livro - o leite em minas gerais

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O

em Minas

Gerais

Belo Horizonte2010

SXC / RF

Ao lado do sal, da salsa, (A receita nunca falsa) Todos boiam na manteiga De natural d oce e meiga. E para ma ior deleite,

Um copo e meio de leite.Carlos Drummond de AndradePoema Culinrio

Apresentao 6

3 Tecnologia e qualidade em construo10Renovao com a SuperAgro 125 Universidade Federal de Viosa 140 Difundindo o saber 141 Da produo artesanal industrializada 142 Doces prmios 143 Instituto Cndido Tostes 147 O leite como prioridade 148 Ensinar inovando 149 A primeira laticinista do pas 150 Alguns espinhos 151 Tradio nas letras e em eventos 152 A mquina em funcionamento 153

108

1 A expanso do gado leiteiroC entre ns 26 Uma verdadeira especiaria 36 Maior produtor de leite do pas 38 Sonho realizado no cerrado 48 Est no sangue 54

2 Evoluo do mercado

56

4

De mos dadas

Projetos Educampo e Balde Cheio 156

O comrcio de leite nas grandes cidades 60 Unidos, fazendo histria 63 Do pequeno Laticnios Lagoa da Prata gigante Embar 71 O Brasil conquista a Nestl 77 Apareceu a margarina 81 Equipamentos para laticnios 82 Fabricao mineira 83 Queijos finos 92

Referncias 174 Acervos fotogrficos 178 Glossrio de siglas 180

A

presentAo

Tempos atrs, pesquisa sobre a agropecuria em Minas Gerais mostrou que a produo de leite a atividade econmica rural mais frequente no estado. A constatao surpreendeu muita gente, que, at por causa da origem no campo, sempre teve a impresso de que a roa de milho era a principal marca produtiva das fazendas mineiras. O levantamento no deixou dvidas, pois ningum contestou a predominncia leiteira. Esse resultado est intimamente ligado histria do desenvolvimento rural de Minas Gerais, que lidera o mercado nacional de leite e derivados, com quase 30% da produo, um ndice de enorme relevncia social e econmica. Numa nova parceria, destinada a resgatar, registrar, divulgar e preservar as tradies mineiras, o Servio de Apoio s Micro e Pequenas Empresas de Minas Gerais (Sebrae-MG) e a Federao da Agricultura e Pecuria de Minas Gerais (Faemg) decidiram unir esforos para contar, nesta publicao, a histria do leite no estado.

Ronaldo Guimares

As duas instituies sempre incentivaram e apoiaram projetos e programas que ajudam o agricultor a entender sua realidade e a agir em benefcio do negcio, contribuindo para o bem-estar da populao. O Sebrae-MG desenvolve o Educampo, em diferentes regies do estado, com resultados to positivos que avana em direo a outros setores do agronegcio, como caf e frutas. A iniciativa se concentra na gesto de pequenas propriedades rurais, capacitando o produtor com tcnicas e conhecimento sobre produtividade, controle de custos e competitividade empresarial. O objetivo a habilitao para um novo modelo de negcio, na moderna fase de explorao do leite. A Faemg adotou o Balde Cheio, desenvolvido pela Embrapa, em So Carlos (SP), sob coordenao do tcnico Arthur Chinelato. J implantado Brasil afora, envolvendo parcerias com cooperativas e entidades-ncoras, o programa contrata tcnicos, para orientar grupos de produtores nas fazendas. Na coordenao geral do programa, a Faemg cuida permanentemente da reciclagem dos especialistas que ensinam atualizadas tcnicas de gesto no campo. Por tudo isso e, muito especialmente, por vivermos na era da informao e do conhecimento, ressaltamos a importncia de O Leite em Minas Gerais. Desde os tempos coloniais, a produo leiteira, sustentada por alguns personagens conhecidos e uma legio de annimos, sempre teve de superar desafios, que no a impediram de chegar expressiva situao atual. Uma realidade marcada pela exigncia de alta produtividade e competitividade, sem as quais no seria possvel sobreviver em um mercado globalizado, de concorrncia acirrada. Mais do que nunca, so imprescindveis a gesto do negcio, a produo eficiente e os cuidados com custos, para alcanar melhor lucratividade.

Ao longo da trajetria, mltiplos fatos econmicos e

sociolgicos determinaram as caractersticas atuais do setor. Entre eles, a reduo do nmero de produtores, dos que permanecem na atividade. Apesar de todas as dificuldades, a gradual consolidao possibilita a gerando aumento do volume da produo individual

certeza de que o Brasil ser um dos maiores exportadores

mundiais de leite, como j de carne, porque pode elevar a produo, por ter reas e condies favorveis expanso. Bastam apenas alguns ajustes.

Todos que participam dessa saga sabem a importncia

que O Leite em Minas Gerais pode ter na modernizao e referncias de que podem orgulhar-se, porque resgatam a origem e a histria do negcio agropecurio que

crescimento da atividade leiteira. O setor e o pas ganham

sustentou sonhos e continua a se atualizar para garantir a

concretizao de novos projetos do produtor rural. Trata-se do presente e projeo do futuro da atividade leiteira, de fundamental importncia para o agronegcio.

de obra indispensvel compreenso do passado, melhoria

Presidente do Conselho Deliberativo do Sebrae-MG Presidente da Faemg

Roberto Simes

Evandro Fiuza

Ronaldo Guimares

1

A expanso

do gado leiteiro

1 a expanso do gado leiteiro

3

12

Por todo o territrio

De olhos no passado, impossvel imaginar que a cadeia produtiva do leite seria um dia, como hoje, uma das maiores em faturamento e gerao de emprego e renda no Brasil. a nica que cria emprego no interior do pas de maneira contnua, porque envolve atividades intensivas em mo de obra e est espalhada pelos 5.560 municpios brasileiros. curioso lembrar que a pecuria de leite no teve incentivos estatais para se desenvolver no pas durante o perodo pr-colonial e colonial, embora aqui estivesse praticamente desde o incio da presena europeia.

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2

No perodo pr-colonial (1500/1530), a Coroa portuguesa s se interessou em investir naquilo que fosse possvel exportar, como madeira (pau-brasil). Essa caracterstica se manteve durante o Brasil Colnia, com itens como acar, metais preciosos, tabaco, couro etc.

O leite, dado seu carter pere cvel, no servia ao propsito dos portugueses naquela poca.1. Foto Maurcio Farias/Arquivo ABCZ 2. Foto Ronaldo Guimares/Arquivo Sebrae-MG 3. Mapa produzido pelo cartgrafo piemonts Giacomo

Gastaldi, em 1565, para Delle Navigationi et Viaggi, um livro sobre relatos de viagens do gegrafo veneziano Giovanni Battista Ramusio (1485/1557). Arquivo Biblioteca Nacional

O frade dominicano Bartolomeu de Las Casas, que chegou ao continente americano em 1503, escreveu em Historia de las Indias que os primeiros bovinos a pisar o continente americano foram trazidos por Cristvo Colombo em 1493. No Brasil, quem trouxe os primeiros animais foi a espanhola

O to que feminino

Ana Pimentel, mulher do navegador portugus Martim

Afonso de Souza. Ele desembarcou em So Vicente (considerada a primeira vila brasileira, localizada em terras paulistas) na terceira dcada do sculo XVI, frente da primeira armada com objetivos colonizadores enviada pelo rei de Portugal, que assim pretendia garantir o domnio em terras brasileiras, cobiadas por outros pases, sobretudo a Frana.

Martim Afonso tornou-se donatrio da Capitania de So Vicente, mas teve que voltar a Portugal em 1534, cerca de dois anos depois de ter chegado, pois foi nomeado capito-mor da armada da ndia. Ana Pimentel foi ento nomeada pelo marido procuradora da capitania, que passou a governar. E em meados da dcada de 1530, ela trouxe para So Vicente 32 bovinos.

Pintura do artista plstico Carlos Fabra que ilustra a chegada ao Brasil das primeiras cabeas de gado, trazidas por Ana Pimentel. Arquivo Prefeitura de So Vicente (SP)

1 a expanso do gado leiteiro

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Apesar de pou co lembrada nos livros, Ana Pimentel est entre as mulheres mais importantes d a histria brasileira. Sua generosid ade deu origem pecuria1

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no Rio Grande do Sul, pois, quando sua dama de companhia se casou com um ndio gacho, deu-lhe como dote algumas reses de sua fazenda. Levados para a estncia nos pampas, os animais se multiplicaram livremente e, j no sculo XVIII, serviram de meio de transporte e de alimento para os mineiros que retiravam ouro das Minas Gerais. Nos primeiros tempos da colonizao portuguesa, as terras frteis do litoral foram usadas para a agricultura, principalmente para o plantio de cana-de-acar. Martim Afonso de Souza proibiu os colonos de subirem a Serra do Mar. O donatrio temia conflitos com os ndios que habitavam as terras mais frteis e de clima mais ameno do planalto paulista. Em 1545, quando essa ordem foi revogada por Ana Pimentel, os moradores de So Vicente puderam aventurar-se dez a doze lguas pelo serto e terra adentro, como contou o Padre Anchieta em seus relatos.

1. leo sobre tela de Benedicto Calixto (sem data), ilustrando

a praia de So Vicente, a primeira vila da Colnia, fundada em 1532. Pinacoteca Benedicto Calixto (SP)

2. O navegador portugus Martim Afonso de Souza,

fundador da Vila de So Vicente (SP), pintado por Benedicto Calixto. Arquivo Prefeitura de So Vicente (SP)

No Nordeste, com as terras litorneas ocupadas pelos canaviais e engenhos, a pecuria foi-se afastando para o amplo serto e, com o tempo, desceu at Minas Gerais, onde se multiplicou pelo Vale do So Francisco e se espalhou pelo Norte e Oeste do estado, pelo Tringulo, chegando a Gois. Historiadores concordam em que a ocupao do interior do Brasil foi sustentada pela pecuria, sendo o boi usado como fora de trabalho, meio de transporte e fonte de protena.

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1 a expanso do gado leiteiro

Outra via de entrada do gado em Minas Gerais foi So Paulo, que recebia a manada trazida por boiadeiros do Rio Grande do Sul. Esta era revendida para fazendeiros do Sul do estado e tambm servia de alimento para a populao das regies ricas em ouro. Estima-se que em 1770 o Brasil tinha dois milhes de habitantes, enquanto s nos pampas gachos cerca de um milho de bovinos viviam soltos, disposio de quem os laasse.

Os bandeirantes que tinham se dedicado caa aos ndios, para ve nd-los como escravos aos senhores de engenho, d escobriram na caa aos bovinos um negc io mais rendoso e menos arriscado.Depois de laados, os animais eram levados at So Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, em uma jornada que durava cerca de seis meses. Essas expedies de caa ao boi nem sempre foram pacficas, pois os animais eram cobiados por outros caadores e pelos prprios gachos.

Caa aos bois

Gravura de Louis Julien Jacottet, de 1835, sobre paisagem mineira, onde se veem carros de bois usados para o transporte de mercadorias, na regio de Matosinhos (MG). Arquivo Biblioteca Nacional

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1

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De outras terras

O gado chegou a Minas Gerais tambm trazido do Rio de Janeiro, espalhando-se pela Serra da Mantiqueira, pela regio de Barbacena e por toda a Zona da Mata. Foi por essa via que se introduziu no estado o gado Holands, o pardo-Suo e o gado Mestio proveniente do cruzamento dessas raas com o gado comum.4

1, 2 e 3. Gado da raa Holandesa, na regio da Mantiqueira.

Foto M. C. Vianna/Arquivo Pblico de Santos Dumont (MG) pertenceram a fazendeiro da regio da Mantiqueira, no incio do sculo XX. Foto M. C. Vianna/Arquivo Pblico de Santos Dumont (MG)

4 e 5. Bezerras da raa Holandesa, malhadas de vermelho, que

6. Campeo da raa Holandesa na Exposio Agropecuria de

1920, realizada em Belo Horizonte. Pertencia ao fazendeiro Jorge de S Fortes, da Fazenda Jacutinga, na regio de Santos Dumont. Arquivo Pblico de Santos Dumont (MG)

7 e 8. Desenho das caractersticas do touro Albert, da raa 7

Holandesa, importado no incio do sculo XX por fazendeiro da regio de Santos Dumont e cpia do seu Certificado de Exportao. Arquivo Pblico de Santos Dumont (MG)

6 5

No sculo XVIII, o comr cio de gado em Minas Gerais era bem organizado.Quase trs sculos depois de Ana Pimentel, outra mulher se tornou lenda nos sertes mineiros ao substituir o marido no comando de suas fazendas espalhadas pelo Centro-Oeste do estado.

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Sede j demolida, da fazenda de Dona Joaquina de Oliveira Campos, em Pompu (MG). Reproduo do livro Dona Joaquina de Pompu, de Coriolano Ribeiro e Jacinto Guimares/Foto Sara Torres

1 a expanso do gado leiteiro

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nascida Joaquina Maria Bernarda da silva Abreu Castelo Branco soutoMayor de oliveira Campos, no Arraial ribeiro do Carmo, hoje cidade de Mariana, em 1752, Dona Joaquina de pompu (por causa do nome de sua principal fazenda e do local da propriedade) era filha de advogado portugus casado com uma aoriana. ela se transformou em grande criadora de gado, atuando no abastecimento de inmeras vilas.

No comeo do sculo XVIII, o bandeirante Joo Leite da Silva Ortiz (fundador do arraial do Curral Del Rey) chegou regio de Sete Lagoas e resolveu cuidar do comrcio de gado. De acordo com Srgio Buarque de Holanda, o novo contrato para o comrcio de carne e leite, em condies pouco favorveis populao, provocou ondas de protestos que resultaram na chamada Guerra dos Emboabas, embora outros historiadores prefiram atribuir esse conflito disputa pelo direito de explorao de jazidas de ouro.

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Um negcio e tantoDona Joaquina se destacou na sociedade tambm porque manteve relao prxima com a Corte portuguesa, pois ajudou a alimentar a famlia real e outros portugueses quando eles desembarcaram no Rio de Janeiro, em 1808 a cidade sofreu falta de abastecimento com o repentino crescimento da populao. Ao morrer, em 1824, aos 72 anos, deixou aos numerosos herdeiros 11 fazendas e 40 mil cabeas de bovinos. A organizao do negcio de gado no estado, naqueles tempos, se refletia na estrutura do comrcio. Havia paragens de tropeiros em pontos determinados, travessias de rios e reas de venda de animais em p ao longo dos caminhos dos currais que ligavam as fazendas do serto de Sete Lagoas e Curvelo a Ouro Preto. Uma das reas de passagem dos tropeiros era o arraial do Curral Del Rey, hoje Belo Horizonte; outra, Ribeiro das Abboras, atual Contagem, na Regio Metropolitana da capital. Alm de funcionarem como ponto de venda, facilitavam o trabalho dos fiscais da Coroa na cobrana de impostos. Como as taxas eram consideradas altas, o contrabando de gado se desenvolveu quase tanto quanto o do ouro e dos diamantes.

De qualquer forma, o rebanho se expandiu na mesma velocidade com que jazidas de ouro e diamante eram descobertas nas Minas Gerais,2

atraindo milhares de novos habitantes. No Brasil, nos cem anos que se seguiram a 1770, a populao quintuplicou, chegando a 10 milhes de habitantes. Ao mesmo tempo, crescia o rebanho bovino. O mercado consumidor de leite foi-se formando entre 1820 e 1930, perodo em que cerca de 4,5 milhes de imigrantes europeus desembarcaram no pas e em que o leite se transformou na principal atividade econmica de boa parte das fazendas mineiras. Exemplo dessa realidade foi a efervescncia econmica em torno dos laticnios na Zona da Mata.

1 a expanso do gado leiteiro

1. Reproduo de cartas escritas por Dona Joaquina

Continua na pgina 30

de Pompu/Sara Torres

2. Curral Del Rey, hoje Belo Horizonte, era rota de

tropeiros que levavam gado para outras regies do estado. Arquivo Pblico da Cidade de Belo Horizonte

1 a expanso do gado leiteiro

A importncia do leite para o homem reconhecida desde a idade da pedra, tanto que fazia parte de ritos da fecundidade, da literatura clssica e das antigas lendas, como a de Rmulo e Remo, fundadores de Roma. Eles teriam ficado rfos muito cedo e, abandonados prpria sorte, sobreviveram porque uma loba os alimentou.

C entre ns referncia tambm o texto bblico sobre a saga dos judeus que fugiram da escravido no Egito e se dirigiram a Cana, a terra em que manam leite e mel. Trs sculos antes de Cristo, o grego Hipcrates, Pai da Medicina, escreveu que leite alimento muito prximo da perfeio e preventivo de vrias doenas. Desde a antiguidade, o leite est presente no preparo de refeies. No Egito dos faras, queijo e leite compunham os tesouros guardados nas pirmides para que os mandatrios falecidos pudessem ter uma viagem bem alimentados ao mundo dos mortos. Plnio, historiador grego, relata que tribos srmatas fabricavam doce de leite de camela e misturavam leite farinha de milho. Na Idade Mdia, o leite puro era consumido quase exclusivamente pelas crianas. No Brasil, a primeira referncia escrita ao leite de 1552, feita pelo padre Manuel da Nbrega, em carta aos superiores em Portugal. Ele revelou que vinha atraindo os indiozinhos para a catequese e para o colgio instalado na vila que deu origem a Salvador, na Bahia, oferecendolhes leite retirado de 12 vacas. S bem mais tarde, contudo, os adultos brasileiros adotaram o hbito de beber leite. O viajante ingls John Barrow, que visitou o Rio de Janeiro em 1792, escreveu que os moradores das cidades raramente bebiam leite e quase nunca comiam queijo e manteiga. Foi difcil conseguir um pouco de leite para seu ch. Quando encontrado, disse Barrow, era de pssima qualidade.

O queijo e a manteiga eram produzidos principalmente em Minas Gerais, em pequenos cmodos nas fazendas, s vezes na prpria residncia da famlia. No havia mquinas apropriadas ou ateno higiene, mesmo quando a produo era destinada ao consumo domstico. Em geral, a fabricao era dirigida pela mulher do fazendeiro. O autor de Viagens ao Interior do Brasil, John Mawe, um britnico que esteve no pas durante dois anos, a partir de 1809, escreveu sobre o assunto. Na regio de Juiz de Fora, ele chegou Fazenda do Capito Rodrigo de Lima e se espantou ao visitar a fbrica de queijo. Em vez de um compartimento apropriado fabricao do produto, encontrou um quarto sujo, de cheiro insuportvel. E ouviu, como explicao, que no era poca de fabricao de queijo, pois as vacas s produziam leite na estao das guas. Pela mesma razo, ningum tinha se preocupado em lavar os utenslios, desde a ltima vez em que haviam sido usados.

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Mawe se deu ao trabalho de ensinar ao fazendeiro entediado o modo correto da produo de queijo, como se fazia em seu pas.Foi ouvido educadamente, mas no percebeu no ouvinte qualquer demonstrao de que seguiria suas orientaes. Porm, em outras regies mineiras, suas lies foram bem aproveitadas. Ele escreveu que a mulher do Conde de Linhares, proprietrio da Fazenda do Barro, a 80 quilmetros de Ouro Preto, olhou nossos preparativos e pareceu muitssimo interessada neles. O britnico se encantou tambm com o interesse de uma mulher no Tijuco, atual Diamantina: A senhora se mostrou vivamente interessada na experincia: ela mesma participou das tarefas, com a ajuda das filhas, convidou vrias amigas para ver como era fcil o processo e distribuiu entre elas o produto obtido. Um raro exemplo de atividade e boa vontade.

Fabricado artesanalmente, o Queijo de Minas ganhou fama e at se tornou patrimnio. Mas nem sempre foi apreciado, especialmente pela falta de higiene em que era produzido nas casas de fazendas que usavam formas e queijeiras (mesas de madeira) pouco recomendveis. Foto Sara Torres/Museu de Artes e Ofcios

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1 a expanso do gado leiteiro

Quase no se produzia manteiga aqui, como observou o prncipe alemo Maximilian Wied-Neuwied, autor de Viagem ao Brasil, publicado em 1820. Ele viajou pelo Rio de Janeiro, Esprito Santo e Bahia, durante os anos de 1815 e 1816, e constatou que a populao no sabia fabricar manteiga. A conservao do produto era prejudicada pelo clima quente e pelo preo elevado do sal. Ao contrrio do ingls e do alemo, o conhecido naturalista francs Auguste de Saint-Hilaire fez trs viagens a Minas Gerais, entre 1817 e 1822, e no reclamou, em seus vrios escritos, da qualidade de nosso leite. At fez comparaes com o produzido nas montanhas da Auvrnia, regio francesa famosa pela indstria de laticnios, principalmente a dos queijos AOC.

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Possivelmente, com a chegada ao Brasil da famlia real, os produtores de leite ganharam ma is estmulo para melhorar a qualidade. Os nobres portugues es faziam questo de queijo e manteiga nas refeies. Os quei jos preferidos eram o chester e o portugus da Serra da Estrela, feito com leite de cabra, mas a fama do queijo Mina s chegara ao litoral.

1. Vista do Rio de Janeiro, em gravura de 1821, de John

Heaviside. Foi nessa poca que o prncipe alemo Maximilian Wied-Neuwied fez seus relatos de Viagem ao Brasil, nos quais reclamou da qualidade da manteiga nacional. Arquivo Biblioteca Nacional

2. Paisagem de Diamantina, em foto de Augusto Riedel, de

1868/69. Anos antes, pela cidade passou o britnico John Mawe, que ensinou a fazendeiros, especialmente mulheres, a produzirem queijo. Arquivo Biblioteca Nacional

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31Continuao da pgina 25

1 a expanso do gado leiteiro

A transparncia do cu, a doura do ar, a benigni dade do clima, o encanto da paisagem, a beleza das flores, a graa das mulheres, a excelncia dos coraes, a brandura dos costume s, a franqueza da hospitalidade fazem de Palmyra a miniatura d e um paraso Rui Barbosa, em crnica de 1920 abrigado entre as austeras serranias mineiras.Quem no conhece a histria de Santos Dumont, ex-Palmyra, cidade da Serra da Mantiqueira, na Zona da Mata mineira, se surpreende ao saber que ali, ainda no sculo XIX, na terra do pai da aviao, a indstria de laticnios era mais do que uma promessa. Era uma realidade econmica que transformou o pequeno municpio no maior polo brasileiro de produtos lcteos.

O prim eiro laticnio

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Em 1888, antes mesmo de Palmyra ser reconhecida como municpio, foi instalada ali a primeira fbrica de laticnios da Amrica do Sul. O proprietrio era o mdico Carlos Pereira de S Fortes, neto de Carlos S Fortes, primeiro importador de gado Holands na regio. Nascido em Barbacena em 1850, seu sonho era produzir queijos com a mesma qualidade dos europeus. Para isso, foi Europa visitar laticnios e comprou na Holanda o maquinrio da Companhia de Laticnios da Mantiqueira, erguida s margens do Rio Pinho.

1. A primeira fbrica de laticnios da Amrica Latina. Arquivo Biblioteca ILCT 2 e 3. o gado Holands foi introduzido nas fazendas da regio de palmyra por Carlos s Fortes, av do criador do Laticnios Mantiqueira, o mdico s Fortes, que implantou o primeiro laticnio da Amrica Latina. Arquivo Pblico de Santos Dumont (MG)

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1 a expanso do gado leiteiro

Convivendo com Santos Dumont De funcionrio a patroOutro amigo de Santos Dumont tambm foi importante personagem da histria da ento cidade plo de laticnios. O holands Joo Kingma era gerente do laticnio do tambm holands Alberto Boeke, quando constatou que fabricar coalho seria uma grande oportunidade de negcio. De certa forma, Kingma repetiu a histria de seu patro. Boeke era um mecnico que veio para o Brasil montar os equipamentos do laticnio de Carlos Pereira S Fortes. Anos depois, em 1907, se tornou fabricante do queijo da marca Borboleta. Sua empresa, fundada naquele ano com trs scios, chamava-se Alberto Boeke e Jong e Companhia, nome mudado em 1922 para Companhia de Lacticnios Alberto Boeke. Pois no que, em 1923, depois de trabalhar para Boeke, Kingma resolveu tambm montar sua prpria indstria em sociedade com o maior pecuarista da Mantiqueira, Joo Geraldo Freiks. Por mais de 50 anos, a fbrica foi a nica de coalho no Brasil.

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A famlia S Fortes fez histria em Palmyra e deixou registros interessantes, alm do envolvimento com a produo de leite e derivados. Um deles sobre a amizade entre o coronel Jos Jorge S Fortes, tambm grande fazendeiro, e o inventor do avio. Santos Dumont (1873/1936) nasceu na Fazenda Cabangu, localizada a 16 quilmetros da ento vila de Joo Gomes. Seu pai, o engenheiro Henrique Dumont, se instalou na propriedade em 1870, pois era o construtor responsvel pelo ramal da Estrada de Ferro Dom Pedro II que passaria pela regio.

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O coronel S Fortes foi uma referncia para Santos Dumont quando se tratava de cuidar da fazenda. Ele aconselhava o amigo sobre a administrao da propriedade, criadora de gado Holands e fornecedora de leite para laticnios como o Alberto Boeke e Jong e Companhia. Transformada em museu, a antiga casa da Fazenda Cabangu guarda rastros dessa histria.

1. Ferro de marcar gado, com as inscries de Santos

Dumont. Museu Cabangu/Reproduo Ronaldo Guimares

2. Recibo do laticnio de Alberto Boeke e Jong mostra a

relao da fbrica com a administrao de Palmyra. Arquivo Cmara Municipal de Santos Dumont (MG) adquirido, em 1960, pela Ribeiro Fonseca. Fruto da compra de laticnios ainda na dcada de 1920, o Ribeiro Fonseca foi, ao longo de muitos anos, o maior de Santos Dumont. Arquivo Ribeiro Fonseca

3. Muito premiado, o laticnio de Alberto Boeke foi

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1 a expanso do gado leiteiro

A trajetria de Kingma contada por seu neto, o escritor Victor Kingma. Filho de uma famlia tradicional de laticinistas da Frsia (regio no noroeste da Europa), Joo Kingma, que se formara tcnico em laticnios, leu num jornal holands anncio que procurava um profissional para montar o equipamento comprado na Europa pelo mdico Hermenegildo Vilaa, que estava instalando um laticnio em Juiz de Fora, na longnqua Minas Gerais. Ele enviou carta a Vilaa pedindo o emprego e, s depois de aceito, informou aos pais que ia viajar para o Brasil. Concludo o servio, preparava-se para voltar sua terra, mas foi convidado por Boeke, em 1909, a ser gerente de sua fbrica em Palmyra.

3

Durante anos, a maior empresa do setor em Santos Dumont, a Ribeiro Fonseca Laticnios S/A teve sua origem na fbrica Santa Martha, fundada em 1920 por Pedro Jos Ribeiro, produtora dos queijos das marcas Palmyra e Chantecler. Em 1935, a empresa muda de nome, com a entrada de outro

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scio, Galileu Fonseca.

O coalho nacionalO Coalho Frsia, de Kingma, era bem mais barato do que o importado, o que possibilitou o surgimento de dezenas de pequenos laticnios na regio. S ele dominava a tcnica de fazer coalho. Depois passou para um filho, meu tio, diz Victor. A empresa resistiu nas mos da famlia por cerca de 80 anos, antes de falir. Hoje, at o prdio da fbrica histrica desapareceu, como o de tantas outras que deram a Palmyra o ttulo de capital do queijo. Sobrevivem ali poucas e pequenas fbricas.

No basta ser grandeA Ribeiro Fonseca chegou a empregar mais de 500 pessoas em 60 laticnios espalhados pela regio. Em 1960, morreu Albert Boeke, e, cinco anos depois, o laticnio fundado por ele foi comprado pela Ribeiro Fonseca. Esta, por sua vez, foi adquirida, em 1975, pelo paulista Jorge Chammas Neto, dono do grupo Moinho So Jorge, do qual fazia parte a Leite Unio. Em 1996, a Ribeiro Fonseca foi fechada. Segundo a Secretaria de Agricultura e Desenvolvimento Econmico de Santos Dumont, o municpio produz ainda cerca de 100 mil litros de leite por dia e possui seis pequenos laticnios, nenhum fabricante de queijo do Reino, que deu fama regio. No toa que, na poca em que a Ribeiro Fonseca foi montada (ainda como Santa Martha), Minas Gerais j era o maior produtor de lcteos do pas, com seus 965 laticnios, no fim da dcada de 1920. No estado, eram fabricados queijos, casena, leite em p, leite condensado e leite pasteurizado, o que embalava o mercado consumidor nacional. O estado nunca perdeu a liderana conquistada naquele incio de sculo. Atualmente, a produo diria de leite calculada em 18 milhes de litros. A produo ocorre em todos os municpios mineiros, mas alguns se destacam. Patos de Minas, segundo pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE), produziu em 2008 mais de 109 millhes de litros de leite, s perdendo no pas para Castro, no Paran, com 138 millhes.

1. Kingma teve importncia nacional, ao fabricar o

primeiro coalho no pas, passando a fornecedora para as dezenas de laticnios existentes na regio da Mantiqueira. Arquivo Vctor Kingma que mais empregava na regio da Mantiqueira. Arquivo Ribeiro Fonseca

Continua na pgina 37

2 e 3. Funcionrios da fbrica Ribeiro Fonseca, a

1 a expanso do gado leiteiro

...Se as condies objetivas para o desenvolvimento laticinista como atividade econmica foram to hostis, o mesmo no se pode dizer de seu desenvolvimento culinrio. Nesse verdadeiro laboratrio experimental em que se transformou nossa culinria, o leite verdade, sempre como um subproduto mesclou-se com todos os demais ingredientes locais ou estrangeiros. Sua culinria floresceu e rendeu inmeros pratos inesquecveis. Com o milho, deu origem a angus, broas e bolos de fub, a canjicas, a inmeras receitas de milho verde ou de seu derivado, a farinha de milho. Tambm se transformou em queijo, outra forma de busca de permanncia, e com ele foram feitos pes de queijo, pudins, bons-bocados, queijadinhas, alm, claro, do clebre requeijo. Com o acar colonial, s

37Continuao da pgina 35

Do caf ao leiteA pecuria do Sul de Minas Gerais se beneficiou do crescimento do mercado consumidor de leite na capital paulista, para onde o produto era transportado a partir da dcada de 1880, por vages de carga, em lates de 50 litros. Quando o Vale do Paraba se viu castigado pela decadncia da cafeicultura, no comeo do sculo XX, e seus fazendeiros comearam a substituir os cafezais por pastagens de capim-gordura ou a vender terras, os do Sul do estado souberam aproveitar a oportunidade.

Uma verdadeira especiariaFoi na culinria que o leite encontrou seu espao como alimento do brasileiro. Na descrio de Maria Luiza de Brito Ctenas e Andr Constantim Ctenas, essa caracterstica se evidencia:vezes na forma de rapadura, outras de melado, o leite transmutou-se em bebidas, balas, doce de leite e roscas doces. Em conjunto com a mandioca, resultou talvez nos pratos mais originais do perodo colonial. Comeando pela prpria farinha, que se presta para bolos e doces; o polvilho, timo para biscoitos; a tapioca e o carim, para doces diversos e mingaus. A mandioca rende tantos produtos e combina to bem com o leite que um captulo especial na culinria brasileira, nica e deliciosa. Com os ovos, surgem as ambrosias, as babas de moa, inmeros cremes de ovos e pudins. J com o coco e seu subproduto, o leite de coco, o leite participa de alguns de seus pontos altos da culinria brasileira. Cuscuzes, manjares e docinhos de coco, sempre com leite, continuam surpreendendo paladares desavisados. Com a europeia farinha de trigo, o leite surpreende menos, porm, modificado por mos negras e influncias indgenas, rende timos pes, bolos e doces. E, por ltimo, o arroz nos brinda com timos arrozes-doces, bolos, mesbentas e alguns pratos salgados...

Eles compraram terras baratas pertencentes a fazendas de caf em decadncia, passando a produzir leite mais perto da cidade de So Paulo, beneficiando-se tambm da boa infraestrutura de transporte existente no Vale do Paraba. Esses mineiros ajudaram a construir ali, nos primeiros anos do sculo XX, a principal bacia leiteira paulista um movimento que se repetiria mais tarde no Paran e em Gois, entre outras regies.

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Gravura A Nurse (Ama de Leite). Data provvel entre 1846 e 1849. Arquivo Biblioteca Nacional

A propriedade produz leite e caf e ocupa terras dos dois estados. Os cafezais esto em territrio mineiro, ao contrrio do que diz a cano de Noel Rosa So Paulo d caf, Minas d leite, e a Vila Isabel d samba. Com cerca de 3.000 animais em lactao e uma produo mdia de 25 litros por cabea, a produo diria de aproximadamente 75 mil litros de leite tipo A, industrializados na prpria fazenda e vendidos em grande parte na capital paulista, a 290 quilmetros de distncia.

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Olavo Barbosa, como mais conhecido, nasceu em 1923, em Guaxup, onde comeou a trabalhar, em 1940, na Companhia Brasileira de Caf, da qual adquiriu dez anos depois seu primeiro armazm. Em 1960, comprou sua primeira fazenda. E mais outras, at os atuais 1.400 alqueires. As reas altas dessa imensido de terra foram reservadas produo de caf; as mais planas, pecuria leiteira. A fazenda produz leite desde 1960, quando iniciou com vacas Gir e touros Holandeses vermelho e branco. Em 1966, introduziu gado Dinamarqus, criando animais tri-cross. Na dcada de 1980, a fazenda fez opo pelo gado Holands preto e branco, importando 300 novilhas dos Estados Unidos e trocando o pasto pelo confinamento free-stall (baia livre), inventado na Califrnia, e o leite B pelo tipo A, comercializado com a marca Fazenda Bela Vista. A sala de ordenha, construda em ao inoxidvel, tem capacidade para 500 animais por hora. A ordenha toda mecanizada, sem qualquer contato manual, bem como todo o resto da linha de produo, at o envasamento feito na prpria fazenda, que tambm fabrica as embalagens.

1 a expanso do gado leiteiro

Maior produtor de leite do pasA ligao de produtores de leite do Sul de Minas Gerais com So Paulo, o principal mercado consumidor do pas, continua at hoje. Um exemplo Orostrato Olavo Barbosa, de Guaxup, que instalou na cidade vizinha de Tapiratiba, em territrio paulista, a sede da Fazenda So Jos, maior produtora de leite do Brasil.

O rebanho formado por 6.000 animais. A So Jos produz rao e tem laboratrio prprio. Foi pioneira no pas em contagem de clulas somticas do leite. Em 1990, montou um laboratrio de transferncia de embries, o que possibilita a reposio de animais e o aprimoramento gentico do rebanho. Ate 2005, eram realizadas cerca de 3.600 transferncias de embries. Atualmente, a fazenda importa embries dos Estados Unidos e realiza um programa de fertilizao in vitro, no qual os embries so transferidos para receptoras meio-sangue Simental/Nelore, multiplicando assim os melhores animais e fazendo o aprimoramento gentico.

A Fazenda So Jos tem cerca de 6.000 animais, ordenhados mecanicamente. Arquivo Fazenda Bela Vista

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Na Zona da Mata, a pecuria leiteira tambm se desenvolveu medida que a produo de caf entrava em decadncia. Curiosamente, o poeta Olavo Bilac, em crnica publicada em 1902, no jornal Gazeta de Notcias, do Rio de Janeiro, culpa o hbito de se tomar caf com leite pela crise da cafeicultura, alegando que a populao havia perdido o costume de tomar caf puro, o que teria reduzido seu consumo.2 3 4

1

Um baro dos trilhosA chegada da ferrovia Zona da Mata, em meados do sculo XIX, possibilitou o transporte do leite in natura para a capital federal, em lates de 50 litros. Isso prosseguiu at meados do sculo seguinte. Meireles (1983) revela que na dcada de 1950 a Cooperativa de So Joo Nepomuceno enviava sua produo para a CCPL, no Rio de Janeiro, em vago-tanque de 15 mil litros da Estrada de Ferro Leopoldina, mas esse tipo de transporte mais eficiente no chegou a ser usado em outras regies. Nos Estados Unidos, porm, era comum o uso de composies frigorficas especialmente fabricadas para o leite a primeira foi inaugurada em 1838. Os avanos observados na Europa e nos Estados Unidos demoravam a aportar em terras brasileiras. O primeiro trecho ferrovirio no pas s foi inaugurado no Rio de Janeiro em 1854, a partir de iniciativa do industrial Irineu Evangelista de Souza, o Baro de Mau. Denominada Estrada de Ferro de

Bilac chegou ao a bsurdo de pedir punio a quem insistisse em beb er caf com leite no Brasil, mas ningum levou a srio esse delrio do poeta.

Petrpolis, tinha apenas 14,5 km, entre a Estao Guia de Pacobaba, na praia de Estrela (no Porto de Mau), at Fragoso, localidade de Inhomirim, hoje municpio de Mag. Os poucos quilmetros foram percorridos pela locomotiva Baronesa, fabricada na cidade inglesa de Manchester, que levou Dom Pedro II na viagem inaugural. No dia seguinte, iniciou-se o transporte regular de passageiros, mas o de mercadorias demorou ainda sete meses para acontecer. Em 1881, Dom Pedro II viajou para a Zona da Mata mineira em trens da Leopoldina e da Companhia Unio Mineira. Almoou na casa do Baro de Cataguazes, escreveu em seu dirio que Juiz de Fora deveria arborizar sua bela avenida, passou por Serraria e percorreu mais 84 quilmetros at o arraial de So Joo de Nepomuceno.

1. Primeira a ser inaugurada no Brasil, em 1854, a Estrada

de Ferro de Petrpolis saa da Estao de Pacobaba (foto) e seguia para Fragoso, ambas no Rio de Janeiro.

2. O feito do Baro de Mau s subiu a Serra de

Petrpolis, entretanto, 30 anos mais tarde, quando foi instalada a estao na cidade. Arquivo CBTU

3. Trabalhadores na Estrada de Ferro de Petrpolis. 4. Locomotiva Baronesa

Arquivo CBTU

1 a expanso do gado leiteiro

1

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A estra da para subir parte da serra do Macuco tem 2 z iguezagues com plataformas. Tem 7 estae s pequenas porm bem construdas confor me a aparncia.Vista muito bela assim como mato vioso de Bicas para diante. Descobre-se amplo vale fechado por altas montanhas, e perto de S. Joo avista-se a alta serra do descoberto de contorno original.

em seu dirio, durante viagem de trem Zona da Mata mineira

Dom Pedro II

1. Dom Pedro II. Arquivo Biblioteca Nacional 2. Desenho das caractersticas de touro da raa

Holandesa. Arquivo Pblico de Santos Dumont (MG)

2

2

1 a expanso do gado leiteiro

Em meados da dcada de 1950, um levantamento da situao da bacia leiteira de Belo Horizonte mostrou que 94% do rebanho era constitudo por gado azebuado ou comum. Meio sculo depois, registrava-se evoluo significativa, conforme estudo da

A primeira rodoviaPersonagem da histria das estradas de ferro no Brasil, Dom Pedro II tambm foi quem inaugurou a primeira rodovia macadamizada do pas, em junho de 1861. O imperador percorreu toda a estrada de 144 quilmetros, entre Petrpolis e Juiz de Fora, viajando em diligncia puxada a cavalo. A histria da Estrada Unio Indstria comeou em 1854, quando o1

Federao da Agricultura de Minas Gerais: 62% do rebanho era formado, em 2004, por gado mestio, com predominncia de raas especializadas na produo de leite.

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Os nmeros ao longo de dcadasMas a situao em todo o estado revelava manuteno de estruturas inadequadas de produo, com o leite sendo extrado de rebanhos de corte, com a proliferao de pequenos produtores que consideravam o leite alternativa de sobrevivncia e de complementao da renda familiar. Assim, perpetuava-se uma conjuntura favorvel manuteno de baixa produtividade e sedimentao de atividade no tecnificada, at hoje disseminada por todo o estado, conforme atestam os pesquisadores Vidal Pedroso de Faria e Paulo do Carmo Martins.

engenheiro Mariano Procpio Ferreira Lage ganhou a concesso para

constru-la, em troca da cobrana de pedgio por 50 anos. Para arrecadar fundos, criou a Companhia Unio e Indstria e trouxe artfices alemes para ajudar na construo.

Os imigrantes e suas famlias foram morar na Colnia Dom Pedro II, nos o governo brasileiro incentivava a imigrao, prometendo terras para europeus empobrecidos pelas guerras napolenicas.

arredores de Santo Antnio do Paraibuna, atual Juiz de Fora. Desde 1840,

E assim, com o tempo, as rodovias tomaram o lugar dos trens no transporte de leite. O

uso de caminhes-tanque comeou provavelmente em 1955, quando a Cooperativa de um tanque de ao inox revestido com chapas de ferro, mas sem isolamento trmico, com capacidade para 17.500 litros. A ideia foi aperfeioada por algumas indstrias l de vidro por placas de isopor e, finalmente, por poliuretano.

Laticnios de So Jos dos Campos instalou, sobre um chassi Mercedes-Benz adaptado,

Apesar dos problemas provocados pela poltica governamental para o abastecimento das grandes cidades, como veremos mais adiante, a produo de leite brasileira cresceu 43% na dcada de 1960, chegando a 4,8 bilhes de litros anuais, enquanto a de Minas Gerais aumentava 157%, atingindo 2,4 bilhes, de acordo com pesquisas do IBGE. No obstante esse incremento acima da mdia nacional, a participao mineira nessa dcada recuou de quase 35% para 33,2% devido entrada mais forte de outras regies na atividade.

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produtoras de semirreboque, que substituram a cortia usada para o isolamento com

A Estrada Unio Indstria, construda pelo mineiro Mariano Procpio, ligava Petrpolis a Juiz de Fora (1). Ela foi percorrida por Dom Pedro II e famlia, passeio registrado pelo fotgrafo do Imprio Revert Klumb (2). Arquivo Mapro3. Transporte de leite em carroa, na regio da Mantiqueira.

Foto Ronaldo Guimares

1 a expanso do gado leiteiro

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Na dcada de 1970, tcnicas para aproveitamento do cerrado chegaram ao conhecimento dos fazendeiros, iniciando-se nova migrao da produo de leite e a ocupao da regio.

O aproveitamento do cerrado se deu muito em funo de polticas implantadas por Paulinelli, que ocupou o cargo de ministro no perodo de 1974/1979. Ele foi homenageado, em 2006, com o The World Food Prize (Prmio Mundial de Alimentao), por sua contribuio ao aproveitamento das extensas reas do cerrado brasileiro. So 297 milhes de hectares, o segundo maior bioma nacional, que, at a dcada de 1970, era improdutivo ou servia apenas para a criao extensiva de gado, cultivo de arroz, extrao de madeira e produo de carvo vegetal.

O cerrado como alternativaQuando o ento secretrio da Agricultura de Minas Gerais no governo Rondon Pacheco, Alysson Paulinelli, promoveu a desapropriao de 60 mil hectares de reas de cerrado na regio de So Gotardo, no Alto Paranaba, o proprietrio, Antnio Luciano Pereira Filho, mantinha no local apenas gado de corte, empregando seis pessoas para seu trato. Paulinelli implantou ali o Padap Programa de Assentamento Dirigido do Alto Paranaba, que garante hoje milhares de empregos. Segundo Martins, no possvel falar em tecnologia no cerrado sem citar Paulinelli. Foi na sua poca como ministro da Agricultura que a Embrapa (Empresa Brasleira de Pesquisa Agropecuria) e a Epamig (Empresa de Pesquisa Agropecuria de Minas Gerais) se desenvolveram e deram ao cerrado as vantagens de hoje.

Tendo iniciado o trabalho em 1971, como secretrio da Agricultura de Minas Gerais, Paulinelli foi bem alm quando no governo federal. Criou polticas para o setor, instituies e infraestrutura para estimular o desenvolvimento. Concentrou recursos considerveis nos projetos e atraiu financiamentos privados, nacionais e estrangeiros para as regies de cerrado. Promoveu, por exemplo, a instalao do Centro de Pesquisa Agropecuria dos Cerrados (CPAC) da Embrapa, responsvel pelo amadurecimento e avano de tecnologias para utilizao da rea. O cerrado se transformou nas dcadas seguintes, ganhando em aproveitamento e diversidade de produo.

Segundo dados da Embrapa, 42% do rebanho brasileiro esto no cerrado, que responsvel por 55% da produo de carne. Em Minas Gerais, um estudo da Faemg e do Sebrae, publicado em 2006, revelou que j em 2005 as regies de cerrado no Alto Paranaba e Tringulo lideravam a produo mineira de leite, com 24,7%, enquanto a Zona da Mata, que no passado ocupara a primeira posio, cara para apenas 9,9%. Entre as 12 mesorregies que compem o estado, a que abrange o Tringulo e o Alto Paranaba mantinha, em 2007, a maior produo de leite, com cerca de 1,8 bilho de litros. A segunda, Sul e Sudoeste, produziu 1,3 bilho no mesmo ano, ficando a Zona da Mata em terceiro lugar, com 762 milhes. No perodo de 1998 a 2008, as mesorregies que mais cresceram em volume de leite foram duas outras de cerrado, o Noroeste e o Norte de Minas.Continua na pgina 50

1. Monte Azul, na regio do cerrado, Norte do estado.

Foto Giselle Fagundes

2. O ex-ministro Alysson Paulinelli considerado um

dos principais articuladores do aproveitamento do cerrado no Brasil. Foi ele quem criou o Centro de Pesquisa Agropecuria do Cerrado, a Embrapa Cerrados, localizada em Planaltina, a 35 quilmetros de Braslia. Arquivo Embrapa Cerrados

1 a expanso do gado leiteiro

A Fazenda So Joo, situada em Inhama, a 85 quilmetros da capital mineira, em regio de cerrado, tem 1,2 mil hectares e produz em mdia 40 mil litros de leite por dia. banhada pelo Rio So Joo numa extenso de aproximadamente quatro quilmetros, tendo gua suficiente para irrigar 400 hectares e produzir milho e aveia para alimentao do rebanho.

Sonho realizadoA propriedade comeou a ser formada em 1994, depois que o empresrio Flavio Guarani resolveu produzir leite em escala comercial. Filho nico de Antnio Luiz Noronha Guarany que foi scioproprietrio do Banco Mercantil do Brasil e da Remil (Refrigerantes Minas Gerais), engarrafadora da Coca-Cola em Belo Horizonte , Flavio comeou a trabalhar muito cedo nas empresas do pai, mas sempre se interessou pela atividade rural.

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Quando resolveu trocar o lazer rural pela produo de leite em escala comercial, encontrou em Inhama a fazenda dos sonhos de Dona Huguette, sua mulher e scia, outra apaixonada pela vida no campo. A fazenda foi adquirida pela holding da famlia, a True Type, nome que designa, em ingls, um animal perfeito. Antes dos investimentos na rea, foi encomendado a especialistas o projeto detalhado da futura fazenda leiteira, que tem como meta produzir 80 mil litros por dia. Para isso, Huguette e Flvio apostaram no aperfeioamento gentico do rebanho. Com o projeto pronto, iniciou-se experincia pioneira no Brasil de se montar toda uma infraestrutura antes de trazer o primeiro animal para a fazenda. Foram cinco anos de trabalho, desde a preparao da terra para plantio at a construo de galpes, plataformas de ordenha e dois tanques de resfriamento de leite com capacidade para 20 mil litros cada, entre outras benfeitorias. Em janeiro de 2002, a Fazenda So Joo entrou em operao, com o nascimento da primeira bezerra no local. Seis meses depois, produzia 30 mil litros/dia, em mdia. Em 2009, o nmero de animais havia aumentado para 3.120, sendo 1.600 vacas em lactao. A cada ano, a reposio feita com cerca de 500 novilhas parindo.

O confinamento dos animais do tipo free-stall (baia livre). O setor de produo de leite conta com quatro galpes para 3.800 vacas e mais trs para 40 a 50 animais em cada. Todas as camas so repostas a cada quatro dias com areia nova. A taxa de ocupao de 80% a 90%. Para resfriar o ambiente nessa regio quente do cerrado mineiro, o sistema de asperso fica ligado por um minuto e desligado por cinco minutos, de maneira rotativa. acionado sempre que a temperatura ambiente fica acima de 19C, o que assegura conforto para as vacas Holandesas. O leite pesado individualmente em todas as trs ordenhas dirias, de 220 vacas por hora. A mdia de produo diria por animal de cerca de 28 litros. Na propriedade, so adotadas prticas de preservao ambiental, que garantem a qualidade da gua das nascentes. No permitido o despejo de qualquer tipo de dejeto nos mananciais da fazenda, que tambm emprega as mais avanadas tcnicas de plantio direto para conservar o solo e garantir a agricultura sustentvel.

o conforto das vacas da Fazenda so Joo, localizada em Inhama, garantido por sistemas de ventilao, resfriamento do ambiente e limpeza das reas. Arquivo True Type

1 a expanso do gado leiteiro

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O IBGE, na Pesquisa da Pecuria Municipal (PPM) de 2008, calculou a produo nacional em 27,5 bilhes de litros de leite, apontando um aumento de 5,5% em relao ao ano anterior, sendo que, de 1996 a 2006, se apurou um aumento de 19,5%. Apesar da produtividade ainda baixa e da qualidade deficiente, o os grandes produtores mundiais de leite no final do sculo XX. A

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aumento do rebanho possibilitou que o pas se posicionasse entre partir de 1970, em apenas 14 anos, a rea de pastagens do Brasil aumentou de 147 milhes de hectares para 179 milhes.

Os nmeros fazem do Brasil o q uinto maior produtor do mundo, atrs apen as dos Estados Unidos, ndia, China e Rssia.O consumo per capita, entretanto, baixo, de 146 litros/ano. Em Minas Gerais, a produo leiteira chegou, em 2008, a 7,6 bilhes de litros, ou 37% a mais que em 1998.

Avano nacional

O Censo Agropecurio de 2006 constatou mudanas

importantes nos nmeros. Contabilizou 5,2 milhes de estabelecimentos agropecurios, que ocupavam 36,7% do territrio nacional e tinham, como atividade mais comum, a criao de bovinos. Em relao ao Censo de 1995, a rea diminuiu em 23,7 milhes de hectares, ou Ambiental e demarcao de terras indgenas. Houve tambm reduo das reas de florestas nesses -6,7%, com a criao de novas Unidades de Conservao

estabelecimentos agropecurios (-11%) e de pastagens pastagens plantadas, sobretudo na regio Norte.

naturais (-6,6%), mas aumentou em quase 2% a rea de

No entanto, no perodo entre os dois censos, a rea de pastagens diminuiu cerca de de cabeas (em 2008, o nmero subiu para 202 milhes de bovinos, conforme a

3% no pas, embora o rebanho bovino tenha aumentado 11%, somando 169,9 milhes PPM), o que mostra avano na produtividade por hectare. Foram ocupadas novas aparecendo tambm na faixa ao longo do Rio Amazonas e de alguns afluentes importantes, do Norte do Par ao Norte do Acre.

De 2007 para 2008, cresceu tambm o

nmero de vacas ordenhadas no pas (2,3%

mais), sendo que Minas Gerais tem a maior parcela desse contingente, com 5,1 milhes de cabeas. O certo que a fronteira da pecuria de leite avanou no estado,

reas no Leste do Par, Noroeste do Maranho e Rondnia, com a pecuria bovina

repetindo o fenmeno que aconteceu em outras regies do pas, como resultado das novas tecnologias e da melhoria da

A concentrao da distribuio das terras permaneceu

praticamente inalterada: 43% da rea eram ocupados por estabelecimentos com mais de 1.000 hectares e 47% por estabelecimentos com menos de dez hectares. Entre os

infraestrutura que, embora ainda precria, por todo o territrio nacional.Censo Agropecurio de 2006 mostrou que as reas de pastagem diminuram, mas o rebanho cresceu. Foto Xar

foi suficiente para a expanso da atividade

proprietrios entrevistados pelo IBGE, mais de 80% tinham baixa escolaridade ou eram analfabetos. Isso, sem dvida, dificulta a apreenso de prticas voltadas para o aumento da produtividade.

1 a expanso do gado leiteiro

Com base no Censo Agropecurio 2006, a Fundao Getlio Vargas divulgou um estudo, em 2010, no qual afirma que os 3,3 milhes de produtores de leite enquadrados no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) representam 64,4% dos estabelecimentos rurais e geram 47,1% do valor do leite produzido no pas, contra 52,5% dos que no pertencem ao programa e que somam 1,6 milho de produtores. Esses nmeros demonstram que existe amplo espao de atuao para programas de capacitao de produtores e de gesto das propriedades, como os desenvolvidos no estado pelo Sebrae-MG e pela Faemg Educampo e Balde Cheio, respectivamente. Para o engenheiro agrnomo Roberto Simes, das entidades so importantssimos, mas o pas precisa tambm de uma profunda mudana de mentalidade em relao aos produtores rurais, tcnica do governo nem com financiamentos especficos. sobretudo em relao aos mdios, que no contam hoje com assistncia

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presidente da Faemg (2006/2011) e do Sebrae-MG (2007/2010), os programas

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Segundo a Pesquisa Pecuria Mu nicipal, o valor da produo do leite em 2008 foi de R $ 17,5 bilhes no Brasil e R$ 7,6 bilhes em Minas Gerais, estado que respondia, naquele ano, por 27,8% da produ o nacional.

So os mdios produtores que

levaram o Brasil a ser um grande afirma Simes, mas eles no so

produtor e exportador de alimentos, valorizados na cadeia produtiva e ainda sofrem discriminao, pois no recebem a ateno devida do governo, como os pequenos,

nem podem sobreviver como os e dos Estados Unidos recebem

grandes. Os agricultores da Europa 300 bilhes de dlares por ano de subsdio, enquanto os brasileiros, sem ajuda dos governos, fazem aAs propriedades de mdio porte sofrem com a falta de assistncia e de financiamentos especficos. Programas como o Educampo, implantado pelo Sebrae-MG, ajudam o produtor a ter mais conhecimento da gesto de sua fazenda. Foto Ronaldo Guimares

agricultura mais barata e mais farta do mundo inteiro, afirma Simes.

Entre abril e setembro ou outubro, todo o gado alimentado no

Est no sangueUm dos que atenderam ao apelo do governo pelo desenvolvimento do cerrado em Minas Gerais foi Jos lvares Filho, presidente da Faemg de 1969 a 1981. Ele pediu ao filho, o engenheiro civil Jacques Gontijo lvares, que o ajudasse a desenvolver a propriedade familiar de 1.500 hectares, no municpio de Bom Despacho, no CentroOeste do estado. Quando saram aqueles financiamentos do governo para aproveitamento do cerrado, j tnhamos comeado a mexer na fazenda, lembra o atual presidente da Itamb, contando que foram aproveitados 1.200 hectares com pastagens e capineiras, ficando o restante como reserva legal.Jacques Gontijo possui atualmente cerca de 200 hectares da fazenda, pois a maior parte foi dividida entre os demais herdeiros de Jos lvares Filho. Para produzir 3.500 litros de leite por dia, ele utiliza apenas 70 hectares, o que significa alta produtividade e elevada utilizao de tecnologia. Parte dessa rea formada por pastagens, e parte irrigada para produo de silagem. As demais reas so ocupadas por reflorestamento com eucalipto. Eu tenho uma produtividade boa por rea. um regime mais estabulado do que de pasto, diz.

estbulo, base de silagem e milho. No restante do ano, parte do gado fica no pasto. O sistema utilizado por Gontijo no o freestall: um sistema em que fao pistas de trfego. O animal tem uma rea para andar no pasto, mas come no cocho. Meu gado de meio sangue a 7/8 Holands.

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1 a expanso do gado leiteiro

Antes de ser eleito presidente da Itamb em 2007, Jacques Gontijo foi presidente da Cooperativa Agropecuria de Bom Despacho, da Comisso de Leite da Faemg e da Comisso de Pecuria de Leite da Confederao da Agricultura e Pecuria do Brasil (CNA), alm de coordenar a Cmara Temtica do Leite da Organizao das Cooperativas Brasileiras (OCB). Em 1993, passou a integrar a diretoria da Itamb, como vice-presidente Comercial.

Como a maioria dos produtores mineiros de leite, Gontijo vem de uma famlia de fazendeiros. O bisav materno, Altino Teodoro, era dono da Fazenda do Sap, tambm em Bom Despacho. A casa da sede, construda por volta de 1800, ainda existe, mas a grande gameleira que havia no meio do curral caiu. Quando essa casa foi erguida, a fazenda tinha cerca de 7 mil alqueires ou quase 17 mil hectares, mas certamente j era bem menor na poca de seu Altino, morto em meados da dcada de 1950. Ele falava que s comprava sal e querosene, conta o bisneto. O presidente da Itamb era menino, mas se lembra de algumas observaes de Altino, entre elas, uma arroba de boi vale 100 litros de leite e uma vaca vale o leite que ela d numa cria. No muito diferente de hoje em dia, observa Gontijo.

Jacques Gontijo, hoje presidente da Itamb, foi criado em ambiente de rica referncia rural. Arquivo Itamb

Arquivo Itamb

Arquivo Prefeitura de Santos Dumont (MG)

2Evoluo do mercado57

2 evoluo do mercado

1

Faltando dez anos para terminar o sculo XIX, a maior cidade brasileira, o Rio de Janeiro, tinha 522 mil moradores. Em 1940, j eram 990 mil. Em apenas 50 anos, de 1890 a 1940, o nmero de habitantes na capital paulista subiu de 65 mil para 1,32 milho, ultrapassando o da ento capital federal. Mais 30 anos, e So Paulo se aproximava dos 6 milhes de moradores, em 1970, e o Rio dos 4,26 milhes, um aumento bem acima dos 126% de crescimento da populao brasileira, que chegou a 93 milhes naquela poca. Nesse perodo, o percentual de moradores nas cidades saltou de 31% para 56% da populao brasileira.

O pas se urbanizou rapidamente, as grandes cidades incharam e seus problemas se multiplicaram, entre eles o do abastecimento, inclusive o de leite. A urbanizao vigorosa se refletiu no mercado de laticnios. Nos anos de 1950, a produo brasileira de leite cresceu 107%, chegando a 4,6 bilhes de litros em 1959.Para fazer frente ocupao urbana, aumentar a rentabilidade dos produtores e melhorar a distribuio do produto no pas, foram criadas

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Belo Horizonte no escapou dessa realidade. Inaugurada em 12 de dezembro de 1897, com cerca de 10 mil moradores, estava com 211 mil em 1940 e 1,2 milho em 1970. Os mineiros que moravam na zona rural somavam aproximadamente 5 milhes, contra 1,7 milho nas cidades, em 1940. Trinta anos depois, 6 milhes nas cidades e 5 milhes no campo.

cooperativas, individuais e centrais (de So Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paran e Gois). O grande impulso para isso ocorreu ainda na dcada2 3

de 1930, motivado pelo descontentamento dos produtores com o preo pago pelos laticnios.

1. O crescimento do Rio de Janeiro foi vertiginoso ainda na

primeira metade do sculo XX. Foto Luiz Pedro Gomes

2 e 3. A formao de cooperativas vinculadas a uma cooperativa

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central foi um passo muito importante no processo de distribuio do leite.Nas fotos, leite sendo coletado, ainda em lates, em cooperativa ligada CCPR. Arquivo Itamb

2 evoluo do mercado

No comeo do sculo XX, Francisco Andrade, morador de Belo Horizonte, foi autorizado pelo governo estadual a sair com suas vacas pelas ruas, vendendo de porta em porta o leite tirado na hora. Foi a forma encontrada por ele para que o fregus no se sentisse enganado, por temer gua adicionada ao produto, como se dizia ser hbito na poca.

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O comrcio de leite nas grandes cidadesEm 1910, entretanto, os habitantes da capital j podiam comprar leite pasteurizado, vendido pela Arthur Savassi Laticnios & Cia., fundada na Rua Gois, pelo empresrio Arthur Savassi. A empresa publicava anncios nos jornais garantindo que era a nica a distribuir leite2

Aos poucos, a Itamb, que comandava as vaquinhas, mudou esse hbito, lanando mo da confiana conquistada por seus entregadores, que distribuam o leite no comrcio, em garrafas de vidro, com alto custo para a empresa. O problema das garrafas foi resolvido quando a cooperativa adotou pioneiramente os sacos plsticos de um litro para embalar o leite. Reduzindo custos, foi possvel vender produto mais barato e aumentar o nmero de consumidores de leite tipo C.

pasteurizado e fazia isso numa carroa, puxada por dois cavalos.

Mais tarde, a venda nas ruas das grandes cidades passou a ser feita por pequenos caminhes. Em Belo Horizonte, eram apelidados de vaquinhas. At a dcada de 1970, podiam ser vistos nas ruas centrais. Chegavam apitando. Atrs do caminhozinho se1 3

formavam filas de pessoas que levavam suas prprias garrafas e leiteiras. Era produto pasteurizado, mas a dona de casa ainda fervia o leite.

Os carreteiros da CCPR/Itamb tinham as chaves das padarias e, todas as noites, envolvidos pela escurido e o silncio da madrugada, entravam, colocavam o leite nas geladeiras, pegavam o dinheiro em uma caixinha, fechavam a porta e iam embora. Naquela poca, o leite chegava mesa do consumidor em garrafas de vidro, o que tornava o processo de distribuio muito oneroso. As garrafas, distribudas nas primeiras horas do dia, eram recolhidas tarde. Portanto, havia o custo de distribuir e recolher as garrafas todos os dias. Somem-se a isso as perdas com as garrafas que quebravam e, ainda, o custo de lav-las, com dispndio elevado de energia, j que eram higienizadas por meio de vapor.Revista Laticnios, maio de 2009

1. No incio do sculo XX, o imigrante italiano Arthur Savassi

vendia leite pasteurizado nas ruas de Belo Horizonte. Ele tambm estava frente de padarias e uma cermica. Reproduo Livro Belo Horizonte & o Comrcio

2. As vaquinhas marcaram poca ao venderem leite

diretamente ao consumidor. Na foto, a vaquinha e alunos de escolas pblicas. Arquivo Itamb

3. Servio de entrega da Itamb ao comrcio

em Belo Horizonte. Arquivo Itamb

2 a evoluo do mercado

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A Cooperativa Central de Laticnios do Estado de So Paulo (CCL) foi a primeira das cooperativas centrais de produtores de leite a ser criada no pas, em 17 de setembro de 1933, durante assembleia que reuniu representantes de sete cooperativas. CCL se filiaram inclusive cooperativas mineiras.

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Unidos, fazendo histriaA primeira cooperativa de que se tem notcia foi criada na Inglaterra, em 1844, por um grupo de 28 teceles, em Manchester, cidade onde se iniciou a industrializao britnica. Era a Sociedade dos Probos Pioneiros de Rochdale, que lanou os princpios do cooperativismo no mundo.

O processo de organizaoPouco tempo antes, surgira em So Paulo a Federao dos Produtores de Leite, tambm a primeira do setor no pas. Para resolver o problema do abastecimento de leite na cidade do Rio de Janeiro, ainda capital da Repblica, o governo federal estimulou a criao da Cooperativa Central dos Produtores de Leite (CCPL). Comeou pela formao, em julho de 1940, da Comisso Executiva do Leite (CEL). Os cinco entrepostos existentes no Rio, sem recursos para ampliar o parque industrial, no conseguiam atender ao aumento do consumo dos cariocas e s necessidades de remunerao dos fornecedores. A primeira coisa que a CEL fez foi comprar todos eles e adquirir terreno para construir uma usina central, iniciando-se tambm a formao das cooperativas que mais tarde criariam a CCPL. Em 1946, o governo extinguiu a CEL e transferiu seu patrimnio para a recm-criada cooperativa central. Nessa poca, o Rio de Janeiro era abastecido por 69 usinas. Entre elas, 42 estavam localizadas em Minas Gerais e forneciam mais de 55% do leite consumido na capital federal. As cooperativas mineiras e fluminenses que abasteciam o Rio se filiaram, em sua maioria, CCPL. Em Minas Gerais, o surgimento, em 1948, da Cooperativa Central dos Produtores de Leite Ltda. (CCPL, como a sigla do Rio de Janeiro, mudada mais tarde), recebeu impulso inicial do governo do estado. A capital tinha 295 mil moradores e enfrentava problemas, apesar de a Secretaria da Agricultura ter criado em 1944 uma estatal que construiu a Usina Central de Leite para garantir o abastecimento local.

No Brasil, a primeira cooperativa foi criada no Paran, por um grupo de colonos europeus, sob a liderana do mdico francs Jean Maurice Faivre. No setor agropecurio, Minas Gerais saiu frente. O presidente do estado, Joo Pinheiro, estabeleceu em 1907 o programa agrcola que priorizava a constituio de cooperativas para reduzir a intermediao nas transaes comerciais, sobretudo de caf.

Naquele ano, foi aprovada a primeira legislao brasileira sobre sociedades cooperativas. Estipulava em 30 anos a vida mxima de qualquer cooperativa e adotava o voto democrtico nas assembleias: cada scio teria direito a um nico voto, independentemente de quantas cotas possusse, e no poderia votar em nome de outro scio. Essa lei permitia a associao das cooperativas em centrais ou federaes. Ela foi alterada em 1932, e a nova legislao acabou com o limite de durao das cooperativas. Em 1966, o governo criou por decreto-lei o Conselho Nacional de Cooperativismo (CNC).

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No comeo do sculo XX, Joo Pinheiro, presidente de Minas Gerais, implantou um programa agrcola que tinha a formao de cooperativas como propsito. Arquivo Pblico Mineiro

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Dentro de algum tempo, o prdio da Rua Itamb, nmero 40, ser apenas um retrato na parede. Foi construdo para abrigar uma indstria e adaptado na dcada de 1970 para servir de sede administrativa. Recentemente, foi condenado pelos bombeiros, pois no tem sada de emergncia, as escadas so estreitas, h pavimentos com p direito de cinco metros, entre outros problemas de segurana. A sada encontrada foi erguer uma nova sede, na rea ao lado, at ento destinada a estacionamento.2 3

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Da CCPL Itamb

A obra j foi iniciada. O projeto prev a construo de um prdio de cinco pavimentos, com rea eq uivalente da sede atual, que ser transferida para ele. Depois, o velho prdio ser demolido e no lugar ser erguido um novo, que pod er servir prpria Itamb.churrasco oferecido por ele a produtores na Fazenda Mata Grande. Com o empurro de Giannetti, 65 produtores se reuniram para constituir a Cooperativa Regional de Produtores Rurais de Sete Lagoas (Coopersete). Ms depois da reunio de Giannetti com os produtores, nascia, em 10 de novembro de 1948, a Cooperativa Central dos Produtores de Leite Ltda. (CCPL), formada pela Coopersete e pelas cooperativas de Par de Minas, Pedro Leopoldo, Itana, Matozinhos e Esmeraldas, alm de cinco produtores individuais: Armindo Caixeta, Jos Alvarenga Costa, Sebastio Fernandes, Manoel da Fonseca Viana e Vitor de Freitas Figueira. Seu primeiro presidente foi Alcides Teixeira Frana, associado da Coopersete. Para se diferenciar da central carioca, a CCPL mudou seu nome, em 1956, para Cooperativa Central dos Produtores Rurais Ltda. (CCPR). Entretanto, ficou mais conhecida por Itamb, marca por ela lanada em 1950 para comercializao do leite e subprodutos. O nome, que em tupi significa pedra afiada, ficou to forte que se tornou tambm o nome de fantasia da cooperativa central. Itamb tambm nome do monumento natural localizado no Parque Estadual Pico do Itamb, entre Serro e Santo Antnio do Itamb, municpios famosos por seus queijos artesanais.

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A capacidade instalada da Usina Central de Leite era de 60 mil litros, mas s distribua a metade, por falta de fornecedores, pois os produtores sofriam com os baixos preos pagos pelo produto e ainda recebiam com atraso. No final da dcada de 1940, Belo Horizonte produzia apenas 900 litros de leite por dia, e a usina precisava buscar sua matria-prima nos municpios vizinhos e at em outros mais distantes, como Carmo do Cajuru, a mais de 120 quilmetros, que fornecia 4.500 litros por dia, transportados em lates, por ferrovia. O secretrio estadual da Agricultura era Amrico Renn Giannetti, que se elegeria prefeito de Belo Horizonte em 1950, ficando no cargo por quatro anos, perodo em que o ex-prefeito Juscelino Kubitschek governava Minas Gerais. Empresrio e poltico habilidoso, Giannetti reuniu, em 1948, no Parque Municipal, que hoje tem seu nome, um grupo de produtores de leite, para propor que organizassem cooperativas e fundassem uma cooperativa central, para que esta assumisse a Usina Central de Leite e a distribuio na cidade. Em Sete Lagoas, a 60 quilmetros da capital, a ideia de criar cooperativas fora lanada dois anos antes, em 1946, pelo jovem lder ruralista Joo Raimundo Dutra Reis, durante1. Na dcada de 1970, a bacia leiteira de atuao da CCPR.

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2. Nascida em 1948, a Cooperativa Central viveu

momentos difceis, mas criou estrutura e se consolidou como empreendimento de sucesso ao longo das dcadas. Arquivo Itamb

3. Amrico Renn Giannetti lanou a semente da

Cooperativa Central, quando secretrio estadual de Agricultura, no final dos anos 40. Arquivo Fiemg

Revista Realidade Rural n35

4. A constituio da CCPR foi um marco para os

produtores mineiros. Revista Realidade Rural n70

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pouco depois de sua criao, o governo estadual arrendou para a CCpr a Usina Central de Leite. nos anos seguintes, a cooperativa central enfrentou muitos desafios, gerados sobretudo pelas intervenes do governo federal no setor. em 1967, Jos pereira Campos Filho, o doutor pereira, assumiu a presidncia da cooperativa central, aos 32 anos de idade, sete anos aps se formar em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

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Um homem e quatro dcadas

2

Doutor Pereira era p residente da Cooperativa de Par de Minas e a cumulou os dois cargos durante um ano e m eio.A CCPR se encontrava em situao de grande fragilidade financeira. Quando deixou o cargo 40 anos depois, ela era exemplo de sucesso no cooperativismo brasileiro. Em 2005, a Itamb recebeu o prmio Primeira Empresa no Setor de Laticnios do Brasil, resultado de anlise realizada pela revista Globo Rural, que seleciona anualmente as 500 maiores empresas do pas no setor de agronegcios. No comeo de sua gesto, doutor Pereira subia algumas vezes, s duas horas da madrugada, na boleia de um caminho de entrega de leite, para ver de perto como era feita a distribuio para as padarias de Belo Horizonte. Logo no primeiro ano, ele introduziu os sacos plsticos para substituir os vidros, revolucionando a embalagem do leite fluido no Brasil. Conseguiu reduzir estoques de leite em p, vendendo-o em embalagens plsticas de 250 gramas, visando s classes C e D, dcadas antes de se tornarem alvo do marketing das grandes indstrias brasileiras.3

1

3. A Cooperativa Agropecuria de Arax (Capal) foi 1 e 2. Construda na Floresta, a antiga Usina Central do

Leite se transformou na Cooperativa Central dos produtores rurais, que usou a marca Itamb para se projetar e ganhar o mercado. Arquivo Itamb

fundada em 1958 e hoje uma das filiadas CCPR. A entidade, com estrutura privilegiada, atua tambm com caf e outros gros. Possui ainda uma fbrica de rao, que d suporte a atividade leiteira dos seus cerca de 1200 cooperados. Arquivo Itamb

2 evoluo do mercado

1

2

Dr. Pereira dizia que a cooperativa tem de ser competente na venda do leite do cooperado, procurando obter o maior valor possvel e dando lucro. Sua estratgia deu to certo que, quatro anos aps assumir a presidncia, a Itamb pde isentar os cooperados do pagamento da taxa de 3% do valor do leite, recurso que era destinado formao de capital para investimentos. O ento presidente da Itamb se preocupava tambm em oferecer servios aos cooperados. Investiu na rede de armazns, para preencher um vazio na venda de insumos no interior de Minas Gerais e Gois. A rede conta hoje com 24 lojas, que vendem aos cooperados cerca de 5 mil itens de produtos agropecurios. a maior rede do gnero no pas. Em sua gesto, a Itamb se tornou pioneira na produo de raes expandidas e peletizadas e lder em vendas no mercado mineiro. Em vrios momentos da histria, doutor Pereira assumiu a liderana do setor. Um exemplo muito citado a carta que escreveu ao presidente Costa e Silva, em 1967, denunciando a difcil situao em que as cooperativas e os produtores de leite se encontravam, em razo da poltica governamental. Defendeu que as taxaes impostas aos produtores nacionais equivaliam a um subsdio dado aos produtos lcteos importados pelo Brasil. A pesada carga tributria incidente sobre o leite in natura aniquila a atividade do pecuarista, mormente agora com a instituio do imposto sobre circulao de mercadorias, escreveu.

Sua liderana ultrapassou as divisas de Minas Gerais, ao presidir a Organizao das Cooperativas Brasileiras e a Confederao Brasileira das Cooperativas de Laticnios.Ele tambm percebeu a movimentao da pecuria leiteira para o cerrado e direcionou a Itamb para a rea. Foi pioneiro ao se deslocar da regio central primeiro para o Tringulo, depois para Gois, construindo ali novas fbricas. Em 2006, foram inauguradas as de Uberlndia e Goinia, que exigiram investimentos de R$ 270 milhes.

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1. Ao longo de 40 anos, doutor Pereira presidiu a Itamb.

Arquivo Itamb

3

2. Ao abandonar o processo de envase do leite em

garrafas de vidro, implantando o saco plstico como embalagem, a Itamb aumentou sua capacidade de distribuio do produto. Arquivo Itamb

3. Itamb, uma marca que se consolidou com

a unio das cooperativas e com o smbolo da vaquinha. Revista Realidade Rural

2

Na dcada de 1960, o carioca Haroldo Antnio Antunes e o alemo Herbert Schmidt se juntaram para participar de um negcio que nasceu quase do acaso. Tentaram negociar, para uma empresa produtora de leite em p, a aquisio do Laticnios Lagoa da Prata, localizado na cidade de mesmo nome, no Oeste mineiro. Por fora de divergncias na empresa que representavam, os dois acabaram comprando o laticnio em prprio nome, formando ento a sociedade que ainda perdura.

Do peque no Laticnios Lagoa da Prata gigante Embar1

Cooperativas e laticnios em nmerosAo contrrio da Itamb, muitas cooperativas centrais no entenderam a situao criada pela abertura do mercado em 1991 e, como muitos laticnios, fecharam as portas ou entraram em srias dificuldades. Entretanto, as cooperativas agropecurias ainda so fundamentais no cenrio da produo agrcola e pecuria do estado. Em 2009, representaram cerca de 10,67% do PIB do agronegcio mineiro, sendo o leite e o caf responsveis por cerca de 43,7% e 44,7% da produo estadual. Dados de 2010 mostram que 101 cooperativas de leite in natura e 46 cooperativas de laticnios possuem registro na Organizao das Cooperativas do Estado de Minas Gerais (Ocemg). No Instituto Mineiro de Agropecuria (IMA), rgo responsvel pela inspeo e fiscalizao sanitria oficial do estado, foram listadas 68 usinas de beneficiamento de leite e 131 fbricas de laticnios.

Sob o comando de Haroldo e Herbert, o Laticnios Lagoa da Prata reforou suas vendas para o Norte e Nordeste do pas, especialmente da marca Camponesa, e exibiu resultados que mostrariam um futuro promissor. A empresa foi, por exemplo, pioneira na produo de leite em p embalado em sacos plsticos. Em 1963, os dois scios foram a Taubat, no interior paulista, adquirir o controle acionrio da Produtos Laticnios Embar S.A. (hoje Embar Indstrias Alimentcias S.A.), dando novo rumo a uma empresa que tinha dcadas de existncia e havia sido criada com o nome de Inglez de Souza Filho & Cia Ltda. Fundada em 1935, na Granja Embar, na zona rural de Taubat, a Inglez de Souza vendia seus produtos (doces, geleias, sopas e derivados de tomate) para So Paulo e Rio de Janeiro. Em 1947, comprou equipamentos modernos e importados para fabricao de caramelos, criou esta nova linha de produo, agora na regio urbana de Taubat, adotou o nome de Embar e desativou a antiga fbrica.

A Embar se despediu de Taubat em 1969, quando a unidade industrial foi transferida para Lagoa da Prata. Conquistou, nas dcadas seguintes, posio de destaque no cenrio nacional, com a produo de doces, caramelos, manteiga e leite em p. A empresa exporta seus produtos para vrios pases. A moderna fbrica, instalada em terreno de mais de 35 mil metros quadrados, trabalha com matria-prima vinda de postos de resfriamento de leite em Divinpolis, Dores do Indai e Bambu (Oeste), Arax, Sacramento e Santa Juliana (Tringulo Mineiro) e Coromandel (Alto Paranaba), captando cerca de 300 mil litros de leite por dia. A empresa emprega mais de mil funcionrios e tem filiais comerciais em Belo Horizonte, So Paulo, Rio de Janeiro e Recife.

Continua na pgina 721. Ronaldo Scucato, presidente da Ocemg desde 2001.

Entidade rene 46 das 101 cooperativas de leite in natura de Minas Gerais. Arquivo Ocemg

2. Rtulos antigos usados pela Embar. Arquivo Embar

2 a evoluo do mercado

Continuao da pgina 70

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Sob controle. De Vargas a CollorO setor leiteiro enfrentou no controle de preos pelo governo uma verdadeira pedreira, formada por nmeros, clculos e tabelas, que emperrou por quase meio sculo o seu desenvolvimento, algo inesquecvel para produtores e para a indstria.

Por longo tempoEssa regulao foi bem recebida por consumidores e, inadvertidamente, pelos representantes dos produtores de leite. O fim do governo Vargas no impediu que a Coordenao da Mobilizao Econmica continuasse, como rgo responsvel por essa poltica na poca, alterando os preos do leite de 1946 a 1949.

A interveno do governo comeou quando a ditadura do Estado Novo chegava ao fim. Getlio Vargas, que a propaganda oficial apresentava como o pai dos pobres, renunciou em 29 de novembro de 1945, pressionado por polticos e militares. No comeo de abril daquele mesmo ano, entrara em vigor a Resoluo n 102, que fixava preos para o leite in natura. Vargas caiu oito meses depois, mas a interveno estatal no setor leiteiro permaneceu at 1991, quando o presidente Fernando Collor de Mello acabou com a regulao sobre o leite. A resoluo n 102, do Servio de Abastecimento, tinha uma tabela de preos vlida apenas para a capital da Repblica. O preo do litro de leite pago ao produtor subiu de 70 centavos para 90 centavos de cruzeiro, equivalente a 60% do valor pago pelo consumidor. O aumento foi justificado por Jos Milliet, membro da Comisso Consultiva do Servio de Abastecimento. Ele reconheceu que o produtor recebia preo insuficiente para cobrir os custos da produo e criticou a plena liberdade concedida indstria, que, segundo ele, podia vender seus produtos pelo maior preo possvel, causando desequilbrio entre a produo agropecuria e a industrial. Milliet afirmou ainda que a produo de leite, por causa do preo, estava desestimulada, pois o boi de corte solto no campo, criado sem qualquer trabalho, valia muito mais. Alegou que o governo gostaria de dar reajuste maior para o produtor de leite, para estimular mais a produo, mas, por outro lado, teria de servir a uma populao assoberbada pelo encarecimento dos gneros de primeira necessidade e que j no suportava qualquer aumento de preos.

Nos anos 50, o primeiro reajuste ocorreu em 1952, um ano depois de Getlio Vargas voltar ao poder.Em janeiro, foi baixada portaria estabelecendo o preo mnimo a ser pago ao produtor das zonas geoeconmicas que abasteciam as capitais de So Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. O produtor recebia mais pelo leite entregue na plataforma da usina ou dos postos de refrigerao do interior.

O controle do preo do leite foi proposto no fim do primeiro governo de Getlio Vargas (1930 a 1945). Ele voltou a governar o pas de 1951 a 1954. Arquivo FGV

2 a evoluo do mercado

2

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Variao de preoDesde 1957, segundo ano do governo Juscelino Kubitschek, o preo pago ao produtor correspondia a 60% do preo final, ficando a margem de intermediao em 40%. A maior preocupao do governo, por razes polticas, era manter o preo final pago pelo consumidor relativamente baixo.

Para isso, ora achatava o preo do produtor, ora a margem de intermediao.1

Bacia leiteiraDois meses antes de Jnio renunciar presidncia da Repblica, foi assinada portaria aumentando o controle para o leite destinado industrializao nas regies fornecedoras das capitais. Em dezembro de 1963, quase 12 meses aps a volta do presidencialismo, o governo de Joo Goulart publicou outra resoluo definindo como bacia leiteira, em Minas Gerais, as zonas da Mata, Metalrgica, Campos de Mantiqueira Mineira, Sul, Rio Doce e Oeste. Foram includos na bacia leiteira dois municpios do Alto So Francisco (Corinto e Curvelo) e quatro do Alto Jequitinhonha (Monjolos, Diamantina, Gouveia e Serro). Essa classificao foi mudada em 1966. A bacia leiteira no Brasil passou a ser os estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro, So Paulo, Esprito Santo, Gois, Paran, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. O regime militar j havia deixado, em novembro de 1964, de fixar preo para leite de indstria e acabara com a tabela de preos de venda dos derivados. O leite em p e demais subprodutos e derivados do leite foram includos no regime do tabelamento. Outra portaria, no incio do governo do presidente Emlio Garrastazu Mdici, em 1969, voltou com o regime de preo de leite-quota e de leiteexcesso. Com isso, o governo esperava conseguir maior regularidade na produo, desvalorizando gradativamente o preo de leite-excesso. Com tantas mudanas na dcada de 1960, a margem de intermediao diminuiu. Na cidade de So Paulo, por exemplo, a margem do produtor variou de 61% a 68% nos primeiros cinco anos da dcada. Nos quatro anos seguintes, a margem aumentou para 72% e caiu at 68%, em 1969.

Em 1959, fez as duas coisas. Em seu ltimo ano no governo, JK estabeleceu que o produtor receberia pelo leite fornecido indstria preo mnimo correspondente a 77% do preo do leite de consumo. Esse percentual foi aumentado para 80% em 1961, por Jnio Quadros. Dois anos depois, com Joo Goulart na presidncia da Repblica, essa poltica foi abandonada, e o preo passou a ser igual para indstria e consumo.

1. Juscelino Kubitschek assumiu a presidncia em 1955. Fez

muitas mudanas no pas, mas manteve o controle dos preos do leite. Foto Mario Fontenelle/Arquivo Pblico Distrito Federal

2. Cidade do Serro, que foi includa no mapa da bacia leiteira de

Minas Gerais durante o governo Joo Goulart. Arquivo Setur

A empresa foi fundada em 1867, na Sua, pelo farmacutico Henri Nestl, inventor da farinha lctea, mas apenas sete anos depois ele a vendeu, por cerca de 1 milho de francos, e foi ser empresrio de hotelaria e turismo. Em 1905, a Nestl se juntou Anglo Swiss Condensed Milk, que se tornou, com o tempo, empregadora de aproximadamente 265 mil pessoas em quase todos os pases do mundo, sob o controle da holding sua Nestl Alimentana. O grupo iniciou suas atividades no Brasil em 1921 e, por muito tempo, no teve aqui concorrente multinacional na rea de produtos lcteos. Ainda em 1921, a Nestl inaugurou sua primeira fbrica brasileira, em Araras (SP). A segunda s surgiu em 1937, em Barra Mansa (RJ).

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O Brasil conquista a Nestl1

Importao permitidaO achatamento de suas margens de preo trouxe graves distores para os laticnios, mas a produo aumentou e o governo no teve que recorrer importao e reidratao de leite para a regularizao do abastecimento. No entanto, permitiu que grandes empresas privadas importassem leite, para aumentar seus lucros. Os produtores, apesar dos percalos, faziam de tudo para continuarem na atividade. Durante a dcada de 1960, as empresas de laticnios concentravam suas operaes em seus mercados regionais, excetuandose as multinacionais estruturadas para atingir os melhores mercados brasileiros, como a Nestl.Continua na pgina 78

Em 1953, a Nestl comeou a diversificar sua produo, com o Nescaf, primeiro produto fora da linha de lcteos. Cinco anos depois, inaugurou fbrica de leite em p em Trs Coraes, no Sul de Minas. Era a maior da Amrica Latina. Na dcada de 1960, o nmero de fbricas no Brasil subira para cinco, sendo trs em Minas Gerais as outras duas em Ibi, inaugurada em 1964, e Ituiutaba, em 1966. Foi no incio da dcada de 1960 que chegou a primeira concorrente multinacional da Nestl: a Fleischmann Royal; depois, em 1968, a Yakult S.A. Mas essa concorrncia no atrapalhou os planos da Nestl no pas. Em 1983, inaugurou a fbrica de Montes Claros, atualmente a maior do mundo. Sete anos depois, a de Tefilo Otoni iniciou suas atividades. E passou a engarrafar gua mineral em So Loureno, de fonte vendida pelo governo de Minas Gerais. No comeo do novo sculo, a Nestl formou uma joint venture com a Fonterra, cooperativa da Nova Zelndia e maior exportadora de lcteos do mundo. a DPA (Dairy Partners America), em que cada scia tem 50% de participao no capital. A nova empresa comeou a operar em janeiro de 2003, com uma fbrica na Argentina, uma na Venezuela e sete no Brasil, estendendo-se depois para outros pases do continente americano. Antes, a Nestl j havia feito aliana com a General Mills, na rea de cereais, e com a Coca-Cola, na de bebidas. Agora atua tambm no segmento de leite longa vida premium, com as marcas Ninho e Molico. Em maro de 2010, o presidente da Nestl, Ivan Zurita, informou ao governo de Minas Gerais que seriam investidos mais R$ 525 milhes no estado, at 2015. Dos 2,3 bilhes de litros de leite que a empresa processava no Brasil, 800 milhes (34,7%) eram captados em Minas Gerais. A filial mineira representa 16% da operao da Nestl no Brasil e, com os novos investimentos, vai superar os 20%. O Brasil hoje o segundo pas em volume e faturamento da Nestl no mundo, atrs apenas dos Estados Unidos. H dez anos, o Brasil era o nono no ranking da empresa. O salto se deu com a entrada no mercado de produtos lcteos das classes C e D, que j representavam 82% dos R$16 bilhes faturados pela Nestl no Brasil em 2009.

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1. Caminho de leite em p, usado pela assistncia social da prefeitura

de Belo Horizonte, em 1957. Arquivo Pblico de Belo Horizonte

2. A primeira fbrica dos produtos Aviao foi criada em Passos (foto),

no Sul de Minas Gerais, na dcada de 1920. Hoje est instalada em So Sebastio do Paraso, e sua principal produo continua sendo a manteiga da latinha. Arquivo Aviao

3. A Nestl chegou ao Brasil em 1921. A empresa lanou produtos

voltados para as classes C e D, usando como apelo em suas propagandas a economia usufruda pelos consumidores. Livro Belo Horizonte e o Comrcio/Fundao Joo Pinheiro

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O produtor de leite viu o preo do produto cair ainda mais aps maio de 1970, pois o custo de transporte no chamado segundo percurso, entre a usina e o entreposto ou a indstria, passou a ser deduzido do preo mnimo tabelado. O Sul de Minas Gerais e outras regies demoraram a reagir baixa de preos, mas a produo de leite em So Paulo tambm vinha caindo, causando srios problemas no abastecimento.Continuao da pgina 76

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Dana de cadeiras na AgriculturaPara tentar resolver o problema, a Cooperativa Central dos Produtores de Laticnios do Estado de So Paulo ampliou sua atuao em Minas Gerais. Foram admitidas 15 novas cooperativas no quadro de scias nessa dcada. A primeira, em agosto de 1970, foi a Cooperativa Agropecuria de Jacutinga, no Sul de Minas Gerais, aps oito anos de funcionamento independente. Quando em maro de 1974, Alysson Paulinelli foi nomeado ministro da

Agricultura pelo presidente Ernesto Geisel em quase 30 anos, nada menos que 35 pessoas haviam ocupado o cargo, mas ele permaneceu ministro por cinco anos , o preo do leite ao produtor subiu 59%, contra a inflao de Mas essa recuperao no se manteve constante nos anos seguintes. 31% medida pelo ndice Geral de Preos (IGP) da Fundao Getlio Vargas.

Pouco depois de sua posse, o ministro divulgou as Diretrizes para a Pecuria Bovina de Leite, que esclareciam: A poltica de preos do governo no visa to-somente manter a renda real do setor, mas tambm proporcionar os

estmulos necessrios para que o verdadeiro produtor de leite melhore a sua produtividade e mantenha um fluxo regular de leite enviado para as usinas durante o ano todo. No entanto, faltaram recursos para implementar as

diretrizes. De acordo com Meireles (1983), Paulinelli analisou adequadamente o setor, mas esbarrou no excesso de centralizao de poder decisrio nos outros interesses. ministrios da rea econmica, que sacrificaram a poltica de leite em prol de

Na dcada de 1970, as cooperativas enfrentaram as dificuldades da variao dos preos realizando investimentos e ampliando o espao de atuao. Revista Realidade Rural

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Produzida com gorduras vegetais misturadas ao leite desnatado, ao sal e a emulsionantes, a margarina foi inventada na Frana pelo qumico Hippolyte Mge-Mouris. Ele venceu o concurso lanado, em 1866, pelo imperador Napoleo III, para estimular a inveno de uma gordura sadia, econmica e de boa conservao, a ser fornecida ao exrcito francs e marinha.

Salto nas importaesPara contornar o problema da escassez de leite, foi institudo, em outubro de 1974, subsdio para o transporte do produto do interior para as capitais. Dez meses depois, o subsdio foi alterado, passando a ser dado usina desde que o leite fosse distribudo in natura nas regies metropolitanas. Isso provocou reduo do capital de giro das empresas que vendiam vista a maior parte do leite in natura, agravando o problema da pequena margem de comercializao.

Apareceu a margarinaO invento foi comprado, em 1871, por uma empresa holandesa fabricante de manteiga, que passou a vender margarina pela metade do preo de seu produto tradicional. Em 1895, a produo atingiu a marca de 300 mil toneladas, ou 10% do mercado da manteiga. A firma foi um dos pilares para a fundao da Unilever, que lidera esse mercado na Europa e nos Estados Unidos.

Outra medida de Paulinelli foi reduzir, em junho de 1974, o teor de gordura do leite C, de 3% para 2%. A gordura assim obtida seria usada na reidratao do leite em p. Naquele ano, o Brasil importou 14.261 toneladas de leite em p; o nmero aumentou para 18.241 no ano seguinte; e pulou para 55 mil em 1977. Esse salto nas importaes foi provocado por acordos firmados na Alalc (Associao LatinoAmericana de Livre Comrcio) e resultou, em 1978, em elevados estoques de manteiga, leite em p e queijo, agravados pelo crescimento da produo brasileira. O foco do governo era o abastecimento. Ele prprio se tornara grande comprador de leite em p para atender aos programas assistenciais. Desse modo, tambm como comprador, o governo passou a ter grande influncia no mercado. Entre as consequncias da interveno estatal, destacam-se a falta de crescimento vertical da produo de leite e o enfraquecimento ou desaparecimento de empresas nacionais no setor de laticnios. Sem condies para crescer verticalmente, por meio de investimentos para aumentar a produtividade, registrou-se forte expanso horizontal das bacias leiteiras (com o aproveitamento de outras regies), aumentando as despesas de transporte a grandes distncias. Para reduzir custos, algumas cooperativas passaram por processos de fuso.

Em 2007, a Unilever fechou acordo com a Perdigo para aumentar sua fatia no mercado brasileiro, estimado em 330 mil toneladas anuais. Somente no sculo atual fabricantes de margarina se animaram a construir unidades em Minas Gerais para concorrer com os produtores mineiros de manteiga. Em junho de 2006, a Sadia, que entrou nesse segmento em 1991, inaugurou em Uberlndia a primeira dessas fbricas, com capacidade para produzir 4.500 toneladas por ms de margarinas das marcas Qualy, Deline e Bom Sabor. Antes, ela j havia montado fbrica em Paranagu, no estado do Paran. Em 2009, a Sa