o ensino de geografia

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Rev. ciênc. hum, Taubaté, v. 11, n. 2, p. 129-135, jul./dez. 2005. 129 O ensino da Geografia Física sob a perspectiva ambiental Fabio de Oliveira Sanches Departamento de Ciências Sociais e Letras Universidade de Taubaté RESUMO Graças à perspectiva ambiental dos últimos anos, a Geografia Física, discriminada durante quase uma dé- cada, retoma posição de destaque, tanto no ensino superior, como na formação básica. Tal posição de destaque foi decorrente da necessidade de se resga- tar os conteúdos físicos da Geografia devido a uma nova abordagem de ensino. O encontro mundial so- bre meio ambiente, ocorrido no Rio de Janeiro em 1992, colocou o Brasil em evidência, inserindo-o na pauta de discussão sobre principais problemas ambientais mundiais (poluição urbana, desmatamentos etc.), e promoveu mudanças internas significativas. Em relação à Educação Básica, a instituição dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), juntamente com os Te- mas Transversais, sugeriram que os problemas ambientais, locais, regionais e mundiais fossem discu- tidos em sala de aula vinculados às disciplinas de en- sino. Já no Ensino Superior, os problemas ambientais assumiram importância como objeto de análise e dis- cussão nos principais trabalhos acadêmicos. Dessa for- ma, podemos considerar que houve, necessariamen- te, um reencontro da Geografia Física com a Geogra- fia Humana, para que, com base no objeto de estudo da Geografia (a relação do Homem com o Meio), pos- sam ser levantadas soluções para os principais proble- mas de ordem ambiental. PALAVRAS-CHAVE Geografia Física. Meio Ambiente. Ensino da Geo- grafia. INTRODUÇÃO A última década do século passado e os primeiros anos deste século estão marcados por severas e pro- fundas mudanças, em todo o mundo, na ordem polí- tica, econômica e social. Passando por modificações em seus sistemas eco- nômicos, alguns países despertaram, nesse período transitório, pretensas crises, que eclodiram e influen- ciaram a economia em âmbito global. Conflitos étni- co-religiosos emergiram em alguns deles (Chechenos, Sérvios, Bósnios, Croatas), bem como, em outros, ver- dadeiras cruzadas foram levantadas para combater supostas práticas terroristas (Afeganistão, Iraque), de- senvolvendo-se, assim, um certo “pano de fundo” para as verdadeiras questões ligadas à economia e, princi- palmente, à política internacional. Paralelamente a tudo isso, questões relacionadas à preservação ambiental mereceram também o seu destaque no contexto in- ternacional (Rio-1992, Kyoto-1997, Johannesburgo- 2002), sobretudo quanto à apropriação de recursos energéticos que, de uma forma ou de outra, estão ligadas às ordens políticas, econômicas e sociais. Sem sombra de dúvida, esse período alimentou bastante o objeto de estudo da ciência geográfica, uma vez que, no seu bojo, fundamenta a ação do homem e suas relações com o espaço. Este trabalho visa demonstrar que, em virtude dessa perspectiva ambiental, houve uma retomada de inte- resses relacionados à Geografia Física como instrumen- to de análise e reflexão das questões ambientais, uma vez que o Espaço Geográfico – objeto de estudo da Geografia – é produto da ação humana sobre o ambi- ente natural e que todas as questões de ordem ambiental se arranjam como conseqüências dessa re- lação. REVISÃO DA LITERATURA Como para a abordagem e compreensão dos ele- mentos de caráter ambiental pela Geografia necessi- ta-se que estejam extremamente bem conceituados e fundamentados os mecanismos de funcionamento dos diversos elementos naturais (comportamento do clima, da dinâmica fluvial, o metabolismo da flora), houve, ao final da década de 1990, uma espécie de “redescoberta” da Geografia Física, para atendimento de tais demandas. Entretanto, é importante salientar que a afinidade da Geografia Física, como um campo da ciência geográfica, com a área das Ciências Ambientais, não deve ser confundida a ponto de ca- racterizar seu estudo como uma abordagem essenci- almente ambiental. Brown (1977) alimenta esse con- texto e, além de resgatar uma antiga discussão da Geografia Humana versus Geografia Física, reforça os cuidados que devem ser mantidos em relação à asso-

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Rev. ciênc. hum, Taubaté, v. 11, n. 2, p. 129-135, jul./dez. 2005. 129

O ensino da Geografia Física sob aperspectiva ambientalFabio de Oliveira SanchesDepartamento de Ciências Sociais e LetrasUniversidade de Taubaté

RESUMOGraças à perspectiva ambiental dos últimos anos, aGeografia Física, discriminada durante quase uma dé-cada, retoma posição de destaque, tanto no ensinosuperior, como na formação básica. Tal posição dedestaque foi decorrente da necessidade de se resga-tar os conteúdos físicos da Geografia devido a umanova abordagem de ensino. O encontro mundial so-bre meio ambiente, ocorrido no Rio de Janeiro em1992, colocou o Brasil em evidência, inserindo-o napauta de discussão sobre principais problemasambientais mundiais (poluição urbana, desmatamentosetc.), e promoveu mudanças internas significativas. Emrelação à Educação Básica, a instituição dos ParâmetrosCurriculares Nacionais (PCN), juntamente com os Te-mas Transversais, sugeriram que os problemasambientais, locais, regionais e mundiais fossem discu-tidos em sala de aula vinculados às disciplinas de en-sino. Já no Ensino Superior, os problemas ambientaisassumiram importância como objeto de análise e dis-cussão nos principais trabalhos acadêmicos. Dessa for-ma, podemos considerar que houve, necessariamen-te, um reencontro da Geografia Física com a Geogra-fia Humana, para que, com base no objeto de estudoda Geografia (a relação do Homem com o Meio), pos-sam ser levantadas soluções para os principais proble-mas de ordem ambiental.

PALAVRAS-CHAVEGeografia Física. Meio Ambiente. Ensino da Geo-

grafia.

INTRODUÇÃOA última década do século passado e os primeiros

anos deste século estão marcados por severas e pro-fundas mudanças, em todo o mundo, na ordem polí-tica, econômica e social.

Passando por modificações em seus sistemas eco-nômicos, alguns países despertaram, nesse períodotransitório, pretensas crises, que eclodiram e influen-ciaram a economia em âmbito global. Conflitos étni-co-religiosos emergiram em alguns deles (Chechenos,Sérvios, Bósnios, Croatas), bem como, em outros, ver-

dadeiras cruzadas foram levantadas para combatersupostas práticas terroristas (Afeganistão, Iraque), de-senvolvendo-se, assim, um certo “pano de fundo” paraas verdadeiras questões ligadas à economia e, princi-palmente, à política internacional. Paralelamente a tudoisso, questões relacionadas à preservação ambientalmereceram também o seu destaque no contexto in-ternacional (Rio-1992, Kyoto-1997, Johannesburgo-2002), sobretudo quanto à apropriação de recursosenergéticos que, de uma forma ou de outra, estãoligadas às ordens políticas, econômicas e sociais. Semsombra de dúvida, esse período alimentou bastante oobjeto de estudo da ciência geográfica, uma vez que,no seu bojo, fundamenta a ação do homem e suasrelações com o espaço.

Este trabalho visa demonstrar que, em virtude dessaperspectiva ambiental, houve uma retomada de inte-resses relacionados à Geografia Física como instrumen-to de análise e reflexão das questões ambientais, umavez que o Espaço Geográfico – objeto de estudo daGeografia – é produto da ação humana sobre o ambi-ente natural e que todas as questões de ordemambiental se arranjam como conseqüências dessa re-lação.

REVISÃO DA LITERATURAComo para a abordagem e compreensão dos ele-

mentos de caráter ambiental pela Geografia necessi-ta-se que estejam extremamente bem conceituadose fundamentados os mecanismos de funcionamentodos diversos elementos naturais (comportamento doclima, da dinâmica fluvial, o metabolismo da flora),houve, ao final da década de 1990, uma espécie de“redescoberta” da Geografia Física, para atendimentode tais demandas. Entretanto, é importante salientarque a afinidade da Geografia Física, como um campoda ciência geográfica, com a área das CiênciasAmbientais, não deve ser confundida a ponto de ca-racterizar seu estudo como uma abordagem essenci-almente ambiental. Brown (1977) alimenta esse con-texto e, além de resgatar uma antiga discussão daGeografia Humana versus Geografia Física, reforça oscuidados que devem ser mantidos em relação à asso-

ciação da Geografia Física com as Ciências do MeioAmbiente, uma vez que, nessa perspectiva, ocorreriaa aproximação de diversos não-geógrafos para o de-senvolvimento de estudos nessa área.

Já Christofoletti (2002) afirma que as mudançasambientais constituem um processo atuante na su-perfície terrestre desde a constituição do planeta, eque as transferências de energia que ocorrem nossistemas terrestres (atmosfera, hidrosfera, litosfera ebiosfera), desencadeadas pela energia solar, promo-vem novas transformações, as quais culminam emnovas condições ambientais. Assim, a problemática dasmudanças ambientais insere-se com grande proprie-dade no campo de ação da Geografia Física. Entretan-to, o surgimento e a evolução do homem propicia-ram uma nova força modificadora que se tornou, noséculo XX, o mais poderoso agente transformador dasuperfície terrestre, graças ao seu desenvolvimentotecnológico.

OS PRECEDENTES AMBIENTAISEm seu trabalho, Moraes (1993) apresenta-nos a

evolução do pensamento geográfico e afirma que épossível observar que a formação do naturalistaHumboldt, associada as suas diversas viagens, colo-cou a Geografia como uma disciplina preocupada coma conexidade dos elementos naturais e sua causalida-de. No entanto, na visão desse naturalista, caberia aohomem apenas contemplar a mais pura universalida-de das coisas, de tudo o que coexiste no espaço e dasimultaneidade de tudo na Terra.

É claro que a metodologia de abordagem deHumboldt apresentava-se puramente na formaempírica, ou seja, fundamentada na observação doselementos componentes da Terra; entretanto, é pos-sível abstrair, da sua linha analítica, uma visão integra-da dos elementos naturais, o que futuramente contri-buiria, de alguma forma, para a formação e consolida-ção das idéias de ecossistema.

Notadamente, o mundo passou a assumir umapreocupação com as questões ambientais após o tér-mino da 2ª Guerra Mundial, sobretudo mediante oprocesso de reconstrução do continente europeu.

A Conferência das Nações Unidas sobre o MeioAmbiente, na cidade de Estocolmo, em 1972, demons-trou para o mundo a necessidade de preocupaçõesrelacionadas às questões ambientais. A partir de en-tão, outros encontros internacionais passaram a discu-tir a problemática ambiental (Tiblisi, em 1976; Rio deJaneiro, em 1992; Johannesburgo, em 2002). Já noBrasil, a criação da Secretaria do Meio Ambiente(SEMA), nos anos 70, a instituição da Lei sobre PolíticaNacional do Meio Ambiente e o Conselho Nacional

do Meio Ambiente (CONAMA), nos anos 80, junta-mente com o encontro no Rio de Janeiro, em 1992,colocaram o país no contexto ambiental mundial (EDU-CAÇÃO, 2001).

A resolução CONAMA 001/86 define que o impac-to ambiental compreende qualquer alteração das pro-priedades físicas, químicas e biológicas do meio am-biente causada pela atividade humana, direta ou indi-retamente, e, ainda, que o licenciamento de ativida-des modificadoras do meio ambiente dependerá daelaboração de Estudo de Impacto Ambiental (EIA) erespectivo relatório (RIMA) aprovado por órgão com-petente,

[...] O desafio de superar a crise ecológica aonível global deve ser, sem dúvida, uma preo-cupação de todas as esferas do poder públicoe da humanidade como um todo. Nessa dire-ção, em termos constitucionais, na década de1980, a Educação Ambiental passou a ser umdos instrumentos da Política Nacional de MeioAmbiente, com a promulgação da Constituiçãoda República Federativa do Brasil, em 1988, seuartigo 225, estabelece que: “Todos têm direitoao meio ambiente equilibrado, bem de usocomum do povo e essencial à sadia qualidadede vida, impondo-se ao poder público e a cole-tividade o dever de defendê-lo e preservá-lopara as presentes e futuras gerações(MARTIM, 2002).

Martim (2002) ressalta que é função do poder pú-blico promover a educação ambiental em todos osníveis de ensino e a conscientização pública sobre apreservação do meio ambiente.

Desse modo, do ponto de vista geográfico, o res-gate dos aspectos físicos mostrou-se mais do que ne-cessário, tanto para a participação do profissional jun-to à elaboração de tais relatórios, como para a aborda-gem e o tratamento de tais questões relacionadas àconceituação e conscientização sobre a ordemambiental.

GEOGRAFIA FÍSICA: DO DESENCONTRO AOREENCONTRO

Com o processo de redemocratização ocorrido noBrasil em meados dos anos 80, houve praticamenteum completo repúdio no ensino dos conteúdos daGeografia Física no ensino regular, frente a uma novaperspectiva no ensino da ciência geográfica que secontrapunha às velhas bases conceituais/conteúdistaslecionadas durante o período militar.

A Geografia Crítica, ideologicamente concebida nobojo marxista e sufocada durante todo o período deexceção, assume naquele momento uma abordagem

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prática nas obras didáticas do ensino da Geografia aolongo do final dos anos 80 e no início dos anos 90.

A coleção Geografia Crítica (VESENTINI; VLACH,2001) fora amplamente utilizada como material didá-tico pelos professores do ensino público. Vieira,Valadão e Le Sann (2002) analisaram a linha de traba-lho da referida obra e observaram que a coleção ten-ta unir a Geografia Crítica com um socio-contrutivismo,ressaltando que a Geografia proposta na coleção nãoelimina o estudo da natureza, mas renova-o.

[...] O manual do professor apresenta temáticasgerais acerca da coleção, do método de ensi-no, da construção do saber e do papel do ho-mem na era da globalização, além do papel doprofessor no processo de ensino-aprendizagem.[...] Essa coleção está voltada para as discus-sões em torno da Geografia humana, envol-vendo, principalmente, os aspectos geopolíticosde organização do espaço mundial. A aborda-gem dos aspectos físicos é bastante restrita.Apresenta uma preocupação específica em tor-no da representação cartográfica, fazendo re-ferências às novas tecnologias acompanhadasde textos explicativos e imagens. Entretanto,no tema relevo, o recurso gráfico priorizado foio mapa hipsométrico. Nos quatro volumes, orelevo é tratado como conteúdo específico decada região, ou seja, relevo brasileiro, relevoafricano, relevo europeu, entre outros [...](VIEIRA, VALADÃO; LE SANN, 2002).

Observamos, nesse contexto, uma valorização dospreceitos relacionados aos aspectos da Geografia Hu-mana, em detrimento dos preceitos da Geografia Físi-ca. Dessa forma, verifica-se que os conteúdos relacio-nados à Geografia Física foram praticamente submeti-dos a um segundo plano de importância no ensinoregular, frente à “preferência” na adoção de discus-sões e reflexões inseridas em conjecturas humanas esocioeconômicas.

Somente com a instituição dos ParâmetrosCurriculares Nacionais (PCN) e a proposição dos Te-mas Transversais (Meio Ambiente, Saúde, Ética,Pluralidade Cultural, Orientação Sexual e Temas Lo-cais) essa dicotomia Geografia Humana versus Geo-grafia Física deixou de prevalecer, sobretudo em rela-ção à redefinição do objeto de estudo da ciência ge-ográfica como o produto da relação do Homem como Espaço (Meio).

A necessidade do resgate de conceitos, conteú-dos e fundamentos e esse novo interesse pelo ensinoda Geografia Física foram, dessa forma, calcados nainstitucionalização de diretrizes básicas voltadas à ori-entação do processo de ensino-aprendizagem no En-sino Fundamental e Médio, destacando os chamados

“Temas Transversais” (LEITE; MININNI-MEDINA, 2001).Destes, embora todos estejam direta e indiretamenterelacionados entre si e com a Ciência Geográfica, oMeio Ambiente, foi o responsável por aquele resgate,uma vez que se compreendeu que a questãoambiental não se limitava meramente à preservaçãode espécies animais e vegetais ou à supressão dosdesmatamentos, mas sim à qualidade de vida do ho-mem no meio em que vive, sendo ele urbano ourural, e aos problemas decorrentes da relação homem-espaço.

Ferreira (1995 apud SENA, 1999) afirma que a ques-tão ambiental, para a maioria da população, ainda seresume aos grandes temas veiculados pela mídia (ca-mada de ozônio, Amazônia etc.), os quais auxiliam nadifusão dos temas ambientais.

Essa “redescoberta” da Geografia Física, nos anos90, em virtude do enfoque ambiental, também podeser encontrada no trabalho de Suertegaray e Nunes(2001), que salientam que esse (re)encontro da Geo-grafia Física não é nada mais do que um (re)encontrocom a Geografia Humana.

Nessa abordagem, é revelado que esse(re)encontro corresponde ao processo de evolução edesenvolvimento do próprio pensamento filosófico denossa ciência, visto que:

[...] a busca da articulação entre natureza esociedade não foi tarefa fácil para os geógrafos.[...] Construir uma ciência de articulação naépoca em que surgiu oficialmente a Geografiapareceria ser como remar contra a maré, poisneste período a visão de ciência dominanteprivilegiava a divisão entre as ciências da natu-reza e da sociedade. [...] O que prevaleceu nofinal do século XIX e durante mais da metadedo século XX foi a fragmentação. Disso resul-tou algo comum aos geógrafos: o esfacelamentoda Geografia e, em particular, de uma partedesta denominada Geografia Física em diferen-tes campos do conhecimento [...](SUERTEGARAY; NUNES, 2001, p. 15-16).

Essa fragmentação científica do século passadoacabou por promover o primeiro impacto na Geogra-fia Física. Entretanto, hoje, a análise integrada do meiofísico, percorrendo conceitos como os de Paisagem,Geossistemas ou Sistemas Físicos, reafirma a impor-tância do estudo da Geografia Física, principalmentequando relacionada com os aspectos humanos, naocupação do espaço.

Suertegaray e Nunes (2001) fundamentam essadiscussão com base nos números apresentados no XXIEncontro Nacional de Geógrafos (XXI ENG) e no 8°Encuentro de Geografos de América Latina (8°EGAL),conforme Tabela 1.

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Tabela 1. Temas predominantes na geografia quetrata as questões ambientais

TemasUnidades de conservaçãoDiagnóstico ambientalImpactos ambientaisZoneamento ecológico/paisagemLegislação e preservaçãoNatureza e sociedadeTurismo, apropriação, impactosAmbiente e planejamento

8°EGAL4

1939

203

1021

XXI ENG7

3666

85578

Fonte: SUERTEGARAY, D. M. A., NUNES, J. O. R. (2001).

[...] No caso do Encontro Nacional de Geógrafos,verifica-se um maior número comparados coma produção na América Latina, não obstante aprodução é restrita. De qualquer forma é pos-sível visualizar os dados referentes ao XII ENGum certo equilíbrio nas diferentes áreas. Nocaso do 8º EGAL, é nítida a predominância detrabalhos em Geomorfologia, Climatologia eRecursos Hídricos. Outro dado importante é onúmero de trabalhos nesta área comparadocom as temáticas reconhecidas como da áreahumana. No âmbito geral, esses trabalhos nãoperfazem um número expressivo [...](SUERTEGARAY; NUNES, 2001).

Colangelo (1997) também apresenta sua contribui-ção, afirmando que fora solicitada à Geografia Físicauma reformulação metodológica significativa em finsda década de 80 e no início da década de 90, princi-palmente, na busca de respostas objetivas na avalia-ção, valoração e elaboração estratégica de interven-ções sobre as componentes do meio físico, vinculan-do o rigor taxonômico e mensuração (qualificação equantificação dos trabalhos respectivamente), atribu-tos imprescindíveis nos estudos de diagnósticos e prog-nósticos dos mais diversos tipos de processos.

Sendo assim, Leite e Mininni-Medina (2001) de-monstra que, nos objetivos gerais dos PCN e do temaMeio Ambiente para o Ensino Fundamental e Médiodestacam-se, principalmente, a importância de conhe-cer a integração e sistematização do ambiente natu-ral e social e suas inter-relações, observando e anali-sando fatos e situações do ponto de vista ambiental,e a ação no sentido de se manter um ambiente sau-dável a fim de melhorar a qualidade de vida.

Oliveira (2002), por sua vez, enfatiza que a Geo-grafia, como disciplina escolar, dispõe de uma situa-ção curricular única, uma vez que é integrante dos

currículos escolares em todos os sistemas educacio-nais. Assim, o professor de Geografia precisa estar in-formado quanto às mudanças que vêm ocorrendo navida moderna, principalmente na tecnologia da edu-cação. Como exemplo disso, ressalta que as fotografi-as aéreas e as imagens de satélites vêm sendo ampla-mente utilizadas para explicar a organização do espa-ço urbano e rural.

Na utilização, análise e interpretação de tais ferra-mentas, necessita-se que sejam levados em conside-ração, desde fundamentos teóricos relacionados aocrescimento populacional, passando por questões re-lacionadas à ordem das políticas públicas e de plane-jamento urbano, até à própria disponibilidade do es-paço físico a ser ocupado, quanto as suaspotencialidades e problemáticas ambientais e às ca-racterísticas intrínsecas dos sensores utilizados, princi-palmente na área de sensoriamento remoto.

Philippi e Rosa (2001) procuraram identificar osproblemas e potencialidades ambientais nos níveisglobal, nacional, regional e local, considerando suasrelações e suas interdependências de forma crítica euma visão linear com relação aos problemasambientais, demonstrando que a abordagem, nessasquestões, deve ser feita sob uma ótica integrada doselementos envolvidos, ou seja, uma visão holística,em que a Terra merece ser analisada como um “siste-ma vivo”, na busca de um equilíbrio natural dos seusprocessos de evolução.

Nessa relação de dependência haveria problemasambientais na entrada do sistema, relacionados como próprio sistema, e, ainda, problemas na saída dosistema, por exemplo: os desmatamentos e proces-sos erosivos na entrada, o modelo agrícolaimplementado em questão (socioeconômico) e gera-ção energética no próprio sistema, e a poluição daságuas, do ar e dos solos, na saída do sistema.

Nesse caso, é possível observar a mais amplaintegração das áreas do conhecimento geográfico (hu-mano, físico econômico etc.), na busca do entendi-mento de toda a problemática ambiental, para com-preensão dos complexos processos erosivos associa-dos ao conjunto dos agentes exógenos. Portanto, amaneira pela qual o homem se apropria do espaçodemonstra e justifica a necessidade de seu estudosistemático e integrado, demonstrando, mais do quenunca, a indissociabilidade dos preceitos físicos e hu-manos da Geografia.

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QUESTÕES AMBIENTAIS E A GEOGRAFIA FÍSICAAs mudanças ambientais incluem uma série de

transformações que ocorrem na superfície terrestre,de ordem quantitativa e qualitativa, envolvendo seto-res relacionados à climatologia, à hidrologia, àgeomorfologia, à geologia, à biologia, à ecologia e àorganização do espaço.

Coltrinari (1997) destaca que, em algumas áreasdas ciências sociais, utiliza-se o termo meio ambienteou ambiente, em referência ao meio social ou à vidahumana. Já nas ciências naturais e nas áreas das ciên-cias humanas próximas a elas, sobretudo a Geografia,os termos referem-se exclusivamente às condiçõesfísicas da Terra e aos componentes e sistemas dageosfera-biosfera, ainda que modificados pela atua-ção do homem.

No trabalho de Cunha e Guerra (2000), pode-seobservar uma discussão sobre as causas e conseqüên-cias da degradação ambiental integrando aGeomorfologia, a paisagem degradada numa baciahidrográfica e seus compartimentos, e, ainda, a degra-dação ambiental abordada de forma global e holística,por meio da análise de sua sociedade e relações como meio natural.

Segundo essa obra, os processos ambientais, comoa lixiviação, os movimentos de massa e as cheias dosrios, ocorrem com e sem a intervenção humana, ochamado Equilíbrio Natural, ou Dinâmico. No entan-to, o grau de degradação ambiental amplia-se em áre-as humanizadas, cabendo ao homem o processo derecuperação, uma vez que a intervenção humana, malplanejada ou não, intensifica e acelera os problemasde ordem ambiental. As causas da degradação justifi-cam-se no crescimento e na concentraçãopopulacional, e também no manejo inadequado dossolos rurais e urbanos (o corte nas encostas, as encos-tas desprotegidas, a falta de infra-estrutura para habi-tação, o mau uso dos solos na agricultura, a erosãolaminar, as ravinas voçorocas etc.).

Christofoletti (2002) afirma que, como conse-qüência dos estudos relacionados à ordem dos siste-mas ambientais (climatologia, hidrologia,geomorfologia biogeografia etc.), novas abordagenssurgirão, mesclando análises do meio físico com asatividades humanas e apresentando uma nova etapano tratamento interdisciplinar, por exemplo, estudosna bioclimatologia, na biogemorfologia, na economiaecológica etc.

Quanto à visão da ocupação do espaço em áreasurbanas, periurbanas e rurais, Agostini (2003) discute

a ocupação, por parte da população, das áreas perifé-ricas ao município de Taubaté e toda a problemáticadecorrente da falta de planejamento urbano. Discutetambém a dificuldade de reconhecimento e regula-mentação de um planejamento pelos órgãos públi-cos, para obtenção dos mínimos serviços sociais, ocu-pação de áreas tidas como de proteção ambiental etc.Trata-se de uma realidade, infelizmente, não exclusi-va a esse município.

Nesse trabalho, foi possível observar a inter-rela-ção das questões socioeconômicas, políticas eambientais na ocupação do espaço e toda a proble-mática envolvida.

A abordagem da questão ambiental pela Geogra-fia Física também deve levar em conta a escala emque o problema está se apresentando.

Um bom exemplo pode ser observado com rela-ção aos problemas de ordem climática, haja vista asmudanças climáticas de âmbito global, nos últimosanos, que vêm sendo estudadas por instituições depesquisa do mundo todo, à procura de um responsá-vel, ou dos responsáveis, pelo aumento das tempera-turas médias no Globo, seja de origem natural, sejade origem antrópica. O mesmo pode ser destacadoquanto aos estudos climáticos em menor escala, con-siderando-se que os elementos que compõem o cli-ma (temperatura, ventos, precipitação etc.) sofremmodificações em seu comportamento, em virtude docrescimento e expansão das áreas urbanas, como osfenômenos da “ilha de calor” e o da chamada “inver-são térmica”.

As obras de Campos (2003) e Marques (2003) de-monstram a importância de tais temas nos trabalhosrealizados no nível acadêmico; no entanto, a efetivaaplicação desses temas em salas de aula do EnsinoFundamental e Médio reforçará o caráter ambientalda ciência geográfica.

Em Brandão (2001), é possível observar uma refle-xão sobre os avanços tecnológicos atuais aliados aosesforços para o conhecimento das forças da naturezae da vulnerabilidade das sociedades modernas frenteaos chamados eventos naturais extremos, principal-mente quanto às questões de ordem meteorológica.

As freqüentes enchentes nos grandes centrospopulacionais, durante os meses chuvosos, têm suaorigem no processo de ocupação espacial, desenvol-vimento e expansão das cidades. A ocupação dasmargens dos córregos, em virtude da forte especula-ção imobiliária, a pouca infra-estrutura de suas cons-truções, somada à impermeabilização do espaço ur-

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bano, que acelera o processo de escoamento superfi-cial da água precipitada, favorecem a ocorrência des-sas eventuais catástrofes em cidades como São Paulo,Rio de Janeiro, Salvador.

O crescimento populacional associado à ocupaçãodo espaço, na maioria das vezes sem o devido plane-jamento, promove a ocorrência de problemasambientais, sobretudo na ocasião desses eventos na-turais extremos (verão com elevada precipitação, con-centração das chuvas em um curto período de tempoetc.), e, muitas vezes, são tidos como os responsáveispelas chamadas catástrofes naturais – deslizamentos,escorregamentos, movimentos de massa etc.

REFLEXÕES FINAISMuito longe de esgotar o assunto, procurou-se,

com essa breve articulação de idéias, demonstrar que,atualmente, o ensino dos conteúdos ligados à Geo-grafia Física reassumiu um papel de destaque no tra-tamento e na análise das questões relacionadas à or-dem ambiental.

Observa-se, também, que tal retomada ocorreugraças à implantação das propostas dos PCN referen-tes aos temas transversais, sobretudo em função dotratamento ao tema meio ambiente, que redirecionouas atenções para o ensino da Geografia Física, que,durante o final da década de 1980, fora desprezada,em virtude das preocupações socioeconômicas calca-das nos ideais da Geografia Crítica. Essa nova atenção,despertada pelos estudos geográficos relacionados àGeografia Física, a partir dos anos 1990, deveu-se auma nova proposta de abordagem de seus conteú-dos, sobretudo sob uma nova postura prática, cami-nhando para a superação da dicotomia entre a Geo-grafia Física e a Geografia Humana e demonstrandoque não se pode abandonar o conhecimento dos ele-mentos da natureza, principalmente porque o homemmantém profunda relação histórica com a apropria-ção espacial. Portanto, cabe ao geógrafo, mas nãoexclusivamente a ele, analisar, interpretar, estudar epropor soluções aos problemas do nosso cotidiano.

THE EDUCATION OF PHYSICAL GEOGRAPHYUNDER THE ENVIROMENTAL PERSPECTIVE

ABSTRACT

Due to the environmental perspective over the lastyears, Physical Geography, which was discriminatedfor almost one decade, now assumes an outstanding

role not only in the superior education, but also inbasic education. This position was occurred by thenecessity to rescue the physical contents of Geographybecause the new teaching approaches. The worldmeeting about the environmental held in Rio de Ja-neiro in 1992, put Brazil in evidence, including thecountry in the discussion about the main worldenvironmental problems (urban pollution,deforestation, etc.), and promoted significant internalchanges. In relation to the Basic Education, theinstitution of “Parâmetros Curriculares Nacionais” (PCN),with the “Temas Transversais”, suggested that theenvironmental, local, regional and world problemswould be discussed in the classrooms linked to theteaching subject. In the undergraduate courses, theenvironmental problems had their importance asanalysis object and discussion in main academic studies.Thus, we can consider there was, necessarily, a reunionwith Physical and Human Geography, so that, basedon the study object of geography (the relationshipbetween man and environment), solutions to the mainenvironmental problems can be raised.

KEY-WORDSPhysical Geography. Environmental. Teaching of the

Geography.

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Fabio Sanchesé Mestre em Ciências Ambientais e professor dos cursos de Geografia daUniversidade de Taubaté – UNITAU- e do Centro Universitário Salesiano deSão Paulo: Unidade Lorena - UNISAL.

Departamento de Ciências Sociais e LetrasR. Visconde do Rio Branco, 22centro – Taubaté –SPCEP. 12.020-040e-mail: [email protected]

TRAMITAÇÃOArtigo recebido em: 14/10/2004Aceito para publicação: 25/08/2005

Rev. ciênc. hum, Taubaté, v. 11, n. 2, p. 129-135, jul./dez. 2005. 135