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Organizadores Emmanuel Zagury Tourinho Sergio Vasconcelos de Luna I Investigações Históricas, Conceituais e Aplicadas ROCA

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Page 1: (livro) tourinho & luna (2010) análise do comportamento investigações históricas, conceituais e apli

Organizadores

Emmanuel Zagury Tourinho

Sergio Vasconcelos de Luna

I

Investigações Históricas, Conceituais e Aplicadas

R O C A

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A construção da análise do compor­tamento no Brasil já tem uma longa história, desde que o Professor Fred Keller fez sua primeira visita à Uni­versidade de São Paulo, no início da década de 1960. A comunidade cien­tífica que, a partir de então, se consti­tuiu inspirada no trabalho de B. F. Skinner e colaboradores (Keller, entre os mais importantes) tem sido uma das mais ativas na Psicologia brasileira. Por um longo tempo, essa comunida­de dedicou-se principalmente à inves­tigação básica de processos compor­tamentais. Nas últimas décadas, tem diversificado suas realizações, ocu­pando-se com maior frequência de temas variados, em um contexto de investigações conceituais e aplicadas.

Este livro reúne produções de al­guns analistas do comportamento que se dedicam também a investi­gações conceituais e aplicadas em análise do comportamento. Também, porque todos têm uma história de dedicação à investigação básica, à qual têm procurado agregar estu­dos de outra natureza que possam contribuir para alargar as fronteiras da análise do comportamento e as condições de interlocução dessa dis­ciplina com outros sistemas de conhe­cimento na Psicologia e fora dela. Tal como as compreendemos, as in­vestigações conceituais e aplicadas constituem dimensões essenciais da análise do comportamento hoje, mas podem ser tão mais efetivas quanto maior for sua articulação com o corpo de conhecimento bási­co que sustenta todo o projeto skin- neriano de constituição da Psicolo­gia como ciência do comportamento.

A reunião deste grupo foi propicia­da pela criação de um Grupo de Tra­

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balho (GT) na Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Psi­cologia (ANPEPP). A primeira reu­nião do GT Investigações Concei­tuais e Aplicadas em Análise do Comportamento aconteceu no XI Simpósio da ANPEPP, em 2006, em Florianópolis (SC). Em 2008, o GT voltou a reunir-se no XII Simpósio da ANPEPP, realizado em Natal (RN), quando começou a formar o material que agora se consolida neste livro. Fazer deste grupo um ambiente de colaboração na pes­quisa conceituai e aplicada em aná­lise do comportamento, com funcio­namento mais orgânico, constitui ainda um grande desafio. Entre ou­tras razões, porque não se encon­tram nos domínios, conceituai e aplicado, da análise do comporta­mento agendas de pesquisa bem estabelecidas, com respeito às quais possam esperar uma adesão ampla dos grupos de pesquisa. Prevale­cem, nesses domínios, iniciativas dis­persas e pouco complementares, em geral, como resposta ao rico universo de problemas com os quais os Psicólo­gos são cotidianamente confrontados.

A edição deste livro representa dois grandes avanços. Uma vez que re­flete o esforço do grupo para co­municar os programas de pesquisas aos quais tem se dedicado, favore­ce o compartilhamento de interes­ses e a emergência de novas cola­borações. Em outra direção, poderá estimular outros pesquisadores e, quem sabe, alargar o universo de interlocutores e colaboradores para a pesquisa conceituai e aplicada em análise do comportamento.

Emmanuel Zagury TourinhoSergio Vasconcelos de Luna

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Investigações Históricas, Conceituais e Aplicadas

A análise do comportamento apresenta-se, hoje, como uma abordagem alternativa dentro da psicologia, distinguindo-se das demais por seus fun­damentos filosóficos e seu sistema teórico básico, e pela prática profissional que eles originam. Tendo como um de seus fundamentos centrais o reco­nhecimento da múltipla determinação do comportamento (filogenética, ontogenética e cultural), analistas do comportamento têm trazido para a psicologia o desafio de superar os limites estreitos já estabelecidos entre os campos psicológico, sociológico e biológico.

Os autores de Análise do Comportamento - Investigações Históricas, Conceituais e Aplicadas apresentam alguns dos aspectos que descrevem a constituição histórica da análise do comportamento que a caracteriza, hoje, como uma abordagem comprometida com a produção e difusão de um saber multidimensional e com uma ética específica. Com tal intento, discutem alguns dos conceitos básicos do sistema explicativo (como, por exemplo, os conceitos de comportamento operante e de comportamento verbal) e o impacto que trazem para alguns problemas vistos como tipica­mente envolvendo ou exigindo a atuação do psicólogo (por exemplo, o desenvolvimento humano, o diagnóstico psicológico, o desenvolvimento de habilidades acadêmicas, a terapia) e para problemas nem sempre in­cluídos entre aqueles que merecem atenção desse estudioso (por exemplo, acidentes envolvendo agentes tóxicos). Dentro dessa perspectiva histórica, os autores apresentam, também, alguns aspectos que marcaram a expan­são da análise do comportamento no Brasil.

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Investigações Históricas, Conceituais e Aplicadas

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NOTAA Editora, os Organizadores e os Colaboradores não se responsabilizam por quaisquer conseqüências advindas do uso das informações contidas neste livro. É responsabilidade do profissional, com base em sua experiência, determinar a melhor aplicação do conteúdo desta obra.

A Editora

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Investigações Históricas, Conceituais e Aplicadas

Organizadores

Emmanuel Zagury TourinhoDoutor em Psicologia: Psicologia Experimental pela Universidade de

São Paulo. Professor Titular da Universidade Federal do Pará. Programa de Pós-graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento.

Sergio Vasconcelos de LunaDoutor em Psicologia: Psicologia Experimental pela Universidade

de São Paulo. Professor Titular do Departamento de Métodos e Técnicas da Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Programa Estudos Pós-graduados em Psicologia

Experimental: Análise do Comportamento.

R O C A

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Copyright © 2010 da l- Edição pela Editora Roca Ltda.ISBN: 978-85-7241-865-2

Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida, guardada pelo sistema “retrieval” ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, seja este eletrônico, mecânico, de fotocópia, de gravação, ou outros, sem prévia autorização escrita da Editora.

Nota: Edição publicada de acordo com o novo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa.

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ.

T667i

Tourinho, Emmanuel Zagury, 1962- Análise do comportamento - investigações históricas, conceituais e

aplicadas / Emmanuel Zagury Tourinho, Sergio Vasconcelos de Luna - São Paulo : Roca, 2010.

Inclui bibliografia e índice ISBN: 978-85-7241-865-2

1. Comportamento humano. 2. Behaviorismo (Psicologia). 3. Terapia do comportamento. I. Luna, Sergio Vasconcelos de. II. Título.

10-0761. CDD: 616.89142CDU: 616.89-008.447

2010

Todos os direitos para a língua portuguesa são reservados pela

E D ITO R A R O C A LTDA.Rua Dr. Cesário Mota Jr., 73

CEP 01221-020 - São Paulo - SP Tel.: (11) 3331-4478-Fax: (11) 3331-8653

E-mail: [email protected] - www.editoraroca.com.br

Impresso no Brasil Printed in Brazil

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Dedicatória

A Análise Experimental do Comportamento (AEC), no Brasil, contou, desde seus primeiros passos, com a presença pioneira, incessante e

incansável de Carolina M. Bori. Ainda nos primórdios da AEC, um segundo nome marcou presença em quase todos os movimentos que circundavam a construção desta ciência: Maria Amélia Matos.

Ambas deixaram seus nomes registrados em quase tudo que diz respeito ao desenvolvimento, disseminação e consolidação de uma forma de

trabalhar em Psicologia, que este livro explora sob vários ângulos. Por estas razões, cada uma delas, ao seu modo, com seu estilo, marcou,

de modo profundo, o caminho percorrido pelos autores destaobra, que é a elas dedicada.

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Apresentação

Análise do Comportamento - Investigações Históricas, Conceituais e Aplicadas reúne um grupo dos melhores nomes da área no Brasil. Trabalhando na fronteira do conhecimento, todos têm produzido com qualidade, em interação com o que há de mais avançado no campo da análise do comportamento no mundo.

É importante ressaltar a seleção de temas. A partir de sua tese de doutorado em Harvard em 1931, B. F. Skinner desenvolveu a análise experimental do comportamento de indivíduos, contrapondo-se ao usual na psicologia experimental da época, a comparação entre médias de grupos com a utilização de métodos estatísticos. O sucesso da análise do comportamento com n = 1 foi tão significativo que o nome de Skinner passou a ser asso­ciado à análise experimental do comportamento (com n = 1 subentendido). Ainda que mais de 80% da produção de Skinner não tenha sido experimental, a abordagem desenvolvida por ele é mais conhecida como análise experimental do comportamento.

Mesmo no Brasil, a análise do comportamento é conhe­cida como Análise Experimental do Comportamento, uma abordagem, uma área, uma filosofia, uma tecno­logia (por exemplo, o Método ABA para o tratamento do autismo). Os trabalhos aqui colecionados mostram que o que fazemos é mais que a cuidadosa manipulação de uma variável independente em situações de laboratório e o registro fidedigno de alterações em alguma variável dependente. O presente esforço mostra por que o Brasil é um dos países líderes no desenvolvimento da análise do comportamento no mundo.

Brasília, 28 de fevereiro de 2009.João Claudio Todorov

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Colaboradores

Alexandre Dlttrich. Doutor em Filosofia pela Universidade Federal de São Carlos. Professor Adjunto do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Paraná.Ana Rita Coutinho Xavier Naves. Doutoranda em Ciências do Comportamento na Universidade de Brasília.David Alan Eckerman. Doutor em Psicologia pela Colum­bia University. PhD, Professor Emérito, University of North Carolina at Chapel Hill, EUA.Denis Roberto Zamignani. Doutor em Psicologia Clínica pela Universidade de São Paulo. Psicólogo Clínico, Profes­sor e supervisor do curso de Especialização em Terapia Analítico-comportamental do Núcleo Paradigma, do qual também é coordenador administrativo.Giovana Del Prette. Doutoranda em Psicologia Clínica pela Universidade de São Paulo. Psicóloga Clínica. Professora do Curso de Especialização em Terapia Analítico-comporta- mental do Núcleo Paradigma.Giuliana César. Mestre em Psicologia Experimental: Análise do Comportamento pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Diretora do Instituto de Terapia e Estudo do Comportamento Humano (ITECH). Professora e supervisora de estágio do Curso de Terapia Analítico-comportamental.Laércia Abreu Vasconcelos. Doutora em Psicologia pela Universidade de Brasília. Professora Adjunta da Universi­dade de Brasília. Programa de Pós-graduação em Ciências do Comportamento.Lincoln da Silva Gimenes. Doutorado em Biopsicologia pela Universidade de Chicago. Professor Titular da Univer­sidade de Brasília. Programa de Pós-graduação em Ciências do Comportamento.Marcelo Frota Lobato Benvenuti. Doutor em Psicologia Experimental pela Universidade de São Paulo. Professor Convidado e Pesquisador Associado do Programa de Pós- graduação em Ciências do Comportamento da Universidade de Brasília.

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X ■ Colaboradores

Marcus Bentes de Carvalho Neto. Doutor em Psicologia Experimental pela Uni­versidade de São Paulo. Programa de Pós-graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento da Universidade Federal do Pará.Maria Amália Pie Abib Andery. Doutora em Psicologia (Psicologia Social) pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professora Titular do Departamento de Métodos e Técnicas da Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde da Pontifí­cia Universidade Católica de São Paulo. Programa de Estudos Pós-graduados em Psicologia Experimental: Análise do Comportamento.Maria do Carmo Guedes. Doutora em Ciências Humanas: Psicologia pela Pontifí­cia Universidade Católica de São Paulo. Professora Titular do Departamento de Métodos e Técnicas da Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde da Pontifícia Universidade de São Paulo. Programa Estudos Pós-graduados em Psicologia Ex­perimental: Análise do Comportamento.Maria Eliza Mazzilli Pereira. Doutora em Educação: Psicologia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professora Associada do Departa­mento de Métodos e Técnicas da Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Programa Estudos Pós-graduados em Psicolocia Experimental: Análise do Comportamento.Miriam Marinotti. Doutora em Educação: Psicologia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Psicóloga Clínica. Professora e supervisora de Cursos de Especialização e Aprimoramento do Núcleo Paradigma.NilzaMicheletto. Doutora em Psicologia (Psicologia Social) pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Titular do Departamento de Métodos e Técnicas da Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Pro­grama Estudos Pós-graduados em Psicologia Experimental: Análise do Comportamento.Raquel Ramos Ávila. Doutoranda em Ciências do Comportamento na Universidade de Brasília.Roberto Alves Banaco. Doutor em Psicologia: Psicologia Experimental pela Universidade de São Paulo. Professor Titular do Departamento de Métodos e Técnicas da Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Psicólogo Clínico, Professor e Supervisor do curso de Especialização em Terapia Analítico-compor­tamental no Núcleo Paradigma, do qual também é coordenador acadêmico. Programa de Estudos Pós-graduados em Psicologia Experimental: Análise do Comportamento.Simone Neno. Doutora em Teoria e Pesquisa do Comportamento pela Universi­dade Federal do Pará. Psicóloga Clínica com atuação na Clínica de Psicologia da Universidade Federal do Pará.Sônia Beatriz Meyer. Doutora em Psicologia: Psicologia Experimental pela Univer­sidade de São Paulo. Professora Livre-docente em Psicologia Clínica do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo.TerezaMaria de Azevedo Pires Sério. Doutora em Psicologia (Psicologia Social). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professora Titular do Departamento de Metódos e Técnicas da Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Programa Estudos Pós-graduados em Psicologia Experimental: Análise do Comportamento.

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índice

1. Definições Contemporâneas da Análisedo Comportamento.............................................................. 1

2. Comportamento Operante: Seleção, Contiguidadee Contigência......................................................................... 15

3. Ética e Comportamento..................................................... 37

4. Especificidades e Implicações da Interpretaçãoda Linguagem como Comportamento Verbal.............. 61

5. Disseminação do Conhecimento em Análise do Comportamento Produzido no Brasil (1962-2007)... 101

6. Abordagem Analítico-comportamentaldo Desenvolvimento............................................................. 125

7. Análise do Comportamento e TerapiaAnalítico-comportamental................................................. 153

8. Função do Comportamento e do DSM:Terapeutas Analítico-comportamentaisDiscutem a Psicopatologia................................................. 175

9. Ensino da Resolução de Problemas: QuestõesConceituais e Metodológicas............................................ 193

10. Toxicologia Comportamental e Comportamentos de Segurança: Contribuições da Análise do Comportamento.................................................................... 219

ÍNDICE REMISSIVO........................................................................ 239

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CAPÍTULO

Definições Contemporâneas da Análise do Comportamento

E m m a n u e l Z a g u r y T o u r in h o T e r e z a M a r ia d e A z e v e d o P ir es Sér io

A Análise do Comportamento é frequentemente referida como uma orientação teórico-metodológica em Psicologia, ampla­mente sustentada na obra filosófica e científica de B. F. Skinner. Considerando essa vinculação filosófica e científica como um marco histórico para datar o início da Análise do Comportamen­to pode-se afirmar que tal orientação tem uma longa história que efetivamente construiu as feições que hoje podem ser vistas como suas características identificadoras. Assim, ao lado do compromisso filosófico e da produção científica dos fun­dadores, essa história deve ser um elemento fundamental em qualquer tentativa de elaborar uma definição razoavelmente compreensível dessa orientação.

Enquanto referência teórico-metodológica, a Análise do Comportamento sustenta que o comportamento constitui o objeto de estudos da Psicologia. Por comportamento, entende-se mais precisamente a relação entre organismo e ambiente, abordada sob a ótica das relações de contingências entre respos­tas e estímulos. Analistas do comportamento voltam-se, portanto, para as relações comportamentais em seus esforços para expli­car os fenômenos tradicionalmente reservados à Psicologia, aí incluídos os fenômenos cognitivos, motivacionais e emocionais.

A proposição do comportamento assim entendido como objeto de estudo trouxe um conjunto de implicações metodo­lógicas, destacando-se o estudo experimental, em situação especialmente criada para isso, das relações comportamentais.

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2 ■ Definições Contemporâneas da Análise do Comportamento

O estudo experimental em situação de laboratório com animais não humanos marcou as primeiras elaborações que viriam a constituir o corpo teórico da Análise do Compor­tamento (Skinner, 1938). E essa maneira de produzir conhecimento passou também a caracterizar a Análise do Comportamento, que, sintomaticamente, autodenominou-se Análise Experimental do Comportamento. Entretanto, essa característica nem sempre foi (ou é) bem compreendida; a construção e compreensão da história da Análise do Comportamento parecem refletir isso. Apesar da proposição clara de que a ciência do comportamento tem como objetivos a predição, o controle e a interpretação (Holland e Skinner, 1969)* e que o fazer ciência inclui uma gama ampla de atividades que vão desde a observação até a especulação (Skinner, 1974), o compromisso com a experi­mentação acabou sendo visto como uma restrição para as atividades daqueles que se dispunham a desenvolver a Análise do Comportamento.

Possivelmente, por um conjunto de pressões alheias às próprias exigências do eventual desenvolvimento da orientação teórico-metodológica adotada, as práticas de analistas do comportamento foram tornando-se mais diversificadas e, mais como re­sultado da própria prática ampliada do que como resultado direto de eventuais reflexões sobre ela ou sobre seus fundamentos filosóficos originais, a própria Análise do Com­portamento foi alargando seu horizonte de possíveis realizações. Na verdade, a própria denominação do campo de saber inaugurado por Skinner foi experimentando trans­formações. Como sugere Michael (s/d), a ampliação do número e também dos tipos de trabalhos realizados acabou dando origem a diferentes publicações: Journal of the Ex­perimental Analysis of Behavior (1958) y Journal of Applied Behavior Analysis (1968) e The Behavior Analyst (1978). Entretanto, o título das publicações nem sempre sugere de forma precisa qual foi exatamente a ampliação realizada no escopo da Análise do Com­portamento. Como ressalta Michael (s/d), a diferença entre os dois primeiros títulos pode sugerir uma oposição entre as dimensões experimental e aplicada da Análise do Comportamento, o que, segundo esse autor, não seria correto; melhor seria reconhecer uma ampliação no âmbito da pesquisa e não necessariamente em seu método; as di­mensões envolvidas seriam a básica (e não a experimental) e a aplicada (que, assim, poderia ser também experimental). O reconhecimento da necessidade de outro méto­do que não o experimental na construção da Análise do Comportamento viria com a realização de trabalhos teóricos e filosóficos; tal necessidade e o reconhecimento da diversidade de estudos e de interesses que passaram a constituir a Análise do Compor­tamento teriam como reflexos o último título {The Behavior Analyst) e também o nome da associação fundada, nos Estados Unidos, para congregar analistas do comportamen­to (originalmente, Midzwestem Association of Behavior Analysis e, a partir de 1978, Association for Behavior Analysis - International)**.

* Sobre a presença da interpretação entre as atividades do cientista, encontramos na autobiografia de Skinner um comentário interessante sobre o curso que ministrava em 1947: “Meu tratamento do comportamento humano era, em grande parte, uma interpretação, não um relato de dados experimentais. Interpretação era uma prática científica comum, mas os estudiosos da metodologia científica deram pouca atenção a ela”, (p. 27)** É possível acrescentar aos títulos já indicados de revistas voltadas especificamente para a análise do com­portamento e, possivelmente, buscar neles também um eventual resultado de alteração na configuração do campo que hoje constitui o que chamamos de Análise do Comportamento (por exemplo, Behaviorism, 1973, e, a partir de 1990, Behavior and Philosophy, The Analysis ofVerbal Behaviorl1982); Behavioristsfor the Social Action, 1978, e, a partir de 1991, Behavior and Social Issues; e The Behavior Analyst Today, 1999). No Brasil, pelo menos duas revistas podem ser vinculadas à Análise do Comportamento: Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva (1999) e Revista Brasileira de Análise do Comportamento (2005).

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Definições Contemporâneas da Análise do Comportamento ■ 3

A preocupação com ampliação do escopo da Análise do Comportamento e com a caracterização da diversidade de trabalhos e interesses que foram passando a constituir o campo do analista do comportamento não é recente e vem ganhando força na última década. Talvez se possa tomar como um marco histórico dessa re­flexão o difundido artigo de Baer, Wolf e Risley (1968) e um levantamento não sistemático poderá indicar alguns outros artigos nos quais, a despeito das perspec­tivas diferentes a que respondem, a diversidade e sua caracterização são objeto direto de discussão; somente a título de exemplo poderiam ser citados: Hayes (1978), Birnbrauer (1979), Pierce e Epling (1980), Woods (1980), Fraley (1981), Epling e Pier­ce (1983), Luna (1997), Tourinho (1999,2003), Hawkins e Anderson (2002), Moore e Cooper (2003), Rutherford (2004).

Como não poderia deixar de acontecer nesse esforço sistemático de caracte­rizar a Análise do Comportamento, além de considerar a diversidade cada vez mais ampliada de interesses (que pode ser identificada na diversidade de temas e proble­mas investigados, de atividades realizadas, de locais de trabalho) com a conseqüente diversificação de métodos empregados, os analistas do comportamento passaram a refletir sobre os próprios fundamentos filosóficos iniciais de sua orientação teó- rico-metodológica. A mudança no título da revista Behaviorism (1973) para Behavior and Philosophy (1990) pode ser vista como resultado de se assumir ex­plicitamente a reflexão filosófica como parte das atividades que formam a Análise do Comportamento.

Em um comentário a um artigo de Moore (2001), que discute posições de vários “behaviorismos” acerca dos conceitos mentais, Leigland (2003) refere-se à ambigüi­dade do termo “behaviorismo” e sua insuficiência como descritor da abordagem psicológica desenvolvida a partir do trabalho de Skinner. A favor de sua tese, Leigland cita as várias modalidades (por exemplo, Behaviorismo Clássico, Behaviorismo Mediacional, Behaviorismo Metodológico, Behaviorismo Lógico ou Filosófico, Behaviorismo Radical etc.) e as submodalidades (por exemplo, Behaviorismo Me­diacional de Tolman, Behaviorismo Mediacional de Hull) de psicologias descritas como Behavioristas. Segundo Leigland, quando o termo não é visto como ambíguo, ele significa (por exemplo, para psicólogos e filósofos) simplesmente uma posição bem estabelecida de reduzir a abordagem de “fenômenos mentais” a uma considera­ção de eventos publicamente observáveis, o que definitivamente não é compatível com a posição skinneriana.

A alternativa de assumir a designação Behaviorismo Radical é considerada igualmente insatisfatória por Leigland, em razão de toda a explicação adicional que se torna também necessária. Sobre essa alternativa, Drash (1988) já havia apontado que o termo radical também “tende a provocar reações negativas em leitores e ou­vintes” (p. 87), e Hayes e Hayes (1992) argumentaram que descreve uma posição filosoficamente inconsistente; alternativamente, Drash (1988) sugeriu a adoção do Behaviorismo Científico, e Hayes e Hayes a adoção de Behaviorismo Contextualista. Análise e discussões, tais como essas, só reafirmam que, entre as diversas atividades possíveis de um analista do comportamento, esta é a própria reflexão filosófica, ou mais especificamente, a reflexão relacionada a questões sobre a produção de conhe­cimento. Ao assumir esta atividade como constituinte da Análise do Comportamento, entretanto, cria-se um problema no mínimo interessante: a Análise do Comporta­

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4 ■ Definições Contemporâneas da Análise do Comportamento

mento deveria ser definida e caracterizada a partir de concepções filosóficas mais amplas de tal forma que comportasse a divergência e, portanto, a convivência de diferentes posições que estariam todas abrigadas dentro dessa concepção mais ampla. Esta atividade - a reflexão filosófica - não é objeto deste capítulo; exemplos dela são apresentados apenas como forma de ilustrar sua presença na Análise do Comportamento e, com isso, discutir aquilo que é aqui objeto central: a identificação e caracterização das diversas atividades que, hoje, constituem o campo da Análise do Comportamento.

Em um artigo sobre a distinção entre ciência e prática em Análise do Compor­tamento, Hawkins e Anderson (2002) argumentam que a intervenção profissional de base analítico-comportamental não se confunde com a pesquisa em Análise do Comportamento, mesmo quando se pensa em termos de Análise do Comportamen­to Aplicada (o que concorda com a análise proposta por Michael [s/d], de que os pontos extremos em um continuum são pesquisa básica versus pesquisa aplicada); entretanto, com a distinção agora proposta - entre ciência e prática - outro conti­nuum está sendo introduzido, continuum no qual os pontos extremos são pesquisa versus aplicação. O controle experimental, que na pesquisa básica e aplicada apresen­ta-se como uma exigência, não constitui um requisito para a intervenção do profissional e, frequentemente, nem lhe está acessível. Luna (1997) já focalizava esse problema, ao apontar que o terapeuta (analítico-comportamental) tem compromisso com seu cliente, não com a produção de conhecimento e, desse modo, não está submetido às exigências proceduais que se aplicam ao cientista, especialmente aquelas que definem a investigação experimental (básica ou aplicada) em Análise do Compor­tamento. Hawkins e Anderson apontam que “a responsabilidade primária de um praticante [da Análise do Comportamento] é oferecer ajuda de excelência ao cliente ou paciente, não contribuir para o nosso corpo de conhecimento sobre quais inter­venções influenciam quais resultados” (p. 116). Hawkins e Anderson (2002) propõem, então, que as diferentes práticas de analistas do comportamento sejam reconheci­das sob a forma de designações correspondentes. Para eles:

podemos... identificar pelo menos quatro papéis que um analista do comportamento pode desempenhar: analista conceituai do comportamento, analista básico do comportamento, analista

do comportamento aplicado e praticante analítico-comportamental Qualquer analista do comportamento pode se engajar em qualquer um

(ou mais) desses papéis em diferentes momentos e poucos analistas do comportamento se engajam em todos. Talvez mais importante do que isso,

(...) cada um desses quatro papéis é uma parte extremamente valiosa da análise do comportamento e cada um merece respeito total e igual. (p. 119)

A caracterização oferecida por Hawkins e Anderson (2002) não apenas consi­dera constitutivas da Análise do Comportamento práticas profissionais não vinculadas à produção de conhecimento, como reconhece vertentes diversas da própria produção de conhecimento analítico-comportamental. Isto é, de um lado, as aplicações da Análise do Comportamento são algo diverso e adicional ao que se tem denominado de Análise do Comportamento Aplicada. De outro, a Análise

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Definições Contemporâneas da Análise do Comportamento ■ 5

do Comportamento Aplicada constitui uma vertente da produção de conhecimen­to na qual se articulam a análise conceituai do comportamento e a Análise Experimental do Comportamento.

Moore e Cooper (2003) oferecem uma interpretação semelhante à de Hawkins e Anderson (2002), porém sugerindo que as práticas de analistas do comporta­mento variam ao longo de um continuum de atividade que vai de uma maior preocupação com o conhecimento fundamental a uma maior preocupação com a aplicação. Moore e Cooper situam a Análise Experimental do Comportamento e a oferta de serviços nos extremos desse continuum, e a Análise do Comporta­mento Aplicada em uma posição intermediária. Sua maior preocupação ao longo desse artigo consiste em explicitar as diferenças entre a oferta de serviços e a pes­quisa em Análise do Comportamento Aplicada.

Os provedores de serviço têm pouca necessidade de se preocupar com condições de pesquisa formalmente controladas, com medidas de fidedignidade e com a publicação avaliada por pares. No lugar disso,

precisam solucionar problemas eficientemente, de forma direta e a um custo razoável em termos financeiros e de tempo. (Moore e Cooper, 2003, p. 82)

Curiosamente, Moore (um analista do comportamento que se dedica primaria­mente a trabalhos conceituais e filosóficos) e Cooper (2003), em várias passagens do artigo, ignoram que Hawkins e Anderson (2002) fazem referência à análise con­ceituai do comportamento como um “papel” desempenhado pelo analista do comportamento, como os demais. Na parte final do artigo, Moore e Cooper reco­nhecem a Análise Conceituai do Comportamento como uma quarta dimensão da Análise do Comportamento atribuem a ela a função de “informar os outros domínios” (p. 80) sobre questões filosóficas e teóricas. De qualquer modo, o que Moore e Cooper argumentam centralmente é que, se em outros momentos houve uma preocupação com a diferenciação entre Análise Experimental do Comportamento e Análise do Comportamento Aplicada, o que mais importa no momento é esclarecer a distinção entre Análise do Comportamento Aplicada e a prestação de serviços.

Em uma direção de valorização das investigações não-experimentais (e não aplicadas) em Análise do Comportamento, Rutherford (2004) chama a atenção para o crescimento e diversificação dos estudos históricos em Análise do Comportamen­to. Segundo a autora, historiadores da Análise do Comportamento agora se voltam para mais do que a construção do sistema explicativo skinneriano, focalizando a área como um todo e as contribuições de vários analistas do comportamento, uma mudança considerada “crucial... se for para a história da Análise do Comportamen­to continuar a desenvolver-se de modo sofisticado e vigoroso” (Rutherford, p. 2). Em seguida, Rutherford propõe que consideremos a história da Análise do Comporta­mento como uma outra dimensão do sistema descrito por Moore e Cooper (2003):

Concluo com um acréscimo à recente divisão da análise do comportamento por Moore e Cooper em quatro partes... sugiro que a análise

do comportamento considere a adição da história a esse esquema, conferindo a ela um papel junto ao behaviorismo radical como filosofia, informando as

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6 ■ Definições Contemporâneas da Análise do Comportamento

outras três ramificações. E que tal uma filosofia behaviorista radical da história? Uma explicação behaviorista radical do

comportamento do historiador? O futuro da história da análise do comportamento é de fato brilhante. (Rutherford, 2004, p. 3)

Se, a pesquisa básica experimental inegavelmente tem respondido pela maior parte da produção de conhecimento e impulsionado o desenvolvimento da Aná­lise do Comportamento em todas as direções, parece, atualmente, ser inegável também que o estabelecimento de pesquisas em outros domínios, como, por exemplo, o conceituai e o histórico, fez com que os métodos da Análise do Com­portamento se estendessem para além da experimentação. Uma argumentação desse tipo foi oferecida por Donahoe (2004), no contexto de uma discussão da proposição de Skinner (1945) de que a interpretação é um método válido, quando a experimentação não é possível. Segundo Donahoe (2004):

Skinner distinguiu dois aspectos complementares da ciência - a análise experi­mental e a interpretação... A análise experimental só é possível

quando as condições permitem a manipulação elou controle de todas as variáveis antecedentes e a mensuração de todas as conseqüências que

participam de relações funcionais ordenadas com aqueles antecedentes. Apenas no laboratório podemos nos aproximar desse

estado idealizado. No caso específico da análise do comportamento, as condições para a análise experimental geralmente requerem o uso de

animais não-humanos, a fim de controlarmos sua história pré-experimental.Dessa perspectiva, muitos experimentos - incluindo a maior parte dos experimentos valiosos - não se aproximam suficientemente daquelas

condições idealizadas para qualificarem-se como análises experimentais. A interpretação acontece quando algum fenômeno é observado sob

condições que não possibilitam a análise experimental, mas ao qual podem se aplicar para a sua explicação, os frutos de análises experimentais anteriores. O comportamento complexo - especialmente o comportamento humano - é

quase sempre o domínio da interpretação, não da análise experimental, (p. 83)

Observe-se que as condições definidas por Donahoe (2004) como ideais para a experimentação são condições de difícil acesso, mesmo na pesquisa com organismo não humanos, mas especialmente na investigação com organismos humanos. Assim, poderíamos dizer não apenas que “todas as aplicações da análise do comportamen­to a campos como a educação e a remediação do comportamento disfuncional são instâncias de interpretação” (Donahoe, 2004, p. 84), mas, que o continuum entre a Análise Experimental do Comportamento e a oferta de serviços, sugerido por Moore e Cooper (2003) poderia ser descrito como envolvendo uma passagem gradual da experimentação para a interpretação, de forma que, próximo a um extremo estaria a pesquisa experimental básica realizada em laboratório com organismos não hu­manos (aqui há um grau avançado de controle de variáveis, mas não aquelas condições ideais de controle referidas por Donahoe - portanto, há também um grau de interpretação) e no outro a pretação de serviços; entre um e outro, encontraríamos

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Definições Contemporâneas da Análise do Comportamento ■ 7

um conjunto de atividades de pesquisa que já conteria muito da atividade de inter­pretar, mesmo que mantendo algumas características da manipulação de variáveis, típica da experimentação. A rigor, podemos supor (e isso é também uma interpre­tação) que, assim como a complexidade do comportamento varia ao longo de um continuum, as descrições que podemos oferecer variam ao longo de um continuum que vai de uma maior fundamentação experimental a uma maior dose de interpre­tação. Donahoe, porém, considera indispensável especificarmos em que consiste exatamente a interpretação como método, uma questão que não tem recebido suficiente atenção, entre outros, em razão do reduzido número de analistas do comportamento dedicados ao trabalho conceituai ou reflexivo. No entanto, desde a proposição de Skinner (1945), a interpretação em Análise do Comportamento difere da interpreta­ção na Psicologia mentalista; enquanto a primeira se volta para o comportamento humano complexo com os princípios e conceitos derivados da investigação expe­rimental, a última lança mão de processos inferidos da própria observação do comportamento humano complexo. Possivelmente, esta diferença reflete concepções diferentes de conhecimento científico; como já foi indicado, possibilitar a interpre­tação é um dos objetivos da prática científica, ao lado da predição e do controle (Holland e Skinner, 1969).

Nos últimos anos, a expansão dos horizontes da Análise do Comportamento tem encontrado expressão também nas instituições que representam a área. Em particular a Association for Behavior Analysis - International (ABA), principal entidade a reunir pesquisadores e profissionais em Análise do Comportamento, vem repercutindo as transformações mencionadas. Midgley (2002) descreve a ABA assinalando que:

... é uma organização dedicada ao campo da análise do comportamento - uma abordagem baseada na ciência natural

do comportamento, frequentemente associada com o ‘behaviorismo radical de B. F. Skinner. Entre as suas áreas de especialização estão a

análise experimental do comportamento (pesquisa básica)t a análise do comportamento aplicada (a pesquisa aplicada e clínica) e a análise

conceituai do comportamento (a pesquisa teórica e histórica). Essas áreas têm em comum a conceitualização do comportamento em termos

naturalísticos e a rejeição do dualismo psicoflsico e de explicações para o comportamento formuladas em termos de processos, estados e eventos

mentais hipotéticos. (Midgley, 2002, p. m)

Na página eletrônica da ABA (www.abaintemational.org) vemos que sua missão é “desenvolver, avançar e sustentar o crescimento e vitalidade da análise do compor­tamento por meio da pesquisa, da educação e da prática”. Mas é na organização de suas reuniões científicas anuais que encontramos um indicador mais preciso do im­pacto das mudanças no funcionamento da ABA. Desde 1975, a ABA (inicialmente uma associação regional, a Midwestern Association of Behavior Analysis) vem realizando convenções anuais, em diferentes locações nos Estados Unidos e no exterior (em 2002, a convenção aconteceu em Toronto, Canadá). A partir de 2001, passou a realizar con-

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8 ■ Definições Contemporâneas da Análise do Comportamento

ferências internacionais, todas fora dos Estados Unidos (Veneza, Itália, em 2001; Campinas, Brasil, em 2004; Pequim, China, em 2005; e Sidney, Austrália, em 2007).

A partir de 1979, as convenções anuais da ABA passaram a indicar a área de cada trabalho. Atualmente, essas áreas incluem:

• Autismo.• Farmacologia comportamental.• Clínica, família e medicina comportamental.• Intervenções em comunidades, questões sociais e éticas.• Atraso no desenvolvimento.• Desenvolvimento humano e gerontologia.• Análise experimental do comportamento.• Educação.• Gestão do comportamento em organizações.• Ensino de análise do comportamento.• Questões teóricas, filosóficas e conceituais.• Comportamento verbal.• Outros.• Internacional (sic).

Além dessas áreas, que refletem temas específicos de interesse, a partir do ano de 2000, os trabalhos passaram a ser categorizados também quanto à natureza em: “trabalhos com base em dados” e “outros”. Essa classificação, ao mesmo tempo em que diferencia o que não é trabalho empírico (com base em dados), legitima e esti­mula a apresentação de trabalhos de outra natureza nos eventos da ABA.

Mais importante, a partir de 2005, as categorias dos trabalhos apresentados nos eventos da ABA (as convenções anuais e as conferências internacionais) deixam de ser duas e passam a ser quatro: “Análise Experimental”, “Análise do Comportamen­to Aplicada”, “oferta de serviços” e “teoria”, o que está inteiramente em acordo com aquela visão que foi se estabelecendo da Análise do Comportamento como uma disciplina multidimensional.

A maior diversificação das produções em Análise do Comportamento e seu reconhe­cimento institucional em vários contextos, nos últimos anos, não acontecem simplesmente por força de uma percepção diferente que analistas do comportamento passam a ter de si mesmos e de suas potencialidades, mas, principalmente, como re­sultado de contingências sociais mais amplas e complexas, relacionadas à configuração do mercado de trabalho para analistas do comportamento nos Estados Unidos (princi­palmente) e em outros países. Uma análise dessas contingências está para além dos objetivos deste capítulo. Mas apenas para dar uma ideia do que acontece nesse domínio, vale a pena citar que, atualmente, uma parte considerável das apresentações de traba­lhos em eventos da ABA nos Estados Unidos, nas várias categorias, versam sobre o atendimento a autistas, por uma razão simples: há uma legislação federal que garante recursos para o atendimento a autistas e um reconhecimento da eficácia de programas com base na Análise do Comportamento, de modo que as instituições que oferecem aquele serviço e agências que financiam a pesquisa na área tendem a preferir contratar profissionais ou apoiar pesquisadores com formação em Análise do Comportamento.

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Definições Contemporâneas da Análise do Comportamento ■ 9

Um outro exemplo de como aquelas contingências operam é encontrado comparando-se a produção de conhecimento e a oferta de serviços na área da tera­pia analítico-comportamental, nos Estados Unidos e no Brasil. Nos Estados Unidos, a oferta da psicoterapia é coberta por seguros ou planos de saúde, que só autorizam despesas com tratamentos “empiricamente validados”, sendo essa validação estabe­lecida por meio de estudos que se fundamentam em uma lógica conceituai e me­todológica conflitante como a da Análise do Comportamento (Neno, 2005). Como resultado, há poucos tratamentos de base analítico-comportamental empiricamente validados, a modalidade de psicoterapia dominante é a terapia cognitivo-compor- tamental, e há poucos pesquisadores em Análise do Comportamento dedicados à pesquisa em terapia analítico-comportamental. No Brasil, ao contrário, a psicote­rapia não é coberta por seguros ou planos de saúde, a oferta é livre, e o consumo do serviço está baseado em informações sobre a satisfação de usuários. Especialmen­te na última década, com as publicações e eventos promovidos pela Associação Brasileira de Psicoterapia e Medicina Comportamental (ABPMC), a oferta de terapia de base analítico-comportamental multiplicou-se, assim como a produção de co­nhecimento sobre essa modalidade de intervenção. Como resultado, há muito mais produção brasileira do que norte-americana sobre a terapia analítico-comporta­mental, ainda que essa produção seja muito heterogênea do ponto de vista de sua articulação com investigações básicas e conceituais em Análise do Comportamen­to (algumas vezes consistem apenas de descrições de intervenções).

Voltando à questão da conformação contemporânea da Análise do Compor­tamento, adimitindo suas quatro dimensões, a diversidade de métodos na investigação e produção de conhecimento e a natureza peculiar dos procedimen­tos de intervenção do profissional com formação analítico-comportamental, é possível relacionar esse estágio de desenvolvimento da área com certos aspectos da constituição da Psicologia como campo de conhecimento e como profissão de ajuda. Tourinho (2003) assinalou que:

...por razões histórico-sociais, a Psicologia se ediflca como um campo do saber que envolve simultaneamente:

(a) Um esforço reflexivo sobre a natureza humana, seus problemas e suas pos­sibilidades de realização em diferentes domínios da vida (social, material, intelectual, religioso etc.).

(b) Uma investigação cientificamente orientada para a descoberta de regulari- dades dos fenômenos psicológicos (um modo de tentar apreender as novas experiências sob a forma de enunciados que incorporam os requisitos em- pírico-racionais da emergente ciência).

(c) Uma profissão de ajuda, voltada à solução de problemas humanos, (p. 35).

No mesmo artigo, Tourinho (2003) propõe a interpretação da Análise do Com­portamento como um campo do saber que assume determinada conformação em resposta às demandas tradicionalmente dirigidas à disciplina psicológica. Recu­perando uma ideia anteriormente formulada (Tourinho, 1999) de interpretar o campo da Análise do Comportamento como um triângulo, cujos vértices são re­

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10 ■ Definições Contemporâneas da Análise do Comportamento

presentados pela trabalhos conceituais/filosóficos, trabalhos de intervenção e pesquisas empíricas, Tourinho (2003) sugere que o Behaviorismo Radical a Análi­se Experimental do Comportamento e a Análise do Comportamento Aplicada constituem os vértices de um campo condicionado pelos três tipos de demandas dirigidas à Psicologia, mas cujas produções podem se diversificar muito mais, localizando-se em posições variadas da área interna daquela figura. A Figura 1.1 reproduz essa representação da Análise do Comportamento.

Levando em conta as caracterizações mais recentes da Análise do Comporta­mento, podemos pensá-la como um campo do saber no interior do qual se articulam tipos variados de produção, mais ou menos aproximados de três refe­rências principais:

• Investigação básica de processos comportamentais.• Produções reflexivas ou metacientíficas.• Intervenções voltadas para a solução de problemas humanos.

Falamos dessas três referências como constitutivas de um mesmo campo, porque o que se produz em uma área é de algum modo regulado pelo que se pro­duz nas demais. Além disso, essas referências podem condicionar de diferentes modos as produções em Análise do Comportamento, gerando uma diversidade muito maior de realizações.

A investigação básica consiste da produção de conhecimento acerca do objeto que define primariamente o campo da Análise do Comportamento, isto é, as relações comportamentais, sob a forma de identificação de regularidades dessas relações. A investigação básica em Análise do Comportamento é tipicamente experimental. Variações metodológicas nas tentativas de estabelecer tais regularidades em geral representam produções mais afastadas do vértice da investigação básica, mais pró­ximas de outros vértices, em posições internas do nosso triângulo epistêmico.

As produções reflexivas ou metacientíficas reúnem tanto trabalhos mais filo­sóficos, quanto investigações científicas propriamente ditas, de caráter histórico, teórico ou conceituai. As últimas são aqui designadas como metacientíficas, de um lado, para assinalar que continuam sendo trabalhos cientificamente validados, não são apenas reflexões filosóficas sobre os objetivos, o objeto e os métodos da

Behaviorismo Radical

Análise do AnáliseComportamento Experimental do

Aplicada Comportamento

Figura 1.1 - Representação da Análise do Comportamento de acordo com Tourinho (2003).

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Definições Contemporâneas da Análise do Comportamento ■ 11

Análise do Comportamento (como Skinner, 1963/1969, definia o Behaviorismo Radical); por outro lado, seu objeto é a própria investigação básica dos processos comportamentais e questões a ela associadas.

As intervenções voltadas para a solução de problemas humanos são aquelas que se ocupam dos problemas usualmente reservados à Psicologia como profissão, frequentemente problemas relacionados ao processo de individualização no mun­do moderno, no campo da saúde mental, da educação, do trabalho etc. Como discutido acima, essas intervenções não se confundem com a pesquisa aplicada, não reproduzem seus métodos e não estão comprometidas com a produção de conhecimento, mas com o atendimento de demandas da população. Onde fica, então, a pesquisa aplicada em Análise do Comportamento, em nosso triângulo epistêmico? Em algum lugar intermediário, entre o vértice da investigação básica e o vértice das intervenções analítico-comportamentais.

Elaborado desse modo, podemos pensar que as quatro dimensões do campo da Análise do Comportamento sugeridas por Hawkins e Anderson (2002) são apenas algumas das diversas realizações possíveis da disciplina. Por exemplo, ao lado da análise conceituai do comportamento, podemos considerar estudos filosóficos e históricos em Análise do Comportamento como outros tipos de produção reflexiva ou metacientífica. A proposta de Rutherford (2004) sobre a história da Análise do Comportamento, uma filosofia Behaviorista Radical da história etc. acomoda-se igualmente no vértice das produções reflexivas ou me- tacientíficas. Estas, por seu turno, não precisam ser vistas como uma área que, de fora, informa as outras, como sugerido por Moore e Cooper (2003), mas podem ser consideradas produções que regulam e são reguladas pelas demais, também variando quanto aos aspectos metodológicos e a conexões com interesses na solução de problemas humanos.

Em uma direção diferente, podemos considerar as análises comportamentais da cultura como produções que se situam em alguma posição intermediária entre os estudos reflexivos e a investigação básica (algumas vezes, também conectadas de modo próximo com estudos aplicados a aplicações da Análise do Comporta­mento). Isto é, são produções que podem se aproximar mais de um ou outro vértice do triângulo epistêmico da Análise do Comportamento, sendo reguladas pelos avanços em cada um dos campos que o constituem.

O aspecto mais importante na presente discussão consiste no reconhecimento do caráter multidimensional da Análise do Comportamento e do processo em cur­so de diversificação das produções em seu âmbito. Há várias razões para que esse reconhecimento seja enfatizado nos dias de hoje. Ainda hoje prevalece, dentro e fora da Análise do Comportamento, uma concepção que identifica o campo analítico-- comportamental com a Análise Experimental do Comportamento. Externamente, essa identificação funciona para desqualificar a Análise do Comportamento, sugerin­do uma estreiteza de seus horizontes, o que impacta o reconhecimento social de analistas do comportamento e seu acesso ao mercado de trabalho da Psicologia. Internamente, essa identificação funciona para, entre outras razões, reduzir o valor ou a importância de produções não experimentais, o que tende a ser evitado quan­do analistas do comportamento dedicam-se a programas amplos de pesquisa que envolvem produções básicas, conceituais e aplicadas.

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12 ■ Definições Contemporâneas da Análise do Comportamento

Outra razão para destacarmos a multidimensionalidade da Análise do Compor­tamento consiste no notório desequilíbrio da produção na área e da necessidade de superá-lo, ampliando as realizações de analistas do comportamento dedicados a produções não experimentais. Por muitos anos, analistas do comportamento dedica- ram-se em sua grande maioria à investigação básica, o que impactou positivamente a disciplina de vários modos, mas não favoreceu que ela se desenvolvesse com vigor em todas as direções possíveis.

A afirmação da Análise do Comportamento como campo do saber multidimen­sional, nos termos discutidos anteriormente, também a qualifica como sistema psicológico, isto é, como um conjunto de práticas que responde às demandas que a cultura cotidianamente dirige à Psicologia. Esse reconhecimento deve trazer con­seqüências para o acesso e atuação de analistas do comportamento em contextos variados de produção e gestão das práticas psicológicas na cultura.

Por último, a caracterização aqui oferecida da Análise do Comportamento sugere termos à frente e também um desafio para a formação de analistas do comportamento. Se, é verdade que a especialização do conhecimento e das funções sociais são quase inescapáveis no mundo contemporâneo, precisamos buscar soluções para que ela não afete a formação de analistas do comportamento sob a forma de um domínio restrito do conhecimento e das técnicas desse campo de saber. Refletir sobre o impacto desse reconhecimento nas disciplinas vinculadas à Análise do Comportamento, em cursos de graduação e pós-graduação (incluin­do os de especialização que têm entre seus objetivos a formação de analistas do comportamento), talvez seja uma tarefa das mais urgentes.

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CAPÍTULO

Comportamento Operante: Seleção, Contiguidade

e Contingência*

M a r c e l o F r o t a L o b a t o B e n v e n u t i M a r c u s B e n t e s d e C a r v a lh o N e t o

O modelo de seleção por conseqüências de B. F. Skinner (1981,1990) contribuiu para uma reflexão sobre o papel se­letivo do ambiente na determinação da ação humana, em diferentes níveis de interação: filogenético, ontogenético e cultural. Na ontogênese, a noção de comportamento ope­rante desempenha uma função-chave para a compreensão da atuação dos processos de variação e seleção na constru­ção de relações comportamentais.

Antes da elaboração formal do modelo selecionista, na abertura do livro O ComportamentoVerbal Skinner (1957/1992) caracteriza o comportamento operante do seguinte modo: “Os homens agem sobre o mundo, mudando-o, e por sua vez são modificados pelas conseqüências de sua ação (p. 1, itálicos acrescentados).

Em Ciência e Comportamento Humano, Skinner (1953/ 1965) descreve o operante ao contrastá-lo com o reflexo:

* Os autores agradecem aos professores Carlos Eduardo Costa, Jair Lopes Junior e Tereza Pires Sério pelos comentários e sugestões ao texto durante seu processo de elaboração.

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16 ■ Comportamento Operante: Seleção, Contiguidade e Contingência

Os reflexos, condicionados ou não, estão mais relacionados à fisiologia interna do organismo. Estamos mais frequentemente interessados,

entretanto, no comportamento que tem algum efeito sobre o mundo ao redor... As conseqüências do comportamento podem retroagir sobre o organismo. Quando isso acontece, podem alterar a probabilidade do

comportamento que as produziu ocorrer novamente.(p. 59, destaque acrescentado)

Keller e Schoenfeld (1950/1974) definem o comportamento operante ao con­frontarem as propostas de E. L. Thorndike e Skinner:

... quando se compara o princípio do condicionamento Tipo R com a lei do efeito, pode-se notar uma grande concordância. Ambas as formulações dão

ênfase à influência do resultado de uma resposta sobre sua força: Thorndike a denomina aisatisfação” e Skinner fala de íestímulo reforçador.

(p. 68, destaque acrescentado)

Ferster, Culbertson e Boren (1968/1979), por sua vez, definem o mesmo tipo de comportamento da seguinte forma: Os operantes atuam sobre o ambiente. Os desempenhos que modificam ou atuam sobre o ambiente são chamados de ope­rantes. (p. 31, destaque acrescentado)

Note-se que nesse contexto o operante teria as seguintes propriedades:

• Primeiro, ocorre uma resposta e, depois, um estímulo (relação R-S).• O responder é alterado pelos seus efeitos no ambiente (especialmente a

probabilidade de ocorrência do responder).• As conseqüências são produzidas pelo responder inicial.

Mais recentemente, Catania (1998/1999) define comportamento operante a partir de características similares:

O comportamento tem conseqüências, e uma propriedade importante do comportamento é que ele pode ser afetado por suas conseqüências. Podemos estudar esse fenômeno programando conseqüências para o

comportamento, mas programar conseqüências envolve mais do que simplesmente apresentar estímulos. Os estímulos devem ocorrer em

alguma relação com o comportamento. O ambiente deve ser programado de tal forma que as respostas farão com que algo aconteça.

(p. 81, destaque acrescentado)

Na mesma época, Pierce e Epling (1999) definiram comportamento operante também enfatizando que as conseqüências seriam produzidas pela resposta:

Formalmente, respostas que produzem uma mudança no ambiente são chamadas operantes. O termo operante vem do verbo operar e se refere ao

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Comportamento Operante: Seleção, Contiguidade e Contingência ■ 17

comportamento que opera sobre o ambiente para produzir conseqüências... Os operantes são definidos pelas conseqüências

que eles produzem, (p. 92, destaque acrescentado)

Em contraste, definições como as oferecidas por Reese (1966/1973) retiram a exigência de uma relação de contingência entre resposta à mudança ambiental:

O comportamento operante é fortalecido ou enfraquecido por eventos posteriores à resposta. Enquanto o comportamento respondente é

controlado por seus antecedentes, o comportamento operante é controlado por suas conseqüências, (p. 15, destaque acrescentado)

Millenson (1967/1975) partilha de uma posição similar:

Dizer que o reforço é contingente a uma resposta pode significar apenas que ele segue a resposta e não implica necessariamente numa ligação

física direta entre a resposta e o reforçador. O reforço pode ser mediado pelo comportamento de um experimentador, ou por algum outro aparelho

automático. O efeito do reforço no comportamento é indiferente aos meios pelos quais a correlação temporal entre R eS + é efetuada.

O poder automático do reforço em fortalecer o comportamento nos lembra que, do mesmo modo que o condicionamento pavloviano, sempre que as condições temporais para o procedimento de fortalecimento operante

são alcançadas (na selva, no lar, no laboratório), é provável que a ocorrência de modificações no comportamento.

(p. 94, destaque acrescentado)

Observa-se, a partir da amostra aqui apresentada, que a literatura analítico-com­portamental define sua principal ferramenta conceituai de modo inconsistente. Para se caracterizar uma relação como operante deveria ou não existir contingência entre res­posta e mudança ambiental? O evento subsequente precisa ou não ser produzido pela classe de respostas? Havendo apenas uma relação de contiguidade, caberia ainda o termo “operante”? Sem a contingência operante é possível falar em reforço?

O objetivo deste capítulo é discutir o papel seletivo do ambiente no comportamento individual a partir de estudos que avaliaram o efeito da apresentação não contingen­te de eventos subsequentes à resposta. A demonstração de efeitos seletivos sobre a variabilidade comportamental por eventos não contingentes parece exigir uma revi­são conceituai, tanto em relação aos mecanismos exatos em funcionamento na seleção do responder ontogenético, quanto em relação aos termos tradicionalmente utilizados (em especial, os conceitos de “operante”, “conseqüência” e “reforço”).

Elaboração Inicial do Conceito de OperanteCom a noção de operante, na Análise do Comportamento (AC), uma ênfase cada vez maior foi dada para o ambiente que ocorria depois da ação. Com o fortaleci­

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18 ■ Comportamento Operante: Seleção, Contiguidade e Contingência

mento da investigação empírica e da própria discussão conceituai, a AC foi gradualmente abrindo mão do modo causai mecanicista presente nas primeiras tentativas de tomar o comportamento como objeto da psicologia. O modo causai de seleção pelas conseqüências substituiu o modo causai mecânico, em que ex­plicar significa, em grande medida, buscar a causa para uma resposta em um evento ambiental anterior. Na passagem do modo causai mecanicista para o se- lecionável nem sempre os dados empíricos e as discussões conceituais andaram juntos. Mesmo diante de dados que indicavam o papel do ambiente que vinha após a ação, psicólogos experimentais ainda relutaram em abandonar o modelo explicativo mecânico (Ringen, 1993).

E. L. Thorndike, por exemplo, formulador da “lei do efeito”, aparece frequen­temente em livros-texto de psicologia como um dos pioneiros do estudo do que mais tarde ficou conhecido como aprendizagem instrumental ou operante (ver, por exemplo, Catania, 1998/1999). Thorndike estudava como o comportamento de seus animais era modificado pelos eventos posteriores à ação: colocados em uma caixa-problema, achavam a solução que os levava para fora cada vez mais rápido à medida que fossem re-expostos à mesma situação. Embora a lei formula­da por Thorndike mostrasse o papel das conseqüências sobre o responder, a explicação de como o comportamento era modificado ainda era de uma causa para um efei­to: supunha-se que a conseqüência fortalecia certas conexões estímulo-resposta no cérebro dos animais. À medida que as conexões eram fortalecidas, o compor­tamento “certo” ocorria cada vez mais rápido. A explicação mecanicista, vinculada ao fisiologismo, parece sugerir uma dificuldade no reconhecimento explícito e independente do papel seletivo do ambiente.

Ringen (1993) mostra que o trabalho de autores que ficaram conhecidos como neobehavioristas mudou a ênfase da AC da formulação S-R para uma noção em que o organismo é visto como um sistema “dirigido a objetivos” {goal-directed sistems). A noção de sistema “dirigido a objetivos” pode sugerir a adesão necessária a um modo de explicação teleológico, em que a causa é colocada no futuro. Segun­do a análise de Ringen, contudo, Skinner teria rejeitado um modelo teleológico de explicação do comportamento, postulando a noção de seleção por conseqüências como uma alternativa histórica, mostrando como algo que acontece depois do responder poderia ainda assim atuar na determinação do comportamento.

O selecionismo é um modelo causai razoavelmente recente na história das ciên­cias (Skinner, 1981). Charles Darwin, com a teoria da evolução, buscou explicar a origem e a diversidade da vida com base na ideia de seleção natural (Darwin, 1959/1998; Gould, 1989, 1992). Suas proposições, em conjunto com as de A. R. Wallace, tiveram um impacto enorme sobre o pensamento ocidental e, em especial, sobre o pensamento científico dos últimos dois séculos. Uma das primeiras contri­buições do pensamento evolucionista de Darwin e Wallace é o reconhecimento de que as mudanças naquilo que define uma espécie dependem do intercâmbio dos membros dessa espécie com o ambiente; ambiente que, sobre a variabilidade dos indivíduos da espécie (aspectos anatômicos, fisiológicos e comportamentais), exerce um papel seletivo. A ideia de adaptação - um dos aspectos centrais no pen­samento darwiniano - já aparecia na teoria de evolução de Lamarck. Para Gould (1989), contudo, o pensamento darwiniano e o lamarckiano divergem na compreen­

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são de como ocorre a adaptação e como os traços que se mostram adaptativos à determinada situação são transmitidos de geração a geração:

No lamarckismo, a transmissão é direta. Um organismo dá-se conta da mudança ambiental, responde a ela de maneira “correta” e passa

diretamente à descendência a reação apropriada. O darwinismo, por outro lado, é um processo de duas fases em que as forças responsáveis pela

variação e pela seleção são diferentes, (p. 67-68)

O modelo de seleção por conseqüências de Skinner (1981,1990) sugere que os processos de variação e seleção não operam apenas no surgimento de novas espécies. Os mesmos processos básicos estão também na construção do repertório individual e no surgimento e manutenção das práticas culturais (Catania e Harnard, 1988; Matos, Machado, Ferrara, Silva, Hunziker, Andery, Sério e Figueiredo, 1989; Andery, Micheletto e Sério, 2008; Skinner, 1981,1990). No comportamento operante atuaria um “segundo nível” de seleção pelas conseqüências: respostas de um organismo são emitidas e selecionadas por eventos ambientais que se seguem a elas. Assim, a análise do comportamento individual também pode ser feita, como na seleção natu­ral, com base em mecanismos de variação e seleção. Como na análise de Darwin sobre a transformação das espécies, a análise do operante exige a reflexão sobre variação e seleção como duas forças separadas, mas trabalhando em conjunto na produção de repertórios comportamentais.

O conceito de operante passou por elaborações desde que Skinner começou a mostrar que a noção S-R era insuficiente como unidade de análise de uma ciência do comportamento (Andery, 1990; Sério, 1990;Todorov, 2002). Skinner (1953/1965) se preocupou em definir e discutir a relação do conceito com o comportamento humano. Em especial, mostrando como a ênfase nas conseqüências do comporta­mento obriga a mudanças importantes no modo de falar sobre, estudar e, ao fim, interpretar o comportamento.

Um dos primeiros pontos destacados por Skinner (1953/1965) é em relação ao papel do que ocorre depois das ações do organismo, justamente porque a ênfase dada pelo autor é na seleção exercida pelo ambiente produzido pelo próprio orga­nismo. Com a noção de operante, o ambiente que deve ser considerado em primeiro lugar é o subsequente às ações do organismo, e não aquele que ocorre antes, como enfatizava a psicologia S-R. Se na psicologia S-R o ambiente causa (de modo me­cânico) a resposta, o comportamento operante causa a mudança ambiental subsequente ao responder e contribui para a construção de relações comporta­mentais, mudando a probabilidade de uma resposta ocorrer no futuro em condições similares. O evento subsequente, o ambiente posterior à resposta, mo­difica a classe, alterando a probabilidade de uma resposta semelhante voltar a ocorrer em contextos similares. Identificar a probabilidade da resposta, variando ao longo dos extremos tudo ou nada, é o desafio de uma análise do comportamento.

Sobre a definição de operante, Skinner (1953/1965), comenta:

... a unidade de uma ciência preditiva não é uma resposta, mas sim uma classe de respostas. A palavra “operante” será usada para essa classe.

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O termo enfatiza o fato que o comportamento opera sobre o ambiente para que as conseqüências sejam geradas. As conseqüências definem as

propriedades com base nas quais respostas são chamadas de similares, (p. 65)*

Nessa passagem, observa-se que na definição de Skinner, resposta não é igual ao comportamento (ver também Catania, 1973; Lee, 1983; Sério, Micheletto e Andery, 2008). Comportamento operante é composto de uma classe de respostas, classe que é definida por resultados comuns produzidos no ambiente. A definição de operante como classe evidencia o caráter dinâmico das relações comportamen­tais, objeto do analista do comportamento.

Diferente do que ocorria na psicologia S-R, de certa forma, é o sujeito quem causa o ambiente que em seguida atua sobre seu próprio comportamento. Nesse sentido, uma contingência entre resposta e ambiente é necessária para a determinação de uma relação operante. Contingência, em AC, descreve uma relação de dependência entre a ação de um organismo e o seu ambiente ou uma re­lação de dependência entre mudanças do próprio ambiente. Usualmente, a forma condicional “se... então” é empregada (Todorov, 1991). Contingências R-S descrevem a relação de dependência entre respostas e mudanças ambientais; contingências S-S descrevem a relação de dependência entre mudanças ambientais (por exemplo, quando estímulos são apresentados de acordo com critério temporal, independente­mente do comportamento do organismo). Tradicionalmente, uma contingência entre resposta e ambiente é necessária para a determinação de uma relação operante (se a resposta, então o ambiente...). Sem a contingência entre resposta e mudança no ambiente não é possível dizer que há comportamento operante. Contudo, é possível que os efeitos esperados de contingências operantes sejam observados sem que haja uma relação contingente: uma resposta pode ser selecionada pelo ambiente quando há apenas uma relação de proximidade espaço-temporal (contiguidade) entre ela e o ambiente que a segue. A noção de comportamento “supersticioso”, caso em que o condicionamento “deu errado” (Skinner 1953/1965, p. 86) mostra o papel seletivo do ambiente no comportamento operante independente das ações do organismo terem produzido as mudanças ambientais selecionadoras. Mudanças ambientais possuem tão forte poder de seleção que respostas podem ser selecionadas mesmo quando são apenas contíguas a eventos ambientais. A seguir, serão destacados alguns estudos que mostram o poder selecionador do ambiente meramente contíguo ao responder.

Comportamento “Supersticioso”Em 1948, Skinner (1948/1972) publicou trabalho experimental com o sugestivo título de “ Superstição” no Pombo. Com esse estudo, começaram a ser discutidas em AC as noções de reforço acidental e comportamento “supersticioso”.

* Do original: “The unit of a predictive science is, therefore, not a response but a class of response. The word ‘operant' will be used to describe this class. The term emphasizes the fact that the behavior ope­rates upon the environment to generate consequences. The consequences define the properties with respect to which responses are called similar”. A tradução de “to generate consequences” para “para que as conseqüências sejam geradas” foi escolhida a fim de evitar uma interpretação teleológica do trecho.

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Em seu estudo de 1948, Skinner trabalhou com pombos privados de alimento e apresentou alimento a eles de tempos em tempos, independentemente do que es­tivessem fazendo. Embora não precisassem fazer nada para que o alimento fosse apresentado, a maior parte dos pombos passou a se comportar como se houvesse uma relação causai entre algo que estavam fazendo e as apresentações do alimento. Um pombo que recebesse o alimento após girar em torno do eixo do próprio corpo, por exemplo, voltava a emitir uma resposta semelhante. Conforme a ocorrência das respostas, como girar em torno do eixo do próprio corpo, aumentava de frequência, novas relações acidentais entre respostas e alimento eram mais prováveis, tomando o comportamento cada vez mais freqüente. Para Skinner, o resultado poderia ser explicado por reforço acidental da resposta do pombo, sugerindo que a mera pro­ximidade temporal entre respostas e reforços seria suficiente para o fortalecimento do comportamento. Skinner sugeriu que o resultado do experimento de 1948 pode­ria ser entendido como “um tipo de superstição” (Skinner, 1948/1972, p. 527) e que o pombo “não era excepcionalmente crédulo” (Skinner, 1953/1965, p. 86), pois podem ser encontradas muitas analogias entre os resultados e o comportamento humano. O comportamento humano também é sensível às coincidências entre ações e refor­ços e pode ser fortalecido por reforço acidental.

O estudo de Skinner de 1948 começou a mostrar que a sensibilidade ao que “vem depois” do responder parece ser tão importante como característica do comportamento operante que um organismo pode ser afetado por eventos sub­sequentes mesmo quando respostas e modificações ambientais relacionam-se apenas temporalmente. Nesse caso, um evento meramente subsequente pode funcionar como um reforçador, modificando a probabilidade do comportamento como se houvesse uma contingência entre resposta e evento subsequente. O cam­po de investigação do que ficou conhecido por comportamento “supersticioso” tem mostrado como relações de contiguidade entre respostas e eventos subse­quentes podem ser responsáveis pelo fortalecimento do comportamento, tanto na aquisição quanto na manutenção.

O termo “supersticioso” não é hoje completamente adequado e pode trazer con­fusão, pois não há exatamente um campo de investigação limitado por ele. O campo de investigação do comportamento “supersticioso”, comportamento adquirido e mantido por relação acidental com reforço, é o campo de investigação do papel da contiguidade para aquisição e manutenção do comportamento. Mesmo a ideia de “acidental” pode causar certa confusão desnecessária: uma relação acidental entre uma resposta e uma mudança ambiental é uma relação em que há apenas contigui­dade entre ação e mudança ambiental. A expressão “comportamento supersticioso” ganhou espaço na análise do comportamento provavelmente pela associação inicial com as superstições no comportamento humano. Comportamento “supersticioso”, contudo, não designa um processo comportamental especial, é apenas um “apelido” para designar o produto do reforço, seleção, de uma resposta a partir de uma relação apenas temporal com uma mudança ambiental subsequente à resposta.

A noção de comportamento “supersticioso” chama a atenção para o efeito de uma regularidade que diz respeito, em primeiro lugar, ao ambiente. O estudo de Skinner de 1948 avaliou o efeito de uma contingência S-S em que um evento ambiental é apresentado regularmente em seguida do mesmo evento: alimento, uma mudança

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ambiental, era apresentado a cada 15s*. Quando eventos ambientais são apresen­tados com tal regularidade, é possível que apareçam contíguos a determinadas respostas de um organismo. O comportamento “supersticioso” foi um efeito iden­tificado por Skinner de uma contingência S-S**.

Comportamento adquirido e mantido em contingências S-S é marcadamente diferente do produzido em contingências R-S. Uma primeira diferença aparece na aquisição do responder. Skinner, em 1948, já ressaltava que a resposta de seus pombos tendia a apresentar considerável variabilidade na topografia e, eventual­mente, a forma inicial da resposta selecionada acidentalmente desaparecia, mesmo com a continuidade das condições de apresentação de alimento. Em um estudo com humanos, Ono (1987) mostrou que era possível que respostas fossem acidentalmente selecionadas em participantes quando mudanças ambientais apareciam independentes do responder. Participaram do estudo 20 estudantes universitários. Os participantes eram, individualmente, levados a uma sala na qual três alavancas, sobre um console, podiam ser acionadas. Pontos em um contador eram apresentados a cada 30 ou 60s, em tempos fixos ou variados, independente do que os participantes fizessem (VT = 30 e 60s; FT = 30 e 60s). Uma sessão foi realizada com cada participante, tendo vigorado a mesma condição experimental durante toda a sessão. Para a maior parte dos participantes, comportamentos “supersticiosos” envolvendo respostas ou seqüências de respostas nas alavancas foram transitórios, isto é, apareceram em determinado momento da sessão e desa­pareceram antes que a sessão terminasse. Apenas dois participantes apresentaram padrões “supersticiosos” consistentes envolvendo as alavancas. A observação di­reta do desempenho dos participantes permitiu identificar, para um deles, um desempenho “supersticioso” que não envolvia as alavancas. O participante passou a tocar o contador pouco antes de receber os pontos. A topografia dessa resposta foi gradualmente mudando, a partir de variações que aconteciam quando não havia apresentação de pontos, de modo que ao fim da sessão o participante pula­va sobre a cadeira e batia com o chinelo no teto da cabine experimental. Para Ono, os resultados da pesquisa foram coerentes com a análise de Skinner sobre a pos­sibilidade de fortalecimento do comportamento a partir de relações acidentais de respostas com reforço.

Em contingências S-S, a manutenção de respostas por relação acidental com reforço também difere marcadamente do mantido em contingências R-S (Herrnstein,

* Atualmente, essa programação para apresentação de eventos ambientais é descrita como esquema de tempo fixo (FT, fixed time). A programação em que a apresentação do evento ambiental varia em torno de uma média é descrita como esquema de tempo variável (VT, variable time).** Após o estudo inaugural de Skinner em 1948, algumas pesquisas mostraram que, em contingências S-S, padrões comportamentais estereotipados e muito semelhantes entre os sujeitos aparecem no lugar do padrão idiossincrático identificado por Skinner (Staddon e Simmelhag, 1971; Timberlake e Lucas, 1985). Esses estudos questionam as conclusões de Skinner sobre o papel da contiguidade na seleção do com­portamento e mostram que contingências S-S podem também ser responsáveis pelo que ficou conhecido como comportamentos “induzidos” ou “adjuntivos”. Para os fins do presente texto, será discutido apenas o papel selecionador do ambiente, mas o leitor interessado pode buscar informações adicionais sobre o assunto em artigos de revisão (por exemplo, Staddon, 1977; Gimenes, Brandão e Benvenuti, 2004).

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1966/1975). Lattal etal. (por exemplo, Lattal, 1974; Sizemore e Lattal, 1977; Glesson e Lattal, 1987) vêm demonstrando que o comportamento dos organismos é muito mais sensível às mudanças nas situações de contiguidade versus contingência ou vice-versa do que sugerem os resultados descritos por Skinner em 1948. Lattal (1974), por exemplo, demonstrou que quando a apresentação de alimento exige a emissão de respostas como bicar um disco, no caso de pombos, a frequência das respostas costuma ser alta. À medida que parte do alimento programado para a sessão passa a ser apresentado independente das respostas, a frequência diminui na proporção em que diminui a exigência de respostas. As conclusões de Lattal (1974) foram posteriormente ampliadas Sizemore e Lattal (1977) e por Glesson e Lattal (1987). No estudo de Sizemore e Lattal, pombos recebiam alimento em três condições diferentes:

• Intervalo variável (VI, variable interval)*.• VI com atraso para apresentação do alimento.• VT com a apresentação de alimento, independentemente da resposta em

uma taxa semelhante à da primeira condição.

Responder foi mais freqüente na primeira condição, com contingência e con­tiguidade. Comparando a segunda condição com a terceira, os autores mostraram que a frequência do responder foi maior na segunda condição, com atraso, do que na condição sem contingência entre resposta e alimento.

A avaliação do comportamento “supersticioso”, nas condições do laboratório, é dificultada por conta das próprias características acidentais do fenômeno. Para a investigação, o pesquisador programa uma relação entre eventos do ambiente e observa os resultados sobre o comportamento. A resposta do participante ou su­jeito experimental não faz parte da contingência programada e não há como prevê-la de antemão. Para resolver esse problema, Wagner e Morris (1987) traba­lharam com um procedimento semelhante ao de Ono (1987): bolinhas de gude, que poderiam ser posteriormente trocadas por outros brinquedos, eram apresen­tadas de acordo com o esquema FT 15s ou FT 30s. Os autores filmaram as sessões nas quais vigorou a contingência S-S e puderam trabalhar em cuidadosa análise posterior, identificando “respostas dominantes” e analisando a distribuição das respostas ao longo dos intervalos entre apresentações das bolinhas de gude. Res­postas como tocar a figura de um palhaço, a face ou o nariz, por meio do qual as bolinhas eram liberadas, ou fazer caretas, foram exemplos de respostas dominan­tes identificadas. Para 7 das 12 crianças, respostas dominantes foram mais freqüentes com a vigência da contingência S-S do que em sessões de linha de base e tenderam a ocorrer pouco antes das apresentações, caracterizando o padrão como “supersticioso”.

Engenhosidade no registro e na análise dos resultados também ajudou na identificação de padrões “supersticiosos” em dois estudos realizados com pombos

* Para uma definição dos esquemas de intervalos ou razões (fixos e variáveis) e descrição de seus prin­cipais efeitos sobre o comportamento, ver Ferster e Skinner (1957).

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(Pear, 1985; Eldridge, Pear, Torgrud e Evers, 1988), diferentes contingências S-S ou R-S foram programadas. Os dois estudos trabalharam com pombos que tinham uma tinta especial aplicada ao pescoço. Essa tinta permitia, a partir do registro de uma filmadora, a identificação de padrões espaço-temporais do pescoço dos pombos na caixa experimental. O experimentador pôde, com esse registro, identificar pa­drões de movimentação do pescoço na sessão e avaliar a sua sistematicidade ao longo das sessões experimentais. O registro permitiu uma medida extra, além do aumento da frequência de uma resposta discreta, dos efeitos das contingências programadas experimentalmente. Pear (1985) realizou um experimento no qual os movimentos do pescoço de dois pombos foram registrados ao longo de sessões nas quais o alimento foi liberado de acordo com um esquema dependente das respostas dos sujeitos. Além do padrão operante esperado de bicar um disco, pa­drões espaço-temporais puderam ser identificados ao longo de 95 sessões nas quais alimento foi apresentado de acordo com um esquema VI 15s. Os padrões espaço-temporais consistiram de respostas de proximidade ao alimentador que concorriam com as respostas de bicar o disco e em seqüências de movimentos circulares e de “ir e voltar”*, mais freqüentes logo depois da liberação do alimento. Uma sessão de extinção foi realizada depois das sessões com o VI. Na extinção, o padrão de atividades tornou-se irregular, havendo diminuição progressiva tanto das respostas de bicar como dos padrões espaço-temporais identificados nas sessões anteriores. Padrões espaço-temporais mais extensos foram observados sob VI 5m e novamente os padrões circulares e de “ir e voltar” voltaram a ser observados quando a contingência para apresentação do alimento voltou ao VI mais curto. Novamente sob extinção, padrões observados sob o VI mais curto ou mais longo reapareceram e foram deixando gradualmente de ocorrer ao longo de seis sessões. Em um trabalho posterior, Eldridge, Pear, Torgrud e Evers (1988) modelaram a resposta de esticar o pescoço até certo ponto da caixa experimental em três pombos. Depois, sessões em que vigorou uma contingência S-S (FT 15s) foram intercaladas com sessões com a vigência de uma contingência R-S (inter­valo fixo de 15s), em que a resposta que produzia o alimento era a resposta de levantar o pescoço. Por último, foi feita a extinção, com a suspensão do alimento. Proximidade ao alimentador foi freqüente nas sessões com alimento apresentado independente da resposta dada. Na contingência do intervalo fixo (FI, fixed in­terval), o padrão de proximidade ao alimentador competiu com as respostas operantes de levantar o pescoço, alternando-se com elas. Com a suspensão do reforço, ambos os padrões foram gradualmente deixando de acontecer.

Nos trabalhos de Pear (1985) e Eldridge et al (1988), padrões espaço-temporais foram analisados como sendo mantidos por relação acidental com reforço. Essa conclusão foi fortalecida pelos resultados encontrados nas sessões com a suspen­são do alimento, nas quais o padrão identificado como “supersticioso” assumiu as características típicas da extinção: frequência alta, seguida de diminuição gradual e irregular até que a resposta praticamente deixava de ser observada. Em ambos os estudos, o padrão “supersticioso” foi observado em contingências R-S, em si­

* Do original circling e back-and-forth.

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tuações em que o alimento dependia de certas respostas dos pombos. Nesse caso, responder de determinado modo pode ser reforçado pela conseqüência produzi­da por outra resposta: a resposta A produz o reforço; a resposta B, não. Como B aparece sistematicamente antes de A, B pode ser fortalecida pelo reforço que apa­rece contingente à resposta A. A possibilidade de comportamento “supersticioso” em contingências R-S já havia sido demonstrada por um experimento de Catania e Cutts (1963) em que estudantes universitários trabalhavam em um esquema concorrente. Responder a um dos componentes produzia pontos em VI e responder ao outro nunca produzia pontos (extinção). Respostas ao componente em extinção eram frequentemente fortalecidas pela conseqüência produzida no componente VI. O resultado foi que a maior parte dos participantes terminou as sessões apre­sentando um padrão que consistia em responder alternadamente entre dois botões, sendo que respostas a um deles esteve sempre em extinção. Catania e Cutts (1963) chamaram esse padrão “supersticioso” de “superstição concorrente”. Retomando esses resultados, Ono (1994) preferiu a expressão “superstição topográfica”, suge­rindo que, em muitas situações, uma parte adicional da topografia de uma resposta que produz reforço (no exemplo, resposta B), parte não necessária para a alteração do ambiente, pode ser mantida por contiguidade com o reforço pro­duzido pelo responder (no exemplo, resposta A).

Tomados em conjunto, os resultados apresentados até aqui evidenciam a possibilidade de que respostas sejam fortalecidas por relação acidental com re­forço. A identificação dos comportamentos “supersticiosos” exige engenhosidade experimental e o reconhecimento das características do fenômeno: respostas selecionadas acidentalmente pelo reforço não podem ser definidas de antemão e, ao longo da exposição às contingências que geraram o responder “supersticioso”, mudança na topografia das respostas são esperadas.

Aquisição e Manutenção do Comportamento “Supersticioso”Algumas vezes, uma resposta pode ser adquirida por uma relação de dependência entre resposta e reforço e, depois, mantida por relação acidental. A distinção entre aquisição e manutenção “supersticiosa”, dependendo de quando entra em vigor a contingência S-S, possibilita novas maneiras de estudar e entender o comporta­mento mantido por relação contígua com reforço. Uma maneira de avaliar o papel da contiguidade na manutenção do comportamento é investigar os efeitos da transição de uma contingência R-S para S-S. Weisberg e Kennedy (1969) sugeriram que o reforço acidental pode tanto ser responsável pela aquisição do comporta­mento como pela manutenção do comportamento já adquirido. Preocupados com o segundo efeito, os autores realizaram dois estudos com crianças em que avalia­ram se a apresentação de salgadinhos ou balas independentes do responder poderia manter o comportamento previamente fortalecido. Respostas foram, inicialmente, fortalecidas em esquemas de razão fixa e intervalo variável e depois avaliadas em condições com a suspensão das conseqüências ou com a apresen­tação de balas ou salgadinhos independente da atitude de resposta das crianças. O responder fortalecido nas contingências R-S enfraqueceu-se com a suspensão

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da apresentação de salgadinho ou balas. Na contingência S-S, o responder perdu­rou para algumas crianças e, para outras, enfraqueceu-se mais demoradamente do que quando a apresentação dos salgadinhos ou doces foi simplesmente suspensa. Na mesma linha de investigação, Neuringer (1970) realizou um experimento no qual foram reforçadas as três primeiras respostas de pombos de bicar um disco. Logo em seguida, na mesma sessão, o alimento passou a ser apresentado inde­pendente do comportamento dos pombos. Assim como no estudo de Weisberg e Kennedy, a aquisição do comportamento se deu em função de uma contingência R-S. Posteriormente, foi possível avaliar a manutenção pela relação de contigui­dade que o responder fortalecido mantinha com a apresentação do alimento. Os resultados do trabalho de Neuringer (1970) mostraram que, embora os pombos não precisassem mais responder para que alimento fosse apresentado, continua­vam a fazê-lo “supersticiosamente” ao longo de aproximadamente 60 sessões experimentais. Apresentações de alimento eram contíguas às respostas de bicar e assim mantinham a frequência de emissão dessas respostas.

No comportamento humano, a aquisição de repertório ao longo da vida de uma pessoa está estreitamente ligada ao comportamento verbal. Durante a vida, repertórios novos são adquiridos não apenas pela exposição direta às contingências, mas também por meio de descrição de contingências. Quando a descrição de uma contingência passa a controlar o comportamento de alguém podemos chamar tal descrição de uma regra e o comportamento de quem segue a regra de comporta­mento governado por regras (Skinner, 1969) ou comportamento governado verbalmente (Catania, 1998/1999).

Instruções comumente auxiliam na aquisição de repertórios novos. Podem também facilitar a aquisição e manutenção de comportamentos “supersticiosos”. A distinção entre aquisição e manutenção do comportamento “supersticioso” é no­vamente vantajosa: a instrução pode ser responsável pelas primeiras ocorrências de respostas que, depois de emitidas algumas vezes, passam a ser mantidas pela relação acidental com reforço. A aquisição da resposta depende de uma história de segui­mento de regras enquanto a manutenção é “supersticiosa”. Higgins, Morris e Johnson (1989) examinaram essa questão em um experimento realizado com crianças. Os pesquisadores diziam que as crianças poderiam ganhar bolinhas de gude caso pressionassem o nariz de um boneco na forma de palhaço pelo qual as bolinhas eram apresentadas. Essas crianças passaram por várias sessões nas quais períodos sinalizados de reforço independente eram intercalados a períodos sinalizados de ausência de reforço. No esquema múltiplo (muli), dois esquemas estão em vigor alternadamente, sendo que a vigência dos diferentes esquemas é sinalizada por estímulos extereoceptivos (ver Ferster e Skinner, 1957). Várias das crianças começa­ram as sessões respondendo nos dois períodos do esquema múltiplo, mas logo passaram a responder apenas no período de reforçamento independente, e con­tinuavam a fazê-lo ao longo de mais de 15 sessões. Em uma segunda etapa do experimento, outras crianças assistiam a um filme que mostrava as crianças que haviam se comportado “supersticiosamente” e eram, em seguida, colocadas nas mesmas condições das primeiras. As crianças que assistiram ao filme também passaram a pressionar o nariz do palhaço durante a vigência do esquema VT como se houvesse uma relação entre a resposta e a apresentação das bolinhas de gude.

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Os resultados do trabalho não podem ser atribuídos apenas ao efeito da regra ou da modelação: o responder “supersticioso” deve ser entendido necessariamente como um produto da instrução ou modelação combinado ao reforço acidental. Antece­dentes verbais ou o comportamento de outra criança controlam a emissão das primeiras respostas: no componente VT bolinhas de gude aparecem contíguas às respostas, no componente EXT (extinção) as respostas nunca são seguidas de boli­nhas de gude. Caso o ato de responder estivesse sob controle exclusivo da instrução ou do comportamento do outro, o responder seria mantido igualmente nos com­ponentes VT e EXT. O enfraquecimento do responder no componente EXT e a manutenção no componente VT indicam que a instrução e o comportamento da outra criança, como antecedentes, facilitaram o responder que, ao longo das sessões, foi mantido pela relação acidental com o reforço.

Efeitos de Eventos Aversivos Contíguos sobre o Comportamento OperanteO efeito selecionador dos eventos contíguos não está restrito aos estímulos com a fun­ção reforçadora positiva. Eventos aversivos, com funções supressivas (punição positiva) e reforçadoras negativas (fuga e esquiva), também são capazes de afetar seletivamente padrões de resposta. A apresentação de eventos aversivos contíguos produz alguns efeitos comportamentais similares aos observados diante do reforço positivo.

Comportamento “Supersticioso”: Fuga e EsquivaEm 1966, ao apresentar uma revisão da literatura sobre comportamento “supers­ticioso”, Herrnstein (1966/1975) afirma:

Espera-se que se desenvolva um comportamento supersticioso se expusermos um animal a um choque elétrico doloroso, o qual é eliminado

de maneira periódica, independentemente das ações do animal. Como aconteceu com os pombos supersticiosos de Skinner, esses animais

desenvolveriam comportamentos supersticiosos como resultado da correlação temporal entre suas atividades e a ocorrência do reforçador

[nesse caso, negativo]. Este experimento ainda não foi executado, porém, se falhar, necessitaremos rever nossos conceitos sobre o

condicionamento de fuga. (p. 60)

Assim como um reforçador positivo que se segue a uma resposta seria capaz de selecioná-la, por mera contiguidade, aumentando a sua frequência, um reforçador negativo deveria, a princípio, ser capaz de exercer a mesma função seletiva, construin­do repertórios de fuga e esquiva “supersticiosas”. Apesar de Herrnstein (1966/1975) afirmar que não haveria na época um estudo mostrando esse efeito, desde 1963, Migler (1963, Experimento 9) já havia apresentado experimentos com ratos nos quais o cho­que elétrico foi capaz fortalecer respostas de fuga (pressão a uma barra) sem qualquer

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relação com a eliminação de um choque que era apresentado automaticamente a cada 10s. No ano seguinte, Keehn e Chaudrey (1964) observaram o mesmo fenômeno em ratos durante procedimentos de esquiva (não sinalizada) de Sidman.

Sidman (1989/1995) menciona dois tipos de padrões “supersticiosos” envol­vendo eventos aversivos. O primeiro estaria relacionado ao paradoxo da esquiva. Um repertório de evitação perfeito seria aquele que impede qualquer contato com o aversivo incondicional. No entanto, o que manteria a esquiva seria exatamente esse contato eventual com o aversivo incondicional, pois ele garantiria a manu­tenção da função aversiva do estímulo condicional que controlaria o responder preventivo (a fuga do aversivo condicional). Desse modo, o desempenho em uma contingência de esquiva perfeita tenderia a se deteriorar após certo tempo, levan­do ao contato com o aversivo incondicional, o que por sua vez tornaria a esquiva provável novamente pelo restabelecimento da aversão do estímulo condicional em um ciclo regular. Sidman (1989/1995) aponta um modo alternativo de manter a esquiva, valendo-se do seu paradoxo: tendo a resposta sido adquirida e inicial­mente fortalecida em uma relação contingente, eventos aversivos contíguos espaçados adequadamente no tempo poderiam posteriormente mantê-la:

Se os choques inevitáveis forem infrequentes, de modo que o sujeito tenha pouca oportunidade de descobrir que eles viriam não importa o que ele

tenha feito, ele continuará a agir indefinidamente como se estivesse realmente esquivando choques. Ele sentará ali, hora após hora, dia após

dia, paciente e calmamente pressionando sua barra, estoicamente aceitando sua rara punição. Afinal, a experiência lhe ensinou que tudo o mais, exceto pressionar a barra, é perigoso. Agora um choque ocasional vem logo depois

que ele tenha pressionado a barra, mas ainda assim, esse ato usualmente não é punido. A maioria dos choques ainda continua aparecendo

após um período durante o qual ele não pressionou a barra.Até onde o sujeito pode dizer, ele continua bem-sucedido

a maior parte do tempo. (Sidman, 1989/1995, p. 60)

Do mesmo modo que um comportamento “supersticioso” poderia ser aprendi­do de modo contingente via reforçamento positivo e depois mantido posteriormente com a apresentação de reforçadores em esquemas de FT, uma resposta de fuga ou esquiva poderia ser mantida igualmente de modo “supersticioso”, com a apresen­tação contígua de reforçadores negativos regulares.

Outro padrão “supersticioso”, na área de controle aversivo, descrito por Sidman (1989/1995), envolveria não o fortalecimento de respostas via reforço negativo, mas a supressão “supersticiosa”, na qual um estímulo aversivo seguiria certas res­postas, mas não seria produzido por elas, punindo-as de modo não contingente. O próximo tópico abordará especificamente esse fenômeno.

Punição Não ContingenteAzrin e Holz (1966/1975) definem punição do seguinte modo:

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Comportamento Operante: Seleção, Contiguidade e Contingência ■ 29

... a punição é uma conseqüência do comportamento que reduz a probabilidade futura desse mesmo comportamento. Enunciada de um

modo mais completo, a punição é uma redução da probabilidade futura de uma resposta específica, como resultado da administração imediata de um

estímulo diante da resposta. O estímulo é chamado de punitivo e todo oprocesso de punição, (p. 456)

Um evento aversivo que se segue a uma resposta, independentemente de tê-la produzido, também produzirá efeitos supressivos sobre a classe de respostas (Catania, 1998/1999). Contudo, tais efeitos não seriam idênticos aos produzidos pela apresen­tação contingente do mesmo evento aversivo. Em uma revisão dessa literatura, Church (1963) concluiu que, de modo geral, a supressão é maior quando a punição é contingente. Posteriormente, Rachlin e Herrnstein (1969) e Church (1969) chegaram à mesma conclusão. Tais diferenças, contudo, são observadas mais claramente dian­te de estímulos aversivos classificados como brandos, pois aversivos mais intensos podem suprimir totalmente o ato de responder já na sua primeira apresentação, contingente ou não contingente, impossibilitando qualquer avaliação desse tipo.

Uma variável que afeta criticamente a punição estaria na relação temporal entre a emissão da resposta e a ocorrência do aversivo. Quanto menor o intervalo entre eles, mais imediata for a punição, maior será a supressão observada (Azrin e Holz, 1966/1975). Camp, Raymond e Church (1967, Experimento 3), usando ratos como sujeitos e choque como aversivo, observaram que o padrão de supressão do respon­der foi similar quando o estímulo punidor foi apresentado de modo contingente atrasado (30s) e não contingente, o que sugere que esta seja uma dimensão rele­vante na explicação dos efeitos característicos da contiguidade.

Além das diferenças no nível de supressão do responder, Church (1963) também indica uma diferença entre o grupo contingente e o não contingente em relação ao padrão comportamental geral. No primeiro, prevaleceram respostas relacionadas à barra, enquanto no segundo as respostas predominantes foram emocionais, como “defecar” e “urinar”, o que pode sugerir que a imprevisibilidade em si mesma poderia ter um efeito aversivo eliciador ou ansiogênico. Ao terem que escolher entre choques sinalizados (previsíveis) e não sinalizados (imprevisíveis), ratos tendem a preferir, com choques mais intensos, a primeira alternativa (Harsh e Badia, 1975). Grillon, Baas, Lissek, Smith e Milstein (2004) estudaram em humanos o efeito de dois tipos de eventos aversivos, choques elétricos e jatos de ar aplicados na laringe, quando apresentados de modo previsível e imprevisível e concluíram que os choques im­previsíveis produziram mais respostas emocionais de ansiedade do que as demais combinações. Sugerem, então, que a aversividade adicional da imprevisibilidade depende da natureza do estímulo aversivo: os jatos de ar imprevisíveis não produ­ziram efeitos diferenciados dos previsíveis, logo, não bastaria tornar o estímulo aversivo imprevisível para garantir um efeito ansiogênico adicional.

Eventos aversivos contíguos podem ser imprevisíveis (não discrimináveis) ou incontroláveis (não evitáveis) e cada arranjo produziria efeitos próprios (Seligman, Maier e Solomon, 1971; Hunziker, 2003). No tópico a seguir, será abordado um fenômeno produzido pela apresentação de eventos aversivos incontroláveis: o desamparo aprendido.

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Desamparo AprendidoOvermeier e Seligman (1967) descreveram como uma história prévia de exposição a choques inescapáveis produziu em cães uma falha posterior na aprendizagem de respostas de fuga em uma shuttlebox (também usando o choque). No mesmo ano, Seligman e Maier (1967) utilizaram um delineamento na forma de tríade (um grupo com choque controlável, outro com choque incontrolável e outro sem cho­que) para separar o efeito do choque em si mesmo do efeito da incontrolabilidade desse evento aversivo. Também usando cães como sujeitos, os autores relataram (Experimento 1) que os sujeitos expostos aos choques incontroláveis tiveram altas latências na fase posterior de fuga na shuttlebox, falhando nessa nova aprendizagem, enquanto os demais animais, mesmos os expostos inicialmente aos choques con­troláveis, não apresentaram esse efeito de interferência negativa. No mesmo trabalho (Experimento 2), os autores criaram para um grupo de animais uma história inicial de choques controláveis antes de eles serem expostos aos choques incontroláveis na fase seguinte. No teste final de fuga na shuttlebox, os autores não observaram nesse grupo o efeito da interferência negativa na nova aprendizagem. Concluíram que a experiência prévia ao choque incontrolável teria “vacinado” os animais contra os efeitos deletérios da incontrolabilidade do estímulo aversivo.

Esse fenômeno passou, então, a chamar ainda mais a atenção da comunidade científica, e agora também do público em geral, com a publicação do trabalho de Seligman (1975) no qual o autor sugeria que a interferência negativa observada em aprendizagens novas após eventos aversivos incontroláveis poderia explicar parte do quadro clínico descrito como “depressão”. Nascia, assim, o “desamparo aprendido”, denominação do autor, como um modelo animal para a depressão humana. Supos­tamente uma história inicial com estímulos aversivos incontroláveis ensinaria que as mudanças no mundo independeriam da ação do indivíduo e por isso apresentaria lentidão ou falha nas aprendizagens posteriores quando o ambiente seria controlável.

Apesar da generalidade entre espécies (vertebrados e invertebrados) ter sido sugerida pela revisão de Eisenstein e Carlson (1997), o fenômeno ainda não foi demonstrado consistente e inequivocamente em humanos (Hunziker, 2003). Mesmo diante dos limites teóricos e metodológicos desse modelo (ver, por exem­plo, a análise crítica de Hunziker, 1997), ele ainda é atualmente usado como um importante instrumento, mesmo que hipotético, de compreensão de problemas humanos, em particular na área de saúde humana (Catania, 1998/1999; Hunziker, 2003; Sanabio-Heck, Souto e Motta, 2005).

Nesse contexto, o fator crítico seria a exposição a eventos aversivos incontrolá­veis, ou seja, haveria uma relação de contiguidade entre as respostas apresentadas pelos sujeitos na condição inicial de tratamento e os estímulos aversivos não con­tingentemente programados.

Em todas as relações aqui descritas envolvendo estímulos aversivos, observam- se múltiplos efeitos de eventos subsequentes (contíguos) à resposta. Em todos, eles não há uma relação de contingência entre resposta e mudança ambiental e ainda assim são identificados efeitos seletivos.

Tais dados ampliam o escopo dos tópicos anteriores, sugerindo que eventos meramente subsequentes ao responder, sejam reforçadores positivos ou aversivos,

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Comportamento Operante: Seleção, Contiguidade e Contingência " 3 1

podem participar da determinação do comportamento. Essa possibilidade exige revisão das noções tradicionais embutidas em conceitos como “operante” e “con­seqüência”. No próximo tópico, tal revisão será realizada.

Considerações FinaisO conceito de operante prevê uma ação inicial do organismo que irá “operar” sobre o mundo. Essa operação resultará em um mundo modificado que por sua vez irá afetar o responder preliminar, formando um ciclo contínuo de ação e reação. Tal noção se contrapõe a um ideário ambientalista mecanicista no qual o organismo seria passivo diante dos determinantes ambientais (eventos anteriores à resposta). A noção de operante reserva ao organismo, quem emite a resposta, o primeiro pas­so na cadeia de determinação. Contudo, o responder que não produz alterações no ambiente, mas é apenas contíguo a mudanças ambientais, também pode ser sele­cionado. Desse modo, ou a noção de operante tradicional é alterada para comportar os dados aqui resumidos ou uma nova categoria de eventos comportamentais pre­cisaria ser criada para descrevê-los. Uma saída mais econômica pode ser discutir o conceito de operante, enfatizando o papel selecionador do ambiente. Como já pre­viamente indicado por Reese (1966/1973) e Millenson (1967/1975), o que definiria um comportamento operante seria a existência de eventos subsequentes ao respon­der capazes de alterar a sua probabilidade de ocorrência.

O conceito de conseqüência necessitaria igualmente de reformulação. Uma conseqüência é entendida como o produto ou o resultado de algo. Implicaria, portanto, uma contingência. No contexto da linguagem operante, uma resposta teria como resultado, ou produziria no ambiente, uma modificação ou sua conse­qüência. Eventos posteriores ao responder, contíguos, mas não produzidos por ele, possuem também a função selecionista. Nesse contexto, os eventos posteriores à resposta, apesar de selecionarem o responder, não seriam a rigor “conseqüências”, pois delas não decorreriam. Seriam eventos “conseguintes” ou “subsequentes”, e não “conseqüentes”. Novamente há duas soluções possíveis: criar uma nova cate­goria ou ampliar a já existente para que comporte os novos dados. A sugestão mais econômica seria, como no caso do operante, manter o termo, modificando o seu significado original. A ênfase no papel seletivo de conseqüências ou de eventos subsequentes ao responder parece mais uma vez uma necessidade para dar con­ta dos dados discutidos até o momento.

Vale a pena ressaltar algumas das diferenças que aparecem nos resultados de estudos que mostram seleção do comportamento na ausência de contingência resposta-mudança ambiental. O comportamento produto de relação acidental com mudanças ambientais é, marcadamente, diferente do produzido por relação de contingência R-S. A diferença no produto de relações acidentais parece estar justamente na parte que cabe ao organismo no comportamento operante: a va­riabilidade comportamental. À medida que há variabilidade nas respostas dos organismos, o produto de seleção acidental se altera, mudam as topografias de respostas selecionadas e antigos padrões deixam de ocorrer, dando lugar a novos. Essas diferenças parecem mostrar que as contingências são fundamentais na

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32 ■ Comportamento Operante: Seleção, Contiguidade e Contingência

manutenção do comportamento. A seleção, contudo, parece ser uma função mais básica que existe a despeito da organização posterior das relações sujeito/ambien­te. O processo seletivo responsável pela origem e mudança comportamental mantém um paralelo adicional com o processo de origem e mudança das espécies: como apontou Gold (1989), duas “forças” independentes são responsáveis pela mudança nas espécies: variação e seleção. A seleção, em certo sentido, é cega porque não necessariamente leva a melhoras ou a vantagens em longo prazo para a espécie. A variação é randômica, não necessariamente comprometida com as demandas do ambiente. Variação e seleção são processos básicos, relacionados na produção de sistemas complexos, mas independentes, que precedem à orga­nização subsequente, seja a espécie, seja a construção de operantes complexos. Na AC, em especial, a discussão conduz a definição de “reforço” e seu papel na determinação da conduta individual. Os dados analisados na presente revisão indicam que o efeito reforçador é independente da existência de uma relação contingente. Assim, é possível definir “reforço” a despeito da existência de uma relação operante. O contrário - definir operante a despeito da identificação do reforço - não parece ser possível, ao menos levando em conta a amostra de defi­nições apresentadas no início deste capítulo, que enfatizam que para a definição de operante é necessária a observação de mudanças no responder. O efeito sele­cionador do ambiente parece, portanto, ser a base ambiental sob a qual são construídas relações operantes.

A discussão apresentada até o momento parece depender e se enriquecer enormemente por linhas de investigação em que são manipuladas contingências S-S. Os resultados de diferentes linhas de investigação estão longe de permitir que questões sejam fechadas ou tratadas categoricamente. Ao contrário, os efeitos de con­tingências S-S, muitas vezes desafiadores, parecem antagônicos e carecem de explicações satisfatórias que deem conta sucessivamente de seus múltiplos aspec­tos. Andery e Sério (2008), discutindo as noções de contingência e contiguidade em análise do comportamento, mostraram que as linhas de pesquisa inauguradas por Skinner (1948/1972) e Seligman et al.t apresentam resultados diferentes gera­dos por uma mesma experiência do organismo com seu ambiente: a experiência em que eventos ambientais aparecem independentes do responder dos organis­mos. A esse respeito, Matute (1994) investigou variáveis que, em uma situação como essa, poderiam facilitar o surgimento de comportamento “supersticioso” ou desamparo. Matute considerou que os efeitos constituem os dois pontos de um continuum, sendo que um fenômeno pode ser facilitado mais do que o outro dependendo de variáveis específicas embutidas na situação em que o ambiente muda a despeito das ações do organismo.

As sugestões conceituais esboçadas podem parecer reparos insuficientes já que os termos originais seriam mantidos, mas a linguagem dos analistas do comporta­mento está repleta de inconsistências tão ou mais graves do que as aqui indicadas e, apesar disso, a disciplina continua avançando em sua busca pela compreensão do fenômeno comportamental, mesmo sem ter definido até hoje de modo indiscu­tível o que seria “comportamento”. Há outros exemplos, como os termos “estímulo” e “resposta”, forjados em um contexto mecanicista, reflexológico, no qual a unidade de análise seria a relação S-R. Etimologicamente, um estímulo necessariamente provocaria de modo direto e automático, eliciaria, uma resposta e essa última seria

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Comportamento Operante: Seleção, Contiguidade e Contingência ■ 33

sempre uma reação, direta e automática, ao estímulo (Catania, 1998/1999). Ainda assim, os dois termos foram convertidos em ferramentas gerais para descrever re­lações entre organismo e ambiente, sem tais implicações de causalidade.

Diante dos dados aqui apresentados, a proposta seria reinterpretar os conceitos de “operante”, “conseqüência” e “reforço” nos moldes aqui defendidos, mantendo os termos e alterando seus significados tradicionais. Adicionalmente, o modelo de seleção pelas conseqüências ganharia outra dimensão ao incorporar uma lingua­gem que descreveria, de modo mais preciso e amplo, o papel dos eventos subsequentes ao responder.

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36 ■ Comportamento Operante: Seleção, Contiguidade e Contingência

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CAPÍTULO

Etica e Comportamento*

A l e x a n d r e D it t r ic h

Definições Preliminares Etica e MoralÉ curioso notar que, etimologicamente, tanto “ética” quanto “moral” remetem ao comportamento. A palavra “ética” é de origem grega. Éthospode ser traduzido como hábito, costume ou disposição. O latim mores- do qual deriva a palavra “moral”- remete, por sua vez, a costumes ou maneiras. As duas palavras são utilizadas para designar um dos campos de estudo funda­mentais da filosofia. Existem diferentes propostas de utilização destas palavras para a designação de tal campo. Adotaremos, neste capítulo, o uso que pajece ser o mais comum (por exem­plo, Frankena, 1963/1981; Hare, 1997/2003): “ética”, como sinônimo de “filosofia moral” - ambas designando o “pensa­mento filosófico acerca da moralidade, dos problemas morais e dos juízos morais” (Frankena, 1963/1981, p. 16).

Etica Prescritiva e MetaéticaEnquanto campo de estudos, a ética divide-se em ética prescritiva e metaética**. Historicamente, as teorias éticas

* O autor agradece às professoras Nilza Micheletto e Tereza Maria de Azevedo Pires Sério (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo) pelas valiosas suges­tões efetuadas durante a redação do texto. Não obstante, assume inteira res­ponsabilidade por seu conteúdo.** Alguns autores acrescentariam a ética aplicada como uma terceira subárea, mas também é possível tratá-la como parte da ética prescritiva.

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dedicaram-se, sobretudo, a prescrever comportamentos. Tratava-se de estabelecer e justificar hierarquias de valores cuja adoção seria desejável. Essa é, presumivel­mente, a tarefa principal da ética: ela deve servir como guia para o comportamento, apontando o que é correto fazer em diferentes situações, e o porquê. Costuma-se denominar “ética prescritiva” ou “ética normativa” a parte da ética que busca cumprir tal tarefa.

Sobretudo, a partir do século XX, porém, começaram a surgir estudos éticos com outra proposta: analisar a própria origem do comportamento ético, verbal e não verbal*. Qual a fonte de nossos valores, atitudes ou ações morais? Qual o signi­ficado de palavras como “bom” ou “ruim”, “certo” ou “errado”? Os estudos que buscam responder a perguntas como estas são denominados “metaéticos”. O prefixo meta é também de origem grega, originalmente podendo significar tanto “após” quanto “junto com” ou “entre”. Ele adquiriu diferentes significados ao lon­go da história. Um de seus usos mais comuns atualmente passou a ser registrado a partir do século XIX: meta como “mais alto”, “mais abrangente”. Uma análise meta pode ser descrita como uma análise da análise, uma teoria da teoria. Uma meta- linguagem é uma linguagem que descreve linguagens, metadados são dados sobre dados, a metaética é a ética voltando-se sobre si mesma: a ética analisando os próprios fundamentos do comportamento ético e do discurso ético.

Embora a ética nunca tenha abandonado seu caráter prescritivo, é evidente, ao longo do século XX, o predomínio de trabalhos metaéticos neste campo, acompa­nhando a tendência da filosofia de se voltar progressivamente para o estudo da linguagem. A metaética toma a linguagem moral como objeto de estudo legítimo por si só, a despeito dos eventuais valores que apresente. Idealmente, portanto, a metaética deveria ser um empreendimento meramente descritivo**. De fato, consi­derando os diferentes objetivos da metaética e da ética prescritiva, é possível derivar uma segunda distinção entre elas, generalizando, estudos metaéticos caracterizam- se pelo uso de uma linguagem predominantemente descritiva, enquanto estudos em ética prescritiva caracterizam-se pelo uso de uma linguagem predominante­mente prescritiva (o que se evidencia, é claro, em sua própria denominação).

Etica Skinneriana/ /

Diálogo entre Etica Skinneriana e Etica TradicionalComo é praxe nos demais campos da filosofia, a ética, tanto em seu aspecto pres­critivo quanto no metaético, gerou diversas teorias divergentes. O número de problemas analisados e as possíveis soluções propostas tornam o campo conside­

* O Principia Ethica de Moore (1903/2004) certamente foi determinante para essa mudança de ten­dência.** Dizemos “idealmente0 porque são comuns acusações mútuas entre filósofos morais, segundo as quais suas respectivas metaéticas estariam, de forma intencional ou não, apresentando como mera­mente descritivos enunciados que, quando propriamente analisados, se revelariam prescritivos (por exemplo, Hare, 1997/2003, sobre as teorias naturalistas).

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Ética e Comportamento ■ 39

ravelmente complexo. Contudo, não faremos, aqui, uma exposição ou classificação destas teorias*.

Skinner (1971a; 1971b) apresenta sua própria ética- e não deveria ser surpreen­dente o fato de que ela apresenta características marcadamente diferentes em relação à maioria das éticas tradicionais. Pode-se perguntar, diante disso, qual seria a utilidade de fazer dialogar a ética skinneriana com os problemas e as teorias da ética tradicional (e a questão não se aplica apenas à ética, mas à própria filoso­fia behaviorista radical). Este é, sem dúvida, um assunto complexo, que não poderemos abordar em detalhe neste momento. Por ora, diga-se apenas o seguinte:

• Talvez seja um requisito para a sobrevivência de uma teoria que dialogue com os demais saberes de seu tempo.

• Diálogos com outros saberes não precisam, necessariamente, estabelecer-se pelo viés da crítica.

Há um número considerável de exemplos de diálogos entre o behaviorismo radical e outros saberes (por exemplo, Glenn, 1988; Malagodi, 1986; Smith, 1995; Ulman, 1995) cujo tom é antes de colaboração e crescimento mútuo do que de crítica (embora a crítica também possa gerar crescimento). Em suma, embora o behaviorismo radical seja, de fato, uma filosofia sui generis, nenhuma filosofia é tão diferenciada das demais a ponto de não poder extrair do diálogo com elas subsídios produtivos para seu próprio fortalecimento - seja pela colaboração ou pela contraposição.

Estas ponderações são importantes, pois consideramos que o behaviorismo radical ainda não enfrentou alguns problemas relevantes propostos pela filosofia moral - é importante que o faça. A despeito disso, porém, a ética skinneriana é certamente uma forma promissora de tratar antigos problemas filosóficos de uma forma coerente e produtiva. É o que buscaremos demonstrar a partir de agora.

Descrição e Prescrição na Etica SkinnerianaEstritamente falando, a ética skinneriana é a ética registrada nos textos de B. F. Skinner. Mas, para além da ética skinneriana, há uma ética behaviorista radical. Diversos autores que se identificam como behavioristas radicais levam a ética skinneriana para além da letra do autor - interpretam-na, em suma (por exemplo, Abib, 2002a; Garrett, 1979; Graham, 1977, 1983; Hocutt, 1977; Rottschaefer, 1980; Vargas, 1982; Waller, 1982). Seria impossível expor a ética skinneriana sem fazê-lo. Portanto, o leitor deve estar ciente deste fato: a presente exposição da ética skinneriana, na

* O leitor interessado encontrará boas exposições, por exemplo, em Frankena (1963/1981) e Hare (1997/2003). Deve estar alerta, porém, quanto ao seguinte: (1) raramente há um completo acordo entre diferentes autores sobre as características distintivas das diversas teorias éticas e a melhor for­ma de classificá-las (embora certas convergências sejam facilmente identificáveis); (2) poucas vezes um filósofo moral limita-se apenas a expor teorias éticas; em geral, faz sua crítica, apresentando, em seguida, sua própria posição.

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medida em que busca não apenas sintetizar, mas também interpretar os escritos de Skinner sobre o assunto, não assume o compromisso de realizar uma exposição “neutra” - embora se mantenha fiel aos princípios básicos do behaviorismo radical*.

A fim de apresentar a ética skinneriana de forma compreensível, julgamos fundamental começar realizando uma distinção que não aparece explicitamente no texto de Skinner: a distinção, comum na ética tradicional, entre uma linguagem descritiva e uma linguagem prescritiva. O leitor recordará que diferenciamos há pouco a metaética da ética prescritiva (ou normativa), com base nos objetivos que buscam cumprir (respectivamente, investigar a origem de comportamentos éticos, verbais ou não verbais, e prescrever comportamentos éticos). Desta diferença de objetivos, além disso, derivamos uma segunda possibilidade de distinção entre ambas: generalizando, estudos metaéticos caracterizam-se pelo uso de uma linguagem predo­minantemente descritiva, enquanto estudos em ética prescritiva caracterizam-se pelo uso de uma linguagem predominantemente prescritiva. Considerando que metaética e ética prescritiva são práticas verbais podemos, de um ponto de vista behaviorista radical, afirmar que a metaética caracteriza-se pela predominância de variáveis controladoras do comportamento verbal típicas do tato e do intraver- bal, enquanto a ética prescritiva caracteriza-se pela predominância de variáveis controladoras do comportamento verbal típicas do mando (conforme definidos em Skinner, 1957)**. Dessa perspectiva, a ética skinneriana compreende tanto uma metaética descritiva quanto uma ética prescritiva.

Metaética Skinneriana Comportamento e Comportamento ÉticoO objeto de estudo da metaética é o comportamento ético, verbal e não verbal. Ainda antes de investigar o significado das palavras utilizadas no discurso ético, podemos, num nível mais básico, perguntar: por que as pessoas comportam-se eticamente? A pergunta sugere que haveria certa parcela do comportamento humano que poderia, propriamente, ser qualificada como “ética” - a parcela res­tante, claro, não merecendo tal qualificação. Seria tal forma de compreender o assunto aplicável à análise skinneriana?

* Nossa interpretação dos possíveis significados de palavras como “bom” e “ruim” por exemplo, vai bastante além da análise de Skinner.** Sobre isso, há duas observações importantes a fazer: (1) estritamente falando, apenas os tatos cons­tituem uma descrição direta de estímulos. No caso da metaética skinneriana, a presença de tatos reve­la-se na utilização de dados experimentais como fundamento da argumentação. Contudo, muito da metaética skinneriana (e de qualquer metaética) certamente compõe-se de intraverbais - por exem­plo, quando Skinner incorpora às suas explicações do comportamento ético dados das ciências bio­lógicas ou quando propõe a existência de um terceiro nível de seleção por conseqüências. (2) Ainda assim, não se trata de supor a predominância, no texto skinneriano, de tatos, intraverbais ou mandos “puros”, mas das variáveis que controlam a emissão desses operantes, sejam eles “puros” ou não. É razoável supor que o texto skinneriano - a respeito da ética ou de qualquer outro assunto - apresente operantes verbais sujeitos ao que o próprio Skinner denominou como “causação múltipla” (1957, p. 227). O comportamento verbal filosófico ou científico, em sua complexidade, certamente é função de múltiplas variáveis.

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Em trabalho anterior, tratamos especialmente deste assunto (Dittrich, 2004a). De uma perspectiva behaviorista radical, a palavra “ética” pode remeter tanto ao controle proveniente dos três níveis de seleção por conseqüências (filogenético, ontogenético e cultural) quanto, mais especificamente, a certas práticas de con­trole no nível cultural que beneficiam as próprias culturas. Não precisamos, necessariamente, optar por apenas uma das formas de aplicação da palavra - am­bas podem ser úteis em diferentes contextos verbais. Contudo, em se tratando da explicação da origem do comportamento ético na metaética skinneriana, a pri­meira forma parece ser a mais apropriada. Se reservássemos o adjetivo “ético” apenas ao comportamento controlado por determinadas práticas culturais, a explicação de qualquer episódio de comportamento ético seria, necessariamente, incompleta - visto que é a interação entre atuantes variáveis nos três níveis seleti­vos que explica, afinal, qualquer comportamento humano. Eis um exemplo simples (e familiar aos behavioristas radicais): podemos qualificar o comportamento de ingerir alimentos ricos em açúcar como bom ou ruim. Poderíamos, porém, expli­car o comportamento de ingerir tais alimentos apenas através do controle cultural? Obviamente, a resposta é negativa. Se ignorarmos o nível filogenético, não sabe­remos explicar porque os seres humanos, enquanto membros de uma espécie, tendem a achar o açúcar bom.

Pode-se, diante disso, perguntar: o que diferencia o comportamento ético do mero comportamento? A pergunta só faz sentido caso suponhamos que haja, de fato, alguma diferença fundamental entre ambos. Contudo, a análise de Skinner não sublinha qualquer diferença desta espécie; pelo contrário, ao explicar o com­portamento tipicamente denominado ético, Skinner lança mão, como sempre, dos três níveis do modelo de seleção por conseqüências. Se, como quer Skinner, “a ética é, principalmente, uma questão de conflito entre conseqüências imediatas e remotas” (1987b, p. 6), ética é sinônimo de seleção por conseqüências, e com­portamento ético é comportamento controlado por suas conseqüências, nos três níveis seletivos. Além disso, como aponta Skinner, “muitas questões que surgem na moral e na ética podem ser resolvidas especificando-se o nível de seleção” (1981 / 1984a, p. 480). Assim, de um ponto de vista behaviorista radical, a pergunta inicial da metaética - por que as pessoas comportam-se eticamente? - pode ser assim reformulada: por que as pessoas comportam-se1? A resposta, naturalmente, é: seleção por conseqüências.

É importante notar que, embora seja comum utilizarmos o adjetivo “ético” como sinônimo de “bom”, obviamente não o estamos fazendo aqui. Antes, tratamos tal adjetivo meramente como sinônimo de “relativo à ética” (enquanto campo de estudos). O comportamento do criminoso é comportamento ético - isto é, é com­portamento que pode ser eticamente explicado por suas conseqüências. Mas, repita-se, qualquer comportamento - mesmo aqueles que não qualificamos com adjetivos como “bom”, “ruim” etc. - pode ser eticamente explicado: comportamen­to ético é sinônimo de comportamento. Se optássemos por classificar como “éticos” apenas comportamentos que qualificamos como “bons” ou “ruins”, nossa defini­ção de quais comportamentos serão passíveis de análise ética mudaria a todo instante, pois qualquer comportamento pode ser potencialmente qualificado desta forma. O comportamento é ético na medida em que produz conseqüências

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(em qualquer dos três níveis seletivos) - e não apenas quando o classificamos como “bom” ou “ruim”. Assim, qualquer comportamento pode ser submetido à análise ética. O campo da ética é o campo do comportamento*.

A despeito disso, é óbvio que certos operantes, especialmente verbais (nota- damente, aqueles que envolvem palavras como “bom” ou “ruim”, “certo” ou “errado”, entre outras), merecem especial atenção em uma análise metaética apli­cada às culturas, dado seu importante papel de controle neste contexto. A metaética skinneriana busca, portanto, explicar o comportamento (verbal e não verbal) a partir das variáveis que o controlam - com especial interesse em certos operantes, especialmente verbais, tipicamente classificados como “éticos”. Segue- se uma tentativa de sintetizar essa explicação.

No nível filogenético, certas formas de comportamento são selecionadas por­que favorecem a sobrevivência do indivíduo enquanto membro de uma espécie. No nível ontogenético, certas formas de comportamento são selecionadas porque são seguidas por conseqüências reforçadoras. No nível cultural, certas formas de comportamento são selecionadas porque favorecem a sobrevivência da cultura na qual ocorrem. Considerando que todos os seres humanos estão submetidos a três níveis seletivos, o comportamento de qualquer ser humano é resultado da ação conjugada das variáveis que atuam nesses três níveis. A despeito disso, formas de comportamento que não favorecem a sobrevivência (seja do indivíduo enquanto membro da espécie, seja de sua cultura), ou ainda que não produzam conseqüências reforçadoras, obviamente surgem. Porém, considerado o universo total de variações comportamentais em cada nível seletivo, tais comportamentos tendem a ser desfavorecidos em termos seletivos. Além disso, nos três níveis os ambientes selecionadores são mutáveis: conseqüências que tiveram valor de sobrevivência (ou valor reforçador) em certo momento podem não mais apre­sentá-los posteriormente.

Na linguagem ética comum, dizemos que as pessoas comportam-se de deter­minadas formas porque “valorizam” as conseqüências que delas resultam (ou gostam delas, ou as preferem, ou as escolhem etc.). Uma pessoa pode valorizar sua própria sobrevivência e bem-estar. Pode gostar de doces, de esportes, de música ou de atividades sociais. Pode valorizar a sobrevivência e o bem-estar de outras pessoas, e pode planejar ambientes que favoreçam isso. Em todos esses casos, “valorizar” é apenas comportar-se de modo a produzir tais conseqüências, e este comportar-se é explicado pela ação de variáveis seletivas passadas. Também é possível, obviamen­te, falar sobre o que valorizamos. Podemos afirmar que valorizamos o dinheiro, ou a felicidade, ou as artes, ou o meio ambiente etc**. Outras pessoas podem “ter” ou­tros valores, podem falar sobre eles - e podem, além disso, tentar transformar nosso comportamento a fim de que ele se torne reforçador para elas. Caso sejam bem-su­

* Isso inclui os respondentes, pois sua origem também é explicada por conseqüências seletivas (de ordem filogenética).** Afirmações como esta, porém, não eqüivalem necessariamente a uma identificação precisa das conseqüências que controlam nosso comportamento. Tratamos desse problema com mais profundi­dade em Dittrich (2004b, Cap. 3).

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cedidas, a explicação para o fato de nosso comportamento ter sido modificado deve, novamente, remeter-se às contingências de reforço (mormente, contingências ver­bais). Explicações analítico-comportamentais nunca fazem recurso à teleologia, e não é diferente no campo da ética. Estritamente falando, “mudar os valores” de outra pessoa é mudar o valor reforçador das conseqüências que selecionam seu comportamento (mudando, com isso, o próprio comportamento).

Ampliando as possibilidades interpretativas do modelo de seleção por conse­qüências a fim de avançar na explicação de comportamentos tipicamente denominados “éticos”, Skinner (1971a; 1971b) identifica três tipos de “bens” que controlam seletivamente o comportamento:

• Bens pessoais (aqueles que reforçam o comportamento de quem os produz, sejam condicionados ou não*).

• Bens dos outros (aqueles que, embora sejam produzidos por certa pessoa, resultam em reforço para o comportamento de outras pessoas)**.

• Bem das culturas (sobrevivência das culturas).

Estes bens remetem às conseqüências seletivas que explicam, conjuntamente, nosso comportamento ético - ou, simplesmente, nosso comportamento.

Note-se, porém, que não há perfeita simetria entre o modelo de seleção por conse­qüências (1981/1984a) e os bens apresentados por Skinner (1971a; 1971b) - embora a lógica do modelo seja plenamente respeitada. Os bens pessoais são reforçadores (agem, portanto, no nível ontogenético). Porém, os reforçadores incondicionados adquirem seu poder reforçador no nível filogenético - e ainda que o condicionamento de respos­tas diante de novos reforçadores ocorra na ontogênese, todos os reforçadores condicionados derivam seu poder reforçador dos incondicionados. Os bens dos outros, por sua vez, surgem a partir do condicionamento de operantes sociais no segundo nível. A simetria com o modelo de seleção de conseqüências é retomada, por fim, quando Skinner trata do bem das culturas. A assimetria inicial é proposital: ela permite o trata­mento de problemas éticos tradicionais a partir de uma perspectiva selecionista. Assim, por exemplo, comportamentos “altruístas” podem ser explicados através de reforço recíproco: uma pessoa age pelo bem de outras porque é reforçada por isso (isto é, porque produz com isso bens pessoais)***.

No próprio Selection by Consequences, porém, Skinner (1981/1984a) retoma o problema das “definições de bom”, apontando que comportamentos denominados “bons” podem favorecer:

* Em alguns momentos, o texto de Skinner (1971a; 1971b) sugere a consideração apenas de reforça­dores incondicionados como bens pessoais - e, em outros, que reforçadores condicionados também podem ser assim denominados. Parece-nos, contudo, que a segunda forma de interpretar sua pro­posta facilita sobremaneira não apenas sua compreensão, mas sua aplicação a problemas práticos.** É importante notar que, ao diferenciar bens pessoais de bens dos outros, “Skinner não está real­mente distinguindo entre duas classes diferentes de reforçadores tanto quanto está esclarecendo as circunstâncias que determinam sua disponibilidade” (Wood, 1979, p. 12).*** Isso não exclui a possibilidade de que haja “uma pequena medida de comportamento altruísta inato na raça humana” (Skinner, 1971a, p. 545).

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• A sobrevivência da espécie (nível filogenético).• O reforço do comportamento de quem os emite ou, ainda, de outras pessoas

(nível ontogenético).• A sobrevivência das culturas (nível cultural).

Essa classificação permite qualificações independentes do que seja “bom” de acordo com as contingências seletivas analisadas: não há nenhuma necessidade de convergência entre o bem das espécies, dos indivíduos e das culturas. De fato, tais bens encontram-se, não raro, em oposição direta.

Significado de Bom e RuimNão é casual o fato de que, em nosso discurso comum, em geral qualificamos como “boas” as respostas que produzem conseqüências reforçadoras, ou ainda respos­tas com possível valor de sobrevivência (para a espécie ou para a cultura). Em geral, também qualificamos desta forma as próprias conseqüências produzidas por tais respostas. Tipicamente, estas conseqüências são as coisas das quais dize­mos “gostar”, pelas quais afirmamos “trabalhar” etc. Aqui, a metaética skinneriana penetra um território historicamente explorado pela metaética tradicional: o do significado das palavras utilizadas no discurso ético. Mas a inclusão da palavra “significado” acrescenta algum problema novo para o behaviorista radical? Uma das conseqüências infelizes do fato de que a filosofia costuma tratar o comporta­mento verbal como um fenômeno essencialmente diferente do comportamento não verbal reflete-se nas tarefas que a metaética estabelece para si: seria preciso não apenas explicar a origem do comportamento ético, mas também o significado das palavras utilizadas no discurso ético. Para Skinner, porém, o significado de um comportamento (verbal ou não verbal) é uma propriedade “das condições sob as quais o comportamento ocorre” (1957, p. 13-14)*. Estas mesmas condições, claro, explicam a origem do comportamento. Assim, para o behaviorista radical, pergun­tar sobre o significado das palavras utilizadas no discurso ético é perguntar sobre sua origem - isto é, sobre as variáveis que as controlam.

A presença de palavras como “bom” e “ruim” (entre outras possíveis) caracteri­za, grosso modo, o que se costuma denominar “discurso ético”. Qual seria o seu significado? Uma análise exaustiva das possíveis funções de palavras como “bom” e “ruim” (no sentido da análise defendida por Skinner, 1945/1972) nunca foi reali­zada - e talvez seja impossível, se tomarmos a palavra “exaustiva” ao pé da letra -, mas é óbvio que tais palavras podem ser utilizadas de diferentes formas em diferentes contextos. Assim, o behaviorista radical não oferece uma explicação essencialista de qual seja “o” significado das mesmas. Vargas (1982) é preciso quanto a este pon­to: enquanto as metaéticas tradicionais ocupam-se, sobretudo, das propriedades lógicas e formais das sentenças éticas, a metaética skinneriana está interessada em suas “propriedades” funcionais - isto é, em apontar as variáveis que as controlam. Mesmo quando assumem uma postura de investigação funcional, as metaéticas tradicionais tendem a apontar apenas uma dentre as possíveis classes de variáveis

* Essas condições, por sua vez, adquirem sua função controladora a partir de seu papel na história seletiva do indivíduo, conforme esclarece Skinner (1974, Cap. 6).

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controladoras do comportamento verbal ético como responsável por todas as ins­tâncias. A perspectiva skinneriana, por outro lado, contempla a análise das contingências verbais de reforçamento no discurso ético, sempre respeitando a matriz interpretativa oferecida pelo modelo de seleção por conseqüências e, em especial, pela tríplice contingência. Essa matriz, ademais, diferencia a proposta skinneriana mesmo das metaéticas que propõem análises funcionais, dado que ela define, na análise do comportamento, uma forma sui generis de análise funcional- isto é, a análise de contingências de reforçamento, fundamentada na identificação das variáveis que controlam o comportamento humano.

Analisemos alguns exemplos, palavras como “bom” ou “ruim”, bem como as sentenças nas quais figuram, podem ser utilizadas para vários fins: para descrever comportamentos do falante (“tive um bom desempenho na tarefa”) ou de outras pessoas (“o discurso dele foi muito bom”), fenômenos físicos (“o tempo está bom”), conseqüências de comportamentos públicas (“o resultado das vendas foi bom”) ou privadas (“este sorvete está muito bom”), ou ainda para recomendar (“este livro é muito bom”), aprovar (“foi bom você ter dito aquilo para ele”) ou reclamar (“seria bom se ele parasse de me importunar”). Partindo deste conjunto de exemplos - que de forma alguma se supõe exaustivo, embora seja bastante abrangente -, é possível verificar que, na maior parte deles a palavra “bom” parece estar sob con­trole de objetos ou eventos positivamente reforçadores, ou do comportamento que os produz. Alguns dos exemplos, porém, merecem atenção especial*.

Retomemos, de início, uma clássica definição de Skinner (1971b): “Coisas boas são reforçadores positivos” (p. 103), e coisas ruins são reforçadores negativos (p. 104). Esta definição aparentemente simples talvez seja a passagem da metaética skinneria­na que mais gere discordâncias interpretativas. Não abordaremos tais discussões neste capítulo. Basta-nos, agora, concordar quanto ao seguinte: a afirmação de Skinner indica, pelo menos, o fato de que as pessoas, efetivamente, produzem “coisas boas” (reforçadores positivos) e evitam “coisas ruins” (reforçadores negativos). Pouco depois, Skinner estende sua análise de forma explícita ao problema da linguagem moral: “Fazer um julgamento de valor chamando algo de bom ou ruim é classificá-lo em termos de seus efeitos reforçadores” (p. 105). Temos, assim, uma resposta de Skinner ao problema do significado de “bom” e “ruim”: emitimos tais palavras para qualificar, respectivamente, reforçadores positivos e negativos em relação a nosso comporta­mento. Quando alguém diz “isso é bom”, está, em princípio, indicando objetos ou eventos que reforçaram positivamente seu comportamento.

Analisemos, agora, a última das sentenças citadas anteriormente (“seria bom se ele parasse de me importunar”). A palavra “bom”, nesta sentença, não denomina um reforçador positivo, mas sim a eliminação de um reforçador negativo (para o

* Antes de prosseguir, contudo, é importante lembrar que só podemos analisar funcionalmente esses exemplos porque as sentenças remetem a situações hipotéticas, passíveis de análise a partir da trí­plice contingência. Não se trata, portanto, de buscar isoladamente significados nas próprias palavras ou sentenças, mas na interação entre o comportamento verbal do falante que as emite e as supostas variáveis que controlam tal comportamento, conforme indicadas pelas sentenças. Pode-se, inclusive, questionar a pertinência de classificar esse exercício interpretativo como uma “análise funcional” - entretanto, por ora, não discutiremos esse problema.

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falante). Achamos bom produzir uma “coisa boa” (um reforçador positivo), mas também podemos achar bom livrar-nos de uma “coisa ruim” (um reforçador ne­gativo). Portanto, a emissão da palavra “bom” pode ser controlada pela presença de reforçadores positivos, mas também pela eliminação de reforçadores negativos. Inversamente, a emissão da palavra “ruim” pode ser controlada pela presença de reforçadores negativos, mas também pela eliminação de reforçadores positivos. Podemos expressar isso de forma mais sucinta: em geral, chamamos de “boas” as conseqüências de contingências de reforço, e chamamos de “ruins” as conseqüên­cias de contingências de punição. Assim, embora oa reforçadores negativos sejam, em geral, chamados de “ruins”, contingências de reforçamento negativo (nas quais reforçadores negativos são eliminados) podem ser chamadas “boas”.

Contudo, a primeira das sentenças citadas (“tive um bom desempenho na tarefa”) não parece fazer referência direta a conseqüências, mas ao próprio comportamento do falante. Presumivelmente, porém, o falante assim define seu comportamen­to porque ele produziu conseqüências reforçadoras. A utilização de palavra “coisas” (things) no texto de Skinner (1971b, p. 103-104) para definir o que é “bom” ou “ruim” talvez seja uma escolha limitada. Estamos, obviamente, tratando de processos, de relações comportamentais caracterizadas pela tríplice contingência. A classificação “bom” ou “ruim” depende, em última instância, das conseqüências de nosso compor­tamento (que, diga-se, nem sempre podem ser adequadamente descritas como “coisas”), mas podemos, igualmente, classificar como “bons” ou “ruins” os próprios comportamentos que as produzem.

Podemos, em suma, classificar como “bons” ou “ruins” qualquer dos elementos de uma tríplice contingência (e, quando o fizermos, tais elementos serão estímu­los discriminativos para nosso comportamento verbal de assim classificá-los). Podemos até mesmo classificar contingências como um todo desta forma, ou ainda conjuntos amplos de contingências (“minha infância foi muito boa”). Não obstante, a explicação subjacente parece ser sempre a mesma: são as conseqüên­cias (reforçadoras ou punitivas) em uma contingência que permitem classificá-la (ou a um de seus elementos) como “boa” ou “ruim”.

Alguns exemplos podem ser utilizados a fim de refinar esta conclusão. Um ladrão pode ser reforçado pelas conseqüências materiais de sua atividade e chamá-las de “boas”, e ainda assim pode reconhecer que tal atividade gera também conseqüên­cias “ruins” para outras pessoas (a distinção skinneriana entre bens pessoais e bens dos outros é útil para analisar este caso). Caso fosse chamado a qualificar seu com­portamento, o ladrão poderia perfeitamente afirmar que ele é “bom e ruim” (ou poderia simplesmente dizer que é “ruim”, a despeito de produzir reforçadores po­sitivos). O fato de uma cultura ensinar seus membros a classificarem determinados operantes como “ruins” certamente não garante que eles não venham a ser emiti­dos*. Um toxicômano pode, igualmente, oscilar entre classificar o consumo de drogas como “bom” ou “ruim”, já que sua utilização pode produzir conseqüências reforçadoras imediatas e conseqüências punitivas atrasadas.

* Para uma revisão das pesquisas sobre a correspondência entre comportamentos verbais e não ver­bais, ver Beckert (2005).

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Exemplos como esses não destoam da regra geral: conseqüências reforçadoras são chamadas “boas”; conseqüências punitivas são chamadas “ruins”. Os exemplos apenas chamam atenção para a complexidade das conseqüências que podem controlar a emissão destas palavras (conseqüências que afetam o faltante ou outras pessoas; conseqüências imediatas ou atrasadas). É possível, contudo, apontar exceções à regra. A mais óbvia verifica-se nas ocasiões em que uma pessoa mente. O conviva pode dizer que o jantar servido está bom, a despeito de não ser refor­çado por ele. O político pode defender “bons valores” sem se comportar de acordo com o que prega. Note-se que um falante pode estar mentindo “conscientemente” (como o conviva e o político provavelmente estão, em nossos exemplos), mas também pode estar mentindo “inocentemente”. A mentira “consciente” implica o controle sobre o comportamento de mentir por variáveis públicas especiais (a simpatia do anfitrião ou os aplausos do eleitorado, por exemplo), mas um falante pode, perfeitamente, proclamar-se detentor de valores em relação aos quais nada faz e, ainda assim, estar “sendo sincero” - ou mentindo “inocentemente”. Se um ̂cultura reforça a exaltação verbal de determinados valores, e se esta exaltação não precisa, necessariamente, ser coerente com outras condutas verbais e não verbais do falante, este quadro é facilmente concebível.

Retomemos o caso do toxicômano, apontando agora outra possibilidade. Mesmo supondo que ele não tenha sofrido qualquer tipo de conseqüência punitiva (física ou social) em virtude do uso de drogas, ainda assim é possível que ele qualifique tal uso como “ruim”. Para tanto, basta que tal qualificação tenha sido selecionada em seu repertório verbal (por exemplo, por pais e professores). É possível, ainda, que a qua­lificação varie diante de diferentes audiências: “ruim” na presença de pais e professores, “bom” na presença de outros usuários. O falante poderia estar “mentindo” no primeiro caso, e “falando a verdade” no segundo, mas a diferença relevante está na mudança das condições que controlam seu comportamento.

Analisemos outra possível exceção: um falante pode, sob controle de circuns­tâncias variadas, afirmar que “o sofrimento é bom”. Ele pode, por exemplo, ser um sadomasoquista, ou pode ser simplesmente um pai dialogando com seu filho. No caso do sadomasoquista, é razoável supor que o adjetivo “bom” é aplicado a con­tingências de reforço positivo (o falante engaja-se com frequência em atividades sadomasoquistas). No segundo caso, porém, o adjetivo “bom” parece ser aplicado a contingências coercivas (punitivas ou de reforço negativo). Diversas explicações para isso são plausíveis: o falante pode, por exemplo, ter sido educado em uma perspectiva religiosa que reforça a tolerância a tais contingências, ou pode considerar que tais contingências possibilitam o surgimento de um repertório comportamental que facilitará a obtenção posterior de reforçadores positivos (ou a eliminação de re- forçadores negativos). Não obstante, este caso constitui outra possível exceção à regra geral de que apenas conseqüências reforçadoras controlam a emissão da palavra “bom”.

Estes exemplos mostram que, em se tratando da explicação dos possíveis signi­ficados de “bom” ou “ruim” na linguagem comum, é desaconselhável ser taxativo. Um falante pode, até mesmo, sob certas condições, classificar conseqüências punitivas como “boas”, e conseqüências reforçadoras como “ruins”. Isso, porém, não muda o fato de que, para este falante, certas conseqüências são reforçadoras

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e outras punitivas. É o que Skinner quer dizer com outra passagem que pode fa­cilmente ser mal interpretada: “Os reforçadores efetivos são uma questão de observação e não podem ser discutidos.... O que é bom para o habitante das Ilhas Trobriand é bom para o habitante das Ilhas Trobriand, e assim o é” (1971b, p. 128). A passagem é de natureza descritiva, não prescritiva. Skinner não está afirmando que os habitantes das Ilhas Trobriand devem contentar-se com seu status quoy mas sim que aquilo que reforça seus comportamentos num determinado momento histórico é um fato empírico. É preciso, portanto, diferenciar cuidadosamente dois problemas metaéticos distintos:

• O que é, de fato, reforçador ou punitivo para um indivíduo?• Em que circunstâncias esse indivíduo emite palavras como “bom” e “ruim”,

ou sentenças que as contenham?

Ambas são perguntas que podem, em princípio, ser respondidas empiricamen- te - mas, da perspectiva do falante, não é necessário que as respostas sejam mutuamente coerentes: um falante não está constrangido a classificar como “boas” as conseqüências de contingências de reforço, ou de “ruins” as conseqüências de contingências de punição. Presumivelmente, isso acontece na maior parte das situa­ções, mas isso reflete apenas uma regularidade na utilização das palavras “bom” e “ruim” por parte de uma comunidade verbal. Nada impede que um falante aprenda a utilizar tais palavras, em algumas circunstâncias, de modo diferente do usual.

Buscamos analisar, até o momento, as possíveis variáveis controladoras da emissão da palavra “bom” nos exemplos que enumeramos. Vimos que “bom” pode descrever contingências, elementos de contingências ou conjuntos de contingên­cias, mas que tal descrição, em geral, depende das conseqüências no interior das contingências: conseqüências reforçadoras aumentam a probabilidade da emissão da palavra “bom”, e conseqüências punitivas aumentam a probabilidade da emis­são da palavra “ruim” (nos dois casos, enquanto variáveis antecedentes para o comportamento verbal). Apontamos, porém, algumas possíveis exceções a esta regra, que dão margem a uma conclusão mais ampla: classificar como “boas” as conseqüências de contingências de reforço e como “ruins” as conseqüências de contingências de punição (assim como os comportamentos que geram tais con­seqüências) é uma convenção de comunidades verbais. Como toda convenção, ela pode ser quebrada, gerando inconsistências no uso destas palavras.

Analisemos agora um problema à parte: não poderíamos descrever como “boas” determinadas conseqüências que, aparentemente, não participam de contingências de reforço? Um behaviorista radical, por exemplo, pode afirmar que a sobrevivência das culturas é algo bom. Poderíamos, em algum sentido, dizer que esta conseqüên­cia é reforçadora? Este problema merece exame detalhado. Contingências seletivas ocorrem em três diferentes níveis, e as conseqüências responsáveis pela seleção das respectivas unidades comportamentais variam em cada nível. Na evolução natural, as conseqüências referem-se à sobrevivência e à transmissão dos genes. Bens pes­soais derivam, primordialmente, dessas conseqüências. Na evolução ontogenética, as conseqüências são reforçadores - condicionados ou não, sociais ou não. Aos bens pessoais, somam-se, portanto, os bens dos outros. Por fim, na evolução cultural, as

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conseqüências referem-se à sobrevivência das culturas*. Mas não podemos, sob hipótese alguma, afirmar que o bem das culturas é um evento reforçador, pois o bem das culturas é sua sobrevivência - e a sobrevivência das culturas “não pode funcio­nar como fonte de reforçadores genuínos para o indivíduo” (Skinner, 1971b, p. 177). Podemos, no entanto, afirmar que eventos que, presumivelmente, promoverão o bem das culturas podem se tornar reforçadores condicionados para certos indiví­duos. Parte dos membros de uma cultura reforçada por eventos que indiquem possível aumento nas chances de sobrevivência dessa cultura é resultado das próprias contingências de sobrevivência cultural. Se essas contingências selecionam cultu­ras que promovem sua própria sobrevivência, é previsível que o planejamento explícito de práticas que a promovam (por membros da cultura que “levam o futu­ro em consideração”) também seja selecionado, com o objetivo de tornar a cultura mais eficiente (isto é, mais apta a sobreviver)**. Deve ficar claro, porém, que os eventos que indicam possível aumento nas chances de sobrevivência de uma cul­tura são reforçadores condicionados - e atuam, portanto, no nível ontogenético. A seleção no nível cultural não controla diretamente o comportamento dos indiví­duos, exatamente porque o bem das culturas (isto é, sua sobrevivência) não os reforça diretamente. Como Skinner deixa claro, “é o efeito sobre o grupo, não as conseqüências reforçadoras para membros individuais, que é responsável pela evolução da cultura” (Skinner, 1981/1984a, p. 478). Embora os operantes que com­põem práticas culturais sejam selecionados, no segundo nível, por conseqüências reforçadoras, as práticas culturais, enquanto unidades comportamentais do tercei­ro nível, são selecionadas porque permitem a sobrevivência dos grupos que as executam (Skinner, 1984c, p. 504).

Estes fatos exigem uma interpretação mais sutil da classificação verbal “bom” quando aplicada ao terceiro nível seletivo. Eventos*** com provável valor de

* Tanto no nível filogenético quanto no cultural, a expressão “refere-se a” é importante. A sobrevivência, nesses níveis, não é uma ou a conseqüência seletiva: é simplesmente o produto final do processo de seleção. Eis um exemplo no nível filogenético: um animal, por meio de algum comportamento espe­cialmente habilidoso, conseguiu escapar de predadores, tendo sobrevivido e transmitido este e muitos outros comportamentos (através de seus genes). O comportamento gerou uma conseqüência: o animal escapou de predadores. Tendo o animal executado este e muitos outros comportamentos com valor de sobrevivência, cada um com conseqüências específicas, ele sobreviveu e se reproduziu. Um raciocínio semelhante aplica-se à seleção de práticas culturais: uma cultura que promoveu certas práticas (diga­mos, práticas preventivas no campo da saúde) conseguiu fazer frente a certas ameaças à integridade física de seus membros, tendo sobrevivido e transmitido esta e muitas outras práticas (pelo condiciona­mento operante). As práticas preventivas geraram uma conseqüência: a cultura evitou certos problemas de saúde entre seus membros. Tendo a cultura executado esta e muitas outras práticas com valor de sobrevivência, cada uma com conseqüências específicas, ela sobreviveu e se “reproduziu”.** Contudo, a “intencionalidade” não é uma característica necessária das práticas culturais. Mesmo a existência de práticas “intencionais” explica-se seletivamente: “As pessoas não observam determi­nadas práticas para que o grupo tenha maior probabilidade de sobreviver; elas as observam porque grupos que induziram seus membros a fazê-lo sobreviveram e transmitiram tais práticas” (Skinner, 1981/1984a, p. 479).*** Entende-se por “evento” qualquer um dos elementos da tríplice contingência, uma contingência como um todo ou, ainda, conjuntos amplos de contingências.

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sobrevivência cultural podem ser chamados “bons” porque sua promoção é reforçada pela cultura. Por exemplo, certos comportamentos, tais como “uma maneira melhor de fazer uma ferramenta, cultivar alimento ou ensinar uma criança são reforçados por suas conseqüências - a ferramenta, a comida, ou um ajudante útil, respectivamente” (Skinner, 1981/1984a, p. 478). Uma cultura que promove tais comportamentos pode “resolver seus problemas” (p. 478) e sobreviver. Tais comportamentos também podem ser “artificialmente” reforçados pelas culturas (com salários, por exemplo), exatamente por causa de seu presumível valor de sobrevivência. Pensemos, agora, em atividades que envolvem comportamentos ainda mais complexos - e que, supostamente, também contribuem para a so­brevivência de uma cultura: a previsão da atividade meteorológica ou sismográ- fica, a promoção de melhorias no campo do saneamento básico e da saúde pública, o aperfeiçoamento do sistema judiciário, a adoção de práticas de de­senvolvimento sustentável, ou mesmo a pesquisa científica. Tais atividades não são naturalmente reforçadoras - e, em sentido estrito, é incorreto dizer que cer­tos membros de uma cultura se engajam nelas porque possuem valor de sobre­vivência. Ambientes sociais reforçam um amplo conjunto de comportamentos, alguns dos quais possuem valor de sobrevivência e podem ser chamados de “bons”. Mas eles não são assim chamados por possuírem valor de sobrevivência (pois este valor é apenas plausível), mas por serem reforçadas em um ambiente social. Isso se aplica mesmo que um indivíduo afirme trabalhar “visando” ao bem de sua cultura, ou das futuras gerações. A afirmação indica, tão-somente, que determinados eventos com provável valor de sobrevivência são, para aquele indivíduo, reforçadores condicionados (e ainda assim é preciso supor, neste caso, uma correspondência entre dizer e fazer).

No entanto, repitamos, não é necessário que haja a “intenção” de promover o bem da cultura - é possível que, na maioria dos casos, comportamentos que promovam o bem da cultura ocorram tão-somente porque foram reforçados “artificialmente” (isto é, por conseqüências não produzidas diretamente pelo comportamento reforçado), e não porque o indivíduo prevê suas possíveis conseqüências de longo prazo. O comportamento “intencional” visando ao bem das culturas pode ocorrer, é claro - mas é explicado não por conseqüências futuras (e apenas prováveis), mas por conseqüências passadas (reforçadoras). Obviamente, um indivíduo também pode qualificar a sobrevivência das culturas como algo “bom” sem que seu próprio comportamento contribua para esta sobrevivência - basta, para tanto, que sua qualificação seja reforçada por uma comunidade verbal.

Em suma, permanece válida neste caso, como nos anteriores, a mesma expli­cação, que pode ser assim resumida:

1. Em geral, conseqüências reforçadoras aumentam a probabilidade de emis­são da palavra “bom”, e conseqüências punitivas, da palavra “ruim”.

2. Isso depende, contudo, da forma como as palavras “bom” e “ruim” são utili­zadas em comunidades verbais e da consistência dessa utilização. Portanto, exceções a (1) são possíveis e se devem a contingências adicionais nas comu­nidades que controlam o comportamento verbal do falante.

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Significado das Sentenças ÉticasEmbora tenhamos analisado, até o momento, as possíveis variáveis que controlam a emissão da palavra “bom” nos exemplos que enumeramos, as sentenças que contêm palavras como “bom” ou “ruim” podem ter diferentes funções. Sentenças como “tive um bom desempenho na tarefa”, “o discurso dele foi muito bom”, ou “o resultado das vendas foi bom” podem ser apenas tatos. Outras, como, por exemplo, “é bom você sair logo daí” podem ser apenas mandos. A classificação depende sempre das variáveis que controlam a emissão das sentenças - mas, neste sentido, nem sempre é possível classificar uma sentença como sendo apenas um tato ou apenas um mando. Considere a sentença “este livro é muito bom”, ela pode des­crever uma característica do livro em relação ao falante (lê-lo foi reforçador), mas também pode ser usada para induzir o ouvinte a ler o livro. Como afirma Skinner, é “altamente provável que qualquer amostra de comportamento verbal seja função de muitas variáveis operando ao mesmo tempo” (1957, p. 228), como exemplifi­cado pelo fato de que um falante pode emitir respostas sujeitas a “uma mistura de relações controladoras características tanto do tato quanto do mando” (p. 151). Sentenças como “este sorvete está muito bom” ou mesmo “o tempo está bom” podem, igualmente, ilustrar este tipo de controle múltiplo, ainda que possam ser apenas tatos. Por fim, a sentença “foi bom você ter dito aquilo para ele” pode ser utilizada como conseqüência reforçadora para uma resposta especificada pela própria sentença (mas pode também ser uma sentença “descritiva do objeto” - isto é, um tato -, assim como um mando). Esta função reforçadora também é aponta­da por Skinner (1971b, p. 109).

Sentenças éticas, portanto, podem ser utilizadas pelo menos com as funções anteriormente indicadas. Mas não se pode afirmar que esta lista esgota as possi­bilidades. Se o significado de palavras e sentenças depende das variáveis que as controlam, certamente palavras como “bom” ou “ruim” e as sentenças que as contêm são polissêmicas. Em quantas outras ocasiões elas forem emitidas, a tarefa do behaviorista radical será sempre empregar sua forma particular de análise, apon­tando as variáveis responsáveis por sua emissão. Vários outros significados para tais palavras e sentenças podem, portanto, ser eventualmente identificados. A forma particular através da qual o behaviorismo radical analisa o significado dos operantes verbais permite percebê-los como multifacetados - tanto quanto o sejam as culturas humanas e suas práticas verbais. Há tantos significados para palavras e sentenças quanto às práticas que as diferentes comunidades empregam para controlar sua emissão e às variáveis controladoras que operam em cada mo­mento da vida do indivíduo que as emite.

Etica Prescritiva SkinnerianaApontamos anteriormente a importância de diferenciar os aspectos descritivo e prescritivo da ética skinneriana. Tratamos, até o momento, do primeiro aspecto: a metaética de Skinner. Há uma explicação skinneriana para o comportamento ético, verbal e não verbal - e esta explicação é descritiva. Mas há também prescri­ção na ética skinneriana: Skinner apresenta e defende o que, tradicionalmente, a ética chama de “valores”.

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Como podemos compreender esta palavra sob a ótica behaviorista radical? O que são os “valores”, tão caros à ética? Como em muitos outros casos, o uso do substantivo é enganoso: não há “valores”, mas há um “valorizar” - e este “valorizar” é uma relação entre nosso comportamento (verbal e não verbal) e os eventos ambientais que o controlam. Como afirmamos anteriormente, “valorizar” deter­minadas conseqüências é apenas comportar-se de modo a produzi-las, e este comportar-se é explicado pela ação de variáveis seletivas passadas. Também vimos que é possível, em outro sentido, “valorizar” diversos objetos ou eventos chaman­do-os de “bons” ou “ruins”. Esses objetos ou eventos podem ser quaisquer dos elementos de uma contingência de reforço, ou uma contingência como um todo, ou ainda conjuntos amplos de contingências. Contudo, as conseqüências desem­penham, novamente, um papel essencial: elas ajudam a explicar que tipo de valor atribuímos às contingências ou a seus elementos - ou ainda, alternativamente, elas ajudam a explicar o que valorizamos e o que não valorizamos (supondo-se certa regularidade na utilização de “bom” e “ruim” em uma comunidade verbal). Não surpreende, portanto, o fato de que Skinner (1971a; 1971b) apontar insisten­temente para as conseqüências quando investiga as “razões” pelas quais valorizamos algo. As conseqüências não apenas explicam o comportamento de “valorizar”, mas aquilo mesmo que é, em última análise, “valorizado”.

Como qualquer ser humano, Skinner não “escolheu” os valores que defende. O fato de alguém valorizar determinadas conseqüências é algo a ser explicado, não uma explicação: valorizar é comportar-se. Isso leva Skinner a afirmar o que segue:

Não precisamos dizer que alguém escolhe a sobrevivência como um critério de acordo com o qual uma prática cultural deve ser avaliada.

O comportamento humano não depende da escolha prévia de qualquer valor... O comportamento de fazer uma sugestão construtiva sobre uma

prática cultural não envolve a uescolha de um valor”. (1953/1965, p. 432-433)

Diante disso, qual o sentido em afirmar que Skinner apresenta ou defende de­terminados valores? E ainda mais: haveria algum sentido em discutir valores? Uma interpretação behaviorista radical dos valores é possível, desde que exclua cuidado­samente a teleologia geralmente implícita ao uso da palavra “valor”. Nossos valores são, tão-somente, as conseqüências que reforçam nosso comportamento. É plena­mente compreensível, portanto, que tentemos induzir outras pessoas a “adotar nossos valores” - isto é, a produzir conseqüências que reforçam nosso comporta­mento. As discussões sobre valores são um resultado inevitável do fato de que, ao buscar produzir conseqüências que reforçam nosso comportamento, encontramos como limite o fato de que outras pessoas agem da mesma forma, mas de acordo com seus próprios “valores” (seu comportamento é reforçado por outras conseqüências, talvez conflitantes com aquelas que reforçam o nosso). Até que ponto tais discussões podem, efetivamente, modificar o comportamento das pessoas envolvidas é um problema empírico (que diz respeito, em especial, à questão da influência do com­portamento verbal sobre o não verbal). A experiência cotidiana sugere que, pelo menos em algumas circunstâncias, estas modificações ocorrem (do contrário, a convivência social seria impossível). Uma compreensão mais precisa de como se dá

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tal processo seria de grande utilidade para uma série de propósitos práticos. Não resta dúvida, porém, de que não se trata de modificar supostas entidades mentais chamadas “valores” para que então se verifique a mudança do comportamento. Trata-se de modificar o comportamento (verbal ou não verbal) manipulando as variáveis que o controlam. É isso o que ocorre em discussões sobre valores, a des­peito dos termos utilizados em tais discussões. Neste sentido, discutir valores é um meio legítimo de mudar comportamentos, mesmo que ainda não compreendamos plenamente os processos envolvidos.

A ética prescritiva de Skinner apresenta os valores de Skinner - melhor seria dizer: as conseqüências que Skinner valorizava, que considerava “boas”, e que su­postamente reforçavam seu comportamento. A divisão entre um aspecto descritivo e outro prescritivo na ética skinneriana pode ser vista com desconfiança, pois reme­te, de imediato, à tradicional distinção entre fatos e valores, explicitamente rejeitada por Skinner (1981 / 1984a, p. 479). Mas há outra forma de compreender essa distinção. Como afirmamos anteriormente, uma linguagem prescritiva é uma linguagem na qual predominam variáveis controladoras típicas do mando - o que também se aplica a Skinner. Prescrever é comportar-se - e as diferentes prescrições são expli­cadas, portanto, por suas conseqüências, como qualquer comportamento. Assim, pelo menos sob este ponto de vista, é óbvio que não há uma diferença entre fatos e valores: valores também são fatos, pois quem prescreve valores comporta-se. Isso, porém, não torna menos importante à distinção entre tatos e intraverbais, por um lado, e mandos, por outro (ou entre uma linguagem descritiva e uma prescritiva). Prescrever valores é prescrever comportamentos que produzem conseqüências- e quem prescreve o faz em função destas conseqüências: elas são reforçadoras para quem prescreve. Por que elas são reforçadoras explica-se pela história com- portamental daquele que prescreve - e, portanto, é esta história que explica por que diferentes pessoas promovem diferentes valores. Mas histórias comportamentais não são melhores ou piores, corretas ou incorretas, boas ou ruins: são simplesmen­te histórias. O problema crucial da ética prescritiva, portanto, continua: por que deveríamos julgar estas ou aquelas prescrições (incluindo as feitas por Skinner) como melhores ou piores, corretas ou incorretas, boas ou ruins? A resposta pode soar decepcionante, mas não parece haver outra: não há nenhum critério impessoal que permita tal julgamento.

Não obstante, prescrições são realizadas: tentamos modificar os comporta­mentos uns dos outros. É o que faz Skinner, por exemplo, nas inúmeras ocasiões em que trata do planejamento cultural. Planejar é comportar-se, e o tipo de pla­nejamento prescrito por Skinner visa declaradamente produzir uma conseqüência: a sobrevivência das culturas - o valor fundamental da ética prescritiva skinneria­na. Note-se que a sobrevivência das culturas surge também na metaética skinneriana (enquanto objeto de descrição, portanto): algumas culturas sobrevivem e outras perecem - e, portanto, as culturas estão continuamente sujeitas às conseqüências de suas próprias práticas. Sob este ponto de vista, a sobrevivência das culturas é, obviamente, um fato empírico. Mas descrever o terceiro nível de seleção do com­portamento por conseqüências é diferente de prescrever a sobrevivência das culturas como meta do planejamento cultural. Os apelos de Skinner relativos à necessidade do planejamento cultural justificam-se exatamente pelo fato de que,

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se nos contentarmos em observar o percurso da evolução cultural sem qualquer preocupação em intervir sobre ele, a sobrevivência de nossas culturas (e, em última análise, da espécie humana) estará sob sério risco. Walden II{Skinner, 1948/ 1978a) é uma obra claramente prescritiva neste sentido.

A sobrevivência das culturas, porém, não é um valor pior, ou melhor, do que qualquer outro: é apenas um valor. Pode-se, diante disso, perguntar: por que de­veríamos promovê-la? Skinner previu essa pergunta - e, como ele mesmo afirmou, “a única resposta honesta a esse tipo de questão parece ser esta: ‘Não há uma boa razão para que você deva importar-se, mas se sua cultura não o convenceu de que há, tanto pior para sua cultura'” (1971b, p. 137). É uma situação insólita: Skinner integra o grupo de pessoas que tenta oferecer “boas razões”, mas admite de forma sincera que elas não existem. Fazer planejamento cultural é exatamente “convencer as pessoas de que há boas razões” - ou, em outras palavras, reforçar comporta­mentos com provável valor de sobrevivência (já que a própria sobrevivência não é um evento reforçador, e nem sequer uma fonte de reforçadores condicionados). Os reforçadores são as únicas “boas razões” - as únicas razões efetivas.

Trabalharemos pela sobrevivência de nossa cultura, se o fizermos, por causa dos reforçadores pessoais que são efetivos por causa de nossa dotação

genética, conforme eles venham a emergir naturalmente ou como parte de nosso ambiente cultural (Skinner, 1971a, p. 551)

Em certo sentido, portanto, a sobrevivência das culturas é um valor arbitrário, como Skinner reconhece: “Seria um erro... tentar justificá-las [práticas com valor de sobrevivência] em qualquer sentido absoluto. Não há nada fundamentalmente certo ou errado sobre a sobrevivência de uma cultura” (1971a, p. 550). Mas o mesmo se aplica a qualquer outro valor - e não há, portanto, qualquer valor absolutamente correto ou verdadeiro: “Não podemos responder a tais questões [sobre valores] apontando para absolutos. Não há verdade absoluta em julgamentos de valor. Nin­guém possui este tipo de verdade ou pode responder a questões apelando a ela” (Skinner, 1971a, p. 547). Se justificativas absolutas são impossíveis, Skinner tem, como qualquer outra pessoa, o direito de defender e promover seus próprios valores.

Contudo, embora a sobrevivência das culturas seja o valor fundamental da ética skinneriana o autor vai além em suas prescrições. Em diversos momentos de sua obra, Skinner indica o que podemos chamar de valores secundários de sua ética (em relação a um valor primário - isto é, à sobrevivência das culturas)*. São aqueles valores que, provavelmente, contribuem para a sobrevivência das cultu­ras: felicidade (1955-1956/1972a, p. 3; 1956/1972b, p. 36; 1971b, p. 152), saúde (1955-1956/1972a, p. 6; 1956/1972b, p. 36; 1971b, p. 152), segurança (1956/1972b, p. 36; 1971b, p. 152), produtividade (1955-1956/1972a, p. 3; p. 6; 1956/1972b, p. 36; 1971b, p. 152), educação (1955-1956/1972a, p. 3; p. 6; 1971b, p. 152), criatividade (1956/1972b, p. 36), experimentação (1971b, p. 153), amor (1955-1956/1972a, p. 6), cooperação (1972/1978b, p. 197), preservação do meio ambiente (1971b, p. 152;

* Esclareça-se que essa distinção não ocorre no texto skinneriano.

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1987b, p. 1). Deve-se sublinhar, porém, um ponto de vital importância: os valores secundários da ética skinneriana não devem ser perseguidos como fins em si mesmos; devem, pelo contrário, estar sempre a serviço de um valor fundamental - a sobre­vivência das culturas -, devem subordinar-se a ele. Todos os valores secundários envolvem a produção de bens pessoais e/ou bens dos outros - isto é, de reforçadores para nosso comportamento e/ou para o comportamento daqueles com quem con­vivemos. Porém, interessa fundamentalmente ao planejador cultural prever em que medida as práticas que produzem tais valores contribuem, simultaneamente, para o fortalecimento de sua cultura. Valores secundários devem estar continuamente sujeitos à revisão, modificação ou substituição de acordo com este critério.

A flexibilidade dos valores secundários talvez seja a grande novidade da ética skinneriana. Ao contrário das éticas prescritivas tradicionais, a perspectiva evolu- cionista de Skinner aponta continuamente para os processos de variação e seleção: boas práticas são práticas com valor de sobrevivência para a cultura, não importa quais sejam. Se for preciso mudá-las, que sejam mudadas - mas não numa obe­diência automática a hierarquias fixas e imutáveis de valores. Valores devem estar a serviço da humanidade, e não o contrário. Esta é uma perspectiva animadora, que abre novas perspectivas para o planejamento cultural. Em Walden II, por exemplo, o chamado “Código Walden” contém as regras que devem ser seguidas pelos membros da comunidade. Essas regras, porém, não são fixas - pelo contrá­rio, são “mudadas de tempos em tempos, de acordo com a experiência” (Skinner, 1948/1978a, p. 165), traduzindo o que Skinner, apropriadamente, chama de uma “ética experimental” (p. 176). Mas notemos, novamente, que a flexibilidade reco­mendada por Skinner aplica-se somente aos valores secundários. Também na ética prescritiva skinneriana há um valor imutável: a sobrevivência das culturas. É para bem promovê-la que Skinner confere aos valores secundários um caráter maleável, eternamente provisório*.

Filosofia Política SkinnerianaComo ocorre na filosofia tradicional, também na filosofia skinneriana a ética prescritiva progride naturalmente para uma filosofia política (como apontamos em Dittrich, 2003; 2004b; Dittrich e Abib, 2004). É natural que aquele que propõe uma ética prescritiva busque concretizá-la, é disso que trata a política. Em geral, a palavra “política” surge, no texto de Skinner, acompanhada de ácidas críticas. A notória ausência de espírito experimental na política tradicional fornece a Skinner os principais subsídios para tanto. Assim sendo, poderíamos apontar uma filoso­fia política na obra de Skinner? Em sua autobiografia, Skinner chega a citar a possível fundação de uma comunidade como Walden II como um exemplo de “ação não-política” (1983/1984b, p. 251). Contudo, se tomarmos a expressão em sentido amplo, “ação política é sempre uma questão de manipular contingências

* A despeito dos aspectos positivos dessa postura, ela também apresenta problemas relevantes, como discutido em outro momento (Dittrich, 2006).

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de reforço” (Skinner, 1969, p. 20). A partir disso, podemos definir a política como o conjunto de procedimentos através dos quais se busca produzir certas conse­qüências, em geral (mas não necessariamente) expostas a éticas prescritivas. Se aceitarmos tal definição, o conceito de política é indissociável do conceito de com­portamento e, um empreendimento como Walden II não apenas não pode ser qualificado como “não político”, como passa a ser a mais fiel tradução do concei­to de ação política. A filosofia política se insinua na obra de Skinner a partir do momento em que esta contempla a necessidade de planejamento cultural em prol da sobrevivência das culturas.

Como o próprio Skinner reconhece, o planejamento cultural, por sua com­plexidade, exige o recurso a suposições (guesses) (Skinner, 1953/1965, p. 436; 1961/1972e, p. 49) - mas a ciência, com sua insistência sobre a “observação cui­dadosa, a coleta de informação adequada e a formulação de conclusões que contenham um mínimo de ilusão [wishful thinkingj” (1953/1965, p. 435) parece oferecer o caminho mais seguro para que tais suposições se revelem corretas. Nunca poderemos estar absolutamente certos de que nossas práticas produzirão os resultados que delas esperamos (Skinner, 1955-1956/1972a, p. 6; p. 13; 1971a, p. 549). Porém, as culturas que buscarem explicitamente e de forma planejada atingir seus objetivos terão mais chances de fazê-lo. A alternativa seria abrir mão do planejamento cultural e torcer por felizes acasos - mas, como lembra Skinner, “não há virtude no caráter acidental de um acidente” (1955-1956/1972a, p. 12).

A noção de planejamento cultural remete, naturalmente, a uma série de pro­blemas práticos. Muitos deles são abordados por Skinner. Walden II (1948/ 1978a) é, neste sentido, uma obra de referência - mas Skinner lançou reflexões posterio­res sobre diversos temas típicos da filosofia política (por exemplo, 1986/1987a; 1987b). Buscamos, em outro momento (Dittrich, 2004b), sistematizar tais contri­buições e posicioná-las ante o espectro da filosofia política tradicional. Julgamos, não obstante, que ainda há muito a avançar na caracterização do behaviorismo radical enquanto filosofia política. Parece-nos evidente, contudo, que é possível tratá-lo desta forma. Reconhecer tal fato pode inaugurar novas perspectivas de planejamento e ação entre os behavioristas radicais.

Para além das Culturas, a HumanidadeTratamos da sobrevivência das culturas (no plural), e acreditamos que os behavio­ristas radicais devem usar a expressão deste modo quando a tomarem em seu aspecto prescritivo. Skinner, geralmente, usa o singular. Em alguns dos mais belos momentos de sua obra, porém, ele vai além de referências a uma ou mais culturas, e trata simplesmente da humanidade. Por exemplo, após apontar o equívoco ao tratar a sobrevivência das culturas como uma mera questão de competição entre elas, complementa desta forma:

Irá alguma cultura finalmente ser afetada por uma mutação que fará seus membros se interessarem pela sobrevivência da raça humana? Podem os

homens ser induzidos a trabalhar pela força da humanidade como um

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Ética e Comportamento ■ 57

todo? Tem havido movimentos nessa direção. Convencer o indivíduo de que todos os homens são irmãos leva a um tipo de ação diferente upelo bem dos

outros”. Afirmar que nenhum homem é uma ilha e que o bem dos outros necessariamente afeta o seu próprio bem é uma linha similar. Se alguma

parte da raça humana finalmente planejar uma cultura que apoia poderosamente a atividade em prol da raça humana, poderemos ver novos

delineamentos culturais de surpreendente poder. (Skinner, 1971a, p. 550)

Não se trata meramente de avançar de um objetivo complexo para outro ain­da mais complexo. Trata-se de perguntar se queremos que algumas culturas sobrevivam à custa do colapso de outras. Não há resposta simples para esta ques­tão. Skinner reconhecia, já em 1974, que “os grandes problemas são agora globais” (p. 251), e dificilmente medidas que viermos a adotar em prol de nossa própria cultura deixarão de afetar outras culturas, para o bem ou para o mal. Em nosso horizonte ético e político, para além das culturas, está a humanidade.

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CAPÍTULO

Especificidades e Implicações da Interpretação da

Linguagem como Comportamento Verbal*

M a r ia A m á l ia P ie A b ib A n d e r y

Verbal Behavior (Skinner, 1957) é um livro de enorme impor­tância para a análise do comportamento porque assumiu um triplo papel:

• Apresenta a proposta de um programa de pesquisas para a análise do comportamento.

• Representa um momento de síntese da obra de Skinner.• Apresenta uma proposta de análise sobre o fenômeno

da linguagem, ou melhor, sobre o comportamento verbal (Andery e Sério, 2002; Michael, 1984,1998; Ri- chelle,1976,1981).

Pesquisa sobre Comportamento Verbal na Análise do ComportamentoCertamente o impacto das propostas contidas no livro sobre a análise do comportamento é imenso quando se

* Este trabalho é produto de projeto de pesquisa financiado pelo Conse­lho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), com Bolsa de Produtividade em Pesquisa.

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considera que hoje praticamente qualquer manual de análise do comportamen­to tem uma seção ou capítulo sobre o tema. Mas a primeira pergunta que é preciso fazer quando se analisa o tema e seu desenvolvimento é: o livro, de fato, inspirou e dirigiu programas de pesquisa sobre comportamento verbal entre os analistas do comportamento?

Para avaliar se o programa de pesquisas contido em Verbal Behaviorteve valor heurístico é preciso examinar a tradição de pesquisas que se estabeleceu a partir de sua publicação e como os resultados assim originados modularam a aceitação e compreensão das propostas contidas no livro, promoveram maior compreensão do fenômeno, ou promoveram tecnologia de pesquisa e de intervenção de parte dos analistas do comportamento. Dizer se o livro, de fato, serviu como a proposi­ção inicial de um programa de pesquisas sobre comportamento verbal correção depende, assim, de que se acompanhe o desenvolvimento da área de comporta­mento verbal, como pesquisa básica e aplicada, na comunidade de análise do comportamento. Entretanto, não há consenso a este respeito mesmo após 50 anos de sua publicação. Há aqueles que sugerem com mais ou menos ênfase que o livro gerou conjuntos muito pobres de pesquisas, ou que gerou um número muito re­duzido de estudos (Kaminski, 1988; Spradlin, 1985; Oah e Dickinson, 1989). Há por outro lado, aqueles que sugerem que embora a pesquisa sobre comportamento verbal jamais tenha atingido, entre os analistas do comportamento, os níveis e a complexidade que mereceria, o trabalho de pesquisa sobre comportamento verbal vem se constituindo em um campo de pesquisa crescente e produtivo (Lee, 1984; Michael, 1980a, 1984,1998; Eshleman, 1991; Knapp, 1998; Sundberg, 1998).

Estes últimos autores listam como argumentos que apontariam que a área estaria em crescimento, tendência razoavelmente constante de publicações em periódicos como o Journal of the Experimental Analysis ofBehavior (JEAB) e Journal of Applied Behavior Analysis (JABA), as publicações - ainda que teóricas, con­ceituais, ou históricas - no Behaviorism/Behavior and Philosophy e, mais recentemente (desde 1982), o aparecimento e o crescimento de The Analysis of Verbal Behavior. Destacam, ainda, como indício do crescimento da área a ampli­tude e diversidade crescente de problemas que os estudos sobre comportamento verbal vêm abordando, bem como a gama de problemas práticos para os quais as pesquisas vêm apontando soluções.

De um modo geral, a esta avaliação positiva estão associadas interpretações que reconhecem problemas na área, mas os atribuem não a características do livro Verbal Behavior, ou à proposta de Skinner. As dificuldades do desenvolvimento da pesquisa sobre comportamento verbal, neste caso, tendem a ser atribuídas, entre outras coisas, à crítica inicial ao livro feita por Chomsky (1959) e à sua divulgação e recepção; ao sucesso dos estudos sobre comportamento não verbal, que ocupa­riam uma comunidade pequena e com limitados recursos; às dificuldades metodológicas envolvidas no objeto de estudo, especialmente aquelas que dizem respeito à sua medida; à dificuldade de se assumir todas as implicações filosóficas envolvidas na proposta skinneriana e às dificuldades de financiamento.

Qualquer que seja a posição que se tome na avaliação destes 50 anos de tra­balho sobre o comportamento verbal, é indiscutível que o fenômeno que recebeu o nome de comportamento verbal tem sido investigado sistematicamente por

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Especificidades e Implicações da Interpretação da Linguagem como... ■ 63

analistas do comportamento, pelo menos desde 1958 - início da publicação de Journal of the Experimental Analysis of Behavior. Com sucesso ou não, a impor­tância deste fenômeno para a análise do comportamento é referendada não apenas pela quantidade de artigos publicados em periódicos, livros e manuais da área, mas também pelos artigos em que o tema é exatamente este: a relevância do estudo de comportamento verbal para a análise do comportamento.

Em recente revisão da literatura sobre o comportamento verbal, publicada em cinco periódicos de análise do comportamento (Journal of the Experimental Analy­sis of Behavior, Journal of Applied Behavior Analysis, Behaviorism/Behavior and Philosophy, The Behavior Analyst e The Analysis of Verbal Behavior) e iniciada em 1958 (ano da primeira edição do JEAB) foram identificados - além de três artigos do próprio Skinner explicitamente sobre comportamento verbal (Skinner, 1985, 1986,1988) - mais de 70 artigos nos quais os autores discutem, sob distintas óticas, a relevância e a história da pesquisa sobre comportamento verbal na análise do comportamento (Andery, 2001).

O alvo de parte destes artigos publicados entre 1970 a 1990 foi a discussão das relações (de oposição ou não) entre a proposta de Skinner e a proposta de outros autores para o estudo do comportamento verbal: enfatizando inicialmente (nos anos 1970) a relação com Chomsky e Wittgenstein e, mais tarde, abordando as relações com a lingüística em geral (ver Catania, 1972, 1986; Costall, 1980; Juliá, 1982, Knapp, 1980, 1990; Lee, 1981; MacCorquodale, 1970; Powell e Still, 1979; Richelle, 1976; Stemmer, 1990;Tweney, 1^79; Waller, 1977).

Há um segundo conjunto (26 artigos) nos quais são propostas mudanças ou extensões teóricas, conceituais ou metodológicas ao sistema proposto por Skinner em 1957. Estes artigos talvez devam ser subdivididos em outros grupos:

• Oito artigos que propõem extensões ou mudanças, mas que se mantêm conceitualmente dentro do sistema skinneriano (Bijou, Umbreit, Ghezzi, e Chao, 1986; Catania, 1986; Hake, 1982; Michael, 1982, 1985; Sundberg e Michael, 1983; Ulman, 1985; Vargas, 1982).

• Artigos que criticam aspectos mais relevantes das propostas contidas no livro e que o fazem de fora, por assim dizer, da análise do comportamento (Cherpas, 1992,1998; Donahoe, 1998; Hutchinson, 1998; Place,1981a, 1981b, 1982, 1983, 1985a, 1985b, 1985c, 1997, 1998).

• Artigos que propõem uma nova perspectiva para o tratamento do compor­tamento verbal ou, pelo menos, a discussão de temas que podem trazer essa mudança, mas que o fazem a partir de uma perspectiva que os autores consideram como da análise do comportamento (Barnes-Holmes, Barnes- Holmes e Cullinan, 2000; Hall, 1998; Hall e Chase, 1991; Horne e Lowe, 1997; Parrott, 1985,1986; Wulfert, Dougher, e Greenway, 1991).

Neste último caso destacam-se cinco artigos nos quais se discute a interação entre o modelo interpretativo proposto por Skinner para a linguagem e os mode­los de interpretação que seriam decorrência do paradigma de equivalência de estímulos, por um lado, e de quadros relacionais, por outro (a este respeito ver também Hayes, Barnes-Holmes e Roche, 2001 e Sidman, 1994).

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Finalmente, há outros 33 artigos*, o primeiro deles de 1969 (MacCorquodale, 1969), em que se comenta o livro de Skinner, enfatizando as perspectivas abertas pelo texto para o estudo do comportamento verbal. Destes artigos, 11 fazem revi­sões: de área, ou de textos do próprio Skinner (Catania e Schimoff, 1998; Critchfield, 2000; Eshleman, 1991; Knapp, 1992; MacCorquodale, 1969; McPherson, Bonem, Green e Osborne, 1984; Morris e Schneider, 1986; Normand, Fossa e Poling, 2000; Sundberg, 1991; Sundberg e Partington, 1983; Whitley, 1985).

Todos estes artigos são de interesse especial porque revelam bastante explici­tamente a importância teórica ou conceituai, assim como a relevância empírica do tema comportamento verbal e o crescimento de importância que teve o tema como área de investigação de analistas do comportamento. Pode-se supor, então, que a crescente literatura sobre o comportamento verbal, como salientaram Andery (2001), Andery e Sério (2002), Day (1980), Knapp (1980, 1998, 1992), Lee (1984), MacCorquodale (1969), Michael (1985), Richelle (1976), Sundberg (1991), fortale­cem a avaliação positiva sobre o valor heurístico do livro Verbal Behavior, é inegável que há um fluxo constante de pesquisa na área: foram identificados mais de 900 títulos de artigos sobre comportamento verbal publicados nos cinco perió­dicos referidos anteriormente desde 1958.

Tanto a literatura que apresenta dados de pesquisa empírica sobre fenômenos envolvidos no comportamento verbal como a literatura que discute a perspec­tiva e o conhecimento produzidos sobre o tema sugerem, então, que alguns programas de pesquisa (ainda que iniciais, tentativos, ou em desenvolvimento quando se considera a complexidade do fenômeno) têm sido levados a cabo por pesquisadores da área.

A análise da literatura empírica sobre comportamento verbal permite identi­ficar alguns temas de investigação recorrentes, os quais podem ser tomados como diferentes subprogramas de pesquisa** sobre comportamento verbal ou distintas áreas de interesse sobre o tema.

O primeiro (inclusive cronologicamente) subprograma de pesquisa, ou subárea de interesse em comportamento verbal, iniciado logo após a publicação Verbal Behavior, teve como foco avaliar a possibilidade de se tomar comportamento ver­bal como comportamento operante-sensível a suas conseqüências. Um conjunto de pesquisas que mostrou a sensibilidade das respostas verbais a suas conseqüên­cias teve importante papel no fortalecimento da perspectiva skinneriana para a linguagem. Poderia se dizer, entretanto, que tendo atingido seus objetivos, tal programa está essencialmente encerrado (Rosenfeld e Baer, 1970, publicaram um relato representativo desse programa).

* O número elevado de artigos considerados de revisão e de reflexão sobre a área foi, de certa forma, inflacionado por dois conjuntos de artigos “encomendados” por editores das revistas analisadas: em 1980, cinco artigos publicados em Behaviorism são parte de um simpósio sobre o tema e, em 1998, foram publicados 11 artigos em uma seção especial do The Analysis o f Verbal Behavior.** O termo “programa de pesquisa” será utilizado aqui no sentido de um conjunto de trabalhos que se articulam em tomo de um problema semelhante, com métodos e procedimentos que permitem que se comparem - ainda que apenas genericamente - os resultados encontrados. O termo é equivalente, então, à subárea de interesse em relação ao comportamento verbal.

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Outra área de interesse especialmente relevante em termos da quantidade de trabalhos realizados é aquela que congrega os estudos sobre operantes verbais. Há um expressivo conjunto de trabalhos empíricos - com animais, participantes humanos com desenvolvimento atípico e com participantes humanos com de­senvolvimento típico - que investigaram variáveis envolvidas na seleção /aquisição, manutenção e generalização de cada um dos operantes verbais descritos por Skinner em 1957 (são exemplos Bowman, Fisher, Thompson e Piazza, 1997; Braam e Sundberg, 1991; Brady, Saunders e Spradlin, 1994; Carroll e Hesse, 1987; Daly e Martens, 1994; Hall e Sundberg, 1987; Howard e Rice, 1988; Lee e Pegler, 1982; Kritch e Bostow,1993; Lubinski e Thompson, 1987; Noell, Gansle, Witt, Whitmarsh, Freeland, LaFleur, Gilbertson e Northup, 1998; Partington e Bailey, 1993; Partington, Sundberg, Newhouse e Spengler, 1994; Poison, Grabavac e Parsons, 1997; Shafer, 1994; Simic e Bucher, 1980; Tenenbaum e Wolking, 1989; Watkins, Pack-Teixeira e Howard, 1989). De uma maneira geral, estes são estudos experimentais, de labo­ratório (mesmo no caso de pesquisas aplicadas), que contribuem para a descrição das condições relevantes para a seleção de operantes verbais. Enquanto programa de pesquisa, os trabalhos sobre comportamento verbal que investigam operantes verbais isoladamente são promissores no que diz respeito a procedimentos de ensino; no entanto, há questões importantes a respeito da generalidade de seus dados e deste ponto de vista, trata-se de um subprograma de pesquisa que mere­ce ainda muita atenção.

Quase uma tendência nesta subárea são os estudos sobre a independência fun­cional de respostas verbais de mesma topografia e sobre as interações entre operantes verbais (ver, por exemplo: Carroll e Hesse, 1987; Lamarre e Holland, 1985; Lodhi e Greer, 1989; Ribeiro, 1989; Stafford, Sundberg e Braam, 1988;Twyman, 1996; Yamamoto e Mochizuki, 1988). São estudos importantes porque os resultados - surpreendentes do ponto de vista do senso comum e das tendências mais tradicionais de interpretação da linguagem - sugerem fortemente que em várias circunstâncias deve-se esperar tal independência. Estes resultados são relevantes conceitualmente porque confirmam a afirmação de Skinner sobre a independência funcional de operantes verbais e porque têm implicações importantes para o planejamento de condições de ensino de reper­tórios que envolvem comportamento verbal.

Dentre os trabalhos empíricos que tratam da aquisição de operantes verbais merecem destaque aqueles que buscaram manipular as variáveis antecedentes envolvidas na emissão de tatos:

• Sob o controle da estimulação antecedente que envolve o comportamento anterior do falante.

• Quando essa estimulação envolve estímulos privados.• Quando a estimulação antecedente envolve um contexto que não é clara­

mente definido.

Estes trabalhos merecem destaque especialmente pelas dificuldades metodo­lógicas que os problemas de pesquisa colocam aos pesquisadores, de um lado, e pela sua importância para a compreensão do comportamento verbal complexo, de outro. As complexidades da área e a necessidade de mais estudos sistemáticos

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são exemplificadas pelos trabalhos de Critchfield (1993a, 1993b, 1996), Critchfield e Epting (1998), Critchfield e Perone (1993), Dougher (1989), Guevremont, Osnes e Stokes (1986), Leigland (1989,1996), Lowenkron e Colvin (1994), Lubisnki e Thompson (1987), Matson, Sevin, Box, Francis e Sevin (1993), Matson, Sevin, Fridley e Love (1990), Spradlin (1985), Striefel, Bryan e Aikins (1974).

Poderia destacar-se ainda como subárea/programa de pesquisa, aquela rela­cionada ao controle que o comportamento verbal, uma vez selecionado, exerce sobre outros comportamentos. A primeira análise sistemática do comportamento do ouvinte sob controle de estimulação verbal que descreve contingências só foi feita por Skinner em 1966, com a publicação do artigo An operant analysis of pro­blem solving, no qual Skinner tratou do chamado comportamento governado por regras. A relevância do tema pode ser mensurada pela explosão de literatura con­ceituai e empírica. Identifica-se, hoje, pelo menos três grandes tradições de pesquisa empírica sobre o controle do comportamento verbal: o estabelecimento de correspondência entre comportamento verbal e comportamento não verbal (ver, por exemplo, Baer e Detrich, 1990; Baer, Detrich e Weninger, 1988; Baer, Williams, Osnes e Stokes, 1984; Ribeiro,1989; Risley e Hart, 1968); as interações verbais mais complexas e continuadas entre falante e ouvinte (Greene e Bry, 1991; Guess, Sailor, Rutheford e Baer, 1968; Hersh, 1990; Moerk, 1990,1998; Spradlin, 1985); as pesquisas que tratam da extensão do controle do comportamento verbal sobre o comporta­mento não verbal (ver, por exemplo, Albuquerque, 1998; Amorim, 2001; Assis, 1995; Bentall e Lowe, 1987; Bentall, Lowe e Beasty, 1985; Braam e Malott, 1990; Catania, Lowe e Horne, 1990; Cha^e, Johnson e Sulzer-Azaroff, 1985; Galizio, 1979; Hayes, Brownstein, Zettle, Rosenfarb e Korn,1986; Lowe, Beasty e Bentall, 1983; Matthews, Catania e Shimoff, 1985; Mistr e Glenn, 1992; Newman, Hemmes e Buffington, 1994; Paracampo, 1998; Torgrud e Holborn, 1990). Mas a relevância e complexidade do tema tradicionalmente chamado de controle por regras também é mensurada por uma literatura conceituai sobre a questão (ver Buskist e DeGrandpre, 1989a, 1989b; Catania, 1989; Catania, Matthews e Shimoff,1989; Cerutti, 1989; Glenn, 1987,1989; Malott, 1988; Schlinger, 1990; Vargas, 1988). Destaca-se nesta literatura o debate sobre a definição de regras, seu status comportamental e a extensão do controle exercido por regras sobre o comportamento evocado por ela.

Ainda que esta lista não esgote os programas de pesquisa empírica/experi­mental sobre comportamento verbal (há conjuntos de pesquisa que podem ser classificados por sua inovação metodológica, por exemplo), e ainda que tais progra­mas possam ser definidos segundo outros critérios (por exemplo, poderia caracterizar estes programas de acordo com o recorte pesquisa básica e pesquisa aplicada, ou de acordo com a linguagem utilizada nos relatos), a listagem aqui feita mostra com clareza a diversidade de trabalhos e de possíveis interesses de pesquisa sobre comportamento verbal.

Foi publicada em 1978 uma tradução de Verbal Behavior em português (Skinner, 1978). Impulsionado ou não pela versão em português, o fato é que se identifica no Brasil um sensível interesse por pesquisa sobre o tema. Há no Brasil um conjun­to de dissertações e teses que tratam de comportamento verbal que são excelentes e que deram origem a programas de pesquisa e outras publicações. Uma parcela destes trabalhos foi orientada por preocupações conceituais ou históricas em

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relação ao próprio livro Verbal Behavior (por exemplo, Borlotti, 2003; Passos, 1999; Pereira, 1999; Rubano, 1999). Outros trabalhos tiveram e têm como alvo aspectos mais específicos relacionados ao comportamento verbal e se caracterizam como pesquisas experimentais. Dado o elevado e crescente conjunto de publicações, destacam-se aqui algumas das dissertações e teses que parecem ter estado na origem de programas de pesquisa sobre diversas subáreas de comportamento verbal: Albuquerque (1998), Amorim (2001), Assis (1995), Hubner (1982), Paracam- po (1998), Ribeiro (1989), Romano (2005), Simonassi (1988)*.

Verbal Behavior: Síntese de um ProcessoComo o próprio Skinner e comentadores de sua obra indicaram (Lee, 1982; Michael, 1984; Eshleman, 1991; Knapp, 1998), o texto final de Verbal Behavior tal como apre­sentado em 1957 foi produto de um longo processo de elaboração intelectual. Skinner (1979) afirmou que desde a década de 1930 comprometera-se com a des­crição/explicação do comportamento verbal e que desde então trabalhava sobre o tema, tentando descrever o comportamento verbal com os conceitos que vinha elaborando e buscando exemplos de instâncias merecedoras de interpretação.

A publicação, por Skinner, desde os anos 1930 até 1957, de 12 artigos que podem ser classificados como relacionados a comportamento verbal, sendo o primeiro deles de 1934 (trata-se do artigo Has Gertrude Stein a Secret?, republicado em 1972**), de certa forma corrobora este relato. A análise destes artigos indica preocupação com distintos aspectos do fenômeno da linguagem e indica também o que parece ser um lento processo de elaboração conceituai sobre o tema: de início comporta­mento verbal foi descrito, às vezes explicitamente, em termos de comportamento respondente, até que finalmente emergiu uma formulação de comportamento verbal como a que se encontra em 1957 (Andery, 1990; Andery, Micheletto e Sério, 2004, 2005; Rubano,1999).

Este processo de elaboração, como não poderia deixar de ser, não foi linear e dependeu também da transformação do sistema conceituai skinneriano para o comportamento em geral. A análise da produção de Skinner sobre comportamento verbal até 1957 mostra, por exemplo, que já em 1938, em The Behavior of Organisms,

* Nos periódicos brasileiros e em coletâneas especializadas, há vários textos sobre comportamento ver­bal compondo um conjunto de artigos didáticos e reflexivos importante sobre o tema, como Amorim e Andery (2002), de Rose (1994,1997), Flores (2004), Hubner (1998), Matos (1991). Há também, mais recen­temente, um crescente número de publicações de relatos de pesquisa sobre diversas subáreas relaciona­das a comportamento verbal; são exemplos Albuquerque, Paracampo, e Albuquerque (2004), Paracam- po (1991), Paracampo e Albuquerque (2004, 2005), Santos, Paracampo e Albuquerque (2004), Simonassi, Borges e Loja (2000) e Simonassi, Tourinho e Silva (2001). A presença da pesquisa brasileira sobre o tema aparece também em periódicos estrangeiros; por exemplo, Andery e Golfeto (2008), Andery, Micheletto e Sério (2005), de Rose, (1996), Hubner, Austin e Miguel (2008), Oliveira, Oliveira-Castro, Simonassi e Vieira (2002), Paracampo, Souza, Matos e Albuquerque (2001) e Ribeiro (1989).** Quando duas datas são mencionadas em uma referência, a primeira se referirá à edição consultada, e a segunda, à data da publicação original.

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Skinner fez referência ao comportamento verbal como característica distintiva do comportamento humano, caracterizando-o em breve passagem (p. 116) como comportamento mediado*. Mas só no artigo de 1945, The Operational Analysis of Psychological Terms, encontra-se o que parece ser uma formulação sistemática de com- portamento verbal que envolve explicitamente a noção de contingência e de comportamento operante, o que, em certa medida, ocorreu também para a conceitua- ção de comportamento operante em geral. Este processo de elaboração sobre a linguagem** parece encerrado já em 1953 e em Science and Human Behavior (1953) comportamento verbal já é tratado como o será com a publicação de 1957: além da formulação de comportamento verbal como comportamento operante mediado, há indícios claros de que Skinner já vinha classificando comportamento verbal como operantes verbais (ver, por exemplo, p. 109). No entanto, isto não deveria causar surpresa, uma vez que, segundo o próprio Skinner (1984) a versão final de Verbal Behavior começou a ser redigida já em 1947 e de Science and Human Beha­vior em 1948, ambas em cursos dados em Harvard; ou seja, os dois livros parecem ter sido escritos pelo menos em parte simultaneamente, o que justificaria a abor­dagem semelhante.

Mas por que Skinner tomaria a proposição de uma teoria*** sobre a linguagem como tarefa tão relevante? E por que tal proposição seria apresentada quase simul­taneamente à Science and Human Behavior? No artigo de 1945 encontra-se parte da resposta. Em The Operational Analysis of Psychological Terms, Skinner delineia, pela primeira vez explicitamente (e de maneira surpreendente quando comparado com o restante de sua publicação até então), a distinção entre behaviorismo metodoló­gico e radical e o faz salientando que a análise behaviorista radical é radicalmente distinta de outras interpretações especialmente por seu tratamento daquilo que é frequentemente tido como característica especificamente humana: a habilidade dos seres humanos em lidar com o que sentem, ou seja, a subjetividade (Andery, Miche- letto e Sério, 2003,2005; Malagodi. 1986; Moxley, 2001,2005).

Segundo Skinner (1945), é especialmente relevante que a psicologia trate os fenômenos tradicionalmente associados à “natureza humana”, especificamente aqueles tratados sob o rótulo “subjetividade humana”. E, mais importante no pre­sente contexto, tal tratamento só seria possível assumindo-se que “consciência, entendida como uma forma de reagir ao próprio comportamento, é um produto social... [que] o indivíduo torna-se consciente do que faz somente depois que a so­ciedade reforçou respostas verbais com relação a seu comportamento.” (p. 277)

A proposição de uma “teoria behaviorista radical sobre a linguagem” seria então indispensável para a construção de uma ciência do comportamento individual e

* “O campo verbal pode ser definido como aquela parte do comportamento reforçada por meio da mediação de outro organismo.” (Skinner, 1938, p. 116)** Embora Skinner (1957) tenha escolhido usar o termo “comportamento verbal”, o termo “lingua­gem” prevalece em outras ciências. Neste artigo, o termo “linguagem” será empregado quando ou­tras abordagens ou ciências forem mencionadas, apresentadas ou discutidas, ou quando houver uma comparação, mesmo que implícita, com a posição de Skinner sobre o tema.*** O termo “teoria” refere-se, aqui, a um conjunto de princípios e conceitos propostos como descri­ção/explicação de um fenômeno qualquer.

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por esta razão o fenômeno lingüístico foi tomado como alvo da construção de uma teoria behaviorista sobre o comportamento verbal, a qual precisaria ser compatível com a teoria behaviorista sobre o comportamento em geral. Esta “teoria específica do comportamento verbal” permitirá ao behaviorismo radical construir uma teoria na qual indivíduo e cultura, variáveis sociais/objetivas e individuais/subjetivas, variáveis presentes e história se articulam, produzindo uma explicação abrangente e teoricamente unitária sobre o comportamento humano. Tanto é assim que ainda em 1945 Skinner afirmou que o que faltava à ciência naquele momento era “a exci­tante hipótese behaviorista do que alguém observa e do que fala é sempre o mundo ‘real’... e que ‘experiência’ é um construto derivado, que só poderá ser compreendi­do por meio da análise de processos verbais”, (p. 293)

O que se pretende destacar aqui é que ao tomar como sua a tarefa de produzir uma descrição/explicação sistemática do comportamento humano, Skinner não pôde, como fizera em 1938, deixar ao leitor a extrapolação*. E por que não? Porque em meados dos anos 1940 Skinner assumira já que a compreensão do comporta­mento humano, envolvia a compreensão da linguagem, com a qual emerge caracteristicamente humano no humano, ou seja, emerge a cultura. A partir daí, tais conceitos - de linguagem e cultura - podem até, em certo sentido, confundir- se, ou melhor, justapor-se.

Foi apenas com a hipótese de que o comportamento humano varia e selecio­nado em três histórias, uma das quais foi chamada de cultura, a qual depende de ou é constituída por comportamento verbal, que tal justaposição foi claramente discutida. Embora fossem necessários outros 20 anos para que Skinner pudesse claramente resolver tal justaposição propondo o modelo de seleção por conseqüên­cias (Skinner, 1981), poderia se argumentar que as bases dessa hipótese produziram com a necessidade de produzir um modelo científico para o comportamento humano já nos anos 1940.

Paleontólogos e estudiosos da evolução humana defendem hoje que se há uma variação que implicaria em ruptura (análogo ao que os biólogos chamam de especiação) na história evolucionária humana, tal variação seria a emergência (ou “decolagem”, ou “explosão”) da cultura e não uma variação filogenética simplesmente (Boyd e Silk, 2003; Lewin e Foley, 2004): foram mudanças comportamentais relevantes para determinar o surgimento do que se considera especificamente humano**. Mais ainda, argumenta-se que foi a emergência da cultura como “força de seleção” que pôs em cena o gênero humano moderno (Harris, 1989; Leakey, 1994) e tal força seletiva só emergiu com, e se confundiu com, a própria emergência da linguagem complexa, ou linguagem com sintaxe, como prefere Deacon (1997), ou, ainda, comportamento lingüístico, de acordo

* Em The behavior o f organisms, Skinner afirmou: “O livro representa nada mais que uma análise ex­perimental de uma amostra representativa do comportamento. Extrapole quem quiser extrapolar. Se, ou não, a extrapolação se justifica, não pode ser decidido no momento.” (p.442)** As características biológicas específicas de indivíduos classificados como Homo sapiens são en­contradas em sítios arqueológicos datados de 150 mil anos. No entanto, há indícios de mudanças sem precedentes em sítios muito mais recentes (40 mil anos). Essas mudanças estão associadas a alterações comportamentais e indicam a emergência do que se considera hoje um período crítico na história evolucionária humana.

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com Lieberman (2006). O argumento é perfeitamente compatível com a “hipótese behaviorista” de que o comportamento verbal na base dos fenômenos usualmente considerados especificamente humanos e que a evolução do comportamento verbal que emerge o terceiro nível de seleção por conseqüências (Skinner, 1981).

Esta história, a história evolucionária humana, então, obrigou, em certo sentido, Skinner a construir uma “teoria do comportamento verbal”: sem tal teoria seria im­possível produzir uma ciência do comportamento humano. Com a publicação do livro em 1957, Skinner enfrentou o problema de formular uma síntese teórica e con­ceituai sobre o comportamento humano que incluísse uma análise específica sobre um fenômeno comportamental humano: a linguagem. Fazê-lo conduziu, por sua vez, à proposição de uma intrínseca relação entre comportamento verbal e cultura e, muito mais tardiamente, à proposição do modelo de seleção por conseqüências.

Uma pergunta por responder seria: por que a emergência da linguagem é afinal tão relevante e por que está tão de perto associada à emergência da cultura? Tal questão será retomada no item “Comportamento Verbal, Indivíduo e Seleção Cultural”, mas para melhor respondê-la cabe discutir qual é, afinal, a especificidade da proposta de Skinner para análise do fenômeno da linguagem, ou melhor, do comportamento verbal.

Linguagem como Comportamento VerbalEm 1957, como já se afirmou inúmeras vezes, Skinner propôs o que chamou de uma nova formulação para o campo do comportamento verbal. Era uma nova formulação não porque se iniciava a investigação de um fenômeno até então inexplorado, mas porque Skinner assumia que cabia à psicologia e, mais especifica­mente, a uma “ciência experimental do comportamento” formular uma explicação do comportamento verbal (p. 5).

Por que a Definição de Comportamento Verbal E Relevante?Comportamento verbal é apresentado já na primeira página de Verbal Behavior como comportamento operante, ou seja, como fenômeno selecionado que pode ser descrito como outros comportamentos operantes, como se diagramou na Fi­gura 4.1, na qual se representa o fluxo comportamental de um indivíduo (plano cinza), no tempo {flecha).

Para Skinner, então, comportamento verbal, como qualquer comportamento operante, é produto de uma história de interações (de seleção) com o ambiente. Na seleção de tais unidades - chamadas de comportamento operante, ou de classe de respostas operantes, ou de linhagens comportamentais, ou linhagens operan­tes* - a relação entre o responder do indivíduo e suas conseqüências é a relação

* Glenn (2003, 2004) propôs a utilização dos termos linhagem operante ou no lugar de comporta­mento operante ou classe de respostas. Os termos respeitam a analogia e chamam a atenção para as similaridades entre o processo de seleção natural. Além disso, “linhagem” indica que o (ou um) com­portamento se produz no tempo e é entendido como unidade que congrega suas instâncias passadas, atual e potenciais, que têm uma origem comum.

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Figura 4.1 - Seleção de comportamento operante pela exposição às contingências. Os triângulos representam estímulos e os retângulos, instâncias de respostas em que as setas indicam que as respostas produzem alterações ambientais. Uma classe de respostas (linhagem operante) torna-se mais provável como resultado de uma história, e só então se pode falar em comportamento operante. Note que no diagrama à esquerda, sugere-se que essa seleção seja produto de uma história de interações com o ambiente (daí a seta representando a passagem do tempo) e que haja seleção de uma unidade comportamental de três termos (representada à direita) (torna-se mais provável), de modo que cada instância de um comportamento ou linhagem seja composta de três termos.

primária (que funda); comportamento (ou linhagens comportamentais) é produ­to de seleção por reforço, como se indica na Figura 4.1 pela recorrência da linhagem operante, depois de instâncias de reforço diferencial (ou exposição às contingên­cias). Mas tal seleção promove relações sujeito-ambiente que envolve também a seleção de funções evocativas do ambiente antecedente, de modo que as relações comportamentais operantes selecionadas por suas conseqüências são quase ne­cessariamente relações comportamentais de três termos.

Mas Skinner (1957, 1986) caracteriza o comportamento verbal como com­portamento operante mediado, e então derivando suas características especiais. Comportamento operante mediado é o comportamento no qual as próprias relações sujeito-ambiente, definidoras do comportamento, são mantidas com o ambiente social, são relações que dependem do comportamento de outro indivíduo, ou seja, de outro comportamento (Skinner, 1953). Se na Figura 4.1a representação de seleção do comportamento pôde ser feita apenas diagramando-se interações de um sujeito com o ambiente, no caso de comportamento mediado o ambiente relevante envolve outro indivíduo que se comporta também à maneira operante, como se representou na Figura 4.2. O comportamento do mediador pode exercer diferentes funções comportamentais em relação ao comportamento mediado e por isso dois exemplos foram representados na Figura 4.2; o que é relevante aqui é que a seleção do com­portamento operante neste caso depende da seleção de contingências de reforço entrelaçadas (Skinner 1953,1957) e diferentes entrelaçamentos promovem distintas interações e muitos possíveis “produtos” (este tópico será retomado a seguir, na discussão da Fig. 4.3).

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Pessoa A

Figura 4.2 - Seleção de comportamento operante mediado por exposição a contingências. Note que dois planos (cada um deles representando o fluxo comportamental relevante de um indiví­duo) compõem o comportamento de interesse: neste caso, o plano representado em cinza escuro (Pessoa A). No exemplo à esquerda, a linhagem operante selecionada depende (é evoca­da por) do comportamento da Pessoa B, o qual tem função de estímulo antecedente relevante (possivelmente SD). No exemplo à direita, a linhagem operante selecionada depende do com­portamento da Pessoa B, o qual provê reforço para o comportamento de A.

Ao definir comportamento verbal como o comportamento operante mediado, portanto, Skinner toma necessariamente a unidade de análise do comportamento verbal uma unidade que envolve uma contingência de reforço que se distingue de outras porque só pode ser descrita como uma contingência entrelaçada. Este é o sentido da afirmação de que comportamento verbal é descrito como um episódio verbal que envolve falante e ouvinte; ele ocorre porque a resposta do falante é a resposta de interesse primá­rio quando se analisa o comportamento de um falante. Mas a classe de respostas/linhagem comportamental só pode ser selecionada e mantida pelas interações com um ambien­te social no qual outro ouvinte desempenha papel comportamental para o falante.

No caso de comportamento verbal, afirma Skinner (1957), a mediação relevan­te para o comportamento do falante é que o ouvinte participa promovendo variável de repertório* do falante: o reforço. Esta especificidade é importantíssima porque o comportamento do falante depende de outro indivíduo de maneira primária, já que o reforço é o processo fundamental na seleção de comportamento operante: ou seja, comportamento verbal só pode ser selecionado com a participação de um ouvinte.

* Glenn e Field (1998) e Michael (1983, 1986) fazem distinções semelhantes em relação às variáveis que constituem os fenômenos comportamentais, distinguindo-as como: variáveis relacionadas à existência ou seleção de unidades operantes chamadas variáveis ou operações alteradoras de reper­tórios, além de variáveis ou operações relacionadas à ocorrência de instâncias operantes, chamadas variáveis ou operações evocativas ou instanciadoras.

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Figura 4.3 - Seleção de comportamento verbal. Condição antecedente e resposta do falante não produzem, por si só, conseqüências selecionadoras (planos na linha superior), mas afetam o ouvin­te (planos na linha do meio), que, então, se comporta de maneira a produzir mudanças no ambiente que são conseqüências selecionadoras do comportamento do falante (planos na linha superior). O ouvinte, por sua vez, só pode reagir ao falante porque as ações deste se tomaram com- portamentalmente relevantes para aquele, treinado para tal pela comunidade (plano inferior) e que, em última instância mantém seu comportamento de ouvinte (último plano). Note que as setas nos retângulos representando respostas são dirigidas do falante para o ouvinte e vice-versa.

No caso do comportamento verbal, então, a própria resposta do falante é dirigida ao ambiente que é especificamente o outro e que foi constituído como ambiente verbal, já que o outro provê reforço. O falante dirige-se ao ouvinte, no sentido de que este é o ambiente por ele afetado.

Mas como pode o ambiente, que é o outro sistematicamente, selecionar/ reforçar comportamento do falante? Apenas se as respostas do falante (e, mais especificamente, as relações de estimulação antecedente-resposta que envolvem o falante) tiverem função comportamental evocativa bem definida para o ouvinte. Ou seja, o comportamento do falante (comportamento verbal) só será selecionado se o responder do falante evocar sistematicamente respostas do ouvinte que levam ao reforço do falante: o comporta­mento do falante tem que ter função evocativa forte e bem definida sobre o ouvinte para ser selecionado; por isso ouvintes são sistematicamente preparados como ouvintes, já que sem tal preparação não haveria sequer a seleção do comportamento do falante.

Como resultado, diagramou-se, na Figura 4.3, a contingência entrelaçada que define as linhagens comportamentais verbais envolvem não dois, mas, necessaria­mente, três planos comportamentais: o comportamento do falante, mantido pelo ouvinte, o do ouvinte, mantenedor do comportamento do falante, e as práticas da comunidade verbal que “preparam o ouvinte”, no sentido de tornar e manter o com­portamento do falante evocativo do comportamento mediador do ouvinte.

Também é importante destacar aqui que a maneira como Skinner (1957,1986) definiu comportamento verbal indica, então, que a seleção de comportamento verbal nos indivíduos depende de uma comunidade verbal que promove compor­tamento de falante e de ouvinte em seus membros. A seleção de comportamento verbal em cada indivíduo é já um produto cultural, depende da ação coordenada de muitos e se reproduz entre indivíduos e gerações. Tal prática certamente foi, ela mesma, selecionada por seus efeitos sobre o grupo.

Por estas razões, na Figura 4.3 as setas que definem as respostas de falante e ouvinte foram direcionadas do falante para o ouvinte e do ouvinte para o falante: uma diferença em relação a outras formas de contingências entrelaçadas (ver Fig. 4.2), nas

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quais as respostas que fazem parte de linhagens operantes são também selecionadas e mantidas pela participação de outros como ambiente mediador, mas não são necessariamente, desde a sua origem e a cada manifestação, “dirigidas” ao ambiente social, o outro. Apenas para aqueles indivíduos para os quais o outro já se destacava como ambiente poderia emergir comportamento verbal e somente diante de tais circunstâncias pode emergir um ambiente verbal.

Este é o sentido da definição de Skinner de comportamento verbal como comportamento operante mediado, sendo o mediador especialmente treinado para tal Essa definição necessariamente toma comportamento verbal como fenômeno que se sobrepõe pelo menos parcialmente com o fenômeno da cultura: apenas em um ambiente verbal pode emergir um falante e, assim, comportamento verbal é irremediavelmente dependente de, condicionado por, ou ainda, determinado por variáveis sociais e históricas*.

Resposta Verbal: PalavraAinda que seja comum a afirmação de que em análise do comportamento interes­sa a função do comportamento e ainda que esta afirmação se aplique também e especialmente ao comportamento verbal, neste caso há outra especificidade que merece destaque. Como afirmam linguistas e antropólogos, uma das especifici­dades do comportamento verbal é sua produtividade: um falante pode sempre emitir uma nova resposta, indefinidamente (Harris e Johnson, 2003; Lieberman,1984) e é esta produtividade que muitas vezes é tomada como criatividade. Tal produtividade relaciona-se diretamente à topografia das respostas tipicamente envolvidas no comportamento verbal.

Embora a questão da origem do comportamento verbal não caiba no escopo do presente artigo, a produtividade do comportamento verbal está associada à evolução da linguagem e merece comentário. Como Skinner (1981) afirmou:

A espécie humana possivelmente tornou-se muito mais social quando sua musculatura vocal ficou sob controle operante. Gritos de alarme, chamados de acasalamento, ameaças agressivas e outros tipos de comportamento vocal podem ser modificados por condicionamento operante, mas aparentemente

apenas com relação às ocasiões nas quais ocorrem, ou em suas taxas de ocorrência. A habilidade da espécie humana em adquirir novas formas

[de resposta vocal] pela seleção por conseqüências presumivelmente é resultado da evolução de enervação especial da musculatura vocal, junto

com um repertório /supply) de comportamento vocal que não está sob forte

* A questão da origem do comportamento verbal como prática cultural e como repertório caracterís­tico do Homo sapiens é complexa e um tema importante de discussão entre linguistas, paleontólogos, antropólogos e biólogos. Em seu artigo de 1986 (The evolution o f verbal behavior), Skinner discute algumas das condições relevantes para se entender o fenômeno. É importante que, nesse artigo, à pergunta quando seria possível de fato considerar que a linguagem teria evoluído, Skinner tenha res­pondido: “Quando evoluiu um ambiente verbal - a cultura”.

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controle de estímulos ou de liberadores - o balbucio dos bebês do qual são selecionados operantes verbais. Nenhuma nova suscetibilidade ao reforço

foi necessária porque as conseqüências do comportamento verbal são distintas apenas porque são mediadas por outras pessoas, (p. 502)

No presente contexto, interessa destacar que a história evolucionária que pro­moveu na espécie humana o controle operante da musculatura vocal permitiu e permite a seleção de um repertório de comportamentos que se destaca, também, pelas características especiais das respostas que o compõem. Seres humanos, como outras espécies, emitem sons, mas os homens, diferentemente de outras espécies, os emitem não apenas naquelas poucas topografias selecionadas como componen­tes de comportamentos típicos de espécie: na espécie humana, em cada indivíduo, são selecionadas respostas vocais novas que não são dependentes de seleção filo- genética. Tais respostas são produzidas pela combinação e recombinação de sons. Como salienta Lieberman (2006), que discute extensamente a evolução da linguagem, a linguagem humana dependeu obviamente de muitas características selecionadas na história filogenética (tais como a anatomia e a fisiologia do cérebro), mas a fala humana é a maior novidade na evolução da linguagem. Para Lieberman, a caracterís­tica com papel central na evolução da linguagem, no sentido de que é característica primária que evoluiu no Homo sapiens, foi a seleção de estruturas que permitiram a possibilidade de “cunhar novas palavras e falar... [a possibilidade] da produção de sons voluntária, quase ilimitada.” (p. 9)

Por que seria tão importante a seleção de características que permitiram a emissão de sons novos? Ou ainda, por que seria tão relevante a possibilidade de controle operante da musculatura vocal? A resposta aparentemente óbvia é que tal possibilidade é pré-requisito para a emergência, por seleção operante, de res­postas vocais de distintas topografias*: topografias que produzem sons não emitidos anteriormente são selecionadas, assim como topografias que envolvem combinações novas de sons. A resposta um pouco menos óbvia é a possibilidade de que o comportamento verbal seja baseado em respostas vocais que o destacou de outros comportamentos mediados. Esta característica do comportamento verbal é, pelo menos em parte, o que o tornou idiossincrático e relevante dentre as formas de interação social.

A expressão “resposta vocal” parece autoexplicativa; poucas pessoas teriam dificuldade de reconhecer se uma dada resposta poderia ser assim classificada e não concordariam que se trata de uma resposta vocal, mas possivelmente a des­creveriam de maneira semelhante, já que com o desenvolvimento da escrita tais respostas podem ser registradas com relativa precisão**. Entretanto, é preciso que

* Obviamente, outras dimensões topográficas dos comportamentos verbais vocais, além dos sons pro­duzidos, são relevantes, tais como altura, duração, velocidade, ritmo, como Skinner mesmo destacou em 1957. No entanto, todas elas dependem da emissão de sons e, nesse sentido, são “secundárias”.** Fala-se em relativa precisão porque ainda que o registro escrito do comportamento vocal guarde estreita correspondência com a topografia da resposta, ele é unidimensional: não se registra pela es­crita, por exemplo, a velocidade, a altura, o timbre, a entonação etc.

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se esclareça que quando uma resposta vocal ocorre, o que se identifica e registra não são propriamente as respostas, mas seus efeitos: a estimulação que afeta o ouvinte é já efeito dos movimentos da “musculatura vocal”1.

É possível que a própria definição de comportamento operante torne neces­sário definir respostas operantes em relação a seus efeitos2, já que a relação resposta-reforço é dependente da resposta ‘operar sobre' ou 'alterar' o ambiente como, aliás, se faz na tradição de laboratório da análise experimental do compor­tamento: são apenas as respostas de pressão à barra que têm força suficiente para fechar um circuito elétrico aquelas que, por definição, compõem a classe operan­te e é, portanto, o efeito da resposta que é definidor da própria classe de respostas3. Respostas operantes, então, têm efeito sobre o ambiente e operam sobre o am­biente; produzem mudanças ambientais e produzem reforçadores, o que pode ou não ser o mesmo evento.

No comportamento operante em geral, ou melhor, no comportamento ope­rante não verbal, o efeito necessário da resposta operante, a mudança ambiental produzida pelo responder, é dependente de relações mecânicas que envolvem a atividade do indivíduo (sua resposta) e o ambiente alterado pela atividade: tal alteração ambiental que é necessariamente produzida pela atividade (resposta) do organismo pode ser, ela mesma, o evento que tem função de reforçador, ou pode ser a condição a que o reforçador é contingente4. Como resultado, as to­pografias de resposta possíveis restringem os efeitos ambientais possíveis. Por exemplo, em um tiro de arco-e-flecha, o efeito das repostas de puxar o arco ten- sionando-o, de posicionar a flecha sobre a corda e soltar flecha é dependente diretamente destes movimentos e mesmo mudanças muito pequenas e sutis nas topografias destas respostas implicam necessariamente em mudanças nos seus efeitos ambientais. O sucesso do comportamento em atirar uma flecha depende da força muscular que é necessária para puxar o arco para trás, do po­sicionamento das mãos que seguram o arco e a flecha, do ângulo em que a flecha com o arco, do momento em que a mão solta a flecha etc. Atingir a presa com a flecha depende diretamente das dimensões das respostas envolvidas e o reforço da resposta é direta e mecanicamente relacionado às mudanças ambien­tais que foram diretamente produzidas pelas respostas.

1 Ao descrever o comportamento ecoico, Skinner (1957) trata explicitamente desta questão, escla­recendo que o ouvinte provê reforço com base no produto da resposta do falante, na estimulação sonora que as respostas musculares e respiratórias do falante produzem. Por sua vez, a produção de comportamento ecoico inicial do falante depende de um longo processo de modelagem, exatamente porque quando o falante emite uma resposta ecoica, ele também reproduz o efeito das respostas.2 A própria escolha feita por Skinner do termo operante, em 1937, parece se basear na distinção feita em 1935, quando salientou que no comportamento respondente (então chamado reflexo de tipo II), a resposta “prepara o organismo... [já]... a resposta do tipo I [comportamento operante] não prepara para o estímulo reforçador, ela o produz.” (Skinner, 1935, p. 77).3 Distinção semelhante é feita por Glenn na discussão de metacontingências, em sua analogia com contingências comportamentais, a quem agradeço por ter chamado a atenção sobre este ponto.4 Esta distinção parece ser o fundamento para a classificação de reforçadores como intrínsecos e extrínsecos.

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Já no caso do comportamento verbal, os efeitos das respostas musculares que atingem e mudam o ambiente são distintos e mecanicamente independentes das conseqüências reforçadoras: não são características físicas ou mecânicas das topografias de respostas que determinam - por si mesmas - as possibilidades de que tais respostas produzam reforço. No caso da resposta verbal vocal, efeitos distintos (sons) são produzidos necessariamente por diferentes topografias de respostas do falante (movimentos musculares e respiratórios) e quaisquer topo­grafias + efeitos* são potencialmente efetivos na produção de reforço e, por extensão, quaisquer topografias + efeitos podem ser colocados sob controle dis­criminative. É neste sentido que o comportamento verbal é livre de restrições mecânicas e topográficas: qualquer combinação de sons vocais, em princípio, tem potencial semelhante para produzir reforço. As condições anatômicas e fi­siológicas para emitir respostas que produzem uma grande variedade de sons com custo de resposta relativamente baixo, e para distinguir sons, tornaram o com­portamento vocal possível; a possibilidade de que diferentes respostas + efeitos participem “livremente” de contingências de reforço originaram a imensa pro­dutividade do comportamento verbal.

Michael (1985) distinguiu dois tipos de comportamento verbal: com base em topografia e na seleção de estímulos (com base em seleção)**. Tal distinção é relevante porque o comportamento verbal baseado em topografia (apresen­tado aqui) são selecionadas “unidades que consistem de uma força aumentada de uma topografia distinguível diante de variáveis controladoras específicas” (Michael, 1985, p. 1). Ou seja, no comportamento verbal baseado em topogra­fia, como é o caso do comportamento vocal e escrito cotidianos, é selecionado respostas de topografias distintas e específicas em diferentes condições de estímulos (também específicas e distintivas). Tal característica do comporta­mento verbal está relacionada à sua produtividade e complexidade, já que novas topografias podem ser “conectadas” quase que indefinidamente a novas condições de estimulação e novas topografias podem ser obtidas pela simples combinação e recombinação dos elementos (por exemplo, sons e letras) que compõem topografias já selecionadas... (ver também Sundberg e Sundberg, 1990; Wraikat, Sundberg e Michael, 1991).

* As expressões topografias de respostas + efeitos, topografias + efeitos, respostas + efeitos o u A ^ a (letra maiúscula designando movimentos do organismo e minúscula, os efeitos necessários e indis­sociáveis desses movimentos) são empregadas como sinônimos aqui. Referem-se sempre a uma ati­vidade do organismo e a alguma mudança ambiental que necessariamente é produzida pela atividade do organismo.** São exemplos de comportamento verbal com base em seleção sistemas como o Picture Exchange System (PECS), nos quais as respostas verbais dos falantes envolvem (a) escanear figuras (que “repre­sentam” eventos, objetos, ações etc.) e (b) apontar aquela envolvida naquela instância. Tais sistemas, muito utilizados em indivíduos com desenvolvimento atípico, envolvem discriminações condicionais a cada emissão de uma resposta e respostas de uma mesma topografia (escanear e apontar) para diferentes estímulos.

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Definição de Comportamento Verbal e Topografias das Respostas Verbais: Sentido das PalavrasNa verdade, então, são apenas os efeitos das respostas verbais que ouvimos ou ve­mos*. É o conjunto de sons que os movimentos musculares e respiratórios produzem que afetam o outro, ou o ouvinte (seja ele outra pessoa ou o próprio falante): ouvin­tes de comportamento verbal são afetados auditivamente (e neste sentido mecanicamente) pelos distintos sons ouvidos, mas tais estímulos podem evocar quaisquer ações para as quais o ouvinte foi direta ou indiretamente preparado, produzindo conseqüências para o comportamento do falante que não guardam qualquer relação direta com as suas respostas vocais. Se chamados de aviso filoge- néticos, por exemplo, apenas certos padrões sonoros são efetivos no sentido de evocar/eliciar respostas daqueles que respondem ao chamado (por exemplo, cor­rendo), no caso do comportamento verbal operante tais restrições inexistem.

Se o “poder” das respostas vocais deve-se às infinitas possibilidades de recom- binação de sons que pequenas variações podem produzir e à possibilidade de que tais combinações assumam funções comportamentais sobre outra pessoa, o “po­der” das respostas vocais, como destacou Michael (1985), deve-se também a uma característica que, embora brevemente assinalada por Skinner (1957, p. 58-59, 65-66), é frequentemente ignorada: os efeitos necessários das respostas vocais, os sons produzidos, tornam-se, eles mesmos, estímulo reforçador para o falante. Se há uma correlação perfeita ou quase perfeita entre resposta vocal e produção de sons, a seleção operante da relação ente resposta + efeito e reforçador envolve o pareamento entre efeito da resposta (som) e reforço: assim, os efeitos - estes sim mecânicos - do comportamento vocal (os sons) tornam-se, eles também, estimu­lação com função de reforço, tornam-se reforçadores automáticos**. Se e quando os sons produzidos (o que em geral se entende por resposta vocal) tornam-se re­forçadores, a mera emissão das respostas já produziria os efeitos que as manteriam e, eventualmente, selecionariam. Daí se explicaria, pelo menos parcialmente, como distintas respostas verbais, ou melhor, respostas + efeitos assumem função com­portamental e porque a função comportamental de uma mesma resposta + efeito pode variar tão amplamente.

Ainda mais, se efeitos necessários de respostas verbais (diferentes estimulações sonoras efeitos de movimentos do aparelho fonador ou os estímulos visuais efei­tos de movimentos da mão e braço) assumem função comportamental de início como reforçadores automáticos e então como estímulos evocativos. Nessa situação:

• O comportamento verbal parece tornar-se independente de outro suporte, já que a emissão de sons torna-se reforçadora e respostas verbais podem ser emitidas e mantidas sem que seja necessária a contingência com outro

* Toda a análise que aqui é realizada para o comportamento verbal envolvendo respostas vocais vale para o comportamento verbal em que a resposta é escrita.** O termo “automático” refere-se ao fato de que movimentos e efeitos são inseparáveis, de que os efeitos são necessariamente produzidos quando as respostas são efetuadas.

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evento (ver Michael, 1985; Smith, Michael e Sundberg, 1996;Wraikat, Sundberg e Michael, 1991).

• Promove-se a ocorrência de comportamento verbal todo o tempo que pa­rece caracterizar os seres humanos.

• Tornamo-nos ouvintes de nós mesmos com tanta facilidade, o que, por sua vez, torna mais provável (e compreensível) a emissão de respostas verbais na forma encoberta.

A relativa facilidade de emitir respostas verbais vocais, a contínua presença de ouvintes e de outros falantes no ambiente e a seleção dos efeitos das respostas vocais como reforçadores automáticos, além do duplo papel que os indivíduos assumem como falantes e ouvintes - de outros e de si mesmos, tornam cada novo membro da cultura (em todas as culturas) cotidianamente imerso em um univer­so lingüístico: milhares de interações verbais ocorrem nos primeiros anos de vida de uma criança, selecionando um repertório extenso e flexível (Hart e Risley, 1995, 1999) que, além de ser livre das “restrições mecânicas” que caracterizam outros comportamentos operantes, torna-se aparentemente liberto e independente da própria comunidade verbal que o constituiu. Assim, o comportamento verbal talvez pudesse ser definido como o mais caracteristicamente operante dos reper­tórios, uma vez que desde muito cedo se torna intrinsecamente relacionado com o reforço e a própria resposta-efeito passa a ter função reforçadora. No entanto, estas características tornam tal comportamento aparentemente livre do ambien­te, originando toda sorte de interpretações cognitivistas.

No entanto, tal autonomia do comportamento verbal e, mais especificamente, das respostas verbais, é apenas aparente e se deve à “independência mecânica” entre topografia da resposta verbal e seu efeito comportamental relevante (o re­forçador mediado) e a possibilidade de reproduzir topografias distintas sem suporte ambiental externo. Tais características permitem que respostas + efeitos de uma mesma topografia sejam emitidas sob condições muito distintas e produ­zam conseqüências variadas, ou seja, que participem de diferentes contingências (ou operantes verbais), como indicado na Figura 4.4, onde a cada linha se diagra- mou uma instância de resposta - retângulo - sempre sob controle de estimulação antecedente e subsequente - triângulos. Cada plano corresponde ao comporta­mento de um indivíduo: o falante no plano superior e o ouvinte no plano inferior.

Note que na Figura 4.4 uma mesma resposta e efeito (as respostas motoras de­signadas como A que produzem como efeito necessário - e estimulação que afeta o ouvinte - um padrão de som designado como a) participam de distintas contingên­cias, o que foi representado a cada linha pelas distintas condições de estimulação que participam da contingência que descreve cada instância de resposta A —> a: assim tal resposta está relacionada a múltiplas condições de estimulação.

Também, as condições antecedentes são especialmente relevantes nas contin­gências verbais, já que com exceção do mando (diagramado na primeira instância da Fig. 4.4) em que um reforçador associado à condição motivadora antecedente é produzido, nos demais operantes verbais a conseqüência selecionadora é um reforça­dor generalizado (o que se diagramou como a resposta do ouvinte que é assinalada por +). No comportamento verbal, então, uma mesma topografia de resposta pode

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Figura 4.4 - Uma só topografia de resposta participa de diferentes contingências. Cada plano representa um indivíduo (falante ou ouvinte) e ocorrências de comportamento, no tempo. Cinco ocorrências, ou instâncias, de interações entre falante e ouvinte estão respresentadas na figura. Em cada conjunto representam-se instâncias de respostas verbais relativas a cada indivíduo (falante e ouvinte), em suas contingências, sendo as respostas e seus efeitos representados pelos retângulos e a estimulação antecedente e os reforçadores pelos triângulos. As tonalidades e símbolos diferentes representam eventos distintos. Neste caso, uma mesma topografia de res­posta do falante [A], que produz como efeito um padrão sonoro específico [a], participa em diferentes contingências: na primeira ocorrência (ou instância), a resposta do falante estaria sob controle de operações estabelecedoras/reforçadores específicos (triângulos hachurados), como ocorre no mando (primeira ocorrência); em todas as demais instâncias está sob controle de re­forçadores generalizados e, especialmente, de estímulos antecedentes verbais específicos distintos entre si (triângulos com linha simples representados à esquerda das respostas na segun­da, terceira e quarta instância), como ocorre nos comportamentos do tipo ecoico, intraverbal, transcrição e textual. Ou, como ocorre na primeira e última instâncias, as respostas estão sob controle de estímulos antecedentes não verbais (triângulos com linha pontilhada), como ocorre nos tatos (representado na última ocorrência), já que ali o estímulo evocativo é não verbal e a conseqüência selecionadora é reforço generalizado e como ocorre no mando, quando a estimu­lação antecedente está relacionada ao reforçador específico (representado na primeira instância de comportamento verbal nesta figura). Note-se também que o comportamento do ouvinte está sob controle de dupla estimulação: do efeito da resposta verbal e da estimulação antecedente que controla tal resposta (por isso o triângulo, que representa a estimulação antecedente e o retângulo, que representa a resposta do falante, são conectados).

e é emitida em muitas distintas contingências e tais contingências podem ser esta­belecidas com “mais liberdade” do que ocorre com outros comportamentos. Por exemplo, no comportamento de atirar flechas certas respostas musculares têm que ocorrer para que a flecha atinja seu alvo e as mudanças ambientais que são o per­curso e velocidade da flecha dependem destes movimentos diretamente. Já no caso do comportamento verbal, as respostas musculares + efeitos ambientais podem variar quase que sem limites e seu reforço depende exclusivamente do comporta­

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mento do ouvinte o qual, por sua vez, ele mesmo dependente de sua história social e não de características intrínsecas das respostas.

Além disso, uma mesma topografia de resposta verbal específica depende fre­quentemente de estímulos discriminativos específicos, mas não de reforçadores específicos, para ser evocada. Como conseqüência: a emissão de uma dada respos­ta selecionada por reforço é equiprovável em relação a outras respostas verbais quando se considera a variável reforço e, depende, assim, de variações na condição antecedente. Na Figura 4.4, por exemplo, a segunda, terceira, quarta e quinta ins­tâncias da resposta A —> a estão vinculadas ao mesmo reforçador, mas em cada caso uma condição de estimulação antecedente específica e distinta teve papel evocati­vo (a, a, o, Por isso, comportamento verbal parece ser indeterminado ou determinado por variáveis antecedentes apenas e, portanto, não parece ser com­portamento operante e as variáveis importantes parecem estar no sujeito.

Nas culturas letradas (com escrita), ademais, um falante pode emitir quase que de modo intercambiado, em cada contingência, pelo menos duas topografias com­pletamente distintas de resposta + efeitos: as respostas vocais e as respostas escritas, cada uma delas com seus respectivos efeitos, estimulação sonora e estimulação visual ou, ainda, fala e escrita. Assim, participam de contingências idênticas respos­tas de topografias diferentes (vocal e escrita) que produzem efeitos distintos (auditivos e visuais), os quais afetam o falante e ouvinte de forma semelhante ao ponto de vista comportamental: estes distintos efeitos se tornam, portanto, uma estimulação evocativa e reforçadora para ambos (falante e ouvinte) e, mais, se tornam intercambiáveis, o que fortalece as concepções de que haveria algo de especial no comportamento verbal que não poderia ser descrito em termos de comportamen­to operante. Todas estas relações estão diagramadas na Figura 4.5.

Constituem-se assim redes de contingências nas quais uma dada resposta (vocal ou escrita) participa de diferentes contingências que podem ser controladas especificamente por reforçadores, ou especificamente por estímulos discrimina­tivos. Tais estímulos podem, por sua vez, ser eventos não verbais ou eventos verbais, que são efeitos de respostas verbais de distintas topografias (auditivos ou visuais). Na Figura 4.5, por exemplo, diagramou-se um conjunto de instâncias de compor­tamento operante no qual a é efeito da resposta do falante, ou seja, é resposta verbal e também estimulação antecedente que afeta o ouvinte e o próprio falante. Também a e a são estímulos antecedentes que evocam a mesma resposta A a (por exemplo, vocal) e outra resposta AA -> aa (por exemplo, escrita). Finalmente, a evoca também a resposta B -> b. Tais contextos, típicos de comportamento ver­bal constituem redes de relações. Neste caso: a,af A-^a,AA-^aa,B-> b. Estas redes tornam as respostas verbais, por um lado, respostas de topografia definida e reprodutível que, embora sejam controladas por múltiplas fontes são precisamen­te controladas em cada caso e, por outro, torna-as aparentemente intercambiáveis com as próprias variáveis que as controlam, mesmo quando estas variáveis são estimulação não verbal.

Como conseqüência, o comportamento verbal se torna especial: primeiramen­te, porque pequenas variações podem ser extremamente relevantes em termos das conseqüências que produzem e da estimulação que as evoca, possibilitando uma infinidade de respostas e de efeitos. Segundo, porque tais variações ocorrem

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Figura 4.5 - Topografias de resposta e contingências de reforçamento no comportamento verbal. Uma mesma topografia de resposta (A -> a, por exemplo) pode estar sob controle de diferentes va­riáveis, como diagramado na primeira e na terceira instância do comportamento do falante. Ou um mesmo conjunto de variáveis pode participar do controle evocativo (estimulação e antecedente) e alterador (conseqüências selecionadoras) de diferentes topografias de respostas relacionadas, como ocorre no caso de respostas orais e escritas. Estes casos são representados na primeira e segunda instâncias na figura e também nas terceira e quarta instâncias: as respostas diagramadas têm topo­grafias diferentes, mas estão sob controle das mesmas variáveis e por isso os triângulos são iguais; porém, os retângulos que representam as respostas dos falantes não são. Por outro lado, estas topo­grafias estão relacionadas entre si, o que foi representado pelas letras “A” e “a”. Finalmente, as mesmas variáveis ambientais (representadas por triângulos) podem controlar duas respostas distintas que produzem efeitos em uma mesma dimensão (respostas orais e efeitos sonoros que afetam auditiva- mente o ouvinte, por exemplo), como foi diagramado na primeira e na última instância da figura.

quase que independentemente de qualquer suporte externo e porque podem produzir muitas e distintas conseqüências reforçadoras que não estão direta ou mecanicamente associadas às topografias da resposta relevante do falante. Final­mente, o comportamento verbal é especial porque as respostas verbais se tornam, até certo ponto, aparentemente substitutas dos próprios eventos que as controlam, dadas as redes de relações que podem ser estabelecidas entre respostas e estimu­lação evocativa de tais respostas.

Como a mesma topografia de resposta pode ser emitida em diferentes circunstâncias dada sua “liberdade” em relação à variável selecionadora (reforço), respostas de mesma topografia sob controle de diferentes estímulos (antecedentes e subsequentes) passam também a mediar relações de controle comportamental, como ocorre com a nomeação de estímulos em tarefas de solução de problemas. Assim, além da possibilidade de que tal mediação participe da formação de classes de estímulos arbitrários (como argumentam Florne e Lowe, 1996, 1997 e Lowe e Horne, 1996), o comportamento verbal se constitui, em boa parte, de respostas verbais que independem de outras relações além daquelas estabelecidas em con­textos verbais (mediados pelas próprias respostas verbais e pelos estímulos verbais

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que compõem as relações verbais), tornando os comportamentos de falante e ouvinte extensamente controlados por classes de estímulos exclusivamente verbais. Parece, então, que palavras têm sentido por elas mesmas.

Comportamento Verbal, Indivíduo e Seleção CulturalE isto não é tudo. O comportamento verbal como produto evolucionário e como resultado de seleção ontogenética e cultural implica ainda em três outras condições que merecem destaque:

• Ouvintes tornam-se audiência.• O falante tende a se tornar ouvinte de si mesmo.• O comportamento verbal passa a controlar o comportamento do próprio

falante, de seus ouvintes e, não menos importante, de qualquer outro que possa entrar em contato com os produtos de tal comportamento.

A seleção de comportamento verbal e a produção de falantes e ouvintes compe­tentes é parte integrante, cotidiana e relevante das práticas culturais de todas as culturas humanas. Desde muito cedo, bebês participam de contingências sociais nas quais são modelados e fortalecidos os repertórios de ouvinte: adultos e outras crianças se engajam em interações com o bebê ou criança, de modo a promover repertórios específicos e repertórios generalizados de ouvinte: por exemplo, assim que o bebê demonstra alguma coordenação motora, a mãe “ensina-o a bater palmas” quando instruído e, orgulhosa, exibe a habilidade a outros. Desta maneira, compor­tamentos específicos são colocados sob controle discriminativo de estímulos verbais e repertórios complexos são selecionados.

Também é promovida generalidade de tais repertórios quando fórmulas verbais bem estabelecidas culturalmente assumem papel de estímulos com função evoca­tiva, como ocorre com cantigas e brincadeiras que descrevem comportamentos a serem emitidos (“Ciranda, cirandinha, vamos todos cirandar”), ou com ditados populares (“quando um não quer, dois não brigam”), ou com topografias de respos­tas que se repetem nas situações em que indivíduos se comportam como ouvintes (“como vai?”, “tudo bem”). Neste último caso, autoclíticos são especialmente impor­tantes, como nas frases em que falantes “usam” verbos no imperativo, ou expressões como “por favor”. Todas essas fórmulas exercem função evocativa, direta ou indire­tamente, quando transformam o restante de uma verbalização de estimulação instantânea. Finalmente, a generalidade dos comportamentos de ouvinte se esta­belece pela interação do ouvinte-aprendiz com vários falantes, de modo que, bastante cedo, nos tornamos, de forma generalizada, ouvintes potenciais quando outros indivíduos estão presentes.

O “treinamento” de ouvinte depende, então, de um conjunto de práticas culturais que envolvem inicialmente a família ou o grupo social com o qual a criança convive. Como mostram os trabalhos de Hart e Risley (1995, 1999), Moerk (1990, 1999) e, em outra perspectiva que parece ser compatível em muitos aspectos com a análise do

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comportamento, de Tomasello (1992), os comportamentos de falante e de ouvinte são inicialmente dependentes de interações verbais específicas de que participam as crian­ças cujos repertórios verbais de falante e de ouvinte estão sendo selecionados. Tais repertórios (falante e ouvinte) são selecionados de certa maneira concomitantemente e a competência da criança como falante e ouvinte tem correlação alta e sistemática com as práticas da comunidade verbal que diretamente interage com o aprendiz.

Os primeiros resultados das práticas culturais que nos transformam anos em falantes e ouvintes competentes com apenas três anos, são, então, estabelecidos, simultaneamente, de modo que os outros se tornam falantes para os quais a crian­ça é potencialmente um ouvinte e ouvintes da criança (adultos - e mesmo outras crianças - aproximam-se de bebês, mesmo antes que eles possam falar interagin­do verbalmente com eles, por exemplo).

Sabe-se que as relações entre eventos discriminativos e reforçadores em uma tríplice contingência são múltiplas e complexas: eventos com função de estímulo discriminativo tornam-se também reforçadores condicionados, dada a relação temporal e de probabilidade entre tais eventos em uma tríplice contingência (Todorov,1985); a produção de estímulos discriminativos reforça as respostas que os produzem (Wyckoff, 1969). Sabe-se também que a estimulação que acompanha eventos re­forçadores ou punidores assume a função de estímulo reforçador ou punidor (Skinner, 1953) e, muito importante aqui, define-se como estímulo discriminativo a estimulação sistematicamente presente quando instâncias de resposta-reforço ocorrem, o que torna tal estimulação evocativa de novas ocorrências dessas respos­tas (Michael, 1980b).

Como se destacou até aqui, as contingências selecionadoras do comportamento verbal são linhagens comportamentais entrelaçadas nas quais sempre participa um ouvinte que se comporta como ambiente mediador, provendo o reforço do com­portamento do falante. Como parte integrante e sempre presente de contingências verbais nas quais participa do reforço, o ouvinte adquire função reforçadora (e, neste sentido, alteradora de repertório), mas assume também a função de estimu­lação evocativa, ou “instanciadora”, de comportamento verbal. Quando o ouvinte assume tal função, diz Skinner, ele se torna audiência: sua presença assume função evocativa que seleciona sub-repertórios verbais e altera a probabilidade de emissão de comportamento verbal*, como se diagramou na Figura 4.6 na qual o plano que representa cada ouvinte aparece também como plano que antecede a emissão de instâncias verbais por parte do falante.

Essa dupla função ambiental do outro no comportamento verbal é, em parte, responsável pela observação de que os seres humanos tendem a se engajar em comportamento verbal, se o outro é, de forma generalizada, audiência, ou seja, estimulação evocativa para respostas verbais, e se cada indivíduo é ouvinte, ou seja, tende a reagir provendo reforço para comportamento verbal, estão dadas as condições de sustentação de episódios verbais (ver Fig. 4.5) e também da recor­rência de comportamento verbal, que parece ter muitas vezes apenas a função de

* Sobre o conceito de “audiência”, consultar a instigante interpretação de Fonai e Sério (2007) e o tra­balho de Pasquinelli (2007).

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Figura 4.6 - Falante e audiência nas interações verbais. O comportamento do falante (plano cinza-claro) é evocado pela audiência e nesta figura são representadas quatro ocorrências ou instâncias em que o mesmo falante interage com três indivíduos diferentes. Cada indivíduo funciona como audiência e como ouvinte. As audiências são representadas pelos pequenos planos (em vários tons) que se sobrepõem ao plano que representa o comportamento do falante. O comportamento do falante também é mediado pelo comportamento dos ouvintes, represen­tados nos planos inferiores (abaixo daquele que representa o falante). Um mesmo indivíduo é representado como ouvinte e como audiência em cada instância de comportamento verbal e por isso a tonalidade que representa o falante é a mesma em cada instância. Por outro lado, cada falante interage com muitos ouvintes e audiências, o que é representado por diferentes tons para ouvinte e audiência em cada instância de comportamento verbal.

engajar falantes e audiências/ouvintes em interações verbais. Como destacou Guerin (2003), uma função relevante do comportamento verbal é manter o outro como ouvinte e audiência, ou seja, como potencial mediador de comportamento verbal. Esta é uma das funções de comportamento intraverbal, tanto aquele com­portamento que se reconhece nas fórmulas de cortesia (por exemplo, dizemos “bom dia” aos nossos colegas de trabalho...), como interações verbais mais exten­sas (... e nos engajamos em conversação no início de um dia de trabalho).

Neste contexto, em que o ambiente mais relevante é constituído de outros homens, o comportamento verbal ocorre em grande parte do tempo em forma de vigília dos indivíduos que são falantes e ouvintes/audiência e no qual o efeito necessário da emissão de respostas verbais assume função de reforçador (auto­mático) é quase uma conseqüência inevitável que cada indivíduo se torne alvo do seu próprio comportamento verbal, ou seja, que se torne ouvinte de si mesmo, fato representado na Figura 4.7.

Assim, a ubiquidade do comportamento verbal ocorre não só nas interações sociais entre indivíduos. Comportamento verbal tende a ocorrer geralmente nas vidas de cada falante individual, estes se tornam seus próprios ouvintes, são uma audiência sempre presente e muito frequentemente se tornam o ouvinte mais importante e mais constante de si mesmos.

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Figura 4.7 - O falante como seu próprio ouvinte. Em um só plano se representa o comporta­mento verbal.

Reprodução do ComportamentoComportamento é um fenômeno que ocorre no indivíduo. É sempre um organismo individual que se comporta. A seleção de comportamento operante é, portanto, a seleção de comportamentos de um indivíduo. No caso de comportamento social, um indivíduo é ambiente social para o comportamento de outro. Desta situação parte a possibilidade do comportamento de um indivíduo seja evocado pelo com­portamento de outro indivíduo e, então, seja selecionado por suas conseqüências. Como se diagramou na Figura 4.8, linhagens comportamentais/comportamentos operantes semelhantes aos selecionados por contingências podem ser evocadas em outros indivíduos e assim se reproduzem (ou melhor, se produzem) acelerando muito a seleção. Por esta razão os processos de imitação/modelação são relevantes.

Na espécie humana, como em outras espécies, imitação e modelação partici­pam da seleção de muitos comportamentos operantes e, explicam, pelo menos em parte, a reprodução de comportamentos e a produção de comportamentos novos e complexos nos indivíduos.

Mas a emergência e difusão do comportamento verbal implicaram em novas possibilidades de interação com o ambiente. Destaca-se, nesse momento:

• A seleção de linhagens comportamentais nas quais respostas específicas e fa­cilmente reprodutíveis (pelo falante original ou por outros falantes) são colocadas sob controle de estímulos antecedentes específicos (como nos tatos).

• A possibilidade de seleção de inumeráveis tatos, dada a ausência de restrições em relação à resposta verbal (e, assim, da relação comportamental possível entre estímulo antecedente com função de estímulo discriminativo e resposta).

• A possibilidade de emissão de tatos sob controle de eventos e de relações entre eventos (inclusive aquelas chamadas comportamentos).

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Especificidades e Implicações da Interpretação da Linguagem como... ■ 87

Pessoa A

Figura 4.8 - Seleção de comportamento operante, da qual participa outro indivíduo: imitação/ modelação. Quando uma linhagem já existe (por exemplo, o comportamento de A), uma segunda classe de respostas (ou linhagem comportamental) pode ser selecionada, mas, neste caso, o novo comportamento selecionado é emitido por outra pessoa (o comportamento da Pessoa B). A classe de respostas/linhagem operante já selecionada para a Pessoa A é selecionada pelas suas conseqüên­cias independentemente da Pessoa B. Mas o comportamento da Pessoa A pode evocar a emissão da resposta da Pessoa B, produzindo conseqüências diferenciais. Neste caso, o comportamento de B, selecionado também, tornando-se ele também comportamento sob controle operante. Como resultado deste processo, há duas classes operantes/linhagens comportamentais, selecionadas, em duas diferentes pessoas. Note que a direção das setas nos ícones que denotam as respostas (quadrados) de ambas as pessoas indica que as alterações ambientais produzidas pelo responder de ambas e que tem efeito selecionador afetam diretamente (mecanicamente) o ambiente.

Uma vez que comportamentos complexos, como tatos, se desenvolvem, pelo menos parte destes tatos pode exercer a função de estimulação, controlando outros comportamentos (ver Figs. 4.4 a 4.6), estabelece-se, assim, a possibilidade de controle do comportamento verbal sobre outros comportamentos. Estabele- ce-se, portanto, a possibilidade de que novos comportamentos sejam evocados com alta probabilidade antes mesmo que tenham sido expostos a conseqüências e ainda que a probabilidade de tal emissão fosse zero ou muito próxima de zero em outras condições.

As relações comportamentais entre indivíduos que se mantêm sob o controle do comportamento verbal, que descreve contingências (ou desempenhos), e entre indivíduos que emitem comportamento verbal sob o controle de eventos não verbais que rompem limites das interações diretas com o ambiente nas quais o comportamento operante é selecionado (ver Fig. 4.9).

É certo que regras/descrições verbais têm função evocativa ou “instanciadora”, e não selecionadora ou alteradora de repertórios. No entanto, a possibilidade de evocar comportamentos antes mesmo da ocorrência da relação resposta-reforço implica em um aumento nas possibilidades comportamentais tanto dos indivíduos que evocam comportamento como daqueles que se comportam sob controle verbal: novos comportamentos podem ser evocados rapidamente, comportamentos com baixa probabilidade momentânea podem ser evocados, e uma vez que o compor­tamento verbal é facilmente reprodutível e que respostas verbais tornam-se

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/Pessoa A /

^Falante

Seleção com participação de comportamento verbal/instrução

Pessoa A

AQV/Falante

Figura 4.9 - Seleção de comportamento operante e sua “reprodução ou transmissão”. Seleção de comportamento operante/linhagem comportamental em uma pessoa, como resultado de uma história de exposição às contingências (terço superior da figura). Neste caso, o comportamento replica-se apenas naquele indivíduo exposto às contingências selecionadoras. No terço do meio, indica-se a seleção de duas linhagens operantes em duas pessoas, pela exposição às contingências e pela mediação social, por exemplo, na imitação. Note-se que, neste segundo caso, a replicação do comportamento ocorre em pelo menos duas pessoas, mas depende do contato direto entre elas para ser selecionado no imitador. No terço inferior, indica-se como o comportamento verbal pro­move a replicação de comportamento selecionado por exposição às contingências: uma vez que o comportamento (ou mesmo a simples ação) é descrito (torna-se resposta verbal), tal descrição pode afetar outras pessoas. O comportamento é evocado em outros indivíduos, mesmo sem con­tato direto com aquele cujo comportamento foi a estimulação que controlou a descrição (as Pessoas B e C na figura não tiveram contato com a A). O comportamento verbal, liberto de restri­ções mecânicas em termos de suas conseqüências, também promove a seleção de novos comportamentos em indivíduos sem qualquer contato anterior com as condições selecionadoras (ou com os indivíduos que dela participaram). O comportamento verbalmente descrito pode ser replicado (evocado) em qualquer pessoa sensível à descrição.

estímulos que podem ser reapresentados facilmente (por exemplo, na forma de instruções escritas) tais comportamentos podem ser multiplicados facilmente em um indivíduo ou em muitos indivíduos, mesmo na ausência dos indivíduos que de início emitiram o comportamento verbal, o falante cujo comportamento verbal evoca o comportamento descrito pode não ser aquele que se comportou, ou mes­mo aquele que descreveu o comportamento (emitiu tato). Tal falante pode sequer ser capaz de se comportar como descreve. Ainda assim, na condição de falan­te pode evocar comportamentos. Com o comportamento verbal, multiplica-se

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Especificidades e Implicações da Interpretação da Linguagem como... ■ 89

exponencialmente a reprodução de comportamentos em um indivíduo e em muitos indivíduos; tal reprodução é possível independentemente do contato di­reto entre os indivíduos cujos comportamentos são mudados.

É assim que os entrelaçamentos cotidianos dos comportamentos de ouvinte e falante participaram e participam da emergência da cultura e do terceiro nível de seleção do comportamento humano (cultural), e por esta razão a emergência da linguagem é afinal tão relevante e está tão de perto associada à emergência da cultura. Como destacou Skinner (1957):

Assim que os homens começaram a trabalhar em conjunto na caça, pesca, construção de abrigos, ou na Guerra, devem ter ocorrido situações em que as

respostas verbais rudimentares seriam úteis.... Comportamento verbal expandiu tanto os poderes sensoriais do ouvinte que agora podia responder ao

comportamento de outros ao invés de responder diretamente a coisas e eventos, assim como expandiu o poder de ação do falante que podia falar ao invés de

fazer.... Comportamento verbal deve terse tornado mais útil para o grupo como um todo e para seus membros individualmente, de forma importante, quando

respostas começaram a ser transmitidas de uma pessoa para outra.... Uma divisão do trabalho útil não foi o único resultado com comportamento verbal. Outras

funções devem ter emergido rapidamente... as quais, de início deviam ser efetivas na jacilitação da coordenação do grupo.... Efeitos especiais cujos resultados estão

gravados na literatura tomaram-se possíveis quando uma palavra particular passou a excitar emocionalmente o leitor ou entretê-lo de várias formas. Essas

reações colaterais do ouvinte logo devem ter alterado o comportamento dos falantes. Adicionalmente, assim que o ouvinte também se tomou um falante competente, o comportamento verbal pôde produzir reações verbais para ele, assim divertindo-o com efeitos humorísticos ou de estilo decorrentes de causa

múltipla, provocando e instigando [prompting e probing] seu comportamento na persuasão ou estimulação intelectual... Esses usos adicionais do

comportamento verbal não resultaram da extensão de poderes sensoriais ou motores. Eles podem ou não ter efeito sobre a coordenação do grupo. Eles são

mais interessantes quando não há um grupo envolvido: quando, em resumo, um homem fala consigo mesmo. (Skinner, 1957, p. 433-434)

Mais uma vez, a interpretação de Skinner e da análise do comportamento (Glenn, 2003) é semelhante à de paleontólogos e antropólogos (Harris, 1989; Harris e Johnson, 2003; Lewin e Foley, 2004): com a emergência da linguagem ou, como disse Skinner (1981) “quando a musculatura vocal ficou sob controle operante” (p. 502) os indivíduos puderam cooperar uns com os outros de maneiras muito mais produtivas e eficazes do que até então* e tal cooperação pôde tornar-se mais complexa, já que mesmo indivíduos que não estavam em contato direto uns com

* A este respeito, ver o episódio criado por Skinner, em 1986, para exemplificar como devem ter sido as primeiras interações humanas das quais interações verbais emergiram e foram selecionadas por seu impacto sobre os indivíduos participantes.

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90 ■ Especificidades e Implicações da Interpretação da Linguagem como..,

os outros podiam participar de empreendimentos comuns. Estas possibilidades certamente ampliaram de maneira única o histórico evolucionário as possibi­lidades de interação dos homens entre si (com o ambiente social) e dos homens com o ambiente "físico”.

Além disso, com a emergência da linguagem, novos comportamentos podiam ser selecionados, ou “reinstados”, de uma maneira também completamente nova na história evolucionária: comportamentos podiam ser emitidos sob controle de comportamento verbal, ou melhor, respostas podiam ser emitidas quando eram descritas e tais descrições sequer precisavam ser feitas por indivíduos que se com­portaram já da maneira descrita. Tal possibilidade permitiu que comportamentos relevantes para os indivíduos e para os demais membros dos grupos com os quais os indivíduos interagiam pudessem ser emitidos mais rapidamente, mas eficien­temente e, principalmente, independentemente de contato direto entre aprendiz e aquele indivíduo cujo comportamento serviu de modelo para a descrição.

Foram precisamente estas possibilidades, abertas apenas com a evolução da lingua­gem, que tornaram o comportamento, em certo sentido, imortal, ou pelo menos, possível que sobrevivesse aos indivíduos, ou melhor, permitiram que comportamentos específicos pudessem se reproduzir entre gerações de indivíduos, mesmo que os indiví­duos que se comportam não tivessem sido expostos às mesmas contingências ou tivessem aprendido uns dos outros. Esta é a base do que chamamos cultura. Com a emergência do comportamento verbal como modo de vida e com a emergência da cultura, emergiu o que Skinner chamou de “terceiro nível de seleção do comportamento”.

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CAPÍTULO

Disseminação do Conhecimento em Análise do Comportamento

Produzido no Brasil (1962-2007)

N il z a M i c h e l e t t o M a r ia d o C a r m o G u e d e s G iu l ia n a C é s a r M a r ia E l iz a M a z z il l i P e r e ir a

Um Pouco de HistóriaUm generoso comentário de Fred Keller sobre sua relação com B. F. Skinner talvez ajude a entender o início de nossa história.

A despeito do seu gênio na pesquisa experimental desde então [os anos 1920], Burrhus Skinner era antes de tudo um sistematizador e eu era

essencialmente um professor. Enquanto ele estava fazendo o seu trabalho árduo para seu artigo

sobre o reflexo, eu estava traduzindo termos mentalistas em estímulo-resposta e revendendo os

resultados para estudantes universitários como uma espécie de behaviorismo pronto para vestir

/ready-to-wear/. Nada eu tive dele para me ajudar muito preparar aulas, e ele teve menos de mim

para favorecer seus fins. Ele era um produtor de sistema; eu era um divulgado e ele ainda não tinha

nada para promover (Keller, 1970, p. 35)

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102 ■ Disseminação do Conhecimento em Análise do Comportamento Produzido..,

Keller não foi apenas um professor ou um divulgador de análise do comporta­mento. Sua produção de conhecimento esteve voltada à investigação experimental de vários processos comportamentais, e ele também se destacou ao gerar uma das mais importantes e fecundas tecnologias de ensino. Mas sua preocupação com a promoção da análise do comportamento possibilita, hoje, historiar um pouco da construção dessa abordagem no Brasil.

A história da Análise do Comportamento no Brasil se inicia com o trabalho formador de Fred Keller (1899-1996). Diversos textos (Queiroz, Guilhardi, Martin, Guedes, 1976; Queiroz, Guilhardi, 1976; Matos, 1996; Bori, 2001) que abordam a história da análise do comportamento no Brasil indicam como marco de origem a vinda do professor norte-americano para ministrar aulas de Psicologia Experi­mental em 1961, na Universidade de São Paulo (USP). A identificação de um momento a partir do qual tudo se inicia constitui uma condição rara na compreen­são da origem e desenvolvimento de uma área do saber.

Análises de transformações sofridas por ideias que foram transportadas para novos locais têm sido frutíferas e esclarecedoras. Elas permitem identificar con­tornos adquiridos por um pensamento que se constituiu a partir de fundamentos próprios e condições históricas específicas em novas condições históricas e sociais que são muitas vezes diferentes ou até incompatíveis. Em vários campos do co­nhecimento encontramos análises de transformações que ocorrem quando um pensamento é transposto para um novo lugar.

Apesar de o início da análise do comportamento no Brasil distar aproximadamen­te 30 anos dos primeiros textos de Skinner, cabe analisar não só que características têm a produção inicial e sua difusão no Brasil, mas também possíveis relações que se estabelecem entre pensadores, oportunidades de troca e de inovação que, às vezes, podem ser geradas por se estar “fora do lugar”*.

A razão que levou ao convite para que um analista do comportamento viesse ministrar aulas de Psicologia Experimental na USP não é clara. Mas uma informação ao menos pitoresca tem sido citada: o convite teria sido feito por uma ex-aluna, uma misteriosa (diz Matos, 1996) Mirthes Rodrigues do Prado - encantada com o curso de Fred Keller na Universidade de Columbia (Queiroz, Guilhardi, Martin, Guedes, 1976; Queiroz, Guilhardi, 1976; Matos, 1996; Bori, 2001). Carolina Bori (1995) diz que o convite a Fred Keller atendia a uma preocupação em estabelecer uma formação experimental no curso de Psicologia que acabava de ser criado.

Seja qual for a razão, Fred Keller inicia o que é descrito por seus colegas e alu­nos na época como uma grande transformação. Maria Amélia Matos (1996), uma de suas alunas e assistente naquele momento, recorda:

O impacto das aulas do professor Keller foi grande: ele discutia ideias e dados e não somente propostas teóricas derivadas de críticas de outras tantas teorias, que por sua vez também derivavam de outras teorias....

Trabalhávamos [nas aulas de laboratório] em dupla... Lembro-me até hoje da sensação, forte e doce, de que, daí por diante, aprenderia não apenas

* Ver a análise clássica de Roberto Schwartz (1981) sobre a aclimatação de ideias europeias no Brasil.

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Disseminação do Conhecimento em Análise do Comportamento Produzido... ■ 103

lendo nos livros, mas realizando o que esses livros diziam, e eventualmente podendo até vir a realizar coisas não escritas, (p. 107-108)

Carolina Bori (2001), professora do curso de Psicologia na época, descreve transformação semelhante produzida na formação dos que participaram dessa experiência inicial.

Quando o professor Keller nos introduziu na análise do comportamento, ele também produziu em nós uma forte preferência pela experimentação versus discussões filosóficas e conceituais.... O legado de suas inovadoras

conferências foi duplo. Em primeiro lugar, os alunos tomaram conhecimento dos princípios, conceitos e procedimentos da análise experimental do

comportamento de uma maneira sistemática e cumulativa. Em segundo lugar, aprenderam afazer pesquisa. Estes efeitos foram concomitantes,

interligados e indiscutivelmente se deram devido à inquestionável habilidade de ensino do professor Fred Keller, (p. 302-303)

Vários analistas do comportamento (Keller, 1982; Matos, 1996; Guilhardi, 1976) descrevem o que implicou a introdução de uma nova abordagem da Psicologia num contexto em que todas as condições para isso precisaram ser criadas: a divulgação intensa, feita por Keller, dessa nova abordagem em palestras, a realização de experi­mentos em condições improvisadas até a construção dos primeiros laboratórios, a tradução dos livros que Keller tinha trazido em sua bagagem, a participação de alunos como assistentes de Keller, a realização das primeiras pesquisas, que foram posterior­mente publicadas (Azzi, Fix, Rocha e Silva e Keller, 1964), e outros aspectos que revelam o entusiasmo das primeiras descobertas e a formação dos primeiros alunos e professores, hoje grandes expoentes da Análise do Comportamento no Brasil. Destaca-se nesse contexto o papel da professora Carolina Bori (Keller, 1982,1988,2009) que participa dessa história desde o primeiro momento da chegada de Keller ao país, em 1961, e estará presente em todos os momentos subsequentes, sendo a maior res­ponsável pela expansão do que foi produzido nessa abordagem no Brasil.

Quando Keller volta para os Estados Unidos, no final de 1961, ele convence alguns de seus alunos a completarem a formação lá, deixa um conjunto de pesquisas ini­ciadas, principalmente as que lidavam com variáveis temporais e com esquemas básicos de reforço - as que eram possíveis devido aos limites dos equipamentos disponíveis - também encarrega alguns de seus primeiros colaboradores de darem continuidade ao curso de Psicologia Experimental - não só na USP, mas em outros centros de formação, como na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Rio Cla­ro (Matos, 1996) -, e indica um de seus ex-alunos da Columbia University, John Gilmour Sherman, que dará impulso à construção de laboratórios e ao ensino de Psicologia Experimental sob a perspectiva da análise do comportamento.

Pode-se dizer que, nos Estados Unidos o início da década de 1960 foi um momen­to em que os pesquisadores behavioristas estavam sistematizando os conhecimentos decorrentes das primeiras décadas de pesquisa e iniciavam a organização dos primei­ros textos voltados à formação e divulgação do conhecimento até então produzido e das primeiras formas de organização da comunidade de analistas do comportamento.

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Quando Keller vem pela primeira vez ao Brasil, Skinner tinha publicado alguns de seus livros: Behavior of Organisms (1938), Walden Two (1948), Science and Human Behavior (1953), Verbal Behavior (1957) (nestes três últimos livros ele propunha as primeiras extensões dos resultados de pesquisa para o comportamento humano), Schedules of Reinforcement (1957), com Fester, e tinha já pronto o The Analysis of Behavior: a Program for Self-instruction, com Holland (1961), um livro elaborado para o ensino de análise do comportamento a partir dos princípios da Instrução Programada. Essas publicações, junto com Principles of Psychology, de Keller e Schoenfeld (1950), eram os poucos livros disponíveis. Tatics of Scientific Research, de Sidman (1960), primeiro livro que apresenta as características específicas da metodologia experimental da análise do comportamento, acabava de ser publicado. E a primeira das revistas de análise do comportamento vinha desde 1958 sendo editada - o Journal ofthe Experimental Analysis of Behavior*.

O intercâmbio de brasileiros e americanos que se estabelece a partir da experiência de 1961 e as novas práticas aqui geradas marcarão a próxima experiência que será fun­damental para a continuidade da implementação da análise do comportamento no Brasil - o curso de Psicologia elaborado para a recém-criada Universidade de Brasília (UnB) - e as condições para que, pela primeira vez, possa se elaborar e realizar um pro­jeto de ensino com características absolutamente peculiares às do Personalized System oflnstruction (PSI), uma das mais importantes tecnologias da análise do comportamento.

Assim, a continuidade da análise do comportamento no Brasil envolverá novamen­te a presença de Keller, em 1964, quando da instalação do Departamento de Psicologia na UnB, que se inicia com a inauguração da nova capital. Segundo Carolina Bori (2005), para criar o projeto da Universidade de Brasília, Darcy Ribeiro, que será seu primeiro reitor, reuniu um conjunto de professores de várias áreas para pensar uma universida­de completamente alternativa e inovadora em relação às propostas vigentes.

Carolina Bori (2005) fala do impacto que foi para ela e seu grupo a oportunida­de de criar algo que fosse realmente novo. Segundo Matos (1996), “um curso inovador de Psicologia... que serviria de modelo para os demais cursos de Ciências Humanas.” (p. 110) Então, com Rodolpho Azzi, que foi trazido pelo professor Sawaya para ser assistente de Keller, mas que “logo se revelou um colega” (Keller, 2009) e Gilmour Sherman (sucessor de Keller na USP após sua partida, em 1961), Carolina convida Keller para pensar com eles a Psicologia da UnB, tendo como orientação a teoria de reforço operante.

Da viagem aos Estados Unidos para conhecer behavioristas e seus trabalhos (Skinner em Harvard, ensinando Tecnologia Comportamental; Ferster trabalhan­do com as máquinas de ensinar e a instrução programada, entre outros) e em busca de livros, equipamentos e ideias para seu projeto, o grupo, segundo Keller (1974), voltou entusiasmado.

* Journal o f Applied Behavior Analysis, uma revista dedicada à divulgação de pesquisas aplicadas, começaria a ser editada em 1968. Behaviorism, sucedida por Behavior and Philosophy, uma revista voltada à discussão especialmente dos aspectos filosóficos do behaviorismo radical, iniciaria sua vei- culação a partir de 1972. The Behavior Analyst e Behaviorists for Social Action são publicadas desde 1978; e The Analysis ofVerbal Behaviortem seu primeiro volume em 1982.

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Disseminação do Conhecimento em Análise do Comportamento Produzido... ■ 105

Eles tinham consultado psicólogos e pesquisadores como Blough, Boren, Brady, Schlosberg, Sidman e Skinner entre outros.

E estavam tomados de entusiasmo e ávidos para tirar proveito de todas as coisas que haviam aprendido, (p. 6-7)

A vinda de Keller foi um marco para alterar o rumo do ensino de Psicologia no Brasil e dar início à construção da história da análise do comportamento em um novo país; neste momento e nos que se seguiram, entretanto, não tivemos apenas um papel de aprendizes. Condições especiais advindas da década anterior*, ape­sar do momento conturbado do país**, parecem ter sido favoráveis à abertura de novas possibilidades de pesquisa e de novas experiências de ensino. Nesse con­texto, foi possível a Keller propor, construir e testar sua nova tecnologia, o PSI.

Em um relato que chamou de “História do PSI”, Keller (1974) descreve o im­portante papel dos brasileiros na construção dessa tecnologia de ensino:

O plano de ensino... (PSI) teve seu começo em uma noite no final de março de 1963, em frente à lareira em minha casa, em Englewood, Nova Jersey. Ele veio ao final de um longo brainstorming, no qual quatro psicólogos

tomaram parte: RodolphoAzzi e Carolina Matuscelli Bori, então na Universidade de São Paulo, Brasil; J. Gilmour Sherman e eu, então professor

na Universidade de Columbia, (p. 6)

Certamente as condições em que foi elaborado o projeto da Universidade de Brasília, no Brasil, durante os anos de 1960 permitiram propor um curso tão ino­vador. As palavras de Sherman, em uma apresentação na American Educational Research Association, descrevem essa situação:

Dois aspectos da situação de Brasília forneceram uma oportunidade única para um novo olhar quanto aos nossos hábitos normais de ensinar.

Primeiro, nenhum limite econômico restringia nossos pensamentos, e dinheiro estava disponível em grande quantidade. Segundo, a concepção

da nova universidade era radicalmente diferente das instituições tradicionais da América Latina, todas as regras tinham sido já quebradas.

Nenhuma regra universitária estabelecida existiu para limitar nossos procedimentos. O reitor da universidade deixou muito claro que estávamos

livres, de fato encorajou-nos afazer o que queríamos, a ser tão ousados, radicais e experimentais quanto desejássemos. Um desafio incomum, sem

dúvida. (Sherman, 1967, citado por Guilhardi, 1976)

* Para exemplo, cabe lembrar o projeto dos Centros Educacionais de Pesquisa em Educação de Anísio Teixeira nos anos 1950. Em 1961, ao ser eleito, Jânio Quadros encomendou ao Centro Brasileiro (havia ainda mais quatro Centros Regionais) um Plano Nacional de Educação, que Anísio Teixeira elaborara com ajuda de Darcy Ribeiro.** Em sua primeira visita ao Brasil, Keller “assiste" à renúncia do Presidente Jânio Quadros, depois de apenas seis a sete meses no governo, insinuando para isso razões políticas. É substituído pelo vice-presi­dente, João Goulart, que desagrada diretamente às classes dirigentes do país com seu projeto de “refor­mas básicas”, visando à proposição de uma “Lei de remessa de lucros”. Em sua segunda visita, Keller che­ga ao Brasil nos dias do golpe que implantou no país uma ditadura militar que durou mais de 20 anos.

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O ensino de psicologia em Brasília foi planejado para ser de orientação operante e experimental, adotar “um procedimento que combina fatores de Psicologia 1 e 2 (primeiro curso [de Análise Experimental do Comportamento] da Columbia) com o curso Ciência Natural de B. F. Skinner, em Harvard*, e o curso Tecnologia Compor­tamental de C. B. Ferster...”. Nas palavras de Keller, “o curso promete ser o mais estimulante e o mais radical jamais dado em um ambiente universitário” (Keller,1971, citado por Guilhardi, 1976).

Mas, o que foi um sonho teve curta duração. A chegada de Keller em 2 de março de 1964 completava as condições postas para início das atividades do novo depar­tamento. Professores e estudantes de várias localidades do país tinham sido convidados a participar do novo curso ou nele completar sua formação, enquanto trabalhavam como monitores. Guilhardi (1976) refere-se aos professores Carolina Bori, Rodolfo Azzi, Isaias Pessotti, Gil Sherman e Fred Keller e aos alunos Mario Guidi, João Cláudio Todorov, Luís Otávio Seixas Queiroz, Rachel Kerbauy, Luís Oli­veira, Herma Drachenberg (então Bauermeister). Conseqüência direta do golpe militar, Darcy Ribeiro (Ministro da Educação de Goulart) é exilado e a UnB ganha um interventor, que propõe o início do curso para 13 de maio. Em 31 de julho, Keller parte do Brasil, em meio a muitas dificuldades, num período extremamente con­turbado de prisões de estudantes e professores** e muito desconforto entre os professores americanos e brasileiros, passeatas e ameaças de greve.

Maria Amélia Matos (1996) destaca o que pode ser chamado de um resultado da experiência de Brasília: “a proposta de Brasília resultou, nos Estados Unidos, no PSI- The Personalized System of Instruction... e, no Brasil, na Análise de Con­tingências em Programação de Ensino” (p. 110).

Keller (1987) assim se refere ao que ocorreu a partir da experiência de Brasília:

O que aconteceu com respeito ao sistema educativo que estava planejado para a UnB? É difícil responder.... Dona Carolina

tornou-se uma ponta de lança de um movimento educacionalna América Latina... (p. 205)

* Skinner (1983) descreve esses cursos em sua autobiografia. No curso de Keller e Schoenfeld, na Colum­bia, “cada estudante tinha seu próprio rato e sua própria caixa e conduziam experimentos que abarca­vam condicionamento e extinção, discriminação, punição e esquiva”. Skinner ressalta o que caracteriza como “a extraordinária descoberta de colocar os estudantes em contato direto com o comportamento sob condições controladas” (p. 28-29). Ciência Natural, anteriormente chamado Psicologia 7 ou Com­portamento Humano, leva Skinner a escrever Ciência e Comportamento Humano (1953). Psicologia 7 é assim apresentado, segundo Skinner (1983), no catálogo da Universidade: “[O curso pretende fazer uma] revisão crítica de teorias do comportamento humano subjacentes às filosofias atuais de governo, educação, religião, arte e terapia e um levantamento geral do conhecimento científico relevante, com ênfase na predição e controle práticos do comportamento” (p. 15). Segundo Skinner (1983), Ciências Naturais “era um título muito mais apropriado [que Psicologia]. Eu não havia dado a meus alunos uma visão geral da psicologia; eu havia ensinado um tema muito diferente” (p. 23).** O processo todo durou ainda mais de um ano. Em 19 de outubro de 1965, Rodolpho Azzi será ex­pulso junto com outros dez professores, segundo o então reitor - ainda interventor - “para o bem da normalidade da vida universitária” (Salmeron, 1999).

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Análises do que ocorre a partir de então destacam que a Análise do Comporta­mento se expandiu*. Com a saída em bloco dos professores brasileiros de Psicologia da UnB e sua dispersão pelo país - a maioria voltando a suas cidades e instituições de origem, tem início a expansão e difusão da abordagem no Brasil.

Evidências de uma ExpansãoEsta expansão pode ser caracterizada de muitas maneiras: as traduções realizadas, as organizações de analistas do comportamento que aqui foram criadas, os cursos de graduação e pós-graduação que se estabeleceram com orientação em análise do comportamento, os núcleos de pesquisa com ênfase nessa abordagem que se cons­tituíram e hoje se expandem, as publicações dessa comunidade, entre outros. Uma análise histórica desse processo tem sido conduzida em diversos estudos voltados buscar fontes e documentos para uma história da análise do comportamento no Brasil**. Guedes et al. (2006) explicitam a perspectiva desses estudos.

Contrariando a ideia de institucionalização apenas como burocratização e conservação, o termo foi assumido com a ideia de afirmação de movimentos de algum modo bem sucedidos, por sua

vez ponto de partida para novos movimentos que, como os anteriores, apenas a história subsequente permite analisar, (p. 17)

Neste capítulo, apresentamos parte desse trabalho de investigação. Buscamos caracterizar aspectos da expansão da análise do comportamento no Brasil nos seus quase 50 anos de história por meio de análise de publicações dessa comunidade.

Destacamos para análise artigos em periódicos*** nacionais publicados entre teses e dissertações em análise do comportamento defendidas nos programas de pós-graduação brasileiros, tendo como limites os anos de 1961 e 2007.

* A expansão que ocorre no Brasil também se dá em outros países, em especial nos Estados Unidos. Michael (1980) descreve o entusiasmo dos primeiros behavioristas americanos e avalia as conseqüên­cias da expansão norte-americana da Análise do Comportamento. São inúmeras as caracterizações, nos Estados Unidos, desse crescimento, as avaliações propostas e os encaminhamentos daí gerados (sobre a difusão da análise do comportamento, ver Baer, 1981; Hayes, Rincover e Solnick,1980).** Estes estudos são conduzidos, com apoio de estudantes, na disciplina “Pesquisa Supervisionada” do Programa de Estudos Pós-graduados em Psicologia Experimental: Análise do Comportamento da Pon­tifícia Universidade Católica de São Paulo. Relatórios iniciais já foram publicados. Analisam-se a produ­ção de teses e dissertações defendidas no Brasil (Micheletto, Guedes, Maestrello, Souza, Perrroni, Silva, Medeiros, Galindo, Sales, Echague, Sério, 2004; Guedes, Silva, Queiroz, Rosenthal, Leite, Klukiewcz, Pe­reira, Micheletto, 2005), a difusão do ensino e da aplicação do conhecimento na área (Guedes, Queiroz, Campos, Fonai, Silva, Sampaio, Pereira, Vedova, Araújo, Guimarães, Pinto, 2006) e sua institucionaliza­ção no Brasil (Guedes, Guimarães, Queiroz, 2007; Pereira, Guedes, Guimarães, 2007; Koebe, 2007).*** A análise de periódicos importantes na área já deu origem a alguns artigos sobre a história e as tendências da produção científica na Análise do Comportamento como um todo ou em determinadas subáreas de estudo (Dougherty, 1994; Dymond e Critchfield, 2001; Northup, Vollmer e Serrett, 1995; Saville, Epting e Buskist, 2002).

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MétodoFontesForam fontes deste estudo periódicos nacionais que publicam artigos de Psicologia de 1961 a 2007 e teses e dissertações em Análise do Comportamento produzidas no Brasil de 1968 a 2007.

Seleção das FontesPara localização dos artigos em análise do comportamento, nove periódicos foram consultados.

• Quatro específicos à área:- Modificação do Comportamento: revista anual da associação de mesmo

nome, publicada pela Hucitec em 1976 e 1977; total = dois números.- Cadernos de Análise do Comportamento: revista iniciada em 1981, com pro­

jeto editorial alterado “para tornar a revista da Associação de Modificação do Comportamento (ACM) mais ágil”; teve seis números publicados ainda pela AMC antes da criação da Associação Brasileira de Análise do Comportamento, que publicou dois números, mas foi desativada em 1986; total=oito números.

- Revista Brasileira de Terapia eMedicina Comportamental e Cognitiva (RBTCC): revista da Associação Brasileira de Psicoterapia e Medicina Comportamental (ABPMC), iniciada em 1999; total = 17 números publicados até 2007.

- Revista Brasileira de Análise do Comportamento (REBAC - Brasília), ini­ciada em 2005; total = seis números publicados até 2007.

• Quatro revistas gerais em Psicologia:- Psicologia: revista do Instituto de Psicologia da USP, iniciada em 1975 e en­

cerrada 1987; total = 13 números.- Psicologia: Teoria e Pesquisa: revista semestral do Departamento de Psico­

logia da UnB, iniciada em 1985; total = 25 números publicados até 2007.- Temas em Psicologia: revista da Sociedade Brasileira de Psicologia, inicia­

da em 1993; total = 16 números publicados até 2007.- Psicologia USP: revista do Instituto de Psicologia da USP, iniciada em 1990;

total = 20 números publicados até 2007.• Um periódico geral para todas as áreas:

- Ciência e Cultura (1961-2007): revista da Sociedade Brasileira para o Progres­so da Ciência (SBPC); total = todos os números publicados entre 1961 e 2007.

Cabe lembrar que a produção dos analistas do comportamento brasileiros não se restringe apenas a estes periódicos. Entre os periódicos gerais, apenas foram escolhidos os que mais publicaram textos de analistas do comportamento enquan­to não existiam periódicos específicos*.

* Ao atualizar regularmente a base de dados montada para a pesquisa, o Laboratório de Estudos Históricos do Programa de Estudos Pós-graduados em Psicologia Experimental: Análise do Comportamento da Pon­tifícia Universidade Católica de São Paulo pretende estender esta procura a outros periódicos nacionais.

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Disseminação do Conhecimento em Análise do Comportamento Produzido... ■ 109

As teses e dissertações foram selecionadas a partir de várias fontes:

• Sites ou bibliotecas das universidades com cursos de pós-graduação em Aná­lise do Comportamento (USP:1971; UnB:1974; Universidade Federal de São Carlos [UFSCar]:1978; Universidade Federal do Pará [UFPA]:1987; Pontifícia Universidade Católica de São Paulo [PUC-SP]:1999); e de universidades reco­nhecidas por agregar pesquisadores em Análise do Comportamento.

• Banco de teses e dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pes­soal de Nível Superior (CAPES).

• Currículos Lattes de orientadores localizados.

A localização inicial das teses e dissertações, feita a partir da leitura do título e do resumo de teses e dissertações disponíveis nos bancos de dados, permitiu selecionar um primeiro conjunto. O Currículo Lattes dos orientadores até então localizados, foi acessado e, a partir dos títulos das orientações concluídas, outros trabalhos que não apareceram no conjunto inicial eram selecionados. Identificado um título, buscava-se o resumo do trabalho no banco de teses da CAPES. Uma coleta adicional foi realizada: o Currículo Lattes de todos os orientandos dos primeiros orientadores foram também acessados para verificar se tinham orientado teses e dissertações em Análise do Com­portamento. Isto foi feito ainda por três gerações.

Tanto para teses e dissertações como para as publicações em periódicos, a seleção ocorreu a partir de título, palavras-chave, autor e resumo, foram selecionados aqueles trabalhos em que foram identificados conceitos da análise do comportamento.

ProcedimentoAs informações coletadas permitiram construir dois bancos de dados: Banco de Dados de Dissertações e Teses em Análise do Comportamento no Brasil 1968-2007(BDTAC/Br)* (Micheletto, Guedes, Pereira, Silva, 2008) e Banco de Dados de Artigos em Análise do Comportamento no Brasil 1968-2007 (BAAC/Br) (César; Micheletto, 2008)**.

Na construção do banco de dados, além dos dados bibliográficos (autor, ano, volume, páginas inicial e final, título, nome do periódico) para as publicações em periódicos foram destacadas: filiação dos autores, tipo de trabalho, tema/conceito do artigo, resumo. Para as teses e dissertações, foram destacados: ano, instituição, autor, orientador, tipo de trabalho e tema/conceito e resumo.

A partir da leitura dos resumos das publicações que constituem estes bancos de dados foram elaboradas as análises propostas.

As teses e dissertações foram categorizadas quanto ao tipo em: básicos, aplicados, histório-conceituais. Cabe destacar que as teses e dissertações identificadas eram trabalhos de pesquisa. Entretanto os trabalhos publicados em periódicos não se cons­tituíam necessariamente em trabalhos de pesquisa.

* Parte dos dados obtidos para a construção deste banco de dados foi coletada em atividades de pesqui­sa no projeto conduzido na disciplina “Pesquisa Supervisionada”, do Programa de Estudos Pós-gradua­dos em Psicologia Experimental: Análise do Comportamento, entre 2004 e 2005, em que se investigou a institucionalização da Análise do Comportamento no Brasil (Micheletto et al., 2004; Guedes et al., 2005).** Esse banco de dados foi construído inicialmente para elaboração do trabalho de dissertação de César (2002) e, a seguir, completado com publicações entre 2001 e 2007.

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Para a classificação dos trabalhos como os de pesquisa básica foi utilizado o critério proposto por Buskist e Miller (1982): trabalhos que investigavam experimen­talmente processos comportamentais descritos pela Análise do Comportamento, voltados para:

... o estudo das interações dos organismos individuais com o ambiente e das variáveis controladoras dessas interações. Deverão também ter uma

metodologia empírica, experimental ou quase experimental, com sujeitos humanos ou infra-humanos, utilizando uma metodologia específica

desenvolvida na Análise do Comportamento, (p. 137-138)

Dentro dessa classificação foram criadas as seguintes categorias: relação resposta- consequência (estudos que investigam efeitos do reforçamento independente da resposta), observação do comportamento animal, controle de estímulos, controle aversivo, parâmetros do reforço (investigações sobre efeitos sobre o responder de determinados eventos subsequentes, como alimento, correr na roda; efeitos da magni­tude de reforço), comportamento verbal, esquemas de reforço, variabilidade comportamental, operações motivadoras, regras etc.

Foram classificados como aplicados os trabalhos cujo problema investigado respondesse a uma demanda social concreta e cujos resultados estivessem volta­dos a essa demanda (Baer, Wolf e Risley, 1968). Essas pesquisas estavam vinculadas às várias áreas de atuação do analista do comportamento. As intervenções desses trabalhos deveriam se apoiar nos supostos metodológicos e conceituais desen­volvidos no behaviorismo radical e na análise experimental do comportamento. Cinco categorias foram criadas: educação, clínica, saúde, trabalho e outros.

Foram classificados como pesquisa histórico-conceitual os trabalhos que ana­lisavam o desenvolvimento histórico e as bases epistemológicas, metodológicas e conceituais do behaviorismo radical e da análise do comportamento (tanto no ramo experimental como aplicado). Foram criadas categorias a partir das quais os trabalhos foram classificados: behaviorismo radical, análise conceituai, aná­lise da análise do comportamento aplicada, concepções sobre a análise do comportamento, relação do behaviorismo com outras ciências e história da aná­lise do comportamento.

Os artigos localizados nos periódicos analisados foram classificados como trabalhos de pesquisa básica, trabalhos aplicados e trabalhos histórico-conceituais. Especialmente nestes dois últimos foram encontrados, além de relatos de pesquisa, estudos de caso, reflexões sobre a prática clínica, estudos de revisão de procedi­mentos utilizados na análise aplicada, revisão de procedimentos de investigação utilizados em estudo de alguns processos básicos, textos didáticos, análise da contribuição da análise do comportamento em diferentes áreas, relatos sobre a história da análise do comportamento no Brasil e memórias, entre outros. As mesmas categorias utilizadas para classificar os três tipos de pesquisas nas teses e dissertações localizadas (básicas, aplicadas e teórico-conceituais) foram utiliza­das para classificar os três tipos de trabalhos para os artigos publicados nos periódicos analisados (trabalhos de pesquisa básica, trabalhos aplicados e traba­lhos histórico-conceituais).

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Resultados e DiscussãoApós o que foi chamado por Keller de “o fim de um sonho”, inicia-se uma expansão que pode ser identificada em publicações de analistas do comportamento - tanto no que se refere aos estudos produzidos nos programas de pós-graduação, em teses e disser­tações, como no que se refere a artigos em periódicos. Nestes quase 50 anos de história da análise do comportamento no Brasil, estabeleceu-se gradualmente e ampliou-se, ao longo dos anos, uma prática de pesquisa e publicação que se evidencia em mais de mil dissertações e teses defendidas (789 dissertações e 221 teses), nos diversos progra­mas de pós-graduação, e 580 artigos publicados nas revistas analisadas. Nas Figuras 5.1 e 5.2, estão representados, respectivamente, o número de teses e dissertações e o número de artigos publicados em periódicos por ano. Está indicada nas figuras, res­pectivamente, a abertura de programas de mestrado e doutorado em diferentes universidades e o início da publicação das revistas analisadas. Nos dois conjuntos, observa-se um crescimento no número de trabalhos na última década, mas especifi- cidades no crescimento podem ser identificadas nos dois tipos de trabalhos. Justifica-se, portanto, um olhar voltado para cada um desses conjuntos de publicações.

A Reforma Universitária de 1968 instituiu no Brasil o sistema nacional de pós-gra­duação, antes sob decisão direta de cada universidade. Os cursos de pós-graduação se expandem e, em alguns deles, formaram-se núcleos de analistas do comporta­mento. Em 1971, inicia-se na USP o mestrado em Psicologia Experimental em que é defendida a quase totalidade dos 58 trabalhos produzidos na primeira década. Em 1974, é criado o mestrado na UnB. Os colaboradores do primeiro curso de Keller de Análise do Comportamento no país são os primeiros orientadores, com destaque

Figura 5.1 - Número acumulado de teses e dissertações defendidas no Brasil por ano, entre 1968 e 2007. M = mestrado; D = doutorado; PUC-SP = Polifícia Universidade Católica de São Paulo; UEL = Universidade Estadual de Londrina; UFPA = Universidade Federal do Pará; UFSCar = Univer­sidade Federal de São Carlos; UnB = Universidade de Brasília; USP = Universidade de São Paulo.

Teses e Dissertações Defendidas no Brasil

* — Dissertações

Ano

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112 ■ Disseminação do Conhecimento em Análise do Comportamento Produzido..,

Ano

Figura 5.2 - Número acumulado de artigos publicados em periódicos científicos nacionais entre 1961 e 2007. AC = Análise do Comportamento; REBAC = Revista Brasileira de Análise do Comportamento; RBTCC = Revista Brasileira de Terapia e Medicina Comportamental e Cogni­tiva; USP = Universidade de São Paulo.

para Carolina Bori que, na primeira década orienta aproximadamente 60% das teses e dissertações. Maria Amélia Matos, ao voltar de seu doutorado na Universidade de Columbia, assume também grande parte das orientações (22% dos trabalhos desses primeiros dez anos). É Carolina Bori que orienta a primeira tese de doutorado, de­fendida por Isaias Pessoti, em 1969, na USP-Ribeirão Preto (USP-RP). Ambos, junto com Rodolpho Azzi, elaboram o primeiro artigo de pesquisa localizado, publicado na Ciência e Cultura, em 1963 - “Aquisição e extinção de uma discriminação simples em duas espécies de abelhas sociais”.

Nos próximos 20 anos, há um crescimento do número de dissertações, que acom­panha a criação de cursos de pós-graduação, com núcleos de pesquisadores analistas do comportamento: Mestrado em Educação Especial na UFSCar, em 1978, e Mestrado em Psicologia Teoria e Pesquisa do Comportamento da UFPA, em 1987. Os novos orientadores são, em geral, os^rimeiros orientandos das professoras Carolina e Maria Amélia. Entretanto, como pofde ser visto na Figura 5.1, é na década de 1990 que há um grande aumento no número de trabalhos defendidos, especialmente dissertações, resultado da formação, na área, de novos doutores (UnB, a partir de 1987) e a criação de novos mestrados.

As dissertações e teses foram defendidas em 19 instituições de ensino, distribuídas em 13 cidades e 7 estados e orientadas por 87 professores. Como pode ser visto na Figura 5.3, que apresenta as instituições que têm trabalhos defendidos, cursos de pós- graduação em Análise do Comportamento ou com área de formação ou professores titulados na abordagem foram os que mais produziram - USR PUC-SR UnB, UFSCar, UFPA, destacando-se o mais antigo (USP). Entretanto, outros cursos, de outras insti­tuições, acolheram pesquisadores que defenderam suas teses e dissertações em Análise do Comportamento (USP-RR Mackenzie, Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Universidade Católica de Brasília, Universidade Católica de Goiás, Univer­sidade Estadual de Londrina, Universidade Federal de Minas Gerais, Universidade Federal da Paraíba, Universidade Federal do Paraná, Universidade Federal de Santa Catarina, Universidade Estadual Paulista e Universidade Estadual de Campinas).

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Disseminação do Conhecimento em Análise do Comportamento Produzido... ■ 113

o-Instituição

Figura 5.3 - Número de teses e dissertações por instituição. Mack = Universidade Presbiteriana Mackenzie; PUCCamp = Pontifícia Universidade Católica de Campinas; PUC-SP = Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; UCB = Universidade Católica de Brasília; UCG = Universi­dade Católica de Goiás; UEL = Universidade Estadual de Londrina; UFES = Universidade Federal do Espírito Santo; UFG = Universidade Federal de Goiás; UFPA = Universidade Federal do Pará; UFPB = Universidade Federal da Paraíba; UFPR = Universidade Federal do Paraná; UFSC = Uni­versidade Federal de Santa Catarina; UFSCar = Universidade Federal de São Carlos; UnB = Universidade de Brasília; Unesp = Universidade Estadual Paulista; Unicamp = Universidade Estadual de Campinas; Unifesp = Universidade Federal de São Paulo; USP = Universidade de São Paulo; USP-RP = Universidade de São Paulo - Ribeirão Preto.

Indiscutivelmente, quando tomamos apenas aprodução em análise do comportamen­to como parâmetro, pode-se concluir que ocorreu um crescimento da área. Entretanto, o crescimento da publicação de teses e dissertações na abordagem não acompanha o crescimento na Psicologia. A partir da Figura 5.4, que apresenta o número acumulado de teses e dissertações em Análise do Comportamento e em Psicologia, segundo rela­tórios CAPES (2004 a 2006) da área de Psicologia, podem-se comparar as produções.

900 -cn0 800 -

| 700 -

| 600 -

£ 500 -a>« 400 -<D

^ 300 - 2| 200 -1 100-

0 -

— #-------- TAC

DAC

_ _ — T Psi

_ _ _* — D Psi

Ano

Figura 5.4 - Número de teses (T) e dissertações (D) em Psicologia (Psi) e Análise do Comportamento (AC) por ano.

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114 ■ Disseminação do Conhecimento em Análise do Comportamento Produzido...

Há uma variedade de interesses refletidos na diversidade de trabalhos produ­zidos, que se distribuem nas três dimensões da análise do comportamento: a pesquisa básica, a pesquisa aplicada e a pesquisa histórico-conceituai, como pode ser observado na Figura 5.5, que apresenta o número de teses e dissertações clas­sificadas pelo tipo de trabalho por ano.

Acompanhando as características de origem da abordagem, a pesquisa bá­sica, desde os primeiros anos em que foram localizadas teses e dissertações, foi o tipo de pesquisa predominante, com uma produção relativamente constante até meados da década de 1990, quando, acompanhando o crescimento de traba­lhos na abordagem, há um crescimento do número de trabalhos, especialmente na última década.

A pesquisa aplicada, após a primeira década, passa a ser sistematicamente pro­duzida. A partir desse momento, acompanha o crescimento da pesquisa básica por aproximadamente 20 anos, inclusive no crescimento que ocorre a partir de meados da década de 1990. Entretanto, a partir de 2001, a produção desses trabalhos se amplia, passando a ocorrer em maior número e chegando, a partir de 2005, a superar os de pesquisa básica.

A pesquisa histórico-conceitual começa a ser produzida mais tardiamente e em número bem menor que as pesquisas básicas e aplicadas. Esse início tardio, em rela­ção aos outros tipos de pesquisa, não é inesperado. Morris, Tood, Miggley, Schneider e Johnson (1995) consideram que:

A evidência mais clara da maturidade de uma disciplina está na emergência de publicações e pesquisas históricas mais sérias, ou seja, na emergência de

historiografia considerando o desenvolvimento da disciplina como um todo e nas suas subdisciplinas - básica..., aplicada... e conceituai... (p. 196)

Não é, pois, de se estranhar que esse aumento aconteça na medida em que são criados os cursos de doutorado no país. É na década de 1980 que esses trabalhos co­meçam a ser produzidos e ocorre um pequeno crescimento em seu número, também na década seguinte, sendo, a partir de então, produzida sistematicamente.

Ano

Figura 5.5 - Número acumulado de teses e dissertações por tipo de pesquisa de 1969 a 2007.

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Disseminação do Conhecimento em Análise do Comportamento Produzido... ■ 115

Podem-se identificar transformações de interesses dos analistas do compor­tamento no Brasil em cada uma dessas três diferentes dimensões.

Os trabalhos classificados como de pesquisa básica estiveram voltados principal­mente à investigação de controle de estímulo, esquemas de reforço, comportamento verbal e controle aversivo. Entretanto, isto não se deu de forma homogênea ao longo dos anos, como pode ser observado na Figura 5.6 em que está representado o núme­ro acumulado de teses e dissertações em relação às seis categorias de conceitos mais investigados por ano. Processos envolvidos no controle de estímulo e controle aver­sivo compõem o foco de investigações entre 1968 e 1973. Em meados da década de 1970, o número de estudos que investigam esquemas de reforço aumenta e há redu­ção de trabalhos sobre controle aversivo. A partir dos anos 1990, destaca-se um acelerado crescimento na produção de trabalhos sobre controle de estímulos. Esse crescimento dos estudos sobre processos envolvidos no controle de estímulos e em esquemas foi também identificado no Journal of the Experimental Analysis of Behavior (JEAB), por Saville et al (2002) e Dymond e Critfield (2001).

Destaca-se, na última década, ainda que com um número de trabalhos bastante menor que o de controle de estímulos, o crescimento de estudos sobre comportamento verbal e comportamento governado por regras e sobre relações de respostas-conse- quências. Observa-se também, de forma mais clara nos últimos anos, uma distância maior entre os conceitos mais e os menos estudados. Para Saville et al. (2002), que identificam desenvolvimento semelhante no JEAB, isto pode indicar um aumento seletivo de produção de pesquisas em análise do comportamento.

As dissertações e teses classificadas como trabalhos de pesquisa aplicada (ver Fig. 5.5) passam a ser produzidas sistematicamente apenas dez anos após o início da produção de trabalhos de pesquisa básica, e destaca-se em todo o período ana­lisado a produção de trabalhos voltados para educação, como pode ser observado na Figura 5.7.

O grande interesse de investigação nos trabalhos de pesquisa em educação pode estar relacionando ao importante trabalho de Carolina Bori na análise de

140

12001 100 £g 80cs

§ 60 £§ 40

20

0

Ano

Figura 5.6 - Número acumulado de teses e dissertações classificadas como básicas em relação a conceitos abordados.

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116 ■ Disseminação do Conhecimento em Análise do Comportamento Produzido..,

300

'3z50

3cd 150 2

o250

0

Ano

Figura 5.7 - Número acumulado de teses e dissertações classificadas como aplicadas em relação aos temas abordados por ano.

contingências em programação de ensino. Matos (1998) descreve a difusão da proposta de analistas do comportamento para educação:

... o Sistema Individualizado de Ensino tomou-se a maneira tradicional de ensinar nestes cursos e muitos estudos foram realizados por orientandos de Carolina

para investigar aspectos específicos dessa técnica. Docentes de outros cursos, a maioria treinada por ela, passou a empregar esta mesma técnica no ensino de

outras ciências: Física em São Paulo e Recife; Biologia em Salvador e Belo Horizonte; Matemática em São Paulo, Recife e Belo Horizonte; Engenharia e

Arquitetura em São Paulo, Mogi das Cruzes, Recife, Salvador; e, mais recentemente, Informática, em Salvador. Do mesmo modo, professores de

Escolas Técnicas de Segundo e Terceiro Grau em Curitiba, Salvador, Belo Horizonte, Belém, Rio Grande do Norte, e São Paulo adotaram esse método de

ensino, após a passagem de Carolina pelo Cenafor. Várias escolas particulares de primeiro grau, bem como inúmeras instituições para treinamento de crianças especiais também adotaram e continuam usando esse método. Carolina sempre

à frente cuidando para que desvios não ocorressem, para que os princípios fossem entendidos, para que novos desenvolvimentos fossem ousados, (p. 96-97)

Foi, sobretudo, possível localizar na última década analisada os trabalhos de pes­quisa aplicada em outras áreas, especialmente em clínica, que passa a ter um crescimento acelerado semelhante aos de educação, seguido por trabalhos na área de saúde. Northup etal. (1993) identificaram diversificação semelhante nos artigos pu­blicados no Journal of Applied Behavior Analysis nos anos 1980. A análise das dissertações e teses indica que, no Brasil, a partir dos anos 1990, os analistas do com­portamento estenderam seu foco de interesse para outras novas áreas, como esporte, mídia, comportamento de consumo, governo e trânsito.

Nos trabalhos de pesquisa históricos-conceituais, três temas se destacam: a discus­são da análise aplicada do comportamento, a análise de conceitos e a análise da

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Disseminação do Conhecimento em Análise do Comportamento Produzido... ■ 117

Ano

Figura 5.8 - Número acumulado de pesquisas histórico-conceituais nos temas mais freqüentes, por ano. AC = Análise do Comportamento.

filosofia do behaviorismo radical, como pode ser observado na Figura 5.8. A investigação conceituai foi a preocupação dominante nos 30 anos inicias, sendo seguida pela inves­tigação da análise do comportamento aplicada, que a partir de 2001 tem um crescimento muito acelerado em comparação com os outros temas. Destaca-se também, a partir dos anos 1990, um crescimento de trabalhos voltados para análise da filosofia behaviorista radical. Parece possível afirmar que neste tipo de trabalho as próprias di­mensões da análise do comportamento passam a ser o foco de pesquisa - as bases filosóficas, a pesquisa aplicada e os conceitos, como indicam Morris et al (1995).

Publicações em PeriódicosA publicação de analista do comportamento em periódicos nacionais ocorre já em 1962 na revista Ciência e Cultura, com um artigo do próprio Keller - “A reformulação da psicologia moderna” - e, no ano seguinte, como indicado anteriormente, é publi­cado o primeiro relato de pesquisa, de Isaias Pessoti, na mesma revista - “Aquisição e extinção de uma discriminação simples em duas espécies de abelhas sociais”.

As publicações em periódicos passam a ocorrer de forma mais sistemática a partir de 1976, ano em que é criada a primeira revista específica em análise do comportamen­to - Modificação do Comportamento. A partir de então, a criação de novas revistas parece abrir novas possibilidades de publicação e gerar uma prática de publicações sistemática, como mostra a Figura 5.2. Identifica-se uma ampliação no número de publicações quando novas revistas especializadas em análise do comportamento são criadas: a fundação, em 1981, dos Cadernos de Análise do Comportamento (que substi­tuiu a anterior), revistas da Associação de Modificação do Comportamento e, da posterior Associação Brasileira de Modificação do Comportamento; Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva da Associação Brasileira de Psicoterapia e Me­dicina Comportamental, em 1999; e a criação, em 2005, da Revista Brasileira de Análise do Comportamento.

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118 ■ Disseminação do Conhecimento em Análise do Comportamento Produzido..,

Cabe destacar, entretanto, que apesar de haver uma prática sistemática de pu­blicações em periódicos com uma pequena aceleração nos últimos anos, o número de trabalhos publicados nos periódicos analisados é muito menor que o total de teses e dissertações defendidas.

Outra especificidade deve ser apontada quando se consideram as publicações em periódicos: estas, especialmente em alguns dos periódicos analisados, não se restringem a trabalhos de pesquisa. São encontrados, entre as publicações, textos didáticos, relatos de casos clínicos e discussões da prática clínica.

Nas publicações em periódicos inicialmente são veiculados trabalhos de pes­quisa básica, que até 1984 foi o tipo de publicação que ocorreu em maior número, apesar de a publicação dos três tipos de trabalhos ocorrer em número semelhante, como pode ser observado na Figura 5.9. A partir de então, é notável o aumento do número de publicações de trabalhos classificados como histórico-conceituais. Na última década percebe-se uma aceleração da publicação de artigos classificados como aplicados. Os artigos classificados como de pesquisa básica, apesar de terem tido também um aumento do número de publicações na última década, são, no final do período analisado, os menos publicados.

Os artigos classificados como trabalhos de pesquisa básica tiveram, predomi­nantemente, como tema inicial a investigação de comportamento animal. A partir de 1975, houve um aumento do número de publicações das três áreas de investiga­ção: controle de estímulo, controle aversivo e esquemas de reforço, fato que pode ser observado na Figura 5.10, na qual estão representados os conceitos mais inves­tigados nos trabalhos de pesquisa básica publicados nos periódicos analisados. A partir de 1990, há uma intensa publicação de pesquisas que abordam controle de estímulos, tal como ocorreu com teses e dissertações. Novas áreas de investigação passam a ser investigadas pelos analistas do comportamento, nos últimos anos - comportamento verbal e comportamento governado por regras.

Os artigos classificados como trabalhos aplicados foram dominantemente na área de educação, característica marcante desde os primeiros anos. Artigos voltados

Ano

Figura 5.9 - Número acumulado de artigos publicados em periódicos nacionais, entre 1961 e 2007, segundo o tipo de pesquisa.

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Disseminação do Conhecimento em Análise do Comportamento Produzido... ■ 119

50

Ano

Figura 5.10 - Número acumulado de artigos de pesquisa básica em relação aos conceitos abor­dados, publicados em periódicos entre 1961 e 2007.

para clínica, trabalho e saúde são poucos ao longo dos anos, até o final dos anos 1990, como pode ser observado na Figura 5.11, na qual está representado o núme­ro de artigos dos trabalhos aplicados identificados nos periódicos analisados, por ano. Entretanto, observa-se a partir de 1999 uma aceleração na quantidade de publicação de artigos em clínica, que são publicados em número muito maior que todos os outros, a partir de então. Neste período, observa-se um aumento do nú­mero de trabalhos publicados nas áreas de educação e saúde.

Os trabalhos histórico-conceituais tiveram como foco dominante os conceitos da análise do comportamento, como mostra a Figura 5.12, na qual está representado o número acumulado de trabalhos histórico-conceituais em relação aos temas aborda­dos, por ano. O segundo alvo desses artigos foram inicialmente, o behaviorismo radica] e a análise do trabalho aplicado do analista do comportamento. Há, entretanto,

Ano

Figura 5.11 - Número acumulado de trabalhos aplicados classificados em áreas, publicados em periódicos entre 1961 e 2007.

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120 ■ Disseminação do Conhecimento em Análise do Comportamento Produzido..,

'32

9 0 -j 80-

70-

60

50-1

40

30

20- 10-

- Conceito

- Behaviorismo radical

- Behaviorismo com outras ciências

-Análise aplicada

- História

Ano

Figura 5.12 - Número acumulado de pesquisas hitórico-conceituais em relação aos temas abor­dados por ano.

a partir de 1995, um aumento do número de trabalhos classificados como história, muitos deles eram trabalhos que passaram a descrever a história da análise do com­portamento no Brasil e a descrever o papel dos seus principais pensadores.

A descrição do conjunto de informações sobre as publicações em periódicos e a produção de teses e dissertações em análise do comportamento no Brasil pode nos dar algumas evidências da expansão dessa abordagem. O conjunto de traba­lhos localizados, certamente não de forma exaustiva, deixa clara a propagação resultante do trabalho dos primeiros analistas do comportamento de nosso país.

A história da análise do comportamento no Brasil tem marcas próprias. Ela foi resultado do trabalho de um conjunto de analistas do comportamento que, usando a expressão de Jack Michael (1980) ao falar dos primeiros analistas do comporta­mento nos Estados Unidos, eram pessoas comprometidas com a visão de mundo do behaviorismo radical; no caso do Brasil, graças ao esforço inicial de um de nossos professores, Fred Keller, disposto a difundir essa visão de mundo.

A efervescência, cultural e política, de nosso país criou espaço para que aqui se constituíssem condições especiais, talvez inigualáveis, para que uma proposta revolucionária de educação pudesse ser viabilizada. Keller descreve a interrupção da proposta como o fim de um sonho. Cabe talvez delimitar o que se encerrou com o fim da experiência da UnB. Não poderíamos caracterizar o desenvolvimento que ocorreu após tal experiência como sendo a realização do projeto de Brasília - a proposta de implementar uma alternativa educacional inovadora que se expan­diria para outras áreas do conhecimento.

O fim do projeto, do sonho, certamente, não impediu a expansão da análise do comportamento no Brasil. Nossa comunidade é numerosa e está em expansão, são evidências disso o número de inscritos no Encontro da Association for Behavior Analysis - International (ABA) que ocorreu em nosso país, o número de encontros e jornadas que se espalham pelo Brasil, a expansão dos cursos de pós-graduação com áreas de concentração em Análise do Comportamento nos últimos anos, assim como o crescente número de trabalhos localizados neste estudo, tanto de

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Disseminação do Conhecimento em Análise do Comportamento Produzido... ■ 121

teses e dissertações como publicações em periódicos. Pode-se dizer que os ana­listas do comportamento no Brasil não somente participaram da produção de condições especiais para uma nova proposta, como também hoje participam da produção do conhecimento dessa abordagem nas várias dimensões que a cons­tituem - na produção de pesquisa básica e aplicada, na extensão desses conhecimentos para subsidiar a atuação, assim como na reflexão conceituai sobre esse conhecimento e da prática dele decorrente. Se foi possível identificar uma preocupação marcante com a educação, possivelmente pela influência dos pri­meiros analistas, em especial da professora Carolina que cria marcas próprias na proposta de ensino de análise de contingências, hoje questões predominantes de investigação parecem se aproximar das tendências que ocorrem com a análise do comportamento em outros países. Isto pode ser identificado nas pesquisas básicas com ênfase em controle de estímulos nos últimos anos, na diversificação de temas na pesquisa aplicada ou no desenvolvimento de trabalhos conceituais.

Caberiam agora novos níveis de análises dos dados obtidos. Por exemplo, a análise dos trabalhos localizados nos periódicos, especialmente os classificados como aplicado e como histórico conceituais, tomando como base quatro dimen­sões da análise do comportamento - análise experimental do comportamento, análise aplicada do comportamento, análise conceituai do comportamento e prestação de serviços - analisadas neste livro por Tourinho e Sério. Tal análise poderia esclarecer a diferença do número e das características dos trabalhos loca­lizados classificados como histórico-conceituais nos periódicos e nas teses e dissertações. Estas e outras questões que abordam outras evidências da institu­cionalização da análise do comportamento no país estão sendo investigadas e serão objeto de próximas publicações.

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CAPÍTULO

Abordagem Analítico-comportamental

do Desenvolvimento

L a é r c ia A b r e u Va s c o n c e l o s A n a R ita C o u t in h o X a v ie r N aves R a q u e l R a m o s Áv il a

O termo desenvolvimento é utilizado com diferentes conota­ções por pesquisadores de diversas áreas do conhecimento científico (por exemplo, Silva, 2000) e pelo público leigo. Um dos grandes desafios na Psicologia, portanto, é promo­ver distinções claras entre as linguagens técnica e cotidiana, tanto ao se referir ao seu objeto de estudo - as interações organismo-ambiente (Todorov, 1989) - como ao se referir a termos e conceitos diversos relacionados a ele (por exem­plo, Andronis, 2004; Matos, 1997; Roche e Barnes, 1997). O objetivo central deste capítulo é discutir a relevância da inclusão do processo de desenvolvimento humano em inves­tigações conceituais, empíricas e aplicadas sob o enfoque da análise do comportamento, ciência proposta por B. F. Skinner (1904-1990). A primeira seção deste capítulo será dedicada a explicitar como o conceito de desenvolvimento é definido por analistas do comportamento, o que não requer a formulação de uma teoria do desenvolvimento específica (Bijou, 1995; Bijou e Baer, 1978; Bijou e Ribes, 1996; Schlinger,1995). Na segunda seção, identificaremos sucintamente outras interpretações ou definições dadas ao conceito, particularmente na Medicina e na Educação, e as possíveis

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implicações destas definições para a prática de profissionais que atuam nessas áreas. Na seção seguinte, apontaremos direções em comum enfatizadas em estudos recentes embasados na Análise do Comportamento e na Ciência do Desenvolvimen­to. Tais direções podem ser de difícil identificação em razão da escassez de trabalhos sistemáticos acerca do desenvolvimento sob enfoque analítico-compor­tamental ou mesmo à falta de integração entre estudos voltados para esse tema (ver Brazelton e Greenspan, 2000/2002; Lisboa, 2003,2006; Rossetti-Ferreira, 2006). Finalizaremos este capítulo sinalizando possíveis contribuições conceituais e metodológicas da Análise do Comportamento para estudos acerca do desenvol­vimento humano.

Conceito de Desenvolvimento na Análise do ComportamentoO termo desenvolvimento é utilizado neste capítulo de forma a se restringir priori­tariamente ao campo da Psicologia e, portanto, para fazer referência ao desenvolvimento humano, psicológico ou comportamental, os quais serão tratados como termos equivalentes. Especificamente sob a perspectiva analítico-comportamental, o desenvolvimento é explicado a partir de mudanças em interações dinâmicas entre um indivíduo ativo e o ambiente, sendo este último constituído por diferentes condições de estimulação que adquirem uma função para o comportamento (Bijou, 1989,1995; Bijou e Baer, 1978; Bijou e Ribes, 1996; Baer e Rosales-Ruiz, 2003; Rosales-Ruiz e Baer, 1997; Schlinger, 1995). Estas interações são interdependentes e contínuas, resultando em influências bidirecionais entre o comportamento do indivíduo e o ambiente, físico ou social. Assim como, em determinado contexto, a ação do organismo altera aspectos do ambiente, estes, por sua vez, retroagem sobre as ações do organismo (Skinner, 1957/1978).

Desenvolvimento é então um processo de individualização, em que mudanças nas interações organismo-ambiente podem ser progressivas ou regressivas, o que não resulta em uma única direção que levará necessariamente ao aprimoramento ou a uma maior complexidade do repertório comportamental (Rosales-Ruiz e Baer,1996). O produto final, relacionado diretamente à história ambiental, é o desenvol­vimento único, idiossincrático de um indivíduo particular, o que poderá, consequentemente, influenciar a evolução da cultura na qual ele está inserido (Biglan et al., 1997; Bijou, 1995; Demetriou e Raftopoulos, 2000*; Novak, 1996). Assim, o analista do comportamento enfoca tanto os “princípios e processos responsáveis pelas mudanças observadas no comportamento, como também as diferentes dire­ções, velocidades e arranjos de contingências” (Gewirtz e Pelaez-Nogueras, 1996, p. 19) produzidos pelas interações organismo-ambiente. Desta forma, para uma maior compreensão do desenvolvimento é necessário considerar o comportamento

* Revisão do livro Rethinking Innateness: a connectionist perspective on development (Parisi e Pluncket, 1996).

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humano como multideterminado, sob a ação de três níveis de variação e seleção, como mostra Skinner em 1981: filogenético (características genéticas presentes em uma determinada espécie, transmitidas de uma geração a outra), ontogenético (história de aprendizagem de um indivíduo particular) e cultural (transmissão de práticas culturais ao longo de diferentes gerações). Na explicação da aquisição, ou mesmo da manutenção, de determinados comportamentos no repertório* do indiví­duo ao longo de seu desenvolvimento, torna-se uma tarefa difícil o estabelecimento de uma fronteira precisa entre o que é inato e o que é somente produto de aprendi­zagem - o nature e nurture (por exemplo, Cohn, 2005). Esforços em direção à atribuição inequívoca de pesos explicativos, maiores ou menores, a cada uma des­sas duas fontes de controle têm sido abandonados diante da complexidade indubitável do comportamento humano (por exemplo, Shanahan, Sulloway e Hofer, 2000; Pereira, 2001). A preparação filogenética (relacionada à história da espécie) não é rígida, uma vez que resulta em variados padrões de comportamento intra e interindivíduos, não havendo assim, uma única topografia comportamental pre­determinada (Bijou, 1995; Carvalho Neto e Tourinho, 1999). A base biológica do comportamento pode ser definida como uma base “aberta” na medida em que, ao mesmo tempo em que produz sensibilidades típicas da espécie humana (por exem­plo, suscetibilidade do comportamento a estímulos reforçadores), também se torna ocasião para que a aprendizagem ocorra e assim possibilita variabilidade compor­tamental (Carvalho Neto e Tourinho, 1999; Tourinho e Carvalho Neto, 2004). Por exemplo, o comportamento de sugar o seio da mãe possui base biológica, mas a interação mãe-bebê durante a amamentação pode promover variabilidade nas funções e topografias deste comportamento.

A análise do comportamento é um sistema explicativo suficientemente abrangen­te e refinado para abarcar a multideterminação e complexidade do comportamento e, desta forma, não defende explicações puramente ambientais ou puramente ge­néticas (Ades, 1986; Tourinho e Carvalho Neto, 2004). Entretanto, adota um recorte analítico próprio, assim como ocorre em qualquer campo do conhecimento, sem necessariamente descartar as possíveis contribuições advindas de áreas que enfocam aspectos diferentes do comportamento humano. Determinadas áreas de estudo que enfatizam o funcionamento de partes específicas do organismo (por exemplo, cé­rebro) podem privilegiar a análise de aspectos anátomo-fisiológicos, o que não significa que neguem a influência de fatores contextuais sobre os mesmos (Landei- ra-Fernandez e Cruz, 1998; Pereira, 2001). Já na análise do comportamento, destaque é dado às contingências comportamentais, embora considere também as bases biológicas do comportamento. As explicações biológicas, portanto, complementam, mas não substituem as explicações comportamentais (Cavalcante, 1999; Tourinho, Teixeira e Maciel, 2000; Roche e Barnes, 1997).

A idiossincrasia do desenvolvimento humano é representada pela integração de aspectos biológicos e comportamentais, sendo o primeiro referente à anatomia e fisiologia do organismo, enquanto o segundo refere-se a suas interações com

* O termo repertório (comportamental) refere-se a comportamentos que um organismo pode emitir, pois existe em uma frequência diferente de zero (Catania, 1998/1999; Teixeira Júnior e Souza, 2006).

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pessoas, objetos e eventos (Bijou, 1995). Porém, mesmo que o analista do com­portamento se dedique a compreender determinados processos neuroquímicos, é preciso que ele recupere a história ambiental ou de aprendizagem do indivíduo. Uma vez que tais processos ou quaisquer variáveis internas ao organismo (por exemplo, traços de personalidade, processamento cognitivo) não são tratados como variáveis independentes (as quais controlam diferentes padrões de com­portamentos e são passíveis de manipulação ou modificação direta) na explicação do comportamento humano, estes processos podem ser considerados apenas com o objetivo de indicarem possíveis variáveis relevantes.

O alvo de análise do analista do comportamento, portanto, envolve a exposição a matrizes de contingências*, na tentativa de explicar também processos neuro­químicos, sem, no entanto, adotar estratégias reducionistas, nas quais uma ciência utiliza teorias de outra para compreender seu objeto de estudo. Uma das características importantes do recorte analítico-comportamental consiste em considerar a pluralidade de possibilidades de análises funcionais, envolvendo um conjunto de variáveis independentes, dependentes e de controle - aquelas man­tidas constantes ao se buscar as interações entre determinados fatores ambientais e comportamentais (por exemplo, Cavalcante, 1999; Kantowitz, Roediger e Elmes, 2006; Sturmey, 1996; Watson e Gresham, 1998).

(...) Cada ação psicológica desempenhada por uma pessoa é ao mesmo tempo, uma ação biológica. Assim, alcançar, agarrar e

colocar na boca um chocalho é para um bebê uma ação psicológica que pode ser analisada em termos dos contatos passados com chocalhos,

ou com objetos similares, e a presente situação que ele se encontra. Esta simples interação com o chocalho é ao mesmo tempo uma ação

biológica que pode ser analisada em termos dos movimentos dos músculos estriados do braço e do funcionamento dos olhos e do sistema nervoso. (Bijou, 1995, p. 29, traduzido pelas autoras)

Vale ressaltar que, além da filogenia, a cultura, como o terceiro nível de varia­ção e seleção, também contribui de forma significativa para uma explicação mais completa do desenvolvimento. A evolução de práticas culturais, envolvendo dife­rentes agentes sociais, acrescentará importantes informações na explicação de uma ação psicológica que pode ser sempre considerada uma ação biológica (por exemplo, Ariès, 1973/1981; Laraia, 1986/2007; Postman, 1982/1999; Todorov, Mar- tone e Moreira, 2005).

* “Matriz de contingências” refere-se à interação de várias contingências tríplices. O comportamento de interesse é o resultado dessa interação, a partir de uma análise de custo-benefício entre elas. Cada con­tingência da matriz exercerá um controle maior ou menor do comportamento, em razão das alternati­vas disponíveis (entende-se como alternativas aquelas contingências capazes de prover conseqüências críticas para o indivíduo). Cada uma das contingências deve ser analisada considerando as variáveis-saté- lite envolvidas no seu estabelecimento e manutenção, tais como operações estabelecedoras, esquemas de reforço, controle abstracional ou instrucional, história, entre outras (ver Goldiamond, em Andronis, 2004; Gimenes, Layng e Andronis, 2003; Gimenes, Andronis e Layng, 2005).

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Implicações da Perspectiva Analítico-comportamental acerca do DesenvolvimentoO conceito de desenvolvimento adotado pelo psicólogo (e por quaisquer outros profissionais), seja qual for o referencial teórico-filosófico, influencia diretamente a seleção de métodos e medidas a serem utilizados por ele, seja na programação de pesquisas básicas e aplicadas, seja na implementação de tecnologias. Assim, a definição de desenvolvimento adotada pelos analistas do comportamento tem implicações relevantes para a atuação dos mesmos, nos mais diversos contextos.

Em primeiro lugar, tal conceito de desenvolvimento influencia diretamente a forma como os comportamentos serão definidos e mensurados (por exemplo, comportamentos são prioritariamente definidos a partir de sua função e não topografia), não sendo possível afirmar que um método específico é o mais ade­quado para a coleta de informações acerca do desenvolvimento do indivíduo, pois isto depende dos objetivos da investigação ou intervenção planejada. Há, portanto, uma variedade considerável de métodos quantitativos e qualitativos disponíveis ao psicólogo, tais como observação livre (por exemplo, Danna e Ma­tos, 1996; Dessen e Murta, 1997), entrevistas de diferentes tipos (por exemplo, estruturada, semiestruturada, livre), questionários (por exemplo, Questionário Construcional - Gimenes, Andronis e Layng, 2005), escalas e testes padroniza­dos (por exemplo, Sistema Multimídia de Habilidades Sociais para Crianças -D el Prette e Del Prette, 2005). Vale ressaltar que o analista do comportamen­to poderá produzir conhecimento ao utilizar análises e revisões conceituais e observações sistemáticas do comportamento, além da pesquisa experimental com destaque para as análises de dados individuais por meio de inspeção visual e análise estatística descritiva. Cada sujeito é único de acordo com sua história de reforço, sua fisiologia e a cultura no qual está inserido. Assim, a análise do comportamento propõe o estudo dos efeitos de cada variável ambien­tal sobre o comportamento de cada indivíduo particular (Skinner, 1953/1981). Utiliza-se, portanto, o delineamento experimental do sujeito como seu próprio controle no estudo das relações funcionais (Baron e Perone, 1998; Matos, 1990; Todorov, 1982). Em segundo lugar, o conceito de desenvolvimento que orientou a avaliação inicial dos comportamentos do indivíduo determina os tipos de análises ou interpretações a serem propostas pelo profissional. Em terceiro lugar, o conceito de desenvolvimento também orienta as práticas adotadas pelo pro­fissional, de modo que as interpretações feitas por ele acerca do desenvolvimento têm significativo impacto em diferentes áreas da ciência como, por exemplo, as áreas médicas e educacionais.

Ao enfatizar especificamente determinantes biológicos do comportamento, as abordagens médicas do desenvolvimento humano mostram uma estreita rela­ção com a variável etária. Com a finalidade de conferir clareza e objetividade ao conceito (Silva, 2000), o desenvolvimento é relacionado a diferentes idades e cri­térios de crescimento físico, como altura e peso. Dessa maneira, os termos desenvolvimento e crescimento têm sido amplamente utilizados como sinônimos nessas abordagens.

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Desenvolvimento físico, ou crescimento, é o componente [do processo de desenvolvimento do ser humano] que corresponde ao aumento do

tamanho dos órgãos e, consequentemente, do organismo como um todo, que resulta nofenótipo do indivíduo adulto. Decorrente da multiplicação

(hiperplasia) e do aumento de tamanho (hipertrofia) das células, o desenvolvimento físico é um processo finito, pois, embora essas

modificações celulares persistam mesmo após os 20 anos, seu papel após esta idade é a reparação ou a reposição do desgaste

natural que os órgãos sofrem, sem que isto resulte no efetivo aumento das dimensões corpóreas. (Leone, 1994, p. 33)

Entretanto, o desenvolvimento físico pode ser contínuo no transcorrer do perío­do de vida do indivíduo se considerar as adaptações orgânicas dirigidas à reparação e reposição do desgaste natural dos órgãos. Pascual-Leone, Amedi, Fregni e Merabet (2005) destacam também o papel fundamental da plasticidade neural do sistema nervoso no transcorrer da vida do indivíduo produzindo uma reorganização do sistema que se reflete nos níveis anatômico, fisiológico e comportamental.

Apesar da idade do indivíduo ser tratada como um ponto de partida em inter­pretações analítico-comportamentais são as contínuas exigências estabelecidas pelo ambiente físico e social que proporcionam diferentes interações envolvendo o indivíduo, o que pode produzir desenvolvimento comportamental (Bijou, 1995). Vale ressaltar que, neste sentido, o desenvolvimento não pode ser classificado apenas do ponto de vista quantitativo, isto é, em termos da aquisição de novos comportamentos, pois também envolve mudanças qualitativas. Novos arranjos poderão ser observados entre comportamentos já adquiridos, a partir de um re­pertório comportamental pré-existente (Bijou e Ribes, 1996). Assim, uma criança poderá, por exemplo, desenvolver novas análises funcionais diante de um antigo problema, envolvendo padrões de comportamentos já adquiridos, porém recon- figurados. E, ainda, pelo processo de generalização de estímulos poderá emitir um determinado comportamento em outras condições de estímulos, para além do contexto de treino (ver Gadelha, 2003; Gadelha e Vasconcelos, 2005).

Na área de saúde mental, um dos sistemas de classificação mais utilizado pelos profissionais é o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, quarta edição, texto revisado (DSM-IV-TR™, American Psychiatric Association [APA], 2000/2003)*. O DSM-IV-TR™ é apresentado como um instrumento ateórico com diversos objetivos dentre os quais facilitar a comunicação interdisciplinar (por exemplo, Kazdin, 1983) e favorecer pesquisas. Portanto, ao utilizar o manual, cabe ao usuário aplicar a teoria psicológica ou do desenvolvimento por ele adotada, de modo a realizar adequada co­leta e análise de dados, assim como planejar pesquisas e intervenções.

* O DSM-IV-TR™ deve ser considerado como um instrumento auxiliar no diagnóstico médico, facili­tando a comunicação e análises estatísticas que, quando bem interpretadas, podem contribuir para o planejamento de intervenções efetivas. Assim, não se trata de um manual para diagnóstico psi­quiátrico, mas um complemento do diagnóstico. Entre as limitações do DSM-IV-TR™ estão a exces­siva fragmentação dos quadros clínicos, além de suas sobreposições (S. M. Burnett, especialista em Reabilitação Infantil e Pediatria do Desenvolvimento - comunicação pessoal em 21 de julho de 2008).

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A adoção, muitas vezes indiscriminada, do DSM-IV-TR para condução de ava­liações psiquiátricas de indivíduos com “comportamentos atípicos”, associada a um conceito de desenvolvimento pautado em padrões de normalidade e patologia, pode resultar em diagnósticos com repercussões negativas para a vida do indivíduo. Tais repercussões, principalmente voltadas para o sistema familiar, poderiam ser evitadas ou minimizadas caso o profissional desenvolvesse uma avaliação mais ampla, que fosse além da classificação sindrômica de padrões comportamentais. Em uma análise da semiologia sindrômica é necessário considerar que “o sintoma pode se tornar não somente produto de algo sentido, mas também de algo pen­sado e, às vezes, até produto de discussão com outrem.” (Martins, 2003, p. 22). Especialmente a partir dos anos 1990, “crianças e adolescentes têm sido tratados por transtornos psiquiátricos, quando, na verdade, têm um problema psicológico- ou nem isso” (Segatto, Padilla e Frutuoso, 2006, p. 111). Ademais, muitas avaliações psiquiátricas ou mesmo psicológicas têm sido questionados pelos profissionais da saúde e da educação devido às altas taxas de comorbidade no sistema diagnós­tico que desafiam a credibilidade na nosologia (por exemplo, Hayes, Nelson e Jarrett, 1987; Segatto, Padilla e Frutuoso, 2006; Vasconcelos, Ávila e Leite, subme­tido). Entre os potenciais riscos para as crianças e jovens diagnosticados está o uso prolongado de psicofármacos, cujos efeitos adversos e cumulativos, em médio e longo prazo, não são completamente conhecidos. Além disso, predições equivo­cadas e simplistas acerca dos comportamentos desses indivíduos controlam as análises feitas por familiares e educadores sobre as “potencialidades de aprendi­zagem”, frequentemente subestimando-as.

Várias expectativas, crenças e teorias psicológicas têm, por isso, um forte poder auto-realizador, ajudando a construir competências e deficiências.

Não se fala com quem se julga surdo, não se ensina a quem não se julga capaz de aprender, recolhe-se em casa, isolada, a criança com paralisia

cerebral que se julga incapaz de ir à escola. Concretizam-se assim, prognósticos feitos anteriormente. (Rossetti-Ferreira, 2006, p. 27)

Ao considerar que o DSM-IV-TR™ (APA, 2000/2003) é um instrumento ampla­mente utilizado na área de saúde mental, é necessário que os analistas do comportamento o conheçam, o que não implica em sua utilização como eixo central na condução de investigações e intervenções analítico-comportamentais. Vale res­saltar a possibilidade de claras discordâncias ou a formulação de novas explicações distintas daquelas formuladas a partir do manual. As interpretações analítico- comportamentais não são dirigidas pelos diagnósticos e sim por uma abordagem funcional* que não destaca os princípios norteadores de uma abordagem médica, mas os princípios da ciência da análise do comportamento. Diferente do modelo médico, a análise do comportamento investigará prioritariamente a história de

978-85-7241-865-2

* Nas abordagens funcionais, os comportamentos são analisados na sua relação com os eventos am­bientais que os causam, controlam ou mantêm, utilizando-se de abordagens ideográficas, ou seja, medidas repetidas do comportamento de indivíduos singulares (Sturmey, 1996).

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exposição do indivíduo a uma ampla matriz de contingências responsável também pelo seu funcionamento orgânico, sem fazer uso de uma classificação nosológica ou sintomatológica. O sistema de classificação diagnóstico não deve delimitar as pesquisas ou as intervenções analítico-comportamentais, pois seria inconsistente com a filosofia do behaviorismo radical e os princípios da ciência da análise do com­portamento (ver Carrara, 1988/2005). Porém, a abordagem funcional médica poderá sugerir variáveis a serem investigadas nos trabalhos analítico-comporta- mentais. É possível que o analista do comportamento discorde do sistema de classificação médica, mas, a partir dele, crie novas investigações para a explicação de um fenômeno comportamental. Isto resultará na produção de novas explicações funcionais que mostrarão diferentes possibilidades de interação das variáveis bio­lógicas na história de aprendizagem do indivíduo, em seu meio cultural.

Uma indiscriminada utilização do DSM-IV-TR™ (APA, 2000/2003) no contexto educacional, principalmente no início do século XXI, mostra que a adoção de alguns conceitos ou mesmo teorias de desenvolvimento pode levar a restrições desneces­sárias na programação de atividades de crianças ou jovens (Brazelton e Greenspan, 2000/2002; Collares e Moysés, 1996; Hübner e Marinotti, 2004; Rossetti-Ferreira,2006), na medida em que sugerem que o fracasso escolar se deve a variáveis estru­turais intrínsecas - como se houvesse uma deficiência inerente ao indivíduo - ou a variáveis sociais - como o baixo nível socioeconômico da família. Ademais, contribui para que a diversidade de grupos culturais que compõem uma população não seja frequentemente representada ou efetivamente considerada no contexto educacio­nal. Isto resulta na criação de outras deficiências na “criança diferente” (Pereira, Marinotti e Luna, 2004; Souza, Souza, Machado, Freller e Souza, 1994), sem que contingências de ensino sejam alteradas de acordo com as demandas específicas apresentadas pelas mesmas. A atuação do professor se baseia geralmente em uma avaliação estrutural da criança e em uma abordagem normativa do desempenho acadêmico que pouco enfatiza os repertórios individuais e o ritmo de aprendizagem único de cada um dos alunos. Pode ocorrer a maximização dos erros diante das tarefas acadêmicas e a manutenção de relações verticais, caracterizadas por ordens freqüentes emitidas pelos educadores (Pereira, Marinotti e Luna, 2004). Assim, as oportunidades de aprendizagem oferecidas para o indivíduo poderão ser ampliadas ou restringidas. Essas oportunidades se referem a contingências de reforço positivo que ocasionam, por exemplo, um aumento na produção acadêmica da criança ou do jovem. Na escola, tais oportunidades envolvem não apenas a apresentação de um estímulo, como um livro, mas uma matriz de contingências, cuja unidade de análise mínima é a contingência tríplice - a emissão de uma resposta, a qual é antecedida e seguida por estímulos específicos que controlam diferentes classes de respostas. É importante ressaltar que os termos comportamento e resposta - classe de respos­tas - são utilizados neste texto como sinônimos e analisados a partir de suas interações com o ambiente (Andronis, 2004; Matos, 1997; Tourinho, 1999). Assim, uma oportunidade de aprendizagem poderia ser:

• Na presença de colegas ou professores.• A criança ler um livro em voz alta, fazer comentários sobre ele.• E com isso receber atenção e elogios da audiência (ver Skinner, 1998).

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Portanto, as tecnologias de intervenção usadas nos campos da educação e saú­de propiciam situações ilustrativas sobre como amplos conjuntos de ações podem alterar oportunidades de aprendizagem disponibilizadas aos indivíduos (ver Hübner e Marinotti, 2004; Vasconcelos, 2002,2006/2008; Vasconcelos etal.} submetido).

Destacamos os efeitos adversos da utilização indiscriminada do DSM-IV-TR™, com destaque especial para o sistema educacional, onde encontramos um grande número de crianças com diferentes diagnósticos. Entretanto, não se pode descon­siderar a utilidade deste instrumento em avaliações e intervenções, pois pode favorecer o amplo desenvolvimento e adaptação dos indivíduos, minimizando ou mesmo eliminando sofrimento diante de dificuldades controladas por desequilí­brios neuroquímicos (ver Caballo e Simón, 2005a, 2005b; Nunes, Appolinario, Galvão e Coutinho, 2006; Silvares, 2000a, 2000b; Tobin, 2000/2004; Zamignani,2007). Muitos estudos experimentais do Transtorno Obsessivo-compulsivo têm contribuído para o aperfeiçoamento de métodos de pesquisa e das técnicas de intervenção, como apresentado no Journal of Behavior Therapy and Experimental Psychiatry em 2004 (ver Bellack, 1986; Dar, 2004; Mancini e Gangemi, 2004; More­no, 2003; Parker, McNally, Nakayama, e Wilhelm, 2004; Purdon, 2004; Rachman, 2004; Radomsky e Rachman, 2004; Shafran e Rachman, 2004; Silva, 2003, 2004; Zamignani e Labate, 2002).

Ao considerar as potenciais influências de uma visão de desenvolvimento sobre as áreas de Saúde Mental e Educação, observa-se no ocidente um destaque para a doença (Brazelton, 1992/2002; Brazelton e Greenspan, 2000/2002; Lisboa, 2003,2006; Ministério da Saúde, 2006; Postman, 1995/2002). Estas práticas cultu­rais têm sido analisadas, visando à promoção de intervenções preventivas na saúde pública (Ministério da Saúde, 2006). Por fim, o analista do comportamento se volta para a programação ou alteração de contingências com a finalidade de fortalecer e ampliar padrões comportamentais alternativos já adquiridos pelo indivíduo, os quais podem ser concorrer com comportamentos perturbadores, enfraquecendo-os sem “a abordagem de eliminação” de comportamentos (ou mesmo de classificação de comportamentos como patológicos), mas com a abor­dagem construcional de enriquecimento do repertório comportamental do indivíduo. O analista do comportamento trabalha, desse modo, com contingências comportamentais que envolvem o comportar-se em diferentes contextos.

Possíveis Diálogos com a Ciência do DesenvolvimentoA terminologia e os conceitos utilizados na psicologia do desenvolvimento mos­tram uma busca constante em direção ao refinamento teórico-metodológico (por exemplo, Demetriou e Raftopoulos, 2000; Eye e Schuster, 2000; Lerner, Fis­cher e Weinberg, 2000; Schaie, 2000). Na medida em que se retoma a construção dessa subárea da psicologia, observam-se pelo menos três modificações relacio­nadas ao próprio termo usado para defini-la: Psicologia da Criança, Psicologia do Desenvolvimento e Ciência do Desenvolvimento (por exemplo, Dessen e Costa Jr., 2005; Harzem, 1996). Este último termo é atualmente usado para se referir a um conjunto de estudos interdisciplinares acerca de fenômenos relacionados

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ao desenvolvimento humano que resulta de convergências entre a psicologia, biologia e sociolo^ja (Aspesi, Dessen e Chagas, 2005; ver as revisões apresentadas no volume 24 do International Journal of Behavioral Development, 2000, e no Brasil, por Collinvaux, Leite e DelFAglio, 2006). O modelo bioecológico elabora­do por Bronfenbrenner e a perspectiva do curso de vida proposta por Elder podem ser citados como componentes desse conjunto de estudos (ver Dessen e Costa Jr., 2005).

Em uma avaliação histórica da psicologia, Rossetti-Ferreira (2006) mostra que, tradicionalmente, o desenvolvimento foi estudado a partir de uma abordagem nor­mativa que o considerava em termos de mudanças progressivas advindas com o crescimento ou a idade do indivíduo. Diferentes manuais de Psicologia do Desen­volvimento focalizaram uma visão linear, fragmentada e descontextualizada do desenvolvimento, que era definido de acordo com estágios, etapas ou fases. Ade­mais, era subdividido em diferentes áreas, tais como o desenvolvimento motor, cognitivo, afetivo, social e moral. O contexto de socialização como alvo de análise se limitava à díade mãe-criança, com o foco em uma visão unidirecional acerca dos comportamentos isolados de cada um dos participantes como apresentado por Dessen e Braz (2005). Por volta da década de 1950, observou-se que a ênfase no que acontecia desde a infância até a idade adulta modificou-se para um perío­do mais longo, que se estendida no transcorrer de toda a vida do indivíduo. Até então havia sido negada à velhice ou terceira idade a “possibilidade” de desenvolvi­mento (Gusmão, 2003). Nas décadas de 1970 e 1980, uma nova revisão significativa ocorreu na subárea da Psicologia do Desenvolvimento, à medida que pesquisado­res enfatizaram uma perspectiva processual, a partir de influências biológicas, ambientais e sociais. Finalmente, nas últimas décadas, a Ciência do Desenvolvimen­to tem mostrado análises que não se restringem à fragmentação do desenvolvimento, pois o consideram como um processo contínuo e dinâmico de mudanças estru­turais que se desdobra ao longo da vida do indivíduo, em constante interação com seu meio cultural (por exemplo, Collinvaux, Leite e DelFAglio, 2006; Dessen e Costa Jr., 2005; Seidl de Moura, 2004). Elementos físicos, sociais, históricos e ideológicos são considerados para uma análise do desenvolvimento de acordo com as trocas recíprocas entre o indivíduo e tais elementos (Rossetti-Ferreira, Amorim e Silva, 1999). Atualmente, portanto, observa-se a emergência de um novo paradigma relativista e contextual, para o qual contribuem áreas de estudo tão variadas quanto à ecologia social, biologia, sociologia, dentre outros (ver Dessen e Costa Jr., 2005).

A partir deste novo paradigma, é possível destacar algumas contribuições relevantes do mesmo para o estudo do processo de desenvolvimento a partir da análise do comportamento. Uma destas contribuições é o estudo do desenvolvi­mento humano considerando os contextos sociais e culturais nos quais o indivíduo está inserido, ampliando-se, assim, a análise de variáveis que podem controlar o comportamento. Outra contribuição é considerar o desenvolvimento a partir de um enfoque interdisciplinar, buscando maior articulação com áreas do conhecimento que consideram o desenvolvimento humano como objeto de estudo, tais como antropologia, sociologia, educação e medicina. Para tanto, é necessário uma abordagem multimetodológica para o estudo do desenvolvi­

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mento humano que apreenda a sua complexidade. Uma parte significativa dos psicólogos do desenvolvimento reconhece a importância dos dados empíricos na avaliação de suas teorias (Eye e Schuster, 2000). No entanto, um dos métodos de pesquisa utilizado, tradicionalmente, no estudo do desenvolvimento corre­lacionado, o qual relaciona a idade com mudanças no desenvolvimento, o que permite a predição de comportamentos futuros, apesar de não haver controle das variáveis relevantes. É importante ressaltar que pesquisas correlacionadas podem sugerir variáveis independentes importantes a serem consideradas no processo de desenvolvimento, as quais podem ser isoladas em uma pesquisa experimental (Schlinger, 1995). A mudança de paradigma na ciência do desen­volvimento, da ênfase em estudos transversais para longitudinais faz parte da evolução da área, a qual tem defendido a utilização de múltiplas e repetidas medidas do desenvolvimento, além da efetiva contribuição do uso de computa­dores e softwares estatísticos (Eye e Schuster, 2000; Schaie, 2000; Nesselroade e McCollam, 2000; Shanahan, Sulloway e Hofer, 2000).

O leitor iniciante pode, à primeira vista, assumir que existem muitas outras semelhanças entre a análise do comportamento e a ciência do desenvolvimento, ou com algumas das propostas que a compõem (por exemplo, modelo bioeco- lógico elaborado por Bronfenbrenner, 1981/1996). O fato de ambas contesta­rem a noção de causalidade linear e de definirem a ontogenia como principal nível de análise, por exemplo, pode sugerir proximidade. No entanto, ao se considerar particularidades voltadas aos pressupostos básicos de cada uma delas, é possível identificar também incompatibilidades. A primeira se baseia em princípios gerais como o reforço (que ocorre quando o comportamento produz conseqüências que aumentam sua probabilidade futura de ocorrência), prioriza relações funcionais (definidas empiricamente por relações de depen­dência entre eventos ambientais e o comportamento) e não atribui a eventos encobertos (por exemplo, sentimentos, pensamentos) um status causal. Já a se­gunda se baseia em noções básicas como as de estágio (conjunto de habilidades características de uma idade ou fase do ciclo de vida) e trajetória (seqüência de eventos pessoais que compõem curso de vida) de desenvolvimento, considera uma causalidade sistêmica e enfoca a influência de fatores cognitivos e de per­sonalidade sobre o desenvolvimento. Outra diferença relevante envolve o con­ceito de ambiente: para Bronfenbrenner (1981/1996) dependerá da forma como o indivíduo percebe o ambiente e não de uma realidade “objetiva”. Já na análise do comportamento, o ambiente refere-se a qualquer estímulo que adquira fun­ção para o organismo (por exemplo, Palmer, 2004). Outros exemplos poderiam ser citados, porém, não cabe nos objetivos desta discussão apontar exaustiva­mente as possíveis diferenças entre análise do comportamento e a ciência do desenvolvimento. Basta indicar que elas existem, devem ser mais bem demar­cadas e precisam ser consideradas por todos os profissionais que as adotam como referencial teórico-medotológico. A prioridade nesta discussão é esclarecer que uma maior integração, não apenas entre diferentes abordagens da psicologia, mas entre a psicologia e outras áreas de conhecimento (por exemplo, sociologia, antropologia, medicina, farmacologia, educação), permitirá maior fortaleci­mento de cada uma delas na busca por seus objetivos.

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Contribuições da Análise do Comportamento para Compreensão do Desenvolvimento HumanoApesar de o desenvolvimento humano ser tradicionalmente definido como obje­to de estudo de uma subárea específica da psicologia, ele não é de interesse apenas dos psicólogos (ou teóricos) do desenvolvimento (por exemplo, Collinvaux, Leite e DelLAglio, 2006; Dessen e Costa Jr., 2005; Harzem, 1996; Seidl de Moura, 2004; Shanahan, Sulloway e Hofer, 2000; Sidman, 1960/1976; Skinner, 1953/1981, 1961/2001,1981,1984,1986; Tourinho e Carvalho Neto, 2004). O analista do com­portamento também se dedica a investigar distintos processos relacionados a padrões comportamentais, incluindo sua aquisição e manutenção, estados estáveis e de transição. O modelo de aprendizagem (operante) tem importante contribui­ção para a compreensão de influências ambientais sobre o desenvolvimento humano (Gauy e Costa Jr., 2005), na medida em que fornece uma base teórica e metodológica sistemática para se identificar mudanças comportamentais que implicam desenvolvimento e, ao mesmo tempo, são suscetíveis à aprendizagem por meio do arranjo de contingências (Gewirtz e Pelaez-Nogueras, 1996). Portanto, este modelo indica variáveis ambientais que podem ser investigadas ou alteradas de modo a gerar previsão e controle sobre padrões de comportamentos que favo­reçam ou dificultem o desenvolvimento.

A relevância e utilidade do principal instrumento conceituai disponível ao analista do comportamento - a análise funcional - podem ser verificadas a partir de estudos com comportamentos autolesivos e agressivos. Tais estudos exemplificam a gradual adoção da terminologia e de instrumentos de avaliação e análise fun­cional, a partir do final da década de 1980 (ver a revisão de Pelios, Morren, Tesch e Axelrod, 1999). Esta revisão considerou os periódicos Analysis and Intervention in Developmental Disabilities (1981 -1985), hoje Research in Developmental Disabilities (1986-1997); Behavior Modification (1978-1997); Journal of Applied Behavior Analysis (1968-1997); Journal of Autism and Childhood Schizophrenia (1971-1978), hoje Journal of Autism and Developmental Disorders (1978-1997); e Mental Retar­dation (1968-1997).

Dunlap e Kincaid (2001) fizeram uma revisão da utilização do termo análise funcional a partir do índice de assuntos (subject index) do Journal of Applied Beha­vior Analysis, de 1968 até 2000. Os registros feitos pelos autores indicaram um gradual aumento de citações do termo a partir da década de 1980 - apesar de não ter sido utilizado nos estudos publicados entre 1968 e 1989, foi identificado em 22 citações no ano de 2000. A maior quantidade de citações ocorreu em 1994 devido à publicação de uma edição especial sobre avaliações e tratamentos baseados em análises funcionais. Além disso, Dunlap e Kincaid (2001) examinaram quatro manuais representativos da abordagem analítico-comportamental e constataram que a maior política de impacto dessa abordagem é representada pela análise funcional. Esta é amplamente utilizada em diversas mídias (por exemplo, livros, CD-ROM e internet), com um total de 173 mil resultados encontrados em uma busca em web sites. Ao final da década de 1990, um manual elaborado por Watson e Gresham (1998), o Handbook of Child Behavior Therapy, também mostra a larga

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utilização da abordagem funcional - a partir dos termos avaliação e análise fun­cional - aplicada a diferentes padrões de comportamentos infantis, nos contextos familiares, educacionais e de saúde.

Entretanto, os termos avaliação funcional e análise funcional têm recebido diferentes defini^Ées (Cavalcante, 1999; Sturmey, 1996), algumas das quais serão apresentadas aqui devido à relevância de ambos para a compreensão do principal instrumento conceituai da análise do comportamento. A avaliação funcional é voltada para a identificação de potenciais variáveis controladoras do comportamen­to e envolve o uso de diferentes métodos, sendo então adotada como um ponto de partida para uma avaliação comportamental mais ampla (Horner, 1994). Gre­sham e Lambros (1998) explicam que a análise funcional é um tipo de avaliação funcional que permite identificar as variáveis mencionadas a partir da manipulação experimental de condições ambientais determinantes para o comportamento do indivíduo. Entretanto, o próprio termo análise funcional tem sido utilizado de diferentes maneiras. Dentre sete possíveis definições consideradas por Sturmey (1996), duas merecem destaque. A análise funcional descritiva se baseia em me­didas indiretas (por exemplo, relatos verbais) ou observacionais, a partir das quais é possível identificar relações entre comportamentos e eventos ambientais, sem haver manipulação direta de variáveis. Quando tal manipulação ocorre, por sua vez, é possível realizar a análise funcional experimental, a partir da qual a função do comportamento é avaliada de forma controlada e sistemática - uma variável inde­pendente (evento ambiental) é manipulada e se demonstram relações de dependên­cia com a variável dependente, isto é, o comportamento-alvo selecionado.

Avaliações funcionais, particularmente baseadas em análises funcionais, po­dem ser enriquecidas quando o profissional adota o método de observação sistemática. Neste, observadores treinados, com índices de concordância estabe­lecidos e que garantem a fidedignidade dos dados, utilizam descrições objetivas e parcimoniosas de unidades comportamentais selecionadas. As observações podem ser contínuas ou parciais, com divisões em blocos temporais ajustadas aos interesses dos diferentes estudos. Vale ressaltar a importância da ambientação prévia do observador, o que poderá minimizar o efeito reativo do método obser- vacional, o qual tem utilizado amplamente a tecnologia de vídeo (Danna e Matos, 1996; Dessen e Murta, 1997; Fagundes, 1982). A metodologia observacional tem sido utilizada por etologistas, antropólogos e psicólogos interessados no desen­volvimento ao realizarem pesquisas com animais não-humanos ou ao investigarem a interação de indivíduos em ambientes naturais ou laboratórios (por exemplo, Bakeman e Gottman, 1986/1997; Naves, 2008 com a observação de famílias no laboratório). No entanto, alguns psicólogos que se interessam pelos aspectos di­nâmicos do comportamento adotam medidas estáticas do mesmo ao discutirem processos envolvidos em interações sociais. As técnicas de análise de dados se­qüenciais são parte dos métodos de observação sistemática capazes de capturarem detalhes na interação entre indivíduos, num determinado contexto. Finalmente, ao discutir qualquer técnica de observação sistemática do comportamento é im­portante considerar o treinamento contínuo de observadores (Johnston e Pennypacker, 1980/1993) e a cuidadosa definição de códigos e categorias compor­tamentais (por exemplo, Zamignani, 2007).

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Técnicas seqüenciais de observação e registro também podem ser adotadas duran­te a avaliação funcional quando for necessário analisar o comportamento, momento a momento, em uma interação em curso, contínua. Elas enriquecem uma observação sistemática ao possibilitarem a formulação de perguntas sobre como o comportamen­to é sequenciado ao longo do tempo, o que também traz informações relevantes sobre a sua função em um contexto determinado (Bakeman e Gottman, 1986/1997). Caso o psicólogo se proponha a investigar o desenvolvimento do comportamento social de crianças de dois a cinco anos, observações sistemáticas podem ser feitas durante brin­cadeiras livres, permitindo a definição de diferentes categorias ou níveis de interação social (por exemplo, brincadeira independente ou solitária, brincadeira cooperativa, brincadeiras paralelas). Ao somar o tempo total em que as crianças de diferentes idades passam em cada uma das categorias de brincadeira, é possível identificar, por exemplo, que as crianças mais velhas se envolvem em tarefas cooperativas durante mais tempo do que crianças de dois anos (Parten, 1932). Não seria imprescindível desenvolver nes­se tipo de estudo uma análise seqüencial, mas pode se tornar relevante caso o pesquisador se interesse em identificar como ocorre a mudança de um tipo de brinca­deira para outro tipo. Como as crianças transitam de uma brincadeira para outra? Será que existe alguma ordem nessas mudanças? Nesse sentido, apenas uma análise seqüen­cial permitiria concluir que raramente as crianças mudam diretamente de uma brincadeira solitária para uma brincadeira em grupo (Parten, 1932).

Todavia, é preciso cautela ao sugerir que tais análises sejam privilegiadas em todo e qualquer estudo ou intervenção, independente dos objetivos de cada um deles. Observações não-sequenciais do comportamento podem ser priorizadas em outros estudos e também fornecer um rico banco de dados, como o obtido por Hart e Risley (1995/2004). O estudo longitudinal conduzido pelos autores enfocou a análise do desenvolvimento do vocabulário de crianças pequenas em 42 famílias norte-ameri- canas, com diferentes status socioeconômicos. As observações foram realizadas durante lh/mês, no transcorrer de dois anos. Nessas observações, a equipe de pes­quisadores filmou as interações cotidianas das crianças com adultos no ambiente doméstico e posteriormente registrou as trocas verbais vocais entre eles. Os dados mostraram que cuidadores podem ampliar consideravelmente o repertório verbal vocal das crianças, o que gera repercussões significativas no desempenho acadêmico das mesmas. Três grupos familiares foram então identificados a partir da quantidade e qualidade das interações verbais vocais desenvolvidas rotineiramente com as crian­ças. As crianças que apresentaram as mais altas frequências de palavras emitidas (ou seja, maior vocabulário) estavam inseridas em famílias nas quais os adultos direcio- navam a elas um maior número de palavras diariamente e, portanto, cumulativamente ao longo dos anos. Além disso, esses adultos utilizavam uma linguagem mais diversi­ficada (por exemplo, diferentes palavras, sentenças mais longas), eram mais responsivos aos interesses da criança durante um diálogo (por exemplo, a ouviam atentamente) e faziam perguntas à criança de modo a ocasionar oportunidades de escolha e negociação. Eles também apresentavam feedbackspaia os comportamentos da criança com base em muitos encorajamentos e poucas proibições ou ordens.

Os dados obtidos no estudo longitudinal conduzido por Hart e Risley (1995/2004) ilustram a importância de se considerar fatores ambientais no desenvolvimento do repertório verbal (vocal) de crianças. À medida que identificaram detalhes presentes

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nas rotinas familiares das famílias norte-americanas observadas, os autores cons­truíram uma rica fonte de consulta para a formulação de políticas sociais. Para tanto, além da influência das práticas (educativas) familiares sobre o desenvolvi­mento de diferentes repertórios comportamentais de crianças e jovens, é necessário considerar também aquelas relacionadas à escola e mídia (Biglan, 1995) por serem as três principais fontes de controle sobre o desenvolvimento da criança, na nova era da comunicação iniciada na década de 1990 (por exemplo, Denning, 2004/2005).

Nesse sentido, torna-se cada vez mais necessário considerar a introdução do tercei­ro nível de seleção apresentado por Skinner (1981) - o nível cultural, em quaisquer estudos voltados para o desenvolvimento. Práticas culturais são definidas em termos de comportamentos que são replicados por indivíduos, intra e intergerações, em um sistema sociocultural (Andery, Micheletto e Sério, 2005; Glenn, 1988; Glenn e Malagodi, 1991; Guerin, 2000; Naves, 2008). Há um gradual desenvolvimento de processos* compor­tamentais (na ontogênese) a partir da evolução biológica do indivíduo (na filogênese), assim como de processos culturais a partir dos processos comportamentais. No nível de seleção cultural, o comportamento de outros membros da espécie toma-se ambiente para o desenvolvimento do repertório social dos indivíduos do grupo. Assim, o ecossis­tema comportamental de cada indivíduo - o repertório comportamental e o ambiente- é integrado a um sistema mais amplo, denominado social. Contingências entrelaçadas** são então observadas, pois o comportamento de cada indivíduo tem um papel duplo de ação e de ambiente para o comportamento de outros indivíduos (Glenn, 1991). Logo, a partir dos processos de seleção no nível cultural é possível explicar as adaptações da humanidade a um ambiente com intensas e constantes mudanças. As práticas culturais produzem alterações cumulativas no ambiente, as quais podem tanto preservar a es­pécie humana, quanto ameaçar a sobrevivência de toda a Terra.

Conforme mencionado anteriormente, o desenvolvimento humano deve ser analisado a partir das relações entre as evoluções biológica, comportamental e cultu­ral. Para exemplificar a necessidade de se considerar essas relações em estudos sobre o comportamento, Glenn (1991) apresenta alguns dados da antropologia evolucioná- ria, dentre os quais destaca a alta proporção de similaridade entre o ácido desoxirribonucleio (DNA, deoxyribonucleic acid), ou seja, entre a estrutura genética de chimpanzés e de seres humanos. Apesar dessa similaridade biológica, seres huma­nos apresentam padrões comportamentais altamente individualizados, intra e intergerações, quando comparados aos chimpanzés, cujo repertório é basicamente formado por padrões fixos de ação***, com menor ocorrência de variabilidade com-

* “Processos” referem-se à produção e manutenção de padrões de comportamentos no transcorrer da vida do indivíduo, em que o primeiro nível de seleção, a filogenia, pode receber um menor peso expli­cativo, que é então complementado pelos níveis ontogenético e cultural (Glenn, 1991; Skinner, 1981).** Ao considerar a interação de dois ou mais indivíduos descrita a partir de três contingências tríplices, o entrelaçamento será definido por relações de dependência entre os elementos de cada uma dessas três contingências. Assim, qualquer um dos elementos da primeira contingência poderá evocar ou causar o comportamento do segundo e terceiro indivíduos, por exemplo. Diferentes arranjos de en­trelaçamento poderão ser observados em diferentes metacontingências.*** Termo etológico utilizado para uma seqüência de respostas determinadas filogeneticamente (Ca­tania, 1998/1999).

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portamental. É interessante notar que, aproximadamente nos últimos 90.000 anos, registraram-se mudanças aceleradas no ambiente em que vivem os seres humanos, enquanto que as características biológicas dos mesmos sofreram pequenas alterações (Glenn, 1991). Na evolução biológica, há uma contínua adaptação das características biológicas às características do ambiente. Estas características são transmitidas entre as gerações, porém, como o ambiente em que vivem pode ter sido altamente modi­ficado, isto exigirá o desenvolvimento de repertórios comportamentais que favoreçam o ajuste a novos ambientes (Skinner, 1981,1984).

Uma forma na qual seres vivos têm se tornado mais complexos é por meio de seus repertórios comportamentais.

Dentre as inovações evolucionárias mais interessantes (pelo menos da perspectiva humana) estão os processos comportamentais, os quais resultam em mudanças no comportamento durante o período da

vida de organismos individuais. Tal evolução ontogenética tem sido especialmente importante no surgimento e dominância de nossa

própria espécie. (Glenn, 1991, p. 42, traduzido pelas autoras)

A unidade de análise proposta e utilizada por alguns autores para o estudo das práticas culturais é a metacontingência. Ela pode ser descrita como um conjunto de contingências comportamentais entrelaçadas, ou seja, como relações funcionais entre classes de operante nas quais o comportamento de um indivíduo pode ser uma ocasião ou uma conseqüência para o comportamento de outro indivíduo. Estas contingências interligadas produzem uma conseqüência em longo prazo comum que retroage sobre todas elas: o produto agregado (Glenn, 1986/2005). Tal conseqüência pode, por sua vez, ser selecionada por um sistema receptor, que corresponde às demandas ambientais de outros grupos sociais (Gleen e Malott, 2004). Todo este arranjo de contingências se insere em um meio cultural consti­tuído, por exemplo, pelos valores religiosos, leis governamentais, tradições familiares e sistema econômico (por exemplo, Houmanfar e Rodrigues, 2006).

Em uma compreensão ampla do desenvolvimento humano, é necessário ir além do indivíduo que se desenvolve, identificando as relações estabelecidas por ele em diversos contextos sociais, incluindo elementos socioeconômicos, políticos, históricos e os valores que perpassam o processo de desenvolvimento (Rossetti- Ferreira, 2006). Assim, unidades sociais mais amplas, tais como família, escola e Estado (Biglan, 1995), devem ser necessariamente consideradas ao se analisar o desenvolvimento de um indivíduo. A análise de metacontingências pode envolver diferentes agentes sociais, como médicos, educadores e pais, e indicar a manu­tenção de práticas culturais voltadas, por exemplo, para a ênfase na doença. Alguns dos conceitos de desenvolvimento adotados por estes agentes sociais podem se tornar estímulos antecedentes (discriminativos ou operações estabelecedoras*) que evocam práticas educativas dirigidas a crianças e jovens. Essas práticas cultu­rais podem ser alteradas a partir da discussão desse conceito e com planejamentos

* Ver Cunha e Isidro-Marinho (2005).

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culturais que defendam a capacidade de todos os indivíduos de interagirem de forma plena e eficaz com seu meio ambiente social, estabelecendo trocas mútuas que favorecem o processo de desenvolvimento.

Tanto psicólogos da ciência do desenvolvimento como analistas do comporta­mento têm considerado os potenciais efeitos sobre o desenvolvimento de mudanças em unidades sociais mais amplas, como a família, escola e governo. Conjuntos de leis recentemente voltados para o estabelecimento do Poder Familiar em substituição à terminologia anterior - Pátrio Poder- da guarda compartilhada e da proteção integral da criança e do jovem (por exemplo, Lemer, Fisher e Weinberg, 2000; Logue, 1998; Shanahan, Sulloway e Hofer, 2000; Lei n2 6.515,1977; Lei n2 8.069,1990; Lei n2 10.406, 2002) propõem mudanças a fim de gerar contingências específicas nos ambientes disponibilizados às novas gerações. Tais contingências devem incluir envolvimento parental e monitoramento constante, associados ao reforço positivo. Esses três ele­mentos resultam em proximidade entre pais e filhos, além de dificultarem o desenvolvimento de repertórios comportamentais de risco (por exemplo, antissociais), seja no ambiente acadêmico, familiar ou social mais amplo (Biglan et al., 1997; Patter­son, Reid e Dishion, 1992). Portanto, a análise dos ambientes nos quais as crianças interagem possibilitará a caracterização de condições que podem otimizar o desen­volvimento de um amplo repertório comportamental, quando se parte da premissa do desenvolvimento a partir das interações do indivíduo com o ambiente.

Nesse sentido, além do conceito de metacontingências, os analistas do compor­tamento dispõem de outro conceito que permite, de alguma maneira, organizar o processo de desenvolvimento. Rosales-Ruiz e Baer (1997) propuseram o conceito de behavioral cusp* (cunha ou ápice comportamental**) para se referir a mudan­ças singulares na interação organismo-ambiente que proporcionam considerável ampliação do repertório comportamental do indivíduo.

Considera-se cunha aquela mudança comportamental que tem conseqüências para o organismo além da mudança em si mesma,

algumas das quais podem ser consideradas importantes (...). O que torna uma mudança comportamental uma cunha é que ela expõe o

repertório do indivíduo a novos ambientes, especialmente a novos reforçadores e punidores, novas contingências, novas respostas,

novos controles de estímulos e novos conjuntos de contingências mantenedoras ou destrutivas, (p. 534, traduzido pelas autoras)

* No sentido de que alguns comportamentos ou contingências cunham ou criam novos comporta­mentos, que interagem com novas contingências. Ver também a discussão sobre contingências de adução e coadução (Andronis, Laying e Goldiamond, 1997). O comportamento social de agressão simbólica constitui-se um exemplo da contingência de coadução, em que há uma combinação de repertórios resultantes de duas contingências, uma histórica e outra vigente, formando uma nova classe funcional de comportamento. Na contingência de adução, um comportamento estabelecido em uma relação de contingência satisfaz as exigências de uma nova contingência, produzindo, assim, uma nova relação funcional.** Ver as diferentes traduções de behavioral cusp em De Rose e Gil (2003) - ápice comportamental - e Tourinho e Carvalho Neto (2004) - cunha comportamental.

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Os comportamentos de engatinhar, falar, ler com fluência, escrever e brincar podem ser considerados cunhas comportamentais se possibilitarem a inserção do indivíduo em uma ampla variedade de contextos e atividades e, assim, proporcionar o desenvolvimento diante de novas exigências que poderão ser implementadas por outros indivíduos (Bijou, 1995; Rosales-Ruiz e Baer, 1997). Na medida em que o desenvolvimento envolve mudanças contínuas nas interações organismo-am- biente, ele dependerá principalmente daquelas que indicarão a uma comunidade específica um momento em que ocorre clara expansão do repertório comporta­mental. Vale ressaltar, no entanto, que uma mudança específica só será considerada uma cunha comportamental de acordo com critérios como:

• Validade social, ou seja, se corresponde às demandas da comunidade em que o indivíduo se insere.

• Generalidade, na medida em que seja um pré-requisito ou um elo em uma cadeia comportamental* e assim facilite a aprendizagem de novos compor­tamentos (Bosch e Fuqua, 2001; de Rose e Gil, 2003).

Por fim, vale detalhar outras contribuições feitas na análise do comportamento ao se considerar o continuum do desenvolvimento humano, que pode ser traçado tendo-se, em um dos extremos, a criança e, em outro, o idoso. Os grupos de indi­víduos que se encontram nesses extremos muitas vezes necessitam de intervenções ou programações específicas de contingências, a fim de se compensar limitações ambientais ou comportamentais.

Se nos referirmos às crianças, é possível identificar contingências familiares, além daquelas estabelecidas no contexto acadêmico, que raramente são criterio­samente analisadas em busca de um planejamento mais favorável ao desenvolvimento delas. Com frequência, práticas culturais predominantes na cultura ocidental atribuem ao organismo ou ao próprio indivíduo toda a responsabilidade pela emissão de comportamentos perturbadores que trazem prejuízos ao seu desen­volvimento. Tais comportamentos são frequentemente categorizados em termos de adjetivações ou rótulos (por exemplo, agressivo, desobediente, viciado, desa­tento, hiperativo), que tendem a ser repetidamente usados como explicações de quaisquer comportamentos. Explicações circulares são assim formuladas por pais e professores, sem que informações contextuais sejam acrescentadas a elas e sem que novas contingências sejam programadas para fortalecer comporta­mentos alternativos. Nesse contexto, a criança pode experimentar sentimentos de tristeza, emitir comportamentos de contracontrole** e apresentar isolamen­to social (Glenn, 1991).

* Uma cadeia comportamental é estabelecida quando um mesmo estímulo possui tanto função de reforçador condicionado para um comportamento anterior da cadeia quanto de um estímulo discri­minative para a ocorrência do comportamento seguinte na cadeia (Teixeira-Júnior e Souza, 2006).** Sidman (1989/1995) mostra que mecanismos de contracontrole são respostas que podem ser con­sideradas quase automáticas a pressões ou coerção intensa. Essas respostas podem ocorrer na forma de burladas leis, por exemplo, a partir do abuso de drogas, do abuso verbal ou, ainda, de outras for­mas de fuga ou esquiva da punição (desistência escolar, por exemplo).

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Em geral, não se observa no mundo contemporâneo destaque para uma ampla análise de práticas educativas das novas gerações de pais na interação com crian­ças e jovens, embora as práticas culturais já mencionadas tenham resultado em significativos problemas para muitas famílias (Biglan, 1995; Biglan et al., 1997).

(...) Como uma sociedade, nossa abordagem na criação das crianças é muito casual Apesar de como consumidores inspecionarmos a qualidade

de televisores, gravadores de videocassetes e automóveis nós, raramente, pensamos nesses termos sobre o nosso mais importante produto - nossas

crianças. (Biglan, 1995, p. 257, traduzido pelas autoras)

Práticas culturais são transmitidas no que se refere ao cuidado ou às interações de adultos com crianças a exemplo da transmissão de práticas educativas coercitivas entre as diferentes gerações (Azevedo e Guerra, 2001; Sidman, 1989/1995; Zagury, 1996). A análise de variáveis contextuais e o planejamento voltado para o efetivo monitoramento ou acompanhamento das crianças em diferentes ambientes favo­recem o desenvolvimento de laços afetivos duradouros (Brazelton e Greenspan, 2000/2002) e a adoção de práticas educativas marcadas por reforço positivo*, dimi­nuindo a utilização de contingências aversivas, marcadas por ameaças e punições. O fortalecimento destas práticas poderá diminuir a frequência de comportamentos perturbadores de risco, os quais podem variar desde baixo desempenho acadêmico a crimes, gravidez precoce, comportamento sexual de risco, abuso de substâncias ilícitas, tabagismo e alcoolismo (Biglan, 1995; Biglan et al., 1997; Patterson, Reid e Dishion, 1992). É necessário analisar e intervir no arranjo de contingências consi­derando-as também a partir do nível de seleção cultural.

A família brasileira, por exemplo, tem sido exposta a mudanças significativas a partir da metade do século XX. O processo de industrialização; as mudanças econômicas e a luta das mulheres pela independência financeira que as introdu­ziu no mercado de trabalho; os avanços tecnológicos que favoreceram o controle do número de filhos, diminuindo-os no transcorrer da história; a promulgação da Lei do Divórcio (1977), do Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) e do novo Código Civil (2002) são fatores que contribuíram para o surgimento de diferentes tipos de organização familiar (Naves, 2008; Postman, 1995/2002). Todo este con­texto pode ser analisado a partir de matrizes complexas envolvendo contingências e metacontingências, já descritas anteriormente, que resultam em alterações signi­ficativas nas interações com as novas gerações.

Se nos referirmos aos idosos, entenderemos que o avanço das ciências no mundo contemporâneo, ao resultar na maior longevidade dos povos, promoveu também mudanças sociais nas interações estabelecidas com eles e a necessidade de considerá-los em estudos sobre o desenvolvimento humano. Comumente, o

* As operações de reforços positivo e negativo resultam no aumento da probabilidade futura de um determinado comportamento de acordo com conseqüências produzidas por ele. Os qualificadores positivo e negativo referem-se a operações matemáticas de introduzir ou suspender essas conseqüên­cias, respectivamente (Catania, 1998/1999).

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comportamento dos idosos é controlado por contingências de reforço vagamente definidas e por reforço não contingente (ou aleatório). Ou seja, eles não precisam emitir comportamentos com topografias específicas frequentemente exigido de outras pessoas, sendo assim dispensados de um desempenho considerado social­mente adequado (por exemplo, em situações que envolvam cuidados pessoais e a participação nas refeições em família). Portanto, muitos comportamentos emi­tidos pelos idosos podem não ser consequencias diferenciais, o que resulta no empobrecimento de seu repertório comportamental diante de rotulações que su­gerem subestimação de suas potencialidades (Starling, 1999). Além da relevância de se enfocar práticas culturais a serem modificadas para que se minimize a “ve­lhice comportamental", práticas alimentares diferenciadas e exercícios físicos rotineiros, assim como outros cuidados com a saúde (por exemplo, envolvendo postura corporal, uso da voz) também podem contribuir para o adiamento ou a minimização do declínio funcional observado no organismo humano. Contingên­cias podem, portanto, ser programadas de modo a proporcionar compensações comportamentais e ambientais (particularmente culturais) para a crescente fra­gilidade fisiológica relacionada ao processo de envelhecimento (por exemplo, Anderson, McCloskery, Tata e Gorby, 2003; Biglan eta l, 1997; Schaie, 2000; Siqueira, Botelho e Coelho, 2002; Skinner e Vaughan, 1983/1985).

Ambos os grupos de indivíduos (crianças e idosos) que se encontram nesses extremos sofrem mudanças intensas em nível biológico e também comportamental e, por isso, merecem atenção especial. A análise dessas particularidades possibili­tará tanto os planejamentos de contingências que promovam o desenvolvimento de um rico repertório comportamental desses indivíduos, quanto os planejamen­tos culturais envolvendo variados sistemas sociais (por exemplo, família, escola e sistemas de saúde). Contudo, isto não significa dizer que o analista do comporta­mento deva atuar com uma abordagem nomotética. Ele deve, ao contrário, continuar adotando uma abordagem idiográfica, utilizando a metodologia do sujeito como seu próprio controle, com os demais indivíduos inseridos no trans­correr desse continuum do desenvolvimento (ver Harris, 2003 e Saville e Buskist, 2003 - revisões de delineamentos de pesquisa experimental nomotética e idiográ­fica, respectivamente).

Considerações FinaisA utilização do termo desenvolvimento, neste capítulo, não se referiu apenas ao desenvolvimento da criança, mas ao desenvolvimento de qualquer padrão de comportamento humano, independente da idade. O desenvolvimento pode en­volver a aquisição de novos comportamentos, sua manutenção ou variação, e deve ser analisado a partir de uma ampla rede de interações organismo-ambiente. O surgimento de novos comportamentos é, na verdade, contínuo sob a perspectiva analítico-comportamental, uma vez que um determinado comportamento nunca é exatamente igual a outro. O conceito de classe operante é então utilizado porque as topografias dos comportamentos podem ser mantidas ou variadas, mas estes resultam em uma mesma conseqüência ou função (Skinner, 1953/1981).

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Abordagem Analítico-comportamental do Desenvolvimento ■ 145

Finalmente, cabe enfatizar novamente que o intercâmbio entre as áreas de pesquisas e de aplicação da tecnologia comportamental indicará variáveis a serem investigadas e assim favorecerá explicações consistentes do desenvolvimento humano (por exemplo, Andronis, 2004; Lattal, 2005; Lerner, Fisher e Weinberg, 2000). A diversidade de fontes de controle sobre o desenvolvimento do comportamento humano reflete a complexidade e riqueza dos processos de desenvolvimento, o que não inviabiliza investigações científicas neste campo de estudo e intervenção (por exemplo, Sidman, 1960/1976).

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CAPÍTULO

Análise do Comportamento e Terapia

Analítico-comportamental

Sô n ia B e a t r iz M e y e r G io van a D e l P r e t t e D e n is R o b e r t o Z a m ig n a n i R o b e r t o A lv es B a n a c o Sim o n e N e n o

E m m a n u e l Z a g u r y T o u r in h o

A análise do comportamento pode ser entendida como um campo do saber que integra produções filosóficas, reflexivas, interpretativas, empíricas (experimentais e não experimentais) e aplicadas. A terapia analítico-comportamental, enquanto uma de suas aplicações é uma modalidade de psicoterapia que está baseada no conhecimento produzido pela análise do compor­tamento. É orientada por um sistema amplo de interpretação do comportamento humano, que auxilia a compreensão e a intervenção sobre fenômenos complexos, como os que se apresentam em ambientes clínicos (Tourinho e Neno Cavalcan­te, 2001). Terapeutas analítico-comportamentais desenvolvem um atendimento amparado em filosofia, princípios, conceitos e métodos da ciência do comportamento (Neno, 2005, Meyer, 1995). Muito frequentemente, sua atuação está também articulada à produção de conhecimento novo em análise do comportamento, criando um ambiente de trocas permanentes entre ciência e aplicação.

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154 ■ Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental

O objetivo deste capítulo é apresentar, resumidamente, os pressupostos filosóficos, princípios de comportamento e métodos nos quais o terapeuta analítico-com­portamental se ampara, assim como as intervenções por ele adotadas com aquela fundamentação.

Pressupostos FilosóficosEntre os pressupostos filosóficos da terapia analítico-comportamental, é importan­te ressaltar as noções de comportamento e ambiente e a forma como a abordagem analítico-comportamental compreende sentimentos, pensamentos e sensações, partindo de uma visão monista do homem e de uma concepção materialista e interacionista dos fenômenos psicológicos.

Seu objeto de estudo é o comportamento, entendido como a relação existente entre a ação de um indivíduo que se comporta e o ambiente no qual está inserido. Nessa relação, focalizam-se as condições antecedentes que estabelecem a ocasião para a ocorrência das ações do indivíduo, e as conseqüências que estas produzem no ambiente. O ambiente com o qual a pessoa interage inclui tanto o organismo como o meio externo, que corresponde a lugares ou objetos inanimados, e também às pessoas com as quais ela interage. O ambiente estabelece a ocasião (anteceden­te) para a ação (resposta) do indivíduo, verbal ou não verbal, que então produz conseqüências no ambiente, que determinam a probabilidade de ocorrência de novas ações do indivíduo.

O ambiente determina as ações dos organismos por meio de três processos de seleção sobrepostos e associados: filogênese, ontogênesee cultura. A filogênese cor­responde à seleção natural definida por Charles Darwin: por meio de variação e seleção, indivíduos mais adaptados ao ambiente tendem a sobreviver e a transmitir seus genes (capacidades, tendências etc.), o que implica uma seleção genética. Em linhas gerais, a filogênese participa na determinação de comportamentos, produ­zindo organismos com diferentes estruturas físicas (e, nesse sentido, diferentes possibilidades para a emissão de respostas) e diferentes graus de sensibilidade aos eventos ambientais, o que produz efeitos em dois processos de aprendizagem:

• O operante, na medida em que é variada a sensibilidade a determinadas conseqüências.

• O respondente, que favorece ou não a ocorrência de determinadas respos­tas incondicionadas (não aprendidas).

Já a ontogênese refere-se à seleção comportamental ao longo da vida do indi­víduo. Tal seleção se dá por meio da interação entre a aprendizagem respondente e operante. No primeiro caso, eventos do ambiente adquirem função eliciadora de respostas do organismo, a partir da associação (por meio de pareamento pavlo- viano) com eventos que apresentam a mesma função como resultado da filogênese. A partir da aprendizagem respondente, portanto, novos estímulos passam a con­trolar as respostas, alterando a reatividade do indivíduo ao ambiente. Já o segundo processo de aprendizagem é denominado operante por referir-se a inte­

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Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental ■ 155

rações nas quais o indivíduo age (opera) sobre o ambiente produzindo alterações neste (conseqüências) que, por sua vez, retroagem sobre o organismo, alterando sua probabilidade de ação futura (Skinner, 1953/1974). Enquanto no processo respondente o ambiente age sobre um repertório comportamental limitado, filo- geneticamente determinado, apenas aumentando as possibilidades de controle pelos estímulos antecedentes, no condicionamento operante há a possibilidade, por meio do processo de modelagem, da criação de novos repertórios comporta­mentais e de sua manutenção. É esse mesmo processo, associado à sensibilidade dos organismos humanos ao reforço de padrões vocais, que permite que um ter­ceiro nível de seleção atue sobre o comportamento.

Esse terceiro nível é o processo de seleção de práticas culturais. Para Skinner, as práticas culturais representam casos especiais de aplicação do conceito de comportamento operante: “é o efeito sobre o grupo, não as conseqüências refor­çadoras para membros individuais, que é responsável pela evolução da cultura” (Skinner, 1974/1982). Novas práticas culturais têm origem na variação do compor­tamento individual, mas são selecionadas por suas conseqüências para o grupo.

Outro pressuposto filosófico da análise do comportamento é a concepção monista de homem. Os analistas do comportamento partem do princípio de que o homem é constituído por uma única substância e seu comportamento é um fenômeno natural, acessível à análise científica. Esta concepção é oposta à deno­minada dualista, segundo a qual o homem é constituído por duas substâncias, uma material, outra imaterial. Para o dualismo, fenômenos psicológicos têm origem na substância imaterial do homem. Nesse caso o comportamento (reconhecido como um evento material) seria uma manifestação superficial (sintomas externos) de processos de natureza mental e inobserváveis. No monismo analítico-compor­tamental, entende-se todo indivíduo como indivisível: o organismo como um todo opera [sobre] e interage com seu ambiente, mudando o contexto e sendo mudado em sua totalidade pelas conseqüências produzidas (Chiesa, 1994/1997).

Na prática, a principal decorrência do monismo é o direcionamento da inves­tigação para variáveis do ambiente que determinam tanto as queixas como as condições de mudança do cliente. O terapeuta analítico-comportamental estuda o papel que o ambiente desempenha sobre as respostas do cliente (um ambiente em que é possível interferir), ao invés de supor a existência de eventos mentais com possíveis funções causais (Windholz e Meyer, 1994).

Decorre do monismo que sensações, sentimentos e pensamentos são consi­derados fenômenos (relações) de natureza material, diferenciando-se de outros tipos de comportamentos apenas porque parte de sua ocorrência (algum estímu­lo, ou alguma resposta) é privada e, portanto, seu acesso é limitado, sendo observáveis apenas por um indivíduo. Esses eventos não são considerados como “causa” de respostas abertas: ambos devem ser explicados com base nos determi­nantes ambientais, de natureza material. Eventos privados podem participar de uma diversidade de fenômenos comportamentais, com diferentes graus de com­plexidade, em um continuum que pode envolver desde fenômenos de base estritamente filogenética até fenômenos comportamentais complexos, engloban­do os três níveis de variação e seleção (Tourinho, 2007). Entre os eventos privados encontram-se as respostas encobertas, que correspondem a ações executadas com

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156 ■ Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental

uma participação tão reduzida do aparelho motor (inclusive a musculatura vocal) que não são visíveis aos outros. Respostas encobertas podem ser emitidas de modo a preparar o organismo para a emissão de uma resposta aberta mais precisa (como o caso do processo de pensamento ou tomada de decisão). Podem, também, ser emitidas na ausência do estímulo que usualmente controla a resposta aberta, sob controle de outros estímulos (como na fantasia, no sonho ou na alucinação - con­forme Skinner, 1974/1982). Entre os eventos privados encontram-se também os estímulos privados, que são parte do ambiente que se encontra “sob a pele” e que interage com a ação do indivíduo. O acesso da comunidade verbal a estes eventos pode ser apenas indireto, a partir das autodescrições do indivíduo no corpo de quem ocorrem (Tourinho, 2007).

O caráter encoberto de certas respostas é transitório e dependente de certas condições socioculturais. Como aponta Tourinho (2006), apenas em sociedades individualizadas os homens são levados a emitir respostas cognitivas na forma enco­berta (a leitura silenciosa, por exemplo, é incomum em sociedades não individualizadas). Apenas em sociedades individualizadas, também, os homens são levados a observar o que se passa com o próprio corpo em episódios emocionais (geralmente porque essas sociedades exigem uma topografia “autocontrolada” das respostas emocionais). A emissão de respostas cognitivas na forma encoberta e observação das condições corporais nos episódios emocionais favorecem uma concepção de sentimentos e pensamentos como ocorrências internas aos indivíduos, obscurecendo o fato de que continuam sendo relações com um ambiente externo, físico e social. Uma aná­lise comportamental desses fenômenos requer, ao contrário, o exame da dimensão relacionai dos sentimentos e pensamentos. O cliente pode chegar ao atendimento convicto de que sua tristeza é uma ocorrência interna e imaterial, mas ao terapeuta analítico-comportamental interessará identificar em que consiste essa tristeza enquanto relação do cliente com o seu ambiente (mesmo reconhecendo que o in­divíduo está respondendo a estímulos privados).

Para terapeutas analítico-comportamentais, relatos de sentimentos, pensa­mentos e sensações são informações relevantes e necessárias para a compreensão do fenômeno comportamental. Terapeutas investigam e interveem sobre esses relatos principalmente por quatro razões:

• Muitas vezes, são as respostas e estímulos privados experimentados pelos clientes que os levam à terapia. Um cliente, por exemplo, pode buscar a terapia procurando ajuda para “acabar com a ansiedade” ou entender o porquê de suas “crises de taquicardia”.

• Apesar de a análise do comportamento não compartilhar desse posicionamento, culturalmente, eventos privados são apontados como motivos dos comporta­mentos. Assim, é mais provável os clientes descreverem seus sentimentos como causas que como comportamentos a serem explicados (Banaco, 1993).

• As respostas verbais descritivas de estímulos privados são indicadoras de eventos ambientais relevantes. Por exemplo, diante do relato de “alívio” pode-se suspeitar da existência de reforço negativo (retirada de um estímulo aversivo); diante de “felicidade” ou “prazer”, a ocorrência de reforço positivo (apresentação de um estímulo reforçador).

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Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental ■ 157

• A história de interação com o grupo social modela a relação do indivíduo com eventos privados e sua descrição, elementos importantes na constitui­ção da subjetividade, do autoconhecimento e do autocontrole.

0 interesse do clínico está voltado para a identificação de relações indivíduo- ambiente, decorrentes da história de vida, e para a proposição de intervenções efetivas com base nessa identificação (Skinner, 1953/1974). As relações indivíduo- ambiente associadas à queixa de um cliente são individualizadas, porque todos os fatores que determinam o comportamento atual - variáveis genéticas e am­bientais, a história pessoal de interação com o ambiente, a cultura e as condições ambientais atuais - são combinações pessoa-ambiente peculiares a cada caso (Hawkins, 1986). Por este motivo, terapeutas analítico-comportamentais realizam intervenções únicas (“sob medida”), ainda que aparentemente as “queixas” iniciais dos clientes se assemelhem.

% 978-85-7241-865-21

Pesquisa e Terapia Analítico-comportamentalA abordagem analítico-comportamental é empiricamente validada em laboratório e em situações aplicadas, tais como a clínica, por meio de demonstração de relações ordenadas entre comportamento e ambiente. Existem vários núcleos de atividades em análise do comportamento, dos quais destacaremos três por sua importância direta na prática do analista do comportamento: a pesquisa básica, a pesquisa aplicada e a prestação de serviços.

O objetivo da pesquisa básica (cujos sujeitos podem ser humanos ou infra- humanos) é descobrir as leis naturais que regem o comportamento. A lei do condicionamento operante, por exemplo, não é uma invenção teórica, mas sim uma formulação derivada de pesquisas empíricas que, repetidamente, têm com­provado a existência de relações entre respostas e conseqüências por elas produzidas (Keller e Shoenfeld, 1966).

A pesquisa aplicada, por sua vez, tem como objetivo descobrir e testar diferentes maneiras pelas quais os resultados encontrados na pesquisa básica podem ser apli­cados na intervenção frente a problemas humanos relevantes. Uma pesquisa, por exemplo, pode investigar o comportamento de mentir como uma resposta operan­te. O primeiro pressuposto que guiaria uma investigação desse tipo é que “mentir” e “falar a verdade” são formas de o indivíduo interagir verbalmente com o meio social e físico. Um relato nem sempre corresponde ao (nem sempre está sob con­trole do) evento descrito, e um relato não correspondente (culturalmente podendo ser reconhecido como “mentira”) pode se dar por diversas razões. Uma dessas razões é o indivíduo não ter “se dado conta” de parte do ocorrido e, por isso, apresentar um relato falso (nesse caso, os estímulos presentes na situação exerceram um controle fraco sobre o comportamento do indivíduo ou o indivíduo observou apenas parte dos estímulos presentes). Provavelmente, boa parte do grupo social chamaria esse tipo de relato não-correspondente de “equívoco”. Outra po§sível fonte de distorções do relato são as conseqüências providas pelo grupo social para a ação de relatar. Mentir, em alguns casos, pode produzir conseqüências reforçadoras. Por exemplo,

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158 ■ Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental

quando um adolescente relata que “pega todas” para um grupo de amigos, quando, de fato, ele nunca teve uma experiência sexual, ele pode produzir a admiração dos colegas. Nesse caso, um reforçador positivo foi produzido pelo relato falso. Em outros casos, em um ambiente predominantemente aversivo, um relato “falso” pode evitar uma punição que seria produzida por um relato fidedigno. Por exemplo, ao relatar que quebrou um objeto de valor em casa, uma criança pode sofrer violência física, mas colocar a culpa no cachorro pode evitar essa violência. No caso, o relato falso tem função de esquiva, pois evita a apresentação de um estímulo aversivo que ocorreria caso fosse fidedigno*.

Ao pesquisar, portanto, os efeitos das conseqüências sociais sobre o compor­tamento de mentir, o experimentador pode, por exemplo, escolher investigar a hipótese de a conseqüência ser um reforço positivo. Para isso, ele pode apresentar um estímulo reforçador contingente a uma determinada resposta verbal (por exem­plo, dizer “Brinquei com o brinquedo X”) mesmo quando tal resposta não descreve o que de fato ocorreu (dizer que brincou quando na verdade não brincou). Se ocorrer um aumento na frequência do relato de brincar, não correspondente ao evento brincar, tem-se um modelo empírico, com controle de variáveis, de um dos fatores que podem agir sobre o comportamento de mentir (esta pesquisa foi desenvolvida por Ribeiro, 1989).

Por fim, a prestação de serviços consiste na utilização do arcabouço teórico da análise do comportamento, obtido por meio de pesquisas básicas e aplicadas, para a solução de problemas humanos, como é o caso da terapia analítico-comporta­mental. Um terapeuta pode, por exemplo, atender uma criança encaminhada por mentir aos pais. Se a criança “mente” com frequência, o trabalho do analista do comportamento é, principalmente, deixar de lado o rótulo “mentir” e investigar que relação comportamental está em curso na interação da criança com os pais. A partir do conhecimento da lei do reforço e da maneira pela qual se instala o comportamento de mentir, ele pode formular hipóteses e planejar intervenções no atendimento a esta criança, por meio de questões tais como as que seguem:

• Será que a criança aprendeu a observar os eventos de modo a emitir relatos fidedignos (ou seja, que tipo de história de aprendizagem discriminativa tem a criança para relatar)?

• Os pais têm a oportunidade de verificar a veracidade dos relatos da criança (quer dizer, a comunidade verbal tem acesso a esse antecedente)?

• Há reforço por relatar o que os pais “querem” ouvir, mesmo quando esse relato é incompatível com sua ação (ou seja, sua comunidade verbal refor­ça o relato por uma topografia específica e não necessariamente pela relação fidedigna com o antecedente)?

* Um evento ambiental é considerado reforçador positivo quando aumenta a probabilidade fu­tura de ocorrência da resposta que o produz e reforçador negativo quando aumenta a probabi­lidade da ocorrência da resposta que o remove. No primeiro caso, fala-se em contingência de re­forço positivo e, no segundo, de reforço negativo, que pode se dar pela remoção de um estímulo aversivo presente (fuga) ou pelo adiamento ou cancelamento da apresentação de um aversivo sinalizado (esquiva).

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Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental ■ 159

• Como esse comportamento se desenvolveu na história de vida da criança?• O que os pais fazem quando a criança fala a verdade (por exemplo, será que a

magnitude e a frequência de conseqüências positivas por falar a verdade são menores que para a mentira, tornando o relato verdadeiro menos provável)?

• O que os pais fazem quando a “mentira” é descoberta (há conseqüências aversivas contingentes e consistentes para o comportamento de mentir)?

Essas são questões que dirigem a uma análise de contingências envolvidas no padrão comportamental comumente referido pelos rótulos “mentir” ou “dizer a verdade”.

Ainda com relação à prestação de serviços em terapia analítico-comportamen- tal, a noção de que todo indivíduo é único, tem um repertório de comportamentos que é único, impede que se estabeleça uma seqüência padronizada de procedi­mentos, podendo ser até inadequada uma prescrição minuciosa de cada passo da intervenção clínica. O comportamento do terapeuta não é somente produto de seu conhecimento teórico; o uso adequado de seu conhecimento depende, em grande medida, da identificação das contingências associadas aos problemas ou queixas do cliente, o que norteia o planejamento da interação e das contingências próprias da relação terapêutica. Em outras palavras, o terapeuta analítico-compor- tamental é constantemente modelado pela interação entre o conhecimento pro­duzido pelo sistema cultural da análise do comportamento e as contingências próprias da situação de intervenção (Tourinho e Neno Cavalcante, 2001). No exemplo sobre o atendimento à “criança mentirosa”, seria inadequado simplificar a intervenção valendo-se da regra: “Então vou elogiar a criança quando ela disser a verdade a mim”. Para o terapeuta entrar em contato com as contingências é ne­cessário ainda observar outras classes de comportamentos da criança na sessão. Supondo que a criança toma o terapeuta como modelo, uma possibilidade a ser testada seria a apresentação de exemplos reais de autorrevelação, utilizando-se do procedimento de modelação sobre o “dizer a verdade”.

Em clínica, dificilmente um único comportamento é focado. Geralmente, o que se observa são múltiplos comportamentos, ou melhor, múltiplas classes de comportamento, alvo da intervenção. Desse modo, enquanto em um experimento é possível selecionar uma variável independente e observar claramente seus efei­tos sobre uma variável dependente (uma classe específica de respostas), na clínica, o número de variáveis e a inter-relação das mesmas dificulta o controle do tipo “se... então”.

Assim, tanto na pesquisa quanto na intervenção clínica, observa-se e testa-se o efeito de variáveis múltiplas sobre diferentes (classes de) respostas. No caso de pesquisas, a preocupação em isolar variáveis é essencial para a produção de vali­dade interna*, mas essa medida pode reduzir a validade externa dos achados. Em outras palavras, a perda de validade externa significa que o ambiente controlado, criado especialmente para a pesquisa, acaba por não corresponder exatamente

* Validade interna refere-se à “capacidade para tirar conclusões sobre relações de causa e efeito de nossos dados” (Cozby, 2003, p. 102), ao passo que validade externa é “o grau em que os resultados podem ser generalizados para outras populações ou situações” (p. 102).

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160 ■ Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental

ao ambiente da prática clínica usual. Por outro lado, para se ampliar a validade interna da pesquisa clínica, o método de trabalho deve envolver múltiplas respostas e múltiplas causas e um maior controle experimental sobre elas, o que geralmen­te é bastante complexo, ainda que não inviável.

As origens experimentais da terapia analítico-comportamental são objeto de críticas equivocadas, até hoje realizadas quando não se conhece profundamente o panorama atual da prática e da pesquisa clínicas. Por outro lado, essas origens trouxeram como vantagens uma maior ênfase na formação do terapeuta analítico-- comportamental. Ele foi treinado a observar comportamentos verbais e não verbais e a observação, feita no próprio consultório ou em outros ambientes, como a casa ou a escola, é fonte de dados muitas vezes mais relevantes do que relatos verbais. Ele deve analisar e entender o que é observado enquanto um processo compor­tamental formado por contínuas interações e, portanto, sujeito a mudanças. Deve ser capaz de conduzir o processo terapêutico de forma similar a uma experimen­tação, mesmo que não controlada, quando observa, levanta hipóteses e, a partir disso, testa a eficácia de diferentes formas de atuação.

Análise de ContingênciasO termo “contingência” significa uma relação de dependência entre eventos. Nes­te capítulo, utiliza-se a terminologia análise de contingências, em vez de análise funcional também bastante disseminada na cultura analítico-comportamental, porque a última se aplica à análise que segue um rigor experimental (manipulação e controle de variáveis). Como, em clínica, se lida com variáveis múltiplas e pouco controle sobre elas (especialmente porque se trabalha com informações derivadas de relato verbal), a terminologia análise de contingências é mais apropriada, cla­rificando que tal análise não é experimental.

Outra terminologia disseminada é avaliação funcional (Follette, Naugle e Linnerooth, 2000; Ulian, 2007). No presente capítulo, o termo análise de contin­gências será também preferido em relação ao termo avaliação funcional uma vez que toda análise já é uma avaliação, mas nem toda avaliação é uma análise. Ana­lisar significa decompor o objeto de avaliação em fatores (oposto a sintetizar, que significaria agrupar fatores para realizar uma síntese), e é isso que se faz em uma análise de contingências, ao decompor o comportamento em antecedente, res­posta e conseqüência.

O modelo teórico analítico-comportamental descreve o comportamento em termos de um processo de seleção pelas conseqüências. Nesse processo, pelo menos quatro elementos básicos são importantes para a compreensão de um determinado comportamento: as operações estabelecedoras (OE), que estabelecem determina­dos estímulos como momentaneamente reforçadores e que evocam o comporta­mento que no passado foi seguido de tais reforçadores; os estímulos discriminativos (SD), que estabelecem a ocasião na qual, caso a resposta venha a ser emitida, o estí­mulo reforçador será produzido; a emissão da resposta (R) pelo indivíduo; e a apre­sentação de estímulos como efeito da (contingentes à) resposta emitida (SR). Este modelo teórico é representado pelo paradigma apresentado na Figura 7.1.

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Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental ■ 161

{OESD • R O S r

Figura 7.1 - Esquema representando o paradigma do comportamento operante, em que OE é uma operação estabelecedora; SD, um estímulo discriminativo; o símbolo • representa uma função probabilística em que, dadas determinadas circunstâncias, há uma probabilidade de que uma resposta seja emitida; “R” é a resposta, e a seta à direita indica uma relação de contin­gência entre resposta e conseqüência, e “SR” é o estímulo produzido pela resposta que, ao retroagir sobre o organismo, altera a probabilidade de que respostas da mesma classe sejam emitidas (Follette etal., 2000).

Partindo desse modelo teórico, pode-se imaginar um episódio ideal de inte­ração do indivíduo com o ambiente, no qual aquele:

• Está suficientemente motivado (há uma operação estabelecedora que torna algum evento momentaneamente reforçador e, portanto, evoca alguma resposta do indivíduo para produzi-lo - OE).

• Responde apropriadamente à ocasião (houve uma história anterior que estabeleceu um controle de estímulos apropriado sobre o responder - SD).

• Apresenta em seu repertório a resposta a ser emitida (R).• Sua ação produz reforçadores ou evita o contato com aversivos (conse­

qüências produzidas no ambiente que alteram a probabilidade da classe de respostas).

A queixa trazida pelo cliente ao consultório pode apontar problemas em cada um dos elos dessa seqüência de eventos. Assim:

• O cliente pode não estar suficientemente motivado para a emissão das res­postas necessárias em determinadas condições.

• O cliente pode não ter um controle de estímulos apropriado que estabeleça a ocasião para responder quando o reforçador está disponível (história insu­ficiente ou ineficaz de reforço diferencial).

• O cliente pode não apresentar o repertório necessário para que sua ação produza estímulos reforçadores.

• O ambiente (social ou físico) pode dispor conseqüências de maneira incon­sistente ou dispensar reforçadores para respostas que, a médio ou longo prazo, podem produzir estimulação aversiva.

Em qualquer caso, o modelo da análise de contingências é a base das inter­venções do terapeuta. A partir dessa organização, o terapeuta pode ter um panorama geral do caso clínico, envolvendo a análise tanto da função exercida pelas respostas-problema do cliente quanto de respostas do cliente que sejam desejáveis (pois produziriam reforçadores se emitidas em um contexto apropria­do) e que precisariam ser fortalecidas.

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162 ■ Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental

No processo de interação com o cliente, o terapeuta analítico-comportamen­tal apresenta uma ampla variedade de comportamentos, classificáveis em quatro grupos (Ireno, 2007):

• Estabelecimento da aliança terapêutica: comportamentos que levam o terapeuta a constituir uma audiência não punitiva e um agente reforçador, gerando um aumento da tolerância do cliente para expor-se a emoções aversivas.

• Postura profissional: comportamentos compatíveis com o código de ética da profissão e com o estabelecimento de um contrato de trabalho.

• Coleta de dados: comportamentos do terapeuta de coleta de dados referentes às queixas apresentadas pelo cliente (situação de vida, experiências passa­das e atuais, pensamentos e sentimentos), de forma a obter indicações consistentes das contingências atuantes.

• Procedimentos de intervenção: comportamentos do terapeuta de interven­ção sobre os comportamentos-alvo do cliente.

Etapas do Processo Terapêutico Analítico-comportamental*Nas últimas décadas, muitos autores (por exemplo, Dougher, 2000; Hayes, 1987; Kohlenberg eTsai, 2001; Pérez-Alvarez, 1996) avançaram na operacionalização dos processos de uma terapia verbal** de base analítico-comportamental.

Follette, Naugle e Callaghan (1996) apresentaram uma descrição bastante detalhada das diferentes etapas que ocorrem ao longo do processo de interação terapeuta-cliente, considerando a relação do principal mecanismo de mudança. Entende-se, deste ponto de vista, que o comportamento do cliente na sessão é uma amostra dos padrões de interação que ele estabelece com o seu ambiente social e que, ao interagir com o terapeuta, são desenvolvidos novos padrões de interação. A modelagem de repertório social, por meio de reforço diferencial na in­teração terapêutica, seria então a principal estratégia a ser empregada pelo terapeuta. Para isso, supõe-se o terapeuta como alguém que pode dispor de re­forçadores sociais em que o cliente é (ou se torna, ao longo da terapia) sensível. O processo por meio do qual o terapeuta torna-se uma potencial fonte de refor­çadores sociais e a maneira com que ele dispõe dessa característica da interação para produzir mudanças, conforme descritos por Follette et al. (1996), são apre­sentados a seguir.

* Parte do material apresentado é uma adaptação de outro trabalho de Meyer (2003) e da tese de dou­torado de Zamignani (2007).** Grande parte da interação que ocorre em psicoterapia é eminentemente verbal (Pérez-Álvares, 1996), e a prática terapêutica “de gabinete” é a mais divulgada, embora existam outros formatos de intervenção, como, por exemplo, o atendimento clínico extraconsultório e combinações das duas modalidades de atendimento (ver Zamignani, Kovac e Vermes, 2007).

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Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental ■ 163

Processo de Reforçamento Social nas Sessões Terapêuticas IniciaisDe acordo com Follette et al (1996), a forma como o cliente se comporta na interação direta com o terapeuta é de especial interesse e a história de aprendizagem que ocor­re ao longo dessa interação é o mecanismo de mudança que ocorre na terapia. O processo começa desde a primeira sessão, quando o cliente procura o terapeuta. Assim, o simples fato do cliente ter procurado ajuda, independentemente de qualquer padrão de comportamento que ele apresente, deve ser alvo de reforço social, via expressões gerais de suporte ao fato de o cliente estar em terapia, dados os problemas que o cliente enfrenta. O que faz do terapeuta, nesse momento, alguém que pode dispor de reforço social é o seu status profissional que, segundo Follette etal (1996), serve como uma operação estabelecedora, que pode evocar respostas do cliente de se engajar no tratamento, importantes uma vez que, para alguns clientes, é difícil falar a respeito de eventos constrangedores, pensamentos, fraquezas pessoais ou erros (Sturmey, 1996).

O reforço social* que o terapeuta deve prover nesse momento parece “não con­tingente”, uma vez que não é direcionado a nenhuma classe de respostas específica do cliente. Entretanto, ele é relacionado a uma ampla classe de comportamentos do cliente de se engajar em um processo de mudança. As classes de resposta a serem emitidas pelo terapeuta são aquelas necessárias para o processo terapêutico ocorrer e são constituídas tipicamente por ações e verbalizações do terapeuta que sugerem cuidado e suporte geral contingente à procura pela terapia (Follette etal.y 1996).

A audiência não punitiva é parte importante desse processo inicial. Skinner (1974) afirma que, para constituir-se como uma alternativa a uma história de inte­ração com eventos aversivos, o terapeuta ouve o relato do cliente sem nenhum tipo de crítica ou julgamento. Supõe-se que esse tipo de interação favoreça que o clien­te fale sobre assuntos “difíceis” - temas ou ações cujo contato ele vinha evitando porque teriam sido punidos em sua história de vida (Skinner, 1974; Sturmey, 1996; Vermes, Zamignani e Kovac, 2007). Como efeito desse conjunto de contingências- o terapeuta se estabelece como ocasião para interações reforçadoras e para a re­moção do controle aversivo -, o terapeuta, por si só, pode tornar-se um evento reforçador condicionado, e o contexto da terapia pode tornar-se algo “desejável”.

Não é em todos os casos que respostas de acolhimento e compreensão, sozinhas, são suficientes para conduzir uma boa intervenção. Banaco (1997), por exemplo, afirma que, além de o terapeuta oferecer um contexto de acolhimento e compreen­são, ele deve demonstrar que entende as relações descritas pelo cliente e que dispõe de estratégias para ajudá-lo. Sturmey (1996), inclusive, aponta que, para alguns clientes, altos níveis de acolhimento e empatia podem ser contra produtivos, ofensivos ou culturalmente inapropriados. Isso indica que aquilo que é reforçador

* Vale ressaltar que, ao se falar sobre reforço social, assume-se uma possível função de ações do tera­peuta. Isso porque, culturalmente, interesse e elogios costumam exercer função reforçadora para as classes de resposta que a produzem. Entretanto, não se pode perder de vista a noção de que a função reforçadora de determinados estímulos é idiossincrática, dependendo da história de interação do cliente com cada classe de ações do terapeuta.

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164 ■ Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental

para um indivíduo pode não ser para outro, cabe ao terapeuta observar os efeitos de suas intervenções.

O processo pelo qual o terapeuta se estabelece como um reforçador condicio­nado é chamado por alguns autores de constituição da aliança terapêutica, que deve ser estabelecida desde muito cedo na terapia: “deve estar claro para o cliente que suas preocupações estão sendo levadas a sério e tratadas de maneira profissio­nal” (Sturmey, 1996, p. 73). Como se vê, os desempenhos do terapeuta na constituição da aliança terapêutica, e a racional para o entendimento da importância dessa aliança, estão pautados nos princípios da análise de contingências.

Coleta de Informações Necessárias para a Avaliação ComportamentalParalelamente ao processo de estabelecimento da aliança terapêutica, desde as pri­meiras sessões, é necessário que o terapeuta colha informações sobre o cliente, de modo a construir um panorama geral sobre sua queixa e outros aspectos de seu re­pertório comportamental. Esse processo de coleta de informações é pautado na análise de contingências relacionadas à instalação e manutenção dos problemas tra­zidos pelo cliente como queixa e determinará quais intervenções serão desenvolvidas.

A Figura 7.2, a seguir, baseada no texto de Follette et a l (2000), apresenta as etapas que compõem, tipicamente, a avaliação comportamental conduzida na terapia analítico-comportamental. Vale lembrar que o trabalho clínico não é um processo linear e que as etapas apresentadas não representam necessariamente uma seqüência temporal de eventos. Follette et al (2000) afirmam que este ciclo

Figura 7.2 - Etapas da avaliação comportamental (adaptado de Follette etal., 2000).

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Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental ■ 165

de eventos ocorre quantas vezes for necessário para produzir análises que levem a intervenções úteis ou a resultados desejáveis.

A primeira etapa da avaliação, destacada por Follette et al (2000), diz respeito à identificação dos problemas apresentados pelo cliente e à organização deles em tomo de algum tipo de critério de importância clínica. Habilidades e déficits comportamentais do cliente, bem como aspectos ambientais facilitadores e problemáticos (tais como suporte social, saúde, recursos financeiros, disponibilidade e diversidade do ambiente para prover reforçadores, questões legais envolvidas etc.) são então levantados, em busca de se estudar as condições disponíveis para a mudança (Follette et al, 2000).

Informações sobre habilidades e metas de mudança ajudam no planejamen­to de comportamentos alternativos ou incompatíveis com a resposta-queixa, além de proporcionar informações sobre possíveis fontes de reforço que estariam su- butilizadas ou indisponíveis (Sturmey, 1996).

Também para Meyer (2003), o primeiro passo para realizar uma análise de contingências do caso clínico é a identificação dos comportamentos de interesse, o que deve ser enunciado tanto em termos de comportamentos ou omissão de com­portamentos, como em termos de classes funcionais mais amplas.

Nesse sentido, a seleção do comportamento para análise e intervenção pode ser molecular - focada preferencialmente na queixa trazida - ou molar (quando conside­ra a queixa com relação a outros aspectos da vida do cliente). Já em 1972, Ferster argumentou que os problemas comportamentais detectados no cliente que busca a terapia são muito mais abrangentes do que a queixa específica e restrita trazida por ele. Para Ferster (1972) o terapeuta deveria lidar com o repertório geral de comporta­mentos do cliente e não atentar, prioritariamente, para a queixa específica apresentada por ele. Esse repertório geral inclui os excessos e déficits comportamen­tais, além dos comportamentos “saudáveis” que o cliente tenha de fato aprendido, mas que por qualquer razão esteja ocorrendo em baixa frequência. Portanto, para todos os autores citados (Ferster, 1972, Follette etal, 2000, Meyer, 2003, Sturmey, 1996) em um diagnóstico funcional, característico da terapia analítico-comportamental, cabe ao terapeuta ampliar o alcance da investigação, abrangendo esse repertório e as relações entre ele e os eventos reforçadores e punitivos disponíveis no ambiente.

A ampliação da análise para além da queixa inicial implica também na diferen­ciação entre respostas e classes de respostas. As classes de respostas são conjuntos de respostas com topografia (especificação da forma do comportamento) diversa, mas que apresentam a mesma função. Na verdade, topografias iguais podem ter funções diferentes, e topografias diferentes podem ter funções iguais.

Os comportamentos de interesse devem ser enunciados clara e objetivamente em termos de ações do cliente, o que inclui identificar e descrever a frequência, duração ou intensidade com que o comportamento ocorre. O passo seguinte é o da identifi­cação de relações ordenadas entre variáveis ambientais e o comportamento de interesse, assim como a identificação de relações entre o comportamento de interes­se e outros comportamentos existentes. Para isso, coletam-se informações sobre eventos que antecedem e sucedem o comportamento de interesse, para em seguida identificar os eventos que, de fato, exercem controle sobre as respostas analisadas.

A queixa do cliente com relação aos eventos antecedentes pode envolver a falta de eventos antecedentes apropriados para a emissão de respostas que produ­

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ziriam reforçadores (em razão da falta de oportunidade para a emissão de com­portamentos desejados ou a um ambiente restritivo); pode não existir um controle discriminativo (o cliente não é capaz de identificar as condições sob as quais certas classes de comportamentos produziriam reforçadores); ou pode haver um controle discriminativo inapropriado (é o caso de comportamentos que produzem conse­qüências desejáveis para o cliente, mas que não são apropriados ao contexto no qual ocorrem) (Follette et al., 2000). Kanfer e Grimm (1977) acrescentam ainda o caso de controle inapropriado por estímulos autogerados (o indivíduo nomeia e responde incorretamente a estados internos).

Com relação ao responder do cliente, podem existir problemas relacionados a excessos comportamentais (comportamentos que ocorrem com frequência ou intensidade excessiva); déflcits comportamentais (falta de repertórios importantes, tais como habilidades sociais, expressão de intimidade etc.) ou a comportamentos intervenientes (comportamentos que impedem a emissão de outras respostas mais efetivas para a produção de reforçadores).

Por último, com relação às conseqüências, podem inexistir as conseqüências que seriam apropriadas para a manutenção do comportamento-alvo; podem ocorrer conseqüências concorrentes (a mesma ação pode produzir diferentes conseqüências, gerando situações de conflito) ou pode ocorrer um controle inapropriado pelas conseqüências (é o caso de comportamentos que produzem conseqüências refor­çadoras para o indivíduo, mas que podem ser inapropriadas para o grupo, tais como situações de abuso sexual).

Estratégias Utilizadas para a Coleta de InformaçõesAs principais estratégias utilizadas para a coleta das informações no trabalho clínico são a entrevista e a observação no contexto da terapia. A coleta de dados por meio da entrevista clínica é parte integrante de qualquer modalidade de ava­liação e pode ser inclusive a única estratégia utilizada para este fim. Durante a entrevista, o terapeuta tipicamente solicita que o cliente relate eventos, sentimen­tos e pensamentos e que estabeleça relações entre esses eventos.

Entretanto, deve-se levar em consideração que o relato do cliente é, muitas vezes, impreciso, isto é, nem sempre há correspondência entre o relato (verbal) e a ocorrência do comportamento relatado (não verbal). O cliente pode não ter “consciência”, ou seja, não ser capaz de relatar parte dos seus vários comporta­mentos, ou mesmo, subestimar ou superestimar a frequência de alguns. Por esse motivo, muitas vezes é interessante solicitar ao cliente uma nova observação, mais acurada, eventualmente com o uso de registros escritos.

No caso de clientes que chegam à terapia com suas próprias teorias - ineficazes- sobre o problema (Sturmey, 1996) ou no caso do relato do cliente ser predomi­nantemente a respeito de eventos encobertos (Banaco, 1993), o terapeuta deve apresentar questões de reflexão, de modo a produzir informações para uma aná­lise das contingências e construir um novo repertório discriminativo. À medida que esse tipo de interação ocorre, o cliente pode passar a estabelecer relações entre suas ações abertas ou encobertas e eventos ambientais relevantes.

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Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental ■ 167

O relato de eventos privados pode também ser utilizado como estratégia para obtenção de dados sobre o cliente. Alguns terapeutas solicitam do cliente o relato de sentimentos, sonhos e fantasias como estratégias para acesso a informações difíceis de serem obtidas por meio de relato direto (Banaco, 1993; Delitti e Meyer, 1995; Nalin, 1993; Otero, 1993). Uma vez que o cliente tenha descrito eventos deste tipo, o terapeuta pode então solicitar que o cliente estabeleça relações ou analogias entre estes eventos e episódios por ele vividos, elaborando, então, interpretações a partir das contingências em vigor.

Considerando que o comportamento do cliente na interação terapêutica é uma amostra de padrões de interação que ele estabelece em seu ambiente social, o inte­resse do terapeuta não deve se resumir aos eventos descritos no relato verbal do cliente, mas também à forma com que o cliente interage com ele durante a sessão terapêutica. Nesse sentido Banaco (1993) afirma que, assim como é possível “apri­morar” o autoconhecimento do cliente a partir do seu relato verbal sobre estados internos, respostas abertas sutis do cliente podem ser indicativas de estados emocio­nais. É importante, por esta razão, a identificação, por parte do terapeuta, de manifestações corporais externas do cliente que podem ser indicativas de sentimen­tos e emoções e, por conseguinte, de contingências de reforço em vigor na relação terapêutica ou relacionadas ao tema relatado. Estas respostas podem também sugerir ao terapeuta informações sobre o impacto que determinados eventos exercem sobre seu comportamento e sobre a qualidade da relação terapêutica.

A Transposição da Análise de Contingências para a IntervençãoFollette et al. (1996) afirmam que, a partir de uma etapa inicial de reforço, aparen­temente não contingente a nenhuma classe de resposta específica, gradualmente ocorre um afunilamento do foco das conseqüências providas pelo terapeuta du­rante a sessão terapêutica. Aos poucos, então, o terapeuta passa a dirigir sua intervenção a aspectos mais específicos do responder do cliente, com vistas à instalação e manutenção de comportamento e à construção de condições para a mudança. Esta etapa coincide com a aplicação de procedimentos por parte do terapeuta a partir da análise de contingências.

Um procedimento comum nas terapias verbais é o desenvolvimento de auto­conhecimento. A este respeito, De Rose (1997) afirma:

A psicoterapia pode ser entendida, ao menos em parte, como uma metodologia para refinar o autoconhecimento, especialmente no que diz

respeito ao controle discriminativo exercido pelo mundo privado do indivíduo. Um dos requisitos para isto provavelmente é que o terapeuta

desenvolva uma sensibilidade para as correlações entre eventos privados e comportamentos manifestos. Isto permite ao terapeuta inferir aspectos do mundo privado do cliente a partir de manifestações sutis; com base nestas

inferências, ele pode auxiliar o cliente no treino das discriminações que ajudam a desenvolver o autoconhecimento... (p. 156)

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168 ■ Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental

De forma similar, Vermes, Kovac e Zamignani (2007) apontam que o trabalho do terapeuta deveria, como um de seus objetivos, chegar à condição em que o cliente não precise mais do terapeuta e, para tanto, este deveria favorecer que o cliente apresentasse a sua própria análise e suas propostas de mudança.

Já os problemas identificados em cada um dos elos da relação comportamental exigem, do terapeuta, diferentes estratégias de intervenção. No caso de não existirem eventos antecedentes apropriados para a emissão de respostas, Kanfer e Grimm (1977) propõem a modificação direta do ambiente atual (o que, segundo Zamignani, Kovac e Vermes, 2007, é viável apenas por meio de intervenção extraconsultório) ou a busca por novos ambientes que disponibilizem reforçadores de uma forma mais apropriada. Follette et al (2000), nesse sentido, sugerem que o terapeuta facilite esta descoberta pelo cliente e incentive sua participação em ambientes mais ricos em oportunidades de interação. O terapeuta pode dispor de diferentes estratégias para conduzir o clien­te em busca de novos ambientes ou grupos sociais. Uma das possibilidades é por meio da apresentação de uma interpretação, na qual ele pode explicitar as variáveis do ambiente que impedem a mudança. Outra possibilidade é a recomendação direta de busca por ambientes alternativos. Esta é, provavelmente, a forma mais “diretiva” e, talvez, a que produziria mais rapidamente a mudança necessária.

Quando não há um controle discriminativo ou há um controle discriminativo inapropriado, Follette et al. (2000) recomendam a modelagem de um repertório discriminativo, de modo que o cliente passe a responder em contextos apropriados ou desenvolva repertórios comportamentais funcionalmente equivalentes àque­les que ocorriam em ambientes inapropriados. Kanfer e Grimm (1977) também sugerem, no caso de controle inapropriado por estímulos autogerados, o desenvol­vimento de treinos discriminativos, de modo que o cliente venha a nomear mais apropriadamente seus estados internos. Na terapia verbal, o treino discriminativo- reforço diferencial de respostas, quando há estímulos apropriados - se aplica apenas a episódios que envolvem o controle discriminativo sobre respostas sociais e, mesmo assim, em alguns casos, não é possível dispor, na terapia, de contextos sociais funcionalmente equivalentes àqueles nos quais ocorre a resposta-proble- ma do cliente, de modo a fornecer diferencialmente as conseqüências. Cabe ao terapeuta, nestes casos, o recurso verbal, intervindo por meio de análises inter- pretativas, apontamentos e feedback sobre a adequação dos eventos relatados verbalmente pelo cliente.

No caso de excessos comportamentais, Kanfer e Grimm (1977) sugerem o de­senvolvimento de respostas incompatíveis com a resposta que ocorre em excesso, o que poderia ser alcançado utilizando-se qualquer um dos procedimentos utili­zados para o ensino de repertório. Sturmey (1996) defende que, mais do que meramente remover uma resposta indesejada, o tratamento analítico-comporta- mental deve ter em vista aumentar a frequência de comportamentos desejáveis.

Para casos em que o problema do cliente envolve déficits comportamentais, Kan­fer e Grimm (1977) sugerem como intervenção que o terapeuta ofereça informação sobre o desempenho correto ou sobre padrões sociais para o comportamento apro­priado a determinadas situações. Além da estratégia proposta por esses autores, pode-se considerar a modelagem por aproximações sucessivas, estratégia na qual repostas que se aproximam daquela a ser aprendida são reforçadas socialmente pelo terapeuta até que o cliente apresente o repertório desejado e produza os reforçadores

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Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental ■ 169

naturais que manteriam a ocorrência do comportamento (Zamignani e Jonas, 2007). Outra estratégia frequentemente usada no ensino de repertório novo é a modelação, que consiste em o terapeuta oferecer modelos de respostas para que o cliente os siga.

Quando o terapeuta identifica a existência de comportamentos intervenientes que impedem a emissão de outras respostas mais efetivas para a produção de reforçadores, Follette et al (2000) sugerem que o terapeuta observe a ocorrência destes comportamentos em exercícios de representação ou mesmo em observação in vivo. Estas circunstâncias devem, então, ser apontadas para o cliente e o tera­peuta deve alterá-las, antes que alternativas mais eficazes de respostas venham a ser estabelecidas. Caso estes comportamentos intervenientes sejam constituídos por excessos comportamentais, estas classes de respostas que ocorrem em excesso poderiam ser substituídas por comportamentos mais úteis, utilizando-se para isso estratégias para a redução e instalação de novas respostas.

Quando o problema do cliente envolve um arranjo problemático de contingên­cias, Follette et al. (2000) alertam o terapeuta que, se tais condições ambientais não forem alteradas, o comportamento tenderá a não se manter e a ser substituído por comportamentos mais problemáticos. Para lidar com esta condição, Kanfer e Grimm (1977) propõem que o terapeuta estabeleça um rearranjo de contingências. Para isso, ele deve estabelecer junto ao cliente objetivos de curto prazo e reforçadores arbitrários intermediários, até que respostas de autogerenciamento do cliente ve­nham a ser fortalecidas por meio de conseqüências naturais.

No caso de conseqüências concorrentes ou controle inapropriado pelas conseqüên­cias, Follette et al. (2000) sugerem que intervenções em ambiente natural sejam desenvolvidas de modo a restringir o acesso ou aumentar o custo de respostas que envolvam a emissão de comportamentos inapropriados. Em consultório é ainda possível desenvolver uma análise de conseqüências: terapeuta e cliente identificam as conseqüências concorrentes, tanto as reforçadoras, que mantêm a resposta, quanto as aversivas, que produzem efeitos indesejáveis, mas que não têm a função de punir comportamentos inapropriados. O efeito esperado de tal análise é que as conseqüências aversivas, que ocorrem no dia a dia do cliente, passem a exercer função punitiva, levando à redução da resposta que produz tal conseqüência.

Comportamentos do Terapeuta na Condução de Procedimentos de MudançaMeyer (2004) propôs uma classificação dos procedimentos básicos empregados pelos terapeutas para promover mudança de comportamento:

• O terapeuta fornece regras.• O terapeuta favorece autorregras.• O terapeuta fornece estimulação suplementar.• O terapeuta modela repertórios.

Os dois primeiros procedimentos descritos por Meyer (2004) envolvem a espe­cificação de alternativas de ação ou a elaboração de descrições de contingências,

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170 ■ Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental

seja por meio do fornecimento de conselhos, ordens e descrições de contingências, seja por meio de incentivo para a construção de autorregras por parte do cliente.

A terceira estratégia refere-se ao fornecimento de estimulação suplementar pelo terapeuta. De acordo com Meyer (2004), uma situação complexa é composta por um grande número de estímulos e, em alguns casos, a queixa do cliente envolve um responder sob controle discriminativo de apenas uma parte destes estímulos, gerando uma ação ineficaz para a produção de reforçadores.

O terapeuta então identifica uma propriedade do estímulo discriminativo que controla uma resposta e torna mais salientes outras propriedades do

mesmo estímulo físico, que já controlam outras respostas. Essas instruções do terapeuta para que o cliente preste atenção a outros aspectos da mesma

situação pode aumentar a probabilidade de que novos aspectos passem acontrolar o comportamento, (p. 154-155)

O último dos procedimentos descritos por Meyer (2004) consiste da modelagem de repertórios por meio do resultado direto dos comportamentos do cliente que ocorrem na interação com o terapeuta, considerando o argumento apresentado por Follette etal. (1996) e por Kohlenberg (1986), de que os comportamentos do cliente que ocorrem durante a sessão terapêutica são uma amostra de sua forma de agir em outros contextos. A modelagem direta de comportamentos envolve desde a audiên­cia não punitiva do terapeuta, que seleciona e fortalece respostas de aproximação e autoexposição do cliente, até a seleção de outras respostas sociais do cliente, por meio de reforço diferencial.

As diferenças nas estratégias propostas por Meyer (2004) apontam para o debate, dentro da aplicação da análise do comportamento, referente ao controle por regras. Alguns autores defendem que o controle por regras é uma forma eficaz de controle do comportamento humano (por exemplo, Catania, 1999); outros questionam a ênfase nesse tipo de controle na relação terapêutica (por exemplo, Guedes, 1993). Meyer (2004) apresentou a argumentação encontrada na literatura de que este tipo de procedimento é especialmente importante nos casos em que “as conseqüências do comportamento são muito adiadas ou escassas, tornando-se, portanto, ineficazes na modificação de comportamentos, ou quando os comportamentos que seriam modelados pelas contingências em vigor são indesejáveis” (p. 152). Regras apresen­tadas pelo terapeuta podem especificar claramente uma ação que o cliente deveria seguir, ou prescrever uma tarefa terapêutica (nesses casos, seriam regras específicas), ou, de forma mais genérica, especificar o resultado a ser atingido, em vez da topo­grafia da ação a ser executada (regra genérica).

Discutindo as diferentes possibilidades de utilização da análise de contingências no contexto clínico, Sturmey (1996) considera que a interpretação de contingên­cias pode ser utilizada como tratamento, ou como um dos componentes do tratamento. Posição semelhante é adotada por Meyer (2004), ao afirmar que a aná­lise de contingências feita pelo terapeuta com seu cliente seria um procedimento de fornecimento de regras. O terapeuta, neste caso, deveria levar o cliente a desen­volver uma análise de contingências do próprio comportamento e ajudá-lo a usar essa análise para mudar seu próprio comportamento. Para isso, ele pode apresentar

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Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental ■ 171

a análise de contingências para o cliente ou trabalhar colaborativamente com este para desenvolver uma análise compartilhada. Goldiamond (1975) recomenda que o cliente seja conduzido a elaborar sua própria análise, ao invés de recebê-la pron­ta, o que implica uma participação mais ativa do cliente no próprio tratamento.

Guedes (1993), por sua vez, critica o modelo de intervenção com base no con­trole por regras. Esta autora afirmou que “contingências artificiais da sessão têm pouca chance de competir com as contingências, em geral, mais antigas, mais significativas e mais freqüentes na vida do sujeito” (1993, p. 84), e que a generali­zação a partir de conselhos ou regras só é possível para pacientes cujo repertório de comportamentos de “seguir regras” é bastante fortalecido.

Meyer (2004) e Zamignani e Jonas (2007) acrescentam outros problemas que podem envolver o seguimento de regras. Um destes problemas é o risco de que o indivíduo venha a responder sob controle da regra e deixe de emitir respostas de observação dos eventos que controlariam naturalmente a resposta em questão. Tal fenômeno tem sido denominado na literatura de pesquisa básica como insensibili­dade às contingências. Estes autores apontam também que, quando conseqüências sociais (implícitas ou claramente descritas na regra), competem com as conseqüên­cias naturais do comportamento descrito na regra, as primeiras podem sobrepujar as conseqüências naturais do responder, fazendo com que o indivíduo siga regras sob controle de aprovação social e não da contingência natural do comportamento especificado pela regra. O fornecimento de regras (principalmente as que especifi­cam a topografia da resposta a ser emitida) pode prover pouca oportunidade para a construção do repertório necessário para o desenvolvimento de autonomia do cliente. Alguns estudos (citados em Meyer, 2005) apontam ainda uma maior frequên­cia de respostas de resistência ou oposição do cliente quando o terapeuta age de forma mais diretiva.

O feedback diferencial, por sua vez, com vistas a manter certos padrões de comportamento e diminuir a probabilidade de ocorrência de outros, não garante a generalização do comportamento para outros contextos, que não a interação terapêutica. Especialmente quando se trata de conseqüências providas à descrição de comportamentos do cliente que não ocorrem na sessão, há certa dificuldade técnica para que o comportamento verbal (fortalecido na sessão) venha a contro­lar o comportamento não verbal em outro contexto.

Meyer (1995) afirma que o conhecimento e a aplicação dos princípios básicos do comportamento, assim como a relação desses princípios com as práticas (técnicas e procedimentos), devem existir para que um trabalho terapêutico seja considerado consistente com a análise do comportamento. Conceitos tais como reforço, extinção, punição, controle de estímulos, generalização e outros devem fornecer a estrutura conceituai para o desenvolvimento da prática do terapeuta analítico-comportamental.

Autores como Cahill, Carrigan e Evans (1998), Follette et al. (1996), Goldfried e Davidson (1976) e Rosenfarb (1992) consideram que o fortalecimento de uma ampla gama de comportamentos é pré-requisito para o engajamento do cliente no trabalho, mas não é suficiente para que ocorram mudanças efetivas, sendo necessário o reforço contingente à emissão de comportamentos alternativos, considerados mais satisfatórios. Ao mesmo tempo, é fundamental que o terapeu­ta apresente conseqüências diferentes daquelas encontradas no ambiente natural

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172 ■ Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental

do cliente - as quais têm mantido seus comportamentos-problema (Folette et al, 1996; Rosenfarb, 1992).•

Em resumo, diversos processos comportamentais podem ser responsáveis por mudanças que ocorrem na psicoterapia. Mudanças podem ocorrer por meio da alte­ração do controle por regras e autorregras, por adição de estimulação suplementar, mas também por meio da modelagem de novos comportamentos na relação terapêu­tica. O mais provável é que os vários tipos de procedimentos estejam envolvidos nos processos de mudança, em proporções diferentes, conforme o terapeuta e o cliente.

Assim, a terapia analítico-comportamental é uma forma de prestação de serviços que utiliza o arcabouço teórico da análise do comportamento e o conhecimento de pesquisas básicas e aplicadas para a solução de problemas humanos. Intervenções de terapeutas analítico-comportamentais são baseadas em filosofia, princípios, conceitos e métodos da ciência do comportamento e incidem sobre as relações do cliente com o seu ambiente, incluindo as relações que definem seus sentimentos e suas cognições, com a participação de eventos (estímulos e respostas) públicos e priva­dos. Para isso, a análise de contingências é o instrumento básico e imprescindível, seja na avaliação da queixa do cliente, seja no delineamento, aplicação e avaliação da própria intervenção. A intervenção pode ser dirigida a diferentes componentes da tríplice contingência, ou seja, mudanças podem ser propostas para alterar antece­dentes, respostas ou conseqüentes. Os comportamentos do terapeuta durante as sessões para atingir tais objetivos podem ser classificados como fornecimento de regras, favorecimento de autorregras, fornecimento de estimulação suplementar e modelagem de repertórios.

978-85-7241-865-2

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CAPÍTULO

Função do Comportamento e do D SM: Terapeutas

Analítico-comportamentais Discutem a Psicopatologia*

R o b e r t o A lv es B a n a co D e n is R o b e r t o Z a m ig n a n i Sô n ia B e a t r iz M e y e r

The scientist who takes time out to consider human nature when so many practical things need to be done

for human welfare is likely to be cast in the role of Nero, fiddling while Rome burns**.

Skinner , 1959, p. 204-205

* O termo “analítico-comportamental” para adjetivar a terapia calcada em preceitos e conceitos da análise do comportamento foi proposto ini­cialmente por Tourinho e Neno (em alguns trabalhos, assinando como Cavalcante). Em um encontro realizado em 2000, na cidade de São Pau­lo, após longa discussão e análise por terapeutas de diferentes regiões do país, o termo foi adotado como ideal para qualificar a prática de terapeutas comportamentais que assumem a análise do comportamento enquanto ciência fundamental e o behaviorismo radical de Skinner enquanto funda­mentação filosófica. O termo serve também para demarcar a identidade de um grupo que não partilha as mesmas concepções explicativas da terapia cognitivo-comportamental. Para melhor conhecimento das delimitações entre as propostas analítico-comportamentais e cognitivas, ver Kazdin, 1978; Pérez-Alvarez (1996); Sturmey (1996a) e Sturmey (2007).** O cientista que passa o tempo examinando a natureza humana enquan­to tantas coisas práticas precisam ser feitas pelo bem-estar humano está, provavelmente, representando o papel de Nero, dedilhando (sua lira) en­quanto Roma queima.

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176 ■ Função do Comportamento e do DSM: Terapeutas Analítico-comportamentais..

A análise do comportamento teve seu conhecimento aplicado à clínica quando experimentos conduzidos por Skinner, Solomon e Lindsley, em 1953, com pacien­tes psicóticos, impulsionaram o desenvolvimento de trabalhos que utilizavam técnicas operantes, visando à modificação de comportamentos em humanos (Kazdin, 1978). Tal prática teve início em um momento histórico relativamente tardio, se comparada a outras abordagens da psicologia, cujas origens se deram a partir da própria atividade clínica. As abordagens psicológicas que desenvolviam atividades clínicas até então tinham seu modelo de psicopatologia e de diagnós­tico psicológico pautados em explicações intrapsíquicas cuja proposta era, em muitos aspectos, análoga ao modelo médico (Krasner e Ullmann, 1965; Kazdin, 1978) o que levou alguns autores a denominá-la modelo quase-médico (Cavalcan­te e Tourinho, 1998; Silvares e Banaco, 2000).

Diante desse cenário, a proposta de compreensão do fenômeno clínico oferecida pela análise do comportamento prometia uma abordagem completamente inovado­ra. Com base em uma perspectiva científica e “extemalista”, ela rejeitava qualquer explicação metafísica para o comportamento. Além disso, tendo como referência o modelo de pesquisa de sujeito único, atribuía, comparando a outras abordagens, uma menor importância a qualquer tipo de método de produção de conhecimento com base em pesquisas estatísticas. Neste sentido, toda a instrumentação oferecida ao psicólogo até então para o diagnóstico e classificação dos problemas psicológicos parecia pouco apropriada para os terapeutas comportamentais, incluindo os testes e escalas de avaliação, bem como qualquer tentativa de classificação diagnostica dos problemas comportamentais (Keefe, Kopel e Gordon, 1980).

A distinção da compreensão analítico-comportamental do fenômeno “psico- patológico” com relação a outras abordagens e também à abordagem médica, em parte, passa pela diferenciação entre o modelo médico, o modelo chamado quase- médico e o modelo analítico-comportamental de análise.

O modelo médico de psicopatologia parte do pressuposto de que a doença ou transtorno é manifestação de uma patologia subjacente e, portanto, em se identifi­cando e definindo uma doença, deve-se buscar uma terapêutica específica (Sturmey, 1996a). Na medicina, esta terapêutica é geralmente farmacológica e sua eficácia é estudada, basicamente, por meio de estudos de comparação entre grupos (por exemplo, grupos de pacientes que recebem o tratamento placebo x grupos tratados com um determinado medicamento), o que fornece uma medida estatística da eficácia terapêutica. No modelo médico, são também estatísticos os critérios para a definição do comportamento patológico, sendo considerados patológicos, em geral, aqueles padrões que diferem significativamente da média da população (Banaco, 1999). Tal perspectiva, certamente, difere do modelo analítico-comportamental de análise, cujos critérios de avaliação são essencialmente funcionais.

O mesmo tipo de crítica apresentada ao modelo médico de psicopatologia dirigiu a oposição dos analistas do comportamento à psicologia de base psicodi- nâmica, que foi denominado modelo quase-médico:

O modelo da psicologia clínica, esta que descende diretamente da Medicina Psiquiátrica, pode ser chamado também de quase-médico.

Apesar de tentar atenuar a distinção entre doença e saúde, este modelo

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Função do Comportamento e do DSM: Terapeutas Analítico-comportamentais... ■ 177

esbarra sempre na dicotomia entre o normal e o patológico e considera as respostas “disfuncionais” do indivíduo (também aqui entendidas como

seu comportamento) como um sintoma da doença, esta subjacente. O indivíduo a ser analisado, quando comparado com uma maioria

normal tem um problema que pode ser descrito como: uma psique doente, um traço de caráter enfraquecido, uma personalidade desviante, uma doença mental, uma estrutura cognitiva falha, um sistema de crenças irracionais etc., que merecem tratamento. Seus estudos e classificações

também se baseiam nos critérios ditados pela maioria, ou seja, em critérios estatísticos que levam em consideração a distribuição prevista pela curva

normal. A principal diferença entre esta abordagem e a abordagem do modelo médico, é que esta acredita que para sanar o mal que acomete os

seres humanos, nem sempre é necessária a utilização de farmacologia para o tratamento (aliás, para esta abordagem é desejável que o tratamento se

utilize o menos possível da terapêutica medicamentosa). (...) esta abordagem também se preocupa, em suas pesquisas, com procedimentos

que atinjam a maior parte das pessoas acometidas pelo mal. Os profissionais que a abraçam prescrevem tratamentos que funcionam para populações, esperando sempre um resultado positivo também nos

repertórios dos indivíduos a eles expostos. (Banaco 1999, p. 79)

Já o modelo analítico-comportamental visa uma abordagem funcional do comportamento tipicamente classificado como psicopatológico. Segundo Neef e Northup (2007), “uma abordagem funcional não faz conjecturas a respeito de etiologia” (p. 89). Pelo contrário, ela busca identificar sob quais circunstâncias um comportamento denominado como psicopatológico pode ser originado, provo­cado e mantido (Banaco, 1999; Carr, Langdon e Yarbrough, 1999; Cavalcante e Tourinho, 1998), e dessa maneira, a partir da identificação das funções desse tipo de comportamento, derivar as estratégias de atuação (Follette, Naugle e Linnerooth, 2000; Falk e Kupfer, 1998; Sturmey, 1996a).

Dadas posições tão distintas dentro do estudo da psicopatologia, seria neces­sário um posicionamento de cada abordagem frente a instrumentos comumente utilizados para a prática do diagnóstico e escolha da terapêutica de enfrentamento desses fenômenos. Tal discussão impõe ao clínico analítico-comportamental uma reflexão sobre os limites, ou mesmo sobre a adequabilidade do uso de um manual de classificação psiquiátrica para a avaliação e intervenção clínicas. Isto exige, por sua vez, uma análise do próprio instrumento, visando caracterizar em que medida ele se aproxima do modelo médico e, em que aspectos, ele pode oferecer elemen­tos para uma análise funcional do problema clínico.

Uso e Disseminação do DSM na PsicologiaO Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM) tem sido utili­zado por terapeutas e pesquisadores de diferentes orientações. Segundo o seu próprio texto, ele tem sido fonte de consulta de profissionais de várias áreas: psi­

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178 ■ Função do Comportamento e do DSM: Terapeutas Analítico-comportamentais...

quiatras, psicólogos, assistentes sociais, enfermeiros, terapeutas ocupacionais, e mesmo advogados, que abraçam várias correntes filosóficas e psicológicas, tais como psicodinâmica, cognitiva, comportamental, interpessoal, sistêmica e biológica (APA, 2004). Apesar de várias críticas recebidas, a comunidade de terapeutas e pesquisa­dores comportamentais tem utilizado amplamente esse manual para os seus trabalhos. Este não é um fenômeno novo e já tem sido observado e apontado em outros trabalhos (por exemplo, Hayes e Follette, 1992; Tourinho e Neno, 2003).

Para iniciar uma análise sobre o DSM pode-se recorrer à história de sua cons­trução e desenvolvimento. Encontra-se nas primeiras páginas do DSM a indicação de que pelo menos 750 profissionais estejam ao redor do mundo envolvidos em sua elaboração. Tais profissionais são especialistas em doença mental, e podem somar milhares de horas de observação, diagnóstico e tratamento de portadores de transtornos psiquiátricos. Esses profissionais são orientados a elaborarem descrições de transtornos que busquem acordos consensuais ao invés de buscarem evidências que deem suporte a opiniões teóricas por eles abraçadas previamente. Além disso, os profissionais são orientados a utilizarem esforços para compatibi­lizar as descrições contidas no DSM com as observadas na Classificação Estatística Internacional de Doença e Problemas relacionados à Saúde, décima edição (CID-10) da Organização Mundial de Saúde. Na verdade, vários profissionais participam da elaboração de ambos os manuais. Por fim, eles são orientados a levar em consideração as várias culturas existentes no planeta, e suas determina­ções nas doenças ditas mentais.

Dessas declarações, pode-se depreender que o DSM não deve ser um material facilmente desprezado, puder de fato fazer uma síntese:

• Resultante das observações de várias horas de trabalho.• De profissionais de várias abordagens que estão em constante diálogo.• Buscando consensos objetivos para a descrição dos fenômenos.

Ainda que esses profissionais levem em consideração as peculiaridades de suas culturas (e de outros), e ainda que se tome aqui por base que tais observações sejam oriundas do encontro de autores que abraçam posturas teóricas divergentes, o diálogo e as recomendações explicitadas para a construção do material deve garantir alguma objetividade.

De onde viria, então, a rejeição que a análise do comportamento apresenta a esse manual?

Possíveis Fontes de Rejeição do DSM por Analistas do ComportamentoAnderson (2007) afirma que o DSM baseia-se em um modelo médico de psicopa- tologia, e que este modelo indicaria uma etiologia médica ou interna para o problema de comportamento. Segundo a autora, isto seria, em si, incompatível com a análise do comportamento, embora sejam reconhecidas por ela as funções de comunicação e troca de informações do DSM.

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Função do Comportamento e do DSM: Terapeutas Analítico-comportamentais... ■ 179

Além da já apontada incompatibilidade entre a concepção de psicopatologia apontada por Anderson (2007), a rejeição por parte de analistas do comportamen­to ao instrumento pode vir do próprio título e da proposta do DSM. Um “Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais” traz em cada um dos termos de seu título e em sua própria concepção, incompatibilidades com a Análise do Com­portamento, ciência na qual se baseia a terapia analítico-comportamental. Parece importante para essa discussão a análise de cada um destes termos, abordando as incompatibilidades que historicamente marcam a posição da análise do com­portamento no âmbito da psicologia.

ManualUm manual é um guia, uma referência básica e rápida de informações, que se pode ter à mão a qualquer momento, para aplicações de conhecimentos colecionados ao longo da construção de uma área. Como ocorre com os manuais de toda a ciên­cia, o DSM descreve situações comuns e cotidianas que podem ser “rapidamente” identificadas e classificadas a partir disso, é possível procurar soluções para problemas delas oriundos. Este é o primeiro problema encontrado para a análise do comportamento. O DSM procura trazer descrições (ainda que consensuais) das formas de comportamentos (descrições topográficas) que não são informações suficientes para uma boa intervenção analítico-comportamental. Assumi-las como fonte suficiente de informação seria deixar de lado a ferramenta básica que o analista do comportamento tem para trabalhar: a análise funcional. Embora o termo análise funcional tenha tido na literatura várias descrições (Andery, Micheletto e Sério, 2001; Neno, 2003; Sturmey, 1996a), o seu significado e práticas mais antigos e melhor aceitos pela maioria dos analistas do comportamento é o de que ela seria composta por alguns pequenos experimentos (Hanley, Iwata e McCord, 2003; Repp e Horner, 1999; Skinner, 1953).

O ponto de discórdia principal sobre este ponto, é que, com o manual e a sua possível utilização, os profissionais correriam o risco de deixarem de fazer boa parte do que se espera que eles façam: que procurem a função do comportamento por meio de pequenas manipulações nas contingências nas quais o comporta­mento problemático aparece. Como decorrência dessa suposta prática, as escolhas de intervenções por meio do diagnóstico diferencial proporcionado pelo manual poderiam ser ineficazes, já que não seriam fundamentadas em uma análise fun­cional do caso.

Desse ponto de vista, portanto, pode-se perceber que para as várias abordagens (sejam elas médicas, quase-médicas ou analítico-funcionais) uma vez identifica­das a etiologia ou a função dos comportamentos psicopatológicos pode-se assumir o tipo de intervenção terapêutica adequado. No entanto, as diferenças iniciam-se exatamente a partir da descrição.

As abordagens médicas e quase-médicas assumem a forma (ou topografia) do comportamento como uma instância de uma psicopatologia subjacente (seja ela física ou mental-cognitiva), a partir da qual determinadas estratégias terapêuticas deveriam ser aplicadas.

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180 ■ Função do Comportamento e do DSM: Terapeutas Analítico-comportamentais..,

A abordagem analítico-comportamental identifica o comportamento-proble- ma como um dos elos essenciais para iniciar a executar sua análise, em busca da função que esse comportamento tem para o indivíduo. A análise funcional busca descrever os problemas de comportamento em termos da tríplice-contingência (ou seja, sob que circunstâncias o comportamento-problema ocorre e produz determinadas conseqüências que o mantém). Desta concepção decorre que a forma do comportamento seja secundária para a análise funcional. Várias formas ou topografias de ações dos indivíduos podem ter a mesma função, ou seja, são evocadas por eventos antecedentes semelhantes e mantidas por eventos conse­qüentes idênticos.

Esta discussão remete diretamente a uma segunda: a questão diagnostica. E por decorrência, o termo “diagnóstico” do DSM deve ser também analisado.

DiagnósticoDesde os anos 1970, analistas do comportamento preferiram substituir o termo “diagnóstico”, oriundo de uma linguagem médica, pelo termo “avaliação compor­tamental” (Keefe, Kopel e Gordon, 1970; Kazdin, 1979, Sturmey, 1996a). Enquanto o termo “diagnóstico” sugere uma patologia semelhante à patologia física (com agentes patológicos identificados e tratamentos adequadamente delineados para ela), o termo “avaliação comportamental” indica um processo por meio do qual se possa avaliar as mais importantes relações entre o indivíduo e seu ambiente físico e social, buscando encontrar aquelas que se supõe serem as mantenedoras do comporta- mento-problema. Desde essa época os analistas do comportamento rejeitaram o uso regular de testes padronizados para identificar patologias comportamentais, assumindo a observação sistemática, por ser livre de problemas de validação, como a técnica mais importante em avaliação comportamental (Kazdin, 1978).

Assim, depois de uma rigorosa observação, hipóteses podem ser formuladas (Carr, Langdon e Yarbrough, 1999), e informações são complementadas por meio de entrevistas, inventários e, mais seguramente, pela análise funcional, já descri­ta anteriormente. Esta seria então composta por pequenas e rápidas intervenções visando testar variáveis que possam produzir ou eliminar o comportamento- problema, de forma a se demonstrar, empiricamente, as variáveis que determinam o aparecimento e a finalização desse comportamento.

A avaliação comportamental tem sido desenvolvida e é descrita em várias etapas (Anderson, 2007; Follette, Naugle e Linnerooth, 2000; Sturmey, 1996b). Todas essas etapas, tão importantes para a consecução de um projeto com base em uma con­cepção de psicologia enquanto ciência natural (Skinner, 1953), seriam ignoradas caso o profissional analista do comportamento iniciasse seu trabalho partindo unicamente de um manual como o DSM. Tal salto implicaria em assumir que a função do comportamento seria desnecessária, já que a intervenção poderia ser delineada unicamente a partir da descrição topográfica, resultando na adoção de uma série de técnicas padronizadas que teriam, em tese, o poder de modificar o comportamento em questão. Este uso faria com que a prática do profissional pres­cindisse do caráter idiossincrático da abordagem analítico-comportamental

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(Silvares e Banaco, 2000), e do caráter relacionai observado entre as ações do orga­nismo e seu ambiente como determinantes do comportamento-problema (Falk e Kupfer, 1998).

E é esse caráter idiossincrático, em oposição ao nomotético que dirige nosso olhar para o próximo termo a ser discutido: o caráter estatístico do DSM.

EstatísticaOutra concepção discordante com os pressupostos da análise do comportamento encontra-se com o caráter estatístico do DSM. Várias ciências (a medicina, inclu­sive) preocupam-se com questões que afetem grandes populações, e por causa disto dão uma importância crucial à estatística enquanto uma ferramenta de tra­balho (caráter nomotético).

O conceito de normalidade por meio da estatística é uma descrição daquilo que é mais freqüente na população observada, qualquer que seja o aspecto que seja objeto da observação. Aspectos infrequentes são tidos como “fora da norma”, ou fora da “curva normal”.

Por seu lado a análise do comportamento, desde muito cedo, preocupou-se com critérios de avaliação que levam em consideração o sujeito como seu próprio controle, buscando a construção de conhecimento a partir de estudos de sujeito único (Sidman, 1960). As comparações analítico-comportamentais dos comporta­mentos não são feitas primordialmente com uma população “normal” de comportamentos, nos vários sentidos que a palavra normal pode ter. Pelo contrá­rio, os padrões de comparação estão nos efeitos que mudanças ambientais podem produzir em um comportamento estável (Falk e Kupfer, 1998; Sidman, 1966). Desse modo, novamente busca-se as variáveis de controle que podem moldar o comportamento de um indivíduo, enquanto processo mutável, a partir da intera­ção com alguns aspectos do ambiente. Esta é a informação a partir da qual a análise funcional indicaria o procedimento a ser utilizado para modificar o com­portamento em questão.

Assim, se a análise funcional revelar, por exemplo, que o comportamento “anormal” tem a função de esquiva de tarefas aversivas ou custosas, promove-se um procedimento por meio do qual se possa ensinar uma resposta de esquiva mais adequada do que o comportamento psicopatológico. Um procedimento alterna­tivo poderia ser aquele por meio do qual a tarefa aversiva seja subdividida em componentes menores, tornando-a mais fácil de ser executada e, por conseguin­te, ser demarcada por vários reforços intermediários para mantê-la em execução.

Portanto, a noção estatística dos transtornos mentais também é insuficiente e pode causar problemas para o analista do comportamento que se utilize do DSM. Ela não revela as variáveis que podem estar em relação ao comportamento “trans­tornado”, embora faça uma descrição detalhada dele.

Esta questão coloca em cheque os rótulos diagnósticos descritos no DSM. Eles perderiam completamente sua função para a elaboração de uma análise funcional, uma vez que se baseiam em critérios estatísticos para o estabelecimento de um transtorno. Este último termo é mais uma fonte de conflitos para o analista do comportamento.

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TranstornoA palavra “transtorno” remete a algo que está “fora da ordem”, o que fere um pressuposto de ciência. A ciência existe para revelar, descrever, interpretar e manipular a ordem dos fenômenos (Skinner, 1953). Assumir que um fenômeno está “fora de ordem” seria assumir que sobre esse fenômeno não se pode fazer ciência (seriam os ditos fenômenos “para- normais”, “extranormais”, “supranormais”, para os quais a ciência natural, em tese, não tem explicação). A análise do comportamento assume que se a ordem de um fenôme­no não foi ainda descrita não implica que esse fenômeno não tenha explicação ou ordem.

A palavra “transtorno” tem três significados problemáticos para a análise do comportamento. O primeiro deles remete a uma situação que causa incômodo a outrem, um contratempo devido à desadaptabilidade, a algo que está fora do “normal”. Este conceito é incompatível com o modelo explicativo de seleção por conseqüências assumido pela análise do comportamento (Skinner, 1981). De acor­do com este pressuposto, um comportamento, por mais que pareça incoerente ou ineficaz, se mantém no repertório em função de sua “utilidade” para o organismo, o que é incompatível com a noção de “desadaptabilidade”.

O segundo significado para “transtorno” é o de uma situação imprevista e desfavorável, uma desordem no sentido de não obedecer a leis. Quanto a este sentido da palavra transtorno, a análise do comportamento também aponta pro­blemas: o comportamento, seja ele normal ou patológico, obedece a leis (Sidman, 1966) que devem ser descritas firmemente pelo método experimental.

O terceiro significado para a palavra “transtorno” refere-se à leve perturbação orgânica: doença. Neste sentido, seria assumido que um transtorno comportamental teria uma origem orgânica, posição defendida, por exemplo, pela psiquiatria biológica e pelas neurociências. Segundo Graeff (2006), “o relativo sucesso dos medicamentos desenvolvidos a partir dos anos 1950 para tratar a esquizofrenia, a depressão melan­cólica e a mania levou à busca de explicações neuroquímicas para esses transtornos”. De fato, pode-se admitir, dentro de uma perspectiva selecionista, a possibilidade de uma alteração orgânica produzir um comportamento atípico. Falk e Kupfer (1998) assumem que parte dos problemas chamados psicopatológicos pode ser caracteriza­da como uma resposta anormal para uma situação normal e esta parcela dos comportamentos psicopatológicos deveria ser explicada por ciências tais como a biologia e a medicina (e suas especialidades: a psiquiatria, a neurologia etc.). No en­tanto, o reconhecimento da parcela biológica do fenômeno comportamental não exclui o fato de que parte importante dos comportamentos psicopatológicos é deter­minada pela interação com ambientes “patológicos”. Neste caso, a “patologia” seria descrita como uma resposta normal para uma situação extrema ou desordenada, e este seria o âmbito de estudos da análise do comportamento.

A essas questões todas relacionadas ao termo “transtorno”, acresce-se o problema do “transtorno” ser adjetivado com a palavra “mental”. Vamos analisá-lo em seguida.

Transtornos MentaisSabidamente, o behaviorismo aparece como um movimento que pretendia tornar o objeto de estudos da psicologia passível de ser aprendido por meio do método

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experimental (Goodwin, 2005; Kazdin, 1978; Pérez-Alvarez, 1996). Mais que isso, partia de uma proposta filosófica e metodológica monista materialista, que rejeita­va como objeto de estudo eventos de natureza metafísica. Ora, a mente, por não ter uma extensão, por não ser material, não poderia ser estudada segundo esses prin­cípios. Os behavioristas utilizaram-se, então, de uma estratégia para continuar a estudar o objeto que era considerado mental: procurar reinterpretá-lo enquanto fenômeno comportamental, buscando, na descrição de comportamentos, as dimen­sões que pudessem ser captadas por instrumentos de mensuração.

Falar sobre fenômenos mentais, portanto, parece um retrocesso num proces­so histórico, tão conflituoso quanto trabalhoso, como o ocorrido no último século em busca de explicações da ciência natural para todos os fenômenos psi­cológicos (Pérez-Alvarez, 1996).

O próprio DSM traz em seu texto introdutório uma autocrítica a este respeito:

Embora esta obra se intitule Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, a expressão “ transtornos mentais ” infelizmente sugere uma

distinção entre transtornos “mentais” e transtornos “físicos”, um anacronismo reducionista do dualismo mente/corpo. Uma

bibliografia rigorosa comprova a existência de muito de “físico” nos transtornos mentais e muito mais de “mental” nos transtornos

“físicos”. O problema criado pela expressão persiste no título do DSM-IV, porque ainda não encontramos

um substituto apropriado. (APA, 2002, p. 27)

Esta declaração, embora possa parecer compatível com a proposta do beha­viorismo radical, é na verdade mais compatível com o da psiquiatria biológica. Com efeito, a seguir, o DSM declara: “... [transtornos] são concebidos como sín- dromes ou padrões comportamentais ou psicológicos clinicamente importantes, que ocorrem num indivíduo...” (APA, 2002, p. 27 - grifos acrescentados).

Ou seja, para o DSM o problema ainda se localiza no indivíduo, concepção compatível com a visão médica da psicopatologia. Mais adiante, no entanto, há o reconhecimento de que:

... Além disso, essa síndrome ou padrão não deve constituir meramente uma resposta previsível e culturalmente aceita diante de um determinado evento,

por exemplo, a morte de um ente querido [relação com evento ambiental]. Qualquer que seja a causa original, a síndrome deve ser considerada no momento como uma manifestação de uma disfunção comportamental,

psicológica ou biológica no indivíduo. (APA, 2002, p. 27-28)

Pode-se notar neste trecho que, ora o indivíduo é considerado o “lócus” da doença, ora admite-se que ela pode se manifestar a partir de relações especiais com eventos ambientais. Estas inconsistências talvez sejam frutos de declarações proferidas por tantos profissionais de abordagens diferentes cuidando do texto do DSM. Mas a tônica geral do manual sugere que os transtornos mentais sejam to­mados como apenas um sintoma de uma causa subjacente.

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Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental: Há o que se Oferecer para o Entendimento dos Fenômenos Psicopatológicos?A história da medicina é da biologia é marcada por uma prática de classificação dos fenômenos observados por essas ciências. Isso não foi diferente quando o assunto a ser tratado incluía as doenças mentais. Inicialmente, uma tentativa de sistematização a partir daquilo que era observado foi realizada, resultando em uma quantidade ra­zoável de classificações possíveis. No entanto, foram observadas muitas divergências nas nomenclaturas resultantes desses esforços, dadas as ênfases em sua fenomeno- logia (descrição dos fenômenos), em suas etiologias (causas identificadas para cada fenômeno), ou em seu curso (como a doença se desenvolvia).

Mais uma vez, a história da análise do comportamento segue caminhos diver­sos dessas ciências. lá foi abordado, por exemplo, que a topografia das respostas observadas fala pouco do fenômeno a ser explicado para a análise do comportamen­to. A abordagem por meio da fenomenologia* não é suficiente para os analistas do comportamento. No entanto, o próprio Skinner já dizia que:

... na pesquisa que enfatiza predição e controle, a topografia do comportamento deve ser cuidadosamente especificada. O que precisamente

o organismo está fazendo? O aspecto mais importante do comportamento assim descrito é a sua probabilidade de emissão. (Skinner, 1959, p. 203)

Ou seja, há um reconhecimento da descrição do fenômeno “comportamento”, especialmente do “comportamento operante”, é uma etapa muito importante para que possamos identificar as variáveis que entram em relação de controle com ele para o seu estudo por meio de uma análise funcional.

A análise funcional, por sua vez, exige que se equacione o fenômeno em pelo menos dois termos, e mais completamente em três termos, essa formulação é chama­da de “contingência tríplice”. É essa formulação que irá revelar como o comportamento se estabelece e se mantém, ou seja, quais são as funções que explicarão, em última análise, por que ele se mantém, se intensifica ou é enfraquecido.

Uma tríplice contingência sempre se identifica como o primeiro termo aquilo que o organismo está fazendo. Para que se possa mensurar este termo do comporta­mento, identificado como as ações do organismo, é necessário, portanto, definir-se cuidadosamente o objeto da observação: suas dimensões e seus limites.

A partir dessa identificação pode-se procurar pelo segundo termo, que vem a se constituir em mudanças ambientais produzidas por essa ação que retroage sobre o organismo tornando-o modificado: as conseqüências (Skinner, 1953).

* Na filosofia de William Hamilton (1788-1856), identificada como a descrição imediata - anterior a qualquer explicação teórica - sobre os fatos e ocorrências psíquicas (Houaiss, 2000).

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Em seguida, pode-se partir em busca do terceiro termo: as condições anteceden­tes, que se tornaram relevantes porque foram associadas a diferentes probabilidades de reforço. Essas condições antecedentes, que estiveram presentes na ocasião de acesso a reforçadores, são “marcadas” como dicas ambientais sobre a disponibi­lidade ou não desses reforçadores (Skinner, 1953) e, por isso, dão regularidade ao comportamento operante, fazendo com que ele não seja caótico, mas ocorra em situações favoráveis para o indivíduo. É de muita utilidade para o organismo que haja sinais que lhe mostrem em que condições suas ações modificarão o ambien­te ao seu favor (Johnston e Pennypacker, 1993).

Dessa forma, embora a topografia seja importante para se realizar uma análi­se do comportamento, ela é apenas um passo inicial para se exercer uma análise funcional do comportamento.

Em relação à busca da etiologia da doença mental, comparando-se a medicina e psiquiatria biológica de um lado e a análise do comportamento de outro, pode-se apontar também algumas divergências. Como foi dito, enquanto as primeiras ocupam- se da etiologia das doenças mentais, à moda de busca de um agente causador do fenômeno agora identificado, a análise do comportamento reconhece que as respos­tas em foco podem ser identificadas em qualquer repertório comportamental. Mesmo as pessoas consideradas mais sãs, por exemplo, já tiveram delírios, já viveram com ansiedade, já experimentaram um estado depressivo, e raramente, algumas, deixaram de sentir os efeitos de substâncias aditivas. A análise do comportamento aborda a questão como um problema de exuberância da ação em foco: frequência, intensida­de e latência. Para essa ciência, a questão não é procurar por um agente causador, mas identificar condições que tornem aquela ação excessiva ou insuficiente.

A mesma relação pode ser invocada quando se busca explicar o “curso da doença”, ou o seu “desenvolvimento”, pela psicopatologia. Para a análise do comportamento, o que deve ser buscado são as condições iniciadoras e/ou mantenedoras do com- portamento-problema. É na relação entre as ações do organismo e os eventos ambientais que se encontrará a “causa” do comportamento.

Por fim, como resultante de classificações nomotéticas, a medicina e a psiquiatria acabam identificando os comportamentos excessivos ou deficitários como “doenças mentais”, ou seja, os “transtornos” conforme já foi abordado anteriormente neste texto. Esta é mais uma incompatibilidade com a análise do comportamento, que busca leis gerais para todos os comportamentos, assumindo, primariamente, que todo o comportamento, se existe, é adaptado dentro das condições em que se encontra, ou seja, tem uma função quando inserido naquele ambiente (Banaco, 1997; Falk e Kupfer, 1999; Sidman, 1966; Skinner, 1981).

Patologia ComportamentalA questão da patologia tem sido encarada pelos analistas do comportamento por meio do modelo de seleção por conseqüências. Segundo Ferster (1973), a patolo­gia comportamental refere-se a um déficit ou excesso de comportamentos que produzem sofrimento individual ou social. Deste ponto de vista, é apenas o sofri­mento que se torna critério para tratamento.

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O comportamento é considerado adaptado, mas se traz sofrimento aponta a possibilidade de haver em primeira instância uma contingência de reforço (seja ela positiva ou negativa), que não é revelada a primeira vista, mas explica a ma­nutenção do comportamento. Esse comportamento tem como conseqüência um evento aversivo que é notado na maior parte das vezes, mas provavelmente em valor (intensidade, frequência, probabilidade, latência) mais fraco que o primeiro. Sidman (1966) afirma que o comportamento psicopatológico “pode ser resultado de combinações quantitativas e qualitativas de processos que são, eles próprios, intrinsecamente ordenados, absolutamente determinados, e normais em sua origem” (p. 43). No resultado das forças de resposta, ele acaba sendo mantido “estranhamente”, sem explicação. Só a análise funcional seria capaz de revelar esse controle “escondido”.

Até este ponto, há um conjunto de razões para que o uso do DSM seja conside­rado com bastante parcimônia pelo analista do comportamento, dadas as muitas incompatibilidades com a abordagem. No entanto, desde sua primeira edição até a mais atual, há uma crescente preocupação nas descrições contidas no manual, com a introdução de aspectos socioculturais (portanto, ambientais) na explicação dos processos psicopatológicos, o que talvez permita algumas aproximações.

DSM Caminha para uma Posição Funcionalista?O DSM tem sido apontado como um sistema topográfico de classificação das psicopatologias (Cavalcante e Tourinho, 1998). E, de fato, se forem tomadas as primeiras versões de sua publicação para chegar à classificação de um sistema topográfico esta característica pode ser identificada (Ferster, 1973).

A questão a ser debatida, então é: o que seria uma posição funcionalista? Seria apenas aquela oriunda de uma análise funcional do comportamento? Seria aque­la que busca hipóteses funcionais a partir de relações entre eventos ambientais e respostas a serem analisadas?

A discussão sobre o que seria uma análise funcional tem sido ampla, com pouca concordância entre os autores. Conforme afirmado anteriormente, a ten­dência atual parece seguir propostas claras de que sejam consideradas, enquanto análise funcional, as ações do profissional que levantem variáveis de controle sobre o comportamento por meio de análogos experimentos, enquanto as formula­ções que obtêm informações por meio de outros métodos (entrevista, questionários e escalas de avaliação - checklists - elou observação) são denominadas “análise de contingências” (Andery, Micheletto e Sério, 2001). Mesmo que o critério para uma posição funcionalista se restringisse a análogos experimentais, haveria pro­blemas na busca de características que apontassem a possibilidade de classificação dos problemas de comportamento tendo essa referência.

O recente livro de Sturmey (2007) intitulado Functional Analysis in Clinical Treatment (2007) é um exemplo da dificuldade em integrar as exigências de uma análise funcional à aplicação. No livro, a estrutura de divisão de capítulos se dá a partir dos grupos de patologias do DSM, com uma ênfase muito reduzida em análogos experimentais para identificar as funções dos comportamentos obser­

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vados. Em 1996, este mesmo autor havia se debruçado sobre este tema, e estabeleceu alguns critérios para que uma análise fosse considerada funcional, partindo ele próprio de uma comparação entre nada menos do que sete modelos de análises funcionais encontradas na literatura clínica comportamental. Sturmey sugeriu um conjunto de critérios para se escrever uma análise funcional sobre um caso clíni­co que, ao ser comparado com as proposições de critérios diagnósticos do DSM, aponta algumas aproximações e divergências:

• Pelo menos um comportamento-alvo operacionalizado “que pode ser um comportamento aberto (por exemplo, ‘chorar’), cognitivo (por exemplo, ‘pen­samentos recorrentes de inutilidade') ou fisiológicos (por exemplo, ‘sentimentos de tensão’)”. Encontram-se no DSM descrições compatíveis com esse critério. Por exemplo, em descrições sobre o episódio depressivo maior são listados comportamentos abertos, tais como alterações no apetite (com a conse­qüente perda de peso), no sono e na atividade motora. Dentre os comportamentos “cognitivos”, encontram-se sentimentos de desvalia ou culpa, dificuldades para pensar, concentrar-se ou tomar decisões, pensamentos recorrentes de morte, ideação suicida e planos ou tentativas de suicídio. Por fim, dentre os fisiológicos, estão a perda de prazer e a diminuição da energia.

• Pelo menos “um antecedente operacionalizado, que deve incluir exemplos. Ilustrando: a cliente apresenta ‘sentimentos de inutilidade’ mais freqüentes quando está sozinha [...] ou depois de fracasso em tentar [ser assertiva] em relação ao seu marido. [Se isto não for localizável...] declare ‘antecedentes desconhecidos”’. No diagnóstico diferencial dos transtornos de humor apre­sentado pelo DSM, há preocupação com situações antecedentes tais como investigar se o humor alterado para deprimido, elevado, expansivo ou irritável não se deve a efeitos fisiológicos de uma condição médica geral ou a efeitos fisiológicos diretos de substâncias de abuso (vistas pela análise do compor­tamento como operações estabelecedoras).

• Pelo menos “uma conseqüência operacionalizada, que deve incluir exem­plos, tais como ‘o comportamento de dor parece ser mantido tanto por reforçadores positivos primariamente sociais em natureza (por exemplo, freqüentes visitas ao pronto-socorro e atenção da família) quanto por refor­çadores negativos (excessivo uso de ansiolíticos, esquiva de dirigir em certas ocasiões e algumas atividades sociais descritas como estressantes), ou de­clare “conseqüências desconhecidas”. Na descrição do transtorno disfórico pré-menstrual, o DSM indica que deve ser investigado se a perturbação interfere acentuadamente no trabalho ou na escola ou em atividades sociais habituais e relacionamentos (por exemplo, evitar atividades sociais, redução na produtividade e da eficiência no trabalho ou na escola).

Pode-se verificar que há aspectos ambientais apontados em algumas das des­crições de quadros diagnósticos do DSM. Nota-se, entretanto, que Sturmey recomenda que estes critérios sejam considerados em sua totalidade para cada comportamento-problema analisado e apenas na descrição de alguns poucos, quadros diagnósticos do DSM pode-se localizar informações que respondam a

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qualquer destes critérios (vale lembrar que a análise funcional não é o objetivo do instrumento). Ainda, não há um único quadro cuja descrição corresponda à totalidade dos critérios propostos por Sturmey, enquanto a maioria deles não corresponde a nenhum dos critérios. Mesmo as considerações sobre o “Eixo 4 - aspectos sociocul- turais dos transtornos”, que sugerem uma preocupação com aspectos funcionais dos comportamentos patológicos (especialmente os do nível cultural), contribuem com uma pequena parcela daquilo que deve ser considerado para uma análise funcional ou de contingências.

Abordagem Analítico-comportamental Caminha para um Sistema Classificatório Funcionalista?A resposta a esta questão parece ser “sim”. Desde os trabalhos de Iwatta e seus colaboradores sobre pessoas com desenvolvimento atípico, que descrevem as funções do que a literatura denomina por “comportamentos bizarros” (autolesão, agressividade, birra etc.), há uma preocupação na análise do comportamento aplicada em encontrar regularidades funcionais para comportamentos tipicamente abordados pelas psicopatologias. No caso de Iwatta etal, e/ou Carr et al. os compor­tamentos bizarros são descritos como tendo uma ou mais dentre quatro funções: obtenção de atenção social (um reforçador generalizado), obtenção de reforçadores tangíveis (alimentos, objetos, brinquedos), fuga/esquiva de tarefas indesejadas (ou de custo elevado para execução), ou autoestimulação.

Já os profissionais da chamada terceira onda da terapia comportamental (0'Donahue, 1999), especialmente os liderados por Stephen Hayes e sua teoria dos quadros relacionais, têm buscado encontrar regularidades funcionais nas descrições das diversas psicopatologias. Um exemplo claro é o artigo de Forsyth (2000), que propõe:

Todos os transtornos de ansiedade podem ser colocados ao longo de pelo menos três dimensões funcionais: (a) origem dos estímulos temidos ou que despertam ansiedade (por exemplo, interna ou corporal versus externa ou ambiental); (b) especificidade do estímulo (geral versus específico); e (c) a

natureza das respostas psicofisiológicas avaliadas negativamente (abrupta e imediata versus crônica e contínua). De acordo com esta perspectiva

dimensional transtorno do pânico pode ser entendido como envolvendo respostas psicofisiológicas abruptas a uma classe geral de sensações físicas

internas, enquanto que fobias específicas e PTSD /sigla em inglês para transtorno de estresse pós-traumático/ representariam respostas

psicofisiológicas abruptas a classes específicas ou mais generalizadas de eventos ambientais. Semelhantemente, transtorno obsessivo-compulsivo

poderia ser entendido como uma resposta psicofisiológica crônica a uma classe geral de eventos internos (isto é, pensamentos), enquanto que o

transtorno de ansiedade generalizada é representado frequentemente como respostas psicofisiológicas crônicas a uma classe geral de eventos externos

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(situações) e internos (pensamentos). Dentro desta estrutura, transtornos de ansiedade são compreendidos como envolvendo relações entre eventos; eventos

que podem ser vistos como tendo funções, tanto verbal quanto não verbal de estímulos e respostas que podem ser estabelecidas e podem ser modificadas

de modos sutis e complexos como uma função de fatores contextuais. (p. 140)

Considerações FinaisAparentemente, o problema não está em ser o DSM topográfico ou funcional, mas sim a sua utilização como critério diagnóstico e, pior ainda, norteador de estratégias terapêuticas. Segundo Cavalcante e Tourinho (1998) e Anderson (2007) as informa­ções contidas no DSM são importantes e úteis, pois permitem a padronização e a troca de informações entre os profissionais, permitem a predição e o desenvolvi­mento de estratégias de tratamento e guiam a pesquisa. A importante questão levantada por esses autores é: a utilização das descrições contidas no DSM implica em adesão ao modelo diagnóstico?

A resposta a esta pergunta deve ser “não”. Por exemplo, se tomarmos como modelo de avaliação comportamental as propostas por Sturmey (1996a) e Follet­te et al. (1999), veremos que ele segue os passos adiante:

• Perguntar-se se há um problema significativo de comportamento.• Identificar os comportamentos-alvo.• Operacionalizar os comportamentos-alvo (e, aqui, o DSM conta com uma

extensa e bem cuidada descrição que pode ser útil, ou seja, não é preciso refazer o que já está bem feito).

• Selecionar o método para descobrir a função do comportamento (a partir daqui, o DSM não é mais capaz de ajudar o analista do comportamento).

• Implementar a intervenção.• Avaliar os resultados:

- Se forem satisfatórios, proceder avaliação comportamental completa.- Se não forem satisfatórios, retornar a identificação de novos comporta­

mentos-alvo e reformular a conceituação funcional.

A busca de respostas ao sofrimento humano decorrente do comportamento deve ser ainda perseguida. A discussão tem sido proveitosa porque aponta diver­gências e possíveis correções em propostas compatíveis, ou parcialmente compatíveis com os princípios e práticas analítico-comportamentais. Aproxima­ções, estudos empíricos e desenvolvimento de tecnologias para a solução dos problemas são urgentes. Talvez com as ferramentas necessárias, Nero não ficasse simplesmente contemplando uma Roma ardente.

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CAPÍTULO

Ensino da Resolução de Problemas: Questões

Conceituais e Metodológicas

Se r g io V a s c o n c e l o s d e L u n a M ír ia m M a r in o t t i

De qualquer ângulo que se procure abordar a educação no Brasil, uma das primeiras constatações que se faz é a coexis­tência, há décadas, no âmbito acadêmico, de muitas teorias, e/ou vertentes de uma mesma postura teórico-epistemo- lógica, dando suporte a diferentes linhas de pesquisa e origem às mais diversas propostas pedagógicas, claramente indicando que divergência e falta de consenso são caracte­rísticas predominantes entre os que postulam políticas públicas e/ou as implementam.

No que se refere à política educacional, assistimos a sucessivas mudanças de orientação, a depender do ideário vigente e, mais diretamente, de quem ocupa quais postos nas diferentes instâncias ligadas à educação.

As constantes mudanças de orientação teórica, nem sempre ou raramente, respaldadas por conhecimento vali­damente construído (Camine, 1992 - quanto à situação nor­te-americana - e Goldemberg, 1993 - em relação a nossa realidade - a respeito dos modismos na educação), exigem dos professores adaptações contínuas a situações bastante diversas, quando não antagônicas. Aliem-se a isto condições peculiares de cada escola em particular, e nos defrontaremos com um professor que faz malabarismos para conciliar novas

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ideias e novas práticas decorrentes destas, às exigências e limitações de seu cotidiano pessoal e profissional, ambos progressivamente dificultados. Em geral, o que impera em sala de aula é uma prática pedagógica quase eclética, guiada muito mais pelas possibilidades reais de ação do professor e necessidade de controle disciplinar sobre os alunos, do que pelos objetivos e teorias educacionais apregoados* (Rigolon, 2007).

Neste quadro, extensamente discutido por inúmeros autores de orientação teó­rica, poucos são os pontos de consenso, ou mesmo, de concordância majoritária. Dentre estes, podemos citar: a falha patente da escola e a crença de que “ensinar a pensar” é um dos objetivos primordiais da educação.

Expressões como “não dar o peixe, mas ensinar a pescar”, “ensinar para a vida”, “desenvolver o raciocínio lógico nos alunos”, “levar o aluno a pensar, a analisar cri­ticamente as situações”, “formar cidadãos autônomos e independentes”, “desenvolver a habilidade de solucionar situações-problema” constituem exemplos desta preocu­pação. Os parâmetros curriculares nacionais explicitam objetivos como esses da seguinte maneira:

Como no desenvolvimento de outras capacidades, a aprendizagem de determinados procedimentos e atitudes — tais como planejar a realização de uma tarefa, identificar formas de resolver um problema, formular boas

perguntas e boas respostas, levantar hipóteses e buscar meios de verificá-las, validar raciocínios, resolver conflitos, cuidar da própria saúde

e da dos outros, colocar-se no lugar do outro para melhor refletir sobre uma determinada situação, considerar as regras estabelecidas — éo instrumento para a construção da autonomia. Procedimentos e atitudes dessa natureza

são objeto de aprendizagem escolar, ou seja, a escola pode ensiná-los planejada e sistematicamente criando situações que auxiliem os alunos a se tornarem progressivamente mais autônomos. Por isso é importante que desde as séries iniciais as propostas didáticas busquem, em aproximações

sucessivas, cada vez mais essa meta. (Brasil, 1997, p. 59)

Skinner também reconhece que esta é uma meta a ser buscada pela escola quan­do afirma que “educação é o estabelecimento do comportamento que será vantajoso para o indivíduo e para outros, em algum momento no futuro” (1953, p. 402) e avança um pouco no tema ao tratar do processo de resolução de problemas, em obras anali­sadas adiante.

Todavia, a preocupação deste autor com questões relativas à educação tem produzido pouco impacto na atuação dos analistas do comportamento junto ao sistema educacio­nal, seja pela preferência de uma maioria destes pela atuação clínica, seja por barreiras reais encontradas por aqueles que tentam ingressar nas instituições educacionais**.

194 ■ Ensino da Resolução de Problemas: Questões Conceituais e Metodológicas

* Essa questão é abordada de forma mais aprofundada em Pereira, Marinotti e Luna (2004), bem como em trabalhos citados nas referências aí expostas.** Desconhecemos analistas do comportamento desenvolvendo profissionalmente atividades regula- res em escolas de ensino fundamental e médio, mas isso já é esperado se forem consideradas as difi­culdades que supervisores de estágio encontram para colocar seus supervisionados em escolas a fim de desenvolverem projetos que declaradamente adotam o referencial behaviorista, radical ou não.

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Ensino da Resolução de Problemas: Questões Conceituais e Metodológicas ■ 195

A situação parece um pouco diferente no âmbito acadêmico universitário, onde se concentra grande parte dos trabalhos teóricos e de pesquisa voltados para questões educacionais e, mais especificamente, para questões de aprendizagem escolar. Entretanto, a despeito da boa qualidade apresentada por grande parte destes trabalhos, permanece a dificuldade de interlocução entre a universidade- produtora de conhecimento - e a sociedade (escola e órgãos educacionais) - que seriam os consumidores finais visados.

Parte desta dificuldade de inserção encontrada pela análise do comportamento se explica através de questões ideológico-políticas, presentes nas diferentes instituições, desde a universidade até os órgãos públicos responsáveis pelo setor*. Entretanto, parte nada desprezível da responsabilidade cabe à própria comunidade de analistas do comportamento (por exemplo, Fantuzzo e Atkins, 1992; Lindsley, 1992).

De fato, a despeito da importância de que se reveste o comportamento de solu­cionar problemas, como parte do repertório a ser instalado pela escola (Parâmetros Curriculares Nacionais, já aqui mencionados, e o próprio Skinner, 1953) a análise do comportamento pouco avançou neste campo depois dos escritos de Skinner. Quando da concepção deste trabalho, uma busca em diferentes sites, com diferen­tes palavras-chave, resultou em um número baixíssimo de estudos sobre resolução de problemas, dentro de uma perspectiva analítico-comportamental. Em grande parte, os encontrados diziam respeito à solução de problemas matemáticos, muitos dos quais com crianças com comprometimento no desenvolvimento (por exemplo, Neef, Nelles, Iwata e Page, 2003; Cassei e Reeid,1996; Lynch e Cuvo, 1995)**.

Esta constatação encontra confirmação em estudo realizado por Leme (2001). Em uma extensa pesquisa teórica sobre a questão da transferência de solução de problemas***, parte do objetivo consistia em comparar como esta questão era

* O problema parece ter ganhado status de truísmo entre os analistas do comportamento. No entanto, conforme já salientado por Luna (2001), somos em grande parte responsáveis por ele, já que nos co­locamos como especialistas na identificação e controle de contingências.** No final dos anos 1980 e início dos 1990, surgiram vários experimentos com resolução de proble­mas, em que os sujeitos eram submetidos a diferentes esquemas de reforço e o problema consistia em maximizar o reforço ajustando o comportamento ao esquema. Uma das variáveis de interesse era o comportamento controlado por regras em relação àquele controlado por contingências, e instruções foram manipuladas em vários desses experimentos. Chase e Bjarnadottir (1992) publicaram uma re­visão crítica desses trabalhos e seus dados são mencionados adiante. No entanto, deve ser registra­do que, ainda que defendam com bastante propriedade que as situações experimentais empregadas atendem à definição geral de um problema (conforme proposta e defendida por Skinner), elas estão longe de configurar aquilo que constitui o interesse central deste trabalho, especialmente tendo em vista a situação educacional.*** Transferência de aprendizagem (transfer o f learning) foi sempre (e continua sendo para os teóricos do cognição) um processo importante para o estudo da aprendizagem. Nas palavras de Leme (2001), escolhe­mos a transferência de solução de problemas para a análise dessa crítica por duas razões: a investigação desse tema é uma preocupação antiga na psicologia, pois, já na escola da Gestalt, enfatizava-se o estudo do processo de solução de problemas, dada sua importância para lidar com situações novas (Wertheimer, 1959). Nessa mesma perspectiva, a psicologia cognitiva, desde seu início, privilegiou esse tema, procuran­do desvendar os processos que tomam possível ao ser humano adaptar conhecimentos adquiridos a uma outra situação (2001, p. 6). Skinner (1957) faz alusão ao termo “transferência” em diferentes obras (Skinner, 1957, por exemplo). Em Comportamento Verbal (Skinner, 1957), no entanto, sugere claramente uma forma alternativa de fazer referência ao que outros teóricos procuram exprimir com a expressão. “Esta formu­lação [transferência do controle de estímulos] é muito mais simples do que explicações tradicionais dos mesmos dados, que apelam para vários processos de generalização, equivalência ou pensamento analógi­co, por meio dos quais o falante é capaz de transferir a resposta a um novo estímulo.” (p. 92)

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tratada em diferentes abordagens. Segundo a autora, enquanto o paradigma cons- trutivista havia sido adotado em 91% das pesquisas encontradas, apenas duas pesquisas foram localizadas dentro do referencial behaviorista* **.

É difícil entender esta lacuna, além do fato de a análise do comportamento ter uma entrada restrita nas questões educacionais***. Skinner afirmou, a respeito do comportamento de resolver problemas, algo que já havia afirmado em relação ao comportamento verbal: “Uma vez que provavelmente não exista processo compor­tamental que não seja relevante para a solução de algum problema, uma análise exaustiva de técnicas [para a solução de problemas] coincidiria com uma análise do comportamento como um todo” (Skinner, 1969, p. 133). Uma primeira leitura po­deria gerar a interpretação de tal afirmação como um atestado de que nada de peculiar haveria no comportamento de resolver problemas, razão pela qual ele não precisaria ser explorado em eventuais peculiaridades. No entanto, o próprio Skinner se encarrega de desfazer um possível equívoco quanto ao significado de sua afirma­ção, ao dizer que “Estas são, essencialmente, as características de uma atividade mais ampla e mais complexa habitualmente denominada de ‘resolução de proble­mas', ‘pensamento’ e ‘raciocínio’” (Skinner, 1953, p. 246, ênfase acrescentada).

Assim, o caminho aberto por ele, em termos conceituais, precisa ser trilhado em termos empíricos se, como analistas do comportamento, quisermos ter algo a oferecer do ponto de vista da educação formal, escolar.

O texto a seguir está dividido em três partes. Na primeira, é apresentada uma con- ceituação do comportamento de resolver problemas, baseada, essencialmente, nas análises de Skinner, bem como na delimitação que ele estabelece para se falar em re­solução de problemas. Em seguida, são apresentadas questões de ordem conceituai e metodológica, que constituem dificuldades ainda não solucionadas para o pesquisador na área. A partir das dificuldades apontadas, na terceira parte são apresentadas alter­nativas para a instalação de um repertório de comportamentos preliminares tendo em vista tornar alunos mais competentes na resolução de problemas.

196 ■ Ensino da Resolução de Problemas: Questões Conceituais e Metodológicas

* É possível argumentar que o fato de a autora adotar o paradigma construtivista teria influenciado a seleção de palavras-chave para efeitos de busca. No entanto, seus resultados seguem a mesma direção dos nossos, resultantes de uma busca com palavras-chave indiscutivelmente compatíveis com o re­ferencial behaviorista radical, como, por exemplo, “análise experimental do comportamento, análise do comportamento, behaviorismo radical” e “resolução de problemas, comportamento de resolver problemas, comportamento preliminar e comportamento lógico”. As palavras foram empregadas em inglês e português.** Na configuração do que denominou referencial behaviorista, Leme (2001) assim se manifesta: “Ve­rificamos a existência de diversas tendências, diferentes quanto à maior aceitação da intervenção de processos subjetivos no que se considera referencial behaviorista. Essa diferença também é encontra­da em relação à solução de problemas, exprimindo duas visões que se destacam: a de Skinner e a de seguidores de Hull.” (p.3)*** Essa questão é, para os autores, uma mera constatação da qual se parte, e não há intenção de discuti-la No entanto, o leitor interessado encontrará farta documentação disso, pelo menos no que se refere aos Es­tados Unidos. Um bom começo pode ser o texto de Sulzer-Azaroff e Gillat (1990) e os contidos no número especial do Journal o f Applied Behavior Analysis, de 1992 (ver Fantuzzo e Atkins, 1992). Em 2004, esse mesmo periódico, lançou um novo número especial dedicado às relações entre a análise do comportamento (AC) e a educação, cujo texto de abertura reafirma a tímida contribuição da AC para as questões educacionais.

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Resolução de Problemas: ConceituaçãoAceitar que a educação deve promover a formação de indivíduos autônomos, capazes de resolver situações “inéditas”, para as quais não foram especificamente treinados- e não meros reprodutores de informações adquiridas ou procedimentos mecaniza­dos - e levam à necessidade de desenvolver estratégias condizentes com esta meta. Ao longo da vida de uma pessoa, estas situações assumem desde um caráter trivial (necessidade de abrir uma gaveta e não dispor de uma chave) até situações mais complexas que resultam em decisões envolvidas em situações de autogoverno.

A necessidade de se planejar um “currículo” na direção de um autogoverno, intelectual ou não, por sua vez, nos remete ao questionamento de quais são os pro­cessos e/ou comportamentos envolvidos na resolução de tais situações: ou seja, ao próprio conceito do que seja “resolver um problema”.

Skinner (1953) concebe situação-problema como aquela na qual o organis­mo não tem um comportamento imediatamente disponível que reduza a privação ou forneça um meio de fuga da situação-aversiva”. (p. 246)

O autor faz uma distinção clara entre “resolução de problema” e “solução do problema”. Enquanto esta última expressão se refere à resposta que elimina a con­dição aversiva ou de privação, resolução de problema refere-se ao processo de “achar a solução”; ou seja, envolve a emissão de comportamentos que, manipulando variá­veis, tornem mais provável a emissão da resposta-solução*. Segundo ele:

O aparecimento de uma solução não garante que a resolução do problema tenha ocorrido. Muitas vezes, uma mudança acidental no ambiente provoca um resultado semelhante (...). Pela mesma razão, a chamada aprendizagem

por ensaio e erro não é resolução de problema. O estado de privação ou a estimulação aversiva requeridos por um problema implicam a alta

probabilidade de muitas respostas (...). Na presença de um problema o organismo fica simplesmente ativo. Neste caso, novamente, a solução

pode surgir por acidente, (p. 239-240)

Esta manipulação de variáveis constitui o exemplo do que Skinner chama de comportamentos preliminares ou pré-correntes (e que Chase e Bjarnadottir, 1992, denominam component behaviors). São estes comportamentos que alteram o indivíduo ou o ambiente e tomam possível a emissão da resposta-solução. Como pro­curaremos indicar na última parte deste trabalho, a resposta para a questão do ensino da resolução de problemas pode estar na instalação de um repertório de comportamentos pré-correntes.

Voltando à questão da conceituação do comportamento em solucionar pro­blemas, para Skinner, de acordo com sua proposta para uma ciência do comportamento, não é a topografia das respostas envolvidas, nem as caracterís­

* Voltaremos a esse tópico adiante, para esclarecer a que o autor se refere quando fala de manipulação de variáveis que tornam mais provável a emissão da resposta-solução.

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198 ■ Ensino da Resolução de Problemas: Questões Conceituais e Metodológicas

ticas formais da condição em que o organismo se encontra que definem a situação como um problema para esse organismo, mas sim a relação entre as peculiaridades da situação e o repertório dele. A partir disso, decorre uma mesma situação poderá se constituir em um problema para alguns indivíduos e não para outros; igual­mente, uma mesma condição poderá ser um problema para o indivíduo em determinado momento de sua vida, mas não em outro.

Para que determinado problema seja solúvel, é necessário que exista, no re­pertório do indivíduo, uma resposta-solução com alguma probabilidade de emissão. Nestas condições, mudanças no ambiente e/ou nas respostas do indiví­duo, levarão à emissão da resposta que constitui a solução para o problema.

Chase e Bjanardottir (1992) destrincham um pouco mais a cadeia de eventos que especificam a resolução de problemas. Segundo eles:

1. O indivíduo, ao resolver um problema se engaja em uma classe de relações entre respostas.

2. Que ocorrem quando um ambiente estabelece uma solução como um reforçador.3. Mas esse ambiente é discriminativo para uma resposta diferente daquela

que produz a solução.4. Essa última resposta produz uma mudança no ambiente que se torna um

estímulo discriminativo para novas respostas.5. Os passos 3 e 4 são repetidos até que a solução seja produzida.6. A resposta que produziu a solução é considerada por um observador como

nova, e esse julgamento se justifica em bases empíricas ou lógicas para os indivíduos.

7. A seqüência de relações comportamento-ambiente produzida pelos passos 3 e 4 também é considerada como uma seqüência de comportamentos di­reta e sistemática, que faz parte da história do indivíduo, e esse julgamento se apoia em bases empíricas ou lógicas para os indivíduos (p. 184).

Passaremos, a seguir, a analisar desafios conceituais e metodológicos a serem enfrentados no estudo e instalação de um repertório de resolução de problemas.

Desafios Conceituais e MetodológicosComo as pessoas aprendem a se comportar deforma apropriada sob

contingências de reforçamento para as quais elas nunca foram preparadas, especialmente contingências que são tão específicas e efêmeras que

nenhuma preparação genérica é possível? (Skinner, 1969, p. 141-142)

Por trás dos diversos aspectos aqui discutidos, há sempre uma questão de cunho mais geral, que diz respeito à possibilidade de instalação de um repertório de comporta­mentos que tomem o indivíduo mais proficiente na solução de problemas. E, a este respeito, é oportuno discutir quatro questões que constituem dificuldade para a pro­dução de conhecimento sobre solução de problemas. Em particular, serão discutidas:

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• A questão da manutenção e generalização da atividade de resolver problemas.• A grande diversidade de situações consideradas um “problema”, e a dificul­

dade de se determinar o que constitui uma “classe de situações-problema”.• O critério para determinar se um indivíduo está de fato diante de um problema.• A confiabilidade dos meios habitualmente empregados para se estudar os

processos de que os indivíduos se valem para solucionar um problema.

Skinner (1972*) acentua uma peculiaridade do comportamento em resolver problemas que torna ainda mais complexa a tarefa de estudá-lo e de ensiná-lo: uma vez emitida a resposta-solução, o problema deixa de existir; ou seja, “condições se­melhantes”, no futuro, não se constituirão em problema pela definição aqui adotada, pois o organismo já dispõe da resposta-solução ou de procedimentos que o conduzam a ela. Para que não restem dúvidas quanto à dificuldade com que se defronta o estudioso da resolução de problema, considerem duas afirmações feitas por Skinner quanto à “semelhança entre situações” (ou quanto à possibilidade de se falar em novas emissões do comportamento de resolução de um dado problema).

A “dificuldade” de um problema está na disponibilidade da resposta que constitui sua solução. Talvez não necessitemos aumentar

muito a força da resposta, como acontece quando o problema se assemelha muito de perto a um outro resolvido anteriormente. (Skinner, 1953, p. 251, itálico acrescentado)

Adiante, no entanto, ele retoma a questão da semelhança entre situações- problema, dizendo que:

À medida que a semelhança com problemas anteriormente resolvidos au­menta, assim como a disponibilidade de uma resposta adequada, chega-se

a um ponto em que é ocioso falar em resolução de problema, (p. 251)

Especialmente do ponto de vista educacional, esta delimitação, feita por Skinner, mas adotada por autores de outras orientações, tais como Echeverria e Pozo (1998), cria uma dificuldade quando se trata de analisar, por exemplo, (mas não exclusi­vamente) a resolução de problemas matemáticos. Voltando às duas citações anteriores, em que momento se pode dizer que o estudante está diante de um problema para o qual busca uma solução, e em que momento se chega à situação “(...) em que a semelhança com problemas anteriormente resolvidos aumenta, assim como a disponibilidade de uma resposta adequada”, configurando um momento em que “(...) é ocioso falar em resolução de problema”?

Dito de outra forma, qual o âmbito do que se chama, por exemplo, de ensino da resolução de problemas matemáticos? Skinner toma esta resposta ainda mais difícil ao

Ensino da Resolução de Problemas: Questões Conceituais e Metodológicas ■ 199

* O original do livro foi publicado em 1968. No entanto, a bem da verdade histórica, é importante lembrar que alguns de seus capítulos foram publicados bem antes, como artigos isolados, para di­ferentes finalidades.

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discutir a questão de algoritmos* e de regras heurísticas**. Depois de referir-se ao em­prego de algoritmos e de regras heurísticas como de “natureza mecânica” (1972, p. 85), Skinner diz que “uma vez que um artifício ou prática heurística tenha sido formulado e programado, não pode ser diferenciado em nenhum aspecto importante da resolução algorítmica de problemas” (p. 85). Adiante, reafirma o que parece considerar como uma limitação das técnicas heurísticas: “Longe de oferecer escopo a uma forma especial de atividade mental, a heurística pode ser tratada simplesmente como um conjunto de técnicas destinadas a resolver o problema da resolução de problemas” (1972, p. 127). Assim, independentemente do valor que algoritmos e regras heurísticas tenham no ensino de resolução de problemas matemáticos, fica claro que, para ele, o seu emprego não constitui resolução de problemas, no sentido estrito em que emprega o termo.

Assim como a ciência se interessa pelo fenômeno replicável, o interesse pelo com­portamento em resolver problemas não está nos casos isolados de enfrentamento de uma situação problemática, mas no estudo de processos e de procedimentos para a instalação de um repertório que tome indivíduos cada vez mais aptos a enfrentar e re­solver situações problemáticas. Entretanto, do ponto de vista teórico-conceitual, a questão é determinar em que medida se ampliou o repertório de um indivíduo para lidar com situações problemáticas; caso contrário, teremos de admitir que ele apenas se vale de algoritmos e regras heurísticas.

Manutenção e Generalização de Comportamentos Envolvidos na Resolução de ProblemasO objeto do estudo da pesquisa de Leme (2001) - embora definido segundo um refe­rencial (cognitivista) diferente do aqui assumido - configura uma preocupação de todos os envolvidos no estudo da resolução de problemas: a generalização interclasses de problemas. Indiscutivelmente, seria uma tarefa inglória a de instalar, no repertório de um indivíduo, uma resposta-solução a cada novo problema que lhe fosse apresentado. Por outro lado, pouco ou nada se tem avançado no que se refere à obtenção de genera­lidade na resolução de problemas. Mas, isto não deve surpreender, uma vez que:

• Manutenção e generalização devem fazer parte de uma programação pla­nejada e não apenas “esperada” (Stokes e Baer, 1977); uma revisão de 120 relatos de pesquisa publicados em diferentes periódicos, elaborada por esses dois pesquisadores, indicou que “na pesquisa aplicada em análise do comportamento, o método mais freqüente de análise da generalização, até agora, pode ser denominado Train and Hope”***, (p. 351)

* O dicionário Houaiss apresenta várias definições de algoritmo, embora elas todas convirjam para uma que parece abarcar o conteúdo das demais: “Conjunto das regras e procedimentos lógicos per­feitamente definidos que levam à solução de um problema em um número finito de etapas”** A conceituação mais clara do que sejam regras heurísticas ainda é da área da informática: “Método de investigação com base na aproximação progressiva de um dado problema” (Dicionário Houaiss). No entanto, não deixa de ser ilustrativo saber que “heurística” tem a mesma origem de “eureca”.*** Treine (o comportamento) e Confie (na ocorrência de generalização).

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Ensino da Resolução de Problemas: Questões Conceituais e Metodológicas " 2 0 1

• Para um planejamento efetivo, esses resultados dependem do conhecimento dos elementos que compõem uma classe de estímulos capaz de controlar o comportamento do aprendiz, ou do estabelecimento dessa classe, o que fecha o círculo de dificuldades; esse é o maior entrave enfrentado pelos que tentam obter uma generalização entre classes de problemas.

Durante os anos 1970, Donald Baer, em parceria com outros autores (Goetz e Baer, 1973; Parsonson e Baer, 1978) conduziu experimentos que, embora tratando do que era chamado de comportamento criativo (ou, mais propriamente, novel behavior), tinham o comportamento de resolver problema como pano de fundo. A despeito do “sucesso” de seus resultados, o relato do experimento de 1978 termina com a seguinte informação:

Embora os procedimentos de treino empregados neste estudo tenham sido relativamente efetivos, eles envolveram interações intensivas

pesquisador-sujeito ao longo de um período de tempo considerável. Além disso, a generalidade das habilidades para solucionar problemas foi

limitada. O treino de pré-escolares para apresentar comportamento generalizado, criativo, de resolver problemas, pode ser justificado tanto

m termos pessoais quanto sociais. Mas, ainda que currículos escolares possam ser planejados, será necessário desenvolver programas eficientes

que estabeleçam habilidades generalizadas de solução de problemas aplicáveis a uma variedade de problemas em uma variedade de

contextos. (Parsonson e Baer, 1978, p. 379-380, negrito acrescentado)

Mais de 20 anos depois, Leme (2001) assim concluiu seu estudo:

Em outras palavras, o ser humano transfere seu conhecimento para situações que deseja resolver, mas a pesquisa contribui pouco para

desvendar como isso ocorre, (p. 533)

(...) observa-se pouca preocupação com a generalização de resultados, obtidos em condições já em si pouco generalizáveis pela artificialidade

em que foram obtidos. Quanto a estes últimos, reduzidos, em sua maioria, a dados quantitativos sobre o desempenho, verifica-se uma forte ênfase

em tratamentos estatísticos, que pouco acrescentam, além da constatação de que nada de muito novo foi desvendado,

principalmente para a Educação, (p. 534)

Identificação de Classes de ProblemasO planejamento generalizado do comportamento em resolver problemas exige a clara identificação das classes de problemas e, caminhando nessa direção, estu­diosos do tema têm procurado classificá-los, na expectativa de que isto torne mais fácil a identificação de variáveis que controlem a probabilidade de obtenção de generalização (transferência, para alguns autores).

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Um retrospecto da literatura sobre solução de problemas em geral, e não apenas uma análise do comportamento, indica uma contínua busca do sistema de classificação das situações empregadas nas pesquisas na área. Uma rápida recuperação dos problemas dos quais nos lembramos de imediato basta para indicar a dificuldade aqui referida: problemas envolvendo palitos de fósforo, anagramas, “Dai a César”1, relações entre distância-tempo-velocidade, por exemplo, são de naturezas absolutamente diferentes e pressupõem comportamentos pré-correntes diferentes para se chegar à resposta-solução.

Moroz (1983) descreve alguns sistemas de classificação de tarefas empregadas em pesquisas sobre solução de problema, cada um baseando-se em um aspecto diferente (natureza da instrução, da formulação do problema, da estratégia a ser empregada etc.), o que os toma pouco ou nada comparáveis. Mais recentemente, Leme (2001) examinou critérios adotados para se distinguir a fase de aquisição da de transferência e conclui que “Como seria de se esperar, encontra-se, assim, uma grande diversidade de concepções acerca do que é considerado como transferência, transferência analógica e os critérios que são adotados para definir dois problemas como análogof (p. 523, itálico acrescentado).

Reese (1992)2, referindo-se a critérios utilizados por autores cognitivistas para a identificação de diferentes tipos de problemas, aponta: especificidade -um proble­ma será considerado “bem especificado” se as instâncias que o envolve estiverem estreitamente delimitadas; definição de estrutura-um problema será considerado bem definido ou bem estruturado se a pessoa que deve solucioná-lo puder identi­ficar com precisão o espaço relevante para o problema; natureza das operações- são aqui identificadas três condições:

• Quando o problema requer a transformação ou manipulação dos elementos constantes em sua formulação inicial.

• Rearranjo dos elementos apresentados no enunciado original.• Busca de uma estrutura, padrão ou relação comum.

Chase e Bjarnadottir (1992), por sua vez, propõem uma tipificação de classes de problemas mais compatível com a análise do comportamento, na qual a im­portância da variabilidade comportamental3 é ressaltada4. Segundo eles:

202 ■ Ensino da Resolução de Problemas: Questões Conceituais e Metodológicas

1 Trata-se de um tipo de problema no qual, a partir de algumas pistas, deve-se combinar um conjun­to de dimensões dadas, com base em relações lógicas. Por exemplo, considerando cinco casais, cada um residindo em um dado apartamento de um mesmo prédio, possuindo automóvel de certa marca e um animal de estimação diferente, são distribuídas algumas pistas positivas (quem tem o carro Stilo possui um gato) ou negativas (o casal do apartamento 51 não se chama Moraes), a partir das quais se deve resolver o enigma completo.2 O texto de Reese é pouco específico em relação à classificação que descreve. Ainda assim, esta é aqui mencionada como mais uma indicação das várias tentativas feitas para se chegar a uma classificação de situações-problema.3 Embora os autores façam referência explícita ao termo variabilidade, fenômeno da variabilidade comportamental já conta com uma história de pesquisa experimental que explicita parâmetros que o explicam (ver, por exemplo, Hunzinker e Moreno, 2000). O interesse, aqui, não é explorar esse con­ceito, mas evidenciar a questão da variação do comportamento no sentido empregado por Skinner a propósito da seleção por conseqüências (Skinner, 1981).4 Como já foi indicado, a literatura sobre resolução de problemas revista por esses dois autores apresenta duas características marcantes: os problemas consistem em ajustar o comportamento a diferentes esque­mas de reforço e têm como uma das variáveis de interesse central o comportamento governado por regras. Essas características precisam ser consideradas na análise da classificação proposta por eles.

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Ensino da Resolução de Problemas: Questões Conceituais e Metodológicas ■ 203

Essencialmente há dois tipos de problemas e os fatores que produzem variabilidade [comportamental] interagem deformas diferentes para cada

um destes [tipos] de problemas. O primeiro [tipo de] problema envolve [a emissão de] um comportamento diferente que produza os reforçadores (...). O segundo tipo de problema envolve situações nas quais não ocorrem mudanças

nos estímulos a menos que haja mudanças no comportamento, (p. 191)

A importância desta classificação está na ênfase sobre a variação do compor­tamento. Ou seja, variação sempre estará envolvida no processo de resolução de problemas, pois:

• Alguma variação precisa ocorrer de forma que “novos” comportamentos possam ser selecionados por suas conseqüências.

• A variação comportamental deve ser mantida de forma sistemática para que se possam obter soluções também sistemáticas.

Conforme será discutido na terceira parte, esta é uma pista importante a se considerar na instalação de um possível repertório de resolução de problemas.

Em síntese, além da resposta à questão formulada por Skinner já aqui mencio­nada (“Como as pessoas aprendem a se comportar de forma apropriada sob contingências de reforçamento para as quais elas nunca foram preparadas, especial­mente contingências que são tão específicas e efêmeras que nenhuma preparação genérica é possível?”) precisamos oferecer resposta a uma outra questão: é possível identificar uma classe de estímulos que controle um conjunto de comportamentos preliminares capazes de tornar o indivíduo competente na resolução de problemas? É possível cogitar a generalização entre classes de problemas? A partir da delimitação feita por Skinner, segundo a qual “À medida que a semelhança com problemas an­teriormente resolvidos aumenta, assim como a disponibilidade de uma resposta adequada, chega-se a um ponto em que é ocioso falar em resolução de problema”, faz sentido cogitar uma generalidade intraclasses de problemas?

Estas considerações devem bastar para configurar o que se apontou como uma dificuldade conceituai relativa ao comportamento de resolver problemas e as implicações dela para a atividade de ensino. A despeito da relevância da pergunta, a literatura não oferece uma resposta confortável ao pesquisador interessado no assunto. É de se perguntar se estamos formulando a pergunta certa...

À parte, a dificuldade conceituai, um grande desafio de cunho metodológico, é encontrar meios para identificar se um indivíduo se encontra, efetivamente, frente a uma situação-problema. Particularmente, em uma situação natural, não temos acesso a todo o repertório, nem à sua história, para saber se dada condição preenche os re­quisitos: ser uma situação para a qual não há resposta imediatamente disponível, nem procedimentos aprendidos que os conduzam a ela. Também, nem sempre é fácil identificar os fatores motivacionais: o indivíduo “quer” ou “precisa” chegar à resposta- solução? Por exemplo, o estudante que desiste de uma questão difícil na prova não dispõe dos recursos necessários para chegar à resposta-solução ou simplesmente se acha diante de um caso em que a aversão da situação é insuficiente frente ao custo de resposta envolvido, de modo que é preferível desistir do que tentar?

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204 ■ Ensino da Resolução de Problemas: Questões Conceituais e Metodológicas

Estas dificuldades exigem análise cuidadosa de boa parte da literatura sobre resolução de problemas, especialmente quando envolve crianças. Confrontar o sujeito com uma dada situação e esperar que ele apresente solução só permite dizer que ele se encontra diante de um problema do ponto de vista formal, mas não assegura que tal situação tenha semelhante statusjunto ao sujeito. Algum tipo de fator motivacional precisaria ser assegurado de modo a aumentar a probabili­dade de o indivíduo manter-se em atividade.

É preciso reconhecer que isto é verdade em relação a qualquer outro tipo de operante. No entanto, pelo menos dois fatores sugerem que isso seja particular­mente verdadeiro no caso do comportamento em resolver problemas:

• O fato de as condições antecedentes tenderem a ser particularmente com­plexas, por um lado (caso contrário, não seriam problemáticas).

• [O que por decorrência produz] O aumento do custo da resposta, de modo que algum tipo de forte controle seja necessário para manter o indivíduo se comportando.

Deste ponto de vista, atestar que um indivíduo resolveu um problema quando já dispunha de uma resposta-solução (ainda que fraca), parece um erro menor do que atestar que ele não tem repertório (competência, no que diz respeito a situações educacionais), quando, na verdade, a situação a ele apresentada não se constitui como problema para ele.

Moroz (1991) inovou em sua pesquisa, ao procurar estudar o desempenho de crianças a partir da identificação de indicadores de que elas estavam diante de um problema, ao invés de definir previamente um problema que elas deveriam solucionar.

É importante mencionar que Skinner oferece duas possibilidades de identifica­ção de um indivíduo frente a um problema: em primeiro lugar, porque, segundo ele, o estado de privação ou a estimulação aversiva torna o organismo ativo. “Ele emite um grande número de respostas em virtude de sucesso anterior ou, talvez, em virtude de certas características do problema” (1953, p. 248); ao mesmo tempo, a resposta “forte” que não pode ser emitida na situação problemática pode ser inferida ao se demonstrar que ela ocorre tão logo seja emitida a resposta-solução. Em seu exemplo, o problema causado pela indisponibilidade de uma chave que abra uma gaveta pode ser evidenciado pelos comportamentos do indivíduo tão logo consiga abrir a gaveta (mexe em seu interior, por exemplo, deslocando obje­tos até retirar um deles de lá e fechando a gaveta em seguida).

Tomando em consideração estes dois elementos, o pesquisador/professor conta com um elemento para analisar o desempenho do indivíduo: suas respostas “não funcionais” ou, em outras palavras, suas “tentativas”. Embora Skinner tenha aproveitado todas as oportunidades disponíveis para demonstrar a inadequação (e inutilidade) da expressão “ensaio e erro” ou “tentativa e erro”, em pelo menos um momento ele parece “ceder” ao procedimento. Diz ele que:

Alguns comportamentos preliminares de autocontrole são adequados a situações para as quais as técnicas já estabelecidas de solução de problemas

são impossíveis de aplicar Um estudante pode “aprendera tentar”, respondendo a uma situação complexa por tentativa e erro. (1972, p. 128)

\

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Uma terceira dificuldade impõe-se ao estudioso da resolução de problemas, grande parte da estimulação e respostas envolvidas nas situações em que um indivíduo se encontra diante de um problema é de natureza encoberta e, consequentemente, diretamente inacessível ao observador. Nestas condições, a emissão da resposta-solu- ção, por si só, nos diz pouco sobre o processo subjacente envolvido. Uma alternativa que tem sido aventada (Skinner, 1972, por exemplo), consiste em promover/facilitar a emissão de respostas abertas durante a resolução de situações (supostamente)- problema. Para tanto, estas são apresentadas a grupos de indivíduos na expectativa de que a situação grupai suscite discussões que evidenciem os passos seguidos para chegar à solução (Moroz, 1983).

Tal estratégia nos informa sobre o processo coletivo; porém, elos encobertos emitidos por cada participante, individualmente, permanecem desconhecidos. Além disso, não dispomos de informações acerca da semelhança/identidade entre os passos seguidos pelo grupo e aqueles que seriam eventualmente utilizados por cada participante, se exposto isoladamente à situação.

Outro elemento que tem sido proposto como evidência dos processos enco­bertos envolvidos é o relato verbal feito pelos sujeitos quando questionados sobre “como pensaram” ou “como fizeram” para resolver a situação. Mais uma vez, não há garantias de que as informações assim obtidas reproduzam, de forma válida e fidedigna, os elos encobertos: o comportamento discriminativo do sujeito diante de seus próprios comportamentos encobertos pode ser falho (De Rose, 1997). Além disso, a resposta verbal apresentada pode ser, ela mesma, resultante do processo (talvez o último elo numa cadeia que envolve desde a apresentação da situação- problema até o questionamento feito pelo experimentador/professor). Tal fato, novamente, deixará o observador incerto quanto à utilidade do dado verbal en­quanto indício do processo ocorrido.

De qualquer modo, até o momento, estes procedimentos ainda são os que oferecem maiores possibilidades de coleta de informações relevantes sobre pro­cessos encobertos que possam presidir a situação de resolução de problemas.

Manutenção da Resolução de Problemas como Elemento de Autogoverno IntelectualUm grupo de pesquisadores espanhóis tem ajudado a lançar luz (mas, não raro, sombra) na questão do ensino da resolução de problemas no âmbito da escolari- zação formal.

Echeverría e Pozo (1998) suscitam uma questão que poderia ser deduzida das questões motivacionais mencionadas por Skinner (uma resposta forte que o indi­víduo precisa emitir) e por suas análises a respeito de contingências naturais e artificiais no ensino (Skinner, 1972, por exemplo): trata-se de determinar o que man­terá o indivíduo, ao longo de sua vida, procurando resolver problemas e que tipo de problema o controlará nessa busca. Dizem eles:

Ensinar a resolver problemas não consiste somente em dotar alunos de habilidades e estratégias eficazes, mas também em criar neles o hábito e a

Ensino da Resolução de Problemas: Questões Conceituais e Metodológicas ■ 205

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206 ■ Ensino da Resolução de Problemas: Questões Conceituais e Metodológicas

atitude de enfrentar a aprendizagem como um problema para o qual deve ser encontrada uma resposta. Não é uma questão de somente ensinar

a resolver problemas, mas também de ensinar a propor problemas para si mesmo, a transformar a realidade em um problema que mereça

ser questionado e estudado, (p. 14-15)

Em Tecnologia do Ensino (1972), Skinner refere-se a isto como autogovemo intelec­tual. Após citar uma lista de situações em que um estudante poderia manipular contingências que controlassem seu próprio comportamento, ele conclui dizendo que:

Ele [o aluno] só fará estas coisas se tiver aprendido afazê-las. A instrução específica é particularmente importante, porque o autogovemo é, muitas

vezes, encoberto e, por isso, geralmente não se dispõe de modelos para imitá-los. Não vemos com frequência pessoas se controlando dessa

maneira. Além disso, as conseqüências reforçadoras naturais são quase sempre muito adiadas. A educação nunca ensinou efetivamente o

autogovemo da motivação. Raramente tentou. Mas, as técnicas se tornam disponíveis tão logo o problema seja entendido. (1972, p. 158)

E esta parece ser a nossa dificuldade como educadores: ainda não entendemos o problema.

Relação entre Conhecimento Factual e Resolução de ProblemasUm segundo aspecto importante discutido por Echeverría e Pozo (1998) é parti­cularmente pertinente ao âmbito educacional, mas não é exclusivo dele. Trata-se do grau de dependência entre habilidades de resolução de problema e conheci­mento factual de questões nele envolvidas. Embora esta relação de dependência possa parecer óbvia, a princípio, ela tem implicações importantes para a questão da generalidade das habilidades de resolver problemas. Para estes pesquisadores, a questão pode ser assim retraçada do ponto de vista de uma evolução dos estudos sobre resolução de problemas.

Durante muito tempo, os estudos psicológicos e as suas aplicações educa­cionais pareciam concordar com a idéia de que a solução de problemas se

fundamenta na aquisição de estratégias gerais, deforma que, uma vez ad­quiridas, possam ser aplicadas com poucas restrições a qualquer tipo de

problema (...). Face a esse enfoque, tem surgido, mais recentemente, outra forma de entender a solução de problemas e a sua instrução, segundo a

qual esta somente pode ser abordada no contexto das áreas ou conteúdos específicos aos quais os problemas se referem, (p. 18)

O conjunto de questões aqui apontado pode estar entre as razões que têm dificultado/desestimulado a investigação do assunto pelos analistas do compor­

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Ensino da Resolução de Problemas: Questões Conceituais e Metodológicas ■ 207

tamento. A despeito delas, entretanto, permanece a necessidade de se desenvolver uma tecnologia que atenda ao objetivo educacional anteriormente exposto - ou seja, formar cidadãos aptos a lidarem com situações novas. Ou, dito de outra for­ma, promover o desenvolvimento de “habilidades” nos alunos que lhes permitam emitir a resposta-solução em condições:

• Que envolvam estado de privação ou estimulação aversiva.• Para as quais não há resposta-solução disponível.• Pela emissão de respostas (comportamentos preliminares) que modifiquem

a situação.

Do anterior exposto, parece claro que a identificação de dada situação como constituindo (ou não) um problema para determinado indivíduo será sempre probabilística e inferencial. Elos abertos (orais - verbalizações, motores - manipu­lação de peças/objetos/figuras, gráficos-desenhos, anotações etc.) que acompanhem e complementem o processo encoberto e descrições feitas pelo sujeito de como resolveu a situação, por exemplo, aumentam a chance de se identificarem elemen­tos importantes, porém não trazem certezas absolutas.

Processo de Resolução de Problemas e EducaçãoA exposição de alunos a situações (supostamente) consideradas problema pode se constituir em um primeiro passo a ser dado pelo professor, na busca de elementos para entender o repertório de solução de problemas do aluno. Se bem planejadas, tais situações serão diversificadas a ponto de permitir ir localizando lacunas no repertório das crianças (dificuldades de atenção, motoras, de persistência ou mesmo de conteúdos, por exemplo), bem como identificando “estratégias” preferenciais de cada criança (um mesmo problema pode, por exemplo, ser resolvido por uma crian­ça, de forma pictórica, por outra através de verbalizações, enquanto outra o resolve intraverbalmente, apenas enunciando a resposta-solução final).

Outra alternativa, ainda pouco explorada, consiste na instalação de repertórios que possam ser efetivos, na qualidade de comportamentos pré-correntes, em um grande número de situações que os exijam para a resolução de problemas. No entanto, confor­me já aqui salientado, a primeira grande dificuldade com que se defronta o pesquisador/ educador, a este respeito, está na identificação de tais repertórios, visto que as futuras situações-problema, com as quais os alunos irão se defrontar, tendem ao infinito e são impossíveis de serem previstas (Echeverría e Pozo, 1998; Skinner, 1969).

Na concepção de Skinner, o cerne do processo de resolução dos problemas está na manipulação de variáveis que permitam a emissão da resposta-solução. Refere-se, es­pecificamente, a manipulações que produzem modificações na situação ou no próprio sujeito, modificações estas que tornam a emissão da resposta-solução mais provável. Conforme já aqui mencionado, o autor se utiliza da noção de comportamentos pré- correntes ou preliminares (Skinner, 1953; 1972) para se referir a tais respostas. Trata-se de respostas que aprimoram a estimulação disponível, isto é, tornam mais salientes as características dos estímulos presentes (afastar ou aproximar objetos dos olhos, isolar

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208 ■ Ensino da Resolução de Problemas: Questões Conceituais e Metodológicas

partes do objeto para exame mais detalhado etc.), alterando, por conseqüência, o próprio comportamento do indivíduo e permitindo a ocorrência da resposta-solução. Seguem alguns exemplos do que Skinner chama de comportamentos preliminares.

Um meio de encorajar a emissão de resposta que talvez prove ser a solução é a manipulação de estímulos. (...) Aperfeiçoar ou ampliar a

estimulação disponível é especialmente eficiente; aumentamos as probabilidades de uma solução quando examinamos cuidadosamente um

problema, quando consideramos todos os fatos, ou quando apontamos estímulos relevantes colocando o problema em seus termos mais claros.

Um passo além é arranjar ou rearranjar estímulos. (1953, p. 249)

O silogismo lógico é um meio de dispor estímulos. O lógico possui um repertório verbal no qual certas conclusões têm maior probabilidade de

serem feitas a partir do enunciado de certas premissas, mas um determinado problema pode não se apresentar na ordem requerida. Resolver o problema

consiste em arranjar o material em forma silogística. (1953, p. 250)

... se o problema for dizer se duas coisas são idênticas ou diferentes, nós podemos colocá-las lado a lado para facilitar uma comparação; se

(o problema) for certificarmo-nos de que devemos tratá-las como diferentes, nós as separamos. Agrupamos coisas similares em classes a fim de tratá-las

da mesma forma. Colocamos as coisas em ordem se a solução requer uma série de passos. Reformulamos uma resposta verbal traduzindo-a de

palavras para símbolos. Representamos as premissas de um silogismo com círculos que se sobrepõem. Clarificamos quantidades contando ou medindo.

Confirmamos uma solução resolvendo o problema uma segunda vez, possivelmente de uma forma diferente. (1974, p. 111)

Descrever de forma acurada as condições, “dar-se deixas”, induzir e deduzir são ainda outros exemplos de manipulação de variáveis através da produção e/ou aprimoramento de estímulos discriminativos.

A partir das afirmações anteriores, surge uma primeira questão de relevância teórica e pragmática: quais as variáveis envolvidas na história de vida das pessoas que as capacitam mais ou menos a produzirem manipulações ambientais que tornem o ambiente discriminativo para a resposta-solução e/ou para seqüências de respostas que conduzam a ela?

O desenvolvimento teórico e empírico na análise do comportamento, no que tange esta questão, está longe de nos fornecer resposta satisfatória. Entretanto, os dados disponíveis já permitem levantar algumas hipóteses a serem consideradas e investigadas. É delas que nos ocupamos abaixo.

Decorrências lógicas da análise expressa anteriormente, bem como alguns dados empíricos, surgem como elementos importantes para o repertório de solu­cionar problemas: variação do comportamento, a existência de repertórios prévios relacionados à situação presente, resistência à frustração e/ou persistência na tarefa e habilidades heurísticas.

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Ensino da Resolução de Problemas: Questões Conceituais e Metodológicas ■ 209

Importância da Variação do ComportamentoQuando falamos, aqui, em variação do comportamento, no contexto da resolução de problemas, estamos considerando dois aspectos. Em primeiro lugar, estamos nos referindo à possibilidade de emissão de respostas distintas ou alternativas, perante uma mesma situação, e não apenas ou necessariamente de exemplares de uma mesma classe de respostas. Isto é fundamental porque fazê-lo pode se constituir justamente naquilo que alterará o ambiente ou o próprio indivíduo, criando estímulos discriminativos que venham a controlar a resposta-solução.

Em segundo lugar, está pressuposta a necessidade/importância de que o in­divíduo seja sensível às contingências presentes e a mudanças nas mesmas, de forma a alterar suas respostas de acordo. Em uma situação problemática, fará toda a diferença discriminar em que medida certas respostas devem ser mantidas ou precisam ser alteradas. E o indivíduo que estiver sob controle das conseqüências de suas respostas estará em melhor condição para decidir se é necessário alterar características delas (frequência, intensidade, topografia, por exemplo) ou se é preferível alterar completamente sua maneira de se relacionar com o ambiente.

Novamente, e como já aqui reiterado, é difícil planejar uma ação educativa que antecipe que repertório é necessário instalar nos alunos, tendo em vista a diversi­dade de situações-problema com que virá a se defrontar. No entanto, parece claro que quanto maior a diversidade de respostas selecionadas na história de um indi­víduo, maior a probabilidade de que venham a ser emitidas sob novas circunstâncias*.

Esta é uma questão complexa para a qual a pesquisa básica tem muito a ofe­recer: trata-se de instalar um repertório em que, por um lado, um controle de estímulos mantenha o indivíduo se comportando de uma dada maneira e, ao mesmo tempo, assegurar uma sensibilidade às conseqüências que o leve a mudar a resposta ou padrão de respostas, tão logo as contingências mudem. A comple­xidade da questão está, entre outras razões, no fato de haver uma aparente ambigüidade entre fortalecer uma resposta por meio de um esquema intermiten­te de reforço e esperar flexibilidade e sensibilidade à ausência de reforço.

Estas questões não são novas. Já em 1950, Keller e Schoenfeld (1968) alertavam para importantes implicações educacionais do reforço intermitente:

Tendo presentes os fatos do P-R**, o leitor deveria ser capaz de fazer algumas deduções críticas sobre procedimentos educacionais que tentam controlar o

comportamento. Deveria, por exemplo, ver como se pode ensinar uma criança a ser persistente diante do insucesso. Ao treinar habilidade, dever- se-ia assegurar a confiança no trabalho, ou a disposição de ser persistente

em atividades sociais, que a criança obtenha alguma garantia de êxito e aprovação - regularmente, a princípio, mas só ocasionalmente mais tarde,

de modo que ela não desista diante das derrotas, (p. 116)

* Nos anos 1980, desenvolveram-se pesquisas em que se estudava o efeito do ensino de funções alter­nativas a um mesmo objeto sobre a subsequente resolução de problemas. Esse tipo de pesquisa era bastante próximo à de Parsonson e Baer (1978), já mencionada.** Recondicionamento periódico.

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210 ■ Ensino da Resolução de Problemas: Questões Conceituais e Metodológicas

A literatura dos anos 1950 e 1960 documentou fartamente resultados de experi­mentos com animais e crianças sobre um processo denominado learning sets*, inicialmente demonstrado por Harlow (1949), com macacos. Criada uma história de sucessivas discriminações, sob reforçamento contínuo, chegava-se ao ponto em que, frente a um novo par de estímulos, a primeira resposta não reforçada era um estímulo discriminativo (SD) para a mudança, levando o organismo ao acerto com, no máximo, um único erro. Em oposição às explicações teóricas adotadas na época, Sidman (1960) mostrou que o fenômeno - conhecido como extinção discriminada - é produto de uma história que alternadamente reforça e coloca em extinção uma resposta, de modo que a única pista do início do procedimento de extinção seja a ausência de reforço.

Uma determinada história de “reforçamento” pode se mostrar útil no caso do ensino da resolução de problemas, na medida em que cria a variação a que nos referimos no início deste tópico, mas coloca-a sob controle das conseqüências.

Por outro lado, é importante que se atente para o fato de que o fenômeno é incompatível com uma história de reforço intermitente que, por sua vez, criaria (alta) maior resistência à extinção.

A questão da variação do comportamento está também ligada a uma segunda, relativa a padrões de aquisição de respostas que nos remete à discussão “compor­tamento governado por regras x modelado por contingências”. Grande parte da literatura (Matos, 2001) apresenta dados que sugerem que o comportamento go­vernado por regras seria mais insensível a mudanças ambientais do que aquele que foi modelado por contingências. Entretanto, não se pode afirmar que esta seja uma postura unânime entre os analistas do comportamento. Chase e Bjarnadottir (1992), por exemplo, consideram que a insensibilidade a mudanças nas contin­gências depende do quão estável era o comportamento, e não do meio como foi adquirido. Os autores comentam os resultados obtidos em pesquisas que abordam a questão da insensibilidade à mudança de contingências versus o comportamen­to modelado por contingências/governado por regras. Citando dados de pesquisa de outros autores e deles mesmos, Chase e Bjarnadottir (1992) afirmam que:

• O fator crucial para que o comportamento seja mais ou menos sensível a mudanças nas contingências é manter a estabilidade; assim, as pesquisas que concluíram sobre a insensibilidade gerada por regras estariam lidando com comportamentos estáveis e comparando-os com comportamentos em transição, na condição de reforço diferencial.

• Se o comportamento está em transição, é mais provável que este tome con­tato com variações nas contingências e também varie, sendo tratado como consequencia.

• Quando se permite que os comportamentos reforçados diferencialmente também atinjam estabilidade, eles também se tornam menos sensíveis a variações ambientais.

• Para que ocorra sensibilidade a mudanças, é importante que o sujeito tenha história de variação nas contingências; nesse caso, tanto o comportamento

* O fenômeno foi também denominado learning to think.

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instruído como aquele instalado via reforço diferencial serão mais sensíveis às mudanças.

• Finalmente, estudos obtiveram variabilidade a partir de instruções que também variavam.

Este conjunto de questões tratadas até aqui parece ir de encontro às propostas de uma aprendizagem sem erros. Uma programação de ensino conducente a uma aprendi­zagem sem erro parece retirar do processo de aprendizagem a variação até aqui propugnada como fator importante. Por outro lado, em mais de uma oportunidade, Skinner lembra que é possível mostrar ao aluno que uma resposta está errada sem que ele tenha de cometer um erro, para isso. Em outras palavras, é possível programar situa­ções em que ele seja reforçado por identificar erros. O ponto central da discussão de Skinner - no contexto da situação de ensino - é o fato de que o ensino de certos compor­tamentos - pensar, estudar, prestar atenção, por exemplo - deve contar com programação específica, ao invés de se esperar que isso ocorra em meio ao ensino de conteúdos. Deste ponto de vista, mantida a conveniência de uma aprendizagem sem erro, o progra­ma deveria continuar com a instalação de uma história de variação do comportamento.

Esta questão da relação entre comportamentos a serem ensinados e os conteú­dos selecionados para ensino enseja a discussão de outro problema do cotidiano escolar que diz respeito ao ensino da resolução de problemas.

A maioria das críticas às escolas “conteudistas” é pertinente e não pretendemos nos alongar em sua análise. Entretanto, reconhecer que a tarefa básica da escola não é sobrecarregar os alunos com toneladas de informações (na suposição de que eles deverão aprender a buscá-las quando necessário) não eqüivale a dizer que parte da tarefa educativa não seja, exatamente, prover informações básicas para o aluno. Por exemplo, grande parte do conteúdo de Matemática, Ciências e Estudos Sociais é essencial para que o aluno prossiga em sua aprendizagem, acadêmica ou não. Por outro lado, também é preciso reconhecer que parte considerável do que é ensinado e cobrado na escola é de relevância questionável ou, pelo menos, não é relevante do ponto de vista dos alunos que não estabelecem relação disto com seus interesses e experiências cotidianos. Portanto, tratar-se-ia de rever não apenas o conteúdo a ser ensinado, mas a metodologia utilizada para fazê-lo.

Ainda no intuito de ampliar o repertório dos alunos, é importante considerar que a escola tem priorizado acentuadamente o comportamento verbal (estratégias de ensino, estudo e avaliação que se baseiam em respostas orais ou escritas dos alunos). Eviden­temente, trata-se de repertório de extrema relevância, dentre outros motivos, pois à medida que cresce a abstração, aumenta também a necessidade de se dominarem linguagens (o próprio idioma, conceitos atinentes às diferentes áreas, uso de símbolos e algoritmos etc). Entretanto, recursos de outros tipos (visuais, gráficos, motores etc.) são tratados precariamente. Parece ficar aqui uma lacuna importante no que tange a repertórios que podem auxiliar na resolução de problemas. Em primeiro lugar, porque várias situações-problema podem ser resolvidas de diferentes formas (um problema no qual aspectos espaciais são relevantes pode admitir soluções algébrica, geométrica ou simplesmente gráfica) (Marinotti, 1992). A restrição a um tipo de solução dificulta, ao aluno, a identificação das outras possibilidades. Com grande frequência, também, situa­ções-problema exigem repertórios diversos e não apenas repertórios verbais.

Ensino da Resolução de Problemas: Questões Conceituais e Metodológicas ■ 211

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212 ■ Ensino da Resolução de Problemas: Questões Conceituais e Metodológicas

Dada a infinidade de situações com as quais o indivíduo poderá vir a se de­frontar, é importante colocar seu comportamento sob controle de diferentes dimensões dos estímulos disponíveis, a fim de que responda a elas quando neces­sário. Por exemplo, imaginemos a situação a seguir, nas quais o aluno é solicitado a indicar qual palavra não combina com as demais:

• Jaca - pêssego - margarida - caju - abacaxi.• Jaca-pêssego-caju-jabuticaba.• Xícara - ameixa - pêssego - lâmpada.

As três situações envolvem algumas palavras em comum. No entanto, para responder à primeira situação, a criança deverá ficar sob controle do aspecto se­mântico dos vocábulos e rejeitar “margarida”, por ser a única não fruta. A segunda alternativa, por sua vez, requer que a dimensão ortográfica exerça controle e que a criança elimine a palavra “pêssego”. Finalmente, na terceira alternativa, tanto o controle por pista visual (acento), quanto pela categoria gramatical dos vocábulos levará à exclusão de “ameixa”, única não proparoxítona e não acentuada.

Se imaginarmos uma criança submetida a estas três situações, poderemos dizer que, para se sair bem, é necessário que ela seja sensível a diferentes dimen­sões do vocábulo, ou seja, responda a classes (fruta, por exemplo), e não apenas aos vocábulos isoladamente, e fique sob controle do critério de classificação, mu­dando a resposta quando a situação mudar.

Portanto, responder a diferentes dimensões dos estímulos parece ser um requisi­to importante para aumentar a chance de responder a situações diversas; classificar, ordenar, seriar e relacionar estímulos é outro; buscar novos critérios de agrupamento seria um terceiro. Cada um destes requisitos pode - e deve - ser ensinado.

Repertório de Comportamentos Preliminares Potencialmente RelevantesIndiscutivelmente, é inglória a tarefa de um planejamento genérico de ensino de resolução de problemas, ainda que isso possa vir a ser feito em situações especí­ficas. A simples dificuldade de se estabelecerem classes de problemas já falaria da dificuldade da empreitada. Por outro lado, conforme já aqui mencionado, Skinner mostra que a solução de um problema depende, em grande parte, da eficácia dos comportamentos preliminares que o sujeito souber/puder emitir, na medida em que estes, de alguma forma, permitirão a emissão da resposta-solução.

A seguir, apresentamos uma relação de comportamentos preliminares com probabilidade de serem eficientes em uma grande quantidade de problemas e que, portanto, merecem ser instalados pela escola. No entanto, deve ser enfatizado que esse mesmo repertório deve ser colocado sob controle de situações em que tenham maior probabilidade de emprego e, portanto, de sucesso.

Iniciamos retomando a questão dos algoritmos e das regras heurísticas e, em seguida, falaremos de comportamentos mais específicos.

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Ensino da Resolução de Problemas: Questões Conceituais e Metodológicas ■ 2 1 3

Algoritmos e HeurísticaSkinner afirma que não estamos interessados em soluções que resultem de “ensaio e erro”, ou do simples aumento de atividade do sujeito. Especialmente no que se refere ao ensino, queremos, principalmente, que a criança aprenda a chegar à resposta-solução através de repertórios apropriados para isto. Tal preocupação envolve alguns aspectos já comentados: exploração e manipulação de diferentes dimensões dos estímulos; estratégias dedutivas e indutivas; transformações (pa­lavras - símbolos - fórmulas) etc.

Neste momento, abordaremos mais explicitamente o desenvolvimento de algoritmos e construção de regras heurísticas como partes fundamentais do pro­cesso de solucionar problemas.

Segundo Reese (1992), algoritmos são regras que produzem a solução correta a menos que seja cometido algum erro. Exemplos de algoritmo são as rotinas para efetuar as operações aritméticas e para a extração de raiz quadrada.

Atividades que auxiliem o indivíduo a identificar os passos utilizados na resolu­ção de determinado problema poderão ser úteis no sentido de colocar em seu repertório o emprego de um novo algoritmo que poderá ser utilizado em situações análogas. Paralelamente, entretanto, é importante que ele também seja confronta­do com situações às quais o procedimento não se aplica, a fim de evitar manutenção destes comportamentos naquelas situações em que não são funcionais.

Regras heurísticas, por sua vez, constituem dicas práticas para lidar com situa- ções-problema, porém não garantem a solução correta, mesmo que não ocorram erros. Segundo Reese (1992), frequentemente essas regras se aplicam a várias classes de problemas e são particularmente úteis em problemas mal definidos. São exemplos de regras heurísticas: identificar o que é conhecido da situação- problema e o que precisa ser descoberto; identificar os meios conhecidos e/ou utilizados em problemas semelhantes para produzir novas informações; transfor­mar os dados de forma a evidenciar relações entre eles etc.

Novamente, a possibilidade de o indivíduo produzir e/ou utilizar tais dicas de­pende, diretamente, da diversidade de experiências com que tenha se defrontado, sejam elas de natureza formal (escola) ou informal. Trata-se, uma vez mais, de en­fatizar a importância de propiciar aos alunos situações bastante diversificadas para que as solucionem. Promover atividades em que a solução envolve trabalho em grupo também pode ser útil uma vez que diferentes pessoas poderão implementar e/ou verbalizar diferentes propostas de como encaminhar a situação-problema.

Persistência na Tarefa e Resistência à FrustraçãoConforme destacado anteriormente, o conceito de resolução de problemas implica, como condição e por definição, que a solução de um problema reforce o compor­tamento que a produziu. Igualmente, comportamentos que, por transformarem o ambiente e/ou o próprio indivíduo, tornem cada vez mais provável a resposta-so­lução, são também reforçadores (secundários) e aumentam a probabilidade de que a pessoa continue se comportando (“tentando”), até, eventualmente, solucionar o

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problema. Entretanto, fora da situação natural, como já aqui indicado, é necessário contar com conseqüências artificiais para manter o indivíduo buscando a solução. Além de ser necessário assegurar que tais conseqüências tenham adquirido valor reforçador suficiente para manter o indivíduo se comportando (algo difícil quando se trata de alunos principalmente do ensino fundamental), seu emprego deve ser, de maneira planejada, substituído por outras, capazes de manter o comportamen­to em situações “mais naturais” (Skinner, 1972). Em outras palavras, é pouco provável que se possa sempre contar com o que Skinner chama de autogoverno intelectual: um indivíduo que se proponha problemas relevantes e disponha-se a encontrar soluções para eles. Até que isso possa acontecer (se vier a acontecer), é fundamental que se programem condições para manter o indivíduo se comportan­do, o que poderia chamar de um repertório de “persistência na atividade”.

Há pelo menos duas maneiras possíveis de se trabalhar nessa direção. A pri­meira é a programação de atividades pedagógicas que coloquem os alunos em contato com situações progressivamente mais difíceis para elas. Para tanto, como deve ocorrer na instalação de qualquer comportamento, é importante que as atividades sejam graduadas de forma a oferecerem algum nível de dificuldade, mas que não seja tal que o problema se torne insolúvel pelos alunos. O conheci­mento do professor sobre o repertório dos alunos e sobre o que já foi ensinado poderá lhe dar elementos para aquilatar, de forma aproximada, o grau de dificul­dade das diferentes condições; a observação deles enquanto as realizam fornecerá elementos adicionais para esta avaliação.

Pressupomos, aqui, que a exposição freqüente a situações para as quais a crian­ça não tem uma resposta imediata, a qual ela consegue emitir após persistir na tarefa, aumente sua resistência à frustração (Skinner, 1953, p. 164; Keller e Schoenfeld, 1968, p. 116) e a torne mais confiante em suas possibilidades, de forma a continuar se comportando quando confrontada com dificuldades extra-escolares e/ou futuras.

Além disso, pode-se supor também que, se a escola passar a enfocar mais atividades que requerem e permitem respostas novas e originais, em contraste com aquelas que enfatizam memorização e repetição de rotinas, estará contri­buindo para que “solucionar problemas” possa adquirir valor reforçador adicional àquele presente na solução específica de cada situação e, portanto, aumentar a probabilidade de abordagens sistemáticas e produtivas a novas situações que lhe forem apresentadas.

A segunda maneira está embutida na primeira, mas merece consideração específica. Trata-se de criar uma história em que o indivíduo tenha sido muito reforçado por continuar se comportando (“tentando”), independentemente das conseqüências previstas para o acertar. Dito de outra forma trata-se de criar uma história de vida em que a conseqüência indique se o problema foi ou não solucio­nado (caso isso seja necessário), para que o manter-se “tentando” possa ser continuamente reforçado. Em situações regulares de ensino, em que não se conta com material programado e individualizado, a dificuldade dos problemas em re­lação ao repertório do aluno pode tornar a tarefa aversiva, levando-o a deixar de comportar-se em relação ao problema. Deste ponto de vista, é importante asse­gurar diferentes contingências: como conseqüência dos comportamentos de solucionar problemas e para manter o indivíduo na atividade, independentemente

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de seu sucesso. O emprego de um recurso como o reforço social descritivo (por exemplo, “estou gostando de ver como você está trabalhando firme, sem desistir”) pode facilitar essa tarefa.

Atentar é outro comportamento preliminar importante para grande parte dos problemas a serem solucionados. Ao discutir as vantagens de uma máquina de ensinar, Skinner (1972) vale-se do contraponto entre o que ocorre entre a atenção (ou desatenção) durante a leitura de um livro (as conseqüências são tão longín­quas que não chegam a ser eficientes) e o que pode ser feito com uma máquina. “O comportamento corrente na observação ou na atenção para detalhes (...) é eficazmente modelado pelas contingências programadas pela máquina.” (p. 51)

Hoje, o professor já conta com inúmeros recursos que facilitam esta sua tarefa. Bancas de jornal vendem revistas com jogos e “exercícios” em que a solução exige atenção e detalhes. O que falta, aparentemente, supondo-se que esse material seja empregado, é que ele o seja como parte de um programa de contingências com a finalidade explícita de gerar comportamentos de exploração e de atenção.

Um último aspecto referente a comportamentos preliminares merece ser co­mentado. Trata-se de enfatizar a importância de que repertórios já instalados façam parte de programações em que eles sejam úteis como comportamentos prelimi­nares. Em outras palavras, trata-se de aumentar a força desses operantes e ampliar o número de situações que os controlem. Entre outras vantagens, isso servirá para conferir maior relevância ao repertório em questão.

Um exemplo mencionado por Skinner serve como ponto de partida para ilustrar esta questão. Ao exemplificar o caso de alguém experiente na resolução de anagra- mas, Skinner (1953) mostra que a experiência e o conhecimento das possibilidades e limites da língua conferem a ele grande vantagem, na medida em que certos agru­pamentos são descartados de cara (MTER por exemplo) e substituídos por outros com maior possibilidade de formar palavras “válidas” (TEMR por exemplo).

Tais procedimentos caminham na direção do que Echeverría e Pozo (1998) assinalaram como tendência no estudo da resolução de problemas: considerar que se trata de uma atividade que, cada vez mais, mostra-se dependente do co­nhecimento disponível (e tornado disponível) em áreas específicas, mais do que uma habilidade geral.

Considerações FinaisMais do que se configurar apenas como uma revisão de literatura sobre contribui­ções da análise do comportamento para a compreensão do comportamento de resolução de problemas (que, de fato, foi o objetivo inicial dos autores), este tra­balho teve como objetivo evidenciar que, se por um lado, temos questões conceituais e metodológicas a resolver, por outro o conhecimento disponível permite ao analista do comportamento uma entrada na prática escolar maior do que a que vem sendo evidenciada. Deste ponto de vista, cabem, ainda, duas con­siderações importantes para os que aceitarem o desafio.

Por um lado, esse conhecimento disponível não está pronto para consumo imediato, por parte do sistema escolar. Não é difícil perceber que muito do que foi

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aqui discutido depende de considerável transposição antes de poder ser absorvi­do e empregado pelo professor. Isso é certamente parte do que Skinner entendeu e pregou como tecnologia do ensino e assim precisaria ser encampado.

A segunda consideração importante tem a ver com os alunos - nosso consumi­dor final dessa tecnologia. Não deve ser difícil demonstrar que eles já contam com habilidades de resolução de problemas e com comportamento preliminares muito além do que supõe o currículo escolar. As habilidades em informática desenvolvidas por crianças e adolescentes constantemente deixam pais e “adjacentes” boquiabertos e, não raro, invejosos. Por sua vez, Carraher, Carraher e Schliemann (1988) demons­traram que essa afirmação é verdadeira mesmo para uma população bastante “carente”. Assim sendo, compete a nós aprender a resolver “este problema”, antes de tentar ensinar nossos alunos a resolver outros.

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CAPÍTULO

Toxicologia Comportamental e Comportamentos de Segurança:

Contribuições da Análise do Comportamento

L in c o l n d a Silva G im e n e s D avid A l a n E c k e r m a n L a é r c ia A b r e u Va s c o n c e l o s

A toxicologia comportamental é um ramo da toxicologia, ciên­cia que estuda os efeitos adversos de substâncias químicas e físicas em sistemas biológicos vivos. A toxicologia comporta­mental ainda pode ser considerada uma disciplina jovem. O primeiro encontro científico dedicado especificamente ao assunto ocorreu em Rochester, Nova York, em 1972. Esse en­contro resultou na publicação de um livro, Behavioral To­xicology (Weiss e Laties, 1975), que demarca formalmente o início da área. O seu desenvolvimento se deu a partir da far­macologia comportamental, outra disciplina que havia cres­cido expressivamente nas duas décadas anteriores com a introdução de drogas para o controle de distúrbio comporta­mentais, e cujo principal objetivo é desvendar os mecanismos comportamentais de ações das drogas, bem como as intera­ções entre drogas e comportamentos. Esta tradição foi trans­ferida para a toxicologia comportamental, muito embora a ênfase seja no estudo dos efeitos adversos de substâncias tóxi­cas sobre o comportamento dos organismos, principalmente após exposições a baixas doses e por longos períodos (por

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exemplo, Annau, 1986; Weiss e Levine, 1976). Assim, um dos objetivos da toxicologia comportamental é identificar doses limites de diferentes substâncias, a partir das quais a exposição se toma tóxica, causando algum tipo de dano comportamental ao orga­nismo. Além disso, procura identificar diferentes funções neurocomportamentais (por exemplo, aprendizagem, atenção, memória, coordenação motora e motivação) que podem ser afetadas por diferentes substâncias. Nesse sentido, qualquer substância pode se tornar tóxica ao organismo, dependendo da dose à qual o mesmo foi exposto. A água, por exemplo, ao ser consumida em excesso poderá causar reações tóxicas ao organismo, com conseqüências até mesmo letais.

Dentre as substâncias que têm sido detectadas como capazes de afetar diferentes funções neurocomportamentais, podemos destacar metais pesados (por exemplo, chumbo e mercúrio), solventes, agrotóxicos, radiação ionizante, e toxinas. O chumbo pode ser encontrado principalmente em baterias automotivas, tintas e materiais de construção. O mercúrio, por sua vez, pode emanar naturalmente do solo em algumas regiões cuja concentração natural é elevada. Este metal pesado é também muito em­pregado na mineração de outro, está em diferentes tipos de equipamentos, e até pouco tempo era frequentemente utilizado na restauração dentária. Os solventes podem ser encontrados em combustíveis, em tintas, e em diferentes tipos de materiais de limpeza, principalmente aqueles utilizados para limpeza de motores. Os agrotóxicos, largamente utilizados em diferentes lavouras, são encontrados na forma de pesticidas, herbicidas e fungicidas. A exposição à radiação ionizante pode ocorrer através de dife­rentes equipamentos utilizados na área médica e em usinas nucleares, e pelo manuseio e contato com lixo radioativo. E, finalmente, alguns insetos e animais marinhos pro­duzem certas toxinas que podem causar efeitos adversos em outros organismos.

As exposições tóxicas podem ocorrer de forma aguda, com uma única exposição, em geral, a uma dose alta e, de forma crônica, com exposições a doses baixas por perío­dos prolongados. As exposições podem ser ocupacionais, com trabalhadores que utilizam algumas substâncias tóxicas em atividades profissionais, ou em situações co­tidianas onde possa existir o contato com essas substâncias de forma eventual ou mesmo rotineiro (por exemplo, no ambiente doméstico, no manuseio de equipamentos de recreação). E, ainda, as exposições podem ser acidentais, quando as substâncias são liberadas no ambiente por falha técnica em equipamentos ou falha no monitoramento e controle dos mesmos, por parte dos responsáveis pela manutenção e segurança.

Os trabalhos desenvolvidos na área de toxicologia comportamental podem ser divididos em dois grandes blocos: a pesquisa de laboratório com animais e a pes­quisa de campo com humanos. Ao longo deste capítulo apresentaremos algumas contribuições da análise do comportamento nessas duas áreas, com especial aten­ção aos trabalhados realizados no Brasil. Além disso, introduziremos uma nova vertente que trata do desenvolvimento de programas de treinamento de compor­tamentos de segurança, objetivando a redução dos riscos de exposição a substâncias tóxicas ou ainda a outros riscos ocupacionais.

Pesquisas de Laboratório com AnimaisInicialmente, estudos de laboratório eram realizados tanto com humanos como com outros animais. Ao se detectar a irreversibilidade dos efeitos de algumas

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substâncias tóxicas, esse tipo de pesquisa se tornou inviável com humanos por questões éticas bastante óbvias. Mais recentemente, objeções têm também cres­cido quanto ao uso de animais em pesquisas de diferentes tipos. Entretanto, pesquisas nesta área que utilizam animais têm seguido orientações padronizadas (National Research Council, 1996) e protocolos rígidos desenvolvidos por especia­listas reunidos numa força de trabalho especialmente para esse fim (ver Akins, Panicker e Cunningham, 2004).

Sempre que possível, a metodologia preferencial no laboratório é a do sujeito como próprio controle. Quando o efeito é reversível, utiliza-se o procedimento ABAB ou variações desse procedimento, quando se pretende determinar curvas de dose- efeito, sendo A uma determinada linha de base comportamental e B as diferentes doses ou exposições às substâncias tóxicas. Esse mesmo tipo de procedimento também pode ser utilizado quando se deseja comparar os efeitos de diferentes substâncias tóxicas, cada B, nesse caso, representando uma diferente substância.

Quando os efeitos não são reversíveis, pode-se recorrer ao procedimento de linha de base múltipla, com uma nova linha de base sendo estabelecida após cada mani­pulação da variável experimental. Por outro lado, quando se pretende controlar os efeitos cumulativos de diferentes doses ou de diferentes substâncias, ou ainda os efeitos de exposições repetidas, pode-se utilizar o tradicional procedimento de grupos, em que um grupo denominado experimental recebe uma dose ou é exposto a uma substância enquanto um grupo denominado controle difere do experimental somen­te em relação ao tratamento da variável experimental. Esse tipo de procedimento pode ter vários grupos experimentais - cada um recebendo uma dose diferente ou sendo exposto a diferentes substâncias - e um grupo controle que recebe dose zero ou é exposto a uma substância placebo ou nenhuma substância.

As contribuições da análise experimental do comportamento de animais para o desenvolvimento da toxicologia comportamental podem ser sumarizadas pelas colocações de Victor Laties, um dos expoentes analistas do comportamento pre­cursores nessa área:

Suas técnicas são úteis para treinar animais nos vários comportamentos que os toxicologistas possam querer estudar. Elas tornam possível a avaliação

sofisticada do funcionamento sensorial. Condicionadores operantes dominam com excelência o uso de esquemas intermitentes de “ reforçamento”

para criar o tipo de desempenho estável necessário para estudar substâncias que produzem efeitos somente após exposição prolongada. O comportamento controlado por esquemas de “ reforçamento” também

ajuda elucidar os precisos mecanismos comportamentais envolvidos em toxicidade. Em uma avaliação inicial de uma substância tóxica, uma escolha

cuidadosa de uma amostra de um desempenho controlado por esquema de “ reforçamento” pode fornecer a melhor estimativa a respeito

se a integridade de um comportamento operante complexo permanece inalterada. (Laties, 1978, p. 26, traduzido pelos autores)

Um dos principais instrumentos conceituais e de procedimento utilizado pela toxicologia comportamental nos estudos com animais para avaliar os efeitos com-

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portamentais de substâncias tóxicas, é o comportamento controlado por esquemas de reforço. A sua adoção se deveu a história de sua utilização pela farmacologia comportamental. Segundo Laties e Wood (1986), as vantagens no uso desse com­portamento são as seguintes: pode-se utilizar um número relativamente pequeno de sujeitos, estudando-os intensivamente por longos períodos; os procedimentos e coleta de dados são automatizados, diminuindo dessa forma os vieses introduzi­dos quando temos que confiar nas intervenções e observações humanas; os sujeitos podem ser utilizados como seus próprios controles, excluindo assim a variabili­dade entre sujeitos e aumentando a sensibilidade; as próprias contingências de reforço restringem a variabilidade para cada sujeito individualmente, tanto dentro de uma mesma sessão como entre diferentes sessões experimentais.

Na toxicologia comportamental os pesquisadores têm utilizado esquemas de refor­ço com diferentes propósitos. Laties e Wood (1986) sumarizam esses diferentes usos:

Em alguns casos, o próprio comportamento controlado pelo esquema de “reforçamento”é o objeto de interesse imediato; esquemas de

“reforçamento”podem gerar comportamentos que valem a pena ser estudados por si só. Em outros casos, o foco é a variável controladora, com o esquema

permitindo sua fácil manipulação; aqui a ênfase está na descoberta da relativa importância de diferentes variáveis comportamentais na

determinação dos efeitos comportamentais da substância. E em outros estudos, os esquemas são utilizados para alterar a sensibilidade do

desempenho ou para controlar o comportamento deforma que outra variável possa ser mais facilmente manipulada, (p. 69-70, traduzido pelos autores)

Laties e Wood (1986) apresentam uma extensiva revisão dos trabalhos reali­zados por eles e por seus colaboradores na University of Rochester, que exemplifica de forma abrangente a utilização de contingências de reforço na toxicologia comportamental. Trabalhando com uma variedade de procedimentos simples e complexos de esquemas de reforço, esses autores desenvolveram expe­rimentos com objetivos investigativos que podem ser classificados dentro de três eixos: o papel dos esquemas na investigação dos mecanismos comportamentais de ação; o uso dos esquemas para aumentar a sensibilidade de um desempenho comportamental; e o papel do comportamento controlado pelo esquema na re­gulação das substâncias tóxicas. Uma grande gama de substâncias foi estudada como variáveis toxicológicas. Nesses estudos podemos destacar a avaliação dos efeitos de metais pesados e solventes, como o chumbo, o mercúrio e o tolueno, entre outros. Segundo esses autores, “talvez a maior força desses procedimentos esteja não na sua habilidade em detectar toxicidade, mas na sua habilidade em caracterizar sua significância funcional e fazê-lo em termos derivados de uma abordagem sistemática e coerente” (p. 91, tradução dos autores).

Outro exemplo da utilização de procedimentos operantes, no estudo dos efei­tos da radiação ionizante sobre o comportamento, é o programa de pesquisa desenvolvido no Laboratório de Análise Experimental do Comportamento da Universidade de Brasília. Esse programa de pesquisa foi uma demanda a partir de um incidente radioativo ocorrido na cidade de Goiânia em setembro de 1987, o

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qual expôs um grande número de indivíduos à radiação causada pela liberação do pó de césio contido num equipamento radioterápico. Pelo fato dos efeitos de um evento desse tipo sobre o comportamento serem multideterminados, em razão das alterações sociais ocasionadas (Gimenes e Vasconcelos, 1997), a pesquisa contro­lada em laboratório busca isolar os efeitos da radiação per se. Em nossos estudos, utilizamos diversos e variados procedimentos de contingências de reforço para avaliar os efeitos da radiação ionizante. Diferentes variáveis radiológicas, como dose de radiação (dentro dos limites sub-letais que permitem o estudo dos orga­nismos a longo prazo), repetições de exposição e fracionamento da dose, entre outras. Essas variáveis foram avaliadas quanto ao seu efeito sobre o comportamento controlado pela contingência de reforço, e quanto a sua interação com variáveis com­portamentais, tais como taxa de respostas na linha de base, e com variáveis motivacionais, tais como nível de privação e tipo de reforçador utilizado (Gimenes e Vasconcelos, 1999). Além de esquemas simples e complexos de reforço, outros procedimentos foram utilizados para expandir os conhecimentos dos efeitos da radiação ionizante sobre comportamentos em situações complexas de aprendi­zagem, bem como sobre comportamentos derivados de certas contingências. No primeiro caso, um exemplo é o uso do procedimento de aquisição repetida, o qual permite separar os efeitos da variável de interesse sobre a aquisição e sobre o de­sempenho da tarefa (Vasconcelos, 1999). No segundo caso, o exemplo é a avaliação dos efeitos da radiação ionizante sobre comportamentos adjuntos, ou induzidos por esquemas de reforço (Brandão, Gimenes e Rodrigues, 2003).

Esta seção não teve como objetivo discutir as descobertas realizadas no labo­ratório com animais sobre os efeitos de diferentes substâncias tóxicas. O objetivo foi exemplificar a contribuição da análise experimental do comportamento como uma ferramenta importante na toxicologia comportamental. Essa contribuição permite o desenvolvimento da área, produzindo conhecimentos inerentes às substâncias utilizadas, oferecendo sugestões e alternativas para os estudos com humanos e para a interpretação dos dados desses estudos, e subsidiando ações regulatórias pelas agências que legislam sobre o controle do uso dessas substâncias.

Avaliação Neurocomportamental dos Efeitos de Substâncias Tóxicas em HumanosO estudo de efeitos tóxicos em indivíduos expostos, no trabalho ou em ambientes domésticos, tem uma história recente. O início da literatura pode ser demarcado pelo trabalho de psicólogos industriais escandinavos, nos anos 1960, quando os efeitos prejudiciais a longo prazo, de um baixo nível de exposição a solventes por operários de fábricas químicas foram pela primeira vez sistematizados e documen­tados (Hanninen, Eskelinen, Husnan e Nurminen, 1976). Esse trabalho sugeriu um grupo de medidas neuropsicológicas que começou a ser aplicado a exposições acidentais e ocasionais (ver Anger,#1990).

Inicialmente, as avaliações foram resultado de esforços individuais de pesquisa­dores que utilizavam diferentes instrumentos e medidas para esse fim. Uma

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dessas medidas, os testes neurocomportamentais fornecem uma avaliação não invasiva da integridade funcional do sistema nervoso por meio do desempenho do indivíduo em tarefas comportamentais. Esses testes podem ser utilizados como medidas quantitativas em diferentes investigações epidemiológicas dos efeitos potenciais sobre o sistema nervoso, resultantes da exposição a metais pesados, solventes e pesticidas, entre outras substâncias tóxicas. Devido à complexidade funcional do sistema nervoso, um conjunto de testes é utilizado para identificar as diferentes funções que um determinado contaminante pode afetar, como memória, aprendizagem, coordenação motora, tempo de resposta e humor. A crescente preo­cupação com os efeitos adversos do uso de contaminantes, nos anos 1980, e o uso inconsistente das medidas de avaliação em diferentes estudos, levou a Organização Mundial da Saúde (OMS), com a colaboração do National Institute for Occupa­tional Safety and Heath (NIOSH), a criar uma força-tarefa para desenvolver uma bateria de avaliações neurocomportamentais que pudesse ser utilizada como me­dida padrão desses efeitos. A padronização dos métodos de avaliação é essencial para fornecer um banco de dados consistente para análise de risco em estudos epidemiológicos numa mesma população ou entre diferentes populações.

Dessa forma, pesquisadores renomados se reuniram e elaboraram uma bateria de testes conhecida como Neurobehavioral Core Test Battery (NCTB) (ver Anger, Liang, Nell, Kang, Cole, Bazylewicz-Walczak, Rohlman e Sizemore, 2000, para o histórico e avaliação da bateria). Os testes que compuseram essa bateria foram os seguintes: Digit Symbol, Digit Span, Benton Visual Memory, Santa Ana Pegboard, Simple Reation Time, Pursuit Aiming II e Profile of Mood States. Os testes da NCTB, em sua maioria, eram do tipo lápis e papel e suas instruções geralmente apresentadas por escrito. A ideia de utilizá-la como instrumento-padrão esbarrou em suas características. Um estudo desenvolvido por Anger e colaboradores em dez países de três continentes demonstrou os efeitos diferenciais de variáveis tais como nível de escolaridade e compreensão das instruções (Anger, Cassitto, Liang, Amador, Hooisma, Chrislip, Mergler, Keifer, Hortnagl, Fournier, Dudek e Zsogon, 1993). Indivíduos não alfabeti­zados ou com baixa escolaridade apresentaram dificuldades no manuseio com lápis e papel. Por sua vez, a leitura e compreensão das instruções se tomaram um problema para indivíduos de diferentes culturas e níveis de escolaridade.

Uma tentativa para contornar alguns dos problemas identificados foi o desenvol­vimento de uma nova bateria, utilizando-se testes computadorizados, denominada Neurobehavioral Evaluation System 2 (NES2) (Letz e Baker, 1988). O NES2 foi com­posto pelos seguintes testes: Finger Tapping, Continuous Performance, Hand-Eye Coordination, Paired Associate Learning, Digit Span, Grammatical Reasoning Symbol! Digit, Pattern Recognition, Pattern Memory, Serial Digit Learning Horizontal Addition, Vocabulary, Delayed Recall of Paired Associate Learning e Mood Scales.

Segundo Letz (1991), a automação dos testes não só fornece padronização, mas também melhora a eficiência ao reduzir o tempo de coleta e análise dos dados. Entretanto, a relativa falta de orientação teórica para o desenvolvimento de testes em toxicologia comportamental ainda comprometia o instrumental disponível para avaliação neurotoxicológica (Iregren e Letz, 1992). Assim, mesmo com as melhoras apresentadas pelo NES2 em relação ao NCTB, alguns dos problemas apontados no estudo de Anger et al. (1993) não foram solucionados. A familiari­

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dade com o instrumento continuou sendo um obstáculo, uma vez que teclados de computadores podem ser tão ou mais estranhos que lápis e papel para popu­lações com baixa ou nenhuma escolaridade. Além disso, as instruções foram apenas transportadas do papel para a tela do computador, o que manteve o pro­blema de compreensão das instruções por diferentes grupos culturais. Dessa forma, indivíduos com dificuldades relativas à velocidade e precisão das respostas requeridas pelos testes, tanto nas suas instruções quanto na sua execução, apre­sentam um desempenho deficitário, independentemente dos efeitos da exposição; esse fator de contaminação dos dados muitas vezes é impossível de ser isolado.

Neste cenário, Anger etal. se propuseram a desenvolver um novo sistema que pudesse minimizar os problemas derivados do nível de escolaridade e das diferen­ças culturais, e pudesse permitir comparações confiáveis dos efeitos de exposições a substâncias tóxicas entre diferentes populações. A opção foi desenvolver um novo sistema computadorizado que pudesse ser útil na avaliação neurocompor- tamental, mas que também pudesse servir como um instrumento de pesquisa. Os autores estavam cientes da necessidade de superar a falta de familiaridade com computadores por grande parte dos indivíduos a serem testados, e partiram do pressuposto de que uma configuração apropriada do equipamento além de um treinamento adequado superaria esse problema. Outro fator crítico considerado foram as instruções, uma vez que as outras opções de testes computadorizados utilizavam instruções escritas transcritas das versões de testes de lápis e papel, o que foi detectado como um direcionamento inadequado para uso com indivíduos com poucos anos de exposição a educação formal. Com base nessas premissas surgiu o Behavior Assessment and Research System (BARS© Oregon Health e Science University, 1996), um sistema que pudesse ser utilizado com diferentes populações, considerando idade, escolaridade e suas especificidades sociocultu- rais (Anger, Rohlman e Storzbach, 1999; Rohlman, Anger, Tamulinas, Phillips, Bailey e McCauley, 2001; Rohlman, Gimenes, Ebbert, Anger, Bailey e McCauley, 2000; Rohlman, Gimenes, Eckerman, Kang, Farahat e Anger, 2003).

O BARS é composto de uma série de testes tradicionais e outros desenvolvi­dos especificamente para o sistema. A Tabela 10.1 apresenta nove dos testes originalmente disponíveis e as funções neurocomportamentais que cada um pretende aferir.

Tabela 10.1 - Testes do Behavior Assessment and Research System (BARS)traduzidos e adaptados para a língua portuguesaTestes Funções

Atenção Seletiva [Selective Attention) AtençãoAprendizagem Serial de Dígitos {Serial Digit Learning) AprendizagemCapacidade para Dígitos (Digit Span) Atenção e memóriaDesempenho Contínuo (Continuous Performance) Motivação e memóriaEscolha de acordo com o Modelo (Matching to Sample) MemóriaRazão Progressiva (Progressive Ratio) MotivaçãoSímbolo-Dígito (Symbol-Digit) Aprendizagem e atençãoTamborilar (Tapping) Coordenação motoraTempo de Reação (Reaction Time) Velocidade de resposta

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A seguir, apresentaremos algumas das principais características do BARS. O sistema foi inicialmente desenvolvido para ser utilizado em notebooks Macintosh da Apple Computers. Atualmente, o sistema está sendo desenvolvido para utiliza­ção também com o sistema operacional Windows. Para superar a possível falta de familiaridade com computadores por parte de alguns indivíduos a serem avaliados, um teclado alternativo foi desenvolvido. Esse teclado consiste de nove teclas dis­postas semicircularmente em um console que cobre totalmente o teclado do notebook, deixando aparente apenas a tela do mesmo. As teclas com tamanho de 1,5 x 2,5 x lcm são resistentes, numeradas de 1 a 9 e podem ser individualmente iluminadas, facilitando dessa forma o seu manuseio. A Figura 10.1 ilustra a utili­zação do equipamento com um dos testes do sistema.

Uma das vantagens da utilização de notebooks é a portabilidade do sistema, o que facilita o seu uso em avaliações e pesquisa em campo; o equipamento pode ser facil­mente transportado e utilizado mesmo em locais mais remotos. Além disso, as avaliações podem ser realizadas individualmente ou em grupos de vários tamanhos, dependendo da disponibilidade de espaço e de equipamentos. A Figura 10.2 ilustra quatro diferentes situações de utilização do sistema em pesquisa de avaliação em campo.

Figura 10.1 - Unidade de resposta (teclado espe­cial) utilizada no Behavior Assessment and Research System (BARS).

Figura 10.2 - {A-D) Sessões de avaliação utilizando o Behavior Assessment and Research System (BARS), em instalações indus­triais e escolares, com diferentes configurações de espaço e grupos.

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O desenvolvimento do BARS teve como um dos objetivos disponibilizar um sistema que pudesse ser utilizado entre diferente culturas possibilitando uma com­paração fidedigna dos dados obtidos em diferentes regiões. Dessa forma, os testes originais na língua inglesa foram traduzidos e adaptados para outros idiomas como espanhol, português, coreano, árabe e ucraniano. A Figura 10.3 ilustra uma tela de instruções de um dos testes do BARS em quatro diferentes idiomas.

A adaptação para o português foi realizada a partir, inicialmente, de uma tra­dução direta das instruções em inglês, seguida de uma tradução reversa. Após a elaboração final da tradução, foram realizados testes de compreensão dos textos traduzidos, com amostras específicas de crianças e de adultos com pouca escola­ridade, a partir dos quais os últimos ajustes foram feitos (Gimenes, Vasconcelos, Bastos, Rodrigues, Kanitz, Vilar, Rohlman e Choe, 1999). Em seguida os testes foram submetidos à avaliação de fidedignidade utilizando-se um procedimento de teste/ reteste com universitários, crianças e adultos com baixa escolaridade (Bastos e Gimenes, 2001; Gimenes e Galvão, 2001; Macedo e Gimenes, 2004).

O BARS é um sistema flexível que permite alterações de seus parâmetros, de forma que o avaliador ou pesquisador possa adequá-los aos seus objetivos. Assim, os parâmetros padrões (default) ou outros disponíveis no sistema podem ser sele­cionados para cada um dos testes. Por exemplo, as instruções podem ser definidas quanto à presença ou ausência das mesmas, a sua forma de apresentação, e o idio­ma. As teclas de respostas utilizadas em cada teste podem também ser definidas, o que permite o controle para indivíduos destros e canhotos. Além disso, o número de tentativas, a configuração dos estímulos, o intervalo entre apresentações de es­tímulos e o grau de dificuldade da tarefa podem ser determinados para cada

Figura 10.3 - Uma das telas de instrução do teste de Capacidade para Dígitos {Digit Span), em quatro idiomas: (A) coreano, (B) português, (Q árabe e (D) espanhol.

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utilização dos testes, permitindo avaliações seriadas que demandam o controle de aprendizagem do teste a partir da repetição de seu uso.

O diferencial do BARS, além da flexibilidade dos parâmetros, consiste na elabo­ração das instruções dos testes. Enquanto outros testes computadorizados apenas transferiram as instruções do papel para a tela do computador, as instruções no BARS foram elaboradas de forma a garantir a compreensão das mesmas por dife­rentes indivíduos, independentemente de idade, escolaridade e cultura. Para tanto, as instruções de cada teste foram elaboradas a partir dos princípios analíticos comportamentais da instrução programada individualizada. As instruções são apresentadas passo a passo, iniciando com demandas pequenas e simples, as quais são gradualmente aumentadas quanto à complexidade. A cada passo, algumas respostas são exigidas, com as respostas corretas sendo fornecidas com uma carinha alegre (smillingface) e as respostas incorretas com uma carinha triste [frawn face). O passo seguinte só é apresentado após uma resposta correta às instruções na tela; diante de uma resposta incorreta, as instruções são repetidas até a emissão da res­posta correta. Para cada teste existe um critério próprio que define o número de repetições de cada etapa das instruções. Quando esse critério é atingido sem que ocorra a resposta correta o teste é abortado e excluído da avaliação para aquele in­divíduo. Esse procedimento garante ao indivíduo exposto ao teste um nível mínimo de compreensão das instruções sobre a tarefa exigida em cada teste do BARS.

A forma de apresentação das instruções também pode ser definida em função do objetivo da sessão de avaliação e dos indivíduos que serão avaliados. Na apli­cação de um teste pela segunda vez, por exemplo, é possível optar pela ausência das instruções detalhadas, uma vez que o indivíduo já foi “treinado” na primeira vez que se submeteu ao teste. O idioma da instrução pode também ser escolhido, o que possibilita em situações especiais, a realização de sessões de avaliação mul­ticultural. Tal característica se torna importante em contextos ocupacionais, onde pode haver indivíduos que falam diferentes idiomas e que executam um mesmo tipo de tarefa. Outra característica das instruções é que além de apresentadas na tela, as mesmas podem ser apresentadas oralmente por meio de arquivos digitais gravados nos diferentes idiomas. Essa opção possibilita a utilização do sistema por crianças que ainda não dominam a leitura e por adultos com baixo índice de es­colaridade ou não alfabetizados. Vale ressaltar que as instruções orais podem ser apresentadas via fone de ouvido, o que permite a realização de sessões de grupo, mesmo quando essa opção é selecionada.

Estudos de Campo em Toxicologia ComportamentalOs estudos de campo com humanos podem ser classificados em dois tipos - de grupos e correlacionais. Em geral, no primeiro tipo, seleciona-se uma tarefa poten­cialmente afetada pela substância tóxica de interesse e compara-se o desempenho de um grupo exposto ou com risco de exposição a uma substância tóxica com um grupo controle, com as mesmas características do grupo de exposição. Os níveis de exposição são usualmente desconhecidos e os resultados dos dois grupos indi­cam apenas o§ efeitos adversos da exposição sobre a função neurocomportamental

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avaliada pela tarefa, sem, no entanto, identificar os níveis de exposição. Dados comparativos disponíveis na literatura poderão sugerir de forma mais geral a grandeza da exposição. Entretanto, quando o nível de exposição é conhecido, podem-se utilizar estudos correlacionais, nos quais os diferentes níveis detectados para cada indivíduo são correlacionados com os diferentes desempenhos desses indivíduos em tarefas planejadas para avaliar as diferentes funções neurocompor­tamentais. Dessa forma podem ser determinadas funções semelhantes às de dose-efeito obtidas em laboratórios com animais.

Diferentes índices podem ser utilizados para determinar o nível de exposição de um indivíduo ou de um grupo a diferentes substâncias tóxicas. Esses índices podem ser biológicos, ambientais e comportamentais. Os índices biológicos são obtidos a partir da concentração de uma determinada substância tóxica no sangue ou na urina do indivíduo que tenha sido exposto àquela substância. Ou ainda, a partir de alterações enzimáticas e metabólicas conhecidas como produzidas pelas substâncias. Os índices ambientais são obtidos a partir de análises da concentra­ção das diferentes substâncias no ar, na água, no solo, ou em diferentes objetos presentes nos locais onde as exposições ocorrem. A partir dessas concentrações ambientais pode-se estimar o nível de exposição dos indivíduos ou do grupo. Os índices comportamentais são derivados de relatos (de outrem sobre os participan­tes) e autorrelatos dos participantes sobre a exposição a uma determinada substância tóxica, observações in loco (em situações ocupacionais) do manuseio ou risco de exposição à substância, e pela utilização de equipamentos de seguran­ça individual, envolvendo tipo de equipamento e frequência de uso, por exemplo.

Utilização do BARS no BrasilApós a tradução e adaptação do BARS para o idioma português, vários estudos têm sido conduzidos no Brasil, numa parceria entre os autores deste capítulo e os pesquisadores idealizadores do sistema - Kent Anger e Daine Rohlman do Center for Research on Occupational and Environmental Toxicology, da Oregon Health and Science University. Além da participação da Universidade de Brasilia e da University of North Carolina, os estudos no Brasil têm contado com a participação de pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), da Universidade Estadual Paulista (Unesp-Bauru) e da Universidade Católica de Goiás.

No primeiro estudo de campo, adolescentes de 10 a 18 anos de idade de uma área rural no estado do Rio de Janeiro foram testados com o BARS para avaliar seus desempenhos nas tarefas neurocomportamentais apresentadas pelos diferentes testes. Os participantes foram selecionados de duas áreas - uma escola rural (N = 38) e uma escola urbana no mesmo município (N = 28). Os participantes faziam parte de um estudo em andamento, realizado pela Fiocruz, no qual os adolescentes rurais e urbanos eram equiparados pela idade, sexo e nível de escolaridade. Nesse estudo em andamento, os participantes haviam sido entrevistados para determi­nar suas histórias ocupacionais, especialmente suas atividades que poderiam envolver exposição a pesticidas. As respostas obtidas nas entrevistas foram utili­zadas para atribuir um índice de exposição a cada participante. Algumas medidas

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de desempenho do BARS sugeriram prejuízos comportamentais para os partici­pantes rurais em comparação aos urbanos. Porém, uma associação mais forte e consistente foi obtida entre as medidas do BARS (especialmente, com prejuízos nos testes de Tamborilar, Capacidade para Dígitos, e Atenção Seletiva) e os níveis de exposição a pesticidas, analisados numa regressão linear múltipla. A exposição apareceu como uma variável especialmente forte para os participantes mais jovens (10 a 11 anos de idade). Isso indica que a exposição a pesticidas teve um efeito prejudicial nos comportamentos exigidos pelos testes, o que foi maior para os participantes rurais mais jovens quando comparados com seus equivalentes ur­banos (Eckerman, Gimenes, Souza, Galvão, Sarcinelli e Chrisman, 2007).

Embora tenha sido demonstrado que a exposição continuada a baixos níveis de pesticida causam prejuízos ao comportamento (Eckerman etal.t 2007; Kamel e Hoppin, 2004), a obtenção individual de medidas quantitativas desse nível de exposição ainda é um desafio. A validade dos autorrelatos retrospectivos é muitas vezes suspeita, pois os mesmos podem conter vieses de respostas, ou porque os indivíduos não se lembram corretamente de eventos passados, ou ainda, em razão do controle de estímulos presentes na situação de entrevista. Neste caso, as res­postas podem não descrever interações no passado, mas estarem sob controle de estímulos presentes durante a entrevista tais como a própria questão formulada e a presença do pesquisador. A validade das medidas ambientais e biológicas re­presenta também desafios ao pesquisador, uma vez que essas medidas avaliam exposição recente e não de longa duração.

Em colaboração com a Universidade Católica de Goiás, um estudo está em andamento, com o objetivo de desenvolver um protocolo de exposição a partir de observações das atividades ocupacionais que envolvem manipulação ou contato, de alguma forma, com pesticidas. O objetivo desse protocolo é disponibilizar uma alternativa confiável para determinação de níveis de exposição que não envolvam técnicas invasivas como as biológicas e menos onerosas do que as ambientais. Essa medida de exposição é obtida a partir de observações semanais sobre o tipo de atividade de cada indivíduo ao trabalhar numa lavoura. Cada uma dessas ati­vidades recebe um fator de risco de exposição com base no julgamento de especialistas e um ajuste nesse fator é realizado a partir do tipo de proteção indi­vidual que é observada sendo utilizada (por exemplo, máscara, luvas, tipo de calçado e roupas especiais). Dessa forma, cada observação fornece uma estima­tiva momentânea de exposição. A soma dessas estimativas obtidas ao longo de um período de 12 semanas pode ser utilizada como uma medida de exposição para avaliar sua correlação com prejuízos comportamentais. Validações cruzadas podem ser feitas com correlações baseadas em outras medidas de exposição. Na fase inicial, 19 trabalhadores rurais em duas lavouras de tomate na região de Goianápolis, em Goiás, consentiram em participar do estudo e foram observados aproximadamente uma vez por semana durante um período de 12 semanas, por dois observadores independentes. Nas observações utilizou-se uma lista de possíveis atividades da lavoura bem como de possíveis itens de proteção. A partir do fator de risco de cada atividade e do fator de ajuste para cada item de proteção, uma matriz de valores foi calculada e aplicada às observações realizadas de cada trabalhador para deter­minar seu índice de exposição, em cada dia de observação. Após a determinação

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do valor médio de exposição diária para cada trabalhador, esses valores foram co­locados numa distribuição, a partir da qual o nível de exposição de cada trabalhador pode ser comparado com o dos outros trabalhadores. Os resultados preliminares demonstraram uma distribuição suficientemente simétrica para fornecer um con­junto razoável de valores de exposição para uso quando explorar a relação entre exposição e medidas comportamentais que são conhecidas como sensíveis para detectar prejuízos tóxicos (Eckerman, Coelho, Gimenes e Huber, 2008).

Em outro estudo, em colaboração com a Unesp-Bauru, 54 trabalhadores de três fábricas de baterias para automotivos, com seus respectivos controles de uma companhia de transporte, foram avaliados com o BARS para determinar possíveis prejuízos neurocomportamentais causados pela exposição ocupacional ao chumbo. Como índice de exposição, amostras de sangue foram coletadas dos participantes do grupo controle para determinação do nível de chumbo no sangue (uma medida tradicionalmente utilizada para o controle de exposição em ambientes ocupacio­nais). Para os participantes das fábricas de bateria esse índice foi obtido dos registros médicos mantidos pelas fábricas (o monitoramento, pelo menos mensal, dos níveis de exposição é uma exigência legal para ambientes ocupacionais onde o chumbo é utilizado). Para as medidas neurocomportamentais, diferenças esta­tisticamente significativas mostraram um prejuízo para o grupo das fábricas de bateria, em relação ao grupo controle, em dois dos testes utilizados: Capacidade para Dígitos e Aprendizagem Serial de Dígitos. Para os outros testes, embora esta­tisticamente não significativas, as diferenças entre as médias dos grupos foram na mesma direção, isto é, mostraram um desempenho pior para os trabalhadores das fábricas. Entretanto, não foram encontradas diferenças entre os dois grupos para o nível de chumbo o sangue. O nível razoavelmente alto para o grupo controle, o fato de essas medidas terem sido obtidas em momentos diferentes, além da falta de independência dos laboratórios (as avaliações foram realizadas pelo laborató­rio de uma das fábricas) suscitam questionamentos sobre a confiabilidade dos índices de plumbemia obtidos (Gimenes, Angerami e Eckerman, 2003; 2004).

Ainda na área do chumbo, outro trabalho foi desenvolvido também em cola­boração com a Unesp-Bauru. Como resultado da contaminação ambiental causada por uma fábrica de baterias de automotivos, mais de 200 crianças que residiam na vizinhança da fábrica foram detectadas como estando contaminadas por chumbo. Após a determinação dos índices de contaminação pela concentra­ção de chumbo no sangue (Pb - mg/dL), 69 crianças participaram do estudo que teve como objetivo detectar prejuízos neurocomportamentais relacionados com a contaminação pelo chumbo. Os participantes foram organizados em ordem cres­cente em função do Pb e divididos em três grupos aproximadamente do mesmo tamanho, com as variações ocorrendo em função dos intervalos entre os valores obtidos. O grupo com a menor média de Pb (grupo 1) foi comparado com o grupo com a maior média (grupo 3), no desempenho de seis dos testes do BARS selecio­nados especificamente para este estudo. A Tabela 10.2 apresenta as características desses grupos, como as médias e desvios padrões para cada uma das medidas.

As médias de Pb encontradas e§tão acima do limite aceitável para crianças, que de acordo com a Organização Mundial da Saúde é de lOmg/dL (para adultos esse valor é de 40mg/dL). Na maioria dos testes, os participantes do grupo com o

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Tabela 10.2 - Média e desvio padrão da concentração de chumbo (Pb) nosangue, da idade e da escolaridade para os dois grupos

Pb (mg/dL) Idade (anos) Escolaridade (anos)

Grupo 1 13,94 (1,61) 9,56 (1,66) 3 (1,56)Grupo 3 23,58 (5,45) 9,38 (1,87) 3,13 (1,57)

menor Pb mostraram um melhor desempenho do que os participantes do grupo com o maior Pb. Entretanto, somente para dois dos testes foram encontradas di­ferenças estatisticamente significativas, os testes de Desempenho Contínuo e de Capacidade para Dígitos. Esses resultados sugerem que as funções de memória e atenção foram as mais afetadas, o que pode ser um resultado de hiperatividade e irritabilidade, efeitos bem conhecidos da contaminação pelo chumbo em crian­ças. Este estudo confirmou a sensibilidade do BARS para detectar variações no desempenho neurocomportamental em crianças, resultantes de contaminação por metal pesado.

Os solventes são outras substâncias químicas conhecidas por produzir efeitos tóxicos sobre o organismo. Uma das principais utilizações dessas substâncias em ambientes ocupacionais refere-se ao seu uso para limpeza de motores e outras partes de veículos automotivos. Silva (2002), em sua dissertação de mestrado sob orientação do primeiro autor, desenvolveu um trabalho de caracterização de substâncias quími­cas (principalmente solventes) utilizadas por uma empresa na manutenção de aviões, bem como de avaliação neurocomportamental dos trabalhadores expostos a essas substâncias. Os participantes exerciam suas atividades em uma das cinco oficinas de manutenção (pintura, capotaria, lavagem, motores e baterias) e seus desempenhos no BARS foram comparados com trabalhadores controladores da mesma empresa. Trinta e seis produtos, solventes ou derivados, foram identificados nas cinco oficinas, um grande número deles do tipo “genérico” não apresentando informações detalha­das da sua composição ou uso. Observações e entrevistas também foram conduzidas para identificar o tempo de exposição, o manuseio e a quantidade de produtos utili­zados em cada oficina. Os resultados obtidos revelaram um pior desempenho em alguns testes do BARS para os trabalhadores das oficinas com maior risco de exposição. Em um estudo subsequente (Gimenes, Silva e Galvão, 2004), mais importante que os resultados dos testes, foi a constatação da falta de conhecimento dos produtos utili­zados bem como a falta de controle na utilização de equipamentos de proteção individual. A Tabela 10.3 apresenta os percentuais dos trabalhadores que conheciam avia de contaminação dos produtos utilizados, discriminados por oficina. Esses dados têm implicação com os cuidados no manuseio desses produtos e na utilização de equipamentos de segurança.

Como pode ser observado na Tabela 10.3, existe uma grande variabilidade entre os trabalhadores e entre as oficinas no nível de conhecimento sobre as vias de contaminação dos produtos utilizados. O mais grave, ainda, é o fato de aproxi­madamente 10% dos trabalhadores não terem nenhum conhecimento sobre a contaminação. Os dados na Tabela 10.4 mostram também a precariedade dos comportamentos de-segurança emitidos pelos trabalhadores. Alguns equipamen-

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Tabela 10.3 - Porcentagem de participantes que relataram conhecer as vias de contaminação dos produtos utilizados

Oficina

Via de contaminação

Contato (%) In alação (%) Oral (%) Não sabiam (%)

Pintura 18,18 18,18 - -

Capotaria 22,73 22,73 - -

Lavagem 22,73 22,73 - 4,55Motores 13,64 9,09 4,55 -

Baterias 13,64 9,09 - 4,55

tos apresentados na tabela não são relacionados à proteção do uso de solventes, entretanto, são apresentados para caracterizar o padrão dos comportamentos de segurança. As oficinas relatadas no estudo ficavam dentro de um hangar à beira de uma pista bastante movimentada do aeroporto. Nesse sentido, o abafador de ruídos é um equipamento de segurança essencial para a manutenção da integri­dade do sistema auditivo. Entretanto, apenas 45% dos trabalhadores utilizavam regularmente esse equipamento. É importante destacar que os perigos da expo­sição ao ruído dos motores dos aviões decolando e aterrissando são “visíveis”, isto é, são de fácil percepção devido à altura dos ruídos. Porém, os perigos da exposição aos solventes são muito menos perceptíveis, uma vez que essas substâncias são voláteis e algumas delas não apresentam nem mesmo um cheiro forte característico. Dessa forma, pela falta de estímulos discriminativos salientes, não é improvável a ausência de comportamentos de segurança por parte dos trabalhadores quando manipulando esses produtos.

Os dados apresentados anteriormente nos remetem a uma preocupação mais ampla do que conhecer os perigos das substâncias tóxicas e avaliar seus efeitos sobre o comportamento daqueles indivíduos que as utilizam ocupacionalmente ou as manuseiam inadvertidamente. Essa preocupação refere-se aos comporta­mentos de segurança ou de diminuição de riscos e às estratégias de treinamento

Tabela 10.4 - Porcentagem de participantes que relataram utilizar algum dos tipos de equipamento de segurança disponíveisEquipamento de segurança %

Abafador de ruídos 45Avental 9Botas 23Capa impermeável 5Luvas 82Macacão 14Máscara de vapor 64Máscara para lixamento de fibra de vidro 0Máscara para pó 14Óculos de proteção 32Viseira 9

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para aumentar esses comportamentos e diminuir os riscos. Esta é outra área de estudo em que os analistas do comportamento podem contribuir, tanto no campo da pesquisa quanto no campo da aplicação.

Treinamento de Comportamentos de SegurançaQuando voltamos nosso foco de avaliação sobre os riscos da exposição para a sua prevenção, a instrução programada, outra contribuição da análise do comportamen­to, apresenta-se útil no treinamento de comportamentos de segurança. A instrução programada, como advogada por Skinner nos anos 1950 (por exemplo, Skinner, 1954) e implantada em muitas situações desde então (por exemplo, Kulik, Cohen e Ebeling, 1980), é um modo eficaz de ensinar conteúdos que podem ser divididos, analisados e aprendidos separadamente antes de serem combinados. As etapas envolvem aprender fatos, regras, procedimentos e habilidades específicas. Peque­nas quantidades de material, frequentemente denominadas de “um quadro” são seguidas por um teste de compreensão, repetindo-se o quadro até que esta seja confirmada. Tal abordagem parece especialmente útil para o participante com baixo índice de escolaridade. Embora “respostas construídas” devam, em geral, ser utilizadas com participantes que tenham ensino formal suficiente (por exem­plo, respostas escritas - Bostow e Kritch, 1998), as “respostas selecionadas” (por exemplo, verdadeiro/falso, sim/não, alternativa 1 ou 2 etc.) podem ser utilizadas por aqueles com escolaridade inferior.

O programa cTrain, desenvolvido por W. Kent Anger e Diane Rohlman da Uni­versidade de Saúde e Ciências de Oregon (Anger, Rohlman, Kirkpatrick, Reed e Lundeen, 2001) fornece uma maneira de viabilizar a instrução programada infor­matizada como instrumento de treinamento. O cTrain apresenta muitas vantagens no treinamento de comportamentos de segurança. Ao participante é ensinado um sistema de navegação simples através de quadros e testes, consistente de uma parte do treinamento para a seguinte. Essa orientação pode requerer apenas 10 a 15min mesmo para indivíduos com baixo índice de escolaridade, ou ainda, com nenhuma exposição à educação formal. O participante pode optar para que o texto escrito seja “falado” pelo computador, através de uma conversão texto-voz ou ainda por meio de arquivos com voz natural, pré-gravados e criados especifi­camente para o treinamento. Assim, não é necessário que o participante seja letrado, exigindo-se apenas familiaridade com os números.

Um teclado USB simplificado é disponibilizado com apenas nove teclas (nu­meradas de 1 a 9) que podem ser iluminadas quando forem relevantes (por exemplo, se as chaves 1, 2 e 3 forem usadas para responder as questões do teste, então apenas essas são iluminadas durante a questão). As características do tecla­do possibilitam a utilização por indivíduos que não se sentem confortáveis em utilizar teclados típicos de computador (Anger, Tamulinas, Uribe e Ayala, 2004). O computador utilizado não precisa ser muito avançado e o sistema operacional pode ser tanto Windows ou Macintosh (embora ainda não testado, qualquer sis­tema baseado em Unix, como o Linux, poderia também ser compatível). Ademais, ao considerar que o módulo de treinamento e os dados que descrevem o treina­

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mento residem no próprio computador, este não necessita de uma conexão com a internet. Além disso, tanto um computador de mesa como um notebook podem ser utilizados. Textos, arquivos de som, fotografias ou vídeos podem constituir os módulos de treinamento. O desenvolvimento do módulo de treinamento para o cTrain envolve a utilização de dois programas distintos: o Builder e o cTrain. O Builder é utilizado para criar o módulo e o cTrain, para apresentar o módulo e registrar o aprendizado. A licença para utilização desses programas pode ser ob­tida pela Northwest Education Training and Assessment, LLC (www.nweta.com, em que outras informações também podem ser obtidas).

Durante o seu desenvolvimento, o cTrain demonstrou fornecer treinamento eficaz em diversas situações, incluindo o treinamento de trabalhadores rurais em pomares (Anger, 2007), trabalhadores rurais de fala não inglesa em uma grande estufa comercial para plantas (Anger, Stupfel, Ammerman, Tamulinas, Bodner, Robinson e 2006), e trabalhadores do serviço de alimentação em um restaurante de um grande hospital (Eckerman, Abrahamson, Ammerman, Fercho, Rohlman e Anger, 2004). Os trabalhadores dos pomares, da estufa e do restaurante tiveram respostas-alvo específicas no treinamento, sendo os primeiros treinados na utili­zação de escadas e tesouras podadoras de maneira segura; os segundos, em políticas de funcionamento da empresa; e os terceiros, no cumprimento dos pa­drões de limpeza do alimento e de segurança contra o incêndio, e a evitar lesões causadas por escorregões, quedas, queimaduras e por maneira inadequada de carregar peso. Em cada projeto, a satisfação do trabalhador com o treinamento foi alta, o conhecimento foi efetivamente transmitido (documentado através de testes pós-treinamento realizados durante vários meses para os trabalhadores de pomares e restaurante), e aumentou o comportamento de segurança no local de trabalho (também documentado durante vários meses tanto para trabalhadores dos po­mares como para os do restaurante).

Embora um treinamento eficaz possa ser desenvolvido a partir do cTrain, tam­bém é verdadeiro que a manutenção de comportamentos de segurança no local de trabalho requer mais do que apenas treinamento eficaz. Contingências eficazes também devem estar presentes para sustentar as mudanças construídas por um adequado treinamento (por exemplo, Sulzer-Azaroff, 1998; Alvero, Buckline Austin, 2001; Boyce e Geller, 2001). O cTrain pode dar início a comportamentos de seguran­ça no local de trabalho através de treinamento e assim pode desempenhar um papel importante na redução dos riscos ocupacionais quando combinado com uma con­sultoria analítico-comportamental, no que se refere a contingências eficazes para manter esses comportamentos de segurança que foram treinados.

Considerações FinaisA toxicologia comportamental é uma área aberta às contribuições da análise do comportamento, tanto no campo da pesquisa em laboratório com animais quanto na pesquisa aplicada em situações ocupacionais e ambientais. A participação de analistas de comportamento, além de contribuir para o avanço dos procedimentos de detecção e avaliação dos efeitos de substâncias tóxicas sobre o comportamento,

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pode também contribuir para o desenvolvimento de técnicas de treinamento necessárias para a redução dos riscos impostos por essas substâncias.

O objetivo deste capítulo foi introduzir o leitor à área da toxicologia comporta- . mental e apresentar algumas das possíveis contribuições da análise do compor­tamento, utilizando exemplos de estudos de laboratório e de campo, com especial atenção aos trabalhos desenvolvidos no Brasil. Ênfase especial também foi dada ao BARS, um sistema de testes computadorizados, desenvolvido para a avaliação neurocomportamental dos efeitos de substâncias tóxicas em humanos. As caracte­rísticas desse sistema o credenciam como um instrumento que permite realizar tais avaliações, independentemente da idade, do nível de escolaridade e da origem étnica ou agrupamento cultural dos participantes na avaliação. Isso permite com­parações entre diferentes populações na avaliação da toxicidade.

Qualquer tipo de avaliação realizada por instrumentos como o BARS ou outros que tenham o mesmo objetivo, deve, entretanto, ser complementada por outras ações que permitam uma avaliação mais precisa das alterações comportamentais que possam surgir a partir da exposição a diferentes substâncias tóxicas. Isso é espe­cialmente importante quando essa exposição é decorrente de acidentes que desencadeiam mudanças ambientais e sociais significativas. O analista do com­portamento pode, mais uma vez, contribuir para a compreensão do fenômeno de alteração comportamental nessas situações, através de análises funcionais que permitem discernir as diferentes variáveis que contribuem para a multidetermi- nação dessa alteração (ver Gimenes e Vasconcelos, 1997; 2002).

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índice Remissivo

A

Abordagemanalítico

-comportamental, 154, 180,188

-funcional, 137,179 médica, 179 nomotética, 144 quase-médica, 179

Adaptação, 18 Alcoolismo, 143 Algoritmo, 200, 212, 213 Aliança terapêutica, 164 Análise

experimental, 8do comportamento, 2, 5,

6 ,1 0 / 11,106,121,196, 221,222

funcional, 136, 137, 180,188 modelo analítico-

comportamental, 176 Apetite, alterações, 187 Aprendizagem, 128,220, 224

modelo, 136serial de dígitos, 2251, 231

Atenção, 220 seletiva, 2251

Atividade, persistência, 214 Audiência, 85 /Autogoverno, 197,214

intelectual, 205 Autorregras, 169,172 Autorrelatos, 230 Avaliação

comportamental, 137,164, 180,189

Avaliação (Cont.) funcional, 137,160 neurocomportamental, 232,

236neurotoxicológica, 224

B

Behaviorismo, 3,56, 68,69,110, 117,175radical, 3 ,1 0 / 30, 51, 56,196

Behaviorista, 103,104 radical, 11,41,44,52, 56

Biologia, 134

cCadeia comportamental, 142Cérebro, 75Chumbo

concentração no sangue, 2321 exposição, 231 nível, 231

Código civil, 143 Walden, 55

Competência, 204 Comportamento, 21,23,31,32,

42, 49-52, 65, 72/ 74, 75, 85, 87, 89, 109, 127, 129-131, 136-139, 141, 144, 154, 156, 159, 160, 162, 165, 166, 169-171, 175,176,180,182, 185-187, 189, 200, 201, 203, 206, 210, 212,214,215,219, 222, 223, 230, 234, 235 adjuntivos, 22

As letras f e íque se seguem aos números de páginas correspondem, respectivamente, a figuras e tabelas.

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240 ■ índice Remissivo

Comportamento (Cont.) análise, 2-4, 6-9,11,12,

17,61,74,101-103, 107, 109-111,117,119, 120, 125-127, 131, 133, 155, 156, 170, 171,175, 182, 184,185,188,196, 202, 219, 220, 235 aplicada, 4, 5, 8, 10f, 116,

121conceituai, 5,121 definições, 1 história, 105,111

analista, 64,133 autolesivos, 136 bizarros, 188 brincar, 142 ciência, 153 cliente, 167 criativo, 201 de atenção, 215 de exploração, 215 de resolver problemas, 196 de segurança, 219 déficits, 166,168 definições, 37 discriminativo, 205 engatinhar, 142 escrever, 142 estímulos, 77 ético, 40, 41, 43, 44, 51 excessos, 166,168 falar, 142governado por regras, 115,

118humano, 70, 89,170 inapropriados, 169 induzidos, 22 intencional, 50 intervenientes, 166,169 intraverbal, 85 leis naturais, 157 ler, 142 lógico, 196 modificação, 117 não verbal, 46, 51, 52,160,

171operante, 16,17,19-21,31,

70-72, 76,81,86, 88/221 mediado, 74 não verbal, 76 seleção, contiguidade e

contingência, 15 padrões, 136 patológicos, 188

Comportamento [Cont.) pré-correntes, 197, 207 preliminar, 196,197, 207,

208,215 repertório, 212

problemas, 186 psicopatológico, 181 reforço, 44 repertório, 196 reprodução, 86 respondente, 76 seleção, 73supersticioso, 20-23,26,

28, 32aquisição, 25 fuga e esquiva, 27 manutenção, 25

topografia, 77, 78 variação, 208,209 verbal, 26, 40, 46, 51, 52,

61-68,71-75, 77, 79, 81-90, 110,115, 118,160, 171,211 teoria, 70

Comunidades verbais, 50 Concepção materialista, 154 Condicionamento, 20

operante, 49,155,157 tipo R, princípio, 16

Conhecimento, 153 factual, 206

Consciência, 68 Conseqüências, 20, 31, 33, 43,

46,47, 50 concorrentes, 166 reforçadoras, 50,51 seleção, 15

Contingência, 17, 20-22, 24- 26,31,32, 45, 46, 55, 66, 71/-73, 79-81, 84, 86, 88, 126, 141, 158, 159, 162, 166, 169,170,214,215, 223 análise, 160,164,188 aversivas, 143 coercivas, 47 comportamentais, 76 de adução, 141 de coadução, 141 de punição, 48 de reforço, 48, 52,167 de sobrevivência cultural, 49 destrutivas, 141 familiares, 142 insensibilidade, 171 mantenedoras, 141

Contingência {Cont.)natural do comportamento,

171tríplices, 128,172,184 variações, 210

Controle aversivo, 115 de estímulos, 115 discriminativo, 166,168 inapropriado, 166 operante, 74

Coordenação motora, 220,224

Criança e adolescente, estatuto, 143

Cultura, 43, 44,49, 54-57, 69, 83, 87, 126,128, 154, 224

D

Darwinismo, 19 Depressão, 30

melancólica, 182 Desamparo, 32

aprendido, 30 Desempenho contínuo, 225 r,

232Desenvolvimento, 133,136,

139,141,144analítico - comportamental,

125ciência, 125,129,133-135,

141conceito, 126 físico, 130humano, 127,129,134,136,

140, 142,143,145 Discurso ético, 44 Doença mental, etiologia, 185 Dualismo, 155

E

Ecologia social, 134 Ecossistema comportamental,

139 Escrita, 81 Esquemas, 115

de reforço, 110 Esquiva, 28, 158 Esquizofrenia, 182 Estimulação, 170

sonora, 81 verbal, 66 visual, 81

Page 254: (livro) tourinho & luna (2010) análise do comportamento investigações históricas, conceituais e apli

índice Remissivo ■ 241

Estímulo, 32, 130 antecedentes, 140 autogerados, 168 aversivos, 30, 156 controle, 161, 171 discriminativos, 160 privados, 156 reforçador, 156 verbais, 82

Estrutura cognitiva, 177 Ética, 40,41,43, 52, 53

definições, 37 normativa, 38 prescritiva, 37, 38, 51, 53,

55skinneriana, 38-40, 51,

53, 55 tradicional, 38

Eventoaversivo, 29, 30 conseguintes, 31 subsequentes, 31

F

Fala, 75,81Falante, 65, 66, 72, 73 / 76, 79,

81-85 Fenômenos

comportamentais, 155 psicológicos, 154

Filogênese, 154 Filosofia, 56,117

behaviorista, 117 radical, 39

moral, 37 política, 55, 56 skinneriana, 55 tradicional, 55

Frustração, resistência, 213, 214

Fuga, 30, 158do aversivo condicional, 28 e esquiva supersticiosas, 27 esquiva, 188

H

Heurística, 200, 213 habilidades, 208

Hipótese behaviorista, 70 Homo sapiens, 75 Humor, tempo, 224

i

Interação, 158, 162,168 terapêutica, 167 verbais, 66, 79, 84, 85/ 89

vocais, 138 Intervalo variável, 23 Intervenção, 163

L

Laços afetivos, 143 Lamarckismo, 19 Learning sets, 210 Lei

do divórcio, 143 do efeito, 18

Linguagem, 61, 63, 66, 68-70, 74evolução, 75

Linhagemcomportamental, 70, 84,

86, 88/ verbal, 73

operante, 70-72

M

Mania, 182 Memória, 220, 224 Metacontingências, 76,140,

141Metaética, 37, 40, 51

skinneriana, 40,41,44 Metaéticos, 38 Modelagem, 168,172 Monismo, 155 Moral, definições, 37 Morte, 187 Motivação, 220 Mudança, 163

ambientais, 20 comportamental, 141

Musculatura vocal, 76

N

Neobehavioristas, 18

oOntogênese, 43, 154

Operaçãoestabelecedora, 140,160,

163,187reforçadora, 80/

motivadora, 110 Operante, 18, 31, 33, 42, 76,

78,136,154 conceito, 17 verbais, 40, 65, 68, 75

Ouvinte, 66, 73/78-85 treinamento, 83

pPadrão

comportamental, 159 supersticioso, 24, 28

Paradigma, 135 construtivista, 196 relativista, 134

Patologia, 186comportamental, 185

Pátrio poder, 141 Personalidade desviante, 177 Poder familiar, 141 Política, 56

educacional, 193 Posição funcionalista, 186 Práticas

alimentares, 144 analítico-

-comportamentais, 189 culturais, 144,155 educativas, 143

Problema, 199, 201, 203-205,213,216classe, identificação, 201 questões

conceituais, 193 metodológicas, 193

resolução, 193,196-198, 200, 201,205, 206,215 comportamento, 215 processo, 207

solucionar, 214 tipos, 202

Processos culturais, 139 terapêutico analítico -

-comportamental, 162 verbais, 69

Psicologia, 1,10-12, 102-104, 107, 108, 113, 125, 126, 133, 135, 136, 176, 177 do desenvolvimento, 134

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242 ■ índice Remissivo

Psicologia (Cont.)experimental, 102,103,107 história, 108 mentalista, 7

Psicopatologia, 175,183,185, 188classificação, 186

Punição, 29não contingente, 28

R

Razão progressiva, 2251 Referencial behaviorista, 194 Reforçadores, 48, 165, 169,

170,213automáticos, 78 aversivos, 30 condicionados, 164 e punidores, 141 generalizados, 188 incondicionados, 43 naturais, 168 negativos, 28, 46, 47,158 positivos, 30,45,47,158 sociais, 162 tangíveis, 188

Reforço, 32, 33,165, 210 diferencial, 162 não contingente, 144 negativo, 47,143,156 positivo, 141,143 social, 163

Regras, 110,169, 171,172 heurísticas, 212, 213

Relação comportamental, 158 Relato verbal, 167 Repertório, 87

comportamental, 144,185 verbais, 211

Respondente, 154 Resposta, 32,154,160,168,

169,198, 204, 207, 208,210, 214, 227conseqüências, 115 construídas, 234

Resposta {Cont.) emissão, 165 emitida, 160 operantes, 76 solução, 203, 204, 207, 208,

213 tempo, 224 topografia, 80f, 82 verbais, 68, 78, 79, 82, 84,

85 vocal, 75

Restrições mecânicas, 79

sSegurança, equipamento, 2331

individual, 229 Seleção

cultural, 83,139 genética, 154

Símbolo-dígito, 2251 Sistema

classificatório funcionalista, 188

cultural da análise do comportamento, 159

dirigido a objetivos, 18 receptor, 140 skinneriano, 63

Situação-problema, 194,197, 199, 200

Sociologia, 134 Subjetividade, 157

humana, 68 Substâncias tóxicas, 235

efeitos humanos, 223 Suicídio, tentativas, 187 Superstição, 21 Supressão supersticiosa, 28

T

Tabagismo, 143 Tarefa, persistência, 213 Tatos, emissão, 65, 86

Tempode reação, 2251 fixo, 22 variável, 22

Teoria, 68behaviorista, 69 naturalistas, 38

Terapiaanalítico-comportamental,

153, 157, 158, 160, 164, 172,175,184

verbais, 167 Testes neurocomportamentais,

224Topografia, 75, 81,170,185

de respostas, 77 Toxicidade, avaliação, 236 Toxicologia comportamental,

219-221,223, 228, 235 Transferência, 195

analógica, 202 de aprendizagem, 195

Transtorno, 183,185, 188 disfórico, 187

pré-menstrual, 187 mentais, 181-183 obsessivo-compulsivo, 133,

188

vValores, 52, 54, 55 Variabilidade, 127

comportamental, 110, 202, 203

Variação, 203 Variáveis, 221

ambientais, 136 controladora, 222 controle, 160 independentes, 135 manipulação, 160,207 múltiplas, 159

Vida, história, 163

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