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Mirella Camarota Pimenta* A PsicologiA em interfAce com o Direito PSyChOlOGy At thE IntErfACE wIth thE lAw lA PSICOlOGíA En IntErfAz COn lA lEy Resumo: O presente estudo aborda a atual relação interdisci- plinar existente entre as ciências da Psicologia e do Direito, bus- cando como objetivo compreender de que maneira a Psicologia influencia o Direito e, ao mesmo tempo, demonstrar como o Di- reito necessita da Psicologia. Dessa misteriosa confluência surge a assertiva de que a psicologia complementa o serviço ju- rídico quando firma seu posicionamento na elaboração de estu- dos técnicos acerca de nuances específicas, guiando os passos do operador do Direito enquanto transita por casos que o Direito em si não aborda na integralidade, mas que são imprescindíveis a sua aplicação, como, por exemplo, as avaliações psicológicas. Abstract: The study examines the current relationship between the interdisciplinary sciences of psychology and law, aimed at seeking to understand how psychology affects the right and at the same time wants to demonstrate how the right needs of psy- chology. This mysterious confluence comes the assertion that psychology complements the firm's legal department when its position in the preparation of technical studies about specific nuances, guiding the steps of the operator of the law while in transit by cases that the law itself does not address in full, but that are essential to their application as an example, the psycho- logical evaluations. Resumen: El estudio examina la actual relación interdisciplinaria existente entre las ciencias de la Psicología y del Derecho, bus- cando comprender cómo la Psicología afecta al Derecho y, al * Especialista em Psicologia Jurídica pelo IPES. Secretária Auxiliar do MP-GO. 445

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Page 1: Mirella Camarota Pimenta - mpgo.mp.br · A PsicologiA e o Direito ciVil Em matéria cível é comum a atuação do psicólogo jurídico em ação de interdição, anulação de casamento,

Mirella Camarota Pimenta*

A PsicologiA em interfAce com o Direito

PSyChOlOGy At thE IntErfACE wIth thE lAw

lA PSICOlOGíA En IntErfAz COn lA lEy

Resumo: O presente estudo aborda a atual relação interdisci-

plinar existente entre as ciências da Psicologia e do Direito, bus-

cando como objetivo compreender de que maneira a Psicologia

influencia o Direito e, ao mesmo tempo, demonstrar como o Di-

reito necessita da Psicologia. Dessa misteriosa confluência

surge a assertiva de que a psicologia complementa o serviço ju-

rídico quando firma seu posicionamento na elaboração de estu-

dos técnicos acerca de nuances específicas, guiando os passos

do operador do Direito enquanto transita por casos que o Direito

em si não aborda na integralidade, mas que são imprescindíveis

a sua aplicação, como, por exemplo, as avaliações psicológicas.

Abstract: The study examines the current relationship between

the interdisciplinary sciences of psychology and law, aimed at

seeking to understand how psychology affects the right and at

the same time wants to demonstrate how the right needs of psy-

chology. This mysterious confluence comes the assertion that

psychology complements the firm's legal department when its

position in the preparation of technical studies about specific

nuances, guiding the steps of the operator of the law while in

transit by cases that the law itself does not address in full, but

that are essential to their application as an example, the psycho-

logical evaluations.

Resumen: El estudio examina la actual relación interdisciplinaria

existente entre las ciencias de la Psicología y del Derecho, bus-

cando comprender cómo la Psicología afecta al Derecho y, al

* Especialista em Psicologia Jurídica pelo IPES. Secretária Auxiliar do MP-GO.

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mismo tiempo, demostrar cómo el Derecho necesita de la Psi-

cología. De esta confluencia misteriosa viene la afirmación de

que la psicología complementa el departamento legal cuando

marca su posición en la elaboración de estudios técnicos sobre

matices específicos, que guían los pasos del operador de la ley

mientras transita por casos que la propia ley no aborda en su to-

talidad, pero que son esenciales para su aplicación como, por

ejemplo, las evaluaciones psicológicas.

Palavras-chaves: interdisciplinaridade, psicologia jurídica, ins-

trumentos psicológicos.

Keywords: interdisciplinary, forensic psychology, psychological

instruments.

Palabras clave: interdisciplinario, psicología forense, instrumen-

tos psicológicos.

DefiniÇÕes De PsicologiA JUrÍDicA

Segundo fiorelli (2006, p. 11), “a Psicologia apresenta-secomo um instrumento de extraordinário valor para o profissionalque se dedica ao Direito (advogado, promotor, juiz) porque lançaluzes a respeito da compreensão das forças interiores que movemos indivíduos”.

De acordo com Jesus (2006, p. 46), “a Psicologia Jurídicaconstitui-se de um campo de investigação psicológico especiali-zado, cuja finalidade é o estudo do comportamento dos atores ju-rídicos no âmbito do Direito, da lei e da justiça”.

Para rovinski (2004, p. 13), “Psicologia e Direito, mesmoconstituindo-se disciplinas distintas, possuem como ponto de inter-secção o interesse pelo comportamento humano”.

Conforme Carvalho e Miranda (2008, p. 10), “a PsicologiaJurídica é uma área especializada de conhecimento e campo de

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atuação profissional que estabelece uma relação específica com oDireito”.

De acordo com frança (2004), a Psicologia Jurídica estásubdividida da seguinte forma: Psicologia Jurídica e o Menor; Psi-cologia Jurídica e Direito de família; Psicologia Jurídica e DireitoCível; Psicologia Jurídica do trabalho; Psicologia Jurídica e DireitoPenal; Psicologia Judicial ou do testemunho, Jurado; PsicologiaPenitenciária; Psicologia Policial e das forças Armadas; Vitimolo-gia; Mediação; formação e atendimento aos Juízes e Promotores.

Segundo Jesus (2006, p. 46), as funções do psicólogo jurí-dico, no exercício de suas atribuições, poderiam ser assim sinteti-zadas:

a) avaliar e diagnosticar: em relação às condutas psicológi-cas dos atores jurídicos;b) assessorar: orientar e/ou assessorar, como perito, órgãosjudiciais em questões próprias de sua área, a fim de trazerpara os autos informações psicológicas essenciais para a to-mada de decisão;c) intervir: planejar e realizar programas de prevenção, tra-tamento, reabilitação e integração de atores jurídicos na co-munidade, no meio penitenciário, tanto individual quantocoletivamente;d) formar e educar: treinar e selecionar profissionais do sis-tema legal (juízes, policiais, promotores, advogados, agentespenitenciários, etc.) em conteúdos e técnicas psicológicasúteis em seu trabalho;e) colaborar com campanhas de prevenção social contra acriminalidade em meios de comunicação: elaborar e asses-sorar campanhas de informação social para a população emgeral e para a que vive em área de risco;f) pesquisar: estudar e pesquisar os problemas da PsicologiaJurídica;g) vitimologia: pesquisar e contribuir para a melhoria da si-tuação da vítima e para sua interação com o sistema legal;h) mediar: apresentar soluções negociadas aos conflitos ju-rídicos, através de uma intervenção mediadora que contribuapara diminuir e prevenir o dano emocional e social, e quepossa oferecer uma alternativa à via legal, em que as partestenham um papel predominante.

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De acordo com Cesca (2004, p. 41):

A relação entre os saberes construídos pela Psicologia, o Di-reito e as práticas judiciárias é muito antiga, mas ainda poucoconhecida no Brasil. A partir da complexidade com que foramse constituindo as regras de convivência humana, as basesda lei foram se complexificando e absorvendo cada vez maiscontribuições dos diversos campos do saber.

A interDisciPlinAriDADe

Segundo Sá (2007), a interdisciplinaridade é uma visão glo-bal dos fenômenos, dos fatos, em suas diferentes interfaces. nãoé só um modo de conhecer, mas também um modo de agir cons-ciente, disciplinado, que se desenvolve numa relação de intersub-jetividade entre as pessoas e numa relação dialética entre elas e omundo.

no mesmo sentido, Calhau (2007) ensina que a interdisci-plinaridade inicia-se como uma necessidade prática de união dosconhecimentos, mas constitui um dos efeitos ideológicos mais es-senciais sobre o atual desenvolvimento das ciências, justamentepor apresentar-se como o alicerce de uma articulação teórica.

leff (2000), citado por Calhau (2007, p. 11), alude que aspráticas interdisciplinares, fundadas num princípio positivista do co-nhecimento, desconhecem a existência dos objetos teóricos dasciências; a produção conceitual dissolve-se na formalização das in-terações e relações entre objetos empíricos. Dessa forma, os fe-nômenos não são captados a partir do objeto teórico de umadisciplina científica, mas surgem da integração das partes consti-tutivas de um todo visível.

Afirmam Silva, Vasconcelos e Magalhães (2001), citadospor Silva (2003, p. 11):

Para que a justiça se consolide sobre os pilares da igual-dade, liberdade e fraternidade, é preciso que haja interação

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dos conhecimentos das várias disciplinas sociais. A Psicolo-gia contribui através da análise e compreensão do compor-tamento humano no contexto afetivo e social, estabelecendoa atuação do Psicólogo Jurídico na mediação e, se possível,na conciliação dos conflitos nos processos judiciais.

Munhoz (2005), citado por Calhau (2007, p. 11), ensina quenão é suficiente diferentes profissionais estarem lado a lado, nummesmo ambiente científico, respeitando-se mutuamente em suasespecificidades, em suas diferenças, mas cada um preso hermeti-camente à sua cultura profissional, sem oportunizarem diálogoentre elas, para trocas e complementações que possam resultarem ampliação de suas perspectivas diante da realidade e em açõesmais efetivas e abrangentes diante da sociedade, em otimizaçãoda qualidade social e política de seu desempenho.

no entanto, Calhau (2007) afirma que não basta os juízesde direito, promotores de justiça, policiais, psicólogos e assistentessociais trabalharem no mesmo prédio no estudo do fenômeno cri-minal. É preciso sustentar um diálogo aberto, ou seja, um verdadeirodiálogo com os outros profissionais, procurando integrar-se com asoutras áreas materialmente, não somente no sentido formal, da bocapara fora, sem estar internamente comprometido com isso.

Constata-se a importância da interdisciplinaridade nestecampo de atuação para que o fato jurídico seja analisado de ma-neira contextualizada.

Munhoz (2005), citado por Calhau (2007, p. 12), “define quea interdisciplinaridade não é um simples monólogo de especialistas,implica graus sucessivos de cooperação e coordenação crescen-tes, interações: reciprocidade de intercâmbios”.

O mesmo autor (MUnhOz, 2005 citado por CAlhAU,2007, p. 12) ressalta que:

O trabalho interdisciplinar leva ao enriquecimento de cadadisciplina/profissão/área de saber – pela incorporação de re-sultados de uma especialidade por outras, da partilha de mé-todos e técnicas à ampliação da consciência crítica.Contribui significativamente para o fim do imperialismo dis-ciplinar, da departamentalização da ciência, dos distritos dosaber.

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Para Arce, Prieto e Sobral (1994), citados por Jesus (2006,p. 42), a Psicologia e o Direito teriam de se encontrar, por mais quetentassem permanecer distantes: a Psicologia, por um lado, procu-rando compreender e explicar o comportamento humano, e o Di-reito, por outro, possuindo um conjunto de preocupações sobrecomo regular e prever determinados tipos de comportamento, como objetivo de estabelecer um contrato social de convivência comu-nitária. Percebe-se, então, a complementaridade que a Psicologiapode fornecer ao Direito, sem desejar ir além do que lhe compete.

De acordo com Silva (2003), a evolução conjunta do Direitocom a Psicologia gera, então, a Psicologia Jurídica, consideradaapropriada para abarcar as questões aí envolvidas, desenvolvidaspelos psicólogos nomeados peritos para dirimir controvérsias nocampo da psicologia e trazidas ao judiciário, no que se refere aosconflitos emocionais e comportamentais, por meio de laudos e pa-receres que servem de instrumentos indispensáveis para que o juizpossa aplicar a justiça.

“A relação entre Psicologia e Direito é antiga, mas a pós-modernidade exige atuação interdisciplinar caracterizada por inter-venções sistêmicas em áreas diversificadas que facilitem o real eamplo alcance do exercício dos Direitos humanos” (CArVAlhO;MIrAnDA, 2008, p. 18).

A PsicologiA e o Direito ciVil

Em matéria cível é comum a atuação do psicólogo jurídicoem ação de interdição, anulação de casamento, guarda de meno-res, regulamentação de visitas, perda do poder familiar, separaçãoconjugal, pensão alimentícia, verificação de validade de ato jurídico,contratual e testamentária.

Segundo Carvalho (2007), outras atividades propostas paraa atuação do psicólogo jurídico são: mediação, reuniões interdisci-plinares, grupos de pais e adolescentes em conflito com a lei, orien-tação a familiares de apenados, grupos com sujeitos em

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cumprimento de pena e envolvidos com dependência química,grupo de crianças e adolescentes abrigados, plantão psicológicona Delegacia do Adolescente.

nas ações de interdição é necessário apurar a capacidadecivil do cidadão, ou seja, se a pessoa é ou não capaz de administrarpsicologicamente a si e a seus bens, com discernimento e probidade.

Para romero e Matos (2007), nas ações de investigaçãode paternidade o psicólogo jurídico desenvolve estudos e buscacompreender aspectos de interface entre o campo do Direito e oda Psicologia, ampliando a visão jurídica na compreensão do fenô-meno do não reconhecimento de paternidade sob a ótica social epsíquica.

nas Varas de família, segundo Arantes (2004), é comumse deparar com a disputa pela guarda dos filhos entre um casal emdissolução conjugal, sob alegações de infidelidade, uso de drogas,um cônjuge possuir menor renda ou trabalhar fora de casa ou não.

Para Silva (2003), nesses casos de questões familiares, aperícia psicológica torna-se necessária e admissível quando se re-conhece a existência de pessoas com atitudes inconvenientes en-volvidas no litígio, pois se sabe que por detrás desses atos podemestar latentes determinações que a razão desconhece. O juiz,então, formulará quesitos a serem respondidos pelo perito, quecomprovará ou não as alegações. O resultado da perícia apontaráuma das partes como sendo a que reúne as melhores condiçõespara a guarda dos filhos.

Diante disso, Brito, Ayres e Amendola (2006) destacam quea escuta da criança adquire diferentes pesos dependendo da causaem julgamento, ressaltando que o assessoramento da equipe téc-nica à Vara de família deve avaliar se está sendo proporcionado ocumprimento dos direitos e deveres à criança, as filiações maternae paterna, observando a responsabilidade educativa dos pais.

De acordo com Silva (2003), ao atuar nas Varas da Infânciae Juventude, em processos cuja natureza é a adoção, o psicólogoatua preventivamente, acompanhando as pessoas interessadas emadotar e serem adotadas, avaliando as questões afetivo-emocio-nais inerentes à adoção. Os estudos realizados pelos psicólogosvisam adequar o adotando às famílias afins e favorecer uma rela-ção familiar satisfatória. Com o auxílio psicológico os pais poderão

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melhor enfrentar a realidade de uma criança que já sofreu situaçãode abandono ou rejeição inicial, e essa convivência terá êxito ape-nas quando puderem lidar com a própria história (principalmentese houver casos de infertilidade ou esterilidade), ou mesmo com ofato de não terem conseguido gerar o filho biológico que pretendiam.

“Uma adoção mal formalizada pode acarretar na criançaconseqüências como: hiperatividade e agressividade; problemasde aprendizagem; enurese noturna; dificuldades afetivas e com-portamentais; baixa auto-estima” (SIlVA, 2003, p. 101).

Concernente à guarda ou tutela, Silva (2003) ressalta queo psicólogo jurídico avaliará a motivação da família que vislumbraguardar ou tutelar alguém e a interação de ambos, analisando ascondições materiais e emocionais dos envolvidos no caso, bemcomo deverá observar a criança no convívio familiar, evitando a for-mação de vínculo com aqueles que guarnecem ou proporcionamambientes moralmente perniciosos.

A mesma autora ressalta que o atendimento psicológico àcriança ou ao adolescente vítimas de qualquer tipo de violência,seja física, sexual ou psicológica, deve ser direcionado ao resgateda autoestima, voltando-se para a conscientização de si mesmo,em termos do corpo (sexualidade) e das emoções, a fim de que otrauma não se agrave e não se perpetue. ressalte-se que, alémdas crianças e adolescentes, a família também necessita de acom-panhamento psicoterapêutico.

De acordo com Cesca (2004), para enfrentar a violência do-méstica são necessárias, além de medidas punitivas, ações queestejam voltadas para a prevenção, e, ainda, medidas de apoio quepermitam, por um lado, à vítima e a sua família terem assistênciasocial, psicológica e jurídica necessárias à recomposição após aviolência sofrida e, por outro lado, que proporcionem a possibilidadede reabilitação dos agressores.

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o PsicÓlogo nA PenitenciÁriA

fala-se em verdadeira individualização da pena quando oajustamento do programa de execução, durante a fase executória,se der conforme a reação observada no condenado, pois nem todopreso deve ser submetido ao mesmo programa de execução.

Individualizar a pena, na execução, consiste em dar a cadapreso as oportunidades e os elementos necessários para lograr asua reinserção social. A individualização inicia-se com a indispen-sável classificação dos condenados a fim de serem destinados aosprogramas de execução mais adequados, conforme as condiçõespessoais de cada um.

Segundo Sá (2007), para um procedimento científico declassificação dos apenados e de individualização da execução éimprescindível a realização do exame de personalidade, pois é im-portante conhecer a realidade irredutível do indivíduo, sem esque-mas preconcebidos, ainda que pertinentes à dinâmica do atocriminoso.

Conforme nucci (2005), o exame de classificação é maisamplo e genérico, envolvendo aspectos relacionados à personali-dade do condenado, seus antecedentes, sua vida familiar e social,sua capacidade laborativa, entre outros fatores, aptos a evidenciaro modo pelo qual deve cumprir sua pena no estabelecimento peni-tenciário (regime fechado ou semiaberto).

De acordo com Saffi e Bemvenutto (2003, p. 252), “a inser-ção do psicólogo, além de ser um fato legislado, tornou-se neces-sária como parte integrante da dinâmica funcional diária dainstituição”.

Com relação à Execução Penal, Costa (2006) dispõe quecabe ao psicólogo averiguar o grau de periculosidade, a fim de pro-porcionar dados ao juiz quanto à melhor medida de segurança, le-vantando características de personalidade do sujeito, como suascapacidades, aptidões, valores, relações interpessoais e dificulda-des, com o intuito de tornar possível um programa individual decumprimento de pena que tornaria mais efetivo o intento de trata-mento no sistema penitenciário.

Segundo Sá (2007, p. 196):

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o exame de personalidade não visa oferecer elementos deprova, elementos instrutórios sobre nenhum fato específico.Seu objetivo é claro: conhecimento amplo e profundo dapessoa do apenado, da personalidade do apenado, en-quanto pessoa. Pessoa não é nenhum fato específico.

Os internos devem ser submetidos a vários processos te-rapêuticos e os exames devem ser repetidos com certa regulari-dade. nesses casos, de acordo com Costa (2006), cabe à períciadefinir precisamente seu funcionamento psíquico para que seja de-senvolvido, dentro do possível, um trabalho terapêutico mais pro-ducente, que valorize os recursos pessoais. As perícias, nessescasos, têm o valor de acompanhamento do interno durante o cum-primento da pena, auxiliando o juiz na manutenção, nas regres-sões, progressões ou conversões de regime.

Para nucci (2005), o exame criminológico é mais especí-fico, abrangendo a parte psicológica e psiquiátrica do exame declassificação, pois concede mais atenção à maturidade do conde-nado, sua disciplina, grau de agressividade, visando à composiçãode um conjunto de fatores, destinados a construir um prognósticode periculosidade, isto é, sua tendência a voltar à vida criminosa.

nas perícias que se repetem durante o período de interna-ção, seria aconselhável que o psicólogo avaliasse também os efeitosdo aprisionamento, pois, conforme zimerman et al. (2003), citado porCosta (2006, p. 176), é bastante conhecido o fenômeno de assimi-lação da cultura carcerária, que pode terminar de deteriorar a perso-nalidade do detento; o modo como esse fenômeno se dá dependede personalidade para personalidade e deve ser enfocado pelo peritocomo um alerta para possíveis modificações no programa.

Segundo nucci (2005), o exame de classificação, o examecriminológico e o parecer da Comissão técnica de Classificaçãonão diferem na prática, constituindo uma única peça feita, porvezes, pelos mesmos profissionais em exercício no estabeleci-mento prisional.

Como ensina Mirabete (2000, p. 51), “as duas perícias, acriminológica e a da personalidade, colocadas em conjugação, ten-dem a fornecer elementos para a percepção das causas do delitoindicadores para sua prevenção”.

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A criminologiA e A ressociAliZAÇÃo

Atualmente, notam-se posturas que servem de alerta paratodos e dizem respeito à banalização da violência e do mal. Pareceque muitos não mais se preocupam com o cometimento de delitos,pois é fácil encontrar notícias diárias acerca da ocorrência de furtos,roubos, sequestros e cárcere privado, homicídios, lesões corporais,nas várias regiões do país. E isso, para os autores dos delitos, pa-rece postura comum, vez que, corajosos e impassíveis, enxergamna impunidade a força para novas investidas criminosas.

Segundo Bernardini (2007, p. 47), “a Psicologia na área ju-rídica e na área da criminologia tem contribuído de forma eficaz,diante da enorme velocidade de mudanças comportamentais quea sociedade tem apresentado principalmente no que se refere àviolência”.

A sociedade, por sua vez, não protegida integralmente peloEstado, assiste, inconformada, a propagação da desordem. há anoção de uma letargia que faz dissipar os limites civilizatórios ecrescer a figura da vulgarização do ilícito, que passa a ser enxer-gado pela sociedade como um costume. O tratamento para essamácula social deve ser levado diretamente ao nascedouro da ques-tão, ou seja, na formação dos cidadãos, e esta se faz com educa-ção, escolas e sadio convívio social. não há como consertarposturas de elementos sociais cuja fibra enrijecida rejeita emenda,porém, simples é a moldagem do infante que recebe os primeirosensinamentos e formação propensos à construção de cidadãos dig-nos e justos.

De acordo com Calhau (2007, p. 85):

A Criminologia é a ciência que estuda o fenômeno criminale, em resumo, busca o seu diagnóstico, prevenção e seucontrole. Para tanto, ela utiliza uma abordagem interdiscipli-nar e se vale de conhecimento específico de outros setorescomo a sociologia, psicologia, biologia, psiquiatria etc., paralançar um novo foco, com a busca de uma visão integradasobre o fenômeno criminal.

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O mesmo autor ressalta que a Criminologia tem buscadojunto à Psicologia entender como os fatores vivenciados durante ainfância e a adolescência influenciam o ser humano em desenvol-vimento, propiciando situações que o predisponham ao envolvi-mento futuro com crimes, em especial os praticados com violênciaou grave ameaça.

A agressividade está contida nas formas de violência, mas,por si só, não a justifica. As providências sociais para a manutençãoda vida em grupo estimulam a convivência por um sentido constru-tivo ou destrutivo. De acordo com Bemvenuto (2006), para a com-preensão do comportamento humano é preciso verificar se asociedade está conseguindo ou não criar condições adequadaspara a construção individual, e não apenas dispondo de mecanis-mos contensores de ordem jurídica: as leis.

Somente com ações educacionais é que se promove de-senvolvimento social.

“O impacto da violência vai além do período de exposição;mais que os prejuízos imediatos, ela repercute pela vida afora. Oimpacto também varia de acordo com cada cultura, que influencianormas, crenças, valores, expectativas de condutas e reações”(GArCIA, 2003, p.118).

De acordo com Bernardini (2007, p. 48):

O trabalho do Psicólogo Jurídico não é apenas um trabalhovoltado às avaliações e pareceres, mas uma tarefa de res-gate aos valores, vivências e transmissão de experiências.não é terapia aos dissociais, mas seqüência de atividadesterapêuticas para homens e mulheres que experimentarama vida do crime e têm dificuldades em evitar as infrações,especialmente em relação ao uso de álcool e drogas. E maisque isto, é fortificar os laços que unem o homem a seumundo familiar e social, contribuindo para que este incorporeo respeito e conservação do mundo de valores dessa socie-dade.

no mesmo sentido, Saffi e Bemvenutto (2003) ressaltamque no processo de reabilitação a família do preso também deveráser incluída, pois é a representante principal da comunidade, tra-balhando-se as semelhanças, os contrastes e os aspectos que

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devem ser harmonizados, correspondendo ao sentenciado e a suareinserção social.

A Psicologia Jurídica tem uma missão árdua, porém profí-cua, colocando como meta de seu trabalho a socialização e a re-construção como meio de reduzir a reincidência criminal.

Para Bernardini (2007, p. 47),

é interessante dar destaque para o fato de que, dentro do sis-tema penitenciário, a Psicologia vem aproveitando o conheci-mento já adquirido para contribuir na construção de mais umcaminho para a ressocialização, ou melhor, na socialização dehomens e mulheres presos.

Para o retorno à convivência social, o agente passa pornovas perícias, que têm a finalidade de prever o risco de reincidên-cia criminal. De acordo com Costa (2006), a intenção é não devol-ver à sociedade indivíduos não tratados, embora se saiba o quãoprecário é o sistema penal e quão árduo é o trabalho nessas insti-tuições; por isso, é de suma importância que o psicólogo desen-volva uma visão de conjunto das perícias realizadas, ao longo documprimento da pena, com o objetivo de acompanhar os aspectospsíquicos em desenvolvimento e de facilitar o preparo do presopara o retorno à sociedade.

O mesmo autor ressalta que, em termos de perícia, sobre-tudo nessa fase, a assimilação das normas e dos padrões sociais,a capacidade de sentimento e empatia na relação com o outro e ahabilidade em prever as consequências de seus atos e controlarseus impulsos são quesitos extremamente importantes de seremavaliados.

A imPortÂnciA Dos instrUmentos PsicolÓgicos

Os testes psicológicos têm lugar preponderante na realiza-ção das perícias, constituindo como elemento essencial para odiagnóstico e prognóstico a serem atingidos, e muitas vezes serão

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necessárias a aplicação de uma combinação deles na chamada“bateria de testes” aplicada pelos psicólogos.

De acordo com Arantes (2004), a perícia é um dos proce-dimentos mais utilizados na área jurídica e tem como objetivo for-necer elementos tendentes a prevenir a formação da convicçãojudicial que resultará na elaboração da sentença, dentro do queimpõe a lei. A perícia pode ser solicitada para averiguação de peri-culosidade, das condições de discernimento ou sanidade mentaldas partes em litígios ou em julgamento.

Deve o psicólogo, também, examinar os autos do processoda ação penal ou da execução para obter melhores esclarecimen-tos dos mecanismos biopsicossociais que levaram o condenado àprática da infração penal. Dessa forma, Costa (2006) ressalta que,como resultado da leitura dos autos e das entrevistas, o psicólogoadquire um panorama do contexto psíquico sobre o qual algumashipóteses, com respeito à estrutura e dinâmica do periciando,podem ser traçadas. Sendo este o momento para fundamentar aescolha dos exames subsidiários, tanto pelo médico (ressonânciamagnética, eletroencefalografia, tomografia computadorizada eassim por diante) quanto pelo psicólogo (avaliação neuropsicoló-gica, testes de inteligência, inventários, escalas psicométricas, tes-tes projetivos, o teste de rorschach).

Assim, Costa (2006) ressalta que ao lado da notável impor-tância das avaliações neuropsicológicas e dos testes de inteligên-cia, os exames de personalidade alcançam um valor bastanteespecífico no psicodiagnóstico do periciando. Os exames de per-sonalidade têm como objetivo esclarecer a organização psíquicaparticular de cada personalidade sobre a qual o indivíduo operaentre os mundos interno e externo e entre a percepção de si próprioe do outro.

De acordo com Silva (2000), citado por Costa (2006, p.172), após o psicólogo se inteirar dos autos do processo é funda-mental escolher os instrumentos de avaliação psicológica neces-sários para a identificação dos seguintes caracteres:

a) Quais são as perguntas cujas respostas se esperam obterpor meio dos instrumentos.b) O que cada instrumento pode oferecer, seus limites e sua

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abrangência.c) Quais processos psíquicos cada instrumento mobiliza.d) Quais são as contra-indicações para a utilização de de-terminado instrumento.e) Duração do tempo gasto na aplicação, correção e aná-lise.f) Como utilizar o instrumento de modo pertinente ao con-texto de perícia, lembrando que os dados descritos em rela-tório devem orientar o juiz e a determinação da sentença.

De acordo com Costa (2006), alguns psicólogos apenasdescrevem os resultados dos diferentes instrumentos utilizados naperícia, não os articulando entre si e nem os relacionando com oseu conhecimento teórico sobre o assunto; passam a ser relatóriosora descritivos e superficiais, ora incoerentes e ambíguos. Dessemodo, é importante que o psicólogo articule os resultados dos ins-trumentos utilizados de forma coerente e concatenada com toda adiscussão do caso, sobretudo na elaboração do laudo, que implicauma argumentação teórica fundamentada e consistente.

Por isso, para atuar no meio jurídico, seja perante o PoderJudiciário, Ministério Público, Conselho tutelar de Menores, Dele-gacias ou qualquer outra instituição, é necessário que o profissionalde Psicologia tenha no mínimo uma especialização em PsicologiaJurídica, o que permitirá a realização de trabalhos que sejam, aofinal, compreensíveis e esclarecedores.

Segundo Costa (2006), são os exames de personalidadeque revelam a dinâmica das forças psíquicas conscientes e incons-cientes que confluem no ato criminoso. Entre esses exames, aProva do rorschach revela-se como o instrumento mais rico portraduzir a estrutura e a dinâmica da personalidade de modo com-pleto. Desse modo, a Prova do rorschach é o exame indicado paraas avaliações mais delicadas e difíceis.

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UtiliZAÇÃo Do teste ProJetiVo rorscHAcH nAPerÍciA

O método rorschach foi criado pelo psiquiatra suíço her-mann rorschach, nascido em zurique aos 8 de novembro de 1884.O Psicodiagnóstico rorschach é um teste projetivo, capaz de cap-tar a vivência subjetiva do sujeito, bem como seus dinamismos,suas áreas de potencialidades e de patologia.

O teste constitui-se de dez pranchas padronizadas, com-postas por manchas de tinta, cuidadosamente selecionadas, demodo que cumpram com certos requisitos de composição e ritmoespacial; são simétricos, o que condiciona o teste de maneira igualpara destros e canhotos, sendo que essa simetria ainda favoreceas interpretações das pessoas inibidas ou bloqueadas (BOhM,1920 citado por PEtrEllI, 2005).

O mesmo autor alude que este teste revela a organização bá-sica da estrutura da personalidade, bem como características da afe-tividade, sexualidade, vida interior, recursos mentais, energia psíquicae traços gerais e particulares do estado intelectual do indivíduo.

De acordo com Costa (2006), o Psicodiagnóstico rorschaché considerado como um tradutor dos mecanismos estruturais do fun-cionamento psíquico, que se tornam evidentes pela determinaçãode certas características das manchas (cor, luminosidade, forma, usodos ângulos das manchas para a produção de movimento ou atri-buição de perspectiva) no processamento da percepção.

Afirma Petrelli (2005) que o Psicodiagnóstico rorschachproporciona o desvelar da experiência de alguém, permitindo a lei-tura por meio dos fenômenos perceptivos. É preciso ver o drama,e não apenas a situação momentânea, ver além das coisas quesão corriqueiras em Psicologia, isto é, o quanto de funções da in-teligência, da cognição, da volição, configurações, dinamismos taiscomo agressividade, ansiedade, a gestão da genitalidade, a admi-nistração da identidade, do poder, etc. É preciso entrar nos signifi-cados dos fenômenos perceptivos.

Desse modo, Costa (2006) ensina que o Psicodiagnósticororschach traz dados valiosos sobre a estrutura e a dinâmica dapersonalidade, a compreensão da constituição das bases afetivas

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sobre as quais repousa todo o funcionamento psíquico, da quali-dade das fantasias, assim como as concepções ligadas à percep-ção de si e do ambiente, as reações afetivoemocionais e ascondições para a ação prática no ambiente são aspectos centraisem uma leitura integrada de um protocolo de rorschach.

De acordo com Vaz (1997, p. 6-7):

O rorschach é considerado como um instrumento capaz defornecer subsídios para avaliação da estrutura da persona-lidade do sujeito e o funcionamento de seus psicodinamis-mos. Através da técnica avaliar seus traços depersonalidade, o funcionamento de suas condições intelec-tuais, o nível de ansiedade básica e situacional, a depressão,suas condições efetivas e emocionais; fornece-nos condi-ções para vermos como está a pessoa quanto ao controlegeral, quanto à capacidade para suportar frustrações e con-flitos, quanto à adaptação ao trabalho e ao ajustamento e in-tegração humanos; impulsos, instintos, reações emocionais,nível de aspiração, são outros elementos psicodinâmicosavaliáveis através do rorschach. Além disso, é um instru-mento capaz de auxiliar o examinador no diagnóstico de pa-ciente com problemas de interferência neurológica e comperturbação ou desvio de conduta.

Segundo Costa (2006), as possibilidades e as formas decontrole dos impulsos, assim como a consciência das motivaçõespessoais em um comportamento manifesto, são dados eminentesem um protocolo de rorschach. A capacidade de suportar frustra-ções, de reagir ao estresse e aos níveis de ansiedade, assim comoos modos de manejá-la, são evidentes à luz dos dados oriundosda aplicação de rorschach.

Acentua Santiago (1998) que, ao avaliar a prática do rors-chach, o instrumento não deve ser utilizado somente como umaconclusão diagnóstica, mas também como uma intervenção quepossibilite à pessoa, uma vez dimensionada suas dificuldades,compreender como se relaciona consigo, com o mundo e com osobjetos, bem como se perceber como campo de possibilidades.

Ensina Costa (2006) que o rorschach traz dados riquíssi-mos a respeito da forma particular de integração do indivíduo com

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o seu ambiente social.nessa perspectiva, para Petrelli (2003), o psicodiagnóstico

rorschach não colhe o sujeito na sua história passada, mas emsuas interações, presentes com um sistema penal e carcerário vio-lento, impiedoso, em que os níveis de agressividade tendem a au-mentar. logo, não se pode defender o rorschach como uminstrumento absoluto de diagnóstico do sujeito, mas sim com o sis-tema jurídico penal. O sujeito reage a situações presentes, e nãoantecedentes, sendo necessário, portanto, integrar os dados rors-chach com os dados da história de vida interior para a obtenção deum núcleo profundo de personalidade.

O mesmo autor ressalta que o objetivo da utilização do testerorschach como instrumento de pesquisa e de conhecimento dosujeito não deve ocorrer de forma a estigmatizar a pessoa que serásubmetida ao teste, visto que os estudos apontam para uma atitudemais humanizada por parte dos profissionais envolvidos nesse pro-cesso. todavia, não se pode negar a eficiência desse instrumento,tanto para se conhecer as dificuldades quanto as potencialidadesdos sujeitos.

Ainda, para Petrelli (2005) é difícil contestar a riqueza doteste de rorschach e a sua amplitude quando se fala em acesso àpersonalidade do sujeito. trata-se de um teste que permite ir deencontro às peculiaridades do indivíduo, de forma mais sutil e ética,fornecendo uma grande quantidade de informações, tanto no quese refere aos aspectos mais comprometidos de sua estruturaquanto às áreas de potencialidades. Dessa forma, além de ser umteste de grande reconhecimento, é indicado com bastante confia-bilidade para as áreas clínica, forense, organizacional, hospitalar eescolar.

conclUsÃo

É preciso discutir uma interdisciplinaridade entre a Psicolo-gia e o Direito, com o intuito de garantir um espaço relacional que

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proporcione mudanças no universo comunicativo de interação entreos juízes, promotores, defensores, psicólogos e assistentes sociaisde um Setor Psicossocial forense.

Um efetivo diálogo entre essas duas áreas de conheci-mento, bem como uma análise reflexiva da importância da interdis-ciplinaridade como instrumento, pode possibilitar a diminuição daviolência intrafamiliar e a promoção da Justiça.

Deve estar claro para o psicólogo que não lhe cabe desco-brir se o agente realmente cometeu o delito ou não, isso é funçãoda investigação policial. Ao psicólogo é dada a função de conhecer,dentro do praticável, o mundo psíquico do indivíduo, de forma queseja possível construir hipóteses capazes de explicar sua condutadelituosa.

A interação dessas ciências tornará mais efetivas as deci-sões judiciais, uma vez que os trabalhadores do Direito e da Psi-cologia serão coautores em ações conjuntas, a fim de conciliar aaplicação da lei com suas necessidades.

Dessa forma, as abordagens afetas à psicologia trespas-sam a barreira das usuais avaliações em casos singulares e ga-nham o patamar da grande importância quando analisam as reaisnecessidades e temores da sociedade, visando contemporizá-los,contribuindo por engrandecer constantemente a humanidade in-teira.

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