microbiologia de lodos ativados
TRANSCRIPT
UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E TECNOLOGIA
CURSO DE ENGENHARIA QUÍMICA
MICROBIOLOGIA DE LODOS ATIVADOS
DA EMPRESA FRAS-LE
Monografia apresentada para a obtenção do título de Bacharel em Engenharia Química. Orientador: Lademir Luiz Beal Co-orientadores: Ilde Borella e Raquel Finkler
CRISTIANE BOFF MACIEL
Caxias do Sul
2002
MICROBIOLOGIA DE LODOS ATIVADOS DA EMPRESA FRAS-LE
BANCA EXAMINADORA
Prof. M.Sc. Lademir Luiz Beal__________________________________
Prof. M.Sc. Ilde Borella________________________________________
M.Sc. Raquel Finkler__________________________________________
Dra. Cláudia Teixeira Panarotto__________________________________
Estudante Cristiane Boff Maciel_________________________________
iii
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho aos meus
pais Irene Boff Maciel
e Assis Borges Maciel
pelo exemplo e incentivo.
iv
AGRADECIMENTOS
A empresa Fras-le S.A pela oportunidade dada a mim para a realização desta
monografia.
Ao professor M.Sc. Lademir Luis Beal pela orientação e confiança demostrada.
Aos co-orientadores M.Sc. Raquel Finkler e M.Sc. Ilde Borella pela orientação,
pelas dicas, sugestões e estímulo.
As colegas, mas principalmente amigas, Nilcéia , Giovana e Daniela, pelo apoio
durante todo este trabalho.
Ao corpo técnico do laboratório químico da Fras-le pelo auxílio na execução das
análises e observação microbiológica.
Ao meu namorado João Francisco Mattana Ramos por acolher as minhas queixas,
meus sofrimentos, meu desânimo, pelas suas palavras de conforto, pela sua paciência, enfim pelo
seu amor.
Aos meus amigos, os quais não cito nomes pois inevitavelmente esqueceria
alguém, pela força e incentivo mesmo quando não estava próxima.
À Deus, sobretudo.
v
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO........................................................................................................... 13
2 OBJETIVOS................................................................................................................ 16
2.1 OBJETIVO GERAL ............................................................................................. 16
2.2 OBJETIVOs ESPECÍFICOS................................................................................ 16
3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA...................................................................................... 17
3.1 QUALIDADE DAS ÁGUAS................................................................................. 17
3.2 DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NA NATUREZA ..................................................... 18
3.3 POLUIÇÃO DAS ÁGUAS ................................................................................... 19
3.4 LANÇAMENTO DE REJEITOS NO AMBIENTE ............................................... 21
3.5 TRATAMENTO DE ÁGUAS RESIDUÁRIAS INDUSTRIAIS.............................. 22
3.5.1 Processos e Graus de Tratamento de Efluentes ......................................... 24
3.5.1.1 Operações Unitárias ...................................................................... 24
3.5.1.2 Processos de tratamento ................................................................ 26
3.5.1.3 Graus de tratamento ...................................................................... 27
3.6 TRATAMENTO BIOLÓGICO DE ÁGUAS RESIDUÁRIAS................................ 28
3.7 LODOS ATIVADOS............................................................................................. 30
3.7.1Vantagens e Desvantagens do Tratamento Biológico com Lodos Ativados 32
3.7.2 Variações do processo................................................................................ 34
3.7.3 Fatores que afetam o processo de Lodos Ativados .................................... 35
3.7.4 Sistemas de aeração ................................................................................... 37
3.7.5 Transferência de Oxigênio (N) ................................................................... 37
3.7.6 Cinética do Processo.................................................................................. 39
vi
3.7.7 Consumo de oxigênio ................................................................................. 41
3.7.8 Requisitos de nutrientes.............................................................................. 43
3.7.9 Condições Relativas ao Lodo ..................................................................... 45
3.7.9.1 Produção de Lodo (∆X) ................................................................. 45
3.7.10 Parâmetros de controle ............................................................................ 46
3.7.10.1 Teor de Lodo (TL) ........................................................................ 46
3.7.10.2 Índice Volumétrico de Lodo (IVL) ............................................... 47
3.7.10.3 Idade do Lodo (θ)......................................................................... 47
3.7.10.4 Fator de Carga (A/M) .................................................................. 48
3.7.11 Recirculação do Lodo (r) ......................................................................... 48
3.7.12 Microbiologia do Processo de Lodos Ativados........................................ 50
3.7.12.1 A Formação de Flocos ................................................................. 50
3.7.12.2 Nutrição dos Microrganismos ..................................................... 54
3.7.12.3 Respiração dos Microrganismos ................................................. 55
3.7.13 Microbiota existente nos Processos de Lodos Ativados........................... 56
3.7.13.1 Identificação dos protozoários..................................................... 63
3.7.13.2 Identificação dos metazoários...................................................... 67
3.7.14 Fatores que afetam a composição da microfauna ................................... 69
4 METODOLOGIA........................................................................................................ 73
4.1 DADOS DA EMPRESA ....................................................................................... 73
4.2 DESCRIÇÃO DO PROCESSO DA ESTAÇÃO DE TRATAMENTO DE
EFLUENTES ....................................................................................................... 74
4.3 COLETA DAS AMOSTRAS ................................................................................. 82
vii
4.4 PARÂMETROS FÍSICO-QUÍMICOS MONITORADOS..................................... 83
4.5 ANÁLISE MICROBIOLÓGICA MONITORADA ................................................ 84
4.6 ANÁLISE ESTATÍSTICA DOS DADOS .............................................................. 87
5 RESULTADOS E DISCUSSÕES ................................................................................ 88
5.1 CARACTERÍSTICAS FÍSICAS E QUÍMICAS DO EFLUENTE PROVENIENTE
DO SISTEMA DE LODOS ATIVADOS............................................................... 88
5.2 CARACTERIZAÇÃO MICROBIOLÓGICA....................................................... 100
6 CONCLUSÃO........................................................................................................... 112
7 RECOMENDAÇÕES ................................................................................................ 115
8 BIBLIOGRAFIA........................................................................................................ 116
viii
LISTA DE QUADROS
Quadro 3.1-Requisitos mínimos de nutrientes. ............................................................................. 44
Quadro 3.2-Principais microrganismos presentes no processo de lodos ativados. ..................... 60
Quadro 3.3-Microrganismos indicadores das condições de depuração....................................... 61
Quadro 3.4-Relação entre a observação de protozoários e o funcionamento da estação de
tratamento no processo de lodos ativados. .............................................................. 62
Quadro 4.1-Metodologia utilizada para determinação de parâmetros físco-químicos (Standard
Methods for Examination of Water and Wasterwater, 18ª edição (1992)). ............. 83
Quadro 4.2-Cronograma de análises da estação de tratamento de efluentes. ............................. 84
Quadro 5.1-Variáveis de controle calculadas para o reator biológico. ....................................... 89
Quadro 5.2-Características do efluente proveniente do decantador secundário – Fras-le unidade
Forqueta, nos meses de janeiro a maio de 2002...................................................... 91
Quadro 5.3-Média das características do efluente final da empresa Fras-le, nos meses de janeiro
a maio de 2002..........................................................................................................92
Quadro 5.4-Espécies identificadas no reator biológico da ETE da empresa Fras-le, de acordo
com seus grupos taxonômicos. ................................................................................. 101
ix
LISTA DE FIGURAS
Figura 3.1 - Distribuição da água na Terra. . .............................................................................. 18
Figura 3.2 - Esquema do processo de lodos ativados. ..................................................................31
Figura 3.3 - Relação de produção de lodo e remoção de DBO entre vários processos de lodos
ativados.....................................................................................................................40
Figura 3.4 - Degradação da matéria orgânica..............................................................................41
Figura 3.5 - Itens componentes do balanço de massa do sistema de lodos ativados....................49
Figura 3.6 - Modelo de curva de crescimento bacteriano em cultura pura..................................53
Figura 3.7 - Representação esquemática das curvas de população de microrganismos em relação
ao tempo de aeração e à estabilização de um despejo industrial orgânico..............58
Figura 4.1 - Fluxograma simplificado da estação de tratamento de efluentes..............................75
Figura 4.2 – Foto do decantador primário da ETE Fras-le..........................................................77
Figura 4.3 – Foto do reator biológico da ETE Fras-le.................................................................78
Figura 4.4 - Vista parcial do decantador secundário da ETE Fras-le..........................................79
Figura 4.5 - Foto do filtro biológico da ETE Fras-le ..................................................................79
Figura 4.6 - Foto da lagoa de polimento da ETE Fras-le.............................................................80
Figura 4.7 - Foto do filtro de carvão ativado da ETE Fras-le......................................................81
Figura 4.8 – Foto do Microscópio Olympus, modelo BH-2 utilizado na visualização dos
microrganismos.......................................................................................................85
Figura 5.1 - Variação dos parâmetros operacionais A/M e Carga Orgânica Volumétrica..........90
Figura 5.2 - Variação de DQO observada durante o período de 21 de janeiro a 15 de maio de
2002, na entrada do reator biológico e na saída do decantador secundário...........93
x
Figura 5.3 - Variação de pH observada durante o período de acompanhamento........................94
Figura 5.4 - Desempenho do reator biológico, durante o período de observação, quanto aos
parâmetros Oxigênio Dissolvido (OD) e Sólidos Suspensos Voláteis (SSV)............96
Figura 5.5 - Concentração de DBO5 na entrada e saída do reator biológico...............................98
Figura 5.6 - Gráfico que apresenta a relação de DBO:N:P para entrada do reator biológico....99
Figura 5.7 - Foto do ciliado fixo do gênero Vorticella sp, presente no lodo no dia 15 de abril de
2002. (aumento 200x)..............................................................................................103
Figura 5.8 - Destaque do protozoário do gênero Euplotes patella presente no lodo ativado do dia
17 de abril de 2002. (aumento 200x)......................................................................104
Figura 5.9 - Microfotografia dos protozoários presentes, Vorticella sp e Paramecium sp, no dia
17 de abril. (aumento 200x)....................................................................................106
Figura 5.10 - Microfotografia do lodo no dia 08 de março de 2002, em destaque microrganismo
do gênero Podophrya fixa (aumento 500x).............................................................107
Figura 5.11 - Destaque do protozoário Difflugia sp presente no lodo do dia 15 de abril (aumento
500 x).......................................................................................................................109
Figura 5.12 - Destaque dos microrganismos pertencentes a classe Rotífero do gênero Rotaria sp
(aumento 200x).......................................................................................................110
Figura 5.13 - Microfotografia do lodo no dia 15 de abril, destaque para o protozoário da classe
Rotífera e do gênero Philodinavus sp (aumento 200x)...........................................111
xi
LISTA DE SÍMBOLOS
ETE = Estação de tratamento de efluentes;
H2O = Água;
DBO5 = Demanda bioquímica de oxigênio (mg/L);
DQO = Demanda química de oxigênio (mg/L);
pH = Potencial de hidrogênio;
COT = Carbono orgânico total;
NT = Nitrogênio total (mg/L);
PT = Fósforo total (mg/L);
OD = Oxigênio dissolvido (mg/L);
CO2 = Dióxido de carbono;
NH3 = Amônia;
SSV = Sólidos suspensos voláteis (mg/L);
SST = Sólidos suspensos totais (mg/L);
COV = Carga orgânica volumétrica (kg DBO5/m3.dia);
A/M = Relação alimento/microrganismo (kg DBO5/kg SSV.dia);
IVL = Índice volumétrico de lodo (ml/g);
θ = Idade do lodo (dias);
TL = Teor de lodo (ml/L).
TRH = Tempo de retenção hidráulica (dias)
xii
RESUMO
O tratamento de águas residuárias pela ação de microrganismos, resulta na estabilização dos compostos orgânicos poluentes, através do emprego de reatores com diferentes configurações, constituindo verdadeiros ecossistemas microbianos. Entre as principais formas de tratamento de efluentes, destaca-se a do tipo lodos ativados. Neste processo, há o confinamento de microrganismos, em um reator, onde ocorrem diversas transformações que imitam o meio natural, resultando na redução da carga poluidora do efluente. Sendo assim, a investigação microscópica do lodo ativado fornece informações sobre o número de protozoários e metazoários, a estrutura e a forma dos flocos. O principal objetivo deste trabalho consistiu em avaliar o lodo do reator biológico da ETE da empresa Fras-le, através do monitoramento microbiológico e físico-químico, no período de 21 de janeiro a 17 de maio de 2002. O reator biológico opera com lodos ativados na modalidade aeração prolongada, que tem por finalidade reduzir, através do tratamento preliminar e secundário, a carga poluidora gerada pela empresa. No presente estudo foram relacionados parâmetros biológicos, físico-químicos e operacionais como forma de avaliação global da eficiência da estação. Verificou-se que os ciliados fixos estão correlacionados com uma boa sedimentação do lodo e a valores de sólidos suspensos totais baixos, e também indicam que o lodo é bom e maduro, resultando numa baixa DQO do efluente. As condições de pH e oxigênio dissolvido, bem como, a freqüente observação do microrganismo Aspidisca sp, indicam condições que contribuem para a nitrificação completa. O rotífero do gênero Philodinavus sp ocorreu com uma freqüência de 90,48 % dos dias monitorados, estando presente em praticamente todos os dias de observação. Estes microrganismos são bons indicadores do processo de estabilização da matéria orgânica no efluente, bem como de uma nitrificação completa. A análise da microfauna, apesar de pouco utilizada no país, é de extrema utilidade para uma melhor compreensão do processo que ocorre no interior de reatores biológicos e sua otimização. Não obstante, as análises microbiológicas não devem substituir as análises físico-químicas, mas complementá-las.
13
1 INTRODUÇÃO
A utilização de microrganismos no saneamento básico e ambiental é prática comum
desde os primórdios do desenvolvimento dos processos biológicos de tratamento de águas
residuárias e resíduos sólidos. A capacidade microbiana de catabolizar diferentes compostos
orgânicos, naturais ou sintéticos, e inorgânicos, servindo-se destes como fonte nutricional e
energética, possibilita o emprego desses microrganismos, pela Engenharia Ambiental, como uma
solução aos problemas gerados pelos rejeitos lançados no meio ambiente.
A habilidade notável de degradação de compostos por microrganismos é conseqüência
da evolução dos sistemas enzimáticos de células procariotas e eucariotas, as quais vêm
coexistindo, durante bilhões de anos, com uma enorme variedade de substâncias naturais de
diferentes origens. Esta diversidade de substratos potenciais ao crescimento microbiano resultou,
então, no aparecimento de enzimas aptas a transformar moléculas orgânicas com estruturas
bastante distintas.
O desenvolvimento do saneamento ambiental é conseqüência direta das atividades de
produção do homem em seu meio. O aumento das necessidades e anseios da sociedade moderna
industrializada, reflete-se no aumento de materiais descartados sob forma de esgotos e resíduos
sólidos. Portanto, soluções para os efeitos do acúmulo de materiais indesejáveis são prementes e
devem ser duradouras.
14
O tratamento de águas residuárias pela ação de microrganismos resulta na estabilização
dos compostos orgânicos poluentes, e emprega reatores (bioreatores) com diferentes
configurações, constituindo verdadeiros ecossistemas microbianos. O principal efeito dos
processos biológicos de tratamento de rejeitos é a despoluição ambiental.
Entre os diferentes métodos de tratamento biológico de efluentes, pode-se citar o
processo de lodos ativados, que é um método comum e versátil de estabilizar os resíduos
orgânicos presentes em águas residuárias. Este processo aeróbio consiste primeiramente, na
assimilação da matéria orgânica por uma massa ativa de microrganismos em suspensão.
Posteriormente, a ocorrência de floculação dos microrganismos e outros materiais coloidais em
suspensão tornam a biomassa (massa biológica), ou floco, sedimentável, o que determina a
produção de um efluente de qualidade elevada. A floculação ou aglutinação biológica permite a
separação dos microrganismos em suspensão, do meio líquido, dentro do decantador secundário,
proporcionando assim, o seu retorno ao tanque de aeração. Por conseguinte, a eficiência global do
processo de lodos ativados e, consequentemente, a qualidade do efluente final são diretamente
dependentes da sedimentabilidade do floco e do processo.
Além dos flocos que são formados de bactérias e protozoários, a microbiota desempenha
um importante papel no sistema de lodos ativados por clarificar o efluente, consumindo a matéria
orgânica particulada, e por ser ativo predador de bactérias, estimulando assim o seu crescimento.
A microbiota é utilizada como indicadora do conjunto de parâmetros de lodos ativados, uma vez
que sua natureza varia com o nível de depuração, concentração de oxigênio dissolvido, presença
de substâncias tóxicas, dentro do tanque de aeração.
Assim, a investigação microscópica do lodo ativado traz informações importantes que se
relacionam com o comportamento do processo de tratamento biológico.
15
Vale lembrar que são dois os objetivos do processo de lodos ativados: reduzir a carga de
poluição a níveis pré determinados e aceitáveis, e produzir um efluente límpido e clarificado.
Para estes dois objetivos os microrganismos desempenham um papel fundamental, e sua
caracterização se torna um indicador importante no controle operacional do processo.
Desse modo, a regularidade da realização de exames microscópicos no lodo biológico do
tanque de aeração pode contribuir para uma melhor compreensão sobre a estrutura do floco do
lodo e da composição de sua biota.
Tendo em conta estas considerações, estabeleceu-se um controle biológico da estação de
tratamento de efluentes industriais da empresa Fras-le S.A, unidade Forqueta, na cidade de
Caxias do Sul - RS.
O presente estudo visa obter informações concernentes ao controle da biota do sistema
de lodos ativados através de análises microbiológicas, relacionando-as com aos resultados das
análises físico-químicas da estação de tratamento de efluentes.
16
2 OBJETIVOS
2.1 OBJETIVO GERAL
Avaliar o lodo de uma ETE tipo lodos ativados através do monitoramento
microbiológico, objetivando otimizar o processo.
2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
• Caracterizar a microbiota presente no tanque de aeração do processo de lodos
ativados da ETE da empresa Fras-le (Caxias do Sul, RS).
• Relacionar os parâmetros microbiológicos, físico-químicos e operacionais, como
forma de avaliação global da eficiência da estação no mesmo período.
17
3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
3.1 QUALIDADE DAS ÁGUAS
O conceito de qualidade da água é muito mais amplo do que a simples caracterização da
água pela fórmula molecular H2O. Isto porque a água, devido às suas propriedades de solvente e
à sua capacidade de transportar partículas, incorpora a si diversas impurezas, as quais definem a
qualidade da água.
A qualidade da água é resultante de fenômenos naturais e da atuação do homem. De
maneira geral, pode-se dizer que a qualidade de uma determinada água é função do uso e da
ocupação do solo na bacia hidrográfica. Tal se deve aos seguintes fatores (Von Sperling, 1996):
a) Condições naturais: mesmo com a bacia hidrográfica preservada nas suas condições
naturais, a qualidade das águas subterrâneas é afetada pelo escoamento superficial e
pela infiltração no solo, resultantes da precipitação atmosférica. O impacto nas
mesmas é dependente do contato da água em escoamento ou infiltração com as
partículas, substâncias e impurezas no solo.
b) Interferência do homem: a interferência do homem, quer de uma forma concentrada,
como na geração de despejos domésticos ou industriais, quer de uma forma dispersa,
como na aplicação de defensivos agrícolas no solo, contribui na introdução de
18
compostos na água, afetando a sua qualidade. Portanto, a forma em que o homem
usa e ocupa o solo tem uma implicação direta na qualidade da água.
3.2 DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA NA NATUREZA
A água é o constituinte inorgânico mais abundante na matéria viva: no homem, mais de
60% do seu peso é constituído por água, e em certos animais aquáticos esta porcentagem sobe a
98% (Dezotti, sem ano).
Os 1,36x108 m3 de água disponível existentes na terra distribuem-se da seguinte forma:
Figura 3.1 - Distribuição da água na Terra. Fonte: Dezotti, sem ano.
Como podemos observar apenas 0,6 % da água do planeta é de água doce e pode ser
utilizada mais facilmente para abastecimento público. Desta pequena fração de 0,6 %, apenas
2,27 % apresenta-se na forma de água superficial, de extração mais fácil. O Brasil tem uma
Água
Oceanos97,3 %
Água doce0,6 %
Geleiras2,1 %
Lagos1,48 %
Rios0,02 %
Umidade do solo0,77 %
Subterrânea97,73 %
19
posição privilegiada, pois possui uma das maiores reservas de água doce do mundo, sendo que
mais de 80% estão na Amazônia.
Segundo a Organização Mundial da Saúde – OMS – quase 25% de todos os leitos
hospitalares do mundo estão ocupados por enfermos portadores de doenças veiculadas pela água
(Dezotti, sem ano).
3.3 POLUIÇÃO DAS ÁGUAS
Segundo Von Sperling (1996), poluição das águas é a adição de substâncias ou de
formas de energia que, direta ou indiretamente, alterem a natureza do corpo d’água de uma
maneira tal que prejudique os legítimos usos que dele são feitos.
Conforme Braile (1979), existem essencialmente três situações de poluição, cada uma
delas característica do estágio de desenvolvimento social e industrial:
a) Primeiro estágio: poluição patogênica. Neste estágio, as exigências quanto à
qualidade da água são relativamente pequenas, tornando-se comuns as enfermidades
veiculadas pela água. O uso de estações de tratamento de água e sistemas de adução
podem prevenir os problemas sanitários neste estágio.
b) Segundo estágio: poluição total. Este estágio define-se como aquele em que os
corpos receptores tornam-se realmente afetados pela carga poluidora que recebem
(expressa como sólidos em suspensão e consumo de oxigênio). Embora neste
estágio, a “saúde” do corpo receptor seja diretamente afetada, os prejuízos à saúde da
população podem ser reduzidos se existirem estações eficientes de tratamento de
água e de esgotos. Este estágio normalmente ocorre durante o desenvolvimento
20
industrial e o crescimento das áreas urbanas. A tecnologia existe como medida
terapêutica.
c) Terceiro estágio: poluição química. Este estágio somente agora está sendo
identificado. É o estágio da poluição insidiosa, causada pelo contínuo uso da água. O
consumo de água aumenta em função do aumento da população e da produção
industrial. Cada dia é maior a quantidade de água retirada dos rios e maior e mais
diversa a poluição neles descarregada. Com o aumento da reutilização da água,
surgem problemas gerados pelos sólidos dissolvidos, que podem tornar a água
imprópria para os usuários de jusante, a menos que sejam adotados métodos
avançados e custosos de tratamento de despejos e de água de abastecimento.
Atualmente, os poluentes industriais que mais preocupam são os orgânicos,
especialmente os sintéticos e os metais pesados. A poluição por matérias orgânicas vem
crescendo muito, principalmente a partir do fim da Segunda Guerra Mundial, com a expansão
acelerada da indústria petroquímica (Braile, 1979).
Esse tema foi objeto de debate pela The World Commission on Environment and
Development, resumido abaixo, segundo Zehnder citado por Vazzoler (1999): “ Sustentabilidade
requer a conservação dos recursos ambientais, tais como manutenção da qualidade dos recursos
hídricos, dos solos, do ar e das florestas; conservação da diversidade genética; e utilização
eficiente de energia, água e materiais naturais. Aperfeiçoamento da eficiência dos mecanismos de
produção, afim de reduzir o consumo per capita dos recursos naturais e estimular a mudança de
tecnologias e de produção de materiais de consumo não poluentes. Todos os países são
conclamados a prevenir a poluição ambiental através do cumprimento de leis de proteção
ambientais, promover tecnologias com baixa geração de resíduos, e prever o impacto de novos
produtos, tecnologias e resíduos”.
21
3.4 LANÇAMENTO DE REJEITOS NO AMBIENTE
Os ecossistemas aquáticos possuem funções ambientais de indiscutível valor. Neles, os
nutrientes são reciclados, a água é purificada, as enchentes são atenuadas, os fluxos das águas são
conservados e ampliados, os lençóis freáticos são recarregados, e sobretudo, constituem fonte de
abastecimento de água para a vida vegetal, animal e humana.
Porém, o rápido aumento populacional em diversas partes do mundo, em conjunto com o
intenso desenvolvimento industrial, comercial e residencial, resultaram na poluição dos recursos
hídricos superficiais e subterrâneos por fertilizantes, pesticidas, inseticidas, óleos, percolados
tóxicos de aterros sanitários, enfim, uma enorme variedade de efluentes industriais e os
sanitários. O agravamento da situação pelo uso indiscriminado dos sistemas hídricos verificou-se
ainda, pelo aumento da demanda do consumo de água, que provoca a redução do fluxo de água
disponível no meio ambiente para a diluição dos despejos (Committee on Restoration of Aquatic
Ecosystems –EUA, 1992).
Em 1992, Griffiths indicou que apenas 10% do total mundial de águas residuárias estão
sujeitas a algum tipo de tratamento. O residual de 90% permanece no meio suscetível a auto-
purificação nos sistemas aquáticos.
No Brasil, a maioria dos ecossistemas aquáticos recebe toda a espécie de impactos
oriundos da atividade humana, sendo prováveis exceções algumas áreas da bacia amazônica e
corpos d’água situados em localidades bastante isoladas. O Brasil possui uma ampla rede
hidrográfica em relação ao mundo, e 51% dos sistemas existentes para a captação de águas de
abastecimento estão localizados em rios, nos quais são lançados cerca de 92% dos esgotos
gerados nas regiões (Tundisi & Barbosa citado por Vazzoler,1999).
22
3.5 TRATAMENTO DE ÁGUAS RESIDUÁRIAS INDUSTRIAIS
Os esgotos sanitários das cidades incluem quase sempre uma parcela de despejos
industriais, em geral de pequenas fábricas, postos de serviços, oficinas e fábricas de maior porte
que se localizam próximo ou nos centros urbanos, contribuindo com seus efluentes para a rede
pública de coleta de esgotos. Nas regiões metropolitanas a contribuição de despejos industriais
pode chegar a 30% da carga de esgotos.
É possível identificar cinco formas bastante típicas da contribuição de despejos líquidos
nas indústrias (Jordão, 1997):
a) Águas de rejeito de processo;
b) Águas servidas de utilidades;
c) Águas pluviais contaminadas;
d) Águas pluviais não contaminadas;
e) Esgotos sanitários.
Estes despejos caracterizam-se por apresentar uma enorme variedade de poluentes, tanto
em tipo e composição, como em volumes e concentrações. Variam de indústria para indústria, e
muitas vezes dentro do mesmo grupo de fabricação. Podem ocorrer, além disso, variações diárias
e horárias, que fazem com que cada caso de poluição industrial deva ser investigado
individualmente.
A caracterização das fontes poluidoras e dos poluentes em uma indústria deve obedecer
uma metodologia objetiva, para a qual se recomenda (Jordão, 1997):
a) Estabelecer uma estratégia de investigação;
b) Conhecimento de todas as atividades de fabricação, fluxograma de processo,
matéria-prima, produtos consumidos, consumo de água;
23
c) Conhecimento dos produtos fabricados e respectivas quantidades; já existe, para
diversos grupos de indústrias, um relacionamento genérico de produção x poluição,
que pode ser utilizado como indicador inicial de avaliação das vazões e cargas de
poluição;
d) Identificação das diversas localizações de saída dos efluentes líquidos, águas de
processo, de utilidades, pluviais, e esgotos sanitários;
e) Medição de vazão e amostragem das diversas fontes de efluentes, de acordo com
metodologia adequada de medição e amostragem;
f) Preparo de balanço de massa das descargas na indústria, para os vários processos de
geração de efluentes;
g) Verificação das variações diárias, horárias, sazonais típicas.
A caracterização propriamente dita deve levar em conta os grupos de poluentes mais
comuns, que podem ser classificados como (Jordão, 1997):
a) Poluente convencionais: os poluentes convencionais são os que tipicamente
caracterizam a matéria orgânica, a matéria sólida, a matéria em suspensão e o pH nos
efluentes. Segundo Jordão (1997) os principais são: DBO, sólidos em suspensão, óleos e
graxas e pH.
b) Poluentes não convencionais: os poluentes não convencionais podem ser classificados
como os que não se acham enquadrados nas categorias anteriores, e podem ser
relacionados como (Jordão, 1997): compostos nitrogenados, amônia, nitrogênio
orgânico, nitratos, fósforo, demanda química de oxigênio (DQO), carbono orgânico total
(COT), cromo hexavalente, fenóis, fluoretos, manganês.
24
d) Poluentes prioritários: os poluentes prioritários constituem um conjunto de 129
poluentes potencialmente tóxicos, identificados pela EPA (USA), que em razão de
possíveis efeitos carcinogênicos, mutagênicos, ou de alta toxidade, devem merecer
atenção particular em relação a sua possível presença nos despejos industriais. São
eles: metais, compostos orgânicos voláteis, compostos orgânicos semi-voláteis,
pesticidas, herbicidas, outros produtos semelhantes.
3.5.1 Processos e Graus de Tratamento de Efluentes
Um sistema de efluentes industriais encaminha seus efluentes, direta ou indiretamente,
para corpos d’água receptores, formados pelos conjuntos das águas de superfície ou de subsolo.
A capacidade receptora destas águas, em harmonia com sua utilização, estabelece o grau de
condicionamento a que deverá ser submetido o efluente industrial, de modo que o corpo d’água
receptor não sofra alterações nos parâmetros de qualidade fixados para a região afetada pelo
lançamento. Os condicionamentos aplicados aos efluentes são comumente denominados de
processos de tratamento.
3.5.1.1 Operações Unitárias
Os processos de tratamento dos efluentes são formados por uma série de operações
unitárias, estas são empregadas para a remoção de substâncias indesejáveis, ou para a
transformação destas substâncias em outras de forma aceitável.
25
As mais importantes operações unitárias, empregadas nos sistemas de tratamento são
(Jordão, 1997):
a) Troca de gás: operação pela qual gases são precipitados no esgoto ou tomados em
solução pelo esgoto a ser tratado, pela sua exposição ao ar sob condição elevada,
reduzida ou normal de pressão;
b) Gradeamento: operação pela qual o material flutuante e a matéria em suspensão que
for maior em tamanho que as aberturas das grades, são retidos e removidos;
c) Sedimentação: operação pela qual a capacidade de carreamento e de erosão da água
é diminuída, até que as partículas em suspensão decantem pela ação da gravidade e
não possam mais ser relevantadas pela ação de correntes;
d) Flotação: operação pela qual a capacidade de carreamento da água é diminuída e sua
capacidade de empuxo é então aumentada às vezes até pela adição de agentes
flotantes; as substâncias naturalmente mais leves que a água, ou que pela ação
destes agentes flotantes são tornadas mais leves, sobem à superfície e são, então,
raspados. Os agentes flotantes costumam ser pequenas bolhas de ar ou compostos
químicos;
e) Coagulação química: operação pela qual substâncias químicas formadoras de flocos
– coagulantes – são adicionadas ao efluente com finalidade de se juntar ou combinar
com a matéria em suspensão sedimentável e, particularmente, com a não
sedimentável e com a matéria coloidal; com isto se formam rapidamente, agregados
às partículas em suspensão, os flocos. Embora solúveis, os coagulantes se precipitam
depois de reagir com outras substâncias do meio;
26
f) Precipitação química: operação pela qual substâncias dissolvidas são retiradas de
solução; as substâncias químicas adicionadas são solúveis e reagem com as
substâncias químicas do efluente, precipitando-as;
g) Filtração: operação pela qual os fenômenos de coar, sedimentar e de contato
interfacial combinam-se para transferir a matéria em suspensão para grãos de areia,
carvão, ou outro material granular, de onde deverá ser removida;
h) Desinfecção: operação pela qual os organismos vivos infecciosos em potencial são
exterminados;
i) Oxidação biológica: operação pela qual os microrganismos decompõem a matéria
orgânica contida no efluente ou no lodo e transformam substâncias complexas em
produtos finais simples.
3.5.1.2 Processos de tratamento
Os fenômenos atuantes na formação dos efluentes industriais deverão atuar, de modo
inverso, nos processos de tratamento.
Em função destes fenômenos e da mesma forma que os poluentes contidos no efluente
são de natureza física, química e biológica, os processos de tratamento podem ser classificados
em (Jordão, 1997):
a) Processos físicos: são os processos em que há predominância dos fenômenos físicos
de um sistema ou dispositivo de tratamento. Estes fenômenos caracterizam-se
principalmente nos processos de remoção das substâncias fisicamente separáveis dos
líquidos ou que não se encontram dissolvidas. Basicamente tem por finalidade
27
separar as substâncias em suspensão no efluente. Os principais processos físicos
adotados são: remoção da umidade do lodo, filtração, homogeneização.
b) Processos químicos: são os processos em que há utilização de produtos químicos e
são raramente adotados isoladamente. É utilizado quando o emprego de processos
físicos e biológicos não atendem ou não atuam eficientemente nas características que
se deseja reduzir ou remover. Os principais processos químicos adotados são:
floculação, precipitação, elutriação, cloração, neutralização de pH.
c) Processos biológicos: são considerados como processos biológicos de tratamento de
efluentes os processos que dependem da ação de microrganismos presentes nos
efluentes; os fenômenos inerentes à alimentação são predominantes na
transformação dos componentes complexos em compostos simples, tais como: sais
minerais, gás carbônico e outros. Os principais processos biológicos de tratamento
são: oxidação biológica (aeróbia, como lodos ativados, filtros biológicos, valos de
oxidação e lagoas de estabilização; e anaeróbia , como reatores anaeróbios de fluxo
ascendente), e digestão de lodo (aeróbia e anaeróbia, fossas sépticas).
3.5.1.3 Graus de tratamento
É comum classificar as instalações de tratamento em função do grau de redução dos
sólidos em suspensão e da demanda bioquímica de oxigênio proveniente da eficiência de uma ou
mais unidades de tratamento (Jordão,1997).
a) Tratamento preliminar: Utilizado para a remoção de sólidos grosseiros e remoção de
gorduras.
28
b) Tratamento primário: é empregado para a remoção de sólidos em suspensão e
material graxo (óleos e graxas).
c) Tratamento secundário: é empregado para a remoção, via ação biológica, do
material em solução de natureza biodegradável. É, portanto, característico de todos
os processos de tratamento por ação de microorganismos.
d) Tratamento terciário: visa a remoção do material em solução não removido nas
etapas de tratamento anteriores, como é o caso da remoção de macro-nutrientes (N e
P), de metais pesados, compostos orgânicos recalcitrantes e/ou refratários ou ainda
na remoção da cor, do odor ou até mesmo na desinfecção do despejo.
3.6 TRATAMENTO BIOLÓGICO DE ÁGUAS RESIDUÁRIAS
No tratamento biológico, procura-se repetir, em ambiente restrito e em curto espaço de
tempo, os mesmos processos que se verificam ao longo da correnteza de um rio, ou na área de um
lago, com respeito à autodepuração. Para isso, é necessário que se proporcione ao efluente, na
estação de tratamento, as condições ideais que favoreçam a oxidação biológica, condições essas
que dizem respeito, principalmente, à proliferação bacteriana – visto serem esses microrganismos
os principais responsáveis pela realização da depuração – e à introdução de oxigênio, no caso dos
processos de tratamento aeróbio.
A depuração das águas ricas em matéria orgânica, consiste, na oxidação desse material
orgânico até estabilizá-lo, isto é, transformá-lo em substâncias de estrutura molecular simples e
baixo conteúdo energético e que, assim, permanecem nas águas, a não ser que, por intermédio de
29
outras atividades biológicas, sejam novamente transformadas em compostos de mais elevada
estrutura (Branco, 1986).
Segundo Vazzoler (1999), o biotratamento de águas residuárias tem como principais
objetivos:
1. Remoção da matéria orgânica, portanto redução da demanda bioquímica de oxigênio
(DBO)1 do resíduo a ser tratado;
2. Degradação de compostos químicos orgânicos de difícil degradação;
3. Fornecimento de um efluente em condições que não afete o equilíbrio do sistema
receptor final (rios, lagos, etc), portanto, emissão de um efluente que esteja de
acordo com os padrões de emissão estabelecidos pelo órgão ambiental, no caso a
FEPAM (Fundação Estadual de proteção Ambiental).
Para se obter sucesso na aplicação de um tratamento biológico de efluentes é necessário
um conhecimento prévio das características da água residuária a ser tratada e uma eficiente
operação dos reatores na manutenção da atividade microbiana e das reações de mineralização
desejadas.
A utilização da Biotecnologia Ambiental, pela Engenharia Ambiental, possibilita a
solução de parte dos problemas causados pelo lançamento de efluentes líquidos e resíduos sólidos
no ambiente.
Os tratamentos biológicos ou “biotratamentos” de águas residuárias mais comumente
utilizados baseiam-se em processos aeróbios e/ou anaeróbios de decomposição de matéria
1 Definição de Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO), segundo Branco (1986): “A DBO representa a quantidade de oxigênio do meio que é consumida pela respiração aeróbia, na oxidação da matéria orgânica nutriente existente no meio. Corresponde, assim, na prática, à quantidade de oxigênio necessária à estabilização das matérias presentes, oxidáveis bioquímicamente”.
30
orgânica. Os principais sistemas de tratamento aeróbios são: filtro biológico, lodos ativados,
lagoas aeradas e lagoas de estabilização (Vazzoler, 1999).
3.7 LODOS ATIVADOS
O processo de tratamento de esgotos por lodos ativados foi desenvolvido na Inglaterra,
em 1914, por Andern e Lockett. É chamado “lodo ativado” porque era suposta a produção de
uma massa ativada de microrganismos capaz de estabilizar um resíduo por via aeróbia.
O sistema de lodos ativados é amplamente utilizado, a nível mundial, para o tratamento
de despejos domésticos e industriais, em situações em que são necessários uma elevada qualidade
do efluente e reduzidos requisitos de área. No entanto, o sistema de lodos ativados inclui um
índice de mecanização superior ao de outros sistemas de tratamento, implicando em uma
operação mais sofisticada e em maiores consumos de energia elétrica (Jordão, 1997).
No processo de lodos ativados a depuração biológica ocorre no tanque de aeração
alimentado com o despejo a ser tratado (afluente). O lodo biológico encontra-se misturado com o
meio líquido. Em sua maior parte ele é formado por uma população mista de bactérias agregadas
sob a forma de flocos biologicamente ativos, de onde vem o nome lodos ativados (Vazzoler,
1989). Um esquema do sistema de lodos ativados completo é mostrado na Figura 3.2.
31
Figura 3.2 – Esquema do processo de lodos ativados. Fonte: Vazzoler, 1989.
No tanque de aeração (reator) ocorrem as reações bioquímicas de remoção da matéria
orgânica e, em determinadas condições, da matéria nitrogenada. A biomassa (massa biológica)
utiliza o substrato presente no esgoto bruto para se desenvolver. No decantador secundário ocorre
a sedimentação dos sólidos (biomassa), permitindo que o efluente final saia clarificado. Os
sólidos sedimentados no fundo do decantador secundário são recirculados para o reator,
aumentando a concentração de biomassa no mesmo, o que é responsável pela elevada eficiência
do sistema.
A biomassa consegue ser facilmente separada no decantador secundário devido à sua
propriedade de decantar. Tal se deve ao fato das bactérias possuírem uma matriz gelatinosa, que
permite a aglutinação das bactérias e outros microorganismos, como protozoários. Essa matriz
gelatinosa recebe o nome de zoogléia (Von Sperling, 1997).
Segundo Branco (1986), a floculação é proporcionada por características coloidais da
massa de bactérias, relacionadas com a intensidade das atividades metabólicas destas. As
bactérias comportam-se como micelas de um colóide do tipo hidrófobo ou liófobo, isto é, como
os colóides inorgânicos.
- Corpo receptor Efluente
- Tratamento terciário
Decantador Secundário
Descarte de lodo
Reciclo de lodo Recirculação
Tanque de aeração
Afluente Ar
32
Em virtude da recirculação do lodo, a concentração de sólidos em suspensão no tanque
de aeração no sistema de lodos ativados é mais de 10 vezes superior à de uma lagoa aerada de
mistura completa, sem recirculação. Nos sistemas de lodos ativados, o tempo de detenção do
líquido é bem baixo, da ordem de horas, implicando em que o volume do tanque de aeração seja
bem reduzido. No entanto, devido à recirculação dos sólidos, estes permanecem no sistema por
um tempo superior ao do líquido. É esta maior permanência dos sólidos no sistema que garante a
elevada eficiência dos sistemas de lodos ativados, já que a biomassa tem tempo suficiente para
metabolizar praticamente toda a matéria orgânica dos efluentes (Von Sperling, 1997).
No tanque de aeração, devido à entrada contínua de alimento, na forma de DBO dos
esgotos, os microrganismos crescem e se reproduzem continuamente. Caso fosse permitido que a
população dos mesmo crescesse indefinidamente, eles tenderiam a atingir concentrações
excessivas no tanque de aeração, dificultando a transferência de oxigênio a todas as células.
Ademais, o decantador secundário ficaria sobrecarregado, e os sólidos não teriam mais condições
de sedimentar satisfatoriamente, vindo a sair com o efluente final, deteriorando a sua qualidade.
Para manter o sistema em equilíbrio, é necessário que se retire aproximadamente a mesma
quantidade de biomassa que é aumentada por reprodução. Este é, portanto, o lodo excedente, que
pode ser extraído diretamente do reator ou da linha de tratamento do lodo, usualmente
compreendendo adensamento, estabilização e desidratação (Von Sperling, 1997).
3.7.1 Vantagens e Desvantagens do Tratamento Biológico com Lodos Ativados
As vantagens apresentadas pelo tratamento aeróbio por lodos ativados estão descritas
abaixo (Branco e Hess, 1975; Von Sperling, 1997):
33
a) Possibilidade de ampliar ou abreviar o tempo de contato entre despejo e os
organismos do meio;
b) Possibilidade de variar a relação alimento/microrganismo;
c) Garantia do fornecimento do oxigênio necessário à respiração da microbiota e flora
ativas;
d) Possibilidade de adaptar a quantidade de oxigênio à demanda dos organismos;
e) Possibilidade de distribuir a carga orgânica ao longo das câmaras de aeração;
f) Possibilidade de remoção biológica de nitrogênio e fósforo;
g) Nitrificação usualmente obtida;
h) Não há problemas com moscas (Psychoda);
i) Baixos requisitos de área;
j) Possibilidade de dispensar os decantadores primários.
Segundo Branco e Hess (1975) e Von Sperling (1997), as desvantagens apresentadas
pelo processo de tratamento com lodos ativados são:
a) Maior sensibilidade, podendo haver períodos de maus resultados;
b) Elevado custo de implantação;
c) Exige operadores especializados;
d) Elevado índice de mecanização;
e) Possíveis problemas ambientais com ruídos e aerosóis;
f) Volume de lodo resultante mais elevado devido ao baixo teor de sólidos;
g) Consumo elevado de energia.
34
3.7.2 Variações do processo
Há um grande número de alternativas de operação de lodos ativados, das quais as mais
importantes são descritas sucintamente abaixo (Von Sperling, 1997):
a) Processo Convencional: nesse sistema a idade do lodo é de 4 a 10 dias e o tempo de
detenção hidráulico é de 4 a 8 horas. No sistema de lodos ativados convencional, a
concentração de biomassa é bastante elevada, devido a recirculação dos sólidos
sedimentares no fundo do decantador secundário, o que proporciona uma elevada
eficiência na remoção de matéria orgânica, expressa em termos de DBO. O
fornecimento de oxigênio é feito por aeradores mecânicos ou por ar difuso. A
montante do reator há uma unidade de decantação primária, de forma a remover os
sólidos sedimentáveis do esgoto bruto.
b) Processo de Aeração Prolongada: nesse sistema a idade do lodo é de 20 a 30 dias e
o tempo de detenção hidráulica é de 16 a 36 horas. A biomassa permanece mais
tempo no sistema. Com isto, há menos DBO disponível para as bactérias, o que faz
com que elas se utilizem da matéria orgânica do próprio material celular para a sua
manutenção. Em decorrência, o lodo excedente retirado já sai estabilizado. Não se
incluem usualmente unidades de decantação primária.
c) Reator Seqüencial em Batelada: a operação do sistema é intermitente. Assim, no
mesmo tanque ocorrem, em fases diferentes, as etapas de reação e sedimentação.
Quando os aeradores estão desligados, os sólidos sedimentam, ocasião em que se
retira o efluente. Ao se religar os aeradores, os sólidos sedimentados retornam à
massa líquida, o que dispensa as elevatórias de recirculação. Não há decantadores
secundários. Pode ser na modalidade convencional ou aeração prolongada.
35
3.7.3 Fatores que afetam o processo de Lodos Ativados
a) Temperatura
A temperatura afeta o crescimento bacteriano, e consequentemente a quantidade de
substrato absorvido, influenciando as taxas das reações catalisadas enzimaticamente, e alterando
a taxa de difusão do substrato na célula (Grandie citado por Pinto, 1998). A faixa ótima está entre
12 e 25°C (Gray, 1990).
Arrhenius formulou uma equação que leva em conta o efeito da temperatura sobre a taxa
de reação:
2020
−= TT KK θ ( 1)
Onde:
T= temperatura(°C);
KT = taxa de reação constante para a temperatura T;
K20 = taxa de reação constante a 20°C (d-1);
θ = coeficiente de temperatura.
b) Concentração de oxigênio dissolvido
Para que haja atividade microbiológica dos heterotróficos, a concentração de OD, deve
ser no mínimo de 1 a 2 mg/L (Gray, 1990).
36
c) pH
O pH ótimo está em torno de 7 para a maioria dos microrganismos heterotróficos. A
faixa sugerida por Gray (1990) é de 6,5 a 8,5. Acima de 9, a atividade é inibida, e abaixo de 6,5,
os fungos predominam sobre as bactérias na competição pelo substrato.
d) Concentração de nutrientes e elementos traços
A presença de nitrogênio e fósforo é importante para o crescimento microbiológico,
sendo estes constituintes encontrados em excesso nos esgotos domésticos, e escassos em alguns
industriais. Para o crescimento ótimo, as quantidade relativas de carbono orgânico (como DBO5),
nitrogênio e fósforo, devem ser 100:5:1 (Branco, 1986). Além disto são necessárias a presença de
elementos traços como ferro, cálcio, magnésio, potássio, manganês, cobre, zinco e molibdênio.
e) Presença de substâncias tóxicas
Metais pesados e outras substâncias, incluindo compostos orgânicos podem ser tóxicos
ou inibitórios para a comunidade do lodo ativado, no caso de estarem acima das concentrações
limites. Incluem-se nestas substâncias alumínio, amônia, arsênio, cálcio, ferro, pesticidas,
surfactantes, etc.
f) Redox
A oxidação da matéria orgânica ocorre para valores de redox entre +50 e +250mV,
expresso em termos do eletrodo de referência padrão de hidrogênio.
37
3.7.4 Sistemas de aeração
Os sistemas de aeração podem introduzir oxigênio puro diretamente às unidades do
tratamento biológico, ou ar, sendo esta a modalidade convencional e mais usual no processo dos
lodos ativados.
Os sistemas convencionais de aeração podem ser classificados segundo a forma pela
qual o ar é introduzido nos tanques de aeração, sendo normalmente (Jordão, 1997):
a) por meio de difusores;
b) por meio de agitadores mecânicos;
c) uma combinação dos dois sistemas acima.
Segundo Branco (1986), esses processos não só fornecem o oxigênio indispensável à
atividade respiratória dos microrganismos depuradores, como promovem a agitação do meio,
distribuindo uniformemente o lodo constituído pelos flocos por toda a massa líquida.
3.7.5 Transferência de Oxigênio (N)
A transferência de oxigênio do ar para o meio líquido se processa em três fases:
a) as moléculas de oxigênio do ar se transferem para a superfície do líquido que se
torna saturada, a uma concentração de saturação de oxigênio Csw . Forma-se uma
interface composta de moléculas de água com sua extremidade negativa voltada para
a fase gasosa, e a positiva, para a fase líquida;
b) as moléculas de oxigênio atravessam esta interface, no sentido do meio líquido, por
difusão;
38
c) sob agitação elevada, o oxigênio é misturado no meio líquido por difusão e
convecção.
Nos casos reais da transferência de oxigênio em que o meio líquido é o efluente a ser
tratado, há a se considerar fatores diversos das condições em que foram testados os aeradores
(Jordão, 1997):
a) a temperatura: o coeficiente global de transferência de massa aumenta com o
crescimento da temperatura;
b) o tipo de efluente a ser tratado: as características do efluente irão definir um fator de
correção α. O coeficiente α varia com a presença de despejos industriais, diminui
com a presença de detergente, cresce à medida que o efluente é mais oxidado e à
medida que a turbulência é mais elevada. No caso do esgoto doméstico seu valor,
situa-se na faixa de 0,8 a 0,9;
c) a geometria do tanque de aeração: a eficiência que se obtém é função também da
geometria do tanque de aeração e do nível de agitação que se manterá.
Assim para quaisquer condições a transferência de oxigênio é dada pela seguinte
equação:
( )200 02,1..
1,9. −⎟
⎠
⎞⎜⎝
⎛ −= TLSW CC
NN α ( 2)
Onde:
N = massa de oxigênio transferido na unidade de tempo (kgO2/h);
N0 = massa de oxigênio transferido em água a 20°C e 1 atm (kgO2/h.HP), denominada
eficiência de oxigenação;
CSW = concentração de saturação de OD no efluente no tanque de aeração;
CL = concentração de OD no tanque, geralmente entre 0,5 e 2,0 mg/L;
39
T = temperatura no tanque de aeração em °C.
3.7.6 Cinética do Processo
A ação dos microrganismos sobre a matéria a ser degradada pode ser retratada como
mostra a Figura 3.3; há uma formação de lodo (curva ABCD) e paralelamente uma redução da
DBO ao longo do tempo (curva EFG).
As seguintes fases se verificam em relação aos organismos (Jordão, 1997):
a) a fase de crescimento logarítmico: A-B: nesta fase o crescimento se dá em presença
de amplas quantidades de alimento para os organismos.
b) A fase de crescimento decrescente: B-C: nesta fase o alimento disponível está
terminando; ∆X1 representa o aumento de organismos desde o início até o fim da
fase de crescimento.
c) A fase de decrescimento: C-D: nesta fase, chamada também de respiração endógena,
vem ocorrer uma auto-oxidação após o esgotamento das reservas de alimento; há
uma destruição de células de microrganismos e uma sucessão de novas espécies;
∆X2 representa a redução de organismos nesta fase.
40
Figura 3.3 - Relações de produção de lodo e remoção de DBO entre vários processos de lodos ativados. Fonte: Jordão, 1997.
Desta forma a matéria vai constituir em parte novas células dos organismos, após serem
utilizados como alimento pelos próprios organismos; com esta fração “a” que é sintetizada em
novas células, uma fração “b” constitui as células dos organismos que serão destruídas na fase de
respiração endógena ou de auto-oxidação.
Uma fração “a” da matéria orgânica a ser degradada é oxidada para produção de energia
na fase de síntese, sendo “b” a quantidade de oxigênio que supre a energia para a fase endógena
como apresentado na Figura 3.4.
41
Matéria Orgânica
CO2, H2O, N2, PProdutos
Finais
Novas Células
CO2, H2O, NH3, PProdutos
não-biodegradáveis
Energia (a')
Síntese (a)
RespiraçãoEndógena
Figura 3.4 - Degradação da matéria orgânica. Fonte: Jordão, 1997.
O coeficiente de produção celular (“Y” ou “a”) têm variado, no esgoto doméstico entre
0,30 e 0,73, e a taxa específica de respiração endógena (“kd” ou “b”) entre 0,016 e 0,075 (Jordão,
1997).
3.7.7 Consumo de oxigênio
As principais parcelas de consumo de oxigênio são usadas para suprir energia para a fase
de síntese e para a respiração endógena. Outra parcela é aquela relativa a nitrificação. A
quantidade de oxigênio pode ser expressa como:
QNNVXbQSSadkgO eaveo )..(57,4.'.).(/ 0'
2 −++−= ( 3)
42
Onde:
a’ = fração da matéria removida que é usada para energia, sendo adimensional;
b’= quantidade de oxigênio utilizado por dia (kgO2/kg lodo) (d-1);
Ne = concentração de nitrogênio na saída do lodo ativado (mg/L);
N0 = concentração de nitrogênio do efluente (mg/L);
S0 = concentração de DBO5 afluente (mg/L);
Se = concentração de DBO5 efluente (mg/L);
Xav = concentração de sólidos em suspensão voláteis no tanque de aeração (mg/L);
V = volume do reator (m3);
Q = vazão afluente (m3/d).
Como:
(1,42 . Y)+a’=1 ( 4 )
e:
b / Kd = 1,42 ( 5)
Deste modo pode-se escrever a equação (3) da seguinte forma:
])..(57,4...42,1).)).(.42,1(1[(/ 02 QNNVXKdQSSYdkgO eaveo −++−−= ( 6)
Onde:
Y = coeficiente de produção celular (massa de sólidos em suspensão voláteis produzidos
por unidade de massa de DBO removida)
Kd = coeficiente de respiração endógena (d-1).
43
Os valores de Y pode ser obtido em testes de laboratório com o efluente a ser tratado.
Para o tratamento aeróbio de esgoto doméstico, o Y para as bactérias heterotróficas responsáveis
pela remoção da matéria carbonácea varia de 0,4 a 0,8 g SSV/g DBO5 removida.
Para o tratamento aeróbio de esgotos domésticos, Kd varia segundo a seguinte faixa 0,06
a 0,10 mg SSV/mg SSV.d.
3.7.8 Requisitos de nutrientes
Os microrganismos responsáveis pela estabilização da matéria orgânica necessitam de
outros nutrientes, além do carbono, para as suas atividades metabólicas. Os principais nutrientes
são normalmente o nitrogênio e o fósforo, além de outros elementos em concentrações diminutas
(Von Sperling, 1997).
Para que o sistema de tratamento remova a DBO ou, em outras palavras, o carbono
orgânico, é necessário que este seja o nutriente limitante no meio, e os demais nutrientes estejam
presentes em concentrações acima da mínima requerida pelos microrganismos. No esgoto
doméstico tal condição é usualmente satisfeita, enquanto que nos despejos industriais pode haver
falta de determinado nutriente, conduzindo a que a biomassa não se desenvolva como desejado.
Em várias situações, é vantajoso misturar-se os esgotos domésticos e industriais na rede de
coleta, fazendo com que, após a mistura e diluição, o efluente à ETE seja auto suficiente em
termos de requisitos de nutrientes.
A quantidade de N e P requerida depende da composição da biomassa. Expressando-se a
composição típica de uma célula bacteriana em termos das fórmulas empíricas C5H7O2N ou
C60H87O23N12P (Tchobanoglous, 1995), tem-se que a biomassa sintetizada no tratamento contém
44
aproximadamente 12,3 % de nitrogênio e 2,6 % de fósforo. O resíduo celular após a respiração
endógena possui em torno de 7% de nitrogênio e 1 % de fósforo.
Segundo Eckenfelder citado por Von Sperling (1997), o nitrogênio requerido é igual ao
nitrogênio removido do sistema através do lodo excedente. As principais frações são o nitrogênio
presente na biomassa ativa que sai do sistema na forma de lodo excedente, mais o nitrogênio
presente no resíduo não ativo da respiração endógena. Levando em consideração as porcentagens
supra citadas da composição celular, pode-se estimar o requisito de nitrogênio:
N requerido = N nas células ativas + N nas células não ativas do lodo excedente do lodo excedente
O nitrogênio, para que seja utilizado pelos microrganismos, deve apresentar-se numa
forma assimilável pelos mesmos, como amônia e nitrato. O nitrogênio orgânico deve primeiro
sofrer uma hidrólise para tornar-se disponível para a biomassa.
Segundo Von Sperling (1997) sistemas com uma elevada idade do lodo, como aeração
prolongada, implicam em menores requisitos de nitrogênio, devido à menor produção de lodo
excedente. O Quadro 3.1 apresenta faixas de valores de requisitos de N e P, para sistemas de
lodos ativados convencional e aeração prolongada.
Quadro 3.1 – Requisitos mínimos de nutrientes. Lodos ativados θ Relação entre os nutrientes (em massa)
(dias) DBO N P
Convencional 4-10 100 4,3-5,6 0,9-1,2
Aeração prolongada 20-30 100 2,6-3,2 0,5-0,6
Fonte: Von Sperling (1997).
Valores usualmente citados na literatura são de uma relação DBO:N:P de 100:5:1.
45
3.7.9 Condições Relativas ao Lodo
3.7.9.1 Produção de Lodo (∆X)
A produção final de lodo ∆X corresponde a um ganho ∆X1, devido a fase de síntese dos
organismos, menos uma perda ∆X2, devido à fase de respiração endógena.
( ) VXKdQSSYX aveo .... −−=∆ ( 7)
Onde:
∆X = excesso de lodo;
O lodo em excesso corresponde à quantidade de sólidos que deve ser descartada do
sistema, a fim de que se possa manter uma concentração constante de lodo no tanque de aeração.
O termo normalmente usado “excesso de lodo” corresponde, assim, a uma produção de
organismos mais uma parcela de sólidos, mesmo minerais.
Esta parcela de sólidos que permanece no sistema e deve assim ser descartada pode ser
determinada através de um balanço de matéria sólida.
eXQXQX '..' −=∆ ( 8)
Onde:
Q = vazão afluente;
X = concentração de sólidos suspensos na saída do sedimentador primário;
Q’ = vazão efluente;
Xe = concentração de sólidos em suspensão na saída do lodo ativado;
46
O total de lodo em excesso, a ser descartado será:
( )[ ] [ ]eaveo XQQXVXKdQSSYX '..... −+−−=∆ ( 9)
3.7.10 Parâmetros de controle
3.7.10.1 Teor de Lodo (TL)
O teor de lodo é o volume de lodo que sedimenta num cone ou cilindro de 1 litro após
meia hora em repouso.
Uma vez que praticamente todos os sólidos sedimentáveis são representados pela parcela
do lodo recirculado, a parcela do esgoto efluente do decantador primário não traz mais do que
0,05 % de sólidos sedimentáveis, podendo-se dizer que o teor de lodo, expresso em mililitros,
será:
000.1*R
R
QQQ
TL+
= ( 10)
Onde:
TL = teor de lodo;
QR = vazão de recirculação (m3/d).
O lodo de boa qualidade contém da ordem de 98,5 % de água e 1,5 % de sólidos (Jordão,
1997).
47
3.7.10.2 Índice Volumétrico de Lodo (IVL)
É o volume em mililitros ocupado por grama de lodo, após uma sedimentação de 30
minutos.
Pode ser definido ainda como a vazão entre o teor de lodo e sua concentração no tanque
de aeração:
( ) avR
R
av XQQQ
XTLIVL
.+== ( 11)
Valores do IVL entre 40 e 150 indicam uma boa qualidade do lodo formado; valores
acima de 200 são normalmente indicativos de um lodo de qualidade inferior.
O IVL pode dar uma medida da facilidade de sedimentação da biomassa, no
sedimentador secundário. Quanto maior o IVL menor o peso específico da biomassa e pior a sua
sedimentação. Ocorre um fenômeno chamado de “bulking” (Jordão, 1997).
3.7.10.3 Idade do Lodo (θ)
A idade do lodo representa o tempo médio que uma partícula em suspensão permanece
sob aeração. É definida como a relação entre a quantidade de sólidos em suspensão, no tanque de
aeração, e a quantidade de DBO removida por dia no sistema.
( ) ⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛−
=⎥⎦
⎤⎢⎣
⎡−
=eo
av
eo
av
SStX
QSSVX .
..
θ ( 12)
48
A experiência tem mostrado que para o processo convencional de lodos ativados a idade
do lodo deve ser da ordem de 4 a 15 dias. Valores de θ menores de 4 dias conduzem a formação
de um floco que não é bastante denso para uma boa decantação, e de θ maiores do que quinze
dias conduzem ao aparecimento de flocos pequenos, que requerem uma menor taxa de vazão
superficial no decantador final (Jordão, 1997).
3.7.10.4 Fator de Carga (A/M)
O fator de carga é um parâmetro importante que mede a relação entre o alimento
presente no afluente e os microrganismos no tanque de aeração. Costuma ser expresso como a
relação A/M (alimento / microrganismo).
tXS
VXSQ
MA
avav
o
... 0== ( 13)
sendo a unidade d-1.
3.7.11 Recirculação do Lodo (r)
Para se ter uma elevada concentração de sólidos no reator e uma idade do lodo maior
que o tempo de detenção hidráulica (θC > t), é necessária a recirculação do lodo ou a sua
retenção, de alguma forma, no sistema. O sistema de recirculação do lodo através do
49
bombeamento é o mais utilizado, sendo típico nos processos de tratamento de fluxo contínuo por
lodos ativados convencionais e aeração prolongada.
A quantidade do lodo a ser recirculada depende fundamentalmente da qualidade do lodo
sedimentado no decantador secundário: quanto mais concentrado for este lodo, menor poderá ser
a vazão de recirculação, para que se atinja uma determinada concentração de sólido no reator.
A Figura 3.5 apresenta os itens componentes do balanço de massa na etapa biológica do
sistema de lodos ativados.
Figura 3.5 - Itens componentes do balanço de massa no sistema de lodos ativados. Fonte: Von Sperling, 1997.
Fazendo-se um balanço de matéria para o lodo do decantador secundário, tem-se que a
razão de lodo recirculado deve ser igual a:
avuv
av
XXX
r−
= ( 14)
50
r R= ( 15)
Onde:
Xuv = concentração de sólidos em suspensão no lodo recirculado (mg/L).
A concentração do lodo recirculado (Xuv) costuma variar entre 8.000 e 20.000 mg/L
(Jordão, 1997).
3.7.12 Microbiologia do Processo de Lodos Ativados
Para Jordão (1997) o lodo ativado é formado principalmente de bactérias, fungos,
protozoários, metazoários, nematodos, sendo as bactérias os microrganismos de maior
importância, uma vez que são elas as maiores responsáveis pela estabilização da matéria orgânica
e pela formação dos flocos, através da conversão da matéria orgânica biodegradável em novo
material celular, CO2 (dióxido de carbono) e água, e outros produtos inertes.
3.7.12.1 A Formação de Flocos
Grande número de bactérias possui um envoltório ou bainha de consistência gelatinosa,
constituída de polissacarídeos, envolvendo cada uma de suas células. Sendo essa bainha
embebível e parcialmente solúvel em água pode, algumas vezes, aumentar muito de espessura,
ocorrendo anastomose entre as bainhas de duas ou mais bactérias contíguas, chegando a
constituir verdadeiras massas gelatinosas, contendo bactérias no seu interior. Essa massa
51
gelatinosa recebe o nome de zoogléia, ela tem sido considerada o elemento responsável pela
floculação do material em suspensão no efluente.
A idéia que prevalecia, até recentemente, sobre a formação dos flocos no efluente era a
de que a propriedade de floculação estava diretamente relacionada com a capacidade das
bactérias em produzir zoogléia. Por essa razão, acreditava-se que a bactéria Zooglea ramigera,
cuja principal característica está na grande quantidade de massa gelatinosa que suas colônias são
capazes de produzir, desempenharia o papel mais importante no processo. A zoogléia,
adsorvendo grande número de partículas em suspensão, daria origem a grandes flocos que se
precipitariam, sendo, em seguida, a matéria orgânica neles contida, assimilada pelas bactérias
(Branco, 1986).
Pesquisas realizadas posteriormente vieram a alterar essas idéias. Verificou-se que, tanto
em meio de cultura como no efluente, é possível obter-se floculação por inúmeras espécies de
bactérias, e que essa característica de produzir flocos está relacionada, não com propriedades
especiais de um ou alguns tipos de bactérias, mas sim com determinadas condições de vida em
que estas se encontram. Atualmente pensa-se que a floculação é proporcionada por características
coloidais da massa de bactérias, relacionadas com a intensidade das atividades metabólicas
destas. As bactérias comportam-se como micelas de um colóide do tipo hidrófobo ou liófobo,
como colóides inorgânicos. Sempre que as micelas do colóide se chocam com as outras, em
virtude do movimento Browniano, duas coisas podem suceder: ou aglutinam-se e isso acontece
sempre que o potencial zeta das partículas é muito baixo, prevalecendo as forças de Van der
Waals ou tornam a se repelir. No primeiro caso houve a floculação do sistema e esta pode ocorrer
sempre que são misturados colóides de cargas opostas (Branco, 1986).
52
O crescimento de microrganismos deve ser discutido em termos de variação de massa de
microrganismos com o tempo. Este crescimento apresenta quatro etapas, conforme está mostrado
na Figura 3.6 (Vazzoler, 1989):
• Fase Lag ou de Aclimatação: não ocorre aumento do número de microrganismos,
nesta etapa eles elaboram o arsenal enzimático necessário ao consumo de substratos.
Velocidade nula;
• Fase de Aceleração: inicia-se o crescimento microbiano, face ao consumo de
substrato. Velocidade aumenta com o tempo;
• Fase Log, ou Exponencial: há um excesso de alimento em torno dos
microorganismos propiciando um crescimento com velocidade máxima;
• Fase de Desaceleração: a velocidade de crescimento passa a diminuir, uma vez que
o substrato começa a escassear e já existe o acúmulo ponderável de excretas tóxicas;
• Fase Estacionária: a velocidade volta a ser nula, devido ao esgotamento dos
substratos ou ao acúmulo de substâncias tóxicas em níveis incompatíveis com o
desenvolvimento microbiano;
• Fase de Declínio ou Endógena: os microrganismos são forçados a metabolizar seu
próprio protoplasma porque a concentração de substrato disponível é mínima,
causando a diminuição do número de microrganismos. Durante esta etapa ocorre o
fenômeno conhecido como ‘lise’ no qual os nutrientes remanescentes nas células
mortas ficam disponível para as células vivas.
53
Figura 3.6 - Modelo de curva de crescimento bacteriano em cultura pura. Fonte: Vazzoler, 1989.
Segundo Vazzoler (1989), as bactérias são formadas por uma população mista que não
cresce de forma sincronizada. Enquanto parte dos microrganismos encontram-se na fase
exponencial de crescimento (renovação celular), outros encontram-se na fase estacionária, e uma
terceira parte, na fase de declínio.
A importância da manutenção da fase endógena para o processo está na diminuição da
biomassa devido à auto-oxidação e também porque é nestas condições que ocorre a floculação
bacteriana.
A aeração do efluente produz a oxidação rápida desse material através de uma intensa
proliferação de bactérias aeróbias, as quais consomem a matéria nutriente, entrando em fase
endógena, por superpopulação. Uma aeração deficiente poderá manter um excesso de matérias
nutritivas, portanto, excesso de valor energético, impedindo a floculação; uma aeração excessiva
54
intensifica a floculação, porém, dá origem a flocos de baixa capacidade depuradora, em virtude
de um metabolismo muito reduzido das bactérias que o formam.
3.7.12.2 Nutrição dos Microrganismos
Segundo Branco (1986), a realização da oxidação dos efluentes, depende da presença de
microrganismos, em grande quantidade, os quais devem reproduzir-se, portanto, sintetizar novos
organismos, à custa de material retirado do meio, através do processo de nutrição. Nem toda a
carga orgânica do efluente, representada pela sua DBO, é oxidada, pois uma parte é
simplesmente transformada em massa de bactérias.
De acordo com as suas necessidades nutricionais e energéticas, os seres vivos são
classificados em dois grandes grupos: os autotróficos e os heterotróficos. Os autotróficos são os
que utilizam compostos inorgânicos (CO2 e H2O), sintetizando a partir destes na presença da luz
substâncias orgânicas. Os seres heterotróficos requerem substratos orgânicos para deles retirar a
energia necessária ao seu desenvolvimento (Vazzoler, 1989).
Com relação às necessidades em nutrientes minerais, apresentadas pelos microrganismos
do efluente, sabe-se que na maior parte, estes se acham presentes, como constituintes normais dos
efluentes domésticos e industriais. Apenas os compostos de nitrogênio e fósforo podem ser
insuficientes, por isso faz-se necessário conhecer as relações entre DBO e nitrogênio e DBO e
fósforo, procurando-se estabelecer a relação ótima que permita uma boa estabilização.
55
3.7.12.3 Respiração dos Microrganismos
Segundo Branco (1986), através da respiração aeróbia, os organismo formadores de
flocos oxidam a matéria orgânica que retiram do efluente. O oxigênio necessário deve estar no
próprio efluente constituindo o OD (oxigênio dissolvido).
As bactérias e outros microrganismos aeróbios, ao destruírem matéria orgânica do
efluente, procedem como os animais superiores ao nutrirem-se: ingerem esse alimento, após
transformá-lo em compostos orgânicos solúveis e assimiláveis que ficam armazenados em suas
células, constituindo reserva que será utilizada na composição de novas células (reprodução) ou
no fornecimento de energia. Assim, o efluente, ao ser intensamente aerado, na fase inicial do
tratamento, sofre grande redução de sua DBO e, portanto, do seu conteúdo de matéria orgânica.
Mas essa matéria orgânica é, inicialmente, armazenada nas células, principalmente sob a forma
de glicogênio e não é imediatamente metabolizada. Só posteriormente, com a continuação do
processo de tratamento, é que será transformada em material para construção de novos
microrganismos ou oxidada para a produção de energia necessária a essa mesma síntese ou a
atividades locomotivas (Branco, 1986).
O fornecimento de ar tem por função suprir o meio em oxigênio, o suficiente para que os
microrganismos possam respirar, oxidando suas reservas de glicogênio (bactérias) ou de outros
compostos (protozoários). Um fornecimento excessivo de oxigênio, em relação à quantidade de
matéria orgânica, leva ao estabelecimento da fase endógena, em que a massa biológica passa a se
autodestruir, transformando o material sintetizado em gás carbônico, água e amônia (Branco,
1986).
56
3.7.13 Microbiota existente nos Processos de Lodos Ativados
Segundo Branco (1986), “...a ecologia dos lodos ativados, pelo menos no que diz
respeito à dinâmica das populações de microrganismos, não tem sido suficientemente estudada”.
A microbiota desempenha um importante papel no sistema de lodos ativados por
clarificar o efluente, consumindo a matéria orgânica, e por ser o predador de bactérias,
estimulando, desta forma, o crescimento das mesmas. A microbiota é um indicador do conjunto
de parâmetros de lodos ativados, uma vez que sua natureza varia com o nível de depuração,
concentração de oxigênio dissolvido e presença de substâncias tóxicas dentro do tanque de
aeração.
A natureza da microbiota presente é característica da idade do lodo, que é o tempo
médio de permanência do lodo no reator. É também característica da saprobicidade, nível de
qualidade da água refletido pelas espécies que constituem a comunidade presente de acordo com
a matéria orgânica biodegradável, expressa em DBO (Vazzoler, 1989).
A proliferação de diferentes tipos de microrganismos, sucedendo-se uns aos outros, em
uma amostra de efluente submetida à constante aeração é conseqüência da sucessão de alterações
químicas e físicas que vão ocorrendo no decurso da estabilização. Desta maneira, o
reconhecimento dos grupos predominantes permite avaliar a eficiência do tratamento ou o grau
de estabilidade atingido pelo sistema.
Enquanto houver predominância de compostos solúveis, serão encontradas bactérias,
como também alguns fungos e protozoários, isto em decorrência da forma de nutrição dos
microrganismos, que são holofíticos, ou seja, nutrem-se de alimento em solução ou solubilizado
externamente por ação enzimática. Essa situação tende a perdurar, enquanto houver excesso de
alimento, sendo que, posteriormente, surgem os primeiros protozoários holozóicos (nutrem-se de
57
partículas), que alimentam-se das bactérias dispersas e, depois, dos flocos formados (Branco,
1986).
Segundo Hawkes citado por Branco (1986), os primeiros protozoários a surgirem, nas
seqüências ecológicas, são os rizópodes (amebas), Amoeba, que logo dão lugar a flagelados
incolores que, entretanto, são substituídos pelos ciliados livres natantes, holozóicos, os quais
atingem grande concentração, alimentando-se das bactérias, mas que principiam a decrescer
quando a população bacteriana também diminui, uma vez que, sendo dotados de grande atividade
locomotora, demandam quantidades elevadas de energia. Na fase de flocos bem formados
aparecem, em concentrações relativamente elevadas, os ciliados sésseis, pedunculados ou não,
mas que, sendo organismos fixos, requerem menores quantidades de alimento. Por coincidir, a
sua maior concentração com a presença de boa floculação é que são universalmente reconhecidos
como indicadores de boas condições de funcionamento do sistema. Se o processo tiver
prosseguimento, o sistema pode atingir graus de estabilidade ainda mais elevados, com
desaparecimento dos próprios ciliados sésseis que serão substituídos por rotíferos, nematóides e
até mesmo larvas e insetos que se alimentam de restos de bactérias mortas.
Segundo Vazzoler (1999), os fungos não são comuns ao sistema de lodos ativados, mas
quando presentes pertencem ao grupo dos Deuteromicetos (fungos imperfeitos). No entanto,
podem predominar quando o tratamento de águas residuárias de origem industrial resulta em
acentuada queda de pH no meio, ou limita a disponibilidade de fontes nitrogenadas.
A Figura 3.7. apresenta uma representação esquemática das curvas de população de
microrganismos em relação ao tempo de aeração e à estabilização de um despejo orgânico.
58
Figura 3.7 - Representação esquemática das curvas de população de microrganismos em relação ao tempo de aeração e à estabilização de um despejo industrial orgânico. Fonte: Branco, 1986.
As bactérias responsáveis pelo processo biológico e presentes no floco pertencem a
diferentes gêneros, e em sua grande maioria são heterotrófas. O Quadro 3.2 mostra alguns
exemplos de gêneros bacterianos e algumas espécies de protozoários presentes nos sistemas de
lodos ativados (Vazzoler, 1999).
Algumas espécies de bactérias filamentosas são também heterotrófas, removendo a
matéria orgânica do meio, e outras são capazes de oxidar compostos reduzidos de enxofre, como
é o caso dos gêneros Thiothrix sp e Beggiatoa sp. Estas bactérias podem ser encontradas na
estrutura dos flocos ou livres, e são em geral, os organismos responsáveis pela ocorrência de um
dos graves problemas no tanque de aeração, o intumescimento do lodo ou “bulking”. O
crescimento em abundância das filamentosas, como efeito de algum desequilíbrio operacional do
59
sistema, forma uma macroestrutura semelhante a uma rede, que interfere na sedimentação e
compactação do floco bacteriano, além da competição com as demais espécies bacterianas
também pode ser exemplificada pelas espécies quimioautotrófas Nitrosomonas sp e Nitrobacter
sp. A primeira oxida a amônia a nitrito, e a segunda, nitrito a nitrato. As atividades combinadas
desses dois organismos efetuam a conversão completa da amônia a nitrato nos processos aeróbios
(Vazzoler, 1999).
60
Quadro 3.2– Principais microrganismos presentes no processo de lodos ativados. Bactérias Protozoários
Heterotrófas Pseudomonas sp, Zooglea
ramigera, Achromobacter sp,
Flavobacterium sp, Bdellovibrio
sp, Mycobacterium sp,
Alcaligenes sp, Arthrobacter sp
e Citromonas sp.
Classe Sarcodina Amebas, Arcella
discoides, Amoeba sp.
Filamentosas Sphaerotillus natans, Beggiatoa
sp, Thiothris sp, Leucothris sp,
Microthrix parvicella, Nocardia
sp, Nostocoida limicola.
Classe Ciliata Ciliados livres
natantes e sésseis,
Aspidisca costata,
Trachelophyllum sp,
Paramecium sp,
Didinium sp,
Chilodenella sp.
Nitrificantes Nitrosomonas sp e Nitrobacter
sp.
Classe Mastigophora Flagelados,
Spiromonas sp, Bodo
sp, Euglena sp, Monas
sp, Cercobodo sp.
Fonte: Vazzoler, 1999.
Segundo Vazzoler (1999), o emprego prático da avaliação dos tipos de protozoários e
micrometazoários presentes no bioreator é de extremo valor, uma vez que análises microscópicas
bastante simples podem indicar as condições de operação do sistema.
61
Algumas espécies de microrganismos encontrados em lodos ativados são consideradas
indicadores das condições de depuração do sistema de tratamento. O Quadro 3.3 indica os
microrganismos e as características do processo a eles associadas (Vazzoler, 1989).
Quadro 3.3 – Microrganismos indicadores das condições de depuração. Microrganismos Características do processo
Predominância de flagelados e rizópodes Lodo jovem, característico de início de
operação ou idade do lodo baixa.
Predominância de flagelados Deficiência de aeração, má depuração e
sobrecarga orgânica.
Predominância de ciliados pedunculados e
livres
Boas condições de depuração
Presença de Arcella (rizópode com teca) Boa depuração
Presença de Aspidisca costata (ciliado livre) Nitrificação
Presença de Trachelophyllum (ciliado livre) Idade do lodo alta
Presença de Vorticella microstoma (ciliado
pedunculado) e baixa concentração de ciliados
livres
Efluente de má qualidade
Predominância de anelídeos do gênero
Aelosoma
Excesso de oxigênio dissolvido
Predominância de filamentos Intumescimento do lodo ou bulking filmantoso
Fonte: Vazzoler, 1989.
Horan citado por Pinto (1998), apresentou uma lista de diferentes situações onde é
possível relacionar o valor indicador de protozoários, com a operação da estação de tratamento
por lodos ativados, conforme mostrado no Quadro 3.4.
62
Quadro 3.4 – Relação entre a observação de protozoários e o funcionamento da estação de tratamento no processo de lodos ativados.
Observação de protozoários Valor indicador
1. Ciliados fixos estão presentes em números
apreciáveis. Ciliados rastejantes também estão
presentes, mas são poucos; sem a presença de
flagelados.
Lodo bom e maduro resultando numa baixa
DQO do efluente. Geralmente ocorre
nitrificação.
2. Todos os protozoários estão ativos, mas
flagelados aumentam e o lodo está
desfloculando, produzindo um grande número
de bactérias livres.
O oxigênio é baixo no final do tanque de
aeração, devido ao tempo de residência
excessivo, ou a choque de carga orgânica.
3. Ciliados fixos nativos, sendo que os ciliados
rastejantes e livres estão, na maioria ativos.
Choque de carga tóxica ( possível aumento da
concentração de oxigênio dissolvido devido a
taxa metabólica reduzida das bactérias).
Possível perda ou redução da nitrificação.
4. Todos os protozoários inativos/ausentes,
exceto flagelados, cujo o número aumenta
apreciavelmente.
Grave carga de choque. Define a perda de
nitrificação. A concentração de oxigênio
dissolvido aumenta. Efluente com sólidos
suspensos altos.
5. Todos os protozoários inativos/ausentes,
incluindo flagelados.
Carga de choque extremamente severa,
acarretando a morte das bactérias, causando um
efluente com concentrações altas de sólidos
suspensos e uma perda total de nitrificação.
6. Proporcionamento dos ciliados livres;
número de ciliados fixos aumenta acompanhado
por um aumento gradual de flagelados.
Razão alimento/microrganismos apresentando
variações crônicas, resultando, inicialmente, na
perda da nitrificação, seguida de uma eventual
perda da capacidade de tratamento.
Fonte: Horan citado por Pinto (1998).
63
3.7.13.1 Identificação dos protozoários
Os protozoários são organismos unicelulares constituído de uma pequena massa de
protoplasma, vivem em colônias de células semelhantes, com tamanho geralmente microscópico
entre 100 e 300 microns, existindo mais de 65.000 espécies observadas. Sua classificação é feita
com base na morfologia, juntamente com seu meio de locomoção e alimentação.
Embora exista um número muito grande de protozoários que pode ser observado no
processo de lodos ativados, limitou-se aqui descrever apenas os grupos taxonômicos2
representados pelos flagelados, ciliados e amebas, pelo seu maior valor como indicador deste
processo.
a) Protozoários flagelados:
Os flagelados caracterizam-se pela locomoção por meio de organelas especiais
denominadas flagelos, em forma de filamento alongado que, em número de um, dois, quatro, seis
ou oito, executam movimento ondulatório na água, propelindo o animal para o próprio lado ou
para o lado oposto ao da inserção do flagelo. Muitos são encontrados normalmente em colônias
de poucos ou vários indivíduos, colônias essas que podem ter formas variadas, de acordo com a
espécie: dentrítica ou arborescente, esférica, etc (Branco, 1986).
Flagelados pequenos como o Bodo sp, Polytoma sp e Tetramitus sp, normalmente
dominam a microbiota durante a partida da estação de tratamento, quando a formação de flocos
por bactérias é ainda escassa. Eles se alimentam de bactérias dispersas e, com o passar do tempo
2 Taxonomia: é a parte da ciência biológica que se ocupa da classificação de organismos, sendo que cada grupo ou unidade sistemática se encontra subordinada a uma unidade maior, que abrange outros grupos equivalentes ou com um mesmo grau de semelhança entre si (Branco, 1986).
64
são substituídos pelos ciliados. Quando presentes em grande quantidade, são associados a má
performance da depuração biológica, motivada pela pouca aeração do lodo ou pela alta carga, ou
ainda pela presença de substâncias fermentativas (Poole citado por Pinto, 1998).
Normalmente, a atividade dos flagelados no lodo é reduzida devido a predação de outros
protozoários ou metazoários (Task Force on Wastewater Biology, 1995).
São agrupados em duas classes diferentes (Pinto, 1998):
i) Phytomastigophorea - são aqueles capazes de alimentar-se autotrófica e
heterotroficamente, sendo classificados também como algas. Exemplos: Euglena,
Volvox sp, Oicomonas sp. Estes flagelados possuem entre 2 e 4 flagelos. Alguns vivem
em colônias, outros, sozinhos. São comuns em filtros, lagoas de oxidação e lodos
ativados;
ii) Zoomastigophoros - são heterotróficos restritos e estão presentes em maior número
nas estações de tratamento de esgotos, sendo classificados como animais. Muitos são
parasitas em animais. Alguns têm um grande número de flagelos estando entre 2 a 20,
enquanto outros locomovem-se apenas com um único flagelo.
b) Protozoários ciliados
Entre os organismos unicelulares, são os ciliados os que possuem maior grau de
complexidade de estrutura. Seu modo característico de locomoção se realiza por meio de cílios,
organelas em forma de filamentos muito curtos que se distribuem geralmente por quase todo o
corpo do animal realizando batimentos coordenados, rítmicos. Além da locomoção, os cílios são
responsáveis pela captura dos alimentos, constituídos por bactérias e outras partículas em
suspensão. A captura é realizada através de turbilhão da água provocado pelos batimentos ciliares
encaminhando as partículas para a abertura denominada citóstoma (Branco, 1986).
65
Os ciliados possuem forma regular (oval, alongada, esférica) ou variada, mudando com
o ambiente ou idade, em alguns espécies. Alguns microrganismos possuem fibrilas contrácteis,
funcionando como músculos e outras destinadas à condução de estímulos sensoriais ou nervosos
(Storer e Usinger, 1978).
Caracterizam-se, ainda, pela presença de dois núcleos sendo um maior, o macronúcleo e
um menor o micronúcleo (Storer e Usinger, 1978). O número, forma e posição do macronúcleo
dentro da célula, são importantes para diagnosticar as suas características. Os micronúcleos são,
em geral, difíceis de observar em animais vivos, mas não tem importância para a identificação.
Estes indivíduos diferem quanto ao comprimento total e outros aspectos, incluindo a
variação da idade, variações ocasionais devido aos fatores ambientais e variações herdadas por
fatores genéticos (Storer e Usinger, 1978).
Os ciliados subdividem-se em fixos, rastejantes e livres, classificação esta baseada em
sua locomoção e arranjo de seus cílios.
i) Ciliados fixos – são protozoários em forma pedúncular (contrácteis), possuindo cílios
utilizados na sua alimentação, sendo ligados ao floco por uma haste que serve como apoio.
Citam-se Opercularias sp, Vorticellas sp, Epistylis sp.
ii) Ciliados Rastejantes – estes ciliados possuem o corpo achatado. O cílio responsável
pela alimentação é bem mais desenvolvido que os demais. Alimentam-se de partículas que
aderem levemente ao floco, e mudam a alimentação com freqüência (Eikelboom citado por Pinto,
1998). Citam-se Aspidiscas sp, Stentor sp e Euplotes sp.
Estão presentes em alta densidade. Sua presença diminui com o aumento da carga de
lodo (Curds e Cockburn citado por Pinto, 1998).
iii) Ciliados livres - são ciliados de vida livre que possuem um arranjo de seus cílios
uniformemente distribuídos ao redor do corpo. Incluem-se Paramecium sp e Litonotus sp.
66
iv) Suctoria – estes protozoários possuem cílios no início da vida, quando estão na sua
forma livre, vindo mais tarde a perdê-los e desenvolvendo então uma haste quando adultos,
alimentando-se por tentáculos através da sucção da matéria orgânica. Citam-se Acineta sp e
Podophyra sp.
c) Amebas
As amebas caracterizam-se, primeiramente, pela locomoção por meio de pseudópodos,
que são organelas transitórias, constituídas por simples prolongamentos protoplasmáticos que se
formam em qualquer ponto da célula, por uma fluidificação da substância coloidal. Estes
pseudópodes são saliências temporárias das células que não tem parede celular rígida (Branco,
1986).
O pseudópodo não é somente utilizado para a locomoção, mas também para a captura de
partículas alimentares, as quais são envolvidas por duas dessas organelas, dando origem a um
vácuo alimentar (Branco, 1986).
A estrutura da ameba é composta de uma massa de protoplasma clara, incolor,
gelatinosa, variando de tamanho entre 50 a 400 microns. O núcleo não é visível. A velocidade
com que estas células movimentam-se é, geralmente, tão baixa que, frequentemente, parecem não
estarem movendo-se.
A alimentação das amebas inclui outros protozoários, algas, rotíferos, pequenos
flagelados e ciliados (Storer e Usinger, 1978). O alimento é absorvido por meio de pseudópodes,
sendo que as amebas têm a capacidade de selecionar seu alimento.
Algumas amebas possuem um tipo de concha, conhecida como carapaça, que pode ser
secretada pelo próprio animal ou formada de partículas retiradas do meio. Estas conchas não
cobrem todo o corpo, mas facilitam a formação de pseudópodes, usados para a alimentação e
67
locomoção. As amebas que não possuem este tipo de concha, são chamadas amebas nuas, ou
Amoeba.
As amebas encontradas no tratamento de esgotos são representadas por dois grupos:
i) Rhizopoda – podem ser nuas ou com carapaça, sendo igualmente representadas nos
processos de tratamento. As que possuem carapaça contém proteínas, silicone ou
calcáreo.
ii) Actinopoda – são geralmente esféricas e possuem fibras centrais temporais compostas
por microtubos. Os membros deste grupo podem ter material mineral composto por
sílica ou sulfato.
3.7.13.2 Identificação dos metazoários
São animais multicelulares que apresentam o corpo com muitas células, geralmente,
dispostas em camadas ou tecidos. Neste trabalho estudaram-se dois grupos de metazoários: os
rotíferos e os nematódeos.
a) Rotíferos
O corpo possui tronco e cauda afilada, que está frequentemente articulada, com pés
tendo as glândulas adesivas para a fixação; a extremidade anterior, com disco troncal contendo
cílios, é usada para locomoção e alimentação (Storer e Usinger, 1978). O tipo de tronco é uma
das características utilizadas para identificar os rotíferos.
68
Possuem o comprimento do corpo entre 100 – 500 µm (Eikelboom e Van Buijsen citado
por Pinto, 1998). O corpo pode ser delgado (Rotatoria neptunius), largo (Macrochaetus), em
forma de saco (Asplanchna), achatado (Ascomorpha) ou esférico (Trochosphera).
Existem 1700 espécies de rotíferos de vida livre, mas algumas são fixas em tubos
protetores. O nome da classe refere-se aos cílios vibratórios da extremidade anterior do corpo.
Esta área ciliada, a ausência de cílios externos em outros lugares e os movimentos da faringe
mastigadora, distinguem os rotíferos. A coroa de cílios é responsável pela locomoção e também
pela captura de partículas alimentares que, pelo movimento provocado na água são encaminhados
à boca (Branco,1986). Existem duas classes, os Monogononta que predominam nas lagoas de
oxidação e Digononta que estão presentes no processo de lodos ativados.
Os sexos são separados e a reprodução é por partenogênese ou sexuada. Na maioria dos
casos, a reprodução por partenogênese constitui mais regra do que exceção sendo que os machos
são relativamente raros e, em várias espécies, permanecem desconhecidos. Em algumas espécies,
a fêmea carrega os ovos presos ao seu corpo (Branco, 1986).
Os rotíferos alimentam-se de algas unicelulares, plantas, protozoários, rotíferos menores
e bactérias. Nas lagoas a alimentação predominante são os fitoplâncton ou algas.
b) Nematódeos
Apresentam o corpo cilíndrico, delgado, frequentemente afilado nas extremidades, sem
segmentação ou cílios; coberto com uma cutícula dura. Contam somente com músculos
longitudinais, produzindo movimentos de flexão, mas não para alongamento ou contração.
Possuem um anel anterior e seis cordões nervoso longitudinais na cabeça (Pinto, 1998).
69
Os nematódeos apresentam formas macroscópicas em tamanho, com o comprimento do
corpo variando de 500 a 3000 µm (0,5 a 3mm), sendo bem maiores que os protozoários. Possuem
trato digestivo completo e reto; sem músculos circulares (Pinto, 1998).
Sua reprodução geralmente é sexuada. Os sexos são separados, macho com cloaca e
usualmente com uma ou duas espículas copuladoras; fêmea sem cloaca. Entretanto, alguns são
partenogênicas, com a fêmea produzindo ovos diplóides. O ciclo de vida consiste de estágios de
ovo, larva e vida adulta.
Os nematódeos são amplamente distribuídos e frequentemente dominam o habitat
aquático e terrestre, sendo de vida livre no solo, na água ou no esgoto, ou parasitas no homem
(Branco, 1986). Como exemplo estão Ascaris, Lombriga, Necator. Existem cerca de 1200
espécies. São constituídos por duas classes Digplogasteroídea e Rhabditoídae.
3.7.14 Fatores que afetam a composição da microfauna
a) Oxigênio dissolvido
O oxigênio dissolvido é reconhecido como o mais importante fator que determina a
presença, ou ausência, das espécies de protozoários e metazoários encontrados no lodo ativado.
A concentração recomendada é a partir de 2mg/L (Curds, 1982). Muitos protozoários
podem sobreviver sem oxigênio por um período limitado, mas com comprometimento da sua
atividade e metabolismo.
70
b) Alimentação
A composição do substrato é um dos fatores decisivos que regula a predominância de
um grupo de microrganismos sobre outros.
c) Temperatura
Em geral, a atividade dos organismos é afetada pela temperatura, e protozoários e
metazoários não são exceção. Verificou-se que a taxa de crescimento aumenta com temperaturas
elevadas (Curds, 1982). A temperatura é capaz de afetar o metabolismo dos microrganismos e
modificar a eficiência na atuação destes na purificação do esgoto.
No inverno, a atividade da microfauna é afetada quando a temperatura for menor que
9°C e no verão quando a temperatura for maior que 19,5 °C (Curds, 1982).
d) ìon H+ e Dióxido de Carbono
O pH é um fator limitante para o crescimento ou sobrevivência de algumas espécies de
microrganismos em particular.
Curds (1982), considera a faixa de pH ótimo entre 7,2 – 7,4. Em lodos ativados, o pH
varia entre 6 – 8, sendo que muitos protozoários possuem uma faixa acima desta.
O pH está ligado a concentração de dióxido de carbono e a alcalinidade do esgoto. O
dióxido de carbono é uma fonte de carbono para a fotossíntese de flagelados, mas também é
tóxico em altas concentrações, podendo limitar a distribuição de ciliados.
71
e) Luz
A fonte de energia para microrganismos fotossintéticos é limitada em alguns processos.
No entanto, não há maiores problemas porque a microfauna fotossintetizante é pouco encontrada
em lodos ativados (Curds, 1982).
f) Esgotos tóxicos
Concentrações de algumas substâncias inibem o tratamento biológico, sendo a
toxicidade, em muitos casos, dependente de outros fatores do meio como pH, OD, temperatura e
outros compostos tóxicos. Entre estes compostos encontram-se os metais pesados, pesticidas e
detergentes que afetam os protozoários e os metazoários (Curds, 1982).
g) Incidência sazonal
A diversidade da população é maior na primavera e no verão. Bodo sp, Chilodonella sp e
Urotrichia sp são encontradas durante os meses de inverno (Curds, 1982).
Ameba proteus, Arcella sp e Podophrys sp são encontrados na primavera e no máximo
no outono. Litonotus sp e Uronema sp são limitados no verão; Oxytrichia sp e Euglypha sp
encontram-se no outono (Curds, 1982).
h) Taxa de escoamento
A taxa de escoamento não afeta somente a taxa de diluição, mas também a velocidade
do líquido das unidades de tratamento. Indiretamente ela pode afetar a microfauna (Task Force on
Wastewater Biology, 1995).
72
i) Outros
Entre outros fatores que podem afetar a microfauna estão clima, turbulência durante a
fase de aeração, salinidade, concentrações elevadas de amônia e ácido sulfúrico.
73
4 METODOLOGIA
4.1 DADOS DA EMPRESA
O trabalho foi realizado na empresa Fras-le S.A. na unidade de Forqueta, cidade de
Caxias do Sul - RS. Essa empresa foi criada em 1953, quando Francisco Stedile, comerciante de
veículos e autopeças, interessou-se pela possibilidade de fabricar no Brasil alguns produtos do
setor automotivo que, na sua maioria, eram importados. Mais tarde houve o interesse de
fabricação de lonas para freio da fábrica italiana FINAFF. Em 22 de fevereiro de 1954 foi
fundada a indústria Francisco Stedile e Cia, licenciada pela FINAFF para fabricação de lonas de
freio. Em 22 de janeiro de 1996 a denominação social, que era Francisco Stedile S.A., foi alterada
para FRAS-LE S.A.
As principais linhas de produtos Fras-le são: pastilhas para freios a disco e lonas para
freios de automóveis e caminhões; lonas para freios moldadas em rolos para aplicações
automotiva e industrial, lonas trançadas em rolos para aplicação universal; revestimentos em
embreagens moldados e trançados para todos os tipos de veículos; revestimentos de embreagens
moldados dentados para tratores, maquinário agrícola e industrial; placas planas para uso
universal; telhas moldadas rígidas e flexíveis para aplicação automotiva e industrial, lonas em
74
blocos trançadas para uso no ramo petrolífero - pastilhas para freios para metrô; sapatas
ferroviárias, entre outros.
4.2 DESCRIÇÃO DO PROCESSO DA ESTAÇÃO DE TRATAMENTO DE
EFLUENTES
O tratamento de efluentes industriais e sanitário da empresa Fras-le é realizado através
de um sistema primário, constituído por tanque de recepção, equalização do efluente e tratamento
físico-químico com decantação para remoção de sólidos em suspensão, óleos e graxas e carga
orgânica, seguido por um tratamento secundário que compreende um processo de degradação
biológica por meio de lodos ativados visando a eliminação da carga orgânica poluidora
remanescente.
Na Figura 4.1 encontra-se o fluxograma da estação de tratamento de efluentes da
empresa Fras-le.
75
Legenda: Efluente tratado
Lodo
Figura 4.1 – Fluxograma simplificado da estação de tratamento de efluentes.
Caixa Séptica
ColetorIndustrial
Tanque deRecepção
Tanque deEmergência
Tanque de Homogenização
DecantadorPrimário
ReatorBiológico
DecantadorSecundário
FiltroBiol.
Lagoa de Polimento
Tanque de Lodo
Prensa Desaguadora
Lodo Prensado
Lagoa de emergência
FiltroC.A Lago de PeixesReciclo de
Água
76
Os despejos sanitários oriundos da fábrica (banheiros, chuveiros e refeitórios) são
enviados para tanques sépticos, que têm a função de decantar os sólidos e reter o material graxo
contido nos esgotos, transformando-os em substâncias e compostos mais simples e estáveis, após
este segue para o tanque de recepção. O segundo tanque ou coletor industrial recebe os efluentes
industriais gerados ao longo do processo de fabricação, este efluente segue para o tanque de
emergência, aonde são diluídos com água tratada com a finalidade de reduzir a carga orgânica.
Após a diluição, são enviados para o tanque de recepção de forma controlada, ou seja, num
volume pequeno para evitar choques de carga.
Os despejos misturados passam por uma grade de barras para a remoção de sólidos
grosseiros em suspensão, bem como corpos flutuantes para a proteção dos dispositivos de
transporte dos despejos contra obstrução, tais como bombas, registros e válvulas, e por um
medidor de vazão tipo calha Parshall com medição por transmissor ultrasônico, seguido então
para um tanque de equalização.
O tanque de equalização possui um sistema de ar distribuído no fundo do tanque, com a
finalidade de promover uma mistura homogênea dos efluentes. Este tanque tem por objetivos,
além da homogeneização do afluente, a equalização das vazões e o ajuste de pH, oferecendo as
próximas etapas do tratamento um efluente de características constantes, evitando cargas de
choque no restante do sistema. O controle de pH é feito através da adição de ácido sulfúrico ou
soda cáustica dependendo do valor em que se encontra, o pH varia de 8,0 a 10,0. A vazão
encontra-se na faixa de 5 a 15 m3/h nesta etapa do tratamento.
O efluente do tanque de equalização é recalcado por uma bomba centrífuga a vazão
constante para o tratamento físico-químico no decantador primário que é apresentado na Figura
4.2. Neste momento é adicionado uma solução de sulfato de alumínio (500 a 1000 mg/L)
diretamente na linha de recalque e solução de polieletrólito (2 a 6 mg/L) no cilindro misturador
77
hidráulico. As duas soluções são colocadas no sistema com bombas dosadoras de diafragma. O
lodo gerado nesta etapa do tratamento é separado por decantação e removido pela parte inferior
do tanque e após, é enviado para o tanque de acúmulo de lodo.
Figura 4.2 – Foto do decantador primário da ETE Fras-le.
Após a decantação, o efluente flui por gravidade para o reator biológico (lodos ativados)
com volume de 322 m3, conforme Figura 4.3. Neste o efluente e o lodo ativado são intimamente
misturados, agitados e aerados para promover a estabilização. O processo é o de aeração
prolongada, onde o oxigênio é introduzido ao sistema através de sopradores de ar, sendo dois em
funcionamento e um reserva. A vazão de entrada nesta unidade é em torno de 6m3/h.
78
Figura 4.3 – Foto do reator biológico da ETE Fras-le.
Ocorrida a estabilização do efluente no reator biológico, faz-se a separação entre lodo e
o efluente tratado, através de sedimentação em decantador. Parte dos sólidos biológicos retorna
ao tanque de aeração e o restante da massa é descartada para o tanque de acúmulo de lodo. A
vazão de reciclo de lodo recirculado é em torno de 18 m3/h.
O decantador secundário, é uma unidade circular mecanizada, provida de uma ponte
móvel radial removedora de lodo equipada com um dispositivo de raspagem de fundo, para a
remoção do lodo decantado, e de um raspador de superfície para a retirada de escuma e outras
formas de sobrenadantes. A Figura 4.4 apresenta uma vista parcial do decantador secundário. O
efluente que transborda do decantador segue para o filtro biológico, que é apresentado na Figura
4.5.
79
Figura 4.4 – Vista parcial do decantador secundário da ETE Fras-le.
O filtro biológico tem a finalidade de remover compostos orgânicos solúveis e partículas
em suspensão presentes no efluente.
Figura 4.5 – Foto do filtro biológico da ETE Fras-le.
80
O efluente segue então para a lagoa de polimento, para que haja a sedimentação dos
sólido remanescente que possam se encontrar em suspensão no meio. A Figura 4.6 apresenta a
lagoa de polimento da ETE.
Figura 4.6 – Foto da lagoa de polimento da ETE Fras-le.
Após a passagem pela lagoa de polimento o efluente é encaminhado para o filtro de
carvão ativado, que possui duas fases distintas num único corpo, sendo a primeira com uso de
areia e a segunda com uso de carvão ativado. Na fase de areia se dá predominantemente a
remoção de particulados em suspensão, bactérias e partículas coloidais. Na fase do carvão ativado
predomina a ação de adsorção, onde serão removidas as substâncias voláteis, substâncias
odoríferas, e também complementa a remoção de nitrogênios e possibilita a clarificação. A Figura
4.7 apresenta o filtro de carvão ativado em operação na ETE.
81
Figura 4.7 – Foto do filtro de carvão ativado da ETE Fras-le.
O líquido clarificado é dividido em duas partes, a primeira (cerca de 30%) será
recirculado para o tratamento novamente, operando em circuito fechado, com o objetivo de
auxiliar na manutenção de uma vazão constante para o tratamento e na diluição de picos de carga
acima de especificações prévias no tanque de emergência ou no tanque de recepção. Também
utiliza-se na preparação de produtos químicos da estação de tratamento e na lavagem da prensa
desaguadora de lodo. A segunda parte será enviada a lagoa de peixes para monitoramento da
qualidade desta água, e posteriormente será enviada ao corpo receptor.
A lagoa de emergência tem como finalidade absorver grandes volumes de efluente em
situações anormais de operação, onde o fluxo precise ser interrompido ou desviado em qualquer
uma das etapas da planta e este efluente se encontrar fora das especificações para lançamento no
corpo receptor, após haverá recirculação para início do sistema.
82
A massa de lodo retida no tanque de acúmulo, ou seja, lodo da decantação primária e
lodo biológico resultante do decantador secundário, é recalcada para a linha de alimentação da
prensa desaguadora, que consiste em dois rolos cilindros de borracha, onde se dá a desaguagem
do lodo realizando uma separação das fases sólido líquido do resíduo. A água de lavagem das
telas da prensa e o líquido clarificado obtido na prensagem do lodo retornam para o tanque de
equalização para posterior tratamento.
4.3 COLETA DAS AMOSTRAS
As amostras foram coletadas após o decantador primário, sendo considerado como
entrada do reator biológico, e após o decantador secundário, sendo considerado como efluente
final, para as determinações de parâmetros físico-químicos, e próximo à saída do tanque de
aeração, para o caso das análises microbiológicas. Para tanto, foram utilizados frascos de 500 ml
de polietileno, preenchidos até a metade de seu volume, de modo a manter o oxigênio em sua
parte superior, necessário a sobrevivência da microbiota durante o transporte das amostras. As
amostras foram coletadas na parte da manhã as segundas, quartas e sextas-feiras, em seguida
seguiram para o laboratório, aonde foram conservadas em geladeira à temperatura de 4°C, até a
determinação de parâmetros físico-químicos e análises microbiológicas.
83
4.4 PARÂMETROS FÍSICO-QUÍMICOS MONITORADOS
A metodologia adotada para a determinação de parâmetros físico-químicos para as
amostras coletadas está descrita no Standard Methods for Examination of Water and Wastewater,
19 ª edição (1995). Os métodos específicos são apresentados no Quadro 4.1.
Quadro 4.1 Metodologia utilizada para determinação de parâmetros físico-químicos (Standard Methods for Examination of Water and Wasterwater, 19ª edição, 1995.
ANÁLISES MÉTODO DE ANÁLISE
Demanda bioquímica de oxigênio (DBO5) Winkler
Demanda química de oxigênio (DQO) Fotométrico
pH Potenciométrico
Sólidos suspensos totais (SST) Gravimétrico
Sólidos voláteis (SSV) Gravimétrico
Oxigênio dissolvido (OD) Oxímetro
Nitrogênio total (NT) Kjedhal
Fósforo total (PT) Fotométrico
A freqüência de análises, os parâmetros analisados e os pontos de coleta de amostras são
apresentados no Quadro 4.2.
84
Quadro 4.2– Cronograma de análises da estação de tratamento de efluentes. Análises Tanque de
emergência Tanque de
equalização Entrada do
reator Dentro do
reator Reciclo do
lodo Efluente
final pH Diária Diária Diária Diária Diária Diária
DQO 2 x semana 2 x semana Diária 2 x semana
DBO5 mensal mensal 2 x mês 1 x mês
SST 1 x semana 2 x semana 2 x semana 2 x semana
SSV 2 x semana 2 x semana
OD 3 x semana 3 x semana
NT 3 x semana 2 x semana
PT 2 x mês 1 x semana
Neste trabalho todas as determinações físico-químicas apresentadas foram realizadas
pelo laboratório da própria empresa (Silaq), o qual está cadastrado junto à Fepam sob número
9/2002-DL, sendo assim apto para realização destas análises.
4.5 ANÁLISE MICROBIOLÓGICA MONITORADA
Juntamente com as análises físico-químicas anteriormente mencionadas, durante as duas
etapas deste experimento, foi feito o acompanhamento da microfauna presente no lodo ativado.
As observações dos microrganismos foram realizadas do período de 21 de janeiro a 17
de maio de 2002, três vezes por semana, ou seja, segundas, quartas e sextas feiras.
Para a descrição e contagem da microfauna apresentados no presente trabalho utilizou-se
um microscópio da marca Olympus , modelo BH-2, com uma magnitude de 200 e 500 vezes. A
85
Figura 4.8 apresenta uma fotografia do equipamento utilizado para a identificação
microbiológica.
Figura 4.8 – Microscópio Olympus, modelo BH-2 utilizado na visualização dos microrganismos.
Os parâmetros de calibração do microscópio foram os seguintes:
• Luminosidade do microscópio em torno de 10;
• Luz transmitida;
• Filtro A;
• Magnificação 20 ou 50x;
86
• Ocular de 10x;
• Campo de visão aproximadamente 0,4mm.
Os parâmetros para fotografia utilizados foram os seguintes:
• Formato do filme 35mm;
• Asa: 400;
• Reprocidade: 5;
• Exposição adjunta: 1;
• Tempo de exposição: 1;
Para a observação microscópica coletaram-se pequenas parcelas homogêneas do lodo
dentro do reator biológico, sendo disposto entre lâmina e lamínula com o auxílio de uma pipeta
graduada de 10 ml, procedendo a retirada do excesso com papel absorvente. Após tal
procedimento as amostras eram analisadas no microscópio. Com o auxílio de bibliografia
especializada, e observando-se a curva de sucessão ecológica de um sistema de lodos ativados,
fotografaram-se os microrganismos de importância no processo. Com este procedimento
objetivou-se avaliar a sucessão microbiana em sistemas de tratamento de efluentes industriais.
As bibliografias utilizadas para a identificação de protozoários e metazoários foram
Vazzoler (1989) e Jenkins et al (1993).
87
4.6 ANÁLISE ESTATÍSTICA DOS DADOS
Os dados obtidos foram posteriormente analisados por meio de testes estatísticos.
Os testes estatísticos foram realizados através da planilha eletrônica Excel, na qual
foram calculadas as médias, desvios padrões e também os coeficientes de correlação (r), para os
parâmetros físico-químicos, a fim de poder embasar as conclusões deste trabalho.
88
5 RESULTADOS E DISCUSSÕES
Neste capítulo são apresentados e discutidos os resultados obtidos no transcorrer da fase
experimental deste trabalho, tanto em termos de variáveis físico-químicas, quanto no que diz
respeito as observações da microfauna presente no lodo ativado.
O formulário utilizado para as anotações dos parâmetros físico-químicos e para as
observações microscópicas, encontram-se no Anexo I.
5.1 CARACTERÍSTICAS FÍSICAS E QUÍMICAS DO EFLUENTE PROVENIENTE
DO SISTEMA DE LODOS ATIVADOS
O Quadro 5.1 apresenta a variação de alguns parâmetros operacionais do reator
biológico ao longo do período de monitoramento do sistema de lodos ativados da ETE da
empresa Fras-le, o qual caracteriza-se pela aeração prolongada com idade de lodo entre vinte e
trinta dias aproximadamente.
89
Quadro 5.1 – Variáveis de controle calculadas para o reator biológico. PARÂMETRO ANALISADO RESULTADOS MÉDIOS
Jan/02 Fev/02 Mar/02 Abr/02 Maio/02
A/M(dia-1) 0,0807 0,05233 0,03404 0,0474 0,1028
IVL(ml/g) 64,93 64,52 65,12 72,38 93,53
θ (dia) 27 28 28 32 26
TL (ml/L) 527,26 528,98 519,46 517,13 514,83
Tempo de retenção hidráulico (dias) 3,08 3,10 2,67 2,27 2,01
Através dos dados apresentados no Quadro 5.1, no período compreendido de janeiro a
maio de 2002, verificou-se que os valores de idade do lodo (θ) variaram de 26 a 32 dias, sendo a
média mensal de 28,2 dias. Segundo Jordão (1997), a idade do lodo para sistemas com aeração
prolongada varia em torno de 20 a 30 dias, sendo assim o sistema está dentro da faixa sugerida
pelo autor.
O valor médio para o índice volumétrico de lodo obtido para o período de
monitoramento foi de 72,09 ml/g, variando de 39,32 a 125,18 ml/g, estando dentro da faixa
considerada indicativa de uma boa qualidade do lodo formado, que é de 40 a 150 ml/g, indicando
assim uma boa sedimentabilidade da biomassa no decantador secundário.
O tempo de retenção hidráulico calculado para o sistema teve uma média de 2,63 dias,
variando de 0,59 a 14,63 dias. Segundo Von Sperling (1997) o tempo de retenção hidráulico
(TRH) para lodos ativados com aeração prolongada deve variar na faixa de 0,67 a 1 dia, e
segundo Jordão (1997), está faixa deve variar de 0,67 a 1,5 dias. Assim o TRH obtido está fora
das faixas sugeridas pelos autores acima mencionados, porém ressalta-se que em processos de
tratamento de efluentes industriais por lodos ativados, os parâmetros operacionais que melhor
90
caracterizam o tipo de processo é a relação A/M e a idade do lodo (θ), sendo de menor
importância o tempo de retenção hidráulico.
A Figura 5.1 nos apresenta a variação do parâmetro de controle, fator de carga (A/M) e
a variação carga orgânica volumétrica.
Figura 5.1 – Variação dos parâmetros operacionais A/M e Carga orgânica volumétrica.
Segundo Jordão (1997), o parâmetro A/M em lodos ativados com aeração prolongada
varia de 0,05 a 0,15 kg DBO5 / kg SSV.dia e a carga orgânica volumétrica varia de 0,15 a 0,4 kg
DBO5 / m3.dia.
Conforme Von Sperling (1997), a relação A/M geralmente assume os valores de 0,08 a
0,15 kg DBO5 / kg SSV.dia, para o sistema de lodos ativados com aeração prolongada.
Através dos dados apresentados na Figura 5.1, observa-se que os valores de A/M obtidos
para o lodo do reator biológico variaram de 0,021 a 0,116 kg DBO5 / kg SSV.dia, sendo a média
Variação de A/M e COV
0
0,1
0,2
0,3
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
04/01 24/01 13/02 05/03 25/03 14/04 04/05 24/05
Data
CO
V (k
gDB
O5/m
3 .dia
)
00,010,020,030,040,050,060,070,080,090,10,110,120,13
COV (KgDBO/m3.dia)A/M(kgDBO5/KgSSV.dia)
A/M
(kgD
BO
5/kg
SSV.
dia)
91
de 0,0634 kg DBO5 / kg SSV.dia ± 0,033 kg DBO5 / kg SSV.dia. Assim o parâmetro A/M
verificado para o sistema manteve-se dentro da faixa sugerida pelo autor (Jordão, 1997).
Também pela análise da Figura 5.1, observa-se que os valores de COV obtidos para o
reator biológico variaram de 0,163 a 0,758 kg DBO5 / m3.dia, sendo a média de 0,456 kg DBO5 /
m3.dia ± 0,218 kg DBO5 / m3.dia. Deste modo o parâmetro COV esteve próximo a faixa sugerida
pelo autor (Jordão, 1997).
Foi calculado a correlação entre os parâmetros A/M e COV, e o resultado obtido foi de
0,959, o que significa que há uma elevada correlação entre eles.
No Quadro 5.2 pode-se verificar a média mensal dos parâmetros físico-químicos do
efluente coletado na saída do decantador secundário da ETE da empresa Fras-le unidade
Forqueta, ao longo do período de execução dos experimentos.
Quadro 5.2 – Características do efluente proveniente do decantador secundário – Fras-le unidade Forqueta, nos meses de janeiro a maio de 2002.
PARÂMETRO ANALISADO RESULTADOS MÉDIOS
Jan/02 Fev/02 Mar/02 Abr/02 Maio/02
DBO5 (mg/L) 12 69 51 40 19
DQO (mg/L) 65 101 107 68 122
pH 8,31 8,41 8,08 7,89 7,93
SST (mg/L) 19 26 71 77 42,6
OD (mg/L) 5,09 5,67 5,37 5,52 4,98
Nitrogênio total (mg/L) 9,48 6,70 10,80 10,15 7,78
Fósforo total (mg/L) 0,61 0,54 0,83 1,30 1,75
*As análises que geraram estes dados foram realizadas em amostras simples pelo laboratório da empresa.
92
No Quadro 5.3 pode-se verificar a média mensal dos parâmetros físico-químicos do
efluente final da ETE da empresa Fras-le unidade Forqueta, ao longo do período de execução dos
experimentos.
Quadro 5.3 – Média das características do efluente final da empresa Fras-le, nos meses de janeiro a maio de 2002.
PARÂMETRO ANALISADO RESULTADOS MÉDIOS
Jan/02 Fev/02 Mar/02 Abr/02 Maio/02
DBO5 (mg/L) 12 69 51 20 21
DQO (mg/L) 65 101 107 35 41
pH 8,31 8,41 8,08 8,10 8,13
SST (mg/L) 19 26 71 15 13
OD (mg/L) 5,09 5,67 5,37 9,37 10,00
Nitrogênio total (mg/L) 9,48 6,70 6,55 6,36 5,43
Fósforo total (mg/L) 0,61 0,54 0,83 0,85 0,73
*As análises que geraram estes dados foram realizadas em amostras simples pelo laboratório da empresa.
93
A Figura 5.2 apresenta a variação na concentração da matéria orgânica e inorgânica, em
termos de DQO ao longo do monitoramento da ETE da empresa.
Figura 5.2 – Variação de DQO observada durante o período de 21 de janeiro a 15 de maio de 2002, na entrada do reator biológico e na saída do decantador secundário.
Através dos dados apresentados na Figura 5.2, no período compreendido de 21 de
janeiro a 15 de maio de 2002, verificou-se que os valores de DQO obtidos para a entrada do
reator apresentaram uma média de 1.679 mg/L ± 972 mg/L variando de 292 mg/L a 4.212 mg/L,
o que permite constatar o elevado índice de carga orgânica que o reator deve ser capaz de
remover. Ainda, com base na Figura 5.2, verificou-se que a média da DQO da saída do
decantador secundário, considerado neste estudo como sendo o efluente final, foi de 81 mg/L ±
51 mg/L. Desta forma, a eficiência média do reator biológico, no período estudado, foi de 95 %
de remoção de carga orgânica em termos de DQO. O limite de emissão estabelecido pelo órgão
Variação de DQO no Sistema
0
400
800
1200
1600
2000
2400
2800
3200
3600
4000
4400
14/01 03/02 23/02 15/03 04/04 24/04 14/05
Data
DQ
O e
ntra
da R
B (m
g/L)
0
30
60
90
120
150
180
210
240
270
300
Entrada R.B
Saída D.S
DQ
O s
aída
D.S
. (m
g/L)
94
ambiental para DQO é de 324 mg/L, sendo assim durante o período mencionado o efluente final
encontrava-se dentro das exigências especificadas.
A Figura 5.3 apresenta a variação de pH medida na entrada do reator biológico, dentro
do mesmo e na saída do decantador secundário.
Figura 5.3 – Variação de pH observada durante o período de acompanhamento.
Pode-se observar, pela análise da Figura 5.3 que o pH na entrada do reator variou de
10,18 a 6,50 sendo que o pH médio verificado no período de amostragem foi de 8,43. Os dados
permitiram concluir que há uma variação bastante grande nos valores de pH para a entrada do
reator, mas que o mesmo consegue absorver a esta variação através da concepção do tanque de
aeração que é de mistura completa. Assim mantendo o pH médio em 7,87 dentro do reator com
variação de 7,12 a 8,56.
Segundo McKinney citado por Povinelli, 1989, o pH é um dos fatores ambientais mais
importantes em sistemas de lodos ativados. Desta forma, o autor recomenda pH superior a 6,5,
Variação do pH no sistema
6
6,5
7
7,5
8
8,5
9
9,5
10
10,5
25/12 14/01 03/02 23/02 15/03 04/04 24/04 14/05 03/06Data
pH
Entrada R.BDentro R.BSaída D.S
95
para evitar o desenvolvimento de fungos, e inferior a 9,0, evitando um retardamento na taxa de
metabolismo bacteriano. O pH ótimo está em torno de 7 para a maioria dos microrganismos
heterotróficos.
Conforme Tchobanoglous (1995), o pH final da biomassa, manteve-se abaixo da faixa
ideal, o qual segundo este autor deve ficar entre 8,0 a 9,5 com a finalidade de evitar-se a
proliferação de microrganismos filamentosos. O crescimento de organismos filamentosos
acarreta ao sistema aeróbio problemas de intumescimento de lodo durante o período de operação
do mesmo.
Assim, o pH médio verificado para o reator biológico (7,87) manteve-se próximo a faixa
sugerida por diversos autores (Tchobanoglous,1995; Mckinney citado por Povinelli, 1989), o que
evitou o desenvolvimento de fungos, decréscimo na taxa metabólica bacteriana e proliferação de
microrganismos filamentosos.
O parâmetro Sólidos Suspensos Voláteis (SSV) foi utilizado no presente trabalho como
sendo um indicador da concentração de microrganismos presentes no meio. Segundo
Tchobanoglous (1995), os sólidos suspensos voláteis se referem ao conteúdo orgânico dos
sólidos suspensos. Ainda, os autores complementam “a análise de sólidos voláteis se aplica mais
frequentemente aos lodos de água residuária para medir sua estabilidade biológica”. Em resumo,
os sólidos suspensos voláteis expressam a biomassa, ou seja, a fração orgânica da biomassa (Von
Sperling, 1997).
É importante destacar, que o parâmetro Sólidos Suspensos Voláteis além de expressar a
concentração da biomassa do sistema, incluem metabólitos, que são excretados pelos
microrganismos em decorrência das reações bioquímicas intrínsecas ao desenvolvimento destes.
96
A Figura 5.4 apresenta o gráfico que mostra a variação na concentração de Oxigênio
Dissolvido (OD) e Sólidos Suspensos Voláteis (SSV) verificada durante o período de observação
do sistema aeróbio tipo lodos ativados.
Figura 5.4 – Desempenho do reator biológico, durante o período de observação, quanto aos parâmetros Oxigênio Dissolvido (OD) e Sólidos Suspensos Voláteis (SSV).
Observando-se o gráfico da Figura 5.4 constata-se que o oxigênio dissolvido dentro do
reator biológico variou de 0 a 7,41 mg/L , sendo a concentração média verificada no período de
2,27 mg/L. Este valor está acima do que seria a faixa ideal para lodos ativados, podendo acarretar
uma diminuição na eficiência do processo, além do que configura um desperdício de energia.
Curds (1982) e Tchobanoglous (1995) afirmam que em sistemas de lodos ativados a
concentração de OD mantida no reator usualmente situa-se na faixa de 1,0 a 2mg/L. Ainda,
segundo Finkler (1999), o oxigênio é um fator limitante e essencial para a biomassa aeróbia, pois
o mesmo condiciona o crescimento bacteriano, quando em sua falta ou excesso.
0
1
2
3
4
5
6
7
8
14/01 03/02 23/02 15/03 04/04 24/04 14/05 03/06
Data
OD
no
R.B
. (m
g/L)
3500
4500
5500
6500
7500
8500
9500
10500
11500
12500
13500
14500 OD
SSV
SSV
no R
.B. (
mg/
L)
Variações de OD e SSV no R.B.
97
O fornecimento de ar tem por função suprir o meio em oxigênio, o suficiente para que os
microrganismos possam respirar. Um fornecimento excessivo de oxigênio, em relação à
quantidade de matéria orgânica, leva ao estabelecimento da fase endógena, em que a massa
biológica passa a se autodestruir, transformando o material sintetizado em gás carbônico, água e
amônia (Branco, 1986).
Pela análise estatística dos dados da Figura 5.4 não foi encontrada correlação entre OD e
SSV para este sistema, sendo r = -0,04655. Este resultado contradiz o que foi observado por
Finkler (1999), “...quando as concentrações de oxigênio dissolvido no meio aproxima-se de um
valor crítico (concentrações baixas), a concentração de SSV atinge seu ápice, ou seja, a medida
que há um aumento da população microbiana, aumenta o consumo de oxigênio, o que explicaria
seu decréscimo”.
A Figura 5.5 apresenta a variação da concentração de DBO5 na entrada e saída do reator
biológico.
98
Figura 5.5 – Concentração de DBO5 na entrada e saída do reator biológico.
A remoção de demanda bioquímica de oxigênio (DBO5) corresponde à quantidade de
oxigênio que é consumido pelos microrganismos, na oxidação biológica da matéria orgânica, a
20ºC, durante cinco dias. É portanto uma medida indireta da capacidade do sistema em reduzir a
carga orgânica. Durante o período estudado a eficiência média de remoção de DBO5 do sistema
foi de 95,44 %.
A Figura 5.6 apresenta o gráfico da relação de DBO:N:P para a entrada do reator
biológico.
Variação da DBO no sistema
0150300450600750900
1050120013501500
04/01 03/02 05/03 04/04 04/05 03/06
Data
Con
cent
raçã
o de
DB
O (m
g/L)
0
20
40
60
80
100
120
Entrada R.BSaída D.S
Con
cent
raçã
o de
DB
O (m
g/L)
99
Figura 5.6 – Gráfico que apresenta a relação DBO:N:P para a entrada do reator biológico.
Segundo Branco (1986), para o crescimento microbiológico ótimo, as quantidades
relativas de carbono orgânico (como DBO5), nitrogênio e fósforo, devem ser de 100:5:1.
Observando-se o gráfico da Figura 5.6, nota-se que a relação utilizada está bem abaixo da
recomendada em literatura, apesar deste fato, a eficiência do sistema não está sendo afetada. Para
precisarmos a quantidade necessário de nitrogênio e fósforo, deveríamos levar em consideração a
quantidade utilizada para síntese de novas células, de acordo com a produção excedente de lodo.
Relação DBO:N:P
0
150
300
450
600
750
900
1050
1200
1350
1500
1650
24/1 13/2 5/3 25/3 14/4 4/5 24/5Data
Con
cent
raçã
o de
DB
O (m
g/L)
0
8
16
24
32
40
48
56
64
72
DBO entrada R.BNT entrada R.BPT entrada R.BNT teóricoPT teórico
Con
cent
raçã
o (m
g/L)
100
5.2 CARACTERIZAÇÃO MICROBIOLÓGICA
O efluente tratado oriundo da empresa Fras-le, apresentou durante a maior parte deste
estudo características boas com relação a densidade do lodo, decantabilidade, dispersão do lodo,
entre outras.
Além do monitoramento dos parâmetros físico-químicos, foi realizado o
acompanhamento microbiológico do lodo do reator biológico, objetivando-se estudar a utilização
da observação microscópica da microbiota como uma variável de controle para o processo de
lodos ativados. O monitoramento microbiológico é um importante indício do funcionamento e da
eficiência do processo, assim como a estabilidade atingida pelo sistema.
Ao longo das observações fotografou-se a microbiota durante o período de 21 de janeiro
a 17 de maio de 2002.
Segundo Vazzoler (1999), “ o emprego prático da avaliação dos tipos de protozoários e
micrometazoários presentes em bioreatores é de extremo valor, uma vez que análises
microscópicas bastante simples podem revelar-se em bons indicadores das condições de operação
do sistema”.
O Quadro 5.4 apresenta o gênero dos principais microrganismos identificados no lodo
do reator biológico durante o período de observação.
101
Quadro 5.3 – Espécies identificadas no reator biológico da ETE, de acordo com seus grupos taxonômicos.
Grupos Taxonômicos Sub-grupos Taxonômicos Espécies observadas Suctoria Podophrya fixa, Acineta sp.
Fixos Opercularia sp, Vorticella sp,
Carchesium sp.
Ciliados Rastejantes Aspidisca sp, Euplotes patella.
Livres Litonotus sp, Paramecium sp,
Didinium sp, Chilodonella sp,
Spirostomum sp, Oxytrichia sp,
Acineria sp, entre outros.
Amebas - Amoeba sp, Difflugia sp.
Rotíferos - Philodinavus sp, Rotaria sp,
Philodina sp.
* Este estudo não abrangeu a identificação das espécies de flagelados e nematódeos.
Comparando-se os Quadro 5.3 e 3.1, observa-se que os microrganismos encontrados
neste experimento estão dentre os principais microrganismos presentes no processo de lodos
ativados citados por Vazzoler (1999).
No Anexo II encontra-se a Tabela 1 com a data e o gênero de cada microrganismo
identificado, para todo o período de monitoramento.
a) Ciliados Fixos
Estes organismos, cuja sobrevivência depende da presença de um substrato sólido ou
semi-sólido, possuem um corpo em forma de sino e um pedúnculo de sustentação que lhes
permite fixarem-se ao floco. São dominantes devido a sua forma diversificada de alimentar-se,
102
podendo representar cerca de 80% das espécies presentes. Ocorrem em situações de transição
numa estação de tratamento. Algumas espécies de Vorticella sp e Opercularia sp podem
sobreviver, e crescer em estações sujeitas a falta de oxigênio e a presença de produtos tóxicos
(Madoni, 1994).
O ciliado fixo do gênero Vorticella sp ocorreu no período de estudo com uma freqüência
de observação em 70,73 % dos dias, estando desta forma presente em praticamente todos os dias
de acompanhamento. Outro ciliado fixo que se repetiu, ao longo do monitoramento, foi o gênero
Opercularia sp, a sua freqüência de observação ficou em torno de 20% dos dias. Segundo
Branco (1986), os ciliados fixos são reconhecidos universalmente como indicadores de boas
condições de funcionamento do sistema, por coincidir a sua maior concentração com a presença
de boa floculação. Se o processo mantiver o prosseguimento, o sistema pode atingir graus de
estabilidade ainda mais elevados, com desaparecimento dos ciliados sésseis que serão
substituídos por rotíferos, nematóides e até mesmo larvas de insetos que se alimentam de restos
de bactérias mortas.
Ainda, segundo Horan citado por Pinto(1998), quando ciliados fixos estão presentes em
números apreciáveis e ciliados rastejantes estão presentes em menor número, sem a presença de
flagelados, isto indica que o lodo é bom e maduro, resultando numa baixa DQO do efluente.
Uma possível causa para que se encontrasse repetidas vezes o microrganismo do gênero
Vorticella sp, seria que os ciliados fixos se prendem ao floco e não são lavados do sistema no
momento que se faz a recirculação do lodo e posterior descarte.
A Figura 5.7 apresenta uma microfotografia do lodo, com uma Vorticella sp.
103
Figura 5.7 – Foto do ciliado fixo do gênero Vorticella sp, presente no lodo no dia 15 de abril de 2002. (aumento 200x)
b) Ciliados Rastejantes
Alimentam-se de partículas que aderem levemente ao floco, e mudam a alimentação
com freqüência. No período de acompanhamento, os principais representantes deste grupo
encontrados foram: Aspidisca sp e Euplotes patella . Conforme Tabela 1 (Anexo II) o primeiro
gênero teve uma freqüência de observação de 70,75 % dos dias monitorados, e o segundo
(Euplotes patella) obteve freqüência de 27% dos dias. No período entre 04 de fevereiro a 22 de
março de 2002, observou-se uma alternância notória entre as populações destes protozoários e as
de ciliados pedunculados que podem ser indicadores da eficiência do sistema de tratamento.
Analisando-se os parâmetros físico químicos, percebe-se que o oxigênio dissolvido é
maior que 2mg/L e o pH fica em torno de 8,5, o que indica condições que contribuem para a
104
nitrificação. Além disso a observação constante do protozoário Aspidisca sp é um indicador deste
processo.
Conforme Vazzoler (1989), a presença de Aspidisca sp indica que está ocorrendo uma
nitrificação completa. Poole citado por Pinto(1998) relatou que quando a nitrificação era
completa existia a predominância de ciliados fixos e rastejantes. Curds (1982) observou que o
número de ciliados fixos aumentava devido ao aumento das concentrações de nitrito e nitrato,
concluindo que os ciliados são responsáveis, em parte, pela ação da nitrificação.
Segundo Jardim et al (1998), a presença de Aspidisca costata indica boa remoção de
fósforo total.
A Figura 5.8 nos apresenta o microrganismo da espécie Euplotes patella da classe
Ciliada.
Figura 5.8– Destaque do protozoário do gênero Euplotes patella presente no lodo ativado do dia 17 de abril de 2002. (aumento 200x)
105
c) Ciliados Livres
Os ciliados de vida livre possuem um arranjo de seus cílios uniformemente distribuídos
ao redor do corpo. Eles são abundante na fase de implantação do processo de lodos ativados
quando os flocos são escassos e, portanto, os ciliados livres estão competindo com os flagelados
por bactérias dispersas, por eles serem mais velozes e ágeis, vencem a competição na luta pelos
alimentos. Neste trabalho os principais representantes deste grupo foram: Paramecium sp,
Didinium sp, Litonotus sp, Oxytrichia sp, Clilodella sp, Sphaerophya, Acineria sp, Spirostomum
sp. O predomínio de freqüência foi do gênero Paramecium sp totalizando 63 % de aparecimento
durante o período monitorado.
Segundo Pinto (1998) os ciliados livres sobrevivem melhor que os outros
microrganismos quando existem substâncias tóxicas e falta de oxigênio.
Segundo Jardim et al (1998), observa-se uma correlação positiva entre a remoção de
sólidos sedimentáveis e a densidade de ciliados livres no tanque de aeração. Esta relação poderá
ser explicada pelo fato de os ciliados livres liberarem polissacarídeos e mucoproteínas,
contribuindo para a formação do floco no tanque de aeração, favorecendo consequentemente a
sedimentação do lodo.
A Figura 5.9 é uma microfotografia do lodo no dia 17 de abril, neste momento o lodo
apresentou-se disperso, porém com boas características, podendo-se observar diferentes
microrganismos, dentre os quais, no canto esquerdo, o Paramecium sp, entre os flocos. Já no
canto direito verifica-se um protozoário pedunculado, que pode ser classificado como pertencente
ao gênero Vorticella sp.
106
Figura 5.9 – Microfotografia dos protozoários presentes Vorticella sp e Paramecium sp, no dia 17 de abril. (aumento 200x)
d) Suctoria
Estes protozoários possuem cílios no início da vida, quando estão na sua forma livre,
vindo mais tarde a perdê-los e desenvolvendo então uma haste quando adultas, alimentando-se
por tentáculos através da sucção da matéria orgânica.
Neste trabalho, os principais representantes deste grupo foram: Podophrya sp e Acineta
sp . Conforme a Tabela 1 (Anexo II), o primeiro gênero teve uma freqüência de observação de
20% dos dias monitorados, e o segundo (Acineta sp) obteve freqüência de observação de 2,5%
dos dias.
Na Figura 5.10 destaca-se um microrganismo classificado como pertencente ao filo
Protozoa. Através de suas características morfológicas, como por exemplo, a presença de cílios
107
na extremidade anterior do corpo e a haste de sustentação, pode-se classificar o microrganismo
dentro da classe de ciliados Suctoria. Cabe ressaltar que com o auxílio de bibliografia
especializada (Vazzoler, 1989, Pelzcar et al. 1980 e Jenkins 1993), pode-se inserir este
microrganismo no gênero Podophrya fixa.
Figura 5.10 – Microfotografia do lodo no dia 08 de março de 2002, em destaque microrganismo do gênero Podophrya fixa (aumento 500x).
e) Amebas
A estrutura da ameba é composta de uma massa de protoplasma clara, incolor,
gelatinosa, variando de tamanho entre 50 a 400 microns. O núcleo não é visível. A velocidade
com que estas células movimentam-se é, geralmente, tão baixa que, frequentemente, parecem não
estarem movendo-se.
108
Algumas amebas possuem um tipo de concha, conhecidos como carapaça. As principais
representantes são: Arcella sp, Difflugia e Euglypha sp. Estes organismos predominam em lodo
caracterizado por carga orgânica baixa, tempo de retenção hidráulico longo e alta concentração
de oxigênio dissolvido no tanque de aeração (Madoni et al., 1993). Sob estas condições a
qualidade do efluente é excelente e a eficiência da estação é elevada.
As amebas que não possuem este tipo de concha, são chamadas amebas nuas, ou
Amoeba.
Segundo Pinto (1998), as amebas tem uma tendência de estarem ligadas a uma
nitrificação incompleta, também associadas a amônia livre.
Na Figura 5.11 pode-se observar detalhes do protozoário que encontrava-se na amostra
do dia 15 de abril. O microrganismo caracteriza-se como uma célula isolada de vida livre e de
proporções microscópicas, o que permite afirmar que o mesmo pertence ao filo Protozoa. O
microrganismo também tem como peculiaridades o seu citoplasma, o qual apresenta grânulos na
forma de escórias, movimento constante e carapaça com finalidade de proteção do organismo, o
que permite, pelas características descritas, classificá-lo como sendo da classe Sarcodina. Com
auxílio de bibliografia (Vazzoler, 1989), pode-se classificá-lo como sendo integrante do gênero
Difflugia sp.
109
Figura 5.11 – Destaque do protozoário Difflugia sp presente no lodo do dia 15 de abril. (aumento 500 x)
f) Rotíferos
O corpo possui tronco e cauda afilada, que está frequentemente articulada, com pés
tendo as glândulas adesivas para a fixação; a extremidade anterior, com disco troncal contendo
cílios, é usada para locomoção e alimentação (Storer e Usinger, 1978). O tipo de tronco é uma
das características utilizadas para identificar os rotíferos.
A função principal dos rotíferos é a estabilização de matéria orgânica no efluente,
incluindo a decomposição desta, fornecendo a penetração de oxigênio e a reciclagem de
nutrientes minerais.
Segundo Pinto (1998), Aspidisca sp e rotíferos encontram-se associados a uma
nitrificação completa, sendo sensíveis a amônia livre.
110
O rotífero do gênero Philodinavus sp ocorreu no período de estudo com uma freqüência
de observação de 90,48 % dos dias, estando desta forma presente em praticamente todos os dias
de observação. Outro rotífero que se repetiu por várias vezes foi o gênero Rotaria sp, a sua
freqüência de observação ficou em torno de 21 % dos dias .
A Figura 5.12 apresenta em detalhes, indivíduos presentes no lodo do dia 29 de abril. Os
indivíduos inserem-se no filo Protozoa e na classe Rotífera, pois uma característica visível é a
extremidade anterior, com disco troncal contendo cílios. Através da análise das características do
microrganismo e com auxílio de material bibliográfico (Vazzoler, 1989), classificou-se os
indivíduos como sendo do gênero Rotaria sp.
Figura 5.12 – Destaque dos microrganismos pertencente a classe Rotífero do gênero Rotaria sp. (aumento de 200 x)
111
Na figura 5.13 pode-se verificar o microrganismo presente no lodo da classe Rotífera do
gênero Philodinavus sp. O grande número deste microrganismo encontrado possibilitou uma
melhor classificação deste e uma melhor análise da amostra. Em função da observação do lodo,
pode-se afirmar que o mesmo apresentava-se com boas características sob o ponto de vista de
sucessão microbiológica.
Figura 5.13 – Microfotografia do lodo no dia 15 de abril, destaque para o metazoário da classe Rotífera e do gênero Philodinavus sp. (aumento 200 x)
112
6 CONCLUSÃO
De acordo com os objetivos inicialmente definidos para o estudo e com base na
interpretação dos resultados analíticos obtidos, foi possível chegar a algumas conclusões sobre o
sistema monitorado no período de 21 de Janeiro a 17 de Maio de 2002.
Concluiu-se que:
a) Com relação aos parâmetros de controle, ou seja, idade do lodo, IVL, A/M e COV,
todos estiveram dentro da faixa sugerida pelos autores, para o sistema de aeração
prolongada.
b) A eficiência média em termos de remoção de Demanda Química de Oxigênio, obtida
durante o período monitorado, foi de 95% de remoção da carga orgânica.
c) A eficiência média de remoção de Demanda Bioquímica de Oxigênio, obtida durante
o período monitorado, foi de 95,44 %.
d) O pH médio verificado para o reator biológico foi de 7,87 mantendo-se próximo a
faixa sugerida por diversos autores.
e) O oxigênio dissolvido dentro do reator biológico variou de 0 a 7,41 mg/L, sendo a
média 2,27 mg/L. Este valor está acima da faixa ideal para lodos ativados, o que
113
pode acarretar uma diminuição na eficiência do processo, além do que configura um
desperdício de energia.
f) A microfauna pode ser utilizada como um parâmetro adicional de controle nas
estações de tratamento de lodos ativados, provando ser um método rápido e
confiável, permitindo um diagnóstico do que está acontecendo na estação bem antes
das análises físico-químicas. Bem como, a contagem do número total de protozoários
e metazoários no lodo ativado é uma análise simples e de baixo custo que pode ser
utilizada como indicadora de eficiência de uma estação de tratamento de efluentes
industriais.
g) Os organismos identificados neste trabalho estão dentre os principais
microrganismos presentes no processo de lodos ativados.
h) Os ciliados fixos estão correlacionados com uma boa sedimentação do lodo e a
valores de sólidos suspensos totais baixos. Estes também indicam que o lodo é bom e
maduro, resultando numa baixa DQO efluente.
i) As condições de pH e oxigênio dissolvido, bem como, a freqüente observação do
microrganismo Aspidisca sp, indicam condições que contribuem para a nitrificação
completa.
j) Existiram alguns gêneros de ciliados livres que apareceram especificamente num dia,
ou em um mês, sendo que isto pode estar ligado ao fato de certas espécies só
aparecerem em determinadas épocas do ano, devido a sensibilidade a baixas
temperaturas.
k) Os ciliados do classe Suctoria, foram pouco observados, sendo assim não foi
possível comprovar uma relação entre a eficiência do sistema e a presença deste
microrganismo.
114
l) As amebas também foram pouco observadas durante o período, não sendo possível
estabelecer uma relação entre elas e a eficiência do sistema.
m) O rotífero do gênero Philodinavus sp ocorreu com uma freqüência de 90,48 % dos
dias monitorados, estando presente em praticamente todos os dias de observação.
Estes microrganismos são bons indicadores do processo de estabilização da matéria
orgânica no efluente, bem como de uma nitrificação completa.
n) Os resultados obtidos, no presente trabalho, indicam a viabilidade das análises
microbiológicas na avaliação da eficiência de ETEs operando com lodos ativados.
Verificou-se que o acompanhamento biológico pode substituir alguns parâmetros
e/ou diminuir a freqüência das análises físico-químicas, com significativa redução
dos custos de monitoramento. Além disso, os dados obtidos nestas análises permitem
uma caracterização imediata do lodo, que facilita a operação e permite tomar
antecipadamente medidas preventivas e/ou corretivas, como o controle dos descartes
e das taxas de recirculação.
115
7 RECOMENDAÇÕES
Analisando-se as conclusões obtidas na execução do presente trabalho e visando a
compreensão do processo de tratamento de efluentes industriais utilizando o sistema de lodos
ativados, pode-se sugerir algumas recomendações pertinentes para a viabilização de outros
estudos:
a) Diminuição na taxa de oxigênio dissolvido dentro do reator biológico;
b) Monitoramento da concentração de amônia e nitrato, na entrada e saída do sistema
de lodos ativados, para a constatação final da ocorrência da nitrificação no interior do reator;
c) Dimensionar as necessidades de nutrientes na água residuária estudada;
d) Realizar o controle do tempo de retenção hidráulico, para que este parâmetro fique
dentro da faixa sugerida por vários autores;
e) Verificar as espécies que aparecem no decorrer do ano, já que certos
microrganismos só estão presentes em determinadas estações;
f) Realizar a identificação de gêneros e espécies e a quantificação dos flagelados e
nematódeos existentes no lodo ativado.
g) Fazer a verificação quantitativa dos microrganismos existentes, a fim de elucidar
alguns aspectos qualitativos.
116
8 BIBLIOGRAFIA
1. BRANCO, S.M; HESS, M.L., Tratamento de Resíduos. In Aquarone, E.; Borzabni, W. e
Lima, U. de L. (orgs). Biotecnologia – Tópicos de Microbiologia Industrial. São Paulo (SP): Editora Edgard Blücher, pp. 47-76, 1975.
2. BRANCO, S.M, Hidrobiologia aplicada à engenharia sanitária, 3ª ed., São Paulo:
CETESB/ASCETESB, 1986. 3. BRAILE, P.M., Manual de tratamento de águas residuárias industriais, São Paulo:
Cetesb, 1979. 4. CURDS, C.R. The ecology and role of protozoa in aerobic sewage treatment processes.
Annual Review of Microbiology, Palo Alto, v.36, p.27-46, 1982. 5. DEZOTTI, M.; RUSSO, C., Técnicas de controle ambiental em efluentes líquidos,
polígrafo do curso, 199_. 6. FINKLER, R., Desempenho dos reatores de bancada com aeração como tratamento
biológico para líquido percolado, Caxias do Sul, 1999, 104 f. Monografia de conclusão do curso de Bacharel em Ciências Biológicas.
7. GRIFFITHS, M., Biotechnology for a clean enviroment. Mike Griffiths Associates, The
Pantilles, Ivy Lane, Woking. Inglaterra. 19p. 1992. 8. GRAY. 1990. Activated sludge: theory and practice. Oxford University. 9. IMNOFF, K.R., Manual de tratamento de águas residuárias, Editora Edgard Blucher Ltda,
São Paulo, 1996. 10. JENKINS, D.; RICHARD, M.G.; DAIGGER, G.T., Manual on the causes and control of
activated sludge bulking and foaming, Michigan (EUA): Lewis Publishers, 2nd ed., 1993. 11. JORDÃO, E.P., et al. Controle microbiológico na operação de um sistema de lodos
ativados – estudo em escala piloto. In 19° Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e
117
Ambiental. Foz do Iguaçu (PR): Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental, 1997.
12. JARDIM, F.A., et al. Avaliação da eficiência do tratamento biológico de esgotos através
da caracterização da microbiota da ETE Fonte Grandre – Contagem – MG. In 19° Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental. Foz do Iguaçu (PR): Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental, 1998.
13. LIU, W., CHAN, O., FANG, HERBERT H.P.. 2002. Characterization of microbial
community in granular sludge treating brewery wastewater. Water Research, V.36, nº 7, p.1767-1775.
14. MADONI, P. Protozoa in waste treatment system. In Perspectives inMicfrobial Ecology.
U.S.A: Megusar. F. & Gantar M. editores, 1986. 15. MADONI, P. 1994b. Microfauna biomass in activated sludge and biofilm. Water Science
and Technology, Oxford, v.29, n.7, p.63-66. 16. MADONI, P., DAVIOLI, D., CHIERICI, E. 1993. Comparative analysis of the ativated
aludge microfauna in several sewage treatment works. Water Research, Oxford, v.27, n.9, p.1485-1491.
17. MADONI, P. A sludge biotic index (SBI) for the evaluation of the biological
performance of activated sludge plants based on the microfauna nalysis. Water Research, v.28, n.1, pp.67-75,1994.
18. PELCZAR JR., J.M., Microbiologia: conceitos e aplicações, volume I, 2ª ed., São Paulo:
Makron Books, 1996. 19. PINTO, Carmem Regina Ribeiro. Nitrificação em reatores seqüenciais em batelada (RSB)
e sua relação com a microfauna. Porto Alegre, 1998. 127f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Ambiental) – Instituto de Pesquisas Hidráulicas – UFRGS.
20. RICHARD, M., Activated Sludge Microbiology, Virginia (EUA): The Water Pollution
Control Federation, 1989. 21. STORER, T.I., USINGER, R.L. 1978. Zoologia Geral. São Paulo: Companhia Editora
Nacional. 757f. 22. TASK FORCE ON WASTEWATER BIOLOGY. Wastewater biology: the microlife.
Alexandria: Water Environment Federation. 190p, 1995. 23. TCHOBANOGLOUS,G. (1995). Wastewater engineering: treatment, disposal and reuse.
Metcalf & Eddy, Inc.-3.rd, 1334 pp. 24. VAZOLLÉR, R. F., Microbiologia de lodos ativados, São Paulo: CETESB, 1989.
118
25. VON SPERLING, M., Lodos Ativados, Belo Horizonte: Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental; Universidade Federal de Minas Gerais; 1997.
26. VON SPERLING, M., Introdução à qualidade das águas e ao tratamento de esgotos, 2ª
edição, Belo Horizonte: Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental; Universidade Federal de Minas Gerais; 1996.
27. VAZZOLER, R., Microbiologia e saneamento ambiental. Referência obtida via base de
dados BDT – Base de dados tropical: Fundação André Tosello. Disponível via internet: www.bdt.org.br/marinez/podet.bio/cap9/3/rosana.html, 1999.
28. WERKER, A., 2001. Applied microbial ecology for the control of wastewater treatment
systems. Water 21 – Magazine of the international water association, December 2001, IWA Publishing, London.
119
ANEXO I
PLANILHA DE IDENTIFICAÇÃO DE MICRORGANISMOS
120
Caracterização do floco / Identificação de Microorganismos
Número da amostra_____________ Local da amostragem_____________ Data da amostra ____/____/______ Data da observação ____/____/_____ Aumento_____________________ ⇒ Abundância de organismos filamentosos:
0 1 2 3 4 5 6 nenhum poucos alguns comum muito abundante excessivo
comum
⇒ Efeito do filamento na estrutura do floco:
Pequeno Ligação Abriu a ou através de estrutura do nenhum pontes floco ⇒ Morfologia do floco:
Firme Fraco Circular Irregular Compacto Difuso ⇒ Características dos filamentos: Ramificações________________________________ Forma do filamento___________________________ Localização_________________________________ Comprimento do filamento_____________________ Observações sobre organismos filamentosos: _________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
121
⇒ Parâmetros de controle: Parâmetros Tanque de
emergência Tanque de equalização
Entrada do reator
Dentro do reator
Reciclo do lodo
Decantador Secundário
PH DQO(mg/l) DBO5 SST(mg/l) SSV(mg/l) OD(mg/l) Ntotal(mg/l) Ptotal(mg/l) ⇒ Organismos observados no microscópio: Organismos 1 2 3 4 Classe Gênero Filo Tamanho Mobilidade Observações sobre Protozoa: ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
122
ANEXO II
TABELA DE MICRORGANISMOS IDENTIFICADOS