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MODELAGEM MATEMÁTICA E O APROVEITAMENTO DE RESÍDUOS SÓLIDOS
Nilson Marques de Oliveira1 Paulo Laerte Natti2
RESUMO
Este trabalho tem por objetivo fazer uma análise crítica da intervenção numa escola estadual do Paraná, em que se aplicou a Modelagem Matemática no processo de ensino, com estudantes da oitava série da Educação Básica. O enfoque abordou “A Matemática na Coleta de Resíduos Sólidos”, evidenciando o papel sócio-econômico da Matemática, bem como a importância da formação do cidadão crítico e transformador da realidade. O trabalho relata os principais resultados obtidos durante a intervenção realizada em São Pedro do Ivaí, PR, durante o primeiro semestre de 2008, na Escola Estadual Vicente Machado. Os resultados da intervenção mostram que os alunos aprendem mais e melhor quando utilizamos a modelagem matemática no processo de ensino-aprendizagem de estatística.
Palavras-Chave: Ensino-Aprendizagem de Matemática. Modelagem Matemática. Coleta Seletiva de Resíduos.
ABSTRACT
This work aims to make a critical analysis of intervention in a state of Parana school, which applied the Mathematical Modeling in the teaching process, with students from eighth grade of Basic Education. The focus addressed "The Mathematics of the Solid Waste Collection", highlighting the role of socio-economic Mathematics, as well as the importance of education of the critic and transformer of reality citizen. The paper reports the main results obtained during the speech held in São Pedro do Ivaí, PR, during the first half of 2008, the State School Vicente Machado. The results of the intervention show that students learn more and better when using the mathematical modeling in the teaching-learning process of statistics.
Keywords: Mathematical Teaching-Learning. Mathematical Modeling. Waste Selective collection.
INTRODUÇÃO1 Professor da rede estadual lotado na Escola Estadual Vicente Machado de São Pedro do Ivaí, PR. E-mail:[email protected] Professor doutor do Departamento de Matemática da Universidade Estadual de Londrina, PR. E-mail: [email protected]
A Matemática é uma ciência muito presente no dia-a-dia das pessoas. O
uso diário da aritmética, da lógica, da interpretação de tabelas, gráficos, índices e
porcentagens são comuns em nosso cotidiano. Por outro lado, o Ensino de
Matemática não é realizado de forma adequada, gerando um abismo entre a
Matemática escolar e esta Matemática da realidade, do cotidiano.
Ensinar e aprender estas matemáticas é uma necessidade e a utilização da
modelagem matemática é um recurso didático-pedagógico promissor. Neste trabalho
escolhemos um tema de interesse atual para realizar a modelação e,
simultaneamente, introduzir conteúdos matemáticos de oitava série da Educação
Básica. O tema motivador da modelagem é “a coleta seletiva de resíduos sólidos”,
assunto que se tornou uma das principais preocupações da sociedade.
Este artigo inicia-se com uma fundamentação sobre a Modelagem
Matemática e a sua importância como estratégia metodológica no ensino da
Matemática. Em seguida apresenta a proposta de intervenção pedagógica e as
atividades desenvolvidas, associadas ao tema “Coleta de Resíduos Sólidos”. Enfim,
os resultados e conclusões são apresentados.
2. MODELAGEM MATEMÁTICA – FUNDAMENTAÇÃO
2.1 Aspectos históricos
A busca de novas metodologias de ensino da matemática é uma constante
na vida dos professores. Atualmente fala-se muito sobre Modelagem Matemática e
mesmo após cerca de vinte e cinco anos de discussões e estudos, ainda muitas
dúvidas prevalecem sobre a mesma. Professores da área debatem sobre as
dificuldades e os benefícios de trabalhar com a modelagem no ensino de
matemática. Vários autores, entre eles, Biembengut (2003) e Bassanezi (2006) têm
argumentado sobre a possibilidade da utilização da Modelagem Matemática como
método alternativo no processo ensino-aprendizagem.
O histórico da modelagem matemática já passou por diversos caminhos. No
Brasil, ela iniciou-se com os cursos de especialização para professores, em 1983, na
Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Guarapuava - FAFIG, atualmente
denominada Universidade Estadual do Centro-Oeste – UNICENTRO. Com o início
do Programa de Mestrado em Ensino de Matemática pela UNESP – Campus de Rio
Claro, a Modelagem ganhou novos adeptos. Surgiram os primeiros trabalhos com
enfoque na Modelagem como uma das alternativas para o Ensino de Matemática, as
primeiras publicações sob forma de dissertações e artigos, surgiram a partir de
1987. Já em 1999 foi realizada a 1a Conferência Nacional sobre o assunto. Nos
últimos anos surgiram várias vertentes da modelagem matemática. Hoje, no Brasil, a
modelagem matemática desenvolve-se em forma de projeto no setor educacional,
onde a ênfase não está apenas na matemática em si, mas pressupõe a
multidisciplinaridade.
Segundo Biembengut (2003) a modelagem matemática hoje constitui um
ramo próprio da matemática que procura traduzir situações reais para uma
linguagem matemática, onde o estudante possa melhor compreender, prever,
estimular ou mudar determinadas vias de acontecimentos, utilizando estratégia de
ação nas mais variadas áreas do conhecimento. De acordo com As Diretrizes
Curriculares da Rede Pública de Educação Básica do Estado do Paraná, ela tem
como pressuposto a potencialização e a problematização do cotidiano. Ao mesmo
tempo em que propõe a valorização do aluno no contexto social, procura levantar
problemas que sugerem questionamentos sobre situações da vida. Neste contexto,
para motivar o aluno, faz-se necessário que o professor pratique atividades
pedagógicas co-relacionadas, como diz Bassanezi (2006), “da mesma forma que só
se aprende a jogar futebol, jogando, só se aprende modelagem, modelando!”. O
mesmo afirma ainda que “[...] o desafio do professor que toma o caminho da
modelagem como método de ensino, é ajudar o aluno a compreender, construindo
relações significativas, em cada etapa do processo”.
2.2 Modelagem e o Ensino da Matemática
A matemática tem presença marcante na vida de qualquer cidadão e pode
até servir como um instrumento de controle social, afinal, os números governam o
mundo, todas as decisões políticas são tomadas a partir de fórmulas, de cálculos, de
estatísticas. Planejamentos de governo são decididos por meio da matemática, e
são decisões que afetam todos nós.
Por outro lado, com freqüência é questionado o papel da matemática na
formação das crianças. Qual o educador em Matemática que nunca ouviu a
pergunta: “para que serve isto?” ou “onde que vou utilizar essa matéria?”. Pode ser
que a resposta para tais perguntas seja a Modelagem Matemática, pois ela tem
como um dos objetivos interpretar e compreender os mais diversos fenômenos do
cotidiano. Através da modelagem pode-se descrever estes fenômenos, bem como
analisá-los e interpretá-los por meio da Matemática.
Para Biembengut (2003), dois pontos são fundamentais para se trabalhar
Modelagem Matemática: aliar o tema a ser escolhido com a realidade dos alunos e
aproveitar as experiências extra-classe dos alunos aliadas à experiência do
professor em sala de aula. Dessa forma é possível fazer com que o aluno sinta
interesse pelo conteúdo desenvolvido, associe esse conteúdo com sua vivência e
tire dele o proveito necessário para sua aprendizagem.
Segundo Anastácio (1999) trabalhar com Modelagem Matemática pode
render diversos benefícios, entre outros, ela cita:
1) a motivação dos alunos e do próprio professor;
2) a facilitação da aprendizagem. O conteúdo matemático passa a ter significação,
deixa de ser abstrato para ser concreto;
3) a preparação para futuras profissões nas mais diversas áreas do conhecimento
devido à interatividade do conteúdo matemático com outras disciplinas;
4) o desenvolvimento do raciocínio, lógico e dedutivo;
5) o desenvolvimento do aluno como cidadão crítico e transformador de sua
realidade;
6) e a compreensão do papel sócio-cultural da matemática, tornando-a mais
importante.
Ferreira (1999) enfatiza que por isso, o professor que se propõe a trabalhar
com a modelagem matemática será criativo, motivador e acima de tudo assumirá a
postura de um mediador entre o saber comum e o saber matemático, fazendo com
que o aluno passe a ser um agente ativo no processo de construção do saber. Como
agente ativo o aluno redefine seus conceitos e internaliza os novos conhecimentos.
A Modelagem Matemática é uma metodologia alternativa para o ensino de
Matemática que pode ser utilizada tanto no ensino fundamental como no ensino
médio (FERREIRA, 1999). Uma maneira de avaliar se a Modelagem Matemática é
eficiente no processo de ensino é instituir um paralelo entre o ensino tradicional e o
ensino atual através da Modelagem Matemática, abordando aspectos como a
metodologia adotada, a criatividade, o interesse pelo estudo da Matemática, a
motivação e entusiasmo dos alunos, e a avaliação do que eles realmente
aprenderam com a Modelagem Matemática.
É notório que a Modelagem Matemática não pode ser utilizada como a única
metodologia de ensino, o educador no exercício das suas atividades, deve procurar
a melhor metodologia de ensino da matemática, através da inovação constante,
como por exemplo: jogos, brincadeiras, histórias da matemática, resolução de
problemas, enfim utilizar-se de todos os seus recursos para obter êxito no ensino da
matemática.
São muitos os desafios a serem vencidos, dentre eles, o maior talvez, é
fazer hoje o aluno perceber o seu verdadeiro papel na sociedade, de agente ativo e
transformador da sua realidade, e a importância da matemática neste contexto.
Paralelamente, outros desafios se apresentam, tais como:
1- a falta de apoio das escolas, que nem sempre viabilizam materiais e condições
necessárias e suficientes às práticas de ensino alternativas;
2- às vezes a própria desmotivação do professor que exerce uma carga excessiva
de horas de trabalho;
3- a falta de interesse por parte dos alunos e a indisciplina;
4- a falta de tempo para a elaboração de projetos alternativos de ensino;
5- a resistência por parte de outros professores da área, que se acomodaram no
ensino tradicional e se opõem à tentativa de inovação das metodologias de ensino;
6- o programa do currículo, previamente estabelecido, não dando oportunidade ao
professor de variar sua metodologia de ensino, pois precisa “cumprir” o inflexível
programa, entre outros tantos problemas.
2.3 A Modelagem Matemática no processo de ensino
A Modelagem Matemática deve ser vista como auxilio ao ensino e não gerar
um trabalho extra para o professor, às vezes até desnecessário, que ao invés de
auxiliar prejudica o andamento dos conteúdos e confunde os alunos. A Modelagem
Matemática não deve ser empregada para justificar o conteúdo, mas sim para
valorizá-lo. Fazer Modelagem Matemática é muito mais do que resolver pequenos
problemas, no quadro de giz, utilizando situações do dia a dia, como tem acontecido
com professores que pensam que solucionar um problema é fazer modelagem.
Assim um modelo para a modelagem se faz preciso.
O professor que pretende ensinar Modelagem Matemática necessita
aprender a fazer modelagem, buscando a essência do processo de
desenvolvimento, procurando atingir as raízes do processo e utilizá-la como
estratégia de ensino da matemática. Deve ter em mente que a Modelagem
Matemática pode ser um recurso para despertar no educando o interesse por
conteúdos matemáticos, que este ainda desconhece, ao mesmo tempo em que
aprende e executa a arte de modelar, matematicamente os fenômenos do seu dia a
dia.
2.4 A Relação da Matemática com a Cultura dos Alunos
Incorporar a cultura na vida dos alunos, por meio de práticas pedagógicas,
vem sendo analisado em diversas teorizações como uma entre as possibilidades
para construir um currículo que busque a inclusão social. Um currículo que valorize
as vivências dos alunos, que coloque em cena a cultura local de cada grupo social,
como uma possibilidade de questionar o que é considerado válido como
conhecimento e para quem este conhecimento tem validade. Uma educação que
busque a construção de uma sociedade mais humana, mais consciente, mais
solidária, que tenha a possibilidade de incorporar os saberes locais e questionar a
universalidade dos conhecimentos escolares.
A educação obrigatória precisa recuperar uma de suas razões de ser, ou
seja, um espaço onde as novas gerações se capacitem para analisar criticamente o
legado cultural da sociedade. As salas de aula não devem ser locais onde se
memorizam informações descontextualizadas. É preciso que o aluno compreenda
bem quais são as diferentes concepções de mundo que se ocultam e os principais
problemas da sociedade a que pertence.
A Matemática como “o grande legado da humanidade”, “livre de
determinações culturais”, uma vez que “as leis dos números são universalmente as
mesmas”, era uma idéia muito difundida. Na escola, a Matemática que se ensinava
geralmente era considerada neutra, isenta de valores. Os conteúdos matemáticos
eram vistos como um a priori, independentes, assumindo um status de serem os
únicos corretos. Esta visão foi sendo problematizada pela Etnomatemática.
Atualmente, a Matemática é vista de uma forma diferente, capaz de incutir hábitos,
de conscientizar e de ensinar algo mais, além de números e regras.
3. Metodologia - Proposta de Intervenção Pedagógica
A proposta foi elaborada para ser aplicada em duas turmas de oitava séries
da Escola Estadual Vicente Machado em São Pedro do Ivaí, Paraná. Quando a
proposta chegou aos estudantes toda a preparação preliminar já havia se
concretizada: reunião com a equipe administrativa, apresentação do projeto, visita à
prefeita para solicitar parceria, enfim, tudo aquilo que se deve fazer antes de iniciar
um projeto. A proposta apresentada aos estudantes foi sobre o tema, resíduos
sólidos, relacionando-o diretamente com as questões ambientais. Depois foi
explanada como se desencadeariam os trabalhos que foram assim enumerados:
- atividades que objetivam mobilizar os estudantes sobre a importância da
coleta seletiva,
- transporte e destinação final dos resíduos sólidos urbanos,
- contextualização dessa realidade com os conteúdos matemáticos.
- Matematização dos temas propostos com formulação e resolução de
problemas concernentes.
As atividades com os estudantes foram desenvolvidas na seguinte
seqüência:
- comentários gerais sobre a importância da colaboração de todos com a
reciclagem dos resíduos sólidos, sobre o tempo que cada tipo de material
gasta para se decompor, sobre a separação dos resíduos sólidos de acordo
com a composição de seu material, sobre as cores dos recipientes utilizados
para a coleta do material reciclável e sobre a importância de se separar esses
lixos. Dados numéricos sobre a economia que se faz quando os resíduos
sólidos são reciclados foram apresentados. Enfim, um folheto elaborado pela
secretaria municipal de saúde do município de São Pedro do Ivaí foi
disponibilizado aos alunos.
- Análise de tabelas que foram retiradas da publicação Programa Desperdício
Zero, criado pelo Governo do Paraná, através da Secretaria de Estado do
Meio Ambiente e Recursos Hídricos - SEMA. Como um exemplo,
apresentamos a tabela 1.
Perfil de resíduos gerados nas grandes cidades brasileirasMatéria orgânica 52%Papel/papelão 25%Plástico 3%Metal 3%Vidro 3%Outros (rejeito) 14%
Tabela 1: Perfil de Resíduos Gerados nas Grandes Cidades Fonte: CEMPRE, 2005.
3.1Diagnóstico da Realidade
O inicio da intervenção foi através de um questionário que serviu de
parâmetro na aplicação de outro questionário no final do projeto. Os mesmos
questionamentos foram utilizados nas duas avaliações, a primeira feita como
sondagem e a segunda feita como auto-avaliação, após a intervenção realizada. Os
questionamentos versavam sobre:
- se o estudante já havia participado de uma campanha de reciclagem,
- se ele achava que a partir de uma campanha sobre reciclagem dos resíduos
sólidos seria possível estudar conteúdos de Matemática,
- se sabia para que servem os gráficos,
- se conhecia os tipos de gráficos,
- se a partir de dados numéricos de uma tabela ele saberia construir alguns dos
tipos de gráficos citados na questão anterior,
- se ele sabia usar corretamente o transferidor,
- se sabia utilizar a regra de três e se sabia calcular porcentagem.
3.2 As Atividades Desenvolvidas
Os questionários respondidos foram recolhidos e guardados, porque seus
dados só seriam analisados no final do projeto, quando seriam cruzados com os
dados dos questionários aplicados na auto-avaliação que fecharia projeto.
Importante recordar que não foram criados conteúdos específicos para se
trabalhar durante a aplicação do projeto, somente foram adaptadas metodologias
para consorciar a coleta de resíduos sólidos com os conteúdos programáticos
designados para o período. Uma das primeiras atividades foi a confecção de
cartazes, trabalho sugerido para se elaborar em equipes, cuja tarefa consistia em
elaborar um cartaz contendo uma frase criativa sobre a importância da reciclagem
e da coleta seletiva de resíduos sólidos. A participação dos alunos foi satisfatória e
em algumas turmas, uma professora de Língua Inglesa também solicitou aos seus
alunos para elaborarem cartazes com o tema do projeto, em inglês. E para concluir
essa atividade, foi organizada uma exposição com os cartazes.
Na primeira quinzena do mês de maio de 2008 foram realizadas palestras,
onde estavam presentes todos os alunos, professores, funcionários, diretor e
equipe pedagógica. O assunto versava sobre a importância da separação dos
resíduos sólidos recicláveis, da coleta seletiva e da destinação final desses
materiais recicláveis. Até então todos os alunos das turmas envolvidas no projeto
estavam apreensivos, porque ainda não conseguiam vislumbrar como a
matemática estaria participando dessa experiência.
Na seqüência, cada uma das duas turmas de oitava séries participantes do
projeto foi dividida em seis equipes, sendo que cada equipe trabalhou com um
tema específico, relacionado com a coleta seletiva dos resíduos sólidos. Os temas
foram os seguintes: plástico, papel, vidro, metal, orgânico e embalagem longa vida.
O material de pesquisa utilizado pelos alunos foi o livro Kit Resíduos, elaborado
pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos – SEMA. As
equipes estavam encarregadas de pesquisar sobre as características diversas
desses materiais, tempo de decomposição no meio ambiente, evidenciando suas
formas de reaproveitamento, bem como os produtos obtidos a partir da sua
reciclagem.
Durante a pesquisa e elaboração do trabalho, os estudantes evidenciaram
a matemática presente em cada tema, através de porcentagem, tabelas e gráficos
que estavam diretamente relacionados aos temas pesquisados. Depois da
pesquisa e organização dos trabalhos, cada equipe fez uma apresentação na sala
de aula. Nos trabalhos apresentados pelas equipes, alguns gráficos de setores
estavam presentes, porém, como já estavam construídos e sem a participação de
todos os alunos da turma, o assunto foi retomado em sala de aula para que todos
trabalhassem sobre o conteúdo.
A partir dessa etapa, a proposta de trabalho foi construir um gráfico de
setores ou de pizza, utilizando os dados percentuais apresentados sobre a
quantidade e os principais tipos de resíduos gerados nas cidades. Para esta
atividade fez-se necessário uma retomada no conteúdo regra de três simples. Os
alunos (sob a orientação do professor) calcularam quantos graus são necessários
para representar cada setor, partindo dos dados percentuais referentes a cada tipo
de resíduo gerado na cidade, que contém cerca de dez mil habitantes.
De posse dos dados da pesquisa específica de cada tipo de resíduo sólido,
sob a coordenação do professor PDE, as duas turmas de oitava séries participantes
do projeto foram novamente divididas em equipes, de modo que cada equipe
contivesse um membro da equipe anterior para mesclar conhecimento em cada tipo
de resíduo sólido. Divididas as equipes, cada uma delas se incumbiu de divulgar a
campanha sobre a coleta seletiva em todas as salas de aula da Escola Estadual
Vicente Machado, bem como convidar todos os estudantes para participarem da
atividade prática, fazendo a coleta de materiais recicláveis em casa e na
comunidade, e na semana seguinte trazer esses materiais para a escola.
Na data pré-estabelecida todos os alunos e alguns pais trouxeram os
materiais recicláveis, separados. Professores e funcionários participaram da
pesagem e do registro dos materiais coletados. Foram “pesados” em separado os
resíduos sólidos recicláveis de cada turma, nos dois períodos de funcionamento da
escola. Em seguida, os funcionários da prefeitura local e alguns participantes da
cooperativa de catadores de materiais recicláveis, recolheram e transportaram os
materiais para o barracão municipal reservado para o armazenamento e
encaminhamento dos materiais recicláveis recolhidos pela campanha do projeto “A
MATEMÁTICA NA COLETA SELETIVA DE RESÍDUOS SÓLIDOS”.
De posse dos dados da coleta, em sala de aula, professor e alunos fizeram
a tabulação dos dados e construíram as tabelas abaixo para demonstrar a
quantidade, em quilogramas, de materiais reciclados que a campanha conseguiu
coletar. Os dados são apresentados na tabela 2.
Partindo dos dados, sob orientação do professor, os alunos somaram a
quantidade em quilogramas de materiais reciclados por cada série, e, em seguida,
calcularam a porcentagem referente a cada série. Com os dados da tabela e
porcentagens calculadas foram construídos gráficos de barras, de setores, de
pizzas utilizando os dados de diversas maneiras, de modo que os estudantes
esgotassem as possibilidades e aproveitassem ao máximo o material disponível.
Tabela 2: Quantidade de material reciclável recolhido na campanha
RESULTADO EM QUILOGRAMAS DOS MATERIAISRECICLADOS POR TURMA E POR PERÍODO
MATUTINO QUANTIDADE VESPERTINO QUANTIDADE
SÉRIES KG SÉRIES KG
5ª “A” 5 4 9
5ª “B” 5 8 2
5ª “C” 1 3 6 0
5ª “D” 2 3 0
6ª “A” 1 0 7 8
6ª “B” 1 3 0 5
6ª “C” 2 6 4
6ª “D” 4 6 0
RESULTADO EM QUILOGRAMAS DOS MATERIAISRECICLADOS POR TURMA E POR PERÍODO
MATUTINO QUANTIDADE VESPERTINO QUANTIDADE
SÉRIES KG SÉRIES KG
7ª “A” 1 4 8
7ª “B” 4 1 9
8ª “A” 4 8 1
7ª “C” 3 1 0
8ª “B” 4 9 6
8ª “C” 4 2 5
8ª “D” 3 0 0
TOTAL (matutino) 7 1 0 7 TOTAL (vespertino) 1 3 0 0 Tabela 2: Quantidade de material reciclável recolhido na campanha
A atividade subseqüente foi uma visita a radio local. A apresentadora de um
programa semanal na Rádio Comunitária Local comentou que observou um grande
movimento dos estudantes e de seus familiares fazendo uma limpeza nos quintais,
e então quis saber a razão da movimentação daquele dia, especificamente. Os
alunos explicaram que naquele dia haviam participado de uma campanha, que fazia
parte de um projeto maior sobre modelagem matemática. A campanha era sobre
coleta seletiva de resíduos sólidos e fora organizada pela Escola Estadual Vicente
Machado. Então a locutora convidou o professor responsável para participar do seu
programa na Rádio São Pedro FM e comentar a importância desse projeto para os
estudantes e para a comunidade em geral.
Duas alunas da oitava série, o professor e a uma pedagoga da escola
participaram do programa por uma hora. A locutora comentou que observou a
movimentação dos estudantes pela cidade e fez questionamentos no que consistia
o projeto, qual a justificativa para tal, quais os objetivos e que atividades foram
desenvolvidas. O professor explicou que a Secretaria Estadual de Educação do
Estado do Paraná elaborou um projeto denominado PDE (Programa de
Desenvolvimento Educacional). E o objetivo desse projeto amplo é incentivar os
professores das diversas disciplinas, a elaborar e desenvolver projetos nas escolas
do todo estado. Enquanto professor participante do PDE, elaborou o projeto: “A
MATEMÁTICA NA COLETA SELETIVA DE RESÍDUOS SÓLIDOS”, que estava
sendo aplicado na Escola Estadual Vicente Machado.
Como justificativa o professor ressaltou que é fundamental a necessidade
de que os alunos e toda comunidade compreendam a importância da preservação
do meio ambiente. E a coleta seletiva de resíduos sólidos é uma alternativa
ecologicamente correta que desvia dos aterros sanitários e dos lixões a céu aberto
os resíduos sólidos que podem ser reciclados. Essa compreensão se torna possível
a partir do momento que é oportunizado aos estudantes textos informativos,
palestras, dados estatísticos e atividades práticas relacionadas com o problema
dos resíduos sólidos. Nesse contexto os estudantes terão oportunidades para
pensar, agir, refletir e praticarem atitudes relacionadas com a transformação da
realidade.
Quanto aos principais objetivos do projeto foram enumerados:
- conscientizar os alunos da importância da reciclagem e da coleta seletiva dos
resíduos sólidos para o ambiente e para a economia;
- fazer uma campanha de coleta de recicláveis na escola e envolvendo a
comunidade;
- motivar os estudantes a manter limpo seu habitat, sala de aula, pátio da escola e
outros lugares;
- fazer um trabalho contínuo de educação ambiental, relacionando-o com as
disciplinas escolares;
- e possibilitar aos estudantes a utilização prática de porcentagem, análise e
construção de gráficos, a partir de problemas relacionados com a produção e
destino de resíduos sólidos na comunidade.
Quanto às atividades desenvolvidas durante o projeto, o professor relatou:
- a apresentação da proposta para o diretor, os professores e para a equipe
pedagógica;
- o encontro com a prefeita para solicitar uma parceria;
- a confecção de cartazes sobre o tema coleta seletiva e reciclagem de
resíduos sólidos;
- a realização de uma palestra sobre a importância da coleta seletiva;
- a exposição dos cartazes no ambiente da palestra;
- a apresentação em sala dos trabalhos elaborados pela equipes, enfatizando
tabelas e gráficos;
- a construção de gráficos de setores a partir dos dados dos trabalhos
apresentados;
- a divulgação na escola para que todos os estudantes separem em casa os
materiais recicláveis;
- a coleta e a pesagem dos materiais recicláveis;
- o registro em quilogramas da quantidade de materiais recicláveis que cada
turma trouxe para a escola;
- a construção de objetos ornamentais, com a utilização de materiais
recicláveis;
- o cálculo percentual referente à quantidade de materiais recicláveis que cada
turma coletou;
- a construção de tabelas e gráficos, a partir da quantidade em kg, dos
materiais coletados pelos estudantes;
- uma pesquisa sobre a utilização e os tipos de gráficos;
- e confecção e apresentação de cartazes sobre os diversos tipos de gráficos.
Enfim, na entrevista, o professor responsável pelo projeto, relatou que sobre
o critério de escolha dos professores PDEs, fora realizada uma seleção no ano letivo
de 2006, por meio de prova objetiva e redação, com oferta de 1200 vagas para todo
o Estado do Paraná, distribuídas entre várias disciplinas. Como preparação para
desenvolver esses projetos, os professores selecionados voltaram às universidades
no ano de 2007. Cursando diversas disciplinas, participando de seminários,
palestras e com a orientação de um professor da universidade (os professores
selecionados de São Pedro do Ivaí freqüentaram a Universidade Estadual de
Londrina) foram elaborados os planos de trabalho. Enfim, no ano letivo de 2008,
estão sendo aplicados os planos de trabalho e as demais atividades do programa
estadual.
3.3 A Segunda Avaliação Diagnóstica
Depois de todas as atividades escolares do projeto desenvolvidas foi
realizada uma segunda avaliação. Distribuídos os questionários, os estudantes
responderam as questões. Os dados coletados na primeira e na segunda avaliações
estão apresentados na tabela 3.
Tabela 03: Questões aplicadas aos alunos comprovando o aproveitamento
1-Você já participou de alguma campanha prática de reciclagem de lixo?
antes depois
67% 100%
2- Você acha que a partir de uma campanha prática sobre reciclagem do lixo é possível estudar conteúdos de Matemática?
antes depois
67% 100%
3-Você sabe qual é a utilidade dos gráficos?
antes depois
44% 90%
4-Você sabe o que é um gráfico:
A - de setores ou pizza?antes depois
40% 77%
B – de colunas?antes depois
84% 93%
C – de barras?antes depois
60% 93%
D – de linhas ou segmentos?
antes depois
34% 73%
E – pictórico?
antes depois
17% 73%
Continuação da tabela 3
5-A partir de dados numéricos de uma tabela você sabe construir alguns dos gráficos citados na questão anterior?
Antes Depois
33% 83%
6-Você sabe usar corretamente o transferidor?
Antes Depois
40% 93%
7-Você sabe utilizar a regra de três?
antes depois
51% 83%
8-Você sabe calcular porcentagem?
antes depois
56% 87%
Tabela 03: Questões aplicadas aos alunos comprovando o aproveitamentoFonte: Autoria própria.
4. Análise dos Resultados
A análise dos resultados é feita a partir dos gráficos a seguir que retratam a
realidade da intervenção nas turmas que participaram do projeto. Neste projeto foi
apresentado um exemplo de modelagem, utilizando a “coleta seletiva de resíduos
sólidos” como tema motivador, onde se procurou evidenciar o papel sócio-
econômico da matemática e a necessidade da formação de um cidadão crítico
capaz de transformar a realidade.
Como se visualiza no gráfico 1, antes do projeto ser aplicado, 67% dos
alunos sabiam o que era uma campanha de reciclagem ou já tinham participado de
uma campanha deste tipo. Após a aplicação do projeto, 100% dos alunos se
consideravam cientes de uma campanha e diziam ter participado. Informação
importante, porque a campanha foi a base para demonstrar que a modelagem
matemática pode ocorrer em diversas situações e produzir resultados favoráveis.
Gráfico 1: Participação em Campanha de ReciclagemFonte: Autoria própria.
O gráfico 2 retrata a opinião dos estudantes participantes do projeto sobre a
possibilidade da reciclagem tornar possível o estudo e aprendizagem da
Matemática. Após o projeto, 100% dos alunos tinham certeza dessa possibilidade.
67%
100%
020406080
100
Antes Depois
Gráfico 2: Acredita que com a Reciclagem é Possível Estudar MatemáticaFonte: Autoria própria.
Antes do projeto, apenas 44% dos alunos sabiam para que serviam e como
eram utilizados os gráficos.
44%
90%
0
20
40
60
80
100
Antes Depois
Gráfico 3: Você sabe qual é a utilidade dos gráficos?Fonte: Autoria própria.
Após a intervenção esse percentual subiu para 90% dos alunos. Importante
ressaltar que esses 90% realmente aprenderam a utilizar esse recurso, inclusive em
outro projeto da professora de Língua Inglesa, que trabalhava com alimentação.
67%
100%
020406080
100
Antes Depois
0
20
40
60
80
100
Antes Depois
Pizza
Coluna
Barras
Linhas e segmentos
Pictóricos
Gráfico 4: Você sabe o que é um gráfico de:Fonte: Autoria própria.
Quanto ao reconhecimento dos tipos de gráficos, entre o antes e o depois
da intervenção, nota-se que houve uma sensível melhora no conhecimento dos
alunos. Os mais conhecidos eram os gráficos de colunas e os menos conhecidos
eram os pictóricos, conhecidos por apenas 17% dos alunos. No entanto, os gráficos
do tipo pictóricos foram os que atingiram o maior índice de crescimento no
conhecimento dos alunos, onde, após a intervenção, 73% dos aprendentes
atestaram conhecê-lo.
33%
83%
0
20
40
60
80
100
Antes Depois
Gráfico 5; A partir de dados numéricos de uma tabela você sabe construir alguns dos gráficos citados na questão anterior? Fonte: Autoria própria.
Quanto à transformação de dados de uma tabela em gráficos, na primeira
avaliação apenas 33% afirmou saber fazer a transformação. Após a intervenção,
esse percentual subiu para 83%, tendo um crescimento substancial.
40%
93%
0
20
40
60
80
100
Antes Depois
Gráfico 6: Você sabe usar corretamente o transferidor?Fonte: Autoria própria
O uso do transferidor melhorou consideravelmente após a intervenção
atingindo 93% dos aprendentes, com aceno positivo para o domínio da sua
utilização.
83%
51%
0
20
40
60
80
100
Antes Depois
Gráfico 7: Você sabe utilizar a regra de três? Fonte: Autoria própria
Quanto à utilização da regra de três, que na primeira avaliação diagnóstica
demonstrava um domínio de 51% dos estudantes, após a intervenção, na segunda
avaliação diagnóstica, revelou o domínio do recurso por 83% dos estudantes.
Embora tenha atingido um bom índice, o resultado poderia ter sido melhor se todos
os estudantes se empenhassem em fazer todas as atividades. Alguns estudantes
não responderam aos estímulos.
87%
56%
0
20
40
60
80
100
Antes Depois
Gráfico 8: Você sabe calcular porcentagem?Fonte: Autoria própria
Enfim, o cálculo de porcentagem, juntamente com a utilização de regra de
três, foram as atividades que apresentaram o menor crescimento durante a
intervenção, 31 e 32 pontos respectivamente. O uso do transferidor e a
transformação dos dados de tabela em gráfico foram as atividades que alcançaram
o maior índice de crescimento no conhecimento dos estudantes.
6. CONCLUSÃO
A intervenção na Escola Estadual Vicente Machado em São Pedro do Ivaí,
Paraná, nas 8ª séries do Ensino Fundamental, teve um excelente resultado. O fato
do projeto do professor PDE trabalhar com a realidade dos alunos e aproveitar as
experiências extraclasse destes, facilitou o processo de ensino-aprendizagem. O
tema motivador “Coleta Seletiva de Resíduos Sólidos” permitiu que conteúdos
matemáticos, tais como gráficos, regra de três, porcentagem, entre outros, fossem
melhor compreendidos pelos estudantes. Assim, verificou-se que a modelagem
matemática pode ser um canal de motivação para os estudantes, inclusive para o
próprio professor, servindo como facilitador da aprendizagem, já que os conteúdos
matemáticos passam a ter maior significação e tornam-se concretos.
Este projeto também mostrou aos estudantes que a Matemática está
inserida nos acontecimentos do cotidiano e que através do conhecimento podemos
atuar sobre nossa realidade, transformando-a. Enfim, a Modelagem Matemática,
associada ao tema motivador “Coleta Seletiva de Resíduos Sólidos”, gerou
estudantes-cidadãos mais conscientes e críticos, capazes de transformar sua
realidade através do desenvolvimento sustentável.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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BASSANEZI, R.C. Ensino-aprendizagem com Modelagem Matemática. S.Paulo: Ed.Contexto, 2006.
BIEMBENGUT, M.S; HEIN, N. Modelagem Matemática no Ensino. S.Paulo: Ed.Contexto, 2003.
DCES, Diretrizes Curriculares de Matemática para as Séries Finais do Ensino Fundamental e para o Ensino Médio. Curitiba, 2008.
GOVERNO DO PARANÁ, SECRETARIA DE ESTADO DO MEIO AMBIENTE E RECURSOS HÍDRICOS – SEMA. Programa Desperdício Zero.
SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO – SEED. Diretrizes Curriculares da rede Pública de Educação Básica do Estado do Paraná. Curitiba, 2006.
FERREIRA, E. S. Como usar a história da matemática na construção de uma educação matemática com significado. In: III Seminário Nacional de História da Matemática, 1999, Vitória. Anais do III Semináiro Nacional de HIstória da Matemática, 1999. v. 1. p. 22-33.
SANTOMÉ, Jurjo Torres. As Culturas Negadas e Silenciadas no Currículo. In: SILVA, Tomaz Tadeu (Org.). Alienígenas na Sala de Aula. Petrópolis: Vozes, 1995.
SILVA, Élcio Oliveira da. O contrato didático e o currículo oculto: um duplo olhar sobre o fazer pedagógico. In: Zetetiké, Campinas, SP, v.4, n.6, p.9-23, jul/dez. 1996.