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MANUAL DE PROCESSO EMPRESARIAL TÍTULOS DE CRÉDITO, AÇÕES CAMBIAIS, AÇÃO MONITÓRIA, RECUPERAÇÕES EMPRESARIAIS E FALÊNCIAS Manual de Processo Empresarial - 001 - 416.indd 1 21.6.2011 13:33:02

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MANUAL DE PROCESSO EMPRESARIALTÍTULOS DE CRÉDITO, AÇÕES CAMBIAIS, AÇÃO MONITÓRIA,

RECUPERAÇÕES EMPRESARIAIS E FALÊNCIAS

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BERNARDO PIMENTEL SOUZA

MANUAL DE PROCESSO EMPRESARIALTÍTULOS DE CRÉDITO, AÇÕES CAMBIAIS, AÇÃO MONITÓRIA,

RECUPERAÇÕES EMPRESARIAIS E FALÊNCIAS

2ª EDIÇÃO

2011

Manual de Processo Empresarial - 001 - 416.indd 3 21.6.2011 13:33:02

ISBN 978-85-02-12953-5

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Pimentel, Bernardo

Manual de processo empresarial / Bernardo Pimentel. — 2. ed. — São Paulo : Saraiva, 2011.

1. Direito empresarial 2. Direito empresarial - Brasil 3. Processo civil 4. Processo civil - Brasil I. Título.

11-03539 CDU-347.9:338.93(81)

Índices para catálogo sistemático:

1. Brasil : Direito processual empresarial:Direito 347.9:338.93(81)

2. Direito processual empresarial :Brasil : Direito 347.9:338.93(81)

Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem a prévia autorização da Editora Saraiva.A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na Lei n. 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.

Diretor editorial Luiz Roberto CuriaGerente de produção editorial Lígia AlvesEditor Jônatas Junqueira de MelloAssistente editorial Sirlene Miranda de SalesAssistente de produção editorial Clarissa Boraschi MariaPreparação de originais Daniel Pavani Naveira

Evandro Lisboa FreireArte e diagramação Cristina Aparecida Agudo de Freitas

Henrique FavaroRevisão de provas Rita de Cássia Queiroz Gorgati

Amanda Maria de Carvalho Paula Brito Araújo

Serviços editoriais Camila Artioli LoureiroLupercio de Oliveira Damasio

Capa Produção gráfica Marli RampimImpressão Acabamento

Data de fechamento da edição: xx-x-2010

Dúvidas? Acesse www.saraivajur.com.br

F il iais

AMAZONAS/RONDÔNIA/RORAIMA/ACRERua Costa Azevedo, 56 – CentroFone: (92) 3633-4227 – Fax: (92) 3633-4782 – Manaus

BAHIA/SERGIPERua Agripino Dórea, 23 – BrotasFone: (71) 3381-5854 / 3381-5895Fax: (71) 3381-0959 – Salvador

BAURU (SÃO PAULO)Rua Monsenhor Claro, 2-55/2-57 – CentroFone: (14) 3234-5643 – Fax: (14) 3234-7401 – Bauru

CEARÁ/PIAUÍ/MARANHÃOAv. Filomeno Gomes, 670 – JacarecangaFone: (85) 3238-2323 / 3238-1384Fax: (85) 3238-1331 – Fortaleza

DISTRITO FEDERALSIA/SUL Trecho 2 Lote 850 – Setor de Indústria e AbastecimentoFone: (61) 3344-2920 / 3344-2951Fax: (61) 3344-1709 – Brasília

GOIÁS/TOCANTINSAv. Independência, 5330 – Setor AeroportoFone: (62) 3225-2882 / 3212-2806Fax: (62) 3224-3016 – Goiânia

MATO GROSSO DO SUL/MATO GROSSORua 14 de Julho, 3148 – CentroFone: (67) 3382-3682 – Fax: (67) 3382-0112 – Campo Grande

MINAS GERAISRua Além Paraíba, 449 – LagoinhaFone: (31) 3429-8300 – Fax: (31) 3429-8310 – Belo Horizonte

PARÁ/AMAPÁTravessa Apinagés, 186 – Batista CamposFone: (91) 3222-9034 / 3224-9038Fax: (91) 3241-0499 – Belém

PARANÁ/SANTA CATARINARua Conselheiro Laurindo, 2895 – Prado VelhoFone/Fax: (41) 3332-4894 – Curitiba

PERNAMBUCO/PARAÍBA/R. G. DO NORTE/ALAGOASRua Corredor do Bispo, 185 – Boa VistaFone: (81) 3421-4246 – Fax: (81) 3421-4510 – Recife

RIBEIRÃO PRETO (SÃO PAULO)Av. Francisco Junqueira, 1255 – CentroFone: (16) 3610-5843 – Fax: (16) 3610-8284 – Ribeirão Preto

RIO DE JANEIRO/ESPÍRITO SANTORua Visconde de Santa Isabel, 113 a 119 – Vila IsabelFone: (21) 2577-9494 – Fax: (21) 2577-8867 / 2577-9565Rio de Janeiro

RIO GRANDE DO SULAv. A. J. Renner, 231 – FarraposFone/Fax: (51) 3371-4001 / 3371-1467 / 3371-1567Porto Alegre

SÃO PAULOAv. Antártica, 92 – Barra FundaFone: PABX (11) 3616-3666 – São Paulo

Rua Henrique Schaumann, 270, Cerqueira César — São Paulo — SPCEP 05413-909PABX: (11) 3613 3000SACJUR: 0800 055 7688De 2ª a 6ª, das 8:30 às 19:[email protected]: www.saraivajur.com.br

128.859.002.001

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À pequena Lavínia,

minha amada filha.

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Ao amigo Fredie Didier Jr., Professor da Universidade Federal da Bahia, pelo incentivo prestado, desde a primeira hora, em favor da pu-blicação do presente compêndio destinado ao direito processual empre-sarial.

Ao amigo Gláucio Inácio da Silveira, Professor da Universidade Federal de Viçosa, colega com quem tenho a honra de exercer o magis-tério, pelas sugestões apresentadas e pelas reflexões conjuntas sobre os temas expostos no presente compêndio.

Ao amigo Otávio Vieira Barbi, Professor da Universidade Federal de Minas Gerais, colega na Vetusta Casa de Afonso Pena, pela confiança sempre depositada e pela significativa contribuição prestada na revisão da atual edição.

AGRADECIMENTOS

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Introdução ....................................................................................... 29

TEMáRIO

Tomo ITíTulos de CrédiTo, Ações CAmbiAis e Ação moniTóriA

Capítulo I

TEORIA GERAL DO DIREITO CAMBIÁRIO ............... 35

1. Conceito de Direito Cambiário ............................................ 35

2. Notícia histórica dos títulos de crédito ............................... 36

3. Conceito de título de crédito ................................................ 36

4. Princípios norteadores do Direito Cambiário .................... 36

4.1. Cartularidade ou documentalidade .......................... 37

4.2. Literalidade ................................................................... 38

4.3. Autonomia .................................................................... 39

4.4. Formalismo ................................................................... 41

4.5. Legalidade ou tipicidade ............................................. 42

5. Atributos ou benefícios dos títulos de crédito: negociabi- lidade e executividade .......................................................... 43

6. Características da obrigação cambiária: quesível e pro solvendo .................................................................................... 44

7. Classificações dos títulos de crédito .................................... 44

8. Subsistência do Direito Cambiário na “Era da Informá- tica” .......................................................................................... 47

Capítulo II

LETRA DE CÂMBIO ........................................................... 49

1. Legislação de regência .......................................................... 49

SuMáRIO

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10

2. Conceito, natureza jurídica e sujeitos da relação jurídico- -cambial ................................................................................... 51

3. Requisitos ou elementos da letra de câmbio ...................... 53

4. Título incompleto: Enunciado 387 da Súmula do STF ..... 58

5. Aceite ....................................................................................... 59

5.1. Conceito ......................................................................... 59

5.2. Ato unilateral de vontade ........................................... 59

5.3. Aceite por intervenção................................................. 59

5.4. Lançamento do aceite .................................................. 60

5.5. Subsistência da letra não aceita .................................. 61

5.6. Letras de câmbio sujeitas a aceite e respectivos prazos . 61

5.7. Pedido de nova apresentação da letra....................... 63

5.8. Apreensão de título sonegado pelo sacado .............. 64

5.9. Recusa do aceite: vencimento antecipado ou extra- ordinário ........................................................................ 65

5.10. Aceite parcial ou qualificado ...................................... 66

5.11. Cláusula impeditiva de apresentação ou cláusula não aceitável .................................................................. 66

6. Endosso ................................................................................... 67

6.1. Origem e significado do vocábulo “endosso” ......... 67

6.2. Conceito de endosso .................................................... 67

6.3. Endosso: forma de transferência dos títulos de crédito . 67

6.4. Endosso e cessão de crédito ........................................ 68

6.5. Endosso e letra de câmbio ........................................... 69

6.6. Sujeitos do endosso ...................................................... 69

6.7. Lançamento do endosso .............................................. 70

6.8. Modalidades de endosso ............................................. 70

6.9. Endosso incondicionado ............................................. 70

6.10. Endosso parcial: nulidade ........................................... 71

6.11. Efeitos do endosso........................................................ 71

6.12. Endossos impróprios ................................................... 71

6.12.1. Endosso-mandato ou endosso-procuração . 72

6.12.2. Endosso-caução, endosso-penhor ou endos- so-pignoratício ................................................. 73

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6.12.3. Endosso-póstumo ou endosso tardio ........... 74

6.12.4. Endosso sem garantia ..................................... 74

6.12.5. Endosso proibido ............................................ 74

7. Aval .......................................................................................... 75

7.1. Conceito ......................................................................... 75

7.2. Sujeitos do aval ............................................................. 75

7.3. Avalista .......................................................................... 75

7.4. Lançamento do aval ..................................................... 76

7.5. Modalidades de aval .................................................... 77

7.6. Responsabilidade do avalista ..................................... 77

7.7. Direito de regresso do avalista ................................... 77

7.8. Avais em branco simultâneos ..................................... 78

7.9. Autonomia da responsabilidade do avalista............ 79

7.10. Aval e fiança: semelhanças e diferenças .................... 80

7.11. Aval limitado ou parcial .............................................. 82

7.12. Aval antecipado ............................................................ 82

7.13. Aval póstumo ................................................................ 83

7.14. Falecimento do avalista e subsistência do aval ........ 83

8. Classes de devedores e cadeia das obrigações cambiais .. 84

8.1. Classificação dos devedores ....................................... 84

8.2. Diferença entre as classes de devedores ................... 84

8.3. Cadeia das obrigações cambiais ................................. 85

9. Vencimento ............................................................................. 86

9.1. Conceito ......................................................................... 86

9.2. Espécies de vencimento ............................................... 86

9.3. Modalidades de vencimento ...................................... 87

9.4. Contagem dos prazos cambiários .............................. 88

9.5. Correção monetária e juros de mora ......................... 89

10. Pagamento .............................................................................. 90

10.1. Conceito ......................................................................... 90

10.2. Possibilidade da exigência do título no momento do pagamento ..................................................................... 90

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10.3. Pagamento parcial ........................................................ 91

10.4. Iniciativa do pagamento .............................................. 91

10.5. Direito de regresso ....................................................... 91

10.6. Local do pagamento ..................................................... 92

10.7. Apresentação para pagamento de letra de câmbio no Brasil e no exterior .................................................. 92

11. Protesto cambial ..................................................................... 93

11.1. Conceito ......................................................................... 93

11.2. Natureza do protesto cambial .................................... 93

11.3. Interrupção da prescrição ........................................... 94

11.4. Protesto obrigatório e protesto facultativo ............... 94

11.5. Protesto por falta de aceite .......................................... 96

11.6. Protesto por falta de pagamento ................................ 98

11.7. Prazo para a extração do protesto pelo tabelião ...... 99

11.8. Dúvida ........................................................................... 100

11.9. Desistência do protesto ............................................... 101

11.10. Pagamento antes da lavratura do protesto ............ 101

11.11. Sustação do protesto .................................................. 101

11.12. Cancelamento do protesto ........................................ 102

11.13. Cláusula “sem protesto” ........................................... 102

12. Ação cambial ou execução cambial ..................................... 103

13. Ação de enriquecimento sem causa ou ação de locuple- tamento indevido ................................................................... 105

14. Ação de cobrança ou ação causal ........................................ 109

Capítulo III

NOTA PROMISSÓRIA ....................................................... 113

1. Conceito .................................................................................. 113

2. Natureza jurídica ................................................................... 113

3. Legislação de regência .......................................................... 113

4. Sujeitos da relação cambial originária da nota promissória 114

5. Requisitos ou elementos da nota promissória ................... 115

6. Enunciado 258 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça 123

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7. Aceite ....................................................................................... 124

8. Aval .......................................................................................... 125

9. Protesto cambial ..................................................................... 127

10. Ação cambial ou execução cambial ..................................... 128

11. Ação de enriquecimento sem causa ou de locupletamen- to indevido .............................................................................. 129

12. Ação de cobrança ou ação causal ........................................ 131

Capítulo IV

CHEQUE ................................................................................. 135

1. Conceito .................................................................................. 135

2. Natureza jurídica e classificação .......................................... 135

3. Ordem de pagamento à vista e cheque pós-datado ......... 135

4. Legislação de regência do cheque ....................................... 138

5. Sujeitos da relação cambial ................................................... 138

6. Requisitos do cheque............................................................. 139

7. Cheque nominativo e cheque ao portador ......................... 143

8. Cheque e pagamento de salário ........................................... 144

9. Cheque sem provisão de fundos e desconto no salário do empregado .............................................................................. 145

10. Cheque e aceite ....................................................................... 145

11. Cheque e endosso .................................................................. 145

12. Cheque e aval ......................................................................... 147

13. Cheque visado ........................................................................ 148

14. Cheque marcado .................................................................... 151

15. Cheque cruzado ..................................................................... 151

16. Cheque para ser creditado em conta ................................... 153

17. Cheque administrativo ......................................................... 153

18. Cheque de viagem ................................................................. 154

19. Cheque especial...................................................................... 155

20. Revogação ou contraordem .................................................. 155

21. Oposição ou sustação ............................................................ 157

22. Cancelamento ......................................................................... 158

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23. Ações fundadas em cheque .................................................. 159

23.1. Ação cambial: execução ............................................... 159

23.2. Ação de enriquecimento sem causa ou de locuple- tamento indevido ......................................................... 162

23.3. Ação de cobrança de conhecimento ou ação causal 165

23.4. Ação de indenização por devolução indevida de cheque ............................................................................ 167

23.5. Ação de indenização por apresentação de cheque “pré-datado” ................................................................. 168

23.6. Ação de indenização por cheques falso, falsificado e adulterado .................................................................. 168

24. Cheque e Direito Penal ......................................................... 169

Capítulo V

DUPLICATA .......................................................................... 173

1. Duplicata mercantil ............................................................... 173

1.1. Conceito ......................................................................... 173

1.2. Duplicata mercantil e classificações dos títulos de crédito ............................................................................ 173

1.3. Prazo da compra e venda mercantil .......................... 174

1.4. Sujeitos da duplicata mercantil .................................. 174

1.5. Legislação de regência da duplicata mercantil ........ 174

1.6. Duplicata mercantil e fatura ....................................... 175

1.7. Duplicata versus letra de câmbio ................................ 176

1.8. Requisitos formais da duplicata mercantil ............... 176

1.9. Livro de Registro de Duplicatas ................................. 178

1.10. Triplicata ........................................................................ 179

1.11. Aceite ............................................................................. 179

1.12. Aval ................................................................................ 180

1.13. Pagamento ..................................................................... 181

1.14. Endosso .......................................................................... 181

1.15. Protesto .......................................................................... 182

1.16. Ações fundadas em duplicata e de triplicata ........... 183

1.16.1. Ação cambial ou execução cambial .............. 183

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1.16.2. Ação de enriquecimento sem causa ou de locupletamento indevido ............................... 185

1.16.3. Ação de cobrança ou ação causal .................. 186

2. Duplicata de prestação de serviços ..................................... 187

3. Fatura ou conta de prestação de serviços ........................... 188

4. Duplicata rural ....................................................................... 189

5. Duplicata simulada ............................................................... 189

Capítulo VI

AÇÃO CAMBIAL ................................................................. 191

1. Conceito de ação cambial ..................................................... 191

2. Objeto da ação cambial ......................................................... 193

3. Polo passivo na ação cambial ............................................... 193

4. Juízo competente para a ação cambial ................................ 194

5. Procedimento da ação cambial ............................................ 194

6. Ação cambial de letra de câmbio ......................................... 195

7. Ação cambial de nota promissória ...................................... 196

8. Ação cambial de cheque ....................................................... 198

9. Ação cambial de duplicata e de triplicata .......................... 201

Capítulo VII

AÇÃO MONITÓRIA ........................................................... 203

1. Preceitos de regência e enunciados sumulares .................. 203

2. Conceito e natureza jurídica ................................................. 203

3. Facultatividade do procedimento monitório ..................... 204

4. Hipóteses de admissibilidade do procedimento monitório 205

5. Legitimidade ativa e passiva ................................................ 209

6. Prazo ........................................................................................ 210

7. Petição inicial .......................................................................... 211

8. Admissibilidade da petição inicial e expedição do man- dado inicial ............................................................................. 212

9. Citação do réu ........................................................................ 215

10. Cumprimento do mandado inicial pelo réu ...................... 215

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11. Inércia do réu: descumprimento do mandado monitório e ausência de embargos ........................................................ 216

12. Contraposição mediante embargos ..................................... 219

13. Indeferimento liminar dos embargos monitórios ............. 221

14. Reconvenção ........................................................................... 223

15. Julgamento dos embargos admitidos ................................. 224

16. Efeito suspensivo e apelação contra sentença em embargos à monitória .............................................................................. 225

Tomo IIreCuPerAções emPresAriAis e FAlÊnCiAs

Capítulo I

TEORIA GERAL DO DIREITO RECUPERACIONAL EFALIMENTAR ....................................................................... 231

1. Conceito .................................................................................. 231

2. Notícia histórica ..................................................................... 231

3. Sujeitos da recuperação empresarial e da falência ............ 233

Capítulo II

INSTITUTOS COMUNS ÀS RECUPERAÇÕES EM-PRESARIAIS E ÀS FALÊNCIAS ....................................... 239

1. Administração da recuperação empresarial e da falência 239

1.1. Conceito de administrador judicial ........................... 239

1.2. Nomeação ...................................................................... 239

1.3. Impedidos...................................................................... 240

1.4. Arguição do impedimento do administrador .......... 240

1.5. Assinatura do termo de compromisso ...................... 241

1.6. Responsabilidade do administrador ......................... 241

1.7. Atribuições do administrador judicial ...................... 241

1.8. Remuneração do administrador judicial .................. 244

1.9. Prestação de contas pelo administrador judicial ..... 245

1.10. Exoneração do administrador judicial ...................... 247

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2. Classificação, verificação e habilitação dos créditos ......... 247

2.1. Conceito ......................................................................... 247

2.2. Existência da classificação dos créditos na recupe- ração judicial ................................................................. 247

2.3. Ordem legal de classificação dos créditos ................ 248

2.4. Classificação inicial ...................................................... 250

2.5. Primeiro edital .............................................................. 251

2.6. Prazo de quinze dias para habilitações e divergên- cias .................................................................................. 251

2.7. Diferença entre divergência e habilitação ................. 251

2.8. Forma da habilitação e da divergência ..................... 252

2.9. Elaboração da relação de credores pelo administra- dor judicial .................................................................... 253

2.10. Segundo edital .............................................................. 253

2.11. Prazo de dez dias para impugnações contra a relação de credores .................................................................... 253

2.12. Ausência de impugnação e homologação da relação de credores .................................................................... 254

2.13. Apresentação de impugnação .................................... 254

2.14. Habilitação retardatária convertida em impugna- ção ................................................................................... 254

2.15. Intimação dos credores para contestação das impug- nações ............................................................................. 254

2.16. Intimação do empresário, da sociedade empresária e do Comitê ................................................................... 255

2.17. Parecer do administrador ........................................... 255

2.18. Última fase do processamento das impugnações .... 255

2.19. Decisão interlocutória agravável ............................... 255

2.20. Consolidação do quadro geral de credores pelo administrador ............................................................... 256

2.21. Homologação do quadro geral pelo juiz .................. 256

2.22. Ação anulatória ............................................................ 256

2.23. Ação de retificação do quadro geral de credores .... 257

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3. Assembleia Geral de Credores ............................................. 257

3.1. Conceito ......................................................................... 257

3.2. Atribuições .................................................................... 258

3.3. Competência para convocar e legitimidade para requerer a convocação da Assembleia Geral ............ 259

3.4. Classes de credores na Assembleia Geral ................. 259

3.5. Convocação e instalação da Assembleia Geral ........ 260

3.6. Despesas com as convocações e com a realização da Assembleia Geral.......................................................... 262

3.7. Presidência da Assembleia Geral ............................... 262

3.8. Lista de presença .......................................................... 262

3.9. Interpretação sistemática dos arts. 17, parágrafo único, e 40 da Lei n. 11.101/2005 ............................... 263

3.10. Admissibilidade da representação de credor por procurador ..................................................................... 264

3.11. Deliberações da Assembleia Geral ............................. 264

3.12. Credores impedidos de votar nas deliberações da Assembleia Geral.......................................................... 265

3.13. Credor impedido de votar na deliberação sobre o Plano de Recuperação .................................................. 265

3.14. Ata da assembleia ........................................................ 265

3.15. Rejeição do Plano de Recuperação ............................ 265

4. Comitê de Credores ............................................................... 266

4.1. Conceito ......................................................................... 266

4.2. Constituição do Comitê ............................................... 266

4.3. Composição do Comitê ............................................... 266

4.4. Presidência do Comitê ................................................. 267

4.5. Comitê com menos de três membros ........................ 267

4.6. Impedidos...................................................................... 267

4.7. Destituição dos membros do Comitê ........................ 268

4.8. Representação superveniente e substituição da re- presentação .................................................................... 268

4.9. Assinatura do termo de compromisso ...................... 268

4.10. Responsabilidade dos membros do Comitê ............. 269

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19

4.11. Atribuições do Comitê ................................................. 269

4.12. Deliberações do Comitê .............................................. 270

4.13. Remuneração dos membros do Comitê .................... 270

4.14. Ressarcimento de despesas do Comitê ..................... 271

4.15. Ausência de Comitê ..................................................... 271

Capítulo III

RECUPERAÇÃO JUDICIAL .............................................. 273

1. Conceito, natureza jurídica e escopo da recuperação ju- dicial ........................................................................................ 273

2. Legitimidade ativa ................................................................. 273

3. Requisitos para a propositura da recuperação judicial .... 274

4. Créditos alcançados pela recuperação judicial .................. 275

5. Créditos excetuados da recuperação judicial .................... 276

6. Meios de recuperação judicial .............................................. 277

7. Petição inicial .......................................................................... 277

8. Juízo competente.................................................................... 279

9. Pronunciamento acerca do processamento da recuperação judicial ..................................................................................... 279

10. Impossibilidade da desistência da ação: regra e exceção . 282

11. Natureza jurídica do pronunciamento do art. 52 da Lei n. 11.101/2005 ......................................................................... 282

12. Plano de Recuperação ........................................................... 283

12.1. Responsabilidade pela apresentação do plano de recuperação ................................................................... 283

12.2. Prazo para a apresentação do plano de recupera- ção ................................................................................... 283

12.3. Consequência jurídica do decurso do prazo: decre- tação da falência ........................................................... 283

12.4. Elementos do plano de recuperação .......................... 284

12.5. Aviso de recebimento do plano em juízo e prazo para objeções dos credores: inteligência dos arts. 7º, § 2º, 53, parágrafo único, e 55, caput e parágrafo

único, todos da Lei n. 11.101/2005 ............................ 284

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12.6. Restrições legais ao plano de recuperação judicial . 285

12.7. Existência de objeção e convocação da Assembleia Geral de credores .......................................................... 285

12.8. Modificação do plano de recuperação: plano alter- nativo ............................................................................. 286

12.9. Rejeição do Plano ......................................................... 286

12.10. Apresentação das certidões negativas de débitos tributários ...................................................................... 286

13. Procedimento da recuperação judicial................................ 287

13.1. Decisão concessiva da recuperação judicial ............. 287

13.2. Decisão concessiva da recuperação e rejeição do plano ............................................................................... 287

13.3. Consequências jurídicas da concessão da recupera- ção judicial ..................................................................... 288

13.4. Recorribilidade da decisão concessiva ...................... 288

13.5. Prazo máximo do processo de recuperação ............. 288

13.6. Desrespeito ao plano no curso do biênio legal ........ 288

13.7. Desrespeito ao plano depois do biênio legal ............ 289

13.8. Satisfação das obrigações constantes do plano du- rante o biênio legal ....................................................... 289

Capítulo IV

RECUPERAÇÃO JUDICIAL ESPECIAL ......................... 291

1. Conceitos de microempresa e empresa de pequeno porte 291

2. Facultatividade do plano especial ....................................... 292

3. Oportunidade para a escolha entre o plano especial e o plano comum .......................................................................... 292

4. Créditos alcançados pelo plano especial ............................ 292

5. Credores não alcançados pelo plano especial.................... 292

6. Inexistência de suspensão dos processos cujos créditos não constam do plano especial ............................................ 292

7. Prazo para a apresentação do plano especial: sessenta dias ........................................................................................... 293

8. Parcelamento máximo dos créditos: 36 meses ................... 293

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9. Prazo máximo para o pagamento da primeira parcela: 180 dias ........................................................................................... 293

10. Aumento de despesas e contratação de empregados: ne- cessidade de autorização judicial ........................................ 293

11. Aprovação do plano especial pelo juiz: inexistência de convocação de assembleia .................................................... 293

12. Improcedência da recuperação especial em razão de ob- jeções ........................................................................................ 294

13. Vedação ................................................................................... 294

14. Aplicação subsidiária das regras da recuperação judicial fundada em plano comum ................................................... 294

Capítulo V

RECUPERAÇÃO EXTRAJUDICIAL ................................ 295

1. Conceito e natureza jurídica da recuperação extrajudi- cial ............................................................................................ 295

2. Legitimados ativos................................................................. 295

3. Vedações ao Plano.................................................................. 296

4. Inexistência de suspensão das ações ................................... 296

5. Regra da impossibilidade de desistência dos credores que aderiram ao Plano .................................................................. 297

6. Possibilidade de propositura de falência pelos credores não sujeitos ao Plano ............................................................. 297

7. Créditos excluídos da recuperação extrajudicial .............. 297

8. Créditos incluídos no plano extrajudicial: créditos com garantia real, com privilégio especial, com privilégio

geral, quirografários e subordinados .................................. 298

9. Petição inicial .......................................................................... 298

10. Procedimento único para as recuperações extrajudiciais sem e com divergência .......................................................... 299

11. Prazo para impugnação ao plano de recuperação extra- judicial: trinta dias ................................................................. 299

12. Matérias passíveis de veiculação na impugnação ao plano de recuperação extrajudicial ................................................ 299

13. Réplica ..................................................................................... 300

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14. Julgamento das impugnações .............................................. 300

15. Natureza jurídica do pronunciamento de homologação: sentença ................................................................................... 300

16. Inexistência de coisa julgada em decorrência da sentença denegatória ............................................................................. 301

17. Possibilidade de acordos privados supervenientes .......... 301

Capítulo VI

FALÊNCIA ............................................................................. 303

1. Conceito de falência .............................................................. 303

2. Etimologia ............................................................................... 303

3. Princípios do processo falimentar ....................................... 304

4. Distribuição imediata e obrigatória .................................... 305

5. Juízo competente.................................................................... 305

6. Juízo universal da falência ................................................... 307

7. Distribuição por dependência das ações sujeitas ao juízo universal da falência .............................................................. 307

8. Exceções ao juízo universal da falência .............................. 307

9. Legitimidade ativa ................................................................. 310

10. Causas de pedir da falência .................................................. 311

10.1. Impontualidade injustificada: inteligência do inciso I do art. 94 da Lei n. 11.101/2005 ............................... 311

10.2. Execução frustrada: inteligência do inciso II do art. 94 da Lei n. 11.101/2005 .............................................. 313

10.3. Atos de falência: inteligência do inciso III do art. 94 da Lei n. 11.101/2005 .................................................. 315

11. Emenda da petição inicial ..................................................... 316

12. Citação, contestação e depósito elisivo ............................... 316

13. Intimação do Ministério Público na fase pré-falencial: obrigatoriedade ...................................................................... 319

14. Decisão de decretação da falência: natureza e recorribili- dade ......................................................................................... 321

15. Decisão de decretação da falência: conteúdo..................... 324

16. Efeitos jurídicos da decretação da falência ........................ 326

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17. Pessoas alcançadas pela decretação da falência ................ 329

18. Ação de responsabilização ................................................... 329

19. Sentença denegatória da falência ........................................ 330

20. Fungibilidade recursal .......................................................... 330

21. Prazos dos recursos falimentares ........................................ 331

22. Preparo dos recursos falimentares ...................................... 331

23. Cabimento de embargos infringentes no processo fali- mentar...................................................................................... 333

24. Arrecadação dos bens ........................................................... 334

25. Bens impenhoráveis .............................................................. 334

26. Custódia dos bens .................................................................. 335

27. Auto de arrecadação e laudo de avaliação ......................... 335

28. Término da arrecadação e início da realização do ativo .. 336

29. Alienação e adjudicação antecipadas em favor de credores 336

30. Alienação antecipada para terceiros ................................... 336

31. Formas de alienação ordinária ............................................. 336

32. Consequências jurídicas da alienação ................................. 337

33. Modalidades de alienação pública ...................................... 337

34. Leilão ....................................................................................... 338

35. Propostas fechadas ................................................................ 338

36. Pregão ...................................................................................... 338

37. Impugnação ............................................................................ 339

38. Pagamento aos credores ....................................................... 339

39. Prestação de contas ................................................................ 339

40. Relatório final do administrador judicial ........................... 341

41. Sentença de encerramento do processo falimentar .......... 341

42. Extinção das obrigações do falido pelo pagamento ......... 342

43. Extinção das obrigações do falido pelo decurso de prazo .. 342

44. Reabilitação ............................................................................. 342

Capítulo VII

AÇÃO REVOCATÓRIA ...................................................... 345

1. A revogação e a ineficácia à luz da Lei n. 11.101/2005 ..... 345

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2. Ação revocatória .................................................................... 346

3. Declaração de ineficácia ........................................................ 347

Capítulo VIII

ARRESTO E SEQUESTRO ................................................. 349

Nota explicativa.............................................................................. 349

1. Arresto ..................................................................................... 349

1.1. Conceito de arresto ...................................................... 349

1.2. Arresto: natureza do processo principal ................... 350

1.3. Arresto antecedente e arresto incidental................... 350

1.4. Hipóteses de arresto: inteligência do art. 813 do Código de Processo Civil ............................................ 351

1.5. Dívida em dinheiro, certeza acerca da existência e vencimento: desnecessidade ....................................... 353

1.6. Bens arrestáveis ............................................................ 354

1.7. Petição inicial do arresto ............................................. 355

1.8. Arresto cautelar liminar .............................................. 355

1.9. Audiência de justificação: inteligência do art. 815 do Código de Processo Civil ............................................ 355

1.10. Exigência da caução para a concessão da liminar: faculdade do juiz .......................................................... 356

1.11. Efetivação da medida, auto de arresto e nomeação do depositário ............................................................... 356

1.12. Efeitos do arresto .......................................................... 357

1.13. Art. 806 do Código de Processo Civil: incidência na cautelar de arresto ........................................................ 358

1.14. Procedimento do arresto ............................................. 358

1.15. Coisa julgada: inteligência dos arts. 810 e 817 do Código de Processo Civil ............................................ 359

1.16. Subsistência do arresto e conversão em penhora .... 359

2. Sequestro ................................................................................. 359

2.1. Conceito de sequestro .................................................. 359

2.2. Sequestro e arresto: diferenças e fungibilidade ....... 360

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2.3. Aplicação subsidiária das regras do arresto em re- lação ao sequestro ........................................................ 361

2.4. Hipóteses de sequestro: inteligência do art. 822 do Código de Processo Civil ............................................ 362

2.5. Sequestro antecedente e sequestro incidental .......... 364

2.6. Petição inicial e liminar ............................................... 365

2.7. Efetivação da medida .................................................. 366

2.8. Substituição do sequestro por caução ....................... 367

2.9. Propositura da ação principal .................................... 367

2.10. Efeitos do sequestro cautelar ...................................... 367

Capítulo IX

AÇÃO DE RESTITUIÇÃO ................................................. 369

1. Conceito .................................................................................. 369

2. Alcance do vocábulo legal “bem” ....................................... 369

3. Legitimidade ativa ................................................................. 369

4. Causas de pedir da ação de restituição .............................. 369

5. Formas de restituição: própria coisa ou dinheiro ............. 370

6. Petição inicial da ação de restituição .................................. 373

7. Distribuição por dependência .............................................. 374

8. Autuação em separado aos autos do processo falimentar 374

9. Indisponibilidade do bem .................................................... 374

10. Intimações ............................................................................... 374

11. Natureza jurídica da manifestação contrária: contestação 375

12. Instrução .................................................................................. 375

13. Conclusão para sentença ...................................................... 375

14. Sentença de procedência da restituição .............................. 376

15. Sentença de improcedência parcial ..................................... 376

16. Sentença de total improcedência ......................................... 376

17. Recorribilidade da sentença ................................................. 376

18. Execução provisória e caução .............................................. 377

19. Insuficiência dos valores ....................................................... 377

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20. Ação de restituição e de embargos de terceiro .................. 377

Capítulo X

EMBARGOS DE TERCEIRO ............................................. 379

1. Admissibilidade em processos de recuperação e de falência . 379

2. Embargos de terceiro: preceitos de regência e enunciados sumulares ................................................................................ 380

3. Embargos de terceiro: nomeniuris e objeto ......................... 380

4. Embargos de terceiro: natureza jurídica e conceito .......... 381

5. Embargos de terceiro e classificações ................................. 383

6. Alvo dos embargos de terceiro ............................................ 383

7. Embargos de terceiro e recurso de terceiro ........................ 384

8. Admissibilidade dos embargos de terceiro em geral ....... 386

8.1. Apreensão judicial de bem ......................................... 386

8.2. Legitimidade ativa: condição de possuidor ou de proprietário do bem ..................................................... 387

8.3. Condição de terceiro .................................................... 388

8.4. Propositura da ação dentro do prazo legal .............. 389

9. Admissibilidade dos embargos de terceiro para a defesa da meação do cônjuge ........................................................... 391

10. Embargos de terceiro e defesa de garantia real ................. 393

11. Parte equiparada a terceiro................................................... 393

12. Petição inicial .......................................................................... 394

13. Competência, distribuição e autuação ................................ 395

14. Indeferimento liminar da petição inicial ............................ 397

15. Petição inicial com defeito sanável ...................................... 398

16. Fungibilidade ......................................................................... 398

17. Admissão dos embargos e suspensão do processo origi- nário ......................................................................................... 399

18. Decisão interlocutória liminar agravável ........................... 399

19. Legitimidade passiva ............................................................ 400

20. Citação ..................................................................................... 401

21. Citação, decisão interlocutória liminar e feriados............. 401

22. Contestação ............................................................................. 401

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23. Fraude contra credores e contestação aos embargos de terceiro ..................................................................................... 402

24. Impugnação ao valor da causa ............................................ 404

25. Reconvenção e ação declaratória incidental ...................... 405

26. Exceções rituais ...................................................................... 405

27. Procedimento final................................................................. 405

28. Sentença e ônus da sucumbência ........................................ 406

29. Apelação e efeitos .................................................................. 407

Capítulo XI

AÇÕES PENAIS .................................................................... 409

1. Nomeniuris .............................................................................. 409

2. Incidência subsidiária dos Códigos Penal e de Processo Penal ........................................................................................ 409

3. Condição objetiva de punibilidade dos crimes empresa- riais ........................................................................................... 409

4. Fase investigatória ................................................................. 410

5. Natureza da ação penal......................................................... 410

6. Prazo para oferecimento da denúncia ................................ 410

7. Ação penal privada subsidiária ........................................... 410

8. Juízo competente: criminal ................................................... 411

9. Indeferimento da denúncia ou da queixa .......................... 411

10. Sujeitos .................................................................................... 411

11. Penas ........................................................................................ 411

12. Prescrição ................................................................................ 412

13. Início da contagem da prescrição ........................................ 412

14. Interrupção da prescrição ..................................................... 412

REFERÊNCIAS .............................................................................. 413

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O Direito Processual Civil e o Direito Comercial (ou, na linguagem mais moderna, o Direito Empresarial1) estão interligados por vários pontos de interseção2. A interdependência já existia ao tempo do Regu-lamento n. 737/1850. Destinado originalmente ao Direito Comercial, o Regulamento n. 737 também passou a ser aplicado ao Direito Processu-al Civil, por força do Decreto n. 763/18903.

Os dois ramos do direito também percorreram juntos o século XX, em virtude de preceitos legais e enunciados sumulares reveladores da simbiose entre o Direito Processual Civil e o Direito Comercial. Em pri-meiro lugar, merece destaque o denominado Código Unitário de 1939, porquanto o art. 1º era explícito acerca da aplicação do Código de Pro-

1 É certo que o inciso I do art. 22 da vigente Constituição de 1988 consagra a tradi-cional denominação “Direito Comercial”. Não obstante, a designação “Direito Empresarial” ganhou força com o advento do Código de 2002, em razão da inclu-são de um livro específico acerca “DO DIREITO DE EMPRESA” no novo Código Civil pátrio. Daí a preferência pela nova expressão “Direito Empresarial”, a qual é mais ampla do que a expressão constitucional “Direito Comercial”, porquanto o empresário não é só o comerciante, mas também o fabricante industrial e o prestador de serviços. Assim, na doutrina: “Com a adoção da Teoria da Empresa pelo ordenamento jurídico nacional, a nosso juízo, é induvidoso que doravante o Direito Comercial, definitivamente, deverá ser denominado de Direito Empresa-rial, porquanto, na atualidade, o Direito Comercial não mais estará voltado ao então comerciante, do Código da França, de 1807, que praticava atos de comércio, mas sim ao empresário individual ou coletivo, com a constituição da sociedade empresária, na visão contemporânea do Código italiano, de 1942” (Luiz Antonio Guerra, Teoriageraldostítulosdecréditoeinstitutosconexos, 2007, p. 28).

2 À vista da interdependência do Direito Comercial com o Direito Processual Civil, o legislador argentino preferiu a didática denominação “CódigoProcesalCivilyComercialdelaNación”.

3 Trata-se de importante exemplo da ligação existente entre o Direito Comercial e o Direito Processual Civil, como bem ensina a melhor doutrina: Celso Agrícola Barbi, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. I, 10. ed., 1998, n. 1, p. 9 -10; e Ovídio A. Baptista da Silva, Teoriageraldoprocessocivil, 3. ed., 2002, n. 16, p. 30.

INTRODuçãO

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cesso Civil também em relação ao Direito Comercial, inverbis: “O pro-cesso civil e comercial, em todo o território brasileiro, reger-se-á por este Código, salvo o dos feitos por ele não regulados, que constituam objeto de lei especial”.

Na mesma esteira, o Código de Processo Civil de 1973 consagrou a aplicação do Direito Processual Civil em relação do Direito Comercial4 em muitos preceitos, por exemplo, no art. 585, I, que dispõe sobre o processo de execução aparelhado em títulos de créditos, no art. 884, que versa sobre o protesto cambiário e a suscitação da respectiva dúvida em juízo, e no art. 885, que dispõe sobre a demanda para apreensão de títu-los de crédito.

Além dos preceitos legais, a jurisprudência também reconheceu a interdependência entre o Direito Processual Civil e o Direito Comer-cial, com a edição do Enunciado 600 da Súmula do Supremo Tribunal Federal e dos Enunciados 25 e 88 da Súmula do Superior Tribunal de

4 De acordo, vale conferir a autorizada lição do saudoso Professor Celso Agrícola Barbi: “Em 1850, o Governo Imperial publicou o Código Comercial e também o Código de Processo Comercial, sendo este o famoso Regulamento 737, sobre cujo valor muito se tem discutido. Com isto, as causas cíveis continuaram a ser regidas pelas velhas Ordenações, enquanto as causas comerciais passaram a ter um Có-digo próprio e novo. Após a proclamação da República, o Governo Provisório, pelo Decreto n. 763, de 19 de setembro de 1890, mandou aplicar o Regulamento 737 às causas cíveis. Restabeleceu-se, desse modo, a antiga unidade processual. A Constituição de 1891, em seu art. 34, n. 23, combinado com o art. 65, n. 2, atribuiu aos Estados a competência para legislar sobre direito processual. A maioria dos Estados elaborou seus Códigos sob a inspiração do Regulamento 737, mantendo a unidade entre o processo civil e o processo comercial. A Constituição de 1934 pôs termo a essa descentralização legislativa e atribuiu à União a competência para legislar sobre o processo civil e comercial. Usando dessa atribuição, o Gover-no Federal publicou o Dec.-Lei n. 1.608, de 18 de setembro de 1939, contendo um Código que, segundo o seu art. 1º, regeria o processo civil e comercial. Foi, por-tanto, mantida a unidade entre esses dois processos. O art. 1º – do Código de Processo Civil de 1973 – ora comentado não reproduz essa menção expressa ao processo comercial. Mas deve-se entender que o Código se aplica também às causas comerciais, isto dada a tradição do nosso direito desde 1890, ao fato de não ter sido editado um Código para o processo comercial, e a falta de disposição que mantivesse o Código de 1939 apenas para as causas comerciais. Aplica-se ele, portanto, às causas comerciais e às causas cíveis, entendidas estas como abran-gentes às de direito civil, administrativo, agrário etc., para as quais as leis não tenham previsto processo diferente” (Celso Agrícola Barbi, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. I, 10. ed., 1998, n. 1 e 2, p. 9-10).

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Justiça, em prol da aplicação do Código de Processo Civil ao Direito Comercial5.

Da mesma forma, as novas leis e enunciados sumulares do início do presente século XXI reforçam a verdadeira simbiose entre os dois ramos. O art. 189 da Lei n. 11.101/2005, por exemplo, é explícito em prol da aplicação do Código de Processo Civil aos processos de recu-peração empresarial e de falência. O art. 93 da mesma lei autoriza a propositura de embargos de terceiro, à vista do Código de Processo Civil. Outro exemplo da aplicação do Código de Processo Civil no Direito Comercial reside no art. 137 da Lei n. 11.101/2005, segundo o qual é admissível o sequestro cautelar, “na forma da lei processual civil”. Com efeito, o Direito Empresarial não prescinde do estudo do sequestro e do arresto, em razão da importância dos institutos para a compreensão dos arts. 103, caput, 137 e 154, § 5º, todos da Lei n. 11.101/2005. Já no plano jurisprudencial, é oportuno lembrar o Enun-ciado 299, aprovado pelo Superior Tribunal de Justiça em 2004: “É admissível ação monitória fundada em cheque prescrito”. O verbete sumular autoriza a cobrança judicial de cheque prescrito mediante o procedimento especial previsto nos arts. 1.102-A a 1.102-C do Código de Processo Civil.

Diante de tantos pontos comuns entre o Direito Empresarial e o Direito Processual Civil, o estudo conjugado dos dois ramos foi retoma-do em seminários jurídicos6 e cursos de especialização7, em virtude da frequente necessidade da combinação e da interpretação sistemática das leis especiais (p. ex., Lei Uniforme de Genebra, Lei n. 7.357/85, Lei n. 5.474/68, e Lei n. 11.101/2005), à vista do Código de Processo Civil. Daí a justificativa para a publicação do presente compêndio, com os apon-

5 Daí a precisa conclusão do Professor Vicente Greco Filho: “O campo de atuação do direito processual civil, por conseguinte, não se limita a regular a aplicação jurisdicional do direito civil, mas de inúmeros outros ramos do direito, como o direito comercial, omissis” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. I, 18. ed., 2005, p. 67).

6 É oportuno registrar a realização do 1º Seminário Brasileiro de Direito Processu-al e Empresarial, em Porto Alegre, nos dias 18 e 19 de junho de 2007, com a parti-cipação de eminentes processualistas e comercialistas.

7 Por exemplo, a Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas – FGV oferece curso de especialização em Direito Processual Empresarial, assim intitulado: “Estratégias Processuais na Advocacia Empresarial”.

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tamentos escritos sobre institutos jurídicos que residem na interseção entre o Direito Empresarial e o Direito Processual Civil, à luz dos estudos comparativos para o magistério concomitante das respectivas disciplinas jurídicas.

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tomo I

TÍTULOS DE CRÉDITO, AÇÕES CAMBIAIS E AÇÃO MONITÓRIA

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TeoriA GerAl do direiTo CAmbiÁrio

1. Conceito de Direito CambiárioO Direito Comercial – ou Direito Empresarial1 – é o ramo do direi-

to que dispõe sobre o empresário e as sociedades empresárias, sob todos os prismas, desde o início da atividade empresarial, o posterior exercício da empresa, até a eventual falência.

Já o Direito Cambiário – ou Direito Cambial2 – é o sub-ramo do Direito Comercial que versa especificamente sobre os títulos de crédito e as respectivas ações cambiais3. Não obstante, por ser o Direito Cambi-

1 Como já anotado na introdução do presente compêndio, o inciso I do art. 22 da Constituição Federal vigente consagra a tradicional denominação “direito comer-cial”. Não obstante, a designação “direito empresarial” ganhou força com o ad-vento do Código de 2002, em razão da inclusão de um livro específico acerca “DO DIREITO DE EMPRESA” no novo Código Civil pátrio. Daí a preferência pela nova expressão “direito empresarial”, a qual é mais ampla do que a expressão consti-tucional “direito comercial”, porquanto o empresário não é só o comerciante, mas também o fabricante industrial e o prestador de serviços. Assim, na doutrina: “Com a adoção da Teoria da Empresa pelo ordenamento jurídico nacional, a nosso juízo, é induvidoso que doravante o Direito Comercial, definitivamente, deverá ser denominado de Direito Empresarial, porquanto, na atualidade, o Di-reito Comercial não mais estará voltado ao então comerciante, do Código da França, de 1807, que praticava atos de comércio, mas sim ao empresário indivi-dual ou coletivo, com a constituição da sociedade empresária, na visão contem-porânea do Código italiano, de 1942” (Luiz Antonio Guerra, Teoriageraldostítulosdecréditoeinstitutosconexos, 2007, p. 28).

2 Cf. Osmar Brina Corrêa-Lima. Cheque. Revogação (contraordem) e oposição. 2009, p. 5 e 9.

3 Cf. Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, v. I, 12. ed., 2008, p. 373; Luiz Antonio Guerra, Teoriageraldostítulosdecréditoeinstitutosconexos, 2007, p. 44; e Pontes de Miranda, Tratadodedireitocambiário, v. I, 2. ed., 1954, p. 85.

CApíTulO

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ário norteado à luz de princípios próprios, regido por leis específicas e interpretado em obras doutrinárias especializadas, é até mesmo possível defender que o Direito Cambiário já é um ramo autônomo do Direito, cujo objeto são os títulos de crédito e as respectivas ações cambiais. A defesa da autonomia do Direito Cambiário encontra explicação na regra consubstanciada na ampla legitimidade para a emissão dos títulos de crédito, porquanto não só os empresários e as sociedades empresárias, mas, também, as pessoas naturais e outras pessoas jurídicas, além das sociedades empresárias, têm legitimidade para a emissão da grande maioria dos títulos de crédito: a letra de câmbio, a nota promissória, o cheque e a duplicata de prestação de serviços, por exemplo.

2. Notícia histórica dos títulos de créditoA origem dos títulos de crédito remonta à Idade Média, em razão

da incompatibilidade do escambo com o crescimento da circulação de mercadorias. Com efeito, o desenvolvimento do comércio exigiu a cria-ção de um meio para que o credor pudesse fazer prova da existência do crédito com segurança quanto ao respectivo recebimento e a eventual cobrança forçada do devedor4.

3. Conceito de título de créditoO título de crédito é o documento que garante o exercício de direito

obrigacional consagrado de forma literal e que é autônomo em relação à obrigação originária. A propósito do conceito de título de crédito vale conferir o disposto no art. 887 do Código Civil de 2002: “O título de cré-dito, documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido, somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei”.

4. Princípios norteadores do Direito CambiárioO art. 887 do Código Civil de 2002 consagrou, à evidência, os

princípios norteadores do direito cambiário5, quais sejam: – cartulari-

4 Assim, na doutrina: Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, v. II, 21. ed., 1998, p. 336-337; e Wille Duarte Costa, Títulosdecrédito, 3. ed., 2007, p. 6.

5 Assim, na doutrina: “Os princípios do direito cambiário ainda resistem às inova-ções preconizadas pela informática. Tanto é assim que o Código Civil de 2002, concebido para ser um diploma moderno em sua época, positivamente incorpora

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dade ou documentalidade; literalidade; autonomia; formalidade; lega-lidade.

4.1. Cartularidade ou documentalidade

A cartularidade é o princípio consubstanciado na documentação da obrigação cambial, razão pela qual quem detém o papel representa-tivo da dívida pode efetuar a respectiva cobrança6.

Por força da cartularidade, o título de crédito original deve ser apresentado em juízo com a petição inicial da respectiva execução cam-bial7. Sem dúvida, a exigência da apresentação do original para a execu-ção do título de crédito está prevista no art. 614, I, c/c o art. 585, I, ambos do Código de Processo Civil, bem assim como no parágrafo único do art. 223 do Código Civil: “A prova não supre a ausência do título de crédito, ou do original, nos casos em que a lei ou as circunstâncias condicionarem o exercício do direito à sua exibição”.

Não obstante, a regra consubstanciada na necessidade da apresen-tação do original do título de crédito não é absoluta8. Se o original do

os princípios cambiários ao definir título de crédito em seu art. 887 como ‘docu-mento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido’” (Jean Carlos Fernandes, Direitoempresarialaplicado, 2007, p. 117).

6 Assim, na doutrina: Jean Carlos Fernandes, Direitoempresarialaplicado, 2007, p. 130; e Luiz Antonio Guerra, Teoriageraldostítulosdecréditoeinstitutosconexos, 2007, p. 41-42.

7 No mesmo sentido, na jurisprudência: “O título original é exigido nas execuções de cambiais em virtude da cartularidade que lhe é inerente” (2ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2005.01.1.048195-3, DiáriodaJustiça, 21-9-2006, p. 70).

8 Assim, na doutrina: “Pela própria natureza dos títulos mencionados, os mesmos devem ser juntos com a inicial no original respectivo. Nem mesmo a fotocópia é permitida, em regra. Excepcionalmente, a certidão – e hoje, de modo muito melhor, por ser inteira reprodução gráfica, a fotocópia autenticada – de qualquer deles poderá ser anexada à inicial, se houver impossibilidade, por obstáculo judicial, no caso de o original estar já instruindo outro processo forense, sem que tenha sido permitido o desentranhamento pelo juiz” (Alcides de Mendonça Lima, Co-mentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. VI, t. I, 1974, n. 741, p. 337). “Em razão do princípio da circulabilidade dos títulos de crédito, para o ingresso da ação execu-tiva exige-se a instrução da petição inicial com o título original, não sendo permi-tida a juntada de fotocópias, ainda que autenticadas. É claro que em situações nas quais o título esteja instruindo outro processo (como uma ação penal de estelio-

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título de crédito constar dos autos de outro processo judicial, o credor pode requerer certidão de inteiro teor, a fim de instruir a petição inicial da execução, como bem autorizam os arts. 9º, parágrafo único, última parte, e 94, § 3º, ambos da Lei n. 11.101/2005. À vista do art. 17 da Lei n. 9.492/97, também é admissível a propositura de execução aparelhada em certidão de inteiro teor expedida pelo escrivão do tabelionato no qual o título de crédito original foi apresentado para protesto9. Outra exceção reside no art. 15, § 2º, da Lei n. 5.474/68, com a redação determinada pela Lei n. 6.458/77, porquanto é admissível a execução sem o título de cré-dito original quando a duplicata não é aceita nem é devolvida, hipótese na qual a petição inicial da execução pode ser instruída com o instru-mento de protesto mediante indicações10. Por tudo, nem sempre a exe-cução depende da apresentação do título de crédito original.

Ainda à luz da cartularidade, aquele que paga pode exigir a entre-ga do título de crédito, a fim de evitar a respectiva circulação, sob pena de nova cobrança por parte de eventual terceiro de boa-fé portador do título11.

4.2. Literalidade

A literalidade é o princípio segundo o qual somente o que constar do título por escrito tem valor jurídico-cambial. As obrigações cambiárias

nato), e sendo impossível o seu desentranhamento, bastará ao exequente a junta-da de fotocópia e certidão de objeto e pé do processo em que se encontra o origi-nal do título” (Daniel Amorim Assumpção Neves, Manualdedireitoprocessualcivil, 2009, p. 792).

9 Em sentido conforme, na jurisprudência: 3ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2002.01.1.112625-0, DiáriodaJustiça, 14-10-2004, p. 23.

10 De acordo, na doutrina: “Há vezes em que a duplicata, enviada ao devedor para aceite, fica retida por ele. Nesse caso, faz-se o protesto por indicação do credor, e a execução poderá ser feita sem a juntada do título” (Marcus Vinicius Rios Gon-çalves, Novocursodedireitoprocessualcivil, v. III, 2008, p. 66).

11 De acordo, na jurisprudência: “A quitação do débito representado por títulos de crédito exige procedimentos específicos em razão da cartularidade e da possibi-lidade da circulação do título. Nesse passo, uma vez paga a dívida, incumbe ao devedor exigir a entrega do título de crédito, não só para fazer prova da sua qui-tação, mas também para impedir a sua circulação” (1ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2005.01.1.071944-3, DiáriodaJustiça, 22-3-2007, p. 75). No mesmo sentido, ainda na jurisprudência: 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Recurso 101.999, DiáriodaJustiça, 28-3-2001, p. 82.

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são apenas aquelas que residem na cártula, de forma explícita: somente o que estiver escrito no documento tem valor jurídico-cambial12.

4.3. Autonomia

A autonomia é o princípio segundo o qual cada relação jurídica proveniente do título de crédito tem subsistência própria, independen-temente das demais13. Com efeito, cada obrigação cambial vale por si só, por ser autônoma em relação às obrigações pretéritas. A autonomia cambial subsiste até mesmo quando as relações anteriores estão conta-minadas por alguma nulidade, como nas hipóteses previstas no art. 7º da Lei Uniforme de Genebra14.

A autonomia é reforçada pela abstração cambiária e pela inoponi-bilidade das exceções pessoais. A abstração significa que a obrigação cambiária não está vinculada à causa que deu origem ao crédito15; e a

12 Assim, na doutrina: Jean Carlos Fernandes, Direitoempresarialaplicado, 2007, p. 130; Luiz Antonio Guerra, Teoriageraldostítulosdecréditoeinstitutosconexos, 2007, p. 41-42; e Marlon Tomazette, Direitosocietário, 2003, p. 259. Em reforço, vale con-ferir a ementa do seguinte precedente jurisprudencial: “PROCESSO DE EXECU-ÇÃO. LITERALIDADE DO TÍTULO CAMBIÁRIO. Em execução baseada unica-mente no título cambiário, nota promissória, não se poderá exigir do devedor senão o adimplemento das obrigações cambiariamente assumidas” (4ª Turma do STJ, REsp 2.598/MG, DiáriodaJustiça, 10-9-1990).

13 Em sentido conforme, na doutrina: Luiz Antonio Guerra, Teoriageraldostítulosdecréditoeinstitutosconexos, 2007, p. 41-42; e Marlon Tomazette, Direitosocietário, 2003, p. 259: “Pela autonomia das obrigações, do título de crédito podem decorrer vários direitos, podem surgir várias relações jurídicas, e todo o possuidor exerce o direito como se fosse um direito originário. Em outras palavras, os vícios em relações existentes entre as partes anteriores não afetam o direito do possuidor atual. Cada obrigação que deriva do título é autônoma, não podendo uma das partes do título invocar, em seu favor, fatos ligados aos obrigados anteriores”.

14 De acordo, na doutrina: Jean Carlos Fernandes, Direitoempresarialaplicado, 2007, p. 131: “Por último, a autonomia do título de crédito determina que cada pessoa que a ele se vincula assume obrigação autônoma relativa ao título, não se vincu-lando uma à outra, de tal forma que uma obrigação nula não afeta as demais obrigações válidas no título, a teor do art. 7º da LUG”.

15 Assim, na doutrina: “Pela abstração, temos que os direitos decorrentes dos títulos são abstratos, independentemente do negócio que deu lugar ao seu surgimento. A abstração não se confunde com a autonomia das obrigações cambiais (princípio da independência das obrigações cambiais). Aquela traz a regra de que uma vez emitido o título este se libera de sua causa; esta disciplina que as obrigações as-

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inoponibilidade das exceções pessoais consiste na impossibilidade de o devedor ressuscitar defeitos jurídicos provenientes da relação jurídica primitiva, com a consequente imunidade dos terceiros contra as eventu-ais defesas oriundas da relação obrigacional originária, exvi do art. 17 da Lei Uniforme de Genebra16-17.

À vista da autonomia, da abstração e da inoponibilidade das exce-ções, as obrigações jurídico-cambiais subsistem a despeito da existência de alguma nulidade na relação jurídica primitiva, razão pela qual o terceiro de boa-fé que não participou da relação obrigacional anterior está protegido das eventuais nulidades que contaminaram a relação jurídica pretérita. Só há lugar para a discussão da causa do título e para a oposição de exceções entre as partes originárias, sem atingir o terceiro de boa-fé titular superveniente do crédito representado na cártula.

Resta saber quando surgem a autonomia, a abstração e a inoponi-bilidade das exceções: no momento da circulação do título de crédito18,

sumidas no título são independentes umas das outras” (Jean Carlos Fernandes, Direitoempresarialaplicado, 2007, p. 132).

16 Em sentido conforme, na jurisprudência: “Em virtude da circulação do título, decorrente da autonomia de que desfruta o título de crédito, não cabe a oposição de exceções porventura existentes entre as partes que celebraram o pacto primi-tivo, consoante dispõe o princípio da inoponibilidade das exceções pessoais” (3ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2004.01.1.049619-9, DiáriodaJustiça, 16-11-2006, p. 69). “Assim, devido ao princípio da autonomia, uma vez que o título de crédi-to saia da esfera de detenção do credor originário, entrando em circulação, deve- -se aplicar a inoponibilidade das exceções pessoais, pois o portador de boa-fé exercita um direito próprio e não derivado da relação havida anteriormente, salvo quando se evidenciar que este tenha agido com má-fé” (6ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2004.01.1.088269-8, DiáriodaJustiça, 26-1-2006, p. 68).

17 Não obstante, a regra da inoponibilidade contra terceiros consagrada no art. 17 da Lei Uniforme não é absoluta, em virtude da ressalva legal dos casos de má-fé do terceiro.

18 Como bem ensina o Professor Luiz Antonio Guerra, “o que interessa ao estudo do Direito Cambiário é a cártula – que após criado e circulado o título de crédito – ganha plena autonomia, não importando a causa da criação ou emissão” (Teoriageraldostítulosdecréditoeinstitutosconexos, 2007, p. 41). Assim, na jurisprudência: “A autonomia própria dos títulos de crédito consiste em reflexo da respectiva negociabilidade, é dizer, a abstração somente se verifica à vista da circulação da cambial” (4ª Turma do STJ, REsp 812.004/RS, DiáriodaJustiça, 1º-8-2006, p. 452). “Assim, devido ao princípio da autonomia, uma vez que o título de crédito saia da esfera de detenção do credor originário, entrando em circulação, deve-se apli-car a inoponibilidade das exceções pessoais, pois o portador de boa-fé exercita um

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a fim de proteger o terceiro de boa-fé de eventual nulidade existente na relação jurídica originária. Em contraposição, enquanto o título de cré-dito não circular, há lugar para a discussão acerca da causadebendi, com a possibilidade da demonstração da ilicitude da origem da dívida19.

4.4. Formalismo

À vista da parte final do art. 887 do Código Civil, tem-se que o princípio do formalismo está consubstanciado na exigência de que o documento representativo do crédito contenha todas as formalidades previstas na legislação pertinente, sob pena de a cártula não ter serven-tia como título de crédito. Só é título de crédito o documento redigido à luz de todas as formalidades insertas na respectiva lei de regência20.

direito próprio e não derivado da relação havida anteriormente, salvo quando se evidenciar que este tenha agido com má-fé” (6ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2004.01.1.088269-8, DiáriodaJustiça, 26-1-2006, p. 68). No mesmo sentido: 3ª Turma do STJ, REsp 11.184/SP, DiáriodaJustiça, 16-9-1991, p. 12634.

19 De acordo, na jurisprudência: “Comercial. Título de crédito. Avalista. Discussão sobre a origem do débito. Ausência de circulação do título. Possibilidade. Prece-dentes. – Na esteira de precedentes da 3ª Turma do STJ, se o título de crédito não circulou, pode o avalista arguir exceções baseadas na extinção, ilicitude ou inexis-tência da dívida da qual originou o título, visando evitar o enriquecimento sem causa do credor. Recurso especial conhecido e provido” (3ª Turma do STJ, REsp 678.881/PR, DiáriodaJustiça, 30-6-2006, p. 216). “Aval. Autonomia. Oponibilidade de exceções. Não pode o avalista opor exceções fundadas em fato que só ao ava-lizado diga respeito, como o de ter-lhe sido deferida concordata. Entretanto, se o título não circulou, ser-lhe-á dado fazê-lo quanto ao que se refira à própria exis-tência do débito. Se a dívida, pertinente à relação que deu causa à criação do títu-lo, desapareceu ou não chegou a existir, poderá o avalizado fundar-se nisso para recusar o pagamento” (3ª Turma do STJ, REsp 162.332/SP, DiáriodaJustiça, 21-8-2000, p. 117). “Em razão da não circulação do título, essa abstração é mitigada, admitindo-se discutir a causadebendi” (1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Recurso 101.999, DiáriodaJustiça, 28-3-2001, p. 82).

20 De acordo, na doutrina: Luiz Antonio Guerra, Teoriageraldostítulosdecréditoeinstitutosconexos, 2007, p. 41-42; e Carlos Maximiliano Pereira dos Santos, Herme-nêuticaeaplicaçãododireito, 16. ed., 1996, p. 319, n. 386: “Por motivos de interesse geral se prescrevem formalidades constitutivas, essenciais para certos atos; a inob-servância das mesmas induz nulidade e dá margem a outras penas, seja qual for a vontade das partes. A estes se não atribui o poder de convencionar o contrário do que uma norma imperativa ou proibitiva dispôs como substancial, intrínseco ou de ordem pública. Assim acontece com os preceitos que regulam a circulação de mer-cadorias e dos títulos de crédito, os requisitos das letras de câmbio e notas promis-

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Por outro lado, não há como exigir outras formalidades adicionais não previstas na legislação de regência do respectivo título de crédito. Por exemplo, as leis que versam sobre os títulos de crédito não exigem que a cártula seja assinada por testemunha do negócio jurídico-cambial. Daí a dispensa da assinatura de testemunha, em virtude da inexistência de formalidade específica nas leis de regência dos títulos de crédito21.

4.5. Legalidade ou tipicidade

O princípio da legalidade está consubstanciado na necessidade da existência de lei de constituição do título de crédito. Com efeito, apenas os documentos reconhecidos exvilegis como títulos de crédito têm na-tureza cambiária e a consequente força executiva22. Em contraposição,

sórias, a organização exterior das sociedades, os termos de outorga de mandato”. Assim, na jurisprudência: “PROCESSUAL CIVIL E COMERCIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. DUPLICATAS MERCANTIS. FORMALISMO. CIRCULAÇÃO. INO-PONIBILIDADE DAS EXCEÇÕES PESSOAIS. Como título de crédito, a duplicata deve se revestir de rigoroso formalismo, preenchendo devidamente os requisitos essenciais contidos no art. 2º da Lei 5.474/68” (6ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2004.01.1.088269-8, DiáriodaJustiça, 26-1-2006, p. 68). “A cédula de crédito industrial constitui título executório extrajudicial, uma vez revestida das formalidades legais. Confere ao credor direito de, em juízo, valer-se da execução forçada. Impossível impedir que o faça. Caso contrário, até a Constituição da República seria contrasta-da (art. 5º, XXXV). Eventual defesa constará de embargos à execução” (2ª Turma do STJ, RMS 185/ES, DiáriodaJustiça, 21-5-1990, p. 4428). “APELAÇÃO CÍVEL – PRO-CESSO DE EXECUÇÃO – REQUISITOS DE FORMALIDADE – NOTA PROMIS-SÓRIA – RASURA NO VALOR NUMÉRICO – OBSTÁCULO INTRANSPONÍVEL. I – Em se tratando de processo de execução, pode e deve o julgador cercar-se da certeza de estarem presentes os requisitos de formalidade inerentes aos títulos cambiais, independentemente da matéria arguida em sede de embargos. II – A ra-sura no valor numérico originalmente consignado, contida na nota promissória, ressai como obstáculo intransponível a que a parte possa se socorrer do rito espe-cialíssimo a que se submete o processo de execução a fim de receber o seu crédito. III – Nada impede a parte de buscar o crédito que considera justo pela via do pro-cesso de conhecimento, quer pelo rito ordinário, quer pelo rito especial da monitó-ria” (2ª Turma do TJDF, Apelação 51.223/99, DiáriodaJustiça, 1º-11-1999, p. 13).

21 De acordo, na jurisprudência: “II. Aos títulos de crédito, assim reconhecidos em lei, dispensa-se a formalidade exigida aos contratos particulares, de assinatura de duas testemunhas, para que adquiram executoriedade” (4ª Turma do STJ, REsp 215.265/GO, DiáriodaJustiça, 4-2-2002, p. 369).

22 De acordo, na doutrina: “e) legalidade – para a validade do título, obrigatoria-mente, deve ele ser criado por lei; sem exceção, todos os títulos de crédito possuem

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documentos sem previsão legal específica não têm natureza de título de crédito, como ocorre, por exemplo, com o simples “boleto bancário”23, também denominado “boleto de cobrança” ou “bloqueto de cobrança”.

5. Atributos ou benefícios dos títulos de crédito: negociabili-dade e executividade

Estudados os princípios norteadores dos títulos de créditos, vale conferir os respectivos atributos ou benefícios que explicam a subsistên-cia e o êxito do instituto: a negociabilidade e a executividade.

A negociabilidade consiste na maior facilidade de circulação do crédito, porquanto a autonomia do título facilita a negociação do crédi-to com terceiros, os quais estão protegidos por força dos arts. 7º e 17 da Lei Uniforme de Genebra. Daí a frequente negociação de títulos de cré-dito com as instituições financeiras, as quais adquirem títulos de credo-res originários mediante pagamento de parcela do valor estampado na cártula, com a posterior cobrança da quantia total dos respectivos deve-dores.

Já a executividade consiste na maior facilidade de satisfação da dívida mediante execução forçada, sem a necessidade de prévio processo de conhecimento para a respectiva cobrança judicial. Com efeito, os títu-los de créditos autorizam o imediato ajuizamento de execução por quan-tia certa, sob o procedimento previsto nos arts. 646 a 724 do Código de

lei especial de regência” (Luiz Antonio Guerra, Teoriageraldostítulosdecréditoeinstitutosconexos, 2007, p. 42).

23 Assim, na doutrina: “Os boletos bancários, como comumente são conhecidos, não passam de simples papéis de cobrança, não caracterizados como títulos de crédi-to pela legislação vigente” (Jean Carlos Fernandes, Direitoempresarialaplicado, 2007, p. 144). De acordo, na jurisprudência: “Segundo entendimento dominante nos tribunais, o boleto bancário não constitui título de crédito, não se sujeitando, dessa forma, ao protesto cambial” (6ª Turma Cível do TJDF, Agravo de Instrumen-to 2007.00.2.005763-8, DiáriodaJustiça, 27-9-2007, p. 119). “O boleto bancário não é tipificado em nosso sistema comercial como título de crédito e por isso não há como se admitir o seu protesto, que se mostra claramente abusivo” (14ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0433.99.002460-9, DiáriodaJustiça, 21-7-2009). “O simples boleto bancário não enseja apontamento de protesto, por não previsto na legislação como título representativo de dívida, máxime quando não comprovado o lastro em nota fiscal correspondente” (4ª Câmara Civil do TAMG, Apelação 2.0000.00.423714-5, DiáriodaJustiça, 20-3-2004).

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Processo Civil, porquanto o inciso I do art. 585 do Código de Processo Civil confere aos títulos de crédito força de título executivo extrajudicial.

6. Características da obrigação cambiária: quesível epro solvendo

Em regra, a obrigação cambiária é quesível e prosolvendo: por ser quesível, a iniciativa rumo à busca do pagamento da quantia estampada no título cabe ao credor24; e por ser prosolvendo, a extinção da obrigação cambiária se dá com o efetivo pagamento, vale dizer, com a liquidação do título de crédito25. Só excepcionalmente a obrigação cambiária é por-tável e prosoluto, por força de disposição específica na lei de regência ou no bojo do título de crédito.

7. Classificações dos títulos de créditoOs títulos de crédito são classificados segundo muitos critérios26:

24 De acordo, na jurisprudência: “– Nosso sistema jurídico adota a regra de que o pagamento é quesível, isto é, deve ser procurado pelo credor (dívida quérable), salvo estipulação em contrário, isto é, que se tenha ajustado – ou que se possa inferir dos dados concretos – que ao devedor competiria oferecer o pagamento (dívida portable)” (18ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0027.08.157786-1/001, DiáriodaJustiça, 10-9-2009). “– Em virtude de o cheque representar obrigação quesível, o devedor é constituído em mora pela apresentação do título pelo credor ao banco sacado, data a partir da qual deverão incidir os juros moratórios” (18ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0481.05.043034-9/001, DiáriodaJustiça, 10-5-2007).

25 Assim, na jurisprudência: “– O mero recebimento, pelo credor, de cheque para pagamento de Duplicata não importa novação da dívida, porquanto referenciado cheque tem a característica prosolvendo, importando dizer que somente se concre-tiza o pagamento após sua compensação” (2ª Câmara Cível do TAMG, Apelação 2.0000.00.377750-0/001, DiáriodaJustiça, 29-11-2003). “– Tratando-se de pagamen-to de dívida com cheque pós-datado, a extinção da obrigação somente se verifica após a liquidação decorrente de sua compensação, em razão do efeito prosolvendo da cártula” (2ª Câmara Cível do TAMG, Apelação 2.0000.00.400700-3/001, DiáriodaJustiça, 20-11-2003).

26 Cf. Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial, v. I, 3. ed., 2000, p. 375-377, e Cursodedireitocomercial: direito de empresa, v. I, 12. ed., 2008, 385-387; Wille Du-arte Costa, Títulosdecrédito, 3. ed., 2007, p. 28-29; e Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, CódigoCivilcomentado, 6. ed., 2008, p. 721, comentário 19, inverbis: “19. Classificação. 1) Quanto ao modelo: livre (sem modelo fixo) ou

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modelo ou padronização; estrutura ou relações jurídicas; emissão ou origem; circulação ou transferência da titularidade; natureza; cambiais ou cambiariformes.

No que tange ao modelo, os títulos de crédito podem ser vinculados ou livres, conforme a confecção dependa da observância de padrão legal, ou não. Por exemplo, o cheque e as duplicatas são títulos atrelados a um padrão legal de confecção, sob pena de não serem considerados títulos de crédito. Já a letra de câmbio e a nota promissória podem ser lançadas em qualquer documento, ainda que não seja um formulário padroniza-do; basta que sejam redigidos em um papel, de qualquer tamanho, cor ou forma, com o lançamento dos termos legais.

Quanto à estrutura, os títulos de crédito podem ser promessa de pagamento ou ordem de pagamento, consoante a existência de duas ou três posições jurídicas distintas, respectivamente. Por exemplo, a nota promissória é uma promessa de pagamento na qual são encontradas apenas duas posições jurídicas: o emitente-sacador e o credor-benefici-ário. Já a letra de câmbio, o cheque e as duplicatas têm natureza de ordem de pagamento, com a existência de três posições jurídicas: emitente-sa-cador, sacado e credor-beneficiário.

No tocante à emissão, os títulos de crédito são causais ou abstratos, em razão da relevância da origem da obrigação, ou não. A formação de um título causal depende da ocorrência de um fato específico indispen-sável por força de lei para a emissão do título. Já o título abstrato ou não causal pode ser emitido independentemente da origem da obrigação. Por exemplo, as duplicatas são títulos de crédito provenientes de compra e venda mercantil ou de prestação de serviços; são, por consequência, títulos causais27. Em contraposição, a letra de câmbio, a nota promissória

vinculado (com modelo fixo); 2) quanto à circulação: ao portador (não há menção ao beneficiário, que poderá ser a pessoa que o tenha em seu poder), ou nomina-tivos (com explícita menção ao beneficiário); 3) quanto à emissão: causal (depen-dente do negócio que lhe deu origem) ou abstrato (sem ligação com o negócio que lhe deu origem; eventual invalidade deste, p. ex., não lhe é prejudicial); 4) quanto à natureza: próprio (o título representa o crédito) ou impróprio”.

27 Assim, na jurisprudência: 3ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2002.07.1.009048-0, DiáriodaJustiça, 26-8-2004, p. 80: “1 – A duplicata, consoante classificação doutri-nária, se constitui em título de crédito causal no sentido de que a sua emissão somente pode ocorrer na hipótese autorizada pela lei, ou seja, de documentação de crédito nascido de uma relação de compra e venda mercantil, que tem como consequência imediata da causalidade a insubsistência da duplicata originada de

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e o cheque podem ser emitidos sem vinculação a nenhuma causa legal específica. Daí a possibilidade de a letra, a nota e o cheque terem as mais diversas origens: comerciais, civis, tributárias, administrativas e até penais28. Por fim, embora seja causal em razão de o saque depender da existência de um negócio específico, a duplicata que circula adquire a autonomia e a abstração como os demais títulos de crédito que não estão vinculados a causa alguma29.

No que tange à circulação do título de crédito, isto é, da transferên-cia da titularidade, os títulos de crédito podem ser ao portador ou no-minativos. Os títulos ao portador não têm a identificação do beneficiário e são transmissíveis pela simples tradição, com a entrega da cártula. Com efeito, à vista do art. 904 do Código Civil, o título ao portador parte da premissa de que o credor é quem porta o título, cuja transferência se dá

ato ou negócio jurídico diverso”. No mesmo sentido: 1ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2004.01.1.111911-8, DiáriodaJustiça, 5-11-2006, p. 79: “Como título causal, a duplicata exige existência prévia de compra de mercadorias ou prestação de serviços. Caso verificado, como no caso vertente, que os títulos foram emitidos sem observância de tal requisito legal, o prestígio da r. sentença que os reconheceu nulos de pleno direito os títulos emitidos traduz medida que se impõe. (...) Como título de crédito causal que é, a duplicata só poderá ser sacada quando houver ocorrido compra e venda de mercadoria ou prestação de serviços” (1ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2003.01.1.047573-3, DiáriodaJustiça, 25-10-2005, p. 99).

28 Em sentido semelhante ao texto do parágrafo, na doutrina: “Trata-se dos chama-dos títulos cambiais ou cambiariformes, havendo os que são causais, isto é, exigí-veis desde que acompanhados de comprovação da relação jurídica subjacente, como a duplicata, e os não causais, que guardam autonomia sobre qualquer rela-ção subjacente, como os cheques e a nota promissória” (Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novocursodedireitoprocessualcivil, v. III, 2008, p. 66). “a) Títulos causais são os títulos que nascem, obrigatoriamente, de uma causa determinada em lei, como são os casos das duplicatas, que nascem da compra e venda mercantil ou da prestação de serviços; da cédula de crédito industrial que só nasce do financia-mento a quem se dedica à atividade industrial; do conhecimento de depósito e do warrant, que só nascem do depósito de mercadorias em armazéns gerais e assim outros títulos. b) Títulos abstratos são os títulos que podem nascer de qualquer causa, já que a lei de regência não predetermina causa alguma para sua criação. São assim a letra de câmbio, a nota promissória, o cheque e outros” (Wille Duarte Costa, Títulosdecrédito, 3. ed., 2007, p. 28-29).

29 De acordo, na doutrina: “A duplicata, por exemplo, em si mesma, é título causal, mas quando funciona como base de uma execução, deixa de ser causal e passa a ser vista como abstrata” (Amílcar de Castro, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. VIII, 2. ed., 1976, p. 54).

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mediante simples tradição, com a entrega do documento representativo do título. Já os títulos nominativos revelam o nome da pessoa em favor de quem são emitidos. Com efeito, os títulos nominativos são marcados pela designação do credor, razão pela qual a transmissão ocorre median-te a tradição acompanhada de endosso cambiário ou da cessão civil de crédito, conforme o caso. Os títulos nominativos podem ser à ordem ou não à ordem. O título nominativo à ordem é marcado pela transferência mediante endosso cambiário, conforme revela o art. 910 do Código Civil: “O endosso deve ser lançado pelo endossante no verso ou no anverso do título”. O endosso também pode ser em branco ou em preto. O en-dosso em branco é o proveniente da simples assinatura, sem a identifi-cação do credor. Já o endosso em preto contém a identificação do bene-ficiário. Em contraposição, o título nominativo não à ordem não é pas-sível de transferência mediante endosso, razão pela qual a transmissão é juridicamente possível, mas depende de contrato civil de cessão ordi-nária de crédito, nos termos da legislação civil30.

Por fim, os títulos de crédito podem ser cambiais ou cambiarifor-mes. A letra de câmbio e a nota promissória, por exemplo, são típicas cambiais. Já o cheque e as duplicatas têm forma cambial, mas não são verdadeiras cambiais. Daí a explicação para a denominação consagrada na doutrina: “cambiariforme”. Não obstante, tanto os títulos cambiais (letra e nota) quanto os títulos cambiariformes (cheque e duplicatas) têm natureza de título executivo extrajudicial e ensejam ação cambial, com fundamento nos mesmos arts. 585, I, 646 e 652, todos do Código de Pro-cesso Civil.

8. Subsistência do Direito Cambiário na “Era da Informática”Ao contrário do que se imaginava à vista do advento da informática

no mundo contemporâneo, os títulos de crédito subsistem no direito bra-sileiro, exvi do Código Civil de 2002: se é certo que o Código Civil vigente autoriza a utilização da informática para a confecção dos títulos de crédito31, também é correto afirmar que o Código de 2002 preservou a cartularidade dos títulos, em prol da segurança jurídica que assegurou o florescimento e a subsistência do direito cambiário ao longo dos séculos.

30 Cf. arts. 286 e s. do Código Civil.

31 Cf. art. 889, § 3º, do Código Civil.

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Por fim, os juristas estão divididos quanto ao futuro dos títulos de crédito: de um lado, há os que confiam na subsistência do Direito Cam-biário na “Era da Informática”32; de outro lado, há respeitáveis juristas que suscitam dúvidas acerca do futuro do direito cambiário33. Embora seja difícil prever qual será o destino dos títulos de crédito nas próximas décadas, o certo é que subsistem em muitos diplomas legais e ainda têm significativa importância nas transações civis, comerciais e bancárias.

32 Cf. Jean Carlos Fernandes, Direitoempresarialaplicado, 2007, p. 117: “Embora os avanços tecnológicos venham criando novas realidades contratuais, envolvendo o comércio eletrônico, a tributação de software, entre outras evoluções, o direito cambiário, baseado na cártula, ainda continua mantendo a sua importância para o desenvolvimento e segurança das relações ou situações jurídicas. (...) Os princí-pios do direito cambiário ainda resistem às inovações preconizadas pela informá-tica. Tanto é assim que o Código Civil de 2002, concebido para ser um diploma moderno em sua época, positivamente incorpora os princípios cambiários ao definir título de crédito em seu art. 887 como ‘documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido’”.

33 Cf. Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, v. I, 12. ed., 2008, p. 389-390: “Os títulos de crédito surgiram na Idade Média, como instrumen-tos destinados à facilitação da circulação do crédito comercial. Após terem cum-prido satisfatoriamente a sua função, ao longo dos séculos, sobrevivendo às mais variadas mudanças nos sistemas econômicos, esses documentos entram agora em período de decadência, que poderá levar até mesmo ao seu fim como instituto jurídico”.

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leTrA de CÂmbio

1. Legislação de regênciaAo contrário do que pode parecer à primeira vista, o Código Civil

de 2002 não é o principal diploma de regência da letra de câmbio, por-quanto o proêmio do art. 903 preservou as leis especiais pretéritas refe-rentes aos títulos de crédito. Daí a incidência apenas subsidiária do Código Civil de 2002, somente quando a legislação especial for omissa. A propósito, vale conferir o disposto no Enunciado 52 das Jornadas de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal: “Art. 903: por força da regra do art. 903 do Código Civil, as disposições relativas aos títulos de crédi-to não se aplicam aos já existentes”.

O principal diploma de regência da letra de câmbio1 é a Con-venção de Genebra de 1930, também intitulada “Lei Uniforme sobre Letras de Câmbio e Notas Promissórias”, a qual recebeu a adesão do Governo brasileiro em 1942, o posterior referendo do Congresso Na-cional por meio do Decreto Legislativo n. 54/642, e a derradeira promulgação mediante o Decreto n. 57.663/663, subscrito pelo Pre-sidente da República4.

1 Na verdade, a Convenção de Genebra também é o principal diploma de regência da nota promissória, tema do próximo capítulo.

2 À vista da competência exclusiva tradicional prevista no art. 66, I, da Constituição Federal de 1946, no art. 47, I, da Carta de 1967 e no art. 49, I, da Constituição Fe-deral de 1988.

3 À vista da competência consagrada no art. 87, I e VII, da Constituição de 1946, no art. 83, II e VIII, da Carta de 1967 e no art. 84, IV e VIII, da Constituição de 1988.

4 “1)- O Pleno do Supremo Tribunal Federal já decidiu unanimemente que tem eficácia imediata no país a Convenção Internacional aprovada pelo Congresso em Decreto Legislativo e promulgada por decreto do Presidente da República (RE 71.154, na RTJ 58/70). 2)- A Lei Uniforme sobre Cambiais e Promissórias está vi-gente no Brasil, porque o Decreto Legislativo n. 54/64 aprovou, e o Decreto Exe-

CApíTulO

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Como os tratados sobre direito comercial ou direito empresarial são incorporados ao ordenamento jurídico brasileiro com força de lei ordinária federal5, houve a parcial revogação tácita do anterior Decreto n. 2.044/19086, o qual, todavia, subsiste em relação às omissões da Con-venção de Genebra e às reservas previstas no art. 1º do Decreto n. 57.663/66, à vista do Anexo II da Lei Uniforme.

Daí a conclusão extraída da combinação do art. 903 do Código Civil de 2002, com o Decreto n. 57.663/66, e com o Decreto n. 2.044/1908, no que tange às regras de regência da letra de câmbio: em primeiro lugar, incide a Convenção de Genebra, isto é, a Lei Uniforme; em segundo lugar, na eventualidade de omissão na Convenção de Genebra ou de reserva estabelecida pelo Decreto n. 57.663/66, incide a Lei Cambiária Nacional, como ocorre, por exemplo, em relação ao instituto do aval antecipado, previsto no art. 14 do Decreto n. 2.044/1908; omissas, entre-tanto, as leis especiais, incide o Código Civil de 2002, cujos arts. 887 a 903 versam sobre disposições gerais dos títulos de crédito. Por exemplo, diante da omissão da Lei Uniforme e da Lei Cambiária Nacional acerca dos efeitos do aval póstumo, incide o art. 900 do Código Civil, aplicável

cutivo n. 57.663 de 24/01/66, promulgou a Convenção de Genebra, da qual se originou esse diploma” (Pleno do STF, RE 76.236/MG, RTJ, v. 67, p. 601).

5 De acordo, na doutrina: Moacyr Amaral Santos, Primeiraslinhasdedireitoproces-sualcivil, v. III, 15. ed., 1995, p. 159. Na precisa lição do eminente Ministro, “os tratados e as leis se equiparam. Os tratados são leis”. Ainda a respeito do tema, merece ser prestigiado acórdão de relatoria do eminente Ministro Eduardo Ribei-ro: “Tratado Internacional. Lei ordinária. Hierarquia. O tratado internacional situa- -se formalmente no mesmo nível hierárquico da lei, a ela se equiparando” (3ª Turma do STJ, REsp 73.376/RJ). Por fim, vale conferir precedente do Plenário do STF, com igual entendimento: RE 80.004/SE, RTJ, v. 83, p. 809.

6 Não obstante, o douto Professor Fábio Ulhoa Coelho sustenta que “a via escolhi-da, em 1966, para fazer valer a Convenção de Genebra no direito brasileiro, não era tecnicamente correta. O Decreto n. 2.044/1908 possui estatuto de lei ordinária, e sua revogação não pode ocorrer por meio de simples decreto do Poder Executi-vo, mas apenas por outra lei” (Cursodedireitocomercial: direito de empresa, v. I, 12. ed., 2008, p. 393). A despeito da autorizada opinião do Professor Fábio Ulhoa Coelho, não se vislumbra inadequação da via legislativa eleita para a incorporação da Convenção de Genebra ao direito pátrio, tendo em vista o disposto no art. 66, I, da Constituição Federal de 1946, no art. 47, I, da Carta de 1967 e no art. 49, I, da Constituição Federal de 1988. Como já sustentado no texto principal, o Decreto n. 57.663 é constitucional e foi incorporado ao direito brasileiro com força de lei or-dinária.

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de forma subsidiária até mesmo aos títulos de crédito com legislação própria, como a letra de câmbio.

Por fim, a legislação de regência da letra de câmbio também é fonte subsidiária dos demais títulos de crédito. Com efeito, os arts. 75 e 77 da Lei Uniforme e o art. 25 da Lei n. 5.474/68 determinam a aplicação subsidiária das regras referentes à letra de câmbio em relação às notas promissórias e duplicatas, respectivamente. Na verdade, como a letra de câmbio é o título de crédito mais antigo e o mais completo, as leis de regência da letra têm incidência subsidiária em relação aos demais títulos7. Daí a explicação para a construção da denominada “Teoria Geral do Direito Cambiário” à luz da letra de câmbio8, por ter sido o título de crédito que influenciou os demais9.

2. Conceito, natureza jurídica e sujeitos da relação jurídico--cambial

A letra de câmbio é o título de crédito de modelo livre por meio do qual o emitente-sacador dá uma ordem a outrem (“sacado”) para que efetue pagamento em prol do credor-beneficiário.

A propósito dos sujeitos da relação jurídico-cambial, não só os empresários podem ser emitentes, sacados e credores da letra de câmbio10.

7 Cf. 6ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2004.01.1.088269-8, DiáriodaJustiça, 26-1-2006, p. 68.

8 Assim, na doutrina: “É sabido que toda a teoria dos títulos de crédito, historica-mente, nasceu do estudo da letra de câmbio, o mais completo e complexo dos tí-tulos”. (...) O título de inspiração da Teoria Geral dos Títulos de Crédito sempre foi a Letra de Câmbio, porque, além de ser essencialmente uma cambial, é o títu-lo de maior expressão internacional dada a sua complexidade e as declarações que nela se inserem” (Luiz Antonio Guerra, Teoriageraldostítulosdecréditoeinstitutosconexos, 2007, p. 13 e 43, respectivamente).

9 De acordo, na doutrina: “Sem dúvida alguma e por tudo que conhecemos, pode-mos afirmar que a letra de câmbio é o mais antigo título de crédito. Foi o primei-ro deles, seguido da nota promissória. Então, se alguma coisa deve-se pesquisar, refere-se ao título mais importante que é a letra de câmbio” (Wille Duarte Costa, Títulosdecrédito, 3. ed., 2007, p. 3).

10 De acordo, na doutrina: “Hoje em dia, por exemplo, não são apenas os comer-ciantes que assinam letra de câmbio ou notas promissórias, títulos usados exclu-sivamente pelos mercadores, na época medieval e até época bem recente. O em-prego do título de crédito tornou-se corrente e universal” (Miguel Reale, Liçõespreliminaresdedireito, 27. ed., 4. tir., 2004, p. 364).

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Todas as pessoas naturais capazes e as pessoas jurídicas em geral podem assumir obrigações e ser beneficiárias de direitos cambiais.

Em regra, três pessoas intervêm na letra de câmbio: o emitente-sacador, o sacado e o credor-beneficiário. O sacador é o emitente da letra, o subscritor do título de crédito. Já o sacado é a pessoa física ou jurídica contra quem é emitida a ordem de pagamento. Ao aceitar a letra de câmbio, com o lançamento da respectiva assinatura, o sacado também passa a ser denominado “aceitante”, quando ocupa o lugar de devedor principal do título. Antes do aceite, todavia, o sacado não tem obrigação cambial alguma; a só emissão da letra não torna o sacado obrigado pela cambial. Com efeito, a obrigação do sacado nasce com a aceitação da letra, quando assume a qualidade de devedor principal. Por fim, o credor ou tomador é o beneficiário do crédito. Um exemplo pode facilitar a compreensão das três posições jurídicas provenientes da letra de câmbio: imagine-se que A é devedor de B, em razão de dívida correspondente a R$ 10.000,00. Por sua vez, B também é devedor de C, mas em montante superior: R$ 15.000,00. Em vez de pagar diretamente a quantia integral ao respectivo credor (C), B (sacador) paga R$ 5.000,00 em espécie11 e emite letra de câmbio contra A (sacado), com a ordem de pagamento da quantia correspondente a R$ 10.000,00 em favor de C (beneficiário). Na eventualidade de o sacado (A) não aceitar a ordem ou não efetuar o respectivo pagamento, o emitente-sacador (B) é o responsável pelo pa-gamento da quantia correspondente a R$ 10.000,00, em favor do credor--beneficiário (C).

A despeito de a regra ser a participação de três sujeitos na relação cambial proveniente da letra, o art. 3º da Lei Uniforme permite que o próprio emitente-sacador seja também o credor-beneficiário12, quando emite a letra de câmbio em seu próprio favor, contra o sacado. Ainda a

11 Vale dizer, em dinheiro.

12 De acordo, na jurisprudência: “Comercial. Protesto por falta de aceite. Letra de câmbio não endossada. Direito do sacador-tomador. Segurança concedida. – O ato da Corregedoria de Justiça que veda ao sacador-tomador da letra de câmbio o acesso ao protesto por falta de aceite, pela circunstância de se confundirem ambos os papéis na mesma pessoa, viola direito do sacador em tomar a providência preservativa dos direitos decorrentes da impontualidade, definidos pelo regime jurídico dos títulos de crédito” (4ª Turma do STJ, RMS 2.603/SP, DiáriodaJustiça, 23-5-1994, p. 12609).

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respeito do art. 3º da Lei Uniforme, o preceito também permite que a letra seja emitida contra o próprio sacador, quando o emitente e o sacado são a mesma pessoa. Em suma, as três posições jurídicas existentes na letra de câmbio podem ser ocupadas por apenas duas pessoas.

Voltando os olhos ao credor-beneficiário, este pode efetuar a trans-ferência da titularidade em prol de outrem (endossatário), por meio de simples endosso. Na eventualidade de o sacado deixar de efetuar o pa-gamento, o endossatário pode acionar tanto o emitente-sacador quanto o endossante (anterior credor-beneficiário) – e até mesmo o sacado, se a letra foi aceita. Sem dúvida, o saque, que é o ato consubstanciado na emissão do título de crédito, também produz o efeito jurídico de vincu-lar o emitente-sacador ao pagamento da letra de câmbio, na qualidade de coobrigado, como bem determinam os arts. 9º e 43 da Lei Uniforme.

Por fim, é vedada a emissão de letra de câmbio proveniente de compra e venda mercantil a prazo faturada, em razão da restrição con-tida no art. 2º da Lei n. 5.474/6813. Pelo mesmo motivo, não é admissível a emissão de letra de câmbio com fundamento em prestação de serviço faturada. A vedação expressa no art. 2º teve como imediata consequência prática o quase desaparecimento da letra de câmbio dos negócios inter-nos no Brasil, com o aumento da utilização das duplicatas mercantil e de prestação de serviços. Não obstante, a letra de câmbio ainda é utili-zada com frequência no comércio externo, tanto que no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social são encontrados muitos mode-los de letras de câmbio destinados aos negócios internacionais, para orientar os empresários individuais e os administradores e diretores das sociedades empresárias nas transações com empresários e sociedades empresárias de outros países.

3. Requisitos ou elementos da letra de câmbioA letra de câmbio é um título de crédito de modelo livre, razão pela

qual ser emitida em qualquer papel, de todos os tamanhos, porquanto

13 De acordo, na jurisprudência: “Em se tratando de dívida resultante de compra de mercadoria a prazo, é vedado ao vendedor emitir letra de câmbio em lugar da duplicata mercantil, mas nada obsta que a compra e venda seja representada por nota promissória ou por cheque, que são títulos sacados pelo comprador (Inteli-gência do art. 2º da Lei n. 5.474/68)” (3ª Câmara Cível do TAMG, Apelação 2.0000.00.306935-8, DiáriodaJustiça, 26-8-2000).

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não há formulário padronizado exvi da legislação de regência. Basta, portanto, o cumprimento dos requisitos legais para a transformação de um simples papel em letra de câmbio. Sem dúvida, o lançamento dos termos legais tem o condão de transformar qualquer papel em letra de câmbio.

Quanto aos requisitos da letra de câmbio, os principais elementos estão arrolados no art. 1º da Lei Uniforme. Não obstante, há requisitos essenciais e requisitos acidentais. Requisitos essenciais são os elementos constitutivos da letra cujas ausências implicam descaracterização do tí-tulo. Já os requisitos acidentais são os elementos sanáveis nas hipóteses arroladas no art. 2º da Lei Uniforme.

Expostas as duas classes de requisitos existentes no art. 1º da Lei Uniforme, convém examinar cada um dos elementos constitutivos da letra.

Em primeiro lugar, há a necessidade da denominação “letra de câmbio” inserta no bojo do documento. Na verdade, nada impede a utilização da simples palavra “letra”, tal como consta do art. 1º, n. 1, da Lei Uniforme. Também é possível a utilização da expressão cor-respondente na língua estrangeira14, porquanto é admissível a execu-ção de título de crédito emitido no estrangeiro, independentemente de homologação no Brasil, exvi do art. 585, I e § 2º, do Código de Processo Civil15.

Em segundo lugar, a letra de câmbio deve conter mandamento explícito para que seja pago determinado valor. Com efeito, à vista do

14 Por exemplo, billofexchange.

15 Assim, na jurisprudência: “– Os títulos de crédito constituídos em país estran-geiro, para serem executados no Brasil (CPC, art. 585, § 2º), não dependem de homologação pelo Supremo Tribunal Federal. A eficácia executiva que lhes é inerente não se subordina ao juízo de delibação a que se refere o art. 102, I, ‘h’, da Constituição, que incide, unicamente, sobre ‘sentenças estrangeiras’, cuja noção conceitual não compreende, não abrange e não se estende aos títulos de crédito, ainda que sacados ou constituídos no exterior” (Pleno do STF, RCL 1.908/SP – AgRg, DiáriodaJustiça, 3-11-2004). De acordo, na doutrina: “Por outro lado, exigida a homologação de decisões judiciais, é intuitivo que títulos executivos extrajudiciais, como letras de câmbio e notas promissórias, não estão submetidas à homologação” (Cristiano Chaves de Farias, Direitocivil: teoria geral, 2. ed., 2005, p. 81).

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art. 1º, n. 2, da Lei Uniforme, a letra deve revelar uma ordem de paga-mento de determinado montante. A ordem deve ser incondicional, isto é, o pagamento não pode depender de condição alguma16. Na eventua-lidade de divergência entre o valor por extenso e o indicado em algaris-mos, prevalece a quantia escrita por extenso, tendo em vista o disposto no art. 6º, § 1º, da Lei Uniforme. Como já anotado, é admissível a emissão da letra de câmbio em moeda estrangeira, a ser paga no Brasil, com a conversão para a moeda nacional corrente no momento do pagamento17. Também é admissível a emissão de letra de câmbio em índice oficial18. Nada impede, por consequência, a inclusão de cláusula de correção monetária19, já que o valor final do título pode ser facilmente obtido por simples operação aritmética. Além da correção monetária, é admissível a inclusão de cláusula de juros, observado o disposto no art. 5º da Lei Uniforme20.

À vista do art. 1º, n. 3, da Lei Uniforme, a letra deve revelar “o nome daquele que deve pagar (sacado)”. Na verdade, mais do que o simples nome do sacado, o art. 3º da Lei n. 6.268 exige a identificação do sacado por meio da inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas, do número no Registro Geral da Secretaria de Segurança Pública, do número do Título Eleitoral ou do número da Carteira Profissional. Em suma, o sacado deve ser qualificado na letra de câmbio, a fim de evitar eventual confusão proveniente de homonímia. Não há, todavia, necessidade de assinatura do sacado no momento da emissão da letra; a assinatura do sacado será buscada em momento posterior, para o lançamento do “aceite” que torna o sacado devedor principal do título. Se o sacado não aceitar a ordem de pagamento consubstanciada na letra de câmbio, permanecerá

16 “Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto” (art. 121 do Código Civil de 2002).

17 Assim, na jurisprudência: “– Letras de câmbio emitidas no estrangeiro. Aplicação do princípio locusregitactum. (...) As cambiais em moeda estrangeira, vencidas e não pagas, são exequíveis no Brasil, pelo seu valor em moeda nacional, ao câmbio do dia da liquidação” (2ª Turma do STF, Ag 80.938/SP – AGR, RTJ, v. 97, p. 238).

18 Por exemplo, Ufir – Unidade Fiscal de Referência, TR – Taxa Referencial.

19 Cf. 1ª Turma do STF, RE 108.613/MG, RTJ, v. 137, p. 1310; 3ª Turma do STJ, REsp 547.319/RS, DiáriodaJustiça, 18-10-2004, p. 270.

20 Diante da existência de preceito específico, qual seja, o art. 5º da Lei Uniforme, não incide a regra geral consubstanciada no art. 890 do Código Civil.

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totalmente alheio à relação cambial, a qual subsistirá apenas em relação ao emitente-sacador e ao credor-beneficiário21.

A letra também deve conter a praça do pagamento e o dia do ven-cimento do título. Com efeito, o art. 1º da Lei Uniforme exige “a indica-ção do lugar em que se deve efetuar o pagamento”22 e “a época do pagamento”23. Se não for indicada a data do vencimento, o título é con-siderado “à vista”, por força do art. 2º, § 2º, da Lei Uniforme, e do art. 889, § 1º, do Código Civil. Se não for designado o lugar do pagamento, será considerado o endereço do sacado revelado na cártula: “Na falta de indicação especial, o lugar designado ao lado do nome do sacado consi-dera-se como sendo o lugar do pagamento, e, ao mesmo tempo, o lugar do domicílio do sacado”24.

Além da qualificação do sacado25, a letra ainda deve conter o nome do tomador, ou seja, do credor-beneficiário, a quem deve ser paga a importância expressa no título. Diante da literalidade do art. 1º, n. 6, da Lei Uniforme, não é admissível letra de câmbio ao portador. É possível, todavia, a emissão da letra de câmbio sem a imediata indicação do credor--beneficiário, desde que o respectivo portador complete o título antes do protesto ou da execução judicial da cambial, tendo em vista a permissão consagrada no Enunciado 387 da Súmula do Supremo Tribunal Federal: “A cambial emitida ou aceita com omissões, ou em branco, pode ser completada pelo credor de boa-fé, antes da cobrança ou do protesto”.

À vista do n. 7 do art. 1º da Lei Uniforme26, a letra de câmbio deve conter a data e o local da emissão do título. Na ausência de designação do lugar onde a letra foi passada, considera-se emitida no local indicado ao lado do nome do emitente-sacador, por força do art. 2º, § 4º, da Lei Uniforme, e do art. 889, § 2º, do Código Civil. Não obstante, o mesmo não ocorre diante da falta da data da emissão. Com efeito, não é letra de câmbio o documento omisso acerca da data da emissão. É certo que a ausência da data da emissão pode ser sanada à luz do Enunciado 387 da Súmula do Supremo Tribunal Federal, ou seja, antes do protesto e da

21 E também em relação aos eventuais endossantes e avalistas!

22 Cf. art. 1º, n. 5, da Lei Uniforme.

23 Cf. art. 1º, n. 4, da Lei Uniforme.

24 Cf. art. 2º, § 3º, da Lei Uniforme.

25 Cf. art. 1º, n. 3, da Lei Uniforme.

26 E também do art. 889, caput, do Código Civil.

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propositura da execução da cambial. Se, entretanto, a falha não for sa-nada a tempo e modo, a falta da data da emissão retira do documento a força de título de crédito27.

Ao final, a letra deve conter a assinatura do sacador que emite a cambial, tendo em vista o disposto no art. 1º, n. 8, da Lei Uniforme, e no art. 889, caput, do Código Civil28. Diante de eventual impossibilidade de assinatura por parte do emitente-sacador, o título pode ser subscrito por procurador com o poder especial para assinar a letra de câmbio. Não obstante, o mandatário com poder especial para sacar a cambial não pode ser o próprio beneficiário do título, como bem assentou o antigo Tribunal de Alçada Cível do Rio de Janeiro, ao aprovar o Enunciado 16: “É nulo o título cambial emitido por procurador do mutuário, vinculado ao mutuante”29. Na mesma esteira, o Superior Tribunal de Justiça aprovou o Enunciado 60, inverbis: “É nula a obrigação cambial assumida por procurador do mutuário vinculado ao mutuante, no exclusivo interesse deste”30. Bem examinados os verbetes sumulares, é lícito concluir que o Enunciado 16 e o Enunciado 60 prestigiaram a conclusão n. 2 aprovada durante o 5º Encontro Nacional dos Tribunais de Alçada, em 1981: “É inválida a procuração outorgada por mutuário em favor de empresa pertencente ao grupo financeiro do mutuante, para assumir responsabi-lidade, de extensão não especificada, em títulos cambiais, figurando como favorecido o mutuante (aprovada por 14 votos contra 4)”31.

Ainda a respeito da elaboração do título, diante da omissão das leis especiais que versam sobre a letra de câmbio32, é admissível a emissão

27 De acordo, na jurisprudência: “A execução fundada em letra de câmbio, sacada sem data de emissão, é nula. Preliminar instalada e execução extinguida” (10ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0481.06.063258-7/001, DiáriodaJustiça, 7-11-2007).

28 Assim, na jurisprudência: 3ª Turma do STJ, REsp 264.174/PR, DiáriodaJustiça, 25-3-2002, p. 273.

29 Cf. DiárioOficial, 16-4-1996, p. 192.

30 De acordo, na jurisprudência: “– É nula a cláusula inserta em contrato de abertu-ra de crédito que autoriza o credor a sacar letra de câmbio contra o devedor, com base em saldo apurado de forma unilateral na sua conta-corrente. Incidência da Súmula 60-STJ” (4ª Turma do STJ, REsp 504.36/RS, DiáriodaJustiça, 27-6-2005, p. 399).

31 Cf. Minas Gerais, DiáriodoJudiciário, 26-2-1982, p. 1.

32 Vale dizer, a Lei Uniforme e o Decreto n. 2.044/1908.

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do título mediante sistema de computação, consoante o disposto no § 3º do art. 889 do Código Civil de 2002, cuja aplicação subsidiária é deter-minada pelo art. 903 do mesmo diploma.

Estudados os requisitos legais, já é possível imaginar um exemplo de letra de câmbio, tendo em vista o caso hipotético apresentado no anterior tópico 2 do presente capítulo:

Pormeiodapresenteletradecâmbio,oemitente-sacadorB,inscritonoCa-dastrodePessoasFísicassobon.222.222-22,domiciliadoemBeloHorizonte,noendereçoX,ordenaaosacadoA,inscritonoCadastrodePessoasFísicassobon.111.111-11,domiciliadoemBrasília,noendereçoY,quepagueemproldotomador-beneficiárioC,inscritonoCadastrodePessoasFísicassobon.333.333-33,domiciliadoemBrasília,noendereçoZ,nodia31dejaneirode2010,omontantedeR$10.000,00(dezmilreais),aserpagonoendereçodotomador-beneficiárioC,emBrasília,sobpenade1%(umporcento)dejurosdemoraaomês.

Passadaem31dejulhode2009,emBeloHorizonte.

Assinadapeloemitente-sacadorB.

4. Título incompleto: Enunciado 387 da Súmula do STFAo contrário do que pode parecer à primeira vista, a emissão in-

completa não impede que a cártula obtenha a natureza jurídica de título do crédito33. À luz dos arts. 3º e 4º do Decreto n. 2.044/1908 c/c o art. 891 do Código Civil de 2002 e com o Enunciado 387 da Súmula do Supremo Tribunal Federal, o documento apenas assinado ou emitido com omissões pode ser completado pelo portador de boa-fé, desde que a complemen-tação ocorra antes do protesto ou da execução judicial.

33 Colhe-se do voto condutor proferido pelo Supremo Tribunal Federal no julga-mento do RE 81.996/SP: “A Lei Brasileira e a Lei Uniforme autorizam a emissão de cambiais em branco, com irrestrita circulabilidade. E, na ensinança doutrinária, o mínimo exigível para existência de uma letra em branco é uma firma cambia-riamente utilizável (Cfr. WHITAKE, ‘Letra de Câmbio’, 95). E, entre o mínimo, que é esse, e o máximo, que está no título completo, é indiferente a quantidade de dizeres omitidos. E, ‘qualquer que seja o número ou a importância dos requisitos omitidos, a letra em branco pode ser validamente completada’. E o preenchimen-to, sendo tácito o mandato outorgado ao possuidor, não minimiza o valor da cambial”.

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Em contraposição, se o documento contiver omissão no momento do protesto ou da execução judicial, não será considerado letra de câm-bio, conforme revela a regra extraída do § 1º do art. 2º da Lei Uniforme.

5. Aceite

5.1. Conceito

O aceite é a declaração unilateral de vontade por meio da qual o sacado – ou terceira pessoa34 – assume a responsabilidade pelo pagamen-to da quantia indicada no título de crédito, na qualidade de devedor principal.

5.2. Ato unilateral de vontade

Por ser o aceite ato unilateral de vontade, o sacado – ou o terceiro – não pode ser obrigado a aceitar o título35, nem mesmo quando a pessoa designada para aceitar é devedora do emitente-sacador em razão de outra relação jurídica pretérita. Na eventualidade de recusa do sacado em aceitar o título, resta a possibilidade da propositura de demanda própria36, para a respectiva cobrança do anterior crédito que o emitente--sacador tem em relação ao sacado. Já o credor-beneficiário poderá protestar o título e acionar desde logo o emitente-sacador mediante execução forçada, tudo nos termos do art. 43, caput, da Lei Uniforme, c/c o art. 585, I, do Código de Processo Civil.

5.3. Aceite por intervenção

Em regra, o aceite tem como destinatário o sacado. A regra, todavia, comporta exceção, a qual reside no art. 55 da Lei Uniforme. Trata-se do denominado “aceite por intervenção”, quando o emitente-sacador indi-ca terceira pessoa para aceitar a letra de câmbio. A pessoa indicada, en-tretanto, tem dois dias úteis para a aceitação. O terceiro designado pelo emitente-sacador pode aceitar a letra, ou não. Se aceitar, passa a ser de-

34 Cf. art. 55 da Lei Uniforme de Genebra.

35 “– O sacado pode, a seu talante, recusar-se a assumir a obrigação cambial, sendo certo que a falta de aceite elide o vínculo ao pagamento do título” (3ª Turma do STJ, REsp 511.387/GO, DiáriodaJustiça, 1º-8-2005, p. 438).

36 Por exemplo, cobrança sob o procedimento comum.

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nominado “aceitante-interveniente”. Se for silente e deixar o prazo de dois dias úteis correr inalbis, não assume a obrigação cambial, mas pode ser responsabilizado na esfera civil, por perdas e danos, com o valor da indenização limitado à importância da letra, tudo nos termos do art. 55 da Lei Uniforme.

5.4. Lançamento do aceite

O sacado não é responsável pelo pagamento da letra de câmbio em razão da simples ordem do emitente-sacador do título. Com efeito, a mera emissão da letra não torna o sacado obrigado pelo pagamento37. O sacado somente passa a ser o devedor principal quando aceita a respec-tiva ordem38, mediante simples assinatura lançada no anverso ou face da letra.

O aceite também pode ser lançado no verso do título, com a apo-sição da assinatura acompanhada dos vocábulos “aceite”, “aceito”, “concordo”, “pagarei” ou “honrarei”, como bem autoriza o § 1º do art. 25 da Lei Uniforme, inverbis: “O aceite é escrito na própria letra. Expri-me-se pela palavra ‘aceite’ ou qualquer outra palavra equivalente; o aceite é assinado pelo sacado. Vale como aceite a simples assinatura do sacado aposta na parte anterior da letra”.

O sacado que aceita a ordem passa a ser denominado “aceitante” e assume a qualidade de devedor principal da letra, exvi do art. 28 da

37 De acordo, na jurisprudência: “Letra de câmbio. Ausência de aceite. A simples emissão de letra de câmbio não importa criação de vínculo cambial por parte do sacado que se absteve de aceitá-la” (3ª Turma do STJ, REsp 89.599/RS, DiáriodaJustiça, 18-5-1998, p. 82). “Letra de câmbio. Aceite inexistente. Responsabilidade do sacado inexistente. A letra de câmbio contém uma ordem de pagamento, ca-bendo àquele a quem é dada a ordem declarar se está disposto a cumpri-la ou não. Enquanto a letra não for aceita o sacado nenhuma responsabilidade tem em rela-ção ao sacador do título” (1ª Câmara Cível do TAMG, Apelação 2.0000.00.314229-0/000, DiáriodaJustiça, 23-9-2000).

38 Assim, na jurisprudência: “Não se obriga cambialmente o sacado que não aceita a letra de câmbio” (3ª Turma Cível do TJDF, Apelação n. 3700895, DiáriodaJustiça, 22-11-1995, p. 17524). “O aceite em letra de câmbio tem como função principal vincular o sacado à obrigação, tornando-o responsável pelo pagamento da impor-tância nela consignada. A simples indicação do nome do sacado na letra não tem o condão de originar obrigação cambiária, sendo necessária, para tanto, a expres-sa aposição do aceite” (17ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0707.08.154246-6/001, DiáriodaJustiça, 28-1-2009).

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Lei Uniforme. Aliás, aceito o título, o aceitante não pode cancelar nem retirar o “aceite”, exvi do art. 12 do Decreto n. 2.044/1908.

Por fim, ainda que aceita a letra, o emitente-sacador preserva a qualidade de coobrigado, razão pela qual ainda pode ser acionado, na eventualidade da posterior negativa de pagamento por parte do sacado- -aceitante39.

5.5. Subsistência da letra não aceita

A ausência do aceite não retira a validade nem a eficácia da letra de câmbio40. Ainda que não aceita, a letra subsiste como título de crédi-to, com a possibilidade de o credor-beneficiário acionar o emitente-sa-cador, o qual, como já anotado, é coobrigado por força do caputdo art. 43 da Lei Uniforme, em razão da emissão do título.

5.6. Letras de câmbio sujeitas a aceite e respectivos prazos

A Lei Uniforme revela que a letra de câmbio pode ser “à vista”, “a um certo termo de vista”, “a um certo termo da data” e com “dia fixado” para o vencimento, tudo nos termos do art. 33 da Convenção de Genebra. O mesmo diploma também estabelece prazos máximos para que o credor- -beneficiário busque o aceite, mas somente nas letras de câmbio a prazo, porquanto a letra de câmbio à vista já é apresentada para pagamento41.

Com efeito, a letra à vista pode ser apresentada para pagamento imediato a qualquer momento, desde que dentro de um ano da data da emissão, como bem revela o proêmio do art. 34 da Lei Uniforme: “A letra

39 Cf. art. 43, caput, da Lei Uniforme.

40 De acordo, na jurisprudência: “O aceite na letra de câmbio não é requisito essen-cial à sua validade, podendo a cártula circular sem a assinatura do sacado” (9ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0137.06.000233-4/001, DiáriodaJustiça, 26-4-2008).

41 De acordo, na jurisprudência: “A apresentação da letra de câmbio sacada à vista é para pagamento, não comportando, portanto, apresentação para aceite. Com efeito, mostra-se regular o protesto por falta de pagamento de letra de câmbio sacada à vista, mesmo sem a presença do aceite do sacado” (17ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0481.02.015974-7/001, DiáriodaJustiça, 28-1-2009). “– É viável o protesto por falta de pagamento de letra de câmbio sacada à vista, mesmo sem o aceite do sacado” (3ª Turma do STJ, REsp 646.519/RS, DiáriodaJustiça, 30-5-2005, p. 373).

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à vista é pagável à apresentação. Deve ser apresentada a pagamento dentro do prazo de 1 (um) ano, a contar de sua data”. A omissão quanto ao cumprimento do prazo ocasiona a impossibilidade de ação cambial contra o emitente-sacador e demais coobrigados, exvi do art. 53, item 1 e § 2º, da Lei Uniforme, inverbis: “Depois de expirados os prazos fixados: – para a apresentação de uma letra à vista ou a certo termo de vista; omis-sis. O portador perdeu os seus direitos de ação contra os endossantes, contra o sacador e contra os outros coobrigados, à exceção do aceitante”.

A cambial “a um certo termo de vista” é letra a prazo cujo venci-mento ocorre com a contagem do lapso somente depois do aceite, isto é, da data em que a letra é apresentada para o lançamento do aceite. O aceite deve ser datado, para possibilitar a contagem do prazo de ven-cimento. O credor-beneficiário deve apresentar o título para aceite dentro de um ano do saque, ou seja, da emissão do título, consoante dispõe o art. 23 da Lei Uniforme: “As letras a certo termo de vista devem ser apresentadas ao aceite dentro do prazo de 1 (um) ano das suas datas”. Tal como se dá na letra à vista, a omissão quanto ao cumpri-mento do prazo também impede a ação cambial contra o emitente- -sacador e demais coobrigados, consoante o disposto no art. 53, item 1 e § 2º, da Lei Uniforme42.

A letra “a um certo termo da data” também é título a prazo, mas o vencimento se dá com o decurso do lapso fixado no título à luz da data da emissão estampada na cártula43. É possível a apresentação da letra para o aceite do sacado até o vencimento estipulado no título, consoan-te o disposto no art. 21 da Lei Uniforme: “A letra pode ser apresentada, até o vencimento, ao aceite do sacado, no seu domicílio, pelo portador ou até por um simples detentor”.

Já a letra “pagável num dia fixado” é título a prazo com expressa indicação do próprio dia do vencimento, “em data certa”. Em virtude da regra inserta no art. 21 da Lei Uniforme, a letra “em data certa” é passível de apresentação para aceite do sacado até o dia do vencimento estampado na cártula.

42 Assim, na doutrina: “A letra de câmbio com vencimento a certo termo de vista deve ser apresentada para aceite até um ano de sua respectiva data. Por falta ou recusa de aceite, pode ser protestada, também no prazo de até um ano de sua emissão, caso em que o portador conserva os seus direitos de ação contra os obri-gados de regresso” (Wille Duarte Costa, Títulosdecrédito, 3. ed., 2007, p. 167).

43 Por exemplo, dois meses da data do saque da letra, em 1º-9-2010.

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Resta saber se a apresentação para aceite nos respectivos prazos é obrigatória ou facultativa em relação às letras “a um certo termo da data” e “pagável num dia fixado”. Autorizada doutrina sustenta a tese da fa-cultatividade44. Em contraposição, abalizada doutrina sustenta a tese da obrigatoriedade45. Ainda que muito respeitável a tese da obrigatoriedade da apresentação para aceite das letras “a um certo termo da data” e “pa-gável num dia fixado”, o art. 21 da Lei Uniforme revela a facultatividade quando dispõe que a letra “pode” ser apresentada. Já o art. 23 estabelece que as letras “a certo termo de vista devem ser apresentadas ao aceite”. Mutatismutandis, o art. 34 determina que a “letra à vista” “deve ser apre-sentada a pagamento”. Daí a justificativa para o disposto no art. 53, o qual exige a apresentação – para aceite e para pagamento, respectivamente – da “letra à vista ou a certo termo de vista”. À luz da interpretação sistemá-tica dos arts. 21, 23, 34 e 53 da Lei Uniforme, portanto, é lícito concluir que, no que tange às letras “a um certo termo da data” e “pagável num dia fixado”, é facultativa a apresentação para aceite.

5.7. Pedido de nova apresentação da letra

Apresentada a letra de câmbio para o aceite do sacado, tem o mes-mo o prazo previsto no art. 24 da Lei Uniforme, segundo o qual o sacado pode pedir nova apresentação da letra no dia seguinte ao da apresenta-ção original, a fim de permitir melhor reflexão sobre o lançamento do aceite, ou não46.

Não obstante, o credor-beneficiário não é obrigado a deixar a letra apresentada ao aceite nas mãos do sacado47. Aliás, nem é conve-

44 “Quando certa a data do vencimento, a apresentação do título para aceite é facul-tativa” (Wille Duarte Costa, Títulosdecrédito, 3. ed., 2007, p. 166).

45 Cf. Fábio Ulhoa Coelho, Manualdedireitocomercial: direito de empresa, 20. ed., 2008, p. 249: “A letra de câmbio a certo termo da data, que é aquela cujo venci-mento se opera com o transcurso de lapso temporal em que a data do saque é o termo aquo, e a letra de câmbio em data certa devem ser apresentadas a aceite, pelo tomador, até o vencimento fixado para o título (art. 21). A inobservância desses prazos pelo credor acarreta a perda do direito de cobrança do título contra os coobrigados (art. 53)”.

46 Na eventualidade de o sacado ter solicitado uma segunda apresentação no dia seguinte, há a prorrogação do prazo referente ao protesto para o dia seguinte (arts. 24, primeira parte, e 44, § 2º, infine, da Lei Uniforme).

47 Cf. art. 24, infine, da Lei Uniforme.

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niente que o faça, para evitar o risco de retenção indevida da letra pelo sacado48.

5.8. Apreensão de título sonegado pelo sacado

Na eventualidade de retenção indevida da letra pelo sacado, no momento da apresentação para o aceite, há a possibilidade do ajuiza-mento de demanda destinada à apreensão do título, com fundamento nos arts. 885 e 886 do Código de Processo Civil49.

Na esteira do antigo parágrafo único do art. 31 do Decreto n. 2.044/1908, o art. 885 do Código de 1973 autoriza até mesmo a decreta-ção de prisão do sacado sonegador do título de crédito. Não obstante, ambos os preceitos são incompatíveis com o art. 5º, LXVII, da Constitui-ção Federal de 1988, porquanto dispõem sobre espécie de prisão civil sem previsão constitucional50. Por conseguinte, a demanda fundada nos

48 Em reforço, bem ensina a doutrina: “A alínea segunda do art. 24 da Lei Uniforme prescreve que ‘O portador não é obrigado a deixar nas mãos do aceitante a letra apresentada ao aceite’. A regra encontra plena justificativa, pois, como é evidente, a ação cambiária somente poderá ser exercida pelo credor mediante a exibição do título no processo de execução” (Carlos Alberto Alvaro de Oliveira, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. VIII, t. II, 7. ed., 2005, p. 419).

49 A despeito do disposto no art. 885 do Código de Processo Civil, há séria diver-gência acerca da natureza cautelar da demanda para a apreensão de título. Em prol da natureza cautelar, na doutrina: “A não devolução do título por aquele que deveria praticar algum ato cambial é ilegal e permite ao prejudicado pedir a apreensão do título (art. 885). O pedido de apreensão é feito em processo cautelar, preparatório da futura execução ou cobrança do título” (Vicente Greco Filho, DireitoProcessualCivilBrasileiro, v. III, 3. ed., 2006, p. 193). Contra a natureza cau-telar, também na doutrina: “O caráter satisfativo e não cautelar da ação, não de-pendente de outra, importa excluir, contudo, a incidência dos arts. 801 e 806. A petição inicial, por isso, obedecerá ao disposto no art. 282. Em caso de receio de lesão poderá ser decretado initiolitis, ou no curso do procedimento, a apreensão do título. Tratar-se-á, então, de antecipação dos efeitos da sentença final, autori-zada pelo art. 273” (Carlos Alberto Alvaro de Oliveira, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. VIII, t. II, 7. ed., 2005, p. 422).

50 De acordo, na doutrina: “Essa prisão, a despeito de regulada no Código, não é compatível com o sistema constitucional vigente. A Constituição Federal somente admite a prisão por dívida no caso de depositário infiel ou inadimplemento de obrigação alimentícia (art. 5º, LXVII). Em nenhuma dessas exceções enquadra-se a hipótese do detentor que retém o título em vez de pagá-lo ou de aceitá-lo. O fato pode constituir, até, infração penal, mas deve ser apurado e punido nos termos do processo penal regular, garantida ampla defesa. A lei não equipara esse detentor

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arts. 885 e 886 do Código de Processo Civil pode ser ajuizada para a apreensão de título sonegado, mas o réu não pode ser preso no respec-tivo processo civil.

5.9. Recusa do aceite: vencimento antecipado ou extraordinário

Na eventualidade de recusa do aceite pelo sacado, há o vencimen-to antecipado ou extraordinário da letra de câmbio, com a possibilidade

ao depositário infiel nem tem ele essas características, daí a conclusão de que a decretação da prisão é inviável por não ser consentânea com o sistema constitucio-nal atual. A previsão da lei cambiária era justificável dada a época em que foi editada. Não podia, porém, o Código de 1973 desconsiderar a posterior disciplina constitucional. Quanto à apreensão por ordem judicial, continua admissível, mas sem a cominação de prisão civil. O pedido de apreensão obedecerá ao procedimen-to geral cautelar” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 194). No mesmo sentido, também na doutrina: Carlos Alberto Alvaro de Oliveira, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. VIII, t. II, 7. ed., 2005, p. 422-424.

Com outra opinião, entretanto, também há respeitável doutrina: Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, 18. ed., 1992, p. 339: “Esses princípios não derrogaram a velha regra do direito anterior, confirmada pelo art. 885, do Código de Processo Civil (1973), de que aquele que recusar a entrega da letra que a recebeu para firmar o acei-te (ou para o pagamento), pode ser compelido a fazê-lo sob pena de prisão, que será evitada se restituir a letra ou depositar a soma cambial e as despesas. Já se sustentou alhures que essa regra moralizadora é inconstitucional, pois não suporta nosso direi-to a prisão por dívida. Não se trata, ao nosso ver, de prisão por dívida, mas de emba-raço na circulação de título de crédito, e a prisão é de ordem administrativa, decreta-da pelo juiz do cível”. Também com opinião contrária, em abalizada doutrina: Fábio Ulhoa Coelho, Manualdedireitocomercial: direito de empresa, 20. ed., 2008, p. 249: “O sacado que retém, indevidamente, a letra de câmbio que lhe foi apresentada para aceite – ou o devedor, em caso de entrega para pagamento – está sujeito a prisão ad-ministrativa, que deverá ser requerida ao juiz, nos termos do art. 885 do CPC. Trata-se de medida coercitiva, de natureza civil, destinada a forçar a restituição da letra ao seu portador legitimado”. Ainda em sentido contrário, há autorizada doutrina: Alexandre Freitas Câmara, Liçõesdedireitoprocessualcivil. v. III, 11. ed., 2006, p. 281: “Apesar disso, porém, parece-nos legítima a prisão civil do devedor que sonega o título de crédito, não o restituindo ao credor. Isto porque, neste caso, não se estará diante de prisão em razão do descumprimento da obrigação do direito privado. O que se tem, aqui, é prisão pelo descumprimento do comando contido na decisão judicial. Assim, é compatível com o sistema constitucional a prisão do demandado que, condenado a restituir ao demandante o título sonegado, não o faz. A prisão incidirá, aqui, como meio de coerção, destinada a constranger psicologicamente o demandado a cumprir a prestação a que foi condenado”. Por fim, há precedente jurisprudencial da Corte Suprema que autoriza a prisão: “– Prisão de sonegador de duplicata enviada para aceite. Sua legalidade. Habeascorpus indeferido” (1ª Turma do STF, HC 52.613/SP, julgado em 24-9-1974 e publicado em 6-11-1974).

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de o credor-beneficiário acionar desde logo o emitente-sacador, para o imediato pagamento do título mediante execução forçada, bem como requerer a respectiva falência, conforme a qualidade do emitente-saca-dor51, tudo nos termos do art. 43, n. 1, da Lei Uniforme, do art. 585, I, do Código de Processo Civil, e dos arts. 1º e 94, I e II, ambos da Lei n. 11.101/2005.

Por fim, a denegação do aceite é comprovada mediante o protesto do título, à vista do art. 44 da Lei Uniforme e do art. 13 do Decreto n. 2.044/190852.

5.10. Aceite parcial ou qualificado

Além da recusa total, o art. 26 da Lei Uniforme permite o aceite parcial ou qualificado, com a limitação da aceitação a uma parte da importância53 ou com a modificação de cláusula do título54, quando o sacado passa a ser devedor da importância na parte e no modo em que foi aceita a letra. Tanto o aceite limitativo quanto o modificativo, todavia, conduzem ao imediato vencimento da letra, com a possibilidade de execução imediata contra o emitente-sacador, com fundamento no art. 43, n. 1, da Lei Uniforme.

5.11. Cláusula impeditiva de apresentação ou cláusula não aceitável

Para impedir o vencimento antecipado da letra de câmbio em razão da recusa total ou parcial do aceite pelo sacado55, o emitente--sacador pode incluir cláusula “impeditiva da apresentação”56 no bojo do título.

51 Se o sacador for empresário individual ou sociedade empresária, há lugar para a propositura de ação de falência, com fundamento no art. 43, n. 1, da Lei Uniforme, e no art. 94 da Lei n. 11.101/2005.

52 De acordo, na doutrina: “Essa prova da apresentação, não havendo aceite no tí-tulo, faz-se pela certidão do protesto cambial” (Wille Duarte Costa, Títulosdecrédito, 3. ed., 2007, p. 168).

53 Aceite limitativo.

54 Aceite modificativo.

55 Hipótese na qual o emitente-sacador assume de imediato a responsabilidade cambial por força do art. 43 da Lei Uniforme.

56 Cf. Wille Duarte Costa, Títulosdecrédito, 3. ed., 2007, p. 168.

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Com efeito, a cláusula “não aceitável” impede a apresentação da letra ao sacado antes do dia do vencimento. Por consequência, o título somente pode ser apresentado ao sacado no prazo designado para o pagamento.

Não obstante, tal faculdade conferida ao emitente-sacador não al-cança as letras emitidas a certo termo de vista, bem como as letras pagá-veis em domicílio de terceiro ou em localidade diferente do lugar do domicílio do sacado, tudo por força do art. 22 da Lei Uniforme.

Outra proteção conferida pelo mesmo art. 22 da Lei Uniforme consiste na possibilidade de o emitente-sacador estipular uma data antes da qual não é admissível a apresentação da letra para o aceite do sacado.

Por fim, o emitente-sacador também pode fixar um prazo para a posterior apresentação do título para o aceite do sacado57, a fim de que a respectiva obrigação cambial não subsista se o credor-beneficiário não observar o prazo fixado na letra.

6. Endosso

6.1. Origem e significado do vocábulo “endosso”

A palavra “endosso” é proveniente da expressão latina “indorso”, a qual pode ser traduzida à luz das seguintes expressões: “no dorso”, “nas costas”, “no verso”.

6.2. Conceito de endosso

O endosso é o ato unilateral de vontade que ocasiona a transferência dos direitos referentes aos títulos de crédito à ordem. A propósito do con-ceito de endosso, vale conferir o disposto no art. 14, § 1º, da Lei Uniforme: “O endosso transmite todos os direitos emergentes da letra”. Não obstante, a transferência por endosso só se completa quando há a tradição do título58.

6.3. Endosso: forma de transferência dos títulos de crédito

A titularidade do crédito consubstanciado em documento próprio pode ser transferida de três formas: – pela simples tradição, se o título

57 Cf. art. 22, § 1º, da Lei Uniforme.

58 Cf. art. 910, § 2º, do Código Civil.

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for ao portador, ou seja, sem indicação do credor; – pelo endosso e a posterior tradição, se o título for nominativo à ordem, isto é, com indi-cação do credor e pagável ao próprio ou à sua ordem; – pela cessão civil de crédito, acompanhada da tradição, se o título for nominativo não à ordem.

Em suma, o endosso é uma forma de transmissão dos direitos provenientes dos títulos de crédito.

6.4. Endosso e cessão de crédito

O endosso não se confunde com a cessão civil de crédito, também denominada “cessão ordinária de crédito”59.

Em primeiro lugar, o endosso é um instituto de direito cambiário60, próprio dos títulos de crédito, enquanto a cessão de crédito é instituto de direito civil61.

Em segundo lugar, o endosso é ato unilateral de vontade, enquan-to a cessão civil é contrato bilateral62.

Em regra, o endosso torna o endossante coobrigado pelo pagamen-to63, o que não ocorre na cessão civil de crédito, salvo estipulação em contrário64.

Por outro lado, o devedor precisa ser comunicado mediante noti-ficação da transferência do crédito objeto da cessão civil65, comunicação que é dispensável para que o endosso seja válido e eficaz.

Por fim, na cessão civil de crédito, o devedor acionado pelo cessio-nário pode suscitar as defesas existentes contra o cedente66. Já o endos-

59 Cf. arts. 11, § 2º, e 20, § 1º, infine, ambos da Lei Uniforme.

60 Cf. arts. 910 e s. do Código Civil.

61 Cf. arts. 286 e s. do Código Civil.

62 Assim, na doutrina: “São os dois institutos, de fato, inconfundíveis, pois o endos-so é o ato unilateral de declaração de vontade que impõe forma escrita, ao passo que a cessão é um contrato bilateral, que pode concluir-se de qualquer forma” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, 18. ed., 1992, p. 331).

63 Cf. art. 15, § 1º, da Lei Uniforme.

64 Cf. art. 296 do Código Civil.

65 Cf. art. 290 do Código Civil.

66 Cf. art. 294 do Código Civil.

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satário é protegido pelo princípio da inoponibilidade das exceções pessoais anteriores67, razão pela qual as eventuais defesas cabíveis em relação ao endossante não podem ser suscitadas contra o endossatário, em virtude da autonomia do título de crédito68. Por conseguinte, as defesas pessoais do devedor em relação ao endossante não são suscitáveis contra o endossatário terceiro de boa-fé.

6.5. Endosso e letra de câmbio

A letra de câmbio é título de crédito à ordem transmissível median-te endosso, até mesmo na falta da cláusula “à ordem” no bojo da cártu-la, porquanto o silêncio gera a presunção de que o título é “à ordem”, por força do art. 11, § 1º, da Lei Uniforme.

Em contraposição, não há a transferência mediante endosso de letra com expressa cláusula “não à ordem”. A transmissão do título de crédito é juridicamente possível, mas tem natureza de cessão civil de crédito, ou seja, cessão ordinária de crédito69.

6.6. Sujeitos do endosso

São dois os sujeitos que participam do endosso: – endossante ou endossador, pessoa que transfere o crédito inserto no título a outrem; – endossatário ou endossado, pessoa a quem o crédito inserto no título é transferido.

Por ser instituto de direito cambiário, o endosso consiste na trans-missão de direito creditício proveniente do título de crédito de forma onerosa70. Por conseguinte, o endossante pode ser denominado “alie-nante”, enquanto o endossatário também é chamado “adquirente”. Nada impede, entretanto, que o endosso seja lançado independentemente de contraprestação do endossatário, mediante ato gracioso do endossante.

67 Cf. arts. 17 da Lei Uniforme e 916 do Código Civil.

68 Cf. art. 887 do Código Civil.

69 Cf. art. 11, § 2º, da Lei Uniforme.

70 Assim, na doutrina: “Logicamente, não se cuida de ato gratuito: o endossante irá receber do endossatário pelo menos uma parte do valor do título de crédito” (Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, v. I, 11. ed., 2007, p. 403).

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6.7. Lançamento do endosso

À vista do art. 13 da Lei Uniforme e do art. 910, § 1º, do Código Civil, o endosso é lançado mediante simples assinatura aposta no verso do título de crédito.

Não obstante, também é admissível o lançamento do endosso no anverso ou face do título, desde que com a expressa indicação do bene-fício (“endosso”) ou do beneficiário (“endosso em favor de ...”), tudo nos termos do art. 13, § 2º, da Lei Uniforme, e do art. 910, caput, do Código Civil.

Não há limite ao número de endossos lançados na letra de câmbio. Por conseguinte, é possível o lançamento de inúmeros endossos na cártula. Na eventualidade de o verso e o anverso do título não compor-tarem novo endosso, por falta de espaço físico, o lançamento do endos-so pode ser feito no alongamento ou alongue, folha própria em conti-nuação ao título71.

6.8. Modalidades de endosso

O endosso pode ser “em branco” (ou ao portador) ou “em preto” (ou nominativo). O endosso “em branco” consiste no lançamento da assinatura do endossante no título, mas sem a indicação do endossatário, ou seja, do beneficiário da transferência. Em contraposição, o endosso “em preto” consiste no lançamento da assinatura do endossante no títu-lo, com a explícita identificação do endossatário, novo beneficiário do crédito.

Por fim, nada impede que um título nominativo seja convertido em título ao portador, em virtude de um endosso “em branco”.

6.9. Endosso incondicionado

À vista do art. 12, § 1º, da Lei Uniforme, e do art. 912, caput, do Código Civil, não tem eficácia a subordinação do endosso ao advento

71 De acordo, na doutrina: “Pode, todavia, faltando espaço no verso do título, ser escrito numa folha de extensão, ligada ao corpo do título, conforme sempre se admitiu no direito brasileiro, e a que a Lei Uniforme faz referência expressa (art. 13). Essa folha é chamada, como vimos anteriormente, extensão, alongue, alonga-mento ou folha de alongamento” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, v. II, 18. ed., 1992, p. 332).

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ou ao cumprimento de condição alguma: “Qualquer condição a que ele seja subordinado considera-se como não escrita”.

6.10. Endosso parcial: nulidade

À vista do art. 12, § 2º, da Lei Uniforme, com o reforço do art. 912, parágrafo único, do Código Civil, não é admissível a limitação do en-dosso a uma parte do valor da letra: “O endosso parcial é nulo”.

6.11. Efeitos do endosso

Em regra, o endosso produz duas consequências jurídicas: trans-fere a titularidade do crédito consubstanciado na letra de câmbio, exvi do art. 14, § 1º, da Lei Uniforme, e torna o endossante coobrigado, por ser também responsável pelo aceite e pelo pagamento da letra, tendo em vista a combinação do art. 15, § 1º, com o art. 43, caput, ambos da Lei Uniforme.

A propósito, diante da existência de preceitos específicos acerca da letra de câmbio72, não incide o caput do art. 914 do Código Civil, por-quanto o art. 903 do mesmo diploma prestigia a legislação especial existente. Sem dúvida, a incidência do Código Civil de 2002 é apenas subsidiária, ou seja, só é aplicável quando a legislação especial é omissa. A propósito, reforça o Enunciado 52, aprovado nas Jornadas de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal: “Art. 903: por força da regra do art. 903 do Código Civil, as disposições relativas aos títulos de crédito não se aplicam aos já existentes”.

Por fim, o endossante pode incluir a expressão “sem garantia” em conjunto com o endosso. Inserida a cláusula “sem garantia”, o endossan-te deixa de ser coobrigado73. É o denominado “endosso sem garantia”, por meio do qual há a transferência da titularidade do crédito, mas o en-dossante não tem responsabilidade alguma pelo respectivo pagamento.

6.12. Endossos impróprios

É considerado endosso impróprio o ato que, a despeito da deno-minação ou da aparência de endosso, não transfere a propriedade do

72 Cf. arts. 15 e 43 da Lei Uniforme.

73 Cf. art. 15, § 1º, da Lei Uniforme.

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título ou não torna o endossante coobrigado. O endosso-mandato, o endosso-caução, o endosso-póstumo, por exemplo, são espécies de en-dosso impróprio.

6.12.1. Endosso-mandato ou endosso-procuração

O endosso-mandato é o ato pelo qual o endossante não transfere o crédito proveniente do título em prol do endossatário, o qual atua como mero procurador, para simples cobrança e recebimento do crédito em nome do endossante74. A propósito, merece ser prestigiado o fundamen-to do Enunciado 99 da Súmula do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro: “No endosso mandato não há transferência do crédito, de forma que o endossatário age na condição de mandatário do endossante”. Em suma, o endosso-mandato transfere a posse, mas não a propriedade do título de crédito75.

O endosso-mandato é lançado no título de crédito por meio da anotação de alguma das expressões legais (“valor a cobrar”, “para co-brança”, “por procuração”) ou outra equivalente76, em conjunto com o

74 No mesmo sentido, na doutrina: “Transmite-se ao mandatário-endossatário, assim investido de mandato e da posse do título, o poder de efetuar a cobrança, dando quitação de seu valor. Desse modo se transfere a posse da letra, mas não a dispo-nibilidade de seu valor, cujo crédito pertence ao endossante” (Rubens Requião, Cursodediretocomercial, 18. ed., 1992, p. 334). Em sentido conforme, na jurispru-dência: “O endosso-mandato não transfere ao mandatário a propriedade do títu-lo endossado ou do crédito por ele representado” (3ª Turma do STJ, REsp 830.481/MG – AgRg, DiáriodaJustiça, 18-11-2006, p. 392).

75 Assim, na jurisprudência: “I – Na linha da orientação deste Tribunal, no endosso--mandato, por não haver transferência da propriedade do título, o mandante é responsável pelos atos praticados por sua ordem pelo banco endossatário” (4ª Turma do STJ, REsp 389.879/MG, DiáriodaJustiça, 2-9-2002, p. 196). “– O endosso--mandato, limitando-se a instituir quem cuide da cobrança do crédito consignado na cártula, não transfere quaisquer direitos ao mandatário, senão o de receber e praticar outros atos em nome do mandante ou endossante” (14ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0134.03.038029-6/001, DiáriodaJustiça, 7-2-2006).

76 De acordo, na jurisprudência: “O endosso-mandato não transmite direitos emer-gentes do título nem transfere a propriedade da letra, mas simplesmente a sua posse. O detentor do título por endosso-mandato recebe-o e pratica todos os atos de proprietário do mesmo, mas o faz como simples mandatário, representando e obrigando, nesse caso, o mandante ou endossante (Fran Martins). Entende-se como endosso-mandato – e como tal será tido – aquele pelo qual terceiro repassa o títu-lo a entidade bancária para promover sua cobrança, tal como o revela a praxe

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endosso, nos termos do art. 18 da Lei Uniforme e do art. 917 do Código Civil.

Resta saber se há extinção do endosso-mandato em razão do fale-cimento ou da superveniente incapacidade do endossante, tal como ocorre com o mandato civil, exvi do art. 682, II, do Código Civil. A res-posta negativa é encontrada tanto no último parágrafo do art. 18 da Lei Uniforme quanto no § 2º do art. 917 do Código Civil, inverbis: “Com a morte ou a superveniente incapacidade do endossante, não perde eficá-cia o endosso-mandato”.

6.12.2. Endosso-caução, endosso-penhor ou endosso-pignoratício

Por ser bem móvel, a letra de câmbio pode ser objeto de penhor, como garantia de eventual credor do endossante, nos termos do art. 1.431 do Código Civil77. Não obstante, não há a transferência imediata do crédito com o endosso-penhor, mas apenas a posse do título, com a possibilidade da cobrança e do recebimento da quantia expressa na letra, como garantia78. O crédito, entretanto, continua sob a titularidade do endossante, desde que a obrigação garantida por meio da letra seja cumprida79.

comercial” (1ª Turma Cível do TJDF, Apelação 39.603/96, DiáriodaJustiça, 19-3-1997, p. 4421).

77 Assim, na doutrina: “No endosso-caução ou pignoratício, o título é onerado por penhor em favor de credor do endossante, de modo que, cumprida a obrigação garantida pelo penhor, o título retorna ao endossante. No endosso-caução, o en-dossatário exerce direito que lhe é próprio, assegurado pelo título creditício, pois não é mero representante do credor originário. Difere, pois, do endosso-mandato, em que o endossatário é simples detentor do título e age em nome do endossante- -mandante” (Waldo Fazzio Júnior, Manualdedireitocomercial, 7. ed., 2006, p. 387).

78 De acordo, na jurisprudência: “O endosso-caução não transfere ao endossatário o crédito consolidado no título, mas apenas a sua posse, para garantia do crédito daquele” (11ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 2.0000.00.518639-6/000, DiáriodaJustiça, 7-4-2006).

79 Assim, na doutrina: “No endosso-caução, o crédito não se transfere para o endos-satário, que é investido na qualidade de credor pignoratício do endossante. Cumprida a obrigação garantida pelo penhor, deve a letra retornar à posse do endossante. Somente na eventualidade de não cumprimento da obrigação garan-tida, é que o endossatário por endosso-caução apropria-se do crédito representa-do pela letra” (Fábio Ulhoa Coelho, Manualdedireitocomercial: direito de empresa, 18. ed., 2006, p. 252).

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O endosso-caução é lançado no título de crédito por meio da ano-tação de alguma das expressões legais (“valor em garantia” ou “valor em penhor”) ou outra equivalente, em conjunto com o endosso, nos termos do art. 19 da Lei Uniforme e do art. 918 do Código Civil.

6.12.3. Endosso-póstumo ou endosso tardio

À vista do art. 20 da Lei Uniforme, tem valor jurídico de mera cessão civil de crédito o endosso posterior ao vencimento do título e também lançado depois do respectivo protesto ou do prazo para a rea-lização do protesto80. Sem dúvida, expirado o prazo para o protesto do título, o ulterior endosso tem efeito de cessão civil de crédito, razão pela qual não incide o princípio da inoponibilidade das exceções pessoais.

Subsiste como o endosso, entretanto, o endosso posterior ao ven-cimento, desde que lançado antes do protesto e da expiração do prazo para o protesto, tendo em vista a ficção jurídica consagrada no proêmio do art. 20 da Lei Uniforme: “O endosso posterior ao vencimento tem os mesmos efeitos que o endosso anterior”.

Por fim, o endosso sem data também é considerado anterior, salvo prova em sentido contrário81.

6.12.4. Endosso sem garantia

À vista do art. 15, § 1º, da Lei Uniforme, o endossante pode incluir a expressão “sem garantia” em conjunto com o endosso, o que afasta a respectiva responsabilidade cambial como coobrigado. Há a transferên-cia da titularidade do crédito, mas o endossante não tem responsabili-dade cambial alguma.

6.12.5. Endosso proibido

À vista dos arts. 11, § 2º, e 15, § 2º, ambos da Lei Uniforme, o ti-tular da letra pode incluir a cláusula “não à ordem” na cártula, com a

80 De acordo, na doutrina: “O endosso póstumo é o posterior ao protesto por falta de pagamento do título ou posterior ao decurso do prazo respectivo. Tem efeito de mera cessão civil, ou seja, o endossante tardio não responde pela solvência do devedor” (Waldo Fazzio Júnior, Manualdedireitocomercial, 7. ed., 2006, p. 386-387).

81 Cf. art. 20, § 3º, da Lei Uniforme.

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consequente proibição de transferência do crédito mediante endosso. Proibido o endosso, a transferência da titularidade tem natureza jurí-dica de cessão civil de crédito, sob o regime do direito comum. Em outros termos, se a cártula contiver a cláusula “não à ordem”, o even-tual “endosso” lançado terá valor jurídico de cessão ordinária de cré-dito, à luz do Direito Civil.

7. Aval

7.1. Conceito

O aval é a declaração unilateral de vontade por meio da qual uma pessoa garante, em prol do devedor principal82 ou de qualquer coobri-gado83, o pagamento do título de crédito. A propósito do conceito de aval, vale conferir o disposto no caput do art. 897 do Código Civil: “O pagamento de título de crédito, que contenha obrigação de pagar soma determinada, pode ser garantido por aval”.

7.2. Sujeitos do aval

A pessoa que garante o pagamento do título é denominada “ava-lista” ou “dador de aval”, na linguagem do art. 32 da Lei Uniforme. Já o devedor principal ou o coobrigado cuja assinatura é garantida pelo aval é o “avalizado”84.

7.3. Avalista

À vista da regra consagrada no art. 30, § 2º, da Lei Uniforme, o avalista é terceiro que não figurava na letra de câmbio até então. Nada impede, todavia, que algum signatário da letra seja avalista de outro. Sem dúvida, o art. 30, § 2º, infine, dispõe sobre o aval dado por pessoa que já integra a relação jurídico-cambial85.

82 Na letra, o sacado-aceitante.

83 Na letra, o emitente-sacador, o tomador-endossante, o segundo endossante etc.

84 De acordo, na doutrina: “Aquele que presta o aval se chama avalista ou dador do aval, e o beneficiário, a cuja obrigação se reforça, se denomina avalizado” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, 18. ed., 1992, p. 342).

85 Assim, na doutrina: “O aval é a garantia de pagamento da letra de câmbio, dada por um terceiro ou mesmo por um de seus signatários” (Rubens Requião, Curso

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7.4. Lançamento do aval

Segundo o art. 31 da Lei Uniforme, o aval deve ser lançado na própria letra de câmbio ou em folha anexa ao título. A assinatura lança-da em documento independente, portanto, não tem natureza de aval86, exvi dos princípios da cartularidade e da literalidade.

O art. 898 do Código Civil revela que o lançamento do aval é ad-missível tanto na face quanto no verso da letra de câmbio. Em ambas as hipóteses, o lançamento do aval se dá com a assinatura de próprio punho do avalista ou do respectivo procurador com poder especial87.

No que tange ao lançamento na face da letra, a simples assinatura tem natureza jurídica de aval, salvo quando aposta pelo sacado ou pelo emitente-sacador88. Sem dúvida, a simples assinatura do sacado exara-da na face da letra significa aceite89, enquanto a assinatura do emitente--sacador lançada no anverso da letra significa saque, ou seja, a emissão do título90. Com efeito, embora o sacado e o emitente-sacador também possam ser avalistas de outro obrigado91, as assinaturas de ambos devem ser acompanhadas da expressão legal “bom para aval” ou outra equiva-

dedireitocomercial, 18. ed., 1992, p. 341).

86 Assim, na jurisprudência: “Aval – Documento à parte. Válido o aval em folha anexa ao título que se entende como seu prolongamento. Não, entretanto, em documento à parte, uma vez que o Brasil não se valeu da reserva consignada no art. 4º do Anexo II da Convenção de Genebra” (3ª Turma do STJ, REsp 4.522/SP, DiáriodaJustiça, 18-2-1991, p. 1.034). No mesmo sentido, também na jurisprudên-cia: “PROCESSO CIVIL. AVAL. O aval supõe assinatura em título cambial ou cambiariforme, não se lhe assimilando a firma posta em instrumento particular” (3ª Turma do STJ, REsp 248.842/PR, DiáriodaJustiça, 18-9-2000, p. 128).

87 Assim, na jurisprudência: “A validade do aval está condicionada à assinatura do próprio punho do avalista ou do mandatário especial, isto é, do que exibe man-dato por escrito, com poderes expressos para a prática de atos cambiais” (4ª Turma do STJ, REsp 50.841/RJ, DiáriodaJustiça, 12-9-1994, p. 23770).

88 Cf. art. 31, § 3º, da Lei Uniforme. De acordo, na doutrina: “Na letra de câmbio, vale insistir, não existe assinatura sem expressão; toda a que for aposta no título, na sua face ou dorso, tem uma função cambiária. Por isso, a simples assinatura firmada no anverso, que não seja do sacado ou do sacador, é considerada aval” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, v. II, 18. ed., 1992, p. 343).

89 Cf. art. 25, § 1º, infine, da Lei Uniforme.

90 Cf. art. 1º, n. 8, da Lei Uniforme.

91 Cf. art. 30, § 2º, da Lei Uniforme.

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lente92, para que tenham natureza de aval. Já em relação aos terceiros, basta a simples assinatura lançada no anverso ou face da letra, a qual tem natureza de aval, exvi do art. 31, § 3º, da Lei Uniforme.

Por fim, o lançamento do aval no verso da letra sempre depende da assinatura acompanhada de alguma expressão identificadora93, con-forme revela a interpretação acontrariosensu do § 1º do art. 898 do Có-digo Civil.

7.5. Modalidades de aval

O aval pode ser “em branco” ou “em preto”. O aval “em preto” ocorre com identificação do avalizado ao lado da assinatura do avalista. Já o aval “em branco” se dá pelo simples lançamento da assinatura, sem a designação do avalizado. Na ausência da identificação do avalizado, há a presunção legal de que o aval foi dado em favor do emitente-sacador da letra, conforme revela o último parágrafo do art. 31 da Lei Uniforme: “O aval deve indicar a pessoa por quem se dá. Na falta da indicação, entender-se-á pelo sacador”.

7.6. Responsabilidade do avalista

À vista do § 1º do art. 32 da Lei Uniforme e do proêmio do art. 899 do Código Civil, a responsabilidade do avalista é equiparada à do ava-lizado, razão pela qual o dador do aval também é responsável pelo pa-gamento integral do título em prol do credor, tanto que o avalista pode ser executado isoladamente94.

7.7. Direito de regresso do avalista

O avalista que efetuar o pagamento da quantia expressa no título poderá acionar tanto o avalizado quanto os coobrigados anteriores, para

92 Por exemplo, “por aval”.

93 Por exemplo, “bom para aval”, “por aval”.

94 Cf. art. 47 da Lei Uniforme. Assim, na doutrina: “O avalista se torna obrigado solidariamente com aquele a favor de quem dá o aval” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, 18. ed., 1992, p. 342). No mesmo sentido, na jurisprudência: “– O aval constitui obrigação autônoma. Tratando-se de responsabilidade solidária dos devedores, ao credor é permitido mover a execução desde logo contra o avalista, independentemente da regra inserta no art. 655, § 2º, do CPC” (4ª Turma do STJ, REsp 443.432/GO, DiáriodaJustiça, 15-8-2005, p. 317).

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cobrar o total da importância paga, com fundamento no art. 32, § 3º, da Lei Uniforme, e no art. 899, § 1º, do Código Civil. Por conseguinte, podem ser acionados, em conjunto ou isoladamente, o sacado-aceitante, o emitente-sacador, o tomador-endossante e até os eventuais avalistas anteriores, em relação ao total do montante que foi pago pelo avalista.

Com efeito, à vista do art. 47, § 3º, da Lei Uniforme, e do art. 899, § 1º, do Código Civil, o avalista que paga o título passa a ter direito regres-sivo contra o devedor principal e todos os coobrigados anteriores, razão pela qual pode acioná-los por meio de execução forçada95, desde que observados os prazos prescricionais arrolados no art. 70 da Lei Uniforme.

7.8. Avais em branco simultâneos

Na eventualidade de ter sido lançado mais de um aval em branco, incide o Enunciado 189 da Súmula do Supremo Tribunal Federal: “Avais em branco e superpostos consideram-se simultâneos e não sucessivos”. À luz do verbete sumular, o avalista simultâneo que pagou o crédito por inteiro só pode cobrar dos demais avalistas simultâneos as partes pro-porcionais, e não a totalidade da quantia paga96. Trata-se, à evidência, de exceção à regra da solidariedade cambial, marcada pela solidarieda-de total e pelo direito de regresso do avalista quanto ao valor total.

95 Cf. art. 32, § 3º, da Lei Uniforme, e art. 567, III, do Código de Processo Civil.

96 Assim, na jurisprudência: “1) Avais em branco e superpostos consideram-se si-multâneos e não sucessivos; 2) Alcance da Súmula 189; 3) Em caso de avais simul-tâneos, pode o avalista, que pagou, cobrar do outro avalista a cota-parte devida por esse coobrigado; 4) Se três são os avalistas, só pode aquele que pagou cobrar uma terça parte de cada um dos coobrigados da mesma natureza; 5) Recurso ex-traordinário conhecido e provido, em parte” (1ª Turma do STF, RE 70.715/GB, DiáriodaJustiça, 18-11-1970). “– COMERCIAL. Aval. Avalista simultâneo e não sucessivo (Súmula 189). Pagando a dívida cambial, fica legalmente sub-rogado no crédito (Cód. Civil, art. 985, III), podendo a cada um dos demais avalistas simul-tâneos cobrar a respectiva quota, em processo de execução por título extrajudicial” (2ª Turma do STF, RE 92.674/SP, DiáriodaJustiça, 29-5-1981, p. 5054). “– Aval. Coavalista. Direito de receber do outro a metade do que pagou, pelo compromis-so. Art. 32 da Lei Uniforme. Resulta do art. 32 da Lei Uniforme que se o dador do aval paga a letra, fica sub-rogado nos direitos emergentes do título contra a pessoa a favor de quem foi dado e contra os demais coavalistas. A sub-rogação é legal, independendo, portanto, de ter sido convencionada. É este o entendimento que tem sido adotado pelo Supremo Tribunal Federal. E não cabe perquirir sobre a causadebendi” (2ª Turma do STF, RE 75.297/RS, DiáriodaJustiça, 6-9-1984, p. 14332).

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Em suma, se o título contiver mais de um aval em branco, sem possibilidade de identificação da ordem em que as garantias foram dadas, aquele avalista que pagar o total só poderá cobrar dos demais avalistas em branco as respectivas partes, de forma proporcional. Nada impede, entretanto, que o avalista que pagou o total opte por acionar o devedor principal e outro coobrigado anterior, como o sacado-aceitante e o emi-tente-sacador, respectivamente, em conjunto ou isoladamente, conforme a preferência do avalista, na tentativa de receber o valor integral97.

7.9. Autonomia da responsabilidade do avalista

Em razão da autonomia e da abstração que norteiam os títulos de crédito98, se a cártula circulou e deixou as mãos dos sujeitos originários da relação cambial, não há mais oportunidade de discussão acerca da causadebendi, isto é, a origem do título. Por conseguinte, a responsabili-dade do avalista subsiste até mesmo quando é nula a obrigação do avalizado. Sem dúvida, os arts. 7º e 32, § 2º, da Lei Uniforme, e o § 2º do art. 899 do Código Civil revelam que a responsabilidade cambial do avalista é independente da obrigação do avalizado, e subsiste até mesmo quando a obrigação primitiva tenha sido viciada na origem99.

97 De acordo, na doutrina: “Se vários são os avalistas, aquele que pagou ao credor do avalizado comum poderá cobrar dos demais coobrigados a cota respectiva de cada um na dívida; e todos, em conjunto ou separadamente, poderão agir contra o devedor-avalizado, para serem reembolsados de todas as parcelas que tiveram de liquidar, pelo inadimplemento dele em relação ao credor originário” (Alcides de Mendonça Lima, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. VI, t. I, 1974, n. 747, p. 339-340).

98 Cf. art. 887 do Código Civil.

99 Assim, na doutrina: “Sendo as obrigações cambiárias autônomas uma das outras, o avalista que está sendo executado em virtude de obrigação avalizada, não pode opor-se ao pagamento, fundado em matéria atinente à origem do título, que lhe é estranha. O aval é obrigação formal, autônoma, independente, e que decorre da simples aposição, no título, da assinatura do avalista” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, v. II, 18. ed., 1992, p. 342). De acordo, na jurisprudência: “– O aval é obrigação autônoma e independente, descabendo assim a discussão sobre a origem da dívida” (4ª Turma do STJ, REsp 190.753/SP, DiáriodaJustiça, 19-11-2003, p. 467). “O aval é obrigação autônoma e independente, afastadas assim as discus-sões sobre a origem do título” (4ª Turma do STJ, REsp 3.594/SC, DiáriodaJustiça, 17-11-1990, p. 15380). Também no mesmo sentido, ainda na jurisprudência: 2ª Turma do STF, RE 75.297/RS, DiáriodaJustiça, 6-9-1984, p. 14332.

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Não obstante, a regra da autonomia não é absoluta, porquanto os vícios formais no título e a existência de má-fé do terceiro podem ser suscitados pelo executado100. Com efeito, ressalvados o vício formal101 que contamine o título e a má-fé do terceiro beneficiário do crédito, o avalista não pode discutir a origem da dívida nem outras nulidades substanciais102 anteriores relativas ao título de crédito que já circulou. Se, todavia, o título ainda não circulou, por ainda estar a cártula nas mãos de alguma das partes originárias da relação cambial, o avalista executa-do pode suscitar até mesmo vício sobre a origem da dívida, como a ili-citude do negócio subjacente103.

7.10. Aval e fiança: semelhanças e diferenças

Ao contrário do que pode parecer à primeira vista, em razão da existência da palavra “afiançada” no bojo do art. 32 da Lei Uniforme, aval e fiança são institutos jurídicos diferentes. Sem dúvida, apesar do escopo comum dos institutos, qual seja, dar garantia, o aval e a fiança têm peculiaridades que afastam a possibilidade de confusão.

Em primeiro lugar, o aval é próprio dos títulos de crédito104, en-quanto a fiança é instituto de Direito Civil105.

100 Em sentido conforme, na jurisprudência: “A responsabilidade cambiária do ava-lista, tendo em vista os princípios da autonomia e abstração, não é afastada pela falsificação ou nulidade de outra assinatura. Art. 7º da Lei Uniforme. Ressalva-se a hipótese de má-fé do favorecido, o que não ocorre na hipótese” (3ª Turma do STJ, REsp 36.837/MG, DiáriodaJustiça, 29-11-1993, p. 25.877).

101 Por exemplo, por falta de algum elemento essencial do art. 1º da Lei Uniforme.

102 Cf. arts. 104, 166, 167 e 168 do Código Civil.

103 De acordo, na jurisprudência: “Comercial. Título de crédito. Avalista. Discussão sobre a origem do débito. Ausência de circulação do título. Possibilidade. Prece-dentes. – Na esteira de precedentes da 3ª Turma do STJ, se o título de crédito não circulou, pode o avalista arguir exceções baseadas na extinção, ilicitude ou inexis-tência da dívida da qual originou o título, visando evitar o enriquecimento sem causa do credor. Recurso especial conhecido e provido” (3ª Turma do STJ, REsp 678.881/PR, DiáriodaJustiça, 30-6-2006, p. 216).

104 De acordo, na jurisprudência: “O aval é garantia que se constitui em título cambial, não em contrato bancário; neste, a garantia de terceiro pode ser a fiança, não o aval” (4ª Turma do STJ, REsp 255.139/PR, DiáriodaJustiça, 9-10-2000, p. 155).

105 Cf. arts. 818 e s. do Código Civil.

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Sob outro prisma, a obrigação proveniente do aval é autônoma106, enquanto a fiança gera obrigação sem autonomia, mas apenas acessória107. Por conseguinte, no aval prevalece a regra segundo a qual a responsabi-lidade do avalista subsiste até mesmo diante de vício proveniente da relação obrigacional originária, tendo em vista o disposto nos arts. 7º e 32, § 2º, ambos da Lei Uniforme, e no art. 899, § 2º, do Código Civil. O mesmo raciocínio, todavia, não alcança a fiança, a qual não subsiste dian-te de obrigação nula, exvi dos arts. 824 e 837 do Código Civil108.

Sob outro prisma, o fiador tem o benefício de ordem previsto no art. 827 do Código Civil e no art. 595 do Código de Processo Civil, isto é, pode exigir que o devedor em favor de quem prestou a garantia seja executado em primeiro lugar109-110. Já o avalista não tem em seu prol o benefício de ordem, porquanto é responsável solidário, na qualidade de coobrigado, razão pela qual pode ser acionado individualmente e até mesmo em primeiro lugar, tudo nos termos do art. 47 da Lei Uniforme111. Daí a conclusão: o avalista não tem o beneficiumexcussionispersonalis.

106 Cf. art. 32, § 2º, da Lei Uniforme.

107 Cf. arts. 824 e 837 do Código Civil. Assim, na doutrina: “O aval é um instituto típico do direito cambiário. Por isso, não se pode confundir com a fiança. Esta é uma garantia acessória de uma obrigação principal, sendo-lhe característica fun-damental essa acessoriedade; o aval, porém, como toda a obrigação cambiária, é absolutamente autônomo de qualquer outra” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, v. II, 18. ed., 1992, p. 342).

108 Assim, na doutrina: “A distinção, porém, pode ser estabelecida na própria lei que afirma que a obrigação do aval mantém-se ‘mesmo no caso de a obrigação que ele garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma’. Na fiança, essa obrigação acessória não sobreviveria à nulidade da obrigação principal, objeto da garantia” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, v. II, 18. ed., 1992, p. 342).

109 De acordo, na doutrina: “Benefício de excussão, ou benefício de ordem, é o direito que tem o fiador de exigir que, antes dos seus, sejam excutidos os bens do devedor” (Amílcar de Castro, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. VIII, 2. ed., 1976, p. 17).

110 Não obstante, o fiador pode renunciar ao benefício de ordem, com fundamento no art. 828, I, do Código Civil.

111 De acordo, na jurisprudência: “– O avalista não pode exercer benefício de ordem” (3ª Turma do STJ, Ag 747.148/SP – AgRg, DiáriodaJustiça, 1º-8-2006, p. 438). No mesmo sentido, ainda na jurisprudência: “Aval. Benefício de ordem. O avalista é um obrigado autônomo (art. 47 da Lei Uniforme) e não se equipara ao fiador, razão pela qual não pode exercer o benefício de ordem previsto no art. 595 do CPC. Recurso conhecido e provido” (4ª Turma do STJ, REsp 153.687/GO, DiáriodaJustiça de 30-3-1998, p. 82).

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Por fim, antiga diferença entre o aval e a fiança restou mitigada com o advento do Código de 2002. Com efeito, à vista do art. 1.647, III, do Código Civil, o cônjuge não pode prestar fiança nem aval sem a au-torização do outro112. Não obstante, a anulabilidade do aval prestado sem a vênia conjugal só pode ser suscitada pelo cônjuge que não auto-rizou o lançamento do aval113. A propósito, vale conferir o Enunciado 114 das Jornadas de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal: “Art. 1.647: o aval não pode ser anulado por falta de vênia conjugal, de modo que o inc. III do art. 1.647 apenas caracteriza a inoponibilidade do título ao cônjuge que não assentiu”.

7.11. Aval limitado ou parcial

A despeito da vedação inserta no parágrafo único do art. 897 do Código Civil, a letra de câmbio pode ser garantida apenas em parte, quando o avalista fica obrigado somente pelo valor garantido, porquan-to o art. 30 da Lei Uniforme autoriza o aval parcial: “O pagamento de uma letra pode ser no todo ou em parte garantido por aval”114. Com efeito, por força do art. 903 do Código Civil, a legislação especial exis-tente prevalece em relação ao disposto no Código de 2002. Daí a conclu-são: a Lei Uniforme autoriza o aval limitado ou parcial, o qual ocasiona a garantia apenas em relação a uma parte do crédito.

7.12. Aval antecipado

O denominado “aval antecipado” consiste no lançamento da assi-natura de garantia do pagamento antes mesmo do aceite (do sacado) ou do endosso (do tomador-beneficiário originário).

É certo que a Lei Uniforme de Genebra é omissa em relação ao instituto do aval antecipado. Não obstante, o proêmio do art. 14 do Decreto n. 2.044/1908 autoriza o prévio lançamento do aval, inverbis:

112 Se o casamento foi sob o regime da separação absoluta, entretanto, não há neces-sidade de autorização alguma, tendo em vista a exceção consagrada na parte final do inciso III do art. 1.647 do Código de 2002.

113 De acordo, na jurisprudência: 10ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0002.06.011432-5/002, DiáriodaJustiça, 19-9-2008.

114 Assim, na doutrina: “O avalista, por essa limitação, se obriga apenas pela soma que declarar, inferior evidentemente ao valor da letra” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, v. II, 18. ed., 1992, p. 345).

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“Art. 14. O pagamento de uma letra de câmbio, independente do aceite e do endosso, pode ser garantido por aval”.

Aliás, ainda que o sacado jamais lance o aceite na letra, o avalista é responsável pelo pagamento, à vista do princípio da autonomia con-sagrado no art. 887 do Código Civil, c/c o art. 14 do Decreto n. 2.044/1908, por força do qual o direito brasileiro consagra o instituto do aval antecipado115.

7.13. Aval póstumo

A Lei Uniforme de Genebra e a Lei Cambial Nacional são omissas acerca do aval dado após o vencimento da letra. Não obstante, o art. 900 do Código Civil dispõe sobre o aval póstumo e confere a ele efeitos ju-rídicos iguais aos do aval dado antes do vencimento. Na falta de precei-to nas leis especiais, incide o art. 900 do Código Civil, tendo em vista o disposto no art. 903 do mesmo diploma.

7.14. Falecimento do avalista e subsistência do aval

A garantia proveniente do aval subsiste até mesmo quando há o falecimento do avalista. Com efeito, a morte do avalista antes do venci-mento não tem o condão de extinguir a obrigação cambial, a qual sub-siste e é transferida aos herdeiros do avalista falecido, dentro dos limites das forças da herança116.

115 Assim, na jurisprudência: “Em face da autonomia das obrigações, a do avalista subsiste, quando se trata de aval antecipado ao aceite do título, mesmo se esse não ocorrer. Há, aí, obrigação de garantir o pagamento da cártula” (1ª Turma do STF, RE 99.523/AM, DiáriodaJustiça, 30-11-1984, p. 20444).

116 De acordo, na jurisprudência: “COMERCIAL. TÍTULOS DE CRÉDITO. AVALIS-TA. ÓBITO ANTES DO VENCIMENTO. OBRIGAÇÃO NÃO PERSONALÍSSIMA. TRANSMISSÃO AOS HERDEIROS. I – O aval, espécie de obrigação cambial, é autônomo em relação à obrigação do devedor principal e se constitui no momen-to da aposição da assinatura do avalista no título de crédito. II – Existente a obrigação desde a emissão do título, o avalista era devedor solidário no momen-to do óbito, constituindo o transcurso da data do vencimento apenas requisito para a exigibilidade do montante devido. III – A morte do responsável cambiário é modalidade de transferência anômala da obrigação que, por não possuir caráter personalíssimo, é repassada aos herdeiros, mesmo que o óbito tenha ocorrido antes do vencimento do título” (3ª Turma do STJ, REsp 260.004/SP, DiáriodaJustiça, 18-11-2006, p. 358).

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8. Classes de devedores e cadeia das obrigações cambiais

8.1. Classificação dos devedores

Os devedores da letra de câmbio – e dos títulos de crédito em geral – podem ser separados em duas classes: na primeira, residem o devedor principal (na letra de câmbio, o sacado após o aceite) e o respectivo ava-lista, na eventualidade de ter sido dado aval; já a outra classe é compos-ta pelos coobrigados, como o emitente-sacador e os endossantes, além dos respectivos avalistas117.

A inclusão do avalista em uma ou outra classe sempre depende do avalizado, conforme revela o § 1º do art. 32 do Decreto n. 57.663/66, se-gundo o qual a responsabilidade do avalista é a mesma da pessoa avali-zada. Na mesma esteira, reforça o proêmio do art. 899 do Código Civil de 2002: “O avalista equipara-se àquele cujo nome indicar”. Daí a conclusão: a responsabilidade cambial do dador do aval é a mesma do avalizado; se o avalizado for o devedor principal, assim também será considerado o avalista; se o avalizado for coobrigado, assim também será o avalista.

8.2. Diferença entre as classes de devedores

Há importante diferença à vista da classe em que o devedor reside. No que diz respeito ao devedor principal (e ao respectivo avalista, se existente), o simples vencimento do título já é suficiente para a exigibi-lidade do crédito por parte do beneficiário. No que tange aos coobrigados (emitente-sacador, endossantes e respectivos avalistas), entretanto, além do vencimento, é necessária a comprovação da recusa do pagamento pelo devedor principal mediante protesto, também indispensável na eventualidade da negativa do aceite pelo sacado118. Daí a importante

117 Cf. art. 43 da Lei Uniforme.

118 De acordo, na doutrina: “A execução é pertinente a portador de qualquer dos títu-los contra os chamados responsáveis principais: a) aceitante na letra de câmbio; b) emitente na promissória e no cheque; c) comprador na duplicata; e d) respectivos avalistas. É a ação direta, que independe de protesto. Contra os denominados res-ponsáveis subsidiários, a) sacador na letra de câmbio; b) endossadores anteriores e seus avalistas em qualquer dos títulos – cabe a ação regressiva, isso é, do que solveu a obrigação e que se vira contra o verdadeiro obrigado. Mas esta exige a juntada do competente instrumento de protesto, que não é judicial, e sim o formulado no Car-tório competente, conforme a organização judiciária local” (Alcides de Mendonça Lima, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. VI, t. I, 1974, n. 744, p. 338).

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diferença entre o devedor principal e o coobrigado, à vista do art. 53, §§ 1º e 2º, da Lei Uniforme: enquanto o devedor principal e o respectivo avalista são responsáveis independentemente do protesto do título119, os coobrigados só podem ser acionados após o protesto120.

8.3. Cadeia das obrigações cambiais

Protestado o título dentro do prazo legal, os coobrigados podem ser acionados mediante execução forçada movida pelo credor, em con-junto ou isoladamente, conforme a livre escolha do exequente, tendo em vista o disposto no art. 47 da Lei Uniforme.

Não obstante, o coobrigado que pagar o título pode acionar os coobrigados pretéritos, porquanto o pagador tem direito de regresso121, e assim por diante, até o início da cadeia de obrigações, isto é, até alcan-çar o sacado-aceitante, devedor principal. A propósito, vale conferir a ordem na cadeia de obrigações cambiais da letra:

1º) sacado-aceitante (devedor principal)

2º) avalista do sacado-aceitante

3º) emitente-sacador

119 Assim, na jurisprudência: “– Lei Uniforme sobre Letras de Câmbio e Notas Pro-missórias – Não é necessário o protesto do título para resguardo do direito de ação contra o avalista do emitente da promissória ou do aceitante da letra de câmbio” (1ª Turma do STF, RE 76.154/SP, DiáriodaJustiça, 15-6-1973).

120 De acordo, na jurisprudência: “Estando o banco com o título por domínio, em face de endosso-cessão, para exercer o direito de regresso em face dos coobrigados, como o endossante, é necessário o protesto do título, porque só poderá se voltar contra este se demonstrar que efetivamente o cobrou do devedor” (16ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0024.06.056167-7/001, DiáriodaJustiça, 10-10-2008).

121 “DIREITO DE REGRESSO. (2) Dir. Camb. O que é exercido pelo endossante ou avalista de título cambiário, ou por quem o pagou, contra os anteriores coobriga-dos, a fim de receber, ou reembolsar, o valor correspondente” (J. M. Othon Sidou, Dicionáriojurídico: Academia Brasileira de Letras Jurídicas, 9. ed., 2004, p. 291).

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4º) avalista do emitente-sacador

5º) tomador-beneficiário-primeiro-endossante

6º) avalista do tomador-endossante

7º) segundo-endossante

8º) avalista do segundo-endossante

etc.

Fixada a ordem da cadeia das obrigações cambiais, já é possível identificar quais os sujeitos das relações cambiais estão obrigados e po-dem ser acionados em regresso. Imagine-se, por exemplo, que o avalista do tomador-endossante foi acionado isoladamente e satisfez a obrigação em prol do credor. Diante do pagamento, o avalista do tomador-benefi-ciário poderá executar o tomador-beneficiário-avalizado, o avalista do emitente-sacador, o emitente-sacador, o avalista do sacado-aceitante e o sacado-aceitante, em conjunto ou isoladamente, conforme a sua livre preferência, tudo nos termos do art. 47 da Lei Uniforme, com o reforço dos arts. 899, § 1º, e 914, § 2º, ambos do Código Civil.

9. Vencimento9.1. Conceito

O vencimento é o ato122 ou o fato123 jurídico que torna exigível a obrigação consubstanciada no pagamento do crédito referente ao título.

9.2. Espécies de vencimento

O vencimento da letra pode ocorrer de forma ordinária ou de forma extraordinária, conforme o caso.

O vencimento ordinário ou comum consiste na exigibilidade do crédito por força do decurso do tempo, no título de crédito a prazo, ou da simples apresentação, no título à vista.

122 Por exemplo, a recusa do aceite.

123 Por exemplo, o decurso do tempo.

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Já o vencimento extraordinário ou antecipado consiste na exigibili-dade do crédito em razão da negativa de aceite pelo sacado, no todo ou em parte, ou pela falência do aceitante que é empresário individual ou sociedade empresária, tudo nos termos do art. 43 da Lei Uniforme, do art. 19, I e II, do Decreto n. 2.044/1908, e do art. 77 da Lei n. 11.101/2005.

Em contraposição, as hipóteses previstas nos §§ 2º e 3º do art. 43 da Lei Uniforme não subsistem no direito brasileiro, em virtude da reserva inserta no art. 10 do Anexo II do mesmo diploma. Diante da ressalva, incide o art. 19 da Lei Cambiária Interna. Por conseguinte, a falência do mero sacado não ocasiona o vencimento antecipado, porquanto o inciso II do art. 19 do Decreto n. 2.044/1908 estabelece que o vencimento ante-cipado tem lugar “pela falência do aceitante”, e não do mero sacado124.

9.3. Modalidades de vencimento

Na letra de câmbio à vista, o vencimento ocorre desde logo, no ato da apresentação do título para pagamento. A letra à vista pode ser apre-sentada para pagamento imediato dentro de um ano da data da emissão, consoante o art. 34 da Lei Uniforme: “A letra à vista é pagável à apresen-tação. Deve ser apresentada a pagamento dentro do prazo de 1 (um) ano, a contar de sua data”.

Já a letra “a certo termo de vista” é título a prazo, cujo vencimento ocorre com a contagem do lapso somente depois do aceite, ou seja, da data em que a letra é apresentada para o lançamento do aceite pelo sa-cado125. Na falta de indicação do dia do aceite, cabe ao credor-beneficiá-rio efetuar o protesto por ausência de data. Se o aceitante deixar de comparecer ao cartório para indicar o dia do aceite, considera-se a data do protesto126. Na falta também do protesto, o aceite não datado é tido como lançado no último dia do prazo para a apresentação ao sacado, isto

124 De acordo, na doutrina: “As situações jurídicas previstas nos números 2º e 3º do art. 43 da LUG, de fato, não podiam mesmo ser consideradas razão para venci-mento antecipado, como ‘falência do sacado’, pois o sacado não é obrigado no título. Está na lei: ‘quer ele (o sacado) tenha aceite, ou não...’. Ora, se aceitou não é sacado e sim aceitante. Sendo aceitante, a hipótese de recusa parcial ou total está prevista no número 1º daquele artigo” (Wille Duarte Costa, Títulosdecrédito, 3. ed., 2007, p. 217).

125 Cf. art. 35, proêmio, da Lei Uniforme.

126 Cf. arts. 25, § 2º, infine, e 35, ambos da Lei Uniforme.

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é, um ano depois da emissão da letra, consoante a combinação do art. 23 com o art. 35 da Lei Uniforme, inverbis: “As letras a certo termo de vista devem ser apresentadas ao aceite dentro do prazo de 1 (um) ano das suas datas”. “Na falta do protesto, o aceite não datado entende-se, no que respeita ao aceitante, como tendo sido dado no último dia do prazo para a apresentação ao aceite”.

A letra “a certo termo da data” também é título a prazo, cujo ven-cimento se dá com o decurso do lapso fixado no título, em dias, meses ou anos, sempre à luz da data do saque, isto é, da emissão da letra. Por exemplo, o vencimento da letra pode ser fixado em trinta dias da data da emissão, em seis meses da data da emissão etc.

Por fim, a letra em data certa ou com “dia fixado” também é título a prazo, mas com a expressa indicação do próprio dia do vencimento, ou seja, “pagável num dia fixado”127. Por exemplo, o vencimento fixado no dia 31 de dezembro de 2011.

9.4. Contagem dos prazos cambiários

Em primeiro lugar, os prazos em dias são contados à luz do caputdo art. 132 do Código Civil, preceito que também é aplicável ao Direito Cambiário, como bem revela, por exemplo, o art. 64, parágrafo único, da Lei n. 7.357/85. Na verdade, o art. 132 do Código Civil brasileiro presti-gia o princípio jurídico consagrado no Código de Direito Canônico, em especial nos §§ 1º e 2º do cânon 203: “Diesaquononcomputaturintermi-no”; “diesadquemcomputaturintermino”128. Daí a conclusão: o dia do início não é computado na contagem, mas o dia do término do prazo é computado129.

Quanto ao prazo estabelecido em mês (ou meses), há o vencimen-to no mesmo dia do mês subsequente (ou correspondente, no prazo em meses). Na eventualidade da ausência de data correspondente no mês

127 Cf. art. 33 da Lei Uniforme.

128 “O dia inicial não é computado no prazo; “o dia final é computado no prazo” (CódigodeDireitoCanônico. Promulgado pelo Papa João Paulo II, traduzido pelo Padre João Corso e pelo Bispo Tarcísio Ariovaldo do Amaral, e comentado pelo Padre Jesús Hortal. 11. ed. 1998, p. 88-89).

129 De acordo, na doutrina: “No mais, segue-se a legislação vigente, excluindo-se o dia do começo e inclusão do dia do vencimento” (Wille Duarte Costa, Títulosdecrédito, 3. ed., 2007, p. 214).

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do vencimento, o vencimento ocorre no último dia do mês130, exvi do art. 36, § 1º, da Lei Uniforme, preceito específico que afasta a incidência da regra geral inserta no § 3º do art. 132 do Código Civil.

Já a expressão “meio mês” significa quinze dias131, razão pela qual a contagem segue o disposto no caput do art. 132 do Código Civil.

Na eventualidade do vencimento com a combinação de mês intei-ro com meio mês, considera-se, em primeiro lugar, a data referente ao mês inteiro; só depois são contados os quinze dias, por força do art. 36, § 2º, da Lei Uniforme132.

Por fim, a expressão “início do mês” significa primeiro dia do mês. Em contraposição, a expressão “final do mês” significa último dia do mês. Já a expressão “meado do mês” significa dia quinze, tudo nos termos do art. 36, § 3º, da Lei Uniforme de Genebra.

9.5. Correção monetária e juros de mora

Vencido o título de crédito, o credor-beneficiário pode cobrar a respectiva quantia mediante execução forçada, com esteio no art. 585, I, do Código de Processo Civil, c/c os arts. 47 e 70 da Lei Uni-forme, e com o caput do art. 49 do Decreto n. 2.044/1908: “A ação cambial é a executiva”.

Além do valor constante da letra de câmbio, o credor também pode exigir a correção monetária133 do montante principal, contada a partir do vencimento, em virtude do art. 1º, § 1º, da Lei n. 6.899/81.

130 Por oportuno, vale conferir o didático exemplo da doutrina: “Também uma letra de câmbio sacada em 31 de janeiro de ano não bissexto para vencimento em um mês irá vencer no dia 28 de fevereiro seguinte” (Fábio Ulhoa Coelho, Manualdedireitocomercial: direito de empresa, 20. ed., 2008, p. 261).

131 Cf. art. 36, § 5º, da Lei Uniforme.

132 A propósito, vale conferir o didático exemplo da doutrina: “Assim, o vencimento de uma letra de câmbio sacada para um mês e meio da vista, cujo aceite foi data-do de 27 de fevereiro de ano não bissexto, recairá em 11 de abril (não em 14 de abril) do mesmo ano” (Fábio Ulhoa Coelho, Manualdedireitocomercial: direito de empresa, 20. ed., 2008, p. 261).

133 Em sentido conforme, na jurisprudência: 1ª Turma do STF, RE 105.554/SP, DiáriodaJustiça, 7-6-1985; 1ª Turma do STF, RE 108.613/MG, RTJ, v. 137, p. 1310; 3ª Tur-ma do STJ, REsp 547.319/RS, DiáriodaJustiça, 18-10-2004, p. 270; 3ª Turma do STJ, REsp 1.291/RS, DiáriodaJustiça, 16-11-1996; e 4ª Turma do STJ, REsp 48.944/RJ, DiáriodaJustiça, 10-10-1994, p. 27169.

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O credor também pode incluir na cártula cláusula específica de juros de mora, contados a partir do vencimento, com fundamento nos arts. 5º e 48, ambos da Lei Uniforme de Genebra134. Em reforço, merece ser prestigiado o Verbete n. 17 aprovado pela 1ª Câmara Civil do antigo Tribunal de Alçada de Minas Gerais: “Os juros nos títulos executivos cambiais devem ser contados a partir do vencimento”135. Na esteira do Verbete n. 17 houve a aprovação unânime da Conclusão n. 18 no 6º En-contro Nacional dos Tribunais de Alçada, inverbis: “Os juros, nos títulos executivos cambiais, devem ser contados a partir do vencimento”136.

Além da correção monetária e dos juros de mora, o credor-benefi-ciário também pode cobrar as eventuais despesas do protesto na mesma execução fundada no título de crédito.

Em síntese, o credor do título pode ajuizar a ação cambial, a fim de executar o devedor principal e os coobrigados, na busca do pagamento da quantia estampada na cártula, com juros de mora e correção mone-tária a partir do vencimento, bem assim das eventuais despesas cartorá-rias com o protesto.

10. Pagamento

10.1. Conceito

O pagamento é ato extintivo da obrigação do respectivo devedor. Quando o pagamento é realizado pelo sacado-aceitante, há a extinção de todas as obrigações cambiais.

10.2. Possibilidade da exigência do título no momento do pagamento

O devedor que paga o crédito pode exigir a entrega da cártula137,

134 Diante da existência de preceitos específicos na Lei Uniforme, não incide a regra geral consubstanciada no art. 890 do Código Civil.

135 Cf. Minas Gerais, Parte II, DiáriodoJudiciário, 26-2-1982, p. 1.

136 Cf. Theotonio Negrão, CódigodeProcessoCivilelegislaçãoprocessualemvigor, 25. ed., 1994, p. 263, nota 9 ao art. 293: “‘Os juros, nos títulos executivos cambiais, devem ser contados a partir do vencimento’ (VI ENTA-concl. 18, aprovada por unanimidade)”.

137 De acordo, na jurisprudência: “A quitação do débito representado por títulos de crédito exige procedimentos específicos em razão da cartularidade e da possibi-lidade da circulação do título. Nesse passo, uma vez paga a dívida, incumbe ao

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com a igual exigência do lançamento da respectiva quitação no próprio título138. A propósito, se o devedor paga o crédito proveniente do título e não exige a entrega ou, ao menos, o lançamento da quitação no bojo da cártula, há o risco de ser submetido a novo pagamento, na eventua-lidade de ulterior endosso a terceiro de boa-fé.

10.3. Pagamento parcial

À vista do art. 39, §§ 2º e 3º, da Lei Uniforme, o pagamento parcial é juridicamente possível, com o lançamento da respectiva quitação par-cial na própria letra.

10.4. Iniciativa do pagamento

Cabe ao credor tomar a iniciativa para a satisfação do crédito, diante da natureza quesível da obrigação cambial.

Omisso o credor, entretanto, os devedores têm a faculdade do de-pósito da quantia objeto do título mediante demanda de consignação em pagamento139, à custa do credor, tudo nos termos do art. 42 da Lei Uni-forme.

10.5. Direito de regresso

Na eventualidade de o pagamento ter sido realizado por algum coobrigado140, há a extinção da respectiva obrigação cambial. Não obs-tante, o pagamento gera direito de regresso contra o devedor principal e contra os coobrigados anteriores da cadeia de obrigações cambiais141, por

devedor exigir a entrega do título de crédito, não só para fazer prova da sua qui-tação, mas também para impedir a sua circulação” (1ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2005.01.1.071944-3, DiáriodaJustiça, 22-3-2007, p. 75). No mesmo sentido, ainda na jurisprudência: 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Recurso 101.999, DiáriodaJustiça, 28-3-2001, p. 82.

138 Cf. art. 39, § 1º, da Lei Uniforme.

139 Cf. arts. 890 e s. do Código de Processo Civil.

140 Por exemplo, o emitente-sacador, o tomador-endossante ou algum avalista.

141 “DIREITO DE REGRESSO. (2) Dir. Camb. O que é exercido pelo endossante ou avalis-ta de título cambiário, ou por quem o pagou, contra os anteriores coobrigados, a fim de receber, ou reembolsar, o valor correspondente” (J. M. Othon Sidou, Dicionário jurídico: Academia Brasileira de Letras Jurídicas, 9. ed., 2004, p. 291).

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força da sub-rogação, à vista do art. 47, §§ 2º e 3º, da Lei Uniforme, com o reforço dos arts. 899, § 1º, e 914, § 2º, ambos do Código Civil. Em regra, a demanda regressiva é exercida mediante execução forçada, fundada no art. 567, III, do Código de Processo Civil, desde que observados os prazos prescricionais do art. 70 da Lei Uniforme, conforme o caso.

10.6. Local do pagamento

À vista do n. 5 do art. 1º da Lei Uniforme, a letra deve conter “a indicação do lugar em que se deve efetuar o pagamento”.

Não obstante, se faltar a indicação do lugar do pagamento no títu-lo, considera-se o endereço do sacado: “Na falta de indicação especial, o lugar designado ao lado do nome do sacado considera-se como sendo o lugar do pagamento, e, ao mesmo tempo, o lugar do domicílio do saca-do”, tudo por força do art. 2º, § 3º, da Lei Uniforme.

10.7. Apresentação para pagamento de letra de câmbio no Brasil e no exterior

A combinação do art. 38 do Anexo I com o art. 5º do Anexo II, am-bos da Lei Uniforme, com o proêmio do art. 20 do Decreto n. 2.044/1908, revela que há diferença em relação ao prazo para apresentação da letra para pagamento.

A letra pagável no Brasil deve ser apresentada ao aceitante no pró-prio dia do vencimento, ressalvada a hipótese de o vencimento cair em dia que não seja útil, quando há a prorrogação para o primeiro dia útil seguinte, consoante o disposto no art. 20, primeira parte, do Decreto n. 2.044/1908, c/c o art. 5º do Anexo II da Lei Uniforme de Genebra. À vista do art. 12, § 2º, da Lei n. 9.492/97, não são úteis o dia sem expedien-te bancário para o público e o dia com expediente bancário reduzido.

No que tange à letra pagável fora do território brasileiro, deve ser apresentada para pagamento no dia do vencimento ou dentro dos dois dias úteis posteriores, tendo em vista a incidência do art. 38, § 1º, da Lei Uniforme de Genebra.

Não obstante, o decurso do prazo sem a apresentação para paga-mento não ocasiona a perda dos direitos cambiários em relação ao acei-tante e ao respectivo avalista. Com efeito, à vista do art. 53, §§ 1º e 2º, da Lei Uniforme, o decurso do prazo sem apresentação para pagamento ocasiona a perda dos direitos cambiários apenas em relação aos coobri-gados: emitente-sacador, tomador-endossante e respectivos avalistas.

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11. Protesto cambial11.1. Conceito

O protesto cambiário é o ato formal e solene pelo qual o credor apresenta o título de crédito142 em Cartório de Protesto de Títulos, a fim de que a recusa de lançamento do aceite, o vencimento ou a ausência do pagamento sejam declarados pelo respectivo tabelião, para a comprova-ção da inércia do devedor principal e para a preservação da admissibi-lidade da execução forçada também contra os coobrigados, tudo nos termos do art. 1º da Lei n. 9.492/97, do art. 44 da Lei Uniforme e do art. 882 do Código de Processo Civil.

Com efeito, o protesto cambiário é a apresentação pública de um título e tem como escopo a produção de prova da recusa do aceite, da ocorrência do vencimento ou da falta do pagamento, conforme o caso. À vista do protesto, portanto, prova-se o descumprimento da obrigação cambial e a respectiva inadimplência do devedor principal, além da interrupção da prescrição para a ação cambial, por força do inciso III do art. 202 do Código Civil de 2002.

11.2. Natureza do protesto cambial

O protesto cambiário tem natureza extrajudicial, porquanto é rea-lizado perante Cartório de Protesto de Títulos, razão pela qual não há necessidade de advogado para a protocolização do título de crédito e do respectivo pedido de protesto.

Sem dúvida, a despeito da previsão nos arts. 882 e 883 do Código de Processo Civil, o protesto cambial não é processo cautelar; aliás, nem mesmo é processo143.

142 Além dos títulos de créditos, “outros documentos de dívida” também são passíveis de protesto, exvi do art. 1º da Lei n. 9.492/97.

143 Em sentido conforme, na doutrina: “Os arts. 882 a 887 tratam de duas medidas de naturezas substancialmente diferentes: o protesto de títulos e a apreensão de títu-los. O primeiro não é processo cautelar. É, aliás, medida administrativa extrajudi-cial, regulada em lei própria: a Lei Cambial, a Lei de Duplicatas, a Lei de Falências, cada uma delas estabelecendo os requisitos do título a ser protestado. (...) Tudo isso se faz, porém, extrajudicialmente, perante o oficial cartorário competente, que intimará do protesto o devedor, por carta registrada, ou entregando-lhe em mãos o aviso” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 192-193).

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Em suma, trata-se de ato de natureza extrajudicial para comprovar a inadimplência do devedor, resguardar direitos cambiários e interrom-per a prescrição da ação cambial.

11.3. Interrupção da prescrição

À luz do Código Civil de 1916, tanto a doutrina144 quanto a juris-prudência assentaram que o protesto cambial não interrompe a pres-crição, tese que restou consagrada no Enunciado 153 da Súmula do Supremo Tribunal Federal: “Simples protesto cambiário não interrom-pe a prescrição”.

Com o advento do Código de 2002, entretanto, o protesto cambial foi incluído no rol das causas interruptivas da prescrição, consoante o disposto no art. 202, III, do Código vigente. Daí a conclusão: o simples protesto cambiário interrompe a prescrição da pretensão executiva do credor, tendo em vista o disposto no art. 202, III, do Código Civil145.

11.4. Protesto obrigatório e protesto facultativo

Considera-se obrigatório o protesto cambial para preservar os di-reitos cambiários em relação aos coobrigados: emitente-sacador, tomador- -endossante, demais endossantes e respectivos avalistas. Em contrapo-sição, o protesto cambial é facultativo em relação ao aceitante da letra e

144 Assim, na doutrina clássica: “Já acentuamos, no momento próprio, que o protesto da cambial levado a efeito perante o Oficial de Protestos, do Registro Público, destinado a constituir o devedor em mora e resguardar o direito regressivo nos casos determinados em lei, não tem a virtude de suspender a prescrição. Somen-te o protesto judicial, com a citação pessoal do devedor, é que a interrompe” (Rubens Requião, Curso de direito comercial, v. II, 18. ed., 1992, p. 376).

145 Assim, na doutrina: “Já o inciso III indica que o protesto cambiário, ou seja, aque-le típico protesto extrajudicial lavrado perante o Cartório de Protestos de Títulos, nas modalidades de falta de aceite ou falta de pagamento, em que se comprova, por ato público, o não aceite por parte do sacado e a materialização do inadim-plemento da obrigação. Neste particular, o Código Civil avançou e ab-rogou a antiga Súmula 153, do Supremo Tribunal Federal, que até então tinha vigência, e indicava que o protesto cambiário não interrompia a prescrição. Assim, antes da regra prevista no inciso III, do art. 202, do Código Civil de 2002, somente era possível interromper a prescrição através de protesto judicial interruptivo, que, agora, como demonstrado, tal exigência está superada” (Luiz Antonio Guerra, Teoriageraldostítulosdecréditoeinstitutosconexos, 2007, p. 155).

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os avalistas do mesmo. Sem dúvida, à vista da interpretação do art. 53, § 1º, parte final, da Lei Uniforme de Genebra, o protesto é dispensável em relação ao devedor principal e aos respectivos avalistas146.

Sob outro prisma, o protesto falimentar é sempre obrigatório para a cobrança de título de crédito mediante demanda de falência fundada na causa de pedir do inciso I do art. 94 da Lei n. 11.101/2005. Com efei-to, a obrigatoriedade do protesto falimentar é extraída do disposto no art. 94, § 3º, da Lei n. 11.101/2005, e do art. 23, parágrafo único, da Lei n. 9.492/97147. Não obstante, não há necessidade de protesto falimentar

146 De acordo, na doutrina: “A execução é pertinente a portador de qualquer dos tí-tulos contra os chamados responsáveis principais: a) aceitante na letra de câmbio; b) emitente na promissória e no cheque; c) comprador na duplicata; e d) respectivos avalistas. É a ação direta, que independe de protesto. Contra os denominados responsáveis subsidiários, a) sacador na letra de câmbio; b) endossadores anterio-res e seus avalistas em qualquer dos títulos – cabe a ação regressiva, isso é, do que solveu a obrigação e que se vira contra o verdadeiro obrigado. Mas essa exige a juntada do competente instrumento de protesto, que não é judicial, e sim o formu-lado no Cartório competente, conforme a organização judiciária local” (Alcides de Mendonça Lima, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. VI, t. I, 1974, n. 744, p. 338). “O protesto, entretanto, não é requisito para acionar o devedor principal e seus avalistas; sua obrigação para com o pagamento apura-se diretamente da cártula, condicionada apenas ao vencimento da data aprazada, sem que tenha havido o pagamento correspondente. É lícito ao credor, porém, protestar o título em tais circunstâncias, mas é uma medida facultativa, razão pela qual se fala em protesto facultativo. Somente para se acionarem outros coobrigados, cuja respon-sabilidade pelo pagamento não é direta, mas decorrente da inadimplência do de-vedor principal e de seus avalistas, faz-se necessário o protesto” (Gladston Mame-de, Direitoempresarialbrasileiro: títulos de crédito, v. III, 3. ed., 2006, p. 168). No mesmo diapasão, na jurisprudência: “CAMBIAL. LEI UNIFORME. É legítima a interpretação de que o art. 53 estabelece a perda da ação, expirados os prazos, contra os endossantes, o sacador e respectivos avalistas, não contra o aceitante e seu avalista” (1ª Turma do STF, Ag 57.484/PE – AgRg, DiáriodaJustiça, 5-10-1973). “– Lei Uniforme sobre Letras de Câmbio e Notas Promissórias. Não é necessário o protesto do título para resguardo do direito de ação contra o avalista do emitente da promissória ou do aceitante da letra de câmbio” (1ª Turma do STF, RE 76.154/SP, DiáriodaJustiça, 15-6-1973, p. 4.332). Ainda no mesmo sentido, também na ju-risprudência: 3ª Turma do STJ, Ag 414.958/MG – AgRg, DiáriodaJustiça, 6-5-2002.

147 De acordo, na doutrina: “Serve, ainda, a outras finalidades, sendo certo, por exemplo, que na Lei de Falências (Lei n. 11.101/2005) para instruir o pedido de falência, os títulos não sujeitos a protesto obrigatório devem ser protestados. Como em tais circunstâncias o exercício do Direito está diretamente vinculado ao pro-testo do título, fala-se em protesto necessário” (Gladston Mamede, Direitoempre-sarialbrasileiro: títulos de crédito, v. III, 3. ed., 2006, p. 168).

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para a propositura de falência fundada nas causas arroladas nos incisos II148 e III do art. 94 da Lei n. 11.101/2005. Em suma, o protesto falimentar só é necessário quando a causa de pedir da falência reside no inciso I do art. 94 da Lei n. 11.101/2005.

11.5. Protesto por falta de aceite

A primeira modalidade de protesto cambiário a ser estudada é o “protesto por falta de aceite”, nos termos do art. 44 da Lei Uni-forme, in verbis: “A recusa de aceite ou de pagamento deve ser comprovada por um ato formal (protesto por falta de aceite ou falta de pagamento)”.

Na eventualidade da falta do aceite pelo sacado, o protesto é tirado contra o emitente-sacador cuja ordem de pagamento foi recusada. O sacado é apenas intimado, a fim de comparecer ao Cartório de Protesto de Títulos149; a recusa do sacado, todavia, ocasiona a extração do protes-to contra o emitente-sacador, responsável cambiário na eventualidade da falta de aceite da letra pelo sacado150.

Quanto ao prazo para o protesto por falta de aceite, aplica-se a regra inserta no proêmio do § 2º do art. 44: “O protesto por falta de acei-te deve ser feito nos prazos fixados para a apresentação ao aceite”.

Com efeito, o credor deve apresentar a letra no cartório compe-tente até o fim do prazo de apresentação para aceite do sacado. Se for letra a certo termo de vista, o prazo é de um ano da emissão do título, tendo em vista a combinação dos arts. 23, § 1º, e 44, § 2º, da Lei Uni-forme. Já a letra a certo termo da data e a letra pagável em dia certo podem ser apresentadas ao sacado para aceite até os respectivos ven-cimentos, em virtude da combinação dos arts. 21 e 44, § 2º, da Lei

148 A respeito da dispensa do protesto falimentar quando a quebra é requerida com esteio no inciso II do art. 94 da Lei n. 11.101/2005, na jurisprudência: “2 – O pedi-do de falência fundado em título executivo judicial pode ser instruído apenas com a certidão do juízo da execução, sendo dispensável o protesto especial para fins de falência. Não há porque exigir-se o protesto especial de um título judicial, porquanto, em sede de execução, a inadimplência e o descumprimento da obri-gação já são suficientemente provadas” (3ª Turma Cível do TJDF, AGI 2006.00.2.012704-5, DiáriodaJustiça, 27-11-2007, p. 253).

149 Cf. arts. 3º e 14 da Lei n. 9.492/97, e 883 do Código de Processo Civil.

150 Cf. art. 9º, § 1º, da Lei Uniforme.

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Uniforme. Por oportuno, vale lembrar que a letra de câmbio à vista não é apresentada para aceite151, mas, sim, para imediato pagamento, o qual deve ser realizado no mesmo momento da apresentação do título, exvi do proêmio do art. 34 da Lei Uniforme152. Na espécie153, portanto, o protesto se dará por falta de pagamento, e não por falta de aceite.

Em todos os casos, na eventualidade de o sacado solicitar uma segunda apresentação no dia seguinte, há a prorrogação do prazo refe-rente ao protesto para o dia seguinte, por força dos arts. 24, primeira parte, e 44, § 2º, infine, da Lei Uniforme: “Se, no caso previsto na alínea 1ª do art. 24, a primeira apresentação da letra tiver sido feita no último dia do prazo, pode fazer-se ainda o protesto no dia seguinte”.

Por fim, o decurso inalbis do prazo para o protesto por falta de aceite ocasiona a perda dos direitos cambiários contra os coobrigados154, exvi do disposto nos parágrafos iniciais do art. 53 da Lei Uniforme de Genebra. Por conseguinte, na eventualidade do decurso do prazo para o protesto por falta de aceite, só o avalista antecipado do sacado poderá ser acionado, tendo em vista o disposto no art. 14, primeira parte, do Decreto n. 2.044/1908155.

151 Em sentido conforme, na jurisprudência: “A apresentação da letra de câmbio sacada à vista é para pagamento, não comportando, portanto, apresentação para aceite. Com efeito, mostra-se regular o protesto por falta de pagamento de letra de câmbio sacada à vista, mesmo sem a presença do aceite do sacado” (17ª Câma-ra Cível do TJMG, Apelação 1.0481.02.015974-7/001, DiáriodaJustiça, 28-1-2009). “– É viável o protesto por falta de pagamento de letra de câmbio sacada à vista, mesmo sem o aceite do sacado” (3ª Turma do STJ, REsp 646.519/RS, DiáriodaJustiça, 30-5-2005, p. 373).

152 A letra à vista pode ser apresentada para pagamento imediato dentro de um ano da data da emissão, em razão do art. 34 da Lei Uniforme: “A letra à vista é pagá-vel à apresentação. Deve ser apresentada a pagamento dentro do prazo de 1 (um) ano, a contar de sua data”.

153 Vale dizer, letra de câmbio à vista.

154 Vale dizer, o emitente-sacador, o tomador-endossante, os demais endossantes e os avalistas de todos.

155 Assim, na jurisprudência: “Em face da autonomia das obrigações, a do avalista subsiste, quando se trata de aval antecipado ao aceite do título, mesmo se esse não ocorrer. Há, aí, obrigação de garantir o pagamento da cártula” (1ª Turma do STF, RE 99.523/AM, DiáriodaJustiça, 30-11-1984, p. 20444).

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11.6. Protesto por falta de pagamento

O proêmio do art. 44 da Lei Uniforme também dispõe sobre a mais importante modalidade de protesto cambiário: o protesto por falta de pagamento.

Na eventualidade de o sacado já ter lançado o aceite na letra, quan-do passa a ser o devedor principal, o protesto por falta de pagamento tem como alvo o sacado-aceitante, o qual deve ser intimado, com a ob-servância do disposto no art. 14 da Lei n. 9.492/97156.

Quanto ao prazo para o protesto por falta de pagamento, há séria divergência na doutrina entre a aplicação do caputdo art. 28 do Decreto n. 2.044/1908157 ou a incidência do § 3º do art. 44 da Lei Uniforme158. À

156 “Art. 14. Protocolizado o título ou documento de dívida, o tabelião de protesto expedirá a intimação ao devedor, no endereço fornecido pelo apresentante do tí-tulo ou documento, considerando-se cumprida quando comprovada a sua entre-ga no mesmo endereço. § 1º A remessa da intimação poderá ser feita por portador do próprio tabelião, ou por qualquer outro meio, desde que o recebimento fique assegurado e comprovado através de protocolo, aviso de recepção (AR) ou docu-mento equivalente”. Sem dúvida, a intimação do devedor não precisa ser realiza-da pessoalmente pelo tabelião.

157 Vale dizer, no dia primeiro útil após o vencimento. Em prol da aplicação do art. 28 do Decreto n. 2.044/1908: “Verificando-se o vencimento ordinário sem que ocorra o pagamento do título, tratando-se de letras de câmbio e notas promissórias, o protes-to por falta de pagamento, havendo devedores de regresso, deve ser tirado no pri-meiro dia útil seguinte ao vencimento. Atente-se que a LUG (3ª al. do art. 44), deter-mina que o protesto por falta de pagamento da letra de câmbio ou da nota promis-sória deve ser tirado ‘num dos dois dias úteis seguintes àquele em que a letra é pa-gável’. Mas o Brasil adotou a Reserva do art. 9º do Anexo II da Convenção de Gene-bra, o que remete a questão para nossa legislação interna. Em consequência, e em face daquela Reserva, aplica-se o art. 28 do Decreto 2.044/1908, ainda em vigor, pelo que o protesto por falta de pagamento da letra de câmbio ou da nota promissória haverá de ser tirado no primeiro dia útil seguinte ao vencimento da letra de câmbio ou da nota promissória” (Wille Duarte Costa, Títulosdecrédito, 3. ed., 2007, p. 262).

158 Vale dizer, até dois dias úteis após o vencimento. Em prol da aplicação do § 3º do art. 44 da Lei Uniforme: “para o protesto por falta de pagamento, o credor deverá entregar o título em cartório num dos dois dias úteis seguintes àquele em que ele for pagável (LU, art. 44), a menos que se adote o entendimento de alguns doutri-nadores que defendem a vigência da lei interna na disciplina desse prazo, quando então deverá o portador encaminhar o título já no primeiro dia útil seguinte ao do vencimento (Dec. n. 2.044/1908, art. 28)” (Fábio Ulhoa Coelho, Manualdedi-reitocomercial: direito de empresa, 18. ed., 2006, p. 265). “A apresentação da cambial a protesto por falta de pagamento deve ser feita num dos dois dias seguintes ao vencimento, porquanto vigente a alínea 3ª do art. 44 da Lei Uniforme, ante a re-

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luz do Decreto n. 57.663/66, tudo indica que o Brasil preservou a legis-lação interna, em razão da reserva permitida pelo art. 9º do Anexo II da Lei Uniforme. Daí a justificativa em prol da incidência do caput do art. 28 do Decreto n. 2.044/1908, com a defesa da doutrina159 segundo a qual o credor tem apenas um dia útil após o vencimento para protocolizar o requerimento de protesto no cartório competente.

Por fim, o decursoinalbis do prazo para o protesto da letra tem como consequência jurídica a perda dos direitos cambiários contra o emitente-sacador, o tomador-endossante, os demais endossantes e os avalistas de todos, exvi do art. 53 da Lei Uniforme. Subsistem apenas os direitos cambiários em relação ao aceitante160 e contra o respectivo avalista161. Daí a conclusão: quanto ao sacado-aceitante e o respectivo avalista, o protesto cambial é facultativo; quanto aos coobrigados, o protesto é necessário, sob pena de perda dos direitos cambiários.

11.7. Prazo para a extração do protesto pelo tabelião

Estudados os prazos para a apresentação do título no Cartório de Protestos de Títulos, resta estudar o prazo para a extração do protesto pelo tabelião.

À vista dos arts. 3º, 12 e 20 da Lei n. 9.492/97, cabe ao tabelião lavrar o registro do protesto no prazo de três dias úteis contados da protocoli-zação do título no Cartório de Protestos de Títulos. Com efeito, o protes-

serva adotada pelo Brasil e que apenas permite acrescentar a esse termo também o dia do vencimento. Todavia, por medida de prudência aconselha a doutrina seja o título apresentado no primeiro dia útil após o vencimento, conforme dispunha o art. 28 do citado Decreto n. 2.044”. (...) Pondera Antonio Mercado Júnior, NovaLeiCambialeNovaLeidoCheque, São Paulo, Saraiva, 1966, p. 136-137, deva ser feita a apresentação a protesto por falta de pagamento num dos dois dias seguin-tes ao vencimento, vigente a alínea 3ª do art. 44 da Lei Uniforme, ante a reserva adotada pelo Brasil e que apenas permite acrescentar a esse termo também o dia do vencimento. Todavia, por medida de prudência, aconselha realize-se a apre-sentação no primeiro dia útil após o vencimento, conforme dispunha o art. 28 do Decreto n. 2.044” (Carlos Alberto Alvaro de Oliveira, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. VIII, t. II, 7. ed., 2005, p. 413 e nota 750).

159 Cf. Wille Duarte Costa, Títulosdecrédito, 3. ed., 2007, p. 262.

160 Cf. art. 53, § 1º, infine, da Lei Uniforme.

161 Cf. art. 32, § 1º, da Lei Uniforme.

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to deve ser registrado pelo tabelião dentro de três dias úteis contados da protocolização do título no respectivo tabelionato.

Como já anotado, o dia é considerado útil para o direito cambi-ário quando há expediente bancário para o público, com horário normal162. No que tange à contagem do tríduo legal há a exclusão do dia da protocolização do título de crédito, com a inclusão do dia do vencimento163.

Não obstante, na eventualidade de a intimação do devedor ter sido realizada no último dia do tríduo legal, o protesto só será tirado no pri-meiro dia útil subsequente164. O mesmo raciocínio alcança a hipótese de realização da intimação do devedor além do prazo legal, por motivo de força maior165.

11.8. Dúvida

À vista do art. 884 do Código de Processo Civil, o tabelião pode denegar o protesto se constatar a irregularidade formal do título de crédito ou a inexigibilidade da obrigação cambial, por ainda não estar vencida166. Na eventualidade da denegação da extração do protesto pelo tabelião, o credor pode acionar o juízo competente, a fim de que a dúvi-da seja resolvida e o protesto seja lavrado, se for o caso, por força da sentença judicial, tudo nos termos do art. 884 do Código de 1973: “Se o oficial opuser dúvidas ou dificuldades à tomada do protesto ou à entre-ga do respectivo instrumento, poderá a parte reclamar ao juiz. Ouvido o oficial, o juiz proferirá sentença, que será transcrita no instrumento”167.

162 Cf. art. 12, § 2º, da Lei n. 9.492/97.

163 Cf. art. 12, § 1º, da Lei n. 9.492/97.

164 Cf. arts. 13 e 14 da Lei n. 9.492/97.

165 Cf. art. 13 da Lei n. 9.492/97.

166 Em contraposição, os obstáculos de fundo não podem ser apreciados pelo tabelião, como a eventual ocorrência de prescrição. Sem dúvida, as questões substanciais relativas ao direito material não podem ser apreciadas pelo tabelião, em razão da vedação prevista no art. 9º da Lei n. 9.492/97.

167 De acordo, na doutrina: “Somente se houver dúvida ou dificuldade quanto à tomada do protesto ou à entrega do respectivo instrumento é que a parte poderá reclamar ao juiz (art. 884). Esse pedido, porém, é de jurisdição voluntária e até administrativa, decorrente do poder de supervisão que o juiz exerce sobre os atos

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Por fim, se o tabelião não estiver convicto acerca da regularidade formal do título de crédito e da possibilidade jurídica do protesto à luz da cártula apresentada em cartório, também pode suscitar a dúvida perante o juízo competente168. Suscitada a dúvida pelo tabelião, o juiz deve ouvir o credor que apresentou o título em cartório. Em seguida, o juiz profere sentença, com a resolução da dúvida e, se for o caso, a ordem de extração do protesto.

11.9. Desistência do protesto

À vista dos arts. 3º e 16 da Lei n. 9.492/97, o credor apresentante do título levado a protesto pode desistir e retirar a cártula ainda não protestada, desde que efetue o pagamento das despesas cartorárias.

11.10. Pagamento antes da lavratura do protesto

O devedor pode efetuar o pagamento do título dentro do prazo legal, no próprio Cartório de Protesto. Além do valor principal estam-pado na cártula, o pagamento deve cobrir as despesas cartorárias, tendo em vista o disposto no art. 19 da Lei n. 9.492/97.

11.11. Sustação do protesto

À vista do art. 17 da Lei n. 9.492/97, o protesto ainda não lavrado também pode ser impedido mediante a propositura de demanda com pedido de sustação de protesto169. Lavrado o protesto, entretanto, não

de registros públicos extrajudiciais. Nesse caso, ouvido o oficial, o juiz proferirá sentença, que será transcrita no instrumento de protesto ou de negativa do pro-testo (art. 884, 2ª parte)” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivil, v. III, 17. ed., 2005, p. 193).

168 Assim, na jurisprudência: 2ª Seção do STJ, CC 35.484/RJ, DiáriodaJustiça, 13-10-2005; e 2ª Seção do STJ, CC n.4.840/RJ, DiáriodaJustiça, 4-10-1993.

169 Em sentido conforme, na jurisprudência: “Protesto. Sustação. Admite-se a susta-ção do protesto cambial quando para isso concorrerem razões relevantes” (3ª Turma do STJ, REsp 218.978/CE, DiáriodaJustiça, 4-9-2000, p. 150). “2. Invalidade da cláusula que autoriza o credor a emitir letra de câmbio com plena eficácia, independentemente de aceite. Sustação do protesto deferida” (4ª Turma do STJ, REsp 202.648/ES, DiáriodaJustiça, 1º-7-1999, p. 184). Também em sentido seme-lhante, na doutrina: “São frequentes, por exemplo, as cauções fixadas em ações cautelares de sustação de protesto, com liminar inauditaalteraparte. (...) Na susta-

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há mais lugar para a sustação do protesto, mas, sim, para o cancela-mento do protesto, mediante demanda com pedido específico de can-celamento170.

11.12. Cancelamento do protesto

O cancelamento do protesto cambial deve ser realizado pelo tabe-lião do Cartório de Protestos, mediante a apresentação, por qualquer pessoa, do título protestado, com o imediato pagamento da quantia declarada pelo apresentante do título no tabelionato, com o acréscimo das despesas cartorárias, com a observância do disposto nos arts. 25 e 26 da Lei n. 9.492/97.

Por fim, o cancelamento do protesto também pode ser determina-do por ordem judicial proveniente de processo instaurado pelo devedor cujo título sofreu protesto indevido.

11.13. Cláusula “sem protesto”

O emitente-sacador pode inserir na letra a cláusula “sem despesas” ou “sem protesto”, com a dispensa do protesto pelo credor para preser-var os direitos cambiários contra todos os devedores: principal e coobri-gados171. Por conseguinte, o protesto cambial passa a ser facultativo em relação a todos os devedores. É certo que ainda pode ser tirado o protes-to, mas corre por conta do credor, exvi do art. 46, § 3º, da Lei Uniforme: “Se, apesar da cláusula escrita pelo sacador, o portador faz o protesto, as respectivas despesas serão de conta dele”.

Se o credor, todavia, deixar de apresentar o título, ao sacado-acei-tante, até o vencimento, a letra “sem despesas” pagável no Brasil, ou até dois dias úteis do vencimento, se a letra for pagável no exterior, há a

ção de protesto, em regra a caução é exigida para demonstrar a solvência do re-querente, mormente quando se trata de empresa que pode postular a medida para impedir o ajuizamento de pedido de quebra ou a retroação dos termos legais desta” (Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novocursodedireitoprocessualcivil, v. III, 2008, p. 290).

170 Com igual opinião, na doutrina: Gladston Mamede, Direitoempresarialbrasileiro: títulos de crédito. 3. ed., 2006, p. 175.

171 Cf. art. 46, §§ 1º e 3º, da Lei Uniforme.

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perda dos direitos cambiários em relação aos coobrigados, exvi do art. 53, §§ 1º e 2º, da Lei Uniforme.

Por fim, quando a cláusula “sem despesas” é inserida por um en-dossante ou por um avalista, a dispensa do protesto para a conservação dos direitos cambiários alcança apenas aquele que fez a inclusão da cláusula. Quanto aos demais, subsiste a exigência do protesto cambial.

12. Ação cambial ou execução cambial

Diante do vencimento172 sem o respectivo pagamento do título de crédito, o credor pode executar tanto o devedor principal quanto os coobrigados, em conjunto ou isoladamente, conforme a preferência da-quele (credor), tudo nos termos dos arts. 43 e 47 da Lei Uniforme173. Em relação aos coobrigados, todavia, a subsistência dos direitos cambiários do credor depende do prévio protesto no prazo legal, consoante se infe-re do art. 53 da Lei Uniforme.

À vista do art. 49 do Decreto n. 2.044/1908, a “ação cambial é a executiva”174. O art. 585, I, do Código de Processo Civil reforça a admis-sibilidade da execução fundada em letra de câmbio.

Em regra, a execução cambial compreende a quantia estampada na cártula, mais juros de mora e correção monetária contados a partir

172 Vencimento que pode ser ordinário ou extraordinário.

173 Assim, na doutrina: “O portador tem, assim, o direito de acionar todos os obri-gados e coobrigados, sem estar adstrito a observar a ordem em que eles se obri-garam. Explicamos à saciedade que todos os que se obrigaram na letra a ela se vinculam diretamente, pois suas obrigações são autônomas, umas em relação às outras. O portador pode eleger apenas um obrigado, ou então um coobrigado para contra ele dirigir a ação, ou promovê-la contra todos, citando-os solidariamente” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, v. II, 18. ed., 1992, p. 368).

174 De acordo, na doutrina: “Mas o nome ação cambial, por tradição, ficou mantido, quando poderia ser execução cambial. No entanto, pouco importa se se trata de execução, ação de execução, execução cambial ou ação cambial. Isso quer dizer que a ação cambial segue o mesmo caminho estabelecido pelo processo civil bra-sileiro vigente para o processo de execução. Entenda-se, pois: a ação cambial corresponde ao processo de execução (arts. 586 e s. do CPC), especialmente com a aplicação do inciso I do art. 585, bem como dos arts. 646 e s. do Código de Pro-cesso Civil” (Wille Duarte Costa, Títulosdecrédito, 3. ed., 2007, p. 275).

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do vencimento, bem como as eventuais despesas cartorárias com o protesto.

No que tange à prescrição da pretensão executiva fundada na letra de câmbio, o prazo varia conforme o executado seja o devedor principal ou algum coobrigado. Em regra, a execução deve ser propos-ta dentro do prazo de três anos do vencimento da letra de câmbio. Trata-se de prazo prescricional disponível para o credor exercer a res-pectiva pretensão patrimonial contra o devedor principal, contra o respectivo avalista ou contra ambos, se assim preferir. Segundo o art. 70 da Lei Uniforme, portanto, o credor pode acionar o aceitante e os respectivos avalistas durante o prazo prescricional de três anos, conta-dos do vencimento da letra175. Com efeito, o credor pode acionar tanto o devedor principal (sacado-aceitante da letra) quanto o respectivo avalista mediante ação direta de execução, isto é, sem a necessidade de prévio protesto.

Quanto aos coobrigados da letra, quais sejam, o emitente-sacador, o tomador-endossante, os demais endossantes e avalistas deles, o credor tem o prazo de um ano para ajuizar a execução fundada no art. 585, I, do Código de Processo Civil. Trata-se de prazo prescricional que corre da data do protesto tempestivo ou do vencimento do eventual título “sem despesas”. Com efeito, no que tange ao emitente-sacador, endos-santes e respectivos avalistas, a ação cambial deve ser proposta dentro do prazo prescricional de um ano, contado da data do protesto tempes-tivo ou da data do vencimento, se a letra tiver a cláusula “sem protesto”, tudo nos termos do art. 70 da Lei Uniforme.

175 De acordo, na jurisprudência: “Nos termos do art. 70 da Lei Uniforme, normativo legal aplicado à letra de câmbio, é a ação cambial (ação de execução) que vem perecer com a incidência do instituto da prescrição, todavia, sobrevivendo ação de conhecimento (de cobrança), de cunho civil” (17ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0702.04.184212-2/001, DiáriodaJustiça, 12-10-2006). “Estabelece o art. 70 da Lei Uniforme, relativa às letras de câmbio, ser de 3 (três) anos o prazo para a propositura da ação executiva contra aceitante, na ordem de pagamento, e emi-tente, na promessa de pagamento, e seus avalistas, contados a partir do vencimen-to da cambial” (11ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 2.0000.00.484560-9/000, DiáriodaJustiça, 28-7-2006). “Estabelece o art. 70 da Lei Uniforme, relativa às letras de câmbio, ser de 3 anos o prazo para a propositura da ação executiva contra aceitante, na ordem de pagamento, e emitente, na promessa de pagamento, e seus avalistas, contados a partir do vencimento da cambial” (10ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0433.07.221751-9/001, DiáriodaJustiça, 20-6-2008).

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Na eventualidade de algum coobrigado efetuar o pagamento, pode exercer o direito de regresso contra outros coobrigados mediante ação de execução no prazo prescricional de seis meses, em virtude da sub- -rogação. À vista dos arts. 47, § 3º, e 70, § 3º, ambos da Lei Uniforme, o coobrigado que efetuar o pagamento dispõe do prazo de apenas seis meses para acionar coobrigados pretéritos na cadeia de anterioridade, em ação executiva de regresso. Por força do art. 567, III, do Código de Processo Civil, o sub-rogado pode iniciar nova execução ou até mesmo dar seguimento à execução movida pelo credor originário, hipótese na qual o coobrigado pagante passa a ocupar o lugar deixado pelo credor original cujo crédito foi satisfeito.

13. Ação de enriquecimento sem causa ou ação de locupleta-mento indevido

À vista do art. 48 do Decreto n. 2.044/1908, c/c os arts. 206, § 3º, IV, 884 e 886 do Código Civil de 2002, prescrita a execução cambial, ainda há a possibilidade de o credor ajuizar demanda cognitiva denominada “ação de locupletamento indevido”, “ação de enriquecimento sem cau-sa” ou “ação inremverso”176, dentro do prazo prescricional de três anos177.

176 De acordo, na doutrina: “AÇÃO INREMVERSO. O mesmo que ação de enrique-cimento ilícito” (Pinto Ferreira, Vocabuláriojurídicodasaçõesedosrecursos, 1999, p. 51). “Como se vê, a Convenção admitiu que a legislação nacional preservasse a ação inremverso, que havia sido introduzida em nosso direito expressamente pelo art. 48, no seguinte texto: ‘Sem embargo da desoneração da responsabilidade cambial, o sacador ou o aceitante fica obrigado a restituir ao portador, com os juros legais, a soma com a qual se locupletou às custas deste. A ação do portador, para este fim, é a ordinária’. Nesta ação, baseada nos princípios naturais da equi-dade, o autor deve provar o locupletamento à sua custa por parte do réu, isto é: a) o enriquecimento do réu; b) o seu empobrecimento; c) a falta de justa causa; d) a relação de causalidade entre o enriquecimento e o empobrecimento” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, v. II, 18. ed., 1992, p. 377).

177 Em sentido conforme, na doutrina: “É no campo dos títulos de crédito, em maior escala, que surgiu entre nós a aplicação da açãoinremverso. (...) Aliás, em matéria cambial, existe referência expressa, no direito positivo, à ação de enriquecimento indevido no art. 48 da Lei n. 2.044/1908. Nele permite-se a ação de rito ordinário contra o sacador ou aceitante de título de crédito que se tenha enriquecido inde-vidamente. Trata-se de ação subsidiária e tem como requisitos: a existência prévia de uma letra de câmbio (ou outro título de crédito), a desoneração da responsa-bilidade cambial por qualquer razão (falta de protesto obrigatório, falta de apre-sentação para aceite, prescrição) e que o prejuízo sofrido pelo portador do título

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À luz do art. 886 do Código Civil de 2002, o triênio previsto no inciso IV do § 3º do art. 206 do mesmo diploma só começa a correr após o decurso inalbis dos prazos para a execução do art. 70, § 1º, da Lei Uni-forme, e do art. 585, I, do Código de Processo Civil.

Com efeito, após o transcurso inalbis dos prazos prescricionais das pretensões executivas provenientes da letra de câmbio, é admissível a propositura da demanda de locupletamento ou enriquecimento indevi-do, no prazo prescricional de três anos, em virtude da combinação do art. 48 do Decreto n. 2.044/1908, com os arts. 206, § 3º, IV, 864 e 866, do Código Civil de 2002.

O prazo prescricional da pretensão de locupletamento é contado após a perda da força executiva da letra de câmbio, porquanto a deman-da de enriquecimento sem causa não é admissível enquanto for cabível a execução cambial, exvi do art. 886 do Código Civil178.

Ao contrário do que ocorre com a execução cambial, com três dife-rentes prazos prescricionais em razão do executado, a prescrição da pretensão exercida mediante demanda de locupletamento indevido é sempre de três anos, independentemente do demandado.

No que tange à legitimidade passiva, a demanda de enriquecimen-to sem causa só pode ser movida contra o beneficiário do locupletamen-to indevido. Por não estar fundada na responsabilidade cambial, mas,

corresponda a um efetivo enriquecimento por parte do aceitante ou sacador. Tí-pica situação de enriquecimento indevido (...). Ao finalizar, cumpre lembrar que o atual Código estabeleceu o prazo prescricional de três anos para a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa (art. 206, § 3º, IV)” (Sílvio de Salvo Venosa, Direitocivil, v. II, 6. ed., 2006, p. 212, 213 e 222, respectivamente).

178 De acordo, na doutrina: Wille Duarte Costa, Títulosdecrédito, 3. ed., 2007, p. 311: “A ação de locupletamento é a ação prevista no art. 48 do Decreto 2.044/1908, e no art. 61 da Lei do Cheque (Lei 7.357/85), que tem por objeto a cobrança quando ocorre a desoneração da responsabilidade cambial, facultando ao possuidor re-embolsar-se da importância com que tenham se locupletado à custa dele. (...) Em ambos os casos, seja em relação às letras de câmbio e notas promissórias, ou aos cheques, a ação de locupletamento tem o procedimento ordinário. Não tem, por isso mesmo, caráter cambial. Segue, portanto, o procedimento ordinário previsto no vigente CPC. Como a lei não fixa qualquer prazo de prescrição para a ação prevista na Lei Cambial (para letras de câmbio e notas promissórias), tem-se que sua prescrição ocorre como estabelece o Código Civil (no Código Civil três anos, de acordo com o inciso IV, § 3º, do art. 206), contados do dia da desoneração da responsabilidade cambial”.

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sim, no direito civil, a demanda não pode ser movida contra os coobri-gados cambiais que não se enriqueceram à custa do empobrecimento do credor do título. Ao contrário, portanto, da execução cambial, a qual pode ser movida contra qualquer um dos devedores e coobrigados cambiais, a demanda de enriquecimento sem causa só pode ser acionada contra quem efetivamente foi beneficiado pelo empobrecimento alheio179. Em suma, a demanda de locupletamento indevido não tem natureza execu-tiva nem cambial, mas, sim, cognitiva e civil, porquanto busca o reco-nhecimento do enriquecimento sem causa, à luz dos arts. 884 e s. do Código Civil e do art. 48 do Decreto n. 2.044/1908.

No tocante à causa de pedir, a demanda de enriquecimento inde-vido prescinde da veiculação da causa que deu origem ao título de cré-dito prescrito que não foi honrado. Com efeito, a petição inicial não precisa veicular a causa subjacente, mas apenas comprovar que o título de crédito prescrito não foi pago180.

179 De acordo, na jurisprudência: “– Ação de locupletamento fundada em cambial prescrita. Diversa da ação cambiária, a ordinária de enriquecimento, prevista no art. 48 da Lei n. 2.044, legitima-se quando se opera a exoneração da responsabili-dade cambial; nesse caso, seu processo não é mais o executivo (v. g. art. 49)” (1ª Turma do STF, RE 26.709/RN, DiáriodaJustiça, 27-1-1955, p. 1109). Colhe-se do voto condutor do eminente Ministro Ribeiro da Costa: “Diversa da ação cambiária, a ordinária de enriquecimento prevista no citado art. 48, legitima-se quando se opera a exoneração da responsabilidade cambial. Nesse caso, seu processo não mais é o executivo (v. g. art. 49). A legitimação passiva não abrange todos os que se obrigaram pela cambial (art. 50) e seu objeto não é tornar efetiva a responsabi-lidade cambial, que se pressupõe extinta, mas obter a restituição de lucro ilicita-mente auferido à custa do portador (vide Rec. Ext. 14.126, voto do Ministro H. Guimarães, relator, in Rev. For., v. 146, pág. 199). ‘Se não é cambiária’, acrescenta o referido voto, ‘a ação de enriquecimento não prescreve com a ação cambial (lei citada, art. 52), porque se supõe, aliás, perdida a ação cambial, pela prescrição ou decadência, como, por exemplo, dispõe o direito suíço das obrigações (redação em vigor a 1º-7-1937, art. 1.052). Observa Carvalho Santos: ‘Ainda que exonerados da responsabilidade cambial, em virtude da negligência do portador da letra de câmbio, o sacador ou o aceitante estão obrigados a restituir a este, com os juros legais, a soma com a qual se locupletaram à custa dele’ (Trat. de Direito Cambial Brasileiro, v. V)”.

180 De acordo, na doutrina: “Como se vê, a Convenção admitiu que a legislação nacional preservasse a ação inremverso, que havia sido introduzida em nosso direito expressamente pelo art. 48, no seguinte texto: ‘Sem embargo da desone-ração da responsabilidade cambial, o sacador ou o aceitante fica obrigado a res-tituir ao portador, com os juros legais, a soma com a qual se locupletou às custas

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Quanto ao procedimento, a demanda de locupletamento ilícito pode ser acionada pelo tradicional procedimento comum181, mas tam-bém pode ser aviada pelo procedimento monitório do art. 1.102-A do Código de Processo Civil182. Em virtude da faculdade conferida pelo art. 1.102-A do Código de Processo Civil, o titular da letra de câmbio prescrita tem a opção entre os procedimentos comum e monitório, para o recebimento da quantia objeto do enriquecimento indevido183, tão

deste. A ação do portador, para este fim, é a ordinária’. Nesta ação, baseada nos princípios naturais da equidade, o autor deve provar o locupletamento à sua custa por parte do réu, isto é: a) o enriquecimento do réu; b) o seu empobreci-mento; c) a falta de justa causa; d) a relação de causalidade entre o enriquecimen-to e o empobrecimento. Discute-se, nos tribunais brasileiros, se basta a simples apresentação do título cambiário para comprovação do prejuízo do autor e o enriquecimento sem causa do réu. Lembramos, no caso da controvérsia, a dou-trina exposta pelo Min. Hahnemann Guimarães, em voto no Supremo Tribunal Federal: ‘Quem não paga uma dívida se enriquece com o não pagamento dela. O emitente do título cambiário não provou o pagamento dele; é de presumir que ele se enriqueceu com o não pagamento. No caso, ficou provado que ele não pagou’ (Rec. Extr. 26.613, de 1958, inRev. Trim. de Jurisp., 8/123). É lição basea-da na doutrina de Whitaker, de que ‘a prova do prejuízo é feita pelo portador com a simples exibição do título não pago’” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, v. II, 18. ed., 1992, p. 377).

181 O procedimento comum pode ser ordinário ou sumário, conforme o valor.

182 Em sentido conforme: “I – A ação monitória foi introduzida no ordenamento jurídico brasileiro com a Reforma do Código de Processo Civil, através da Lei n. 9.079/95. Seu objetivo primordial é o de abreviar o caminho para a forma-ção do título executivo, contornando a lentidão inerente ao processo de co-nhecimento e ao rito ordinário. II – Mostra-se adequado a instruir a ação monitória o título de crédito que tenha perdido a eficácia executiva em face do transcurso do lapso prescricional. Precedentes do STJ” (3ª Turma do STJ, REsp 260.219/MG, DiáriodaJustiça, 2-4-2001). “I – O procedimento monitório, também conhecido como injuntivo, introduzido no atual processo civil brasi-leiro, largamente difundido e utilizado na Europa, com amplo sucesso, tem por objetivo abreviar a formação do título executivo, encurtando a via proce-dimental do processo de conhecimento. II – A ação monitória tem a natureza de processo cognitivo sumário e a finalidade de agilizar a prestação jurisdi-cional, sendo facultada a sua utilização, em nosso sistema, ao credor que possuir prova escrita do débito, sem força de título executivo, nos termos do art. 1.102-A, CPC” (4ª Turma do STJ, REsp 208.870/SP, DiáriodaJustiça, 28-6-1999, p. 124).

183 Cf. art. 48 do Decreto n. 2.044/1908, e arts. 206, § 3º, IV, 884 a 886, do Código Civil de 2002.

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logo decorrido inalbis o prazo prescricional disponível para a execução cambial184.

Ao contrário do que ocorre no procedimento comum, cujo valor da causa pode interferir na adoção do rito ordinário ou sumário, o mesmo não ocorre no procedimento monitório, o qual pode ser adota-do em causas com valores inferiores e superiores a sessenta salários mínimos.

Por fim, o réu indevidamente beneficiado pelo enriquecimento indevido deve ser condenado a pagar o valor objeto do enriquecimento ilícito, com juros, exvi do art. 48 do Decreto n. 2.044/1908.

14. Ação de cobrança ou ação causalO credor também pode acionar o devedor mediante demanda de

cobrança, com fundamento na causa subjacente que originou o título de crédito185. Na hipótese, a cártula não tem serventia enquanto título de crédito, mas apenas como meio de prova da relação jurídica subja-cente, sujeita ao livre convencimento do juiz da causa. Por conseguin-te, deve o autor veicular na petição inicial a origem da dívida cuja co-brança se faz186.

Por não ter natureza cambial, mas, sim, civil, a demanda cognitiva de cobrança ou causal só pode ser movida contra a pessoa que participou da relação jurídica subjacente, e não contra todos os obrigados e coobri-gados cambiais187.

184 Cf. art. 70 da Lei Uniforme e art. 585, I, do Código de Processo Civil.

185 De acordo, na jurisprudência: “Por isso, prescrita a execução do título pode o credor valer-se do procedimento ordinário de cobrança, o qual não é excluído pela existência da ação de locupletamento” (11ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0024.08.937384-9/001).

186 De acordo, na doutrina: “Ao se instaurar processo de conhecimento, objetivando o recebimento da importância devida e que fora representada por título executivo prescrito, declarado ou não, é evidente que o negócio subjacente deve ser descri-to como causa do pedido, e o título que poderá servir de começo de prova docu-mental perde toda sua natureza cambial” (Ernane Fidélis dos Santos, Manualdedireitoprocessualcivil, v. II, 10. ed., 2006, p. 24).

187 De acordo, na doutrina: Ernane Fidélis dos Santos, Manualdedireitoprocessualcivil, v. II, 10. ed., 2006, p. 24; e Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: di-reito de empresa. v. I, 12. ed., 2008, p. 432: “O devedor cuja obrigação tenha se

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No que tange ao prazo prescricional para a demanda de cobrança, há séria divergência na doutrina e na jurisprudência. É certo, entretanto, que prevalente a tese consubstanciada na aplicação do art. 206, § 5º, I, do Código Civil. Com efeito, à vista do entendimento predominante, a demanda de cobrança está sujeita ao prazo prescricional de cinco anos, nos termos do art. 206, § 5º, I, do Código Civil188.

Há, todavia, precedentes jurisprudenciais em favor da incidência da regra geral inserta no art. 205 do Código Civil: prazo prescricional de dez anos189-190.

originado exclusivamente no título de crédito – como e, em geral, o caso do ava-lista –, após a prescrição da execução cambial, não poderá ser responsabilizado em nenhuma hipótese perante o seu credor, já que não há causa subjacente a fundamentar qualquer pretensão ao recebimento do crédito. Por outro lado, como a ação causal não é cambial, são admitidas quaisquer matérias de defesa por parte do demandado”.

188 “2) Assim, o prazo prescricional da pretensão de cobrança é quinquenal, nos termos do art. 206, § 5º, I, do NCC” (2ª Câmara Cível do TJRJ, Apelação 2009.001.07855). Colhe-se do didático voto proferido pelo eminente Desembarga-dor Alexandre Freitas Câmara: “O direito de crédito decorrente da relação subja-cente ao cheque, por sua vez, está sujeito a prazo prescricional de cinco anos, na forma do disposto no art. 206, § 5º, I, do Código Civil, que estabelece o prazo quinquenal no caso de cobrança de dívida líquida constante de instrumento pú-blico ou particular”.

189 “O prazo prescricional para a pretensão de cobrança é de dez anos, ainda que o montante pleiteado se consubstancie em título de crédito, pois a ação proposta trata-se de direito pessoal e não de cambial” (14ª Câmara Cível do TJMG, Apela-ção 1.0035.06.066822-1/001, DiáriodaJustiça, 3-9-2007).

190 Ainda a respeito da aplicação da regra geral inserta no art. 205 do Código Civil, vale conferir a respeitável doutrina do Professor Ernane Fidélis dos Santos: “Na execução do título, autorizada exclusivamente por sua realidade formal (letra de câmbio, nota promissória, duplicata ou cheque), nada se questiona sobre o negócio subjacente, que, aliás, pode ser levantado, mas apenas em grau de embargos (ou nas vias ordinárias), com o objetivo de desconstituição do título. Uma pessoa, por exemplo, venda a outra um imóvel. Há prazo para o pagamento, e o comprador emite nota promissória corres-pondente à dívida. Vencido, o credor, em execução, apenas relata o título que tem em mãos (nota promissória, com tais e tais características) e reclama o pagamento. Nada de falar sobre a venda, que foi o negócio que provocou a emissão do título. Poderá ocorrer que, após o vencimento da nota promissória, três anos se passem. Mesmo assim, o credor promove a execução. O devedor alega prescrição, e o juiz deve declará-la, não valendo nenhuma alegação de

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Ainda que muito respeitáveis ambas as teses, defende-se outro raciocínio no presente compêndio: como a causa de pedir da demanda de cobrança é a causa subjacente que originou o título de crédito, o pra-zo prescricional deve ser aferido à vista de cada caso concreto, ou seja, à luz de cada causa ensejadora da demanda, tendo em vista os vários casos arrolados no art. 206 do Código Civil191.

Por fim, no que tange ao termo inicial do prazo prescricional, tam-bém há séria divergência na doutrina e na jurisprudência, mas prevale-ce o entendimento segundo o qual o quinquênio só começa a correr a partir da prescrição da execução cambial192. É a opinião sustentada no presente compêndio, porquanto não há interesse de agir para a cobran-

negócio subjacente, já que este não é objeto da execução e sim a nota promis-sória. Acontece que um negócio jurídico foi realizado entre as partes: a venda de um imóvel. O vendedor, porém, não recebeu o preço e, neste caso, poderá cobrá-lo em ação de conhecimento. O fato jurídico, a causa que vai justificar seu pedido, já não é a nota promissória vencida, mas a venda do imóvel e o não recebimento do preço, pretensão que só ficará afetada pela prescrição comum, agora, de dez anos (CC/2002, art. 205)” (Manualdedireitoprocessualcivil, v. II, 10. ed., 2006, p. 23-24).

191 Em sentido semelhante, na doutrina: “A ação causal (seja de conhecimento ou monitória) prescreve, por sua vez, de acordo com o disposto na legislação aplicá-vel ao vínculo extracambiário que une as partes da demanda: por exemplo, o contrato de compra e venda que deu origem ao título, o mútuo que foi cumprido através do endosso etc.” (Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, v. I, 12. ed., 2008, p. 432).

192 Em sentido conforme, na doutrina: “O credor que perdeu o direito à execução cambial pode com o título recorrer ao procedimento ordinário de conhecimento do negócio fundamental. Caso em que a cambial funciona como documento pro-batório da causa de que havia sido abstraída” (Amílcar de Castro, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. VIII, 2. ed., 1976, p. 55). De acordo quanto ao termo inicial, na jurisprudência: “O segundo prazo prescricional a ser observado, após a sua prescrição como cambial, nos termos do art. 206, § 5º, do Código Civil de 2002, é o prazo previsto para a cobrança, ou para a monitória, qual seja, o prazo de 05 (cinco) anos, contado a partir do término do prazo para o ajuizamento da ação de execução” (17ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0394.08.085900-9/001, DiáriodaJustiça, 6-10-2009).

Em sentido contrário, na doutrina: “O termo inicial de prescrição da ação causal, portanto, não é o exaurimento do prazo prescricional da ação cambial, mas a data – que pode mesmo ser até anterior à do saque do título de crédito – em que a medida poderia ter sido ajuizada” (Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, v. I, 12. ed., 2008, p. 432).

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ça mediante processo cognitivo na pendência do prazo prescricional para a execução cambial193.

193 De acordo, na doutrina: “Exemplo bastante eloquente desse elemento formador do interesse de agir é o que se tem na execução de créditos. Tendo o credor um título executivo, como um cheque ou uma nota promissória, deverá propor de-manda de execução, a fim de ver seu crédito satisfeito. Não existindo esse título, porém, a via executiva se mostra inadequada, devendo o credor propor demanda de conhecimento. A propositura de demanda de execução por quem não tenha título executivo (ou a propositura de demanda de conhecimento por quem tenha tal título) revela que a atuação do Estado-juiz terá sido provocada em busca de um provimento inadequado para a tutela da situação fática narrada pelo deman-dante, o que demonstra cabalmente a total inutilidade do referido provimento, razão pela qual faltará, na hipótese, interesse de agir” (Alexandre Freitas Câmara, Liçõesdedireitoprocessualcivil, v. I, 18. ed., 2008, p. 119). No mesmo sentido, ainda na doutrina: Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. I, 18. ed., 2005, p. 82-83.

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noTA PromissóriA

1. ConceitoA nota promissória é o título de crédito consubstanciado em com-

promisso escrito e solene, revelador de promessa direta de pagamento de quantia certa que o emitente-sacador faz em prol do tomador-bene-ficiário ou à sua ordem. É, em síntese, o conceito extraído da combinação do art. 54, caput, do Decreto n. 2.044/1908, com o art. 75 da Lei Uniforme de Genebra1.

2. Natureza jurídicaÀ vista do art. 887 do Código Civil, do art. 75 da Lei Uniforme de

Genebra e do art. 585, I, do Código de Processo Civil, a nota promissória é uma espécie de título de crédito e tem natureza de título executivo extrajudicial, razão pela qual pode instruir execução forçada contra o devedor principal (emitente-sacador) e eventuais coobrigados (endos-santes e avalistas).

3. Legislação de regênciaNa esteira da letra de câmbio, a nota promissória tem como prin-

cipal diploma de regência a Lei Uniforme de Genebra, a qual foi incor-

1 Em sentido conforme, na doutrina: “A nota promissória é uma promessa de pa-gamento pela qual alguém se obriga a pagar a outrem certa soma em dinheiro” (Waldo Fazzio Júnior, Manualdedireitocomercial, 7. ed., 2006, p. 403). “Incorporan-do a dívida com a promessa de pagamento em certo prazo, solenizada em docu-mento escrito e revestida das formalidades legais de natureza cambiária, assinada pelo devedor, passou a ser, por excelência, o documento sobre o qual se funda a operação de crédito, efetuada pelos estabelecimentos bancários” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, 18. ed., 1992, p. 380).

CApíTulO

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porada ao direito brasileiro por força do Decreto n. 57.663/66, com destaque para os arts. 75 a 78.

Na verdade, como o art. 77 da Lei Uniforme determina a aplicação subsidiária dos preceitos de regência da letra de câmbio também em relação à nota promissória, somente os arts. 75, 76 e 78 são dispositivos específicos da nota promissória, aplicáveis de forma direta. Já os precei-tos arrolados no art. 77 têm incidência apenas subsidiária, em virtude da aplicação analógica de dispositivos referentes à letra de câmbio.

No que for omissa a Lei Uniforme de Genebra, incide o Decreto n. 2.044/1908, ou seja, a Lei Cambiária Nacional2.

No que diz respeito especificamente ao protesto cambial, incide a Lei n. 9.492/97, cujo art. 21, § 4º, por exemplo, dispõe sobre a nota pro-missória.

Por fim, no que for omissa a legislação especial, incide o Código Civil de 2002, consoante revela o art. 903.

4. Sujeitos da relação cambial originária da notapromissória

A nota promissória tem apenas dois sujeitos originais: o emitente- -sacador3, na qualidade de devedor principal, e o tomador-beneficiário, credor do título.

O emitente-sacador é a pessoa que subscreve a nota promissória e assume o compromisso de pagar determinada importância em favor do tomador-beneficiário ou a alguém, à sua ordem. O emitente-sacador é o devedor principal da nota promissória, por ser equiparado ao aceitante4

2 Por exemplo, na jurisprudência: “RECURSO ESPECIAL. COMERCIAL E PRO-CESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. NOTA PROMISSÓRIA ASSINADA. DATAS DE VENCIMENTO. UMA POR ESCRITO E OUTRA NUMÉRICA. DIVERGÊNCIA DE ENTENDIMENTO. NULIDADE. APLICAÇÃO DE ANALOGIA. INCABÍVEL. EXISTÊNCIA DE LEI EXPRESSA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PRO-VIDO. I. Existindo dispositivo legal que prevê expressamente a nulidade da nota promissória que apresenta divergência de data de vencimento, incabível torna-se a aplicação da analogia para suprir lacuna que não existe. II. Aplicação do art. 55, parágrafo único, da Lei n. 2.044/1908. III. Recurso especial conhecido e provido” (4ª Turma do STJ, REsp 751.878/MG, DiáriodaJustiça eletrônico, 17-5-2010).

3 Vale dizer, “subscritor”, segundo a terminologia da Lei Uniforme de Genebra.

4 No mesmo sentido, na doutrina: “O sacador (emitente) compromete-se a pagar

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exvilegis, tendo em vista o disposto no art. 78, § 1º, da Lei Uniforme, no art. 56, § 2º, do Decreto n. 2.044/1908, e no art. 21, § 4º, da Lei n. 9.492/97. Por conseguinte, é facultativo o protesto em relação ao emitente-sacador da nota promissória, raciocínio que também alcança o respectivo avalis-ta. Ambos podem ser acionados mediante execução direta, ou seja, sem a necessidade de prévio protesto cambial5.

Já o tomador-beneficiário é o credor da quantia expressa na nota promissória. Por ser a nota promissória título à ordem6, o credor pode transferir o respectivo crédito mediante endosso.

Por fim, não só os empresários podem ser emitentes e beneficiários na relação jurídico-cambial proveniente da nota promissória7. Na verdade, todas as pessoas naturais capazes e as pessoas jurídicas em geral podem assumir obrigações e ser beneficiárias de direitos cambiais originários de notas promissórias.

5. Requisitos ou elementos da nota promissória

O art. 75 da Lei Uniforme contém os requisitos para que um docu-mento seja nota promissória. É indispensável a observância do disposto no art. 75, sob pena de nulidade do título e de carência da respectiva execução. Aliás, os requisitos legais devem ser apreciados até mesmo de

quantia determinada ao beneficiário; tem responsabilidade idêntica à do sacado (aceitante) da letra de câmbio” (Waldo Fazzio Júnior, Manualdedireitocomercial, 7. ed., 2006, p. 403).

5 De acordo, na jurisprudência: “I – Desnecessário é o protesto por falta de paga-mento da nota promissória, para o exercício do direito de ação do credor contra o seu subscritor e respectivo avalista” (4ª Turma do STJ, REsp 2.999/SC, DiáriodaJustiça, 6-8-1990, p. 7343). “LEI UNIFORME SOBRE LETRAS DE CÂMBIO E NOTAS PROMISSÓRIAS – Não é necessário o protesto do título para resguardo do direito de ação contra o avalista do emitente da promissória ou do aceitante da letra de câmbio” (1ª Turma do STF, RE 76.154, DiáriodaJustiça, 15-6-1973).

6 Cf. art. 75, n. 5, infine, da Lei Uniforme.

7 De acordo, na doutrina: “Hoje em dia, por exemplo, não são apenas os comer-ciantes que assinam letra de câmbio ou notas promissórias, títulos usados exclu-sivamente pelos mercadores, na época medieval e até época bem recente. O em-prego do título de crédito tornou-se corrente e universal” (Miguel Reale, Liçõespreliminaresdedireito, 27. ed., 4ª tir., 2004, p. 364).

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ofício pelo juiz da execução, em cumprimento ao disposto no art. 618, I, do Código de Processo Civil8.

Na verdade, os requisitos arrolados no art. 75 da Lei Uniforme podem ser essenciais ou acidentais. Os requisitos essenciais são os ele-mentos constitutivos da nota cujas ausências implicam imediata desca-racterização do título. Já os requisitos acidentais são os elementos saná-veis nas hipóteses arroladas no art. 76 do mesmo diploma, sem desca-racterização do título.

Expostas as duas classes de requisitos existentes no art. 75 da Lei Uniforme, convém examinar cada um dos elementos constitutivos da nota promissória.

À vista do art. 75, n. 1, da Lei Uniforme, a expressão “nota promis-sória” deve estar inserta no próprio texto da cártula, no idioma em que o título foi emitido. É juridicamente possível a emissão de nota promis-sória no estrangeiro e no idioma do país de origem, para ser paga no Brasil, como bem revela o § 2º do art. 585 do Código de Processo Civil9. À vista do mesmo preceito, nem há necessidade de homologação da nota promissória perante o Poder Judiciário brasileiro10.

Em segundo lugar, é indispensável a indicação da quantia a ser paga, consoante determina o art. 75, n. 2, da Lei Uniforme. Na eventua-lidade de divergência entre as indicações da importância, prevalece a

8 Assim, na jurisprudência: “AÇÃO DE EXECUÇÃO – NOTA PROMISSÓRIA – DATA E LOCAL DE EMISSÃO – OMISSÃO – REQUISITO ESSENCIAL – INEFI-CÁCIA PARA A EXECUÇÃO – EXTINÇÃO DO PROCESSO – MATÉRIA A SER ARGUIDA DE OFÍCIO. A jurisprudência das Turmas que compõem a Seção de Direito Privado do colendo Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que a data de emissão da nota promissória configura requisito essencial à sua validade como título executivo, nos termos do art. 75 da Lei Uniforme de Genebra” (18ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0702.06.276005-4/001, DiáriodaJustiça, 29-2-2008).

9 No mesmo sentido, na jurisprudência: “Os títulos executivos extrajudiciais, como a nota promissória, oriundos de país estrangeiro, somente terão eficácia executiva, no Brasil, nos termos da lei processual brasileira, se o indicarem como lugar do cumprimento da obrigação” (1ª Turma do STF, RE 101.120/RJ, DiáriodaJustiça, 5-10-1984, p. 16453).

10 De acordo, na doutrina: “Por outro lado, exigida a homologação de decisões ju-diciais, é intuitivo que títulos executivos extrajudiciais, como letras de câmbio e notas promissórias, não estão submetidas à homologação” (Cristiano Chaves de Farias, Direitocivil: teoria geral, 2. ed., 2005, p. 81).

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lançada por extenso no contexto da nota promissória, tendo em vista a combinação dos arts. 6º e 77 da Lei Uniforme, com o art. 54, § 3º, § 1º, do Decreto n. 2.044/1908. Em contraposição, eventual rasura retira do do-cumento a qualidade de título de crédito, por desrespeito aos princípios da literalidade e do formalismo11.

À luz do § 2º e do inciso I do art. 585 do Código de Processo Civil, é admissível a emissão de nota promissória em moeda estrangeira, com a conversão para moeda corrente no dia do pagamento12. Também é possível a emissão de nota promissória com valor expresso em índice oficial de atualização monetária13, com a posterior conversão para a

11 Assim, na jurisprudência: “APELAÇÃO CÍVEL – PROCESSO DE EXECUÇÃO – REQUISITOS DE FORMALIDADE – NOTA PROMISSÓRIA – RASURA NO VALOR NUMÉRICO – OBSTÁCULO INTRANSPONÍVEL. I – Em se tratando de processo de execução, pode e deve o julgador cercar-se da certeza de estarem presentes os requisitos de formalidade inerentes aos títulos cambiais, indepen-dentemente da matéria arguida em sede de embargos. II – A rasura no valor nu-mérico originalmente consignado, contido na nota promissória, ressai como obstáculo intransponível a que a parte possa se socorrer do rito especialíssimo a que se submete o processo de execução a fim de receber o seu crédito. III – Nada impede a parte de buscar o crédito que considera justo pela via do processo de conhecimento, quer pelo rito ordinário, quer pelo rito especial da monitória” (2ª Turma do TJDF, Apelação 51.223/99, DiáriodaJustiça, 1º-11-1999, p. 13).

12 Em sentido conforme, na jurisprudência: “Recurso extraordinário. Execução cambial fundada em título de crédito em moeda estrangeira. Exclusão dos juros inseridos nas notas promissórias. Decreto n. 2.044/1908, art. 44, I. Cobrança de títulos em moeda estrangeira, desde que o pagamento se faça mediante conversão cambial” (1ª Turma do STF, RE 100.550/SP, DiáriodaJustiça, 6-3-1992, p. 2430). “NOTA PROMISSÓRIA. Moeda estrangeira. Conversão. Data do pagamento. – A conversão da moeda estrangeira pode ser feita ao câmbio do dia do pagamento da nota promissória” (4ª Turma do STJ, REsp 195.078/BA, DiáriodaJustiça, 1º-7-1999, p. 183). “EXECUÇÃO. NOTA PROMISSÓRIA. VALOR EXPRESSO EM MOEDA ESTRANGEIRA. COBRANÇA EM REAL. LEGALIDADE. – Legítimo é o pacto celebrado em moeda estrangeira, desde que o pagamento se efetive pela conversão em moeda nacional” (4ª Turma do STJ, REsp 209.295/PB, DiáriodaJustiça, 26-8-2002, p. 224).

13 De acordo, na jurisprudência: “Nota promissória. Valor do débito expresso em O.R.T.N. (Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional), para pagamento do equivalente em cruzeiros, na data da liquidação. Admissibilidade da ação de execução. Liquidez e certeza do título. Sendo o valor da O.R.T.N. aferível a qual-quer momento e em qualquer lugar do País, pode ser expresso, como o quantum do débito, em nota promissória, o número dessas obrigações, desde que para pagamento em moeda nacional. Com isso, não deixa de ser líquido e certo o valor

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moeda nacional no momento do pagamento14. Por fim, é lícita a inclusão de cláusula de juros, contados a partir do vencimento15.

A nota promissória também deve conter a data do pagamento, em razão do disposto no art. 75, n. 3, da Lei Uniforme de Genebra. A propó-sito da época do pagamento, o art. 55 do Decreto n. 2.044/1908 revela que a nota pode ser à vista, a dia certo ou a tempo certo da data16. Se omissa a cártula acerca da época do pagamento, a nota promissória subsiste, mas como título à vista, em virtude do art. 76, § 2º, da Lei Uni-

da dívida. A adoção de tal critério, em título cambiário, não o desvirtua, mantém atualizados o crédito e o débito, não afronta qualquer princípio de direito, muito menos norma expressa de lei, não torna incerta nem ilíquida a dívida, não ofende a ordem pública nem os bons costumes. Com esse expediente, que não é ilícito, até se prescinde da correção monetária, que, nos títulos exequíveis em juízo, se conta a partir do vencimento da obrigação e também se calcula pela variação da O.R.T.N. (Lei 6.899/81, art. 1º, par 1.), pois a correção se fará automaticamente, com a variação dos índices respectivos. Precedente do S.T.F. R.E. conhecido, pela letra ‘d’ (dissídio jurisprudencial), e provido para prosseguimento da ação de execução como de direito. Maioria de votos” (1ª Turma do STF, RE 108.613/MG, DiáriodaJustiça, 24-4-1992, p. 5378). “Nota promissória. Valor expresso em OTN. Admissibilidade” (3ª Turma do STJ, REsp 31.593/MG, 26-4-1993). “Não é impres-tável nota promissória emitida em OTN (quantia determinada)” (3ª Turma do STJ, REsp 19.553/SP, DiáriodaJustiça, 31-5-1993, p. 10660). “EMBARGOS À EXECU-ÇÃO. Notas promissórias lançadas em cruzados, mas com correspondência às antigas OTNS. A circunstância de o título estar emitido em OTNS, ou conter também a expressão numérica a elas correspondente, não é motivo para invali-dá-lo, ou retirar-lhe a executividade” (4ª Turma do STJ, REsp 10.033/PR, DiáriodaJustiça, 30-9-1991, p. 13492).

14 Cf. art. 315, primeira parte, do Código Civil.

15 Assim, na jurisprudência: “Os juros da mora contam-se do vencimento do título” (1ª Turma do STF, RE 47.956/RS, DiáriodaJustiça, 15-2-1967). “– Cambial. Cobran-ça executiva de nota promissória. Contam-se os juros do vencimento do título” (1ª Turma do STF, RE 54.280/RS, DiáriodaJustiça, 13-11-1967).

16 Assim, na doutrina: “No direito cambiário brasileiro, por outro lado, não existe nota promissória a ‘tempo certo de vista’, como ocorre com a letra de câmbio” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, 18. ed., 1992, p. 382).

Em sentido contrário, também na doutrina: “d) As notas promissórias, embora não admitam aceite, podem ser emitidas com vencimento a certo termo de vista. Nesta hipótese, o credor deverá apresentar o título ao visto do emitente no prazo de 1 ano do saque (art. 23), sendo a data desse visto o termo aquo do lapso tem-poral de vencimento” (Fábio Ulhoa Coelho, Manualdedireitocomercial: direito de empresa, 18. ed., 2006, p. 271).

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forme17. Em contraposição, se lançadas duas datas de vencimento na cártula, esta não vale como nota promissória, exvi do art. 55, parágrafo único, da denominada Lei Cambial interna18.

A nota promissória também deve conter a indicação do lugar no qual o pagamento deve ser realizado. É o que determina o art. 75, n. 4, da Lei Uniforme, inverbis: “A indicação do lugar em que se deve efetuar o pagamento”.

Não obstante, ainda que omissa a cártula quanto ao lugar do pa-gamento, a nota promissória subsiste como título de crédito, porquanto o local no qual a nota foi emitida passa a ser considerado o lugar do pagamento, em virtude do art. 76, § 3º, da Lei Uniforme. Se omissa a nota também quanto ao local no qual foi emitida, considera-se o lugar indi-cado ao lado do nome do emitente-sacador, por força do art. 76, § 4º, do mesmo diploma19.

A nota também deve conter expressa referência ao nome do toma-dor-beneficiário, exvi do art. 75, n. 5, da Lei Uniforme. O tomador-bene-ficiário é o credor, ou seja, a pessoa a quem ou à ordem de quem deve ser paga a quantia indicada na nota promissória. Com efeito, a expressão

17 Assim, na jurisprudência: “– A nota promissória que não indique a época do pagamento será considerada à vista. Art. 75, Lei Uniforme” (3ª Turma do STJ, Ag 752.391/SP – EDcl – AgRg, DiáriodaJustiça, 18-11-2006, p. 374).

18 Assim, na jurisprudência: “RECURSO ESPECIAL. COMERCIAL E PROCES SUAL CIVIL. EXECUÇÃO. NOTA PROMISSÓRIA ASSINADA. DATAS DE VENCI-MENTO. UMA POR ESCRITO E OUTRA NUMÉRICA. DIVERGÊNCIA DE ENTENDIMENTO. NULIDADE. APLICAÇÃO DE ANALOGIA. INCABÍVEL. EXISTÊNCIA DE LEI EXPRESSA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PRO-VIDO. I. Existindo dispositivo legal que prevê expressamente a nulidade da nota promissória que apresenta divergência de data de vencimento, incabível torna-se a aplicação da analogia para suprir lacuna que não existe. II. Aplicação do art. 55, parágrafo único, da Lei n. 2.044/1908. III. Recurso especial conhecido e pro-vido” (4ª Turma do STJ, REsp 751.878/MG, DiáriodaJustiça eletrônico, 17-5-2010).

19 De acordo, na jurisprudência: “Não se erige a ausência do lugar do pagamento em requisito essencial, visto que dispõe expressamente a lei cambial que a nota promissória a que o mesmo faltar será pagável no domicílio do emitente, circuns-tância que não afeta a exigibilidade do título” (16ª Câmara Cível do TJMG, Ape-lação 1.0694.07.036282-7/001, DiáriodaJustiça, 15-2-2008). “Dispõe expressamen-te a Lei Cambial que a nota promissória a que faltar o lugar do pagamento será pagável no domicílio do emitente, pelo que a ausência de tal fato não afeta a exigibilidade do título” (3ª Câmara Cível do TAMG, Apelação 296.539-1, DiáriodaJustiça, 12-2-2000).

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legal “à ordem” significa que a nota pode ser transferida em prol de outrem, por meio de endosso20.

À vista do art. 75, n. 5, da Lei Uniforme, nota promissória sacada ao portador não tem validade alguma, porquanto o preceito legal revela a classe do título: nominativo. Não obstante, a nota promissória emitida em branco ou incompleta, sem a designação do tomador-beneficiário, pode ser preenchida, em momento posterior, pelo respectivo credor de boa-fé, desde que antes do protesto do título e também antes de acionar a execução, tudo nos termos do Enunciado 387 da Súmula do Supremo Tribunal Federal21.

A nota promissória também deve conter a indicação do local e da data da emissão, tendo em vista o disposto no art. 75, n. 6, da Lei Uni-forme. Não obstante, a ausência do local no qual a nota promissória foi emitida não a descaracteriza enquanto título de crédito, porquanto é considerado o lugar indicado ao lado do nome do emitente-subscritor, por força do art. 76, § 4º, da Lei Uniforme22. Em contraposição, a falta da data da emissão retira do documento o valor de nota promissória23;

20 Cf. art. 910 do Código Civil.

21 No sentido do texto, na jurisprudência: “– Nota promissória em branco ou incom-pleta. Até terminar sua circulação ou ingressar em juízo, pode ser completada pelo portador, salvo caso de má-fé comprovada” (1ª Turma do STF, RE 17.573/DF, DiáriodaJustiça, 14-7-1952). “– A nota promissória em branco pode circular por tradição manual, até que algum portador de boa fé possa inscrever o seu nome como beneficiário;” (1ª Turma do STF, RE 53.399/MG, DiáriodaJustiça, 27-9-1968). “– Já é pacífica na doutrina e na jurisprudência a possibilidade da emissão de tí-tulo cambial em branco ou incompleto, a ser preenchido por terceiro” (1ª Turma do STF, RE 91.209/SP, DiáriodaJustiça, 31-8-1979).

22 De acordo, na jurisprudência: “1 – O local de emissão do título consiste em requi-sito acidental da nota promissória, sendo suprida sua ausência pela consideração advinda da lei de que o documento foi emitido no local do domicílio do subscritor” (9ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0702.07.347329-1/001, DiáriodaJustiça, 1º-11-2008).

23 Assim, na jurisprudência: “PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO DE INSTRUMEN-TO – NOTA PROMISSÓRIA – AUSÊNCIA DA DATA DA EMISSÃO – RIGOR CAMBIÁRIO. REQUISITO ESSENCIAL – IMPOSSIBILIDADE PARA INSTRU-MENTALIZAR A EXECUÇÃO – EXTINÇÃO. A ausência da data de emissão da nota promissória a descaracteriza como título executivo. Se a nota promissória não contém a data de sua emissão, não está apta a embasar processo executivo, devendo ser extinta a execução proposta com base neste título” (17ª Câmara Cível do TJMG, Agravo de Instrumento 1.0079.02.011059-3/004, DiáriodaJustiça, 12-8-

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a omissão, todavia, pode ser sanada com o preenchimento pelo credor de boa-fé, desde que antes do protesto cambial e do ingresso da execução em juízo24.

Ao final, a nota promissória deve conter a assinatura do emitente- -sacador, em cumprimento do disposto no art. 75, n. 7, da Lei Uniforme. É admissível, todavia, a emissão de nota promissória subscrita por man-datário especial, ou seja, por procurador com poder especial, tendo em vista a autorização do art. 54, IV, do Decreto n. 2.044/190825. Não obs-tante, o mandatário com poder especial para sacar a nota promissória não pode ser o próprio beneficiário do título, como bem assentou o Su-perior Tribunal de Justiça por meio do Enunciado 60 da Súmula da Corte: “É nula a obrigação cambial assumida por procurador do mutu-ário vinculado ao mutuante, no exclusivo interesse deste”26. Bem exa-

2008). “AÇÃO DE EXECUÇÃO – NOTA PROMISSÓRIA – DATA E LOCAL DE EMISSÃO – OMISSÃO – REQUISITO ESSENCIAL – INEFICÁCIA PARA A EXE-CUÇÃO – EXTINÇÃO DO PROCESSO – MATÉRIA A SER ARGUIDA DE OFÍCIO. A jurisprudência das Turmas que compõem a Seção de Direito Privado do colen-do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que a data de emissão da nota promissória configura requisito essencial à sua validade como título execu-tivo, nos termos do art. 75 da Lei Uniforme de Genebra” (18ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0702.06.276005-4/001, DiáriodaJustiça, 29-2-2008).

24 De acordo, na jurisprudência: “PROCESSUAL CIVIL – EXECUÇÃO – NOTA PROMISSÓRIA – DATA DE EMISSÃO OU INEXISTÊNCIA DO NOME DO BE-NEFICIÁRIO. I – Sua ausência importa em descaracterização do título. II – Porta-dor do título pode preencher o claro, mas há de fazê-lo até o ajuizamento da ação; de contrário, ocorre carência de execução por falta de título executivo regular. Lei Uniforme, art. 76 e 77. Ineficácia do título” (3ª Turma do STJ, REsp 137.769/MG, DiáriodaJustiça, 5-4-1999, p. 124). “Execução. Nota Promissória. Data de emissão. Sua ausência importa em descaracterização do título. Portador do título pode preencher o claro, mas há de fazê-lo, até o ajuizamento da ação; do contrário, ocorre carência da execução, por falta de título executivo regular. Lei Uniforme, arts. 10, 76 e 77. Ineficácia do Título” (1ª Turma do STF, RE 100.828/SP, DiáriodaJustiça, 23-8- 1985, p. 13779).

25 Assim, na jurisprudência: “Constitui entendimento pacífico, na doutrina e na ju-risprudência pátrias, ser perfeitamente possível a emissão de títulos cambiais por meio de procurador. Quanto a isso não há controvérsia” (trecho extraído do bem fundamentado voto proferido pelo Ministro Eduardo Ribeiro no REsp 13.996/RS).

26 De acordo, na jurisprudência: “COMERCIAL E CIVIL. EXECUÇÃO. NOTA PROMISSÓRIA PREENCHIDA EM NOME DA DEVEDORA POR INSTITUIÇÃO CREDITÍCIA COLIGADA DO EXEQUENTE. CLÁUSULA-MANDATO. NULI-DADE. CC, ART. 115. SÚMULA 60-STJ. Nula é a nota promissória preenchida, em

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minado o teor do verbete sumular, constata-se que o Enunciado 60 prestigiou a Conclusão n. 2 aprovada durante o 5º Encontro Nacional dos Tribunais de Alçada, em 1981: “É inválida a procuração outorgada por mutuário em favor de empresa pertencente ao grupo financeiro do mutuante, para assumir responsabilidade, de extensão não especificada, em títulos cambiais, figurando como favorecido o mutuante (aprovada por 14 votos contra 4)”27.

Além do requisito arrolado no n. 7 do art. 75 da Lei Uniforme, qual seja, a assinatura do emitente-sacador da nota promissória, o título tam-bém deve conter alguma identificação numérica do emitente-sacador, como o número da respectiva Cédula de Identidade, da inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas, do Título Eleitoral ou da Carteira Profissio-nal, tendo em vista a exigência inserta no art. 3º da Lei n. 6.268/75, inverbis: “Art 3º Os títulos cambiais e as duplicatas de fatura conterão, obrigatoriamente, a identificação do devedor pelo número de sua cédu-la de identidade, de inscrição no cadastro de pessoa física, do título eleitoral ou da carteira profissional”.

Não há necessidade, por outro lado, de assinatura de testemunha da relação jurídico-cambial, porquanto a obrigação cambiária nasce com a só subscrição da nota promissória pelo emitente-sacador28.

Por fim, ressalvadas as exceções legais já apontadas, quais sejam, as arroladas nos §§ 2º, 3º e 4º do art. 76 da Lei Uniforme, a ausência de algum requisito previsto no art. 75 da Lei Uniforme retira do documen-to o valor jurídico de nota promissória e, por conseguinte, de título de crédito29. Com efeito, a formação da nota promissória depende da ob-

nome do devedor, pelo próprio credor ou pessoa/instituição a ele vinculada ou coligada, com base em mandato inserto em cláusula de contrato de mútuo. Con-traposição de interesses jurídicos, a desvirtuar a natureza da outorga, tornando-a ineficaz, bem assim a cártula dela decorrente. Incidência, na espécie, da Súmula 60 do STJ. Recurso especial conhecido e provido” (4ª Turma do STJ, REsp 168.029/SP, DiáriodaJustiça, 4-2-2002, p. 367).

27 Cf. Minas Gerais,DiáriodoJudiciário, 26-2-1982, p. 1.

28 De acordo, na jurisprudência: “II. Aos títulos de crédito, assim reconhecidos em lei, dispensa-se a formalidade exigida aos contratos particulares, de assinatura de duas testemunhas, para que adquiram executoriedade” (4ª Turma do STJ, REsp 215.265/GO, DiáriodaJustiça, 4-2-2002, p. 369).

29 A propósito da necessidade da observância dos requisitos legais da nota promis-sória, vale conferir a precisa lição do Ministro Carlos Maximiliano: “Por motivos

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servância dos requisitos essenciais do art. 75 da Lei Uniforme, tendo em vista o disposto no art. 76, § 1º, da Lei Uniforme, e no art. 54, § 4º, do Decreto n. 2.044/1908. Não obstante, o credor de boa-fé pode completar a cártula após o saque da nota promissória, desde que o faça antes do protesto e da execução cambial, à vista do Enunciado 387 da Súmula do Supremo Tribunal Federal.

Estudados os elementos legais, eis um exemplo de nota promis-sória:

Por meio da presente nota promissória, o sacador S, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas sob o número 111.111-11, domiciliado em Viçosa, no endereço X, promete pagar, no dia 31 de janeiro de 2011, o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), em prol do beneficiário B, inscrito no Cadas-tro de Pessoas Físicas sob o número 222.222-22, domiciliado em Belo Horizonte, no endereço Z, no qual o pagamento será realizado na data do vencimento, sob pena de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês.

Passada em Viçosa, no dia 1º de dezembro de 2008.

Assinada pelo sacador S.

6. Enunciado 258 da Súmula do Superior Tribunal de JustiçaAntes do advento do Enunciado 258 da Súmula do Superior Tribu-

nal de Justiça era muito frequente a emissão de notas promissórias provenientes de contratos bancários de abertura de crédito.

Com efeito, as notas promissórias eram sacadas pelos devedores de contratos de abertura de crédito como verdadeiras garantias das dí-vidas bancárias cujos valores devidos não eram líquidos, tendo em vista a unilateralidade da prova consubstanciada nos extratos produzidos pelas próprias instituições bancárias.

de interesse geral se prescrevem formalidades constitutivas, essenciais para certos atos; a inobservância das mesmas induz nulidade e dá margem a outras penas, seja qual for a vontade das partes. A estes se não atribui o poder de con-vencionar o contrário do que uma norma imperativa ou proibitiva dispôs como substancial, intrínseco ou de ordem pública. Assim acontece com os preceitos que regulam a circulação de mercadorias e dos títulos de crédito, os requisitos das letras de câmbio e notas promissórias, a organização exterior das sociedades, os termos de outorga de mandato” (Hermenêuticaeaplicaçãododireito, 16. ed., 1996, p. 319, n. 386).

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Ademais, como as notas promissórias não circulavam, por terem sido emitidas como instrumento de garantia, havia lugar para a discus-são sobre a origem das dívidas, até mesmo em razão da falta de liquidez.

À vista dos argumentos expostos, o Superior Tribunal de Justiça aprovou o correto Enunciado 258, nos seguintes termos: “A nota promis-sória vinculada a contrato de abertura de crédito não goza de autonomia em razão da iliquidez do título que a originou”30.

7. Aceite

Não há lugar para aceite na nota promissória31, porquanto o emi-

30 Assim, ainda na jurisprudência: “PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE EXECUÇÃO. EMISSÃO DE TÍTULO DE CRÉDITO – NOTA PROMISSÓRIA – VINCULADA A CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO. AUSÊNCIA DE EXIGIBILIDADE. TÍTULO CAMBIAL EMITIDO COMO GARANTIA DE DÍVIDA BANCÁRIA. AUSÊNCIA DE CIRCULAÇÃO. PERDA DA NATUREZA CAMBIÁRIA. I – Au-sente a circulação do título de crédito, a nota promissória que não é sacada como promessa de pagamento, mas como garantia de contrato de abertura de crédito, a que foi vinculada, tem sua natureza cambial desnaturada, subtraída a sua auto-nomia. II – A iliquidez do contrato de abertura de crédito é transmitida à nota promissória vinculada, contaminando-a, pois o objeto contratual é a disposição de certo numerário, dentro de um limite prefixado, sendo que essa indeterminação do quantum devido, comunica-se com a nota promissória por terem nascidos da mesma obrigação jurídica” (2ª Seção do STJ, EREsp 262.623/RS, DiáriodaJustiça, 2-4-2001, p. 251). “PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE EXECUÇÃO. EMISSÃO DE TÍTULO DE CRÉDITO – NOTA PROMISSÓRIA – VINCULADA A CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO. AUSÊNCIA DE EXIGIBILIDADE. TÍTULO CAM-BIAL EMITIDO COMO GARANTIA DE DÍVIDA BANCÁRIA. AUSÊNCIA DE CIRCULAÇÃO. PERDA DA NATUREZA CAMBIÁRIA. I – Não havendo a circu-lação do título, resta patente que este se destinou à garantia de negócio jurídico subjacente, refugindo da principiologia cambiária. II – Nota promissória que não é sacada como promessa de pagamento, mas como garantia de contrato de aber-tura de crédito, a que foi vinculada, tem sua natureza cambial desnaturada, sub-traída a sua autonomia. Precedente da 3ª Turma: REsp 239.352” (3ª Turma do STJ, REsp 264.850/SP, DiáriodaJustiça, 5-3-2001, p. 159).

31 No mesmo sentido, na doutrina: “O emitente da nota promissória é equiparado, para os efeitos legais, ao aceitante da letra de câmbio, pois no título ocupa a posi-ção de devedor. A nota promissória não tem aceite, pois a simples assinatura do emitente o obriga ao pagamento, como ocorre com o aceitante da letra de câmbio. A nota promissória, por assim dizer, nasce aceita...” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, v. II, 18. ed., 1992, p. 379; grifos aditados). “A nota promissória desconhece aceite, ou seja, a ela não se aplicam os princípios desse instituto pe-

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tente-sacador já é equiparado ao aceitante por força de lei: art. 78, § 1º, da Lei Uniforme, e art. 56, § 2º, do Decreto n. 2.044/1908.

Ademais, o art. 77 faz referência aos diversos institutos cambiários aplicáveis à nota promissória, sem menção alguma ao aceite, com evi-dente silêncio eloquente. Daí a conclusão: ao contrário da letra de câmbio, a nota promissória não enseja aceite.

8. AvalAlém dos sujeitos originários da nota promissória, também há lugar

para a intervenção de avalista, conforme revela o último parágrafo do art. 77, inverbis: “São também aplicáveis às notas promissórias as dispo-sições relativas ao aval (arts. 30 a 32); no caso previsto na última alínea do art. 31, se o aval não indicar a pessoa por quem é dado, entender-se- -á ser pelo subscritor da nota promissória”.

Sem dúvida, as regras atinentes ao aval na letra de câmbio também alcançam a nota promissória. Por exemplo, tal como ocorre na letra, também é admissível aval parcial na nota promissória, em virtude da combinação dos arts. 30 e 77, ambos da Lei Uniforme.

À vista dos arts. 47, § 1º, e 77, § 1º, da Lei Uniforme, o avalista da nota promissória é responsável cambial pelo pagamento do título tal como o avalizado32. Ainda por força das disposições que versam sobre a letra de câmbio, incide a regra segundo a qual, se o título de crédito já circulou, não há lugar para discussão da origem da dívida pelo avalista da nota33. Em contraposição, se a nota promissória ainda está nas mãos

culiares à letra de câmbio” (J. M. Othon Sidou, Dicionáriojurídico: Academia Bra-sileira de Letras Jurídicas, 9. ed., 2004, p. 589; grifo aditado). “Assim, não há que se cogitar de aceite, vencimento antecipado por recusa de aceite, cláusula não aceitável etc.” (Fábio Ulhoa Coelho, Manualdedireitocomercial: direito de empresa, 18. ed., 2006, p. 270; grifo aditado).

32 De acordo, na jurisprudência: “– Como instituto típico do direito cambiário, o aval é dotado de autonomia substancial, de sorte que a sua existência, validade e eficácia não estão jungidas à da obrigação avalizada. – Diante disso, o fato do sacador de nota promissória vir a ter a sua falência decretada, em nada afeta a obrigação do avalista do título, que, inclusive, não pode opor em seu favor qual-quer dos efeitos decorrentes da quebra do avalizado” (3ª Turma do STJ, REsp 883.859/SC, DiáriodaJustiça eletrônico, 23-3-2009).

33 De acordo, na jurisprudência: “EXECUÇÃO. NOTA PROMISSÓRIA. AVALISTA. DISCUSSÃO SOBRE A ORIGEM DO DÉBITO. INADMISSIBILIDADE. ÔNUS DA

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dos sujeitos originários da relação jurídico-cambial, é possível discutir a eventual ilicitude da origem da dívida, ou seja, da causadebendi34.

Quanto ao aval em branco, na letra é considerado em favor do emitente-sacador35; mutatismutandis, o favorecido pelo aval em branco lançado na nota promissória também é o emitente-sacador36.

Por fim, há um aspecto do aval na promissória que merece destaque. A despeito da literalidade do art. 31 da Lei Uniforme, não só a simples assinatura aposta na face da nota implica aval; se não há dúvida de que a simples assinatura exarada no verso da nota não foi lançada na qualidade de endosso, prevalece o entendimento ju-risprudencial de que também significa aval37.

PROVA. – O aval é obrigação autônoma e independente, descabendo assim a discussão sobre a origem da dívida” (4ª Turma do STJ, REsp 190.753/SP, DiáriodaJustiça, 19-11-2003, p. 467).

34 De acordo, na jurisprudência: “Comercial. Título de crédito. Avalista. Discussão sobre a origem do débito. Ausência de circulação do título. Possibilidade. Prece-dentes. – Na esteira de precedentes da 3ª Turma do STJ, se o título de crédito não circulou, pode o avalista arguir exceções baseadas na extinção, ilicitude ou inexis-tência da dívida da qual originou o título, visando evitar o enriquecimento sem causa do credor. Recurso especial conhecido e provido” (3ª Turma do STJ, REsp 678.881/PR, DiáriodaJustiça, 30-6-2006, p. 216). “Aval. Autonomia. Oponibilidade de exceções. Não pode o avalista opor exceções fundadas em fato que só ao ava-lizado diga respeito, como o de ter-lhe sido deferida concordata. Entretanto, se o título não circulou, ser-lhe-á dado fazê-lo quanto ao que se refira à própria exis-tência do débito. Se a dívida, pertinente à relação que deu causa à criação do títu-lo, desapareceu ou não chegou a existir, poderá o avalizado fundar-se nisso para recusar o pagamento” (3ª Turma do STJ, REsp 162.332/SP, DiáriodaJustiça, 21-8-2000, p. 117).

35 Cf. art. 31, § 4º, infine, da Lei Uniforme.

36 Cf. art. 77, infine, da Lei Uniforme.

37 Cf. STF, RE 93.058/PR; 3ª Turma do STJ, REsp 90.269/MG, RevistadoSTJ, v. 104, p. 297; e 3ª Turma do STJ, REsp 86.584/MG, Diárioda Justiça, 7-2-2000: “COMERCIAL. NOTA PROMISSÓRIA. AVAL. A só assinatura no verso da nota promissória caracteriza o aval. Ressalva do ponto de vista pessoal do Relator”. Com efeito, o Relator, Ministro Ari Pargendler, fez a seguinte ressalva: “Salvo melhor juízo, a letra do art. 31 da Lei Uniforme não autoriza a interpretação de que a só assinatura no verso da nota promissória caracterize o aval”. Não obs-tante, prevaleceu a tese segundo a qual a simples assinatura no verso também pode ser aval, desde que não haja dúvida de que a assinatura lançada não pode ser endosso.

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9. Protesto cambialEm razão da equiparação legal do subscritor da nota ao aceitante

da letra de câmbio38, o protesto é facultativo em relação ao emitente--sacador da promissória39, devedor principal da nota40, e aos respectivos avalistas41. Por conseguinte, é admissível a propositura de execução di-reta, isto é, independente de prévio protesto cambial42.

Por outro lado, no que tange aos endossantes e aos respectivos avalistas, é necessário o protesto tempestivo43, para que o credor possa

38 Cf. art. 78 da Lei Uniforme.

39 De acordo, na jurisprudência: “– A Nota Promissória é título executivo extrajudi-cial, uma vez que contém a obrigação incondicionada de pagamento de quantia determinada, em data certa. – Para a ação de execução contra o emitente não exige a lei seja a nota promissória previamente protestada” (14ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 2.0000.00.515.817-8/000, DiáriodaJustiça, 26-10-2005). “– Para a ação de execução contra o emitente não exige a lei sejam as notas promissórias previamente protestadas” (5ª Câmara Cível do TAMG, Apelação 411.535-3, DiáriodaJustiça, 3-2-2004).

40 Cf. art. 21, § 4º, da Lei n. 9.492/97.

41 Assim, na jurisprudência: “– LEI UNIFORME DE CAMBIAIS – PROTESTO. Não é necessário o prévio protesto para ação executiva do tomador contra o emitente de promissória e seus avalistas. – Interpretação do art. 47 e 53 da Lei Uniforme sobre Letras de Câmbio)” (1ª Turma do STF, AI 59.071/PE, DiáriodaJustiça, 2-1-1974).

42 De acordo, na jurisprudência: “I – Desnecessário é o protesto por falta de paga-mento da nota promissória, para o exercício do direito de ação do credor contra o seu subscritor e respectivo avalista” (4ª Turma do STJ, REsp 2.999/SC, DiáriodaJustiça, 6-8-1990, p. 7343). “– Lei Uniforme sobre Letras de Câmbio e Notas Pro-missórias – Não é necessário o protesto do título para resguardo do direito de ação contra o avalista do emitente da promissória ou do aceitante da letra de câmbio” (1ª Turma do STF, RE 76.154/SP, DiáriodaJustiça, 15-6-1973).

43 Vale dizer, no primeiro dia útil após o vencimento, exvi do art. 28 do Decreto n. 2.044/1908: “Verificando-se o vencimento ordinário sem que ocorra o pagamento do título, tratando-se de letras de câmbio e notas promissórias, o protesto por falta de pagamento, havendo devedores de regresso, deve ser tirado no primeiro dia útil seguinte ao vencimento. Atente-se que a LUG (3ª al. do art. 44) determina que o protesto por falta de pagamento da letra de câmbio ou da nota promissória deve ser tirado ‘num dos dois dias úteis seguintes àquele em que a letra é pagável’. Mas o Brasil adotou a Reserva do art. 9º do Anexo II da Convenção de Genebra, o que remete a questão para nossa legislação interna. Em consequência, e em face daquela Reserva, aplica-se o art. 28 do Decreto 2.044/1908, ainda em vigor, pelo que o protesto por falta de pagamento da letra de câmbio ou da nota promissória

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acionar os coobrigados da nota promissória, tendo em vista o disposto nos arts. 53 e 77 da Lei Uniforme.

10. Ação cambial ou execução cambialDiante do vencimento44 sem o respectivo pagamento da nota pro-

missória, o credor pode executar tanto o devedor principal quanto os coobrigados, em conjunto ou isoladamente, conforme a livre escolha, tudo nos termos dos arts. 43 e 47 da Lei Uniforme, aplicáveis por força do art. 77 do mesmo diploma.

No que tange ao devedor principal45 e ao respectivo avalista, o credor pode mover ação direta46 de execução aparelhada em título ex-trajudicial, com fundamento no art. 585, I, do Código de Processo Civil. Já em relação aos coobrigados, a subsistência dos direitos cambiários do credor depende do prévio protesto no prazo legal, exvi do art. 53 da Lei Uniforme, aplicável à nota promissória em razão do art. 77 do Decreto n. 57.663/66.

O prazo prescricional para a execução cambial fundada na nota promissória varia conforme o executado seja o devedor principal ou algum coobrigado. Em regra, a execução deve ser proposta dentro do prazo de três anos do vencimento da nota promissória47. Trata-se de

haverá de ser tirado no primeiro dia útil seguinte ao vencimento da letra de câm-bio ou da nota promissória” (Wille Duarte Costa, Títulosdecrédito, 3. ed., 2007, p. 262).

44 Vencimento que pode ser ordinário ou extraordinário.

45 O emitente-sacador da nota promissória.

46 Vale dizer, sem a necessidade de prévio protesto.

47 Assim, na jurisprudência: “– COMERCIAL. NOTA PROMISSÓRIA. PRESCRIÇÃO DA AÇÃO CAMBIAL. O prazo é atualmente de três anos, consoante os arts. 70 e 77 da Lei Uniforme relativa às letras de câmbio e notas promissórias, promulgada pelo Decreto n. 57.663, 24.1.66” (2ª Turma do STF, RE 91.050/RJ, DiáriodaJustiça, 1º-7-1983, p. 9996). Colhe-se do voto condutor do Ministro-Relator: “Tais disposi-tivos preveem a prescrição das ações contra o aceitante da letra de câmbio ou emitente da nota promissória, e, consequentemente, contra seus avalistas, no prazo de três anos”. (...) “EXECUÇÃO – TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL – NOTA PROMISSÓRIA – PRAZO PRESCRICIONAL DE TRÊS ANOS – ART. 70 E 77 DA LEI UNIFORME DE GENEBRA – PRESCRIÇÃO – OCORRÊNCIA. A execução embasada em nota promissória prescreve em três anos, em consonância com os arts. 70 e 77 da LUG” (TJMG, Apelação 1.0024.05.829981-9/002, Diárioda

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prazo prescricional disponível para o credor exercer a respectiva preten-são patrimonial contra o devedor principal, contra o respectivo avalista ou contra ambos, se assim preferir48.

Quanto aos coobrigados49, o credor tem o prazo de um ano para ajuizar a execução fundada no art. 585, I, do Código de Processo Civil. Trata-se de prazo prescricional que corre da data do protesto tempestivo ou do vencimento do eventual título “sem despesas”50. A regra, todavia, é o credor acionar os coobrigados mediante execução precedida de pro-testo cambial.

Na eventualidade de algum endossante ou avalista de endossante efetuar o pagamento, pode exercer o direito de regresso contra outros endossantes e avalistas no prazo prescricional de seis meses, em virtude da sub-rogação. Com efeito, o coobrigado que efetuar o pagamento dispõe do prazo de apenas seis meses para acionar coobrigados pretéri-tos na cadeia de anterioridade, em execução regressiva51. Por força do art. 567, III, do Código de Processo Civil, o sub-rogado pode iniciar nova execução ou até mesmo dar seguimento à execução movida pelo credor originário, quando o coobrigado pagante passa a ocupar o lugar deixado pelo credor original cujo crédito foi satisfeito.

11. Ação de enriquecimento sem causa ou de locupletamento indevido

Além da ação de execução, há outra via processual a ser acionada na eventualidade da prescricional cambial. À vista do art. 48 do Decreto

Justiça, 23-8-2008). “APELAÇÃO – EMBARGOS DO DEVEDOR – NOTA PRO-MISSÓRIA – DEMORA NA CITAÇÃO – PRESCRIÇÃO – OCORRÊNCIA. – De acordo com o art. 18, I, da Lei n. 5.474/68, a ação proposta pelo sacador da dupli-cata contra o sacado prescreve em 3 anos. Idêntico o prazo prescricional para a execução de nota promissória, nos termos do art. 70, da Lei Uniforme, promulga-da em nosso país pelo Decreto n. 57.663/66” (TJMG, Apelação 1.0702.05.246064-0/001, DiáriodaJustiça, 15-2-2007).

48 Cf. arts. 70, § 1º, e 77, ambos da Lei Uniforme, c/c o art. 585, I, do Código de Processo Civil.

49 Na nota promissória, o beneficiário-endossante, os demais endossantes e seus avalistas.

50 Cf. arts. 46, 70 e 77 da Lei Uniforme.

51 Cf. arts. 47, § 3º, 70, § 3º, e 77, todos da Lei Uniforme.

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n. 2.044/1908, c/c os arts. 206, § 3º, IV, 884 e 886 do Código Civil de 2002, ainda há a possibilidade de o credor ajuizar demanda cognitiva deno-minada “ação de locupletamento indevido”, “ação de enriquecimento sem causa” ou “açãoinremverso”, dentro do prazo prescricional de três anos.

À luz do art. 886 do Código Civil de 2002, o triênio previsto no inciso IV do § 3º do art. 206 do mesmo diploma só começa a correr após o decurso inalbis dos prazos para a execução fundada no art. 70, § 1º, da Lei Uniforme, e no art. 585, I, do Código de Processo Civil. Com efeito, após o transcurso inalbis dos prazos prescricionais das pretensões executivas provenientes da nota promissória, é admissível a propositura da demanda de locupletamento ou enriquecimento in-devido, no prazo prescricional de três anos52. À vista do art. 886 do Código Civil, o prazo prescricional da ação de locupletamento é con-tado após a perda da força executiva da nota promissória, porquanto a demanda de enriquecimento sem causa não é admissível enquanto estiver aberta a via executiva.

A demanda de locupletamento ou enriquecimento sem causa pode ser acionada pelo tradicional procedimento comum53, mas também pode ser aviada pelo procedimento monitório do art. 1.102-A do Código de Processo Civil54. Em virtude da faculdade conferida pelo art. 1.102-A do

52 Cf. art. 48 do Decreto n. 2.044/1908, c/c os arts. 206, § 3º, IV, 864 e 866, do Código Civil de 2002.

53 Comum-ordinário ou comum-sumário, conforme o valor da causa.

54 De acordo, na jurisprudência: “PROCESSUAL CIVIL – NOTA PROMISSÓRIA – PRESCRIÇÃO – CRÉDITO – COBRANÇA – PROCEDIMENTO MONITÓRIO – POSSIBILIDADE – ART. 1.102-A DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – INTER-PRETAÇÃO. I – A ação monitória foi introduzida no ordenamento jurídico brasileiro com a Reforma do Código de Processo Civil, através da Lei n. 9.079/95. Seu objetivo primordial é o de abreviar o caminho para a formação do título executivo, contornando a lentidão inerente ao processo de conhecimento e ao rito ordinário. II – Mostra-se adequado a instruir a ação monitória o título de crédito que tenha perdido a eficácia executiva em face do transcurso do lapso prescricional. Precedentes do STJ” (3ª Turma do STJ, REsp 260.219/MG, DiáriodaJustiça, 2-4-2001). “PROCESSUAL CIVIL. COBRANÇA DE DESPESAS DE CONDOMÍNIO. ART. 275, II, b, CPC. PROCEDIMENTO MONITÓRIO OU SUMÁRIO. FACULDADE DO CREDOR. RECURSO DESACOLHIDO. I – O procedimento monitório, também conhecido como injuntivo, introduzido no atual processo civil brasileiro, largamente difundido e utilizado na Europa, com amplo sucesso, tem por objetivo abreviar a formação do título executivo, encur-

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Código de Processo Civil, o titular da nota promissória prescrita tem a opção entre os procedimentos comum e monitório, para o recebimento da quantia objeto do enriquecimento sem causa55, tão logo decorrido inalbis o prazo prescricional disponível para a execução.

Ao contrário do que ocorre no procedimento comum, cujo valor da causa pode interferir na adoção do rito ordinário ou sumário, o mesmo não ocorre no procedimento monitório, o qual pode ser adotado em causas com valores inferiores e superiores a sessenta salários mínimos.

Por não ter natureza de ação cambial, a demanda de locupletamen-to só pode ter em mira a pessoa que foi beneficiada pelo enriquecimen-to sem causa, razão pela qual não pode ser movida contra avalista que não foi beneficiário do enriquecimento indevido56.

12. Ação de cobrança ou ação causalNa eventualidade de prescrição da nota promissória, o credor tem

a opção entre acionar o devedor com fundamento no enriquecimento sem causa, quando a juntada do título vencido e não pago já é suficien-te para comprovar a lesão prevista no art. 884 do Código Civil, indepen-dentemente da declinação da origem da dívida na petição inicial, ou acionar o devedor mediante demanda de cobrança, com fundamento na relação causal, ou seja, na origem da dívida.

Com efeito, o credor pode mover demanda de cobrança contra o devedor, à vista da relação jurídica subjacente. Aliás, a demanda de co-brança só pode ser movida contra a pessoa que participou da relação jurídica subjacente, e não contra todos os obrigados e coobrigados cam-

tando a via procedimental do processo de conhecimento. II – A ação monitória tem a natureza de processo cognitivo sumário e a finalidade de agilizar a pres-tação jurisdicional, sendo facultada a sua utilização, em nosso sistema, ao credor que possuir prova escrita do débito, sem força de título executivo, nos termos do art. 1.102-A, CPC” (4ª Turma do STJ, REsp 208.870/SP, Diárioda Justiça,28-6-1999, p. 124).

55 Cf. art. 48 do Decreto n. 2.044/1908, e arts. 206, § 3º, IV, 884 a 886, do Código Civil de 2002.

56 “APELAÇÃO CÍVEL. MONITÓRIA. PRESCRIÇÃO. NOTA PROMISSÓRIA. CAUSADEBENDI. AVALISTA. RESPONSABILIDADE. EXONERAÇÃO. Omissis 3. Prescrita a execução cambial, o avalista de cheque não responde pelo pagamen-to do valor constante do título” (TJMG, Apelação 1.0024.07.388446-2/001, DiáriodaJustiça, 21-10-2008).

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biais57. Trata-se de processo de conhecimento, o qual pode seguir o procedimento comum58 ou o procedimento monitório59, conforme a preferência do credor. Independentemente do procedimento escolhido, a demanda de cobrança deve ser proposta dentro do prazo prescricional previsto para a respectiva relação causal60.

Por fim, a demanda de cobrança não se confunde com a demanda de enriquecimento indevido. A demanda de enriquecimento indevido

57 De acordo, na doutrina: Ernane Fidélis dos Santos, Manualdedireitoprocessualcivil, v. II, 10. ed., 2006, p. 24; e Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: di-reito de empresa, v. I, 12. ed., 2008, p. 432: “O devedor cuja obrigação tenha se originado exclusivamente no título de crédito – como e, em geral, o caso do ava-lista –, após a prescrição da execução cambial, não poderá ser responsabilizado em nenhuma hipótese perante o seu credor, já que não há causa subjacente a fundamentar qualquer pretensão ao recebimento do crédito. Por outro lado, como a ação causal não é cambial, são admitidas quaisquer matérias de defesa por parte do demandado”.

58 O procedimento comum pode ser ordinário ou sumário, conforme o valor da causa.

59 Ao contrário do que ocorre no procedimento comum, o qual pode ser ordinário ou sumário conforme o valor da causa, no procedimento monitório o valor da causa tanto pode ser inferior quanto pode ser superior a sessenta salários mínimos. Em outros termos, o valor da causa não é relevante para a adoção do procedimen-to monitório, ou não. O que importa para a adoção do procedimento monitório consta do art. 1.102-A do Código de Processo Civil.

60 Em sentido semelhante, na jurisprudência: “– É pacífica a jurisprudência no sentido de admitir a cobrança de crédito decorrente de nota promissória prescrita pela via da ação monitória. – Todavia, nessas hipóteses, o crédito não se torna automaticamente imprescritível, mas vinculado à relação jurídica-base. – Se, do ponto de vista dessa relação jurídica, também estiver prescrita a pretensão da cobrança, correta a decisão que a reconheceu” (3ª Turma do STJ, REsp 682.559/RS, DiáriodaJustiça, 1º-2-2006).

Contra, entretanto, com a sustentação da tese de que incide o art. 206, § 5º, I, do Código Civil de 2002: “– Em razão da incorporação dos direitos e deveres na cártula, verifica-se a pertinência dos cheques e notas promissórias prescritas como prova escrita sem eficácia de título executivo para o fim de ajuizamento de ação monitória. – Tratando-se a ação monitória de tipo especial de cobrança, o prazo para o ajuizamento da demanda é de cinco anos, nos termos do art. 206, § 5º, I, do CC/02” (18ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0481.05.043034-9/001, DiáriodaJustiça, 10-5-2007). “A ação monitória para cobrança de nota promissória prescri-ta é tipo especial de cobrança, sendo prazo para o ajuizamento da demanda de cinco anos, contados da entrada em vigor do CC/2002” (10ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0592.09.013099-4/001, DiáriodaJustiça, 26-11-2009).

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não depende da exposição da origem da dívida na petição inicial, por-quanto a simples existência da nota promissória prescrita sem pagamen-to já é suficiente para demonstrar a ocorrência do locupletamento ilícito. Em contraposição, a demanda de cobrança depende da exposição da origem da dívida na petição inicial, porquanto a nota promissória pres-crita e não paga é simples meio de prova da relação subjacente. Outra diferença reside no prazo prescricional: a prescrição da pretensão de enriquecimento sem causa é de três anos, por força do art. 206, § 3º, IV, do Código Civil; já a prescrição da pretensão de cobrança depende da causa consubstanciada na relação subjacente, conforme o caso concreto, opinião defendida no presente compêndio – ou, segundo forte corrente jurisprudencial, o prazo é de cinco anos, à vista da interpretação que tem sido conferida ao art. 206, § 5º, I, do Código Civil.

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1. ConceitoO cheque é o título de crédito consubstanciado em ordem de paga-

mento à vista dada pelo emitente-sacador contra o banco-sacado, para efetuar pagamento de quantia determinada em favor do credor-benefi-ciário ou à pessoa endossada, em virtude de fundos que o emitente-sa-cador dispõe em conta corrente perante o banco-sacado.

2. Natureza jurídica e classificaçãoO cheque tem natureza jurídica de título de crédito, razão pela qual

está sujeito aos princípios e institutos de direito cambiário, ressalvadas as regras específicas, previstas na legislação de regência, como, por exemplo, o aceite, instituto incompatível com o cheque, exvi do art. 6º da Lei n. 7.357/85.

No que tange à classificação, o cheque é título de crédito de mode-lo vinculado, razão pela qual só é considerado cheque o documento impresso e emitido com a perfeita observância do padrão legal, ao qual o sacado está vinculado na expedição do talonário e das folhas avulsas.

Por fim, o cheque é título executivo extrajudicial, o que explica a possibilidade jurídica de o emitente-sacador ser acionado diretamente mediante processo de execução, exvi do art. 585, I, do Código de Proces-so Civil.

3. Ordem de pagamento à vista e cheque pós-datado Cheque pós-datado é o cheque com data futura1. Na linguagem

1 “CHEQUE PÓS-DATADO. Dir. Camb. Cheque emitido com data futura, em ar-tifício juridicamente inútil, dado que o título é pagável no dia da apresentação,

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corrente, todavia, é denominado “cheque pré-datado”2.

Ainda que pós-datado – ou “pré-datado”, à luz da linguagem corrente –, o cheque sempre preserva a natureza de ordem de pagamen-to à vista3, em razão do disposto no art. 32 da Lei n. 7.357/85, com o reforço do proêmio do art. 11 da Resolução n. 1.682/90: “Art. 11. O cheque é pagável à vista, considerando-se não escrita qualquer menção em contrário”.

Com efeito, a indicação de data futura não transforma o cheque em nota promissória; subsiste a natureza de ordem de pagamento à vista, com a mera ampliação do prazo previsto no art. 33 da Lei n. 7.357/85, para a apresentação do título junto ao banco-sacado. Nada impede, portanto, a imediata apresentação do cheque em data anterior à lançada na cártula, com a subsistência da obrigatoriedade do pagamento pelo banco-sacado que encontrar fundos disponíveis na conta corrente do

independentemente da data nela lançada” (J. M. Othon Sidou, Dicionáriojurídico: Academia Brasileira de Letras Jurídicas, 9. ed., 2004, p. 149).

2 “CHEQUE PRÉ-DATADO. Dir. Camb. Ver cheque pós-datado e pós-data” (J. M. Othon Sidou, Dicionáriojurídico: Academia Brasileira de Letras Jurídicas, 9. ed., 2004, p. 150). “PRÉ-DATAR. V. Dir. Obr. Lançar em documento feito num deter-minado dia, data anterior, o que pode constituir ilícito penal, conforme cause dano a terceiros. Opos.: pós-datar (v.) (const. pós-data). OBS. A expressão ‘prédatar’ ganhou uso consagrado sobretudo para efeito do cheque sem fundos, embora nesse caso o correto seja pós-datar” (J. M. Othon Sidou. DicionárioJurídico: Acade-mia Brasileira de Letras Jurídicas. 9. ed., 2004, p. 672). “– A emissão de cheque pós-datado, popularmente conhecido como cheque pré-datado, não o desnatura como título de crédito, e traz como única consequência a ampliação do prazo de apresentação” (3ª Turma do STJ, REsp 612.423/DF, DiáriodaJustiça, 26-6-2006).

3 De acordo, na jurisprudência: “Isso porque o Superior Tribunal de Justiça já consolidou seu entendimento no sentido de que, mesmo pós-datado, o cheque mantém todas as suas características cambiais, não se convertendo em uma nota promissória ou qualquer outra modalidade de promessa de adimplemento. A única consequência da pós-datação do cheque, consoante a jurisprudência desta Corte, é a postergação do prazo do art. 33 da LC, para apresentação da cártula para pagamento. Nesse sentido há diversos precedentes deste Tribunal, do que são exemplo o REsp 223.486/MG (DJ de 8/2/2000) e 195.748/PR (DJ de 15/6/99)” (trecho extraído do voto-vencedor proferido no julgamento do REsp 612.423/DF, cujo acórdão foi publicado no DiáriodaJustiça, 26-6-2006). A propósito, reforça o voto-condutor do acórdão proferido no REsp 195.748/PR: “2. A jurisprudência desta Corte firmou o entendimento de que o cheque pré-datado não perde a ca-racterística de ordem de pagamento à vista, revestindo-se das prerrogativas dos títulos de crédito, dentre as quais a executoriedade”.

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emitente-sacador4. Daí a conclusão: o cheque pós-datado – ou “pré--datado”, à luz da linguagem corrente – não perde a cambiariedade nem a consequente executividade5.

Embora a obrigação cambial seja preservada à vista, a apresentação do cheque pós-datado antes do dia pactuado pode gerar uma nova obrigação, mas de natureza comum, de direito civil, do credor-benefici-ário em relação ao emitente-sacador, pelo desrespeito ao pacto avençado. Daí a possibilidade jurídica da condenação do credor-beneficiário por dano moral ao emitente-sacador, como bem assentou o Superior Tribunal de Justiça ao aprovar o Enunciado 370: “Caracteriza dano moral a apre-sentação antecipada do cheque pré-datado”6.

Por fim, outra consequência jurídica da apresentação antecipada do cheque pós-datado é afastar a incidência do art. 171, § 2º, VI, do Có-digo Penal, em razão da inexistência do dolo essencial do tipo7.

4 De acordo, na doutrina: “A pós-datação (aliasdictus pré-datação) do cheque, isto é, a emissão com data posterior, é ato jurídico válido, apenas não tem o poder de impedir o pagamento do cheque se há apresentação em data anterior à constante do título. Igualmente não impede a apresentação qualquer outra cláusula ou ob-servação, lançada na face ou no verso da cártula, que determine sua apresentação ou depósito em data futura (bom para..., depositar apenas em..., e qualquer outra equivalente). Em quaisquer dessas hipóteses, as restrições à pronta apresentação deverão ser cambiariamente consideradas como não escritas, preservando-se o vencimento à vista, imediato, da cártula. No plano cambial, o único efeito que produz, já se viu, é ampliar o prazo de apresentação, que passa a ser contado da data constante da cártula, ainda que futura” (Gladston Mamede, Títulosdecrédito, 2003, p. 277).

5 Cf. Conclusão n. 1 do 5º Encontro Nacional dos Tribunais de Alçada: Minas Gerais, Parte II, DiáriodaJustiça, 26-2-1982, p. 1.

6 Em sentido conforme, na jurisprudência: “Cheque pré-datado. Apresentação antes do prazo. Indenização por danos morais. Precedentes da Corte. 1. A apre-sentação do cheque pré-datado antes do prazo avençado gera o dever de indeni-zar, presente, como no caso, a consequência da devolução do mesmo por ausência de provisão de fundos. 2. Recurso especial conhecido e provido” (3ª Turma do STJ, REsp 557.505/MG, DiáriodaJustiça, 21-6-2004, p. 219). “– A apresentação do cheque pré-datado antes do prazo estipulado gera o dever de indenizar, presente, como no caso, a devolução do título por ausência de provisão de fundos” (3ª Turma do STJ, REsp 707.272/PB, DiáriodaJustiça, 3-3-2005, p. 382).

7 No mesmo sentido, na jurisprudência: “1. A emissão de cheques como garantia de dívida (pré-datados), e não como ordem de pagamento à vista, não constitui crime de estelionato, na modalidade prevista no art. 171, § 2º, VI, do Código Penal.

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4. Legislação de regência do chequeEm primeiro lugar, incide a Lei n. 7.357/85. No que tange às com-

petências arroladas no art. 69 da Lei n. 7.357/85, incidem as normas infralegais do Conselho Monetário Nacional8 e do Banco Central9, respectivamente.

Para solucionar eventuais conflitos de Direito Internacional Priva-do provenientes de leis em matéria de cheques, incide o Decreto Execu-tivo n. 1.240/94, por meio do qual o Presidente da República promulgou a Convenção Interamericana sobre Conflitos de Leis em Matéria de Cheque, antes ratificada pelo Congresso Nacional mediante o Decreto Legislativo n. 9, de 7 de fevereiro de 1994. Não obstante, se a controvér-sia não estiver sob o império da Convenção Interamericana, incide a Convenção Internacional sobre conflitos de leis em matéria de cheques, promulgada mediante o Decreto n. 57.595/66.

Por fim, omissas a legislação especial e as demais normas de re-gência do instituto, incide o Código Civil de 2002. Com efeito, à vista do art. 903, o Código Civil só é aplicável na falta de leis e outras normas específicas. A propósito, merece ser prestigiado o Enunciado 52 do Conselho da Justiça Federal, aprovado durante as Jornadas de Direito Civil, inverbis: “Art. 903: por força da regra do art. 903 do Código Civil, as disposições relativas aos títulos de créditos não se aplicam aos já existentes”.

5. Sujeitos da relação cambialSão três os sujeitos originários da relação cambial proveniente do

cheque: emitente-sacador, banco-sacado e credor-beneficiário.

Na verdade, a expressão “banco-sacado” deve ser interpretada em sentido amplo, porquanto o termo “sacado” alcança todas as instituições financeiras contra as quais a lei admite a emissão de cheque10. O “saca-

Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. 2. Recurso provido” (5ª Turma do STJ, ROHC 13.793/SP, DiáriodaJustiça, 19-11-2003).

8 Cf. art. 4º, VI e VIII, da Lei n. 4.595/64, Resolução n. 1.682/90, e Resolução n. 1.631/89.

9 Cf. arts. 9º e 11, VI, ambos da Lei n. 4.595/64, Circular n. 2.444/94, Carta-Circular n. 3.173, de 2005, por exemplo.

10 Cf. art. 67 da Lei n. 7.357/85.

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do”, portanto, só pode ser banco ou instituição financeira equiparada, sob pena de o documento não valer como cheque11.

Embora seja o fornecedor dos talonários e das folhas de cheque, o banco-sacado não é o devedor principal na relação cambial proveniente do cheque. À vista do art. 15 da Lei n. 7.357/85, o devedor principal é o emitente-sacador. Em contraposição, o banco-sacado não tem obrigação cambial12, porquanto o cheque não é passível de aceite pelo sacado, exvi do art. 6º da Lei n. 7.357/85: “O cheque não admite aceite consideran-do-se não escrita qualquer declaração com esse sentido”. Por força do art. 29 da Lei n. 7.357/85, o banco-sacado também não pode ser avalista do emitente-sacador. Daí a conclusão: o banco-sacado não responde pela ausência nem pela insuficiência de fundos, porquanto a responsabilida-de pela disponibilidade da quantia expressa no cheque é do emitente- -sacador, devedor principal da relação cambial proveniente do cheque13.

Ainda em relação ao emitente-sacador, a superveniente incapaci-dade e até mesmo o falecimento dele não retiram a validade nem a efi-cácia do cheque emitido, tendo em vista o disposto no art. 37 da Lei n. 7.357/85: “A morte do emitente ou a sua incapacidade superveniente à emissão não invalidam os efeitos do cheque”.

6. Requisitos do chequeO art. 1º da Lei n. 7.357 arrola os requisitos essenciais do cheque,

os quais devem ser observados para a constituição do aludido título de crédito. Com efeito, a ausência de algum dos requisitos legais impede a formação do cheque, exvi do art. 2º da Lei n. 7.357/85.

O primeiro requisito legal é a denominação “cheque”, vocábulo que deve estar inserto no bojo da cártula e na língua em que o documen-

11 Cf. art. 3º da Lei n. 7.537/85, c/c os arts. 17 e 18 da Lei n. 4.595/64.

12 Não obstante, o banco-sacado pode ser responsabilizado na esfera civil, nas hi-póteses dos arts. 186 e 927 do Código Civil de 2002. A propósito, na vigência do Código Civil de 1916, o Supremo Tribunal Federal aprovou o Enunciado 28, à luz do antigo art. 159, equivalente ao atual art. 186. Por oportuno, vale conferir o Enunciado 28 da Súmula da Corte Suprema: “O estabelecimento bancário é res-ponsável pelo pagamento de cheque falso, ressalvadas as hipóteses de culpa ex-clusiva ou concorrente do correntista”. Trata-se, todavia, de responsabilidade civil, e não cambial, já que fundada nos arts. 186 e 927 do Código Civil.

13 Cf. art. 21, § 4º, proêmio, da Lei n. 9.492/97.

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to é redigido. Sem dúvida, à vista do art. 1º, I, da Lei n. 7.357/85, o do-cumento sem o vocábulo “cheque” expresso no texto não tem valor ju-rídico de cheque. É mero documento particular, e não título de crédito.

Em segundo lugar, o cheque deve conter ordem incondicional de pagamento de quantia determinada14. É imprescindível o lançamento da quantia por extenso, sob pena de devolução do cheque. Com efeito, o art. 6º da Resolução n. 1.682 é explícito acerca da necessidade do “re-gistro do valor por extenso”, cuja ausência é erro formal e ocasiona a devolução do cheque15. Na eventualidade de divergência entre a quan-tia indicada em algarismos e o montante expresso por extenso, o cheque subsiste, com a prevalência do valor indicado por extenso, exvi do art. 12 da Lei n. 7.357/85.

À vista do art. 42 da Lei n 7.357/85, é admissível a emissão de cheque em moeda estrangeira, com a posterior conversão para a moeda nacional, ao câmbio do dia da liquidação. A propósito, o art. 318 do Código Civil é compatível com o art. 42 da Lei n. 7.357, porquanto o preceito do diploma de 2002 preserva a incidência da norma específica.

No que tange aos índices oficiais16, autorizada doutrina17 susten-ta a impossibilidade da utilização de índices econômicos. Diante da natureza do cheque, qual seja, ordem de pagamento à vista, merece ser prestigiada a lição da doutrina. Com efeito, por ser o cheque uma ordem de pagamento imediato, nada justifica a utilização de índices de atuali-zação monetária, os quais só têm serventia para títulos a prazo, como, por exemplo, a letra de câmbio e a nota promissória.

Resta saber se é o cheque título de recebimento obrigatório. A res-posta é negativa18, porquanto não há na legislação brasileira dispositivo algum que torne obrigatório o recebimento de pagamento mediante cheque. Sob outro prisma, o art. 315 do Código Civil revela a obrigato-riedade do recebimento apenas da moeda corrente, ou seja, o Real. Em suma, o cheque não tem curso forçado próprio da moeda nacional.

14 Cf. art. 1º, II, da Lei n. 7.357/85.

15 Cf. Resolução n. 1.682, Motivo 31.

16 Por exemplo, Ufir, ORTN, OTN.

17 Cf. Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, v. II, 18. ed., 1992, p. 392.

18 Assim, na doutrina: “O cheque não tem o poder liberatório da moeda. Ninguém é obrigado a receber cheque em pagamento, pois só a moeda tem curso forçado” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, v. II, 18. ed., 1992, p. 389).

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O terceiro requisito legal reside nos arts. 1º, III, 3º e 67, todos da Lei n. 7.357/85: a indicação do nome do banco ou da instituição financeira equiparada. Por conseguinte, os documentos confeccionados por pesso-as físicas e por pessoas jurídicas sem natureza de instituição financeira não têm valor jurídico de cheque. Daí a importância do conceito de ins-tituição financeira. Diante da omissão da Lei n. 7.357/85, incide o dis-posto no art. 17 da Lei n. 4.595/64: “Art. 17. Consideram-se instituições financeiras, para os efeitos da legislação em vigor, as pessoas jurídicas públicas ou privadas, que tenham como atividade principal ou acessória a coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de valor de propriedade de terceiros”.

O quarto requisito legal reside no art. 1º, IV, da Lei n. 7.357/85: indicação do lugar do pagamento. Com efeito, o cheque deve conter a indicação do lugar do pagamento. A ausência de indicação especial, todavia, não interfere na subsistência do cheque, já que a falta é suprida à luz do inciso I do art. 2º da Lei n. 7.357/85: ausente designação espe-cífica, o lugar do pagamento é o local indicado junto ao nome do banco- -sacado. Na falta de indicação especial do local do pagamento do cheque, se designados vários lugares junto ao nome do banco-sacado, considera--se lugar do pagamento o primeiro deles19. Por fim, na ausência de indi-cação especial do lugar do pagamento e omissa a cártula até mesmo junto ao nome do sacado, o cheque é pagável no local da emissão20.

O quinto requisito legal é a indicação do local da emissão, ou seja, o “lugar de emissão”, na linguagem do art. 1º, V, infine, da Lei n. 7.357/85. A ausência da indicação do lugar da emissão, entretanto, não descarac-teriza o cheque enquanto título de crédito. Na falta da designação do local da emissão, considera-se emitido o cheque no lugar indicado junto ao nome do emitente-sacador21.

O sexto requisito legal é a data da emissão, ou seja, “a indicação da data”, na linguagem do art. 1º, V, proêmio, da Lei n. 7.357/85. À luz do preceito legal, c/c o art. 6º da Resolução n. 1.682/90, a ausência da data

19 Cf. art. 2º, I, segunda parte, da Lei n. 7.357/85.

20 Cf. art. 2º, I, infine, da Lei n. 7.357/85.

21 Cf. art. 2º, II, da Lei n. 7.357/85.

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da emissão é considerada “erro formal” e é motivo para a devolução do cheque22.

Ademais, a data da emissão é importante para fixar o prazo para a apresentação do cheque e, por conseguinte, o prazo da respectiva prescrição executiva. O cheque deve ser apresentado para pagamento perante o banco-sacado dentro de trinta dias da data da emissão, quan-do emitido no mesmo lugar do pagamento23. Emitido o cheque em lugar diverso do local do pagamento24, o prazo para apresentação é de sessenta dias da data da emissão25. Decorrido inalbis o prazo de apre-sentação, o credor-beneficiário perde o direito de executar os coobri-gados, quais sejam, os endossantes e os respectivos avalistas26, e até mesmo o direito de executar o próprio emitente-sacador que tinha fundos disponíveis durante o prazo da apresentação, mas deixou de tê-los em razão de fato alheio à sua vontade27-28. No mais, o cheque é pagável pelo sacado até mesmo depois do prazo de apresentação29, desde que não verificada a prescrição30, a qual também é até motivo de devolução do cheque31-32.

22 Cf. Resolução n. 1.682/90, art. 6º, Motivo 31.

23 Cf. art. 33 da Lei n. 7.357/85, e art. 11 da Resolução n. 1.682/90.

24 Vale dizer, em outro Município, em outro Estado-membro ou em País diverso.

25 Cf. art. 33 da Lei n. 7.357/85, e art. 11 da Resolução n. 1.682/90.

26 Cf. art. 47, II, da Lei n. 7.357/85.

27 Cf. art. 47, § 3º, da Lei n. 7.357/85.

28 De acordo com o texto do parágrafo, há autorizada doutrina: “A não apresentação do cheque nos prazos previstos (30 e 60 dias) surte os seguintes efeitos: (1º) o beneficiário ou portador perde o direito de regresso contra endossantes e respec-tivos avalistas; (2º) o beneficiário ou portador perde também o direito de execução contra o emitente ou sacador, se este tinha fundos disponíveis durante o prazo de apresentação e os deixou de ter, em razão de fato que não lhe seja imputável (art. 47, § 3º)” (Osmar Brina Corrêa-Lima, Cheque: revogação (contraordem) e oposição, 2009, p. 2).

29 Cf. art. 35, parágrafo único, infine, da Lei n. 7.357/85.

30 Cf. arts. 47 e 59, ambos da Lei n. 7.357/85.

31 Cf. art. 6º, Motivo n. 44, da Resolução n. 1.682/90.

32 Em sentido contrário à opinião defendida no presente compêndio, o Professor Rubens Requião sustenta a respeitável tese de que o cheque é pagável pelo banco até mesmo depois da ocorrência da prescrição (Cursodedireitocomercial, v. II, 18. ed., 1992, n. 667, p. 434). Não obstante, à vista dos arts. 47 e 59 da Lei n. 7.357/85, com o reforço do art. 6º, n. 44, da Resolução n. 1.682/90, preserva-se a opinião

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A prescrição executiva ocorre com o decurso do prazo de seis meses do término do prazo de apresentação, conforme o enquadramento do caso concreto em uma ou em outra hipótese do art. 33 da Lei n. 7.357/85. Se o local do pagamento é o mesmo da emissão, o prazo de seis meses corre do término dos trinta dias disponíveis para apresentação; se o lugar do pagamento for diverso do local da emissão, o prazo de seis meses corre somente depois do decurso dos sessenta dias para a apresentação. Por conseguinte, a data da emissão constante do título tem enorme rele-vância jurídica tanto em relação ao período disponível para a apresenta-ção do cheque quanto para a prescrição da execução fundada no art. 585, I, do Código de Processo Civil, e nos arts. 47 e 59 da Lei n. 7.357/85.

De volta aos requisitos legais, o cheque deve conter a assinatura do emitente-sacador ou do respectivo mandatário com poder especial na procuração33. Além da assinatura de próprio punho, também é admis-sível o lançamento de assinatura mecânica ou de forma equivalente34. A propósito, o relativamente incapaz35 também pode subscrever cheque, desde que formalizada a respectiva assistência perante o banco-sacado. Em qualquer caso, o cheque deve ser preenchido e subscrito mediante caneta, independe da cor da tinta. Com efeito, não há norma legal nem infralegal com indicação da cor da tinta a ser utilizada no preenchimen-to do cheque36.

Por fim, além da assinatura, o cheque deve conter alguma identi-ficação numérica do emitente-sacador, como o número da sua Cédula de Identidade, da inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas, do Título Eleitoral ou da Carteira Profissional, tendo em vista a exigência inserta no art. 3º da Lei n. 6.268/75.

7. Cheque nominativo e cheque ao portadorPor força do art. 69 da Lei n. 9.069/95, cheque de valor igual ou

defendida no texto principal: decorrido o prazo prescricional, o banco-sacado já não pode efetuar o pagamento do cheque prescrito.

33 Cf. art. 1º, VI, da Lei n. 7.357/85.

34 Cf. art. 1º, parágrafo único, da Lei n. 7.357/85.

35 Vale dizer, o menor com mais de 16 anos e menos de 18 anos.

36 Não obstante, as cartilhas bancárias sugerem o preenchimento dos cheques me-diante caneta de cor preta ou azul.

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inferior a R$ 100,00 (cem reais) pode ser ao portador. Em contraposição, os cheques de valor superior a R$ 100,00 devem ser nominais, vale dizer, com a identificação do credor-beneficiário, exvi do art. 69 da Lei n. 9.069/95:

“Art. 69. A partir de 1º de julho de 1994, fica vedada a emissão, paga-mento e compensação de cheque de valor superior a R$ 100,00 (cem REAIS), sem identificação do beneficiário”.

Em reforço, dispõe o art. 1º da Circular n. 2.444/94, do Banco Central:

“Art. 1º Os cheques de valor superior a R$100,00 (cem reais), emitidos sem a identificação do beneficiário, acaso encaminhados ao Serviço de Compensação de Cheques e Outros Papéis, deverão ser devolvidos, a qualquer tempo, pelo motivo ‘48 – cheque emitido sem a identificação do beneficiário – acima do valor estabelecido’”.

No mais das vezes, portanto, os cheques são nominativos, já que apenas os títulos cujas quantias sejam iguais ou inferiores a R$ 100,00 (cem reais) dispensam a identificação do credor-beneficiário.

Não obstante, a omissão em relação ao nome do beneficiário pode ser sanada pelo mesmo, o qual pode preencher o espaço destinado à indicação do nome do credor, consoante autoriza o Enunciado 387 da Súmula do Supremo Tribunal Federal.

Por fim, ainda que devolvido o cheque por falta de identificação do beneficiário, é admissível a reapresentação do título ao banco-sacado, desde que indicado o nome do credor, exvi do parágrafo único do art. 1º da Circular n. 2.444/94: “Será permitida a reapresentação dos cheques de que trata o caput deste artigo, desde que cumprida a exigência legal de identificação do beneficiário”.

8. Cheque e pagamento de salárioÉ juridicamente possível o pagamento de salário mediante che-

que, desde que seja concedido ao empregado o tempo necessário para a liquidação ou o depósito bancário no mesmo dia. A propósito, me-rece ser prestigiado o Precedente Normativo n. 117 do Tribunal Supe-rior do Trabalho: “Se o pagamento do salário for feito em cheque, a empresa dará ao trabalhador o tempo necessário para descontá-lo, no mesmo dia”.

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9. Cheque sem provisão de fundos e desconto no salário do empregado

No que tange ao abatimento no salário do empregado que recebe cheque sem provisão de fundos no estabelecimento empresarial, o des-conto é juridicamente possível, mas só se o empregado deixou de obser-var as orientações do empregador relativas ao recebimento de cheque de clientes. O Tribunal Superior do Trabalho julgou a vexataquaestio em duas oportunidades, quando firmou o seguinte entendimento: o empregado não pode sofrer redução no salário em razão de recebimento de cheque sem provisão de fundos, salvo se recebeu o título sem as cautelas estabe-lecidas pelo empregador. Assim dispõe a Orientação Jurisprudencial n. 251: “É lícito o desconto salarial referente à devolução de cheques sem fundos, quando o frentista não observar as recomendações previstas em instrumento coletivo”. Reforça o Precedente Normativo n. 14: “Proíbe-se o desconto no salário do empregado dos valores de cheques não compen-sados ou sem fundos, salvo se não cumprir as resoluções da empresa”.

10. Cheque e aceiteÀ luz do art. 6º da Lei n. 7.357/85, o cheque não comporta aceite.

Por conseguinte, é ineficaz qualquer cláusula lançada no título com o teor de aceite ou com referência a aceite.

11. Cheque e endossoNo mais das vezes, o cheque é transmissível mediante endosso. Na

verdade, o cheque é endossável quando há a cláusula “à ordem” expres-sa na cártula e também quando o título é omisso, sem nada dispor sobre o endosso. Com efeito, presume-se que o cheque é título “à ordem”, independentemente da existência da respectiva cláusula no bojo da cártula. A regra da possibilidade de lançamento de endosso em cheque reside nos arts. 8º, I, e 17, caput, ambos da Lei n. 7.357/85. Daí a possibi-lidade jurídica de endossos nos cheques em geral37.

37 Vale lembrar, por oportuno, que na vigência do art. 17, I, da Lei n. 9.311/96, e do item 7 do Anexo V da Carta-Circular n. 3.173, de 2005, do Banco Central, somen-te era permitido um endosso nos cheques pagáveis no Brasil. Cheque com mais de um endosso era devolvido por irregularidade consubstanciada no Motivo n. 36: “cheque emitido com mais de um endosso – Lei n. 9.311/96” (Carta-Circular

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Em contraposição, há a vedação do endosso quando o cheque con-tém a cláusula “não à ordem”, prevista no art. 17, § 1º, da Lei n. 7.357/85. Diante da existência da cláusula “não à ordem” ou outra equivalente lançada no cheque38, a transmissão do título só pode ocorrer mediante cessão civil de crédito39, também denominada “cessão ordinária de cré-dito”, a qual não se confunde com o endosso. Enquanto o endosso é instituto de direito cambiário, a cessão de crédito é instituto do direito civil propriamente dito. Sob outro prisma, o endosso é ato unilateral de vontade, enquanto a cessão civil é contrato bilateral40. À vista do art. 21 da Lei n. 7.357/85, o endosso torna o endossante coobrigado pelo paga-mento do cheque, o que não ocorre na cessão civil de crédito, exvi do art. 296 do Código Civil. À luz do art. 290 do Código de 2002, o devedor precisa ser comunicado da transferência do crédito objeto da cessão civil mediante notificação, a qual é dispensável para que o endosso tenha eficácia. Por fim, na cessão civil de crédito, o devedor acionado pelo cessionário pode suscitar as defesas existentes contra o cedente, com fundamento no art. 294 do Código Civil. Já o endossatário é protegido pelo princípio da inoponibilidade das exceções pessoais, em virtude da combinação do art. 25 da Lei n. 7.357/85, com o art. 916 do Código Civil.

No que tange ao endosso parcial e ao endosso pelo próprio banco- -sacado, ambos são vedados por força do § 1º do art. 18 da Lei n. 7.357/85.

n. 3.173, Anexo V, item 7, de 2005). Não obstante, tanto a Lei n. 9.311 quanto a Carta-Circular n. 3.173 foram revogadas, por força da insubsistência da Contri-buição Provisória sobre Movimentação Financeira – CPMF. A propósito, vale conferir o seguinte trecho do voto que fundamenta recente acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais: “Ressalte-se que a então vigente Lei 9.311/96, em seu art. 17, visando evitar a evasão de divisas em decorrência da CPMF dis-punha que ‘somente é permitido um único endosso nos cheques pagáveis no país’, o que uma vez mais impossibilitava o saque na forma pretendida” (14ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0209.03.030389-2/001, DiáriodaJustiça, 17-3-2009).

38 Por exemplo, “proibido o endosso”, “não endossável”.

39 De acordo, na doutrina: “É preciso ficar atento para o fato de que a cláusula não à ordem não impede a transferência do crédito; apenas impede que se faça pela forma simplificada, isto é, por mero endosso, exigindo das partes interessadas na transmissão (na sucessão subjetiva) que recorram ao procedimento da cessão de crédito” (Gladston Mamede, Títulosdecrédito, 2003, p. 255).

40 De acordo, na doutrina: “São os dois institutos, de fato, inconfundíveis, pois o endosso é o ato unilateral de declaração de vontade que impõe forma escrita, ao passo que a cessão é um contrato bilateral, que pode concluir-se de qualquer forma” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, 18. ed., 1992, p. 331).

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Sem dúvida, o endosso parcial e o endosso pelo banco-sacado são nulos exvilegis: “§ 1º São nulos o endosso parcial e o do sacado”.

No que tange à forma de lançamento, o endosso pode ser lan-çado na face do cheque, no verso do título ou na folha de alongamen-to, sempre acompanhado da assinatura do endossante ou do respec-tivo procurador com poder especial, tudo nos termos do art. 19, caput, da Lei n. 7.357/85. Na verdade, só o endosso em preto pode ser lan-çado na face, no verso ou no alongamento, com a respectiva identi-ficação do endossatário. Já o endosso em branco, isto é, sem a desig-nação do endossatário, só pode ser lançado no verso do cheque ou na folha de alongamento, tendo em vista o disposto no art. 19, § 1º, da Lei n. 7.357/85.

Por fim, o art. 20 da Lei n. 7.357 revela que o endosso transmite todos os direitos resultantes do cheque41, embora o endossante continue obrigado a garantir o pagamento, por ser responsável pela solvência do devedor principal, ou seja, do emitente-sacador do cheque. Não obstan-te, o art. 21 da Lei n. 7.357 estabelece que o endossante não responde pelo pagamento do cheque quando há estipulação expressa em sentido con-trário: por exemplo, quando o endossante lança no título a cláusula “sem garantia”42.

12. Cheque e avalO aval é a declaração unilateral de vontade de uma pessoa que

garante, em prol do devedor originário ou de coobrigado, o pagamento de algum título de crédito. Há lugar para aval no cheque, desde que o avalista não seja o banco-sacado. Sem dúvida, à vista do art. 29 da Lei n. 7.357/85, o banco-sacado não pode ser avalista do emitente-sacador.

O aval pode garantir tanto o pagamento integral quanto o paga-mento parcial do cheque. Com efeito, o art. 29 da Lei n. 7.357 autoriza o lançamento do denominado “aval parcial”.

41 Vale dizer, a posse e também a propriedade do título.

42 De acordo, na doutrina: “O endossante, é claro, torna-se codevedor do título e está sujeito à execução, caso o cheque seja devolvido pelo banco sacado por insu-ficiência de fundos. O endosso do cheque admite a cláusula ‘sem garantia’, pela qual o endossante não assume, em relação ao título, nenhuma responsabilidade cambial” (Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, v. I, 11. ed., 2007, p. 438).

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Ressalvado o aval parcial, o qual torna o avalista responsável ape-nas em relação à parte objeto do aval, o avalista é responsável pelo pa-gamento do cheque tal como o avalizado, tendo em vista a regra consa-grada no caputdo art. 31 da Lei n. 7.357/85: “O avalista se obriga da mesma maneira que o avalizado. Subsiste sua obrigação, ainda que nula a por ele garantida, salvo se a nulidade resultar de vício de forma”.

No que tange às modalidades, o aval pode ser em preto ou em branco, conforme haja a identificação do avalizado, ou não. Se lançado em branco, ou seja, sem a identificação do avalizado, o aval é tido como dado ao emitente-sacador do cheque, exvi do art. 30, parágrafo único, da Lei n. 7.357/85.

Por fim, o aval pode ser lançado na face do cheque, no verso do título e na folha de alongamento, desde que o avalizado seja identificado, nos termos do art. 30, capute parágrafo único, da Lei n. 7.357/85. Já a simples assinatura sem designação do avalizado só tem valor jurídico de aval se lançada na face do cheque. Sem dúvida, à vista do art. 30, caput, infine, simples assinatura lançada no verso do cheque não é con-siderada aval, mas, sim, endosso43.

13. Cheque visadoO cheque visado consiste no lançamento de “visto” pelo banco-

-sacado no verso de título nominativo que ainda não foi endossado, após a verificação da existência de fundos disponíveis para o pagamento da quantia expressa na cártula, com a imediata reserva da respectiva im-portância durante o prazo legal de apresentação44.

Por força do art. 7º da Lei n. 7.357/85, a aposição do “visto” pelo banco-sacado pode ser solicitada tanto pelo emitente-sacador quanto pelo credor-beneficiário designado no título. Aliás, o “visto” só pode ser lançado em cheque nominal.

43 Assim, na jurisprudência: “Cheque – Aval – Endosso – Lei 7.357/85. Nos termos da vigente lei, considera-se aval a assinatura lançada no anverso do cheque. Como tal valerá também a aposta no verso, desde que acompanhada da expressão ‘por aval’ ou equivalente (art. 30). A firma constante do verso do cheque, sem outras ex-plicações, corresponde a endosso (art. 19, § 1º)” (3ª Turma do STJ, REsp 5.544/GO, DiáriodaJustiça, 8-4-1991).

44 Cf. art. 33 da Lei n. 7.357/85.

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Após a solicitação do “visto” pelo emitente-sacador ou pelo credor--beneficiário, o gerente do banco-sacado realiza a conferência da existên-cia de fundos e faz a reserva da quantia indicada no título, com o respec-tivo débito da conta do emitente-sacador. A quantia fica reservada no banco-sacado durante o prazo disponível para a apresentação do cheque: trinta ou sessenta dias, conforme as hipóteses do art. 33 da Lei n. 7.357/85. Daí a conclusão: o “visto” lançado pelo banco-sacado assegura ao credor--beneficiário do cheque tanto a existência de fundos quanto a reserva da importância. Decorrido o prazo do art. 33 da Lei n. 7.357, entretanto, a quantia reservada retorna para o emitente-sacador, com o crédito da importância na respectiva conta bancária, por força do art. 7º, § 2º, pro-êmio, do mesmo diploma legal. Com efeito, a reserva subsiste até o término do prazo de apresentação do cheque, qual seja, o previsto no art. 33 da Lei n. 7.357/85.

Ao contrário do que pode parecer, o “visto” não equivale a “aceite”, o qual, aliás, é vedado por força do art. 6º da Lei n. 7.357/85. Ainda que lançado o “visto”, as relações e as obrigações cambiais originárias sub-sistem intactas45, com a responsabilidade principal do emitente-sacador e as responsabilidades solidárias do endossante e dos avalistas, tudo nos termos dos arts. 15, 21 e 29 da Lei n. 7.357/85, respectivamente. Com efeito, o “visto” não significa que o banco-sacado aceitou pagar a quan-tia em seu próprio nome, independentemente da existência de fundos disponíveis na conta do emitente-sacador. Na verdade, o “visto” signi-fica que o banco-sacado verificou a existência de fundos na conta do emitente-sacador, bem como reservou a quantia necessária para o paga-mento da importância expressa no título. Em virtude da prestação dos serviços de certificação e de reserva, pode o banco-sacado cobrar a tari-fa correspondente.

Por fim, responde o banco-sacado pela inexistência de fundos na data do lançamento do “visto”, bem como pela superveniente ausência da respectiva quantia durante o prazo legal de apresentação, por falta da reserva. Resta saber se a responsabilidade do banco-sacado é cambial ou civil, porquanto a natureza da responsabilidade interfere na ade-quação da via processual admissível contra o banco-sacado: imediata

45 De acordo, na doutrina: “O visto do cheque não exonera o emitente, endossantes e demais devedores, e não importa nenhuma obrigação cambial do banco sacado” (Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, v. I, 11. ed., 2007, p. 440).

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execução46 ou prévia demanda cognitiva47? Trata-se de vexataquaestio, porquanto há autorizada doutrina em prol de ambas as teses. Ainda que muito respeitável a tese favorável à execução imediata do banco--sacado, o art. 47 da Lei n. 7.357 só autoriza a execução fundada em cheque contra o emitente, o endossante e os respectivos avalistas; não há referência alguma ao banco-sacado, o qual também não pode ser considerado avalista (art. 29, in fine). Por conseguinte, a obrigação proveniente do § 1º do art. 7º não se confunde com a obrigação cambi-ária autorizadora da execução imediata (art. 47). Daí a justificativa para a defesa da segunda tese, qual seja, em favor da necessidade de prévia demanda cognitiva48.

46 Segundo o Professor Gladston Mamede, a responsabilidade é de natureza cambial e enseja imediata execução até mesmo contra o banco-sacado: “De qualquer sorte, como estabelecido no art. 7º, § 1º, a aposição do visto ou certificação no cheque, visando-o, obriga o banco sacado, que passa a ter que garantir (um dever, portan-to), durante o prazo de apresentação (e não além desse), o pagamento do cheque, seja apresentado ao caixa, seja apresentado à câmara de compensação. Essa res-ponsabilidade específica pelo pagamento não exonera a obrigação própria do sacador e dos demais coobrigados eventualmente existentes, a exemplo do ava-lista. Haverá, entre todos, uma obrigação solidária para com o pagamento, poden-do o credor escolher qual ou quais executará. Aliás, diante do visto e/ou certifi-cação, a responsabilidade do banco pelo pagamento do valor sacado só não é prejudicial à responsabilidade do próprio sacador e, havendo, de seu avalista” (Títulosdecrédito, 2003, p. 258).

47 Segundo o Professor Fábio Ulhoa Coelho, a responsabilidade é de natureza comum e não enseja execução imediata, porquanto depende da propositura de ação de conhecimento: “Claro está que, se o banco não proceder à obrigação legal de reservar, da conta do correntista, numerário suficiente para a liquidação do cheque visado, responderá pelo pagamento do cheque ao credor, se os fundos não existiam ou deixaram de existir. Isto não significa, contudo, que o sacado do cheque tenha alguma obrigação cambial, posto que se trata, no caso, de res-ponsabilidade decorrente da inobservância de determinação legal e não do tí-tulo de crédito. Tanto é assim que o sacado não poderá ser protestado, nem executado, nesta hipótese, cabendo ao credor apenas ação declaratória. Uma vez condenado a pagar o cheque irregularmente visado, o banco terá direito de re-gresso contra o seu emitente” (Manualdedireitocomercial: direito de empresa, 18. ed., 2007, p. 275-276). “A instituição financeira somente poderá ser responsabi-lizada, se deixou de proceder à reserva que a lei determina, mas isso não em decorrência do direito cambiário, mas sim pelas normas gerais de responsabili-dade civil, por ato culposo” (Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: di-reito de empresa, v. I, 11. ed., 2007, p. 440).

48 Cf. nota anterior.

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14. Cheque marcado Antes do advento da Lei n. 7.357/85, existia o denominado

“cheque marcado”, cuja característica principal era a possibilidade de o banco-sacado marcar data futura para a liquidação do cheque, median-te o lançamento das expressões “bom para”, “para o dia” ou outra equivalente, com a consequente conversão do cheque em ordem de pagamento a prazo.

Com a superveniência da Lei n. 7.357/85, entretanto, o cheque marcado foi abolido do direito pátrio, em razão da incompatibilidade com o disposto no art. 32 do atual diploma de regência do cheque.

15. Cheque cruzado O cheque cruzado está regulado nos arts. 44 e 45 da Lei n.

7.357/85, segundo os quais o cruzamento consiste na simples aposição de dois traços paralelos (oblíquos49, consoante o costume50), lançados na face do título, quer pelo emitente-sacador, quer pelo credor-bene-ficiário, a fim de que o pagamento seja feito mediante crédito em conta bancária51, e não de forma direta, em dinheiro, com maior proteção tanto para o emitente-sacador quanto para o credor-benefi-ciário, em razão da possibilidade da fácil identificação da pessoa beneficiada pelo pagamento52. Tanto pela segurança quanto pela

49 Assim, na jurisprudência: “Estão obliquamente traçadas, no contexto do cheque, duas retas paralelas” (trecho extraído do voto proferido pelo Ministro Hahnemann Guimarães no HabeasCorpus 37.463/DF, perante o Pleno do STF, com a posterior publicação na RTJ, v. 13, p. 256).

50 No mesmo sentido, na doutrina: “O cruzamento consiste na aposição de dois traços paralelos na face (no anverso) do título. Habitualmente, esses traços são grafados em diagonal, com inclinação para a direita; é um costume, não uma exigência” (Gladston Mamede, Títulosdecrédito, 2003, p. 259).

51 De acordo, na jurisprudência: “O pagamento de cheque cruzado tem de ser feito a um banco” (HC 37.463/DF, Pleno do STF, DiáriodaJustiça, 17-4-1961, p. 35). Colhe-se do voto proferido pelo Ministro Hahnemann Guimarães: “Seja como for, não podia o tomador desse cheque exigir o pagamento, já que o pagamento tinha de ser feito a um banco, por ser esta uma formalidade necessária, característica, do cheque cruzado”.

52 Assim, na jurisprudência: “O cruzamento se destina a evitar que o cheque possa cair em mãos de pessoas desonestas, evitando-se, assim, que o cheque possa ser pago a um ladrão” (trecho extraído do voto proferido pelo Ministro Hahnemann

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simplicidade da aposição do cruzamento, o cheque cruzado é muito comum na prática.

O cruzamento pode ser geral53 ou especial54, bem como pode ser feito pelo emitente-sacador e pelo credor-beneficiário, tudo nos termos do art. 44, caput, proêmio, da Lei n. 7.357/85.

O cruzamento geral ocorre com o lançamento dos dois traços sem indicação alguma entre os mesmos ou, quando muito, apenas o termo genérico “banco”, sem a designação da instituição bancária. Por conse-guinte, o cheque com cruzamento geral pode ser pago mediante crédito em conta-corrente de qualquer banco.

Já o cruzamento especial se dá quando há a indicação do banco, razão pela qual o cheque só pode ser pago mediante crédito em conta na instituição bancária designada entre os dois traços lançados na face do título (art. 45, caput, segunda parte)55. Não obstante, o banco indicado pode incumbir outra instituição bancária da liquidação do cheque, por meio de endosso-mandato, na eventualidade de o credor-beneficiário não ter conta corrente no banco designado no cruzamento especial (arts. 26, caput, e 45, caput, infine e § 2º).

Por fim, a inutilização do cruzamento – tanto do geral quanto do especial – não tem eficácia jurídica alguma (art. 44, § 3º); mas o cruza-mento geral pode ser convertido em especial, pela simples designação do nome do banco entre os dois traços paralelos (art. 44, § 2º). A indica-ção do nome do banco pode ser feita tanto pelo emitente-sacador quan-to pelo credor-beneficiário (art. 44, caput, proêmio, e § 2º).

Guimarães no HC 37.463/DF, perante o Pleno do STF, com a posterior publicação na RTJ, v. 13, p. 256). De acordo, na doutrina: “O cruzamento destina-se a tornar segura a liquidação de cheques ao portador, uma vez que, cruzado o título, será possível identificar-se a pessoa em favor de quem o cheque foi liquidado. É facul-dade exclusiva do portador (beneficiário) e do sacador (emitente), mediante aposição de dois traços paralelos no anverso do título” (Waldo Fazzio Júnior, Manualdedireitocomercial, 7. ed., 2006, p. 446).

53 Isto é, em branco.

54 Vale dizer, em preto ou nominal.

55 De acordo, na doutrina: “Já, se for especial o cruzamento, o cheque somente po-derá ser pago ao banco mencionado no interior dos traços; e, assim, o tomador deverá procurar exatamente a instituição financeira designada no cruzamento e contratar dela os serviços de recebimento do respectivo valor” (Fábio Ulhoa Coe-lho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, v. I, 11. ed., 2007, p. 441).

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16. Cheque para ser creditado em contaO art. 46 da Lei n. 7.357 versa sobre o cheque para ser creditado em

conta bancária, diante da inscrição transversal no anverso do título da cláusula “para ser creditado em conta”, a qual pode ser lançada pelo emitente-sacador e pelo credor-beneficiário do cheque, com o consequen-te impedimento ao pagamento em dinheiro, mas somente por algum meio de lançamento contábil: crédito em conta, transferência ou com-pensação. Eis um exemplo: parasercreditadonacontabancária111.111daagência2222dobancoX. Trata-se, todavia, de espécie pouco utilizada na prática bancária.

17. Cheque administrativo O cheque administrativo está previsto no inciso III do art. 9º da

Lei n. 7.357/85. É o cheque emitido contra o próprio banco-sacador. Daí a justificativa para as denominações “cheque bancário”, “cheque de te-souraria”, “cheque de direção” e “cheque de caixa”, porquanto o título de crédito é emitido pelo banco contra si mesmo, ou seja, contra o próprio caixa. Por conseguinte, o sacado e o sacador do cheque administrativo são a mesma pessoa jurídica: o banco.

Como o emitente-sacador é o próprio banco-sacado, o cheque ad-ministrativo ocasiona maior proteção para o credor-beneficiário, tendo em vista a alta probabilidade de o banco-emitente efetuar o pagamento do respectivo crédito56. Ainda em prol da segurança do instituto, o che-que administrativo só pode ser nominal, razão pela qual é imprescindí-vel a identificação do credor-beneficiário no bojo do título, por força do art. 9º, III, infine, da Lei n. 7.357/85.

56 Em sentido conforme, na doutrina: “Como facilmente se verifica, a emissão do cheque pelo banco, ordenando-se a pagar ao beneficiário nomeado determinada importância, é modalidade negocial que tem nítido objetivo de servir de instru-mento de segurança para as transações, pressupondo o mercado que, como o cheque é emitido pelo próprio banco, sacando contra seu próprio caixa, são me-nores as chances de inadimplência” (Gladston Mamede, Títulosdecrédito, 2003,p. 256). “Serve essa modalidade de cheque ao aumento da segurança no ato de recebimento de valores. O vendedor de imóvel, ao outorgar a escritura ao com-prador, em negócio à vista, normalmente exige o pagamento em cheque adminis-trativo de banco de primeira linha, porque a probabilidade de esse título não ter fundos é remotíssima” (Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, v. I, 11. ed., 2007, p. 441).

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Trata-se, à evidência, de serviço prestado pelas instituições bancá-rias. Em razão da prestação do serviço consubstanciado na emissão do cheque administrativo, é legítima a cobrança de tarifa bancária. Daí a explicação para outra denominação também conferida ao cheque admi-nistrativo: “cheque comprado”57.

Por fim, o cheque administrativo pode ser adquirido por cliente do banco e também por terceiro, para a posterior realização do pagamento em prol de outrem ou até do próprio adquirente, o qual, por sua vez, pode endossar o título a outrem ou efetuar a respectiva liquidação em seu próprio favor.

18. Cheque de viagemO cheque de viagem, também denominado “cheque de viajante”,

“cheque de turismo” e “traveller’scheck”, é o título de crédito consubs-tanciado em ordem de pagamento à vista proveniente do próprio banco- -sacado e que tem como beneficiário original o respectivo adquirente, o qual também deve subscrever a cártula no ato da aquisição, acompanha-do de gerente ou de outro preposto do banco-emitente, bem como no momento da utilização do cheque, quando lança a segunda assinatura na cártula58. O viajante, portanto, não precisa transportar dinheiro e correr os riscos daí provenientes: extravio, furto, roubo.

No que tange à natureza jurídica do cheque de viagem, trata-se de verdadeira espécie de cheque administrativo59, por ser proveniente

57 De acordo, na doutrina: “A expressão cheque comprado revela o outro lado des-se negócio, deixando claro que a instituição bancária faz tal emissão como um tipo de serviço que presta ao mercado e à sociedade, mas pelo qual cobra tarifa espe-cífica. O cheque pode ser emitido a favor de – e, portanto, pode ser comprado por – pessoa que seja ou não cliente do banco” (Gladston Mamede, Títulosdecrédito, 2003, p. 256).

58 Assim, na doutrina: “Na presença do banqueiro, ou de funcionário seu, o emiten-te – após identificar-se – apõe a sua assinatura na parte superior do cheque, ali ficando ela registrada. A qualquer momento, em praça diferente ou na mesma praça, o viajante emite o cheque, identificando-se novamente e o assinando, ao pé, em lugar indicado. Conferindo a assinatura aposta anteriormente no alto do cheque, com a segunda assinatura lançada na parte inferior, de modo a permitir a sua conferência, está o cheque emitido pronto para ser pago” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, 18. ed., 1992, p. 420).

59 “CHEQUE DE VIAJANTE. (Ing. traveller’scheck) Dir. Camb. Modalidade de cheque administrativo, empregado para ter curso entre praças de países diversos,

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do próprio banco-sacado, contra o respectivo caixa. A peculiaridade do cheque de viagem reside no lançamento de duas assinaturas do adquirente-beneficiário. Com efeito, no ato da aquisição do cheque de viagem, o adquirente-beneficiário deve lançar a respectiva assina-tura na parte superior da cártula. Ao utilizar o crédito proveniente do título, o credor deve lançar a segunda assinatura, agora na parte inferior da cártula.

Por fim, o art. 66 da Lei n. 7.357 estabelece que o cheque de viagem segue o disposto na legislação especial de regência, como a Instrução n. 237/63.

19. Cheque especialO denominado “cheque especial” consiste na concessão de crédito

pelo banco-sacado em prol do correntista, por meio de contrato de aber-tura de crédito, sujeito aos juros a serem pagos pelo emitente-sacador de cheque com valor superior aos fundos próprios existentes na respectiva conta-corrente, se e quando utilizar o crédito adicional emprestado pelo banco-sacado.

Ressalvada a origem dos fundos disponíveis na conta-corrente, provenientes do empréstimo bancário mediante contrato de abertura de crédito, quanto aos demais aspectos, não há diferença entre o denomi-nado “cheque especial” e o cheque propriamente dito. Sem dúvida, como todo cheque, o denominado “cheque especial” é título de crédito, razão pela qual também pode ser executado pelo credor-beneficiário, na even-tualidade da falta de provisão de fundos na respectiva conta-corrente.

20. Revogação ou contraordemA revogação ou contraordem é o ato pelo qual o emitente de cheque

pagável no Brasil determina ao banco-sacado que não efetue o respecti-vo pagamento após o decurso do prazo de apresentação previsto no art. 33 da Lei n. 7.357/85. Com efeito, a contraordem não impede o paga-

para facilitação das pessoas em viagem” (J. M. Othon Sidou, Dicionáriojurídico: Academia Brasileira de Letras Jurídicas, 9. ed., 2004, p, 148). “Uma das espécies mais conhecidas de cheque administrativo, que possui algumas peculiaridades, é o cheque de viajante (traveller’scheck)” (Fábio Ulhoa Coelho, Manualdedireitocomercial: direito de empresa, 18. ed., 2007, p. 276).

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mento do cheque durante o prazo do art. 33, porquanto a revogação “só produz efeito depois de expirado o prazo de apresentação”60.

Quanto à iniciativa, a contraordem só pode ser manifestada pelo emitente-sacador do cheque, com fundamento no art. 35, caput, proêmio, da Lei n. 7.357/85.

No que tange à forma, a contraordem deve ser escrita, com a co-municação fundamentada dirigida ao banco-sacado mediante carta, notificação extrajudicial ou notificação judicial61, conforme a escolha do emitente-sacador, tudo nos termos do art. 35 da Lei n. 7.357/85.

Além das vias disponíveis à luz do art. 35 da Lei n. 7.357/85, o § 4º do art. 3º da Resolução n. 2.747 do Conselho Monetário Nacional também autoriza a revogação por simples ligação telefônica e até por mensagem eletrônica, desde que confirmadas, dentro de dois dias úteis, por meio de documento escrito e assinado62.

Por fim, decorrido inalbis o prazo de apresentação sem a expedição de contraordem por parte do emitente-sacador, o cheque ainda continua pagável pelo banco-sacado, desde que não ocorrida a prescrição semes-tral63. Após o decurso tanto do prazo de apresentação quanto do prazo prescricional semestral, o banco-sacado já não pode liquidar o cheque, porquanto os arts. 6º, n. 44, e 12, ambos da Resolução n. 1.631, do Con-selho Monetário Nacional, estabelecem que o cheque prescrito deve ser devolvido.

60 Cf. art. 35, parágrafo único, da Lei n. 7.357/85.

61 Cf. arts. 867 e 873 do Código de Processo Civil.

62 “§ 4º Admite-se que as solicitações de sustação, de contraordem e de cancelamen-to de cheques sejam realizadas em caráter provisório, por comunicação telefônica ou por meio eletrônico, hipótese em que seu acatamento será mantido pelo prazo máximo de dois dias úteis, após o que, caso não confirmadas nos termos dos §§ 1º a 3º, deverão ser consideradas inexistentes pela instituição financeira”.

63 Cf. arts. 35, parágrafo único, e 59, ambos da Lei n. 7.357/85. De acordo, na dou-trina: “A revogação ou contraordem só produz efeito depois de expirado o prazo de apresentação e, não sendo promovida, pode o sacado pagar o cheque até que decorra o prazo de prescrição” (Waldo Fazzio Júnior, Manualdedireitocomercial, 7. ed., 2006, p. 451). “Um cheque não apresentado durante o prazo legal pode ser pago pelo sacado, desde que não se encontre prescrito e, evidentemente, haja suficiente provisão de fundos em seu poder (art. 35, parágrafo único)” (Fábio Ulhoa Coelho, Manualdedireitocomercial: direito de empresa, 18. ed., 2007, p. 279).

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21. Oposição ou sustação A oposição ou sustação é o ato pelo qual o emitente-sacador e o

credor-beneficiário podem impedir o pagamento do cheque, ainda que no curso do prazo de apresentação. Ao contrário da revogação, portanto, a oposição tem efeito imediato64. Não alcança, todavia, cheque já liqui-dado65.

Por força do art. 36 da Lei n. 7.357/85, a oposição deve ser mani-festada por escrito, com fundamentação em relevante razão de direito: extravio, furto, roubo. Além das vias disponíveis à luz do art. 36, o § 4º do art. 3º da Resolução n. 2.747 do Conselho Monetário Nacional auto-riza a oposição também mediante telefone e por meio eletrônico, desde que confirmada por escrito dentro de dois dias úteis66.

À vista do art. 36, § 2º, da Lei n. 7.357/85, e do art. 3º, § 1º, da Re-solução n. 2.747/2000, não cabe ao banco-sacado decidir sobre a existên-cia da relevância da oposição, ou não67. Qualquer discussão acerca da inexistência de relevância só pode ser veiculada perante o Poder Judici-ário, único com jurisdição para decidir eventual conflito de interesses68.

64 Assim, na jurisprudência: “COMERCIAL. CHEQUE. OPOSIÇÃO. SUSTAÇÃO DE PAGAMENTO PELO BANCO SACADO. TEMPESTIVIDADE. LEI N. 7.357/85, ARTS. 34, 35 E 36. EXEGESE. I. Até o instante da efetiva liberação do numerário ou do creditamento em conta é possível ao banco sacado suspendê-lo, em atendimen-to a oposição realizada pelo emitente do cheque. II. Recurso especial conhecido e provido” (4ª Turma do STJ, REsp 178.369/MG, DiáriodaJustiça, 12-11-2005, p. 386).

65 De acordo, na jurisprudência: “Cheque. Oposição ao pagamento. Lei 7.357/85, art. 36. Efetuado o pagamento do cheque com o crédito ao beneficiário e o débito ao emitente, não é mais possível proceder-se eficazmente à oposição” (3ª Turma do STJ, REsp 178.453/MG, DiáriodaJustiça, 28-8-2000, p. 76).

66 “§ 4º Admite-se que as solicitações de sustação, de contraordem e de cancelamen-to de cheques sejam realizadas em caráter provisório, por comunicação telefônica ou por meio eletrônico, hipótese em que seu acatamento será mantido pelo prazo máximo de dois dias úteis, após o que, caso não confirmadas nos termos dos §§ 1º a 3º, deverão ser consideradas inexistentes pela instituição financeira”.

67 “§ 1º Para a efetivação de sustação e de contraordem de cheques, as instituições financeiras que operam na captação de depósitos à vista devem exigir, na forma da lei, solicitação escrita do interessado, com justificativa fundada em relevante razão de direito, não cabendo à instituição examinar o mérito ou a relevância da justificativa”.

68 De acordo, na jurisprudência: “COMERCIAL – CHEQUE – SUSTAÇÃO DE PA-GAMENTO POR OPOSIÇÃO – MATÉRIA DE FATO – INTELIGÊNCIA DO ART.

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No que tange ao alcance, todos os cheques podem ser sustados, até mesmo o cheque administrativo69.

Quanto à iniciativa, a oposição pode ser manifestada pelo emiten-te-sacador e pelo credor-beneficiário. Não obstante, o emitente que já veiculou contraordem não pode sustar o cheque, e vice-versa, porquan-to os institutos “se excluem reciprocamente”, por força do § 1º do art. 36 da Lei n. 7.357/85. Daí a necessidade da distinção dos institutos da re-vogação (ou contraordem) e da oposição (ou sustação)70.

Por fim, a sustação dolosa configura crime de fraude no pagamen-to por meio de cheque, por força da combinação do art. 65 da Lei n. 7.357 com o art. 171, § 2º, VI, do Código Penal.

22. Cancelamento O cancelamento está previsto no art. 3º da Resolução n. 2.747 do

Conselho Monetário Nacional, norma expedida com sustentação no art. 69 da Lei n. 7.357/85.

36 DA LEI DO CHEQUE. I – A seriedade da oposição (sustação do pagamento) está assegurada pela exigência da relevância jurídica da razão invocada pelo oponente, a qual, obviamente, não é deixada ao julgamento do banco sacado, mas ao do juiz” (3ª Turma do STJ, REsp 101.096/RS, DiáriodaJustiça, 25-2-1998, p. 69).

69 Assim, na jurisprudência: “– Não afasta a aplicação do instituto da oposição mo-tivada, nos termos do art. 36 da Lei n. 7.357/85, a circunstância de tratar-se de ‘cheque administrativo’ sacado pelo estabelecimento bancário contra a sua própria caixa, no caso de oposição apresentada pelo favorecido e endossante do cheque sob invocação ao negócio subjacente do endosso” (3ª Turma do STJ, REsp 130.428/PR, DiáriodaJustiça, 27-11-2000, p. 155). De acordo, ainda na jurisprudên-cia: 4ª Turma do STJ, REsp 16.713/MS, DiáriodaJustiça, 28-6-1993, p. 12895.

70 A respeito da diferença entre os institutos, merece ser prestigiada a autorizada lição da doutrina: “Um outro conceito, diferente de revogação ou contraordem, é o de oposição. Mesmo durante o prazo de apresentação, o emitente e o portador legitimado podem fazer sustar o pagamento, manifestando ao sacado, por escrito, oposição fundada em qualquer razão de direito (art. 36, caput). Confirmando a diferença entre os dois conceitos, o § 1º do art. 36 dispõe que ‘a oposição do emi-tente e a revogação ou contraordem se excluem reciprocamente’. Em suma, a re-vogação mercê de contraordem só pode ser dada pelo emitente, com razões mo-tivadoras do ato, e só produz efeito depois de expirado o prazo de apresentação; a oposição com o objetivo de sustar o pagamento do cheque, fundada em relevan-te razão de direito, pode ser apresentada pelo emitente ou pelo portador legitima-do, mesmo durante o prazo de apresentação, não cabendo, entretanto, ao sacado julgar da relevância da razão invocada pelo oponente” (Osmar Brina Corrêa-Lima, Cheque: revogação (contraordem) e oposição. 2009, p. 4).

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O cancelamento diz respeito somente às folhas em branco de cheque e pode alcançar até mesmo o talonário por inteiro. Ao contrário da revo-gação e da oposição, o cancelamento atinge o cheque que ainda não foi emitido71. Com efeito, à vista do art. 3º da Resolução n. 2.747/2000, o cancelamento é admissível nas hipóteses de roubo, furto e extravio de folha de cheque ou do talonário, desde que em branco.

No que tange à iniciativa, o cancelamento deve ser feito de ofício pela instituição bancária, na hipótese da ocorrência do roubo, do furto ou do extravio antes da entrega ao legítimo destinatário, ou seja, ao cliente do banco. Após a entrega do talonário, o cancelamento depende de pedido fundamentado do correntista, com esteio no art. 3º, § 3º, da Resolução n. 2.747/2000. O pedido deve ser feito por escrito ao banco, embora também seja admissível o cancelamento por telefone ou por meio eletrônico, com a posterior confirmação mediante requerimento escrito, dentro do prazo de dois dias úteis, tudo nos termos do art. 3º, § 4º, da Resolução n. 2.747/2000.

23. Ações fundadas em cheque

23.1. Ação cambial: execução

Como já estudado, o cheque deve ser apresentado para pagamen-to perante o banco-sacado dentro de trinta dias da data da emissão, quando emitido no mesmo lugar do pagamento72. Emitido o cheque em lugar diverso do local do pagamento, ou seja, em outra praça, o prazo para apresentação é de sessenta dias da data da emissão73. De-corrido inalbis o prazo de apresentação, o credor-beneficiário perde o direito de executar os coobrigados, ou seja, os endossantes e os respec-tivos avalistas74-75. Por conseguinte, no que tange ao emitente-sacador

71 No mesmo sentido, na doutrina: “Diferente é a hipótese de cancelamento do cheque. Não há, para seu caso específico, uma contra-ordem ao pagamento ou sustação do pagamento do cheque, pois não houve sua emissão. Se houve emissão, deve-se recorrer a tais institutos” (Gladston Mamede, Títulosdecré-dito, 2003, p. 287).

72 Cf. art. 33 da Lei n. 7.357/85, e art. 11 da Resolução n. 1.682/90.

73 Cf. art. 33 da Lei n. 7.357/85, e art. 11 da Resolução n. 1.682/90.

74 Cf. art. 47, II, da Lei n. 7.357/85.

75 À vista do art. 47, § 3º, da Lei n. 7.357/85, o credor-benefício pode perder o direi-to de executar até mesmo o emitente-sacador, se o mesmo tinha fundos disponíveis

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e ao respectivo avalista, a execução pode ser ajuizada até mesmo quan-do o cheque foi apresentado ao banco-sacado depois do decurso do prazo de apresentação, desde que ainda não ocorrida a prescrição se-mestral, como bem assentou o Supremo Tribunal Federal no Enuncia-do 600: “Cabe ação executiva contra o emitente e seus avalistas, ainda que não apresentado o cheque ao sacado no prazo legal, desde que não prescrita a ação cambiária”.

A prescrição da ação cambiária ocorre com o decurso do prazo de seis meses do término do prazo de apresentação, conforme o enquadra-mento do caso concreto em uma ou em outra hipótese do art. 33 da Lei n. 7.357/85. Se o local do pagamento é o mesmo da emissão, o prazo de seis meses corre do término dos trinta dias disponíveis para apresentação; se o lugar do pagamento for diverso do local da emissão, o prazo de seis meses corre somente depois do decurso dos sessenta dias para a apre-sentação. Por conseguinte, a data da emissão constante do título tem enorme relevância jurídica para a prescrição da execução fundada no art. 585, I, do Código de Processo Civil, e nos arts. 47 e 59 da Lei n. 7.357/85. Imagine-se, por exemplo, que o cheque foi emitido no dia 19 de janeiro de 2010, mês com 31 dias, para pagamento na mesma praça. O termo inicial é o próprio dia 19, dia da emissão, o qual, entretanto, é excluído da contagem, por força da combinação dos arts. 33 e 64 da Lei n. 7.357/85, com o art. 132, caput, do Código Civil. Por conseguinte, a contagem dos trinta dias previstos no art. 33 da Lei n. 7.357 começa no dia 20 de janeiro e termina no dia 18 de fevereiro, desde que seja dia útil bancário76. Resta saber qual é o termo inicial do prazo de seis meses da execução. À vista dos arts. 47 e 59 da Lei n. 7.357, o termo inicial do prazo prescricional coincide com o termo final do prazo de apresentação do cheque, ou seja, dia 18 de fevereiro. Como o prazo de seis meses é contado à luz do § 3º do art. 132 do Código Civil, o termo final do prazo prescricional reside no dia 18 de agosto, desde que seja dia útil forense77.

durante o prazo da apresentação, mas deixou de tê-los em razão de fato alheio à sua vontade.

76 Por força do § 1º do art. 132 do Código Civil, o termo final do prazo deve ser dia útil, vale dizer, dia com expediente bancário regular.

77 A propósito, vale conferir outro exemplo encontrado na melhor doutrina: “Por exemplo, cheque de mesma praça emitido em 2 de março prescreve em 1º de outubro do mesmo ano” (Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial, v. I, 12. ed., 2008, p. 451).

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A execução pode ser movida contra o devedor principal, o emiten-te-sacador do cheque, mas também contra todos, alguns ou um dos coobrigados, em conjunto ou isoladamente, se assim desejar o credor- -beneficiário, porquanto todos são devedores solidários, exvi do art. 51 da Lei n. 7.357/85.

O cheque não precisa ser protestado para a propositura da imedia-ta ação de execução forçada contra o emitente-sacador e o respectivo avalista78. Em contraposição, no que tange aos coobrigados (endossante e respectivos avalistas), a execução depende do cumprimento de três exigências legais cumulativas: 1ª) apresentação do cheque dentro do prazo legal79; 2ª) propositura da ação executiva dentro de seis meses da expiração do prazo de apresentação do cheque80; 3ª) comprovação da recusa do pagamento mediante protesto cambial, por simples declaração escrita e datada proveniente do banco-sacado ou, ainda, por declaração escrita e datada expedida na câmara de compensação81, ressalvada a exceção consubstanciada na dispensa tanto do protesto quanto de decla-ração equivalente, em relação ao cheque que contém a cláusula “sem protesto”82.

Por oportuno, vale registrar que o protesto cambial produz o im-portante efeito jurídico previsto no art. 202, II, do Código Civil: interrup-ção da prescrição.

Ainda em relação ao protesto, o cheque pode ser protestado tanto no cartório de protesto do lugar do pagamento quanto no tabelionato do local do domicílio do emitente-sacador, conforme a escolha do credor- -beneficiário83. O posterior pagamento do cheque protestado, entretanto, enseja o imediato cancelamento do protesto perante o Tabelionato de Protestos de Títulos, por intermédio de qualquer interessado. Basta a demonstração do respectivo pagamento, sem a necessidade da anuência do credor-beneficiário, a qual só é exigida na impossibilidade de apre-

78 Cf. art. 47, I, da Lei n. 7.357/85, c/c o art. 585, I, do Código de Processo Civil.

79 Cf. arts. 33 e 47, II, ambos da Lei n. 7.357/85.

80 Cf. arts. 33, 47 e 59 da Lei n. 7.357/85.

81 Cf. art. 47, II e § 1º, da Lei n. 7.357/85.

82 Cf. art. 50 da Lei n. 7.357/85.

83 Cf. art. 6º, proêmio, da Lei n. 9.492/97.

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sentação do original do título protestado84. A respeito do tema, merece ser prestigiado o Enunciado 1 da Súmula do antigo Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul: “O cancelamento de protesto de títulos cambiais pode ser feito mediante comprovação de quitação regular e independen-te de consentimento do credor”.

Por fim, além da quantia determinada indicada no cheque85, o credor-beneficiário também pode cobrar na ação cambial: – os juros de mora legais cabíveis desde o dia da apresentação do cheque86; – as des-pesas em geral, como as referentes ao protesto cambial e as relativas ao processo executivo87; – a correção monetária pela perda do valor aqui-sitivo da moeda, a ser calculada a contar da respectiva apresentação do cheque88. A propósito, não há incompatibilidade alguma entre os arts. 10 e 52, II, ambos da Lei n. 7.357/85. O art. 10 dispõe sobre a vedação da estipulação de juros no bojo do cheque, em razão da natureza do título: ordem de pagamento à vista. Não liquidado o cheque no dia da apre-sentação, daí começa a incidência dos juros de mora legais89.

23.2. Ação de enriquecimento sem causa ou de locupletamento indevido

Decorrido o prazo prescricional semestral para a ação cambial, o credor-beneficiário ainda pode ajuizar a “ação de enriquecimento ilícito”90, “ação de locupletamento indevido” ou actioinremverso91, no

84 Cf. art. 26 da Lei n. 9.492/97.

85 Cf. art. 52, I, da Lei n. 7.357/85.

86 Cf. art. 52, II, da Lei n. 7.357/85.

87 Cf. art. 52, III, da Lei n. 7.357/85, e art. 19 do Código de Processo Civil.

88 Cf. art. 52, IV, da Lei n. 7.357/85, c/c o art. 1º, § 1º, da Lei n. 6.899/81.

89 Cf. art. 52, II, da Lei n. 7.357/85.

90 Cf. Pinto Ferreira, Vocabuláriojurídicodasaçõesedosrecursos, 1999, p. 11, especial-mente a parte final da transcrição da autorizada lição do saudoso jurisconsulto: “AÇÃO DE CHEQUE. A ajuizada para exigir o importe do título com os encargos complementares, atribuída ao beneficiário, ao coobrigado que tenha pago e ao avalista, contra todos os coobrigados ou mesmo um só (Lei Uniforme sobre o Cheque, Anexo I, art. 52; Lei n. 7.357, de 2-9-1985, art. 47). Prescreve em seis meses, contados da data de expiração do prazo de apresentação. Permanece, entretanto, o direito do beneficiário de cobrar o que lhe é devido, não mais por ação cambiá-ria, e sim por ação de enriquecimento ilícito”.

91 De acordo, na doutrina: “A ação, que objetiva evitar ou desfazer o enriquecimen-to sem causa, denomina-se actioinremverso. (...) Tal é o que ocorre, por exemplo,

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prazo de dois anos do dia em que se consumou a prescrição da pretensão executiva, consoante o disposto no art. 61 da Lei n. 7.357/85.

A demanda de locupletamento tem natureza cognitiva e pode ser ajuizada sob procedimento comum92 ou sob procedimento monitório, exvi do Enunciado 299 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça: “É admissível ação monitória fundada em cheque prescrito”. Cabe ao autor da ação de locupletamento indevido a escolha entre o procedimento comum e o monitório93.

À vista do art. 61 da Lei n. 7.357/85, não há necessidade da indica-ção da origem da dívida na petição inicial da ação de locupletamento indevido, quer sob o procedimento comum, quer sob o rito monitório94. Com efeito, a simples juntada do cheque prescrito que não foi liquidado já é suficiente para demonstrar a ocorrência do locupletamento ilícito,

quando o credor perde o direito de executar o cheque por força da prescrição, e, nos termos do art. 61 da Lei n. 7.357/85, promove ação de inremverso contra o emitente ou outros obrigados da cártula, que se locupletaram com o não paga-mento do cheque. Portanto, concorrendo os requisitos supraelencados, e em face da inexistência de outro meio específico de tutela, a ação de enriquecimento ilíci-to (inremverso) será sempre uma alternativa à parte prejudicada pelo espúrio enriquecimento da outra” (Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Novocursodedireitocivil, v. II, 9. ed., 2008, p. 349 e 351).

92 Procedimento comum que pode ser ordinário ou sumário, conforme o valor da causa.

93 Em reforço ao entendimento defendido no presente compêndio, vale conferir o didático voto do eminente Desembargador Alexandre Freitas Câmara: “A deman-da de enriquecimento, a ser proposta pelo credor, poderá levar à utilização do procedimento monitório ou de procedimento comum (ordinário ou sumário, conforme o caso), por opção do demandante. Impende, pois, considerar que a assim chamada ‘ação monitória’ não é figura distinta da ‘ação de enriquecimento’ mas, tão somente, o nome dado pela lei processual a um dos procedimentos que podem ser usados para o desenvolvimento do processo instaurado pela proposi-tura da ‘ação de enriquecimento’” (2ª Câmara Cível do TJRJ, Apelação 2009.001.07855).

94 Em sentido conforme, na jurisprudência: “Comercial. Processual civil. Ação monitória. Cheque. Desnecessidade de indicação da causadebendi. Dissídio jurisprudencial não demonstrado. I. Para a admissibilidade da ação monitória, não tem o autor de declinar a causadebendi, bastando, para esse fim, a juntada de qualquer documento escrito que traduza em si um crédito e não se revista de eficácia executiva” (3ª Turma do STJ, REsp 274.257/DF, Diárioda Justiça, 24-9-2001).

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razão pela qual é dispensável a exposição da causadebendi na demanda fundada no art. 61 da Lei n. 7.357/8595.

Embora seja adequada para o recebimento de valores expressos em títulos de crédito prescritos, a ação de enriquecimento sem causa não pode ser proposta contra todos os obrigados e coobrigados cambiais, porquanto a solidariedade cambial cessa com o decurso dos prazos prescricionais para a execução. Daí a conclusão: a ação de locupletamen-

95 De acordo, na jurisprudência: “PROCESSO CIVIL – AÇÃO DE LOCUPLETA-MENTO – CHEQUE PRESCRITO – ART. 61 DA LEI 7.357/85 – DESNECESSI-DADE DE DEMONSTRAR A CAUSA DEBENDI – PRESUNÇÃO JURISTANTUM– APLICAÇÃO DO ART. 333, II, CPC – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO IMPROVIDO” (2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Recurso 2007.05.6.000859-7, Diárioda Justiça, 24-5-2007, p. 116). “Se a ação monitória se embasar em cheque prescrito, mas tiver sido ajuizada no prazo da ação de locupletamento, não há que se exigir a indicação do negócio subjacente. A desnecessidade da remissão primária à causadeben-di na exordial da monitória encontra amplo suporte ao serem conjugadas as regras do procedimento especial (arts. 1.102-A a 1.102-C do CPC) com a nor-ma inserta no art. 61 da Lei 7.357/85” (6ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2006.01.1.031251-4, DiáriodaJustiça, 22-5-2007, p. 661). “AÇÃO MONITÓRIA – CHEQUE PRESCRITO – PROPOSITURA DA MONITÓRIA NO PRAZO DA AÇÃO DE LOCUPLETAMENTO – CAUSADEBENDI – DESNECESSIDADE – ÔNUS DO RÉU. 1. Antes do advento da ação monitória, o credor de cheque prescrito poderia valer-se da ação de locupletamento até dois anos após a prescrição da cártula, não sendo necessário provar a causadebendi (art. 61 da Lei 7.357/85). Transcorrido o prazo da ação de locupletamento, o credor só poderia ajuizar a ação de cobrança, incumbindo-lhe o ônus de provar toda a relação jurídica subjacente. 2. A Lei n. 9.079/95 introduziu no Ordenamento Jurídico Brasileiro a ação monitória, que é um procedimento mais ágil para a formação do título executivo. 3. Assim, há que se distinguir a monitória como sucedâneo da ação de locupletamento e da ação de cobrança. 4. Ajuizada monitória no prazo da ação de locupletamento, o cheque prescrito presume o enriquecimento ilícito do réu, cabendo a este o ônus de provar a inexistên-cia do crédito vindicado. 5. Apelo provido” (3ª Turma do TJDF, Apelação 2006.01.1.061023-3, DiáriodaJustiça, 13-11-2007, p. 90). “PROCESSUAL CIVIL. CHEQUES PRESCRITOS. AÇÃO DE LOCUPLETAMENTO. POSSIBILIDADE JURÍDICA. PRESUNÇÃO. A posse de cheques que não foram honrados pelo emitente, exaurido o prazo de cobrança executiva das dívidas por ele repre-sentadas, é suficiente à propositura da ação de locupletamento ilícito, presu-mindo-se em favor do autor a causa lícita das dívidas, o prejuízo sofrido pelo não pagamento e o enriquecimento do emitente, presunção que poderá ser elidida, por provas em contrário, a cargo do réu” (3ª Turma do STJ, REsp 32.772/PR, DiáriodaJustiça, 24-5-1993, p. 10005).

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to indevido só pode ter como alvo aquele devedor realmente beneficia-do pelo enriquecimento sem causa96.

Por fim, a ação de locupletamento indevido deve ser proposta, processada e julgada no foro do domicílio do devedor, juízo competente para a demanda, tanto sob o procedimento monitório quanto sob o rito comum, ordinário ou sumário, em virtude da incidência da regra inser-ta no caput do art. 94 do Código de Processo Civil97.

23.3. Ação de cobrança de conhecimento ou ação causal

Além da execução cambial e da ação de enriquecimento sem causa, ainda há lugar para a ação de cobrança fundada na relação causal, como autoriza o art. 62 da Lei n. 7.357/85. A ação de cobrança pode ser movi-da sob o procedimento comum98 e sob o procedimento monitório, con-forme a escolha do autor.

A ação fundada na relação causal prescreve à vista dos arts. 205 e 206 do Código Civil, conforme a origem da dívida, a qual deve ser de-monstrada na petição inicial. Com efeito, se a demanda é ajuizada com fundamento no art. 62 da Lei n. 7.357/85, o cheque prescrito tem serven-tia apenas como meio de prova documental da relação jurídica subjacen-te, a qual precisa ser exposta na petição inicial e demonstrada no proces-so cognitivo fundado na relação causal99.

96 Assim, na jurisprudência: 4ª Turma do STJ, AG 620.909/RS – AgRg, DiáriodaJustiça, 2-4-2007, p. 277; 3ª Turma do STJ, REsp 200.492/MG, DiáriodaJustiça, 21-8-2000, p. 123; e 4ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2004.01.1.010196-7, DiáriodaJustiça, 3-5-2007, p. 98: “Estando prescrito o título cambial, desaparece a relação cambial e, em consequência, o aval”.

97 Assim, na jurisprudência: “PROCESSO CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA. A ação monitória deve ser processada e julgada no foro do domicílio do devedor (art. 94, caput, do CPC). Recurso especial conhecido e provido” (3ª Turma do STJ, REsp 287.724/MG, DiáriodaJustiça, 22-5-2006, p. 190).

98 O procedimento comum pode ser ordinário ou sumário, conforme o valor da causa.

99 Assim, na jurisprudência: 1ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2005.01.1.081440-4, DiáriodaJustiça, 18-9-2007, p. 106: “I – É indispensável a declinação da causa de pedir nos casos em que a ação monitória, fundada em cheque prescrito, é ajuizada após o prazo de dois anos, previsto na Lei do Cheque para a propo-situra da ação de locupletamento. II – Prescrita a pretensão de locupletamento, o prazo prescricional a ser considerado para cobrança é aquele fixado para a obrigação que deu ensejo ao saque do cheque prescrito. (...) PROCESSO CIVIL.

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Não obstante, prevalece a orientação jurisprudencial segundo a qual a ação de cobrança prescreve em cinco anos, tendo em vista o art.

AÇÃO MONITÓRIA. CHEQUE PRESCRITO. DECURSO DO PRAZO PARA AÇÃO DE LOCUPLETAMENTO. ORIGEM DA DÍVIDA. FALTA DE COMPRO-VAÇÃO. INÉPCIA DA INICIAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGA-MENTO DE MÉRITO. INCIDÊNCIA DOS ARTS. 282, INC. III E 267, INC. I, AMBOS DO CPC. SENTENÇA REFORMADA. 1. Escolhendo o credor, para a satisfação de seu crédito, o caminho do procedimento injuntivo, estará dispen-sado de deduzir a causadebendi do cheque prescrito, se a ação vier a ser pro-posta até dois anos após o decurso do prazo previsto no art. 59 da Lei 7.357/85 (ação de enriquecimento – art. 61 –, sob o rito previsto no art. 1.102-A do CPC). 2. Se decorridos esses dois anos, intentar, para o mesmo fim, também a ação monitória, aí sim, a respectiva inicial deverá narrar a origem do título, que, neste caso, constitui apenas começo de prova escrita da ação de cobrança proposta nos termos do art. 1.102-A do CPC” (4ª Turma Cível do TJDF, Apela-ção 1999.01.1.052164-8, DiáriodaJustiça, 19-3-2003, p. 86). “CIVIL E PROCESSO CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. CHEQUE PRESCRITO. APTIDÃO PARA INS-TRUIR A AÇÃO INJUNTIVA. PRECEDENTES. VENCIMENTO DO PRAZO PARA A PROPOSITURA DA AÇÃO DE ENRIQUECIMENTO. ART. 61 DA LEI N. 7.357/85. NECESSIDADE DE O AUTOR DECLINAR, NA AÇÃO MONI-TÓRIA, A CAUSADEBENDI. INCUMBÊNCIA DO RÉU DE PROVAR FATO EXTINTIVO OU MODIFICATIVO DO DIREITO DO AUTOR. ART. 333, II, CPC. PRESCRIÇÃO DA AÇÃO APÓS O PRAZO DA AÇÃO DE ENRIQUECIMEN-TO. PRAZO QUE SE REGULA PELA LEGISLAÇÃO DE DIREITO MATERIAL. OBRIGAÇÃO CONCERNENTE À PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EDUCACIO-NAIS. PRESCRIÇÃO ANUAL. ART. 178, § 6º, VII, CCB de 1916. 1 – Na esteira dos precedentes deste Tribunal, considera-se o cheque prescrito documento apto a ensejar a propositura da ação monitória; 2 – Prescrito o cheque e ultra-passado o prazo bienal estabelecido no art. 61 da Lei do Cheque (Lei n. 7.357/85), deve o proponente da ação monitória declinar a relação jurídica material que ensejou a emissão do título prescrito; 3 – O direito à ação moni-tória fundada em cheque prescrito proposta após o vencimento do prazo da ação de enriquecimento prevista no art. 61 da Lei do Cheque prescreve em 1 (um) ano, se o pedido disser respeito à cobrança de mensalidades escolares. Art. 178, § 6º, VII. Precedentes deste Tribunal e do STJ. 4 – Apelo provido” (4ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2000.01.1.038185-9, DiáriodaJustiça, 17-10-2006, p. 100). “DIREITO COMERCIAL. MONITÓRIA. CHEQUE PRESCRITO. AÇÃO DE COBRANÇA. ULTRAPASSADO BIÊNIO PARA A AÇÃO DE ENRIQUE-CIMENTO. ART. 61 LEI 7.357/85. CAUSADEBENDI. NECESSIDADE. 1 – A ação fora proposta fora do prazo legal previsto para o ajuizamento da ação de locupletamento ilícito. 2 – O autor da ação monitória, que no caso deve ser aceito e julgado como ação de cobrança, deveria, na hipótese, declinar e provar a causadebendi relativamente ao título prescrito. 3. Recurso conhecido e impro-vido” (4ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2006.01.1.090370-3, DiáriodaJustiça, 11-10-2007, p. 160).

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206, § 5º, I, do Código Civil100. Sem dúvida, prevalece a tese da prescrição quinquenal da pretensão de cobrança fundada em cheque prescrito, independentemente do procedimento a ser adotado101.

23.4. Ação de indenização por devolução indevida de cheque

À vista do art. 5º, X, da Constituição Federal, e dos arts. 186 e 927 do Código Civil, o emitente-sacador pode acionar o banco-sacado pelo dano moral causado em razão da devolução de cheque sem motivo previsto em lei. Foi o que bem assentou o Superior Tribunal de Justiça ao aprovar o Enunciado 388: “A simples devolução indevida de cheque caracteriza dano moral”102.

100 “São três os prazos prescricionais relacionados ao cheque. O primeiro de seis meses referente à ação de execução, contados do término do prazo de apresenta-ção (art. 59, da Lei n. 7.357/85). O segundo de dois anos para a ação de locuple-tamento, contados da prescrição da pretensão executiva (art. 61, Lei n. 7.357/85). E o terceiro, atualmente, de cinco anos, contados do término do prazo para o ajuizamento da ação de locupletamento, referente à pretensão cuja causa de pedir é instrumento particular que representa dívida líquida (art. 206, § 5º, I, CCB/2002)” (17ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0313.06.207890-9/001, julgamento em 3-9-2008).

101 “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CHEQUE PRESCRITO. AÇÃO MONITÓRIA. PRAZO PRESCRICIONAL. A ação monitória fundada em cheque prescrito está subordinada ao prazo prescricional de 5 (cinco) anos previsto no art. 206, § 5º, I, do Código Civil” (3ª Turma do STJ, REsp 1.038.104/SP, DiáriodaJustiça eletrônico, 18-6-2009). A propósito da tese predominante na jurisprudência, vale conferir a respeito voto-vencedor proferido pelo eminente Desembargador Alexandre Frei-tas Câmara, na qualidade de Revisor da Apelação 2009.001.07855: “O direito de crédito decorrente da relação subjacente ao cheque, por sua vez, está sujeito a prazo prescricional de cinco anos, na forma do disposto no art. 206, § 5º, I, do Código Civil, que estabelece o prazo quinquenal no caso de cobrança de dívida líquida constante de instrumento público ou particular” (2ª Câmara Cível do TJRJ, Apelação 2009.001.07855).

102 “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – DEVOLUÇÃO INDEVIDA DE CHEQUES – DANO MORAL – SUCUMBÊNCIA. I – A devolução indevida do cheque por culpa do banco prescinde da prova do prejuízo. II – A jurisprudência recente da Segunda Seção desta Corte entende que, nas ações de indenização por dano moral, a postulação contida na inicial se faz em caráter meramente estimativo. Assim, na hipótese de o pedido vir a ser julgado proce-dente em montante inferior ao assinalado na peça exordial, fica respeitada a proporcionalidade na condenação, porquanto a par de estabelecida em percen tual razoável, se faz sobre o real montante da indenização a ser paga. Precedentes” (3ª

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No que tange ao prazo para a propositura da demanda indeniza-tória, a pretensão de reparação prescreve em três anos, nos termos do art. 206, § 3º, V, do Código Civil de 2002.

23.5. Ação de indenização por apresentação de cheque “pré-datado”

Os arts. 186 e 927 do Código Civil também autorizam o emitente- -sacador a ajuizar demanda indenizatória contra o credor-beneficiário de cheque emitido com data futura, mas apresentado ao banco-sacado antes do acordado, com a quebra do pacto avençado. A propósito, vale conferir o Enunciado 370 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça: “Caracteri-za dano moral a apresentação antecipada de cheque pré-datado”.

Por fim, a pretensão de reparação prescreve em três anos, por força do art. 206, § 3º, V, do Código Civil, como já estudado no tópico anterior.

23.6. Ação de indenização por cheques falso, falsificado e adulterado

À vista do art. 39, parágrafo único, segunda parte, da Lei n. 7.357/85, com o reforço dos arts. 186 e 927 do Código Civil, o banco- -sacado é civilmente responsável pelo pagamento de cheque falso, falsi-ficado ou adulterado103. Com efeito, o correntista prejudicado pelo pa-gamento de cheque falso, falsificado ou adulterado pode ajuizar deman-da indenizatória contra o banco-sacado, no prazo de três anos, tendo em

Turma do STJ, REsp 434.518/MG, DiáriodaJustiça, 12-8-2003, p. 220). “RECURSO ESPECIAL. DEVOLUÇÃO INDEVIDA DE CHEQUE. RESPONSABILIDADE DO BANCO. DANO MORAL. PRESUNÇÃO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. RECUR-SO ESPECIAL PROVIDO. 1. A devolução indevida do cheque por culpa do banco prescinde da prova do prejuízo, mesmo que, ao ser reapresentado, tenha sido devidamente pago, e ainda que não tenha havido registro do nome da correntista em órgão de proteção ao crédito. 2. O valor da indenização deve ser fixado sem excessos, evitando-se enriquecimento sem causa da parte atingida pelo ato ilícito. 3. Recurso especial conhecido e provido” (4ª Turma do STJ, REsp 453.233/MG, DiáriodaJustiça, 5-2-2007, p. 240).

103 Aliás, o correntista também deve ser indenizado na eventualidade de prejuízo causado em conta bancária proveniente do pagamento mediante procuração falsa: “RESPONSABILIDADE CIVIL. Banco. Fundo mútuo de investimento. Conta ouro. Procuração falsa. Responsabilidade do banco. É do banco a responsabilidade pelo pagamento do saldo de fundo mútuo de investimento feito a quem se apresentou com procuração falsa, se não demonstrada a culpa exclusiva ou concorrente do depositante. Recurso conhecido e provido” (4ª Turma do STJ, REsp 267.651/RO, DiáriodaJustiça, 19-3-2001, p. 116).

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vista o art. 206, § 3º, V, do Código de 2002. A propósito da responsabili-dade civil do banco-sacado, vale conferir o Enunciado 28 da Súmula do Supremo Tribunal Federal: “O estabelecimento bancário é responsável pelo pagamento de cheque falso, ressalvadas as hipóteses de culpa ex-clusiva ou concorrente do correntista”104.

Não obstante, como bem revelam os trechos finais do Enunciado 28 da Súmula do Supremo Tribunal Federal e do parágrafo único do art. 39 da Lei n. 7.357/85, a responsabilidade civil do banco-sacado pode ser afastada, no todo ou em parte, quando há dolo, culpa exclusiva ou ao menos culpa concorrente do correntista105, em razão de negligência106, imprudência107 ou imperícia108 do emitente-sacador do cheque.

24. Cheque e Direito PenalNo que tange aos efeitos penais da emissão de cheque sem sufi-

ciente provisão de fundos e da consequente frustração do pagamento do cheque, incide o art. 171, § 2º, VI, do Código Penal de 1940, consoante determina o art. 65 da Lei n. 7.357/85.

À vista do art. 171, § 2º, VI, do Código Penal, a fraude é elemento do tipo penal, o que revela a natureza dolosa da infração. Por conseguin-

104 Por oportuno, há didático acórdão proferido pela 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, na Apelação 39.064, da relatoria do eminente Desembar-gador Barbosa Moreira, com a seguinte ementa: “Cheque especial com assinatura grosseiramente falsificada: responde o banco, perante o correntista, pelo respec-tivo pagamento, se não há prova de culpa exclusiva ou concorrente do titular da conta. Declaração de exoneração inserta na carta-aviso: limites de sua eficácia” (Barbosa Moreira, DireitoaplicadoI, 2. ed., 2001, p. 257).

105 Na hipótese de culpa concorrente, a jurisprudência firmou que o correntista e o banco-sacado devem arcar com o prejuízo proveniente do cheque liquidado: “Em hipótese de culpa concorrente, a responsabilidade do Banco é mitigada, dividindo- -a com o correntista” (4ª Turma do STJ, REsp 52.750/PE, DiáriodaJustiça, 14-11-1994, p. 30.962). “Cheque falso – Responsabilidade pelo pagamento. Reconhecendo o acórdão ter havido culpa concorrente, do estabelecimento bancário e do corren-tista, correta a conclusão ao declarar ser aquele responsável pelo ressarcimento de metade do prejuízo” (3ª Turma do STJ, REsp 2.539/SP, DiáriodaJustiça, 6-8-1990, p. 7334).

106 Em outros termos, desídia, desleixo.

107 Vale dizer, imprevisão.

108 Isto é, falta de técnica.

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te, não há o crime quando a emissão do cheque sem provisão de fundos ocorre por culpa do correntista, em razão de negligência, imprudência ou imperícia do emitente-sacador. A propósito, merece ser prestigiado o Enunciado 246 da Súmula do Supremo Tribunal Federal: “Comprovado não ter havido fraude, não se configura o crime de emissão de cheque sem fundos”.

Quanto ao processo penal, a competência é aferida à luz do local no qual ocorreu a recusa do pagamento pelo banco-sacado. Com efeito, não é o lugar da emissão do cheque sem suficiente provisão de fundos que marca a competência para o processo penal. A propósito, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal já aprovaram os Enun-ciados 244 e 521, respectivamente: “Compete ao foro do local da recusa processar e julgar o crime de estelionato mediante cheque sem provisão de fundos”. “O foro competente para o processo e julgamento dos crimes de estelionato, sob a modalidade da emissão dolosa de cheque sem provisão de fundos, é o do local onde se deu a recusa do pagamento pelo sacado.”

Não obstante, o pagamento do cheque sem provisão de fundos antes do recebimento da denúncia impede o processamento da ação penal contra o emitente-sacador109. Em contraposição, o pagamento posterior ao recebimento da denúncia não impede o curso do pro-cesso penal, como já assentou o Supremo Tribunal Federal median-te o Enunciado 554: “O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não obsta ao prossegui-mento da ação penal”.

Por fim, além da responsabilidade civil estudada no tópico anterior, há a responsabilidade criminal proveniente da falsidade, da falsificação

109 Assim, na jurisprudência: “RECURSO ORDINÁRIO EM HABEASCORPUS. DIREITO PROCESSUAL PENAL. ESTELIONATO. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. CHEQUE SEM PROVISÃO DE FUNDOS. AUSÊNCIA DE JUSTA CAU-SA. PAGAMENTO ANTES DO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. 1. Inexiste justa causa para a ação penal, quando, compro-vadamente, há o pagamento do cheque sem provisão de fundos, antes do recebi-mento da denúncia. Precedentes. 2. Recurso provido” (6ª Turma do STJ, RHC 15.039/AM, DiáriodaJustiça, 6-2-2006, p. 312). No mesmo sentido, ainda na juris-prudência: 5ª Turma do STJ, RHC 2.285/SP, DiáriodaJustiça, 16-11-1992, p. 21152. Por fim, vale conferir antigo precedente da Corte Suprema: 1ª Turma do STF, HC 50.935/GB, DiáriodaJustiça, 6-6-1973: “Habeascorpusdeferido, eis que o signatário do cheque efetuou o pagamento do seu valor antes do recebimento da denúncia”.

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e da adulteração de cheque, com a incidência do Código Penal, aplicável exvi do art. 65 da Lei n. 7.357/85. No que tange à falsificação e à adulte-ração posteriores ao furto ou ao roubo do cheque, entretanto, não incidem o Enunciado 244 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça e o art. 171, § 2º, VI, do Código Penal, em razão da tipificação do crime como este-lionato padrão, nos termos do caput do art. 171. Daí a justificativa para a construção jurisprudencial específica, como bem revela o Enunciado 48 do Superior Tribunal de Justiça: “Compete ao juízo do local da obten-ção da vantagem ilícita processar e julgar crime de estelionato cometido mediante falsificação de cheque”.

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duPliCATA

1. Duplicata mercantil

1.1. Conceito

A duplicata mercantil, também denominada “duplicata de fatura” ou simplesmente “duplicata”, é o título de crédito de emissão facultati-va e exclusiva para as vendas mercantis entre contratantes domiciliados no Brasil1.

1.2. Duplicata mercantil e classificações dos títulos de crédito

No que tange à emissão, trata-se de título causal. Com efeito, à vista dos arts. 1º e 2º da Lei n. 5.474/68, a emissão de duplicata está atrelada a uma causa específica: compra e venda mercantil. Daí a impos-sibilidade jurídica de emissão de duplicata mercantil fundada em mera locação de bem móvel, como bem assentou o antigo Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, exvi do Enunciado 17: “O contrato de locação de bem móvel não autoriza o saque de duplicata”2.

Quanto ao modelo, trata-se de título vinculado, em razão da exis-tência de normas de padronização provenientes do Conselho Monetário Nacional, como bem revelam o art. 27 da Lei n. 5.474/68, e a Resolução n. 102/68. Por conseguinte, só é duplicata mercantil o documento emi-

1 Cf. arts. 1º e 2º da Lei n. 5.474/68.

2 Cf. Pleno do 1º TACIVSP, Incidente de Uniformização de Jurisprudência 372.571, DiáriodaJustiça, 20-4-1988 e RevistaJTA, v. 107, p. 191; in: “Súmulas”. AASP, 1994, p. 376. No mesmo sentido, na jurisprudência do STJ: “– Não se admite a emissão de duplicata mercantil com base em contrato de locação de bens móveis, uma vez que a relação jurídica que antecede à sua formação não se enquadra nas hipóteses legais de compra e venda mercantil ou de prestação de serviços” (3ª Turma do STJ, REsp 397.637/RS, DiáriodaJustiça, 23-6-2003, p. 353).

CApíTulO

V

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tido por vendedor empresário, após a confecção da cártula à luz do padrão normativo estabelecido na Resolução n. 102.

Por fim, a duplicata é um título nominativo, em razão da necessi-dade da indicação dos nomes tanto do emitente-vendedor-credor quan-to do sacado-comprador-devedor3. Não obstante, a duplicata é transmis-sível mediante endosso, quando pode ser convertida em título ao porta-dor.

1.3. Prazo da compra e venda mercantil

A combinação dos arts. 1º e 2º da Lei n. 5.474/68 conduz à seguin-te conclusão: a duplicata tem origem em venda mercantil a prazo igual ou superior a trinta dias. A regra, entretanto, não é absoluta, tendo em vista as exceções insertas no inciso III do § 1º do art. 2º e no § 2º do art. 3º da Lei n. 5.474/68, os quais autorizam a emissão de duplicata para vendas mercantis à vista e a prazo inferior a trinta dias.

1.4. Sujeitos da duplicata mercantil

Os sujeitos originais da relação jurídica proveniente da duplicata são o emitente-sacador, na qualidade de credor, e o sacado, na qualidade de devedor da compra e venda mercantil. Com efeito, o emitente-sacador é o vendedor, enquanto o sacado é o comprador, devedor principal da duplicata4.

Além dos sujeitos originais da duplicata, também há lugar para a intervenção de avalistas5 e de endossantes. O primeiro endossante só pode ser o próprio vendedor-sacador, credor original do título.

1.5. Legislação de regência da duplicata mercantil

O Código Comercial de 1850 dispôs sobre o instituto no art. 219, preceito no qual reside a origem da duplicata mercantil6. Hoje, entretan-

3 Cf. art. 2º, § 1º, IV, da Lei n. 5.474/68.

4 Cf. arts. 1º, caput, e 2º, caput, da Lei n. 5.474/68, e art. 21, § 4º, da Lei n. 9.492/97.

5 Cf. art. 12 da Lei n. 5.474/68.

6 “Art. 219. Nas vendas em grosso ou por atacado entre comerciantes, o vendedor é obrigado a apresentar ao comprador por duplicado, no ato da entrega das mer-cadorias, a fatura ou conta dos gêneros vendidos, as quais serão por ambos assi-

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to, o principal diploma de regência da duplicata é a Lei n. 5.474/68, com as modificações realizadas pelo Decreto-Lei n. 436/69, e pela Lei n. 6.458/77.

Omissa a legislação específica, incide a Lei Uniforme de Genebra sobre letra de câmbio, exvi do art. 25 da Lei n. 5.474/68: “Aplicam-se à duplicata e à triplicata, no que couber, os dispositivos da legislação sobre emissão, circulação e pagamento das Letras de Câmbio”.

No que tange ao protesto da duplicata, além dos arts. 13 e 14 da Lei n. 5.474/68, também incidem o art. 29 do Decreto n. 2.044/1908, e o art. 21, § 4º, da Lei n. 9.492/97.

Por fim, omissas as leis, incidem as normas infralegais autorizadas pelo art. 27 da Lei n. 5.474/687, como, por exemplo, a Resolução n. 102/68.

1.6. Duplicata mercantil e fatura

A duplicata está atrelada a uma fatura, por ser verdadeira repro-dução da fatura da venda mercantil. A fatura é o escrito unilateral de emissão obrigatória pelo vendedor de mercadorias a prazo, a ser apre-sentado ao respectivo comprador, com a descrição analítica da venda e das condições de pagamento8. Já a emissão da duplicata é facultativa, mas tem a vantagem de constituir título de crédito de fácil negociação e passível de execução forçada mediante processo judicial, exvi do art. 585, I, do Código de Processo Civil.

nadas, uma para ficar na mão do vendedor e outra na do comprador. Não se de-clarando na fatura o prazo do pagamento, presume-se que a compra foi à vista (art. n. 137). As faturas sobreditas, não sendo reclamadas pelo vendedor ou com-prador, dentro de 10 (dez) dias subsequentes à entrega e recebimento (art. n. 135), presumem-se contas líquidas”. Como toda a primeira parte do Código Comercial de 1850, o art. 219 foi revogado pelo Código Civil de 2002, agora de forma expres-sa, já que o art. 28 da Lei n. 5.474/68 não o fez de forma expressa.

7 “Art. 27. O Conselho Monetário Nacional, por proposta do Ministério da Indús-tria e do Comércio, baixará, dentro de 120 (cento e vinte) dias da data da publica-ção desta lei, normas para padronização formal dos títulos e documentos nela referidos fixando prazo para sua adoção obrigatória”.

8 Cf. art. 1º, § 1º, da Lei n. 5.474/68.

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A realização de venda mercantil a prazo com parcelamento pode ser representada em uma só duplicata, com a indicação das parcelas e das datas dos respectivos vencimentos, ou em várias duplicatas, uma para cada parcela, conforme a preferência do sacador-vendedor, tendo em vista a autorização inserta no § 3º do art. 2º da Lei n. 5.474/68.

Em contraposição, uma duplicata não pode estar atrelada a mais de uma fatura, em razão da vedação explícita no § 2º do art. 2º da Lei n. 5.474/68.

1.7. Duplicata versus letra de câmbio

À vista do caput do art. 2º da Lei n. 5.474/68, o vendedor de mercadoria a prazo não pode emitir letra de câmbio para representar o crédito proveniente da compra e venda mercantil. Sem dúvida, o preceito legal só autoriza o vendedor a formalizar o crédito mediante duplicata. Nada impede, entretanto, a emissão de título subscrito pelo comprador, em prol do vendedor, como a nota promissória. Daí a correta interpretação do caput do art. 2º da Lei n. 5.474/68: o crédito proveniente de compra e venda mercantil a prazo só pode ensejar um título de crédito emitido pelo vendedor, qual seja, a duplicata, mas não impede a emissão de títulos subscritos pelo comprador em favor do vendedor9.

1.8. Requisitos formais da duplicata mercantil

O § 1º do art. 2º da Lei n. 5.474/68 arrola os requisitos formais re-lativos à emissão de duplicata mercantil.

Em primeiro lugar, é necessária a denominação “duplicata”, com a indicação da data da emissão e do número de ordem. Com efeito, à vista do art. 2º, § 1º, I, da Lei n. 5.474/68, o termo “duplicata” precisa estar inserido no texto da cártula para que esta seja título de crédito.

9 De acordo, na jurisprudência: “Em se tratando de dívida resultante de compra de mercadoria a prazo, é vedado ao vendedor emitir letra de câmbio em lugar da duplicata mercantil, mas nada obsta que a compra e venda seja representada por nota promissória ou por cheque, que são títulos sacados pelo comprador (Inteli-gência do art. 2º da Lei n. 5.474/68)” (3ª Câmara Cível do TAMG, Apelação 2.0000.00.306935-8, DiáriodaJustiça, 26-8-2000).

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Em razão do vínculo existente com a compra e venda mercantil, também é necessária a indicação do número da respectiva fatura10. A despeito da regra segundo a qual a duplicata é extraída no ato da emis-são da fatura11, a duplicata também pode ser emitida depois da extração da fatura12.

A duplicata também deve conter a indicação da data precisa do vencimento ou a declaração de que o pagamento deve ser à vista13. Não é admissível, entretanto, a emissão de duplicata a certo termo de vista, ou seja, com o vencimento contado do dia do lançamento do aceite.

A duplicata deve conter a indicação dos nomes e dos domicílios tanto do vendedor-sacador-emitente quanto do comprador-sacado14. Por ser o comprador-sacado o devedor principal da duplicata15, também é necessária a identificação adicional prevista no art. 3º da Lei n. 6.268/75, mediante a indicação do número de inscrição no cadastro nacional de pessoas jurídicas, se o comprador for pessoa jurídica, ou do número de inscrição no cadastro de pessoas físicas, da cédula de identidade, do tí-tulo eleitoral ou da carteira profissional, se o comprador for pessoa na-tural, sem prejuízo da qualificação genérica prevista no inciso IV do § 1º do art. 2º da Lei n. 5.474/68.

No que tange à importância a ser paga, a duplicata deve conter a precisa indicação em algarismos e por extenso, tendo em vista o dispos-to no art. 2º, § 1º, V, da Lei n. 5.474/68.

A duplicata também deve conter a indicação da praça do respecti-vo pagamento16. A praça de pagamento constante do título também

10 Cf. art. 2º, § 1º, II, da Lei n. 5.474/68.

11 Cf. art. 2º, caput, proêmio, da Lei n. 5.474/68.

12 “Direito comercial. Recurso especial. Ação cautelar. Fatura comercial. Data de emissão. Duplicata. Saque em data posterior. Possibilidade. – A duplicata mercan-til pode ser sacada em data posterior à de emissão da fatura comercial. – A menção à data de emissão da fatura (Lei n. 5.474/68, art. 2º) deve ser entendida apenas como o termo aquo de saque da duplicata, o qual deve ser observado em obediên-cia à natureza causal deste título de crédito” (3ª Turma do STJ, REsp 292.355/MG, DiáriodaJustiça, 18-2-2002, p. 414).

13 Cf. art. 2º, § 1º, III, da Lei n. 5.474/68.

14 Cf. art. 2º, § 1º, IV, da Lei n. 5.474/68.

15 Cf. art. 21, § 4º, da Lei n. 9.492/97.

16 Cf. art. 2º, § 1º, VI, da Lei n. 5.474/68.

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marca o lugar do Tabelionato competente para o protesto17. Com efeito, o protesto da duplicata deve ocorrer no Cartório de Protesto de Títulos da praça do pagamento indicada na cártula.

A duplicata deve conter a cláusula “à ordem”, por ser título endos-sável18. Com efeito, a expressão legal “à ordem” significa que o título pode ser transferido a terceiro mediante endosso19. Não é admissível, portanto, a emissão de duplicata com cláusula “não à ordem”.

A duplicata deve conter a declaração de reconhecimento da obri-gação de pagamento pelo sacado-comprador, a ser apresentada ao pos-terior aceite dele20.

Por fim, o vendedor-sacador deve assinar a duplicata, na qualida-de de emitente do título21-22. Além da assinatura de próprio punho do vendedor-emitente, a Lei n. 6.304/75 estendeu às duplicatas a subscrição mediante chancela mecânica, consoante a nova redação conferida ao art. 1º da Lei n. 5.589/70.

1.9. Livro de Registro de Duplicatas

Embora seja facultativa a emissão de duplicata mercantil, o vende-dor-emitente que efetuar o saque deve abrir o respectivo livro de registro previsto no art. 19 da Lei n. 5.474/68. Daí a conclusão: o saque da dupli-cata é facultativo, mas se o título for emitido, a abertura e o lançamento no Livro de Registro de Duplicatas são obrigatórios.

O Livro de Registro de Duplicatas não pode conter emenda, borrão, rasura nem entrelinhas, bem como deve ser conservado no próprio es-tabelecimento empresarial do emitente-vendedor23. A falsificação e a adulteração da escrituração do Livro de Registro de Duplicatas são tipi-ficadas no parágrafo único do art. 172 do Código Penal brasileiro.

17 Cf. art. 13, § 3º.

18 Cf. art. 2º, § 1º, VII, da Lei n. 5.474/68.

19 Cf. art. 910 do Código Civil.

20 Cf. art. 2º, § 1º, VIII, da Lei n. 5.474/68.

21 Cf. art. 2º, § 1º, IX, da Lei n. 5.474/68.

22 Assim, na doutrina: “A duplicata é um título sacado pelo próprio credor, sem a participação do devedor” (Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novocursodedireitoprocessualcivil, v. III, 2008, p. 66).

23 Cf. art. 19, § 2º, da Lei n. 5.474/68.

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Por fim, o Livro de Registro de Duplicatas tem grande serventia na eventualidade de perda ou extravio da duplicata, para a emissão da triplicata.

1.10. Triplicata

À vista do art. 23 da Lei n. 5.474/68, o emitente-vendedor tem a obrigação de emitir triplicata quando há perda ou extravio da duplicata. Na verdade, a emissão da triplicata só é obrigatória para que o emitente- -vendedor possa acionar o sacado-comprador mediante execução forçada24.

Além das duas hipóteses de emissão de triplicata previstas no art. 23 da Lei n. 5.474/68, há uma terceira hipótese já reconhecida pelos tri-bunais pátrios: na eventualidade de retenção da duplicata pelo sacado- -comprador, com a recusa da devolução do título remetido para aceite, o emitente-vendedor também pode emitir a triplicata25.

Por fim, a emissão da triplicata se da à luz do Livro de Registro das Duplicatas. Trata-se, a rigor, de uma segunda via da duplicata, ou seja, a segunda reprodução da fatura.

1.11. Aceite

Após a emissão pelo vendedor, a duplicata – ou a respectiva tripli-cata – deve ser remetida ao sacado-comprador, para o lançamento do

24 De acordo, na jurisprudência: “1. A emissão de triplicata (art. 23 da Lei 5.474/68) só é necessária quando o vendedor-credor pretender cobrar executivamente o crédito materializado nas duplicatas extraviadas. Tal necessidade desaparece quando o credor, renunciando à cobrança executiva, manejar ação monitória” (3ª Turma do STJ, REsp 819.329/RJ, DiáriodaJustiça, 18-11-2006, p. 391).

25 Assim, na jurisprudência: “DIREITO COMERCIAL. DUPLICATAS NÃO DEVOL-VIDAS. TRIPLICATAS. EXTRAÇÃO. LICITUDE. LEI 5.474/68, ART. 23. DISSIDIO. RECURSO CONHECIDO MAS DESPROVIDO. I – Não veda a lei a extração de triplicata em face de retenção da duplicata pela sacada. II – Inteligência do art. 23 da Lei 5.474/68” (4ª Turma do STJ, REsp 3.253/RS, DiáriodaJustiça, 19-11-1990, p. 13262). “Triplicata. Duplicatas não devolvidas. A jurisprudência admite a extração de triplicata quando o devedor retém as duplicatas que lhe foram enviadas para aceite. Interpretação extensiva ao art. 23 da Lei 5.478/68” (4ª Turma do STJ, REsp 64.227/RS, DiáriodaJustiça, 9-10-1995, p. 33570). “1. A obrigatoriedade da extração de triplicatas alcança os casos de perda ou extravio dos títulos, embora a jurispru-dência admita possível a extração havendo retenção” (3ª Turma do STJ, REsp 174.221/SP, DiáriodaJustiça, 27-3-2000, p. 94).

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respectivo aceite, à vista dos arts. 2º, § 1º, e 6º, caput, ambos da Lei n. 5.474/68.

A remessa da duplicata deve ser feita dentro do prazo de trinta dias, quando efetuada pelo próprio emitente-vendedor26. Não obstante, se a remessa for feita por intermédio de instituições financeiras, procu-radores, correspondentes ou representantes do emitente-vendedor, a duplicata deve ser apresentada ao sacado-comprador dentro de dez dias do recebimento do título na praça de pagamento27.

Após a apresentação da duplicata, o sacado-comprador deve efe-tuar a devolução no prazo de dez dias, com o aceite ou o motivo da re-cusa28. O sacado-comprador só pode recusar o aceite pelos motivos ar-rolados no art. 8º: não recebimento da mercadoria ou avaria na merca-doria recebida, ressalvada a hipótese de o sacado-comprador ter assu-mido o risco; vício, defeito ou diferença na qualidade ou na quantidade da mercadoria; e divergência quanto ao prazo ou preço.

Como é perceptível primoictuoculi, ressalvadas as hipóteses taxa-tivas arroladas no art. 8º, o aceite é obrigatório na duplicata. Daí a im-portante diferença entre a duplicata e a letra de câmbio: enquanto na duplicata o aceite é obrigatório, na letra o aceite é facultativo. A recusa do aceite na letra não gera responsabilidade cambial alguma para o sa-cado. O mesmo raciocínio não tem lugar na duplicata, porquanto a responsabilidade cambial do sacado-comprador ocorre exvilegis, e não do aceite em si.

Por fim, vale ressalvar que a duplicata à vista não comporta aceite, mas, sim, pagamento imediato, no momento da apresentação29.

1.12. Aval

No que tange ao aval, também há lugar para a garantia cambiária na duplicata, à vista do art. 12 da Lei n. 5.474/68: “O pagamento da duplicata poderá ser assegurado por aval, sendo o avalista equiparado àquele cujo nome indicar; na falta da indicação, àquele abaixo de cuja firma lançar a sua; fora desses casos, ao comprador”. Como bem revela

26 Cf. art. 6º, § 1º, da Lei n. 5.474/68.

27 Cf. art. 6º, § 2º, da Lei n. 5.474/68.

28 Cf. art. 7º, caput, da Lei n. 5.474/68.

29 Cf. art. 7º, caput, proêmio, da Lei n. 5.474/68.

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o preceito legal, na falta de indicação do avalizado, considera-se que a garantia foi prestada em favor do sacado-comprador.

1.13. Pagamento

Em virtude da faculdade conferida pelo caput do art. 9º da Lei n. 5.474/68, o sacado-comprador pode efetuar o pagamento da duplicata mercantil antes de lançar o aceite e antes do vencimento do título, con-forme a sua preferência. Aliás, é admissível até mesmo o pagamento parcial, exvi do art. 9º, § 2º, da Lei n. 5.474/68.

A prova do pagamento da duplicata é o recibo passado pelo credor, no verso do próprio título ou em documento independente, com refe-rência expressa à duplicata30. Trata-se, à evidência, de exceção aos prin-cípios cambiais da cartularidade e da literalidade.

Por fim, na eventualidade do pagamento mediante cheque, a respectiva liquidação, somada à anotação de que o cheque é destinado ao pagamento da duplicata, no verso da cártula, também comprova o pagamento da duplicata31. Não obstante, como o cheque tem nature-za prosolvendo, o pagamento da duplicata só se dá com a liquidação do cheque32.

1.14. Endosso

Na esteira da letra de câmbio e dos demais títulos de crédito, a duplicata mercantil também é transmissível mediante endosso. Com o endosso, o emitente-vendedor passa a garantir o título em relação ao aceite e ao pagamento. Por conseguinte, ainda que não aceita a dupli-cata e não comprovada a entrega da mercadoria, a execução pode ter

30 Cf. art. 9º, § 1º, da Lei n. 5.474/68.

31 Cf. art. 9º, § 2º, da Lei n. 5.474/68.

32 De acordo, na jurisprudência: “– O mero recebimento, pelo credor, de cheque para pagamento de Duplicata não importa novação da dívida, porquanto referenciado cheque tem a característica prosolvendo, importando dizer que somente se concre-tiza o pagamento após sua compensação” (2ª Câmara Cível do TAMG, Apelação 2.0000.00.377750-0/001, DiáriodaJustiça, 29-11-2003). “– Tratando-se de pagamen-to de dívida com cheque pós-datado, a extinção da obrigação somente se verifica após a liquidação decorrente de sua compensação, em razão do efeito prosolvendo da cártula” (2ª Câmara Cível do TAMG, Apelação 2.0000.00.400700-3/001, DiáriodaJustiça, 20-11-2003).

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em mira o emitente-sacador que endossou o título e os respectivos avalistas33.

1.15. Protesto

A duplicata e a respectiva triplicata são passíveis de protesto por recusa de aceite, por ausência de devolução do título ou por falta de pagamento34. São três, portanto, as hipóteses legais de protesto da du-plicata e da respectiva triplicata: falta de aceite, falta de devolução da duplicata e falta de pagamento.

Na eventualidade da ausência de devolução da duplicata por par-te do sacado-comprador, o emitente-vendedor pode realizar o protesto mediante simples indicações prestadas ao tabelião do cartório de pro-testo35. À vista da interpretação jurisprudencial conferida ao art. 23 da Lei n. 5.474/68, a extração da triplicata é outra solução juridicamente possível para a eventualidade de retenção da duplicata pelo sacado- -comprador, com a consequente possibilidade do protesto da triplicata36.

33 Assim, na jurisprudência: “DUPLICATA – AUSÊNCIA DE ACEITE E DE PROVA DA OPERAÇÃO COMERCIAL – EXECUÇÃO CONTRA ENDOSSANTE E AVA-LISTAS – POSSIBILIDADE. – A duplicata, mesmo sem aceite e desprovida de prova da entrega da mercadoria ou da prestação do serviço, pode ser executada contra o sacador-endossante e seus garantes. É que o endosso apaga o vínculo causal da duplicata entre endossatário, endossante e avalistas, garantindo a acei-tação e o pagamento do título (LUG, art. 15 c/c arts. 15, § 1º, e 25 da Lei 5.474/68)” (3ª Turma do STJ, REsp 823.151/GO, DiáriodaJustiça, 27-11-2006, p. 285).

34 Cf. art. 13 da Lei n. 5.474/68.

35 Cf. art. 13, § 1º, da Lei n. 5.474/68.

36 Assim, na jurisprudência: “COMERCIAL. Extração de triplicatas. Obrigatorieda-de e faculdade. O art. 23 da Lei 5.474/68 obriga o vendedor a extrair triplicata, em casos de extravio ou perda da duplicata, mas não exclui a faculdade de fazê-lo em casos de retenção da duplicata, ou em situações assemelhadas que tolhem a cir-culação do título e deixam sem possibilidade de aparelhar sua execução” (3ª Turma do STJ, REsp 10.941/RS, DiáriodaJustiça, 26-8-1991, p. 11401). “Triplicata. Duplicatas não devolvidas. A jurisprudência admite a extração de triplicata quan-do o devedor retém as duplicatas que lhe foram enviadas para aceite. Interpreta-ção extensiva ao art. 23 da Lei 5.478/68” (4ª Turma do STJ, REsp 64.227/RS, DiáriodaJustiça, 9-10-1995, p. 33570). “1. A obrigatoriedade da extração de triplicatas alcança os casos de perda ou extravio dos títulos, embora a jurisprudência admi-ta possível a extração havendo retenção” (3ª Turma do STJ, REsp 174.221/SP, DiáriodaJustiça, 27-3-2000, p. 94).

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Quanto ao lugar, o protesto da duplicata – ou da respectiva triplicata – deve ser realizado na praça do pagamento indicada no título37.

No que tange ao prazo, o protesto deve ser realizado dentro de trinta dias da data do vencimento do título. Com efeito, o § 4º do art. 13 da Lei n. 5.474/68 dispõe sobre a necessidade do protesto da duplicata dentro do prazo de trinta dias, sob pena de perda dos direitos cambiários contra os coobrigados: endossantes e respectivos avalistas38. Por exem-plo, o emitente-vendedor é o credor originário da duplicata e pode ser o primeiro endossante do título; na hipótese, o emitente-endossante passa a ser coobrigado pelo pagamento da duplicata, razão pela qual pode ser acionado mediante execução forçada, desde que o título tenha sido protestado dentro do prazo legal.

Já em relação ao devedor principal da duplicata (sacado-compra-dor), o protesto é facultativo, desde que o título tenha sido aceito pelo sacado-comprador39. Em contraposição, denegado o aceite pelo sacado--comprador, o protesto é obrigatório, por força do art. 15, II, a, da Lei n. 5.474/68, para que seja admissível posterior execução – civil ou falimen-tar – a ser movida contra o sacado-comprador40.

1.16. Ações fundadas em duplicata e de triplicata

1.16.1. Ação cambial ou execução cambial

A duplicata e a respectiva triplicata são títulos executivos extra-judiciais que autorizam a propositura de ação de execução para a cobrança judicial da quantia proveniente da compra e venda mercan-til, exvi do art. 585, I, do Código de Processo Civil, e do art. 15 da Lei n. 5.474/68.

37 Cf. arts. 2º, § 1º, VI, e 13, § 3º, ambos da Lei n. 5.474/68.

38 De acordo, na jurisprudência: “É princípio básico que para se poder exercer o direito de regresso o protesto deve ser lavrado até o 30º dia após o vencimento da duplicata, do contrário ocorre a decadência do direito” (5ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 2.0000.00.516493-2, DiáriodaJustiça, 30-11-2005).

39 Cf. art. 15, I, da Lei n. 5.474/68.

40 De acordo, na doutrina: “Quando não aceita, o instrumento de protesto é indis-pensável para a caracterização do título executivo” (Marcus Vinicius Rios Gon-çalves, Novocursodeprocessocivil, v. III, 2008, p. 66).

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No que tange ao juízo competente para a execução da duplicata e também da triplicata, a execução deve ser acionada no juízo do lugar do pagamento41.

No que tange ao sacado-comprador e aos respectivos avalistas, a prescrição da pretensão à execução da duplicata ocorre em três anos42, contados da data do vencimento do título, exvi do art. 18, I, da Lei n. 5.474/68.

Quanto aos endossantes e respectivos avalistas, entretanto, o prazo prescricional é de apenas um ano, contado da data do protesto (art. 18, II), o qual é necessário (art. 13, § 4º).

Além da observância do prazo prescricional, a execução depende do cumprimento de outras exigências legais, consoante as seguintes hipóteses:

1ª) se a duplicata foi aceita e devolvida pelo comprador-sacado, o título pode aparelhar a execução do mesmo (sacado-comprador) e do respectivo avalista, independentemente de protesto cambial, no prazo de três anos (arts. 13, § 4º, 15, I, e 18, I);

2ª) se a duplicata foi aceita e devolvida pelo sacado-comprador, o título pode aparelhar a execução dos coobrigados (endossantes e respec-tivos avalistas), desde que efetuado o protesto cambial dentro do prazo de trinta dias do vencimento da duplicata, e que a execução tenha sido ajuizada dentro do prazo de um ano da data do protesto (arts. 13, § 4º, 15, I, e 18, II);

3ª) se a duplicata não foi aceita, mas foi devolvida pelo sacado--comprador, é indispensável o protesto cambial do título devolvido sem

41 Assim, na jurisprudência: “COMPETÊNCIA. EXECUÇÃO. DUPLICATA. PRO-TESTO. É competente para a execução lastreada em duplicata o foro da praça de pagamento constante do título (art. 17, da L. 5.474/68). Irrelevante que o protesto tenha sido tirado no local em que estabelecida a devedora. Agravo não provido” (6ª Turma Cível do TJDF, AGI 2007.00.2.004505-5, DiáriodaJustiça, 14-6-2007, p. 168).

42 De acordo, na jurisprudência: “APELAÇÃO – EMBARGOS DO DEVEDOR – NOTA PROMISSÓRIA – DEMORA NA CITAÇÃO – PRESCRIÇÃO – OCORRÊN-CIA. – De acordo com o art. 18, I, da Lei n. 5.474/68, a ação proposta pelo sacador da duplicata contra o sacado prescreve em 3 anos. Idêntico o prazo prescricional para a execução de nota promissória, nos termos do art. 70, da Lei Uniforme, promulgada em nosso país pelo Decreto n. 57.663/66” (TJMG, Apelação 1.0702.05.246064-0/001, DiáriodaJustiça, 15-2-2007).

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aceite e a comprovação da entrega da mercadoria mediante recibo idôneo, para a posterior propositura da execução contra o sacado-comprador ou contra os coobrigados, nos prazos de três anos e de um ano, respectiva-mente (arts. 15, II, a e b, e § 1º, e 18, I e II). Na verdade, à vista da inter-pretação conferida ao § 1º do art. 15 da Lei n. 5.474/68, o recibo da en-trega da mercadoria só é indispensável quando a execução fundada no inciso II tem como alvo o sacado-comprador. Quando a ação executiva tem em mira coobrigado, basta o protesto cambial tempestivo43;

4ª) se a duplicata não foi aceita nem devolvida pelo sacado-com-prador, é indispensável o protesto cambial por meio da triplicata ou por simples indicações do credor ao Tabelião do Cartório de Protesto, bem assim a comprovação da entrega da mercadoria vendida mediante reci-bo idôneo, para a posterior propositura da execução contra o sacado- -comprador ou contra os coobrigados, nos respectivos prazos (arts. 13, § 1º, infine, 15, II, a e b, e § 1º, e 18, I e II).

Por fim, a execução cambial não subsiste se o sacado-comprador comprova, mediante ação de embargos à execução, ter recusado o aceite dentro do prazo de dez dias, com a observância da forma escrita exigida para a recusa e com fundamento em algum dos motivos arrolados no art. 8º (art. 15, II, c).

1.16.2. Ação de enriquecimento sem causa ou de locupletamento indevido

Decorrido o último prazo prescricional da pretensão executiva44, o sacador-vendedor ainda pode acionar o sacado-comprador, agora em razão do locupletamento indevido, dentro do prazo de três anos, com fundamento nos arts. 206, § 3º, IV, e 884, ambos do Código Civil de 2002, no art. 25 da Lei n. 5.474/68, e no art. 48 do Decreto n. 2.044/1908. Em razão da natureza cognitiva da demanda de enriquecimento sem causa, o autor deve escolher entre o procedimento comum45 e o procedimento

43 De acordo, na jurisprudência: “O comprovante de recebimento das mercadorias ou do serviço prestado somente é exigido quando a execução é movida contra o devedor principal” (5ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 2.0000.00.516493-2, Di-áriodaJustiça, 30-11-2005).

44 Qual seja, o prazo de três anos previsto no art. 18, I, da Lei n. 5.474/68.

45 O procedimento comum é dividido em ordinário e sumário, conforme o valor da causa.

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monitório, mas não precisa declinar a origem da dívida na petição inicial, porquanto o locupletamento indevido é demonstrado pela simples jun-tada da duplicata aceita prescrita ou da duplicata prescrita sem aceite, mas acompanhada do comprovante da entrega das mercadorias46.

1.16.3. Ação de cobrança ou ação causal

Diante da ausência de alguma das exigências arroladas no art. 15 da Lei n. 5.474/68 para a propositura da execução cambial e na eventu-alidade de prescrição da pretensão executiva, o credor ainda pode esco-lher entre ajuizar a demanda de cobrança sob o rito ordinário, com fundamento no art. 16 da Lei n. 5.474/68, ou sob o procedimento moni-tório47, à vista do art. 1.102-A do Código de Processo Civil, com a junta-da da prova escrita sem eficácia de título executivo para demonstrar a origem da dívida declinada na petição inicial48.

46 Em reforço, vale conferir o didático voto proferido pelo eminente Desembargador Alexandre Freitas Câmara, na qualidade de revisor da Apelação 2009.001.07855: “A partir daí, porém, só se pode demandar com apoio no direito literal e autôno-mo representado pela duplicata (demanda de enriquecimento, que dispensa a invocação da causadebendi). Neste caso, então, incide o prazo previsto no art. 206, § 3º, IV, do Código Civil, de três anos, contados do término do prazo dentro do qual era adequada a execução. A demanda de enriquecimento, evidentemente, pode ser proposta pelo procedimento ordinário ou monitório, conforme prefira o demandante” (cf. 2ª Câmara Cível do TJRJ, Apelação 2009.001.07855).

47 Assim, na jurisprudência: “AÇÃO MONITÓRIA. DUPLICATA SEM ACEITE, ACOMPANHADA DA NOTA FISCAL/FATURA E DO INSTRUMENTO DE PROTESTO. PROVA ESCRITA. DOCUMENTO QUE NÃO PRECISA SER OBRI-GATORIAMENTE EMANADO DO DEVEDOR. – O documento escrito a que se refere o legislador não precisa ser obrigatoriamente emanado do devedor, sendo suficiente, para a admissibilidade da ação monitória, a prova escrita que revele razoavelmente a existência da obrigação. Recurso especial conhecido e provido” (4ª Turma do STJ, REsp 167.618/MS, DiáriodaJustiça, 14-6-1999, p. 202). “Ação monitória. Duplicata de prestação de serviço sem aceite. Ausência de documento comprovando o recebimento do serviço. 1. Afirmando o Acórdão recorrido que, no caso, não há documento comprovando o recebimento dos serviços, e admitin-do a jurisprudência da Corte que a duplicata sem aceite é título executivo se acompanhado de tal documento, não é possível impedir o autor de exercer o seu direito de credor pela via da ação monitória” (3ª Turma do STJ, REsp 167.222/MG, DiáriodaJustiça, 4-10-1999, p. 55).

48 No mesmo sentido, na doutrina: “Se a duplicata ou triplicata não preenche os requisitos legais para a execução, pode seu credor recorrer ao procedimento ordi-nário, ou seja, ao processo de conhecimento, aforando uma ação de cobrança. A

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2. Duplicata de prestação de serviçosA duplicata de prestação de serviços reside nos arts. 20 e 21 da Lei

n. 5.474/68. Trata-se de duplicata cujo objeto é a prestação de serviços. À prestação de serviços, entretanto, não equivale mera locação de bem móvel, como bem assentou o Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, ao aprovar o Enunciado 17: “O contrato de locação de bem móvel não autoriza o saque de duplicata”49.

A duplicata de prestação de serviços pode ser emitida por empre-sário individual, por sociedade empresária, bem assim por fundação e por sociedade civil50. Não obstante, sempre tem natureza cambial, até mesmo quando emitida por fundação ou por sociedade simples.

No que tange aos requisitos formais, além dos requisitos gerais arrolados no § 1º do art. 2º da Lei n. 5.474/68, a duplicata de prestação de serviço também deve conter a natureza do serviço prestado e a res-pectiva importância a ser paga51.

Tal como a duplicata mercantil, a emissão de duplicata de pres-tação de serviço torna obrigatória a abertura do Livro de Registro de Duplicatas, porquanto incidem as regras gerais de regência da dupli-cata mercantil.

mesma alternativa processual socorre o credor na hipótese de prescrição do título. De qualquer sorte, tem-se ainda a possibilidade de manejo da ação monitória, instrumento de previsão mais recente no Direito brasileiro” (Gladston Mamede, Títulosdecrédito, 2003, p. 340).

49 Cf. Pleno do 1º TACIVSP, Incidente de Uniformização de Jurisprudência 372.571, DiáriodaJustiça, 20-4-1988 e RevistaJTA, v. 107, p. 191. No mesmo sentido, na ju-risprudência do STJ: “– Não se admite a emissão de duplicata mercantil com base em contrato de locação de bens móveis, uma vez que a relação jurídica que ante-cede à sua formação não se enquadra nas hipóteses legais de compra e venda mercantil ou de prestação de serviços” (3ª Turma do STJ, REsp 397.637/RS, DiáriodaJustiça, 23-6-2003, p. 353). “DECLARATÓRIA – DUPLICATA – EMISSÃO COM BASE EM RELAÇÃO LOCATÍCIA – IMPOSSIBILIDADE. A locação de bens mó-veis, inclusive a de veículos, não pode ser fato gerador do ISS. A duplicata, por ser título causal, só pode ser emitida nas hipóteses legais de compra e venda mercantil ou de prestação de serviços, não se admitindo a sua emissão com base em contrato de locação de bens móveis, uma vez que a relação jurídica que ante-cede a sua formação não se classifica como prestação de serviços” (15ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0024.05.582373-6/001, DiáriodaJustiça, 17-9-2007).

50 Vale dizer, sociedade simples.

51 Cf. art. 20, §§ 1º e 2º, da Lei n. 5.474/68.

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Na mesma esteira, o art. 21 versa sobre os motivos de recusa do aceite, à vista do disposto no art. 8º. Por conseguinte, tal como ocorre com a duplicata mercantil devolvida sem aceite, é admissível o protesto cambial fundado na comprovação da prestação dos serviços, com a posterior abertura da via executiva em prol do credor, o qual pode acio-nar tanto a execução civil quanto a falência. A propósito, vale conferir o preciso Enunciado 248 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça: “Com-provada a prestação de serviços, a duplicata não aceita, mas protestada, é título hábil para instruir pedido de falência”.

Por fim, na esteira da duplicata mercantil, a duplicata de prestação de serviços também é transmissível mediante endosso. Com o endosso, o emitente-sacador passa a garantir o título em relação ao aceite e ao pagamento. Por conseguinte, ainda que não aceita a duplicata e não comprovada a prestação do serviço, o emitente-sacador que endossou o título e os respectivos avalistas podem ser executados52.

3. Fatura ou conta de prestação de serviçosA fatura de prestação de serviços consta do art. 22 da Lei n. 5.474/68.

Trata-se de título de crédito impróprio consubstanciado em fatura emi-tida por profissionais liberais ou prestadores eventuais de serviços. Tal como na duplicata de prestação de serviços, o objeto da fatura ou conta também é a prestação de serviços. Não obstante, não há Livro de Regis-tro de Duplicatas, porquanto não há emissão de duplicata alguma, mas, sim, de mera fatura ou conta, com o simples registro no Tabelionato de Títulos de Documentos53. Por fim, os requisitos formais da fatura ou conta estão arrolados no § 1º do art. 22: natureza do serviço prestado; valor do serviço; local e data do pagamento; vínculo contratual originá-rio do serviço.

52 Assim, na jurisprudência: “DUPLICATA – AUSÊNCIA DE ACEITE E DE PROVA DA OPERAÇÃO COMERCIAL – EXECUÇÃO CONTRA ENDOSSANTE E AVA-LISTAS – POSSIBILIDADE. – A duplicata, mesmo sem aceite e desprovida de prova da entrega da mercadoria ou da prestação do serviço, pode ser executada contra o sacador-endossante e seus garantes. É que o endosso apaga o vínculo causal da duplicata entre endossatário, endossante e avalistas, garantindo a acei-tação e o pagamento do título (LUG, art. 15 c/c arts. 15, § 1º, e 25 da Lei 5.474/68)” (3ª Turma do STJ, REsp 823.151/GO, DiáriodaJustiça, 27-11-2006, p. 285).

53 Cf. art. 22, § 2º, da Lei n. 5.474/68.

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4. Duplicata ruralO diploma de regência da duplicata rural é o Decreto-Lei n. 167/67,

com as alterações conferidas pela Lei n. 6.754/79.No que tange ao objeto, a duplicata rural pode ser emitida para

representar venda a prazo de bens de natureza rural: agrícola, pastoril ou extrativa. Por conseguinte, a duplicata rural pode ser emitida por produtores rurais e por cooperativas rurais.

Quanto aos requisitos formais, são, mutatismutandis, os mesmos arrolados no § 1º do art. 2º da Lei n. 5.474/68, com as adaptações neces-sárias ao objeto e ao emitente da duplicata rural. Eis os requisitos formais previstos no Decreto-Lei n. 167/67: designação “duplicata rural”; data do pagamento; nomes e domicílios do comprador e do vendedor; importân-cia a pagar, em algarismos e por extenso; praça do pagamento; indicação dos produtos rurais vendidos; data e lugar da emissão; cláusula “à or-dem”; reconhecimento da obrigação pelo comprador, a ser subscrito no momento da apresentação para aceite; assinatura do vendedor.

Ao contrário dos títulos de crédito em geral (letra de câmbio, nota promissória, cheque, duplicata), os quais são apenas créditos quirogra-fários, a duplicata rural goza de privilégio especial, exvi do art. 53 do Decreto-Lei n. 167, razão pela qual deve ser paga com prioridade em relação aos demais títulos de crédito, na eventualidade de falência do devedor, tudo nos termos do art. 83, IV e VI, da Lei n. 11.101/2005.

5. Duplicata simulada A emissão de fatura, duplicata ou nota de venda sem exata corres-

pondência à mercadoria vendida ou ao serviço prestado é crime previs-to no art. 172 do Código Penal, cuja redação atual foi dada pela Lei n. 8.137/90. Com maior razão, a emissão de duplicata sem venda de mer-cadoria alguma e sem prestação de serviço algum também deve ser apenada à luz do art. 172 do Código Penal54. Em qualquer caso, a ação penal é pública incondicionada.

54 De acordo, na jurisprudência: “1. A nova redação do art. 172 do Código Penal, dada pela Lei n. 8.137/90, não excluiu do tipo o ato de emitir duplicata que não corresponda a uma venda de mercadoria ou prestação de serviço efetivamente realizadas. Precedente da Suprema Corte” (6ª Turma do STJ, REsp 443.929/SP, DiáriodaJustiça, 25-6-2007, p. 307). “1. Responde pelo crime de duplicata simula-da o agente que emite duplicata que não corresponde à efetiva transação comercial” (5ª Turma do STJ, HC 9.444/SP, DiáriodaJustiça, 20-9-1999, p. 72).

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Em razão da natureza formal do crime tipificado no art. 172 do Código Penal, há a consumação com a emissão e a circulação da dupli-cata simulada, sem depender da ocorrência de prejuízo a outrem55. Por conseguinte, há a consumação do crime com a simples remessa da du-plicata simulada ao sacado-comprador ou com o lançamento do endos-so pelo emitente-vendedor, seguido da tradição a outrem.

Sob outro prisma, trata-se de crime doloso consubstanciado na vontade de emitir duplicata mercantil, sem perfeita vinculação com venda de mercadorias, ou sem a correspondente prestação de serviços, no caso da duplicata de prestação de serviço. Por conseguinte, a emissão de duplicata proveniente de negligência, imprudência ou imperícia não configura o crime, porquanto não há a modalidade culposa no art. 172 do Código Penal.

Por fim, a duplicata simulada não tem efeito cambial, razão pela qual não pode aparelhar a execução prevista no art. 15 da Lei n. 5.474/68, e no art. 585, I, do Código de Processo Civil. Eventual execução ajuizada com esteio em duplicata simulada é passível de embargos à execução, para a desconstituição do título de crédito e a extinção do processo executivo56.

55 Assim, na jurisprudência: “RECURSO ESPECIAL. PENAL. PENAL E PROCESSO PENAL. DUPLICATA SIMULADA. ARTS. 172 E 71 DO CÓDIGO PENAL. CRIME CONTINUADO. CONCURSO DE PESSOAS. LEGISLAÇÃO. SUSPENSÃO CON-DICIONAL DO PROCESSO. O delito do art. 172 do CP sempre foi, na antiga e na atual redação, crime de natureza formal. Consuma-se com a expedição da dupli-cata simulada, antes mesmo do desconto do título falso perante a instituição bancária” (5ª Turma do STJ, REsp 147.507/RS, DiáriodaJustiça, 18-9-2000, p. 147). “PENAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. DUPLICATA SIMULADA. A consu-mação do delito previsto no art. 172 do CP se dá com a simples e efetiva colocação da duplicata em circulação, independentemente do prejuízo (Precedente)” (3ª Seção do STJ, CC 27.049/PE, DiáriodaJustiça, 14-8-2000, p. 135). “A consumação do delito previsto no art. 172 do CP, crime formal e unissubsistente, dá-se com a simples e efetiva colocação da duplicata em circulação, independentemente do prejuízo” (6ª Turma do STJ, RHC 16.053/SP, DiáriodaJustiça, 12-9-2005, p. 368).

56 De acordo, na jurisprudência: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL – EMBARGOS À EXECUÇÃO – DUPLICATA SIMULADA – LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO À UNANIMIDADE. I – Diante do fato de as notas fiscais que originaram a execução não corresponderem ao negócio jurídico entabulado entre as partes, verifica-se a existência de duplicata simulada, impon-do-se a anulação desta. II – Devem, portanto, ser acolhidos os embargos à execução opostos para desconstituir os títulos que embasaram a execução em face da simu-lação de entrega de mercadoria” (3ª Turma Cível do TJDF, Apelação 1999.01.1.074963-0, acórdão registrado sob o número 150.097, DiáriodaJustiça, 13-3-2002, p. 47).

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Ação CAmbiAl

1. Conceito de ação cambialÀ vista do proêmio do art. 49 do Decreto n. 2.044/1908: “A ação

cambial é executiva”. Daí a explicação para as expressões “execução cambial” e “execução cambiária”1.

Não obstante, autorizada doutrina sustenta que tanto a execução quanto a demanda cognitiva de enriquecimento sem causa fundadas em

1 De acordo, na doutrina: “A ação cambial, no direito brasileiro, é uma ação exe-cutiva típica” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, v. II, 25. ed., 2008, n. 599, p. 465). “Mas o nome ação cambial, por tradição, ficou mantido, quando poderia ser execução cambial. No entanto, pouco importa se se trata de execução, ação de execução, execução cambial ou ação cambial. Isso quer dizer que a ação cambial segue o mesmo caminho estabelecido pelo processo civil brasileiro vi-gente para o processo de execução. Entenda-se, pois: a ação cambial correspon-de ao processo de execução (arts. 586 e s. do CPC), especialmente com a aplica-ção do inciso I do art. 585, bem como dos arts. 646 e s. do Código de Processo Civil” (Wille Duarte Costa, Títulosdecrédito, 3. ed., 2007, p. 275). “AÇÃO CAM-BIAL. É a ação típica para a cobrança executiva dos títulos de crédito: letra de câmbio, nota promissória ou conta assinada (duplicata). É uma ação executiva, por também se conhece vulgarmente pelos nomes de executivo cambial ou executivo cambiário” (De Plácido e Silva, Vocabuláriojurídico, v. I, 6. ed., 1980, p. 16). Ainda a respeito da distinção, merece ser prestigiada a lição do Professor Luiz Pinto Ferreira, especialmente na parte final, quando bem ensina que a ação de enriquecimento indevido não é ação cambial: “AÇÃO DE CHEQUE. A ajui-zada para exigir o importe do título com os encargos complementares, atribuída ao beneficiário, ao coobrigado que tenha pago e ao avalista, contra todos os coobrigados ou mesmo um só (Lei Uniforme sobre o Cheque, Anexo I, art. 52; Lei n. 7.357, de 2-9-1985, art. 47). Prescreve em seis meses, contados da data de expiração do prazo de apresentação. Permanece, entretanto, o direito do bene-ficiário de cobrar o que lhe é devido, não mais por ação cambiária, e sim por ação de enriquecimento ilícito” (Pinto Ferreira, Vocabuláriojurídicodasaçõesedosrecursos, 1999, p. 11).

CApíTulO

Vi

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título de crédito são “ações cambiais”2. Ainda que muito respeitável a tese, prestigia-se o disposto no art. 49 do Decreto n. 2.044/1908, segundo o qual a “ação cambial” tem natureza executiva. A demanda de enrique-cimento sem causa não é verdadeira “ação cambial”, por ter natureza cognitiva e por não estar fundada em obrigação cambial, mas, sim, na obrigação civil prevista no art. 884 do Código Civil. Com efeito, a de-manda de enriquecimento sem causa tem como escopo evitar o locuple-tamento de uma pessoa que obteve ganho sem cumprir a contraprestação devida. Por conseguinte, a demanda de enriquecimento sem causa tem em mira apenas o beneficiário do locupletamento indevido, e não todos os obrigados cambiais3, como se dá na única “ação cambial”, vale dizer, a execução fundada em título de crédito.

Por tudo, a ação de execução movida à vista dos arts. 43, 47 e 53 da Lei Uniforme de Genebra, dos arts. 15 e 18 da Lei n. 5.474/68, dos arts. 47 e 59 da Lei n. 7.357/85, e do inciso I do art. 585 do Código de Proces-so Civil é a única ação cambial, porquanto está submetida às regras do Direito Cambiário.

Em suma, à vista do art. 585, I, do Código de Processo Civil, dos arts. 43, 47, 53, 70 e 77 da Lei Uniforme de Genebra, dos arts. 15 e 18 da Lei n. 5.474/68, e dos arts. 47 e 59 da Lei n. 7.357/85, ação cambial é a execução forçada aparelhada em título de crédito; as outras “ações”4

2 Cf. Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, v. I, 12. ed., 2008, p. 451-452, inverbis: “As ações cambiais do cheque são duas: a execução, que prescreve nos 6 meses seguintes ao término do prazo de apresentação; e a de enriquecimento indevido, que tem natureza cognitiva e pode ser proposta nos 2 anos seguintes à prescrição da execução. Nas duas, operam-se os princípios do direito cambiário e, assim, o demandado não pode arguir, na defesa, matéria es-tranha à sua relação com o demandante”.

3 No mesmo sentido, na jurisprudência: “Ação monitória. Cheque prescrito. Ava-lista. Prescrito o cheque, desaparece a relação cambial e, em consequência, o aval. Permanece responsável pelo débito apenas o devedor principal, salvo se demons-trado que o avalista se locupletou” (3ª Turma do STJ, REsp 200.492/MG, DiáriodaJustiça, 21-8-2000, p. 123). “Direito comercial. Recurso especial. Embargos à ação monitória. Cheque prescrito. Propositura de ação contra o avalista. Necessidade de se demonstrar o locupletamento. Precedente. – Prescrita a ação cambial, desa-parece a abstração das relações jurídicas cambiais firmadas, devendo o benefici-ário do título demonstrar, como causa de pedir na ação própria, o locupletamen-to ilícito, seja do emitente ou endossante, seja do avalista” (3ª Turma do STJ, REsp 457.556/SP, DiáriodaJustiça, 16-11-2002, p. 331).

4 Por exemplo, a ação de locupletamento indevido e a ação de cobrança fundada na relação jurídica causal, tanto sob o rito comum quanto sob o procedimento

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admissíveis para a cobrança judicial de “títulos de crédito” prescritos, rasurados, rasgados ou descaracterizados por outro motivo não são propriamente cambiais, porquanto não são fundadas na responsabilida-de nem na solidariedade especiais provenientes da relação jurídico- -cambial, mas, sim, nas regras comuns do Direito Civil5.

2. Objeto da ação cambialNo que tange ao objeto6, a execução abrange a quantia estampada

no título de crédito, os juros de mora contados a partir do vencimento7, a correção monetária também contada a partir do vencimento8, as even-tuais despesas cartorárias com o protesto, se existentes, bem assim as despesas processuais antecipadas pelo exequente, por força dos arts. 19, 257 e 598 do Código de Processo Civil, e os honorários advocatícios fi-xados à luz do art. 652-A, caput, do mesmo diploma.

3. Polo passivo na ação cambialA ação cambial pode ser movida contra o devedor principal do

monitório. Tanto a demanda de enriquecimento sem causa quanto a demanda de cobrança estão sujeitas às regras comuns do Direito Civil, razão pela qual não são verdadeiras ações cambiais.

5 De acordo, na jurisprudência: “Nos termos do art. 70 da Lei Uniforme, normativo legal aplicado à letra de câmbio, é a ação cambial (ação de execução) que vem perecer com a incidência do instituto da prescrição, todavia, sobrevivendo ação de conhecimento (de cobrança), de cunho civil” (17ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0702.04.184212-2/001, DiáriodaJustiça, 12-10-2006).

6 Cf. art. 52 da Lei n. 7.357/85.

7 Assim, na jurisprudência: “– Cambial. Cobrança executiva de nota promissória. Contam-se os juros do vencimento do título” (1ª Turma do STF, RE 54.280/RS, DiáriodaJustiça, 13-11-1967). “Os juros da mora contam-se do vencimento do tí-tulo” (1ª Turma do STF, RE 47.956/RS, DiáriodaJustiça, 15-2-1967). Em abono, merece ser prestigiado o Verbete n. 17 aprovado pela 1ª Câmara Civil do antigo Tribunal de Alçada de Minas Gerais: “Os juros nos títulos executivos cambiais devem ser contados a partir do vencimento” (Minas Gerais, Parte II, DiáriodoJudiciário, 26-2-1982, p. 1). Na esteira do Verbete n. 17, houve a aprovação unânime da conclusão n. 18 no 6º Encontro Nacional dos Tribunais de Alçada, inverbis: “Os juros, nos títulos executivos cambiais, devem ser contados a partir do vencimen-to” (cf. Theotonio Negrão, CódigodeProcessoCivilelegislaçãoprocessualemvigor, 25. ed., 1994, p. 263, nota 9 ao art. 293).

8 Cf. art. 1º, § 1º, da Lei n. 6.899/81.

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respectivo título de crédito, bem assim contra todos os coobrigados, em litisconsórcio passivo facultativo, à vista dos arts. 43, 47 e 77 da Lei Uni-forme de Genebra, do art. 18, §§ 1º e 2º, da Lei n. 5.474/68, e dos arts. 47 e 51, caput e §§ 1º, 2º e 3º, da Lei n. 7.357/85. Sem dúvida, o credor pode acionar tanto o devedor principal quanto os coobrigados, em conjunto ou isoladamente, porquanto o credor pode mover a execução contra todos ou contra aquele que bem preferir9.

4. Juízo competente para a ação cambialA competência para a execução cambial é do juízo do foro do local

do cumprimento da obrigação, qual seja, o lugar no qual deve ocorrer o pagamento do título de crédito10. É a regra extraída da combinação dos arts. 100, IV, d, 576 e 598, todos do Código de Processo Civil, com os arts. 1º, n. 5, e 75, n. 4, ambos da Lei Uniforme de Genebra, e o art. 17 da Lei n. 5.474/68. Sem dúvida, no que tange à ação cambial, não incide a regra inserta no caput do art. 94 do Código de Processo Civil.

5. Procedimento da ação cambialA ação cambial segue o procedimento previsto nos arts. 646 a 724

do Código de Processo Civil, por ser verdadeira execução por quantia

9 Portanto, na doutrina: “O portador tem, assim, o direito de acionar todos os obri-gados e coobrigados, sem estar adstrito a observar a ordem em que eles se obri-garam. Explicamos à saciedade que todos os que se obrigaram na letra a ela se vinculam diretamente, pois suas obrigações são autônomas, umas em relação às outras. O portador pode eleger apenas um obrigado, ou então um coobrigado para contra ele dirigir a ação, ou promovê-la contra todos, citando-os solidariamente” (Rubens Requião, Cursodedireitocomercial, v. II, 18. ed., 1992, p. 368).

10 De acordo, na jurisprudência: “Execução com base em título executivo extrajudi-cial (nota promissória). Competência. Hipótese de competência do foro onde a obrigação deve ser satisfeita (local de pagamento). Conflito conhecido e declarado competente o suscitado” (2ª Seção do STJ, CC 1.422/MG, DiáriodaJustiça, 1º-4-1991, p. 3412). “PROCESSUAL CIVIL. Conflito negativo de competência. 1. Execução por quantia certa, nota promissória (título executivo extrajudicial). 2. Competên-cia do foro do local de pagamento da obrigação. 3. Precedentes” (2ª Seção do STJ, CC 1.218/MG, DiáriodaJustiça, 21-10-1991, p. 14727). “COMPETÊNCIA. EXECU-ÇÃO. DUPLICATA. PROTESTO. É competente para a execução lastreada em duplicata o foro da praça de pagamento constante do título (art. 17, da L. 5.474/68). Irrelevante que o protesto tenha sido tirado no local em que estabelecida a deve-dora. Agravo não provido” (6ª Turma Cível do TJDF, AGI 2007.00.2.004505-5, DiáriodaJustiça, 14-6-2007, p. 168).

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certa contra devedor solvente11. O executado é citado para pagar em três dias, sob pena de penhora dos respectivos bens, para a satisfação do crédito do exequente, nos termos dos arts. 591, 646 e 652 do Código de Processo Civil.

No que tange à contraposição do executado, dá-se mediante ação de embargos, à vista dos arts. 736 e s. do Código de Processo Civil, sem prejuízo da possibilidade da veiculação de objeção de não executividade ou “exceção de pré-executividade”, para a arguição de matérias de co-nhecimento oficial pelo juiz, como, por exemplo, a carência de alguma condição da ação cambial12, a falta de algum pressuposto processual13 e a ocorrência da prescrição da pretensão cambial.

6. Ação cambial de letra de câmbioA ação cambial fundada em letra de câmbio está prevista no art.

585, I, do Código de Processo Civil. O credor pode acionar tanto o deve-dor principal (sacado-aceitante da letra) quanto os respectivos avalistas mediante ação direta de execução, isto é, sem a necessidade de prévio protesto. À vista do art. 70 da Lei Uniforme de Genebra, a execução contra o devedor principal (aceitante e respectivos avalistas) deve ser proposta dentro do prazo de três anos, contados do vencimento da letra de câmbio14. Trata-se de prazo prescricional disponível para o credor

11 Na eventualidade da insolvência do devedor, há lugar para a ação de falência, prevista nos arts. 94 e s. da Lei n. 11.101/2005, ou para a ação de insolvência civil, prevista nos arts. 748 a 786-A do Código de Processo Civil, conforme o devedor seja empresário (falência) ou civil (insolvência civil).

12 Por exemplo, um vício formal no “título de crédito”, como na hipótese do prece-dente jurisprudencial resumido na seguinte ementa: “APELAÇÃO CÍVEL – PRO-CESSO DE EXECUÇÃO – REQUISITOS DE FORMALIDADE – NOTA PROMIS-SÓRIA – RASURA NO VALOR NUMÉRICO – OBSTÁCULO INTRANSPONÍVEL. I – Em se tratando de processo de execução, pode e deve o julgador cercar-se da certeza de estarem presentes os requisitos de formalidade inerentes aos títulos cambiais, independentemente da matéria arguida em sede de embargos” (2ª Turma do TJDF, Apelação 51.223/99, DiáriodaJustiça, 1º-11-1999, p. 13).

13 Por exemplo, a incompetência absoluta do juízo da execução, a inépcia da petição inicial, a inexistência e a nulidade de citação do executado.

14 De acordo, na jurisprudência: “Estabelece o art. 70 da Lei Uniforme, relativa às letras de câmbio, ser de 03 (três) anos o prazo para a propositura da ação exe-cutiva contra aceitante, na ordem de pagamento, e emitente, na promessa de pagamento, e seus avalistas, contados a partir do vencimento da cambial” (11ª

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exercer a respectiva pretensão patrimonial contra o devedor principal, contra os respectivos avalistas (do devedor principal), contra qualquer um ou até contra todos, se assim preferir15.

Quanto aos coobrigados da letra, quais sejam, o emitente-sacador, o tomador-endossante, os demais endossantes e os avalistas dos mesmos, o credor tem o prazo de um ano para ajuizar a execução fundada no art. 585, I, do Código de Processo Civil. Trata-se de prazo prescricional que corre da data do protesto tempestivo ou do vencimento do eventual tí-tulo “sem despesas”. Com efeito, no que tange ao emitente-sacador, endossantes e respectivos avalistas, a ação cambial deve ser proposta dentro do prazo prescricional de um ano, a contar da data do protesto tempestivo ou da data do vencimento, se a letra tiver a cláusula “sem protesto”, tudo nos termos do art. 70 da Lei Uniforme.

Na eventualidade de algum coobrigado efetuar o pagamento da letra, este pode, com fundamento na sub-rogação, exercer o direito de regresso contra outros coobrigados, por meio de ação de execução, a qual deve ser proposta dentro do prazo prescricional de seis meses. Com efeito, à vista dos arts. 47, § 3º, e 70, § 3º, ambos da Lei Uniforme, o coo-brigado que efetuar o pagamento tem o prazo de seis meses para acionar coobrigados pretéritos na cadeia de anterioridade, por meio de ação executiva de regresso. Por força do art. 567, III, do Código de Processo Civil, o sub-rogado pode iniciar nova execução ou até mesmo dar segui-mento à execução movida pelo credor originário, hipótese na qual o coobrigado pagante passa a ocupar o lugar deixado pelo credor original cujo crédito foi satisfeito.

7. Ação cambial de nota promissóriaDiante do vencimento16 sem o respectivo pagamento da nota pro-

missória, o credor pode executar tanto o devedor principal17 quanto os

Câmara Cível do TJMG, Apelação 2.0000.00.484560-9/000, DiáriodaJustiça, 28-7-2006). “Estabelece o art. 70 da Lei Uniforme, relativa às letras de câmbio, ser de 03 anos o prazo para a propositura da ação executiva contra aceitante, na ordem de pagamento, e emitente, na promessa de pagamento, e seus avalistas, contados a partir do vencimento da cambial” (10ª Câmara Cível do TJMG, Ape-lação 1.0433.07.221751-9/001, DiáriodaJustiça, 20-6-2008).

15 Cf. arts. 43 e 47 da Lei Uniforme de Genebra.

16 Vencimento que pode ser ordinário ou extraordinário.

17 O emitente-sacador da nota promissória.

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coobrigados, em conjunto ou isoladamente, conforme a livre preferência, tudo nos termos dos arts. 43 e 47 da Lei Uniforme, aplicáveis por força do art. 77 do mesmo diploma.

No que tange ao devedor principal e ao respectivo avalista, o credor pode mover ação de execução aparelhada em título extrajudicial, com fundamento no art. 585, I, do Código de Processo Civil, de forma direta18. Já em relação aos coobrigados, a subsistência dos direitos cambiários do credor depende do prévio protesto no prazo legal, exvi do art. 53 da Lei Uniforme, aplicável à nota promissória em razão do art. 77 do Decreto n. 57.663/66.

O prazo prescricional para a execução cambial fundada na nota promissória também varia conforme o executado seja o devedor princi-pal ou algum coobrigado. Em regra, a execução deve ser proposta dentro do prazo de três anos do vencimento da nota promissória19. Trata-se de prazo prescricional disponível para o credor exercer a respectiva preten-são patrimonial contra o devedor principal, contra o respectivo avalista ou contra ambos, se assim preferir20.

18 Vale dizer, sem a necessidade de prévio protesto.

19 Assim, na jurisprudência: “– COMERCIAL. NOTA PROMISSÓRIA. PRESCRIÇÃO DA AÇÃO CAMBIAL. O prazo é atualmente de três anos, consoante os arts. 70 e 77 da Lei Uniforme relativa às letras de câmbio e notas promissórias, promulgada pelo Decreto n. 57.663, de 24.1.66” (2ª Turma do STF, RE 91.050/RJ, DiáriodaJus-tiça, 1º-7-1983, p. 9996). Colhe-se do voto condutor do Ministro-Relator: “Tais dispositivos preveem a prescrição das ações contra o aceitante da letra de câmbio ou emitente da nota promissória, e, consequentemente, contra seus avalistas, no prazo de três anos. (...) EXECUÇÃO – TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL – NOTA PROMISSÓRIA – PRAZO PRESCRICIONAL DE TRÊS ANOS – ARTS. 70 E 77 DA LEI UNIFORME DE GENEBRA – PRESCRIÇÃO – OCORRÊNCIA. A execução embasada em nota promissória prescreve em três anos, em consonância com os arts. 70 e 77 da LUG” (TJMG, Apelação 1.0024.05.829981-9/002, DiáriodaJustiça, 23-8-2008). “APELAÇÃO – EMBARGOS DO DEVEDOR – NOTA PRO-MISSÓRIA – DEMORA NA CITAÇÃO – PRESCRIÇÃO – OCORRÊNCIA. – De acordo com o art. 18, I, da Lei n. 5.474/68, a ação proposta pelo sacador da dupli-cata contra o sacado prescreve em 3 anos. Idêntico o prazo prescricional para a execução de nota promissória, nos termos do art. 70, da Lei Uniforme, promulga-da em nosso país pelo Decreto n. 57.663/66” (TJMG, Apelação 1.0702.05.246064-0/001, DiáriodaJustiça, 15-2-2007).

20 Cf. arts. 70, § 1º, e 77, ambos da Lei Uniforme c/c o art. 585, I, do Código de Pro-cesso Civil.

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Quanto aos coobrigados21, o credor tem o prazo de um ano para ajuizar a execução fundada no art. 585, I, do Código de Processo Civil. Trata-se de prazo prescricional que corre da data do protesto tempestivo ou do vencimento do eventual título “sem despesas”22.

Na eventualidade de algum endossante ou avalista de endossante efetuar o pagamento, pode exercer o direito de regresso contra outros endossantes e respectivos avalistas no prazo prescricional de seis meses, em virtude da sub-rogação. Com efeito, o coobrigado que efetuar o pa-gamento dispõe do prazo de seis meses para acionar coobrigados preté-ritos na cadeia de anterioridade, em execução regressiva23. Por força do art. 567, III, do Código de Processo Civil, o sub-rogado pode iniciar nova execução ou até mesmo dar seguimento à execução movida pelo credor originário, quando o coobrigado pagante passa a ocupar o lugar deixado pelo credor original cujo crédito foi satisfeito.

8. Ação cambial de chequeComo estudado no capítulo específico destinado ao cheque, o títu-

lo deve ser apresentado para pagamento perante o banco-sacado dentro de trinta dias da data da emissão, quando emitido no mesmo lugar do pagamento24. Emitido o cheque em lugar diverso do local do pagamen-to, ou seja, em outra praça, o prazo para apresentação é de sessenta dias da data da emissão25. Decorrido inalbis o prazo de apresentação, o credor--beneficiário perde o direito de executar os coobrigados, ou seja, os en-dossantes e os respectivos avalistas26-27. Já em relação ao emitente-sa-cador e ao respectivo avalista, a execução pode ser ajuizada até mesmo quando o cheque foi apresentado ao banco-sacado depois do decur-

21 Na nota promissória, o beneficiário-endossante, os demais endossantes e avalis-tas destes.

22 Cf. arts. 46, 70 e 77 da Lei Uniforme.

23 Cf. arts. 47, § 3º, 70, § 3º, e 77, todos da Lei Uniforme.

24 Cf. art. 33 da Lei n. 7.357/85, e art. 11 da Resolução n. 1.682/90.

25 Cf. art. 33 da Lei n. 7.357/85, e art. 11 da Resolução n. 1.682/90.

26 Cf. art. 47, II, da Lei n. 7.357/85.

27 À vista do art. 47, § 3º, da Lei n. 7.357/85, o credor-benefício pode perder o direi-to de executar até mesmo o emitente-sacador, se o mesmo tinha fundos disponíveis durante o prazo da apresentação, mas deixou de tê-los em razão de fato alheio à sua vontade.

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so do prazo de apresentação, desde que ainda não ocorrida a prescrição semestral. Foi o que bem assentou o Supremo Tribunal Federal no Enun-ciado 600 da Súmula da Corte: “Cabe ação executiva contra o emitente e seus avalistas, ainda que não apresentado o cheque ao sacado no pra-zo legal, desde que não prescrita a ação cambiária”28.

A prescrição da ação cambiária ocorre com o decurso do prazo de seis meses do término do prazo de apresentação, conforme o enquadra-mento do caso concreto em uma ou em outra hipótese do art. 33 da Lei n. 7.357/85. Se o local do pagamento é o mesmo da emissão, o prazo de seis meses corre do término dos trinta dias disponíveis para apresentação; se o lugar do pagamento for diverso do local da emissão, o prazo de seis meses corre somente depois do decurso dos sessenta dias para a apre-sentação29. Por conseguinte, a data da emissão constante do título tem enorme relevância para a conferência da prescrição da execução funda-da no art. 585, I, do Código de Processo Civil, e nos arts. 47 e 59 da Lei n. 7.357/85. Imagine-se, por exemplo, que o cheque foi emitido no dia 19 de janeiro, mês com 31 dias, para pagamento na mesma praça. O termo inicial é o próprio dia 19, dia da emissão, o qual é excluído da contagem, por força da combinação dos arts. 33 e 64, parágrafo único, ambos da Lei n. 7.357/85, com o art. 132, caput, do Código Civil. Por conseguinte, a contagem dos trinta dias previstos no art. 33 da Lei n. 7.357 começa no dia 20 de janeiro e termina no dia 18 de fevereiro, desde que o mesmo seja dia útil bancário30. Resta saber qual é o termo inicial do prazo de seis meses para a execução. À vista dos arts. 47 e 59 da Lei n. 7.357/85, o termo inicial do prazo prescricional coincide com o termo final do prazo de apresentação do cheque, no exemplo, dia 18 de feve-reiro. Como o prazo de seis meses é contado à luz do § 3º do art. 132 do

28 É o que também se depreende da combinação dos incisos I e II do art. 47, com o art. 59, ambos da Lei n. 7.357/85.

29 A propósito, vale conferir a autorizada lição do Professor Osmar Brina Corrêa Lima: “Emitido o cheque, o beneficiário ou portador deve apresentá-lo no prazo legal de 30 dias, a contar da data da emissão, quando pagável na mesma praça; e de 60 dias, quando emitido em outro lugar do País ou do exterior (art. 33). Não se confundem os prazos para apresentação do cheque e de prescrição da ação por falta de pagamento (execução), que é de 6 meses, contados da ex-piração do prazo de apresentação (art. 59)” (Cheque: revogação (contraordem) e oposição, 2009, p. 1-2).

30 Por força do § 1º do art. 132 do Código Civil, o termo final do prazo deve ser dia útil, vale dizer, dia com expediente bancário regular.

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Código Civil, o termo final do prazo prescricional reside no dia 18 de agosto, desde que o mesmo seja dia útil forense31.

A execução pode ser movida contra o devedor principal, o emiten-te-sacador do cheque, mas também contra todos, alguns ou um dos coobrigados, em conjunto ou isoladamente, se assim desejar o credor- -beneficiário, porquanto todos são devedores solidários, exvi do art. 51 da Lei n. 7.357/85.

O cheque não precisa ser protestado para a propositura da imedia-ta ação de execução forçada contra o emitente-sacador e o respectivo avalista32. Em contraposição, no que tange aos coobrigados (endossante e respectivos avalistas), a execução depende do cumprimento de três exigências legais cumulativas: 1ª) apresentação do cheque dentro do prazo legal33; 2ª) propositura da ação executiva dentro de seis meses da expiração do prazo de apresentação do cheque34; 3ª) comprovação da recusa do pagamento mediante protesto cambial, por simples declaração escrita e datada proveniente do banco-sacado ou, ainda, por declaração escrita e datada expedida na câmara de compensação35, ressalvada a exceção consubstanciada na dispensa tanto do protesto quanto de decla-ração equivalente, em relação ao cheque que contém a cláusula “sem protesto”36.

Por fim, além da quantia determinada indicada no cheque37, o credor-beneficiário também pode cobrar na ação cambial: – os juros de mora legais cabíveis desde o dia da apresentação do cheque38; – as des-pesas em geral, como as referentes ao eventual protesto cambial e as relativas ao processo executivo39; – a correção monetária pela perda do

31 Em reforço, vale conferir preciso exemplo encontrado na literatura especializada: “Por exemplo, cheque de mesma praça emitido em 2 de março prescreve em 1º de outubro do mesmo ano” (Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial, v. I, 12. ed., 2008, p. 451).

32 Cf. art. 47, I, da Lei n. 7.357/85, c/c o art. 585, I, do Código de Processo Civil.

33 Cf. arts. 33 e 47, II, ambos da Lei n. 7.357/85.

34 Cf. arts. 33, 47 e 59 da Lei n. 7.357/85.

35 Cf. art. 47, II e § 1º, da Lei n. 7.357/85.

36 Cf. art. 50 da Lei n. 7.357/85.

37 Cf. art. 52, I, da Lei n. 7.357/85.

38 Cf. art. 52, II, da Lei n. 7.357/85.

39 Cf. art. 52, III, da Lei n. 7.357/85, e arts. 19, 257, 598 e 652-A, caput, todos do Có-digo de Processo Civil.

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valor aquisitivo da moeda, a ser calculada a contar da respectiva apre-sentação do cheque40.

9. Ação cambial de duplicata e de triplicataA duplicata e a respectiva triplicata são títulos executivos extraju-

diciais que autorizam a propositura de ação de execução forçada, com fundamento no art. 585, I, do Código de Processo Civil, e nos arts. 15 e 18 da Lei n. 5.474/68.

No que tange ao sacado-comprador e aos respectivos avalistas, a prescrição da pretensão à execução da duplicata ocorre em três anos, contados da data do vencimento do título, exvi do art. 18, I, da Lei n. 5.474/6841. Já em relação aos endossantes e respectivos avalistas, o pra-zo prescricional é de apenas um ano, contado da data do protesto42, o qual é necessário43.

Além da observância do prazo prescricional, a execução depende do cumprimento de outras exigências legais. Se a duplicata foi aceita e devolvida pelo sacado-comprador, o título pode aparelhar a execução do mesmo (sacado-comprador) e dos respectivos avalistas, no prazo de três anos, independentemente de protesto cambial44. Ainda na hipótese de duplicata aceita e devolvida pelo sacado-comprador, o título também pode aparelhar a execução dos coobrigados (endossantes e respectivos avalistas), desde que efetuado o protesto cambial dentro do prazo de trinta dias do vencimento da duplicata, e que a execução seja ajuizada dentro do prazo de um ano da data do protesto45.

Já se a duplicata não é aceita, mas é devolvida pelo sacado-com-prador, é indispensável o protesto cambial do título devolvido sem aceite, com a comprovação da entrega da mercadoria mediante recibo idôneo, para o posterior ajuizamento da execução contra o sacado-

40 Cf. art. 52, IV, da Lei n. 7.357/85, c/c o art. 1º, § 1º, da Lei n. 6.899/81.

41 De acordo, na jurisprudência: “– De acordo com o art. 18, I, da Lei n. 5.474/68, a ação proposta pelo sacador da duplicata contra o sacado prescreve em 3 anos” (TJMG, Apelação 1.0702.05.246064-0/001, DiáriodaJustiça, 15-2-2007).

42 Cf. art. 18, II, da Lei n. 5.474/68.

43 Cf. art. 13, § 4º, da Lei n. 5.474/68.

44 Cf. arts. 13, § 4º, 15, I, e 18, I, da Lei n. 5.474/68.

45 Cf. arts. 13, § 4º, 15, I, e 18, II, da Lei n. 5.474/68.

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-comprador ou contra os coobrigados, nos prazos de três anos e de um ano, respectivamente46. Não obstante, o recibo da entrega da mercadoria só é imprescindível quando a execução fundada no inciso II do art. 15 da Lei n. 5.474/68 tem em mira o sacado-comprador. Quando a ação executiva tem como alvo algum coobrigado, basta o protesto cambial tempestivo, tendo em vista a interpretação do § 1º do mesmo art. 1547.

Por fim, se a duplicata não é aceita nem é devolvida pelo sacado- -comprador, é indispensável o protesto por meio da triplicata ou por simples indicações do credor perante o tabelião do cartório de protesto, reforçado (o protesto) com a comprovação da entrega da mercadoria vendida mediante recibo idôneo, para a ulterior propositura da execução contra o sacado-comprador ou contra os coobrigados, nos respectivos prazos48. Ainda em relação à negativa do aceite, a execução não subsis-te se o sacado-comprador comprova, na respectiva ação de embargos, ter recusado o aceite dentro do prazo de dez dias, com a observância da forma escrita exigida para a recusa e com fundamento em algum dos motivos arrolados no art. 8º da Lei n. 5.474/6849.

46 Cf. arts. 15, II, a e b, e § 1º, e 18, I e II, da Lei n. 5.474/68.

47 De acordo, na jurisprudência: “O comprovante de recebimento das mercadorias ou do serviço prestado somente é exigido quando a execução é movida contra o devedor principal” (5ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 2.0000.00.516493-2, Di-áriodaJustiça, 30-11-2005).

48 Cf. arts. 13, § 1º, infine, 15, II, a e b, e § 1º, e 18, I e II, da Lei n. 5.474/68.

49 Cf. art. 15, II, c.

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Ação moniTóriA

1. Preceitos de regência e enunciados sumularesA ação monitória está prevista nos arts. 1.102-A a 1.102-C do Códi-

go de Processo Civil, acrescentados pela Lei n. 9.079/95. Além dos pre-ceitos legais, há vários enunciados da Súmula do Superior Tribunal de Justiça sobre a ação monitória1, em virtude da enorme importância do instituto na prática forense, especialmente em relação aos títulos de crédito prescritos.

2. Conceito e natureza jurídicaA monitória é um procedimento especial de processo cognitivo2,

porquanto tem início sem título executivo algum e permite ampla dis-

1 Cf. enunciados n. 247, 282, 292, 299 e 339, por exemplo.

2 Em sentido conforme, na doutrina: “Nesses casos, identifica-se o procedimento, a que o processo cognitivo obedece, com o adjetivo monitório. (...) Trata-se de uma ação de conhecimento, isto é, de uma ação que dá início a uma relação proces sual cognitiva, na qual a prestação jurisdicional de composição da lide não se faz de uma só vez” (Sergio Bermudes, Ação monitória: primeiras impressões sobre a Lei n. 9.079, de 14.7.1995, in: EstudosdedireitoprocessualemmemóriadeLuizMachadoGuimarães, Coordenação de José Carlos Barbosa Moreira, 1. ed., 2. tir., 1999, p. 272). Ainda no mesmo sentido do texto, na jurisprudência: “I – O procedimento moni-tório, também conhecido como injuntivo, introduzido no atual processo civil brasileiro, largamente difundido e utilizado na Europa, com amplo sucesso, tem por objetivo abreviar a formação do título executivo, encurtando a via procedi-mental do processo de conhecimento. II – A ação monitória tem a natureza de processo cognitivo sumário e a finalidade de agilizar a prestação jurisdicional, sendo facultada a sua utilização, em nosso sistema, ao credor que possuir prova escrita do débito, sem força de título executivo, nos termos do art. 1.102-A, CPC” (4ª Turma do STJ, REsp 220.887/MG, DiáriodaJustiça, 3-11-1999, p. 118).

CApíTulO

Vii

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cussão3 acerca da existência do direito subiudice, na busca da formação do título executivo judicial passível de execução. Com efeito, na eventu-alidade de o réu não oferecer defesa mediante embargos, ou de os em-bargos monitórios veiculados serem rejeitados, incide o disposto no Capítulo X do Título VIII do Livro I do Código de Processo Civil, desti-nado ao cumprimento de sentença por meio da execução padrão que tem lugar após a fase cognitiva de todo processo4. São, em suma, as justificativas que conduzem à conclusão em favor da predominância da natureza cognitiva do processo sujeito ao procedimento monitório.

Por tudo, a denominada “ação monitória”5 é o processo cognitivo que se desenvolve sob procedimento especial marcado pela celeridade rumo à execução, em prol do portador de prova escrita sem eficácia de título executivo, para a obtenção de pagamento de soma em dinheiro, da entrega de coisa fungível ou de bem móvel.

3. Facultatividade do procedimento monitórioAo contrário do que pode parecer à primeira vista, a adoção do

procedimento monitório é facultativa. Com efeito, cabe ao portador do documento sem eficácia de título executivo escolher entre a cobrança judicial por meio de processo cognitivo sob o rito monitório ou sob o procedimento comum, ordinário ou sumário, conforme o valor da causa e a natureza da causa6. Em reforço, o § 1º do art. 1.102-C do Código de Processo Civil revela a facultatividade do procedimento monitório, porquanto o autor pode desejar o pagamento não só do principal, mas também das custas judiciais recolhidas7 e dos honorários advocatícios8. Daí a conclusão: cabe ao credor a escolha entre o procedimento comum ou o monitório para a cobrança judicial9.

3 Tanto que há lugar para a conversão do procedimento em ordinário, exvi do art. 1.102-C, § 2º, do Código de Processo Civil.

4 Cf. art. 1.102-C, caput e § 3º c/c os arts. 475-I e s., todos do Código de Processo Civil.

5 Cf. art. 1.102-A do Código de Processo Civil.

6 Cf. art. 275, I e II, do Código de Processo Civil.

7 Cf. art. 257 do Código de Processo Civil.

8 Cf. art. 20 do Código de Processo Civil.

9 De acordo, na jurisprudência: “II – A ação monitória tem a natureza de processo cognitivo sumário e a finalidade de agilizar a prestação jurisdicional, sendo facul-

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Em contraposição, se o documento tiver eficácia executiva, a co-brança judicial deve ocorrer mediante execução forçada, cuja admissibi-lidade conduz à carência da ação sob o procedimento monitório, pela ausência do interesse processual. Com efeito, à vista do art. 267, VI, do Código de Processo Civil, só é admissível a demanda mediante o proce-dimento monitório quando não há lugar para execução forçada10.

4. Hipóteses de admissibilidade do procedimento monitórioA primeira hipótese de admissibilidade do rito monitório diz

respeito à cobrança de soma em dinheiro comprovada mediante prova

tada a sua utilização, em nosso sistema, ao credor que possuir prova escrita do débito, sem força de título executivo, nos termos do art. 1.102-A, CPC” (4ª Turma do STJ, REsp 220.887/MG, DiáriodaJustiça, 3-11-1999, p. 118). Com igual opinião, na doutrina: Daniel Amorim Assumpção Neves, Manualdedireitoprocessualcivil, 2009, p. 1310.

Em sentido contrário, na doutrina: “Não se diga que o credor poderia evitar essa desvantagem, propondo ação de procedimento comum, em vez da monitória. O princípio da infungibilidade procedimental – conforme o qual é a lei, não a parte, que determina qual o processo e como se haverá de desenvolver – o faria carecedor da ação, por falta de interesse, decorrente da inadequação da via eleita, se, na situ-ação do art. 1.102-A, o demandante se servisse de remédio diferente do de que agora se trata” (Sergio Bermudes, Ação monitória: primeiras impressões sobre a Lei n. 9.079, de 14.7.1995, in: EstudosdedireitoprocessualemmemóriadeLuizMachadoGuimarães, Coordenação de José Carlos Barbosa Moreira, 1. ed., 2. tir., 1999, p. 276).

10 De acordo, na doutrina: “Obviamente, porque se tivesse título teria execução e faltar-lhe-ia o interesse processual necessário ao provimento monitório” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 262-263). Ainda na melhor doutrina, o Professor Sergio Bermudes também sustenta “o estreitamen-to do âmbito de incidência da ação monitória, que não pode ser usada, se couber a ação executiva” (Ação monitória: primeiras impressões sobre a Lei n. 9.079, de 14.7.1995, in: EstudosdedireitoprocessualemmemóriadeLuizMachadoGuimarães, Coordenação de José Carlos Barbosa Moreira, 1. ed., 2. tir., 1999, p. 271). Por fim, há precedentes do Superior Tribunal de Justiça que reforçam a lição da doutrina: 4ª Turma do STJ, REsp 167.618/MS, DiáriodaJustiça, 14-6-1999, p. 202; e 3ª Turma do STJ, Ag 216.816/DF – AgRg, DiáriodaJustiça, 31-5-1999, p. 149: “1. Constituindo as atas de assembleias e as convenções condominiais títulos executivos extrajudi-ciais, cabível é a via executiva e não o ajuizamento de ação monitória”.

Em sentido contrário, entretanto, também há forte corrente jurisprudencial: “AÇÃO MONITÓRIA. Título executivo. O credor que tem em mãos título exe-cutivo pode dispensar o processo de execução e escolher a ação monitória. Pre-cedentes” (4ª Turma do STJ, REsp 435.319/PR, DiáriodaJustiça, 24-3-2003, p. 231). Conforme revela a ementa, o acórdão está fundamentado em precedentes da Corte, com igual orientação: REsp 182.084/MG e REsp 210.030/RJ.

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escrita sem eficácia executiva. É indispensável que o credor seja porta-dor de documento escrito comprobatório do valor a ser cobrado. O exemplo mais frequente na prática forense reside na cobrança judicial de títulos de crédito prescritos, como bem atesta o Enunciado 299 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça: “É admissível a ação monitória fundada em cheque prescrito”. Aliás, a tese consagrada no Enunciado 299 pode ser aplicada aos títulos de crédito em geral, como a nota pro-missória11, as duplicatas12, por exemplo. Enfim, todos os títulos de crédito prescritos servem como prova escrita necessária para o ajuiza-mento de ação monitória.

Outro importante exemplo de prova escrita idônea para a cobran-ça mediante o procedimento monitório reside no contrato de abertura de crédito em conta corrente, acompanhado do extrato bancário demons-trativo do débito. Com efeito, o contrato bancário de abertura de crédito em conta corrente não goza de certeza, razão pela qual não pode ser considerado título executivo extrajudicial13. Não obstante, o contrato é idôneo para a cobrança judicial sob o rito monitório: é prova escrita, não tem eficácia executiva e versa sobre soma em dinheiro. Daí a admissibi-lidade da cobrança judicial sob o procedimento monitório, como bem revela o Enunciado 247 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça: “O contrato de abertura de crédito em conta corrente, acompanhado do demonstrativo de débito, constitui documento hábil para o ajuizamento da ação monitória”.

Na verdade, toda prova documental que não tenha eficácia de tí-tulo executivo e que seja idônea para demonstrar a existência de obriga-ção pecuniária pode instruir a petição inicial de demanda sob o proce-dimento monitório, para a cobrança judicial de soma em dinheiro14.

11 De acordo, na jurisprudência: “IV. Cabível o uso da monitória para a cobrança de valores alusivos a nota promissória alcançada pela prescrição” (4ª Turma do STJ, REsp 437.136/MS, DiáriodaJustiça eletrônico, 9-6-2008).

12 Assim, na jurisprudência: “2. Cópias de duplicatas são documentos hábeis para instruir ação monitória” (3ª Turma do STJ, REsp 819.329/RJ, DiáriodaJustiça, 18-11-2006, p. 391).

13 Cf. Enunciado 233 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça, Enunciado 49 do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e Enunciado 14 do Tribunal de Justiça de Santa Catarina.

14 Em sentido conforme, na doutrina: “Prova escrita é a documental, não necessa-riamente o instrumento do negócio jurídico. Podemos citar, entre outras: o docu-

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Aliás, à luz do art. 1.102-A do Código de Processo Civil, não há necessi-dade de que a prova escrita tenha sido assinada pelo devedor15, nem mesmo que o documento esteja assinado16. Nada impede, portanto, que a prova escrita tenha sido constituída de forma unilateral17. Não obstan-

mento assinado pelo devedor, mas sem testemunhas, os títulos cambiários após o prazo de prescrição, a duplicata não aceita antes do protesto ou a declaração de venda de um veículo, por exemplo” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 263). O Professor Sergio Bermudes também formu-la didático exemplo: “Imagine-se a carta na qual um amigo agradece ao outro o empréstimo de dinheiro, enuncia o montante da soma e declara que irá pagá-la num determinado dia” (Ação monitória: primeiras impressões sobre a Lei n. 9.079, de 14.7.1995, in: EstudosdedireitoprocessualemmemóriadeLuizMachadoGuimarães, Coordenação de José Carlos Barbosa Moreira, 1. ed., 2. tir., 1999, p. 271).

15 Por exemplo, duplicata sem aceite, quando não há prova da entrega da mercado-ria ou da prestação do serviço. Assim, na jurisprudência: “AÇÃO MONITÓRIA. DUPLICATA SEM ACEITE, ACOMPANHADA DA NOTA FISCAL/FATURA E DO INSTRUMENTO DE PROTESTO. PROVA ESCRITA. DOCUMENTO QUE NÃO PRECISA SER OBRIGATORIAMENTE EMANADO DO DEVEDOR. – O documento escrito a que se refere o legislador não precisa ser obrigatoriamente emanado do devedor, sendo suficiente, para a admissibilidade da ação monitória, a prova escrita que revele razoavelmente a existência da obrigação. Recurso espe-cial conhecido e provido” (4ª Turma do STJ, REsp 167.618/MS, DiáriodaJustiça, 14-6-1999, p. 202). “Ação monitória. Duplicata de prestação de serviço sem aceite. Ausência de documento comprovando o recebimento do serviço. 1. Afirmando o Acórdão recorrido que, no caso, não há documento comprovando o recebimento dos serviços, e admitindo a jurisprudência da Corte que a duplicata sem aceite é título executivo se acompanhado de tal documento, não é possível impedir o autor de exercer o seu direito de credor pela via da ação monitória. 2. Recurso especial não conhecido” (3ª Turma do STJ, REsp 167.222/MG, DiáriodaJustiça, 4-10-1999, p. 55).

16 Assim, na jurisprudência: “PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO MONITÓRIA – INS-TRUÇÃO DA INICIAL POR NOTAS FISCAIS – MATÉRIA DE FATO. I – Não é imprescindível que o documento esteja, para embasar a inicial da Monitória, as-sinado, podendo mesmo ser acolhido o que provém de terceiro ou daqueles re-gistros, como os do comerciante ou dos assentos domésticos que não costumam ser assinados, mas aos quais se reconhece natural força probante (CPC, art. 371)” (3ª Turma do STJ, REsp 164.190/SP, DiáriodaJustiça, 14-6-1999, p. 186).

17 Ao julgar incidente de uniformização de jurisprudência, o Conselho Especial do TJDF aprovou a seguinte orientação jurisprudencial: “O documento unilateral emitido por condomínio é eficiente para instruir ação monitória”. O respectivo acórdão contém a seguinte ementa: “PROCESSUAL CIVIL – UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA – ADMISSIBILIDADE – AÇÃO MONITÓRIA – COBRAN-ÇA DE TAXAS CONDOMINIAIS – DOCUMENTO UNILATERAL – POSSIBILI-DADE. Verificada a divergência de posicionamentos acerca da aplicabilidade de

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te, compete ao juiz, à vista da espécie, avaliar a prova documental acos-tada à petição inicial, para formar a respectiva convicção acerca da de-monstração dos fatos, ou não. Se a prova documental for julgada sufi-ciente para demonstrar o quadro fático delineado pelo autor, o juiz deve admitir a petição inicial e determinar a expedição do mandado inicial de citação, já com a ordem de pagamento da quantia, tudo nos termos do art. 1.102-B do Código de Processo Civil. Em contraposição, se o juiz formar convencimento contrário à luz da petição inicial e da respectiva documentação, deve proferir sentença extintiva do processo sob o pro-cedimento monitório.

Exposta a primeira – e mais importante – hipótese de admissibili-dade do procedimento monitório, passa-se ao estudo das demais hipó-teses previstas no art. 1.102-A do Código de Processo Civil.

A segunda e a terceira hipóteses de admissibilidade do procedi-mento monitório têm lugar nas obrigações para a entrega de coisa18, com igual demonstração mediante prova escrita, conforme revela o art. 1.102-A do Código de Processo Civil: “A ação monitória compete a quem pre-tender, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, pa-gamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determi-nado bem móvel”. Quanto ao alcance da expressão legal “bem móvel”, incidem os arts. 82 a 84 do Código Civil de 2002. No que tange ao signi-ficado de “coisa fungível”, incide o art. 85 do Código Civil. A coexistên-

determinado direito, impõe-se a admissão do incidente de uniformização de ju-risprudência. Cabível a ação monitória desde que a prova escrita apresentada preencha os requisitos do art. 1.102-A, do Código de Processo Civil e, ainda, este-ja clara a relação jurídica de crédito e débito entre as partes, mesmo que a referida prova seja constituída unilateralmente. Precedentes do colendo STJ” (Conselho Especial do TJDF, UNJ 2007.00.2.011888-7, DiáriodaJustiça, 6-3-2009, p. 47).

Com opinião contrária, entretanto, há autorizada doutrina: “Além da exigência de uma prova documentada por escrito, não se admite que a prova tenha sido produzida unilateralmente pelo autor, exigindo-se alguma participação do réu na sua formação” (Daniel Amorim Assumpção Neves, Manualdedireitoprocessualcivil, 2009, p. 1311).

18 A propósito, vale conferir didático exemplo de autoria do Professor Sergio Ber-mudes: “Pense-se no bilhete, deixado pelo fazendeiro, na propriedade vizinha, onde afirma que apanhou certo número de sacas de café, que devolverá, impre-terivelmente, em igual dia da semana seguinte” (Ação monitória: primeiras im-pressões sobre a Lei n. 9.079, de 14-7-1995, in: Estudosdedireitoprocessualemme-móriadeLuizMachadoGuimarães, Coordenação de José Carlos Barbosa Moreira, 1. ed., 2. tir., 1999, p. 271).

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cia das duas alternativas (“coisa fungível” ou “bem móvel”) amplia o alcance do procedimento monitório, com a possibilidade da cobrança da entrega de coisas fungíveis19, assim como de bens móveis que não são fungíveis20. Em contraposição, o procedimento monitório não é admis-sível para a veiculação de pretensões de entrega de imóveis, de fazer e de não fazer21.

5. Legitimidade ativa e passiva O procedimento monitório pode ser acionado por toda pessoa,

tanto a pessoa natural quanto a pessoa jurídica, quer seja pública, quer seja privada. A amplitude da legitimidade ativa é fruto da expressão genérica inserta no art. 1.102-A: “quem pretender”.

O polo passivo da demanda também pode ser ocupado pelas pes-soas física e jurídica, tanto a privada quanto a pública. Aliás, após o advento do Enunciado 339 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça22, não há mais dúvida acerca da admissibilidade da adoção do rito moni-tório em processo movido contra pessoa jurídica de direito público in-terno23. Não incidem, entretanto, ao final do processo sob rito monitório

19 Por exemplo, semoventes, navios, aeronaves. No mesmo sentido, na doutrina: Sergio Bermudes, Ação monitória: primeiras impressões sobre a Lei n. 9.079, de 14.7.1995, in: EstudosdedireitoprocessualemmemóriadeLuizMachadoGuimarães, Coordenação de José Carlos Barbosa Moreira, 1. ed., 2. tir., 1999, p. 274.

20 Por exemplo, um quadro de famoso pintor já falecido, os originais de antigo livro escrito por importante autor, o instrumento musical utilizado por músico de fama internacional em concerto humanitário de significativa importância histórica.

21 De acordo, na doutrina: “Conforme expressa previsão legal, as obrigações de fazer, não fazer e entrega de coisa imóvel não podem ser objeto de demanda monitória, pois esta é limitada às obrigações de pagar e entregar coisas móveis, pouco importando se a pretensão se funda em direito das obrigações ou em direi-to real” (Daniel Amorim Assumpção Neves, Manualdedireitoprocessualcivil, 2009, p. 1.312).

22 “É cabível ação monitória contra a Fazenda Pública.”

23 Com igual opinião à defendida no presente compêndio, na doutrina: “Não vejo razões para não se admitir a ação monitória pelo Estado e pelas pessoas da admi-nistração indireta, bem como por quaisquer pessoas físicas, jurídicas ou formais, nem contra todos esses entes” (Sergio Bermudes, Ação monitória: primeiras im-pressões sobre a Lei n. 9.079, de 14.7.1995, in: Estudosdedireitoprocessualemme-móriadeLuizMachadoGuimarães, Coordenação de José Carlos Barbosa Moreira, 1. ed., 2. tir., 1999, p. 275).

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contra a Fazenda Pública, os arts. 475-I a 475-R do Código de Processo Civil, ou seja, a regra prevista no art. 1.102-C, mas, sim, os arts. 730, 731 e 741, preceitos específicos para a execução contra a Fazenda Pública24.

6. PrazoO Código de Processo Civil não estabelece prazo algum para a

propositura da denominada “ação monitória”; e a razão é simples: mo-nitório é o procedimento, e não a ação destinada ao exercício de uma pretensão. A pretensão, sim, é passível de prazo, o qual tem natureza prescricional, tendo em vista o disposto no art. 189 do Código Civil. Assim, por exemplo, é prescritível a pretensão de enriquecimento sem causa exercida mediante demanda sob o procedimento comum ou sob o procedimento monitório25. Sem dúvida, é a pretensão de enriqueci-mento sem causa que sofre a incidência da prescrição, à vista dos dife-rentes prazos prescricionais existentes para cada caso: por exemplo, dois anos, no caso do cheque, por força do art. 61 da Lei n. 7.357/85, e três anos, nos casos da letra de câmbio, da nota promissória e das duplicatas, à vista do art. 206, § 3º, IV, do Código Civil.

Além da pretensão de enriquecimento sem causa fundamentada no título de crédito prescrito que não foi honrado, a pretensão causal também pode ser veiculada mediante o procedimento monitório, mas com fundamento na causadebendi, vale dizer, na origem da dívida, a qual precisa ser declinada na petição inicial26. Por conseguinte, a prescrição

24 De acordo, na doutrina: Rodrigo Mazzei, ReformadoCPC, v. I, 2006, p. 330 (nota 11) a 336.

25 Em reforço ao entendimento defendido no presente compêndio, vale conferir o didático voto do Desembargador Alexandre Freitas Câmara: “A demanda de enriquecimento, a ser proposta pelo credor, poderá levar à utilização do procedi-mento monitório ou de procedimento comum (ordinário ou sumário, conforme o caso), por opção do demandante. Impende, pois, considerar que a assim chamada ‘ação monitória’ não é figura distinta da ‘ação de enriquecimento’ mas, tão somen-te, o nome dado pela lei processual a um dos procedimentos que podem ser usados para o desenvolvimento do processo instaurado pela propositura da ‘ação de enriquecimento’” (2ª Câmara Cível do TJRJ, Apelação 2009.001.07855).

26 Tal exigência não se dá quando a ação monitória veicula pretensão de enriqueci-mento sem causa, porquanto a simples juntada do título de crédito prescrito que não foi pago já é suficiente para revelar a ocorrência do locupletamento indevido.

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deve ser observada à luz da pretensão causal, tendo em vista o disposto nos arts. 205 e 206 do Código Civil27.

Em suma, a “ação monitória” em si não está sujeita a prazo algum; na verdade, a prescrição diz respeito à pretensão exercida mediante a ação, por meio de demanda cujo procedimento pode ser o monitório. O prazo prescricional deve ser aferido à luz da espécie, em cada caso con-creto, tendo em vista a pretensão objeto da demanda sob o procedimen-to monitório.

7. Petição inicialA petição inicial da demanda sob o procedimento monitório deve

ser elaborada à luz dos arts. 39, I, 258, 282, todos do Código de Processo Civil28.

Como toda causa, também deve ser conferido valor à submetida ao procedimento monitório, em cumprimento ao art. 258 do Código de Processo Civil. Ao contrário do que ocorre no procedimento comum, cujo valor da causa pode interferir na adoção do rito ordinário ou sumário, o mesmo não ocorre no procedimento monitório, o qual pode ser adota-do em causas com valores inferiores e superiores a sessenta salários mínimos.

Em cumprimento aos arts. 283 e 1.102-B, a petição inicial deve ser “devidamente instruída” com a prova documental elucidativa do valor ou da coisa objeto da cobrança judicial. À luz da prova escrita juntada pelo autor, o juiz realiza cognição perfunctória acerca da pertinência do

27 Segundo forte corrente jurisprudencial, a pretensão causal enseja demanda de cobrança sujeita ao prazo prescricional de cinco anos, previsto no art. 206, § 5º, do Código Civil. Por todos, vale conferir o respeitável voto proferido pelo emi-nente Desembargador Alexandre Freitas Câmara, na qualidade de Revisor da Apelação 2009.001.07855. Ainda que muito respeitável o entendimento predomi-nante, defende-se no presente compêndio raciocínio diverso, segundo o qual a prescrição da pretensão causal depende de cada caso concreto, ou seja, de cada causadebendi.

28 De acordo, na doutrina: “A petição inicial atenderá os requisitos do art. 282 do Código, cuja observância as normas da ação monitória não dispensaram” (Sergio Bermudes, Ação monitória: primeiras impressões sobre a Lei n. 9.079, de 14.7.1995, in: EstudosdedireitoprocessualemmemóriadeLuizMachadoGuimarães, Coordenação de José Carlos Barbosa Moreira, 1. ed., 2. tir., 1999, p. 274).

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pedido monitório, para indeferir ou admitir a petição inicial29. Indeferi-da a petição inicial, cabe apelação, em quinze dias, nos termos dos arts. 267, I, 295, 296, 508 e 513, todos do Código de Processo Civil30.

Não obstante, se a petição inicial estiver incompleta, incide o art. 284 do Código de Processo Civil, a fim de que o autor emende a inicial, em dez dias, sob pena de indeferimento31.

8. Admissibilidade da petição inicial e expedição domandado inicial

Se a petição estiver regular à luz dos arts. 39, I, 258, 282, 283, 1.102-A e 1.102-B, todos do Código de Processo Civil, e também for ade-quado o rito monitório, à vista da cobrança de soma em dinheiro, da entrega de coisa fungível ou de bem móvel com lastro em prova docu-mental, o juiz admite a inicial e determina a expedição do mandado de citação, com a ordem de pagamento ou da entrega da coisa, conforme o

29 De acordo, na doutrina: “Depois de cognição sumária, o juiz defere a expedição do mandado de cumprimento da obrigação” (Sergio Bermudes, Ação monitória: primeiras impressões sobre a Lei n. 9.079, de 14.7.1995, in: Estudosdedireitopro-cessualemmemóriadeLuizMachadoGuimarães, Coordenação de José Carlos Barbo-sa Moreira, 1. ed., 2. tir., 1999, p. 272). “No procedimento monitório, há cognição desenvolvida pelo juiz, consubstanciada no convencimento de que há verossimi-lhança nas alegações do autor. Somente após tal cognição deverá o juiz proferir o pronunciamento inicial positivo, com a expedição do mandado monitório” (Daniel Amorim Assumpção Neves, Manualdedireitoprocessualcivil, 2009, p. 1.315).

30 De acordo, na doutrina: “Ao despachar a inicial, o juiz pode indeferi-la de plano nas mesmas hipóteses de indeferimento da inicial do processo de conhecimento e, em especial, se não estiver acompanhada da prova escrita da obrigação. Esse ato de rejeição é sentença; logo, o recurso contra ela cabível é a apelação, nos termos do art. 296, com redação dada pela Lei n. 8.952/94” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 263).

31 De acordo, na doutrina: “Obviamente, o juiz ordenará a emenda da inicial insu-ficiente (art. 284), e a indeferirá, nos casos previstos no Código (art. 295), ou se verificar a nulidade da obrigação (v. g., examinando os documentos, descobriu que o devedor era absolutamente incapaz, quando assinou o escrito, ou que a obrigação é de entrega para abate de animais cuja comercialização a lei proíbe)” (Sergio Bermudes, Ação monitória: primeiras impressões sobre a Lei n. 9.079, de 14.7.1995, in: EstudosdedireitoprocessualemmemóriadeLuizMachadoGuimarães, Coordenação de José Carlos Barbosa Moreira, 1. ed., 2. tir., 1999, p. 274).

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caso32. Com efeito, o mandado monitório contém a determinação de ci-tação do réu, com a ordem de pagamento ou da entrega da coisa, no prazo de quinze dias, tudo nos termos do art. 1.102-B, infine, do Código de Processo Civil. Nada dispõe, entretanto, sobre honorários advocatícios nem custas processuais, até mesmo em razão da isenção legal33 existen-te em prol do réu que paga ou entrega a coisa no prazo de quinze dias da citação. A condenação ao pagamento de honorários advocatícios e das custas processuais se dá apenas ao final da fase cognitiva, no mo-mento da prolação da sentença pelo juiz.

No que tange à natureza do pronunciamento previsto no art. 1.102-B, trata-se de verdadeira decisão interlocutória34, porquanto o juiz de-cide acerca da regularidade da petição inicial e também profere juízo de delibação acerca da própria admissibilidade do procedimento monitório.

Resta saber se há lugar para recurso de agravo contra a decisão interlocutória proferida à luz do art. 1.102-B. Segundo o entendimento

32 De acordo, na doutrina: “Depois de cognição sumária, o juiz defere a expedição do mandado de cumprimento da obrigação” (Sergio Bermudes, Ação monitória: primeiras impressões sobre a Lei n. 9.079, de 14.7.1995, in: Estudosdedireitopro-cessualemmemóriadeLuizMachadoGuimarães, Coordenação de José Carlos Barbo-sa Moreira, 1. ed., 2. tir., 1999, p. 272). “No procedimento monitório, há cognição desenvolvida pelo juiz, consubstanciada no convencimento de que há verossimi-lhança nas alegações do autor. Somente após tal cognição deverá o juiz proferir o pronunciamento inicial positivo, com a expedição do mandado monitório” (Daniel Amorim Assumpção Neves, Manualdedireitoprocessualcivil, 2009, p. 1.315).

33 Cf. art. 1.102-C, § 1º, do Código de Processo Civil.

34 De acordo, na doutrina: Antônio Raphael Silva Salvador, Daaçãomonitóriaedatutelajurisdicionalantecipada: comentários à Lei n. 9.079, de 14.7.95, 1995, p. 23-24: “Quando o juiz defere a inicial, fundamentando a sua decisão, para determinar a expedição do mandado de pagamento ou de entrega de coisa, está proferindo decisão interlocutória, capaz de atingir o direito do réu”. Também no mesmo sentido, ainda na doutrina: Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 263: “Esse ato é decisão interlocutória, contra a qual cabe agravo de instrumento”.

Em sentido contrário, entretanto, há autorizada doutrina: Sergio Bermudes, Ação monitória: primeiras impressões sobre a Lei n. 9.079, de 14.7.1995, in: EstudosdedireitoprocessualemmemóriadeLuizMachadoGuimarães, Coordenação de José Carlos Barbosa Moreira, 1. ed., 2. tir., 1999, p. 275 (“Ao menos por enquanto, vejo o pronunciamento, que defere a expedição do mandado, como ato de prestação jurisdicional. Trata-se, no meu sentir, de sentença condenatória condicional, pro-ferida na forma de despacho (ou de decisão interlocutória, para os que, como não penso, só admitem a existência de despachos de mero expediente”)).

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predominante na doutrina e na jurisprudência, a decisão interlocutória prevista no art. 1.102-B é irrecorrível, por falta de interesse recursal35.

Coerente com o raciocínio sustentado em trabalho específico sobre recursos36, prestigia-se no presente compêndio a doutrina minoritária que defende o cabimento do recurso de agravo de instrumento37, por-quanto a admissão da petição inicial da ação monitória pode causar gravame até mesmo ao autor, que pode não concordar com algum dos termos da decisão interlocutória38.

35 Cf. Sergio Bermudes, Ação monitória: primeiras impressões sobre a Lei n. 9.079, de 14.7.1995, in: EstudosdedireitoprocessualemmemóriadeLuizMachadoGuimarães, Coordenação de José Carlos Barbosa Moreira, 1. ed., 2. tir., 1999, p. 275: “Não me parece que o réu da ação monitória possa recorrer do ato de deferimento da ex-pedição do mandado. Faltar-lhe-ia interesse recursal, porquanto a lei põe ao seu dispor, no art. 1.102-C, embargos com efeito suspensivo da eficácia daquela or-dem”.

36 Cf. Bernardo Pimentel Souza, Introduçãoaosrecursoscíveiseàaçãorescisória. 7. ed., 2010.

37 Cf. Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 263; e Antônio Raphael Silva Salvador, Daaçãomonitóriaedatutelajurisdicionalanteci-pada: comentários à Lei n. 9.079, de 14.7.95, 1995, p. 23-24: “Quando o juiz defere a inicial, fundamentando a sua decisão, para determinar a expedição do mandado de pagamento ou de entrega de coisa, está proferindo decisão interlocutória, capaz de atingir o direito do réu. Este, se o desejar, poderá agravar de instrumento, mesmo ainda não citado, pois pode preferir atacar desde logo a decisão, não aguardando o momento em que poderia discutir o direito do autor através dos chamados embargos”.

38 A propósito, o antigo Tribunal de Alçada de Minas Gerais conheceu e deu provi-mento a recurso de agravo de instrumento interposto pelo autor contra a decisão interlocutória de admissão da petição inicial, por não concordar com todos os termos do pronunciamento proferido em primeiro grau de jurisdição: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO MONITÓRIA – DESPACHO INICIAL – CONTEÚ-DO DECISÓRIO – RECORRIBILIDADE – MODIFICAÇÃO INICIAL DOS JUROS E DA CORREÇÃO MONETÁRIA COBRADOS – IMPOSSIBILIDADE – RECURSO PROVIDO. O despacho que manda expedir o mandado monitório tem conteúdo eminentemente decisório, equiparando-se a uma verdadeira decisão interlocutó-ria, que desafia o recurso de agravo. Ao despachar a inicial da ação monitória, o juiz, além de verificar os requisitos da peça, as condições da ação e os pressupos-tos processuais comuns a qualquer procedimento, deverá fazer um prévio juízo de valor a respeito da prova escrita ofertada. Todavia, uma vez aceita esta prova e admitida como verdadeira a assunção da obrigação, não pode o Magistrado alterar os encargos que sobre ela se fizeram incidir, posto que tais questões perti-

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9. Citação do réu

A citação do réu no procedimento monitório pode ser realizada por todas as formas arroladas no art. 221 do Código de Processo Civil.

A respeito da possibilidade da citação pela forma prevista no inci-so III do art. 221, o Enunciado 282 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça autoriza a citação por edital: “Cabe a citação por edital em ação monitória”. Na eventualidade de citação por edital e da posterior ocor-rência de revelia, o juiz deve nomear curador especial para exercer a defesa do réu mediante embargos, em observância ao disposto no art. 9º, II, infine, do Código de Processo Civil39. Mutatismutandis, aplica-se à espécie o mesmo raciocínio consagrado no Enunciado 196 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça.

Por fim, em virtude da natureza cognitiva da demanda veiculada sob o procedimento monitório, não incide a vedação contida no inciso “d” do art. 222 do Código de Processo Civil, razão pela qual a citação pelo correio também é compatível com o procedimento monitório40.

10. Cumprimento do mandado inicial pelo réu

Após a citação, o réu tem a opção de cumprir o mandado inicial previsto no art. 1.102-B do Código de Processo Civil, quando fica isento

nem à matéria de defesa dos embargos monitórios” (7ª Câmara Cível do TAMG, AGI 307.730-7, DiáriodaJustiça, 23-8-2000).

39 Assim, na jurisprudência: “AÇÃO MONITÓRIA. Citação por edital. É possível a citação por edital do réu em ação monitória; sendo ele revel, nomear-se-á curador especial para exercer a sua defesa através de embargos (art. 1.102 do CPC). Recur-so conhecido e provido” (4ª Turma do STJ, REsp 175.090/MS, DiáriodaJustiça, 28-2-2000, p. 87).

40 De acordo, na doutrina: “Se a inicial estiver em ordem, o juiz determinará a citação do réu (isso não está expresso na lei, mas é óbvio que não pode haver processo sem citação, que será feita nos termos gerais do Código, inclusive, se for o caso, pelo correio), com a determinação de pagamento ou entrega da coisa no prazo de quin-ze dias (art. 1.102-B)” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 263). “Não se tratando de processo executivo, todas as formas de cita-ção são admitidas (art. 221 do CPC), inclusive a citação por correio” (Daniel Amo-rim Assumpção Neves, Manualdedireitoprocessualcivil, 2009, p. 1316, item 80.7).

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do pagamento das custas processuais adiantadas pelo autor, bem assim dos honorários advocatícios, em virtude do disposto no § 1º do art.1.102-C do mesmo diploma.

Como é perceptível primoictuoculi, o § 1º do art. 1.102-C tem como escopo estimular o réu a cumprir o mandado inicial, mediante o paga-mento da quantia ou a entrega da coisa, conforme o caso, dentro dos quinze dias posteriores à citação.

Cumprido o mandado inicial pelo réu, o juiz profere sentença ex-tintiva do processo, em virtude do pagamento da soma em dinheiro ou da entrega da coisa, conforme o caso41.

11. Inércia do réu: descumprimento do mandado monitório e ausência de embargos

Apesar de citado, o réu pode permanecer silente, sem aviar embar-gos à monitória na quinzena legal. Diante da omissão do réu, incide a segunda parte do caputdo art. 1.102-C, com a imediata conversão exvilegis do mandado inicial em mandado executivo, independentemente de sentença do juiz. É a interpretação prevalecente tanto na doutrina42

41 De acordo, na doutrina: “Cumprido o mandado, só lhe resta declarar extinto o processo pela satisfação do direito do credor. Ocorrerá, aqui, embora não se trate de execução no sentido próprio, a hipótese do art. 794, I, do Código, na qual o devedor satisfaz a obrigação, cabendo ao juiz proferir declaratória da extinção semelhante à referida no art. 795” (Sergio Bermudes, Ação monitória: primeiras impressões sobre a Lei n. 9.079, de 14.7.1995, in: EstudosdedireitoprocessualemmemóriadeLuizMachadoGuimarães, Coordenação de José Carlos Barbosa Moreira, 1. ed., 2. tir., 1999, p. 272-273).

42 Conferir, na doutrina: Alexandre Freitas Câmara, Liçõesdedireitoprocessualcivil, v. III, 12. ed., 2007, p. 543: “É de se notar que a conversão do provimento inicial em título executivo se dá, nos termos da lei, de pleno direito, o que significa afir-mar que não há necessidade de prolação de qualquer provimento judicial decla-rando ter-se constituído o título executivo”. Assim, ainda na doutrina: Antônio Raphael Silva Salvador, Daaçãomonitóriaedatutelajurisdicionalantecipada: comen-tários à Lei n. 9.079, de 14.7.95. 1995, p. 36: “Portanto, independe a formação desse título de qualquer decisão judicial, podendo o autor, diante da inércia do réu, iniciar a execução, com petição inicial nos mesmos autos, pedindo a entrega da coisa certa (arts. 621 e s.) ou o pagamento de quantia certa contra o devedor solvente (arts. 646 e s.). Esta execução assim se iniciará, evitando-se que o juiz precise proferir qualquer ato jurisdicional antes, quando possibilitaria ao réu procrastinar a chegada à execução, com o recurso que pudesse interpor”. Também

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quanto na jurisprudência43.

Ainda que muito respeitável o entendimento predominante na doutrina e na jurisprudência, prestigia-se, no presente compêndio, a tese

com igual opinião, na doutrina: Elaine Harzheim Macedo, Doprocedimentomoni-tório, 1999, p. 153: “Na prática, isso significa que o magistrado, constatando o decurso do prazo para o oferecimento de embargos sem sua interposição, ouvin-do o autor ou mesmo de ofício, determinará o prosseguimento do feito como execução para entrega de coisa ou para pagamento de quantia certa, independen-te de qualquer ato decisório. Despacho ordinatório, irrecorrível, que marca o início da execução forçada, a fim de atuar o direito de crédito, agora adjetivado pela certeza decorrente não de uma sentença condenatória típica, mas de um comando sumário, emitido condicionalmente, cuja condição verificou-se frente à não oposição do demandado”.

43 Conferir, na jurisprudência: “MONITÓRIA – APELAÇÃO – HIPÓTESE DE NÃO CABIMENTO – EMBARGOS NÃO OFERTADOS – CONVERSÃO DO MANDADO DE PAGAMENTO EM TÍTULO EXECUTIVO. – A revelia do executado constitui, de pleno direito, o mandado inicial em título executivo, independentemente de sentença, hipótese em que, por consequência, não cabe apelação” (6ª Câmara Cível do TAMG, Apelação 343.723-8, DiáriodaJustiça, 23-10-2001). “AÇÃO MONITÓRIA – NÃO OPOSIÇÃO DE EMBARGOS – CONVERSÃO DO MANDADO INICIAL EM MANDADO EXECUTIVO – APELAÇÃO – HIPÓTESE INICIAL EM MAN-DADO EXECUTIVO – APELAÇÃO – HIPÓTESE DE NÃO CABIMENTO. Quan-do não há o oferecimento de embargos – que reclamou ato decisório –, a conversão do mandado inicial de pagamento em mandado executivo, nos moldes do art. 1.102-C, caput, do CPC, independe de sentença, ou de qualquer outra formalidade, tratando-se unicamente de um despacho ordinatório de conversão” (16ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0016.05.488737-6/001, DiáriodaJustiça, 11-8-2006). “AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO MONITÓRIA – APELAÇÃO – HIPÓ-TESE DE NÃO CABIMENTO. 1 – Na ação monitória, se, no prazo de quinze dias, não são opostos embargos pelo réu, constitui-se de pleno direito, o título executivo judicial, convertendo-se o mandado inicial em mandado executivo, independente-mente de sentença ou qualquer outra formalidade, hipótese em que não é cabível apelação” (4ª Turma Cível do TJDF, AGI 8.434/97, DiáriodaJustiça, 4-2-1998, p. 63). Colhe-se do voto condutor: “Se não são opostos embargos, constituir-se-á, de pleno direito, o título executivo judicial, convertendo-se o mandado inicial em tí-tulo executivo, independentemente de sentença ou de qualquer outra formalidade, conforme Theotonio Negrão (ob. cit.). ‘Trata-se de um estranho título executivo judicial, porque prescinde de sentença. Ao que parece, tal natureza lhe é atribuída pela lei para evitar que o réu oponha, posteriormente, embargos à execução com fundamento no art. 745, em vez de ficar restrito às hipóteses do art. 741.’ (apudTheotonio Negrão, ob. cit.). Segue-se daí que, não sendo oferecidos embargos, o mandado inicial é convertido em título executivo independentemente de senten-ça ou qualquer outra formalidade. A decisão, da qual se apelou, sequer era, portanto, necessária. Não é cabível dela, assim, apelação”.

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minoritária, segundo a qual o juiz deve proferir sentença de conversão do mandado inicial em mandado executivo, para constituir o título exe-cutivo judicial, quando poderá44 reexaminar as matérias de ordem pú-blica, como a prescrição e a incompetência absoluta do juízo, por exem-plo. Com efeito, à vista da parte final do art. 1.102-C do Código de Processo Civil, incidem os arts. 475-I a 475-R do mesmo diploma, os quais versam sobre o “cumprimento da sentença”. É imprescindível, portanto, a prolação de uma sentença, ainda que concisa, a fim de que a “execução” prevista no art. 475-I esteja aparelhada em “sentença”, tal como exige o preceito legal45 aplicado por força da parte final do art. 1.102-C.

Ademais, o art. 475-L restringe as matérias passíveis de impugna-ção, na certeza de que outras tantas (muitas delas de conhecimento oficial, como a prescrição e a incompetência absoluta do juízo) já foram julgadas na sentença. Daí a necessidade da prolação de sentença, até mesmo para que faça sentido o disposto na parte final do inciso VI do art. 475-L: “omissis ou prescrição, desde que superveniente à sentença”.

Por tudo, parece ser necessária a prolação de sentença, para o juiz julgar o pedido monitório e converter o mandado inicial em mandado executivo, com a constituição do título executivo46.

44 Rectius, deverá!

45 Vale dizer, o art. 475-I do Código de Processo Civil.

46 De acordo, na doutrina: “Resta indagar se, igualmente, se faz necessário algum ato judicial, na hipótese de faltarem os embargos, ou de virem eles intempestiva-mente. Parece-me que sim, e por mais de um motivo. Diferente do processo de execução, com o qual não se confunde porque relação cognitiva, dependerá de uma sentença, como acontece em qualquer outro processo. Seria temerário proce-der-se à execução sem um ato judicial de reconhecimento da constituição do títu-lo – título executivo judicial, como está no art. 1.102-C, criado pela atividade ju-risdicional pelo Estado – porque a ausência dos embargos não implica, necessa-riamente, a consolidação do título provisório, representado pelo mandado. Pense--se, por exemplo, na citação inexistente, ou nula, que acarreta a invalidade do processo e impede a configuração da contumácia do réu. Por conseguinte, urge que se profira uma sentença declaratória positiva de que se operou, de pleno di-reito, a constituição aludida no art. 1.102-C. Essa sentença completa a formação do título executivo judicial, consolidando-o, tanto quanto a sentença de rejeição dos embargos, prevista no § 3º” (Sergio Bermudes, Ação monitória: primeiras impressões sobre a Lei n. 9.079, de 14.7.1995, in: EstudosdedireitoprocessualemmemóriadeLuizMachadoGuimarães, Coordenação de José Carlos Barbosa Moreira, 1. ed., 2. tir., 1999, p. 276-277). Com igual opinião, também na doutrina: “Não embargada a ação monitória, será proferida sentença (constituição do título exe-

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Não obstante, como já anotado, prevalece o entendimento segundo o qual a inércia do réu diante da citação ocasiona a imediata conversão do mandado inicial em mandado executivo por força de lei, sem a pro-lação de sentença pelo juiz.

Por fim, a despeito do silêncio anterior, o réu, agora executado, pode aviar impugnação na fase de cumprimento da sentença, ainda que a respectiva defesa fique limitada às matérias arroladas no art. 475-L do Código de Processo Civil. Sem dúvida, o fato de o réu não ter veiculado embargos à monitória não gera preclusão em relação à impugnação do art. 475-L do Código de Processo Civil47. Não obstante, quando a de-manda sob o procedimento monitório é movida contra pessoa jurídica de direito público interno, incidem o art. 100 da Constituição Federal e os arts. 730, 731 e 741 do Código de Processo Civil. Por conseguinte, no lugar da impugnação prevista no art. 475-L, são admissíveis os embargos à execução dos arts. 730 e 741 do mesmo diploma48.

12. Contraposição mediante embargosCitado, o réu pode discordar e apresentar defesa mediante embar-

gos, dentro da quinzena disponível para o pagamento da soma em di-nheiro ou para a entrega da coisa. Com efeito, é de quinze dias o prazo disponível para a veiculação dos embargos à monitória, com fundamen-to nos arts. 1.102-B, infine, e 1.102-C, proêmio, ambos do Código de Processo Civil.

cutivo judicial), prosseguindo o feito com o cumprimento da sentença. O mesmo ocorre quando os embargos monitórios forem julgados improcedentes” (Bianca Oliveira de Farias e Milton Delgado Soares, Direitoprocessualcivil, v. I, 2009, p. 286).

47 Assim, na doutrina: “Pois bem: pensamos agora, como pensávamos antes da reforma empreendida pela Lei 11.232/2005, que não restará vedado ao réu da ação monitória apresentar resistência no âmbito da execução do título judicial. Ou seja, poderá ele reagir à execução ajuizada. (...) Da exposição, conclui-se que: a) não se cogita mais em manejo de embargos à execução quando houver título executivo proveniente de ação monitória, sendo caso de utilização da figura prevista no art. 475-L (impugnação), que possui rol blindado de matérias que podem ser arguidas (com cognição horizontal limitada)” (Rodrigo Mazzei, ReformadoCPC, v. I, 2006, p. 327 e 330).

48 Assim, na doutrina: Rodrigo Mazzei, ReformadoCPC, v. I, 2006, p. 330 (nota 11) a 336.

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Os embargos são veiculados mediante simples petição, endereçada ao mesmo juízo do processo sob o rito monitório. Feito o protocolo, a petição já é juntada no bojo dos autos do mesmo processo, consoante o disposto no art. 1.102-C, § 2º, do Código de Processo Civil. Com efeito, a petição dos embargos à monitória não passa pela distribuição nem depende de recolhimento de custas. Os embargos à monitória também não dependem da segurança do juízo, exvi do mesmo art. 1.102-C, § 2º. Sem dúvida, não há necessidade de penhora nem do depósito da quan-tia ou da coisa objeto do processo.

Veiculados os embargos pelo réu, há a imediata suspensão da efi-cácia do mandado inicial, com a consequente conversão do procedimen-to monitório em ordinário, por força do art. 1.102-C, § 2º, do Código de Processo Civil. Com efeito, a simples apresentação de embargos tempes-tivos suspende a eficácia do mandado inicial previsto no art. 1.102-B, até o posterior julgamento pelo juiz, já sob o procedimento ordinário, com a possibilidade de ampla discussão e de dilação probatória49.

No que tange à natureza jurídica, os embargos à monitória não se confundem com os embargos à execução previstos nos arts. 736 e 738 do Código de Processo Civil. Os embargos à execução têm natureza jurídi-ca de ação autônoma e formam novo processo, porquanto são veiculados mediante petição inicial50, têm autonomia procedimental51 e são julga-dos em sentença própria52. Já os embargos à monitória têm natureza jurídica de resposta defensiva do réu, porquanto são veiculados em petição simples e não têm autonomia procedimental, já que são juntados aos próprios autos do mesmo processo, o qual passa a seguir o procedi-mento ordinário, tudo nos termos do art. 1.102-C, § 2º, do Código de Processo Civil. Daí a conclusão: os embargos à monitória têm natureza de contestação.

Por fim, vale anotar que a natureza de contestação não é peculia-ridade dos embargos monitórios; os embargos previstos no art. 755 do

49 De acordo, na jurisprudência: “IV – Em relação à liquidez do débito e à oportu-nidade de o devedor discutir os valores, a forma de cálculo e a própria legitimi-dade da dívida, assegura-lhe a lei a via dos embargos, previstos no art. 1.102-C, que instauram amplo contraditório e levam a causa para o procedimento ordiná-rio” (4ª Turma do STJ, REsp 218.459/RS, DiáriodaJustiça, 20-9-1999, p. 68).

50 Cf. arts. 295 e 739, II, ambos do Código de Processo Civil.

51 Cf. art. 736, parágrafo único, do Código de Processo Civil.

52 Cf. art. 740 do Código de Processo Civil.

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Código de Processo Civil têm igual natureza jurídica. Na verdade, o termo “embargos” é equívoco no direito brasileiro e pode significar “ação”, “recurso” ou “contestação”, conforme o disposto na legislação. No que tange aos “embargos” previstos no art. 1.102-C, caput e parágra-fos, do Código de Processo Civil, o instituto é verdadeira contestação53.

13. Indeferimento liminar dos embargos monitóriosComo anotado no tópico anterior, os embargos monitórios são a

via processual defensiva à disposição do réu citado em demanda moni-tória, para impedir a conversão do mandado monitório em executivo e para converter o procedimento monitório em ordinário, com o prosse-guimento da cognição de forma ampla.

A dúvida surge quando o juiz de primeiro grau indefere os embar-gos monitórios inliminelitis, por intempestividade. Discute-se se há a prolação de decisão interlocutória agravável ou de sentença apelável.

53 Em abono, na jurisprudência: “Segundo a menslegis os embargos na ação moni-tória não têm ‘natureza jurídica de ação’, mas se identificam com a contestação. Não se confundem com os embargos do devedor, em execução fundada em título judicial ou extrajudicial, vez que inexiste ainda título executivo a ser desconstitu-ído” (2ª Seção do STJ, REsp 222.937/SP, DiáriodaJustiça, 2-2-2004, p. 265). No mesmo sentido, na doutrina: Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novocursodedirei-toprocessualcivil, v. II, 3. ed., 2007, p. 427; e Rodrigo Mazzei, ReformadoCPC, v. I, 2006, p. 323.

Em sentido contrário, todavia, há respeitável doutrina: “No prazo de quinze dias contados da juntada aos autos da prova da citação (mandado, precatória, aviso de recebimento da carta) o réu poderá oferecer embargos (art. 1.102-C). Os embar-gos, como identificou Liebman, são ação, de natureza declaratória ou constitutiva negativa, não havendo razão para considerá-los, no caso, somente defesa. São ação, como eram ação os embargos do devedor na ação executiva do Código de 1939” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivil, v. III, 17. ed., 2005, p. 263). “De-pois de forte perplexidade, cheguei à conclusão – nada definitiva, como tudo quanto se pensa em matéria científica, em especial quando se examina lei recente – de que esses embargos têm a natureza de ação: ação constitutiva, pela qual se busca o desfazimento da eficácia da determinação, contida no mandado inicial” (Sergio Bermudes, Ação monitória: primeiras impressões sobre a Lei n. 9.079, de 14.7.1995, in: EstudosdedireitoprocessualemmemóriadeLuizMachadoGuimarães, Coordenação de José Carlos Barbosa Moreira, 1. ed., 2. tir., 1999, p. 278). “Parece ser correto o entendimento da doutrina majoritária de que os embargos ao man-dado monitório têm natureza de ação, e não de contestação” (Daniel Amorim Assumpção Neves, Manualdedireitoprocessualcivil, 2009, p. 1325, item 80.14).

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Autorizada doutrina sustenta a primeira tese: decisão interlocutória agravável por instrumento54. À vista da lição doutrinária transcrita na nota, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais não conheceu de recurso de apelação55. Assim também decidiu o Tribunal de Justiça de Goiás, em acórdão, todavia, reformado pelo Superior Tribunal de Justiça56.

Ainda que muito respeitável o entendimento contrário, merece ser prestigiada a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça57, porquanto o indeferimento liminar dos embargos monitórios ocasiona o encerramento da cognição na demanda sob o procedimento monitório,

54 Cf. Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery, CódigodeProcessoCivilco-mentado, 4. ed., 1999, p. 1380, nota 5: “Indeferidos liminarmente os embargos, essa decisão se caracteriza como interlocutória, desafiando o recurso de agravo de instrumento (não retido)”. “O ato que indefere liminarmente os embargos não é sentença, porque não encerra nenhum processo, já que os embargos são defesa e não se processam em separado.”

55 Cf. 11ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 2.0000.00.486880-4/001, DiáriodaJusti-ça, 21-10-2005: “AÇÃO MONITÓRIA – EMBARGOS – INTEMPESTIVIDADE – APELAÇÃO – RECURSO INADEQUADO – AGRAVO DE INSTRUMENTO. O ato do MM. juiz que rejeita liminarmente os embargos monitórios, por intempes-tividade, é decisão interlocutória, pois não põe fim ao processo. O agravo de instrumento é recurso próprio para atacar decisão que resolve questão incidente no curso do processo”. Como anotado, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais prestigiou a autorizada lição dos Professores Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery, conforme revela o seguinte trecho extraído do voto-vencedor proferido pela Desembargadora Relatora, inverbis: “Nesse sentido, é também pertinente o entendimento de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery: ‘Indeferidos liminarmente os embargos, essa decisão se caracteriza como interlo-cutória, desafiando o recurso de agravo de instrumento (não retido). (...) O ato que indefere liminarmente os embargos não é sentença, porque encerra nenhum pro-cesso, já que os embargos são defesa e não se processam em separado. (...)’ (Códi-godeProcessoCivilcomentado, 8. ed., 2004, p. 1314) (grifo nosso). Mediante tais considerações, não conheço da apelação, uma vez que se mostra recurso inade-quado para atacar a r. decisão interlocutória proferida” (cf. 11ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 2.0000.00.486880-4/001, DiáriodaJustiça, 21-10-2005).

56 Cf. 3ª Turma do STJ, REsp 803.418/GO, DiáriodaJustiça, 9-10-2006, p. 300.

57 Cf. 3ª Turma do STJ, REsp 803.418/GO, DiáriodaJustiça, 9-10-2006, p. 300: “Re-curso especial. Ação monitória. Recurso cabível contra decisão que rejeita liminar-mente os embargos. Apelação. – Deve ser interposta apelação contra a decisão que rejeita liminarmente os embargos à monitória ou os julga improcedentes, pois, nesta hipótese, há extinção do processo de conhecimento com resolução de méri-to em razão do acolhimento do pedido do autor, sendo inaugurada a fase execu-tória. Recurso especial conhecido e provido”.

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com o início da execução mediante cumprimento de sentença, tudo consoante o disposto nos arts. 475-I, 475-J e 1.102-C, caput, todos do Código de Processo Civil.

Com efeito, o indeferimento liminar dos embargos à monitória implica encerramento do conhecimento e início da execução, com a conclusão em favor da procedência do pedido objeto da demanda, em razão da conversão prevista no caputdo art. 1.102-C. Daí a compatibili-dade com o disposto nos arts. 162, § 1º, e 269, I, com o consequente ca-bimento do recurso de apelação, sem prejuízo, entretanto, da aplicação da fungibilidade recursal, com a igual admissibilidade de eventual re-curso de agravo de instrumento, à vista do art. 579, caput e parágrafo único, do Código de Processo Penal, aplicável por força do art. 126 do Código de Processo Civil.

14. ReconvençãoFixadas as premissas de que os embargos à monitória têm nature-

za de contestação e ocasionam a conversão do procedimento em ordiná-rio, não há dúvida de que o réu também pode aviar reconvenção, nos termos dos arts. 297 e 299 do Código de Processo Civil. Em abono à conclusão defendida no presente compêndio, vale conferir o Enunciado 292 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça: “A reconvenção é cabível na ação monitória, após a conversão do procedimento em ordinário”58.

Na eventualidade de o juiz indeferir a petição inicial da reconven-ção, cabe recurso de agravo de instrumento, tendo em vista a natureza

58 Em sentido contrário, todavia, há respeitável doutrina: “A natureza e a finalidade dos embargos mostram-se incompatíveis com a possibilidade de reconvenção, conquanto eles constituem relação processual cognitiva diferente do processo da ação monitória” (Sergio Bermudes, Ação monitória: primeiras impressões sobre a Lei n. 9.079, de 14.7.1995, in: EstudosdedireitoprocessualemmemóriadeLuizMa-chadoGuimarães, Coordenação de José Carlos Barbosa Moreira, 1. ed., 2. tir., 1999, p. 279). “Afastado o entendimento de que os embargos possuem natureza jurídi-ca de contestação, mostra-se de singular infelicidade a Súmula 292 do STJ, ao admitir a reconvenção a ser proposta pelo réu da demanda monitória. (...) Prefiro o entendimento de que a reconvenção realmente é inviável, mas ao autor dos embargos ao mandado monitório é plenamente admissível o ingresso de uma nova demanda autônoma, conexa com a demanda monitória, pela qual postule contra o autor da mesma forma que faria numa reconvenção” (Daniel Amorim Assumpção Neves, Manualdedireitoprocessualcivil, 2009, p. 1326 e 1327).

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interlocutória do pronunciamento, porquanto o indeferimento se dá no bojo do mesmo processo, o qual prossegue na fase cognitiva por força da demanda primitiva.

Além da contestação e da reconvenção, também há lugar para as outras respostas disponíveis aos réus em geral: impugnação ao valor da causa, exceção de incompetência relativa, exceção de suspeição e exceção de impedimento, tudo nos termos dos arts. 261 e 297 do Código de Pro-cesso Civil59.

15. Julgamento dos embargos admitidosOpostos e admitidos os embargos à monitória pelo juiz há a sus-

pensão do mandado de pagamento ou entrega, com a conversão do procedimento em ordinário, a fim de que o réu tenha assegurada a am-pla defesa, com dilação probatória.

Findo o processamento sob o rito ordinário, o juiz profere sentença, quando julga os embargos mediante sentença. Da sentença cabe apela-ção60, em quinze dias, nos termos dos arts. 508 e 513 do Código de Processo Civil.

Rejeitados os embargos mediante sentença de procedência do pe-dido monitório, forma-se o título judicial idôneo para a execução à luz dos arts. 475-I a 475-R, todos do Código de Processo Civil, consoante a regra consagrada no art. 1.102-C, § 3º, do mesmo Código. Não obstante, a regra comporta exceção: na eventualidade de a monitória ter sido movida contra a Fazenda Pública, incidem os arts. 730, 731 e 741 do Código de Processo Civil e o art. 100 da Constituição Federal61.

59 Assim, na jurisprudência: “– A ação monitória, com a impugnação do réu através de embargos, se torna ação normal de conhecimento regida pelo procedimento ordinário podendo, assim, dar ensejo a exceções processuais, reconvenção inclu-sive” (5ª Turma do STJ, REsp 147.945/MG, DiáriodaJustiça, 9-11-1998, p. 133).

60 De acordo, na jurisprudência: “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO. AÇÃO MO-NITÓRIA. EMBARGOS. RECURSO CABÍVEL. APELAÇÃO. I. Cabe apelação da decisão que rejeita os embargos opostos em ação monitória. II. Agravo im-provido” (4ª Turma do STJ, AG 539.424/DF – AgRg, DiáriodaJustiça, 29-3-2004, p. 248). “PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. EMBARGOS. JULGAMEN-TO. RECURSO CABÍVEL. APELAÇÃO. CPC, ARTS. 162, § 1º, 515 E 1.102-C, § 2º. I. Cabe apelação da decisão que rejeita os embargos opostos pelo réu em ação monitória” (4ª Turma do STJ, REsp 171.350/SP, DiáriodaJustiça, 4-2-2002, p. 367).

61 A respeito da exceção, merece ser prestigiada a lição do Professor Rodrigo Mazzei: ReformadoCPC, v. I, 2006, p. 330 (nota 11) a 336.

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16. Efeito suspensivo e apelação contra sentença em embar-gos à monitória

Consoante anotado no tópico anterior, após o oferecimento pelo réu e a admissão para processamento pelo juiz, os embargos monitórios são julgados mediante sentença apelável. Resta saber quais os efeitos do recebimento da apelação.

O antigo Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo assentou que a exceção ao efeito suspensivo prevista no inciso V do art. 520 do Código de Processo Civil não alcança a apelação interposta contra sen-tença proveniente de embargos à monitória, nos termos do Enunciado 47: “A apelação interposta da sentença que julga os embargos ao man-dado monitório será recebida, também, no efeito suspensivo”62.

À vista das premissas fixadas no anterior tópico 12, o Enunciado 47 merece ser prestigiado. Com efeito, os embargos à monitória não se con-fundem com os embargos à execução previstos nos arts. 520, V, e 736, ambos do Código de Processo Civil. Os embargos à execução têm natu-reza jurídica de ação autônoma e formam novo processo, porquanto são veiculados mediante petição inicial, têm autonomia procedimental e são julgados em sentença própria. Já os embargos à monitória têm natureza jurídica de defesa do réu, de verdadeira contestação, porquanto são vei-culados em petição simples e não têm autonomia procedimental, tanto que os embargos à monitória são juntados aos próprios autos do proces-so já em curso, o qual passa a seguir o procedimento ordinário, tendo em vista o disposto no art. 1.102-C, § 2º, do Código de Processo Civil.

Ora, se os embargos à monitória são julgados em processo sob o procedimento ordinário, ou seja, o procedimento comum adotado como regra pelo Código de Processo Civil63, também deve incidir a regra consagrada no proêmio do caput do art. 520, qual seja, o recebimento da apelação também no efeito suspensivo, porquanto uma regra atrai a incidência da outra.

62 Órgão Especial, Uniformização de Jurisprudência 831.423-2/01, DiáriodaJustiça, 10-11-1999, JTA, v. 180, p. 290. Ainda no mesmo sentido, também há precedentes jurisprudenciais do STJ colacionados em nota subsequente.

63 Cf. arts. 271, 272, parágrafo único, segunda parte, e 274, todos do Código de Processo Civil.

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Ademais, a combinação do § 3º do art. 1.102-C com o art. 475-I64 não permite a conclusão de que a sentença tem eficácia imediata, por-quanto o proêmio do § 1º do próprio art. 475-I é compatível com a regra consagrada no caputdo art. 520, segundo a qual a apelação também é recebida no efeito suspensivo, sem possibilidade de execução antes do trânsito em julgado. Ainda à luz do § 1º do art. 475-I, só há a execução imediata na excepcional pendência de algum recurso sem efeito suspen-sivo65. Não obstante, tal como a segunda parte e os incisos do art. 520 são exceções no sistema, a segunda parte do § 1º do art. 475-I também é excepcional. A regra reside no proêmio tanto do § 1º do art. 475-I quanto do caput do art. 520: em regra, a apelação produz efeito suspensivo e não há lugar para execução alguma antes do trânsito em julgado. O raciocí-nio também alcança a apelação proveniente dos embargos à monitória, porquanto o § 3º do art. 1.102-C atrai a incidência do art. 475-I, cujo § 1º está em harmonia com os arts. 520 e 521 do mesmo diploma.

Sopesados todos os argumentos, exsurge a conclusão de que a apelação interposta contra a sentença proveniente dos embargos à mo-nitória também tem efeito suspensivo66. Aliás, o recebimento do recurso

64 Preceito que deve ser aplicado por força do § 3º do art. 1.102-C.

65 Por exemplo, os recursos previstos no § 2º do art. 542 do Código de Processo Civil.

66 Assim, na jurisprudência: “AÇÃO MONITÓRIA. EMBARGOS JULGADOS IM-PROCEDENTES. RECEBIMENTO DA APELAÇÃO NO DUPLO EFEITO. Inapli-cabilidade da regra inscrita no art. 520, inc. V, do CPC, uma vez que, tratando-se de norma de exceção, deve ser interpretada restritivamente” (4ª Turma do STJ, REsp 170.482/SC, DiáriodaJustiça, 12-4-1999, p. 160). “AÇÃO MONITÓRIA. Embargos. Apelação. Efeitos. Tem duplo efeito a apelação interposta de sentença que julga improcedentes os embargos opostos na ação monitória. Interpretação restritiva do disposto no art. 520, V, do CPC. Precedente. Recurso conhecido e provido” (4ª Turma do STJ, REsp 207.750/SP, DiáriodaJustiça, 23-8-1999, p. 133). De acordo, na doutrina: “Com efeito, por não ter ocorrido (ainda) alteração no rol do art. 520 do CPC, deverá prevalecer o entendimento (já sedimentado) de que o recurso que desafia a decisão de rejeição dos embargos monitórios deve ser rece-bido no duplo efeito, isto é, conferindo-se efeito suspensivo. Sem a retificação no art. 520 do CPC, não nos parece possível, diante do quadro atual e apenas com a sistemática introduzida pela Lei 11.232/2005, afirmar que será possível a execução provisória em título decorrente de ação monitória, caso a decisão que rejeitar os embargos seja impugnada via recurso de apelação” (Rodrigo Mazzei, Ação mo-nitória, in: ReformadoCPC, v. I, 2006, p. 337-338 e nota 18). Também com igual opinião, ainda na doutrina: “omissis, merecendo elogios a corrente doutrinária que defende o recebimento da apelação no duplo efeito, pelo menos até modificação

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também no efeito suspensivo alcança a apelação interposta da sentença de improcedência do pedido monitório (ou seja, de acolhimento dos embargos à monitória), bem como a apelação interposta da sentença de procedência do pedido monitório (ou seja, de rejeição dos embargos à

legislativa” (Daniel Amorim Assumpção Neves, Manualdedireitoprocessualcivil, 2009, p. 1328).

Autorizada doutrina, todavia, sustenta respeitável tese contrária ao raciocínio de-fendido no presente compêndio: “No prazo de quinze dias contados da juntada aos autos da prova da citação (mandado, precatória, aviso de recebimento da carta) o réu poderá oferecer embargos. Os embargos, como identificou Liebman, são ação, de natureza declaratória ou constitutiva negativa, não havendo razão para consi-derá-los, no caso, somente defesa. São ação, como eram ação os embargos do deve-dor na ação executiva do Código de 1939. Se o legislador se utilizou da figura dos embargos foi para dar à defesa a forma de ação, com todas as consequências que daí resultam, em especial a inversão dos ônus da iniciativa da prova. Além disso, a sentença somente será proferida nos embargos se forem apresentados, e dela cabe-rá apelação sem efeito suspensivo, como preceitua o art. 520, V” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 15. ed., 2002, p. 261). O Professor Sergio Bermudes também sustenta a tese de que “a apelação da sentença dos embargos não produz efeito suspensivo, diante do art. 520, V, com a redação do art. 1º da Lei n. 8.950, de 13-12-1994” (Ação monitória: primeiras impressões sobre a Lei n. 9.079, de 14-7-1995, in: EstudosdedireitoprocessualemmemóriadeLuizMachadoGuimarães, Coordenação de José Carlos Barbosa Moreira, 1. ed., 2. tir., 1999, p. 279). É a tese também defendida pelo Professor Antônio Carlos Marcato: “Apesar dessas judicio-sas ponderações – e apesar, mesmo, do silêncio da Lei 9.079, de 14-07-1995 –, cremos ser perfeitamente sustentável, diante da natureza dos embargos ao mandado e do escopo do processo monitório (a pronta obtenção, em caso de omissão do réu ou de rejeição de seus embargos, de título executivo judicial, seguida de imediata execu-ção), a aplicação, por analogia, do contido no inciso V do art. 520 do Código também para a apelação interposta contra a sentença de rejeição dos embargos de início re-feridos” (A sentença dos embargos ao mandado monitório, in: Aspectospolêmicoseatuaisdosrecursos, 2000, p. 32). “De outro lado, porém, entendemos que a apelação contra a sentença que julga procedente a demanda monitória (rejeitando os embar-gos ao mandado) deve ser recebida sem efeito suspensivo. O fundamento de nossa tese, porém, não é a aplicação analógica do art. 520, V, do CPC, que nos parece, como dito, impossível. A nosso sentir à ausência de efeito suspensivo a hipótese decorre do disposto no § 3º do art. 1.102-C do Código de Processo Civil. Nos termos do aludido dispositivo, ‘rejeitados os embargos’ intima-se o devedor, ‘prosseguindo-se’ com a execução. Afirma o dispositivo, pois, que a execução se inicia logo após a ‘rejeição dos embargos’, bastando, assim, a prolação da sentença para que se inicie a produção dos efeitos da sentença liminar que determinou a expedição do manda-do monitório, não exigindo a lei processual que se aguarde o julgamento da apela-ção para que aquela eficácia comece a se manifestar” (Alexandre Freitas Câmara, Liçõesdedireitoprocessualcivil, v. III, 12. ed., 2007, p. 557).

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monitória). Diante do duplo efeito da apelação interposta contra a sen-tença, não há lugar para execução alguma, nem mesmo provisória, na pendência do recurso apelatório, em virtude da subsistência da suspen-são ocasionada pela oposição dos embargos à monitória67.

67 Em sentido contrário, há respeitável doutrina: Vicente Greco Filho, Direitoproces-sualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 264.

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Tomo II

RECUPERAÇÕES EMPRESARIAIS E FALÊNCIAS

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CApíTulO

iTeoriA GerAl do direiTo reCuPerACionAl e FAlimenTAr

1. ConceitoO direito recuperacional e falimentar é o sub-ramo do direito co-

mercial (rectius, direito empresarial) que versa sobre a recuperação em-presarial dos empresários e das sociedades empresárias em crise econô-mico-financeira, e também sobre a falência ou quebra daqueles que não merecem continuar a exercer a atividade empresarial.

2. Notícia históricaA regra da vida em sociedade é a quitação das dívidas pelos deve-

dores em prol dos credores. Na eventualidade, todavia, de inadimple-mento do devedor, o credor pode acionar o Poder Judiciário, a fim de que o patrimônio daquele (devedor) seja alcançado e ocorra a satisfação do crédito, mediante a respectiva execução forçada, a qual pode ser in-dividual ou concursal e ter a natureza civil ou comercial (mais especifi-camente, falencial), conforme o caso.

Diante da existência de várias dívidas, sem o correspondente lastro no patrimônio do devedor, a regra da execução individual dá lugar à concursal, marcada pela execução dos credores de forma coletiva. Assim, ao invés de inúmeras execuções individuais contra o mesmo devedor insolvente, há apenas uma execução, com a igualdade de tratamento entre os credores, a fim de que os credores em geral tenham as mesmas oportunidades na tentativa da satisfação dos respectivos créditos, tudo em homenagem ao princípio da parconditiocreditorum1, consagrado nos arts. 91, parágrafo único, 115, 126 e 149, §§ 1º e 2º, todos da Lei n. 11.101/2005.

1 Paridade de condições dos créditos.

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A execução do devedor civil ocorre consoante sua solvência2 ou insolvência3, bem assim é processada conforme a existência de um ou mais credores, hipótese (mais de um credor) na qual há a execução uni-versal do devedor civil, também denominada concurso de credores4.

Além da execução coletiva contra o devedor civil insolvente, há a falência propriamente dita, a qual tem em mira o empresário individual e a sociedade empresária. Com efeito, a execução concursal – ou coletiva5 – de empresário ou sociedade empresária é denominada falência ou quebra, terminologia utilizada no antigo Código Comercial de 1850, cuja Parte Terceira tinha o seguinte título: “DAS QUEBRAS”. É certo que os respectivos arts. 797 a 913 do Código de 1850 foram revogados com o advento do Decreto-Lei n. 7.661/45, intitulado “Lei de Falências”. Em seguida, com a superveniência da Lei n. 11.101/2005, houve a revogação do Decreto-Lei n. 7.661/45, porquanto a novel lei é o diploma em vigên-cia que dispõe sobre “a recuperação judicial, extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária”.

À luz da novel Lei n. 11.101/2005, fica evidente a atual opção do legislador pela decretação da falência apenas quando não há possibili-dade alguma de recuperação do empresário individual ou da sociedade empresária. Com efeito, o novo diploma tem como escopo principal a recuperação do empresário e da sociedade empresária cujas dívidas contraídas prejudicam ou até impossibilitam o regular exercício da res-pectiva atividade econômica. Diante do escopo consubstanciado na preservação da empresa6, a Lei n. 11.101/2005 apresenta três formas para evitar a decretação da falência: recuperação judicial (arts. 47 a 69),

2 Cf. arts. 646 e s. do Código de Processo Civil.

3 Cf. arts. 748 e s. do Código de Processo Civil.

4 Cf. art. 751, III, do Código de Processo Civil.

5 De acordo, na doutrina: “Quando um devedor comerciante não paga suas obri-gações, instaura-se contra ele execução coletiva” (Celso Agrícola Barbi, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. I, 9. ed., 1994, p. 86, n. 126).

6 De acordo, na jurisprudência: “III – No moderno Direito falimentar, o interesse social preponderante é manter a empresa em atividade (L. 11.101/05, Art. 1º)” (3ª Turma do STJ, REsp 971.215/RJ, DiáriodaJustiça, 15-10-2007, p. 268). Assim, na doutrina: “A preservação da atividade negocial é o ponto mais delicado do regime jurídico de insolvência. Só deve ser liquidada a empresa inviável, ou seja, aquele que não comporta uma reorganização eficiente ou não justifica o desejável resga-te” (Waldo Fazzio Júnior, Manualdedireitocomercial, 7. ed., 2006, p. 629).

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recuperação especial (arts. 70 a 72) e recuperação extrajudicial (arts. 161 a 167). Com efeito, são novos institutos jurídicos que consagram o prin-cípio da preservação da empresa, em razão da importância da respecti-va subsistência para os empregados, os consumidores e até para o Fisco.

Do exposto, já é possível saber qual execução é mais favorável ao devedor: a civil ou a falimentar? Não há dúvida de que há importantes vantagens na Lei n. 11.101/2005, em relação à legislação civil7. Em primei-ro lugar, o empresário e a sociedade empresária são beneficiados pela re-cuperação, instituto por meio do qual é possível ampliar o prazo para o pagamento de dívida e até reduzir o seu valor. Sob outro prisma, o empre-sário e a sociedade empresária são favorecidos pela extinção das obrigações em razão do pagamento de mais de cinquenta por cento dos créditos qui-rografários, com o ativo disponível do devedor (art. 158, II). Daí a impor-tância da discussão quanto aos sujeitos excluídos da incidência da Lei n. 11.101/20058, total ou parcialmente, tema do tópico subsequente.

3. Sujeitos da recuperação empresarial e da falênciaComo revelam tanto o comando quanto o art. 1º da Lei n.

11.101/2005, o novel diploma versa sobre a recuperação e a falência do empresário individual e da sociedade empresária. Daí a incidência do art. 966 do Código Civil de 2002: “Considera-se empresário quem exer-ce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”. Com efeito, o conceito de em-presário é extraído do art. 966 do Código Civil, c/c os arts. 967 e 982 do mesmo diploma de 2002. Por conseguinte, o conceito de empresário tem sentido amplo, de forma a alcançar não só o empresário individual (arts. 966 e 967), mas também a sociedade empresária (arts. 967 e 982, caput, primeira parte).

7 De acordo, na doutrina: “Ao empresário, quando insolvente, o direito nacional destina um regime jurídico próprio. Excepcionando o concurso de credores pre-visto no CPC (arts. 751 e s.), submete-o ao sistema falimentar. Este lhe confere a possibilidade de obter recuperação. Pode solucionar seu passivo obrigacional em condições mais vantajosas que aquelas proporcionadas ao devedor civil e, confor-me o caso, até escapar do exício negocial” (Waldo Fazzio Júnior, Manualdedireitocomercial, 7. ed., 2006, p. 59).

8 Além das vantagens provenientes da Lei n. 11.101/2005, a natureza empresarial também enseja outros benefícios legais, como a garantia da renovação compulsó-ria do contrato de aluguel, prevista na Lei n. 8.245/91.

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À luz do art. 966 do Código Civil de 2002, só é considerado empre-sário aquele que tem como profissão alguma atividade econômica orga-nizada atinente à produção ou à circulação de bens ou serviços. A ideia de profissão pressupõe o exercício habitual (habitualidade9), por inter-médio de pessoas contratadas (pessoalidade) para concretizarem a produção ou a circulação de bens ou serviços em relação aos quais o empregador tem conhecimento específico (monopólio das informações). Já a expressão legal “atividade econômica” significa empreendimento em busca do lucro. A atividade econômica deve ser organizada, em razão da interligação do capital, com a mão de obra (empregados), com os insumos (matéria-prima) e com a tecnologia (conhecimentos próprios para a produção de bens, a prestação de serviços ou a circulação de ambos). Por fim, a produção consiste na fabricação de bens e na presta-ção de serviços, enquanto a circulação significa intermediação, ou seja, fazer a ligação entre o produtor e o consumidor (dos bens ou serviços)10.

O empresário pode ser tanto pessoa natural (ou seja, pessoa física) quanto pessoa jurídica. A pessoa física é o empresário individual (ou seja, o empresário unipessoal, empresário singular). Já a pessoa jurídica é a sociedade empresária, constituída por pessoas naturais unidas na busca do lucro comum, denominadas sócios. Tanto o empresário indivi-dual (incluído o respectivo espólio11) quanto a sociedade empresária (e também os respectivos sócios de responsabilidade ilimitada12) são su-jeitos da recuperação empresarial e da falência13, em razão da incidência da Lei n. 11.101/2005.

9 Vale dizer, “a profissionalidade habitual da mercancia”, consoante a expressão do Professor Waldo Fazzio Júnior (Manualdedireitocomercial, 7. ed., 2006, p. 50).

10 Assim, na doutrina: Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, v. III, 7. ed., 2007, p. 247.

11 Cf. arts. 48, parágrafo único, 97, II, e 125, todos da Lei n. 11.101/2005.

12 Cf. arts. 81 e 190 da Lei n. 11.101/2005.

13 De acordo, na doutrina: “Para os fins da LRE (Lei de Recuperação de Empresas), identifica-se como empresário tanto a pessoa física que, em seu próprio nome, exercita profissionalmente atividade negocial com intuito de lucro, como a pessoa jurídica nas mesmas condições. Ou seja, tanto o empresário unipessoal como a sociedade empresária são destinatários legais dos mecanismos judiciais de recu-peração e falência. Conquanto seja evidente o maior grau de complexidade estru-tural da sociedade empresária, a LRE não dispensou expresso tratamento diferen-ciado para empresários singulares e pessoas jurídicas empresárias” (Waldo Fazzio Júnior, Manualdedireitocomercial, 7. ed., 2006, p. 631). Por oportuno, o Professor Fazzio Júnior reitera a precisa lição no bojo da página 673: “Este pode ser pessoa natural (empresário) ou pessoa jurídica (sociedade empresária)”.

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O mesmo não ocorre, entretanto, com as pessoas físicas e jurídicas regidas pelo direito civil, como as sociedades simples (também denomi-nadas sociedades civis14) e as sociedades cooperativas15. Com efeito, as sociedades cooperativas jamais são empresariais, razão pela qual não são alcançadas pela Lei n. 11.101/2005 (cf. arts. 982, infine e parágrafo único, segunda parte, 1.093 e 1.096, todos do Código Civil, e art. 4º da Lei n. 5.764/71).

Algumas atividades econômicas também são consideradas civis por força de lei. Não são empresários, por exemplo, os profissionais in-telectuais que exercem atividades de natureza científica, literária ou artística, ainda que com a participação e com o auxílio de empregados. É o que revela a primeira parte do parágrafo único do art. 966 do Códi-go Civil de 2002: “Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda que com o concurso de auxiliares ou colaboradores”. Se, entretanto, a atividade econômica perder o caráter individual e o profissional deixar de ser o centro da atividade, incide a exceção contida na parte final do mesmo parágrafo único do art. 966 (“salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa”), razão pela qual deixa de ser profissional inte-lectual regido pelo direito civil e passa a ser empresário sujeito à inci-dência da Lei n. 11.101/2005.

No que tange ao profissional que exerce atividade rural, a distinção entre aquele que é considerado empresário para o civil depende exclu-

14 Como bem revela o art. 786 do Código de Processo Civil, as sociedades civis (rectius, sociedades simples) em insolvência estão sujeitas ao regime de execução civil previsto nos arts. 748 a 786-A daquele Código.

15 No mesmo sentido, na jurisprudência: “3. As sociedades cooperativas não se sujeitam à falência, dada a sua natureza civil e atividade não empresária, devendo prevalecer a forma de liquidação extrajudicial prevista na Lei 5.764/71, que não prevê a exclusão da multa moratória pleiteada pela recorrente, nem a limitação dos juros moratórios, posteriores à data da liquidação judicial, à hipótese de existência de saldo positivo no ativo da sociedade. 4. A Lei de Falências vigente à época – Decreto-Lei n. 7.661/45 – em seu art. 1º, considerava como sujeito passivo da falência o comerciante, assim como a atual Lei 11.101/2005, que a revogou, atribui essa condição ao empresário e à sociedade empresária. No mesmo sentido, a norma insculpida no art. 982, § único c/c art. 1.093, do Código Civil de 2002, corroborando a natureza civil das referidas sociedades, razão pela qual não lhes são aplicáveis os preceitos legais da Lei de Quebras às cooperativas” (1ª Turma do STJ, REsp 770.861/SP, DiáriodaJustiça, 8-10-2007, p. 214).

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sivamente da inscrição perante a Junta Comercial. À vista do art. 971 do Código Civil, o profissional rural que efetuar a inscrição na Junta Co-mercial passa a ser considerado empresário, razão pela qual fica subme-tido ao regime da Lei n. 11.101/2005. Em contraposição, o profissional rural sem inscrição na Junta Comercial é considerado civil e fica sujeito ao disposto nos Códigos Civil e de Processo Civil.

Além da exclusão das sociedades simples, das sociedades coope-rativas e dos profissionais civis arrolados nos arts. 966, parágrafo único, primeira parte, 971 e 982 do Código Civil, o art. 2º da Lei n. 11.101/2005 também afasta outras sociedades do regime especial da recuperação e da falência, independentemente da natureza empresarial das sociedades16.

Em primeiro lugar, o art. 2º da Lei n. 11.101/2005 afasta a incidên-cia do regime recuperativo-falimentar em relação às empresas públicas e às sociedades de economia mista, porquanto são entidades da admi-nistração pública indireta, razão pela qual ficam totalmente excluídas daquele regime jurídico (recuperativo-falimentar).

Em seguida, o art. 2º afasta a incidência da Lei n. 11.101/2005 em relação às instituições financeiras públicas e privadas, cooperativas de crédito, consórcios, entidades de previdência complementar, sociedades operadoras de plano de assistência à saúde, sociedades seguradoras, sociedades de capitalização e outras entidades legalmente equiparadas, todas submetidas ao regime especial de liquidação extrajudicial previs-to em leis específicas17. A exclusão do regime consagrado na Lei n. 11.101/2005, todavia, não é absoluta, porquanto, ainda que de forma indireta, aquelas sociedades podem ser atingidas pela falência, em mo-mento posterior à liquidação extrajudicial, em razão do disposto no art. 197 da Lei n. 11.101/2005: “esta Lei aplica-se subsidiariamente”.

Por fim, situação peculiar é a dos empresários e das sociedades empresárias irregulares, ou seja, que exercem atividade empresarial sem

16 Assim, na doutrina: “Note-se, contudo, que nem todo exercente de atividade econômica empresarial encontra-se sujeito à falência. Alguns empresários, embo-ra produzam ou circulem bens ou serviços por empresas organizadas estão exclu-ídos do direito falimentar. Na verdade, a lei prevê hipóteses de exclusão total ou parcial do regime falencial” (Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, v. III, 7. ed., 2007, p. 247-248).

17 Cf. Decreto n. 22.456/93, Decreto-Lei n. 73/66, Lei n. 5.768/71, Lei n. 6.024/74, Lei n. 9.656/98, Lei n. 10.190/2002.

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o cumprimento do disposto nos arts. 967 e 1.150, primeira parte, ambos do Código Civil de 2002. Os empresários e as sociedades irregulares não são beneficiados pela recuperação empresarial, mas podem ser alcança-dos pela falência18, até mesmo em razão da possibilidade do requeri-mento da autofalência (art. 105, IV, segunda parte, da Lei n. 11.101/2005).

18 De acordo, na doutrina: “A falência incide tanto sobre o empresário ou sociedade empresária regular, como sobre o empresário de fato, mas a recuperação só alcan-ça os que praticam a empresa conforme a lei. (...) Para fins falitários, a inscrição no registro do comércio não é, pois, requisito indispensável à qualificação do empresário” (Waldo Fazzio Júnior, Manualdedireitocomercial, 7. ed., 2006, p. 637).

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CApíTulO

iiinsTiTuTos Comuns Às reCuPerAções emPresAriAis

e Às FAlÊnCiAs

1. Administração da recuperação empresarial e da falência

1.1. Conceito de administrador judicial

O administrador judicial é o auxiliar do juízo1 nomeado pelo juiz da recuperação judicial ou da falência, para zelar pelo regular seguimento do processo e pela conservação os bens sujeitos à sua guarda, sob a fiscalização do próprio juiz e do Comitê de Credores (se e quando constituído o órgão). Na verdade, o atual administrador judicial da Lei n. 11.101/2005 ocupa o lugar dos anteriores comissá-rio e síndico do antigo Decreto-Lei n. 7.661/45, na concordata e na falência, respectivamente.

Em suma, o juiz preside, dirige o processo (cf. art. 125 do Código de Processo Civil); já o administrador judicial, auxiliar daquele (cf. art. 139 do Código de Processo Civil), é o administrador do processo, por-quanto exerce as atribuições insertas no art. 148 do Código de Processo Civil, além das arroladas no art. 22 da Lei n. 11.101/2005.

1.2. Nomeação

Compete ao juiz nomear o administrador judicial, com a observân-cia do disposto no art. 21 da Lei n. 11.101/2005. O administrador judicial deve ser profissional idôneo, da confiança do juiz. Sempre que possível, o administrador judicial deve ser nomeado entre algum dos seguintes

1 Cf. art. 139 do Código de Processo Civil e art. 189 da Lei n. 11.101/2005.

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profissionais, observada a ordem de preferência do art. 21: advogado, economista, administrador de empresas ou contador. O juiz pode, entre-tanto, optar pela nomeação de pessoa jurídica especializada (em presta-ção de serviços de consultoria empresarial). Em suma, tanto pessoa na-tural quanto pessoa jurídica podem ser nomeadas pelo juiz.

A nomeação pelo juiz, todavia, não obriga o profissional designado, o qual pode recusar a respectiva nomeação.

1.3. Impedidos

Não pode ser nomeado administrador judicial o profissional que exerceu o cargo de administrador judicial ou foi membro de Comitê em processo de recuperação ou de falência nos últimos cinco anos, se foi destituído, deixou de prestar contas ou teve a prestação desaprovada (art. 30).

Também não pode ser nomeado administrador judicial o profissio-nal que tiver relação de parentesco ou afinidade até o terceiro grau com o empresário individual, os administradores, os controladores ou repre-sentantes legais da sociedade empresária, bem assim o profissional que tiver relação de amizade, inimizade ou dependência com qualquer deles (art. 30, § 1º).

1.4. Arguição do impedimento do administrador

O empresário individual, os representantes legais da sociedade empresária, qualquer credor e o Ministério Público têm legitimidade para suscitar o impedimento mediante simples petição endereçada ao juiz, a fim de que o administrador judicial impedido seja substituído. O incidente é processado nos próprios autos2 e deve ser decidido pelo juiz no prazo de 24 horas após a conclusão (art. 30, §§ 2º e 3º). Trata-se, à evidência, de prazo impróprio, isto é, não sujeito à preclusão. Da respec-tiva decisão interlocutória cabe agravo de instrumento, em dez dias (art. 189 da Lei n. 11.101/2005, c/c os arts. 522 e 524 do Código de Processo Civil).

2 Com efeito, não incide o disposto no art. 299, infine, do Código de Processo Civil, porquanto o impedimento não é veiculado mediante exceção, mas, sim, por sim-ples petição.

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1.5. Assinatura do termo de compromisso

Após a nomeação pelo juiz, o administrador judicial será intimado pessoalmente (p. ex., mediante oficial de justiça) para assinar o termo de compromisso, quando assume a responsabilidade de desempenhar o cargo “bem e fielmente” (art. 33). O termo de compromisso deve ser assinado na sede do juízo, dentro das 48 horas seguintes à intimação da nomeação. Se o profissional nomeado não assinar o termo de compro-misso no prazo de 48 horas, o juiz deve nomear outro profissional, em substituição ao nomeado em primeiro lugar (art. 34).

Também é admissível a posterior substituição do administrador judicial. A substituição pode ocorrer por determinação do juiz ou por renúncia do próprio administrador judicial. Em regra, o administrador substituído tem direito à remuneração proporcional ao trabalho desem-penhado. Em contraposição, se renunciar sem razão relevante ou for destituído (pelo juiz) por dolo, culpa, desídia ou qualquer descumpri-mento das obrigações legais, o administrador perde o direito à remune-ração (art. 24, § 3º, da Lei n. 11.101/2005, e art. 150, primeira parte, do Código de Processo Civil).

1.6. Responsabilidade do administrador

Ao assinar o termo de compromisso, o administrador judicial as-sume todas as responsabilidades pelo bom e fiel desempenho do munus (art. 32 da Lei n. 11.101/2005, e art. 150 do Código de Processo Civil). Daí a responsabilidade do administrador pelos prejuízos que causar ao empresário (individual ou sociedade empresária) ou aos respectivos credores, em razão de dolo ou culpa (p. ex., imperícia). Por força do art. 22, tanto o juiz quanto o Comitê de Credores exercem a fiscalização do administrador judicial.

1.7. Atribuições do administrador judicial

Ao assinar o termo de compromisso, o administrador judicial pas-sa a ter várias atribuições, as quais são realizadas sob a fiscalização do juiz e do Comitê de Credores (se existente o último, por ser órgão de constituição facultativa).

As atribuições do administrador estão arroladas no art. 22. O rol, todavia, não é exaustivo, porquanto há “outros deveres”, como a obri-gação de verificar e classificar os créditos (art. 7º, § 2º). O art. 28 reforça

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a conclusão de que as atribuições arroladas no art. 22 não são exaustivas, porquanto também cabe ao administrador exercer as atribuições do Comitê de Credores, quando não constituído o órgão. O proêmio do art. 37 indica outra importante atribuição do administrador judicial: presidir a Assembleia Geral dos Credores. Não é só. Na eventualidade do afas-tamento do empresário individual ou do administrador da sociedade empresária da direção da atividade empresarial (art. 64), o administrador judicial ainda exerce a função de gestor até a Assembleia Geral deliberar sobre o nome do gestor judicial (art. 65), oportunidade na qual o admi-nistrador judicial assume de forma provisória a condução da atividade empresarial.

À luz do art. 22, a primeira obrigação do administrador (depois de assinar o termo de compromisso) é enviar correspondência aos credores constantes da relação nominal que acompanha a petição inicial, com a comunicação da data do pedido de recuperação judicial e da classificação inicial conferida aos créditos pelo empresário individual ou pela socie-dade empresária (arts. 22, I, a, 51, III, e 52, § 1º, II).

O administrador judicial também deve fornecer todas as informa-ções adicionais solicitadas pelos credores, sempre com a máxima pres-teza possível (art. 22, I, b). O administrador ainda deve conceder aos interessados os extratos dos livros comerciais e fiscais do empresário individual ou da sociedade empresária, a fim de permitir tanto a habili-tação quanto a impugnação dos créditos (art. 22, I, c). Para tanto, o ad-ministrador judicial pode exigir dos credores, do empresário individual e dos administradores da sociedade empresária todas as informações que julgar necessárias (art. 22, I, d). Denegadas as informações exigidas, o administrador judicial apresenta requerimento endereçado ao juiz, a fim de que as informações sejam prestadas pessoalmente em juízo, sob pena de crime de desobediência, em audiência com a presença do admi-nistrador judicial (art. 22, § 2º).

Apresentadas eventuais habilitações ou divergências (art. 7º, § 1º), cabe ao administrador judicial elaborar a Relação de Credores (arts. 7º, § 2º, e 22, I, e). Em seguida, o administrador deve providenciar a publi-cação de edital com a Relação de Credores e a indicação do local e do horário para que os credores, o Ministério Público, o empresário indivi-dual, os sócios da sociedade empresária e o Comitê tenham acesso aos documentos utilizados na elaboração daquela relação, para que possam veicular as eventuais impugnações (art. 8º). Após as impugnações e as respectivas decisões do juiz da recuperação (ou da falência, conforme o

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caso), cabe ao administrador consolidar o Quadro Geral dos Credores à luz da anterior Relação de Credores e das posteriores decisões proferidas pelo juiz nas impugnações oferecidas (arts. 18 e 22, I, f).

À vista do art. 22, I, g, compete ao administrador judicial requerer a convocação da Assembleia Geral dos Credores, a qual também pode ser requerida ao juiz sempre que o administrador julgar necessária a oitiva da assembleia.

No exercício das respectivas obrigações, o administrador judicial pode, após autorização judicial, contratar profissionais e empresas espe-cializadas para auxiliá-lo (art. 22, I, h, da Lei n. 11.101/2005, e art. 149, parágrafo único, do Código de Processo Civil), os quais são remunerados pelo empresário individual ou pela sociedade empresária (art. 25). As remunerações dos auxiliares do administrador serão fixadas pelo juiz, em razão da complexidade dos trabalhos a serem executados e dos va-lores praticados no mercado para o desempenho de atividades seme-lhantes (art. 22, § 1º).

Outra importante atribuição do administrador judicial é a de fisca-lização: o administrador deve sempre fiscalizar as atividades do empre-sário individual ou da sociedade empresária em recuperação judicial, bem assim o cumprimento do plano de recuperação (art. 22, II, a). Na eventualidade de descumprimento do plano de recuperação pelo em-presário individual ou pela sociedade empresária, cabe ao administrador judicial requerer a decretação da falência pelo juiz (art. 22, II, b).

Em decorrência da atividade de fiscalização que exerce, o adminis-trador judicial deve apresentar ao juiz relatório mensal das atividades do empresário individual ou da sociedade empresária (art. 22, II, c). Não é só. No prazo de quinze dias da sentença de encerramento da recupe-ração judicial, o administrador deve apresentar ao juiz relatório final sobre a execução do plano (arts. 22, II, d, e 63, III). Se o administrador judicial deixar de apresentar algum relatório, será intimado pessoalmen-te a fazê-lo no prazo de cinco dias, sob pena de crime de desobediência (art. 23).

Por fim, o administrador judicial também tem a obrigação de pres-tar as próprias contas ao juiz, no prazo de trinta dias do encerramento da recuperação (art. 63, I), sob pena de crime de desobediência (art. 23); na eventualidade, todavia, de substituição ou destituição no curso do processo, o administrador deve prestar as respectivas contas desde logo.

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1.8. Remuneração do administrador judicial

Em compensação às responsabilidades e às atribuições assumidas, o administrador judicial tem direito à remuneração fixada pelo juiz (art. 24, caput, da Lei n. 11.101/2005, e art. 149, caput, do Código de Processo Civil).

Após sopesar o grau de complexidade do trabalho, os valores pra-ticados no mercado de trabalho para o desempenho de atividades simi-lares e a capacidade de pagamento da empresa, cabe ao juiz indicar tanto o valor quanto a forma de pagamento da remuneração do admi-nistrador judicial. Trata-se de decisão interlocutória passível de impug-nação mediante agravo de instrumento, recurso que pode ser interposto pelo empresário individual, pela sociedade empresária, bem assim pelos demais legitimados previstos no art. 499 do Código de Processo Civil (p. ex., algum credor, o Ministério Público).

Quanto ao valor, a remuneração jamais pode ser superior a cinco por cento dos créditos pendentes (art. 24, § 1º, da Lei n. 11.101/2005).

No que tange à forma, não é admissível o imediato pagamento integral da remuneração ao administrador judicial. Quarenta por cento ficam reservados para pagamento somente depois da apresentação do relatório final da recuperação judicial pelo administrador, da aprovação do relatório final pelo juiz, da prestação de contas pelo administrador e do julgamento das contas pelo juiz (arts. 24, § 2º, 63, I, e 154).

A propósito, o administrador judicial que tiver suas contas desa-provadas pelo juiz perde o direito de remuneração (art. 24, § 4º, da Lei n. 11.101/2005, e art. 919, infine, do Código de Processo Civil). Ainda em relação à sentença de rejeição das contas, o juiz também deve fixar a responsabilidade civil do administrador judicial, pode determinar a indisponibilidade e até o sequestro (rectius, arresto3) de bens do admi-nistrador, bem assim determinar a remessa de fotocópias dos autos ao Ministério Público, para a apuração de eventual responsabilidade penal do administrador (arts. 179, 184, caput, e 188, todos da Lei n. 11.101/2005

3 A despeito da literalidade do preceito legal, na verdade, trata-se de arresto, por-quanto a condenação ao pagamento de indenização enseja execução por quantia certa. Com a mesma opinião, na doutrina: Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 176: “Entre eles se encontra o do já comentado art. 653, inserido na execução, e o do art. 154, § 5º, da Lei de Falências (a lei refere--se a sequestro, mas o caso é de arresto)”. Por oportuno, o capítulo VII do presen-te tomo versa sobre as cautelares de sequestro e de arresto.

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c/c o art. 40 do Código de Processo Penal). A sentença de rejeição das contas serve como título executivo para a execução da indenização de-vida pelo administrador judicial (art. 154, § 5º).

Tal como o administrador com contas rejeitadas, também perde o direito à remuneração o administrador substituído por renúncia sem razão relevante ou destituído pelo juiz por dolo, culpa, desídia ou des-cumprimento de qualquer obrigação legal. Em contraposição, se a re-núncia ao munus for considerada justificada pelo juiz, subsiste o direito à remuneração em prol do administrador judicial, mas apenas propor-cional ao trabalho realizado (art. 24, § 3º).

Quanto à natureza do crédito relativo à remuneração do adminis-trador judicial, trata-se de crédito extraconcursal, conforme revela o art. 84, I, da Lei n. 11.101/2005. Daí a respectiva preferência de pagamento em relação a outros créditos, como os arrolados no art. 83.

Por fim, a responsabilidade pelo pagamento da remuneração do administrador judicial é do empresário individual ou da sociedade em-presária, conforme o caso (art. 25).

1.9. Prestação de contas pelo administrador judicial

Por força dos arts. 24, § 2º, e 63, I, ambos da Lei n. 11.101/2005, o administrador judicial tem o dever de prestar contas ao juiz, no prazo de trinta dias da sentença de encerramento do processo (de recuperação judicial ou de falência, conforme o caso), com a observância do disposto nos arts. 154 e 155, preceitos aplicáveis à vista do § 2º do art. 24.

Com efeito, cabe ao próprio administrador efetuar a prestação mediante petição instruída com os documentos comprobatórios das contas, no prazo de trinta dias da sentença de encerramento do processo (arts. 63, caput e inciso I, 154, caput e § 1º).

Na eventualidade de inércia por parte do administrador judicial, cabe ao juiz determinar a intimação pessoal do administrador, a fim de que preste as contas em cinco dias, sob pena de crime de desobediência (art. 23 da Lei n. 11.101/2005).

Ainda em relação à omissão do administrador judicial, a ação de prestação de contas também pode ser proposta por quem tem o direito de exigi-las (art. 914, I, do Código de Processo Civil, c/c o art. 189 da Lei n. 11.101/2005), como o empresário individual e a sociedade empresária, em razão do pagamento da remuneração em prol do administrador (art. 25 da Lei n. 11.101/2005).

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Prestadas as contas pelo administrador judicial, a petição deve ser autuada em separado (art. 154, § 1º, da Lei n. 11.101/2005, e art. 919 do Código de Processo Civil). Em seguida, o juiz determina a publicação de aviso de que as contas estão disponíveis aos interessados, os quais têm dez dias para oferecimento de impugnação (art. 154, § 2º, da Lei n. 11.101/2005).

Decorrido o decêndio de impugnação ou, impugnadas as contas, realizadas as eventuais diligências necessárias à apuração dos fatos, o juiz intima o Ministério Público para apresentação de parecer, em cinco dias (art. 154, § 3º, da Lei n. 11.101/2005).

Apresentada impugnação por algum interessado (p. ex., pelo em-presário individual, pela sociedade empresária, por algum credor) ou manifestação contrária do Ministério Público, é aberta vista ao adminis-trador judicial, a fim de que este seja ouvido, em cinco dias (arts. 154, § 3º, e 189, ambos da Lei 11.101/2005, e art. 185 do Código de Processo Civil).

Por fim, o juiz profere sentença, com o julgamento das contas (art. 154, § 4º, da Lei n. 11.101/2005). Na eventualidade da rejeição das contas, o juiz deve fixar a responsabilidade civil do administrador judicial, quando também pode determinar a indisponibilidade e até o sequestro (rectius, arresto4) de bens na própria sentença de rejeição, a qual serve como título executivo contra o administrador judicial responsável pela indenização (art. 154, § 5º, da Lei n. 11.101/2005). Ainda em relação à sentença de rejeição das contas, se constatar algum delito cometido pelo administrador judicial, cabe ao juiz determinar a remessa de fotocópias dos autos ao Ministério Público, para a apuração de eventual responsa-bilidade penal do administrador judicial (arts. 179, 184 e 188, todos da Lei n. 11.101/2005 c/c o art. 40 do Código de Processo Penal).

A sentença é impugnável mediante apelação, em quinze dias (arts. 154, § 6º, e 189, da Lei n. 11.101/2005, e art. 508 do Código de Processo Civil). Após o trânsito em julgado, os autos da prestação de contas devem ser apensados aos autos do processo de recuperação ou de falência (art. 154, § 1º).

4 A despeito da literalidade do preceito legal, na verdade, trata-se de arresto, por-quanto a condenação ao pagamento de indenização enseja execução por quantia certa. Com a mesma opinião, na doutrina: Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro. v. III, 17. ed., 2005, p. 176: “Entre eles se encontra o do já comentado art. 653, inserido na execução, e o do art. 154, § 5º, da Lei de Falências (a lei refere--se a sequestro, mas o caso é de arresto)”.

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1.10. Exoneração do administrador judicial

Proferida a sentença de encerramento da recuperação judicial, aprovado o relatório final da recuperação, prestadas as contas pelo ad-ministrador e paga a parcela remanescente da respectiva remuneração, há a exoneração do administrador judicial pelo juiz, ato derradeiro que marca o término da atuação do administrador no processo de recupera-ção (art. 63, IV). Mutatismutandis, o mesmo ocorre no processo de falên-cia, com a prolação da sentença de encerramento da falência (art. 156), com a consequente exoneração do administrador judicial.

2. Classificação, verificação e habilitação dos créditos

2.1. Conceito

A classificação dos créditos consiste na elaboração do rol de prefe-rência de recebimento dos credores consoante a capacidade de pagamen-to do empresário individual ou da sociedade empresária em recuperação judicial ou com a falência decretada, conforme o caso. A ordem de prio-ridade é extraída dos arts. 83 e 84 da Lei n. 11.101/2005. No que tange ao processo de recuperação judicial, há lugar para alteração do rol legal; já no processo de falência, a ordem legal de preferência é taxativa, de observância obrigatória.

2.2. Existência da classificação dos créditos na recuperação judicial

Ao contrário do que pode parecer à primeira vista, a classificação dos créditos não diz respeito apenas ao processo de falência5, mas também ao processo de recuperação judicial, no qual há a igual necessi-dade da classificação para pagamento dos credores, como bem revelam os arts. 22, I, a, 51, III, e 52, § 1º, II, todos da Lei n. 11.101/2005, inverbis: “classificação de cada crédito”. A ordem de pagamento, todavia, pode ser modificada no plano de recuperação a ser submetido à deliberação dos credores.

5 Com efeito, a classificação dos créditos tem maior importância no processo de falência, em razão da impossibilidade de alteração da ordem legal, a qual só é possível no processo de recuperação judicial. Diante do caráter absoluto do rol de créditos no processo falimentar, os respectivos preceitos de regência foram inclu-ídos no bojo do Capítulo V da Lei n. 11.101/2005, destinado à falência.

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2.3. Ordem legal de classificação dos créditos

Os arts. 83 e 84 trazem a ordem de classificação dos créditos, a qual, entretanto, enseja modificação no processo de recuperação judicial, con-soante o disposto no plano de recuperação a ser aprovado em assembleia. De qualquer forma, as classificações dos créditos realizadas antes da aprovação do plano devem seguir o disposto nos arts. 83 e 84 da Lei n. 11.101/2005.

Antes de qualquer outro pagamento, devem ser pagos, em prazo não superior a trinta dias, os créditos trabalhistas dos últimos três meses anteriores ao ajuizamento da recuperação judicial, até o limite de cinco salários mínimos por trabalhador (arts. 54, parágrafo único, e 151).

Em seguida, devem ser pagas as restituições em dinheiro determi-nadas mediante sentenças proferidas em ações de restituição (arts. 86, parágrafo único, 149 e 151)6.

Depois, devem ser pagos os créditos extraconcursais, consoante a ordem estabelecida no art. 84: a remuneração do administrador judicial e dos respectivos auxiliares contratados mediante autorização judicial (art. 84, I); as quantias fornecidas pelos credores ao empresário indivi-dual ou à sociedade empresária em recuperação ou em falência (art. 84, II); as despesas com a arrecadação, a administração, a realização do ativo e a distribuição do passivo entre os credores (art. 84, III); as custas judiciais em geral (art. 84, III e IV); e as obrigações resultantes de atos jurídicos praticados durante a recuperação judicial (arts. 67 e 84, V).

Após o pagamento dos créditos extraconcursais, há a incidência do art. 83, com a observância da ordem de preferência dos créditos concur-sais. Em primeiro lugar, são pagos os créditos trabalhistas e os decorren-tes de acidente de trabalho, embora com a limitação do pagamento preferencial daqueles (créditos trabalhistas) até o valor de 150 salários mínimos (art. 83, I), porquanto o crédito trabalhista superior remanes-cente passa a integrar a classe destinada aos créditos quirografários (art. 83, VI, c)7.

6 O posterior Capítulo VIII versa sobre a ação de restituição.

7 O Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 83, I e IV, da Lei n. 11.101/2005, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucio-nalidade 3.934, cujo acórdão foi publicado com a seguinte ementa: “AÇÃO DIRE-TA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTS. 60, PARÁGRAFO ÚNICO, 83, I E IV, E 141, II, DA LEI 11.101/2005. FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO JUDICIAL.

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Em segundo lugar, são pagos os créditos com garantia real (art. 1.419 do Código Civil), mas apenas até o limite do bem gravado (art. 83, II e § 1º), porquanto o crédito superior remanescente passa a integrar a classe destinada aos créditos quirografários (art. 83, VI, b). Dentro do limite do valor do bem gravado, os créditos com garantia real têm pre-ferência em relação aos créditos tributários, privilegiados (especial e geral), quirografários etc.

Em terceiro lugar, são pagos os créditos tributários (art. 83, III), mas não as multas tributárias, as quais integram a classe destinada às multas e são pagas depois dos créditos quirografários (art. 83, VII).

Em quarto lugar, são pagos os créditos com privilégio especial (art. 83, IV), assim considerados os arrolados no art. 964 do Código Civil8, sem prejuízo de outros créditos com privilégio especial exvilegis, como o Decreto-Lei n. 167/67, em prol dos credores de nota promissória rural e de duplicata rural.

INEXISTÊNCIA DE OFENSA AOS ARTS. 1º, III, E IV, 6º, 7º, I, E 170, DA CONS-TITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. ADI JULGADA IMPROCEDENTE. I – Inexiste reserva constitucional de lei complementar para a execução dos créditos traba-lhistas decorrente de falência ou recuperação judicial. II – Não há, também, in-constitucionalidade quanto à ausência de sucessão dos créditos trabalhistas. III – Igualmente não existe ofensa à Constituição no tocante ao limite de conversão de créditos trabalhistas em quirografários. IV – Diploma legal que objetiva pres-tigiar a função social da empresa e assegurar, tanto quanto possível, a preservação dos postos de trabalho. V – Ação direta julgada improcedente” (Pleno do STF, ADI 3.934/DF, DiáriodaJustiçaeletrônico,5-11-2009).

8 Eis os credores com privilégio especial por força do art. 964 do Código de 2002: o credor de custas e despesas judiciais feitas com a arrecadação e liquidação, sobre a coisa arrecadada e liquidada; o credor por despesas de salvamento, sobre a coisa salvada; o credor por benfeitorias necessárias ou úteis, sobre a coisa beneficiada; o credor de materiais, dinheiro, ou serviços para a sua edificação, reconstrução, ou melhoramento, sobre os prédios rústicos ou urbanos, fábricas, oficinas, ou quaisquer outras construções; o credor por sementes, instrumentos e serviços à cultura, ou à colheita, sobre os frutos agrícolas; o credor de aluguéis, quanto às prestações do ano corrente e do anterior, sobre os enfeites e utensílios de uso doméstico, nos prédios rústicos ou urbanos; o autor ou seus legítimos representantes, pelo crédito fundado contra aquele no contrato da edição, sobre os exemplares da obra existente na massa do editor; o trabalhador agrícola, quanto à dívida dos seus salários, sobre o produto da colheita, para a qual hou-ver concorrido com o seu trabalho, e precipuamente a quaisquer outros créditos, ainda que reais.

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Em quinto lugar, são pagos os créditos com privilégio geral (art. 83, V), assim considerados os previstos no art. 965 do Código Civil9, além de outros créditos com privilégio geral previstos em lei, como os hono-rários advocatícios arbitrados em decisão judicial (art. 24, caput, da Lei n. 8.906/94).

Em sexto lugar, são pagos os créditos quirografários, como os títu-los de crédito em geral10, os contratos comerciais, os créditos não satis-feitos pela alienação de bem gravado com garantia real, os créditos tra-balhistas superiores a 150 salários mínimos e os créditos trabalhistas cedidos a terceiros (art. 83, VI e § 4º).

Em sétimo lugar, são pagas as multas em geral, até mesmo as tri-butárias (art. 83, VII). Com efeito, as multas em geral só são pagas depois dos créditos quirografários.

Por fim, são pagos os créditos subordinados, assim considerados os créditos dos sócios e dos administradores sem vínculo empregatício, além de outros previstos em lei (art. 83, VIII).

É certo, entretanto, que a classificação dos créditos provenientes dos arts. 83 e 84 tem maior importância no processo de falência, no qual é de observância obrigatória. Não obstante, também tem utilidade no processo de recuperação judicial, ainda que para a elaboração da petição inicial, da posterior Relação de Credores pelo administrador judicial, com repercussão na elaboração do Quadro Geral de Credores. A ordem de pagamento, todavia, segue o disposto no plano de recuperação judi-cial, no qual é possível modificar não só a ordem, mas também a forma e até o valor dos créditos, sempre sob a condição da aprovação pelos credores em assembleia.

2.4. Classificação inicial

A petição inicial da recuperação judicial e da autofalência deve ser instruída com a relação nominal dos credores, acompanhada da classi-

9 Eis os credores com privilégio geral por força do art. 965 do Código Civil de 2002: “o crédito por despesa de seu funeral, feito segundo a condição do morto e o costu-me do lugar; o crédito por despesas com o luto do cônjuge sobrevivo e dos filhos do devedor falecido, se foram moderadas; o crédito por despesas com a doença de que faleceu o devedor, no semestre anterior à sua morte; o crédito pelos gastos necessários à mantença do devedor falecido e sua família, no trimestre anterior ao falecimento”.

10 Ressalvadas as exceções consubstanciadas na nota promissória rural e na dupli-cata rural, títulos de crédito que têm privilégio especial.

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ficação inicial e do valor dos créditos, conforme determinam o inciso III do art. 51 e o inciso II do art. 105 da Lei n. 11.101/2005. Com efeito, a classificação inicial deve instruir a petição inicial da autofalência, isto é, da falência requerida pelo empresário individual ou pela sociedade empresária.

Nas demais falências, a classificação inicial dos credores também deve ser apresentada pelo empresário individual ou pela sociedade empresária, mas no prazo de cinco dias após a intimação da decretação da falência (art. 99, III).

2.5. Primeiro edital

Se admitir o processamento da recuperação judicial, o juiz deter-mina a publicação do primeiro edital no órgão oficial de imprensa, com a relação nominal de credores e a classificação inicial dos créditos pre-vistas no inciso III do art. 51 (art. 52, § 1º, II). Não basta, entretanto, a publicação do edital com a relação no órgão oficial de imprensa; à vista da Lei n. 11.101/2005, o administrador judicial deve enviar correspon-dência a cada um dos credores constantes da relação nominal, com a comunicação da classificação inicial dos créditos (art. 22, I, a).

Mutatismutandis, o mesmo procedimento tem lugar na falência e na autofalência, tendo em vista o disposto nos arts. 22, I, a, 99, III e pa-rágrafo único, e 105, II, todos da Lei n. 11.101/2005.

2.6. Prazo de quinze dias para habilitações e divergências

Como consequência da publicação do primeiro edital com a relação nominal dos credores e a classificação inicial dos créditos (arts. 52, § 1º, II, e 99, III e IV, e parágrafo único), há o início do prazo de quinze dias para que os credores e demais interessados11 apresentem as respectivas divergências e habilitações (arts. 7º, § 1º, e 52, § 1º, III, primeira parte).

2.7. Diferença entre divergência e habilitação

As divergências podem versar sobre os créditos já relacionados na classificação inicial; as habilitações podem tratar de créditos não relacio-nados na classificação inicial (art. 7º, § 1º). Outra diferença importante

11 Por exemplo, credores não relacionados na classificação inicial.

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reside na consequência jurídica da ausência de habilitação e da inexis-tência de divergência na quinzena legal: a ausência de habilitação de créditos não ocasiona a preclusão, em razão da inexistência de intimação pessoal ao requerente, porquanto este não integra a relação nominal de credores que acompanha a petição inicial. Daí o recebimento de habili-tação retardatária como impugnação, a fim de que seja julgado o pedido de inclusão do crédito do até então terceiro em relação ao processo (art. 10, § 5º). O mesmo raciocínio não tem aplicação ao credor que deixa de apresentar divergência na quinzena legal, porquanto o mesmo é intima-do por correspondência enviada pelo administrador judicial (art. 22, I, a). Daí a impossibilidade da aplicação do art. 10, § 5º, em prol do credor omisso: dormientibusnonsuccurritius12.

2.8. Forma da habilitação e da divergência

As habilitações de crédito devem ser veiculadas na quinzena legal mediante requerimento endereçado ao administrador judicial, com a indicação do nome e do endereço do credor, bem assim do endereço em que o credor deve ser intimado dos atos do processo (arts. 7º, § 1º, e 9º, caput e inciso I).

O requerimento de habilitação também deve conter o valor do crédito, a origem do mesmo e a respectiva classificação. O requerimento também deve ser instruído com os documentos comprobatórios do cré-dito, sem prejuízo da produção de outras provas para a demonstração do crédito (art. 9º, II e III).

Em regra, a habilitação deve ser instruída com os documentos e títulos originais, salvo se estiverem em autos de outro processo, hipóte-se na qual é permitida a apresentação de fotocópia autenticada (art. 9º, parágrafo único).

Na eventualidade da existência de crédito com garantia, o credor também deve apresentar o instrumento da garantia, com a petição de habilitação (art. 9º, IV e V).

Mutatismutandis, o art. 9º também é aplicável por analogia às even-tuais divergências dos credores já relacionados, salvo em relação às in-

12 O Professor Agnelo Amorim Filho prestigia o princípio dormientibusnonsuccurritius, vale dizer, o direito não socorre aos que dormem, em excelente artigo doutri-nário publicado na RevistadosTribunais, v. 300, p. 7.

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formações já existentes nos autos do processo13, as quais não precisam ser reiteradas no requerimento de divergência.

Por fim, tanto as habilitações quanto as divergências devem ser juntadas aos próprios autos principais do processo de recuperação judi-cial ou de falência, conforme o caso.

2.9. Elaboração da relação de credores pelo administrador judicial

Decorrido o prazo de quinze dias para as divergências e as habili-tações, o administrador judicial realiza a verificação dos créditos (art. 7º, caput), com a consideração da classificação inicial e dos respectivos do-cumentos que acompanharam a petição inicial, bem assim das divergên-cias e das habilitações apresentadas pelos credores e interessados.

Com base nas informações e documentos já existentes nos autos e nas supervenientes divergências e habilitações dos credores e interessa-dos, o administrador judicial elabora a relação de credores, com a res-pectiva classificação dos créditos, dentro de 45 dias do término da quinzena destinada às habilitações e divergências (arts. 7º, §§ 1º e 2º, e 22, I, e).

2.10. Segundo edital

Dentro dos mesmos 45 dias do término da quinzena destinada às habilitações e divergências, o administrador judicial também deve pro-videnciar a publicação do segundo edital no órgão oficial de imprensa, com a relação de credores e a respectiva classificação. O edital deve conter o local, o horário e o prazo comum para que o Ministério Público, o Comitê, os credores, o empresário individual ou os sócios da socieda-de empresária tenham acesso e conhecimento dos documentos à vista dos quais o administrador judicial realizou a verificação dos créditos e elaborou a relação de credores, com a respectiva classificação dos crédi-tos (art. 7º, § 2º).

2.11. Prazo de dez dias para impugnações contra a relação de credores

Publicado o edital com a relação de credores no órgão oficial de imprensa, o Ministério Público, o Comitê, os credores e o empresário

13 Por exemplo, nome e endereço do credor.

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individual ou os sócios da sociedade empresária têm dez dias para apresentarem as respectivas impugnações contra a relação elaborada pelo administrador judicial (art. 8º, caput).

2.12. Ausência de impugnação e homologação da relação de credores

Decorrido inalbis o decêndio legal para impugnação da relação de credores, o juiz profere decisão homologatória, quando aquela relação é homologada já na qualidade de Quadro Geral de Credores (art. 14).

2.13. Apresentação de impugnação

Apresentada alguma impugnação no decêndio legal, deve ser esta autuada em separado (art. 8º, parágrafo único). Na eventualidade da veiculação de mais de uma impugnação sobre o mesmo crédito, as im-pugnações devem ser autuadas em conjunto, mas também em apenso (art. 13, parágrafo único).

As impugnações devem ser oferecidas mediante petição endereça-da ao mesmo juízo do processo, com fundamentação na ausência de algum crédito, na ilegitimidade, no excesso, na insuficiência ou na irre-gularidade da ordem de classificação de crédito relacionado (art. 8º).

Além de fundamentadas, as petições devem ser instruídas com os documentos comprobatórios das respectivas impugnações, sem prejuízo da possibilidade da produção de outras provas (art. 13).

2.14. Habilitação retardatária convertida em impugnação

A habilitação de crédito retardatária, isto é, apresentada depois do prazo de quinze dias da publicação do primeiro edital (art. 7º, § 1º), é rece-bida e processada como se impugnação fosse, desde que tenha sido veicu-lada antes da homologação do Quadro Geral de Credores (art. 10, § 5º).

2.15. Intimação dos credores para contestação das impugnações

Os credores com créditos impugnados são intimados e têm cinco dias para contestarem as impugnações (art. 11). As contestações podem ser instruídas com os documentos que os credores considerarem rele-vantes para a comprovação dos respectivos créditos, sem prejuízo do requerimento de produção de outras provas. As contestações devem ser juntadas aos autos separados das respectivas impugnações.

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2.16. Intimação do empresário, da sociedade empresária e do Comitê

Em seguida, são intimados o empresário individual ou a sociedade empresária, conforme o caso, bem assim o Comitê, se constituído, para manifestação no prazo comum de cinco dias (art. 12).

2.17. Parecer do administrador

Depois da intimação do empresário, da sociedade empresária e do Comitê há a intimação do administrador judicial, para emitir parecer circunstanciado no prazo de cinco dias (art. 12, parágrafo único).

2.18. Última fase do processamento das impugnações

Após o parecer do administrador judicial, os autos das impugnações sobem conclusos ao juiz, para a fixação dos pontos controvertidos e a determinação da produção de provas adicionais. Na mesma oportuni-dade, o juiz também deve designar a audiência de instrução e julgamen-to. Na eventualidade, todavia, de instrução já suficiente, o juiz pode julgar desde logo as impugnações (art. 15).

2.19. Decisão interlocutória agravável

Resta saber qual a natureza do pronunciamento por meio do qual o juiz resolve as impugnações contra a relação dos credores elaborada pelo administrador judicial. No parágrafo único do art. 18 há o vocábu-lo “sentença”, inverbis: “sentença que houver julgado as impugnações”14. Não obstante, trata-se de decisão interlocutória, em razão do julgamen-to de mero incidente processual (art. 162, § 2º, do Código de Processo Civil). A respectiva decisão interlocutória é impugnável mediante agra-vo de instrumento, como bem revela o art. 17. Por força do art. 189 da Lei n. 11.101/2005, incide o art. 522 do Código de Processo Civil, razão pela qual o agravo de instrumento deve ser interposto em dez dias pe-rante o tribunal competente.

14 Autorizada doutrina sustenta que há prolação de sentença, mas reconhece o ca-bimento do recurso de agravo: “Contra a sentença proferida na impugnação de crédito cabe agravo” (Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, v. III, 7. ed., 2007, p. 343).

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2.20. Consolidação do quadro geral de credores pelo administrador

Proferidas todas as decisões acerca das impugnações aviadas con-tra a Relação dos Credores elaborada pelo administrador judicial, cabe a este consolidar o quadro geral de credores, com a consideração daque-la relação e das decisões prolatadas pelo juiz ao julgar as impugnações (art. 18, caput). O quadro geral de credores deve conter o montante e a classificação de cada crédito (art. 18, parágrafo único).

2.21. Homologação do quadro geral pelo juiz

Em seguida, o juiz homologa o quadro geral de credores consolida-do pelo administrador judicial e juntado aos autos do processo, bem assim determina a imediata publicação do inteiro teor do quadro geral no órgão oficial de imprensa (art. 18, caput e parágrafo único). O pronunciamento homologatório do quadro geral de credores também tem natureza de decisão interlocutória. A propósito, enquanto a decisão sobre o incidente de impugnação é proferida nos respectivos autos separados, a decisão homologatória do quadro geral de credores é prolatada nos próprios autos principais do processo de recuperação judicial (ou de falência, conforme o caso), com a posterior publicação (art. 18, parágrafo único).

2.22. Ação anulatória

Decorrido o prazo de dez dias para interposição de agravo de instru-mento contra a decisão interlocutória, a homologação não poderá mais ser discutida no processo de recuperação judicial nem no processo falimentar, conforme o caso. Há, todavia, a possibilidade do ajuizamento de ação anulatória sob o procedimento ordinário perante juiz de primeiro grau, consoante a combinação dos arts. 19 e 189 da Lei n. 11.101/2005, com os arts. 352, II, e 486, ambos do Código de Processo Civil. Com efeito, a ação prevista no art. 19 da Lei n. 11.101 não é a rescisória15 do art. 485 do Códi-go de Processo Civil, mas, sim, a anulatória do art. 486, porquanto tem como alvo a decisão homologatória do quadro geral de credores do art. 18.

15 Não obstante, autorizada doutrina ensina que a ação prevista no art. 19 é “resci-sória”, ou seja, “ação de rescisão” (Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, v. III, 7. ed., 2007, p. 344). Ainda que muito respeitável a de-nominação sugerida pela melhor doutrina, a ação subexamine não tem ligação com a ação rescisória do art. 485 do Código de Processo Civil, mas, sim, com a ação anulatória do art. 486. Daí a opção pela segunda denominação: ação anulatória. A respeito das diferenças entre a ação rescisória e a ação anulatória: Bernardo Pimentel Souza, Introduçãoaosrecursoscíveiseàaçãorescisória, 7. ed., 2010.

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Em regra, a ação anulatória deve ser proposta perante o juízo do processo de recuperação judicial ou de falência, conforme o caso, salvo quando o crédito for de natureza trabalhista ou proveniente de ação por quantia ilíquida, hipóteses nas quais a ação anulatória deve ser propos-ta no juízo de origem (art. 19, § 1º).

Quanto aos legitimados, a ação anulatória pode ser ajuizada pelo Ministério Público, pelo administrador judicial, pelo Comitê e por qual-quer credor, até o encerramento do processo de recuperação judicial ou da falência, conforme o caso, tudo à luz dos arts. 19, 63 e 156.

A ação anulatória tem como escopo a exclusão, outra classificação ou a retificação de qualquer crédito, em razão da descoberta de falsida-de, dolo, simulação, fraude, erro essencial, bem assim de documentos ignorados no momento do julgamento do crédito ou da respectiva in-clusão no quadro geral de credores.

Proposta a ação anulatória, o titular do crédito questionado somen-te pode levantar o pagamento da respectiva importância mediante caução no mesmo valor (art. 19, § 2º).

2.23. Ação de retificação do quadro geral de credores

O crédito não habilitado até a homologação judicial do quadro geral de credores só pode ser pleiteado mediante ação própria, intitulada ação de retificação, também sob o procedimento ordinário previsto no Código de Processo Civil, a ser proposta perante o mesmo juízo da recuperação judicial ou da falência, conforme o caso, a fim de que seja retificado o quadro geral de credores, com a inclusão do crédito não habilitado, tudo consoante o disposto no art. 10, § 6º, da Lei n. 11.101/2005.

3. Assembleia Geral de Credores

3.1. Conceito

A Assembleia Geral é o órgão coletivo de constituição obrigatória16

16 Assim, na doutrina: “Como se percebe, as mais relevantes questões relacionadas ao processo de recuperação judicial inserem-se na esfera de competência da As-sembleia dos Credores. Simplesmente não tramita a recuperação judicial sem a atuação desse colegiado” (Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, 7. ed., 2007, p. 393).

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que congrega todos os credores classificados nos processos de recupera-ção judicial e de falência.

3.2. Atribuições

A Assembleia Geral de Credores tem várias atribuições tanto no processo de recuperação judicial quanto no processo falimentar.

No que tange ao processo de recuperação judicial, compete à As-sembleia Geral (art. 35, I):

— Deliberar sobre a aprovação, a rejeição e até sobre a modificação do Plano de Recuperação Judicial apresentado pelo empresário individu-al ou pela sociedade empresária (art. 35, I, a, c/c o art. 53, caput). A deliberação sobre o Plano de Recuperação ocorre em cada uma das classes de credores arroladas no art. 41 da Lei n. 11.101/2005, com a observância do quorum qualificado previsto no art. 45 da mesma lei.

— Deliberar sobre a conveniência da existência do Comitê de Credores e, se aprovada a constituição, escolher os respectivos membros, bem assim os eventuais substitutos (art. 35, I, b), sempre em votação sepa-rada em cada classe (art. 44).

— Deliberar sobre o pedido de desistência da recuperação judicial após a decisão concessiva do processamento (art. 35, I, d, c/c o art. 52, § 4º). Com efeito, proposta a ação de recuperação judicial e deferido o res-pectivo processamento pelo juiz, não é admissível a desistência pelo empresário individual ou sociedade empresária, ressalvada a hipótese de a Assembleia Geral de Credores aprovar a desistência.

— Deliberar sobre o nome do gestor judicial, na eventualidade do excepcional afastamento do empresário individual ou do administrador da sociedade empresária da direção da respectiva atividade empresa-rial (arts. 35, I, d, 64 e 65);

— Deliberar sobre qualquer outra matéria que possa afetar os interes-ses dos credores, por ser a Assembleia Geral o órgão representativo dos credores na recuperação judicial (art. 35, I, e).

Por fim, em razão do veto presidencial que atingiu a alínea c do inciso I do art. 35 do Projeto da Lei n. 11.101/2005, a Assembleia Geral de Credores não tem competência para deliberar sobre a substituição do administrador judicial nomeado pelo juiz. Tanto a nomeação quanto a substituição do administrador judicial são da competência exclusiva do juiz. É certo, todavia, que os credores em geral e o Comitê de Credores

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podem requerer a substituição do administrador judicial (art. 30, § 2º), mas a decisão cabe ao juiz, e não à Assembleia Geral de Credores, muito menos ao Comitê de Credores.

3.3. Competência para convocar e legitimidade para requerer a convo-cação da Assembleia Geral

Ao contrário do que pode parecer à primeira vista, só o juiz do processo tem competência para convocar a Assembleia Geral de Credo-res (art. 36, caput). O juiz pode efetuar a convocação de ofício (p. ex., nas hipóteses dos arts. 56 e 65) ou em virtude de requerimento dos legitima-dos (p. ex., nas hipóteses dos arts. 22, I, g, 27, I, e, e 36, § 2º). Com efeito, o administrador judicial, o Comitê e os credores com pelo menos 25 por cento dos créditos de alguma classe têm legitimidade para requerer a convocação da Assembleia Geral ao juiz, mas não para convocar desde logo a Assembleia Geral, porquanto a convocação é atribuição exclusiva do juiz do processo (art. 36, caput).

3.4. Classes de credores na Assembleia Geral

Em regra, as deliberações assembleares são feitas em plenário, sem a separação dos votos em classes, com a consideração apenas da propor-ção do valor do crédito de cada credor presente (arts. 38, caput, primeira parte, e 42, primeira parte). A regra, todavia, comporta exceções, nas quais há votações separadas em diferentes classes de credores.

Para a aprovação e qualquer outra deliberação acerca do Plano de Recuperação Judicial (art. 45), os credores são divididos nas três classes previstas no art. 41: titulares de créditos trabalhistas em geral, incluídos os decorrentes de acidentes de trabalho, independentemente do valor dos respectivos créditos (art. 41, I e § 1º); titulares de créditos com garan-tia real, os quais, todavia, votam na presente classe até o limite do valor do bem gravado, quando passam a votar na classe subsequente, em re-lação aos créditos remanescentes (art. 41, II e § 2º); e titulares de créditos quirografários, subordinados, com privilégio especial, com privilégio geral, bem assim os com garantia real, mas apenas em relação ao créditos superiores ao valor do bem gravado (art. 41, III e § 2º).

No que diz respeito à aprovação da constituição do Comitê de Credores e a escolha dos respectivos membros, os credores também são separados em classes (arts. 42, segunda parte, e 44), mas com outra com-posição. Com efeito, no que tange às deliberações referentes ao Comitê,

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os credores são distribuídos nas classes arroladas no art. 26: titulares dos créditos trabalhistas em geral (art. 26, I); titulares dos créditos com ga-rantia real e privilégios especiais (arts. 26, II, e 83, II e IV, da Lei n. 11.101/2005, arts. 964 e 1.149 do Código Civil, e Decreto-Lei n. 167/67); e titulares dos créditos quirografários e com privilégios gerais (arts. 26, III, e art. 83, V e VI, da Lei n. 11.101/2005, e art. 965 do Código Civil).

Por fim, as demais deliberações da Assembleia Geral relativas ao processo de recuperação judicial são tomadas em plenário17, com a ob-servância do disposto no proêmio do caput do art. 38 e na primeira parte do art. 42.

3.5. Convocação e instalação da Assembleia Geral

Se o juiz do processo constatar a necessidade da oitiva da Assem-bleia Geral18 ou for apresentado requerimento de convocação pelo ad-ministrador judicial, pelo Comitê ou pelos credores que representam ao menos 25 por cento dos créditos de alguma das classes do art. 41, há a convocação da Assembleia Geral pelo juiz.

Com efeito, a convocação é sempre feita pelo juiz, mediante a pu-blicação de edital no órgão oficial de imprensa e em jornais de grande circulação nas localidades do estabelecimento empresarial principal e das eventuais filiais (art. 36). Além da publicação do edital, fotocópias do aviso de convocação também devem ser afixadas de forma ostensiva tanto no estabelecimento empresarial principal quanto nas eventuais filiais (art. 36, § 1º).

O edital deve ser publicado com pelo menos quinze dias de ante-cedência da data designada para a Assembleia Geral, com a indicação do dia, da hora e do local da reunião, da pauta dos trabalhos, com a respectiva ordem do dia, além do local no qual os credores podem ter prévio acesso ao Plano de Recuperação Judicial a ser submetido à deli-beração da assembleia, se a reunião for versar sobre a aprovação ou a rejeição do Plano (art. 36, I, II e III).

17 De acordo, na doutrina: “Sempre que a matéria não disser respeito à constituição do Comitê ou não se tratar do plano de reorganização, cabe a deliberação ao plenário” (Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, 18. ed., 2007, p. 397).

18 Por exemplo, nas hipóteses dos arts. 56 e 65 da Lei n. 11.101/2005.

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Para a instalação da Assembleia Geral em primeira convocação há a necessidade da presença de credores titulares de mais da metade dos créditos de cada uma das três classes previstas no art. 41 (art. 37, § 2º). A apuração é realizada com a consideração dos valores dos respectivos créditos, e não pelo número de credores presentes. A regra consagrada no caputdo art. 38 revela que os créditos (e não os credores) é que são considerados tanto na apuração do quorum para a instalação dos trabalhos quanto nas deliberações em geral19.

Na eventualidade de ausência do quorum previsto no § 2º do art. 37 para a instalação da assembleia na primeira convocação, ocorre a instalação da assembleia em segunda convocação, a qual só pode ser realizada em prazo igual ou superior a cinco dias da primeira convoca-ção (art. 36, I). Ao contrário da primeira convocação, não há fixação de quorum mínimo para a realização da Assembleia Geral em segunda con-vocação, conforme revela o art. 37, § 2º, infine: “em 2ª (segunda) convo-cação, com qualquer número”.

Resta saber se o juiz deve determinar a publicação de novo edital destinado à segunda convocação ou se a data da segunda convocação deve ser fixada no primeiro edital, já com a observância do prazo míni-mo de cinco dias da primeira convocação. Autorizada doutrina20 sus-tenta a tese consubstanciada na publicação de novo edital para a segun-da convocação. Ainda que muito respeitável o entendimento favorável à publicação de novo edital específico para a segunda convocação, o comando do art. 36 permite a conclusão de que há a publicação de ape-nas um “edital”, já com as datas tanto da primeira convocação quanto da segunda convocação, e com a observância do lapso mínimo de cinco dias entre as duas datas. A conclusão extraída da literalidade do caput do art. 36 (“edital”) é reforçada pelos princípios processuais da economia e da celeridade, consagrados no art. 5º, LXXXIII, da Constituição Federal, e no art. 75, parágrafo único, da Lei n. 11.101/2005. Por tudo, o edital (frise-se, único!) deve conter as duas datas para a primeira e a segunda

19 Há, todavia, a exceção prevista no § 2º do art. 45 da Lei n.11.101/2005, ressalvada no próprio art. 38.

20 “Caso não seja alcançado ou mesmo se a Assembleia não se realizar por qualquer outra razão, o anúncio da segunda convocação deverá ser publicado com a ante-cedência mínima de 5 dias da data programada para a realização da reunião” (Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, 7. ed., 2007, p. 393).

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convocações, com a observância do prazo mínimo exigido pelo inciso I do art. 36.

3.6. Despesas com as convocações e com a realização da Assembleia Geral

Em regra, as despesas com as convocações e com a realização das assembleias correm por conta do empresário individual ou da sociedade empresária em recuperação judicial ou já em falência, conforme o caso. Em duas hipóteses, entretanto, as despesas são pagas pelos credores. Com efeito, quando o requerimento de convocação parte do Comitê (arts. 27, I, e, e 36, § 3º) ou de credores que representam pelo menos 25 por cento dos créditos de alguma classe (arts. 36, §§ 2º e 3º, e 41), as despesas com a convocação são pagas pelos próprios credores.

3.7. Presidência da Assembleia Geral

Em regra, cabe ao administrador judicial exercer a presidência da Assembleia Geral de Credores (art. 37). Não obstante, quando a delibe-ração assemblear versar sobre alguma matéria em relação à qual há in-compatibilidade com a presidência do administrador judicial21, o titular do maior crédito assume a presidência da Assembleia Geral (art. 37, § 1º).

3.8. Lista de presença

Em regra, só pode participar da assembleia, com direito de voz e voto, o credor cujo nome constar da lista de presença elaborada à luz da última classificação vigente na data da reunião (arts. 37, § 3º, e 39, caput, proêmio). Com efeito, há três classificações ao longo do processo de re-cuperação judicial e também no processo falimentar: 1a) a classificação que acompanha a petição inicial (art. 51, III, e art. 105, II); 2ª) a classifica-ção do administrador judicial consubstanciada na Relação de Credores (art. 7º, § 2º); 3ª) a classificação consolidada no quadro geral de credores (art. 18). Por conseguinte, a lista de presença para a assembleia depende

21 A propósito, a principal hipótese de incompatibilidade do administrador judicial (qual seja, a deliberação sobre a substituição do administrador judicial), todavia, não subsistiu à sanção presidencial, conforme revela o veto imposto pelo Presi-dente da República à alínea c do inciso I e à letra a do inciso II do art. 35 da Lei n. 11.101/2005.

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da última classificação vigente, conforme a fase processual na qual se encontra a recuperação judicial ou a falência, no momento da realização da assembleia (arts. 37, § 3º, e 39, caput, proêmio).

Além dos credores incluídos na classificação vigente no momento da assembleia, também as pessoas com habilitações subiudice na data da realização da assembleia e as beneficiadas por decisão judicial têm di-reito de voz e voto na Assembleia Geral (arts. 17, parágrafo único, e 39, caput).

Para participar das deliberações assembleares com direito de voz e de voto, o credor deve assinar a lista de presença, a qual será encerra-da no momento da instalação da respectiva assembleia (art. 37, § 3º).

Por fim, na eventualidade de posterior alteração da classificação dos créditos, as deliberações da Assembleia Geral já tomadas à luz da classificação vigente na data da reunião não podem ser invalidadas por posterior decisão judicial (art. 39, § 2º)22.

3.9. Interpretação sistemática dos arts. 17, parágrafo único, e 40 da Lei n. 11.101/2005

Ao contrário do que pode parecer à primeira vista, não há contra-dição entre o disposto no parágrafo único do art. 17 e o teor do art. 40, ambos da Lei n. 11.101/2005. Enquanto o último preceito (art. 40) veda a prolação de decisão judicial para suspender a realização e para adiar a assembleia em razão de discussão sobre a classificação dos créditos, aquele dispositivo (art. 17) permite a prolação de decisão judicial apenas para impedir ou para garantir a efetiva participação na assembleia, con-forme o caso. Ainda que de forma implícita, o art. 17 confirma o dispos-to no art. 40: ambos revelam que a assembleia não deve ser suspensa nem adiada; mas é possível a concessão de tutela jurisdicional para impedir ou garantir a participação de algum credor na assembleia, a qual, todavia, deve ser realizada na data designada pelo juiz.

22 Assim, na doutrina: “Note-se de nenhuma deliberação da assembleia geral será invalidada caso uma decisão judicial posterior venha a desconstituir, reduzir a valor ou reclassificar qualquer dos créditos que serviram de base para o cálculo dos quóruns de instalação ou deliberação. Se tais decisões pudessem interferir no resultado de assembleias passadas, o processo de recuperação judicial estaria exposto a significativos entraves” (Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, 7. ed., 2007, p. 397).

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3.10. Admissibilidade da representação de credor por procurador

O credor pode ser representado por procurador constituído para atuar em seu nome durante a assembleia. A representação do credor mediante procurador, entretanto, depende da apresentação do respecti-vo instrumento de mandato ou da indicação das folhas dos autos do respectivo processo, até 24 horas antes da data designada no edital de convocação da Assembleia Geral (art. 37, § 4º).

3.11. Deliberações da Assembleia Geral

Em regra, são aprovadas as propostas que alcançam mais da me-tade do valor total dos créditos cujos titulares participam da assembleia, sem a consideração das respectivas classes. Com efeito, à vista dos arts. 38, caput, início, e 42, primeira parte, ambos da Lei n. 11.101/2005, todos os credores presentes participam com votos proporcionais ao valor dos respectivos créditos, sem a consideração das classes. A regra, todavia, não é absoluta. Há três hipóteses – previstas nos arts. 44, 45 e 46 – nas quais o critério de votação é de tal forma diferenciado que pode ser denominado qualificado. Enquanto a primeira (art. 44) tem lugar nos processos de recuperação judicial e de falência, a segunda (art. 45) é própria da recuperação judicial, e a última (art. 46) é exclusiva do pro-cesso falimentar.

A propósito da primeira exceção, a votação sobre a constituição e a composição do Comitê de Credores não segue o padrão previsto no proêmio do art. 42. Ao invés da deliberação plenária padrão, a votação é feita em separado, em cada classe (arts. 26 e 44); e basta a aprovação da constituição em uma classe para a formação do Comitê de Credores (art. 26).

A segunda exceção diz respeito ao Plano de Recuperação Judicial. As deliberações sobre o Plano de Recuperação devem ocorrer em cada uma das três classes previstas no art. 41, ou seja, em separado. Na classe relativa aos créditos trabalhistas (inciso I), basta a aprovação por maioria simples dos credores presentes à assembleia, sem a consideração do valor dos respectivos créditos (art. 45, § 2º). Já nas outras duas classes (incisos II e III), há a necessidade da aprovação pela maioria simples dos credores presentes à assembleia e que também representem mais da metade do valor total dos créditos de titulares presentes (art. 45, § 1º).

Por fim, a terceira exceção reside no processo falimentar. Com efeito, a adoção de forma alternativa de alienação do ativo da massa

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falida depende do voto favorável de dois terços dos créditos presentes à assembleia (arts. 46 e 145).

3.12. Credores impedidos de votar nas deliberações da Assembleia Geral

Os titulares de créditos excetuados não são considerados para a verificação do quorum de instalação nem podem participar de deliberação alguma (art. 39, § 1º, c/c os arts. 49, §§ 3º e 4º, e 86, II).

Da mesma forma, o empresário individual, os sócios da sociedade empresária, as sociedades coligadas, controladoras, controladas e as que tenham sócio ou acionista com participação superior a dez por cento do capital social da sociedade empresária podem participar da assembleia, mas sem direito de voto e sem a consideração deles para a apuração do quorum de instalação e de deliberação (art. 43).

3.13. Credor impedido de votar na deliberação sobre o Plano de Recuperação

O credor cujo crédito não sofrer alteração alguma no que tange ao valor e às condições originais de pagamento não participa da votação acerca da aprovação do Plano de Recuperação. Aliás, nem há a conside-ração do respectivo credor para a apuração de quorum (art. 45, § 3º).

3.14. Ata da assembleia

Finda a assembleia, é lavrada a respectiva ata, com o relato do ocorrido e das deliberações. A ata é assinada pelo presidente (em regra, o administrador judicial), pelo empresário individual ou pelo represen-tante da sociedade empresária, bem assim por dois representantes de cada uma das classes votantes. Lançadas as assinaturas, a respectiva ata e a lista de presença devem ser entregues ao juiz dentro das 48 horas do término da assembleia, mediante petição de juntada da ata da assembleia aos autos do processo (art. 37, § 7º).

3.15. Rejeição do Plano de Recuperação

Na eventualidade de o Plano de Recuperação Judicial ter sido re-jeitado na assembleia (art. 56, § 4º), há lugar para a decretação da falên-cia do empresário individual ou da sociedade empresária mediante

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decisão judicial de convolação da recuperação em falência (art. 73, III, c/c o art. 56, § 4º)23. Trata-se de decisão interlocutória, razão pela qual é impugnável por meio de agravo de instrumento (art. 100, primeira par-te), em dez dias (art. 189 da Lei n. 11.101/2005, c/c o art. 522 do Código de Processo Civil), endereçado ao tribunal de segundo grau competente (art. 524 do Código de Processo Civil).

Com efeito, rejeitado o plano, a regra é a convolação da recuperação judicial em falência, mas há a excepcional possibilidade de divergência qualificada, quando o juiz pode conceder a recuperação judicial, a des-peito da rejeição do plano pela Assembleia Geral (art. 58, § 1º).

4. Comitê de Credores

4.1. Conceito

O Comitê é o órgão de constituição facultativa para a fiscalização e defesa dos interesses dos credores no processo de recuperação judicial e também de falência.

4.2. Constituição do Comitê

O Comitê é formado em razão da aprovação de qualquer uma das classes de credores do art. 26 da Lei n. 11.101/2005. A constituição do Comitê, todavia, é facultativa; mas basta a votação majoritária favorável em alguma classe de credores para a criação do órgão.

4.3. Composição do Comitê

Em regra, o Comitê tem três membros titulares. Cada titular é es-colhido em conjunto com dois suplentes, para a eventualidade do não comparecimento ou até da destituição daquele (art. 31, § 1º). Os repre-sentantes titulares e suplentes são escolhidos pelas respectivas classes de credores, assim divididas para a indicação dos componentes do Co-mitê: classe de credores trabalhistas; classe de credores com direitos reais de garantia e com privilégios especiais; e classe de credores quirografá-rios e com privilégios gerais.

23 Ao contrário do que pode parecer à primeira vista, a regra consagrada no § 4º do art. 56 e no inciso III do art. 73 está sujeita à exceção prevista no § 1º do art. 58, consoante reforça o parágrafo posterior do próprio texto principal.

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Por força do art. 44, apenas os respectivos credores podem votar na escolha dos representantes de cada classe no Comitê. Assim, os credores trabalhistas têm um representante titular e dois suplentes. Da mesma forma, os credores com direitos reais de garantia e privilé-gios especiais escolhem um titular e dois suplentes. Por fim, os credo-res quirografários e com privilégios gerais escolhem um titular e dois suplentes.

4.4. Presidência do Comitê

Os próprios membros do Comitê de Credores escolhem o respec-tivo presidente entre si (art. 26, § 3º).

4.5. Comitê com menos de três membros

Embora a regra seja a composição do Comitê com três membros titulares, o § 1º do art. 26 autoriza o funcionamento do órgão com núme-ro inferior, na eventualidade da ausência de indicação da respectiva re-presentação por alguma classe. Aliás, é até mesmo possível o funciona-mento do Comitê com a representação de apenas uma classe de credores.

4.6. Impedidos

O credor que foi membro de Comitê ou administrador judicial nos últimos cinco anos e foi destituído, deixou de prestar as contas devidas nos prazos legais ou teve as contas prestadas rejeitadas não pode integrar o Comitê. Também está impedido de integrar o Comitê o credor com relação de parentesco ou afinidade até o terceiro grau com o empresário individual ou os administradores, controladores ou representantes legais da sociedade empresária em recuperação judicial (ou em falência, con-forme o caso). Da mesma forma, o credor que tiver relação de amizade, inimizade ou dependência com qualquer um deles também não pode integrar o Comitê (art. 30, caput e § 1º, da Lei n. 11.101/2005).

Qualquer credor, o Ministério Público, o empresário individual, bem assim os administradores, controladores e representantes legais da sociedade empresária têm legitimidade para suscitar o impedimento de algum membro do Comitê nomeado em desobediência ao disposto no art. 30 da Lei n. 11.101/2005.

Suscitado o impedimento de algum membro do Comitê, o juiz deve proferir a respectiva decisão no prazo impróprio (isto é, não preclusivo)

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de 24 horas da conclusão dos autos, com a confirmação da nomeação ou a destituição do nomeado e a convocação do primeiro suplente escolhi-do pela mesma classe (arts. 26, § 2º, 31, § 1º, e 44, todos da Lei n. 11.101/2005). Da respectiva decisão interlocutória cabe agravo de ins-trumento, em dez dias (art. 189 da Lei n. 11.101/2005, c/c o art. 522 do Código de Processo Civil).

4.7. Destituição dos membros do Comitê

O juiz pode determinar a destituição dos membros do Comitê mediante requerimento de qualquer interessado ou até mesmo de ofício, quando verificar que houve nomeação de credor impedido ou que o membro do Comitê não cumpre os respectivos deveres, é omisso, negli-gente ou age de forma lesiva às atividades do empresário individual, da sociedade empresarial ou contra terceiros (art. 31 da Lei n. 11.101/2005). Destituído o titular de alguma classe, o juiz convocará o primeiro su-plente para recompor o Comitê (art. 31, § 1º).

4.8. Representação superveniente e substituição da representação

A classe ainda não representada no Comitê de Credores pode apre-sentar requerimento endereçado ao juiz, com a indicação dos respectivos representantes: tanto o titular quanto os suplentes. O requerimento deve ser subscrito pelos credores com maioria dos créditos da respectiva classe. À luz do requerimento com as indicações dos escolhidos, compe-te ao juiz efetuar a nomeação dos representantes titular e suplentes, sem a necessidade da oitiva da Assembleia Geral (art. 26, § 2º, I, da Lei n. 11.101/2005).

A substituição dos representantes mediante deliberação de cada classe segue o mesmo procedimento, com a posterior nomeação, pelo juiz, do titular e dos suplentes substitutos escolhidos pela respectiva classe de credores. Com efeito, o juiz leva em consideração o requeri-mento subscrito pelos credores com maioria dos créditos da classe cuja representação será substituída, no todo ou em parte (art. 26, § 2º, II).

4.9. Assinatura do termo de compromisso

Nomeados pelo juiz os escolhidos pelas respectivas classes de credores, os futuros membros do Comitê são desde logo intimados pes-soalmente para a assinatura do termo de compromisso na sede do juízo,

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dentro das 48 horas posteriores à intimação (art. 33). A propósito, o mesmo raciocínio alcança os membros do Comitê nomeados em substi-tuição, consoante o disposto no inciso II do § 2º do art. 26.

4.10. Responsabilidade dos membros do Comitê

Assinado o termo do compromisso, os membros do Comitê passam a ser responsáveis pelos eventuais prejuízos causados ao empresário individual, à sociedade empresária ou aos credores, em decorrência de atos dolosos e culposos. A responsabilidade se dá tanto no campo penal quanto no plano cível. Por conseguinte, na eventualidade de um membro do Comitê não concordar com alguma deliberação dos demais, deve consignar a divergência em ata, a fim de afastar as possíveis responsa-bilidades pelo ato danoso doloso ou culposo praticado pelo Comitê (art. 32 da Lei n. 11.101/2005).

4.11. Atribuições do Comitê

O Comitê de Credores tem várias atribuições arroladas no art. 27, além de outras tantas previstas nos demais preceitos da Lei n. 11.101/2005. Por exemplo, o art. 8º versa sobre a legitimidade do Comitê para impug-nar a Relação de Credores elaborada pelo administrador judicial. Outro exemplo reside no art. 66: após a distribuição da petição inicial da recu-peração judicial, o empresário individual ou a sociedade empresária em recuperação judicial não pode alienar ou onerar bens ou direitos do ativo sem a prévia audiência do Comitê24. Daí a conclusão: a relação das atribuições do art. 27 não é exaustiva.

Em primeiro lugar, o Comitê de Credores tem várias atribuições de fiscalização. Com efeito, cabe ao Comitê fiscalizar as atividades e exami-nar as contas do administrador judicial (arts. 27, I, a, e 63, I). Ao Comitê também compete fiscalizar e elaborar relatórios mensais acerca das ati-vidades administrativas e mercantis do empresário individual ou da sociedade empresária (arts. 27, II, a, e 64). Ainda no tocante à fiscalização, cabe ao Comitê acompanhar a execução do Plano de Recuperação Judi-cial (arts. 27, II, b, 53, caput).

24 Ressalvados aqueles bens e direitos em relação aos quais o plano de recuperação aprovado já indica a alienação ou a constituição de ônus (art. 66, infine).

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O Comitê também deve zelar pela regularidade do processo, a fim de que as determinações legais sejam observadas (art. 27, I, b). Tanto que cabe ao Comitê comunicar ao juiz eventual prejuízo aos interesses dos credores ou algum desrespeito aos direitos dos mesmos (art. 27, I, c). Aliás, diante de alguma reclamação dirigida ao Comitê, compete a este apurar e elaborar o respectivo parecer (art. 27, I, d).

Também cabe ao Comitê requerer ao juiz a convocação da Assem-bleia, quando for necessária ou conveniente a manifestação dos credores em geral (art. 27, I, e).

Na eventualidade do afastamento do empresário individual ou dos administradores da sociedade empresária da direção das respectivas atividades (arts. 64 e 65), cabe ao Comitê submeter à autorização do juiz a alienação de bens do ativo, a constituição de ônus reais ou outras ga-rantias, e o endividamento indispensáveis à continuação da atividade empresarial no período anterior à aprovação do Plano de Recuperação (art. 27, II, c).

4.12. Deliberações do Comitê

Em regra, as deliberações do Comitê são tomadas em votação ma-joritária (ou unânime, quando convergentes todos os votos) dos três membros titulares. Na eventualidade de empate na votação, porquanto o Comitê pode funcionar com menos de três membros (art. 26, § 1º), cabe ao administrador judicial resolver o impasse. Diante de eventual incom-patibilidade do administrador judicial, cabe ao juiz solucionar a diver-gência. Em todas as hipóteses, as decisões tomadas pelo Comitê devem ser consignadas no livro de atas, a ser rubricado pelo juiz em seguida. O livro de atas é guardado na secretaria do juízo, mas fica disponível para consulta do administrador judicial, dos credores em geral, do empresá-rio individual ou dos administradores, controladores ou representantes legais da sociedade empresária (art. 27, §§ 1º e 2º).

4.13. Remuneração dos membros do Comitê

A remuneração dos membros do Comitê deve ser objeto de delibe-ração na Assembleia Geral, porquanto são os próprios credores os res-ponsáveis pelo eventual pagamento, por ser o órgão constituído para representar os interesses dos credores. Com efeito, ao contrário do ad-ministrador judicial e dos respectivos auxiliares, cujas remunerações são provenientes do empresário individual ou da sociedade empresária (art.

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25), os membros do Comitê não são remunerados pelo empresário nem pela sociedade empresária em recuperação judicial (art. 29). Quando muito, são remunerados pelos próprios credores, se assim os mesmos decidirem em assembleia25.

Diante de eventual dificuldade para a composição do Comitê em razão da aprovação de ingresso voluntário (ou seja, sem remuneração alguma), o órgão pode não ser constituído, por falta de credor interessa-do em assumir o munus. Já a constituição mediante remuneração só encontra justificativa em processos de grandes sociedades empresárias (especialmente as sociedades anônimas), com credores com capacidade econômico-financeira para arcar com a remuneração dos membros do Comitê. Fora daí, não há explicação para a existência do Comitê, até mesmo por ser o órgão de constituição facultativa.

4.14. Ressarcimento de despesas do Comitê

Ao contrário do que ocorre com a remuneração, as despesas rela-cionadas aos atos do Comitê no exercício das atribuições legais (como as arroladas no art. 27) devem ser ressarcidas pelo empresário individual ou pela sociedade empresária, conforme o caso, após a comprovação e a autorização do juiz. Na verdade, o ressarcimento depende não só da comprovação das despesas e da autorização do juiz, mas também da disponibilidade de caixa (art. 29).

4.15. Ausência de Comitê

Na eventualidade de ausência de Comitê, consoante deliberações negativas de todas as classes de credores, as atribuições do órgão são desde logo exercidas pelo administrador judicial. Diante de incompati-

25 De acordo, na doutrina: “A função dos membros do Comitê pode ou não ser re-munerada. Depende da deliberação adotada pela Assembleia dos Credores. Se deliberado que a função é gratuita, aquele que não se interessar por exercê-la nessas condições deve simplesmente não aceitar a indicação para compor o órgão. Se, por outro lado, a Assembleia dos Credores aprovar alguma remuneração aos membros do Comitê, ela deve também votar o valor e quem deverá arcar com o pagamento. Quanto a este último aspecto, proíbe a lei que a remuneração dos membros do Comitê seja paga pelo devedor em recuperação ou pela massa falida. Quer dizer, os credores devem se cotizar para levantar os recursos necessários ao pagamento que a Assembleia aprovou” (Fábio Ulhoa Coelho, ComentáriosànovaLeideFalênciasedeRecuperaçãodeEmpresas, 2007, p. 79).

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bilidade do administrador, cabe ao juiz exercer as atribuições destinadas ao Comitê de Credores (art. 28).

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CApíTulO

iiireCuPerAção JudiCiAl

1. Conceito, natureza jurídica e escopo da recuperação judicial

A recuperação judicial é o processo instaurado perante o Poder Judiciário mediante ação proposta pelo empresário individual ou sociedade empresária1 em crise econômico-financeira, na tentativa de restabelecer a normalidade da respectiva atividade econômica, em prol dos empregados, dos credores, dos consumidores e até mesmo do Estado, tanto em razão da arrecadação fiscal quanto em virtude do fortalecimento da economia nacional. A propósito, reforça o art. 47 da Lei n. 11.101/2005: “A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do em-prego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica”.

2. Legitimidade ativaÀ luz da combinação dos arts. 1º e 48 da Lei n. 11.101/2005, a ação

de recuperação judicial pode ser proposta por empresário individual e por sociedade empresária no exercício da atividade econômica organi-zada há mais de dois anos, bem assim pelo cônjuge sobrevivente, pelos herdeiros do empresário falecido, pelo inventariante e pelo sócio rema-nescente, conforme autoriza o parágrafo único do art. 48.

1 Além dos legitimados ativos (empresário individual e sociedade empresária) revelados pela combinação dos arts. 1º e 47 da Lei n. 11.101/2005, o parágrafo único do art. 48 revela a existência de outros legitimados ativos: cônjuge sobrevi-vente, herdeiros, inventariante, sócio remanescente.

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Por fim, o concordatário com pedido formulado na vigência do Decreto-Lei n. 7.661/45, também pode requerer a recuperação judicial com fundamento na Lei n. 11.101/2005, consoante autoriza o § 2º do art. 192. Deferido o processamento da recuperação judicial, o anterior pro-cesso de concordata é extinto e os respectivos créditos são inscritos na recuperação judicial, com a observância do valor original, menos as eventuais parcelas já pagas pelo concordatário (art. 192, § 3º).

3. Requisitos para a propositura da recuperação judicialAlém da legitimidade ativa e do exercício da atividade econômica

há mais de dois anos, o art. 48 da Lei n. 11.101 arrola outros requisitos para a propositura da recuperação judicial, os quais devem ser preen-chidos cumulativamente:

— Não ser falido ou, se o foi, ter a declaração da extinção das respon-sabilidades mediante sentença transitada em julgado (art. 48, I, c/c os arts. 158 e 159). Quanto ao falido, é imprescindível que não tenha co-metido crime falimentar2, em razão da restrição prevista no inciso IV do art. 48. Com efeito, ainda que reabilitado por força dos arts. 158 e 159, o falido que cometeu crime falimentar não tem direito à recupe-ração empresarial, em razão do disposto no inciso IV do art. 48.

— Não ter sido já beneficiado pela concessão da recuperação judicial há menos de cinco anos (art. 48, II).

— Não ter sido já beneficiado pela concessão da recuperação judicial especial para microempresas e empresas de pequeno porte há menos de oito anos (art. 48, III, c/c os arts. 70, 71 e 72).

— Não ter sido condenado por crime empresarial o empresário indi-vidual, algum administrador ou sócio controlador da sociedade em-presarial (art. 48, IV, c/c os arts. 168 e s. da Lei n. 11.101/2005). Ao contrário do que pode parecer à primeira vista, não há contradição entre o inciso IV do art. 48 e o inciso I do art. 64. O inciso IV do art. 48

2 O Título XI do Decreto-Lei n. 7.661/45 era assim intitulado: “DOS CRIMES FA-LIMENTARES”. O atual diploma de regência, qual seja, a Lei n. 11.101/2005, to-davia, não prestigiou aquela expressão. Por outro lado, os arts. 168 e s. versam sobre os crimes cometidos no processo falimentar, mas também nos processos de recuperação judicial e extrajudicial. Por fim, o comando e o art. 1º da Lei n. 11.101 revelam a adoção de nova terminologia, em consonância com o disposto nos arts. 966 e s. do Código Civil de 2002. Daí a explicação em prol da expressão “crimes empresariais”.

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versa sobre a ilegitimidade ativa do empresário individual condenado mediante decisão transitada em julgado e da sociedade empresária cujo administrador ou sócio controlador foi condenado por crime empre-sarial. Já o inciso I do art. 64 tem lugar quando o processamento da recuperação judicial já foi admitido. Com efeito, o inciso I do art. 64 incide quando há o superveniente trânsito em julgado da condenação no curso do processo de recuperação judicial, bem assim quando há mudança do administrador na recuperação judicial já em processamen-to (arts. 1.062, 1.063 e 1.071, II e III, do Código Civil, e art. 50, IV, da Lei n. 11.101/2005). Em contraposição, o inciso IV do art. 48 conduz ao indeferimento liminar da petição inicial da recuperação judicial, em razão da ilegitimidade ativa. Tanto quanto sutil, a diferença é relevan-te, porquanto o art. 64 permite o seguimento da recuperação judicial, com a nomeação de gestor judicial.

A ausência de algum dos requisitos ocasiona o indeferimento liminar da petição inicial, com a prolação de sentença terminativa, fundada nos arts. 267, VI, e 295, ambos do Código de Processo Civil c/c o art. 189 da Lei n. 11.101/2005. Com efeito, trata-se de sentença terminativa, porquan-to a hipótese não se enquadra no disposto no art. 73 da Lei n. 11.101/2005, quando há a prolação de decisão interlocutória (agravável) de decretação da falência, em razão da convolação da recuperação judicial, por impro-cedência da mesma (art. 72, parágrafo único). No caso sob comento, toda-via, não há convolação da recuperação em falência, mas, sim, mera extin-ção do processo de recuperação judicial por carência da ação, com prolação de sentença (arts. 267, VI, e 295, ambos do Código de Processo Civil).

Da sentença cabe apelação, em quinze dias3. Diante da natureza terminativa da sentença, nada impede a propositura de nova ação de recuperação judicial, tão logo esteja satisfeito o requisito formal antes ausente. Com efeito, a combinação do art. 268 do Código de Processo Civil com o art. 48 da Lei n. 11.101/2005 conduz ao raciocínio de que o posterior cumprimento do requisito formal antes ausente permite a propositura de nova ação de recuperação judicial.

4. Créditos alcançados pela recuperação judicialPor força do art. 49 da Lei n. 11.101/2005, todos os créditos existen-

tes na data da propositura são alcançados pela recuperação judicial, até

3 Cf. arts. 508 e 513 do Código de Processo Civil c/c o art. 189 da Lei n. 11.101/2005.

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mesmo os ainda não vencidos. Com efeito, a recuperação judicial não alcança apenas os créditos vencidos, mas também os vincendos.

Como regra, as obrigações anteriores à recuperação judicial preser-vam as condições originais contratadas ou estabelecidas em lei, mas há a possibilidade de modificação no plano de recuperação (§ 2º do art. 49).

Ainda em relação aos créditos alcançados pela recuperação, os credores preservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, os fiadores e os obrigados de regresso (§ 1º do art. 49).

5. Créditos excetuados da recuperação judicial A regra (da sujeição de todos os créditos à recuperação judicial)

inserta no caput do art. 49 da Lei n. 11.101/2005, entretanto, comporta exceções, porquanto alguns créditos não são alcançados pela recuperação judicial.

A importância entregue ao empresário individual ou à sociedade empresária decorrente de adiantamento a contrato de câmbio para ex-portação não é alcançada pela recuperação judicial (art. 49, § 4º, da Lei n. 11.101/2005). Por conseguinte, o credor poderá pedir a restituição em dinheiro da importância adiantada em razão de contrato de câmbio para exportação, mediante ação de restituição4.

Quanto ao credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, até mesmo em incorporações imo-biliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domí-nio, os créditos não se submetem aos efeitos da recuperação judicial, porquanto prevalecem os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, tendo em vista a legislação respectiva. Não se permite, contudo, durante o prazo de suspensão de 180 dias, a venda ou a retirada dos bens de capital essenciais à atividade empresarial do es-tabelecimento do empresário individual ou da sociedade empresária (§ 3º do art. 49).

Por fim, como são excetuados os créditos, as ações que versem sobre eles não são suspensas em razão do deferimento do processamen-to da recuperação judicial (art. 52, III, infine).

4 Cf. art. 86, II, da Lei n. 11.101/2005, c/c o art. 75, §§ 3º e 4º, da Lei n. 4.728/65.

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6. Meios de recuperação judicial Os meios de recuperação são as soluções empresariais propostas

pelo empresário individual ou pela sociedade empresária em crise eco-nômico-financeira, na tentativa de restabelecer a lucratividade da ativi-dade empresarial.

O art. 50 da Lei n. 11.101/2005 arrola os meios disponíveis para a obtenção da recuperação do empresário individual e da sociedade em-presária. O rol, todavia, não é exaustivo, porquanto o preceito de regên-cia não afasta a utilização de outros meios (“dentre outros”). Os principais meios, entretanto, são os seguintes: – concessão de prazos adicionais e condições favorecidas para pagamento tanto de dívidas já vencidas quanto das vincendas; – cisão, incorporação, fusão ou transformação de sociedade, constituição de subsidiária integral, ou cessão de quotas ou ações; – mudança do controle societário; – substituição dos administra-dores ou em seus órgãos administrativos; – outorga aos credores da es-colha de administradores e também do poder de veto nas hipóteses es-tabelecidas pelo plano de recuperação; – aumento do capital social; – trespasse (isto é, transferência) ou simples arrendamento do estabele-cimento, até mesmo para sociedade constituída pelos respectivos em-pregados; – redução salarial, compensação de horários e redução da jornada de trabalho, tudo mediante acordo ou convenção coletiva5;– dação em pagamento ou novação de dívidas do passivo; – constituição de sociedade de credores; – venda parcial dos bens; – equalização dos encargos financeiros relativos a todos os débitos; – usufruto da empresa; – administração compartilhada; – emissão de valores mobiliários para participação de cotação em Bolsa de Valores (ações, debêntures, bônus de subscrição); – constituição de sociedade para adjudicar ativos do empresário individual ou da sociedade empresária, como forma de rea-lizar pagamentos dos créditos (art. 50 da Lei n. 11.101/2005).

7. Petição inicialAlém das exigências comuns previstas no art. 282 do Código de

Processo Civil, cuja aplicação encontra sustentação no art. 189 da Lei n.

5 Ao contrário do que pode parecer à primeira vista, o meio de recuperação em-presarial inserto no art. 50, VIII, da Lei n. 11.101/2005 está em harmonia com o disposto no art. 7º, VI, da Constituição Federal: “VI – irredutibilidade de venci-mentos, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo”.

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11.101/2005, a petição inicial da recuperação judicial deve conter a ex-posição das causas concretas da situação patrimonial do empresário individual ou da sociedade empresária, bem assim as razões da crise econômico-financeira (art. 51, I, da Lei n. 11.101/2005).

A inicial deve ser instruída com as demonstrações contábeis dos três últimos exercícios, incluídos o balanço patrimonial, a demonstração de resultados acumulados, a demonstração do resultado desde o último exercício social, o relatório gerencial do fluxo de caixa e de sua projeção para o futuro (art. 51, II, da Lei n.11.101/2005).

A exordial também deve ser instruída com a relação nominal e a qualificação completa dos credores e dos empregados (art. 51, III e IV).

A petição inicial ainda deve ser acompanhada da certidão compro-batória da regularidade da inscrição no Registro Público de Empresas, ou seja, na Junta Comercial, consoante a combinação do art. 51, V, da Lei n. 11.101/2005, com os arts. 967 e 1.150 do Código Civil de 2002, respectiva-mente: “É obrigatória a inscrição do empresário no Registro Público das Empresas Mercantis da respectiva sede, antes do início de sua atividade”. “O empresário e a sociedade empresária vinculam-se ao Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais”. Além da certidão obtida na Junta Comercial, a inicial também deve ser instruída com os atos constitutivos (p. ex., contrato de firma individual do empresário indivi-dual, contrato social da sociedade limitada, estatuto da sociedade por ações), bem assim com as atas de nomeação dos atuais administradores.

A exordial deve ser instruída com a relação dos bens particulares dos sócios controladores e dos administradores, com os extratos atuali-zados das contas bancárias do empresário individual ou da sociedade empresária, com as eventuais aplicações financeiras de qualquer moda-lidade, até mesmo em fundos de investimento ou em bolsas de valores, emitidos pelas respectivas instituições financeiras (art. 51, VI e VII).

A petição inicial também deve ser acompanhada das certidões dos cartórios de protesto da comarca do domicílio do empresário individual ou da sede da sociedade empresária, bem assim das certidões dos car-tórios de protesto das comarcas das respectivas filiais (art. 51, VIII).

Por fim, a inicial ainda deve ser instruída com a relação das ações em geral nas quais é parte o empresário individual ou a sociedade em-presária, até mesmo as ações trabalhistas (art. 51, IX).

Embora seja dispensável a instrução imediata da exordial com os livros comerciais, estes ficam à disposição do juízo e do administrador

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judicial, bem como podem ser consultados por qualquer interessado, após autorização judicial (art. 51, § 1º). Aliás, o juiz pode determinar o depósito em cartório dos livros comerciais ou de fotocópias deles (art. 51, § 3º).

8. Juízo competente É competente para deferir a recuperação judicial o juízo cível ou

empresarial existente na comarca do local do principal estabelecimento do empresário individual ou sociedade empresária nacional, ou da filial de empresa que tenha sede fora do país (art. 3º da Lei n. 11.101/2005). No que tange ao conceito de “principal estabelecimento”, não importa o indicado no contrato ou no estatuto, conforme o caso, mas, sim, o es-tabelecimento no qual reside o comando da atividade empresarial6, ainda que não seja o maior do ponto de vista físico. Trata-se de compe-tência absoluta7, a qual pode ser declarada de ofício pelo juiz, bem como pode ser suscitada na contestação ou veiculada a qualquer tempo me-diante simples petição.

A distribuição da ação de recuperação judicial previne a competên-cia do juízo para qualquer outro pedido de recuperação judicial, relativo ao mesmo empresário individual ou à mesma sociedade empresarial (art. 6º, § 8º, da Lei n. 11.101/2005).

9. Pronunciamento acerca do processamento da recupera-ção judicial

Se a petição inicial estiver completa, o juiz defere o processamento da recuperação judicial, oportunidade na qual também nomeia o admi-

6 Quanto ao conceito de principal estabelecimento, merece ser prestigiado o didá-tico precedente da relatoria do Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira: “II – Con-soante entendimento jurisprudencial, respaldado em abalizada doutrina, ‘estabe-lecimento principal é o local onde a atividade se mantém centralizada’, não sendo, de outra parte, ‘aquele a que os estatutos conferem o título principal, mas o que forma o corpo vivo, o centro vital das principais atividades do devedor’” (2ª Seção do STJ, CC 32.988/RJ, DiáriodaJustiça, 4-2-2002, p. 269). Ainda em sentido con-forme, também na jurisprudência: Pleno do STF, CJ 6.025/SP, DiáriodaJustiça, 18-2-1977, RevistaTrimestraldeJurisprudência, v. 81, p. 705.

7 Em sentido semelhante, na jurisprudência: 1ª Turma do STF, RE 98.928/RJ, DiáriodaJustiça, 12-8-1983, p. 11766.

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nistrador judicial. Com efeito, há a nomeação do administrador judicial no mesmo pronunciamento de concessão do processamento da recupe-ração judicial8.

Na mesma oportunidade, o juiz dispensa o empresário individual ou a sociedade empresária da apresentação de certidões negativas para o exercício das respectivas atividades, salvo para contratação com o Poder Público e para o recebimento de incentivos fiscais ou creditícios. Não obstante, em todos os atos, contratos e documentos firmados pelo empresário individual ou pela sociedade empresarial em recuperação judicial devem ser acrescidos os termos “em Recuperação Judicial”, após o nome empresarial (art. 52, II, c/c o art. 69, ambos da Lei n.11.101/2005). Resta saber se o juiz também deve determinar a anotação corresponden-te na Junta Comercial (isto é, no Registro Público de Empresas9), logo ao deferir o processamento da recuperação judicial. Autorizada doutri-na10 sustenta que a anotação da recuperação judicial no Registro de Empresas é consequência da decisão sobre o plano, a qual consta dos arts. 58 e 59 da Lei n. 11.101/2005. Ainda que muito respeitável a lição da melhor doutrina, a combinação do inciso II do art. 52 com o parágra-fo único do art. 69 permite a conclusão de que a anotação na Junta Co-mercial deve ser ordenada pelo juiz desde logo, já com a admissão do processamento da recuperação judicial, até mesmo para conferir maior segurança jurídica e evitar prejuízos provenientes de eventual conluio fraudulento. Em suma, à vista da combinação dos arts. 52, II, infine, e 69, parágrafo único, o juiz também deve determinar a imediata anotação do deferimento da recuperação judicial, no registro do empresário indi-vidual ou da sociedade empresária perante a Junta Comercial.

O juiz também ordena a suspensão das ações (como as execuções) movidas contra o empresário individual ou a sociedade empresária, pelo prazo de 180 dias, com a permanência dos respectivos autos dos proces-sos nos respectivos juízos de origem. Cabe ao empresário individual ou à sociedade empresária a comunicação da suspensão aos juízos compe-tentes nos quais tramitam as ações nas quais ocupa o polo passivo11. A regra da suspensão, entretanto, não é absoluta.

8 Cf. arts. 21 e 52, I, ambos da Lei n. 11.101/2005.

9 Cf. art. 1.150, primeira parte, do Código Civil de 2002.

10 Cf. Waldo Fazzio Júnior, Manualdedireitocomercial, 7. ed., 2006, p. 685 e 687.

11 Cf. arts. 6º, caput e § 4º, e 52, III e § 3º, ambos da Lei n. 11.101/2005.

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Com efeito, o deferimento do processamento da recuperação judicial não tem o condão de suspender algumas ações. Por exemplo, as ações que versam sobre quantia ilíquida devem prosseguir no mesmo juízo de origem (art. 6º, § 1º, da Lei n. 11.101/2005). As execuções fiscais e as correlativas ações de embargos às execuções fiscais também não são suspensas pelo deferimento do processamento da recuperação judicial (art. 6º, § 7º, da Lei n. 11.101/2005, e arts. 5º e 29 da Lei n. 6.830/80). As ações de natureza trabalhista também devem prosseguir perante a Justiça do Trabalho, com a posterior inclusão, no quadro geral de credores, do valor estipulado na sentença do juiz do trabalho (art. 6º, § 2º, da Lei n. 11.101/2005). Por fim, não são suspensas as ações relativas aos créditos excetuados da recupera-ção judicial12, ou seja, as ações sobre importâncias entregues ao empresá-rio individual ou à sociedade empresária como adiantamento a contrato de câmbio para exportação13, bem assim as ações movidas por credor ti-tular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprie-tário em contrato de venda com reserva de domínio (art. 52, III, infine, c/c o art. 49, §§ 3º e 4º). São, em suma, as exceções à regra da suspensão tem-porária (por 180 dias) das ações movidas contra o empresário individual ou sociedade empresária em recuperação judicial.

No mesmo pronunciamento de deferimento da recuperação judicial, o juiz determina, ao empresário individual ou à sociedade empresária, a apresentação de contas demonstrativas mensais enquanto perdurar o processo (art. 52, IV).

Ainda ao deferir o processamento da recuperação judicial, o juiz ordena a intimação do Ministério Público e a comunicação por carta às Fazendas Públicas Federal e de todos os Estados e Municípios nos quais o empresário individual ou a sociedade empresarial tiver estabelecimen-to empresarial principal ou filial (art. 52, V).

Por fim, o juiz ordena a expedição do edital14 previsto no § 1º do art. 7º da Lei n. 11.101/2005, para publicação no órgão oficial de im-

12 Cf. art. 49, §§ 3º e 4º, da Lei n. 11.101/2005.

13 Por exemplo, ação de restituição e ação de embargos de terceiro.

14 É o denominado “primeiro edital”, objeto do tópico 4.5 do anterior Capítulo I do presente Tomo II.

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prensa, com a observância das exigências arroladas nos incisos do § 1º do art. 52.

10. Impossibilidade da desistência da ação: regra e exceçãoProposta a ação de recuperação judicial e deferido o respectivo

processamento pelo juiz, não é admissível a desistência pelo empresário individual ou sociedade empresária, conforme o caso, ressalvada a hi-pótese excepcional de a Assembleia Geral de Credores aprovar a desis-tência (art. 52, § 4º, da Lei n. 11.101/2005).

11. Natureza jurídica do pronunciamento do art. 52 da Lei n. 11.101/2005

À primeira vista, o pronunciamento de deferimento do processa-mento da recuperação judicial tem natureza de despacho, razão pela qual é irrecorrível, em virtude da combinação do art. 189 da Lei n. 11.101/2005, com o art. 504 do Código de Processo Civil.

Uma segunda reflexão, entretanto, conduz à conclusão de que o pronunciamento previsto no art. 52 tem conteúdo decisório, porquanto ocasiona a suspensão das outras ações em geral15 movidas contra o empresário individual ou a sociedade empresária, conforme o caso, pelo prazo de 180 dias (art. 6º, caput e § 4º, da Lei n. 11.101/2005). Daí a ver-dadeira natureza de decisão interlocutória, como bem revelam o inciso I do § 1º do art. 52 e o caputdo art. 53 da Lei n. 11.101/2005, inverbis: “decisão que defere o processamento da recuperação judicial”; “decisão que deferir o processamento da recuperação judicial”. Por conseguinte, há a possibilidade de interposição de recurso de agravo de instrumento (p. ex., pelo terceiro prejudicado pela suspensão da respectiva ação mo-vida contra o empresário individual ou a sociedade empresária; pelo Ministério Público, como custoslegis, na eventualidade de a petição ini-cial admitida pelo juiz não cumprir as exigências legais).

Não obstante, na vigência do antigo Decreto-Lei n. 7.661/45, o Superior Tribunal de Justiça aprovou o Enunciado 264: “É irrecorrível o ato judicial que apenas manda processar a concordata preventiva”. Em-

15 Ressalvadas as exceções insertas na parte final do inciso III do art. 52 da Lei n. 11.101/2005.

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bora não seja a melhor solução à luz da Lei n. 11.101/2005, não há como afastar a possibilidade de o Superior Tribunal de Justiça firmar orienta-ção semelhante em relação ao pronunciamento de deferimento do pro-cessamento da atual recuperação judicial, na esteira do Enunciado 264. Por enquanto, na falta de precedente jurisprudencial específico daquela Corte Superior, é possível defender a tese da recorribilidade (mediante agravo de instrumento) do pronunciamento objeto do art. 52 da Lei n. 11.101/2005.

12. Plano de Recuperação

12.1. Responsabilidade pela apresentação do plano de recuperação

A apresentação da proposta inicial do plano de recuperação judicial cabe ao empresário individual ou à sociedade empresária, conforme o caso (art. 53 da Lei n. 11.101/2005).

12.2. Prazo para a apresentação do plano de recuperação

A proposta referente ao plano de recuperação judicial deve ser apresentada dentro do prazo de sessenta dias, da publicação da decisão de deferimento do processamento da recuperação judicial (arts. 50 e 53).

12.3. Consequência jurídica do decurso do prazo: decretação da falência

O decurso inalbis do prazo destinado à apresentação do plano de recuperação ocasiona a convolação em falência (arts. 53, caput, e 73, II). Com efeito, o juiz deve decretar a falência se o plano de recuperação não for apresentado pelo empresário individual ou pela sociedade empresá-ria dentro do prazo legal de sessenta dias.

A despeito da omissão, não há intimação específica do empresário individual ou da sociedade empresária, para a apresentação do plano de recuperação, sob pena de falência. A omissão quanto ao prazo de sessen-ta dias conduz à imediata convolação em falência, tendo em vista o disposto nos arts. 53, caput, e 73, II, ambos da Lei n. 11.101/2005, os quais revelam que não há nova intimação do empresário individual ou da sociedade empresária silente, mas, sim, a imediata decretação da quebra pelo juiz.

Não obstante, a decisão de convolação da recuperação em falência é impugnável mediante recurso de agravo de instrumento (art. 100,

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proêmio), porquanto a falibilidade humana pode ocasionar erro na con-tagem do prazo legal pelo juiz.

12.4. Elementos do plano de recuperação

A proposta apresentada pelo empresário individual ou pela socie-dade empresária deve conter a discriminação pormenorizada dos meios de recuperação escolhidos para tentar restabelecer a normalidade das atividades empresárias e vencer a atual crise econômico-financeira. Além dos meios de recuperação arrolados no art. 50, há a possibilidade da indicação de outras soluções imaginadas pelo empresário individual ou pelos administradores da sociedade empresária. Após a exposição ana-lítica dos meios de recuperação escolhidos, a proposta também deve conter o respectivo resumo (art. 53, I, da Lei n. 11.101/2005).

Além da exposição analítica e do resumo dos meios de recuperação, a proposta ainda deve conter a demonstração da viabilidade econômica (art. 53, II).

Por fim, o projeto de plano de recuperação deve ser instruído com laudo econômico-financeiro subscrito por profissional legalmente habi-litado (p. ex., contador, economista), com a avaliação dos bens e ativos do empresário individual e da sociedade empresária em recuperação judicial (art. 53, III).

12.5. Aviso de recebimento do plano em juízo e prazo para objeções dos credores: inteligência dos arts. 7º, § 2º, 53, parágrafo único, e 55, caput e parágrafo único, todos da Lei n. 11.101/2005

Apresentada a proposta com o plano de recuperação judicial, o juiz deve ordenar a publicação de edital no órgão oficial de imprensa, com a notícia do recebimento do plano na secretaria do juízo, a fim de que os credores possam suscitar as respectivas objeções, no prazo de trinta dias (arts. 53, parágrafo único, e 55).

Na verdade, a contagem do prazo de trinta dias depende da já ocorrência da publicação da relação de credores elaborada pelo admi-nistrador judicial (art. 7º, § 2º), ou não. Se o edital com o aviso de rece-bimento do plano tiver sido publicado antes da divulgação da relação dos credores, o prazo de trinta dias para as objeções dos credores é con-tado da publicação do edital previsto no § 2º do art. 7º, isto é, do edital com a relação dos credores (arts. 53, parágrafo único, e 55, caput). Não

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obstante, se o aviso de recebimento do plano em juízo ainda não tiver sido publicado no momento da veiculação da relação de credores, o prazo de trinta dias corre do edital referente ao aviso do recebimento do plano de recuperação (art. 55, parágrafo único), porquanto os credores não teriam como apresentar as respectivas objeções ao plano antes da entrega deste em juízo. Daí a conclusão: o prazo de trinta dias para ob-jeções só começa a correr depois da publicação do último edital, seja o referente ao aviso de recebimento do plano (art. 53), seja o edital com a relação de credores (art. 7º, § 2º).

12.6. Restrições legais ao plano de recuperação judicial

A proposta do empresário individual ou da sociedade empresária não pode estabelecer prazo superior a um ano para o pagamento de todos os créditos trabalhistas e provenientes de acidentes do trabalho já vencidos no momento da propositura da recuperação judicial (art. 54).

A proposta do plano também não pode prever prazo superior a trinta dias para o pagamento dos créditos de natureza estritamente sa-larial16 vencidos nos últimos três meses antes do ajuizamento da recupe-ração, mas somente até o limite de cinco salários mínimos por trabalha-dor (art. 54, parágrafo único). Os créditos salariais excedentes ficam sujeitos à regra do caput do mesmo art. 54.

12.7. Existência de objeção e convocação da Assembleia Geral de credores

Apresentada alguma objeção por qualquer credor, o juiz deve con-vocar a Assembleia Geral, a fim de que as três classes de credores delibe-rem sobre a aprovação, a modificação ou a rejeição do plano de recupera-ção judicial. A assembleia deve ser realizada dentro dos 150 dias do defe-rimento do processamento da recuperação judicial (arts. 35, I, a, 45, e 56).

Aprovado o plano de recuperação, os credores também podem decidir pela constituição do Comitê, bem assim escolher os respectivos membros, tudo na mesma oportunidade. A escolha dos membros do Comitê, entretanto, deve observar o disposto nos arts. 26 e 44, com vo-tações separadas em cada uma das classes de credores (art. 56, § 2º).

16 Somente os créditos provenientes dos contratos de trabalho, sem a inclusão dos créditos referentes aos acidentes do trabalho.

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12.8. Modificação do plano de recuperação: plano alternativo

A proposta apresentada pelo empresário individual ou sociedade empresária é passível de alteração durante as deliberações na assembleia. Não obstante, o plano alternativo dos credores depende da anuência expressa do empresário individual ou do representante legal da socie-dade empresária. Também não é possível a modificação da proposta original em prejuízo somente dos credores ausentes à assembleia. Com efeito, é admissível o plano alternativo que implique diminuição e res-trição aos credores em geral, mas não apenas em prejuízo dos credores ausentes (arts. 35, I, a, e 56, § 3º, ambos da Lei n. 11.101/2005).

12.9. Rejeição do Plano

Se a proposta de plano apresentada pelo empresário individual ou pela sociedade empresária em recuperação for rejeitada por alguma das classes de credores, há a convolação da recuperação em falência (arts. 56, § 4º, e 73, III), ressalvada a hipótese excepcional de divergência qua-lificada, quando o juiz pode conceder a recuperação judicial (art. 58, § 1º). Em regra, todavia, rejeitado o plano de recuperação judicial, compe-te ao juiz decretar a falência do empresário individual ou da sociedade empresária, por meio de decisão interlocutória, a qual, todavia, é impug-nável mediante agravo de instrumento (art. 100, proêmio).

12.10. Apresentação das certidões negativas de débitos tributários

Na eventualidade do decurso inalbis do prazo de trinta dias para apresentação de objeção ou, a despeito da veiculação de objeção por algum credor, aprovado o plano de recuperação na Assembleia Geral, deve o empresário individual ou o representante legal da sociedade empresária apresentar as certidões negativas de débitos tributários, para que o juiz possa proferir a decisão de concessão da recuperação judicial (arts. 57 e 58, caput, ambos da Lei n. 11.101/2005 c/c os arts. 151, 205 e 206 do Código Tributário Nacional)17.

17 A propósito, merece ser prestigiado o seguinte trecho veiculado no jornal EstadodeMinas de 26 de dezembro de 2006, proveniente da matéria do jornalista Paulo Paiva: “Os empresários brasileiros querem mudar a nova Lei de Recuperação de Empresas e Falências, que entrou em vigor em junho do ano passado. Na verdade, a mudança reivindicada pelo setor resume-se a um único ponto: o que obriga as

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13. Procedimento da recuperação judicial

13.1. Decisão concessiva da recuperação judicial

Decorrido o prazo de trinta dias sem objeção alguma ou aprovado o plano de recuperação em assembleia, em razão da improcedência da objeção veiculada por algum credor, cabe ao empresário individual ou à sociedade empresária apresentar as certidões negativas de débitos tributários ou as certidões equiparadas, em razão do parcelamento (arts. 57 e 68 da Lei n. 11.101/2005 c/c os arts. 151, 155-A, 205 e 206 do Código Tributário Nacional).

Em seguida, o juiz concede a recuperação judicial mediante decisão interlocutória passível de agravo de instrumento (arts. 58, caput, e 59, § 2º, ambos da Lei n. 11.101/2005).

13.2. Decisão concessiva da recuperação e rejeição do plano

A decisão concessiva também pode ser proferida até mesmo quan-do plano não obtém aprovação integral, ou seja, não alcança o quorum qualificado do art. 45.

Com efeito, mesmo que o plano não tenha alcançado aprovação em todas as classes, há lugar para a concessão da recuperação pelo juiz. A prolação da decisão concessiva, entretanto, depende da ocorrência de divergência reveladora de uma corrente significativa de credores em prol da aprovação do plano. Por conseguinte, o juiz pode conceder o benefí-cio da recuperação quando o plano tenha alcançado de forma cumulati-va na assembleia: – voto favorável de credores titulares de mais da me-tade dos créditos presentes à assembleia, sem consideração das classes; – voto favorável de pelo menos duas das três classes ou, na eventualida-de da ausência de alguma classe durante a assembleia, que uma das duas classes presentes tenha optado pela aprovação do plano; – voto favorável

empresas em dificuldades a apresentarem Certidões Negativas de Débitos (CNDs) com a Receita Federal antes de ter acesso aos benefícios da nova legislação. Para empresários e analistas, a obrigação fere os princípios da própria lei, já que con-fere ao Fisco prioridade no recebimento das dívidas, em detrimento dos demais credores. O desejo de alterar esse ponto foi captado pela segunda pesquisa ‘Recu-peração de empresas’, realizada pela consultora Deloitte com mais de 100 organi-zações em todo o país, todas com faturamento anual a partir de R$ 50 milhões. Cerca de 75% dos entrevistados assinalaram esse tópico na questão ‘o que mais precisa mudar’ na nova lei” (p. 10).

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de pelo menos um terço dos credores da classe contrária à aprovação. Satisfeitas todas as exigências mínimas arroladas no § 1º do art. 58, de forma cumulativa, o juiz pode conceder a recuperação judicial.

13.3. Consequências jurídicas da concessão da recuperação judicial

Homologado o plano e concedida a recuperação judicial, há a no-vação dos créditos anteriores, com a obrigação do empresário individu-al ou da sociedade empresária em recuperação, bem assim de todos os credores submetidos ao processo (arts. 49 e 59). A decisão concessiva é título executivo judicial, razão pela qual pode fundamentar futura exe-cução civil ou falencial (arts. 59, § 1º, e 62, ambos da Lei n. 11.101/2005, c/c o 475-N18, III, do Código de Processo Civil vigente).

13.4. Recorribilidade da decisão concessiva

Cabe agravo de instrumento contra a decisão concessiva da recu-peração judicial (art. 59, § 2º), recurso que deve ser interposto no prazo de dez dias e endereçado ao tribunal de segundo grau competente (arts. 522 e 524 do Código de Processo Civil, aplicáveis à vista do art. 189 da Lei n. 11.101/2005).

13.5. Prazo máximo do processo de recuperação

O processo de recuperação judicial pode durar até dois anos, prazo que somente é computado depois da decisão concessiva da recuperação. Com efeito, ainda que o plano contenha parcelamento por prazo superior (p. ex., sessenta meses), o processo de recuperação deve ser encerrado no prazo máximo de dois anos (art. 61 da Lei n. 11.101/2005).

13.6. Desrespeito ao plano no curso do biênio legal

O descumprimento ao disposto no plano de recuperação durante o prazo de dois anos ocasiona a imediata falência, decretada em razão da convolação da recuperação (arts. 61, § 1º, e 73, IV). Com efeito, a convolação em falência pode ocorrer por desrespeito a qualquer obriga-ção assumida no plano de recuperação judicial (art. 94, III, g).

18 O art. 584 do original Código de Processo Civil de 1973 foi revogado, com a transposição da matéria para o art. 475-N do Código vigente.

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No que tange aos atos empresariais praticados durante a recupe-ração judicial com a observância das formalidades legais (p. ex., aliena-ção, oneração de bens, endividamento), são considerados válidos, até mesmo quando a recuperação é convolada em falência. Com efeito, são válidos os atos empresariais realizados com a observância da Lei n. 11.101/2005, ainda que a recuperação judicial seja convolada em falência (art. 74).

Na eventualidade de decretação da falência em qualquer das hipó-teses de convolação (art. 73), os créditos de obrigações supervenientes ao ajuizamento da recuperação serão considerados extraconcursais no processo falimentar, razão pela qual têm preferência e são pagos com preferência em relação aos créditos concursais (arts. 67, 83 e 84, V).

Resta saber se o deferimento da recuperação judicial no curso do processo falimentar impede a posterior convolação em falência. É irre-levante se a recuperação judicial foi concedida na pendência da falência (art. 96, VII): sempre há lugar para a convolação em falência (arts. 73, IV, e 94, III, g).

13.7. Desrespeito ao plano depois do biênio legal

No que tange às obrigações previstas no plano com vencimento somente depois do biênio legal, o descumprimento pode ocasionar a propositura de execução civil fundada na decisão concessiva da recupe-ração judicial ou a propositura da falência, desde que preenchidas as exigências legais (arts. 59, § 1º, 62 e 94, III, g, todos da Lei n. 11.101/2005, e art. 475-N, III, do Código de Processo Civil vigente).

13.8. Satisfação das obrigações constantes do plano durante o biênio legal

Cumpridas todas as obrigações previstas no plano de recuperação durante o biênio legal, há a prolação de sentença pelo juiz, com o encer-ramento da recuperação.

A despeito do encerramento da recuperação, há ainda a necessida-de da observância das providências finais, as quais são tomadas depois da prolação da sentença (art. 63).

Por fim, a sentença prevista no art. 63 da Lei n. 11.101/2005 é im-pugnável mediante apelação, em quinze dias (arts. 508 e 513 do Código de Processo Civil c/c o art. 189 da Lei n. 11.101/2005).

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reCuPerAção JudiCiAl esPeCiAl

1. Conceitos de microempresa e empresa de pequeno portePor força dos arts. 170, IX, e 179, da Constituição Federal, as micro-

empresas e as empresas de pequeno porte devem receber tratamento privilegiado, com o recebimento de incentivos e a simplificação das obrigações tributárias, creditícias, previdenciárias e administrativas. O art. 970 do Código Civil também assegura o tratamento privilegiado, nos termos da legislação especial.

A regulamentação específica reside na Lei Complementar n. 123/2006, diploma que indica os conceitos de microempresário e de empresário de pequeno porte. À luz do art. 3º da Lei Complementar n. 123/2006, microempresa é a firma mercantil individual ou a socie-dade empresária que tiver receita bruta anual igual ou inferior a R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais). Já a empresa de pequeno porte é a firma mercantil individual ou a sociedade empresária que tiver receita bruta anual superior a R$ 240.000,00 (duzentos e quaren-ta mil reais), desde que não seja superior a R$ 2.400.000,00 (dois mi-lhões e quatrocentos mil reais)1.

1 Por oportuno, merece ser conferido o disposto no art. 3º da Lei Complementar n. 123/2006: “Para os efeitos desta Lei Complementar, consideram-se microempresas ou empresas de pequeno porte a sociedade empresária, a sociedade simples e o empresário a que se refere o art. 966 da Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002, devidamente registrados no Registro de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme o caso, desde que: I – no caso das microempresas, o empresário, a pessoa jurídica, ou a ela equiparada, aufira, em cada ano-calen-dário, receita bruta igual ou inferior a R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais); II – no caso das empresas de pequeno porte, o empresário, a pessoa jurídi-ca, ou a ela equiparada, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta superior a R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais) e igual ou inferior a R$ 2.400.000,00

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2. Facultatividade do plano especial A adoção do plano especial é facultativa, em prol apenas das mi-

croempresas e das empresas de pequeno porte (arts. 70, § 1º, e 72, caput, ambos da Lei n. 11.101/2005).

No que tange às microempresas e às empresas de pequeno porte concordatárias na vigência do Decreto-Lei n. 7.661/45, as mesmas podem requerer a recuperação judicial, mas não a recuperação especial (art. 192, § 2º, infine, da Lei n. 11.101/2005).

3. Oportunidade para a escolha entre o plano especial e o plano comum

A escolha do plano entre o especial (arts. 70 a 72) e o comum (arts. 49 a 54) deve ser indicada na petição inicial da recuperação judicial (art. 70, § 1º, c/c o art. 51).

4. Créditos alcançados pelo plano especialO plano especial abrange apenas credores quirografários. Com

efeito, não são todos os créditos alcançados, mas apenas os quirografários (art. 71, I, da Lei n. 11.101/2005).

5. Credores não alcançados pelo plano especialOs credores não quirografários não participam do processo, por-

quanto os respectivos créditos não podem ser habilitados na recuperação judicial fundada em plano especial (art. 70, § 2º, da Lei n. 11.101/2005).

6. Inexistência de suspensão dos processos cujos créditos não constam do plano especial

Apenas as ações e execuções cujos créditos foram alcançados pelo plano especial são atingidas pela recuperação judicial especial; as demais têm curso normal (art. 71, parágrafo único).

(dois milhões e quatrocentos mil reais). § 1º Considera-se receita bruta, para fins do disposto no caput deste artigo, o produto da venda de bens e serviços nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado nas operações em conta alheia, não incluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos”.

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7. Prazo para a apresentação do plano especial:sessenta dias

Tal como o plano comum de recuperação judicial, o plano especial deve ser apresentado no prazo de sessenta dias da publicação da decisão de admissão do processamento da recuperação (arts. 53, caput, e 71, caput).

8. Parcelamento máximo dos créditos: 36 mesesOs créditos quirografários alcançados pelo plano especial podem

ser divididos em até 36 meses, em parcelas mensais iguais, com correção monetária e juros de doze por cento ao ano (art. 71, II).

9. Prazo máximo para o pagamento da primeira parcela: 180 dias

A primeira parcela deve ser paga no prazo máximo de 180 dias da distribuição da petição inicial da ação de recuperação especial (art. 71, III).

10. Aumento de despesas e contratação de empregados: necessidade de autorização judicial

O empresário individual e a sociedade empresária em recuperação judicial pelo regime especial previsto nos arts. 70 a 72 só podem aumen-tar despesas e contratar empregados mediante expressa autorização do juiz, com a prévia manifestação do administrador judicial e do eventual Comitê de Credores (art. 71, IV).

11. Aprovação do plano especial pelo juiz: inexistência de convocação de assembleia

Ainda que apresentadas objeções pelos credores, não há a convo-cação de assembleia de credores para a aprovação do plano especial, porquanto a competência para a respectiva aprovação é do juiz. Com efeito, cabe apenas ao juiz julgar o pedido de recuperação judicial fun-dada em plano especial (art. 72, caput).

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12. Improcedência da recuperação especial em razão de objeções

Na eventualidade de credores titulares de mais da metade dos créditos apresentarem objeções ao plano especial, o juiz deve julgar improcedente a recuperação judicial especial, com a imediata decretação da falência (art. 72, parágrafo único).

Ao contrário do que pode parecer à primeira vista, o pronun-ciamento judicial previsto no parágrafo único do art. 72 não é sen-tença apelável, mas, sim, decisão interlocutória agravável, em razão da conversão do processo de recuperação especial em falência (art. 100, proêmio).

13. Vedação A microempresa e a empresa de pequeno porte já beneficiadas pela

concessão da recuperação com base no plano especial não podem reque-rer nova recuperação dentro do prazo de oito anos (art. 48, III).

14. Aplicação subsidiária das regras da recuperação judicial fundada em plano comum

No que for omissa a Seção V do Capítulo III da Lei n. 11.101/2005, específica sobre o plano especial, incidem as regras relativas à recupera-ção fundada em plano comum.

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VreCuPerAção eXTrAJudiCiAl

1. Conceito e natureza jurídica da recuperação extrajudicialA recuperação extrajudicial é o processo no qual o empresário in-

dividual ou a sociedade empresária em crise econômico-financeira busca a homologação judicial de plano de recuperação empresarial pro-veniente de prévia negociação extrajudicial com os respectivos credores, a fim de que as dívidas possam ser pagas em prol dos credores, mas em condições também favoráveis ao devedor.

Ao contrário do que pode parecer à primeira vista, a recuperação extrajudicial é um processo judicial, o qual, todavia, é precedido por uma fase extrajudicial, consubstanciada na negociação extrajudicial do em-presário individual ou da sociedade empresária com os respectivos credores1.

2. Legitimados ativosA legitimidade ativa para requerer a homologação judicial do pla-

no de recuperação extrajudicial é extraída da combinação dos arts. 48 e 161 da Lei n. 11.101/2005.

Em primeiro lugar, só o empresário individual e a sociedade em-presária com regular registro na Junta Comercial há mais de dois anos

1 Ainda a respeito do conceito e da natureza jurídica da recuperação extrajudicial, merece ser prestigiada a lição da doutrina: “A recuperação extrajudicial é um procedimento concursal preventivo que contém uma fase preambular de livre contratação e outra final ancorada à formalização judicial. A validade do pacto celebrado envolvendo credores e devedor é condicionada à homologação judicial (...). A recuperação extrajudicial é, sobretudo, um negócio plurilateral. Com efeito, trata-se de um acordo celebrado entre o devedor e alguns credores ou entre o devedor e todos os credores que, consubstanciado formalmente num plano de recuperação do devedor, é levado à homologação judicial” (Waldo Fazzio Júnior, Manualdedireitocomercial, 7. ed., 2006, p. 668-669).

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têm legitimidade para propor a homologação da recuperação extrajudi-cial (arts. 48, caput, e 161, caput).

Em contraposição, não tem legitimidade ativa o empresário indi-vidual ou a sociedade empresária ainda sob a pecha da falência, ou seja, que ainda não teve as respectivas obrigações e responsabilidades decla-radas extintas mediante sentença transitada em julgado em ação de re-abilitação (art. 48, I, c/c os arts. 158 e 159). Com maior razão, não tem legitimidade ativa o empresário individual ou a sociedade empresária cujo administrador foi condenado por crime empresarial (art. 48, IV).

Por fim, a legitimidade ativa do empresário individual ou da so-ciedade empresária depende da inexistência de ação de recuperação judicial em curso e que também não tenha ocorrido a concessão da re-cuperação judicial ou a homologação da recuperação extrajudicial nos últimos dois anos (art. 161, § 3º).

A falta de algum dos requisitos legais2 conduz à carência da ação, com a prolação de sentença terminativa (art. 267, VI, do Código de Pro-cesso Civil). Incide, por conseguinte, o art. 268 do Código de Processo Civil, com a possibilidade da propositura de novo pedido de homologa-ção de plano de recuperação extrajudicial, desde que cumpridos os re-quisitos legais (art. 164, § 8º, da Lei n. 11.101/2005).

3. Vedações ao Plano O plano de recuperação extrajudicial não pode estabelecer o paga-

mento antecipado de dívidas, nem conferir tratamento desfavorável aos credores cujos créditos não foram alcançados, sob pena de a homologa-ção judicial ser denegada pelo juiz (art. 161, § 2º).

4. Inexistência de suspensão das açõesA propositura do requerimento de homologação judicial do plano

de recuperação extrajudicial não suspende os processos em curso, nem mesmo as execuções (art. 161, § 4º). Não incide, por conseguinte, o dis-posto no art. 6º, preceito que alcança apenas os processos de falência e de recuperação judicial, mas não o processo de homologação do plano de recuperação extrajudicial, cujo preceito de regência é o art. 161.

2 Cf. arts. 48, caput e I e IV, e 161, caput e § 3º, ambos da Lei n. 11.101/2005.

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5. Regra da impossibilidade de desistência dos credores que aderiram ao Plano

Em regra, os credores que participaram da prévia negociação e aderiram ao plano de recuperação extrajudicial não podem desistir des-te. Só é possível a desistência com a concordância expressa de todos os subscritores do plano, inclusive do empresário individual ou do repre-sentante legal da sociedade empresária, conforme o caso (art. 161, § 5º).

Com efeito, ao contrário do que ocorre em vários preceitos3 da Lei n. 11.101/2005, não há, no § 5º do art. 161, referência somente ao “deve-dor” nem apenas aos “credores”, mas, sim, aos “signatários”. Daí a conclusão: só é admissível a desistência de algum credor quando há a anuência do devedor (empresário individual ou sociedade empresária, à vista do art. 1º), bem como dos demais credores subscritores do plano.

6. Possibilidade de propositura de falência pelos credores não sujeitos ao Plano

Os credores titulares de créditos não alcançados pelo plano de re-cuperação extrajudicial podem requerer a falência do empresário indi-vidual ou da sociedade empresária, ainda que na pendência do processo de homologação extrajudicial daquele plano (art. 161, § 4º, infine).

7. Créditos excluídos da recuperação extrajudicialNão são todos os créditos que são compatíveis com a recuperação

extrajudicial, a qual não alcança créditos tributários, trabalhistas, aciden-tários e alguns créditos contratuais especiais (art. 161, § 1º). Com efeito, a recuperação extrajudicial não é admissível em relação aos créditos de natureza tributária, provenientes da relação de trabalho, decorrentes de acidentes de trabalho, referentes a adiantamento a contrato de câmbio para exportação (arts. 49, § 4º, 86, II, e 161, § 1º, todos da Lei n. 11.101/2005 c/c o art. 75, §§ 3º e 4º, da Lei n. 4.728/65), bem assim os créditos relati-vos aos contratos de alienação fiduciária, arrendamento mercantil (isto é, leasing) e de promessa de compra e venda de imóvel com cláusula de irrevogabilidade e de irretratabilidade (art. 49, § 3º, c/c o art. 161, § 1º, ambos da Lei n. 11.101/2005).

3 Por exemplo, no art. 161, caput e §§ 2º, 3º e 4º, da Lei n. 11.101/2005, são encon-trados os vocábulos “devedor” e “credores”.

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8. Créditos incluídos no plano extrajudicial: créditos com garantia real, com privilégio especial, com privilégio geral, quirografários e subordinados

Exvi da interpretação acontrariosensu do § 1º do art. 161 da Lei n. 11.101/2005, todos os créditos das classes arroladas nos incisos II (crédi-tos com garantia real), IV (créditos com privilégio especial), V (créditos com privilégio geral), VI (créditos quirografários) e VIII (créditos subor-dinados) do art. 83 podem ser incluídos no plano de recuperação extra-judicial. Aliás, é possível a inclusão de todos os créditos de uma deter-minada classe, bem assim de apenas um grupo dos respectivos credores (art. 163, § 1º, primeira parte).

Não obstante, somente os créditos incluídos no plano são conside-rados na apuração da existência de maioria qualificada de três quintos (ou seja, de sessenta por cento), quando há divergência por parte de credores em relação ao plano proposto pelo empresário individual ou pela sociedade empresária, conforme o caso (art. 163, §§ 1º e 2º).

Subscrito o plano extrajudicial por pelo menos três quintos dos credores titulares de créditos de uma mesma classe (ou seja, ao menos sessenta por cento dos créditos de igual natureza sujeitos ao plano), os demais credores incluídos no plano também ficam obrigados à vista do caput e do § 1º do art. 163 da Lei n. 11.101/2005.

9. Petição inicialA petição inicial da ação de homologação do plano de recuperação

extrajudicial sem divergência com os credores alcançados deve ser fun-damentada (“juntando sua justificativa”, como determina o art. 162), instruída com o documento no qual constam os termos e condições do plano extrajudicial, com as assinaturas dos credores que aderiram.

Além das exigências gerais previstas no art. 162, a petição inicial da ação de homologação de plano extrajudicial com divergência também deve ser instruída com a exposição da situação patrimonial do empre-sário individual ou da sociedade empresária, as demonstrações contábeis relativas ao último exercício social, os documentos comprobatórios dos poderes dos subscritores do plano para novar e transigir, a relação no-minal completa dos credores, a classificação e o valor atualizado dos créditos, o regime dos respectivos vencimentos e a indicação dos registros contábeis de cada transação pendente, tudo à vista do § 6º do art. 163, c/c o art. 162, ambos da Lei n. 11.101/2005.

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10. Procedimento único para as recuperações extrajudiciais sem e com divergência

Recebidas as petições iniciais das homologações dos planos de recuperação extrajudicial sem e com divergência (arts. 162 e 163, respec-tivamente), o juiz determina a publicação de edital no órgão oficial de imprensa e em jornal de grande circulação nacional ou na localidade do estabelecimento empresarial, a fim de que os credores possam tomar ciência da abertura do prazo de trinta dias para impugnações ao plano (art. 164, caput).

11. Prazo para impugnação ao plano de recuperação extraju-dicial: trinta dias

Os credores podem apresentar impugnações no prazo de trinta dias, contados da publicação do edital (art. 164, caput e § 2º). Como é necessária a veiculação do edital no órgão oficial de imprensa e em jornal de grande circulação, o prazo só começa a correr da última publicação, em virtude da combinação do art. 164, caput e § 2º, com os arts. 53, pa-rágrafo único, e 55, caput e parágrafo único, aplicáveis por analogia.

Ainda no mesmo prazo de trinta dias, deve ser comprovada a re-messa de correspondência a todos os credores sujeitos ao plano extraju-dicial. A postagem que fica a cargo do empresário individual ou da so-ciedade empresária, conforme o caso (art. 164, § 1º).

12. Matérias passíveis de veiculação na impugnação ao plano de recuperação extrajudicial

A impugnação só pode versar sobre as matérias arroladas no § 3º do art. 164 da Lei n. 11.101/2005. Em primeiro lugar, o credor pode sus-citar preliminares referentes ao descumprimento dos requisitos legais previstos nos arts. 48, 161 e 163. No mérito, o credor pode apontar atos fraudulentos e simulados arrolados nos arts. 94, III, e 130.

Ao contrário do que ocorre com a impugnação cabível contra a relação de credores, a qual é autuada em separado por força dos arts. 8º e 13, o mesmo não ocorre com a impugnação ao plano de recuperação extrajudicial. Com efeito, a impugnação ao plano é juntada nos próprios autos do processo de recuperação extrajudicial.

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13. RéplicaProtocolizada alguma impugnação, é aberta vista ao empresário

individual ou à sociedade empresária, com a oportunidade de réplica, em cinco dias (art. 164, § 4º).

14. Julgamento das impugnaçõesAs eventuais impugnações são julgadas pelo juiz mediante senten-

ça, com a concessão ou a denegação da homologação, conforme o caso. Tanto a sentença concessiva quanto a sentença denegatória da homolo-gação são impugnáveis mediante apelação, sem efeito suspensivo (arts. 161, § 6º, e 164, §§ 5º, 6º e 7º, da Lei n. 11.101/2005)4. Por conseguinte, a sentença homologatória do plano de recuperação tem eficácia desde logo, como bem revela o caputdo art. 165 da Lei n. 11.101/2005. Daí a possibilidade da imediata apresentação de requerimento de cumprimen-to da sentença, mediante execução provisória da sentença homologatória do plano de recuperação extrajudicial (arts. 475-I e 475-N do Código de Processo Civil)5.

15. Natureza jurídica do pronunciamento de homologação: sentença

Ainda em relação ao pronunciamento referente ao plano de recu-peração extrajudicial, será sempre sentença, independentemente da

4 Não obstante, o efeito suspensivo inexistente exvilegis pode ser concedido pelo juiz de primeiro grau, desde que solicitado pelo apelante nas razões do recurso apelatório (arts. 518, caput, 520 e 558, parágrafo único, todos do Código de Pro-cesso Civil c/c o art. 189 da Lei n. 11.101/2005). Denegado o pleito pelo juiz de origem, ainda há lugar para a concessão mediante agravo de instrumento peran-te o tribunal de segundo grau (arts. 522, infine, 527, III, e 558, caput, todos do Código de Processo Civil c/c o art. 189 da Lei n. 11.101/2005). Ainda a respeito do tema: Bernardo Pimentel Souza, Introduçãoaosrecursoscíveiseàaçãorescisória, 5. ed., 2008, p. 359-365.

5 Em abono ao raciocínio sustentado no texto, na doutrina: “Qualquer decisão ju-dicial sobre o plano, positiva ou negativa, o recurso cabível será sempre de ape-lação sem efeito suspensivo. De tal arte que, se o juiz homologar o plano, embora haja recurso do Ministério Público ou de algum credor discordante, o que foi homologado começa a produzir efeitos” (Waldo Fazzio Júnior, Manualdedireitocomercial, 7. ed., 2006, p. 674).

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existência de impugnação, ou não, e da homologação judicial ou da respectiva denegação (arts. 161, § 6º, e 164, §§ 5º, 6º e 7º, da Lei n. 11.101/2005, e art. 475-N, III, do Código de Processo Civil). Em todas as hipóteses, há a prolação de sentença, a qual é impugnável mediante re-curso de apelação, em quinze dias (art. 508 do Código de Processo Civil)6.

Por fim, a sentença homologatória do plano de recuperação extra-judicial constitui título executivo judicial, a ensejar o requerimento de cumprimento da sentença previsto no art. 475-I do Código de Processo Civil (art. 161, § 6º).

16. Inexistência de coisa julgada em decorrência da sentença denegatória

Ao contrário da sentença concessiva da homologação do plano de recuperação extrajudicial, a qual tem natureza de título executivo judicial e ocasiona a formação da coisa julgada material, o mesmo não ocorre com a sentença denegatória da homologação. Daí a possibilidade da propositura de novo requerimento de homologação judicial do plano extrajudicial, tão logo sejam cumpridas as exigências legais pelo empre-sário individual ou pela sociedade empresária, conforme o caso (art. 164, § 8º).

17. Possibilidade de acordos privados supervenientesA pendência do processo de recuperação extrajudicial e até a pro-

lação da respectiva sentença homologatória não impedem a realização de acordos privados entre os credores e o empresário individual ou a sociedade empresária, ainda que os acordos sejam supervenientes à propositura da ação de recuperação extrajudicial ou à prolação da sen-tença homologatória (art. 167).

6 Em sentido conforme, na doutrina: “Qualquer decisão judicial sobre o plano, positiva ou negativa, o recurso cabível será sempre de apelação sem efeito sus-pensivo” (Waldo Fazzio Júnior, Manualdedireitocomercial, 7. ed., 2006, p. 674).

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FAlÊnCiA

1. Conceito de falênciaA falência é o processo judicial consubstanciado na execução con-

cursal – ou coletiva1 – movida contra o empresário individual ou a so-ciedade empresária, a fim de arrecadar o ativo para liquidar o respecti-vo passivo em favor dos credores, com o imediato afastamento do empresário, da sociedade e dos respectivos sócios ilimitadamente res-ponsáveis das atividades empresárias (arts. 1º, 75, 81, 115 e 190 da Lei n. 11.101/2005).

2. EtimologiaAs raízes históricas do termo “falência” residem no latim “fallere”,

cujo significado (falhar, faltar, enganar) revela a essência do instituto jurídico: omissão do empresário individual ou da sociedade empresária em relação ao pagamento das obrigações com os respectivos credores, por falta de recursos financeiros ou por conduta fraudulenta na admi-nistração empresarial2.

1 De acordo, na doutrina: “Quando um devedor comerciante não paga suas obri-gações, instaura-se contra ele execução coletiva” (Celso Agrícola Barbi, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. I, 9. ed., 1994, p. 86, n. 126).

2 De acordo, na doutrina: “Convém, nestes estudos preliminares, indagarmos da origem etimológica do vocábulo falênciaou, mais precisamente, do verbo falir. Proveio, sem dúvida, do verbo latino fallere – faltar, enganar. Significa falta do cumprimento de uma obrigação ou do que foi prometido. De expressão comum o verbo passou, tecnicamente, no meio jurídico, a expressar a impossibilidade do devedor pagar suas dívidas, em consequência da falta de meios decorrentes de escasso e insuficiente patrimônio” (Rubens Requião, Cursodedireitofalimentar, v. I, 14. ed., 1991, p. 3, com os destaques em itálico no original).

CApíTulO

Vi

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Com efeito, a execução concursal – ou coletiva – de empresário ou sociedade empresária é denominada “falência”, tendo em vista o dispos-to na Lei n. 11.101/2005. Não obstante, o sinônimo “quebra” é o termo encontrado no antigo Código Comercial de 1850, cuja Parte Terceira tinha o seguinte título: “DAS QUEBRAS”. É certo que os respectivos arts. 797 a 913 do Código de 1850 foram revogados com o advento do Decreto-Lei n. 7.661/45, diploma intitulado “Lei de Falências”. Consagrou-se, a partir daí, o termo “falência”, prestigiado na atual Lei n. 11.101/2005.

Além dos vocábulos “falência” e “quebra”, o antigo termo “ban-carrota” também pode ser utilizado para designar a falência3, com bem revela o art. 263 do Código Criminal de 1830: “A bancarrôta que for qualificada de fraudulenta, na conformidade das Leis do Comércio, será punida com a prisão com trabalho por oito annos”4.

Já o termo “insolvência” não pode ser considerado sinônimo de “falência”, tendo em vista o disposto no direito positivo brasileiro. Com efeito, o vocábulo “insolvência” designa instituto do direito processual civil, como bem revelam os arts. 748 e s. do Código de Processo Civil. Em suma, os termos “quebra” e “bancarrota” são sinônimos de “falência”, mas não o vocábulo “insolvência”, porquanto este tem lugar no direito processual civil, para designar o processo contra o devedor civil cujas dívidas superam os bens pessoais.

Por fim, os vocábulos “falimentar” e “falencial” também podem ser utilizados para designar a falência e o respectivo processo.

3. Princípios do processo falimentar O processo falimentar é norteado pelos princípios da celeridade

e da economia processual (art. 75, caput, da Lei n. 11.101/2005). Aliás, mais do que princípios do processo falimentar, os princípios da celeri-dade e da economia são princípios constitucionais norteadores dos processos em geral (arts. 5º, LXXVIII, e 93, XV, ambos da Constituição Federal vigente).

3 É preciso reconhecer, entretanto, que a doutrina clássica ensina que o termo “bancarrota” significa falência fraudulenta: cf. Rubens Requião, Cursodedireitofalimentar, v. I, 14. ed., 1991, p. 3-4. Não obstante, o art. 263 do Código Criminal de 1830 permite sustentar que há sinonímia com o termo “falência”.

4 Texto transcrito com a redação original.

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No que tange ao processo falimentar, é possível encontrar a influ-ência dos princípios da celeridade e da economia processual em vários preceitos da Lei n. 11.101/2005. Por exemplo, o art. 79 assegura a prefe-rência5 de julgamento das ações, dos incidentes e dos recursos relativos à falência em todos os graus de jurisdição, em razão da celeridade que marca o processo falimentar. Já a economia processual é encontrada no art. 80, preceito segundo o qual os créditos incluídos no Quadro Geral de Credores durante a recuperação judicial já são considerados habilita-dos na falência. Outro exemplo de incidência do princípio da economia processual reside na segunda parte do § 3º do art. 159, em virtude da possibilidade da declaração da extinção das obrigações do falido na própria sentença de encerramento da falência, sem a necessidade da prolação de sentença específica para a reabilitação.

4. Distribuição imediata e obrigatóriaAlém da distribuição imediata garantida às ações em geral à vista

do inciso XV do art. 93 da Constituição Federal vigente, a distribuição da ação falimentar também é obrigatória. Por conseguinte, o disposto no art. 257 do Código de Processo Civil não alcança a ação falimentar, por-quanto prevalece o preceito específico, qual seja, o art. 78, caput, da Lei n. 11.101/2005, segundo o qual a distribuição é obrigatória, vale dizer, a distribuição da falência não está sujeita ao pagamento de custas iniciais. À luz da combinação do art. 84, III, infine, com o art. 149, caput, ambos da Lei n. 11.101/2005, as custas processuais somente são pagas depois da arrecadação dos bens e da realização do ativo e das restituições, quando são pagos os créditos extraconcursais.

5. Juízo competenteÉ competente para processar e julgar a falência o juízo cível ou

empresarial existente na comarca do local do principal estabelecimento do empresário individual ou da sociedade empresária nacional (art. 3º da Lei n. 11.101/2005). No que tange ao conceito de “principal estabele-

5 O art. 79 da Lei n. 11.101, entretanto, deve ser interpretado conforme a Cons-tituição Federal, porquanto as ações constitucionais de habeascorpus, mandado de segurança, habeasdata e ação popular têm preferência em relação à ação de falência.

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cimento”, não importa o indicado no contrato ou no estatuto, conforme o caso, mas, sim, o estabelecimento no qual reside o comando da ativi-dade empresarial6, ainda que não seja o maior do ponto de vista físico. Trata-se de competência absoluta7, a qual pode ser declarada de ofício pelo juiz, bem como pode ser suscitada na contestação ou veiculada a qualquer tempo mediante simples petição.

Já em relação às sociedades empresárias estrangeiras, a competên-cia é do juízo do local da filial existente no país (art. 3º, infine, da Lei n. 11.101/2005).

Por fim, a distribuição da ação de falência previne a competência do juízo para qualquer outro pedido de falência relativo ao mesmo em-

6 Quanto ao conceito de principal estabelecimento, merece ser prestigiado o didá-tico precedente da relatoria do Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira: “II – Con-soante entendimento jurisprudencial, respaldado em abalizada doutrina, ‘estabe-lecimento principal é o local onde a atividade se mantém centralizada’, não sendo, de outra parte, ‘aquele a que os estatutos conferem o título principal, mas o que forma o corpo vivo, o centro vital das principais atividades do devedor’” (2ª Seção do STJ, CC 32.988/RJ, DiáriodaJustiça, 4-2-2002, p. 269). Ainda em sentido con-forme, também na jurisprudência: Pleno do STF, CJ 6.025/SP, DiáriodaJustiça, 18-2-1977, RevistaTrimestraldeJurisprudência, v. 81, p. 705. Por fim, ainda na juris-prudência: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. PEDIDO DE FALÊNCIA. COMPE-TÊNCIA. SEDE DESIGNADA NOS ESTATUTOS. PREVALÊNCIA DO PRINCIPAL ESTABELECIMENTO. I – É competente para declarar a falência o juízo do local em cuja jurisdição o devedor tem o seu principal estabelecimento ou da filial de empresa que tenha sede fora do Brasil. Inteligência do art. 3º da Lei n. 11.101/2005. II – Consoante entendimento jurisprudencial, respaldado em abalizada doutrina, ‘estabelecimento principal é o local onde a atividade se mantém centralizada’, não sendo, de outra parte, ‘aquele a que os estatutos conferem o título principal, mas o que forma o corpo vivo, o centro vital das principais atividades do devedor’ (CC 32.988/RJ, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, SEGUNDA SE-ÇÃO’. III – Deu-se provimento” (6ª Turma Cível do TJDF, AGI 2007.00.2.007081-3, DiáriodaJustiça, 30-8-2007, p. 106).

7 De acordo, na jurisprudência: “FALÊNCIA. FORO DO ESTABELECIMENTO PRINCIPAL DO DEVEDOR. COMPETÊNCIA ABSOLUTA. Conforme prescrição expressa no art. 7º do Decreto-Lei n. 7.661/45, bem como no art. 3º da nova Lei de Falências – Lei n. 11.101/2005 –, o foro competente para declaração da falência é aquele onde o devedor mantém o seu principal estabelecimento” (2ª Turma Cível do TJDF, AGI 2004.00.2.003330-5, Acórdão registrado sob o número 218.531, DiáriodaJustiça, 4-8-2005, 63). “– A competência do juízo falimentar é absoluta” (2ª Seção do STJ, CC 37.736/SP, DiáriodaJustiça, 16-8-2004). Ainda em sentido semelhante, também na jurisprudência: 1ª Turma do STF, RE 98.928/RJ, DiáriodaJustiça, 12-8-1983, p. 11766.

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presário individual ou à mesma sociedade empresarial (art. 6º, § 8º, da Lei n. 11.101/2005)8.

6. Juízo universal da falênciaEm regra, as ações sobre bens, negócios e interesses em geral do empre-

sário individual e da sociedade empresária também são processadas perante o juízo da falência, o qual é universal. Com efeito, além da ação de falência, o juízo falimentar tem competência para a generalidade das ações relaciona-das aos bens, negócios e interesses do empresário individual e da sociedade empresária. É a regra extraída do proêmio do art. 76 da Lei n. 11.101/2005.

7. Distribuição por dependência das ações sujeitas ao juízo universal da falência

Na esteira da ação de falência, as inúmeras ações conexas devem ser distribuídas no mesmo juízo da falência, por dependência ao proces-so falimentar já instaurado (art. 78, parágrafo único, da Lei n. 11.101/2005). A ação de retificação do art. 10, § 6º, a ação de responsabilização do art. 82, a ação de restituição do art. 85, a ação de embargos de terceiro do art. 93, a ação de recuperação judicial dos arts. 95 e 96, VII, a ação revocatória dos arts. 130 e 132, a ação de prestação de contas do art. 154 e a ação de reabilitação do art. 159, por exemplo, devem ser propostas no juízo da falência e distribuídas por dependência ao processo falimentar.

Ainda em relação às ações conexas, o administrador judicial nome-ado pelo juiz no processo falimentar deve ser intimado para participar de todas as ações, sob pena de nulidade dos respectivos processos (art. 76, parágrafo único, com o reforço do art. 22, III, c).

8. Exceções ao juízo universal da falência O art. 76 da Lei n. 11.101/2005 indica as ações que não são proces-

sadas perante o juízo da falência, porquanto a regra da universalidade não é absoluta.

8 Assim, na jurisprudência: 2ª Turma do TJDF, AGI 2005.00.2.007098-9, DiáriodaJustiça, 7-3-2006, p. 90: “1. A fixação da competência para o conhecimento e julga-mento de ações falimentares se opera quando da distribuição da primeira ação manejada com esse mister, estando prevento o juízo que primeiro cuidou da ma-téria”.

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Em primeiro lugar, a combinação do art. 6º, § 2º, segunda parte, com o art. 76 da Lei n. 11.101/2005 revela que as ações de natureza tra-balhista não são processadas perante o juízo falimentar, ainda que ajui-zadas depois da decretação da falência. À vista do art. 114 da Constitui-ção Federal, a competência é da Justiça do Trabalho.

Por força da combinação do art. 6º, § 7º, com o art. 76, ambos da Lei n. 11.101/2005, as ações de execução fiscal e de embargos à execução fiscal também não são processadas perante o juízo da falência. Em refor-ço, o art. 187 do Código Tributário Nacional e os arts. 5º e 29 da Lei n. 6.830/80 estabelecem que a cobrança judicial do crédito tributário não está sujeita a concurso de credores nem habilitação na falência. Com efeito, como as execuções fiscais e as correlativas ações de embargos não são da competência do juízo da falência, devem ser distribuídas segun-do os princípios da alternatividade, do sorteio e da publicidade9 peran-te os juízos especializados da Fazenda Pública ou, na falta dos mesmos, entre os juízos cíveis, sem dependência alguma ao processo falimentar10. Nada impede, entretanto, que a pessoa jurídica de direito público inter-no titular do crédito tributário opte pela habilitação do mesmo no pro-cesso falimentar, quando fica sujeita ao juízo da falência11.

Também não compete ao juízo da falência processar as ações não reguladas pela Lei n. 11.101/2005, quando movidas pelo empresário individual, pela sociedade empresária ou pelos sócios com responsabi-lidade ilimitada, na qualidade de autor ou de litisconsórcio ativo (art.

9 Cf. arts. 252 e 256 do Código de Processo Civil.

10 Assim, na jurisprudência: “CONFLITO DE COMPETÊNCIA. EXECUÇÃO FIS-CAL. FALÊNCIA DA EXECUTADA. A teor do disposto no art. 187, do Código Tributário Nacional e na Lei de Execuções Fiscais, não há obrigação, por parte da Fazenda Pública, em habilitar-se perante o juízo universal da falência, uma vez que a cobrança judicial de crédito tributário não está sujeita ao concurso de cre-dores. Precedentes jurisprudenciais. CONFLITO ACOLHIDO” (5ª Câmara Cível do TJRS, CC 70014787964, DiáriodaJustiça, 31-5-2007).

11 Assim, na jurisprudência: “CRÉDITO TRIBUTÁRIO. HABILITAÇÃO NA FA-LÊNCIA. POSSIBILIDADE. IMPUGNAÇÃO. 1 – O crédito tributário – cuja co-brança judicial se faz por meio de procedimento próprio, a execução fiscal – não é sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência. 2 – No entanto, po-derá a Fazenda Pública optar pela habilitação de seu crédito na falência, caso em que a competência para eventual impugnação será do juízo falimentar. 3 – Agra-vo provido” (6ª Turma Cível do TJDF, AGI 2008.00.2.001657-8, DiáriodaJustiça, 2-4-2008, p. 110).

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76, caput, infine). Com efeito, as ações propostas pelo empresário indi-vidual, pela sociedade empresária ou pelos sócios com responsabilidade ilimitada não são da competência do juízo da falência12.

Salvo a ação de falência, não compete ao juízo falimentar processar e julgar as ações em geral nas quais a União, as autarquias e as empresas públicas federais participam na qualidade de autoras, rés, opoentes ou assistentes, ainda que movidas contra o empresário individual ou a so-ciedade empresária em regime falimentar. À vista do art. 109, I, da Constituição, trata-se de competência da Justiça Federal13.

Não obstante, as ações trabalhistas, fiscais e cíveis processadas fora do juízo da falência são acompanhadas pelo administrador judicial, o qual deve ser intimado, sob pena de nulidade dos respectivos processos (art. 76, parágrafo único, com o reforço do art. 22, III, c, da Lei n. 11.101/2005).

Sob outro prisma, as ações penais também não são da competência do juízo da falência (art. 183 da Lei n. 11.101/2005). Com efeito, compe-te ao juízo criminal conhecer da ação penal pelos crimes previstos na Lei n. 11.101/2005. A ação penal só é processada perante o mesmo juízo da falência nas comarcas de interior com vara única. Nas demais comarcas, a ação penal é processada perante o juízo criminal.

Por fim, as ações que versam sobre quantia ilíquida iniciadas antes da falência têm prosseguimento no mesmo juízo no qual foram propos-tas, ainda que movidas contra o empresário individual ou a sociedade empresária (art. 6º, § 1º, da Lei n. 11.101/2005)14. Com a superveniência

12 A propósito, merece ser prestigiada a lição do Professor Waldo Fazzio Júnior: “A lei não menciona, mas também prosseguem contra o devedor mesmo as ações tangentes com o direito de família (ação de divórcio, de nulidade matrimonial etc.), visto que personalíssimas” (Manualdedireitocomercial, 7. ed., 2006, p. 648).

13 Assim, na jurisprudência: “COMPETÊNCIA. CONFLITO. AÇÃO AJUIZADA POR EMPRESA PÚBLICA FEDERAL CONTRA MASSA FALIDA. PRECEDENTES DA SEÇÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. – Não se tratando de causa de falência, assim entendida aquela em que se pede a decretação da quebra ou é regulada pela lei respectiva, a competência para as ações em que figure como autora, ré, assistente ou opoente a União, autarquia ou empresa pública federal, é da Justiça Federal, ainda que movimentada contra massa falida” (2ª Seção do STJ, CC 16.115/RS, DiáriodaJustiça, 24-2-2003, p. 179).

14 Em abono, na doutrina: “Em cinco hipóteses, contudo, abrem-se exceções ao princípio da universalidade do juízo falimentar: omissis; b) ações que demandam quantia ilíquida, independentemente da posição da massa falida na relação pro-

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da falência, o administrador judicial assume a representação judicial da massa falida, no juízo original no qual a ação tramita, sem deslo-camento para o juízo falimentar (art. 22, III, alínea c, da Lei n. 11.101/2005).

9. Legitimidade ativa A falência do empresário individual ou da sociedade empresária

pode ser requerida por qualquer um dos legitimados arrolados no art. 97 da Lei n. 11.101/2005.

Em primeiro lugar, há a possibilidade da denominada autofalência, porquanto o empresário individual e a sociedade empresária podem requerer as respectivas falências (arts. 97, I, 105 a 107).

O cônjuge sobrevivente, qualquer herdeiro e o inventariante do processo de inventário do empresário individual também têm legitimi-dade ativa para o requerimento da falência do espólio do empresário individual falecido (art. 97, II). Com efeito, o espólio do empresário in-dividual falecido cujo passivo supera o ativo é rateado mediante proces-so de falência, segundo a classificação dos créditos e o princípio da parconditiocreditorum (arts. 97, II, e 125, todos da Lei n. 11.101/2005). O re-querimento de falência, entretanto, não pode ser apresentado após um ano do falecimento do empresário individual (art. 96, § 1º, infine)15.

Os cotistas e acionistas de sociedade empresária também têm legi-timidade para o requerimento da falência, na forma da lei, do estatuto ou do contrato social (art. 97, III).

Na verdade, à vista do art. 97, IV, da Lei n. 11.101/2005, todo e qual-quer credor pode requerer a falência do empresário individual ou da so-

cessual, também não são atraídas pelo juízo universal da falência, caso já estives-sem em tramitação ao tempo da decretação desta; nesse caso, elas continuam se processando no juízo no qual haviam sido distribuídas; imagine que o culpado pelo acidente de trânsito era o motorista empregado da sociedade empresária e que a ação de indenização proposta pela vítima já corria quando foi decretada a falência da demandada; como se trata de ação referente a quantia ilíquida, o juízo falimentar não terá força atrativa” (Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, v. III, 7. ed., 2007, p. 262-263).

15 À vista do art. 983 do Código de Processo Civil, o processo de inventário deve ser iniciado dentro de sessenta dias da abertura da sucessão e deve ser concluído nos doze meses subsequentes.

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ciedade empresária. Com efeito, tanto o credor civil quanto o credor em-presário têm legitimidade ativa para a propositura da ação falimentar16.

No que tange especificamente ao credor empresário, o pedido de decretação da falência deve ser instruído com a certidão comprobatória da regularidade da atividade empresarial do requerente, obtida perante a Junta Comercial (art. 97, § 1º, da Lei n. 11.101/2005, c/c o proêmio do art. 1.150 do Código Civil de 2002).

Por fim, o credor domiciliado no exterior deve cumprir o disposto nos arts. 97, § 2º, e 101, ambos da Lei n. 11.101/2005: o pedido de decreta-ção da falência depende da prestação de caução, para a eventualidade de condenação do autor ao pagamento de indenização por requerimento doloso, além das custas processuais. Trata-se de caução similar à prevista no art. 835 do Código de Processo Civil, denominada cautioproexpensisecautioiudicatumsolvi17. Deve o autor oferecer a caução já na petição inicial da falência; omissa a petição, o autor deve ser intimado para prestar a caução, sob pena de indeferimento da inicial da ação falimentar, exvi do art. 284 do Código de Processo Civil, c/c o art. 189 da Lei n. 11.101/2005.

10. Causas de pedir da falênciaO art. 94 da Lei n. 11.101/2005 arrola inúmeras causas que autori-

zam a decretação da falência do empresário individual ou da sociedade empresária, quais sejam: impontualidade injustificada, execução frustra-da e atos de falência.

10.1. Impontualidade injustificada: inteligência do inciso I do art. 94 da Lei n. 11.101/2005

Com efeito, a primeira causa de pedir reside na impontualidade injustificada, isto é, a falta de pagamento de obrigação líquida prove-

16 No mesmo sentido do texto, na jurisprudência: 4ª Turma do STJ, REsp 237.419/PR, DiáriodaJustiça, 1º-7-2004.

17 De acordo, na doutrina: “Os arts. 835 a 838 tratam de uma caução especial, a cautiojudicatumsolvi, exigida do autor, nacional ou estrangeiro, que residir fora do Brasil ou dele se ausentar na pendência da demanda, para garantia das custas e honorários de advogado da parte contrária, se não tiver no Brasil bens imóveis que lhe assegurem o pagamento. Idêntica caução é exigida do credor que não tenha domicílio no Brasil para requerer a falência (art. 97, § 2º, da Lei Falimentar)” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 19. ed., 2008, p. 193-194).

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niente de título protestado cujo valor supera o equivalente a quarenta salários mínimos, sem relevante razão de direito18. É líquida a obrigação de valor determinado proveniente de título executivo judicial ou extra-judicial19 (arts. 475-N e 585 do Código de Processo Civil). Não obstante, ainda que líquidos, créditos provenientes de obrigações a título gratuito e eventuais despesas20 realizadas para reconhecimento de crédito não autorizam a propositura da ação falimentar (arts. 5º e 94, § 2º, da Lei n. 11.101/2005).

No que tange ao valor mínimo para a imediata propositura da ação falimentar, é possível a formação de litisconsórcio ativo de credores, com a soma dos respectivos créditos, a fim de alcançar quantia superior ao piso de quarenta salários mínimos (art. 94, § 1º, da Lei n. 11.101/2005).

Quanto ao protesto falimentar, incide o disposto na Lei n. 9.492/97, especialmente o parágrafo único do art. 23, por força do art. 94, § 3º, da Lei n. 11.101/2005. Por conseguinte, a petição inicial da falência deve ser instruída com o instrumento comprobatório do protesto falimentar, com a precisa qualificação da pessoa que o recebeu (cf. art. 23, parágrafo único, da Lei n. 9.492/97, e Enunciado 361 da Súmula do Superior Tri-bunal de Justiça21). Ainda em relação à petição inicial da falência, deve

18 São exemplos de falta de pagamento por relevante razão de direito: – queda das ações da sociedade anônima na Bolsa de Valores em razão de crise econômica internacional; – restrições internacionais às mercadorias nacionais produzidas pela sociedade empresária acionada; – bloqueio governamental de ativos do empresá-rio individual ou da sociedade empresária; – liquidação extrajudicial do banco no qual estão depositados os respectivos ativos (os últimos dois exemplos são de autoria do Professor Fábio Ulhoa Coelho).

19 Como os títulos de crédito insertos no art. 585, I, do Código de Processo Civil. Assim, na jurisprudência: 1ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2004.01.1.107170-5, DiáriodaJustiça, 27-3-2007, p. 80: “– O pagamento parcial da dívida não pode afastar o direito de ajuizar pedido de falência, com base em cheque devolvido por insuficiência de fundos, pois o mesmo configura título líquido, certo e inexigível”. Em contraposição, títulos de crédito prescritos não autorizam a propositura da falência, em razão da perda do atributo da executividade: “O cheque prescrito não é título hábil para embasar o pedido de falência, assim como a duplicata sem aceite, protestada, mas sem a necessária prova da efetiva prestação de serviços. Precedentes” (4ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2004.01.1.068011-4, DiáriodaJustiça, 21-3-2006, p. 106).

20 Por exemplo, com honorários advocatícios, com perito judicial.

21 “A notificação do protesto, para requerimento de falência da empresa devedora, exige a identificação da pessoa que a recebeu.”

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ser instruída com o título executivo original; no lugar do título executivo original, entretanto, é igualmente admissível a juntada da respectiva reprodução autenticada em juízo (cf. art. 9º, parágrafo único, da Lei n. 11.101/2005). Por fim, cabe ação cautelar de sustação protesto com esteio no art. 17 da Lei n. 9.492/97, para impedir a lavratura do protesto fali-mentar indispensável para a propositura da ação de falência fundada na impontualidade, quando existir justo motivo para a não realização do pagamento22.

10.2. Execução frustrada: inteligência do inciso II do art. 94 da Lei n. 11.101/2005

A segunda causa de pedir da ação falimentar é a execução frustra-da, assim considerada a falta de pagamento dentro do prazo legal de três dias pelo executado, somada à ausência de bens penhoráveis, em execu-ção por quantia líquida movida contra o empresário individual ou a sociedade empresária, conforme o caso (art. 94, II, da Lei n. 11.101/2005, c/c o art. 652, caput, do Código de Processo Civil, com a redação confe-rida pela Lei n. 11.328/2006)23.

Com efeito, decorrido o prazo de três dias, o oficial de justiça efetua a penhora de bens (art. 652, § 1º, do Código de Processo Civil). Não en-contrados bens penhoráveis pelo oficial, o juiz, de ofício ou a requeri-mento do exequente, pode determinar a intimação do executado, para indicar bens passíveis de penhora (arts. 600, IV, e 652, § 3º, do Código de Processo Civil). Na falta de bens penhoráveis, suspende-se o processo

22 Em sentido conforme, na doutrina: “São frequentes, por exemplo, as cauções fi-xadas em ações cautelares de sustação de protesto, com liminar inauditaalteraparte”. “Na sustação de protesto, em regra a caução é exigida para demonstrar a solvência do requerente, mormente quando se trata de empresa que pode postu-lar a medida para impedir o ajuizamento de pedido de quebra ou a retroação dos termos legais desta” (Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novocursodedireitoproces-sualcivil, v. III, 2008, p. 290).

23 Em sentido semelhante, na doutrina: “APELAÇÃO – PEDIDO DE FALÊNCIA – EXECUÇÃO FRUSTRADA – AUSÊNCIA DE REQUISITO ESSENCIAL – CITA-ÇÃO – PESSOA JURÍDICA – REPRESENTANTE PROCESSUAL. 1. Para decreta-ção da falência com fundamento no art. 94, II, da Lei 11.101/2005, faz-se necessá-rio que a empresa, devidamente citada na pessoa do representante legal, não tenha pago, depositado ou indicado bens em valor suficiente ao adimplemento da obri-gação executada” (6ª Turma Cível do TJDF, Apelação 2006.01.1.026514-2, DiáriodaJustiça, 5-9-2007, p. 144).

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executivo civil (art. 791, III, do Código de Processo Civil). Diante da execução frustrada, há lugar para a propositura da falência pelo exe-quente, após a obtenção de certidão comprobatória da frustração da execução civil perante o juízo competente (art. 94, § 4º, da Lei n. 11.101/2005)24.

Ainda a respeito da segunda causa de pedir, a ação de falência proveniente de execução frustrada independe do valor da obrigação lí-quida, a qual pode até ser inferior ao piso legal de quarenta salários mínimos do inciso I do art. 94 da Lei n. 11.101/2005. Com efeito, frustra-da a execução, há lugar para a falência, independentemente do valor objeto da execução.

Além dos requisitos gerais previstos nos arts. 282 e 283 do Código de Processo Civil, bem assim nos §§ 1º e 2º do art. 97 da Lei n. 11.101/2005, a petição inicial da falência fundada no inciso II do art. 94 deve ser ins-truída com certidão expedida no juízo da execução (art. 94, § 4º, da Lei n. 11.101/2005). A execução individual proposta contra o empresário individual ou a sociedade empresária à luz do Código de Processo Civil, entretanto, fica suspensa com a decretação da falência, até a ulterior prolação da sentença de encerramento do processo falimentar (arts. 6º, caput, 99, V, e 157, da Lei n. 11.101/2005 c/c o art. 265, IV, a, do Código de Processo Civil)25.

24 Em sentido semelhante, na jurisprudência: “É possível o pedido de certidão fali-mentar quando evidenciada a inadimplência da devedora (art. 94 da Lei n. 11.101/2005)” (1ª Turma Cível do TJDF, AGI 2007.00.2.008520-4, DiáriodaJusti-ça, 27-9-2007, p. 95). Colhe-se do didático voto condutor proferido pelo Desem-bargador Relator: “Evidenciou-se a inadimplência da agravante, pois, não obstan-te a determinação pelo magistrado de origem para o cumprimento da obrigação de pagar quantia certa ou indicar bens à penhora, permaneceu a mesma inerte. Foi, ainda, requerido pelo agravado e autorizado o bloqueio via BacenJud, sem a obtenção de êxito. Logo, o pedido de certidão falimentar está em consonância com o disposto no § 4º do art. 94 da Lei n. 11.101/2005”.

25 Em abono, ainda que na jurisprudência construída à luz do anterior Decreto-Lei n. 7.661/45: “EXECUÇÃO. PEDIDO DE FALÊNCIA SUPERVENIENTE FORMU-LADO COM ARRIMO NO ART. 2º, INC. I, DA LEI DE QUEBRAS. SUSPENSÃO DO PROCESSO EXECUTIVO. EXTINÇÃO DO FEITO AFASTADA. É permitido ao credor requerer a suspensão do processo de execução, quando por ele ajuizado pedido de falência contra o executado comerciante nos termos do art. 2º, inc. I, do Dec. Lei n. 7.661, de 21-6-45. Recurso especial conhecido pela letra ‘c’ e provido” (4ª Turma do STJ, REsp 146.648/MG, DiáriodaJustiça, 29-6-1998). Ainda no mesmo sentido: “A execução contra devedor falido fica suspensa desde que seja declara-

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Por fim, não há necessidade de protesto para a propositura da ação de falência fundada na causa arrolada no inciso II26 do art. 94 da Lei n. 11.101/2005, porquanto o § 3º do art. 94 exige o protesto falimentar ape-nas na quebra requerida com esteio no inciso I.

10.3. Atos de falência: inteligência do inciso III do art. 94 da Lei n. 11.101/2005

A terceira e última causa de pedir reside na prática de algum ato de falência arrolado na Lei n. 11.101/2005. Trata-se, na verdade, de am-plo rol de atos que não versam sobre impontualidade nem execução frustrada, mas que igualmente permitem a decretação da falência.

Com efeito, salvo quando constar do plano de recuperação judicial, a prática de algum dos atos arrolados no inciso III do art. 94 autoriza a decretação da falência, independentemente da impontualidade do em-presário individual ou da sociedade empresária. Eis os atos que também ensejam a decretação da falência: liquidação precipitada dos ativos ou utilização de meios ruinosos ou fraudulentos para a realização de paga-mentos por parte do empresário individual ou da sociedade empresária (art. 94, III, a); realização de negócio simulado ou alienação de ativos, para retardar pagamentos ou fraudar credores (art. 94, III, b); transferên-cia ou simulação de transferência do estabelecimento empresarial (art. 94, III, c e d); concessão ou reforço de garantia em prol de algum credor, em prejuízo dos demais (art. 94, III, e); abandono do estabelecimento empresarial ou do domicílio pessoal (art. 94, III, f); descumprimento de

da a falência até o seu encerramento” (4ª Turma do STJ, REsp 196.303/MG, DiáriodaJustiça, 9-9-2002). “III – Aforado pelo credor exequente o requerimento de fa-lência, a execução singular ajuizada deverá pelo menos ficar suspensa, sendo vi-ciados os atos que nela vierem a ter lugar a partir de então” (4ª Turma do STJ, REsp 6.782/RS, DiáriodaJustiça, 22-3-1993).

26 A respeito da dispensa do protesto falimentar quando a quebra é requerida com esteio no inciso II do art. 94 da Lei n. 11.101/2005, na jurisprudência: “2 – O pedi-do de falência fundado em título executivo judicial pode ser instruído apenas com a certidão do juízo da execução, sendo dispensável o protesto especial para fins de falência. Não há porque exigir-se o protesto especial de um título judicial, porquanto, em sede de execução, a inadimplência e o descumprimento da obri-gação já são suficientemente provados” (3ª Turma Cível do TJDF, AGI 2006.00.2.012704-5, DiáriodaJustiça, 27-11-2007, p. 253).

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obrigação assumida no plano de recuperação judicial (art. 94, III, g, c/c o art. 73, IV).

Em qualquer caso arrolado no inciso III do art. 94, a petição inicial deve conter a descrição analítica do ato ilegal, a especificação das provas a serem produzidas, bem como já deve ser instruída com as provas do-cumentais disponíveis no momento da propositura da ação falimentar (art. 94, § 5º, da Lei n. 11.101/2005).

11. Emenda da petição inicialSe a petição inicial contiver algum defeito passível de correção (p.

ex., ausência de indicação das provas), o juiz deve conceder ao autor o prazo de dez dias para a emenda da inicial, tal como dispõe o art. 284 do Código de Processo Civil, aplicável ao processo falimentar à vista do art. 189 da Lei n. 11.101/2005.

12. Citação, contestação e depósito elisivoApós a admissão da petição inicial pelo juiz da falência, há a citação

do empresário individual, da sociedade empresária e até dos sócios com responsabilidade ilimitada, com a abertura de prazo de dez dias para a contestação à ação falimentar (arts. 81, caput, e 98, caput, ambos da Lei n. 11.101/2005)27.

A citação na falência é realizada à vista dos arts. 221 a 231 do Có-digo de Processo Civil. Em regra, a citação é feita por oficial de justiça, mas também é admissível a citação por edital28. Por outro lado, não é admissível a citação pelo correio, em razão da restrição contida na alínea d do art. 222 do Código de Processo Civil, porquanto a falência é uma espécie de processo de execução.

A contagem do prazo de dez dias para a contestação segue o dis-posto nos arts. 184, 240 e 241 do Código de Processo Civil, aplicáveis ao processo falimentar por força do art. 189 da Lei n. 11.101/2005.

27 Não há citação nem contestação na hipótese de autofalência, isto é, quando o pedido de falência é formulado à luz do art. 105, pelo próprio empresário indivi-dual ou pela sociedade empresária.

28 De acordo, na jurisprudência: “II – Não encontrada a empresa no domicílio cons-tante de seus cadastros, válida é a citação por edital” (3ª Turma do STJ, REsp 63.669/SP, DiáriodaJustiça, 17-6-2002, p. 254).

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Se a causa de pedir da falência versar sobre impontualidade injus-tificada (inciso I do art. 94) ou execução frustrada (inciso II do art. 94)29, o réu pode efetuar o depósito elisivo30 do valor da dívida, com o acrés-cimo de correção monetária, juros e honorários advocatícios, dentro do prazo de dez dias para a contestação (art. 98, parágrafo único). A respei-to do tema, merece ser prestigiado o Enunciado 29 da Súmula do Supe-rior Tribunal de Justiça: “No pagamento em juízo para elidir falência, são devidos correção monetária, juros e honorários de advogado”. Re-força o preciso Enunciado 1 da Súmula do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul: “Nos casos de elisão de falência pelo depósito da quantia devida com finalidade de efetuar o pagamento, cabe a condenação do devedor em honorários advocatícios, bem como a atualização do débito mediante correção monetária, a partir do vencimento do título, na forma da Lei n. 6.889/81”31.

Além da hipótese consubstanciada no depósito elisivo integral (isto é, do principal e das verbas acessórias), a decretação da falência também não tem lugar quando o réu apresenta contestação fundada em alguma das defesas arroladas no art. 96 da Lei n. 11.101/2005, com a respectiva comprovação do alegado. Com efeito, não há a decretação da falência requerida com base no art. 94, I, quando o réu contesta e prova a falsi-dade do título, a ocorrência de prescrição, a nulidade da obrigação ou

29 A despeito da explícita restrição legal prevista no parágrafo único do art. 98 da Lei n. 11.101/2005, autorizada doutrina sustenta outra interpretação dos preceitos, em prol da admissibilidade do depósito elisivo até mesmo quando há ato de fa-lência, nas hipóteses do inciso III do art. 94 da Lei n. 11.101/2005: “Embora a lei não preveja expressamente, deve ser admitido o depósito elisivo também nos pedidos de credor fundados em ato de falência, já que ele afasta a legitimidade do requerente. Assegurado, pelo depósito, o pagamento do crédito por ele titula-rizado, não tem interesse legítimo na instauração do concurso falimentar” (Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, v. III, 7. ed., 2007, p. 264-265). “A lei não prevê o depósito elisivo se o fundamento do pedido diz res-peito a prática de ato de falência. Mas deve ser admitido também nessa hipótese, porque com o depósito do valor do seu crédito, perde o requerente o interesse na instauração do concurso de credores” (Fábio Ulhoa Coelho, Manualdedireitoco-mercial: direito de empresa, 18. ed., 2007, p. 324).

30 “O depósito elisivo nada mais é do que a possibilidade à falida de evitar o decre-to de quebra com base na impontualidade de pagamento” (6ª Turma Cível do TJDF, AGI 2005.00.2.010110-1, DiáriodaJustiça, 20-4-2006, p. 158).

31 Incidente de Uniformização de Jurisprudência, classe II, e, número 01/89. Súmu-las. Associação dos Advogados de São Paulo – AASP, v. 2, São Paulo, 1995, p. 77.

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do título, o pagamento da dívida, a ocorrência de qualquer outro fato extintivo ou suspensivo da obrigação ou da respectiva cobrança, a exis-tência de vício no protesto ou no respectivo instrumento, a propositura de ação de recuperação judicial, ou a cessação da atividade empresarial mais de dois anos antes da propositura da falência, demonstrada me-diante documento hábil da Junta Comercial (art. 96, caput e incisos, da Lei n. 11.101/2005). A propósito do ajuizamento de ação de recuperação judicial, ainda que não decretada a falência em virtude do deferimento da recuperação em prol do empresário individual ou da sociedade em-presária (art. 96, VII), nada impede a posterior decretação da quebra, porquanto a concessão da recuperação judicial não afasta a possibilida-de da ulterior convolação da mesma em falência (arts. 73, IV, e 94, III, g).

O réu também pode contestar mediante a arguição de preliminar prevista no art. 301 do Código de Processo Civil, em virtude da incidên-cia do art. 189 da Lei n. 11.101/2005. Daí a possibilidade de o réu suscitar, por exemplo, a incompetência absoluta do juízo na contestação à ação falimentar.

O réu, entretanto, não precisa depositar e contestar. O empresário individual e a sociedade empresária têm a opção entre depositar e tam-bém contestar, depositar e não contestar, ou contestar e não depositar, porquanto as três alternativas podem evitar a decretação da falência. Basta, portanto, o depósito integral (do principal e dos acessórios) para elidir a decretação da falência, ainda que não contestada a ação falimen-tar. Se o réu apenas contestar, a falência só não será decretada se alguma defesa veiculada na contestação for acolhida pelo juiz32.

Além da contestação e do depósito elisivo, o réu ainda pode apre-sentar outras respostas. Com efeito, também são admissíveis a impug-nação ao valor da causa e as exceções processuais de impedimento e de

32 Em abono ao raciocínio sustentado no presente compêndio, há respeitável prece-dente jurisprudencial: “II – No prazo da defesa do processo falimentar, três cami-nhos surgem para o comerciante: a) pagar a quantia cobrada, com os seus consec-tários, com consequente extinção do feito; b) fazer o depósito juntamente com a contestação sobre a validade do crédito, impedindo a decretação de falência e proporcionando uma apuração das alegações das partes pelo juiz; c) simplesmen-te contestar, sem o mencionado depósito. Destarte, a oferta pura e simples de defesa, desacompanhada de caução, é possível, não obstante seja um risco para a devedora, tendo em vista que o não acatamento das razões de contestação leva à decretação de sua falência” (4ª Turma do STJ, REsp 30.536/PB, DiáriodaJustiça, 18-3-1996).

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suspeição, as quais podem ser veiculadas em petições distintas e devem ser autuadas em apenso (arts. 261 e 299 do Código de Processo Civil). Quanto ao prazo para a apresentação das outras respostas admissíveis, deve ser observado o disposto no art. 98 da Lei n. 11.101/2005, ou seja, o prazo de dez dias, e não o prazo previsto no art. 297 do Código de Processo Civil, em homenagem aos princípios da celeridade e da econo-mia processual, consagrados no parágrafo único do art. 75 da legislação específica (Lei n. 11.101/2005).

Por fim, não há previsão de reconvenção no processo falimentar. O réu pode, entretanto, dentro do prazo de dez dias para a contestação, ajuizar a ação de recuperação judicial, com a distribuição por dependên-cia ao processo falimentar (arts. 51, 78, parágrafo único, 95 e 96, VII, todos da Lei n. 11.101/2005).

13. Intimação do Ministério Público na fase pré-falencial: obrigatoriedade

O Presidente da República vetou o art. 4º do Projeto que deu lugar à Lei n. 11.101/2005. O preceito vetado versaria sobre a obrigatoriedade da intervenção do Ministério Público nos processos de recuperação judicial e de falência, bem assim nas ações movidas pela e contra a massa falida. À vista da literalidade da Lei n. 11.101/2005, o Ministério Público só é intima-do da existência do processo após a decretação da falência (cf. art. 99, XIII).

A despeito do veto presidencial, há séria controvérsia acerca da necessidade da intimação do representante do Ministério Público já na primeira fase do processo falimentar, ou seja, antes da decretação da falência. Predomina a correta tese de que o juiz deve determinar a inti-mação do Ministério Público já na fase pré-falimentar, isto é, antes da prolação da decisão de decretação da quebra, sob pena de nulidade33.

33 Cf. 1ª Turma Cível do TJDF, AGI 2006.00.2.013721-9, DiáriodaJustiça, 15-5-2007, p. 180: “DIREITO COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL. FALÊNCIA. SENTENÇA. OITIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. NECESSIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. Em virtude do relevante interesse social nessa espécie de demanda, necessária a oitiva do Ministério Público mesmo na fase preliminar, ou seja, antes do decreto de falência (art. 82, III, do Código de Processo Civil). 2. Recurso provido”. No mesmo sentido: 2ª Turma Cível do TJDF, AGI 2006.00.2.013013-8, DiáriodaJustiça, 21-6-2007, p. 87: “PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO FALIMENTAR. INTERESSE PÚ-BLICO. MINISTÉRIO PÚBLICO. INTERVENÇÃO. INDISPENSABILIDADE.

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De outro lado, entretanto, há respeitável entendimento jurisprudencial

contrário à necessidade da intimação do Ministério Público antes da

decretação da falência34.

OMISSÃO DA LEI ESPECÍFICA (LEI N. 11.101/2005). IRRELEVÂNCIA. APLI-CAÇÃO DA REGRA GERAL (CPC, ART. 82, III). FALÊNCIA. DECRETAÇÃO. SENTENÇA. NULIDADE INSANÁVEL. AGRAVO. INSTRUMENTO. FORMA-ÇÃO ADEQUADA. Omissis 2. A falência, redundando na paralisação das ativida-des da quebrada e na liquidação dos seus ativo e passivo de forma a ser preser-vado o exercitamento da livre iniciativa de conformidade com os primados que governam o regime capitalista, prevenindo-se que empreendimento desprovido de viabilidade continue operando em detrimento da ordem jurídica e com menos-prezo para com o crédito e fé públicos, reveste-se de evidente interesse público, irradiando essa natureza aos processos falimentares. 3. Conquanto a nova Lei de Falências – Lei n. 11.101/2005 – tenha ficado desprovida de disposição específica acerca da indispensabilidade de o Ministério Público ser ouvido nas ações que a têm como estofo, o parquet, valendo-se da legitimação ordinária que lhe é confe-rida – CPC, art. 82, IIII – ante a natureza das disposições que nela estão impreg-nadas e do interesse público de que se revestem as ações de insolvência civil e comercial, deve necessariamente delas participar, velando pela correta aplicação do legalmente prescrito, resguardando o direito dos credores e do próprio falido e fiscalizando a atuação do administrador nomeado à massa. 4. Aferido que o itinerário procedimental não fora percorrido de conformidade com o legalmente delineado ante a omissão havida quanto à necessária intervenção do Ministério Público na ação falimentar, o processo resta maculado por vício insanável, afetan-do, por conseguinte, a intangibilidade da sentença que afirmara a quebra, deter-minando sua anulação, independentemente da ocorrência de prejuízo para as partes diretamente envolvidas na relação processual, pois da simples omissão havida emerge a nulidade (CPC, arts. 84 e 246). 5. Recurso conhecido e provido. Unânime”. Também no mesmo sentido: 6ª Turma Cível do TJDF, AGI 2006.00.2.010808-7, DiáriodaJustiça, 17-4-2007, p. 130: “AGRAVO DE INSTRU-MENTO – FALÊNCIA – MINISTÉRIO PÚBLICO – AUSÊNCIA DE INTERVEN-ÇÃO – NULIDADE. 1. A Lei de Falências em vigor não prevê a intervenção do Ministério Público em todos os atos do procedimento falimentar, mas o parquetdeverá ser intimado desde o início do procedimento, mesmo que opte por não se manifestar, por força do art. 82, III, do Código de Processo Civil. O fiscal da Lei é que dirá se há ou não interesse público. 2. Não se trata de derrubar o veto presi-dencial ao art. 4º da novel Lei de Falência, mas de reconhecer a presença de inte-resse público nas ações falimentares e de recuperação judicial, o que implica a impossibilidade de afastar o Ministério Público, já que fiscal da lei e guardião de todos os interesses indisponíveis. 3. Recurso do Ministério Público provido. Re-curso da empresa prejudicado”.

34 Cf. 6ª Turma Cível do TJDF, AGI 2006.00.2.006521-8, DiáriodaJustiça, 21-6-2007, p. 123: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. FALÊNCIA. DECISÃO QUE DECRETA A QUEBRA. FALTA DE INTIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA FASE

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Ainda que muito respeitável o entendimento contrário, tudo indi-ca que é necessária a intimação do Ministério Público ainda na fase pré- -falencial, para tomar conhecimento do processo e oferecer parecer na qualidade de fiscal da lei, antes mesmo da prolação do julgamento acer-ca da falência, em razão do interesse público em jogo, porquanto os empregados, os consumidores, o fisco e até a economia (nacional, regio-nal ou local, conforme o caso) são prejudicados pela quebra.

Com efeito, o Ministério Público deve ser intimado ainda na fase pré-falimentar, quando poderá intervir no processo, logo após as mani-festações das partes, mas antes da decisão do juiz, tendo em vista o disposto no art. 83 do Código de Processo Civil, aplicável por força do art. 189 da Lei n. 11.101/2005.

A ausência de efetiva intervenção do Ministério Público, todavia, não ocasiona nulidade alguma no processo falimentar, em virtude do veto presidencial ao art. 4º do projeto que deu lugar à Lei n. 11.101/2005. Para a regularidade do processo, basta a intimação do promotor de jus-tiça que oficia perante o juízo competente, independentemente da exis-tência de efetiva intervenção ministerial no processo falimentar.

14. Decisão de decretação da falência: natureza erecorribilidade

Improcedentes as defesas suscitadas na contestação e inexistente, insuficiente ou intempestivo o depósito elisivo, o juiz decreta a falência do empresário individual ou da sociedade empresária.

A rigor, o pronunciamento de decretação da falência não tem na-tureza de sentença, nem é apelável. Trata-se de decisão interlocutória agravável, consoante revelam o parágrafo único do art. 99 e o proêmio do art. 100, ambos da Lei n. 11.101/2005.

PRÉ-FALIMENTAR. IRRELEVÂNCIA. AUSÊNCIA DE NULIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. 1. Inexiste nulidade na sentença que decretou a falência sem a manifestação prévia do Ministério Público, vez que a nova Lei de Falências e de Recuperação de Empresas (Lei n. 11.101, de 9-2-2005) não prevê a atuação minis-terial na fase pré-falimentar. 2. Segundo o magistério de FÁBIO ULHOA COELHO (in ComentáriosàNovaLeideFalênciaedeRecuperaçãodeEmpresas, Saraiva, 3. ed., p. 30), ‘O Ministério Público só começa a participar do processo falimentar depois da sentença declaratória da falência. A lei prevê sua intimação apenas no caso de o juiz decretar a quebra do devedor insolvente (art. 99, XIII). Durante a tramitação do pedido de falência, não há sentido nenhum em colher sua manifestação’. 3. Agravo conhecido e improvido”.

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Não obstante, autorizada doutrina35 sustenta que há a prolação de sentença agravável quando o juiz decreta a falência do empresário indi-vidual ou da sociedade empresária, hipótese que é considerada exceção ao binômio sentença-apelação, segundo o entendimento predominante na literatura especializada36.

Ainda que muito respeitável a lição da doutrina, o pronunciamen-to de decretação da falência não tem natureza de sentença. Trata-se de decisão interlocutória agravável, consoante revelam o parágrafo único do art. 99 e o proêmio do art. 100, ambos da Lei n. 11.101/2005. Além da combinação dos preceitos da Lei n. 11.101/2005, outros motivos também sustentam a conclusão defendida no presente compêndio: a de que não há a prolação de sentença, mas, sim, de decisão interlocutória, a qual é compatível com o cabimento do recurso de agravo de instrumento.

No que tange ao argumento de que há resolução de mérito quando o juiz decreta a falência, sem dúvida, merece ser prestigiado. Não obs-tante, não é a existência de resolução de mérito no pronunciamento que revela a sua natureza jurídica. Tanto que o direito brasileiro reconhece a existência de sentença de mérito (art. 269 do Código de Processo Civil) e de sentença processual (art. 267 do mesmo diploma). Não é, portanto, a existência de resolução de mérito que esclarece se o pronunciamento proferido pelo juiz é sentença, ou não. Vale relembrar, há sentença sem resolução do mérito (art. 267). Outro, portanto, é o critério para a iden-tificação da sentença.

Com efeito, o critério distintivo adotado no direito pátrio é o casu-ístico-legal: só é sentença o pronunciamento de autoria de juiz de pri-meiro grau assim considerado pelo legislador, independentemente da resolução do mérito no provimento jurisdicional. É possível perceber que o critério legal vigente no direito brasileiro é pragmático, sem preo-cupação científica. Assim, por exemplo, se o juiz de primeiro grau reco-nhece a existência de prescrição, há sentença apelável. Em contraposição, se o juiz afasta a mesma alegação de prescrição, há decisão interlocutória agravável, a despeito de versar sobre matéria de mérito. Vale o que dis-

35 Cf. Fábio Ulhoa Coelho, Cursodedireitocomercial: direito de empresa, v. III, 7. ed., 2007, p. 267 e 270; Fredie Didier Jr. e Leonardo José Carneiro da Cunha, Cursodedireitoprocessualcivil, 3. ed., 2007, p. 35, 95, 96 e 97; e Waldo Fazzio Júnior, Manualdedireitocomercial, 7. ed., 2006, p. 735, 736 e 742.

36 Cf. nota anterior.

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põe a lei: no exemplo, o disposto nos arts. 162, § 1º, 269, IV, e 513, todos do Código de Processo Civil. O mesmo critério casuístico-legal também é adotado no art. 100 da Lei n. 11.101/2005: a decisão de decretação da falência é agravável e a sentença de improcedência é apelável. Com efeito, se o juiz reconhece a prescrição suscitada com esteio no art. 96, II, da Lei n. 11.101/2005, profere sentença apelável (cf. arts. 96, caput, e 100, infine); se o juiz afasta a mesma alegação de prescrição, profere decisão interlocutória agravável (art. 100, primeira parte). Bem examinadas as hipóteses, constata-se que a Lei n. 11.101/2005 segue o padrão consagra-do no Código de Processo Civil, em harmonia, aliás, com o disposto no art. 189 daquela lei.

Sob outro enfoque, a decisão de decretação da falência é similar à decisão igualmente agravável prevista no art. 475-M, § 3º, do Código de Processo Civil, porquanto a falência também é um processo de execução, ainda que de natureza concursal e que tem lugar contra empresário indi-vidual ou sociedade empresária. A falência é execução concursal fundada em título executivo já constituído (arts. 94 e 97 da Lei n. 11.101/2005), o que afasta a analogia à fase cognitiva do processo sincrético, destinada à formação do título executivo, para a posterior execução. Na falência, como dito, o título executivo já existe; não há uma fase autônoma de conheci-mento, mas, sim, a possibilidade da contraposição incidental, da mesma forma que ocorre na execução no processo sincrético (cf. arts. 475-L e 475-M do Código de Processo Civil). Daí a explicação para a igual solução extraída do art. 100, primeira parte, da Lei n. 11.101/2005, e do art. 475-M, § 3º, do Código de Processo Civil: cabimento do recurso de agravo de instrumento contra a decisão interlocutória de resolução do incidente proveniente da contraposição (mediante “contestação”, na falência, ou por meio de “impugnação”, na fase executiva do processo sincrético). Ambas as hipóteses partem da mesma premissa: existência de título executivo. Há um simples incidente processual no qual o juiz resolve se a execução (empresarial ou civil, conforme o caso) deve prosseguir, ou não. Se a resposta for positiva, decreta-se a falência, com o prosseguimen-to da execução e o cabimento de recurso de agravo de instrumento (art. 100, primeira parte). Se a resposta for negativa, extingue-se a execução falimentar, com o cabimento do recurso de apelação (art. 100, segunda parte). Mutatismutandis, igual solução é encontrada no art. 475-M, § 3º, do Código de Processo Civil, porquanto ambas as hipóteses partem da mesma premissa: título executivo já existente. Em suma, as duas hipóte-ses são de execução (civil ou falimentar, conforme o executado), o que explica a igual solução acerca da recorribilidade.

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Por fim, além da hipótese inserta na primeira parte do art. 100, há outro exemplo de decisão interlocutória de mérito passível de agravo na mesma Lei n. 11.101/2005. Com efeito, o caput e os §§ 1º e 2º do art. 59 revelam a possibilidade jurídica da prolação de decisão interlocutória de mérito impugnável mediante recurso de agravo de instrumento. Daí a conclusão: é juridicamente possível a prolação de decisão interlocutó-ria de mérito, sem que o seu conteúdo (de mérito) interfira na respectiva recorribilidade37.

Sob todos os prismas, a decretação da falência se dá mediante de-cisão interlocutória agravável; só há sentença apelável quando o juiz indefere a petição inicial, denega a falência e encerra o processo falimen-tar (cf. arts. 267, I, 295, 296 e 513, do Código de Processo Civil, e arts. 100, segunda parte, 156, caput e parágrafo único, e 189, da Lei n. 11.101/2005). Não obstante o entendimento defendido no presente compêndio em favor da existência de decisão interlocutória agravável, prevalece outra orientação na doutrina e na jurisprudência predominantes: sentença agravável.

15. Decisão de decretação da falência: conteúdoComo toda decisão jurisdicional, a decisão de decretação da falên-

cia também deve ser fundamentada (art. 93, IX, da Constituição Federal).

37 Em sentido semelhante, na doutrina: “O art. 162, § 1º, após a Lei n. 11.232/2005, passou a dizer que ‘a sentença é o ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos arts. 267 e 269 desta Lei’. Considerando-se os arts. 267 e 269, seria possível chegar à conclusão de que se passou a admitir sentenças de mérito no interior do processo ou sentenças interlocutórias de mérito (...) Porém, não houve a intenção de equiparar os atos jurisdicionais que tratam do mérito no interior do processo – à semelhança da decisão que defere ou indefere a tutela antecipada – às sentenças. Tais atos continuam a ser decisões interlocutórias, sujeitando-se ao recurso de agravo. Ainda que, do ponto de vista eminentemente teórico, seja possível sustentar a existência de sentenças interlocutórias, qualificando-as a partir do conteúdo da decisão proferida no curso do processo, não há como negar que, na perspectiva do CPC, a preocupação pragmática se sobrepõe, fazendo com que as decisões que tratam do mérito no seio do processo não sejam definidas como sentenças e, assim, não fiquem sujeitas ao recurso de apelação. Ora, não há como submeter ao sistema da apelação uma decisão tomada no curso do proces-so, uma vez que o recurso, neste caso, necessariamente deve ser apresentado ao tribunal através de instrumento” (Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Are-nhart, Cursodeprocessocivil, v. III, 2007, p. 138).

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À vista o inciso I do art. 99 da Lei n. 11.101/2005, além da fundamentação, a decisão de decretação da falência também deve conter relatório, com a síntese do pedido falimentar, a identificação do falido e os nomes dos respectivos administradores, porquanto os últimos também podem ser responsabilizados tanto no plano civil (art. 82) quanto na esfera penal (arts. 99, VII, e 179).

Na mesma oportunidade, o juiz já decide acerca do “termo legal da falência”, o qual pode alcançar período correspondente a até noven-ta dias antes do primeiro protesto, da distribuição da recuperação judicial ou da distribuição da falência, conforme o caso (art. 99, II). O termo legal da falência é o período anterior à decretação da quebra no qual são ine-ficazes os atos, contratos e pagamentos contrários aos credores em geral (art. 129, I, II e III).

Ao proferir a decisão de decretação da falência, o juiz deve deter-minar que o falido apresente, no prazo máximo de cinco dias, sob pena de crime de desobediência, a relação nominal de credores, bem assim a respectiva classificação analítica dos créditos, para a posterior publicação de edital no órgão oficial de imprensa, com a veiculação do inteiro teor da decisão de decretação da falência, da relação nominal de credores e da respectiva classificação dos créditos. A publicação do edital marca a abertura de prazo de quinze dias para as eventuais habilitações e as divergências dos credores (arts. 7º, § 1º, 99, III e IV, e parágrafo único, e 104, XI e parágrafo único).

Ao decretar a falência, o juiz também deve ordenar a suspensão das ações e execuções movidas contra o falido, ressalvadas as ações trabalhistas e as cíveis que versam sobre quantia ilíquida (arts. 6º, §§ 1º e 2º, e 99, V)38. Ainda como consequência da decretação da falência, também há a suspensão do inventário do empresário individual falecido, com a posterior intervenção do administrador judicial (art. 125).

38 Em sentido semelhante, na doutrina: “Discute-se se a decretação da quebra ou a liquidação extrajudicial do réu seria causa para a suspensão do processo, pois que caberia ao credor habilitar o seu crédito no juízo universal. Se o processo for de execução, haverá suspensão, já que o crédito deverá ser habilitado no concurso de credores. Se o processo for de conhecimento, porém, não há razão para que o juiz determine a suspensão, pois, para que o crédito seja habilitado, é preciso que ele seja primeiro reconhecido por sentença” (Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novocursodedireitoprocessualcivil, v. I, 4. ed., 2007, p. 281).

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O juiz ainda deve nomear o administrador judicial (arts. 22, III, e 99, IX). Em virtude do veto presidencial à alínea a do inciso II do art. 35, a Assembleia Geral de Credores não tem competência para deliberar sobre a substituição do administrador judicial nomeado pelo juiz, por-quanto não subsiste a parte final do inciso IX do art. 99. Por outro lado, ressalvada a existência do Comitê de Credores na anterior recuperação judicial convertida em falência, o juiz também deve determinar a con-vocação da Assembleia Geral dos Credores, a fim de que ocorra a deli-beração sobre a constituição do Comitê (art. 99, XII).

Ainda em relação à decisão de decretação da falência, o juiz também deve proibir a prática de atos de alienação e oneração dos bens do falido (arts. 99, VI, e 103, caput), bem como resolver entre a lacração do estabe-lecimento empresarial ou a continuação provisória das atividades sob a direção do administrador judicial (arts. 99, XI, e 109).

Na mesma oportunidade, o juiz deve determinar a anotação da falência e da inabilitação empresarial do falido perante a Junta Comercial (arts. 99, VIII, e 102). O juiz também deve ordenar a expedição de ofícios aos órgãos públicos em geral (art. 99, X), a intimação pessoal do Minis-tério Público e a comunicação das Fazendas Públicas Federal, Estadual, Distrital e Municipal mediante carta, para dar ciência da decretação da falência e permitir eventuais intervenções no respectivo processo fali-mentar (art. 99, XIII).

Por fim, constatada a ocorrência de crime falimentar, o juiz pode ordenar a prisão do falido e dos administradores na própria decisão de decretação da falência (art. 99, VII). Trata-se de prisão preventiva funda-da em crime falimentar, razão pela qual não há lugar para a incidência do Enunciado 280 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça. Com efeito, o verbete n. 280 versa sobre a antiga prisão administrativa previs-ta no art. 35 do revogado Decreto-Lei n. 7.661/45, preceito que não en-contra similar na atual Lei n. 11.101/2005. Na verdade, a prisão autori-zada pelo inciso VII do art. 99 tem natureza penal, ainda que preventiva. Daí a compatibilidade do preceito com o art. 5º, LXVII, da Constituição Federal de 1988.

16. Efeitos jurídicos da decretação da falência A decretação da falência produz vários efeitos jurídicos. Muitos

deles já foram apontados no anterior tópico 14, destinado ao estudo do art. 99 da Lei n. 11.101/2005. Não obstante, além dos arrolados no art.

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99 da Lei n. 11.101/2005, há muitos outros efeitos jurídicos provenientes da decretação da falência.

À vista do art. 77, a decretação da falência ocasiona o vencimento antecipado de todas as dívidas do empresário individual, da sociedade empresária, bem assim dos sócios com responsabilidade ilimitada, os quais ficam sujeitos aos mesmos efeitos jurídicos produzidos em relação à sociedade falida (cf. art. 81).

Ainda por força do art. 77, a decretação da falência também oca-siona a conversão de todos os créditos em moeda estrangeira para a moeda nacional, observado o câmbio do dia da decisão judicial.

Sob outro prisma, a decretação da falência suspende o curso da prescrição em face do empresário individual, da sociedade empresária e dos sócios com responsabilidade ilimitada (cf. arts. 6º e 81, caput, ambos da Lei n. 11.101/2005). O prazo prescricional só volta a correr a partir do dia em que transitar em julgado a sentença de encerramento da falência (cf. art. 157 da Lei n. 11.101/2005)39.

Outro importante efeito da decretação da falência é proveniente do princípio parconditiocreditorum40, consagrado no art. 115 da Lei n. 11.101/2005. Após a decretação da falência, todos os credores só podem exercer os respectivos direitos no processo falimentar, com a impossibi-lidade da execução individual, a qual dá lugar à execução concursal da falência. Por conseguinte, não subsistem as penhoras realizadas nas execuções civis individuais processadas à vista do Código de Processo Civil41, porquanto todos os bens são arrecadados para a formação da

39 Assim, na jurisprudência: “A afirmação da falência enseja a suspensão do curso da prescrição e todas as execuções promovidas em desfavor da falida, inclusive aquelas aviadas pelos credores particulares do sócio solidário, devendo o fluxo das ações ser suspenso desde o momento da decretação da quebra até o encerra-mento do processo falimentar (Lei n. 11.101/2005, art. 6º)” (2ª Turma Cível do TJDF, AGI 2006.00.2.015007-6 – AGR, DiáriodaJustiça, 9-8-2007, p. 76).

40 Paridade de condições dos créditos.

41 De acordo, na doutrina: “Recompôs o Código vigente a precedência do credor que primeiro penhorar, preferência essa que desaparece, dando lugar à igualdade entre os credores de igual categoria perante a lei civil (parconditiocreditorum), se for decretada sua insolvência, como, aliás, acontece na falência” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 12).

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massa objetiva42, também denominada “massa ativa”43, para o posterior pagamento dos credores (massa subjetiva), consoante a ordem de clas-sificação dos créditos e as forças daquela (massa objetiva).

Exvi do art. 6º da Lei n. 11.101/2005, a decretação da falência tam-bém é causa impeditiva da propositura de execuções individuais previs-tas no Código de Processo Civil44.

Sob outro prisma, a decretação da falência afasta a exigibilidade de juros posteriores à quebra, ainda que previstos em contrato ou até mes-mo em lei. É a regra consagrada no art. 124, caput, da Lei n. 11.101/2005. Não obstante, há lugar para a exigência de juros na excepcional hipóte-se de o ativo do falido ser suficiente para o pagamento até mesmo dos titulares de créditos subordinados. Por outro lado, são sempre exigíveis da massa falida os juros provenientes das debêntures45 e dos créditos com garantia real (art. 124, parágrafo único).

No que tange aos eventuais contratos, se o falido for locador, a locação subsiste; se o falido for locatário, a locação também subsiste, salvo quando o contrato é denunciado pelo administrador judicial (art. 119, VII). Já o mandato outorgado pelo empresário individual ou pelo representante legal da sociedade empresária antes da falência não sub-siste à decretação da quebra (art. 120).

Por fim, a decretação da falência ocasiona a inabilitação para o exercício da atividade empresarial, bem como a perda do direito de

42 Cf. art. 108 da Lei n. 11.101/2005.

43 Cf. Celso Agrícola Barbi, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. I, 9. ed., 1994, p. 86, n. 126: “Quando um devedor comerciante não paga suas obrigações, instau-ra-se contra ele execução coletiva: os seus bens são arrecadados, formando uma massa ativa”.

44 Assim, na doutrina: Barbosa Moreira, Onovoprocessocivilbrasileiro, 25. ed., 2007, p. 199.

45 A debênture é o título de crédito (executável à vista do art. 585, I, do Código de Processo Civil) proveniente de contrato de mútuo a médio ou longo prazo (com vencimento de três a cinco anos) que confere àquele que emprestou à companhia o crédito correspondente constante da escritura de emissão, perante a companhia beneficiada pelo empréstimo (arts. 52 e 54, § 2º, e 55, todos da Lei n. 6.404/76). Trata-se de importante mecanismo de captação de recursos financeiros em prol das sociedades anônimas. A debênture tem valor nominal expresso geralmente em moeda nacional (art. 54 da Lei n. 6.404/76) e pode ser convertida em ação da companhia emissora consoante o disposto na escritura de emissão (art. 57 da Lei n. 6.404/76).

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administração e de disposição em relação aos bens (arts. 102 e 103). Tanto que as contas correntes do falido são encerradas exvi legis, no momento da decretação da falência, com a apuração do respectivo saldo (art. 121).

17. Pessoas alcançadas pela decretação da falência A decretação da falência alcança o empresário individual, a socie-

dade empresarial e os sócios com responsabilidade ilimitada (arts. 1º, 81, caput, e 190 da Lei n. 11.101/2005), quais sejam todos os sócios de socie-dade em nome coletivo (art. 1.039 do Código Civil), os sócios comandi-tados de sociedade em comandita simples (art. 1.045 do Código Civil) e o sócio ostensivo de sociedade em conta de participação (art. 991 do Código Civil).

18. Ação de responsabilizaçãoNo que tange aos sócios de responsabilidade limitada, aos contro-

ladores e administradores da sociedade empresária falida, todos podem ser responsabilizados pessoalmente, à vista do art. 28 do Código do Consumidor46 e do art. 50 do Código Civil.

Com efeito, as eventuais responsabilidades pessoais dos sócios de responsabilidade limitada, dos controladores e administradores podem ser apuradas em ação própria, intitulada “ação de responsabilização”, a qual é processada sob o rito ordinário previsto no Código de Processo Civil (cf. art. 82 da Lei n. 11.101/2005).

No que tange ao juízo competente, a ação de responsabilização é processada perante o juízo falimentar, após a distribuição por dependên-cia ao processo de falência (cf. arts. 78, parágrafo único, e 82, ambos da Lei n. 11.101/2005).

Quanto ao prazo, a pretensão de responsabilização dos sócios, dos controladores e dos administradores pelos danos provocados prescreve em dois anos do trânsito em julgado da sentença de encerramento da falência (cf. arts. 82, § 1º, e 156, ambos da Lei n. 11.101/2005). Por conse-

46 Com efeito, o caput do art. 28 do Código do Consumidor é expresso acerca da possibilidade da desconsideração da personalidade jurídica em caso de “falência” causada por má administração.

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guinte, o biênio prescricional não é contado da decisão de decretação da falência prevista no proêmio do art. 100, mas apenas da sentença de encerramento do processo falimentar (cf. art. 156). Por fim, a prescrição pode ser pronunciada de ofício pelo juiz, tendo em vista a combinação dos arts. 219, § 5º, e 295, IV, do Código de Processo Civil, com o art. 189 da Lei n. 11.101/2005.

19. Sentença denegatória da falênciaElidida a falência pelo depósito ou procedente alguma das defesas

veiculadas na contestação do réu (empresário individual, sociedade empresária ou sócio com responsabilidade ilimitada), o juiz extingue o processo falimentar. A improcedência da falência é proferida mediante sentença (cf. art. 100, segunda parte). Além de julgar improcedente a falência, o juiz também pode condenar o autor que agiu com dolo ao ajuizar a ação falimentar, à vista do art. 101 da Lei n. 11.101/2005.

20. Fungibilidade recursalAinda em relação ao cabimento dos recursos de agravo de instru-

mento e de apelação, há o problema da contradição existente entre os arts. 99 e 100. Com efeito, o proêmio do art. 99 contém a seguinte expres-são: “A sentença que decretar a falência”. Reforça a primeira parte do art. 180: “A sentença que decreta a falência”. Em contraposição, dispõe o proêmio do art. 100: “Da decisão que decreta a falência cabe agravo”. Na mesma esteira, o parágrafo único do art. 99 trata “da decisão que decreta a falência”. Assim também dispõe o proêmio do art. 81: “Da decisão que decreta a falência”.

Diante da contradição legislativa, a melhor opção é a fungibilidade recursal, a fim de que eventual apelação interposta seja recebida e pro-cessada como agravo de instrumento, recurso correto contra a verdadei-ra decisão interlocutória de decretação da falência. Com efeito, o art. 579 do Código de Processo Penal merece ser prestigiado, até mesmo em razão do disposto no art. 188 da Lei n. 11.101/2005.

Não obstante, prevalece na jurisprudência o entendimento contrá-rio à aplicação da fungibilidade recursal47.

47 Conferir: “DIREITO COMERCIAL. FALÊNCIA. SENTENÇA DECLARATÓRIA. RECURSO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. APELAÇÃO. INADMISSIBILIDADE.

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21. Prazos dos recursos falimentaresDa decisão de decretação da falência cabe agravo de instrumento,

em dez dias (art. 100, primeira parte, da Lei n. 11.101/2005); já a senten-ça denegatória da falência é passível de apelação, em quinze dias (art. 100, segunda parte, da Lei n. 11.101/2005). Ademais, sempre há lugar para embargos de declaração, em cinco dias (art. 536 do Código de Pro-cesso Civil, c/c o art. 189 da Lei n. 11.101/2005).

Independentemente do recurso a ser interposto, o prazo está atre-lado à intimação da decisão ou da sentença, diante da incidência dos arts. 184, 240, 242 e 506 do Código de Processo Civil, prestigiados no Enunciado 25 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça.

Por fim, são duplicados todos os prazos dos recursos interpostos pelo Ministério Público, tendo em vista a aplicação subsidiária do art. 188 do Código de Processo Civil, por força do art. 189 da Lei n. 11.101/2005.

22. Preparo dos recursos falimentaresNo que tange ao preparo, a regra reside no caput do art. 511 do

Código de Processo Civil, aplicável aos recursos falimentares por força do art. 189 da Lei n. 11.101/2005.

Tal como a regra inserta no caputdo art. 511, as exceções consagra-das nos parágrafos são igualmente aplicáveis. Daí a dispensa do prepa-ro quando o recorrente é o Ministério Público.

Resta saber se aos recursos interpostos pela massa falida deve ser aplicada a regra inserta no caput do art. 511 do Código de Processo

FUNGIBILIDADE. ERRO GROSSEIRO. Deve ser mantida a decisão que, em sede de ação de falência, não conhece da apelação interposta contra a sentença que declara a quebra, porquanto aquela desafia o recurso de agravo de instrumento. Para que seja aplicado o princípio da fungibilidade recursal é necessário que o recorrente não tenha incidido em erro grosseiro” (6ª Câmara Cível do TJMG, Agravo 1.0433.02.046435-3/001, DiáriodaJustiça, 14-5-2004). “APELAÇÃO CÍVEL. FALÊNCIA. DECRETAÇÃO DE QUEBRA. RECURSO DE APELAÇÃO. DESCA-BIMENTO. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE RECURSAL. INAPLICABILIDADE. EXPRESSA PREVISÃO LEGAL. Havendo expressa determinação legal quanto ao cabimento do agravo de instrumento para atacar sentença que decretou a quebra, não há como ser conhecido o recurso de apelação interposto” (6ª Câmara Cível do TJRS, Apelação 70013291950, julgamento em 31 de agosto de 2006).

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Civil ou se há preceito específico na legislação de regência do processo falimentar.

Consoante a jurisprudência consolidada no Tribunal Superior do Trabalho sob a égide do art. 208 do Decreto-Lei n. 7.661/45, os recursos interpostos pela massa falida não estão sujeitos à regra do preparo ime-diato, conforme revela o proêmio do Enunciado 86 da Súmula daquela Corte Superior: “Não ocorre deserção de recurso da massa falida por falta de pagamento de custas ou de depósito do valor da condenação”. Com efeito, o art. 208 do Decreto-Lei n. 7.661 ensejava a efetuação do “preparo” “oportunamente”, com o consequente afastamento da pena de deserção, em razão da dispensa provisória48.

À luz do mesmo art. 208 do Decreto-Lei n. 7.661/45, entretanto, o Superior Tribunal de Justiça firmou jurisprudência em favor da dispen-sa provisória do preparo apenas em relação aos recursos interpostos pela massa falida no processo falimentar propriamente dito49.

Revogado o antigo Decreto-Lei n. 7.661/45, com o advento da Lei n. 11.101/2005, a vexataquaestio agora deve ser solucionada à luz da nova legislação que versa sobre a recuperação empresarial e a falência.

48 Assim, na doutrina: “Também goza do privilégio da dispensa provisória do pa-gamento de custas a massa falida (Súmula 86 do TST)” (Júlio César Bebber, Recur-sosnoprocessodotrabalho, p. 147).

49 Cf.: “Processual civil. Ação de indenização. Massa falida. Custas. Deserção. I. – O art. 208 da Lei de Falências só incide sobre o processo principal da falência, sendo excluída a sua aplicação em ações autônomas de que a massa seja parte. Não efe-tuado o preparo quando do recurso de apelação em ação de indenização, a deser-ção se impunha” (3ª Turma do STJ, REsp 400.342/MG, DiáriodaJustiça, 17-5-2004, p. 214). “COMERCIAL. FALÊNCIA. MASSA FALIDA. AÇÃO REVOCATÓRIA. APELAÇÃO. PREPARO. ART. 208 DO DECRETO-LEI N. 7.661/45. NÃO INCI-DÊNCIA. 1 – O art. 208 do Decreto-Lei n. 7.661/45 ao autorizar o pagamento de preparo em momento oportuno, somente se aplica ao processo falimentar propria-mente dito, não alcançando os incidentes a ele correlatos, como por exemplo, na espécie, a ação revocatória. Precedente desta Corte” (4ª Turma do STJ, REsp 254.558/SP, DiáriodaJustiça, 24-11-2003, p. 308). No mesmo sentido, também na jurispru-dência: “MASSA FALIDA – AÇÃO ORDINÁRIA – APELAÇÃO – ART. 208 DO DECRETO-LEI N. 7.661/45 – NÃO INCIDÊNCIA – PREPARO – NECESSIDADE – PENA DE DESERÇÃO – APELAÇÃO ADESIVA – NÃO CONHECIMENTO. O art. 208 do Decreto-Lei n. 7.661/45, ao autorizar o pagamento de preparo em mo-mento oportuno, somente se aplica ao processo falimentar propriamente dito, não alcançando as demais ações em que a Massa Falida litiga” (1ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0024.98.077804-7/001, DiáriodaJustiça, 20-5-2005).

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À vista dos incisos III e IV do art. 84 da Lei n. 11.101/2005, é possível concluir que a orientação consagrada no proêmio do Enun-ciado 86 da Súmula do Tribunal Superior do Trabalho subsiste à luz da atual legislação, porquanto os incisos III e IV do art. 84 e o caputdo art. 149 revelam que o pagamento das custas processuais relativas às ações em geral da massa falida só será realizado ao final do processo falimentar, ou seja, depois da realização do ativo e das restituições. Por conseguinte, a regra prevista no caput do art. 511 do Código de Processo Civil não alcança os recursos interpostos nos processos em geral nos quais a massa falida é vencida. Com efeito, diante da exis-tência de legislação específica (arts. 84, III e IV, e 149, caput, da Lei n. 11.101/2005) em prol da massa falida, não há lugar para a incidência do preceito genérico do Código de Processo Civil, ou seja, do caput do art. 511. Daí a dispensa do preparo recursal imediato em favor da massa falida nas ações em geral, na mesma linha do proêmio do Enun-ciado 86 da Súmula do Tribunal Superior do Trabalho: “Não ocorre deserção de recurso da massa falida por falta de pagamento de custas ou de depósito do valor da condenação”.

23. Cabimento de embargos infringentes noprocesso falimentar

No que tange ao cabimento de embargos infringentes em apelação no processo falencial (p. ex., art. 100, segunda parte), a ausência de res-trição no art. 530 do Código de Processo Civil permite a conclusão em prol da admissibilidade do recurso contra todas as apelações, desde que cumpridas as outras exigências do preceito legal. Com efeito, diante da inexistência de vedação no texto codificado e na legislação especial de regência do processo falimentar, é possível concluir pela igual adequação do recurso do art. 530 do Código. Aliás, na mesma esteira do antigo ca-put50 do art. 207 do revogado Decreto-Lei n. 7.661/45, o art. 189 da novel Lei n. 11.101/2005 também sugere a incidência do Código de Processo Civil: “Aplica-se a Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil, no que couber, aos procedimentos previstos nesta Lei”.

50 Com a redação dada pela Lei n. 6.014/73.

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Subsiste, por conseguinte, o preciso Enunciado 88 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça: “São admissíveis embargos infringentes em proces-so falimentar”. Por tudo, cabem embargos infringentes contra acórdão de provimento por maioria em apelação interposta de sentença de mé-rito no processo falencial51.

24. Arrecadação dos bens Após ser nomeado pelo juiz na decisão de decretação da falência

(art. 99, IX), o administrador judicial deve ser intimado pessoalmente para assinar o termo de compromisso (art. 33). Em seguida, o adminis-trador judicial deve efetuar a arrecadação dos bens e dos documentos do falido, bem como elaborar o respectivo laudo de arrecadação e de avaliação dos bens (arts. 22, III, f e g, e 108, caput).

O falido pode acompanhar a arrecadação e a avaliação realizadas pelo administrador judicial (art. 108, § 2º). Se constatar, entretanto, a existência de risco para a efetivação da arrecadação ou para a preserva-ção dos bens, o administrador judicial pode requerer ao juiz da falência a lacração do estabelecimento empresarial (arts. 99, XI, e 109).

25. Bens impenhoráveisDurante a arrecadação, o administrador judicial deve levar em

consideração a impenhorabilidade de alguns bens exvilegis (art. 108, § 4º), como, por exemplo, os bens arrolados no art. 649 do Código de Pro-cesso Civil, com a redação conferida pela Lei n. 11.382/2006.

Por força do art. 1º da Lei n. 8.009/90, o bem de família também é impenhorável, razão pela qual não é alcançado por dívidas de natureza civil, comercial, fiscal e previdenciária. Ressalvadas as ex-ceções arroladas no art. 3º daquele diploma, a impenhorabilidade subsiste intotum, independentemente do valor do bem de família, porquanto o Presidente da República vetou o parágrafo único que

51 De acordo, na doutrina: Barbosa Moreira, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. V, 10. ed., p. 520: “Atenta a aplicabilidade subsidiária das normas do Código aos procedimentos regidos por leis especiais, é fora de dúvida que em princípio cabem embargos contra acórdãos proferidos em tais feitos (v.g., em processo de falência), no julgamento de apelação”.

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seria acrescentado ao art. 650 do Código de Processo Civil, a fim de limitar a impenhorabilidade até o valor correspondente a mil salários mínimos.

26. Custódia dos bensOs bens arrecadados ficam sob a guarda do administrador judicial

ou de pessoa escolhida por ele, sob a responsabilidade do administrador (art. 108, § 1º, proêmio, da Lei n. 11.101/2005, e do art. 148 do Código de Processo Civil).

Para a melhor guarda e conservação, os bens arrecadados podem ser removidos para depósito, mas continuam sob a responsabilidade do administrador (art. 112 da Lei n. 11.101/2005).

Não obstante, não é absoluta a regra da custódia dos bens pelo administrador judicial ou por pessoa de sua confiança, sob a sua respon-sabilidade. Com efeito, o falido e os representantes da sociedade empre-sária falida também podem ser nomeados depositários dos bens (art. 108, § 1º, infine). Não obstante, tanto o falido quanto os respectivos re-presentantes da sociedade empresária falida só passam a ser responsáveis quando assumem expressamente o encargo, mas não podem sofrer pri-são civil, exvi do Enunciado Vinculante n. 26 da Súmula do Supremo Tribunal Federal: “É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito”.

27. Auto de arrecadação e laudo de avaliaçãoO auto de arrecadação deve conter o inventário dos bens e o res-

pectivo laudo de avaliação, bem como deve ser assinado pelo adminis-trador judicial, pelo falido ou por seus representantes, bem assim por outras pessoas (p. ex., oficial de justiça) que auxiliarem ou presenciarem o ato (art. 110). Em seguida, o auto de arrecadação é juntado aos autos do processo de falência (art. 139).

Se não for possível, todavia, a avaliação imediata dos bens no momento da arrecadação, o administrador judicial pode requerer ao juiz a concessão de prazo adicional de até trinta dias, para apresentar o laudo de avaliação em separado (art. 110, § 1º). Concluído o laudo de avaliação, ele também deve ser juntado aos autos do processo de falência.

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28. Término da arrecadação e início da realização do ativoFindas a arrecadação e a avaliação dos bens, e juntados o auto de

arrecadação e o laudo de avaliação aos autos do processo falimentar, tem início a realização do ativo, com a alienação dos bens arrecadados e o pagamento dos credores (art. 139).

29. Alienação e adjudicação antecipadas em favorde credores

É admissível, todavia, a alienação e a adjudicação antecipadas, isto é, antes mesmo do término da arrecadação e da avaliação de todos os bens do falido. Com efeito, sopesados os custos de conservação dos bens, o interesse da massa falida e a preferência na ordem legal de classificação dos créditos, o juiz da falência, ouvido o Comitê de Cre-dores (se constituído!), pode autorizar tanto a alienação quanto a ad-judicação de bens arrecadados, pelo valor da respectiva avaliação, em favor de credores interessados, com a compensação dos respectivos créditos (art. 111). O eventual remanescente da alienação entrará para a massa falida (art. 108, § 3º).

30. Alienação antecipada para terceirosAlém da alienação e da adjudicação antecipadas de bens em prol

de credores, também é admissível a imediata alienação para terceiros, especialmente em relação aos bens perecíveis, deterioráveis ou de con-servação dispendiosa. Em qualquer caso, a alienação depende de decisão do juiz da falência, após a concessão de vista ao Comitê de Credores (se constituído!) e ao falido, pelo prazo comum de 48 horas (art. 113).

31. Formas de alienação ordináriaRessalvadas as excepcionais alienações antecipadas (ou extraordi-

nárias) previstas nos arts. 111 e 113, a alienação dos bens pode ser reali-zada pelas formas previstas no art. 140, observada a seguinte ordem de preferência: – alienação dos estabelecimentos empresariais em bloco; – alienação isolada dos estabelecimentos empresariais, filiais ou unidades produtivas; – alienação em bloco dos bens de cada um dos estabeleci-mentos; – alienação isolada dos bens.

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32. Consequências jurídicas da alienaçãoA alienação dos bens do falido produz as seguintes consequências

jurídicas: – sub-rogação de todos os credores (massa falida subjetiva) no produto da alienação (arts. 108, § 3º, proêmio, e 141, I); – o objeto da alienação fica livre de ônus (art. 141, II, proêmio); – não há sucessão do arrematante nas obrigações do falido, até mesmo em relação às obrigações tributárias, trabalhistas e acidentárias (art. 141, II, segunda parte, e § 2º, infine)52; – os empregados contratados pelo arrematante são admitidos mediante novos contratos de trabalho (art. 141, § 2º).

33. Modalidades de alienação públicaApós a manifestação do administrador judicial e do eventual Co-

mitê de Credores, o juiz determina a alienação por uma das seguintes modalidades: – leilão, por lances orais; – propostas fechadas; – pregão. Com efeito, compete ao juiz ordenar a alienação do ativo do falido após a manifestação do administrador judicial e consoante a orientação do Comitê de Credores (art. 142, caput).

Além das três modalidades arroladas no art. 142, o juiz pode auto-rizar a alienação por outra modalidade sugerida pelo administrador judicial ou pelo Comitê de Credores (art. 144).

Independentemente da modalidade de alienação determinada pelo juiz, o Ministério Público deve ser sempre intimado pessoalmente, sob pena de nulidade da alienação (art. 142, § 7º).

52 O Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 141, II, da Lei n. 11.101/2005, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionali-dade 3.934, cujo acórdão foi publicado com a seguinte ementa: “AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTS. 60, PARÁGRAFO ÚNICO, 83, I E IV, E 141, II, DA LEI 11.101/2005. FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO JUDICIAL. INEXIS-TÊNCIA DE OFENSA AOS ARTS. 1º, III E IV, 6º, 7º, I, E 170, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. ADI JULGADA IMPROCEDENTE. I – Inexiste reserva cons-titucional de lei complementar para a execução dos créditos trabalhistas decor-rente de falência ou recuperação judicial. II – Não há, também, inconstitucionali-dade quanto à ausência de sucessão dos créditos trabalhistas. III – Igualmente não existe ofensa à Constituição no tocante ao limite de conversão de créditos traba-lhistas em quirografários. IV – Diploma legal que objetiva prestigiar a função social da empresa e assegurar, tanto quanto possível, a preservação dos postos de trabalho. V – Ação direta julgada improcedente” (Pleno do STF, ADI 3.934/DF, DiáriodaJustiçaeletrônico,5-11-2009).

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A divulgação da alienação pública ocorre mediante edital de anún-cio da venda, publicado em jornal de grande circulação, com pelo menos quinze ou trinta dias de antecedência, conforme a alienação alcance bens móveis ou imóveis, respectivamente (art. 142, § 1º). No que tange ao conteúdo, o edital deve conter o dia, o horário, o local e outras informa-ções relativas à alienação do ativo do falido.

As quantias recebidas em razão da alienação do ativo do falido devem ser depositadas em conta remunerada em favor da massa falida (arts. 108, § 3º, primeira parte, e 147), sob administração do administra-dor judicial e fiscalização do juiz.

34. LeilãoA primeira modalidade de alienação pública prevista no art. 142 é

o leilão por lances orais, com a alienação pelo maior valor oferecido, ainda que inferior ao valor da avaliação (art. 142, § 2º).

O leilão por lances orais segue o disposto na Lei n. 11.101/2005, no Código de Processo Civil (art. 142, § 3º, da Lei n. 11.101/2005) e no edital de anúncio da alienação (art. 142, § 1º, da Lei n. 11.101/2005).

O leilão do processo falimentar não se confunde com o leilão do processo civil, porquanto aquele (falimentar) alcança todos os bens do falido, tanto os móveis quanto os imóveis. Não há, portanto, no proces-so falimentar, a distinção terminológica entre leilão (para bens móveis) e praça (para bens imóveis), própria do direito processual civil.

35. Propostas fechadasSegundo a modalidade de alienação pública por propostas fecha-

das, os interessados na aquisição de bens do falido devem apresentar as respectivas propostas em envelopes lacrados perante o cartório do juízo da falência, sob recibo (art. 142, § 4º).

As propostas são abertas pelo juiz, no dia, hora e local indicados no edital de anúncio da alienação (art. 142, II e § 4º).

Tal como o leilão, a alienação mediante propostas fechadas também ocorre pelo maior valor, ainda que inferior ao da avaliação (art. 142, § 2º).

36. PregãoO pregão é uma modalidade constituída pela soma das anteriores

(propostas fechadas e leilão por lances orais). A primeira fase do pregão

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consiste na apresentação das propostas (art. 142, § 5º, I). Em seguida, há o leilão por lances orais, do qual participam apenas os proponentes que apresentaram propostas iguais ou superiores a noventa por cento da maior proposta (art. 142, § 5º, II).

37. ImpugnaçãoIndependentemente da modalidade de alienação ordenada pelo

juiz, há lugar para apresentação de impugnação pelo Ministério Público, pelo falido e por qualquer credor, no prazo comum de 48 horas da arre-matação (art. 143). A impugnação deve ser juntada aos próprios autos do processo falimentar, para posterior decisão do juiz, no prazo impróprio de cinco dias (art. 143). Julgada improcedente a impugnação, o juiz or-dena a entrega do bem ao arrematante, observadas as condições previs-tas no edital de anúncio da alienação pública. A decisão interlocutória acerca da impugnação é agravável por instrumento, no prazo de dez dias, com possibilidade de requerimento de efeito suspensivo ao relator no tribunal, a fim de evitar a imediata entrega do bem ao arrematante (arts. 522, 527, III, e 558, todos do Código de Processo Civil, aplicados por força do art. 189 da Lei n. 11.101/2005).

38. Pagamento aos credoresTão logo exista disponibilidade de caixa em favor da massa falida,

deve ser realizado o pagamento imediato dos créditos trabalhistas pro-venientes de salários vencidos nos três meses anteriores à decretação da falência, até o limite de cinco salários mínimos por trabalhador (art. 151).

Após, são realizadas as restituições em dinheiro (arts. 86, parágra-fo único, e 149). Depois, são pagos os créditos extraconcursais (arts. 84 e 149). Em seguida, há o pagamento dos credores arrolados no Quadro Geral, consoante a ordem de classificação dos créditos prevista no art. 83 (art. 149). Pagos todos os credores, o eventual saldo remanescente deve ser entregue ao falido (art. 153).

39. Prestação de contasApós a alienação do ativo e a distribuição do produto entre os

credores arrolados no Quadro Geral, o administrador deve prestar suas contas ao juiz, no prazo de trinta dias (arts. 22, III, r, primeira parte, e 154).

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Se o administrador judicial deixar de apresentar suas contas no prazo previsto no art. 154, o juiz deve determinar a intimação pessoal do administrador para apresentar as respectivas contas em cinco dias, sob pena de crime de desobediência (art. 23 da Lei n. 11.101/2005, c/c o art. 330 do Código Penal). Nada impede, por outro lado, que a ação de prestação de contas seja proposta pelo Comitê, por qualquer credor e pelo falido, contra o administrador judicial (art. 914, I, do Código de Processo Civil).

Na eventualidade de o administrador judicial tomar a iniciativa que lhe cabe, deve instruir a petição inicial com os documentos compro-batórios da prestação das contas (art. 154, § 1º, da Lei n. 11.101/2005). A prestação de contas deve ser feita de forma mercantil, ou seja, contábil, com uma coluna para as despesas e outra para as receitas, as quais devem ser demonstradas mediante documentos acostados à petição, em virtude da incidência do art. 917 do Código de Processo Civil, aplicável por força do art. 189 da Lei n. 11.101/2005.

A prestação de contas do administrador judicial deve ser distribu-ída por dependência ao processo falimentar, com a autuação em separa-do da petição inicial e dos respectivos documentos, para posterior apensação aos autos da falência (arts. 78, parágrafo único, e 154, § 1º, ambos da Lei n. 11.101/2005, e art. 919 do Código de Processo Civil).

Em seguida, o juiz ordena a publicação de aviso de que as contas do administrador judicial estão disponíveis para consulta e impugnação, em dez dias (art. 154, § 2º, da Lei n. 11.101/2005). Na eventualidade de impugnação quanto aos fatos, o juiz pode ordenar a conversão em dili-gência (art. 154, § 3º), para, por exemplo, a realização de perícia contábil.

Após, o juiz determina a intimação do membro do Ministério Pú-blico, para apresentação de parecer, no prazo de cinco dias (art. 154, § 3º). Veiculada alguma impugnação às contas ou apresentado parecer contrário à aprovação pelo Ministério Público, o administrador judicial é intimado para oferecer réplica (art. 154, § 3º, infine), em cinco dias (art. 185 do Código de Processo Civil, aplicado por força do art. 189 da Lei n. 11.101/2005).

Findo o processamento, o juiz profere sentença de procedência ou improcedência da prestação das contas do administrador (art. 154, § 4º). Rejeitadas as contas, o juiz já fixa na própria sentença de improcedência as responsabilidades do administrador judicial, condena o administrador

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a indenizar a massa e pode determinar a indisponibilidade ou o seques-tro (rectius, arresto53) de bens do administrador (art. 154, § 5º).

Por fim, da sentença (de improcedência ou de procedência) cabe apelação, em quinze dias, com efeito suspensivo (arts. 154, § 6º, e 189, ambos da Lei n. 11.101/2005 c/c os arts. 508 e 520, primeira parte, do Código de Processo Civil).

40. Relatório final do administrador judicialJulgadas as contas, o administrador judicial deve apresentar rela-

tório final da falência, no prazo de dez dias (art. 155). O relatório final deve conter a indicação do valor do ativo, do produto da respectiva alienação, do valor do passivo, dos pagamentos feitos aos credores, bem assim das responsabilidades do falido que subsistem (art. 155).

Se o administrador judicial deixar de apresentar o relatório final no prazo legal (de dez dias), o juiz deve determinar a intimação pessoal daquele (administrador judicial), a fim de que apresente o relatório final no prazo adicional de cinco dias, sob pena de crime de desobediência (art. 23).

41. Sentença de encerramento do processo falimentarApresentado o relatório final pelo administrador judicial, o juiz

encerra o processo de falência mediante sentença, a qual deve ser publi-cada por edital no órgão oficial de imprensa (art. 156, caput e parágrafo único, da Lei n. 11.101/2005).

Da sentença de encerramento da falência cabe apelação, em quinze dias, com efeito suspensivo (arts. 156, caput e parágrafo único, e 189 da Lei n. 11.101/2005 c/c os arts. 508 e 520, primeira parte, do Código de Processo Civil).

Quanto aos prazos prescricionais que estavam suspensos desde a decisão de decretação da falência (ou da decisão de deferimento do processamento da recuperação judicial, se a falência foi decretada me-

53 A despeito da literalidade do § 5º do art. 154 (“sequestro de bens”), trata-se, na verdade, de arresto, porquanto o preceito dispõe sobre futura execução por quan-tia certa, em razão da condenação do administrador judicial ao pagamento de indenização à massa falida.

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diante convolação da recuperação), voltam a correr a partir do trânsito em julgado da sentença de encerramento da falência (arts. 6º, caput, e 157, ambos da Lei n. 11.101/2005).

42. Extinção das obrigações do falido pelo pagamentoAs obrigações do falido são extintas mediante o pagamento de

todos os créditos (art. 158, I), bem assim pelo pagamento de mais de cinquenta por cento dos créditos quirografários, depois de realizado todo o ativo (art. 158, II, primeira parte). Não alcançada a percentagem extin-tiva das obrigações após a integral liquidação do ativo, o falido ainda pode efetuar o depósito da quantia necessária para ultrapassar o piso de cinquenta por cento dos créditos quirografários, a fim de obter a extinção das obrigações (art. 158, II, segunda parte).

43. Extinção das obrigações do falido pelo decurso de prazoAlém da extinção das obrigações em virtude do pagamento total

ou parcial, o decurso de prazo também é fato extintivo das obrigações do falido. Com efeito, há a extinção das obrigações após o decurso do prazo de cinco anos do encerramento do processo de falência, desde que o falido não tenha sido condenado por crime falimentar (art. 158, III). Na hipótese de condenação do falido por crime falimentar, a extinção das obrigações só ocorre após o decurso do prazo de dez anos do encerra-mento do processo de falência (art. 158, IV).

44. ReabilitaçãoConfigurada alguma das hipóteses previstas no art. 158 (isto é,

pagamento total, pagamento parcial ou decurso de prazo), o falido pode ajuizar a ação de reabilitação, com o requerimento da declaração da extinção das obrigações (art. 159, caput).

A ação de reabilitação é distribuída por dependência ao processo falimentar (art. 159, caput), com a posterior autuação em separado da petição inicial e dos respectivos documentos (art. 159, § 1º, primeira parte). Admitida a petição inicial, há a publicação de edital de citação no órgão oficial de imprensa e também em jornal de grande circulação (art. 159, § 1º, infine). Qualquer credor pode contestar, no prazo próprio de trinta dias, cuja contagem só tem início após a última publicação do edital (art. 159, §§ 1º e 2º). Em seguida, o juiz profere sentença no proces-

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so de reabilitação, no prazo impróprio de cinco dias (art. 159, § 3º, pri-meira parte). Da sentença cabe apelação (art. 159, § 5º), em quinze dias (art. 508 do Código de Processo Civil). Transitada em julgado a sentença da reabilitação, os respectivos autos são apensados aos autos do proces-so falimentar (art. 159, § 6º).

Na eventualidade de reabilitação ajuizada ainda na pendência do processo falimentar, o juiz pode declarar a extinção das obrigações do falido na própria sentença de encerramento da falência (art. 159, § 3º, infine), com igual cabimento de recurso de apelação (arts. 156, caput, e 159, § 5º).

Em qualquer caso, da sentença de declaração da extinção das obri-gações do falido sempre devem ser comunicadas todas as pessoas e entidades informadas da decretação da falência, especialmente a Junta Comercial, a fim de que proceda à anotação da reabilitação no registro do empresário ou da sociedade empresária (arts. 99, VIII e X, e 159, § 4º, da Lei n. 11.101/2005).

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Ação reVoCATóriA

1. A revogação e a ineficácia à luz da Lei n. 11.101/2005A Lei n. 11.101/2005 dispõe sobre a revogação e a ineficácia de atos

(p. ex., doação, contrato de compra e venda, contrato de cessão civil) praticados pelo empresário individual e pela sociedade empresária em prejuízo aos credores. A despeito da existência de diferenças entre a re-vogação e a ineficácia, ambas têm como escopo comum a proteção da massa falida subjetiva, ou seja, dos credores.

A primeira diferença entre os institutos é de cunho processual. A revogação só pode ser alcançada em ação própria, denominada “ação revocatória” (art. 132). Já a ineficácia pode ser declarada no curso do processo falimentar, até mesmo de ofício, bem assim mediante petição avulsa veiculada no próprio processo falencial. Além da possibilidade da declaração incidental no curso do processo de falência, a ineficácia pode ser objeto de ação própria, de natureza declaratória (art. 129, pará-grafo único).

A segunda diferença reside na causa de pedir. A revocatória tem causa de pedir subjetiva. Com efeito, a ação de revogação tem em mira atos praticados com a intenção de prejudicar os credores, pelo conluio entre o empresário individual ou a sociedade empresária (por intermédio dos seus controladores ou administradores) e o terceiro participante do contrato causador de prejuízo à massa falida (art. 130). Já a ineficácia tem causa de pedir objetiva, isto é, não está atrelada à intenção de fraudar credores, mas apenas ao ato em si, independentemente do conhecimen-to do estado de crise econômico-financeira pelo terceiro contratante e da intenção fraudulenta do empresário individual ou dos administradores, diretores, sócio-controladores da sociedade empresária, em prejuízo da massa falida. Para a declaração da ineficácia basta a incidência do ato praticado pelo empresário individual ou pela sociedade empresária em alguma das hipóteses legais arroladas no art. 129, sem necessidade al-guma de comprovação da intenção de prejudicar os credores.

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Por fim, a terceira diferença diz respeito ao prazo. A revocatória é uma ação constitutiva negativa com prazo decadencial de três anos (art. 132). Em contraposição, a Lei n. 11.101/2005 não estabelece prazo para a declaração da ineficácia, em razão da natureza declaratória da ação (arts. 129, parágrafo único, 136 e 138), a qual não está sujeita a prazo algum.

2. Ação revocatóriaA revocatória é a ação de natureza constitutiva sujeita a prazo de-

cadencial de três anos, adequada para a revogação dos atos fraudulentos praticados em razão do conluio do empresário individual ou da socie-dade empresária com terceiro, a fim de prejudicar os credores (arts. 130 e 132, ambos da Lei n. 11.101/2005).

A ação revocatória, também denominada “ação pauliana”, pode ser ajuizada pelo Ministério Público, pelo administrador judicial ou por qualquer credor, porquanto todos são legitimados ativos à vista do art. 132. Com efeito, além do administrador judicial e dos credores, também o Ministério Público tem legitimidade ativa para mover a ação revoca-tória, a fim de evitar a perpetuação da fraude à lei.

No que tange à legitimidade passiva, a revocatória pode ser movi-da contra todos os contratantes, inclusive os respectivos herdeiros e le-gatários (art. 133). Com efeito, a ação revocatória pode ser movida contra todos os que participaram do ato fraudulento, bem assim contra outras pessoas beneficiadas por ele.

A ação revocatória é da competência do próprio juízo da falência e é processada mediante o rito ordinário (art. 134). Com efeito, trata-se de ação da competência do juízo falimentar e processada sob o procedimen-to ordinário do Código de Processo Civil.

Ademais, o autor da ação revocatória pode requerer medida cau-telar de sequestro do bem objeto do ato fraudulento cuja revogação é o objeto daquela ação (art. 137 da Lei n. 11.101/2005)1. A medida

1 O Professor Vicente Greco Filho sustenta que o caso do art. 137 da Lei n. 11.101/2005 não é de sequestro, mas de arresto (cf. Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 178). Ainda que muito respeitável a douta lição do eminen-te processualista, sustenta-se no presente compêndio que a hipótese prevista no art. 137 é de sequestro, porquanto tem em mira bem determinado objeto de litígio proveniente de ação revocatória, para a posterior entrega do bem à massa falida,

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cautelar pode ser requerida antes (mediante ação cautelar antecedente ou preparatória), no curso (por meio de ação cautelar incidental) ou até mesmo no bojo do próprio processo da revocatória (por intermédio de simples petição avulsa, consoante autoriza o art. 273, § 7º, do Código de Processo Civil).

Por fim, a sentença proferida na ação revocatória ocasiona a descons-tituição dos atos fraudulentos. Da sentença proferida na revocatória, en-tretanto, cabe apelação (art. 135 da Lei n. 11.101/2005), com efeito suspen-sivo (art. 520, caput, proêmio, do Código de Processo Civil). Já da senten-ça no eventual processo cautelar de sequestro também cabe apelação, mas sem efeito suspensivo, por força do art. 520, IV, do Código de Processo Civil, razão pela qual a efetivação da apreensão do bem é imediata.

3. Declaração de ineficáciaA ineficácia dos atos praticados pelo empresário individual ou pela

sociedade empresária (por intermédio dos respectivos administradores ou controladores) pode ser declarada no bojo do próprio processo fali-mentar ou em ação própria, independentemente da existência de prévio conhecimento do estado de crise econômico-financeira por parte do terceiro contratante com o empresário individual ou com a sociedade empresária, ainda que sem a ocorrência de conluio fraudulento para prejudicar os credores (art. 129, caput e parágrafo único).

Na verdade, a declaração da ineficácia depende apenas do enqua-dramento do ato praticado em alguma das hipóteses objetivas previstas nos incisos do art. 129, como a ocorrência de pagamento de dívidas não vencidas, pelo empresário individual ou pela sociedade empresária, dentro do termo legal, período de até noventa dias antes do primeiro protesto, da propositura da recuperação judicial ou do ajuizamento da falência, fixado pelo juiz na decisão de decretação da falência (arts. 99, II, e 129, I), salvo quando há previsão do respectivo pagamento no plano de recuperação judicial (art. 131).

Também é ineficaz o pagamento, dentro do termo legal, de dívidas já vencidas e exigíveis, salvo quando o pagamento se dá mediante o

tal como determinam os arts. 130, 132 e 136, todos da Lei n. 11.101/2005. Daí o perfeito enquadramento no conceito de sequestro, estudado em capítulo especí-fico do presente compêndio.

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disposto no prévio contrato (art. 129, II) ou consta do plano de recupe-ração judicial (art. 131).

Da mesma forma, não tem eficácia a constituição de direito real de garantia dentro do termo legal (art. 129, III), salvo quando há previsão específica no plano de recuperação judicial (art. 131).

É igualmente ineficaz qualquer ato a título gratuito praticado nos dois anos anteriores à decretação da falência (art. 129, IV). Pelo mesmo motivo, não tem eficácia a renúncia à herança2 ou a legado3 nos dois anos anteriores à decretação da falência (art. 129, V)4.

Não têm eficácia a venda e a transferência do estabelecimento empresarial sem o consentimento ou o prévio pagamento de todos os credores (art. 129, VI), salvo quando há previsão da venda ou da trans-ferência no plano de recuperação judicial (art. 131).

Também são ineficazes os registros de direitos reais e de transfe-rência de propriedade entre vivos (p. ex., doação) após a decretação da falência, ressalvada anterior prenotação (art. 129, VII).

Em suma, salvo quando constar do plano de recuperação judicial (art. 131), o ato previsto no art. 129 deve ser declarado ineficaz median-te decisão judicial, independentemente do prévio conhecimento do es-tado de crise econômico-financeira por parte do terceiro participante do ato e da existência de conluio fraudulento para prejudicar os credores.

2 Universalidade de bens cuja transferência ocorre em razão do falecimento de uma pessoa natural (arts. 1.784 e 1.791 do Código Civil de 2002).

3 Bem certo e especificado deixado pelo falecido em favor de outrem mediante testamento (art. 1.912 do Código Civil).

4 O inciso V do art. 129 da Lei n. 11.101/2005 tem o mesmo escopo do art. 1.813 do Código Civil, a fim de que os credores não sejam prejudicados pela renúncia à herança, razão pela qual aqueles (credores) podem aceitar a herança no lugar do renunciante.

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ArresTo e seQuesTro

Nota explicativa

Ao contrário do que pode parecer à primeira vista, o direito em-presarial não prescinde do estudo do arresto e do sequestro, em razão da importância dos institutos para a compreensão dos arts. 103, caput, 137 e 154, § 5º, todos da Lei n. 11.101/2005. Daí a explicação para a abertura de um capítulo específico para o estudo do arresto e do se-questro, a fim de que aqueles preceitos tantas vezes citados ao longo do presente compêndio possam ser interpretados sob o prisma técnico- -processual.

1. Arresto

1.1. Conceito de arresto

Arresto é a medida cautelar admissível em prol do credor, destina-da à apreensão de bens indeterminados do devedor, a fim de afastar sério risco de dilapidação do patrimônio e resguardar o resultado útil de execução por quantia certa1.

1 Em sentido conforme, na doutrina: “Arresto, ou embargo, como diziam os antigos praxistas, é a medida cautelar de garantia da futura execução por quantia certa. Consiste na apreensão judicial de bens indeterminados do patrimônio do devedor. Assegura a viabilidade da futura penhora (ou arrecadação, se se tratar de insol-vência), na qual virá a converter-se ao tempo da efetiva execução. É figura caute-lar típica, com as nítidas marcas da prevenção e da provisoriedade, posta a servi-ço da eliminação do perigo de dano jurídico capaz de pôr em risco a possibilida-de de êxito da execução por quantia certa. Garante, enquanto não chega a opor-tunidade da penhora, a existência de bens do devedor sobre os quais haverá de incidir a provável execução por quantia certa. Realiza-se, destarte, através da apreensão e depósito de bens do devedor, com o mencionado fito” (Humberto Theodoro Júnior, Cursodedireitoprocessualcivil, v. II, 27. ed., 1999, n. 1.053, p. 441).

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1.2. Arresto: natureza do processo principal

Como o arresto está diretamente relacionado à execução por quan-tia certa, questiona-se se a cautelar pode ser ajuizada na pendência de processo de conhecimento. Sem dúvida, o arresto cautelar também pode ser requerido no curso de um processo de conhecimento, como bem revela o art. 814, parágrafo único, infine, do Código de Processo Civil. Com efeito, quando o processo de conhecimento for a fonte da futura execução por quantia certa, não há dúvida da admissibilidade do arres-to cautelar2. Por fim, a futura ou atual execução por quantia certa au-torizadora do arresto cautelar pode ser civil ou falimentar. Com efeito, o arresto cautelar também tem lugar na falência3.

1.3. Arresto antecedente e arresto incidental

À vista dos arts. 796 e 812 do Código de Processo Civil, o arresto cautelar pode ser antecedente ou incidental, exercido mediante ação cautelar específica, consubstanciada em petição inicial própria, autuada em separado (art. 809).

Não obstante, o arresto cautelar incidental também pode ser reque-rido no bojo dos autos do processo principal. Com efeito, após o advento da Lei n. 10.444/2002, as cautelares incidentais podem ser concedidas

“O arresto é a apreensão cautelar de bens com a finalidade de garantir uma futu-ra execução por quantia” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 175). Também no mesmo sentido, na doutrina: Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novocursodedireitoprocessualcivil, v. III, 2007, p. 303: “serve para garantir que a futura execução por quantia certa venha a ter êxito. O risco que o arresto cautelar procura afastar é o de que o devedor dilapide o seu patrimônio, tornando-se insolvente. Serve para que se faça a apreensão judicial de bens do devedor, entregues a um depositário”.

2 No mesmo sentido, na doutrina: “O arresto pode ser preparatório ou incidente, de execução por quantia certa ou de ação condenatória” (Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novocursodedireitoprocessualcivil, v. III, 2007, p. 303). Também em sentido conforme, ainda na doutrina: Alexandre Freitas Câmara, Liçõesdedireitoprocessualcivil, v. III, 12. ed., 2007, p. 109. Assim, na jurisprudência: 1ª Turma do STJ, REsp 199.478/MG, DiáriodaJustiça, 8-5-2000, p. 61.

3 De acordo, na jurisprudência: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – CAUTELAR DE ARRESTO – DEFERIMENTO DE LIMINAR – DETERMINAÇÃO DE QUE O AGRAVADO FIQUE COMO DEPOSITÁRIO FIEL DOS BENS ARRESTADOS – LEI DE FALÊNCIA – ART. 666 DO CPC” (5ª Turma do TJDF, AGI 2003.00.2.006965-1, DiáriodaJustiça, 10-12-2003, p. 62).

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até mesmo dentro do próprio processo principal4, em virtude do art.

273, § 7º, do Código de Processo Civil. Aliás, o arresto pode ser determi-

nado até de ofício pelo juiz do processo principal, em virtude do poder

geral de cautela consagrado no art. 798 do Código de Processo Civil5.

1.4. Hipóteses de arresto: inteligência do art. 813 do Código de

Processo Civil

O art. 813 do Código de Processo Civil arrola as principais hipóte-

ses de arresto6, todas à luz da mesma premissa: resguardar o resultado

útil de execução por quantia certa diante do risco de dilapidação do

patrimônio pelo devedor. O preceito, entretanto, não é exaustivo. Aliás,

o inciso IV do próprio art. 813 revela a existência de outros tantos casos

4 Em sentido semelhante, na jurisprudência: 3ª Turma do STJ, REsp 709.479/SP, DiáriodaJustiça, 1º-2-2006, p. 548; e 1ª Turma do STJ, REsp 199.478/MG, DiáriodaJustiça, 8-5-2000, p. 61: “2. A teor da Lei 7.347/85 (art. 12), o arresto de bens per-tencentes a pessoas acusadas de improbidade, pode ser ordenado nos autos do processo principal”.

5 Assim, na jurisprudência: “PROCESSUAL CIVIL – PODER CAUTELAR DO JUIZ – ARRESTO. I – Jurisprudência do STJ acolhe entendimento no sentido de que arresto decretado pelo juiz da execução, de ofício, no exercício de seu poder cau-telar e para garantia do processo e eficácia da decisão, é cabível e pode ser efeti-vado sem audiência da parte adversa” (3ª Turma do STJ, REsp 122.583/RS, DiáriodaJustiça, 4-5-1998, p. 154). “PROCESSUAL CIVIL – PODER CAUTELAR DO JUIZ – ARRESTO. I – Jurisprudência do STJ acolhe entendimento no sentido de que arresto decretado pelo juiz da execução, de ofício, no exercício de seu poder cau-telar e para garantia do processo e eficácia da decisão, é cabível e pode ser efeti-vado sem audiência da parte adversa” (3ª Turma do STJ, RMS 5.345/RS, DiáriodaJustiça, 7-8-1995, p. 23035).

6 “Art. 813. O arresto tem lugar: I – quando o devedor sem domicílio certo intenta ausentar-se ou alienar os bens que possui, ou deixa de pagar a obrigação no pra-zo estipulado; II – quando o devedor, que tem domicílio: a) se ausenta ou tenta ausentar-se furtivamente; b) caindo em insolvência, aliena ou tenta alienar bens que possui; contrai ou tenta contrair dívidas extraordinárias; põe ou tenta pôr os seus bens em nome de terceiros; ou comete outro qualquer artifício fraudulento, a fim de frustrar a execução ou lesar credores; III – quando o devedor, que possui bens de raiz, intenta aliená-los, hipotecá-los ou dá-los em anticrese, sem ficar com algum ou alguns, livres e desembargados, equivalentes às dívidas; IV – nos demais casos expressos em lei.”

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de arresto7: art. 154, § 5º, da Lei n. 11.101/20058, art. 731 do Código de Processo Civil9, art. 45, caput e § 2º, da Lei n. 6.024/74, art. 16, caput e § 1º, da Lei n. 8.429/9210, e arts. 136, 137, 138, 139, 141, 143 e 144, todos do Código de Processo Penal. Em suma, além das hipóteses arroladas no art. 813 do Código de Processo Civil, há lugar para arresto cautelar em outros casos11, sempre que o credor demonstrar, a um só tempo, a plau-sibilidade do respectivo direito (fumusboniiuris) e o perigo da demora (periculuminmora)12.

7 Sem contar com a hipótese prevista no art. 653 do Código de Processo Civil, em razão da divergência doutrinária acerca da natureza executiva ou cautelar do arresto previsto naquele preceito. Reconhecem a natureza cautelar do arresto previsto no art. 653, na doutrina: José Carlos Barbosa Moreira, Onovoprocessocivilbrasileiro, 25. ed., 2007, p. 234; Humberto Theodoro Júnior, Cursodedireitoproces-sualcivil, v. II, 27. ed., 1999, n. 1.053, p. 442; e Vicente Greco Filho, Direitoprocessu-alcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 176. Negam a natureza cautelar e sustentam a natureza executiva do arresto do art. 653: Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novocursodedireitoprocessualcivil, v. III, 2008, p. 303; e Alexandre Freitas Câmara, Liçõesdedireitoprocessualcivil, v. III, 12. ed., 2007, p. 104.

8 Com a mesma opinião, na doutrina: Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 176: “Entre eles se encontra o do já comentado art. 653, inserido na execução, e o do art. 154, § 5º, da Lei de Falências (a lei refere-se a sequestro, mas o caso é de arresto)”.

9 Em sentido conforme, na doutrina: Humberto Theodoro Júnior, Cursodedireitoprocessualcivil, v. II, 27. ed., 1999, n. 1.057, p. 444.

10 Em erudito voto proferido no julgamento do REsp 206.222/SP, o Ministro Teori Albino Zavascki sustenta a respeitável tese de que o sequestro previsto no art. 16 da Lei n. 8.429/92 ora tem natureza de arresto, ora tem natureza de sequestro. Ainda que muito respeitável a tese do eminente Professor, o sequestro inserto no art. 16 da Lei n. 8.429 tem natureza de arresto, porquanto alcança bens indetermi-nados como garantia de execução por quantia certa, conforme se infere do art. 7º da mesma lei.

11 No mesmo sentido, na jurisprudência: “– O art. 813 do CPC deve ser interpreta-do sob enfoque ampliativo, sistemático e lógico, de sorte a contemplar outras hipóteses que não somente as expressamente previstas no dispositivo legal” (3ª Turma do STJ, REsp 909.478/GO, DiáriodaJustiça, 27-8-2007, p. 249). “– As hipó-teses numeradas no art. 813, do CPC, são meramente exemplificativas, de forma que é possível ao juiz deferir cautelar de arresto fora dos casos enumerados” (3ª Turma do STJ, REsp 709.479/SP, DiáriodaJustiça, 1º-2-2006, p. 548).

12 No mesmo sentido, na jurisprudência: “II – Considerando que a medida cautelar de arresto tem a finalidade de assegurar o resultado prático e útil do processo principal, é de concluir-se que as hipóteses contempladas no art. 813, CPC, não são exaustivas, mas exemplificativas, bastando, para a concessão do arresto, o

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1.5. Dívida em dinheiro, certeza acerca da existência e vencimento: desnecessidade

À primeira vista, os arts. 813 e 814 do Código de Processo Civil condicionam a concessão do arresto ao prévio reconhecimento da dívida e ao vencimento da obrigação pecuniária.

Não obstante, fixada a premissa de que as hipóteses arroladas no art. 813 não são taxativas, o arresto pode ter lugar antes do vencimento da dívida e até mesmo antes do reconhecimento da obrigação pecuniária, desde que comprovados o fumusboniiuris, à luz da plausibilidade do direito do requerente,e opericuluminmora, à vista do risco iminente de dilapidação do patrimônio por parte do devedor.

Com efeito, o arresto é admissível mesmo antes da propositura da execução, ainda que na pendência do processo de conhecimento, como autoriza o parágrafo único do art. 814. A propósito, merece ser prestigia-da a Conclusão n. 71 aprovada no Simpósio de Processo Civil de Curi-tiba, sob a relatoria do Professor Cândido Dinamarco: “ARRESTO E EXIGIBILIDADE DA DÍVIDA – A exigibilidade da dívida não é requisi-to indispensável à concessão do arresto”13.

Em suma, o arresto não depende do vencimento da dívida nem do reconhecimento da existência da obrigação mediante sentença transitada em julgado, mas apenas do fumusboniiuris e do periculuminmora, ou seja, a probabilidade da existência da dívida somada ao sério risco de dissipação de bens pelo requerido14.

risco de dano e o perigo da demora” (4ª Turma do STJ, REsp 123.659/PR, DiáriodaJustiça, 21-9-1998, p. 175).

13 Cf. RevistaForense, v. 252, p. 23 e 28: “40. CÂNDIDO DINAMARCO apresentou esta dúvida: é necessário que a dívida esteja vencida para possibilitar o arresto? (arts. 586 e 814 – I). CÂNDIDO DINAMARCO: exigibilidade não é requisito para arresto. A medida, entretanto, perderia a finalidade se não proposta a ação dentro de trinta dias. E se a dívida, nestes trinta dias, ainda não estiver vencida? LUÍS RENTATO PEDROSO: parece que houve cochilo do legislador neste caso. GALE-NO LACERDA: não se restringe o direito do credor ao prazo fatal de trinta dias. Isto não seria compreensível. MOURA ROCHA: nem todas as medidas cautelares são preparatórias. Decisão do SIMPÓSIO: o arresto pode ser concedido antes de vencida a dívida, permanecendo a sua eficácia até trinta dias após a exigibilidade da mesma (arts. 814 e 586)” (Edson Prata, Simpósio de Processo Civil, RevistaForense, v. 252, p. 23).

14 Em abono, na doutrina: “É registrar-se, outrossim, uma tendência doutrinária e jurisprudencial no sentido de abrandar-se o rigor na determinação do que seria

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1.6. Bens arrestáveis

O arresto pode ocasionar a apreensão de bens móveis, semoventes e imóveis do devedor. Não obstante, à vista dos arts. 818 e 821 do Códi-go de Processo Civil, somente os bens penhoráveis podem ser objeto da constrição mediante arresto. Por conseguinte, os bens impenhoráveis

‘prova literal de dívida líquida e certa’. Assim, não seria necessário que o credor dispusesse, desde logo, de um título executivo perfeito e completo, bastando contar com prova documental de dívida reconhecida pelo devedor, ou a ele opo-nível com verossimilhança. Essa posição merece acolhida, diante do fato de a lei autorizar, com toda amplitude, o poder geral de cautela, o que tornaria sem sen-tido tratar a medida típica sob um rigor formal impróprio aos desígnios da juris-dição preventiva” (Humberto Theodoro Júnior, Cursodedireitoprocessualcivil, v. II, 27. ed., 1999, n. 1.056, p. 443). Também em sentido conforme, na doutrina: “Mas a leitura do inciso I do art. 814 do CPC poderia levar a equívocos, ao exigir ‘prova literal da dívida líquida e certa’. Poderia dar a impressão de que a medida exige que o crédito já seja reconhecido, consubstanciado em documento com força executiva. Imagine-se uma vítima de acidente de trânsito, do qual resultam graves lesões. Ela ajuíza ação com pedido de reparação de danos, mas, antes do julga-mento, descobre que o devedor está transferindo todos os seus bens e corre sério risco de cair em insolvência. Não teria sentido que, para a concessão do arresto, fosse necessário aguardar o resultado do processo de conhecimento, o que retira-ria grande parte da utilidade da medida. Basta, para a concessão da medida, a plausibilidade da existência do crédito. (...) Para a concessão do arresto, o juiz não precisa ter absoluta certeza da existência do crédito; do contrário, teria de aguar-dar o julgamento do processo de conhecimento. Basta que se afigure plausível, verossímil, para que a proteção seja concedida” (Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novocursodedireitoprocessualcivil, v. III, 2007, p. 304-305). Também com opinião conforme, na doutrina: “É preciso, dizer, em primeiro lugar, que a ‘certeza’ exigi-da pelo art. 814 do CPC não se refere à existência da obrigação. Isto porque, como sabido, o processo cautelar não é sede própria para verificação da existência de direitos subjetivos, não cabendo ao juiz, neste tipo de processo, formar juízo de certeza. Basta-lhe, para concessão da tutela cautelar, o fumusboniiuris, o que sig-nifica dizer que basta a probabilidade de existência da obrigação. (...) É de se considerar, pois, que o requisito que ora se analisa para a concessão do arresto é nada mais, nada menos, que o fumusboniiuris, ou seja, a probabilidade de exis-tência do direito de crédito cuja satisfação se irá buscar no processo de execução por quantia certa cuja efetividade se quer proteger” (Alexandre Freitas Câmara, Liçõesdedireitoprocessualcivil, v. III, 12. ed., 2007, p. 108-109).

Em sentido contrário, quanto à existência da dívida, e no mesmo sentido, quanto ao vencimento, na doutrina: “Em todos os casos, a dívida deve ser líquida e certa para a obtenção do arresto, mas, como já se disse, não precisa estar vencida” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 176).

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arrolados no art. 649 do Código de Processo Civil, no art. 1.715 do Có-digo Civil e na Lei n. 8.009/90, não são passíveis de arresto15.

O arresto deve incidir em tantos bens quantos bastem para a satis-fação da execução por quantia, com o pagamento do principal atualiza-do, juros, custas e honorários advocatícios (arts. 659, caput, e 821, ambos do Código de Processo Civil).

1.7. Petição inicial do arresto

Em regra, a medida cautelar de arresto é requerida mediante ação própria, especialmente quando a medida é solicitada antes da proposi-tura da ação principal. Daí a regra: a ação cautelar de arresto é veiculada mediante petição inicial, a qual deve ser elaborada à luz dos arts. 39, I, 258, 282, 283 e 801, todos do Código de Processo Civil. As formalidades tradicionais somente podem ser relevadas quando a medida cautelar é incidental e é requerida no bojo do próprio processo principal, quando o arresto pode ser solicitado mediante simples petição, como autoriza o art. 273, § 7º, do Código de Processo Civil.

1.8. Arresto cautelar liminar

À vista dos arts. 804 e 812 do Código de Processo Civil, é admissí-vel a concessão do arresto cautelar inliminelitis, mediante decisão inter-locutória proferida pelo juiz. Tanto a decisão concessiva quanto a dene-gatória do arresto liminar são passíveis de impugnação mediante recur-so de agravo de instrumento, no prazo de dez dias (art. 522).

1.9. Audiência de justificação: inteligência do art. 815 do Código de Processo Civil

Se a prova documental juntada com a petição de arresto não for suficiente para o convencimento do juiz em prol da imediata concessão da medida cautelar, o magistrado pode designar audiência de justificação prévia, a fim de colher outras provas requeridas na petição de arresto. Com efeito, ao contrário do que pode parecer à primeira vista, a neces-sidade da medida cautelar de arresto pode ser demonstrada por outros

15 Assim, na jurisprudência: 3ª Turma do STJ, REsp 605.641/RS, DiáriodaJustiça, 29-11-2004, p. 333.

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meios de prova além da documental. Daí a possibilidade da oitiva de testemunhas e até mesmo de prova pericial na audiência de justificação prévia. Colhidas as provas adicionais, o juiz decide se concede ou dene-ga o arresto liminar, conforme o caso concreto.

1.10. Exigência da caução para a concessão da liminar: faculdade do juiz

A combinação dos arts. 804 e 816, II, do Código de Processo Civil, revela que o juiz pode condicionar a concessão do arresto liminar à prestação de caução pelo requerente da cautelar. Trata-se de caução fa-cultativa e poderá ser exigida ou dispensada pelo juiz, à vista do caso concreto16. A caução prevista no inciso II do art. 816 tem natureza de contracautela, porquanto tem como escopo mitigar os eventuais danos causados por um eventual arresto indevido (cf. arts. 804 e 811).

1.11. Efetivação da medida, auto de arresto e nomeação do depositário

A medida cautelar de arresto pode ser efetiva em qualquer dia, até mesmo nos feriados, tendo em vista o disposto no art. 173, II, do Código de Processo Civil.

À vista do art. 821 do Código de Processo Civil, a efetivação do arresto segue o disposto nos arts. 659 e s. do mesmo diploma. Não há execução propriamente dita, mas apenas a expedição de mandado judi-cial para a efetivação da medida cautelar17. O arresto é efetivado me-diante a apreensão e o depósito dos bens, com a lavratura do auto de arresto. Na eventualidade de mais de um arresto, também há mais de um auto, um para cada arresto.

16 De acordo, na jurisprudência: “– Nas hipóteses do art. 813 do CPC, é facultati-va a exigência de caução pelo juiz da causa, da mesma forma como o é em rela-ção ao art. 804, do CPC” (3ª Turma do STJ, REsp 709.479/SP, DiáriodaJustiça, 1º-2-2006, p. 548).

17 Em sentido conforme, na doutrina: “Independentemente do ordinário procedi-mento de execução forçada, ela se cumpre por si mesma, gerando a imediata ex-pedição do mandado de arresto” (Humberto Theodoro Júnior, Cursodedireitoprocessualcivil, v. II, 27. ed., 1999, n. 1.067, p. 449). “A efetivação da medida caute-lar de arresto, como a efetivação de todas as demais medidas cautelares, se faz no próprio processo cautelar, sem que se possa pensar num processo autônomo de execução” (Alexandre Freitas Câmara, Liçõesdedireitoprocessualcivil, v. III, 12. ed., 2007, p. 117).

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Se o devedor oferecer resistência, incidem os arts. 579, 660, 661, 662 e 663, com a requisição de força policial para a efetivação do arresto.

Os bens arrestados ficam sob a guarda do depositário, nomeado pelo juiz. Na nomeação do depositário dos bens móveis e imóveis, tem preferência o depositário judicial (art. 666, II). Nada impede, entretanto, que o depositário seja um dos litigantes, até mesmo o devedor, desde que o credor concorde com a nomeação. Qualquer que seja o depositário nomeado pelo juiz, o encargo só é assumido com a assinatura do depo-sitário no auto de arresto, quando os bens arrestados passam à guarda do depositário, responsável pela conservação deles (cf. art. 148).

1.12. Efeitos do arresto

O arresto cautelar produz alguns importantes efeitos jurídicos. O primeiro efeito do arresto é vincular o bem apreendido ao processo principal. Na eventualidade de o bem arrestado ser alienado a terceiro, a alienação não tem eficácia alguma em relação ao processo acautelado mediante o arresto. Realmente, o arresto não gera a imediata perda da propriedade, razão pela qual o devedor ainda pode alienar o bem arres-tado. Não obstante, a alienação não tem eficácia alguma em relação ao processo principal ao qual o bem arrestado está vinculado, o que explica a possibilidade de o bem ser penhorado e alienado no processo principal, com o pagamento do credor.

Ademais, o arresto ocasiona a perda da posse direta do bem pelo seu proprietário, ou seja, o devedor. Com o arresto, o Estado-juiz assume a posse direta do bem arrestado. Daí a nomeação do depositário pelo juiz, auxiliar do juízo que fica pela guarda e pela conservação do bem arrestado (art. 148 do Código de Processo Civil). O devedor cujo bem foi arrestado ainda tem a propriedade e a posse indireta, tanto que é possí-vel a alienação do bem a terceiro, mas sem eficácia em relação ao proces-so garantido por meio do arresto18.

18 Assim, na doutrina: “Com o arresto surge uma nova situação jurídica para o bem apreendido, que fica materialmente sujeito à guarda judicial e, juridicamente, vinculado à atuação da prestação jurisdicional objeto do processo principal. De-correm, portanto, do arresto, dois efeitos importantes: a) restrição física à posse do dono, já que o objeto arrestado passa à guarda de depositário judicial; b) im-posição de ineficácia dos atos de transferência dominial frente ao processo em que se deu a constrição. Observe-se, porém, que ineficácia não se confunde com nuli-dade, nem impede que seja válida a alienação do bem; apenas faz com que o ato

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1.13. Art. 806 do Código de Processo Civil: incidência na cautelar de arresto

Diante da natureza constritiva do arresto, incide o art. 806 do Có-digo de Processo Civil. Por conseguinte, o requerente deve ajuizar a ação principal no prazo de trinta dias da efetivação da cautelar concedida inliminelitis19, sob pena de perda da eficácia da medida (art. 808, I).

1.14. Procedimento do arresto

Estudados os atos processuais em tópicos específicos, resta fe-char o procedimento do arresto cautelar, após a síntese da soma daque-les (atos processuais).

praticado seja irrelevante para o processo, ou seja, faz com que o bem transferido, embora integrado no patrimônio do adquirente, conserve a vinculação ao arresto e aos destinos do processo a que serve a medida cautelar” (Humberto Theodoro Júnior, Cursodedireitoprocessualcivil, v. II, 21. ed., 1999, n. 1.070, p. 451). Também em sentido conforme, ainda na doutrina: “O primeiro efeito do arresto é a afetação do bem apreendido à futura execução. Isto porque o bem arrestado será, na exe-cução por quantia certa cuja efetividade se pretende, com a medida cautelar, as-segurar, penhorado (se, obviamente, a penhora não acabar por recair sobre outro bem, o que é sempre possível). Outro efeito do arresto é fazer com que o deman-dado perca a posse direta do bem apreendido. Mantém o demandado a proprie-dade do bem, assim como sua posse indireta. O bem arrestado, contudo, é entre-gue a um depositário judicial, auxiliar da justiça, ficando com o Estado-juiz, pois, sua posse direta. (...) É de se afirmar, ainda, que a apreensão do bem através do arresto não retira a sua disponibilidade, mesmo porque, como se viu, o deman-dado não perde, com a apreensão cautelar do bem, o domínio que exerce sobre o mesmo. É possível, pois, a alienação do bem arrestado, sendo válido tal ato de disposição. A alienação de bem arrestado, porém, assim como se dá em relação ao bem penhorado, é ineficaz em relação ao credor (ou seja, o ato de alienação do bem arrestado não é oponível ao credor que, com o arresto, buscou assegurar a efetividade da futura execução). Significa isto dizer que a alienação do bem arres-tado não desembaraça o bem apreendido judicialmente, nem impede a posterior incidência, sobre o mesmo bem, de penhora” (Alexandre Freitas Câmara, Liçõesdedireitoprocessualcivil, v. III, 12. ed., 2007, p. 117-118).

19 Em sentido conforme, na jurisprudência: “PROCESSUAL CIVIL – CAUTELAR DE ARRESTO – AÇÃO PRINCIPAL – PRAZO DE AJUIZAMENTO – TERMO INICIAL – PEDIDO DE REVOGAÇÃO DA LIMINAR – INDEFERIMENTO – DUPLICIDADE DE AGRAVOS – PRECLUSÃO. I – Nos autos de Cautelar, quan-do deferida a medida liminar, o prazo de 30 (trinta) dias para ajuizamento da ação principal flui a partir da data da efetivação da medida (art. 806 do CPC)” (3ª Turma do STJ, REsp 88.975/SP, DiáriodaJustiça, 1º-3-1999, p. 304).

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Após a distribuição da petição inicial de arresto, perante o juízo competente para o processo principal (cf. art. 800), o juiz decide acerca do pedido liminar. Pode o juiz designar audiência de justificação prévia, a fim de colher provas testemunhal e pericial, antes de decidir o pleito liminar. Trata-se de faculdade conferida ao juiz, se a prova documental juntada com a petição inicial não permitir a formação do convencimen-to ao juiz. Deferido o arresto liminar, há a imediata efetivação da medi-da. Na mesma oportunidade ou logo em seguida, o requerido é citado para contestar, em cinco dias (art. 802). Se houver necessidade de dilação probatória, o juiz designa audiência de instrução e julgamento (art. 803). Na mesma oportunidade ou logo em seguida, o juiz profere sentença (arts. 456 e 803), quando julga procedente ou improcedente o pedido cautelar, independentemente de ter concedido ou denegado o pleito li-minar. É, em suma, o procedimento do arresto cautelar.

1.15. Coisa julgada: inteligência dos arts. 810 e 817 do Código de Processo Civil

Em regra, a sentença proferida no processo cautelar de arresto não produz coisa julgada material (ou seja, substancial), tendo em vista o disposto nos arts. 810 e 817 do Código de Processo Civil. À vista de am-bos os preceitos, só há coisa julgada material se o juiz pronunciar a prescrição da pretensão principal ou a decadência do direito em si. Res-salvadas as duas exceções, a sentença de procedência do arresto cautelar só produz coisa julgada formal, apenas com o impedimento de renova-ção da discussão no mesmo processo já sentenciado.

1.16. Subsistência do arresto e conversão em penhora

À vista dos arts. 807 e 818 do Código de Processo Civil, o arresto subsiste durante a pendência do processo principal, com a posterior conversão em penhora, para a satisfação da execução por quantia certa.

2. Sequestro2.1. Conceito de sequestro

O sequestro é a medida cautelar típica de proteção de execução para entrega de coisa e que ocasiona a apreensão judicial de bem deter-minado, objeto do litígio. Daí as duas características que marcam o se-questro cautelar: apreensão de bem específico, determinado, litigioso; e proteção de execução para entrega de coisa.

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2.2. Sequestro e arresto: diferenças e fungibilidade

Sequestro e arresto são espécies do mesmo gênero, razão pela qual têm em comum a finalidade de resguardar o resultado útil de uma exe-cução, atual ou futura. Não obstante, os institutos não se confundem: enquanto o sequestro diz respeito à execução para entrega de coisa e tem em mira bem determinado, o arresto está relacionado à execução por quantia certa e que tem como alvo bens indeterminados, mas passíveis de conversão em dinheiro20.

A despeito das diferenças entre o arresto e o sequestro, o requeri-mento de um no lugar do outro é erro escusável, passível de fungibilida-de. Com efeito, à vista dos arts. 154, caput, 798 e 823, todos do Código de Processo Civil, incide o princípio da fungibilidade das cautelares, segun-do o qual a cautelar inadequada deve ser recebida como se fosse a correta para a espécie. Nada justifica o indeferimento liminar da petição inicial do sequestro, ao fundamento de que a cautelar adequada é o arresto, porquanto o inciso V do art. 295 do Código de Processo Civil só autoriza o indeferimento da petição quando não for possível adaptar a inicial ao tipo de procedimento legal, obstáculo que não alcança as cautelares de sequestro e de arresto, como bem revela o art. 823 do Código de Processo

20 De acordo, na doutrina: “Quanto à materialidade e também quanto ao procedi-mento, o arresto é idêntico ao sequestro. A diferença está em que, no arresto, os bens apreendidos são quaisquer bens penhoráveis que vão ser convertidos em dinheiro para pagamento do credor, ao passo que no sequestro a apreensão é da coisa litigiosa, para garantir sua total entrega ao vencedor” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 177). “A proteção que se busca por meio do sequestro é diferente daquela que se almeja no arresto. Este será sempre ligado a uma execução por quantia, a uma dívida, e sua função é garantir a solvência do devedor, para que ela venha a ser frutífera. Por isso, o objeto do arresto não é um bem determinado, específico, mas bens quaisquer do devedor, que tenham valor econômico e que possam ser penhorados para, opor-tunamente, em hasta pública, serem arrematados e, com o produtor da venda forçada, servir para pagar o credor. O sequestro não tem relação com uma dívida em dinheiro. Sua finalidade é preservar um ou alguns bens determinados e espe-cíficos, sobre os quais recaia o litígio, e que estejam em risco. Apreende-se um bem determinado, que é ou será objeto de demanda judicial, a fim de resguardar a sua entrega ao vencedor. Pressupõe-se que haja um fundado receio de que a coisa que já é, ou venha a tornar-se litigiosa, possa vir a ser alienada, perdida ou a se dete-riorar. O arresto presta-se à garantia de uma futura execução de dinheiro, ao passo que o sequestro, a uma futura execução para entrega de coisa certa. Aquele converte-se, no momento apropriado, em penhora; este não” (Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novocursodedireitoprocessualcivil, v. III, 2008, p. 311).

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Civil. Aliás, por vezes o próprio legislador conduz o intérprete em falsa pista, ao chamar de sequestro o que é verdadeiro arresto, como, por exem-plo, no art. 154, § 5º, da Lei n. 11.101/200521, no art. 731 do Código de Processo Civil, no art. 45, caput e § 2º, da Lei n. 6.024/7422, art. 16, caput e § 1º, da Lei n. 8.429/92, e nos arts. 136 e 137 do Código de Processo Penal de 194123, antes das correções feitas pela Lei n. 11.435/2006. Por tudo, há lugar para fungibilidade entre as cautelares de sequestro e de arresto24.

2.3. Aplicação subsidiária das regras do arresto em relação ao sequestro

Como estudado no tópico anterior, o art. 823 do Código de Proces-

21 Com a mesma opinião, na doutrina: Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 176: “Entre eles se encontra o do já comentado art. 653, inserido na execução, e o do art. 154, § 5º, da Lei de Falências (a lei refere-se a sequestro, mas o caso é de arresto)”.

22 Assim, na doutrina: “Outro exemplo é o do art. 45 da Lei n. 6.024, de 13 de janei-ro de 1974, que trata da liquidação extrajudicial das instituições financeiras e prevê o arresto de bens dos ex-administradores que não tenham sido atingidos pela indisponibilidade, prevista no art. 36 dessa lei. Conquanto o dispositivo mencione sequestro, trata-se de verdadeiro arresto, porque não recai sobre um bem determinado, mas sobre bens suficientes para a efetivação da garantia da responsabilidade desses administradores” (Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novocursodedireitoprocessualcivil, v. III, 2008, p. 307).

23 Com igual opinião, na doutrina: Humberto Theodoro Júnior, Cursodedireitoprocessualcivil, v. II, 27. ed., 1999, n. 1.062, p. 447: “Também o Código de Processo Penal, arts. 136 e 137, embora usando indevidamente a expressão sequestro, pre-vê casos de arresto contra o indiciado para garantir o ressarcimento do dano so-frido pela vítima do delito, antes da condenação, caso em que, também, não há, previamente, liquidez da obrigação, nem mesmo certeza dela. (...) Esses casos tanto podem aparecer nas leis processuais como nas substanciais, que muitas vezes não usam linguagem rigorosamente técnica, já que é comum encontrar-se em diplomas legais extravagantes o emprego da palavra sequestro para designar hipóteses que, a rigor, seriam de arresto, como, por exemplo, se dá com o Código de Processo Penal, quando regula a medida cautelar de garantia da ação de inde-nização civil pelo dano oriundo do crime (arts. 136 e 137)” (Humberto Theodoro Júnior, Cursodedireitoprocessualcivil, v. II, 27. ed., 1999, n. 1.083, p. 460).

24 De acordo, na jurisprudência: “– O erro na indicação da medida cautelar não pode levar o Poder Judiciário a simplesmente afirmar que o expediente jurídico é ina-dequado. Cabe ao juiz, com base na fungibilidade das medidas cautelares, pro-cessar o pedido da forma que se mostrar mais apropriada” (3ª Turma do STJ, REsp 909.478/GO, DiáriodaJustiça, 27-8-2007, p. 249).

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so Civil determina a aplicação subsidiária das regras do arresto em rela-ção ao sequestro, porquanto ambos os institutos são medidas cautelares protetivas de execução mediante apreensão e depósito judicial de bens. Por conseguinte, todas as omissões existentes na Seção do Código de Processo Civil destinada ao sequestro são sanadas pela incidência dos preceitos referentes ao arresto.

2.4. Hipóteses de sequestro: inteligência do art. 822 do Código de Processo Civil

O art. 822 do Código de Processo Civil arrola os principais casos de sequestro cautelar25, todos à vista da mesma premissa: apreensão judicial de bens litigiosos determinados para a posterior entrega da coisa na respectiva execução. O art. 822, todavia, não contém rol exaus-tivo, mas, sim, exemplos de sequestro, sem prejuízo de outros casos26, como bem revela o inciso IV do próprio art. 822, inverbis: “IV – nos demais casos expressos em lei”. Sem dúvida, o art. 822 arrola alguns casos de sequestro cautelar, mas não todos. O art. 137 da Lei n. 11.101/2005, por exemplo, traz importante caso de sequestro, inverbis: “O juiz poderá, a

25 “Art. 822. O juiz, a requerimento da parte, pode decretar o sequestro: I – de bens móveis, semoventes ou imóveis, quando lhes for disputada a propriedade ou a posse, havendo fundado receio de rixas ou danificações; II – dos frutos e rendi-mentos do imóvel reivindicando, se o réu, depois de condenado por sentença ainda sujeita a recurso, os dissipar; III – dos bens do casal, nas ações de desquite (rectius, de separação judicial) e de anulação de casamento, se o cônjuge os estiver dilapidando; IV – nos demais casos expressos em lei”.

26 De acordo, na doutrina: “Teria andado melhor o legislador se se tivesse valido de fórmula genérica, autorizando o sequestro sempre que a incolumidade de deter-minado bem, de interesse específico da parte, estivesse em risco. Ao preferir enumerar, o legislador correu o risco de deixar de fora hipótese em que a medida seria a única apropriada para afastar a situação de risco. A solução será atribuir ao rol do art. 822 um caráter meramente exemplificativo, numerusapertus: o se-questro poderá ser deferido mesmo fora das hipóteses do art. 822, sem necessida-de de recorrer-se à medida cautelar inominada” (Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novocursodedireitoprocessualcivil, v. III, 2008, p. 313). “Por isso, a melhor exegese do art. 822 é a que considera sua enumeração como apenas exemplificativa. Des-sa maneira, assegura-se ao sequestro o principal atributo da tutela cautelar, que é a maleabilidade capaz de propiciar socorro ao processo principal nas situações emergenciais, quaisquer que sejam elas, desde que haja necessidade de preservar sua eficiência e utilidade práticas” (Humberto Theodoro Júnior, Cursodedireitoprocessualcivil, v. II, 27. ed., 1999, n. 1.079, p. 458).

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requerimento do autor da ação revocatória, ordenar, como medida pre-ventiva, na forma da lei processual civil, o sequestro dos bens retirados do patrimônio do devedor que estejam em poder de terceiros”27. Os arts. 125, 126 e 127 do Código de Processo Penal versam sobre outro impor-tante exemplo de sequestro cautelar. De volta ao Código de Processo Civil, os arts. 1.016, § 1º, e 1.039 revelam a admissibilidade de sequestro cautelar de bem objeto de inventário litigioso28. Daí a conclusão: os casos previstos no art. 822 do Código de Processo Civil não são as únicas hi-póteses de sequestro cautelar no direito brasileiro. Na verdade, sempre que existir risco iminente de um litigante dissipar, dilapidar, danificar bens determinados, o outro litigante prejudicado ou ameaçado de sofrer o prejuízo proveniente da dissipação, dilapidação ou danificação dos bens litigiosos pode requerer o sequestro cautelar destes. Em suma, demonstrados o periculuminmora e o fumusboniiuris, há lugar para se-questro cautelar, independentemente de a espécie constar do rol do art. 822, ou não29.

27 O Professor Vicente Greco Filho sustenta que o caso do art. 137 da Lei n. 11.101/2005 não é de sequestro, mas de arresto (cf. Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 178). Ainda que muito respeitável a douta lição do eminen-te processualista, sustenta-se no presente compêndio que a hipótese do art. 137 é de sequestro, porquanto tem em mira bem determinado objeto de litígio prove-niente de ação revocatória, para a posterior entrega do bem à massa falida, tal como determinam os arts. 130, 132 e 136, todos da Lei n. 11.101/2005. Daí o per-feito enquadramento no conceito de sequestro.

28 De acordo, na jurisprudência: “INVENTÁRIO. MEDIDA CAUTELAR. SEQUES-TRO. CABIMENTO. Sobrevindo no inventário controvérsia efetiva sobre a per-manência dos herdeiros nos quadros societários como sucessores do autor da herança, admissível a medida cautelar de sequestro, uma vez afirmado pelas instâncias ordinárias o risco de dilapidação do patrimônio pertencente às empre-sas questionadas” (4ª Turma do STJ, REsp 61.786/ES, DiáriodaJustiça, 11-11-1996, p. 43715).

29 Por oportuno, merece ser prestigiado o voto condutor do Ministro Barros Mon-teiro, na mesma linha da opinião defendida no presente compêndio: “As medidas cautelares não se mostram estranhas ao processo de inventário, conforme se infe-re daquelas que são previstas na lei processual civil (art. 1.039). São elas admissí-veis, ainda, em hipóteses não catalogadas pelo Código, quando satisfeitos os pressupostos genéricos para a sua concessão” (Trecho do voto proferido pelo Relator na 4ª Turma do STJ, REsp 61.786/ES, DiáriodaJustiça, 11-11-1996, p. 43715). Em sentido semelhante, com a defesa da tese de que o art. 822 merece interpreta-ção extensiva: “MEDIDA CAUTELAR. Sequestro. Incidência sobre bens adquiri-dos pelos autores do ato lícito. Coisa litigiosa. O sequestro pode incidir sobre bens

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Por fim, quanto ao objeto, o sequestro pode alcançar os mais diver-sos bens: móveis, semoventes e imóveis (art. 822, I). Aliás, por serem bens móveis, os títulos de créditos são passíveis de apreensão mediante se-questro.

2.5. Sequestro antecedente e sequestro incidental

À vista do art. 796 do Código de Processo Civil, as cautelares podem ser antecedentes ou incidentais em relação ao processo principal. Incidentais são as cautelares requeridas na pendência do processo prin-cipal. Antecedentes são as cautelares ajuizadas antes mesmo da propo-situra da ação principal, razão pela qual também são denominadas “preparatórias”. Por conseguinte, o sequestro cautelar pode ser tanto antecedente quanto incidental em relação ao processo principal.

Em regra, o sequestro é exercido mediante ação cautelar autô-noma, consubstanciada em petição inicial, autuada em separado – ainda que apensados os respectivos autos aos do processo principal (art. 809). A despeito da regra da autonomia, com o advento da Lei n. 10.444/2002, passou a ser possível o requerimento de cautelar incidental no bojo do próprio processo principal, mediante simples petição, como autoriza o art. 273, § 7º, do Código de Processo Civil30. Daí a conclusão: em regra, o sequestro cautelar é exercido mediante ação cautelar autônoma, a qual pode ser antecedente ou incidental ao processo principal; nada impede, todavia, o requerimento de sequestro incidental mediante simples peti-ção veiculada no próprio processo principal.

No que tange ao processo principal, o sequestro busca garantir execução de entrega de coisa. Não obstante, o sequestro pode ser – e geralmente é – antecedente em relação à execução, até mesmo para ga-rantir o resultado útil desta. Por conseguinte, o sequestro cautelar pode ser requerido antes ou no curso de processo de conhecimento, como, por exemplo, de ação possessória (art. 822, I, do Código de Processo Civil),

que constituam proveito do ato ilícito praticado pelos autores, dando-se interpre-tação extensiva ao conceito de coisa litigiosa (art. 822, I, do CPC)” (4ª Turma do STJ, REsp 60.288/SP, DiáriodaJustiça, 2-10-1995, p. 32377).

30 De acordo, na jurisprudência: “Não há, porém, qualquer impedimento a que seja formulado o mesmo pedido de medida cautelar de sequestro incidentalmente, inclusive nos próprios autos da ação principal, como permite o art. 273, § 7º, do CPC” (1ª Turma do STJ, REsp 206.222/SP, DiáriodaJustiça, 13-2-2006, p. 661).

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de ação reivindicatória (art. 822, I e II, do Código de Processo Civil), de ação de separação judicial (art. 822, III, do Código de Processo Civil), de ação de anulação de casamento (art. 822, III, do Código de Processo Civil), de ação revocatória (art. 137 da Lei n. 11.101/2005), ação de inventário (arts. 1.016, § 1º, e 1.039, do Código de Processo Civil). Por tudo, é pos-sível concluir que o processo principal da cautelar de sequestro pode ser a própria execução para entrega de coisa, mas também o processo de conhecimento pretérito à execução para entrega de coisa31.

2.6. Petição inicial e liminar

Como estudado no tópico anterior, subsiste a regra de que o se-questro é exercido mediante ação cautelar autônoma, consubstanciada em petição inicial. A inicial do sequestro cautelar deve ser elaborada à luz dos arts. 39, I, 258, 282, 283 e 801, todos do Código de Processo Civil. A petição inicial deve ser endereçada ao juízo competente para o proces-so principal, tendo em vista a regra do art. 800.

À vista dos arts. 258 e 282, V, ambos do Código de Processo Civil, a petição inicial da ação cautelar de sequestro deve conter valor da cau-sa32, tendo em vista o valor do bem a ser sequestrado33.

31 Em sentido conforme, na doutrina: “Tal como o arresto, o sequestro pode ser ajuizado como ação cautelar preliminar ou incidental a processo de conhecimen-to ou de execução em que se litigue sobre determinado bem, seus frutos ou ren-dimentos” (Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novocursodedireitoprocessualcivil, v. III, p. 315).

32 De acordo, na jurisprudência: “PROCESSUAL CIVIL. CAUTELAR DE SEQUES-TRO. VALOR DA CAUSA. NECESSIDADE DE INDICAÇÃO NA PETIÇÃO INICIAL (ARTS. 258, 259 E 801, CPC). ART. 801, CPC. DISSÍDIO JURISPRUDEN-CIAL NÃO CONFIGURADO. RECURSO DESACOLHIDO. – A necessidade de indicação do valor da causa na petição inicial das ações cautelares não afronta o art. 801, CPC, sendo aplicáveis os arts. 258 e 259 do mesmo diploma” (4ª Tur-ma do STJ, REsp 145.723/PR, Diárioda Justiça, 14-2-2000, p. 34). “MEDIDA CAUTELAR. VALOR DA CAUSA. A circunstância de o art. 801 do CPC não arrolar a declaração do valor da causa entre os requisitos da inicial não exclui que esta a deva conter. Aplicação do art. 258” (TFR, AG 47.612/PR, DiáriodaJustiça, 7-11-1985).

33 Assim, na jurisprudência: “VALOR DA CAUSA – PROCESSO CAUTELAR – SE-QUESTRO. – Apesar do silêncio do art. 801 do CPC, a petição inicial do processo cautelar deve enunciar o valor da causa, à vista do que preceituam os arts. 258 e 259 do mesmo Código. – Na cautelar de sequestro, o valor da causa será corres-pondente ao valor dos bens que sejam objeto do pedido de sequestro. – Agravo

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Na eventualidade de o sequestro cautelar ser antecedente, o reque-rente deve indicar o processo principal na petição inicial, com a respec-tiva exposição (art. 801, III e parágrafo único).

Ainda em relação à petição inicial, o requerente pode pedir a con-cessão do sequestro liminar (art. 804). Diante do periculuminmora e do fumusboniiuris comprovados inliminelitis, o juiz pode proferir imedia-ta decisão interlocutória, com a ordem de sequestro dos bens litigiosos. Contra a decisão, entretanto, cabe agravo de instrumento (arts. 522 e 558).

Resta saber se o juiz pode decretar o sequestro de ofício, ou seja, independentemente de requerimento na petição inicial. Trata-se de ve-xataquaestio. À vista da combinação dos arts. 798 e 804, ambos do Códi-go de Processo Civil, entretanto, é possível concluir em prol do sequestro cautelar até mesmo de ofício pelo juiz34.

2.7. Efetivação da medida

Não há execução propriamente dita no processo cautelar, mas, sim, a efetivação da medida cautelar mediante mandado judicial. Daí a ime-diata expedição de mandado de sequestro dos bens determinados.

A medida cautelar de sequestro pode ser efetiva em qualquer dia, até mesmo nos feriados, tendo em vista o disposto no art. 173, II, do Código de Processo Civil.

Se o requerido oferecer resistência à ordem judicial de sequestro dos bens, cabe ao juiz requisitar força policial (arts. 579, 662 e 825, pará-grafo único, todos do Código de Processo Civil).

Compete ao juiz nomear o depositário dos bens, tendo em vista o disposto nos arts. 666 e 824 do Código de Processo Civil. A regra reside na nomeação do depositário público (art. 666, II), mas o juiz pode nome-ar um dos litigantes, até mesmo o devedor (art. 824, II).

de instrumento desprovido” (TJPR, in: 4ª Turma do STJ, REsp 145.723/PR, DiáriodaJustiça, 14-2-2000, p. 34).

34 No mesmo sentido, há antigo precedente jurisprudencial da Corte Suprema: Pleno do STF, MS 9.535/DF, DiáriodaJustiça, 12-7-1962, p. 1714. Colhe-se da emen-ta a tese prestigiada no presente compêndio: “O juiz pode decretar exofficio o sequestro, para evitar rixas ou a dilapidação da coisa”.

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Os bens sequestrados ficam sob a guarda do depositório nomeado pelo juiz, tão logo o depositário assine o compromisso35. Cabe ao depo-sitário a guarda e a conservação dos bens36.

2.8. Substituição do sequestro por caução

À vista do art. 805, o requerido pode solicitar ao juiz a substituição do sequestro por caução, real ou fidejussória (art. 826).

2.9. Propositura da ação principal

Se o sequestro for antecedente, o requerente deve ajuizar a ação principal dentro do prazo legal de trinta dias da efetivação da medida37, sob pena de perda da eficácia da cautelar38. Com efeito, diante da natu-reza constritiva do sequestro, incide a regra do art. 806 do Código de Processo Civil39.

2.10. Efeitos do sequestro cautelar

O sequestro cautelar produz alguns efeitos, como a vinculação jurídica do bem sequestrado em relação ao processo principal por ele garantido. Daí a possibilidade da expedição de mandado judicial contra o eventual terceiro adquirente do bem, com a ordem de depósito do bem em juízo. Sem dúvida, o sequestro cautelar não significa perda da pro-priedade, mas apenas da posse direta, a qual é transferida ao Estado-juiz,

35 Cf. art. 825, caput, do Código de Processo Civil.

36 Cf. art. 148 do Código de Processo Civil.

37 Assim, na jurisprudência: “Medida cautelar – Sequestro – Prazo para ajuizamen-to da ação principal – Início. Existindo restrição ao direito do réu, desde o primei-ro ato de execução, deste conta-se o prazo, não importando que a medida com-preenda outros, efetuados em dias subsequentes. Releva, para fluência do prazo, o momento em que efetivada a medida e não aquele em que se juntou aos autos o mandado” (3ª Turma do STJ, REsp 7.084/RS, DiáriodaJustiça, 15-4-1991, p. 4301).

38 De acordo, na jurisprudência: “MEDIDA CAUTELAR. SEQUESTRO. AÇÃO PRINCIPAL NÃO PROPOSTA NO PRAZO DE LEI. HIPÓTESE DE PERDA DE EFEITO DA MEDIDA PROVISÓRIA” (4ª Turma do TFR, Apelação 43.091/SP, DiáriodaJustiça, 11-12-1986).

39 No mesmo sentido, na jurisprudência: “MEDIDA CAUTELAR DE SEQUESTRO. APLICAÇÃO DOS ARTS. 806 E 808, II, DO CPC” (1ª Turma do STF, RE 104.150/SP, DiáriodaJustiça, 15-2-1985, p. 1274).

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por intermédio do depositário nomeado pelo juiz. Por conseguinte, o requerido preserva o domínio e a posse indireta, tanto que pode alienar o bem sequestrado a terceiro. Não obstante, a alienação não tem eficácia jurídica em relação ao processo principal garantido por meio do seques-tro (art. 626).

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Ação de resTiTuição

1. ConceitoA restituição é a ação incidental ao processo falimentar por meio

da qual o proprietário pode pedir a devolução de bem arrecadado pelo administrador judicial no processo de falência1, de bem que se encontre em poder do empresário individual ou da sociedade empresária na data da decretação da quebra (art. 85, caput) e de coisa vendida a crédito, desde que tenha sido entregue ao empresário individual ou à sociedade empresária nos quinze dias anteriores à distribuição da falência, mas não alienada a terceiro (art. 85, parágrafo único).

2. Alcance do vocábulo legal “bem”O vocábulo “bem”, inserto no art. 85 da Lei n. 11.101/2005 deve ser

interpretado em sentido amplo, a fim de alcançar dinheiro, coisas em geral e demais bens arrolados no art. 655 do Código de Processo Civil.

3. Legitimidade ativaÀ vista do caput do art. 85 da Lei n. 11.101/2005, somente o pro-

prietário pode ajuizar a ação de restituição; ao mero possuidor resta a ação de embargos de terceiro2, consoante a combinação do art. 93 da Lei n. 11.101/2005 com o art. 1.046 do Código de Processo Civil.

4. Causas de pedir da ação de restituição O art. 85 da Lei n. 11.101/2005 arrola três causas de pedir para a

restituição. A primeira causa autorizadora da restituição protege o pro-

1 Na verdade, a ação de restituição também é admissível na pendência de recupe-ração judicial: cf. arts. 49, § 4º, e 86, II, ambos da Lei n. 11.101/2005.

2 Cf. Enunciado 84 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça.

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prietário de bem injustamente arrecadado pelo administrador judicial, no processo de falência (arts. 22, III, f, 85, caput, e 108, caput).

A segunda causa autorizadora da restituição protege o proprietário de bem que se encontra em poder do empresário individual ou da so-ciedade empresária, na data da prolação da decisão de decretação da falência (art. 85, caput, infine).

Por fim, pode ser objeto de ação de restituição a coisa vendida a crédito e entregue ao empresário individual ou à sociedade empresária nos quinze dias anteriores à distribuição da falência, desde que ainda não tenha sido alienada (art. 85, parágrafo único). Com efeito, não há lugar para a restituição quando a coisa vendida a crédito na quinzena anterior à distribuição da falência já tiver sido alienada pelo empresário individual ou pela sociedade empresária, a quem cabe o ônus da prova da respectiva alienação. Se a coisa vendida a crédito não é encontrada, mas não é comprovada a respectiva alienação pelo empresário indivi dual ou pela sociedade empresária, a restituição deve ser feita em dinheiro, consoante o Enunciado 495 da Súmula do Supremo Tribunal Federal: “A restituição em dinheiro da coisa vendida a crédito, entregue nos quinze dias anteriores ao pedido de falência ou de concordata, cabe, quando, ainda que consumida ou transformada, não faça o devedor prova de haver sido alienada a terceiro”.

No que tange ao prazo de quinze dias, conta-se da efetiva entrega da coisa, e não da simples remessa ao empresário individual ou à socie-dade empresária. Cabe ao autor da ação de restituição o ônus da prova da entrega da coisa na quinzena anterior à distribuição da falência. A respeito do tema, merece ser prestigiado o Enunciado 193 da Súmula do Supremo Tribunal Federal: “Para a restituição prevista no art. 76, § 2º, da LF, conta-se o prazo de quinze dias da entrega da coisa e não de sua remessa”. Embora o Enunciado 193 tenha sido aprovado na vigência do antigo Decreto-Lei n. 7.661/45, subsiste a orientação jurisprudencial, porquanto o atual parágrafo único do art. 85 da Lei n. 11.101/2005 tem redação similar à do anterior § 2º do art. 76 do Decreto-Lei n. 7.661/45. Daí a possibilidade da aplicação do Enunciado 193 mesmo após o ad-vento da Lei n. 11.101/2005.

5. Formas de restituição: própria coisa ou dinheiroA primeira forma de restituição consiste na devolução da própria

coisa, tal como determina o caput do art. 88: “A sentença que reconhecer

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o direito do requerente determinará a entrega da coisa no prazo de 48 (quarenta e oito) horas”.

Quando o bem injustamente arrecadado ou que se encontre em poder do empresário individual ou da sociedade empresária na data da decretação da falência for dinheiro, também a restituição deve ser feita em dinheiro, como bem assentou o Supremo Tribunal Federal no Enun-ciado 417: “Pode ser objeto de restituição, na falência, dinheiro em poder do falido, recebido em nome de outrem, ou do qual, por lei ou contrato, não tivesse ele a disponibilidade”. É o que ocorre, por exemplo3, na hipótese do parágrafo único do art. 514 da Lei n. 8.212/91, em relação aos valores descontados pelo empresário individual ou pela sociedade empresária dos respectivos empregados e não recolhidos ao Instituto Nacional de Seguro Social. Ainda a respeito do tema, merece ser presti-giado o Enunciado 21 da Súmula do Tribunal de Justiça do Rio de Janei-ro: “É passível de restituição, na falência, a contribuição previdenciária arrecadada dos empregados, da qual é depositário o falido, não tendo dela disponibilidade”.

A restituição também deve ser feita em dinheiro nas três hipóteses previstas no art. 86. Em primeiro lugar, a restituição deve ser feita em dinheiro quando a coisa arrecadada injustamente ou que se encontre em poder do empresário individual ou da sociedade empresária na data da decretação da falência não mais existir quando a ação restituição for ajuizada, ainda que a coisa tenha sido alienada (art. 86, I). Com efeito, no que tange às duas hipóteses previstas no caput do art. 85, é irrelevan-te se a inexistência da coisa decorre de alienação, ou não. Em ambas as hipóteses, a restituição deve ser feita em dinheiro logo depois de reali-zado o pagamento previsto no art. 151 (art. 86, parágrafo único). A res-tituição em dinheiro da coisa inexistente deve ser feita à luz da avaliação e, no caso de ter ocorrido alienação, pelo respectivo preço, sempre com a atualização monetária (art. 86, I). Situação bem diferente é a prevista

3 Cf. 2ª Turma do STJ, REsp 501.643/RS, InformativoSTJ, n. 334.

4 “Art. 51. O crédito relativo a contribuições, cotas e respectivos adicionais ou acréscimos de qualquer natureza arrecadados pelos órgãos competentes, bem como a atualização monetária e os juros de mora, estão sujeitos, nos processos de falência, concordata ou concurso de credores, às disposições atinentes aos créditos da União, aos quais são equiparados. Parágrafo único. O Instituto Nacional do Seguro Social – INSS reivindicará os valores descontados pela empresa de seus empregados e ainda não recolhidos.”

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no parágrafo único do art. 85: se a coisa não mais existir em razão de sua alienação comprovada, não há lugar para a restituição em dinheiro, mas, sim, para a mera habilitação do credor consoante a classificação do res-pectivo crédito5. Se, entretanto, a coisa não mais existir, mas não for comprovada sua alienação pelo empresário individual ou pela socieda-de empresária, deve ser feita a restituição em dinheiro, na esteira do Enunciado 495 da Súmula do Supremo Tribunal Federal.

À vista da segunda hipótese arrolada no art. 86, deve ser realizada a restituição em dinheiro da importância entregue, ao empresário indi-vidual ou à sociedade empresária, em moeda corrente nacional, em razão de adiantamento a contrato de câmbio para exportação, previsto no art. 75, §§ 3º e 4º, da Lei n. 4.728/65 (art. 86, II, da Lei n. 11.101/2005). Aliás, a importância entregue ao empresário individual ou à sociedade empre-sária decorrente de adiantamento a contrato de câmbio para exportação também não é alcançada pela recuperação judicial (art. 49, § 4º, da Lei n. 11.101/2005). Por conseguinte, o credor poderá pedir a restituição em dinheiro da importância adiantada em razão de contrato de câmbio para exportação, ainda que na pendência tanto de processo de recuperação quanto de processo de falência6.

A restituição da importância adiantada deve ser feita com a corre-ção monetária correspondente, na esteira do Enunciado 36 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça: “A correção monetária integra o valor da restituição, em caso de adiantamento de câmbio, requerida em con-cordata ou falência”. A propósito, não incide a exigência da quinzena prevista no parágrafo único do art. 85 em relação a importância decor-rente de adiantamento a contrato de câmbio para exportação, porquan-to aquele lapso só precisa ser observado para a restituição de coisa vendida a prazo, como bem assentou o Superior Tribunal de Justiça no Enunciado 133: “A restituição da importância adiantada, a conta de contrato de câmbio, independe de ter sido a antecipação efetuada nos quinze dias anteriores ao requerimento da concordata”.

5 Assim, na jurisprudência: “CONCORDATA. Coisa vendida a crédito. Entrega quinze dias antes do requerimento. A venda a crédito de mercadoria entregue menos de quinze dias antes do ajuizamento do pedido de concordata, alienada a terceiros, não autoriza a restituição, devendo o crédito ser habilitado como quiro-grafário. Precedentes do STJ. Recurso conhecido e provido” (4ª Turma do STJ, REsp 437.596/RS, DiáriodaJustiça, 10-2-2003, p. 221).

6 Cf. arts. 49, § 4º, e 86, II, da Lei n. 11.101/2005 c/c o art. 75, §§ 3º e 4º, da Lei n. 4.728/65.

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Resta saber se o Enunciado 307 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça subsiste em sua totalidade. Dispõe o verbete sumular: “A resti-tuição de adiantamento de contrato de câmbio, na falência, deve ser atendida antes de qualquer crédito”. Consoante o parágrafo único do art. 86, todavia, a restituição em dinheiro somente pode ocorrer após o pagamento dos créditos trabalhistas de natureza salarial vencidos nos três meses anteriores à decretação da falência, até o limite de cinco salá-rios mínimos por trabalhador. Com efeito, por força do art. 151, tão logo haja disponibilidade de caixa, devem ser pagos em primeiro lugar os trabalhadores com salários vencidos nos três últimos meses anteriores à decretação da falência, dentro do limite de cinco salários mínimos por trabalhador. Só após tem lugar a restituição em dinheiro prevista no art. 86. Por conseguinte, o Enunciado 307 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça aprovado em 6 de dezembro de 2004 deve ser interpretado cumgranosalis, com a ressalva da exceção contida no parágrafo único do art. 86 da Lei n. 11.101/20057.

Por fim, o art. 86 versa sobre a restituição em dinheiro que também tem lugar em relação aos valores entregues ao empresário individual ou à sociedade empresária pelo contratante de boa-fé, na eventualidade da declaração da ineficácia (art. 129) ou da revogação de contrato (art. 130). Com efeito, a combinação do inciso III do art. 86 com o caputdo art. 136 revela a admissibilidade da restituição em dinheiro em prol daquele que contratou de boa-fé e é surpreendido pela declaração da ineficácia ou pela revogação do contrato, no que tange aos valores entregues ao em-presário individual ou à sociedade empresária.

6. Petição inicial da ação de restituiçãoA ação de restituição deve ser proposta mediante petição inicial,

com a observância do art. 282 do Código de Processo Civil. A petição

7 Não obstante, a ressalva defendida no presente compêndio não foi prestigiada em recente julgamento do Superior Tribunal de Justiça. A Corte não acolheu a ressalva contida no parágrafo único do art. 86 da Lei n. 11.101/2005, e aplicou a tese consagrada no Enunciado 307, porquanto “reafirmou que as contribuições previdenciárias descontadas dos salários dos empregados pelo empregador falido que deixaram de ser repassadas aos cofres previdenciários não integram o patri-mônio do falido. Por isso devem ser restituídas antes do pagamento de qualquer crédito, ainda que trabalhista” (2ª Turma do STJ, REsp 501.643/RS, InformativoSTJ, n. 334).

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inicial também deve conter a descrição do bem reclamado e a fundamen-tação que sustenta o pedido de restituição (art. 87, caput, da Lei n. 11.101/2005).

7. Distribuição por dependênciaA petição da ação de restituição deve ser distribuída por depen-

dência ao processo de falência (art. 78, parágrafo único, da Lei n. 11.101/2005).

8. Autuação em separado aos autos do processo falimentar Após a distribuição por dependência, o juiz da falência deve deter-

minar a autuação em separado da petição inicial, com os respectivos documentos que a acompanham (art. 87, § 1º, proêmio).

9. Indisponibilidade do bem O art. 91 da Lei n. 11.101/2005 revela a suspensão exvi legis da

disponibilidade do bem reclamado até o trânsito em julgado da senten-ça proferida na ação de restituição, independentemente de pronuncia-mento específico do juiz. A eventual alienação do bem litigioso não tem eficácia alguma e pode ser reconhecida perante o juízo da falência.

10. IntimaçõesO juiz deve determinar a “intimação” do empresário individual ou

do representante da sociedade empresária, para eventual manifestação, em cinco dias. A despeito da literalidade do § 1º do art. 87 da Lei n. 11.101/2005, vale dizer, do vocábulo “intimação”, trata-se de verdadeira citação do empresário individual ou da sociedade empresária, conforme o caso, para ocupar o polo passivo do processo instaurado por força da ação de restituição.

Em seguida, o juiz deve determinar a intimação do Comitê de Credores, para possível manifestação, em cinco dias. Com efeito, como o § 1º do art. 87 estabelece que o prazo é sucessivo, os cinco dias só cor-rem após a intimação do Comitê, na pessoa do respectivo presidente.

Depois, há a intimação de cada um dos credores arrolados na rela-ção nominal prevista nos arts. 99, III, e 105, II, ambos da Lei n. 11.101/2005. Ao contrário do que pode parecer à primeira vista pela existência da

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expressão “prazo sucessivo” no bojo do § 1º do art. 87, o prazo de cinco dias dos credores é comum, ou seja, corre para todos os credores de uma só vez. Com efeito, a expressão “prazo sucessivo” diz respeito às classes de legitimados passivos: 1) empresário individual ou sociedade empre-sária, conforme o caso; 2) Comitê de Credores; 3) Credores; e 4) Admi-nistrador Judicial. Aliás, os credores já podem estar representados pelo Comitê, quando têm, a rigor, duas oportunidades de manifestação. Sob outro prisma, a interpretação do § 1º do art. 87 na linha de raciocínio de que o prazo de cinco dias referente aos credores é comum a todos encon-tra sustentação nos princípios da celeridade e da economia processual consagrados no parágrafo único do art. 75. Embora o prazo seja comum, o quinquídio só começa a correr após a intimação do último credor, em virtude da incidência do art. 241, III, do Código de Processo Civil, apli-cável exvi do art. 189 da Lei n. 11.101/2005.

Por fim, há a intimação do administrador judicial, na qualidade de representante judicial da massa falida (art. 22, III, c), para a respectiva manifestação, em cinco dias.

11. Natureza jurídica da manifestação contrária: contestaçãoEventual manifestação contrária à restituição vale como contestação

(art. 87, § 1º, infine).

12. InstruçãoContestada a restituição, o juiz deve decidir sobre as provas reque-

ridas e designar audiência de instrução e julgamento, se considerar ne-cessária a produção de provas em audiência (art. 87, § 2º).

13. Conclusão para sentençaNão solicitada prova alguma além da documental ou indeferidas

as provas adicionais requeridas pelas partes, os autos devem ser conclu-sos ao juiz para sentença (art. 87, § 3º).

Na eventualidade de deferimento e produção de provas além da documental, finda a instrução, o juiz pode proferir sentença desde logo ou determinar a conclusão dos autos para posterior prolação da senten-ça (arts. 454 e 456 do Código de Processo Civil).

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14. Sentença de procedência da restituiçãoJulgado procedente o pedido de restituição, o juiz deve determinar

a entrega da coisa reclamada, em quarenta e oito horas (art. 88, caput).

No caso condenação de restituição em dinheiro, o juiz deve deter-minar o depósito tão logo seja realizado o pagamento previsto no art. 151 (art. 86, parágrafo único), ou seja, com preferência em relação aos créditos extraconcursais e concursais (arts. 83, 84 e 149).

Por fim, o juiz deve condenar a massa em honorários advocatícios, salvo quando não há contestação, vale dizer, manifestação contrária à restituição (art. 88, parágrafo único).

15. Sentença de improcedência parcial Denegada a restituição na sentença, mas reconhecido o crédito, o

juiz determina a inclusão do nome do autor no quadro geral de credores, na classificação que lhe couber (art. 89).

16. Sentença de total improcedência Denegada a restituição e nem sequer reconhecido o crédito pelo

juiz, há a prolação de sentença de total improcedência, sem inclusão do nome do autor no quadro geral de credores.

17. Recorribilidade da sentença Em qualquer caso, da sentença cabe apelação (art. 90, caput). Na

esteira do Enunciado 25 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça, o prazo de quinze dias para a interposição da apelação corre das respec-tivas intimações das partes, representadas por seus advogados (arts. 184, 242, 506 e 508 do Código de Processo Civil c/c o art. 189 da Lei n. 11.101/2005).

O recurso apelatório, todavia, não tem efeito suspensivo (art. 90, caput), razão pela qual é admissível a execução provisória da sentença.

Ainda a respeito da apelação, contra o respectivo acórdão majori-tário de provimento cabe o recurso de embargos infringentes (Enuncia-do 88 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça, art. 189 da Lei n. 11.101/2005, e art. 530 do Código de Processo Civil).

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18. Execução provisória e caução A execução da sentença na pendência de recurso depende da pres-

tação de caução, a fim de que o autor possa efetuar desde logo o levan-tamento da coisa ou da quantia reclamada (art. 90, parágrafo único).

19. Insuficiência dos valoresNa eventualidade de restituição em dinheiro, deve ser feito o rateio

proporcional do disponível, se insuficiente o saldo existente (art. 91, parágrafo único). Tal rateio, todavia, só tem lugar depois do pagamento dos salários vencidos dos empregados, na forma prevista no art. 151.

20. Ação de restituição e de embargos de terceiroÀ luz do caput do art. 85, a restituição só pode ser proposta por

proprietário, em razão da natureza reivindicatória da ação. Já o possuidor tem apenas a ação de embargos de terceiro, porquanto o § 1º do art. 1.046 do Código de Processo Civil autoriza a propositura dos embargos tanto por proprietário quanto por possuidor. Por conseguinte, além do pos-suidor, o proprietário também pode ajuizar ação de embargos de tercei-ro; já aquele (possuidor) não tem legitimidade para a ação de restituição, mas, sim, para a ação de embargos de terceiro8.

Resta saber se o proprietário pode escolher entre as duas ações ou se alguma tem caráter subsidiário. Por força do art. 93, os embargos de terceiro são admissíveis quando “não couber pedido de restituição”. Daí a conclusão: a ação de embargos de terceiro tem caráter subsidiário, ou seja, só é admissível quando não for adequada a ação de restituição.

Segundo autorizada doutrina9, há outro critério distintivo entre a admissibilidade da restituição e dos embargos de terceiro, conforme a existência de relação jurídica com o empresário individual ou à socieda-

8 Por exemplo, na jurisprudência: “PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. Quem exerce o comércio em prédio que lhe foi locado pela falida tem legitimida-de para opor embargos de terceiro contra o ato de arrecadação do imóvel, impe-dindo o prosseguimento da atividade empresarial” (3ª Turma do STJ, REsp 579.490/MA, DiáriodaJustiça, 17-10-2005, p. 291).

9 Cf. Fábio Ulhoa Coelho, Manualdedireitocomercial: direito de empresa, 18. ed., 2007, p. 344.

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de empresarial, ou não. Se a indevida apreensão do bem decorre da existência de alguma relação jurídica, é admissível a restituição do art. 85. Se a apreensão ocorreu a despeito da inexistência de relação jurídica alguma, são admissíveis embargos de terceiro.

Por fim, em virtude da importância dos embargos de terceiro na falência, o próximo capítulo é destinado ao estudo do instituto.

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embArGos de TerCeiro

1. Admissibilidade em processos de recuperaçãoe de falência

À vista do art. 351º, n. 2, do Código de Processo Civil de Portugal, com a redação conferida pelo Decreto-Lei n. 329-A/95, não são admis-síveis embargos de terceiro quando a apreensão de bens de terceiro tem lugar em processos de recuperação empresarial e de falência, inverbis: “2. Não é admitida a dedução de embargos de terceiro relativamente à apreensão de bens realizada no processo especial de recuperação de empresa e de falência”1.

Em contraposição, o direito brasileiro admite a propositura de embargos de terceiro até mesmo quando a apreensão de bens se dá nos processos de recuperação e de falência, como bem revela o art. 93 da Lei n. 11.101/2005: “Nos casos em que não couber pedido de restituição, fica resguardado o direito dos credores de propor embargos de terceiros, observada a legislação processual civil”. Sem dúvida, ressalvados os casos de ação de restituição2, são admissíveis embargos de terceiro re-ferentes a bens apreendidos em processos de recuperação e de falência,

1 Como bem ensina a melhor doutrina lusitana, os embargos de terceiro são inad-missíveis quando a apreensão de bens ocorre em processos de recuperação e de falência, em razão da vedação inserta no art. 351º, n. 2, do Código de Processo Civil de Portugal, bem assim da existência de via própria para a restituição de bens na legislação especial dos processos de recuperação e de falência: “2. A res-tituição e separação de bens no âmbito do processo especial de recuperação de empresa e de falência rege-se pelo disposto nos arts. 201º e ss. do CPEREF, apro-vado pelo DL n. 132/93, de 23-4” (Abílio Neto, CódigodeProcessoCivilanotado, 15. ed., 1999, p. 473-474).

2 Cf. arts. 85 e 86 da Lei n. 11.101/2005.

CApíTulO

X

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quer pelo administrador judicial nomeado pelo juiz, quer por ordem do próprio juiz3.

2. Embargos de terceiro: preceitos de regência eenunciados sumulares

Os embargos de terceiro estão previstos nos arts. 173, II, 1.046 a 1.054, todos do Código de Processo Civil, bem assim no art. 93 da Lei n. 11.101/2005.

Além dos preceitos legais, os embargos de terceiro também constam de alguns enunciados das Súmulas do Superior Tribunal de Justiça4, do antigo Tribunal Federal de Recursos5 e do extinto Tribunal de Alçada Civil do Rio de Janeiro6, em razão da grande importância do instituto na prática forense.

3. Embargos de terceiro: nomen iuris e objetoAlém da denominação consagrada nos preceitos de regência, os

embargos de terceiro também são denominados “embargos de separa-ção”, porquanto ensejam a exclusão de bem de terceiro de injusta cons-

3 Por exemplo, na jurisprudência: “PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. Quem exerce o comércio em prédio que lhe foi locado pela falida tem legitimidade para opor embargos de terceiro contra o ato de arrecadação do imóvel, impedindo o prosseguimento da atividade empresarial” (3ª Turma do STJ, REsp 579.490/MA, DiáriodaJustiça, 17-10-2005, p. 291). “PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TER-CEIRO. AÇÃO POSSESSÓRIA. COMPETÊNCIA. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. LEI 11.101/2005, ART. 66. 1. O Juízo que determinou a reintegração de posse da INFRA-ERO em áreas aeroportuárias que eram ocupadas pela VASP tem competência para o processamento e julgamento dos embargos de terceiro opostos sob a alegação de turbação na posse de bens que se encontram na referida área (CPC, art. 1.049). 2. A regra prevista no art. 66 da Lei 11.101/2005 não impõe a remessa dos autos dos embargos de terceiro ao Juízo em que tramita o processo de recuperação judicial da VASP, uma vez que, no caso, não se cogita a alienação de bens da empresa aérea. 3. O pedido de substituição do fiel depositário não foi objeto de deliberação pelo Juiz aquo e, portanto, o seu exame pelo Tribunal configuraria supressão de instância. 4. Agravo de instrumento a que se dá parcial provimento” (6ª Turma do TRF da 1ª Região, AGI 2006.01.00.046041-6/AM, DiáriodaJustiça, 2-4-2007, p. 135).

4 Cf. Enunciados 84, 134, 195 e 303.

5 Cf. Enunciados 33 e 184.

6 Cf. Enunciado 17.

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trição judicial. Daí o objeto dos embargos de terceiro: a proteção tanto da posse quanto da propriedade em prol de pessoa que sofre apreensão indevida de bem em processo no qual não é parte, a fim de que o bem seja excluído da injusta constrição judicial. Não versam os embargos de terceiro, entretanto, sobre o objeto do processo originário, mas apenas sobre a exclusão de bem de terceiro indevidamente apreendido no pro-cesso primitivo7.

4. Embargos de terceiro: natureza jurídica e conceito O termo “embargos” tem vários significados à vista da legislação

brasileira. Há ações de embargos8, recursos de embargos9 e até mesmo embargos com natureza de contestação10.

No que tange aos embargos de terceiro, não há dúvida de que têm natureza de ação, porquanto formam um novo processo distinto do an-terior processo no qual houve a apreensão de bem de terceiro. Aliás, a existência de “contestação”11 como forma de contraposição aos embargos de terceiro reforça a conclusão acerca da natureza do instituto: ação12.

7 Em sentido conforme, na doutrina: Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 255: “Consistem em outro processo cujo objeto é o pedido de exclusão de bens da constrição judicial, porque o senhor ou possuidor não foi parte no feito. Trata-se de uma ação que tem por objeto a exclusão dos efeitos de uma decisão judicial e que completa a sistemática dos limites subjetivos da coisa julgada, que não pode beneficiar nem prejudicar terceiros. (...) Nos em-bargos de terceiro não se discute o objeto da ação de que emanou a ordem de apreensão. Pede-se, apenas, a exclusão do bem dessa apreensão, sem questionar o direito do autor da ação primitiva. Daí a denominação, também, de embargos de separação”.

8 Por exemplo, os embargos à execução (cf. arts. 736 e s. do Código de Processo Civil) e os embargos de terceiro (cf. art. 1.046 do Código de Processo Civil) são ações.

9 Por exemplo, os embargos infringentes (cf. arts. 496 e 530 do Código de Processo Civil), os embargos de divergência (cf. arts. 496 e 546 do Código de Processo Civil), os embargos de declaração (cf. arts. 496, 535, 538 e 554 do Código de Processo Civil) e os embargos infringentes de alçada (cf. art. 34 da Lei n. 6.830/80) têm natureza recursal.

10 Por exemplo, os embargos previstos nos arts. 755 e 1.102-C do Código de Proces-so Civil têm natureza de contestação.

11 Cf. art. 1.053 do Código de Processo Civil.

12 Assim, na jurisprudência: 1ª Seção do STJ, CC 54.437/SC, DiáriodaJustiça, 6-2-2006, p. 189: “Tendo os embargos de terceiro natureza de ação”.

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Estudada a natureza jurídica, já é possível conceituar os embargos de terceiro: ação cognitiva, de cunho constitutivo13, processada sob procedimento especial de jurisdição contenciosa14.

Sob outro prisma, os embargos de terceiro são, a um só tempo, ação autônoma15 e incidental16: autônoma, em razão da formação de um novo processo diverso daquele no qual houve a apreensão judicial de bem de terceiro, com petição inicial, autuação, citação, contestação e sentença próprias; incidental, em razão da distribuição por dependência ao pro-cesso anterior, com o apensamento dos autos dos embargos aos autos do processo originário, por força do art. 1.049 do Código de Processo Civil.

13 Rectius, constitutiva negativa, porquanto os embargos desconstituem, desfazem o ato judicial de apreensão indevida de bens do terceiro. Em sentido conforme, na doutrina: “Eles constituem uma nova ação, e um processo novo, embora estejam ligados àquele no qual se deu a apreensão judicial. Não são meros incidentes da execução, mas têm natureza de processo de conhecimento, de natureza constitu-tiva negativa, que visam desfazer a constrição judicial indevida” (Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novocursodedireitoprocessualcivil, v. II, 2007, p. 387).

Em sentido contrário, todavia, há respeitável doutrina: “A sentença que defere os embargos é declaratória, já que declara o direito e posse do terceiro. Seu efeito específico, no entanto, é desvincular o bem do ato judicial constritivo, razão pela qual a declaração autoriza a reintegração ou manutenção da posse” (Ernane Fi-délis dos Santos, Manualdedireitoprocessualcivil, v. III, 10. ed., 2006, p. 139-140).

14 De acordo, na doutrina: “Como já se repetiu mais de uma vez, o termo ‘embargos’, no processo civil, é equívoco por ser utilizado para denominar ações, recursos e medidas ou providências judiciais. No caso, trata-se de uma ação, procedimento especial de jurisdição contenciosa, que tem por finalidade a proteção da posse ou propriedade daquele que, não tendo sido parte no feito, tem um bem de que é proprietário ou possuidor, apreendido por ato judicial originário de processo de que não foi parte” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 254-255).

15 A propósito, merece ser prestigiada a precisa lição do Professor Fredie Didier Jr.: “Os embargos de terceiro veiculam pretensão própria do terceiro, que enseja processo novo; trata-se, de fato, de uma ação autônoma de impugnação de ato judicial – no caso, com o objetivo de retirar a sua eficácia em relação a terceiro” (Recursodeterceiro, 2002, p. 119-120, nota 165).

16 De acordo, na doutrina: “Posto que os embargos de terceiro sejam processo inci-dente e nasçam de ato praticado em outro feito e devam correr no juízo do pro-cesso principal, é indispensável a citação pessoal dos embargos. São os embargos uma outra ação, diversa da que existe no processo principal, e são outras as pes-soas da relação processual” (Hamilton de Moraes e Barros, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. IX, p. 303).

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Por tudo, os embargos de terceiros são a ação autônoma de impug-nação que tem em mira apreensão judicial de bem de terceiro alheio ao processo no qual houve a constrição indevida.

5. Embargos de terceiro e classificaçõesAo contrário das demandas petitórias típicas e das demandas

possessórias específicas, os embargos de terceiro não podem ser inclu-ídos em nenhuma das classes, porquanto podem ser fundados na propriedade, mas também podem ser veiculados pelo possuidor. Daí a dificuldade da inclusão dos embargos de terceiro em alguma das classes tradicionais.

Com efeito, embora possam ser veiculados com fundamento na posse, os embargos de terceiro também podem ser fundados na proprie-dade, razão pela qual não são verdadeiros interditos possessórios.

Ademais, os embargos de terceiro só têm em mira esbulho, turbação e ameaça provenientes de ato judicial, ao contrário dos verdadeiros in-terditos possessórios, admissíveis contra esbulho, turbação e ameaça provenientes de pessoas naturais ou jurídicas em geral.

À vista das distinções apontadas, os embargos de terceiro não são interditos possessórios; mas também não têm natureza petitória, em virtude da admissibilidade fundada apenas na posse, à vista do § 1º do art. 1.046 do Código de Processo Civil.

6. Alvo dos embargos de terceiroA ação de embargos tem em mira ato de constrição judicial de bem

de terceiro, como a arrecadação, o sequestro, o arresto, a alienação judi-cial e qualquer outra modalidade de apreensão judicial de bem de ter-ceiro em relação ao processo no qual houve a constrição indevida, tendo em vista o caráter exemplificativo do caputdo art. 1.046 do Código de Processo Civil17.

17 Em sentido conforme, na doutrina: “Tal se dá nos casos de penhora, depósito, arresto, sequestro, alienação judicial, arrecadação, arrolamento, inventário, parti-lha e qualquer outra espécie de apreensão, caso em que faculta ao prejudicado a defesa através de embargos de terceiro (art. 1.046, caput), cujo objetivo é o de reintegrá-lo ou mantê-lo na posse” (Ernane Fidélis dos Santos, Manualdedireitoprocessualcivil, v. III, 10. ed., 2006, p. 139).

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7. Embargos de terceiro e recurso de terceiroOs embargos de terceiro não se confundem com o recurso de ter-

ceiro18. Segundo o art. 1.046 do Código de Processo Civil, os embargos são ação autônoma de impugnação em favor de terceiro alheio ao pro-cesso no qual foi exarado o ato judicial lesivo. Por conseguinte, os em-bargos de terceiro ocasionam a formação de novo processo, tendo como alvo o ato de apreensão judicial praticado em processo anterior. Já o recurso de terceiro tem, à vista do art. 499 do Código de Processo Civil, verdadeira natureza recursal, porquanto a impugnação tem lugar no bojo do mesmo processo no qual foi proferido o julgamento contrário ao terceiro.

Resta saber se o terceiro ao processo no qual houve a prolação de decisão judicial que ocasiona a apreensão de bem pode recorrer no mes-mo processo ou se necessita instaurar outro processo mediante a ação de embargos de terceiro. Trata-se de vexataquaestio, com opiniões anta-gônicas na melhor doutrina.

Com efeito, autorizada doutrina19 sustenta que o terceiro que dis-põe dos embargos do art. 1.046 do Código de Processo Civil pode optar pela interposição do recurso de terceiro previsto no art. 499, caput e § 1º, do mesmo diploma. O terceiro, portanto, tem liberdade de escolha, des-de que observe os respectivos prazos legais.

18 De acordo, na doutrina: “A ação de embargos de terceiro (art. 1.046 do CPC) é outra forma típica de ataque ao ato jurisdicional que não se confunde com os re-cursos” (Ovídio A. Baptista da Silva, Cursodeprocessocivil, v. I, 4. ed., 1998, p. 482). “Impossível, também, a confusão com o recurso de terceiro prejudicado. Este é um verdadeiro recurso, que mantém a lide nos limites primitivos, e o recorrente poderá ser beneficiado se for a ação decidida em favor da parte que ele assiste recorrendo. Nos embargos há um pedido autônomo de exclusão do bem da apre-ensão judicial” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 19. ed., 2008, p. 267).

19 Cf. Pontes de Miranda, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, t. VII, 3. ed., 1999, p. 59: “Assim, o art. 499 e § 1º funcionam como espécie de evitador da inovação dos arts. 56-61 e 1.046-1.054; quer dizer: quem apela, ou, em geral, recorre, como terceiro prejudicado, evita a oposição de terceiro, e os embargos de terceiro contra a futura sentença ou contra a execução judicial (no mais amplo sentido). Quem poderia opor embargos de terceiro pode recorrer como terceiro prejudicado, porém nem todo terceiro prejudicado pode opor embar-gos de terceiro”.

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Em contraposição, doutrina20 muito abalizada sustenta a incom-patibilidade das vias impugnativas previstas nos arts. 499, caput e § 1º, e 1.046, ambos do Código de Processo Civil, ao fundamento de que o terceiro não pode agregar nova demanda na angusta via recursal.

Ainda que muito respeitáveis ambas as teses antagônicas, tudo indica que há lugar para uma solução intermediária: o terceiro não pode agregar nova demanda mediante recurso de terceiro, tendo em vista a impossibilidade jurídica da modificação do pedido e da causa de pedir em grau de recurso, exvi do parágrafo único do art. 264 do Código de Processo Civil; mas há lugar para a livre escolha entre o recurso de ter-ceiro e os embargos de terceiro quando a impugnação do terceiro susci-tar questão diretamente relacionada ao processo originário e que neces-site apenas de julgamento à luz do conjunto probatório disponível nos próprios autos21. Imagine-se, por exemplo, o avalista cujo bem foi cons-trito em execução movida apenas contra o avalizado, a despeito da nu-lidade formal do título de crédito que aparelhou a execução22. Ora, a

20 Cf. Fredie Didier Jr., Recursodeterceiro, 2002, p. 120-121: “Consideramos, entre-tanto, inadmissível a possibilidade de o possível opoente e, afortiori, o embargan-te, recorrer como terceiro prejudicado. O recurso de terceiro é modalidade inter-ventiva que não amplia objetivamente a causa; adere, o terceiro, a pretensão de uma das partes, com intuito de que esta prevaleça. Não exerce, o terceiro, ação de direito material, pelo recurso”.

21 Em reforço, no julgamento do REsp 656.498/PR, a 3ª Turma do STJ reformou acórdão do TJPR, para determinar o conhecimento de recurso interposto por terceiro com igual legitimidade para ajuizar embargos de terceiro.

22 Por exemplo, na jurisprudência: “AÇÃO DE EXECUÇÃO – NOTA PROMISSÓRIA – DATA E LOCAL DE EMISSÃO – OMISSÃO – REQUISITO ESSENCIAL – INE-FICÁCIA PARA A EXECUÇÃO – EXTINÇÃO DO PROCESSO – MATÉRIA A SER ARGUIDA DE OFÍCIO. A jurisprudência das Turmas que compõem a Seção de Direito Privado do colendo Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que a data de emissão da nota promissória configura requisito essencial à sua validade como título executivo, nos termos do art. 75 da Lei Uniforme de Genebra” (18ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0702.06.276005-4/001, DiáriodaJustiça, 29-2-2008). “A ausência da data de emissão da nota promissória a descaracteriza como título executivo. Se a nota promissória não contém a data de sua emissão, não está apta a embasar processo executivo, devendo ser extinta a execução pro-posta com base neste título” (17ª Câmara Cível do TJMG, Agravo de Instrumento 1.0079.02.011059-3/004, DiáriodaJustiça, 12-8-2008). “A execução fundada em letra de câmbio, sacada sem data de emissão, é nula. Preliminar instalada e execução extinguida” (10ª Câmara Cível do TJMG, Apelação 1.0481.06.063258-7/001, DiáriodaJustiça, 7-12-2007).

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nulidade formal do título de crédito e a nulidade da respectiva execução cambial podem ser veiculadas mediante recurso de terceiro e também por embargos de terceiro23, conforme a livre escolha do avalista. Daí a conclusão: o terceiro com legitimidade para ajuizar embargos de tercei-ro pode interpor recurso de terceiro, desde que a impugnação recursal não veicule demanda nova; para tanto, ou seja, para veicular demanda nova, o terceiro deve optar pela propositura dos embargos do art. 1.046 do Código de Processo Civil.

Em suma, o recurso de terceiro e os embargos de terceiro são ins-titutos distintos, tendo em vista a natureza jurídica de cada: recurso e ação autônoma de impugnação, respectivamente. Não obstante, é ad-missível a interposição de recurso de terceiro por quem tem legitimida-de para ajuizar embargos de terceiro, desde que o recurso não traga nova demanda ao processo em curso, mas, sim, verse sobre a própria deman-da que é o objeto do processo em curso.

8. Admissibilidade dos embargos de terceiro em geralA admissibilidade da ação de embargos de terceiro está sujeita às

seguintes condições específicas: – apreensão judicial de bem ou ameaça de constrição; – condição de possuidor ou de proprietário do bem apre-endido; – condição de terceiro em relação ao processo no qual houve a apreensão; – observância do prazo legal.

8.1. Apreensão judicial de bem

Os embargos de terceiro têm em mira ato judicial que já ocasionou a constrição de algum bem. Além dos embargos repressivos, entretanto, também são admissíveis embargos preventivos, em razão de iminente ameaça de apreensão indevida de bens de terceiro.

Com efeito, a regra reside nos embargos repressivos, ajuizados após a efetiva ocorrência da apreensão judicial indevida de bem de terceiro; mas também são admissíveis embargos preventivos, propostos antes mesmo da constrição, mas diante da real ameaça de apreensão, a qual

23 De acordo, na jurisprudência: “1. O terceiro embargante pode arguir em defesa de seu direito a nulidade da execução” (3ª Turma do STJ, REsp 650.790/AM, Di-áriodaJustiça, 28-5-2007, p. 323).

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também enseja proteção judicial à vista do art. 5º, XXXV, da Constituição Federal24.

8.2. Legitimidade ativa: condição de possuidor ou de proprietário do bem

No que tange à legitimidade ativa, os embargos de terceiro podem ser ajuizados por quem tem a qualidade de possuidor ou de proprie-tário do bem apreendido25. Com efeito, tanto o possuidor quanto o senhor têm legitimidade ativa para o ajuizamento dos embargos de terceiro. É o que se infere do § 1º do art. 1.046 do Código de Processo Civil: “Os embargos podem ser de terceiro senhor e possuidor, ou apenas possuidor”.

A propósito da legitimidade ativa do apenas possuidor, o Superior Tribunal de Justiça aprovou o correto Enunciado 84: “É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advin-da do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovi-do do registro”26. Na esteira do Enunciado 84, o antigo Tribunal de Al-

24 No mesmo sentido, na jurisprudência: “EMBARGOS DE TERCEIRO. Justifica-se o seu uso para evitar a consumação de ordem judicial, já instrumentalizada em mandado, ainda que não tenha havido concreta turbação da posse” (3ª Turma do STJ, REsp 1.702/CE, DiáriodaJustiça, 9-4-1990, p. 2741).

25 Em sentido conforme, na doutrina: “Quem não for senhor nem possuidor não tem interesse processual nem legitimidade para os embargos de terceiro (art. 1.046, § 1º)” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 1999, p. 256).

26 Em sentido conforme, na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “SÚM. 84-STJ. EMBARGOS DE TERCEIRO. ADQUIRENTE. BOA-FÉ. É cediço que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem protegido a promessa de compra e venda, ainda que não registrada em cartório (art. 530, I, do CC/1916), preservando-se o direito dos terceiros adquirentes de boa-fé (Súm 84-STJ)” (2ª Turma do STJ, REsp 892.117/RS, InformativoSTJ, n. 375). Também no mesmo sentido, ainda na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: 3ª Turma do STJ, REsp 8.598/SP, DiáriodaJustiça, 6-5-1991, p. 5667; 4ª Turma do STJ, REsp 573/SP, DiáriodaJustiça, 6-8-1990, p. 7337; e 4ª Turma do STJ, REsp 1.172/SP, DiáriodaJustiça, 16-4-1990, p. 2878. Por conseguinte, está superado o antigo Enunciado 621 da Súmula do Supremo Tribunal Federal. Sem dúvida, com o advento da Consti-tuição de 1988, a interpretação final do direito infraconstitucional passou a ser da competência do Superior Tribunal de Justiça, Corte que afastou a aplicação do Enunciado 621, por ser o verbete incompatível com o disposto no § 1º do art. 1.046 do Código de Processo Civil.

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çada Cível do Rio de Janeiro aprovou o preciso Enunciado 17, inverbis: “São cabíveis os embargos de terceiro, fundamentados na posse, ainda que decorrente de título não registrado”27. Daí a conclusão: os embargos podem ser veiculados com fundamento apenas na posse do terceiro, por não ser procedimento exclusivo de proprietário, à vista do § 1º do art. 1.046 do Código de Processo Civil.

Ainda a respeito da legitimidade ativa, autorizada doutrina28 sus-tenta a inadmissibilidade dos embargos por quem é senhor sem posse, ao fundamento de que o § 1º do art. 1.046 do Código confere legitimida-de ao senhor que é possuidor e ao possuidor que não é senhor; não, entretanto, ao senhor que não é possuidor do bem. Embora a tese seja muito respeitável, o § 1º do art. 1.046 não enseja interpretação restritiva. Com efeito, o § 1º confere a máxima proteção possível em favor do ter-ceiro prejudicado pela constrição judicial, até mesmo ao terceiro “apenas possuidor”. Com maior razão, ao proprietário também deve ser confe-rida legitimidade ativa para a ação de embargos de terceiro, indepen-dentemente de ser possuidor, ou não. Basta que seja proprietário29.

8.3. Condição de terceiro

Sob outro prisma, a ação de embargos é outorgada em prol de quem

27 Cf. DiárioOficialdoRiodeJaneiro, 16-4-1996, p. 192.

28 Cf. Alexandre Freitas Câmara, Liçõesdedireitoprocessualcivil, v. III, 12. ed., 2007, p. 489: “Em outras palavras, o terceiro poderá ajuizar os embargos de terceiro para buscar proteção para bens de que tenha domínio e posse, ou apenas posse. O terceiro que tenha domínio mas não posse, portanto, não poderá manejar os em-bargos de terceiro”.

29 De acordo, na doutrina: “O art. 1.046, § 1º, do CPC dispõe que os embargos podem ser de terceiro senhor e possuidor, ou apenas possuidor. Uma interpretação literal levará à conclusão de que eles só podem ser opostos pelo possuidor, tendo ou não a propriedade do bem. Mas não por aquele que seja apenas proprietário, sem a posse da coisa. Não nos parece ser essa interpretação a melhor, pois é inegável que o proprietário, ainda que sem a posse da coisa, tem interesse em preservá-la. Da mesma forma que ele tem o direito de havê-la de quem quer que injustamen-te tenha a coisa consigo (direito à posse decorrente da propriedade – juspossiden-di), tem o direito de preservá-la de injustas apreensões judiciais. A pessoa que adquire um imóvel, por escritura pública levada a registro, pode valer-se dos embargos de terceiro para protegê-lo de apreensão judicial indevida, ainda que não tenha ingressado em sua posse” (Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novocursodedireitoprocessualcivil, v. II, 3. ed., 2007, p. 390).

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não é parte no processo no qual houve a constrição judicial do bem30. Só é parte quem tem o nome inserto na petição inicial e é citado, ou então comparece de forma espontânea ao processo, quando supre a falta da citação. Por outro lado, não é parte quem é apenas intimado de algum ato processual, ainda que a intimação seja da própria constrição judicial, como nas hipóteses previstas nos arts. 615, II, 655, § 2º, e 698, todos do Código de Processo Civil. Daí a admissibilidade da ação de embargos de terceiro por quem foi apenas intimado (e não citado!) no processo no qual houve a apreensão judicial. Assim dispõe o preciso Enunciado 134 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça: “Embora intimado da pe-nhora em imóvel do casal, o cônjuge do executado pode opor embargos de terceiro para defesa de sua meação”.

Já quem foi citado (e não apenas intimado!) no processo no qual houve a apreensão de bens atua na qualidade de parte, razão pela qual não tem legitimidade para aviar embargos de terceiro31. A propósito, merece ser prestigiado o Enunciado 184 da Súmula do antigo Tribunal Federal de Recursos: “Em execução movida contra sociedade por quotas, o sócio-ge-rente, citado em nome próprio, não tem legitimidade para opor embargos de terceiro, visando livrar da constrição judicial seus bens particulares”.

Por tudo, é possível concluir que os embargos de terceiro podem ser propostos tanto pelo proprietário quanto pelo possuidor, desde que não tenham sido citados no processo no qual houve a apreensão judicial dos bens.

8.4. Propositura da ação dentro do prazo legal

Quanto ao prazo dos embargos de terceiro, depende do processo originário no qual houve a indevida apreensão judicial do bem do ter-

30 De acordo, na doutrina: “A qualidade de terceiro é estabelecida por exclusão: é terceiro quem não é parte no feito, ainda que possa vir a ser” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 256).

31 Assim, na jurisprudência: “1. Os embargos a serem manejados pelo sócio-geren-te contra quem se redirecionou ação executiva, regularmente citado e, portanto, integrante do polo passivo da demanda, são os de devedor” (1ª Seção do STJ, EREsp 98.484/ES, DiáriodaJustiça, 17-12-2004, p. 394). “Embargos de terceiro. Bem de família. Precedente da Corte. 1. Se os herdeiros embargantes são parte na exe-cução, não podem ingressar com o procedimento que o direito positivo reservou para os terceiros. 2. Recurso especial conhecido e provido” (3ª Turma do STJ, REsp 220.731/SP, DiáriodaJustiça, 1º-8-2000, p. 266).

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ceiro. Com efeito, a injusta constrição judicial pode ter lugar em proces-sos cognitivos, executivos e cautelares. Daí a explicação para a existência de prazos diferenciados no art. 1.048 do Código de Processo Civil.

No que tange à apreensão judicial de bens em processo cognitivo, os embargos de terceiro podem ser propostos a qualquer tempo, desde que antes do trânsito em julgado da decisão judicial final32.

Diante de apreensão judicial indevida em processo de execução ou na fase de execução de processo sincrético, o prazo dos embargos de terceiro é de até cinco dias depois da adjudicação, da alienação ou da arrematação, desde que antes da assinatura da respectiva carta de adju-dicação33, de alienação34 ou de arrematação35, conforme o caso.

Com efeito, à vista do art. 1.048, infine, do Código de Processo Civil, a tempestividade dos embargos de terceiro em sede de execução deve ser aferida sob dois enfoques: em primeiro lugar, a ação de embar-gos de terceiro deve ser proposta até cinco dias depois da adjudicação, da alienação ou da arrematação; em segundo lugar, a ação de embargos deve ser ajuizada antes da assinatura da carta de adjudicação, de aliena-ção ou de arrematação, ainda que a carta tenha sido assinada no curso do quinquídio posterior à adjudicação, à alienação ou à arrematação, conforme o caso. Daí a conclusão: são intempestivos os embargos de terceiro ajuizados depois da assinatura da carta, ainda que dentro do quinquídio previsto no art. 1.048.

Quanto ao processo cautelar, o prazo dos embargos de terceiro segue a mesma regra do processo principal, conforme o caso. Por conse-guinte, se a apreensão judicial ocorreu em processo cautelar cujo proces-so principal é cognitivo, os embargos de terceiros são tempestivos se propostos antes do trânsito em julgado da sentença do processo de co-nhecimento. Já a constrição judicial em processo cautelar de proteção de execução pode ser impugnada mediante embargos de terceiro dentro do prazo de cinco dias da adjudicação, da alienação ou da arrematação, desde que antes da assinatura da respectiva carta.

32 Cf. art. 1.048, proêmio, do Código de Processo Civil.

33 Cf. art. 685-B do Código de Processo Civil.

34 Cf. art. 685-C, § 2º, do Código de Processo Civil.

35 Cf. art. 693 do Código de Processo Civil.

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No que tange à natureza do prazo previsto no art. 1.048 do Código de Processo Civil, trata-se de prazo decadencial, o qual ocasiona a perda apenas do direito de embargar como terceiro mediante procedimento especial marcado pela celeridade. Com efeito, a perda do prazo previsto no art. 1.048 não interfere no direito à desconstituição do ato judicial de apreensão indevida dos bens do terceiro. Daí a possibilidade da propo-situra da ação anulatória consagrada no art. 486 do Código de Processo Civil, sob o procedimento comum36.

9. Admissibilidade dos embargos de terceiro para a defesa da meação do cônjuge

À vista do § 3º do art. 1.046 do Código de Processo Civil, os embar-gos de terceiro são adequados para que um cônjuge defenda a respecti-va meação diante de constrição judicial indevida efetuada em anterior processo movido apenas contra o outro cônjuge37.

Ainda a respeito do § 3º do art. 1.046 do Código de Processo Civil, a legitimidade ativa para os embargos de terceiro subsiste ainda que o cônjuge tenha sido intimado da constrição judicial realizada no processo movido somente contra o outro cônjuge. A propósito, merece ser presti-giado o Enunciado 134 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça: “Embora intimado da penhora em imóvel do casal, o cônjuge do execu-

36 No mesmo sentido, na doutrina: “Esse prazo é de natureza de decadência da via processual especial. Não se exclui a via ordinária posterior de anulação do ato judicial, sem, porém, a força dos embargos de terceiro” (Vicente Greco Filho, Di-reitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 257).

37 Assim, na jurisprudência: “5. Não tendo havido a citação da mulher na ação pauliana, a ineficácia do negócio jurídico reconhecido nessa ação produziu efeitos apenas em relação ao marido, sendo legítima, na forma do art. 1.046, § 3º, do CPC, a pretensão da mulher, que não foi parte, de preservar a sua meação, livrando-a da penhora” (1ª Turma do STJ, REsp 506.312/MG, DiáriodaJustiça, 31-8-2006, p. 198). Também no mesmo sentido, ainda na jurisprudência: “I – A legitimidade do marido para propor embargos de terceiro restringe-se aos casos em que esteja defendendo a sua meação” (3ª Turma do STJ, REsp 231.364/SP, DiáriodaJustiça, 7-2-2000, p. 162). “Mulher casada. Meação. Defesa. Os embargos de terceiro cons-tituem a via adequada para que a mulher busque afastar a constrição que recaia sobre sua meação” (3ª Turma do STJ, REsp 141.821/GO, DiáriodaJustiça, 21-8-2000, p. 116). Colhe-se do voto do Relator, Ministro Eduardo Ribeiro: “Se a mulher pretende sustentar que seus bens estão sendo atingidos indevidamente, a hipóte-se é própria dos embargos de terceiro”.

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tado pode opor embargos de terceiro para defesa de sua meação”. Em contraposição, se ambos os cônjuges foram citados no processo no qual houve a apreensão indevida, não há lugar para embargos de terceiro, porquanto são partes, em litisconsórcio passivo38.

Ainda que procedentes os embargos para a defesa da meação do terceiro, se o bem constrito for indivisível, a apreensão judicial deve ser preservada, com a posterior entrega ao terceiro do produto da alienação do bem correspondente à meação, exvi do art. 655-B do Código de Pro-cesso Civil39.

Por fim, a despeito da legitimidade ativa do cônjuge não citado, a apreensão judicial dos bens deve ser mantida quando a dívida objeto da cobrança por meio do processo originário foi contraída em benefício do casal ou da família, à vista de prova a cargo do embargado40.

38 De acordo, na jurisprudência: “2. O cônjuge que figurou, na qualidade de litis-consorte, no polo passivo de execução em que foi determinada penhora sobre bem de propriedade do casal não detém legitimidade para apresentar embargos de terceiro, na defesa de sua meação, contra tal ato de constrição” (6ª Turma do STJ, AG 727.564/MG – AgRg, DiáriodaJustiça, 11-6-2007, p. 383).

39 No mesmo sentido, na jurisprudência: “PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO FIS-CAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. MEAÇÃO DO CÔNJUGE. BEM INDIVISÍ-VEL. PENHORA. POSSIBILIDADE. 1. Os bens indivisíveis, de propriedade comum decorrente do regime de comunhão no casamento, podem ser levados à hasta pública por inteiro, reservando-se ao cônjuge a metade do preço alcan-çado. Precedentes: (REsp 200.251/SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Corte Especial, DJU de 29-4-2002; REsp 508.267/PR, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 6-3-2007; REsp 259.055/RS, Rel. Ministro Garcia Vieira, DJ de 30-10-2000). 2. Deveras, a novel reforma do Processo Civil Brasileiro, na estei-ra da jurisprudência desta Corte, consagrou na execução extrajudicial que ‘tratando-se de penhora em bem indivisível, a meação do cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da alienação do bem’ (CPC, art. 655-B). 3. Recurso especial provido” (1ª Turma do STJ, REsp 814.542/RS, DiáriodaJusti-ça, 23-8-2007, p. 214).

40 De acordo, na jurisprudência: “1. Tratando-se de execução fiscal oriunda de ato ilícito e, havendo oposição de embargos de terceiro por parte do cônjuge do executado, com o fito de resguardar a sua meação, o ônus da prova de que o produto do ato não reverteu em proveito da família é do credor e não do embargante. Precedentes” (1ª Turma do STJ, REsp 701.170/RN, DiáriodaJusti-ça, 18-9-2006, p. 269). “1. A meação do cônjuge feminino só responde pelos atos ilícitos praticados pelo marido quando o credor provar que ela foi também beneficiada com a infração” (2ª Turma do STJ, AG 658.411/PR – AgRg, DiáriodaJustiça, 1º-7-2005, p. 478).

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10. Embargos de terceiro e defesa de garantia realÀ vista dos arts. 615, II, e 698 c/c os arts. 1.047, II, e 1.054, todos do

Código de Processo Civil, o credor cuja garantia real for objeto de apre-ensão judicial em processo alheio deve ser intimado da constrição, a fim de que possa ajuizar embargos de terceiro, para a defesa do direito de preferência em virtude da garantia real, como a hipoteca41, o penhor e a anticrese.

11. Parte equiparada a terceiroO § 2º do art. 1.046 do Código de Processo Civil versa sobre hipó-

tese peculiar de embargos de terceiro: os embargos podem ser ajuizados por quem já é parte no processo no qual houve a indevida apreensão judicial, quando a constrição alcança bem que não poderia ter sido apre-endido, tendo em vista o título da aquisição ou a qualidade da posse. Imagine-se, por exemplo, uma demanda de despejo movida contra o locatário de dois imóveis contíguos alugados mediante contratos distin-tos, ambos do mesmo locador. Não obstante, a demanda de despejo por falta de pagamento teve como objeto apenas um imóvel locado, em re-lação ao qual foi proferida a sentença de procedência. Na eventualidade de o mandado judicial de despejo compulsório ter em mira o outro imó-vel, que não foi objeto da demanda, o réu poderá ajuizar embargos de terceiro, com fundamento no § 2º do art. 1.046 do Código de Processo Civil. Os embargos seriam igualmente admissíveis por parte do réu em processo de reintegração de posse, se a ordem judicial de desocupação compulsória tivesse em mira imóvel contíguo ao objeto da demanda42.

41 Assim, na jurisprudência: “EMBARGOS DE TERCEIRO. Credor hipotecário. O credor hipotecário, com garantia real protegida de outras penhoras (DL n. 413/69), pode promover ação de embargos de terceiro para liberar o imóvel constrito em execução promovida por outro credor” (4ª Turma do STJ, REsp 175.565/SP, DiáriodaJustiça, 14-12-1998, p. 250). “RECURSO ESPECIAL. TERCEIRO HIPOTECAN-TE. EXECUÇÃO REAL DIRIGIDA CONTRA O DEVEDOR. EMBARGOS DE TERCEIRO. 1. O terceiro hipotecante, que não figura na relação processual origi-nária, tem legitimidade para opor embargos de terceiro” (3ª Turma do STJ, REsp 49.550/RO, DiáriodaJustiça, 30-9-1996, p. 36638).

42 De acordo, na doutrina: “A admissibilidade dos embargos de terceiro, manifes-tados por quem seja parte no processo principal, está condicionada à distinção entre os títulos que tenha sobre a coisa objeto dos embargos ou da constrição ju-dicial. Assim, o vencido na ação, ou o obrigado, pode manifestar embargos de

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12. Petição inicialA petição inicial dos embargos de terceiro deve ser elaborada à

vista dos arts. 39, I, 258, 282, 283 e 1.050, todos do Código de Processo Civil.

terceiro quanto aos bens que, pelo título, ou qualidade em que os possuir, não devem ser atingidos pela diligência judicial constritiva. A mesma pessoa física ou jurídica pode ser simultaneamente parte e terceiro no mesmo processo, se são diferentes os títulos jurídicos que justificam esse duplo papel. A palavra ter signi-fica não só a pessoa física ou jurídica que não tenha participado do feito, como também a pessoa que participou do processo, mas que, aqui, nos embargos, é ti-tular de um direito diferente, outro que não o que foi objeto da decisão judicial. Assim, por exemplo, o condômino que seja também proprietário do prédio con-tíguo, mesmo participando da ação de divisão, pode embargar, como terceiro, se a linha do perímetro invadir a propriedade que é sua. Do mesmo modo, a viúva meeira e inventariante tem qualidade para oferecer embargos de terceiro à arre-cadação dos bens deixados pelo marido, se, por exemplo, arguir sua qualidade de comerciante e quanto aos bens de seu ramo comercial. (...) A pessoa que foi parte na ação possessória poderá valer-se dos embargos de terceiro, quando a restituição a que for condenada na ação possessória, ou a que foi obrigada em consequência da ação – como nas liminares –, compreende bens sobre que não versa a demanda. É a mesma pessoa, mas agindo com outros títulos, ou seja, vindo a juízo noutro processo e com outra qualidade e litigando sobre outros bens” (Hamilton de Moraes e Barros, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. IX, 294-295). No mesmo sentido, ainda na doutrina: “É o caso, por exemplo, de ato de apreensão judicial numa possessória que vem atingir um bem do réu, mas que não foi objeto da ação” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 256). Também em sentido conforme, ainda na doutrina: “A parte, no processo principal, poderá ter apreendidos bens que possui, mas, dependendo da qualidade de sua posse, fica ela equiparada a terceiro, podendo opor embargos, quando, em razão da mesma posse, ditos bens não puderem ser apreendidos (art. 1.046, § 2º). É o caso, por exemplo, do locatário que, executado, vê penhorado o bem locado; ou o do devedor fiduciante que teve arrestada ou sequestrada a coisa alienada fidu-ciariamente. Em ambas as hipóteses, o equiparado a terceiro poderá defender-se, alegando domínio alheio, ficando também o possuidor indireto, no caso o locador e credor fiduciário, com o direito de opor embargos. A coisa, pelo título de aqui-sição, não pode, às vezes, receber o ato de constrição judicial. Exemplo comum é o da coisa recebida com cláusula de inalienabilidade e penhorada em execução. Da mesma forma, o herdeiro poderá ser demandado pelas dívidas da herança, depois de feita a partilha, mas apenas os bens que recebeu é que respondem pela execução e não os primitivamente seus. Em ambos os casos, pelo título de aquisi-ção, poderão o executado e os herdeiros embargar como terceiros, embora sejam partes no processo de onde se originou a apreensão (art. 1.050, § 2º)” (Ernane Fi-délis dos Santos, Manualdedireitoprocessualcivil, v. III, 10. ed., 2006, p. 140).

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Por conseguinte, a petição inicial deve conter a indicação do valor da causa, à vista dos arts. 258 e 282, V, ambos do Código de Processo Civil. Ao contrário do que pode parecer à primeira vista, o valor da causa dos embargos não está vinculado ao valor da causa do processo originário no qual houve a apreensão indevida de bem do terceiro. A propósito, merece ser prestigiado o Verbete n. 51 da Primeira Câmara Civil43 do antigo Tribunal de Alçada de Minas Gerais: “Nos embargos à execução e nos de terceiro, o valor da causa não é obrigatoriamente o mesmo atribuído à causa principal”44-45.

Diante da natureza jurídica dos embargos de terceiro, o autor deve formular pedido específico de citação do réu, porquanto há a instauração de novo processo46.

Ainda que de forma perfunctória, o autor também já deve compro-var a qualidade de terceiro e a respectiva posse ou propriedade, por meio de prova documental, tendo em vista o disposto no caput do art. 1.050 do Código de Processo Civil.

Por fim, a petição inicial deve ser instruída com o rol de testemu-nhas, para a eventualidade de o juiz designar a audiência prevista no § 1º do art. 1.050 do Código de Processo Civil.

13. Competência, distribuição e autuaçãoÀ vista do art. 1.049 do Código de Processo Civil, os embargos de

terceiro são da competência do mesmo juízo do processo primitivo no

43 Por oportuno, vale lembrar que eminentes processualistas integravam a Primei-ra Câmara Civil do antigo Tribunal de Alçada de Minas Gerais, na composição de 1982, como os então Juízes Sálvio de Figueiredo Teixeira e Walter Veado, ambos Professores de Direito Processual Civil da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais.

44 Cf. Minas Gerais, Parte II, DiáriodoJudiciário, 26-2-1982, p. 2.

45 Ainda a respeito do valor da causa nos embargos de terceiro, conferir o disposto no posterior tópico 24 do presente capítulo.

46 De acordo, na doutrina: “Posto que os embargos de terceiro sejam processo inci-dente e nasçam de ato praticado em outro feito e devam correr no juízo do pro-cesso principal, é indispensável a citação pessoal dos embargos. São os embargos uma outra ação, diversa da que existe no processo principal, e são outras as pes-soas da relação processual” (Hamilton de Moraes e Barros, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. IX, p. 303).

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qual houve a constrição judicial. Trata-se de competência funcional e, por consequência, absoluta, razão pela qual é passível de apreciação oficial pelo juiz47.

A petição inicial dos embargos de terceiro, portanto, deve ser dis-tribuída ao mesmo juízo, por dependência em relação ao processo origi-nal no qual houve a indevida apreensão judicial. Diante de apreensão indevida na falência, os embargos de terceiro devem ser distribuídos por dependência do processo falimentar, exvi da combinação do art. 78, parágrafo único, da Lei n. 11.101/2005, com o art. 1.049 do Código de Processo Civil.

Após a distribuição, a petição inicial é autuada em separado48, mas os autos dos embargos de terceiro são apensados aos autos originais.

Na eventualidade de apreensão judicial mediante carta preca-tória, os embargos de terceiro podem ser oferecidos tanto no juízo deprecante quanto no juízo deprecado, consoante autoriza o proêmio do art. 747 do Código de Processo Civil, com a redação determinada pela Lei n. 8.953/94. Em seguida, os embargos são distribuídos, pro-cessados e julgados no juízo deprecado, salvo se o bem constrito tiver sido indicado pelo próprio juiz deprecante, quando compete a este decidir os embargos de terceiro. A propósito, vale conferir o Enun-ciado 33 da Súmula do antigo Tribunal Federal de Recursos: “O juízo deprecado, na execução por carta, é o competente para julgar os embargos de terceiro, salvo se o bem apreendido foi indicado pelo juízo deprecante”49. Reforça a precisa Conclusão n. 74 do Simpósio

47 Assim, na jurisprudência: “1 – A competência para processar e julgar embargos de terceiro, determinada no art. 1.049 do CPC, segundo o qual ‘os embargos serão distribuídos por dependência e correrão em autos distintos perante o mesmo juiz que ordenou a apreensão’, é funcional, de natureza absoluta, sendo, portanto, declinável de ofício” (2ª Seção do STJ, CC 44.223/GO, DiáriodaJustiça, 1º-8-2005, p. 313).

48 Cf. art. 1.049 do Código de Processo Civil.

49 Em sentido conforme, na jurisprudência moderna: “COMPETÊNCIA. EMBAR-GOS. JUÍZO DEPRECANTE. A Turma decidiu que compete ao juízo deprecante apreciar os embargos de terceiro opostos contra a penhora do imóvel por ele in-dicado (Súm. 33-TFR)” (3ª Turma do STJ, REsp 1.033.333/RS, InformativoSTJ, n. 364). “2 – Se, quando da expedição da carta precatória, o Juízo deprecante não especifica os bens a serem arrestados, a competência para apreciar os embargos de terceiro, visando à desconstituição da constrição, é do Juízo deprecado. Inci-dência da Súmula 33 do extinto TFR, verbis: ‘O juízo deprecado, na execução por

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de Curitiba, de 1975: “EMBARGOS DE TERCEIRO: JUÍZO COM-PETENTE EM EXECUÇÃO POR CARTA – Os embargos de tercei-ro, na execução por carta, correm perante o juízo deprecado, se a apreensão do bem foi por este determinada, mas se o juiz depre-cante indica o bem a ser apreendido, perante ele correrão os embargos”50. Com efeito, se o bem objeto da constrição judicial mediante carta precatória foi designado pelo juiz deprecante, in-cide o art. 1.049, com a distribuição por dependência ao processo originário51.

Por fim, na eventualidade de os embargos de terceiro serem ajui-zados pela União, por autarquia federal ou por empresa pública federal, incide o art. 109, I, da Constituição Federal, razão pela qual a competên-cia passa a ser da Justiça Federal52.

14. Indeferimento liminar da petição inicialDiante de embargos de terceiro fora do prazo53 ou com petição

inicial inepta, incidem os arts. 267, I, e 295, ambos do Código de Pro-cesso Civil, com a prolação de sentença de indeferimento liminar da petição inicial.

carta, é o competente para julgar os embargos de terceiro, salvo se o bem apreen-dido foi indicado pelo juízo deprecante’” (2ª Seção do STJ, CC 44.223/GO, DiáriodaJustiça, 1º-8-2005, p. 313).

50 Cf. RevistaForense, v. 252, p. 28.

51 De acordo, na jurisprudência: “EMBARGOS DE TERCEIRO – PRECATÓRIA. Se o juízo deprecante indicou precisamente qual o bem a ser penhorado, será o com-petente para os embargos de terceiro” (2ª Seção do STJ, CC 331/MG, DiáriodaJustiça, 20-11-1989, p. 17290).

52 Em sentido conforme, na jurisprudência: “EMBARGOS DE TERCEIRO OPOS-TOS PELO BANCO CENTRAL DO BRASIL – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL – ART. 109, I, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. 1. Nos termos do art. 109, I, da CF/88, o critério definidor da competência da Justiça Federal é rationepersonae, vale dizer, considera-se a natureza das pessoas envolvidas na relação processual. 2. Embargos de terceiro opostos por autarquia federal em execução fiscal movida por Município em face de particular. Competência da Justiça Federal para processar a causa e decidir acerca do interesse jurídico do ente estatal na demanda” (1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, CC 66.119/RJ, DiáriodaJustiça, 27-11-2006, p. 227).

53 Cf. art. 1.048 do Código de Processo Civil.

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Indeferida a petição inicial dos embargos de terceiro, não há sus-pensão do processo originário. Da sentença, entretanto, cabe apelação, com efeitos devolutivo e suspensivo, em virtude da regra consagrada no proêmio do art. 520 do Código de Processo Civil. Ao contrário do que pode parecer à primeira vista, a existência do efeito suspensivo na ape-lação não significa que a apreensão judicial fica suspensa nem que o processo originário fica suspenso54.

Em síntese, o indeferimento da petição inicial não atrai a incidência dos arts. 1.051 e 1.052, porquanto o indeferimento liminar significa que os embargos de terceiros não produzem efeito jurídico algum. Por con-seguinte, a produção do efeito suspensivo do recurso apelatório não traz consequência alguma55.

15. Petição inicial com defeito sanávelDiante de petição inicial com defeito sanável56, o juiz determina a

respectiva emenda, à vista do art. 284 do Código de Processo Civil, sob pena de indeferimento.

16. Fungibilidade Na eventualidade da propositura de embargos de terceiro por

quem, na verdade, é parte no processo originário no qual houve a apre-ensão judicial, o juiz, ao invés de indeferir a petição inicial inliminelitis, deve examinar se há lugar para a conversão dos embargos de terceiro na via processual cabível: embargos à execução ou impugnação à execução, conforme o caso.

54 No mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que “a apelação interposta contra sentença que indefere, liminarmente, os embargos de terceiro não suspende o processo de execução objeto dos referidos embargos” (3ª Turma do STJ, MC 10.800/SP – AgRg, DiáriodaJustiça, 2-5-2006, p. 299). Também no mesmo sentido, ainda na jurisprudência: “EMBARGOS DE TERCEIRO. APELA-ÇÃO. Ainda que se admita efeito suspensivo da apelação contra sentença que rejeite liminarmente embargos de terceiro, tal efeito não alcança a execução” (4ª Turma do STJ, RMS 3.776/SP, DiáriodaJustiça, 28-8-1995).

55 “A suspensão do não é nada, já que não se transforma em sim” (4ª Turma do STJ, PET 513/ES – AgRg, DiáriodaJustiça, 22-11-1993).

56 Por exemplo, ausência de indicação do valor da causa.

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Cumpridos todos os requisitos legais, em especial o prazo do art. 1.048 do Código de Processo Civil, o juiz deve converter os embargos de terceiro na via processual adequada, em homenagem ao princípio da instrumentalidade das formas consagrado nos arts. 154 e 295, V, infine, do Código de Processo Civil57.

17. Admissão dos embargos e suspensão doprocesso originário

Diante de petição inicial apta, o juiz recebe os embargos de terceiro e determina a citação do réu – ou dos réus, no caso de litisconsórcio passivo.

Além de ordenar a citação do réu, o juiz também determina a ime-diata suspensão do processo originário no qual houve a constrição judicial, mas só se os embargos recebidos versarem sobre todos os bens apreendi-dos, tudo nos termos dos arts. 265, IV, a, e 1.052, primeira parte, ambos do Código de Processo Civil58. Se, entretanto, os embargos versarem apenas sobre alguns dos bens apreendidos, o juiz determina o prosseguimento do processo originário somente em relação aos bens não embargados59.

18. Decisão interlocutória liminar agravávelSe o juiz considerar suficiente a prova documental que instruiu a

petição inicial ou a prova testemunhal na audiência prevista no § 1º do

57 De acordo, na jurisprudência: “Os embargos a serem manejados pelo sócio-ge-rente contra quem se redirecionou ação executiva, regularmente citado e, portan-to, integrante do polo passivo da demanda, são os de devedor, e não por embargos de terceiros, adequados para aqueles que não fazem parte da relação processual. Todavia, em homenagem ao princípio da fungibilidade das formas, da instrumen-talidade do processo e da ampla defesa, a jurisprudência admite o processamen-to de embargos de terceiro como embargos do devedor. Exige, para tanto, entre outras circunstâncias, a comprovação do implemento dos requisitos legais de admissibilidade, notadamente quanto à sua propositura dentro do prazo legal” (1ª Seção do STJ, EREsp 98.484/ES, DiáriodaJustiça, 17-12-2004).

58 Assim, na jurisprudência: “Embargos de terceiros. Admitido o seu processamen-to e versando sobre a totalidade dos bens penhorados, há que se suspender o curso do processo de execução” (3ª Turma do STJ, REsp 235.459/SP, DiáriodaJustiça, 14-8-2000, p. 165).

59 Cf. art. 1.052, segunda parte, do Código de Processo Civil.

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art. 1.050 do Código de Processo Civil, profere decisão interlocutória inliminelitis à vista do art. 1.051, com a expedição de mandado judicial de manutenção ou de restituição dos bens em favor do embargante.

Como a decisão interlocutória liminar ocasiona a antecipação da manutenção ou da restituição da posse em favor do terceiro embargan-te, não pode ser classificada como cautelar, mas, sim, como verdadeira antecipação da tutela, tendo em vista o disposto no art. 273 do Código de Processo Civil60.

Não obstante, a restituição liminar dos bens apreendidos depende de prévia prestação de caução pelo embargante, tendo em vista o dis-posto nos arts. 826 e 1.051 do Código de Processo Civil.

Por fim, a decisão interlocutória liminar é passível de agravo de instrumento, em dez dias, com fundamento no art. 522 do Código de Processo Civil.

19. Legitimidade passivaNo que tange ao polo passivo dos embargos de terceiro, a regra

reside na inclusão do autor da demanda originária na qual houve a in-devida apreensão judicial, na qualidade de embargado61.

Não obstante, a regra comporta exceção: se a constrição judicial é efetivada em razão de manifestação do demandado no processo

60 De acordo, na doutrina: “3. Antecipação da tutela. A medida liminar tem nature-za de tutela antecipatória do provimento final (CPC 273), não se tratando de providência cautelar” (Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery, CódigodeProcessoCivilcomentado, 4. ed., 1999, p. 1356, nota 3 ao art. 1.051).

61 No mesmo sentido, na jurisprudência: “I – Nas hipóteses em que o imóvel de terceiro foi constrito em decorrência de sua indicação à penhora por parte do credor, somente este detém legitimidade para figurar no polo passivo dos Embar-gos de Terceiro, inexistindo, como regra, litisconsórcio passivo necessário com o devedor” (3ª Turma do STJ, REsp 282.674/SP, DiáriodaJustiça, 7-5-2001, p. 140). Em sentido conforme, na doutrina: “No polo passivo da ação de embargos de terceiro figura como réu aquele que deu causa à apreensão judicial, mediante pedido ao Poder Judiciário, ainda que não haja, de sua parte, indicação direta e precisa do bem a ser apreendido. Assim, na execução, se forem penhorados bens de terceiro, será réu da ação de embargos o credor exequente, mesmo que não tenha sido ele pessoalmente quem tenha indicado o bem para ser penhorado e a penhora resultou de atuação de ofício do oficial de justiça” (Vicente Greco Filho, Direitoprocessualcivilbrasileiro, v. III, 17. ed., 2005, p. 256).

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originário, como ocorre quando o executado indica bem de terceiro à penhora62, há a excepcional formação de litisconsórcio passivo neces-sário entre o demandante e o demandado do processo primitivo, os quais devem ser citados como litisconsortes passivos nos embargos de terceiro. Trata-se, todavia, de exceção, porquanto a regra é a citação apenas do demandante do processo originário, réu por excelência nos embargos de terceiro.

20. CitaçãoNo que tange à citação, o novel § 3º do art. 1.050 do Código de

Processo Civil, acrescentado por força da Lei n. 12.125/2009, dispensa a citação pessoal do réu-embargado na ação de embargos de terceiros, quando ele já tem advogado constituído nos autos do processo anterior no qual reside a constrição judicial: “§ 3º A citação será pessoal, se o embargado não tiver procurador constituído nos autos da ação prin-cipal”.

Com efeito, à vista do novo § 3º do art. 1.050 do Código de Proces-so Civil, a citação do réu-embargado agora se dá na pessoa do respecti-vo advogado constituído nos autos do processo originário.

Em suma, agora só há necessidade de citação pessoal do próprio réu-embargado no processo de embargos se ele não constituiu advogado constituído nos autos do processo principal.

21. Citação, decisão interlocutória liminar e feriadosÀ vista do art. 173, II, do Código de Processo Civil, há lugar para a

citação, para o cumprimento da decisão interlocutória concessiva da restituição liminar e para a prática de outros atos processuais urgentes até mesmo em feriados.

22. ContestaçãoÀ vista do art. 1.053 do Código de Processo Civil, o réu dispõe de

apenas dez dias para contestar os embargos de terceiro. Por conseguinte, não incide a regra do art. 297, mas, sim, a exceção do art. 1.053, preceito

62 Cf. arts. 600, IV, e 652, § 3º, ambos do Código de Processo Civil.

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específico acerca da contestação dos embargos de terceiro. Na eventua-lidade de litisconsórcio passivo, com procuradores diferentes, entretan-to, o prazo é duplicado por força do art. 191 do Código de Processo Civil.

No que tange à matéria de defesa, o réu pode suscitar fraude de execução63, porquanto o bem alienado a terceiro continua sujeito à exe-cução, tendo em vista o disposto no art. 592, V, do Código de Processo Civil. Sem dúvida, como ato atentatório à dignidade da justiça64, verda-deiro crime65, a fraude de execução é passível de conhecimento oficial, razão pela qual pode ser suscitada na contestação do exequente citado como réu nos embargos de terceiro66.

Resta saber se também há lugar para veiculação de fraude contra credores na contestação, tema do próximo tópico.

23. Fraude contra credores e contestação aosembargos de terceiro

Durante muitos anos perdurou séria divergência jurisprudencial acerca da alegação de fraude contra credores pelo embargado, em sede

63 “A fraude à execução consiste na alienação de bens pelo devedor, na pendência de um processo capaz de reduzi-lo à insolvência, sem a reserva – em seu patrimô-nio – de bens suficientes a garantir o débito objeto de cobrança. Trata-se de insti-tuto de direito processual, regulado no art. 593 do CPC, e que não se confunde com a fraude contra credores prevista na legislação civil” (1ª Turma do STJ, REsp 684.925/RS, DiáriodaJustiça, 24-10-2005, p. 191). “Somente se caracteriza a fraude de execução quando a alienação é realizada já pendente aquela demanda que dá origem à penhora, contra a qual se insurge o adquirente mediante embargos de terceiro. Se a alienação é anterior a tal demanda, a hipótese somente pode ser entendida, em tese, como de fraude a credores, ainda que ao tempo da venda outras demandas afetassem o patrimônio do devedor-alienante” (4ª Turma do STJ, REsp 327/SP, DiáriodaJustiça, 20-11-1989, p. 17302).

64 Cf. art. 600, I, do Código de Processo Civil.

65 Cf. art. 179 do Código Penal.

66 Em sentido conforme, na doutrina: “2. Fraude de execução. Pode ser alegada e proclamada nos embargos de terceiro, porque se caracteriza como ato atentatório à dignidade da justiça. É ineficaz relativamente ao processo fraudado, prescindin-do de ação para ser reconhecida. Deve ser declarara exofficio pelo juiz e pode ser alegada por petição simples. Afortiori, na contestação dos embargos de terceiro, pode-se pedir sua improcedência, tendo em vista o ato ter sido praticado em fraude de execução (CPC 593)” (Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery, CódigodeProcessoCivilcomentado, 4. ed., 1999, p. 1357, nota 2 ao art. 1.053).

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de contestação aos embargos de terceiro. A Colenda Primeira Câmara Civil67 do antigo Tribunal de Alçada de Minas Gerais chegou até mesmo a aprovar orientação jurisprudencial em favor da possibilidade da vei-culação de fraude contra credores em sede de embargos de terceiro, como revela o teor do Verbete n. 10: “A fraude contra credores pode ser apre-ciada em embargos de terceiro, desde que todos os interessados partici-pem ou tenham sido convocados ao processo”68. Hoje, entretanto, não há mais lugar para dúvida, em virtude da aprovação do Enunciado 195 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça, inverbis: “Em embargos de terceiro não se anula ato jurídico, por fraude contra credores”69.

Com efeito, não há lugar para veiculação de fraude contra credores em embargos de terceiro, porquanto a discussão é incompatível com a celeridade procedimental dos embargos, tendo em vista a aplicação subsidiária do procedimento cautelar, em razão da combinação dos arts. 803 e 1.053 do Código de Processo Civil.

Na verdade, a discussão acerca da fraude contra credores depende de demanda específica a ser movida pelo credor acionado por meio dos embargos de terceiro, tendo como réus o devedor e o terceiro beneficia-do. Em suma, é imprescindível a propositura de “ação pauliana”70.

Sob ambos os prismas, não há lugar para veiculação de fraude contra credores em embargos de terceiro71.

67 Por oportuno, vale lembrar que eminentes processualistas integravam a Primei-ra Câmara Civil do antigo Tribunal de Alçada de Minas Gerais, na composição de 1982, como os então Juízes Sálvio de Figueiredo Teixeira e Walter Veado, ambos Professores de Direito Processual Civil da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais.

68 Cf. Minas Gerais, Parte II, DiáriodoJudiciário, 26-2-1982, p. 1.

69 De acordo, na jurisprudência: “Direito civil e processual civil. Recurso especial. Embargos de terceiro à execução. Fraude contra credores. Embargos de declaração. Dissídio. Súmula 195/STJ. – Não é possível a apuração e o reconhecimento de fraude contra credores no âmbito dos embargos de terceiro à execução, notada-mente porquanto existente ação própria para tanto. Recurso especial provido” (3ª Turma do STJ, REsp 841.361/PA, DiáriodaJustiça, 23-4-2007, p. 267).

70 Assim, na doutrina: Cândido Rangel Dinamarco, Fraude contra credores alegada nos embargos de terceiro, RJTJESP, v. 97, p. 30; e Hamilton de Moraes e Barros, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. IX, 2. ed., 1988, n. 190, p. 376-377.

71 Assim, na doutrina: “Por isso, ao defender-se na ação de embargos de terceiro, não pode o embargado postular a anulação do ato jurídico, arguindo que foi praticado em fraude a credores. Não contemplam, assim, os embargos de terceiros

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24. Impugnação ao valor da causaComo noticiado no anterior tópico 12 do presente capítulo, a peti-

ção inicial dos embargos de terceiro deve conter a indicação do valor da causa, à vista dos arts. 258 e 282, V, ambos do Código de Processo Civil.

Quanto ao critério de fixação, o valor da causa dos embargos de terceiro deve ser atrelado ao valor do bem objeto da apreensão indevida, mas não pode ser superior ao valor da dívida cobrada no processo ori-ginário no qual houve a constrição judicial72.

a defesa fundada em fraude a credores” (Hamilton de Moraes e Barros, Comentá-riosaoCódigodeProcessoCivil, v. IX, 2. ed., n. 190, p. 376 e 377). No mesmo sentido, ainda na doutrina: Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery, CódigodeProcessoCivilcomentado, 4. ed., 1999, p. 1357, nota 3 ao art. 1.053. De acordo, na jurisprudência: “CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. FRAUDE CONTRA CREDORES. EMBARGOS DE TERCEIROS. AÇÃO PAULIANA. O meio processual adequado para se obter a anulação de ato jurídico por fraude a credores não é a resposta a embargos de terceiro, mas a ação pauliana. Abono da melhor doutrina e prece-dente do STJ (3ª Turma)” (3ª Turma do STJ, REsp 27.903/RJ, DiáriodaJustiça, 22-3-1993). Ainda a respeito do tema, merece ser conferido trecho de didático voto proferido pelo Ministro Eduardo Ribeiro: “O objeto dos embargos é limitado. Destina-se, apenas, a desfazer o ato de constrição judicial. O embargado, defen-dendo-se, não amplia o objeto do processo, embora possa alargar o número de questões a serem decididas pelo juiz. Assim, não haverá espaço para que se pro-fira sentença, anulando ato que, aliás, não interessa apenas ao embargante, mas também ao terceiro, adquirente do bem. Seria indispensável o litisconsórcio, invi-ável nas circunstâncias” (3ª Turma do STJ, REsp 13.322/RJ). Assim também se manifestou o Ministro Moreira Alves: “Para decretá-la, é mister a utilização da ação pauliana, em que é autor o credor prejudicado pela fraude, e réus, em litis-consórcio passivo necessário, os participantes do negócio jurídico a ser descons-tituído (em regra, o devedor insolvente e o terceiro beneficiado), se a ação for julgada procedente. Que há litisconsórcio passivo necessário é indubitável em face do atual direito processual civil brasileiro, uma vez que, como é evidente, não se pode desconstituir um negócio jurídico bilateral, sem a participação de todos aqueles que o celebraram” (voto-vista no ERE 90.934/RJ, RTJ 100, p. 735).

72 De acordo, na jurisprudência: “PROCESSUAL CIVIL – RECURSO ESPECIAL – EMBARGOS DE TERCEIRO – VALOR DA CAUSA – CORRESPONDÊNCIA DO VALOR DO BEM SOB CONSTRIÇÃO – IMPOSSIBILIDADE DE ULTRAPASSAR O VALOR DA DÍVIDA – SÚMULA 83/STJ. 1 – Nos embargos de terceiro, o valor da causa deve corresponder ao do bem objeto da constrição, não podendo, entre-tanto, exceder o valor do débito” (4ª Turma do STJ, REsp 787.674/PA, DiáriodaJustiça, 12-3-2007, p. 245). “PROCESSUAL CIVIL – EMBARGOS DE TERCEIRO – VALOR DA CAUSA – CORRESPONDÊNCIA DO VALOR DO BEM SOB CONS-TRIÇÃO. Nos embargos de terceiro, o valor da causa deve corresponder ao do

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Atribuído o valor da causa fora dos parâmetros apontados, há lugar para impugnação pelo embargado, com fundamento no art. 261 do Có-digo de Processo Civil, no mesmo prazo da contestação aos embargos: dez dias.

25. Reconvenção e ação declaratória incidentalNão há lugar para reconvenção73 nem para ação declaratória inci-

dental em embargos de terceiro, tendo em vista o procedimento especial célere previsto para os embargos.

Sem dúvida, o art. 1.053 do Código de Processo Civil revela a ma-nifesta inadmissibilidade de reconvenção e de ação declaratória inciden-tal em sede de embargos de terceiro, porquanto aquelas demandas pressupõem a adoção do procedimento ordinário, enquanto os embargos de terceiro seguem procedimento especial marcado pela celeridade, tendo em vista a combinação daquele preceito com o art. 803 do Código de Processo Civil.

26. Exceções rituaisNo que tange às exceções rituais, são admissíveis as exceções de

suspeição e de impedimento do juiz do processo dos embargos de tercei-ro. Não é admissível, entretanto, exceção de incompetência, a qual só tem lugar diante de incompetência relativa, incompatível com os embargos de terceiro, cuja competência é funcional e, por consequência, absoluta.

27. Procedimento finalApós a citação e o decurso do prazo de contestação, os embargos

de terceiro seguem o célere procedimento padrão do processo cautelar,

bem objeto da constrição, não podendo exceder o valor do débito. Precedentes jurisprudenciais” (1ª Turma do STJ, REsp 323.384/MG, DiáriodaJustiça, 27-8-2001, p. 238).

73 A respeito do tema, merece ser prestigiada a seguinte conclusão do Ministro Moreira Alves: “E, em embargos de terceiro, não é admissível, dada a diversidade de ritos, reconvenção” (ERE 90.934/RJ, RTJ 100, p. 738). No mesmo sentido, na doutrina: Hamilton de Moraes e Barros, ComentáriosaoCódigodeProcessoCivil, v. IX, 2. ed., n. 190, p. 376-377; Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery, CódigodeProcessoCivilcomentado, 4. ed., 1999, p. 1357, nota 4 ao art. 1.053.

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exvi da combinação do art. 1.053 com o art. 803, ambos do Código de Processo Civil.

Não contestados os embargos de terceiro, os fatos alegados pelo embargante podem ser considerados verdadeiros, por força de ficção legal. À vista da presunção relativa consagrada no art. 319, o juiz profe-re sentença desde logo.

Em contraposição, se o embargado contestar os embargos de ter-ceiro dentro do prazo do art. 1.048, o juiz, sem abrir vista para réplica, designa audiência de instrução e julgamento, se necessária para a colhei-ta de provas adicionais. Em seguida, profere sentença, tudo nos termos do art. 803 do Código de Processo Civil.

28. Sentença e ônus da sucumbênciaFindo o processamento, os embargos de terceiro são julgados me-

diante sentença, cuja natureza é controvertida na doutrina. A sentença de procedência em embargos de terceiro repressivos tem natureza cons-titutiva (negativa74), porquanto desfaz, desconstitui o ato judicial de apreensão indevida do bem do terceiro. Já a sentença de procedência em embargos de terceiros preventivos tem natureza condenatória, porquan-to impõe obrigação de não fazer.

Resta estudar o problema dos honorários advocatícios nos embar-gos de terceiro. Em homenagem ao princípio da causalidade, o Superior Tribunal de Justiça aprovou o Enunciado 303, inverbis: “Em embargos de terceiro, quem deu causa à constrição indevida deve arcar com os honorários advocatícios”. Daí a possibilidade de o embargante vencedor ser condenado a pagar os honorários advocatícios75.

74 De acordo, na doutrina: Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery, CódigodeProcessoCivilcomentado, 4. ed., 1999, p. 1347, nota 1 ao art. 1.046.

75 Cf. 1ª Turma do STJ, REsp 641.478/RS, DiáriodaJustiça, 16-4-2007, p. 168: “Em se tratando de embargos de terceiro, deve o magistrado, na condenação dos ônus sucumbenciais, atentar-se aos princípios da sucumbência e da causalidade, pois há casos em que o embargante, embora vencedor na ação, é o responsável por seu ajuizamento, devendo sobre ele recair as despesas do processo e os honorários advocatícios. A respeito do tema, a Corte Especial editou a Súmula 303/STJ, con-signando que ‘em embargos de terceiro, quem deu causa à constrição indevida deve arcar com os honorários advocatícios’. (...) Honorários. Hipótese em que, diante das peculiaridades do caso concreto e pela aplicação do princípio da cau-salidade, deverá o próprio embargante arcar com os honorários de seu advogado”

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29. Apelação e efeitosA sentença em embargos de terceiro desafia recurso de apelação,

no prazo de quinze dias, à vista dos arts. 508 e 513 do Código de Proces-so Civil.

O recurso apelatório produz tanto efeito devolutivo quanto efeito suspensivo, porquanto incide a regra do caputdo art. 520, e não a exceção do inciso V, restrita aos embargos à execução. Daí a conclusão: a apelação proveniente de embargos de terceiro tem efeitos devolutivo e suspensi-vo76. Por conseguinte, se o processo originário foi suspenso quando da

(3ª Turma do STJ, REsp 165.332/SP, DiáriodaJustiça, 21-8-2000, p. 117). “PROCES-SO CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. SUCUMBÊNCIA. PRINCÍPIO DA CAU-SALIDADE. AUSÊNCIA DE CULPA DO CREDOR NA PENHORA. VERBA HONORÁRIA INDEVIDA. PRECEDENTES. DOUTRINA. RECURSO PROVIDO. I – Sem embargo do princípio da sucumbência, adotado pelo Código de Processo Civil vigente, é de atentar-se para outro princípio, o da causalidade, segundo o qual aquele que deu causa à instauração do processo, ou ao incidente processual, deve arcar com os encargos daí decorrentes. II – Tratando-se de embargos de terceiro, imprescindível que se averígue, na fixação dos honorários, quem deu causa à constrição indevida. III – O credor não pode ser responsabilizado pelos ônus sucumbenciais por ter indicado à penhora imóvel registrado no Cartório de Imóveis em nome dos devedores mas prometidos à venda aos terceiros-embar-gantes. A inércia dos embargantes-compradores, em não providenciar o registro do compromisso de compra e venda, deu causa à penhora indevida” (4ª Turma do STJ, REsp 264.930/PR, DiáriodaJustiça, 16-10-2000, p. 319).

76 De acordo, na jurisprudência: “Processo civil. Embargos de terceiro. Efeitos da apelação. A apelação interposta contra sentença proferida em sede de embargos de terceiro deve ser recebida em seu duplo efeito” (3ª Turma do STJ, AG 643.347/SP – AGRG, DiáriodaJustiçaeletrônico,20-11-2008). “Direito Processual Civil. Medida Cautelar. Embargos de Terceiro. Apelação Cível. Efeitos. A apelação cível interposta de sentença que rejeita ou acolhe embargos de terceiro deve ser recebi-da no duplo efeito. Inteligência do art. 520, 1ª parte, do CPC” (2ª Turma Cível do TJDF, MC 2003.00.2.008308-9, DiáriodaJustiça, 14-4-2004, p. 51). “II – O Código de Processo Civil, em seu art. 520, I a VII, estabelece, taxativamente, os casos em que a apelação deverá ser recebida apenas no efeito devolutivo. Nesse rol não constam os embargos de terceiro, caso em que há de se aplicar a regra geral, esculpida no caput do mesmo artigo” (1ª Turma Cível do TJDF, AGI 2005.00.2.003639-7, DiáriodaJustiça, 6-9-2005, p. 96). “1. Embargos de terceiro à execução de mandado pos-sessório não acolhidos. 2. Recurso de apelação a ser recebido em ambos os efeitos” (Câmara Cível do TJDF, MSG 192.289, DiáriodaJustiça, 13-3-1990, p. 1).

Em sentido contrário à opinião defendida no presente compêndio, na doutrina: “O recurso cabível é a apelação, que não tem efeito suspensivo quando os em-bargos opostos pelo terceiro à execução são julgados improcedentes (art. 520, n.

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admissão da petição inicial dos embargos de terceiro77, subsiste a sus-pensão até o julgamento da apelação.

v)” (Humberto Theodoro Júnior, Cursodedireitoprocessualcivil, v. III, 21. ed., 1999, p. 337).

77 Cf. art. 1.052, primeira parte, do Código de Processo Civil.

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Ações PenAis

1. Nomen iurisO Título XI do Decreto-Lei n. 7.661/45 tinha a seguinte denomi-

nação: “DOS CRIMES FALIMENTARES”. A Lei n. 11.101/2005, toda-via, não prestigiou a tradicional expressão. Com efeito, como os arts. 168 e s. versam sobre os crimes cometidos não só no processo fali-mentar, mas também nos processos de recuperação, aquela expressão não parece ser a melhor. Na verdade, o comando e o art. 1º da Lei n. 11.101/2005 sugerem a adoção de nova terminologia, em consonância com o disposto nos arts. 966 e s. do Código Civil de 2002. Daí a expli-cação para a utilização da expressão “crimes empresariais” no pre-sente compêndio1.

2. Incidência subsidiária dos Códigos Penal e deProcesso Penal

No que a Lei n. 11.101/2005 for omissa, há a incidência subsidiária dos Códigos Penal e de Processo Penal, aplicáveis também aos crimes empresariais, conforme revelam os arts. 182, 185 e 188 da Lei n. 11.101/2005.

3. Condição objetiva de punibilidade dos crimes empresariaisExvi do art. 180 da Lei n. 11.101/2005, a existência de provimento

judicial de decretação da falência ou de concessão da recuperação (judi-cial, especial ou extrajudicial) é condição objetiva para a punibilidade dos crimes empresariais.

1 A melhor doutrina (cf. Waldo Fazzio Júnior, Manualdedireitocomercial, 7. ed., 2006, p. 671), entretanto, ainda prestigia a tradicional expressão “crimes falimentares”.

CApíTulO

Xi

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410

4. Fase investigatóriaIntimado da decretação da falência ou da concessão da recuperação,

o Ministério Público tem a oportunidade de verificar a ocorrência de crime empresarial, quando deve requisitar a abertura de inquérito poli-cial ou promover desde logo a ação penal, se desnecessário o inquérito. Com efeito, o art. 187 da Lei n. 11.101/2005 revela que o inquérito policial é facultativo e pode ser requisitado pelo Ministério Público, quando necessário.

Na verdade, em qualquer fase processual da falência ou da recu-peração, se surgir indício da prática de crime empresarial, o juiz da fa-lência ou da recuperação deve intimar o Ministério Público, consoante determinam o art. 187, § 2º, da Lei n. 11.101/2005, e o art. 40 do Código de Processo Penal.

5. Natureza da ação penalA ação penal relativa aos crimes empresariais é pública incondicio-

nada (art. 184, caput), razão pela qual deve ser proposta mediante de-núncia do Ministério Público, independentemente de representação.

6. Prazo para oferecimento da denúnciaO prazo para o oferecimento da denúncia pelo Ministério Público

depende da ocorrência de prisão, ou não. Se o réu estiver preso (p. ex., com fundamento no art. 99, VII), o Ministério Público deve oferecer a denúncia em cinco dias, da data do recebimento do inquérito policial (art. 187, § 1º, da Lei n. 11.101/2005, c/c o art. 46 do Código de Processo Penal). Em contraposição, se o réu estiver solto ou afiançado, o prazo para o oferecimento da denúncia é de quinze dias, da data do recebimen-to do inquérito policial ou, se preferir, da apresentação do relatório do administrador judicial, com exposição circunstanciada (arts. 22, III, e, 186 e 187, § 1º, todos da Lei n. 11.101/2005).

7. Ação penal privada subsidiáriaDecorrido inalbis o prazo legal para oferecimento da denúncia pelo

Ministério Público, há a abertura da ação penal subsidiária em favor do administrador judicial e de todos os credores habilitados no processo falimentar ou recuperativo. Com efeito, trata-se de ação penal privada

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a ser oferecida mediante queixa-crime do administrador judicial ou de qualquer credor habilitado. A queixa-crime deve ser oferecida no prazo de seis meses do término do prazo ministerial, sob pena de decadência (arts. 184, parágrafo único, e 187, § 1º, ambos da Lei n. 11.101/2005 c/c o art. 46 do Código de Processo Penal).

8. Juízo competente: criminalNo que tange ao juízo competente para a ação penal por crime

empresarial, tanto para a ação pública quanto para a ação privada sub-sidiária, a competência é sempre do juízo criminal da mesma comarca na qual a falência foi decretada ou a recuperação foi concedida (art. 183).

9. Indeferimento da denúncia ou da queixaNa eventualidade do não recebimento da denúncia (proveniente

da ação penal pública) ou da queixa-crime (proveniente da ação privada subsidiária) pelo juiz criminal, cabe recurso em sentido estrito (art. 581, I, do Código de Processo Penal), no prazo de cinco dias (art. 586 do Có-digo de Processo Penal), com a possibilidade da apresentação das razões recursais nos dois dias posteriores (art. 588 do Código de Processo Penal).

10. SujeitosQuanto aos sujeitos alcançados pela Lei n. 11.101/2005, além do

empresário individual, os sócios, diretores, gerentes, administradores e conselheiros da sociedade empresária podem ser processados por crimes empresariais. Não é só. O art. 179 estabelece que até mesmo o adminis-trador judicial pode ser processado por crime empresarial. Por fim, os contadores, técnicos contábeis, auditores, outros profissionais e até mes-mo credores que concorrerem para as condutas criminosas também são passíveis de condenação por crime empresarial (arts. 168, § 3º, e 172, parágrafo único).

11. PenasNo que tange às penas, todos os crimes arrolados nos arts. 168 a

178 ensejam a condenação mediante imposição de multa. Em relação à pena restritiva de liberdade, a regra é a reclusão (arts. 168 a 177); só o crime previsto no art. 178 dá lugar à detenção.

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12. PrescriçãoA prescrição dos crimes empresariais segue o disposto no Código

Penal (art. 182 da Lei n. 11.101/2005 c/c os arts. 108 a 110 do Código Penal).

13. Início da contagem da prescriçãoSob a égide do Decreto-Lei n. 7.661/45, o Supremo Tribunal

Federal aprovou o Enunciado 147, em relação ao início da contagem do prazo prescricional: “A prescrição de crime falimentar começa a correr da data em que deveria estar encerrada a falência, ou do trân-sito em julgado da sentença que a encerrar ou que julgar cumprida a concordata”.

Com o advento da Lei n. 11.101/2005, houve a modificação do termo inicial do prazo prescricional dos crimes empresariais. Por força do art. 182, a prescrição dos crimes começa a correr do dia da decretação da falência, da concessão da recuperação judicial ou da homologação do plano de recuperação extrajudicial, conforme o caso. Por conseguinte, o Enunciado 147 da Súmula do Supremo Tribunal Federal está superado, por ser incompatível com a novel Lei n. 11.101/2005.

14. Interrupção da prescriçãoA Lei n. 11.101/2005 indica apenas uma hipótese de interrupção da

prescrição dos crimes empresariais, qual seja a prevista no parágrafo único do art. 182: “A decretação da falência do devedor interrompe a prescrição cuja contagem tenha iniciado com a concessão da recuperação judicial ou com a homologação do plano de recuperação extrajudicial”. No mais, consoante orientação jurisprudencial consolidada no Enuncia-do 592 da Súmula do Supremo Tribunal Federal e no Verbete n. 13 do Grupo de Câmaras Criminais do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, as causas interruptivas da prescrição previstas no Código Penal também incidem em relação aos crimes empresariais.

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