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A alegao que conecta a democracia e a representao que na democracia os governos so representativos porqueso eleitos: se as eleies so concorridas livremente, se a
participao ampla, e se os cidados desfrutam das liber-dades polticas, ento os governos agiro em favor do inte-resse da populao. Em um primeiro ponto de vista domandato , as eleies servem para selecionar boas polticasou polticos que sustentam determinadas polticas. Os par-tidos ou os candidatos fazem propostas polticas durante acampanha e explicam como essas propostas poderiam afe-tar o bem-estar dos cidados, os quais elegem as propostasque querem que sejam implementadas e os polticos quese encarregaro de pratic-las; os governos, efetivamente,realizam-nas. Conseqentemente, as eleies semelhamuma assemblia direta e a plataforma vencedora se torna
ELEIES E REPRESENTAO*
Bernard Manin
Adam PrzeworskiSusan C. Stokes
* O artigo o Captulo I do livro de Adam Przeworski, Susan C. Stokes e BernardManin (eds).1999. Democracy, Accountability and Representation. Cambridge: Cam-bridge University Press. Agradecemos a Adam Przeworski a acolhida favorvel iniciativa de traduzir e publicar este texto e a Cambridge University Press a cessodos direitos para este nmero de Lua Nova. Traduo de Felipe Duch.
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o mandato que os governos perseguem. Em um segundoponto de vista da prestao de contas , as eleies servem
para manter o governo responsvel pelos resultados de suasaes passadas. Por anteciparem o julgamento dos eleitores,os governantes so induzidos a escolher polticas, julgandoque sero bem avaliadas pelos cidados no momento daprxima eleio.
Ambos os pontos de vista so problemticos. Repre-sentao um tema de discusso porque os polticos tmobjetivos, interesses e valores prprios, e eles sabem coisas
e tomam decises que os cidados no conseguem obser-var ou s podem monitorar com certo custo. Mesmo se,uma vez no cargo, os polticos possam no querer fazernada a no ser atuar a servio do interesse pblico, paraserem eleitos eles podem ter que, em primeiro lugar, satis-fazer certos interesses. E uma vez eleitos, podem quererdedicar-se aos seus objetivos pessoais ou a alguns interes-
ses pblicos que diferem daqueles dos cidados. Se elestiverem tais motivaes, eles vo querer fazer outras coisasdistintas de representar a populao. E os eleitores nosabem tudo que precisariam saber, tanto para decidir pros-pectivamente o que os polticos deveriam fazer, quanto parajulgar retrospectivamente se eles fizeram o que deveriam terfeito. Se os eleitores sabem que existem coisas que eles nosabem, eles no querem obrigar os polticos a realizar seus
desejos. Por sua vez, se os cidados no tiverem informaessuficientes para avaliar o governo em exerccio, a ameaade no ser reeleito insuficiente para induzir os governan-tes a agirem de acordo com os interesses dos cidados.
Neste artigo ns analisamos se os eleitores podemreforar a representao, utilizando os seus votos para esco-lher polticos e polticas pblicas, para sancionar o gover-
nante em exerccio, ou para fazer ambos simultaneamente.Depois, discutimos as caractersticas institucionais que tal-vez contribuam para induzir representao.
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A concepo da representao por mandatoNas campanhas eleitorais, os partidos propem polticas e
lanam candidatos. Se os eleitores acreditarem que os pol-ticos no so todos iguais, podem tentar assegurar a repre-sentao, ao usar seus votos para escolher as melhores pol-ticas ou polticos associados a determinadas polticas. Asquestes que precisamos analisar so (1) se as campanhaseleitorais so informativas, isto , se os eleitores podem jus-tificadamente esperar que os partidos faam o que eles pro-pem, e (2) se perseguir a realizao da plataforma vence-
dora, o mandato, ser sempre em favor do bem comumdos eleitores. Poderamos dizer que a representao pormandato ocorre se a resposta de ambas as perguntas forpositiva, isto , se os partidos verdadeiramente informaremos eleitores sobre suas intenes e se a realizao dessasintenes o melhor para os eleitores sobre as circunstn-cias dadas.
A concepo da representao por mandato difundi-da: acadmicos, jornalistas e cidados ordinrios confiamnela como se fosse um axioma. Keeler (1993), por exem-plo, explica as reformas polticas mais importantes intro-duzidas por Reagan, Thatcher, e Miterrand como segue:seus respectivos pases enfrentavam uma crise poltica,eleitores queriam mudanas e expressaram seus desejosnas urnas, e os respectivos governantes as implantaram
em seus mandatos. Esse modelo parece explicar bem aformao da poltica em sociedades industriais avanadas(Klingeman, Hofferbert e Budge, 1994). Como um polti-co francs exps, desde os romanos, existe uma antiga leipoltica que ns nunca devemos perder de vista: governospodem durar apenas pelo princpio pelo qual nasceram(Sguin, 1997).
Um aparato conceitual rudimentar talvez ajude a cla-rear o que est envolvido. Nas eleies, partidos ou candi-datos se apresentam para os eleitores, informam-nos sobre
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1. Os candidatos tambm exaltam suas virtudes. Este um ponto que trataremosadiante.
2. A terminologia de Elster (1994).
suas intenes sobre polticas pblicas1. Especificamen-te, eles dizem aos eleitores quais polticas sero adotadas,
com qual propsito, e com quais conseqncias. Uma vezeleitos, os candidatos vitoriosos escolhem as polticas, nonecessariamente as mesmas que anunciaram. Tendo obser-vado os resultados das polticas adotadas, os eleitores votamnovamente. Para introduzir um exemplo, suponha que hduas plataformas polticas possveis: polticas para a segu-rana econmica (S) e para eficincia (E)2. Os partidos oucandidatos em competio prometem fazer S ou E, e, uma
vez eleitos, buscam realizar S ou E.Os polticos podem se preocupar tanto com as polticas
quanto em serem eleitos e reeleitos. Os polticos tm prefe-rncias sobre polticas pblicas se a recompensa de manter-se no cargo ou a probabilidade de se reeleger depende daspolticas por eles adotadas. Pode-se pensar na recompensade manter-se no cargo em trs formas: os polticos podem
ter polticas favoritas e derivar utilidade de execut-las,podem querer realizar seus interesses pessoais, ou podemobter satisfao da honra de estar no cargo. Os polticostm algumas crenas sobre as promessas que mais provavel-mente os fazem vencer, assim como sobre as polticas que oseleitores iro de fato apreciar tendo experimentado os seusresultados.
Assim, a questo sobre a representao por mandato
(1) se as polticas dos governantes sero as mesmas desuas plataformas eleitorais, e (2) se seguir esta plataformaser melhor para os eleitores. As condies sob as quais arepresentao por mandato ocorre so de tripla natureza:quando os interesses dos polticos e dos eleitores coinci-dem, quando os polticos esto motivados pelo desejo de
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serem reeleitos e acreditam que os eleitores vo reeleg-losse eles realizarem polticas defendidas durante a campanha,
e quando polticos esto preocupados com a credibilidadede suas futuras promessas. Vamos discutir essas situaes naseqncia.
a) Os interesses dos polticos coincidem com os doscidados3. Eleitores e governantes tm interesses idnticos,se os governantes quiserem por interesse prprio criar osestados de coisas mais desejados pelos eleitores. Se polticose eleitores tambm tm as mesmas crenas sobre os efeitos
dos resultados das polticas (crenas tcnicas nos termosde Austen-Smith, 1990)4, ento os candidatos so eleitoscom base na plataforma de maior preferncia dos eleitorese, como representantes, implementam essa plataforma, poisbeneficiam seus prprios interesses.
Quase todas as discusses sobre representao, a come-ar com as Consideraes sobre um Governo Representativode
John Stuart Mill (1991 [1861]), assumem que a eleio derepresentantes que, de alguma forma, espelham ou repro-duzem a composio do eleitorado, produz representao.Nesse ponto de vista, a assemblia representativa se foruma miniatura do eleitorado, uma amostra dele. A hiptesesubjacente a essa convico que, se a assemblia descri-tivamente representativa, ento atuar para representar osinteresses dos representados. Como conseqncia, as discus-
ses sobre as instituies representativas centram-se quase
3. Obviamente, a questo que surge com tal formulao : Quais eleitores? Nsassumimos neste texto que, qualquer que seja a dimenso do espao temtico,existe um equilbrio da regra da maioria, portanto existe o voto decisivo. Sobreas complicaes que surgem quando essa suposio no se cumpre, ver Ferejohn(1986, 1995).
4. Em sua forma pura, a teoria espacial do voto logicamente incompleta: os elei-
tores s se preocupam com os resultados, mas elegem com base nas polticas. Oque obviamente falta so crenas tcnicas, como j definido anteriormente. Noteque se os candidatos e eleitores tiverem interesses idnticos, mas crenas tcnicasdiferentes, eles tero diferentes preferncias sobre as polticas.
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exclusivamente sobre o sistema eleitoral (por exemplo, vejaRogowski, 1981). A contribuio seminal de Pitkin (1967),
ainda hoje indevidamente ignorada, foi precisamente pro-blematizar essa conexo: ser que a proporo a melhorforma de garantir a representao? Se cada representantedefender opinies e promover os interesses do seu redu-to eleitoral, ser promovido o interesse comum da coletivi-dade5? E, o que acontece se os representantes se tornaremdiferentes de seus eleitorados pelo simples fato de seremrepresentantes? E se, uma vez eleitos, perceberem que os
eleitores no tm interesses prprios?b) Os polticos querem ser eleitos e reeleitos6. E espe-
ram que os eleitores vo reeleg-los se eles perseguirem aspropostas polticas apresentadas em suas campanhas eleito-rais. Se os polticos que procuram vencer as eleies soubes-sem a preferncia dos eleitores decisivos, eles apresentariamuma plataforma que coincidisse com essas preferncias. Se
eles esperam que as preferncias dos eleitores no mudem,ou que, elas sero confirmadas pela observao dos resul-tados implementados durante o mandato (Harrington,1993a), ento os representantes seguem as polticas anun-ciadas procurando a reeleio. E se os eleitores souberemo que bom para eles, o resultado melhor para eles, demodo que a ameaa dos eleitores de punir desvios do man-dato plausvel.
c) Os polticos esto interessados em fazer que suas pro-messas tenham credibilidade no futuro. Mesmo se os elei-tores acreditarem que um desvio do mandato tenha sidobenfico, eles descontaro promessas futuras dos polticos
5. Uma dificuldade com esta viso, manifestada em Mill, que enquanto a assem-blia pode refletir os interesses proporcionalmente, muitas decises vinculadas ao
governo no permitem distribuies proporcionais.6. Isto verdadeiro, independente de se os polticos tambm tiverem outros inte-resses, desde que o maior valor seja a manuteno do cargo per se.
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que adquiriram uma reputao de renegar suas promes-sas de campanha. Portanto, os eleitores podem ameaar
os representantes de votar contra eles se trarem suas pro-messas, independentemente dos resultados. Essa ameaa implementada pelo partido rival no modelo de Alesina(1988), no qual os eleitores no tm comportamento estra-tgico. Por sua vez, so os eleitores que executam a ameaano modelo de Bank (1990), no qual a credibilidade dessaameaa suposta em vez de derivada7. Conseqentemente,no melhor dos casos, esta uma estria incompleta. Retor-
naremos a esse assunto mais adiante.Observe-se que a representao por mandato uma
situao em que as polticas adotadas pelos representan-tes seguem suas plataformas eleitorais eessas polticas soas melhores para os cidados sob as condies observadaspelos representantes. As trs possibilidades distinguidasanteriormente levam concluso de que a representao
por mandato ocorre quando as vontades dos polticos edos eleitores coincidem, ou quando os polticos se preo-cupam apenas em vencer a eleio. Para vencer eles preci-sam prometer e implementar as propostas polticas que somelhores para o pblico. Mas, fora essa feliz coincidncia,os polticos podem ter incentivos para se desviar das pro-postas de campanha, e isto em favor do que melhor parao pblico, ou, seguir essas propostas mesmo com custos
para o eleitorado.Para clarear as debilidades do mecanismo de mandato,
suponha-se que os polticos no possam ser reeleitos, nem
7. Bank justifica esta suposio referindo-se ao modelo de multiperodo de Austen-Smith e Banks (1989), no qual a ameaa de punir desvios certamente coerente.Mas, no modelo de Austen-Smith e Banks, os governantes nunca cumprem total-mente suas promessas: quando os eleitores tm pouca expectativa dos governan-tes, os partidos sempre prometem mais do que podem fazer, mesmo que faamprimeiramente o melhor; entretanto, quando os eleitores esperam muito, as plata-formas e as chances de reeleio so independentes do que os eleitores querem.
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mesmo uma vez8. Os eleitores sabem que, uma vez eleito, orepresentante far qualquer coisa que deseje. Sem a puni-
o de votar novamente, os eleitores precisam adivinharquais partidos ou candidatos concorrentes tm prefernciasde polticas que coincidem com as deles e quais so impene-trveis corrupo dominante no cargo. A menos que, noquadro de candidatos, existam tais polticos e que os elei-tores adivinhem corretamente quem eles so, os candida-tos vitoriosos no atuaro de maneira representativa. Se ospolticos tiverem preferncias por polticas distintas daque-
las dos eleitores decisivos, eles iro se afastar das polticasanunciadas; se eles perseguirem benefcios prprios, tiraroproveito ou rendas do cargo.
Alm disso, para serem eleitos, os polticos podem terque fazer promessas a interesses especficos. Suponha-se, noesprito da Escola de Regulao de Chicago (Stigler, 1975;Peltzman, 1976; Becker, 1958 e 1983) que (1) os eleitores
so ignorantes, racionais ou no, sobre o impacto das pro-postas polticas para seu bem-estar, e que (2) para se apre-sentarem aos eleitores, os polticos precisam utilizar recur-sos, incluindo mas no apenas dinheiro. Os polticos sepreocupam apenas em ganhar eleies, mas, para vencer,necessitam arrecadar recursos. Devido ao fato de os elei-tores no se importarem com propostas polticas que tmapenas um impacto pequeno em seu bem-estar, os polticos
podem vender aos grupos de interesse polticas que infli-
8. De fato, suficiente ser conhecido e finito o nmero de eleies que o polticopode concorrer. Suponhamos que o poltico no poder concorrer depois de umdeterminado perodo no cargo. Ento, durante a sua ltima eleio, os eleitoressabero que no prximo perodo no cargo, o poltico no ter nenhum incentivopara tentar a reeleio e os eleitores votaro contra ele. Logo, se o poltico noser reeleito na prxima eleio, ele no ter incentivos para se comportar bem
durante o atual mandato..., e assim por diante. A menos que os polticos se preo-cupem com a aprovao dos eleitores quando exercerem o cargo pela ltima vez,os limites da durao do cargo privam os eleitores de criar incentivos para que ospolticos os representem.
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gem um custo pequeno para cada eleitor mas com bene-fcios concentrados nesses grupos de interesse , e gastar
nas eleies os recursos arrecadados nessa troca. Posto queas polticas que arrecadam recursos de grupos especficosde interesse so custosas para os eleitores, os polticos esco-lhem polticas que os deixam indiferentes sobre a margementre aumentar o prprio bem-estar dos eleitores e as des-pesas de campanha. Assim, o bem-estar dos eleitores no maximizado.
O fato que para existirem e se apresentarem aos
eleitores, os partidos polticos precisam arrecadar fundos.Quando esses fundos vm de interesses particulares, so tro-cas de favores. Presumidamente, se Philip Morris Co. Inc.contribuiu em 1996 com mais de US$ 2,5 milhes para oComit Nacional Republicano (New York Times, 28 de janei-ro de 1997, p. 3), deve ter esperado pelo menos US$ 2,5milhes em favores; de outra forma, seus dirigentes pode-
riam ter sido despedidos pelos acionistas. Os intercmbiosde contribuies polticas por favores de polticas geramdistores atravs de seus efeitos na distribuio de recur-sos. O custo social de tais distores provavelmente muitomaior do que aquele do roubo aberto, que causa distoresapenas atravs de seus efeitos sobre os impostos.
Porm, as situaes em que ou o poltico se desvia desuas promessas em prol do interesse dos eleitores, ou man-
tm-nas contra o interesse de uma maioria, so possveismesmo se os representantes enfrentam eleies repetidas emesmo se as campanhas eleitorais forem baratas (ou susten-tadas com financiamento pblico).
a) As condies podem mudar de tal forma que aimplantao do mandato no mais o melhor para os elei-tores. Suponha-se que um governo que esteja iniciando o
mandato, ao vencer as eleies com uma campanha sobreuma proposta poltica S, imediatamente aps assumir ocargo, aprende algo que nem ele e nem os eleitores sabiam
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na poca de eleio: o governo anterior, competindo para areeleio, escondeu a triste situao do tesouro, e os ganha-
dores da eleio descobrem, ao assumirem o cargo, que oscofres esto vazios. Digamos que S a melhor poltica quan-do as condies so boas, enquanto E melhor quando ascondies so ruins. Ento, o governo se depara com a opode se desviar do mandato para o bem dos eleitores ou ade-rir s propostas apesar de as circunstncias terem mudado.Por sua vez, os eleitores, que teriam concordado em mudara poltica, se tivessem observado o que o governante obser-
vou, precisam decidir se acreditam na mensagem do gover-no que parecer auto-interessada sem ter acesso direto informao. E podem se equivocar em uma outra direo.Portanto, os representantes se desviaro uma parte do tempoe os eleitores puniro alguns desses desvios bons ou ruins.
Perceba-se que mesmo as mudanas de condies queso endgenas poltica do governo, mas que no foram
previstas pelos polticos antes de chegar ao cargo, podemser razes para mudar o rumo poltico em prol do bem-estar dos cidados; a mudana, em 1983, do governo socia-lista francs pode ilustrar esse ponto.
b) Para ser eleito, um candidato deve oferecer a plata-forma preferida pelo eleitor decisivo. Suponha-se que umcandidato acredita que o eleitor decisivo tem crenas incor-retas sobre os resultados de certas polticas. Esse candida-
to enfrenta a escolha de apresentar a plataforma que eleacredita ser a melhor para os eleitores e sofrer uma derrota(entretanto, espera vencer a prxima disputa, se o compe-tidor implementar polticas menos efetivas), ou propor oque os eleitores querem e ter pelo menos 50 por cento dechances de vencer (se o outro adversrio apresentar a mes-ma plataforma). Se o representante acredita que a poltica
menos popular suficientemente mais efetiva do que a pre-ferida pelos eleitores, ele ou ela antecipa que, tendo obser-vado esses efeitos, os eleitores vo ser persuadidos de que
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a poltica correta foi a escolhida e votaro para reeleg-lo.Assim, esse poltico poder continuar uma poltica que de
fato melhor para os cidados. necessrio distinguir outras duas situaes. Na pri-meira (Harrington, 1993a, seo 4), os dois candidatos tmas mesmas crenas sobre as preferncias do eleitor decisivo,mas diferentes crenas sobre a efetividade das polticas, oque significa que um deles acha o eleitor decisivo errado.Ento, eles oferecem a mesma plataforma em suas campa-nhas eleitorais, mas, uma vez eleitos, podem seguir diferen-
tes polticas. Se o vencedor o candidato que acredita que apoltica preferida pelo eleitor decisivo significantementeinferior a uma alternativa, o representante adota a polti-ca preferida por ele, acreditando que os eleitores se con-vencero de sua superioridade, uma vez que os resultadossejam concretizados. Em tais situaes, ns observaremoscandidatos que apresentam a mesma plataforma e, depois,
desviam-se de seu mandato.Na segunda situao, os dois candidatos tm as mes-mas crenas sobre a efetividade das propostas polticas,mas diferem em suas crenas quanto preferncia do elei-tor decisivo. Se eleitos, eles buscaro realizar as mesmaspolticas, mas para serem eleitos vo apresentar diferentesplataformas. Se o vencedor o candidato que acredita queos eleitores estavam errados, uma vez eleito como repre-
sentante altera a poltica. Em tais situaes, ns observa-remos que os candidatos oferecem diferentes plataformase depois seguem a mesma poltica independentemente dequem foi eleito.
Repare-se que, em ambas as situaes, os candidatostm a possibilidade de se desviar de suas plataformas quan-do eleitos, mas eles o fazem acreditando que esto agindo
pelo bem do eleitorado.c) Suponha-se que tudo se mantm conforme acabamosde descrever, mas que o representante no acredita que os
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eleitores se convencero da efetividade da melhor poltica;ora porque os eleitores esto certos de quais polticas so
melhores para eles, ora porque a escolha de polticas nofaz grande diferena. Como Harrington (1993a) demons-tra, se os eleitores inicialmente acreditam que uma poltica melhor do que outra, ser mais difcil que se convenamex post da superioridade da alternativa9. Temendo que, sepropuser uma plataforma e seguir outra, ele no ser ree-leito, o representante oferece a proposta inferior, preferidapelos eleitores, e a implementa, contra o que ele considera-
va ser melhor para os interesses dos cidados. O mandatoser implementado, mas os polticos no atuaro de formarepresentativa.
Em resumo, sob certas condies, os representantespodem ora executar polticas que melhoram o bem-estardos eleitores por meio de desvios do mandato, ora ser obe-dientes ao mandato, mesmo se acreditarem que sua imple-
mentao no ser melhor para os eleitores. Se a imple-mentao do mandato no o melhor que o governantepode fazer, ento difcil acreditar na ameaa de puniopara quem se desvia do mandato. Os eleitores podem nogostar de governantes que traem suas promessas, mas nopuniro os polticos que beneficiam os eleitores mediantedesvios do mandato.
Essa impunidade atenuada por consideraes de
reputao (Downs, 1957; Ferejohn, 1995). Os polticos tal-vez se preocupem com o comprometimento a promessascomo um investimento em suas credibilidades. Certamen-
9. A intuio a seguinte. Supondo que inicialmente os eleitores crem que a po-ltica S a melhor para eles do que a E por certa quantidade e. Se eles observaremque um resultado de implementao E melhor do que S por uma certa quanti-
dade e, sua crena posterior ser que E produz resultados num nvel entre suasexpectativas iniciais a suas observaes, que continuar estando abaixo de S. Paraser persuadido que E melhor do que S, o resultado de E ter que ser melhor doque o anterior de S por uma quantidade maior que e.
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te, sabido que o governo polaco foi forado a recordar-se das promessas de 1993 e a fazer algumas concesses aos
eleitores, sob a pena de perder sua credibilidade (Krauze,1994). Se os representantes anteciparem que os eleitoresno observaro apenas suas polticas passadas, mas tambmprestaro ateno nas novas promessas, isto , se seu desem-penho passado no cargo no completamente informativo,eles precisam se preocupar em que se acredite neles, o que,por sua vez, modera suas tentaes de se desviar de anti-gas promessas. Um poltico que executa uma manobra ter
que descansar somente em seu desempenho passado quan-do for buscar a reeleio, enquanto que um poltico que semantm fiel a suas promessas ter maiores possibilidades deo eleitor acreditar nele. Por sua vez, os eleitores poderiampunir os polticos que renegam suas promessas como uminvestimento em informao. Depois de tudo, os eleitoresquerem que suas escolhas tenham conseqncias; portanto,
eles desejam ser vivel prever o comportamento dos polti-cos com base em suas plataformas polticas, retricas e iden-tidades. Os polticos podem argumentar que circunstnciasimprevisveis so razes para eles se desviarem do mandato,mas tm que dar alguma explicao para faz-lo. Isto evi-dncia prima facieque eles pensam que se espera que sigamo mandato.
Enquanto esses mecanismos de reputao podem enco-
rajar os representantes a obedecerem s promessas eleito-rais, uma caracterstica surpreendente das instituies demo-crticas, destacada por Manin (1997), que em nenhumsistema democrtico os polticos so legalmente obrigadosa manter suas plataformas. Em nenhuma democracia exis-tente os representantes so obrigados a seguir instrues.As aes judiciais dos cidados contra os governantes que
traem promessas especificas de campanha tm sido rejei-tadas pelos tribunais em vrios pases, mais recentementena Polnia. Nenhuma constituio democrtica em mbi-
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to nacional permite a revogao, e, exceto na Cmara deRepresentantes dos Estados Unidos, os perodos eleitorais
tendem a ser longos em mdia, 3,7 anos para legisladorese 3,9 anos para presidentes (Cheibud e Przeworski, 1999).Enquanto disposies para impeachment e procedimentospara retirar a confiana dos representantes so comuns,eles nunca so voltados a punir a traio de promessas10.Referendos nacionais com efeitos vinculantes e fundamen-tados em iniciativas populares apenas existem na Sua, e,sob formas mais restritas, na Itlia e na Argentina. Nesse
sentido, uma vez que os cidados elegem os representantes,no h dispositivos institucionais que os forcem a cumprirsuas promessas. Os eleitores podem sancionar desvios dosmandatos apenas depois de experimentarem seus efeitos.
Por que, ento, no h mecanismos institucionais paraforar os polticos empossados a serem fiis a suas platafor-mas? Historicamente, o principal argumento era que deve-
ria se permitir aos legisladores deliberar. As pessoas queremque seus representantes aprendam um com o outro. Almdisso, quando as pessoas esto inseguras sobre seus julga-mentos, podem querer que os representantes consultemperitos.
Outro argumento histrico era que os eleitores podemdesconfiar de seus prprios julgamentos. As pessoas podemno apenas estar com medo de suas prprias paixes, mas
se so racionalmente ignorantes, devem reconhecer queno sabem. Presumivelmente, as eleies estabelecem umcalendrio para um acerto de contas; portanto, os cidadospodem querer dar aos governantes alguma liberdade para
10. Ocasionalmente, um desvio do mandato provoca parte de um mpeto para oimpeachment, mesmo quando o desvio no uma justificativa formal. Dois recentespresidentes que abandonaram suas promessas de campanhas, na Venezuela e noEquador, sofreram um impeachment, mesmo sem tempo para que os resultados seconcretizassem.
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governar e avaliar as aes dos lderes nas pocas de elei-es. OFlaherty (1990) argumenta que essa a razo para
eleger polticos por um tempo determinado; dessa maneira,os cidados podem se proteger contra preferncias incon-sistentes no tempo e, no entanto, exercer o controle a pos-teriori(ex post).
Finalmente, as instituies devem permitir lidar commudanas de condies. Nenhuma plataforma eleitoralpode especificar a priorio que o governo deveria fazer emcada estado contingente de coisas; os governos precisam
ter alguma flexibilidade para enfrentar mudanas circuns-tanciais. Se os cidados esperam que as condies devemmudar e os governos so representativos, no vo amarraros governos a suas instrues11.
Portanto, existem boas razes para as instituiesdemocrticas no ter mecanismos para obrigar a obedin-cia ao mandato. Ns escolhemos polticas que representam
nossos interesses ou candidatos que nos representam comopessoas, mas queremos que os governantes sejam capazesde governar. Em conseqncia, embora preferssemos queos governantes se mantivessem presos s suas promessas,a democracia no contm mecanismos institucionais paraassegurar que nossas escolhas sejam respeitadas.
A concepo de representao por prestao de contas
Mesmo se os cidados so incapazes de controlar os gover-nos obrigando-os a seguirem mandatos, os cidados quiconsigam faz-lo, se puderem induzir os representantes aantecipar que eles tero que prestar contas por suas aesanteriores. Os governantes so controlveis mediante pres-
11. Minford (1995: 105) observa no contexto da poltica monetria que se oseleitores tm pouca informao, devem preferir deixar o governo ter completadiscrio, independentemente da falta de credibilidade, no lugar de t-lo em suasmos.
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tao de contas, caso os eleitores possam discernir se osgovernantes esto agindo em prol de seus interesses e caso
possam sancion-los apropriadamente, de tal forma queaqueles representantes que agirem em benefcio do inte-resse dos cidados vencero a reeleio e aqueles que no ofizerem, perdero. Representao por prestao de contasocorre quando (i) os eleitores votam para reterem os repre-sentantes somente quando eles agem em favor do interessedos primeiros, e (ii) o representante escolhe polticas neces-srias para ser reeleito.
Para entender porque surge o problema da prestaode contas, devemos considerar novamente os objetivos dospolticos. Eles podem no querer fazer nada que os cida-dos bem informados no teriam gostado que fizessem; tal-vez tenham esprito pblico para se dedicarem totalmente apromover o interesse comum. Eles tambm podem querer,todavia, algumas coisas diferentes e com custos para os cida-
dos, ora apenas algumas metas que os cidados no com-partilham, ora a reeleio ou ganhos particulares. Os pol-ticos podem querer promover suas prprias idias, mesmose forem distintas da vontade dos cidados12. Alguns podemse importar mais em crescer na carreira contra outros pol-ticos, dentro do governo ou do mesmo partido. Outrospodem buscar destaque (Niskanen, 1971). H aqueles quepodem querer enriquecer-se s custas dos cidados, seja
enquanto esto no cargo ou aps deix-los. Enfim, algunspodem estar mais preocupados em obter o reconhecimentodos estrangeiros. Em todos esses casos, os polticos vo que-rer alguma coisa cuja busca danosa para os cidados. Porfalta de um termo melhor e para manter uma terminologiaregular, ns vamos nos referir a essas coisas como rendas.
12. Suponha-se que em um pas pobre, as pessoas querem consumir imediatamen-te enquanto os polticos benevolentes querem desenvolver o pas incrementandoos investimentos.
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Para introduzir outro termo comum na literatura, hdiferentes caminhos em que os polticos podem se esqui-
var da suas responsabilidades(shirk), isto , fazer coisas queos cidados no queriam que eles fizessem. Eles se esquivamse passarem o tempo conspirando contra seus rivais, se agi-rem para incrementar sua prpria riqueza, se estenderemfavores clientelistas para seus familiares e amigos; entretan-to, o meio mais importante em que eles podem agir contraos interesses de seus eleitores escolher polticas que bene-ficiam seus interesses particulares ou os interesses de algum
grupo especifico, ao qual devem favores.Os cidados enfrentam o problema de estabelecer uma
troca com os polticos entre extrair rendas e perder o cargoou no extrair rendas e manter-se no cargo que poderiainduzi-los a manter comportamentos rentistas baixos, enten-dendo que manter rendas baixas significaria fazer o que oseleitores querem. A viso padro de como funciona o meca-
nismo de prestao de contas baseia-se no voto retrospecti-vo. Nesse enfoque, os cidados estabelecem algum parme-tro de desempenho para avaliar os governantes: meu salriodeve subir pelo menos quatro por cento durante o perodo,as ruas precisam ser seguras, ou at mesmo a seleo nacio-nal precisa classificar-se para a Copa do Mundo. Os cidadosvotam contra os representantes a menos que satisfaam essescritrios. Por sua vez, o governo, esperando ser reeleito e
antecipando a regra de deciso dos eleitores, far o que forpossvel para satisfazer tais critrios.
Imagine que as condies sob as quais o governantetoma decises podem ser boas ou ruins. Os polticosdecidem implementar a poltica S, que melhor para oscidados quando as condies so boas, ou a poltica E, que melhor quando as condies so ruins. Suponha-se que
a renda obtida pelos representantes quando fazem tudoo que podem para o pblico consiste apenas em seus sal-rios e os benefcios legalmente autorizados, e suponha que
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os representantes querem ser reeleitos. Suponha-se aindaque o eleitorado sabe tudo o que precisa saber e que ele,
para introduzir os representantes a atuar to bem quantopossvel em determinadas circunstncias, estabelece par-metros de desempenho para condies boas ou ms. Nes-se caso, o governo atuar de maneira representativa e oscidados obtero o melhor possvel em ambas as condies.Por outras palavras, a prestao de contas induz represen-tao (Key, 1966). Como Fiorina (1981: 11) se expressou:Dados certos atores polticos que desejam fervorosamente
preservar suas posies e que, cuidadosamente, antecipama reao do pblico em exerccio do cargo como meio paraalcanar um fim, um eleitorado que vota retrospectivamen-te colocar em vigor a prestao de contas, mesmo que sejano sentido ex poste no ex ante.
Porm, suponha-se que os eleitores no sabem quais soas condies. Os polticos conhecem essas condies, mas,
para os eleitores, pode ser invivel observ-las ou talvez pos-sam monitor-las apenas com um certo custo. Tais condiespodem incluir a postura de negociao de governos estran-geiros ou de instituies financeiras internacionais (algo queos cidados no podem observar); ou o nvel de demanda daexportao dos maiores compradores do pas (algo que oseleitores conseguem observar apenas se se tornarem econo-mistas). Ento, os eleitores esto em um dilema: se eles esta-
belecem um parmetro elevado e as condies forem ruins, orepresentante no ser reeleito, faa o que ele fizer, e ele irbuscar rendas excessivas. Por sua vez, se os eleitores estabe-lecem um parmetro baixo, o representante ter condiesde procurar rendas excessivas quando as condies foremboas e, nesse caso, ser reeleito dando menos aos eleitoresdo que poderia ter dado. Seja qual for a deciso dos eleitores,
os polticos algumas vezes vo escapar de seu controle.Um aspecto da informao incompleta merece atenoparticular. Note que os eleitores que atuavam nas pginas
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prvias foram mopes: estavam preocupados apenas emmudanas para o seu bem-estar durante o presente. Mas se
os eleitores forem completamente racionais, tambm deve-riam preocupar-se no valor presente do seu futuro bem-estar, o legado que o representante deixa para o futuro. Sea economia cresce porque o governo corta todas as rvoresdo pas, o eleitor viver de champagne durante o perodo,mas no haver rvores para cortar. Por sua vez, se a econo-mia decresce porque passa por reformas estruturais, os elei-tores sofrero privaes econmicas, mas poderiam ter sido
melhoradas as oportunidades de suas vidas no futuro. Tudoo que os eleitores observam, todavia, a mudana do seubem-estar durante o perodo, e tm que fazer, nesta base,inferncias sobre o futuro. Digamos que os eleitores dogoverno em exerccio observam seu bem-estar atual decair:deveriam eles concluir que o governante est investindo nofuturo ou perseguindo quimeras (neoliberais) por sua con-
ta, ou simplesmente roubando? Conforme Stokes (1996a)demonstra, os eleitores podem adotar uma das trs seguin-tes posturas:
a) Eles podem extrapolar a experincia atual parao futuro. Esta a postura normal, ao menos o que osmodelos do voto retrospectivo normalmente assumem.
b) Eles podem assumir uma postura intertemporal(Przeworski, 1996), e esperando que as piores coisas j pas-
saram, prevem o melhor para o futuro.c) Eles podem assumir uma postura de exonerao,
atribuindo o declnio de seu bem-estar s ms condies,mais do que a qualquer coisa que o governo tenha feito.
difcil falar o que racional para as pessoas sob essascircunstncias. Alguns trabalhos empricos sobre as refor-mas neoliberais nas novas democracias (Przeworski, 1996;
Stokes, 1996b) sugerem que as pessoas esto dispostas aexonerar os governos pela inflao e por tratar os aumen-tos salariais intertemporalmente, como previso da infla-
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o, mas que so avessos ao risco quanto ao desempregoe tornam-se contra os governos que o geram. Contudo, h
outros estudos que concluem que as pessoas so sensveis inflao e relativamente indiferentes ao desemprego (Rose,1997; Weyland, 1996). Em qualquer caso, h pouco em queas pessoas possam basear seus julgamentos.
Os modelos eleitorais de prestao de contas normal-mente assumem que, enquanto os eleitores no conhecemaquilo que precisariam saber para avaliar os governos, osrepresentantes sabem o que precisam fazer para serem ree-
leitos. O artifcio implcito no qual esse modelo se baseia que os eleitores oferecem um contrato ao governo: sevoc nos der pelo menos isso, ns votaremos em voc; casocontrrio, no. Porm, os eleitores no oferecem tais con-tratos. Perceba que ns poderamos depositar no apenascdulas numa urna, mas tambm uma lista com nossas con-dies para reeleger o representante. Contudo, ns no
fazemos isso, e no o fazemos porque queremos que osgovernantes faam tudo o que puderem por ns, mais doque simplesmente satisfazer nossas demandas mnimas. Defato, Manin (1997) mostra que os eleitores podem decidirreeleger o representante sobre qualquer base que desejemlevar em considerao, incluindo a classificao para a Copado Mundo, e podem mudar de idia entre o inicio e o finaldo perodo de governo. Pelo menos nesse sentido, os eleito-
res so soberanos.Assim, surge uma questo sobre como o representante
agir se a informao assimtrica em ambos os sentidos:os eleitores no esto seguros acerca das condies sob asquais se faz a poltica, e os representantes esto incertossobre o que poderia satisfazer o eleitores. Pode ser mostrado(Cheibub e Przeworski, 1999) que, quando os governantes
verdadeiramente se preocupam em ser reeleitos, eles repre-sentaro buscando polticas apropriadas para as condiesobservadas, de tal forma que, para os eleitores, ser melhor
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manter suas expectativas em segredo. Quando, entretanto,os representantes esto menos preocupados em se reeleger
e, por sua vez, os eleitores esperam que as condies sejamboas, o melhor que os eleitores podem fazer formulardemandas pontuais e fazer que os polticos tomem conhe-cimento delas. Finalmente, quando os representantes doainda menos valor para a reeleio e os eleitores esperamque as condies sejam ms, no h nada que os eleitorespossam fazer para evitar que os governantes extraiam ren-das excessivas se as condies forem boas. Portanto, os elei-
tores estaro melhor se puderem, estrategicamente, revelarou no suas demandas; mas, para faz-lo, ainda precisamsaber quanto importa para o representante ser reeleito equal a probabilidade de as condies serem boas.
Em suma, a prestao de contas no suficiente parainduzir a representao quando os eleitores tm informa-es incompletas.
O uso do voto para dois propsitosEm um modelo puro de prestao de contas, os eleitoresutilizam o voto apenas com um propsito: sancionar orepresentante, e toda informao disponvel para os elei-tores revelada pelo desempenho do governante. Em ummodelo de mandato puro, eleitores comparam as promes-sas feitas pelos candidatos sobre o futuro e usam o voto
somente para escolher o melhor candidato. No modelo deDowns (1957; tambm Fiorina, 1981), os eleitores usam asinformaes sobre o desempenho anterior do representan-te e, se disponvel, dos concorrentes, mas isso tambm ummodelo de mandato no sentido de que os eleitores usamas informaes sobre o passado apenas para escolher umgoverno melhor para o futuro. De fato, Sniderman, Glaser
e Griffin (1990) afirmam que a votao retrospectiva puraseria irracional: as pessoas racionais olham para frente. Con-tudo, isso no correto: se os eleitores puderem empregar
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bilidade positiva, o representante optar por um nvel maisalto de rentabilidade. Portanto, as rendas necessrias para
induzir o representante a buscar a reeleio, quando os elei-tores usam o voto como um mecanismo de seleo, so maisaltas do que quando os eleitores s esto preocupados comos incentivos para o governante em exerccio. Nesse senti-do, usar o voto para escolher o melhor governo prospectiva-mente custoso para os eleitores em termos do seu controlesobre o representante em exerccio (veja Fearon, 1999)
Nota-se imediatamente que pode surgir o seguinte
pesadelo (Ferejohn, 1986; Banks e Sundaram, 1993): se oseleitores sempre acharem que o concorrente melhor, logoos representantes no podero jamais ser reeleitos e sem-pre escolhero extrair rendas altas. Por sua vez, se os repre-sentantes extrarem rendas altas, os eleitores nunca votaroneles. O representante sabe que os eleitores sempre se incli-naro pelas promessas do adversrio e sempre extrair ren-
das mximas. Isso significa que se os eleitores acreditaremque todos os polticos so iguais, estaro seguros de que osconcorrentes so melhores. Nessa situao, o controle doseleitores se rompe totalmente13.
Porm, mesmo se os eleitores podem ser crdulos, noso assim ingnuos. O desempenho do governante infor-mativo. Como descobriu Bartels (1988), o desempenhoanterior do presidente, pelo menos nos Estados Unidos,
um bom preditor de seu desempenho futuro (e no daque-le do concorrente). Assim, os eleitores que usam seu votoprospectivamente tm boas razes para basear-se na infor-mao retrospectiva. Harrington (1993b) demonstra que
13. Isso pode parecer exagerado. Mas vrios pases, notadamente Equador e Po-
lnia, experimentaram uma srie de eleies, nas quais um candidato prometeuseguir uma poltica de expanso e os eleitores acreditaram, e, eleito, mudou parauma poltica de contrao, s para ser derrotado por um candidato que prometeuuma poltica de expanso etc.
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quanto mais incerteza tm os eleitores sobre os resultadosde polticas pblicas, mais deveriam basear-se em informa-
es sobre o desempenho anterior. Eles podem observaro desempenho anterior do representante e decidir qual a probabilidade do adversrio ser melhor. No obstante,na medida em que os eleitores usem o voto para eleger omelhor governo, devem diminuir o poder dos incentivospara os representantes em exerccio.
Madison (O Federalista, n.o 57) pensou que o objetivode toda a constituio poltica , ou deveria ser, primeiro,
obter, para governar, homens que possuam uma alta sabe-doria para discernir e a maior virtude para perseguir o bemcomum da sociedade; posteriormente, tomar precaues asmais efetivas para mant-los virtuosos enquanto continua-rem a ser fiducirios pblicos. Utilizar o voto para ambosos propsitos obter os melhores governantes e mant-losvirtuosos no irracional: enquanto os eleitores perdem
algo do controle sobre o representante; em troca, eles ele-gem um melhor governo. No entanto, o sistema designadopor Madison e seus colegas torna possvel empenhar-se ape-nas por um desses propsitos, s custas do outro.
Instituies, eleies e representaoAs democracias no so todas iguais, e possvel que algunssistemas democrticos promovam mais a representao do
que outros. Embora ns tenhamos pouco conhecimentosistemtico sobre os efeitos de arranjos institucionais parti-culares no controle dos eleitores sobre os polticos, algunsfatores institucionais merecem ateno.
a) Os eleitores devem ser capazes de imputar claramen-te a responsabilidade pelo desempenho do governo. Suahabilidade para faz-lo limitada quando o governo uma
coalizo. Tambm limitada quando a Presidncia e o Con-gresso so controlados por partidos diferentes. necess-ria uma teoria elaborada do governo para descobrir quem
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responsvel pelo qu nessas circunstncias (todavia, verAnderson, 1995).
Hamilton argumentou, em O Federalistan.o
70, que aprestao de contas obscurecida sob um executivo plural,isto , um executivo de gabinete: Mas uma das objeesde maior peso pluralidade no executivo [...] que ten-de a ocultar falhas e a destruir a responsabilidade [...] Ascircunstncias que podem ter conduzido a qualquer fracas-so ou infortnio nacional so s vezes to complicadas queh um nmero de atores com diferentes graus e tipos de
agncia. Embora possamos ver claramente sobre o todo quehouve erros na administrao, praticamente impossvelpronunciar quem deve, de fato, pagar esses eventuais errosmalignos. Porm, uma ambigidade similar aparece emsistemas presidenciais. Bagehot (1992: 67) expressou esseponto de vista energicamente: Dois homens inteligentesnunca esto propriamente de acordo sobre um oramento
[...] Eles esto seguros na discusso e o resultado certamen-te no satisfar a nenhum dos dois. E quando os impostosno geram rendimentos como se esperava, quem respon-svel? Muito provavelmente, o secretrio do tesouro nopoderia convencer o presidente do comit, assim como pro-vavelmente o presidente no poderia convencer seu comi-t e o comit no poderia convencer a assemblia. Quem,ento, podemos punir quem voc pode deixar de lado
quando os impostos no se equilibram?As descobertas empricas sobre a transparncia da res-
ponsabilidade a maior parte delas devidas a Powell e seuscolaboradores so confusas. Instituies que induzemmaiorias aumentam a distncia entre a posio ideal doeleitor mdio e do governo (Huber e Powell, 1996), masaumentam o que Powell (1990) afere como a transparn-
cia da responsabilidade, o que, por sua vez, faz com quea votao dos representantes em exerccio seja mais sens-vel ao desempenho econmico (Powell e Whitten, 1993).
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Assim, parece que as instituies majoritrias geram gover-nos que so mais distantes dos eleitores no espao das pol-
ticas, mas com maior prestao de contas. A relao entre aspreferncias dos cidados e as polticas reais no estudadapor Powell conseqentemente indeterminada.
b) Os eleitores devem poder votar para retirar do car-go os partidos responsveis por um desempenho ruim, eos partidos por eles eleitos devem poder tomar posse dogoverno. Essas poderiam parecer caractersticas universaisda democracia, mas sob alguns sistemas eleitorais so qua-
se impossveis: testemunhe a contnua permanncia dosDemocratas Cristos na Itlia ou do PLD no Japo, ou a fra-ca conexo entre os resultados da votao e os resultadoseleitorais na Bolvia. Como Pasquino (1994: 25) colocou noque diz respeito Itlia: os partidos governantes parecemexpropriar os eleitores da influncia poltica, ao fazer e des-fazer governos de todos os nveis com muito pouco respeito
pelo resultado eleitoral.c) Os polticos devem ter incentivos para desejaremser reeleitos. Essa condio torna-se problemtica quandoh limitaes para a reeleio, algo habitual nos sistemaspresidenciais (Cheibub e Przeworski, 1999), e quando ospartidos polticos no so organizados burocraticamentede forma permanente, de modo que oferea aos militantesperspectivas de carreira (Zielinski, 1997). Paldam (1991)
observou que, quando o sistema partidrio estvel, os coe-ficientes da funo que relaciona probabilidade de reelei-o com resultados econmicos so maiores e suas estimati-vas mais precisas.
d) A oposio deve monitorar o desempenho do gover-no e informar os cidados. Certamente, qualquer entendi-mento razovel de representao precisa incluir a oposio.
Os cidados tm dois agentes, no apenas um: os repre-sentantes que governam e a oposio que quer tornar-segoverno. A oposio um agente dos cidados porque quer
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ganhar o cargo e, para tal, necessita antecipar julgamentosretrospectivos que os eleitores faro sobre os representan-
tes. Antecipando esses julgamentos, a oposio tem incen-tivos para informar (verdadeiramente ou no) os eleitoressobre o desempenho dos governantes.
No obstante, a existncia de uma oposio que quer epode monitorar o desempenho do governo no deveria serassumida como um pressuposto. A oposio pode coligar-se com o governo14 ou pode estar to dividida que passe adedicar mais energia com brigas internas do que contra os
governantes. A oposio pode no visualizar nenhuma chan-ce de vitria e fazer alguma outra coisa em vez de monitoraro governo (veja, Pasquino, 1994, a respeito do PCI na It-lia). E pode ou no ter recursos para faz-lo. Entre os vintepases que estuda Powell (1990), apenas nove providenciamrecursos para a oposio em comits legislativos. Em contra-posio, uma oposio que sempre se ope no mais con-
fivel para os eleitores do que o governo. Se cada vez que ogoverno diz uma coisa, a oposio defende que falso, oseleitores no esto de modo algum mais bem informados.Portanto, a oposio desempenha um papel de informar oseleitores somente quando no se alia ao governo, nem ocontradiz sempre.
e) A mdia, cujo papel enfatizado por Arnold (1993),realiza um papel particular. A menos que tenha interesses
claramente partidrios, mais confivel do que o governoe a oposio.
f) Finalmente, mas talvez o mais importante, os elei-tores precisam ter alguns instrumentos institucionais para
14. Crain (1977) argumentou que em um sistema eleitoral de maioria relativa
pouco provvel que os representantes compitam contra outros e, portanto, com-partilhem interesses de romper as barreiras para a candidatura dos competidoresde qualquer outro partido. Dasqupta (1993) demonstrou outro modelo de coali-zo e o argumento de que devemos subsidiar novos partidos.
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recompensar e castigar os governos pelos resultados quegeraram em mbitos distintos. As eleies so inerentemen-
te um instrumento nada acurado de controle: os eleitorestm apenas uma deciso para fazer no que diz respeito aum pacote inteiro de polticas governamentais. Suponha-seque um governo tem que tomar dez decises durante umagesto, o representante toma todas as decises contra o inte-resse da maioria e o adversrio promete fazer uma decisocorreta. Ento, os cidados elegero um governo que tomenove decises incorretas. Obviamente, a pergunta : por
que algum outro candidato no poderia se propor a tomarduas decises certas, ou trs, ou quatro, ou todas as dez?Uma resposta so as barreiras de entrada: a poltica partid-ria a indstria mais protegida nos Estados Unidos. Mas seno houvesse barreiras de entrada, ento haveria incentivospara formar partidos, que prometeriam fazer todas as dezdecises corretas, no cumpririam nenhuma delas e iriam
embora. Se a entrada no sistema eleitoral implica custosfixos, a competio ser limitada; se gratuita, os partidosno sofrero quando perderem. Assim temos ou um sistemade partidos de alta coluso, como nos Estados Unidos, ouum completamente efmero, como no Equador, onde hum novo sistema de partidos a cada eleio15. Em ambos oscasos, o controle limitado.
Concluso: a eleio como mecanismo de representaoEmbora a democracia no possa assegurar a representao, plausvel, todavia, que a democracia leve mais represen-tao do que os regimes alternativos. Ainda assim, a conclu-so desta anlise deve ser que o controle dos cidados sobreos polticos , no melhor dos casos, altamente imperfeito namaioria das democracias. As eleies no so mecanismos
15. Sobre a importncia dos sistemas eleitorais para a extrao rendas dos parti-dos, veja Meyerson (1993).
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essas decises: o voto. No possvel controlar milhares demetas com um instrumento. Assim, por exemplo, separar
as decises monetrias de outras decises polticas e votarseparadamente, e em intervalos espaados, para eleger odiretor do Banco Central, poderia dar aos eleitores um ins-trumento adicional de controle, com resultados superiorestanto a dar ao governo a discricionariedade sobre a polticamonetria quanto a delegar as decises a um banco centralindependente do controle dos eleitores (Minford, 1995).
O fato que durante os ltimos duzentos anos temos
pensado pouco sobre o desenho institucional da democra-cia. Desde a grande exploso do pensamento institucional,quando as instituies democrticas atuais foram inventadas e foram mesmo inventadas no tem havido praticamen-te nenhuma criatividade institucional. Exceto pelas nuncaimplementadas medidas para a co-administrao dos traba-lhadores na Constituio de Weimar, a descoberta da repre-
sentao proporcional na dcada de 1860 foi a ltima grandeinveno institucional. Todas as democracias que emergiramdesde o final do sculo XVIII, incluindo as mais recentes,apenas combinaram em diferentes formas, freqentementepea por pea, as instituies preexistentes. H, portanto,muito espao para a criatividade institucional.
Bernard Manin
professor do Departamento de Poltica da Universidadede Nova York
Adam Przeworski professor do Departamento de Poltica da Universidadede Nova York
Susan C. Stokes professora do Departamento de Cincia Poltica da Uni-versidade de Yale
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Resumos / Abstracts
ELEIES E REPRESENTAO
BERNARD MANIN, ADAM PRZEWORSKI E SUSAN C. STOKES
O artigo indaga o quanto o mecanismo eleitoral pode, defato, tornar mais representativas as instituies da democra-
cia. Os autores diagnosticam srias limitaes no voto comomecanismo capaz de alavancar algum controle do represen-tado sobre o representante.
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Resumos / Abstracts
Palavras-chave: Teoria Democrtica; Responsividade; Controleda representao.
ELECTIONS AND REPRESENTATION
The issue of this article is how much the electoral mechanism can
effectively make the institutions of democracy more representative.
The authors single out some critical limitations for the constituents
to enhance controlling mechanisms over their representatives.
Keywords: Democratic Theory; Responsiveness; Accountability.