motivacao na instrucao: comparação entre um enfoque...

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PuB LI CADO NA REV IS TA "TE CNO LOJIA E!lUCAC IONAl", EDITADA P ELA ASS OC IAC ÃO BRAS IL EI RA DE T ECflKJlOG IA EooCACIONAL, Arv XI L 50, DE 138 3. MOTIVACAO NA INSTRUCAO: - - Comparação entre um enfoque comportamental e um cognitivo. Jai ro Eduardo Bo rges- Andrade- A mot ivação. wmo tema A mot ivação. para o plane· em Psicologia. t em sido muito jador do ensino. é de grarde imo t em po ex tensame n te estudada. . . portância prática. pois constitui Muitú tem sido escrito a respeito o primeiro fenômeno numa se· do tópico. tanto no contexto das qüê ncia temporal que poce com· teori as da persona lidade quanto prometer. às vezes irr eversive l· no da aprendizagem. Nestes co men te. os resultados de um pro· 1 ex tos; a preocupação dos auto· grama instrucional. Contudo. a res é a de cons truir O conhecimen· área denominada por Gagné e to a respeito de mot ivação. orga· Rohwer (1969) e por Glaser nizando·o em mode los teóricos. (1978) de "Psicologia I nstru· Nesses model os , é ind icada e des· cional" carece de est udos volta· crita a terminologia a ser usada dos espec if icamente para o pro· e são es pecificadas as relações su o blema da motivação na instrução. postamente existentes entre os Nesse contexto, a preocupação t ermos definid os. A intenção do planejador seria a de acumu· destes modelos teóricos é a de lar conhecimento sobre motiva· oferecer uma ampla exp licação ção. seja ele advi ndo de teor ias do fenômeno da mot ivação. A da ap rendizagem ou da área ins· pesquisa desenvolvida em torno trucional. organizando·o em mo· des tes mode los va lor iza a com· de l os. Esses modelos, ou conjun· pr ovação cien tífi ca dos construo tos de procedimen t os congruen· t os e rel ações propostos e/ou a tes o devem indicar oIs) modo(s) sua vinculação com dados em· que o planejador pode usar para pír icos. manipular eventos que ativem ou determinem. no presente caso . a fase de aprendizagem denomina· da mo t ivaç ão. (Gagné. 1 979 e Borges·Andrade. 1982al. Portan· to, a natureza desses modelos (ass im como a de todos os outros de planejamento instrucional) é pres cr it iva e seus propósitos são fina listas. O seu teste empirico é r ea lizado à medida em que se r ea· lizam a,val iações de .pr ogra mas instrucionais nos ' quais eles são usados. Como não poderia deixar de ser. o princi pa l critério utili· zado para sua comprovação cien· tif ica é o da efetividade. indi ca· da pe lo alcance dos objetivos ins· t rucionais propostos. Considerando a necessi dade de con st ruir modelos de mot iva· ção na instrução, o pr esen te tr balho se propõe ana li sar e ·co mpa· rar dois enf oques teór i cos ares· peito de motivação: um com potamental e um cog ni ti vo. A preo· • Ph. D. em Sistemas Instrucionais - 1979 - Florida State Univers it y - Tallahassee. E.U.A.; Pesquisador do Departament o de Re- cursos Humanos da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - EMBRA PA .. 31

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AR'f ~GO PuBLI CADO NA REV ISTA "TECNOLOJIA E!lUCAC IONAl", EDITADA PELA ASSOC IACÃO BRAS ILEI RA

DE TECflKJlOG IA EooCACIONAL, Arv XI L Nº 50, JAf\JEI ~O/FEVERE I RO DE 1383.

MOTIVACAO NA INSTRUCAO: - -Comparação entre um

enfoque comportamental e um cognitivo.

Jairo Eduardo Borges-Andrade-

A mot ivação. wmo tema A mot ivação. para o plane· em Psicologia. tem sido há muito jador do ensino. é de grarde imo tempo ex tensamente estudada. . . portância prática. pois constitui Muitú tem sido escrito a respeito o primeiro fenômeno numa se· do t ópico. tanto no contexto das qüência temporal que poce com· teorias da persona lidade quanto prometer. às vezes irreversive l· no da aprendizagem. Nestes con· men te. os resultados de um pro· 1ex tos; a preocupação dos auto· grama instrucional. Contudo. a res é a de construir O conhecimen· área denominada por Gagné e to a respeito de mot ivação. orga· Rohwer (1969) e por Glaser nizando·o em mode los teóricos. (1978) de "Psicologia I nstru· Nesses modelos, é ind icada e des· cional" carece de est udos volta· crita a term inologia a ser usada dos especif icamente para o pro· e são especificadas as relações suo b lema da motivação na instrução. postamente existentes entre os Nesse contexto, a preocupação termos def inidos. A intenção do planejador seria a de acumu · destes modelos teóricos é a de lar conhecimento sobre motiva· oferecer uma ampla exp licação ção. seja ele advindo de teor ias do fenômeno da mot ivação. A da aprendizagem ou da área ins· pesquisa desenvolvida em torno trucional. organizando·o em mo· destes modelos va loriza a com· delos. Esses modelos, ou conjun· provação cien tífi ca dos construo tos de procedimen tos congruen· tos e rel ações propostos e/ou a tes o devem indicar oIs) modo(s) sua vinculação com dados em· que o planejador pode usar para p ír icos. manipu lar eventos que ativem ou

determinem. no presente caso . a fase de aprendizagem denomina· da mot ivação. (Gagné. 1979 e Borges·Andrade. 1982al. Portan· to, a natureza desses modelos (assim como a de todos os outros de planejamento instruciona l) é prescr it iva e seus propósitos são f ina listas. O seu teste empirico é rea l izado à medida em que se rea· lizam a,val iações de .programas inst rucionais nos' quais eles são usados. Como não poderia deixar de ser. o principa l cr itér io utili· zado para sua comprovação cien· tif ica é o da efetividade. ind ica· da pe lo alcance dos objeti vos ins· t rucionais propostos.

Considerando a necessidade de const ruir modelos de mot iva· ção na instrução, o presen te tra· balho se propõe analisar e ·compa· rar dois enf oques teór icos a res· peito de motivação : um compor· tamental e um cog ni tivo. A preo·

• Ph. D. em S istemas Instrucionais - 1979 - Florida State Universit y - Tallahassee. E.U.A.; Pesquisador do Departamento de Re­cursos Humanos da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - EMBRA PA ..

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cupação aqUI será a de extrair deles informações úteis para se­rem detalhadamente indicadél!> as condições a serem manipLlarl;is, visando ativar a fase de motiva­ção da aprendizagem_ Em cada um dos dois enfoques, serão le­vantadas questões sobre cinco as­pectos relevant es para a constru­ção de modelos prescr it ivos de motivação na instrução:

a) qual o papel teór ico da mot ivação na aprend iza­gem;

b) porque ela funcio na (den­tro do contexto teór ico específico) ;

c) como as d iferenças indi­viduais da clientela são le­va das em consideração, dent ro da proposta teó ri­ca de mot ivação;

d ) como ela pode ser usada para os diferentes tipos de resultados da aprend i­zagem , e

e) como ela pode ser prog ra­mada_

Depois que as posições teó­ricas forem apresentadas e com­paradas, serão mostradas suas pos­síveis aplicações prát icas_ Isso se­rá feit o, apresentando-se seis si­tuações hipotéti cas de ensino em que se descreverão seus objetivos instrucionais, a.i suas supostas cl ientelas, e os :nodos como po­deriam ser at ivadas as suas fases de mot ivação da aprend izagem.

Enfoques Teóricos

Tendo em vista as d i feren­ças que possam exist ir entre vá­rios au tores, decid iu-se esco lher alguns cuj as proposições pudes­sem ser aceitas por uma parcela razoável dos teóricos em cada en­foque. Devido ao volume de tra­balhos pu blicados e/ou à quanti­dade de citações que lhes tem si­do fei tas, foram consideradas aqui , para fins de aná lise e com­paração, as propostas de B. F.

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Skinner (enfoque comportamen­tal) e W.K. Estes e D.F. Ausubel (enfoque cognitivo).

O autor do presente traba­lho está cônscio das discrepâncias e controvérsias existentés entre os pressupostos e idéias desenvol­vidos por aqueles três teóricos, bem como das dúvidas levantadas a respei to dos paradigmas que eles propõem. Contudo, ele acre­dita que, em paralelo às discussões teór icas vi sando a revisão e cons­trução do conhecimento científi­co, devam ser desenvolvidos mo­delos prescritivos e finalistas, que usem o conhecimento existente no desenvolvimento de uma tec'­nologia instrucional. Essa, por sua vez, deve ser modificada à medida que ocorrerem revi sões

. do conheci men to ou que as ava­liações sucessivas demonstrarem a necessidade de mudanças.

A segu ir, serão interpretadas as propostas daqueles -"três auto­res, referentes a cada um dos cin­co aspectos aci ma I istados. Nos casos em que as posições dos au­tores não est iverem claramente ex postas, elas serão omitidas. Tendo em vi sta a intenção prag­mática do presente trabalho, o autor se limitará a extrair possí­veis prescrições, sem emitir sua opinião, nem tecer críticas sobre as propostas teóricas apre;enta­das' .

Papel da Motivação

Ausubel (1968) considera a mot ivação um fato significante, mas que não é indispensável para a aprendizagem. Os componentes do processo cognitivo seriam so­mente: reconci I iação integrat iva, subordinação, assimilação e con­solidação. E les dependeriam dire­tamente de variáveis, tais como : materiais instrucionais potencial­mente significativos (i .e. : que te­nham signif icado para o aprendiz)

diferenciação. progressiva; organi­zadores avançádos e comparativos e estruturas cognitivas claras, es­táveis e organizadas. As variáveis mot ivaciona is não estar iam d ire­tamente envolvidqs com o pro­cesso cognitivo supostamente res­ponsável pela aprend izagem_

Skinner (1972) releva a mo· tivação, definida como valor do reforçado r, à condição de "cha­ve" da aprendizagem. O paradig­ma básico para expl icar a apren­dizagem seria o do condiciona­mento operante : a aprendizagem ocorre quando uma resposta de pouca força é sistema t icamente seguida de 'um reforçador e tem sua força aumentada. O fenôme­no mais importante na aprendi ­zagem é supostamente o processo de reforçamento da resposta. Es­se processo depender ia do va lor reforçador (motivação) da conse­qüência que segue sist ematica­mente a resp osta .

Por~ue a Motivação Funciona

Deacordo comAusubel (ib.l, a motivação aceleraria o processo cognitivo, intensif icando o esfor­ço, a atenção e a prontidão. En­tretanto, ela não seria um reagen­te, mas um catalisador no proces­so cognitivo que levar ia à apren-dizpgem_ .

Skinner (ib.) não explica porque um reforçador fortalece a respost3 que o precede, produzin­do aprend izagem . De acordo com ele, <) único fator relevante é que o comportamento pode ser mod i­ficado (i _e.: aprendizagem) como resultado de um arranjo de conti-

1 Motivação é definida como um processo cognitivo em que são desenvolvidas ex­pectativas sobre o desempenho a ser aprendido, as Quais podem ser determi­nadas pela antecipaç~o 5imoolica da re­compensa e/ou por retroalimentação in­formativa proporcionada por recompen­sas recebidas ou vicariantes (Borges-An­drade; 198~-al.

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gências de reforça men ta . I r além disso, ser ia inútil.

Estes (19721 iden t if ica duas funções dos eventos reforçadores : como recompensas que sat isfa ­zem mot ivos e como in forma­ções sobre as ações que podem le­var a recompensas no futuro. Estes (ib.1 sugere que a função informadora do even to reforça­dor é essencia l para tornar possi­ve l a aprendizagem (i .e. : mudan­ça na força da resposta I.

Diferenças Individuais e a Motivação

Ausubel (ib.1 afirma que, na aprendizagem, a importância da motivação é reduzida com a ida­de. Cr ia nças jovens necessitariam de recompensas e puniçõ8s numa extensão maior que crianças mais velhas. Com aprendizes mais ido­sos, os fatores cog n i~ivos seriam suficientes para a ocorrência da aprend izagem. Na civiJ:zação oci­dental, os impu :sos de "enalteci­mento do ego" (relacionados com rea l ização como fonte de posição socia ll ser iam os fatores motivacionais dom inantes em adolescentes e adultos. Impu lsos de adoção (re lacionados com rea­li zação como fonte de posição sociall seriam os falores motiva­ciona is dominan tes em adolescen­tes e ad ul tos. Impulsos de ado­ção (relacionados com reali zação como fonte de aprovação de pes­soas superiores) seriam proemi­nentes na infância.

Um dos pressupostos bási­cos propostos por Skinner ( ibl é o de que os reforçadores secundá­ri os (naturais ou sociaisl va riam de individuo para indiv íduo. Ele afi rma também que a ún ica ma· neira, de se cer tificar se um dado evento é um reforçado r, ser ia a observação dos seus efeitos so· bre a probabilidade de ocorrên­cia das respostas que ele segue. Contudo, a motivação se ria sem-

pre uma condição necessária pa ra a aprendizagem, independente­mente de aspectos culturais ou de idade. A experiência tem de­monstrado que reforçadores pri­mários (ligados a fatores de so­brev ivêncial são geralmente mais eficazes com crianças pequenas. E ntreta nto, sugestões são feitas para usá-los simL!'~~n~amente

com eventos naturais, visando cria r reforçadores secundários· que estar iam presentes na so­ciedade onde aquelas cria nças vi ­veriam no futuro.

Categorias de Aprendizagem e Motivação

Segundo Ausubel (ib.1. a motivação é mais indispensáve l para a aprendizagem de rot inas, para a instrumental, e para a re­SO lução de problemas e mais dis­pensável pa ra a aprendizagem significativa . Na aprendizagem de sala de au las, o impulso cog­nitivo (desejo de conhecimen­to I ser ia a mot ivação ma is im­portante' sendo intr ínseco à aquisição de aprendizagem sig­nifica tiva. Assim, o seu uso ex­tr ínseco deliberado seria redun­dância. A retroa limentação in­f ormativa (i .e.: informar o apren­diz sobre o sucesso de sua açãol ser ia uma importante motiva­ção para as aprend izagens sig nificat ivas por descoberta e por recepção. Pun ições e recompen­sas, que são fa tores motivacio­nais supostamente relacionados à redução de impulsos, ser iam importantes somente para as aprendizagens instrumental e de rot inas.

Para Skinner (ib .1. qual­quer evento que segue uma resposta e aumenta sua proba­bi lidade de ocorrên Cia pode ser usado para produzir apren­dizagem. Eventos reforçadores são considerados fatores moti­vac iona is fundamentais para to-

. dos os tipos de aprendizagens, dentro do dom ínio de compor­tamentos operantes. Reforçado­res naturais deveriam ter priori­dade sobre os artificiais. Os re­forçadores sociais são altamente re·comendados para ambientes de sala de aula. Skinner (ib.1. tanto quanto Estes (ib.I , desen­coraja o uso de punição em si­tuações instrucionais.

Estes (ib.1 entra em deta­lhes a respei to dos reforçadores específicos a serem usados na instrução e dá ênfase ao fato de que eles devem fornecer retro­alimentação informativa aoapren­diz. E le também indica que a an­tecipação do reforçador (i.e. : in­formar ao aprendiz sobre o valor do evento reforçado r!. a ser pro­vido ao aprend iz, aumenta a ta xa de resposta à ta refa. Ass im, a cr iação de expectat ivas a Icançã­veis poderia aumentar a ação das recompensas. Estes (ib .1 contu­do, especifica abordagens diferen­cia is para o ensi no de tarefas com dist intos níveis de complexidade. Para ·tarefas com plexas, em situa­ções altamente est ruturadas, a função informat iva dos . reforça­dores deveria ser bastante ex­plorada. Ao co ntrário, para hábi ­tos si mples em si tuações restriti­vas, estas características in forma­tivas não seriam importantes, desde ,que o evento fosse capaz de aumentar a f orça das respostas que o precedessem (i .e.· desde que ele fosse um reforçador!.

Planejamento da Motivação

A motivação é vista por Au­subel (ib.1 como um produto da aprendizagem : é enfat izada uma relação de reciprocidade entre mot ivação e aprendizagem. O pro­fessor deveria inicialmente igno­rar o estado motivacional do aprendiz e instruí-lo da manei ra mais efetiva possive l. Alguma aprendizagem sempre ocúrrer ia

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e aumentaria a motivação para aprender mais. Assim , a mot iva· ção aconteceria quando um em­preendimento fosse atingic'o CI)m êx ito. No caso de aprendizagem com signif icado, que ocorresse a longo prazo, o estudante deveria sentir a necess idade do conteú do da disciplina, mas não de tópicos específ icos.

Ao contrário da proposta descrit a acima, Skinner (ib .) advo­ga que o instrutor deveria propo­sitadamente programar situações nas qua is o reforçador esta ria contingente à resposta. Durante a fase de aquisição do desempenho, cada resposta deveria se r seguida de um reforçador. Nesta fase , as formas de resposta que se des­viassem daquele desempenho se­riam postas sob ex tinção. A ins­trução deveria ini ciar-se com pe­quenos passos, que seriam gra­dualmen te aumentados à medida que o desempenho fosse fortale­cido. Depois desta fa5<3, se ria uti ­l izado reforçamento intermiten­te, visando manter o desempenho. Skinner (ib.) ainda enfatiza que o reforcador dever ia ser cont ingen­te à resposta.

Estes (ib.) por outro lado, não considera a contingência en­tre reposta E: reforço como uma condição necossár ia para obter aprendizagem com seres huma­nos. Como já fo i explicado an­teriormente, a condição que é considerada muito importante (em substituição à da cont ingen­te) é que os reforçadores tenham valor in format ivo para o apren­diz.

Algumas Possíveis Apl icações Prá t icas

Na primeira parte do presen­te trabalho, descreveram-se algu­mas proposições teóricas a respei­to da mot ivação na instrução, no que se refere ao seu papel e fun­ção teóricos, seus usos para di-

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ferentes categor ias de aprendiza­gem, tipos de ind ivíduos, e para o planejamento de ensino.

Nesta segunda parte, o au­tor procurará demonstrar como aqueles enfoques teóricos des­critos poderiam se aplicar a uma gra nde variedade de situações de ensino: pré-escolar; de 10 grau; de 20 grau; profissionalizante; universitário; comuni tário e em organizações. Para realizar este propósito, serão definidos seis objetivos instrucionais hipotéti­cos e descritas algumas alterna­tivas de clientelas que suposta­mente poder iam alcançar esses objetivos. Para cada um destes seis- casos, serão prescr itos even­tos que obedeceria m às proposi ­ções teóricas descrit as acima.

As possíveis aplicações de va riáveis motivacionais, segundo Ausubel, Sk inner e Estes, res­pect ivamente, estão apresenta­das abaixo.

Objet ivo I nstrucional : Def ini r as ca tegor ias de aprendizagem de Gagné. População Alvo : estudantes uni ­versitários de psiCOlogia e/ou edu­cação; ou

- profissionais de trei na­mento , com curso superior com­pleto; ou

- ·professores a qua lquer ní­vel, com curso superior comple­to .

PR ESCR IÇÃO 1 (Segundo Au­subel; ib.) - Não seria necessá­r io programar recompensas ex­trínsecas para esta tarefa. A aqui­sição do conhecimen to com sig­nificado seria provave lmente uma motivação suf icien te. Essa aqúisi­ção dever ia se real izar através da ut ilização de: a) orga ni zado res ava nçados (mater ia is introdu tó­rios relevantes, inclusivos, claros e estáveis, que são apresentados antes do material inst ruci onal e a níveis mais elevadsos de abstra­ção, gMeralidade e abrangência)

e b) diferenciação progress iva (uso seqüênciá l de uma série hie­rárqui ca de organi zadores, numa ordem decrescente de abrangên­cia, programando o conteúdo da discipl ina de modo que as idéias mais gerais e abrangentes apareçam primeiro e se jam pro­gressivamente detalhadas e especificadas). Sendo o objet ivo parte de um curso maior, deveria ser enfat izada a importância da área de conteúdo geral para as atividades específicas da cliente la (estudantes universitários; ou profissionais de treinamento; ou professores) .

PR ESCRiÇÃO 2 (Segundo Skin­ner ; ib.) - Ser ia programada a ocorrência de eventos reforçado­res depois de cada definição cor­reta. Esses poder iam ser parte da nota (pontos), ou palavras ta is como "correto" ou "boa defini­ção", ou uma afirmativa que in­di casse a resposta correta.

PR ESCR IÇÃO 3 (Segundo Es­tes; ib.) - Tendo em vista o que está descrito na prescri ção ante­r ior, ser iam ut ilizados reforçado­res que garantissem a confir­mação de expectativas previa­mente estabeleci das. Se os apren­dizes forem in icialmente infor­mados da importância de definir cat.egorias de aprefl dizagem, o re­forçador pOderia ser uma afirma­t iva refer indo-se ao acerto ou erro da resposta, em relação ao que 0S aprendizes deveriam rea­lizar.

Objetivo Instrucional: Usar corre­tamente o papel higiênico. :l. Popula ção A lvo : Crianças entre e e 3 anos de idade.

PRESCRiÇÃO 1 - Ausebe l (ib l não tem uma teoria ex tensa e in ­clusiva que faça propostas espe­cíficas a respei to da mot ivação para este t ipo de resultado da aprendizagem. Neste caso, ele

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provavelmente concordar ia com as variáveis motivacionais sugeri­das nas duas prescrições que se seguem, já que elas se ajustam ao seu modelo de recompensas/pu­nições e de impulsos afiliativos, para a mot ivação destes tipos de aprendizagem e para uma clien­tela como a que está de fin ida acima.

PRESCRiÇÃO 2 - Inicia lmente seria m programadas pequenas contingências para o reforçamen­to de respostas próximas da for­ma correta final esperada. Então, haveria um aumento gradual das exigências {critér ios) para serem entregues os reforçadores. Esses poderiam ser fichas, doces, pon­tos, palavras tais como "muito bem", sorr isos, atenção e:< tra , ou horas ex tra de lazer (Sk inner; ib .!.

PR ESCRiÇÃO 3 - De acordo com o que está descr ;to na pres­crição anterior, os su jeitos pode­riam ter seus reforçadores ante­cipados verbalmente, sendo in­f ormados do tipo de conseqüên­cias que eles receberiam por rea lizar a tarefa corretamente. Contudo, essa retroalimentação informativa, segundo Estes (ib.l. não é essencial , pois o resultado de aprendizagem descrito pelo objet ivo inst rucional é uma tare­fa bem simples.

Objetivo Instrucional : Identificar elemen tos químicos e suas carac­terísticas, a partir de uma tabela periódica de elementos. População alvo: estudantes de 29 grau; ou

- laboratoristas; ou - estudantes de cursos pro-

f issionalizantes.

PRESCRiÇÃO 1 - Tendo em vista que esta seria uma aprendi ­zagem significante (segundo a classificação de Ausubel; ib.), de­ve·se supor que sua aquisição efi-

caz seria motivação suficiente (sat isfação de impulsos cogni ti ­vos intrínsecos!. Assim, não de' veriam ser programadas variáveis motivacionais ex trlnsecas (variá­veis de insumo tais com o organi­zado res avançados, diferenCiação progressiva e est rutura cognitiva estável não são consideradas mo­t ivacionais) . Entretan'') no iní­cio do curso de qu ímica, ao qual pertence o objetivo acima, o es­tudante (ou aprendiz) seria in for­mado da necess idade especifica, de con heci mento na área, que ele teria .

PR ESCR IÇÃO 2 - O reforça­dor deveria inicialmente seguir cada ident ificação correta de ele­mentos. Gradualmente, o pla­nejador aumentaria o número de identificações corretas neces­sárias para receber o evento re­frçador. Depois da aquisição, um número va riável de identi­fi cações corretas seria reforça­do. Os eventos ref orçadores a se­rem usados poderiam ser a res­posta correta, a palavra "certo", ou partes de uma nota (pontos!.

PRESCRiÇÃO 3 - Somando-se à prescrição acima , a antecipa­ção verbal do evento reforçado r poderia aumentar a velocidade de identi ficaçÕes sucessivas de ele­mentos qu ,micos e suas caracte­rísticas. Os t ipos de reforçadores descri tos acima seriam provave l­men te su fi cientes para prover a retroalimentação informativa.

Objetivo Instrucional : Fornecer os nomes das capita is de pelo menos 20 uni dades da federação. População Alvo: estudantes de 19 grau (9- 11 anos de idade ).

PRESCRiÇÃO 1 - Dado o tipo de resultado de aprendizagem do obje tivo, seria necessário usar mais do que impulsos cognitivos i ntr ínsecos. Considerando especi­f icame<) te as caracter íst icas da

popu lação alvo, variáveis mot iva­cionais tais como a aprovação do grupo social (relacionada a im­pulsos afiliativos) e outras recom­pensas extrínsecas poderiam ser prescritas. A ssi m, Ausubel (ib.l. neste caso, usar ia even tos refor­çadores ta l como Skinner (ib.) e Estes (ib.) (Ver as duas pres-

. crições abaixo).

PR ESC R IÇÃO 2 Reforça r ca­da nome de capital declinado corretamente (em relação a cada unidade da federação dada!. Os ref orçadores poderia m ser notas', fi chas, palavras tais como "muito bem" ou pontos num jogo com­petitivo em sala de aula.

PRESCR iÇÃO 3 - Consideran­do a prescri ção anterior, a anteci­pação verbal dos pontos ou notas ou fi chas poderia aumentar a ta­xa de respostas corretas. A sua posterior confirmação forneceria retroalimentação informat iva. De acordo com Estes (ib.), não é ne­cessár io fornecer aos aprendizes reforçadores contingentes a cada resposta correta, desde que exis­tam dei xas informativas .que an­teci pem (e acumulem) os pontos, notas ou fichas. Os nomes das capitais deveriam ocorrer repe­tidamente e ser reforçados.

Objetivo Instrucional : Semear em vasos ' População Alvo: estudantes (15 a 18 anos de idade) de cursos pro­fissionalizantes ou de cursos de ex tensão rural.

PRESCRiÇÃO 1 - Deveriam ser usadas variáveis mot ivaciona is ex­trínsecas para o tipo de aprendi­zagem ( instrumental). descrito neste objet ivo. Dada a presente cI ientela, essas variáveis poderiam estar relacionadas a impulsos de realce do egd: recompensas relacionadas à posição social al­cançada pela aprendi zagem. A obtenção de vasos cu ltivados po-

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deria ser utilizada como recom­pensa (desde que o grupo soc;al valorizasse esse produto!.

PRESCRiÇÃO 2 - Deveriam ser inicialmente feforçadas unidades de resposta menores que aque la envolvida em cult ivar um vaso de plantas. Depois da aquisição. então o número de vasos cultiva­dos poder ia ser usado como evento reforçador. Outros even­tos que poderiam ser usados são pontos num jogo compet it ivo em sala de aula. notas. e aprova­ção social ("ótimo trabalho" . " lindos vasos". etc.!. O refor­çanrento deveria ser dado inter­mitentemente. após a fase de aquisição do desempenho deseja­do_

PRESCRiÇÃO 3 - Ver a pres­crição anterior. A observação das pequenas plantas crescerem pode prover sua própria retroalimenta­ção informat iva e/ou cúnfirma­ção do desempBn ho adqu irido (provave lmente antecipado ver­balmente pelo aprendiz!.

Objetivo I nstruciona l : const ruir um plano para reduzir compor­tamentos inadequados de crian­ças. População Alv:> : jovens (20-35 anos de idad&) casa is de pa is. com pelo menos o 29 grau com­pleto; ou

professores de crianças.

PRESCRiÇÃO 1 - Este objetivo é tipi camen te um caso de tarefa que envolve reso lução' de pro­blemas. Portanto. segundo Ausu ­bel (ib.l. seria necessário usar motivação extrínseca. Para estas populações alvo específicas. a confirmação dos resultados seria suficiente. pois ela sa tisfaria Im­pulsos de realce do ego.

PR ESCR IÇÃO 2 Skinner (ib.) recomendaria inicialmente a programação de pequenos pas-

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sos que levassem ao reforçador e. então. uma ampliação desses passos (unidades de resposta!. A aquisição seria mantida por re­f orçamento inter mitente.

PRESCRiÇÃO 3 - A confir­mação da meta esperada ser ia o reforçador ideal no presente caso . provendo retroalimenta­ção informativa (decréscimo dos comportamentos inadequados) para as grandes expecta t ivas da presente clientela (supõe-se que a "melhora" dos comportamen­tos inadequados seja a sua meta prioritária ). A conf irmação da exa tidão dos planos construidos deveria ser feita à medida em que eles fossem desenvolvidos. Isso possibilitaria o reforçamento dos comportamentos em peque­nos passos. sendo os aprend izes informados a respeito de desvios no caminho (i .e. : durante o pro-o cesso de planejar estratégias para reduzir comportamentos!.

Da Comparação Teórica à Validação Instrucional

A análise e comparação de alguns enf oques teóricos sobre motivação permit iu. no presente trabalho. a extração de prescri­ções alternativas que podem ser usadas para programar a ' ase de motivação na instrução. Através de alguns exemplos de situações instrucionais. demonstrou-se co­mo estas prescrições al ternativas podem ser ut il izadas para dife­rentes categorias de aprend iza­gem e diversos tipos de clientela .

Naqueles exemplos. o leitor pode verifica r que. em muitos casos. as prescri ções baseadas em enf oques teóri cos divergentes po­dem se completar. Nesse caso. o planejador tem o dever de lançar mão de vários procedi mentos

-motivacionais simultaneamente. mesmo que eles sejam derivados

de f ontes teóricas divergentes. Ao fazer isso. 'seu propósito. co­mo tecnólogo é o tornar efetivo o seu programa instrucional. Con­tudo. é também seu dever. como cientista. de ir além da vtri fica­ção da efetividade. anali sa ndo os dados obtidos e verifi cando are­leváncia de cada pr ocedimento L'

variável na determin ilção do re-· sultado final do proglama (Bor­ges-Andrade. 1982-b!.

Esse processo de inves tiga­ção. nos contex tos educacional e de treinamento. poderá susten tar os pr incípi os teóricos subj acentes aos procedimentos motivac iona is usados. Ele poderá também indi­car a necessidade de revisões des­ses princípios. Além dessas duas possibilidades. a investigação nes­tes co ntextos poderá mesmo de­terminar a construção de conhe­cimen to específi co para a área de motivação na instrução. Nes­se tercei ro caso. estará sendo iniciadO um processo que po­derá levar à construção de uma teoria Instrucional da motIvação. em paralelo ou em con traposição às teor ias de aprend izagem atua l­mente vigentes.

Seja qua l for O rum o a to­mar. a part ir das inves t igações real izadas. o planejador deve es­tar . consciente de que também é seu o papel de validar os mo­delos prllScritivos que util iza no planejament o instruciona l.

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