o silÊncio À ajuda: a experiÊncia brasileira de...
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ISSN 2176-1396
O SILÊNCIO À AJUDA: A EXPERIÊNCIA BRASILEIRA DE
COMBATE AO BULLYING PELA IMPLANTAÇÃO E EQUIPES
DE AJUDA
Raul Alves de Souza – FCLAr/UNESP1
Luciene Regina Paulino Tognetta– FCLAr/UNESP2
Luciana Zobel Lapa– FCLAr/UNESP3
Sandra Cristina Trambaiolli De Nadai– FCLAr/UNESP4
Eixo – Psicologia da Educação
Agência Financiadora – Fundação Lemman
CAAE 66086617.6.0000.5400
Resumo
O bullying e os demais problemas de convivência na escola têm chamado a atenção das
investigações atuais não pelo fato do aumento no número de ocorrências, mas pela
urgência com que o tema da convivência está presente nas instituições educativas. A
literatura internacional tem apontado um caminho ainda pouco explorado no Brasil: a
participação efetiva dos alunos na solução dos problemas vivenciados. Este artigo
apresenta uma pesquisa de campo, de caráter exploratório cujo objetivo foi averiguar as
possíveis diferenças na frequência das intimidações entre estudantes do Ensino
Fundamental II em uma escola em que houve a implantação de um tipo de sistemas de
apoio entre pares: as equipes de ajuda, na percepção dos alunos comparando-se antes e
depois de sua implementação. Participaram da amostra 270 adolescentes estudantes do
sexto ao nono ano de uma escola do interior paulista em que se organizou um Projeto de
Formação para a Convivência Ética junto a professores, equipe gestora e alunos do
colégio. Tratando-se de uma pesquisa exploratória, de caráter descritivo, o instrumento
utilizado constituiu-se em um questionário que trazia vinte situações em que os alunos
da escola, sendo das Equipes de Ajuda ou não, apontariam “O quanto você presenciou,
viu ou soube de um colega na escola...”. Para as 20 situações, as respostas deveriam
apontar “Antes de ter as Equipes de Ajuda na escola”: nunca; uma ou duas vezes;
muitas vezes. E “Agora, com as Equipes de Ajuda na escola”: nunca; uma ou duas
vezes; muitas vezes. Os dados encontrados corroboram o que as pesquisas
internacionais já apontavam: a participação dos alunos nas soluções dos problemas de
1 Especialista em Relação Interpessoais na Escola e Mestrando em Educação Escolar pela Faculdade de Ciências e Letras da UNESP de Araraquara 2 Professora Doutora do departamento de Psicologia Educacional da Faculdade de Ciências e Letras da UNESP de Araraquara e líder do GEPEM (Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Moral) 3 Psicóloga, Especialista em Relação Interpessoais na Escola e Mestrando em Educação Escolar pela Faculdade de Ciências e Letras da UNESP de Araraquara 4 Psicopedagoga, Especialista em Relação Interpessoais na Escola e Mestrando em Educação Escolar pela Faculdade de Ciências e Letras da UNESP de Araraquara
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convivência, através das Equipes de Ajuda, pode promover a melhoria da convivência e
assim, a diminuição de possibilidades de intimidação.
Palavras-chave: Convivência Ética. Bullying. Protagonismo. Equipes de Ajuda.
“A indiferença é a maneira mais polida de desprezar alguém”
Mario Quintana
Introdução
A percepção da violência no cotidiano escolar tem sido relevante para boa parte
da sociedade no Brasil, aponta Leme (2004). O aumento da sua ocorrência nas escolas
tem sido percebido por professores e pais, chamando assim a atenção da mídia e das
pesquisas sobre a temática. Certamente, como indicam estudos atuais, (Debarbieux,
2006), a violência dura - marcada por atos de agressão e vandalismos, uso de drogas ou
armas - não tem aumentado nem no Brasil nem no mundo de maneira tão crítica como
nos impõe o senso comum. Contudo, o que necessariamente se chama de violência
evidencia um sintoma de que há problemas na convivência escolar e estes têm sido o
‘calcanhar de Aquiles’ daqueles que educam, visto que, por diversas razões, tal temática
dificilmente tenha sido contemplada nas demandas de investigações sobre educação que
possam atravessar as paredes das universidades e dar respostas às escolas (Knöener e
Tognetta, 2016).
Assim, crescem os números que evidenciam situações de falta de civilidade, de
indisciplinas e mesmo de bullying. Fenômenos especiais não apenas em suas
nomenclaturas, mas também em suas especificidades.
Com relação a este último, embora as pesquisas internacionais Olweus (1993),
Del Barrio (2003), Avilés (2013), Cowie e Smith (2002) e nacionais Tognetta e Vinha
(2009), Tognetta e Rosário, (2013) evidenciem a importância do fenômeno a ser
estudado, no Brasil, poucas possibilidades de ultrapassar os diagnósticos são
apresentadas entre as investigações científicas.
Visto como um fenômeno grupal, o bullying configura-se como um mal-estar
entre crianças, jovens e adultos que se manifesta com características peculiares de, por
um lado, escolhas intencionais por parte daqueles que agridem, e por outro, de
fragilidade e timidez daqueles que são escolhidos como vítimas diante de um público
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que reverbera a condição de quem é bem visto ou não dentro de uma comunidade. Um
fenômeno de violência em que a submissão de um a outro, se manifesta na igualdade
das relações estabelecidas – entre pares – assim como na desigualdade configurada na
expressão de um, imbuído de poder físico e psicológico, sobre outro.
Segundo Olweus (1993) o bullying é definido como "comportamento indesejado
e agressivo entre crianças e adolescentes que envolve um desequilíbrio de poder entre as
partes, que se repete ao longo do tempo". Avilés (2013) acrescenta que os que sofrem
tais agressões se mantêm numa questão de vitimização por impossibilidade de se
desvencilhar de uma autoimagem com pouco valor. Ainda que ambos, agressor e
vítima, estejam sempre sob os olhos de seus iguais, que testemunham os fatos.
Investigações de Tognetta e Rosário (2013) apontam efeitos do bullying tanto
para agressores quanto para as vítimas. Em pesquisa recente com 2600 sujeitos para a
caracterização do fenômeno encontrou-se que os autores da vitimização apresentam
substratos de violência e ausência de respeito, não conseguindo, assim, tomar
consciência do estado e sentimento das vítimas que agridem, lhes faltando, portanto,
sensibilidade moral.
Certamente, os dados de pesquisas brasileiras e internacionais atestam que o
problema em questão é fato em qualquer que seja o espaço físico e psicológico de
relações humanas. Da mesma forma, os números indicam um percentual, ainda que
pequeno de autores e vítimas e um grande número de espectadores cuja falta de
manifestação ou repúdio à violência parece demonstrar certa indiferença ao problema
do outro, e, portanto, também desrespeito.
Nesse interim, pesquisas internacionais Cowie (2000), Salmivalli (2010) e
nacionais Tognetta e Avilés (2016), Lapa e Tognetta (2016), Souza e Tognetta (2016)
têm se projetado a discutir e reiterar o papel essencial dos espectadores para que o
problema de intimidação seja não perpetuado na escola.
Segundo O'Connell, Pepler e Craig (1999), a ação daqueles que assistem uma
cena de intimidação pode ter papel fundamental para a interrupção das agressões. Em
três quartos dos casos descritos pelos autores em suas investigações, quando os
espectadores intervêm em favor das vítimas, é dada a interrupção da agressão.
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Contudo, outros estudos têm apontado que tal defesa da vítima por parte de
quem assiste o problema não é fato tão comum como gostaríamos. Salmivalli e
colaboradores (1996), numa investigação com os espectadores de bullying, encontraram
apenas 4,5% dos meninos e 30% das meninas sendo considerados como defensores
entre os espectadores de bullying. Certamente, a sensação de segurança para esses
alunos envolvidos em situações de intimidação não é tão boa Gini, Pozzoli, Borghi e
Franzoni (2008).
Hawkins, Pepler e Craig (2001), Nishina e Bellmore (2010), Salmivalli et al.
(1996) sugerem que as testemunhas que não se posicionam contra o bullying, o fazem
porque querem proteger seu status entre os pares, alinhando-se com os populares visto
que mais do que agressivos ou vitimizados, os alunos são tipicamente vistos como
‘pares sociais’ – Juvonen e Galvan (2008).
E por que esses espectadores ajudariam as vítimas? Em resposta a essa pergunta,
Thornberg et al. (2012) entrevistaram 30 alunos com idade entre 9 e 15 anos sobre suas
perspectivas e preocupações ao serem testemunhas de um caso de bullying. De maneira
geral, a motivação para agir em favor da vítima depende de como a testemunha avalia e
define a situação, o contexto e sua condição de ajudar. Isso significa que, se, por um
lado, em escolas cujos valores trabalhados sejam os da competição, do “cada um por si”
ou a orientação à obediência à autoridade, a avaliação das testemunhas será meramente
aguardar que outra pessoa cuide do problema ou mesmo se isentar da responsabilidade
dos fatos.
Outros pesquisadores indicam que o medo de ser a próxima vítima é a principal
justificativa das testemunhas por não defender os pares, Chaux (2012).
Assim, pelo contrário, estruturas de funcionamento escolar em que os alunos
sejam chamados a definir quais os valores que admiram e devem ser estabelecidos em
suas relações, sua importância e por que vivenciar valores como generosidade e não
egoísmo, justiça e não absenteísmo, terão condições de transformar situações caóticas
de sofrimento em possibilidades de exercício da cidadania por parte de quem ajuda, e
mesmo do pertencimento, por parte de quem recebe a ajuda. Então, implicar os alunos
na tarefa de garantir o bem-estar de todos por valores de justiça, generosidade,
igualdade, tolerância ao diferente, são ações promissoras para que o bullying e outros
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tantos problemas de convivência possam ser superados.
Isso porque diferentes pesquisas têm demonstrado o quanto se ganha quando a
participação dos alunos é efetiva para a ativação desses valores, Van Schoiack-Edstrom,
Frey e Beland (2002), Cowie, Boardman, Dawkins e Jennifer (2004). Atestam também
o quanto a formação de redes de apoio entre os próprios pares é muito mais eficaz do
que quaisquer que sejam outras estratégias implantadas na escola que venham por
imposição de adultos.
Uma dessas formas de protagonismo (redes de apoio) são as chamadas “equipes
de ajuda” (MARTÍNEZ, 2013). Tal sistema é estudado por autores no Brasil (Lapa e
Tognetta, 2016; Souza e Tognetta, 2016; Daud e Tognetta, 2016; Bomfim e Tognetta
2016; De Nadai e Tognetta, 2016) e na Espanha (Avilés, 2013; Avilés, Torres e Vian,
2008) e correspondem a grupos de referência em que crianças e jovens, trabalhando de
forma colaborativa e fortalecidos por uma formação em conteúdos de assertividade
como ajuda, comunicação e valores, podem atuar frente a outros colegas que passam
por problemas. Em uma palavra, sabe-se que só os pares, têm acesso, segundo como
aponta Cowie e Wallace (2000) aos problemas vividos pelos iguais. Esses autores
identificaram anteriormente as contribuições que um sistema de apoio entre pares pode
propiciar. Dentre elas, destaca-se:
A probabilidade de um jovem contar o que se passa com ele a um igual é muito
maior do que a de ele contar a uma autoridade.
Os alunos identificam com mais facilidade as formas de violência que ocorrem
entre seus pares do que os adultos.
A proposta brasileira – a descrição do caminho percorrido na implementação das
Equipes de Ajuda
Como apresentado, as Equipes de Ajuda têm sido implantadas em escolas
públicas e particulares no Brasil por um grupo de pesquisadores brasileiros (GEPEM –
Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Moral) e estrangeiros – da universidade de
Valladolid na Espanha.
Durante os anos de 2015 e 2016 dentro de um projeto em parceria com a
Fundação Lemman de Pesquisas intitulado “Em busca de caminhos que desenvolvam a
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convivência respeitosa em sala de aula todos os dias” desenvolvido pelo Grupo no
interior paulista, duas escolas pilotos instituíram um programa de convivência e
implantação desse sistema de apoio entre iguais. Assim, 270 alunos passaram pela
experiência de refletir, escolher e praticar ou ter presente em suas escolas, as Equipes de
Ajuda. Também em seções de formação de professores, foram discutidos conteúdos
sobre o fenômeno bullying e a abordagem necessária ao fortalecimento tanto dos grupos
de apoio como a atuação da autoridade no processo de combate a violência.
O trabalho realizado pelas Equipes de Ajuda configura-se como uma estratégia
das escolas para o desenvolvimento da empatia, da solidariedade, do respeito e justiça
entre os adolescentes. É também, no caso do Brasil, uma resposta a lei número 13.185
(06 de novembro de 2015), a chamada "Lei Antibullying", que obriga os
estabelecimentos educacionais a organizarem ações e medidas de conscientização,
diagnose e prevenção do problema. Conforme a legislação, os objetivos desses trabalhos
devem ser: "prevenir e combater a prática da intimidação sistemática (bullying)" e o de
"promover a cidadania, a capacidade empática e o respeito a terceiros, nos marcos de
uma cultura de paz e tolerância mútua" (Art. 4o.)
Para a formação das Equipes de Ajuda, seus integrantes são escolhidos pelos
pares, baseados no critério de confiabilidade. Além disso, fazer parte de um sistema de
apoio entre pares exige que o aluno tenha boas habilidades de comunicação e um
importante nível de empatia e assertividade. São formados em momentos
extracurriculares para que possam ser instrumentalizados e necessariamente, poderem
agir para ajudar aqueles que mais precisam de apoio na escola. Importante ressaltar
também, que todo o processo de escolha, formação e acompanhamento são feitos
diretamente pelos seus professores e por membros do GEPEM.
Cowie e Wallace (2000) apontam algumas características principais para o
sistema de apoio entre pares:
As crianças e os adolescentes que participam dos sistemas de apoio são
formados para trabalhar em grupos para além das relações de amizade.
Os participantes dos sistemas de apoio entre pares têm a oportunidade de
conhecer o outro e aprender a se conhecer, além de perceber suas
próprias emoções nas relações que estabelecem com os colegas e praticar
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formas de comunicação mais efetivas.
A formação das crianças e dos jovens tem como objetivo maior favorecer
as relações interpessoais entre eles, para que os conflitos sejam
resolvidos de maneira não violenta.
Seu funcionamento desde então, sugere que atestemos a veracidade com que os
problemas de convivência possam ser diminuídos com tais ações. Passemos então, à
apresentação da atual pesquisa.
A investigação propriamente dita: os resultados que nos apontam caminhos.
Nosso problema de pesquisa pode ser assim formulado: qual a percepção dos
alunos das escolas públicas em que foram implantadas as Equipes de Ajuda, um
ano após o trabalho, sobre a frequência de situações de intimidação antes e após a
implementação desse sistema de apoio?
Numa amostra intencional, participaram da investigação 270 alunos, estudantes
do Ensino Fundamental II, de duas escolas públicas do interior paulista em que foi
implantado o sistema de apoio entre iguais. Tratando-se de uma pesquisa exploratória,
de caráter descritivo, o instrumento utilizado constituiu-se em um questionário que
trazia vinte situações em que os alunos da escola, sendo das Equipes de Ajuda ou não,
apontariam “O quanto você presenciou, viu ou soube de um colega na escola...”. Para as
20 situações, as respostas deveriam apontar “Antes de ter as Equipes de Ajuda na
escola”: nunca; uma ou duas vezes; muitas vezes. E “Agora, com as Equipes de Ajuda
na escola”: nunca; uma ou duas vezes; muitas vezes.
Assim, os objetivos dessa investigação foram:
1. Avaliar se houve mudança na frequência das intimidações considerando a
perspectiva de antes e após a implantação das Equipes de Ajuda e;
2. Comparar os resultados encontrados entre os alunos que fazem parte do
sistema de apoio entre pares e os que não fazem parte.
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Os resultados
Para comparação de variáveis categóricas entre os 2 momentos foi utilizado o
teste de McNemar e para variáveis numéricas o teste de Wilcoxon para amostras
relacionadas. Com auxílio da figura 1 podemos destacar os resultados encontrados:
Figura 1 . Distribuição de frequência de respostas para a categoria “uma ou mais vezes”
em cada situação de intimidação antes e após as equipes de ajuda.
Na figura, os itens identificados com asterisco, representam uma mudança
significativa nos conteúdos de intimidação apresentados. Como podemos constatar,
dentre as vinte formas de intimidação possíveis, oito delas sofreram diminuição,
conforme percepção dos discentes. Aplicando-se os testes de McNemar para variáveis
numéricas e o teste de Wilcoxon para amostras relacionadas, há diferença
estatisticamente significativa (p<0,01) para tais resultados.
Os alunos destacam em suas percepções que houve diminuição da frequência das
seguintes formas de intimidação: 1* mensagens de insulto pelo celular (p < 0.0143) 3*
fotos na internet/celular (p< 0.0114); 6* ameaça e medo (p< 0.0339); 7* apanhar dos
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colegas (p< 0.0339); 9* falar mal (p<0.0339); 11* que foi discriminado (p<0.0114) 12*
acusações (p< 0.0006); 17* brincadeiras/constrangimento (p< 0.0339); 19* mentiras
(p<0.0209). Perceba-se também que, ainda que não haja diferença significativa entre a
frequência antes e depois, também não houve aumento dos índices após a implantação
das Equipes de Ajuda.
O outro objetivo proposto era comparar as respostas de alunos de Equipes de
Ajuda e aqueles que não pertenciam a elas. Havia a preocupação de que fossem os
próprios alunos das equipes de ajuda quem tivesse indicado a diminuição da frequência
das diferentes formas de intimidação. Para atender a esse objetivo, foi aplicado o teste
das Equações de estimação Generalizadas (EEG), afim de se obter a certificação que
não haveria interferência dos resultados com a variável “pertencer as Equipes de
Ajuda”. Os resultados podem ser encontrados no quadro a seguir.
Quadro 2. Resultados das Equações de Estimação Generalizadas (EEG) para
comparação das respostas entre tempos (antes-após), entre equipes de ajuda.
Situação de
intimidação
Valor-p
(antes-após)
Valor-p
Equipes ajuda
S1 0.0143 0.1623
S2 1.0000 -
S3 0.0114 0.3484
S4 0.6547 0.2784
S5 0.3173 0.3140
S6 0.0339 0.2908
S7 0.0339 0.2374
S8 0.1317 0.2575
S9 0.0339 0.8201
S10 0.1797 0.5034
S11 0.0114 0.0012 equipe 2
S12 0.0006 0.4388
S13 0.7815 0.3188
S14 0.4795 0.1629
S15 0.1655 0.3181
S16 0.0588 0.5780
S17 0.0339 0.1014
S18 0.0833 0.5225
S19 0.0209 0.6027
S20 0.2568 0.7295
Soma total <0.0001 0.2693
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Analisando as variáveis é possível constatar que somente em um caso – S11
(zoação e discriminação) fazer parte das Equipes de Ajuda fez diferença (p=0.0012),
indicando assim que meninos e meninas participantes das Equipes de Ajuda não
influenciaram as respostas para a diminuição das frequências da intimidação.
Discussão e considerações
Os resultados encontrados por esta investigação reiteram outros anteriormente
apontados por Cowie e Wallace (2000), Cowie e Smith (2002), Menesini et al (2003),
Avilés (2013). Sugerem que quando se trata de situações de intimidação e violência que
acontecem entre pares no ambiente escolar, os sistemas de apoio, aqui representados
pelas “Equipes de Ajuda”, se tornam uma importante ferramenta tanto de combate,
quanto de prevenção ao problema. Além disso, a implantação dos sistemas de apoio
entre pares, notadamente o modelo espanhol das Equipes de Ajuda, adotado por
algumas escolas brasileiras, reflete a preocupação da comunidade escolar em relação ao
fenômeno bullying como um problema cuja ausência de valores morais é sentida.
Acreditamos que, se na atual investigação, das vinte formas de intimidação
possíveis, nove delas sofreram diminuição na percepção dos alunos podemos considerar
a estreita relação entre o decréscimo apresentado à atuação direta das Equipes de Ajuda.
Pesquisas como essa nos confirmam a necessidade das intervenções cotidianas ao
combate às situações de bullying e maus tratos entre os iguais. Reverberam também a
necessária sensação de segurança e proteção frente a quem é seu par, seu companheiro,
na constituição de um clima escolar positivo.
A utilização de um modelo de intervenção que permita a participação efetiva de
quem, principalmente assiste as cenas de bullying nos permite reiterar o quanto os
estudantes não aprovam espectadores que se apresentam de forma passiva as agressões e
se comportam como uma “maioria silenciosa” (Gini et al, 2008).
A experiência de meninos e meninas brasileiros mostra-nos a possibilidade de
dar voz e vez aos alunos, como protagonistas de sua própria atuação e, como sujeitos
cuja escola objetiva que sejam autônomos no futuro, experimentem a autonomia no
presente. É possível reconhecer que a implantação de sistemas de apoio entre iguais
proporciona, na escola, a mudança do clima de confiança e a presença de valores morais
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num cotidiano, que muitas vezes, era marcado pela violência (Avilés, Torres e Vian,
2008; Honig e Zdunowski-Sjoblom, 2014).
Assim, se bullying é um problema moral, a resolução deste não se dá por meio
apenas de “remédios“ ou intervenções pontuais no momento da intimidação. Espera-se
por uma “vacina”, ou seja, a criação de um cotidiano em que todos os implicados na
convivência da escola possam repensar suas ações. A construção de um ambiente livre
de tensões, promotor da igualdade e de relações de respeito requer um novo olhar ao
papel da autoridade e das relações de poder na escola. Requer que meninos e meninas
possam discutir as regras que regulam sua convivência, ter escolhas, ter seus
sentimentos reconhecidos e manifestados para que possam aprender a resolver seus
conflitos de forma mais elaborada e evoluída. E ainda, que possam sentir em seus pares
a confiança de que precisam para se tornarem uma personalidade fortalecida e
adjetivada de ética. Em uma palavra: não se combate a violência, senão, pela
convivência.
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