machado, m - mestre machado de assis

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Mestre Machado, um recorte de velhos mestres, realinhados ao Memorial de Aires Universidade Federal do Rio de Janeiro Faculdade de Letras – 2º semestre de 2008 A proposta desta pequena apresentação é fazer uma leitura em comparação – um exercício de literatura comparada – baseada na sugestão contida no Memorial de Aires, último livro de Machado de Assis. Algumas observações são desconfiadas e sugestivas, porque em muito são resultantes de minhas pesquisas dentro da literatura somadas às sugestões que me foram trazidas pelo correr do semestre e pelas leituras tratando de memorialismo poético e ideologia. Aqui faço uma seleção do corpus, que estará basicamente ancorado apenas em relação ao Memorial de Aires, porque é a exigência do momento, porque é o norteador e o limitador deste trabalho, especificamente. Essas observações é que me levaram a considerar as bases para o discurso de Mestres. O ponto de partida tem três bases: a autoridade do gesto (que também será a autoridade do casal Aguiar e do conselheiro Aires, representantes da elite carioca de então e da sabedoria, de maneira geral), a sedução melódica em contar histórias ritmadas (principalmente esta, tão cheia de nomes e referências musicais) e a filosofia das regras (voltada para o pensamento do mundo, a mesma filosofia de quem observa o mundo lá fora e pula pela janela, para participar dele, aderir e interferir, pervertendo suas leis e regras, também). 1 1 Um sonho: “Deste lado do vale, eu podia enxergar três velhos sentados, alinhados. Cada qual em sua cadeira, cada qual à sua maneira, falava estórias para mim, tentei prestar atenção ao que diziam, e prestava muita, mas não escutei uma só palavra. Meu olhar estava encantado no gesto do primeiro velho que carregava uma bengala e contava histórias de valentia e danação , no som do segundo velho que carregava um pandeiro e contava histórias de ensinar criança e no pito do terceiro velho que carregava, além do pito, suas histórias de sangue e de herança.

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Monografia apresentada a Teresa Cristina Meireles, no curso especial do mestrado em Letras, UFRJ.

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Page 1: Machado, M - Mestre Machado de Assis

Mestre Machado, um recorte de velhos mestres,

realinhados ao Memorial de Aires

Universidade Federal do Rio de Janeiro

Faculdade de Letras – 2º semestre de 2008

A proposta desta pequena apresentação é fazer uma leitura em

comparação – um exercício de literatura comparada – baseada na

sugestão contida no Memorial de Aires, último livro de Machado

de Assis. Algumas observações são desconfiadas e sugestivas,

porque em muito são resultantes de minhas pesquisas dentro da

literatura somadas às sugestões que me foram trazidas pelo

correr do semestre e pelas leituras tratando de memorialismo

poético e ideologia. Aqui faço uma seleção do corpus, que

estará basicamente ancorado apenas em relação ao Memorial de

Aires, porque é a exigência do momento, porque é o norteador e

o limitador deste trabalho, especificamente.

Essas observações é que me levaram a considerar as bases

para o discurso de Mestres. O ponto de partida tem três bases:

a autoridade do gesto (que também será a autoridade do casal

Aguiar e do conselheiro Aires, representantes da elite carioca

de então e da sabedoria, de maneira geral), a sedução melódica

em contar histórias ritmadas (principalmente esta, tão cheia de

nomes e referências musicais) e a filosofia das regras (voltada

para o pensamento do mundo, a mesma filosofia de quem observa o

mundo lá fora e pula pela janela, para participar dele, aderir

e interferir, pervertendo suas leis e regras, também).1

1 Um sonho: “Deste lado do vale, eu podia enxergar três velhos sentados, alinhados. Cada qual em sua cadeira,

cada qual à sua maneira, falava estórias para mim, tentei prestar atenção ao que diziam, e prestava muita, mas não

escutei uma só palavra. Meu olhar estava encantado no gesto do primeiro velho – que carregava uma bengala e

contava histórias de valentia e danação –, no som do segundo velho – que carregava um pandeiro e contava

histórias de ensinar criança – e no pito do terceiro velho – que carregava, além do pito, suas histórias de sangue e

de herança.

Page 2: Machado, M - Mestre Machado de Assis

2

Sem procurar um sentido etnográfico, tenho reconhecido em

nossa cultura de mestres, nas artes populares e canônicas,

ferramentas que em muito ultrapassam “caldo” das culturas

americana, africana e européia, que juntas e amalgamadas ainda

têm servido de justificativa e fôrma para a cultura brasileira.

As tais ferramentas parecem aspectos ou equipamentos especiais

de criação literária, poética e musical de agência eventual,

não obrigatória nem fundamental, mas essencial à criação

estética.2

Uma breve dedicação intelectual ao entendimento do que

seriam os equipamentos dos mestres trouxe à pesquisa a

evidência necessária de fundamentos. Para uma explanação

inicial, os equipamentos do tripé mostraram-se: a música (no

que tem de encanto e sintonia, cadência); a regra (na fala, na

autoridade, poder, nos espaços de atuação e de conversa) e a

herança (ancestrais, história, ensinamento).

Pretendo esboçar um entendimento do que tenho percebido como

aspectos na escrita dos mestres. Não me refiro a estrutura ou

receita, não quero saber de forma nem alerto para ingredientes;

falo de aspectos e sutilezas que podem – porque têm competência

e capacidade – ser notadas em narrativas de mestres.

A freqüência com que escrevo que não, deve muito à incerteza

destes primeiros passos. Aliás, apenas as características

encontradas nas pesquisas, para cada um dos três aspectos e

para sua atuação nos textos literários foi que recebi o esboço

do todo. Como se estivessem em lugares confortáveis, alinhadas

(porque estão de acordo, concordes, frescas e bem dispostas)

posso chegar a entender e adotar alguma significação próxima às

invenções dos escritores, à procura da síntese do mundo, para

nos mostrar o caminho, para nos ensinar, principalmente, e é

2 Durante o discurso de posse no Pen Clube do Brasil, você, minha professora, Teresa Cristina Meireles, avisa que

sua poesia, estancada na meninice, retornou na adolescência e fixou-se ao tempo dos estudos de graduação,

durante as “[...] aulas dos cursos de Letras, Direito e Música; escrita nos cadernos, nos blocos, com os temas da

Teoria Geral do Estado e de Direito Internacional, ao lado das pautas musicais com os exercícios de baixo

contínuo ou canto dado, junto às anotações de Linguística ou de Literatura Inglesa, das declinações gregas e da

Filologia, a poesia esteve sempre ali”.

Page 3: Machado, M - Mestre Machado de Assis

3

neste único particular que têm coincidência, são aspectos de um

texto de ensinamento.

Uma característica dos três aspectos atuantes é a invocação;

eles parecem ser invocados a cada necessidade, no sentido que

nos dá Gumbrecht,3 da produção de presença, não por inferência

de sentido, não por interpretação, mas por manifestação mágica,

de possessão, de consubstanciação. Da mesma maneira o

conselheiro Aires, em conversa com a irmã, faz a invocação de

seus poderes, uma tentação como a de Fausto, em Goethe,

expressa como se dissesse: “Tornai-me a aparecer, entes

imaginários, que me enchíeis outrora os olhos visionários”.4

Outra característica evocativa poderia estar na reserva moral,

suscitada em algumas das epígrafes de José Saramago, citações

de livros não publicados, mas reconhecidos culturalmente. São

seus conselhos e provérbios o conjunto de saberes, conheceres,

dúvidas e vontades; são também livros de mestres, são coleções

da moral humana.

Se for necessário expor razões, além de meu próprio desejo

intelectual, para falar sobre os mestres, destaco algumas

recentes.

O falecimento e conseqüente recuperação da importância de

Miriam Makeba, a Mama África, e seu canto de ensinamento do que

é a cultura sul-africana, a enorme repercussão dos trabalhos de

cultivo e respeito ao povo e à cultura negra. O Encontro com

Mestres Populares, na Universidade Federal do Rio de Janeiro,

promovido pela Companhia Folclórica do Rio propõe uma linha de

diálogo entre os saberes acadêmicos e populares. Não vejo

justificativa para qualquer distinção; por mim, não cabe

alimentar diferenças, os saberes são saberes, conheceres, lá e

aqui. Uma edição especial do Suplemento Literário de Minas

Gerais (SLMG), com estudo sobre os “Vissungos, cantos afro-

3 GUMBRECHT, Hans Ulrich. “Produção de presença, perpassada de ausência, sobre música, libreto e encenação”.

In: Como falar de literatura hoje? Revista Palavra, nº7. Rio de Janeiro: PUC-Rio, 2001.

Page 4: Machado, M - Mestre Machado de Assis

4

descendentes” em língua africana, ouvidos outrora nos serviços

de mineração e publicados em O negro e o garimpo em Minas

Gerais, de Aires da Mata Machado Filho (Editora Itatiaia,

1985).

Estas são juntas outra razão: reafirmam que minha procura

não é solitária. Ouço sua reverberação e entendo outra

sugestão, a de que “O narrador é um homem que sabe dar

conselhos.”5

Tomando o conjunto, aceito os conselhos dos mestres e esclareço

minha procura, porque na ausência de mestres quem se perde sou

eu.

Em comentário sobre Memórias póstumas de Brás Cubas, Abel

Baptista fala da situação de perda gerada pelo narrador morto

(para mim, a morte do mestre seria tão ou mais desconcertante),

esta discussão gira em torno do relato livre de exames e

julgamentos, porque não tem platéia ou porque não lhe importa o

que pensa a platéia. Destaco.

A metáfora da platéia descreve essa perda: não são os

mortos que perdem a platéia, são os vivos que perdem a

possibilidade de se constituírem platéia relativamente

aos mortos. “Não há platéia” descreve a situação anômala

em que os espectadores olham, assistem, apreciam; mas

aos atores, sabendo que eles olham, assistem, apreciam,

lhes é indiferente o resultado da assistência e da

apreciação. A platéia responde, talvez aplauda – os

atores é que em caso algum regressam ao palco para

agradecer.6

Prefiro viver entre mestres e, se já não estiverem vivos,

procuro conhecê-los ou entendê-los pelo que me deixaram; minha

perda tem se resolvido pelos sussurros que ouço do passado,7 meu

intelecto tem despertado sobre as coisas que percebo no que

ouço em sonho. O que percebo, enfim, tem tomado forma neste

4 GOETHE, Johann Wolfgang von. Fausto. E-books Brasil, acessado em 29.11.2008,

http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/faustogoethe.html. 5 BENJAMIN, Walter. “O narrador”. In Magia e técnica, arte e política. São Paulo: Brasiliense, 1994.

6 BAPTISTA, Abel Barros. “Liberdade da forma”. In Suplemento Literário. Belo Horizonte: Secretaria de Estado de

Cultura de Minas Gerais, abril de 2008. 7 BENJAMIN, Walter. “Teses sobre a filosofia e a história”. São Paulo: Brasiliense, 1994.

Page 5: Machado, M - Mestre Machado de Assis

5

estudo, agora escrito para ser discutido. Durante os estudos de

grupo e as leituras, estas percepções vão tomando força, em uma

prática de discípulo, a tentar entender.

Buscando abrigo e apoio nos escritos públicos, cito

novamente o estudo de Abel Baptista, porque preciso dele para

continuar, porque preciso da forma que ele mesmo encontrou em

Machado de Assis, adotada aqui também, que é a “forma adequada

ao pandemônio é por isso a forma livre. Livre no mesmo sentido

em que sabemos ou dizemos que uma coisa é expor, descobrir ou

arrancar a verdade e outra, bem diferente, é captar o sentido

duma piada – e rir”.8

O gesto

Na origem da narrativa está uma autoridade de quem conhece a

morte, o gesto inesquecível; “a morte é a sanção de tudo que o

narrador pode contar”. É da morte que deriva a autoridade do

narrador de Benjamin, em outras palavras, as histórias do

narrador-mestre remetem à história natural e nisto enxergamos o

“sentido da vida” a “moral da história”. Este gesto toma as

coisas do mundo e as recoloca, dispõe no mundo reordenado à

maneira que atendam, que sustentem o dito:

Os objetos iluminados perdem seus nomes: sombras e

claridades formam sistemas e problemas particulares que

não dependem de ciência, que não aludem à prática, mas

que recebem toda sua existência e todo o seu valor de

certas afinidades singulares, entre a alma, o olho e a

mão de uma pessoa nascida para surpreender tais

afinidades em si mesma, e para reproduzi-las. A mão

intervém decisivamente, com seus gestos, aprendidos na

experiência do trabalho, que sustentam de cem maneiras o

fluxo do que é dito.9

Para o Conselheiro Aires e para Machado de Assis, escrever o

Memorial de Aires foi também aprender a morrer, perceber a

8 BAPTISTA, op. cit.

9 BENJAMIN, op. cit.

Page 6: Machado, M - Mestre Machado de Assis

6

encruzilhada da vida e da morte. O já bastante conversado cargo

de Aires, conselheiro e diplomata, mais uma vez atende a

leitura de Walter Benjamin sobre os trabalhos do narrador,

sobre o poder contido na mão do narrador: “O narrador figura

entre os mestres e os sábios, sabe dar conselhos e recorre ao

acervo de toda uma vida. Seu dom é poder contar sua vida, sua

dignidade é contá-la inteira”.10

Machado coloca nas mãos do Conselheiro Aires a sugestão de

que ele também poderia contar toda a sua vida, a sugestão de

que este seria seu dom; mas não é, porque o Conselheiro Aires

conta a vida de outros. O Memorial não seria um receituário de

seu próprio viver, poderia ter sido “um acúmulo de saberes e

conheceres íntimos”;11 mas não foi, porque o Conselheiro Aires

escreveu em um diário, porque escreveu de maneira íntima as

suas intimidades e as alheias. Por esses nãos Machado de Assis

derrubou de nós a impressão de mestre no Conselheiro Aires;

retirou de nós a verdade e a dignidade de contar sua própria

vida, e contou a dos outros. Neste momento, a coincidência de

iniciais, de Machado de Assis e Memorial de Aires provoca a

mesma imagem, ambos são responsáveis pela nossa falta.

O mestre é o condutor de destinos, não impõe a todos sua

autoridade, é recebido de bom grado, não usa de mando, não

manobra nem submete a jugo arbitrário. Mas o conselheiro Aires

é de outra ordem de mestres, seu modo de contar poderia ter

sido em receita de viver, mas não foi. A história que o

Conselheiro contou sugeria o que se vai desenrolando, a cada

nova e excitada anotação em diário. A cada pensamento e

peripécia, o conselheiro sugere novidade num contexto mais ou

menos previsível.

Esta peculiar anotação me deu a lembrança de um mote de

Alberto Mussa, n’O movimento pendular, “o pá eiye lona / o so

10

BENJAMIN, idem. 11

BENJAMIN, idem.

Page 7: Machado, M - Mestre Machado de Assis

7

òkò loni.” 12 O dístico faria alusão à relação ou à sugestão de

causalidade, na verdade, o que acontece na narração do

conselheiro é de outra ordem, a do planejamento. Por uma

propriedade mágica, pela interferência de senhoras da noite,

neste dístico iorubá, está explicada uma relação de causalidade

anterior ao acontecimento provocador. Para nosso assunto, em

particular, corrobora a idéia de que Tristão e Fidélia – por

Isolda – já estavam combinados ao casamento, a enganar os

velhos, a propiciar a paixão, o noivado e a partida. É como se

Machado de Assis já dissesse, pela nomeação do jovem casal, que

o que lemos no diário do Conselheiro Aires já estava dito, já

estava escrito, já tinha acontecido em um romance ainda mais

antigo.

Outro gesto do conselheiro Aires trata de seu corpo, que

experimenta também o desejo por Fidélia, em contexto de

disponibilidade da viúva; o conselheiro participa e nisto tem

também propiciado um estatuto de autoridade. Se o corpo estiver

ausente, se não experimentar nem desejar, não influirá no

contexto, se não produzir nem compreender metáforas, não será

capaz de compreender o contexto.

Num jogo de cumprir e esquivar-se, o conselheiro Aires,

resultado da pena de Machado de Assis, vai criando e ajustando

sua obra, anota coisas aqui e ali, ignora ou omite coisa acolá,

resume e detalha a seu gosto. Por isso revela sua autoridade

sobre a obra, vai criando e ajustando o relato conforme permite

sua vigilância.

A propósito da solidão do Conselheiro Aires, percebemos uma

necessidade sua de manter-se ativo nas relações sociais, seria

uma necessidade de manter-se vivo. Segundo a concepção de

Lucien Goldmann – que sem contatos concretos com outros homens

o homem não seria capaz de manter-se humano –, pude perceber

uma figuração do medo que tem o Conselheiro desta sua solidão;

12

MUSSA, Alberto. O movimento pendular. Rio de Janeiro: Record, 2006. No original, a tradução do rodapé

“matou um pássaro ontem / com a pedra que atirou hoje”.

Page 8: Machado, M - Mestre Machado de Assis

8

nas vezes em que chove e que fica preso em casa, o escritor

deste diário sente-se cada vez mais próximo da morte, sofre

pela dor nos joelhos, pela gripe, pela falta que faz a

companhia dos seus iguais.

Este medo da morte e da decadência alude também à presença

da destruição e da morte no século XX. Um temor não suplantado

pelo progresso, do homem que ainda está sozinho, continua a

descobrir, continua a desfazer e ainda está sozinho. Nas

pequenas reuniões, festejos e visitações haveria um

apaziguamento de temores nesta convivência da sociedade em que

estavam colocados os personagens do Memorial.

Menina, quem foi teu mestre?

– Um batuqueiro...

— Luiz Antonio SIMAS

e Alberto MUSSA, 2009.

O som

A trama pequena, singela, de todos os dados claros é

pungente,13 ainda mais por esta concepção do professor Ronaldes,

para mim, adicionada às concepções dos estudos de Gumbrecht, me

sugerem o entendimento de que a força do Memorial de Aires está

numa tensão propiciadora, assim como na ópera – tão cara a este

livro – a expectativa da realização do libreto em consonância,

em sintonia de maestro, atores-cantores, músicos e público.

A ópera é tipo especial de encenação, cujo papel

central é ocupado pela música. É um tipo de

experiência que não pode ser justamente analisada

segundo a dimensão da produção de sentido (no

âmbito interpretativo) ou segundo a identificação

de sentido (da hermenêutica). O fascinante é o que

13

MELO E SOUSA, Ronaldes de. “A gaia ciência do Conselheiro Aires”. In O romance tragicômico de Machado de

Assis. Rio de Janeiro: Eduerj, 2006.

Page 9: Machado, M - Mestre Machado de Assis

9

permanece excluído e ainda assim postulado (uma

sugestão, apenas).14

Quanto mais leio Gumbrecht mais machadiano fica meu

entendimento da sugestão operística do Memorial de Aires; nada

é gratuito, não acontece por acaso a tomada dos nomes de

Fidélia e Tristão, seria mais um exercício da ambigüidade de

Machado a escolha desses nomes, como o particular da ópera,

este tipo especial de expor a música para manter a graça do

enredo de um livro carente de ações, de enredo simples,

singelo, entretanto, não sem significação.

O que se diz de “ver com novos olhos” ou “olhar sob nova

luz” é, na verdade, a expressão de uma idéia pela falta do

nome, é expressar alguma coisa antes já sugerida, urgentemente

nomeada porque diante da “crescente complexidade dos fenômenos

culturais” o falante precisa, mais uma vez, classificar.

No esporte, a substância é dada pela presença dos

jogadores no campo, toda a atenção e tensão dirigem-se à

possibilidade de emergir uma forma a partir da interação

dos corpos presentes. Na ópera, já que o libreto anuncia

antes a ação, a atenção e a tensão do público, dos

cantores e dos músicos está voltada para a emergência da

substância sonora.15

Ora, Machado de Assis certamente provocava em nós as

possibilidades de sua história, de dados claros, singela, a

história do casal Aguiar e de seus afilhados e visitantes se

desenrola dentro de uma das possibilidades de realização,

certamente, Machado de Assis exercitou conosco esta mesma

tensão operística; já tínhamos quase o libreto, o maestro, os

músicos, o cenário, era só o caso de ver realizar-se. E os

recursos musicais não cessam, ao contrário, o “momento de

silêncio, antes da abertura, cria a descontinuidade entre o

cotidiano e a encenação”.16 O Memorial de Aires está escrito em

diário, cada dia é um nova entrada, há intervalos seguidos e

seqüenciados, são os momentos de silêncio narrativo. Ao mesmo

14

GUMBRECHT, op. cit. 15

GUMBRECHT, idem.

Page 10: Machado, M - Mestre Machado de Assis

10

toque que reforçam o descompromisso narrativo, as pausas, como

a despertar a atenção para o seguinte, refazem o momento de

silêncio da ópera.

Um intertexto operístico está no Memorial de Aires, a cada

citação da linguagem musical – por exemplo, tenho claro

contracanto, baixo contínuo, apoteose –, o leitor tornado

platéia é público de afilhados, de pupilos, alunos ou

seguidores e segue aqui encantado pelas evocações musicais do

escritor. O rallentando, da linguagem musical, é um ritmo aos

poucos se acabando, como vai aos poucos ralentando o diário do

velho Conselheiro Aires, mais um indício fortemente aproximado

de aprender a morrer, ralentando…

Sem querer mais falar de esquemas musicais, passo

rapidamente por uma explicação sobre a urdidura dos elementos,

da riqueza de variedades arranjadas da maneira mais equilibrada

possível no sentido de criar uma “obra de invenção e técnica,

mais que de inspiração”.17 A escrita de Machado pode considerar

a cadência perfeita, em evoluções espirais e sintomaticamente

contínuas, entretanto sua música é ilusória. No abandono dos

compromissos do casalzinho Tristão e Fidélia, há dissonância;

no casal Aguiar, antes velhos hospitaleiros e risonhos, há

solidão e saudade de si mesmos que lhes é consolo, há

dissonância; no próprio Aires, que agora ficará

irremediavelmente sozinho e morto, há dissonância. No fundo e

no fim, “tudo [...] parece beneficamente confuso”. O ato final

é de paz e “termina com as labutas da conquista, a libertação

do tempo que une o homem com Deus, o homem com a natureza, em

sensualismo, jogos e canções.18

No fim, a técnica de Machado de Assis escreve uma cerimônia

de sacrifício reconciliatório, em ritual de música e de morte.

16

GUMBRECHT, idem. 17

SCLIAR, Ester. Elementos de teoria musical. São Paulo: Novas Metas, 1986. 18

MARCUSE, Paul. Eros e civilização. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1981.

Page 11: Machado, M - Mestre Machado de Assis

11

O pito

A regra é que dá a forma às coisas, inclusive quando as

coisas pervertem a regra que lhes deu forma, até pela burla,

essas coisas precisam se aproximar da regra. Na escrita do

Memorial de Aires, as regras estiveram na construção da

história tanto quanto nas relações da pequena elite carioca

retratada. O caso do Memorial era uma provocação final de

Machado de Assis, seria seu último livro, seria mais uma de

suas crônicas precisas, em romance, em diário que distraísse a

atenção do leitor à morosidade, que despertasse uma observação

mais alerta do mundo.

Em seu último romance, Machado de Assis escreve para

provocar, chegou a ser considerado menor pelo gosto do leitor,

mas é na sutileza que o seu Memorial deixou a opinião bem

marcada. Em uma referência ao ensino de música, à professora

Ester Scliar, um de seus alunos relata: “Chegava a ser

intransigente, polêmica e afogueada feiticeira que se comprazia

com a luta, o movimento que transformasse o lago sereno das

certezas no mar encapelado das inquietações”.19 Em Alberto

Mussa, no Elegbara, “A primeira comunhão de Afonso Ribeiro” e

“Os sábios de Tombuctu” figuram situações em que os mestres se

perdem, perdem-se de seus discípulos e perdem a maestria porque

se perdem na regra, foram desafiados em seus espaços de atuação

e perderam-se nos meandros da conversa de um andarilho

tentador.

Afonso Ribeiro percebe a disputa entre o pajé e o cacique,

sem entender bem a língua, mas percebendo cada nuance da

discórdia. O degredado enxerga na luta entre os líderes da

tribo o desejo de poder e o mando, um acredita que é líder por

desígnio de deus, acredita que é foi escolhido e é imortal; o

outro acredita que só a razão e o conhecimento garantem a vida

e a prosperidade da comunidade, ao líder cabe educar e comandar

porque é o mais capacitado. O fim dos dois é a morte, a tribo

19

ESCOBAR, Ailton. Prefácio de SCLIAR, Ester. Elementos de teoria musical. São Paulo: Novas Metas, 1986.

Page 12: Machado, M - Mestre Machado de Assis

12

não percebe a ausência dos dois líderes e ele morrem sozinhos,

um perde o privilégio divino e o outro perde a confiança dos

seus.

Em Tombuctu, os sábios perderam-se em conflitos sobre a

verdade, acreditavam racionalmente conhecer o que era a verdade

e caíram em desgraça; o elemento desagregador foi a discórdia,

plantada por um andarilho; depois de se desentenderem os

sábios-mestres, o mundo conhecido ficou soterrado pelos novos

interesses de fé e de moeda.20

Estas narrativas privilegiam o conhecimento, as categorias

da regra, do saber e do tempo. Há uma sugestão de que os

mestres detentores do conhecimento têm também o domínio do

ensinamento, da conservação e do aprimoramento do saber. Há uma

sugestão de que será preservado da ação do tempo o conhecimento

modelado e difundido em regra, para que haja uma futura

compreensão do mundo. Contudo, no Memorial de Aires o que

acontece é a tentação à regra, a perversão da regra, a fuga da

regra.

Os relatos diários do Conselheiro Aires têm indícios de

mudança, de mutação de regras sociais, de moral e bons

costumes, de maledicência e de interesses... Entretanto, tudo

acontece na suposição da mais estreita e justa correção, D.

Cesária é o grande retrato da mudança. Ela atiça o pensamento

meio safado e pervertido, “[...] tão risonha que parecia falar

mal de mim, mas não falava, ia só – ou falava de mim consigo;

mas só consigo não teria tanto prazer. Cumprimentámo-nos e

seguimos”.21 O escritor coloca na senhora uma perversão meio

escondida, velhaca, que atiça a traição, atiça a dúvida, mas

depois passa, vai, segue, aceita o estranhamento e continua seu

próprio rumo. Esta mutação é uma provocação, tão instigante e

dificultosa que só ao bom senso musical é dado realizar.22

20

MUSSA, Alberto. Elegbara. Rio de Janeiro: Record, 2005. 21

MACHADO DE ASSIS, Joaquim Maria. Memorial de Aires. Belo Horizonte: Garnier, 2008. 22

SILVA, José Paulo da. Manual de fuga. Rio de Janeiro: Escola Nacional de Música. Universidade do Brasil,

Page 13: Machado, M - Mestre Machado de Assis

13

A falsidade dos relatos do Conselheiro chega a se aproximar

das apropriações criativas do sertanejo Ariano Suassuna, na

Pedra do Reino, em que faz um narrador sabedor de todos os

conhecimentos, histórias e verdades, capaz de contar seus

causos baseado em outros, sempre pervertidos à maneira do

sertanejo, a maneira de lhe servir ou de atender, “A rigor,

todas as citações no Romance da Pedra do Reino são falsas ou

transformadas, o escritor nunca cita um texto alheio sem

interferir nele, sem modificá-lo a propósito, usando para isso

o pretexto de ser Quaderna que faz a citação se amoldar a seu

estilo régio”.23 O velho Quaderna cita outros sábios e regras

pervertendo seu sentido. O velho Conselheiro conta os fatos e

os acontecidos pervertendo tudo e, é diferente, ele mesmo,

porque é desmascarado por D. Cesária, ela sabe que “as regras

[do conselheiro] não têm o rigorismo das leis”.24

Tratamos da tessitura de um espetáculo, montado ao modo mais

provável e equilibrado e simples, entretanto, nem de longe este

retrato do mundo está aproximado da sintonia, muito mais perto

ficou da dissonância; tanto é que mestre e discípulos (poderia

falar Conselheiro Aires e D. Cesária) estão em fase e

defasagem, em pleno-quase-desentendimento, encontram-se e

afastam-se, um quer fugir a si e o outro quer enganar o

primeiro.

Na cultura de presença, este espírito provocador é

encantado, do ponto de vista ideal, o corpo é “possuído” pelo

espírito, pelo demônio, pelo deus. Cada evento apresentado não

está lá para uma definição feita em contrastes, com intenções e

expectativas, mas por uma resultante dos contrastes, “A

possessão, no cotidiano, não é rasura, é ênfase”.25

1949. 23

MUZART, Idelete. “O decifrador de brasilidades”. In: Ariano Suassuna. Cadernos de literatura brasileira, nº 10.

Rio de Janeiro: Instituto Moreira Sales, novembro de 2000. 24

SILVA, op. cit. 25

GUMBRECHT, op. cit.

Page 14: Machado, M - Mestre Machado de Assis

14

Assim, acreditando na influência do espírito possuidor

pervertendo as regras a que deveria o mundo obedecer, chegamos

aos afetos de Fidélia, a moça que foge a si mesma. Machado de

Assis tem, neste Memorial de Aires, as artes do desfazer e do

abandono, de recuar às obrigações ou aos compromissos pátrios,

mátrios e sociais. O tempo preside a tudo, passa e, por causa

do movimento das coisas, é impossível voltar ao começo. Neste

lugar vejo o poder do movimento a determinar dinastias,

sucessões, na eterna transformação das coisas, Fidélia tem

conhecimento de que o tempo passará e que cada momento é uma

tentação de seu desejo feminino, de seu desejo por ser esposa,

mãe, mulher, ela sabe e parece fugir de si mesma.

A moral é o que faz o povo conviver, segura, sustenta as

relações entre os homens. O jogo de Machado de Assis expõe

discussões das mais interessantes na literatura, das que

instigam o leitor, das miudezas morais, das regras de

convivência em comunidade, estabelecidas e pervertidas para

apaixonar o leitor, da evidência de que “O povo cansou de ser

virtuoso”.26

Essa situação cabe ao povo francês, já no período final da

Revolução, o povo novamente se rebela, a observação de

Montaigne cabe também para a descrição do que ocorre a Fidélia,

ela cansou de ser virtuosa.

O Conselheiro Aires é sábio, sensato e experiente, as suas

referências à história social deveriam ter importância maior na

narrativa, mas não têm. O narrador é dúbio, Aires é ator. Passa

pelos fatos com visão de panorama, em sobrevôo de pássaro.27 No

fim, o conselheiro Aires não assume o papel de narrador, mas

anotador cotidiano; seletivo, o velho Conselheiro age como

aquele que confunde que faz pouco caso das verdades

estabelecidas, para ser mensageiro, mediador entre diferenças,

entre diferentes mundos que, de outra forma, ficariam

eternamente separados com suas leis incompatíveis; um narrador

26

MICHELET, Jules. História da Revolução Francesa. São Paulo: Companhia das Letras, 2003. 27

MELO E SOUSA, op. cit.

Page 15: Machado, M - Mestre Machado de Assis

15

que trabalha entre o dito e o não dito, entre encobrir e

descobrir.28

Machado de Assis teve aqui uma capacidade de reunir coisas,

de inventar coisas e deixar tudo sem definição; na platéia e no

jogo, deseja-se chegar ao fim da partida, deseja-se placares

bem definidos, saber exatamente quem é o vencedor e quem é o

vencido, ver a punição dos culpados e a premiação dos heróis.

Mas este desejo no Memorial fica suspenso, o autor não nos

define, exatamente, ele sugere tanto quanto o sorridente

cumprimento de D. Cesária.

Uma referência interessante ao largo mundo é a capacidade de

agradar opostos do conselheiro Aires. Assim como o deus da

transformação pode transitar entre o vivo e o morto, o deus das

encruzilhadas, da troca e da volatilidade – Hermes, Mercúrio,

Exu –, o compasso largo do Conselheiro Aires acontece para

agradar extremos, aceitar o bem e o mal, não há verdade, o que

há é a contingência.

E o tempo, que na maioria das histórias a tudo consome, aqui

é preservador da vida, a concepção da história do Memorial de

Aires é de um tempo cíclico, de sucessivas gerações, da morte

do velho e da necessidade de vida do jovem. Bastante aproximado

do pensamento africano exposto por Nei Lopes: “O ser humano tem

de acreditar na existência simultânea do passado, do presente e

do futuro e orientar seu tempo dentro da harmonia dessas três

variantes. O conceito de tempo linear é uma ilusão e a

materialidade, uma miragem”.29

28

MEIRELES, Teresa Cristina. Anotações de aula. Rio de Janeiro: 2º semestre de 2008. 29

LOPES, Nei. Kitábu - o livro do saber e do espírito negro-africanos. Rio de Janeiro: Pallas, 2007.

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Discípulos

No pequeno “Idéias de um canário” estão figuradas grandes

preocupações da humanidade e uma das resultantes proposições

deste estudo: o desejo de entender o mundo nascido da relação

entre mestre e discípulo. Nosso interesse pode chegar alguma

hora a esbarrar, na era da globalização e da consagração do

superficial, na prática dos mestres a tentar desvendar o mundo

ou educar a grande massa da população desnorteada.

Buscando um caráter originário sem comprometer o rigor

científico, levanto a suposição das relações dos mestres com

seus discípulos sem pensar em melindres nem ressentimentos

porque o que importa na arte é a estética, não a ética. Será

sempre um gesto de esperança a reunião de mestres e discípulos

para conversar. Hierarquia e ancestralidade são essenciais a

este aprendizado. Os mestres são, sim, os detentores de um

segredo, uma visão de história e de ancestralidade que não pode

ser compartilhada de modo raso, simples, direto e fácil. Só

pode ser sugerida, até que se torne, enfim, compreendida pelo

discípulo capaz. O Conselheiro Aires quer cumprir o papel de

mestre, encontrar no moço Tristão o discípulo possível, mas a

realidade é outra nesta relação. Ao fim do relato, percebemos

que o discípulo era um quase-traidor, estava distante

formalmente do discípulo aplicado, era mais de representação

que de afeto a aproximação do jovem ao casal Aguiar, ao velho

conselheiro, ao Brasil, provavelmente.

Os três aspectos são ferramentas de uso, manuseio e artifício

legado a mestres. Inclusive quando se usam deles para desfazer

a relação de mestrado, de ensinamento.

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