mulheres sem fronteira

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CLAUDIA | Setembro 2011 2 Tendência curiosidade está no nosso DNA: gostamos de observar, conversar, tocar, questionar. Faze- mos isso na cadeira da manicure ou em um café em Paris. Um time cada vez maior de mulheres vem transformando essa vontade de explorar novos caminhos em ferramenta de autoconhecimento e crescimento pessoal. “Elas passam a olhar as pessoas com maior interesse, quase como se fossem objeto de um estudo etnográfico”, explica Cynthia de Almeida, consul- tora do Movimento Habla (habla.abril.com.br), área do Grupo Abril que mapeia o comportamento feminino e aponta tendências. “Por isso, as definimos como etno- women.” Pense, por exemplo, em alguém que, numa via- gem, prefere dividir a mesa com uma família nativa a provar pratos feitos por chefs renomados. Que vê um ho- A mem correndo na rua e se pergunta por que ele se atra- sou. Estaria fugindo? Teria alguém à espera dele? Seria feliz? O comportamento passa longe da bisbilhotice: essa observação pode se transformar numa vivência enrique- cedora, daquelas que chegam a mudar a visão de mundo. Antes, o simples fato de pegar um avião ou estar do outro lado do planeta era uma conquista. Agora, quere- mos descobrir quem são e como vivem os moradores. A grande aventura é entender o outro. “Há algum tempo tenho observado uma ideologia entrando disfarçadamen- te na nossa vida: a crença de que tudo pode ser conse- guido e tudo pode ser alterado, adaptado”, diz a sociólo- ga Celia Belem. É uma vontade de customizar o bombar- deio de informações e desenvolver um olhar muito parti- cular. Como fazem estas três etnowomen inspiradoras. Mulheres sem fro n teır as No mundo globalizado, em que a informação é livre, gratuita e abundante, queremos customizar nosso olhar, gerar nossas notícias – e não simplesmente comprar o que nos empurram. Se você também se sente assim, bem-vinda à turma das etnowomen M arcia K edouK /c olaborou i sabella d’e rcole A cineasta Vera Egito faz seus registros em Ibiza Foto Ilana Lichtenstein

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CLAUDIA - 09 - 11

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Page 1: Mulheres sem fronteira

CLAU DIA | Setembro 20112

Tendência

curiosidade está no nosso DNA: gostamos de observar, conversar, tocar, questionar. Faze-mos isso na cadeira da manicure ou em um café em Paris. Um time cada vez maior de

mulheres vem transformando essa vontade de explorar novos caminhos em ferramenta de autoconhecimento e crescimento pessoal. “Elas passam a olhar as pessoas com maior interesse, quase como se fossem objeto de um estudo etnográfico”, explica Cynthia de Almeida, consul-tora do Movimento Habla (habla.abril.com.br), área do Grupo Abril que mapeia o comportamento feminino e aponta tendências. “Por isso, as definimos como etno-women.” Pense, por exemplo, em alguém que, numa via-gem, prefere dividir a mesa com uma família nativa a provar pratos feitos por chefs renomados. Que vê um ho-

A mem correndo na rua e se pergunta por que ele se atra-sou. Estaria fugindo? Teria alguém à espera dele? Seria feliz? O comportamento passa longe da bisbilhotice: essa observação pode se transformar numa vivência enrique-cedora, daquelas que chegam a mudar a visão de mundo.

Antes, o simples fato de pegar um avião ou estar do outro lado do planeta era uma conquista. Agora, quere-mos descobrir quem são e como vivem os moradores. A grande aventura é entender o outro. “Há algum tempo tenho observado uma ideologia entrando disfarçadamen-te na nossa vida: a crença de que tudo pode ser conse-guido e tudo pode ser alterado, adaptado”, diz a sociólo-ga Celia Belem. É uma vontade de customizar o bombar-deio de informações e desenvolver um olhar muito parti-cular. Como fazem estas três etnowomen inspiradoras.

Mulheressem fro n teır as

No mundo globalizado, em que a informação é livre, gratuita e abundante, queremos customizar nosso olhar, gerar nossas notícias – e não simplesmente comprar o que nos empurram. Se você também se sente assim, bem-vinda à turma das etnowomen M a r c i a K e d o u K /c o l a b o r o u i s a b e l l a d’e r c o l e

A cineasta Vera Egito faz seus registros em Ibiza

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Eu preciso andar, viver a cidade, criar uma relação íntima com ela, ver as pessoas

Vera esteve em Portland (1, 3 e 5) e Havana (2 e 4)

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CLAU DIA | Setembro 20114

Em 2003, fiz um curso de roteiro em Cuba, na cidade de San Antonio de los Baños. Passava a semana no

alojamento e, aos sábados e domingos, fi-cava hospedada em Havana, a capital, na casa de um escritor amigo do meu namo-rado. As moradias são do governo e não podem ser reformadas – as mudanças são feitas ilegalmente. Por isso, é comum en-contrar fachadas sujas contrastando com interiores bonitos, coisas que as câmeras dos turistas apressados não captam. Os moradores oferecem outra visão da cida-de. E com essa experiência você aprende a ter também um olhar diferente do lugar onde vive. Por exemplo, tem gente que nasceu em São Paulo e não anda a pé, não conhece o jornaleiro da banca do lado de casa. Eu preciso andar, viver a cidade, criar uma relação íntima com ela. Gosto de ir a parques onde mães levam crianças. Minha viagem mais recente foi para Portland, nos Estados Unidos. Antes, fiz contato com fotógrafos e músicos da região pela inter-net. Lá, saí com eles, fui a bares, acompa-nhei sessões de fotos. A graça do mundo são as pessoas. Uma vez, percorri o trajeto entre Pernambuco e Rio Grande do Norte de carro. Em algum lugar da Paraíba, no meio da estrada, parei para comprar frutas exóticas em uma barraquinha. Pedi ao ven-dedor para me explicar o sabor de cada uma. Elas eram tão diferentes! Uma hora ele levantou um abacaxi e já ia falar sobre a fruta. Dei risada e disse que aquela eu já tinha experimentado. A resposta: “Como eu ia saber? Você não conhece nada!” Ver-dade. O que ele comia desde criança era completamente desconhecido para mim.V e r a e g i to , 29 a n o s , c i n e a sta

Visão que alcança além do óbvio

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Não fui à Torre Eiffel, não escrevi um livro. Em vez disso, enchi um diário com percepções

Paris (1, 3 e 4), Nova York (2) e Texas (5) foram alguns dos destinos explorados por Helena

Lugares que não estão nos guiasGosto de tomar café em uma padaria e deixar os pensamentos fluírem en-quanto observo o que acontece ao re-

dor. Caminho pelas ruas até cansar ou até encontrar um lugar para visitar. Evito pegar metrô, porque o bacana é justamente ver a paisagem. Em 2010, fui a Nova York e pas-sei a maior parte do tempo nas escadarias dos prédios olhando quem andava por ali. Fiquei hospedada na casa de um engenhei-ro que encontrei pelo Airbnb (airbnb.com), site para alugar quartos ou apartamentos pelo mundo. O proprietário só recebe o di-nheiro quando a estada terminar e se a sua avaliação for positiva. Além disso, paguei muito barato, aproximadamente 75 dólares por noite. Outra coisa que vale a pena é sair sozinha. Em bares, muitas pessoas vi-nham conversar. Se eu me fechasse, teria perdido experiências ótimas. Como a que aconteceu em Paris: um francês superdi-vertido quis me apresentar o bairro dele, Marais, e me levou até a sorveteria de lá. Os lugares que conheci não estão nos guias e, talvez por isso, sejam tão encantadores. Em situações assim, me liberto do peso de ser turista e por um tempo vivo como se pertencesse àquele lugar. Não fui à Torre Eiffel nem escrevi um livro para os outros entenderem como é a cidade em que esti-ve. Em vez disso, enchi um diário com percepções. Porque a experiência é minha, é única. Viajar não deve ter um objetivo, mas várias consequências.H e l e n a s a s s e r o n , 28 a n o s , p u b l i c i tá r i a

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CLAU DIA | Setembro 20116

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Experiência que muda tudo

Eu me sentava em praças ou bares e observava a vida tão diferente que cada pessoa levava

A beleza dos outrosA vontade de transformar o mundo em fonte de descobertas tem levado a novas formas de viajar e se relacionar

Moda de ruaPessoas comuns e cheias de estilo inspiram outras a reinventar o jeito de se vestir. Vale a pena ver: modaspot.abril.com.br, gotryiton.com, thesartorialist.com.

Imersão socioculturalDá para comer na casa de moradores, alugar um sofá na sala dos outros, praticar um hobby enquanto viaja... Vale a pena ver: latitudes.com.br, livemyfood.com, couchsurfing.com.

Viagens personalizadasAgências especializadas em viagens para mulheres formam grupos com interesses em comum. Vale a pena ver: mulherespelomundo.com.br, women-traveling.com, madamevoyage.com

O plano inicial era uma viagem com o meu namorado para Buenos Aires, em 2009. Mas brigamos e eu tomei a

melhor decisão: a de ir sozinha. Não fiz roteiros e acabei conhecendo poucos lu-gares históricos. Eu passeava pela cidade, me sentava em praças ou bares e observa-va as pessoas, a vida tão diferente que ca-da uma delas levava. Ando sempre com um caderno para fazer anotações sobre o que vejo, sinto, penso. Não me inspiro em cartões-postais para escolher os destinos. Minha viagem à capital francesa, por exemplo, aconteceu depois que li Um Li-vro por Dia – Minha Temporada Parisien-se (Casa da Palavra), em que o jornalista Jeremy Mercer conta a história real do tempo em que morou em uma livraria com outras pessoas. O pagamento era a leitura de um livro por dia, além de ajudar em tarefas para a manutenção e limpeza do local. Achei incrível e quis visitar. Na Fran-ça, eu acordava sem horário para sair, pes-quisava as regiões que gostaria de explorar, via se existia um ônibus que me levasse até lá ou tentava alugar uma bicicleta. Simples? Pode ser. Mas sempre volto dessas expe-riências feliz por ter me afastado da rotina e mergulhado, mesmo que por pouco tempo, em um novo estilo de vida.M a r i a n a r e z e n d e , 28 a n o s , e s c r i to r a

Uma viagem a BuenosAires (1 e 2) foi inspiradora para Mariana

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Tendência

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