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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
DOUTORADO EM EDUCAÇÃO
DÉBORA MATE MENDES
JUVENTUDE E EDUCAÇÃO DO CAMPO NA AMAZÔNIA:
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE O SOME E AS IMPLICAÇÕES
EM SEUS PROJETOS DE VIDA
BELÉM – PARÁ
MAIO 2020
1
DÉBORA MATE MENDES
JUVENTUDE E EDUCAÇÃO DO CAMPO NA AMAZÔNIA:
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE O SOME E AS IMPLICAÇÕES
EM SEUS PROJETOS DE VIDA
Tese de Doutorado apresentada à Linha de Pesquisa
Educação, Cultura e Sociedade do Programa de Pós-
Graduação em Educação do Instituto de Ciências da
Educação da Universidade Federal do Pará
(PPGED/UFPA), como requisito à obtenção do título de
Doutora em Educação, sob a orientação da Professora
Doutora Ivany Pinto Nascimento.
BELÉM – PARÁ
MAIO 2020
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) de acordo com ISBD Sistema de Bibliotecas da Universidade Federal do Pará
Gerada automaticamente pelo módulo Ficat, mediante os dados fornecidos pelo(a) autor(a)
M538j Mendes, Débora Mate
Juventude e Educação do Campo na Amazônia: representações sociais sobre o SOME e as implicações em seus projetos de vida / Débora Mate Mendes. — 2020.
208 f. : il. color.
Orientador(a): Profª. Dra. Ivany Pinto Nascimento
Tese (Doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Instituto de Ciências da Educação, Universidade Federal do Pará, Belém, 2020.
1. Representações Sociais. 2. Juventude. 3. Educação do Campo. I. Título.
CDD 370
3
DÉBORA MATE MENDES
JUVENTUDE E EDUCAÇÃO DO CAMPO NA AMAZÔNIA:
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE O SOME E AS IMPLICAÇÕES
EM SEUS PROJETOS DE VIDA
Aprovado em: 27/02/2020
BANCA EXAMINADORA
_________________________________________
Prof.ª Dr.ª Ivany Pinto Nascimento
Orientadora/Presidente da Banca Examinadora (PPGED/ICED/UFPA)
_________________________________________
Salomão Antônio Mufarrej Hage
Avaliador Interno (PPGED/ICED/UFPA)
_________________________________________
Lucia Isabel da Conceição Silva
Avaliadora Interna (PPGED/ICED/UFPA)
_________________________________________
Georgina Negrão Kalife Cordeiro
Avaliadora Convidada (PPLSA/UFPA)
_________________________________________
Arthane Menezes Figueirêdo
Avaliadora Externa(PPGED/UNIFAP)
_________________________________________
Eliana do Socorro Brito Paixão
Avaliadora Externa (PPGED/UNIFAP)
4
Às mulheres da minha vida: Erci (mãe) e
Emanuele (filha),
Ao meu amor, companheiro de todas as lutas:
Marlo,
Às Juventudes do Campo, das Águas e das
Florestas que lutam pelo direito à vida digna nos
seus territórios...
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AGRADECIMENTOS
“Se é na sutileza que reside a exuberância,
Busco ressonância ...nos ideais do amor.
Liquidificaram as relações da lida, não há mais-
valia,
Há agonia, há temor.
Quem de pé ficará? Se a luta acomodar.
Diga quem nos dirá?
Quem viver, provará!
Nossa emancipação! [...]
A alça, a lança tranca, a resistência necessária
Oxidou,
A ponte, a fonte, a chance de fundir o que rachou
Difundir pra gerações.
A demanda do mundo é amar!”
(O Teatro Mágico)
Como na letra da música d‘O Teatro Mágico busco ressonância nos ideais de amor, e,
apesar das agonias e do temor que esses tempos sombrios nos trazem, tenho a clareza de que
estamos junt@s, ficaremos de pé! Essa clareza é possível pois se fortalece nos vínculos e
afetos de tantas gentes queridas que partilham as lidas do dia-a-dia e são fonte, são ponte, são
alicerces em cada dificuldade. A tod@s que seguram a minha mão, expresso meu sentimento
de gratidão!
À minha família, que segurou as pontas nas ausências de cada momento desde a ponte
aérea Macapá-Belém sobre o rio-mar, os longos períodos longe de casa, até os meses em que
tivemos um mar-oceano entre nós no período do doutorado sanduíche. E tiveram paciência
mesmo nos momentos de presença que mais pareceram ausência, pois foram tempos de
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escrita. Emanuele Mate Reis e Marlo dos Reis vocês foram meu suporte e incentivo! Eu amo
vocês e sou grata por todo o apoio!
Minha grande família: mãe Erci Lopes Mate, pai Homero Lair Ferreira Mendes (in
memorian - que partiu no período de finalização desta tese), irmãs Andréia Mate Mendes e
Cristina Mate Mendes... ah! e Márcia Dalchiavon Rosa, sobrinhos Lizandra Mendes Perine,
Raul Mendes Markendorf e Samuel dos Reis, sobrinhos netos Otávio Martins e Nicole
Martins (coração da dinda) e afilhados Gabriel Dalchiavon Rosa Nied e Eduardo Ghisleni
Figueiredo (corações da dinda também), cunhados Luiz Carlos Perine, Marcelo Markendorf,
Marcelo Reis, Raquel Silva e Munir dos Reis, sogro Dionísio dos Reis e sogra Maria Eva
Pereira Pinto, gratidão por toda a compreensão e ânimo nessa jornada...
Aos meus amigos e amigas... e são tantos! Os de Unifap, Mellissa Sobrinho, Flávio
Costa, Galdino Xavier, demais colegas de colegiado e vizinha e companheira de mate
(também unifapiana) Eliane Cabral, sou grata pelos diálogos, empurrões e por ouvirem
minhas dores de cotovelo acadêmicas. No entrelugar Unifap/UFPA – Macapá/Belém o Albert
Cordeiro foi presença e apoio em toda a caminhada! Gratidão às meninas da casinha 802 que
me acolheram em Belém, dividiram o mesmo teto e por consequência os bolos, cafés, alegrias
e angústias em cada etapa do doutorado – Suany Rodrigues, Andréa Silveira e Daybelis
González, vocês foram meu lar! A las chicas – Ionara Albani, Elisângela Knoblauch, Maiara
Laís Pinto e Letícia Clelis - que compartieron el techo, la vida, los artículos, las producciones
escritas de la tesis y los desafíos del doctorado sandwich, me presentaron un mundo de
posibilidades y me ayudaron a crecer personal y académicamente en tierras españolas, ―yo
estaré contigo las noches de más frío aunque haya que luchar, querida amiga mía, que te
comes a besos la vida‖! Aos anjos que me adotaram no útlimo ano de doutorado e me deram
muito mais que um teto, mas abrigo e aconhego, muito obrigada de coração Zenaide Teles de
Oliveira e Alcifran Viana Pimenta.
À Unifap, instituição que me acolheu como docente, pelo investimento e incentivo no
período de afastamento para o doutorado. Um abraço especial ao querido Emanuel Leal de
Lima que colaborou nas burocracias e sempre foi presença e afeto. À Ana Cláudia Peixoto de
Cristo que sempre me apoiou e desafiou, especialmente por me inserir na casinha 802 em
Belém.
À minha orientadora Dra. Ivany Pinto Nascimento pela competência, força, dedicação
e comprometimento que imprimiu no proceso de orientação. Gratidão por cada gesto, cada
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leitura, conselho e testemunho nessa caminhada de estudo, investigação, análise e
sistematização. Sua orientação foi (e é) preciosa em cada momento!
Ao PPGED – coordenação, professores, funcionários, colegas, cada um que colocou
um (ou mais) tijolinho em minha construção, sou profundamente grata. À CAPES pela
oportunidade de vivenciar a experiência do doutorado sanduíche (PDSE) um agradecimento e
desejo que se fortaleça e possibilite alternativas como essa a outros inúmeros estudantes e
pesquisadores/as. Aos colegas do Gepejurse que partilharam conhecimentos e mundos de
vida durante os quatro anos de percurso, especialmente a Dra Sônia Eli Rodrigues que junto
com a profa Dra. Ivany conduziram com maestria nossas reuniões e atividades de pesquisa.
Um carinho especial, também, ao Lourival Nascimento e Glauber Ranieri que seguiram por
estas estradas comigo desde 2016. Ah! Glauber e Patrícia Kimura, nossas caronas que davam
início e sequência aos diálogos das reuniões foram momentos profícuos de reflexão sobre
nosso objeto de pesquisa.
Ao Dr. Manuel Tomás González Fernández, orientador do estágio de doutorado
sanduíche, pela recepção na Universidad Pablo de Olavide de Sevilla, pelos diálogos,
indicações de leitura, atividades acadêmicas e de pesquisa. Agradeço a acolhida e desejo que
seja uma parceria perene de diálogos e pesquisas futuras.
Aos queridos/as professores/as da banca avaliadora Arthane Figueirêdo, Eliane Brito
Paixão, Georgina Kalife, Lúcia Isabel da Conceição Silva e Salomão Mufarrej Hage pela
leitura cuidadosa e pelas preciosas contribuições à esta tese.
Às escolas de Ensino Médio da RESEX-CA que abriram suas portas para essa
investigação. Às diretoras Sidineia Maria Sarges Ferreira e Raiane Mendonça de Oliveira, aos
professores e funcionários, às lideranças das comunidades que nos acolheram em suas casas
durante as atividades e partilharam a mesa, a vida e os sonhos conosco, especialmente ao seu
Francisco Antônio de Oliveira, dona Francineide Teles de Oliveira, Fábio Teles de Oliveira,
Felipe Teles de Oliveira, Zeneide Teles, Yasmim Teles de Oliveira (Sofia), Enzo Gabriel
Teles de Almeida e Kalebe Teles da Silva (recém chegado) pela acolhida e carinho que nos
recebem sempre, me sinto em família quando estou com vocês. Aos condutores dos veículos e
voadeiras que nos levaram pelas estradas e rios da Amazônia. Um abraço mais do que
especial aos Jovens da RESEX-CA que partilharam suas vivências, suas crenças, sonhos e
projetos de vida, gratidão e desejo de uma Educação No e Do Campo com qualidade para
todos/as os/as Jovens do Campo, das Águas e das Florestas!
8
Aos Movimentos Sociais por toda a luta e construção coletiva da Educação do Campo,
especialmente o Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), pela atuação na
Amazônia e no Amapá. Meu reconhecimento ao Sr. Tomé de Souza Belo (in Memoriam) pelo
seu legado e a Joaquim Belo que segue lutando pelos mesmos ideais de justiça e pelo direito
dos povos e comunidades tradicionais de viver e trabalhar em harmonia com a floresta em pé.
Por fim, mas não menos importante, meu agradecimento aos parceiros do Núcleo de
Agroecologia, especialmente os Jovens estudantes da Licenciatura em Educação do Campo
do Campus Mazagão que participaram das nossas empreitadas de extensão com as Juventudes
da RESEX-CA, muito obrigada meus queridos/as Patrícia Duarte Pereira, Francisco
Malheiros, Rogério Luz, Luciene Almeida, Lenize Santos, Sirlany Brandão e Janilson Morais
de Leão, que venham muitas expedições, fotos, vídeos, artigos e eventos!
Gratidão ao universo! E se ―a demanda do mundo é amar‖ que tenhamos cada vez
mais a coragem de seguir amando, construindo, resistindo, aprendendo e ensinando!
9
“Quero falar de uma coisa
Adivinha onde ela anda
Deve estar dentro do peito
Ou caminha pelo ar
Pode estar aqui do lado
Bem mais perto que
pensamos
A folha da Juventude
É o nome certo desse amor
Já podaram seus momentos
Desviaram seu destino
Seu sorriso de menino
Quantas vezes se escondeu
Mas renova-se a esperança
Nova aurora a cada dia
E há que se cuidar do broto
Pra que a vida nos dê
Flor, flor e fruto
Coração de estudante
Há que se cuidar da vida
Há que se cuidar do mundo
Tomar conta da amizade
Alegria e muito sonho
Espalhados no caminho
Verdes, planta e sentimento
Folhas, coração
Juventude e fé.”
(Coração de Estudante, Milton Nascimento)
10
RESUMO
O presente estudo se propõe articular a Teoria das Representações Sociais (TRS) ao Sistema
de Organização Modular de Ensino (SOME) e a Juventude do Campo na Amazônia. Para
tanto, propomos o seguinte problema de investigação: quais as representações sociais dos
Jovens da Reserva Extrativista do Rio Cajari (RESEX-CA) sobre a sua escolarização no
sistema modular de ensino (SOME) e as implicações no seu projeto de vida? A partir deste
questionamento, tomamos como referência o seguinte objetivo geral: Compreender as
representações sociais dos jovens da Reserva Extrativista do Rio Cajari sobre a sua
escolarização no sistema modular de ensino e as implicações no seu projeto de vida. Para
responder ao referido objetivo, traçamos como objetivos específicos 1) Identificar o perfil dos
jovens da Reserva Extrativista do Rio Cajari matriculados no Ensino Médio Modular; 2)
Caracterizar as imagens e os sentidos dos jovens sobre a sua escolarização no sistema
modular de ensino; 3) Destacar as objetivações e as ancoragens que compõe as representações
sociais de jovens sobre a sua escolarização no sistema modular de ensino; 4) Verificar as
implicações das representações sociais nos seus projetos de vida. Constitui-se em uma
pesquisa de campo, de abordagem qualitativa, ancorada nos pressupostos teórico-
metodológicos da Teoria das Representações Sociais (TRS) em abordagem processual,
articulada ao processo de escolarização de jovens no SOME. Os territórios onde nosso estudo
foi realizado compreendem 2 escolas da rede estadual de ensino do Amapá que ofertam
Ensino Médio por meio do SOME na Reserva Extrativista do Rio Cajari, situadas nos
municípios de Mazagão e Laranjal do Jari. Os sujeitos são inicialmente 60 e no segundo
momento 12 jovens estudantes do Ensino Médio nas referidas escolas. O levantamento de
dados foi realizado por meio de questionário semiestruturado, grupos triangulares e da técnica
de elaboração de desenhos. A análise dos dados tomou como referência a análise temática
articulada à apreensão de ancoragens e objetivações, processos formadores das
Representações Sociais. Assim, os resultados foram discutidos a partir das seguintes
temáticas: educação base de tudo; preparação para o futuro; superação de
obstáculos/conquista; e escola e território. Constatamos que o SOME é representado a partir
de imagens e sentidos pautados no reconhecimento da importância da educação escolar no
campo como via de acesso a melhores oportunidades de futuro ao possibilitar o ingresso no
ensino superior e alternativas de trabalho e renda no campo e na cidade. Essas representações
geram implicações em seus projetos de vida, pois permanecer ou sair do campo não se trata de
uma questão simplesmente de livre arbítrio do/a jovem, mas de uma tomada de decisão em
função de condições alheias ao seu desejo, de modo que o campo e a cidade com suas
realidades diferentes se entrelaçam na objetividade e na subjetividade deste sujeito-jovem
produzindo contradições que não cessam de se inscrever, mesmo com a mudança do sujeito
de um lugar para outro.
Palavras Chave: Representações Sociais; Juventude; Educação do Campo.
11
ABSTRACT
This study proposes to articulate the Theory of Social Representations (TRS) with the
Modular Teaching Organization System (SOME) nd the Youth of the Countryside in the
Amazon. Therefore, we propose the following research problem: what are the social
representations of the Youth of the Rio Cajari Extractive Reserve (RESEX-CA) about their
schooling in the modular teaching system (SOME) and the implications for their life project?
From this questioning, we take as a reference the following general objective: To understand
the social representations of young people from the Rio Cajari Extractive Reserve about their
schooling in the modular teaching system and the implications for their life project. To
respond to that objective, we have outlined as specific objectives 1) Identify the profile of
young people from the Rio Cajari Extractive Reserve enrolled in modular high school; 2)
Characterize the images and meanings of young people about their schooling in the modular
teaching system; 3) Highlight the objectifications and anchorages that make up the social
representations of young people about their schooling in the modular teaching system; 4)
Check the implications of social representations for their life projects. It constitutes a field
research, with a qualitative approach, anchored in the theoretical-methodological assumptions
of the Theory of Social Representations (TRS) in a procedural approach, articulated to the
process of schooling young people in SOME. The territories where our study was carried out
comprise 2 schools in the state teaching network of Amapá that offer high school through
SOME in the Rio Cajari Extractive Reserve, located in the municipalities of Mazagão and
Laranjal do Jari. The subjects are initially 60 and in the second moment 12 young high school
students in the referred schools. Data collection was carried out by means of a semi-structured
questionnaire, triangular groups and the technique of make drawings. The data analysis took
as a reference the thematic analysis articulated to the apprehension of anchors and
objectivations, processes that form Social Representations. Thus, the results were discussed
based on the following themes: Education is the basis on everything; preparation for the
future, overcoming obstacles / achievement; and school and territory. We found that SOME is
represented from images and meanings based on the recognition of the importance of school
education in the countryside as a way of access to better opportunities for the future by
enabling entry into higher education and alternative work and income in the countryside and
in the city, which has implications for their life projects, since staying in or leaving the
countryside is not simply a matter of the young person's free will, but of making a decision
based on conditions outside their desire, so that the countryside and the city with their
different realities are intertwined in the objectivity and subjectivity of this young subject,
producing contradictions that never cease, even with the subject's change from one place to
another.
Keywords: Social Representations; Youth; Rural Education.
12
RESUMEN
Este estudio propone articular la Teoría de las Representaciones Sociales (TRS) con el
Sistema de Organización de Enseñanza Modular (SOME) y la Juventud del Campo en la
Amazonía. Por lo tanto, proponemos el siguiente problema de investigación: ¿cuáles son las
representaciones sociales de los jóvenes de la Reserva Extractiva del Río Cajari (RESEX-CA)
sobre su escolaridad en el sistema de enseñanza modular (SOME) y las implicaciones para su
proyecto de vida? A partir de este cuestionamiento, tomamos como referencia el siguiente
objetivo general: Comprender las representaciones sociales de los jóvenes de la Reserva
Extractiva del Río Cajari sobre su escolarización en el sistema de enseñanza modular y las
implicaciones para su proyecto de vida. Para responder a ese objetivo, hemos delineado como
objetivos específicos 1) Identificar el perfil de los jóvenes de la Reserva Extractiva del Río
Cajari inscritos en la escuela secundaria modular; 2) Caracterizar las imágenes y los
significados de los jóvenes sobre su escolaridad en el sistema de enseñanza modular; 3)
Destacar los objetivos y las anclas que conforman las representaciones sociales de los jóvenes
sobre su escolaridad en el sistema de enseñanza modular; 4) Comprobar las implicaciones de
las representaciones sociales para sus proyectos de vida. Constituye una investigación de
campo, con un enfoque cualitativo, anclada en los supuestos teórico-metodológicos de la
Teoría de las Representaciones Sociales (TRS) en un enfoque procesal, articulado al proceso
de escolarización de los jóvenes en el SOME. Los territorios donde se realizó nuestro estudio
comprenden 2 escuelas en la red de enseñanza estatal de Amapá que ofrecen la escuela
secundaria a través de SOME en la Reserva Extractiva de Río Cajari, ubicada en los
municipios de Mazagão y Laranjal do Jari. Los participantes son inicialmente 60 y en el
segundo momento 12 jóvenes estudiantes de secundaria en las escuelas referidas. La recogida
de datos se realizó mediante un cuestionario semiestructurado, grupos triangulares y la técnica
de dibujos. El análisis de datos tomó como referencia el análisis temático articulado a la
aprehensión de anclas y objetivaciones, procesos que forman las Representaciones Sociales.
Por lo tanto, los resultados se discutieron en base a los siguientes temas: educación centro de
todo; preparación para el futuro, superación de obstáculos/logros; y escuela y territorio.
Descubrimos que el SOME está representado a partir de imágenes y significados basados en
el reconocimiento de la importancia de la educación escolar en el medio rural como una forma
de acceder a mejores oportunidades para el futuro al permitir el ingreso a la educación
superior y al trabajo alternativo e ingresos en el campo y en la ciudad, lo que tiene
implicaciones para sus proyectos de vida, ya que quedarse o abandonar el campo no es
simplemente una cuestión de libre albedrío del joven, sino de tomar una decisión basada en
condiciones fuera de su deseo, de modo que el rural y la ciudad con sus diferentes realidades
se entrelazan en la objetividad y subjetividad de este joven sujeto, produciendo
contradicciones que nunca dejan de inscribirse, incluso con el cambio del sujeto de un lugar a
otro.
Palabras clave: Representaciones Sociales; Juventud; Educación Rural.
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LISTA DE ILUSTRAÇÕES
QUADROS
Quadro 01 Perfil dos Participantes dos Grupos
Triangulares………………..………………...56
Quadro 02 Organização dos Grupos
Triangulares…………………………………….………60
Quadro 03 Distribuição por Programas de Pós-
Graduação………………………....................65
Quadro 04 Distribuição dos Desenhos por Temas ……………………………………….…125
Quadro 05 Temas e Subtemas que compõem as
RS……………………………………….…126
TABELAS
Tabela 01 Dissertações Elencadas no Descritor
Juventude………………………………...….66
Tabela 02 Tese Elencada no Descritor Juventude………………………………………...…..
67
Tabela 03 Tese Elencada no Descritor Juventude e Representações
Sociais…………………..68
Tabela 04 Tese Elencada no Descritor Juventude e Projeto de
Vida…………………………..69
Tabela 05 Dissertações Elencadas no Descritor Juventude e Projeto de
Vida………….…….70
Tabela 06 Tese Elencada no Descritor Juventude Rural……………………………….……..72
Tabela 07 Dissertações Elencadas no Descritor Juventude
Rural…………………………….73
Tabela 08 Dissertação Elencada no Descritor Juventude e
RS………………......................…74
Tabela 09 Síntese das Teses e Dissertações
Elencadas……………………………..…………76
14
Tabela 10 Número de Jovens por
Comunidade………………………………..………….…113
GRÁFICOS
Gráfico 01 Distribuição dos Trabalhos por Região do
País……………………………………77
Gráfico 02 Distribuição das Produções por
Ano…………………………………………..…..78
Gráfico 03 Área de Concentração dos Programas de Pós-
Graduação………………….……..78
Gráfico 04 Faixa
Etária…………………………………………………………………..…..114
Gráfico 05 Identidade……………………………………………………..………………....115
Gráfico 06 Auto-reconhecimento…………………………………………………………....117
Gráfico 07 Religião…………………………………………………………………….……117
Gráfico 08 Estado Civil…………………………………………………………...................117
Gráfico 09 Grupo Familiar…………………………………………………………….…….118
Gráfico 10 Renda Familiar…………………………………………………………………..119
Gráfico 11 Gestão da Unidade
Produtiva…………………………………………...………..119
Gráfico 12 Participação em Organizações
Sociais………………………………….………..121
Gráfico 13 Projeto de
Vida………………………………………………………….……….123
FIGURAS
Figura 01 Organização dos Instrumentos de
Pesquisa……………………………………..….57
Figura 02 Percurso de
Análise………………………………………………………………...63
Figura 03 Funções Básicas da
Representação………………………………………..………..85
Figura 04 Fases do Processo de
Objetivação………………………………………………..…86
Figura 05 Dimensões das
RS……………………………………………………………….....86
15
Figura 06 Educação No e Do
Campo……………………………………………………….…97
Figura 07 Desafios aos Educadores do
Campo……………………………………………..…99
Figura 08 Objetivações e
Ancoragens…………………………………………………..…...174
IMAGENS
Imagem 01 Feita de
retalhos…………………………………………………….……….……21
Imagem 02 Jovem tirando
açaí……………………………………………………….…….…36
Imagem 03 Semente de
castanha……………………………………………………………...49
Imagem 04 Paneiro de
mandioca……………………………………………………………...80
Imagem 05 Vamos Amazonizar o
Mundo…………………….……………………………..109
Imagem 06 Escola Osmundo Valente Barreto – Baixo
Cajari…………….……………….....111
Imagem 07 Escola Água Branca do Cajari – Alto
Cajari……………….………….…………112
Imagem 08 Jovens Formando
Aliança…………………………………..…………………...181
DESENHOS
Desenho 01 A educação é a base de tudo, melhor ainda quando é ao ar
libre………………...128
Desenho 02 Buscando no
Futuro……………………………………………………...……..130
Desenho 03 Sem minha escola não sei o que seria de
mim.......................................................133
Desenho 04 A escola do ensino modular lugar que leva você ao seu
sonho………………….139
Desenho 05 Em busca do
sonho………………………………………………………….......141
Desenho 06 Meu sonho de vida poder combater os fora da
lei……………………………….143
16
Desenho 07 Minha formatura de conclusão do Ensino Médio/Em
breve…………………….145
Desenho 08 O momento no
módulo……………………………………………………...….149
Desenho 09 Na hora da
explicação…………………………………………………………..151
Desenho 10 De estudar e aprender junto com minhas amigas………………………………151
Desenho 11 Na hora que chego em
casa……………………………………………………...152
Desenho 12 O caminho da
escola………………………………………………………….....164
Desenho 13 Projeto de vida para minha comunidade: aulas
regulares!!!.................................167
Desenho 14 O destino da minha
vida…………………………………………………..…….171
MAPAS
Mapa 01 Localização da Reserva Extrativista do Rio Cajari
………………………………….44
Mapa 02 Localização das Escolas Pesquisadas no Território da RESEX-
CA…...………..…...52
17
LISTA DE ABREVIATURAS
AIDS Síndrome da Imunodeficiência Adquirida
BDTD Biblioteca Digital de Teses e Dissertações
CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico
CNS Conselho Nacional das Populações Extrativistas
CSJR Consórcio Social da Juventude Rural – Sementes na Terra
DESER Departamento de Estudos Socioeconômicos Rurais
FEALQ/ESALQ Fundação de Estudos Agrários Luiz de Queiroz
FETRAF-SUL/CUT Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar
FF Formação de Formadores
GEPEJURSE Grupo de Estudos em Juventude, Identidade e Representações
sociais
IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
18
ICED Instituto de Ciências da Educação
IDMH Índice de Desenvolvimento Humano Municipal
INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira
IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
PNCF Programa Nacional de Crédito Fundiário
PPGED Programa de Pós-Graduação em Educação do Instituto de
Ciências da Educação
PPP Projeto Político Pedagógico
RENCA Reserva Nacional do Cobre e Associados
RESEX-CA Reserva Extrativista do Rio Cajari
RS Representações Sociais
SEED Secretaria de Estado de Educação
SOME Sistema Modular de Ensino
TCC Trabalhos de Conclusão de Curso
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TRS Teoria das Representações Sociais
UERGS Universidade Estadual do Rio Grande do Sul
UFC Universidade Federal do Ceará
UFMG Universidade Federal de Minas gerias
UFPA Universidade Federal do Pará
UFPE Universidade Federal Rural de Pernambuco
19
UFSC Universidade Federal de Santa Catarina
UFV Universidade Federal de Viçosa
UNESP Universidade Estadual Paulista
UNIFAP Universidade Federal do Amapá
UNIOESTE Universidade Estadual do Oeste do Paraná
UNIJUÍ Universidade Regional do Noroeste do Rio Grande do Sul
UNISINOS Universidade do Vale do Rio dos Sinos
USP Universidade de São Paulo
PEJA Programa de Educação de Jovens e Adultos
20
SUMÁRIO
PRÓLOGO .............................................................................................................................21
1. SEÇÃO I: INTRODUÇÃO........................................................................................36
1.1 NESTE TEMPO, NESTE ESPAÇO: DESIGUALDADES E POSSIBILIDADES.....37
1.2 APRESENTAÇÃO DA TEMÁTICA...........................................................................41
2. SEÇÃO II: PERCURSO METODOLÓGICO........................................................ 49
2.1 APRESENTAÇÃO.......................................................................................................50
2.2 TIPO DE PESQUISA ...................................................................................................50
2.3 TERRITÓRIOS ONDE A PESQUISA FOI DESENVOLVIDA.................................51
2.4 SUJEITOS ....................................................................................................................53
2.5 INSTRUMENTOS........................................................................................................56
2.5.1 Primeiro passo: questionário..........................................................................57
2.5.2 Segundo passo: grupo
triangular....................................................................58
2.5.3 Terceiro passo: desenho..................................................................................60
2.6 ANÁLISE......................................................................................................................62
2.7 ESTADO DO CONHECIMENTO .............................................................................64
2.7.1 A Juventude Rural nas teses e dissertações da BDTD.................................64
2.7.2 Juventude e Representações Sociais..............................................................68
2.7.3 Juventude e Projeto de Vida...........................................................................69
2.7.4 Banco de teses e dissertações da Capes..........................................................71
2.7.5 Juventude Rural no Banco da Capes.............................................................71
2.7.6 Juventude e Representações Sociais .............................................................74
3. SEÇÃO III: ELABORAÇÃO TEÓRICA.................................................................80
3.1 APRESENTAÇÃO.......................................................................................................81
3.2 A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS......................................................81
21
3.2.1 Processos de formação das RS........................................................................84
3.3 JUVENTUDE COMO CATEGORIA SOCIAL...........................................................87
3.3.1 Juventude, território e condição juvenil no campo......................................89
3.3.2 Juventude e educação......................................................................................93
3.4 EDUCAÇÃO DO CAMPO...........................................................................................95
3.4.1 Ensino Médio no campo no Amapá.............................................................102
3.5 PROJETO DE VIDA DA JUVENTUDE...................................................................105
4. SEÇÃO IV: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS/AS JOVENS SOBRE O
SOME..109
4.1 CARACTERÍSTICAS DOS SUJEITOS DO ESTUDO: QUEM FALA E DE ONDE
FALA?....................................................................................................................................110
4.2 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS JOVENS SOBRE O SOME..........................123
4.2.1 Educação base de tudo..................................................................................126
4.2.2 Preparação para o futuro.............................................................................136
4.2.3 Escola como superação de
obstáculos/conquista.........................................147
4.2.3.1 Compositor de Destinos: tempo, tempo,
tempo................................154
4.2.4 Escola e Território.........................................................................................162
4.2.5 Objetivações e Ancoragens que compõe as RS de Jovens sobre o
SOME..172
5. SEÇÃO V: CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................181
REFERÊNCIAS ...................................................................................................................187
APÊNDICES..........................................................................................................................197
22
PRÓLOGO
Fonte: Arquivo pessoal.1
“Sou feita de retalhos.
Pedacinhos coloridos de cada vida
que passa pela minha e que vou costurando na
alma.
1 A cada início de seção traremos imagens e poesias que compõe o contexto da Amazônia Amapaense e se
encontram alinhavadas com as palavras ao longo do texto, representando o território simbólico de onde falamos
e onde moramos como também dos jovens estudantes sujeitos da pesquisa.
23
Nem sempre bonitos, nem sempre felizes,
mas me acrescentam e me fazem ser quem eu sou.
Em cada encontro, em cada contato, vou ficando
maior…
Em cada retalho, uma vida, uma lição, um
carinho, uma saudade…
Que me tornam mais pessoa, mais humana, mais
completa.
E penso que é assim mesmo que a vida se faz:
de pedaços de outras gentes que vão se tornando
parte da gente também.
E a melhor parte é que nunca estaremos prontos,
finalizados…
Haverá sempre um retalho novo para adicionar à
alma.
Portanto, obrigada a cada um de vocês,
que fazem parte da minha vida e que me
permitem
engrandecer minha história com os retalhos
deixados em mim.
Que eu também possa deixar pedacinhos de mim
pelos caminhos e que eles possam ser parte das
suas histórias.
E que assim, de retalho em retalho,
24
possamos nos tornar, um dia,
um imenso bordado de „nós‟.”
(Cris Pizziment)
TRAJETÓRIA PESSOAL: TECENDO MINHA COLCHA DE RETALHOS
Ao pensar a escrita da minha trajetória pessoal e o movimento de encontro com a
temática de pesquisa é exatamente essa a metáfora que vislumbro. Me vejo como uma colcha
de retalhos como diz Cris Pizziment. Alguns pedaços de pano tem cores intensas, vibrantes e
deixaram marcas profundas na minha alma, aprendizagens imensas. Outros tem cores opacas,
tons pastel, criaram um laço necessário e passaram mais ou menos rápido.
Alguns retalhos são quadriculados e me ensinaram a colocar cada coisa no seu lugar.
Tem aqueles que são floridos e provocaram aprendizagens por meio do encantamento, do
exemplo, do testemunho. Tem aqueles que são petit pois, e se espalharam com tons de alegria
e delicadeza, ensinamentos cotidianos e imprescindíveis.
São multicoloridos, multitamanho, cada um a seu modo me preencheu no tempo e
espaço necessários para se tornarem importantes. Alguns foram tecidos com linha fina e
ponteados precisos. Aquela costura perfeita que liga um pedaço ao outro e quase não se vê,
extremamente profissional. Outros foram tecidos com linha grossa e ao juntar um retalho a
outro fizeram buracos doloridos. Tem aqueles que foram tecidos de maneira preciosa - e pode
passar o tempo que for - estarão ligados um ao outro. E tem, também, aqueles que foram
costurados de maneira aligeirada e com a pressão do tempo vão se soltando, desfazendo os
vínculos.
Cada retalho costurado é parte de mim, me tornou quem eu sou hoje. Esse aprendizado
da poesia de Cris Pizziment nos lança para novas tessituras, novos laços e retalhos a serem
costurados. Nos acrescenta a perspectiva do inacabamento, de estar sempre em construção.
Ao mesmo tempo nos remete à gratidão que cada troca possibilitou e pelas novas que virão.
25
Na jornada da vida, em que me constituo como educadora e pesquisadora, desejo
manter sempre a necessária disposição para aprender. Sem isso, a vida se esgota em si mesma.
Por isso, aceito o desafio da poesia e sigo na busca de tornar-me ―[...] um imenso bordado do
nós.‖
Primeiros retalhos...
Minhas primeiras memórias são pedaços de pano desgastados, trazem lembranças da
ruptura provocada pela separação dos meus pais. As dificuldades desse momento, para além
de emocionais, se referem a materialidade da vida. Minha mãe lavava roupa e fazia faxina
―para fora‖ e minhas duas irmãs mais velhas (um pouco) deixaram a escola para trabalhar e
colocar comida na mesa. Eu, pequenina, seguia sempre agarrada à saia da minha mãe
(literalmente), nas casas das diversas patroas.
Alguns anos depois, o primeiro desafio que me recordo foi o de enfrentar a escola. Me
sentia abandonada em meio a pessoas estranhas. Foram anos de choro, castigos, a única surra
que tomei na vida e minha mãe quase desistindo de me obrigar a estudar. Ela repete hoje em
dia: ―ainda bem que ouvi sua professora quando ela disse pra não desistir porque via muito
potencial em você.‖ Depois da batalha que levou aproximadamente três anos, aprendi a gostar
da escola e dizia que quando crescesse desejava ser professora.
Retalhos da adolescência e Juventude
O retalhos costurados nesse período da minha trajetória pessoal e em alguma medida
da minha constituição enquanto profissional, se constituíram ao longo dos anos com duas
marcas muito significativas: a Juventude e a Música. Minha relação com ambas tem início na
Pastoral da Juventude da Igreja Católica na Diocese de Cruz Alta, interior do Rio Grande do
Sul, por volta do ano 1996.
Foi nesse momento que comecei a participar dos primeiros debates sobre o papel e a
importância da Juventude nos processos de construção das pautas de transformação da
realidade, sempre mais ouvi do que falei, uma característica que carrego ainda hoje. Nesse
26
mesmo período alguém me disse que eu sabia cantar, e a música passou a fazer parte do meu
cotidiano em todos os espaços por onde eu passei.
Foi, então, na Pastoral da Juventude, que minha trajetória e minha formação política e
cidadã tiveram início, com a luta na construção de pautas da Juventude, participação e defesa
de organizações e movimentos sociais, um processo marcado pelos referenciais da Teologia
da Libertação e uma crença na fé que só tem sentido se colocada em prática. Nesse período, as
letras e melodias que nos moviam diziam ―Ei Juventude! Rosto do mundo! Teu dinamismo
logo encanta quem te vê. A liberdade, aposta tudo. Não perde nada na certeza de vencer!‖
A caminhada pastoral e, de certo modo, minha Juventude, foram interrompidos pela
gravidez não planejada, o abandono da escola e a necessidade de assumir novos papéis, de
mãe, esposa, dona de casa (nesse último nunca tive muito sucesso). Um momento de intensas
transformações e mudanças que me impulsionaram para novos caminhos, novas decisões: o
supletivo para a conclusão do Ensino Médio e o início da militância no partido político e no
movimento sindical da agricultura familiar. A voz entoava as canções de luta que diziam
―Queremos que abrace essa terra, por ela quem sente paixão, quem põe com carinho a
semente, pra alimentar a nação...‖
A militância trouxe a oportunidade de cursar Pedagogia Anos Iniciais: Crianças
Jovens e Adultos no convênio firmado entre a Universidade Estadual do Rio Grande do Sul –
UERGS e a Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar – FETRAF-SUL/CUT e a
possibilidade de estudar intensificou a militância, foram encontros, congressos,
acampamentos, mobilizações. Em cima do caminhão, no palco, com o microfone na mão eu
ajudava na animação de agricultores e agricultoras em luta, cantando: ―Agricultura Familiar
mãos calejadas que alimentam o povo, semeando terra solidária, política agrária, plantando o
sindicalismo novo.‖
A Graduação foi um dos períodos mais importantes da minha formação, especialmente
pela sua característica, visto que, a universidade abriu as portas para agricultores e
agricultoras familiares vinculados ao movimento sindical e com isso permitiu um tempo
diferenciado para nossa formação – as aulas ocorriam de maneira intensiva alternando uma
semana ou duas a cada mês – porém, não havia uma construção curricular ou proposta de
alternância pedagógica intencional por parte da instituição, de modo que os processos de
organização e proposição partiam da própria turma. Foram também momentos de tensão e
disputa que se materializaram em um excelente processo de construção de conhecimentos.
27
A característica do curso ao alternar os tempos, e da turma composta por agricultoras e
agricultores familiares sindicalizados dos três estados da região sul – Paraná, Santa Catarina e
Rio Grande do Sul - geraram situações distintas das realidades acadêmicas conhecidas pelos
estudantes e professores. A Federação adquiriu móveis e a turma alugava uma casa na cidade
de Cruz Alta/RS, onde o curso funcionava, e nesse ambiente se partilhava tudo: o espaço, a
comida, os conhecimentos, os trabalhos acadêmicos, as dificuldades, as realizações pessoais e
coletivas, a vida, tudo de maneira muito intensa.
A casa se tornou um ambiente formativo em todos os sentidos, as condições em que
ela passou a existir, ou seja, uma república de estudantes que se juntam para sobreviver à
formação superior. Inicialmente eram quarenta e seis pessoas que não se conheciam e
passaram a dividir o mesmo teto. Entre os principais aprendizados desse processo destaco os
da organização, da escuta do outro, da divisão de tarefas e responsabilidades, para as quais
muitas tentativas e erros foram criando alternativas que possibilitaram a convivência por
quatro anos.
Entre as alternativas criadas para o funcionamento da turma/casa, criamos a eleição de
representantes que chamávamos coordenação de finanças e coordenação pedagógica. A
primeira tinha como função organizar as contas de aluguel, alimentação, luz, água e
infraestrutura da casa, apresentar o balanço financeiro em reuniões sistemáticas e arrecadar as
cotas de cada morador/aluno para efetivar os pagamentos – um aprendizado na área de gestão
incorporado na necessidade cotidiana. A segunda, a qual assumi por um período, tinha o papel
de fazer a relação da turma com as coordenações institucionais da Universidade e da
Federação, participar de reuniões nos diferentes âmbitos levando as pautas da turma e
contribuindo na construção de alternativas viáveis para a materialização dos processos
formativos.
A representação estudantil (que chamávamos coordenação pedagógica) me permitiu
vivenciar experiências muito significativas de proposição, construção de alternativas e
mediação das pautas dos estudantes com a universidade. Entre essas vivências destaco os
momentos de tensão e disputa para a organização do primeiro estágio curricular, o qual, a
depender da instituição deveria ocorrer na cidade de Cruz Alta/RS, para que houvesse um
acompanhamento integral da professora responsável, porém, o município não dispunha de
escolas do campo em número suficiente para acolher os graduandos que, pela sua
característica específica, apresentavam essa pauta como intransponível.
28
Foi um processo intenso de organização e construção que culminou em uma parceria
com as Secretarias Municipais de Educação de Espumoso, cidade onde eu residia, e
Jacuizinho, ambas no Rio Grande do Sul e relativamente próximas da cidade de Cruz Alta,
que receberam e distribuíram todas/os as/os estagiárias/os nas suas escolas do campo. As
famílias das comunidades que residiam no entorno das escolas hospedaram as/os
estagiárias/os e participaram intensamente das atividades escolares naquele período,
demonstrando que as aprendizagens construídas no estágio curricular extrapolaram os muros
das escolas e trouxeram inúmeros conhecimentos e novos significados para essa experiência.
A melodia que nos embalava nessa trajetória era de Milton Nascimento: ―Coração de
estudante, há que se cuidar da vida, há que se cuidar do mundo, tomar conta da amizade.
Alegria e muito sonho, espalhados no caminho. Verdes, planta e sentimento, folhas, coração,
Juventude e fé.‖
Outra memória marcante desses espaços de mediação e construção de caminhos para a
turma foi a reunião que construiu as linhas de pesquisa para o desenvolvimento dos Trabalhos
de Conclusão de Curso (TCCs), que contou com a participação das coordenações
institucionais da Universidade e da Fetraf-Sul/CUT e representação dos estudantes. A
proposta era que os TCCs se constituíssem em iniciação à pesquisa para os acadêmicos e ao
mesmo tempo possibilitassem investigações de interesse social, do movimento sindical da
agricultura familiar e da Educação do Campo, a partir da inserção dos acadêmicos nos
espaços de produção do conhecimento da Federação e nas escolas públicas do campo. Foram
elaboradas cinco linhas de pesquisa nas quais os professores orientadores e acadêmicos se
inscreveram conforme o seu campo de interesse.
Minha escolha foi pela linha denominada ―o papel da escola no desenvolvimento
local‖. A pesquisa foi realizada em uma escola pública do campo que estava implantando um
curso técnico em agroecologia a partir da demanda da própria comunidade. Era uma proposta
inovadora naquele momento e tinha a prerrogativa de um trabalho coletivo de construção
junto com a comunidade. A ideia que levamos a cabo foi de uma pesquisa qualitativa onde
entrevistamos professores, alunos e comunidade. O trabalho discutiu os temas da Educação do
Campo e desenvolvimento a partir da experiência vivida pelas comunidades envolvidas. O
resultado foi o trabalho intitulado ―O papel da escola no desenvolvimento local: a experiência
de Espumoso.‖
29
Retalhos de uma atuação profissional e do início da caminhada como pesquisadora
Os retalhos alinhavados na minha colcha de retalhos profissional e de pesquisadora
apresentam novas cores a partir do final da graduação, quando comecei a trabalhar na
Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar, foi um momento de retomada dos
projetos de formação na Fetraf-Sul/CUT que teve início com o ―Projeto Terra Solidária‖, um
projeto de elevação de escolaridade em nível fundamental para agricultores e agricultoras
familiares na perspectiva da formação integral do sujeito tornando-o capaz de atuar como
agente de desenvolvimento. O Projeto foi desenvolvido articulando ―a formação fundamental
e a qualificação profissional integradas nas atividades teóricas e práticas na perspectiva da
ação-reflexão-ação.‖ (PASSOS, 2001, p.29)
Uma das características importantes a serem destacadas no Projeto é a formação
permanente em serviço. A cada nova unidade de ensino2 nós, os/as educadores/as, recebíamos
formação sobre as temáticas a serem desenvolvidas e elaborávamos coletivamente nossos
percursos formativos, ou seja, um guia com sugestões de atividades para serem desenvolvidas
em sala de aula de maneira que fosse possível articular as disciplinas curriculares do ensino
fundamental, dentro das prerrogativas do projeto, considerando o fato que desenvolvíamos as
atividades por meio da unidocência – docência dos diferentes conhecimentos por um/a
único/a educador/a, considerando que, na perspectiva do projeto, ―não se pretende que o (a)
educador (a) domine todas as áreas a serem trabalhadas, mas que ele possa identificar as
relações que existem entre elas‖ (PASSOS, 2001, p.32).
Atuei como educadora nos primeiros módulos do Terra Solidária e em uma
reorganização e ampliação dos projetos da Fetraf-Sul/CUT passei a compor a equipe de
formação no cargo denominado Assistente Pedagógica. Foram aprovados dois novos projetos,
um deles com foco na formação das mulheres e outro na Juventude, denominados ―Projeto
Mulher‖ e ―Consórcio Social da Juventude Rural – Sementes na Terra‖.
A nova fase no trabalho com o movimento sindical me possibilitou ampliar a visão
em relação a organização dos/as agricultores e agricultoras familiares e ao mesmo tempo
estreitar os laços teóricos e práticos com a Educação do Campo e seus sujeitos. Entender as
demandas dos Agricultores, das Mulheres Agricultoras e da Juventude, participar de
2 O projeto foi organizado em 20 unidades de ensino (PASSOS, 2001, p.35).
30
assembleias, mobilizações, lutas e enfrentamentos fortaleceu vínculos e a crença na
possibilidade de transformação da sociedade por meio da organização e da luta coletiva.
Na prática, minha função na equipe de formação era de elo entre os educadores/as das
turmas do estado do Rio Grande do Sul com a coordenação pedagógica e política de cada
projeto. Para tornar essa ligação possível realizava visitas periódicas nas diferentes turmas do
estado, ouvia as turmas e os/as educadores e levava suas pautas às reuniões de trabalho da
equipe.
Além disso, colaborava na preparação e organização das Formações de Formadores
(FFs) e durante sua execução atuava na coordenação da elaboração dos percursos formativos.
Foi uma experiência muito enriquecedora e um grande aprendizado. Me possibilitou conhecer
as diferentes regiões do estado, cada uma com suas especificidades, seja na área produtiva da
Agricultura Familiar ou nas formas distintas de organização, mas que juntas partilhavam seus
saberes e elaboravam ricas propostas de ensino-aprendizagem.
Uma página que se tornou especial nesse processo foi a retomada das atividades com a
Juventude por meio do Consórcio Social da Juventude Rural – Sementes na Terra (CSJR). O
projeto teve duração de dezoito meses os quais foram de intensa formação, diálogo e
organização da Juventude. O diferencial proposto para o seu desenvolvimento era a chamada
tríade metodológica: Formação político-programática, Técnico-produtiva e atividades na
Comunidade.
Na prática, o referido projeto considerava que a aprendizagem não se dá apenas no
espaço da sala de aula e por isso articulava a sua metodologia em três momentos a cada
módulo de formação, quais sejam: a) atividades em aula, b) práticas e intercâmbios na área
técnica estudada e, c) trabalhos de campo que implicavam na inserção do educando na sua
comunidade, entendendo os/as sujeitos na sua integralidade.
O trabalho no Consórcio por meio do acompanhamento das turmas do Rio Grande do
Sul e a aproximação com a Juventude e suas pautas me levou a estreitar laços com o Coletivo
de Jovens da Federação do Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região Sul, espaço de
diálogo, participação e proposição de políticas públicas. Instância específica de organização
da Juventude que mobilizou milhares de jovens na perspectiva do reconhecimento da sua
identidade e construção de espaços de diálogo dessa Juventude.
Ao findar minha atuação como assistente pedagógica da Federação, quando da
conclusão dos projetos, segui acompanhando o Coletivo de Jovens nos seus espaços de
31
formação e organização, contexto que gerou a demanda pela inserção dessa pauta no ambiente
acadêmico. Participei, então, do processo seletivo no Mestrado em Educação nas Ciências da
Universidade Regional do Noroeste do Rio Grande do Sul – Unijuí com proposta de pesquisa
objetivando analisar a contribuição do CSJR para a permanência dos jovens na Agricultura
Familiar, seus reflexos na formação de agentes de desenvolvimento, intervenção dos mesmos
nas políticas públicas, na construção de alternativas de geração de renda e no processo
organizativo dessa Juventude.
A opção por investigar o tema da Juventude Rural, como podemos observar pela
trajetória ora descrita, vem se construindo ao longo do tempo, inicialmente pela participação
em espaços de formação e discussão do Coletivo de Jovens da Federação dos Trabalhadores
na Agricultura Familiar da Região Sul – Fetraf-Sul/CUT, no sentido de garantir as condições
necessárias para a permanência de Jovens no campo e, portanto, de continuidade da
Agricultura Familiar. Posteriormente, este engajamento militante resultou na pesquisa
realizada no Mestrado em Educação nas Ciências da Universidade Regional do Noroeste do
Rio Grande do Sul – UNIJUÍ, vinculada à Linha de Pesquisa de Educação e Movimentos
Sociais, sob a orientação da professora Anna Rosa Fontella Santiago, intitulada ―Sementes na
Terra: Educação, Juventude, Agricultura Familiar‖.
Esse trabalho se construiu fruto da inserção nesses espaços e da percepção da
importância da Agricultura Familiar e suas possibilidades de reprodução a partir das escolhas
dos/as Jovens sujeitos desse processo. Nesse sentido, satisfazer o desejo de compreender os
motivos que movem tais escolhas, para além das necessidades econômicas, na subjetividade,
naquilo que produz sentido e nos projetos de vida desses/as Jovens. Entre as melodias
entoadas nesse período, Dante Ramón Ledesma tem uma especial, chamada ―A Vitória do
Trigo‖: ―Se somos todos irmãos, se todos somos amigos, basta um pedaço de chão para a
vitória do trigo.‖
Retalhos de uma nova ruptura: o trabalho em Brasília
Os retalhos costurados na minha trajetória no período que vivi em Brasília foram
diferentes, provocaram certa ruptura no compasso das experiências que havia construído até
então. Primeiro porque significou arrancar raízes, partir para longe da família, amigos, e
cenários que eu estava habituada. Foram trinta anos vivendo no Rio Grande do Sul,
32
convivendo com a cultura local e de repente me vejo em meio ao cerrado, em uma cidade
inicialmente fria, do ponto de vista das relações, e, um trabalho completamente novo para
desempenhar.
Foram três anos envolvida em processos de gestão em âmbito nacional, em programas
específicos, primeiramente no Ministério de Desenvolvimento Agrário, na Secretaria de
Reordenamento Agrário onde estive vinculada ao Programa Nacional de Crédito Fundiário –
PNCF e, posteriormente, no Ministério da Educação, na Secretaria de Ensino Superior,
vinculada a Coordenação de Residências em Saúde.
Foram ambas tarefas desafiadoras, pela característica dos contratos de consultoria que
previam a elaboração de relatórios e documentos técnicos em áreas tão específicas que
demandaram estudo e aprofundamento de cada uma. No Crédito Fundiário minha atuação foi
relacionada a análise, sistematização e proposição de aprimoramento dos processos de gestão
e relação entre a Secretaria de Reordenamento Agrário e os Estados que executavam o
Programa, análise de relatórios técnicos como a Avaliação de Impacto do Programa elaborado
pela Fundação de Estudos Agrários Luiz de Queiroz (FEALQ/ESALQ), e, Programa nacional
de crédito fundiário: uma avaliação Qualitativa (2003-2010) produzido pelo Departamento de
Estudos Socioeconômicos Rurais (DESER). Outras atividades desenvolvidas nesse período
estão relacionadas a elaboração de conteúdo e metodologia e sistematização de resultados de
oficinas técnicas sobre o PNCF realizadas nas regiões sul, sudeste e centro-oeste.
Na Coordenação de Residências em Saúde as atividades que desenvolvi estão
relacionadas aos estudos analíticos de áreas de concentração dos Programas de Residência em
Área Profissional da saúde nas diferentes Câmaras Técnicas existentes com foco nas
nomenclaturas, perfil geral do egresso, perfil geral da área de concentração e perfil específico
dos egressos por área profissional.
É importante destacar entre os aprendizados desse período a compreensão da
dimensão territorial e da diversidade que compõe o Brasil. Acompanhar e estudar processos
de gestão em Programas operacionalizados em âmbito nacional nos permite perceber que cada
região, estado, município tem características próprias e formas distintas de resolver problemas
que impactam na implementação dos referidos programas, o que torna fundamental que a
relação entre os entes envolvidos possibilite o permanente diálogo e avaliação desses
processos. A música que reflete um pouco essas vivências é de Milton Nascimento e seu
33
nome ―Coração Civil‖: ―Quero a utopia, quero tudo e mais, quero a felicidade nos olhos de
um pai. Quero a alegria, muita gente feliz, quero que a justiça reine em meu país.‖
Retalhos de um retorno à Educação do Campo
Os retalhos que fizeram parte dessa tessitura de retorno à Educação do Campo, onde
considero o meu lugar, se fizeram, também, desafiadores por se constituir em um novo
território: A Licenciatura em Educação do Campo no Amapá, para mim, um encontro que
resultou no apaixonamento pela Amazônia.
Esse processo se constituiu em continuidade à trajetória de pesquisadora, em um novo
momento e novo contexto, vivenciando a experiência da docência na Licenciatura em
Educação do Campo da Universidade Federal do Amapá, que convoca a imersão na realidade
Amazônica, pois é desenvolvida por meio da Pedagogia da Alternância, que pressupõe
diferentes tempos e espaços de formação, ou seja, períodos intensivos de formação presencial
no campus universitário e, pelo Tempo Comunidade, que se constitui de períodos de formação
presencial nas comunidades camponesas, com a realização de atividades pedagógicas
orientadas e acompanhadas pelo corpo docente do curso.
Essa vivência docente inserida nas comunidades dos acadêmicos sejam elas
ribeirinhas, extrativistas, reinseriu a preocupação com a Juventude do Campo que já existia,
mas ganhou novo impulso ao conhecer novas perspectivas de campo, novos sujeitos e modos
de vida. Nesse período, também, nasce o nosso Grupo de Pesquisas denominado JUREMA:
Juventude Rural, Educação e Movimentos Sociais na Amazônia da parceria entre docentes e
pesquisadores, com a participação de acadêmicos da Ledoc.
A Licenciatura em Educação do Campo proporcionou uma importante imersão na
realidade dos alunos, a possibilidade de conhecer e vivenciar momentos de intensa
aprendizagem com as comunidades do campo no Amapá. As atividades em cada comunidade
manifestavam suas características próprias e os saberes acumulados ao longo do tempo pelas
suas lideranças.
A medida que o curso se desenvolvia, nas suas atividades de ensino, pesquisa e
extensão, no desenvolvimento da formação por Alternância, nosso horizonte se expandia no
sentido de conhecer e vivenciar novas formas de organização social, cultural e mesmo
34
curricular. A heterogeneidade presente na realidade Amazônica se fazia presente nas
aprendizagens e em cada um dos cinco sentidos, na pele, no olfato, no paladar, na visão e
audição, por meio do envolvimento com os sujeitos da Educação do Campo.
Entre diversas andanças pelas comunidades amapaenses, conhecer e dialogar com as
comunidades da RESEX-CA nos desafiou a uma nova perspectiva de entendimento da posse e
―exploração‖ da terra e do território, completamente distinto dos processos organizativos de
onde eu vinha e conhecia. Essa especificidade provocou inquietudes e curiosidades
pedagógicas, no sentido freiriano, e plantou o desejo de investigar e conhecer cada vez mais
sobre esse lugar.
Nesse período a Música Popular Amapaense entra na minha vida, com toda sua
riqueza de poesia e melodia. Entre muitas canções que aprendi a amar, a do amigo Zé Miguel
―Meu Endereço‖ abriu caminho para o encantamento: ―É fácil o meu endereço vá lá quando o
sol se pôr, na esquina do rio mais belo com a linha do equador‖.
Retalhos de Andanças com a “Juventude da Floresta”: partilhando visões, canções e
modos de vida
Ao costurar os retalhos dessa memória tão significativa em minha trajetória sinto um
misto de alegria, gratidão e emoção. Foram experiências extremamente importantes na minha
trajetória no sentido mais amplo, seja no campo pessoal, familiar, profissional, acadêmico,
enfim, em cada pedaço do meu ser.
O início se deu em conjunto, nós, os professores da Licenciatura em Educação do
Campo da UNIFAP (que nesse momento do curso éramos 4) em parceria com o Professor
Dr. Antônio Sérgio Monteiro Filocreão do colegiado de ciências sociais, apresentamos
proposta ao edital do CNPq e aprovamos um projeto de extensão com o objetivo de realizar
processo de formação com Jovens de 15 a 29 anos matriculados regularmente no Ensino
Médio da Escola Família Agroextrativista do Carvão, no município de Mazagão, Estado do
Amapá. Foram desenvolvidas atividades de produção e difusão de conhecimentos, com vistas
ao fortalecimento da identidade e modo de vida extrativista na perspectiva da garantia de
protagonismo da Juventude, auto-organização, criação de produtos culturais e a geração de
renda. Para além disso, tínhamos como prerrogativa contribuir com o desenvolvimento
sustentável e com a superação das desigualdades de renda de agricultoras/es e extrativistas,
um grande desafio.
35
Para um relato mais detalhado desse processo seriam necessárias muitas linhas, nesse
sentido, farei um destaque para alguns resultados que foram: a realização de exposição de
fotos itinerante que visitou o Garden Shopping em Macapá e as Escolas Famílias do Amapá; a
publicação de um livro de imagens intitulado ―Visões da Juventude da Floresta‖ e de um livro
contando a experiência do projeto denominado ―Juventude da Floresta: relatos de uma
experiência‖; a realização de um festival de músicas inéditas com gravação de CD ao vivo,
chamado ―Festival da Juventude da Floresta‖ e gravação de um documentário por nome
―Juventude da Floresta em Movimento‖.
Cabe destacar que cada um desses resultados foi vivenciado pela Juventude como
processo de formação, sempre conduzidos de maneira participativa, por meio de módulos e
oficinas que, em cada etapa proporcionaram aprendizagens nas diferentes áreas, seja na
fotografia, filmagem, composição musical, roteiro, etc. Essas atividades possibilitaram aos/as
jovens vivenciar situações novas que se traduziram em ricos relatos que foram apresentados a
comunidade e, também, em eventos acadêmicos científicos.
As letras e músicas que marcaram esses momentos foram muitas, composições dos/as
jovens participantes que falam da sua terra, do seu jeito de ser, das lutas diárias. Deixo aqui
um trecho de uma letra de luta ―Somos frutos dessa terra e não viemos pra brincar, a
Educação do Campo nós iremos transformar, mudar, realizar, nossa vida melhorar‖!
Retalhos da vivência acadêmica: o Doutorado em Educação
Falar dos retalhos costurados na caminhada do doutorado é expressar de maneira
muito significativa um dos processos mais intensos e desafiadores de aprendizagem e
produção de conhecimento. A participação nas disciplinas, as leituras e aprofundamentos
teóricos que impõe ritmo e rotina de estudos foram ingredientes potentes e necessários em
minha constituição enquanto pesquisadora.
A participação em diversos eventos acadêmico-científicos possibilitaram trocas,
questionamentos, discussões teórico-metodológicas que enriqueceram as elaborações a cada
nova escrita e apresentação de trabalho.
A participação no Grupo de Estudos em Juventude e Representações sociais
(GEPEJURSE) foi um capítulo extremamente importante na trajetória do doutorado. O
36
ambiente acolhedor do grupo nos torna mais gente, nos permite diálogos e partilhas que são
decisivos na tarefa cotidiana de produzir, cumprir prazos e buscar uma escrita melhor a cada
nova elaboração. As contribuições acadêmico-científicas possibilitadas nas reuniões do grupo,
a condução dos trabalhos, a organização das reuniões e atividades geraram aprendizagens
imprescindíveis nesse processo formativo.
Outro capítulo que merece destaque foi a vivência do doutorado sanduíche na
Universidad Pablo de Olavide, na Espanha. Posso traduzir em um dos maiores desafios que
me propus ao longo da vida pessoal, profissional e acadêmica. Deixei família, amigos/as,
colegas, meu ―lugar‖ e parti para outro país, outra língua, outra cultura, como se me jogasse
em um novo universo. As aprendizagens dessa experiência extrapolam e muito as acadêmico-
científicas e se traduzem em um processo de desterritorialização e reterritorialização.
O tempo de 6 a 7 meses pareceu muito maior pela importância que tomou em cada
âmbito da vida. Conhecer um novo rural, novas Juventudes, outro sistema educacional, as
leituras, as aulas, os eventos, a organização da universidade, todo esse universo de situações
novas que exigem adaptação e novas relações foi simplesmente brutal. Do mesmo modo
retornar para casa, para a UFPA, para as relações anteriores, porém, pelo contexto, pareceu
tudo novo, de novo! Reaprender as rotinas e retomar as atividades é também uma rica
aprendizagem.
Entre as músicas que ecoavam com letras cantadas em outro idioma, a do grupo La
Oreja de Van Gogh sem dúvida foi a mais marcante ―Así que ven y mírate al espejo te
presento a la chica más valiente del universo y aunque a veces tenga miedo y se esconda del
reflejo ella siempre brillará dentro de ti...‖
O tamanho da aprendizagem proporcionada no caminho percorrido é imensurável.
Apesar da descrição hiperbólica, essa é a forma que consigo traduzir. De todo modo, cabe
mencionar que, entre outras coisas, nos faz perceber que as dificuldades, os acertos, os erros,
os desafios estão em todos os lugares. No âmbito pessoal, institucional, sempre há processos
de construção de algo melhor e a busca pelo conhecimento e pela melhoria nas relações, nos
fluxos, na organização. Estamos todos no mesmo ―barco‖!
37
SEÇÃO I
INTRODUÇÃO
Fonte: Visões da Juventude da Floresta (2016, p. 12).
A imagem acima apresenta um jovem extrativista ―tirando açaí‖ (colheita). A
fotografia fala por si, do esforço para suspender o próprio peso, cortar o cacho e deslizar com
38
ele até o chão para posteriormente debulhar. O fruto é conhecido na região como ―ouro
negro‖, é ao mesmo tempo um dos alimentos mais consumidos pelas populações do campo
amapaense e importante fonte de renda para as famílias dessas comunidades.
“E tua fruta vai rolando, para os nossos
alguidares
Tu te entregas ao sacrifício. Fruta santa, fruta
mártir.
Tens o dom de seres muito, onde muitos não têm
nada
Uns te chamam açaizeiro, outros te chamam
juçara...”
(Sabor Açaí, Nilson Chaves)
1.1 NESTE TEMPO, NESTE ESPAÇO: DESIGUALDADES E POSSIBILIDADES
A realidade em que estamos inseridos muda constantemente, na contemporaneidade a
tecnologia avança e a chamada obsolescência programada torna objetos substituíveis
rapidamente. Equipamentos considerados de última geração são descartados, pois se tornam
ineficientes diante da próxima inovação. A velocidade com que as mudanças ocorrem impacta
na materialidade da vida, na corrida provocada pelo consumo do novo, do inédito, mas,
também, nas relações e trocas que passam a ser paradoxalmente encurtadas e distanciadas. De
um lado, os meios de comunicação e informação, tais como as redes sociais, interligam
pessoas distantes fisicamente, ao passo que afastam aqueles que vivem debaixo do mesmo
teto.
É expressão do ―novo tempo‖, fundado nas novas tecnologias, intemporal e alheio a
vida concreta, porém, há uma infinidade de possibilidades que ainda se apoiam no ―tempo
humano‖, sobre o qual Manuel Castells afirma: ―Todo tempo, na natureza como na sociedade,
parece ser específico a um determinado contexto: o tempo é local‖ (1999, p. 457).
Não obstante essa realidade provocada pelo consumo e pela interconectividade, temos
no Brasil um cenário de muitas incertezas e dúvidas sobre a possibilidade dos processos de
trocas, partilhas e construção de conhecimentos estabelecerem redes de fortalecimento de
39
grupos sociais para seguirmos construindo a superação das desigualdades por meio de
alternativas de melhoria na qualidade de vida das populações.
A atual conjuntura nos coloca no compromisso de ―não soltar a mão de ninguém‖3,
principalmente quando somos parte de grupos de resistência que enfrentam a dura realidade
da negação de acesso aos direitos básicos. Essa situação ocorre a partir das políticas de
governo que impactam diretamente na sobrevivência, especialmente da população que mais
necessita do sistema público. São tempos de retrocesso nas diversas áreas, tais como nos
direitos trabalhistas, previdência social, sistema único de saúde, na educação, etc.
A educação no Brasil é tratada como mecanismo de subordinação aos interesses do
capital, enquanto às elites é destinado o privilégio de uma formação completa e abrangente, às
classes populares e aqui destacamos as populações do campo, das águas e das florestas, são
destinadas a aprendizagem de saberes básicos e elementares, necessários aos ofícios que irão
exercer no mundo do trabalho.
Esse processo de subordinação pode ser observado nas diferentes políticas em curso,
como, por exemplo a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) que propõe a
homogeneização do currículo em um país com a extensão territorial do Brasil e com contextos
e dinâmicas extremamente desiguais, sob o argumento de que a qualidade da educação
depende disso. Cabe-nos problematizar: qual a noção de que qualidade da educação? Nessa
lógica, a dita qualidade segundo Lopes (2018) fica ―reduzida [...] a assimilação de conteúdos
e ao cumprimento de expectativas de aprendizagem‖ além do fato de que ―passa a ser
identificada com resultados positivos nos exames nacionais e internacionais e o currículo
torna-se cada vez mais dirigido pelas avaliações‖ (LOPES, 2018, p. 26).
Além disso, o contexto de desestruturação das garantias sociais conquistadas à custa
de muitas lutas e organização ocorre em uma sociedade globalizada, em rede, como afirma
Nascimento ―a comunicação e a informação assumem papel fundamental e crescente para
todos‖ (2015, p. 45). As distancias físicas e geográficas são encurtadas pelas novas
tecnologias e, dessa forma, tornam-se uma importante ferramenta de organização, porém,
paralelamente, são uma forma para difusão de conteúdos questionáveis, como o caso do
3 Segundo Nassif (2018) a expressão ―Ninguém solta a mão de ninguém‖ tem origem no período da ditadura
militar, onde funcionava o curso de ciências sociais da USP em barracos improvisados. Segundo o jornalista,
―De noite, quando as luzes das salas de aula eram repentinamente apagadas, os estudantes buscavam as mãos uns
dos outros e se agarravam ao pilar mais próximo. Depois, quando as luzes acendiam, faziam uma chamada entre
eles. Muitas vezes acontecia de um colega não responder, pois já não estava mais lá...‖ Desse modo, se tornou
símbolo de resistência e união, sendo amplamente compartilhada nas redes sociais por pessoas ligadas a grupos e
movimentos sociais em 2018, a partir da eleição do presidente Jair Bolsonaro.
40
grande número de ―fake news4‖ espalhadas por meio de redes sociais. Falsas notícias aceitas
por um grande número de pessoas sem as condições necessárias para filtrar as informações
recebidas, em geral, pela falta de acesso a escolarização, bem como, pela sua inserção recente
nesse espaço e, por conseguinte, inexperiência na navegação e checagem de fontes.
Apesar da recente inserção de um grande número de pessoas a esse universo, a
chamada inclusão digital não chega de maneira efetiva a todas as regiões do país,
principalmente quando se trata do campo brasileiro. Em inúmeras comunidades amazônicas,
por exemplo, há ausência de água potável, saneamento básico e o acesso à energia elétrica
durante 24 horas ainda não é uma realidade, dificultando de maneira concreta o acesso aos
recursos digitais.
Nesses territórios, a oferta de energia elétrica se dá por meio de geradores movidos a
combustível, mantidos por recursos públicos em algumas horas do dia (entre às 16 e 23 horas
aproximadamente). Porém, durante as poucas horas do dia em que o gerador das comunidades
é ligado, grupos de pessoas se aglomeram próximos ao sinal de internet disponível. São
tempos em que ―As trocas simbólicas se aprimoram a partir do desenvolvimento de novas
tecnologias e registram no aparecimento da comunicação digital da multimídia, um
considerável avanço nas interações sociais‖ (NASCIMENTO, 2015, p. 45).
É nesse contexto que buscamos melhorar o entendimento sobre a Juventude do
Campo. Pretendemos refletir essas questões a partir de leituras e reflexões entrecruzando-as
com os modos de vida que se constituem nos territórios da Amazônia Amapaense,
especificamente na Reserva Extrativista do Rio Cajari (RESEX-CA), compreendendo a
Educação do Campo neste contexto como espaço de luta, organização e resistência.
Nos propomos a estudar Juventude em relação com as temáticas de educação e opção
de vida no campo brasileiro, o que implica em considerar essa problemática de discussão e
elaboração sobre os referidos modos de vida e, portanto, modelos de desenvolvimento, formas
de luta e organizações sociais específicos. Estes diferentes modelos configuram e
reconfiguram as escolhas das/os jovens em diferentes escalas, devido ao contato com um
contexto plural e diverso que compõe a realidade da sociedade brasileira.
Em se tratando da Amazônia amapaense, os modos de vida dos Jovens da floresta,
extrativistas, ribeirinhos, assentados, pescadores, quilombolas possuem especificidades nesse
lugar onde as trocas entre esses sujeitos possibilitam a construção de sua singularidade
4 A tradução literal da expressão em inglês Fake News é notícias falsas.
41
simbólica. Esse processo de trocas e interações é apresentado com propriedade por
Nascimento da seguinte forma:
A singularidade simbólica da cultura local de cada sociedade é perpassada, por um
lado, por uma sinalização que se configura em uma rede de conexões interativas, e
por outro lado, cada cultura ao depender de sua dinâmica histórico-social, avança em
diferentes níveis por uma codificação em que a mídia participa efetivamente da
legitimação deste capital simbólico (NASCIMENTO, 2015, p. 47).
Essa singularidade simbólica vivenciada pelos/as jovens amazônidas é perpassada por
aspectos culturais específicos e que são repassados de geração em geração. Ao mesmo tempo
essa cultura é atravessada pelas novas tecnologias, que de maneira precária, chegam a estas
comunidades em alguns pontos de acesso a serviços públicos como, por exemplo, em escolas
e unidades de saúde.5
Esse processo de construção é perpassado pela disputa do território, seja no campo
simbólico a partir do discurso de modernização e desenvolvimento econômico, na perspectiva
de que o ―o Agro é Pop, Agro é Tech, o Agro é Tudo‖6, seja nas formas de produzir que não
incluem a floresta em pé e tensionam a ocupação desse espaço, a partir da força e das
artimanhas do capital econômico e cada vez mais ganham força. Um exemplo claro dessa
disputa foi, em 2017, o decreto de extinção da Reserva Nacional do Cobre e Associados
(Renca) e sua posterior revogação após sua imensa repercussão.
Segundo o Censo Demográfico de 20107, os/as jovens residentes no meio rural
brasileiro somam um total de 7.807.627, o que corresponde a aproximadamente 5% do total
da população brasileira e o equivalente a 1/3 da população rural brasileira. A preocupação
com a sua permanência (ou não) no campo é alvo de debates em diferentes setores da
sociedade e vem pautando pesquisas acadêmicas nas diferentes regiões do país. Cabe destacar
que, se considerarmos os dados da microrregião de Mazagão8, onde se localiza a RESEX-CA,
os jovens residentes no meio rural somam 3.333, mantendo os mesmos percentuais do total
nacional, ou seja, aproximadamente 1/3 da população residente no meio rural nesta
microrregião.
5 As comunidades do território da RESEX-CA possuem poucos pontos de acesso à internet em locais como
Escolas e Unidades de Saúde. O sinal é fraco e oscila muito, tornando o acesso difícil. Além disso, a energia
elétrica nessas comunidades é proveniente de geradores que são ligados durante poucas horas do dia, somente
nesse período o sinal fica disponível. 6 Comercial de Televisão veiculado exaustivamente em horário nobre pela Rede Globo.
7 Dados do último censo disponíveis em https://sidra.ibge.gov.br/tabela/200.
8 Assim definida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
42
Nos dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), as populações rural e
urbana no Brasil apresentam uma significativa desigualdade no Índice de Desenvolvimento
Humano Municipal (IDHM). Dentre os grupos analisados pelo estudo intitulado
―Desenvolvimento humano para além das médias‖ publicado em 2017, se destacou como o
grupo de maior desigualdade entre os analisados. Quando observamos os dados do estado do
Amapá referentes ao IDHM calculado pelo Ipea no ano de 2015, a partir de três dimensões,
quais sejam, longevidade, educação e renda, a área urbana possui um índice de 0,746,
considerado alto nos parâmetros do instituto, enquanto a área rural apresentou o índice de
0,595 apontado como baixo.
As desigualdades apontadas, especialmente nos dados do IDHM rural e urbano, são
resultados da negação das políticas públicas nas comunidades rurais no estado do Amapá, que
acarretam inúmeros desafios enfrentados pelos/as Jovens para permanecer no campo e, ainda,
construir alternativas de acesso e permanência na escola, especialmente no Ensino Médio.
Em se tratando especificamente dos dados educacionais, podemos observar no censo
escolar, elaborado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira (INEP) que o número de matrículas (inicial) no Ensino Médio no estado do Amapá
no ano de 2018, figurou em um total de 30.533 entre parcial e integral, desse universo, 4.411
encontram-se no meio rural. Nos municípios que compõe a RESEX-CA as matrículas no meio
rural em Laranjal do Jari somam um total de 84, já no município de Mazagão o quantitativo é
de 912 e Vitória do Jari possui 629. Especificamente nas escolas pesquisadas, na RESEX-CA
o total é de 84 no Alto Cajari e no 101 no Baixo Cajari.
Para além dos dados, é importante inferir que o lugar onde a pesquisa foi realizada
possui modos de vida específicos, que se constroem nas relações entre os sujeitos e destes
com o território, em uma região que possui atividades agropecuárias, e mais do que isso é
também uma área protegida9, constituída por florestas, rios, igarapés e lagos. A partir desse
contexto nos dispusemos a caminhada de construção da presente tese que se propôs seguir por
estas estradas e navegar por estes rios na perspectiva de produzir e compartilhar
conhecimentos.
1.2 APRESENTAÇÃO DA TEMÁTICA: PELAS ESTRADAS, RIOS, LAGOS E
IGARAPÉS
9 Diploma Legal de Criação: Dec. nº 99.145 de 12 de março de 1990.
43
“Quem nunca viu o Amazonas nunca irá
entender a vida de um povo. De alma e cor
brasileiras, suas conquistas ribeiras, seu ritmo
novo [...] Quem avistar o Amazonas, nesse
momento, e souber transbordar de tanto amor,
esse terá entendido o jeito de ser do povo daqui.”
(Joãozinho Gomes e Val Milhomen)
A canção Jeito Tucujú, citada acima, alimenta o coração de muita gente desta terra e
destas águas e nos desafia a olhar para esse lugar não somente com os olhos da razão, mas
também a partir do coração. É a forma de transbordar de amor, pois, segundo a letra, só assim
é possível entender o jeito de ser do povo daqui. Estudar, pesquisar, nesse território implica
entender esse Jeito Tucujú. Esse desafio, que nos insere na responsabilidade de propor e
desenvolver um estudo na profundidade necessária de uma tese, também nos desperta para
inúmeros questionamentos.
Definir um problema de pesquisa é ir ao encontro das curiosidades que nos movem,
que nos instigam e que, ao mesmo tempo, possam incidir em algum processo e grupo social.
As perguntas que se tornam importantes nesse momento, segundo GIL (2008, p.34), são: O
que pesquisar? Como? Por que? Para quem?
Esses questionamentos nos seguem durante todo o processo de elaboração, desde o
projeto inicial até o momento da conclusão e se ampliam: Tomei a decisão correta? Será esse
o melhor caminho metodológico? Será isso que importa aos sujeitos envolvidos? Serão essas
as leituras e diálogos necessários? Serão essas articulações e construções teóricas possíveis?
Em cada momento e a cada linha de produção escrita e reescrita brotam novas elaborações, e
com elas outras dúvidas. Para GIL (2008, p.35) a escolha do tema de pesquisa sempre indica
algum tipo de comprometimento, ou seja, um constante processo de construção e reconstrução
de conhecimentos que também é permeado por sentimentos e subjetividades.
Considerando esses elementos, a questão chave colocada para esse estudo é: quais as
representações sociais dos Jovens da Reserva Extrativista do Rio Cajari (RESEX-CA)
sobre a sua escolarização no sistema modular de ensino (SOME) e as implicações no seu
projeto de vida? E, por consequência, tomamos como referência o seguinte objetivo Geral -
Compreender as representações sociais dos jovens da Reserva Extrativista do Rio Cajari
44
sobre a sua escolarização no sistema modular de ensino e as implicações no seu projeto
de vida.
Para responder ao referido objetivo, traçamos como objetivos específicos 1)
Identificar o perfil dos jovens da Reserva Extrativista do Rio Cajari matriculados no
Ensino Médio modular; 2) Caracterizar as imagens e os sentidos dos jovens sobre a sua
escolarização no sistema modular de ensino; 3) Destacar as objetivações e as ancoragens
que compõe as representações sociais de jovens sobre a sua escolarização no sistema
modular de ensino; 4) Verificar as implicações das representações sociais nos seus
projetos de vida.
Nesse sentido, a proposta de investigação em questão buscou entender os processos de
inserção da Juventude na educação escolar e quais os impactos que esses processos de
educação provocam em projetos de vida idealizados e/ou construídos por esses/as sujeitos
Jovens.
Além disso nossa problemática surge da preocupação com a manutenção das reservas
extrativistas no Amapá e o impacto que a migração dos/as Jovens pode provocar em sistemas
de produção que atualmente garantem a preservação da Floresta Amazônica nessa região.
Para tanto, buscamos entender as razões que contribuem para a decisão de projeto de vida
dos/das Jovens como chave para entender o processo de migração.
O lugar estudado, o estado do Amapá, possui grandes dimensões territoriais, ou seja,
142.828,521 km² divididos em 16 (dezesseis) municípios. Segundo o IBGE, a população
estimada em 201810
é de 829.494 pessoas. A imensa maioria da população se concentra nas
áreas urbanas da capital Macapá, a estimativa do IBGE para 2018 é de 493.634 e do
Município de Santana na região metropolitana, com uma estimativa de 119.610, somando
73,9%. Os demais municípios possuem uma pequena sede urbana e grandes extensões de
território formada por comunidades camponesas e tradicionais, assentamentos, reservas
extrativistas, onde os sujeitos do Campo, das Águas e Florestas vivem e produzem.
Essa característica de distribuição do espaço e a ausência de políticas específicas para
organização dessas comunidades torna os acessos precários, com estradas de terra de longas
distâncias em péssimas condições e, em outras comunidades em que o acesso só é possível
por água. Nesse contexto, o território definido para a presente pesquisa é o da Reserva
10
Dado mais recente disponibilizado pelo IBGE: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/populacao/9103-
estimativas-de-populacao.html?=&t=o-que-e.
45
Extrativista do Rio Cajari (RESEX-CA), que fica localizada entre as coordenadas 01º05‘10‘‘S
e 51º46‘36‘‘W. Sua área compreende parte de três municípios, a saber, Laranjal do Jari,
Mazagão e Vitória do Jari no Sul do Estado do Amapá e possui aproximadamente
532.397,20 hectares e população de 4.164 habitantes (ICMbio). O mapa abaixo apresenta a
localização do estado do Amapá no Brasil e por conseguinte a localização do território da
RESEX-CA no Amapá.
O referido mapa utiliza a cor verde para delimitar a área onde está localizada a
RESEX-CA, situando-a nos mapas do Brasil, posteriormente no estado do Amapá e na região
sul do estado, compondo parte dos três municípios da referida região. As setas e o círculo na
cor vermelha tem a função de indicar a sua posição em cada mapa. Cabe mencionar que a
RESEX-CA, tornou-se área de proteção sob a gestão do ICMbio por meio do Diploma Legal
de Criação: Dec. nº 99.145 de 12 de março de 1990.
Mapa 01: Localização da Reserva Extrativista do Rio Cajari no Brasil, Amapá e Região sul
do estado.
Fonte: ICMbio (2015); IBGE (2009), elaboração ESQUERDO, Priscyla.
Segundo Filocreão (2008), acompanhando o movimento iniciado no Acre nos anos 80,
as populações agroextrativistas do sul do Amapá também se organizaram politicamente para
garantir o acesso aos produtos do extrativismo vegetal. Contando com o apoio de entidades
46
nacionais e internacionais, este processo culminou com a criação de unidades de proteção
ambiental, nas quais está assegurado de forma coletiva o seu uso sustentável. Entre elas, a
reserva extrativista do Rio Cajari (RESEX-CA), vinculada ao Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), criada em 1990. No total, as áreas
protegidas do Amapá ocupam aproximadamente três milhões de hectares de florestas na
Amazônia exploradas de forma sustentável pelos agroextrativistas.
Ainda, segundo Filocreão (2008), a existência, no Sul do Amapá, de castanhais,
seringais e açaizais foi um fator decisivo na criação dessas importantes áreas protegidas.
Acreditou-se nas possibilidades desses recursos naturais em garantir, às populações locais,
condições de geração de ocupação, emprego e renda sem destruir a floresta como já vinha
acontecendo na história regional.
Essas comunidades atuam na busca de alternativas econômicas para o
desenvolvimento sustentável da Amazônia, com o extrativismo de produtos florestais não
madeireiros, como a seringueira (Hévea brasiliensis), o açaí (Euterpe oleraceae) e a castanha
do Pará (Bertholletia excelsa), que sempre foram considerados altamente promissores, devido
ao baixo impacto ecológico dessas atividades aliado à existência de mercados potenciais ou
consolidados na esfera nacional e/ou internacional (FILOCREÃO, 2008).
O acesso à Educação nesse contexto é um capítulo à parte da singularidade do modo
de vida desses povos e comunidades. Como nosso foco no presente trabalho passa pelo acesso
à Educação dos/as Jovens e a construção dos seus projeto de vida, nossa produção tratará do
Ensino Médio, pois, em geral, é nesse momento do processo de escolarização que os sujeitos
se encontram na faixa etária correspondente.
Quase 20 anos após a criação da RESEX-CA o Conselho Nacional das Populações
Extrativistas (CNS) se preocupa com a manutenção do seu modo de vida ―ameaçado‖. Em
entrevista para a Carta Capital11
, o Presidente do CNS, Joaquim Belo, afirma que ―a luta
agora é resistir para mostrar para o resto do Brasil e do mundo como os extrativistas prestam
um serviço enorme para proteção do que ainda resta de Floresta Amazônica no Brasil‖
(CARTA CAPITAL, 2013). Ainda, segundo ele, a batalha dos extrativistas é um contraponto
ao modelo de produção padronizado, um pacote tecnológico que se choca com o modo de
vida extrativista que é passado de geração para geração.
11
Disponível em: http://www.cartacapital.com.br/sociedade/201cnosso-modo-de-vida-esta-ameacado201d-diz-
lideranca-extrativista-5344.html.
47
Esse processo mantido pelos sujeitos do campo ainda hoje, em que a família transmite
o conhecimento tradicional acumulado de geração em geração, se choca com as novas
configurações onde o bom, o bonito, o lugar dos sujeitos toma outras referências, sejam elas a
Escola, a Mídia, etc. Se considerarmos o momento histórico, podemos refletir a partir do que
afirma Nascimento quando diz que ―Anteriormente, este processo era mais fechado e
circunscrito à família, num primeiro momento, e posteriormente ele se ampliava de acordo
com o crescimento da criança‖ (2009, p. 31), porém, no momento vivenciado atualmente,
podemos perceber de maneira mais incisiva a preocupação de Joaquim Belo pois, como
afirma Nascimento: ―ao pensarmos na socialização da criança nos dias atuais, constatamos
que as determinações socioeconômicas aliadas à mídia se confrontam e fragilizam os
operadores que as funções de mãe e de pai utilizam para o crescimento e aprendizagem
infantil‖ (NASCIMENTO, 2009, p.31).
Além disso, se tomarmos a Escola como referência, como proposto como tema de
pesquisa, na mesma entrevista Joaquim Belo faz uma reflexão acerca da educação, segundo
ele, ―A formação está desenhada para o jovem não enxergar a realidade dele como uma coisa
importante. Está desenhada pra tirar ele da floresta porque ali ele não vai crescer, não vai ser
importante, não vai ter um futuro‖ (CARTA CAPITAL, 2013). Para ele o olhar do governo ao
criar institutos de educação no meio rural é ―vesgo‖, pois prepara os jovens para sair da
comunidade, consequentemente colocando em risco os modos de vida e o futuro da floresta.
Nesse sentido, o presente trabalho reflete em que medida o processo educativo
contribui com a reflexão teórico-epistemológica da relação dos educadores e educandos, a fim
de qualificar a intervenção pedagógica na perspectiva de constituir uma ação reflexiva
orientada para a transformação da realidade social. Ou seja, a Educação é ferramenta para
inverter essa lógica de migração dos jovens da floresta para os centros urbanos? Considerando
o Campo um lugar fecundo de experiências de educação, é fundamental promover um debate
acerca desse tema dialogando com a especificidade da Juventude, público historicamente
invisível aos olhares da academia e das políticas públicas.
Cabe mencionar que o presente estudo se insere na Linha de Pesquisa Educação,
Cultura e Sociedade que compreende estudos e investigações que problematizam a Educação
em meio à formação do sujeito, à cultura e às condições históricas das sociedades.
A referida linha entende os processos educativos em articulação com as demandas da
sociedade, movimentos sociais, ações no campo da mobilização política e práticas de
48
reivindicação por educação e inclusão social, além disso, trata a educação na sua historicidade
e a escola, em particular, com seus currículos e práticas pedagógicas, com base nas
representações e ações coletivas dos sujeitos.
Desse modo, a problemática ora proposta é pertinente, pois discute a questão da
desigualdade educacional no que se refere ao acesso dos/as jovens da Amazônia a educação,
que é também, a preocupação do CNS enquanto Movimento Social, bem como, com a
temática da relação que se estabelece entre a educação e a definição de projeto de vida dos/as
Jovens extrativistas a partir das ações e representações desses sujeitos.
Nosso estudo está vinculado ao Grupo de Estudos em Juventude, Identidade,
Representações Sociais e Educação (GEPEJURSE), espaço de fomento à produção e difusão
de estudos no âmbito acadêmico-científico, bem como, de aprofundamento do campo da TRS
e da Juventude, onde o nosso trabalho se insere.
Para a consecução do presente estudo, partimos das seguintes questões orientadoras:
Quem são os/as Jovens da RESEX-CA Cajari estudantes do Ensino Médio modular? Quais as
imagens e os sentidos desses jovens sobre a sua escolarização no sistema modular de ensino?
Quais as objetivações e as ancoragens que compõem as representações sociais de jovens sobre
a sua escolarização no sistema modular de ensino? Quais os projetos de vida de jovens da
Reserva Extrativista do Rio Cajari estudantes do sistema modular de ensino?
A partir desses questionamentos a tese que defendemos é de que a construção dos
projetos de vida dos/as jovens da Reserva Extrativista do Rio Cajari é implicada pelas
suas representações sociais sobre o Sistema de Organização Modular de Ensino,
incidindo nas suas escolhas relacionadas a permanência no campo, possibilidades de
acesso ao ensino superior e melhorias na sua qualidade de vida.
Para tanto, nosso estudo se ancora na Teoria das Representações Sociais elaborada por
Serge Moscovici e aprofundada por Denise Jodelet, Ivany Pinto Nascimento entre outros
importantes autores desse campo, por entender a TRS como uma teoria do conhecimento que
parte do cotidiano dos sujeitos, articulada a concepção de Juventude do Campo defendida por
Elisa Guaraná de Castro, Geraldo Leão, Nilson Weisheimer, entre outros, na perspectiva de
entender esses sujeitos para além da faixa etária, mas percebendo-os a partir da sua vinculação
com o território e das possibilidades de vivência da condição juvenil no campo.
Além disso, nos situamos na compreensão de Educação do Campo construída por
autores como Roseli Salete Caldart, Miguel Arroyo, Mônica Castagna Molina e Salomão
49
Mufarrej Hage no sentido do direito das populações do campo à Educação, no lugar onde
vivem e pensada desde o seu lugar, vinculada a sua cultura e necessidades humanas e sociais.
Nesse sentido nos propomos a realização de um estudo qualitativo, na perspectiva descritivo-
analítica o qual será apresentado de maneira mais detalhada na próxima seção.
O presente estudo está organizado a partir das reflexões apresentadas no Prólogo,
constituído pela apresentação da temática vinculada à trajetória pessoal e profissional, da
importância desse estudo e sua relevância acadêmica, social e pessoal, seguida por esta Seção
I – que inclui as perspectivas de tempo e espaço onde nos situamos no contexto atual. Foram
apresentadas as inquietações que nos levaram a essa elaboração, bem como, a problemática de
pesquisa seguida pelos seus objetivos e a tese que defendemos.
Na seção II – Percurso Metodológico, apresentaremos o percurso trilhado na
realização do presente estudo, destacando o tipo de pesquisa, os territórios onde a pesquisa
foi realizada, seus sujeitos, os instrumentos definidos para sua execução, bem como, a
proposta de análise que seguimos para consecução desse trabalho. Para concluir a referida
seção, apresentamos o estado do conhecimento por meio de levantamento de teses e
dissertações que discutem nossa temática.
Na Seção III – Elaboração Teórica, apresentamos nossa construção a partir dos temas
que envolvem o presente estudo, quais sejam: Representações Sociais, Juventude e Educação
do Campo. Para tanto, percorremos o processo de construção da categoria Juventude, nas
especificidades do rural, do campo e extrativista e a vinculação desses sujeitos com o
território, bem como, a condição juvenil e situação juvenil no campo. Além disso, abordamos
a Educação do Campo e os desdobramentos dessa no Ensino Médio, culminando com a
caracterização do Sistema Modular de Ensino no Estado do Amapá.
A Seção IV intitulada Representações Sociais de Jovens sobre o SOME, apresenta o
perfil socioeconômico dos sujeitos da pesquisa, suas representações sobre o SOME e os
projetos de vida da Juventude, permeados pelas análises e discussões construídas no presente
estudo.
Por fim, na Seção V, trazemos as considerações finais, construídas com base nas
nossas percepções e elaborações vivenciadas durante o processo de construção da tese, na
busca por responder a problemática central proposta pelo nosso estudo de compreender as
representações sociais dos jovens e as implicações nos seus projetos de vida.
50
SEÇÃO II
PERCURSO METODOLÓGICO
Fonte: Visões da Juventude da Floresta (2016, p. 27).
A imagem apresenta a mão de uma jovem segurando uma castanha. O fundo
desfocado, coloca em evidência as unhas pintadas em vermelho e os dedos onde quase é
possível observar as impressões digitais, seguram uma semente totalmente exposta,
descascada. Pode ser consumida in natura ou como ingrediente para diversos pratos
deliciosos. Na RESEX-CA a Associação das Mulheres do Alto Cajari produz e comercializa
principalmente biscoitos e bombons de Castanha.
“A vida que leva essa gente é um canto
plangente, no meio dos castanhais. Tem som de
facão no ouriço, de castanha entre os dentes, de
pele nos espinhais [...].
(Joãozinho Gomes e Val Milhomem)
51
2.1 APRESENTAÇÃO
Nesta seção abordaremos os caminhos teórico-metodológicos percorridos pelo
presente estudo. Cabe destacar que esse percurso não se realiza de maneira linear e por
diversos momentos nos encontramos e desencontramos com nosso problema de pesquisa e as
definições teórico-metodológicas.
Feitas as escolhas, apresentaremos a seguir o tipo de pesquisa e a teoria que ancora a
elaboração do presente estudo, posteriormente os territórios onde a pesquisa foi desenvolvida,
seguido pela definição dos sujeitos.
Na sequência trazemos os instrumentos de coleta de dados e o detalhamento do
processo de aplicação, seguidos pela proposta de análise definida. Por fim, apresentamos o
estado do conhecimento elaborado a partir do levantamento de teses e dissertações que nos
deram suporte na elaboração desta tese.
Cabe mencionar que no início de cada seção trazemos uma imagem, sua descrição e
trechos de poesias e músicas com o objetivo de possibilitar ao leitor transitar pela realidade
material e cultural por onde se construiu o presente estudo.
2.2 TIPO DE PESQUISA
Para a consecução da presente pesquisa escolhemos a abordagem qualitativa, do tipo
descritiva-analítica na perspectiva apontada por Gil (2008), por considerar as características
da Juventude da RESEX-CA e estabelecer relações entre as variáveis relacionadas as
representações sociais desses sujeitos e as implicações em seus projetos de vida. O autor
afirma que ―[...] são inúmeros os estudos que podem ser classificados sob este título e uma de
suas características mais significativas está na utilização de técnicas padronizadas de coleta de
dados‖ (GIL, 2008, p. 28).
No que se refere ao embasamento teórico, o presente estudo se ancora na Teoria das
Representações Sociais por entender que esta é como afirma Guareschi ―uma teoria do
conhecimento; pretende, entre outros objetivos, examinar como se formam os conhecimentos,
como pensamos, com que pensamos, a partir do que pensamos‖ (2007, p. 30).
52
É, segundo Ornellas, um ―conhecimento do senso comum e é formada em razão do
cotidiano do sujeito‖ (2018, p.15), para a autora, as representações sociais encontram-se
atualmente ocupando a centralidade de debates interdisciplinares pela relação que
estabelecem entre as construções simbólicas e a realidade social (ORNELLAS, 2018).
No mesmo sentido, Oliveira, Oliveira e Silveira observam que as RS ―apresentam uma
dimensão epistemológica, por se constituir em uma forma de saber prático produzido e
comunicado nas relações intersubjetivas sociais e culturais cotidianas‖ (OLIVEIRA,
OLIVEIRA e SILVEIRA, 2018, p.50). Ambas autoras reiteram que por se tratar de um
conhecimento socialmente compartilhado as RS contribuem para a construção da realidade
social.
Nosso estudo se desenvolveu a partir da abordagem processual da TRS proposta por
Jodelet (2001), a qual elabora os seguintes questionamentos: 1) Quem sabe e de onde sabe? 2)
O que e como sabe? 3) Sobre o que sabe e com que efeitos? O primeiro questionamento diz
respeito aos sujeitos e ao local de produção e circulação das RS; o segundo tem como base os
pensamentos, ideias, imagens elaborados por determinado grupo social; enquanto o terceiro se
refere a análise e interpretação dos dados coletados e organizados pela pesquisa.
2.3 TERRITÓRIO ONDE A PESQUISA FOI DESENVOLVIDA
O contexto específico onde desenvolvemos a pesquisa foi a Reserva Extrativista do
Rio Cajari, situada na Amazônia, no estado do Amapá, que, em seu território possui duas
escolas que ofertam Ensino Médio por meio do SOME. A escolha das escolas teve como
critério a oferta dessa modalidade de ensino dentro do território que compreende a RESEX-
CA.
A primeira, Escola Estadual Osmundo Valente Barreto possui em média 120 alunos
matriculados e está localizada no Rio Amazonas, próximo à foz do Rio Ajuruxi, na região do
Baixo Cajari, município de Mazagão. A escola atende alunos dos rios Ajuruxi, Ariramba,
Mulato, Capitão, Chato, Carneiro (todos afluentes do Rio Amazonas pela margem esquerda) e
alunos do Rio Arirambinha (afluente do Rio Ariramba). Além de alunos do Rio Curuçá, no
Projeto de Assentamento Maracá.
53
A segunda é a Escola Estadual Água Branca do Cajari com, em média, 100 alunos
matriculados segundo informações da SEED, localizada no Município de Laranjal do Jari,
região do Alto Cajari, às margens da BR 156 que liga o município a capital, Macapá. A escola
atende alunos das comunidades Água Branca do Cajari, Açaizal, Martins, Santarém do Cajari,
Itaboca, Boca do Braço, São Pedro, Dona Maria e Poção.
O Mapa a seguir apresenta a Reserva Extrativista do Rio Cajari e dentro dela a
localização das duas escolas. Cabe retomar que o território da RESEX-CA compreende
aproximadamente 532.397,20 hectares e população de 4.164 habitantes e possui oferta de
Ensino Médio somente em duas unidades escolares com atendimento de menos de 200
estudantes.
É possível observar no referido mapa a dimensão do território da RESEX-CA e a
localização das duas escolas, demonstrando a imensa área que fica sem cobertura pelo sistema
educacional. Além disso, é possível perceber as diferenças entre as escolas, uma delas, em
terra firme e situada às margens da rodovia, enquanto a outra na margem direta do mapa,
localizada na foz do rio Ajuruxi, próxima ao estuário do rio Amazonas.
Mapa 02: Localização das escolas pesquisadas no território da RESEX-CA.
Fontes: ICMbio (2015), IBGE (2009), IEPA (2011), elaboração ESQUERDO, Priscyla.
54
2.4 SUJEITOS DA PESQUISA
Os jovens dos segundos e terceiros anos do Ensino Médio das escolas Água Branca do
Cajari e Osmundo Barreto Valente que foram considerados na pesquisa somam um total de
60, ou seja, todos/as os/as jovens que estão matriculados atualmente e que estavam presentes
nas atividades escolares na data em que a pesquisa foi realizada foram convidados e se
dispuseram a participar.
Entre esses sujeitos, 34 são do sexo masculino e 26 do sexo feminino, com idade entre
15 e 27 anos, provenientes de 24 comunidades da RESEX-CA. Dentre eles/as foram
selecionados 2 grupos triangulares12
em cada escola (somando um total de 12 sujeitos) por
meio dos seguintes critérios: a) um grupo jovens do sexo feminino e outro do sexo masculino;
b) em cada grupo foram mescladas as séries, a participação em instituições e permanência no
campo.
Em relação aos aspectos éticos da pesquisa, os participantes selecionados a partir dos
critérios especificados que se dispuseram a participar assinaram um Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido (TCLE) que se encontra em anexo, bem como, no caso dos menores de
idade o referido termo foi enviado e assinado pelos pais ou responsáveis. Além disso, os
nomes dos participantes serão preservados, para tanto, utilizaremos pseudônimos.
Para substituir os nomes dos/as sujeitos consideramos o contexto da RESEX-CA e
escolhemos pseudônimos a partir dos produtos da sociobiodiversidade amazônica que tenham
importância para essa região, seja pelo impacto econômico, pelos saberes e/ou sabores que
tenham algum significado para a comunidade e para o/a entrevistado. Houve um diálogo com
os/as sujeitos da pesquisa sobre a escolha dos codinomes e os mesmos consideraram
interessantes e se manifestaram favoráveis à escolha.
Buscamos selecionar produtos do gênero masculino e feminino de acordo com o/a
respectivo participante. No alto Cajari foram entrevistadas as Jovens Castanha, Pupunha e
Bacaba, além dos Jovens Piquiá, Uxi e Cupuaçu. No baixo Cajari as jovens Mandioca,
Sapucaia e Pitomba, e os jovens, Buriti, Tucumã e o Açaí. A seguir, apresentamos as
características dos produtos e sua importância para a região:
12
Os grupos triangulares e sua organização serão apresentados posteriormente entre os instrumentos da pesquisa.
55
Castanha: está entre os principais produtos do Alto Cajari, segundo Jesus, Firmino e
Guedes (2013) muitas famílias trabalham na agricultura, porém, a atividade que gera
maior renda é o extrativismo da castanha. Para os autores, ―Além da importância
econômica e ambiental, o extrativismo da castanha também é determinante no modo
de vida dos castanheiros‖ (2013, p.01).
Pupunha: fruto da pupunheira, uma palmeira nativa da Amazônia, de grande
importância socioeconômica. ―Dela, também é possível se extrair vários produtos,
como: o fruto cozido para consumo humano direto, fruto para farinha, fruto para
alimentação animal e o palmito‖ (Bergo, 2014).
Bacaba: O consumo é semelhante ao do açaí, extraído da polpa do fruto quando
maduro, sua importância se dá pelo fato de ser muito apreciado pelas comunidades
indígenas e caboclas da Amazônia (Vasconcelos, Lopes e Araújo, 2019).
Piquiá: É encontrado em toda a Amazônia, com maior concentração na terra firme da
região do Rio Amazonas. Segundo Shanley, Galvão e Cymeys, ―o fruto do piquiazeiro
é comestível depois do cozimento e é bastante apreciado pela população tradicional da
Amazônia que se delicia com o sabor e cheiro incomuns da polpa‖ (p. 127). Além
disso, sua madeira é de qualidade, com fibras entrelaçadas, o que faz com que possua
grande resistência, de modo que é utilizada na indústria naval (SHANLEY;
GALVÃO; CYMEYS).
Uxi: É, segundo FILHO (2018) uma ―espécie frutífera amplamente utilizada para
consumo e comercialização, mas que vem diminuindo em função de queimadas e
desmatamento‖. Além disso, foi amplamente utilizada pelos antepassados da
localidade e atualmente é rara ou está em processo de diminuição populacional
(FILHO, 2018).
Cupuaçu: O cupuaçuzeiro (Theobroma grandiflorum, Schum) é uma planta
tipicamente amazônica e uma das frutíferas mais atrativas da região em virtude das
excelentes características de aroma e sabor de sua polpa. Além disso, é um produto de
fácil industrialização que vêm despertando grande interesse não só do mercado
regional, como nacional e internacional. Possui inúmeras possibilidades de consumo
entre os quais destacam-se os sucos, sorvetes, licores, compotas, cremes e doces de
incomparável sabor. Outra característica que merece destaque está em sua semente, já
que dela obtêm-se produto semelhante ao chocolate. Segundo Ribeiro (2000) é ―de
56
finíssima qualidade, caseiro ou industrial, que no caso de ser fabricado com sementes
de cupuaçu recebe o nome de cupulate‖ (RIBEIRO, 2000, p. 07).
Mandioca: Entre os alimentos produzidos nas roças das populações agroextrativistas
da Amazônia destacamos a Mandioca. Sua importância é caracterizada por apresentar
dupla finalidade: subsistência e comercialização. Segundo estudos de Castro e Oliveira
(2015), ―a mandioca é beneficiada por estas populações, transformando-se em farinha,
cujas características nutricionais garantem [...] grande valor energético‖ (CASTRO;
OLIVEIRA, 2015, p. 02).
Sapucaia: Encontrada em estado nativo na região amazônica, possui fruto
arredondado, com casca rígida e espessa, de coloração castanha, suas sementes
(castanhas) são comestíveis e saborosas. Segundo o guia da ANS, ―as sapucaias [...] já
eram bastante conhecidas e aproveitadas pelas populações que habitavam o Brasil na
época da chegada dos primeiros europeus, no século XVI‖ (BRASIL, Ministério da
Saúde, 2015, p. 303).
Pitomba: Segundo publicação do Ministério da Saúde (2015), ―a fruta possui casca
dura, porém fácil de ser aberta, fina polpa suculenta e doce, além de um caroço que
ocupa a maior parte do conteúdo‖ (2015, p.144). Seu fruto pode ser consumido in
natura ou beneficiado na fabricação de licores ou polpa. Uma curiosidade sobre seu
nome de origem tupi é o significado que seria sopapo, bofetada ou chute forte
(BRASIL, Ministério da Saúde, 2015).
Buriti: O buritizeiro é uma das maiores palmeiras da Amazônia e possui um fruto
bastante nutritivo e relevante para as populações e também para os animais da região.
Segundo Cymerys, Fernandes e Rigamonte-Azevedo (2005), ―essa palmeira prefere
áreas alagadas, igapós, beira de igarapés e rios, onde é encontrada em grandes
concentrações. Os frutos, folhas, óleo, pecíolo e tronco são utilizados para muitos
fins‖ (CYMERYS, FERNANDES E RIGAMONTE-AZEVEDO, 2005, p.187).
Tucumã: É o fruto de uma palmeira de caule simples (solitário). Possui grande
importância socioeconômica para as populações amazônidas. Esta palmeira, segundo o
Ministério da Saúde (2015) ―Produz cachos com numerosos frutos de formato ovoide.
Estando maduro, o fruto tem cor alaranjada e polpa grudenta e fibrosa‖ (BRASIL,
Ministério da Saúde, 2015).
57
Açaí: Possui grande importância na economia e na dinâmica sociocultural da região
amazônica. Para Souza et al. (2015) o açaí ―compõe parte do patrimônio tangível e
intangível desses grupos amazônicos [...]‖ (2015, p. 03) o que torna fundamental
reconhecer e valorizar esse patrimônio material e imaterial.
Para a participação dos/as sujeitos nos grupos triangulares foram apresentados os critérios
aos participantes e aqueles que se enquadravam no perfil puderam manifestar o desejo de
contribuir com a pesquisa. Abaixo apresentaremos um quadro com as características de cada
jovem que se voluntariou e participou dos referidos grupos.
Quadro 01: Perfil dos/as participantes dos grupos triangulares.
Jovem Perfil
Castanha Alto Cajari – 16 anos – 3° ano – sexo feminino – Extrativista – não
participa de organização social – deseja estudar e retornar para o campo.
Bacaba Alto Cajari – 18 anos - 2° ano – sexo feminino – Agricultora Familiar –
não participa de nenhuma organização social – deseja estudar e mudar para
a cidade
Pupunha Alto Cajari – 16 anos – 1° ano – sexo feminino – Agroextrativista – não
participa de organização social – deseja mudar e trabalhar na cidade.
Piquiá Alto Cajari - 19 anos - 2° ano - sexo masculino - Agricultor Familiar -
participa de associação - deseja estudar e retornar para a comunidade.
Uxi Alto Cajari – 18 anos - 3° ano – Sexo masculino – Extrativista – participa
de associação, deseja estudar e retornar para o campo.
Cupuaçú Alto Cajari – 18 anos – 2° ano – sexo masculino – Extrativista – Não
participa em nenhuma organização social – deseja estudar e retornar para o
campo.
Mandioca Baixo Cajari – 3° ano – 18 anos – sexo feminino – não participa de
organização social – deseja mudar para a cidade.
Sapucaia Baixo Cajari, 2° ano, 17 anos - sexo feminino – participa do sindicato –
deseja estudar e retornar para o campo.
Pitomba Baixo Cajari, 2° ano, 15 anos – sexo feminino – não participa de
organização social – deseja mudar para a cidade.
Buriti Baixo Cajari - 18 anos - 3° ano - sexo masculino - não participa de
organização social – deseja mudar para a cidade e manter vínculo com o
campo.
Tucumã Baixo Cajari, - 19 anos – 3° ano – sexo masculino - não participa de
organização social – deseja estudar e retornar para o campo.
Açaí Baixo Cajari, 17 anos, 2° ano, sexo masculino, Agricultor Familiar,
participa de grupo de jovens, deseja estudar e retornar para o campo.
Fonte: Corpus da pesquisa.
2.5 INSTRUMENTOS
O presente estudo se utilizou de um conjunto de técnicas e instrumentos aplicados de
maneira articulada com a finalidade de responder aos objetivos propostos. São eles: o
58
questionário, o grupo triangular e o desenho, conforme disposto no diagrama abaixo. A
seguir, apresentaremos cada técnica individualmente, bem como, o processo de aplicação por
meio do detalhamento da realização da pesquisa.
Figura 01: Organização dos instrumentos de pesquisa.
Fonte: Elaboração própria.
A figura acima demonstra a maneira como as técnicas de investigação foram
articuladas, sendo o primeiro, o segundo e o terceiro passos levados a cabo conforme
descrição a seguir e desembocando na proposta de análise definida para o presente estudo.
2.5.1 Primeiro passo: questionário
Considerando os objetivos da pesquisa, bem como, a abordagem processual da Teoria
das Representações Sociais, o primeiro instrumento utilizado em nosso estudo foi o
questionário, entendido por GIL (2008) ―como a técnica de investigação composta por um
conjunto de questões que são submetidas a pessoas com o propósito de obter informações‖ (p.
121).
Com o propósito de identificar o perfil dos jovens da Reserva Extrativista do Rio
Cajari matriculados no Ensino Médio modular, e desse modo responder ao primeiro eixo da
abordagem processual da TRS proposto por Jodelet (2001) - Quem sabe e de onde sabe? – foi
Instrumentos
3º Passo:
Desenhos
1º Passo:
Questionários 2º Passo:
Grupo Triangular
Análise Temática
59
elaborado um questionário com 20 perguntas dentre as quais 15 fechadas e 5 abertas o qual
encontra-se anexo.
O questionário conforme proposto por GIL (2008) aborda questões relacionadas aos
―conhecimentos, crenças, sentimentos, valores, interesses, expectativas, aspirações, temores,
comportamento presente ou passado etc‖ (2008, p.121), no caso do presente estudo, o
instrumento foi dividido em três partes, a primeira delas referente ao perfil socioeconômico
dos sujeitos participantes da pesquisa, a segunda parte faz questionamentos sobre a
permanência no campo e, por fim, a terceira parte busca introduzir um questionamento sobre
os projetos de vida desses sujeitos.
A escolha desse instrumento teve como um dos seus requisitos alcançar o maior
número possível de sujeitos. Na Escola Água Branca do Cajari responderam ao questionário
um total de 42 estudantes, entre os quais 12 concluíram o Ensino Médio em 2018 e não serão
considerados nesse estudo. Já na Escola Osmundo Valente Barreto obtivemos um total de 41
sujeitos, dos quais 11 concluíram. Somados os questionários a serem considerados para o
nosso estudo totalizam 60 Jovens estudantes do Ensino Médio da RESEX-CA. Foram
considerados os questionários dos jovens que permaneceriam no Ensino Médio durante todo o
período de realização da pesquisa, ou seja, aqueles que no momento da aplicação do
questionário cursavam o 1º e 2º anos e poderiam participar das próximas etapas as quais
foram realizadas no ano seguinte.
2.5.2 Segundo Passo: grupo triangular
O segundo passo da abordagem processual se propõe a buscar respostas ao
questionamento: O que e como sabe? (JODELET, 2001), ou seja, levantar pensamentos,
imagens, opiniões, ideias, processo e estados das RS elaborados por um determinado grupo
social. No caso desse estudo foram jovens estudantes do Sistema de Organização Modular na
Reserva Extrativista do Rio Cajari. Cabe destacar que a técnica dos grupos triangulares foi
uma das aprendizagens do doutorado sanduíche, a qual foi escolhida para realização das
atividades de pesquisa realizadas no período do estágio.
Desse modo, nossa escolha foi pela execução do grupo triangular ou personalizado o
qual, segundo Ruiz (2012) se constitui em ―una dinámica grupal más abierta e interactiva, que
60
permite explorar la génesis y producción discursiva además de la representación, y que
propicia la emergencia de un discurso con una mayor cercanía a su referente, esto es, más
vivencial (2012, p. 142).
Para Ruiz (2012), o grupo triangular pode ser comparado a outras técnicas qualitativas
como, por exemplo, o grupo de discussão e a entrevista, porém se apresenta como
intermediária entre as duas. Para o autor, tanto a produção discursiva quanto a análise e
interpretação dos dados é semelhante em ambas as técnicas.
O que caracteriza a posição intermediária do grupo triangular é a sua constituição que
se dá mediante três participantes e um moderador/a, de modo que não se pode compreendê-lo
somente como grupo pois mantém uma forte incidência do individual e pessoal devido ao seu
tamanho. Ruiz (2012) afirma que
Por un lado, en el grupo triangular sus participantes están más expuestos como
individuos que en el grupo de discusión. Al ser un grupo muy reducido, sus
participantes están más obligados desde el principio a actuar desde posicionamientos
individuales para mantener la dinámica. Por otro lado, lo reducido del grupo hace
que el discurso grupal tenga menos fuerza o menos peso (RUIZ, 2012, p. 146).
Para Ruano (2016) estas duas características diferenciais do grupo triangular, fazem
com que sua dinâmica esteja caracterizada por uma tensão intensa e permanente entre os
discursos individuais de cada participante por um lado e por outro, um incipiente discurso
grupal que não chega a adquirir solidez suficiente ou consistência para resolver as diferenças
individuais. A autora afirma ainda que:
El elemento de la tensión constituye un punto clave, en la medida en que facilita
expresar más ampliamente las diferencias personales y sociales que, en cambio,
muestran mayores dificultades de que se produzcan y desarrollen en las dinámicas
que tradicionalmente tienen lugar en los grupos de discusión cuando se tratan
fenómenos sociales com tendencia a ser estereotipados (RUANO, 2016, p. 20).
O que poderia ser considerado como fragilidade do discurso grupal para Ruiz (2012)
não se configura como uma limitação, mas torna-se uma de suas principais potencialidades.
Essa foi nossa motivação na escolha dessa técnica, pois, ao permitir que os discursos grupal e
individual se apresentem de maneira simultânea, podemos atentar para as visões individuais
expressas ao grupo pelas vivencias de cada um, ao passo que temos também a confrontação
de diferentes experiências. Para Ruiz (2012), é possível entender ―cómo se producen y se
61
reproducen socialmente, en base a la confrontación entre experiencias y puntos de vista
particulares y entre estos y los tópicos sociales‖ (2012, p. 149).
No que se refere aos aspectos metodológicos, Ruano (2016) observa que são muito
similares aos utilizados em entrevistas grupais ou individuais em relação a organização das
sessões, contato com participantes, local, roteiro, tipo e sequência de perguntas, etc.
Para a autora, a tarefa consiste em identificar subgrupos que compõe a população estudada e
definir quais devem ser incluídos no estudo em função de critérios que correspondam com
características que marquem diferenças na maneira de viver, sentir e opinar sobre o tema de
interesse.
Para a autora, é importante organizar os grupos combinando critérios de
homogeneidade e heterogeneidade. Significa que nos aspectos que podem dificultar a
comunicação deve-se manter o grupo homogêneo, enquanto nas características que podem
variar o discurso é fundamental considerar a heterogeneidade dos participantes.
Desse modo, nosso estudo definiu pela realização de 4 grupos triangulares organizados
a partir do perfil previamente levantado pela aplicação dos questionários, sendo 2 grupos
triangulares em cada escola da RESEX-CA, conforme quadro a seguir.
Quadro 02: Organização dos grupos triangulares.
Grupos Triangulares
Características Homogêneas Heterogêneas
Escola 1
G1
3 jovens do sexo feminino
com idade entre (15 a 26),
estudantes do Ensino
Médio.
50% 2º ano e 50% 3º ano; 50% participante
organização social; 50% deseja permanecer no
campo.
G2
3 jovens do sexo
masculino com idade entre
(15 a 20), estudantes do
Ensino Médio.
50% 2º ano e 50% 3º ano; 50% participante
organização social; 50% deseja permanecer no
campo.
Escola 2
G1
3 jovens do sexo feminino
com idade entre (15 a 18),
estudantes do Ensino
Médio.
50% 2º ano e 50% 3º ano; 50% participante
organização social; 50% deseja permanecer no
campo.
G2
3 jovens do sexo
masculino com idade entre
(15 a 23), estudantes do
Ensino Médio.
50% 2º ano e 50% 3º ano; 50% participante
organização social; 50% deseja permanecer no
campo.
Fonte: Elaboração própria.
2.5.3 Terceiro Passo: desenho
62
O desenho foi outra técnica utilizada para o levantamento dos dados necessários para a
consecução dos objetivos da pesquisa. Essa técnica possibilita ao sujeito da investigação uma
alternativa de expressar as representações sociais e atribuir sentido à sua elaboração.
Oliveira, Oliveira e Silveira (2018) apresentam a técnica do desenho como um
significativo suporte metodológico nas pesquisas em educação. Segundo as autoras, ―os
desenhos nas pesquisas analisadas sobre educação apresentam diferentes formas e
significados simbólicos. Expressam situações existenciais, sociais e culturais da vida
cotidiana, formas de pensar, saberes e experiências‖ (p. 50).
Nesse sentido, destacamos a importância da utilização dessa técnica no sentido de
extrair os sentidos atribuídos ao cotidiano pelos/as Jovens inseridos/as no SOME por meio
das imagens produzidas por eles/as. Tomamos como exemplo o dito popular ―entendeu ou
quer que desenhe‖ como perspectiva de como essa técnica pode ser útil no processo de
comunicação entre entrevistador/a e entrevistado/a.
Desse modo seguimos o proposto por Silveira (2011) em relação ao planejamento da
produção dos desenhos. Segundo a autora é necessário esclarecer ao entrevistado ―a finalidade
dos mesmos, bem como organizar a disponibilização de materiais adequados, tais como lápis
de cor, canetas hidrocor coloridas e papel em branco, dentre outros‖ (p. 44).
Cabe informar que a análise dos dados foi realizada a partir das falas dos/as sujeitos
sobre os seus desenhos conforme orienta Oliveira; Oliveira e Silveira:
[...] O pesquisador solicita ao entrevistado que desenhe suas Representações Sociais
sobre alguém ou alguma coisa e em seguida explique seu desenho, dando por fim,
um nome à figura desenhada. O pesquisador analisa, então, os desenhos a partir das
explicações e dos dizeres dos entrevistados. As imagens obtidas no desenho
referem-se as suas representações (OLIVEIRA; OLIVEIRA; SILVEIRA, 2018, p.
25).
A produção das imagens no presente trabalho foi realizada pelos/as mesmos/as
sujeitos que participaram dos grupos triangulares. Porém, nessa fase da coleta de dados os/as
participantes realizaram a atividade individualmente, tanto a elaboração dos desenhos quanto
as falas explicativas sobre sua produção. Os sujeitos foram convidados a representar por meio
de desenhos o Sistema de Organização Modular de Ensino e, posteriormente, falar sobre o
63
que desenharam. As informações foram gravadas e transcritas e compõem o presente estudo
na seção que apresenta as análises.
Foram um total de 14 desenhos elaborados por 12 sujeitos definidos previamente
como participantes dos grupos triangulares, com base em critérios antes expostos. É
importante mencionar que o conjunto de técnicas utilizadas na presente pesquisa não foram
realizadas de forma estanque, mas, articuladas entre si, com a finalidade de responder, da
melhor forma, aos objetivos propostos em nosso estudo.
2.6 ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES
O processo de análise foi realizado na perspectiva temática conforme Braun e Clarke
(2006). Para as autoras, ―a análise temática é um método para identificar, analisar e relatar
padrões (temas) dentro dos dados. Ela minimamente organiza e descreve o conjunto de dados
em (ricos) detalhes‖ (2006, p. 05).
Esse procedimento é defendido pelas autoras como uma importante ferramenta de
análise em pesquisas qualitativas entre outros motivos pela sua liberdade teórica, por ser uma
ferramenta de pesquisa flexível e pela sua utilidade, visto que possibilita o levantamento de
um conjunto detalhado, ainda que complexo, de dados.
Para Braun e Clarke (2006) a análise temática ―envolve a busca através de um
conjunto de dados - seja em uma série de entrevistas ou grupos de foco, ou em uma série de
textos - para encontrar padrões repetidos de significado‖ (2006, p. 13), sendo que se entende
como conjunto de dados todos os dados do corpus que estão sendo usados em uma análise
particular. É importante destacar que, segundo as autoras, ―[...] a análise envolve um
constante movimento para frente e para trás pelo conjunto de dados, pelos extratos
codificados que você está analisando, e pela análise deles que você está produzindo‖ (2006, p.
13).
Nesse movimento de idas e vindas, seguimos os procedimentos propostos pelas
autoras (2006, p. 14) no seguinte percurso:
64
Figura 02: Percurso de análise.
65
Fonte: Elaboração própria a partir do texto de Braun e Clarke.
A partir da execução de cada etapa do percurso apresentado acima, dentro de cada
conjunto de dados – grupos triangulares e desenhos - foram agrupados os temas que
respondem ao objetivo do presente estudo, ou seja, foram destacadas as imagens e sentidos
1º Passo:
Familiarização com
os dados
•Transcrição dos dados, leitura e releitura dos dados, apontamento de ideias iniciais.
2º Passo:
Geração de Códigos Iniciais
•Codificação das características interessantes dos dados de forma sistemática em todo o conjunto de dados e coleta de dados relevantes para cada código.
3º Passo:
Busca por Temas
•Agrupamento de dados em termos potenciais, reunindo todos os dados relevantes para cada tema potencial.
4º Passo:
Revisão dos Temas
•Verificação se os temas funcionam em relação aos extratos codificados e ao conjunto de dados inteiro, gerando um "mapa" temático da análise.
5º Passo:
Definição e Nomeação
dos temas
•Nova análise para refinar as especificidades de cada tema, e a história geral contada pela análise; geração de definições e nomes claros para cada tema.
6º Passo:
Elaboração do Relaório
•A última oportunidade para a análise. Seleção de exemplos vívidos e convincentes do extrato, análise final dos extratos selecionados, relação entre análise, questão da pesquisa e literatura, produzindo um relatório acadêmico da análise.
66
que compõe as Representações Sociais dos sujeitos envolvidos, bem como, suas objetivações
e ancoragens. A partir dessas RS foi possível apresentar inferências sobre as implicações nos
projetos de vida dos/as jovens.
2.7 ESTADO DO CONHECIMENTO
Esta subseção tem por objetivo apresentar o estado do conhecimento produzido pelo
nosso estudo com o intuito de situar nosso problema de pesquisa no âmbito da academia no
sentido de justificar a sua importância e a sua contribuição enquanto produção acadêmica e
social na realidade em que o mesmo se insere.
Definimos como caminho o levantamento das teses e dissertações produzidas entre os
anos de 2012 e 2016, que corresponde ao quinquênio exigido ao se fazer o estado de
conhecimento de um tema.
Sua construção teve como foco nossa proposta de tese com o tema ―representações
sociais dos/as jovens da reserva extrativista do Rio Cajari sobre o Sistema de Organização
Modular de Ensino (SOME) e as implicações no seu projeto de vida‖, elegemos três
descritores principais: Juventude rural, Juventude e representações sociais, e Juventude e
Projeto de vida.
Os bancos de dados definidos para a pesquisa foram a Biblioteca Digital de Teses e
Dissertações (BDTD), e o Banco de teses e dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior (CAPES), o lapso temporal delimitado foi o período de 2012 a
2016.
2.7.1 A Juventude Rural nas dissertações e teses da BDTD
A busca na BDTD pelo descritor Juventude rural localizou um total de 178 trabalhos
dos quais 143 são dissertações e 35 teses. Nesse universo, podem ser observadas as mais
diversas temáticas discutidas em torno da categoria Juventude. Para organizar as informações,
foram utilizados alguns filtros (de assunto) separando o grupo de teses do grupo de
67
dissertações. Na apresentação, informamos as questões que se destacam em cada filtro
utilizado.
Quando utilizamos o filtro de assunto – Juventude – localizamos um total de 19 teses,
das quais três tratam especificamente sobre Juventude Rural, entre elas, duas discutem
permanência no campo e dialogam com nosso tema enquanto uma trata de representações
sobre Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS). Com o mesmo filtro foram
encontradas cinco dissertações, sendo que apenas uma trata de Juventude rural e discute a
relação campo-cidade na produção de sentidos.
No caso do filtro assunto – Juventude Rural – nossa busca localizou um total de 20
teses e duas dissertações. Um dado que nos chamou atenção, especificamente nesse filtro, foi
a distribuição desses estudos pois se concentra principalmente na região sudeste e se sobressai
em algumas instituições, conforme pode ser observado no quadro abaixo. Em geral esses
Programas de Pós-Graduação são mais antigos, o que reflete na quantidade de produções.
Quadro 03: Distribuição por programas de pós-graduação.
Região Universidade Número Tipo
Sudeste UFV 5 T
UNESP 2 T
UFMG 1 T
USP 1 D
Sul UNIOESTE 2 T
UFSM 2 T + D
UNISINOS 1 T
Nordeste UFC 1 T
UFRPE 1 T
Norte UFPA 1 T
Fonte: elaboração própria com base nos dados da BDTD.
Nossa pesquisa utilizou outros três filtros de assunto – Agroecologia – que localizou
13 teses, porém, nenhuma delas tratava especificamente sobre Juventude e, - Agricultura
familiar – onde localizamos 10 teses, entre elas três tratam sobre o tema Juventude, das quais
apenas uma diferente daquelas localizadas com os filtros anteriores e uma dissertação que
também foi localizada em outro filtro. Por fim, com o filtro - Políticas Públicas - foram
encontradas oito teses, destas, apenas uma sobre Juventude rural. Nesse filtro não foram
encontradas dissertações.
68
Abstraindo os filtros e o grande número de trabalhos localizados, cabe informar que há
uma grande variedade de tematizações, metodologias, áreas do conhecimento, categorias que
perpassam pelo descritor Juventude, mais especificamente Juventude Rural. Ao aprofundar as
aproximações e distanciamentos da temática proposta para investigação, filtramos
inicialmente 17 dissertações que dialogam em alguma medida com nosso objeto. Entre essas
17, optamos por trazer três para dialogar com nosso trabalho, pois abordam diretamente
questões relacionadas à permanência/ficar ou sair do campo/fatores subjetivos de valorização
do campo. Esses estudos trazem elementos importantes para aprofundar a discussão acerca do
nosso objeto e apontar possibilidades de análise a partir destas categorias. A tabela a seguir
apresenta os referidos trabalhos, autores, ano de defesa e instituição, além de breves
aproximações e distanciamentos em relação a nossa proposta de estudo.
Tabela 01: Dissertações elencadas no descritor Juventude.
Fonte: Elaboração própria com base nos dados da BDTD.
Na busca de aproximações e distanciamentos, trazemos os trabalhos individualmente, na
perspectiva de compreender esses delineamentos e o lugar que nossa proposta ocupa nesse
campo de pesquisa.
Barasuol (2016) apresenta aspectos subjetivos do projeto de vida de jovens a partir de
valorações e emoções positivas sobre o rural. A autora constrói seu trabalho a partir da Teoria
das Representações Sociais e possui um referencial muito próximo do que nos propomos
construir, além disso, nos aproximamos na temática da Juventude rural. Porém, nosso foco
está nas representações sociais sobre o SOME, o que nos distância dos resultados construídos
no referido trabalho.
Autor Título Ano Instituição
Aline Barasuol Juventude rural e emoções: fatores subjetivos de
valorização do campo
2016 UFV
Rodrigo Kummer Juventude rural, entre ficar e partir: a dinâmica dos
jovens rurais da comunidade de Cerro Azul, Palma
Sola/SC
2013 UNIOESTE
Zenicleia Angelita
Deggerone
A permanência dos jovens nas unidades de produção
familiares na região Alto Uruguai, Rio Grande do Sul
2013 UNIVATES
69
Kummer (2013) aborda os aspectos e condições sociais da decisão entre ficar e sair do
campo, analisando as dinâmicas da Juventude de Palma Sola no estado de Santa Catarina.
Constrói sua pesquisa por meio de etnografia e coleta dados com a aplicação de questionários.
Nossa pesquisa se aproxima do trabalho de Kummer por considerar que os projetos de vida
dos/as Jovens levam em consideração as condições sociais em que estão inseridos/as, porém,
se distancia por colocar o foco nas representações sobre SOME e suas implicações no projeto
de vida.
Deggerone (2013) discute a preocupação com um modo de vida, com a reprodução
social de uma identidade cultural que perpassa gerações, da produção de alimentos, da
preservação da biodiversidade, pela manutenção da paisagem rural, uma identidade que pode
se perder se não houver processos de sucessão na Agricultura Familiar. Desenvolve seu
trabalho na região Alto Uruguai, no estado do Rio Grande do Sul por meio de pesquisa
quantiqualitativa com aplicação de questionários e entrevistas. Nossa aproximação com a
pesquisa de Deggerone está no entendimento de que se os projetos de vida dos/as jovens
pesquisados incluírem permanecer no campo, haverá como consequência a manutenção de um
modo de vida, preservação da biodiversidade no local de realização da pesquisa. Nos
distanciamos à medida que para além da sucessão, nosso olhar tem como foco a educação no
SOME.
Seguindo a mesma lógica de aproximação, encontramos seis teses que dialogam com
temas semelhantes ao da nossa proposta. Algumas serão discutidas em outros descritores, pois
estão diretamente ligadas àquelas tematizações. Nesse sentido, restou para discussão nesse
momento do trabalho apenas uma tese que reflete justamente os dilemas e desafios da
Juventude em relação à permanência ou não no campo. Segue abaixo a tabela apresentando os
principais pontos da referida tese e seus desdobramentos.
Tabela 02: Tese elencada no descritor Juventude.
Autor Título Ano Instituição
Patrícia Fracarolli
Canholi
Dilemas e desafios da Juventude rural: um olhar
sobre o Alto da Serra de São Pedro-SP
2014 USP
Fonte: Elaboração própria com base nos dados da BDTD.
Canholi (2014) discute os dilemas e desafios colocados para os jovens que resultam
nos processos de êxodo rural. A autora parte da reflexão acerca dos impactos da economia
70
global sobre a Agricultura Familiar para lançar um olhar crítico às motivações da Juventude
do interior do município de São Pedro, no estado de São Paulo, acerca do destino das
migrações. Sua análise das motivações dos/as jovens se deu à luz de pressupostos
interdisciplinares para entender porque é ínfima a parcela de jovens que se destinam às
atividades agroalimentares familiares nas propriedades da região.
Nossa proposta se aproxima da reflexão construída por Canholi na medida em que
pensamos processos migratórios campo-cidade nos projetos de vida dos/as jovens
pesquisados, mas se distancia no sentido de que em nosso lócus de pesquisa há um
movimento inverso, o de permanência nas comunidades rurais, além disso, nosso foco
principal está na educação.
2.7.2 Juventude e Representações Sociais
A busca pelo descritor ―Juventude e Representações Sociais‖ localizou um total de
136 trabalhos, dos quais 98 teses e 38 dissertações. Entre as discussões propostas nos
referidos trabalhos, foram encontradas quatro dissertações com as quais podemos estabelecer
algum diálogo. Uma delas discute Juventude e Representações Sociais de maneira mais geral,
não especificamente com jovens rurais, outra trata dos fatores subjetivos de valorização do
campo (a qual já foi apresentada no descritor Juventude Rural). Outra aborda as migrações de
jovens rurais com foco específico no ensino superior e, a última, que embora pesquise
Juventude Rural, tem como foco as representações sobre a AIDS. Como as aproximações não
são tão estreitas optamos por não trazer nenhum dos textos para aprofundamento.
A tese localizada nesse descritor na BDTD discute as representações sociais sobre a
condição juvenil no campo, ela aparece também no descritor de Juventude Rural e é a única
representante da região norte nessa temática, fruto de pesquisa desenvolvida no âmbito do
Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade Federal do Pará, orientada pela
Dra. Ivany Pinto Nascimento.
Tabela 03: Tese elencada no descritor Juventude e Representações Sociais.
Autor Título Ano Instituição
Joana d'Arc de
Vasconcelos
Juventude e inclusão: representações sociais sobre a
condição juvenil no campo
2014 UFPA
71
Neves
Fonte: Elaboração própria com base nos dados da BDTD.
Neves (2014) desenvolve seu trabalho com jovens egressos de um programa de
inclusão - PROJOVEM Campo Saberes da Terra no município de Bragança, no estado do
Pará. Seu enfoque está nas representações desses jovens sobre a sua condição juvenil no
campo. Nossa aproximação se dá na abordagem por meio da Teoria das Representações
Sociais e dos sujeitos – jovens rurais, porém o foco da representação discutida por Neves
(2014) está na condição juvenil, enquanto nossa proposta tem como foco as representações
sociais dos jovens sobre o SOME enquanto processo de escolarização.
2.7.3 Juventude e Projeto de vida
Quando realizamos a pesquisa partindo do descritor ―Juventude e projeto de vida‖,
localizamos em números gerais, um total de 252 trabalhos, sendo que destes, 189 são
dissertações e 62 são teses. Dentre as teses, observamos três com temáticas que nos permitem
estabelecer algum parâmetro. Uma discute a reprodução social de um assentamento a partir da
pluriatividade, outra aborda o futuro entre o rural e o urbano em um estudo de caso, e a última
dialoga com os projetos de jovens produtores de tabaco. Optamos por trazer para a discussão,
a tese que reflete sobre os significados da tensão rural-urbano entre jovens rurais conforme
pode-se observar na tabela a seguir.
Tabela 04: Tese elencada no descritor Juventude e projeto de vida.
Autor Título Ano Instituição
Adeline Araújo
Carneiro Farias
Os significados da tensão rural – urbano entre
jovens rurais: identificações e projetos de vida
2016 UNISSINOS
Fonte: Elaboração própria com base nos dados da BDTD.
Farias (2016) desenvolve seu trabalho com foco na tensão rural-urbano e suas
implicações na construção identitária e nos projetos de vida da Juventude. Considerou
questões como a localização fronteiriça onde a pesquisa foi desenvolvida no estado de
Roraima e o impacto das migrações. Sua pesquisa foi desenvolvida por meio de grupos focais
72
e entrevistas individuais para a coleta de dados e posterior análise de conteúdo. Visualizamos
aproximações no trabalho de Farias (2016) no que concerne as questões identitárias de jovens
que constituem seus projetos de vida considerando a tensão rural-urbano ao passo que
percebemos distanciamentos na realidade fronteiriça.
Entre as dissertações encontradas, observamos um número maior de trabalhos que
dialogam com projeto de vida de jovens rurais/camponeses, em um total de 10 trabalhos.
Desses, dois discutem questões diretamente relacionadas a educação, três analisam questões
vinculadas ao trabalho e organização em movimento e cooperativas, dois refletem a partir de
questões identitárias, outros dois investigam quais são os fatores de permanência no campo, e
um analisa a relação trabalho e educação nos processos de migração sazonal de jovens rurais.
Trazemos para análise por entendermos serem mais próximos da nossa reflexão, um sobre
educação e outro sobre migração.
Tabela 05: Dissertações elencadas no descritor Juventude e Projeto de vida.
Autor Título Ano Instituição
Conceição
Aparecida
Luciano
Entre o "cá" e o "lá": educação e trabalho na vida
dos jovens migrantes do Alto Jequitinhonha, MG
2013 UFMG
Kamila Costa de
Sousa
Percursos e projetos de vida das Juventudes
egressas da Escola do Campo
2016 UFC
Fonte: Elaboração própria com base nos dados da BDTD.
Luciano (2013) discute a relação trabalho-educação na vida dos jovens com jovens
migrantes do Alto Jequitinhonha que se deslocam em busca de trabalho. Para a autora, esses
sujeitos fazem parte de um grande contingente de reserva de mão de obra que, fragilizados
política e socialmente, disputam os postos de trabalho mais precários do setor de serviços com
migrantes de outras regiões.
Os resultados da sua pesquisa apontam que os jovens rurais migrantes não incluem a
escola em seus projetos profissionais de futuro e acreditam ser o trabalho a única
possibilidade de ascensão social. Sua metodologia consistiu na observação de dados
predominantemente quantitativos e entrevista semiestruturada, por considerar a relação
dialógica entre entrevistado e pesquisador. O tratamento dos dados se deu por meio de análise
de conteúdo.
73
Nessa direção, entendemos o foco de Luciano (2013) no tema da educação e seus
sujeitos – os/as jovens – como aproximações com nossa proposta de pesquisa, porém, o
contexto de inserção do público pesquisado é totalmente distinto e espera-se produzirá um
resultado distinto do encontrado pela pesquisadora.
Souza (2016) investigou a forma como a educação repercute nos percursos e projetos
de vida iniciados pelos jovens, para tanto, realizou sua pesquisa com egressos de uma escola
que possui uma concepção de Educação do Campo, por meio de pesquisa qualitativa de cunho
etnográfico. Para a autora, essas Juventudes redesenham a relação campo-cidade e produzem
outros sentidos para o ―ficar ou sair‖ do campo. No caso da pesquisa de Souza (2016), nossas
aproximações se dão pelos sujeitos e na temática da educação, porém, sua pesquisa especifica
a concepção de educação presente na escola estudada, enquanto, em nosso contexto, o SOME
está mais próximo de uma concepção de educação rural, distinta da Escola João Sem Terra,
lócus da pesquisa de Souza.
2.7.4 Banco de Teses e Dissertações da CAPES
No banco de teses e dissertações da CAPES a pesquisa seguiu o mesmo padrão
utilizado na BDTD, utilizando os mesmos descritores e estabelecendo alguns filtros. O lapso
temporal delimitado também foi o mesmo, ou seja, 2012-2016.
2.7.5 Juventude Rural no Banco de Teses e Dissertações da Capes
O primeiro descritor pesquisado foi Juventude Rural com os seguintes filtros - grande
área ciências humanas, área do conhecimento educação, separando o grupo de teses que
localizou um total de 351 trabalhos, enquanto no grupo de dissertações 1.111. Cabe
mencionar que a maioria dos trabalhos encontrados nas buscas desses descritores não discute
diretamente essas temáticas o que dificulta em grande medida a pesquisa.
A partir do levantamento das 351 teses passamos à leitura dos títulos e selecionamos
aquelas com temáticas afins. Inicialmente, de maneira mais geral, selecionamos oito
trabalhos. As tematizações em torno do descritor Juventude Rural articulam suas reflexões em
categorias como Condição Juvenil (aparece em dois trabalhos). Quando a questão é o
74
contexto, aparecem temas como continuidades e permanências, projetos de vida, passaporte
para o futuro; quando tratam de questões relacionadas à identidade temos ser jovem
camponês, e ser jovem agricultor. As pesquisas foram realizadas em diferentes contextos, em
escolas de formação por alternância (Escola Família Agrícola e Casa Escola da Pesca), em
Programa de Educação de Jovens e Adultos (PEJA), em um Centro Estadual Integrado de
Educação Rural, em assentamentos e comunidades ribeirinhas.
Entre todos os trabalhos levantados, destacamos duas teses que dialogam com nossa
temática, uma delas, Neves (2014) já foi apresentada em outro filtro, restando o trabalho
apresentado na tabela a seguir.
Tabela 06: Tese elencada no descritor Juventude rural.
Autor Título Ano Instituição
Maria Zenaide Alves Ser alguém na vida: condição juvenil e
projetos de vida de jovens moradores de um
município rural da microrregião de
Governador Valadares-MG
2013 UFMG
Fonte: Elaboração própria com base nos dados do Banco da CAPES.
Alves (2013) investiga a condição juvenil e os projetos de vida de jovens em
município rural marcado pelo transnacionalismo e pela cultura da migração, que segundo a
autora são marcas que afastam a cultura local. Segundo ela, os resultados apresentam tensões
entre projetos individuais e familiares. Sua elaboração se deu por meio de etnografia,
observação participante, questionários e entrevistas com jovens do Ensino Médio, que foram
analisados a luz de um referencial multidisciplinar. Nossa aproximação com Alves está
especificamente na temática de projeto de vida de jovens do Ensino Médio, porém, seu
contexto, foco e referencial são distintos.
No que se refere às dissertações com temáticas aproximadas, localizamos um total de
18 trabalhos, dentre estes, três discutem especificamente projetos de vida, outros quatro
discutem variações dessa temática, como destinos escolares e sociais, permanência no campo,
contenção do êxodo rural e esvaziamento do campo. O tema da formação da Juventude
aparece em três trabalhos, enquanto os processos de escolarização em seis dissertações.
Nesses últimos, destacamos dois trabalhos que abordam especificamente o Sistema de
Organização Modular de Ensino (SOME), um deles na ótica dos Jovens egressos e o outro faz
uma avaliação do trabalho pedagógico. Por fim, uma dissertação discute as representações
75
sobre campo/rural e outra a formação da identidade pescadora dos Jovens. Na tabela a seguir
destacamos dois trabalhos que possuem temática mais próxima da nossa proposta de pesquisa.
Tabela 07: Dissertações elencadas no descritor Juventude rural.
Fonte: Elaboração própria com base nos dados do Banco da CAPES.
Pinto (2016) analisa o processo de escolarização de jovens rurais no Ensino Médio,
suas experiências escolares e expectativas de futuro a partir dos sentidos atribuídos às
vivências em escola rural. Observa as dificuldades, ganhos e possibilidades oferecidas pela
escola e entende o aluno como parceiro fundamental na compreensão dos processos de
escolarização. Para a realização da pesquisa, utilizou as técnicas de observação de
estabelecimento, questionários e análise de documentos escolares. O trabalho de Pinto (2016)
é o que mais se aproxima da nossa proposta, pelos sujeitos – jovens do Ensino Médio, o
contexto – em escola rural, no foco - as expectativas de futuro, o que distancia é a o fato de
ser uma escola ―regular‖, diferente do nosso propósito que é SOME e a abordagem, pois o
referido trabalho não considera a Teoria das Representações Sociais.
Rodrigues (2016) investigou as percepções de alunos egressos do Ensino Médio no
município de Breves, no interior do estado do Pará, com foco nas contribuições e limitações
do SOME na formação dos jovens no meio rural perante suas necessidades e expectativas.
Realizou uma pesquisa qualitativa com entrevista semiestruturada e posterior análise de
conteúdo, partindo de referencial epistemológico do materialismo histórico dialético,
Autor Título Ano Instituição
Karla de Freitas
Alves Pinto
Jovens Rurais do Ensino Médio: Experiências
Escolares e Expectativas Juvenis
2016 São João Del Rey
Joao Marcelino
Pantoja Rodrigues
No espelho do rio o que reflete e o que
―SOME‖? O Sistema de Organização Modular
de Ensino (SOME) na ótica de jovens egressos
no município de Breves – Pará
2016 UFPA
Autor Título Ano Instituição
Karla de Freitas
Alves Pinto
Jovens Rurais do Ensino Médio: Experiências
Escolares e Expectativas Juvenis
2016 São João Del Rey
Joao Marcelino
Pantoja Rodrigues
No espelho do rio o que reflete e o que
―SOME‖? O Sistema de Organização Modular
de Ensino (SOME) na ótica de jovens egressos
no município de Breves – Pará
2016 UFPA
76
especialmente nas categorias contradição, totalidade e historicidade. Nos aproximamos da
pesquisa de Rodrigues (2016) por tratar especificamente do SOME e investigar Jovens,
porém, o autor pesquisou egressos a partir de referencial e abordagem distintos, visto que não
considera as RS.
2.7.6 Juventude e Representações Sociais
A busca no banco de teses e dissertações da CAPES com o descritor Juventude e
Representações Sociais apresentou alguns resultados duplicados em relação às buscas por
outros descritores, não havendo nenhuma tese encontrada nos parâmetros da nossa pesquisa.
Destacamos, porém, uma dissertação apresentada na tabela a seguir.
Tabela 08: Dissertação elencada no descritor Juventude e Representações Sociais.
Autor Título Ano Instituição
Lucivaldo Maia
Pontes
Alunos (as) da Colônia: cotidiano, saberes e
contradições socioculturais em seus modos e
projetos de vida.
2012 UEPA
Fonte: Elaboração própria com base nos dados do Banco da CAPES.
Pontes (2012) discute as relações entre modos de vida, saberes e contradições
socioculturais nos deslocamentos colônia (meio rural) – cidade, por meio de um olhar para as
implicações dessas relações no âmbito das dinâmicas escolares. Desenvolve uma pesquisa a
partir do método dialético com enfoque crítico e abordagem quantitativa, utiliza ainda
observações sistemáticas e entrevistas semiestruturadas. Ao observar o trabalho de Pontes
(2012), percebemos aproximações, pois a pesquisa foi desenvolvida com jovens rurais,
porém, nos distanciamos, pois o mesmo opta pelo método dialético e seu foco é
especificamente nos deslocamentos que jovens rurais fazem para estudar na cidade.
Cabe informar que a busca pelo descritor Juventude e Projeto de vida apresentou
resultados muito semelhantes, não havendo nesse levantamento nenhum destaque. O
levantamento das produções de dissertações e teses possibilita observar um panorama das
pesquisas construídas acerca da nossa temática no país. Ao mesmo tempo em que
constatamos o grande número de trabalhos que possuem a Juventude Rural/Camponesa como
foco, podemos observar o que de diferente nossa proposta pode construir.
77
Encontramos uma heterogeneidade de entrecruzamentos teóricos, metodológicos e
mesmo de objetos de análise, em contextos ainda mais diversos, onde as Juventudes rurais,
camponesas, ribeirinhas, colonas, entre tantas, constroem suas identidades e seus projetos de
vida.
Os trabalhos que destacamos apresentam uma riqueza de análises e resultados que nos
permitem melhor delinear nosso objeto e construir nossa pesquisa. Nesse sentido, seguimos
na proposta de estabelecer aproximações e distanciamentos com os trabalhos elencados em
nossa busca nos bancos de dados.
A planilha a seguir apresenta um consolidado sobre os trabalhos elencados
considerando autor, tipo (dissertação-D ou tese-T), ano, programa e universidade.
78
Tabela 09: Síntese das teses e dissertações elencadas.
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados da BDTD e Plataforma de teses e dissertações Capes.
79
Nosso levantamento elencou um total de 12 trabalhos para aproximações e
distanciamentos, entre os quais, oito são dissertações e quatro teses. São trabalhos que
aprofundam questões próximas da nossa temática, mas cada um reflete a partir de contextos
distintos. Todos os trabalhos elencados possuem em comum os sujeitos – a Juventude Rural,
porém, cada pesquisa apresenta espaços diferentes de inserção desses/as jovens, metodologias
e abordagens distintas, entrecruzamento com as temáticas da educação e projeto de vida
diferentes da nossa proposta.
Se observarmos o panorama dos trabalhos, podemos destacar algumas questões como
a distribuição geográfica dos mesmos. Nesse quesito se destaca a região sudeste, seguida
pelas regiões sul e norte na mesma proporção (cabe destacar que todos os trabalhos da região
norte foram realizados no estado do Pará). Nordeste tem um número menor e centro-oeste não
aparece no levantamento. Abaixo o gráfico ilustrativo da distribuição geográfica.
Gráfico 01: Distribuição dos trabalhos por região do país.
Fonte: Elaborado pela autora com base no levantamento realizado nas bases de dados.
Outro dado que merece destaque é a distribuição dessas produções ao longo dos anos
dentro do lapso temporal delimitado (2012-2016), sendo que o ano com maior número de
trabalhos foi 2016 com um total de cinco, em seguida 2013 com quatro, 2014 com dois, e
2012 com apenas um, conforme representação gráfica a seguir.
0
1
2
3
4
5
6
Nordeste Norte Sudeste Sul
Nordeste
Norte
Sudeste
Sul
80
Gráfico 02: Distribuição das produções por ano.
Fonte: Elaborado pela autora com base no levantamento realizado nas bases de dados.
No que se refere aos programas em que as pesquisas se distribuem, temos a maioria na
Educação, em um total de sete. Nas ciências sociais localizamos dois e nos demais programas
– extensão rural, ambiente e desenvolvimento, ecologia e ecossistemas – com apenas um em
cada, conforme gráfico abaixo.
Gráfico 03: Área de Concentração dos Programas de Pós-graduação.
Fonte: Elaborado pela autora com base no levantamento realizado nas bases de dados.
0
1
2
3
4
5
6
Ano 2012 Ano 2013 Ano 2014 Ano 2016
Série1
012345678
Série1
81
O exercício de levantar a produção de teses e dissertações nos possibilita confrontar
nosso objeto e buscar seu lugar. O que constatamos nesse processo é que a proposta de
estudar ―as representações sociais dos/as jovens sobre o Sistema de Organização Modular de
Ensino (SOME) e as implicações no seu projeto de vida‖, no contexto de uma área protegida
que é a Reserva Extrativista do Rio Cajari – RESEX-CA, é pertinente visto seu ineditismo e
condições de produzir pesquisa com essa Juventude da Amazônia, em grande medida ainda
invisibilizada.
82
SEÇÃO III
ELABORAÇÃO TEÓRICA
Fonte: Visões da Juventude da Floresta, 2016, p. 20.
A imagem acima é de um paneiro cheio de mandioca descascada e lavada, pronta para
ser triturada, prensada e posteriormente peneirada e torrada para se tornar farinha. Em outras
regiões o paneiro pode ser conhecido como cesto e o produto dentro dele conhecido como
mandioca brava. A produção de farinha é uma das principais atividades produtivas na região
onde se situa a RESEX-CA e fonte de renda para inúmeras famílias de modo que esse
trabalho é desempenhado por um grande quantitativo de Jovens dessas comunidades.
83
“Da velha casa de farinha [...]
Várias mulheres no chão com a mandioca a
raspar.
Um forno com farinha assando e outra ali já
peneirando
Para poder ensacar.”
(Armando Morais)
3.1 APRESENTAÇÃO
Esta seção tem como objetivo apresentar o referencial que orienta a escrita dessa tese.
Para tanto, partimos da apresentação da Teoria das Representações Sociais que embasa nosso
estudo por tratar-se de uma ferramenta teórico-metodológica para a compreensão dos
conhecimentos produzidos pelos grupos sociais. Para Nascimento, ―essa teoria é uma
ferramenta teórico-metodológica importante para se compreender este jogo de peças de
encaixe que é a construção do conhecimento que emerge dos grupos para dar sentido e
orientação a suas vidas‖ (2004, p. 90).
Nesse sentido, situaremos a TRS no contexto de nosso estudo entrecruzando-a aos
conceitos de Juventude, Educação do Campo e Projeto de Vida os quais dão suporte para a
elaboração do presente estudo. Desse modo, apresentaremos na primeira subseção a TRS,
suas abordagens, especialmente a processual, pois trata-se da utilizada em nosso estudo, além
de como se organizam as RS, as imagens, sentidos, ancoragens e objetivações.
Posteriormente, apresentaremos a discussão em torno da construção da categoria
Juventude com ênfase na Juventude do Campo e sua articulação com o território, bem como, a
perspectiva da condição e situação juvenil no campo. Na sequência nos debruçaremos sobre o
tema da Educação do Campo, especialmente o Ensino Médio e seus impactos na vida da
Juventude. Por fim, abordaremos como se dá a construção dos projetos de vida da Juventude.
3.2 A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
84
A Teoria das Representações Sociais originou-se em 1961, na Europa, a partir dos
estudos de Serge Moscovici. Para o autor, ―as representações sociais devem ser vistas como
uma maneira específica de compreender e comunicar o que nós já sabemos‖ (MOSCOVICI,
2007, p. 46). A contribuição da TRS se dá inicialmente no campo da psicologia social, porém,
vem se estabelecendo em diversos campos, entre eles o da sociologia, da antropologia e da
educação (SOUZA, 2008).
Nessa construção, Denise Jodelet aparece como principal colaboradora de Moscovici e
desempenha a tarefa de sistematização do campo. Com isso, possui uma grande contribuição
no aprofundamento teórico e no sentido de esclarecer melhor o conceito e os processos
formadores das representações sociais (ALVES-MAZZOTTI, 2008).
Desse modo, Jodelet situa as RS na história, bem como seu processo de construção
observando que estas sofrem mudanças de acordo com o contexto de sua produção, já que se
constituem a partir das experiências de determinado grupo social, segundo a autora:
As representações sociais estão na história e têm uma história: evoluem na medida
das mudanças intervenientes nos modelos culturais, nas relações sociais, nas
circunstâncias históricas que afetam os contextos em que se desenvolvem, nos
agentes que as forjam a partir de sua experiência e de sua inserção em uma rede de
vínculos sociais e intersubjetivos (JODELET, 2017, p. 27).
Nesse sentido, Moscovici destaca que as Representações Sociais ao compreender e
comunicar o que sabemos, ―ocupam, [...] uma posição curiosa, em algum ponto entre
conceitos, que têm como seu objetivo abstrair sentido do mundo e introduzir nele ordem e
percepções, que reproduzam o mundo de uma forma significativa‖ (2007, p. 46).
Cabe mencionar que as Representações Sociais são simbolizações de algo para
alguém, de modo que são produzidas nas interações. Para Placco e Souza (2012), ―[...] sujeito
e objeto se fundem e se reinterpretam nas interações sociais. O sujeito está individualmente
inteiro na interação, ao mesmo tempo em que representa a cultura e o grupo social que
pertence‖ (2012, p. 24). Nesse sentido, as RS são entendidas como conhecimento do senso
comum, pois concebem o pensar e a linguagem como capturados no discurso cotidiano.
Ao partir do senso comum, as RS se forjam dos saberes, das crenças, do conhecimento
produzido por meio do diálogo dos grupos sociais. São, portanto, organizadas a partir de
informações que estão baseadas no passado, na cultura, na tradição e na linguagem. Para
Guareschi (2007), as Representações Sociais ―são, pois, entidades concretas, realidades em si
85
mesmas, conjuntos de saberes e práticas que constituem e ocupam um espaço vital e
simbólico, no qual nos movemos, pensamos, falamos e somos levados a agir‖ (GUARESCHI,
2007, p. 34).
Para Jodelet (2017), o estudo das Representações Sociais está situado nos processos de
interação entre indivíduos, indivíduos e grupos ou entre grupos. Segundo a autora, as RS:
[...] como forma de saber prático implicam duplamente uma relação indissociável
entre um sujeito, que é sempre social: por sua inserção social e por sua ligação com
o outro, e um objeto que, simbolizado pela representação, é construído e
interpretado pelo sujeito ao se referir a ele (JODELET, 2017, p. 31).
Alves-Mazzotti (2008) caracteriza o surgimento das RS como a criação de ―universos
conceituais‖, onde estas são produzidas e comunicadas. Para a autora, as RS extrapolam as
simples opiniões e tornam-se ―teorias‖ do senso comum. Trata-se de ―[...] construções
esquemáticas que visam dar conta da complexidade do objeto, facilitar a comunicação e
orientar condutas‖ (ALVES-MAZZOTTI, 2008, p. 21). Ainda, para Moscovici ―As
representações, por outro lado, restauram a consciência coletiva e lhe dão forma, explicando
os objetos e acontecimentos de tal modo que eles se tornam acessíveis a qualquer um e
coincidem com nossos interesses imediatos‖ (p. 52).
Esse processo ocorre por meio das imagens e opiniões criadas pelos sujeitos a partir de
sua realidade social ou universo de conhecimento, visto que, segundo Moscovici ―a finalidade
de todas as representações é tornar familiar algo não-familiar, ou a própria não familiaridade‖
(2007, p.54).
Jodelet destaca alguns consensos sobre as representações sociais, são eles:
- quanto à pertinência social e cultural dos fenômenos simbólicos que a noção
permite identificar e estudar;
- quanto à sua estrutura: conjunto complexo e ordenado compreendendo elementos
informativos, cognitivos, ideológicos, normativos, crenças, valores, opiniões,
imagens, atitudes, etc.;
- quanto ao processo de sua constituição como modalidade de conhecimento (...)
(JODELET, 2017, p. 39).
86
A partir dos consensos apresentados por Jodelet (2017) e compreendendo a relevância
das RS enquanto modalidade de conhecimento tomamos esta teoria como referência para o
presente estudo. A seguir, apresentaremos os processos de constituição das RS.
3.2.1 Processos de formação das RS: Ancoragem e Objetivação
Os processos de formação das representações socais são denominados de Ancoragem
e Objetivação. Para Braz, ―o primeiro gira em torno de classificação e nomeação e o segundo
se refere a transfiguração do que é abstrato para o concreto, por imagens‖ (BRAZ, 2011, p.
60). Nesse sentido, Moscovici explica que:
Ancoragem e objetivação são, pois, maneiras de lidar com a memória. A primeira
mantém a memória em movimento e a memória é dirigida para dentro, está sempre
colocando e tirando objetos, pessoas e acontecimentos, que ela classifica de acordo
com o tipo e rotula com um nome. A segunda, sendo mais ou menos direcionada
para fora (para os outros), tira daí conceitos e imagens para juntá-los e produzi-los
no mundo exterior para fazer coisas conhecidas a partir do que já é conhecido
(MOSCOVICI, 2007, p.78).
A ancoragem é o processo pelo qual os indivíduos tornam o desconhecido em algo
familiar por meio de sua nomeação. Para Placco, Bôas e Souza, ―do ponto de vista cognitivo,
a ancoragem consiste na integração do objeto a um sistema de pensamento já existente,
enraizando-o ali, por meio da memória‖ (PLACCO; BÔAS; SOUZA, 2012, p. 24). Isso é
explicado por Moscovici (2007), como sendo ―um processo que transforma algo estranho e
perturbador, que nos intriga, em nosso sistema particular de categorias e o compara com um
paradigma de uma categoria que nós pensamos ser apropriada‖ (2007, p. 61).
Alves-Mazzotti (2008) observa que ―o processo de ancoragem, relacionado
dialeticamente à objetivação as três funções básicas da representação‖ (2008, p.30) as quais
ilustramos por meio do diagrama abaixo:
87
Figura 03: Funções básicas da representação.
Fonte: Elaboração própria.
A objetivação é o processo pelo qual transformamos os conceitos e ideias em imagens
concretas, é, por assim dizer, a forma como atribuímos sentidos às palavras e ideias que
passam a circular na sociedade em dado momento histórico, ou seja, ―objetivar é descobrir a
qualidade icônica de uma ideia, ou ser impreciso; é reproduzir um conceito em uma imagem‖
(MOSCOVICI, 2007, p.71-72).
Segundo Placco, Bôas e Souza, ―Na objetivação, a intervenção social assume duas
funções: a primeira, de organizar o conhecimento e, a segunda, de dar forma a esse
conhecimento‖ (2012 p. 24-25). Desse modo, a objetivação possui a tarefa de
―concretização‖, ou seja, ela facilita a visualização do novo conceito por meio de formas, ou
materialização do mesmo (PLACCO; BÔAS; SOUZA, 2012).
O processo de objetivação ocorre em três fases, na primeira denominada construção
seletiva o sujeito se apropria das informações sobre algo ou alguém, durante o processo de
apropriação ocorre uma filtragem em função de questões culturais e critérios normativos, por
fim ficarão retidas as informações que estão de acordo com os valores do seu grupo social. A
segunda fase corresponde a esquematização, momento em que se produz uma forma visível e
Orientação das condutas e
relações sociais de grupos
Cognitiva
88
facilmente comunicável do objeto da representação. Esse processo permite a apreensão do
mesmo ao sujeito, seja individualmente ou nas suas relações (ALVES-MAZZOTTI, 2012).
Por fim, a terceira fase compreende o resultado dessa organização e é denominado de
naturalização. Nesse momento as novas informações sobre algo ou sobre uma teoria se
transformam em representações, ou seja, em realidade (ALVES-MAZZOTTI, 2008). As fases
do processo de objetivação estão apresentadas no diagrama abaixo:
Figura 04: Fases do processo de objetivação.
Fonte: Elaboração própria.
Segundo Placco, Bôas e Souza (2012) o processo ―contínuo e simultâneo de
ancoragem e objetivação é carregado de valores e possibilita ao sujeito sua adesão e seu
reconhecimento nos grupos sociais, auxiliando, assim, seu processo de inserção social [...]‖
(2012, p. 25).
Nascimento (2004, p. 25) apresenta três dimensões que fornecem conteúdo e coerência
ao conteúdo e sentido das representações sociais, são elas:
Figura 05: Dimensões das RS.
A) Atitude B) Informação C) Imagem
OBJETIVAÇÃO
2. Esquema
Figurativo
3.
Naturalização
1.
Construção
Seletiva
89
Fonte: Elaboração própria.
A autora descreve cada uma das dimensões da seguinte forma:
A) Configura-se como uma dimensão em que a representação social fornece a
orientação global para a ação, favorável ou desfavorável, em relação ao objeto da
representação;
B) Corresponde à sistematização dos conhecimentos que o grupo tem sobre o
objeto;
C) É a ideia ou imagem associada a um conteúdo selecionado e preciso sobre o
objeto, fornecendo-lhe uma unidade (NASCIMENTO, 2004, p.83-84).
Por fim, nos propomos navegar nas águas da reflexão proposta por Alves-Mazzotti
(2008) ao defender que as RS possuem como diferencial em relação a outras abordagens uma
dupla questão: O social interfere na elaboração psicológica e esta interfere no social, ou seja,
o pensamento social como aspecto constituído (produto) e aspecto constituinte (a objetivação
e ancoragem).
Segundo a autora, ao estudá-las como produto buscamos ―apreender seu conteúdo e
sentido através de seus elementos constitutivos: informações, crenças, imagens, valores,
expressos pelos sujeitos e obtidos por meio de questionários, entrevistas, observações, análise
de documentos, etc.‖ (2008, p.34), ao passo que ao estudarmos como processo ―estamos
interessados na relação entre a estrutura da representação e suas condições sociais de
produção, bem como nas práticas sociais que induzem e justificam‖ (ALVES-MAZZOTTI,
2008, p. 34).
3.3 JUVENTUDE COMO CATEGORIA SOCIAL
Para pensar Juventude do campo e seus projetos de vida enlaçados aos processos de
escolarização é necessário observar como esses conceitos vêm emergindo ao longo do tempo
e como ocorre o processo de construção de identidade considerando que, conforme aponta
Castro, apesar do avanço nas produções a respeito da Juventude do campo, ainda há uma
produção frágil se compararmos aos estudos sobre outras Juventudes (CASTRO, 2015).
Cabe destacar que o conceito de Juventude perpassou por definições vinculadas a
diferentes paradigmas. Segundo ABRAMO, essas definições ―coexistem e, por vezes,
competem entre si nos diferentes campos que compõem a arena múltipla de ações dirigidas à
90
Juventude‖ (2005, p. 20) quais sejam, a Juventude como período preparatório, a Juventude
como etapa problemática, o Jovem como ator estratégico do desenvolvimento, Juventude
cidadã como sujeito de direitos.
Nesta mesma perspectiva, Castro (2009), observa que Juventude ―[...] é, além de uma
categoria que representa identidades sociais, uma forma de classificação social que pode ter
múltiplos significados, mas que vem se desenhando em diferentes contextos como uma
categoria marcada por relações de hierarquia social‖ (CASTRO, 2009, p. 03).
A autora discute as definições de Juventude enquanto ―revolucionária/transformadora‖
ou ―problema‖, nesses casos tratada segundo uma definição hierárquica de seu papel social e,
ainda, como ―transitoriedade do ciclo-de-vida‖ ou ―biológico‖, entendida como sem
experiência, em formação, que precisam ser encaminhados (CASTRO, 2009).
Alves e Durand (2015) situam sua reflexão a partir da perspectiva de que ―Histórica e
socialmente, a Juventude vem sendo unanimemente compreendida como fase da vida, que é
construída social e culturalmente e, portanto, modifica-se conforme o contexto histórico,
social, econômico e cultural‖ (2015, p. 72). Para as autoras, não é possível consideramos uma
única Juventude, mas Juventudes, dado a sua condição plural e diversificada.
Ainda sobre a construção da categoria ―Juventude‖, Castro afirma que: ―Juventude é
uma categoria permeada de definições genéricas, que constantemente tende a ser
substantivada, adjetivada, sem que se busque a auto-percepção e formação de identidades
daqueles que são definidos como ―jovens‖‖ (CASTRO, 2005, p. 06).
Essa multiplicidade de definições e entendimentos acerca do conceito de Juventude
também é evidente quando a situamos no contexto do Rural, do Campo, e/ou da Floresta. Os
estudos realizados sobre esse público se apresentam, também de maneira dinâmica e passam
por mudanças de interpretação ao longo do tempo e do espaço.
Nesse sentido, Castro (2005) aponta para a necessidade de buscarmos um olhar para as
diferentes formas de construção da identidade, sejam elas: ―jovem rural‖, ―jovem da roça‖,
―jovem do campo‖ e acrescentamos aqui ―jovem ribeirinho‖, ―jovem extrativista‖, ―jovem da
floresta‖, no sentido de ―[...] desubstancializar estas categorias e procurar compreendê-las em
seus múltiplos significados‖ (2005, p. 06).
Essa preocupação apontada por Castro (2005) traz elementos importantes para nossa
construção no sentido de não limitar ou aprisionar a(s) Juventude(s), mas compreender seus
91
múltiplos significados, a partir dos seus territórios e da construção de suas identidades e da
sua auto-percepção.
Outra autora, que dialoga com esses campos, Jaqueline Freire (2009) utiliza o termo
Juventude Camponesa a partir do entendimento destes como categoria sociológica. Segundo a
autora, é ―expressão de processos dinâmicos e multidimensionais no contexto amazônico –
histórico, econômico, social, cultural, ambiental –, superando assim o reducionismo do
recorte etário ou a naturalizada denominação de jovens rurais‖ (FREIRE, 2009, p. 26).
A autora defende que a categoria Campesinato abarca todas as múltiplas e diversas
identidades presentes no contexto da Amazônia, o qual ela denomina ―vastidão de suas matas
e águas‖. Ela afirma, ainda, que ao longo das suas reflexões, apresenta citações que se
utilizam do termo Juventude Rural ou Juventude do Campo, porém, na sua interpretação as
diferentes nomenclaturas não significam antagonismos conceituais com perspectivas
analíticas diferentes, o contrário, por exemplo, do que ocorre com Educação Rural e Educação
do Campo que carregam campos antagônicos de construção teórica.
Os autores Leão e Antunes-Rocha (2015), ao apresentar essas categorias observam que
a categoria Juventude Rural foi muito útil no sentido de enfrentar a invisibilidade do debate
no início dos anos 2000. Para os autores, isso se dá pelo processo de aproximação e
articulação de uma grande diversidade de jovens em que essa categoria se forjou (LEÃO;
ANTUNES-ROCHA, 2015).
Esses diferentes paradigmas dão conta da complexidade existente na conceituação de
Juventude, porém, no presente estudo vamos ao encontro de Durand e Alves (2015) pelo
entendimento de que essa construção é histórica e social e difere de acordo com questões
geográficas, de visões de mundo colocando o termo Juventude(s) no plural.
Nesse sentido, Abramo coloca duas tarefas importantes, uma histórica de ―definir o
que constitui a condição Juventude e Adolescência no Brasil [...], o que a singulariza, quais
são os elementos que a constituem e quais são os desafios postos‖ e a outra política que ―é a
de definir que direitos garantem a vivência dessa condição de uma forma digna e satisfatória,
que sinalizem políticas que objetivem, universalmente, o cumprimento desses direitos‖ (2005,
p. 34).
Desse modo, no esforço de articular essas questões e buscar compreendê-las, o
presente estudo segue na direção de vislumbrar o que singulariza a Juventude que compõe o
92
nosso estudo. Para tanto, nossa discussão abordará no próximo tópico como ponto de partida
o tema Juventude, território e condição juvenil.
3.3.1 Juventude, Território e Condição Juvenil
Ao considerarmos a heterogeneidade e as trajetórias dos sujeitos que compõe a
diversidade de Juventude(s) amazônidas, suas origens, seus modos de vida, os modos de
produção e convivência com a terra, as águas e a floresta surgem preocupações. Entre elas, as
questões ligadas à preservação destes modos de vida, e o impacto que a migração desses/as
Jovens pode provocar em sistemas de produção que atualmente garantem a preservação da
Floresta Amazônica nessa região.
Dessa forma, partimos da premissa de que essas construções se deram historicamente
a partir de disputas e relações de poder. Quando falamos do território amazônico,
vislumbramos muito além do espaço amazônico, visto que conforme afirma Raffestin o
―Espaço e território não são equivalentes. [...] território, nessa perspectiva, é um espaço onde
se projetou um trabalho, seja energia e informação, e que, por consequência, revela relações
marcadas pelo poder‖ (2011, p. 128).
É nesse contexto que se forjam as identidades dos/as Jovens e, portanto, há uma
diversidade tamanha de Juventude(s) que se constituem a partir dos seus territórios
específicos. Nesse espaço em que se planta, extrai, pesca, e, para além disso, produz cultura,
se constrói um território. Bonnemaison afirma que ―É pela existência de uma cultura que se
cria um território e é por ele que se fortalece e se exprime a relação simbólica existente entre
uma cultura e o espaço‖ (2012, p. 288).
Milton Santos em sua obra ―Por uma outra globalização‖ (2008), traz uma definição
de território, para este autor:
O território não é apenas o resultado da superposição de um conjunto de sistemas
naturais e um conjunto de sistemas de coisas criadas pelo homem. O território é o
chão e mais a população, isto é, uma identidade, o fato e o sentimento de pertencer
àquilo que nos pertence. O território é a base do trabalho, da resistência, das trocas
materiais e espirituais e da vida sobre as quais ele influi. Quando se fala em
território, deve-se, pois, de logo, entender que está se falando em território usado,
utilizado por uma dada população (SANTOS, 2008, p. 96-97).
93
Nesse sentido, pensar o território a partir da produção material e simbólica da
Juventude nos leva ao que Haesbaert (2004) propõe, visto que, o autor afirma que ―todo
território é, ao mesmo tempo e obrigatoriamente, em diferentes combinações, funcional e
simbólico, pois exercemos domínio sobre o espaço tanto para realizar ―funções‖ quanto para
produzir ―significados‖‖ (HAESBAERT, 2004, p.03).
Desse modo se evidencia a importância de conhecer os territórios em que os jovens
vivem no sentido de entendermos os próprios jovens, bem como, seus modos de ser e estar no
mundo (ALVES; OLIVEIRA, 2014), além das relações que se estabelecem, as trocas, bem
como, as formas de organização possibilitadas nesses territórios.
Nessa perspectiva observamos que a vinculação dos/as jovens com o território é um
aspecto que se apresenta de maneira recorrente nas produções de diferentes autores. Esse
aspecto aparece como constitutivo a partir do entendimento de que é nesse lugar que esses
sujeitos constroem suas identidades e estes são atravessados pelos modos de vida e pelas
relações sociais e de produção estabelecidas nesse contexto que possibilitam, em diferentes
medidas, a vivência e a construção da condição juvenil.
É possível observar essa afirmação nos estudos de Durand e Alves (2015) sobre a
busca de escolarização/qualificação de jovens do estado de Santa Catarina, participantes do
Programa ProJovem Campo – Saberes da Terra ao evidenciarem que a construção do ser
jovem está ligada a questões regionais e locais dos grupos em que estão inseridos.
O estudo de Alves (2015) sobre a condição juvenil em contexto rural a partir das
especificidades de um município rural mineiro revela que: ―A questão territorial é um fator
significativo na constituição identitária e na condução e elaboração dos projetos de vida dos
jovens‖ (ALVES, 2015, p. 87).
Pensar o tema territórios e Juventudes para Alves e Oliveira (2014) implica considerar
a forma como os jovens constroem e dão significados aos espaços, isso se dá por meio dos
locais que frequentam, dos modos de vida, da produção de culturas juvenis, das possibilidades
de consumo, bem como, das relações e da sociabilidade. Para esses autores é necessário,
ainda, ―pensar de que forma os espaços vividos, construídos e (re)significados pelos jovens
influenciam suas escolhas e seus modos de vida‖ (2014, p. 18).
Ao partir desse olhar, ficam evidenciadas as desigualdades que recaem sobre os
territórios brasileiros. Podemos observar pelo viés campo-cidade, conforme dados
apresentados anteriormente no presente estudo, ou pelo viés das diferentes regiões do país. Se
94
a perspectiva for de renda ou de acesso a políticas públicas, em qualquer recorte de análise
encontraremos evidências da desigualdade vivenciada no Brasil.
Essas desigualdades e diferenças produzem marcas que acabam por estigmatizar e
inferiorizar os moradores do campo perante os outros grupos territoriais. Essa situação
repercute de forma acentuada nas visões e interpretações dos/as Jovens sobre si e sobre os
seus territórios.
Desse modo, os grandes desafios que se constituem estão nas possibilidades de
permanência desses sujeitos nos seus territórios, visto que não há o suporte necessário por
meio das políticas para que possam vivenciar os diversos elementos constituintes da condição
juvenil (IPEA, 2015, p. 08).
Nesse sentido, torna-se fundamental observar que, para além da vinculação com o
território, outro aspecto chave para entendermos a Juventude do campo é a condição Juvenil.
Isto porque os jovens do campo aparecem ora como vítimas, ora como culpados dos
processos de continuidade e reprodução do campo (DURAND; ALVES, 2015), e isso ocorre
em grande medida desconsiderando as desigualdades impostas a esses sujeitos na vivência da
condição juvenil.
Nessa direção, compartilhamos a reflexão proposta por Leão e Antunes-Rocha que ao
pensar os sujeitos em seu tempo histórico a partir da compreensão de Condição Juvenil, no
sentido de reconhecer que são atribuídos valores à Juventude considerando não somente a
questão geracional, como também, que existem condicionantes sociais impostas. A afirmação
de Leão & Antunes-Rocha apresenta essa questão com propriedade:
[...] esse termo reconhece que toda sociedade constrói representações sociais e
atribui determinados valores a Juventude a partir de um recorte geracional. Ao
mesmo tempo, não desvincula isso das especificidades de cada situação social vivida
a partir de condicionantes de classe, gênero, pertencimento étnico-racial, etc (LEÃO;
ANTUNES-ROCHA, 2015, p.19).
Ao partir desse entendimento, podemos constatar que é impossível conceber a
existência de uma Juventude universal ou um tipo ideal de Jovem, mas é fundamental
considerar as múltiplas Juventudes e seus contextos de vida. Essas Juventudes possuem para
além das dimensões de classe, gênero e pertencimento étnico-racial, especificidades
simbólicas e culturais e possibilidades de viver (ou não) a condição juvenil, conforme
abordam Leão e Antunes Rocha: ―dimensões simbólicas e culturais, como também [...]
95
situações materiais que definem limites e possibilidades de viver a condição juvenil‖ (LEÃO;
ANTUNES-ROCHA, 2015, p. 19).
Nesse sentido, nossa reflexão assume como referência a Juventude do campo da
Reserva Extrativista do Rio Cajari, sujeitos que para além da faixa etária, pertencem a grupos
sociais que possuem modos de vida específicos e que se constituem a partir de dimensões
múltiplas que vão desde elementos técnicos do seu processo de trabalho até questões
simbólicas e ritos próprios da sua cultura. É esta Juventude do campo, nesse tempo histórico,
que reafirma sua identidade por meio de diferentes linguagens e busca a concretização e
materialização de seus projetos de vida.
Diante do exposto, torna-se imprescindível pensar os/as Jovens do campo como
sujeitos que possuem a capacidade de intervir na realidade e transformá-la. Ou seja, é
necessário romper com a ideia de que os/as jovens não pensam por si e incorporam de
maneira passiva modelos culturais preestabelecidos e difundidos pelos meios de comunicação,
para vislumbrá-los como sujeitos que dialogam, se organizam e constroem sua trajetória
pessoal e coletiva. Leão e Antunes-Rocha complementam, atentando para a necessidade de:
[...] romper com o círculo vicioso dos saberes que afirmam imagens e sentidos de
jovens que desistem de suas identidades como uma trajetória inexorável para ir ao
encontro de sujeitos que se movimentam em torno da luta pelo direito de existir
reafirmando suas identidades, seja no campo e/ou na cidade (LEÃO; ANTUNES-
ROCHA, 2015, p. 26).
Trata-se de romper com a ideia de que é necessário fixar os jovens no campo.
Diferente disso, existe a necessidade de criar condições para que esses sujeitos possam ter
opção de escolha. Isso implica a elaboração e efetivação de políticas permanentes para os/as
jovens do campo pois, para que os/as jovens possam escolher permanecer no campo, é
fundamental que eles/as tenham acesso à serviços públicos de qualidade, dentre os quais,
destacamos o acesso à escolarização, saúde, lazer, entre outros, ou seja, implica construir
possibilidades para que esta Juventude possa viver a condição juvenil em seus territórios.
3.3.2 Juventude e educação
96
Ao se discutir a relação entre educação e Juventude, não se pode omitir que a
educação é ao mesmo tempo um direito e uma exigência. Direito garantido pela legislação
brasileira mas que nem sempre é efetivado e exigência para que os jovens possam
compreender as mudanças impostas pela sociedade em que vivem e para que tenham a
formação necessária para exercerem uma profissão. Porém, uma parte da Juventude brasileira
ainda não consegue chegar ao Ensino Médio e ao Ensino Superior, as condições de acesso
diferem de acordo com a renda, a classe social e com o lugar onde vivem (MESQUITA;
JUNIOR; SIMÕES, 2012, p. 01).
Se consideramos a educação no contexto do campo, os desafios enfrentados pelos
jovens são objeto de estudo de vários autores, como, por exemplo, Marinho (2016), ela
observa que em diferentes medidas os jovens são afetados por desafios sociais, culturais,
produtivos e tecnológicos, os quais dificultam e até podem inviabilizar a sua permanência no
campo em algumas circunstâncias (MARINHO, 2016, p. 59).
As inúmeras dificuldades enfrentadas pelos jovens do campo implicam nas suas
representações sobre o campo e consequentemente nos seus projetos de vida, sejam eles,
permanecer ou buscar espaço na cidade. Para fins desse estudo e em consonância com a
literatura disponível, podemos afirmar que um dos principais e mais significativos desafios
estão ligados ao acesso e permanência na escola. Ou seja, a Educação pode ser considerada –
a depender da oferta e dos condicionantes – fator de permanência no campo ou migração.
Podemos observar, no estudo de Galindo (2015) que os desafios para acessar e
permanecer na escola emergem como bandeira de luta nas ações coletivas da Juventude. Essa
pauta, que não é exclusiva de uma região, impacta diferentes territórios do campo brasileiro,
conforme afirma a autora: ―As adversidades relacionadas ao acesso e permanência na escola
permeiam memórias e relatos, ponto de onde emerge uma importante bandeira de luta que
orienta a ação coletiva das Juventudes organizadas‖ (GALINDO, 2015, p. 107).
Apesar dos desafios apresentados estes sujeitos buscam de todas as maneiras enfrentar
os obstáculos, pois há uma crença na escola como via de acesso para uma vida melhor. É
possível observar nos estudos de autores como Alves (2015), a autora afirma que: ―Apesar das
dificuldades enfrentadas para acessar e permanecer na escola, esses jovens acreditavam nos
estudos e evidenciavam uma forte crença na escola como caminho para uma vida melhor‖
(ALVES, 2015, p. 91-92).
97
Os processos de escolarização, no que diz respeito aos desafios enfrentados para
acesso e permanência, bem como os aspectos de continuidade e qualidade, tornam-se fatores
de saída do campo de maneira similar ao que aparece em estudos como no de Leão e Antunes-
Rocha (2015). Os autores afirmam que ―em grande parte, esse movimento de saída é resultado
das condições desfavoráveis de educação‖ (LEÃO; ANTUNES-ROCHA, 2015, p. 23).
A visão que os/as jovens manifestam sobre os processos de escolarização, a
penosidade enfrentada para garantir o acesso e permanência, bem como, a preocupação com a
qualidade dos processos formativos ficaram evidenciados na discussão apresentada por
Marinho (2016) que observa a problemática da ausência e má qualidade das escolas
localizadas no campo, além da descontextualização do currículo em relação a realidade dos/as
educandos/as. Para a autora esses fatores contribuem para a expulsão de um grande número de
jovens do campo em busca de melhores perspectivas.
Para a autora, ―[...] a permanência do jovem no campo se torna mais ameaçada
principalmente quando o mesmo almeja um nível de ensino em descompasso com o ofertado
na comunidade‖ (MARINHO, 2016, p. 59-60). Essa problemática reafirma que migrar nem
sempre é uma escolha do/a jovem, mas uma condição imposta pela ausência de políticas
públicas que possibilitem a permanência no campo.
Alcançar seus projetos implica, na maioria dos casos, em acessar maiores níveis de
formação, o desejado curso superior, porém, sem abandonar sua identidade de jovem do
campo. Essa problemática é apresentada no estudo realizado por Oliveira & Feliciano. Os
referidos autores afirmam que: ―[...] a vontade de permanecer choca-se com a necessidade da
saída do campo, [...] consolidando um movimento contraditório de busca, construção e
desconstrução e resistência de jovens camponeses e camponesas‖ (OLIVEIRA; FELICIANO,
2016, p. 224).
Na literatura disponível sobre esse tema fica evidente que a decisão sobre permanecer
(ou não) no campo não é uma decisão fácil. É um processo difícil, tenso e contraditório, onde
como afirma Marinho (2016) estão imbricados os laços cultivados pelos jovens com suas
culturas e, ao mesmo tempo a possibilidade de construir seus projetos de vida na cidade
permeados pela crença em algo melhor para si e para suas famílias que em geral está
associado a estruturas sociais de educação, saúde, lazer entre outros.
Desse modo, podemos dizer em consonância com a reflexão proposta por Durand e
Alves (2015) que essa discussão é reveladora no sentido de que a educação escolar sozinha
98
não tem o poder de definir a permanência do jovem no campo, nem tampouco de ser o único
condicionante responsável pelo êxodo rural. Ao contrário disso é fundamental considerar ―as
condições sociais da Juventude no campo, para se entender o alcance e os limites dos projetos
educativos‖ (DURAND; ALVES, 2015, p. 83).
3. 4 EDUCAÇÃO DO CAMPO
Quando tratamos da educação no contexto do campo nosso ponto de partida passa a
ser as possibilidades de vivenciar e conhecer experiências diversas e heterogêneas. Dessa
forma é necessário que a nossa abordagem compreenda a educação em seus distintos
processos formativos, sejam eles, na escola, na família, no trabalho, nas organizações sociais,
enfim, na vida.
A Educação do Campo é fruto da luta e organização dos movimentos sociais do
campo. Esse processo se constituiu ao longo da sua trajetória por meio de embates, debates,
discussões e proposições teóricas e práticas construídas dentro e fora das escolas. Sua
identidade está expressa na legislação, por meio da RESOLUÇÃO CNE/CEB 1, DE 3 DE
ABRIL DE 2002, que instituiu as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas
do Campo, no parágrafo único do artigo 2º, conforme segue:
A identidade da Escola do Campo é definida pela sua vinculação às questões
inerentes à sua realidade, ancorando-se na temporalidade e saberes próprios dos
estudantes, na memória coletiva que sinaliza futuros, na rede de ciência e tecnologia
disponível na sociedade e nos movimentos sociais em defesa de projetos que
associem as soluções exigidas por essas questões à qualidade social da vida coletiva
no país (BRASIL, 2002).
Desse modo, pensar Educação do Campo implica conhecer sua realidade e a partir
dela possibilitar a construção do conhecimento considerando propostas, projetos, soluções que
possam ampliar a qualidade de vida nas comunidades e organizações do campo. Significa ter
como parâmetro os princípios da Educação do Campo expressos no artigo 2º do decreto
7352/2010:
I - respeito à diversidade do campo em seus aspectos sociais, culturais, ambientais,
políticos, econômicos, de gênero, geracional e de raça e etnia;
99
II - incentivo à formulação de projetos político-pedagógicos específicos para as
escolas do campo, estimulando o desenvolvimento das unidades escolares como
espaços públicos de investigação e articulação de experiências e estudos
direcionados para o desenvolvimento social, economicamente justo e
ambientalmente sustentável, em articulação com o mundo do trabalho;
III - desenvolvimento de políticas de formação de profissionais da educação para o
atendimento da especificidade das escolas do campo, considerando-se as condições
concretas da produção e reprodução social da vida no campo;
IV - valorização da identidade da Escola do Campo por meio de projetos
pedagógicos com conteúdos curriculares e metodologias adequadas às reais
necessidades dos alunos do campo, bem como flexibilidade na organização escolar,
incluindo adequação do calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições
climáticas; e
V - controle social da qualidade da educação escolar, mediante a efetiva participação
da comunidade e dos movimentos sociais do campo (BRASIL, 2010).
Nesse sentido, a proposta da Educação do Campo provoca a educação escolar a
realizar um processo de reflexão, pois o que se espera é que a escola cumpra seu papel no
sentido de que "a escola e os saberes escolares são um direito do homem e da mulher do
campo, porém esses saberes escolares têm que estar em sintonia com os saberes, os valores, a
cultura e a formação que acontecem fora da escola" (ARROYO, 2004, p. 78).
Esse processo de reflexão nos leva a uma análise do sistema educacional que está ao
alcance dos/as Jovens do campo e suas possibilidades de vincular os saberes próprios das
populações do campo, à cultura, aos valores, a vida desses/as sujeitos. O questionamento
levantado seria: A escola que está no campo é do campo? Essa discussão é proposta por
Roseli Caldart no texto em que debate a identidade da Educação do Campo. A autora expressa
a definição de ―no campo e do Campo‖ na compreensão de ―no‖ enquanto lugar e ―do‖ na
perspectiva da participação dos povos do campo no seu processo de construção. O diagrama
abaixo ilustra a discussão proposta por Caldart (2002).
Figura 06: Educação No e Do Campo.
100
Fonte: Elaboração própria.
É importante nessa discussão observar de maneira clara que os problemas e
questionamentos levantados não pretendem colocar toda a responsabilidade nos ombros da
escola. Sabemos que os processos educativos reproduzidos nas escolas são construídos a
partir de questões que ultrapassam seus muros e são permeadas por relações de poder. É
nessas entrelinhas que se disseminam as visões e os discursos que normatizam o cotidiano dos
sujeitos do campo e, também, os procedimentos escolares.
Arroyo reflete que "A cultura hegemônica trata os valores, as crenças, os saberes do
campo de maneira romântica ou de maneira depreciativa, como valores ultrapassados, como
saberes tradicionais, pré-científicos, pré-modernos" (2004, p. 79). São essas visões que nas
disputas e relações de poder são concretizadas e excluem do cotidiano escolar a relação com
os saberes do campo, nesse sentido, "Pensar uma proposta de educação básica do campo
supõe superar essa visão homogeneizadora e depreciativa e avançar para uma visão positiva"
(ARROYO, 2004, p. 80).
Na contramão da lógica homogeneizadora da educação, Salomão Hage afirma que ―a
Amazônia apresenta como uma de suas características fundamentais a ―heterogeneidade‖, que
se expressa de forma bastante significativa no cotidiano da vida, do trabalho e das relações
sociais, culturais e educacionais dos sujeitos que nela habitam‖ (2005, p. 61). Essas
características produzem uma riqueza tamanha e ao mesmo tempo complexa. Desse modo,
torna-se fundamental que esta seja ―valorizada e incorporada nos processos e espaços de
elaboração e implementação de políticas e propostas educacionais para a região‖ (2005, p.
67).
O autor reflete, ainda, que toda essa riqueza exuberante deveria estar incluída e
referenciar a formulação de políticas públicas visto que ―essa é uma condição necessária
No
Campo
•O povo tem direito a ser educado no lugar onde vive
Do
Campo
•O povo tem direito a uma educação pensada desde o seu lugar e com a sua participação, vinculada à sua cultura e às suas necessidades humanas e sociais.
101
quando nos pautamos pela intencionalidade de valorizar e afirmar as identidades culturais das
populações da Amazônia‖ (HAGE, 2005, p. 67). Para além disso, deve se considerar que ―é
inadmissível que as políticas e as práticas curriculares vigentes continuem a se perpetuar
desconsiderando essas especificidades que constituem as identidades culturais de nossa
região‖ (HAGE, 2005, p. 67).
A realidade segue no rumo inverso ao proposto pelo autor, em um processo de
precarização dos processos educativos no que diz respeito a infraestrutura e principalmente no
que tange as questões da política educacional e da organização curricular que afetam as
escolas em geral. Esta situação é ainda mais dura quando se trata do contexto do campo, pois
justifica-se nos custos impostos pelas distancias geográficas e no número de alunos/as nas
comunidades nas faixas etárias correspondentes a cada série. Se consideramos o contexto
amazônico, as dificuldades e justificativas da precarização se ampliam ainda mais.
Cabe ressaltar que o abandono e a precarização não são necessariamente descuido,
mas em grande medida possuem como intencionalidade a defesa de modelos econômicos
distintos, que, para se manter, precisam de uma parcela significativa da população
domesticada e dependente das migalhas oferecidas pelo sistema. Para Roseli Caldart, ―Além
de não reconhecer o povo do campo como sujeito da política e da pedagogia, sucessivos
governos tentaram sujeitá-lo a um tipo de educação domesticadora e atrelada a modelos
econômicos perversos‖ (CALDART, 2002, p. 19).
Esse é o contexto de desumanização denunciado pela Educação do Campo, mas com a
clareza de que é preciso ir além da denúncia, pois é na luta e na construção de alternativas de
transformação que o processo educativo se faz verdadeiramente, como afirma Caldart:
Discutimos a educação vinculada aos processos sociais de formação dos sujeitos do
campo porque aprendemos na prática que não há como educar verdadeiramente o
povo do campo sem transformar as condições atuais de sua desumanização; e
também já aprendemos que é na própria luta por estas transformações que o
processo de humanização é retomado (2002, p. 21).
No ano de 2002 Mônica Molina falou e escreveu desafios aos educadores do campo.
Passados quase 20 anos do Seminário Nacional Por uma Educação do Campo, vivenciamos
muita história e conquistas importantes, porém, os desafios propostos pela autora ainda são
extremamente atuais. É importante ressaltar que nos últimos anos temos acompanhado
retrocessos significativos que nos recolocam na urgência de uma forte agenda de lutas por
102
uma educação de qualidade em todos os âmbitos, especialmente no Campo. A figura a seguir,
retoma os desafios propostos por Molina (2002).
Figura 7: Desafios aos educadores do campo.
Estudar sempre e muito
Transformar o
conhecimento em ação
Transformar ação em
conhecimento
Estar na luta pela
Educação do Campo nas e
para além das escolas
Criar e consolidar
articulações regionais e
estaduais de educação do
campo
Inserção nos Planos
Municiais e Estaduais
de Educação
Consolidar um espaço
permanente de debate
Enraizar a Educação do
Campo nos sistemas
federais de ensino e na
agenda de pesquisa
Criar e consolidar
articulações municipais
de Educação do Campo
Fortalecer a Educação
do Campo como área
do conhecimento
A luta pela Educação
do Campo dentro dos
sistemas públicos
Criar e consolidar setores
específicos de Educação
nos Movimentos Sociais
Fonte: Elaboração Própria com base no texto ―Desafios aos educadores do campo‖ (MOLINA 2002).
Os desafios aos educadores do campo propostos por Molina (2002) abrangem uma
série de ações necessárias para o fortalecimento da Educação do Campo. São tarefas
permanentes que se impõe no processo de construção e consolidação da Educação do Campo
nos diferentes níveis e espaços. Para o nosso estudo, destacamos o foco na luta pela Educação
do Campo dentro dos sistemas de ensino público, especialmente no que tange ao Ensino
Médio por considerar o contexto onde se insere a presente pesquisa.
Nesse sentido, concordamos com a discussão proposta por Roseli Caldart em relação
aos porquês da luta em defesa da escola, para a autora:
A Educação do Campo não cabe em uma escola, mas a luta pela escola tem sido um
de seus traços principais: porque a negação do direito à escola é um exemplo
emblemático do tipo de projeto de educação que se tenta impor aos sujeitos do
campo; porque o tipo de escola que está ou nem está mais no campo tem sido um
dos componentes do processo de dominação e de degradação das condições de vida
dos sujeitos do campo; porque a escola tem uma tarefa educativa fundamental,
especialmente na formação das novas gerações; e porque a escola pode ser um
espaço efetivo de fazer acontecer a Educação do Campo (CALDART, 2002, p. 24).
103
A partir dessa compreensão, torna-se necessário pensar os processos de escolarização,
ou seja, a inserção dos/as Jovens do campo nos sistemas públicos de ensino. Desse modo,
vislumbramos como um caminho a busca por compreender os desafios enfrentados pelos/as
jovens na escola e a relação com seus projetos de vida, conforme afirma Dayrell: ―É preciso,
portanto, compreender as expectativas dos jovens estudantes a respeito de sua formação
escolar e a avaliação que eles fazem dessa‖ (2009, p. 07).
Na atualidade, há uma certa naturalização dos processos de escolarização, dos/as
jovens enquanto alunos e dos papéis atribuídos a eles/as. Porém, como afirma Penatieri ―[...] a
escola nem sempre existiu, trata-se de uma instituição situada no(s) tempo(s) e espaço(s), por
isso a importância do olhar histórico‖ (PENATIERI, 2012 p. 03). Se considerarmos
especificamente o Ensino Médio, a expansão e o acesso ainda são conquistas recentes e até
mesmo um desafio para os/as jovens do campo.
Muito embora o Ensino Médio tenha passado por um processo recente de expansão13
,
para Penatieri (2012), esse momento da escolarização se constitui como um espaço importante
de sentido. No seu bojo se evidenciam desigualdades e oportunidades distintas nos diferentes
âmbitos da sociedade brasileira as quais produzem marcas na Juventude. Ao mesmo tempo
pode ser considerado um espaço de construção e luta por direitos desses/as sujeitos.
Em geral, a noção de escolarização está associada ao conceito de educação, porém, a
forma como a escola está organizada atualmente é um processo de construção recente e sua
implantação não ocorreu de maneira uniforme nos diferentes lugares e regiões (CAMPOS;
RODRIGUES & VITKOWSKI, 2012). Essa situação é descrita pelos autores da seguinte
forma: ―[...] a rigor, a educação escolar está associada a um conjunto de elementos que a
caracterizam de modo distinto de todas as outras experiências educativas estabelecidas
anteriormente [...]‖ (CAMPOS; RODRIGUES; VITKOWSKI, 2012).
Ao observarmos essa realidade a partir de dados quantitativos de diferentes fontes, as
desigualdades se mostram evidentes. Nossa consulta se deu em diferentes documentos os
quais abordam os dados de maneira distinta, ora com referência à idade e ora a partir do
número de matrículas independente de faixa etária.
13
LEI Nº 12.061, DE 27 DE OUTUBRO DE 2009. Altera o inciso II do art. 4o e o inciso VI do art. 10 da Lei no
9.394, de 20 de dezembro de 1996, para assegurar o acesso de todos os interessados ao ensino médio público.
104
Segundo os números apresentados pelo INEP no Panorama da Educação: Destaques
do Education at a Glance14
(2018), no Brasil, o percentual da população que frequenta a
escola, por idade, é de 85% entre os jovens de 16 anos; 74% entre os de 17 anos; 49% entre os
de 18 anos; 42% entre os de 19 anos; e 35% entre os de 20 anos. Esse dado demonstra que a
medida que a idade dos jovens avança diminui o número de estudantes. Segundo o estudo,
esses percentuais são baixos em comparação com os outros países, os quais apresentam, em
sua maioria, percentuais superiores a 90% para a população de 16 e 17 anos. A média da
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) para a população de
18 anos é 76%, para a população de 19 anos 64% e para a população de 20 anos 56%.
O mesmo estudo afirma, ainda, que o perfil do estudante do Ensino Médio brasileiro é
semelhante ao dos estudantes que cursam as séries finais do ensino fundamental. Eles tem, em
média, 18 anos e o percentual de alunos na rede pública de ensino é o mesmo: 86%.
Outro dado apresentado que pode ser considerado preocupante diz respeito ao fato de
que menos de 60% dos estudantes brasileiros concluem o Ensino Médio antes dos 25 anos,
enquanto em outros países da OCDE esse número se amplia para mais de 80%. Esse dado
reflete a dificuldade no acesso e permanência dos Jovens brasileiros ao Ensino Médio que
possui diversas e distintas causas entre as quais podemos destacar a necessidade de inserção
no mundo do trabalho nessa faixa etária, bem como, a falta de escolas próximas a sua
residência, esse último, com ênfase para a realidade das comunidades do campo.
A planilha da Sinopse Estatística da Educação Básica de 2018 disponibilizada para
consulta pelo INEP permite a filtragem de dados de matrículas no Ensino Médio sem
considerar a faixa etária, nesse caso, o Brasil aparece com um total de 7.125.365 matrículas
no Ensino Médio regular e 505.791 no Ensino Médio Técnico, enquanto no Amapá os
números do regular são de 35.427 e no técnico 9.250.
Quando filtramos os dados por faixa etária, a sinopse não informa a qual nível de
escolaridade as matrículas se referem. Nesse caso, as matrículas de jovens de 15 a 17 anos são
um total de 8.281.372 no Brasil e 42.249 no Amapá; entre os jovens de 18 e 19 anos o Brasil
possui um total de 1.979.448 matrículas e o Amapá 12.912; na faixa etária de 20 a 24 anos o
número é de 1.393.843 no Brasil e 8.926 no Amapá; por fim, no intervalo entre 25 e 29 anos
temos 612.041 no Brasil e 3.469 no Amapá.
14
Education at Glance: Educação num relance.
105
É nesse contexto que nos situamos, os dados apresentados revelam numericamente as
condições em que se encontram jovens e, considerando essa realidade, buscamos
compreender a forma como se relacionam com a escola, as suas demandas e necessidades
próprias.
3.4.1 Ensino Médio no Campo no Amapá
Os processos de escolarização no Ensino Médio das comunidades do campo no
Amapá ocorrem de três formas distintas. A primeira é a modalidade denominada regular na
legislação estadual que é ofertada pela Secretaria de Estado de Educação (SEED) em escolas
de distritos e comunidades mais populosas, a segunda é o Sistema de Organização Modular de
Ensino (SOME), também ofertada pela SEED em escolas de comunidades mais distantes, de
difícil acesso e mais dispersas territorialmente. A terceira é ofertada pelas Escolas Famílias
Agroextrativistas e Agrícolas que promovem Educação do Campo por meio da Pedagogia da
Alternância e são geridas por associações15
próprias que acessam recursos públicos de
convênios com o Governo do Estado, além de outras fontes de financiamento.
As unidades escolares onde o presente estudo foi realizado desenvolvem suas
atividades por meio do Sistema de Organização Modular de Ensino (SOME), conhecido
popularmente na região como ―módulo‖, modalidade em que o professor de cada disciplina
permanece na escola por um período determinado (50 dias) para ministrar todas as aulas da
sua disciplina em bloco e retorna para a cidade para posteriormente se dirigir a outra escola.
A Lei nº 0949, de 23 de dezembro de 2005, publicada no Diário Oficial do Estado nº
3668, de 23.12.2005 que dispõe sobre normas de funcionamento do Sistema Estadual de
Educação, reestrutura o Grupo Magistério do Quadro de Pessoal do Governo do Estado do
Amapá e organiza o Plano de Cargos, Carreiras e Salários dos profissionais da educação
básica do Poder Executivo Estadual, apresenta em seu artigo 59 a possibilidade de
implantação do Sistema Modular de Ensino:
15
As Escolas Famílias possuem associações mantenedoras próprias que são responsáveis pela gestão das
Escolas. São compostas por uma diretoria executiva, conselho fiscal e conselho administrativo que são
responsáveis pela administração da escola. O conselho administrativo é composto por representantes de pais,
professores, alunos, membros das igrejas e órgãos de assistência técnica existentes nas localidades que
juntamente com a diretoria executiva fazem a gestão e administração de cada EFA. O órgão soberano de cada
associação é a assembleia geral de pais e mestres.
106
Art. 59 - Nas localidades do Estado em que não seja possível estruturar e colocar em
funcionamento o ensino fundamental e médio regular será implantado, em caráter
excepcional, o Sistema Modular de Ensino, desde que observadas as seguintes
condições:
I - comprovação da existência de, pelo menos, 20 (vinte) alunos por série;
II - disponibilidade de alojamento ou local adequado para moradia dos professores;
III - existência de infraestrutura física compatível com o ambiente escolar (AMAPÁ,
2005).
Segundo informações da Unidade do Ensino Médio Modular (UEMOD) da Secretaria
Estadual de Educação do Amapá (SEED), o SOME foi implantado em caráter experimental,
com a prerrogativa de levar séries finais do ensino fundamental e Ensino Médio para as
localidades do Estado onde não é possível estruturar o ensino regular.
Esse processo teve início na década de 80 com foco na formação de professores (1982)
nos municípios de Amapá, Calçoene, Mazagão e Oiapoque com a oferta de cursos de
formação de Professores de 1ª a 4ª série (Magistério). Posteriormente em 1983 houve a
expansão do curso de Magistério para os municípios de Porto Grande, Pedra Branca do
Amapari, Serra do Navio e Laranjal do Jarí. Em 1984 na sede Alexandre Vaz Tavares ocorreu
a implantação do Curso Básico de 2º grau para atender os município de Porto Grande,
Laranjal do Jari, Vitória do Jari e Ferreira Gomes.
Em 1989 houve uma avaliação do processo, diálogo com a comunidade e proposta de
cessação. Em 1996 houve a reativação das modalidades de formação de professores e do
curso básico de 2º grau, porém, em 2002 foi extinta a modalidade de formação de professores.
Atualmente, segundo dados fornecidos pela Unidade do Ensino Médio Modular
(UEMOD), 12 (doze) municípios são atendidos pelo SOME, são eles, Calçoene, Itaubal,
Laranjal do Jari, Macapá, Mazagão, Oiapoque, Pedra Branca do Amapari, Porto Grande,
Pracuúba, Santana, Tartarugalzinho e Vitória do Jari, distribuídas em 33 (trinta e três) escolas
e localidades com um alcance de 257 comunidades. No total foram 1.587 alunos/as atendidos
em 2017 e 1.463 no ano de 2018, e um total de 137 professores distribuídos nas 12 disciplinas
da Matriz Curricular obrigatória.
O SOME estabelece o trabalho em 04 (quatro) módulos com duração de 50
(cinquenta) dias letivos cada um, a semana letiva é de 06 (seis) dias, garantindo assim os 200
dias letivos previstos na legislação vigente. Em cada módulo são ofertadas 2 a 3 disciplinas.
107
Essa é a realidade de um grande número de jovens estudantes que vivem no campo
amapaense. O acesso e permanência nessas escolas aliado a problemática dos transportes
escolares tornam a vida escolar desses sujeitos um grande desafio.
Ao pensar os processos educativos no estado do Amapá e seus rumos para os
próximos anos, observamos o previsto na LEI Nº 1.907, DE 24 DE JUNHO DE 2015,
publicada no Diário Oficial do Estado pelo Poder Executivo que dispõe sobre o Plano
Estadual de Educação - PEE, para o decênio 2015 -2025, e dá outras providências. No que
tange ao Ensino Médio, a referida lei propõe a meta 4, enquanto especificamente sobre o
SOME a meta 4.12, explicitamente sobre a Educação do Campo as metas 4.13 e a meta 11
que trata da Juventude do campo, conforme segue:
Meta 4: Universalizar, até 2016, o atendimento escolar para toda a população de quinze a
dezessete anos de idade, e até o final do período de vigência do Plano Estadual de
Educação-PEE elevar a taxa líquida de matrículas no Ensino Médio para 85% (oitenta e
cinco por cento).
4.12) Fortalecer o SOME e o SOMEI para garantir o acesso ao Ensino Médio às
comunidades onde não seja possível a oferta dessa etapa educacional em sistema regular.
4.13) Promover o acesso e a permanência dos educandos na Escola do Campo e das
comunidades indígenas, quilombolas, negras, ribeirinhas, extrativistas, e de assentamentos,
assegurando-lhes transporte, alimentação, alojamento e estrutura física, bem como pessoal
docente e de apoio necessários ao regular desenvolvimento do período letivo.
Meta 11: Elevar, até o último ano de vigência do Plano Estadual de Educação-PEE, a
escolaridade média das pessoas de dezoito a vinte e nove anos de idade, de modo que
especialmente as populações do campo, do Município com menor nível de escolaridade, e
os 25% (vinte e cinco por cento) mais pobres do Estado, concluam pelo menos o Ensino
Médio, além de diminuir a discrepância de escolaridade entre as diversas culturas étnicas
declaradas ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (AMAPÁ, 2015).
O Plano Estadual de Educação prevê o fortalecimento do SOME (e SOMEI16
) e a
promoção do acesso e permanência dos Jovens na Escola do Campo, e ainda, a diminuição da
discrepância de escolaridade entre as diferentes culturas. Há uma sinalização no sentido de
qualificar os espaços da Educação do Campo. Cabe garantir a efetivação o que só será
realidade por meio da participação das comunidades e movimentos sociais por meio de luta,
organização e disputa permanente.
3.5 PROJETO DE VIDA DA JUVENTUDE
16
SOMEI: Sistema de Organização Modular de Ensino Indígena.
108
Compreender os projetos de vida dos/as jovens passa por vislumbrar os desafios e os
fatores que influenciam na decisão de permanecer (ou não) no campo, tomando como
referência a ideia de projeto de vida como um plano de ação que possui um lapso temporal
mais ou menos longo. Leão; Dayrell & Batista Dos Reis apresentam essa definição da
seguinte forma: ―A ideia de projeto de vida remete a um plano de ação que um indivíduo se
propõe a realizar em relação a alguma esfera de sua vida (profissional, escolar, afetivo etc.)
em um arco temporal mais ou menos largo‖ (LEÃO; DAYRELL; BATISTA DOS REIS,
2011, p. 1.071).
Tardeli (2010) corrobora com a ideia de que o Projeto de Vida se caracteriza por sua
temporalidade. Para a autora, este se constitui em uma ―relação entre a concepção e o
emprego do tempo presente com as expectativas do emprego do tempo futuro‖ (2010, p. 65).
A autora reflete, ainda, que o tempo é uma questão fundamental na organização dos projetos
de vida, de modo que a forma como os jovens colocam suas pretensões para o futuro denotam
seus ―estilos de vida e seus significados, bem como as condições de vida concretas na
sociedade em que vivem‖ (2010, p. 65).
Cabe destacar que esse processo de elaboração ocorre nas trocas entre sujeitos e destes
com a sociedade, conforme podemos observar na afirmação de Nascimento: ―A ideia de que o
Projeto de Vida se delineia na relação do sujeito com o mundo nos remete à constituição do
sujeito com a sociedade. As histórias de cada um certamente não seriam protagonizadas sem a
presença do outro‖ (NASCIMENTO, 2013, p. 88).
O contexto onde as relações se concretizam, seja no que diz respeito à situação
material, cultural ou simbólica, está intrinsecamente articulado às elaborações de projeto de
vida. Para Leão; Dayrel & Batista dos Reis: ―[...] tais elaborações dependem sempre de um
campo de possibilidades dado pelo contexto socioeconômico e cultural no qual cada jovem se
encontra inserido e que circunscreve suas experiências‖ (LEÃO; DAYRELL; BATISTA DOS
REIS, 2001, p. 1.071).
Desse modo, a escola – do Ensino Médio – é entendida nesse estudo como espaço de
trocas e partilhas onde os/as jovens encontram uns/mas nos/as outros/as a possibilidade de
presença do/a outro/a que também se constrói e possui expectativas e desejos. Nascimento
afirma que: ―A presença do outro reenvia a ideia de partilha necessária tanto às
particularidades da vida de cada sujeito como para a vida na relação com o outro‖
(NASCIMENTO, 2013, p. 88).
109
A escola está inserida na realidade social dos/as jovens, de modo que atua também
como espaço de construção da subjetividade e, portanto, é fundamental enquanto local para
construção do projeto de vida, de maneira especial no Ensino Médio. Afinal, esse nível de
escolaridade constitui a fase da vida em que se acentua o processo de definições relacionadas
ao mundo do trabalho, entre outras questões (MARCELINO, CATÃO; LIMA, 2009).
O convívio diário e os processos de aprendizagens, especialmente nesse momento da
vida escolar em que os/as jovens projetam suas expectativas e desejos de futuro, possibilitam
esses vínculos relacionais que se constroem, tanto objetiva como subjetivamente, individual e
coletivamente, conforme afirma Nascimento: ―[...] o individual e o coletivo estão presentes
tanto na subjetividade quanto na objetividade do sujeito. Não existe uma separação, mas uma
relação entre estas partes‖ (NASCIMENTO, 2013, p. 88).
Esse espaço de convivência diária permite intercambiar visões de mundo, dificuldades
e aspirações, situações concretas do cotidiano, bem como, aspectos simbólicos, culturais que
são importantes na constituição dos sujeitos, conforme salienta Nascimento: ―O Projeto de
Vida emerge nessa trama complexa de relações, de construção de saberes sobre si e sobre o
mundo na medida em que significados são partilhados no cotidiano‖ (NASCIMENTO, 2013,
p. 88).
Esse processo de busca de identidade imerso nas possibilidades de vivência e inserção
social, amplificam a posição da sociabilidade nesta etapa de vivência da Juventude. Ou seja,
nesse espaço é possível vivenciar novas experiências, criar identificações e laços de
solidariedade. Para Tardeli (2010) essas são formas particularmente juvenis de buscar
respostas indispensáveis para a construção das suas identidades e projetos de vida. Segundo a
autora, são formas de ―responder às perguntas: Quem eu sou? Quem eu quero ser? O que eu
quero para mim e para a sociedade?‖ (2010, p. 63).
Na visão de Furlani e Bonfim, o projeto de vida é um ponto significativamente
relevante na vida de qualquer pessoa que possui posicionamentos críticos e embasados sobre
si e sobre a realidade em que está inserido. Porém, para os/as jovens torna-se um grande
desafio. Para as autoras:
O jovem, que comumente é um ser questionador, traz em si um grande potencial
para ser o grande autor de sua vida. No entanto, as dificuldades pelas quais passa,
sejam elas de cunho individual (crises existenciais, alterações de humor,
modificações hormonais etc.) ou de cunho social (situação socioeconômica,
desigualdades sociais, crise de valores etc.), podem influenciar na atuação
110
consciente e planejada desse jovem em sua própria vida (FURLANI; BONFIM,
2010, p. 57).
Essas características dão conta de que os projetos de vida são carregados de valores,
sejam eles individuais ou dos grupos sociais em que nos inserimos e partilhamos experiências
e vivências. Para Alves (2015) mais do que isso, é ―um processo de aprendizagem que implica
o amadurecimento da capacidade de integrar o passado, o presente e o futuro, bem como as
condições objetivas e subjetivas‖ (2015, p. 87), tudo isso compõe a individualidade de um
sujeito.
Situar o conceito de projeto de vida é fundamental para o nosso estudo no sentido de
caminhar na direção de compreender como os/as Jovens do Campo constroem, apreendem e
organizam suas vivências e desse modo planejam seus projetos de vida. Autores como
Marinho (2016) observam algumas questões que impactam nesse processo em se tratando de
jovens do campo, para a autora:
Os Jovens do campo em sua maioria vivem um constante antagonismo, divididos
entre a possibilidade de trilharem projetos mais individualizados na cidade, expresso
na vontade de ―melhorar a qualidade de vida sua e da família‖, de ―ser alguém na
vida‖ e a vontade de continuar residindo no local de origem, principalmente pela
relação com a família e o sentimento de pertencimento com a localidade, já que sua
família é o espaço privilegiado de sociabilidade (MARINHO, 2016, p. 60).
Desse modo, considerando as reflexões produzidas e apresentadas nesta seção, nos
propomos a buscar respostas aos objetivos do presente estudo por meio da análise dos dados
levantados pela pesquisa em diálogo com a elaboração teórica ora explicitada. Nesse sentido,
a próxima seção abordará as representações dos jovens da Reserva Extrativista do Rio Cajari
sobre a sua escolarização no sistema modular de ensino e as implicações no seu projeto de
vida.
111
SEÇÃO IV
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS/AS JOVENS SOBRE O SOME
112
Fonte: Visões da Juventude da Floresta (2016, p. 07).
A imagem apresenta um jovem de costas pilotando uma voadeira – embarcação de
pequeno porte com motor potente - pelas águas do rio Amazonas. Sob um céu azul e nuvens
brancas, navega nas água de tonalidade marrom, onde ao longe se pode observar sinais de
verde e terra das ilhas marajoaras. O Jovem veste uma camiseta branca com a frase ―Vamos
Amazonizar o mundo‖.
Cantamos pra celebrar e proteger a nossa
Aldeia.
Nas noites sob o luar, quando o dia clareia.
Esse é um canto de amor, passarinho que semeia.
Pólen, pólen, amor em flor.
Amazônia na Veia.
(Zé Miguel)
113
4.1 CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS DO ESTUDO: QUEM FALA E DE ONDE
FALA?
Esta subseção tem como objeto a caracterização dos sujeitos envolvidos no estudo.
Trata-se dos/as Jovens estudantes do Ensino Médio, especificamente 2º e 3º anos nas duas
Escolas da Reserva Extrativista do Rio Cajari, na Amazônia Amapaense, que ofertam Sistema
Modular de Ensino, conforme apresentado em seção anterior.
A presente caracterização baseou-se nos dados levantados por meio da aplicação de
questionário semiestruturado envolvendo questões relacionadas as características
socioeconômicas, sobre a permanência no campo e sobre projeto de vida do Jovem.
Participaram do levantamento 60 (sessenta) jovens, das duas escolas que ofertam a
modalidade no território da RESEX-CA, quais sejam, no Alto Cajari – Escola Água Branca
do Cajari (Imagem 07) e no Baixo Cajari – Escola Osmundo Barreto Valente (imagem 06),
entre os quais 34 do sexo masculino, (totalizando 56%) e 26 do sexo feminino (44%).
A escola Osmundo Barreto Valente está situada no Baixo Cajari, no Braço do Ajuruxi,
na comunidade Maranata, próximo a Foz do rio Ajuruxi no rio Amazonas. É uma escola
ribeirinha que recebe alunos de diversas comunidades próximas e atende desde as séries
iniciais (em um anexo) do ensino fundamental até o Ensino Médio. Funciona nos turnos
matutino e vespertino e possui 04 salas de aulas e outras 4 estão em construção, sala de
professores, cozinha, biblioteca, banheiros, despensa, pátio coberto (onde os alunos/as
recebem a merenda), pátio descoberto. A diretora da escola é da própria comunidade,
bem como, a secretária, e os/as funcionários/as responsáveis pela merenda, limpeza e
organização dos espaços.
O prédio é construído em madeira e suas janelas possuem venezianas com pequenas
aberturas por onde entra a única luz do ambiente visto que a comunidade não possui
fornecimento de energia 24h, a mesma é proveniente de gerador mantido com combustível e é
ligado por volta das 20 horas permanecendo até por volta de 23 horas.
A imagem a seguir (06) apresenta a fachada da escola com o nome em destaque na cor
verde, fixado na cobertura do corredor principal de acesso às suas dependências. É possível
observar na imagem o corredor de acesso às salas de aula e parte do pátio externo, bem como,
as copas de alguns açaizeiros presentes no seu entorno.
114
Imagem 06: Escola Osmundo Valente Barreto - Baixo Cajari.
Fonte: Arquivo Pessoal.
A escola Água Branca do Cajari está situada no Alto Cajari, na BR 156 que liga a
capital Macapá ao município de Laranjal do Jari, na comunidade (de mesmo nome) Água
Branca do Cajari. É uma escola em terra firme que recebe alunos de diversas comunidades
próximas e atende desde as séries iniciais do ensino fundamental até o Ensino Médio.
Funciona nos turnos matutino, vespertino e noturno, possui 8 salas de aulas (não são todas
utilizadas), sala de diretoria, sala de professores, quadra de esportes coberta, cozinha,
biblioteca, banheiros, banheiro adequado à alunos com deficiência ou mobilidade reduzida,
sala de secretaria, refeitório, despensa, pátio coberto e pátio descoberto.
A diretora da escola não é da própria comunidade, não possui secretária, apenas
voluntariado e/ou arranjo eventual da direção com membro da comunidade, já os/as
funcionários/as responsáveis pela merenda, limpeza e organização dos espaços residem na
comunidade.
O prédio é todo construído em alvenaria. A comunidade não possui fornecimento de
energia 24h, a mesma é proveniente de gerador mantido com combustível e é ligado por volta
das 16 horas permanecendo até por volta de 23 horas.
115
A imagem a seguir (07) apresenta a fachada (parcial) da escola com a placa do nome
pouco visível, fixado na cobertura do corredor principal de acesso às suas dependências. É
possível observar na imagem o corredor de acesso à algumas salas de aula e parte do pátio
externo, bem como, da secretaria e o telhado da quadra coberta, além dos muros e grades do
prédio.
Imagem 07: Escola Água Branca do Cajari - Alto Cajari.
Foto: Zenaide Teles de Oliveira, janeiro/2020.
Cabe mencionar que no Médio Cajari não há oferta de Ensino Médio. Essa é uma
problemática que não está na centralidade do nosso estudo mas que merece atenção pela sua
importância. Não é uma realidade apenas das comunidades Amazônicas, Molina e Freitas
apresentam essa discussão em seu estudo sobre os avanços e desafios da Educação do Campo.
As autoras afirmam que a insuficiente oferta educacional no meio rural é um dos maiores
problemas da Educação do Campo, segundo elas, há uma desproporção no número de vagas
que manifesta um ―afunilamento na oferta educacional do meio rural, dificultando o progresso
escolar daqueles alunos que estariam almejando continuar os seus estudos em escolas
localizadas nesse território‖ (2011, p. 19). O referido tema aparece nas falas dos sujeitos
participantes dos grupos triangulares da seguinte forma:
116
O módulo é muito importante, tanto que eu não morava aqui, eu morava pra Ilha
do Pará, aí só que lá eu terminei o Ensino Fundamental e não tinha o Ensino
Médio, aí minha irmã morava aqui e eu vim morar aqui com ela porque tem o
módulo. Aí eu preferi vir pra cá no caso, porque se tivesse lá, era mais fácil, né? É
importante ter assim, nos interiores pra melhorar, porque tem muitas pessoas que
não têm condição de vir pra Santana estudar, estudar depois pra ir pra faculdade
que é mais fácil (Jovem Mandioca).
Conforme mencionado em seção anterior, a RESEX-CA possui uma ampla extensão
territorial e apenas duas escolas públicas que ofertam o Ensino Médio. Dessa forma, os
sujeitos envolvidos no presente estudo são provenientes de diversas comunidades situadas
nesse território. A Tabela abaixo apresenta as referidas comunidades e o número de
estudantes de cada uma que compõe o corpus da pesquisa.
Tabela 10: Número de jovens por comunidade.
COMUNIDADES JOVENS
Água Branca do Cajari 11
Santa Maria do Rio Curuçá 8
Martins 6
Dona Maria 4
Marinho do Cajari 3
Bom Jesus 2
Furo do Maracá 2
Maranata 2
N. S. do Perpétuo Socorro do Rio Capitão 2
Rio Ajuruxi 2
Rio Arraia 2
Rio Capitão 2
Rio Curuçá 2
Santarém do Cajari 2
Boca do Braço 1
Santo Antônio da Foz do Ajuruxi 1
BR 156 entre São Pedro e Água Branca 1
Carneiro 1
Poção 1
Santa Maria 1
Santa Maria do Maracá 1
São Bernado 1
Vila Betel 1
Vila Canaã 1
Fonte: Corpus da Pesquisa.
117
Os Jovens participantes da pesquisa possuem entre 15 (quinze) e 26 (vinte e seis) anos,
sendo que a maioria dos sujeitos (60%) tem entre 15 e 18 anos e estão na faixa etária
correspondente ao Ensino Médio, enquanto os demais (40%) estão em distorção idade x série
com faixa etária entre 19 e 26 anos. Cabe mencionar que apenas 9% possuem mais de 20
anos. Em geral esse dado nos permitiria inferir que os estudantes das escolas do campo
possuem pouca distorção idade x série, porém, as escolas estudadas não ofertam a modalidade
de Educação de Jovens e Adultos e não acessamos os dados de evasão escolar e/ou do
quantitativo de jovens ou adultos que não concluíram o Ensino Médio e estão fora da escola
(visto que não está na centralidade de nosso estudo) de modo que uma inferência sobre essa
situação seria imprudente. No gráfico abaixo podemos observar a distribuição do quantitativo
de alunos por faixa etária.
Gráfico 04: Faixa Etária.
Fonte: Corpus da pesquisa.
No que se refere a identidade, a grande maioria dos/as jovens participantes da pesquisa
se reconhecem como Agricultores/as totalizando 45%, outros 22% se identificam como
Ribeirinhos/as, Agroextrativistas e Extrativistas possuem 11% e 10% respectivamente,
enquanto as demais denominações aparecem timidamente. É importante destacar que ao
analisarmos em separado os dados por escola, foi possível perceber que há uma diferença
marcante nas identidades do Alto e do Baixo Cajari, especialmente no que tange ao
10%
22%
20% 18%
13%
8%
5%
2% 2%
Faixa Etária
15 anos 16 anos 17 anos 18 anos 19 anos 20 anos 21 anos 23 anos 26 anos
118
reconhecimento como Extrativista e Agroextrativista, ou seja, 100% dos/as Jovens que se
reconhecem dessa maneira são do Alto Cajari, enquanto aqueles que se reconhecem como
pescadores são todos/as do Baixo Cajari. Já entre os que se identificam como Agricultores/as
50% são da região do Alto e 50% do Baixo. O gráfico a seguir apresenta as identidades
definidas pelos sujeitos.
Gráfico 05: Identidade.
Fonte: Corpus da pesquisa.
As diferenças demonstradas nessas características dizem respeito a relação
estabelecida pelos/as sujeitos com o trabalho, já que no Alto Cajari as atividades que geram
renda são basicamente o extrativismo da castanha e o cultivo de mandioca e macaxeira,
enquanto no Baixo a renda provém do açaí, camarão e da pesca. Essa questão aparece nas
falas dos sujeitos sobre as atividades desenvolvidas nas suas unidades produtivas:
Da Pesca e açaí, e a agricultura, né... Porque tem uma certa parte que tem a pesca
e daí é curto o período, daí quando não tem a pesca tem o açaí e quando não tem o
açaí tem a pesca e daí e assim vai... (Jovem Buriti – Baixo Cajari)
É mais a Castanha, e de verão é mais a agricultura [...] É que aqui na parte do
alto, que tem o alto, né... O médio e o baixo. Então aqui nós vivemos mais da
extração da castanha e da agricultura, na parte do médio eles vivem mais da parte
da pecuária e da agricultura disponível (Jovem Uxi – Alto Cajari).
45%
22%
11%
3% 10%
3% 2% 2% 2%
Identidade
Agricultor Ribeirinho Agroextrativista
Agricultor/ribeirinho Extrativista Pescador
Agricultor/pescador Camponês/ribeirinho Ribeirinho/extrativista
119
O estudo de Reis (2018) apresenta a forma como a identidade extrativista se constrói
no contexto da RESEX-CA, o autor afirma que no decorrer de sua pesquisa as categorias
―trabalhador‖ e ―camponês‖ deram lugar a expressão ―extrativista‖, segundo ele, as falas dos
sujeitos de seu estudo são explícitas ―quando defendem sua identidade relacionada com seu
modo de vida fundamentado na forma de trabalhar e viver preservando a floresta em pé‖
(REIS, 2018, p. 24).
Para Reis (2018), a questão identitária se materializou entre os extrativistas na luta em
defesa do seu território, bem como, do seu modo de vida. Segundo o autor:
Os extrativistas se perceberam e se afirmaram como classe social ao lutar contra os
coronéis, empresas e patrões na defesa do seu território, sua autonomia e garantia de
manutenção de seu modo de ser e de viver e de trabalhar. Seringueiros e
castanheiros, perceberam na floresta em pé um marco comum na construção da
categoria social identitária: Extrativistas. Trabalhadores extrativistas. Camponeses
extrativistas. Juventude extrativista. Mulheres extrativistas (REIS, 2018, p. 111).
Em relação ao auto reconhecimento, os/as Jovens da RESEX-CA em sua ampla
maioria (72%) se percebem como pardos, seguidos por 13% de brancos, 8% de pretos,
enquanto 2% se reconhecem como indígenas e 2% não declaram. O tema religião apresentou
uma divisão clara entre duas posições, sendo 50% de católicos e 47% evangélicos, os demais
3% se declararam sem religião. Os gráficos a seguir apresentam os números:
Gráfico 06: Auto-Reconhecimento e Gráfico 07 – Religião.
120
Fonte: Corpus da pesquisa.
No que se refere ao estado civil, a grande maioria dos/as participantes é solteiro
somando um total de 78%, o que possui relação com a faixa etária, já que trata-se de um
público bastante jovem. Os demais, 17% vivem em regime de união estável e 5% são casados.
Um dado interessante nesse aspecto é o fato de que quase a totalidade dos/as jovens que
vivem em regime de união estável e casados/as vivem no Alto Cajari, e somente 1 vive na
região do baixo Cajari. O gráfico a seguir, apresenta os percentuais ora descritos:
Gráfico 08: Estado Civil.
Fonte: Corpus da pesquisa.
A composição do grupo familiar em comunidades do campo em geral apresenta uma
conformação ampla em que cabem, além de pai, mãe e filhos, um número maior de pessoas,
sejam avós, tios, primos, etc. Em alguns casos, há uma casa grande que comporta muitas
72%
13%
8% 3% 2% 2%
Auto Reconhecimento
Pardo/a Branco/a Preto/a
50% 47%
3%
Religião
Católico/a Evangélico/a Sem Religião
78%
17%
5%
Estado Civil
Solteiro/a União Estável Casado/a
121
pessoas residindo nela, em outros, dentro da unidade produtiva são construídas habitações
menores nas quais os núcleos familiares se distribuem dentro daquele território. Essa
característica é evidenciada pelos números levantados em nosso instrumento de pesquisa que
aponta para famílias bastante numerosas, ou seja, em apenas 2% dos casos o grupo familiar é
composto por 1 a 3 pessoas, enquanto em 29% é composto por mais de 10 pessoas. Temos
ainda uma frequência de 27% de grupos familiares com um número de 7 a 10 pessoas, além
de 42% (maior quantitativo) dos grupos familiares com 4 a 6 pessoas. Podemos observar
esses dados no gráfico abaixo:
Gráfico 09: Grupo Familiar.
Fonte: Corpus da Pesquisa.
Quando falamos sobre a renda familiar o dado compilado pelo instrumento de
pesquisa revela-se preocupante, pois, apesar do grande número de pessoas que compõe o
grupo familiar, o valor estimado pelos/as jovens para sobrevivência das suas famílias está em
torno de 1 salário mínimo mensal em 52% dos casos. Já em 40% das famílias esses valores
correspondem a média de 1 a 3 salários mínimos. Apenas 5% das famílias vivem com renda
superior a 3 salários mínimos e 3% dos informantes não respondeu a essa questão. Abaixo,
podemos visualizar o gráfico com os respectivos quantitativos.
Gráfico 10: Renda Familiar.
122
Fonte: Corpus da Pesquisa.
Em relação a gestão da unidade produtiva nosso estudo evidenciou que as decisões
sobre as atividades produtivas, investimentos e todo o processo de organização do trabalho e
da renda são definidos pelos adultos, ou seja, 70% das unidades produtivas são geridas por pai
e mãe, e, em outras 7% as decisões são centralizadas apenas pelo pai – figura masculina que
possuía tarefa de prover a família. Em outros 12% das unidades produtivas as decisões são
tomadas por todos os membros da família. Os dados podem ser observados no gráfico a
seguir:
Gráfico 11: Gestão da Unidade Produtiva.
Fonte: Corpus da Pesquisa.
52% 40%
5%
3%
Renda Familiar
Até 1 Salário 1 a 3 Salários Acima de 10 Salários Não repondeu
70%
20%
7%
1% 2%
Gestão unidade produtiva
Pai e mãe Todos Pai Homens Não respondeu
123
A temática da participação na gestão da unidade produtiva apareceu nos grupos
triangulares também. Nas falas dos/as sujeitos a centralidade da decisão dos adultos foi
referendada conforme podemos observar a seguir:
Alunos: A gente trabalha, no caso ajuda o pai e a mãe, mas a organização
principal, quem vai lá conversar com eles lá, é o pai e a mãe que resolve, mas lá
no... pra ajudar plantar, colher, a gente a gente ajuda sim.(Jovem Açaí)
Aluno 2: A gente conversa assim, no caso assim eh, ouve a opinião dentre, mas a
decisão é do pai e da mãe, no caso assim [...] para poder comprar mercadoria,
combustível, para poder voltar, para... porque nós tem que guardar no caso, sei que
lá em casa é assim [...](Jovem Bacaba).
O estudo de Stropasolas (2011) indica que a não participação dos/as jovens na gestão
da unidade produtiva é uma das causas dos problemas para sua sucessão. O autor constatou
que ―os principais conflitos intergeracionais se revelam no modelo de gestão da propriedade
centralizado na figura do pai chefe de família‖ (2011, p. 27). Em geral, essa situação é
decorrente da dificuldade de aceitação de novas ideias, desenvolvimento de projetos e
atividades propostos pelos/as jovens, bem como na questão da autonomia financeira e de
mobilidade dos mesmos (STROPASOLAS, 2011).
Em relação aos dados referentes a participação em organizações sociais indicam que a
maioria dos/as jovens, um total de 59% não participa de nenhum tipo de organização. Entre os
demais, 17% participam de associação, 10% faz parte de grupos de jovens, 7% participam de
sindicato, 5% se articulam em mais de uma organização e 3% não responderam a essa
questão, conforme gráfico a seguir:
124
Gráfico 12: Participação em Organizações Sociais.
Fonte: Corpus da Pesquisa.
A ausência de um grande contingente de Jovens do Campo nos espaços de
organização manifesta uma problemática no sentido da continuidade dessas instituições que
permanentemente carecem de renovação e para possibilitar a elaboração de propostas que
atendam as comunidades possui uma tarefa constante de construção. Se analisarmos o
decorrer da história de conquistas das populações tradicionais a exemplo da demarcação da
Reserva Extrativista onde os Jovens vivem hoje, fica evidente o quanto os movimentos e
organizações sociais foram fundamentais na luta e nos enfrentamentos necessários.
Para além desse território específico, as conquistas relacionadas a programas e
políticas públicas de Educação do Campo foram construídas e são defendidas pelos
movimentos sociais e sindicais, ―entre os quais se destacam: o Programa Nacional de
Educação na Reforma Agrária (Pronera), o Programa Saberes da Terra e o Programa de Apoio
às Licenciaturas em Educação do Campo (Procampo)‖ (MOLINA; FREITAS, 2011, p. 23).
Para Molina, apesar das dificuldades enfrentadas na execução e liberação de recursos,
especialmente no que diz respeito a quantidade e a morosidade na sua consecução, esses
processos se materializam em práticas consistentes de concepções construídas pela Educação
do Campo (MOLINA; FREITAS, 2011, p. 23).
No que se refere a materialidade da vida, da organização produtiva e geração de renda
no campo, as falas dos grupos triangulares evidenciam a importância das organizações
59% 16%
10%
7%
5% 3%
Participação em Organizações Sociais
Nenhuma Associação Grupo de Jovens Sindicato Mais de uma Não respondeu
125
sociais, seja no Baixo Cajari, no sentido de facilitar o escoamento da produção ou no Alto
Cajari, em relação a organização produtiva das mulheres para produção dos derivados da
castanha, conforme podemos observar abaixo:
Isso facilitava quando tinha as associações, (inaudível) que a gente tirasse a
produção, entregava para ela e trazia a nossa renda. Você ficava muito mais fácil
porque a gente tinha saída para esses produtos, como abóbora, a banana, a batata,
a macaxeira, a mandioca e produzia farinha de tapioca. Tinha saída e agora,
devido não ter recursos para a presença dessas associações, a participação é mais
difícil porque não tem recurso, não tem como nós escoar esse produto. (Jovem
Buriti)
Aluno: É que é assim, é uma associação de mulheres, então vai nossa mãe, irmãs,
tias. E aí, as mulheres participavam e a gente ajudava elas fazer esse trabalho
assim, esses produtos que estava desempregado. E aí, a gente andava, na verdade a
gente conseguia trazer a despesa da casa (Jovem Piquiá).
Apesar de manifestarem a importância das organizações sociais com clareza nas suas
falas, os/as Jovens não se sentem parte do processo e não participam diretamente desses
espaços de decisão. Em um estudo recente, foram observados indícios de que a falta de
participação nas decisões de gestão nas unidades produtivas não gera coparticipação ou
responsabilidade nos/as jovens, seja no que se refere a iniciativas na unidade produtiva ou na
participação em espaços de organização e decisão na comunidade, nas associações, sindicatos,
etc. por meio do cruzamento de dados quantitativos relativos a participação na gestão e em
organizações sociais (REIS, 2017, p. 26).
Ao pensar seus projetos de vida, e confrontados com as possibilidades de ficar – ou
não – no campo, a maioria dos/as Jovens em um total de 57% desejam partir em busca de
outras possibilidades enquanto 41% deseja permanecer no seu território, no gráfico a seguir,
podemos observar os números ora mencionados. Cabe destacar que se observarmos os dados
por sexo, há uma maior tendência de migração entre as Jovens do sexo feminino, ou seja, 60%
delas afirmaram que desejam mudar para a cidade, enquanto entre os do sexo masculino
foram 51,5%. Esse dado merece aprofundamento, mas entre as questões que emergiram no
diálogo dos grupos triangulares a divisão do trabalho e a definição de papéis nas unidades
produtivas podem ser considerados elementos que justificam a maior incidência no desejo de
migração das jovens mulheres. Entre esses elementos está a responsabilidade pelos trabalhos
domésticos como tarefa feminina, a maior submissão em relação aos adultos em virtude do
risco de gravidez enquanto os homens são responsáveis pelo provimento das famílias
(atividades que geram renda) e, consequentemente serão os herdeiros do trabalho dos pais,
126
além do fato de possuírem maior liberdade de sair e participar de eventos e festas. Essa
temática será aprofundada posteriormente em tópico específico.
Gráfico 13: Projeto de vida.
Fonte: Corpus da Pesquisa.
Os dados ora apresentados nos permitem vislumbrar as principais características
dos/as sujeitos do nosso estudo, ou seja, jovens entre 15 e 26 anos que se identificam, em sua
maioria, como Agricultores Familiares e se auto reconhecem pardos. São, em geral, solteiros,
metade católicos e a outra metade evangélicos e possuem famílias numerosas, na imensa
maioria dos casos não participam da gestão das unidades produtivas e consequentemente não
participam de organizações sociais, possuem projetos de migração permanente e/ou
temporária, e outros/as de permanência no campo os quais analisaremos posteriormente de
maneira mais detalhada. Nosso estudo parte dessa descrição para, a seguir, discutir ―o que fala
e com que efeito‖ especificamente no que se refere a suas representações sociais sobre o
sistema de organização modular e as implicações em seus projetos de vida.
4.2 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS JOVENS SOBRE O SOME
Nosso estudo se debruça agora sobre a análise temática dos dados coletados pela
pesquisa por meio das técnicas apresentadas anteriormente, quais sejam: grupo triangular e
41%
57%
2%
Projeto de Vida
Permanecer no Campo Mudar pra a cidade Não respondeu
127
desenho. Cabe destacar a afirmação de Martha de Alba (2011) em seu estudo sobre a riqueza
do método de análise das representações socioespaciais em mapas cognitivos de que ―os
desenhos contribuíram com informações não verbais sobre as representações que não
poderíamos ter indagado por meio de métodos exclusivamente verbais‖ (ALBA, 2011, p.
143).
A análise das informações foi realizada por meio do agrupamento de informações dos
entrevistados, na perspectiva da análise temática conforme Braun e Clarke (2006). Desse
modo, os temas que emergiram a partir do agrupamento pelas unidades de sentido foram: A)
Educação base de tudo; B) Preparação para o futuro; C) Superação de obstáculos/conquista;
D) Escola e Território. É importante mencionar que essas quatro temáticas, em nosso
entendimento, centralizam os principais sentidos que respondem a compreensão das
representações sociais dos/as jovens sobre o SOME.
A organização das informações para análise partiu inicialmente dos desenhos e das
respectivas falas de apresentação dos mesmos, as quais permitiram o agrupamento das
unidades de sentidos que geraram os temas e subtemas ora apresentados. Posteriormente, o
conteúdo dos grupos triangulares foi agregado para a discussão dentro dos temas e subtemas
já definidos. O quadro a seguir apresenta a divisão dos desenhos por tema:
128
Quadro 04: Distribuição dos desenhos por tema.
Fonte: Corpus da pesquisa.
A organização dos temas e subtemas elaborados pela análise pode ser observada no
quadro a seguir que apresenta uma síntese dos referidos temas e subtemas que compõe as RS,
seguidas pelas implicações nos projetos de vida:
Tema 1
Educação base de
tudo
Tema 2
Preparação para o
futuro
Tema 3
Superação de
obstáculos/conquista
Tema 4
Escola e Território
Desenho 1: Jovem
Castanha – A
educação é a base de
tudo, melhor ainda
quando é ao ar livre.
Desenho 4:
Jovem Mandioca – A
escola do ensino
modular lugar que
leva você ao seu
sonho
Desenho 8:
Jovem Bacaba – O
momento no Módulo
Desenho 12: Jovem
Uxi – O caminho da
Escola
Desenho 2: Jovem
Cupuaçu – Buscando
no futuro
Desenho 5:
Jovem Piquiá – Em
busca de um sonho
Desenhos 9, 10, 11:
Jovem Pitomba – Na
hora da explicação/De
estudar, e aprender junto
com minhas colegas/ Na
hora que eu chego em
casa.
Desenho 13:
Jovem Açaí – Projeto
de vida para minha
comunidade: aulas
regulares!
Desenho 3 :
Jovem Sapucaia – Sem
minha escola não sei o
que seria de mim
Desenho 6: Jovem
Buriti – Meu sonho
de vida combater os
fora da lei e ajudar
minha sociedade
Desenho 14:
Jovem Pupunha – O
destino da minha vida
Desenho 7: Jovem
Tucumã – Minha
formatura do Ensino
Médio/Em breve eu
formado como
Professor
129
Quadro 05: Temas e subtemas que compõe as RS.
4.2.1 Educação base de tudo
O primeiro tema organizado a partir do agrupamento das unidades de sentido diz
respeito a atribuição dada pelos jovens à educação, ou seja, na visão dos/os participantes do
estudo ―Educação é base de tudo‖. Isso pode ser observado nos desenhos e falas dos/as
Jovens Castanha, Cupuaçu e Sapucaia.
Nessa mesma perspectiva no estudo de Souza (2007) sobre a experiência de ingresso
de jovens no Ensino Médio o autor observou que a escola aparece como uma instituição
importante vinculada a valores positivos, ao conhecimento, o amadurecimento e ao sucesso
(2007, p. 212). Além disso, o autor destaca que, em relação ao plano pessoal, ―a escola está
ancorada em crenças e esperanças: ela entra como parte de um projeto de transformação
individual em direção a uma vida mais confortável e de maior status pessoal‖ (SOUZA, 2007,
p. 221).
No estudo realizado por Franco e Novaes (2001) as representações sociais dos jovens
sobre a escola também se assemelham no sentido de vislumbrarem na escola a crença de que
ela implicará melhores oportunidades de futuro, seja no mercado de trabalho ou na
possibilidade de continuidade dos estudos. A ideia de ―ser alguém na vida‖ aparece como
pano de fundo (2001, p. 178).
Temas/Objetivações Subtemas/Ancoragens
Educação base de tudo
Centralidade da educação
Educação redentora
Escola como preparação para o futuro Foco na Universidade
Foco na profissão/emprego
Casa própria
Superação de Obstáculos/conquista Tempo
Lacunas
Infraestrutura
Deserção de professores/aceleração
Escola e território Direito x privilégio
Relação professor x comunidade
Módulo como única opção
Implicações projeto de vida
Formar
Emprego
Casa Própria
130
As autoras observam que estudantes trabalhadores que conseguem superar os
obstáculos para permanecer na escola e chegar ao Ensino Médio ―[...] depositam na escola e
na educação a única esperança de conseguir um status social mais reconhecido e empregos
mais qualificados‖ (FRANCO; NOVAES, 2001, p. 178-179).
Concordamos com Franco e Novaes (2001) quando questionam a visão da educação
como base de tudo, capaz de possibilitar a desejada melhoria na qualidade de vida que
perpassa as representações sociais dos/as jovens em nosso e em outros estudos. A questão
posta está nas possibilidades e limites das instituições escolares de transformar vidas de
maneira linear e imediata, ou seja, existem outros inúmeros obstáculos contextuais e
conjunturais impostos pela realidade concreta do sistema capitalista em que estamos inseridos
e que mantém e ampliam as desigualdades sociais e o abismo que separa ricos e pobres.
Vejamos a seguir o desenho elaborado pela jovem Castanha e sua apresentação do
mesmo, com o título ―A educação é a base de tudo, melhor ainda quando é ao ar livre‖:
131
Desenho 01: A educação é a base de tudo, melhor ainda quando é ao ar livre.
Fonte: Corpus da pesquisa.
Jovem Castanha
Título: A educação é a base de tudo, melhor ainda quando é ao ar livre.
Tenho dezesseis anos, curso o terceiro ano do Ensino Médio e a representação que
eu fiz no meu desenho, bom eu representei, a escola que é o centro onde eu estudo,
onde eu me identifico, ao ar livre, desenhei umas nuvens e o sol, o sol representa e o
ar livre representa liberdade pra mim, desenhei uma árvore que significa muito pra
mim, uma borboleta, um passarinho, umas notas musicais, a música faz parte da
minha vida, é o que me define como ser humano. Bom, a educação é a base de tudo,
melhor ainda quando a gente sente isso mesmo, melhor ainda quando é ao ar livre,
que a gente se sente em liberdade. Quando a gente esquece todos os problemas lá
fora e enfia a cara no livro, só estudo e aquele vento bate no rosto, a gente sente
aquela sensação de liberdade que tá vivendo uma história e tá se sentindo liberta
das coisas lá fora. É isso a representação do meu desenho.
A Jovem Castanha ao apresentar seu desenho coloca a escola como centro, o que
demonstra a importância atribuída pelos/as Jovens da RESEX-CA ao espaço de aquisição do
conhecimento – lugar de ―enfiar a cara nos livros‖. A perspectiva da centralidade da educação
explicitada nas imagens e sentidos da Jovem nos remete ao que Carlos Rodrigues Brandão
(2007) afirma sobre a missão da educação no imaginário de sujeitos e grupos sociais como
crença de que ela possa ―transformar sujeitos e mundos em alguma coisa melhor, de acordo
com as imagens que se tem de uns e de outros‖ (2007, p. 12).
132
No texto base ―Por uma educação básica do campo‖, Arroyo e Fernandes (1999) já
destacavam a escolarização como extremamente importante mesmo considerando que ela não
é toda a educação, e pela sua importância foi definido que deveria ser enfatizada na
conferência. Contudo, a proposição de escola sempre esteve articulada a um projeto educativo
contextualizado com foco na intervenção social na realidade onde se insere, ou seja, o campo.
Esse debate fomentou a construção da identidade da educação e, por conseguinte, da
Escola do Campo. Ao refletir sobre a Escola do Campo, Roseli Caldart afirma que, ―tem que
ser um lugar onde especialmente [...] os jovens possam sentir orgulho desta origem e deste
destino; não porque enganados sobre os problemas que existem no campo, mas porque
dispostos e preparados para enfrentá-los, coletivamente‖ (2002, p. 24).
Nesse sentido, a fala da Jovem Castanha segue afirmando que a escola é o lugar onde
ela se identifica e destaca suas características ―ao ar livre, os pássaros, árvores e borboletas‖
como cenário do lugar de onde ela fala, leia-se a escola ―no campo‖, e define: ―a educação é
a base de tudo‖ e como o título do seu desenho já afirma, melhor ainda quando é ao ar livre.
As características destacadas pela Jovem representam o desejo de ter uma escola com as
características de seu contexto de vida. Podemos dizer que o adjetivo ao ar livre simboliza
estudar livre para ser livre como se fosse a liberdade do Ar. Para a Jovem, o estudo e o vento
batendo no rosto, possibilitam uma sensação de liberdade e de estar vivendo uma história. É
importante destacar que perceber-se parte da história é um passo importante no entendimento
de que se pode transformá-la, na perspectiva de melhorar a qualidade de vida das
comunidades, especialmente da RESEX-CA e construir seus projetos de vida seja no campo
ou na cidade.
A seguir, podemos observar o desenho apresentado pelo Jovem Cupuaçu, intitulado
―buscando no futuro‖, o segundo do agrupamento que gerou a temática Educação base de
tudo:
133
Desenho 02: Buscando no Futuro.
Fonte: Corpus da pesquisa.
Jovem Cupuaçu
Título: Buscando no futuro.
O meu desenho foi simples. Onde eu fiz só uma escola e uma árvore e um rio e aqui
a escola representa tudo na nossa vida porque aqui na escola está os nossos
objetivos e nossos sonhos pra nós chegarmos no futuro nós temos que caminhar
todos os dias pra escola e pra mim a escola é a importância das nossa vida, sem ela
nós não podemos nada, nem chegar no futuro e nem chegar a lugar nenhum.
O Jovem Cupuaçu apresenta seu desenho destacando-o como simples, mas um
desenho entrelaçado em seu contexto de vida. Reiteramos que o contexto de vida desses
jovens é muito mais que a sua moradia, pois se encontra encharcado de suas vivências e
aprendizagens. É um contexto tecido pelo lugar, posição e condição que ocupa e respira. As
letras que conferem ao seu discurso os sentidos do que sente parecem simples diante do olhar
urbano, porém, seu desenho ultrapassa a palavra que utiliza para dizer que desenhou apenas
diante da imensidão da riqueza que a interação com o seu contexto, com os outros, com o
viver lhe traz. O tudo a que se refere é como se fosse o nirvana, uma inesgotável fonte de
prazer ao vislumbrar a paisagem de seu território que se confunde com ele e com o que deseja
para a sua vida.
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Nesse sentido, ele expressa o seu contexto com poucas palavras e argumenta que
desenhou apenas uma árvore, um rio e destaca a escola que segundo ele ―representa tudo na
nossa vida‖. Essa afirmação possibilitou articular seu desenho ao agrupamento de unidades de
sentido que gerou a temática ―Educação base de tudo‖. Essa fala evoca a importância
atribuída a educação, ao conhecimento, como também, à Escola e a Universidade como
espaços de transformação de vidas e por conseguinte de realidades.
Ao explicar os porquês da escola representar tudo na vida, o jovem destaca os
objetivos e sonhos, o caminho para chegar ao futuro. Nas suas palavras há uma ênfase ao
percurso diário, realizado cotidianamente na construção desse futuro almejado que não será
possível sem a escola, e reafirma: ―para mim a escola é a importância das nossas vidas, sem
ela não podemos chegar a lugar algum‖.
Para esses Jovens que apresentam em suas imagens e sentidos a visão da educação
como base de tudo, que a enxergam como divisor de águas em suas vidas, entre ser ou não ser
alguém na vida, independente das dificuldades e resistências necessárias do percurso diário e
escola torna-se fundamental. Desse modo, a busca no futuro - presente desde o título do
desenho do Jovem Cupuaçu - expõe a crença na educação como via de acesso para uma vida
melhor.
Em certa medida podemos vislumbrar nessas representações semelhanças com aquelas
destacadas por Miguel Arroyo entre as populações de retirantes em busca de escola que vivem
em periferias urbanas. Eles migram em busca da escola para seus filhos, pois não à tiveram no
campo. Essa discussão está presente em sua obra ―Outros Sujeitos, Outras Pedagogias‖ e
reflete sobre a busca de algum lugar (e escola) de dignidade para os (as) seus filhos (as) que
―confere à escola a dimensão social de extrema centralidade nas representações e lutas dos
setores populares‖ (2014a, p. 248).
O autor atenta para a ausência de reflexão e aproximação da função da escola pela qual
lutam os movimentos sociais. Segundo ele, lutam por ―saberes e direitos a outra escola, com
outras funções sociais mais radicais. Tão radicais como suas experiências sociais e suas lutas
por territórios de dignidade e justiça‖ (ARROYO, 2014a, p. 248).
Essa situação fica evidenciada pela falta de participação dos/as jovens envolvidos em
nosso estudo em espaços de organização e luta, sejam movimentos sociais, associações,
sindicatos, etc. Vimos anteriormente que 59% dos participantes de nosso estudo não
participam de nenhuma organização social e, portanto, não estão incluídos/as nas reflexões
135
propostas por Arroyo de modo que não há compreensão da importância da luta pelos saberes e
direitos, por territórios de dignidade e justiça.
No estudo de Franco (2002) a maioria dos/as jovens (64,7%) ao apresentarem os
motivos pelos quais frequentam a escola a maioria dos/as jovens afirmam que é ―para ser
alguém na vida‖, ―para ter um futuro melhor‖, em geral vinculado ao mercado de trabalho. O
autor destaca, nesse mesmo estudo que os/as sujeitos manifestam expectativas bastante altas
em relação a escola, chegando a emitir declarações como: ―somente através dela é que
conseguiremos melhorar na vida‖.
Essa visão se assemelha a dos/as jovens de nosso estudo, na mesma direção da
reflexão proposta pelo autor ao inferir que geralmente são afirmações de jovens mais pobres e
sem acesso a opções de geração de trabalho e renda. É evidente que a escola não resolve todos
os problemas mas é a única opção de ascensão vislumbrada pelos/as jovens. Nessa
perspectiva, vejamos na sequência, o desenho elaborado pela Jovem Sapucaia e sua
apresentação intitulados ―Sem minha escola não sei o que seria de mim‖:
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Desenho 03: Sem minha escola não sei o que seria de mim...
Fonte: Corpus da pesquisa.
Jovem Sapucaia
Título: Sem minha escola não sei o que seria de mim.
Eu desenhei a minha escola, a minha casa porque eu queria que a minha casa fosse
perto da escola, seria mais fácil. O rio, as árvores e os peixes, porque como as vezes
tem lugar que eu já cheguei muito poluído, rio muito poluído... Aí, sem minha
escola não sei o que seria de mim? Eu só vou de casa pra escola e da escola pra
casa, as vezes eu vou pra casa das minhas amigas mas é a coisa mais difícil então.
Depois que terminar... fazer faculdade e pronto!
Sob o título ―Sem minha escola não sei o que seria de mim‖, o terceiro e último
desenho agrupado em torno da temática ―educação base de tudo‖ apresenta a escola onde a
Jovem Sapucaia estuda e a casa onde ela reside. O título do seu desenho parece um paradoxo
pois diante de tanta grandeza em seu contexto de vida a escola parece ser a única alternativa
para mudar o rumo de sua história. Por que será? Sabemos de antemão que a Amazônia tão
reverenciada nos discursos de nossos governantes permanece somente na prosa e no verso.
Significa dizer que a vida desses jovens, seus familiares e demais habitantes poderia ser
cantada e dançada com a mesma alegria desses discursos eleitoreiros mas seria uma grande
ilusão, ou, utilizando o dito bem sugestivo obra do encantado para não sair do lugar.
137
As escolas do campo sofrem ameaças de fechamento o que implica em dizer que aos
olhos de nossos governantes não são necessárias. Isto ecoa como um movimento que vai além
do fechamento destas escolas do Campo como também a desterritorialização desses sujeitos
que ali construíram suas raízes juntamente com as raízes de tudo o que existe lá.
Em sua fala, fica evidente entre outros, o desafio de ir e vir quando ela manifesta o
desejo de que a escola fosse mais próxima da sua casa: ―seria mais fácil‖. A distância
percorrida pelos Jovens para acessar o Ensino Médio será aprofundada na temática ―Escola
como superação de obstáculos/conquista‖, mais uma evidência de que as temáticas elencadas
estão entrelaçadas, ou seja, existem intersecções presentes em todas elas e a organização desse
ou daquele agrupamento acabam por manifestar a linha de pensamento do/a pesquisador/a.
Porém, nesse caso, cabe reafirmar que quando falamos de Educação do Campo, das Águas e
das Florestas, as distâncias são elementos significativos na operacionalização concreta do
acesso à educação.
Outros elementos que se constituem característicos do campo, das águas e da floresta
neste e em outros desenhos dos/as Jovens da RESEX-CA e das escolas presentes nesse
território são ―o rio, as árvores e os peixes‖ associados a isso a representação de que o
território onde vivem, trabalham, estudam e produzem é um ambiente preservado. Em suas
falas é possível observar essas afirmações de maneira recorrente, como nesse caso da Jovem
Sapucaia: ―as vezes tem lugar que eu já cheguei muito poluído, rio muito poluído‖.
A vinculação do desenho da Jovem Sapucaia aos demais desenhos e falas articulados
na temática ―educação base de tudo‖ é visível de maneira mais específica no título escolhido
pela jovem e na seguinte fala: ―sem minha escola não sei o que seria de mim?‖ O
questionamento apresentado pela Jovem corrobora com a ideia de que o único caminho para
uma vida melhor é o acesso à educação escolar. Essa lógica coloca na escola a chance de
salvação, de sucesso, como ainda se pode ouvir em algumas comunidades a possibilidade de
―ser alguém na vida‖ está atrelada aos bancos escolares.
A jovem ainda acrescenta o fato de que sua possibilidade de sair de casa é para ir à
escola, ou seja, ―eu só vou de casa pra escola e da escola pra casa as vezes eu vou pra casa das
minhas amigas mas é a coisa mais difícil‖. A questão da escola como espaço de socialização
também será discutida dentro dos subtemas em ―Educação como superação de
obstáculos/conquista‖, pela importância dada pelos/as jovens como na fala da Jovem
Sapucaia.
138
Nesse sentido, vale ressaltar a discussão proposta em seção anterior sobre isso, no
sentido de que o convívio diário e os processos de aprendizagens, especialmente no âmbito do
Ensino Médio, momento em que os/as jovens projetam suas expectativas e desejos de futuro,
possibilitam o fortalecimento de vínculos relacionais que se constroem, tanto objetiva como
subjetivamente, individual e coletivamente, conforme afirma Nascimento: ―[...] o individual e
o coletivo estão presentes tanto na subjetividade quanto na objetividade do sujeito. Não existe
uma separação, mas uma relação entre estas partes‖ (NASCIMENTO, 2013, p. 88).
Esse espaço de convivência diária permite intercambiar visões de mundo, dificuldades
e aspirações, situações concretas do cotidiano, bem como, aspectos simbólicos, culturais que
são importantes na constituição dos sujeitos, conforme salienta Nascimento: ―O Projeto de
Vida emerge nessa trama complexa de relações, de construção de saberes sobre si e sobre o
mundo na medida em que significados são partilhados no cotidiano‖ (NASCIMENTO, 2013,
p. 88).
Nos grupos triangulares a temática educação base de tudo aparece em vários diálogos,
especialmente naqueles que reforçam a importância da educação enquanto possibilidade
concreta de mudar de vida, de possibilitar melhoria nas condições de vida para si e para seus
familiares, vejamos algumas falas dos grupos a seguir:
Hoje em dia eu olho uma coisa que hoje em dia ninguém consegue seguir em
frente se não tiver estudo. Então, isso me motiva para que no futuro eu possa ter
meu trabalho... tá trabalhando, porque todos nós, um dia, vamos ter uma família
pensando - tem que pensar - no nosso futuro. (Jovem Castanha)
[...] que minhas irmãs não terminaram de estudar e agora elas passam mais
dificuldade na vida delas, tipo, a situação financeira deles, tipo, a gente que ajuda
quando tem - papai e mamãe - pra eles ter uma vida melhor, tipo, só os daqui
porque os outros estão em outras cidades. Aí mamãe fala pra gente estudar, pra
gente não depender disso, pra gente conseguir as nossas próprias coisas e não
depender de homem e de ninguém do que a gente deseja. (Jovem Sapucaia)
O meu objetivo é estudar e não acontecer isso comigo e um dia eu poder ajudar os
meus irmãos que precisam da minha ajuda (Jovem Mandioca).
As três falas se complementam no sentido de apresentar situações em que as condições
de vida são precarizadas pela ausência da educação e/ou pela exclusão dos/as sujeitos do
espaço escolar. Outro elemento comum expresso nesse conjunto de falas diz respeito a
importância atribuída a família pelos Jovens, seja sua futura família – que será constituída –
seja a família que se tem atualmente – pais, irmãos, etc.
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Há, também, uma crença de que com educação é possível ―ter um trabalho‖,
independência financeira, ―não depender de homem e de ninguém‖, nesse caso específico
acrescenta-se a temática de gênero. Esses elementos que emergem das falas dos/as jovens
provêm da visão destes da sua realidade atual, das relações familiares estabelecidas no
contexto em que estão inseridos e da dificuldade enfrentada por eles para superar as
adversidades e buscarem alternativas de vida digna para si e para suas famílias.
Os condicionantes de desigualdade narrados pelos/as jovens a partir da realidade estão
associados, na visão deles, à falta de estudo, de modo que eles creem na educação como via
de acesso a outra realidade, porém, não aparece de maneira evidente nas falas como se daria o
processo de transformação dessa realidade. Essa ausência nos provoca a refletir se a educação
base de tudo seria a mesma proposta por Freire como transformadora, considerando que ela
sozinha não muda a realidade, mas as pessoas e estas por sua vez transformam a realidade
(FREIRE, 1987, p. 84).
A seguir, nosso estudo se volta a temática ―Educação como preparação para o futuro‖
a qual emergiu do agrupamento de unidades de sentido em 4 desenhos.
4.2.2 Preparação para o futuro
A segunda temática proveniente do agrupamento das unidades de sentido configurou-
se na visão da escola como processo de preparação para o futuro. A referida temática emerge
como desdobramento das falas a respeito da importância da escola que aparecem nos
diferentes momentos da coleta de dados, tanto no contexto das falas sobre os desenhos como
nos grupos triangulares.
Especificamente no que se refere aos desenhos, a temática se apresenta em 4
elaborações, quais sejam, do Jovem Piquiá, da Jovem Mandioca, do Jovem Tucumã e do
Jovem Buriti. Nas falas dos sujeitos o futuro é expressado como sonho e a escola aparece
como caminho ou estratégia para realizá-lo. Os sonhos se referem a profissão que pretendem
seguir no futuro, consequentemente ao trabalho/emprego desejado e a materialização de
desejos como a casa própria.
Para alcançar essas realizações a escola aparece como lugar de preparação o que em
alguma medida reflete o proposto na legislação educacional e amplamente repetido nas
140
escolas, nos meios de comunicação e nos diferentes espaços em que a educação é pautada. A
Lei de Diretrizes e Bases explicita essa questão em seu artigo segundo da seguinte forma:
A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e
nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento
do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para
o trabalho (BRASIL, 1996, grifo nosso).
Conforme explicitado, na Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional (Brasil,
1996), o Ensino Médio, mais que preparar para o exame nacional do Ensino Médio teria como
função preparar para a vida adulta, formando cidadãos capazes de enfrentar os desafios que
surgirão ao longo da vida. Para Aguiar e Conceição (2009) ―nem o ensino fundamental, nem o
médio, nem o superior parecem estar cumprindo o papel básico de formar o cidadão para que
ele construa sua identidade profissional e contribua para a sociedade‖ (2009, p. 113).
Ainda, se partirmos da perspectiva de que vivemos na contemporaneidade e conforme
refletem Coutinho e Lisbôa (2011) em um mundo onde a comunicação extrapola as barreiras
do tempo e do espaço, uma realidade que possibilita múltiplas possibilidades de aprender,
―em que o espaço físico da escola, tão proeminente em outras décadas, neste novo paradigma,
deixa de ser o local exclusivo para a construção do conhecimento e preparação do cidadão
para a vida activa‖ (2011, p. 05), fica ainda mais evidente a crise do Ensino Médio nos dias
atuais.
Nesse bojo, Dalila Oliveira (2010) reflete sobre a crise de papel da escola entre a
preparação para estudos posteriores e para o trabalho, a autora questiona a perspectiva dual
pela qual o Ensino Médio vem se construindo historicamente, ou seja, de uma escola para
ricos x escola para pobres. Dalila Oliveira afirma que:
O Ensino Médio, historicamente, enfrenta problemas que se relacionam em
certa medida a uma crise de identidade. Tal crise advém da dificuldade de
caracterização dessa etapa da educação básica, pois, ao mesmo tempo que
enseja a noção de terminalidade (conclusão de uma formação completa), ou
seja, de poder atribuir profissionalização aos seus concluintes, vê-se ante a
sua recorrente função de preparação para estudos posteriores, como etapa
intermediária entre o ensino fundamental e a universidade, com caráter mais
geral e propedêutico. Um dos principais fatores dessa crise assenta-se na
dificuldade que as escolas médias, sobretudo as públicas de redes estaduais e
municipais, encontram para oferecer de maneira eficaz o ensino técnico-
profissionalizante. Tais dificuldades têm corroborado para que se coloque
141
em discussão o papel formador do Ensino Médio regular como capacitador
para o trabalho (OLIVEIRA, 2010, p. 271).
Na mesma direção, Libâneo (2012) vislumbra tendências polarizadas que indicam um
dualismo da escola brasileira de modo que de um lado estaria a escola reservada aos filhos
dos ricos com foco no conhecimento e nas tecnologias, enquanto do outro lado, para os pobres
a escola teria a função de acolhimento e integração sociais (LIBÂNEO, 2012, p. 16).
Nesse sentido, essa representação da educação reafirma a ideia que perdura ao longo
do tempo de que uma das finalidades da educação é a de preparar os indivíduos para
exercerem diversos papéis na sociedade, porém, a depender de qual escola se está inserido
será o papel para o qual será preparado.
Vejamos a seguir o primeiro desenho incluído nessa temática elaborado pela jovem
Mandioca sob o título ―A escola do ensino modular lugar que leva você ao seu sonho‖, bem
como, sua apresentação.
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Desenho 04: A escola do ensino modular lugar que leva você ao seu sonho.
Fonte: Corpus da pesquisa.
Jovem Mandioca
Título: A escola do ensino modular lugar que leva você ao seu sonho.
Eu fiz aqui eu na minha escola, no caso onde eu estudo e eu fiz aqui mais pra frente
uma faculdade lugar que eu pretendo estar depois quando eu terminar aqui e aqui
a minha casa própria.
A jovem mandioca apresenta seu desenho com poucas palavras e define sua
representação em três momentos: a escola – momento atual que tem a função de prepara-la
para a faculdade; a faculdade como segundo momento – traduzido como o lugar que o ensino
modular leva você, cabe mencionar que no desenho a jovem não visualiza como possibilidade
de acesso ao ensino superior a universidade pública, mas uma faculdade privada situada na
cidade de Macapá, a FAMA, por fim, seu desenho aponta para o seu ―destino‖ que em sua
representação seria a uma casa própria.
A jovem representa o seu destino em três momentos específicos, ou seja, a escola, o
ensino superior e a casa própria. Essa trajetória vislumbrada por ela nos permite articular o
seu desenho à temática ―Preparação para o futuro‖, visto que a mesma enxerga a
escola/educação como período de preparação para a próxima fase. Essa representação fica
143
evidente desde o título que a jovem dá para o seu desenho: ―A escola do ensino modular que
leva você ao seu sonho‖. Essa percepção sobre a escola é observada também no estudo de
Souza, segundo o autor:
A escola é hegemonicamente representada pelos jovens como caminho para um
futuro melhor, para uma boa inserção profissional. Os alunos produzem práticas
condizentes com esse discurso, assumindo uma relação eminentemente instrumental
frente ao saber escolar: esse saber é sobretudo importante para passar de ano, para
obter um diploma, para ter um bom futuro (SOUZA, 2007, p. 227-228).
Essa representação de escola presente em nosso estudo e corroborada pelo estudo de
Souza (2007) está presente, também, nos resultados encontrados por Oliveira et al (2001), que
revelam, segundo os autores, a centralidade da educação na dimensão de futuro vislumbrada
pelos/as jovens. Esta perspectiva está associada à educação escolar como pressuposto para a
mobilidade social desses/as jovens, seja ela por um melhor emprego ou profissão, ou por
questões indefinidas que possibilitariam ―ser alguém na vida‖, o que possivelmente estaria
relacionado ao sucesso financeiro (OLIVEIRA et al, 2001, p. 249).
144
Desenho 05: Em busca do sonho.
Fonte: Corpus da pesquisa.
Jovem Piquiá
Título: Em busca do sonho.
O título do meu desenho aqui que eu fiz é “Em busca do sonho”. Bom, eu fiz aqui
representando a escola Água Branca do Cajari onde eu estudo, faço o segundo ano
do Ensino Médio, e aqui é meu projeto de vida do módulo: Eu aqui na frente da
escola, sonhando, no meu sonho que desejo me formar, que todos os dias eu venho
pra minha escola, e aqui o outro lado do desenho eu já formado. Formado e já
fazendo o serviço já em computador, formado e com meu emprego garantido, que
até diz aqui técnico em computadores. É esse meu desenho e é esse meu sonho. Se
Deus quiser vai ser realizado. A importância da escola faz parte da minha
caminhada, porque nessa escola diretor ou professor que vem eles me apoiam
muito na minha caminhada em busca desse sonho, eles me dão conselhos,
indicações, onde eu posso fazer o curso e isso é muito importante pra mim, isso
me motiva muito mais em correr em busca desse sonho e essa escola aqui é
fundamental pra mim na minha jornada.
O Jovem Piquiá também dividiu o seu desenho momentos distintos, porém, no caso
dele aparecem apenas dois: o atual e o projeto futuro. Em sua fala, explica a representação do
momento atual, ou seja, sua vivência no Ensino Médio da escola Água Branca do Cajari e ele
sonhando com a concretização de seu projeto futuro que consiste em se formar e trabalhar
com computadores. O Jovem destaca o apoio de professores e direção em sua caminhada
145
estudantil, o que ele enfatiza como ―importância da escola‖ e motivação para persistir em sua
jornada.
O lado direito do seu desenho apresenta o seu projeto de vida, o momento posterior ao
atual que passa pelo acesso ao ensino superior, especificamente em um curso ligado à
informática que em sua reflexão o incluirá em um emprego garantido, de modo que sua visão
do Ensino Médio se articula à temática ―Preparação para o Futuro‖.
Essa perspectiva dialoga com a reflexão proposta por Oliveira et al (2001), onde os
autores destacam que na visão dos/as jovens o futuro apresenta-se como ideal a ser
conquistado, conforme sua habilidade de garantir sua própria escolarização, ou seja, o grau de
escolarização é entendido por estes/as sujeitos como caminho para o acesso a empregos
formais. Nesse sentido, os jovens compreendem os obstáculos para conquistar um espaço no
mercado de trabalho e vislumbram na educação o que distingue as possibilidades de acessar
ou não uma melhor colocação (OLIVEIRA et al, 2001, p. 248).
Nesse sentido, cabe mencionar que nos diálogos do grupo triangular o Jovem Piquiá
foi abordado sobre a possível contradição de manifestar o desejo de trabalhar com informática
e viver no campo, ambos como projeto de vida, porém, convicto de seu projeto ele afirmou
que com a chegada da internet via satélite na comunidade cada vez mais famílias estão
adquirindo seus computadores e tendo acesso à internet, e que, em aproximadamente 5 a 6
anos, quando ele concluir sua graduação o cenário da inclusão digital será bem diferente do
atual em sua comunidade.
A reflexão proposta pelo jovem está fundamentada no fato de que ao iniciar a pesquisa
na comunidade de Água Branca haviam dois pontos de acesso coletivo à internet: a Unidade
Básica de Saúde e na casa de uma família que eram compartilhados, os mesmos ficavam
disponíveis quando o motor de energia da comunidade era ligado por volta de 16 horas até a
meia noite (conforme narrado no início desta tese). Em aproximadamente 2 anos de contato
com esses jovens, a realidade se alterou significativamente. Atualmente grupos de famílias
que possuem residências próximas umas às outras tem se organizado para cotizar a instalação
de placas de energia solar e internet via satélite para acesso 24 horas por dia.
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Desenho 06: Meu sonho de vida poder combater os fora da leie ajudar minha sociedade.
Fonte: Corpus da pesquisa.
Jovem Buriti
Título: Meu sonho de vida poder combater com os fora da lei e ajudar minha sociedade.
Me chamo [...] eu tenho 18 anos, estou concluindo o terceiro ano, então eu
representei um carro de polícia na rua, pra poder assim ajudar a sociedade e poder
dar orgulho pro meu pai com a minha mãe e dar exemplo assim do que o estudo
trouxe pra mim e eu quero concluir pra mim poder conseguir alcançar o meu
sonho. A escola me trouxe a importância de que eu possa ser o que eu quero ser e
eu posso conseguir!
O desenho e as falas do Jovem Buriti foram articuladas à temática ―preparação para o
futuro‖, pois apresenta a escola como etapa preparatória pra a realização do seu projeto de
vida. Segundo ele, seu projeto é ser policial pra ajudar a sociedade combatendo ―os fora da
lei‖.
Outra característica importante que aparece no desenho do jovem Buriti diz respeito ao
desejo que ―dar orgulho para seus pais‖ e ser exemplo para os demais jovens, o que emerge,
também, nas discussões dos grupos triangulares em outros contextos, mas sempre associado à
visão que as famílias terão dos jovens a partir de seu sucesso – atribuído à materialização de
seus projetos de vida.
147
No estudo de Farias (2016) sobre os significados da tensão rural-urbano nos projetos
de vida de jovens rurais, há uma importante constatação sobre o impacto causado pela família
e pela escola na vida dos/as jovens no presente, e que, consequentemente influencia em seus
projetos futuros. Os familiares e professores são para alguns os mais incentivadores e para
outros os mais opressores principalmente pelo significado que ocupam em suas vidas tanto no
que se refere tanto ao apoio quanto a pressão (FARIAS, 2016, p. 172).
Por fim, na visão do Jovem Buriti a importância da escola está no fato de ―ser o que
quer ser‖, ou seja, a possibilidade de concretizar o projeto de vida passa pela escola como
caminho e/ou preparação para essa nova etapa. Esse fato ocorre no entendimento de Souza
(2007) porque ―a escola se estabeleceu, também em nossa cultura, como fenômeno de massas
e como via natural e obrigatória de preparação para a vida e para o trabalho‖ (2007, p. 221).
Nesse interim, Lourdes Helena da Silva (2012) em seu estudo sobre a problemática
das relações construídas entre o meio escolar e o meio familiar em Centros de Familiares de
Formação por Alternância observa que nas representações sociais de monitores a concepção
de escola que se apresenta é a de espaço de preparação para a vida, de maneira semelhante as
afirmações dos sujeitos de nosso estudo. Para a autora: ―Em um sentido mais geral, a escola
era concebida como espaço de uma preparação para a vida cuja dinâmica de formação tem
como base a realidade vivida pelos alunos em seu meio familiar/produtivo‖ (2012, p. 78-79),
o que difere do nosso estudo é que na alternância a formação tem como base a realidade
vivenciada pelos alunos, enquanto no sistema modular de ensino não existe essa vinculação.
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Desenho 07: Minha formatura de conclusão do Ensino Médio/Em breve eu formado em um professor.
Fonte: Corpus da pesquisa
Jovem Tucumã
Título: Minha formatura do Ensino Médio/Em breve eu formado como professor.
Eu desenhei a minha formatura que eu ainda pretendo fazer ela ainda esse ano, a
formatura de conclusão do Ensino Médio e uma sala com aluno em breve eu um
professor dando aula. Isso representa o que eu quero pra mim no futuro, é
basicamente isso. É ter o meu emprego pra mim ter o meu sustento e dar orgulho
para os meus pais.
A visão da escola como período preparatório é evidenciada na apresentação de seu
desenho pelo jovem Tucumã nas seguintes falas: ―eu desenhei minha formatura [...] de
conclusão do Ensino Médio‖, e, ―Isso representa o que eu quero para mim no futuro‖. Ou
seja, o Ensino Médio é uma etapa da sua ―preparação para o futuro‖, assim como as imagens e
sentidos dos/as demais jovens articuladas nesta temática.
Essa perspectiva é apontada por Nascimento que constatou em seu estudo sobre
educação e projeto de vida de adolescentes do Ensino Médio que estes Sujeitos associam a
escola aos seus projetos de vida, segundo a autora:
149
Esses adolescentes acreditam que a escola possibilita-lhes conhecer e saber, e que
este é o caminho para ingressar no nível superior de ensino, trabalhar e obter uma
vida melhor. Essa associação, além de funcionar como uma demanda para com a
escola indica, também, que a escola continua a ser o depositário da realização dos
seus projetos de vida (NASCIMENTO, 2013, p. 24).
Essas questões são evidenciadas na fala do Jovem Tucumã, quando vislumbra sua
formatura, bem como, quando seu projeto de vida é explicitado no desejo de ser professor, ter
um emprego que possibilite o seu sustento e dar orgulho aos pais. Duas questões explicitadas
pelo jovem nos desafiam a pensar sobre os projetos de vida dos jovens do campo:
- A primeira diz respeito ao desejo de permanecer no campo, mas com uma profissão
que não esteja vinculada a produção de alimentos e/ou extrativismo. Essa situação aparece
como pano de fundo em várias falas sobre os desenhos e nos grupos triangulares, porém, não
ficou claro nas manifestações se essas profissões seriam conciliadas com outras atividades
produtivas ou não, desse modo, traduz-se como uma questão que merece novos estudos e
aprofundamentos.
Estudos como o de Paulo (2011) indicam que os/as jovens rurais, vivem um dilema
que em grande medida é pautado pela visão da sociedade sobre o trabalho na agricultura. Ao
mesmo tempo que manifestam orgulho por serem filhos de agricultores e defenderem os
valores ligados ao campo (honestidade, coragem, etc) sentem vergonha de se assumir como
tal em consequência da visão estereotipada que define o rural como espaço do atraso (2011, p.
25).
Os resultados do estudo realizado por Canholi (2014) sobre os dilemas e desafios da
juventude rural apontam que estes vivem a dúvida constante entre o que a autora chama de
segurança da vida familiar e a saída em busca de alternativas que estão ligadas em geral a
formação educacional (acesso ao ensino superior) e a busca por melhores condições de
trabalho e renda (2014, p. 141).
Outro estudo que apresenta reflexão semelhante é o de Luciano (2013) sobre educação
e trabalho na vida de jovens migrantes do Alto Jequitinhona, cuja realidade imposta é a
negação do direito a Educação constatada entre os sujeitos da pesquisa, visto que nenhum
deles teve acesso ao Ensino Médio. O sonho dos/as jovens desse estudo, além de se qualificar
profissionalmente, consiste em aliar essa formação a profissões que possibilitem maior
autonomia e ao mesmo tempo residir na roça (2013, p. 126).
150
- A segunda trata do desejo de ser orgulho para os pais que também é recorrente em
várias falas e nos instiga a reflexão sobre os significados dessas afirmações e as implicações
delas nos projetos de vida desses jovens. Essa preocupação dos/as jovens com o futuro ficou
evidenciada em nosso estudo em diferentes situações e de maneira bastante concreta na
relação com a educação conforme podemos observar, também, em algumas falas dos grupos
triangulares:
Pra mim é importante, né... Porque a gente termina o Ensino Médio aqui e aí, vai
cursar uma faculdade que a gente deseja, pra mim é muito importante. (Jovem
Pitomba)
Aí, então assim, eu sempre estudei, eu nunca estudei no regular, eu sempre estudei
no módulo, mas é bom, é bom o módulo, a estrutura do módulo que dá um prazo
para estudar mais, estamos levando, né? Aprendendo para quem sabe um dia
chegar lá com a experiência (Jovem Uxi).
Nosso estudo evidenciou de maneira bastante clara a preocupação dos/as jovens com o
futuro e a importância atribuída por eles/as à escola no sentido de uma etapa preparatória, um
diferencial que possibilita galgar novas oportunidades. Associado a essa perspectiva,
aparecem questões de fundo como o tipo de escola/educação que estão inseridos, e, as
expectativas de projeto futuro que em geral estão associadas a empregabilidade mesmo entre
os/as sujeitos que desejam permanecer no campo.
Nas manifestações dos/as sujeitos do estudo ―ter um prazo para estudar‖ é um grande
desafio e se refere ao fato das disciplinas serem ofertadas em 50 dias no SOME. Da mesma
maneira, os/as Jovens do estudo de Souza (2007), Franco (2002) e Oliveira et al (2001)
também representaram a escola como caminho para o futuro, assim como manifestaram a
percepção das dificuldades ligadas à escola pública, alguns manifestam certa preocupação
quanto ao fato desta escola lhes possibilitar a formação necessária para a concretização de
seus projetos de vida pessoal e profissional (SOUZA, 2007). Desse modo, esse e outros
obstáculos para acesso e permanência no Ensino Médio dos/as Jovens do campo, das águas e
das florestas serão discutidos na próxima subseção.
4.2.3 Escola como superação de obstáculos/conquista
O terceiro tema que emergiu a partir do agrupamento das unidades de sentido é a
representação do módulo como superação de obstáculos/conquista. O referido tema articula as
151
elaborações de duas jovens em seus desenhos, além de uma frequência importante nas
afirmações dos grupos triangulares. Para esses/as jovens cada dia ao retornar para casa é uma
conquista, pois as dificuldades de acesso e permanência no Ensino Médio, especialmente no
que se refere ao sistema modular, são obstáculos que precisam ser superados.
Nesse sentido, apresentaremos a discussão acerca do tema partindo da análise das falas
sobre os desenhos das Jovens Bacaba e Pitomba. Cabe mencionar que os obstáculos
enfrentados pelos jovens do campo são objetos de estudo de vários autores, entre eles
destacamos Marinho (2016) quando observa que, em diferentes medidas, os jovens são
afetados por desafios sociais, culturais, produtivos e tecnológicos, os quais dificultam e até
podem inviabilizar a sua permanência no campo em algumas circunstâncias.
Esses obstáculos para acessar e permanecer na escola emergem como bandeira de luta
nas ações coletivas da Juventude do campo visto que essa é uma pauta que não é exclusiva de
uma região, mas impacta diferentes territórios do campo brasileiro, conforme nos mostra o
estudo de Galindo (2015, p. 107), a autora afirma que: ―As adversidades relacionadas ao
acesso e permanência na escola permeiam memórias e relatos, ponto de onde emerge uma
importante bandeira de luta que orienta a ação coletiva das Juventudes organizadas‖.
Apesar disso, esses sujeitos buscam de todas as maneiras enfrentar tais obstáculos,
pois há uma crença na escola como via de acesso para uma vida melhor, conforme o estudo de
Alves (2015, p. 91-92) que afirma: ―Apesar das dificuldades enfrentadas para acessar e
permanecer na escola, esses jovens acreditavam nos estudos e evidenciavam uma forte crença
na escola como caminho para uma vida melhor‖.
Destarte para aprofundarmos nossa discussão, apresentaremos a seguir as elaborações
da jovem Bacaba intitulada ―O momento do módulo‖, e da jovem Pitomba que elaborou os
desenhos intitulados ―Na hora da explicação‖, ―De estudar, e aprender junto com as minhas
colegas‖ e, ―Na hora que chego em casa‖.
152
Desenho 08: O momento no módulo.
Fonte: Corpus da pesquisa.
Jovem Bacaba
Título: O momento do módulo.
A Jovem Bacaba explica o que retrata em seu desenho:
Estou no segundo ano do Ensino Médio, fiz um desenho aqui retratando o que eu
penso assim do módulo que é tipo um monte de obstáculos que você tem que
enfrentar aqui, foi por isso que eu fiz aqui um monte de montanhas, desenhei uma
casa que provavelmente seria a escola e uma árvore que seria do futuro e um
solzinho ali pra... mas o que eu vejo assim o módulo com bastante obstáculos, mas
que a gente vai lá e supera.
Podemos observar na fala da Jovem Bacaba sua visão sobre o processo de
escolarização no qual está inserida. Na perspectiva da Jovem, o ―módulo‖ é entendido como
montanhas que precisam ser escaladas, obstáculos que necessitam de superação. Isto ocorre
em grande medida pelas dificuldades de acesso e permanência ao Ensino Médio vivenciadas
cotidianamente.
Em geral, para os jovens da RESEX-CA, os problemas de transporte escolar, na
infraestrutura e ausência de materiais didáticos, disponibilidade de professores nas diferentes
áreas do conhecimento, permanência dos professores na escola durante o período previsto
153
(cada um desses obstáculos será aprofundado posteriormente) são algumas das ―montanhas‖ a
serem enfrentadas.
As dificuldades enfrentadas pelos/as jovens não são realidade apenas no nosso estudo,
Franco (2002) afirma que em sua pesquisa os/as jovens quando se manifestaram sobre suas
expectativas em relação à escola afirmam que ―a escola está longe de se adequar às exigências
do mercado de trabalho‖, ―a escola não prepara para o futuro‖, ―a escola está defasada‖, ―os
professores faltam muito‖, ―os professores não explicam direito‖ (FRANCO, 2002, p. 201).
A superação desses obstáculos, em nossa percepção, passa pela compreensão dos
caminhos da educação básica de Ensino Médio para a Juventude do campo, das águas e das
florestas. No documento do 1º Seminário sobre Educação Básica de Nível Médio nas áreas de
Ensino Médio nas áreas de Reforma Agrária em 2006, foram discutidos elementos
articuladores e elaboradas proposições, as quais partem do entendimento de uma escola dos/as
jovens e para os/as Jovens, que os/as compreenda como sujeitos que ―integram uma
identidade social mais ampla‖ (2011, p. 2.016), além de pensar a garantia de prosseguimento
dos estudos sem precisar sair do campo.
154
Desenho 09: Na hora da explicação.
Fonte: Corpus da pesquisa.
Desenho 10: De estudar e aprender junto com minhas amigas.
Fonte: Corpus da pesquisa.
155
Desenho 11: Na hora que chego em casa.
Fonte: Corpus da Pesquisa.
Jovem Pitomba
Título: Na hora da Explicação /De estudar, e aprender junto com as minhas colegas/Na hora
que chego em casa.
Pra mim o que tem mais importância é na hora que o professor tá explicando, tem
que prestar atenção, por isso que eu fiz esse desenho, porque pra mim é importante.
No desenho tem aqui o professor explicando e eu prestando atenção. Daí tem o
outro, aí já depois de estudar, né, junto com minhas colegas, as minhas amigas e
só somos nós três mesmo, eu gosto de todos, mas quem mais eu convivo é com elas
mesmo, minhas três amigas. E... na hora que eu chego em casa, na hora que eu vou
chegando em casa pra mim é importante, né, mais um dia ter conseguido, mais
uma conquista.
A Jovem Pitomba apresentou três desenhos nos quais ela reflete sobre três momentos
distintos da sua vida escolar. A estudante elencou por ordem de prioridade: primeiro a
explicação do professor, pois segundo ela, é o mais importante. Na sua representação, o
momento da explicação é quando ocorre o processo de ensino aprendizagem, ou a aquisição
do conhecimento e por esse motivo é a prioridade na sua vida escolar. Em sua caracterização
ela se coloca como uma aluna que ―presta atenção‖ à explicação do professor.
156
No segundo desenho a jovem representa o processo de socialização que ocorre no
ambiente escolar, ela descreve que depois de estudar fica com as amigas, destaca que gosta de
todos/as os/as colegas, mas há um afeto especial por duas amigas que estão sempre juntas.
Outra Jovem também destaca a escola como espaço de convivência em sua fala no grupo
triangular, conforme segue:
Tipo, A escola é pra estudar, né? Mas é o lugar que, tipo a gente tem um tempo
com os amigos, brinca com os amigos, se diverte, né? Pra sair da rotina de
estudar, estudar, também tem que se divertir. (Jovem Bacaba)
Aí é muito bacana, o módulo nos ajuda dessa forma de unir, como nossas
comunidades são distantes, a gente não se encontra muito assim fora da escola, só
aqui nós tem ocasiões que nós se encontra e se encontramos por aí e se fala, mas o
módulo, ele... ele une os jovens de cada comunidade, aqui na escola, e é muito
bom (Jovem Cupuaçú).
Para essa estudante, a escola proporciona além do processo de aquisição de
conhecimentos que ela define como ―rotina de estudar‖, um tempo com amigos e de se
divertir. Cabe destacar que nas comunidades do campo, a escola tem um papel fundamental
no processo de socialização das crianças e jovens, pois o seu ambiente permite a aproximação
das diversas comunidades dispersas espacialmente que são conectadas pelo processo
educativo por meio do transporte escolar. O aspecto da socialização entre os Jovens do campo
permite a construção de intercâmbios tanto de saberes, como de afetos, de visões de mundo e
representações por assim dizer (NASCIMENTO, 2015)
A fala de outro Jovem (Cupuaçú) se refere a união entre as comunidades
proporcionada pelo módulo, pois não há possibilidade de muitos encontros fora da escola, ele
destaca a união como positiva, nas suas palavras ―na escola é muito bom‖. As falas dos/as
sujeitos evidenciam a importância das múltiplas dimensões da educação, com ênfase para os
processos de socialização que ocorrem dentro do ambiente da escola que, especialmente nessa
fase da vida, é fundamental.
No estudo de Souza (2011) podemos observar algumas semelhanças nessas
representações, para os jovens pesquisados pelo autor a escola é visualizada como espaço a
ser aproveitado, tanto como caminho de preparação para o futuro como no que se refere as
possibilidades de socialização, fazer amigos e diversão. Segundo o autor, ―para os estudantes
que pesquisamos, é natural e desejável que os jovens frequentem a escola: escolarizar-se é
elemento constitutivo importante da Juventude‖ (SOUZA, 2001).
157
O estudo de Pinto (2016) também destaca a importância atribuída pelos/as estudantes à
socialização no espaço da escola, em seu estudo, a autora observou que para a amizade foi
destacada como fundamental no processo de escolarização visto que a escola propicia e
incentiva esse aspecto por meio de diversas atividades e trabalhos em grupo (PINTO, 2016, p.
85).
Além disso, a reflexão apresentada pela Jovem Pitomba sobre seu último desenho se
articula à temática em debate ao se referir a hora que chega em casa como uma superação, nas
palavras da jovem ―mais uma conquista‖. A ênfase dada ao fato de ―mais um dia ter
conseguido‖ carrega um peso que estabelece vínculo com a fala da jovem Bacaba sobre as
montanhas a serem superadas. Faz ecoar as dificuldades impostas para acessar e permanecer
na escola que produzem conquistas diárias ao retornar para casa.
As afirmações das jovens acerca das dificuldades enfrentadas dão conta de que a
escola tal como está organizada atualmente está na contramão do proposto pelo movimento da
Educação do Campo que compreende que a escola, segundo Molina (2014): ―deve ser aliada
dos sujeitos sociais em luta para poderem continuar existindo enquanto camponeses e para
continuar garantindo a reprodução material de suas vidas a partir do trabalho na terra‖
(MOLINA, 2014, p. 12). Ainda, segundo a autora, a possibilidade de permanência dessas
escolas e sujeitos no campo está diretamente ligada aos desdobramentos da luta de classes.
Para além das falas sobre os desenhos que tratam dos obstáculos e das conquistas
diárias ao concluir o turno de aula de maneira mais genérica, outras falas dos grupos
triangulares explicitam quais são as montanhas que necessitam ser transpostas, ou, quais são
as superações diárias enfrentadas pelos/as jovens do campo para acessar e permanecer no
Ensino Médio, as quais apresentaremos a seguir.
4.2.3.1 Compositor de destinos: tempo, tempo, tempo17
As imagens e sentidos dos/as jovens em relação ao módulo manifestam preocupação
com o tempo. Na canção do poeta, ele faz um pedido: ―o prazer legítimo e o movimento
preciso [...], quando o tempo for propício, tempo, tempo, tempo, tempo‖ (Veloso, 1979). A
letra da canção provoca a refletir sobre a forma que lidamos com o tempo em todos os
âmbitos da vida, a qual tomamos como questionamento para a escola. Quanto tempo temos
17
Referência a música ―Oração ao Tempo‖ de Caetano Veloso.
158
para cada disciplina? Quanto tempo é necessário para aprender um conteúdo? Quanto tempo
cada sujeito demora para aprender? Como a escola organiza os espaços-tempos de ensino
aprendizagem?
Na visão dos estudantes, o fato de (no módulo) as aulas de cada disciplina serem
concentradas reduz o tempo de apropriação dos conteúdos. Nas falas dos/as sujeitos fica
evidente que a pressão de concluir as disciplinas no tempo previsto afeta seu processo de
aprendizagem, conforme podemos observar nas seguintes manifestações:
Em relação ao módulo, eu sempre estudei no regular aí, eu passei estudar o
modular, claro assim, eu senti o impacto da diferença que tem do regular para o
modular, que é mais corrido... é trabalho por cima de trabalho, o aluno tem que se
esforçar mais, tem que estar mais atento para poder ter o resultado bom no final do
módulo que é 50 dias [...] (Jovem Piquiá).
O módulo é bom até em algumas partes, mas, às vezes, a gente se sente pressionado
até porque o tempo, né? Que é... para mim é bem pouco tempo. Aí, aquilo vai
pressionando até a mente, né? [...] muita das vezes, a gente até pensa assim que
não vai conseguir, mas aí vai se esforçando, se esforçando, e a gente consegue
(Jovem Castanha).
Eu acho muito bom o módulo por uma parte, mas por outra eu vejo um erro muito
grave que é a gente estudar muito pouco uma matéria. Tipo, o que os alunos do
ensino regular estudam em um ano, a gente estuda uma terça parte, umas aí, tipo
os conteúdos [...]a gente não aprende quase nada. Então, quando a gente chega lá
na frente e olha o Ensino do Modular, ele tem um pouco de dificuldade
principalmente na parte portuguesa e Matemática (Jovem Uxi).
A gente pega um livro de tantos capítulos, mas a gente estuda no máximo dois e
quando estuda (Jovem Mandioca).
E do pouco tempo que a gente estuda, praticamente a gente não aprende quase
nada (Jovem Sapucaia).
Aí prejudica a gente porque a gente era pra ter aprendido muito mais e a gente
aprendeu só o resumo. Porque é feito o resumo de todo o conteúdo que vai, quem
vai passar e aí pra frente só vai prejudicar a gente (Jovem Pitomba).
A situação expressa na fala dos/as jovens reforça a ideia do tempo apreendido pelo
capital, a escola como a fábrica é um local de produtividade no qual o tempo determina o que
pode, ou não, ser apropriado. Nessa lógica, é ―trabalho por cima de trabalho‖ para ―alcançar o
resultado‖ como afirma o Jovem Piquiá. A Jovem Castanha sente a pressão na mente e o risco
de não conseguir alcançar o previsto para a série/disciplina/bimestre.
Miguel Arroyo em sua obra ―Imagens quebradas‖ discute essa temática, o autor chama
a atenção para a cultura escolar que ―materializa modos de pensar, simbolizar e ordenar
mentes e corpos‖ (2014, p. 206), onde a centralidade do tempo provoca vivências frustrantes
em um esforço de encadear tempos humanos e tempos escolares (ARROYO, 2014b, p. 191),
159
da mesma forma que observamos na fala dos/as jovens a respeito do esforço depreendido e da
pressão sofrida nesse processo. Segundo o autor:
O tempo de escola é tão conflitivo porque foi constituído faz séculos e terminou se
cristalizando em calendários, níveis, séries, semestres e bimestres, rituais de
transmissão, avaliação, reprovação e repetência. Quando chegamos as escolas,
entramos nessa lógica temporal institucionalizada que se impõe sobre os alunos e
sobre os profissionais da educação (ARROYO, 2014b, p.192).
Ao se apropriarem desse discurso, os/as estudantes reclamam o pouco tempo para
cumprir com o roteiro preestabelecido de conteúdos organizados em livros e capítulos, os
quais o tempo não lhes permite alcançar. A eles/as, restam poucos capítulos de um livro
inteiro, ou o resumo do que deveria ser apreendido. Nas suas falas, lhes sobra a terça parte do
conteúdo que alunos do sistema dito regular acessam, e dessa terça parte, nem tudo se
aprende, de modo que se sentem prejudicados em relação ao Ensino Médio regular.
Para Arroyo, essa é uma lógica em que os ―conteúdos‖ a serem ensinados definem a
organização dos tempos e espaços de todos os envolvidos no processo educativo, e se
constituem como ―eixo vertebrado‖ dessa estrutura dividida em graus, séries, disciplinas, etc
(ARROYO, 2014b, p. 194).
Se pararmos para analisar, o sistema modular de ensino em sua organização dos
tempos e espaços escancara com maior crueza a lógica denunciada por Arroyo. O cronograma
definido de 50 dias para cada disciplina cumprir o seu programa explicita, de maneira ainda
mais clara do que no sistema regular, a forma como os tempos ―predefinidos para o domínio
de cada habilidade‖ são ―recortados minuciosamente‖ (ARROYO, 2014b, p. 194). O autor
questiona essa lógica ao afirmar que:
Toda a formação, as aprendizagens e a socialização dos alunos e alunas são presas a
essa sequenciação e, sobretudo, os mestres são forçados a serem fiéis cumpridores
dessa sequenciação preestabelecida. O que é programado para cada aula, o para-casa
e as provas tem de obedecer a essa sequência rígida, os professores não tem
liberdade para definir essa sequência. Os alunos manifestam tensões e conflitos
constantes entre esses tempos predefinidos e os tempos vividos e possíveis no
trabalho e na sobrevivência [...] (ARROYO, 2014b, p. 194).
O tempo curto para aprender se soma a outros obstáculos que dificultam a
permanência dos/as jovens na escola e o processo de aprendizagem. Os/as jovens do Ensino
160
Médio associam estudo e trabalho, essa é uma realidade presente na imensa maioria das
escolas. No campo, essa situação também é frequente nesse momento da trajetória escolar,
conforme podemos observar nas falas dos/as sujeitos do estudo.
Outra problemática que se soma é a situação do gerador de energia que funciona
poucas horas na comunidade, ou seja, quando os/as estudantes chegam da escola após a aula,
o tempo para realizar qualquer tarefa é mínimo, pois o gerador é desligado, em geral, a meia
noite. Depois disso, é impossível estudar no escuro ou adiantar qualquer tarefa. Atentemo-nos
aos relatos dos/as alunos/as:
É mais difícil porque a gente tem que fazer aquilo tudo na correria, a gente tem que
batalhar, tem que fazer coisas e aí, muitas vezes, a gente tem um trabalho e
aparece alguma coisa e aí, a gente tem que tá correndo e aí trabalha e vem e faz
uma coisa, estuda um pouquinho e aí, vira aquela correria do dia a dia (Jovem
Bacaba).
O tempo é muito curto e aí a gente tem que acabar levando trabalho para casa...
(Jovem Castanha).
A gente trabalha em casa e, às vezes, é muito corrido, muito pesado e aí, a gente
chega lá e a gente não tem muito tempo para estudar porque a energia, ela vai
desaparecer e aí, você tem que fazer as coisas de casa e aí, se chegar tarde, não
temos tempo para estudar. Digo isso por mim, mas como muitas vezes me emprego
dai não... Daí é muito mais corrido para mim (Jovem Sapucaia.)
E aí, nossa, eu trabalho até meia-noite quando o motor não vai até duas três horas
da madrugada e passa a fazer avaliação de manhã e aí, não tem como a gente
estudar de madrugada no escuro, né, para fazer avaliação de manhã (Jovem
Mandioca).
As situações relatadas acima dão conta de que não há uma definição prévia dos
tempos, os/as jovens devem estar disponíveis para a escola independente de outras atividades
relacionadas a família, comunidade, trabalho, etc para conseguir acessar o maior número de
disciplinas dentro do período que (se espera) cursa o Ensino Médio. Ou seja, as aulas, via de
regra deveriam ocorrer em turno pré-definido com professores disponíveis em cada disciplina,
porém, na realidade são feitos inúmeros arranjos para minimizar o número de lacunas no
histórico escolar dos/as alunos/as.
Essa problemática afeta diretamente na permanência dos/as jovens no Ensino Médio
visto que os mesmos possuem atribuições em casa, na roça, na família, etc. Desse modo, o
processo de evasão ao longo do ano letivo torna-se uma situação constante no Ensino Médio
dessas escolas. Os/as estudantes que permanecem, por vezes, o fazem apenas no horário
regular das aulas e acumulam lacunas no histórico ao longo do percurso estudantil do Ensino
Médio, ao concluir os 3 anos correspondentes a essa etapa escolar, precisam retornar para
161
―pagar disciplinas‖ ou participam de exames de massa, entre outras alternativas para
preencher os vazios do seu histórico escolar.
Muitas são as causas do não cumprimento do cronograma previsto para as atividades
do Ensino Médio nessas escolas, por muitas vezes os motivos não podem ser previstos, como
por exemplo, quando um professor adoece e precisa se deslocar para a capital para cuidar de
problemas de saúde não conseguindo retornar para cumprir com os 50 dias do módulo.
Porém, a falta de professores para atuar com algumas disciplinas no módulo é frequente no
estado tornando inviável a organização curricular do Ensino Médio nas escolas do campo.
Atentemos para o conjunto de falas a seguir que exemplifica a discussão ora proposta:
Poderia ter tempo só que, às vezes, atrasa, a pessoa atrasa e não pode atrasar
muito, a gente passa quase um mês... (Jovem Buriti).
É que nem o ano passado, a matéria de Artes, quem tava fazendo primeiro ano, no
mínimo acho que foram as duas aulas que a gente estudemos com a professora de
Arte, porque ela foi embora para Macapá e tava doente e não veio mais (Jovem
Tucumã).
Aí, a gente falou então para repor, e aí, quando eles vêm rápido, eles fazem um
projeto para... para evitar a reprovação, mas eles falam 15 dias, e não chega, fica
uma semana que eles vêm aqui, vêm da aula e aqui e aí, você tem que se virar. [...]
Então, se o modular fosse um pouco mais, digamos que eles cumprirem o regime,
daí tudo seria ótimo, eu acho, para nós (Jovem Açaí).
Ás vezes, também já querem ir embora já e passam qualquer atividade valendo 15,
20 aqui e vão embora. E aí, passa negócio de 15, 20 coisa lá e vai embora lá. Aí a
gente se sente com dificuldade (Jovem Cupuaçú).
A vida escolar dos/as jovens estudantes do Ensino Médio no campo amapaense é
marcada por estes e outros obstáculos ou montanhas a serem transpostas, entre eles, as
lacunas são uma problemática frequente na agenda das escolas e alunos/as do ―módulo‖. Essa
situação ocorre nas circunstâncias mencionadas acima e em outras tantas que tornaram essa
nomenclatura corriqueira no cotidiano desses/as sujeitos.
Nesse rumo, os estudantes pesquisados por Oliveira et al corroboram com a percepção
dos obstáculos enfrentados para acesso e permanência no Ensino Médio e destacam o esforço
pessoal como prerrogativa para superar os desafios, segundo os autores:
A escola pública é tratada como um dos desafios a ser vencido, a partir do empenho
dos alunos e da sua maior dedicação, como ferramentas para vencer a má qualidade
de ensino oferecida. A associação do sucesso profissional ao estudo aparece
referenciada à formação em nível superior, ou seja, ―fazer uma faculdade‖ ainda
162
representa para esses jovens o caminho para a melhoria das condições de vida
(OLIVEIRA et al, 2001, p. 248).
Nas falas dos/as jovens aparecerem algumas das causas já mencionadas anteriormente,
tais como, a falta de professores em algumas disciplinas, o adoecimento docente, a resolução
de qualquer problema na vida dos/as professores que demanda retorno para a cidade, este
último, poderia ser minimizado se fossem considerados professores que vivem nas
comunidades onde as escolas estão situadas, proposta esta, defendida pela Educação do
Campo que em alguma medida vem se tornando realidade nos locais em que foram/são
ofertados cursos pelo PRONERA e ou Licenciatura em Educação do Campo. Molina e Freitas
discutem a questão do perfil do/a educador/a e sua importância para a Educação do Campo,
segundo a autora:
O perfil de educador do campo exige uma compreensão ampliada de seu papel. É
fundamental formar educadores das próprias comunidades rurais, que não só as
conheçam e valorizem, mas, principalmente, que sejam capazes de compreender os
processos de reprodução social dos sujeitos do campo e que se coloquem junto às
comunidades rurais em seus processos de luta e resistência para permanência na
terra. (MOLINA; FREITAS, 2011, p. 28).
Quando esse perfil não é considerado, como no caso do SOME, que os/as professores
estão em constante deslocamento - de escola em escola, de comunidade em comunidade - sem
estabelecer vínculo com nenhuma delas, e em alguns casos nem mesmo a identificação com a
Educação do Campo, emergem outros problemas em efeito cascata. É o caso, por exemplo das
lacunas. Vejamos a seguir as falas dos/as jovens sobre essa situação em seus históricos
escolares:
[...] pela secretaria não oferecem todas as matérias que é para oferecer muitas
vezes falta disciplina e a gente acaba ficando afetado por aquela disciplina que a
gente acaba perdendo e, muitas vezes, até a parte do ano tem que ficar esperando
ter que resolver e mandar. [...] (Jovem Uxi).
Sempre falta aparecer, quando não falta um, falta outro... (Jovem Sapucaia).
Tem que esperar o próximo ano letivo, mas sabe os professores, eles são legais que
tem professor que ele não dá aquela lacuna, entendeu? Aí, tanto com esse fato do
professor não querer dar a lacuna, o aluno fica com aquela lacuna até o final do
estudo dele (Jovem Pitomba).
[...] quando a secretaria está de bom humor e quando passa uma prova para a
gente fazer e quando não, eles não passam [...] a gente vai lá faz a prova e assim,
se conseguir a pontuação, aí a gente preenche a lacuna e aí, coloca nota (Jovem
Castanha).
163
O módulo assim, todo mundo que termina o terceiro ano ele tem que voltar para
estudar depois, pagar lacuna. Eu não tenho nenhuma dependência na minha
caderneta, mais tem várias lacunas ainda mais que... umas dez matérias desde a
quinta série para cá. Porque não vem professor, não tem professor (Jovem Buriti).
As lacunas provocam um descompasso no processo de ensino aprendizagem dos/as
jovens das comunidades do campo no Amapá. Nas escolas onde é ofertado Ensino Médio
modular é comum o/a aluno/a necessitar mais de 3 anos para cumprir o currículo do Ensino
Médio. Se no ensino dito regular as situações de reprovação e dificuldades para concluir os
estudos denunciados por Arroyo (2014) são um problema, no ―módulo‖, a situação consegue
ser ainda mais precária. Arroyo atribui essas situações a lógica temporal que é de reduzir cada
vez mais os tempos, segundo o autor:
Os conteúdos são predefinidos para serem ensinados e aprendidos em semanas e
bimestres. Atualmente a sorte o aluno não é decidida como antigamente na prova
final – ao final do percurso -, mais a sorte de 20% ou mais dos alunos pode estar
selada na primeira prova bimestral. A cada avaliação bimestral, ou a cada volta do
percurso o educando pode ―entrar no vermelho‖, entrar na categoria dos
irrecuperáveis, ou ―lentos‖ e dos condenados a repetência (ARROYO, 2014b, p.
194).
No caso do módulo, essa redução do tempo é institucionalizada, porém, não é
cumprida nem mesmo nos moldes propostos para esse sistema. Além da falta de professores,
quando há disponibilidade não há garantia de cumprimento do cronograma. Os docentes se
tornam reféns do sistema mesmo quando cumprem o cronograma e, por vezes, necessitam
criar arranjos para cobrir as brechas existentes trabalhando em turno inverso em um número
maior de horas do que o previsto em suas atividades para que os/as alunos/as possam
acompanhar a ―sequência‖ prevista pela disciplina, visto que, como o próprio nome já diz,
ficaram lacunas dos anos anteriores.
Essa problemática aparece no estudo de Rodrigues (2016) sobre o Sistema de
Organização Modular em Breves no estado do Pará e indica que principal limitação percebida
pelos/as jovens é o descumprimento do calendário escolar que produz grandes intervalos entre
os módulos, bem como, a forma aligeirada dentro de um mesmo módulo que acarreta em
situações relatadas que o tempo de 50 dias foi resumido a uma semana (RODRIGUES, 2016,
p. 122).
164
No nosso contexto, os intervalos produzidos pelas lacunas geram um processo de
descontinuidade na aquisição do conhecimento das áreas afetadas por elas. Essa problemática
emergiu com ênfase nas falas dos/as estudantes participantes dos grupos triangulares,
observemos suas manifestações a respeito dessa situação:
E aí a gente passa e tem um ano que a gente não estuda a matéria, aí no outro ano
a gente estuda aquela matéria e aí, não viu o conteúdo anterior e aí, não vai
entender nada (Jovem Bacaba).
E tem professor que não entende isso, daí agora a gente tá com dificuldade aqui no
segundo ano de Português, por quê? Porque o conteúdo que a gente era pra ter
sido visto no primeiro ano, a gente não viu, aí a gente tá perdido, não sabe (Jovem
Açaí).
Agora, o professor tá fazendo uma revisão para nós do ano passado que a gente
não viu (Jovem Tucumã).
As dificuldades, ou obstáculos como denominado pelos/as jovens, são enfrentados por
todos os envolvidos no sistema modular. São necessários ajustes e negociações constantes
entre as direções de escola e os professores com o intuito de reduzir ao máximo os impactos
causados pelas brechas que se acumulam ao longo do percurso vivenciado pelos/as sujeitos no
processo, ou seja, todos/as os elos da corrente são afetados, sejam professores, direções,
porém, o impacto é muito maior na vida dos/as jovens que pretendem dar continuidade aos
estudos.
A precarização da escola pública é realidade em diferentes contextos, é vivenciada nas
diferentes regiões do país. Quando se trata da Educação do Campo a sobreposição de
problemas torna o cenário ainda mais complexo, especialmente em se tratando de regiões
dispersas espacialmente e de difícil acesso. Essa realidade poderia ser motivo de proposição e
elaboração de políticas públicas específicas que minimizem os problemas, porém, ao contrário
disso, os arranjos criados geram situações ainda mais graves de negação do direito à
educação.
As evidências dessa realidade podem ser observadas nas diversas escolas do campo,
nas falas dos/as jovens, sujeitos do presente estudo, além das questões já discutidas
acrescentamos a situação de infraestrutura e materiais das escolas estudadas, conforme segue:
E sobre a estrutura da escola, aí tá certo que ela não oferece, no quadro regular,
uma estrutura legal, não tem material suficiente, não tem livros didáticos
165
suficientes, e isso tudo vai atrapalhando nesse mundo do aluno porque não tem o
material adequado para ensinar naquele ano que ele está (Jovem Pupunha).
Eh, tipo, também na escola tinha música, agora a gente não tem que a gente
deveria ter, como a senhora tá vendo, tem violão, o esporte, a gente não tem, não
tem quadra, a gente não tem, não pode praticar esporte (Jovem Tucumã).
Não tem energia, tem uma época do inverno que as salas são muito escuras, dia
chuvoso fica escuro (Jovem Açaí).
O que mais impede é no inverno, daí no inverno é praticamente todo dia nublado,
daí fica escuro dentro da sala e é a dificuldade (Jovem Buriti).
O transporte, que teve uma vez na minha comunidade que o transporte faltou toda
uma semana e eram duas kombis que vem me buscar, só que uma não trazia os
outros alunos (Jovem Bacaba).
A situação da infraestrutura é um dos obstáculos mencionados pelos/as jovens, entre
os quais eles/as destacam a falta de materiais didáticos entre eles os livros, os problemas
constantes relacionados ao transporte escolar, a interrupção de projetos como o de música,
etc. Além dessas e outras dificuldades mencionadas, a falta de energia ganhou destaque, pois
na escola que as aulas ocorrem pela manhã o tipo de janela dificulta a entrada de luz no
ambiente, especialmente nos dias nublados, e, na escola que possui aulas no período noturno
quando falta combustível ou outro problema relacionado as aulas precisam ser suspensas.
Cabe destacar que durante a coleta de dados presenciamos problemas com a energia, a
falta de transporte escolar, a falta de materiais didáticos, enfim, essas situações dão a
dimensão de que as dificuldades são cotidianas, e como afirma a Jovem Pitomba cada dia de
aula é uma conquista.
4.2.4 Escola e Território
O quarto e último tema que, em nossa análise, emergiu do agrupamento das unidades
de sentido foi Escola e Território, esse tema apresenta as falas dos/as jovens sobre a
importância do acesso à educação no seu território, o desejo de que a Escola do Campo
possua educação de qualidade em local próximo de suas residências, além da relação que
possuem com seus territórios seja no que tange ao trabalho, a produção e extração de
alimentos e renda, além das vantagens de viver em contato com a floresta.
Nesse tema, traremos os desenhos e as respectivas falas dos/as Jovens Uxi, Açaí e
Pupunha, além de outras manifestações oriundas dos grupos triangulares.
166
O tema emergiu dos dados levantados em nosso estudo em uma correspondência entre
a representação do módulo atrelada à representação espacial. Os/as jovens destacam a
importância da escola No campo, próxima da sua residência e, trazem em seus desenhos
elementos de sua representação socioespacial. Cabe mencionar que como afirma Alba (2011),
o tema das representações sociais do espaço é complexo, pois abarca três dimensões, quais
sejam, a social, a territorial e a subjetiva.
Destacamos em nosso estudo a relação que os/as sujeitos apresentam com a dimensão
territorial, que na proposição da autora é entendido não só ―como contexto material, mas
como cenário de dinâmicas econômicas, políticas e culturais que o criam e recriam
constantemente‖ (ALBA, 2011, p. 109).
A segunda dimensão destacada pela autora, a Social é segundo ela ―dada pelas
pertenças sociais dos ocupantes do espaço e pelo significado eminentemente social de um
meio inserto num meio cultural determinado‖ (2011, p. 109).
A terceira dimensão apresentada por Alba (2011) é a subjetiva, nesta, segundo a
autora, ―por intermédio da experiência vivenciada no território, o sujeito constrói simbólica e
materialmente seu espaço, da mesma forma em que esse espaço o constrói, dando-lhe
identidade e pertença socioterritorial‖ (2011, p. 109).
Nesse sentido, nosso diálogo parte do desenho e respectivas falas do jovem Uxi acerca
do caminho para a escola para refletir acerca das representações articuladas em torno da
temática escola e território.
167
Desenho 12: O caminho da escola.
Fonte: Corpus da pesquisa.
Jovem Uxi
Título: O caminho da escola.
Eu fiz um desenho aqui retratando a importância da escola pra mim porque ela
facilita porque ela fica muito perto da minha moradia e isso não me traz
dificuldade pra chegar até ela, não é muito distante e muitas pessoas não tiveram
essa oportunidade de ter a escola perto da sua casa pra fazer o Ensino Médio. Tem
o rio, o trajeto da minha caminhada, eu caminho um pouco na estrada, pego a
minha canoa e desço pra minha casa que não fica muito distante da escola, mas
pra mim tem sido um privilégio ter essa oportunidade de estudar nessa escola tão
perto de casa. Minha canoa é rabeta, leva uns sete minutos, na verdade é pago um
catraieiro pra me levar até dentro de casa.
O Jovem Uxi retrata em seu desenho a importância da escola com destaque para o fato
de a mesma ser próxima de sua residência, segundo ele, isso facilita o acesso dele, enquanto a
distância dificulta para outros/as jovens chegarem à escola, ele destaca o fato de que muitas
pessoas não tiveram essa oportunidade. No momento seguinte, ao reafirmar o fato da escola
ser perto de casa ele utiliza expressão privilégio.
Cabe o questionamento: estudar próximo de casa, ter uma escola de Ensino Médio no
seu território é oportunidade ou privilégio? Quando tratamos da legislação educacional do
168
campo e os referenciais do movimento da Educação do Campo a tônica é o direito a Educação
do Campo no seu território, bem como, uma educação pensada desde o seu lugar e com a sua
participação, que possua vínculo com a sua cultura, saberes locais e necessidades, sejam elas
humanas e/ou sociais (CALDART, 2002).
Nos grupos triangulares o tema do direito x privilégio a uma escola no seu território
emergiu em diversas falas, nelas os jovens dialogaram sobre a importância do SOME como
sendo sua possibilidade concreta de acessar o Ensino Médio no campo. Observemos as falas a
seguir:
Então, a nossa comunidade aqui teve um privilégio de ter um Ensino Médio como
muitos outros não têm e isso é a importância que nós temos para contar (Jovem
Uxi).
E para nossa reserva, eu falo que além da reserva, o módulo é importante sim,
enquanto de alguma dificuldade familiar que a gente tem que sair para fora para
estudar, conseguir um estudo melhor de qualidade e, dessa forma, ele é muito
importante para nós sim, para nós ter direito de ter uma formação legal e ter,
futuramente, o emprego adequado e assim, vai dessa forma ele é muito importante
sim, com certeza, para nós que vive aqui dentro da reserva (Jovem Cupuaçú).
O estudo chegou até aqui, facilitou muito mais para a gente, a gente custa mais a
sair de perto das nossas famílias para chegar até a cidade. Isso foi uma facilidade
muito grande para a gente (Jovem Piquiá).
Ao referendar a importância do módulo para suas comunidades um dos jovens enfatiza
o território da Reserva, destacando que o Ensino Médio é para ―nós que vive aqui dentro da
reserva‖. Outras questões que emergem nas falas são as relações familiares e os projetos
futuros, ou seja, há uma ênfase na possibilidade de ―ter uma formação legal e ter, futuramente,
o emprego adequado‖, atrelando o acesso ao Ensino Médio no território às possibilidades de
tornar realidade seus projetos de vida.
Outros elementos de destaque no desenho do Jovem Uxi dizem respeito as
características do seu território: ―tem o rio, o trajeto da minha caminhada [...] na estrada‖,
imagens e sentidos que trazem em seu bojo a perspectiva da sua representação socioespacial
em consonância com o proposto por Alba (2011) e discutido anteriormente.
Nessa mesma perspectiva, o desenho do Jovem Uxi manifesta traços da cartografia
social, pois incorpora traços do território onde o sujeito constrói sua identidade. Gomes
(2017) e Acselrad (2013) discutem a Cartografia Social como um processo e não uma técnica
de representação em si, a CS, segundo eles, tem como princípio a autorrepresentação do
sujeito que se apropria do território e ali constrói sua identidade. Esse processo envolve
169
percepção, concepção e representação. É social, pois não se restringe a localizar e distribuir os
elementos do espaço representado, mas sim expressar, por meio da representação, a teia de
relações conflituosas do território.
Essas relações conflituosas nem sempre são explícitas. Muitas vezes emergem nos
processos de organização social e até nas questões relacionadas a gestão da escola, as quais
aprecem nas falas dos grupos triangulares permeadas por relações de poder e apropriação
indevida de recursos públicos.
170
Desenho 13: Projeto de vida para minha comunidade: aulas regulares!!!
Fonte: Corpus da pesquisa.
Jovem Açaí
Título: Projeto de vida para minha comunidade aulas regulares!!!
Eu me chamo [...] estou cursando o segundo ano do Ensino Médio e eu desenhei
digamos que não é bem representado (risos) mas é no futuro minha comunidade
tendo aula regular pra todo mundo. Então é uma sala cheia de alunos
estudando/cursando com aulas regulares que é o que eu tenho vontade. O módulo tá
me levando adiante, tá abrindo vários caminhos pra mim no futuro me formar, eu tô
aprendendo várias coisas, poucas, mas estou, então, eu me vejo formado no futuro
talvez com esse projeto sendo professor.
O Jovem Açaí apresenta em seu desenho uma questão que permeia toda a discussão de
fundo do nosso estudo, ou seja, as representações sociais sobre o SOME especificamente.
Essas representações dizem respeito a um modelo de escola e de educação presentes no
campo, nas águas e nas florestas, nesse caso específico na RESEX-CA. Trata-se de pensar:
que tipo de escola e educação os Jovens do Campo tem acesso e qual eles/as desejam?
O desenho do Jovem Açaí é uma representação de futuro, é a representação do seu
desejo ―é no futuro minha comunidade tendo aula regular pra todo mundo [...] uma sala cheia
de alunos estudando/cursando com aulas regulares‖. Ao mesmo tempo que ele manifesta o
171
seu desejo de futuro ele destaca o fato de o módulo o levar adiante, abrir caminhos e tornar
possível para ele e para os demais colegas o acesso ao Ensino Médio. Há junto da
representação de seu projeto pessoal de futuro um projeto coletivo de futuro, ou seja, a
Educação no Campo e Do Campo como possibilidade concreta de transformação da sua
vida e dos/as demais jovens da comunidade.
Essa temática foi recorrente nos grupos triangulares, conforme podemos observar
abaixo em um compilado das principais falas sobre a importância do módulo. Cabe mencionar
que dos 12 sujeitos participantes do estudo, pelo menos 7 se manifestaram na mesma direção,
vejamos:
O módulo acho que na verdade ele tem importância para nós aqui na comunidade,
porque nós necessitamos dele porque senão nós, algumas pessoas não têm
condições de vir até a cidade fazer um estudo mais detalhado e para nós a
importância dele é que ele chegou até aqui, nós podemos fazer uso aqui na
comunidade (Jovem Buriti).
E também assim, não é que eu queria que fosse modular aqui, melhor seria se
fosse regular, planejamento um pouco melhor, mas o módulo trouxe esse benefício
para nós. Tem benefícios, tem professores que... que vêm com intuito de ensinar, de
ensinar mesmo, traz em projetos como eles falaram, trazem projetos e a gente junta
o primeiro, terceiro e segundo, a gente junto e faz uma elaboração, faz o conjunto
bacana e a gente vai na comunidade, pesquisa, traz o trabalho de fora para dentro
da escola e fica muito bacana (Jovem Tucumã).
E se não fosse o ensino modular também a gente não estaria estudando, né? Não
teria essa escola aqui se não fosse o ensino modular (Jovem Pupunha).
O pouco tempo que a gente estuda, mas a gente aprende pouco de alguma coisa
(Jovem Pitomba).
Que... tipo, eu não vejo professor nenhum do Estado em querer vir para cá dar
aula regular. Então, esse é o bom do módulo (Jovem Mandioca).
A importância é que é na zona rural, né? E aí na zona rural tudo se torna mais
difícil, transporte, aí a gente não tem, aí para mim se torna mais difícil assim. Aí é
muito importante o módulo. Não é igual na cidade, que na cidade tem um
transporte ou a senhora vai andando na bicicleta para escola e aqui não, se não
tiver o transporte, não tem... o significado para mim ir para escola e aprender
alguma coisa. Aí, eu acho isso o módulo muito importante na zona rural (Jovem
Castanha).
Muito mesmo, ajuda muitas pessoas mesmo, porque digamos que se o módulo não
tivesse hoje aqui a gente teria que tá trabalhando, ou quem quisesse teria que ir
para a cidade e quem quisesse estudar e estudar na cidade não tá fácil e quem não
tem emprego, não tá fácil no interior mesmo... (Jovem Sapucaia).
As imagens e sentidos expressas nas falas dão o tom presente no dito popular ―ruim
com ele, pior sem ele‖, ou seja, os/as jovens trazem suas críticas ao SOME mas acreditam ser
sua única alternativa de acessar o Ensino Médio em seus territórios.
172
Eles/as destacam os diversos obstáculos apontados na primeira temática discutida no
presente estudo, tais como, o pouco tempo, o planejamento fragmentado, as distâncias
percorridas, a ausência de professores para atuar no ensino regular no campo, entre outras. Em
contrapartida, repetem quase como um eco: se não fosse o modular a gente não estaria
estudando, não haveria essa escola, muitos não conseguiriam ir para cidade estudar.
Apesar dos inúmeros relatos relacionados aos problemas com a falta de continuidade
nas disciplinas vivenciadas pelo fato de professores não permanecerem o tempo necessário na
escola (nem mesmo os 50 dias), outros permanecem mas não manifestam interesse em
conhecer a comunidade e compreender a dinâmica da Educação do Campo, a relação positiva
de muitos/as professores/as com a comunidade e sua atuação no sentido de se integrar e
potencializar os saberes e a realidade vivenciada pelos alunos foi destacada nos diálogos dos
grupos triangulares, vejamos:
Eu acho que os professores que vêm de fora, eles se preocupam em entender o nosso
dia a dia fazendo esse tipo de equipe e pesquisas para saber como lidar com a
gente, de que a comunidade vive, os trabalhos que a comunidade faz, o que nós
trabalhamos na agricultura, na pecuária e se ela produz ao ponto de
sobrevivência para ela mesmo. E isso, eu acho até bom que a gente consegue ver
bem e perceber de como a gente vive no dia a dia mesmo (Jovem Buriti).
E, às vezes, alguns professores, eles têm interesse de conhecer o nosso local, ver o
nosso dia a dia o que que ocorre, quais são as dificuldades que a gente tem na
escola e o que ocorre. Tem professora que se interessa por isso, por isso, para
saber da vila, para estar e para sentir a dificuldade que o aluno passa. Porque
alguns alunos são desinteressados nos estudos, mas os outros tem... tem
dificuldades que ocorrem como meu caso lá no Marinho, no inverno eu tinha lá, a
descida lá chove e aí, fica complicado, não desce e aí, nós temos que subir a ladeira
e são alguns problemas que ocorrem. Aí o professor foi lá para ver nossa
dificuldade que nós passa lá no período do inverno (Jovem Piquiá).
Nesse bojo, os/as jovens destacaram inúmeras situações em que os/as professores/as
desenvolveram atividades coletivas e de intervenção nas comunidades que possibilitaram a
aproximação da escola com as famílias, com as experiências e saberes produzidos pelos
sujeitos do campo. Destacaram atividades realizadas nas disciplinas de artes, geografia, língua
portuguesa, entre outras, além de situações em que os/as docentes foram até suas casas e
buscaram aproximar e conhecer as dificuldades e esforços empreendidos pelos/as estudante
para permanecer na escola.
Podemos constatar, nesses casos, um esforço dos/as educadores/as em aproximar os o
processo de construção do conhecimento da realidade vivida pelos/as estudantes,
corroborando com o proposto por Ciavata e Ramos (2012) ao afirmar que a construção do
173
conhecimento pressupõe que sejam apresentados os conceitos previamente elaborados ou em
processo de elaboração sobre a realidade, sendo que, a função da escola é de ―socializá-los e
difundi-los, tanto em benefício da própria ciência quanto pelo direito de todos os cidadãos
terem acesso aos conhecimentos produzidos‖ (CIAVATA; RAMOS, 2012, p. 309).
174
Desenho 14: O destino da minha vida.
Fonte: Corpus da pesquisa.
Jovem Pupunha
Título: O destino da minha vida.
Estou cursando o segundo ano do Ensino Médio, moro na comunidade do Martins.
O desenho que eu fiz foi da natureza que me chama muita atenção os pássaros, as
árvores, as flores, e tudo o que há nelas porque elas que nos cobrem de nos dar os
alimentos e eu desenhei uma escola que é onde é o meu futuro, que eu desejo
estudar, me formar pra ter um futuro, pra ser alguém.
O desenho da Jovem Pupunha apresenta a visão do seu território a partir da relação
estabelecida entre as pessoas e a natureza materializada nos pássaros, árvores, flores, etc., e
também com a produção/extração de alimentos. A sua fala evidencia a importância desse
território na manutenção cotidiana das famílias que vivem nestas comunidades, porém, ao
falar sobre a escola, há uma ruptura nesse contexto, já que ela conduziria ao futuro, ao formar-
se para ser alguém.
A Jovem parte da ideia de que para ser alguém é preciso formar-se, seguindo a lógica
da canção ―A caneta e a enxada‖ que diz "um dia a caneta foi passear lá no sertão". A canção
torna-se emblemática, pois se a caneta vai passear no sertão é porque ela não reside nesse
175
lugar. Essa imagem construída corrobora com a questionada por Arroyo (2004) de que "para a
escolinha rural qualquer coisa serve. Para mexer com a enxada não há necessidade de muitas
letras" (2004, p. 71).
Consequentemente, a escola passa a ser uma busca para aqueles/as que desejam sair do
campo e/ou são empurrados para a cidade, seja por questões objetivas de falta de acesso a
renda e/ou políticas públicas, seja por questões subjetivas de sair do atraso e ser alguém na
vida. Sobre essa reflexão, Weisheimer afirma que
Estudar é visto como a principal via de acesso para o trabalho não agrícola e tido por
grande parte das moças como uma possibilidade de realização pessoal e profissional,
que não envolve apenas uma melhor remuneração, mas o reconhecimento e
valorização do trabalho por elas realizado (WEISHEIMER, 2005, p. 14).
A escola é uma via de acesso as inovações tecnológicas e a um ideal de modernidade
que é valorizado pelos jovens (2005, p. 10). Essas questões abordadas por Weisheimer (2005)
refletem uma construção social que vem se constituindo há gerações na visão já discutida
anteriormente pela letra da música e pela reflexão de Arroyo, bem como pela divisão das
atribuições e dos papéis no campo, nas águas e nas florestas.
Porém, nesse momento da discussão, torna-se pertinente a reflexão acerca da
afirmação do autor de que a escola é a principal via de acesso ao trabalho não-agrícola, pois
reafirma a situação da educação que não valoriza o campo como espaço de construção de
sonhos e projetos de vida. Na contramão desse processo, a luta pela Educação do Campo tem
como prerrogativa que a Escola do Campo, das Águas e das Florestas é direito dos/as sujeitos
do que vivem e produzem nesse território. Ou seja, ―estamos colocando a educação rural onde
sempre deve ser colocada, na luta pelos direitos. A educação básica, como direito ao saber,
direito ao conhecimento, direito a cultura produzida socialmente‖ (ARROYO, 2004, p. 71).
4.2.5 Objetivações e Ancoragens que compõe as RS de Jovens sobre o SOME
Na perspectiva de compreender se a construção dos projetos de vida dos/as jovens da
Reserva Extrativista do Rio Cajari é implicada pelas suas representações sociais sobre o
Sistema de Organização Modular de Ensino nos colocamos em marcha pelas trilhas da
investigação, tarefa que nos possibilitou encontros, partilhas e também muitos desafios que
176
vão desde o deslocamento para as comunidades por estradas e rios, de carro, ônibus, voadeira
em busca de compreender as diferentes nuances contidas no emaranhado de informações e
suas múltiplas possibilidades de interpretação rumo a construção de um novo conhecimento.
Nesse intento, o processo de escrita e análise de dados se revela instigante e ao mesmo
tempo solitário, de modo que as dúvidas e questionamentos em relação as escolhas e
articulações possíveis pelo emaranhado de sentidos e significados que envolvem o corpus da
pesquisa que por vezes parecem melodias com as quais entoamos canções e/ou dançamos em
sua música.
No esforço de trazer as melodias para o universo da escrita acadêmica nossos
referenciais de análise nos brindam com a tarefa de colocar os pés no chão e tensionar a
realidade dos dados com todo o esforço e conhecimento já produzido e que nos foi permitido
acessar e, por assim dizer, possibilitar os diálogos necessários. Fischer nos ajuda a refletir
sobre essa tarefa, ao afirmar que:
[...] a escrita será tanto mais marcada por vida e pulsação quanto mais puder dar
conta, honestamente, de um mínimo de sólidas referências de herança intelectual,
referências que aparecerão no texto como parte constitutiva de uma experiência
intransferível do pesquisador com as figuras (autores, obras) que lhe povoaram e
povoam a trajetória acadêmica profissional e pessoal, que lhe conferiram e conferem
inclusive um modo de pertencimento a uma época a um dado ambiente intelectual"
(FISCHER, 2005, p. 23).
Ao tecer essas relações entre a realidade vivida e o conhecimento acumulado nos
propomos sempre uma contribuição na produção de algo novo, de uma perspectiva distinta
constituída de análises e interpretações que emergem da realidade, em nosso caso específico,
da teia de representações sociais de jovens sobre o SOME e suas implicações em seus projetos
de vida. Ao construirmos nossa caminhada de pesquisa nos desafiamos na semeadura que, em
solo fecundo, possa crescer e frutificar, considerando o proposto por Fischer (2005) ao
afirmar que:
Não é obviamente necessário e indispensável que nossa produção seja algo
imediatamente eficaz, produza frutos logo ali; nem que sejam obras- primas de
criação artística. Não. Mas que pelo menos nossos textos tenham algo de fecundo
[...] Podemos desejar aquilo que dá a pensar, beber naquilo que dá a dizer, e
impregnar nossa escrita desse espírito - um modo de existência que avança não
diretamente ao ponto, mas obliquamente [...] Sem tanta vaidade [...] disponíveis ao
que jorra" (FISCHER, 2005, p. 25).
177
Cabe reafirmar que as representações sociais não são estáticas, mas estão em
movimento de construção e reconstrução, de modo que o presente texto apresenta seu próprio
viés das questões em debate. Cabe, ainda, informar que as objetivações e ancoragens ora
apresentadas são enlaçadas umas às outras e, portanto, possuem intersecções que possibilitam
a emergência de novas construções constantemente. Vejamos a seguir o diagrama que
apresenta as objetivações e ancoragens destacadas em nosso trabalho de análise:
Figura 08: Objetivações e Ancoragens que compõe as RS de Jovens sobre o SOME.
Fonte: Elaboração própria.
As objetivações ora apresentadas na figura acima buscam materializar as imagens que
os/as jovens possuem do ―Sistema de Organização Modular‖ as quais denotam a importância
atribuída a esse processo formativo por meio de representações positivas ao destacá-lo como:
A) Base de Tudo; B) Preparação para o Futuro; C) Superação de Obstáculos/conquista; D)
Escola e Território. Se analisarmos isoladamente a terceira temática podemos percebê-la com
•Direito x privilégio
•Natureza + Sustento
•Relações familires e comunitárias
•Módulo = única opção
•Universidade
•Emprego
•Casa própria
•Centralidade
•Melhoria de vida
•Projeto de vida
•Pouco tempo
•Lacunas
•Descontinuidade
• Infraestrutura precária
Obstáculos/
Conquista
Educação
Base de
Tudo
Escola e
Território
Preparação
para o
Futuro
Ancoragens Ancoragens Objetivações
178
certa ambiguidade, pois traz atrelada em si ancoragens que expõem problemáticas enfrentadas
no cotidiano escolar, porém, o fazem em uma perspectiva de desafio e superação, tornando-a
uma representação positiva do SOME.
As ancoragens atreladas às objetivações destacam a centralidade da educação, a
melhoria da qualidade de vida, a construção do projeto de vida; a busca pela universidade, o
emprego e a casa própria; nos atentam para os desafios do pouco tempo, das lacunas, da
descontinuidade e da infraestrutura; e nos chamam a atenção para o direito x privilégio,
natureza x sustento, as relações familiares e comunitárias e o módulo como única opção na
realidade atual dos/as jovens do RESEX-CA para acessar o Ensino Médio.
Dessa maneira, apreendemos que no emaranhado de imagens e sentidos emergem
questões latentes e por vezes contraditórias que quando expostas nos interpelam no sentido de
entender os processos educativos que os/as jovens acessam na RESEX-CA, na Amazônia
amapaense e, em certa medida, no campo brasileiro em geral. Destarte, podemos inferir que:
- O SOME possui grande importância para os/as Jovens, pois é entendido pelos mesmos como
necessário à medida que possibilita o acesso ao Ensino Médio nos seus territórios, está
presente na comunidade e permite envolvimento com as famílias e organizações sociais
locais. À depender do desejo dos/as sujeitos participantes do estudo seria melhor que as
comunidades do campo pudessem acessar o dito ―ensino regular‖, especialmente pelas
condições favoráveis no que tange ao planejamento e execução de maneira mais participativa,
principalmente com os professores e a direção das escolas residindo na comunidade;
- Se não houvesse o SOME não haveria para muitos/as Jovens a possibilidade de dar
prosseguimento aos estudos, pois pelas distâncias e condições desfavoráveis de acesso, não
conseguiriam chegar às localidades e distritos que possuem escola regular e/ou se deslocar
para viver na cidade desde o Ensino Médio, como já ocorre nas comunidades do Médio Cajari
onde não há oferta de Ensino Médio. Na percepção dos/as Jovens, no SOME o tempo é curto
mas é possível aprender, principalmente se o cronograma e o processo organizativo previsto
originalmente forem cumpridos.
- A presença das escolas nas comunidades do campo trazem inúmeros benefícios entre os
quais o desenvolvimento de projetos, pesquisas e valorização da cultura e organização local, a
participação das famílias no processo de ensino aprendizagem dos/as Jovens, entre outros.
Existem professores/as atuando no SOME que buscam se envolver e construir parcerias com a
comunidade escolar e realizam um excelente trabalho.
179
Desse modo, o registro ora apresentado reflete uma imagem expressiva das
representações que os jovens possuem acerca do SOME de forma que nos permitimos apontar
possibilidades e limites relacionados a sua importância. A partir do conjunto dessas
representações sociais dimensionamos algumas possíveis implicações nos projetos de vida
destes/as jovens, a saber:
O desejo de ―se formar‖, incluindo a profissão que deseja seguir, e, o objetivo de
melhorar a vida da sua família por meio do acesso à universidade, emprego e aquisição de
bens passa pelo acesso e permanência no Ensino Médio, que só é possível para a maioria
dos/as Jovens por meio do SOME;
Os dados levantados pelo estudo em relação ao Projeto de vida dos/as Jovens da
RESEX-CA corroboram com o que aponta Marinho ao afirmar que: ―[...] a permanência do
jovem no campo se torna mais ameaçada principalmente quando o mesmo almeja um nível de
ensino em descompasso com o ofertado na comunidade‖ (MARINHO, 2016, p. 59-60). As
falas dos sujeitos evidenciam que o principal fator de saída do campo é a continuidade dos
estudos, o que reafirma que migrar nem sempre é uma escolha do/a jovem, mas uma condição
imposta pela ausência de políticas públicas que possibilitem a permanência no campo.
Os resultados nos mostram as dificuldades de viver a condição juvenil no campo no
contexto da Reserva Extrativista do Rio Cajari. Alcançar seus projetos implica, na maioria dos
casos, em acessar maiores níveis de formação, o desejado curso superior, porém, sem
abandonar sua identidade de jovem do campo. Essa problemática é apresentada no estudo
realizado por Oliveira e Feliciano (2016).
Os referidos autores afirmam que: ―[...] a vontade de permanecer choca-se com a
necessidade da saída do campo, [...] consolidando um movimento contraditório de busca,
construção e desconstrução e resistência de jovens camponeses e camponesas‖ (OLIVEIRA;
FELICIANO, 2016, p. 224). Esse movimento de idas e vindas, de resistência, dos/as jovens
do campo torna-se um desafio no sentido de construir seus projetos de vida apesar das
dificuldades enfrentadas ao longo do percurso.
Da mesma forma, Pinto (2016) em seu estudo sobre Jovens Rurais no Ensino Médio e
suas expectativas, observou que os/as jovens vivem o dilema entre ―‗melhorarem de vida‘,
‗serem alguém na vida‘ e assumirem o compromisso com a família e com o sentimento de
pertencimento à localidade de origem‖ (2016, p. 84), visto que consideram que não há
perspectivas de alcançarem suas expectativas nas suas localidades.
180
Autores como Leão e Antunes-Rocha (2015), também, discutem essa temática, eles
constataram que educação, trabalho e a questão fundiária são fatores decisivos que levam
os/as jovens a tomar a decisão de sair do campo em busca de melhores condições de vida.
Porém, em consonância com os resultados levantados pelo presente estudo, os referidos
autores entendem que o fato de os jovens buscarem a saída do campo como caminho não
representa uma negação da vida no campo.
Uma reflexão que vem sendo construída em torno dos movimentos de idas e vindas de
Jovens do campo é apresentada por Leão e Antunes-Rocha (2015). Para os autores o fato de
que muitos jovens buscam alternativas de saída, retorno, idas e vindas, expressa que não há
uma negação da vida no campo. Eles afirmam que:
Muitos jovens constroem projetos de saída, mas com perspectivas de retorno. Outros
mantém trajetórias de idas e vindas entre o campo e a cidade. Embora as facilidades
da vida urbana sejam atrativas para a Juventude, ao que parece há uma relação tensa
e ambígua para os jovens do campo (LEÃO; ANTUNES-ROCHA, 2015, p. 23).
Não obstante nos desafios relatados pelos/as jovens participantes do presente estudo
fica evidente que a decisão sobre permanecer (ou não) no campo não é uma decisão fácil. É
um processo difícil, tenso e contraditório, onde como afirma Marinho (2016) estão imbricados
os laços cultivados pelos jovens com suas culturas e, ao mesmo tempo a possibilidade de
construir seus projetos de vida na cidade permeados pela crença em algo melhor para si e para
suas famílias que em geral está associado a estruturas sociais de educação, saúde, lazer entre
outros.
Essa situação reafirma o dilema vivenciado pelos/as jovens em seus projetos de vida
os quais são atravessados pela dúvida entre a manutenção dos laços e vínculos construídos nas
suas famílias e comunidades e a busca pelo conhecimento, a profissionalização e a desejada
melhoria nas condições de vida, que no contexto vivenciado atualmente em muitas
comunidades passa pela migração. Nesse sentido, ficar ou sair do campo não é
necessariamente questão de escolha e/ou projeto de vida, mas uma necessidade no sentido do
acesso a direitos básicos como Educação, trabalho, mobilidade, entre outros.
Por fim, o estudo sinaliza que as Juventudes que vivem no campo ainda sofrem
desenraizamento de suas origens, famílias e culturas uma vez que as oportunidades se
encontram centralizadas na cidade. Esse cenário faz com que um contingente significativo de
jovens permaneçam no campo por não terem condições financeiras e ou infraestrutura que os
181
mantenham na cidade para a continuidade de seus estudos. Desse modo seus projetos de vida
ficam restritos aos sonhos e a esperança de que um dia possam transformar em realidade a
vida com qualidade no campo, para que possam exercer o direito de escolher viver nos seus
territórios e não serem empurrados para os centros urbanos em busca de melhores
oportunidades.
Diante disso, afirmamos que as representações sociais de jovens da Reserva
Extrativista do Rio Cajari sobre o Sistema Modular de Ensino revelam a existência de
implicações sobre a realização dos seus projetos de vida, uma vez que incide em tomadas de
decisões que envolverão suas respectivas famílias. Dentre as possíveis decisões, destacamos
aquela que significa para estes jovens o ponto central: a da permanência ou não no campo,
pois são vários os condicionantes que impactam nesse processo apresentados ao longo da
análise sobre as informações que estes sujeitos nos forneceram. Estes demonstram que
permanecer ou sair do campo não se trata de uma questão simplesmente de livre arbítrio do/a
jovem, mas de uma tomada de decisão em função das condições desfavoráveis do contexto
em que eles se encontram enraizados18
.
A precarização dos serviços públicos, e até mesmo os privados, ofertados na
Amazônia amapaense, além da ausência de políticas públicas de saúde, educação, mobilidade,
renda, dentre outros, fazem com que o contexto vivido por esses jovens se contraponha, em
grande medida com a cidade próxima. Significa dizer que as cidades se diferenciam pelas
ofertas de serviços fundamentais para suprir as demandas do sujeito, sobretudo as dos jovens
e, como tal, o reforço na sua decisão de morar na cidade, mesmo sabendo das dificuldades que
acenam como: seguir sem a família, morar na casa dos outros, fazer alguns serviços
remunerados para se manter e dar continuidade em seus estudos.
O desejo de seguir o modelo de reprodução social se vincula ao imaginário dos jovens,
o que faz com que a continuidade dos estudos para a qualificação profissional e
consequentemente a inserção no mercado de trabalho para a produção de capital e
consequentemente do consumo, sejam expectativas que se encontram na contramão do que a
vida no campo demanda.
Neste sentido, o campo como local vivido e a cidade como local possível se
transformam em contrários e de tensionamentos permanentes na vida desses jovens. A
dinâmica destes contrários não se esgota e por isso faz com que esse sujeito-jovem se
18
Nos referimos aqui ao processo de enraizamento identitário.
182
posicione no entre lugar do vivido e do possível. O estudioso Cheptulin (1982) nos diz que os
contrários ―coexistem contraditoriamente e estão ligados organicamente, interpenetram-se e
supõem-se um ao outro, o que equivale dizer que eles são unidos e representam a unidade dos
contrários‖ (CHEPTULIN, 1982, p. 286, 287, 288). O campo e a cidade com suas realidades
diferentes se entrelaçam na objetividade e na subjetividade deste sujeito-jovem. As
contradições que estes possuem não cessam de se inscrever, mesmo com a mudança do sujeito
de um lugar para outro; a cidade, vista como um campo de possibilidades para estes jovens
como: ter um ensino qualificado que lhes proporcione condições positivas em termos de
―competitividade‖ nos processos seletivos de ingresso nas universidades, o que reforça a
lógica da meritocracia do sistema capitalista neoliberal; as melhorias na qualidade de vida e
futuramente de sua família seguem a mesma lógica.
Consideramos que, para estes jovens, não se trata de um ser melhor que o outro ou seja
que o campo seja melhor que a cidade ou vice versa de acordo com Thompson (1998), o
conflito se situa mais além do que esta avaliação, ele é inerente à condição humana e social
(THOMPSON, 1998, p. 294).
As situações humanas vividas são carregadas de mediações nas quais as ideologias
manipulam percepções que se transformam em representações sociais. Estas mediações nem
sempre são percebidas, sobretudo pelo jovem se encontra sem necessariamente ter
conhecimento claro e crítico da vida na cidade e toma decisões com base no aqui e agora
denominadas por Hartog (2015) de presentismo, termo usado para denominar o privilégio
dado ao tempo presente na contemporaneidade sem levar em consideração o tempo passado e
a perspectiva do futuro.
Contudo, o tempo passado relacionado à vida do campo se encontra vivo e encadeado
ao tempo presente e ao tempo futuro. As formas de pensar, sentir e agir da vida no campo,
mesmo que aparentemente sejam modificadas por formas mais próximas da vida na cidade, se
manifestam como resistência para alcançar objetivos mais profundos e articulados à vida no
campo (THOMPSON, 1998). Atribuímos essa resistência ao fenômeno social de
desenraizamento.
Esta juventude luta para que seja possível a reprodução do modelo social para viver o
sonho de liberdade conforme mencionado pela jovem Castanha, no entanto não imagina que
ao invés da liberdade encontra o aprisionamento que o descentraliza enquanto sujeito para dar
lugar ao capital, maior do que todos os sonhos idílicos. Mesmo assim os conflitos não cessam
de se inscrever pelas demandas identitárias inscritas nas suas raízes.
183
Vale destacar que estas e outras contradições necessitam de maiores elementos para
seu aprofundamento. Não podemos ficar somente com a avaliação de pior, inferior, melhor e
superior (MUNANGA, GOMES, 2005, p. 218). Se assim fosse, não teríamos jovens saindo
do seu território e estabelecendo mediações para a manutenção do vínculo com o campo ou
outra cidade deixada por ele.
184
SEÇÃO V
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Fonte: Visões da Juventude da Floresta (2016, p. 66).
A imagem apresenta uma aliança feita com as mãos de jovens do campo, das águas e
das florestas. Um conjunto de 5 pares de mãos unidas de forma que o polegar de um é
segurado na palma da mão do outro. O ângulo da imagem – de cima para baixo – nos
possibilita visualizar diferentes cores nas roupas, nas sandálias e na pele do/as jovens, assim
como um laço de papel celofane verde e outro rosa enlaçados ao pulso de duas jovens.
“É circular a imensidão, é circular...
É circular a palma da mão, é circular...
A solidão, o silêncio, a partida,
O sim e o não,
O cordão grão da vida e a missão,
185
De chegada e saída,
É circular...”
(Camila Costa)
A música ―É circular‖ citada acima nos desperta para as circularidades da vida, desde
a imensidão, passando pela palma da mão, o sim e o não, mas também as chegadas e saídas.
Podemos dizer que nosso intento de pesquisar é circular? Creio que em alguma medida sim.
Ao pesquisar nos lançamos na busca de responder perguntas e ao findar a jornada percebemos
que as respostas encontradas trazem consigo outras muitas perguntas que emergiram na
caminhada.
É circular! É uma jornada por entre as curiosidades que nos movem, que nos instigam
e que, possam de alguma maneira frutificar, incidir em algum processo e/ou grupo social. Na
reta de chegada da tarefa proposta para a tese retomamos as perguntas iniciais: O que
pesquisar? Como? Por que? Para quem?
Esses questionamentos nos desafiaram ao longo de todo o processo de elaboração, e
em cada momento e a cada linha de produção escrita e reescrita emergiram novas dúvidas. De
fato é uma constante construção e reconstrução de conhecimentos inundados de sentimentos e
subjetividades os quais nos movem, comovem... e nos colocam em marcha.
No início dessa trajetória desafiadora de elaboração de uma tese de doutorado nos
propusemos a buscar respostas ao questionamento: quais as representações sociais dos Jovens
da Reserva Extrativista do Rio Cajari (RESEX-CA) sobre a sua escolarização no sistema
modular de ensino (SOME) e as implicações no seu projeto de vida? No intuito de respondê-
lo, elaboramos o seguinte objetivo Geral - Compreender as representações sociais dos jovens
da Reserva Extrativista do Rio Cajari sobre a sua escolarização no sistema modular de ensino
e as implicações no seu projeto de vida, de modo que como objetivos específicos nos
propusemos a:
Identificar o perfil dos jovens da Reserva Extrativista do Rio Cajari matriculados no
Ensino Médio modular;
Caracterizar as imagens e os sentidos dos jovens sobre a sua escolarização no sistema
modular de ensino;
186
Destacar as objetivações e as ancoragens que compõe as representações sociais de
jovens sobre a sua escolarização no sistema modular de ensino;
Verificar as implicações das representações sociais nos seus projetos de vida.
Na perspectiva de responder ao primeiro objetivo específico, destacamos que o perfil
dos jovens da RESEX-CA foi identificado por meio das informações prestadas pelos
estudantes do Ensino Médio das escolas pesquisadas. Sabemos que são jovens entre 15 e 26
anos que se identificam em sua grande maioria como Agricultores Familiares, mas se
observarmos com maior atenção, podemos afirmar que há uma diferença significativa nas
identidades do Alto e Baixo Cajari que se manifesta nas menores frequências de resposta,
porém, trazem as marcas das atividades produtivas das suas respectivas regiões: no Alto
Cajari – região de floresta - temos um grupo significativo de jovens que se identificam como
extrativistas, os quais estão diretamente ligados ao trabalho com a castanha, enquanto a
totalidade dos jovens que se identificam como pescadores vive no Baixo Cajari – região do
estuário do Rio Amazonas.
Além disso, os/as jovens do nosso estudo se auto reconhecem pardos, são, em geral,
solteiros, metade se definem como católicos e a outra metade evangélicos. Possuem famílias
numerosas e, na maioria dos casos, não participam da gestão das unidades produtivas e
consequentemente não participam de organizações sociais.
A não participação na gestão e decisões das unidades produtivas e nas organizações
reafirmou o indício de que ambas as situações estão relacionadas, ou seja, ambas são
responsabilidades dos adultos de modo que os/as jovens não são considerados sujeitos desse
processo. Estudos como os de Stropasolas (2011), Weisheimer (2005) e Reis (2017) apontam
essa problemática em estudos anteriores como um dos elementos que interferem na
elaboração de projetos de migração de jovens do campo, das águas e da floresta em busca de
oportunidades de autonomia na cidade. Nas circularidades dos caminhos da pesquisa essa
questão emerge como uma das possibilidades de aprofundamento em estudos posteriores.
No que se refere as imagens e sentidos dos/as jovens sobre sua escolarização no
SOME, foram articuladas quatro temáticas que emergiram em nosso agrupamento de
unidades de sentido, são elas:
A) Educação base de tudo – essa temática possui em seu bojo a ideia de que ser
alguém na vida, no sentido de alcançar maior qualidade de vida, realização de sonhos e
projetos passa pelo acesso à escola enquanto instituição detentora do conhecimento, os/as
187
jovens depositam todas as suas crenças e esperanças de futuro na escola que aparece como
uma instituição importante, ou seja, a única capaz de proporcionar uma vida melhor.
A questão posta está nas possibilidades e limites das instituições escolares de
transformar vidas de maneira linear e imediata, ou seja, para além do acesso à educação
existem outros inúmeros obstáculos contextuais e conjunturais impostos pela realidade
concreta do sistema capitalista em que estamos inseridos e que mantém e ampliam as
desigualdades sociais e o abismo que separa ricos e pobres.
Nesse sentido, a proposição de Escola do Campo construída desde 1999, destaca a
necessidade de que esta esteja articulada a um projeto educativo contextualizado com a
realidade onde se insere de modo que seja um espaço em que os/as jovens possam sentir
orgulho de quem são e de onde vem, não ingenuamente, mas com clareza dos problemas que
existem no campo e com disposição para enfrentá-los coletivamente.
B) Preparação para o futuro – nessa temática ficou evidenciada de maneira bastante
clara a preocupação dos/as jovens com o futuro e a percepção da escola como etapa
preparatória e/ou um diferencial que possibilita galgar novas oportunidades. Associado a essa
perspectiva, aparecem questões de fundo como o tipo de escola/educação que estão inseridos,
e, as expectativas de projeto futuro que em geral estão associadas a empregabilidade mesmo
entre os/as sujeitos que desejam permanecer no campo.
Além disso, emergem questões como a intenção de construir projetos de futuro que
incluem permanecer no campo, mas com uma profissão que não esteja vinculada a produção
de alimentos e/ou extrativismo e, o forte desejo de ser orgulho para os pais. Essa situação que
pode parecer contraditória e/ou paradoxal explicita o dilema vivenciado pelos/as jovens que
em grande medida é pautado pela visão da sociedade sobre o trabalho na agricultura, ou seja,
eles/as demonstram ter orgulho por serem filhos de agricultores e defenderem os valores
ligados ao campo ao passo que sentem receio de se assumir como tal em consequência da
visão estereotipada que define o rural como espaço do atraso e a cidade como ideal de
modernidade.
C) Superação de obstáculos/conquista – essa temática centralizou os desafios
enfrentados pelos/as jovens para acesso e permanência no Ensino Médio, com destaque para
os problemas específicos do SOME. Foram elencadas situações ligadas ao pouco tempo (50
dias) para aquisição de conhecimentos, conteúdo das disciplinas curriculares, problemas de
falta de professores, não cumprimento dos cronogramas, arranjos complicados para suprir
188
lacunas nos históricos escolares, problemas de infraestrutura, a ausência de energia elétrica 24
horas nas escolas, o transporte escolar, entre outros.
É importante mencionar que apesar de todas as montanhas a serem escaladas
(utilizando a metáfora da jovem Bacaba), os/as jovens apresentam as dificuldades em uma
perspectiva de superação e conquista, manifestam a importância do esforço pessoal e os
pequenos êxitos diários. Porém, não podemos romantizar as dificuldades enfrentadas pelos/as
jovens colocando no esforço pessoal e na falácia da meritocracia as possibilidades de
superação dos obstáculos, de modo inverso, é necessário fomentar e fortalecer os espaços de
organização social e as bandeiras de luta da Juventude do Campo, das Águas e das Florestas
que orientam a ação coletiva dessas Juventudes organizadas.
D) Escola e Território – a quarta e última temática que emergiu do agrupamento das
unidades de sentido trouxe como tônica a importância da escola nos territórios dos/as jovens.
As manifestações dos/as participantes ecoaram o desejo de um Ensino Médio ―regular‖, no
sentido de possibilitar melhor planejamento das atividades e maior inserção da escola na
realidade e na vida das comunidades.
Por outro lado, apesar de o SOME ser apresentado como única opção, foram
destacadas as suas vantagens com ênfase para o fato de possibilitar o acesso ao Ensino Médio
próximo de suas residências, construindo, assim, oportunidades de continuidade dos estudos
para os Jovens do campo, das águas e das florestas. Todavia, as manifestações oscilaram entre
o entendimento da escola no seu território ora como direito, ora como privilégio e frisaram
sua importância no sentido de tornar realidade seus projetos de vida.
No que tange as objetivações destacamos que estas denotam a importância atribuída
ao SOME por meio de representações positivas ao destacá-lo como: A) Base de Tudo; B)
Preparação para o Futuro; C) Superação de Obstáculos/conquista; D) Escola e Território,
enquanto as ancoragens enlaçadas às objetivações destacam a centralidade da educação, a
melhoria da qualidade de vida, a construção do projeto de vida; a busca pela universidade, o
emprego e a casa própria; nos atentam para os desafios do pouco tempo, das lacunas, da
descontinuidade e da infraestrutura; e nos chamam a atenção para o direito x privilégio,
natureza x sustento, as relações familiares e comunitárias e o módulo como única opção na
realidade atual dos/as jovens do RESEX-CA para acessar o Ensino Médio.
Nesse sentido, defendemos a tese de que a construção dos projetos de vida dos/as
jovens da Reserva Extrativista do Rio Cajari é implicada pelas suas representações sociais
189
sobre o Sistema de Organização Modular de Ensino, incidindo nas suas escolhas relacionadas
a permanência no campo, possibilidades de acesso ao ensino superior e melhorias na sua
qualidade de vida.
Visto que, os projetos de vida destacados pelos/as jovens incluem o desejo de ―se
formar‖, incluindo a profissão que desejam seguir, e, o objetivo de melhorar a sua vida e da
sua família, por meio do acesso a Universidade, emprego e aquisição de bens o que passa
necessariamente pelo acesso e permanência no Ensino Médio, que só é possível para a
maioria dos/as Jovens do nosso estudo por meio do SOME.
Diante do exposto, é fundamental salientar que nosso estudo não se esgota aqui, uma
vez que outros desdobramentos e aprofundamentos são possíveis, porém, consideramos que o
mesmo aponta respostas ao que se propôs investigar. Além disso, as circulares chegadas e
saídas abrem sempre novas possibilidades de investigação, novos questionamentos e
problematizações.
Por fim, destacamos que a possibilidade de saída do doutorado é também de chegada
em novas jornadas enquanto pesquisadora. Desse modo, brindamos na poesia, no timbre, no
tom de Camila Costa com a crença de que ―É circular a folha no vento... É circular! É circular
o tamanho do tempo... É circular! O novo, a mãe, coração, som da vida e o girassol, a leitura
do disco e a visão da maior das estrelas, é circular!‖
190
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WEISHEIMER, Nilson. Juventudes rurais: mapas de estudos recentes. Brasília: Ministério
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200
APÊNDICES
201
APÊNDICE 1 – QUESTIONÁRIO
202
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
Prezado(a) Jovem(a),
Convidamos você para participar da pesquisa intitulada Juventude e Educação no Campo na
Amazônia: trajetórias construídas nas reservas extrativistas do Amapá, que tem como objetivo analisar as
representações sociais de jovens sobre o Ensino Médio modular e as implicações em seu projeto de vida.
Esperamos com esse estudo contribuir com as pesquisas e produções sobre o acesso e permanência dos/as jovens nos
processos de escolarização formal e as opções em permanecer ou não no campo. Para sua realização, apresentamos esse
questionário - com questões que se subdividem em três partes:
I - Perfil sócio-econômico
II- Questões sobre a permanência no campo
III- Questões específicas sobre Projeto de Vida do Jovem
Informamos que todos os dados obtidos nesse formulário serão confidenciais. Nesse sentido,
nos comprometemos com o sigilo e discrição sobre suas informações.
Solicitamos que seja claro e sincero em suas respostas.
Agradecemos sua colaboração.
Respeitosamente,
Débora Mate Mendes (Estudante de Doutorado)
E-mail: [email protected] – telefone: (96) 984041077
Profa. Dra. Ivany Pinto (Orientadora)
E-mail: [email protected] - telefone: (91) 99333-9714
_____________________________________________________________________
I - PERFIL SÓCIO-ECONÔMICO
1) Qual a sua Comunidade?_______________________________________________
2) Qual a série que você estuda?:________________________________
203
3) Qual a sua idade _________________________________________________
4) Qual o seu sexo? *
(A) Feminino
(B) Masculino
(C) Outro: ____________________
5) Você se au to -r econh ece ?
(A) Branco(a)
(B) Pardo(a)
(C) Preto(a)
(D) Amarelo(a)
(E) Indígena
6) Você se auto-reconhece?
(A) Agricultor (a) Familiar
(B) Camponês
(C) Extrativista
(D) Pescador
(E) Ribeirinho
(F) Outro. Qual?____________________________________________
7) Qual a sua religião?
(A) Católica
(B) Evangélica
(C) Espírita
(D) Umbanda ou Candomblé
(E) Sem Religião
(F) Outro: ________________________
8) Qual seu estado civil?
(A) Solteiro(a).
(B) Casado(a)
(C) União estável
(D) Separado(a) / divorciado(a)
(E) Viúvo(a).
204
Possui Filhos? ______________________
9) Quantas pessoas compõe o seu grupo familiar
(A) 1 a 3
(B) 4 a 6
(C) 7 a 10
(D) Mais de 10
10) Qual a sua renda f a m i l i a r ?
(A) Até 1 salário mínimo
(A) De 1 a 3 salários mínimos.
(B) De 4 a 6 salários mínimos.
(C) De 7 a 9 salários mínimos.
(D) Acima de 10 salários mínimos.
11) A renda familiar é proveniente de quais atividades
(A) Produção agrícola
(B) Extrativismo
(C) Pesca
(D) Pecuária
(E) Aposentadoria
(F) Bolsa
(G) Funcionalismo público
(H) Outra. Qual? __________________________________
12) Quais são os principais produtos que geram renda para a família?
(A) Castanha
(B) Mandioca/farinha
(C) Macaxeira
(D) Hortaliças
(E) Outros. Quais? __________________________________________________
13) Como é realizada a gestão na unidade produtiva?
(A) Decisão do Pai
(B) Decisão dos homens
(C) Participação de toda a família nas decisões
(D) Pai e mãe
205
(E) Outra. Qual?______________________________________________________
14) Participa de alguma organização social?
(A) Grupo de Jovens
(B) Associação
(C) Cooperativa
(D) Sindicato
(E) Nenhuma
(F) Outra. Qual? _________________________________________________
15) Qual seu projeto futuro?
(A) Permanecer no campo
(B) Estudar e retornar para o campo
(C) Mudar para trabalhar na cidade
(D) Estudar e mudar para a cidade
(E) Outro. Qual?__________________________________________________________
II - QUESTÕES SOBRE A PERMANÊNCIA NO CAMPO
1. No seu ponto de vista, o Ensino Médio modular atende as necessidades dos/as jovens no atual
contexto? Comente.
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________
2. Quais os desafios que você enfrenta para estudar no Ensino Médio modular atualmente?
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
__________________________________________Quais os fatores que contribuem para você
permanecer no Campo e/ou mudar para a cidade?
______________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________________
____________________________________________
III- QUESTÕES ESPECÍFICAS SOBRE PROJETO DE VIDA DO JOVEM
206
1. Qual o seu Projeto de Vida?
___________________________________________________________________________
_______________________________________________________________
APÊNDICE 2 – ROTEIRO GRUPOS TRIANGULARES
207
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
Pergunta Geral: Como você (s) vê o SOME? O que você pensa sobre essa forma de ensino?
Como são as aulas?
Como é a organização da escola?
Você considera que é possível compreender bem os conteúdos nessa modalidade de ensino?
Qual a importância do SOME para você? E para as comunidades do Campo?
O que você pensa sobre a qualidade do ensino no SOME?
Como são as relações (professor-colegas-direção) no SOME?
Como é a sua comunidade?
O que você gosta e o que você não gosta no SOME? Porque?
Pergunta Geral 2: Qual o seu projeto de vida?
Qual a importância da Escola em seu projeto de vida?
Como você imagina construir seu projeto de vida?
Quais as suas motivações para seguir esse caminho?
Você vislumbra alguma dificuldade para realizar o seu projeto de vida?
208
APÊNDICE 3 – TCLE JOVENS
209
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
DOUTORADO ACADÊMICO EM EDUCAÇÃO
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
(Resolução 466/2012 do CNS)
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE JOVENS SOBRE O SOME E SUAS IMPLICAÇÕES NO SEU
PROJETO DE VIDA
Eu, DÉBORA MATE MENDES, estudante do Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal do Pará – UFPA, convido-lhe a participar como voluntário deste estudo
referente à tese de doutorado tendo como orientadora a pesquisadora Profª Drª Ivany Pinto
Nascimento. Ao aceitar, você será informante da pesquisa, respondendo a um questionário,
participando de um grupo triangular no qual será utilizado um roteiro, bem como a elaboração de um
desenho e posterior apresentação individual do mesmo. Durante o grupo triangular e a apresentação do
desenho será utilizado um aparelho de gravação de áudio e você estará permitindo a utilização dos
dados fornecidos para fins de análise. Você tem liberdade de se recusar a participar e ainda, de se
recusar a continuar participando em qualquer fase da pesquisa, sem qualquer prejuízo pessoal. Todas
as informações coletadas serão estritamente confidenciais, portanto, não existe a necessidade de
identificação, caso não deseje. Apenas a pesquisadora terá acesso às suas informações e após os
registros, o documento será arquivado por cinco anos e em seguida destruído. Sua participação nessa
pesquisa auxiliará na obtenção de dados que poderão ser utilizados para fins científicos,
proporcionando maiores informações e discussões que poderão trazer benefícios para a área da
Educação. Além disso, informo que os resultados deste trabalho poderão ser divulgados em revistas
científicas e em anais de eventos dessa natureza.
________________________________
Assinatura da pesquisadora responsável
_________________________
Assinatura do membro de pesquisa
Declaro que li as informações sobre a pesquisa e que estou devidamente esclarecido (a) a respeito do
conteúdo da mesma, e autorizo a publicação das informações que compartilhei.
Laranjal do Jari, _____/_____/_____
210
APÊNDICE 4 – TCLE PAIS OU RESPONSÁVEIS
211
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
DOUTORADO ACADÊMICO EM EDUCAÇÃO
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
(Resolução 466/2012 do CNS)
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE JOVENS SOBRE O SOME E SUAS IMPLICAÇÕES NO SEU
PROJETO DE VIDA
Eu, DÉBORA MATE MENDES, estudante do Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal do Pará – UFPA, solicito sua autorização para que seu/ua filho/a participe como
voluntário deste estudo referente à tese de doutorado tendo como orientadora a pesquisadora Profª Drª
Ivany Pinto Nascimento. Ao aceitar, seu/ua filho/a será informante da pesquisa, respondendo a um
questionário, participando de um grupo triangular no qual será utilizado um roteiro, bem como a
elaboração de um desenho e posterior apresentação individual do mesmo. Durante o grupo triangular e
a apresentação do desenho será utilizado um aparelho de gravação de áudio e você estará permitindo a
utilização dos dados fornecidos para fins de análise. Você tem liberdade de recusar a participação do
seu/ua filho/a, e ainda, de recusar que o mesmo continue participando em qualquer fase da pesquisa,
sem qualquer prejuízo pessoal a você ou ao seu/ua filho/a. Todas as informações coletadas serão
estritamente confidenciais, portanto, não existe a necessidade de identificação, caso não deseje.
Apenas a pesquisadora terá acesso às suas informações e após os registros, o documento será
arquivado por cinco anos e em seguida destruído. Sua participação nessa pesquisa auxiliará na
obtenção de dados que poderão ser utilizados para fins científicos, proporcionando maiores
informações e discussões que poderão trazer benefícios para a área da Educação. Além disso, informo
que os resultados deste trabalho poderão ser divulgados em revistas científicas e em anais de eventos,
livros ou capítulos de livro dessa natureza.
________________________________
Assinatura da pesquisadora responsável
_________________________
Assinatura do membro de pesquisa
Declaro que li as informações sobre a pesquisa e que estou devidamente esclarecido (a) a respeito do
conteúdo da mesma, e autorizo a publicação das informações que compartilhei.
Mazagão, _____/_____/