior, uma
vez que não considera potencialidades e curso de vida. Além do
mais, a empresa que contratou a consultoria de RH vai também
pagar outros consultores para treinar as suas equipes e então,
quando descobrem que os “perfis” contratados não “respondem”
adequadamente ao treinamento ou ficam presos a uma suposta 17“zona de conforto” eles se ressentem. Magoam-se: Surpresa! A
equipe não é a “ideal”, estamos investindo sem ter retorno... Não
adianta treinar... Então, um dia de baixa no mercado, alguém olha as
planilhas de custo vem a idéia brilhante: vamos demitir quem não se
adapta, “reestruturar” o departamento, criar novos perfis e
atribuições para resolver o problema...analisar gaps de
competências...assim vamos produzir mais. É a típica atitude-coisa
que alimenta o processo infernal da incoerência, dos erros não
localizados. Na outra ponta o pessoal de R&S (Recrutamento e
Seleção) não conseguirá identificar lhufas...
Enfim: podemos definir perfil como o escopo das
competências e experiências que formam a trajetória do
profissional, aliado ao seu aspecto comportamental. Cada um
construiu a sua trajetória e possui experiências - no mais das vezes -
únicas, de modo que cada um tem seu próprio perfil. Não é disso
que estamos falando. Falamos da somatória, das escolhas, das
formações, dos interesses que levam alguém a ser engenheiro ou
poeta, bem como aquilo que desenvolveram em suas carreiras, as
funções exercidas e que se enquadram ou não em determinados
cargos. A trajetória de cada indivíduo não é linear, nada impedindo
que haja retrocessos ou mesmo desenvolvimento de novas 18capacidades, mas defender a meritocracia não significa que todos
possam fazer qualquer coisa. Por exemplo: de nada adianta você ser
competente como auxiliar de escritório e pleitear uma vaga de
químico industrial: você não se encaixa no perfil, pelo menos até
que adquira conhecimento técnico, experiência e postura. Deu
para entender? Não? Bom, vamos aos detalhes.
O que se chama genericamente de perfil é um vocábulo
que se encontra meio gasto pelo uso excessivo, aplicação
inadequada e pretensão de ser conceito final de uma dada situação
de coisas. É como o hórrido a nível de: inexistente, forma
gramaticalmente incorreta e muita gente pensa que ao dizer esta
excrescência está falando bonito... Ai, meus sais! Mas não fiquemos
parados aqui, vamos à fonte. Segundo o dicionário Aurélio significa:
S.m. 1.Contorno de um rosto de uma pessoa vista de lado; 2.O aspecto
ou representação gráfica dum objeto que é visto só de um lado; 3.
Contorno, silhueta; 4. Descrição de uma pessoa com traços mais ou
menos rápidos. Como podem ver, não há nada na etimologia da
palavra que afirme se tratar de algo completo, mas ao contrário,
parcial.
Entretanto, nem sempre as palavras traduzem o que se vê
na prática, deste modo, para um psicólogo e/ou um profissional de
recursos humanos, a palavra transforma-se em conceito,
transforma-se em todo e vem a significar, literalmente o seguinte: A
um dado conjunto de características e de impulsos desencadeantes de
comportamentos existentes e atuantes em cada pessoa dá-se o nome de
perfil psicológico.
Justificativa para o uso do perfil nas empresas: adequar o
indivíduo às funções de forma mais produtiva. A crença básica é a de
que quando um profissional exerce uma atividade condizente e
17 Citação preferida dos instrutores quando notam que seu “treinamento revolucionário” não surtiu efeitos. Quando não se levantam indicadores pré-evento e a coisa desanda é melhor culpar a equipe e salvar os honorários. Pior que isso só os execráveis Power Points motivacionais com flores, citações de almanaque e trechos de filmes como “A Vida é Bela”.
18 Filósofos da bioética, como Singer, afirmam com propriedade, não existir igualdade de oportunidades, mas somente igualdade de interesses. Este é o panorama triste que nos leva a hipérbole da instrumentalização do uso. Uma saída possível seria a formação de sistemas de recompensas baseados tanto no mérito - que é a verificação da competência explícita - quanto na sua adequação em função da ordem social, sem desprezar a características da subjetividade.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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adequada às suas características psicológicas, ele trabalha mais feliz
e se dedica com mais afinco às suas atribuições, proporciona mais
retorno financeiro ao empregador, assim como maior satisfação
pessoal, mantendo o equilíbrio emocional e evitando o stress.
Então, podemos concluir que se trata de instrumento, um agente
facilitador que pode trazer algum subsídio para a tomada de decisão
no processo seletivo e na contratação, nunca um diagnóstico
fechado.
O mesmo se dá com postura, palavra que serve a um sem
número de aplicações, mas veja o que o Aurélio nos aponta: S.f. 1.
Posição do corpo; atitude. 2. Aspecto físico. 3. Substância
embelezadora; cosmético. 4. Os ovos postos por uma ave durante certo
tempo. 5. Preceito municipal escrito, que obriga os munícipes a
cumprirem certos deveres de ordem pública. Ilustrativo, não?
Interessante imaginar até uma relação entre ser, estar, parecer e
obedecer. Já para os profissionais do ramo, no entanto a palavra
significa apenas: Adequação (ou não) das reações comportamentais a
determinadas situações, desafios e demandas, respeitando-se as
práticas vigentes e aceitas. Em outras palavras, busca-se verificar
aqui se existe a adequação das características da personalidade ao
perfil do trabalho. Isto se faz, basicamente porque o objetivo maior
por trás destes conceitos psicológicos não é a melhoria do homem, a
busca de sua felicidade ou permitir a ele o acesso a uma função que
alimentará sua família, mas meramente obter uma produtividade
maior, com menor custo, reduzindo o turn over e o índice de 19absenteísmo.
É óbvio que diferentes características de personalidade são
importantes para trabalhos diferentes. Os famosos tipos junguianos
(introvertido/extrovertido) são uma faceta do que falamos,
normalmente sendo usados para “classificar” os espécimes
humanos que se candidatam para um posto de trabalho. Afinal,
parece estúpido colocar uma pessoa introvertida para ser
vendedora, ou ao contrário, alguém extrovertido para ser um fiscal
da tesouraria de um banco. Imagine, então, uma pessoa meiga e
tolerante alocada no setor de cobranças ou alguém bem durão,
pavio curto, que adora o confronto, como responsável pelo
atendimento ao consumidor. Não vai funcionar, mesmo! Porém este
pessoal de recursos humanos esquece de que Jung também
pregava um monismo holístico, uma totalidade e, sua obra é
vastíssima, não cabendo em uma apostila.
Além disso, nada implica que mesmo pessoas, de tipos
diferentes não possam se sair bem em situações extemporâneas. O
perigo é o modo de se apropriar, recortar, isolar esta ou aquela
asserção de um pensador profundo e transformá-la em techné
(técnica), em conceito, em metáfora, esquecendo sua raiz, as
verdadeiras preocupações originais.
Isto é estar a serviço do capital selvagem e não do
humanismo ou da ciência. As organizações costumam tomar
decisões absurdas na hora de preparar uma descrição de cargo e os
profissionais que deveriam esclarecer os erros dos tecnocratas,
simplesmente dizem amém e, ao invés, buscam encaixar a peça
redonda na caixa quadrada, porque “assim são as coisas, assim
funciona o mercado”.
Agora que os meandros dos significados estão descritos,
cabe frisar que perfil e postura significam a qualidade das
construções profissionais e a reação do indivíduo à determinada
situação, contexto ou atividade social. Entretanto não significam em
absoluto o que se é, mas como se age naquele instante.
Apesar de ser extremamente subjetiva uma avaliação
pontual sobre determinada reação a determinado estímulo, face a
determinado contexto é justamente o que você irá se deparar na sua
caminhada rumo a um novo emprego. Isto, porque a despeito de
toda a erudição conquistada lendo este Manual, dificilmente você
escapará de ter que lidar com os magos negros do senso comum.
Portanto, cuidado: em caso de dúvida, seja o áureo medíocre! Num
processo seletivo comum, diga exatamente o que se espera ouvir,
sempre de forma positiva e polida, mesmo que isso seja a maior
obviedade do mundo. As pessoas normalmente se ressentem de
quem sabe mais, desempenha melhor ou não age de acordo com “o
perfil”. Evite afrontar a pequenez e tudo sairá bem.19 Estes palavrões significam, respectivamente: índice de demissão/contratação e o índice de faltas e atrasos.
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adequada às suas características psicológicas, ele trabalha mais feliz
e se dedica com mais afinco às suas atribuições, proporciona mais
retorno financeiro ao empregador, assim como maior satisfação
pessoal, mantendo o equilíbrio emocional e evitando o stress.
Então, podemos concluir que se trata de instrumento, um agente
facilitador que pode trazer algum subsídio para a tomada de decisão
no processo seletivo e na contratação, nunca um diagnóstico
fechado.
O mesmo se dá com postura, palavra que serve a um sem
número de aplicações, mas veja o que o Aurélio nos aponta: S.f. 1.
Posição do corpo; atitude. 2. Aspecto físico. 3. Substância
embelezadora; cosmético. 4. Os ovos postos por uma ave durante certo
tempo. 5. Preceito municipal escrito, que obriga os munícipes a
cumprirem certos deveres de ordem pública. Ilustrativo, não?
Interessante imaginar até uma relação entre ser, estar, parecer e
obedecer. Já para os profissionais do ramo, no entanto a palavra
significa apenas: Adequação (ou não) das reações comportamentais a
determinadas situações, desafios e demandas, respeitando-se as
práticas vigentes e aceitas. Em outras palavras, busca-se verificar
aqui se existe a adequação das características da personalidade ao
perfil do trabalho. Isto se faz, basicamente porque o objetivo maior
por trás destes conceitos psicológicos não é a melhoria do homem, a
busca de sua felicidade ou permitir a ele o acesso a uma função que
alimentará sua família, mas meramente obter uma produtividade
maior, com menor custo, reduzindo o turn over e o índice de 19absenteísmo.
É óbvio que diferentes características de personalidade são
importantes para trabalhos diferentes. Os famosos tipos junguianos
(introvertido/extrovertido) são uma faceta do que falamos,
normalmente sendo usados para “classificar” os espécimes
humanos que se candidatam para um posto de trabalho. Afinal,
parece estúpido colocar uma pessoa introvertida para ser
vendedora, ou ao contrário, alguém extrovertido para ser um fiscal
da tesouraria de um banco. Imagine, então, uma pessoa meiga e
tolerante alocada no setor de cobranças ou alguém bem durão,
pavio curto, que adora o confronto, como responsável pelo
atendimento ao consumidor. Não vai funcionar, mesmo! Porém este
pessoal de recursos humanos esquece de que Jung também
pregava um monismo holístico, uma totalidade e, sua obra é
vastíssima, não cabendo em uma apostila.
Além disso, nada implica que mesmo pessoas, de tipos
diferentes não possam se sair bem em situações extemporâneas. O
perigo é o modo de se apropriar, recortar, isolar esta ou aquela
asserção de um pensador profundo e transformá-la em techné
(técnica), em conceito, em metáfora, esquecendo sua raiz, as
verdadeiras preocupações originais.
Isto é estar a serviço do capital selvagem e não do
humanismo ou da ciência. As organizações costumam tomar
decisões absurdas na hora de preparar uma descrição de cargo e os
profissionais que deveriam esclarecer os erros dos tecnocratas,
simplesmente dizem amém e, ao invés, buscam encaixar a peça
redonda na caixa quadrada, porque “assim são as coisas, assim
funciona o mercado”.
Agora que os meandros dos significados estão descritos,
cabe frisar que perfil e postura significam a qualidade das
construções profissionais e a reação do indivíduo à determinada
situação, contexto ou atividade social. Entretanto não significam em
absoluto o que se é, mas como se age naquele instante.
Apesar de ser extremamente subjetiva uma avaliação
pontual sobre determinada reação a determinado estímulo, face a
determinado contexto é justamente o que você irá se deparar na sua
caminhada rumo a um novo emprego. Isto, porque a despeito de
toda a erudição conquistada lendo este Manual, dificilmente você
escapará de ter que lidar com os magos negros do senso comum.
Portanto, cuidado: em caso de dúvida, seja o áureo medíocre! Num
processo seletivo comum, diga exatamente o que se espera ouvir,
sempre de forma positiva e polida, mesmo que isso seja a maior
obviedade do mundo. As pessoas normalmente se ressentem de
quem sabe mais, desempenha melhor ou não age de acordo com “o
perfil”. Evite afrontar a pequenez e tudo sairá bem.19 Estes palavrões significam, respectivamente: índice de demissão/contratação e o índice de faltas e atrasos.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
4746
5 - Na Sala de Espera: Comportamento, Projeto e Apresentação
Uma das situações mais entediantes que existem é ficar aboletado
num sofá, cadeira ou mesmo em pé, aguardando ser chamado para
uma entrevista. Como já dissemos: Ao aguardar, não demonstre sua
impaciência, pois você pode estar sendo observado, mas sem
neurose, pois a recepcionista pode ser apenas recepcionista, não
uma psicóloga disfarçada. É fato que muitas empresas simplesmente
são desorganizadas e você deve estar preparado para o famoso chá
de cadeira. Aproveite o tempo para fazer observações úteis,
utilizando a técnica do vendedor-pracista de análise presencial.
Todo bom vendedor sabe que ao fazer uma prospecção
deve estar atento a todos os detalhes. Esta é a sua situação atual:
verificando um terreno novo e explorando uma oportunidade de
vender seu melhor produto - você! Então, o que ele faz? Primeiro ele
observa a fachada da loja, depois entra e verifica a disposição das
prateleiras, o design da vitrine, a quantidade de funcionários, o
volume de produtos, se há estoque aparente, se a atmosfera é
acolhedora ou séria, o movimento dos clientes e somente depois
disso é que se apresenta cordial e sorridente. De tudo o que ele
observou, já pode fazer uma idéia se o cliente tem ou não potencial
para comprar, se o negócio parece ir bem, se existem ou não
produtos dos concorrentes e quais os preços praticados, se deve
abordar o dono ou o comprador desta ou daquela maneira. No caso
do candidato a emprego, funciona da mesma forma, embora numa
ordem diferente de fatores e interpretações.
Ao entrar, apresente-se direta e cordialmente à recepção,
informando o motivo de você estar ali e com quem deseja falar. Após
esta apresentação, não vá correndo sentar e ficar ali inerte, com a
pasta ou a bolsa sobre os joelhos, mas aproveite para observar
atentamente o local. Veja como é a decoração, o tipo de revistas que
estão à disposição, verifique se existem produtos, maquetes,
mostruários ou qualquer painel informativo sobre a empresa.
Analise quem se encontra ao seu lado: sejam possíveis candidatos,
funcionários, repare na movimentação, em como se vestem ou se
portam. Procure acomodar-se da melhor maneira possível,
buscando uma posição sóbria e confortável de modo a evitar ficar
rígido e acumulando tensões desnecessárias. Veja também se se
trata de local sério ou é mais um matadouro. Normalmente salas
abarrotadas de candidatos não querem dizer que a empresa cobre
pelos serviços, porém é um indicador importante verificar as
expressões de quem sai pela porta e vai embora. De tudo isto você
pode retirar informações preciosas sobre qual é o tipo de comprador
que aguarda você, enquanto não é anunciado.
Antes de tudo, porém - e lamentavelmente - é necessário
você ter preparado seu projeto decorativo, que não difere
substancialmente entre homens e mulheres. Ir a qualquer entrevista
exige um processo de preparação visual que é, na verdade uma
variação sobre o mesmo tema: para os homens terno e gravata;
mulheres, tailleur e salto, numa sinfonia em preto ou tons escuros.
Não sei quem é o estafermo que efetuou pesquisas cromoterápicas
que definam que os tons escuros transmitem sobriedade, respeito
ou equivalência em habilidades concretas, mas sei que isto conta ao
senso comum. Para os varões, recomendam-se escapar de sapatos,
cintos e gravatas extravagantes.
Se você não é comediante, obeso ou marqueteiro deixe os
suspensórios e a gravata borboleta em casa, aprenda a fazer um nó
bem feito e evitar a todo custo calçar meias claras com sapatos
escuros. Vá lá um corte em azul ou marrom, mas somente se já foi
alguma vez e não quer repetir o costume. A não ser que o seu ramo
de atuação seja informal, nem pense em aparecer de jeans e camisa.
Aprenda também a conviver com o terno para não parecer um saco
de batatas, quando estiver sentado. O truque é puxar um pouco a
parte de trás do paletó e sentar em cima, assim você fica esticado.
Evite encher os bolsos de coisas, deixando tudo numa providencial
pasta ou mala de mão.
Para as mulheres a carga de preconceito ainda é maior.
Outro dia vi uma capa de revista que mostrava uma mesma e linda
mulher vestida de dois jeitos diferentes:
A) Tailleur preto, cabelos lambidos e lisos, sem qualquer acessório, no
máximo uns nanômetros de base e batom, camisa preta de gola,
bolsinha pequena preta e salto altíssimo de bico...cafonérrima e;
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
4948
5 - Na Sala de Espera: Comportamento, Projeto e Apresentação
Uma das situações mais entediantes que existem é ficar aboletado
num sofá, cadeira ou mesmo em pé, aguardando ser chamado para
uma entrevista. Como já dissemos: Ao aguardar, não demonstre sua
impaciência, pois você pode estar sendo observado, mas sem
neurose, pois a recepcionista pode ser apenas recepcionista, não
uma psicóloga disfarçada. É fato que muitas empresas simplesmente
são desorganizadas e você deve estar preparado para o famoso chá
de cadeira. Aproveite o tempo para fazer observações úteis,
utilizando a técnica do vendedor-pracista de análise presencial.
Todo bom vendedor sabe que ao fazer uma prospecção
deve estar atento a todos os detalhes. Esta é a sua situação atual:
verificando um terreno novo e explorando uma oportunidade de
vender seu melhor produto - você! Então, o que ele faz? Primeiro ele
observa a fachada da loja, depois entra e verifica a disposição das
prateleiras, o design da vitrine, a quantidade de funcionários, o
volume de produtos, se há estoque aparente, se a atmosfera é
acolhedora ou séria, o movimento dos clientes e somente depois
disso é que se apresenta cordial e sorridente. De tudo o que ele
observou, já pode fazer uma idéia se o cliente tem ou não potencial
para comprar, se o negócio parece ir bem, se existem ou não
produtos dos concorrentes e quais os preços praticados, se deve
abordar o dono ou o comprador desta ou daquela maneira. No caso
do candidato a emprego, funciona da mesma forma, embora numa
ordem diferente de fatores e interpretações.
Ao entrar, apresente-se direta e cordialmente à recepção,
informando o motivo de você estar ali e com quem deseja falar. Após
esta apresentação, não vá correndo sentar e ficar ali inerte, com a
pasta ou a bolsa sobre os joelhos, mas aproveite para observar
atentamente o local. Veja como é a decoração, o tipo de revistas que
estão à disposição, verifique se existem produtos, maquetes,
mostruários ou qualquer painel informativo sobre a empresa.
Analise quem se encontra ao seu lado: sejam possíveis candidatos,
funcionários, repare na movimentação, em como se vestem ou se
portam. Procure acomodar-se da melhor maneira possível,
buscando uma posição sóbria e confortável de modo a evitar ficar
rígido e acumulando tensões desnecessárias. Veja também se se
trata de local sério ou é mais um matadouro. Normalmente salas
abarrotadas de candidatos não querem dizer que a empresa cobre
pelos serviços, porém é um indicador importante verificar as
expressões de quem sai pela porta e vai embora. De tudo isto você
pode retirar informações preciosas sobre qual é o tipo de comprador
que aguarda você, enquanto não é anunciado.
Antes de tudo, porém - e lamentavelmente - é necessário
você ter preparado seu projeto decorativo, que não difere
substancialmente entre homens e mulheres. Ir a qualquer entrevista
exige um processo de preparação visual que é, na verdade uma
variação sobre o mesmo tema: para os homens terno e gravata;
mulheres, tailleur e salto, numa sinfonia em preto ou tons escuros.
Não sei quem é o estafermo que efetuou pesquisas cromoterápicas
que definam que os tons escuros transmitem sobriedade, respeito
ou equivalência em habilidades concretas, mas sei que isto conta ao
senso comum. Para os varões, recomendam-se escapar de sapatos,
cintos e gravatas extravagantes.
Se você não é comediante, obeso ou marqueteiro deixe os
suspensórios e a gravata borboleta em casa, aprenda a fazer um nó
bem feito e evitar a todo custo calçar meias claras com sapatos
escuros. Vá lá um corte em azul ou marrom, mas somente se já foi
alguma vez e não quer repetir o costume. A não ser que o seu ramo
de atuação seja informal, nem pense em aparecer de jeans e camisa.
Aprenda também a conviver com o terno para não parecer um saco
de batatas, quando estiver sentado. O truque é puxar um pouco a
parte de trás do paletó e sentar em cima, assim você fica esticado.
Evite encher os bolsos de coisas, deixando tudo numa providencial
pasta ou mala de mão.
Para as mulheres a carga de preconceito ainda é maior.
Outro dia vi uma capa de revista que mostrava uma mesma e linda
mulher vestida de dois jeitos diferentes:
A) Tailleur preto, cabelos lambidos e lisos, sem qualquer acessório, no
máximo uns nanômetros de base e batom, camisa preta de gola,
bolsinha pequena preta e salto altíssimo de bico...cafonérrima e;
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
4948
B) Casaquinho e calça clara, blusa meio decote, cabelos soltos,
maquiada, salto médio e confortável, bolsa combinando, visual
agradável.
Adivinha então qual era a chamada da capa? Era a tenebrosa e hiper
preconceituosa: “Você é analisada em dois segundos antes de ser 20aprovada ou descartada”.
Já imaginou qual era o modelito “aprovado” pelos padrões
estilísticos profissionais “permitidos”: claro que era a da bruxa de
velório, ou modelo insossa opção A. Portanto, vale também aqui
esquecer qualquer traço que valorize suas formas ou optar pela
tendência fashion atual. Use o pretinho básico e, se não tiver - ou
puder - componha um visual conservador. O mesmo é recomendado
para esmaltes, brincos, perfumes, batons e outros componentes do
arsenal estético feminino. A não ser que vá trabalhar na Prada,
esteja preparada para não dar na vista, ao mesmo tempo deixando
claro que sabe escolher a composição conforme a ocasião. Mesmo
porque poderá atrair a antipatia alheia se exagerar ou faltar. Se o
selecionador for homem, cuidado com sentir-se incomodada ou
entusiasmada com olhares ou simpatia, pode ser um teste. Fique
atenta, serena e responda sempre de forma objetiva, mas sem frieza.
Se for mulher, redobre a guarda: não entre no clássico jogo de
competição e ironia.
Já adiantamos também quais os procedimentos após ouvir
seu nome: Passos firmes, desembaraço, polidez, cordialidade.
Expresse sua satisfação por estar ali, mas nada de muita efusão ou
fortes apertos de mão: existem muitas pessoas que odeiam
cumprimentos afetuosos com desconhecidos e somente o fazem
porque o protocolo exige - retribua na mesma moeda o tempo e a
pressão das mãos. Aquilo que já dissemos sobre os gestos, após estar
frente ao entrevistador também deve ser observado. Não se
esqueça que existe um problema de territorialidade com a natureza
das relações humanas, ou seja: é de muito bom tom que você não
“invada” o espaço dos outros, seja fisicamente ou mesmo
intelectualmente.Procure preservar suas opiniões, conhecimentos
e comentários pessoais para si mesmo, ou quando seja instado a
fazê-lo. Seja como o vendedor: não venda para empresas, mas
venda para pessoas. São pessoas que compram e elas podem ser
influenciadas. Veja como:
A pior coisa que você pode fazer em uma entrevista é
“aproveitar o gancho” de um jargão do ramo psicológico e tentar
dar aula ao entrevistador. Ou então corrigir o interlocutor
intempestivamente. Se fizer, praticamente você é carta fora do
baralho. Não se esqueça que talvez a pessoa que está lhe
entrevistando ganhe muito menos do que a sua pretensão salarial,
portanto, se você a insultar ou se mostrar arrogante - mesmo
subliminarmente - estará colocando seu pescoço sob a lâmina da
guilhotina e aí baubau! Ao contrário, seu maior esforço nestes
momentos é ganhar a adequada simpatia e a atenção técnica
daquele que está com o encargo da seleção. Mesmo que a pessoa
lhe aborreça, perturbe, ironize, diminua, trate você como um
código de barras, seja ético e respeitoso. Tente ganhar sua confiança
para que a relação não retroceda a um estado de natureza 21hobbesiano.
Esta prática também o auxiliará na recusa de propostas 22indecentes de venda de emprego ou mesmo de funções com
remunerações desprezíveis, porque você estará concentrado no
contexto, extraindo o máximo da situação de forma racional. Assim,
não será vampirizado e poderá resistir a quaisquer ataques à sua
auto-estima, ficando numa situação emocional mais confortável.
Como ninguém é perfeito, saindo de lá, você pode aliviar suas
tensões chutando todas as latas que encontrar até chegar em casa
ou dobrar a sessão na academia. Entrementes, procure verificar que
20 É o fim da picada que alguém possa ser analisado de forma imediata. O terror alocado sobre o pseudo “poder” dos avaliadores dita estilos e modos de proceder, no entanto é importante ficar atento a estas tendências. Não há poder ou formação a não ser o da ignorância do jornalista. Nenhum profissional de seleção sério ou psicólogo ético faria uma análise meramente subjetiva, baseada em segundos de avaliação ou conceitos de moda. Mas o mundo não é o ideal e sequer talvez o melhor daqueles que nos possam ser dados como possíveis. Fora isso, ligue os depuradores culturais: Revistas têm de ser apelativas para poder vender, portanto cuide de “limar” onde exageram na dose, porque exageram!
21 Segundo Hobbes, no Leviatã, o estado natural dos homens é a guerra de todos contra todos - lupus homo hominis - o homem é o lobo do homem, ou seja, a coisa pode acabar mal se não houver repressão legal às paixões.22 Exceção à regra: se quiser, proteste a vontade e inclusive denuncie qualquer prática ilegal ou antiética.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
5150
B) Casaquinho e calça clara, blusa meio decote, cabelos soltos,
maquiada, salto médio e confortável, bolsa combinando, visual
agradável.
Adivinha então qual era a chamada da capa? Era a tenebrosa e hiper
preconceituosa: “Você é analisada em dois segundos antes de ser 20aprovada ou descartada”.
Já imaginou qual era o modelito “aprovado” pelos padrões
estilísticos profissionais “permitidos”: claro que era a da bruxa de
velório, ou modelo insossa opção A. Portanto, vale também aqui
esquecer qualquer traço que valorize suas formas ou optar pela
tendência fashion atual. Use o pretinho básico e, se não tiver - ou
puder - componha um visual conservador. O mesmo é recomendado
para esmaltes, brincos, perfumes, batons e outros componentes do
arsenal estético feminino. A não ser que vá trabalhar na Prada,
esteja preparada para não dar na vista, ao mesmo tempo deixando
claro que sabe escolher a composição conforme a ocasião. Mesmo
porque poderá atrair a antipatia alheia se exagerar ou faltar. Se o
selecionador for homem, cuidado com sentir-se incomodada ou
entusiasmada com olhares ou simpatia, pode ser um teste. Fique
atenta, serena e responda sempre de forma objetiva, mas sem frieza.
Se for mulher, redobre a guarda: não entre no clássico jogo de
competição e ironia.
Já adiantamos também quais os procedimentos após ouvir
seu nome: Passos firmes, desembaraço, polidez, cordialidade.
Expresse sua satisfação por estar ali, mas nada de muita efusão ou
fortes apertos de mão: existem muitas pessoas que odeiam
cumprimentos afetuosos com desconhecidos e somente o fazem
porque o protocolo exige - retribua na mesma moeda o tempo e a
pressão das mãos. Aquilo que já dissemos sobre os gestos, após estar
frente ao entrevistador também deve ser observado. Não se
esqueça que existe um problema de territorialidade com a natureza
das relações humanas, ou seja: é de muito bom tom que você não
“invada” o espaço dos outros, seja fisicamente ou mesmo
intelectualmente.Procure preservar suas opiniões, conhecimentos
e comentários pessoais para si mesmo, ou quando seja instado a
fazê-lo. Seja como o vendedor: não venda para empresas, mas
venda para pessoas. São pessoas que compram e elas podem ser
influenciadas. Veja como:
A pior coisa que você pode fazer em uma entrevista é
“aproveitar o gancho” de um jargão do ramo psicológico e tentar
dar aula ao entrevistador. Ou então corrigir o interlocutor
intempestivamente. Se fizer, praticamente você é carta fora do
baralho. Não se esqueça que talvez a pessoa que está lhe
entrevistando ganhe muito menos do que a sua pretensão salarial,
portanto, se você a insultar ou se mostrar arrogante - mesmo
subliminarmente - estará colocando seu pescoço sob a lâmina da
guilhotina e aí baubau! Ao contrário, seu maior esforço nestes
momentos é ganhar a adequada simpatia e a atenção técnica
daquele que está com o encargo da seleção. Mesmo que a pessoa
lhe aborreça, perturbe, ironize, diminua, trate você como um
código de barras, seja ético e respeitoso. Tente ganhar sua confiança
para que a relação não retroceda a um estado de natureza 21hobbesiano.
Esta prática também o auxiliará na recusa de propostas 22indecentes de venda de emprego ou mesmo de funções com
remunerações desprezíveis, porque você estará concentrado no
contexto, extraindo o máximo da situação de forma racional. Assim,
não será vampirizado e poderá resistir a quaisquer ataques à sua
auto-estima, ficando numa situação emocional mais confortável.
Como ninguém é perfeito, saindo de lá, você pode aliviar suas
tensões chutando todas as latas que encontrar até chegar em casa
ou dobrar a sessão na academia. Entrementes, procure verificar que
20 É o fim da picada que alguém possa ser analisado de forma imediata. O terror alocado sobre o pseudo “poder” dos avaliadores dita estilos e modos de proceder, no entanto é importante ficar atento a estas tendências. Não há poder ou formação a não ser o da ignorância do jornalista. Nenhum profissional de seleção sério ou psicólogo ético faria uma análise meramente subjetiva, baseada em segundos de avaliação ou conceitos de moda. Mas o mundo não é o ideal e sequer talvez o melhor daqueles que nos possam ser dados como possíveis. Fora isso, ligue os depuradores culturais: Revistas têm de ser apelativas para poder vender, portanto cuide de “limar” onde exageram na dose, porque exageram!
21 Segundo Hobbes, no Leviatã, o estado natural dos homens é a guerra de todos contra todos - lupus homo hominis - o homem é o lobo do homem, ou seja, a coisa pode acabar mal se não houver repressão legal às paixões.22 Exceção à regra: se quiser, proteste a vontade e inclusive denuncie qualquer prática ilegal ou antiética.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
5150
qualquer progresso que você possa fazer em termos de tolerância e
sublimação equivale a anos luz de evolução, deste modo procure
perdoar e esquecer os muitos instrumentos de provação que você
encontrará no caminho, disfarçados de entrevistadores,
contratadores, chefes, líderes, consultores, especialistas,
concorrentes e todos os que possuem o dom de ferir. É melhor
pensar assim, pois como dizia Gandhi, se for olho por olho, sempre,
um dia todos terminarão cegos.
Embora a metodologia, os valores ideologizados, o sistema
sócio-econômico-cultural como um todo massacre o indivíduo,
aquele que detêm temporariamente alguma relação de poder, por
ele mesmo é apenas a frágil instância desta relação. Tente descobrir
onde vai dar o caminho. Dentro das complexas relações que
constituem o tecido social e profissional, os indivíduos que exercem
funções, tendem a ser guiados por técnicas, procedimentos e
crenças justificadas sobre valores concretos as quais nunca 23questionam. A ordem das relações se estabelece, porém, dentro de
uma lógica de produção e maximização, onde o que importa são a
quantidade de resultados e a eficácia das ações. Isto coloca a
subjetividade e o próprio indivíduo à mercê de uma série de
avaliações, nem sempre plausíveis. Isto é onde acaba a linha de
produção. Aprenda a linguagem das máquinas.
Tenha em mente que o entrevistador é um ser humano
comum, mas cujo material de trabalho são as pessoas. Se o sistema
de operações pode parecer medieval, dada a brutalidade dos
direcionamentos em busca da adequação ao perfil solicitado, quem
dirige o processo não é necessariamente um inquisidor. Fora dali ele
pode ser bom pai, boa mãe, bom amigo, bom samaritano, embora
no exercício de suas funções e, pelo fato de deter poder sobre sua
contratação ele possa lhe parecer um carrasco - mesmo se assim for,
como tal, ele lhe pede o perdão -, em nome do que seu tipo de
emprego lhe obriga a fazer. Embora o caso não seja de coerção, mas
de crença e escolha; principalmente de evolução destes processos
arcaicos, vale a analogia. Meu conselho é simples: Mudem-se os
meios pelos quais a sociedade opera e desaparecerão os também
verdugos.
6 - Meio Ambiente Hostil
Digam o que disserem os retóricos inflamados das nobres virtudes
dos profissionais de recursos humanos, a verdade empírica é que
para quem está do outro lado da mesa (ou do balcão, depende!) a
sala de entrevistas é um espaço alienígena. A geografia competitiva
e desconhecida da situação fornece mais motivos de ansiedade e de
insegurança, do que propriamente um “desafio”, tornando-se,
portanto, uma arena onde se deverá travar um combate mortal.
Ao leitor desavisado, poderá parecer que eu estou aqui a
desfiar um longo rosário de queixas e recriminações contra estes
profissionais, um revanchismo contra o que é considerado como
crença social na “ciência exata e positiva” da psicologia - porque ela
tem papel dominante nas instâncias de avaliação, sejam quais forem
os objetivos - ou no mínimo dando vazão aos meus instintos
psicopatológicos numa catarse literária. Nada disso! É importante
verificar que o intuito aqui é registrar a prática moderna de
contratação e quais os impactos que os mecanismos, instrumentos,
visões e técnicas aceitas têm nos indivíduos. Se há alguma acidez
nas minhas considerações, estas se dirigem - sim - ao utilitarismo
preferencial das sociedades de consumo, seu modus operandi, cujo
único valor é o lucro e cuja maior preocupação é aumentar a
extração, produção, conquistar mercados e baixar os custos, seja a
que custo ético for. Disciplinas fundamentais têm sido cooptadas
para este projeto, no mais das vezes desfigurando seu corpo
doutrinário e seus profissionais.
Senão, vejamos: o que realmente é o escopo das doutrinas
que analisamos?
Uma teoria pode ser desenvolvida através de sérias
pesquisas e estudos, mas isto não significa que sua adequação
prática seja orientada conforme uma prioridade que permita elevar
o espírito. Vivemos o segundo milênio da civilização ocidental,
numa sociedade que está estruturada dentro de infinitas séries de
relações entre microcosmo e macrocosmo. Temos de um lado as
micro relações afetivas, sociais e culturais que são estabelecidas
pela vida cotidiana dos indivíduos e, de outro os aparatos do Estado,
dos mercados, das instituições e suas interações globais. Até aí, tudo 23 Se o fizesse entrava em crise, pois questionaria a si mesmo e o alcance de suas atitudes...
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
5352
qualquer progresso que você possa fazer em termos de tolerância e
sublimação equivale a anos luz de evolução, deste modo procure
perdoar e esquecer os muitos instrumentos de provação que você
encontrará no caminho, disfarçados de entrevistadores,
contratadores, chefes, líderes, consultores, especialistas,
concorrentes e todos os que possuem o dom de ferir. É melhor
pensar assim, pois como dizia Gandhi, se for olho por olho, sempre,
um dia todos terminarão cegos.
Embora a metodologia, os valores ideologizados, o sistema
sócio-econômico-cultural como um todo massacre o indivíduo,
aquele que detêm temporariamente alguma relação de poder, por
ele mesmo é apenas a frágil instância desta relação. Tente descobrir
onde vai dar o caminho. Dentro das complexas relações que
constituem o tecido social e profissional, os indivíduos que exercem
funções, tendem a ser guiados por técnicas, procedimentos e
crenças justificadas sobre valores concretos as quais nunca 23questionam. A ordem das relações se estabelece, porém, dentro de
uma lógica de produção e maximização, onde o que importa são a
quantidade de resultados e a eficácia das ações. Isto coloca a
subjetividade e o próprio indivíduo à mercê de uma série de
avaliações, nem sempre plausíveis. Isto é onde acaba a linha de
produção. Aprenda a linguagem das máquinas.
Tenha em mente que o entrevistador é um ser humano
comum, mas cujo material de trabalho são as pessoas. Se o sistema
de operações pode parecer medieval, dada a brutalidade dos
direcionamentos em busca da adequação ao perfil solicitado, quem
dirige o processo não é necessariamente um inquisidor. Fora dali ele
pode ser bom pai, boa mãe, bom amigo, bom samaritano, embora
no exercício de suas funções e, pelo fato de deter poder sobre sua
contratação ele possa lhe parecer um carrasco - mesmo se assim for,
como tal, ele lhe pede o perdão -, em nome do que seu tipo de
emprego lhe obriga a fazer. Embora o caso não seja de coerção, mas
de crença e escolha; principalmente de evolução destes processos
arcaicos, vale a analogia. Meu conselho é simples: Mudem-se os
meios pelos quais a sociedade opera e desaparecerão os também
verdugos.
6 - Meio Ambiente Hostil
Digam o que disserem os retóricos inflamados das nobres virtudes
dos profissionais de recursos humanos, a verdade empírica é que
para quem está do outro lado da mesa (ou do balcão, depende!) a
sala de entrevistas é um espaço alienígena. A geografia competitiva
e desconhecida da situação fornece mais motivos de ansiedade e de
insegurança, do que propriamente um “desafio”, tornando-se,
portanto, uma arena onde se deverá travar um combate mortal.
Ao leitor desavisado, poderá parecer que eu estou aqui a
desfiar um longo rosário de queixas e recriminações contra estes
profissionais, um revanchismo contra o que é considerado como
crença social na “ciência exata e positiva” da psicologia - porque ela
tem papel dominante nas instâncias de avaliação, sejam quais forem
os objetivos - ou no mínimo dando vazão aos meus instintos
psicopatológicos numa catarse literária. Nada disso! É importante
verificar que o intuito aqui é registrar a prática moderna de
contratação e quais os impactos que os mecanismos, instrumentos,
visões e técnicas aceitas têm nos indivíduos. Se há alguma acidez
nas minhas considerações, estas se dirigem - sim - ao utilitarismo
preferencial das sociedades de consumo, seu modus operandi, cujo
único valor é o lucro e cuja maior preocupação é aumentar a
extração, produção, conquistar mercados e baixar os custos, seja a
que custo ético for. Disciplinas fundamentais têm sido cooptadas
para este projeto, no mais das vezes desfigurando seu corpo
doutrinário e seus profissionais.
Senão, vejamos: o que realmente é o escopo das doutrinas
que analisamos?
Uma teoria pode ser desenvolvida através de sérias
pesquisas e estudos, mas isto não significa que sua adequação
prática seja orientada conforme uma prioridade que permita elevar
o espírito. Vivemos o segundo milênio da civilização ocidental,
numa sociedade que está estruturada dentro de infinitas séries de
relações entre microcosmo e macrocosmo. Temos de um lado as
micro relações afetivas, sociais e culturais que são estabelecidas
pela vida cotidiana dos indivíduos e, de outro os aparatos do Estado,
dos mercados, das instituições e suas interações globais. Até aí, tudo 23 Se o fizesse entrava em crise, pois questionaria a si mesmo e o alcance de suas atitudes...
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
5352
bem: trata-se apenas de ver as coisas como estão, como nos
aparecem. O problema é que todo este complexo mecanismo move-
se, orientado por uma lógica de produção, poder e acumulação
privada, onde os indivíduos podem ser comparados a meros - e
substituíveis - componentes de desgaste.
Quando você compra uma bicicleta, pode verificar no
manual que normalmente não se dá grandes garantias para as peças
que compõe as engrenagens de movimento, mas sim à estrutura.
Ora, é claro que a corrente, o pedal e a roda livre se desgastam mais,
pois são estas partes do mecanismo que produzem o atrito
necessário para que exista o movimento. O engraçado é verificar
que são justamente estas as partes mais desconsideradas. O mesmo
acontece com as relações produtivas em quaisquer setores da
economia: as ocupações da produção geram a riqueza em
produtos, em troca de salário, suportando os atritos da fabricação,
enquanto que outros segmentos suportam os percalços da logística
e, para encurtar, finalmente os benefícios são auferidos, usufruídos e
geridos pelas camadas que detém os “direitos”, poderes ou o
controle do processo produção-distribuição.
Disto infere-se que seria bem grande a diminuição das
margens obtidas no negócio, caso fosse dada garantia e assistência
plena aos itens de desgaste. Ora! Esta mesma base unilinear do
pensamento cumulativo de bens - sacrossanta relação
custo/benefício - sai do insumo, matéria e tributos para serem
levados às práticas de manuseio dos estoques de recursos humanos
disponíveis ou captados. As corporações estratificam o
escalonamento funcional em níveis estanques onde reina a planilha.
Em torno das funções, criam-se normas, procedimentos e todo um
aparato burocrático - conflitante - de modo a garantir a demanda,
elevar metas, conseguir benefícios e concentrar o poder decisório.
Ninguém se engane: estão superadas as distinções entre valor de
uso e troca, ouvem-se traços discursivos de sustentabilidade, mas o
que importa é a contínua produção e conseqüente descarte.
Teoricamente, haveria recolhimento de impostos que
seriam revertidos para a melhora das condições de vida, maior
disponibilidade de produtos, mais oportunidades iguais para todos,
porém isto é balela. Inserido como coisa dentro deste panorama,
torna-se claro que o papel do indivíduo é infinitamente menor do
que as mercadorias e serviços de que é capaz de produzir ou
realizar. Então, surge outro fantasma: seguindo este mesmo
raciocínio, é evidente que a preocupação de quem detém os meios
de produção, os empregadores e financiadores, é voltar sua atenção
para os elos desta cadeia de conseqüências e fazer com que o
mecanismo corporativo funcione bem, sempre produzindo mais, a
menor custo e com maior eficiência. Mas isto não ocorre bem assim.
Desgaste é igual à concessão de benefício, portanto a
lógica tacanha da produção é imputar o vício, como inerente à
“natureza” do produto - ao contrário de produzir peças melhores,
que durem mais, faz-se o inverso para “garantir mercado”. Por isso,
contratam, formam ou desenham “especialistas” e especialidades
para lhes providenciar no ecossistema humano, as cabeças, corpos,
comportamentos e membros de que precisam. Se, por um lado
enquanto produzem, tentam se eximir de responsabilidades por
quebras, falhas e outros dolos em seu agir, naturalizando a
apropriação dentro dos sistemas de valores, crenças e práticas - que
movimentam a máquina criada para ser mantida e consumida; por
outro demandam a formação de novos comportamentos, mais 24compatíveis com desejos e necessidades de uso e descarte para
que sejam alocados nas suas baias e produzam acima das
expectativas até o fim de sua vida útil.
Mas nem tudo são cinzas. Vamos dar crédito, é claro, às
inúmeras vertentes, que trabalham em prol da excelência na
formação e atuação profissional com vistas à ética e ao
comportamento civilizado, na responsabilidade social, ciência,
reciclagem e outros posicionamentos dignos. São poucos, mas
justamente impedem que as técnicas e instrumentos da psicologia se
reduzam a meras ferramentas nas mãos de trogloditas
administrativo-financeiros. Buscam mesmo, inocular nas teorias
jurídico-administrativas a necessidade de haver uma compleição
teórica mais abrangente do objeto das principais atenções e
cuidados: o indivíduo em sua dignidade de ser. Esta complexa esfera
24 Pense em como é bom ser sido assertivo na hora de ser demitido, acreditando ter contribuído para a empresa. Isto é que é ter espírito de equipe!
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
5554
bem: trata-se apenas de ver as coisas como estão, como nos
aparecem. O problema é que todo este complexo mecanismo move-
se, orientado por uma lógica de produção, poder e acumulação
privada, onde os indivíduos podem ser comparados a meros - e
substituíveis - componentes de desgaste.
Quando você compra uma bicicleta, pode verificar no
manual que normalmente não se dá grandes garantias para as peças
que compõe as engrenagens de movimento, mas sim à estrutura.
Ora, é claro que a corrente, o pedal e a roda livre se desgastam mais,
pois são estas partes do mecanismo que produzem o atrito
necessário para que exista o movimento. O engraçado é verificar
que são justamente estas as partes mais desconsideradas. O mesmo
acontece com as relações produtivas em quaisquer setores da
economia: as ocupações da produção geram a riqueza em
produtos, em troca de salário, suportando os atritos da fabricação,
enquanto que outros segmentos suportam os percalços da logística
e, para encurtar, finalmente os benefícios são auferidos, usufruídos e
geridos pelas camadas que detém os “direitos”, poderes ou o
controle do processo produção-distribuição.
Disto infere-se que seria bem grande a diminuição das
margens obtidas no negócio, caso fosse dada garantia e assistência
plena aos itens de desgaste. Ora! Esta mesma base unilinear do
pensamento cumulativo de bens - sacrossanta relação
custo/benefício - sai do insumo, matéria e tributos para serem
levados às práticas de manuseio dos estoques de recursos humanos
disponíveis ou captados. As corporações estratificam o
escalonamento funcional em níveis estanques onde reina a planilha.
Em torno das funções, criam-se normas, procedimentos e todo um
aparato burocrático - conflitante - de modo a garantir a demanda,
elevar metas, conseguir benefícios e concentrar o poder decisório.
Ninguém se engane: estão superadas as distinções entre valor de
uso e troca, ouvem-se traços discursivos de sustentabilidade, mas o
que importa é a contínua produção e conseqüente descarte.
Teoricamente, haveria recolhimento de impostos que
seriam revertidos para a melhora das condições de vida, maior
disponibilidade de produtos, mais oportunidades iguais para todos,
porém isto é balela. Inserido como coisa dentro deste panorama,
torna-se claro que o papel do indivíduo é infinitamente menor do
que as mercadorias e serviços de que é capaz de produzir ou
realizar. Então, surge outro fantasma: seguindo este mesmo
raciocínio, é evidente que a preocupação de quem detém os meios
de produção, os empregadores e financiadores, é voltar sua atenção
para os elos desta cadeia de conseqüências e fazer com que o
mecanismo corporativo funcione bem, sempre produzindo mais, a
menor custo e com maior eficiência. Mas isto não ocorre bem assim.
Desgaste é igual à concessão de benefício, portanto a
lógica tacanha da produção é imputar o vício, como inerente à
“natureza” do produto - ao contrário de produzir peças melhores,
que durem mais, faz-se o inverso para “garantir mercado”. Por isso,
contratam, formam ou desenham “especialistas” e especialidades
para lhes providenciar no ecossistema humano, as cabeças, corpos,
comportamentos e membros de que precisam. Se, por um lado
enquanto produzem, tentam se eximir de responsabilidades por
quebras, falhas e outros dolos em seu agir, naturalizando a
apropriação dentro dos sistemas de valores, crenças e práticas - que
movimentam a máquina criada para ser mantida e consumida; por
outro demandam a formação de novos comportamentos, mais 24compatíveis com desejos e necessidades de uso e descarte para
que sejam alocados nas suas baias e produzam acima das
expectativas até o fim de sua vida útil.
Mas nem tudo são cinzas. Vamos dar crédito, é claro, às
inúmeras vertentes, que trabalham em prol da excelência na
formação e atuação profissional com vistas à ética e ao
comportamento civilizado, na responsabilidade social, ciência,
reciclagem e outros posicionamentos dignos. São poucos, mas
justamente impedem que as técnicas e instrumentos da psicologia se
reduzam a meras ferramentas nas mãos de trogloditas
administrativo-financeiros. Buscam mesmo, inocular nas teorias
jurídico-administrativas a necessidade de haver uma compleição
teórica mais abrangente do objeto das principais atenções e
cuidados: o indivíduo em sua dignidade de ser. Esta complexa esfera
24 Pense em como é bom ser sido assertivo na hora de ser demitido, acreditando ter contribuído para a empresa. Isto é que é ter espírito de equipe!
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que envolve faculdades, sentimentos e competências, merece
alguma avaliação positiva em função de suas qualidades e
possibilidades, não somente pela materialidade de sua produção ou
sua adequação a um uso. Mas porque, a grande maioria crê mesmo
estar atuando em prol de algo que se encontra além da discussão
sobre o “bem”. Que seja! Incipit!
No entanto é preciso frear os ímpetos administrativos, sem
cair nas mazelas dos discursos políticos. Embora sejam bilhões de
habitantes a circular por aí, não somos e nem podemos ser mais
considerados apenas como “recurso” disponível, matéria-prima,
subsídio, porém entidades vivas e autoconscientes.
Mas aceitando-se ou não o chamado desemprego
estrutural, como constituinte das relações econômicas e sociais, não
se pode - sem conseqüências - aceitar isto como desejável ou deixar
de posicionar-se a razão contra este estado de coisas, mesmo que
seja através de pequenas e meritórias ações locais. Mas, em todo
caso, dada a singularidade humana, e mesmo depois de tudo isso
posto, algum gaiato poderia dizer, assertivamente:
- Crise, que crise? Tudo são oportunidades! Nosso modo de vida exaure
o planeta? Provoca fome, violência e miséria? No mínimo denigre o
indivíduo? Não é bem assim! E mesmo se for, tem solução, você é um
“negativo”, que vê tudo pelo pior lado. Temos que ser práticos:
Mantemos os privilégios e distribuímos alguns benefícios. A vida
sempre vai ser assim: ao vencedor, as batatas. Por que mudar, então? As
coisas vão se ajeitar. Se bem que, a cada dia fica mais difícil sair na rua.
Mas para o amanhã, vai bastar blindar a porta, o apê, o carro para ir ao
serviço, implantar o chip anti-seqüestro, cápsula de morfina anti-
tortura e nunca esquecer de usar protetor solar fator 30.000, mesmo
aqui, dentro do escritório. Fácil! Não? Você tem que se adaptar. Se
preocupar para quê? Ética lhe dá o que comer? Se liga rapá!
Ufa! Credo! O pior é que conheço uns tipos que diriam isto, achando
que são sérios. Eles existem mesmo. São os chamados “líderes-
servidores negativos”, não porque influenciem pessoas, mas pelo
contrário, impedem de tomar alguma atitude coerente, servindo de
âncoras ao status quo vigente
Agora, o aquecimento global e as blindagens
arquitetônicas contra a violência urbana já são partes da realidade
de mercado e, se quiserem eu recomendo uma empresa séria no
ramo.
Mas, vamos falar de coisas mais amenas: que tal um “perfil”
daqueles que nos entrevistam? Uma fotografia deste terreno
acidentado, por onde temos que caminhar até o objetivo
empregatício. Como eles trabalham? Quais as etapas? O que é
relevante? O que fazer? O que querem dizer os conceitos? O que
eles esperam de nós? Para isso precisamos mapear os módulos
básicos que norteiam um processo de seleção e sua nomenclatura,
para saber no que acreditam e como agem nossos avaliadores.
Tentamos resumir este monte de informações, conforme a tabela a
seguir. Cá entre nós, se você conseguir a oportunidade de emprego,
que tal contribuir para um mundo melhor?
Alguns destes instrumentos, técnicas e abordagens são
legitimamente úteis, cientificamente válidos e seu uso está
amparado e regulamentado pelos conselhos e órgãos de classe. 25Estas instituições, conselhos de classe e associações, há muito
dispõe de severos códigos de ética relacionados às atividades
desenvolvidas, bem como aos produtos (testes) aplicados. Inclusive
25 Maiores informações veja na seção final do livro ou vá direto ao Google.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
5756
que envolve faculdades, sentimentos e competências, merece
alguma avaliação positiva em função de suas qualidades e
possibilidades, não somente pela materialidade de sua produção ou
sua adequação a um uso. Mas porque, a grande maioria crê mesmo
estar atuando em prol de algo que se encontra além da discussão
sobre o “bem”. Que seja! Incipit!
No entanto é preciso frear os ímpetos administrativos, sem
cair nas mazelas dos discursos políticos. Embora sejam bilhões de
habitantes a circular por aí, não somos e nem podemos ser mais
considerados apenas como “recurso” disponível, matéria-prima,
subsídio, porém entidades vivas e autoconscientes.
Mas aceitando-se ou não o chamado desemprego
estrutural, como constituinte das relações econômicas e sociais, não
se pode - sem conseqüências - aceitar isto como desejável ou deixar
de posicionar-se a razão contra este estado de coisas, mesmo que
seja através de pequenas e meritórias ações locais. Mas, em todo
caso, dada a singularidade humana, e mesmo depois de tudo isso
posto, algum gaiato poderia dizer, assertivamente:
- Crise, que crise? Tudo são oportunidades! Nosso modo de vida exaure
o planeta? Provoca fome, violência e miséria? No mínimo denigre o
indivíduo? Não é bem assim! E mesmo se for, tem solução, você é um
“negativo”, que vê tudo pelo pior lado. Temos que ser práticos:
Mantemos os privilégios e distribuímos alguns benefícios. A vida
sempre vai ser assim: ao vencedor, as batatas. Por que mudar, então? As
coisas vão se ajeitar. Se bem que, a cada dia fica mais difícil sair na rua.
Mas para o amanhã, vai bastar blindar a porta, o apê, o carro para ir ao
serviço, implantar o chip anti-seqüestro, cápsula de morfina anti-
tortura e nunca esquecer de usar protetor solar fator 30.000, mesmo
aqui, dentro do escritório. Fácil! Não? Você tem que se adaptar. Se
preocupar para quê? Ética lhe dá o que comer? Se liga rapá!
Ufa! Credo! O pior é que conheço uns tipos que diriam isto, achando
que são sérios. Eles existem mesmo. São os chamados “líderes-
servidores negativos”, não porque influenciem pessoas, mas pelo
contrário, impedem de tomar alguma atitude coerente, servindo de
âncoras ao status quo vigente
Agora, o aquecimento global e as blindagens
arquitetônicas contra a violência urbana já são partes da realidade
de mercado e, se quiserem eu recomendo uma empresa séria no
ramo.
Mas, vamos falar de coisas mais amenas: que tal um “perfil”
daqueles que nos entrevistam? Uma fotografia deste terreno
acidentado, por onde temos que caminhar até o objetivo
empregatício. Como eles trabalham? Quais as etapas? O que é
relevante? O que fazer? O que querem dizer os conceitos? O que
eles esperam de nós? Para isso precisamos mapear os módulos
básicos que norteiam um processo de seleção e sua nomenclatura,
para saber no que acreditam e como agem nossos avaliadores.
Tentamos resumir este monte de informações, conforme a tabela a
seguir. Cá entre nós, se você conseguir a oportunidade de emprego,
que tal contribuir para um mundo melhor?
Alguns destes instrumentos, técnicas e abordagens são
legitimamente úteis, cientificamente válidos e seu uso está
amparado e regulamentado pelos conselhos e órgãos de classe. 25Estas instituições, conselhos de classe e associações, há muito
dispõe de severos códigos de ética relacionados às atividades
desenvolvidas, bem como aos produtos (testes) aplicados. Inclusive
25 Maiores informações veja na seção final do livro ou vá direto ao Google.
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são responsáveis diante da lei, pela avaliação científica dos mesmos,
de acordo com normas internacionais e literatura disponível. Mas, a
existência, por si só destas instâncias, não significa que o uso prático
seja fiscalizado conforme deveria, portanto há que se ter muito
cuidado e, caso desconfie de arbitrariedades, não hesite: denuncie.
Somente assim existirá possibilidade de começar a sanear o
mercado de empregos e permitirá aos responsáveis tomar as
medidas cabíveis a cada caso.
Sei também que estes processos são embasados num
discurso de “mão-dupla”, do tipo: buscamos os que são adequados
ao cargo, mas quem busca também deve ver se o cargo é adequado
a si mesmo, portanto se não for agora, sempre haverá uma
oportunidade futura. Mas o que interessa ao presente
desempregado é livrar-se o mais rapidamente possível de sua
incômoda situação, daí que toda esta arenga sobre adequação não
serve de mínimo consolo quando se é preterido. Se o pão nosso de
cada dia não está assegurado, que importa saber a distinção entre as
nuances e diferenciais de nossa personalidade?
Se não há a possibilidade de retomar imediatamente uma
atividade produtiva, que interesse pode haver em aguardar um
feedback? No mais, quem garante que os testes aplicados pelo
mercado de seleção realmente funcionam como deveriam?
Selecionar o mais adequado a um perfil significa realmente
selecionar o melhor? Estatísticas informais apontam que este
problemão tende a ser resolvido nos próximos 50 anos, nos quais
psicólogos, cientistas, filósofos, administradores e economistas
continuarão a socar-se mutuamente, disputando a primazia teórica,
porém há sempre o risco de os políticos colocarem os outros
litigantes a nocaute. O ideal, portanto seria uma esfera de
intersecção dos conhecimentos, rumo a uma melhor condição
prática de coexistência.
Mas vamos também deixar de lado este exercício de
futurologia para nos dedicarmos a descobrir como interpretar o que
é solicitado por este estado aparentemente caótico de coisas. O
importante neste ponto é ter em mente que existe um considerável
abismo entre os interesses do candidato e os da empresa, mas que
pode ser solucionado por um esforço de vontade, dedicação e,
porque não, fé. Ao candidato a determinação é que se prepare e
atualize, ao selecionador que tenha bom senso e ao empregador
que se disponha a reconhecer sua força de trabalho. As duas
últimas, embora dentro de nossas esperanças, fogem um pouco à
nossa alçada, mas a primeira nos permitirá uma oportunidade de
emprego e daí para frente, recomeçar de onde havíamos parado.
Para isso a única alternativa é não confiarmos apenas na
leitura de manuais que nos digam como fazer numa entrevista,
dinâmica ou jogos empresariais ou comportamentais. Se não
houver o mínimo de conteúdo no candidato, pode esquecer
qualquer roteiro ou resumo. O negócio é estar empregado, fazendo
tudo para continuar “empregável”, mesmo antes que suas antenas
captem que a casa pode cair, vá à luta e busque conhecimentos e
desenvolva talentos. Isto, de um lado evitará uma demissão,
podendo até gerar uma promoção.
Na pior das hipóteses a busca contínua de qualificação o
deixará preparado para buscar uma nova e mais alta posição.
Portanto, além de prosseguir com tato e jogo de cintura nos
processos seletivos, vá também em busca de qualidade. A palavra
de ordem é capacitação: aprenda algo mais a cada ano e recicle seus
conhecimentos. Seja em que classe social você esteja, sempre pode
ter oportunidade de aprender. Fazendo assim, estará ao mesmo
tempo trabalhando sua auto-imagem e estima, e isto fará com que o
terreno acidentado não pareça algo intransponível, além de facilitar
sua contratação.
7 - Produtos e Serviços: Como me Qualificar?
Fechando esta primeira parte do percurso, devemos dar toda a
importância ao que chamamos de qualificação ou educação
contínua. Muitos profissionais pensam que uma vez formados,
acabou-se o ciclo de aprendizado e que doravante irão seguir as
orientações e necessidades da empresa ou perseguir seus objetivos
pessoais.
Este é um típico pensamento que não mais tem lugar no
século de velocidade e imensa massa de informações que permeia
os locais onde vivemos. É certo que não é possível mais acompanhar
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
5958
são responsáveis diante da lei, pela avaliação científica dos mesmos,
de acordo com normas internacionais e literatura disponível. Mas, a
existência, por si só destas instâncias, não significa que o uso prático
seja fiscalizado conforme deveria, portanto há que se ter muito
cuidado e, caso desconfie de arbitrariedades, não hesite: denuncie.
Somente assim existirá possibilidade de começar a sanear o
mercado de empregos e permitirá aos responsáveis tomar as
medidas cabíveis a cada caso.
Sei também que estes processos são embasados num
discurso de “mão-dupla”, do tipo: buscamos os que são adequados
ao cargo, mas quem busca também deve ver se o cargo é adequado
a si mesmo, portanto se não for agora, sempre haverá uma
oportunidade futura. Mas o que interessa ao presente
desempregado é livrar-se o mais rapidamente possível de sua
incômoda situação, daí que toda esta arenga sobre adequação não
serve de mínimo consolo quando se é preterido. Se o pão nosso de
cada dia não está assegurado, que importa saber a distinção entre as
nuances e diferenciais de nossa personalidade?
Se não há a possibilidade de retomar imediatamente uma
atividade produtiva, que interesse pode haver em aguardar um
feedback? No mais, quem garante que os testes aplicados pelo
mercado de seleção realmente funcionam como deveriam?
Selecionar o mais adequado a um perfil significa realmente
selecionar o melhor? Estatísticas informais apontam que este
problemão tende a ser resolvido nos próximos 50 anos, nos quais
psicólogos, cientistas, filósofos, administradores e economistas
continuarão a socar-se mutuamente, disputando a primazia teórica,
porém há sempre o risco de os políticos colocarem os outros
litigantes a nocaute. O ideal, portanto seria uma esfera de
intersecção dos conhecimentos, rumo a uma melhor condição
prática de coexistência.
Mas vamos também deixar de lado este exercício de
futurologia para nos dedicarmos a descobrir como interpretar o que
é solicitado por este estado aparentemente caótico de coisas. O
importante neste ponto é ter em mente que existe um considerável
abismo entre os interesses do candidato e os da empresa, mas que
pode ser solucionado por um esforço de vontade, dedicação e,
porque não, fé. Ao candidato a determinação é que se prepare e
atualize, ao selecionador que tenha bom senso e ao empregador
que se disponha a reconhecer sua força de trabalho. As duas
últimas, embora dentro de nossas esperanças, fogem um pouco à
nossa alçada, mas a primeira nos permitirá uma oportunidade de
emprego e daí para frente, recomeçar de onde havíamos parado.
Para isso a única alternativa é não confiarmos apenas na
leitura de manuais que nos digam como fazer numa entrevista,
dinâmica ou jogos empresariais ou comportamentais. Se não
houver o mínimo de conteúdo no candidato, pode esquecer
qualquer roteiro ou resumo. O negócio é estar empregado, fazendo
tudo para continuar “empregável”, mesmo antes que suas antenas
captem que a casa pode cair, vá à luta e busque conhecimentos e
desenvolva talentos. Isto, de um lado evitará uma demissão,
podendo até gerar uma promoção.
Na pior das hipóteses a busca contínua de qualificação o
deixará preparado para buscar uma nova e mais alta posição.
Portanto, além de prosseguir com tato e jogo de cintura nos
processos seletivos, vá também em busca de qualidade. A palavra
de ordem é capacitação: aprenda algo mais a cada ano e recicle seus
conhecimentos. Seja em que classe social você esteja, sempre pode
ter oportunidade de aprender. Fazendo assim, estará ao mesmo
tempo trabalhando sua auto-imagem e estima, e isto fará com que o
terreno acidentado não pareça algo intransponível, além de facilitar
sua contratação.
7 - Produtos e Serviços: Como me Qualificar?
Fechando esta primeira parte do percurso, devemos dar toda a
importância ao que chamamos de qualificação ou educação
contínua. Muitos profissionais pensam que uma vez formados,
acabou-se o ciclo de aprendizado e que doravante irão seguir as
orientações e necessidades da empresa ou perseguir seus objetivos
pessoais.
Este é um típico pensamento que não mais tem lugar no
século de velocidade e imensa massa de informações que permeia
os locais onde vivemos. É certo que não é possível mais acompanhar
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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as mudanças e que nosso cérebro acabará se adaptando à
seletivamente alienar-se, para que possa tornar tolerável a própria
angústia.
É certo também que a cada dia, as escolhas feitas com
propriedade determinarão cada vez mais nosso futuro e que ficará
difícil reparar erros de percurso, em virtude desta mesma
velocidade das mudanças. Se o mundo não é mais o que era
antigamente, ainda existe em nós uma incrível capacidade de
adaptação que pode nos proporcionar um ajuste mais ou menos
confortável na situação patrimonial e existencial. Se tudo são
commodities, nem mais a prestação de serviços resolve: deve-se ter
uma posição de aliança estratégica com seus objetivos. Agregar
valor a si mesmo e se tratar - nesta fase - como produto. Ter apoio no
relacionamento e excelência.
A estratificação social ainda pode atingir índices
alarmantes, antes que sejam adotadas medidas de compensação ou
de resolução. Deste modo, estar ao abrigo de quaisquer injunções
de ordem mundial pode depender única e exclusivamente da
capacidade de cada um de prever as mudanças e agir de acordo
com o que é solicitado pelo encadeamento das situações. Isto vale
também para aqueles que estão em busca de seu primeiro emprego
e que não podem contar com o beneplácito de serem aprovados no 26estreito funil dos programas de trainees. Sobre isto é interessante
notar que grande parte dos índices de desemprego vem do fato de as
empresas estarem cada vez mais voltadas a formar sua própria mão
de obra, com pessoal oriundo de faculdades de primeira linha e se
recusarem a dar oportunidade a quem nunca trabalhou ou já tem
alguma experiência.
Sei de todas as dificuldades de voltar a estudar, mesmo
porque fiquei uns vinte anos sem fazer isto e quando tive, por força
das circunstâncias e de meu desejo, retornar a estudar foi 27complicado. Uma porque eu era o “velhinho” da classe e outra
porque não temos mais a mesma energia de antes. Mas, se eu não
tivesse feito um esforço eu nem estaria aqui escrevendo “estas mal
traçadas linhas”. Existem hoje uma série de programas de
qualificação, particulares, Entidades de Classe, Ongs ou
governamentais e até mesmo nas ações de responsabilidade social
das empresas, como as universidades corporativas, basta procurar e
informar-se.
Também há uma oferta bem maior de bolsas para os que se
saem bem nos vestibulares. Muitas instituições oferecem descontos,
ampla e variada gama de cursos e seminários gratuitos. O advento
da informática descobriu novos horizontes e ao mesmo tempo
extinguiu várias profissões, assim, não ficar parado é a melhor
maneira de não ficar para trás. Para facilitar esta busca, colocamos
um apêndice no final, com vários links e endereços úteis. Basta uma
procurada na web para verificar que cada vez mais estas
oportunidades de qualificação são acessíveis aos pobres mortais.
Além do mais, quem procura acha e àquele que pede algo se dará!
Mas, voltando ao assunto das mudanças, exigências e
competências, dêem só uma olhada nos quadros que apresentamos
abaixo, sobre esta evolução:
26 Aqui também existem armadilhas. Procure os departamentos de integração de sua escola ou universidade...27 Havia outros mais velhos e fiz grandes amigos na graduação, no entanto era penoso saber que não podia acompanhar nem fisicamente nem intelectualmente a elasticidade da galera mais nova...
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
6160
as mudanças e que nosso cérebro acabará se adaptando à
seletivamente alienar-se, para que possa tornar tolerável a própria
angústia.
É certo também que a cada dia, as escolhas feitas com
propriedade determinarão cada vez mais nosso futuro e que ficará
difícil reparar erros de percurso, em virtude desta mesma
velocidade das mudanças. Se o mundo não é mais o que era
antigamente, ainda existe em nós uma incrível capacidade de
adaptação que pode nos proporcionar um ajuste mais ou menos
confortável na situação patrimonial e existencial. Se tudo são
commodities, nem mais a prestação de serviços resolve: deve-se ter
uma posição de aliança estratégica com seus objetivos. Agregar
valor a si mesmo e se tratar - nesta fase - como produto. Ter apoio no
relacionamento e excelência.
A estratificação social ainda pode atingir índices
alarmantes, antes que sejam adotadas medidas de compensação ou
de resolução. Deste modo, estar ao abrigo de quaisquer injunções
de ordem mundial pode depender única e exclusivamente da
capacidade de cada um de prever as mudanças e agir de acordo
com o que é solicitado pelo encadeamento das situações. Isto vale
também para aqueles que estão em busca de seu primeiro emprego
e que não podem contar com o beneplácito de serem aprovados no 26estreito funil dos programas de trainees. Sobre isto é interessante
notar que grande parte dos índices de desemprego vem do fato de as
empresas estarem cada vez mais voltadas a formar sua própria mão
de obra, com pessoal oriundo de faculdades de primeira linha e se
recusarem a dar oportunidade a quem nunca trabalhou ou já tem
alguma experiência.
Sei de todas as dificuldades de voltar a estudar, mesmo
porque fiquei uns vinte anos sem fazer isto e quando tive, por força
das circunstâncias e de meu desejo, retornar a estudar foi 27complicado. Uma porque eu era o “velhinho” da classe e outra
porque não temos mais a mesma energia de antes. Mas, se eu não
tivesse feito um esforço eu nem estaria aqui escrevendo “estas mal
traçadas linhas”. Existem hoje uma série de programas de
qualificação, particulares, Entidades de Classe, Ongs ou
governamentais e até mesmo nas ações de responsabilidade social
das empresas, como as universidades corporativas, basta procurar e
informar-se.
Também há uma oferta bem maior de bolsas para os que se
saem bem nos vestibulares. Muitas instituições oferecem descontos,
ampla e variada gama de cursos e seminários gratuitos. O advento
da informática descobriu novos horizontes e ao mesmo tempo
extinguiu várias profissões, assim, não ficar parado é a melhor
maneira de não ficar para trás. Para facilitar esta busca, colocamos
um apêndice no final, com vários links e endereços úteis. Basta uma
procurada na web para verificar que cada vez mais estas
oportunidades de qualificação são acessíveis aos pobres mortais.
Além do mais, quem procura acha e àquele que pede algo se dará!
Mas, voltando ao assunto das mudanças, exigências e
competências, dêem só uma olhada nos quadros que apresentamos
abaixo, sobre esta evolução:
26 Aqui também existem armadilhas. Procure os departamentos de integração de sua escola ou universidade...27 Havia outros mais velhos e fiz grandes amigos na graduação, no entanto era penoso saber que não podia acompanhar nem fisicamente nem intelectualmente a elasticidade da galera mais nova...
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Algumas conclusões já são possíveis, entre elas que a velocidade das
transformações da tecnologia e dos mercados exige uma adaptação
contínua. Ninguém pode acompanhar o ritmo sem atualização. O
profissional de sucesso é o que tem conhecimentos, pois sucesso
sem esforço e estudo é tão difícil quanto lutar sozinho contra um
leão. A sua capacidade de aplicar o conhecimento na prática, ou
seja: saber fazer algo com eficiência e qualidade é que garante um
futuro de realizações. Invista em você mesmo, porque nestes
tempos bicudos de competitividade, ninguém dá valor a quem não
conquista seu próprio espaço. É duro dizer isso: mas assim são as
coisas!
Antigamente, o mais importante era planejar, organizar e
controlar com mão de ferro. Hoje, o mais importante é influenciar,
facilitar, inspirar, motivar, ensinar, coordenar, empreender, realizar,
prever, efetivar, economizar, persuadir, comunicar e liderar.
Qualidade não é mais o diferencial competitivo, é apenas mais uma
das premissas dos negócios. Não existe mais uma brecha temporal
corporativa para formar excelência profissional e sim excelência
pessoal. É evidente que pessoas excelentes serão profissionais
naturalmente excelentes. Tanto para arrumar emprego quanto para
crescer profissionalmente é preciso ter foco no desempenho,
motivação e resultado. Mais do que isso: Não existe resultado
mensurável se não se agir no sentido de fomentar possibilidades de
aumentar a participação no mercado. Lucros a curto prazo ou os
projetos são descartados. Pessoas também mudam as organizações,
assim como as organizações mudam e dispõe de pessoas. Nem
sempre a receita funciona. Para isso é preciso mais que
competências! A pressão é do balacobaco!
Hoje se deseja algo muito além das tradicionais posturas
profissionais, embora continuem a pagar menos do que você
merece: disso ninguém abre mão!
Mesmo em nível hierárquico intermediário, o que se quer
desejar serão profissionais especialistas, inteligentes, produtivos sob
longos períodos, resistentes à pressão, de mente aberta, assertivos,
empreendedores, sociáveis, éticos, eficazes, estáveis, bem-
humorados, motivados, comprometidos, competentes,
pluridisciplinares, carismáticos e com alto equilíbrio de inteligência
emocional. Mas como estes espécimes não existem na natureza,
forjam-se máscaras e desenham-se processos. Mesmo que os
houvesse, a norma é: mesmo contratados os candidatos ideais, eles
serão demitidos pouco depois por ameaçarem a modorra
empresarial ou o chefete imediato. Dilbert forever!
É por tudo isso que eu insisto na busca de conhecimento
(atenção: informação não é conhecimento) e na qualificação e
capacitação tanto para seu segmento, quanto para novas áreas de
atuação. O grande “gargalo”, que impede as pessoas de arrumarem
logo um novo e bom emprego é que os currículos, perfis e
competências dos candidatos que chegam aos entrevistadores para
concorrer a uma vaga são tão similares (cerca de 70%) que qualquer
diferencial de qualidade pode fazer diferença crucial para a
contratação ou não de determinado profissional. O segundo ponto
é tudo aquilo que já falamos sobre como se portar em entrevistas e o
que deve ser feito ou evitado. Um terceiro momento permeia toda a
discussão e impõe um limite à crença nos benefícios da
padronização dos processos: Resistir à massificação destrutiva das
sistemáticas de recolocação é possível pelo poder de afirmação do
valor pessoal. Sem esta perspectiva você estará fragilizado e
qualquer resistência será fútil. No mais, o que se verá a seguir é um
pequeno panorama multifacetado dos modelos, instrumentos
conceitos e critérios de seleção atualmente perpetrados. Muitos
exclusivamente baseados nos famigerados testes, outros mais
eficientes e éticos. Diremos que este caminho não precisa ser
palmilhado, mas sempre é bom saber onde foram colocados os
explosivos conceituais e que tipo de ação, postura ou
comportamento os detona.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
6362
Algumas conclusões já são possíveis, entre elas que a velocidade das
transformações da tecnologia e dos mercados exige uma adaptação
contínua. Ninguém pode acompanhar o ritmo sem atualização. O
profissional de sucesso é o que tem conhecimentos, pois sucesso
sem esforço e estudo é tão difícil quanto lutar sozinho contra um
leão. A sua capacidade de aplicar o conhecimento na prática, ou
seja: saber fazer algo com eficiência e qualidade é que garante um
futuro de realizações. Invista em você mesmo, porque nestes
tempos bicudos de competitividade, ninguém dá valor a quem não
conquista seu próprio espaço. É duro dizer isso: mas assim são as
coisas!
Antigamente, o mais importante era planejar, organizar e
controlar com mão de ferro. Hoje, o mais importante é influenciar,
facilitar, inspirar, motivar, ensinar, coordenar, empreender, realizar,
prever, efetivar, economizar, persuadir, comunicar e liderar.
Qualidade não é mais o diferencial competitivo, é apenas mais uma
das premissas dos negócios. Não existe mais uma brecha temporal
corporativa para formar excelência profissional e sim excelência
pessoal. É evidente que pessoas excelentes serão profissionais
naturalmente excelentes. Tanto para arrumar emprego quanto para
crescer profissionalmente é preciso ter foco no desempenho,
motivação e resultado. Mais do que isso: Não existe resultado
mensurável se não se agir no sentido de fomentar possibilidades de
aumentar a participação no mercado. Lucros a curto prazo ou os
projetos são descartados. Pessoas também mudam as organizações,
assim como as organizações mudam e dispõe de pessoas. Nem
sempre a receita funciona. Para isso é preciso mais que
competências! A pressão é do balacobaco!
Hoje se deseja algo muito além das tradicionais posturas
profissionais, embora continuem a pagar menos do que você
merece: disso ninguém abre mão!
Mesmo em nível hierárquico intermediário, o que se quer
desejar serão profissionais especialistas, inteligentes, produtivos sob
longos períodos, resistentes à pressão, de mente aberta, assertivos,
empreendedores, sociáveis, éticos, eficazes, estáveis, bem-
humorados, motivados, comprometidos, competentes,
pluridisciplinares, carismáticos e com alto equilíbrio de inteligência
emocional. Mas como estes espécimes não existem na natureza,
forjam-se máscaras e desenham-se processos. Mesmo que os
houvesse, a norma é: mesmo contratados os candidatos ideais, eles
serão demitidos pouco depois por ameaçarem a modorra
empresarial ou o chefete imediato. Dilbert forever!
É por tudo isso que eu insisto na busca de conhecimento
(atenção: informação não é conhecimento) e na qualificação e
capacitação tanto para seu segmento, quanto para novas áreas de
atuação. O grande “gargalo”, que impede as pessoas de arrumarem
logo um novo e bom emprego é que os currículos, perfis e
competências dos candidatos que chegam aos entrevistadores para
concorrer a uma vaga são tão similares (cerca de 70%) que qualquer
diferencial de qualidade pode fazer diferença crucial para a
contratação ou não de determinado profissional. O segundo ponto
é tudo aquilo que já falamos sobre como se portar em entrevistas e o
que deve ser feito ou evitado. Um terceiro momento permeia toda a
discussão e impõe um limite à crença nos benefícios da
padronização dos processos: Resistir à massificação destrutiva das
sistemáticas de recolocação é possível pelo poder de afirmação do
valor pessoal. Sem esta perspectiva você estará fragilizado e
qualquer resistência será fútil. No mais, o que se verá a seguir é um
pequeno panorama multifacetado dos modelos, instrumentos
conceitos e critérios de seleção atualmente perpetrados. Muitos
exclusivamente baseados nos famigerados testes, outros mais
eficientes e éticos. Diremos que este caminho não precisa ser
palmilhado, mas sempre é bom saber onde foram colocados os
explosivos conceituais e que tipo de ação, postura ou
comportamento os detona.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
6362
CAPÍTULO II
A MARATONA DOS TESTES
A guisa de introdução, além do que já no início deste livro pudemos
relatar (a lúcida e profética opinião do Prof. Gérard Lebrun), sobre o
tema. Eis uma reportagem também antiga, mas deveras
interessante, acerca da briga que ainda se arrasta nos tribunais: de
um lado o Ministério Público, de outro a indústria de testes 28psicológicos. Vejam só o que está rolando há tempos:
Ministério Público pede proibição de todos
os testes psicológicos no Brasil
Fonte: Jornal O Globo - 06 de novembro de 2004 - Carolina
Brígido
BRASÍLIA. O procurador da República no Distrito Federal Carlos
Henrique Martins Lima entrou com ação civil pública na Justiça
Federal pedindo a proibição da comercialização e a suspensão do
uso de qualquer tipo de teste psicológico em território nacional.
Lima alegou que os testes não foram regulamentados e por isso
não seguem um padrão de qualidade.
O procurador também pediu à Justiça Federal a apreensão dos
produtos disponíveis no mercado até que o Ministério da Saúde
crie procedimentos para a concessão de registro do teste. Os testes
psicológicos são aplicados há décadas no Brasil, inclusive na
admissão em empregos e concessão de habilitação de motoristas.
Só o Conselho de Psicologia realiza o controle.
28 Veja no anexo os links para várias entrevistas sobre o tema.
Como nunca foram regulamentados pelo Sistema Único de Saúde
(SUS), só o Conselho Federal de Psicologia (CFP) vem realizando o
controle, por meio de uma resolução de 2001. Segundo o
Ministério Público Federal, o procedimento é ilegal. O procurador
informou que o conselho só poderia regulamentar os produtos se a
lei lhe desse essa atribuição ou se o Ministério da Saúde publicasse
uma aprovação, o que nunca ocorreu.
O Ministério Público Federal também pede na ação que o CFP se
abstenha de aprovar os testes. O presidente do conselho, Ricardo
Moretzsohn, explicou que não se opõe à fiscalização do ministério,
mas disse que a entidade tem condições de exercer a atividade.
Como vêem, além de cientificamente questionáveis (em sua
eficácia), a maioria dos testes “à venda” no Brasil para avaliar os
candidatos, pode ser também ilegal pela falta de registro e de
uniformidade na qualidade. Como o CFP não tem pessoal suficiente
para fiscalizar, a coisa rola solta e até o MP entrou na questão. Mas, a
verdade é que somos todos “avaliados” por estes instrumentos em
função única de um “perfil”. Mesmo que eles sejam baseados em
premissas técnicas confiáveis, a orientação ética (?) de aplicação é
de uma insensibilidade total.
Tratados todos como meros “espécimes”, “capital
humano”, “recurso humano” e outros eufemismos que não
escondem a orientação econômico-pragmática e utilitarista de suas
diretrizes somos considerados apenas como “matéria-prima”
renovável e que pode ser explorada e manejada sem causar
nenhum dano ao “meio ambiente social”. Afinal, segundo estes
canhestros neopositivistas, insumos e recursos são partes da
natureza à disposição do homem (que detém os meios de produção)
e a natureza deve ser dominada em proveito próprio, não
importando outras considerações. Como já dissemos,
comportamentos podem ser mensurados, no entanto eles não dão a
medida do profissional e muito menos do indivíduo. Assim, apenas
referem-se os testes a responder uma pergunta: tenho ou não tenho
um perfil exigido pelo empregador, esta pessoa se encaixa ou não se
encaixa. Só isso, nada mais.
Há apenas alguns anos, esta situação se resolvia através de
um funcionário que efetuava o R&S (Recrutamento e Seleção),
agora em face à conjuntura social e economia de mercado, tornou-
se impraticável a seleção manual. Resumindo um pouco: Estamos
na cova dos leões, ou melhor, no mato sem cachorro, veja por que:
1 - Softwares de Triagem de Currículos
Antes de entrarmos no tema espinhoso dos modernos instrumentos
de tortura seletiva, vamos dar uma palavrinha sobre como tudo
realmente tem início: a escolha dos currículos.
Até alguns anos atrás, o procedimento corriqueiro de
quem procurava um empregado ou precisava substituir alguém, era
anunciar a vaga, esperar a chegada dos currículos pelo correio e, de
posse de toda a papelada, analisar, fazer a triagem e chamar os
escolhidos para uma conversa preliminar (que muitas vezes já
resultava em contratação). Com a “globalização” dos mercados, o
aumento das exigências profissionais e a popularização da internet,
isto virou coisa do passado. Hoje os currículos são enviados por e-
mail, já com a foto do candidato ou garimpados em enormes bancos
de currículos disponíveis em empresas especializadas, em
mecanismos de busca por palavras-chave. A versão mais comum é a
dos sites e bancos de empregos, onde você digita algumas palavras e
o mecanismo de busca varre os arquivos buscando as referências.
Outro são os softwares específicos e programas desenhados para as 29consultorias de Recursos Humanos.
Por um aspecto isto veio a facilitar enormemente o
trabalho de quem seleciona e contrata, pois podem contar com uma
maior agilidade e segurança nos processos, já que há empresas
terceirizadas que prestam serviços, consultores e outros
“opiniólogos” que trabalham para melhorar os critérios e o perfil dos
contratados, enfim, a tecnologia proporcionou uma verdadeira
panacéia de ferramentas para o setor. Mas não para quem está
buscando um emprego, é claro! E, também em outros aspectos,
29 Hoje isto é realidade e somado ao e-recruitment aloca os candidatos ao mundo virtual. Só se materializam as oportunidades de entrevista com seres humanos, após passadas as baterias de testes e os nefandos protocolos de targeting (segmentações em busca da melhor produção). Mas o cerne da questão não muda: vagas importantes somente são preenchidas por indicação. Questão de Q.I ou de karma!
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
6766
Como nunca foram regulamentados pelo Sistema Único de Saúde
(SUS), só o Conselho Federal de Psicologia (CFP) vem realizando o
controle, por meio de uma resolução de 2001. Segundo o
Ministério Público Federal, o procedimento é ilegal. O procurador
informou que o conselho só poderia regulamentar os produtos se a
lei lhe desse essa atribuição ou se o Ministério da Saúde publicasse
uma aprovação, o que nunca ocorreu.
O Ministério Público Federal também pede na ação que o CFP se
abstenha de aprovar os testes. O presidente do conselho, Ricardo
Moretzsohn, explicou que não se opõe à fiscalização do ministério,
mas disse que a entidade tem condições de exercer a atividade.
Como vêem, além de cientificamente questionáveis (em sua
eficácia), a maioria dos testes “à venda” no Brasil para avaliar os
candidatos, pode ser também ilegal pela falta de registro e de
uniformidade na qualidade. Como o CFP não tem pessoal suficiente
para fiscalizar, a coisa rola solta e até o MP entrou na questão. Mas, a
verdade é que somos todos “avaliados” por estes instrumentos em
função única de um “perfil”. Mesmo que eles sejam baseados em
premissas técnicas confiáveis, a orientação ética (?) de aplicação é
de uma insensibilidade total.
Tratados todos como meros “espécimes”, “capital
humano”, “recurso humano” e outros eufemismos que não
escondem a orientação econômico-pragmática e utilitarista de suas
diretrizes somos considerados apenas como “matéria-prima”
renovável e que pode ser explorada e manejada sem causar
nenhum dano ao “meio ambiente social”. Afinal, segundo estes
canhestros neopositivistas, insumos e recursos são partes da
natureza à disposição do homem (que detém os meios de produção)
e a natureza deve ser dominada em proveito próprio, não
importando outras considerações. Como já dissemos,
comportamentos podem ser mensurados, no entanto eles não dão a
medida do profissional e muito menos do indivíduo. Assim, apenas
referem-se os testes a responder uma pergunta: tenho ou não tenho
um perfil exigido pelo empregador, esta pessoa se encaixa ou não se
encaixa. Só isso, nada mais.
Há apenas alguns anos, esta situação se resolvia através de
um funcionário que efetuava o R&S (Recrutamento e Seleção),
agora em face à conjuntura social e economia de mercado, tornou-
se impraticável a seleção manual. Resumindo um pouco: Estamos
na cova dos leões, ou melhor, no mato sem cachorro, veja por que:
1 - Softwares de Triagem de Currículos
Antes de entrarmos no tema espinhoso dos modernos instrumentos
de tortura seletiva, vamos dar uma palavrinha sobre como tudo
realmente tem início: a escolha dos currículos.
Até alguns anos atrás, o procedimento corriqueiro de
quem procurava um empregado ou precisava substituir alguém, era
anunciar a vaga, esperar a chegada dos currículos pelo correio e, de
posse de toda a papelada, analisar, fazer a triagem e chamar os
escolhidos para uma conversa preliminar (que muitas vezes já
resultava em contratação). Com a “globalização” dos mercados, o
aumento das exigências profissionais e a popularização da internet,
isto virou coisa do passado. Hoje os currículos são enviados por e-
mail, já com a foto do candidato ou garimpados em enormes bancos
de currículos disponíveis em empresas especializadas, em
mecanismos de busca por palavras-chave. A versão mais comum é a
dos sites e bancos de empregos, onde você digita algumas palavras e
o mecanismo de busca varre os arquivos buscando as referências.
Outro são os softwares específicos e programas desenhados para as 29consultorias de Recursos Humanos.
Por um aspecto isto veio a facilitar enormemente o
trabalho de quem seleciona e contrata, pois podem contar com uma
maior agilidade e segurança nos processos, já que há empresas
terceirizadas que prestam serviços, consultores e outros
“opiniólogos” que trabalham para melhorar os critérios e o perfil dos
contratados, enfim, a tecnologia proporcionou uma verdadeira
panacéia de ferramentas para o setor. Mas não para quem está
buscando um emprego, é claro! E, também em outros aspectos,
29 Hoje isto é realidade e somado ao e-recruitment aloca os candidatos ao mundo virtual. Só se materializam as oportunidades de entrevista com seres humanos, após passadas as baterias de testes e os nefandos protocolos de targeting (segmentações em busca da melhor produção). Mas o cerne da questão não muda: vagas importantes somente são preenchidas por indicação. Questão de Q.I ou de karma!
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
6766
contribuiu para reduzir o valor dos profissionais que trabalham em
Recursos Humanos. Como? Fazendo com que muitos dos milhares
de egressos de cursos superiores, em sua rotina comum de trabalho,
sejam apenas operadores de programas de computador ou simples
tabuladores de resultados de testes e não mais especialistas em
comportamento e competências. A ditadura das avaliações
padronizadas não somente aflige aos desempregados, como
também atingiu em cheio a dignidade de bons profissionais, muitos
dos quais passam os dias a checar relatórios, fazer tabelas e
remunerar os horários trabalhados.
Lembro-me que na década de 80 eu trabalhava em um
grande jornal, fazendo diagramação e cuidando da montagem das
matérias em grandes chapas de aço, que depois eram fotografadas e
levadas para as rotativas. Um belo dia, eles instalaram na redação,
novos computadores e máquinas que operavam com um novo
programa e isto simplesmente extinguiu a nossa profissão! Agora
você faz tudo on line. Fazer o quê? É o pogréssio! A nota triste é que a
empresa - baluarte da democracia e pluralismo civil - nem se
preocupou em absorver ou requalificar a mão de obra: não sobrou
ninguém por ali, todo mundo foi para o olho da rua em poucos
meses.
Mesmo nos dias de hoje, ainda não é bom dar motivos! As
mudanças quase que nos atropelam, tamanha a sua mobilidade e
velocidade. Como já dissemos um dos novos instrumentos de
seleção que estão sendo alardeados por aí, a despeito de suas
nefastas conseqüências, são os softwares de triagem de currículos.
Trata-se, como sabemos de um aplicativo de busca e leitura de textos
que faz pesquisas por tópicos ou palavras chave, destinado, é claro,
a poupar tempo e buscar “precisão” na escolha dos candidatos
ideais. Este robô, escaneia e interpreta, maquinalmente, as
diretrizes de sua busca, baseado nos inputs digitados, ou seja:
alguém precisa contratar um assistente comercial, com 3 anos de
experiência, formado em administração ou área correlata, salário
tal, idade entre 25 e 35 anos etc, etc. Faz-se o anúncio e direciona-se
uma caixa postal. Antes, o selecionador já digitou os dados
desejados no programa, que passa - automaticamente - em revista
os e-mails recebidos, com também varre a web em busca de
selecionar estes critérios em bancos de currículos. Após, ele
apresenta uma lista de currículos selecionados com o percentual de
acerto provável e então o responsável pela vaga começa a
selecionar quem interessa ou não.
Tudo isso seria muito bom se o programa também pudesse
“analisar” o material recolhido, mas isto ele ainda não é capaz de
fazer. Qual o problema? Recusar quem não se encaixe nas
determinações de cara, rejeitando as inconsistências a priori. Além
de deixar passar informações importantes sobre a sua história
profissional, o aplicativo não as correlaciona: ele é apenas um leitor
eletrônico. Como assim? Veja: suponha que você responda ao
anúncio. Digamos que tenha uns 5 anos de experiência na função,
pretensão compatível, possua vastas competências, grandes
realizações, cursos atuais, seja bilíngüe, mas sua formação é em
relações internacionais e tenha 36 anos. O que acontece?
Simplesmente o programa vai desconsiderar o seu currículo,
porque ele não apresentou similaridade com o que foi colocado
como parâmetro de busca! E o seu querido e-mail vai para a lixeira!
Caput! Adiós pampa mia! Mesmo se for uma versão mais sofisticada
do programa que possa ranquear o conteúdo secundário, ele irá
deixar você na última fila e o selecionador vai entender que você
possui apenas uma pequena parte do que é pedido pelo perfil da
vaga e, devido à quantidade absurda de mensagens que são
recebidas, nem vai se dar ao trabalho de ler. Ou seja: o selecionador
antes, selecionava, hoje apenas faz conferências e isto, qualquer um
faz, não precisa ser especialista. Para quê eu vou pagar um psicólogo
ou bacharel em gestão se o trabalho pode ser feito por uma
competência um pouco acima do analfabetismo funcional?
Duvidam? Vou contar uma história. Um pouco menos de
um mês depois da última entrevista, fui chamado para participar de
uma dinâmica de grupo, para um cargo em uma multinacional
francesa do ramo comercial. Até aí beleza, eu estava já há algum
tempo sem notícias. O que aconteceu por lá é que foi digno de nota.
Na hora marcada eu estava sentado junto com mais alguns
participantes, aguardando começar a prova, quando chegou mais
um candidato. A entrevistadora perguntou seu nome e se ele havia
já enviado o currículo. A pessoa disse que sim e então ela chamou a
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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contribuiu para reduzir o valor dos profissionais que trabalham em
Recursos Humanos. Como? Fazendo com que muitos dos milhares
de egressos de cursos superiores, em sua rotina comum de trabalho,
sejam apenas operadores de programas de computador ou simples
tabuladores de resultados de testes e não mais especialistas em
comportamento e competências. A ditadura das avaliações
padronizadas não somente aflige aos desempregados, como
também atingiu em cheio a dignidade de bons profissionais, muitos
dos quais passam os dias a checar relatórios, fazer tabelas e
remunerar os horários trabalhados.
Lembro-me que na década de 80 eu trabalhava em um
grande jornal, fazendo diagramação e cuidando da montagem das
matérias em grandes chapas de aço, que depois eram fotografadas e
levadas para as rotativas. Um belo dia, eles instalaram na redação,
novos computadores e máquinas que operavam com um novo
programa e isto simplesmente extinguiu a nossa profissão! Agora
você faz tudo on line. Fazer o quê? É o pogréssio! A nota triste é que a
empresa - baluarte da democracia e pluralismo civil - nem se
preocupou em absorver ou requalificar a mão de obra: não sobrou
ninguém por ali, todo mundo foi para o olho da rua em poucos
meses.
Mesmo nos dias de hoje, ainda não é bom dar motivos! As
mudanças quase que nos atropelam, tamanha a sua mobilidade e
velocidade. Como já dissemos um dos novos instrumentos de
seleção que estão sendo alardeados por aí, a despeito de suas
nefastas conseqüências, são os softwares de triagem de currículos.
Trata-se, como sabemos de um aplicativo de busca e leitura de textos
que faz pesquisas por tópicos ou palavras chave, destinado, é claro,
a poupar tempo e buscar “precisão” na escolha dos candidatos
ideais. Este robô, escaneia e interpreta, maquinalmente, as
diretrizes de sua busca, baseado nos inputs digitados, ou seja:
alguém precisa contratar um assistente comercial, com 3 anos de
experiência, formado em administração ou área correlata, salário
tal, idade entre 25 e 35 anos etc, etc. Faz-se o anúncio e direciona-se
uma caixa postal. Antes, o selecionador já digitou os dados
desejados no programa, que passa - automaticamente - em revista
os e-mails recebidos, com também varre a web em busca de
selecionar estes critérios em bancos de currículos. Após, ele
apresenta uma lista de currículos selecionados com o percentual de
acerto provável e então o responsável pela vaga começa a
selecionar quem interessa ou não.
Tudo isso seria muito bom se o programa também pudesse
“analisar” o material recolhido, mas isto ele ainda não é capaz de
fazer. Qual o problema? Recusar quem não se encaixe nas
determinações de cara, rejeitando as inconsistências a priori. Além
de deixar passar informações importantes sobre a sua história
profissional, o aplicativo não as correlaciona: ele é apenas um leitor
eletrônico. Como assim? Veja: suponha que você responda ao
anúncio. Digamos que tenha uns 5 anos de experiência na função,
pretensão compatível, possua vastas competências, grandes
realizações, cursos atuais, seja bilíngüe, mas sua formação é em
relações internacionais e tenha 36 anos. O que acontece?
Simplesmente o programa vai desconsiderar o seu currículo,
porque ele não apresentou similaridade com o que foi colocado
como parâmetro de busca! E o seu querido e-mail vai para a lixeira!
Caput! Adiós pampa mia! Mesmo se for uma versão mais sofisticada
do programa que possa ranquear o conteúdo secundário, ele irá
deixar você na última fila e o selecionador vai entender que você
possui apenas uma pequena parte do que é pedido pelo perfil da
vaga e, devido à quantidade absurda de mensagens que são
recebidas, nem vai se dar ao trabalho de ler. Ou seja: o selecionador
antes, selecionava, hoje apenas faz conferências e isto, qualquer um
faz, não precisa ser especialista. Para quê eu vou pagar um psicólogo
ou bacharel em gestão se o trabalho pode ser feito por uma
competência um pouco acima do analfabetismo funcional?
Duvidam? Vou contar uma história. Um pouco menos de
um mês depois da última entrevista, fui chamado para participar de
uma dinâmica de grupo, para um cargo em uma multinacional
francesa do ramo comercial. Até aí beleza, eu estava já há algum
tempo sem notícias. O que aconteceu por lá é que foi digno de nota.
Na hora marcada eu estava sentado junto com mais alguns
participantes, aguardando começar a prova, quando chegou mais
um candidato. A entrevistadora perguntou seu nome e se ele havia
já enviado o currículo. A pessoa disse que sim e então ela chamou a
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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pessoa responsável pela seleção, que ouviu o caso e saiu para
imprimir o material. Minutos depois ela voltou e disse: - Moço, você
tem uma cópia do currículo aí? É que minha caixa postal está lotada,
somente hoje eu já recebi 530 mensagens para esta vaga e não
consegui localizar o seu e-mail! E eu também estou sozinha na
recepção. Já sei, você sabe o nome de seu e-mail? Assim eu acho mais
fácil! Inacreditável! Todos nos olhamos, espantados, tanto pelo
inusitado da situação, quanto pela quantidade de candidatos para
uma única vaga. Parece mentira, mas é a pura verdade.
A dinâmica também se mostrou um desastre, porque entre
os candidatos selecionados por tal método, apesar de alguma
homogeneidade, o que se encontrava era uma disparidade enorme
nas experiências e no perfil. A vaga era para analista de promoção
de e-commerce. Havia no mínimo três ou quatro jovens, com MBA,
mas que nunca tinham trabalhado diretamente com a área
comercial e eram bem crus em negociação, embora arrotassem 30impertinentemente a todo instante, clichês de planejamento.
Outros tinham vivência em backoffice de marketing, mas não
atuaram com promoção, outros, enfim, vinham de logística,
finanças e gravadoras. Eu, ali no meio! Quando dividiram os grupos,
descobriram que não éramos em número par e fiquei como
mediador. O que vi foi um espetáculo de egos, cada um tentando se
sobrepor aos outros e não conseguindo trabalhar em grupo, nem
escutar as ponderações do mediador. No final, deu-se o confronto,
com o francês responsável pela empresa observando - e o que foi
pior - dando palpite em tudo, impedindo o desenrolar da
negociação que fora proposta pela dinâmica e se irritando porque
as coisas não saiam do jeito que ele queria. Foi lamentável! Não sei
que bicho que deu, mas acho que eles tiveram que recomeçar tudo
da estaca zero. Um mês depois recebi o e-mail de agradecimento
pela participação.
Para ilustrar, dê só uma olhada numa outra antiga 31reportagem da Folha , sobre o assunto:
Folha Online - 2003 - DISPUTA ELETRÔNICA:
Triagem virtual divide opinião de empresas
Dentre as possibilidades oferecidas pelos softwares de gestão de
pessoas (gerenciamento de banco de dados, triagem por
palavras-chave, encaminhamento de respostas e de
convocações, atualização do currículo feita pelo candidato,
definição do perfil ideal da vaga)... A agilidade na triagem de
candidatos é o ponto mais comentado entre os profissionais
ouvidos pela Folha. Com o desemprego em alta, a quantidade
de currículos recebidos aumenta, e poder selecionar
eletronicamente e com maior precisão passa a ser o sonho de
consumo do RH. "Num sistema manual, uma pessoa leva cerca
de três horas por dia lendo currículos. Com a triagem eletrônica,
esse tempo cai para uma hora por dia, e a empresa ganha duas
horas operacionais de cada profissional envolvido. Só não é
interessante se isso não for bem analisado e gerar demissões",
diz Rogerio Leme, 32, diretor da AncoraRH, que desenvolve
sistemas para recrutamento.
No programa de estágios de 2002 da Ford, pela primeira vez
todo o processo de triagem foi feito pela internet. "De 2.383
inscritos, 260 foram selecionados para a primeira fase, e todos
foram avisados por e-mail. Isso é viável para processos
grandes, quando não podemos convocar todos os candidatos",
pondera Barbaroto. Franco conta que a redução de custos
também é significativa. "Antes gastávamos R$ 3.000 por mês
com cartas agradecendo a participação em seleções. Hoje
gastamos 10% desse valor.
Uma pesquisa de abril da consultoria Price Waterhouse-
Coopers sobre práticas e estratégias de gestão de pessoas
aponta algumas tendências sobre a informatização do RH. O
estudo foi feito em 47 países, incluindo o Brasil, em 1.055
empresas, sempre com seus principais executivos de RH. O
benefício trazido pelos softwares de recrutamento seria, em tese,
livrar o recrutador da triagem manual dos currículos e de outras
tarefas. "Com menos finalistas, o tempo para uma entrevista
pessoal pode ser maior e melhor explorado", argumenta Miriam
Barbaroto, 26, analista de RH da Ford, empresa que utiliza
programa de computador para recrutamento e seleção.
30 Tipo: Break even point, kpis, targeting, market share, forecasting e outros. Que traduzimos aqui: ponto de retorno financeiro, indicadores de desempenho, segmentação, participação em mercado, prognósticos. 31
http://www2.uol.com.br/aprendiz/guiadeempregos/primeiro/noticias/ge160903.htm#3
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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pessoa responsável pela seleção, que ouviu o caso e saiu para
imprimir o material. Minutos depois ela voltou e disse: - Moço, você
tem uma cópia do currículo aí? É que minha caixa postal está lotada,
somente hoje eu já recebi 530 mensagens para esta vaga e não
consegui localizar o seu e-mail! E eu também estou sozinha na
recepção. Já sei, você sabe o nome de seu e-mail? Assim eu acho mais
fácil! Inacreditável! Todos nos olhamos, espantados, tanto pelo
inusitado da situação, quanto pela quantidade de candidatos para
uma única vaga. Parece mentira, mas é a pura verdade.
A dinâmica também se mostrou um desastre, porque entre
os candidatos selecionados por tal método, apesar de alguma
homogeneidade, o que se encontrava era uma disparidade enorme
nas experiências e no perfil. A vaga era para analista de promoção
de e-commerce. Havia no mínimo três ou quatro jovens, com MBA,
mas que nunca tinham trabalhado diretamente com a área
comercial e eram bem crus em negociação, embora arrotassem 30impertinentemente a todo instante, clichês de planejamento.
Outros tinham vivência em backoffice de marketing, mas não
atuaram com promoção, outros, enfim, vinham de logística,
finanças e gravadoras. Eu, ali no meio! Quando dividiram os grupos,
descobriram que não éramos em número par e fiquei como
mediador. O que vi foi um espetáculo de egos, cada um tentando se
sobrepor aos outros e não conseguindo trabalhar em grupo, nem
escutar as ponderações do mediador. No final, deu-se o confronto,
com o francês responsável pela empresa observando - e o que foi
pior - dando palpite em tudo, impedindo o desenrolar da
negociação que fora proposta pela dinâmica e se irritando porque
as coisas não saiam do jeito que ele queria. Foi lamentável! Não sei
que bicho que deu, mas acho que eles tiveram que recomeçar tudo
da estaca zero. Um mês depois recebi o e-mail de agradecimento
pela participação.
Para ilustrar, dê só uma olhada numa outra antiga 31reportagem da Folha , sobre o assunto:
Folha Online - 2003 - DISPUTA ELETRÔNICA:
Triagem virtual divide opinião de empresas
Dentre as possibilidades oferecidas pelos softwares de gestão de
pessoas (gerenciamento de banco de dados, triagem por
palavras-chave, encaminhamento de respostas e de
convocações, atualização do currículo feita pelo candidato,
definição do perfil ideal da vaga)... A agilidade na triagem de
candidatos é o ponto mais comentado entre os profissionais
ouvidos pela Folha. Com o desemprego em alta, a quantidade
de currículos recebidos aumenta, e poder selecionar
eletronicamente e com maior precisão passa a ser o sonho de
consumo do RH. "Num sistema manual, uma pessoa leva cerca
de três horas por dia lendo currículos. Com a triagem eletrônica,
esse tempo cai para uma hora por dia, e a empresa ganha duas
horas operacionais de cada profissional envolvido. Só não é
interessante se isso não for bem analisado e gerar demissões",
diz Rogerio Leme, 32, diretor da AncoraRH, que desenvolve
sistemas para recrutamento.
No programa de estágios de 2002 da Ford, pela primeira vez
todo o processo de triagem foi feito pela internet. "De 2.383
inscritos, 260 foram selecionados para a primeira fase, e todos
foram avisados por e-mail. Isso é viável para processos
grandes, quando não podemos convocar todos os candidatos",
pondera Barbaroto. Franco conta que a redução de custos
também é significativa. "Antes gastávamos R$ 3.000 por mês
com cartas agradecendo a participação em seleções. Hoje
gastamos 10% desse valor.
Uma pesquisa de abril da consultoria Price Waterhouse-
Coopers sobre práticas e estratégias de gestão de pessoas
aponta algumas tendências sobre a informatização do RH. O
estudo foi feito em 47 países, incluindo o Brasil, em 1.055
empresas, sempre com seus principais executivos de RH. O
benefício trazido pelos softwares de recrutamento seria, em tese,
livrar o recrutador da triagem manual dos currículos e de outras
tarefas. "Com menos finalistas, o tempo para uma entrevista
pessoal pode ser maior e melhor explorado", argumenta Miriam
Barbaroto, 26, analista de RH da Ford, empresa que utiliza
programa de computador para recrutamento e seleção.
30 Tipo: Break even point, kpis, targeting, market share, forecasting e outros. Que traduzimos aqui: ponto de retorno financeiro, indicadores de desempenho, segmentação, participação em mercado, prognósticos. 31
http://www2.uol.com.br/aprendiz/guiadeempregos/primeiro/noticias/ge160903.htm#3
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
7170
Solução: Dá até calafrios saber que hoje estes softwares estão bem
mais desenvolvidos. A única saída para enfrentar isto é fazer
currículos personalizados, pelo menos alguns, para que, de acordo
com o que é solicitado no anúncio, você tenha maiores chances de
ser escolhido. Outro ponto é continuar insistindo, pois nem todas as
agências trabalham com estes softwares, se bem que se a situação
continuar deste jeito, eles não terão escolha e deverão adotar este
sistema. Enquanto isso previna-se e procure destacar o que você
tem de melhor no foco e perfil da vaga, como se fosse um pescador
que seleciona iscas, anzóis e varas diferentes, conforme o peixe que
deseja pegar. Dá algum trabalho, mas os resultados serão melhores.
Just do it!
2 - A Lógica das Figurinhas
É importante que seus leitores entendam o custo de contratação.
Existe uma enorme despesa com o recrutamento e o estágio inicial
de contratação. Qualquer coisa que o empregador possa fazer
para assegurar que o encaixe seja bom, geralmente vale a pena ser 32
feito.
(Carter, 2001)
O raciocínio acima - uma espécie de padrão patronal - esconde um
sofisma de justificação, pois afirma justamente o que se pretende
provar. Em primeiro lugar os gastos com os processos seletivos
significam investimento e não despesas já que funcionários são 33recursos e não custos - Peter Drucker já dizia isto em 1960 -, no
mais, quem for o escolhido lutará para ser efetivado na função e
assim, tentará cumprir os ideais da companhia e seu trabalho
reverterá em lucros.
Além disso, quem garante que mesmo contratado o
profissional mais adequado ao perfil da vaga, ele seja reconhecido e
bem tratado, ou que a empresa honrará as promessas feitas na
admissão? Se não for, haverá afastamento, desmotivação,
absenteísmo, e isto gerará mais postos em aberto pela máxima culpa 34do empregador e de seus conselheiros. Portanto, é fácil generalizar
35a situação e colocar toda a carga negativa dos erros de Rh em cima
dos candidatos, afinal os consultores ganham das empresas e não
dos desempregados. A verdadeira pergunta é: trata-se de construir
parcerias frutíferas ou efetivar a exploração de curto prazo? O que
esconde a delirante ênfase no discurso acerca do candidato “ideal”?
Será que já chegamos ao ponto de colocar mark-ups nos
empregados?
Além disso, o argumento também pode se reduzido a pó,
caso se constate que a empresa investe porque está crescendo e não
porque tenha “responsabilidade social” ou acredite em wellfare
state. Contrata-se porque precisa de maior staff para fazer frente às
demandas existentes, imediatas ou previstas. Contrata-se para
“reparar” os erros de avaliação, de construção de perfil e até mesmo
porque o candidato “ideal” não funcionou... Ou foi para a 36concorrência ganhar o dobro!
32Extraído de:
33 Não que seja meu autor preferido, mas ele foi responsável por conhecermos melhor R. Deming. Este sim, um gênio.
http://www.universiabrasil.net/nextwave/ver_materia.jsp?materia=131&subcanal=3
34 É lamentável, mas normalmente as empresas preferem suportar altos índices de turn-over que melhorar salários, condições de trabalho ou o clima organizacional. Deve dar retorno ou esconder incompetências. Sei lá!35 Eis meu ponto de vista, afinal. Não somente técnica de “gestão”, mas uma imbricação (que é suposta, embora não ocorra sempre) com o humano naquilo em que seja mais digno, responsável, livre e produtivo. Existem outras estratégias e mensurações válidas que as atualmente praticadas. Ao redundar tautologicamente o humano à equivalência do capital, exige-se, a administração rentável e controlada do mesmo. Atrela-se “conhecimento” a custo e segue-se daí que as flutuações de mercado determinam até quando se torna conveniente mantê-lo no budget. A expulsão do que deveria ser a esfera mais relevante, se dá, na prática das empresas, por motivos mecânicos. Joga-se o trigo e fica-se com o Joio. Mas, se as transferências interbancárias são indolores, o fechamento de fábricas ou extinção de postos de trabalho demonstra a interface direta com o “sujeito que conhece”. Em extremos esta posição indica a “coisificação” denunciada por Drummond, só que agora sabidamente alocada dentro de uma sistemática para gerir apenas o Recurso, pois (parafraseando Nietzsche) se jogarmos fora o mundo ideal, jogamos também aquilo que é real, ou seja: o Humano.36 Não esqueço do gerente que iria vir para um conglomerado ao qual prestava consultoria. Meses se passaram na busca do candidato ideal (e o meio de campo da empresa parado, aguardando o novo chefão). Finalmente um semideus foi contratado: ficou duas semanas e foi embora. Quando perguntei à diretora o porquê de tal situação ela disse: fizeram a ele uma proposta indecente e eu não pude cobrir. E agora? Perguntei. Temos que recuperar o tempo perdido, disse ela resignadamente. O incrível é que a empresária possuía altíssima capacidade diretiva e mesmo assim caiu no conto do RHgário, quer dizer, do vigário. No final, desistiram da contratação e continuaram com seus problemas internos. É sobre este aspecto daninho a ambos os lados é que eu me refiro...
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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Solução: Dá até calafrios saber que hoje estes softwares estão bem
mais desenvolvidos. A única saída para enfrentar isto é fazer
currículos personalizados, pelo menos alguns, para que, de acordo
com o que é solicitado no anúncio, você tenha maiores chances de
ser escolhido. Outro ponto é continuar insistindo, pois nem todas as
agências trabalham com estes softwares, se bem que se a situação
continuar deste jeito, eles não terão escolha e deverão adotar este
sistema. Enquanto isso previna-se e procure destacar o que você
tem de melhor no foco e perfil da vaga, como se fosse um pescador
que seleciona iscas, anzóis e varas diferentes, conforme o peixe que
deseja pegar. Dá algum trabalho, mas os resultados serão melhores.
Just do it!
2 - A Lógica das Figurinhas
É importante que seus leitores entendam o custo de contratação.
Existe uma enorme despesa com o recrutamento e o estágio inicial
de contratação. Qualquer coisa que o empregador possa fazer
para assegurar que o encaixe seja bom, geralmente vale a pena ser 32
feito.
(Carter, 2001)
O raciocínio acima - uma espécie de padrão patronal - esconde um
sofisma de justificação, pois afirma justamente o que se pretende
provar. Em primeiro lugar os gastos com os processos seletivos
significam investimento e não despesas já que funcionários são 33recursos e não custos - Peter Drucker já dizia isto em 1960 -, no
mais, quem for o escolhido lutará para ser efetivado na função e
assim, tentará cumprir os ideais da companhia e seu trabalho
reverterá em lucros.
Além disso, quem garante que mesmo contratado o
profissional mais adequado ao perfil da vaga, ele seja reconhecido e
bem tratado, ou que a empresa honrará as promessas feitas na
admissão? Se não for, haverá afastamento, desmotivação,
absenteísmo, e isto gerará mais postos em aberto pela máxima culpa 34do empregador e de seus conselheiros. Portanto, é fácil generalizar
35a situação e colocar toda a carga negativa dos erros de Rh em cima
dos candidatos, afinal os consultores ganham das empresas e não
dos desempregados. A verdadeira pergunta é: trata-se de construir
parcerias frutíferas ou efetivar a exploração de curto prazo? O que
esconde a delirante ênfase no discurso acerca do candidato “ideal”?
Será que já chegamos ao ponto de colocar mark-ups nos
empregados?
Além disso, o argumento também pode se reduzido a pó,
caso se constate que a empresa investe porque está crescendo e não
porque tenha “responsabilidade social” ou acredite em wellfare
state. Contrata-se porque precisa de maior staff para fazer frente às
demandas existentes, imediatas ou previstas. Contrata-se para
“reparar” os erros de avaliação, de construção de perfil e até mesmo
porque o candidato “ideal” não funcionou... Ou foi para a 36concorrência ganhar o dobro!
32Extraído de:
33 Não que seja meu autor preferido, mas ele foi responsável por conhecermos melhor R. Deming. Este sim, um gênio.
http://www.universiabrasil.net/nextwave/ver_materia.jsp?materia=131&subcanal=3
34 É lamentável, mas normalmente as empresas preferem suportar altos índices de turn-over que melhorar salários, condições de trabalho ou o clima organizacional. Deve dar retorno ou esconder incompetências. Sei lá!35 Eis meu ponto de vista, afinal. Não somente técnica de “gestão”, mas uma imbricação (que é suposta, embora não ocorra sempre) com o humano naquilo em que seja mais digno, responsável, livre e produtivo. Existem outras estratégias e mensurações válidas que as atualmente praticadas. Ao redundar tautologicamente o humano à equivalência do capital, exige-se, a administração rentável e controlada do mesmo. Atrela-se “conhecimento” a custo e segue-se daí que as flutuações de mercado determinam até quando se torna conveniente mantê-lo no budget. A expulsão do que deveria ser a esfera mais relevante, se dá, na prática das empresas, por motivos mecânicos. Joga-se o trigo e fica-se com o Joio. Mas, se as transferências interbancárias são indolores, o fechamento de fábricas ou extinção de postos de trabalho demonstra a interface direta com o “sujeito que conhece”. Em extremos esta posição indica a “coisificação” denunciada por Drummond, só que agora sabidamente alocada dentro de uma sistemática para gerir apenas o Recurso, pois (parafraseando Nietzsche) se jogarmos fora o mundo ideal, jogamos também aquilo que é real, ou seja: o Humano.36 Não esqueço do gerente que iria vir para um conglomerado ao qual prestava consultoria. Meses se passaram na busca do candidato ideal (e o meio de campo da empresa parado, aguardando o novo chefão). Finalmente um semideus foi contratado: ficou duas semanas e foi embora. Quando perguntei à diretora o porquê de tal situação ela disse: fizeram a ele uma proposta indecente e eu não pude cobrir. E agora? Perguntei. Temos que recuperar o tempo perdido, disse ela resignadamente. O incrível é que a empresária possuía altíssima capacidade diretiva e mesmo assim caiu no conto do RHgário, quer dizer, do vigário. No final, desistiram da contratação e continuaram com seus problemas internos. É sobre este aspecto daninho a ambos os lados é que eu me refiro...
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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Não é preciso ser especialista, para saber que os
empregadores querem ter o máximo de segurança possível antes de
se arriscarem a fazer uma contratação e por isso, gastam os tubos
com empresas de seleção para localizarem e extraírem do mercado
os candidatos adequados. Mas, mesmo que o perfil se encaixe
perfeitamente nas qualificações exigidas, estas empresas acreditam
que não conhecem de verdade o candidato enquanto ele não for
submetido a extensivas baterias de testes, que indiquem
características de personalidade ou antecipem possíveis
dificuldades interpessoais. Tudo em nome das sagradas técnicas de
seleção. Porém, é importante notar que alguns destes testes passam
dos limites ao recolherem informações pessoais desnecessárias que
muitas pessoas consideram ofensivas, inclusive de cunho sexual.
Outros, menos esdrúxulos, tentam medir a capacidade de
sanar problemas e determinar potencial para tarefas mais
específicas, como supervisão de equipes. As empresas que usam
estas ferramentas de entrevista têm por “filosofia” que você não é o
conteúdo de seu currículo, biografia ou o que é apresentado
pessoalmente: eles acreditam que a lista de habilidades e de técnicas
não reflete de fato quem você realmente é, mas sim, o que o teste
revelaria. Existe, portanto o bom senso. A nota triste é que a grande
maioria deles, bem como o escopo de sua aplicação não está de
acordo com o que é regulamentado por lei e até o Ministério Público
entrou recentemente na briga por moralizar este pandemônio em 37que se transformaram os processos seletivos. Muitas coisas
importam e, deste modo, inúmeros são os aspectos ditos relevantes
que deveriam ser trabalhados mais apropriadamente, no entanto
apenas podemos apresentar as percepções e crenças racionais
justificadas com as quais nos relacionamos em maior profundidade.
Esta instância é a das relações de duração, reciprocidade e
diferença: recortes que nos apropriamos e ordenamos segundo as
compreensões e linguagens que dispomos para atuar no mundo.
Enfim. É isto! Vamos voltar às figurinhas.
Os testes, em geral se propõem a verificar alguns
pressupostos e possuem inúmeras diferenciações, conforme
estiverem eles mais próximos da área acadêmica ou da crendice do
indivíduo, mercado e organizações. No mais das vezes se trata de
exercícios segmentados em relação às competências ou
38capacitações categoria funcional adotada: operacional, executiva,
diretiva, temporária, técnica ou expertise. Falemos dos mais
comuns como aqueles em que você vê diante de uma série de
figuras geométricas incompletas - muitas vezes sem nexo - que
devem ser indicadas, organizadas ou selecionadas pelo candidato.
Normalmente este teste é apenas de atenção, pois um exame mais
acurado das figuras vai revelar uma disposição lógica de movimento
e proporção, ou seja: a resposta certa é aquela que segue a seqüência
de direção em que aparecem ou desaparecem partes da figura.
Mesmo que inicialmente assustem, não é com estes que é preciso se
preocupar. Existem outros que pretendem verificar os mil
pormenores da personalidade do candidato, num processo de
análise e síntese “associacionista”. É incrível a nossa originalidade:
Geramos laudos e avaliações, cada vez mais detalhados e
complexos, mas sem a devida garantia e segurança de que
conseguimos identificar o que avaliamos. De brinde, selecionamos
algumas sugestões de leitura sobre os lados positivos (Lado A) e
negativos (Lado B) destes modernos instrumentos de stress.
Habilidade com Figuras Seqüenciais:
Lado A: São questionários de avaliação de habilidade com figuras
seqüenciais, geométricas ou assimétricas e procuram verificar qual
o grau de precisão e rapidez em lidar com figuras e sinais de lógica
pura. Isto indica as tendências analíticas do candidato e seu poder
de decisão e concatenação. Lado B: Análise não é tudo. Se fosse
assim, não existiriam outras áreas do conhecimento, inclusive a
psicologia, que por definição é irredutível à lógica. Este teste não
revela, senão os mecanismos superficiais de raciocínio, já que seu
enunciado pode não ser apreendido de início, mas isso não indica
que você é inepto. Ao fazer estes testes, verifique bem o que é
pedido, fique calmo e avalie as possibilidades: encaixe, movimento,
construção e seqüência das figuras (horário/anti-horário etc).
37 Vide Lébrun e as matérias no apêndice.
38 Capacidades são imanentes ao indivíduo, competências podem ser construções teóricas vazias. Identificar quem é capaz dentro do ambiente significa investir na formação de perfis adequados estabelecendo diferenciais.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
7574
Não é preciso ser especialista, para saber que os
empregadores querem ter o máximo de segurança possível antes de
se arriscarem a fazer uma contratação e por isso, gastam os tubos
com empresas de seleção para localizarem e extraírem do mercado
os candidatos adequados. Mas, mesmo que o perfil se encaixe
perfeitamente nas qualificações exigidas, estas empresas acreditam
que não conhecem de verdade o candidato enquanto ele não for
submetido a extensivas baterias de testes, que indiquem
características de personalidade ou antecipem possíveis
dificuldades interpessoais. Tudo em nome das sagradas técnicas de
seleção. Porém, é importante notar que alguns destes testes passam
dos limites ao recolherem informações pessoais desnecessárias que
muitas pessoas consideram ofensivas, inclusive de cunho sexual.
Outros, menos esdrúxulos, tentam medir a capacidade de
sanar problemas e determinar potencial para tarefas mais
específicas, como supervisão de equipes. As empresas que usam
estas ferramentas de entrevista têm por “filosofia” que você não é o
conteúdo de seu currículo, biografia ou o que é apresentado
pessoalmente: eles acreditam que a lista de habilidades e de técnicas
não reflete de fato quem você realmente é, mas sim, o que o teste
revelaria. Existe, portanto o bom senso. A nota triste é que a grande
maioria deles, bem como o escopo de sua aplicação não está de
acordo com o que é regulamentado por lei e até o Ministério Público
entrou recentemente na briga por moralizar este pandemônio em 37que se transformaram os processos seletivos. Muitas coisas
importam e, deste modo, inúmeros são os aspectos ditos relevantes
que deveriam ser trabalhados mais apropriadamente, no entanto
apenas podemos apresentar as percepções e crenças racionais
justificadas com as quais nos relacionamos em maior profundidade.
Esta instância é a das relações de duração, reciprocidade e
diferença: recortes que nos apropriamos e ordenamos segundo as
compreensões e linguagens que dispomos para atuar no mundo.
Enfim. É isto! Vamos voltar às figurinhas.
Os testes, em geral se propõem a verificar alguns
pressupostos e possuem inúmeras diferenciações, conforme
estiverem eles mais próximos da área acadêmica ou da crendice do
indivíduo, mercado e organizações. No mais das vezes se trata de
exercícios segmentados em relação às competências ou
38capacitações categoria funcional adotada: operacional, executiva,
diretiva, temporária, técnica ou expertise. Falemos dos mais
comuns como aqueles em que você vê diante de uma série de
figuras geométricas incompletas - muitas vezes sem nexo - que
devem ser indicadas, organizadas ou selecionadas pelo candidato.
Normalmente este teste é apenas de atenção, pois um exame mais
acurado das figuras vai revelar uma disposição lógica de movimento
e proporção, ou seja: a resposta certa é aquela que segue a seqüência
de direção em que aparecem ou desaparecem partes da figura.
Mesmo que inicialmente assustem, não é com estes que é preciso se
preocupar. Existem outros que pretendem verificar os mil
pormenores da personalidade do candidato, num processo de
análise e síntese “associacionista”. É incrível a nossa originalidade:
Geramos laudos e avaliações, cada vez mais detalhados e
complexos, mas sem a devida garantia e segurança de que
conseguimos identificar o que avaliamos. De brinde, selecionamos
algumas sugestões de leitura sobre os lados positivos (Lado A) e
negativos (Lado B) destes modernos instrumentos de stress.
Habilidade com Figuras Seqüenciais:
Lado A: São questionários de avaliação de habilidade com figuras
seqüenciais, geométricas ou assimétricas e procuram verificar qual
o grau de precisão e rapidez em lidar com figuras e sinais de lógica
pura. Isto indica as tendências analíticas do candidato e seu poder
de decisão e concatenação. Lado B: Análise não é tudo. Se fosse
assim, não existiriam outras áreas do conhecimento, inclusive a
psicologia, que por definição é irredutível à lógica. Este teste não
revela, senão os mecanismos superficiais de raciocínio, já que seu
enunciado pode não ser apreendido de início, mas isso não indica
que você é inepto. Ao fazer estes testes, verifique bem o que é
pedido, fique calmo e avalie as possibilidades: encaixe, movimento,
construção e seqüência das figuras (horário/anti-horário etc).
37 Vide Lébrun e as matérias no apêndice.
38 Capacidades são imanentes ao indivíduo, competências podem ser construções teóricas vazias. Identificar quem é capaz dentro do ambiente significa investir na formação de perfis adequados estabelecendo diferenciais.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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Pró Atividade:
Lado A: Avalia qual energia disponível para a realização de tarefas
que exijam empenho, interesse e dedicação e também o grau de
força e entusiasmo para a realização de tarefas. É o verificador do 39famoso quociente de hands on. Lado B: A quantidade de energia é
regida pelo biorritmo e, portanto, variável, além disso, pode estar
momentaneamente indisponível ou bloqueada e a pessoa perde
ânimo para realizações pessoais e profissionais. Nem sempre o
selecionador tem em mente que o candidato apresenta pouca
energia em função da baixa auto-estima advinda do desemprego.
No mais das vezes a seleção é “linha de produção”. Ao fazer este
teste, busque apresentar bom ânimo, mesmo que no momento isso
seja difícil.
Habilidade de Concentração:
Lado A: Avalia a habilidade do candidato em identificar ínfimos
detalhes entre uma série de outros estímulos semelhantes. Muitas
tarefas exigem atenção minuciosa a pequenos detalhes. Estas
atividades apresentam uma série de estímulos diferentes, nos quais a
máxima atenção é importante para que não se incida em erro, como
digitação de documentos. Lado B: Avaliar rapidez e exatidão nas
tarefas é um dado circunstancial. Nada impede a ocorrência de
erros futuros. Um digitador em local silencioso produz muito, mas
mesmo assim precisa de revisão. Se o chefe fica gritando na mesa ao
lado, não há como produzir e revisar, a não ser com MBA em um
mosteiro Zen. Ao fazer este teste, procure estar calmo e administrar
o tempo.
Avaliadores Globais:
Lado A: Avalia o dinamismo interno de uma pessoa, o quanto ela
tem de energia em atividade para tarefas. Indicar o grau de
confiança que ela deposita em seus julgamentos lógicos para
tomada de decisões. Verifica o quanto prefere ou não, tomar
decisões mais com os sentimentos ou com a razão no ambiente
profissional. Mensura a flexibilidade ou rigidez de princípios morais
interiores e por último, referir-se ao peso que esta pessoa dá aos
ganhos materiais. Lado B: Esta lista não pode ser um indicador
completo de uma pessoa, pois muitas das tendências podem ser
conflitantes e, mesmo assim, eficazes profissionalmente. Cícero
distinguia entre prudência e justiça, ou seja, se for levado ao pé da
letra a razão e a ética, ninguém pode vender mais nada que
contenha conservantes químicos impunemente. Se o fizer estará
sendo prudente, mas faltando com a justiça. Se não o fizer será
taxado de tolo, porém estará sendo ético. Por outro lado a sede de
ganhos pode não significar empreendedorismo e sim, ambição.
Estes testes falham porque são direcionados a um perfil, ora passivo,
ora agressivo, onde uma ou outra instância predomina, de acordo
com a vaga. Portanto, ao responder, verifique a descrição da vaga e
opte por destacar aquilo que é diretamente relevante.
Integridade Profissional
Lado A: Avalia a aderência frente a princípios éticos e de cidadania.
Valores éticos e morais são avaliados neste questionário, que propõe
escolhas individuais de situações do cotidiano. Tenciona verificar a
aquisição de valores de ética profissional, social e criação familiar.
Lado B: Um juízo ético é uma instância a posteriori podendo ser ou
não aceito por determinados grupos e nada impede de se responder
obviedades e amenidades aceitas. Então, trata-se de mera
convenção onde não importam os juízos reflexivos. Portanto, este
questionário espelhará muito mais parâmetros comparativos de
rigidez ética do que moralidade em si. Não avalia contextos ou
atitudes. Posso colecionar saquinhos de chá e, ao mesmo tempo
economizar milhões para a empresa.
39 Nem toda a citação do bastião “conceitual” em administrês ou sócio-economês grifadas em inglês (rimou de novo!) quer enfatizar um ponto essencial: pode ser irônica também. Afinal se lá fora isto se parece com “mãos prontas para agir”, aqui significa mão na massa. E agora? Quanto vai existir de bolo e quantos serão pegos em flagrante?
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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Pró Atividade:
Lado A: Avalia qual energia disponível para a realização de tarefas
que exijam empenho, interesse e dedicação e também o grau de
força e entusiasmo para a realização de tarefas. É o verificador do 39famoso quociente de hands on. Lado B: A quantidade de energia é
regida pelo biorritmo e, portanto, variável, além disso, pode estar
momentaneamente indisponível ou bloqueada e a pessoa perde
ânimo para realizações pessoais e profissionais. Nem sempre o
selecionador tem em mente que o candidato apresenta pouca
energia em função da baixa auto-estima advinda do desemprego.
No mais das vezes a seleção é “linha de produção”. Ao fazer este
teste, busque apresentar bom ânimo, mesmo que no momento isso
seja difícil.
Habilidade de Concentração:
Lado A: Avalia a habilidade do candidato em identificar ínfimos
detalhes entre uma série de outros estímulos semelhantes. Muitas
tarefas exigem atenção minuciosa a pequenos detalhes. Estas
atividades apresentam uma série de estímulos diferentes, nos quais a
máxima atenção é importante para que não se incida em erro, como
digitação de documentos. Lado B: Avaliar rapidez e exatidão nas
tarefas é um dado circunstancial. Nada impede a ocorrência de
erros futuros. Um digitador em local silencioso produz muito, mas
mesmo assim precisa de revisão. Se o chefe fica gritando na mesa ao
lado, não há como produzir e revisar, a não ser com MBA em um
mosteiro Zen. Ao fazer este teste, procure estar calmo e administrar
o tempo.
Avaliadores Globais:
Lado A: Avalia o dinamismo interno de uma pessoa, o quanto ela
tem de energia em atividade para tarefas. Indicar o grau de
confiança que ela deposita em seus julgamentos lógicos para
tomada de decisões. Verifica o quanto prefere ou não, tomar
decisões mais com os sentimentos ou com a razão no ambiente
profissional. Mensura a flexibilidade ou rigidez de princípios morais
interiores e por último, referir-se ao peso que esta pessoa dá aos
ganhos materiais. Lado B: Esta lista não pode ser um indicador
completo de uma pessoa, pois muitas das tendências podem ser
conflitantes e, mesmo assim, eficazes profissionalmente. Cícero
distinguia entre prudência e justiça, ou seja, se for levado ao pé da
letra a razão e a ética, ninguém pode vender mais nada que
contenha conservantes químicos impunemente. Se o fizer estará
sendo prudente, mas faltando com a justiça. Se não o fizer será
taxado de tolo, porém estará sendo ético. Por outro lado a sede de
ganhos pode não significar empreendedorismo e sim, ambição.
Estes testes falham porque são direcionados a um perfil, ora passivo,
ora agressivo, onde uma ou outra instância predomina, de acordo
com a vaga. Portanto, ao responder, verifique a descrição da vaga e
opte por destacar aquilo que é diretamente relevante.
Integridade Profissional
Lado A: Avalia a aderência frente a princípios éticos e de cidadania.
Valores éticos e morais são avaliados neste questionário, que propõe
escolhas individuais de situações do cotidiano. Tenciona verificar a
aquisição de valores de ética profissional, social e criação familiar.
Lado B: Um juízo ético é uma instância a posteriori podendo ser ou
não aceito por determinados grupos e nada impede de se responder
obviedades e amenidades aceitas. Então, trata-se de mera
convenção onde não importam os juízos reflexivos. Portanto, este
questionário espelhará muito mais parâmetros comparativos de
rigidez ética do que moralidade em si. Não avalia contextos ou
atitudes. Posso colecionar saquinhos de chá e, ao mesmo tempo
economizar milhões para a empresa.
39 Nem toda a citação do bastião “conceitual” em administrês ou sócio-economês grifadas em inglês (rimou de novo!) quer enfatizar um ponto essencial: pode ser irônica também. Afinal se lá fora isto se parece com “mãos prontas para agir”, aqui significa mão na massa. E agora? Quanto vai existir de bolo e quantos serão pegos em flagrante?
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Inteligência Emocional
Lado A: A avaliação de Inteligência Emocional fundamenta-se na
teoria das Inteligências Múltiplas, entendendo-se inteligência
emocional como o composto de duas inteligências da teoria de
base: a inteligência interpessoal e a intrapessoal. Pretende-se
verificar os níveis de autocontrole emocional, equilíbrio entre razão
e emoção, além de avaliar as competências de relacionamento.
Lado B: “Inteligência Emocional” é uma metáfora que mascara uma
hipótese razoável de as afecções sejam “controláveis” através de
instâncias intelectivas ou até possuírem seu próprio centro racional.
Mas, isto seria um contra-senso ao conceito, já que a inteligência é
de natureza utilitária e não condiz ontologicamente com as
emoções e, mormente, antagônica. Se há um componente racional
em tudo o que existe há algo aqui a ser estudado, mas não define
tipos de inteligência.
Visão Geral dos Testes:
Segundo a visão do Lado A e as próprias empresas que 40comercializam os testes , eles são uma excelente ferramenta para
identificar as potencialidades e perfil de um ou mais candidatos. De
acordo com isto, permitem que o recrutador compare os resultados
de diversos candidatos, podendo, assim, selecionar para a próxima
etapa do recrutamento somente aqueles profissionais com o perfil
desejado. A meta é possibilitar a análise rápida e eficaz das
características de um único candidato e descartar aqueles que não
são compatíveis. Resumo da ópera: trata-se mais de facilitar o dia a
dia administrativo da seleção de pessoal, que propriamente de
verificar as reais potencialidades que podem ser desenvolvidas. É a
lógica da linha de produção e tem raízes econômicas e
operacionais, já que existe um verdadeiro mercado da recolocação
e muitas empresas disputam espaço e clientes para o chamado
outsourcing.
Do Lado B, pouco se tem falado, mas é preciso atenção e, a
respeito deste mercado de terceirização, veja só a opinião de 41alguém que está no ramo:
De um modo geral esse tipo de seleção de pessoal é feita, em várias
empresas, para as áreas administrativas, técnicas, operacionais e
comerciais, em todos os níveis, inclusive gerência média. A razão
de tantos recorrerem a esses serviços, se deve ao fato de ser muitas
as vantagens oferecidas, principalmente no que diz respeito a
menos tempo, dinheiro e esforço gastos.
No entanto, O grande problema ocorre quando os testes
psicológicos usados não são adequados. As técnicas psicológicas
são muito úteis para se compreender melhor certas características
pessoais a fim de avaliar candidatos em processos de seleção.
Contudo, como "técnicas" exigem do selecionador uma boa
formação em psicologia, além de conhecimento teórico e
experiência profissional. Caso contrário, o que vai prevalecer é o
senso-comum. Afinal de contas, até mesmo estes instrumentos
não devem oferecer uma palavra final na avaliação de uma
pessoa.
Há empresas que, sob a capa de "testes psicológicos", inventam
procedimentos sem os critérios que validam as práticas
psicológicas. Existe uma falta de clareza em relação ao âmbito da
Psicologia. O uso de mapa astral, técnicas (pretensamente)
asiáticas, exóticas ou ainda dinâmicas quaisquer, não podem ser
consideradas como válidas, do ponto de vista do saber
psicológico.
O atual panorama da terceirização da seleção de pessoal,
portanto, constitui um estímulo ao senso-comum, pois a falta de
respaldo técnico de procedimentos ditos "psicológicos" por parte
de terceirizados e terceirizando, proporciona uma demanda
equivocada da avaliação psicológica.
(Carvalho Castro)
O que isto quer dizer? Nada mais, nada menos do que já cansamos
de dizer: que a formação do entrevistador e, aliás de qualquer
profissional de Recursos Humanos deve ser a mais sólida possível,
pois a mera aplicação da mecânica de testes não significa muita
40 Os dados foram extraídos de vários sites especializados e bancos de emprego. Veja a relação na seção links. 41 Extraída de: www.psicometria.com.br
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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Inteligência Emocional
Lado A: A avaliação de Inteligência Emocional fundamenta-se na
teoria das Inteligências Múltiplas, entendendo-se inteligência
emocional como o composto de duas inteligências da teoria de
base: a inteligência interpessoal e a intrapessoal. Pretende-se
verificar os níveis de autocontrole emocional, equilíbrio entre razão
e emoção, além de avaliar as competências de relacionamento.
Lado B: “Inteligência Emocional” é uma metáfora que mascara uma
hipótese razoável de as afecções sejam “controláveis” através de
instâncias intelectivas ou até possuírem seu próprio centro racional.
Mas, isto seria um contra-senso ao conceito, já que a inteligência é
de natureza utilitária e não condiz ontologicamente com as
emoções e, mormente, antagônica. Se há um componente racional
em tudo o que existe há algo aqui a ser estudado, mas não define
tipos de inteligência.
Visão Geral dos Testes:
Segundo a visão do Lado A e as próprias empresas que 40comercializam os testes , eles são uma excelente ferramenta para
identificar as potencialidades e perfil de um ou mais candidatos. De
acordo com isto, permitem que o recrutador compare os resultados
de diversos candidatos, podendo, assim, selecionar para a próxima
etapa do recrutamento somente aqueles profissionais com o perfil
desejado. A meta é possibilitar a análise rápida e eficaz das
características de um único candidato e descartar aqueles que não
são compatíveis. Resumo da ópera: trata-se mais de facilitar o dia a
dia administrativo da seleção de pessoal, que propriamente de
verificar as reais potencialidades que podem ser desenvolvidas. É a
lógica da linha de produção e tem raízes econômicas e
operacionais, já que existe um verdadeiro mercado da recolocação
e muitas empresas disputam espaço e clientes para o chamado
outsourcing.
Do Lado B, pouco se tem falado, mas é preciso atenção e, a
respeito deste mercado de terceirização, veja só a opinião de 41alguém que está no ramo:
De um modo geral esse tipo de seleção de pessoal é feita, em várias
empresas, para as áreas administrativas, técnicas, operacionais e
comerciais, em todos os níveis, inclusive gerência média. A razão
de tantos recorrerem a esses serviços, se deve ao fato de ser muitas
as vantagens oferecidas, principalmente no que diz respeito a
menos tempo, dinheiro e esforço gastos.
No entanto, O grande problema ocorre quando os testes
psicológicos usados não são adequados. As técnicas psicológicas
são muito úteis para se compreender melhor certas características
pessoais a fim de avaliar candidatos em processos de seleção.
Contudo, como "técnicas" exigem do selecionador uma boa
formação em psicologia, além de conhecimento teórico e
experiência profissional. Caso contrário, o que vai prevalecer é o
senso-comum. Afinal de contas, até mesmo estes instrumentos
não devem oferecer uma palavra final na avaliação de uma
pessoa.
Há empresas que, sob a capa de "testes psicológicos", inventam
procedimentos sem os critérios que validam as práticas
psicológicas. Existe uma falta de clareza em relação ao âmbito da
Psicologia. O uso de mapa astral, técnicas (pretensamente)
asiáticas, exóticas ou ainda dinâmicas quaisquer, não podem ser
consideradas como válidas, do ponto de vista do saber
psicológico.
O atual panorama da terceirização da seleção de pessoal,
portanto, constitui um estímulo ao senso-comum, pois a falta de
respaldo técnico de procedimentos ditos "psicológicos" por parte
de terceirizados e terceirizando, proporciona uma demanda
equivocada da avaliação psicológica.
(Carvalho Castro)
O que isto quer dizer? Nada mais, nada menos do que já cansamos
de dizer: que a formação do entrevistador e, aliás de qualquer
profissional de Recursos Humanos deve ser a mais sólida possível,
pois a mera aplicação da mecânica de testes não significa muita
40 Os dados foram extraídos de vários sites especializados e bancos de emprego. Veja a relação na seção links. 41 Extraída de: www.psicometria.com.br
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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coisa. Aliás, como já vimos, nem avaliar precisamente se pode exigir
de um “teste”. Na ânsia de “preencher o perfil” e atender o cliente, o
que vale é apelar para os prognósticos da buena dicha
organizacional. Esta situação é comum no mercado e não vai mudar
tão cedo. Mas, a bem da verdade, um profissional de seleção sério e
bem preparado (graduado, de preferência) dá mais valor ao que ele
realmente “extrai” do candidato em termos de competências e
potencial, do que o que é verificado por avaliadores padrão.
Morou? Mas cuidado! Nada de enfrentar o selecionador, impor-se
ou zombar nas respostas que você vai entrar literalmente pelo cano. 42Use menos Sun Tzu e mais Von Clausewitz.
3 - Associação Livre e Perguntas sem Nexo
Veja só o que pode estar escrito num questionário qualquer para 43você responder :
1 - Trabalhar com prazos de entrega te dá uma onda?
a) Não, mas trabalhar com prazos de entrega é um mal necessário que a
maioria de nós tem que encarar.
b) Não. Trabalhar com prazos de entrega é muito preocupante. Prefiro
estabelecer meu próprio ritmo.
c) Sim, acredito que opero bem sob stress.
2 - Você está preso num engarrafamento. Qual seria sua reação mais
provável?
a) Raiva.
b) Frustração.
c) Tédio.
3 - Se uma pessoa do sexo oposto lhe atrai, você:
a) Não perde a oportunidade e marca um encontro.
b) Prefere não se arriscar, embora se sinta tentado e acabe se culpando
por isso.
c) Não se incomoda com que os outros vão pensar.
4 - Você está para conseguir uma promoção. Qual seria sua reação mais
provável?
a) Posso ser impiedoso para conseguir o que quero.
b) É fácil concentrar minha atenção numa única coisa por períodos
bem longos.
c) Estaria preparado para desistir de tudo o que ame na vida, em troca
de sucesso na carreira que escolhi.
Como é que um ser humano normal pode responder a uma única
alternativa, se algumas destas questões, simplesmente não toleram
alternativas cabíveis? Eu detesto ser pressionado com prazos, mas
procuro cumpri-los religiosamente. Também nem sempre fico
entediado num engarrafamento, posso cantar ou ouvir música.
Talvez criar uma conspiração imaginária contra o governo ou o meu
chefe. E, quando tenho um relacionamento com alguém ou sou
casado, não me importa o quanto seja linda a secretária, que não
terei inclinações a cantá-la. Mesmo que estiver cotado para uma
promoção eu não preciso enfiar uma faca nas costas de meus
concorrentes para conseguir o cargo, aliás, muito pelo contrário. O
pecado é pensar indutivamente, do particular ao geral...
No entanto, alguns selecionadores (empresas que
compraram os testes) acreditam só haver uma resposta possível que
é identificada com o perfil do candidato e se recusam a aceitar que a
maioria das pessoas simplesmente não pense ou aja desta maneira
(o que é muito saudável). Ninguém questiona porque os testes “são
assim” e quais as margens de dissociação aceitáveis sem perda de
foco. Nestes casos, fica aquela vontade de abrir um novo
quadradinho e escrever: n.d.a para não dizer coisa pior. Queria
deixar um recado: Joguem fora estas apostilas xerocadas avaliem
com instrumentos eficazes, eliminando aquilo que seja
constrangedor ou desnecessário. Posso como candidato, oferecer
alta qualidade e comprometimento e tenho o direito de ser
investigado de forma inteligente. Por estas e outras que não acredito
em criar padrões identificados por padrões, mas esta é apenas a
minha opinião. Lá fora eles não buscam o saber, mas o processo
como prioridade. Busca-se completar tabulações eficientes para
gerir processos, identificar perfis e checar competências. Buscam
apenas certificar-se de que a reposição da peça foi completada com
sucesso.
42 Em Da Guerra, Carl Von Clausewitz ao menos admite alguma espécie de ética do confronto. Sun Tzu é mais punk.43 Os dados foram extraídos de vários sites especializados e bancos de emprego. Veja a relação na seção links.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
8180
coisa. Aliás, como já vimos, nem avaliar precisamente se pode exigir
de um “teste”. Na ânsia de “preencher o perfil” e atender o cliente, o
que vale é apelar para os prognósticos da buena dicha
organizacional. Esta situação é comum no mercado e não vai mudar
tão cedo. Mas, a bem da verdade, um profissional de seleção sério e
bem preparado (graduado, de preferência) dá mais valor ao que ele
realmente “extrai” do candidato em termos de competências e
potencial, do que o que é verificado por avaliadores padrão.
Morou? Mas cuidado! Nada de enfrentar o selecionador, impor-se
ou zombar nas respostas que você vai entrar literalmente pelo cano. 42Use menos Sun Tzu e mais Von Clausewitz.
3 - Associação Livre e Perguntas sem Nexo
Veja só o que pode estar escrito num questionário qualquer para 43você responder :
1 - Trabalhar com prazos de entrega te dá uma onda?
a) Não, mas trabalhar com prazos de entrega é um mal necessário que a
maioria de nós tem que encarar.
b) Não. Trabalhar com prazos de entrega é muito preocupante. Prefiro
estabelecer meu próprio ritmo.
c) Sim, acredito que opero bem sob stress.
2 - Você está preso num engarrafamento. Qual seria sua reação mais
provável?
a) Raiva.
b) Frustração.
c) Tédio.
3 - Se uma pessoa do sexo oposto lhe atrai, você:
a) Não perde a oportunidade e marca um encontro.
b) Prefere não se arriscar, embora se sinta tentado e acabe se culpando
por isso.
c) Não se incomoda com que os outros vão pensar.
4 - Você está para conseguir uma promoção. Qual seria sua reação mais
provável?
a) Posso ser impiedoso para conseguir o que quero.
b) É fácil concentrar minha atenção numa única coisa por períodos
bem longos.
c) Estaria preparado para desistir de tudo o que ame na vida, em troca
de sucesso na carreira que escolhi.
Como é que um ser humano normal pode responder a uma única
alternativa, se algumas destas questões, simplesmente não toleram
alternativas cabíveis? Eu detesto ser pressionado com prazos, mas
procuro cumpri-los religiosamente. Também nem sempre fico
entediado num engarrafamento, posso cantar ou ouvir música.
Talvez criar uma conspiração imaginária contra o governo ou o meu
chefe. E, quando tenho um relacionamento com alguém ou sou
casado, não me importa o quanto seja linda a secretária, que não
terei inclinações a cantá-la. Mesmo que estiver cotado para uma
promoção eu não preciso enfiar uma faca nas costas de meus
concorrentes para conseguir o cargo, aliás, muito pelo contrário. O
pecado é pensar indutivamente, do particular ao geral...
No entanto, alguns selecionadores (empresas que
compraram os testes) acreditam só haver uma resposta possível que
é identificada com o perfil do candidato e se recusam a aceitar que a
maioria das pessoas simplesmente não pense ou aja desta maneira
(o que é muito saudável). Ninguém questiona porque os testes “são
assim” e quais as margens de dissociação aceitáveis sem perda de
foco. Nestes casos, fica aquela vontade de abrir um novo
quadradinho e escrever: n.d.a para não dizer coisa pior. Queria
deixar um recado: Joguem fora estas apostilas xerocadas avaliem
com instrumentos eficazes, eliminando aquilo que seja
constrangedor ou desnecessário. Posso como candidato, oferecer
alta qualidade e comprometimento e tenho o direito de ser
investigado de forma inteligente. Por estas e outras que não acredito
em criar padrões identificados por padrões, mas esta é apenas a
minha opinião. Lá fora eles não buscam o saber, mas o processo
como prioridade. Busca-se completar tabulações eficientes para
gerir processos, identificar perfis e checar competências. Buscam
apenas certificar-se de que a reposição da peça foi completada com
sucesso.
42 Em Da Guerra, Carl Von Clausewitz ao menos admite alguma espécie de ética do confronto. Sun Tzu é mais punk.43 Os dados foram extraídos de vários sites especializados e bancos de emprego. Veja a relação na seção links.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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Desde que Freud desconfiou que existia algo além do
princípio de prazer e experimentou a associação livre de
significados (para que fosse possível romper com as resistências pré-
conscientes que guardavam os mecanismos das neuroses de
repetição) e levá-las a um patamar mais sadio das neuroses de
transferência, estancando as histerias, esta técnica foi cada vez mais
deturpada pelos pesquisadores ulteriores.
Hoje, acredita-se que se falar em cachorro quente e
chocolate ao leite no café da manhã, pode levar a identificar uma
instância psicopatológica qualquer no eterno confronto entre eros e 44thanatos. Mas os que adaptaram as técnicas psicanalíticas ao
mundo corporativo nem se preocuparam com a filosofia ou a
medicina, simplesmente, orientaram os resultados para as práticas
mais relevantes às empresas. Outro caso emblemático destes testes é
o dos questionários que lhe pedem satisfação sobre tendências
sexuais e cujas respostas podem ser inadmissíveis para alguns
sistemas de crenças ou cidadãos moralmente comuns.
Mas cuidado aí! Não são os testes os verdadeiros monstros
deste circo de horrores, pois eles servem apenas de instrumentos de
medição que em alguns casos, funcionam. Não importa assuntar
quais foram os interesses comerciais ou doutrinários por trás da
confecção destes questionários. Vamos deixar a resolução do nó
ético ou metodológico para os filósofos do porvir.
O problema real, para o candidato é sempre de
compreensão e ação. Não importa sua opinião, a do professor ou o
parecer do Procon, o teste estará lá e será preciso fazê-lo ou então
desistir da vaga (lembra da “redução fenomenológica”? É isso aí:
aceitar o mundo como dado e a partir daí compreendê-lo). Por
exemplo, você é chamado a fazer alguns testes para uma vaga, cujo
perfil é operacional, ou seja, cumprir ordens e fazer com que as
coisas aconteçam.
Então, lá vem o questionário para verificar se você está
adequado ou não, ao perfil. Num dos mais comuns, com nome de
mamífero matreiro, você terá longas baterias de perguntas versando
sobre como age no lazer, trabalho, escola, na rua etc. Na maioria das
vezes são duas alternativas a escolher, nem sempre compatíveis
com seu modo de ser e que precisam ser respondidas em certa
ordem.
As perguntas são invariavelmente fechadas - senão
contraditórias, eu diria - sempre do tipo: você age de forma: a)
impessoal e lógica; b) sentimental e pessoal ou c) se aborrece com
tarefas repetitivas; d) aceita bem ser liderado e por aí vai. Ora, se
você - a despeito de sua capacidade - anota nas respostas que é do
tipo sentimental ou empreendedor e estrategista, você pode até
estar dizendo a verdade sobre a imagem, a representação mental
que tem de si mesmo, mas aí a vaga já era. Por quê? Porque o perfil
pedia apenas quem obedeça e seja pontual e organizado; não quem
possa dar a entender que irá se intrometer na vida do departamento,
questionar o poder ou pretenda corrigir as estultices que encontrar
pelo caminho. Qual a relação entre ser planejador, empreendedor e
a possibilidade de não ser um bom funcionário operacional?
Nenhuma. Depende apenas de quem bolou o teste e disse que
resultados x ou y significam/apontam necessariamente a, b ou c.
Não há razão científica, apenas projeções. Entre a pergunta O que é
a Ciência afinal? E as práticas que definem conhecimento eu lembro
o que dizia Nietzsche: não há fatos, apenas interpretações.
Mais uma vez, aqui é o caso de se verificar o que quer e o
que não quer dizer o enunciado das perguntas e dos discursos.
Assim, antes de fazer qualquer teste, procure saber o perfil da vaga
ou pelo menos que lhe falem um pouco a respeito da descrição do
cargo. Depois você vai responder às perguntas de forma a dar uma
maior ênfase naquilo que está dentro do desejado por aquela
posição específica. Vai fraudar? De jeito nenhum! Testes não dizem
quem você é, apenas como está e se comporta no momento
imediatamente presente. Se você acordou saudoso, melancólico
estará propenso escolher as respostas que mais se pareçam com seu
estado de alma momentâneo e quem avaliar este teste, pode
considerá-lo um sonhador incorrigível, uma pessoa não prática. Se
você foi empurrado no metrô e destratado pela recepcionista, suas
respostas poderão levar o avaliador entender que você é algo
instável. Se você sofreu alguma decepção sentimental recente que o
44 Relação entre desejo e morte, através da dualidade do princípio de prazer e princípio de realidade. Deleuze faz uma leitura interessante do tema ao propor um monismo de fundo à insistência freudiana na dualidade constituinte. Mas isso é outro assunto...
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
8382
Desde que Freud desconfiou que existia algo além do
princípio de prazer e experimentou a associação livre de
significados (para que fosse possível romper com as resistências pré-
conscientes que guardavam os mecanismos das neuroses de
repetição) e levá-las a um patamar mais sadio das neuroses de
transferência, estancando as histerias, esta técnica foi cada vez mais
deturpada pelos pesquisadores ulteriores.
Hoje, acredita-se que se falar em cachorro quente e
chocolate ao leite no café da manhã, pode levar a identificar uma
instância psicopatológica qualquer no eterno confronto entre eros e 44thanatos. Mas os que adaptaram as técnicas psicanalíticas ao
mundo corporativo nem se preocuparam com a filosofia ou a
medicina, simplesmente, orientaram os resultados para as práticas
mais relevantes às empresas. Outro caso emblemático destes testes é
o dos questionários que lhe pedem satisfação sobre tendências
sexuais e cujas respostas podem ser inadmissíveis para alguns
sistemas de crenças ou cidadãos moralmente comuns.
Mas cuidado aí! Não são os testes os verdadeiros monstros
deste circo de horrores, pois eles servem apenas de instrumentos de
medição que em alguns casos, funcionam. Não importa assuntar
quais foram os interesses comerciais ou doutrinários por trás da
confecção destes questionários. Vamos deixar a resolução do nó
ético ou metodológico para os filósofos do porvir.
O problema real, para o candidato é sempre de
compreensão e ação. Não importa sua opinião, a do professor ou o
parecer do Procon, o teste estará lá e será preciso fazê-lo ou então
desistir da vaga (lembra da “redução fenomenológica”? É isso aí:
aceitar o mundo como dado e a partir daí compreendê-lo). Por
exemplo, você é chamado a fazer alguns testes para uma vaga, cujo
perfil é operacional, ou seja, cumprir ordens e fazer com que as
coisas aconteçam.
Então, lá vem o questionário para verificar se você está
adequado ou não, ao perfil. Num dos mais comuns, com nome de
mamífero matreiro, você terá longas baterias de perguntas versando
sobre como age no lazer, trabalho, escola, na rua etc. Na maioria das
vezes são duas alternativas a escolher, nem sempre compatíveis
com seu modo de ser e que precisam ser respondidas em certa
ordem.
As perguntas são invariavelmente fechadas - senão
contraditórias, eu diria - sempre do tipo: você age de forma: a)
impessoal e lógica; b) sentimental e pessoal ou c) se aborrece com
tarefas repetitivas; d) aceita bem ser liderado e por aí vai. Ora, se
você - a despeito de sua capacidade - anota nas respostas que é do
tipo sentimental ou empreendedor e estrategista, você pode até
estar dizendo a verdade sobre a imagem, a representação mental
que tem de si mesmo, mas aí a vaga já era. Por quê? Porque o perfil
pedia apenas quem obedeça e seja pontual e organizado; não quem
possa dar a entender que irá se intrometer na vida do departamento,
questionar o poder ou pretenda corrigir as estultices que encontrar
pelo caminho. Qual a relação entre ser planejador, empreendedor e
a possibilidade de não ser um bom funcionário operacional?
Nenhuma. Depende apenas de quem bolou o teste e disse que
resultados x ou y significam/apontam necessariamente a, b ou c.
Não há razão científica, apenas projeções. Entre a pergunta O que é
a Ciência afinal? E as práticas que definem conhecimento eu lembro
o que dizia Nietzsche: não há fatos, apenas interpretações.
Mais uma vez, aqui é o caso de se verificar o que quer e o
que não quer dizer o enunciado das perguntas e dos discursos.
Assim, antes de fazer qualquer teste, procure saber o perfil da vaga
ou pelo menos que lhe falem um pouco a respeito da descrição do
cargo. Depois você vai responder às perguntas de forma a dar uma
maior ênfase naquilo que está dentro do desejado por aquela
posição específica. Vai fraudar? De jeito nenhum! Testes não dizem
quem você é, apenas como está e se comporta no momento
imediatamente presente. Se você acordou saudoso, melancólico
estará propenso escolher as respostas que mais se pareçam com seu
estado de alma momentâneo e quem avaliar este teste, pode
considerá-lo um sonhador incorrigível, uma pessoa não prática. Se
você foi empurrado no metrô e destratado pela recepcionista, suas
respostas poderão levar o avaliador entender que você é algo
instável. Se você sofreu alguma decepção sentimental recente que o
44 Relação entre desejo e morte, através da dualidade do princípio de prazer e princípio de realidade. Deleuze faz uma leitura interessante do tema ao propor um monismo de fundo à insistência freudiana na dualidade constituinte. Mas isso é outro assunto...
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
8382
fez desacreditar temporariamente no amor e fizer o teste, o 45resultado mostrará alguém tão frio e lógico quanto um vulcano.
Sempre ao ser avaliado, confie em si mesmo, respire, controle-se e
pense somente como profissional.
Afinal, a construção de tais produtos e serviços para o fim
de seleção não é uma iniciativa isenta, ela possui pressupostos. A
busca da fraqueza e da inconsistência nos raciocínios devolutivos,
acabou criando uma orientação metodológica que despotencializa
os benefícios. No caso, mais uma vez reafirmamos que não se trata
de simplesmente afrontar os que trabalham em um dado segmento
profissional, mas sim, verificar suas práticas e conseqüências. Existe
uma lenda urbana a respeito da imparcialidade da ciência, mas isto
não corresponde à verdade, pois que qualquer objetivação, mesmo
a mais empírica é sempre precedida de uma tese que lhe indica a
direção (ou de um interesse econômico que financiou a pesquisa).
Talvez a única instância em que isso se torna possível é quando se
propõe - sempre no exemplo dos testes e sua aplicação - inicialmente
buscar o perfil atual do indivíduo e sua provável constituição, a fim
de compreendê-lo em seu momento. Mas com o significado de
buscar este perfil com fins à construção de um panorama a ser
abordado, posteriormente, sob uma perspectiva terapêutica e 46eticamente válida: um phamakós. Aqui o pressuposto justifica a
técnica, sendo esta a instância onde a ciência cumpre sua maior
missão, pois sua objetivação está direcionada a um bem geral e a
premissa se dilui, espalhando benefícios.
A premissa de mercado - a busca do perfil profissional - que
de antemão determina um x útil, já exclui de suas preocupações,
todo o restante do alfabeto pela negação através da afirmação, não
se interessando por nada mais. Esta premissa inicial invalida a
imparcialidade em vista de utilidade manifesta. Não é científica a
aplicação de quaisquer testes para fins de seleção, pois se a pesquisa
já está direcionada a um resultado predeterminado, ela é
tendenciosa. Deste modo, mesmo que o teste seja elaborado
cientificamente, a sua aplicação pode invalidar esta condição. Além
do mais, confunde causa e efeito, conteúdo e forma, pois a
somatória de tais ou quais qualidades não indica - na prática diária -
qual o grau de uso das mesmas pelo sujeito, seja em termos técnico
ou morais: tendência não é fato, assim como potência não é ato.
Deste modo, nada logicamente determina que o x exigido no perfil
idealizado não possa ser cumprido com mais eficiência por a, b ou j.
Como vêem a ignorância na distinção entre forma e
conteúdo é o que penaliza o homem, pois leva a confundir o que é
pessoa e o que é perfil, sendo que, dentro do processo, onde não se
identificar um prévio perfil de dados, ignora-se também a pessoa.
Não importa se ela possa ou não desenvolver este perfil melhor e
mais produtivamente, do que aquele em que lhe foram encontrados
tais tendências e indícios. Ninguém é x, porque possui x qualidades e
competências, este x profissional foi criado por quem deseja
encontrar alguém que aja como tal, para cuidar de seus interesses
de mercado.
O erro jurássico é creditar sub-repticiamente a práxis, que
estas qualificações sejam a pessoa: que estes indicadores lhe
constituam a realidade ontológica e não fenomênica. Que deva ser
encontrado um fariseu que as incorpore plenamente ou que possa
ser identificada a quantidade desejada de “virtudes”, quando tudo
se trata de aproximações, apenas. Cansei de ouvir: Ah! Se você fosse
mais assim... seria bem o perfil da vaga... Se você fosse mais assado
poderia ser contratado. Caiu a ficha da confusão entre o ente e o
“agente” profissional? Ser preterido por uma crença que perfis
sejam ou devam estar contidos em pessoas, de forma clara e
indubitável, senão elas não servem ou podem desenvolver estas
capacidades, devia ser considerado crime hediondo. Por estas e
outras razões, estar apto a saber jogar o jogo dos testes é
imprescindível para sua contratação. Mesmo porque a maioria se
constitui preconceito, embora a lei não tenha alcance nestes
ambientes (ainda).
Não estamos dizendo com isso que se trata de manipular
quaisquer resultados, mas estudar quais as relações entre suas reais
capacidades e experiência com o perfil determinado pela vaga e
agir em conformidade. Responderá sinceramente, no entanto, irá
mostrar que, além do estreito foco - característica principal dos 45 Vida longa e próspera, Sr.Spock!46 Medicamentos, processo de cura.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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fez desacreditar temporariamente no amor e fizer o teste, o 45resultado mostrará alguém tão frio e lógico quanto um vulcano.
Sempre ao ser avaliado, confie em si mesmo, respire, controle-se e
pense somente como profissional.
Afinal, a construção de tais produtos e serviços para o fim
de seleção não é uma iniciativa isenta, ela possui pressupostos. A
busca da fraqueza e da inconsistência nos raciocínios devolutivos,
acabou criando uma orientação metodológica que despotencializa
os benefícios. No caso, mais uma vez reafirmamos que não se trata
de simplesmente afrontar os que trabalham em um dado segmento
profissional, mas sim, verificar suas práticas e conseqüências. Existe
uma lenda urbana a respeito da imparcialidade da ciência, mas isto
não corresponde à verdade, pois que qualquer objetivação, mesmo
a mais empírica é sempre precedida de uma tese que lhe indica a
direção (ou de um interesse econômico que financiou a pesquisa).
Talvez a única instância em que isso se torna possível é quando se
propõe - sempre no exemplo dos testes e sua aplicação - inicialmente
buscar o perfil atual do indivíduo e sua provável constituição, a fim
de compreendê-lo em seu momento. Mas com o significado de
buscar este perfil com fins à construção de um panorama a ser
abordado, posteriormente, sob uma perspectiva terapêutica e 46eticamente válida: um phamakós. Aqui o pressuposto justifica a
técnica, sendo esta a instância onde a ciência cumpre sua maior
missão, pois sua objetivação está direcionada a um bem geral e a
premissa se dilui, espalhando benefícios.
A premissa de mercado - a busca do perfil profissional - que
de antemão determina um x útil, já exclui de suas preocupações,
todo o restante do alfabeto pela negação através da afirmação, não
se interessando por nada mais. Esta premissa inicial invalida a
imparcialidade em vista de utilidade manifesta. Não é científica a
aplicação de quaisquer testes para fins de seleção, pois se a pesquisa
já está direcionada a um resultado predeterminado, ela é
tendenciosa. Deste modo, mesmo que o teste seja elaborado
cientificamente, a sua aplicação pode invalidar esta condição. Além
do mais, confunde causa e efeito, conteúdo e forma, pois a
somatória de tais ou quais qualidades não indica - na prática diária -
qual o grau de uso das mesmas pelo sujeito, seja em termos técnico
ou morais: tendência não é fato, assim como potência não é ato.
Deste modo, nada logicamente determina que o x exigido no perfil
idealizado não possa ser cumprido com mais eficiência por a, b ou j.
Como vêem a ignorância na distinção entre forma e
conteúdo é o que penaliza o homem, pois leva a confundir o que é
pessoa e o que é perfil, sendo que, dentro do processo, onde não se
identificar um prévio perfil de dados, ignora-se também a pessoa.
Não importa se ela possa ou não desenvolver este perfil melhor e
mais produtivamente, do que aquele em que lhe foram encontrados
tais tendências e indícios. Ninguém é x, porque possui x qualidades e
competências, este x profissional foi criado por quem deseja
encontrar alguém que aja como tal, para cuidar de seus interesses
de mercado.
O erro jurássico é creditar sub-repticiamente a práxis, que
estas qualificações sejam a pessoa: que estes indicadores lhe
constituam a realidade ontológica e não fenomênica. Que deva ser
encontrado um fariseu que as incorpore plenamente ou que possa
ser identificada a quantidade desejada de “virtudes”, quando tudo
se trata de aproximações, apenas. Cansei de ouvir: Ah! Se você fosse
mais assim... seria bem o perfil da vaga... Se você fosse mais assado
poderia ser contratado. Caiu a ficha da confusão entre o ente e o
“agente” profissional? Ser preterido por uma crença que perfis
sejam ou devam estar contidos em pessoas, de forma clara e
indubitável, senão elas não servem ou podem desenvolver estas
capacidades, devia ser considerado crime hediondo. Por estas e
outras razões, estar apto a saber jogar o jogo dos testes é
imprescindível para sua contratação. Mesmo porque a maioria se
constitui preconceito, embora a lei não tenha alcance nestes
ambientes (ainda).
Não estamos dizendo com isso que se trata de manipular
quaisquer resultados, mas estudar quais as relações entre suas reais
capacidades e experiência com o perfil determinado pela vaga e
agir em conformidade. Responderá sinceramente, no entanto, irá
mostrar que, além do estreito foco - característica principal dos 45 Vida longa e próspera, Sr.Spock!46 Medicamentos, processo de cura.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
8584
perfis - determinado pela empresa, você tem condição de sair-se
bem nas atribuições do cargo por sua versatilidade e
adaptabilidade. Isto significa que você deve se ater à descrição do
cargo e reforçar as alternativas que tenham relação direta com suas
competências em relação ao perfil exigido. Saiba que 80% destes
testes somente são aplicados em níveis hierárquicos menores e,
portanto, no caso do exemplo que demos anteriormente, que era
uma função nitidamente administrativo-operacional, se você se
deparar com questões tipo: a) planejo meu dia antecipadamente ou
b) executo as tarefas determinadas, é lógico que deverá optar pela
segunda alternativa.
Apenas algumas respostas nessa direção são suficientes para evitar
ser excluído por crenças do tipo: quem não tem alto índice de
ambição ou testosterona não pode liderar e ser um bom chefe ou
este não serve porque respondeu que tem propensão a escutar os
problemas dos outros e isto não é muito compatível com finanças.
Portanto, nada de ficar chocado com as perguntas, analise-as e
confronte as respostas com o contexto em que são pedidas e em
relação às atribuições do cargo pretendido. Imagine-se no cargo,
suas atribuições e qual a expectativa esperada de você.
Mas veja bem: os testes repetem as perguntas em diferentes
situações, de propósito, pois eles não são ingênuos e “cercam”
aqueles que chutam ou tentam manipular os resultados. Portanto
atenção: não vá se contradizer, apenas decida-se por responder o
mais próximo possível do que é esperado pelo candidato “ideal” em
relação às suas próprias capacidades. Não entendeu? Explico: Não
importa se você é normalmente reservado, impessoal e opte por
escolher que é sociável, se isto não lhe causa problemas existenciais
e pode conviver com esta exigência. Ou seja, mais inclinado a
planejar que executar e, no entanto, concorre a uma vaga
operacional, pois mesmo tendo este ou aquele tipo de disposição na
personalidade, não há razão científica que diga que não vá se sair
bem nas funções a que se candidata.
Você pode, é claro, ter que se adaptar e modificar suas
disposições, mas isso pode lhe ser muito útil: pois se falta
“teoricamente” ao sentimental um pouco de lógica, cabe ao
analítico buscar um pouco de sentimento. O que quero dizer, enfim
é que mesmo sendo uma pedra de gelo, você conseguiria se
imaginar como uma pessoa leal, produtiva, comprometida com a
equipe e a empresa? Se você pode imaginar ou sentir que sim, então
tasque lá a resposta mais apropriada a partir deste ponto de vista
pragmático e não pessoal. Esqueça por um momento como é agora
e concentre-se no que poderia ser e fazer com qualidade e
satisfação, embora seja distinto de suas preferências atuais. Se não
consegue nem pensar no assunto, então a vaga não é para você.
Deixe a questão em branco.
Finalmente, e não menos importante é dizer que o teste de
associação descontínua, ou livre, não tem respostas certas ou 47erradas. O que eles medem são tendências comportamentais. Por
isso não devem ser interpretados como valorativos, apenas como
indicadores. Daí que aquele candidato que se detém a analisar as
perguntas do ponto de vista de sua real adequação e não de seus
valores e crenças, pode direcionar as respostas para um patamar
mais próximo do perfil desejado pela vaga. Resumindo: verdade
não é apenas o que se acredita como tal, mas também, condição de
possibilidade de que as coisas sejam daquele jeito. Um dos exemplos
clássicos é aquele tipo de questionário que exige ser respondido de
dois pontos de vista: o seu e dos empregadores/equipe. São muitas
perguntas tipo como os outros o vêem ou o que esperam de você e o
que você vê ou espera que os outros esperem de você.
Muitas pessoas (eu mesmo, inclusive), têm inclinação de
marcar a maioria das ocorrências possíveis de ambos os lados, por
uma questão de abrangência e experiências anteriores. Mas isto não
corresponde à verdade, pois nem todos ficam prestando a atenção
ao que fazemos o dia inteiro. Portanto, se você responder um monte
de quesitos, pode ter certeza de que estará dizendo ao selecionador:
tenho medo que isso aconteça, me cobro demais, já vi situações
47 Mesmo que os neurofisiólogos, psicólogos evolutivos e céticos atuais esperneiem, eles ainda debatem o problema bergsoniano. Claro que em “Matéria e Memória” Bergson criticava a justaposição de estados de consciência, ou seja: não somos causados por secreções, enzimas ou hormônios. Atualizando a biologia, estamos na discussão sobre se somos ou não sinapses e redes neurais. Além do mais, behavioristas e radicais de toda a espécie também falharam, inclusive sociólogos e economistas. Deste modo, apenas podemos consentir, cientificamente (e Chalmers nos ajude) que mensuramos aglomerados de tendências e padrões não repetitivos. A filosofia progride, sempre!
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
8786
perfis - determinado pela empresa, você tem condição de sair-se
bem nas atribuições do cargo por sua versatilidade e
adaptabilidade. Isto significa que você deve se ater à descrição do
cargo e reforçar as alternativas que tenham relação direta com suas
competências em relação ao perfil exigido. Saiba que 80% destes
testes somente são aplicados em níveis hierárquicos menores e,
portanto, no caso do exemplo que demos anteriormente, que era
uma função nitidamente administrativo-operacional, se você se
deparar com questões tipo: a) planejo meu dia antecipadamente ou
b) executo as tarefas determinadas, é lógico que deverá optar pela
segunda alternativa.
Apenas algumas respostas nessa direção são suficientes para evitar
ser excluído por crenças do tipo: quem não tem alto índice de
ambição ou testosterona não pode liderar e ser um bom chefe ou
este não serve porque respondeu que tem propensão a escutar os
problemas dos outros e isto não é muito compatível com finanças.
Portanto, nada de ficar chocado com as perguntas, analise-as e
confronte as respostas com o contexto em que são pedidas e em
relação às atribuições do cargo pretendido. Imagine-se no cargo,
suas atribuições e qual a expectativa esperada de você.
Mas veja bem: os testes repetem as perguntas em diferentes
situações, de propósito, pois eles não são ingênuos e “cercam”
aqueles que chutam ou tentam manipular os resultados. Portanto
atenção: não vá se contradizer, apenas decida-se por responder o
mais próximo possível do que é esperado pelo candidato “ideal” em
relação às suas próprias capacidades. Não entendeu? Explico: Não
importa se você é normalmente reservado, impessoal e opte por
escolher que é sociável, se isto não lhe causa problemas existenciais
e pode conviver com esta exigência. Ou seja, mais inclinado a
planejar que executar e, no entanto, concorre a uma vaga
operacional, pois mesmo tendo este ou aquele tipo de disposição na
personalidade, não há razão científica que diga que não vá se sair
bem nas funções a que se candidata.
Você pode, é claro, ter que se adaptar e modificar suas
disposições, mas isso pode lhe ser muito útil: pois se falta
“teoricamente” ao sentimental um pouco de lógica, cabe ao
analítico buscar um pouco de sentimento. O que quero dizer, enfim
é que mesmo sendo uma pedra de gelo, você conseguiria se
imaginar como uma pessoa leal, produtiva, comprometida com a
equipe e a empresa? Se você pode imaginar ou sentir que sim, então
tasque lá a resposta mais apropriada a partir deste ponto de vista
pragmático e não pessoal. Esqueça por um momento como é agora
e concentre-se no que poderia ser e fazer com qualidade e
satisfação, embora seja distinto de suas preferências atuais. Se não
consegue nem pensar no assunto, então a vaga não é para você.
Deixe a questão em branco.
Finalmente, e não menos importante é dizer que o teste de
associação descontínua, ou livre, não tem respostas certas ou 47erradas. O que eles medem são tendências comportamentais. Por
isso não devem ser interpretados como valorativos, apenas como
indicadores. Daí que aquele candidato que se detém a analisar as
perguntas do ponto de vista de sua real adequação e não de seus
valores e crenças, pode direcionar as respostas para um patamar
mais próximo do perfil desejado pela vaga. Resumindo: verdade
não é apenas o que se acredita como tal, mas também, condição de
possibilidade de que as coisas sejam daquele jeito. Um dos exemplos
clássicos é aquele tipo de questionário que exige ser respondido de
dois pontos de vista: o seu e dos empregadores/equipe. São muitas
perguntas tipo como os outros o vêem ou o que esperam de você e o
que você vê ou espera que os outros esperem de você.
Muitas pessoas (eu mesmo, inclusive), têm inclinação de
marcar a maioria das ocorrências possíveis de ambos os lados, por
uma questão de abrangência e experiências anteriores. Mas isto não
corresponde à verdade, pois nem todos ficam prestando a atenção
ao que fazemos o dia inteiro. Portanto, se você responder um monte
de quesitos, pode ter certeza de que estará dizendo ao selecionador:
tenho medo que isso aconteça, me cobro demais, já vi situações
47 Mesmo que os neurofisiólogos, psicólogos evolutivos e céticos atuais esperneiem, eles ainda debatem o problema bergsoniano. Claro que em “Matéria e Memória” Bergson criticava a justaposição de estados de consciência, ou seja: não somos causados por secreções, enzimas ou hormônios. Atualizando a biologia, estamos na discussão sobre se somos ou não sinapses e redes neurais. Além do mais, behavioristas e radicais de toda a espécie também falharam, inclusive sociólogos e economistas. Deste modo, apenas podemos consentir, cientificamente (e Chalmers nos ajude) que mensuramos aglomerados de tendências e padrões não repetitivos. A filosofia progride, sempre!
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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assim e não gostei, o inferno são os outros eles me vigiam o tempo
todo, entre outras. O ideal nestas situações é fazer uma criteriosa
seleção e marcar apenas as respostas realmente mais importantes,
selecionando três campos: profissional, comportamento,
expectativas assim você constrói um perfil neutro e focado. De vinte
e tantas, responda pelo menos um quarto, o resto deixe para lá. Se
tiver que escolher entre ser compreensivo e organizado, não hesite
em optar pela segunda hipótese. Não se esqueça que estes testes
mostram também os chamados “níveis de energia”, portanto nunca
se esqueça de colocar pelo menos uma resposta do tipo sou firme,
objetivo ou entusiasta na parte pessoal, pois se não colocar podem
interpretar como uma pessoa desanimada. Nem sempre menos é
mais.
Como já dissemos, se você não é do tipo mandão ou
controlador, mas sente que é capaz de agir assim, bem como
continuar a desenvolver suas habilidades em liderar e conseguir
resultados não hesite em responder que possui esta capacidade. Se
não é o caso, se você nem se imagina liderando alguém, planejando
corte de custos ou abominaria desenvolver a capacidade necessária
para ficar mexendo o dia inteiro em arquivos, então esqueça o
assunto, pois será flagrado como contraditório pelo entrevistador.
Seja verdadeiro com seus potenciais, ao mesmo tempo em que é
verdadeiro com suas preferências, habilidades e experiências e a
vaga poderá ser sua.
4 - Você é apenas aquilo que escreve na Redação:
Outro indicador importante dos processos de seleção é a expressão
estruturada de idéias, análise e impressões sobre um tema dado.
Estas competências são geralmente avaliadas através de uma
redação, instrumento que permite verificar com bastante
profundidade as competências e nível cultural de um candidato.
Escrever, assim como falar, também é uma arte que deve ser
cultivada em toda a sua extensão, seja pelo amor ao conhecimento,
respeito às normas cultas e gramaticalmente aceitas, seja por mera
necessidade prática. Com certeza o discurso, suma condição de
possibilidade para realizar-se a comunicação dentro da sociedade,
dá-se de forma intersubjetiva, ou seja: falamos algo que alguém
possa compreender, nos dirigindo para além de nós mesmos.
Também se dá como àquilo que seja registrado em signos
identificáveis, portadores de um sentido inteligível a qualquer ente
que fale a mesma linguagem ou partilhe a mesma cultura. Ao lado
da necessidade de que nossas mensagens sejam compreensíveis,
coloca-se a obrigação de que elas possuam condições suficientes
para que isso possa acontecer. Falar um bom português é o mínimo
que se exige de um brasileiro.
Mas, embora todo o universo conspire para que as pessoas
possam se expressar de forma correta e conveniente, muitos ainda
estão longe de dominar satisfatoriamente sua língua natal. É preciso
um esforço para ilustrar-se. Tudo bem! Tudo bem! Eu sei que no
Brasil, existem 90 milhões sem ação, verdadeiro exército de
analfabetos funcionais. Isto é fruto, claro, das condições histórico-
culturais, das desigualdades econômicas, do sucateamento do
Estado e toda a parafernália retórica sobre o assunto, mas eu prefiro
crer que isto é apenas uma parte do problema. No fundo destas
questões mais complexas, se esconde um elemento mais soturno,
afinal seja quem ou quais grupos detenham o poder, este é sempre
estabelecido sobre uma linguagem que legitima a sua manutenção,
portanto, quem souber decifrar esta linguagem, está apto a partilhar
do mesmo poder ou controlar e interferir em seus mecanismos! No
mínimo, terá clareza sobre tudo o que se passa. Isto eles não
querem, de jeito nenhum. Quanto menos mãos alcançam o tacho
de marmelo, mais sobra de doce.
Deixando as teorias da conspiração de lado e voltando à
simples redação, a sua importância, seja em vestibulares ou
processos de seleção é a mesma: você é aquilo que escreve. A
totalidade de seu horizonte de eventos e possibilidades está ali,
impresso pelas suas próprias mãos. Saber o que fazer, então é
fundamental. Mas, ao contrário do que pensam - e
lamentavelmente do que fazem por aí - precisamos separar o que é
natureza da obra produzida, das reais intenções do seu autor.
Expressar-se corretamente é uma coisa, passível de análise e
mensuração, conforme dissemos acima. Interpretação de textos é
outro departamento e não leva em conta a estrutura formal daquilo
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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assim e não gostei, o inferno são os outros eles me vigiam o tempo
todo, entre outras. O ideal nestas situações é fazer uma criteriosa
seleção e marcar apenas as respostas realmente mais importantes,
selecionando três campos: profissional, comportamento,
expectativas assim você constrói um perfil neutro e focado. De vinte
e tantas, responda pelo menos um quarto, o resto deixe para lá. Se
tiver que escolher entre ser compreensivo e organizado, não hesite
em optar pela segunda hipótese. Não se esqueça que estes testes
mostram também os chamados “níveis de energia”, portanto nunca
se esqueça de colocar pelo menos uma resposta do tipo sou firme,
objetivo ou entusiasta na parte pessoal, pois se não colocar podem
interpretar como uma pessoa desanimada. Nem sempre menos é
mais.
Como já dissemos, se você não é do tipo mandão ou
controlador, mas sente que é capaz de agir assim, bem como
continuar a desenvolver suas habilidades em liderar e conseguir
resultados não hesite em responder que possui esta capacidade. Se
não é o caso, se você nem se imagina liderando alguém, planejando
corte de custos ou abominaria desenvolver a capacidade necessária
para ficar mexendo o dia inteiro em arquivos, então esqueça o
assunto, pois será flagrado como contraditório pelo entrevistador.
Seja verdadeiro com seus potenciais, ao mesmo tempo em que é
verdadeiro com suas preferências, habilidades e experiências e a
vaga poderá ser sua.
4 - Você é apenas aquilo que escreve na Redação:
Outro indicador importante dos processos de seleção é a expressão
estruturada de idéias, análise e impressões sobre um tema dado.
Estas competências são geralmente avaliadas através de uma
redação, instrumento que permite verificar com bastante
profundidade as competências e nível cultural de um candidato.
Escrever, assim como falar, também é uma arte que deve ser
cultivada em toda a sua extensão, seja pelo amor ao conhecimento,
respeito às normas cultas e gramaticalmente aceitas, seja por mera
necessidade prática. Com certeza o discurso, suma condição de
possibilidade para realizar-se a comunicação dentro da sociedade,
dá-se de forma intersubjetiva, ou seja: falamos algo que alguém
possa compreender, nos dirigindo para além de nós mesmos.
Também se dá como àquilo que seja registrado em signos
identificáveis, portadores de um sentido inteligível a qualquer ente
que fale a mesma linguagem ou partilhe a mesma cultura. Ao lado
da necessidade de que nossas mensagens sejam compreensíveis,
coloca-se a obrigação de que elas possuam condições suficientes
para que isso possa acontecer. Falar um bom português é o mínimo
que se exige de um brasileiro.
Mas, embora todo o universo conspire para que as pessoas
possam se expressar de forma correta e conveniente, muitos ainda
estão longe de dominar satisfatoriamente sua língua natal. É preciso
um esforço para ilustrar-se. Tudo bem! Tudo bem! Eu sei que no
Brasil, existem 90 milhões sem ação, verdadeiro exército de
analfabetos funcionais. Isto é fruto, claro, das condições histórico-
culturais, das desigualdades econômicas, do sucateamento do
Estado e toda a parafernália retórica sobre o assunto, mas eu prefiro
crer que isto é apenas uma parte do problema. No fundo destas
questões mais complexas, se esconde um elemento mais soturno,
afinal seja quem ou quais grupos detenham o poder, este é sempre
estabelecido sobre uma linguagem que legitima a sua manutenção,
portanto, quem souber decifrar esta linguagem, está apto a partilhar
do mesmo poder ou controlar e interferir em seus mecanismos! No
mínimo, terá clareza sobre tudo o que se passa. Isto eles não
querem, de jeito nenhum. Quanto menos mãos alcançam o tacho
de marmelo, mais sobra de doce.
Deixando as teorias da conspiração de lado e voltando à
simples redação, a sua importância, seja em vestibulares ou
processos de seleção é a mesma: você é aquilo que escreve. A
totalidade de seu horizonte de eventos e possibilidades está ali,
impresso pelas suas próprias mãos. Saber o que fazer, então é
fundamental. Mas, ao contrário do que pensam - e
lamentavelmente do que fazem por aí - precisamos separar o que é
natureza da obra produzida, das reais intenções do seu autor.
Expressar-se corretamente é uma coisa, passível de análise e
mensuração, conforme dissemos acima. Interpretação de textos é
outro departamento e não leva em conta a estrutura formal daquilo
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que se quis dizer, mas principalmente, o sentido e a lógica interna do
texto. Mesmo tendo o texto, como obra, vida própria e distinta de
quem o fez, carrega seu estilo e pertence a um gênero. Mesmo aí
existem regras que devem ser obedecidas, em função, não de um
arbítrio, mas da finalidade. Nosso interesse é exorcizar alguns tabus
sobre as redações, reconhecendo, ao mesmo tempo seu estatuto.
Primeiro item: Redação não é romance, poesia, conto ou e-mail.
Redação é prosa curta e deve conter começo, meio e fim, seguindo
um tema que pode ser livre ou não. Ao redigir, você deve usar
corretamente os sinais ortográficos, evitar construções
gramaticalmente incoerentes, rimas, ditos ou expressões 48populares. Usar sintaxes eletrônicas, tbém naum eh lgaw, muito
menos escrever aquilo que na hora vier na telha. Não é tão longa
quanto a história de sua vida ou deve versar sobre seus desejos e
opiniões, mas estritamente demonstrar sua análise sobre aquilo que
foi pedido. Em alguns processos seletivos, exige-se determinado
número de linhas e que o candidato assine ou coloque seu nome no
final. A regra corporativa mais essencial é a da obediência, desse
modo, se pedirem para você escrever vinte linhas, não passe ou
fique muito aquém deste limite.
Segundo item: Como não se trata de concurso literário, o que será
verificado pelo selecionador, além do solicitado é se alguma
experiência ou traço de personalidade aproveitável e adequado ao
perfil da vaga pode ser encontrado em sua opinião. Aí é que entra a
sabedoria daquele que, mesmo instado a escrever sobre flores na
primavera, possa relacionar o tema - de algum modo criativo - com
suas competências, visão otimista e produtiva de atuar no mundo.
Versatilidade, criatividade, originalidade e estilo também são partes
importantes da construção de um texto. Além disso, busca-se
verificar como se estrutura sua opinião, se sabe defender seus
pontos de vista, se os argumentos são razoáveis e tudo o mais. Se
você gosta ou não de flores, não é problema de quem seleciona, mas
como no caso, estamos lidando não só com a técnica e
conhecimento, mas com interpretações, sempre é bom lembrar do
velho teste de desenhar uma casinha e uma árvore. Aí você, que mal
sabe desenhar e nem tem noção das leis da perspectiva, vai lá e
rabisca uma casinha e um coqueiro, pois o seu sonho de consumo
sempre foi ter uma casa na praia e isto demonstra persistência e
vontade. Danou-se! Aquilo que à primeira vista parecia algo
virtuoso ou elogioso se transforma em pesadelo.
Interpretação: A casinha é tida como o seu eu, se for torta ou mal
ajambrada, faltando uma porta, você será considerado relapso,
inseguro, instável, irresponsável (construiu uma casa na areia). Já o
coqueiro é a pá de cal na sua ingênua pretensão à vaga, pois, dizem
os doutos, que isto significa a falta de raízes e de estrutura sólida em
suas pretensões de vida. Fuja dos estereótipos e cuidado com tudo o
que fala, escreve, pensa ou sente, pois pode ser usado contra você.
Acredite, se quiser!
Terceiro Item: Do que já foi exposto, cabe relacionar que, da mesma
forma com que trabalhamos com metáforas e conceitos na
construção de um texto, estes devem ser bem colocados para evitar
desastres. Fazer analogias ou comparações é algo que deve ser
estudado antes de se colocar no papel. Uma coisa é fazer uma
aproximação relevante com fatos e circunstâncias, transferindo as
qualidades de uma coisa para a outra, para reforçar o sentido de
compreensão ou amplitude de contexto. Outra coisa é dizer algo
sobre aquilo que não se sabe ou não domina no idioma, correndo o
risco de afirmar que alhos são iguais a bugalhos. Neste ponto evite
ao máximo as construções cheias de “estilo” ou frases de efeito:
muitas delas podem simplesmente nada significar. Acima do
vocabulário ornamental, existe o sentido, que é dado pela boa
cultura (geral e específica) e são mais importantes para tornar
compreensível quaisquer discursos que palavras rebuscadas. Textos
objetivos devem ser claros: é melhor utilizar o pouco que se sabe,
construindo um texto bem estruturado, onde se possa localizar suas
idéias com facilidade, do que pecar pelo exagero e obscuridade:
afaste o risco de parecer pedante ou incorrer em situações de non-
sense.48 Se for o caso e couber no que estiver discorrendo, use sempre aspas.
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que se quis dizer, mas principalmente, o sentido e a lógica interna do
texto. Mesmo tendo o texto, como obra, vida própria e distinta de
quem o fez, carrega seu estilo e pertence a um gênero. Mesmo aí
existem regras que devem ser obedecidas, em função, não de um
arbítrio, mas da finalidade. Nosso interesse é exorcizar alguns tabus
sobre as redações, reconhecendo, ao mesmo tempo seu estatuto.
Primeiro item: Redação não é romance, poesia, conto ou e-mail.
Redação é prosa curta e deve conter começo, meio e fim, seguindo
um tema que pode ser livre ou não. Ao redigir, você deve usar
corretamente os sinais ortográficos, evitar construções
gramaticalmente incoerentes, rimas, ditos ou expressões 48populares. Usar sintaxes eletrônicas, tbém naum eh lgaw, muito
menos escrever aquilo que na hora vier na telha. Não é tão longa
quanto a história de sua vida ou deve versar sobre seus desejos e
opiniões, mas estritamente demonstrar sua análise sobre aquilo que
foi pedido. Em alguns processos seletivos, exige-se determinado
número de linhas e que o candidato assine ou coloque seu nome no
final. A regra corporativa mais essencial é a da obediência, desse
modo, se pedirem para você escrever vinte linhas, não passe ou
fique muito aquém deste limite.
Segundo item: Como não se trata de concurso literário, o que será
verificado pelo selecionador, além do solicitado é se alguma
experiência ou traço de personalidade aproveitável e adequado ao
perfil da vaga pode ser encontrado em sua opinião. Aí é que entra a
sabedoria daquele que, mesmo instado a escrever sobre flores na
primavera, possa relacionar o tema - de algum modo criativo - com
suas competências, visão otimista e produtiva de atuar no mundo.
Versatilidade, criatividade, originalidade e estilo também são partes
importantes da construção de um texto. Além disso, busca-se
verificar como se estrutura sua opinião, se sabe defender seus
pontos de vista, se os argumentos são razoáveis e tudo o mais. Se
você gosta ou não de flores, não é problema de quem seleciona, mas
como no caso, estamos lidando não só com a técnica e
conhecimento, mas com interpretações, sempre é bom lembrar do
velho teste de desenhar uma casinha e uma árvore. Aí você, que mal
sabe desenhar e nem tem noção das leis da perspectiva, vai lá e
rabisca uma casinha e um coqueiro, pois o seu sonho de consumo
sempre foi ter uma casa na praia e isto demonstra persistência e
vontade. Danou-se! Aquilo que à primeira vista parecia algo
virtuoso ou elogioso se transforma em pesadelo.
Interpretação: A casinha é tida como o seu eu, se for torta ou mal
ajambrada, faltando uma porta, você será considerado relapso,
inseguro, instável, irresponsável (construiu uma casa na areia). Já o
coqueiro é a pá de cal na sua ingênua pretensão à vaga, pois, dizem
os doutos, que isto significa a falta de raízes e de estrutura sólida em
suas pretensões de vida. Fuja dos estereótipos e cuidado com tudo o
que fala, escreve, pensa ou sente, pois pode ser usado contra você.
Acredite, se quiser!
Terceiro Item: Do que já foi exposto, cabe relacionar que, da mesma
forma com que trabalhamos com metáforas e conceitos na
construção de um texto, estes devem ser bem colocados para evitar
desastres. Fazer analogias ou comparações é algo que deve ser
estudado antes de se colocar no papel. Uma coisa é fazer uma
aproximação relevante com fatos e circunstâncias, transferindo as
qualidades de uma coisa para a outra, para reforçar o sentido de
compreensão ou amplitude de contexto. Outra coisa é dizer algo
sobre aquilo que não se sabe ou não domina no idioma, correndo o
risco de afirmar que alhos são iguais a bugalhos. Neste ponto evite
ao máximo as construções cheias de “estilo” ou frases de efeito:
muitas delas podem simplesmente nada significar. Acima do
vocabulário ornamental, existe o sentido, que é dado pela boa
cultura (geral e específica) e são mais importantes para tornar
compreensível quaisquer discursos que palavras rebuscadas. Textos
objetivos devem ser claros: é melhor utilizar o pouco que se sabe,
construindo um texto bem estruturado, onde se possa localizar suas
idéias com facilidade, do que pecar pelo exagero e obscuridade:
afaste o risco de parecer pedante ou incorrer em situações de non-
sense.48 Se for o caso e couber no que estiver discorrendo, use sempre aspas.
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Portanto, de todos os mecanismos de avaliação existentes,
a redação é o que melhor expressa a condição geral de um
candidato, uma vez que se trata da forma pela qual a pessoa emite
seus juízos sobre algo ou alguém. Assim é importante que o texto seja
construído de forma a permitir que um terceiro que o leia,
compreenda exatamente o que se quis dizer. É claro que em função
da clareza e objetividade não se deva compor frases telegráficas ou
mesmo lacônicas. O que se pretende em uma redação é que exista
“um contar de histórias”, que seja relevante, que faça sentido e,
onde os raciocínios e opiniões ali expressos possuam lógica e
justificação entre si. Faça isso!
5 - Dinâmicas: Dados Imediatos sobre o Ridículo em Grupo:
Para melhor confrontar a realidade expressa no título acima, com o
que pensam os especialistas, vamos ver inicialmente as definições
tradicionais e depois voltaremos ao que interessa:
Seja no âmbito das escolas construtivistas ou não, da educação, da
formação e do trabalho com equipes existem técnicas conhecidas
como “dinâmicas de grupo”, as quais têm como objetivo primordial
facilitar e promover inter-relações interpessoais e individuais. No
plano teórico, estas atividades contribuem para facilitar e
aperfeiçoar a ação dos grupos, em virtude do seu poder de ativação
dos impulsos e motivações individuais e de estimulação tanto da
dinâmica interna (indivíduo - grupo) como da externa (grupo -
grupos), de forma a potenciar a integração das forças existentes no
grupo e as direcionarem para as metas estabelecidas.
Alguns analistas e comentadores as classificam como:
"Qualquer situação em que você reúna pessoas para uma atividade 49conjunta, com um objetivo específico, caracteriza uma dinâmica".
A meu ver, esta descrição é tão genérica que serve até para definir as
atividades de uma diretoria, facção, quadrilha, lobby de construtora
ou grupo de políticos. Mas, segundo eles, dinâmica é a atividade que
leva o grupo a uma movimentação, a um trabalho em que se
perceba, por exemplo, como cada pessoa se comporta no coletivo,
como é a comunicação, o nível de iniciativa, a liderança, o processo
de pensamento, o nível de frustração, se aceita bem o fato de não ter
sua idéia levada em conta. Enfim, trata-se de um processo dirigido
de observação onde os selecionadores procuram descobrir e
avaliar como as pessoas do grupo se comportam em relação a cada
componente e vice-versa. O problema não é a teoria, mas como por
ser “apropriada”.
Estas atividades são subdivididas em “momentos”, onde se
procura guiar os acontecimentos. Em sua forma estrutural,
assemelha-se aos laboratórios de teatro, mas sem nenhuma função
estética ou lúdica. Nestes jogos corporativos mergulha-se no
universo dos conceitos-minuto que se pretendem suficiente em si
para ditar as regras a toda consciência, comportamento ou função.
Estes muitos e imensos edifícios feitos de leis, modos, memórias,
imagens, crenças e valores estão no centro desta paisagem onírica e
mutável. Uma atmosfera inquieta ronda o local suspeito onde será
realizada a competição, em nossos dias tão civilizada, pois não mata
ou maltrata, apenas exclui, demite e isola aquele considerado
culpado de estar distante do perfil. Neste instante, na mente de 50todos os que estão presentes na sala 101 não cala a pergunta: Será
que tem alguém aqui melhor que eu? Mas deixemos você curioso e
falaremos disso mais para frente.
As fases normais de uma dinâmica são um pouco variadas
em ordem, mas contém pelo menos algumas situações padrão, que
são: a apresentação, o entrosamento e a atividade principal. Na
primeira é usual que o candidato dirija-se ao grupo e diga quem “é”,
“quais” seus principais feitos e sua história resumida. No
aquecimento, quebra-se o gelo e procura-se fazer os candidatos
interagirem, como, por exemplo, formando equipes. A atividade
principal pode ser qualquer coisa, desde a criação de um produto, a
execução de um projeto, uma campanha de marketing ou operação
logística. Propõe-se aos candidatos que tenham criatividade, jogo
de cintura, dinamismo, clareza de idéias, conhecimento do
mercado, visão, comportamento em relação ao grupo, sintonia, e o
49 Tatiana Wernikoff, IPO - Instituto de Psicologia Organizacional in www.grandesprofissionais.com.br
50 A temida sala de tortura de 1984, George Orwell, o “inventor” do Big Brother.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
9392
Portanto, de todos os mecanismos de avaliação existentes,
a redação é o que melhor expressa a condição geral de um
candidato, uma vez que se trata da forma pela qual a pessoa emite
seus juízos sobre algo ou alguém. Assim é importante que o texto seja
construído de forma a permitir que um terceiro que o leia,
compreenda exatamente o que se quis dizer. É claro que em função
da clareza e objetividade não se deva compor frases telegráficas ou
mesmo lacônicas. O que se pretende em uma redação é que exista
“um contar de histórias”, que seja relevante, que faça sentido e,
onde os raciocínios e opiniões ali expressos possuam lógica e
justificação entre si. Faça isso!
5 - Dinâmicas: Dados Imediatos sobre o Ridículo em Grupo:
Para melhor confrontar a realidade expressa no título acima, com o
que pensam os especialistas, vamos ver inicialmente as definições
tradicionais e depois voltaremos ao que interessa:
Seja no âmbito das escolas construtivistas ou não, da educação, da
formação e do trabalho com equipes existem técnicas conhecidas
como “dinâmicas de grupo”, as quais têm como objetivo primordial
facilitar e promover inter-relações interpessoais e individuais. No
plano teórico, estas atividades contribuem para facilitar e
aperfeiçoar a ação dos grupos, em virtude do seu poder de ativação
dos impulsos e motivações individuais e de estimulação tanto da
dinâmica interna (indivíduo - grupo) como da externa (grupo -
grupos), de forma a potenciar a integração das forças existentes no
grupo e as direcionarem para as metas estabelecidas.
Alguns analistas e comentadores as classificam como:
"Qualquer situação em que você reúna pessoas para uma atividade 49conjunta, com um objetivo específico, caracteriza uma dinâmica".
A meu ver, esta descrição é tão genérica que serve até para definir as
atividades de uma diretoria, facção, quadrilha, lobby de construtora
ou grupo de políticos. Mas, segundo eles, dinâmica é a atividade que
leva o grupo a uma movimentação, a um trabalho em que se
perceba, por exemplo, como cada pessoa se comporta no coletivo,
como é a comunicação, o nível de iniciativa, a liderança, o processo
de pensamento, o nível de frustração, se aceita bem o fato de não ter
sua idéia levada em conta. Enfim, trata-se de um processo dirigido
de observação onde os selecionadores procuram descobrir e
avaliar como as pessoas do grupo se comportam em relação a cada
componente e vice-versa. O problema não é a teoria, mas como por
ser “apropriada”.
Estas atividades são subdivididas em “momentos”, onde se
procura guiar os acontecimentos. Em sua forma estrutural,
assemelha-se aos laboratórios de teatro, mas sem nenhuma função
estética ou lúdica. Nestes jogos corporativos mergulha-se no
universo dos conceitos-minuto que se pretendem suficiente em si
para ditar as regras a toda consciência, comportamento ou função.
Estes muitos e imensos edifícios feitos de leis, modos, memórias,
imagens, crenças e valores estão no centro desta paisagem onírica e
mutável. Uma atmosfera inquieta ronda o local suspeito onde será
realizada a competição, em nossos dias tão civilizada, pois não mata
ou maltrata, apenas exclui, demite e isola aquele considerado
culpado de estar distante do perfil. Neste instante, na mente de 50todos os que estão presentes na sala 101 não cala a pergunta: Será
que tem alguém aqui melhor que eu? Mas deixemos você curioso e
falaremos disso mais para frente.
As fases normais de uma dinâmica são um pouco variadas
em ordem, mas contém pelo menos algumas situações padrão, que
são: a apresentação, o entrosamento e a atividade principal. Na
primeira é usual que o candidato dirija-se ao grupo e diga quem “é”,
“quais” seus principais feitos e sua história resumida. No
aquecimento, quebra-se o gelo e procura-se fazer os candidatos
interagirem, como, por exemplo, formando equipes. A atividade
principal pode ser qualquer coisa, desde a criação de um produto, a
execução de um projeto, uma campanha de marketing ou operação
logística. Propõe-se aos candidatos que tenham criatividade, jogo
de cintura, dinamismo, clareza de idéias, conhecimento do
mercado, visão, comportamento em relação ao grupo, sintonia, e o
49 Tatiana Wernikoff, IPO - Instituto de Psicologia Organizacional in www.grandesprofissionais.com.br
50 A temida sala de tortura de 1984, George Orwell, o “inventor” do Big Brother.
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principal, de que forma cada integrante contribui para isso. Outras
avaliações levam em conta as posturas corporais, capacidade de
argumentação, conhecimento do assunto proposto, estratégia e
poder de negociação, relacionamento interpessoal, facilidade de
expor idéias, maturidade e nível cultural.
O objetivo é checar capacidade de compreensão, de
síntese, liderança, habilidade analítica, aceitação do que foi exposto
pelos oponentes, poder de negociação, coesão do grupo e
maturidade.
Não bastasse este elenco de pretensões, ainda procura-se
definir as crenças, ações e opções. Para isso escora-se em axiomas
interpretativos, tais como se fossem verdadeiros veredictos: diante
de uma situação em que um barco está afundando, lança-se a
pergunta: a quem você salvaria? O mediador diz o perfil de cada um
dos ocupantes do barco e cada candidato faz sua escolha. Seria a
menina surda? O sacerdote? O criminoso armado? A grávida
doente? O executivo forte? Salvaria a si mesmo?
Esse tipo de dinâmica visa identificar os seus valores
determinantes (econômico, religioso, humano) e se você é uma
pessoa mais sonhadora, prática, organizada ou desregrada. E as
bases para isso são dadas por suas escolhas e comportamento a
respeito de quem se salva no barco afundando ou em quais objetos 51você levaria para a Lua. Como diria o Sr. Spock: Fascinante!
Agora que conhecemos a opinião corrente no universo de
Recursos Humanos, tanto em sua descrição funcional quanto em
sua colorida utopia, vamos ao que realmente querem dizer estas
afirmações e também o não afirmado - mas implícito - nas condições
dos dados imediatos da consciência no ambiente de laboratório, ou
seja: no ambiente das manifestações empíricas e mensuráveis, onde
mais uma vez, notamos (como qualquer cientista sabe) que as
condições de experimentação podem significar o sucesso ou
fracasso da experiência. Esta situação pode determinar a priori,
além dos valores de verdade, a validade das respostas obtidas.
Imagine uma cepa de bactérias a serem modificadas geneticamente
em uma empresa bioquímica e que estejam elas, acondicionadas
em um recipiente não-estéril, de qualquer forma contaminado por
algum elemento estranho.
Uma vez efetuada a experiência, a mesma será invalidada,
pois sua execução não preenche as condições ideais, necessárias e
cientificamente aceitáveis: ela, no caso, não é isenta na construção
de seus valores de verdade por um erro operacional. Uma segunda
conseqüência seria a de não poder repetir-se a mesma experiência,
sem resultados discrepantes, caso fosse esterilizado o recipiente. O
terceiro ponto é inferir que o método experimental contém uma
verdade empírica valorativa, ou seja: a razão não permite, pelo erro
de princípio, generalizar em lei os resultados obtidos, nem se
admitirá - até novos testes - que o monstro porventura criado na
experiência com bactérias seja algo fora o resultado necessário que
ocorre quando se misturam as substâncias a ou b, ou se faz isto ou
aquilo, já que se defende justamente o contrário. Onde há
inconsistência lógico-metodológica? Ela está justamente onde falha
a ciência no campo de verdades que interessam ao homem: Na
aplicação adequada, na generalização dos conceitos, na qualidade
desta aplicação, conforme existam mais ou menos condições
normais de temperatura, pressão e conhecimento.
Para melhor entender o escopo do que chamamos ciência,
vejamos uma interessante opinião sobre seus aspectos de
desenvolvimento e contínuo progresso: “A falha está em pensar que
esse progresso seja real. A ciência, no geral, chega mais perto da
verdade do mundo que outros sistemas de crença, é nós temos
testemunhado seu sucesso pragmático em aumentar o poder
humano. Mas, do ponto de vista ético, o conhecimento é neutro,
desprovido de valor - pode tanto nos levar a realizações
maravilhosas quanto atender a propósitos terríveis... A ciência não é 52essencial para a felicidade”.
Trocando em miúdos, isto quer dizer que um produto da
ciência, não pode ser também imparcial, seja artefato, tese ou
técnica, já que a forma de uso imputa ao mesmo uma direção, um
valor moral ou a ausência deste. Mas, isso significa que também não 51 Fico imaginando quanta metodologia é necessária para criar um teste destes para o “mercado” e o que seria mensurado objetivamente no curso dos acontecimentos (e não me venham com esta de “campo do fluir”...). 52 John Gray in Veja de 23/11/2005.
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principal, de que forma cada integrante contribui para isso. Outras
avaliações levam em conta as posturas corporais, capacidade de
argumentação, conhecimento do assunto proposto, estratégia e
poder de negociação, relacionamento interpessoal, facilidade de
expor idéias, maturidade e nível cultural.
O objetivo é checar capacidade de compreensão, de
síntese, liderança, habilidade analítica, aceitação do que foi exposto
pelos oponentes, poder de negociação, coesão do grupo e
maturidade.
Não bastasse este elenco de pretensões, ainda procura-se
definir as crenças, ações e opções. Para isso escora-se em axiomas
interpretativos, tais como se fossem verdadeiros veredictos: diante
de uma situação em que um barco está afundando, lança-se a
pergunta: a quem você salvaria? O mediador diz o perfil de cada um
dos ocupantes do barco e cada candidato faz sua escolha. Seria a
menina surda? O sacerdote? O criminoso armado? A grávida
doente? O executivo forte? Salvaria a si mesmo?
Esse tipo de dinâmica visa identificar os seus valores
determinantes (econômico, religioso, humano) e se você é uma
pessoa mais sonhadora, prática, organizada ou desregrada. E as
bases para isso são dadas por suas escolhas e comportamento a
respeito de quem se salva no barco afundando ou em quais objetos 51você levaria para a Lua. Como diria o Sr. Spock: Fascinante!
Agora que conhecemos a opinião corrente no universo de
Recursos Humanos, tanto em sua descrição funcional quanto em
sua colorida utopia, vamos ao que realmente querem dizer estas
afirmações e também o não afirmado - mas implícito - nas condições
dos dados imediatos da consciência no ambiente de laboratório, ou
seja: no ambiente das manifestações empíricas e mensuráveis, onde
mais uma vez, notamos (como qualquer cientista sabe) que as
condições de experimentação podem significar o sucesso ou
fracasso da experiência. Esta situação pode determinar a priori,
além dos valores de verdade, a validade das respostas obtidas.
Imagine uma cepa de bactérias a serem modificadas geneticamente
em uma empresa bioquímica e que estejam elas, acondicionadas
em um recipiente não-estéril, de qualquer forma contaminado por
algum elemento estranho.
Uma vez efetuada a experiência, a mesma será invalidada,
pois sua execução não preenche as condições ideais, necessárias e
cientificamente aceitáveis: ela, no caso, não é isenta na construção
de seus valores de verdade por um erro operacional. Uma segunda
conseqüência seria a de não poder repetir-se a mesma experiência,
sem resultados discrepantes, caso fosse esterilizado o recipiente. O
terceiro ponto é inferir que o método experimental contém uma
verdade empírica valorativa, ou seja: a razão não permite, pelo erro
de princípio, generalizar em lei os resultados obtidos, nem se
admitirá - até novos testes - que o monstro porventura criado na
experiência com bactérias seja algo fora o resultado necessário que
ocorre quando se misturam as substâncias a ou b, ou se faz isto ou
aquilo, já que se defende justamente o contrário. Onde há
inconsistência lógico-metodológica? Ela está justamente onde falha
a ciência no campo de verdades que interessam ao homem: Na
aplicação adequada, na generalização dos conceitos, na qualidade
desta aplicação, conforme existam mais ou menos condições
normais de temperatura, pressão e conhecimento.
Para melhor entender o escopo do que chamamos ciência,
vejamos uma interessante opinião sobre seus aspectos de
desenvolvimento e contínuo progresso: “A falha está em pensar que
esse progresso seja real. A ciência, no geral, chega mais perto da
verdade do mundo que outros sistemas de crença, é nós temos
testemunhado seu sucesso pragmático em aumentar o poder
humano. Mas, do ponto de vista ético, o conhecimento é neutro,
desprovido de valor - pode tanto nos levar a realizações
maravilhosas quanto atender a propósitos terríveis... A ciência não é 52essencial para a felicidade”.
Trocando em miúdos, isto quer dizer que um produto da
ciência, não pode ser também imparcial, seja artefato, tese ou
técnica, já que a forma de uso imputa ao mesmo uma direção, um
valor moral ou a ausência deste. Mas, isso significa que também não 51 Fico imaginando quanta metodologia é necessária para criar um teste destes para o “mercado” e o que seria mensurado objetivamente no curso dos acontecimentos (e não me venham com esta de “campo do fluir”...). 52 John Gray in Veja de 23/11/2005.
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será o conhecimento tão neutro eticamente já que ninguém produz
sem visar a algum fim determinado. Se eu desenvolvo uma nova
arma laser, não posso dizer que não sabia para que fins ela se
destina: ataque ou defesa, mas sempre de forma a derrubar o
oponente. Portanto, não posso afirmar que se eu guardar a arma e
não for nunca utilizá-la, não fará mal a quem quer que seja, isto não
importa, o que importa é que existe uma finalidade determinada ou
o objeto perde o propósito de existência: para quê construir algo se
não sei de antemão para que servirá?
Sendo a instância ética a da ação, ela se desenrola não
somente quando eu desejo agir desta ou daquela maneira, mas
também em porque produzo os instrumentos que me permitirão a
ação e, assim, o produto é parte integrante do agir, seja pela
apropriação do que está à minha volta, seja pela construção
tecnológica visando a efetivação da intenção, que se dá nas
escolhas e nos atos.
Levado este raciocínio para as ciências humanas, veremos
que não é somente em laboratórios de pesquisa que existem
contaminações que estragam uma experiência. Uma dinâmica de
grupo é uma dessas situações onde deveria existir uma boa assepsia,
ao lado de respeito e reconhecimento aos valores humanos, que
não se resumam a competências e habilidades profissionais. No
entanto, é um daqueles espaços teóricos mais poluídos pelos
vapores tóxicos dos pré-conceitos, práticas insensatas e das
tecnologias castradoras do comportamento. Uma “lúdica” e
“participativa” dinâmica é, no mais das vezes invasiva, alienígena,
incômoda: fonte de violência e desespero. Poucos sabem desenhá-
las e menos são os que estão aptos à sua aplicação e
desenvolvimento.
A realidade para o candidato é sempre muito, muito
diferente das definições edulcoradas. Ainda lembro bem de uma
experiência pela qual passei, já no meio ano do trajeto ao sonhado
emprego:
- Eu estava sentado ali há pelo menos meia hora, pensava comigo
mesmo. Revia na mente todo o trajeto desde o metrô, até chegar à sala
onde se apertavam umas doze pessoas. Lugar quente, apesar do ar-
condicionado na parede, que ninguém se atrevia a ligar. Aliás, depois
do cumprimento que fiz - e alguns responderam - ao entrar lá, as
pessoas evitavam olhar diretamente uma para as outras. Isto era
particularmente complicado, pois éramos muitos, uns de frente aos
outros. Eu sentia o paletó começar a encharcar de suor. Ambiente
pesado e quieto onde o tempo demorava a passar.
- Será que dá para ligar o ar? Perguntei a alguém. Vocês não estão com
calor?
Não houve comentário, exceto um fulano que resmungou baixinho:
- Pô! Tá muito calor, será que está funcionando?
- É só ligar ali na tomada, emendei.
- Ai! Acho melhor não, respondeu temeroso o da frente. Vamos esperar
alguém chegar.
- Se quiser ligar, você é quem sabe. Eu vou esperar, ameaçou a moça ao
meu lado.
- Acho que não tem problema, insisti sem obter resposta.
Então eu notei uma saraivada de olhares, expressões e mentes que
se fixaram em mim como ostras grudadas num recife. Eles estavam
como que esperando um movimento para projetarem-se e me
dissecarem. Naquele vero instante, me senti analisado nos mais
ínfimos detalhes, alvo das mais absurdas considerações. Meio
ressabiado com a reação, me acomodei à cadeira e disfarcei
fingindo mexer no celular. O calor continuava. Ficamos ali,
esgrimindo olhares, que ao inadvertidamente se tocarem,
desviavam-se. Hostilidade, angústia. De repente entra uma
selecionadora e pergunta:
- Nossa! Vocês não estão com calor aqui? Porque não ligaram o ar?
Ao que muitos imediatamente responderam:
- Deixa comigo, disse um, eu já ia ligar mesmo.
- Já devia ter ligado antes, disse outro mais distante, aqui tá muito
abafado.
- Melhor abrir a janela, para não ficar muito frio, disse a outra já se
levantando.
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será o conhecimento tão neutro eticamente já que ninguém produz
sem visar a algum fim determinado. Se eu desenvolvo uma nova
arma laser, não posso dizer que não sabia para que fins ela se
destina: ataque ou defesa, mas sempre de forma a derrubar o
oponente. Portanto, não posso afirmar que se eu guardar a arma e
não for nunca utilizá-la, não fará mal a quem quer que seja, isto não
importa, o que importa é que existe uma finalidade determinada ou
o objeto perde o propósito de existência: para quê construir algo se
não sei de antemão para que servirá?
Sendo a instância ética a da ação, ela se desenrola não
somente quando eu desejo agir desta ou daquela maneira, mas
também em porque produzo os instrumentos que me permitirão a
ação e, assim, o produto é parte integrante do agir, seja pela
apropriação do que está à minha volta, seja pela construção
tecnológica visando a efetivação da intenção, que se dá nas
escolhas e nos atos.
Levado este raciocínio para as ciências humanas, veremos
que não é somente em laboratórios de pesquisa que existem
contaminações que estragam uma experiência. Uma dinâmica de
grupo é uma dessas situações onde deveria existir uma boa assepsia,
ao lado de respeito e reconhecimento aos valores humanos, que
não se resumam a competências e habilidades profissionais. No
entanto, é um daqueles espaços teóricos mais poluídos pelos
vapores tóxicos dos pré-conceitos, práticas insensatas e das
tecnologias castradoras do comportamento. Uma “lúdica” e
“participativa” dinâmica é, no mais das vezes invasiva, alienígena,
incômoda: fonte de violência e desespero. Poucos sabem desenhá-
las e menos são os que estão aptos à sua aplicação e
desenvolvimento.
A realidade para o candidato é sempre muito, muito
diferente das definições edulcoradas. Ainda lembro bem de uma
experiência pela qual passei, já no meio ano do trajeto ao sonhado
emprego:
- Eu estava sentado ali há pelo menos meia hora, pensava comigo
mesmo. Revia na mente todo o trajeto desde o metrô, até chegar à sala
onde se apertavam umas doze pessoas. Lugar quente, apesar do ar-
condicionado na parede, que ninguém se atrevia a ligar. Aliás, depois
do cumprimento que fiz - e alguns responderam - ao entrar lá, as
pessoas evitavam olhar diretamente uma para as outras. Isto era
particularmente complicado, pois éramos muitos, uns de frente aos
outros. Eu sentia o paletó começar a encharcar de suor. Ambiente
pesado e quieto onde o tempo demorava a passar.
- Será que dá para ligar o ar? Perguntei a alguém. Vocês não estão com
calor?
Não houve comentário, exceto um fulano que resmungou baixinho:
- Pô! Tá muito calor, será que está funcionando?
- É só ligar ali na tomada, emendei.
- Ai! Acho melhor não, respondeu temeroso o da frente. Vamos esperar
alguém chegar.
- Se quiser ligar, você é quem sabe. Eu vou esperar, ameaçou a moça ao
meu lado.
- Acho que não tem problema, insisti sem obter resposta.
Então eu notei uma saraivada de olhares, expressões e mentes que
se fixaram em mim como ostras grudadas num recife. Eles estavam
como que esperando um movimento para projetarem-se e me
dissecarem. Naquele vero instante, me senti analisado nos mais
ínfimos detalhes, alvo das mais absurdas considerações. Meio
ressabiado com a reação, me acomodei à cadeira e disfarcei
fingindo mexer no celular. O calor continuava. Ficamos ali,
esgrimindo olhares, que ao inadvertidamente se tocarem,
desviavam-se. Hostilidade, angústia. De repente entra uma
selecionadora e pergunta:
- Nossa! Vocês não estão com calor aqui? Porque não ligaram o ar?
Ao que muitos imediatamente responderam:
- Deixa comigo, disse um, eu já ia ligar mesmo.
- Já devia ter ligado antes, disse outro mais distante, aqui tá muito
abafado.
- Melhor abrir a janela, para não ficar muito frio, disse a outra já se
levantando.
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- Regula ali a temperatura no botão de cima.
- Ai que bom! Agora vai refrescar!
- Não liguei porque não estava com calor. Se alguém tivesse pedido eu
faria.
Enfim, o silêncio sepucral de antes estava perdido para sempre.
Cada um, como que acionado por molas queria se prestar a fazer o
que antes lhes incomodava, agora com um enorme sorriso no rosto.
Bastou uma interferência de alguém “neutro”, fora do grupo e a
modificação fora completa. O que havia antes naquela sala que
parecia ter poder para gerar tal tensão cumulativa por coisa de
somenos? Nada mais que pessoas, seus sentimentos, pensamentos e
opiniões formadas sobre como se comportar frente a
desconhecidos. Junte-se a isso um ambiente fisicamente
desconfortável, lotado de competidores e temos a explicação. É
sobre este aspecto que vamos falar, dando a devida importância ao
contexto psicobiosocial e não somente ao psicológico, pois há muito
mais nos seres humanos que a somatória de suas habilidades ou
competências profissionais.53Estar na condição de desempregado significa
experienciar situações de violenta tensão e exclusão, as quais têm
um impacto relevante sobre toda a estrutura do ser e sua relação
com a realidade. Envolve desde o sistema pessoal de crenças do
indivíduo, até suas relações valorativas consigo próprio, com a
sociedade, a economia e os círculos familiares. Para facilitar a
divisão, diremos que no mínimo temos que lidar com três instâncias
naturais e, pelo menos, duas esferas transcendentes aos processos
da matéria. O que nos é naturalmente dado são os seis sentidos
corporais, uma civilização que é regida pelo tempo, espaço,
história, cultura e um lugar no ecossistema planetário com direito a
todos os instintos. Internamente possuímos o sentimento, a
memória, a intuição, a consciência e, mesmo que alguns discordem,
até uma alma.
Dito isto, vejamos o que realmente acontece, a despeito
das conclusões que abriram este capítulo:
Estar sob pressão, constante, de todos estes mecanismos e
inter-relações em todos os níveis é ter uma carga dramática de
significados, escolhas, ações e decisões que se tem que tomar
pesando sobre o ombro a cada passo dado. Errar significa, ao senso
comum mais que a desonra, significa a continuidade da privação e
toda sua coorte de problemas.
Desconhecer ou desprezar as complexas relações entre
todas as instâncias que compõe o homem, em função de um perfil é
reduzi-lo a uma insignificância. Suas emoções, atitudes,
pensamentos e comportamentos não somente são frutos da escolha
pessoal, mas deste atrito e sinergia entre todos os fatores envolvidos.
No mecanismo acima descrito ainda se insere a etiqueta social
determinando um protocolo de atitudes, os perfis profissionais
exigindo competências, os jornais e revistas estampando
procedimentos, especialistas inventando necessidades, o mercado
exigindo retorno, as empresas clamando por excelência.
Tudo o que se relaciona com estas demandas, mormente
vai de encontro com a singela pretensão do candidato, que é a
oportunidade de trabalho. Este esmagamento coloca o candidato
em posição de animal acuado, pois só pode se defender com a
crença no valor de sua força produtiva. Que, embora diminuída em
seu valor, é ainda e sempre a principal pedra angular do edifício
corporativo, fonte de toda motivação, invenção e progresso.
Dificilmente as tabelas de desempenho podem configurar com
exatidão o que é ou não a realidade de quem se submete à peneira,
pois ignora as necessidades de quem lhe bate às portas e julga
desespero, o que pode ser simplesmente o apelo por uma chance.
No mais das vezes a análise é superficial, crítica ou atende a
interesses inconfessáveis.
Para o candidato, trata-se de expor-se de forma ridícula,
invasiva e coercitiva, onde, conforme o caso pode passar por
situações como: ficar agachado no chão de paletó e gravata,
montando torres com jornal e dois clipes, fazer uma regressão em
busca da criança interior, pegar e construir algo com os objetos que
encontra espalhados pela sala, desenhar um projeto e expressá-lo
por mímica, buscar convencer sobre determinado assunto pessoas
instruídas a reagir de forma contrária para que surja a polêmica; 53 Se quiserem podem usar eufemismos, como: Phd, disponível, em busca de colocação, retornando ao mercado, etc.
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- Regula ali a temperatura no botão de cima.
- Ai que bom! Agora vai refrescar!
- Não liguei porque não estava com calor. Se alguém tivesse pedido eu
faria.
Enfim, o silêncio sepucral de antes estava perdido para sempre.
Cada um, como que acionado por molas queria se prestar a fazer o
que antes lhes incomodava, agora com um enorme sorriso no rosto.
Bastou uma interferência de alguém “neutro”, fora do grupo e a
modificação fora completa. O que havia antes naquela sala que
parecia ter poder para gerar tal tensão cumulativa por coisa de
somenos? Nada mais que pessoas, seus sentimentos, pensamentos e
opiniões formadas sobre como se comportar frente a
desconhecidos. Junte-se a isso um ambiente fisicamente
desconfortável, lotado de competidores e temos a explicação. É
sobre este aspecto que vamos falar, dando a devida importância ao
contexto psicobiosocial e não somente ao psicológico, pois há muito
mais nos seres humanos que a somatória de suas habilidades ou
competências profissionais.53Estar na condição de desempregado significa
experienciar situações de violenta tensão e exclusão, as quais têm
um impacto relevante sobre toda a estrutura do ser e sua relação
com a realidade. Envolve desde o sistema pessoal de crenças do
indivíduo, até suas relações valorativas consigo próprio, com a
sociedade, a economia e os círculos familiares. Para facilitar a
divisão, diremos que no mínimo temos que lidar com três instâncias
naturais e, pelo menos, duas esferas transcendentes aos processos
da matéria. O que nos é naturalmente dado são os seis sentidos
corporais, uma civilização que é regida pelo tempo, espaço,
história, cultura e um lugar no ecossistema planetário com direito a
todos os instintos. Internamente possuímos o sentimento, a
memória, a intuição, a consciência e, mesmo que alguns discordem,
até uma alma.
Dito isto, vejamos o que realmente acontece, a despeito
das conclusões que abriram este capítulo:
Estar sob pressão, constante, de todos estes mecanismos e
inter-relações em todos os níveis é ter uma carga dramática de
significados, escolhas, ações e decisões que se tem que tomar
pesando sobre o ombro a cada passo dado. Errar significa, ao senso
comum mais que a desonra, significa a continuidade da privação e
toda sua coorte de problemas.
Desconhecer ou desprezar as complexas relações entre
todas as instâncias que compõe o homem, em função de um perfil é
reduzi-lo a uma insignificância. Suas emoções, atitudes,
pensamentos e comportamentos não somente são frutos da escolha
pessoal, mas deste atrito e sinergia entre todos os fatores envolvidos.
No mecanismo acima descrito ainda se insere a etiqueta social
determinando um protocolo de atitudes, os perfis profissionais
exigindo competências, os jornais e revistas estampando
procedimentos, especialistas inventando necessidades, o mercado
exigindo retorno, as empresas clamando por excelência.
Tudo o que se relaciona com estas demandas, mormente
vai de encontro com a singela pretensão do candidato, que é a
oportunidade de trabalho. Este esmagamento coloca o candidato
em posição de animal acuado, pois só pode se defender com a
crença no valor de sua força produtiva. Que, embora diminuída em
seu valor, é ainda e sempre a principal pedra angular do edifício
corporativo, fonte de toda motivação, invenção e progresso.
Dificilmente as tabelas de desempenho podem configurar com
exatidão o que é ou não a realidade de quem se submete à peneira,
pois ignora as necessidades de quem lhe bate às portas e julga
desespero, o que pode ser simplesmente o apelo por uma chance.
No mais das vezes a análise é superficial, crítica ou atende a
interesses inconfessáveis.
Para o candidato, trata-se de expor-se de forma ridícula,
invasiva e coercitiva, onde, conforme o caso pode passar por
situações como: ficar agachado no chão de paletó e gravata,
montando torres com jornal e dois clipes, fazer uma regressão em
busca da criança interior, pegar e construir algo com os objetos que
encontra espalhados pela sala, desenhar um projeto e expressá-lo
por mímica, buscar convencer sobre determinado assunto pessoas
instruídas a reagir de forma contrária para que surja a polêmica; 53 Se quiserem podem usar eufemismos, como: Phd, disponível, em busca de colocação, retornando ao mercado, etc.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
9998
disputar com o grupo, encenar uma situação onde fala sobre suas
fraquezas e forças, fazer passa anel e ter que descobrir a regra para
completar a frase ou perde a vez; defender as respostas dadas ao
grupo sobre perguntas contraditórias; fazer escolhas em situações
limite com alternativas sem nexo, mediar uma discussão acalorada,
recortar figuras de revistas e explicar seu significado; cantar e dançar
as canções propostas ao grupo, bater palmas e inventar slogans,
escolher alguém para ser eliminado, justificar as razões de seu
desemprego, dizer seus defeitos ao grupo e muito mais. A dimensão
burlesca está no objetivo final, dado pela lógica do só restará um!
Tudo isso então, que seria apenas dimensão lúdica para os
especialistas, se torna uma plataforma de lançamento de mísseis,
pela tensão e objetivos, que não são os do livre jogo - da diversão no
tempo da festa -, mas de combate onde ferimos e somos feridos em
decorrência das ações em campo. Das sensações de agrado e
desagrado que nos cercam, de acordo com nossa percepção dos
fatos e valores envolvidos. Do sentir ou não a fortuna indo embora
em meio às exigências que nos gritam sua urgência implacável. Não
é uma terapia ou terapêutica que promova a purgação de nossas
dores e recalques através de uma catarse, porque não se está
fazendo outra coisa senão disputar uma vaga.
Esta face oculta invalida quaisquer argumentos que
preguem as vantagens das vivências dinâmicas, pois o que está
ocorrendo é uma avaliação. Este desconforto conceitual é inegável
aos participantes que não buscam a catarse ou a metáfora criativa,
mas competem entre os perfeitos estranhos ali presentes.
Apropriaram-se mal de Vigotsky, Freire e outros defensores da práxis
intervencionista.
Senão vejamos: Como é que realmente se apresentam e se
comportam os candidatos admitidos nos jogos corporativos, que
são a coqueluche moderna dos estereótipos funcionais? Como já
citamos teoricamente este instrumento deveria fazer ressaltar a
atuação e o relacionamento entre grupos e indivíduos, de modo a
destacar as qualidades, mediado por um facilitador. Mas o que
ocorre é uma guerra de todos contra todos, onde o que fica
realmente claro são as necessidades pessoais se sobrepujando umas
às outras, em detrimento de quaisquer benesses humanitárias ou
espírito de equipe. Por quê? Por que quem está na condição de
candidato não possui nenhum espírito olímpico, apenas deseja
vencer o processo de seleção. Isto contraria a tese dos
selecionadores que buscam o perfil ideal, já que ninguém se
interessa por “contribuir”, “participar”, “interagir”, “compreender
as necessidades da empresa” ou “aceitar colaborar com os mais
aptos”, mas tão somente em fazer sobressair suas habilidades, nem
que seja à custa de seus instintos mais primitivos.
Não é uma meritocracia, uma “mediação proximal”, mas
um combate feroz onde não se fazem prisioneiros, seja entre os
competidores, seja entre os analistas e candidatos.
Cansei de ver situações como esta, mas uma me pareceu
singular e por isso, merece ser contada na íntegra:
- Eu estava ali há algum tempo. Como sempre, a observar desde como
estavam vestidos os outros candidatos, sua possível idade, tanto como
se portavam na sala de espera. O relógio escoava lento, arrastando-se a
cada segundo, enquanto aguardávamos a chegada do diretor, que
junto com outra pessoa, iniciaria a atividade. Tentava me concentrar na
folha de papel sobre a carteira, relendo as respostas que eu dera ao
questionário. Os outros ainda escreviam me dando espaço para
vaguear os pensamentos entre minhas esperanças e frustrações.
- A sala era grande e fria, pensei. O anúncio pedia candidatos para a
área comercial de uma importadora de produtos médico-cirúrgicos,
que tencionava posicionar-se mais fortemente no mercado onde
atuava. O salário era baixo, precisava também usar o próprio carro, ter
celular e computador, mas disseram que haveria bonificações e
benefícios. Eu sabia que na verdade não estaria sendo empregado, mas
fazendo um investimento em parceria com a empresa. Mas minha
situação estava apertada, o dinheiro que recebi na rescisão já tinha ido
embora, precisava arriscar uma atividade, mesmo que significasse um
passo atrás naquilo que chamamos de carreira. Então, me restava
esperar. Até que chegaram.
- Boa tarde, o Sr.Shuami, o Lustrécio, o Cramílson, o Óriston e eu vamos
todos acompanhar este exercício, fazendo observações, anotações e
perguntas. Por favor, levem as cadeiras e coloquem encostadas à
parede, de frente para nós. Cada um de vocês tem cinco minutos para
se apresentar, depois vamos iniciar a atividade. Entenderam?
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
101100
disputar com o grupo, encenar uma situação onde fala sobre suas
fraquezas e forças, fazer passa anel e ter que descobrir a regra para
completar a frase ou perde a vez; defender as respostas dadas ao
grupo sobre perguntas contraditórias; fazer escolhas em situações
limite com alternativas sem nexo, mediar uma discussão acalorada,
recortar figuras de revistas e explicar seu significado; cantar e dançar
as canções propostas ao grupo, bater palmas e inventar slogans,
escolher alguém para ser eliminado, justificar as razões de seu
desemprego, dizer seus defeitos ao grupo e muito mais. A dimensão
burlesca está no objetivo final, dado pela lógica do só restará um!
Tudo isso então, que seria apenas dimensão lúdica para os
especialistas, se torna uma plataforma de lançamento de mísseis,
pela tensão e objetivos, que não são os do livre jogo - da diversão no
tempo da festa -, mas de combate onde ferimos e somos feridos em
decorrência das ações em campo. Das sensações de agrado e
desagrado que nos cercam, de acordo com nossa percepção dos
fatos e valores envolvidos. Do sentir ou não a fortuna indo embora
em meio às exigências que nos gritam sua urgência implacável. Não
é uma terapia ou terapêutica que promova a purgação de nossas
dores e recalques através de uma catarse, porque não se está
fazendo outra coisa senão disputar uma vaga.
Esta face oculta invalida quaisquer argumentos que
preguem as vantagens das vivências dinâmicas, pois o que está
ocorrendo é uma avaliação. Este desconforto conceitual é inegável
aos participantes que não buscam a catarse ou a metáfora criativa,
mas competem entre os perfeitos estranhos ali presentes.
Apropriaram-se mal de Vigotsky, Freire e outros defensores da práxis
intervencionista.
Senão vejamos: Como é que realmente se apresentam e se
comportam os candidatos admitidos nos jogos corporativos, que
são a coqueluche moderna dos estereótipos funcionais? Como já
citamos teoricamente este instrumento deveria fazer ressaltar a
atuação e o relacionamento entre grupos e indivíduos, de modo a
destacar as qualidades, mediado por um facilitador. Mas o que
ocorre é uma guerra de todos contra todos, onde o que fica
realmente claro são as necessidades pessoais se sobrepujando umas
às outras, em detrimento de quaisquer benesses humanitárias ou
espírito de equipe. Por quê? Por que quem está na condição de
candidato não possui nenhum espírito olímpico, apenas deseja
vencer o processo de seleção. Isto contraria a tese dos
selecionadores que buscam o perfil ideal, já que ninguém se
interessa por “contribuir”, “participar”, “interagir”, “compreender
as necessidades da empresa” ou “aceitar colaborar com os mais
aptos”, mas tão somente em fazer sobressair suas habilidades, nem
que seja à custa de seus instintos mais primitivos.
Não é uma meritocracia, uma “mediação proximal”, mas
um combate feroz onde não se fazem prisioneiros, seja entre os
competidores, seja entre os analistas e candidatos.
Cansei de ver situações como esta, mas uma me pareceu
singular e por isso, merece ser contada na íntegra:
- Eu estava ali há algum tempo. Como sempre, a observar desde como
estavam vestidos os outros candidatos, sua possível idade, tanto como
se portavam na sala de espera. O relógio escoava lento, arrastando-se a
cada segundo, enquanto aguardávamos a chegada do diretor, que
junto com outra pessoa, iniciaria a atividade. Tentava me concentrar na
folha de papel sobre a carteira, relendo as respostas que eu dera ao
questionário. Os outros ainda escreviam me dando espaço para
vaguear os pensamentos entre minhas esperanças e frustrações.
- A sala era grande e fria, pensei. O anúncio pedia candidatos para a
área comercial de uma importadora de produtos médico-cirúrgicos,
que tencionava posicionar-se mais fortemente no mercado onde
atuava. O salário era baixo, precisava também usar o próprio carro, ter
celular e computador, mas disseram que haveria bonificações e
benefícios. Eu sabia que na verdade não estaria sendo empregado, mas
fazendo um investimento em parceria com a empresa. Mas minha
situação estava apertada, o dinheiro que recebi na rescisão já tinha ido
embora, precisava arriscar uma atividade, mesmo que significasse um
passo atrás naquilo que chamamos de carreira. Então, me restava
esperar. Até que chegaram.
- Boa tarde, o Sr.Shuami, o Lustrécio, o Cramílson, o Óriston e eu vamos
todos acompanhar este exercício, fazendo observações, anotações e
perguntas. Por favor, levem as cadeiras e coloquem encostadas à
parede, de frente para nós. Cada um de vocês tem cinco minutos para
se apresentar, depois vamos iniciar a atividade. Entenderam?
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
101100
Colocamos as pesadas cadeiras sobre um palco, e ficamos
frente ao tribunal, com a selecionadora sentada mais ao fundo. A
iluminação forte dificultava enxergar direito as expressões dos
analistas. Como ninguém queria começar a falar, indicaram um
nome, fazendo-o se levantar e pediram informações sobre seu perfil,
as atividades, as expectativas. Ele foi questionado por não dizer sua
idade e o bairro onde morava. O segundo levantou e com base no
que o primeiro já tinha dito, reforçou seu endereço e falou sobre sua
vida, sendo questionado sobre alguns produtos da empresa. A
seguinte iniciou com seus dados completos, sua vida, falou sobre
alguns produtos e lhe perguntaram algo sobre descontos. A próxima
se apresentou, falou de si, de seus dados, de produtos da empresa e
descontos e tributação, sendo-lhe perguntado como agiria numa
negociação.
Todos iam assim, completando as respostas com mais
dados e perguntas, o que fazia com que demorassem cada vez mais,
ultrapassando em muito o limite estabelecido de tempo. Isto é
bastante comum nas dinâmicas: os outros observam as todas as
falhas e argumentos. Ao chegar sua vez tentam parecer melhores
que os anteriores, explorando novas possibilidades e se o facilitador
não é atento, tomam o espaço e tempo dos outros de forma injusta.
Por isso, não é bom nem ser o primeiro nem o último, já que um terá
que iniciar o jogo e tenderá a ser abrangente e o outro quase não
terá o que falar de forma original, que não tenha sido abordado
antes, além do problema do tempo. Dinâmicas e apresentações são
aborrecidas para quem avalia, de modo que em algum ponto do
percurso saturam os que são ou não são habituados a estes
processos que procuram encurtá-lo.
Este foi o meu caso, eu estava colocado na última cadeira e
tive que esperar todos se manifestarem. Ao chegar a minha vez a
apresentação já durava pelo menos uma hora, sendo que ao me
levantar e começar a falar resolvi ser brilhante e assertivo: disse que
iria ser conciso, por amor à brevidade. Nem bem disse as primeiras
palavras e fui - como os outros - interrompido:
- Vamos acelerar mais o andamento, diga o que quero saber: você tem
experiência comercial?
- Sim, como está em meu currículo, eu tenho bastante experiência,
respondi espantado.
- Eu quero que você explique o que é esta sua experiência, retrucou o
primeiro.
Então discorri sobre minhas atividades com desembaraço,
elencando fatos e situações, não deixando a peteca cair. Os outros
candidatos olhavam meio intimidados com minha performance,
mas pela cara do analista, ele não estava satisfeito. A coisa estava
tensa demais, com os outros entrevistadores também fazendo
perguntas, mas sempre como pessoas compreensivas, afáveis, o
perguntador carrancudo era o diretor. Pelos meus cálculos já
durava umas duas horas, eles queriam ser rápidos, mas, a todo o
momento interrompiam, gerando mais esclarecimentos, até que
finalmente pediram para elaborar uma exposição final sobre
técnicas de venda, que convencesse o diretor:
- Quero que me digam uma coisa: por que eu contrataria vocês? Por
que seriam úteis para a empresa? Por que motivo eu deveria comprar
estes produtos?
Os candidatos se revezavam na tentativa de se “vender” como
melhor opção, e eu ali pensando que para o custo que teria para
trabalhar, as exigências estavam sendo demasiadas. Não ia ser uma
posição de assalariado confortável em seu departamento, mas algo
que dependeria em grande parte de intenso esforço e motivação,
pois teria que sair a campo e garantir mercado. Achava que esta
parceria só pendia para um lado, mas enfim! Resolvi utilizar uma
solução que sempre dera certo comigo quando em situações tensas,
que é sorrir e aliviar o clima, apontando soluções utilizando uma
linguagem coloquial com um toque de humor.
- Você disse que é persistente, falou o diretor, e se o cliente não quiser
lhe atender e eu exija que ele seja incorporado à nossa carteira. O que
você faz? A secretária tem ordens para não lhe atender de jeito
nenhum!
- No contato com clientes e na prospecção é importante além da
determinação, criatividade. Eu tentaria de todas as formas: cartas,
folders, telefonemas, e-mails, sinais de fumaça, pombo correio,
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
103102
Colocamos as pesadas cadeiras sobre um palco, e ficamos
frente ao tribunal, com a selecionadora sentada mais ao fundo. A
iluminação forte dificultava enxergar direito as expressões dos
analistas. Como ninguém queria começar a falar, indicaram um
nome, fazendo-o se levantar e pediram informações sobre seu perfil,
as atividades, as expectativas. Ele foi questionado por não dizer sua
idade e o bairro onde morava. O segundo levantou e com base no
que o primeiro já tinha dito, reforçou seu endereço e falou sobre sua
vida, sendo questionado sobre alguns produtos da empresa. A
seguinte iniciou com seus dados completos, sua vida, falou sobre
alguns produtos e lhe perguntaram algo sobre descontos. A próxima
se apresentou, falou de si, de seus dados, de produtos da empresa e
descontos e tributação, sendo-lhe perguntado como agiria numa
negociação.
Todos iam assim, completando as respostas com mais
dados e perguntas, o que fazia com que demorassem cada vez mais,
ultrapassando em muito o limite estabelecido de tempo. Isto é
bastante comum nas dinâmicas: os outros observam as todas as
falhas e argumentos. Ao chegar sua vez tentam parecer melhores
que os anteriores, explorando novas possibilidades e se o facilitador
não é atento, tomam o espaço e tempo dos outros de forma injusta.
Por isso, não é bom nem ser o primeiro nem o último, já que um terá
que iniciar o jogo e tenderá a ser abrangente e o outro quase não
terá o que falar de forma original, que não tenha sido abordado
antes, além do problema do tempo. Dinâmicas e apresentações são
aborrecidas para quem avalia, de modo que em algum ponto do
percurso saturam os que são ou não são habituados a estes
processos que procuram encurtá-lo.
Este foi o meu caso, eu estava colocado na última cadeira e
tive que esperar todos se manifestarem. Ao chegar a minha vez a
apresentação já durava pelo menos uma hora, sendo que ao me
levantar e começar a falar resolvi ser brilhante e assertivo: disse que
iria ser conciso, por amor à brevidade. Nem bem disse as primeiras
palavras e fui - como os outros - interrompido:
- Vamos acelerar mais o andamento, diga o que quero saber: você tem
experiência comercial?
- Sim, como está em meu currículo, eu tenho bastante experiência,
respondi espantado.
- Eu quero que você explique o que é esta sua experiência, retrucou o
primeiro.
Então discorri sobre minhas atividades com desembaraço,
elencando fatos e situações, não deixando a peteca cair. Os outros
candidatos olhavam meio intimidados com minha performance,
mas pela cara do analista, ele não estava satisfeito. A coisa estava
tensa demais, com os outros entrevistadores também fazendo
perguntas, mas sempre como pessoas compreensivas, afáveis, o
perguntador carrancudo era o diretor. Pelos meus cálculos já
durava umas duas horas, eles queriam ser rápidos, mas, a todo o
momento interrompiam, gerando mais esclarecimentos, até que
finalmente pediram para elaborar uma exposição final sobre
técnicas de venda, que convencesse o diretor:
- Quero que me digam uma coisa: por que eu contrataria vocês? Por
que seriam úteis para a empresa? Por que motivo eu deveria comprar
estes produtos?
Os candidatos se revezavam na tentativa de se “vender” como
melhor opção, e eu ali pensando que para o custo que teria para
trabalhar, as exigências estavam sendo demasiadas. Não ia ser uma
posição de assalariado confortável em seu departamento, mas algo
que dependeria em grande parte de intenso esforço e motivação,
pois teria que sair a campo e garantir mercado. Achava que esta
parceria só pendia para um lado, mas enfim! Resolvi utilizar uma
solução que sempre dera certo comigo quando em situações tensas,
que é sorrir e aliviar o clima, apontando soluções utilizando uma
linguagem coloquial com um toque de humor.
- Você disse que é persistente, falou o diretor, e se o cliente não quiser
lhe atender e eu exija que ele seja incorporado à nossa carteira. O que
você faz? A secretária tem ordens para não lhe atender de jeito
nenhum!
- No contato com clientes e na prospecção é importante além da
determinação, criatividade. Eu tentaria de todas as formas: cartas,
folders, telefonemas, e-mails, sinais de fumaça, pombo correio,
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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mandaria amostras, convidaria para almoçar. Se nada desse certo, eu
visitaria a empresa, mandaria flores para a secretária, iria a algum
evento que ele comparecesse, procuraria amigos em comum que
pudessem me apresentá-lo. Seria cara de pau o suficiente para poder
conseguir contatá-lo. Além disso, teríamos que analisar quais os nossos
diferenciais e verificar o real motivo deste cliente não estar comprando,
afinal pode ser falha nossa e se for, deve ser corrigida, concluí certo de
ter atingido o alvo. Ledo engano.
- E porque razão, Sr. Luís, eu deveria contratar um cara de pau para
minha empresa? O negócio aqui é comercial, é resultado e não blá-blá-
blá. Se não vender tá na rua, se não consegue chegar no cliente você
não tem capacidade. Você quer gastar dinheiro sem saber o quanto o
cara vai comprar? Que retorno você me garante? O que vocês acham?
Disse, apontando para os outros na sala.
- Mas, em casos extremos, estes hold outs precisam ser cativados de
alguma maneira, não é custo é investimento, tentei inferir, dirigindo-me
aos outros, de modo a manter o domínio da situação. Mas o que
aconteceu é que fui atropelado pelos demais candidatos, que antes
inexpressivos e cordatos, iniciaram um ataque coordenado e
simultâneo à minha posição.
- Eu não perderia tempo com ele, eu venderia para os concorrentes...
- Eu continuava a tentar, mas sempre vendendo para todo mundo, até
que ele comprasse. Manteria as metas, abriria novas frentes...
- Negócio é negócio, eu apresentaria um preço lá embaixo, mesmo que
perdesse toda minha comissão, depois que ele virasse cliente eu
recuperava na quantidade e programação.
- Eu dava tudo isso para ele, mas com pedido mínimo e venda casada.
- Eu conheço o cara, ele ia me atender porque já me conhece. Eu
conheço todo o ramo!
- Gente! Não existe esse negócio de não conseguir ser atendido!
Imagine...tá brincando.
- Vendedor que é vendedor vai lá e tira o pedido na marra, se for
preciso! Conquista o cliente.
- Acho que ninguém aqui falou de pós-venda. Não é conquistar. É
cativar o cliente...
Pego em meio ao fogo cruzado, os meus escudos defletores foram
desativados e me vi abatido em questão de segundos. A coisa toda
degringolou em uma balbúrdia e ninguém mais se entendia. Nada
mais pude fazer a não ser olhar em volta e aguardar a próxima
pergunta, que não houve. Pediram para que eu sentasse e ainda
ficamos lá mais algum tempo antes que nos dispensassem, com
aquela promessa de um contato futuro. Nem preciso dizer que não
fui selecionado para as próximas etapas, afinal cometi o erro de
subestimar a capacidade de união no perigo, que no caso eu
representava aos demais candidatos. Fora isso, tinha me atrevido a
questionar a eficácia da postura do diretor prepotente. Ficou como
lição que poucos aceitam críticas a seus erros organizacionais!
A maioria das empresas não que saber de suas falhas internas
- administrativas, financeiras, produtivas, éticas e comerciais - mas
apenas ganhar dinheiro, acreditando piamente ser problema dos
funcionários o desempenho insatisfatório no mercado.
Para essas empresas, manter a margem é tudo, o resto é
bobagem. Toda a orientação é em prol do imediato retorno ao
capital investido, em níveis cada vez maiores, seja sobre qual atrito
corporativo for. Estimulam a ambição como motor de arranque e
aplicam regras de metas hiperbólicas a serem continuamente
alcançadas; por outro lado mantém as ameaças de punição como
elemento motivador constante, esperando gerar o dinamismo
necessário que elevará o grau de competitividade, pela
agressividade, instrumento com o qual eles sonham açambarcar o
maior naco possível de mercado. C'est la vie? Não deveria. Qualquer
força, natural ou econômica é destrutiva se não houver limites e
proteções ao que é do âmbito humano.
Enfim, a conclusão que se pode tirar do que dissemos sobre
as dinâmicas é que não se trata apenas de jogos inocentes, onde
todos estão dispostos a fazer o melhor para a equipe. Nem é um
momento mágico de sinergia e assertividade, onde as competências
florescem e são recolhidas pelos lídimos entrevistadores.
Os candidatos, como gladiadores, que estão ali dispostos
em círculo sabem que se não conseguirem anular seus oponentes,
estarão fora da partida.
Portanto, a questão toda se resume numa só palavra:
estratégia. Não se pode oferecer todo seu potencial de uma vez, pois
ameaçará os demais que se unirão para derrubá-lo, a qualquer
preço. Nem se deve ocultar suas competências e habilidades, pois
estará sendo observado.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
104 105
mandaria amostras, convidaria para almoçar. Se nada desse certo, eu
visitaria a empresa, mandaria flores para a secretária, iria a algum
evento que ele comparecesse, procuraria amigos em comum que
pudessem me apresentá-lo. Seria cara de pau o suficiente para poder
conseguir contatá-lo. Além disso, teríamos que analisar quais os nossos
diferenciais e verificar o real motivo deste cliente não estar comprando,
afinal pode ser falha nossa e se for, deve ser corrigida, concluí certo de
ter atingido o alvo. Ledo engano.
- E porque razão, Sr. Luís, eu deveria contratar um cara de pau para
minha empresa? O negócio aqui é comercial, é resultado e não blá-blá-
blá. Se não vender tá na rua, se não consegue chegar no cliente você
não tem capacidade. Você quer gastar dinheiro sem saber o quanto o
cara vai comprar? Que retorno você me garante? O que vocês acham?
Disse, apontando para os outros na sala.
- Mas, em casos extremos, estes hold outs precisam ser cativados de
alguma maneira, não é custo é investimento, tentei inferir, dirigindo-me
aos outros, de modo a manter o domínio da situação. Mas o que
aconteceu é que fui atropelado pelos demais candidatos, que antes
inexpressivos e cordatos, iniciaram um ataque coordenado e
simultâneo à minha posição.
- Eu não perderia tempo com ele, eu venderia para os concorrentes...
- Eu continuava a tentar, mas sempre vendendo para todo mundo, até
que ele comprasse. Manteria as metas, abriria novas frentes...
- Negócio é negócio, eu apresentaria um preço lá embaixo, mesmo que
perdesse toda minha comissão, depois que ele virasse cliente eu
recuperava na quantidade e programação.
- Eu dava tudo isso para ele, mas com pedido mínimo e venda casada.
- Eu conheço o cara, ele ia me atender porque já me conhece. Eu
conheço todo o ramo!
- Gente! Não existe esse negócio de não conseguir ser atendido!
Imagine...tá brincando.
- Vendedor que é vendedor vai lá e tira o pedido na marra, se for
preciso! Conquista o cliente.
- Acho que ninguém aqui falou de pós-venda. Não é conquistar. É
cativar o cliente...
Pego em meio ao fogo cruzado, os meus escudos defletores foram
desativados e me vi abatido em questão de segundos. A coisa toda
degringolou em uma balbúrdia e ninguém mais se entendia. Nada
mais pude fazer a não ser olhar em volta e aguardar a próxima
pergunta, que não houve. Pediram para que eu sentasse e ainda
ficamos lá mais algum tempo antes que nos dispensassem, com
aquela promessa de um contato futuro. Nem preciso dizer que não
fui selecionado para as próximas etapas, afinal cometi o erro de
subestimar a capacidade de união no perigo, que no caso eu
representava aos demais candidatos. Fora isso, tinha me atrevido a
questionar a eficácia da postura do diretor prepotente. Ficou como
lição que poucos aceitam críticas a seus erros organizacionais!
A maioria das empresas não que saber de suas falhas internas
- administrativas, financeiras, produtivas, éticas e comerciais - mas
apenas ganhar dinheiro, acreditando piamente ser problema dos
funcionários o desempenho insatisfatório no mercado.
Para essas empresas, manter a margem é tudo, o resto é
bobagem. Toda a orientação é em prol do imediato retorno ao
capital investido, em níveis cada vez maiores, seja sobre qual atrito
corporativo for. Estimulam a ambição como motor de arranque e
aplicam regras de metas hiperbólicas a serem continuamente
alcançadas; por outro lado mantém as ameaças de punição como
elemento motivador constante, esperando gerar o dinamismo
necessário que elevará o grau de competitividade, pela
agressividade, instrumento com o qual eles sonham açambarcar o
maior naco possível de mercado. C'est la vie? Não deveria. Qualquer
força, natural ou econômica é destrutiva se não houver limites e
proteções ao que é do âmbito humano.
Enfim, a conclusão que se pode tirar do que dissemos sobre
as dinâmicas é que não se trata apenas de jogos inocentes, onde
todos estão dispostos a fazer o melhor para a equipe. Nem é um
momento mágico de sinergia e assertividade, onde as competências
florescem e são recolhidas pelos lídimos entrevistadores.
Os candidatos, como gladiadores, que estão ali dispostos
em círculo sabem que se não conseguirem anular seus oponentes,
estarão fora da partida.
Portanto, a questão toda se resume numa só palavra:
estratégia. Não se pode oferecer todo seu potencial de uma vez, pois
ameaçará os demais que se unirão para derrubá-lo, a qualquer
preço. Nem se deve ocultar suas competências e habilidades, pois
estará sendo observado.
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Sua atuação deve ser pontual e eficaz, de forma a
nocautear, sendo duro quando preciso e, em alguns casos, deixar
bem à mostra sua diplomacia e humildade. A correta proporção 54entre estes ingredientes resulta em boas chances. Antes de
hipocrisia hedonista, a estratégia trata da crítica a este modelo, pois
se lida com transvalorações e limites. E o que deve ser encontrado
nesta busca é o equilíbrio entre virtude e prudência, entre ética e
justiça, entre vontade e necessidade, entre a consciência e mercado
nos instantâneos móveis de todos os relacionamentos. Há que se
jogar com nobreza de espírito, conhecimentos e força de caráter,
mas sem descuidar dos golpes que provêem dos abismos da
ferocidade humana.
No mais, ainda existe o problema de quem interpreta e
aplica as dinâmicas. Em última nota, cabe dizer que estas técnicas
uma vez colocadas em ação por técnicos competentes, no plano
teórico e prático, consistirão em instrumentos a serem utilizados de
forma complementar, de apoio e não enquanto objeto ou objetivo
único. Portanto, a concretização, o sucesso na aplicação de uma
atividade pedagógica, de uma didática, dinâmica ou programação
recreativa, depende também do investimento na qualificação do
agente aplicador. De como ele interage e trabalha as características
intrínsecas dos participantes, como direciona e lida com o clima
gerado no grupo durante as situações, responde pela mediação,
como acopla a tranqüilidade e leveza à sua respectiva discussão e
integração, enfim, como responde globalmente por tudo e faz trazer
à tona não o competidor implacável: mas as reais formações,
qualificações e virtudes dos candidatos. Caso não haja esta alta
qualificação dos facilitadores e entrevistadores - o que é raro - a
coisa desanda em um sem número de variáveis e os aspectos lúdicos
e pedagógicos desaparecem em meio ao tumulto.
6 - Observação contínua: Normas para os Enjaulados
Estar participando de entrevistas, dinâmicas, testes e tudo aquilo
que se configura como processo seletivo, envolve muito mais do
que a inteligência, a experiência e as competências para tanto.
Significa que você vai passar grande parte de seu tempo preso em
salas de espera, escritórios e auditórios fazendo atividades ou
respondendo a perguntas e questionários. Fosse somente isto e tudo
estaria bem afinal, o mundo corporativo está muito longe de
qualquer perfeição e um pouco de paciência e jogo de cintura para
lidar com situações de stress e tensão é até saudável. Porém, a coisa
não é assim tão simples, porque, além de tudo isso, você também é
avaliado pelo modo como se comporta em tais ante-salas do
inferno.
Desde que começaram as pesquisas e observações sobre
modelos de comunicação não-verbal, a paranóia é parte integrante 55das avaliações sobre possíveis significados das expressões
corporais. Existem alguns trabalhos sérios sobre o assunto, claro,
mas como toda teoria da subjetividade, estes postulados não podem
ser utilizadas diretamente em toda e qualquer situação, nem tiradas
conclusões de forma apressada, quiçá temerária. O perigo é a
universalização, a aplicação generalizada de conceitos que
somente são válidos em âmbito estrito e sob condições ideais, numa
adaptação sem cuidado para o pragmático mundo corporativo.
Ora, um processo seletivo nunca é condição ideal, pois
além da fragilidade natural observada nos candidatos a um
emprego, soma-se a isso um verdadeiro circo de horrores onde são
manipuladas as expectativas em função de um perfil e não de um
panorama. Mas no senso comum que grassa nos corredores do setor
de seleção predomina a idéia que basta ter um dicionário básico de 56psicologia no bolso , alguns best sellers sazonais na gaveta e testes
comprados em boas casas do ramo para que se possa sair por aí
fazendo diagnósticos: Veja só o que me aconteceu:
- De novo estava ali, aguardando numa sala para ser chamado à
entrevista, pensava.
O calor sufocante da manhã fora substituído por uma tempestade
daquelas. Lá fora, raios e trovões. Após algum tempo mofando na
carteira, me indicaram uma nova sala para aguardar. Fiquei uns
54 Para maiores detalhes sobre postura pessoal em dinâmicas, continue lendo e, se quiser, consulte os links do apêndice.
55 Que me perdoe Pierre Weil e suas Relações Humanas na Família e no Trabalho, mas a coisa hoje saiu dos trilhos e existe uma verdadeira hipostasia de interpretações, as mais estapafúrdias possíveis sobre este importante tema.56 Isto não substitui uma faculdade, mesmo de terceira linha...Enfim, dá no mesmo.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
106 107
Sua atuação deve ser pontual e eficaz, de forma a
nocautear, sendo duro quando preciso e, em alguns casos, deixar
bem à mostra sua diplomacia e humildade. A correta proporção 54entre estes ingredientes resulta em boas chances. Antes de
hipocrisia hedonista, a estratégia trata da crítica a este modelo, pois
se lida com transvalorações e limites. E o que deve ser encontrado
nesta busca é o equilíbrio entre virtude e prudência, entre ética e
justiça, entre vontade e necessidade, entre a consciência e mercado
nos instantâneos móveis de todos os relacionamentos. Há que se
jogar com nobreza de espírito, conhecimentos e força de caráter,
mas sem descuidar dos golpes que provêem dos abismos da
ferocidade humana.
No mais, ainda existe o problema de quem interpreta e
aplica as dinâmicas. Em última nota, cabe dizer que estas técnicas
uma vez colocadas em ação por técnicos competentes, no plano
teórico e prático, consistirão em instrumentos a serem utilizados de
forma complementar, de apoio e não enquanto objeto ou objetivo
único. Portanto, a concretização, o sucesso na aplicação de uma
atividade pedagógica, de uma didática, dinâmica ou programação
recreativa, depende também do investimento na qualificação do
agente aplicador. De como ele interage e trabalha as características
intrínsecas dos participantes, como direciona e lida com o clima
gerado no grupo durante as situações, responde pela mediação,
como acopla a tranqüilidade e leveza à sua respectiva discussão e
integração, enfim, como responde globalmente por tudo e faz trazer
à tona não o competidor implacável: mas as reais formações,
qualificações e virtudes dos candidatos. Caso não haja esta alta
qualificação dos facilitadores e entrevistadores - o que é raro - a
coisa desanda em um sem número de variáveis e os aspectos lúdicos
e pedagógicos desaparecem em meio ao tumulto.
6 - Observação contínua: Normas para os Enjaulados
Estar participando de entrevistas, dinâmicas, testes e tudo aquilo
que se configura como processo seletivo, envolve muito mais do
que a inteligência, a experiência e as competências para tanto.
Significa que você vai passar grande parte de seu tempo preso em
salas de espera, escritórios e auditórios fazendo atividades ou
respondendo a perguntas e questionários. Fosse somente isto e tudo
estaria bem afinal, o mundo corporativo está muito longe de
qualquer perfeição e um pouco de paciência e jogo de cintura para
lidar com situações de stress e tensão é até saudável. Porém, a coisa
não é assim tão simples, porque, além de tudo isso, você também é
avaliado pelo modo como se comporta em tais ante-salas do
inferno.
Desde que começaram as pesquisas e observações sobre
modelos de comunicação não-verbal, a paranóia é parte integrante 55das avaliações sobre possíveis significados das expressões
corporais. Existem alguns trabalhos sérios sobre o assunto, claro,
mas como toda teoria da subjetividade, estes postulados não podem
ser utilizadas diretamente em toda e qualquer situação, nem tiradas
conclusões de forma apressada, quiçá temerária. O perigo é a
universalização, a aplicação generalizada de conceitos que
somente são válidos em âmbito estrito e sob condições ideais, numa
adaptação sem cuidado para o pragmático mundo corporativo.
Ora, um processo seletivo nunca é condição ideal, pois
além da fragilidade natural observada nos candidatos a um
emprego, soma-se a isso um verdadeiro circo de horrores onde são
manipuladas as expectativas em função de um perfil e não de um
panorama. Mas no senso comum que grassa nos corredores do setor
de seleção predomina a idéia que basta ter um dicionário básico de 56psicologia no bolso , alguns best sellers sazonais na gaveta e testes
comprados em boas casas do ramo para que se possa sair por aí
fazendo diagnósticos: Veja só o que me aconteceu:
- De novo estava ali, aguardando numa sala para ser chamado à
entrevista, pensava.
O calor sufocante da manhã fora substituído por uma tempestade
daquelas. Lá fora, raios e trovões. Após algum tempo mofando na
carteira, me indicaram uma nova sala para aguardar. Fiquei uns
54 Para maiores detalhes sobre postura pessoal em dinâmicas, continue lendo e, se quiser, consulte os links do apêndice.
55 Que me perdoe Pierre Weil e suas Relações Humanas na Família e no Trabalho, mas a coisa hoje saiu dos trilhos e existe uma verdadeira hipostasia de interpretações, as mais estapafúrdias possíveis sobre este importante tema.56 Isto não substitui uma faculdade, mesmo de terceira linha...Enfim, dá no mesmo.
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cinco minutos, olhando em torno, dez minutos e não vinha
ninguém. Resolvi aproveitar o tempo sozinho para assoar o nariz,
limpar meus óculos, coçar o joelho, ajeitar um pouco o terno, de
forma a estar mais à vontade e apresentável. Quinze minutos e eu já
estava bocejando, quando entrou a pessoa que ia me entrevistar.
- Olá! Desculpe o atraso eu estava terminando outra atividade, vamos
conversar?
- Claro! Estou à sua disposição.
Fiquei lá mais de quarenta minutos, respondendo às perguntas.
Como em muitos outros locais que onde fui entrevistado, a cadeira
me deixava muito em frente à mesa e minhas pernas ficavam meio
prensadas, o que me obrigava a me arrumar toda hora. A cadeira
era pesada e eu não conseguia empurrá-la para trás. Sentar e ficar
ali como um dois de paus não é meu estilo, eu não sou o tipo de
pessoa que consegue sentar sem que me incline para um lado ou
outro. Além disso, eu costumo gesticular, e não sei ficar com as mãos
paradas em cima do colo, inda mais demorando como estava o
interrogatório. Enfim, mesmo me contendo e, às vezes estudando
cautelosamente os meus gestos, não sou de forma nenhuma
inexpressivo.
O que me chamou a atenção, quase no final é que ela
ficava olhando por cima de mim, como se recebesse instruções de
alguém. Às vezes fazia uns gestos. Como havia uma infinidade de
outras saletas, separadas por divisórias de vidro e madeira,
instintivamente virei a cabeça, e recebi um sinal de advertência:
- Sr. Luís, por favor, não é nada. Vamos manter a atenção. Já estamos
terminando.
- Sim, pois não!
Depois desta chamada e já um tanto vencido pela tensão e o
cansaço, eu ainda encontrei forças para me concentrar em cada
gesto que ela fazia e para onde seus olhares se dirigiam. Descobri
que ela fixava os olhos em um ponto focal neutro, do qual podia
acompanhar toda a minha movimentação e postura. Era como se
ela estivesse ao mesmo tempo presente e buscando uma posição de
completo distanciamento. Mas também podia ser que estivessem
me observando de outro lugar. Finalmente acabara o suplício e, de
novo, veio àquela velha estória do aguarde um contato. Pedi para ir
ao banheiro. Ao retornar, mais aliviado, fui em busca da saída. Meio
perdido, acabei passando por um corredor, onde se reuniam
algumas pessoas e ouvindo, quase sem querer, a sentença, de mim
oculta:
- E aí? Fechou a vaga?
- Muito inseguro pro meu gosto. Não parava quieto no lugar! Sabe
aquele tipo besta que tenta compreender tudo o que se passa? Tenta dar
resposta para tudo? Ai que saco! Tive até que chamar a atenção. Esta
vaga tá difícil de fechar! Que dia, viu? Ninguém merece!
- Vai para o teste ou não vai? Preciso fechar a turma esta semana ou o
cliente não paga.
- Perca de tempo! Tenho mais quatro, fora um banco de candidatos
enorme para triar.
- Falando nisso, quem vai dividir comigo as dinâmicas da terça? Eu tô
sozinha cuidando de oito seletivas diferentes e umas trocentas
prospecções. Você faz isso Amadeu?
- Amanhã eu vejo se eu atendo uma parte, beleza?
Resolvi passar batido, tinha ouvido o suficiente por um dia.
Enquanto saía e ganhava o elevador, eles devem ter ficado lá a
conversar sobre as agruras de seu ofício. Para mim só restava
empreender uma descida de vinte andares e voltar para casa. Ficou
um nó na garganta. Eu queria sumir para dentro da terra, mas como
a chuva não dava trégua, resolvi refrescar a cuca e saí caminhando
em meio ao temporal. Nem adiantava reclamar, pois aquele não
parecia ter sido meu dia e além de tudo, havia esquecido o guarda-
chuva...
Outra Roubada...
Um mês depois de cair a ficha, me vi frente à antítese desta
malfadada experiência. Eu jurava que agora estava pronto para
mais uma empreitada, mas o que a memória registrou foi diferente.
Diário de bordo, data estelar 2.005 mark 10, notas do capitão:
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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cinco minutos, olhando em torno, dez minutos e não vinha
ninguém. Resolvi aproveitar o tempo sozinho para assoar o nariz,
limpar meus óculos, coçar o joelho, ajeitar um pouco o terno, de
forma a estar mais à vontade e apresentável. Quinze minutos e eu já
estava bocejando, quando entrou a pessoa que ia me entrevistar.
- Olá! Desculpe o atraso eu estava terminando outra atividade, vamos
conversar?
- Claro! Estou à sua disposição.
Fiquei lá mais de quarenta minutos, respondendo às perguntas.
Como em muitos outros locais que onde fui entrevistado, a cadeira
me deixava muito em frente à mesa e minhas pernas ficavam meio
prensadas, o que me obrigava a me arrumar toda hora. A cadeira
era pesada e eu não conseguia empurrá-la para trás. Sentar e ficar
ali como um dois de paus não é meu estilo, eu não sou o tipo de
pessoa que consegue sentar sem que me incline para um lado ou
outro. Além disso, eu costumo gesticular, e não sei ficar com as mãos
paradas em cima do colo, inda mais demorando como estava o
interrogatório. Enfim, mesmo me contendo e, às vezes estudando
cautelosamente os meus gestos, não sou de forma nenhuma
inexpressivo.
O que me chamou a atenção, quase no final é que ela
ficava olhando por cima de mim, como se recebesse instruções de
alguém. Às vezes fazia uns gestos. Como havia uma infinidade de
outras saletas, separadas por divisórias de vidro e madeira,
instintivamente virei a cabeça, e recebi um sinal de advertência:
- Sr. Luís, por favor, não é nada. Vamos manter a atenção. Já estamos
terminando.
- Sim, pois não!
Depois desta chamada e já um tanto vencido pela tensão e o
cansaço, eu ainda encontrei forças para me concentrar em cada
gesto que ela fazia e para onde seus olhares se dirigiam. Descobri
que ela fixava os olhos em um ponto focal neutro, do qual podia
acompanhar toda a minha movimentação e postura. Era como se
ela estivesse ao mesmo tempo presente e buscando uma posição de
completo distanciamento. Mas também podia ser que estivessem
me observando de outro lugar. Finalmente acabara o suplício e, de
novo, veio àquela velha estória do aguarde um contato. Pedi para ir
ao banheiro. Ao retornar, mais aliviado, fui em busca da saída. Meio
perdido, acabei passando por um corredor, onde se reuniam
algumas pessoas e ouvindo, quase sem querer, a sentença, de mim
oculta:
- E aí? Fechou a vaga?
- Muito inseguro pro meu gosto. Não parava quieto no lugar! Sabe
aquele tipo besta que tenta compreender tudo o que se passa? Tenta dar
resposta para tudo? Ai que saco! Tive até que chamar a atenção. Esta
vaga tá difícil de fechar! Que dia, viu? Ninguém merece!
- Vai para o teste ou não vai? Preciso fechar a turma esta semana ou o
cliente não paga.
- Perca de tempo! Tenho mais quatro, fora um banco de candidatos
enorme para triar.
- Falando nisso, quem vai dividir comigo as dinâmicas da terça? Eu tô
sozinha cuidando de oito seletivas diferentes e umas trocentas
prospecções. Você faz isso Amadeu?
- Amanhã eu vejo se eu atendo uma parte, beleza?
Resolvi passar batido, tinha ouvido o suficiente por um dia.
Enquanto saía e ganhava o elevador, eles devem ter ficado lá a
conversar sobre as agruras de seu ofício. Para mim só restava
empreender uma descida de vinte andares e voltar para casa. Ficou
um nó na garganta. Eu queria sumir para dentro da terra, mas como
a chuva não dava trégua, resolvi refrescar a cuca e saí caminhando
em meio ao temporal. Nem adiantava reclamar, pois aquele não
parecia ter sido meu dia e além de tudo, havia esquecido o guarda-
chuva...
Outra Roubada...
Um mês depois de cair a ficha, me vi frente à antítese desta
malfadada experiência. Eu jurava que agora estava pronto para
mais uma empreitada, mas o que a memória registrou foi diferente.
Diário de bordo, data estelar 2.005 mark 10, notas do capitão:
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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avaliar com muito cuidado as respostas e não subestimar o efeito da
concentração em grupo. Bem, estava eu lá, aguardando ser
atendido em outra seletiva, desta vez para um grande projeto de
treinamento para o lançamento de uma montadora americana.
Éramos uns vinte e poucos candidatos, quando houve a triagem e
agora contávamos com doze finalistas, aguardando ser anunciados.
Após a recepção, fomos colocados numa ampla sala e
pediram para que aguardássemos. Isto era por volta de meio dia e
até as três horas nada de acontecer a dinâmica. A tarefa era fazer
uma apresentação para um grupo de selecionadores e
observadores da própria empresa. Após algum tempo ali, as pessoas
dividiram-se em dois grupos, um dos quais demonstrava o franco
relacionamento anterior dos mesmos. Descobri, pelas conversas,
que eles haviam trabalhado para a prestadora de serviços que
efetuava a seleção anteriormente e agora retornavam para um novo
projeto. Neste meio tempo conversávamos, mas aquele papo vazio,
sobre fatos profissionais.
Lá pelas tantas, resolvi dar uma volta pelo andar, pois
alguém falou da existência de uma garrafa de café ou de uma copa.
O lugar estava cheio de tipos estranhos, e sentia aquela velha
sensação de peso no ar que transformava a sala moderna e clean em 57um verdadeiro locus suspectus. O que motivou minha iniciativa foi
estar sentado ao lado de um alemãozão irritado, que não parava de
mexer em seu notebook, resmungando e bufando sem parar pela
demora e, por outro que estava histérico, porque tinha ficado de
levar a mulher no médico e a coisa não terminava para ele poder
sair. Também tinha o grupinho das mulheres que sentou na ponta da
mesa e há horas falava sem parar, sem mencionar o papo chato que
os demais encenavam com ares de especialistas. Aquilo estava me
revirando o estômago e eu nem tinha almoçado. Meus últimos
trocados eu gastara numa lan house para gravar em cd a 58apresentação e ainda bem que não levei disquete , pois a coisa ali
era de pen drive para cima. Achei a tal garrafa e depois do café, saí 59para fumar um cigarro.
Fiquei enrolando um bom tempo nas escadas de incêndio
até que voltei para a sala. A situação ali não havia mudado, todos
continuava aguardando. Muito tempo depois e chegaram os
observadores da montadora para o início do processo. As mulheres
foram chamadas primeiro, cada uma entrava numa sala preparada
para a exposição e parecia nunca mais sair dali. Depois foi a vez do
alemão, que agora reclamava que ia perder o vôo. Engraçado notar
que, não obstante sua rudeza, ele era excepcionalmente bem
tratado. Foi um, foi outro e eu ali, curtindo uma imensa agonia. Os
que restavam comentavam o desenrolar dos fatos ou
congratulavam-se por suas técnicas didáticas, mas o que sobressaia
em seus olhos era a carga estática negativa de ansiedade e
apreensão. Comecei a me sentir mal e mesmo tendo me distanciado
para o lado das janelas em busca de ar fresco, não passava o efeito
warp típico da sensação de pressão baixa. Logo começou o enjôo, a
dor de cabeça e então, uma conclusão brilhante me ocorreu: eram
quase seis da tarde e tudo que havia ingerido eram vários cafés!
O resultado fora previsível: quando entrei na salinha
escura para finalmente poder fazer a minha apresentação, eu já não
era mais o mesmo. Estava um bagaço. Só não tinha ido embora por
causa da necessidade. De frente às quatro pessoas, que me
observavam sentadas em uma mesinha eu discorri sobre os
fundamentos de um treinamento bem planejado e até que fiz uma
boa exposição, mas um detalhe me havia escapado. Detalhe este
que versava sobre a ignorância sobre a construção do
conhecimento. Devido ao mal estar e cansaço eu nem mencionara
as técnicas comuns e aceitas de convencimento aos vendedores,
mas me concentrei em não enganá-los com promessas e motivá-los
consistentemente. Putz! Os caras me olhavam como se estivessem
vendo um alienígena.
Claro que o que eles queriam ouvir eram argumentos
padrão tipo “como encantar o cliente”, fazer o “walk around”, e as
outras obviedades que teriam o poder de causar “impacto” no
vendedor. Eu que fizera uma apresentação estruturada e com
conteúdo, fora classificada de “sem foco”, “prolixo”. Na miopia dos
bordões do marketing brasileiro que abusa da saturação, ninguém
consegue aceitar que alguém viesse discorrer sobre pontos
57 Local perigoso, suspeito, insalubre, pantanoso.58 Hoje tenho pen drive, notebook e servidores, mas na época, nem dava, pois meu querido Celeron 433 ainda funcionava, mas com o drive 3 ½ quebrado há anos...59 Eu ainda fumava naquela época. Viram como se pode melhorar? Basta ter fé, conhecimento e Vontade!
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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avaliar com muito cuidado as respostas e não subestimar o efeito da
concentração em grupo. Bem, estava eu lá, aguardando ser
atendido em outra seletiva, desta vez para um grande projeto de
treinamento para o lançamento de uma montadora americana.
Éramos uns vinte e poucos candidatos, quando houve a triagem e
agora contávamos com doze finalistas, aguardando ser anunciados.
Após a recepção, fomos colocados numa ampla sala e
pediram para que aguardássemos. Isto era por volta de meio dia e
até as três horas nada de acontecer a dinâmica. A tarefa era fazer
uma apresentação para um grupo de selecionadores e
observadores da própria empresa. Após algum tempo ali, as pessoas
dividiram-se em dois grupos, um dos quais demonstrava o franco
relacionamento anterior dos mesmos. Descobri, pelas conversas,
que eles haviam trabalhado para a prestadora de serviços que
efetuava a seleção anteriormente e agora retornavam para um novo
projeto. Neste meio tempo conversávamos, mas aquele papo vazio,
sobre fatos profissionais.
Lá pelas tantas, resolvi dar uma volta pelo andar, pois
alguém falou da existência de uma garrafa de café ou de uma copa.
O lugar estava cheio de tipos estranhos, e sentia aquela velha
sensação de peso no ar que transformava a sala moderna e clean em 57um verdadeiro locus suspectus. O que motivou minha iniciativa foi
estar sentado ao lado de um alemãozão irritado, que não parava de
mexer em seu notebook, resmungando e bufando sem parar pela
demora e, por outro que estava histérico, porque tinha ficado de
levar a mulher no médico e a coisa não terminava para ele poder
sair. Também tinha o grupinho das mulheres que sentou na ponta da
mesa e há horas falava sem parar, sem mencionar o papo chato que
os demais encenavam com ares de especialistas. Aquilo estava me
revirando o estômago e eu nem tinha almoçado. Meus últimos
trocados eu gastara numa lan house para gravar em cd a 58apresentação e ainda bem que não levei disquete , pois a coisa ali
era de pen drive para cima. Achei a tal garrafa e depois do café, saí 59para fumar um cigarro.
Fiquei enrolando um bom tempo nas escadas de incêndio
até que voltei para a sala. A situação ali não havia mudado, todos
continuava aguardando. Muito tempo depois e chegaram os
observadores da montadora para o início do processo. As mulheres
foram chamadas primeiro, cada uma entrava numa sala preparada
para a exposição e parecia nunca mais sair dali. Depois foi a vez do
alemão, que agora reclamava que ia perder o vôo. Engraçado notar
que, não obstante sua rudeza, ele era excepcionalmente bem
tratado. Foi um, foi outro e eu ali, curtindo uma imensa agonia. Os
que restavam comentavam o desenrolar dos fatos ou
congratulavam-se por suas técnicas didáticas, mas o que sobressaia
em seus olhos era a carga estática negativa de ansiedade e
apreensão. Comecei a me sentir mal e mesmo tendo me distanciado
para o lado das janelas em busca de ar fresco, não passava o efeito
warp típico da sensação de pressão baixa. Logo começou o enjôo, a
dor de cabeça e então, uma conclusão brilhante me ocorreu: eram
quase seis da tarde e tudo que havia ingerido eram vários cafés!
O resultado fora previsível: quando entrei na salinha
escura para finalmente poder fazer a minha apresentação, eu já não
era mais o mesmo. Estava um bagaço. Só não tinha ido embora por
causa da necessidade. De frente às quatro pessoas, que me
observavam sentadas em uma mesinha eu discorri sobre os
fundamentos de um treinamento bem planejado e até que fiz uma
boa exposição, mas um detalhe me havia escapado. Detalhe este
que versava sobre a ignorância sobre a construção do
conhecimento. Devido ao mal estar e cansaço eu nem mencionara
as técnicas comuns e aceitas de convencimento aos vendedores,
mas me concentrei em não enganá-los com promessas e motivá-los
consistentemente. Putz! Os caras me olhavam como se estivessem
vendo um alienígena.
Claro que o que eles queriam ouvir eram argumentos
padrão tipo “como encantar o cliente”, fazer o “walk around”, e as
outras obviedades que teriam o poder de causar “impacto” no
vendedor. Eu que fizera uma apresentação estruturada e com
conteúdo, fora classificada de “sem foco”, “prolixo”. Na miopia dos
bordões do marketing brasileiro que abusa da saturação, ninguém
consegue aceitar que alguém viesse discorrer sobre pontos
57 Local perigoso, suspeito, insalubre, pantanoso.58 Hoje tenho pen drive, notebook e servidores, mas na época, nem dava, pois meu querido Celeron 433 ainda funcionava, mas com o drive 3 ½ quebrado há anos...59 Eu ainda fumava naquela época. Viram como se pode melhorar? Basta ter fé, conhecimento e Vontade!
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importantes como ação contínua, postura ética, perspectivas de
longo prazo e ainda sugerisse que se devia respeitar a inteligência da 60equipe. Para encurtar, dias depois recebi um e-mail pela
participação e a campanha da montadora já estava berrando na TV.
O interessante foi notar que o tal lançamento do “carro
diferenciado” era simplesmente uma maquiagem da versão
anterior, com menos potência, com poucos opcionais de série e
preço até mais elevado. O tonto aqui não havia se tocado que o
objetivo real da campanha relâmpago não era alavancar as vendas
de um produto consagrado, motivar a equipe, manter a união rumo
a um objetivo, criar mercado e fidelizar o cliente, avante ao futuro
glorioso. Mas sim, convencer, por ora, os profissionais - que
conhecem mecânica e acabamento - a vender um carro de
qualidade inferior com a mesma gana e entusiasmo que fariam se
oferecessem ao cliente algo realmente espetacular, ou seja: dobrar
suas resistências naturais e convencê-los das vantagens do gato
sobre a lebre. Qualidade? Cuidado ao utilizar este conceito! Pode
ser prejudicial ao seu futuro emprego. Afinal como os chineses já
descobriram há muito tempo, algo descartável, ordinário, mas
muito bem apresentado vende tanto quanto algo que funcione e
satisfaça por longo tempo.
Mas eu estou fugindo do assunto. O exemplo que
realmente ilustra a incômoda situação de estar sendo observado - e
avaliado - foi o que ocorreu em uma outra dinâmica, tempos depois.
Como sempre, lá estava eu pensando na vida com o mesmo 61entusiasmo do jabuti Osmar , quando tocou o telefone e me
chamaram para uma entrevista.
Dia seguinte lá estava eu na Vila Olímpia, buscando vaga
para estacionar e cumprindo todo o ritual de travar o volante, tirar o
cachimbo da bobina, escapar do flanelinha. Já que estava mesmo
um pouco adiantado, resolvi tomar um café e andei até uma padoca
próxima. Depois fui até o hall de entrada do edifício e dei de cara
com muitas pessoas também aguardando.
Outras mais foram chegando, se ajuntando, até que
alguém veio e indicou uma sala para que nos acomodássemos. Num
quadro branco estavam algumas anotações: o salário, os poucos
benefícios, as muitas obrigações da descrição do cargo e o nome do
entrevistador.
Por mais algum tempo continuaram chegando pessoas, até
que a sala ficou lotada. O homem abriu para perguntas e alguns
começaram a questionar o cargo, o baixo salário, as condições de
trabalho, que não tinham sido informados corretamente e, enfim,
choveram reclamações dos que se achavam mais qualificados. O
sujeito nem se abalou, riu e disse que se era assim, então não
deveriam perder tempo e retirar-se. Depois que os descontentes se
levantaram, ele continuou a operação informando que ao contrário
do que era usual, a resposta para os candidatos reprovados sairia na
hora e no final do dia já teriam preenchido a vaga. Dito isso, pediu
uma redação, forma humana, acrósticos, tudo no verso dos
currículos - para facilitar, segundo ele. Quando todos acabaram,
houve uma pausa e fomos para o corredor tomar água e ficar
batendo papo, conhecendo as pessoas. Mesmo com os que saíram
ainda restava umas quinze almas por ali.
Fui ao banheiro e lavei o rosto para me manter o mais
desperto possível, quando voltei para a sala o entrevistador estava
com vários currículos na mão. Para meu espanto, conforme os
nomes eram anunciados os candidatos se levantavam e iam
embora. Ficamos eu e mais três pessoas a aguardar o
prosseguimento do processo indubitavelmente rápido, mas, pelo
menos, eu era um dos finalistas. Depois veio mais uma hora de jogos
com perguntas idiotas do tipo: você é contra ou a favor do aborto, da
eutanásia, da erradicação dos pobres. Tudo para verificar o nível de
stress e competição nos argumentos de cada um. Eu estava me
dando bem, mas os outros competidores, percebendo que não
podiam me vencer pelo raciocínio, optaram por enclausurar-se em
posturas simpáticas, tentando “ganhar” o entrevistador pelo senso
comum, tipo: prefiro não convencer, mas ser o mais adequado e
coerente (para não dizer, subserviente).
60 Verdade seja dita: Coisa raríssima nestes dias de “faça o que eu digo e não faça o que eu faço”.61 Era uma piada que meu professor de Lógica sempre contava na faculdade sobre um jabuti preguiçoso.
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importantes como ação contínua, postura ética, perspectivas de
longo prazo e ainda sugerisse que se devia respeitar a inteligência da 60equipe. Para encurtar, dias depois recebi um e-mail pela
participação e a campanha da montadora já estava berrando na TV.
O interessante foi notar que o tal lançamento do “carro
diferenciado” era simplesmente uma maquiagem da versão
anterior, com menos potência, com poucos opcionais de série e
preço até mais elevado. O tonto aqui não havia se tocado que o
objetivo real da campanha relâmpago não era alavancar as vendas
de um produto consagrado, motivar a equipe, manter a união rumo
a um objetivo, criar mercado e fidelizar o cliente, avante ao futuro
glorioso. Mas sim, convencer, por ora, os profissionais - que
conhecem mecânica e acabamento - a vender um carro de
qualidade inferior com a mesma gana e entusiasmo que fariam se
oferecessem ao cliente algo realmente espetacular, ou seja: dobrar
suas resistências naturais e convencê-los das vantagens do gato
sobre a lebre. Qualidade? Cuidado ao utilizar este conceito! Pode
ser prejudicial ao seu futuro emprego. Afinal como os chineses já
descobriram há muito tempo, algo descartável, ordinário, mas
muito bem apresentado vende tanto quanto algo que funcione e
satisfaça por longo tempo.
Mas eu estou fugindo do assunto. O exemplo que
realmente ilustra a incômoda situação de estar sendo observado - e
avaliado - foi o que ocorreu em uma outra dinâmica, tempos depois.
Como sempre, lá estava eu pensando na vida com o mesmo 61entusiasmo do jabuti Osmar , quando tocou o telefone e me
chamaram para uma entrevista.
Dia seguinte lá estava eu na Vila Olímpia, buscando vaga
para estacionar e cumprindo todo o ritual de travar o volante, tirar o
cachimbo da bobina, escapar do flanelinha. Já que estava mesmo
um pouco adiantado, resolvi tomar um café e andei até uma padoca
próxima. Depois fui até o hall de entrada do edifício e dei de cara
com muitas pessoas também aguardando.
Outras mais foram chegando, se ajuntando, até que
alguém veio e indicou uma sala para que nos acomodássemos. Num
quadro branco estavam algumas anotações: o salário, os poucos
benefícios, as muitas obrigações da descrição do cargo e o nome do
entrevistador.
Por mais algum tempo continuaram chegando pessoas, até
que a sala ficou lotada. O homem abriu para perguntas e alguns
começaram a questionar o cargo, o baixo salário, as condições de
trabalho, que não tinham sido informados corretamente e, enfim,
choveram reclamações dos que se achavam mais qualificados. O
sujeito nem se abalou, riu e disse que se era assim, então não
deveriam perder tempo e retirar-se. Depois que os descontentes se
levantaram, ele continuou a operação informando que ao contrário
do que era usual, a resposta para os candidatos reprovados sairia na
hora e no final do dia já teriam preenchido a vaga. Dito isso, pediu
uma redação, forma humana, acrósticos, tudo no verso dos
currículos - para facilitar, segundo ele. Quando todos acabaram,
houve uma pausa e fomos para o corredor tomar água e ficar
batendo papo, conhecendo as pessoas. Mesmo com os que saíram
ainda restava umas quinze almas por ali.
Fui ao banheiro e lavei o rosto para me manter o mais
desperto possível, quando voltei para a sala o entrevistador estava
com vários currículos na mão. Para meu espanto, conforme os
nomes eram anunciados os candidatos se levantavam e iam
embora. Ficamos eu e mais três pessoas a aguardar o
prosseguimento do processo indubitavelmente rápido, mas, pelo
menos, eu era um dos finalistas. Depois veio mais uma hora de jogos
com perguntas idiotas do tipo: você é contra ou a favor do aborto, da
eutanásia, da erradicação dos pobres. Tudo para verificar o nível de
stress e competição nos argumentos de cada um. Eu estava me
dando bem, mas os outros competidores, percebendo que não
podiam me vencer pelo raciocínio, optaram por enclausurar-se em
posturas simpáticas, tentando “ganhar” o entrevistador pelo senso
comum, tipo: prefiro não convencer, mas ser o mais adequado e
coerente (para não dizer, subserviente).
60 Verdade seja dita: Coisa raríssima nestes dias de “faça o que eu digo e não faça o que eu faço”.61 Era uma piada que meu professor de Lógica sempre contava na faculdade sobre um jabuti preguiçoso.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
112 113
Finda esta etapa, o sujeito nos colocou para correr e disse
que até as seis horas daria um telefonema. Quem não o recebesse
podia ir cantar em outra freguesia. Estou até hoje aguardando o
telefone tocar, e isto, é claro que não vai acontecer. Provavelmente
eu fui o melhor, mais articulado, arrojado, empreendedor e
racional. Mas como o cargo não era executivo, e sim operacional,
devem ter achado que eu não “servia”.
Na maioria das vezes, destacar-se não significa aprovação,
mas pelo contrário, rejeição. É preciso adequar o discurso para o
que está previsto no perfil ou você, por melhor que seja, estará
descartado. Veja, no final do livro, um “causo” interessante que
ocorreu com Winston Churchill e que tem circulado na internet: a 62inteligência e capacidade sempre ameaçam os medíocres. E estes
revidam ferozmente. Que foi? Nunca viu novela! É real!
O mais engraçado é que a empresa não fechou a vaga. Por
mais de dois meses ainda vi o mesmo anúncio em jornais e sites de
empregos. O que será que aconteceu? Os candidatos não se
habituaram ao clima serrano do Rio? Os naturebas não gostaram
dos candidatos aprovados à corte de facão? Ou se tratava de mais
uma armadilha? Eis mais um mistério que ronda os perdidos nas
selvas do desemprego e que nenhuma ciência ou metafísica jamais
responderá!
No entanto, novamente a filosofia pode dar algumas pistas,
dentre estes paus e pedras do meio do caminho, situando a
relevância do respeito à condição humana, valorizando condutas
afirmativas e propondo a proteção do indivíduo contra danos
subjetivos:
Se nos sujeitarmos a um poder irresponsável, descobriremos,
antes de mais nada, que existem muitas coisas que não somos
livres para dizer ou fazer. Acima de tudo, precisaremos ter certeza
de evitar dizer ou fazer algo que possa ser interpretado pelos
mandatários como ato de desafio, competição ou crítica. Também
descobriremos que nos falta a liberdade de nos abstermos de dizer
ou fazer certas coisas. Quando chamados a aconselhar nossos
mandatários ou comentar seu comportamento, nos veremos
constrangidos a endossar toda e qualquer política que eles já
desejem implementar. Mais sério ainda é o permanente dano
psicológico infligido por essas formas de autocensura... A servidão
inevitavelmente alimenta o servilismo. Quando toda uma nação é
impedida de exercer seus mais elevados talentos e virtudes, essas
qualidades começam a atrofiar e as pessoas gradualmente
mergulham numa abjeta condição de torpor e apatia.63(Skinner,2002)
62 Continue lendo e aprenda um pouco mais sobre como se apresentar numa primeira vez.
63 Quentin Skinner - A Third Concept of Liberty in London Review of Books, vol. 24, nr.7, 2002.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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Finda esta etapa, o sujeito nos colocou para correr e disse
que até as seis horas daria um telefonema. Quem não o recebesse
podia ir cantar em outra freguesia. Estou até hoje aguardando o
telefone tocar, e isto, é claro que não vai acontecer. Provavelmente
eu fui o melhor, mais articulado, arrojado, empreendedor e
racional. Mas como o cargo não era executivo, e sim operacional,
devem ter achado que eu não “servia”.
Na maioria das vezes, destacar-se não significa aprovação,
mas pelo contrário, rejeição. É preciso adequar o discurso para o
que está previsto no perfil ou você, por melhor que seja, estará
descartado. Veja, no final do livro, um “causo” interessante que
ocorreu com Winston Churchill e que tem circulado na internet: a 62inteligência e capacidade sempre ameaçam os medíocres. E estes
revidam ferozmente. Que foi? Nunca viu novela! É real!
O mais engraçado é que a empresa não fechou a vaga. Por
mais de dois meses ainda vi o mesmo anúncio em jornais e sites de
empregos. O que será que aconteceu? Os candidatos não se
habituaram ao clima serrano do Rio? Os naturebas não gostaram
dos candidatos aprovados à corte de facão? Ou se tratava de mais
uma armadilha? Eis mais um mistério que ronda os perdidos nas
selvas do desemprego e que nenhuma ciência ou metafísica jamais
responderá!
No entanto, novamente a filosofia pode dar algumas pistas,
dentre estes paus e pedras do meio do caminho, situando a
relevância do respeito à condição humana, valorizando condutas
afirmativas e propondo a proteção do indivíduo contra danos
subjetivos:
Se nos sujeitarmos a um poder irresponsável, descobriremos,
antes de mais nada, que existem muitas coisas que não somos
livres para dizer ou fazer. Acima de tudo, precisaremos ter certeza
de evitar dizer ou fazer algo que possa ser interpretado pelos
mandatários como ato de desafio, competição ou crítica. Também
descobriremos que nos falta a liberdade de nos abstermos de dizer
ou fazer certas coisas. Quando chamados a aconselhar nossos
mandatários ou comentar seu comportamento, nos veremos
constrangidos a endossar toda e qualquer política que eles já
desejem implementar. Mais sério ainda é o permanente dano
psicológico infligido por essas formas de autocensura... A servidão
inevitavelmente alimenta o servilismo. Quando toda uma nação é
impedida de exercer seus mais elevados talentos e virtudes, essas
qualidades começam a atrofiar e as pessoas gradualmente
mergulham numa abjeta condição de torpor e apatia.63(Skinner,2002)
62 Continue lendo e aprenda um pouco mais sobre como se apresentar numa primeira vez.
63 Quentin Skinner - A Third Concept of Liberty in London Review of Books, vol. 24, nr.7, 2002.
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CAPÍTULO III
NA COVA DOS LEÕES
1 - Na frente do empregador: O Teatro do Chefe
Se vocês conseguiram manter a sanidade através do longo e
tenebroso percurso entre a seleção, testes e entrevistas, fatalmente
se depararão com uma última e não menos importante etapa de sua
via crucis: se apresentar ao empregador. Normalmente, os
contratadores não confiam totalmente nas agências e pedem para
“conhecer e aprovar” os candidatos finalistas. A palavra final
sempre é deles, já que dificilmente uma empresa ou selecionador
vai abrir o bico em caso de alguma escolha equivocada, eles são
pragmáticos demais para isso (querem é concluir o processo e
receber os honorários. Se não der certo, iniciam a seleção do zero, e
vão lá cobrar de novo dos stakeholders, hahaha!). Portanto, prepare-
se para viver um esquete manjado, gasto, do tipo enlatado trash
americano, onde no interrogatório existe o policial bonzinho e o
malvado.
Cair nesta esparrela significa botar a perder todo o seu
esforço e orações. Não se esqueça que nem Deus pode se imiscuir
no livre arbítrio humano, deste modo, esteja pronto para negociar
com esta dupla dinâmica. Por vezes é um só, que se mostra afável ou
duro, conforme a ocasião. Mas normalmente são dois,
desempenhando um teatrinho de fantoches. Nestas situações, o
mais importante é não acreditar nem por um minuto no que as
aparências indicam, pois se trata de uma situação armada para os
incautos, que se crendo quase aprovados, abrem a guarda e aí,
baubau!
Veja só você, ali, na frente de dois desconhecidos: um
simpático e comunicativo e outro sério e circunspecto, com seu
currículo na mão. O primeiro faz tudo para cativar sua atenção e aí
você só responde a ele, instintivamente ignorando ou desprezando
o outro, ameaçador. O cara levanta a voz, extrovertido e você, feliz,
acompanha o jogo. Ele dá risada e você se sente em casa e arrisca
até umas tiradas de efeito, engraçadas mesmo. O outro, só
observando e querendo saber sobre coisas profissionais. O primeiro
amenizando todos os enfoques apresenta-se como o subalterno do
chefe “bravo”, mas que pode ser manipulado com jeitinho e você
indo na dele. Eles trocam olhares a todo o momento, cúmplices que
são, e você agora discorre abertamente sobre seus sentimentos,
posição política, futebol, sobre o que ama e odeia, além de ter a
ousadia de contradizer o caladão, pois concorda com o bem falante.
Perdeu, cara!
O objetivo aqui é saber qual a chance de você ser um
completo irresponsável, se resiste à pressão, a uma “boa conversa”,
se obedece ou não à hierarquia. Querem, na realidade, saber se
você pode ser diplomático e confiante o suficiente para afirmar suas
opiniões e não ofender as posições contrárias. Querem saber como
você se comportaria de fato, se sabe ou não o que diz saber. Se você
caiu na lábia do “amigo”, deu atenção só a ele, ficou bem
demonstrado que sua personalidade é maleável “demais” ou, com
certeza, você deixou escapar alguma minúcia que eles abominam e
você já Elvis! Pelo contrário, se você detestou a intimidade,
acautelou-se e ficou de olho apenas no taciturno, também não foi
muito bem, já que na vida real o maluco pode ser ele e, deste modo,
mesmo agindo como o “sério”, você não se mostrou autêntico. Além
dos problemas de uma “escolha” entre os dois tipos de abordagem,
existe também a questão de simpatia ou antipatia. Poucas pessoas
possuem um arcabouço ético ou psicológico suficiente para
enfrentar quem é potencialmente melhor que si. Se você foi muito
brilhante, naturalmente é um ente ameaçador e será descartado na
hora, pela covardia inerente ao mundo cão.
Se, você apenas optou por um dos dois lados, certamente
despertou antipatia no que foi preterido e também estará fora. Se
você não conseguiu ser franco, autêntico, afável e objetivo o
suficiente, também dançou. Sem mencionar que existem disputas
de poder dentro de uma empresa e que uma escolha certa
(contratarem você, por exemplo), pode ser anulada pela
mesquinharia e egoísmo tipicamente humanos. Acredite no que
digo: não existe uma ética corporativa ou sociedade empresarial
perfeita baseada apenas na qualificação e experiência. Isto é uma
ideologia que nos vendem os manuais administrativos de auto-
ajuda. A realidade, como sempre pode ser outra. Veja só um caso
real - aconteceu comigo - um pouco antes de me demitirem na
indústria kamikaze onde eu trabalhava:
64- Luíííís, gritou o chefe da sala de reuniões, venha aqui já!
- Pois não? Você me chamou?
- Já passa das 14h30 e o Datake não chegou. As promotoras estão
esperando há um tempão e você vai me ajudar na seleção. Sentaí que
vou explicar o esqueminha. Prestenção. Ó, o negócio é o seguinte: uma
hora você é o mala, se faz de sério e depois é a minha vez de apertar.
Outra coisa: você não me abra a boca quando eu estiver falando. Essa
mania que você tem de contemporizar é irritante. Não estamos aqui
buscando o lado melhor das coisas, nem temos tempo a perder.
Estamos contratando, captou? Vai lá e manda a primeira entrar. Eu
começo.
- Certo...Você é quem manda.
- Vai, vai logo.
Uma a uma eu conduzi as candidatas para dentro da sala e ali,
iniciávamos uma bateria de perguntas pessoais e profissionais.
Queríamos saber de todos os “ses”: se eram casadas; se tinham
filhos; se pretendiam engravidar; se agüentavam pressão; se
lidavam com clientes insatisfeitos, se moravam longe, quais os
objetivos, porque estavam ali, o que esperavam da vida e as
fazíamos repetirem tudo o que já estava escrito no currículo como
nas fichas que haviam preenchido antes. Verificávamos as
respostas: se os objetivos eram compatíveis (se não tinham,
cortávamos, se eram ambiciosas demais, cortávamos também, pois
sabíamos que nunca haveria promoções e, na verdade, a vaga era
64 Impossível não relacionar minha situação com a de Mortadelo...
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
118 119
Veja só você, ali, na frente de dois desconhecidos: um
simpático e comunicativo e outro sério e circunspecto, com seu
currículo na mão. O primeiro faz tudo para cativar sua atenção e aí
você só responde a ele, instintivamente ignorando ou desprezando
o outro, ameaçador. O cara levanta a voz, extrovertido e você, feliz,
acompanha o jogo. Ele dá risada e você se sente em casa e arrisca
até umas tiradas de efeito, engraçadas mesmo. O outro, só
observando e querendo saber sobre coisas profissionais. O primeiro
amenizando todos os enfoques apresenta-se como o subalterno do
chefe “bravo”, mas que pode ser manipulado com jeitinho e você
indo na dele. Eles trocam olhares a todo o momento, cúmplices que
são, e você agora discorre abertamente sobre seus sentimentos,
posição política, futebol, sobre o que ama e odeia, além de ter a
ousadia de contradizer o caladão, pois concorda com o bem falante.
Perdeu, cara!
O objetivo aqui é saber qual a chance de você ser um
completo irresponsável, se resiste à pressão, a uma “boa conversa”,
se obedece ou não à hierarquia. Querem, na realidade, saber se
você pode ser diplomático e confiante o suficiente para afirmar suas
opiniões e não ofender as posições contrárias. Querem saber como
você se comportaria de fato, se sabe ou não o que diz saber. Se você
caiu na lábia do “amigo”, deu atenção só a ele, ficou bem
demonstrado que sua personalidade é maleável “demais” ou, com
certeza, você deixou escapar alguma minúcia que eles abominam e
você já Elvis! Pelo contrário, se você detestou a intimidade,
acautelou-se e ficou de olho apenas no taciturno, também não foi
muito bem, já que na vida real o maluco pode ser ele e, deste modo,
mesmo agindo como o “sério”, você não se mostrou autêntico. Além
dos problemas de uma “escolha” entre os dois tipos de abordagem,
existe também a questão de simpatia ou antipatia. Poucas pessoas
possuem um arcabouço ético ou psicológico suficiente para
enfrentar quem é potencialmente melhor que si. Se você foi muito
brilhante, naturalmente é um ente ameaçador e será descartado na
hora, pela covardia inerente ao mundo cão.
Se, você apenas optou por um dos dois lados, certamente
despertou antipatia no que foi preterido e também estará fora. Se
você não conseguiu ser franco, autêntico, afável e objetivo o
suficiente, também dançou. Sem mencionar que existem disputas
de poder dentro de uma empresa e que uma escolha certa
(contratarem você, por exemplo), pode ser anulada pela
mesquinharia e egoísmo tipicamente humanos. Acredite no que
digo: não existe uma ética corporativa ou sociedade empresarial
perfeita baseada apenas na qualificação e experiência. Isto é uma
ideologia que nos vendem os manuais administrativos de auto-
ajuda. A realidade, como sempre pode ser outra. Veja só um caso
real - aconteceu comigo - um pouco antes de me demitirem na
indústria kamikaze onde eu trabalhava:
64- Luíííís, gritou o chefe da sala de reuniões, venha aqui já!
- Pois não? Você me chamou?
- Já passa das 14h30 e o Datake não chegou. As promotoras estão
esperando há um tempão e você vai me ajudar na seleção. Sentaí que
vou explicar o esqueminha. Prestenção. Ó, o negócio é o seguinte: uma
hora você é o mala, se faz de sério e depois é a minha vez de apertar.
Outra coisa: você não me abra a boca quando eu estiver falando. Essa
mania que você tem de contemporizar é irritante. Não estamos aqui
buscando o lado melhor das coisas, nem temos tempo a perder.
Estamos contratando, captou? Vai lá e manda a primeira entrar. Eu
começo.
- Certo...Você é quem manda.
- Vai, vai logo.
Uma a uma eu conduzi as candidatas para dentro da sala e ali,
iniciávamos uma bateria de perguntas pessoais e profissionais.
Queríamos saber de todos os “ses”: se eram casadas; se tinham
filhos; se pretendiam engravidar; se agüentavam pressão; se
lidavam com clientes insatisfeitos, se moravam longe, quais os
objetivos, porque estavam ali, o que esperavam da vida e as
fazíamos repetirem tudo o que já estava escrito no currículo como
nas fichas que haviam preenchido antes. Verificávamos as
respostas: se os objetivos eram compatíveis (se não tinham,
cortávamos, se eram ambiciosas demais, cortávamos também, pois
sabíamos que nunca haveria promoções e, na verdade, a vaga era
64 Impossível não relacionar minha situação com a de Mortadelo...
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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temporária), se não chegariam atrasadas, de faltar para levar filhos
ao médico, qual a cor da pele, tipo físico, como estavam vestidas,
evidências de orientação sexual ou se haveria “facilidades” de
abordagem sexual posterior, se eram articuladas, se poderiam ser
treinadas, enfim: todo um escopo dos mais abjetos, ilegais e sub-
reptícios era tido como “critério”. Mas no final quem decidia era o
cara, sozinho. Eu estava ali apenas porque obedecia a ordens.
Nos intervalos, trocávamos de função e fazíamos um
resumo da entrevista. Durante as perguntas, um ficava de olho no
outro para frisar ou denunciar alguma coisa fora dos padrões.
Depois eram feitas anotações nos currículos e separados para
apresentar ao gerente, que depois iria falar com as que foram
se lec ionadas . Mui tas daquelas coi tadas , sent indo -se
“compreendidas” pelo empregador, contavam seus sonhos e
esperanças de vir a trabalhar numa “empresa grande”, que isto iria
dar uma chance de melhorar o futuro de seus filhos, ajudarem em
casa, voltar a estudar, casar, pagar suas dívidas, arrumar um
emprego, ser efetivada e tudo o que é normal, sadio e desejável em
qualquer pessoa. Mas estas eram as suas famosas últimas palavras...
Tive que ter estômago para agüentar aquela tarde
interminável. Foram mais de 20 entrevistas para selecionarmos um
time de 8 pessoas. Qualquer menção a situações e opiniões que eles
achavam estar “fora do perfil” era motivo de perder pontos na
avaliação. No final, de todas as candidatas que eu selecionei por
suas competências, experiência no perfil da vaga e - principalmente 65- por sua necessidade real de emprego , foram descartadas. Eu, que
a despeito da advertência inicial já havia levado algumas duras, por
me intrometer nos juízos do chefe, mesmo assim arrisquei e bati o pé
para contratar uma que me pareceu especial. Afinal, eu seria o
supervisor em campo e precisava de ao menos uma profissional que
desse conta do recado e não alguém sem capacidades. Assim,
convenci-o de que ela era interessante e ele acabou descartando
outra que nem sequer sabia assinar o nome direito, mas tinha dotes
estéticos inegáveis. Foi a contragosto, quase queimei meu filme,
mas ela saiu e a mais competente acabou sendo contratada.
Como ilustrou a experiência acima, sempre que você
estiver na mesma situação pense e pondere, muito, suas respostas e
não se deixe levar pela onda. Nada é o que parece ser. Procure ser
afável, desembaraçado e até sociável, mas imponha-se um limite e
não saia dele. Não tente impressionar os dois ao mesmo tempo, pois
eles estarão usando de posturas e discursos diferentes e, como diz a
Bíblia, não dá para servir a dois senhores. Seja o mais autêntico
possível, inclusive procure deixar bem claro que você é uma pessoa
que consegue enfrentar pressões. Isto significa que se tiver que
discordar dos dois em assuntos de ordem ética ou polêmica, sinta-se
à vontade.
Outro ponto deste breve capítulo são as entrevistas finais
que são levadas a cabo por uma só pessoa. Talvez sejam as mais
perigosas, pois além de você sentir na pele que é estar quase lá, o
nervosismo pode botar tudo a perder. Sem mencionar que nestes
casos, o clima agradável pode ser a mais fatal e traiçoeira armadilha
que você já enfrentou na sua vida profissional. Veja só pelo que
passou este humilde narrador, quando caiu nesta esparrela:
- Bom dia! Prazer em conhecer! Sente-se, disse o anfitrião, afável e
generoso. Nossa! Seu currículo é impressionante. Parece que encontrei
quem estava procurando. Vamos lá! Me diga um pouco mais sobre
você.
- Bom, eu agradeço muito estar sendo recebido. Na verdade procuro
uma oportunidade de poder oferecer minha dedicação. Tenho grande
experiência em marketing, vendas e na parte promocional e acredito
que posso contribuir muito para o desempenho da equipe.
- Sei. Nossa empresa trabalha com armas e pretendemos expandir
nossos negócios junto aos órgãos militares e de segurança. O que temos
em mente é uma pessoa que possa fazer a interface entre a parte de
relações públicas, marketing e promoção. Você se julga apto para a
vaga? Tem facilidade em chegar até aqui? Está estudando? Quais seus
objetivos?
Entusiasmado com a recepção comecei a discorrer sobre o que
sabia fazer, sobre a alegria de estar ali, que não via nenhum
problema com o produto (odeio armas!) e estava à total disposição
da empresa. Mas, enquanto falava, uma sensação emergiu de meu 65 Ninguém trabalha mais e motivadamente que um empregado agradecido. Isto, só os consultores não vêem.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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temporária), se não chegariam atrasadas, de faltar para levar filhos
ao médico, qual a cor da pele, tipo físico, como estavam vestidas,
evidências de orientação sexual ou se haveria “facilidades” de
abordagem sexual posterior, se eram articuladas, se poderiam ser
treinadas, enfim: todo um escopo dos mais abjetos, ilegais e sub-
reptícios era tido como “critério”. Mas no final quem decidia era o
cara, sozinho. Eu estava ali apenas porque obedecia a ordens.
Nos intervalos, trocávamos de função e fazíamos um
resumo da entrevista. Durante as perguntas, um ficava de olho no
outro para frisar ou denunciar alguma coisa fora dos padrões.
Depois eram feitas anotações nos currículos e separados para
apresentar ao gerente, que depois iria falar com as que foram
se lec ionadas . Mui tas daquelas coi tadas , sent indo -se
“compreendidas” pelo empregador, contavam seus sonhos e
esperanças de vir a trabalhar numa “empresa grande”, que isto iria
dar uma chance de melhorar o futuro de seus filhos, ajudarem em
casa, voltar a estudar, casar, pagar suas dívidas, arrumar um
emprego, ser efetivada e tudo o que é normal, sadio e desejável em
qualquer pessoa. Mas estas eram as suas famosas últimas palavras...
Tive que ter estômago para agüentar aquela tarde
interminável. Foram mais de 20 entrevistas para selecionarmos um
time de 8 pessoas. Qualquer menção a situações e opiniões que eles
achavam estar “fora do perfil” era motivo de perder pontos na
avaliação. No final, de todas as candidatas que eu selecionei por
suas competências, experiência no perfil da vaga e - principalmente 65- por sua necessidade real de emprego , foram descartadas. Eu, que
a despeito da advertência inicial já havia levado algumas duras, por
me intrometer nos juízos do chefe, mesmo assim arrisquei e bati o pé
para contratar uma que me pareceu especial. Afinal, eu seria o
supervisor em campo e precisava de ao menos uma profissional que
desse conta do recado e não alguém sem capacidades. Assim,
convenci-o de que ela era interessante e ele acabou descartando
outra que nem sequer sabia assinar o nome direito, mas tinha dotes
estéticos inegáveis. Foi a contragosto, quase queimei meu filme,
mas ela saiu e a mais competente acabou sendo contratada.
Como ilustrou a experiência acima, sempre que você
estiver na mesma situação pense e pondere, muito, suas respostas e
não se deixe levar pela onda. Nada é o que parece ser. Procure ser
afável, desembaraçado e até sociável, mas imponha-se um limite e
não saia dele. Não tente impressionar os dois ao mesmo tempo, pois
eles estarão usando de posturas e discursos diferentes e, como diz a
Bíblia, não dá para servir a dois senhores. Seja o mais autêntico
possível, inclusive procure deixar bem claro que você é uma pessoa
que consegue enfrentar pressões. Isto significa que se tiver que
discordar dos dois em assuntos de ordem ética ou polêmica, sinta-se
à vontade.
Outro ponto deste breve capítulo são as entrevistas finais
que são levadas a cabo por uma só pessoa. Talvez sejam as mais
perigosas, pois além de você sentir na pele que é estar quase lá, o
nervosismo pode botar tudo a perder. Sem mencionar que nestes
casos, o clima agradável pode ser a mais fatal e traiçoeira armadilha
que você já enfrentou na sua vida profissional. Veja só pelo que
passou este humilde narrador, quando caiu nesta esparrela:
- Bom dia! Prazer em conhecer! Sente-se, disse o anfitrião, afável e
generoso. Nossa! Seu currículo é impressionante. Parece que encontrei
quem estava procurando. Vamos lá! Me diga um pouco mais sobre
você.
- Bom, eu agradeço muito estar sendo recebido. Na verdade procuro
uma oportunidade de poder oferecer minha dedicação. Tenho grande
experiência em marketing, vendas e na parte promocional e acredito
que posso contribuir muito para o desempenho da equipe.
- Sei. Nossa empresa trabalha com armas e pretendemos expandir
nossos negócios junto aos órgãos militares e de segurança. O que temos
em mente é uma pessoa que possa fazer a interface entre a parte de
relações públicas, marketing e promoção. Você se julga apto para a
vaga? Tem facilidade em chegar até aqui? Está estudando? Quais seus
objetivos?
Entusiasmado com a recepção comecei a discorrer sobre o que
sabia fazer, sobre a alegria de estar ali, que não via nenhum
problema com o produto (odeio armas!) e estava à total disposição
da empresa. Mas, enquanto falava, uma sensação emergiu de meu 65 Ninguém trabalha mais e motivadamente que um empregado agradecido. Isto, só os consultores não vêem.
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inconsciente. Algo de inseguro estava se apresentando e ia
crescendo. Eu estava botando para fora todas as minhas energias,
no afã de convencer e manter a empatia com o dono da empresa,
mas sentia que me enfraquecia a cada frase dita. Quanto mais me
empenhava, mais as palavras me escapavam e lutava contra mim
mesmo para parecer coerente. Era estranho me sentir assim, no
entanto, continuei. Eu precisava aproveitar o momento e
impressionar o homem a todo custo. Assim falei até as tampas e só
parei quando, já exausto, percebi que não tinha mais nada para
acrescentar. Quando eu finalmente deixei que ele falasse, fui
abatido à queima roupa por uma situação inesperada:
- Well, I think I get very enough about your experience. Listen very
carefully: the person I have in mind must be so proficient and it's
mandatory. I want a quite objective explanation regarding your way to
obtain these desirable targets. Would you like to resume this? What you
really want of us? Let me know how you run your english, and remember: 66
from now on you're straight making your choices!
De um momento para outro, a vaga impressão de insegurança se
transformou em pânico explícito. Diante daquela ameaça, eu
simplesmente não conseguia articular meu raciocínio. Houve uma
súbita transformação no clima. O gentil empresário deixara cair a
máscara e mostrava suas afiadas garras. Comecei a suar, primeiro
porque pressenti que falara demais em meu idioma nativo e, depois,
porque estava claro que iria ser contratado ou dispensado a partir
das próximas frases. Enquanto isso, o homem me olhava fixamente
nos olhos, observando cada movimento. De repente eu gelei. Fazia
tempo que não falava em inglês, embora tivesse excelentes
conhecimentos na língua. Mas, não estava esperando ser
entrevistado assim, no máximo um teste escrito ou coisa do gênero.
Tinha que agir rápido. Achei que precisava responder prontamente,
então engoli em seco e comecei:
- Shure. So… I…I …you know…is quite difficult to explain myself in single
words. I would like to say that's an opportunity to reestart my career and I'll
try to do my best. I beg you pardon me, because my last personal
conversation in english was such a long time ago…Look… I mean…All I
really want to say it's I'm feel a little rusty, by now. But, you know…it's a
matter of practicise. I have all the required knowledge and really need this
position. I'm shure to offer my colaboration in all whole required 67
assignments.68
- Oh, really? I can bear it!
Desnecessário continuar com a novela, já que não houve final feliz.
Quando se está em determinada faixa etária, as pessoas acham que
você deve ser um expertise em tudo o que faz ou diz. Ninguém
admite a mínima hesitação. É um pensamento retrógrado supor que
os adultos devem dominar o mundo e todas as suas relações, porque
são adultos. Mas, infelizmente não são somente as crianças que
acham não existir insegurança ou improvisação quando se é
grande.
Tivesse eu alguns anos a menos e, certamente minha
momentânea falta de efeito solo seria relevada, com
condescendência até. Não agora. Eles querem perfeições a preços
módicos e qualquer indicador de alteridade e/ou alteração é fator
de discriminação quando conjugado com a idade. Lembro que,
antes de sair ele ainda perguntou a minha idade, ficou me olhando
e, metaforicamente, deduzi seus pensamentos que diziam algo
como: Que pena! Ele parecia que tinha qualificações, mas não
passava de uma casca vazia! Não vale a pena perder mais tempo, o
melhor é chamar o próximo da lista.
66 Tradução aproximada: Bem, eu penso que já ouvi mais que o suficiente sobre sua experiência. Ouça com muita atenção: a pessoa que eu tenho em mente deve ser muito proficiente e isto é obrigatório. Eu quero agora uma explanação bem objetiva acerca de como você fará para obter as metas desejadas. Poderia resumir isto? O que você realmente espera de nós? Deixe-me saber como vai seu inglês e, lembre-se: a partir de agora tudo depende só de você!
67 Tradução aproximada (as correções dos erros estão entre parênteses): Certo...Então...Eu...Eu...Você sabe...É muito difícil explanar tudo sobre mim mesmo (about me = sobre mim) em simples (few = poucas) palavras. Eu gostaria de dizer que esta é uma oportunidade de recomeçar minha carreira e eu tentarei fazer o meu melhor. Eu quero que você me desculpe porque minha última conversação pessoal (personal = era desnecessário dizer isto) em inglês foi há muito tempo atrás...Veja...Eu queria...Eu quero dizer que eu me sinto um pouco enferrujado, por ora. Mas isto é questão de prática, voe compreende. Eu possuo todos os conhecimentos requeridos e realmente preciso muito deste emprego. Estou certo de poder oferecer minha colaboração em tudo o que for requerido para as tarefas.68 Tradução ao pé da letra: Fala sério? Eu acho que posso viver com isso!
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
122 123
inconsciente. Algo de inseguro estava se apresentando e ia
crescendo. Eu estava botando para fora todas as minhas energias,
no afã de convencer e manter a empatia com o dono da empresa,
mas sentia que me enfraquecia a cada frase dita. Quanto mais me
empenhava, mais as palavras me escapavam e lutava contra mim
mesmo para parecer coerente. Era estranho me sentir assim, no
entanto, continuei. Eu precisava aproveitar o momento e
impressionar o homem a todo custo. Assim falei até as tampas e só
parei quando, já exausto, percebi que não tinha mais nada para
acrescentar. Quando eu finalmente deixei que ele falasse, fui
abatido à queima roupa por uma situação inesperada:
- Well, I think I get very enough about your experience. Listen very
carefully: the person I have in mind must be so proficient and it's
mandatory. I want a quite objective explanation regarding your way to
obtain these desirable targets. Would you like to resume this? What you
really want of us? Let me know how you run your english, and remember: 66
from now on you're straight making your choices!
De um momento para outro, a vaga impressão de insegurança se
transformou em pânico explícito. Diante daquela ameaça, eu
simplesmente não conseguia articular meu raciocínio. Houve uma
súbita transformação no clima. O gentil empresário deixara cair a
máscara e mostrava suas afiadas garras. Comecei a suar, primeiro
porque pressenti que falara demais em meu idioma nativo e, depois,
porque estava claro que iria ser contratado ou dispensado a partir
das próximas frases. Enquanto isso, o homem me olhava fixamente
nos olhos, observando cada movimento. De repente eu gelei. Fazia
tempo que não falava em inglês, embora tivesse excelentes
conhecimentos na língua. Mas, não estava esperando ser
entrevistado assim, no máximo um teste escrito ou coisa do gênero.
Tinha que agir rápido. Achei que precisava responder prontamente,
então engoli em seco e comecei:
- Shure. So… I…I …you know…is quite difficult to explain myself in single
words. I would like to say that's an opportunity to reestart my career and I'll
try to do my best. I beg you pardon me, because my last personal
conversation in english was such a long time ago…Look… I mean…All I
really want to say it's I'm feel a little rusty, by now. But, you know…it's a
matter of practicise. I have all the required knowledge and really need this
position. I'm shure to offer my colaboration in all whole required 67
assignments.68
- Oh, really? I can bear it!
Desnecessário continuar com a novela, já que não houve final feliz.
Quando se está em determinada faixa etária, as pessoas acham que
você deve ser um expertise em tudo o que faz ou diz. Ninguém
admite a mínima hesitação. É um pensamento retrógrado supor que
os adultos devem dominar o mundo e todas as suas relações, porque
são adultos. Mas, infelizmente não são somente as crianças que
acham não existir insegurança ou improvisação quando se é
grande.
Tivesse eu alguns anos a menos e, certamente minha
momentânea falta de efeito solo seria relevada, com
condescendência até. Não agora. Eles querem perfeições a preços
módicos e qualquer indicador de alteridade e/ou alteração é fator
de discriminação quando conjugado com a idade. Lembro que,
antes de sair ele ainda perguntou a minha idade, ficou me olhando
e, metaforicamente, deduzi seus pensamentos que diziam algo
como: Que pena! Ele parecia que tinha qualificações, mas não
passava de uma casca vazia! Não vale a pena perder mais tempo, o
melhor é chamar o próximo da lista.
66 Tradução aproximada: Bem, eu penso que já ouvi mais que o suficiente sobre sua experiência. Ouça com muita atenção: a pessoa que eu tenho em mente deve ser muito proficiente e isto é obrigatório. Eu quero agora uma explanação bem objetiva acerca de como você fará para obter as metas desejadas. Poderia resumir isto? O que você realmente espera de nós? Deixe-me saber como vai seu inglês e, lembre-se: a partir de agora tudo depende só de você!
67 Tradução aproximada (as correções dos erros estão entre parênteses): Certo...Então...Eu...Eu...Você sabe...É muito difícil explanar tudo sobre mim mesmo (about me = sobre mim) em simples (few = poucas) palavras. Eu gostaria de dizer que esta é uma oportunidade de recomeçar minha carreira e eu tentarei fazer o meu melhor. Eu quero que você me desculpe porque minha última conversação pessoal (personal = era desnecessário dizer isto) em inglês foi há muito tempo atrás...Veja...Eu queria...Eu quero dizer que eu me sinto um pouco enferrujado, por ora. Mas isto é questão de prática, voe compreende. Eu possuo todos os conhecimentos requeridos e realmente preciso muito deste emprego. Estou certo de poder oferecer minha colaboração em tudo o que for requerido para as tarefas.68 Tradução ao pé da letra: Fala sério? Eu acho que posso viver com isso!
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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De nada adiantaria explicar que eu tinha sim, as
competências requeridas e que o que dizia era verdade. Os juízos de
valor, uma vez efetuados são irredutíveis ao bom senso. Descobrira,
afinal, de onde vinha minha insegurança: vinha da possibilidade
iminente de conseguir o tão sonhado e necessário emprego! Era um
alerta psíquico que estava querendo me dizer para ir mais devagar,
para medir mais as palavras, para - como na música - utilizar as
pausas para causar efeito. Era a voz da minha experiência que me
gritava lá de dentro: cuidado, ele vai atacar!
Mas, na ânsia de conseguir o que estava tão perto, confiei
que seria compreendido, que o importante era a minha experiência, 69a minha intensidade de dedicação e esqueci que as pessoas não
medem nada mais senão o desempenho. Eu estava tão empolgado
em mostrar-me capaz que acabei dando a entender que era o oposto
daquilo. Mesmo se tivesse balbuciado, engasgado ou tossido, porém
tivesse mantido o controle de meus nervos e não tivesse me
apressado para responder a tudo prontamente, de maneira
definitiva, teria sido contratado. Nas entrevistas, como na vida, um
pouco de conhecimento de técnicas de teatro é de muita valia.
Tivesse eu agido de forma mais estudada e não seria presa de minha
ansiedade. A ironia é que depois de sair dali, eu estava pronto a
declamar Shakespeare, mas na hora que realmente importava,
vacilei.
De tudo isso, tiramos duas importantes conclusões: uma é
que devemos confiar mais em nossas intuições do que em juízos
“racionais” sobre o ambiente e as pessoas ao nosso redor: afinal, 70tudo pode ser uma bem urdida farsa. A segunda é que não
devemos nos deixar envolver, excessivamente, por nossas
expectativas e desejos, pois elas podem nos colocar em sérias
dificuldades. E, como na antiguidade, ao seguir olhando as estrelas,
caímos no poço em frente e, no final, ainda temos que agüentar o
sarcasmo de quem nos viu desabar.
2 - Postura e Comprometimento: Fugir da Falta e do Excesso
Como foi dito anteriormente, ainda não podemos nos esquecer
daquilo que foi e sempre será objeto de reflexão por parte daqueles
que desejam um conhecimento mais efetivo sobre como se portar
diante das circunstâncias. Se lembrarmos de pesquisar os que nos
antecederam, verificaremos que algo de valioso foi escrito há mais
de 2.300 anos. Estou falando de Ética a Nicômaco, um dos livros
atribuídos a Aristóteles e que pode nos dar pistas importantes sobre
como devemos encarar a vida e as relações que mantemos com o
mundo. Trata-se de um clássico, em linguagem um pouco pesada,
mas - muito grosso modo - nos informa que devemos sempre buscar
o meio termo. Não o meio termo linear entre duas medidas
diferentes, mas o nosso meio termo entre medidas diferentes,
através de um exercício de virtudes.
E virtude pode ser definida como o funcionamento de
acordo com a sua constituição própria, em máximo grau de
excelência. Não se quer dizer aqui se trate de uma escolha entre 71bens, mas a mais desejável de todas as coisas , sendo algo absoluto e
auto-suficiente, a própria finalidade da ação. Mas esta ação deve-se
se dar no intervalo entre o excesso e a falta, seguindo de acordo com
a regra justa, pois tanto o excesso quanto a deficiência destroem a força 72do agente. Esta mediação, esta mediocridade áurea é justamente
em relação a nós mesmos e nunca entre extremos conceituais. Aliás,
a virtude é, então, esta disposição de caráter relacionada com a
escolha e consistente numa mediania, isto é, a mediania relativa a nós,
a qual é determinada por um princípio racional próprio do homem 73dotado de sabedoria prática.
Ao mesmo tempo, o conceito está diretamente ligado à
escolha, onde existe um papel preponderante a ser cumprido pelas
paixões, uma vez que devemos levar em conta os meios para os
quais se dirigem estas escolhas e não propriamente aos fins, que se
encontram dados. O importante é saber se posicionar em relação aos
meios adequados para que se processe uma instância de liberdade, 69 Eu superaria até minha ojeriza por armas e teria sido um bom colaborador. Mas, c'est la vie! Por um lado foi bom, pois todas estas experiências me permitiram escrever este livro e você foi beneficiado!70 Na verdade, tendemos a confundir juízos emocionais com racionais e, assim, metemos os pés pelas mãos!
71 Ética a Nicômaco, 1097b, 15/20.72 Justamente o que descrevemos no capítulo anterior...73 Ética a Nicômaco, II, 1106a.
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De nada adiantaria explicar que eu tinha sim, as
competências requeridas e que o que dizia era verdade. Os juízos de
valor, uma vez efetuados são irredutíveis ao bom senso. Descobrira,
afinal, de onde vinha minha insegurança: vinha da possibilidade
iminente de conseguir o tão sonhado e necessário emprego! Era um
alerta psíquico que estava querendo me dizer para ir mais devagar,
para medir mais as palavras, para - como na música - utilizar as
pausas para causar efeito. Era a voz da minha experiência que me
gritava lá de dentro: cuidado, ele vai atacar!
Mas, na ânsia de conseguir o que estava tão perto, confiei
que seria compreendido, que o importante era a minha experiência, 69a minha intensidade de dedicação e esqueci que as pessoas não
medem nada mais senão o desempenho. Eu estava tão empolgado
em mostrar-me capaz que acabei dando a entender que era o oposto
daquilo. Mesmo se tivesse balbuciado, engasgado ou tossido, porém
tivesse mantido o controle de meus nervos e não tivesse me
apressado para responder a tudo prontamente, de maneira
definitiva, teria sido contratado. Nas entrevistas, como na vida, um
pouco de conhecimento de técnicas de teatro é de muita valia.
Tivesse eu agido de forma mais estudada e não seria presa de minha
ansiedade. A ironia é que depois de sair dali, eu estava pronto a
declamar Shakespeare, mas na hora que realmente importava,
vacilei.
De tudo isso, tiramos duas importantes conclusões: uma é
que devemos confiar mais em nossas intuições do que em juízos
“racionais” sobre o ambiente e as pessoas ao nosso redor: afinal, 70tudo pode ser uma bem urdida farsa. A segunda é que não
devemos nos deixar envolver, excessivamente, por nossas
expectativas e desejos, pois elas podem nos colocar em sérias
dificuldades. E, como na antiguidade, ao seguir olhando as estrelas,
caímos no poço em frente e, no final, ainda temos que agüentar o
sarcasmo de quem nos viu desabar.
2 - Postura e Comprometimento: Fugir da Falta e do Excesso
Como foi dito anteriormente, ainda não podemos nos esquecer
daquilo que foi e sempre será objeto de reflexão por parte daqueles
que desejam um conhecimento mais efetivo sobre como se portar
diante das circunstâncias. Se lembrarmos de pesquisar os que nos
antecederam, verificaremos que algo de valioso foi escrito há mais
de 2.300 anos. Estou falando de Ética a Nicômaco, um dos livros
atribuídos a Aristóteles e que pode nos dar pistas importantes sobre
como devemos encarar a vida e as relações que mantemos com o
mundo. Trata-se de um clássico, em linguagem um pouco pesada,
mas - muito grosso modo - nos informa que devemos sempre buscar
o meio termo. Não o meio termo linear entre duas medidas
diferentes, mas o nosso meio termo entre medidas diferentes,
através de um exercício de virtudes.
E virtude pode ser definida como o funcionamento de
acordo com a sua constituição própria, em máximo grau de
excelência. Não se quer dizer aqui se trate de uma escolha entre 71bens, mas a mais desejável de todas as coisas , sendo algo absoluto e
auto-suficiente, a própria finalidade da ação. Mas esta ação deve-se
se dar no intervalo entre o excesso e a falta, seguindo de acordo com
a regra justa, pois tanto o excesso quanto a deficiência destroem a força 72do agente. Esta mediação, esta mediocridade áurea é justamente
em relação a nós mesmos e nunca entre extremos conceituais. Aliás,
a virtude é, então, esta disposição de caráter relacionada com a
escolha e consistente numa mediania, isto é, a mediania relativa a nós,
a qual é determinada por um princípio racional próprio do homem 73dotado de sabedoria prática.
Ao mesmo tempo, o conceito está diretamente ligado à
escolha, onde existe um papel preponderante a ser cumprido pelas
paixões, uma vez que devemos levar em conta os meios para os
quais se dirigem estas escolhas e não propriamente aos fins, que se
encontram dados. O importante é saber se posicionar em relação aos
meios adequados para que se processe uma instância de liberdade, 69 Eu superaria até minha ojeriza por armas e teria sido um bom colaborador. Mas, c'est la vie! Por um lado foi bom, pois todas estas experiências me permitiram escrever este livro e você foi beneficiado!70 Na verdade, tendemos a confundir juízos emocionais com racionais e, assim, metemos os pés pelas mãos!
71 Ética a Nicômaco, 1097b, 15/20.72 Justamente o que descrevemos no capítulo anterior...73 Ética a Nicômaco, II, 1106a.
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onde se é possível realizar a ação apropriada. A ética de Aristóteles
lida com a idéia de responsabilidade e as impressões do bem, no
dinamismo do ser é que determinam o foco nas escolhas, pois o ser
sempre se dirige à sua realização e nunca à sua negação, ao não ser.
É inútil, portanto, a razão ignorar as paixões, mas deve-se
dialogar com elas, pois os afetos nascem na alma e possuem certa
verdade. Há motores que vêm dos afetos e não só do raciocínio
prático, desta forma, a escolha que é subsumida na virtude contém 74(deve-se orientar), por si, a busca da mediedade e os meios
adequados para a ação correta, entendida no contexto de
apropriada e digna de um ser racional. Estão orientadas para um
horizonte de plenitude (felicidade), não em relação à utilidade ou 75no âmbito da autonomia mas na afirmação da realização humana.
O que este papo filosófico quer dizer? Simples: que existe
sempre erro na falta ou no excesso. Que qualquer posição adequada á
qualquer objetivo deve ser uma condição de equilíbrio. Parece
claro que as revistas e publicações espetaculosas abusam dos
discursos sobre perseguir obsessivamente os sonhos e ter
determinação inquebrantável e ser obcecado por metas e
resultados. Besteira.
Pare e pense em quantas pessoas estão, ou cabem, no
apertado topo da pirâmide e você verá que isto só funciona para
poucos e em determinadas condições. Não é toda hora que se deve
agir como se o mundo fosse acabar se você não conseguir alcançar
objetivos que lhes são exigidos, ou que você se impõe para ser,
realizado, próspero ou feliz.
Vender uma imagem ou discurso de completa dedicação
profissional, deixando de lado a qualidade de vida, os valores éticos
e fraternos que devem nortear uma sociedade sã em prol de uma
competitividade desenfreada é o que está levando nosso planeta ao
colapso. No entanto, é o que precisam vender aqueles que detêm o
poder, ou serão em pouco tempo destituídos dele, seja em qual
escala for exercido este mando. Se tudo continuar assim,
parafraseando o poeta, eles com certeza passarão, mas nós não
iremos passarinhar, pois nada mais restará: tudo terá sido
consumido.
Aliás, este é um discurso bem perverso e de viés
ideologizante: ele encobre a realidade do pouco que você
realmente pode alcançar com a nuvem cor de rosa dos apelos de
“sucesso” - assim como bilhões de seres humanos, você
provavelmente nunca chegará ao topo do mundo e nem será o
próximo presidente ou um novo Steve Jobs - de forma a manter
você “motivado” a produzir o máximo pelo mesmo salário.
Salvo as exceções que validam esta regra, todos nós
sonhamos e nos queimamos por dentro imaginando como seria se
conseguíssemos ser quem desejamos, ter o emprego ideal, a mulher
perfeita, ganhar na loteria ou achar um tesouro escondido no final
do arco-íris. Mas, na realidade, se pode contar nos dedos a
quantidade de pessoas que realmente conseguem seus anos de
prazer, ócio e fama, mandando na sociedade com suas empresas,
opiniões ou desejos. O resto dos mortais se divide entre sonhos
inatingíveis, vidas simples, anônimas, pequenas alegrias e
lamentações pelo fracasso. 76No entanto, é para nós os sinos dobram e somos nós que
realmente construímos a civilização e a sociedade, não eles, os
“formadores de opinião”. Ademais, mesmo que se a riqueza fosse
igualmente distribuída entre todos os habitantes da Terra, não daria
para as necessidades de todos e, em menos de um ano, haveria
novamente ricos e pobres, pelo bom ou mau uso de seu capital e de
suas capacidades.
O que importa, é descobrir em que se é realmente bom,
para que possa, então, de forma segura ter uma chance a mais. Não
obstante, é preciso saber que mesmo nesta atividade, talvez não se
seja bem-sucedido, enquanto que, por outro lado, sempre se
poderá ganhar o viver com dignidade e algum bom conforto, caso
sejamos apenas nós mesmos em qualquer função, desde que Deus
nos abençoe e o governo não atrapalhe.
74 Meio termo entre os extremos de nossas possibilidades (não das dos outros). Um atleta pode precisar de muita comida e energia, mas uma pessoa comum não. É inútil, portanto fazer uma média simples entre o que comemos e o que come o atleta. O meio termo é o ideal entre aquilo que constitui nosso máximo e o que se parece como o mínimo indispensável.75 Como no caso dos filósofos modernos, mais especificamente em relação a Kant.
76 Ouça Losing It do grupo canadense Rush.
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126 127
onde se é possível realizar a ação apropriada. A ética de Aristóteles
lida com a idéia de responsabilidade e as impressões do bem, no
dinamismo do ser é que determinam o foco nas escolhas, pois o ser
sempre se dirige à sua realização e nunca à sua negação, ao não ser.
É inútil, portanto, a razão ignorar as paixões, mas deve-se
dialogar com elas, pois os afetos nascem na alma e possuem certa
verdade. Há motores que vêm dos afetos e não só do raciocínio
prático, desta forma, a escolha que é subsumida na virtude contém 74(deve-se orientar), por si, a busca da mediedade e os meios
adequados para a ação correta, entendida no contexto de
apropriada e digna de um ser racional. Estão orientadas para um
horizonte de plenitude (felicidade), não em relação à utilidade ou 75no âmbito da autonomia mas na afirmação da realização humana.
O que este papo filosófico quer dizer? Simples: que existe
sempre erro na falta ou no excesso. Que qualquer posição adequada á
qualquer objetivo deve ser uma condição de equilíbrio. Parece
claro que as revistas e publicações espetaculosas abusam dos
discursos sobre perseguir obsessivamente os sonhos e ter
determinação inquebrantável e ser obcecado por metas e
resultados. Besteira.
Pare e pense em quantas pessoas estão, ou cabem, no
apertado topo da pirâmide e você verá que isto só funciona para
poucos e em determinadas condições. Não é toda hora que se deve
agir como se o mundo fosse acabar se você não conseguir alcançar
objetivos que lhes são exigidos, ou que você se impõe para ser,
realizado, próspero ou feliz.
Vender uma imagem ou discurso de completa dedicação
profissional, deixando de lado a qualidade de vida, os valores éticos
e fraternos que devem nortear uma sociedade sã em prol de uma
competitividade desenfreada é o que está levando nosso planeta ao
colapso. No entanto, é o que precisam vender aqueles que detêm o
poder, ou serão em pouco tempo destituídos dele, seja em qual
escala for exercido este mando. Se tudo continuar assim,
parafraseando o poeta, eles com certeza passarão, mas nós não
iremos passarinhar, pois nada mais restará: tudo terá sido
consumido.
Aliás, este é um discurso bem perverso e de viés
ideologizante: ele encobre a realidade do pouco que você
realmente pode alcançar com a nuvem cor de rosa dos apelos de
“sucesso” - assim como bilhões de seres humanos, você
provavelmente nunca chegará ao topo do mundo e nem será o
próximo presidente ou um novo Steve Jobs - de forma a manter
você “motivado” a produzir o máximo pelo mesmo salário.
Salvo as exceções que validam esta regra, todos nós
sonhamos e nos queimamos por dentro imaginando como seria se
conseguíssemos ser quem desejamos, ter o emprego ideal, a mulher
perfeita, ganhar na loteria ou achar um tesouro escondido no final
do arco-íris. Mas, na realidade, se pode contar nos dedos a
quantidade de pessoas que realmente conseguem seus anos de
prazer, ócio e fama, mandando na sociedade com suas empresas,
opiniões ou desejos. O resto dos mortais se divide entre sonhos
inatingíveis, vidas simples, anônimas, pequenas alegrias e
lamentações pelo fracasso. 76No entanto, é para nós os sinos dobram e somos nós que
realmente construímos a civilização e a sociedade, não eles, os
“formadores de opinião”. Ademais, mesmo que se a riqueza fosse
igualmente distribuída entre todos os habitantes da Terra, não daria
para as necessidades de todos e, em menos de um ano, haveria
novamente ricos e pobres, pelo bom ou mau uso de seu capital e de
suas capacidades.
O que importa, é descobrir em que se é realmente bom,
para que possa, então, de forma segura ter uma chance a mais. Não
obstante, é preciso saber que mesmo nesta atividade, talvez não se
seja bem-sucedido, enquanto que, por outro lado, sempre se
poderá ganhar o viver com dignidade e algum bom conforto, caso
sejamos apenas nós mesmos em qualquer função, desde que Deus
nos abençoe e o governo não atrapalhe.
74 Meio termo entre os extremos de nossas possibilidades (não das dos outros). Um atleta pode precisar de muita comida e energia, mas uma pessoa comum não. É inútil, portanto fazer uma média simples entre o que comemos e o que come o atleta. O meio termo é o ideal entre aquilo que constitui nosso máximo e o que se parece como o mínimo indispensável.75 Como no caso dos filósofos modernos, mais especificamente em relação a Kant.
76 Ouça Losing It do grupo canadense Rush.
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No entanto, este pouco pode ser muito em vários aspectos
(ter casa própria, na praia, carro novo filhos na escola, contas em dia
etc), e não significa que não seja bom. Você pode ser um vencedor
naquilo que faz e gostar de atuar no que trabalha, subir posições e
tudo o mais. Porém, é extremamente difícil que você consiga ser o
número um em tudo, saia na capa de revistas, seja uma celebridade
internacional. Isto é ilusão, e como toda a ilusão, daqui a algum
tempo ela se desfaz. E mesmo que você conseguisse ser o
bambambam, quem garante que daqui a seis meses alguém se
lembraria? Não vê o triste exemplo de tanta gente que daria tudo por
uma entrevista e vive implorando e fazendo coisas absurdas por
causa de um segundo na televisão?
Porque ninguém mais quer saber deles? É porque não tem
talento, capacidade ou são considerados “velhos” e descartáveis.
Este mesmo mercado que reverenciamos é um deus cruel e
sanguinário que se alimenta de seus adoradores e sacerdotes. 77Cícero tratou do tema, com muita propriedade e até hoje suas
análises são atuais. Portanto, existe vida feliz além da fama e da
competição desenfreada. Com isso, queremos dizer que não será
com a destruição de nossos valores e personalidade que
justificaremos a aquisição de alguns bens de consumo necessários e
outros supérfluos. Ninguém aqui é contra ganhar dinheiro ou
agarrar oportunidades, mas sim saber que nem tudo vale a pena em
se tratando de subir na vida. É um mito que atravessa todas as
gerações, desde o pós-guerra, que o trabalho extenuante, o
abandono do tempo em família, o ocaso de si, em prol do sustento
da família, a dedicação “100%” à empresa e um mísero final de
semana de embriaguez e esporte, como compensação deve tornar-
se o padrão ideal dos cidadãos das democracias da liberdade.
A condição de instabilidade social, assim como o próprio
aumento dos índices de violência é gerado por esta política insana:
relegar tudo à condição de uma formulação econômica ou de
consumo. Quem não consegue ou se revolta ou se frustra e quase
todos tem um pouco disto dentro de si. Nem todos somos
estereótipos ou conseguiremos alcançar modelos de perfeição: Se
homens, não somos todos igualmente fortes, belos, másculos,
carismáticos, bem sucedidos ou seguros. Se mulheres, nem todas
são magras, loiras, irresistíveis, onde não paira a sombra da TPM,
celulite ou rugas.
Toda a diversidade é importante. Imagine um mundo
absolutamente uniforme, o que viria à sua mente? Na minha
aparece uma floresta imensa de pinheiros habitada somente por 78pardais. Na prática é impossível, tanto a mim quanto aos gregos
antigos, desconsiderar as diferenças, seja de grau ou de natureza.
Não somos apenas organismos que, com outros animais, reagem às
circunstâncias ambientais com determinadas respostas
comportamentais. Portanto, não podemos ser reduzidos a
instâncias psicológicas, justaposição de estados que demandem
comportamentos em função de acontecimentos ou que eles possam
sequer ser previstos ou antecipados (nem os patológicos) com
clareza meridiana. Não podemos ser, da mesma forma, entidades
mensuráveis, delineadas por cargos, atribuições, histogramas,
pirâmides de Maslow, diagramas de Paretto ou curvas ABC. Pelo
contrário, com isso nos tornamos cada vez mais invisíveis.
Não somos um conjunto de dados que pode ser analisado
por um software qualquer e daí extraída uma tabela de alocações,
de descrições de funções e de vida. Há algo de imenso onde termina
o horizonte empírico e que é a “essência” da existência e não se
reduz ao mundo analítico. O que provam as pretensas hierarquias
de satisfações e realizações? Se perdermos esta guerra, ou nos
mantivermos apáticos e “adestráveis”, estaremos condenados a um
admirável mundo novo, onde nada mais seremos do que aquilo que
formos designados pelo organograma social.
Mas o que isso tem a ver com a árdua procura do emprego
e com o fim de nossa condição amorfa de invisibilidade e
sofrimento? Quero dizer que, dadas as condições em que este
mundo se encontra suas relações estruturais de sociedade e
produção, é imperativo poder acompanhar sua evolução e nos
reintegramos em uma síntese superior. Mais filosofia? Não: trata-se
de ter em mente que as reais metas são aquelas possíveis de serem
77 Vale a pena ler Da República, principalmente o capítulo VI: O Sonho de Cipião.
78 Marcelo Moreira dizia isto a respeito de um mundo cético, onde as verdades teóricas seriam apenas fenomênicas.
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No entanto, este pouco pode ser muito em vários aspectos
(ter casa própria, na praia, carro novo filhos na escola, contas em dia
etc), e não significa que não seja bom. Você pode ser um vencedor
naquilo que faz e gostar de atuar no que trabalha, subir posições e
tudo o mais. Porém, é extremamente difícil que você consiga ser o
número um em tudo, saia na capa de revistas, seja uma celebridade
internacional. Isto é ilusão, e como toda a ilusão, daqui a algum
tempo ela se desfaz. E mesmo que você conseguisse ser o
bambambam, quem garante que daqui a seis meses alguém se
lembraria? Não vê o triste exemplo de tanta gente que daria tudo por
uma entrevista e vive implorando e fazendo coisas absurdas por
causa de um segundo na televisão?
Porque ninguém mais quer saber deles? É porque não tem
talento, capacidade ou são considerados “velhos” e descartáveis.
Este mesmo mercado que reverenciamos é um deus cruel e
sanguinário que se alimenta de seus adoradores e sacerdotes. 77Cícero tratou do tema, com muita propriedade e até hoje suas
análises são atuais. Portanto, existe vida feliz além da fama e da
competição desenfreada. Com isso, queremos dizer que não será
com a destruição de nossos valores e personalidade que
justificaremos a aquisição de alguns bens de consumo necessários e
outros supérfluos. Ninguém aqui é contra ganhar dinheiro ou
agarrar oportunidades, mas sim saber que nem tudo vale a pena em
se tratando de subir na vida. É um mito que atravessa todas as
gerações, desde o pós-guerra, que o trabalho extenuante, o
abandono do tempo em família, o ocaso de si, em prol do sustento
da família, a dedicação “100%” à empresa e um mísero final de
semana de embriaguez e esporte, como compensação deve tornar-
se o padrão ideal dos cidadãos das democracias da liberdade.
A condição de instabilidade social, assim como o próprio
aumento dos índices de violência é gerado por esta política insana:
relegar tudo à condição de uma formulação econômica ou de
consumo. Quem não consegue ou se revolta ou se frustra e quase
todos tem um pouco disto dentro de si. Nem todos somos
estereótipos ou conseguiremos alcançar modelos de perfeição: Se
homens, não somos todos igualmente fortes, belos, másculos,
carismáticos, bem sucedidos ou seguros. Se mulheres, nem todas
são magras, loiras, irresistíveis, onde não paira a sombra da TPM,
celulite ou rugas.
Toda a diversidade é importante. Imagine um mundo
absolutamente uniforme, o que viria à sua mente? Na minha
aparece uma floresta imensa de pinheiros habitada somente por 78pardais. Na prática é impossível, tanto a mim quanto aos gregos
antigos, desconsiderar as diferenças, seja de grau ou de natureza.
Não somos apenas organismos que, com outros animais, reagem às
circunstâncias ambientais com determinadas respostas
comportamentais. Portanto, não podemos ser reduzidos a
instâncias psicológicas, justaposição de estados que demandem
comportamentos em função de acontecimentos ou que eles possam
sequer ser previstos ou antecipados (nem os patológicos) com
clareza meridiana. Não podemos ser, da mesma forma, entidades
mensuráveis, delineadas por cargos, atribuições, histogramas,
pirâmides de Maslow, diagramas de Paretto ou curvas ABC. Pelo
contrário, com isso nos tornamos cada vez mais invisíveis.
Não somos um conjunto de dados que pode ser analisado
por um software qualquer e daí extraída uma tabela de alocações,
de descrições de funções e de vida. Há algo de imenso onde termina
o horizonte empírico e que é a “essência” da existência e não se
reduz ao mundo analítico. O que provam as pretensas hierarquias
de satisfações e realizações? Se perdermos esta guerra, ou nos
mantivermos apáticos e “adestráveis”, estaremos condenados a um
admirável mundo novo, onde nada mais seremos do que aquilo que
formos designados pelo organograma social.
Mas o que isso tem a ver com a árdua procura do emprego
e com o fim de nossa condição amorfa de invisibilidade e
sofrimento? Quero dizer que, dadas as condições em que este
mundo se encontra suas relações estruturais de sociedade e
produção, é imperativo poder acompanhar sua evolução e nos
reintegramos em uma síntese superior. Mais filosofia? Não: trata-se
de ter em mente que as reais metas são aquelas possíveis de serem
77 Vale a pena ler Da República, principalmente o capítulo VI: O Sonho de Cipião.
78 Marcelo Moreira dizia isto a respeito de um mundo cético, onde as verdades teóricas seriam apenas fenomênicas.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
128 129
alcançadas com esforço, mas que nenhuma obsessão deve se
interpor em nosso caminho caso não seja absolutamente necessária.
Veja bem o que você é agora e o que foi quando era criança: o ser
consiste na contínua alteração de si mesmo - uma unidade movente,
como diria Bergson. Estamos em contínuo processo de constituição
e assim, a cada momento, somos outros, embora continuemos no
fundo os mesmos.
Conclusão: O homem deve ser superado a cada passo, em
direção a uma realização maior. Esta realização não se dá apenas
seguindo as instruções descritas nos manuais de executivos, que
mormente determinam pisar na garganta dos outros e praticar
políticas de terra arrasada, mas sim, na contínua superação de
nossas dificuldades e na compreensão de como podemos voltar a
nos tornar visíveis ao mundo.
Afinal, que mal há em não conseguir consumir tudo o que
nos é oferecido pelo marketing aviltante? Qual o crime que
cometemos se não se puder dar tudo e mais um pouco a nossos filhos
(de modo a aplacar nossa consciência e nossa inabilidade frente aos
desafios do educar), que normas sociais violarão aqueles que são
honestos e recusam propina? Que pecado mortal pesa sobre nossas
cabeças quando nos conformamos em uma vida medianamente
próspera? Porque devemos levar vantagem em tudo? Que destino
cruel nos aguarda, pelo fato de sermos esclarecidos e recusarmos a
ignorância? Será lançado o anátema (ou fatwa) sobre nós quando
impomos limites à nossa ambição e ferocidade? E se recusarmos
compactuar com este degradante estado de coisas, qual será a nossa 79pena? Temos realmente de ter tudo? Todas estas perguntas
somente possuem uma resposta: um mundo melhor será construído
através de nossos agires na realidade e não na busca incessante de
aprovação, oportunidade, padrão de consumo e status social.
Assim, desde que não falte o necessário e se possa ir
levando a vida, não se amofine ou desespere: são milhões na mesma
condição. Isto não quer dizer que você deva se contentar com
pouco ou aceitar passivamente o chicote no lombo, mas apenas e
simplesmente, deixar claro que você não está sozinho e que - com
trabalho, qualificação e determinação - conseguirá realizar sonhos.
Agora, acreditar que agindo como se estivesse com um encosto e
não ser capaz de ver nada à sua frente, a não ser uma idéia única e
repetitiva - o chamado comportamento obsessivo/compulsivo -
apenas se tornará uma pessoa sem horizontes, cristalizada em suas
próprias convicções; altamente vulnerável às opiniões alheias.
Depois os consultores, analistas e gurus lançam novas modas e você
fica superado, palavra-conceito que hoje, perante o deus mercado,
equivale a uma sentença de morte.
Aprender a desistir, quando isto é estratégico pode ser a
mais potente arma tática que você pode dispor. Aprender a
conviver com um pouco menos do que você acha que merece,
também pode reforçar suas defesas e fazer com que você se
qualifique para alcançar o que deseja. Aprender a equilibrar suas
reações, frente aos desafios e dificuldades fará com que seja
fortalecido. Aprender a ter paciência em momentos de crise,
equivale a traçar uma grande campanha de reconquista.
Compreender que em nenhum dos extremos se encontra a
realização é agir com sabedoria. Fechando a questão,
relembramos: todo o excesso diminui nosso vigor, portanto, aja com
prudência, em todas as ocasiões, buscando um equilíbrio entre os
pontos eqüidistantes.
3 - Processos Suspensos e o Mico do No Feedback
Uma das coisas que mais revolta o candidato, dentro do universo
dos processos seletivos é uma situação de desrespeito,
popularmente chamada de “síndrome de espera do feedback”. Eu
não sei por que este pessoal adora uma palavrinha estrangeira, mas
eu juro que já vi muita gente sentir orgasmos trifásicos ao falar de
boca cheia: recruitment, management, supply chain, stakeholders.
Não sou nenhum partidário de Aldo Rebelo, mas sinceramente
acho que é preciso por um freio nesta psicose, nesta falta de auto-80estima do brasileiro. Tudo é feedback! Que raio eles querem dizer
81com retroalimentação?
79 Se todos os países pudessem ter o padrão de vida americano, necessitaríamos da matéria prima de 4 planetas Terra!
80 Com tanta palavra e verbo e a gente fica usando os anglicismos. Não é a toa que os argentinos nos chamam de macaquitos! Só para constar: stakeholder é qualquer um interessado em um projeto (ou objeto dele)81 Diga-se, de passagem, que retorno e retroalimentação (realimentação) são conceitos diferentes, o que prova a sandice deste pessoal!
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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alcançadas com esforço, mas que nenhuma obsessão deve se
interpor em nosso caminho caso não seja absolutamente necessária.
Veja bem o que você é agora e o que foi quando era criança: o ser
consiste na contínua alteração de si mesmo - uma unidade movente,
como diria Bergson. Estamos em contínuo processo de constituição
e assim, a cada momento, somos outros, embora continuemos no
fundo os mesmos.
Conclusão: O homem deve ser superado a cada passo, em
direção a uma realização maior. Esta realização não se dá apenas
seguindo as instruções descritas nos manuais de executivos, que
mormente determinam pisar na garganta dos outros e praticar
políticas de terra arrasada, mas sim, na contínua superação de
nossas dificuldades e na compreensão de como podemos voltar a
nos tornar visíveis ao mundo.
Afinal, que mal há em não conseguir consumir tudo o que
nos é oferecido pelo marketing aviltante? Qual o crime que
cometemos se não se puder dar tudo e mais um pouco a nossos filhos
(de modo a aplacar nossa consciência e nossa inabilidade frente aos
desafios do educar), que normas sociais violarão aqueles que são
honestos e recusam propina? Que pecado mortal pesa sobre nossas
cabeças quando nos conformamos em uma vida medianamente
próspera? Porque devemos levar vantagem em tudo? Que destino
cruel nos aguarda, pelo fato de sermos esclarecidos e recusarmos a
ignorância? Será lançado o anátema (ou fatwa) sobre nós quando
impomos limites à nossa ambição e ferocidade? E se recusarmos
compactuar com este degradante estado de coisas, qual será a nossa 79pena? Temos realmente de ter tudo? Todas estas perguntas
somente possuem uma resposta: um mundo melhor será construído
através de nossos agires na realidade e não na busca incessante de
aprovação, oportunidade, padrão de consumo e status social.
Assim, desde que não falte o necessário e se possa ir
levando a vida, não se amofine ou desespere: são milhões na mesma
condição. Isto não quer dizer que você deva se contentar com
pouco ou aceitar passivamente o chicote no lombo, mas apenas e
simplesmente, deixar claro que você não está sozinho e que - com
trabalho, qualificação e determinação - conseguirá realizar sonhos.
Agora, acreditar que agindo como se estivesse com um encosto e
não ser capaz de ver nada à sua frente, a não ser uma idéia única e
repetitiva - o chamado comportamento obsessivo/compulsivo -
apenas se tornará uma pessoa sem horizontes, cristalizada em suas
próprias convicções; altamente vulnerável às opiniões alheias.
Depois os consultores, analistas e gurus lançam novas modas e você
fica superado, palavra-conceito que hoje, perante o deus mercado,
equivale a uma sentença de morte.
Aprender a desistir, quando isto é estratégico pode ser a
mais potente arma tática que você pode dispor. Aprender a
conviver com um pouco menos do que você acha que merece,
também pode reforçar suas defesas e fazer com que você se
qualifique para alcançar o que deseja. Aprender a equilibrar suas
reações, frente aos desafios e dificuldades fará com que seja
fortalecido. Aprender a ter paciência em momentos de crise,
equivale a traçar uma grande campanha de reconquista.
Compreender que em nenhum dos extremos se encontra a
realização é agir com sabedoria. Fechando a questão,
relembramos: todo o excesso diminui nosso vigor, portanto, aja com
prudência, em todas as ocasiões, buscando um equilíbrio entre os
pontos eqüidistantes.
3 - Processos Suspensos e o Mico do No Feedback
Uma das coisas que mais revolta o candidato, dentro do universo
dos processos seletivos é uma situação de desrespeito,
popularmente chamada de “síndrome de espera do feedback”. Eu
não sei por que este pessoal adora uma palavrinha estrangeira, mas
eu juro que já vi muita gente sentir orgasmos trifásicos ao falar de
boca cheia: recruitment, management, supply chain, stakeholders.
Não sou nenhum partidário de Aldo Rebelo, mas sinceramente
acho que é preciso por um freio nesta psicose, nesta falta de auto-80estima do brasileiro. Tudo é feedback! Que raio eles querem dizer
81com retroalimentação?
79 Se todos os países pudessem ter o padrão de vida americano, necessitaríamos da matéria prima de 4 planetas Terra!
80 Com tanta palavra e verbo e a gente fica usando os anglicismos. Não é a toa que os argentinos nos chamam de macaquitos! Só para constar: stakeholder é qualquer um interessado em um projeto (ou objeto dele)81 Diga-se, de passagem, que retorno e retroalimentação (realimentação) são conceitos diferentes, o que prova a sandice deste pessoal!
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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No popular trata-se de uma alimentação por trás!
Quiéisso? Aiaiai! Além do mico que é estar na condição de
desempregado, ainda tem que conviver com as manias, siglas e
esquisitices deste pessoal? Não bastaria dizer pura e simplesmente,
retorno? Não! Aí a brincadeira perderia a graça. O legal é
transformar o discurso em uma peça quase ininteligível para não-
iniciados - através de colagem de conceitos - de modo que o mais
absurdo vire o mais correto.
E assim, eles vivem falando de estratégias de T&D, onde se
supõe que se deva fazer um LNT e depois medir os KPIs, sem
esquecer de anexar o Report no parecer da análise 360º, antes de
dizer se haverá Entrepreneuring. Para entender o índice de CHA,
deve-se alocar a política de RH para se adequar ao TQM , alongar o
perfil de R&S, ver o que sobra para os programas de QVT e aí
priorizar somente os MBAs e para quem não se encaixar BVP! (o
bicho vai pegar, rimou haha!). Mas, enfim: eles falam, falam e nunca
estão dispostos a cumprir com suas assertivas promessas. Depois
que você passou por várias etapas do processo, que incluíram testes,
entrevistas, mais testes e entrevistas, finalmente você receberá esta
orientação: aguarde um feedback. Não ligue. Nós ligaremos ou
mandaremos uma mensagem e informaremos sobre os passos
seguintes.
Aí o infeliz vai para casa corroendo-se de ansiedade e
esperanças, marcaram o retorno para a terça-feira e ainda é quinta,
então terá que esperar alguns dias e passar o fim de semana em
oração. Seu tempo será gasto rezando terços, fazendo promessas,
acendendo velas na frente do monitor para que o imail chegue logo
e concordando racionalmente (vai que existe mesmo) com tudo o
que o sincretismo manda para afastar o azar e tomando cuidado
para não fazer nada de errado. Pois, na situação (que de tão
grotesca, nem sei como classificar) devem ser seguidas à risca, senão
a mandinga não funciona.
Então, finalmente chega o dia tão esperado, mas ninguém
dá o menor sinal de vida. Você entra duzentas vezes na web,
conexão discada, horário comercial e nada na caixa postal. Você
gasta seus últimos trocados em pulsos, até que tomado de profundo
senso de indignação, liga para a tal agência ou empresa e tenta falar
com a pessoa. Aí você descobre o quanto vale os discursos e teorias
de Administração e Recursos Humanos, colocadas na prática, ao
ouvir:
- Quem quer falar? Ela não pode atender agora. Espere aí, vou
perguntar.
- Fulana...é o beltrano sobre o processo X. A outra responde:
- Não conheço! É candidato? Olha, diga que se não recebeu contato é
porque não foi aprovado. Não, não posso atender agora. Para seu
desespero, volta a primeira voz:
- Moço, você não foi aprovado é por isso que não entramos em contato.
Ora, isto é lógico: se tivesse sido chamado é porque tinha sido
aprovado. Não, não damos este tipo de informação, se o candidato não
passou não se trata de saber onde errou, mas devia ser porque não
cabia no perfil da vaga. Calma, moço, a vaga foi fechada há alguns dias
atrás. Porque não ligou antes? Não, não precisa mandar o currículo de
novo ele ficará aqui por seis meses e se tiver uma vaga nós lhe
chamaremos. Isso. Fique tranqüilo. É. Boa Tarde.
- Ai que homem chato, não desligava. Fulana...Fulaaana...Se você já
acabou este processo posso descartar os currículos dos reprovados?
Pode? Vou jogar hein? Pode mesmo? Ai que bom, não agüentava mais
esta papelada em cima da minha mesa. Ih, lascou minha unha!
E lá fora, um homem violentado em suas esperanças, desliga o
telefone mudo, enquanto o coração da tarde se entristecia. Estala,
coração de vidro pintado!
Assim, além do amargo na língua, eis que sobra algo do
veneno lógico dos incas venusianos de recrutamento e seleção, que
merece nossa atenção:
Premissa 1 - Se você foi bem, será contatado.
Premissa 2 - Em qualquer caso, para ser contatado deve aguardar.
Conclusão - Logo, se você aguardar, receberá um contato.
Parece verdadeiro, não? Só tem um problema: a lógica não tem
preocupações com a verdade, mas com a validade das construções
lingüísticas e racionais. Não vou aqui cansar seus neurônios com
uma demonstração através de tabelas de verdade ou outros
operadores semânticos, mas sim fazer algo mais simples,
decompondo os componentes do silogismo:
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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No popular trata-se de uma alimentação por trás!
Quiéisso? Aiaiai! Além do mico que é estar na condição de
desempregado, ainda tem que conviver com as manias, siglas e
esquisitices deste pessoal? Não bastaria dizer pura e simplesmente,
retorno? Não! Aí a brincadeira perderia a graça. O legal é
transformar o discurso em uma peça quase ininteligível para não-
iniciados - através de colagem de conceitos - de modo que o mais
absurdo vire o mais correto.
E assim, eles vivem falando de estratégias de T&D, onde se
supõe que se deva fazer um LNT e depois medir os KPIs, sem
esquecer de anexar o Report no parecer da análise 360º, antes de
dizer se haverá Entrepreneuring. Para entender o índice de CHA,
deve-se alocar a política de RH para se adequar ao TQM , alongar o
perfil de R&S, ver o que sobra para os programas de QVT e aí
priorizar somente os MBAs e para quem não se encaixar BVP! (o
bicho vai pegar, rimou haha!). Mas, enfim: eles falam, falam e nunca
estão dispostos a cumprir com suas assertivas promessas. Depois
que você passou por várias etapas do processo, que incluíram testes,
entrevistas, mais testes e entrevistas, finalmente você receberá esta
orientação: aguarde um feedback. Não ligue. Nós ligaremos ou
mandaremos uma mensagem e informaremos sobre os passos
seguintes.
Aí o infeliz vai para casa corroendo-se de ansiedade e
esperanças, marcaram o retorno para a terça-feira e ainda é quinta,
então terá que esperar alguns dias e passar o fim de semana em
oração. Seu tempo será gasto rezando terços, fazendo promessas,
acendendo velas na frente do monitor para que o imail chegue logo
e concordando racionalmente (vai que existe mesmo) com tudo o
que o sincretismo manda para afastar o azar e tomando cuidado
para não fazer nada de errado. Pois, na situação (que de tão
grotesca, nem sei como classificar) devem ser seguidas à risca, senão
a mandinga não funciona.
Então, finalmente chega o dia tão esperado, mas ninguém
dá o menor sinal de vida. Você entra duzentas vezes na web,
conexão discada, horário comercial e nada na caixa postal. Você
gasta seus últimos trocados em pulsos, até que tomado de profundo
senso de indignação, liga para a tal agência ou empresa e tenta falar
com a pessoa. Aí você descobre o quanto vale os discursos e teorias
de Administração e Recursos Humanos, colocadas na prática, ao
ouvir:
- Quem quer falar? Ela não pode atender agora. Espere aí, vou
perguntar.
- Fulana...é o beltrano sobre o processo X. A outra responde:
- Não conheço! É candidato? Olha, diga que se não recebeu contato é
porque não foi aprovado. Não, não posso atender agora. Para seu
desespero, volta a primeira voz:
- Moço, você não foi aprovado é por isso que não entramos em contato.
Ora, isto é lógico: se tivesse sido chamado é porque tinha sido
aprovado. Não, não damos este tipo de informação, se o candidato não
passou não se trata de saber onde errou, mas devia ser porque não
cabia no perfil da vaga. Calma, moço, a vaga foi fechada há alguns dias
atrás. Porque não ligou antes? Não, não precisa mandar o currículo de
novo ele ficará aqui por seis meses e se tiver uma vaga nós lhe
chamaremos. Isso. Fique tranqüilo. É. Boa Tarde.
- Ai que homem chato, não desligava. Fulana...Fulaaana...Se você já
acabou este processo posso descartar os currículos dos reprovados?
Pode? Vou jogar hein? Pode mesmo? Ai que bom, não agüentava mais
esta papelada em cima da minha mesa. Ih, lascou minha unha!
E lá fora, um homem violentado em suas esperanças, desliga o
telefone mudo, enquanto o coração da tarde se entristecia. Estala,
coração de vidro pintado!
Assim, além do amargo na língua, eis que sobra algo do
veneno lógico dos incas venusianos de recrutamento e seleção, que
merece nossa atenção:
Premissa 1 - Se você foi bem, será contatado.
Premissa 2 - Em qualquer caso, para ser contatado deve aguardar.
Conclusão - Logo, se você aguardar, receberá um contato.
Parece verdadeiro, não? Só tem um problema: a lógica não tem
preocupações com a verdade, mas com a validade das construções
lingüísticas e racionais. Não vou aqui cansar seus neurônios com
uma demonstração através de tabelas de verdade ou outros
operadores semânticos, mas sim fazer algo mais simples,
decompondo os componentes do silogismo:
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1 - Não sei se fui bem. E se não fui nunca serei avisado disto.
2 - Se fui serei contatado, em todo caso devo aguardar (mas posso estar
enganado).
3 - Não adianta aguardar porque ninguém vai ligar mesmo...
Realmente, o que mais deixa os candidatos exaustos é a persistência
e energia gastas na sustentação da esperança de que, após a
maratona de testes e entrevistas, finalmente alguém irá ligar. Não
existe nada mais desrespeitoso, insensível ou deselegante do que
alguém marcar algo e não cumprir. Isto prova a qualidade (ou falta)
dos processos seletivos aplicados em terras tupiniquins. O
engraçado é que os caras sempre dizem, sorrindo que “logo”
entrarão em contato e sentem verdadeiro horror em deixar um
telefone ou algum meio de nós, candidatos, obtermos respostas.
Não bastasse isto, quando cobramos a promessa, somos tratados
como alienígenas ou malucos.
É o fim da picada! Esta situação parece muito com aquela
velha piada do paulista, do carioca e do mineiro: O mineiro, quando
encontra um conhecido, aguarda primeiro um convite e depois
retribui. O carioca é todo simpático e termina sempre a conversa
dizendo: aparece um dia desses lá em casa. Se o outro for mesmo, o
cara fica louco da vida. Não era para ir, era só força de expressão,
morou? Já o paulista, para demonstrar apreço, faz o convite e se a
pessoa não aparecer ele é que fica muito bravo. Era para ir e ele 82ficou esperando. Será que estamos dominados pela cultura do
Projac?
Bem, não importa. O que deve ser levado em conta é que
devemos sempre exigir de volta o mesmo grau de comprometimento e
objetividade que qualquer processo seletivo exige de nós. Empresas
que não cumprem requisitos mínimos como dar um retorno sobre as
avaliações ou a situação do andamento do processo, não devem ser
consideradas de qualidade. Uma quebra de confiança, logo no
início pode revelar muito sobre os métodos praticados no dia a dia.
Embora quase 70% das empresas façam isto cabe a nós, candidatos,
não deixar a peteca cair. Antes de apertar a mão do selecionador e
ouvir a terrível frase, deixe bem claro que você está celebrando ali
um acordo, com prazo determinado e que existe a expectativa de
cumprimento. Questione sobre a necessidade ou não de você tomar
a iniciativa de entrar em contato, em que fase se encontra a seleção,
quantos candidatos estão concorrendo, qual o número de vagas, se
existe algo mais que deva informar, se o recrutador tem mais algo a
perguntar e, principalmente, pegue o cartão de visitas da agência.
Estas providências poderão lhe proporcionar um
panorama sobre o real andamento do processo. Assim, você poderá
se dedicar a outras candidaturas e não fica perdendo tempo,
tentando descobrir os “valores” e “missão” da empresa, decorando
produtos e tudo o mais, se não aparentar haver muitas chances para
você. Pergunte sempre! Não tenha medo ou receio de “estragar”
suas chances na seletiva, porque o recrutador tem obrigação de lhe
informar sobre as exigências do processo. Se ele não fizer ou se
recusar a lhe dar maiores detalhes, desconfie da competência ou
das intenções do selecionador.
Tenha em mente que a sua dignidade é garantida por lei e
que ninguém pode ficar aí escolhendo candidatos a esmo,
deixando-os “no escuro”, ao mesmo tempo em que exige satisfações
de sua vida profissional, pessoal e emocional. Deixe claro que está ali
para um diálogo, não para ser escolhido como se faz com um punhado
de feijões. Renuncie à subserviência e sempre encare o entrevistador
de igual para igual. Nunca abaixe a cabeça para ele e nem
contemporize quando não for o caso, pois ele está ali para testar seus
princípios e se você deixar ele o levará a uma sinuca de bico, de
onde será difícil sair empregado. O selecionador não é seu “amigo”, 83nem muito menos um “parceiro” na busca por um emprego. Ele é
um capataz contratado para escolher, entre muitos, qual o tipo de
funcionário que se daria melhor em determinada empresa e função
(ou não). Ele não está interessado em descobrir o seu “potencial”,
saber o quanto você poderia “contribuir”, mas sim, em analisar se
existe como justificar ao cliente a sua contratação. Nada mais. Caiu a
ficha?
Quem acha que eu trabalho uma moral dos fracos, dos
“ressentidos”, não sabe o alcance de suas inferências ou faz muito
tempo que não fica desempregado. O predador, o “forte”, exibe sua
natural exuberância, porém ela é diretamente proporcional às suas
82 Há melhor exemplo disso, do que o popular Samba do Arnesto?
83 A não ser que você esteja pagando uma recolocação, mas aí o risco é todo seu. Pode funcionar ou não.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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1 - Não sei se fui bem. E se não fui nunca serei avisado disto.
2 - Se fui serei contatado, em todo caso devo aguardar (mas posso estar
enganado).
3 - Não adianta aguardar porque ninguém vai ligar mesmo...
Realmente, o que mais deixa os candidatos exaustos é a persistência
e energia gastas na sustentação da esperança de que, após a
maratona de testes e entrevistas, finalmente alguém irá ligar. Não
existe nada mais desrespeitoso, insensível ou deselegante do que
alguém marcar algo e não cumprir. Isto prova a qualidade (ou falta)
dos processos seletivos aplicados em terras tupiniquins. O
engraçado é que os caras sempre dizem, sorrindo que “logo”
entrarão em contato e sentem verdadeiro horror em deixar um
telefone ou algum meio de nós, candidatos, obtermos respostas.
Não bastasse isto, quando cobramos a promessa, somos tratados
como alienígenas ou malucos.
É o fim da picada! Esta situação parece muito com aquela
velha piada do paulista, do carioca e do mineiro: O mineiro, quando
encontra um conhecido, aguarda primeiro um convite e depois
retribui. O carioca é todo simpático e termina sempre a conversa
dizendo: aparece um dia desses lá em casa. Se o outro for mesmo, o
cara fica louco da vida. Não era para ir, era só força de expressão,
morou? Já o paulista, para demonstrar apreço, faz o convite e se a
pessoa não aparecer ele é que fica muito bravo. Era para ir e ele 82ficou esperando. Será que estamos dominados pela cultura do
Projac?
Bem, não importa. O que deve ser levado em conta é que
devemos sempre exigir de volta o mesmo grau de comprometimento e
objetividade que qualquer processo seletivo exige de nós. Empresas
que não cumprem requisitos mínimos como dar um retorno sobre as
avaliações ou a situação do andamento do processo, não devem ser
consideradas de qualidade. Uma quebra de confiança, logo no
início pode revelar muito sobre os métodos praticados no dia a dia.
Embora quase 70% das empresas façam isto cabe a nós, candidatos,
não deixar a peteca cair. Antes de apertar a mão do selecionador e
ouvir a terrível frase, deixe bem claro que você está celebrando ali
um acordo, com prazo determinado e que existe a expectativa de
cumprimento. Questione sobre a necessidade ou não de você tomar
a iniciativa de entrar em contato, em que fase se encontra a seleção,
quantos candidatos estão concorrendo, qual o número de vagas, se
existe algo mais que deva informar, se o recrutador tem mais algo a
perguntar e, principalmente, pegue o cartão de visitas da agência.
Estas providências poderão lhe proporcionar um
panorama sobre o real andamento do processo. Assim, você poderá
se dedicar a outras candidaturas e não fica perdendo tempo,
tentando descobrir os “valores” e “missão” da empresa, decorando
produtos e tudo o mais, se não aparentar haver muitas chances para
você. Pergunte sempre! Não tenha medo ou receio de “estragar”
suas chances na seletiva, porque o recrutador tem obrigação de lhe
informar sobre as exigências do processo. Se ele não fizer ou se
recusar a lhe dar maiores detalhes, desconfie da competência ou
das intenções do selecionador.
Tenha em mente que a sua dignidade é garantida por lei e
que ninguém pode ficar aí escolhendo candidatos a esmo,
deixando-os “no escuro”, ao mesmo tempo em que exige satisfações
de sua vida profissional, pessoal e emocional. Deixe claro que está ali
para um diálogo, não para ser escolhido como se faz com um punhado
de feijões. Renuncie à subserviência e sempre encare o entrevistador
de igual para igual. Nunca abaixe a cabeça para ele e nem
contemporize quando não for o caso, pois ele está ali para testar seus
princípios e se você deixar ele o levará a uma sinuca de bico, de
onde será difícil sair empregado. O selecionador não é seu “amigo”, 83nem muito menos um “parceiro” na busca por um emprego. Ele é
um capataz contratado para escolher, entre muitos, qual o tipo de
funcionário que se daria melhor em determinada empresa e função
(ou não). Ele não está interessado em descobrir o seu “potencial”,
saber o quanto você poderia “contribuir”, mas sim, em analisar se
existe como justificar ao cliente a sua contratação. Nada mais. Caiu a
ficha?
Quem acha que eu trabalho uma moral dos fracos, dos
“ressentidos”, não sabe o alcance de suas inferências ou faz muito
tempo que não fica desempregado. O predador, o “forte”, exibe sua
natural exuberância, porém ela é diretamente proporcional às suas
82 Há melhor exemplo disso, do que o popular Samba do Arnesto?
83 A não ser que você esteja pagando uma recolocação, mas aí o risco é todo seu. Pode funcionar ou não.
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necessidades e sua voracidade cessa, ao sentir-se satisfeito. No
homem, a ambição a cobiça e vontade de potência que hoje se
expressa na “vontade de controle” e daí degringola facilmente para
uma “vontade de sistema”, não tem um limite para suas satisfações.
Portanto, aqui não é o caso de lembrar a ausência de compaixão que
existe na natureza para justificar a competição, citarmos aforismos
ou muito menos de identificar uma falácia naturalista, pois estamos
saindo da mesma premissa básica. Aliás, trata-se de uma
constatação de egolatria e megalomania corporativas em
proporções tais que os nefandos sistemas de “racionais” Weber ou
Taylor hoje parecem contos da carochinha.
Voltando ao assunto, a imposição de uma exigência de
respostas por parte dos responsáveis pelos processos seletivos, além
de manter você longe de uma sociologia do “clown”, pode lhe
poupar muitos desgostos com os vários processos seletivos que são
simplesmente interrompidos e ninguém é avisado. Seja por desleixo
da empresa, que muda de idéia ao sabor das conveniências e
incompetências (ou pauras) da média gerência e se esquece que
está lidando com pessoas e não com “recursos” ou “insumos”. Seja
por reviravoltas no mercado, na política, na bolsa ou problemas
com selecionadores e consultores que saem e entram de agências a
toda hora, seja, enfim pelo batimento irregular das asas das
borboletas azuis em Bornéu, sempre existe a possibilidade dos
processos serem suspensos. Portanto, o quanto mais cedo você
souber a respeito, mais cedo se conformará e partirá para outra,
evitando passar o que eu passei, na situação abaixo:
- Bom, Luís, você chegou à fase final do processo. Agora o que
queremos é que você desenvolva uma estratégia detalhada do
treinamento para ser aplicado em 1.000 treinandos em todo o Brasil.
Depois você irá apresentar o trabalho ao diretor-geral do
hipermercado. Se ele gostar, está aprovado, disse para mim a
consultora de ínterim management.
- Estou muito feliz e farei um ótimo projeto, pode ter certeza, disse-lhe
confiante.
- Então nos vemos na central de compras daqui a dois dias. Leve a
apresentação em cd.
As duas noites seguintes eu fiquei acordado, montando,
revisando e ampliando o projeto que consumiu mais esforço e
neurônios do que no tempo em que eu ficava na balada.
Quando acabei, eu tinha feito um planejamento-monstro,
detalhadíssimo, com hierarquias definidas de processos, planilhas,
análises e meios, cuja sinopse chegava a umas 50 lâminas de power
point. Arrematando isso, um calhamaço de papel, descrevendo os
passos mais importantes, logística, indicadores, avaliações e por aí
vai.
Tudo para uma vaga de supervisor de treinamento em uma
multinacional francesa. Estava quase lá! Sentia isto no ar!
No dia marcado, nos encontramos no imponente saguão
da recepção e ficamos, eu e a consultora, a conversarmos sobre
amenidades e lendo os banners sobre a campanha de ética no
trabalho da empresa. Antes de entrarmos, ela me sussurrou no
ouvido:
- Olha, se ele pedir para copiar o projeto, não deixe. Ok?
- Mas, por quê?
- Não, nada. Deixa pra lá. O diretor já vem vindo. Vamos.
Achei aquilo um absurdo. Talvez, pensei, ela gostasse de um outro
candidato e estava tentando me colocar numa fria. Imagina que eu
ia negar algo ao todo poderoso da rede. Entramos. Logo verifiquei
que o local era um infindável corredor cheio de cubículos e
divisórias de vidro, como saletas. Um grande departamento de
compras. Sentamos, nos apresentamos e coloquei o cd para rodar.
Antes de começar as explicações a consultora brincou,
dizendo que o diretor era formado em filosofia também. Foi o
máximo! Finalmente alguém que nunca poderia questionar a
validade de se fazer um curso de humanas, pois seu cargo era de alta
hierarquia. No mais, isto criou uma imediata empatia e então, passei
a discorrer sobre o ambicioso projeto, enquanto era observado
pelos dois e - tinha a certeza - por mais gente, escondida num dos
outros cubículos.
Certa altura da apresentação, quando entramos na fase de
implantação e as variáveis, o homem deu um grito:
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
136 137
necessidades e sua voracidade cessa, ao sentir-se satisfeito. No
homem, a ambição a cobiça e vontade de potência que hoje se
expressa na “vontade de controle” e daí degringola facilmente para
uma “vontade de sistema”, não tem um limite para suas satisfações.
Portanto, aqui não é o caso de lembrar a ausência de compaixão que
existe na natureza para justificar a competição, citarmos aforismos
ou muito menos de identificar uma falácia naturalista, pois estamos
saindo da mesma premissa básica. Aliás, trata-se de uma
constatação de egolatria e megalomania corporativas em
proporções tais que os nefandos sistemas de “racionais” Weber ou
Taylor hoje parecem contos da carochinha.
Voltando ao assunto, a imposição de uma exigência de
respostas por parte dos responsáveis pelos processos seletivos, além
de manter você longe de uma sociologia do “clown”, pode lhe
poupar muitos desgostos com os vários processos seletivos que são
simplesmente interrompidos e ninguém é avisado. Seja por desleixo
da empresa, que muda de idéia ao sabor das conveniências e
incompetências (ou pauras) da média gerência e se esquece que
está lidando com pessoas e não com “recursos” ou “insumos”. Seja
por reviravoltas no mercado, na política, na bolsa ou problemas
com selecionadores e consultores que saem e entram de agências a
toda hora, seja, enfim pelo batimento irregular das asas das
borboletas azuis em Bornéu, sempre existe a possibilidade dos
processos serem suspensos. Portanto, o quanto mais cedo você
souber a respeito, mais cedo se conformará e partirá para outra,
evitando passar o que eu passei, na situação abaixo:
- Bom, Luís, você chegou à fase final do processo. Agora o que
queremos é que você desenvolva uma estratégia detalhada do
treinamento para ser aplicado em 1.000 treinandos em todo o Brasil.
Depois você irá apresentar o trabalho ao diretor-geral do
hipermercado. Se ele gostar, está aprovado, disse para mim a
consultora de ínterim management.
- Estou muito feliz e farei um ótimo projeto, pode ter certeza, disse-lhe
confiante.
- Então nos vemos na central de compras daqui a dois dias. Leve a
apresentação em cd.
As duas noites seguintes eu fiquei acordado, montando,
revisando e ampliando o projeto que consumiu mais esforço e
neurônios do que no tempo em que eu ficava na balada.
Quando acabei, eu tinha feito um planejamento-monstro,
detalhadíssimo, com hierarquias definidas de processos, planilhas,
análises e meios, cuja sinopse chegava a umas 50 lâminas de power
point. Arrematando isso, um calhamaço de papel, descrevendo os
passos mais importantes, logística, indicadores, avaliações e por aí
vai.
Tudo para uma vaga de supervisor de treinamento em uma
multinacional francesa. Estava quase lá! Sentia isto no ar!
No dia marcado, nos encontramos no imponente saguão
da recepção e ficamos, eu e a consultora, a conversarmos sobre
amenidades e lendo os banners sobre a campanha de ética no
trabalho da empresa. Antes de entrarmos, ela me sussurrou no
ouvido:
- Olha, se ele pedir para copiar o projeto, não deixe. Ok?
- Mas, por quê?
- Não, nada. Deixa pra lá. O diretor já vem vindo. Vamos.
Achei aquilo um absurdo. Talvez, pensei, ela gostasse de um outro
candidato e estava tentando me colocar numa fria. Imagina que eu
ia negar algo ao todo poderoso da rede. Entramos. Logo verifiquei
que o local era um infindável corredor cheio de cubículos e
divisórias de vidro, como saletas. Um grande departamento de
compras. Sentamos, nos apresentamos e coloquei o cd para rodar.
Antes de começar as explicações a consultora brincou,
dizendo que o diretor era formado em filosofia também. Foi o
máximo! Finalmente alguém que nunca poderia questionar a
validade de se fazer um curso de humanas, pois seu cargo era de alta
hierarquia. No mais, isto criou uma imediata empatia e então, passei
a discorrer sobre o ambicioso projeto, enquanto era observado
pelos dois e - tinha a certeza - por mais gente, escondida num dos
outros cubículos.
Certa altura da apresentação, quando entramos na fase de
implantação e as variáveis, o homem deu um grito:
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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- Nossa! O que é isso? Maravilha! Muito complexo!
- Nem tanto, trata-se apenas do fluxograma de aplicação em primeiro
nível, retruquei, ainda pode haver correções e desvios, embora tenha
previsto um ciclo de paradas e avaliações.
- Você está usando o PDCA? Muito bom, prossiga.
E eu todo feliz continuei a minha arenga sobre as fases do processo,
sistemas de recompensa, adequação multinível, LNT e tudo o mais.
No final veio a pergunta:
- Você me disponibiliza uma cópia?
- Mas é claro! Assim você pode analisar com cuidado e discutiremos os
detalhes depois, disse triunfante, certo de que estava com os dois pés
dentro da empresa.
Despedimos-nos e a consultora ficou de nos dar uma posição dentro
de no máximo duas semanas, pois o diretor iria viajar etc. Marcamos
uma data para contato e fui embora para casa, sonhar com meu
novo emprego e passei os próximos dias conhecendo mais a
empresa e pesquisando. Mas, passaram-se as duas semanas e nada
de um contato.
Resolvi mandar um e-mail. Sem resposta. Liguei, não
estavam. Outro e-mail e então um retorno lacônico: estamos
aguardando ele voltar. Dias depois, telefonei: pediram-me para
“visitar” as lojas e fazer observações de campo. Fui lá, gastei o pouco
dinheiro que tinha para pôr gasolina, fui a várias lojas, fiz relatórios,
acabei com o meu último cartucho de tinta da impressora
imprimindo o material e fiquei esperando. Nada. Tive mais fé. Não
adiantou.
Mantive a esperança. Nenhum contato. Resisti ao
desânimo. Sem retorno. Eu já não sabia mais o que fazer, pois havia
se passado três meses e não havia posição sobre o processo. Então
num último e-mail veio a bomba: processo suspenso por tempo
indeterminado. Fiquei sem ação, completamente desolado. Liguei
para um amigo que trabalhou comigo na fábrica e estava na mesma
seletiva, mas para outro cargo, e então ele me abriu os olhos para a
dura realidade:
- Ô, Luisão! Você não ouviu na tv que eles compraram a Rede Gib? Tá
tudo parado por causa disso. Veio até uma nova diretoria do exterior e
tudo o mais. Aquela lasanha que você me prometeu parece que vai ter
que esperar. É a vida! Bola pra frente meu irmão!
Depois de me deixar cair no sofá, desalentado, eu me lembrei da
advertência da consultora. Além de o processo ter dançado, todo o
material do projeto estava com eles, que bem poderiam utilizar sem
custo algum. Senti que fora usado, mais que isso: um completo
idiota. Nunca mais ouvi falar deles e, sinceramente, até hoje evito
entrar em suas lojas para fazer compras, tamanho o dano que me foi
infringido. Demorei um bom tempo até me recuperar e conseguir
levantar o moral. Mas, para eles isto não significou nada e nenhuma
satisfação me foi dada, a despeito de tudo.
Mas, um processo não é somente suspenso por fatores que
aliem decisões de mercado, problemas de comunicação
interdepartamental ou pelo típico caos administrativo - e ético -, que
vigora nas grandes empresas, em geral. Muitos outros
recrutamentos são suspensos ou cancelados pela suprema
incompetência dos próprios empregadores em traçar um perfil de
cargo que seja adequado a determinadas funções que se deseja
criar, ou substituir na empresa. Nisto eu concordo com o pessoal de
recursos humanos: é uma pedreira lidar com estes clientes!
Senão, veja só o último causo que tenho para lhes contar,
antes de entramos propriamente nas partes mais técnicas e práticas
deste alfarrábio:
- Mais um dia ou menos um dia? Seja o que for, acho que esta semana
vai, conversava eu com meus botões, enquanto descia as escadas do
metrô e entrava no vagão.
Durante a viagem, o balanço monótono do trem me fazia dormitar.
Quando, enfim, cansei de ficar “pescando”, programei meu relógio
interno para me acordar dali a quatro estações e apaguei até chegar
em meu destino. Subi, virei à esquerda nos bloqueios e fui descendo
a rua, naquela fria manhã de julho. Atravessei o terminal da Vila
Mariana e desci a Lins de Vasconcelos em direção ao Cambuci,
parando de quando em quando para conferir a numeração. Ao
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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- Nossa! O que é isso? Maravilha! Muito complexo!
- Nem tanto, trata-se apenas do fluxograma de aplicação em primeiro
nível, retruquei, ainda pode haver correções e desvios, embora tenha
previsto um ciclo de paradas e avaliações.
- Você está usando o PDCA? Muito bom, prossiga.
E eu todo feliz continuei a minha arenga sobre as fases do processo,
sistemas de recompensa, adequação multinível, LNT e tudo o mais.
No final veio a pergunta:
- Você me disponibiliza uma cópia?
- Mas é claro! Assim você pode analisar com cuidado e discutiremos os
detalhes depois, disse triunfante, certo de que estava com os dois pés
dentro da empresa.
Despedimos-nos e a consultora ficou de nos dar uma posição dentro
de no máximo duas semanas, pois o diretor iria viajar etc. Marcamos
uma data para contato e fui embora para casa, sonhar com meu
novo emprego e passei os próximos dias conhecendo mais a
empresa e pesquisando. Mas, passaram-se as duas semanas e nada
de um contato.
Resolvi mandar um e-mail. Sem resposta. Liguei, não
estavam. Outro e-mail e então um retorno lacônico: estamos
aguardando ele voltar. Dias depois, telefonei: pediram-me para
“visitar” as lojas e fazer observações de campo. Fui lá, gastei o pouco
dinheiro que tinha para pôr gasolina, fui a várias lojas, fiz relatórios,
acabei com o meu último cartucho de tinta da impressora
imprimindo o material e fiquei esperando. Nada. Tive mais fé. Não
adiantou.
Mantive a esperança. Nenhum contato. Resisti ao
desânimo. Sem retorno. Eu já não sabia mais o que fazer, pois havia
se passado três meses e não havia posição sobre o processo. Então
num último e-mail veio a bomba: processo suspenso por tempo
indeterminado. Fiquei sem ação, completamente desolado. Liguei
para um amigo que trabalhou comigo na fábrica e estava na mesma
seletiva, mas para outro cargo, e então ele me abriu os olhos para a
dura realidade:
- Ô, Luisão! Você não ouviu na tv que eles compraram a Rede Gib? Tá
tudo parado por causa disso. Veio até uma nova diretoria do exterior e
tudo o mais. Aquela lasanha que você me prometeu parece que vai ter
que esperar. É a vida! Bola pra frente meu irmão!
Depois de me deixar cair no sofá, desalentado, eu me lembrei da
advertência da consultora. Além de o processo ter dançado, todo o
material do projeto estava com eles, que bem poderiam utilizar sem
custo algum. Senti que fora usado, mais que isso: um completo
idiota. Nunca mais ouvi falar deles e, sinceramente, até hoje evito
entrar em suas lojas para fazer compras, tamanho o dano que me foi
infringido. Demorei um bom tempo até me recuperar e conseguir
levantar o moral. Mas, para eles isto não significou nada e nenhuma
satisfação me foi dada, a despeito de tudo.
Mas, um processo não é somente suspenso por fatores que
aliem decisões de mercado, problemas de comunicação
interdepartamental ou pelo típico caos administrativo - e ético -, que
vigora nas grandes empresas, em geral. Muitos outros
recrutamentos são suspensos ou cancelados pela suprema
incompetência dos próprios empregadores em traçar um perfil de
cargo que seja adequado a determinadas funções que se deseja
criar, ou substituir na empresa. Nisto eu concordo com o pessoal de
recursos humanos: é uma pedreira lidar com estes clientes!
Senão, veja só o último causo que tenho para lhes contar,
antes de entramos propriamente nas partes mais técnicas e práticas
deste alfarrábio:
- Mais um dia ou menos um dia? Seja o que for, acho que esta semana
vai, conversava eu com meus botões, enquanto descia as escadas do
metrô e entrava no vagão.
Durante a viagem, o balanço monótono do trem me fazia dormitar.
Quando, enfim, cansei de ficar “pescando”, programei meu relógio
interno para me acordar dali a quatro estações e apaguei até chegar
em meu destino. Subi, virei à esquerda nos bloqueios e fui descendo
a rua, naquela fria manhã de julho. Atravessei o terminal da Vila
Mariana e desci a Lins de Vasconcelos em direção ao Cambuci,
parando de quando em quando para conferir a numeração. Ao
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chegar, olhei o prédio antigo e fui entrando. Cumprimentei o
zelador e fui para os elevadores. Sobe! Entrei. Pouco depois saltei no
quinto, conferi mais uma vez o nome da pessoa e adentrei na
recepção da agência.
Mais uma operação começava. Duas cópias do currículo,
com todos os dados ordenados, objetivos, destacando as
competências, experiência e perfil não bastavam. Era sempre
preciso preencher a bendita ficha de admissão, com os mesmos
dados do currículo. Nas saletas, a mesma fauna de sempre. Tipos
estranhos, bem ou mal vestidos, olhando para você como se fosse
um potencial competidor, ou, no mínimo, um animal curioso.
Enfim! O negócio era sentar, preencher a ficha e aguardar
ser chamado. Como sempre, o pior ainda estava por vir, em forma
de entrevista.
- Bom dia! Sou a Sirlene, sente-se e vamos falar de seu perfil.
- Bom dia! Como vai? Minha experiência é ampla e variada, passei por
diversas empresas em vários segmentos, exercendo funções de
responsabilidade com ênfase para...
Continuamos ali por uma boa meia hora e, aparentemente, tudo
estava bem. No final, vieram algumas questões sobre
desenvolvimento de produtos, prospecção, abertura de mercado e
o be-a-bá do marketing promocional. Respondi com clareza todas as
perguntas e ela respondeu:
- Olha, acho que podemos marcar uma visita à empresa. Por mim você
pode ser indicado sem problemas, devido à sua experiência e suas
competências. Você pode ir até lá agora? Só vou ligar avisando, porque
este cliente é um pouco exigente, mas eu volto em um momento.
Fiquei ali admirado, sonhando com a porta que começava a se abrir.
Com certeza, pensava, como estou indo já indicado pela agência, o
pessoal da empresa só vai querer me conhecer e daí eu estava a um
passo de finalmente ser contratado. Mas aí veio a bomba:
- Sr. Luís. Eu nem sei o que dizer... Mas o Sr. tem formação em mecânica
industrial? Eles querem uma pessoa para gestão de marketing,
treinamento e promoção, que possua tanto longa experiência
comercial como formação técnica em manutenção de máquinas. 84
Ajudaria se tiver alguma experiência em T&D, CEP e em motivação de
equipes. Parece que vai ter que ajudar na fábrica também. Eu não
entendo! Este cliente toda a hora muda o perfil...
- Claro que não tenho formação em mecânica, caso contrário não
estaria pleiteando uma vaga em trade marketing! Afinal é para sujar a
mão de graxa ou para atuar no mercado?
- Me desculpe, mas então o perfil não se completa e eu fico com seu
currículo para outra oportunidade.
- Mas nem um alienígena completaria este perfil, esbravejei. O que eles 85
querem afinal?
Como a letra da música, voltei para casa, abatido e desencantado
com a vida. Que coisa! Revisitei os pensamentos e folhinhas e
constatei a passagem inexorável do tempo. Salvo um ou outro bico,
em um ano havia totalizado dezenas entrevistas e dinâmicas,
centenas de testes; enviara quase 5.000 currículos, inúmeras
ligações, gastara muita sola de sapato e uma incrível soma de
dinheiro em transporte, papelada e itens de apresentação. A coisa
estava feia e esperava em Deus algo mudar.
Mas, como já disseram (e com razão) tudo é mudança e o 86mundo é opinião. Algumas semanas depois, fui contratado como
consultor empresarial em uma empresa de treinamento e passei
outro ano viajando por todo o País e desenvolvendo cursos e
atuando intensivamente em análise de gestão comercial em
grandes empresas. Ralava dias, noites, finais de semana e feriados,
mas “produzia” contente e hiperativo. Poderia ser este o ponto final
de uma trajetória do operário do conhecimento, explorado
delicadamente, que vai envelhecendo até entrar finalmente no
eterno anonimato.
Mas os absurdos não pararam de ocorrer quando fui
contratado, pelo contrário, pude observar como consultor outras
séries de disparates organizacionais que seriam trágicos se não
fossem cômicos nos desgastes e conseqüências e danos psicológicos
causados ou potenciais. As inovações, a tecnologia, as abordagens e
84 Cep = Controle estatístico do processo. Não ria, eu realmente passei por isso!85 Such a monkey business...86 Marco Aurélio, Meditações.
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chegar, olhei o prédio antigo e fui entrando. Cumprimentei o
zelador e fui para os elevadores. Sobe! Entrei. Pouco depois saltei no
quinto, conferi mais uma vez o nome da pessoa e adentrei na
recepção da agência.
Mais uma operação começava. Duas cópias do currículo,
com todos os dados ordenados, objetivos, destacando as
competências, experiência e perfil não bastavam. Era sempre
preciso preencher a bendita ficha de admissão, com os mesmos
dados do currículo. Nas saletas, a mesma fauna de sempre. Tipos
estranhos, bem ou mal vestidos, olhando para você como se fosse
um potencial competidor, ou, no mínimo, um animal curioso.
Enfim! O negócio era sentar, preencher a ficha e aguardar
ser chamado. Como sempre, o pior ainda estava por vir, em forma
de entrevista.
- Bom dia! Sou a Sirlene, sente-se e vamos falar de seu perfil.
- Bom dia! Como vai? Minha experiência é ampla e variada, passei por
diversas empresas em vários segmentos, exercendo funções de
responsabilidade com ênfase para...
Continuamos ali por uma boa meia hora e, aparentemente, tudo
estava bem. No final, vieram algumas questões sobre
desenvolvimento de produtos, prospecção, abertura de mercado e
o be-a-bá do marketing promocional. Respondi com clareza todas as
perguntas e ela respondeu:
- Olha, acho que podemos marcar uma visita à empresa. Por mim você
pode ser indicado sem problemas, devido à sua experiência e suas
competências. Você pode ir até lá agora? Só vou ligar avisando, porque
este cliente é um pouco exigente, mas eu volto em um momento.
Fiquei ali admirado, sonhando com a porta que começava a se abrir.
Com certeza, pensava, como estou indo já indicado pela agência, o
pessoal da empresa só vai querer me conhecer e daí eu estava a um
passo de finalmente ser contratado. Mas aí veio a bomba:
- Sr. Luís. Eu nem sei o que dizer... Mas o Sr. tem formação em mecânica
industrial? Eles querem uma pessoa para gestão de marketing,
treinamento e promoção, que possua tanto longa experiência
comercial como formação técnica em manutenção de máquinas. 84
Ajudaria se tiver alguma experiência em T&D, CEP e em motivação de
equipes. Parece que vai ter que ajudar na fábrica também. Eu não
entendo! Este cliente toda a hora muda o perfil...
- Claro que não tenho formação em mecânica, caso contrário não
estaria pleiteando uma vaga em trade marketing! Afinal é para sujar a
mão de graxa ou para atuar no mercado?
- Me desculpe, mas então o perfil não se completa e eu fico com seu
currículo para outra oportunidade.
- Mas nem um alienígena completaria este perfil, esbravejei. O que eles 85
querem afinal?
Como a letra da música, voltei para casa, abatido e desencantado
com a vida. Que coisa! Revisitei os pensamentos e folhinhas e
constatei a passagem inexorável do tempo. Salvo um ou outro bico,
em um ano havia totalizado dezenas entrevistas e dinâmicas,
centenas de testes; enviara quase 5.000 currículos, inúmeras
ligações, gastara muita sola de sapato e uma incrível soma de
dinheiro em transporte, papelada e itens de apresentação. A coisa
estava feia e esperava em Deus algo mudar.
Mas, como já disseram (e com razão) tudo é mudança e o 86mundo é opinião. Algumas semanas depois, fui contratado como
consultor empresarial em uma empresa de treinamento e passei
outro ano viajando por todo o País e desenvolvendo cursos e
atuando intensivamente em análise de gestão comercial em
grandes empresas. Ralava dias, noites, finais de semana e feriados,
mas “produzia” contente e hiperativo. Poderia ser este o ponto final
de uma trajetória do operário do conhecimento, explorado
delicadamente, que vai envelhecendo até entrar finalmente no
eterno anonimato.
Mas os absurdos não pararam de ocorrer quando fui
contratado, pelo contrário, pude observar como consultor outras
séries de disparates organizacionais que seriam trágicos se não
fossem cômicos nos desgastes e conseqüências e danos psicológicos
causados ou potenciais. As inovações, a tecnologia, as abordagens e
84 Cep = Controle estatístico do processo. Não ria, eu realmente passei por isso!85 Such a monkey business...86 Marco Aurélio, Meditações.
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práticas além de desnaturarem-se em relação à ciência originadora,
ainda renegavam seus pressupostos. As pessoas manipulando
processos e ferramentas de maneira tosca, evidenciando o
despreparo, personalismos ou a avidez do retorno. Há muito ainda
por dizer. Tanto que já sei como pode continuar a história: vou
sistematizar as principais idéias e práticas que contribuem para
afundar uma empresa e escrever o segundo volume do manual.
Nesse meio tempo, verifiquei que não mais podia ficar
correndo atrás das oportunidades: Eu tinha que começar a construí-
las. E, assim, ao final de algum tempo naquela empresa me vi na
situação de optar por crescer ou estagnar. Então comecei a
pavimentar esta estrada chamada oportunidade e fazê-la
condizente com minhas capacidades. No final de 2006, após
administrar com sucesso um projeto de grande porte para uma
montadora de renome, me desliguei. Dois anos atrás e estaria cru,
receoso do futuro, mas agora estava, pelo contrário com os
machados afiados. Fui em frente e fundei meu próprio estúdio de
consultoria, que é especializada em programas especiais para
desenvolvimento e motivação. A procura tem sido surpreendente e
crescemos dia a dia. Quanto aos disparates, procuro eliminar estas
insanidades organizacionais, capacitando pessoas através de uma 87metodologia ou processo que designo por campo transcendental ,
pois é uma área de ressonância e interação ao redor da presença
individual. Pessoas excelentes se tornam profissionais excelentes.
Mas, enquanto eu entrava e saía do olho do furacão, como
todo personagem eu tinha também que manter uma vida dupla: a
de candidato e pesquisador. Como bolsista de uma grande
universidade, durante o curso destes fenômenos eu ainda tinha que 88estudar muito para concluir com méritos o meu mestrado. Dada à
qualidade da formação, as cobranças eram muitas, mas isto
contribuía para o melhor. Aliás, se não fossem os programas que me
foram oferecidos pela São Judas - aos quais me habilitei -, e à
capacidade humana e técnica de seu corpo docente e
coordenadores, eu ainda estaria no rés-do-chão empresarial.
O fato de ter continuado a estudar e instado a apresentar
textos, dar aulas, representava a confiança em minhas
potencialidades. Ter sido sempre estimulado a dar o melhor de mim
foi definitivo para manter a auto-estima, nos períodos mais negros.
Mesmo nos dias mais solitários, em meio a passeios pelo campus,
aguardando o telefone tocar para uma entrevista, recolhi bons
frutos: Desenvolvi um projeto acadêmico que recebeu uma Bolsa
Capes, apresentei vários trabalhos em simpósios, escrevi livros,
encontrei amigos, artistas e pensadores de alto estofo intelectual de
várias instituições. No meio da tormenta, coisas e pessoas para se
agradecer.
Por isso, não posso me queixar já que agora - devido a toda
esta experiência e formação - consigo oferecer diferenciais que
encantam os clientes, sou respeitado no meu segmento de atuação,
tenho formado uma boa rede de relacionamentos e sou
freqüentemente solicitado para palestras e projetos, dentre os quais
está a publicação deste livro pela Ex Libris. Mas isto é apenas o (re)
começo, sei que a estabilidade somente virá quando completar
minha formação acadêmica e puder trabalhar mais próximo ao
contexto de minha expertise em pesquisa. Quero crer que isto será
possível e eu não tenha que me juntar aos amigos que saíram do país
em busca do reconhecimento de seu trabalho.
Esta é uma etapa estratégica para poder respirar e alçar
vôos maiores, uma vez que meu objetivo é mais amplo. Outro ponto
é deixar claro que as avaliações que efetuei não buscam atacar
disciplinas, procedimentos técnicos, profissões ou campos do
conhecimento. Também passo ao largo de taxinomias e
considerações epistemológicas. Teorias válidas e aceitáveis que
quando aplicadas acarretam danos são inúteis operacional ou
eticamente. Práticas danosas que se instalam ao arrepio da reflexão,
também o são. Apenas relatei o que foi registrado pela perspectiva
de um homem comum, perdido entre uma selva de exigências
incoerentes, cuja essentia lhe escapa.
São reflexões contemporaneamente fragmentárias,
relacionais, próprias de quem sofre e denuncia o descaso, a desídia
e a incompetência em valorizar o humano. De qualquer forma,
como reflexão eu deixo o texto abaixo, extraído do conhecido
87 Minha singela homenagem ao Prof. Bento Prado Jr, eminente pensador, que este ano adentrou o céu dos filósofos.88 É difícil, mas as ondas contras as quais resisto não são suficientes para me fazer naufragar: Fluctua nec mergitur!
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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práticas além de desnaturarem-se em relação à ciência originadora,
ainda renegavam seus pressupostos. As pessoas manipulando
processos e ferramentas de maneira tosca, evidenciando o
despreparo, personalismos ou a avidez do retorno. Há muito ainda
por dizer. Tanto que já sei como pode continuar a história: vou
sistematizar as principais idéias e práticas que contribuem para
afundar uma empresa e escrever o segundo volume do manual.
Nesse meio tempo, verifiquei que não mais podia ficar
correndo atrás das oportunidades: Eu tinha que começar a construí-
las. E, assim, ao final de algum tempo naquela empresa me vi na
situação de optar por crescer ou estagnar. Então comecei a
pavimentar esta estrada chamada oportunidade e fazê-la
condizente com minhas capacidades. No final de 2006, após
administrar com sucesso um projeto de grande porte para uma
montadora de renome, me desliguei. Dois anos atrás e estaria cru,
receoso do futuro, mas agora estava, pelo contrário com os
machados afiados. Fui em frente e fundei meu próprio estúdio de
consultoria, que é especializada em programas especiais para
desenvolvimento e motivação. A procura tem sido surpreendente e
crescemos dia a dia. Quanto aos disparates, procuro eliminar estas
insanidades organizacionais, capacitando pessoas através de uma 87metodologia ou processo que designo por campo transcendental ,
pois é uma área de ressonância e interação ao redor da presença
individual. Pessoas excelentes se tornam profissionais excelentes.
Mas, enquanto eu entrava e saía do olho do furacão, como
todo personagem eu tinha também que manter uma vida dupla: a
de candidato e pesquisador. Como bolsista de uma grande
universidade, durante o curso destes fenômenos eu ainda tinha que 88estudar muito para concluir com méritos o meu mestrado. Dada à
qualidade da formação, as cobranças eram muitas, mas isto
contribuía para o melhor. Aliás, se não fossem os programas que me
foram oferecidos pela São Judas - aos quais me habilitei -, e à
capacidade humana e técnica de seu corpo docente e
coordenadores, eu ainda estaria no rés-do-chão empresarial.
O fato de ter continuado a estudar e instado a apresentar
textos, dar aulas, representava a confiança em minhas
potencialidades. Ter sido sempre estimulado a dar o melhor de mim
foi definitivo para manter a auto-estima, nos períodos mais negros.
Mesmo nos dias mais solitários, em meio a passeios pelo campus,
aguardando o telefone tocar para uma entrevista, recolhi bons
frutos: Desenvolvi um projeto acadêmico que recebeu uma Bolsa
Capes, apresentei vários trabalhos em simpósios, escrevi livros,
encontrei amigos, artistas e pensadores de alto estofo intelectual de
várias instituições. No meio da tormenta, coisas e pessoas para se
agradecer.
Por isso, não posso me queixar já que agora - devido a toda
esta experiência e formação - consigo oferecer diferenciais que
encantam os clientes, sou respeitado no meu segmento de atuação,
tenho formado uma boa rede de relacionamentos e sou
freqüentemente solicitado para palestras e projetos, dentre os quais
está a publicação deste livro pela Ex Libris. Mas isto é apenas o (re)
começo, sei que a estabilidade somente virá quando completar
minha formação acadêmica e puder trabalhar mais próximo ao
contexto de minha expertise em pesquisa. Quero crer que isto será
possível e eu não tenha que me juntar aos amigos que saíram do país
em busca do reconhecimento de seu trabalho.
Esta é uma etapa estratégica para poder respirar e alçar
vôos maiores, uma vez que meu objetivo é mais amplo. Outro ponto
é deixar claro que as avaliações que efetuei não buscam atacar
disciplinas, procedimentos técnicos, profissões ou campos do
conhecimento. Também passo ao largo de taxinomias e
considerações epistemológicas. Teorias válidas e aceitáveis que
quando aplicadas acarretam danos são inúteis operacional ou
eticamente. Práticas danosas que se instalam ao arrepio da reflexão,
também o são. Apenas relatei o que foi registrado pela perspectiva
de um homem comum, perdido entre uma selva de exigências
incoerentes, cuja essentia lhe escapa.
São reflexões contemporaneamente fragmentárias,
relacionais, próprias de quem sofre e denuncia o descaso, a desídia
e a incompetência em valorizar o humano. De qualquer forma,
como reflexão eu deixo o texto abaixo, extraído do conhecido
87 Minha singela homenagem ao Prof. Bento Prado Jr, eminente pensador, que este ano adentrou o céu dos filósofos.88 É difícil, mas as ondas contras as quais resisto não são suficientes para me fazer naufragar: Fluctua nec mergitur!
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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89diálogo da Morsa e das Ostras , de Lewis Carroll, para que meditem
na real seqüência dos discursos e que aprendam a entendê-los de
forma a evitar interpretações ingênuas e, principalmente, deixar se
levar por promessas vãs:
Está na hora de falarmos sobre sapatos, lacres e reis, de se o mar está
fervendo, ou se os porcos tem asas, talvez!
904 - Resumo da Ópera: Pequenas Grandes Coisas a Evitar
A - Não tenha medo de recomeçar, mesmo que a oportunidade
esteja em outro ramo.
Veja só: No início da década de 90, a coisa estava feia: Hiperinflação,
planos fracassados, o pessoal tentando implantar o Real e eu tinha
acabado de sair de uma grande multinacional, num plano de
demissões...Um amigo me falou que tinha uma vaga de vendedor de
peças de bicicletas. Eu agradeci a gentileza, mas pensei: ele devia
estar louco. Vendedor? É fim de carreira! Mas, como a situação
estava apertada, resolvi tentar a sorte. Tinha acabado de comprar
meu primeiro carro e lá fui eu para a Baixada Santista, porta mala
cheio de amostras e tabelas de preço. Não conhecia o ramo e nem as
cidades. Só que no primeiro dia eu vendi R$ 5.000,00. Nos meses
subseqüentes - com algum esforço, é claro - já estava vendendo de
R$ 40.000,00 a R$ 70.000,00. Depois arrumei outras representadas,
abri uma firma e dois anos depois estava com minha própria loja.
Adquiri grandes conhecimentos em negociação, fiz bons amigos e
durante dez anos esta foi a minha vida. Eu estaria lá até agora se o
governo FHC não tivesse ajudado a quebrar milhares de empresas
na alta do dólar. Depois disso, voltei ao mercado e tive outras
oportunidades. O importante não é a minha história, mas saber que
sempre existem possibilidades se você acreditar e tiver
determinação.
B - Não se sinta desmotivado com os resultados das “análises”
que fazem sobre você.
A maioria dos testes e avaliações apresenta resultados tão
disparatados e conflitantes, que é improvável que haja índices de
acerto superiores a 30%. Claro, alguma coisa você pode identificar
como “parte” de você e outras correlações. No entanto, não se fie
muito nisto, pois como eu já disse antes, tudo depende de como
você estava “se sentindo” na hora de preencher as respostas. No
mais as possibilidades de que estes testes digam como você é
“realmente” podem ser tão remotas quanto ganhar na loteria.
Os textos parecem, no mais das vezes, os prognósticos
daqueles sites de mapa astral, que já tem o texto pré-configurado e
só fazem encaixes conforme os dados que são inseridos. Mantenha
sempre a cabeça erguida e seja prático: Aprenda com as
experiências. Não desanime. No entanto, se notou alguma coisa em
seu comportamento que “bate” com o resultado ruim da avaliação,
não perca tempo e comece agora mesmo a buscar mecanismos de
melhorar a si mesmo.
C - Não procure passar a idéia de ser um infalível especialista:
Se você não construiu uma carreira até o pós-doutorado, então
deve tomar cuidado com o que fala e escreve nas seletivas. Não
critique os processos e pessoas de sua última empresa ou defina-se
como expertise. Sua postura pode ser confundida com arrogância e
despreparo, a despeito de suas muitas habilidades e experiência.
Mesmo com a generalização dos conceitos e das
denominações de cargo, procure sempre lembrar que algumas
coisas não mudam: se você não possui formação compatível com o
que afirma, será tratado como impostor. Lamentavelmente a
sociedade se apóia nos títulos e diplomas para aceitar opiniões e
considerar-se segura (mesmo que você seja um completo imbecil,
mas possua formação de primeira linha, eles acreditarão em você).
Outra coisa é lidar com o preconceito: se você mandava na
empresa, mas estava registrado como assistente o que vale para os
selecionadores é o registro em carteira e não a realidade dos fatos.
89 Alice no País do Espelho. A Morsa falava sem parar, distraindo as Ostras, enquanto as devorava.90 Fechando a parte expositiva, vamos ao resumo do que foi abordado e mais uma série de comentários, dicas e informações. Não se esqueça de verificar no final, informações importantes sobre o mercado e serviços aos candidatos.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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89diálogo da Morsa e das Ostras , de Lewis Carroll, para que meditem
na real seqüência dos discursos e que aprendam a entendê-los de
forma a evitar interpretações ingênuas e, principalmente, deixar se
levar por promessas vãs:
Está na hora de falarmos sobre sapatos, lacres e reis, de se o mar está
fervendo, ou se os porcos tem asas, talvez!
904 - Resumo da Ópera: Pequenas Grandes Coisas a Evitar
A - Não tenha medo de recomeçar, mesmo que a oportunidade
esteja em outro ramo.
Veja só: No início da década de 90, a coisa estava feia: Hiperinflação,
planos fracassados, o pessoal tentando implantar o Real e eu tinha
acabado de sair de uma grande multinacional, num plano de
demissões...Um amigo me falou que tinha uma vaga de vendedor de
peças de bicicletas. Eu agradeci a gentileza, mas pensei: ele devia
estar louco. Vendedor? É fim de carreira! Mas, como a situação
estava apertada, resolvi tentar a sorte. Tinha acabado de comprar
meu primeiro carro e lá fui eu para a Baixada Santista, porta mala
cheio de amostras e tabelas de preço. Não conhecia o ramo e nem as
cidades. Só que no primeiro dia eu vendi R$ 5.000,00. Nos meses
subseqüentes - com algum esforço, é claro - já estava vendendo de
R$ 40.000,00 a R$ 70.000,00. Depois arrumei outras representadas,
abri uma firma e dois anos depois estava com minha própria loja.
Adquiri grandes conhecimentos em negociação, fiz bons amigos e
durante dez anos esta foi a minha vida. Eu estaria lá até agora se o
governo FHC não tivesse ajudado a quebrar milhares de empresas
na alta do dólar. Depois disso, voltei ao mercado e tive outras
oportunidades. O importante não é a minha história, mas saber que
sempre existem possibilidades se você acreditar e tiver
determinação.
B - Não se sinta desmotivado com os resultados das “análises”
que fazem sobre você.
A maioria dos testes e avaliações apresenta resultados tão
disparatados e conflitantes, que é improvável que haja índices de
acerto superiores a 30%. Claro, alguma coisa você pode identificar
como “parte” de você e outras correlações. No entanto, não se fie
muito nisto, pois como eu já disse antes, tudo depende de como
você estava “se sentindo” na hora de preencher as respostas. No
mais as possibilidades de que estes testes digam como você é
“realmente” podem ser tão remotas quanto ganhar na loteria.
Os textos parecem, no mais das vezes, os prognósticos
daqueles sites de mapa astral, que já tem o texto pré-configurado e
só fazem encaixes conforme os dados que são inseridos. Mantenha
sempre a cabeça erguida e seja prático: Aprenda com as
experiências. Não desanime. No entanto, se notou alguma coisa em
seu comportamento que “bate” com o resultado ruim da avaliação,
não perca tempo e comece agora mesmo a buscar mecanismos de
melhorar a si mesmo.
C - Não procure passar a idéia de ser um infalível especialista:
Se você não construiu uma carreira até o pós-doutorado, então
deve tomar cuidado com o que fala e escreve nas seletivas. Não
critique os processos e pessoas de sua última empresa ou defina-se
como expertise. Sua postura pode ser confundida com arrogância e
despreparo, a despeito de suas muitas habilidades e experiência.
Mesmo com a generalização dos conceitos e das
denominações de cargo, procure sempre lembrar que algumas
coisas não mudam: se você não possui formação compatível com o
que afirma, será tratado como impostor. Lamentavelmente a
sociedade se apóia nos títulos e diplomas para aceitar opiniões e
considerar-se segura (mesmo que você seja um completo imbecil,
mas possua formação de primeira linha, eles acreditarão em você).
Outra coisa é lidar com o preconceito: se você mandava na
empresa, mas estava registrado como assistente o que vale para os
selecionadores é o registro em carteira e não a realidade dos fatos.
89 Alice no País do Espelho. A Morsa falava sem parar, distraindo as Ostras, enquanto as devorava.90 Fechando a parte expositiva, vamos ao resumo do que foi abordado e mais uma série de comentários, dicas e informações. Não se esqueça de verificar no final, informações importantes sobre o mercado e serviços aos candidatos.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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Portanto, se for o caso de realçar suas competências,
procure enfatizar os aspectos práticos de sua atuação. Se suas
pretensões são operacionais, nem tente bancar o esperto: o que se
busca é alguém que saiba cumprir ordens e atingir metas. Se você
não se conforma com isso, procure aprimorar-se faça uma nova
faculdade ou uma pós-graduação na área de seu maior interesse.
D - Palavras impronunciáveis em qualquer seleção:
Seja qual for o cargo ou função ao qual você está se candidatando,
no momento de expor ao selecionador as suas experiências e perfil,
preste muita atenção com o que vai dizer.
Evite a qualquer custo metáforas criativas ou analogias
circunstanciais. Algumas palavras e conceitos são proibidos para
quem quer arrumar um emprego. Se você disser que trabalha até
ficar doente, ou é pau para toda obra, que não era compreendido, está
se reciclando ou precisa muito do emprego, pode parecer coisa
inocente, mas veja só o que será entendido pelos selecionadores:
A - Você fica doente (não serve); B - Não tem foco ou especialidade
(quem faz tudo é ajudante geral); C - Não sabe agir em equipe
(criadores de casos são incompreendidos). D - Se você não é
capacitado, não se candidate. E - Está desesperado (aceita qualquer
coisa = você é qualquer coisa).
Evite também lugares comuns como: suar a camisa (prefira:
dedicação, superar desafios), crescer na empresa (prefira:
desenvolver minha carreira), começar de baixo (se não gostou da
vaga, porque veio?), matar a pau (prefira: resolvo problemas) e
outras expressões populares.
Enfim, os exemplos são inúmeros, portanto risque de seu
vocabulário qualquer palavra, locução ou expressão que indique
fraqueza, desânimo, casos pessoais, não integração ou possibilidade
de reivindicação.
E - Gestos que não devem ser feitos:
Pode parecer coisa de Lombroso, aquele cara que garantia ter
descoberto uma “ciência” para distinguir criminosos dos homens 91comuns, apenas analisando suas feições. Mas pessoas sérias já
92escreveram livros sobre isto, inclusive no Brasil , embora estes
pesquisadores não se atrevessem a ir tão longe assim e deixassem
claras as limitações da tese. No entanto, os seus discípulos que leram
seus livros nos cursinhos rápidos das universidades de
conveniência, ou na hora do almoço, acreditam sinceramente que
uma pessoa pode ser definida por seus gestos. Muitos outros “papas”
de administração e psicologia, também escreveram sobre isto, mas
não é o caso de ficar aqui com apelos a argumentos de autoridade,
que no mais estão superados desde a Idade Moderna.
O foco central da questão é que - e isto certamente ocorre -,
alguns estados emocionais podem ser lidos através de uma
linguagem não simbólica. É o caso da chamada comunicação não
verbal, onde os gestos podem indicar estados de espírito, como por
exemplo: mexer os pés sem parar indica nervosismo, cruzar as
pernas e braços significa retração e distanciamento. Talvez, apontar
o pé na direção da porta signifique que se queira ir embora, mostrar
o cotovelo a alguém ao lado tem o sentido de que não se está
interessado nele, por a mão na boca significa que se deve calar,
morder um lápis significa que se está tentando extrair uma resposta
de algo e por aí vai. A advertência, no entanto é que: Nem todos os
itens deste teatro gestual, possuem uma significação única. Este é o
ponto que quero ressaltar. Mas, tome cuidado, pois alguns chavões
retirados dos manuais serão sempre utilizados contra o candidato,
portanto evite:
91 Incrível, mas foi verdade. Esta técnica chegou até a ser muito utilizada no fim do século XIX e início do século XX, chamava-se fisiognomia. Certamente foi inspirada na passagem em que o trácio Zópiro, ao dialogar com Sócrates, gabava-se de conhecer profundamente a cada um, somente de olhar para sua face. No trecho, recolhido por Nietzsche, se não me engano em O Nascimento da Tragédia. Zópiro classificou Sócrates de imbecil, sensual e depravado. Enquanto os outros presentes ao diálogo tentaram linchar o trácio, Sócrates interveio e disse: Ele está certo sobre meus defeitos, mas eu os superei todos pela força de minha razão!92 Falo aqui do best-seller de RH: Relações Humanas na Família e no Trabalho, de Pierre Weil e Roland Tupankow.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
146 147
Portanto, se for o caso de realçar suas competências,
procure enfatizar os aspectos práticos de sua atuação. Se suas
pretensões são operacionais, nem tente bancar o esperto: o que se
busca é alguém que saiba cumprir ordens e atingir metas. Se você
não se conforma com isso, procure aprimorar-se faça uma nova
faculdade ou uma pós-graduação na área de seu maior interesse.
D - Palavras impronunciáveis em qualquer seleção:
Seja qual for o cargo ou função ao qual você está se candidatando,
no momento de expor ao selecionador as suas experiências e perfil,
preste muita atenção com o que vai dizer.
Evite a qualquer custo metáforas criativas ou analogias
circunstanciais. Algumas palavras e conceitos são proibidos para
quem quer arrumar um emprego. Se você disser que trabalha até
ficar doente, ou é pau para toda obra, que não era compreendido, está
se reciclando ou precisa muito do emprego, pode parecer coisa
inocente, mas veja só o que será entendido pelos selecionadores:
A - Você fica doente (não serve); B - Não tem foco ou especialidade
(quem faz tudo é ajudante geral); C - Não sabe agir em equipe
(criadores de casos são incompreendidos). D - Se você não é
capacitado, não se candidate. E - Está desesperado (aceita qualquer
coisa = você é qualquer coisa).
Evite também lugares comuns como: suar a camisa (prefira:
dedicação, superar desafios), crescer na empresa (prefira:
desenvolver minha carreira), começar de baixo (se não gostou da
vaga, porque veio?), matar a pau (prefira: resolvo problemas) e
outras expressões populares.
Enfim, os exemplos são inúmeros, portanto risque de seu
vocabulário qualquer palavra, locução ou expressão que indique
fraqueza, desânimo, casos pessoais, não integração ou possibilidade
de reivindicação.
E - Gestos que não devem ser feitos:
Pode parecer coisa de Lombroso, aquele cara que garantia ter
descoberto uma “ciência” para distinguir criminosos dos homens 91comuns, apenas analisando suas feições. Mas pessoas sérias já
92escreveram livros sobre isto, inclusive no Brasil , embora estes
pesquisadores não se atrevessem a ir tão longe assim e deixassem
claras as limitações da tese. No entanto, os seus discípulos que leram
seus livros nos cursinhos rápidos das universidades de
conveniência, ou na hora do almoço, acreditam sinceramente que
uma pessoa pode ser definida por seus gestos. Muitos outros “papas”
de administração e psicologia, também escreveram sobre isto, mas
não é o caso de ficar aqui com apelos a argumentos de autoridade,
que no mais estão superados desde a Idade Moderna.
O foco central da questão é que - e isto certamente ocorre -,
alguns estados emocionais podem ser lidos através de uma
linguagem não simbólica. É o caso da chamada comunicação não
verbal, onde os gestos podem indicar estados de espírito, como por
exemplo: mexer os pés sem parar indica nervosismo, cruzar as
pernas e braços significa retração e distanciamento. Talvez, apontar
o pé na direção da porta signifique que se queira ir embora, mostrar
o cotovelo a alguém ao lado tem o sentido de que não se está
interessado nele, por a mão na boca significa que se deve calar,
morder um lápis significa que se está tentando extrair uma resposta
de algo e por aí vai. A advertência, no entanto é que: Nem todos os
itens deste teatro gestual, possuem uma significação única. Este é o
ponto que quero ressaltar. Mas, tome cuidado, pois alguns chavões
retirados dos manuais serão sempre utilizados contra o candidato,
portanto evite:
91 Incrível, mas foi verdade. Esta técnica chegou até a ser muito utilizada no fim do século XIX e início do século XX, chamava-se fisiognomia. Certamente foi inspirada na passagem em que o trácio Zópiro, ao dialogar com Sócrates, gabava-se de conhecer profundamente a cada um, somente de olhar para sua face. No trecho, recolhido por Nietzsche, se não me engano em O Nascimento da Tragédia. Zópiro classificou Sócrates de imbecil, sensual e depravado. Enquanto os outros presentes ao diálogo tentaram linchar o trácio, Sócrates interveio e disse: Ele está certo sobre meus defeitos, mas eu os superei todos pela força de minha razão!92 Falo aqui do best-seller de RH: Relações Humanas na Família e no Trabalho, de Pierre Weil e Roland Tupankow.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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- Cruzar os braços ou enroscar as pernas na cadeira (resistência,
proteção).
- Colocar os cotovelos sobre a mesa ou inclinar-se demais à frente
(invasão de espaço).
- Abaixar a cabeça ou os olhos enquanto fala (medo, subserviência,
fraqueza).
- Encolher-se, ou refestelar-se na cadeira (insegurança ou arrogância)
- Apontar o dedo, bater na mesa ou fazer outros gestos bruscos
(intimidação, ameaça).
- Não sorrir, ou sorrir em demasia (negativismo ou desafio, falta de
personalidade ou tolice).
- Movimentar-se e ajeitar-se o tempo todo (insatisfação, desconforto,
irritação).
- Ficar rígido, duro e sem movimentos (travado, inflexível,
desorientado).
Como se pode ver, o limite das interpretações é o subjetivismo de
cada selecionador. Como dizia Foucault, a interpretação levada a
extremos, aniquila o próprio intérprete, não restando nada a ser
interpretado. Os próprios conceitos são genéricos e dizer que existe
uma escala que possa medir a intensidade e veracidade destas
linguagens é uma verdadeira contradição em termos. Se
epistemologicamente há problemas conceituais, imagine no dia a
dia da seleção com alguém tocando a linha de produção de
candidatos. Além do mais, ninguém ali vai considerar se a cadeira é
ou não confortável, se há espaço para seus pés, se faz calor ou se a 93perna, de repente começou a coçar , se o seu espaço foi invadido
bruscamente ou se as perguntas feitas foram tão ridículas que fique
difícil não rir ou chorar, entre outros senões. Sem mencionar o
salário... Assim, procure ficar á vontade, sem exagerar, e sentar-se
confortavelmente, procurando observar os gestos do selecionador
e cuidar para que o seu gestual seja firme, sóbrio e gentil.
F - Enfrente com dignidade o Preconceito:
Pensa que isto só acontece com negros, mulheres, favelados, 94cadeirantes, homosexuais e outras minorias? Você está
redondamente enganado. Em nosso país, na ingrata faina de se
conseguir um emprego você estará exposto a uma série de
constrangimentos. Um dos motivos pelos quais eu fiquei mais de um
ano desempregado foi por que cometi o crime hediondo de
ultrapassar a barreira dos quarenta anos! Apesar de ser ilegal, a
maioria das empresas costuma fixar parâmetros para a contratação
que, mormente, colocam de fora pessoas produtivas, experientes e
dedicadas. Isto, porque na lógica tacanha dos processos produtivos,
os empresários costumam buscar candidatos que possam render o
máximo e, contra todo o bom senso, acredita-se que uma pessoa é
velha se passou de determinada idade.
Veja só a contradição: se você é jovem, não tem
experiência e não consegue emprego. Se já passou da faixa
“apropriada”, “competitiva”, sua experiência e maturidade não
valem nada. Fora isto, existe a discrepância de encaixar suas
competências nos malditos perfis: Se você é da área comercial,
querem que seja também engenheiro, se é da área técnica, querem
também que faça decoração, se é contador deve entender de fluxo
de produção, se é operário tem que saber lidar com administração,
se é office boy tem que falar inglês, se é secretária tem que fazer café,
no final, se você tiver estas e outras qualificações, dirão que não
serve porque é um generalista! Como é que se vai fazer? Como dizia
minha avó: aonde nós vamos parar? Força, irmão! Mantenha sua
cabeça erguida, não se deixe abater e desafie o preconceito, seja
explícito ou disfarçado com conceitos administrativos e setoriais. Se
for o caso, denuncie aos órgãos competentes, pois ninguém pode
ser discriminado por idade, cor, sexo, deficiência, religião ou
qualquer outra condição. Meu conselho é que, nas entrevistas, tente
abrir os olhos do selecionador para suas capacidades, reforçando
que elas somente são excelentes e úteis, em função da sua idade e
experiência.
G - Não fique aí parado, desenvolva alguma habilidade nova:
Se você ainda acha que emprego é das 08h00 às 18h00, com uma
hora de almoço, benefícios, férias anuais, dissídio e o fim de semana
é cerveja, samba e futebol, cuidado! Esta espécie de vida está em
extinção. Foi-se o tempo em que o segundo grau bastava para
qualquer um ser “alguém” na vida, afinal era só arrumar um
93 O homem é um animal que se coça em público, dizia Angeli.94 Talvez fosse mais correto falar em maiorias...Mas, vocês entenderam.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
148 149
- Cruzar os braços ou enroscar as pernas na cadeira (resistência,
proteção).
- Colocar os cotovelos sobre a mesa ou inclinar-se demais à frente
(invasão de espaço).
- Abaixar a cabeça ou os olhos enquanto fala (medo, subserviência,
fraqueza).
- Encolher-se, ou refestelar-se na cadeira (insegurança ou arrogância)
- Apontar o dedo, bater na mesa ou fazer outros gestos bruscos
(intimidação, ameaça).
- Não sorrir, ou sorrir em demasia (negativismo ou desafio, falta de
personalidade ou tolice).
- Movimentar-se e ajeitar-se o tempo todo (insatisfação, desconforto,
irritação).
- Ficar rígido, duro e sem movimentos (travado, inflexível,
desorientado).
Como se pode ver, o limite das interpretações é o subjetivismo de
cada selecionador. Como dizia Foucault, a interpretação levada a
extremos, aniquila o próprio intérprete, não restando nada a ser
interpretado. Os próprios conceitos são genéricos e dizer que existe
uma escala que possa medir a intensidade e veracidade destas
linguagens é uma verdadeira contradição em termos. Se
epistemologicamente há problemas conceituais, imagine no dia a
dia da seleção com alguém tocando a linha de produção de
candidatos. Além do mais, ninguém ali vai considerar se a cadeira é
ou não confortável, se há espaço para seus pés, se faz calor ou se a 93perna, de repente começou a coçar , se o seu espaço foi invadido
bruscamente ou se as perguntas feitas foram tão ridículas que fique
difícil não rir ou chorar, entre outros senões. Sem mencionar o
salário... Assim, procure ficar á vontade, sem exagerar, e sentar-se
confortavelmente, procurando observar os gestos do selecionador
e cuidar para que o seu gestual seja firme, sóbrio e gentil.
F - Enfrente com dignidade o Preconceito:
Pensa que isto só acontece com negros, mulheres, favelados, 94cadeirantes, homosexuais e outras minorias? Você está
redondamente enganado. Em nosso país, na ingrata faina de se
conseguir um emprego você estará exposto a uma série de
constrangimentos. Um dos motivos pelos quais eu fiquei mais de um
ano desempregado foi por que cometi o crime hediondo de
ultrapassar a barreira dos quarenta anos! Apesar de ser ilegal, a
maioria das empresas costuma fixar parâmetros para a contratação
que, mormente, colocam de fora pessoas produtivas, experientes e
dedicadas. Isto, porque na lógica tacanha dos processos produtivos,
os empresários costumam buscar candidatos que possam render o
máximo e, contra todo o bom senso, acredita-se que uma pessoa é
velha se passou de determinada idade.
Veja só a contradição: se você é jovem, não tem
experiência e não consegue emprego. Se já passou da faixa
“apropriada”, “competitiva”, sua experiência e maturidade não
valem nada. Fora isto, existe a discrepância de encaixar suas
competências nos malditos perfis: Se você é da área comercial,
querem que seja também engenheiro, se é da área técnica, querem
também que faça decoração, se é contador deve entender de fluxo
de produção, se é operário tem que saber lidar com administração,
se é office boy tem que falar inglês, se é secretária tem que fazer café,
no final, se você tiver estas e outras qualificações, dirão que não
serve porque é um generalista! Como é que se vai fazer? Como dizia
minha avó: aonde nós vamos parar? Força, irmão! Mantenha sua
cabeça erguida, não se deixe abater e desafie o preconceito, seja
explícito ou disfarçado com conceitos administrativos e setoriais. Se
for o caso, denuncie aos órgãos competentes, pois ninguém pode
ser discriminado por idade, cor, sexo, deficiência, religião ou
qualquer outra condição. Meu conselho é que, nas entrevistas, tente
abrir os olhos do selecionador para suas capacidades, reforçando
que elas somente são excelentes e úteis, em função da sua idade e
experiência.
G - Não fique aí parado, desenvolva alguma habilidade nova:
Se você ainda acha que emprego é das 08h00 às 18h00, com uma
hora de almoço, benefícios, férias anuais, dissídio e o fim de semana
é cerveja, samba e futebol, cuidado! Esta espécie de vida está em
extinção. Foi-se o tempo em que o segundo grau bastava para
qualquer um ser “alguém” na vida, afinal era só arrumar um
93 O homem é um animal que se coça em público, dizia Angeli.94 Talvez fosse mais correto falar em maiorias...Mas, vocês entenderam.
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emprego, dar duro e depois de alguns anos passar a agir assim para
suportar as frustrações e “esquecer” os problemas. O que conta hoje
é qualidade: Qualidade de vida, qualidade acadêmica, qualidade
técnica, excelência pessoal, psicológica e profissional. Se você
parou, volte a estudar. Se ainda não conclui os estudos, não pare até
o Pós-Doutorado!
Se você não desenvolver sempre novas competências,
habilidades e conhecimentos pode esperar a demissão em
curtíssimo prazo! Se você não está empregado ou nem conseguiu
ainda seu primeiro emprego pense nisto com carinho: aproveite o
tempo disponível para se atualizar em alguma coisa útil a si, à
profissão e ao mundo. Hoje não se pode mais dizer que se está
empregado, mas que é “empregável”, ou seja: que possui, reúne e
dispõe de capacidades reais para - além de fazer seu serviço - ser útil
à empresa de outras formas e à comunidade também. Lembre-se de
um velho ditado chinês: Se você come até ficar velho, também pode
aprender até ficar velho. Entendeu? Nem precisa investir muito
tempo, seja prático: se você é da área comercial, leia a Você S/A ou a
Venda Mais, adquira um lugar numa palestra da Consultive Labs ou
vá visitar uma feira de negócios. É de outra área ou não é o caso,
mesmo assim refresque a mente e visite um Museu ou Exposição.
H - Faça uma Reforma Íntima e se transforme em uma pessoa
melhor:
Este é o momento exato de revisar suas crenças e abandonar
paradigmas. Não existe profissional excelente sem que o indivíduo
possua altos padrões de excelência pessoal. Não se iluda em tentar
oferecer algo que não exista dentro de si mesmo e achar que fará
sucesso. Ninguém mantém ou alcança um triunfo a não ser pela
força da vontade. Nada é por acaso, portanto, as condições de
possibilidade devem estar estabelecidas antes de qualquer coisa
existir e funcionar.
Você acha realmente que é do jeito que imagina? Que sua
visão de mundo realmente se aplica? Será que a maioria das pessoas
em volta não tem uma idéia completamente diversa de como você
realmente se comporta? Ilusão: Largue este corpo que não é teu!
Acorde para a realidade em movimento: duração é simultaneidade
e tudo o que fica parado enferruja! Abandone imediatamente a
velha condição modorrenta e preconceituosa e olhe para dentro de
si. Será que não há nada mesmo para ser mudado, atualizado e
higienizado? Veja se pode dizer isto de si mesmo:
Como, até hoje, te conduziste para com os deuses, para com teus
pais, teus irmãos, tua mulher, teus filhos, teus professores, teus
preceptores, teus amigos, teus próximos, teus subordinados? Vê se
à tua conduta em relação a eles se aplica, até agora, o verso: “A
ninguém fazer mal, de ninguém maldizer”... Se não é justo, não o
faças; se não é verdade, não o digas; tua vontade é livre...No
discurso é mister ser atento às palavras e nos empreendimentos
aos atos: procurar aqui o objetivo e lá o sentido.95
(Marco Aurélio)
I - Considerações para um Novo Horizonte de Eventos: O RH no
Poder?
Resumamos aqui e justifiquemos depois: Há uma enorme lacuna
ética e regimental no universo trabalhista e que sequer é previsto na
CLT anciã. Mas estes golpes, que mudam apenas de logotipo não são
realmente o grande problema. Sempre haverá canalhas. A
economia de mercado ainda sustenta um desemprego “estrutural”
que atinge índices sempre alarmantes e fomenta todo o tipo de
estelionato. Caso de polícia, Golpe do Emprego, Venda de Laudos,
Ministério Público, mas não é o ponto final. O que enfrentamos no
bojo desta situação extrapola a malícia do malfeitor ou a
incompetência de nosso modelo de sociedade. Lutamos hoje para
saber quem decide os aspectos humanos nas empresas e qual o
novo horizonte de eventos para os gestores de Recursos Humanos.
O que aqui demonstramos, invoca certa dose de omissão
por parte de uma classe profissional importante, intelectualmente
eclética, criativa, formadora de opinião. Vivem no mais, dentro de
sua normatividade apática e filosofia utilitária, onde comandam
importantes funções. Estes botos são os responsáveis - diretos ou
95 Marco Aurélio: Meditações - LV - XXXII, LXII -XVII e LVII - IV.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
150 151
emprego, dar duro e depois de alguns anos passar a agir assim para
suportar as frustrações e “esquecer” os problemas. O que conta hoje
é qualidade: Qualidade de vida, qualidade acadêmica, qualidade
técnica, excelência pessoal, psicológica e profissional. Se você
parou, volte a estudar. Se ainda não conclui os estudos, não pare até
o Pós-Doutorado!
Se você não desenvolver sempre novas competências,
habilidades e conhecimentos pode esperar a demissão em
curtíssimo prazo! Se você não está empregado ou nem conseguiu
ainda seu primeiro emprego pense nisto com carinho: aproveite o
tempo disponível para se atualizar em alguma coisa útil a si, à
profissão e ao mundo. Hoje não se pode mais dizer que se está
empregado, mas que é “empregável”, ou seja: que possui, reúne e
dispõe de capacidades reais para - além de fazer seu serviço - ser útil
à empresa de outras formas e à comunidade também. Lembre-se de
um velho ditado chinês: Se você come até ficar velho, também pode
aprender até ficar velho. Entendeu? Nem precisa investir muito
tempo, seja prático: se você é da área comercial, leia a Você S/A ou a
Venda Mais, adquira um lugar numa palestra da Consultive Labs ou
vá visitar uma feira de negócios. É de outra área ou não é o caso,
mesmo assim refresque a mente e visite um Museu ou Exposição.
H - Faça uma Reforma Íntima e se transforme em uma pessoa
melhor:
Este é o momento exato de revisar suas crenças e abandonar
paradigmas. Não existe profissional excelente sem que o indivíduo
possua altos padrões de excelência pessoal. Não se iluda em tentar
oferecer algo que não exista dentro de si mesmo e achar que fará
sucesso. Ninguém mantém ou alcança um triunfo a não ser pela
força da vontade. Nada é por acaso, portanto, as condições de
possibilidade devem estar estabelecidas antes de qualquer coisa
existir e funcionar.
Você acha realmente que é do jeito que imagina? Que sua
visão de mundo realmente se aplica? Será que a maioria das pessoas
em volta não tem uma idéia completamente diversa de como você
realmente se comporta? Ilusão: Largue este corpo que não é teu!
Acorde para a realidade em movimento: duração é simultaneidade
e tudo o que fica parado enferruja! Abandone imediatamente a
velha condição modorrenta e preconceituosa e olhe para dentro de
si. Será que não há nada mesmo para ser mudado, atualizado e
higienizado? Veja se pode dizer isto de si mesmo:
Como, até hoje, te conduziste para com os deuses, para com teus
pais, teus irmãos, tua mulher, teus filhos, teus professores, teus
preceptores, teus amigos, teus próximos, teus subordinados? Vê se
à tua conduta em relação a eles se aplica, até agora, o verso: “A
ninguém fazer mal, de ninguém maldizer”... Se não é justo, não o
faças; se não é verdade, não o digas; tua vontade é livre...No
discurso é mister ser atento às palavras e nos empreendimentos
aos atos: procurar aqui o objetivo e lá o sentido.95
(Marco Aurélio)
I - Considerações para um Novo Horizonte de Eventos: O RH no
Poder?
Resumamos aqui e justifiquemos depois: Há uma enorme lacuna
ética e regimental no universo trabalhista e que sequer é previsto na
CLT anciã. Mas estes golpes, que mudam apenas de logotipo não são
realmente o grande problema. Sempre haverá canalhas. A
economia de mercado ainda sustenta um desemprego “estrutural”
que atinge índices sempre alarmantes e fomenta todo o tipo de
estelionato. Caso de polícia, Golpe do Emprego, Venda de Laudos,
Ministério Público, mas não é o ponto final. O que enfrentamos no
bojo desta situação extrapola a malícia do malfeitor ou a
incompetência de nosso modelo de sociedade. Lutamos hoje para
saber quem decide os aspectos humanos nas empresas e qual o
novo horizonte de eventos para os gestores de Recursos Humanos.
O que aqui demonstramos, invoca certa dose de omissão
por parte de uma classe profissional importante, intelectualmente
eclética, criativa, formadora de opinião. Vivem no mais, dentro de
sua normatividade apática e filosofia utilitária, onde comandam
importantes funções. Estes botos são os responsáveis - diretos ou
95 Marco Aurélio: Meditações - LV - XXXII, LXII -XVII e LVII - IV.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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indiretos - pelos panoramas conceituais dos processos de
contratação e as exigências sine qua non, de realização ou de sua
validade e, deste modo, tornam-se extensivamente parte
interessada no caso.
A economia não é tudo, postura sim! Ao incorporarem os
paradigmas (Platão is not dead) e o discurso criado pelos seus
expoentes, os novos sofistas que lhes copiam as denominações,
laudos e testes, apenas atuam no vácuo de sua ausência.
Desde a antigüidade que se postulam aos mais sábios,
preparados e ativos que tomem e mantenham o poder. Mas a
omissão ocorre por não conseguirem colocar em prática as
“vivências”, os discursos, os congressos e toda a.
Na realidade os especialistas de RH temem intervir na
administração das empresas, quando deveriam - sim - buscar maior
influência e dividir co-responsavelmente a sua direção executiva e
operacional. A ausência é por criarem entes em demasia, critérios
indutivos formatando esquemas justapostos, que nunca serão
factíveis, embora possam ser apropriados como verdade. Em não o
fazendo deixam espaço para os lobos lucrarem com as receitas de
bolo e apesar de possuírem conhecimentos, habilidades não há
muita atitude...
Recuam frente aos financistas e suas notáveis planilhas de
custos ou calam-se quando o diretor grita suas impertinências sem
sentido. No dia-a-dia não estão presentes onde é necessário e no
mais das vezes, por não conseguirem gerir o conhecimento, voltam-
se a esoterismos, jogos, sistemáticas e tabulações organizacionais.
Terminam sempre por dizer que assim são as coisas e, então,
chamam a rotina de “processo”, sublocando as delimitações e
indicando tendências.
E com isso, ao invés de desenvolver, acabam por formatar
na realidade externa uma geografia competitiva, terra média
desconhecida e cuja situação a quem nela se inscreve, fornece mais
motivos de ansiedade e de insegurança, do que propriamente um
“desafio”, tornando-se, portanto, cada etapa numa arena onde se
deverá travar um combate mortal... onde somente restará um!
É importante verificar que o intuito aqui é registrar o
anátema das modernas práticas de contratação e quais os impactos
que os mecanismos, instrumentos, visões e técnicas aceitas têm nos
indivíduos. Gerir pessoas deve pressupor algo mais do que a aridez
dos perfis e denominações como “capital humano”, metáfora algo
infeliz que se aproxima perigosamente do modus operandi, daqueles
cujo único valor é o lucro e cuja maior preocupação é aumentar a
extração, produção, conquistar mercados e baixar os custos, seja a
que custo legal, ético, social ou ecológico que for. Não temos mais
tempo para isso. É preciso mudar logo o morubixaba.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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indiretos - pelos panoramas conceituais dos processos de
contratação e as exigências sine qua non, de realização ou de sua
validade e, deste modo, tornam-se extensivamente parte
interessada no caso.
A economia não é tudo, postura sim! Ao incorporarem os
paradigmas (Platão is not dead) e o discurso criado pelos seus
expoentes, os novos sofistas que lhes copiam as denominações,
laudos e testes, apenas atuam no vácuo de sua ausência.
Desde a antigüidade que se postulam aos mais sábios,
preparados e ativos que tomem e mantenham o poder. Mas a
omissão ocorre por não conseguirem colocar em prática as
“vivências”, os discursos, os congressos e toda a.
Na realidade os especialistas de RH temem intervir na
administração das empresas, quando deveriam - sim - buscar maior
influência e dividir co-responsavelmente a sua direção executiva e
operacional. A ausência é por criarem entes em demasia, critérios
indutivos formatando esquemas justapostos, que nunca serão
factíveis, embora possam ser apropriados como verdade. Em não o
fazendo deixam espaço para os lobos lucrarem com as receitas de
bolo e apesar de possuírem conhecimentos, habilidades não há
muita atitude...
Recuam frente aos financistas e suas notáveis planilhas de
custos ou calam-se quando o diretor grita suas impertinências sem
sentido. No dia-a-dia não estão presentes onde é necessário e no
mais das vezes, por não conseguirem gerir o conhecimento, voltam-
se a esoterismos, jogos, sistemáticas e tabulações organizacionais.
Terminam sempre por dizer que assim são as coisas e, então,
chamam a rotina de “processo”, sublocando as delimitações e
indicando tendências.
E com isso, ao invés de desenvolver, acabam por formatar
na realidade externa uma geografia competitiva, terra média
desconhecida e cuja situação a quem nela se inscreve, fornece mais
motivos de ansiedade e de insegurança, do que propriamente um
“desafio”, tornando-se, portanto, cada etapa numa arena onde se
deverá travar um combate mortal... onde somente restará um!
É importante verificar que o intuito aqui é registrar o
anátema das modernas práticas de contratação e quais os impactos
que os mecanismos, instrumentos, visões e técnicas aceitas têm nos
indivíduos. Gerir pessoas deve pressupor algo mais do que a aridez
dos perfis e denominações como “capital humano”, metáfora algo
infeliz que se aproxima perigosamente do modus operandi, daqueles
cujo único valor é o lucro e cuja maior preocupação é aumentar a
extração, produção, conquistar mercados e baixar os custos, seja a
que custo legal, ético, social ou ecológico que for. Não temos mais
tempo para isso. É preciso mudar logo o morubixaba.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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CAPÍTULO IV
TIPOS DE AGÊNCIAS
Para que você possa se localizar no meio da selva de conceitos e
siglas, preparamos abaixo um pequeno dicionário sobre os serviços
e tipos de agência existentes por aí:
1 - Consultorias e Agências de Recolocação
Existem dois níveis de recolocação, um é sério e o outro não. O
primeiro nível é quando você procura um profissional para
desenvolver sua performance e gerenciar sua carreira. Neste caso,
você estará pagando para que o consultor avalie seu potencial,
analise seu currículo, desenvolva treinamentos e outras
providências. É como um personal trainer, só que voltado à gestão
de sua carreira.
O consultor não oferece emprego e nem oportunidades,
ele apenas é pago para preparar você para entrevistas, avaliar seu
perfil psicológico, descobrir suas falhas e potenciais para processos
seletivos ou auxiliar na transição de carreira, nada mais. Geralmente
custa bem caro e o resultado depende somente de sua performance
e qualificações. Por isso é utilizado por altos executivos e diretores
que são contratados em processos sigilosos. Não costuma funcionar
bem para a raia miúda, uma vez que exige competências
inequívocas, excelente formação acadêmica e sólida experiência.
No entanto é algo perfeitamente normal e em alguns casos vale
realmente a pena.
O segundo é o típico caso de polícia: Trata-se do famoso
golpe da venda do emprego. Empresas de idoneidade duvidosa
colocam anúncios em todos os lugares e prospectam os portais de
empregos atrás de possíveis vítimas. É feito um contato, onde se
oferece a vaga de seus sonhos, com todos os benefícios e vantagens.
Marcada a entrevista, vai lá o ansioso incauto e lhe apresentam uma
visão do paraíso, onde eles dizem que o seu perfil é o ideal, que a
empresa tem pressa em contratar, só existe você concorrendo e que
(pasmem) o selecionador foi com a sua cara e acha que o emprego é
seu. No entanto, para formalizar a contratação é necessário fazer
alguns testes, precisam levar para o cliente um laudo
comportamental, um perfil de personalidade e outros documentos.
O candidato nem desconfia que, na realidade, a vaga não
existe. Pego pela oportunidade de sua vida, ele concorda em pagar
os “custos” da empresa e deixa lá vários cheques pré-datados. Eles
também prometem “treiná-lo” para as entrevistas e pedem que
assine um contrato e retorne dali a alguns dias. Feito isto, o coitado
nunca mais consegue ser recebido pelo “consultor”, que não
retorna seus telefonemas e muito menos o atende pessoalmente. O
contrato é redigido de tal modo que nada do que foi acertado
verbalmente está no papel, assim, quando o iludido candidato tenta
dar queixa na polícia, no Procon ou ao Bispo, os “advogados” da
empresa simplesmente dizem que a pessoa devia ter lido o que
assinou. Que ninguém ali prometeu emprego, mas apenas
assessoria e que os “honorários” são devidos e, concluem
singelamente, estão no mercado há anos, sendo “parceiros” na
recolocação de profissionais; que sem eles a pessoa não arruma
emprego, entre outras inverdades. Se receber uma proposta
indecorosa desta, recuse imediatamente!!!
2 - Consultoria de Recursos Humanos
É o novo nome da antiga agência de empregos. Como no caso
acima, existem níveis de atuação destas empresas. O primeiro nível
é o mais tradicional, onde todos os custos são pagos pelos
empregadores e o candidato somente tem que comparecer à
seleção e fazer os testes. Uma vez contratado a empresa recebe do
cliente e o candidato não põe a mão no bolso. É o correto!
O segundo nível é o chamado custo parcial, onde a
empresa contratante arca com a maior parte dos valores do
processo seletivo e o candidato, uma vez empregado, paga uma
porcentagem à agência que é descontada em folha no seu primeiro
salário. Trata-se de uma prestação de serviços e, este tipo de negócio
costuma ser bem sucedido, pois tanto a agência quanto a empresa
ou o candidato tem interesse nesta modalidade. Normalmente os
termos ficam claros, desde o início para as partes, o que traz
segurança e transparência. Quem é qualificado é aprovado e se não,
não paga nada!
O terceiro nível é o da Arapuca. Funciona como uma
recolocação, mas sem as firulas e salas de espera luxuosas das
consultorias da avenida Paulista. O fulano chega lá e é informado da
vaga ou então é convencido a pagar uma taxa de “prospecção” e
“geração de entrevistas”. Dizem para você que vão arrumar 10
entrevistas por semana e o valor geralmente é baixo, coisa de R$
50,00 a R$ 100,00. Se você assina o contrato, eles não mais vão lhe
atender, no máximo receberá as vagas retiradas de jornais para você
comparecer. É a versão “pobre” do golpe da venda de emprego.
Como sempre, no contrato não está escrito que vão lhe arranjar
emprego, mas que estão ali de toda a boa vontade do mundo para
lhe “assessorar”. Todo cuidado é pouco com estes e outros picaretas.
3 - Head Hunter
Na tradução literal é um “caçador de cabeças”. O termo vem dos
profissionais que vasculham o mercado atrás de candidatos para
processos sigilosos e de altíssimo escalão. Neste nível existem
grandes empresas voltadas a “raptar” cérebros e dirigentes de
outras empresas e repassá-los aos seus clientes. A não ser que você
seja uma sumidade em seu trabalho, pode ficar tranqüilo que nunca
vai receber um contato destes “bwanas”. No entanto, como já dizia
o velho yankee: não há nada no mundo que ninguém possa fazer um
pouco mais ordinário e vender por um preço melhor. Assim, existem
os caçadores de médio e baixo escalão, que se aproveitam da
denominação para fazer seus contatos e vender seus candidatos ao
mercado.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
156 157
O segundo é o típico caso de polícia: Trata-se do famoso
golpe da venda do emprego. Empresas de idoneidade duvidosa
colocam anúncios em todos os lugares e prospectam os portais de
empregos atrás de possíveis vítimas. É feito um contato, onde se
oferece a vaga de seus sonhos, com todos os benefícios e vantagens.
Marcada a entrevista, vai lá o ansioso incauto e lhe apresentam uma
visão do paraíso, onde eles dizem que o seu perfil é o ideal, que a
empresa tem pressa em contratar, só existe você concorrendo e que
(pasmem) o selecionador foi com a sua cara e acha que o emprego é
seu. No entanto, para formalizar a contratação é necessário fazer
alguns testes, precisam levar para o cliente um laudo
comportamental, um perfil de personalidade e outros documentos.
O candidato nem desconfia que, na realidade, a vaga não
existe. Pego pela oportunidade de sua vida, ele concorda em pagar
os “custos” da empresa e deixa lá vários cheques pré-datados. Eles
também prometem “treiná-lo” para as entrevistas e pedem que
assine um contrato e retorne dali a alguns dias. Feito isto, o coitado
nunca mais consegue ser recebido pelo “consultor”, que não
retorna seus telefonemas e muito menos o atende pessoalmente. O
contrato é redigido de tal modo que nada do que foi acertado
verbalmente está no papel, assim, quando o iludido candidato tenta
dar queixa na polícia, no Procon ou ao Bispo, os “advogados” da
empresa simplesmente dizem que a pessoa devia ter lido o que
assinou. Que ninguém ali prometeu emprego, mas apenas
assessoria e que os “honorários” são devidos e, concluem
singelamente, estão no mercado há anos, sendo “parceiros” na
recolocação de profissionais; que sem eles a pessoa não arruma
emprego, entre outras inverdades. Se receber uma proposta
indecorosa desta, recuse imediatamente!!!
2 - Consultoria de Recursos Humanos
É o novo nome da antiga agência de empregos. Como no caso
acima, existem níveis de atuação destas empresas. O primeiro nível
é o mais tradicional, onde todos os custos são pagos pelos
empregadores e o candidato somente tem que comparecer à
seleção e fazer os testes. Uma vez contratado a empresa recebe do
cliente e o candidato não põe a mão no bolso. É o correto!
O segundo nível é o chamado custo parcial, onde a
empresa contratante arca com a maior parte dos valores do
processo seletivo e o candidato, uma vez empregado, paga uma
porcentagem à agência que é descontada em folha no seu primeiro
salário. Trata-se de uma prestação de serviços e, este tipo de negócio
costuma ser bem sucedido, pois tanto a agência quanto a empresa
ou o candidato tem interesse nesta modalidade. Normalmente os
termos ficam claros, desde o início para as partes, o que traz
segurança e transparência. Quem é qualificado é aprovado e se não,
não paga nada!
O terceiro nível é o da Arapuca. Funciona como uma
recolocação, mas sem as firulas e salas de espera luxuosas das
consultorias da avenida Paulista. O fulano chega lá e é informado da
vaga ou então é convencido a pagar uma taxa de “prospecção” e
“geração de entrevistas”. Dizem para você que vão arrumar 10
entrevistas por semana e o valor geralmente é baixo, coisa de R$
50,00 a R$ 100,00. Se você assina o contrato, eles não mais vão lhe
atender, no máximo receberá as vagas retiradas de jornais para você
comparecer. É a versão “pobre” do golpe da venda de emprego.
Como sempre, no contrato não está escrito que vão lhe arranjar
emprego, mas que estão ali de toda a boa vontade do mundo para
lhe “assessorar”. Todo cuidado é pouco com estes e outros picaretas.
3 - Head Hunter
Na tradução literal é um “caçador de cabeças”. O termo vem dos
profissionais que vasculham o mercado atrás de candidatos para
processos sigilosos e de altíssimo escalão. Neste nível existem
grandes empresas voltadas a “raptar” cérebros e dirigentes de
outras empresas e repassá-los aos seus clientes. A não ser que você
seja uma sumidade em seu trabalho, pode ficar tranqüilo que nunca
vai receber um contato destes “bwanas”. No entanto, como já dizia
o velho yankee: não há nada no mundo que ninguém possa fazer um
pouco mais ordinário e vender por um preço melhor. Assim, existem
os caçadores de médio e baixo escalão, que se aproveitam da
denominação para fazer seus contatos e vender seus candidatos ao
mercado.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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Geralmente são autônomos e trabalham para várias
empresas, sem muita fidelidade. No caso de ser chamado para uma
avaliação, deixe bem claro que você não vai trocar o seu emprego
atual por uma promessa futura. Já ouvi casos de head hunters que
são contratados pelos concorrentes, somente para danificar os
departamentos de seus inimigos comerciais e não tem nenhuma
intenção de, mesmo contratando-o, efetivá-lo.
O real interesse é que você se demita e assim, passe
informações sigilosas e abra um buraco na administração da
empresa que você deixou para trás. Se for uma proposta séria, avalie
bem as conseqüências de dar este passo. Verifique quais são os
custos, se não há “pegadinhas”, se cercando de todos os cuidados
possíveis antes de dizer o que pensa ao seu chefe e sair do
emprego... Seguro morreu de velho!
4 - Coaching & Mentoring
Para o leigo esta palavra lembra o barulho de um sapo na lagoa. Não
está muito longe disto. Coach em inglês quer dizer treinador. Sabe
aquele tipo flácido e repugnante dos filmes de beisebol que arrota
palavrões a cada instrução e martiriza todos os seus pupilos, fazendo
de suas vidas um inferno só para ganhar um jogo e, assim, espantar
os fantasmas de seu passado? Pois é mais ou menos isto o que se
pretendem os coaxadores, quero dizer os treinadores. Trata-se de
processos para a formação de times de liderança, de motivação
extrema, de “saber agir na tempestade”, de conduzir os subalternos,
de estar sempre alerta (sorry, escoteiros), de descobrir as reais
competências, de ser 100% assertivo e eficiente durante as 24 horas
do dia em que passa pensando no escritório. Enfim, de uma série de
técnicas e “approaches”, perdão, bobagens, Holly God!
Abordagens, destinadas a maximizar a gestão-minuto e a condução
do “capital humano” pelos abençoados caminhos da auto-96realização , através do direcionamento e instruções pontuais e
necessárias para correções de rota. Já o mentoring é o velho e
desprezado conselho.
Qualquer profissional mais experiente está apto a desfilar
sua “visão de mundo”. Temos casos e casos, mas de forma geral
ninguém está disposto a ensinar “pulo do gato” ao jovem “backup”
que pode vir a lhe puxar o tapete na próxima reunião.
Não fosse pela premência e devoção teleológica com que
são colocadas estas hipóteses, até que seria interessante ouvir suas
preleções. Afinal, é preciso reconhecer que o jogador marca os gols,
mas o técnico é quem escala o time. Existe obviamente uma função
relevante aqui. Alguns processos funcionam nas organizações e
outros - pagos - podem vir a ensinar realmente algo, mas vamos
deixar de lado esta história dourada de mestre e guru. Certo
gafanhoto? Na vida sobre a Terra, ninguém consegue viver
buscando a qualidade zero ou o motor de suas motivações. Nem
todos nós estamos sob os holofotes dando espetáculos para o
mundo ver. Buscar o máximo, fazendo do homem uma ponte para
além de todos os esforços e tendo como recompensa apenas a
frugalidade estóica como imperativo categórico é pedir demais de
nós, simples mortais. O que fizeram do super homem nietzscheano,
meu Deus? Podem ser profissionais, consultores ou agências
especializadas nestes tipos de treinamento e postura profissional e
você somente tomará contato com eles, se contratado, quando
passar por uma bateria de reciclagem. Mas no fundo, no fundo trata-
se dos velhos e bons sofismas: igualdade de condições e competir
até morrer para vencer. Algumas destas “filosofias administrativas” 97até que são simpáticas, umas realmente funcionam , outras não,
mas o que eles buscam não é a melhoria pessoal, mas, sim, o
retorno. E isto, invalida qualquer raciocínio de gestão de carreira.
Nesta faixa estão alocados todos os gatos pardos como os 6Sigma,
5S, Kaizen, Monges Executivos, Black Belts até os Old Eights da vida.
Ossos do ofício!
5 - Mapeamento Ontológico
Eis algo que se salva dentro da selva dos anfíbios e coaxadores. O
“coaching” ontológico é uma instância de desenvolvimento pessoal
que permite a interação pedagógica e visa realmente o
96 Queria ver o que Maslow teria a dizer sobre isso.
97 Sem responsabilidade social, ética, treinamento e meritocracia, nada funciona. Nada vale a pena!
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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Geralmente são autônomos e trabalham para várias
empresas, sem muita fidelidade. No caso de ser chamado para uma
avaliação, deixe bem claro que você não vai trocar o seu emprego
atual por uma promessa futura. Já ouvi casos de head hunters que
são contratados pelos concorrentes, somente para danificar os
departamentos de seus inimigos comerciais e não tem nenhuma
intenção de, mesmo contratando-o, efetivá-lo.
O real interesse é que você se demita e assim, passe
informações sigilosas e abra um buraco na administração da
empresa que você deixou para trás. Se for uma proposta séria, avalie
bem as conseqüências de dar este passo. Verifique quais são os
custos, se não há “pegadinhas”, se cercando de todos os cuidados
possíveis antes de dizer o que pensa ao seu chefe e sair do
emprego... Seguro morreu de velho!
4 - Coaching & Mentoring
Para o leigo esta palavra lembra o barulho de um sapo na lagoa. Não
está muito longe disto. Coach em inglês quer dizer treinador. Sabe
aquele tipo flácido e repugnante dos filmes de beisebol que arrota
palavrões a cada instrução e martiriza todos os seus pupilos, fazendo
de suas vidas um inferno só para ganhar um jogo e, assim, espantar
os fantasmas de seu passado? Pois é mais ou menos isto o que se
pretendem os coaxadores, quero dizer os treinadores. Trata-se de
processos para a formação de times de liderança, de motivação
extrema, de “saber agir na tempestade”, de conduzir os subalternos,
de estar sempre alerta (sorry, escoteiros), de descobrir as reais
competências, de ser 100% assertivo e eficiente durante as 24 horas
do dia em que passa pensando no escritório. Enfim, de uma série de
técnicas e “approaches”, perdão, bobagens, Holly God!
Abordagens, destinadas a maximizar a gestão-minuto e a condução
do “capital humano” pelos abençoados caminhos da auto-96realização , através do direcionamento e instruções pontuais e
necessárias para correções de rota. Já o mentoring é o velho e
desprezado conselho.
Qualquer profissional mais experiente está apto a desfilar
sua “visão de mundo”. Temos casos e casos, mas de forma geral
ninguém está disposto a ensinar “pulo do gato” ao jovem “backup”
que pode vir a lhe puxar o tapete na próxima reunião.
Não fosse pela premência e devoção teleológica com que
são colocadas estas hipóteses, até que seria interessante ouvir suas
preleções. Afinal, é preciso reconhecer que o jogador marca os gols,
mas o técnico é quem escala o time. Existe obviamente uma função
relevante aqui. Alguns processos funcionam nas organizações e
outros - pagos - podem vir a ensinar realmente algo, mas vamos
deixar de lado esta história dourada de mestre e guru. Certo
gafanhoto? Na vida sobre a Terra, ninguém consegue viver
buscando a qualidade zero ou o motor de suas motivações. Nem
todos nós estamos sob os holofotes dando espetáculos para o
mundo ver. Buscar o máximo, fazendo do homem uma ponte para
além de todos os esforços e tendo como recompensa apenas a
frugalidade estóica como imperativo categórico é pedir demais de
nós, simples mortais. O que fizeram do super homem nietzscheano,
meu Deus? Podem ser profissionais, consultores ou agências
especializadas nestes tipos de treinamento e postura profissional e
você somente tomará contato com eles, se contratado, quando
passar por uma bateria de reciclagem. Mas no fundo, no fundo trata-
se dos velhos e bons sofismas: igualdade de condições e competir
até morrer para vencer. Algumas destas “filosofias administrativas” 97até que são simpáticas, umas realmente funcionam , outras não,
mas o que eles buscam não é a melhoria pessoal, mas, sim, o
retorno. E isto, invalida qualquer raciocínio de gestão de carreira.
Nesta faixa estão alocados todos os gatos pardos como os 6Sigma,
5S, Kaizen, Monges Executivos, Black Belts até os Old Eights da vida.
Ossos do ofício!
5 - Mapeamento Ontológico
Eis algo que se salva dentro da selva dos anfíbios e coaxadores. O
“coaching” ontológico é uma instância de desenvolvimento pessoal
que permite a interação pedagógica e visa realmente o
96 Queria ver o que Maslow teria a dizer sobre isso.
97 Sem responsabilidade social, ética, treinamento e meritocracia, nada funciona. Nada vale a pena!
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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desenvolvimento pessoal e profissional. Este sistema foi
desenvolvido pelos professores Rafael Echeverria e Fernando
Flores, no Chile e se apresenta como uma verdadeira revolução na
maneira de treinar e desenvolver equipes e profissionais. Tenho
aplicado com sucesso os conceitos aqui no Brasil, com ampla
aceitação e resultados animadores. Inclusive adaptei a
metodologia, que rebatizei de Mapeamento Ontológico, já que
efetuo esta análise em profundidade e vou além, ao incorporar as
teses de Henri Bergson ao itinerário criado pelos professores
chilenos, que são calcados na ética de Maturana. No entanto deixo
bem claro que este terreno não é para qualquer aventureiro, nem
pode ser confundido com auto-ajuda ou caça-níqueis de ocasião.
Também não se trata de “passinhos” da venda ou cursos de
prateleira (aqui em São Paulo se chacoalhar uma árvore caem uns
dez consultores...). Este é um campo Epistemológico e, de certa
forma também lingüístico e histórico. Trata o Mapeamento
Ontológico do profundo questionamento da ação humana no
mundo e de como transformar o homem e estabilizar as demandas
da civilização. Que não entre aqui quem não conheça filosofia e não
seja experiente em ética e gestão do desempenho estratégico na
carreira! Se quiserem informações fidedignas e cursos de formação,
acessem: www.consultivelabs.com.br e eu respondo sem cobrar
nada.
6 - Outsourcing & Interim Management
Outsoucing, para os não iniciados significa simplesmente a variada
gama de serviços que são terceirizados por empresas em função de
redução de custos, impostos, administração e até pela falta de
espaço físico. Hoje em dia existem empresas especializadas em
prestar todo o tipo de serviços, incluindo: telemarketing, impressão,
treinamento, consultoria, auditoria, limpeza, conservação,
paisagismo, empregados temporários, arquivos, depósitos e tudo o
que sua imaginação mandar.
Ínterim Management: Não se assuste. Tudo o que leva o sufixo
management significa apenas gerenciamento. Só isso. Sua definição
mais precisa é o uso pontual de profissionais para a execução de
tarefas que podem incluir a gestão de situações para as quais as
empresas não têm recursos humanos disponíveis, especialização ou
experiência prévia. Por um lado é uma abertura, pois identifica 98profissionais maiores de 40 anos , que não estão sendo
aproveitados em empresas, que cada vez mais buscam reduzir a
faixa etária dos funcionários. Mas pelo lado perverso é a constatação
do estabelecimento de uma modalidade de trabalho que, em suma,
oferece alguma oportunidade àqueles que aceitem trocar a
segurança da atividade convencional pela incerteza do futuro, sem
nenhuma garantia trabalhista (sonho das empresas).
7 - Assessoria & Consultorias
Qualquer empresa ou profissional liberal que preste algum serviço
para pessoas físicas ou jurídicas é uma assessoria. Pode ser um
médico, um contador, um arquiteto, uma agência de empregos,
uma empresa de terceirização. Já as consultorias são formadas de
profissionais especializados em alguma área técnica ou do
conhecimento e vendem serviços, treinamentos, processos etc.
Quando sérias e experientes, podem trazer muitos benefícios às
empresas e aos profissionais. No entanto, certifique-se de que não
esteja comprando gato por lebre, ou seja: de que desenvolvam
produtos e serviços que realmente sirvam para o fim destinado. E
atenção: consultorias não são escolas, portanto, “certificados de
participação” não são reconhecidos pelo MEC - Ministério da
Educação e Cultura, para fins acadêmicos ou de formação. Se
quiser se atualizar, muito bem, mas é a formação técnica ou
universitária que vale mais. Consultores são educadores em
processos e técnicas práticas de mercado (vendas, gestão,
marketing entre outras) e aumento de competências (C.H.A ou seja:
a soma de conhecimento, habilidades e atitudes). Avalie a
qualidade e compre bem.
98 É ilegal e antiético discriminar cidadãos produtivos por idade, raça, credo e gênero (masculino e feminino). No entanto, a maioria das empresas simplesmente ignora a Constituição e as Leis Trabalhistas neste aspecto. Trata-se de erro crasso: profissionais experientes rendem mais (qualitativamente e quantitativamente) do que os que não o são.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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desenvolvimento pessoal e profissional. Este sistema foi
desenvolvido pelos professores Rafael Echeverria e Fernando
Flores, no Chile e se apresenta como uma verdadeira revolução na
maneira de treinar e desenvolver equipes e profissionais. Tenho
aplicado com sucesso os conceitos aqui no Brasil, com ampla
aceitação e resultados animadores. Inclusive adaptei a
metodologia, que rebatizei de Mapeamento Ontológico, já que
efetuo esta análise em profundidade e vou além, ao incorporar as
teses de Henri Bergson ao itinerário criado pelos professores
chilenos, que são calcados na ética de Maturana. No entanto deixo
bem claro que este terreno não é para qualquer aventureiro, nem
pode ser confundido com auto-ajuda ou caça-níqueis de ocasião.
Também não se trata de “passinhos” da venda ou cursos de
prateleira (aqui em São Paulo se chacoalhar uma árvore caem uns
dez consultores...). Este é um campo Epistemológico e, de certa
forma também lingüístico e histórico. Trata o Mapeamento
Ontológico do profundo questionamento da ação humana no
mundo e de como transformar o homem e estabilizar as demandas
da civilização. Que não entre aqui quem não conheça filosofia e não
seja experiente em ética e gestão do desempenho estratégico na
carreira! Se quiserem informações fidedignas e cursos de formação,
acessem: www.consultivelabs.com.br e eu respondo sem cobrar
nada.
6 - Outsourcing & Interim Management
Outsoucing, para os não iniciados significa simplesmente a variada
gama de serviços que são terceirizados por empresas em função de
redução de custos, impostos, administração e até pela falta de
espaço físico. Hoje em dia existem empresas especializadas em
prestar todo o tipo de serviços, incluindo: telemarketing, impressão,
treinamento, consultoria, auditoria, limpeza, conservação,
paisagismo, empregados temporários, arquivos, depósitos e tudo o
que sua imaginação mandar.
Ínterim Management: Não se assuste. Tudo o que leva o sufixo
management significa apenas gerenciamento. Só isso. Sua definição
mais precisa é o uso pontual de profissionais para a execução de
tarefas que podem incluir a gestão de situações para as quais as
empresas não têm recursos humanos disponíveis, especialização ou
experiência prévia. Por um lado é uma abertura, pois identifica 98profissionais maiores de 40 anos , que não estão sendo
aproveitados em empresas, que cada vez mais buscam reduzir a
faixa etária dos funcionários. Mas pelo lado perverso é a constatação
do estabelecimento de uma modalidade de trabalho que, em suma,
oferece alguma oportunidade àqueles que aceitem trocar a
segurança da atividade convencional pela incerteza do futuro, sem
nenhuma garantia trabalhista (sonho das empresas).
7 - Assessoria & Consultorias
Qualquer empresa ou profissional liberal que preste algum serviço
para pessoas físicas ou jurídicas é uma assessoria. Pode ser um
médico, um contador, um arquiteto, uma agência de empregos,
uma empresa de terceirização. Já as consultorias são formadas de
profissionais especializados em alguma área técnica ou do
conhecimento e vendem serviços, treinamentos, processos etc.
Quando sérias e experientes, podem trazer muitos benefícios às
empresas e aos profissionais. No entanto, certifique-se de que não
esteja comprando gato por lebre, ou seja: de que desenvolvam
produtos e serviços que realmente sirvam para o fim destinado. E
atenção: consultorias não são escolas, portanto, “certificados de
participação” não são reconhecidos pelo MEC - Ministério da
Educação e Cultura, para fins acadêmicos ou de formação. Se
quiser se atualizar, muito bem, mas é a formação técnica ou
universitária que vale mais. Consultores são educadores em
processos e técnicas práticas de mercado (vendas, gestão,
marketing entre outras) e aumento de competências (C.H.A ou seja:
a soma de conhecimento, habilidades e atitudes). Avalie a
qualidade e compre bem.
98 É ilegal e antiético discriminar cidadãos produtivos por idade, raça, credo e gênero (masculino e feminino). No entanto, a maioria das empresas simplesmente ignora a Constituição e as Leis Trabalhistas neste aspecto. Trata-se de erro crasso: profissionais experientes rendem mais (qualitativamente e quantitativamente) do que os que não o são.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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8 - Cooperativa
São associações de trabalhadores, por um lado e, de outro são
entidades que agenciam e cooptam trabalhadores, através de
solicitações externas, recebendo proventos parciais de cada
cooperado. A atividade tem amparo legal e reduz custos para as
empresas, o que facilita a contratação, mas praticamente não há
benefícios trabalhistas. A lei 8949, de 09/12/94, através do parágrafo
único artigo 442° da CLT, estabeleceu que não há vínculo
empregatício entre a cooperativa e seus associados, nem entre os
associados e clientes da cooperativa. Portanto, a contratação de
serviços de uma cooperativa de trabalho nada mais é que o
desmembramento de uma atividade econômica da empresa
contratante.
9 - Portais Web & E-Recruitment
Se trata da evolução das agências de emprego, e dos processos de
seleção (R&S). Trata-se de sites e portais na Internet, que
representam empresas de recursos humanos. Alguns destes serviços
são contratados por determinado período de tempo, outros são
gratuitos. O recrutamento eletrônico visa a facilitar (a quem tem
acesso à web, claro) a interação entre empresas e candidatos,
muitos dos quais passam pelos primeiros testes pelo sistema on line,
antes de qualquer entrevista pessoal. Se por um lado facilita, por
outro pulveriza as chances e afasta os candidatos dos contratadores.
Pasmem, mas a maioria das vagas ainda é preenchida por
indicações de perfis e candidatos.
10 - Sindicatos e Governo
Bom, dos 10 milhões de empregos que o Lula prometeu criar, pouco
se viu fora do palanque. Na realidade os programas governamentais
apenas contemplam ações assistencialistas para os miseráveis
(muitos nem tanto) - pagos com nossos impostos - que deixando
progressivamente de ser miseráveis vem disputar terreno em nossas
faixas de emprego, o que aumenta exponencialmente o número de
desempregados. Uns pela falta de qualificação e analfabetismo
funcional, os outros pela acirrada concorrência dos “chineses
brasileiros” que se sujeitam a trabalhar por um prato de comida e
uma bolsa família. Nivelar por baixo é a tarefa dos dirigentes, em
todos os escalões. Nada contra dar assistência aos desvalidos,
imagine, é até falta de caridade. O problema é histórico-social: se
não houver uma classe média forte, governaremos mais tranqüilos,
pois os pobres se contentam com muito pouco. Já os esclarecidos e
capazes exigem mudanças estruturais profundas. Enfim, esqueça o
governo. Eles não têm programas fora de Brasília. Se quiser tentar,
basta entrar em: www.brasil.gov.br e cansar de procurar.
Outro caminho são as centrais sindicais, que mantém
alguns programas de atendimento e requalificação aos
desempregados, os mais famosos são os da Força Sindical e da CUT.
Mas não se iluda com toda esta bondade de recebê-los em seus
edifícios suntuosos. Isto é o mínimo que eles poderiam fazer, já que
os sindicatos descontam compulsoriamente de todos os
empregados brasileiros com carteira assinada, um dia de salário por
ano, o que dá uns bons milhões ao ano. Normalmente as vagas são
para os setores da produção e vagas operacionais. Para entrar em
contato basta verificar os endereços: www.cst.org.br e
www.cut.org.br Nota: chegue bem cedo ou você não consegue a
ficha para ser atendido. Não se preocupe se demorar, pois eles
servem um pequeno café da manhã. Depois é só sair e, se tiver um
por perto ir almoçar nos restaurantes Bom Prato (R$ 1,00) e voltar
para casa, talvez sem emprego, mas com a barriga cheia. Mas preste
atenção: estes serviços sindicais são para ocupações operacionais e
da produção, de nada adianta ir lá se você for muito qualificado ou
de porte gerencial ou executivo. Perda de tempo!
11 - Currículos
Não é sempre assim, mas, normalmente uma empresa quando
recruta tem pressa em selecionar o candidato ideal. O problema é
definir o que é este ideal, já que os perfis que são passados podem ser
às vezes, muito fechados, confusos ou até contraditórios. O
recrutador dificilmente irá questionar estas inconsistências ou
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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8 - Cooperativa
São associações de trabalhadores, por um lado e, de outro são
entidades que agenciam e cooptam trabalhadores, através de
solicitações externas, recebendo proventos parciais de cada
cooperado. A atividade tem amparo legal e reduz custos para as
empresas, o que facilita a contratação, mas praticamente não há
benefícios trabalhistas. A lei 8949, de 09/12/94, através do parágrafo
único artigo 442° da CLT, estabeleceu que não há vínculo
empregatício entre a cooperativa e seus associados, nem entre os
associados e clientes da cooperativa. Portanto, a contratação de
serviços de uma cooperativa de trabalho nada mais é que o
desmembramento de uma atividade econômica da empresa
contratante.
9 - Portais Web & E-Recruitment
Se trata da evolução das agências de emprego, e dos processos de
seleção (R&S). Trata-se de sites e portais na Internet, que
representam empresas de recursos humanos. Alguns destes serviços
são contratados por determinado período de tempo, outros são
gratuitos. O recrutamento eletrônico visa a facilitar (a quem tem
acesso à web, claro) a interação entre empresas e candidatos,
muitos dos quais passam pelos primeiros testes pelo sistema on line,
antes de qualquer entrevista pessoal. Se por um lado facilita, por
outro pulveriza as chances e afasta os candidatos dos contratadores.
Pasmem, mas a maioria das vagas ainda é preenchida por
indicações de perfis e candidatos.
10 - Sindicatos e Governo
Bom, dos 10 milhões de empregos que o Lula prometeu criar, pouco
se viu fora do palanque. Na realidade os programas governamentais
apenas contemplam ações assistencialistas para os miseráveis
(muitos nem tanto) - pagos com nossos impostos - que deixando
progressivamente de ser miseráveis vem disputar terreno em nossas
faixas de emprego, o que aumenta exponencialmente o número de
desempregados. Uns pela falta de qualificação e analfabetismo
funcional, os outros pela acirrada concorrência dos “chineses
brasileiros” que se sujeitam a trabalhar por um prato de comida e
uma bolsa família. Nivelar por baixo é a tarefa dos dirigentes, em
todos os escalões. Nada contra dar assistência aos desvalidos,
imagine, é até falta de caridade. O problema é histórico-social: se
não houver uma classe média forte, governaremos mais tranqüilos,
pois os pobres se contentam com muito pouco. Já os esclarecidos e
capazes exigem mudanças estruturais profundas. Enfim, esqueça o
governo. Eles não têm programas fora de Brasília. Se quiser tentar,
basta entrar em: www.brasil.gov.br e cansar de procurar.
Outro caminho são as centrais sindicais, que mantém
alguns programas de atendimento e requalificação aos
desempregados, os mais famosos são os da Força Sindical e da CUT.
Mas não se iluda com toda esta bondade de recebê-los em seus
edifícios suntuosos. Isto é o mínimo que eles poderiam fazer, já que
os sindicatos descontam compulsoriamente de todos os
empregados brasileiros com carteira assinada, um dia de salário por
ano, o que dá uns bons milhões ao ano. Normalmente as vagas são
para os setores da produção e vagas operacionais. Para entrar em
contato basta verificar os endereços: www.cst.org.br e
www.cut.org.br Nota: chegue bem cedo ou você não consegue a
ficha para ser atendido. Não se preocupe se demorar, pois eles
servem um pequeno café da manhã. Depois é só sair e, se tiver um
por perto ir almoçar nos restaurantes Bom Prato (R$ 1,00) e voltar
para casa, talvez sem emprego, mas com a barriga cheia. Mas preste
atenção: estes serviços sindicais são para ocupações operacionais e
da produção, de nada adianta ir lá se você for muito qualificado ou
de porte gerencial ou executivo. Perda de tempo!
11 - Currículos
Não é sempre assim, mas, normalmente uma empresa quando
recruta tem pressa em selecionar o candidato ideal. O problema é
definir o que é este ideal, já que os perfis que são passados podem ser
às vezes, muito fechados, confusos ou até contraditórios. O
recrutador dificilmente irá questionar estas inconsistências ou
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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orientar a empresa neste quesito, por medo de perder o cliente.
Assim, ele sai a campo garimpando profissionais e “tentando” achar
o ideal. O que você pode ter certeza é de que vai disputar a vaga
com uma média inicial de 100 a 200 pessoas, muitas em condições
semelhantes as suas e das quais serão chamados no máximo 20
(10%). Assim que acaba o prazo de recepção dos currículos, uma
das primeiras preocupações deste atarefado e (mal pago)
selecionador é separar o material em três montinhos: potenciais,
talvez e recusados. Os primeiros serão convocados para a
entrevista; enquanto os demais...
Nesta competição acirrada, a falta de clareza, falha técnica
na apresentação, omissão da idade e datas, e falta de qualificação
são os principais fatores responsáveis pela eliminação nesta
primeira fase. Um currículo bem elaborado, acompanhado de carta
de apresentação pode ser uma chave para abrir as portas da
empresa. Como já dito, devido à grande quantidade de currículos
recebidos, os/as selecionadores precisam agir com rapidez e
precisão, lendo e tentando extrair alguma análise das informações.
Como são seres humanos e tudo que é humano tende para a
comodidade, para facilitar o processo, foram criadas algumas
técnicas e regras, que resumimos abaixo:
A primeira página é decisiva porque pode despertar o 99interesse da selecionadora ou não . Deixe transparecer
objetividade, positivismo e comunicabilidade. A linguagem deve
ser clara e objetiva. Revise o texto para evitar erros gramaticais e de
acentuação. Redija em primeira pessoa (Realizei, Coordenei,
Participei etc.). Utilize as palavras “mágicas” (Realização do projeto,
Participação como líder, Cumprimento de metas, Aumento das
vendas, Redução de custos). Procure mostrar os resultados positivos
de suas atividades. Destaque seus pontos fortes, como estabilidade,
experiência, proatividade e liderança, mas sem exageros, mantendo
o equilíbrio e o bom-senso do texto.
Finalmente: As informações devem ser verídicas, pois
serão checadas. Se você se desentendeu com alguém no emprego
anterior, evite dar o nome desta pessoa como referência. Não insista
em querer valorizar o currículo, seja alterando dados sobre
formação acadêmica, tempo de serviço ou suas realizações no
trabalho. No entanto, nada impede de você redigir de forma a
deixar o texto mais atraente, escolhendo sinônimos e expressões
mais bem elaboradas (sem rebuscar demais). Seja objetivo e evite
usar formulários prontos, que são impessoais e demonstram pouca
dedicação na elaboração de uma apresentação tão importante.
Foto também é essencial.
Muitas empresas exigem alguns dados a mais e os
consultores geralmente não se entendem entre si, porém, na média
é o que deve conter. Depois, você pode personalizar conforme o
cargo desejado. Muitas empresas também agem contra a lei ao
discriminar candidatos por idade, cor, sexo, estado civil e até
religião. Por isso e como medida de precaução, evite colocar a sua
idade e outros dados, a não ser que seja absolutamente necessário.
Importante: se você sofreu algum tipo de discriminação ou achou
algum anúncio abusivo, recolha todas as provas e faça uma 100denúncia aos órgãos competentes.
A ordem dos tratores variar em função da vaga-foco e
eventualmente das atividades, mas estas são informações mínimas
para qualquer processo sério de R&S. Alguns privilegiam um
histórico de tópico outros mais descritivo. O que importa é que o
currículo não deve conter mais que duas páginas. Se você possui
muitas qualificações, cursos e experiências coloque o principal na
folha de rosto e o restante na segunda página. Lembre-se de ter
modelos diferentes para competências diferentes e também de
oferecer ordens de leitura diferentes, para que o subconsciente do
selecionador identifique índices, genéricos e concordantes ou
práticos e específicos.
Entrevistas: As principais perguntas que você terá que
responder.
Quando estiver frente ao entrevistador saiba qual é o tom da música
que vai rolar: É um samba de uma nota só. Na maioria das vezes as
perguntas são as mesmas, com pequenas variações em função do
99 Supondo é claro, que ela seja humana e não um software de triagem. Mas alguém irá olhar.
100 Veja minha entrevista na Folha de S.Paulo, mais adiante.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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orientar a empresa neste quesito, por medo de perder o cliente.
Assim, ele sai a campo garimpando profissionais e “tentando” achar
o ideal. O que você pode ter certeza é de que vai disputar a vaga
com uma média inicial de 100 a 200 pessoas, muitas em condições
semelhantes as suas e das quais serão chamados no máximo 20
(10%). Assim que acaba o prazo de recepção dos currículos, uma
das primeiras preocupações deste atarefado e (mal pago)
selecionador é separar o material em três montinhos: potenciais,
talvez e recusados. Os primeiros serão convocados para a
entrevista; enquanto os demais...
Nesta competição acirrada, a falta de clareza, falha técnica
na apresentação, omissão da idade e datas, e falta de qualificação
são os principais fatores responsáveis pela eliminação nesta
primeira fase. Um currículo bem elaborado, acompanhado de carta
de apresentação pode ser uma chave para abrir as portas da
empresa. Como já dito, devido à grande quantidade de currículos
recebidos, os/as selecionadores precisam agir com rapidez e
precisão, lendo e tentando extrair alguma análise das informações.
Como são seres humanos e tudo que é humano tende para a
comodidade, para facilitar o processo, foram criadas algumas
técnicas e regras, que resumimos abaixo:
A primeira página é decisiva porque pode despertar o 99interesse da selecionadora ou não . Deixe transparecer
objetividade, positivismo e comunicabilidade. A linguagem deve
ser clara e objetiva. Revise o texto para evitar erros gramaticais e de
acentuação. Redija em primeira pessoa (Realizei, Coordenei,
Participei etc.). Utilize as palavras “mágicas” (Realização do projeto,
Participação como líder, Cumprimento de metas, Aumento das
vendas, Redução de custos). Procure mostrar os resultados positivos
de suas atividades. Destaque seus pontos fortes, como estabilidade,
experiência, proatividade e liderança, mas sem exageros, mantendo
o equilíbrio e o bom-senso do texto.
Finalmente: As informações devem ser verídicas, pois
serão checadas. Se você se desentendeu com alguém no emprego
anterior, evite dar o nome desta pessoa como referência. Não insista
em querer valorizar o currículo, seja alterando dados sobre
formação acadêmica, tempo de serviço ou suas realizações no
trabalho. No entanto, nada impede de você redigir de forma a
deixar o texto mais atraente, escolhendo sinônimos e expressões
mais bem elaboradas (sem rebuscar demais). Seja objetivo e evite
usar formulários prontos, que são impessoais e demonstram pouca
dedicação na elaboração de uma apresentação tão importante.
Foto também é essencial.
Muitas empresas exigem alguns dados a mais e os
consultores geralmente não se entendem entre si, porém, na média
é o que deve conter. Depois, você pode personalizar conforme o
cargo desejado. Muitas empresas também agem contra a lei ao
discriminar candidatos por idade, cor, sexo, estado civil e até
religião. Por isso e como medida de precaução, evite colocar a sua
idade e outros dados, a não ser que seja absolutamente necessário.
Importante: se você sofreu algum tipo de discriminação ou achou
algum anúncio abusivo, recolha todas as provas e faça uma 100denúncia aos órgãos competentes.
A ordem dos tratores variar em função da vaga-foco e
eventualmente das atividades, mas estas são informações mínimas
para qualquer processo sério de R&S. Alguns privilegiam um
histórico de tópico outros mais descritivo. O que importa é que o
currículo não deve conter mais que duas páginas. Se você possui
muitas qualificações, cursos e experiências coloque o principal na
folha de rosto e o restante na segunda página. Lembre-se de ter
modelos diferentes para competências diferentes e também de
oferecer ordens de leitura diferentes, para que o subconsciente do
selecionador identifique índices, genéricos e concordantes ou
práticos e específicos.
Entrevistas: As principais perguntas que você terá que
responder.
Quando estiver frente ao entrevistador saiba qual é o tom da música
que vai rolar: É um samba de uma nota só. Na maioria das vezes as
perguntas são as mesmas, com pequenas variações em função do
99 Supondo é claro, que ela seja humana e não um software de triagem. Mas alguém irá olhar.
100 Veja minha entrevista na Folha de S.Paulo, mais adiante.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
164 165
perfil ou da maior qualificação do selecionador. Seja por que as
agências não adquirem e reciclem métodos de seleção evoluindo
para modelos mais cordatos e precisos, ou porque não os sabem
aplicar e se está ali apenas para ganhar dinheiro ou não estejam nem
aí para tudo isso. Portanto eis o que esperar: Prepare-se para um
verdadeiro Horror Boring Show, um lugar onde se ganha a vida
respondendo perguntas banais, negociando e mantendo a postura.
Mas lá também é o lugar onde não há modelos de respostas
possíveis, pois isto depende de cada um. Só que você precisa saber
qual é a correta a priori!!
No entanto, lembre-se que as perguntas podem ser as
mesmas, mas se dirigem a resultados diferentes, conforme a
natureza do cargo ou função. Por isso, antes de começar a abrir o
bico, procure sondar o entrevistador e obter todas as informações
sobre a vaga, mesmo as mais tênues. Isso vai ajudar a responder com
mais segurança e maiores chances de ser considerado “apto” para a
função.
Anote e já vá respondendo em casa.
1 - Foi demitido ou pediu demissão? Por que motivo você está
desempregado?
2 - Por que está demorando tanto para arrumar um novo emprego?
3 - Resuma sua experiência e perfil profissional.
4 - Cite um caso de sucesso e um de fracasso! Por quê?
5 - Como espera contribuir para a empresa?
6 - O que o motiva profissionalmente?
7 - Quais são seus objetivos pessoais?
8 - Diga três qualidades e três defeitos seus.
9 - Você gosta de trabalhar com pessoas?
10 - Defina-se em uma só palavra!
11 - Por que você escolheu esta formação acadêmica específica?
12 - Por que você trabalha com vendas se é formado em filosofia?
13 - Você é casado? Pretende ter filhos?Se sim, por quê? Se não, por quê?
14 - Por que trabalhou em tantas empresas? Você não para, não é?
15 - Por que você ficou tanto tempo numa só empresa, você se
acomodou?
LUÍS SÉRGIO LICO
166
16 - Você tem quarenta anos e pretende uma nova carreira? Explique-
me como isso funciona!
17 - Um MBA aos 22 não garante sua colocação, como você prova a
sua experiência?
18 - Você está tenso?Acha melhor marcarmos para outro dia?
19 - Você tem condições de honrar seus compromissos?
20 - Por que você candidatou-se a esta vaga?
O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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perfil ou da maior qualificação do selecionador. Seja por que as
agências não adquirem e reciclem métodos de seleção evoluindo
para modelos mais cordatos e precisos, ou porque não os sabem
aplicar e se está ali apenas para ganhar dinheiro ou não estejam nem
aí para tudo isso. Portanto eis o que esperar: Prepare-se para um
verdadeiro Horror Boring Show, um lugar onde se ganha a vida
respondendo perguntas banais, negociando e mantendo a postura.
Mas lá também é o lugar onde não há modelos de respostas
possíveis, pois isto depende de cada um. Só que você precisa saber
qual é a correta a priori!!
No entanto, lembre-se que as perguntas podem ser as
mesmas, mas se dirigem a resultados diferentes, conforme a
natureza do cargo ou função. Por isso, antes de começar a abrir o
bico, procure sondar o entrevistador e obter todas as informações
sobre a vaga, mesmo as mais tênues. Isso vai ajudar a responder com
mais segurança e maiores chances de ser considerado “apto” para a
função.
Anote e já vá respondendo em casa.
1 - Foi demitido ou pediu demissão? Por que motivo você está
desempregado?
2 - Por que está demorando tanto para arrumar um novo emprego?
3 - Resuma sua experiência e perfil profissional.
4 - Cite um caso de sucesso e um de fracasso! Por quê?
5 - Como espera contribuir para a empresa?
6 - O que o motiva profissionalmente?
7 - Quais são seus objetivos pessoais?
8 - Diga três qualidades e três defeitos seus.
9 - Você gosta de trabalhar com pessoas?
10 - Defina-se em uma só palavra!
11 - Por que você escolheu esta formação acadêmica específica?
12 - Por que você trabalha com vendas se é formado em filosofia?
13 - Você é casado? Pretende ter filhos?Se sim, por quê? Se não, por quê?
14 - Por que trabalhou em tantas empresas? Você não para, não é?
15 - Por que você ficou tanto tempo numa só empresa, você se
acomodou?
LUÍS SÉRGIO LICO
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16 - Você tem quarenta anos e pretende uma nova carreira? Explique-
me como isso funciona!
17 - Um MBA aos 22 não garante sua colocação, como você prova a
sua experiência?
18 - Você está tenso?Acha melhor marcarmos para outro dia?
19 - Você tem condições de honrar seus compromissos?
20 - Por que você candidatou-se a esta vaga?
O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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ou recolocação mas na realidade não prestam estes serviços e, muitas
vezes, nem tem condição de fazê-lo. Tome sempre grande cuidado para
verificar se a empresa de recolocação ou seleção é uma empresa idônea
(por exemplo consultando a ABRH - Associação Brasileira de Recursos
Humanos) e com referências imaculadas e desconfie sempre de
propostas, promessas ou vagas "maravilhosas" assim como de
propostas pouco transparentes. Como regra geral vale lembrar que
quando uma empresa procura um funcionário numa operação de
"hunting" ambas as partes tem direito a receber informações. Ou seja,
como a empresa justamente pede informações sobre o candidato este
também pode pedir informações sobre a empresa. Quanto um
selecionador diz que foi pré-selecionado e que a vaga é praticamente
sua (ou seja, que o candidato se encontra, supostamente, em uma fase
bem avançada da seleção), mas não quer informar qual seria a
empresa contratante, a chance é muito grande que não exista nenhuma
empresa contratante e seja tudo conversa fiada. Também não julguem
pelas aparências, algumas destas empresas de recolocação malandras
tem lindas e modernas instalações, nome aparentemente internacional
e funcionários profissionais e muito bem treinados para aplicar o golpe.
Uma variante bastante freqüente deste golpe é aos danos de candidatas
e candidatos a profissão de modelo. Existem numerosas agencias ou
supostas agencias que publicam anúncios nos jornais e na internet
convidando a participar de seleções. Você liga, marca um encontro, eles
conversam, pedem um currículo e algumas fotos, ou conforme for tiram
umas fotos suas ai na hora. Depois deixam de entrar em contato. Dias
depois ligam falando que passou na pré-seleçao ou algo deste tipo e que
agora precisa fazer um book profissional para ter chances de finalmente
entrar no seleto mundo e arrumar trabalhos de bom nível. O book tem
que ser no padrão da agencia, por isso só eles podem fazer. Para isso
obviamente tem um custo variável de 150 até 500 ou mais R$. Você faz o
book, na esperança de ser a próxima Gisele, e ... nada de trabalhos. Vão
dizer que não foi bem aceita pelos clientes ou algo parecido. O único
objetivo era obviamente pegar o dinheiro do book ... Agencia seria que
acredita em você como modelo, faz o book as suas custas ou, no
mínimo, aceita inicialmente um book feito por sua conta particular e
não insiste para que seja o book deles. Pior ainda se disser que já tem
trabalho garantido te esperando, mas depende do book ... ai é fria na
certa."
Agências vendem empregos inexistentes
Fonte: site do Fantástico: www.globo.com/fantastico
Numa reportagem para o caderno Boa Chance, do jornal O Globo, e
para o Fantástico, a repórter Fabiana Ribeiro mostra como agem
algumas empresas de recolocação, como são conhecidas as agências
de emprego. Os problemas começam com um telefonema, como o que
recebeu o economista Pedro Zander. Ele foi procurado pela empresa
HCO Internacional, com sede em São José dos Campos, interior de São
Paulo. A proposta era tentadora.
“Mais ou menos uns R$ 12 mil, chegando a R$ 13 mil, mais benefícios
que passavam por carro, plano de saúde”, conta Pedro. O economista,
que mora no Rio, viajou para São José dos Campos. Pagou passagem e
hospedagem. E viu vários candidatos pagarem por uma promessa de
emprego. “Cada um pagou um valor. Uns pagaram R$ 1.200, outros R$
1.500, outros R$ 2.500, outros mais de R$ 3 mil, que nem eu”.
De volta ao Rio, passou a telefonar para a empresa HCO, que, segundo
Pedro, já não falava do emprego prometido. “Eu já tinha passado três
cheques”. Valor exato da taxa paga por Pedro: R$ 3.948. Por telefone, o
gerente-geral da HCO negou que a empresa tenha enganado o
economista Pedro Zander: “O que nós fazemos é todo um trabalho de
estruturação e preparação do profissional para essa possível entrevista.
No caso do Pedro, infelizmente, as oportunidades que foram passadas
pra ele não houve êxito”.
A publicitária Sandra Alencar é outra que se queixa. Diz que o ex-patrão
pagou R$ 3 mil a uma empresa de São Paulo para conseguir um novo
emprego para ela. Esta empresa acionou uma outra do Rio - a
Alphalaser -, para entrar em contato com Sandra. “Me falaram que em
seis meses estariam me recolocando no mercado de trabalho e até
aquele período ali nunca aconteceu nada”, reclama Sandra.Sandra
decidiu então recorrer ao Procon, mas a empresa nem chegou a ser
intimada, porque fechou o escritório no Rio. “O porteiro não deixava
nem a gente subir, falando que a empresa tinha fechado e que não só eu
como outras pessoas que estavam lá no processo de seleção estavam
entrando na Justiça porque a empresa era picareta”, comenta Sandra.
O Procon informa que desde 2001 já recebeu 61 reclamações contra a
Alphalaser. A empresa, no início, chegou a fazer acordos e devolver o
dinheiro. Mas depois deixou de atender as notificações.“Nós aplicamos
multas que chegam a R$ 700 mil”, diz o secretário estadual de Defesa do
Consumidor Sérgio Zveiter.
A advogada da Alphalaser Andréa Costalonga nega que a empresa
venda promessas de emprego e que tenha sido desonesta com qualquer
candidato. “É uma empresa que tenta prospectar o profissional no
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
178 179
mercado de trabalho, então ela não pode garantir uma vaga, até
porque ela não sabe se o perfil daquele profissional agrada a quem tem
aquela vaga disponível”, defende.
E isso fica claro para o cliente? “Isso fica claro, inclusive esses clientes
são todos executivos, não são pessoas analfabetas, eles lêem o contrato,
assinam um termo de que não está sendo vendida uma vaga”, responde
a advogada. Em São Paulo, só no ano passado, o Procon recebeu 300
reclamações, número que não reflete a realidade. “Muitas vezes, a
pessoa não se sente bem em ter caído num determinado golpe e não
procura reclamar. Ela arca com o prejuízo”, comenta Gustavo
Marrone, diretor executivo da Fundação Procon de São Paulo.
A Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH), que representa
as empresas de recolocação, disse que resolveu criar um selo de
qualificação. Este selo só será dado às empresas que agem
corretamente. “É uma forma de mobilizar o público e de atender a essa
dificuldade que vem ocorrendo no mercado de trabalho”, garante Leyla
Nascimento, conselheira da ABRH.
Agora, preste atenção!
Se alguma empresa de recolocação prometer emprego é sinal de que
não é uma empresa séria. Se ela quiser cobrar antecipadamente pela
vaga, pior ainda. Antes de assinar qualquer contrato, leia tudo
atentamente. Os Procons dizem que as empresas podem cobrar para
fazer currículos e cursinhos e que têm direito a cobrar uma taxa do
candidato, no primeiro salário, caso realmente consiga um emprego
para ele. Mas o procurador do Ministério Público do Trabalho Cássio
Casagrande discorda. “O trabalho, de acordo com a Organização do
Trabalho, não pode ser objeto de comércio. Então, na verdade, nós
vamos agora abrir investigação contra todas essas empresas, porque
na verdade essa é uma prática comum no mercado, mas que é ilegal”.
Sandra e o economista Pedro ainda aguardam uma decisão da
Justiça.“Na verdade, a grande lição disso tudo, que é o que justifica eu
estar aqui hoje podendo falar pra vocês, é que eu não gostaria que
outras pessoas passassem pelo que eu passei”, finaliza Pedro.
A Indústria da Recolocação (Revista Você S/A, abril 2003)
Mergulhamos nos bastidores de um negócio que não pára de crescer no
Brasil à custa da venda de um sonho: o emprego perfeito
Por Cassio Utiyama, Dalen Jacomino e Maria Tereza Gomes
A história é quase sempre a mesma. Um dia qualquer, o telefone toca.
Do outro lado da linha, alguém diz ter uma oportunidade perfeita para
você. Melhor ainda: com um salário bem maior que o atual. Feliz da
vida, você vai para a entrevista. Intimamente, pensa: "Finalmente
alguém reconhece o meu potencial". O escritório passa credibilidade
pela localização nobre. É um espaço atraente e bem decorado. Na
conversa pessoal, o consultor carrega no tom de urgência para
preencher a vaga. Tudo precisa ser resolvido ali, na hora. É pegar ou
largar - só que a vaga tem um preço: a compra de serviços de
consultoria de carreira. O passaporte para o emprego perfeito não é
mais o seu currículo. É o seu cartão de crédito.
... A lição que fica é que, na próxima vez que você precisar de um serviço
como esse, não tenha a ilusão de que há um caminho rápido e seguro
para o emprego. Não existe milagre. O profissional tem de assumir o
controle da carreira, inclusive nos momentos difíceis.
9 - Rastejando por entre as Brechas do Sistema:
Apesar do Código do Consumidor (atentem para o Art. 39), poucas
pessoas se dão ao trabalho de ler os contratos que assinam e aos
serviços que aderem. Ainda confiam no que o “head-hunter” ou o e-
mail lhes diz. Cuidado. A denúncia é antiga e os bons profissionais de
RH convivem com o joio há muito tempo, mas é hora de separar as
coisas. Casos não tão explícitos e, nem por isso menos daninhos ou
sub-reptícios, são também notificados por revistas especializadas,
veja só:
Coluna Conversa de Corredor (Revista Você S/A Fev/2007)
Atenção professores universitários. Vocês são as novas vítimas das
falsas consultorias de carreira. Duas delas, a Search e a Master Target,
velhas conhecidas do Ministério Público de São Paulo por cobrar por
vagas e serviços de recolocação de executivos, estão vasculhando a base
do Currículo Lattes em busca de outras vítimas.
Em, se tratando de promessas de emprego ou “gestão de carreira” a
norma é: Desconfie sempre. Principalmente se os contatos
ocorrerem nas situações a seguir. Na verdade tratam-se de algumas
modalidades do que eu chamo de rasteiras psicológicas: O intuito é
criar curiosidade e esperança na vítima para estimulá-la a pagar pra
ver.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
180 181
mercado de trabalho, então ela não pode garantir uma vaga, até
porque ela não sabe se o perfil daquele profissional agrada a quem tem
aquela vaga disponível”, defende.
E isso fica claro para o cliente? “Isso fica claro, inclusive esses clientes
são todos executivos, não são pessoas analfabetas, eles lêem o contrato,
assinam um termo de que não está sendo vendida uma vaga”, responde
a advogada. Em São Paulo, só no ano passado, o Procon recebeu 300
reclamações, número que não reflete a realidade. “Muitas vezes, a
pessoa não se sente bem em ter caído num determinado golpe e não
procura reclamar. Ela arca com o prejuízo”, comenta Gustavo
Marrone, diretor executivo da Fundação Procon de São Paulo.
A Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH), que representa
as empresas de recolocação, disse que resolveu criar um selo de
qualificação. Este selo só será dado às empresas que agem
corretamente. “É uma forma de mobilizar o público e de atender a essa
dificuldade que vem ocorrendo no mercado de trabalho”, garante Leyla
Nascimento, conselheira da ABRH.
Agora, preste atenção!
Se alguma empresa de recolocação prometer emprego é sinal de que
não é uma empresa séria. Se ela quiser cobrar antecipadamente pela
vaga, pior ainda. Antes de assinar qualquer contrato, leia tudo
atentamente. Os Procons dizem que as empresas podem cobrar para
fazer currículos e cursinhos e que têm direito a cobrar uma taxa do
candidato, no primeiro salário, caso realmente consiga um emprego
para ele. Mas o procurador do Ministério Público do Trabalho Cássio
Casagrande discorda. “O trabalho, de acordo com a Organização do
Trabalho, não pode ser objeto de comércio. Então, na verdade, nós
vamos agora abrir investigação contra todas essas empresas, porque
na verdade essa é uma prática comum no mercado, mas que é ilegal”.
Sandra e o economista Pedro ainda aguardam uma decisão da
Justiça.“Na verdade, a grande lição disso tudo, que é o que justifica eu
estar aqui hoje podendo falar pra vocês, é que eu não gostaria que
outras pessoas passassem pelo que eu passei”, finaliza Pedro.
A Indústria da Recolocação (Revista Você S/A, abril 2003)
Mergulhamos nos bastidores de um negócio que não pára de crescer no
Brasil à custa da venda de um sonho: o emprego perfeito
Por Cassio Utiyama, Dalen Jacomino e Maria Tereza Gomes
A história é quase sempre a mesma. Um dia qualquer, o telefone toca.
Do outro lado da linha, alguém diz ter uma oportunidade perfeita para
você. Melhor ainda: com um salário bem maior que o atual. Feliz da
vida, você vai para a entrevista. Intimamente, pensa: "Finalmente
alguém reconhece o meu potencial". O escritório passa credibilidade
pela localização nobre. É um espaço atraente e bem decorado. Na
conversa pessoal, o consultor carrega no tom de urgência para
preencher a vaga. Tudo precisa ser resolvido ali, na hora. É pegar ou
largar - só que a vaga tem um preço: a compra de serviços de
consultoria de carreira. O passaporte para o emprego perfeito não é
mais o seu currículo. É o seu cartão de crédito.
... A lição que fica é que, na próxima vez que você precisar de um serviço
como esse, não tenha a ilusão de que há um caminho rápido e seguro
para o emprego. Não existe milagre. O profissional tem de assumir o
controle da carreira, inclusive nos momentos difíceis.
9 - Rastejando por entre as Brechas do Sistema:
Apesar do Código do Consumidor (atentem para o Art. 39), poucas
pessoas se dão ao trabalho de ler os contratos que assinam e aos
serviços que aderem. Ainda confiam no que o “head-hunter” ou o e-
mail lhes diz. Cuidado. A denúncia é antiga e os bons profissionais de
RH convivem com o joio há muito tempo, mas é hora de separar as
coisas. Casos não tão explícitos e, nem por isso menos daninhos ou
sub-reptícios, são também notificados por revistas especializadas,
veja só:
Coluna Conversa de Corredor (Revista Você S/A Fev/2007)
Atenção professores universitários. Vocês são as novas vítimas das
falsas consultorias de carreira. Duas delas, a Search e a Master Target,
velhas conhecidas do Ministério Público de São Paulo por cobrar por
vagas e serviços de recolocação de executivos, estão vasculhando a base
do Currículo Lattes em busca de outras vítimas.
Em, se tratando de promessas de emprego ou “gestão de carreira” a
norma é: Desconfie sempre. Principalmente se os contatos
ocorrerem nas situações a seguir. Na verdade tratam-se de algumas
modalidades do que eu chamo de rasteiras psicológicas: O intuito é
criar curiosidade e esperança na vítima para estimulá-la a pagar pra
ver.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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- A consultoria liga para a vítima fora do horário comercial e marca
entrevista para a manhã seguinte. Essa atitude dificulta checagens e
“obriga” o candidato ir pessoalmente à empresa;
- O tipo de emprego ofertado pela consultoria por telefone é
irrecusável;
- O salário é além do oferecido pelo mercado com benefícios não
condizem com o cargo;
- O texto do e-mail oferece oportunidades para pesquisadores, doutores
ou professores ganharem muito dinheiro, tipo: Sou Consultora de RH,
trabalho assessorando acadêmicos, com negociações junto ao mercado
privado em âmbito Nacional e Internacional, trabalho inovador e de
excelentes resultados.
- A consultoria diz ao cliente que ele é perfeito para a vaga, mas seu
currículo precisa ser refeito;
- Na hora da suposta entrevista com a consultoria, o “headhunter”
perde mais tempo falando das maravilhas do futuro emprego e
elogiando o perfil do que entrevistando o candidato;
- Antes de assinar o contrato, a agência diz que não cobram taxas do
cliente, apenas o custo com o teste psicológico, “laudo” supostamente
exigido pela empresa contratante;
- As promessas verbais de garantia de emprego e prazos não estão
descritas no contrato;
- Antes de assinar o contrato, a agência diz que não cobram taxas do
cliente, apenas o custo com o teste psicológico, supostamente exigido
pela empresa;
Maiores informações acesse:
www.empregabrasil.org.br
www.fraudes.org
www.abrhnacional.org.br
10210 - Crônicas: O Medo Causado pela Inteligência:
Dizem que, quando Winston Churchill, ainda jovem, acabou de
pronunciar seu discurso de estréia na Câmara dos Comuns, foi
perguntar a um velho parlamentar, amigo de seu pai, o que tinha
achado do seu primeiro desempenho naquela assembléia de
vedetes políticas. O velho pôs a mão no ombro de Churchill e disse,
em tom paternal: “Meu jovem, você cometeu um grande erro. Foi
muito brilhante neste seu primeiro discurso na Casa. Isso é
imperdoável! Devia ter começado um pouco mais na sombra. Devia
ter gaguejado um pouco. Com a inteligência que demonstrou hoje,
deve ter conquistado, no mínimo, uns trinta inimigos. O talento
assusta".
Ali estava uma das melhores lições de abismo que um
velho sábio pôde dar ao pupilo que se iniciava numa carreira difícil.
Isso, na Inglaterra. Imaginem aqui, no Brasil. Não é demais lembrar
de Ruy Barbosa: “Há tantos burros mandando em homens de
inteligência que, às vezes, fico pensando que a burrice é uma
Ciência”. A maior parte das pessoas encasteladas em posições
políticas é medíocre e tem um indisfarçável medo da inteligência.
Temos de admitir que, de um modo geral, os medíocres são mais
obstinados na conquista de posições. Sabem ocupar os espaços
vazios deixados pelos talentosos displicentes que não revelam o
apetite do poder.
Mas, é preciso considerar que esses medíocres, ladinos,
oportunistas e ambiciosos, têm o hábito de salvaguardar suas
posições conquistadas com verdadeiras muralhas de granito por
onde talentosos não conseguem passar. Em todas as áreas
encontramos dessas fortalezas estabelecidas, as panelinhas do
arrivismo, inexpugnáveis às legiões dos lúcidos. Dentro desse
raciocínio, que poderia ser uma extensão do "Elogio da Loucura",
de Erasmo de Röterdam, somos forçados a admitir que uma pessoa
precise fingir de burra se quiser vencer na vida. É pecado fazer
sombra a alguém até numa conversa social. Assim como um grupo
de senhoras burguesas bem casadas boicota, automaticamente, a
entrada de uma jovem mulher bonita no seu círculo de convivência,
por medo de perder seus maridos, também os encastelados
medíocres se fecham como ostras, à simples aparição de um
talentoso jovem que os possa ameaçar.
Eles conhecem bem suas limitações, sabem como lhes
custa desempenhar tarefas que os mais dotados realizam com uma
perna nas costas... Enfim, na medida em que admiram a facilidade
102 Recebi isto pela web e acabei reescrevendo o texto. Mostrar toda sua capacidade somente é suportável aos olhos daqueles que já efetuaram alguma ascese, desenvolveram transcendentalidade, metafísica ou sentimentos mínimos. Tão necessários... Por outro lado acreditar-se totalmente capaz é raiz de megalomanias: a arrogância segue a tolice, para dizer o mínimo.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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- A consultoria liga para a vítima fora do horário comercial e marca
entrevista para a manhã seguinte. Essa atitude dificulta checagens e
“obriga” o candidato ir pessoalmente à empresa;
- O tipo de emprego ofertado pela consultoria por telefone é
irrecusável;
- O salário é além do oferecido pelo mercado com benefícios não
condizem com o cargo;
- O texto do e-mail oferece oportunidades para pesquisadores, doutores
ou professores ganharem muito dinheiro, tipo: Sou Consultora de RH,
trabalho assessorando acadêmicos, com negociações junto ao mercado
privado em âmbito Nacional e Internacional, trabalho inovador e de
excelentes resultados.
- A consultoria diz ao cliente que ele é perfeito para a vaga, mas seu
currículo precisa ser refeito;
- Na hora da suposta entrevista com a consultoria, o “headhunter”
perde mais tempo falando das maravilhas do futuro emprego e
elogiando o perfil do que entrevistando o candidato;
- Antes de assinar o contrato, a agência diz que não cobram taxas do
cliente, apenas o custo com o teste psicológico, “laudo” supostamente
exigido pela empresa contratante;
- As promessas verbais de garantia de emprego e prazos não estão
descritas no contrato;
- Antes de assinar o contrato, a agência diz que não cobram taxas do
cliente, apenas o custo com o teste psicológico, supostamente exigido
pela empresa;
Maiores informações acesse:
www.empregabrasil.org.br
www.fraudes.org
www.abrhnacional.org.br
10210 - Crônicas: O Medo Causado pela Inteligência:
Dizem que, quando Winston Churchill, ainda jovem, acabou de
pronunciar seu discurso de estréia na Câmara dos Comuns, foi
perguntar a um velho parlamentar, amigo de seu pai, o que tinha
achado do seu primeiro desempenho naquela assembléia de
vedetes políticas. O velho pôs a mão no ombro de Churchill e disse,
em tom paternal: “Meu jovem, você cometeu um grande erro. Foi
muito brilhante neste seu primeiro discurso na Casa. Isso é
imperdoável! Devia ter começado um pouco mais na sombra. Devia
ter gaguejado um pouco. Com a inteligência que demonstrou hoje,
deve ter conquistado, no mínimo, uns trinta inimigos. O talento
assusta".
Ali estava uma das melhores lições de abismo que um
velho sábio pôde dar ao pupilo que se iniciava numa carreira difícil.
Isso, na Inglaterra. Imaginem aqui, no Brasil. Não é demais lembrar
de Ruy Barbosa: “Há tantos burros mandando em homens de
inteligência que, às vezes, fico pensando que a burrice é uma
Ciência”. A maior parte das pessoas encasteladas em posições
políticas é medíocre e tem um indisfarçável medo da inteligência.
Temos de admitir que, de um modo geral, os medíocres são mais
obstinados na conquista de posições. Sabem ocupar os espaços
vazios deixados pelos talentosos displicentes que não revelam o
apetite do poder.
Mas, é preciso considerar que esses medíocres, ladinos,
oportunistas e ambiciosos, têm o hábito de salvaguardar suas
posições conquistadas com verdadeiras muralhas de granito por
onde talentosos não conseguem passar. Em todas as áreas
encontramos dessas fortalezas estabelecidas, as panelinhas do
arrivismo, inexpugnáveis às legiões dos lúcidos. Dentro desse
raciocínio, que poderia ser uma extensão do "Elogio da Loucura",
de Erasmo de Röterdam, somos forçados a admitir que uma pessoa
precise fingir de burra se quiser vencer na vida. É pecado fazer
sombra a alguém até numa conversa social. Assim como um grupo
de senhoras burguesas bem casadas boicota, automaticamente, a
entrada de uma jovem mulher bonita no seu círculo de convivência,
por medo de perder seus maridos, também os encastelados
medíocres se fecham como ostras, à simples aparição de um
talentoso jovem que os possa ameaçar.
Eles conhecem bem suas limitações, sabem como lhes
custa desempenhar tarefas que os mais dotados realizam com uma
perna nas costas... Enfim, na medida em que admiram a facilidade
102 Recebi isto pela web e acabei reescrevendo o texto. Mostrar toda sua capacidade somente é suportável aos olhos daqueles que já efetuaram alguma ascese, desenvolveram transcendentalidade, metafísica ou sentimentos mínimos. Tão necessários... Por outro lado acreditar-se totalmente capaz é raiz de megalomanias: a arrogância segue a tolice, para dizer o mínimo.
LUÍS SÉRGIO LICO O PROFISSIONAL INVISÍVEL
182 183
com que os mais lúcidos resolvem problemas, os medíocres os
repudiam para se defender. É um paradoxo angustiante!
Infelizmente, temos de viver segundo essas regras absurdas que
transformam a inteligência numa espécie de desvantagem perante a
vida. Isto está tão presente na ironia de Nelson Rodrigues: "Finge-te
de idiota, e terás o céu e a terra", quanto no ceticismo de Raul Seixas:
“Se eu fosse burro não sofria tanto”.
O problema é que os inteligentes gostam de brilhar! Aliás,
o fazem naturalmente, espontaneamente brindando a luz de novas
conquistas (e agora Nietzsche vem em nossa defesa), embora os
problemas continuem. Podemos escolher nossos inimigos, mas
quase nunca os nossos vizinhos. Portanto ou estamos cercados pelo
nada e acompanhados numa relação infernal de base econômica ou
isto é um falso problema. Prefiro as abordagens criativas e que
sapientes, sorriem. Estamos lançados numa história, questionando
o sujeito e procurando emprego. Se o governo não atrapalhar,
iremos longe. Podemos pensar e agir racionalmente, quem sabe até
poupar umas toneladas de detritos e carbono. Podemos construir
políticas mais próximas ao coração e estancar os ferimentos
causados pela ignorância e o analfabetismo ético. Não temos muito
tempo. De qualquer modo, que Deus nos proteja, então, dos
medíocres... Estes, sim, são muito perigosos.
Em poucas e últimas palavras, gostaria de dizer que tudo o
que tentei mostrar até aqui, se baseou não somente na análise de
todo este trajeto até a realização profissional. Existe pouco de
“realidade” neste itinerário, a não ser a metáfora cotidiana que
usamos para designar as superestruturas que desconhecemos o
funcionamento.
Além do conhecimento existe a discursividade que o
representa e para além das experiências mudas, a relação intuitiva
imediata consigo, o fluxo criativo da consciência, com o mundo et
coetera. Pude verificar na prática a validade de algumas correntes
do pensamento que alertavam sobre necessidade de suspeitar da
ilimitada fé depositada nos conceitos, como portadores de
essencialidades vitais:
LUÍS SÉRGIO LICO
184
A análise opera sobre o imóvel, enquanto a intuição se coloca na
mobilidade. Aí está a linha de demarcação entre intuição e
análise. Reconhecemos o real, o concreto, o vivido na própria
variabilidade. Reconhecemos o elemento naquilo que é
invariável. E é invariável por definição, sendo um esquema, uma
reconstrução simplificada, com freqüência um simples símbolo, e
em todo caso um simples aspecto da realidade que flui. Mas o erro
é acreditar que com estes esquemas recomporíamos o real. Nunca
repetiremos o suficiente: da intuição podemos passar à análise,
mas não da análise à intuição. 103
Henri Bergson, Introdução à Metafísica
103 Cartas, Conferências e outros Escritos Trad. Franklin Leopoldo e Silva, Abril, pág. 26.
O PROFISSIONAL INVISÍVEL
185
com que os mais lúcidos resolvem problemas, os medíocres os
repudiam para se defender. É um paradoxo angustiante!
Infelizmente, temos de viver segundo essas regras absurdas que
transformam a inteligência numa espécie de desvantagem perante a
vida. Isto está tão presente na ironia de Nelson Rodrigues: "Finge-te
de idiota, e terás o céu e a terra", quanto no ceticismo de Raul Seixas:
“Se eu fosse burro não sofria tanto”.
O problema é que os inteligentes gostam de brilhar! Aliás,
o fazem naturalmente, espontaneamente brindando a luz de novas
conquistas (e agora Nietzsche vem em nossa defesa), embora os
problemas continuem. Podemos escolher nossos inimigos, mas
quase nunca os nossos vizinhos. Portanto ou estamos cercados pelo
nada e acompanhados numa relação infernal de base econômica ou
isto é um falso problema. Prefiro as abordagens criativas e que
sapientes, sorriem. Estamos lançados numa história, questionando
o sujeito e procurando emprego. Se o governo não atrapalhar,
iremos longe. Podemos pensar e agir racionalmente, quem sabe até
poupar umas toneladas de detritos e carbono. Podemos construir
políticas mais próximas ao coração e estancar os ferimentos
causados pela ignorância e o analfabetismo ético. Não temos muito
tempo. De qualquer modo, que Deus nos proteja, então, dos
medíocres... Estes, sim, são muito perigosos.
Em poucas e últimas palavras, gostaria de dizer que tudo o
que tentei mostrar até aqui, se baseou não somente na análise de
todo este trajeto até a realização profissional. Existe pouco de
“realidade” neste itinerário, a não ser a metáfora cotidiana que
usamos para designar as superestruturas que desconhecemos o
funcionamento.
Além do conhecimento existe a discursividade que o
representa e para além das experiências mudas, a relação intuitiva
imediata consigo, o fluxo criativo da consciência, com o mundo et
coetera. Pude verificar na prática a validade de algumas correntes
do pensamento que alertavam sobre necessidade de suspeitar da
ilimitada fé depositada nos conceitos, como portadores de
essencialidades vitais:
LUÍS SÉRGIO LICO
184
A análise opera sobre o imóvel, enquanto a intuição se coloca na
mobilidade. Aí está a linha de demarcação entre intuição e
análise. Reconhecemos o real, o concreto, o vivido na própria
variabilidade. Reconhecemos o elemento naquilo que é
invariável. E é invariável por definição, sendo um esquema, uma
reconstrução simplificada, com freqüência um simples símbolo, e
em todo caso um simples aspecto da realidade que flui. Mas o erro
é acreditar que com estes esquemas recomporíamos o real. Nunca
repetiremos o suficiente: da intuição podemos passar à análise,
mas não da análise à intuição. 103
Henri Bergson, Introdução à Metafísica
103 Cartas, Conferências e outros Escritos Trad. Franklin Leopoldo e Silva, Abril, pág. 26.
O PROFISSIONAL INVISÍVEL
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