jurisprudência da sexta turma - o tribunal da cidadania · do artigo 171, caput, do cp, pela...
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Jurisprudência da Sexta Turma
Relator:
Impetrante:
Advogados:
Impetrada:
Paciente:
Assistente:
Advogado:
JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA
HABEAS CORPUS Nº 7.734 - RJ (Registro nº 98.0053049-5)
Ministro Fernando Gonçalves
José Carlos Amaral Kfouri
Arthur Lavigne e outros
595
Sétima Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado
do Rio de Janeiro
José Carlos Amaral Kfouri
Ricardo Terra Teixeira
José Mauro Couto deAssis
Sustentação Oral: José Mauro Couto de Assis (pelo assistente Ricardo Terra
Teixeira)
EMENTA: Habeas corpus - Difalllação - Lei de illlprensa
Trancalllento da ação penal- Illlpossibilidade.
1- O entendilllento pretoriano direciona-se no sentido de que a apre
ciação do elelllento subjetivo para fins de trancalllento da ação penal,
quando dependente de investigação probatória, salvo casos especialís
SilllOS, é tarefa reservada à instrução crilllinal ou llleSlllO, elll sendo o
caso, a ser debatida no recurso próprio, COlllO parece ser esta a hipótese
vertente, llláxillle elll sede de delito de illlprensa, onde há illlputação de
fato deterlllinado, cujo conteúdo estaria, in thesi, a ultrapassar os lilllites
da silllples inforlllação. Nestas circunstâncias, illlpróprio o relllédio he
róico.
2 - Ordelll negada.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta
Turma do SuperiorTribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas a seguir, por unanimidade, denegar a ordem. Votaram com o Relator
os Ministros Vicente Leal e Anselmo Santiago. Ausentes, por motivo de licença,
o Ministro William Patterson e, ocasionalmente, o Ministro Luiz Vicente
Cernicchiaro.
RST], Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
596 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE]USTIÇA
Brasília-DF, 24 de novembro de 1998 (data do julgamento).
Ministro VICENTE LEAL, Presidente.
Ministro FERNANDO GONÇALVES, Relator.
Publicado no DJ de 14.12.98.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES: Trata-se de ordem de habeas corpus, substitutiva de recurso ordinário, impetrado em favor de José Carlos Amaral Kfouri contra acórdão da Sétima Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro que guarda a ementa seguinte:
"Habeas corpus. Falta de justa causa. Nulidade da sentença.
Havendo necessidade de exame das provas colhidas no processo, não
será declarada falta de justa causa para a ação penal, na via estreita do habeas corpus.
É nula a sentença que, em ação penal privada, depois das alegações finais apresentadas pelo querelante e, após, parecer do Ministério Público que postula a condenação do querelado, não se abre vista a este." (fi. 74)
Segundo as razões da inicial estaria o paciente, conceituado colunista da imprensa brasileira, a sofrer indevido constrangimento, em função de decreto condenatório na ação penal privada que lhe move o presidente da Confederação Brasileira de Futebol, Sr. Ricardo Teixeira, em curso perante a 36ª Vara Criminal do Rio de Janeiro. Em verdade não haveria justa causa para a actio, cuja peça de ingresso não descreve qualquer fato típico, porquanto o paciente, em decorrência de entrevista publicada no jornal "O Dia", onde o presidente da CBF, a ele se referindo disse não falar com bandidos, defendeu-se, com utilização do consagrado direito de resposta, verbis:
"Ele disse que não fala com bandidos como eu. Prefere trocar beijos com Castor de Andrade. Por que não explica à polícia da Flórida o que fazia seu BMW 3251, preto, conversível, ano 95, chapa BDN930, chassis WBABJ6327SJD41897, no acidente que matou ajovemA.A.C. no dia 13 de outubro do ano passado?" (fi. 5)
Daí, prossegue o articulado vestibular, o processo por crimes de injúria e
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difamação, sendo certo que, também o paciente, ofereceu queixa-crime contra o Sr. Ricardo Teixeira. Os fatos, na realidade, como já assinalado, não seriam nem injuriosos nem difamatórios, mas, surpreendentemente, ao se defender o paciente foi condenado e o agressor absolvido.
Houve, finaliza o impetrante, apenas direito de resposta, assegurado pela Constituição Federal, proporcionalmente ao agravo sofrido (art. 5Q
, X). Revide imediato, excludente do crime.
Nas informações o eminente 1 Q Vice-Presidente do Tribunal de Justiça, Desembargador Miguel Pachá, por cópia, encaminha o inteiro teor do acórdão impugnado.
A douta Subprocuradoria Geral da República, através do Dr. Antônio Augusto César, opina pela denegação da ordem.
Pelo despacho de fi. 83 foi concedida liminar sustando o curso da ação penal, até ulterior deliberação desta Superior Corte.
Faz-se mister esclarecer que o Sr. RicardoTerraTeixeira, opondo-se à concessão da ordem, requereu sua intervenção na qualidade de assistente, haja vista precedente do STF no Agravo Regimental em Petição nO 423-SP RTJ 136/1034 (Tribunal Pleno - 26.04.91 - ReI. o Min. Sepúlveda Pertence). Com vista às futuras publicações (fi. 238) foi determinada a anotação dos nomes dos signatários do pedido que está às fis. 88/89.
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES (Relator): A presente impetração, ao contrário daquela manejada perante a Sétima Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, onde a sentença foi anulada parcialmente, apenas para propiciar a fala do paciente acerca do pedido de sua condenação pelo Ministério Público, restringe-se ao trancamento da ação penal por falta de justa causa, posto que os termos utilizados, no exercício do direito de resposta, tiveram o caráter exclusivo de revide à expressão "não falo com bandidos" .
Quanto a este pleito - trancamento por falta de justa causa - destacou o tribunal a quo:
"Este último pedido envolve mérito, dependendo de provas que, às vezes, só os autos revelam, fato este, que torna difícil, em via estreita do habeas corpus, uma decisão equilibrada e justa, devendo ser sustentada
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em alegações finais ou no recurso próprio, para que, reconhecida a falta de justa causa, venha, o paciente, conseguir uma decisão absolutória." (fi. 190)
Efetivamente, não se apresenta como adequada a estreita via do habeas corpus ao deslinde da questão, consistente na demonstração da falta do elemento subjetivo, ou mesmo aquilatar a eventual ou não exacerbação do revide ex
presso nos dizeres utilizados como possível defesa (animus deffendendi).
A leitura dos textos reputados difamatórios não deixam evidenciar - ictu oculi - fato atípico, exigindo a quaestio maiores indagações. De outro lado, o entendimento pretoriano se direciona no sentido de que a apreciação do ele
mento subjetivo para fins de trancamento da ação penal, quando dependente de investigação probatória, é tarefa - salvo casos especialíssimos - reservada à
instrução criminal, ou mesmo, em sendo o caso, a ser debatida no recurso pró
prio, como parece ser esta a hipótese vertente, máxime em sede de delito de imprensa, onde há imputação de fato determinado, ou, na dicção do Ministro
Luiz Vicente Cernicchiaro (REsp nº 26.620-1), de "acontecimento histórico, identificável, pois, no tempo e no espaço", cujo conteúdo estaria in thesi, a
ultrapassar os limites da simples informação. Mostra-se o remédio heróico incapaz desta verificação que, a toda evidência - reclama investigação probatória.
N ego a ordem.
VOTO-VISTA
o SR. MINISTRO ANSELMO SANTIAGO: Cuida-se de writ em que se pretende ver acolhida a falta de justa causa, com o conseqüente trancamento da
ação penal, sob os seguintes fundamentos:
a) o querelado teria se valido, tão e simplesmente do direito de resposta, em virtude de entrevista concedida pelo querelante a determinado periódico, onde teria sido chamado de "bandido";
b) as frases tidas como ofensivas, assim não o seriam.
Penso que não se discute o direito de resposta, mas é inegável que deve ser proporcional à ofensa, guardando relação com o teor da entrevista, sob pena de se responder pelo excesso no retruque, ou seja, - "Deve cingir-se à reposição da
verdade sobre os fatos narrados no escrito incriminado, não se prestando ao revide e muito menos a uma contundência muito mais intensa que aquela en
contrada na publicação respondida". (RT 705/348)
No caso, o querelado, além da retorsão, teria difamado o querelante, o que configura o ilícito até mesmo sendo verdadeiro o fato imputado, pois o que
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basta é ser ele desabonador (TACRIM/SP, Rec. nº 769.037, ReI. Juiz Carlos
Bueno).
Agora, como bem ressaltado pelo nobre relator, se houve excesso doloso, indo a resposta muito além do que devia, é questão que não pode ser solvida nos
estreitos limites do xnandaxnus, pois demandaria o reexame da prova.
Com tais considerações, acompanho o Sr. Relator.
Relator:
Impetrante:
Impetrado:
Paciente:
HABEAS CORPUS NQ 8.179 - GO (Registro nº 98.0086927-1)
Ministro Vicente Leal
Aparecido Cavilha Gomes
Desembargador-Relator da Revisão Criminal nº 9701074106 do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás
Omilton de Souza Morais (preso)
EMENTA: Processual Penal- Habeas corpus - Citação por editalIntixnação pessoal da sentença condenatória - Alegação de nulidades -Ixnprocedência - Exnendatio libelli - Furto xnediante fraude.
- Não há cerceaxnento de defesa por nulidade da citação ou por intixnação da sentença condenatória, axnbos efetuados por edital, se aquela foi precedida de adequada diligência, por via de carta precatória, no endereço indicado pelo réu no inquérito policial, sendo certificada a ixnpossibilidade de sua citação pessoal, de paradeiro ignorado e que perxnaneceu ausente durante todo o processo.
- Conforxne o autoriza o art. 383 do Código de Processo Penal, pode o juiz, ao proferir a sentença condenatória, conferir ao fato descrito na denúncia definição jurídica diversa daquela que lhe deu o Ministério Público, xnesxno que tenha que aplicar sanção xnais severa.
- No crixne de estelionato a fraude antecede o apossaxnento da coisa e é causa para ludibriar sua entrega pela vítixna, enquanto no furto qualificado pela fraude, o artifício xnalicioso é exnpregado para iludir a vigilância ou a atenção.
- Ocorre furto xnediante fraude e não estelionato nas hipóteses de subtração de veículo posto à venda xnediante solicitação ardil de teste experixnental ou xnediante artifício que leve a vítixna a descer do carro.
- Habeas corpus denegado.
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
600 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, denegar a ordem, na conformidade dos votos e notas taquigráficas a seguir. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Fernando Gonçalves e Hamilton Carvalhido. Ausentes, por motivo de licença, o Sr. Ministro William Patterson e, justificadamente, o Sr. Ministro LuizVicente Cernicchiaro.
Brasília-DF, 27 de abril de 1999 (data do julgamento).
Ministro VICENTE LEAL, Presidente e Relator.
Publicado no DJ de 17.05.99.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO VICENTE LEAL: Aparecido Cavilha Gomes, servidor da penitenciária "Dr.Alberto Brocchieri" impetrou ordem de habeas corpus em favor de Omilton de Souza Morais, denunciado como incurso nas sanções do artigo 171, caput, do CP, pela prática do crime de estelionato simples, contra o v. acórdão do egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, que julgou improcedente pedido de revisão criminal de sentença que condenou o paciente revel à pena de 4 (quatro) anos de reclusão, por infração ao artigo 155, § 4º, II, do Código Penal.
Na peça exordial, pugna o impetrante pelo reconhecimento da nulidade do processo e, de conseqüência, pela decretação da prescrição da pretensão executória, alegando, em síntese, as seguintes razões: (a) prematuridade da citação editalícia, quando era de rigor a citação do acusado por carta precatória, que se encontrava recolhido à Casa de Detenção "Dr.Antônio Dutra Ladeira", no Estado de Minas Gerais, e sua requisição para o interrogatório; (b) inviabilidade da decretação da revelia, porquanto retificada a capitulação do fato descrito na denúncia; e (c) inexistência do trânsito em julgado da sentença condenatória, por falta de intimação pessoal do paciente, que se encontrava preso, à época de sua publicação, desde 3 de fevereiro de 1987.
Prestando informações, o ilustre Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás noticia os fatos que ensejaram a presente impetração, anexando cópia das principais peças extraídas dos autos da revisão criminal. (fls. 30/31)
A douta Subprocuradoria Geral da República em parecer da lavra do ilustre Subprocurador-Geral Henrique Fagundes, opina pela concessão da ordem, para que seja declarada a nulidade da sentença condenatória, tendo em vista a
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JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA 601
ocorrência da Inutatio libelli, e, de conseqüência, pela decretação da pretensão punitiva. (fls. 49/58)
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO VICENTE LEAL (Relator): Conforme anotado no relatório, o presente habeas corpus ataca acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás que julgou improcedente pedido de revisão criminal em que se postulava a desconstituição de sentença que condenou o paciente à pena de quatro anos de reclusão, por infração ao artigo 155, § 4º, II, do Código Penal.
E a pretensão deduzida encontra-se escorada nos seguintes fundamentos: (a) nulidade do edital de citação e da decretação da revelia, por ausência de extração de carta precatória para a citação do paciente que se encontrava recolhido à prisão na Casa de Detenção "Antônio Dutra Ladeira", o que impunha sua requisição para o interrogatório; e (b) desconstituição do trânsito em julgado da sentença condenatória, pela falta de intimação pessoal do condenado.
Após detida análise dos autos tenho que a pretensão não merece agasalho.
Examinando-se a situação de fato sob enfoque, verifica-se que o ilustre
Juiz de Direito da 3ª Vara Criminal da Comarca de Goiânia processante ordenou a expedição de carta precatória para determinar a citação e o conseqüente interrogatório do paciente, no seguinte endereço por ele fornecido: Rua Martin Mermejo, n Q 46, Sertãozinho-SP (fl. 13).
E o Oficial de Justiça responsável pelo cumprimento da precatória certificou que realizou diligência no citado local em 22 de dezembro de 1983, sem conseguir qualquer notícia do paradeiro do réu, que se encontrava em local incerto e não sabido. E, como é sabido, as certidões de oficial de justiça gozam de fé pública, somente ilidível por prova em contrário.
Em face disso, foi citado por edital, publicado no Diário da Justiça de 23 de julho de 1986, com circulação em 29 de julho, cujo prazo também transcorreu in albis, em face do que foi decretada a sua revelia em 22 de agosto de 1986 (fls. 16/17).
Assinale-se, conforme consignado no acórdão que julgou improcedente a revisão criminal e reiterado no parecer do representante federal do Parquet, que à época em que a citação por edital foi ordenada não havia qualquer notícia nos autos de que o paciente encontrava-se preso em Bauru-SP, circunstância essa que somente foi trazida a conhecimento após o trânsito em julgado da sentença condenatória, publicada em cartório em 17 de setembro de 1991.
RSTJ, Brasília, a. lI, (119): 593-661, julho 1999.
602 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
A propósito, registre-se excerto contido no aresto impugnado, in verbis:
"Conforme se depreende das folhas dos autos originários, não foi possível proceder-se à citação do réu, via precatória, no endereço fornecido por ele, em Sertãozinho-SP, ainda na fase policial do processo Cfl. 13), certificando o Oficial de Justiça encarregado da diligência, encontrar-se, aquele, em "loca 1 incerto e não sabido" Cfl. 48).
Em conseqüência, foi ele citado por edital, publicado no Diário da Justiça nº 9.905, de 23 de julho de 1986, com circulação em 29 de julho de 1986, e, não comparecendo para audiência de qualificação e interrogatório, decretou-se-Ihe a revelia, com nomeação de defensor Cfl. 61).
Permaneceu revel durante todo o curso da ação, até a intimação da sentença condenatória pela mesma via editalícia Cfl. 98). Só depois do trânsito em julgado da referida sentença é que veio ter, aos autos, a notícia de que o ora requerente encontrava-se preso em Bauru, Estado de São Paulo Cfl. 105) . Nenhuma afirmação nesse documento de que à época do interrogatório que seria para 16.08.96 estivesse cumprindo pena. De concreto só há informação que em 18.11. 96 estava o requerente preso em Bauru, mas não em 18.08.86 quando o interrogatório deveria se realizar." Cfls. 41 e 42).
Assim, é de se reconhecer que a citação por edital foi efetuada segundo os regramentos próprios, não se detectando nesse ato processual qualquer nulidade nem qualquer afronta ao direito de defesa, pela nomeação de seu defensor dativo.
Em razão disso, não procede a pretensão de nulidade do processo pela prematura decretação da revelia e pela ausência de requisição do réu, sendo irrelevante a questão da retificação da capitulação dada ao fato pelo Ministério Público nas alegações finais.
Da mesma forma, não merece agasalho a pretensão de desconstituição do trânsito da sentença condenatória por ausência de intimação pessoal do condenado.
Acentue-se que o Código de Processo Penal, ao dispor no art. 392 sobre a intimação de sentença, proclama que ela deve ser feita ao réu, pessoalmente, e ao defensor por ele constituído, quando se livrar solto ou, sendo afiançável a infração, tiver prestado fiança.
Todavia, conforme já exaustivamente anotado, na hipótese sub examen o réu revel permaneceu ausente durante todo o processo, o que justificou sua intimação da sentença condenatória por edital, dispensando a intimação pessoal na forma assegurada no Estatuto Punitivo.
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
]URISPRUDÊNCIADA SEXTATURMA 603
Por derradeiro, data venia, não procede a alegação suscitada no parecer
do ilustre Subprocurador-Geral da República de que o magistrado monocrático,
ao proferir sentença condenando o réu pela prática de furto mediante fraude, afastou-se dos limites da acusação pelo crime de estelionato simples, como ex
posto na denúncia.
Para o deslinde do tema, impõe-se o exame do teor da peça de acusação.
O paciente foi denunciado como incurso nas sanções do artigo 171, caput, pela prática de crime de estelionato simples, por haver, sob o pretexto de se mostrar interessado na compra do automóvel Passat da Volkswagen anunciado,
solicitado ao proprietário permissão para testar o veículo, oportunidade em que, em companhia e sob a vigilância de seu filho adolescente, subtraiu-o do
patrimônio da vítima.
Ainda segundo a denúncia, o paciente, quando se viu desacompanhado, aproveitou-se do momento em que o menor desceu do veículo para abandoná-lo
na estrada e evadir-se do local.
Na sentença, o ilustre Juiz de Direito, após concluir pela existência do
crime de furto qualificado pela fraude, fez consignar, verbis:
"Realmente, não se trata de estelionato, mas de furto mediante frau
de, que se consubstancia no engodo levado a efeito pelo acusado, quando
pediu para experimentar o carro, a pretexto de fechar o negócio, deixando o menor abandonado na estrada, justamente quando abria a porteira a seu pedido. Entende-se que, neste caso não se aperfeiçoou o crime de estelionato,
que exige outros elementos para integração do tipo; a despeito disso, o
fato foi razoavelmente descrito na denúncia, apenas com erro na capitulação legal.
O fato é típico, como furto qualificado pela fraude e subsume no art.
155, § 4º, inciso II, do Código Penal." (fl. 24).
Confrontando-se o teor da acusação e o dispositivo da sentença condena
tória, verifica-se, sem qualquer dúvida, que inocorre a alegação de cerceamento de defesa, por ausência de correlação entre a denúncia e o decreto condenatório.
Não houve mutatio libeUi. A denúncia noticiou a ocorrência de furto de veículo que se encontrava à venda, cedido ao acusado em virtude de sua manifesta
ção de interesse para que fosse previamente experimentado. E a vigilância do
veículo conferida pelo proprietário ao filho menor, determinou o emprego de
fraude para iludir o menor a descer do carro a fim de que o réu pudesse empreender a fuga e consumar a subtração.
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
604 REVISTADO SUPERIORTRIBUNALDEJUSTICA
Ora, no crime de estelionato a fraude antecede o apossamento da coisa e é causa para ludibriar sua entrega pela vítima, enquanto no furto qualificado pela
fraude, o artifício malicioso é empregado para iludir a vigilância ou a atenção,
figura que se concretiza nas hipóteses de subtração de veículo posto à venda
mediante solicitação ardil de teste experimental ou mediante artifício que leve a
vítima a descer do carro.
Em face dessas considerações, agiu o magistrado nos precisos limites do
art. 383 do Código de Processo Penal, que autoriza o juiz a dar ao fato definição
jurídica diversa daquela constante da denúncia, mesmo que tenha que aplicar
sanção mais severa. É que, segundo o pensamento consolidado na doutrina e na
jurisprudência, o acusado defende-se dos fatos e na classificação legal inscrita
na denúncia.
A propósito, merece registro o magistério do ilustre jurista Vicente Greco
Filho, mencionado no voto-condutor do acórdão denegatório do writ originá
rio:
"Pode-se dizer que a única classificação definitiva é que se estabili
zou com o trânsito em julgado da sentença; as demais são provisórias e
podem ser modificadas na decisão seguinte. Desde que os fatos sobre os
quais incide sejam sempre os mesmos, a alteração da classificação independe
de qualquer providência ou procedimento prévio, inexistindo nisso qualquer cerceamento de defesa ou surpresa, porque o acusado defende-se de
fatos e não da classificação legal, ainda que o juiz deva aplicar pena mais
elevada em virtude da nova classificação". (Manual de Processo Penal,
Saraiva, 1991,p. 287).
Assim, não ocorreu o alegado cerceamento de defesa, nem a ll1.utatio libelli
alegada, o que afasta, no particular, qualquer nulidade na sentença.
Em face de todo o exposto, denego o habeas corpus.
É o voto.
RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 7.590 - SP (Registro nº 98.0031744-9)
Relator: Ministro Vicente Leal
Recorrente: Chung Kwo Tzuo
RST}, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
Recorrido:
Paciente:
Advogados:
JURISPRUDÊNCIADASEXTATURMA
Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo
ChungKwoTzuo
Antônio Ferro Ricci e outro
605
EMENTA: Penal- Processual Penal- Habeas corpus - Ação penalQueixa-crillle - Ausência de justa causa - Crillle contra a propriedade illlaterial - Concorrência desleal - Exallle pericial - Desnecessidade -CPP, artigo 325 - Prazo decadencial - CPP, artigo 38 - Alegação de atipicidade do fato - Ausência do elelllento subjetivo do tipo - Exallle de prova - Illlpropriedade.
- Seja o Código de Processo Penal, seja o Código de Propriedade Industrial exigelll, nos crillles contra a propriedade illlaterial que deixalll vestígio, COlllO pressuposto à adlllissibilidade da queixa-crillle, a prévia cOlllprovação da lllaterialidade do ilícito pelo exallle de corpo de delito.
- Elll sede de crillle de concorrência desleal, que se conSUllla selll
deixar vestígios, a realização prévia de perícia não é indispensável à propositura da ação, incidindo o prazo decadencial de seis llleses do direito de queixa expresso na regra geral do artigo 38 do estatuto processual, contado do dia elll que o ofendido vier a tomar conhecilllento do autor do crillle.
- O trancalllento de ação penal por falta de justa causa, postulado na via estreita do habeas corpus, SOlllente se viabiliza quando, pela lllera exposição dos fatos na denúncia, se constata que há illlputação de fato
penallllente atípico ou que inexiste qualquer elelllento indiciário delllonstrativo da autoria do delito pelo paciente.
- Para a descaracterização do elelllento subjetivo do tipo previsto no artigo 195, lU, da Lei de Propriedade Industrial, é illlperativo o exallle de questão de fato controvertido, especificalllente no que tange à alegação de ter sido o paciente induzido em erro quanto à titularidade da patente requerida por informações prestadas por funcionários do Instituto N acionaI da Propriedade Industrial, e por isso o tellla situa-se fora do alcance do habeas corpus, que não é instrulllento processual próprio para se obter sentença de absolvição sUlllária.
- Recurso ordinário desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta
RSTJ, Brasília, a. lI, (119): 593-661, julho 1999.
606 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao
recurso,na conformidade dos votos e notas taquigráficas a seguir. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Fernando Gonçalves e Hamilton Carvalhido. Ausentes, por motivo de licença, o Sr. Ministro William Patterson e,
justificadamente, o Sr. Ministro LuizVicente Cernicchiaro.
Brasília-DF, 27 de abril de 1999 (data do julgamento).
Ministro VICENTE LEAL, Presidente e Relator.
Publicado no DI de 24.05.99.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO VICENTE LEAL: Os advogados Antônio Ferro Ricci
e José Eduardo Brochi impetraram ordem de habeas corpus em favor de
Chung Kwo Tzuo, contra quem foi ajuizada queixa-crime, imputando-lhe a
prática do crime previsto no artigo 195, XIII, da Lei n Q 9.729/96 - Lei de Propriedade Industrial, sob acusação de concorrência desleal.
Nas razões de impetração, são deduzidos os seguintes fundamentos: a)
decadência do direito de queixa; b) ausência de realização da medida de busca e
apreensão na empresa do querelado, essencial na hipótese de crime contra a
propriedade imaterial; c) extensão ao paciente dos efeitos da renúncia no oferecimento da queixa-crime contra seu outro sócio; e d) atipicidade da conduta,
pela ausência do dolo, elemento subjetivo do crime contra a propriedade industrial.
A egrégia Décima Quinta Câmara do Tribunal de Alçada Criminal do
Estado de São Paulo denegou a ordem, rechaçando a alegação de decadência do
direito de queixa, já que seu marco teve início em abril de 1997, quando o
querelante tomou conhecimento da inexistência da patente do produto que o
paciente alegou ser titular. Proclamou, ainda, que a ausência do dolo deve ser
comprovada na ação penal competente, ocasião em que deverão ser provas soli
citadas pelas partes, ao reconhecer a presença dos elementos indiciários do cri
me de concorrência desleal. (fls. 90/94)
Irresignados, os impetrantes interpõem o presente recurso ordinário,
reeditando os mesmos argumentos da inicial e postulando a reforma do aresto
para se determinar o trancamento da ação penal pela não-configuração do dolo.
Reafirma a tese de decadência do direito de queixa e de ausência da materialidade
do crime pela não-realização do exame pericial preliminar. (fls. 97/106)
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
JURISPRUDÊNCIA DA SEXTATIJRMA 607
Apresentadas as contra-razões (fls. 109/110), o recurso foi admitido na origem, ascendendo os autos a esta Corte.
A douta Subprocuradoria Geral da República, em parecer de fls. 115/121, opina pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO VICENTE LEAL (Re1ator):A pretensão de trancamento da ação penal privada deduzida no presente recurso ordinário repousa nos seguintes fundamentos: a) ausência da comprovação do fato descrito na queixacrime pela não-realização de medida preliminar de busca e apreensão; b) decadência do direito de queixa; c) extensão ao paciente dos efeitos da renúncia ao direito de promover a ação penal contra o outro sócio; e d) ausência do dolo.
Não vejo como censurar o acórdão recorrido, não merecendo prosperar as alegações.
Acentue-se, por primeiro, que, via de regra, tanto o Código de Processo Penal quanto o Código de Propriedade Industrial exigem, nos crimes contra a propriedade imaterial que deixam vestígio, como pressuposto à admissibilidade da queixa-crime, a prévia comprovação da materialidade pelo exame de corpo de delito.
Todavia, o crime de concorrência desleal, por se consumar sem deixar vestígios, dispensa a prévia realização de perícia, podendo a materialidade ser comprovada por outros elementos produzidos durante o curso da ação penal.
A propósito, cite-se o seguinte precedente afirmativo desse entendimento, in verbis:
"RRC. Processual. Concorrência desleal. Queixa-crime. Figuras típicas. Habeas corpus. Recurso.
1. Não se exige prova pericial para o início da ação penal quando as figuras típicas são daquelas que não deixam vestígios. Caso destes autos.
2. Recurso conhecido mas improvido" (RRC nº 4.293-SP, Relator Min. Edson Vidigal, in DJ de 13.11.95).
Daí por que não se aplica à espécie o artigo 529 do CPP, regra especial que disciplina o prazo decadencial do direito de queixa nos crimes de ação privativa, cuja materialidade exige a realização de diligências preliminares de busca e apreensão e perícia, estipulado em 30 dias a partir da homologação do laudo.
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
608 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Assim sendo, na espécie posta sub judice, é de rigor a aplicação do prazo decadencial de seis meses do direito de queixa expresso na regra geral do artigo 38 do Estatuto Punitivo, contado do dia em que o ofendido vier a tomar conhecimento do autor do crime.
In casu, consta dos autos que o paciente, em maio de 1996, enviou correspondência endereçada à empresa Escala 7 Editora Gráfica, informando ter registrado perante o INPI, em abril de 1990, patente de protetores solares em papelão para automóveis, cuja industrialização por terceiros não autorizados assegura-lhe direito à indenização a ser fixada judicialmente.
Daí por que a empresa querelante procurou certificar-se junto ao INPI quanto à veracidade dos fatos narrados e à ilicitude da conduta a ela imputada, tomando conhecimento em abril de 1997 de que o pedido de privilégio requerido pelo paciente havia sido indeferido, tendo ajuizado a queixa-crime em julho de 1997.
Resta claro, pois, que a queixa-crime foi proposta quando ainda não escoado o prazo decadencial que, para fins do crime de concorrência desleal tipificado no artigo 195, lII, do Código de Propriedade Industrial, teve início quando a empresa querelante tomou conhecimento da inexistência da patente do produto que o querelado afirmava ser titular.
No que tange à pretensão de extensão ao paciente da renúncia do direito de queixa ao outro sócio em virtude do princípio da indivisibilidade da ação penal, tenho como incensuráveis as considerações contidas no bojo do parecer do representante federal do Parquet, cujo seguinte excerto é oportuno registrar, in verbis:
"De outra parte, quanto à suposta violação do princípio da individualização da ação penal, verifica-se que a missiva dirigida à empresa querelante, e que deu ensejo ao oferecimento da queixa-crime, encontra-se assinada apenas pelo paciente (fl. 29), assim como outros dados apresentados nestes autos só trazem o nome deste (fls. 28 e 38), nada estando a sugerir que tenha sido voluntária a falta de menção aos demais sócios do querelado, e por conseguinte, que tenha ocorrido renúncia tácita que se estenda a este, de maneira que ao membro do Parquet, que velará pela indivisibilidade da ação penal, é lícito promover o aditamento da queixa, nos termos dos artigos 45 e 48 do Código de Processo Penal" (fls. 119/120).
Correto o pronunciamento do Ministério Público, que adoto como razão de decidir.
De resto, tem-se consagrado de modo unissonante que o trancamento de
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA 609
ação penal por falta de justa causa, pela via estreita de habeas corpus, somente se viabiliza quando, pela mera exposição dos fatos se constata que há imputação
de fato atípico ou que inexiste qualquer elemento indiciário demonstrativo da autoria do delito pelo paciente. Se para o deslinde da questão é necessário o revolvimento da prova condensada no bojo dos autos, o tema situa-se fora do alcance do habeas corpus, que não é remédio próprio para se decretar a absol
vição sumária.
Ora, saber se o paciente foi efetivamente induzido em erro quanto à
titularidade da patente requerida por informações prestadas por funcionários do Instituto Nacional da Propriedade Industrial, é matéria que envolve investiga
ção fática.
Para o seu deslinde será necessária a busca de elementos de provas, o que se torna inviável no âmbito do habeas corpus.
À luz dessas considerações, não vejo como modificar o acórdão, que decidiu com acerto.
Isto posto, nego provimento ao recurso.
É o voto.
RECURSO EM HABEAS CORPUS NQ 7.968 - SP (Registro n Q 98.0072693-4)
Relator:
Recorrente:
Advogados:
Recorrido:
Paciente:
Ministro Fernando Gonçalves
Gelson Terkeli
Ary Almeida Ferreira e outro
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Gelson Terkeli (preso)
EMENTA: RHC - Prisão preventiva - Recurso em liberdade - Réu foragido.
1. Encontra amparo no art. 312 do CPp, o decreto de prisão preventiva, com impedimento de se aguardar em liberdade julgamento interposto contra sentença de pronúncia, que se ampara, além da extrema gravidade do crime, no fato de haver o acusado se evadido do distrito da culpa, após recebimento da denúncia, por 11 (onze) anos.
2. RHC improvido.
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
610 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DEJUSTICA
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao recurso. Votaram
com o Relator os Ministros Vicente Leal e Anselmo Santiago. Ausentes, por
motivo de licença, o Ministro William Patterson e, justificadamente, o Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro.
Brasília-DF, 19 de novembro de 1998 (data do julgamento).
Ministro VICENTE LEAL, Presidente.
Ministro FERNANDO GONÇALVES, Relator.
Publicado no DJ de 14.12.98.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES: Pronunciado por homicídio qualificado e formação de quadrilha, na comarca de Itapecerica da Serra - São Paulo - Gelson Terkeli, não obstante primário, com bons antecedentes, residência fixa e ocupação lícita, teve negado o direito de recorrer em liberdade, impetrando, conseqüentemente, habeas corpus, denegado pela Sexta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça ao fundamento de que, a par da gravidade dos crimes imputados, esteve foragido por mais de onze (11) anos, apenas se apresentando quando, já com prisão preventiva decretada, sobreveio a lume a sentença de pronúncia.
Inconformado, recorre a esta Superior Corte, invocando em seu favor a norma do art. 5º, LXVI, da Constituição Federal. Aduz - ainda - no essencial nunca haver perturbado a marcha processual e que se apresentou espontânea e voluntariamente. Não há, pois, motivo para a segregação, decretado porque o MM. Juiz teria sido levado a erro, no tocante a seus antecedentes, pois quem fora já condenado é seu irmão Gilson.
Oferecidas contra-razões (fls. 150/154), oficiou a douta Subprocuradoria Geral da República no sentido do improvimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES (Relator): O recorren-
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA 611
te, acusado da prática de homicídio doloso qualificado em concurso com o
crime de formação de quadrilha, teve sua prisão preventiva decretada, por
ocasião do recebimento da denúncia. Citado pessoalmente, deixou de comparecer ao interrogatório, tornando-se revel, somente se apresentando após de
corridos onze (lI) anos, circunstância assaz relevante e justificadora da manu
tenção da prisão como forma de garantir a aplicação da lei penal. Com efeito, proclama o Supremo Tribunal Federal, seguido por esta Corte, que a fuga do
acusado do distrito da culpa justifica a prisão preventiva. Ademais, como posto em destaque pelo v. acórdão, primariedade, residência fixa e ocupação lícita
não são dados suficientes, in casu, para justificar a concessão de liberdade, mesmo porque, além da decretação da custódia preventiva, o encarceramento
é efeito natural da pronúncia. Os outros co-réus, segundo noticiam os autos,
cumprem ou já cumpriram pena, pois desmembrado o processo, foram julga
dos e condenados. Este um elemento a mais a indicar a necessidade da prisão
do recorrente, pois para quem esteve foragido por onze (lI) anos, nada impe
de repita a dose por igualou superior período.
Não há indevido constrangimento. Nego provimento ao recurso.
RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 7.990 - MG (Registro nº 98.0073719-7)
Relator:
Recorrente:
Advogado:
Recorrido:
Paciente:
Ministro Fernando Gonçalves
Walter Lúcio de Lima
Walter Lúcio de Lima
Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais
Olavo Drummond
EMENTA: RHC - Penal- Crime de desobediência - Prefeito Muni
cipal- Não configuração.
1. Em princípio, diante da expressiva maioria da jurisprudência, o
crime de desobediência definido no art. 330 do CP só ocorre quando pra
ticado por particular contra a Administração Pública, nele não incidindo
a conduta do Prefeito Municipal, no exercício de suas funções. É que o
Prefeito Municipal, nestas circunstâncias, está revestido da condição de
funcionário público.
RSTJ, Brasília, a. lI, (119): 593-661, julho 1999.
REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL
2. Constrangimento indevido representado pela cláusula "sob pena de incidir em crime de desobediência à ordem judicial" corporificado em intimação para pagamento em 48 horas de vencimentos em atraso, não pleiteado em medida cautelar inominada, cujo provimento liminar, em segunda instância, assegura apenas a reintegração em cargo do qual foi o servidor demitido.
3. Recurso provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso. Participaram do julgamento os Ministros Vicente Leal, Luiz Vicente Cernicchiaro e Anselmo Santiago. Ausente, por motivo de licença, o Ministro William Patterson.
Brasília-DF, 29 de outubro de 1998 (data do julgamento).
Ministro VICENTE LEAL, Presidente.
Ministro FERNANDO GONÇALVES, Relator.
Publicado no DI de 30.11.98.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES: Cuida-se de recurso ordinário interposto contra acórdão da Câmara Especial do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais denegatório de ordem de habeas corpus impetrada em favor de Olavo Drummond que estaria a sofrer constrangimento indevido por ato do Juiz de Direito da Comarca de Araxá.
Segundo exame dos autos, o recorrente, na qualidade de Prefeito Municipal de Araxá, foi intimado para, em 48 horas, sob pena de ser processado por crime de desobediência (fls. 32), pagar os vencimentos e vantagens devidos aos servidores municipais por ele dispensados sob o fundamento de investidura irregular na função pública e reprovação no concurso público pertinente.
Não satisfeitos com o ato de demissão, revela a peça inaugural, os servidores manejaram ação cautelar inominada, obtendo junto à Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, liminar de reintegração nos respectivos cargos, com pronto acatamento pelo recorrente, salvo quanto aos estipêndios em atraso e aqueles referentes a março de 1998, dado que materializada a providência, no mês a este subseqüente.
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA 613
Nestas condições, ressaltam as razões de recurso, absolutamente ilegal a
advertência, porquanto o Prefeito Municipal não pode ser constrangido a pagar uma dívida sem discussão, frustrando-lhe o direito ao devido processo.
A douta Subprocuradoria Geral da República, por intermédio do Dr. José
Flaubert Machado Araújo, opina pelo provimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
o SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES (Relator): Servidores
públicos municipais, gozando in thesi de estabilidade provisória, pois com
ponentes da Diretoria do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais da
Prefeitura, Câmara e Autarquias de Araxá, tiveram seus contratos de trabalho
rescindidos (fIs. 14/19) porque não obtiveram a pontuação mínima necessária
à classificação no concurso público realizado pela Municipalidade em 20 de
julho de 1997.
O egrégio Tribunal de Justiça, provendo agravo de instrumento tirado em
autos de medida cautelar inominada, determinou a reintegração de todos os "seus respectivos cargos, até decisão final no feito principal" (fi. 23). O coman
do expresso no acórdão foi cumprido por ato do Prefeito Municipal, como faz
certo o Decreto nº 499, de 3 de abril de 1998, fi. 30. No entanto, mediante
requerimento dos interessados, no que pertine ao pagamento dos salários em atraso, bem como dos meses subseqüentes, o MM. Juiz de Direito determinou a intimação do recorrente para que implemente medidas necessárias à quitação
destas verbas, em 48 horas, "sob pena de incidir em crime de desobediência à
ordem judicial" - fi. 32. O egrégio tribunal, ao ~egar a ordem impetrada para
afastar o constrangimento corporificado na cláusula "sob pena de incidir em
crime de desobediência à ordem judicial", pelo voto do eminente Desembargador
Mercêdo Moreira, assevera que "Reintegração sem pagamento de vencimentos
não é reintegração. É nada." (fi. 66)
Data venia, de acordo com a tese articulada pelo douto parecer ministe
rial, não se pode escapar da verdade contida na afirmação de que pagamento de
atrasados em sede de ação cautelar inominada, carente ainda de comprovação do ajuizamento do feito, principal, "soa como medida precipitada", mesmo por
que (I) não há no pedido inicial, colacionado às fIs. 7/13, solicitação quanto a
esta providência e (II) nem a Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça, ao
prover o agravo tirado da decisão negatória da liminar, porque "continha natu
reza satisfativa" (fi. 38), abordou e decidiu acerca do tema relativo ao pagamen-
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
614 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
to de atrasados (fi. 23). A propósito, vale o registro de que o MM. Juiz, negando a liminar, invoca a Lei nº 8.437, de 1992 - art. 1 º, § 3º.
Por outro lado, o entendimento pretoriano se direciona, capitaneado pelo Supremo Tribunal Federal, no sentido de que o Prefeito Municipal, em princí
pio, quando no exercício de suas funções, não comete o crime do art. 330 do
Código Penal, capitulado entre os delitos praticados por particulares contra a
Administração Pública (BC nº 76.888-PI - STF - Relator o Min. Carlos Velloso,
29.09.98). De igual modo o Superior Tribunal de Justiça, em julgados
colacionados por Celso Delmanto, Código Penal Comentado, 4ª ed., Renovar,
1998, p. 563, ressalta que a "desobediência tem o particular como sujeito ativo;
o funcionário somente pratica esse delito, caso a ordem desrespeitada não seja
referente às suas funções" (BC nº l.390, BC nº l.322 e BC nº l.371) sendo, no
entanto, importante frisar que, a exemplo do STF, todos os julgados indicam, na hipótese gizada, eventual tipificação de outra infração penal.
De qualquer forma, in casu, o debate é restrito ao crime de desobediência que, em princípio, diante da expressiva maioria da jurisprudência como anotado, só ocorre quando praticado por particular contra a Administração, nele não
incidindo então a conduta do Prefeito Municipal no exercício de suas funções,
porquanto nestas circunstâncias revestido do conceito de funcionário público, STF - RHC nº 62.496 e STJ - REsp nº 50.486-4, in Código Penal Comentado, Celso Delmanto, 1998, p. 553.
Assim sendo, a toda evidência, a cláusula inserta na intimação de fi. 32,
referendada pelo tribunal a quo, sem qualquer sombra de dúvida, traduz constrangimento ilegal, perfeitamente reparável pela via do habeas corpus. Acres
ce-se - ainda - a norma do art. 29, VIII, da Constituição Federal e a possibili
dade do uso da ação própria.
Em conseqüência, dou provimento ao recurso ordinário.
VOTO
O SR. MINISTRO LUIZVICENTE CERNICCBIARO: Sr. Presidente,
a matéria é interessante. Estou de acordo com o eminente Ministro-Relator no
tocante à (!strutura do crime de desobediência. Efetivamente, só pode ser praticado por particular contra a administração, a teor do disposto no art. 330 do
Código Penal.
Parece-nos, entretanto, Sr. Presidente, ser írrita, sem nenhum efeito,
essa advertência do magistrado. Assim o é porque o Prefeito Municipal goza da
prerrogativa constitucional de ser processado e julgado por Tribunal de Justiça.
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA 615
Conseqüentemente, apesar do estardalhaço, da ameaça, Írrita é a advertência.
O caminho correto para eventual direito do servidor é o Judiciário.
Em razão dessas considerações, parece-me carecedor do direito da ação
proposta pelo Prefeito Municipal. E, por isso, embora a matéria não tenha
sido aqui tratada, não diviso qualquer possibilidade de conferir trânsito à pre
tendida ameaça.
Por essas razões, com fundamentação diversa, acompanho o eminente
Ministro-Relator.
Relator:
Recorrente:
Advogado:
Recorrido:
Paciente:
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS NQ 8.226 - SP
(Registro nQ 98.0098475-5)
Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro
Gilberto Rocha de Andrade
Gilberto Rocha de Andrade (em causa própria)
Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo
Gilberto Rocha de Andrade
EMENTA: RHC - Penal- Estelionato - Reparação do dano.
Somente na hipótese do § 2Q ,VI, art. 171, do Código Penal-fraude no
pagamento por meio de cheque - o ressarcimento do dano causado à víti
ma antes do início da ação penal descaracteriza o crime de estelionato. No
caso dos autos, o recorrente foi denunciado pelo fato típico do art. 171,
caput, não sendo possível o trancamento da ação penal pelo ressarcimen
to do prejuízo antes do oferecimento da denúncia.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao re
curso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Votaram os Srs. Ministros
Fernando Gonçalves e Vicente Leal. Ausente, por motivo de licença, o Sr. Mi
nistro William Patterson.
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
616 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Brasília-DF, 4 de fevereiro de 1999 (data do julgamento).
Ministro VICENTE LEAL, Presidente.
Ministro LUIZ VICENTE CERNICCHIARO, Relator.
Publicado no DJ de 29.03.99.
RELATÓRIO
o SR. MINISTRO LUIZ VICENTE CERNICCHIARO: Recurso ordinário interposto por Gilberto Rocha deAndrade, em seu favor, contra v. acórdão do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo denegatório de ordem de habeas corpus.
O writ fora impetrado com o objetivo de trancar a ação penal a que responde o recorrente por delito de estelionato. Em suas razões recursais alega o recorrente inépcia da denúncia ao argumento de omissão em relação ao acordo realizado com a vítima antes do início da ação penal.
Parecer do Ministério Público Federal, às fls. 90/92 opinando pelo nãoprovimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO LUIZ VICENTE CERNICCHIARO (Relator): A denúncia (fls. 8/10) satisfaz formal e materialmente, os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal. Evidencia, na redação, fato típico. Colho da fundamentação:
"De posse do cheque, o indiciado, ao invés de repassá-lo ao seu cliente, como era sua obrigação, falsificou a assinatura da vítima aposta em seu verso, para que pudesse, em seguida, descontá-lo e apoderar-se da quantia sacada.
Assim agindo, ou seja, falsificando a assinatura da vítima (fraude), o indiciado obteve a vantagem ilícita por ele pretendida em prejuízo da vítima, que teve extinto seu processo trabalhista, sem contudo auferir o valor consignado no acordo." (fl. 9)
O recorrente sustenta ser inepta a denúncia por não conter em sua narração acordo realizado entre ele e a suposta vítima, no qual foi pago em dobro o valor devido.
RSTI, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA 617
Como bem consignou o douto parecer do Ministério Público Federal,
somente na hipótese do § 2º,VI, art. 171, do Código Penal-fraude no pagamen
to por meio de cheque - o ressarcimento do dano causado à vitima antes do
início da ação penal descaracteriza o crime de estelionato.
No caso dos autos, o recorrente foi denunciado pelo fato típico do art. 171,
caput, não sendo possível o trancamento da ação penal pelo ressarcimento do
prejuízo antes do oferecimento da denúncia.
A respeito do tema, o SuperiorTribunal de Justiça já tem se pronunciado.
Ilustrativamente, RHC n Q 5.000-PB, Relator Ministro Anselmo Santiago:
"Processual Penal. Recurso em habeas corpus. Crime de estelionato
(art 171, caput, do CP) - Reparação do prejuízo antes do oferecimento
da denúncia. Trancamento da ação penal.
Impossibilidade.
1. O ressarcimento do prejuízo antes do oferecimento da denúncia
não caracteriza o crime de estelionato e, por via de conseqüência, não
rende ensejo ao trancamento da ação penal por falta de justa causa.
2. Recurso improvido."
Nego provimento ao recurso.
RECURSO EM HABEAS CORPUS NQ 8.267 - RS (Registro nº 99.0004606-4)
Relator:
Recorrente:
Recorrido:
Paciente:
Advogados:
Ministro Vicente Leal
Vinícius Mac Ginity
Tribunal Regional Federal da 43 Região
Vinícius Mac Ginity
Sandra Viana Reis e outros
EMENTA: Penal- Processual Penal- Crime de concussão - Admi
nistrador e médico de hospital privado credenciado pelo SUS - Funcioná
rio público - Ausência de justa causa - Trancamento da ação penal -
Habeas corpus.
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
618 REVISTADO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA
- Na seara do Direito Penal, a extensão do conceito de funcionário
público encontra-se vinculada à noção de função pública, que pressupõe
o desempenho, em caráter profissional e ainda que por pessoas estra
nhas à Administração, de quaisquer atividades próprias do Estado
direcionadas à satisfação de necessidades ou conveniências de interesse
público.
-A Constituição Federal, em seu art. 194, define a seguridade social
como um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e
da sociedade, sendo certo que no tocante aos serviços de assistência à
saúde, são eles prestados por meio do Sistema Único de Saúde, organiza
do em rede regionalizada de hospitais públicos e hospitais particulares
conveniados.
- Os administradores e médicos de estabelecimentos hospitalares
privados credenciados pelo SUS que prestam atendimento aos
beneficiários da seguridade social não se enquadram no conceito de fun
cionário público definido no artigo 327 do CP, para efeitos de crime de
concussão, por desempenharem atividade privada, a eles entregues pelo
próprio ordenamento constitucional.
- Inexistindo justa causa para a ação penal, por ausência de elemen
to normativo subjetivo do tipo, impõe-se a concessão do habeas corpus
para fazer cessar o constrangimento ilegal.
- Recurso ordinário provido. Habeas corpus concedido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao
recurso e conceder o habeas corpus para trancar a ação penal, na conformida
de dos votos e notas taquigráficas a seguir. Participaram do julgamento os Srs.
Ministros Fernando Gonçalves e Hamilton Carvalhido. Ausentes, por motivo de
licença, o Sr. Ministro William Patterson e, justificadamente, o Sr. Ministro
Luiz Vicente Cernicchiaro.
Brasília-DF, 27 de abril de 1999 (data do julgamento).
Ministro VICENTE LEAL, Presidente e Relator.
Publicado no DI de 17.05.99.
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
JURlSPRUDÊNCIADASEXTATURMA 619
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO VICENTE LEAL: Vinícius Mac Ginity, denunciado
como incurso nas penas do artigo 316, C.c o artigo 327, ambos do Código Penal, pela prática do crime de concussão, por ter pressionado a internação de paciente
no Hospital de Caridade Dr. Astrogildo de Azevedo em acomodação custeada
pelo sistema particular, e não por via do convênio do Sistema Único de Saúde.
Na peça exordial do writ, pugna o impetrante pelo trancamento da ação penal alegando: (a) incompetência da Justiça Federal, por não se tratar de delito que viole bens, serviços ou interesses da União, suas entidades autárquicas ou
empresas públicas; (b) falta de justa causa para a ação penal pela inépcia da
denúncia, já que a natureza da atividade que exerce não lhe atribui a caracterís
tica de funcionário público, sujeito ativo do crime de concussão.
A egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 42 Região, por
acórdão de fls. 82/97, denegou a ordem, reconhecendo a competência da Justiça
Federal para processar e julgar a ação penal instaurada para apuração do crime de concussão, ao entendimento de que os particulares que, por força de convênio celebrado com a Administração Pública, exercem função pública delegada pelo SUS enquadram-se no conceito de funcionário público inscritp no artigo
327 do CPP. Proclamou, ainda, que a inexistência do crime de concussão deve ser comprovado na ação penal competente, inviável em sede de habeas corpus.
Irresignado, o impetrante interpõe o presente recurso ordinário, pugnando pelo trancamento da ação penal, sob a invocação das mesmas razões expendidas na exordial do habeas corpus. (fls. 100/113).
A douta Subprocuradoria Geral da República, em parecer de fls. 1311135,
opina pela concessão da ordem, mediante o trancamento da ação penal, ou, pela declaração da incompetência da Justiça Federal.
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO VICENTE LEAL (Relator): Pretende o recorrente,
provedor de estabelecimento hospitalar particular credenciado pelo SUS, pela
via estreita do habeas corpus obter o trancamento de ação penal que lhe é
movida sob a acusação de prática do crime de concussão sob os seguintes funda
mentos: (a) falta de justa causa para a ação penal pela inépcia da inicial, por não
apresentar a condição de funcionário público, sujeito ativo do tipo previsto no
artigo 316 do Código Penal; e (b) incompetência da Justiça Federal, por não se
RST], Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
620 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE}USTIÇA
tratar de crime contra bens, serviços ou interesses da União, de suas autarquias
ou empresas públicas.
Para um adequado exame do thetna decindendutn, é relevante, por pri
meiro, que se proceda a uma adequada definição do conceito de funcionário
público para efeitos de imputabilidade penal, que não se confunde com a mol
dura que lhe foi conferida pela órbita do Direito Administrativo.
Para tal providência, impõe-se a transcrição do artigo 327, que assim estatui:
"Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, em
bora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública."
Sem embargo, na seara do Direito Penal considera-se funcionário público
toda a pessoa que ocupa, ainda que em caráter transitório ou sem remuneração, não apenas cargo ou emprego público, mas que de qualquer modo exerça função pública.
Resta claro, pois, que a expressão foi definida em seu conceito mais am
plo, porquanto vinculada à noção de função pública, que pressupõe o desempe
nho, em caráter profissional e ainda que por pessoas estranhas ao aparelho ad
ministrativo, de quaisquer atividades próprias do Estado direcionadas à satisfa
ção de necessidades ou conveniências de interesse público.
É de se assinalar, todavia, que nosso ordenamento constitucional, ao passo
em que expressamente definiu certas atividades como públicas quando desem
penhadas pelo Estado, entregou-as concomitantemente à responsabilidade da
iniciativa privada, situando-se, nesse contexto, a prestação de serviços médico
hospitalar e de educação.
No particular, a Constituição Federal, em seu art. 194, define a seguridade
social como um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos
e da sociedade, sendo certo que no tocante aos serviços de assistência à saúde,
são eles prestados por meio do Sistema Único de Saúde, organizado em rede
regionalizada de hospitais públicos e hospitais particulares conveniados.
Dentro dessa visão, não se pode conceber a prestação de assistência médi
ca por hospital particular credenciado pelo SUS como função pública delegada,
quando deve ser concebida, iniludivelmente, como atividade privada, a eles en
tregues pela própria Carta Magna.
Assim sendo, os administradores e médicos de estabelecimentos hospitala
res privados que prestam atendimento aos beneficiários da seguridade social
RST}, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
]URISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA 621
mediante convênio celebrado com a Previdência Social não se enquadram no
conceito de funcionário público definido no artigo 327 do CP, para efeitos de
crime de concussão, delito de natureza funcional, que somente pode ser cometi
do por pessoas que exerçam função pública.
In casu, o impetrante, na qualidade de médico e provedor do Hospital de
Caridade Dr. Astrogildo de Azevedo, credenciado pelo SUS à época dos fatos,
foi denunciado pelo crime de concussão, sob acusação de ter induzido a internação
particular de paciente beneficiário da previdência social, quando este fazia jus à
internação gratuita pela rede pública.
Daí por que é de afirmar, em face de todo o exposto, a inocorrência de cri
me de concussão, por não se revestir o acusado da condição de funcionário
público, o que afasta a justa causa para a ação penal. Isto posto, dou provimento
ao recurso e concedo a ordem de habeas corpus, ordenando o trancamento da
ação penal.
É o voto.
Relator:
Recorrente:
Recorridos:
Advogados:
RECURSO ESPECIAL NQ 63.393 - MG (Registro nº 95.0016067-6)
Ministro Vicente Leal
Anísio Glória
Carlos Alexandre Ribeiro e outros
Hildeu Gomes Pereira e outro e Fortunato José da Cunha e
outro
EMENTA: Processual Civil- Normas sobre nulidade - Interpretação
teleológica - Proteção do incapaz - Irregularidade na representação -
Ministério Público - Intervenção no processo - Omissão - Parecer do
Procurador de Justiça com atuação no primeiro grau - Nulidade -
Inexistência.
- As normas processuais pertinentes a nulidades devem ser inter
pretadas, em se tratando de incapazes, teleologicamente, em razão do
que a outorga oportuna de mandato procuratório por menor incapaz afasta o vício na representação.
RST], Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
622 REVISTADO SUPERIORTRIBUNALDEJUSTIÇA
- EIll teIlla de nulidade no processo civil, o princípio fundaIllental que norteia o sisteIlla preconiza que para o reconheciIllento da nulidade do ato processual é necessário que se deIllonstre, de Illodo objetivo, os prejuízos conseqüentes, COIll influência no direito Illaterial e reflexo na decisão da causa.
- EIllbora haja disposição expressa no sentido de ser obrigatória a intervenção do Ministério Público nas causas que envolvaIll interesses de incapazes (CPC, arts. 82 e 246), tal oIllissão, que não consubstancia nulidade absoluta, foi sanada COIll o parecer do representante do Parquet COIll atuação eIll priIlleiro grau, IllOIllento eIll que reconheceu a inexistência de qualquer prejuízo ao interesse dos Illenores, sOIllado à procedência da ação por eles ajuizada.
- Recurso especial não conhecido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso especial, na conformidade dos votos e notas taquigráficas a seguir. Participaram do julgamento os Srs. Ministros LuizVicente Cernicchiaro e Fernando Gonçalves. Ausente, por motivo de licença, o Sr. Ministro William Patterson.
Brasília-DF, 14 de dezembro de 1998 (data do julgamento).
Ministro VICENTE LEAL, Presidente e Relator.
Publicado no DI de 22.02.99.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO VICENTE LEAL: Nos autos de ação de despejo por denúncia vazia ajuizada por Carlos Alexandre Ribeiro e pelos menores
Frederico Ribeiro e Maria Cristina Ribeiro, representados por sua genitora, contra Anísio Glória, o r. Juízo de Primeiro Grau julgou procedente o pedido, para decretar a rescisão contratual e a conseqüente desocupação do imóvel comercial locado.
A egrégia Quarta Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais, por unanimidade, negou provimento aos agravos retidos e à apelação do inquilino, rejeitando as preliminares de inépcia da inicial, pela entrega da notificação sem o instrumento de mandato, bem como de nulidade processual pela não-intervenção do Ministério Público (fls. 91/98).
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
JURISPRUDÊNCIADASEXTATURMA 623
Irresignado, O réu interpõe o presente recurso especial (fls. 100/108), com fulcro nas alíneas a e c do permissivo constitucional, verberando ter o acórdão em destaque violado os artigos 13,37,38,254,267, I, IV e VI, e 283, todos do CPC, bem como o artigo l.209, do CC c.c o artigo 5 12 da Lei nº 6.649/79, ao considerar válida a notificação premonitória desacompanhada do instrumento de mandato outorgado ao advogado subscritor da inicial, acentuando ainda, que quando do ajuizamento da ação um dos menores ainda não se encontrava devidamente representado. Alega, ainda, a ocorrência de divergência jurisprudencial em relação a julgados que reconhecem a nulidade ab initio pela falta de inter
venção do Ministério Público em processos que envolvam interesses de incapazes.
Apresentadas as contra-razões, o recurso foi inadmitido na origem, advindo
agravo, que provido, ensejou a subida dos autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO VICENTE LEAL (Relator): Como anotado no relatório, o presente apelo nobre tem por objeto dupla pretensão, a saber: (a) irre
gularidade da notificação premonitória, porquanto desacompanhada do instru
mento de mandato, bem como na representação de um dos menores quando do ajuizamento da ação; (b) nulidade processual ab initio por falta de interven
ção do Ministério Público em processo envolvendo interesses de incapazes.
Cumpre notar inicialmente que a alegação de violação ao artigo 1.209 do
CC c.c o artigo 512 da Lei n Q 6.649/79 não foi acompanhada da adequada funda
mentação, o que impossibilita a exata compreensão da pretensão deduzida no apelo nobre.
Ora, consubstancia óbice a admissibilidade do recurso especial a impu
tação de lesão a artigo de lei federal quando a fundamentação não se reveste de
embasamento suficiente à compreensão da controvérsia, incidindo o comando
contido na Súmula nº 284 do STF.
Ademais, no que tange à notificação premonitória, é de se ressaltar que o
acórdão recorrido considerou irrelevante o fato de ter sido subscrita por patrono não previamente constituído, ao entendimento de se tratar de ato cuja prática
prescinde da forma especial pela outorga de mandato expresso. E este funda
mento restou inatacado no apelo nobre, não tendo o recorrente, ademais, indica
do qualquer dispositivo de lei federal, pressuposto de sua admissibilidade pela
letra a do permissivo constitucional.
RST], Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
624 REVISTADO SUPERIORTRIBUNALDEJUSTIÇA
Com relação à invocação de ofensa aos dispositivos da lei processual civil,
tenho que o recurso não merece prosperar.
É que a tese proclamada pelo tribunal a quo, consoante já salientado, entendeu por afastar a alegação de carência da ação ao reconhecer a regularidade na representação de todos os autores, acentuando que a irregularidade da
representação em juízo do menor púbere, haja vista sua incapacidade relativa
para a prática de qualquer ato, foi sanada oportunamente.
Com efeito, as normas processuais relativas à incapacidade processual e à irregularidade na representação das partes foi interpretada com os olhos no caráter teleológico nela presente.
Ora, o fim almejado pela legislação que versa sobre capacidade é, sem dúvida, de fornecer especial proteção ao incapaz, sendo, portanto, inconcebível que se anule todo o processo, diante da mera alegação de irregularidade na
representação de um dos menores quando do ajuizamento da ação, se o ato supostamente viciado foi saneado a tempo em benefício para o autor.
É esse, aliás, o sentido que se extrai do disposto no § 1 Q do artigo 269 do CPC, verbis:
§ 1 º "O ato não se repetirá nem se lhe suprirá a falta quando não prejudicar a parte".
Por fim, quanto à alegação de ocorrência de divergência juriSprudencial com julgado que declara a nulidade de processo que envolva interesse de meno
res por falta de intervenção do Ministério Público, considerando irrelevante a posterior manifestação de seu representante, não vejo como censurar a tese pro
clamada no acórdão recorrido.
É certo que o art. 82 do CPC contém expressa disposição no sentido de ser obrigatória a intervenção do Ministério Público nas causas que envolvam interesses de incapazes, e o artigo 246 estatui que a ausência da intimação de seu representante para acompanhar os feitos de intervenção obrigatória implica em nulidade processual.
Todavia, tal omissão não chega a configurar nulidade absoluta, passível de contaminar irremediavelmente o julgamento.
Ora, em tema de nulidade no processo civil, o princípio fundamental que norteia o sistema preconiza que para o reconhecimento da nulidade do ato processual é necessário que se demonstre, de modo objetivo, os prejuízos conse
qüentes com efetiva influência na apuração do direito material e reflexo na
decisão da causa.
RSTJ, Brasília, a. lI, (119): 593-661, julho 1999.
]URISPRUDÊNCIADASEXTATURMA 625
No caso, consoante acentuado no acórdão recorrido, a ausência de inter
venção do órgão ministerial foi suprida pelo parecer do ilustre Procurador de Justiça com atuação no primeiro grau (fls. 71/78), que reconheceu a inexistência
de qualquer prejuízo causado ao interesse dos menores pela falta de sua intimação
no acompanhamento do feito, somado ao fato de ter sido a ação proposta pelos
incapazes julgada procedente.
A propósito, nesse sentido já se pronunciou este Tribunal, consoante se depreende dos seguintes precedentes a seguir colacionados, in verbis:
"Processual Civil. Embargos de declaração. Interesse de menores.
Ausência de prejuízo. Obscuridade.
Não se declara nulidade, por falta de audiência do Ministério Público, se o interesse dos menores se acha preservado, posto que vitoriosos na
demanda" (in DJ de 30.11.92).
"Medida cautelar. Ministério Público. Caráter satisfativo.
1. A intervenção do Ministério Público, em segundo grau, supriu a
falta de intervenção na medida cautelar que foi deferida liminarmente em
favor dos menores e depois julgada extinta por desatenção ao disposto no artigo 806 do CPC.
2. Proposta a ação com caráter nitidamente preparatório, descabe invocar doutrina sobre a existência de medidas satisfativas.
Recurso não conhecido" (REsp nº 59.003-SP, ReI. Min. Ruy Rosado
de Aguiar, in DJ de 14.08.95).
"Processual Civil.
(1) Réu menor, manifestação do Ministério apenas a partir da se
gunda instância. Argüição de invalidade do processo, pela parte, somente nos aclaratórios. Improcedência.
(2) Vários advogados sendo um comum a todos os litisconsortes,
com poderes para atuação isolada. Inaplicação da regra benévola do art.
191 do CPC.
(1) Não se tem por nulo o processo, por insonolência da intervenção
obrigatória do Ministério Público em primeiro grau, se tal nulidade só é
postulada pela parte em sede de declaratórios e depois de o Procurador de
Justiça ter opinado nos autos, sem a tanto nada aduzir, sobretudo quando,
RST], Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
626 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
como na espécie, foi determinado o retorno do feito ao juízo monocrático, ainda que por outra razão.
(2) Quando um dos procuradores ~ comum a todos os litisconsortes, com poderes para atuar sozinho em nome de todos eles, não se aplica a
regra benévola do art. 191 do Código de Processo Civil.
Recurso especial não conhecido" (REsp nº 29.881-MG, ReI. Minis
tro CesarAsfor Rocha, in DJ de 19.08.96).
Assim, é de se reconhecer que a questionada omissão em nada repercutiu
no julgamento da apelação. E como já acentuado, sem prejuízo não há nulidade.
Ante o exposto, não conheço do recurso especial.
É o voto.
Relator:
Recorrente:
Advogado:
Recorrido:
RECURSO ESPECIAL Nº 105.296 - RS (Registro nº 96.0053591-4)
Ministro LuizVicente Cernicchiaro
Marta Garcia Costa Rochedo
Carlos Frederico Guazzelli (Defensor Público)
Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul
EMENTA: REsp - Penal - Apropriação indébita - Arrependimento
posterior.
A apropriação indébita, dizem os penalistas, se dá quando o agente inverte o título de posse, isto é, muda, sem justa causa, o título, utili
zando-o como se sua fosse. Vale dizer, incorpora-a ao seu patrimônio. O animus do agente é fundamental para configurar a natureza jurídica da impontualidade. O ressarcimento do prejuízo não exclui a tipicidade. Aliás, o Código Penal, a propósito encerra instituto específico - arre
pendimento posterior - cujo efeito é causa especial de diminuição da pena.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
}URISPRUDÊNCIADA SEXTA TURMA 627
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, não conhecer do recurso,
nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator.Votaram os Srs. Ministros Fernando
Gonçalves e Vicente Leal. Ausente, por motivo de licença, o Sr. Ministro William
Patterson.
Brasília-DF, 9 de março de 1999 (data do julgamento).
Ministro VICENTE LEAL, Presidente.
Ministro LUIZVICENTE CERNICCHIARO, Relator.
Publicado no DI de 26.04.99.
RELATÓRIO
o SR. MINISTRO LUIZ VICENTE CERNICCHIARO: Recurso espe
cial interposto por Marta Garcia Costa Rochedo, com fundamento na alínea c
do permissivo constitucional, no intuito de impugnar v. aresto do Tribunal de
Alçada do Estado do Rio Grande do Sul, assim ementado:
"Apropriação indébita. Se o advogado recebe dinheiro do constituin
te para o pagamento das despesas de uma ação e não o efetua, aproprian
do-se de numerário, e, também levanta quantia pertencente ao cliente, a
título de indenização, não lhe repassando a importância, pratica, por duas
vezes, o crime do art. 168, § 1 º, IIl, do Código Penal." (fl. 188)
F oram interpostos embargos infringentes, acolhidos por maioria, para re
duzir a pena fixada para dois anos de reclusão, declarando extinta a punibilidade
pela prescrição da pretensão punitiva, em relação ao primeiro fato e quanto ao
segundo fato, reduzir a pena para um ano e quatro meses de reclusão, a ser
cumprida inicialmente em regime semi-aberto e reduzir a pena pecuniária para
vinte dias, no valor mínimo legiferado.
A recorrente alega que o v. acórdão recorrido divergiu de julgados de ou
tros tribunais.
Despacho de admissão às fls. 256/258.
Parecer do Ministério Público Federal, às fls. 264/267, opinando pelo não
provimento do recurso.
É o relatório.
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
628 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
VOTO
O SR. MINISTRO LUIZ VICENTE CERNICCHIARO (Relator): De
bate-se quanto ao crime de apropriação indébita praticado por advogado que, em juízo, valendo-se de poder específico de mandato, levantou o valor da inde
nização depositada, na Justiça do Trabalho, em favor do cliente.
Esse delito, nos termos do disposto no art. 168 do Código Penal, reclama,
como pressuposto a posse, ou detenção de coisa alheia. E, por conseqüência, a
distinção entre ilícito civil e ilícito penal. Apesar da divergência doutrinária, são institutos diferentes. Daí, o inadimplemento contratual não confundir-se com a
apropriação indébita. E a distinção é ontológica. O profissional, por força do
contrato, tem obrigação de repassar ao mandante a importância que receber. A demora (tempo normativamente considerado relevante) para fazê-lo evidencia
animus de ter a coisa para si. Coisa alheia, sem dúvida. Aqui, com a omissão, exterioriza vontade de não transferi-la ao cliente, fazê-lo apenas quando descoberto o fato, ou depois de reclamada. Diferente, ser a falta de repasse decorrer
somente de desleixo, mera impontualidade, ou depender de prestação de contas,
do acerto de crédito e débito.
A apropriação indébita, dizem os penalistas, se dá quando o agente inverte
o título de posse, isto é, muda, sem justa causa, o título, utilizando-o como sua
fosse. Vale dizer, incorpora-a ao seu patrimônio.
O animus do agente é fundamental para configurar a natureza jurídica da impontualidade.
O ressarcimento do prejuízo não exclui a tipicidade. Aliás, o Código Penal, a propósito encerra instituto específico - arrependimento posterior - cujo
efeito é causa especial de diminuição da pena. Atuaria, então, pelo menos, como
causa de extinção da punibilidade? Sabe-se, o tipo penal descreve a conduta delituosa (implicitamente o preceito jurídico) e cominação da pena (conseqüência lógica).
A extinção da punibilidade (a esse título o Código Penal, no art. 107 relaciona casos também de extinção do crime, de que são exemplos a aboli tio
criminis e a anistia ampla e incondicional) repercute na - pretensão punitiva
poder de o Estado aplicar a sanção penal. Esse poder é relativo a qualquer infração penal. As normas de extinção do crime e da punibilidade, entretanto,
são excepcionais. Incidem nos limites postos pela respectiva lei.
Atendem a situações previamente definidas. Apesar da natureza penal mais
benigna, não se estendem por analogia. O comando constitucional pressupõe
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
JURISPRUDÊNCIADASEXTATURMA 629
supostos fáticos iguais. Sabido ainda, o instituto atende a circunstâncias de Po
lítica Criminal. Daí, a matéria ser necessariamente casuística.
O pagamento do débito tributário, antes do recebimento da denúncia, extingue a punibilidade, relativo aos crimes definidos na Lei nº 8.137/90. Alcança,
sem dúvida, também os casos da Lei nº 8.212/90. Todavia, pela natureza dos
ilícitos neles descritos. Confirma, aliás, a observação da identidade fática.
O v. acórdão, registrou a recorrente, antes da imputação do Ministério Público efetuara o pagamento reclamado pelo cliente.
O Código Penal da Itália é expresso. Estatui o art. 182, verbis:
(((Effetti delte causa e di estinzione del reato e della pena) - Salvo che la
legge disponga altrimemi, l'estinzione del reato e delta pena ha effeuo soltamo
per coloro ai quali la causa di estinzione si rijerisce (art. 198)".
Em sendo assim, remanesce o interesse processual. Inadequado trancar a
ação penal.
Não conheço do recurso especial.
Relator:
Recorrente:
Advogados:
Recorridos:
Advogados:
RECURSO ESPECIAL Nº 112.487 - SP (Registro nº 96.0069848-1)
Ministro Hamilton Carvalhido
Instituto Nacional do Seguro Social- INSS
Ricardo Ramos Novelli e outros
Maria Ana Pavan Pontes e outros
Francisco Antônio Zem Peralta e outro
EMENTA: Previdenciário - Salário mínimo de junho/89 - NCz$ 120,00 - Lei nº 7.789/89 - Índices inflacionários - Reajuste - Honorários
Redução - Súmula nº 7 -STJ - Prestações vincendas - Súmula nº 111-STJ.
1. Para o reajuste do benefício de competência de junho de 1989,
deve-se observar o salário mínimo de NCz$ 120,00, a teor do que dispõe a
Lei nº 7.789/89.
2. Firme a jurisprudência acerca da inexistência de direito adquiri-
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
630 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
do à incorporação dos índices inflacionários no reajuste dos benefícios
previdenciários.
3. IITlpossível, eITl sede especial, reapreciar redução de verba honorária. Óbice da SÚITlula nº 7-STJ.
4. "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incideITl sobre as prestações vincendas." SÚITlula nº 111-STJ.
5. Recurso conhecido e parcialITlente provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e lhe dar parcial
provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Vicente Leal, Luiz Vicente Cernicchiaro e Fernando Gonçalves. Ausente, por motivo de licença, o Sr. Ministro William Patterson.
Brasília-DF, 25 de maio de 1999 (data do julgamento).
Ministro VICENTE LEAL, Presidente.
Ministro HAMILTON CARVALHIDO, Relator.
Publicado no DI de 14.06.99.
RELATÓRIO
o SR. MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO: Trata-se de recurso
especial interposto contra acórdão da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que deu parcial provimento ao apelo autárquico, nos autos da ação de revisão de benefício previdenciário, na parte em que fixou o valor do salário mínimo de junho de 1989 em NCz$ 120,00, reconheceu devida a
inclusão dos percentuais inflacionários relativos aos meses de junho/87, janeiro/
89, abril/90 e fevereiro/9l no reajuste dos benefícios e manteve o percentual de 20% para a verba honorária, incidindo sobre doze (12) prestações vincendas.
A recorrente, como razões da insurgência especial, alega ofensa ao artigo 5º da Lei nº 7.789/89, §§ 3º, e 4º, do artigo 20, do Código de Processo Civil, ao tempo em que pleiteia a fixação do valor do salário mínimo de junho de 1989
em NCz$ 81,40, a exclusão dos índices inflacionários do reajuste do benefício, a redução da verba honorária e sua eliminação das prestações vincendas.
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA 631
Positivo o juízo de admissibilidade (Constituição Federal, artigo 105, inciso
lII, alíneas a e c).
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO (Relator): Sr. Presi
dente, as questões recursais estão no valor do salário mínimo de junho de 1989,
na aplicabilidade dos índices inflacionários no reajuste do benefício previ
denciário e na redução da verba honorária e sua aplicabilidade sobre prestações
vincendas.
A decisão recorrida está alinhada com o entendimento cristalizado neste
Superior Tribunal de Justiça, ao fixar o valor do salário mínimo de junho de
1989 em NCz$ 120,00, a propósito os seguintes julgados:
"Processual e Previdenciário. Benefícios. Reajustes. Correção mone-
tária.
1. Em junho de 1989, por força do art. 58 do ADCT/88, os benefícios
em manutenção, regem-se pelo valor do salário mínimo de NCz$ 120,00.
2. Indevida a incorporação aos benefícios dos índices ditos 'inflacioná
rios', em face de não haver direito adquirido a tais reajustes.
3. Aplicam-se os critérios corretivos da Lei nQ 6.899/81 às prestações
devidas e cobradas na sua vigência, inclusive às parcelas anteriores ao
ajuizamento da ação, no entendimento das Súmulas nQs 148 e 43-STl
4. Recurso parcialmente conhecido e provido." (REsp n Q 178.831-
SP, Quinta Turma, ReI. Min. Gilson Dipp, julgado em 02.03.99).
"Previdenciário. Reajuste de benefício. ORTN/OTN. Valor do salá
rio mínimo. Junho de 1989. IPCs. Incorporação ao benefício. Impossibili
dade. Correção monetária. Súmula nº 71-TFR.
1. É devida a aplicação da ORTN/OTN para o reajuste de benefícios
concedidos antes da Lei nQ 8.213/91.
2. No mês de junho de 1989, o reajuste dos benefícios previdenciários
deve ser feito com base no salário mínimo de NCz$ 120,00 (cento e vinte
cruzados novos).
3. Os expurgos inflacionários (IPC), consoante iterativa jurisprudên
cia da Corte, são devidos em liquidação de sentença, entretanto, não po-
RST], Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
632 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
dem incorporar-se no cálculo de reajustamento de beneficios previdenciários, a exemplo do que já foi decidido pela Suprema Corte, em relação aos vencimentos dos servidores públicos. Precedente do STl
4. Na correção monetária dos benefícios previdenciários em atraso há de se observar o critério estabelecido pela Lei nº 6.899/81, com ressalva do termo inicial, que deve ser a partir de quando devida a prestação, aplicando-se simultaneamente as Súmulas nºs 148 e 43 do STJ.
5. Recurso especial conhecido em parte, e nesta extensão, provido." (Recurso Especial nº 187 .462-SP, ReI. Min. Fernando Gonçalves, julgado emI7.11.98)
No que diz respeito à incorporação dos percentuais inflacionários no reajuste do benefício, inadmissível a sua incidência como fator de recomposição dos benefícios, tais indexadores, no entanto, só têm aplicabilidade na apuração dos cálculos da correção monetária, o que não é a hipótese do caso sub examinem. Vale registrar, por todos, o seguinte julgado:
"Processual Civil. Embargos de declaração. Efeito infringente. Possibilidade. Benefício. Reajuste automático. URPs de junho/1987 e fevereiro/1989. IPCs de março e abrilll990.
- Embora os embargos de declaração tenham por escopo expungir do julgamento obscuridades ou contradições, ou suprir omissão sobre tema de pronunciamento obrigatório pelo tribunal, segundo o comando expresso do art. 535 do CPC, a tal recurso é possível conferir-lhe efeito modificativo ou infringente, desde que a alteração do julgamento decorra da correção daqueles citados defeitos.
- A jurisprudência desta corte, sufragando entendimento do STF, é pacífica no sentido de que os benefícios do INSS não têm direito adquirido ao reajuste mensal de seus benefícios previdenciários pela incorporação dos
índices inflacionários expurgados, que não se confunde com a correção monetária dos débitos cobrados em Juízo, cuja incidência é devida. (grifou-se)
- Embargos de declaração acolhidos. Recurso especial parcialmente conhecido e nesta extensão provido." (EDREsp nº 112.224, ReI. Min. Vicente Leal).
No que tange à redução da verba honorária, fixada em 20% sobre o valor da condenação, impossível a sua reanálise em sede especial, de vez que envolve reapreciação de matéria fática, o que é vedado pela Súmula nº 7 deste Superior Tribunal de Justiça.
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA 633
Por fim, é de se notar que não cabe a cobrança de verba honorária sobre
prestações vincendas em débitos de natureza previdenciária, a teor do que dispõe a Súmula nU 111 deste Superior Tribunal de Justiça, verbis:
"Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem
sobre prestações vincendas."
Pelo exposto, conheço do recurso e lhe dou parcial provimento, para ex
cluir da condenação os índices dos percentuais inflacionários como critérios de
reajuste do previdenciário e a verba honorária sobre prestações vincendas.
É o voto.
Relator:
Recorrente:
Recorrente:
Recorrente:
Advogados:
Recorrido:
RECURSO ESPECIAL Nº 149.522 - SP (Registro nU 97.0067253-0)
Ministro LuizVicente Cernicchiaro
Marcelo Curi
N erivaldo Frare
Roberto Brito da Silva
Anésio Duarte e outro
Ministério Público do Estado de São Paulo
EMENTA: REsp - Penal - Condenação - Efeitos administrativos -
Fundamentação.
A reforma penal de 1984, quanto aos efeitos administrativos da sen
tença penal condenatória inovou legislativamente. Antes essa sanção era
mero efeito decorrente da sentença condenatória, levando em conta o quantum de condenação. A aplicação era automática. A Lei nU 7.209/84
estatuiu no art. 92, parágrafo único - "Os efeitos de que trata este artigo
não são autônomos, devendo ser motivadamente declarados na sentença."
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta
RST}, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
634 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE]USTIÇA
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, não conhecer do recurso, mas de ofício conceder o habeas corpus para ordenar o retorno dos autos ao tribunal a quo para fundamentar quanto ao efeito administrativo do acórdão, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Votaram os Srs. Minis
tros Fernando Gonçalves e Vicente Leal. Ausente, por motivo de licença, o Sr. Ministro William Patterson.
Brasília-DF, 9 de março de 1999 (data do julgamento).
Ministro VICENTE LEAL, Presidente.
Ministro LUIZ VICENTE CERNICCHIARO, Relator.
Publicado no DI de 26.04.99.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO LUIZ VICENTE CERNICCHIARO: Recurso especial interposto por Marcelo Curi, Nerivaldo Frare e Roberto Brito da Silva,
com apoio na alínea a do permissivo constitucional, contra v. acórdão do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo condenando os recorrentes como incursos nas penas dos artigos 3º, i, e 4º, h, da Lei nº 4.898/65 e à pena
acessória de proibição do exercício de funções policiais no distrito de culpa pelo prazo de três anos.
Os recorrentes alegam:
"Descumpriu-se pois, os artigos 394 a 405, 498 a 502 e 518 do CPP, e 381 do mesmo dispositivo legal, e mais 59 do Código Penal, como se verá abaixo. Quando não reconheceu o crime como sendo próprio de funcionário público, descumpriu os artigos 3º e 4º, letras i e h, respectivamente, da Lei nº 4.898/65." (fl. 61)
Contra-razões às fls. 86/88.
Recurso especial admitido por força de agravo de instrumento (fl. 117).
O Ministério Público Federal, em parecer às fls. 122/126, assim se ma-
nifestou:
"Pelo exposto, é o parecer do Ministério Público Federal pelo não
conhecimento do presente recurso especial, assim como pela concessão de habeas corpus de ofício aos recorrentes, para o fim de que os autos
RST], Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
JURISPRUDÊNCIADASEXTATURMA 635
retornem ao egrégio tribunal a quo para a devida fundamentação da pena
autônoma de suspensão do exercício das funções policiais." (fl. 126)
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO LUIZ VICENTE CERNICCHIARO (Relator): O v.
acórdão realça, na fundamentação, às fls. 37/38:
"Nesse sentido, tocantemente à autoria e materialidade da infração,
dúvida nenhuma subsiste na prova coligida quanto ao constrangimento
ilegal a que submeteram a vítima em dependência policial, a pretexto de
fazê-la confessar a prática de furto, que de resto não praticara, cujo proces
so de tortura física e moral que a ela inflingiram, na oportunidade, a par
da mais grosseira distorção e do mais absoluto despreparo para a nobre
função de seus misteres profissionais, demonstra sobretudo o evidente e
comprovado abuso de autoridade e desvio de poder de que estavam inves
tidos." (fls. 37/38)
E mais.
"Quanto à autoria delituosa, outrossim, a prova e mequívoca e
irrefutavelmente incriminadora dos apelados. Eles mesmos jamais nega
ram a presença da vítima e deles próprios nas dependências da DIG no dia
e momento dos fatos, a fim de ser interrogada acerca do furto em sua
empregadora, Malharia Araçatuba, o que evidentemente aponta-os como
diretos responsáveis pelo seu estado deplorável, física e psicologicamente,
ao deixar aquelas dependências policiais, (fls. 169 e seguintes)" (fls.
38/39).
o reexame do mérito implica investigação probatória. O particular é in
compatível com o recurso especial. (Súmula nº 7-STJ).
O douto parecer do Ministério Público Federal suscita questão de signifi
cativa relevância, no item 8:
"Conquanto o recurso não tenha mesmo como prosperar, ressalta
mos ser de rigor a concessão de habeas corpus de ofício aos recorrentes,
RSTJ,Brasília, a.11, (119): 593-661, julho 1999.
636 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DEJUSTICA
uma vez que o v. acórdão recorrido não fundamentou a aplicação da pena
autônoma de proibição do exercício das funções policiais no Município da
culpa acima do mínimo legal." (fl. 126)
Com efeito, a reforma penal de 1984, no particular, inovou legislati
vamente. Antes, a sanção administrativa decorrente de sentença condenatória,
levando em conta o quantutn da condenação, era aplicada automaticamente.
A Lei nº 7.209/84 dispõe no art. 92, parágrafo único:
"Os efeitos de que trata este artigo não são autônomos, devendo ser
motivadamente declarados na sentença."
No particular o v. acórdão (fls. 47/48) é silente.
Não conheço do recurso especial, concedo, outrossim, habeas corpus de oficio a fim de os autos retornarem ao egrégio Tribunal para fundamentar quanto
ao efeito administrativo do acórdão.
Relator:
Recorrente:
Advogados:
Recorrido:
Advogado:
RECURSO ESPECIAL Nº 163.722 - RS (Registro nº 98.0008516-5)
Ministro Hamilton Carvalhido
Instituto Nacional do Seguro Social- INSS
Jaqueline Maggioni Piazza e outros
Dalmiro de Mattos
Flosculo Antônio de Carvalho
EMENTA: Recurso especial - Art. 468, CPC - Falta de preques
tionatnento - Sútnulas nºs 282 e 356 do STF - Não conhecitnento do re-
curso.
1. A falta de apreciação e discussão do dispositivo legal tido COtnO
violado, no âtnbito do tribunal a quo, resulta na falta de prequestio
natnento, o que inviabiliza o recurso especial.
2. Aplicabilidade das Sútnulas nºs 282 e 356 do STE
3. Recurso não conhecido.
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
]URISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA 637
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso, nos termos
do voto do Sr. Ministro-Relator. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Vicente Leal e Fernando Gonçalves. Ausentes, por motivo de licença, o Sr. Ministro William Patterson e, ocasionalmente, o Sr. Ministro LuizVicente Cernicchiaro.
Brasília-DF, 11 de maio de 1999 (data do julgamento).
Ministro VICENTE LEAL, Presidente.
Ministro HAMILTON CARVALHIDO, Relator.
Publicado no DI de 31.05.99.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO: Trata-se de recurso especial interposto contra o acórdão da Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, assim ementado:
"Processual Civil. Previdenciário. Execução do julgado em parte.
Se é certo que o vencedor da demanda pode desistir da execução do julgado, não menos correto é lhe ser facultado promovê-la em parte."
A ofensa ao artigo 468 do Código de Processo Civil funda o apelo extremo.
Positivo o juízo de admissibilidade (Constituição da República, artigo 105, inciso lU, alínea a).
O Ministério Público Federal veio pelo não conhecimento à fi. 39.
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO (Relator): Sr. Presidente, o recurso não reúne condições de admissibilidade.
Em sede especial, a recorrente alega que houve ofensa ao artigo 468 do
Código de Processo Civil, que cuida dos limites objetivos da coisa julgada.
Ocorre que a matéria não foi objeto de apreciação pelo tribunal recorrido,
RST], Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
638 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
ressentindo-se o apelo extremo do indispensável prequestionamento (Súmulas nºs 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal).
Nesses termos, não conheço do recurso.
É o voto.
Relator:
Recorrente:
Advogados:
Recorrida:
Advogado:
RECURSO ESPECIAL Nº 167.242 - SP (Registro nº 98.0018165-2)
Ministro Hamilton Carvalhido
Instituto Nacional do Seguro Social- INSS
Vilma WestmannAnderlini e outros
N euza Rodrigues Alves
N ahur Estrella Maia
EMENTA: Previdenciário - Benefício - Reajuste - Decreto-Lei nº 2.351/87 -Piso Nacional de Salários.
1. O reajuste do benefício previdenciário, durante a vigência do Decreto-Lei nº 2.351/87, deve ser feito COlll base no salário lllínilllo de referência, COlllO deterlllinado no § 1 º do seu artigo 2º.
2. Precedentes.
3. Recurso conhecido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Vicente Leal e Fernando Gonçalves. Ausentes, por motivo de licença, o Sr. Ministro William Patterson e, justificadamente, o Sr. Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro.
Brasília-DF, 18 de maio de 1999 (data do julgamento).
Ministro VICENTE LEAL, Presidente.
Ministro HAMILTON CARVALHIDO, Relator.
Publicado no DI de 07.06.99.
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA 639
RELATÓRIO
o SR. MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO: Trata-se de recurso especial contra acórdão da Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, assim ementado:
"Direito Previdenciário e Processual Civil. Conta de liquidação. Observância do julgado. Salário mínimo de referência x piso nacional de salários. Sentença homologatória confirmada.
1. A conta de liquidação, elaborada pelo Contador Judicial, aplicou corretamente o Piso Nacional de Salários, sucedâneo do 'maior' salário mínimo vigente no País, na conformidade do julgado, além de ter sido elaborada com observância ao disposto na Portaria nº 4.164/88, do extinto Ministério da Previdência e Assistência Social, em vigor à época.
2. Apelo autárquico improvido." (fl. 94).
A ofensa ao artigo 2º, § lU, do Decreto-Lei nU 2.351/87, ante a aplicação do piso nacional de salários e, não, do salário mínimo de referência, no reajuste do benefício previdenciário, funda o apelo extremo.
Positivo o juízo de admissibilidade (Constituição da República, artigo 105, inciso lII, alínea a).
O Ministério Público Federal veio pelo provimento, colacionando aresto deste Superior Tribunal de Justiça:
"Previdenciário. Reajuste de benefício. Salário mínimo de referência. Decreto-Lei nU 2.351/87. Salário mínimo. Art. 58/ADCT.
- Os benefícios previdenciários devem ser corrigidos pelo salário mínimo de referência durante a vigência do Decreto-Lei nU 2.351/87, até março de 1989, a partir de quando passa a incidir o art. 58/ADCT, e os valores então devem ser atualizados pelo salário mínimo.
- Precedentes.
(EREsp nº 40.372/RS, Terceira Seção, ReI. Min. Felix Fischer, DJ de 12.05.97)." (fls. 1081109).
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO (Relator): Sr. Presidente, a questão está na utilização do piso nacional de salários como critério de
RST], Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
640 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
reajuste dos benefícios previdenciários, determinada no acórdão recorrido.
Ocorre que o Decreto-Lei nº 2.351/87 vinculou, não, ao piso nacional de salários, mas, sim, ao salário mínimo de referência as pensões e proventos de aposentadoria de qualquer natureza, assim dispondo, com efeito, o § 1 º do seu artigo 2º:
"Art. 2º - ...
§ 1 º Ficam vinculados ao Salário Mínimo de Referência todos os valores que, na data da publicação deste Decreto-Lei, estiverem fixados na função do valor do salário mínimo, e, ainda pensões e proventos de aposentadorias de qualquer natureza, penalidades estabelecidas em lei, contribuições e benefícios previdenciários e obrigações contratuais legais."
Não é outro o entendimento fixado pela Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, valendo, a propósito da questão, transcrever a ementa do EREsp nº 40.366-PR, publicado no DJ de 01.12.97, da lavra do Ministro Felix Fischer:
"Previdenciário. Reajuste de benefícios. Salário mínimo de referência. Decreto-Lei nº 2.351/87. Salário mínimo. Art. 58/ADCT.
- Os benefícios previdenciários devem ser corrigidos pelo salário mínimo de referência durante a vigência do Decreto-Lei nº 2.351/87, até março de 1989, a partir de quando passa a incidir o art. 58/ADCT, e os valores então devem ser atualizados pelo salário mínimo.
- Precedentes.
- Embargos parcialmente recebidos."
Pelo exposto, conheço do recurso, para reformar o acórdão impugnado e determinar a aplicação do salário mínimo de referência na conta de liquidação do julgado.
É o voto.
Relator:
Recorrente:
RECURSO ESPECIALNQ 168.314-RJ (Registro nº 98.0020616-7)
Ministro Fernando Gonçalves
Ministério Público Federal
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
Recorridos:
Advogados:
JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA
Abelardo de Lima Puccini e outros
Paulo Freitas Ribeiro e outro
641
EMENTA: REsp - Ação penal-Trancamento - Inépcia da denúnciaNão ocorrência - Crime coletivo - Diretores - Sociedade limitada - Responsabilidade.
1 - A descrição pormenorizada da conduta de cada um dos envolvidos no caso dos delitos coletivos via de regra tem sua demonstração relegada para a instrução criminal, sendo, no entanto, exigência fundamental que, para fins de condenação, se detalhe o comportamento dos
acusados.
2 - Recurso especial do MP conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e lhe dar provi
mento. Votaram com o Relator os Ministros Luiz Vicente Cernicchiaro e Gilson Dipp. Ausentes, por motivo de licença, o Ministro William Patterson e, justificadamente, o Ministro Vicente Leal.
Brasília-DF, 10 de dezembro de 1998 (data do julgamento).
Ministro FERNANDO GONÇALVES, Presidente e Relator.
Publicado no DI de 17.02.99.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES: Trata-se de recurso es
pecial interposto pelo Ministério Público Federal, com fundamento no art. 105,
inciso lU, letra c, da Constituição Federal, contra acórdão do TRF 2° Região, assim ementado, verbis:
"Constitucional. Processual Penal.
I - A denúncia, no que pertine, consignou:
'Os denunciados figuram como diretores da empresa Multigás
consoante cópia autenticada da ata da assembléia de quotistas reali-
RSTI, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
642 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
zada em 30.04.92 (conf. fls. 46/53), sendo certo resta consignado na cláusula X do contrato social consolidado que 'a diretoria terá os mais amplos poderes de administração ( ... )' (cf. fl. 50).'
II - A amplitude da defesa e o contraditório (CF, 5º, LV), exigem
que se atenda, ao denunciar, às exigências do CPP, art. 41, ainda que de forma sucinta, com relação aos diversos acusados, nos chamados crimes societários, o que inocorreu, no caso.
III - Como se sabe, o egrégio STJ, órgão de cúpula do Judiciário na exegese última da lei federal (CF, arts. 105 e segs.), vem perfilhando orientação no sentido da necessidade que:
'A denúncia, por isso, deve imputar conduta de cada sócio, de
modo a que o comportamento seja identificado, ensejando possibili
dade de exercício do direito pleno de defesa.' (RRC nº 2.882-3, reI. Min.Vicente Cernicchiaro, 6" T, un., in DJU de 13.09.93, p. 18580)
Em igual sentido, basicamente, vide, ainda, dentre outros, o RRC nº 4.214-1-DF, reI. Min.AssisToledo, DJU de 27.03.95, pp. 7174/5.
IV - Concessão do habeas corpus para anular a ação, a partir da denúncia, inclusive, podendo outra ser apresentada, observado o devido
processo legal. Decisão extensiva (CPP, 654, § 2º), aos demais denunciados que não figuram como pacientes." (fl. 263)
Sustenta o recorrente que o acórdão, ao assim decidir, coloca-se em franco
dissenso com os julgados iterativos desta Corte, pois, segundo observa, nos crimes societários, não é inepta a denúncia quando descreve, de modo genérico, a conduta delituosa dos dirigentes da empresa, pois a individualização dos atos criminosos será firmada no decorrer da instrução criminal.
Contra-arrazoado (fls. 290/305), o recurso teve admitido o seu proces
samento (fl. 307), ascendendo os autos a esta Corte.
A Subprocuradoria Geral da República opina pelo provimento do recur
so (fls. 316/321).
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES (Relator): O dissenso
jurisprudencial encontra-se demonstrado e comprovado, a teor do disposto na
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA 643
norma do art. 255, § 1 º, letra b, do Regimento Interno (citação do repositório
oficial onde publicados os acórdãos discordantes), porquanto as ementas
colacionadas pelo recorrente, na medida em que enunciadas de modo abrangente
e elucidativo, permitem visualizar - si et in quantuIll - as circunstâncias
identificadoras dos casos confrontados, cifrados exclusivamente na obrigatorie
dade ou não de o Ministério Público, nos crimes de autoria coletiva, pormeno
rizar a conduta do acusado no limiar da persecutio criIllinis.
Dentro deste contexto, não há como fugir à tese da viabilidade da presente
ação penal, instaurada para apurar a responsabilidade de diretores da sociedade
Multigás Distribuidora de Gás Ltda pela contabilização, por conta de serviços
prestados, de notas fiscais forjadas, de emissão de Emag Engenharia Ltda, redu
zindo-se, em conseqüência, a base de cálculo do imposto de renda do ano de
1992. A denúncia, no essencial, arrolando o diretor-presidente e mais três dire
tores - Abelardo de Lima Puccini, Geraldo Ferreira Muniz, Edson Neves Maia
Filho e Bráulio Bonadiu (fls. 27/28) - destaca:
" ... meados de 1992, no exercício de suas atribuições de adminis
tradores da sociedade Supergasbrás Distribuidora de Gás Ltda, em prévio conluio, mandado falsificar 7 (sete) notas fiscais da Emag Engenha
ria Ltda, acostadas às fls. 47/53.
Com tal artifício os acusados ludibriaram os agentes do Fisco, re
duzindo o imposto de renda relativo ao ano-base de 1992, devido pela
supracitada sociedade.
O fato foi apurado no curso do procedimento administrativo
(fls. 27/28)
Colocado o debate nestes exatos termos, data venia, da bem lançada e
exposta tese no v. acórdão, no mínimo precipitado se exterioriza o ato de trancamento da ação penal ainda na fase em que se encontra, sem o fornecimen
to pela instrução criminal de qualquer adminículo de prova de onde ressaia a
inocência dos envolvidos, dado que a materialidade da infração encontra-se su
ficientemente afastada em função da Auditoria Fiscal doTesouro Nacional leva
da a efeito na escrita da empresa e devidamente instrumentalizada em procedi
mento administrativo que, a todas as luzes, dispensa o inquérito policial.
De outro lado, não é crível que Diretores, inclusive o Diretor-Presidente
(firmatário do contrato de prestações de serviços com a Emag, empresa que teve
as notas fiscais contrafeitas - fls. 75/77), de uma sociedade limitada permane
çam à frente dos negócios, alheios às questões administrativas, como exposto na
RST], Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
644 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
peça vestibular, quando elas, ainda que in thesi, se revestem de grande impor
tância, pois relativas ao pagamento de imposto de renda, incidente sobre o lu
cro, diminuído pelo artifício perpetrado.
Não se vislumbra nas circunstâncias qualquer dificuldade ao exercício de
direito de defesa, estando a denúncia, malgrado redigida com economia, perfei
tamente adequada ao art. 41 do Código de Processo Penal. É evidente que não
há descrição pormenorizada da conduta de cada diretor no evento danoso ao
erário nacional que se viu privado de receita pela diminuição da hipótese de
incidência do imposto de renda, sendo por oportuno, destacar a irrelevância,
nestes casos, do valor em termos quantitativos do prejuízo, mas, apenas, a neces
sidade de demonstração de sua existência.
De outro lado, o conhecimento ou não da falsidade ou inexatidão do do
cumento utilizado para redução do tributo, é detalhe que apenas a instrução criminal poderá ministrar. Nos delitos coletivos, o entendimento pretoriano,
mantém-se no sentido de que a descrição pormenorizada da conduta de cada um
dos envolvidos deve ter sua demonstração relegada para a instrução criminal,
sendo, no entanto, exigência fundamental que, para fins de condenação, se deta
lhe o comportamento de cada um. Neste sentido, os seguintes julgados:
"Criminal. Delito contra a ordem tributária. Lei nº 8.137/90. Em
presa. Diretor. Denúncia.
1 - Se o fato foi exposto pormenorizadamente pela acusação, não
se torna necessária para o oferecimento e recebimento da denúncia, por
se tratar de crime coletivo, a descrição da conduta de cada um dos dire
tores da empresa, relegando-se esta demonstração para a instrução cri
minal.
2 - Precedentes do STF e do ST].
3 - Recurso improvido." (RRC nº 5.896-MG, Sexta Turma, DJ de
03.02.97, p. 785, ReI. Min. Fernando Gonçalves)
"Penal. Denúncia. Crime Societário. Individualização. Responsabi
lidade.
- Nos crimes de natureza societária, não se há de exigir, na denúncia,
o rigor da individualização da responsabilidade de cada acusado, confor
me se busca em outros tipos de delito.
- Habeas corpus indeferido." (HC nº 4. 7211RJ, Sexta Turma, DJ de
28.04.97, p. 15918, ReI. Min. William Patterson)
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA 645
Aliás, muito sintomaticamente, em atitude causadora não apenas de
espanto, mas, também, de admiração, o recorrido Abelardo Lima Puccini,
coincidentemente patrocinado pelo mesmo causídico subscritor da petição
inicial, e também Bráulio Bonadiu e Geraldo Ferreira Muniz, nos Habeas
Corpus nºs 4.659 e 6.260, dos quais fui relator, julgados em 3 de novem
bro de 1996 e 17 de novembro de 1997, postularam o trancamento da ação
penal, por inépcia da denúncia, restando os acórdãos respectivos, assim
ementados:
"Criminal. Delito contra a ordem tributária. Lei nº 8.137/90. Em
presa. Diretor. Denúncia.
1. Se o fato foi exposto pormenorizadamente pela acusação, não se
torna necessária para o oferecimento e recebimento da denúncia, por se
tratar de crime coletivo, a descrição da conduta de cada um dos diretores
da empresa, relegando-se esta demonstração para a instrução criminal.
2. Precedentes do STF e do STJ.
3. Ordem denegada."
"Criminal. Delito contra a ordem tributária. Lei nº 8.137/90. Em
presa. Diretor. Denúncia. Aferição de documentos. Dilação probatória não
condizente com a via angusta do writ.
1. Se o fato foi exposto pormenorizadamente pela acusação, não se
torna necessária para o recebimento da denúncia, por se tratar de crime
coletivo, a descrição da conduta de cada um dos diretores da empresa,
relegando-se esta demonstração para a instrução criminal. Precedentes do
STF e do STJ.
2. Aferir se, pelo contrato social, somente o diretor-presidente pode
ria praticar os atos imputados aos pacientes e que as assinaturas constantes
do contrato de prestação de serviços não seriam dos acusados, é intento
que, por demandar dilação probatória, não condiz com o angusto âmbito
do writ.
3. Ordem denegada."
Para que dúvidas não restem, a este faço juntar, em inteiro teor, os votos
proferidos naquelas assentadas, a eles me reportando.
Em face do exposto, conheço do recurso e lhe dou provimento.
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
646
Relator:
Impetrante:
Advogados:
Impetrada:
Paciente:
REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
"ANEXO
HABEAS CORPUS NQ 4.659 - RJ (Registro nº 96.0027198-4)
Ministro Fernando Gonçalves
Abelardo de Lima Puccini
Arthur Lavigne e outro
Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 2" Região
Abelardo de Lima Puccini
Sustentação Oral: Arthur Lavigne, pelo paciente e Raimundo Francisco Ribeiro de Bonis, Subprocurador-Geral da República
EMENTA: Criminal- Delito contra a ordem tributária - Lei n° 8.137/90. Empresa - Diretor - Denúncia.
1. Se o fato foi exposto pormenorizadamente pela acusação, não
se torna necessária para o oferecimento e recebimento da denúncia, por se tratar de crime coletivo, a descrição da conduta de cada um dos diretores da empresa, relegando-se esta demonstração para a instrução criminal.
2. Precedentes do STF e do STJ.
3. Ordem denegada.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, denegar a ordem. Votaram com o Relator os Ministros Anselmo Santiago, William Patterson, Luiz Vicente Cernicchiaro e Vicente Leal.
Brasília-DF,3 de dezembro de 1996 (data do julgamento).
Ministro ANSELMO SANTIAGO, Presidente.
Ministro FERNANDO GONÇALVES, Relator.
Publicado no DJ de 03.03.97.
RSTJ, Brasília, a. lI, (119): 593-661, julho 1999.
JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TIJRMA 647
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES: Paulo Freitas Ribeiro e Arthur Lavigne, advogados nos auditórios da cidade do Rio de Janeiro, impetram habeas corpus, substitutivo de recurso ordinário, em favor de Abelardo de Lima Puccini que estaria a sofrer constrangimento ilegal em virtude de denúncia inepta formulada pelo Ministério Público e acatada integralmente pela Quarta Turma do egrégio Tribunal Regional Federal da 2ª Região.
Segundo o articulado vestibular, por curto período, o paciente exerceu a função de Diretor-Presidente do Grupo Supergasbrás, cuidando da parte executiva da empresa, com vinculação ao Planejamento de Estratégias de Mercado, sem ligação com problemas administrativos. Não obstante, foi denunciado pela prática do crime de sonegação fiscal, ao entendimento da Receita Federal de que contrato por uma empresa do Grupo com outra, do ramo de engenharia, teve a finalidade de escamotear
impostos, com criação de despesas inexistentes. Em face da autuação, não solucionada no âmbito administrativo, o MP, sem inquérito policial, ofereceu denúncia genérica contra todos os diretores da empresa, sem descrever o valor do tributo e a forma de sonegação.
Afirmou-se, junto ao TRF-2ª Região, a inépcia da peça acusatória e falta de justa causa para ação penal. A ordem foi denegada, dando azo à presente impetração, porque não houve prévia investigação, sendo, por outro lado, vulnerado o princípio da ampla defesa, face aos termos genéricos da denúncia, que se apóia em simples autuação fiscal.
Pedem, em conseqüência, após análise da matéria sob o aspecto doutrinário e jurisprudencial, a concessão da ordem, com trancamento da ação penal.
Com as informações o Presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, Juiz Ney Magno Valadares, encaIIJ,inha, por cópia, o teor do acórdão e outros documentos - fls. 72/73 e i411 09.
A Subprocuradoria Geral da República opina pelo indeferimento
do pedido, porquanto a denúncia atende, si et in quantulll, as prescrições do art. 41 do Código de Processo Penal.
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES (Relator): O pa-
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648 REVISTADO SUPERIORTRIBUNALDE]USTIÇA
ciente foi denunciado como incurso nas penas do art. 1 º, inciso IV, da Lei nº 8.13 7/90, pelo fato de haver a empresa Multigás Distribuidora de Gás Ltda, da qual era diretor, segundo constatação fiscal, decorrente de autua
ção, forjado notas fiscais de suposta emissão da Emag Engenharia Ltda, por conta de serviços que teriam sido prestados, contabilizando os respectivos valores como despesa operacional, com redução indevida da base de incidência do Imposto sobre a Renda. Diz ainda a denúncia (fls. 3/5) que, conforme consignado na cláusula X do contrato social, a diretoria da empresa goza de amplos poderes administrativos. Faz ainda menção expressa aos valores constantes das notas fiscais tidas como forjadas.
A colenda Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, pelo voto do eminente Juiz Frederico Gueiros, ao exame do habeas corpus interposto para trancar por falta de justa causa e inépcia da denúncia a ação penal, decidiu, consoante a seguinte ementa:
"'I - Penal. Habeas corpus. Sonegação fiscal. Art. 1°, inciso
IV, da Lei n° 8.137/90. Crime societário. Inépcia da inicial e falta de justa causa. Inocorrência. A denúncia não é inepta quando descreve o
fato típico com as suas principais circunstâncias, contendo os requisitos legais e permitindo o exercício do amplo direito de defesa.
Comprovada a materialidade do delito através dos trabalhos investigatórios levados a efeito pela Receita Federal, há justa causa para a ação penal, nos crimes societários a responsabilidade individual de cada dirigente se estabelece em função de sua culpabilidade, a ser definida no curso da ação penal. A denúncia não precisa, obrigatoriamente, vir precedida de inquérito policial e decisão conclusiva do respectivo processo administrativo.
II - Ordem denegada'." (fl. 109)
Não vejo, data venia, como trancar a ação em face do teor da peça acusatória que, a toda evidência, retrata infração à Lei nº 8.137/90 que sanciona a conduta corporificada na redução ou tentativa de redução de tributo mediante utilização de documento que o agente sabia ou devia saber que é falso ou inexato. In casu, a empresa envolvida com a contrafacção de notas fiscais, como forma de reduzir ilegitimamente a base de cálculo do Imposto de Renda, é uma sociedade limitada e o paciente seu diretor.
O fato foi exposto pormenorizadamente, pela acusação, não sendo
necessária para oferecimento e recebimento da denúncia, por se tratar de
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JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA 649
crime coletivo, a descrição da conduta de cada um dos diretores da empre
sa relegando-se esta demonstração, como anota Datnásio E. de Jesus, in
Direito Penal Empresarial- Didática - SP - 1995 - p. 63 - para a instru
ção criminal- STF RTJ 100/115,1011563 e 114/228 e STJRHC nº 2.768
- Sexta Turma - DJ de 16.08.93 - p. 15996.
Não se trata, evidentemente, da adoção descuidada da intolerável
versari in re illicita, mas apenas de atribuir responsabilidade a diretor
de sociedade limitada com poderes de gestão insertos em cláusula
contratual. Em regra, como anota Luiz Mélega, "a ilicitude do ato de
gestão que atrai a sanção, decorre de ato pessoal de determinado admi
nistrador, não se tornando os demais co-responsáveis, a não ser que te
nham negligenciado em descumpri-Ios ou que, deles cientes, tenham dei
xado de agir para impedir a sua prática".
Ora, a Lei nº 8.137/90 não institui responsabilidade objetiva e nisto
o v. acórdão é bastante explícito (fi. 105), mas em seu art. 11 autoriza
concluir que nos denominados crimes societários a responsabilidade
individual de cada dirigente "se estabelece em função de sua culpabilida
de, a ser definida no curso da ação penal".
O Supremo Tribunal Federal, em caso análogo, conforme acórdão,
cuja ementa foi trazida à colação à fi. 105, pelo voto do Ministro Brossard,
fixou:
"Habeas corpus. Crime contra a ordem tributária. Crime de
autoria coletiva ou conjunta: exportação de madeira serrada de pinus
elliottii como se fosse pallets, para desfrute da imunidade do ICMS.
Trancamento da ação penal: inépcia da denúncia e falta de justa
causa.
1. A denúncia, nos casos de crimes de autoria coletiva ou con
junta, em especial nos delitos praticadas em sociedade, pode conter
narração genérica dos fatos, sem especificação pormenorizada da
conduta de cada agente, desde que não prejudique o direito de defesa,
segundo jurisprudência do Supremo Tribunal Federal quanto ao art.
41 do CPP. N o caso, a denúncia não é inepta porque descreve o fato
típico com as principais circunstâncias, contém os requisitos legais e
permite o exercício do direito à ampla defesa; não ofende a lei, nem
é obscura ou contrária. 2. Pedido de habeas corpus que não indica
quais os sócios responsáveis pela operação impugnada, a fim de ex-
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650 REVISTADO SUPERIORTRIBUNALDEJUSTICA
cluir os que são a ela alheios. 3. Quando há, em tese, fato penalmente típico e indícios de autoria razoavelmente demonstrados e superficialmente comprovados, há justa causa para a ação penal, onde o órgão acusador deve provar os fatos e a culpa dos denunciados ( ... ) (STF, BC nQ 71.788-8, ReI. Min. P. Brossard, in DJ de 04.11.94,p. 29830)."
Cabe, por fim destacar, que o inquérito policial no crime de sonegação fiscal não é essencial para o oferecimento da denúncia que pode ancorar-se em outras peças de informação. Do mesmo modo, não é de mister seja declinado o valor da lesão fiscal, pois esta ocorre com a utilização do documento contrafeito. Ademais, o auto de infração que serviu de base à denúncia, espelha o valor do imposto devido (fi. 59).
Assim sendo, denego a ordem.
VOTO-VOGAL
o SR. MINISTROWILLIAM PATTERSON: Sr. Presidente, já tenho me manifestado em várias oportunidades a respeito do problema dos
chamados crimes societários. E venho acompanhando a orientação jurisprudencial do egrégio Supremo Tribunal Federal. Entendo que, realmente, é muito difícil, no início do processo, com os elementos que são levados a conhecimento do Ministério Público para abertura do inquérito ou da ação penal, divisar, desde logo, a responsabilidade desses agentes.
Penso que no curso da instrução é que deve ser apurada a culpabilidade de cada um.
No caso dos autos, parece-me que há elementos para acolher como válida a peça de denúncia. O eminente Subprocurador, em sua fala, indicou documentos assinados pelo paciente. É assim que me tenho comportado a respeito desses crimes coletivos e, por isso, acompanho o eminente
relator.
VOTO-VOGAL
O SR. MINISTRO LUIZ VICENTE CERNICCBIARO: Sr. Presi
dente, a sustentação oral foi promovida por um dos mais conceituados advogados dos foros brasileiros, especialista em Direito Penal.
Argüi três itens a fim de justificar o pedido e a conclusão do processo na esfera administrativa deve anteceder ao oferecimento da denúncia; em
outras palavras, considerando o procedimento fiscal condição de procedibilidade da ação penal.
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JURISPRUDÊNCIADASEXTATURMA 651
Data venia, tenho manifestado entendimento contrário. Assim o faço
porque a Constituição da República, ao atribuir as atribuições ao Ministé
rio Público, fê-lo como o titular privativo da ação penal pública. Ora, se
assim é, não pode ficar condicionado a manifestação do Poder Executivo.
Não há dúvida, o reconhecimento da inexistência da fraude, a inexistência
de conluio, a caracterização de prescrição trazidos da Fazenda são ele
mentos importantíssimos. Todavia, não cerceiam a atividade do titular da
ação penal.
Tenho sempre dito que há de se fazer distinção entre a decisão admi
nistrativa e eventual decisão jurisdicional. Fui Relator de um caso em que
rejeitei o acolhimento da ação penal porque no juízo cível, decidindo a mesma situação jurídica, havia sentença com trânsito em julgado não abo
nando o fato imputado na causa de pedir do Ministério Público. Aqui é diferente. Tenho dito também, quando, na área administrativa, se dá decisão definitiva, a parte que não se considerar satisfeita, vale-se do mandado
de segurança e, eventualmente, até do habeas corpus. O que vale, portan
to, é que, em termos derradeiros, somente a decisão judicial pode ser acolhida. E a jurisprudência desta Turma é entendendo da inexistência no caso da condição de procedibilidade.
Traz também o eminente Advogado a necessidade de a denúncia individualizar a conduta dos réus, dos acusados. Nesse ponto, estou inteira
mente de acordo. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, ultima
mente, tem tido alteração, no sentido de que, mesmo nos chamados crimes societários, nas hipóteses em que há pluralidade subjetiva ou co-autoria,
necessário se faz individualizar, ainda que não exaustivamente, mas de
modo, entretanto, a ensejar que dois princípios constitucionais sejam respeitados: o contraditório e a defesa plena. A decisão mais recente, publicada
tanto no Diário da Justiça como em um dos volumes dos Informativos, do
mês passado, do Supremo Tribunal Federal de autoria do eminente Minis
tro Celso de Mello que concedeu liminar em habeas corpus, entendendo
que a denúncia, por não descrever o fato, era inepta. Não concordo, tam
bém, embora seja opinião generalizada, de se deixar para a instrução even
tual verificação. Ora, denúncia é instituto de interpretação restrita. Há de
indicar o fato para que haja a defesa. Ninguém é obrigado a se defender. O Ministério Público é obrigado a acusar, a imputar. A denúncia, no caso, parece-me satisfeita; do ponto de vista formal, é necessário que contenha
os elementos do art. 41 do Código de Processo Penal e, materialmente, estar amparada, apoiada em elementos que dêem, em nível de juízo de
probabilidade, indícios de poder ser verdadeira imputação. O inquérito
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652 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE]USTIÇA
policial é sempre útil, todavia não se faz necessário. Elemento que me parece dar razão ao acolhimento da denúncia, não obstante a descrição não ser rica, se faz presente. Só pelo fato de ser diretor ninguém pode ser denunciado. Ser diretor é exercício regular de direito. Só pode haver crime se a conduta for ilícita. Em se examinando o confronto do aspecto
formal com o aspecto material e, nesse último, juntaram-se contratos, dos quais teriam caracterizado simulação para a expedição de notas fiscais. Conseqüentemente, obter vantagem no Imposto de Renda. Os dois contratos às fls. 53/54 e 56/58, envolvendo as respectivas empresas; quem se apresenta para o caso concreto, não como diretor e, sim, como contratante, exatamente em nome de Multigás Distribuidora de Gás Ltda, é Abelardo de Lima Puccini. Das assinaturas aqui constantes uma inacessível, mas a outra, à primeira vista, parece não haver dúvida alguma.
Em razão de haver o fUIllUS boni juris estando caracterizado o fato, ou seja, realização de contratos para simular despesas e com as mesmas obter abatimento no valor do Imposto de Renda, a denúncia é bastante, apta.
Data venia, acompanho o eminente Ministro-Relator."
Relator:
Impetrante:
Impetrada:
Pacientes:
"ANEXO
HABEAS CORPUS NQ 6.260 - RJ (Registro nº 97.0063291-1)
Ministro Fernando Gonçalves
Laércio Guarconi
QuartaTurma do Tribunal Regional Federal da 2ª Região
Geraldo Ferreira Muniz, Daniel de Marco eJosé Fernando Castioni
EMENTA: CriIllinal- Delito contra a ordeIll tributária - Lei n° 8.137/90 - EIllpresa - Diretor - Denúncia - Aferição de docuIllentosDilação probatória não condizente COIll a via angusta do writ.
1. Se o fato foi exposto porIllenorizadamente pela acusação, não se torna necessária para o recebimento da denúncia, por se tratar de crime coletivo, a descrição da conduta de cada um dos diretores da empresa, relegando-se esta demonstração para a instrução criIllina!. Precedentes do STF e do STJ.
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~SPRUDÊNCL\DASEX~T,~A_~~~ _____________________ 6_5_3
2. Aferir se, pelo contrato social, somente o diretor-presidente
poderia praticar os atos imputados aos pacientes e que as assinaturas constantes do contrato de prestação de serviços não seriam dos
acusados, é intento que, por demandar dilação probatória, não condiz com o angusto âmbito do writ.
3. Ordem denegada.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da
Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos
e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, denegar a ordem de habeas corpus. Participaram do julgamento os Ministros Anselmo San
tiago, William Patterson e Luiz Vicente Cernicchiaro. Ausente, justifica
damente, o Ministro Vicente Leal.
Brasília-DF, 17 de novembro de 1997 (data do julgamento).
Ministro ANSELMO SANTIAGO, Presidente.
Ministro FERNANDO GONÇALVES, Relator.
Publicado no Dl de 09.12.97.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES:Trata-se de habeas
corpus, substitutivo de recurso ordinário, impetrado contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, denegatório de outra ordem onde
se emprestou validade a denúncia inepta, recebida pela Juíza Federal da
13ªVara da Seção Judiciária do Rio de Janeiro.
Sustenta o impetrante que os pacientes, Geraldo Ferreira Muniz, Daniel de Marco e José Fernando Castioni foram denunciados pelo sim
ples fato de serem diretores da Empresa Multigás - Distribuidora de Gás
Ltda, asseverando que a denúncia, no único trecho onde a eles se refere, não delimita, de maneira satisfatória, a conduta de cada um, além do que, como se não bastasse o fato de que, de acordo com a cláusula XVII do
contrato social, somente ao diretor-presidente cabia representar a empre
sa, as assinaturas do contrato de prestação de serviços não são dos pacien
tes, razões pelas quais, afirma existir motivos suficientes para o trancamento da ação penal.
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
654 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Prestadas as informações (fls. 45/49), a Subprocuradoria Geral da República opina (fls.52/56) pela denegação da ordem.
É o relatório. VOTO
O SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES (Relator): Os pacientes foram denunciados como incursos nas penas do art. 1 º, inciso IV, da Lei nº 8.137/90, pelo fato de haver a empresa Multigás Distribuidora
de Gás Ltda, da qual eram diretores, segundo constatação fiscal, decorrente de autuação, forjado notas fiscais de suposta emissão da Emag Engenharia Ltda, por conta de serviços que teriam sido prestados, contabilizando os respectivos valores como despesa operacional, com redução indevida da base de incidência do Imposto sobre a Renda. Diz ainda a denúncia (fls. 15/17) que, conforme consignado na cláusula X do contrato social, a diretoria da empresa goza de amplos poderes administrativos.
A colenda QuartaTurma do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, pelo voto do eminente Juiz Frederico Gueiros, ao exame do habeas corpus interposto para trancar por falta de justa causa e inépcia da denúncia a ação penal, decidiu, consoante a seguinte ementa:
"I - Penal - Habeas corpus - Sonegação fiscal - Art. la, inciso IV, da Lei na 8.137/90 - Crime societário - Inépcia da inicial e falta de justa causa - Inocorrência - A denúncia não é inepta quando descreve o fato típico com as suas principais circunstâncias, conten
do os requisitos legais e permitindo o exercício do amplo direito de defesa - Nos crimes de autoria coletiva ou conjunta, em especial nos delitos praticados em sociedade, pode a denúncia conter narração genérica dos fatos, sem especificação pormenorizada da conduta de cada agente, devendo a participação individual ser apurada no curso da ação - Comprovada a materialidade do delito através dos trabalhos investigatórios levados a efeito pela Receita Federal, há justa causa para a ação penal - O trancamento da ação, nestes casos, e pelos fundamentos de inépcia da denúncia e falta de justa causa, re
presentaria uma absolvição antecipada.
II - Ordem denegada." (fl. 49)
Não vejo, data venia, como trancar a ação em face do teor da peça acusatória que, a toda evidência, retrata infração à Lei nº 8.l37/90 que sanciona a conduta corporificada na redução ou tentativa de redução
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA 655
de tributo mediante utilização de documento que os agentes sabiam ou deviam saber que é falso ou inexato. In casu, a empresa envolvida com a contrafacção de notas fiscais, como forma de reduzir ilegitimamente a base de cálculo do imposto de renda, é uma sociedade limitada e os pacientes seus diretores.
O fato foi exposto pormenorizadamente, pela acusação, não sendo necessária para oferecimento e recebimento da denúncia, por se tratar de crime coletivo, a descrição da conduta de cada um dos diretores da empresa relegando-se esta demonstrqção, como anota Da1D.ásio E. de Jesus, in Direito Penal Empresarial, Didática, SP, 1995, p. 63, para a instrução criminal, STF RTJ 100/115,1011563 e 114/228 e STJ RHC n Q
2.768, Sexta Turma, DJ de 16.08.93, p. 15996.
Não se trata, evidentemente, da adoção descuidada da intolerável versari in re illicita, mas apenas de atribuir responsabilidade a diretor de sociedade limitada com poderes de gestão insertos em cláusula
contratual. Em regra, como anota Luiz Mélega, "a ilicitude do ato de gestão que atrai a sanção, decorre de ato pessoal de determinado administrador, não se tornando os demais co-responsáveis, a não ser que tenham negligenciado em descumpri-Ios ou que, deles cientes, tenham deixado de agir para impedir a sua prática".
Ora, a Lei nº 8.137/90 não institui responsabilidade objetiva e nisto o v. acórdão é bastante explícito (fl. 47), mas em seu art. 11 autoriza concluir que nos denominados crimes societários a responsabilidade individual de cada dirigente "se estabelece em função de sua culpabilidade, a ser definida no curso da ação penal."
O Supremo Tribunal Federal, em caso análogo, conforme acórdão, cuja ementa foi trazida à colação à fl. 105, pelo voto do Ministro Brossard, fixou:
"Habeas corpus. Crime contra a ordem tributária. Crime de autoria coletiva ou conjunta: exportação de madeira serrada de pinus elliotti como se fosse pallets, para desfrute da imunidade do ICMS. Trancamento da ação penal: inépcia da denúncia e falta de justa causa.
1. A denúncia, nos casos de crimes de autoria coletiva ou conjunta, em especial nos delitos praticados em sociedade, pode conter narração genérica dos fatos, sem especificação pormenorizada da conduta de cada agente, desde que não prejudique o direito de defesa, segundo jurisprudência do Supremo Tribunal Federal quanto ao art. 41 do CPP. No caso, a denúncia não é inepta porque descreve
RST], Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
656 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
o fato típico com as principais circunstâncias, contém os requisitos legais e permite o exercício do direito à ampla defesa; não ofende a lei, nem é obscura ou contrária. 2. Pedido de habeas corpus que não indica quais os sócios responsáveis pela operação impugnada, a
fim de excluir os que são a ela alheios. 3. Quando há, em tese, fato penalmente típico e indícios de autoria razoavelmente demonstra
dos e superficialmente comprovados, há justa causa para a ação penal, onde o órgão acusador deve provar os fatos e a culpa dos de
nunciados ( ... ) (STF, BC n° 71.788-8, ReI. Min. P. Brossard, in DJ de 04.11. 94, p. 29830)."
Cabe, por fim destacar, que as alegações de que, pelo contrato soci
al, somente o diretor-presidente poderia praticar os atos imputados aos pacientes e que as assinaturas constantes do contrato de prestação de serviços não seriam dos pacientes, não merecem acolhida, na via eleita, porquanto demandam dilação probatória não condizente com o angusto âmbito do writ. A propósito:
"Penal e Processual Penal. Habeas corpus contra decisão monocrática que indefere de plano revisão criminal. Dilação probatória incompatível com a via eleita. Falta dos pressupostos contidos no art. 621 e incisos do CPP.
1 - Da leitura do art. 621 e incisos do CPP, constata-se das expressões ('evidência dos autos', 'depoimentos, exames ou documentos', 'novas provas', etc.) contidas no elenco autorizativo da Revisão Criminal, está todo ele arrimado em elementos fáticos probatórios, razão pela qual, qualquer juízo acerca dos motivos que levam ao indeferimento de plano do feito revisional, esbarram na assertiva de que é intento que refoge ao âmbito angusto da via eleita.
2 - De outra parte, ainda que assim não fosse, conforme se extrai dos documentos acostados às informações, não há se falar em cerceamento de defesa, porquanto, para a propositura de revisão criminal, não é suficiente mero pedido de retificação da sentença condenatória, mas demonstração inequívoca das hipóteses contidas no art. 621 e incisos do CPP.
3 - Ordem denegada." (BC n° 5.868-SP, DJ de 20.10.97, ReI. Min. Fernando Gonçalves).
Ante o exposto, denego a ordem.
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
]URISPRUDÊNCIADA SEXTA TURMA 657
VOTO
O SR. MINISTRO LUIZ VICENTE CERNICCHIARO: Sr. Presidente, continuo entendendo, o devido processo legal, está na nossa Constituição: distingue perfeitamente imputação de instrução. O réu não tem obrigação de se defender; tem o direito de reputar; obrigação de apontar a infração penal de modo a ensejar a defesa, é do Ministério Público. Com esse ponto, a jurisprudência do Supremo vem se modificando para exigir a indicação da conduta de cada um, o limite de facilitar e ensejar a defesa. Há, entretanto, uma particularidade: ouvi do douto voto de V. Exa., ao ler a denúncia, ao mencionar que os diretores ora pacientes, nessa qualidade, acordaram em praticar condutas que levassem a simular atos de comércio para, com isso, extrair vantagem de ordem tributária. Parece-me ser suficiente, ou seja, em face do art. 29, quem de qualquer modo concorre para o crime incide nas penas nele cominadas.
Por essa particularidade, acompanho V. Exa.
Relator:
Recorrente:
Advogado:
Recorrido:
Advogados:
RECURSO ESPECIAL NQ 181.405 - SP (Registro n Q 98.0050058-8)
Ministro LuizVicente Cernicchiaro
Adilson Rogério Piovani
José Geraldo Simioni
Luiz Carlos de Souza
José Eduardo Ferreira Pimont e outros
EMENTA: REsp - Locação - Relação locatícia desconstituída - Bens deixados pelo inquilino no imóvel.
Os móveis e utensílios deixados, no imóvel, pelo inquilino devem ser entregues à guarda de depositário. O instituto do "abandono" reclama comprovação do animus.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
658 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer do recurso e lhe dar provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Votaram com o Sr. Ministro-Relator os Srs. Ministros Anselmo Santiago e Fernando Gonçalves. Ausentes, por motivo de licença, o Sr. Ministro William Patterson e, justificadamente, o Sr. Ministro Vicente Leal.
Brasília-DF,5 de novembro de 1998 (data do julgamento).
Ministro FERNANDO GONÇALVES, Presidente.
Ministro LUIZ VICENTE CERNICCHIARO, Relator.
Publicado no DJ de 14.12.98.
RELATÓRIO
O SR. MINISTRO LUIZ VICENTE CERNICCHIARO: Recurso especial interposto por Adilson Rogério Piovani com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional.
Narram os autos tratar-se de ação de despejo por falta de pagamento cumulada com cobrança de aluguéis, sob a alegação de ofensa a vários artigos do Código Civil, Processual Civil e artigo 23, II, da Lei de Locação (Lei nº 8.245/91), além de divergência jurisprudencial.
A discussão cinge-se em torno da data efetiva em que se deve considerar rescindida a locação, para os efeitos da retomada do bem, assim como para a responsabilização do inquilino pelos aluguéis vencidos durante o período de vigência da relação locatícia.
Aduz o Recorrente restar finda a obrigação no termo convencionado em juízo quando da audiência de conciliação e julgamento, muito embora as chaves dos imóveis tenham sido entregues em data anterior.
O v. acórdão entendeu pelo término da relação ex locato quando da entrega das chaves, não ficando o pacto avençado prorrogado pela falta de retirada dos bens deixados no imóvel pelo inquilino.
Entendeu, ainda, o egrégio Segundo Tribunal de Alçada do Estado de São Paulo pela legitimidade do locador em assenhorar-se das coisas "abandonadas" à luz do artigo 592 do Código Civil.
Salienta o recorrente, que tem como profissão guincheiro, entendendo estar adstrito a entregar o bem imóvel locado no estado em que o recebeu (art. 23 da Lei nº 8.245/91), ficando, por conseqüência a posse do imóvel condicionada à retirada dos bens.
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
]URISPRUDÊNCIADA SEXTA TURMA 659
Irresigna-se, ainda, quanto à forma encontrada pelo Colegiado ao aplicarlhe dispositivo "estranho" na sua fundamentação, uma vez que jamais poderiam incorporar-se ao patrimônio do locador bens pertencentes a terceiros - veículos acidentados e recolhidos por determinação de autoridades competentes.
Contra-razões (fls. 336/343).
Despacho admitindo o recurso somente no tocante à alínea a (fls. 345/346).
É o relatório.
VOTO
O SR. MINISTRO LUIZVICENTE CERNICCHIARO (Relator): O v. acórdão hostilizado estampa a seguinte ementa:
"Despejo por falta de pagamento c. c cobrança - Entrega das chaves - Bens de propriedade do inquilino deixados no prédio locado - Circunstância que não implica na continuidade de relação ex locato já rompidaRecurso improvido." (fl. 301).
Irrepreensível a decisão paulista no concernente ao término da relação ex locato.
Entregues as chaves, finda-se a relação jurídica, até mesmo pelo exaurimento da situação fática envolvedora de um lado o locador e de outro o locatário. A conclusão é lógica não merecendo maiores comentários.
Com relação à entrega das chaves o ponto nodal é a vontade das partes de liberar-se do vínculo locatício. A entrega corresponde ao aperfeiçoamento das vontades, não obstante assistir ao locatário prazo superior para a mencionada entrega. A esse respeito ilustro caso semelhante do qual fui relator:
"REsp -Administrativo - Imóvel funcional- Ocupação - DataA ocupação do imóvel se dá quando entregues as chaves, ato simbólico de autorizar o uso do prédio. Pouco importa que, nessa data, o imóvel estivesse em reparos. O vínculo jurídico aperfeiçoou-se na data de conclusão do consentimento do proprietário." (REsp nº 76.800-DF, julgado em 12 de fevereiro de 1996).
No tocante ao "assenhoramento" dos bens deixados no imóvel locado, divirjo do entendimento esposado pelo douto Tribunal de Alçada, até mesmo por violação expressa ao artigo 65 da Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/91), verbis:
RST], Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
660 REVISTA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
"Art. 65. Findo o prazo assinado para a desocupação, contado da data da notificação, será efetuado o despejo, se necessário com emprego de força, inclusive arrombamento.
§ 1 º Os móveis e utensílios serão entregues à guarda de depositário, se não os quiser retirar o despejado.
§ 2º O despejo não poderá ser executado até o trigésimo dia seguinte ao do falecimento do cônjuge, ascendente, descendente ou irmão de qualquer das pessoas que habitem o imóvel."
O referido artigo trata da execução compulsória em caso de despejo. No caso sub judice a entrega das chaves foi consensual, não obstando, contudo, a sua aplicabilidade, senão vejamos:
- O ex-locatário deve ser intimado, pessoalmente, para retirar os bens deixados no imóvel, através de qualquer uma das formas preconizadas no art. 238 do CPC.
- Após o transcurso do prazo sem manifestação da parte, cabe ao proprietário ou oficial relacionar os bens e removê-los, entregando-os à
guarda de um depositário. Nada impede que o juiz nomeie o ex-locador como depositário, desde que este aceite o encargo.
- Obviamente, todas as despesas realizadas para a efetivação da guarda dos bens serão pagas pelo responsável.
Não pode o juiz instituir a figura do assenhoramento como o fez à fi. 302, verbis:
"Assinale-se que o simples fato de terem sido deixados nos imóveis locados bens de propriedade do inquilino não implica na continuidade de vínculo locatício já rompido, mas apenas autoriza uma de duas soluções: ou o proprietário transfere tais bens a um depósito público ou particular e cobra de seu ex-inquilino as despesas com remoção e armazenamento, ou então se assenhora das coisas abandonadas, à luz do que prescreve o art. 592 do Código Civil."
O Código Civil disciplina o instituto em seu artigo 592, verbis:
"Quem se assenhorar de coisa abandonada, ou ainda não apropriada, para logo lhe adquire a propriedade, não sendo essa ocupação defesa por lei."
RSTJ, Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.
JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA 661
Ora, o alegado assenhoramento é, indubitavelmente, defeso em lei face ao disposto no artigo 65, § 1 º, da Lei do Inquilinato. Ademais, tal incorporação
patrimonial caracteriza verdadeira legitimação da apropriação indébita, haja vista ser o Recorrente guincheiro e haver em sua posse bens de terceiros, além de seus apetrechos indispensáveis à consecução de seu labor.
Outro aspecto a ser analisado é o conceito de bem abandonado.
Para caracterizar-se o abandono é indispensável a renunciar ao dOIDinus
da res. Esta intenção há de ser patente e insofismável para evidenciar desapreço e a desafetação do bem ao patrimônio do senhorio. Torna-se coisa sem dono.
Obviamente não foi o que ocorreu no caso em exame. A propósito, grande parte dos bens deixados no imóvel locado pertencem a terceiros não podendo serem tidos como abandonados e, quiçá, incorporados pelo instituto da ocupação como entendeu o v. acórdão a quo. Esse entendimento traz complicações extra contrato locatício, ao passo que se assenhora o locador de bens pertencen
tes a proprietários direto e indireto, sem dar ouvidos aos seus legítimos senhores.
Por último, a manutenção da figura do assenhoramento aplicada ao caso
vertente viola não somente preceitos infraconstitucionais, assim como as garan
tias constitucionais do direito à propriedade assegurados na Carta Política.
Isto posto, conheço do recurso e lhe dou provimento para cassar o v. acórdão.
RST], Brasília, a. 11, (119): 593-661, julho 1999.