notas petrogrÁfioas sobre' rochas sedimentares … · tendência monogénica, a que parece...

21
NOTAS PETROGRÁFIOAS SOBRE' ROCHAS SEDIMENTARES PORTUGUESAS IX - ALGUMAS ROCHAS DA REGIÃO DE MOURA - BARRANCOS POR C. ROMARIZ (Prof. Agreg. da Faculdade de Ciências de Lisboa Bolseiro do Instituto de Alta Cultura) Na presente nota estudam-se, petrogràficamente, algumas rochas sedimentares da região de Moura-Barrancos-Ficalho. 1- GRAUVAQUE COM VEGETA,IS DEVÕNICOS DE BARRANCOS A ,existência de rochas grauvacóides com fragmentos de vege- tais na região de Barrancos foi referida por NERY DELGADO (1908). Este autor indicou a presença de camadas com vegetais em Eiras Altas, Volta dos Nogais, próximo do vértice trigonométrico da Gata e em Vale da Coitada, atribubdo-as ao topo do Silúriw; admitiu, no entanto, a hipótese de poderem pertencer ao Devónico. CARLOS TEIXEIRA (1951) realizou novas explorações na região de Barrancos tendo colhido abundante material nos seguintes locais: trincheira da estrada de Moura a Barrancos, aos km 95,480 e 100,950; bifurcação das linhas de água a cerca de 1000 m a W da pirâmide de Calvário. O material, 'embora mal conservado, permitiu a identificação de Drepanophycus sp. (D. af. sPinae- fo-rmis Goep.) e sob certa lleserva de PSIi/ophyton e de Hostimella. Isto é, do ponto de vista estratigráfico, os grauvaques com vege- tais de Barrancos pertencem ao Devónico.

Upload: nguyentuyen

Post on 30-Nov-2018

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

NOTAS PETROGRÁFIOAS SOBRE' ROCHAS SEDIMENTARES PORTUGUESAS

IX - ALGUMAS ROCHAS DA REGIÃO DE MOURA - BARRANCOS

POR

C. ROMARIZ (Prof. Agreg. da Faculdade de Ciências de Lisboa

Bolseiro do Instituto de Alta Cultura)

Na presente nota estudam-se, petrogràficamente, algumas rochas sedimentares da região de Moura-Barrancos-Ficalho.

1-GRAUVAQUE COM VEGETA,IS DEVÕNICOS DE BARRANCOS

A ,existência de rochas grauvacóides com fragmentos de vege­tais na região de Barrancos foi referida por NERY DELGADO (1908). Este autor indicou a presença de camadas com vegetais em Eiras Altas, Volta dos Nogais, próximo do vértice trigonométrico da Gata e em Vale da Coitada, atribubdo-as ao topo do Silúriw; admitiu, no entanto, a hipótese de poderem pertencer ao Devónico.

CARLOS TEIXEIRA (1951) realizou novas explorações na região de Barrancos tendo colhido abundante material nos seguintes locais: trincheira da estrada de Moura a Barrancos, aos km 95,480 e 100,950; bifurcação das linhas de água a cerca de 1000 m a W da pirâmide de Calvário. O material, 'embora mal conservado, permitiu a identificação de Drepanophycus sp. (D. af. sPinae­fo-rmis Goep.) e sob certa lleserva de PSIi/ophyton e de Hostimella. Isto é, do ponto de vista estratigráfico, os grauvaques com vege­tais de Barrancos pertencem ao Devónico.

SGP
Referência bibliográfica
Boletim da Sociedade Geológica de Portugal, Vol. XVI, Fasc. I-II, 1966.

A rocha que constitui os afloramentos da estrada de Moura a Barrancos encontra-se, em geral, muito alterada. A nova estrada de Amardeja aquela última vila faculta ,esplêndidos cortes através das formações silúricas e devónicas da região; em vários pontos, aquela estrada intersecta isoclinais siluro-devónicos, permitindo observação de rochas frescas; as bancadas estão no prolongamento das cortadas pela estrada de Moura a Barrancos.

Em rocha cinzenta-escura a !legra, encontram-se, como ali, abundantes, ainda que mal conservados, restos de vegetais do mesmo tipo.

Novas colheitas realizadas - quer nos locais indicados por CARLOS TEIXEIRA, quer ao longo da estrada de Amareleja a Barrancos não forneceram qualquer forma diferente das indica­das. A pesquisa de estruturas vegetais nalguns moldes ·melhor conservados resultou infrutíf.era.

Os numerosos cortes existentes põem em evidência sedimen­tação de fácies «flysch»; há camadas alternantes de rocha de granu­lariedade média, ou mesmo grosseira, e de rocha 'muito fina de aspecto xistoso.

A presença de rocha sã nas trincheiras da ,estrada de Amare­lej a permite -confirmar a designação de grauvaque que lhe fora atribuída por observação macroscópica. Em amostra de mão, estas rochas têm cor cinzenta-escura, são ásperas ao tacto, mesmo as mais finas, muito compactas, contendo elementJois filito-argilosos abundantes; alteradas tornam-se ci!lzentocacastanhada;s a castanhas, exalam forte cheiro a barro quando bagejadas e fazem eferves­cência fraca com o ácido clorídrico.

O microscópio mostra tratar-se de grauvaque típico, consti­tuído por microclastos muito angulosos e mal calibrados, consoli­dados por matriz quartzo~filito-argilosa (Est. I, Figs. 1 e 2).

A fracção detrítica inclui elementos de quartzo, quartzito, clorite e feldspato; este é relativamente abundante, distinguindo-se: albite-oligoclase, tOIftose, pertite e mirmequite. A matriz contém sericite, moscovite, clorite e matéria argilosa; é abundante o calcário intergranular. Observa-se, ainda, escassa impregnação piritosa.

49

II-ROCHAS CONGLOMERÁTICAS DE GATA

Próximo do vértice trigonométrico de Gata, camadas grauva­cóides, passando insenslvelmenre a conglomeráticas, assentam sobre xisto com fauna de graptolitos do Lud1oviano. As, camadas grau­vacóides e conglomeráticas, pertencentes ao DevóniCO', afloram 'em certa extensão. O vértice trigonométrico de Gata está implantado ~obre a rocha conglomerática.

A rocha cinzenta, de grão médio, com 'quartzo e feldspato visíveis à lupa, assente sobfie o conglomerado, é um grauvaque. O microscópio mostra a presença de detritos muito anguloso~ e com índise-·de esfericidade baixo; a calibragem é assaz má, variando as dimensões dos clastos entre 0,27 e 0,04 m'm.

Identificaram-se detritos de quartzo, de quartzito, de cherte, de Feldspato (ortose e plagioclase) muito calcitizado, detritos duma rocha de pasta microlítica, de clorite e alguns grãos de zircão.

A matriz contém sericite, matéria argilosa, quartzo e calcite; a silicificação é intensa. Trata-se portanto dum grauvaque rico de clastos feldspáticos, com notável semelhança com o descrito ante-riormente. .

Junto do vértice geodésico de Gata, ;> Km a SW de Barran­cos, afloram, em certa extensão, camadas conglomerático-gresosas passando, para leste, a grés grauvacóide e ao grauvaque acima descritos. .

NERY DELGADO (1908) refere, neste local, a presença de oonglomerado grosseiro, composto de grãos de quartzo cinZento e pequenos fragmentos de xisto da mesma cor, cimentados por pasta de grés argiloso. O autor citado considera estas rochas como gotlandianas, incluindo-as na rubrica «grauvaques e xistos supe­riores». Na opiniã:o de CARRINGTON DA COSTA (1931) estas camadas devem ser incluídas no Devónico. Assim o mostrou, tam­bém, CARLOS TEIXEIRA (1951).

O conglomerado de Gata é essencialmente constituído por dementos quártzicos rolados e sub-rolados, com índice de ,esferici­dade méd10 a elevado.

O microscópio mostra a presença, como elementos ,esse!1ciais, de quartzo muito triturado e com extinção rolante e de quartzitlO;

SQ

encontra-se, ainda, um ou outro fragmento de xisto. A matriz é abundante, silto-gresosa, de natureza quártzica. O cimento filito. -silicioso ou fundamentalmente silicioso, engloba sílica, alguma sericite, raríssima moscovite e., nalguns pontos, matéria argilosa (Est. II, Figs. 1 e 2). Trata-se, pois, de conglomerado com tendência monogénica, a que parece poder atribuir-se origem marinha.

III - ALGUMAS ROCHAS DAS SERRAS DA PREGUIÇA E DE FICALHO

As serras da Preguiça ,e de Ficalho sãcy ,essencialmente cons­tituídas por rochas carbonatadas, quer magnesianas, quer cálcicas, nitidamente cristalinas, mais ou menos atingidas por epigenização siliciosa.

Estas rochas as.sentam sobre xistos sericíticos, xistos cloríticos e xistos epidóticos, como se pode observar em vários pontos, ao longo das estradas que ligam MO'llra a Sobral da Adiça e esta localidade a Safara.

Entre as rochas verdes e as rochas carbonatadas evidencia-se, nalgúns locais (D.a Catarina e a N do Monte da Preguiça), bancada pouco espessa, mas relativamente constante, de arcose. A presença desta Docha, certamente mais antiga do que os mármores de Pre­guiça que sobre ela ass.entam, reves.te-se de importância para a estratigrafia desta região e consequentemente da da serra de Ficalho, pertencente ao mesmo grupo.

Assim, um corte SW-NE próximo da terminação sudeste da serra da Preguiça mostra, a partir da base:

a) Xistos sericíticos, cloríticos e epidóticos, correspondendo à fácie dos xistos verdes;

b) Arcoses; c) Rochas carbonatadas, mármores e dolO'mitos, com interca­

lações siliciosas, por v.ezes. oonstituindo bancadas chérticas.

A estrutura geológica, assaz complicada, par·ece corresponder, na Preguiça, a um sinclinal; na região de D.aCatarina é ,evidente a terminação periclinal das camadas ref.eridas.

. Descrevem~s.e em seguida alguns aspectos·· fillidamentais das rochas de cada um dos grupos indicados.

a) ROCHAS DA F ÁCIES DOS XISTOS VERDES

1. Xis-tos sericíticos

Foram observadas diversas amos.tras deste tipo petrográfico. São rochas xistosas, cinzentas a esverdeadas, por vezes com veios ferruginosos e chérticos muito finos.. Ao microscópio evidenciam-se zonas ess.encialmente com textura nematablástica e zonas quartzo­-feldspático-micáceas de textura granular. As primeiras são consti­tuídas, qU!l..se ,exclusivamente, por agregados sericíticos a que, num ou outro -ponto, se junta ,escassa clarite. .

Veios chérticos, em geral impregnados de matéria ferruginosa, são, por vez,es, abundantes. Nalgumas amostras nota-se, também, a presença de pirite.

2. Xistos clorítico-sericíticos

São rochas esverdeadas, com xistosidade pouco aparente em amostra de mão. Contêm quartzo, muito abundante, clorite, provà­velmente penina, em agregados fibrosos, sericite e carbonato, formando este agregados com a mica potássica. Encontra-se, ainda, raro feldspato não geminado (provàvelmente albite) .

. As percentagens das duas micas equivalem-se nalguns casos; noutros há preponderância de uma ou de outra.

O quartzo mostra, em muitos pontos, solução de continuidade dos grãos. Em várias amostras observam-se abundantes porfiroblas­tos quártzicos, cloríticos e quart:w-cloríticos. Quase sempre a zona central do porfiroblasto é ocupada por massas metálicas; .estas só foram 'Observadas nos porfiroblastos, parecendo acompanhar a sua formação (Est. III, Fjgs. 1 e 2).

3. Xistos cloríticos

- ..... Sã'Ü:rochas verdes, bastante compactas, de aspecto granular em amostra de mão. A textura é granúlar, heterogénea, de grão médio.

A análise micrO'scoplCa mO'stra que são constituídcrs por: clorite, epídoto, quartzo, calcite, feldspato não geminado (provàvelmente albite) e biO'tite.

b) ARCOSES DE D.a CATARINA

Em vários pontos do sopé sudoeste e sudeste da serra da Pre­guiça. é O'bservável, a pr,esença de bancadas pouco espessas de rochas granulares, de grão fino, médio ou grosseiro, com quartzo e feldspato visíveis, cimentado por matéria mineral esverdeada; algu­mas amostras revelam orientação nítida dos elementos. Ê frequente a presença de veios quártzicos atravessando a rocha.

O microscópio põe em evidência textura granular, atingida por vez-es pO'r tectonização intensa; a calibragem é má e os elementos quártzicos são angulosos a sub-angulosos, com índice de esterici­dade fraco.

A arcos,e de D.a Catarina é constituída pelos seguintes minerais:

1) quartzo, em geral límpido, raramente se individualizando inclusões; apresenta-se muito fracturado, por vezes triturado e sempr.e com extinção rolante; 2) teldspatO', abundante, cons­tituído por O'rtO'se, pertite, microcli11'a e plagioclase de tipO' albite-oligO'clase; o mais cümum é a pertite; üS f.eld5patos mostram-se mais O'U 'menüs caulinizados e sericitizadüs, não sendo raros as efeitos de defürmação; 3) o mineral acessório mais abun­dante é a sericite, acompanhada de matéria argilO'sa e, pO'r vezes, de moscO'vite; fürma massas ocupando os espaçüs intergranulares, frequentemente cO'm aspecto fluidal, por vezes com tendência à disposição em leitos; nalgumas amostras a sericite é escassa; obser­vam-se, ainda, clorite, zoisite, epídO'tO' -em agregados radiais, quartzo secundário e fraca impregnação hematítica.

A rO'cha de D.a Catarina é, pois, um grés teldspático, com escasso transporte e devada percentagem de feldspato, isto é, uma arcose. Petrogràficamente podem individualizar-se düis tipos:

a) arcose não tectonizada, em que o cimentO' é escasso, 'essencialmente fO'rmado de matéria argilosa, com rara sericite (Est. IV, Fig. 1);

53

(3) arcose tectonizada, riCa de sericite e contendo epídoto; a' presença de sericite e de epídoto ·em agregados radiais provém, talvez, da acção tectonizante que atingiu a rocha nalguns locais (Est. IV, Fig. 2).

c) ROCHAS CARBONATADAS

Nas serras da Preguiça e de Ficalho abundam as rochas carbonatadas calcíticas e dolomíticas CO'm predomínio dos termo'S magnesianos. Rochas deste tipo formam, ainda, afloramentos, se bem que pouco importantes, nas proximidades de Moura; nas estradas para Amareleja ,e para Barrancos há pequena exploração para fabrico' de cal.

As· rochas da Preguiça e de Ficalho, s-obretudo os termos magnesianos, mostram epigenização siliciO'sa, por vezes muito intensa; a sílica substitui frequentemente todo o carbonato, consti­tuindo bancadas chérticas que, em várias faixas, interrampem os calcários dolomíticos e os dolomitos; com frequência, venulação chértica corta, discordante da estratificação, as rochas carbonatadas.

Conhecem-se todos os termos entre mármores calcíticos puros e mármores dolomíticos; de modo idêntico há todas as transições entre mármores puros, mármores chértificados .e chertes.

1) Mármo1'es calcíticos - Na herdade de D.a Catarina, que constitui a terminação periclinal SE da Serra da Preguiça, às bancadas arcósicas descritas anteriormente sobrepõem-se, em concor­dância, mármores calcíticos. Mármores do "mesmo tipo encon­tram-se noutros p01).tos desta serra e na de Ficalho. São rochas compactas, granular.es, com cristalinidade evidente, acinzentadas, nalguns pontos esbranquiçadas, atravessadas por veios vermelhos.

A composição é essencialmente carbonatada (Fig. 1); são cons­tituídas por calcite cristalina, com textura iis.ogranular suturada, de grão fino a grosseiro, em que são correntes as geminações (Est. V, Fig. 1). Observam-se muito escassos grãos de quartzo e alguma sericite.

Os veio!) vermelhos que at.ravessam as rochas são constituídos por filitos fortemente impregnados por hematite globular. Verifi­ca-se' ainda, a presença de veios de calcite secundária.

54

FC

FG _ ...... _ ..... .K...._ ...... ____ ..... _____ FF

Fig. 1 - Diagrama triangular que mostra a composição essencial de alguns mármores das serras da Preguiça e de Ficalho (Moura).

(FC, fracção carbonatada; FG, fracção grosseira; fF, fracção fina)

2) Mármores dolomíticos, dolo mitos calcaríferos edolomitos chertificados.

As rochas carbonatadas mais abu-'1dantes da região são as do tipo dolomítico, encontrando-se, cOlmo ;se disse, todos ()JS termos de transição.

Os dolomitO's são muito compactos, em geral de tons averme­lhados, por vezes cinzentos; não dão ef.ervescência por acção do ácido clorídrico. A textura é isogranular, de grão fino a médio; nota-se tendência geral para a formação de romboedros, eviden­ciando-se alguns cristais típicos.

O carbonato está impregnado de hematite granular difusa; existe, abda" hematite intergranular e em rdação corri fracturas.

As rochas dolomíticas de Preguiça-Ficalhocontêm, também, calcite e sílica.

Em cerca de duas dezenas de amostras. analisadas verifica­ram-se valores entre 3 70 e 37 % de carbonato de magnésio (Fig. 2); a percentagem de sílica varia, também, muitíssimo, com passagem a cherte carbonatado (Fig. 3).

55

FC

FA

Figoí(- Diagrama triangular a quatro variáveis evidenciando diferenças de composição nas rochas dolomíticas da serra da Preguiça (Moura).

(FC, fracção carbonatada; FS, fracção siliciosa; F A, fracção argilosa; os triângulos são proporcionais à percentagem de carbonato de magnésio contida na rocha)

FC

FS FA

Fig. 3 - Diagrama triangular mo~trando a composição essencial dos dolo mitos e chertes associados, da serra da Preguiça (Moura).

(FC, fracção carbonatada; PS, fracção siliciosa; FA, fracção argilosa)

Os dolomitos calcaríferos chérticos são rochas com eferves­cência moderada a fraca, muito duras, compactas, ou, porosas, por dissolução do carbonato cálcico, de granularidade muito fina.

A cor é, em geral, avermelhada, por vezes acinzentada, com zonas esbranquiçadas, o que lhes conreDe, frequentemente, aspecto de brechas.

A textura é granular, heterogénea (Est. VI, Figs. 1 e 2); nas zonas. vermelhas domina o carbonato, enquanto as manchas brancas são essencialmente chérticas.

As zonas carbonatadas são constituídas por carbonato isogranu­lar, mais raramente heterogranular, suturado e, em geral geminado e clivado; os romboedras dolomíticos 'São pouco abundantes. Hematite granular ou difusa impregna o carbonato ou dispõe-se intergranularmente; os óxidos de ferro atingem, também, em geral, as fracturas.

As zonas siliciosas, de forma irregular, são constituídas por quartzo com granulariedade heterogénea; há concentrações de grão grosseiro, em geral, rodeadas por quartzo de grão fino. O quartzo detrítico, fracturado e com extinção rolante, é escasso; a maior parre é quartzo secundário, límpido, em que não são raras inclusões de carbonato oe s,ericite e, por vezes, romboedros típicos de dolamite.

É frequente a disposição em leitos alternantes, em que domina o carbonato ou a sílica.

Num ou noutro ponto, pr-ovàvelmente em relação com micro­geodes, há rosetas de fribrocalcedonite.

É, também, comum a impregnação chértica difusa. A sericite é, em geral, constante, embora pouco ahundante;

se bem que dispersa por toda a rocha é, ~o entanto, mais frequente nas zonas carbonatadas.

São vulgares bancadas de ce,rta espessura essencialmente chérticas. A rocha que as constitui é compacta, acinzentada .ou esbranquiçada, com brilho gorduroso em fractura recente. O micros­cópio mostra que o quartzo granular com textura heterogénea constitui a massa fundamental da rocha; fiLonetes de quartzo de grão grosseiro oe geodes de fibrocalcedonite interrompem a regula­ridade da textura.

Observam~se, também, chertes com textura isomicrogranular.

57

* * *

Do.is factos no.táveis r,essaltam das descrições anterio.res; um de impo.rtância estratigráfica, a presença de bancadas de arcose na base das formações calcário~do.lo:míticas da serra da Preguiça; outro, de importância sedimento.lógica, a intensa silicificação das rochas carbonatadas,.

Como se disse, estas rochas, na região de Moura, mostram silicificação mais ou menOos intensa, 'encontrando-se bancadas quas·e ou mesmo exclusivamente silicio.sas constituídas por chertes quártziws. As obs,ervações petwgráficas parecem indicar cherti­ficação pgr epigenia. De factOo, a inteJJisidade da silicificaçãOo é muito-variávd; quase sempr,e aparece, embora em percentagem reduzida, algum quartzo detrítico, ladOo a lado com sílica de neOofor'mação. A silicificação po.de apresentar-se difusa na rocha

,carbo.natada o.U cQl1lcentrar-se em zonas mais o.U menos impOor­tantes; em qualquer dos caso.s, o quartzo secundáriOo inclui, com muita frequência, restos de carbonato, quer calcite, quer dolomite.

Parece pois de aceitar que episódio silicioso. importante tenha atingido as formaçó-es carbo.natadas, substituindOo, mais o.U menos profundamente, os carbonato.s de cálcio. e magnésio.. A epigeniza­ção acompanho.u mais frequentemente a estratificação mas, nãOo é raro ter preenchido fracturas e vazios, originando. rochas de aspecto br,echóide. Pareoe mais provável a hipótese de iSilicificaçãOo pós-dia­genética; a penetração. de 'águas ricas de sílica através dOo, maciço calcário., permitiu a sO'lubilização. dOo carbOonato. ,e deposição da sílica sob a forma de quartzo e, nalguns casos, de calcedonite. Assim, trata-se de sílica estritamente de precipitação.; de resto, em várias dezenas de amostras o.bservadas nunca se deparou com qualquer vestígio. da presença de organismos siliciosos, o que seria de esperar sea origem fosse biogenética.

As rochas carbo.natadas da região de Mo.ura têm no.tável semelhança petrográfica com rochas do mesmo tipo. existentes no.utros aHmam1entos po.rtugueses" como Abrantes (Est. VII, Fig. 2), Cabeço de Vide (Est. VII, Fig. 1) e Estremo.z.

Amostras estudadas destes afloramentos mostram que se trata de mármores calcíticos, dolomíticos O'U caldtico-dolomíticos, com

58

impregnação chértica mais ou menos intensa, difusa ou com ten­dência a constituir zonas de cO'11centração.

Do ponto de viiSta estratigráfico os mármores da grupo Pre­guiça-Ficalho foram incluídos nas mapas geológicos de Portugal de 1899 e 1952 r,espectivamente no Precâmbrico e Arcaico e no Complexo Cristalofílico Antigo.

CARLOS TEIXEIRA (1953) põe a hipótese de se tratar de forma­ções mais modernas, provàvelmente da mesma idade da dos mármo­res de Extremoz; estes, segundo o mesmo autor, se bem que despro­vidos de fósseis, podem atribuir-se ao Câmbrico, pois encontram-se no prolongamento das formações espanholas da serra de Alconera, ao Sul da província de Badajoz, não long1e da fronteira portuguesa, que contêm fauna de arqueociatídeos.

A base do Câmbrico na província de Sevilha assenta sabre granito e o conglomerado de base daquele sistema contém elemen­tos do mesmo granito. Assim, parece haVier indicações duma granitização ante-câmbrica na região SW da península. Apre. sença de arcos e na base das formações calcárias de Preguiça­-Ficalho pode estarem relação com tais granitos, o que levaria, portanto, a considerar aquelas formações como Câ'mbricas.

A semelhança do que sucede em Estremoz e Abrantes, não foram até hoje encontrados fósseis na região de Preguiça-Ficalho. Os calcários e dolomitos atingidos por metamorfização mais ou menos intensa são pouco susceptíveis de terem conservado restos fossilíferos.

Nalgumas rochas menos meta:morfizadas e bastante alteradas da serra de Preguiça, na vertente sudoeste da serra Alta, parece poder pôr-'se em evidência, microscopicamente, a presença de estruturas particulares. De facto, em várias amostras estudadas encontram-se aspectos que lembram restas de organismos; não é, no entanto, possível reconhecer a que grupo animal possam per­tencer devido à recristalização que atingiu o carbonato.

A rocha original parece te.r sido um calcarenito oolítico ou pseudoJoolítico, textura ainda evidente em várias lâminas delgadas (Est. V, Fig. 2). A recristalização quase destruiu a textura original.

59

SUMMARY

ln this paper the following rocks from outcrops of Moura-Barrancos zone are refered:

1) Tipical graywacks of Devonic age from several outcrops of the Amareleja-Barrancos and Moura-Barrancos rout. ln thi5 rocks have been found marks of a psilophytine flora.

2) A marine conglomerate mainly composed oE clastic quartz and qUM"tzite with a few clastes of slate5; the conglomerate matrix is essen­cially of silt and quartz particules and the ciment is silicious with little amount of phylites. The conglomerate of Gata, Barrancos, have probably a Devol).ic age.

3) The Preguiça-Ficalho outcrops are compOl5ed, from the base to the top by the following crops: a) green schists; b) tipical arcoses and tectonizc;cl/arcoses with epidote; c) Limestones and cherts, including calcitic marbles, dolomites, dolomitic limestones, dolomitic cherts and cherts. The Preguiça-Ficalho limestones are not fossiliferous. A calca­renite which seems to contain recristalized organic strutures is described. The Geology of this limestone5 system is very similar to the one of the Extre­moz and Abrantes limestones. The Estremoz limestones are not fossili­ferous also, but their outcrops continues in Spain (Sierra of Alconera) where they have arqueocyathides. ln Seville, not very far from Preguiça­Ficalho in the base of low Cambrian there are a conglomerate with granitic elements much alike the granitic rocks from the crystaline basement. The presence of arcoses in the base of Preguiça-Ficalho limestones and the geology and petrology of this mountaim seems to point also to a Cambrian age for this series. The limestones of Preguiça-Ficalho are mainly dolomitic ones and they have been epigenized by granular silica. This chertification can be so important as to form tipical chertic beds.

BIBLIOGRAFIA

CosTA, J. CARRÍNGTON DA (1931) -O Paleozóico português (Síntese e Crítica) - Porto.

DELGADO, J. F. NERY (1908) - Systeme Silurique du Portugal- Mem. d-a Cammis. das Servo Geai. Portugal- Lisboa.

MELÉNDEZ, B. (1942) - Los Tel"'rOOOl5 Cambricos de la peninsula hispanica - Trab. Inst. J. Acosta, ser. Geologia, t. I, n.o 1. Madrid.

SAMPELAYO, P. H. (1933) -EI Cambrico en Espana-Inst. Geol. y Min. de'Espafía. Madrid.

TEIXEIRA, C. (1951) - Notas sobre a geologia da região de Barrancos e, em especial, sobre a sua flora de Psilofitíneas - Comun. Servo Ge()l. de Portugal, voI. XXXII, págs. 75-83. Lisboa.

60

TEIXEIRA, C. (1953) - Notas sobre a Geologia de Portugal. O Sistema Câmbrico - Lisboa.

TEIXEIRA, C. (1954) -Notas sobre a Geologia de Portugal. O sistema Devónico - Lisboa.

TEIXEIRA, C. (1959) - L'evolution du territoire portugais pendant les temps antemésozoiques - BoI. Soco Geol. P01'tugal, val. XIII,

págs. 229-285. Lisboa.

Centro de Estudos de Geologia da Faculdade de Ciências de Lisboa (Fundação do Instituto de Alta Cultura).

C. ROi\[ARJZ - Rochas da região de Moura-Barrancos

Fig. 1 - Oevónico de Barrancos. Aspecto geral do grauvaque com vegetais da estrada de Amareleja a Barrancos. NIC. +, 20 X •

EST. I

Fig. 2 - Pormenor da preparação anterior, mostrando microclastos quártzicos, qua rt ziticos e feldspáticos englobados por matriz filito-argilosa. NIC. +, 80 X •

C. RmlARIZ - Rochas da região de Moura-Barrancos EST. II

Fig. 1 - Conglomerado do v. g. de Gata. Barrancos. Clasto quartzít ico rodeado por matriz quártzica. NIC. +, 20 x .

Fig. 2 - Idem. Aspecto geral, evidenciando a matriz quárt zica e o cimento filito-silicioso . NIC, +, 20 x •

C. Ro:-rAR 1Z - Rocltas da regido j];foura-Barrallcos EST. JI[

Fig. 1 - Xisto cloritico-sericítico da serra da Preguiça , Moura. Podl roblastos de quartzo com inclusões de grânulos metálicos. Lu z nat., 20 x •

Fig. 2 - Idem. Po rmenor dum po rfiroblasto quártzico. Lu z nat., 80 x .

C. ROMARI Z - Roclzl1s da r f'giâo de 11fou r a-Barrallcos EST. I V

Fig. 1 - Arcose de O.' Catarina, se rra da Preguiça, Moura. Aspecto geral, evidenciando-se quartzo com extinção rolante e feldspato. NIC. +, 20 x .

Fig . 2 - Idem. Arcose tectonizada com epídoto em agregados rad iais. NIC. +, 80 x .

C. [? O ~{A1UZ - Rochas da 1'f'giào de Moura-Barrancos EST. V

Fig. l-Mármore de O.' Catarina, ser ra da Preguiça, Moura. Textura isogranular

de grão médio. NIC. + I 20 X •

Fig . 2 - Calcarenito pseudo-oolític0 da Serra da PI eguiça, Moura . Zona recristali zada em relação com restos orgâniccs. NIC. +, 20 x .

C. RO~[ f\](IZ - Rochas da rrgúlJ de Jlfou ra-Banallcos EST. \"l

Fig. 1 - Calcário dolomítico chertificado da serra da Preguiça, Moura .

NIC.+,20 x .

Fig. 2 - Dolomito calcarífcro da serra da Preguiça , Moura. Zo na com sericite

fl uidal e chertificação. NIC. +, 80 X ,

C. HOMA RIZ - Rochas da região de Moura-Bana71cos EsT. VII

Fig. 1 - Mármore de Cabeço de Vide. Carbonato g ranular com tendência a suturado; breve cherti fi cação. NIC, +, 20 x .

Fig. 2 - Mármore de Abrantes . Carbonato g ranular sutu rado; Ch ~rtificação

intensa. NIC . +, 20 X .