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LITERATURA AFRICANA: CONVERGÊNCIAS E DIVERGÊNCIAS
TEMÁTICAS DA POESIA AFRICANA DE LÍNGUA PORTUGUESA
Josenilton Silva Cavalcante Júnior¹ Adilza Ker-Leem Correia Gomes¹ Aluska Silva Carvalho¹
Universidade Federal de Campina Grande
[email protected]; [email protected]; [email protected]
Resumo: A literatura africana de língua portuguesa vem ganhando notoriedade depois de muitos anos de luta
e de um processo que buscava mostrar a cultura e a história dos negros no ensino nas escolas. Uma grande
conquista foi caracterizada como marco fundamental na trajetória das lutas antirracismo e pela
democratização do ensino, a aprovação da lei 10.639/2003 que completou 13 anos em 2016. Nosso trabalho
nasce, então, a partir de leituras realizadas na disciplina literaturas africanas de língua portuguesa e
pretende mostrar as diferentes temáticas abordadas por poetas africanos de diferentes países presentes no
livro Poesia Africana de Língua Portuguesa (Antologia) organizado por Apa, Barbeiro e Dáskalos (2012).
Sendo assim, observaremos quais temas predominam nos poemas dos poetas de Angola, Moçambique, São
Tomé e Príncipe e Cabo Verde, e mostraremos a sua relevância no cenário da literatura, tanto para uma
melhor apreensão e conscientização dos alunos em relação à história e à cultura negra, quanto para os
professores um aprimoramento histórico olvidado por muitos anos na literatura brasileira. Sabendo que o
ensino de poesia é de extrema importância e pode trazer benefícios como o prazer pela leitura, a reflexão, a
criatividade e, nesse caso, aproximação entre a história e cultura africanas, também apresentaremos uma
sequência didática de ensino dos poemas, que servirá de sugestão para o trabalho destes em sala de aula. Para
esta pesquisa, nos fundamentaremos nos trabalhos de Caetano (2007), Oliveira (2009), Santos (2009), Martin
e Moraes (2011), dentre outros.
Palavras-chave: Literatura africana, Poesia africana de língua portuguesa, Ensino.
INTRODUÇÃO
Nos últimos anos, a escola tem mais contato com a literatura, história e cultura africanas,
seja em âmbitos escolas e/ou acadêmicos e nos meios de comunicação. Esse crescimento deu-se
graças à Negritude, movimento, a lei brasileira, a luta e a resistência que tinha por objetivo fazer
com que a voz dos negros fosse ouvida, para que víssemos suas histórias e costumes sob outra
perspectiva que não a dos europeus, que muito escreviam sobre eles, mas sob uma ótica
colonizadora. A literatura é um dos meios que colaboraram com o movimento trazendo de forma
singular, a reflexão e descrição dos fatos ocorridos historicamente, de forma literal ou figurada.
O livro Poesia Africana de Língua Portuguesa (Antologia) organizado por Apa, Barbeiro e
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Dáskalos (2012) é um dos mais variados livros que possui os objetivos visados pela Negritude.
Esta antalogia de poemas está organizada em seções nomeadas com os países africanos de
Língua Portuguesa de onde vieram os poemas e poetas: Angola, Moçambique, Cabo Verde e São
Tomé e Príncipe. A partir da leitura da obra, temos como finalidade neste trabalho analisar os
poemas apresentados considerando a convergência e a divergência temática entre eles.
Além do movimento, anos depois, outra conquista que também pode ser considerada como
resultado dos movimentos de Negritude foi a aprovação da Lei 10. 639/03, que torna determinado o
ensino da história e cultura africana nas escolas brasileiras. Por isso, também objetivamos trazer ao
final do trabalho sugestões de aulas que envolvam alguns poemas, tendo em vista propiciar maior
aproximação dos alunos com a cultura e história africana, tentando desmistificar a ideia de que na
África só há aspectos negativos.
Para nosso trabalho, utilizamos o método interpretativo-comparativo, no qual analisaremos
os poemas contidos na obra e separamos as temáticas mais recorrentes em cada país. Após a leitura
de cada poema e análises dos mesmos, separamos as temáticas mais relacionadas entre si. Espera-se
que este trabalho sirva como forma de conhecimento, reflexão e até uma forma de respeito e
valorização da cultura e história africana.
O trabalho está dividido da seguinte maneira: primeiramente, explanaremos um pouco sobre
como surgiu o movimento da Negritude que ocasionou o aparecimento da literatura africana, bem
como o surgimento da Lei 10. 639/03; logo após, abordaremos os critérios, autores e poemas
escolhidos para as análises mais detalhadas; mostraremos também quais temáticas mais presentes e
que mais se relacionam entre os países africanos; faremos em seguida uma pequena sequência
didática simples com sugestões de trabalho dos poemas em sala de aula e por último traremos
nossas considerações finais.
Para a realização desta pesquisa, nos utilizamos como bases teóricas os artigos de Caetano
(2007), Oliveira (2009), Santos (2009), Martin e Moraes (2011), dentre outros.
1- A HISTÓRIA DA LITERATURA AFRICANA
Ultimamente, estamos notando que a literatura, em especial a literatura africana, vem
ganhando cada vez mais espaço na sociedade e nas escolas e com isso, trazendo para todos nós uma
maior proximidade com a cultura e com a história do continente africano, sobretudo dos países
africanos de língua portuguesa. Sendo assim, a literatura africana traz em si histórias de luta, de
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vida, de cultura de um povo que por muito tempo foi escravizado por seus colonizadores europeus,
mostrando o quão cruel e traumático foi esse período.
Através da literatura africana o povo foi ganhando vez e voz e ganhando mais firmeza e
confiança para assim lutar pelos seus direitos, ter orgulho de si e de sua identidade, regressar às suas
origens, resistir aos seus colonizadores que impunham sua cultura europeia.
Um dos gêneros em destaque desse sinal de persistência foi a poesia africana que, desde
1930, tornou-se símbolo de movimento e propagação do movimento do orgulho negro, conhecido
como Negritude. Esse movimento foi o que deu nome a um “movimento artístico” que, juntando
escritores africanos, prezava por valorizar, reconhecer e divulgar a cultura negra em países
africanos ou afrodescendentes. Em sua liderança estavam Léopold Sedar Sénghor, Aimée Césaire,
juntamente com Damas, que traziam uma ideologia de valorização e aceitação da cultura e combate
ao preconceito.
Segundo Santos (2009, p. 2),
a negritude exerceu o papel de mobilizador para que os negros ganhassem
confiança em suas próprias forças e partissem, naquele primeiro momento, no
resgate de sua cultura. Na verdade, o que acontecia então era um projeto de
renascimento dos povos negros e o movimento da negritude foi a principal arma
utilizada. Isto porque o movimento devolveu aos negros colonizados a consciência
de si mesmos e deu coragem àqueles que sofriam os efeitos cruéis da colonização
para enfrentar os colonizadores.
As vozes que ecoaram a partir desse movimento vieram mais fortes e confiantes, possuindo
marcas de louvor à sua terra, de amor e respeito à cultura negra, mostrando também sua história de
luta, sofrimento, colonização, escravidão, libertação, reafirmação identitária e admiração a tudo
quanto o povo negro passou.
Com isso, surgem gêneros em que há o enaltecimento dos falares próprios do povo,
esquecendo os modelos europeus, dando à língua o poder de dialogar e de levar de dentro para fora
o movimento da negritude.
Além da luta ganha em relação ao movimento de negritude e propagação da história dos
negros, propôs-se também, no cenário brasileiro, a inserção deste conteúdo na escola no Ensino
Fundamental e no Ensino Médio, mas para que toda essa literatura chegasse até nós, houve um
período de reforma das propostas curriculares para que se apresentassem aos alunos autores como
Ondjaki e Mia Couto, por exemplo, que de diferentes formas e diferentes gêneros apresentam mais
sobre a história e a cultura da África para os alunos. Trazer esses e mais autores africanos para a
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sala de aula é uma forma de respeito ao obedecer a Lei 10. 639/03, que inclui o ensino da História e
Cultura Africana no currículo das escolas brasileiras.
1.1- A Lei 10. 639/03 e o ensino de literatura africana nas escolas
Ensinar sobre a África, há muito tempo, resumia-se a se deter em abordar apenas a questão
da escravidão e colonização nas aulas de História. O negro era visto de forma inferior desde o
período em que foi colonizado e escravizado pelos europeus na África, chegando aqui no Brasil
visto também como seres insignificantes. A partir do momento em que eles foram tratados como
objetos, sendo alvo de violência e discriminação, ficaram de herança a humilhação e o preconceito.
Para Rosa e Backes (p. 2), “buscava-se destituir desses seres humanos a sua dignidade e
humanidade, quando aqui foram submetidos a todo tipo de humilhação, comparados a objetos,
mercadorias, a animais e foram escravizados.”.
Foram mais de 300 anos de violência e humilhação e o resultado de tudo isso perdura
atualmente, tanto em relação aos traumas vividos quanto na visão das pessoas que, infelizmente, até
hoje tratam os negros como sendo de uma raça inferior. Mesmo com a abolição da escravatura,
muito desse preconceito ainda acontece.
Apesar de toda essa visão negativa, o povo negro vem tentando quebrar esse preconceito,
buscando igualdade e aceitação, demonstrando resistência da sua raça.
Ainda segundo Rosa e Backes (p. 3),
é importante salientar sempre, que mesmo diante da escravização e das constantes
agressões e humilhações, a pessoa negra continuamente lutou em busca de
liberdade e dignidade. O negro nunca deixou de lutar por sua liberdade. Nunca
houve passividade dos negros diante de sua situação de miséria. Tanto na África
como em qualquer parte do mundo onde eles foram levados sempre resistiram.
Um sinal dessa persistência e conquista foi a promulgação da Lei 10. 639/03 no dia 9 de
janeiro de 2003, lei que considera obrigatório o ensino da história e cultura africana nas escolas
brasileiras, cada turma com a temática propícia para a sua faixa etária, e seu maior objetivo é o de
estimular a valorização da diversidade, bem como o respeito pela história e cultura negra.
Um dos principais pontos positivos do ensino de literatura africanas nas escolas é a quebra
de paradigmas que ele pode trazer, visto que temos um vínculo muito próximo com o continente
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africano e mesmo assim, não se conhece tanto sobre ele. Também é bom apontar que muitos alunos
têm uma visão equivocada quando falamos da África onde só se vê fome, tristeza, miséria e até há
um preconceito em relação à sua religiosidade, o que não retrata por completo o que o continente
apresenta.
Outro ponto positivo é ver a outra face da história da África, não aquela contada pelos
brancos, mas a história de amor à sua terra, de aceitação de sua identidade, sua cultura, a história de
seus antepassados e ver que os negros têm história de vida para contar.
Por meio do cumprimento dessa lei, houve uma ressignificação e remodelagem do ensino da
história e da cultura africana, não mais sendo vista pela visão dos colonizadores, mas com uma nova
abordagem que foque na história desconhecida e/ou ignorada dos negros.
O Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE) tem como objetivo prover as escolas de
ensino público das redes federal, estadual, municipal e do Distrito Federal, no âmbito da educação
infantil (creches e pré-escolas), do ensino fundamental, do ensino médio e educação de jovens e
adultos (EJA), com o fornecimento de obras e demais materiais de apoio à prática da educação
básica, sendo este um importante meio de levar acervos literários para as escolas de todo país.
2- CRITÉRIO DE ESCOLHA DOS POEMAS
A escolha dos poemas nasce das discussões e análises levantadas durante as aulas da
disciplina literaturas africanas de língua portuguesa. Os poemas escolhidos trazem traços de
resistência e as lutas vivenciadas no passar dos anos, abordando temáticas que vão desde a
colonização pelos europeus nos países africanos até o processo de libertação, celebração da
natureza, da valorização da terra para com o trabalho, imposição e valorização da cultura europeia
provocando o esquecimento da sua cultura de origem, dentre outros temas específicos.
A antologia analisada apresenta versos de poetas de Angola, Moçambique, São Tomé e
Príncipe, Guiné Bissau e Cabo Verde, alguns dos países africanos de língua portuguesa cujos temas
são variados e relacionados à vida de seus poetas ou não.
3- TEMÁTICAS RECORRENTES EM CADA PAÍS
Dentre as questões levantadas por cada poeta de cada país, encontramos algumas questões
que se relacionam entre si, tais como: questões raciais, preconceitos, colonização europeia (o
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sofrimento vivido suportado pelos negros, as dores causadas, a escravidão e a descolonização),
perda da cultura e da religiosidade em troca dos costumes europeus, esperança de dias melhores e
de igualdade, saída dos europeus (queda do tirano), reconquista das terras após a saída dos
europeus, louvor ao continente africano, sua história e cultura e sua natureza, questões amorosas e
subjetivas de cada poeta, dentre outras temáticas menos recorrentes. Veremos algumas dessas
temáticas a seguir.
5.1- Questões raciais e preconceito
É fato que os negros muito sofreram e ainda sofrem muito devido ao preconceito com a sua
cor, o que faz com que sejam vistos de forma inferior às pessoas de raça branca. Os poemas com
essa temática abordam o preconceito que sofrem os africanos pela sua cor e alguns também querem
demonstrar amor ao valorizar sua raça. Eis alguns:
Poema Poeta País Pág.
Negra! Joaquim Cordeiro da Mata Angola 39
Mantenha Alzira Cabral Cabo Verde 170
Naturalidade Rui Knopfli Moçambique 210
Minha cor é negra Caetano de Costa Alegre São Tomé e Príncipe 261
5.2- Colonização europeia
Os poemas com essa temática abordam todo o sofrimento e todas as consequências causadas
pelos europeus no período de colonização do continente africano. Foi um período bastante triste
para os africanos, pois um povo diferente entrava em sua terra para causar dor e sofrimento a todos
os negros.
Poema Poeta Temática País
Portugal Colonial
(p.103)
David Mestre Colonização portuguesa Angola
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Prelúdio (p.128) Jorge Barbosa Colonização/Descoberta das terras
africanas
Cabo Verde
Flagelados do vento
Leste (p.155)
Ovídio Martins Lamento dos africanos pela condição de
escravos em que viveram.
Cabo Verde
A minha dor (p.203) José Craveirinha Dor e angústia dos negros Moçambique
Vós que ocupais nossa
terra (p.271)
Manuela
Margarido
Crítica aos colonizadores S. Tomé e Príncipe
Meu canto Europa
(p.276)
Tomás Medeiros Crítica e lamento a tudo de negativo que
ocorreu durante a colonização.
S. Tomé e Príncipe
5.3- Perda da cultura e da religiosidade em troca dos costumes europeus
Na colonização, os europeus forçaram a aceitação sua cultura, seus costumes, bem como sua
religião aos africanos para que estes tomassem para si e fizessem seus, esquecendo assim seus
hábitos e modos de vida. Aqui, elencamos algumas dessas perdas religiosas e culturais. Também
citaremos algumas culturas que foram esquecidas pelos próprios africanos.
Poema Poeta Temática País
Carta (p.50) Alexandre Dáskalos Oração a Jesus Cristo (religião europeia) Angola
Makézu (p.60) Viriato da Cruz Perda da cultura negra em troca da
europeia.
Angola
Te Deum (p.208) José Craveirinha Perda da cultura religiosa africana.
Moçambique
Magaíça (p.198) Noêmia de Souza Queda da cultura africana Moçambique
Poema (p.275) Tomás Medeiros Crítica à religião europeia (católica) S. Tomé e Príncipe
5.4- Esperança por dias melhores e por igualdade
Em muitos dos poemas lidos por nós, percebemos o canto de esperança, o desejo e a
confiança de que toda a dor e sofrimento que os africanos estavam passando na colonização iriam
cessar e tudo ia voltar ao normal. Há também poemas em que a confiança de que negros e brancos
fossem vistos como seres iguais e que merecem igual respeito e tratamento, ou seja, há a fé de que o
preconceito fosse extinto.
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Poema Poeta Temática País
Poema da Manhã
(p.69)
Ernesto Lara Filho Esperança de um futuro melhor para os
negros.
Angola
Aspiração (p.74) Agostinho Neto Esperança de dias melhores. Angola
Crioulo (p.141) Manuel Lopes Esperança de liberdade Cabo Verde
Roça (p.273) Manuela Margarido Esperança de liberdade S. Tomé e Príncipe
5.5- Louvor e valorização do continente africano
Encontramos poemas em que a África é bastante louvada. Há, então, versos sobre o
continente, sua história, sua cultura, sua natureza e sua religião, sempre em aspectos positivos.
Alguns estão na tabela abaixo:
Poema Poeta Temática País
Mama Negra (p. 55)
Viriato da Cruz Louvor à África e a tudo que veio dela e a
valorização da luta dos negros.
Angola
Encruzilhada (p. 141) Manuel Lopes História da África Cabo Verde
Caminho longe
(p.151)
Gabriel Mariano História do descobrimento dos países
africanos
Cabo Verde
Hino à minha terra (p.
200)
José Craveirinha Louvor a terra Moçambique
Eu, o povo (p. 216) Mutimati Barnabé
João
Valorização da terra e rejeição dos modos
coloniais.
Moçambique
Coração em África (p.
263)
Francisco José
Tenreiro
Canção à África S. Tomé e Príncipe
4- ANÁLISE DOS POEMAS
De toda a obra analisada, escolhemos nove poemas que explicitam algumas das questões
mais levantadas pelos poetas. Os versos que observaremos a seguir são de diversas formas,
tamanhos e temáticas. Faremos um breve comentário de cada um deles, atentando para os elementos
temáticos que eles trazem.
Para representar Angola, observamos o Poema da manhã de Ernesto Lara Filho e
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percebemos uma temática principal circundada pela esperança, em que o eu-lírico, se dirigindo à
própria África, nomeada de Negra, remete ao forte poder do pensar no crescimento dos seus filhos,
em que eles terão os mesmos direitos dos seus colonizadores e que podem se mostrar tão capazes
quanto eles. Logo após, mostra a importância da sua cor e de sua raça, mostrando para a América, a
Europa e o mundo que são capazes, de lutar, conquistar com seus próprios esforços e vencer. É um
poema que mostra que mesmo que os filhos da África passem por dificuldades e preconceito, num
futuro muito próximo, eles serão motivo de orgulho, eles vão ser exaltados e valorizados.
Adentramos agora no poema cabo-verdiano Ditador!, de David Hopfer C. Almada. É um
poema curto e no seu próprio título percebemos uma exclamação, uma acusação feita do
colonizador. A princípio, entendemos como o povo dominado que fala sobre seu dominador, mas na
leitura do poema, percebemos que, o “Ditador!” mencionado no poema está relacionado ao
dominador, o seu colonizador, onde dita as regras do jogo, e se formos relacionar ao contexto
histórico, entendemos como a imagem do Ditador que se faz e desfaz das leis a seu favor e, talvez,
dependendo da sorte do dominado, pode ter a sorte de ser liberto ou não.
Para representar Moçambique, escolhemos o poema Em vez de lágrimas de José
Craveirinha, em que temos um campo semântico muito parecido e que faz lembrar a despedida de
alguém, pois palavras como “choro”, “dor”, “luto” e “lágrimas” nos faz remeter a despedida, mas
esse choro de despedida é seco e por isso se relaciona com o título de Em vez de lágrimas, pois o
fato de estar em luto é, culturalmente diferente de país para país. O que o eu-lírico tenta demonstrar
é que o luto, a tristeza e o choro podem ser validados sem as lágrimas que ao invés de usar lágrimas
(o choro em si), um choro em seco proclama o mais alto luto. Outras palavras representando um
mesmo campo semântico foram utilizadas no poema para dar ênfase ao luto do eu-lírico: vértice,
intenso e auge.
Um dos poemas de São Tomé e Príncipe tem como título Fragmentos Poéticos e é da autora
Conceição Lima. Nele, encontramos a temática da retomada da terra, da reconquista de terras
africanas que foram tomadas pelos colonizadores, percebemos isso através de palavras como:
reconquista, recuperaremos e reabitaremos. É, pois um poema de recomeço “Emergiremos do canto
como do chão emerge o milho jovem” e que traz também uma intertextualidade bíblica da terra
prometida e do maná que veio do céu para o povo que, segundo a bíblia, era o povo de Deus que ia
buscar de sua terra prometida.
5- PROPOSTA DE ENSINO DOS POEMAS
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A princípio, pensamos em uma sequência para uma turma de 3º ano do Ensino Médio com o
objetivo de ler e analisar poemas africanos de língua portuguesa, visto que o principal foco de
ensino de literatura é formar leitores, e criar um material didático para ser veiculado na mídia
digital. Temos a ideia de quatro momentos distintos para os estudos dos poemas africanos de língua
portuguesa. Vejamos agora o desenvolvimento dos quatro momentos.
o 1º MOMENTO (90 min)
Entregar cópias dos poemas que serão estudados e levantar juntamente dos alunos
inferências sobre os títulos dos poemas: Ditador, Em vez de lágrimas e Fragmentos poéticos
realizando uma breve discussão sobre o que os alunos entendem por essas palavras e qual a sua
relação com a sua vida, norteando e sempre trazendo para contexto do negro em nossa sociedade;
(20 min)
Ler os poemas pausadamente, analisando cada fragmento dos poemas, observando palavras
desconhecidas e os seus sentidos no texto e no contexto em que estão inseridos; (40 min)
Realizar a leitura oral de todos os poemas, observando as entonações trazidas pelos sinais
de pontuação e mostrando as relações de sentidos existentes durante a leitura, caracterizando assim
a importância dessa etapa no estudo da poesia; (15 min)
Perguntar oralmente aos alunos e anotar na lousa as relações estabelecidas no início da aula,
quando falamos nas inferências vivenciadas por eles (mostrando seu conhecimento de mundo), e
como eles veem agora esses mesmos títulos, já depois de todas as discussões acerca dos poemas
africanos de língua portuguesa; (15 min)
o 2º MOMENTO (45 min)
Ler oralmente o poema “Poema da manhã” de Ernesto Lara Filho; (5 min)
Analisar juntamente com os alunos o poema, os nomes desconhecidos e a influência do
estrangeirismo para a construção do mesmo; (15 min)
Dividir a sala em quatro grupos para que eles descrevam as ideias principais do texto,
observando as temáticas presentes no poema, e pedir para que dois integrantes de cada grupo
anotem na lousa, para uma melhor observação da turma, as temáticas existentes e fatos que lhe
chamaram atenção no poema; (15 min)
Escolher nove alunos que se destacaram na leitura do poema, separar estrofes e especificar a
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estrofe de cada aluno, para que consigamos avançar e dialogar sobre o próximo momento que é de
fundamental importância, já que criaremos um material didático para ser veiculado na mídia digital,
assim os alunos já começarão a ensaiar em casa o seu momento de recitação; (10 min)
o 3º MOMENTO (45 min)
Ensaiar com os nove alunos o material que será produzido, onde cada aluno ficará
responsável por uma estrofe do poema, então cabe aos alunos, com o auxílio do professor, em
aprender as estrofes e aprender cada parte do poema, para que na hora da recitação os alunos
demonstrem toda a carga semântica e emotiva constatada no poema; (45 min)
Escolhemos um ambiente que propicie melhor aproveitamento dos poemas: deve ser escuro,
com alguns alunos vestidos de preto e o último que trará a mensagem de esperança de branco,
deverá contar com um técnico em gravação, para o momento de produção e edição do vídeo, caso o
professor tenha essas habilidades, ele mesmo poderá ser responsável pela edição do vídeo e
divulgá-lo em blogs de educação ou canais da mídia digital.
o 4º MOMENTO (45 min)
Gravar o vídeo, os alunos em forma de círculo, sentados, e o responsável pela gravação no
meio; A recitação deverá trazer todos os elementos textuais contidos no conto, emotividade na
execução de cada estrofe, uma vez que todos os alunos já terão ensaiado o poema e observado todos
os aspectos enaltecidos pelo professor, e o último aluno vestido de branco, trará emoção em sua fala
da esperança por dias melhores e a da ascensão do negro na sociedade; (45 min)
RECURSOS
Sala escura, câmera, roupas pretas e uma branca.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para que a literatura africana chegasse até nós, muita luta teve e ainda tem de ser travada,
pois há sempre muita resistência. A literatura veio até nós para quebrarmos o preconceito e deixar
de lado algumas ideias equivocadas que tivemos em relação à África e aos negros, em que muitas
vezes inferimos existir apenas pobreza, miséria e sofrimento, mas ao ler obras vindas após o
movimento da Negritude e a nossa obra em análise, entendemos que as temáticas e os poemas
oferecem diversas questões muitas vezes desconsideradas quando falamos no continente africano.
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Assim, percebamos quão importante é o trabalho com os poemas, pois através deles conseguimos
fazer várias abordagens históricas e atuais de um povo, que, aqui especificamente, se refere aos
africanos. Temas como valorização da cor negra, valorização da religião e cultura africanas, crítica
aos colonizadores europeus, valorização das terras africanas, sofrimento vivido no período da
escravidão, são alguns dos temas que o livro Poesia Africana de Língua Portuguesa (Antologia) de
Apa, Barbeiro e Dáskalos traz e eles nos fazem ter mais contato com a cultura e com a história do
povo africano.
Apesar da resistência em relação à literatura africana, com o surgimento e aprovação da Lei
10.639/2003 em relação à inclusão, no currículo escolar, o estudo da cultura, da luta, da sociedade e
da história dos negros, ficou mais fácil todos nós termos maior contato e aproximação. Essa lei
também foi um símbolo de conquista para que se trabalhe nos alunos desde cedo o respeito e a
proximidade com a cultura africana.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CAETANO, Marcelo José. Itinerários africanos: do colonial ao pós-colonial nas literaturas
africanas de língua portuguesa. Fênix – Revista de História e Estudos Culturais Abril/ Maio/
Junho de 2007 Vol. 4 Ano IV nº 2 ISSN: 1807-6971. Disponível em: www.revistafenix.pro.br
DÁSKALOS, Maria Alexandre. APA, Lívia. BARBEITOS, Arlindo. Poesia Africana de língua
portuguesa (Antologia). Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2012.
MARTIN, Vima Lia; MORAES, Anita Martins Rodrigues de. O Brasil e a poesia africana de
língua portuguesa. SCRIPTA, Belo Horizonte, v. 15, n. 29, p. 69-84, 2º sem. 2011
OLIVEIRA, Jurema José de. A poesia contemporânea nos países africanos de língua
portuguesa. Revista Augustus | Rio de Janeiro | Vol. 14 | N. 27 | Fevereiro de 2009 | Semestral.
PRESIDÊNCIA DA REPUBLICA. Lei 10639 de 9 de janeiro de 2003. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis.
ROSA, João Martos; Backes, José Licínio. O ensino da Literatura Africana na Educação
Básica: observações iniciais. In: IV SEMINÁRIO POVOS INDÍGENAS E SUSTENTABILIDADE:
saberes tradicionais e formação acadêmica. (Campo Grande/ MS, 15-18 de agosto de 2011) ST 3
Disponível em: http://www.neppi.org/eventos/4sustentabilidade/simposio3.htm
SANTOS, A poesia africana de língua portuguesa: compromisso com a negritude. Diálogo
com a poesia brasileira. Revista África e Africanidades – Ano 2 - n. 6 - Agosto. 2009 - ISSN
1983-2354 www.africaeafricanidades.com