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QUÍMICA NOVA NA ESCOLA N° 26, NOVEMBRO 2007 29 O Lavoisier que não está presente nos livros didáticos N os últimos anos, têm sido re- novados os esforços para se aproximar a cultura científica de um número maior de cidadãos e cidadãs. Segundo Cachapuz (2005), a educação científica converteu-se em uma exigência urgente, fator essencial para o desenvolvimento dos povos, mesmo em curto prazo. Dentre os aspectos que uma educa- ção básica em Ciência deveria conter, entre os vários propostos por Reid e Hodson (1993), destaca-se a História da Ciência. Matthews (1994) também se alinha entre os autores que acre- ditam no potencial didático da História da Ciência. Entre os benefícios desse tipo de abordagem no ensino de Ciências, Matthews aponta que a história desta pode humanizar as ciências e relacioná-las mais aos interesses éticos, culturais e políticos; pode deixar as aulas mais estimulan- tes e reflexivas, desenvolvendo o pen- samento crítico dos alunos; pode contribuir para uma compreensão maior dos conteúdos científicos; e po- de melhorar a formação dos profes- sores, contribuindo para o desenvol- vimento de uma epistemologia da Recebido em 18/12/06; aceito em 26/6/07 Paulo Henrique Oliveira Vidal, Flavia Oliveira Cheloni e Paulo Alves Porto O artigo apresenta algumas contribuições de Antoine Laurent Lavoisier (1743-1794) para a construção da Química Moderna que podem ser utilizadas didaticamente. As informações encontradas em uma fonte primária (Tratado Elementar de Química, de Lavoisier) são confrontadas com os relatos encontrados em livros didáticos de Química e algumas discrepâncias são apontadas. Observa-se que alguns conceitos desenvolvidos por Lavoisier são relevantes para o Ensino de Química atual, e sua discussão pode despertar reflexões úteis para os discentes e docentes do Ensino Médio. Lavoisier, livros didáticos, conservação da massa Ciência mais rica e mais autêntica em sala de aula. Entretanto, ainda há muito a ser feito em relação ao ensino de Ciên- cias no Brasil para que essas pers- pectivas se concre- tizem. Avaliação feita por Costa e colabo- radores (2006), em trabalho apresen- tado no XIII Encontro Nacional de Ensino de Química, eviden- ciou que os estudan- tes dos períodos iniciais do curso de Química da UFMG têm poucos co- nhecimentos sobre Lavoisier e suas contribuições para a Química. Levan- tamento feito por Cheloni e colabora- dores (2006), entre alunos de Licen- ciatura em Química do IQ - USP, reve- lou situação semelhante. Pode-se então indagar - embora Lavoisier seja conhecido por muitos estudantes e professores de Química, e mesmo pelo público leigo, como um químico importante - as razões pelas quais suas realizações sejam tão pouco conhecidas. O aspecto que este artigo se pro- põe a investigar é a presença de La- voisier nos livros didáticos de Quími- ca. Tal aspecto se justifica pela larga utilização dos livros didáticos como fontes de consulta por parte dos professores do Ensi- no Médio, conforme apontam, por exem- plo, Mortimer (1988), Lopes (1992) e Fra- calanza e Megid Neto (2006). A metodolo- gia adotada consistiu em confrontar algu- mas idéias sobre Lavoisier comumen- te encontradas nos livros didáticos com as suas próprias palavras. A fonte primária escolhida foi o Traité Élémentaire de Chimie, de 1789 (na tradução inglesa, Elements of Chem- istry, de 1790), a qual sumariza déca- das de trabalho de Lavoisier e seus colaboradores na construção de uma nova abordagem teórica e metodo- lógica para a Química. Foram desta- cados, em fragmentos escolhidos nessa obra, três aspectos do seu trabalho que, apropriadamente discu- tidos, podem ser úteis ainda hoje no contexto do Ensino da Química em A educação científica converteu-se em uma exigência urgente, fator essencial para o desenvolvimento dos povos, mesmo em curto prazo

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  • QUMICA NOVA NA ESCOLA N 26, NOVEMBRO 2007

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    O Lavoisier que no est presente nos livros didticos

    Nos ltimos anos, tm sido re-novados os esforos para seaproximar a cultura cientficade um nmero maior de cidados ecidads. Segundo Cachapuz (2005),a educao cientfica converteu-seem uma exigncia urgente, fatoressencial para o desenvolvimentodos povos, mesmo em curto prazo.Dentre os aspectos que uma educa-o bsica em Cincia deveria conter,entre os vrios propostos por Reid eHodson (1993), destaca-se a Histriada Cincia. Matthews (1994) tambmse alinha entre os autores que acre-ditam no potencial didtico da Histriada Cincia. Entre os benefcios dessetipo de abordagem no ensino deCincias, Matthews aponta que ahistria desta pode humanizar ascincias e relacion-las mais aosinteresses ticos, culturais e polticos;pode deixar as aulas mais estimulan-tes e reflexivas, desenvolvendo o pen-samento crtico dos alunos; podecontribuir para uma compreensomaior dos contedos cientficos; e po-de melhorar a formao dos profes-sores, contribuindo para o desenvol-vimento de uma epistemologia da

    Recebido em 18/12/06; aceito em 26/6/07

    Paulo Henrique Oliveira Vidal, Flavia Oliveira Cheloni e Paulo Alves Porto

    O artigo apresenta algumas contribuies de Antoine Laurent Lavoisier (1743-1794) para a construo da QumicaModerna que podem ser utilizadas didaticamente. As informaes encontradas em uma fonte primria (TratadoElementar de Qumica, de Lavoisier) so confrontadas com os relatos encontrados em livros didticos de Qumica ealgumas discrepncias so apontadas. Observa-se que alguns conceitos desenvolvidos por Lavoisier so relevantespara o Ensino de Qumica atual, e sua discusso pode despertar reflexes teis para os discentes e docentes doEnsino Mdio.

    Lavoisier, livros didticos, conservao da massa

    Cincia mais rica e mais autntica emsala de aula.

    Entretanto, ainda h muito a serfeito em relao ao ensino de Cin-cias no Brasil para que essas pers-pectivas se concre-tizem. Avaliao feitapor Costa e colabo-radores (2006), emtrabalho apresen-tado no XIII EncontroNacional de Ensinode Qumica, eviden-ciou que os estudan-tes dos perodos iniciais do curso deQumica da UFMG tm poucos co-nhecimentos sobre Lavoisier e suascontribuies para a Qumica. Levan-tamento feito por Cheloni e colabora-dores (2006), entre alunos de Licen-ciatura em Qumica do IQ - USP, reve-lou situao semelhante. Pode-seento indagar - embora Lavoisier sejaconhecido por muitos estudantes eprofessores de Qumica, e mesmopelo pblico leigo, como um qumicoimportante - as razes pelas quaissuas realizaes sejam to poucoconhecidas.

    O aspecto que este artigo se pro-

    pe a investigar a presena de La-voisier nos livros didticos de Qumi-ca. Tal aspecto se justifica pela largautilizao dos livros didticos comofontes de consulta por parte dos

    professores do Ensi-no Mdio, conformeapontam, por exem-plo, Mortimer (1988),Lopes (1992) e Fra-calanza e Megid Neto(2006). A metodolo-gia adotada consistiuem confrontar algu-

    mas idias sobre Lavoisier comumen-te encontradas nos livros didticoscom as suas prprias palavras. Afonte primria escolhida foi o Traitlmentaire de Chimie, de 1789 (natraduo inglesa, Elements of Chem-istry, de 1790), a qual sumariza dca-das de trabalho de Lavoisier e seuscolaboradores na construo de umanova abordagem terica e metodo-lgica para a Qumica. Foram desta-cados, em fragmentos escolhidosnessa obra, trs aspectos do seutrabalho que, apropriadamente discu-tidos, podem ser teis ainda hoje nocontexto do Ensino da Qumica em

    A educao cientficaconverteu-se em uma

    exigncia urgente, fatoressencial para o

    desenvolvimento dospovos, mesmo em curto

    prazo

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    nvel mdio: (1) conservao damassa; (2) definio operacional deelemento qumico; e (3) nova nomen-clatura qumica.

    Investigao de alguns livrosdidticos de Qumica

    Os livros didticos de Qumica sounnimes em associar o nome de La-voisier conservao da massa nastransformaes qumi-cas. Entretanto, pou-cos avanam alm dis-so ou de escassosdados biogrficos. Se-lecionamos, comoexemplos, trechos dedois livros que fazemparte do Programa Na-cional do Livro Didticopara o Ensino Mdio (PNLEM 2007),que serviro como ponto de partidapara nossa discusso.

    Entre esses cientistas, umdos mais importantes foi ofrancs Antoine Laurent Lavoi-sier. Seus trabalhos, realizadosno sculo XVIII, foram to im-portantes que alguns o consi-deram o pai da qumica. En-tre suas contribuies, a maisconhecida e relevante a Leida Conservao da Massa,enunciada por ele aps realizarinmeras reaes qumicasdentro de recipientes fecha-dos. (Peruzzo e Canto, 2003)

    No final do sculo XVIII, ocientista Antoine Lavoisierrealizou uma srie de experin-cias em recipientes fechados(para que no entrasse nemescapasse nada do sistemaem estudo) e efetuando pesa-gens com balanas mais preci-sas do que as dos cientistasanteriores concluiu: no interiorde um recipiente fechado, amassa total no varia, quais-quer que sejam as transforma-es que venham a ocorrernesse espao. Tal afirmativaficou conhecida como lei deLavoisier (ou lei da conservaoda massa ou lei da conservaoda matria). (Feltre, 2000)

    Esses fragmentos so represen-tativos da viso oferecida pelos livrosdidticos a respeito de Lavoisier e daprpria natureza da Cincia. Nos doistrechos, a nica contribuio atribudaa ele a lei da conservao da mas-sa, e no h meno definio deelemento qumico ou nova nomen-clatura. Tampouco so citados outroscientistas que colaboraram com ele.

    Os livros tambmsugerem que a leida conservao damassa teria sidoinduzida a partir deuma srie de obser-vaes experimen-tais. A leitura daobra de Lavoisier,entretanto, nos

    mostra um panorama bem diferente.A conservao da massa no foi indu-zida, mas postulada:

    Podemos afirmar, como umaxioma incontestvel, que, emtodas as operaes da arte eda natureza, nada criado;uma quantidade igual de mat-ria existe antes e depois do ex-perimento; a qualidade e aquantidade dos elementos per-manecem precisamente asmesmas; e nada ocorre almde mudanas e modificaesna combinao desses ele-mentos. Desse princpio de-pende toda a arte de realizarexperimentos qumicos. Deve-mos sempre supor uma exataigualdade entre os elementosdo corpo examinado e aquelesdos produtos de sua anlise.(Lavoisier, 1790, p. 130-131;grifos nossos)

    Pode-se observar que Lavoisierclaramente apresenta a conservaoda massa, afirmando-a como umprincpio fundamental, o qual deveorientar todos os trabalhos em Qu-mica. Esse princpio foi postulado apriori - contrariando a viso simplistabaseada na existncia de um mtodocientfico indutivo e nico.

    Como curiosidade, vale notar queno de autoria de Lavoisier o enun-ciado tantas vezes repetido de queNa natureza, nada se perde, nada

    se cria, tudo se transforma. SegundoVanin (1994), esse seria um resumodo Livro I do poema De rerum natura,do filsofo latino Tito Lucrcio Caro(96-55 a.C.), que por sua vez seguiaas idias do filsofo atomista gregoEpicuro (341-270 a.C.). Tambm importante salientar que Lavoisier nofoi o primeiro a trabalhar com a idiade que a massa se conserva, poisoutros filsofos naturais j haviamadmitido isso implicitamente. Entre-tanto, Lavoisier foi o primeiro a expres-sar a conservao das massas expli-citamente como um princpio e atomar essa idia como fundamentalpara o estabelecimento dos estudosem Qumica.

    Observa-se tambm a importn-cia do conceito de elemento que apa-rece no fragmento citado acima: aconservao da massa entendidatambm como conservao dos ele-mentos qumicos. A idia de elementoera discutida desde a Antigidade,porm, Lavoisier desenvolveu umanova definio para o termo, que iriainfluenciar de maneira importante odesenvolvimento posterior da Qumi-ca.

    A definio operacional deelemento qumico

    Assim Lavoisier apresenta suaconcepo de elemento:

    Se, pelo termo elementosquisermos expressar aquelestomos simples e indivisveisdos quais a matria compos-ta, extremamente provvelque nada saibamos sobre eles.Entretanto, se aplicarmos o ter-mo elementos [...] para expres-sar nossa idia do ltimo pontoque a anlise capaz de alcan-ar, devemos admitir, comoelementos, todas as substn-cias nas quais somos capazes,por quaisquer meios, de reduziros corpos por decomposio[...]. E nunca devemos sup-las como compostas, at queo experimento e a observaoprovem que so. (Lavoisier,1790, p. xxiv)

    Segundo Bensaude-Vincent eStengers (1992), a novidade dessa

    O Lavoisier que no est presente nos livros didticos

    Se, pelo termo elementosquisermos expressar aquelestomos simples e indivisveis

    dos quais a matria composta, extremamenteprovvel que nada saibamos

    sobre eles(Lavoisier, 1790, p. xxiv)

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    definio que Lavoisier a apresentacomo uma alternativa tradicional,considerada metafsica, dos elemen-tos ou princpios como constituintesltimos da matria: sua nova defini-o estritamente operacional, e tor-na o elemento uma entidade relativae provisria.

    O caminho percorrido por Lavoi-sier para a construo de uma novaQumica foi longo e complexo eabrange muitos outros aspectos in-ter-relacionados que no seria poss-vel aprofundar aqui. Assim, no contex-to de suas consideraes tericas ede suas observaes experimentais,gua e ar deixam de ser consideradoselementos - conforme dizia uma tra-dio secular - e uma nova explica-o para a combusto tambm emer-giu. Ao longo do sculo XVIII, haviase desenvolvido a teoria do flogstico,segundo a qual a combusto consis-tiria no desprendimento do princpioda inflamabilidade (chamado deflogstico) pelos corpos inflamveis.Dentro desse panorama conceitual,desenvolveram-se, por exemplo, ostrabalhos de importantes qumicospneumaticistas como Joseph Pries-tley, Henry Cavendish e muitos outros.A partir de suas novas idias e deexperimentos prprios, Lavoisierreinterpretou, por exemplo, algunsexperimentos de Priestley - e identifi-cou o ar desflogisticado, descritopor este, com o componente do arque se combina com os corpos infla-mveis por ocasio da combusto.Surgia, assim, o que poderamoschamar de teoria do oxignio paraa combusto. Alm disso, Lavoisierpde dar novo significado combi-nao de ar inflamvel com ardesflogisticado, na qual Cavendishobservara a formao de gua: parao qumico francs, tratava-se da com-binao entre dois elementos qumi-cos: o gs hidrognio e o gs oxig-nio. Lavoisier, alm de dar novo signifi-cado a esse experimento de snteseda gua, tambm realizou sua de-composio: fazendo passar vaporde gua pelo interior de um tubo deferro aquecido ao rubro, ele logrou aobteno de gs hidrognio, ficandoo oxignio combinado na forma dexido de ferro. Esses so alguns dos

    exemplos que ilustram como a Qumi-ca emergiu, ao final do sculo XVIII,com uma face bem diferente daquelade meados dos setecentos (Alfonso-Goldfarb e Ferraz, 1993).

    Como vimos, a definio opera-cional de elemento qumico consti-tuiu-se em um dos fundamentos deseu sistema qumico e se manifesta,de maneira evidente, na nova nomen-clatura proposta pelo grupo de Lavoi-sier.

    A nova nomenclaturaAntes da adoo generalizada da

    nova nomenclatura, cada substnciadescoberta recebia um nome quepoderia se relacionar com seu pro-cesso de obteno, propriedade ca-racterstica, sua origem ou o nome depessoas. Diversos nomes eramoriundos de antigas tradies, comoda alquimia. Desse modo, no haviauma nomenclatura sistemtica e pa-dronizada, o que dificultava o apren-dizado da Qumica pelos iniciantes.Alguns exemplos de nomes antigosso citados na Tabela 1.

    Diante dessas dificuldades, umgrupo de qumicos franceses se dedi-cou a desenvolver uma metodologiade nomenclatura, constituda porregras que facilitassem sua compre-enso. Assim, em 1787, Louis Ber-nard Guyton de Morveau (1737-1810),Antoine Franois de Fourcroy (1755-1809), Claude Louis Berthollet (1748-1822) e Lavoisier publicaram o Mtho-de de Nomenclature Chimique, cujoobjetivo era sistematizar a nomencla-tura qumica, tomando por base a

    composio das substncias. Paraisso, os autores se voltaram aos con-ceitos de classes e de espcies,comumente usados na nomenclaturabotnica desde a metade do sculoXVIII. A esse respeito, Lavoisier escre-veu:

    Na ordem natural das idias,o nome da classe ou genus o que expressa uma qualidadecomum a um grande nmerode indivduos. O nome daespcie, ao contrrio, expressauma qualidade peculiar a cer-tos indivduos somente. (La-voisier, 1790, p. xxvi)

    A partir dessas idias, so defini-das as classes de substncias, ba-seadas em suas composies ele-mentares. Vejamos, por exemplo,como Lavoisier descreve o mtodopelo qual ele e os demais autores danova nomenclatura atriburam nomesaos xidos:

    Substncias metlicas, queforam expostas ao conjun-ta do ar e do fogo, perdem seubrilho metlico, aumentam seupeso, e assumem uma aparn-cia terrosa. Nesse estado [...],so compostos de um princpioque comum a todos eles, epor um que peculiar a cadaum. Do mesmo modo, portan-to, julgamos apropriado classi-fic-los sob um nome genrico,derivado de um princpio co-mum; para esse propsito ado-tamos o termo xido; e ns os

    O Lavoisier que no est presente nos livros didticos

    Tabela 1. Origem dos nomes antigos de algumas substncias.

    Nome antigo Origem do nome Nome atual

    Custico lunar Propriedade (custico - que queima); nitrato de prataorigem e composio

    (analogia entre a prata e a Lua)

    Acar de Saturno Propriedade (sabor adocicado); acetato de chumbo (II)origem e composio (analogia entre

    o chumbo e o planeta Saturno)

    Ar fixo Propriedade (constituinte de corpos fixos, gs carbnicoisto , no volteis)

    Rgulo de antimnio Idia de metal como um composto antimnio elementar

    Sal de Glauber Pessoa e mtodo de obteno sulfato de sdio(preparado pelo qumico germnico

    Johann R. Glauber)

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    distinguimos pelo nome parti-cular do metal que cada umpossui. (Lavoisier, 1790, p. xviii)

    Nesse excerto, pode-se perceberque a nomenclatura que atribumosatualmente aos xidos metlicos ,essencialmente, a mesma atribudapor esses autores em 1787. Isso nosignifica que a nova nomenclaturatenha sido universalmente aceita deimediato: durante ao menos vinteanos, a proposta foi objeto de vivacontrovrsia, especialmente pelasmudanas tericas emetodolgicas quelhe eram subjacentes(Bensaude-Vincent,1992).

    Outro aspectoque chama a atenoao se analisar os li-vros didticos aausncia de meno a outros qu-micos que colaboraram com Lavoi-sier. Um dos trechos citados acimase refere a este como o Pai da Qu-mica - como se a Cincia fosse resul-tado do esforo isolado de um gnio.Segundo Solomon (1987), isso podegerar uma viso deformada da Cin-

    cia, que ignora seu carter de trabalhocoletivo e de conhecimento queemerge como consenso da comuni-dade dos cientistas.

    Consideraes finaisEstudos de casos em Histria da

    Cincia podem ajudar o educador naconstruo de conceitos e na constru-o de uma viso da Cincia comoatividade complexa. A proposio doprincpio da conservao da massamostra que a Cincia nem sempre sefaz de maneira indutiva: nesse caso,

    Lavoisier fundamen-tou-se em uma hip-tese que se mostroumuito importante pa-ra o desenvolvi-mento posterior daQumica. Alm dis-so, o estudo de seutrabalho, com um

    pouco mais de detalhe, justifica queo seu nome seja lembrado noapenas em associao com aqueleprincpio, mas tambm por haversistematizado o conhecimento qumi-co de sua poca sobre novas bases.A definio operacional de elementoqumico e a nova nomenclatura so

    O Lavoisier que no est presente nos livros didticos

    Abstract: The Lavoisier Who Is Not in the Textbooks. This paper presents some of the contributions made by Antoine Laurent Lavoisier (1743-1794) for the construction of Modern Chemistry, aimingat the didactic use of such ideas. A comparison is made between information found in a primary source (Lavoisiers Elements of Chemistry) and how they are presented in Chemistry textbooks andsome discrepancies are pointed out. Some of the concepts discussed by Lavoisier may be relevant for the Chemistry teaching in current days, and a historical approach may lead to useful reflectionsboth for students and teachers.Keywords: Lavoisier, textbooks, conservation of masses

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    dois aspectos dessa sistematizaoque no tm sido lembrados pelosautores de livros didticos, emborapudessem ser teis para a iniciaonos estudos da Qumica nos dias dehoje. Um estudo de caso abordandoLavoisier, se realizado de formahistoriograficamente atualizada,permitiria mostrar que o trabalhodesse qumico no foi importante poruma suposta induo da lei daconservao das massas, mas simporque estruturou as bases de umanova abordagem para a Qumica,abrangendo tanto aspectos tericos(como a proposio de novos con-ceitos e novas explicaes para osexperimentos) como aspectos meto-dolgicos.

    Paulo Henrique Oliveira Vidal ([email protected]),licenciado e bacharelado em Qumica pelo CentroUniversitrio Fundao Santo Andr, mestrandoem Ensino de Cincias, Programa Interunidades emEnsino de Cincias, IF-IQ-IB-FE na Universidade deSo Paulo. Flavia Oliveira Cheloni ([email protected]) graduanda em Qumica pelo Institutode Qumica da Universidade de So Paulo (IQ-USP).Paulo Alves Porto ([email protected]), licenciadoe bacharelado em Qumica pelo IQ-USP, mestre edoutor em Comunicao e Semitica (rea deHistria da Cincia) pela Pontifcia UniversidadeCatlica de So Paulo, docente do IQ-USP.

    Estudos de casos emhistria da cincia podem

    ajudar o educador naconstruo de conceitos, ena construo de uma visoda cincia como atividade

    complexa