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Joyce Ribeiro, Vilma Brício, Jadson Gonçalves, Sandra Karina P. Mendes, Dinair Leal da Hora, Socorro Lima, Mariza Felippe Assunção, Adelino Ferranti (Orgs.)

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Joyce Ribeiro, Vilma Brício, Jadson Gonçalves, Sandra Karina P. Mendes, Dinair Leal da Hora, Socorro Lima, Mariza Felippe Assunção, Adelino Ferranti (Orgs.)

Arte da capa: Caped Capa: Comissão científica Editoração Joyce O. S. Ribeiro

Comissão Científica

Adelino Ferranti AnaNice de Lima Rodrigues

Deusa Maria de Sousa Dinair Leal da Hora

Isabel Cristina Baia da Silva Ivete Brito e Brito

Jadson Fernando Garcia Gonçalves Jaqueline Serra Freire

Joyce Otânia Seixas Ribeiro Josimeire Serrão Gonçalves

Lorena Lopes de Freitas Lucielma Lobato da Silva

Maria Antonia Paixão Feitosa Maria do Socorro Pereira Lima

Mariza Felippe Assunção Raimunda Dias Duarte Renan Carvalho Barros

Ruan Felipe Carvalho Vilhena Sandra Karina Mendes Vilma Nonato de Brício

Comissão científica de apoio: Ana Cláudia S. Saldanha

Bruna Soares Neves Daniela Pantoja Amaral Danila Castilho da Silva

Leileane Mac Dovel Ribeiro Luana Carneiro Bezerra Thaina F. Gomes Bahia

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

Reitor: Emmanuel Zagury Tourinho Vice-reitor: Gilmar Pereira da Silva

Pró-reitoria de Ensino de graduação: Edmar Tavares da Costa Pró-reitoria de Extensão: Nelson José de Souza Júnior

Pró-reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação: Maria Iracilda da Cunha Sampaio

CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE ABAETETUBA Coordenadora: Ana Áurea Barreto Maia

Vice-coordenadora: Rosângela do Socorro Nogueira de Souza Divisão de Pesquisa e Pós-graduação: Osvaldo dos Santos Barros

Realização IV EPED

Comissão Organizadora Anderson de Jesus de Sousa Miranda

Danile Azevedo Rodrigues Francisauro Fernandes da Costa

Mauriceia Rodrigues Barbosa Thiago Rodrigues Machado

Apoio:

DPPG

Grupos de pesquisa do Campus Universitário de Abaetetuba:

Différance – Grupo de Estudos e Pesquisa sobre Educação e diferença na contemporaneidade

Experimentações – Grupo de Estudos e Pesquisa sobre Currículo, Subjetividade e Sexualidade na educação básica

Gepege – Grupo de Estudos e Pesquisa Gênero e Educação

Ghecap - Grupo de Pesquisa História da Educação da Criança na Amazônia

Gehlda - Grupo de Estudo em História do Livro Didático da Amazônia

Gehmorga – Grupo de Estudos em História, gênero, movimentos sociais e religiosidade na Amazônia

SUMÁRIO

PREFÁCIO ....................................................................................................................... PARTE 1. POLÍTICAS, LEGISLAÇÃO E GESTÃO EDUCACIONAL Organização do Trabalho Pedagógico: uma análise da proposta pedagógica em uma escola municipal de Abaetetuba/PA................................................................................ Mário José Silva da Costa, Graciete Cardoso dos Santos, Iana da cruz Miranda, Renata da Silva Barbosa Federalismo, regime de colaboração e gestão de políticas educacionais: uma síntese desse processo histórico educacional ............................................................................. Naiara da Silva, Rafaela Wanzeler Pereira, Odete da Cruz Mendes Planejamento educacional: o projeto político pedagógico e a participação na escola ..... Romário Ribeiro dos Prazeres, José Elieton Mendes Moraes PARTE 2. EDUCAÇÃO DO CAMPO, RIBEIRINHA, QUILOMBOLA E INDÍGENA A circularidade do saber em territórios rurais do município de Abaetetuba/PA: o ensinar-aprender de crianças pela diversidade e cultura ................................................ Ianny Cabral Pereira, Eliana Campos Pojo Crianças, Leitura e Escrita: experiência extensionista em escola do campo ..................... Ediuma Cordeiro de Oliveira, Raimundo Nonato Falabelo Os desafios da educação do campo: uma abordagem sobre o transporte escolar na E.M.E.F. Jadielson De Souza Moraes no município de Cametá/Pará ................................ Maiane da Silva Valente, Eldieni Martins Monteiro, Lesly Pacheco Freitas, Viviane Teles Gomes Transporte Escolar: condições estruturais das embarcações e suas implicações na vida escolar de alunos ribeirinhos .......................................................................................... Sávio Freitas da Cunha, Franciely Farias da Cunha, Eraldo Souza do Carmo Os saberes e fazeres do mundo insular na construção do currículo: um relato sobre práticas pedagógicas dos professores do SOME no município de Abaetetuba/PA ........... Merian Nascimento de Abreu, Tatiana Monteiro Ribeiro Campesinato feminino ................................................................................................... Paulo Emil Rodrigues Chaves, Antônia Correa Novaes, Marilia dos Santos Fernandes Vacinação na escola, o ensinar lúdico em uma comunidade rural Marajoara: relato de experiência .................................................................................................................... Raimara Suane P. Brito, Camila Leal, Sâmia Caroline B. Silva, Ailini Danielle Ribeiro Os níveis de desenvolvimento e aprendizagem dos alunos de educação infantil em localidades ribeirinhas: Comunidade de Rio Furtados .................................................... Rodrigo Borges Miranda, Nazareno Ferreira Farias Educação Ambiental: perspectivas e contribuições para a educação ribeirinha, Abaetetuba/PA ............................................................................................................. Rafael de jesus Corrêa Quaresma, Yvens Ely Martins Cordeiro

10 14 20 27 37 43 49 57 64 75 85 90 94

PARTE 3. DIDÁTICA E FORMAÇÃO DE PROFESSORES Currículo na educação infantil: um olhar investigativo na Escola Santa Rosa em Abaetetuba/PA .............................................................................................................. Joanice Rodrigues de Souza, Vivian da Silva Lobato Reflexões sobre a violência na escola pública no município de Abaetetuba .................... Joanice Rodrigues De Souza, Damiana Gonçalves de Almada, Vivian Da Silva Lobato Prática docente na Educação de Jovens e Adultos do campo: um processo de ensino e aprendizagem ................................................................................................................. Dierge Alline Pinto Amador, Silvana Ferreira Lima Formação do pedagogo: uma experiência na construção e desenvolvimento de oficinas pedagógicas ................................................................................................................... Andreza Viana Souza, Dayana Suelen Viana da Cruz, Myéllen Karen Contente, Benilda Miranda Veloso Silva Práticas pedagógicas na Educação Infantil ...................................................................... Cheliane Estumano Gaia Direito de aprendizagem: a educação infantil, a Base Nacional Comum Curricular e o papel do Conselho Tutelar ............................................................................................. Alinne Miranda da Silva, Jadson Fernando Garcia Gonçalves, Cledilson Amaral Pinheiro, Paula Luzia Bezerra Gonçalves Educação socioambiental e formação docente: dialogando com o projeto pedagógico do curso de Pedagogia/UFPA-Abaetetuba ...................................................................... Francisauro Fernandes da Costa A integração de práticas sociais e educativas: realizadas no centro de referência de Assistência Social/CRAS, São Sebastião/PA .................................................................... Camila Ellen Pinheiro da Silva, Samuel Santos Ribeiro, Maria Vitória dos Santos Recriação e movimento: descobrindo caminhos no processo de ensino-aprendizagem .. Dayana Suelen Viana da Cruz, Andreza Viana Souza, Myéllen Karen Contente PARTE 4. EDUCAÇÃO INCLUSIVA O Programa habilidades educacionais alternativas (PHA) na APAE Abaetetuba: Experiência na turma nível 2 .......................................................................................... Leileanne MacDowel Ribeiro, Ana Claudia Santos Saldanha, Sandra Karina Barbosa Mendes Identidades e cultura Surda: uma questão para a escola regular de ensino .................... Marília do Socorro Oliveira Araújo Associação Milton Melo: práticas e saberes nas perspectivas da Educação Inclusiva ...... Danila Castilho da Silva, Brenda Suellem Dias Cavalheiro, Sandra Karina Barbosa Mendes, Regina Pantoja Siqueira A importância da Educação Infantil para crianças com Síndrome de Down ..................... Luana Santos Nascimento, Kelly Bruna Costa Afonso, Jessica Alan Santos Silva, Larrisa Ventura Garcia

101 107 113 118 125 131 139 145 151 159 166 167 176

A aplicabilidade do método de compostagem na APAE ................................................ Valter Thiago Pantoja da Gama, Natália de Kassia Cardoso Farias, Priscyla C. Santiago da Luz PARTE 5. LINGUAGENS E EDUCAÇÃO Música “A Rezadeira”: uma análise semiótica, baseada na perspectiva de Greimas ........ Waléria Oliveira da Silva, Adrielle do Socorro Alves Araújo, Valéria Thaís Martins Araújo Égua: estudo de uma interjeição utilizada por paraenses como método expressivo nas redes sociais .................................................................................................................. Andréia Feio da Costa, Thaina Ferreira Gomes Bahia Contexto de construção da língua nacional no século XIX e início do século XX .............. Thaina Ferreira Gomes Bahia, Andréia Feio da Costa Anglicismos: uma análise morfológica no facebook ........................................................ Manuelle Pereira da Silva, Amanda Ferreira Ferreira, Bárbara Furtado Pinheiro As dificuldades para formação do hábito de leitura ........................................................ Adrielle do Socorro Alves Araújo, Marilucia Ferreira da Silva Estágio supervisionado I: experiência teórica e prática na formação do estudante de Letras-Língua Portuguesa ............................................................................................... Marilucia Ferreira da Silva, Waléria Oliveira da Silva Metaplasmos Contemporâneos: as variações da língua portuguesa através das canções de Luiz Gonzaga ............................................................................................................. Keise Barreto da Silva, Ivana de Jesus Silva de Sena A Língua em uso: sintaxe de colocação .......................................................................... Amanda Ferreira Ferreira, Bárbara Furtado Pinheiro, Manuelle Pereira da Silva PARTE 6. ENSINO DAS CIÊNCIAS E DA MATEMÁTICA As Tecnologias de Informação Móveis (TIM’S) como metodologia alternativa no ensino de Ciências ..................................................................................................................... Myéllen Karen Contente, Andreza Viana Souza, Dayana Suelen Viana da Cruz Ensinando localização de pontos no plano cartesiano para alunos surdos utilizando como recurso, o miriti .................................................................................................... Josiane Reis Silva, Diemisson das Neves da Silva, Rosileide de Jesus de Souza Melo A utilização de jogos matemáticos em classes multisseriadas ......................................... Eria Silva Matias, Juliete Dias Souza, Ivanete Maria Barroso Moreira A experimentação como ferramenta facilitadora no ensino de Eletroquímica ................ Kelma da Conceição Bitencourt, Larissa dos Santos Brito, Nara Lilian Pires e Pires, Marcos Antônio Barros dos Santos PARTE 7. EDUCAÇÃO, RELAÇÕES RACIAIS, GÊNERO E SEXUALIDADE Educação para relações étnico-raciais; aplicabilidade da lei 10.639/2003 e 11.645/2008: formação para professores na vila do Caeté e na escola Esmerina Bou Habib ................. Matheus Furtado Pinheiro, Deusa Maria de Sousa

183 188 193 198 204 211 215 219 222 228 235 241 249 257

Descolonização do Conhecimento: mas, afinal, para quê? .............................................. Josimeire Serrão Gonçalves “Vidas Brasileiras”: a jovem negra na telenovela Malhação ............................................ Isabel Cristina Baia da Silva, Vilma Nonato de Brício Representações da Educação Moral e Cívica no Instituto Nossa Senhora dos Anjos (1953-1971): uma prática complementar na formação educacional de meninas ............. Joelma da Silva Trindade, Maria do Socorro Pereira Lima Ateliê Rodrigues Pacheco: tradição, gênero e a produção da diferença ........................... Lídia Sarges Lobato, Joyce O. S. Ribeiro Narrativas de jovens sobre gênero e sexualidade: silenciamento no currículo escolar ..... Maiara e Silva Oliveira, Vilma Nonato De Brício Colonialidade de gênero, resistência e feminismo decolonial .......................................... Maylana Emanuelle Pereira dos Santos, Clarice Almeida dos Santos, Joyce O.S. Ribeiro A “Produção Generificada” do brinquedo de miriti: uma análise a partir da teorização de María Lugones ........................................................................................................... Clarice Almeida dos Santos, Maylana Emanuelle Pereira dos Santos, Joyce O. S. Ribeiro Biopolítica e musicalização: a medicalização do corpo da mulher.................................... Maria Antonia Paixão Feitosa, Vilma Nonato de Brício PARTE 8. EDUCAÇÃO E CULTURAS O açaí na merenda escolar: tradição alimentar e identidades ......................................... Luana Carneiro Bezerra, Joyce O. S. Ribeiro Cultura e costumes alimentares: o mingau de açaí na merenda escolar .......................... Mauriceia Rodrigues Barbosa, Joyce O. S. Ribeiro A Relação entre o ambiente cultural e a educação .......................................................... Fahid da Costa Kemil “Abaetetuba, terra morena e garota de valor. Abaetetuba, hoje é domingo e eu vou ver o meu amor”. Só que não! .............................................................................................. João Marcos Feitosa Quaresma, Maria Antonia Paixão Feitosa O espaço escolar na constituição de identidades juvenis ............................................... Ataíze Gonçalves Paz O brinquedo de miriti como prática pedagógico-cultural: representação e Identidade ..................................................................................................................... Isane da Conceição de Lima Gonçalves Carimbloco do Pacoval: fusão de tradições ..................................................................... Karla Roberta de Souza Malato, Giselle Fonseca Sarmento, Leida Lira Lima

263 269 275 281 288 294 301 309 319 325 331 336 341 352 364

Educação e compromisso social

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PREFÁCIO

Não sem grande entusiasmo e alegria realizo a apresentação deste IV

Eped/2019 - Encontro de Estudantes do Curso de Pedagogia.

No começo tratava-se de uma ideia, nascida entre os gestores e as(os) estudantes do

Curso de Pedagogia de nossa Faculdade, de realização de um evento que nos permitisse dar

continuidade e amplitude ao processo de reelaboração do Projeto Pedagógico do Curso e que

congregasse as(os) estudantes e viabilizasse o fortalecimento de seu Centro Acadêmico. Em

torno deste ideal, estudantes e professoras(es) (também com a colaboração de pessoas e

instituições externas à Universidade) iniciaram a tarefa coletiva de organizar e realizar o

evento.

Foi assim que, em 2016, ainda sob a denominação de Encontro dos Estudantes de

Pedagogia do Campus de Abaetetuba, realizamos, em 31 de maio de 2016, o I Eped, que teve

por temática: O Curso de Pedagogia e as Novas Diretrizes Curriculares Nacionais para os

Cursos de Licenciatura.

Em 2017, de forma mais ousada e graças ao sucesso do I Eped, que teve repercussão

e participação de diversos estudantes de nosso próprio Curso e de outras Instituições de

ensino superior públicas e privadas, realizamos, em 18 e 19 de maio, o II Eped, agora com a

denominação de Encontro dos Estudantes de Pedagogia, alterado com a clara intenção de

não limitar-se às(aos) estudantes de nossa Faculdade. O II Eped teve por temática:

Compromisso, Educação e Resistência: Desafios contemporâneos às práticas pedagógicas.

O objetivo do II Eped foi o de promover reflexões e debates sobre educação e sociedade no

contexto das transformações políticas no Brasil que já acenavam para os ataques que a

educação pública brasileira viria a ser alvo das políticas neoliberais e ressaltar o importante

papel da formação e da prática pedagógica de professores na resistência e enfrentamento das

problemáticas contemporâneas.

Em 2018 realizamos, em 14, 15 e 16 de maio, o III Eped. De forma madura e

responsável registramos na temática do evento nossa defesa e compromisso com a educação

pública brasileira ante o agravamento do ataque à educação e às Universidades públicas

Educação e compromisso social

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brasileiras. O III Eped teve por temática: Educação e Mudança: Lutar e resistir sem temer.

Neste ano o evento inseriu em sua programação as modalidades de apresentação de trabalhos

Comunicação Oral; Pôster; Relato de Experiência e ofertou 10 GTs (1 - Fundamentos da

Educação; 2 - Educação Socioambiental; 3 - Didática e Formação de Professores; 4 - Educação

inclusiva; 5 - Políticas, Legislação e Gestão Educacional; 6 - Movimentos Sociais e Educação; 7

- Ensino de Ciências e Matemática; 8 - Literatura e Educação; 9 - Educação Não-Escolar; 10 -

Currículos, Culturas e Diferenças), além de Mesas de Debates, Palestras, Oficinas, e

registramos mais de 300 participantes inscritos e publicamos um Caderno de Resumos (ISBN

978-85-92786-17-5), 55 páginas, com 35 Resumos e publicamos um E-book (ISBN 978-85-

92786-18-2), 220 páginas, com 36 Trabalhos.

O conjunto de trabalhos aprovados, o expressivo número de participantes e a

materialização das publicações do evento refletem o exitoso resultado alcançado com a

realização do Eped.

Para este ano de 2019, com a realização do IV Eped, em 22, 23 e 24 de maio, elegemos

a temática Educação e Compromisso Social: O agir pedagógico na perspectiva da inclusão e

sustentabilidade socioambiental. Mantivemos, com poucas alterações, a configuração do III

Eped com Conferências, Mesas de Debates, Oficinas, GTs (1 - Fundamentos da Educação; 2 -

Políticas, Legislação e Gestão Educacional; 3 - Educação Socioambiental; 4 - Educação do

Campo, Ribeirinha, Quilombola e Indígena; 5 - Didática e Formação de Professores; 6-

Educação Inclusiva; 7 - Linguagens e Educação; 8 - Ensino das Ciências e da Matemática; 9 -

Educação Não-Escolar; 10 - Educação e Relações Étnico-Raciais; 11 - Educação e Cultura; 12 -

Gênero, Sexualidade e Educação), Comunicação Oral, Pôster e publicação do presente E-Book

com 54 (cinquenta e quatro) Trabalhos publicados. Alcançamos, aproximadamente, 415

participantes inscritos o que revela a dimensão que o evento vem ganhando a cada ano.

Ao elegermos a temática Educação e Compromisso Social em uma perspectiva

inclusiva, reafirmamos o posicionamento e defesa intransigente do relevante e transformador

papel social que a educação, como prática política, exerce na formação e prática pedagógica

de nossas(os) jovens professoras(es) e também de nossas(os) futuras(os) profissionais da

educação, sobretudo em um momento de agressivos ataques à educação pública brasileira;

às escolas e universidades públicas; o ataque aos direitos sociais; o desrespeito às diferenças

Educação e compromisso social

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múltiplas; o ataque ao meio ambiente e aos povos tradicionais; e a tentativa de fragilização

da democracia.

O IV Eped, em sua dimensão pedagógica, se apresenta como o espaço promotor do

exercício do pensamento crítico, da reflexão e da produção do conhecimento qualificado a

respeito das problemáticas sociais e educacionais que nos atingem contemporaneamente.

Não poderia finalizar sem o registro de agradecimentos e elogios às(os) protagonistas

deste evento, estudantes e professoras(es), que resultou neste E-book e que se apresenta

como um importante dispositivo formativo, também, porque permite a abertura de múltiplas

possibilidades de olhares, leituras e diálogos sobre a educação, a formação e prática de

professoras e professores em variados contextos e situações educativas de nossa Amazônia.

Abaetetuba, 22 de maio de 2019.

Jadson Fernando Garcia Gonçalves Coordenador do Curso de Pedagogia

Faculdade de Educação e Ciências Sociais/Campus de Abaetetuba/UFPA

Educação e compromisso social

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Parte 1 – Políticas, legislação e gestão da educação

Educação e compromisso social

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ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICO: UMA ANÁLISE DA PROPOSTA PEDAGÓGICA

EM UMA ESCOLA MUNICIPAL DE ABETETUBA/PA

Mário José Silva da Costa1

Graciete Cardoso dos Santos2

Iana da Cruz Miranda3

Renata da Silva Barbosa4

Introdução

A Escola Municipal Dr. Francisco Leite Lopes, está localizada no bairro de São Sebastião,

região periférica de Abaetetuba/PA, bairro em situação de vulnerabilidade social e onde

muitos moradores são oriundos da região das ilhas de Abaetetuba ou da zona rural de terra

firme. Atualmente a escola oferece os níveis de ensino da Educação Infantil (Período I) e

Ensino Fundamental (1° ao 5° ano). A escola possui 8 salas de aulas, 1 secretaria, sala de

direção e coordenação pedagógica, sala de atendimento educacional especializado,

biblioteca, copa, banheiros com acessibilidade para deficientes e quadra poliesportiva. Em seu

quadro funcional possui 51 servidores e atende uma clientela de 310 alunos, funcionando nos

turnos de manhã e tarde.

A escola possui um Projeto Político Pedagógico atualizado, que foi elaborado com a

participação da comunidade escolar, visando nortear as ações a serem realizadas com o

objetivo de alcançar uma educação satisfatória para o desenvolvimento cognitivo e social dos

alunos. Pois segundo Veiga (1995), “o projeto político-pedagógico tem a ver com a

organização do trabalho pedagógico em dois níveis: como organização da escola como um

todo e como organização da sala de aula, incluindo sua relação com o contexto social

imediato” (p.53).

1 Universidade Federal do Pará/UFPA. E-mail: [email protected] 2 Universidade Federal do Pará/UFPA. E-mail: [email protected] 3 Universidade Federal do Pará/UFPA. E-mail: [email protected] 4 Universidade Federal do Pará/UFPA. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

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Em relação ao currículo, a escola trabalha com Língua Portuguesa, História, Geografia,

Ciências, Matemática, Ensino Religioso, Educação Física, Artes e Parte Diversificada voltado ao

trabalho com o Aspecto da Vida Cidadã e isso em todos os turnos e anos e para isso, utiliza

uma carga horária semanal de 20 horas para cada período e anual de 800 horas, tudo de

acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação.

Analisando a situação da escola, percebemos que a grande problemática pedagógica

diz respeito ao baixo rendimento escolar dos anos do ciclo de alfabetização (1°, 2° e 3° anos).

Questão essa, que após análise, verificou-se que é impulsionada pelo contexto de

vulnerabilidade socioeconômica e familiar, em que a maioria dos alunos se encontram. Nesse

patamar, isso ocasiona a deficiência na leitura e escrita destes alunos, pois em sua maioria,

estes não recebem incentivos familiares.

Na escola Dr. Francisco Leite Lopes, o objetivo geral do plano de ação, apresenta um

importante papel na definição de ações e propósitos mais amplos, que por sua vez, responde

às expectativas e exigências da comunidade escolar, ou seja, a escola através de seu

regimento, proporciona aos alunos instrumentos que visam a aprendizagem de valores e

conhecimentos por meio de estimulação frequente, voltados para alfabetizar os alunos na

idade certa, com o apoio da família, incentivando a prática da leitura e escrita.

Nas características gerais do plano de ação, a escola se propõe a uma formação sólida

voltada para o senso crítico e a criatividade para o exercício da cidadania, através da

alfabetização por meio de hábitos da leitura e da escrita.

Assim como, oferecer à comunidade ensino de qualidade que vise contribuir para o

desenvolvimento da autonomia responsável, por meio da mediação do educador e o

comprometimento da família e da instituição de ensino, para que possibilite aos educandos o

desenvolvimento das habilidades da leitura e da escrita na idealização do processo de ensino-

aprendizagem.

Neste contexto, a escola impulsiona a construção do conhecimento, através de suas

práticas pedagógicas, para que os mesmos aprendam a exercer sua cidadania com senso

crítico e de forma democrática.

Contudo, o plano de ação descrito na proposta pedagógica, visa compreender e

solucionar as dificuldades encontradas no processo de leitura e escrita, detectadas em uma

parcela dos alunos, dos anos iniciais do ensino fundamental. Desta feita, busca-se alfabetizar

Educação e compromisso social

16

de forma competente, afim de formar educandos capazes de entender os diversos contextos

sociais.

1 Materiais e métodos

Após a definição do tema, traçou-se as estratégias de levantamento de informações,

inicialmente com uma revisão bibliográfica sobre o tema, a fim de construir o arcabouço

teórico possível, para em seguida ir a campo fazer as observações que compõem este

trabalho.

Para Ludke e André (1986) a pesquisa trata-se de uma ocasião privilegiada, desta

forma reunindo o pensamento e a ação de uma pessoa ou de um grupo, no esforço de

elaborar o conhecimento de aspectos da realidade. Com base nesse pressuposto e após as

questões levantadas e as consequentes discussões em sala de aula, surgiu uma indagação em

relação como está constituído o projeto político pedagógico da escola em questão.

A pesquisa está organizada nos seguintes itens; Primeiro abordamos as características

da escola; segundo, daremos o diagnóstico da escola Dr. Francisco Leite Lopes; terceiro,

esboçaremos a análise dos dados coletados na pesquisa de campo realizada nesta instituição

de ensino, e finalizamos com uma conclusão acerca da atividade realizada na escola.

2 Resultados e discussões

A realização do trabalho permite uma compreensão acerca da estrutura teórica e

prática, das estruturas de um Projeto Político Pedagógico participativo, onde em sua

constituição como identidade da escola, este documento expressa a evolução histórica e

teórica das ideias e dos direcionamentos do trabalho pedagógico da unidade escolar, sendo

isso percebido durante a pesquisa de campo, realizada na escola Dr. Francisco Leite Lopes.

Nessa lógica, segundo Vasconcellos (2003, p.127), o projeto político-pedagógico:

é um instrumento teórico-metodológico que visa ajudar a enfrentar os desafios do cotidiano da escola, só que de uma forma refletida, consciente, sistematizada, orgânica e, o que é essencial, participativa. É uma metodologia de trabalho que possibilita ressignificar a ação de todos os agentes da instituição.

Educação e compromisso social

17

Durante as observações realizadas na referida escola, foi percebido que a comunidade

escolar sempre buscou trabalhar para além das salas de aulas, ou seja, com a realidade que a

cerca, sempre levando em consideração a clientela advinda de famílias carentes do bairro.

Ademais, ela procurou buscar, com os seus recursos e profissionais capacitados, um projeto

mais amplo, visando integrar os conhecimentos teóricos com a realidade vivida pelas famílias

dos alunos. Nessa ótica, o objetivo do trabalho, é saber se o que se estabelece no o plano de

ação pedagógica da Escola Municipal Dr. Francisco Leite Lopes, está realmente acontecendo,

na prática escolar.

E dessa maneira a escola em questão, busca solucionar, a grande problemática que é

o baixo rendimento escolar dos anos iniciais do ciclo de alfabetização (1º, 2º e 3º anos).

Questão essa que, segundo a nossa pesquisa, está sendo impulsionada pelo contexto de

vulnerabilidade sócio familiar, que a maioria dos alunos se encontra. Essa conjuntura acaba

influenciando consequentemente no rendimento dos estudantes, tanto na leitura, quanto na

escrita, devido ao não recebimento de incentivo por parte dos familiares e do ambiente social.

Contudo, a escola sempre buscou responder às expectativas e exigências da

comunidade escolar, pois em seu regimento ela procura proporcionar aos seus alunos

instrumentos, que visam uma aprendizagem de valores e conhecimentos por meio de

estimulação frequente, voltada para a alfabetização dos mesmos, na idade certa, com o apoio

da família, através do incentivo da prática da leitura, com o Projeto Leitura e Escrita Prazerosa.

Além deste, há a feira cultural, a de ciências e o soletrando, que são instrumentos que visam

resistir ao pensamento hegemônico implantado pela política neoliberal.

Outrossim, a comunidade escolar, diante dessa dificuldade, procura encontrar

soluções como a implementação de ações, que para Padilha (2001), ao pensar em planejar

uma ação, deve-se entender o processo que lhe deu origem de modo reflexível, ou seja, uma

decisão sobre como agir, onde primeiro deve-se fazer um levantamento das reais

necessidades e a união de recursos materiais e humanos, almejando que os objetivos sejam

concretizados em prazos estabelecidos.

Segundo o exposto, a escola procura estabelecer um plano de ação pedagógica com o

intuito de solucionar a problemática da dificuldade dos estudantes na escrita e na leitura, isso

como fora percebido tem como origem a família, devido ao não acompanhamento da mesma,

problemas sociais e consequentemente o perfil do bairro da escola (São Sebastião), área de

grandes índices de criminalidade.

Educação e compromisso social

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Objetivo Alfabetizar os alunos das séries iniciais do ensino fundamental com a cooperação escola-família

Metas 1. Desenvolver estratégias que despertem em 90% dos alunos a importância da leitura e escrita.

2. Atingir 95% dos professores lotados na escola. 3. Realizar duas reuniões anuais com o intuito de atingir 75% dos pais ou

responsáveis.

Justificativa

O referido plano de ação surgiu através da observação e análise da relação dos alunos com a leitura e a escrita, onde foi percebido um déficit no processo de alfabetização destes. Segundo Emília Ferreiro (1996) a leitura e a escrita são sistemas construídos paulatinamente, visto que, as primeiras escritas feitas pelos alunos no início da aprendizagem devem ser consideradas como produção de grande valor.

Ações 1. Realizar uma aula conscientizadora para os educandos entenderem a importância da leitura e escrita.

2. Conscientizar os professores sobre a aplicação dos estudos de Emília Ferreiro. 3. Promover duas palestras anuais de conscientização familiar no que se diz

respeito a importância da leitura e escrita.

Responsáveis Professores, alunos, pais, comunidade escolar em geral.

Período Durante 2 anos

Recursos Canetas, cartolinas, lápis de cor, jogos educativos, livros didáticos, Datashow, cola, e.v.a.

Tabela 1 – Sistematizações do plano de ação para a Escola Dr. Francisco Leite Lopes em Abaetetuba. Fonte: Autores do trabalho, 2019.

Conclusão

Esse estudo torna-se fundamental, pois irá estabelecer uma nova vertente de

compreensão, voltada a uma ação-reflexão-ação, por parte dos discentes que irão ser

impulsionados naturalmente a construir, modificar e relacionar ideias, integrando-se com os

outros e com o mundo. Consoante a isso, o ato da leitura, segundo Emília Ferreiro (1996) só

desperta interesse quando há uma interação com o leitor, quando faz sentido e

conhecimentos que se articulam com os conhecimentos já possuídos. E dessa forma, com o

ato de leitura emergem possibilidades dos alunos se afastarem das condutas violentas,

levando-os a serem mais críticos e possuindo dessa feita, uma visão mais ampla sobre a

sociedade. Onde a autora citada ratifica que:

A escrita não é um produto escolar, mas sim um objeto cultural, resultado do esforço coletivo da humanidade. Como objeto cultural, a escrita cumpre diversas funções de existência.

Referências

BERBERIAN, Ana Paula. Psicogênese da língua oral escrita: letramento e inclusão. Curitiba: IESDE Brasil, 2009.

DI PALMA, Marcia Silva. Organização do Trabalho Pedagógico. Curitiba: INTERSABERES, 2012.

Educação e compromisso social

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FERREIRO, Emília; Teberosk, Ana. A Psicogênese da Língua Escrita. Porto Alegre: Artes Médicas 1985. 284p.

LUCKE, Hermengarda Alves; ANDRÉ, Marli. A pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 2013.

Projeto Político Pedagógico da EMIF Dr. Francisco Leite Lopes. 2019-2023.

PADILHA, Paulo Roberto. Planejamento dialógico: como construir o projeto político-pedagógico da escola. 4ª ed. São Paulo: Cortez, 2003. p. 29 a 71.

VASCONCELOS, Geni Amélia Nader (Org.). Como me fiz professora. 2ª ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2003.

VEIGA, Ilma dos Passos (Org.). Projeto Político-pedagógico da escola: Uma construção possível. Campinas: Papirus, 1995.

Educação e compromisso social

20

FEDERALISMO, REGIME DE COLABORAÇÃO E GESTÃO DE POLÍTICAS EDUCACIONAIS: UMA SÍNTESE DESSE PROCESSO HISTÓRICO EDUCACIONAL

Naiara da Silva 5

Rafaela Wanzeler Pereira6

Odete da Cruz Mendes7

Federalismo no contexto brasileiro

A estrutura federalista foi instalada no Brasil após uma análise de descentralização a

qual antes o regime brasileiro era unitário e passaria a ter sua autonomia política, construindo

assim um sistema com estrutura federalista.

O mesmo dá origem a uma organização que é dividida em três partes, assim

decompondo o poder e consequentemente melhorando a organização no país, mas para que

este meio de organização seja eficaz, é necessário que cada estrutura saiba seus deveres e

obrigações, e saber onde irão conseguir as verbas para o local situado, e o nome deste meio

é pacto federativo. Esta organização foi uma ideia a partir da imagem estadunidense em que

o país juntou três estados e constituíram a União, enquanto o Brasil, juntou os vinte e seis

estados e o distrito federal para elaborar o federalismo. Esta forma de poder está evidenciada

desde a Constituição de 1989, quando o país deixa de ser império e passa a ser federação,

para que este possa se desenvolver.

Segundo Abrucio (1998) “A história federativa brasileira foi marcada por sérios

desequilíbrios entre os níveis de governo. No período inicial, na República Velha, predominou

um modelo centrífugo, com estados tendo ampla autonomia, pouca cooperação entre si e um

governo federal bastante fraco”. Após o período do Estado Novo, houve o retorno do regime

democrático acrescentado de uma inovação na Constituição de 1946: distribuição de recursos

federais para a esfera municipal. Nesse período, a Segunda República, em comparação com a

Primeira República, é mais eficiente em equilibrar as relações federativas.

5 Graduanda em licenciatura plena em pedagogia /intensivo 2017. Bolsista PIBIC - políticas educacionais. E-mail:

[email protected] 6 Graduanda em Pedagogia 2018, bolsista PIBIC - Reformas do ensino médio. E-mail:

[email protected] 7 Professora, orientadora do presente trabalho. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

21

A fim de neutralizar os interesses regionais e fortalecer efetivamente o poder central,

Vargas, o atual presidente do país, aplicou um golpe de Estado, em 1937. O federalismo

brasileiro foi abolido, o Congresso Nacional e as Assembleias Estaduais foram fechados e,

subordinando os estados ao Executivo Federal, foram instauradas interventoras, nomeadas

pelo presidente, para governar os estados. A Segunda República, no entanto, não foi capaz de

evitar o golpe de Estado, instaurado pelas Forças Armadas, em 1964. A partir de 88, por meio

da descentralização de recursos e competências, o Brasil implementa um sistema de

coordenação para transferência de recursos federais, autonomizando os entes constitutivos

da Federação brasileira. Abrucio (1998), em seus estudos conceitual o termo federalismo,

como sendo, a federação em uma forma de organização político-territorial baseada no

compartilhamento, tanto da legitimidade, como das decisões coletivas entre mais de um nível

de governo.

A peculiaridade na formação do federalismo brasileiro se põe em incorporar não só o

estado, como os municípios, na constituição da federação, evidenciando as necessidades de

coordenação entre essas instâncias de governo. O equilíbrio entre elas garante o correto

desempenho das instituições públicas e, consequentemente, a efetividade das políticas

públicas. Ao falar-se de educação e contrapor com a temática de federalismo, analisa-se que

o mesmo se torna um obstáculo ao relaciona-lo ao ensino educacional, pois a política

educacional necessita de uma organização federalista em que os três níveis de governo

possam se relacionar onde ambos se interligaram para uma política desejavelmente voltada

para a educação.

Diante da Constituição de 1988, em um de seus artigos, ela nos denota a

obrigatoriedade de cooperação entre a União, os estados, os municípios e o Distrito Federal,

com vistas ao “equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional” (BRASIL,

1988) em diversas áreas e setores, inclusive o da educação, da ciência e da cultura. Porém,

seguindo práticas protelatórias, inseriu um § único para estabelecer que lei complementar

fixará normas para a cooperação entre as diversas instâncias, sendo que essa determinação

constitucional nunca avançou, em que pesem vários projetos terem sido apresentados nos

últimos anos por parlamentares de diferentes origens partidárias. Assim, a consolidação das

políticas educacionais, estão presentes até os dias atuais.

Nesta mesma perspectiva, ainda ocorre bastante discursão sobre o federalismo

brasileiro sendo ele visto como autônomo diante os entes federados, não tendo clara

Educação e compromisso social

22

responsabilidade com o que diz respeito a Constituição de 1988, em que deve ocorrer a

cooperação entre a União, os estados, os municípios e o Distrito Federal, levando em conta o

equilíbrio e o bem-estar em âmbitos nacionais. Deste modo, o federalismo, passou a atuar

como nação, pois abrangia sua autoridade sobre todos os cidadãos, alcançando efetivamente

a União.

1 Regime de colaboração no contexto educacional

Quando adentramos no meio educacional, relembramos que o país é um ente

federado e com isso o rumo educacional institui-se com o regime de colaboração em que

ambos se aproximam para uma melhor educação. Logo o estudo sobre regime de colaboração,

nos debruça para uma análise em que ocorre grandes influencia, devido isso está relacionando

as políticas educacionais, assim iremos discutir um pouco sobre as contribuições vigentes

pelos entes federados relacionando os elementos envolvidos na educação.

O artigo 211 da Constituição Federal de 1988, reconhecendo a complexidade do

modelo desconcentrado de prestação de serviço educacional instituído pelos artigos

precedentes, afirma que “a União, os Estados e os Municípios organizarão em regime de

colaboração, seus sistemas de ensino”. O autofinanciamento do regime de colaboração é

fundamentado pela alta assimetria administrativa, em que a desigualdade é visualizada de

forma eloquente, bem como a má distribuição de renda, consequentemente afeta o regime,

logo, passa existir elementos que reforçam a necessidade de um pacto federativo que faça

valer o sentido de sermos uma federação, que como já afirmamos, requer relação de

reciprocidade entre suas partes constituintes.

Conforme observa (ABRUCIO, 2010, p. 61), “a nomenclatura regime de colaboração só

foi utilizada na educação, embora outros setores tenham incluído na Constituição a previsão

de formas colaborativas”. Contudo, o sistema público de educação tem por obrigação atender

os estudantes que utilizam esse meio educativo. A Constituição Federal de 1988 apenas indica,

ou recomenda, a regulamentação da colaboração (artigos 23 e 211). Recentemente, a Emenda

Constitucional nº 59/ 2009, modificou a redação do art. 211 da Carta Magna, que passa a

vigorar em seu § 4º o seguinte texto: “na organização de seus sistemas de ensino, a União, os

Estados, o Distrito Federal e os Municípios definirão formas de colaboração, de modo a

assegurar a universalização do ensino obrigatório”. Portanto, tem-se uma nova

recomendação, dessa vez, para que no país haja formas de colaboração, sem avanços em

Educação e compromisso social

23

relação ao que indica o artigo 23 da CF/1988, que definia a necessidade de uma lei

complementar para regular a cooperação entre as esferas do poder federado. Assim explica o

real motivo de iniciarmos um regime colaborativo no país.

A perspectiva de colaboração que é norteada através de termos regulamentadores

firmados entre chefes do executivo, não se coaduna ao princípio da descentralização político-

administrativa que se vislumbra com a gestão sistêmica da educação, uma vez que as

instâncias de participação democrática não têm parte na definição do que faz jus à

colaboração. Pelo fato do Regime de Colaboração não ser claramente definido nem

regulamentado nos aportes legais, gera-se a dificuldade de se compreender como este

princípio materializa-se nas vivências práticas entre a União e os Estados, entre os Estados e

os municípios, entre a União e os municípios, e dos municípios entre si. A tendência é que as

ações que materializam esse regime se configurem de diversas formas, de acordo com as

características sociais, econômicas e culturais peculiares a cada localidade, além das

interferências de acordos políticos. A partir dos estudos de Abrucio (2010) de que essa lacuna

normativa induziu um tipo de “municipalização” com negociações políticas entre os Estados e

Municípios, sem que houvesse uma arena institucional que mediasse o estabelecimento e

cumprimento de critérios claros de repasse de funções, de modo que este processo dependeu

muito mais do jogo político de gestores, portanto, para além da Política Educacional.

No Brasil o regime de colaboração é uma norma de eficácia relativa de

complementação, desse modo, a implementação desse instituto depende primeiramente da

atuação do Poder Legislativo que, apesar de algumas tentativas, não obteve êxito em âmbito

nacional. Já nas esferas estaduais, é possível encontrar tal instituto regulamentado, em que

apresenta características e concepções diferenciadas, mas que indicam certo distanciamento

teórico e conceitual do significado estrito do “regime de Colaboração”.

2 Gestão de políticas educacionais e o papel do estado

Antes de adentrarmos em gestão de política educacional temos que relembrar o

contexto educacional da política que envolvia e educação no Brasil. Onde a sua

contextualização é de suma importância até hoje, quando nos relacionamos as Gestões

educacionais. Pois a política educacional tem por objetivo o bem comum, atendendo as

demandas sociais, levando em conta a realidade brasileira, pois cada região tem sua

peculiaridade, e este movimento veio a surgir a partir da década de 30, substituindo o modelo

Educação e compromisso social

24

educacional para o modelo industrial, voltado para uma educação profissional, devido em

1932 ocorre o movimento conhecido como, Manifesto dos Pioneiros, liderado por Anísio

Teixeira e Fernando Azevedo, que foi um movimento que influenciou para uma educação

renovadora, defendendo a escola pública e de qualidade. Na década de 90, a partir da

Constituição já reconfigurada, a educação tinha que acompanhar as configurações ocorrentes

no país; gerando uma Declaração, onde o Brasil foi signatário, assumindo assim,

compromissos inerentes para a educação, como o desenvolvimento da educação, tentando

mudar o sistema da educação.

Em 1996, ocorreu a implementação da LDB (9394/96) favorecendo também para o

sistema educação, como o FUNDEF (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino

Fundamental e de Valorização do Magistério), que vem para financiar a educação, desse

modo, em 2003 ocorre a incrementarão do Programa Escola do tamanho do brasil, com o

objetivo de agregar uma educação para todos e com qualidade, a universalização e

democratização do ensino e da gestão escolar. E no intervalo de 2001 a 2010 surgiu a criação

do PNE (Plano Nacional de Educação).

A partir que a civilização cresce, faz-se necessário que a educação tenha um novo olhar

e o estado passa a ter um papel importante no processo educacional, levando em conta as

políticas e ações exercidas em uma sociedade. Esta gestão comunga de uma educação gratuita

e de qualidade, para que possa abranger todos os alunos, tendo parcerias para que este meio

possa se desenvolver e oferecer uma educação de qualidade para os discentes presentes nos

ambientes escolares.

O papel da gestão de políticas educacionais é algo notório para a educação, bem como

para a sociedade, levando em conta sua função social, sendo sua complexidade ainda vista

como assunto de debates, visto que ao caracterizar-se como uma complexa relação existente

entre as transformações econômicas, sociais, culturais e políticas ocorridas em âmbito

mundial e seus desdobramentos no plano da educação em todos os seus níveis, assim

percebe-se o quanto é necessário que tenhamos gestores para as políticas no âmbito da

educação, pois no que se refere ao papel do estado é válido demarcar que, ao longo da sua

evolução histórica, o estado liberal tem sofrido transformações e assumido diferentes

funções, isso porque o Estado não é um elemento monolítico, mas, uma organização que

existe em função de prioridades e interesses de grupos sociais que compõem a sociedade e

Educação e compromisso social

25

desse modo observa-se o quanto é importante seu papel neste meio político, buscando uma

qualidade socialmente diferenciada, garantindo a emancipação da sociedade brasileira, dando

também condições para que esse cidadão seja participante e consciente.

Os interesses de classe e da acumulação do capital, sem, contudo, aparentar

compromissos com interesses particulares, tampouco com grupos específicos, os quais

transmitem uma noção de neutralidade. Sua função, portanto, vem se modificando articulada

às necessidades do capital, ora desempenhando um papel de interventor, ora se retraindo

para uma função mais controladora e avaliadora do que executora.

Considerações finais

A discussão apresentada neste trabalho aponta para a intensificação das relações

federativas no âmbito das políticas públicas para educação, demonstrando o processo tardio

que a educação vem trilhando gradativamente para uma educação renovadora e de

qualidade, diante da contextualização, analisa-se as relações do regime de colaboração e

cooperação entre os entes federados.

À estrutura do federalismo no Brasil, pode-se dizer que, após a elevação dos

municípios à condição de ente federado, houve um movimento mais intenso no processo de

descentralização político-administrativo das políticas públicas para educação. Contudo, esse

processo associado a municipalidade, vinha deixando lacunas nos Sistemas Municipais de

Ensino, principalmente, no que concerne a qualidade da gestão e da elaboração das normas

que regem a educação nos municípios. Neste contexto, a atuação da Secretaria de Educação

do Estado passou a ocupar papel estratégico com o oferecimento de ações de cooperação

técnica com o objetivo de qualificar e fortalecer os Sistemas Municipais. Há que se concluir

que o Estado ocupa papel fundamental na articulação das ações que se materializam em

políticas públicas demandadas pela agenda de políticas públicas do governo, que, ao garantir

as condições de efetivação das ações demonstra que é necessário criar as condições para que

os regimes de colaboração e cooperação se materializem em prol da qualidade da educação

no Estado, bem como os meios de gestão que ocorrem na educação.

Referências

ABRUCIO, F.L. A dinâmica federativa da educação brasileira: diagnóstico e propostas de aperfeiçoamento. In: OLIVEIRA, R. P.; SANTANA, W. (Orgs.). Educação e Federalismo no Brasil: combater as desigualdades, garantir e diversidade. Brasília: UNESCO, 2010.

Educação e compromisso social

26

ABRUCIO, Fernando Luiz. A Coordenação Federativa no Brasil: A experiência do período FHC e os desafios do governo Lula. Rev. Sociol. Polít. Curitiba, 24, p. 41-67, jun. 2005. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rsocp/n24/a05n24.pdf > Acesso em: 01/12/2018.

ARAÚJO, Luiz. O desafio do regime de colaboração no novo Plano Nacional de Educação. Jornal

de Políticas Educacionais. N. 16, julho-dezembro de 2014, p. 59-65.

ARRETCHE, Marta. Federalismo e políticas sociais no Brasil: problemas de coordenação e autonomia. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v. 18, n. 2, p. 17-26, abr./jun. 2004.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, 1988. Brasília: Senado Federal, 1. Magistério. 2. Carreira do magistério. 3. Remuneração do magistério. I. 161 p. (Cadernos de Educação, ISSN 1982-758X; 21) 2001;2009.

CABRAL NETO e et. al. Federalismo e educação no Brasil: subsídios para o debate. Revista Educação em Questão, Natal, v. 50, n. 36, p. 42-72, set./dez. 2014. Acesso em: 01/12/2018.

Educação e compromisso social

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PLANEJAMENTO EDUCACIONAL: O PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO E A PARTICIPAÇÃO NA ESCOLA

Romario Ribeiro dos Praseres8

José Elielton Mendes Moraes9

Introdução

O presente artigo é resultado de uma pesquisa realizada no âmbito da disciplina

Planejamento Educacional. De maneira geral, ele discorre sobre os princípios de uma gestão

democrática na escola e como o Projeto Político Pedagógico (PPP) constitui-se como um

elemento fundamental de participação coletiva.

O texto faz uma análise histórica de como, ao longo dos anos, as escolas foram

administradas de acordo com a lógica do capital, objetivando o desenvolvimento econômico

em detrimento a uma educação de qualidade social. Nesse contexto, as escolas estavam

sendo ocupadas predominantemente por profissionais técnicos que pensavam a educação

enquanto um mero instrumento econômico e que era indispensável ao “progresso”.

Instituições como a Comissão Econômica para América Latina e Caribe – “CEPAL”,

desempenharam um papel indispensável para a disseminação dessa ideia. Todo o

conhecimento que não tivesse uma utilidade para o mercado de trabalho tornava-se

dispensável, o objetivo não era transformar a realidade social do educando ou emancipa-lo,

mas qualifica-lo, minimante, para suprir as demandas do mercado.

Nesse sentindo, o artigo busca também elucidar o leitor sobre como fazer o processo

inverso ao supracitado. Ele apresenta os princípios de uma gestão democrática e quais os

caminhos para se alcançá-la no interior das escolas, enfatizando a importância do P.P.P que

se constitui como um espaço coletivo dentro dessa perspectiva de gestão. Pois, através de sua

construção é possível traçar metas e objetivos que correspondem aos anseios de toda a

comunidade escolar. Ele busca minimizar as relações competitivas, corporativas e autoritárias

que ocorrem dentro da escola. Além de destacar a sua importância, o texto demonstra,

resumidamente, formas de como elaborá-lo.

8 Universidade Federal do Pará/Campus Cametá. E-mail: [email protected] 9 Universidade Federal do Pará/Campus Cametá. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

28

Sendo assim, tendo em vista a atual conjuntura política do país, onde cotidianamente a

educação vem sofrendo ataques de um governo que se mostra autoritário e que rege a nação

sob a ótica do neoliberalismo, este artigo torna-se de grande relevância para professores e

alunos que almejam uma educação democrática, de qualidade, e que possibilite a

transformação social da classe trabalhadora.

1 Materiais e métodos

O método utilizado para a construção do trabalho foi o de uma pesquisa bibliográfica,

que, de acordo com Fonseca (2002), é feita a partir do levantamento de referências teóricas

já analisadas, e publicadas por meios escritos e eletrônicos, como livros, artigos científicos,

páginas de web sites. Foram utilizados textos e artigos, afim de dialogar com diferentes

autores que abordam questões relacionadas à gestão, ao planejamento e a participação na

escola, almejando com isso obter observações precisas e que validassem as perspectivas

defendidas pelos autores. Assim, utilizamos textos e artigos de autores como Silva (2012) e

suas contribuições acerca da defesa da participação como forma de rompimento das

hierarquias de poder presentes no ambiente escolar, Oliveira (1997) que nos forneceu

observações muito importantes sobre as relações entre as questões econômicas e as

perspectivas de planejamento educacional, Bordignon (2014) com sua visão sobre as lutas

rumo às utopias educacionais e o processo de democratização da escola, dentre outros mais,

que nos viabilizaram alicerces fortes para fundamentar e desenvolver o referido artigo.

2 Resultados e discussão

2.1. Planejamento e gestão: princípios da gestão democrática na escola

O planejamento educacional traz em sua historicidade as relações entre

desenvolvimento econômico e educação, onde a última é vista como uma ramificação do

primeiro em uma estreita relação de interdependência.

Alguns princípios do capitalismo como a competitividade, hierarquia, produção,

consumo, exploração, acabam sendo associados às diferentes formas de planejamento pelas

instituições detentoras do poder e consequentemente das tomadas de decisões, com isso no

Brasil desde a década de 1930 ocorre um movimento global de elaboração de diversos

programas e planos para as diferentes formas de intervenção na sociedade, mas que veem as

Educação e compromisso social

29

políticas sociais e educacionais como coadjuvantes e como afirma Oliveira (1997), como

“meras ajustadoras do sistema econômico”.

A partir de então durante as décadas de 30 e 40 do Século XX a perspectiva das

discussões acerca dos caminhos do planejamento ganham os ideais da teoria do capital

humano onde, de acordo com Frigotto (2010), o mesmo “busca traduzir o montante de

investimentos que uma nação faz ou os indivíduos fazem, na expectativa de retornos

adicionais futuros”. Desta forma o planejamento educacional fica como sinônimo de investir

em educação, objetivando um retorno rápido e prático que impulsione o mercado.

Nesse viés surge a Comissão Econômica para América Latina e Caribe – “CEPAL”, como

instituição orientadora da lógica do desenvolvimento e da industrialização, que buscava

explicar para os países emergentes que as desigualdade em relação as nações no que diz

respeito ao setor econômico e as várias áreas sociais se dá pelo processo de industrialização,

ou seja, há diferença entre os países porque alguns são mais industrializados que outros,

porém essa condição não é irreversível, de acordo com ela o progresso e o bem estar das

nações se daria de forma natural a partir do investimento na indústria.

Os conceitos e debates acerca da administração surgem a partir da década de 1960

por meio da concepção de um planejamento global e centralizado. No âmbito educacional as

medidas organizativas incorporadas em tal processo, deveriam obter, a partir de estratégias

específicas, resultados favoráveis, logo a presença de técnicos qualificados para exercerem tal

função, no processo de planejamento era indispensável.

Ao longo da década de 1980 e 1990 perante um cenário de reivindicações, objetivando

participação nas tomadas de decisões no que diz respeito a educação, a sociedade civil luta e

consegue significativas conquistas materializadas na Constituição Nacional de 1988, na lei

4.024/61, e o discurso de uma educação e um planejamento mais democrático vai ganhando

ainda mais força. Mas diferente de uma democratização mascarada por uma falsa

participação, vistas como meras implementadoras de políticas, fruto de decisões pensadas

hierarquicamente. Com isso é de extrema importância lutar por uma educação mais

democratizada, de fato, pois, é por meio dela que a classe trabalhadora exerce os seus

direitos, e contribui para a transformação da sociedade em busca de um futuro melhor uma

vez que “a liberdade amadurece no confronto com outras liberdades, na defesa de seus

direitos em face da autoridade dos pais, do professor, do estado” (FREIRE, 1997, p. 119-20).

2.2 A gestão democrática na escola e o P.P.P. como espaço coletivo

Educação e compromisso social

30

A escola, sobretudo a de ensino público, cumpre uma função social, que para a classe

trabalhadora é a de criar possibilidades para a transformação da realidade e para o

enfrentamento à opressão, desigualdade e exploração que historicamente sofrem em

decorrência da vigência de um sistema econômico excludente que valoriza e prioriza ricos em

detrimento aos pobres.

Nesse sentido, não se pode falar de orientação das políticas educacionais sem postular

a sociedade de classes. Desse modo, de acordo com Paro (2008), os grupos no poder, para

garantir que a realidade vigente continue imutável, se apropriam da instituição escolar e

inserem em seus planos e metas de desenvolvimento, a lógica do liberalismo, resumindo sua

administração em métodos e técnicas burocráticas, que muitas vezes, são importados de

empresas, reduzindo a educação apenas a aspectos econômicos, com o objetivo de qualificar

os indivíduos para suprir as demandas do mercado, sem perspectiva de transformação social.

Todavia, a história mostra que esse movimento não ocorre sem resistência. As

conquistas que bravamente a sociedade civil vem garantindo as duras penas é resultado das

disputas entre o bloco no poder e a classe trabalhadora. Lutas para conquistar seu espaço nas

instituições escolares, sobretudo, no âmbito administrativo. Para que seus objetivos sejam

levados em consideração, para que a educação se torne emancipadora e de qualidade social.

Paro (2008) afirma que:

Se queremos uma escola transformadora, precisamos transformar a escola que temos aí. E a transformação dessa escola passa necessariamente por sua apropriação por parte das camadas trabalhadoras. É nesse sentido que precisam ser transformados o sistema de autoridade e a distribuição do próprio trabalho no interior da escola (PARO, 2008 p. 10).

É nesse contexto que a gestão democrática, que é um dos princípios base da educação

pública nacional, assegurado pela Lei 9.394/1996, art. 3º, parágrafo VIII, (BRASIL, 1996), se

configura como um dos meios para se organizar a escola democraticamente e com a

participação de toda a comunidade que compõe a instituição - professores, alunos, pais,

direção, coordenação pedagógica e funcionários. Levando em consideração a existência de

regras e regulamentações que envolvem a gestão democrática é possível explicita-la melhor

por meio de seus princípios fundamentais que Silva (2012) destaca como “participação

formal” e “participação informal”. A primeira ocorre por meio de documentos formais e

burocráticos, que podem legitimar determinada intervenção ou impedi-la. Enquanto que a

segunda se configura como a construção, por exemplo, de regras informais que surgem a

Educação e compromisso social

31

partir de pequenos grupos do interior da escola, tendo como objetivo a resolução de

problemas específicos. Nela admite-se “outros desenvolvimentos e outras adaptações não

previstos nas normas e nos regulamentos”, facilitando a mudança ou a manutenção da

realidade.

Por conseguinte, Silva (2012), sugere então que nesse contexto de gestão na escola a

“participação praticada” se desenvolverá de acordo com quatro critérios: “democraticidade;

regulamentação; envolvimento e orientação”. O primeiro divide-se em dois tipos de

participação, direta e indireta. A direta é caracterizada pela “intervenção direta dos sujeitos”,

tendo como exemplo o direito ao voto. A indireta é a participação a partir de representantes

designados pelos setores da escola. No que se refere ao critério de regulamentação, segundo

o autor, ele é composto pela participação formal, informal – já mencionadas anteriormente –

e não formal, sendo esta última uma ação de “interpretação das regras formais”, com o

objetivo de mantê-las ou transformá-las. No critério de envolvimento, Silva (2012), inclui três

tipos de participação: “ativa, reservada e passiva”. A ativa é aquela em que os sujeitos se

envolvem diretamente em todas as demandas e reivindicações da escola buscando sua

transformação e melhoria. A passiva é composta, principalmente, pelos sujeitos que, por

medo ou acomodação, não se envolvem diretamente nas reivindicações e se deixam

representar pelos que participam ativamente. Já a reservada é caracterizada pelos sujeitos

que assumem a postura da neutralidade, que no fim das contas não faz nada para que a

realidade da escola mude, mas reclamam de quem se mobiliza. No que tange o critério da

orientação, ela “é vista sob dois ângulos: convergente e divergente”. A primeira tende a

aceitar as regras e normas pré-estabelecidas nos documentos oficiais, enquanto que a

segunda problematiza e se contrapõe a elas.

Nessa perspectiva o Projeto Político Pedagógico (PPP) se configura como uma forma

de organização coletiva de planejamento da escola. Onde os sujeitos da instituição irão,

coletivamente, definir quais os objetivos e metas serem alcançados, se uma formação que

fomente o senso crítico, de enfretamento às mazelas proporcionadas pelo sistema capitalista

ou uma formação “neutra”, passiva, que apenas reproduz as ideologias impostas pela classe

empresarial. Segundo Veiga (1998):

[...] o projeto político-pedagógico vai além de um simples agrupamento de planos de ensino e de atividades diversas. O projeto não é algo que é construído e em seguida arquivado ou encaminhado às autoridades educacionais como prova do cumprimento de tarefas burocráticas. Ele é

Educação e compromisso social

32

construído e vivenciado em todos os momentos, por todos os envolvidos com o processo educativo da escola (VEIGA, 1998, p. 1).

Sendo assim, o PPP desempenha um papel fundamental na busca por uma educação

de qualidade social e pela democratização da escola, no sentido em que ele é constituído e

vivenciado pelos atores que o construíram. Ele é a concretização da autonomia da escola e a

sua capacidade em compreender sua realidade.

Diante disso, o Projeto Político Pedagógico implementado como elemento de uma

gestão democrática da escola se constitui um imprescindível instrumento de transformação

política, econômica e social. Mas ele para isso ser possível, segundo Veiga (1998) é necessário

propiciar situações que permita ao professor, aluno, pais, funcionário, diretor e coordenador

pedagógico aprender a realizar o fazer pedagógico de forma coerente. É necessário ter

consciência de classe! Para se construir uma escola feita por trabalhadores e para

trabalhadores, para romper com a lógica do capital e propiciar uma educação popular,

coletiva, que compreenda a necessidade e a realidade do povo e não do mercado.

2.3 Estrutura organizacional do PPP

É na escola que os indivíduos serão formados, segundo Veiga (1998) para serem

cidadãos autônomos, participativos, responsáveis, compromissados, críticos e criativos que

atuarão individual e coletivamente na sociedade. Para alcançar esse tipo de educação é

essencial desenvolver um projeto que verse o melhor atendimento do aluno, para isso,

conhecer o contexto em que a escola está inserida e proporcionar uma participação coletiva

é fundamental, pois de acordo com Veiga (1998):

Considerando o contexto, os limites, os recursos disponíveis (humanos,

materiais e financeiros) e a realidade escolar, cada instituição educativa

assume sua marca tecendo, no coletivo, seu projeto Político-Pedagógico,

propiciando consequentemente a construção de uma nova forma de

organização (VEIGA, 1998 p. 26).

Ao ser desenvolvido de forma democrática, quando as decisões são tomadas por toda

a comunidade escolar, e expressaram com clareza os objetivos sociais e pedagógicos da

instituição, o projeto político pedagógico servirá como um guia nas decisões, valores e

objetivos podendo fazer com que a escola atinja de forma eficiente e eficaz as suas finalidades.

O PPP traz basicamente a ideia de utopia (lugar ou estado ideal, harmonia entre os indivíduos),

Educação e compromisso social

33

porque todos os componentes do corpo escolar dependem desta cooperação para que o

planejamento ocorra como desejado.

A estrutura do PPP é composta por perguntas e respostas, perguntas estas

formuladas para descobrir o que o corpo escolar precisa ou almeja. Assim podendo obter

saídas e soluções para possíveis problemas, definir estratégias e ações especificas para todas

as áreas participantes da escola. Padilha (2001) elaborou algumas perguntas que podem

contribuir nesse sentido: “que tipo de homem e de sociedade queremos construir?”; “Que

papel desejamos para a escola em nossa realidade?”; “Que tipo de relações devem ser

estabelecidas entre professor e aluno, entre escola e a comunidade?”; “Qual o papel do

Estado em relação à educação, em termos ideais? ”.

Essas perguntas são umas das muitas utilizadas, para chegar ao objetivo pretendido

pelo PPP. Que é a participação do corpo escolar por completo, corpo este composto por

alunos, pais, professores, coordenação pedagógica, direção escolar e os demais funcionários.

Com as respostas colhidas e avaliadas, se terá uma base de qual caminho seguir, de como gerir

essa escola manuseando as ferramentas corretas. Pois nessa resposta estará explicito o que e

desejado por todos em relação a escola e ao ensino.

Após a definição do marco referencial faz-se necessário conhecer a realidade da escola

e de todos que participam desse meio, é a partir disso que aparece os problemas e

possivelmente as soluções. O primeiro passo dessa fase é a Avaliação dos resultados do ano

anterior, conforme o exemplo na tabela abaixo:

PROBLEMAS CONCRETOS O QUE FAREMOS PARA SUPERAR ESTE PROBLEMA (Exemplos)

PROPOSTAS DE AÇÃO (TIPOS)

(Exemplos)

1. A indisciplina e a violência estão altas na escola

Palestras na escola; reuniões com os pais; definir normas com os alunos.

1, 3 e 4

2. Ameaçar, falar alto, gritar com os alunos

Formação dos professores; Respeito ao aluno.

1,2

3. Avaliação do Aluno muito rígida e tradicional

Curso sobre avaliação e conversa com os pais.

3

Tabela 1: Como organizá-los. Fonte: Padilha, 2001.

Se na elaboração do marco referencial do projeto político pedagógico é preciso a

participação coletiva, para produzir a proposta de ação não é diferente, pois, segundo Padilha

Educação e compromisso social

34

(2001), cada segmento escolar deve indicar os problemas, de acordo com seu olhar. Contudo,

a definição do orçamento é importante nessa etapa, visto que seu uso será essencial em

determinadas propostas de ação.

O próximo passo da fase exige a “leitura de mundo" da realidade escolar “Ela

caracteriza-se por considerar aspectos relacionados a dimensão cotidiana da escola e da

comunidade, que fazem parte de sua área de abrangência, enfatizando sobretudo os

elementos culturais dos sujeitos e dos segmentos que nela atuam direta ou indiretamente”

(PADILHA, 2001, p. 86). Ou seja, é com a participação e conhecimento da realidade de todos

os envolvidos com o projeto e dos resultados obtidos no ano anterior, que as propostas de

ações tomarão rumo.

Para concretizar o projeto político pedagógico e realizar as propostas de ação,

determinar a programação das atividades é essencial nessa fase. Ela acontecerá de acordo

com os passos anteriores, com ênfase as necessidades e os problemas da maior parte da

comunidade escolar. Por último, o desenvolvimento de uma redação da programação das

atividades e das etapas anteriores, “será a base para a elaboração “definitiva” do documento

do projeto político-pedagógico da escola” (PADILHA, 2001, p. 89).

Considerações finais

Portanto, o estudo que realizamos através dos textos nos propiciou a evidenciar que

em uma sociedade capitalista, guiada sob a ideia da competitividade, da individualidade e do

lucro, a escola necessita criar mecanismos de enfrentamento para mudar a realidade. A gestão

democrática se configura como um desses mecanismos. Esse modelo de administração é

descentralizado e se estrutura sob um esquema de coletividade. Todos os sujeitos da escola

possuem responsabilidades e importância em um mesmo grau.

No bojo de uma instituição democratizada o Projeto Político Pedagógico se estrutura

como um guia para uma educação libertadora e de qualidade social. Sendo assim, é

indiscutível a importância que o PPP desempenha na instituição escolar, pois ele traz debates,

conflitos de ideias, desafios, que mostra a necessidade de se pensar em uma gestão

democrática da educação que favoreça a classe trabalhadora, onde os seus interesses sejam

ouvidos e não silenciados por aqueles que veem o processo educativo a partir de uma

perspectiva meramente técnica, em que a formação dos sujeitos vai além da ideia de somente

qualificação de mão de obra para o mercado de trabalho, mas que comtemple todas as áreas

Educação e compromisso social

35

da vida em sociedade. A pesquisa ainda segue em curso, os autores continuaram o

desenvolvimento do artigo investigando a realidade concreta das escolas.

Referências

BORDGNÓN, Genuíno. Caminhar da educação brasileira: muitos planos, pouco planejamento In: SOUZA, Donaldo Bello; MARTINS, Angela Maria (Orgs.). Planos de educação no Brasil: planejamento, políticas, práticas. São Paulo: Edições Loyola, 2014.

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FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo, Paz e Terra, 1997.

FRIGOTTO, Gaudêncio. A produtividade da escola improdutiva: um (re)exame das relações entre educação e estrutura econômico-social capitalista. 9ª ed. São Paulo: Cortez, 2010.

OLIVEIRA, Dalila Andrade. Educação e planejamento: A escola como núcleo da gestão In: OLIVEIRA, Dalila Andrade (Org.). Gestão democrática da Educação: desafios contemporâneos. Petrópolis: Vozes, 1997.

PADILHA, Paulo Roberto. Planejamento dialógico: Como Construir o Projeto Político Pedagógico da Escola. São Paulo: Cortez, 2001.

PARO, Vitor Henrique. Gestão democrática da escola pública. 3ª ed. São Paulo: Editora Ática, 2008.

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Educação e compromisso social

36

PARTE 2. EDUCAÇÃO DO CAMPO, RIBEIRINHA, QUILOMBOLA E INDÍGENA

Educação e compromisso social

37

A CIRCULARIDADE DO SABER EM TERRITÓRIOS RURAIS DO MUNICÍPIO DE ABAETETUBA/PA: O ENSINAR-APRENDER DE CRIANÇAS PELA DIVERSIDADE E CULTURA

Ianny Cabral Pereira10

Eliana Campos Pojo11

Introdução

Este projeto está fundamentado na ideia da circularidade do saber, visão cunhada pelo

educador e antropólogo Carlos Rodrigues Brandão, que reconhece a existência do saber a partir

das várias interlocuções sociais e, portanto, o saber abarca um conjunto de intertrocas, maneiras

de fazer, de criar que, ensinadas informalmente ou não, que transcendem gerações constituindo

um dado construto cultural (BRANDÃO, 1997).

Nesses termos, a investigação dirige-se primeiramente para a comunidade do Cujari,

localizada na área rural do município de Abaetetuba-PA, buscando caracterizar e mapear o saber

que circula nesta comunidade, na perspectiva de analisar a cultura pelas vozes das crianças. Para

isso, nos direcionamos junto e com elas a partir de suas interações, laços familiares e,

principalmente, seus brincares, sem contar na observação sobre as relações que elas estabelecem

com a escola, na perspectiva de problematizar a educação do campo e uma possível

endoeducação do lugar.

Diante disso, os espaços educacionais rurais, infelizmente tais escolas ainda padecem com

uma infraestrutura precária e, também, raramente tais instituições problematizam a importância

dos saberes de povos tradicionais (tradições, costumes, manifestações, ritos), enquanto circuitos

culturais que educam no ordinário da vida (BRANDÃO, 2015).

Além disso, no tocante a educação escolar, ganha sentido discutir a dimensão dos saberes,

dado que o próprio paradigma educacional e as instituições educacionais são desafiadas a

mudarem suas práticas de forma que problematize e reinvente as condições concretas da vida das

pessoas. Sobre tal especificidade territorial e dos sujeitos, o Decreto n. 6040, de sete de fevereiro

de 2007, que institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e

Comunidades Tradicionais.

10 Universidade federal do Pará. E-mail: [email protected] 11 Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

38

Nesse contexto, tais fazeres, saberes e práticas das crianças nos remete as palavras do

antropólogo, ao afirmar que a educação acontece em vários espaços onde há relações sociais.

Dessa forma, seja na rua, na família, na escola, na igreja, no trabalho, no assentamento, nas

associações, nas comunidades e lugarejos, enfim, sempre estamos vivenciando situações de

aprendizagem e, assim, de modo prático a vida se mistura com a educação. Para aprender, para

ensinar, para aprender-e-ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para conviver (BRANDÃO,

1993).

No caso das crianças em territórios rurais, elas possuem ricas experiências, interações e

ao se apropriarem das culturas do meio social, elas se expressam e reinventam o mundo que os

circundam. A autora afirma que elas produzem e interpretam sua própria cultura por meio do

brincar nas águas, nos quintais, em árvores, nos trapiches e matas em contextos rurais e

amazônicos (POJO, 2017).

Assim, acreditamos que ao investigar as diversidades de infâncias a partir dos modos de

vida em grupos de pertencimento, construiremos “Mapeamentos socioculturais das infâncias

amazônidas”. Diante disso, este projeto objetivou-se problematizar e praticar a pesquisa

participante com as crianças das comunidades do Cujari (Vila de Beja), visando a construção de

uma possível caracterização simbólica e territorial das comunidades, como forma de registro do

lugar.

1 Materiais e métodos

Trata-se de um projeto de pesquisa o qual foi adotado as dimensões do saber ancorados

pelo educador e antropólogo Carlos Rodrigues Brandão, cujos pressupostos perpassam

concepções de educação enquanto uma prática social sobreposto no cotidiano dos sujeitos.

Os procedimentos metodológicos que foram desenvolvidos na pesquisa, destacamos:

levantamento bibliográfico, subsídio fundamental para construir um quadro referencial

consistente sobre o objeto e a temática em questão, bem como para uma fundamentação teórico-

metodológica adequada; levantamento documental que trace o perfil sociopolítico das

comunidades (PPP, escolas, associações, igrejas) associado aos eixos que perpassam a pesquisa,

campo-saber-criança-cotidiano.

A pesquisa deste projeto escolheu e delimitou, inicialmente, a comunidade do Cujari, que

fica localizada em Abaetetuba-Pa. Toda travessia do projeto é voltada para as experiências das

crianças em seus ciclos de vida embora envolva os diálogos com os demais atores da comunidade.

Educação e compromisso social

39

Inicialmente realizamos reuniões com a comunidade envolvendo lideranças, docentes e famílias

das crianças com intuito de apresentar a proposta e formalizar as parcerias.

Foi realizado trabalhos de campo para mapear as crianças e suas respectivas famílias, os

brincares presentes na comunidade, o trabalho pedagógico da escola Cujari, a organização

comunitária e histórica da comunidade e, ainda, identificar potencias lideranças da comunidade

(agricultores, pescadores, extrativistas, contadores de história) para nos narrar/ socializar a pratica

social exercida no cotidiano do trabalho, de festa, de lazer.

Após esta etapa, realizamos entrevistas com lideranças e familiares responsáveis pelas

crianças em busca de compreender as principais formas de convívios, de laços familiares, de

educação de casa e de vida escolar; assim como realizamos andanças no território com vistas a

proceder observações a fim de elencar os saberes e práticas culturais em torno do trabalho,

envolvendo a pesca, o extrativismo do açaí, a produção de carvão, agricultura.

2 Resultados e discussão

Inicialmente foram realizadas quarenta pesquisas de campo na comunidade do Cujari, Com

o compacto trabalho de campo realizado em 2019, na oportunidade estabelecemos uma relação

mais próxima com os moradores da comunidade, com a escola, com os professores e com as

crianças. Além de desenvolver um convívio com a comunidade e colher dados característicos

daquele local por meio do brincar das crianças e diálogos com as pessoas, pontualmente foi

possível alcançar parte dos objetivos, destacando alguns aspectos do cotidiano, conjugados no

tripé: Lugar-território, Criança e Cultura que evidenciam. Diante disso, foram observados alguns

pontos importantes como:

Existe todo um cotidiano de práticas comuns das crianças no que tange suas brincadeiras

em mediação com a natureza daquele contexto rural/ambiental/social/geográfico, isto é, as

crianças em seu fazer principal – brincar -, se utilizam das árvores, dos quintais, de áreas livres.

Na comunidade do Cujari é comum nos depararmos com crenças, mitos, linguajares

sendo parte da conversa cotidiana. Afirmam a existência de um ser que faz com que “pessoas

fiquem desnorteados e se percam na mata (conhecido por curupira)”. É forte a ligação de muitos

moradores com a religião católica, mais especificamente com Santo Antônio -, padroeiro do lugar

e, é considerado parte do surgimento da comunidade. Além disso, possui, ainda, uma única escola

Educação e compromisso social

40

municipal denominada de Escola municipal de Ensino Infantil e Fundamental do Cujari, a qual

comporta alunos da educação infantil (a nível de pré-escola) e uma turma multissérie.

Ali, se presencia como parte da identidade cultural, dentre outros aspectos o respeito

pela natureza. É comum avistarmos na comunidade moradores cuidando de suas plantações e

animais bem como frequentemente estarem se banhando no rio Arienga ou no igarapé Cujari. As

crianças brincam com a natureza, seja desenhando na estrada em uma parte que é de areia ou

brincando com o cachorro. Em suma, é cultural as pessoas da comunidade fazerem uso da

natureza para viver e aprender algo dela.

Destacam-se outras brincadeiras: brincar de peteca, de carrinho, de boneca, de desenhar

no chão, de pira-pega, de fazer comidinha, de colher frutos para o consumo, de correr, de pular

etc. Mapear alguns dos saberes pelas crianças. Elas possuem o conhecimento sobre os elementos

da lavoura dos pais, sobre a produção da farinha nos retiros, reconhecem alguns tipos de árvores

frutíferas (esse aspecto encontra-se em processo de captação).

Neste contexto, através da vivencia com os sujeitos da comunidade observou-se, que o

brincar circula-se como uma atividade de grande importância para as crianças e adultos, pois são

através das brincadeiras que eles desenvolvem seus conhecimentos, interação social, aspectos

culturais e proporciona o lazer.

A autora afirma que as crianças produzem e interpretam suas próprias culturas por meio

dos brincar nas águas, nos quintais, em árvores, nos trapiches e matas em contextos rurais e

amazônicos. Elas promovem ações de alteridades, a ser aprendida por adultos e entre elas

próprias. Além disso, nos territórios rurais, elas possuem ricas experiências, interações e ao se

apropriarem das culturas do meio social, elas se expressam e reinventam o mundo que os

circundam (POJO, 2017).

De acordo com Brandão (2015) que alguns dos brincares e outros fazeres das crianças

fazem parte do trabalho de campo e, realizar atravessamento aos seus “círculos de vida que

fazem parte de um modo geral do seu ciclo de vida” de que elas convivem, com ou sem a

participação direta de seus pais ou responsáveis, destacando o brincar de tomar banho no

igarapé Cujari ou no rio Arienga, de andar em meio a mata em busca de plantas para brincar, de

subir em árvores nos quintais e mais seus convívios familiares, nas pontes e trapiches, entre

trocas com grupos de idade (BRANDÃO, 2015).

Educação e compromisso social

41

Também foi possível compreender a relevância da natureza como meio de sustento, que

acarreta com sigo muitos significados, pois é visível o sentimento de pertencimento dos sujeitos

com natureza e a influência direta no cotidiano da comunidade seja no extrativismo artesanal,

no brincar com natureza, no descanso do dia a dia, na utilização de ervas medicinais que são

encontradas na mata, no uso do rio Arienga como passagem de matéria, tijolos e frutos para

comercialização assim, como o Igarapé Cujari que é uns dos lugares de lazer das crianças e

adultos desde lugar.

Sendo assim, os “Povos e Comunidades Tradicionais são grupos culturais diferenciados e

que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam

e usam territórios e recursos naturais como condição para a sua reprodução cultural, social,

religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e

transmitidos pela tradição”; e os “Territórios tradicionais, os espaços necessários à reprodução

cultural, social e econômica dos povos e comunidades tradicionais, sejam eles utilizados de forma

permanente ou temporária” (BRANDÃO, 2007).

São comunidades que possuem um conjunto de fazeres-saberes sobre a vida ribeirinha

que são criados e recriados em sintonia com os recursos naturais, ou seja, há uma atitude

prospectiva de reinvenção dos conteúdos culturais existentes nesses territórios, consequência

não apenas de razões práticas de gestão da vida, mas também de uma curiosidade que os move

e que os coloca na condição de ‘atravessados’ à natureza, ao mesmo tempo que seus valores do

conviver, suas tradições ricas de simbologias amazônicas convertem-se em processos educativos

no ordinário da vida (POJO, 2017).

Considerações finais

A partir dessa investigação (em andamento), foi possível identificar que as crianças

aprendem, interagem, convivem e exercem brincares cotidianamente à geografia das águas, aos

diversos caminhos das matas e terras, no entremeio dos quintais e trapiches. Na comunidade do

Cujari-PA elas fazem uso do ambiente e seus recursos, dos tempos da vizinhança, do trabalho dos

pais, das marés, do sol e da chuva em suas brincadeiras; consequentemente tais vínculos e

experiências influenciam em sua formação como morador da comunidade, como por exemplo o

ato de colher e plantar frutos para consumo e comercialização, as formas de participarem nos

Educação e compromisso social

42

retiros ajudando na produção da farinha, as diversas formas reinventadas de brincar com/na água

etc.

Em suma, sua contribuição acadêmica e formativa atingirá os seus participantes diretos:

educadores, pesquisadores e os estudantes. Somado a isto, está premente o debate caro e

relevante para a sociedade e educação contemporânea, a que diz respeito dos Povos Tradicionais

da Amazônia em suas educações, nos instigando questionar as necessidades sociais, educacionais

e políticas para esses povos como demanda de vida. Assim, dar visibilidade as experiências

camponeses e seus modos de resistir são salutares para se pensar e até construir outras

significações teóricas e epistemológicas, outras maneiras de agir, de desenvolver políticas sociais

e do aprendizado de uma outra sociabilidade.

Referências

BRANDÃO, C. R. Olhar o mundo e ver a criança: ideias e imagens sobre ciclos de vida e círculos de cultura. Crítica Educativa (Sorocaba/SP), V.1, n.1, p. 108-132, jan./jun. 2015.

BRANDÃO, C. Reflexões sobre como fazer trabalho de campo. Sociedade e Cultura, v. 10, p. 11-28, 2007.

BRANDÃO, C. R. O que é Educação. São Paulo: Editora Brasiliense, 1993.

POJO, E. C. Gapuiar de saberes e de processos educativos e identitários na comunidade do Rio Baixo Itacuruçá, Abaetetuba/Pa. Doutorado em Ciências Sociais. Campinas: IFCH/UNICAMP, 2017. 243f.

Educação e compromisso social

43

CRIANÇAS, LEITURA E ESCRITA: EXPERIÊNCIA EXTENSIONISTA EM ESCOLA DO CAMPO

Ediuma Cordeiro de Oliveira12

Raimundo Nonato Falabelo13

Introdução

Cada criança dentro ou fora da escola apresenta uma singularidade de ser, de

raciocinar e de enxergar o mudo a sua volta, as vezes nem com tanta nitidez como um adulto.

Dentro do seu campo de conhecimento, as crianças criam e diversificam sua aprendizagem a

cada dia, de maneira diferente, o que torna desapropriada para a família e principalmente

para a escola, pensar em uma educação universalizada, sem considerar as dificuldades de

aprendizado que as crianças paralelamente umas às outras podem apresentar e como essas

dificuldades surgiram nessas crianças, no caso, o que as ocasionaram.

Para Vigotsky (1998b, p.130) o aprendizado das crianças deve ser voltado para os seus

pontos fortes, habilidades ou ações nas quais elas mais se empenham e se destacam, ou seja,

a aprendizagem se torna significativa e propicia à criança quando o seu melhor é realçado, no

intuito de trabalhar e superar as suas dificuldades apresentadas. Com isso, é necessário que a

escola, o professor e o corpo docente como um todo, compreenda e aceite o seu aluno de

forma inteira, pois esses discentes ao adentrarem os portões da escola trazem consigo uma

história de vida, história essa constituída no seu meio sócio cultural, na sua sociedade de uma

forma muito particular, que segundo Vigotsky (1998) também é constituída através de suas

relações interpessoais com as pessoas e com o meio onde a criança vive.

A criança, durante suas ações em seu cotidiano, absorve conhecimentos relevantes ou

não para uma pessoa adulta, mas, esses conhecimentos necessitam ser respeitados e

reconhecidos como parte integrante da própria criança, e essa compreensão e respeito deve

se estender à escola no ato do professor de ensinar os conhecimentos científicos, pois de

acordo com Vigotsky (1998b, p. 135) “o desenvolvimento espontâneo da criança é

ascendente, enquanto o desenvolvimento dos conceitos científicos é descendente”, ou seja,

12 Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected] 13 Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

44

os conhecimentos espontâneos, no caso adquiridos pela própria criança, tende a crescer,

ajudando-a a progredir sua capacidade de pensar e aprender, enquanto que os

conhecimentos científicos tendem fazer a criança compreender e exercitar um conhecimento

adquirido por outra pessoa diminuindo sua capacidade própria de aprendizado.

Durante o seu aprendizado, e principalmente durante o desenvolvimento da leitura e

escrita, a criança relaciona a palavra com o conhecimento que tem por experiência de vida,

pois conhecimentos que proporcionam a criança ler e escrever não se desenvolve

naturalmente, mas precisam das relações com o meio e com as pessoas para serem

apresentados, e dentro da escola por intermédio de uma aprendizagem mediadora.

Desta forma, no intuito desenvolver metodologias e estratégias com atividades

didáticas-pedagógicas que atendam a partir de uma perspectiva de inclusão crianças em

situação de vulnerabilidade social, econômica e educacional, buscando associar teoria e

prática na mediação pedagógica/docente no processo de ensino-aprendizagem dentro da

escola, o projeto de extensão “Criança, Linguagem, Cultura e Desenvolvimento Humano:

ações pedagógicas em leitura e escrita nos anos iniciais (1° ao 5° ano)” busca promover ações

didáticas e culturais voltadas para a ampliação e consolidação de competências/habilidades

leitora e escrita, incentivando a criança desenvolver características de leitor, assim como a

prática da escrita, proporcionando às crianças com dificuldades de aprendizado em ler e

escrever, ambiente propício para o desenvolvimento dos conhecimentos simbólicos,

ressignificação de saberes e aquisição de aprendizagem por intermédio da mediação de

atividades lúdicas, produtivas e interacionistas, priorizando experimentos com leitura e

escrita, tendo o lugar de atuação em uma escola do campo.

A escola da zona rural que abriga o projeto extensionista, fica a aproximamente 28

quilômetros da cidade de Irituia, chamada de Escola Horácia Ribeiro de Leão, fundada há mais

de 84 anos na comunidade de São Jorge, no interior do município. Escola do campo esta que,

a escassez de recursos didáticos, falta de estrutura física, assim como a falta de professor

academicamente formado ou em formação, atinge a qualidade da aprendizagem e

desempenho dos alunos, sendo, estes alunos na maioria, filhos de pequenos agricultores da

região, pessoas que trabalham com o plantio de mandioca, do açaí e do milho, pequenos

proprietários de terra e gado, e de empregados das grandes fazendas no interior do município,

Educação e compromisso social

45

oriundos da comunidade de São Jorge e as diversas proximidades da comunidade, o que

dificulta a locomoção das crianças à escola diariamente.

1 Materiais e métodos

Para a realização das atividades do projeto na escola de campo, Horacia Ribeiro de

Leão, fez-se preciso de primeira partida a observação do cotidiano das crianças da escola, no

mínimo três vezes por semana, durante dois meses, para estabelecer uma relação de

interação com esses discentes e levantar a quantidade de alunos que apresentavam

dificuldades de aprendizado relacionados ao desenvolvimento da leitura e escrita.

Posteriormente houve uma socialização com os professores em exercício na escola e com os

pais das crianças através de um encontro pedagógico realizado na instituição de ensino.

Com os dados coletados, as atividades de atuação pedagógica se iniciaram no dia a

partir do dia 24/11/2018 com uma oficina voltada para a valorização da Semana da

Consciência Negra, com atividades que proporcionassem a socialização do tema e a produção

textual, através de aula dialogada, confecção de objetos crioulos, pintura corporal, leitura de

histórias e produção de textos. Em seguida, no dia 23/03/2019 houve a segunda ação de

atuação pedagógica, após o período de férias do término do ano letivo, atividade esta, voltada

para a produção de histórias em quadrinhos através de um tema atual, a Alimentação

Saudável, onde os alunos puderem ter o primeiro contato com um notebook, assim como com

slide, como puderam também interagir uns com os outros e realizar suas produções artísticas.

E, finalmente no dia 30/03/2019 aconteceu o dia da leitura e interpretação textual,

onde se realizou atividades voltadas para a interpretação de textos através da leitura coletiva

em sala, e produção de textos e objetos relacionadas a fábula. Com isso, houve a análise das

observações e ações em sala no intuito de intercalar as pesquisas bibliográficas com essas

experiências vividas na escola, para assim desenvolver e elaborar este resumo expandido.

2 Resultados e discussão

As atividades do projeto foram realizadas no intuito de contribuir para o

desenvolvimento de crianças com dificuldades no ato de ler e escrever, promovendo e

instaurando através das atividades de atuação pedagógica, ambientes que favoreciam a

Educação e compromisso social

46

socialização das crianças, interação com o meio e incentivo a produções autenticas dos

próprios discentes, com atividades voltadas para experimentos e contatos com variadas

formas de leitura e escrita, para ampliação dos conhecimentos já adquiridos (pelos alunos)

dessas áreas, oferendo a junção do lúdico, cultural, social no desenvolvimento cognitivo, que

segundo Kramer (2007, p. 17) ajudam a recriar o conhecimento que as crianças já adquiriram

em suas relações, e que segundo Borba e Goulart (2007, p. 49) ajudam no desenvolvimento

da criança dentro e/ou fora da escola.

As oficinas, atividades e socializações desenvolvidas pelo projeto, assim como a busca

por conhecer mais da realidade das crianças da escola Horácia Ribeiro de Leão, e também a

realidade de suas famílias, da comunidade e de suas redondezas buscavam promover através

da proximidade do cotidiano dos alunos, atividades envolvendo leitura e escrita em diversas

produções textuais que viessem de encontro com suas necessidades, pois segundo Smolka

(1999, p. 63) a criança aprende fazendo, praticando, conhecendo, pois a palavra escrita cria

relações com o indivíduo que com ela mantém contato, então, quando a criança escreve,

aprende a escrever e aprende sobre a escrita, e assim, consequentemente, sobre a leitura.

Portanto, através de uma metodologia diversificada, o projeto se atenta em oferecer

aprendizagem através da mediação de conhecimentos, onde o mediador ao se relacionar com

o aluno, consegue mediar o conhecimento e ao mesmo aprender, durante essa troca de saber

que tem valor vice-versa, proporcionando dinamicidade e reconhecimento das necessidades

dos seus alunos elaboração e execução das atividades, que para Vigotsky (1998, p.155 a 156)

é necessário para que a criança encontre significado no ato de aprender e desenvolver a

escrita e a leitura, de forma com que não se torne cansativo ou entediante, mas algo em que

elas encontrem a necessidade de se aprender e exercitar.

Entretanto, mesmo com todas as limitações que a escola e os alunos apresentam

durante o processo de ensino-aprendizagem, ao não oferecer materiais de suporte

metodológicos para a realização das atividades, não disponibilização de um espaço lúdico,

cultural e acolhedor às crianças, assim como, a falta de interesse dos alunos em comparecer

as aulas, o projeto extensionista em atuação na escola de campo, Horácia Ribeiro de Leão,

busca associar os conhecimentos específicos com os conhecimentos e capacidade de

aprendizado desses alunos com dificuldades em ler e escrever, utilizando utensílios do dia a

dia das crianças, materiais recicláveis para produção artísticas, contos, relatos e histórias que

Educação e compromisso social

47

mais se aproximam de sua realidade de interior de zona rural, oferecendo assim, um ambiente

atrativo, produtivo e que respeita as criações e produções dos alunos, e os incentivem a

desenvolver a leitura e a escrita através de ações didáticas que mais condizem com a forma

em que as crianças apresentam mais facilidade em aprender, através das interações,

mediação e compreensão das dificuldades de se chegar, adentrar, e aprender na escola de

campo.

Conclusão

Assim, pode-se dizer que o projeto (ainda em desenvolvimento) caminha-se de

encontro com as deficiências do ato de aprender referente às dificuldades de ler e escrever

dos alunos das séries iniciais da escola Horácia Ribeiro de Leão, pois os resultados estão sendo

positivos em todo os âmbitos que envolvem a comunidade onde a escola está localizada,

mostrando que os discentes estão avançando em suas produções textuais, em sua oralidade,

conhecimento de seu mundo e interação com o meio social, pois, a cada ação do projeto

acadêmico, onde são realizadas as atividades pedagógicas, as crianças se desenvolvem ao

demonstrar que se expressam melhor a cada atividade proposta, demonstrando suas

opiniões, seus conhecimentos sobre o determinado tema que está sendo trabalhado em sala,

além da evolução na aquisição de uma boa escrita e leitura com noções ortográficas.

As crianças da escola de campo Horácia Ribeiro de Leão encontraram no projeto, uma

oportunidade que, em meio as limitações que a escola apresenta, de recriar um espaço de

superação tanto do aluno quanto do mediador, onde a aprendizagem é valorizada pela sua

forma significativa, proporcionado ao aluno (enquanto criança) iniciativas e incentivos que

melhorem seu aprendizado, através de oficinas, brincadeiras, criação de material didático e

produções autorais de textos.

Este trabalho vem como somatória à formação do pedagogo para reflexão de sua

formação continuada, assim como sobre sua prática, proporcionando uma visão da

importância de intervenção pedagógica no cotidiano escolar e sobre as dificuldades

enfrentadas durante o processo de ensino-aprendizagem que envolve professor e aluno

durante a alfabetização e letramento das crianças, assim como metodologias e iniciativas que

podem modificar essa realidade.

Educação e compromisso social

48

Referências

BORBA, Angela Meyer; GOULART, Cecilia. As diversas expressões e o desenvolvimento da criança na escola. In. BEAUCHAMP, Jeanete; PAGEL, Sandra Denise; NASCIMENTO, Aricélia Ribeiro do (Orgs.). Ensino fundamental de nove anos: orientações para inclusão da criança de seis anos de idade. Brasília: Ministério da Educação, 2007.

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FREIRE, P. A importância do ato de ler: em três artigos que se complementam. 4ª ed. São Paulo: Cortez, 2006.

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VIGOTSKY, L. S. A formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes, 2000ª

______. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

Educação e compromisso social

49

OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO DO CAMPO: UMA ABORDAGEM SOBRE O TRANSPORTE ESCOLAR NA E.M.E.F. JADIELSON DE SOUZA MORAES NO MUNICÍPIO DE CAMETÁ/PARÁ

Maiane da Silva Valente14

Eldieni Martins Monteiro15

Lesly Pacheco Freitas16

Viviane Teles Gomes17

Introdução

Inicialmente, partimos da ideia de que o campo é um objeto de discussões muito

importante abordado por muitos pesquisadores. É no campo que se produz e é dele que se

extrai uma diversidade de produtos e por isso é um dos elementos de suma importância para

as pessoas que nele vivem. É um povo que luta por seus direitos e um deles é a educação.

O campo é espaço emancipatório quando associado à construção da democracia e de

solidariedade de lutas pelo direito à terra, à educação, à saúde, à organização da produção e

pela preservação da vida.

Segundo o Projeto Base do programa Projovem Campo – Saberes da Terra: “A

Educação do Campo enfrenta processos de alienação dirigidos contra o camponês, tais como

o esvaziamento e a precarização da produção, da cultura e da escola do campo. Segundo essa

visão de alienação, existe um esvaziamento cultural do trabalho e da educação, provocado

pela desvalorização crescente da escola e da cultura do campo diante do avanço da

modernização da agricultura no Brasil”. Essa desvalorização da escola ocorre quando os alunos

têm um direito usurpado e também quando um serviço educacional obrigatório deixa de ser

ofertado, como, por exemplo, o transporte escolar.

O objetivo deste artigo é discutir e refletir sobre os principais desafios da educação do

campo, enfatizando a situação do transporte escolar na E.M.E.F. Jadielson de Souza Moraes,

14 Discente do curso de Pedagogia na Universidade Federal do Pará-UFPA/Campus Cametá. E-mail:

[email protected] 15 Discente do curso de Pedagogia na Universidade Federal do Pará-UFPA Campus Cametá. E-mail: [email protected] 16 Discente do curso de Pedagogia na Universidade Federal do Pará-UFPA Campus Cametá. E-mail: [email protected] 17 Discente do curso de Pedagogia na Universidade Federal do Pará-UFPA Campus Cametá. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

50

destacando a importância do mesmo, no processo de ensino-aprendizagem e para a educação

de modo geral, sendo que este se constitui um dos maiores desafios na garantia do acesso e

permanência dos alunos do campo na escola. O transporte escolar para os alunos que

precisam dele significa um meio de acesso à educação, de frequência às aulas e, também,

pode-se dizer que ajuda a reduzir o índice de evasão escolar, pois, possibilita aos alunos

residentes em áreas sem unidade escolar, ou que moram longe da escola, a devida inclusão

educacional.

Para compreendermos melhor iremos trazer brevemente os aspectos legais que

asseguram como deve ser o transporte escolar, os tipos de transporte escolar que existe quem

deve oferecer esse serviço e os recursos financeiros, dando ênfase a dois programas do

governo federal que auxiliam na garantia do transporte escolar, que são: o PNATE (Programa

Nacional de Apoio ao Transporte Escolar), e o programa CAMINHO DA ESCOLA.

O que diz a legislação sobre o transporte escolar

No artigo 205 da Constituição Federal de 1988, está determinado que “a educação é

um direito de todos e dever do Estado e da família, com a colaboração de toda sociedade”. A

partir disso, veremos agora algumas características importantes que nos possibilitam

compreender quais são os órgãos e instituições que as leis determinam que deva garantir o

acesso a essa educação através do transporte escolar. Para tanto, responderemos a algumas

indagações para melhor esclarecimento e compreensão dessa determinação.

Quem deve oferecer o transporte escolar?

Na Constituição Federal está determinado o direito ao transporte escolar, no artigo

208, inciso VII:

“O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:”

VII - atendimento ao educando, no ensino fundamental, através de programas suplementares,

de material-didático escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB n. 9.394/96) também reforça o direito ao

transporte escolar, ela afirma que os Estados devem assumir o transporte escolar para os

alunos da rede estadual de ensino, e os municípios serão responsáveis pelo transporte dos

alunos da rede municipal de ensino, artigos 10 e 11:

“Art. 10 - Os Estados incumbir-se-ão de:”

Educação e compromisso social

51

VII - assumir o transporte escolar da rede estadual;

“Art. 11 - Os municípios incumbir-se-ão de:”

VI - assumir o transporte escolar da rede municipal;

Quais são os tipos de transportes escolares previstos por leis?

Existem três tipos de transportes escolares mais utilizados pelos alunos para garantir

o acesso à escola, que são respectivamente:

Veículo automotor: ônibus, vans, Kombis e outros;

Barcos: (para rios e mar quando essa é a única forma de acesso). Para este tipo de

veículo é necessário autorização marítima para a navegação.

Bicicletas: destinam-se às crianças acima de seis anos e adolescentes, que moram na

zona rural. Para esse tipo de transporte exige-se que o caminho a ser percorrido seja

plano, longe de vias de grande tráfico e conhecido pelos pais ou responsáveis pelo

aluno. É exigido o uso de capacete e a responsabilidade pela manutenção da bicicleta

e de outros equipamentos é compartilhada entre os estudantes e seus pais;

Como deve ser o transporte escolar?

Para um veículo ser reconhecido como transporte escolar ele deve atender algumas

exigências estabelecidas pelo código de trânsito brasileiro e resoluções do Conselho Nacional

de Trânsito. Como por exemplo:

O veículo deve ter pintura de faixa horizontal na cor amarela, com quarenta

centímetros de largura, à meia altura, em toda extensão das partes laterais e traseiras

da carroceria, com o nome ESCOLAR, em preto, sendo que, em caso de veículo de

carroceria pintado na cor amarela, as cores indicadas devem ser invertidas;

Cintos de segurança em número igual à lotação;

É proibido transportar número de pessoas acima da capacidade permitida pelo

fabricante do veículo;

Para embarcações:

Todas as embarcações usadas no transporte escolar devem estar equipadas com

coletes salva-vidas na mesma proporção de sua capacidade, ter registro na Capitania dos

Educação e compromisso social

52

Portos e manter autorização para trafegar em local visível. Recomenda-se, ainda, que uma

embarcação possua:

Cobertura para proteção contra o sol e a chuva;

Grades laterais para proteção contra quedas;

Boa qualidade e apresentar bom estado de conservação.

Quais os recursos?

O Brasil tem um fundo nacional para o desenvolvimento da educação, representado

pela sigla FNDE.

O dinheiro (o recurso) do FNDE é destinado para merenda, livros, mobiliário,

equipamento, transporte escolar, e outras necessidades. O objetivo desse recurso é garantir

educação de qualidade para todos os brasileiros, é liberado pelo Tesouro Nacional e a principal

origem do dinheiro é a arrecadação da contribuição social do salário educação. Parte desses

recursos é repassado aos Estados, aos Municípios e às organizações não governamentais para

aplicação em programas ligados à educação, dentre outros, o transporte escolar.

Para garantir a segurança e a qualidade ao transporte dos estudantes o Ministério da

Educação por meio do FNDE mantém dois programas de apoio ao transporte escolar para os

alunos da educação básica que residem na zona rural: o Programa Nacional de Apoio ao

Transporte Escolar (PNATE), e o programa Caminho da Escola, que visam atender alunos da

rede pública de educação básica, preferencialmente os que residem na zona rural.

O Programa Nacional de Apoio ao Transporte do Escolar (PNATE) foi instituído pela Lei

nº 10.880, de 9 de junho de 2004, com o objetivo de garantir o acesso e a permanência nos

estabelecimentos escolares dos alunos do ensino fundamental público residentes em área

rural que utilizem transporte escolar, por meio de assistência financeira, em caráter

suplementar, aos estados, Distrito Federal e municípios.

O programa consiste na transferência automática de recursos financeiros, sem

necessidade de convênio ou outro instrumento similar, para custear despesas como,

reformas, seguros, impostos e taxas, pneus, câmaras, serviços de mecânica em freio,

suspensão, câmbio, motor, elétrica e funilaria, recuperação de assentos, combustível e

lubrificantes do veículo ou, no que couber da embarcação utilizada para o transporte de

alunos da educação básica pública residente em área rural. Serve, também, para o pagamento

de serviços contratados junto a terceiros para o transporte escolar.

Educação e compromisso social

53

O programa Caminho da Escola foi criado pela Resolução nº 3, de 28 de março de 2007,

e consiste na concessão, pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

(BNDES), de linha de crédito especial para a aquisição, pelos estados e municípios, de ônibus

zero quilômetro com capacidade para 23 ou mais passageiros/ estudantes e de embarcações

novas.

Seus objetivos são renovar a frota de veículos escolares, garantir segurança e

qualidade ao transporte dos estudantes e contribuir para a redução da evasão escolar,

ampliando, por meio do transporte diário o acesso e a permanência na escola dos estudantes

matriculados na educação básica da zona rural das redes estaduais e municipais. Também visa

à padronização dos veículos de transporte escolar, à redução dos preços dos veículos e ao

aumento da transparência nessas aquisições.

O Caminho da Escola beneficia, prioritariamente, os estudantes residentes na zona

rural da pré-escola, do ensino fundamental e do ensino médio das redes públicas de educação

estaduais e municipais que utilizam o transporte escolar para acessar as escolas.

A realidade local da Escola “Jadielson de Souza Moraes” em relação ao uso do transporte

escolar

Para aprofundamento desta pesquisa abordamos algumas questões essenciais que

surgiram antes e durante a pesquisa e se tornaram fundamentais para compreender a

realidade local no que diz respeito ao funcionamento, à segurança, à qualidade do transporte

escolar, etc. Para entendermos tais questões fizemos algumas indagações para os

entrevistados, como:

- No momento, está funcionando o transporte escolar?

-Quando não há o transporte como vocês fazem para chegar até a escola?

-A escola procura uma forma de intervir quando não há o transporte?

- Como é o transporte que vocês utilizam?

-Como é o barco? É seguro? É confortável?

-Como é o comportamento do barqueiro?

-Como vocês gostariam que fosse o transporte escolar?

Na localidade que realizamos a pesquisa, a partir das entrevistas (com pais, alunos e

direção da escola), pudemos diagnosticar problemas no atendimento do transporte escolar e

o principal naquele momento era a falta do transporte. Porém, tivemos a oportunidade de ir

Educação e compromisso social

54

até a casa de um dos barqueiros (que conduz a embarcação que serve para o transporte) e

observar a estrutura física do barco.

FIGURA 1

FONTE: Viviane Gomes.

Naquele momento os alunos ainda estavam sem o transporte e para chegar até a

escola faziam uso de embarcações próprias e comuns, como podemos ver na imagem abaixo:

FIGURA 2

FONTE: Lesly Freitas.

Educação e compromisso social

55

Com isso, constatamos que as embarcações utilizadas como transporte escolar,

(quando está em funcionamento) naquela localidade, não atende as exigências da legislação

como citamos anteriormente. Portanto, infringe a lei e, de certo modo, acaba colocando a

vida dos alunos em risco. Pudemos ter uma breve noção sobre isso através das entrevistas e

observações.

Mas, infelizmente o transporte escolar naquele momento não estava em

funcionamento na escola de nossa pesquisa. Segundo a diretora da instituição isso se deu pelo

fato de que o pagamento dos barqueiros estava em atraso e os mesmos usavam suas

embarcações para outros fins. Esses e outros problemas levam os alunos a se ausentarem nas

aulas e até mesmo à evasão dos mesmos.

Algo que nos chamou a atenção é o fato de que aqueles que deveriam ser beneficiados

pelo transporte escolar e até a própria comunidade não tem a mínima noção de como

realmente deve ser o serviço do transporte. A maioria desconhece a necessidade da qualidade

e da segurança que esse serviço educacional precisa ter. Para eles basta ter um barco comum

que leve e traga os alunos diariamente. Assim, reconhecemos a importância da Cartilha do

Transporte escolar, entendemos que garantir o acesso dos alunos até as escolas do campo é

direito de todos, de outro lado é responsabilidade dos órgãos públicos melhorar esta

qualidade uma vez que esta responsabilidade faz parte das políticas públicas educacionais.

Considerações finais

Assim sendo, a educação do campo se dá a partir do momento em que os sujeitos se

organizam e mostram para o Estado suas necessidades. São sujeitos que não se intitulam

“coitados” e sim sujeitos de direitos que precisam de uma educação emancipatória e uma

visão homogênea.

Portanto, a luta principal da educação o campo é a luta por direitos, o direito ao acesso

e a permanência na escola e o transporte escolar é um dos meios principais para a garantia

desse direito no meio campestre devido às escolas se situarem longe das residências dos

alunos. Desse modo, para que os alunos cheguem às escolas, principalmente os que moram

na localidade ribeirinha, até mesmo em local de difícil acesso, é necessário a garantia do

transporte escolar com qualidade, dignidade e segurança. Pois, a educação do campo se

Educação e compromisso social

56

sustenta na valorização da vida no campo, com o objetivo de construir políticas públicas que

garantam o direito de trabalhar e estudar no campo satisfatoriamente.

Reconhecer a real necessidade do transporte escolar para facilitar o acesso e a

aprendizagem dos alunos que residem no campo é importante para fortalecer a sua

identidade campestre. Entendemos que além das formulações de políticas educacionais é

necessário para que ocorra o processo da aprendizagem significativa nas escolas campesinas

um projeto pedagógico voltado a facilitar o acesso dos alunos, logo, é imprescindível existirem

políticas públicas que contemplem a oferta de transportes escolares adequados para os

estudantes da escola campestre.

Portanto, valorizar o acesso às escolas campesinas e reconhecer as especificidades da

educação do campo é primordial para que tais políticas e programas se concretizem.

Referências

ARROYO, Miguel Gonzáles; CALDART, Roseli Salete; MOLINA, Mônica Castagna (Org.). Por uma educação do campo. Petrópolis: Vozes, 2004.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988.

BRASIL. Decreto n. 6.768, de 10 de fevereiro de 2009. Disciplina o Programa Caminho da Escola. Congresso Nacional, Brasília, DF, 2009. Disponível em: www.planalto.gov.br. Acesso em: 30/05/2018.

BRASIL. Lei n. 10.880, de 9 de junho 2004. Institui o Programa Nacional de Apoio ao Transporte Escolar – PNATE. Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, Brasília, DF, 2012. Disponível em: www.fnde.gov.br. Acesso em: 30/05/ 2018.

BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Congresso Nacional, Brasília, DF, 1996. Disponível em: www.planalto.gov.br. Acesso em: 30 de mai. 2018.

GHEDIN; Evandro. Perspectivas sobre a identidade do educador do campo. In:______. (Org.). Educação do campo: epistemologias e práticas. 1ª ed. São Paulo: Cortez, 2012.

INEP. Cartilha do Transporte Escolar/Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP – Brasília: O instituto, 2005, disponível em: http://www.fnde.gov.br. Acesso em: 25/03/2018.

MEC. Resolução CD/FNDE N° 18, de junho de 2012. Dispõe sobre os critérios para utilização de veículos de transporte escolar adquiridos no âmbito do Programa Caminho da Escola. Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, Brasília, DF. Disponível em: www.fnde.gov.br. Acesso em: 01/06/2018.

SABERES DA TERRA, Projovem Campo - Projeto base. Programa nacional de educação de jovens integrada com qualificação social e profissional para agricultores (as) familiares. Brasília, 2008.

Educação e compromisso social

57

TRANSPORTE ESCOLAR: CONDIÇÕES ESTRUTURAIS DAS EMBARCAÇÕES E SUAS IMPLICAÇÕES NA VIDA ESCOLAR DE ALUNOS RIBEIRINHOS

Sávio Freitas da Cunha18

Franciely Farias da Cunha19

Eraldo Souza do Carmo20

Introdução

A educação do campo é compreendida como uma política pública voltada à população

rural, objetivando garantir o acesso à educação de crianças, jovens e adultos que vivem no

campo, porém não deve ser vista apenas como modalidade de ensino, mas também como

uma política pública que garanta à população rural os mesmos direitos educacionais

garantidos à população urbana, pois ainda há dificuldades para ter acesso às escolas. E as

desigualdades referentes à educação estão explícitas diante da realidade vivenciada pelas

pessoas do campo. Neste contexto, o transporte escolar de modo geral é o principal meio de

acesso à escola, sendo ofertado pelo Programa Nacional de Apoio ao Transporte Escolar

(PNATE) e pelo programa Caminho da Escola. Porém apesar de existirem esses programas há

diversas irregularidades em termos econômicos, políticos e educacionais que envolvem a

política do transporte escolar no Brasil, desse modo é importante analisar a forma de

contratação desse serviço adequando de acordo com o contexto e a realidade a qual essas

pessoas estão inseridas.

Falando especificamente do transporte escolar ribeirinho, é notório as diversas

dificuldades enfrentadas diariamente pelos alunos, que na maioria das vezes não são levadas

em considerações, afetando assim diretamente a vida educacional desses alunos. Ademais, a

educação escolar nas comunidades ribeirinhas é de suma importância para o

desenvolvimento dessas pessoas, e a oferta de um serviço adequado, seguro é indispensável

para a contribuição de uma educação com qualidade. Neste sentido, o objetivo deste trabalho

é analisar as condições das embarcações do transporte escolar e suas implicações no acesso,

18 Universidade Federal do Pará/Campus Cametá. E-mail: [email protected] 19 Universidade Federal do Pará/Campus Cametá. E-mail: [email protected] 20 Universidade Federal do Pará/Campus Cametá. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

58

permanência e aproveitamento escolar dos alunos da EMEIF Juvenal Viana Teles, da Ilha de

Cuxipiari, no município de Cametá/PA.

1 Materiais e métodos

A pesquisa se configura dentro da abordagem qualitativa do tipo estudo de caso, sendo

desenvolvida em três fases, que englobaram a revisão de literatura, a pesquisa de campo e a

sistematização e análise de dados. Na abordagem qualitativa, segundo Guerra (2014, p. 11),

o cientista objetiva aprofundar-se na compreensão dos fenômenos

que estuda – ações dos indivíduos, grupos ou organizações em seu ambiente ou contexto social –, interpretando-os segundo a perspectiva dos próprios sujeitos que participam da situação.

O tipo de pesquisa utilizada foi o estudo de caso que é a história de um fenômeno

passado ou atual, elaborada a partir de múltiplas fontes de provas, que pode incluir dados da

observação direta e entrevistas sistemáticas, bem como pesquisas em arquivos públicos e

privados (VOSS; TSIKRIKTSIS; FROHLICH, 2002). Neste sentido, será possível reunir

informações detalhadas dentro do contexto da realidade dos alunos ribeirinhos da Escola

Municipal de Educação Infantil e Fundamental Juvenal Viana Teles, localizada na Ilha de

Cuxipiari, no município de Cametá/Pa. Essa instituição de ensino no ano de 2018 atendia 105

alunos, distribuídos na educação infantil e ensino fundamental, sendo que todos os alunos da

escola utilizavam o transporte escolar que era ofertado a partir de 2 embarcações.

A primeira fase relacionada a revisão de literatura, teve a finalidade de realizar um

levantamento bibliográfico sobre o transporte escolar e a territorialidade ribeirinha na

Amazônia. Nesse processo recolheu-se artigos em periódicos e anais de eventos, livros,

capítulos de livros, teses e dissertações por meio da internet e em bibliotecas. Também foi

realizado levantamento documental sobre as leis, programas, regulações oficiais que

estabelecem os marcos legais do transporte escolar no Brasil e em Cametá.

Na fase da pesquisa de campo, que segundo Severino (2007), o objeto/fonte é

abordado em seu meio ambiente próprio, nas condições naturais em que os fenômenos

ocorrem, sendo assim diretamente observados, foi adotado como instrumento de coleta de

dados a observação, que segundo Lakatos (2003), é uma técnica de coleta de dados para

conseguir informações e utiliza os sentidos na obtenção de determinados aspectos da

realidade. Não consiste apenas em ver e ouvir, mas também em examinar fatos ou fenômenos

Educação e compromisso social

59

que se desejam estudar, sendo assim um elemento básico de investigação científica, utilizado

na pesquisa de campo. Além da observação, foi utilizado também a aplicação de questionário,

realizada com 40 alunos do 6º ao 9º ano e também com os condutores das embarcações. De

acordo com Severino (2007), o questionário é um conjunto de questões, sistematicamente

articuladas, que se destinam a levantar informações escritas por parte dos sujeitos

pesquisados, com vistas a conhecer a opinião dos mesmos sobre os assuntos em estudo.

Por fim, foi feito a sistematização e análise dos dados coletados de todas as etapas da

pesquisa, com base na análise de conteúdo que é um conjunto de técnicas de análise das

comunicações pontuadas na pesquisa de campo que tende a obter por meio de

procedimentos sistemáticos e objetivos da descrição do conteúdo das comunicações

indicadoras que permite a indução e a conclusão dos conhecimentos referentes às categorias

de produção/recepção das mensagens (BARDIN, 2011).

2 Resultados e discussão

No dia 29 de novembro de 2018 foi realizado na EMEIF Juvenal Viana Teles/Ilha de

Cuxipiari, a aplicação de questionário com 2 barqueiros e também com 40 alunos do 6º ao 9º

ano, para levantamento das condições estruturais das embarcações e suas implicações na vida

escolar de alunos ribeirinhos, sendo que esta escola apresenta o menor quantitativo de

embarcações no município de CametáqPA, segundo informações da Secretaria Municipal de

Educação - SEMED.

Figura 1: Visita realizada na EMEIF Juvenal Viana Teles, na Ilha de Cuxipiari/Cametá-PA, para aplicação de questionário com alunos e condutores das embarcações, no dia 29 de novembro de 2018.

Fonte: arquivo da pesquisa

Educação e compromisso social

60

A partir da aplicação de questionário foi possível observar que a maioria dos alunos

são do gênero masculino (67,50%), possuem idade entre 11 e 21 anos, gastam em média de 5

a 35 minutos até chegar na escola (67,50%), mas por outro lado, alguns chegam a permanecer

de 45 a 55 minutos dentro da embarcação (25,00%) (Figura 2).

Figura 2: Percentual da média de tempo gasto até o transporte escolar chegar na EMEIF Juvenal Viana Teles na Ilha de Cuxipiari, município de Cametá, no ano de 2018.

A partir desses dados podemos observar que o perfil de alguns desses alunos é de

jovens que encontram-se com distorção idade-série, isso se deve ao fato de que esses alunos

passam por sequências reprovações e que acabam abandonando os estudos por alguns anos,

retornando com defasagem em relação à idade considerada adequada para cada ano. Neste

contexto, segundo o panorama do Unicef:

A distorção idade-série imobiliza milhões de meninas e meninos brasileiros, deixando-os atados ao ciclo do fracasso escolar. Esse fenômeno atinge, principalmente, quem vem das camadas mais vulneráveis da população e corre sério risco de exclusão, estando mais propenso a abandonar a escola para ingressar no mercado de trabalho de modo prematuro e precário, sem concluir os estudos. São crianças e adolescentes já privados de outros direitos constitucionais, que não têm assegurados os direitos de aprender e de se desenvolver na idade apropriada. (Unicef, p. 4).

Os direitos dos alunos de permanecerem na escola são gradativamente violados. A

política pública do transporte escolar que vem para assegurar não só o acesso, mas também

a permanência do educando do campo nas escolas, apresenta uma série de irregularidades

que podem afetar no rendimento dos alunos, contribuindo assim para a evasão escolar. Um

dos fatores que contribuem para isso é o longo tempo de viagem até chegar na escola.

2,50

22,50 22,50 22,50

5,00

20,00

5,00

0,00

5,00

10,00

15,00

20,00

25,00

Perc

en

tua

l

Em média quanto tempo você gasta até chegar na escola?

< 5 min 5 min 15 min 25 min 35 min 45 min 55 min > 55 min

Educação e compromisso social

61

De acordo com Fox (1996), as grandes distâncias entre as comunidades rurais e a

escola acarretavam em viagens longas e, consequentemente, restringia as atividades

familiares, recreativas e extracurriculares, bem como limitava o tempo de sono e a atenção

em sala de aula. Como foi constatado na pesquisa os alunos também permanecem durante

um longo tempo na embarcação e por conta disso é comum chegarem cansados, com fome e

sem disposição para estudar. Com base nos dados verificou-se que 30,77% dos alunos

disseram que se sente bem ao chegar na escola, porém o mesmo percentual é apresentado

por aqueles que disseram que se sentem cansados (30,77%), seguido dos que se sentem com

fome (19,23%) e sem disposição (15,38%) ao chegar na escola.

A maioria considera o transporte escolar desconfortável (60,00%), porque é muito

lotado (54,84%), muito quente (29,03%) e por conta do barulho (16,13%). No âmbito do

sistema de transporte, o conforto está relacionado com a satisfação do usuário e com aspectos

qualitativos, tais como, o comportamento dos motoristas, a temperatura interna do veículo,

as condições de ventilação e de limpeza, o ruído e etc (YAMASHITA e BRAGA, 1994). De acordo

com EBTU (1988), a lotação nos transportes escolares é a característica mais importante do

usuário e se constitui num parâmetro de fácil mensuração para avaliar o nível de conforto.

Figura 3: Percentual da sensação dos alunos com relação a chegada na escola após o trajeto realizado pelo transporte escolar da EMEIF Juvenal Viana Teles na Ilha de Cuxipiari, município de Cametá, no ano de 2018.

Na pesquisa realizada com os barqueiros observou-se que eles têm idade entre 25 e

31 anos, possuem o ensino médio completo e trabalham com o transporte escolar de 1 a 2

anos de tempo. Quando não pode pilotar a embarcação quem o substitui é o irmão. Além

disso, constatou-se que os barqueiros afirmam transportar no mínimo 20 alunos e alguns

chegam a transportar em média até 30 alunos na embarcação.

30,77

30,77

19,23

15,38

1,92

1,92

0,00 5,00 10,00 15,00 20,00 25,00 30,00 35,00

Cansado

Me sinto bem

Com fome

Sem disposição

Enjoado

Com dor nas costas

Percentual

Como você se sente ao chegar na escola?

Educação e compromisso social

62

Verificou-se também que os 2 barqueiros fazem entre 10 a 15 paradas para embarque

dos alunos. As embarcações ofertadas para o transporte escolar dos alunos na Ilha de Cuxipiari

tem 5 anos cada e pertencem ao próprio barqueiro que considera regular o estado de

conservação. As embarcações não possuem os itens que são obrigatórios estar presentes na

embarcação, como a proteção do motor na embarcação, pintura lateral, tacógrafo e colete

salva vidas, além do condutor que não possui licença para pilotar embarcação.

Segundo a lei nº 9.503 de 1997 do Código de Trânsito Brasileiro (BRASIL, 1997), o

condutor do veículo destinado ao transporte escolar deverá atender aos requisitos

estabelecidos no Código de Trânsito Brasileiro e quando se trata de embarcação, possuir o

nível de habilitação estabelecido pela autoridade competente. A partir dessa premissa, a

capitania dos portos exige que o condutor das embarcações devem ser habilitados e possuir

matrícula específica na capitania. O guia do transporte escolar elenca os pré-requisitos para o

transporte, onde o veículo ou embarcação deve conter todos os itens obrigatórios para o seu

devido funcionamento. Neste sentido, todas as embarcações usadas no transporte escolar

devem estar equipadas com coletes salva-vidas na mesma proporção de sua capacidade, ter

registro na Capitania dos Portos e manter a autorização para trafegar em local visível.

Recomenda-se, ainda, que a embarcação possua cobertura para proteção contra o sol

e a chuva, grades laterais para proteção contra quedas, boa qualidade e apresentar bom

estado de conservação. Com base nessas informações, percebemos o alto nível de

irregularidades cometidas no que diz respeito a oferta do transporte escolar fluvial. Este

serviço que é um direito do aluno, vem sendo realizado sem o devido planejamento e de forma

que não garante a segurança daqueles que o utilizam e todas essas irregularidades refletem

na vida escolar dos educandos, uma vez que se for ofertado de maneira precária, causará

prejuízo no rendimento escolar de estudantes que dependem desse serviço.

Conclusão

O presente trabalho possibilitou analisar as implicações das condições das

embarcações do transporte escolar no acesso, permanência e aproveitamento escolar dos

alunos da EMEIF Juvenal Viana Teles, da Ilha de Cuxipiari, no município de Cametá/PA. Os

dados demonstraram que os alunos permanecem por mais de uma hora dentro da

embarcação do transporte escolar e não sentem motivação ao chegar na escola, devido essa

rotina cansativa. Com relação às condições estruturais das embarcações, os alunos

Educação e compromisso social

63

consideram desconfortável, por conta das condições dentro do veículo, como a lotação,

temperatura, barulho e etc.

Esse cenário se agrava ainda mais, pois as embarcações não são adequadas para

ofertar esse serviço, tendo em vista, que não atendem os requisitos básicos de segurança,

apresentando alto nível de irregularidades, prejudicando assim o rendimento dos alunos

ribeirinhos dessa localidade, os quais apresentam um atraso em seus estudos, diagnosticado

pela distorção idade-série. É muito comum ocorrer evasão em escolas que atuam nessas

condições, nas quais não respeitam os direitos dos alunos, principalmente quando se trata de

alunos do campo, que vivem em uma dinâmica diferente da região urbana, onde as suas

peculiaridades da vida rural, apesar de ser amparada por lei, não são respeitadas. Portanto,

garantir que a política pública do transporte escolar seja ofertada com qualidade é um grande

passo para que esses alunos não só tenham acesso a escola, mas que também possam

permanecer, tendo um bom aproveitamento escolar.

Referências

BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Tradução Luís Antero Reto e Augusto Pinheiro. São Paulo: Edições 70, 2011.

BRASIL. Código de Trânsito Brasileiro. Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9503.htm. Acesso em: maio/2019.

EBTU. Empresa Brasileira de Transportes Urbanos. Planejamento da operação do sistema existente. Módulo de treinamento, STPP Gerência do sistema de transporte público de passageiros, Brasília, v. 4, 1988.

GUERRA, Elaine Linhares de Assis. Manual de Pesquisa Qualitativa. Belo Horizonte, 2014.

LAKATOS, Eva Maria. Fundamentos de Metodologia Científica. 5ª ed. Atlas. São Paulo, 2003.

SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do Trabalho Científico. 23ª ed. rev. e atual., São Paulo, 2007.

UNICEF. Panorama da distorção idade-série. Disponível em: https://www.unicef.org/brazil/media/461/file. Acesso em: maio de 2019.

VOSS, C.; TSIKRIKTSIS, N.; FROHLICH, M. Case research in operations management. International Journal Of Operations & Production Management, v. 22, n. 2, p. 195-219, 2002.

YAMASHITA, Y; BRAGA, G. Qualidade no transporte coletivo urbano-ônibus na visão dos 3 agentes (operador, usuário e gestor). Anais do VIII Congresso de Pesquisa e ensino em transportes – ANPET, Recife-PE, 1994.

Educação e compromisso social

64

OS SABERES E FAZERES DO MUNDO INSULAR NA CONSTRUÇÃO DO CURRÍCULO: UM RELATO SOBRE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DOS PROFESSORES DO SOME NO MUNICÍPIO DE

ABAETETUBA/PA

Merian Nascimento de Abreu21

Tatiana Monteiro Ribeiro22

Introdução

O DIMUAMA- Diversidade do Mundo Amazônico é um projeto desenvolvido por uma

equipe de professores do Sistema de Organização Modular de Ensino (SOME) no Município de

Abaetetuba (PA), com o objetivo de apresentar uma proposta de educação do campo que leve

em consideração a realidade das comunidades ribeirinhas do município dentro da diversidade

da Região Amazônica.

O SOME foi implantado no Município de Abaetetuba em meados de 1996, atendendo o

Ensino Fundamental e Médio, e na atualidade atende 21 comunidades ribeirinhas com

aproximadamente 2.700 alunos, com uma diversidade natural, social, econômica e cultural

que se forem trabalhadas de forma contextualizada enriquecem o processo ensino-

aprendizagem.

Como modalidade de ensino, o SOME funciona em quatro módulos durante o ano

letivo, agrupando as disciplinas afins que, durante 50 dias, concentram suas atividades

referentes ao ano. As equipes organizam suas atividades de modo a garantir a aprendizagem

levando em consideração o currículo formal que é apresentado pela SEDUC. Todavia, o

educador pode construir a partir da realidade encontradas nas diversas comunidades, um

currículo que atenda as expectativas e necessidades locais e de sentido a aprendizagem.

As diversas comunidades ribeirinhas do Município de Abaetetuba apresentam um

universo cultural, social, econômico e ambiental singular, tendo a sua organização e dinâmica

influenciada pelo regime das marés dos diversos rios que encontramos no município, os quais

são cruciais para a população já que são as vias de acesso, fonte de alimentação, renda e lazer.

O projeto DIMUAMA - Diversidade do Mundo Amazônico, foi elaborado no intuito de

construir um currículo real que contemple os saberes, sabores, cultura e cores das ilhas de

21 UFPA/Campus de Abaetetuba. E-mail: [email protected] 22 Secretaria de Estado de Educação do Pará. E-mail: [email protected].

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Abaetetuba, para que os conteúdos trabalhados em sala de aula tenham significado para os

educandos e os contemplem como construtores de conhecimentos e não meros expectadores

de conhecimentos elaborados a partir de uma visão exógena à sua realidade.

O DIMUAMA foi elaborado no ano de 2016 pelas professoras Merian Nascimento de

Abreu e Tatiana Monteiro Ribeiro e vem sendo desenvolvido desde o primeiro módulo do ano

letivo de 2016 pelas referidas professoras com a participação dos professores Edinaldo Costa

e Roseildo da Costa Farias, que buscam realizar um trabalho interdisciplinar entre as

disciplinas Artes, Estudos Amazônicos, Filosofia, Geografia e Sociologia. O projeto foi

desenvolvido em onze comunidades ribeirinhas do Município de Abaetetuba, sendo quatro

no ano letivo de 2016, quatro durante o ano letivo de 2017 e três no ano letivo de 2018,

abrangendo os seguintes rios: Rio Guajará de Beja, Rio Sapucajuba, Rio Caripetuba, Rio da

Prata, Rio Doce, Rio Xingu, Rio Panacuera, Rio Sirituba, Rio Ajuaí, Rio Tucumanduba e Rio

Urubuéua. Neste trabalho enfocaremos as edições que aconteceram na Escola Santo Afonso

localizada no Rio Xingu (ao norte) e na Escola Frei Paulino (ao sul).

As comunidades do Rio Xingu e Rio Panacuera apresentam semelhanças típicas das

comunidades ribeirinhas da Amazônia, mas com peculiaridades que marcam as relações

econômica e social, posto que, se em uma predomina a várzea baixa, o açaí e a pesca tornam-

se os produtos principais, enquanto na várzea alta, como é o caso da ilha Xingu, seus

moradores podem ainda ocupar-se de atividades agrícolas, como a produção de roças, e

atividades extrativas. Todavia, os rios são os elementos determinantes na mobilidade e

mesmo no fluxo da vida, os quais aliados a outros elementos configuram a diversidade cultural

da paisagem, manejadas a partir de conhecimentos que são repassados e atualizados a cada

geração, e, portanto, devem ser respeitados e considerados no processo educacional,

proposta a que nos propusemos no âmbito do DIMUAMA.

Educação e compromisso social

66

Figura 1: Localização das áreas onde se desenvolveram as duas etapas citadas do projeto: a saber, rio Panacuera e rio Xingu.

1 Materiais e métodos

O DIMUAMA é um projeto interdisciplinar que envolve as disciplinas: Artes,

Filosofia, Estudos Amazônicos, Geografia e Sociologia e busca produzir o conhecimento de

forma coletiva com a participação efetiva dos sujeitos do processo ensino-aprendizagem.

Nesse sentido busca-se desenvolver nos alunos competências e habilidades que os prepare

para a vida em sociedade.

Ao longo do desenvolvimento do DIMUAMA nas aulas de Estudos Amazônicos,

Filosofia, Geografia e Sociologia, nossas ações visam associar os conteúdos do currículo formal

com a realidade local e assim construirmos um currículo real, vivo e que proporcione aos

educandos o desenvolvimento das seguintes competências e habilidades:

Compreender os elementos culturais que constituem as identidades;

Compreender as transformações dos espaços geográficos como produto das relações

socioeconômicas e culturais de poder;

Compreender a produção e o papel histórico das instituições sociais, políticas e

econômicas, associando-as aos diferentes grupos, conflitos e movimentos sociais;

Compreender a sociedade e a natureza, reconhecendo suas interações no espaço em

diferentes contextos históricos e geográficos.

Na disciplina de Artes trabalhamos com os eixos: Artes Visuais, Dança, Música e

Teatros no intuito de que os alunos possam:

Educação e compromisso social

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Reconhecer as diferentes funções da Arte, do trabalho, da produção dos artistas em

seus meios culturais;

Reconhecer o valor da diversidade artística e das interpelações de elementos que se

apresentam nas manifestações de vários grupos sociais e étnicos.

O DIMUAMA – Diversidade do Mundo Amazônico é desenvolvido durante o

período letivo do módulo e compreende as seguintes etapas:

Apresentação do projeto a comunidade;

Levantamento bibliográfico realizado em sala de aula de acordo com a disciplina

ministrada;

Levantamento histórico, cultural, social, geográfico, ambiental e econômico da

comunidade realizado pelos alunos sob a coordenação dos educadores envolvidos no

projeto;

Atividades de campo;

Realização de oficinas com os alunos e comunidade;

Produção de trabalhos escritos, artesanais, ensaio de danças e de outras

manifestações culturais, as quais são apresentadas a comunidade;

Produção de alimentos a partir de produtos regionais;

E por fim, a Culminância do projeto com o Festival DIMUAMA, em que são

apresentados todos os trabalhos realizados durante o módulo, os quais buscam

retratar a integração do conhecimento formal com os saberes locais.

2 Resultados e discussão

O DIMUAMA edição Rio Xingu foi desenvolvido durante o segundo módulo do ano

letivo de 2017 na E.M.E.F. Santo Afonso. Inicialmente fizemos uma reunião com a comunidade

escolar para apresentarmos nosso projeto e falarmos da importância dele na construção de

uma proposta de educação contextualizada que respeite e valorize a realidade local e possa

ser um instrumento de transformação social. Nesse debate, incentivamos a participação de

todos os membros da comunidade para que possamos ter o conhecimento prévio da realidade

e assim iniciarmos nossas atividades educativas tendo nossos educandos como os agentes

fundamentais dentro do processo. Nesse contexto, compreendemos que a:

A educação do campo é a que valoriza os saberes da população do campo, saberes culturais e experienciais. Saberes produzidos nas práticas sociais, nos

Educação e compromisso social

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processos culturais, relações sociais e interpessoais. Saberes da terra, da mata, das águas (OLIVEIRA, 2012, p. 9).

Dentro da sala de aula, associamos os conteúdos programáticos das diversas

disciplinas trabalhadas durante o módulo à realidade da comunidade. Buscamos trabalhar a

história, a cultura, os saberes, as memórias, os fazeres, a religiosidade, a cartografia do lugar,

sem perder de vista o diálogo, o respeito e a importância de todos no processo ensino-

aprendizagem. As atividades em classe e extraclasse sempre estão associadas com a realidade

e integradas nas diversas disciplinas.

A relação e integração com a comunidade aconteceu através de trabalhos de pesquisa

sobre a história do lugar, no qual buscamos através de conversas informais e entrevistas com

os moradores mais antigos, os fatos e acontecimentos que constituem a memória do povo do

Rio Xingu. Foram semanas de conversas, nos quais muitos reviveram momentos marcantes de

suas vidas, se emocionaram em recordar tais fatos, nos dando elementos para compreender

a identidade do povo daquele lugar e assim nos forneceram informações que enriqueceram e

dinamizaram nossas aulas. Também promovemos oficinas de culinária regional para a

comunidade aprender a fazer diversos pratos doces e salgados tendo como matéria prima o

açaí, a mandioca e o miriti, produtos que fazem parte da cultura milenar da Amazônia.

Em sala de aula, os conteúdos ganharam vida, novo significado e despertaram nos

educandos um interesse maior pelas atividades desenvolvidas em sala de aula e fora do

ambiente escolar. Nossas atividades priorizaram a troca de experiências, de saberes e fazeres

e a construção de um conhecimento que valorize a cultura, a identidade e as peculiaridades

da comunidade. Os alunos deixam de ser meros expectadores de um currículo dissociados de

sua realidade e se transformam em sujeitos que constroem coletivamente o conhecimento.

É claro que não abandonamos o currículo formal, mas constituímos um currículo real

com as dimensões da realidade amazônica e em especial, das ilhas de Abaetetuba que tem

intrínseco os conhecimentos, saberes e fazeres de populações que habitam a Amazônia há

milhares de anos.

A educação ribeirinha não acontece somente no espaço e no tempo da sala de aula, mas envolve o modo de vida da população ribeirinha, bem como o pescar, plantar e colher como forma de manter a subsistência alimentar (COELHO, et al., 2015, p. 53).

No final do segundo módulo do ano de 2017 que aconteceu no dia 31 de agosto do

ano de 2017, tivemos a culminância do projeto o Festival DIMUAMA - edição Rio Xingu,

momento que apresentamos para a comunidade local e comunidades vizinhas à produção de

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nossos educandos no decorrer daquele módulo. Esses trabalhos envolvem trabalhos escritos

sobre a história do lugar com seus mitos e lendas, saberes, fazeres e sabores com as receitas

de produtos feitos com açaí, mandioca e miriti que fazem parte da cultura regional e que

podem gerar renda para a comunidade, trabalhos artesanais, levantamento cartográfico,

apresentações culturais que valorizam a cultura local.

Dentre os trabalhos apresentados nesta edição do DIMUAMA destacamos a produção

de material cartográfico (maquetes e mapas) feitos de miriti, produção escrita sobre o

histórico da comunidade, levantamento do capital natural do Rio Xingu, cartilha ambiental da

comunidade, os movimentos sociais como forma de resistência e re-existência da

comunidade, cartilha de memórias da comunidade, mosaicos feitos de caroço de açaí. Estes

trabalhos foram expostos e apresentados pelos alunos e fazem parte do acervo da Escola

Santo Afonso.

Nesse contexto, compreendemos que:

Na educação do campo na Amazônia, as relações entre os sujeitos, entre os saberes e as práticas sociais e culturais precisam ser construídas alicerçadas na dialogicidade, no compartilhamento dos sonhos e utopias de uma sociedade democrática e na luta política pela garantia de direito a toda população do campo (OLIVEIRA, 2012, p.11).

Figura 2: Poesias produzidas pelos alunos do 1º ano do Ensino Médio nas disciplinas Artes e Geografia. Arquivo Merian Abreu.

A efetivação do DIMUAMA traz um novo sentido ao nosso trabalho à medida que não

apenas transmitimos conhecimentos, mas temos o desafio de construirmos uma proposta

educacional que permita a troca e construção de novos conhecimentos, que esteja envolvida

com a luta dessas comunidades. Reconhecemos que não é fácil construir uma proposta deste

nível, são muitos encontros e desencontros, mas com certeza, nos dá uma visão mais ampla

Educação e compromisso social

70

das comunidades ribeirinhas do Município de Abaetetuba que possuem especificidades

encantadoras que precisam ser valorizadas para dar significado a educação oferecida nessas

comunidades. Assim acreditamos que:

São as lutas pela realização de uma educação como prática de liberdade, emancipatória e alicerçada na valorização e partilha dos saberes, sem hierarquização e com aprendizagens impregnadas de sentido, integradas com a realidade e centralizadas no diálogo, ao tempo que atentas para a relação de poder que perpassam as relações entre os sujeitos e suas expressões de luta na sociedade. São os confrontos e desencontros de um processo de ensinar e aprender, articulado na alternância de espaços e tempos e que apresentam desafios, como toda prática educativa, mas que se desenham como possibilidades educativas com, no e dos sujeitos dos diferentes campos do território brasileiro (CAVALCANTE; VERGUTZ, 2014, p. 386).

Esta edição do DIMUAMA no Rio Xingu tem caráter único por ser uma localidade com

uma riqueza cultural imensa que era repassada de forma oral e que tivemos o prazer de fazer o

registro através das falas de moradores antigos que se emocionaram durante as entrevistas e

nas diversas apresentações que foram realizadas, destacamos a apresentação do Boi Bumba

Campo Verde que faz parte da cultura centenária da Comunidade do Rio Xingu e que há muitos

anos não se apresentava, foi revitalizado pelos educandos com o envolvimento dos membros da

comunidade que socializaram o que tinham de registro escrito e resgate da memória através de

histórias orais, bem como a apresentação realizada pelas mães dos alunos que destacou a

biosociodiversidade da Amazônia.

Figura 3: Produção cartográfica dos alunos do 6º ano do Ensino Fundamental nas disciplinas Artes e Geografia. Arquivo Merian Abreu.

Educação e compromisso social

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DIMUAMA - Edição Rio Panacuera

O DIMUAMA edição Rio Panacuera foi realizado nos meses de setembro e outubro de

2017 durante o terceiro módulo desse ano letivo na E.M.E.F. Frei Paulino. Na primeira semana

de setembro realizamos a reunião com a comunidade escolar e após apresentarmos nossa

proposta de trabalho para aquele módulo, definimos coletivamente a temática a ser

trabalhada: ‘O Capital Natural do Rio Panacuera” e a partir de então iniciamos nossas

atividades pedagógicas sempre relacionando os conteúdos de sala de aula com a temática

definida.

As turmas do sexto ao nono ano do Ensino Fundamental ficaram sob a coordenação

das professoras Merian Nascimento de Abreu e Tatiana Monteiro Ribeiro que em suas aulas

de Artes, Estudos Amazônicos e Geografia, trabalharam a paisagem, o lugar e o espaço

geográfico como produtos da ação humana e que refletem a sociedade que o produziu,

destacando a importância social, econômica e cultural da floresta e do rio para a comunidade.

Destacamos a importância cultural do açaí que além de ser um produto básico na alimentação

da população tem uma importância econômica gerando renda e trabalho no período da safra.

O rio que é a única via de acesso a comunidade é fonte de alimentação e de renda para a

comunidade, destacando-se a pesca do camarão e de vários tipos de peixes.

Nas aulas os conceitos trabalhados na disciplina de Artes ganharam formas e cores,

com os recursos naturais encontrados na floresta e no rio Panacuera presente nas aulas e

sendo utilizados como matéria prima de produtos artesanais. Os alunos do sexto ano

pesquisaram sobre os produtos que podemos fazer com o açaí e elaboraram um livro de

receitas intitulado: “Gostosuras e doçuras de Açaí”; os alunos do sétimo ano elaboraram uma

cartilha sobre a diversidade étnico racial do Rio Panacuera; a turma do oitavo ano pesquisou

sobre a cultura da comunidade destacando as festas tradicionais e a diversidade religiosa; os

alunos do nono ano elaboraram um trabalho escrito em forma de cartilha intitulado: “O

capital natural do Rio Panacuera”.

As turmas do Ensino Médio ficaram sob a coordenação dos professores Edinaldo Costa,

Merian Nascimento de Abreu, Roseildo Farias e Tatiana Monteiro Ribeiro, sendo que no

primeiro ano a professora Tatiana relacionou o conteúdo programático da disciplina à

produção de açaí e do miriti e durante as aulas práticas os discentes construíram mosaicos

utilizando impressionismo e pontilhismo tendo como matéria prima o açaí e o miriti produtos

abundantes na comunidade. Nas disciplinas de Geografia e Sociologia, os professores Edinaldo

Educação e compromisso social

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Costa e Roseildo Farias através de um estudo interdisciplinar elaboraram junto com os alunos

o trabalho intitulado: “Um olhar sobre o Rio Panacuera no mundo globalizado”, destacando o

uso das tecnologias e as repercussões para o homem do campo.

As turmas do segundo e terceiro ano sob a coordenação da professora Merian

Nascimento de Abreu construíram um cenário sobre os impactos ambientais no Rio

Panacuera, pesquisaram como o açaí vem sendo cultivado na comunidade, pesquisaram sobre

as outras fontes de renda dos moradores e fizeram um levantamento estatístico da população.

Os alunos do terceiro ano e a comunidade participaram de uma oficina culinária ministrada

pela professora Merian Nascimento de Abreu sobre como produzir as doçuras e gostosuras

de açaí e miriti.

Durante a execução do projeto DIMUAMA na escola Frei Paulino percebemos uma

mudança positiva em relação à participação e aprendizagem dos alunos, pois à medida que

percebiam que sua realidade tinha entrado nos conteúdos trabalhados em sala de aula

participaram mais das discussões e das atividades propostas em sala de aula. Assim,

reforçamos nosso pensamento que:

[...] o currículo é um instrumento de confronto de saberes: o saber sistematizado, indispensável à compreensão crítica da realidade, e o saber de classe, que o aluno representa e que é resultado das formas de sobrevivência que as camadas populares criam. Valoriza o saber de classe e coloca como ponto de partida para o trabalho educativo (VEIGA, apud LIMA 2001, p. 4).

A culminância aconteceu no dia 31 de outubro de 2017 na qual apresentamos a

comunidade escolar o resultado de tudo que trabalhamos durante o primeiro módulo com

várias apresentações artísticas e culturais, gincanas, mostra dos trabalhos realizados em sala

de aula, degustação de bolos, doces, cremes, brigadeiros e pudins feitos com açaí e miriti, e,

principalmente demonstrar que a aprendizagem é um processo coletivo que deve envolver

todos os sujeitos sociais e que o conhecimento é resultado dos saberes de várias gerações e

de vários povos, portanto os saberes da comunidade são fundamentais no processo

educativo.

O projeto vem atender uma expectativa do grupo de professores que defendem a

construção de um currículo específico para as escolas do campo que respeite e valorize os

saberes locais, a especificidade das comunidades, relacione o local e o global e dê real

significado ao processo ensino-aprendizagem. Todavia, tal proposta não é tarefa simples nem

fácil de ser desenvolvida, pois dentre outros tantos, exige compromisso e contato assíduo

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entre educadores e educandos, ao passo que a operacionalização do módulo tem duração de

dois meses. Nesse sentido, é necessário que o currículo se constitua a partir das experiências

locais, dialogando com as tecnologias e saberes que os educandos desenvolvem e vivenciam,

em seu espaço de vivência (LIMA, 2011, p. 10).

Figura 4: Cartilha sobre O capital natural do Rio Panacuera elaborada por alunos do 9º ano do Ensino Fundamental na disciplina Estudos Amazônicos.

Figura 5: Mosaico produzidos com caroços de açaí, construídos pelos alunos do 1º ano do Ensino Médio, na disciplina de Artes. Arquivo Merian Abreu.

Conclusão

O DIMUAMA é um projeto elaborado e executado por um grupo de professores que

atuam no Município de Abaetetuba. No entendimento do grupo, a educação do campo deve

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ser um processo construído com e para os sujeitos do campo, tendo em consideração a

diversidade socioambiental, os conhecimentos, saberes e fazeres dos povos que habitam

esses espaços. Nesse contexto a educação se torna a principal alavanca no sentido de

transformar positivamente realidades vividas, tendo em conta a riqueza socioambiental que

permeia o mundo social dessas particularidades.

Entendemos que tal proposta é apenas um pequeno passo rumo à um ideal de

educação do campo, cuja efetivação se dê de forma democrática e participativa. No entanto

torna-se imperioso entender a necessidade de se oferecer aos sujeitos do campo,

oportunidades de participarem e contribuírem com seus conhecimentos, saberes e fazeres na

construção e reconstrução de novos conhecimentos que proporcionem a transformação

social, econômica e ambiental e a construção de uma sociedade com mais justiça e igualdade

social.

Referências

ARROYO, M. G.; CALDART, R. S.; MOLINA, M. C. (Orgs.). Por uma Educação do Campo. Petrópolis: Vozes, 2004. CAVALCANTE, Ludmila Oliveira Holanda; VERGUTZ, Cristina Luísa Bencke. As aprendizagens na Pedagogia da Alternância e na Educação do Campo. Revista Reflexão e Ação. Santa Cruz do Sul, v. 22 n 2, p. 371-390. Jul./dez 2014. COELHO, W.N.B; SANTOS, R. A.; SILVA, R.M.N.B. Educação e Diversidades na Amazônia. São Paulo: Editora Livraria da Física, 2015. GHEDIN, Evandro; BORGES, Heloísa da Silva. Educação do Campo: a epistemologia de um horizonte em formação. Manaus: UEA Edições, 2007. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008.

LIMA, Elmo de S. Currículo das escolas do campo: perspectivas de rupturas e inovação. In: LIMA, Elmo de Souza; SILVA, Ariosto Moura da. Diálogos sobre Educação do Campo. Teresina: EDUFPI, 2011.

OLIVEIRA, Ivanilde Apoluceno. Educação no campo na Amazônia: bases socioculturais, epistemológicas e matrizes educacionais. XVI ENDIPE- Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino/UNICAMP, Campinas, 2012.

TRIPP, D. Pesquisa-ação: uma introdução metodológica. Revista Educação e Pesquisa. São Paulo, v. 31, n. 3, p. 443-466, set./dez. 2005.

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CAMPESINATO FEMININO

Paulo Emil Rodrigues chaves23

Antônia Correa Novaes24

Marilia dos Santos Fernandes25

Introdução

Partindo da reflexão de que, feminismo e campesinato são temas carregados de

contradições em si e entre si. A abordagem ao campesinato, necessariamente, implica admitir

e explicitar as relações entre camponeses e camponesas que vivem e trabalham no campo

(CARVALHO, 2005). Logo: eles e elas constroem vínculos entre si, sendo que estes, por sua

vez, podem ser chamados de relações de gênero. Tais relações não podem ser negadas ou

tidas como algo sem importância, pois, se fazem no e do cotidiano das pessoas, em todos os

espaços.

Mesmo quando realiza atividades voltadas para o fim produtivo da agricultura,

designadas geralmente como “masculinas”, a mulher é vista como uma “ajudante” e

normalmente recebe baixa remuneração (ou mesmo nenhuma remuneração) por seu

trabalho. As atividades agrícolas exercidas por elas são vistas como uma extensão intrínseca

às suas atribuições de mãe e esposa.

Uma das justificativas para classificá-las como “ajudante” está relacionada com o tipo

de trabalho executado na atividade rural, descrito como trabalho “pesado” ou “leve” Paulilo

(2009). Tal diferenciação é bastante imprecisa e possui marcantes traços culturais, uma vez

que o que é considerado trabalho “leve” ou “pesado” depende da perspectiva social analisada,

haja vista que na esfera de suas atividades, a mulher também executa trabalhos entendidos

como pesados, tais como a colheita de produtos agrícolas, os cuidados com os filhos.

23 Licenciatura Plena em Educação do Campo/2013; Especialização em Educação do Campo/2017- Universidade

Federal do Pará/UFPA. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Cidades, Territórios e Identidades/2019/UFPA - Campus Abaetetuba. E-mail: [email protected] 24 Licenciatura Plena em Educação do Campo/2012; Especialização em Educação do Campo/2017/Universidade Federal do Pará/UFPA. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Cidades, Territórios e Identidades/2019/ UFPA - Campus Abaetetuba. E-mail: [email protected] 25 Licenciatura Plena em Educação do Campo/2012; Especialização em Educação do Campo/2017/Universidade

Federal do Pará/UFPA. Mestranda do Programa de pós-graduação em Cidades, Territórios e Identidades/2018/UFPA - Campus Abaetetuba. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

76

O feminismo surgiu pela luta das mulheres para evocar o poder que as constitui como

seres humanos. O mesmo possui o objetivo de colocar as mulheres em equiparidade com os

homens (GEBARA, 2001). Por outro lado, se deve considerar que a igualdade entre homens e

mulheres, na sociedade capitalista não é possível (MÉSZÁROS, 2002).

Juntar os dois conceitos e afirmar que é possível o feminismo no campesinato é

bastante ousado e desafiador. Por isso tivemos algumas contradições destes temas, assim

como, entre ambos. Se é possível escrever sobre esta junção é porque já existem práticas que

apontam isto, por exemplo, nas elaborações da autora que tomaremos por analise.

O artigo está dividido em duas partes, na primeira discutiremos a organização do

trabalho na agricultura familiar, bem como o papel da mulher nas diversas atividades,

produtivas, considerando esse debate, partindo do pressuposto de que, na divisão social do

trabalho, coexistem dominação, complementaridade e vínculos sociais entre homens,

mulheres e crianças nos processos individuais e coletivos que vivenciam no dia a dia,

especialmente no caso do extrativismo.

Na segunda parte, trataremos da resistência e empoderamento feminino: novas

abordagens no meio rural brasileiro tendo por base as discussões de gênero, Paulilo (2009)

ressalta que considerar como trabalho inúmeras atividades desenvolvidas no lar e nas

propriedades agrícolas foi uma forma de torná-las visíveis e valorizadas. Para isso, os

movimentos de mulheres lutaram para que as esposas envolvidas na produção agrícola

familiar fossem consideradas “produtoras rurais” e não “do lar”. Nos apoiaremos em

trabalhos de; Gonçalves (2011), Mota (2008, 2010, 2012), Stancki (2003) entre outros.

1 A organização do trabalho da agricultura familiar

A organização do trabalho da agricultura familiar é determinada por uma forte

dependência da família em relação à mão de obra de seus membros e pela própria estrutura

interna e externa de suas unidades de produção. São os membros da família que executam

predominantemente as atividades no lote a partir de uma divisão do trabalho, segundo Garcia

Júnior (1983). Pois o trabalho depende de todas as pessoas que compõem o grupo familiar,

homens, mulheres e crianças.

É importante ressaltar que a divisão do trabalho é necessária para que todos os

membros familiares possam contribuir de alguma forma no dia a dia do lote. Para Garcia Júnior

Educação e compromisso social

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(1983), a divisão do trabalho era definida e delimitada de acordo com o sexo e a idade dos

indivíduos e evidenciada por delimitações de espaços laborais femininos e masculinos.

Nesse sentido Stancki (2003), admite que esta divisão pode ocorrer através da

separação das atividades de produção de acordo com o sexo das pessoas que as realizam, mas

não deve ser pensada de forma homogênea e linear, pois as delimitações de espaço masculino

e feminino variam e assumem concepções distintas, podendo tanto os homens quanto as

mulheres desempenhar atividades ligadas ao setor produtivo e reprodutivo.

Nesse caso, os filhos homens acompanham os pais nos trabalhos de brocar a terra, e

as meninas trabalham com as mães nos serviços domésticos, pois para os agricultores e

agricultoras, o trabalho da roça é mais difícil que os trabalhos domésticos. Para Mota (2008),

nessa divisão social de trabalho, as crianças (meninos ou meninas), em geral, acompanham as

suas mães, quando não estão na escola. Está embutida nessa prática tanto a usual “ajuda”

quanto o controle para que não fiquem “aprontando por aí” (MOTA, p. 158, 2008). À medida

que crescem, no entanto, os meninos afastam-se e passam a acompanhar mais o pai.

Mota (2008) apresenta três diferenças entre o trabalho do homem em relação ao da

mulher, trabalhos exclusivamente de homens (tirar e descascar coco e pescar em alto-mar),

trabalhos exclusivamente de mulheres (artesanato, afazeres domésticos e cuidar dos filhos) e

trabalhos realizados por homens e mulheres, dependendo do contexto (demais atividades).

Esse modelo de divisão do trabalho é percebido na pesquisa realizada com as

catadoras de mangaba, pois são as mulheres que têm de fazer a coleta da mangaba por ser

considerado um fruto delicado, já que as mulheres têm mais sensibilidade e delicadeza. Para

Mota (2005) as catadoras não concebem que certas capacidades são adquiridas socialmente

pela repetição dos movimentos concernentes à coordenação motora fina.

O trabalho da mulher é conceituado como inferior ao do homem, e tudo que a mulher

produz é considerado como ajuda. Mota (2008) ressalta que, apesar dessa classificação,

interpretamos que, aos homens, caberia prover o sustento da família e às mulheres,

complementá-lo, mesmo que, muitas vezes, elas aportem tanto quanto ou até mais do que

eles.

Há de ser ressaltar outros dois fatores que influenciam diretamente no trabalho

exercido pelas mulheres. O primeiro e relacionados os filhos que trabalham juntos com os pais

e outros aos filhos que trabalham fora do lote. No primeiro, Alves e Mota (p. 204, 2012),

relatam:

Educação e compromisso social

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Surgiram novos arranjos na organização do trabalho das famílias, um deles foi o afastamento da mulher em relação às atividades no roçado, as quais passaram a desenvolver outras atividades extra lote com a venda de produtos agrícolas em feiras locais. Segundo esses autores, tais arranjos também podem estar relacionados à fase evolutiva da unidade de produção familiar, pois com o crescimento dos filhos homens, reduz a necessidade de mão de obra da mulher no espaço de produção.

Neste caso, a mulher contribui de outras formas nos sistemas de produção, confecção

de artesanatos, a criação de pequenos animais, já no segundo caso, a mulher tem que

trabalhar junto com o marido. Segundo Alves e Mota (2012, p. 208-209),

Com isso, a mãe passou a trabalhar mais frequentemente na roça e a desempenhar tarefas anteriormente executada pelo filho. Além de novas atribuições na esfera do roçado, a mãe passou a executar outras tarefas no retiro durante o processo da fabricação da farinha.

O que também pode ser percebido que em muitos casos as mulheres têm que assumir

sozinha essa atividade, pois não tem marido e os filhos são muitos pequenos, e ainda não

participam do trabalho, mas já acompanham a mãe nos trabalhos, pelo fato de não haver um

lugar para deixar as crianças.

Ao analisarmos os textos de Dalva Maria de Mota, percebemos que o trabalho das

mulheres é de fundamental importância para o trabalho na agricultara familiar, pois além de

trabalhar com o marido ainda tem que cuidar da casa e dos filhos, assim aumentando a

jornada de trabalho da mulher, pois geralmente ela não conta com o apoio dos homens nesse

tipo de trabalho. Além de que, as mulheres também contribuem para o fortalecimento da

agricultura familiar, seja ele na produção de alimentos como também nas construções dos

espaços sociais do campo.

2 Resistência e empoderamento feminino: novas abordagens no meio rural brasileiro tendo por base as discussões de gênero

Nos trabalhos analisados de Dalva Maria da Mota, mostra a luta das mulheres por

autonomia, e empoderamento, sendo que a mulher conseguiu ao longo dos anos uma

presença bastante visível no ingresso ao mercado de trabalho, mas permanecem as

desigualdades, que se reflete em diversos aspectos, a destacar, a desigualdade de salários, a

ocupação de postos de trabalhos mais precários e com menor remuneração etc. O pagamento

da força de trabalho feminina é, na maioria das vezes, muito menor do que o valor pago pela

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masculina, permitindo concluir que “a precarização no mundo do trabalho vem atingindo

muito mais a mulher trabalhadora e acentua as desigualdades de gênero” (NOGUEIRA, 2004,

p. 73).

Dessa forma, pode-se observar que:

À dimensão feminina torna-se importante incorporar a análise das formas de organização social, política e econômica, na medida em que os dados estatísticos da Organização Internacional do Trabalho – OIT mostram que apesar dos avanços das mulheres em assumir novos postos de trabalhos, bem como, ampliarem os seus espaços de inserção e suas conquistas históricas no domínio do espaço público e os ganhos comparativos ainda deixa a desejar (GONÇALVES, 2011, p. 51).

Ainda Gonçalves (2011, p. 51) corrobora que:

Na mesma linha de pensamento, é preciso compreender a situação das trabalhadoras rurais, que em contexto diferenciado, também vêm passando por mudanças significativas ao longo dos anos, refletindo talvez em proporções mais acentuadas de desigualdade e pobreza. Vigueira (1995) afirma que as mulheres constituem cerca de 60% da população rural pobre do mundo, o que supera mais de um bilhão de pessoas.

Assim, a organização do trabalho no meio rural está organizada:

De acordo com Abramovay e Silva (2000) a divisão tradicional estipula a homens e mulheres formas diferenciadas de inserção no trabalho e na sociedade, essa divisão social entre os sexos condiciona à mulher à responsabilidade pelo espaço privado reforçando as condições de submissão, doação e sublimação de seus sonhos e desejos, além da invisibilidade embutida na ausência de sua participação na esfera pública (GONÇALVES, 2011, p. 51).

Ainda temos que o trabalho da mulher muitas vezes é reconhecido como “ajuda”, o

que não remete a importância que o trabalho da mulher tem na sociedade. Assim, Abramovay

e Castro (1998, p. 349), corroboram que “existe certa dificuldade em determinar as diferenças

entre produção e reprodução quando se fala de trabalhadora rural”.

O trabalho da mulher no meio rural vai além do processo produtivo, com muitas

funções. Nessas condições Gonçalves (2011, p. 56) analisa que:

No Brasil, o trabalho da mulher no âmbito do meio rural é também subestimado, à medida que há uma cultura patriarcal que atribui ainda à atividade doméstica como tarefa principal a ser desempenhada. Os estudos de Abramovay e Silva (2000) apontam certa dificuldade em determinar as diferenças entre produção e reprodução, quando se trata de trabalhadora

Educação e compromisso social

80

rural, visto que o processo reprodutivo inclui tarefas produtivas, tais como, o próprio trabalho agrícola, adubação, colheita e capinação.

Ainda para a autora é importante salientar que as discussões nesse sentido são

primordiais, pois há necessidade de “resistência e empoderamento das mulheres

trabalhadoras da agricultura familiar, com vistas a oportunidades de renda e igualdade entre

os gêneros” (GONÇALVES, 2011, p. 56).

Mota (2005) destaca que, faz-se necessário apresentar alguns estudos acerca da

discussão de gênero, na tentativa de refletir não só na perspectiva de uma pretensa igualdade,

mas necessariamente, na possibilidade de se pensar a diferença além do igual e do desigual,

ou seja, como Ferreira (1997, apud SILVA, 2008, p. 91), através do gênero rejeitar conceitos

que separam os sexos entre si, e considerar que os estudos deixam de ser isolados e passam

a acontecer através das relações entre homens e mulheres. Temos que as discussões sobre

gênero vêm ganhando maior visibilidade na década de 70. Segundo Silva (2008, p. 91).

Sendo assim, a discussão acerca do gênero ganha maior visibilidade a partir da década de 70, quando o termo é usado para teorizar a questão da diferença sexual. O gênero sublinha o aspecto relacional entre homens e mulheres, ou seja, nenhuma compreensão de qualquer um dos dois pode-se dar por meio de um estudo que os considere totalmente em separado.

Assim, sobre essa questão Meyer (2003, p.9) afirma que:

As relações de gênero são elementos constitutivos das relações sociais baseadas nas diferenças que distinguem os sexos e são, portanto, uma forma primária de relações significantes de poder. Os estudos de gênero procuram mostrar que as referências sexuais são culturalmente produzidas, por meio de símbolos, jogos de significação, cruzamento de conceitos e relações de poder, conceitos normativos, relações de parentesco, econômicas e políticas.

Nesse sentido, destacam que o empoderamento apresenta-se como um desafio para

as relações de poder existentes, visto que pode contribuir para a expansão da liberdade de

escolha e de atuação, além do aumento da capacidade de agir dos sujeitos sobre os recursos

e as decisões que afetam suas vidas, ou seja, abordar a questão de gênero, implica em

desvendar as relações de poder e hierarquia entre homens e mulheres. Estas reflexões fazem

parte das discussões acerca do movimento feminista, no qual a questão central é a

necessidade de politizar o espaço privado e a necessidade de participação das mulheres nos

espaços públicos, nas conquistas de seus direitos (como ao voto), às creches... enfim, na luta

Educação e compromisso social

81

concreta das mulheres. Este movimento cresce nas camadas populares, levando-as,

posteriormente, à sua auto-organização. Assim, Gonçalves (2011, p. 57) corrobora que:

Deste modo, “o processo pelo qual indivíduos, organizações e comunidades angariam recursos que lhes permitam ter voz, visibilidade, influência e capacidade de ação e decisão” [...] contribui para que mulheres e homens possam discutir e formular alternativas relacionadas aos temas que afetam suas vidas, podendo, com isso, possibilitar a superação das desigualdades de gênero, à medida que as mulheres conhecem/reconhecem que há uma ideologia de opressão perpetuando a discriminação em relação a elas.

No Brasil, há a preocupação pela busca da identidade política do movimento feminista,

por isto, inserem-se em partidos, associações, além do processo de participação da

constituinte em 1986 e a conquista dos direitos na constituição de 1988. Atualmente, a

participação das mulheres se dá em diversos setores da sociedade, graças à força dos

movimentos de reafirmação da identidade feminina. Vale ressaltar que os estudos de gênero

são úteis para explicar muitos comportamentos de mulheres e homens em nossa sociedade,

nos ajudando a compreender parte dos problemas e dificuldades que as mulheres enfrentam

na vida pública, na sexualidade, na reprodução da família e nas relações escolares.

A partir de então, as mulheres, progressivamente, passaram a ocupar o mundo do

trabalho. Assumir o novo papel social de profissional com carreira não modificou sua

identidade de mulher, apenas a ampliou. Agora, mais que mães e esposas, elas também são

donas-de-casa e profissionais.

Assim, a discussão do gênero passa para categoria social, como aponta Abramovay e

Castro (2000, apud GONÇALVES, 2011, p. 57) “(...) analisar papéis, responsabilidades,

limitações e oportunidades, que se dão de formas diferentes, para homens e mulheres, no

interior da unidade de produção, da família, da comunidade e da sociedade”.

Além de ressaltar a importante de se colocar o gênero à “resistência [como sendo] a

capacidade que os grupos oprimidos ou a minoria descobrem de operar com a visão dual e

que lhes permite transitar entre os valores da cultura dominante e os da sua própria cultura...”

(MENEGHEL, FARINA, RAMÃO, 2005, apud GONÇALVES, 2011, p. 57). Ainda apontam que a

“resistência e empoderamento, são modos de enfrentar os sistemas de

dominação/exploração baseados em gênero, raça e classe social” (MENEGHEL, FARINA,

RAMÃO, 2005 apud GONÇALVES, 2011, p. 57).

Educação e compromisso social

82

Considerações finais

Em quaisquer setores, sendo do âmbito econômico ou social, o trabalho e participação

das mulheres são essenciais, isto vemos desde os tempos remotos, quando observamos

verdadeiras guerreiras lutando pelo seu sustento e pelo seu espaço em quaisquer sociedades,

enquanto desempenhavam o indispensável papel de mãe, esposa e donas de casa. Observa-

se, pela pesquisa, que evoluímos muito nestas questões de superação das desigualdades e no

reconhecimento da importância do papel feminino no meio agrícola, embora se tenha pago

um alto preço para tanto. Contudo, vemos em nossa cultura uma dificuldade de aceitar a

realidade dos fatos de que apesar das diferenças físicas, homens e mulheres são igualmente

capazes no desempenho de todas as atividades. Portanto é evidente que as nossas

agricultoras ainda não ocupam a posição que lhes é devida, mesmo trabalhando tanto quanto,

e por vezes mais, que os agricultores homens.

É no seio familiar que acontece as relações de trabalho, gênero, produção e

reprodução, neste artigo buscamos a luz de alguns trabalhos da professora Dalva Maria de

Mota (2008, p. 165), analisar como vem se construindo essas relações no meio rural, e cita o

exemplo do extrativismo da mangaba pelo fato dos homens não se dedicam pois, consideram

“uma atividade de mulheres – que se caracteriza pela sazonalidade, por mecanismos de

socialização atribuídos as mulheres e pela execução de movimentos impróprios, que

poderiam pôr em questionamento até a masculinidade”.

Os reflexos nas hierarquias e no sistema de posições ocupadas pelos diferentes

membros da família estão em questionamento, com a valorização da fruta no mercado

regional, o reconhecimento da importância das mulheres na comercialização e a rejeição dos

jovens à participação no extrativismo.

De modo geral, o trabalho das famílias em suas unidades de produção é configurado a

partir de uma divisão social do trabalho pautado nas relações de gênero e hierarquias. No

entanto, é possível concluir que o trabalho feminino é de fundamental importância para toda

a família e que paulatinamente vem se quebrando paradigmas e as mulheres assumindo seu

papel na sociedade. Diversos esforços recentes têm sido realizados com o intuito de gerar

visibilidade ao trabalho da mulher rural. Dentre os quais, destacam-se certas correntes que

evidenciam a importância da mulher dentro da lógica produtivista da agricultura. Destacam-

se, também, abordagens quantitativas baseadas em métodos estatísticos, utilizadas para

demonstrar o papel que a mulher desempenha em determinadas áreas socioeconômicas,

Educação e compromisso social

83

dentre elas a agricultura. Em geral, o resultado desses indicadores estatísticos demonstra a

participação das mulheres dentro de uma perspectiva predominantemente masculina, haja

vista que os indicadores de gênero são construídos dentro da lógica da economia neoliberal

dominante.

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Educação e compromisso social

85

VACINAÇÃO NA ESCOLA, O ENSINAR LÚDICO EM UMA COMUNIDADE RURAL MARAJOARA: RELATO DE EXPERIÊNCIA

Raimara Suane P. Brito26

Camila Leal27

Sâmia Caroline B. Silva28

Ailini Danielle Ribeiro29 Introdução

A Educação em Saúde (ES) visa contemplar os princípios do Sistema Único de Saúde

(SUS) por intermédio da promoção da saúde e da conscientização do indivíduo e da

comunidade a fim de garantir uma formação cidadã e política (1).

Dessa forma, a articulação de meios que correlacionem educação e saúde, objetiva a

promoção da autonomia dos sujeitos na escolha de hábitos saudáveis que favoreçam a

minimização de riscos e possibilitem um viver mais saudável. Preconizadas pelas Conferências

Internacionais sobre Promoção da Saúde, as ações de promoção e de educação, nessa

perspectiva, devem contar com a participação ativa dos usuários desses serviços, os quais

possuem capacidade de decidir sobre questões que envolvem seu bem-estar, subsidiados

pelas próprias experiências e pelas práticas educativas (2).

É importante que o profissional de saúde saiba identificar quais problemas necessitam

de um trabalho de educação contínua. O sujeito portador de necessidades é sempre biológico,

social e subjetivo, assim como ele é também histórico. Por isto, a avaliação das necessidades

não deve ser somente epidemiológica. As situações nas quais a educação em saúde se aplica

são aquelas que exigem uma participação ativa do sujeito, possibilitando a transformação de

suas atitudes, conhecimentos e habilidades para lidar com os problemas de saúde/doença (3)

.

26 Universidade Federal do Pará. Escola de Ensino Técnico do Pará/Salvaterra. E-mail: [email protected] 27 Universidade Federal do Pará. Escola de Ensino Técnico do Pará/Salvaterra. E-mail: [email protected] 28 Universidade Federal do Pará. Escola de Ensino Técnico do Pará/Salvaterra. E-mail: [email protected] 29 Universidade Federal do Pará. Escola de Ensino Técnico do Pará/Salvaterra. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

86

As práticas educativas no contexto da enfermagem vêm sendo uma realidade cada vez

mais efetivada devido à mudança de paradigmas de atenção à saúde, partindo do modelo

biomédico falido para a implantação do conceito da promoção da saúde humana (4) .

O programa nacional de imunizações (PNI), criado em 1973, é responsável pela

organização da política nacional de vacinação da população brasileira. O PNI coordenou a

intervenção de saúde pública de caráter universal, contribuindo assim para a redução

mortalidade por doenças transmissíveis no Brasil. Por meio da vacinação alcançaram-se

muitas conquistas dentre elas a erradicação da febre amarela urbana, da varíola e da

poliomielite, controle do sarampo, do tétano neonatal e acidental, formas graves de

tuberculose, difteria e coqueluche (5).

As escolas infantis são instituições criadas para oferecerem condições que propiciem

o crescimento e o desenvolvimento equilibrado da criança. É nesse contexto que ganha ênfase

a equipe de saúde, que deve estar atenta para prevenir e intervir na saúde do infante (6).

A inserção da saúde no ambiente escolar guia a família e a sociedade na assistência às

crianças, e na manutenção e obtenção da saúde, baseando-se em orientações ao educando

para escolhas seguras e saudáveis. Essa sensibilização às crianças pode repercutir tanto nos

seus hábitos como nos de seus pais no ambiente familiar(7).

A prática da educação em saúde no ambiente escolar requer do profissional de saúde,

e principalmente de enfermagem, por sua proximidade com esta prática, uma contribuição

para que as crianças adquiram conhecimentos claros para o seu pleno desenvolvimento e

crescimento e melhorem a sua qualidade de vida.

O processo educativo almejou associar a teoria da educação em saúde: prática

educativa vivenciada durante a formação acadêmica em enfermagem e as práticas

pedagógicas compreendidas no curso de pedagogia. A importância de práticas preventivas e

educativas para as crianças levou as autoras a realizarem este estudo abordando o tema

vacinação destrinchando-o através de perguntas como: O que são vacinas? Como são feitas

as vacinas? E como elas funcionam?.

Materiais e métodos

Esta é a descrição de um relato de experiência, baseado na metodologia para a

assistência de enfermagem em saúde coletiva I. A atividade educativa foi realizada em uma

Escola Municipal de Ensino Infantil de Maruacá-Salvaterra, Marajó/Pará, durante uma

Educação e compromisso social

87

proposta para elaboração para um projeto cientifico de pesquisa voltado para a comunidade

idealizado na Feira de Ciências da Escola de Ensino Técnico do Estado do Pará- polo Salvaterra

por alunos do Curso Técnico em Enfermagem subsequente, em outubro de 2018. Participaram

desta iniciativa alunos de 5 a 8 anos, locados no ensino fundamental menor da instituição. Foi

utilizado como prática lúdica o teatro.

Inicialmente, a turma iniciou um trabalho quanti-qualitativo e buscou dados referentes

a realização da vacinação nestas comunidades rurais. Foi realizado para a obtenção destes

dados a coleta de informações por meio de um instrumento semi-estruturado na comunidade

escolhida, e importante reforçar que foi feito uma busca e realizado entrevistas em 100% das

casas da comunidade que continham crianças em idade vacinal, onde foi confirmada a

afirmativa da não realização de vacinação das crianças na comunidade envolvida.

No segundo momento foi realizada uma visita para reconhecimento e captação da

realidade para tal buscou se a parceria da escola infantil da comunidade, onde, em diálogo

com a diretora, houve a sugestão dos seguintes temáticas para serem abordados aos

estudantes. Por se tratar de experiência de ensino-aprendizagem, não houve necessidade da

formalização do procedimento de consentimento livre e esclarecido, previsto na Resolução N

466/12 do Conselho Nacional de Saúde.

De posse dessas informações, seguiu-se a elaboração do plano de atividades

educativas contendo assunto, objetivos, conteúdo, metodologia, recursos audiovisuais e

avaliação da aprendizagem. Utilizando-se de materiais didáticos, foram elaboradas estratégias

para que a atividade fosse dinâmica e envolvente, sendo o tempo oportunizado para que

houvesse a participação de todas as crianças assim, optou-se pelo teatro.

As atividades educativas foram ministradas na sala de áudio e vídeo da escola, foi

realizado algumas dinâmicas, os quais caracterizaram-se sob a forma de desenhos, vídeos

dinâmicas de roda com constatação de histórias e criação de um personagem. Todas as

atividades duraram em torno de 40 minutos.

Resultados e discussão

Como estratégia lúdica para reduzir a evasão nas campanhas vacinais e nas salas de

vacinas utilizou-se a mediação de estudantes do curso técnico em enfermagem caracterizados

em palhaços que buscou proximidades com as crianças da comunidade e informações sobre

Educação e compromisso social

88

o conhecimento prévio destas a respeito da temática, realizou-se um teatro interativo cuja a

temática discorria sobre a importância da vacina.

Foi trabalhado analogamente por meio de video “A Origem do Homen Aranha” a

sensibilização das crianças a respeito do ato de imunizar-se reforçando de que por mais que

“doa” a vacina, a mesma atua combatendo os vilões no nosso organismo. Através da palestra

foram trabalhados com os pais das crianças os métodos sobre a importância para a

erradicação das doenças e sua propagação.

Por meio da prática lúdica foi possível informar a população de estudo sobre os principais

cuidados em saúde voltados para a temática imunização/vacinação. Observou-se através de

estudos que estas crianças após a pratica lúdica compreenderam o papel da imunização e

tornaram-se transmissoras dos conhecimentos aprendidos.

Conclusão

A partir da realização das oficinas, foi observado que a estratégia adotada consolidou

uma medida eficaz de intervenção no processo saúde-doença, estabelecendo uma prática

educativa satisfatória. As discentes afirmam que estas oficinas são extremamente válidas para

integração dos saberes entre educadores e profissionais da saúde, na luta por um processo

educativo em saúde que valorize o cuidar e o educar na infância.

Com base neste estudo, novas estratégias devem ser incentivadas e implementadas

no sentido de estabelecer o cuidado continuado a estudantes desse grupo e a objetividade

das ações com a participação da família, uma vez que ela representa fator primordial na

promoção de saúde de escolares.

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Educação e compromisso social

90

OS NÍVEIS DE DESENVOLVIMENTO E APRENDIZAGEM DOS ALUNOS DE EDUCAÇÃO INFANTIL EM LOCALIDADES RIBEIRINHAS: COMUNIDADE DE RIO FURTADOS

Rodrigo Borges Miranda30

Nazareno Ferreira Farias31

Introdução

Através das inquietações que nos move a ir em busca de novos conhecimentos e de

procurar a compreensão pelo desenvolvimento e aprendizagem das crianças ribeirinhas a

partir do seu espaço natural de convivência e existência, e também das suas próprias

realidades de vida, culturas e contexto social, suas relações estabelecidas com o meio no qual

está inserida, foi o que fez com que se movesse a ir a campo e vivenciar essa experiência com

crianças das comunidades ribeirinha, mas especificamente na comunidade de Rio Furtados na

Escola Municipal de Ensino Fundamental Raimundo Inácio Ferreira, para assim estabelecer

uma relação de proximidade e confiança dessas crianças e assim além, poder também através

das leituras dos autores e teóricos compreender como funciona a formação destas crianças

enquanto que autoras do seu próprio processo de ensino e aprendizagem.

A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem um relevante papel no

desenvolvimento humano e social de todas as crianças de zero a cinco anos. Para tanto, o

diálogo é um instrumento fundamental para propiciar a constituição de uma prática

pedagógica pensada com as crianças, na perspectiva da valorização dos saberes e experiências

da infância, suas percepções sobre o mundo, seus sonhos, suas curiosidades para a construção

de novos saberes e o protagonismo infantil.

Este artigo tem por finalidade refletir sobre o diálogo de saberes no processo ensino

aprendizagem na educação infantil situada na comunidade de Rio Furtados as margens do rio

Tocantins localizado no município de Cametá. Partimos da concepção da necessidade de

compreendermos o contexto ribeirinho, o modo de vida dos sujeitos em interlocução com as

práticas de ensino. Nessa perspectiva, o estudo partiu da seguinte questão norteadora: Qual

30 Universidade Federal do Pará/UFPA. E-mail: [email protected] 31 Universidade Federal do Pará/UFPA. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

91

a contribuição do diálogo de saberes no processo ensino aprendizagem da educação infantil

ribeirinha, considerando as experiências socioculturais desse contexto?

1 Materiais e métodos

Diagnosticar através do contato direto com as crianças ribeirinhas e em seu próprio

contexto social/cultural o nível de desenvolvimento e aprendizagem, a forma de saberes

utilizados no decorrer desse processo, também identificar os desafios e facilidades para que

se dei a consolidação do ensino e assim compreender como acontece tal aprendizado.

Neste estudo utilizarei a pesquisa teórica e a pesquisa de campo que tem como foco

investigativo a prática pedagógica na educação infantil em uma escola ribeirinha localizada na

comunidade de Rio furtados, situada às margens do rio Tocantins, município de Cametá no

Pará. O aporte teórico utilizado nessa investigação estará fundamentado nos estudos de Freire

(1979, 1997, 2001), Diegues (2008), Oliveira (2008), Lüdke e André (2013) e Brandão (2014).

Outro procedimento metodológico utilizado será a observação das práticas pedagógicas da

educação infantil em uma turma multisseriada nos meses correntes do ano de 2019. Para

Lüdke e André (2013, p. 31), “a observação direta permite também que o observador chegar

mais perto da perspectiva dos sujeitos, um importante alvo nas abordagens qualitativas.

A localidade de Rio Furtados possui 180 famílias e está localizada à margem direita do

rio Tocantins no município de Cametá, população predominantemente de baixa renda,

beneficiários do programa Bolsa Família do Governo Federal. É nesse desafio que se dará a

pesquisa feita na escola desta localidade, levando em consideração todo o contexto social

cultural e ideológico desta mesma região e assim buscar compreender a relação dos saberes

e o desenvolvimento e aprendizagem dos alunos ribeirinhos. É nesse contexto que se encontra

as famílias residentes nesta comunidade, sua principal forma de sobrevivência é a vida do

extrativismo do açaí, da Pesca e também uma pequena parte desta população sobrevive de

benefícios do governo como aposentadoria por idade e outros ainda empregados no serviço

público, porém menos 1% da população.

Neste cenário de biodiversidade e riquezas naturais, os povos ribeirinhos produzem e

expressam seus conhecimentos tradicionais que estão vinculados às suas práticas

Educação e compromisso social

92

socioculturais nas atividades religiosas, econômicas, ambientais, culturais e educacionais. Esse

conhecimento, segundo Diegues (2008, p.179), é

‘[...] o saber e o saber-fazer, a respeito do mundo natural, sobrenatural, gerados no âmbito da sociedade não urbano/industrial, transmitidos oralmente de geração em geração’. [...] nessas comunidades, a dimensão trabalho, portanto, é compreendida enquanto processos de trabalho, que se constituem em lócus de autêntica transmissão de múltiplos saberes, valores e costumes de geração para geração historicamente, expressando um campo extremamente fértil de educação [...] (OLIVEIRA, 2008, p. 46).

Os ribeirinhos encontram-se familiarizados com a natureza por meio da terra, dos rios

e da floresta. Nela, adentram para retirar os recursos que necessitam, não têm receio de fazer

usos das águas no curso dos rios, respeitam o tempo das cheias e de intensas chuvas. As

crianças logo cedo aprendem a nadar, pescar, remar, conhecer os animais da floresta, escamar

os peixes e cultivar a terra. Os ribeirinhos encontram-se familiarizados com a natureza por

meio da terra, dos rios e da floresta. Nela, adentram para retirar os recursos que necessitam,

não têm receio de fazer usos das águas no curso dos rios, respeitam o tempo das cheias e de

intensas chuvas. As crianças logo cedo aprendem a nadar, pescar, remar, conhecer os animais

da floresta, escamar os peixes e cultivar a terra. A infância é uma construção histórica, social,

cultural e novas histórias e novas concepções são construídas constantemente. Assim,

destaca-se nesse processo o diálogo de saberes como um instrumento importante nessa

construção, porque possibilita ouvir as vozes das crianças, suas percepções sobre o mundo,

os seus questionamentos e suas curiosidades para repensar e transformar as práticas

pedagógicas. A escuta como fundamento do diálogo é uma prática essencial na educação das

crianças, uma vez que não há diálogo sem escuta.

[...] uma espécie de postura necessária, na medida em que os seres humanos se transformam cada vez mais em seres criticamente comunicativos. O diálogo é o momento em que os seres humanos se encontram para refletir sobre sua realidade tal como a fazem e a refazem (FREIRE, 2008, p.123).

Assim se faz necessário o cuidado com a subjetividade individual a partir da sua

realidade, da sua história de vida, sua bagagem cultural, familiar e social. Todo ser humano já

possui toda uma bagagem e se essencial usufruir da mesma para o desenvolvimento e sua

formação tanto intelectual quanto humana.

Educação e compromisso social

93

Conclusão

Em se tratando do diálogo de saberes da educação infantil das crianças ribeirinhas

apresenta pouca visibilidade, ainda há poucos estudos que retratem esta realidade, daí a

necessidade de discutir a relação entre educação escolar e os saberes das crianças que

residem em comunidades ribeirinhas na Amazônia. As vivências da infância ribeirinha são

tecidas por múltiplos saberes e representações sociais, as quais são imprescindíveis na

tessitura do projeto educativo, uma vez que sua proposição exigirá a construção de um fazer

que contemple as experiências socioculturais dessa infância. Portanto, evidenciamos que os

processos cotidianos, mediados por ações e simbologia são essenciais para postular a prática

de ensino na educação infantil, porque toda ação educativa só fará sentido se pensada a partir

e com os sujeitos em suas necessidades. A educação não é um instrumento válido se não

estabelecer uma relação.

Referências BRANDÃO, C. R. História do menino que lia o mundo. São Paulo: Expressão Popular, 2014. DIEGUES, A. C. O mito moderno da natureza intocada. São Paulo: Hucitec/Nupaub-USP, 2008. FREIRE, P. A educação na cidade. 5ª ed. São Paulo: Cortez, 2001. ______. Política e educação. 5ª ed. São Paulo: Cortez, 2001. ______. Professora sim, tia não: cartas a quem ousa ensinar. São Paulo: Olho d’Água, 1997. LÜDKE M.; ANDRÉ, M. E. D. A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. 6ª ed. São Paulo: EPU, 2013. OLIVEIRA, I. A. de (Org.). Cartografias ribeirinhas: saberes e representações sobre práticas sociais cotidianas de alfabetizandos amazônidas. Belém: EDUEPA, 2008.

Educação e compromisso social

94

EDUCAÇÃO AMBIENTAL: PERSPECTIVAS E CONTRIBUIÇÕES PARA A EDUCAÇÃO RIBEIRINHA, ABAETETUBA/PA

Rafael de Jesus Corrêa Quaresma32

Yvens Ely Martins Cordeiro33

Introdução

Nesse estudo damos ênfase a importância da Educação Ambiental para as escolas

situadas em áreas ribeirinhas do município de Abaetetuba/PA, em decorrência das 72 ilhas

que compõem essa espacialidade, os ribeirinhos habitando as margens dos rios mantêm

fortes relações que expressam sua própria cotidianidade, em interações com a natureza e as

redes de sociabilidade entre os indivíduos e suas territorialidades. Objetivamos destacar a

importância da Educação Ambiental em relação as escolas ribeirinhas como desenvolvimento

e consolidação de valores ambientais sustentáveis nas comunidades de várzeas.

Como método para levantamento de dados utilizamos a pesquisa bibliográfica que de

acordo com Gil (2008, p.50), “é desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído

principalmente de livros e artigos científicos” (GIL, 2008, p. 50). Esse tipo de pesquisa

possibilita ao pesquisador o contado amplo com diferentes estudos e interpretações sobre o

tema, também apresentada uma amostra documental que justifica a tomada da Educação

Ambiental enquanto política pública, ação educativa e prática social.

Assim, esse texto em sua finalidade apresenta a educação ambiental como um meio

político social indispensável para a manutenção das comunidades de várzea, levanta o perfil

das comunidades ribeirinhas da Amazônia, ponderam a importância da educação ambiental

para o processo educativo a partir do território de várzea dentre suas perspectivas e

contribuições ao que tange constituir um importante componente da educação básica e da

formação humana crítica e reflexiva para as questões ambientais. Essa temática nos faz refletir

sobre a necessidade de se pensar em uma educação que compreenda os processos cotidianos

e as inter-relações do homem do campo com a natureza, a partir de uma educação dialógica

e autônoma.

32 Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected] 33 Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

95

1 Comunidades Ribeirinha: espaços de inter-relações

Os ribeirinhos marcam a própria confluência com o espaço, sua condição enquanto

sujeito social repercute sua própria existência, como um território de insurgências, o rio

destacando-se como próprio cursor das relações cotidianas. Segundo Gonçalves (2008, p.

155), esses sujeitos possuem “uma visão e uma prática nas quais solo, floresta e rio se

apresentam como interligados, um dependendo do outro, dos quais todo modo de vida e de

produção foi sendo tecido, combinando essas diferentes partes dos ecossistemas amazônicos

com a agricultura, o extrativismo e a pesca”.

O território de várzea, adotado a partir de uma perspectiva ambiental corresponde as

múltiplas concepções que integram o contexto das ações públicas, sobretudo, levando em

consideração a universalidade desse ambiente desde aos aspectos sociais e naturais, contudo,

restringimo-nos a esse ambiente por entendermos a relevância das políticas públicas

ambientais como uma meio estratégico cultural-político-ambiental para dá continuidade à

própria existência dos ribeirinhos e as atividades que os mantêm ligados a essa espacialidade.

Ao nos referirmos sobre ou a partir do território Amazônico nos inserimos a uma

espacialidade permeada por uma complexidade vinculada aos próprios conjuntos de

elementos sociais, culturais, ambientais e produtivos que integram essas relações, como

destacados anteriormente. Para Ferreira (2012), essas relações correspondem a própria

sociodiversidade refletidas pelos diversos grupos e sujeitos que o integram essa região,

produzem e organizam-se conforme seus modos de ser e viver. Conforme Corrêa e Hage

(2011), a sociodiversidade refletidas por intermédio da relação do homem com a natureza

representa uma das principais características dos territórios e comunidades amazônicas.

2 Educação Ambiental: perspectivas e contribuições

Em Jacobi (2006, p. 530), a Educação Ambiental em “suas múltiplas possibilidades, abre

um estimulante espaço para um repensar de práticas sociais e o papel dos professores

educadores e capacitadores como mediadores e como transmissores de um conhecimento

necessário para que os alunos adquiram uma base adequada de compreensão essencial do

meio ambiente global e local” visando a proporcionar aos estudantes autonomia e

compreensão sobre os problemas ambientais e sobretudo, a responsabilidade ao que tange

para a construção de uma sociedade ambientalmente sustentável.

Educação e compromisso social

96

Leff (2001, p. 256), considera que o ensino e aprendizagem atento a educação

ambiental contribui na trans/formação do pensamento crítico e reflexivo “sintonizado com a

necessidade de propor respostas para a preservação da natureza no futuro, capaz de analisar

as complexas relações entre os processos naturais e sociais e de atuar no ambiente em uma

perspectiva global, respeitando as diversidades socioculturais”. Assim, buscando contribuir

com o processo de humanização, entre alunos, professores e sociedade, possibilitando

maiores meios de informação e comunicação com a natureza, a partir de uma ótica educativa,

propostas que devem partir principalmente das escolas para o bem comum.

Para Jacobi (2005, p. 244), afirma que a Educação Ambiental “precisa construir um

instrumental que promova uma atitude crítica, uma compreensão complexa e a politização da

problemática ambiental, a participação dos sujeitos, o que explicita uma ênfase em práticas

sociais menos rígidas, centradas na cooperação entre os atores”. Essa assertiva intensifica a

urgência desse tipo de abordagem nos espaços escolares meio à crise ambiental que se

instaurou desde o período da Revolução Industrial e que tem se intensificado cada vez.

Construindo desse modo, uma cultura ecológica que compreenda natureza e a sociedade, a

partir de relações interconectadas, ou seja, compreendidas como um conjunto formativo,

estando atrelada a uma proposta educativa que ultrapassa os muros da escola, em uma

formação humana, política e social, a partir de um trabalho educativo que integra as

experiências sociais aos processos de formação crítica reflexiva para com o meio em que

vivem.

Correspondendo a racionalidade ambiental como nos propõem Leff (2011), integrados

pelas mediações socioambientais em que se coloca o sujeito social como parte do processo

para a equidade ambiental. Nesse contexto, incluir-se a própria dimensão da participação da

sociedade como uma forma para o desenvolvimento das políticas públicas, compensando

interesses individuas e coletivos da sociedade, principalmente quando se analisa a partir desse

viés de um território heterogêneo e social, como a várzea.

3 Educação Ambiental: uma política social

A educação ambiental enquanto ação pública compreende os processos educativos,

ressaltando a própria participação da sociedade como característica para a cidadania

ambiental, como destaca a Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA - 9.795/1999)

Educação e compromisso social

97

dentro de seu conjunto normativo. A Constituição Federal 1988 determina que “todos têm

direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e

essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de

defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações” (BRASIL, 1988). Assim a PNEA

- 9.795/1999 determina que “a educação ambiental é um componente essencial e

permanente da educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os

níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não-formal” (BRASIL, 1999).

Sorrentino e colaboradores, (2005, p. 289), explicam que a Educação Ambiental “nasce

como um processo educativo que conduz a um saber ambiental materializado nos valores

éticos e nas regras políticas de convívio social e de mercado, que implica a questão distributiva

entre benefícios e prejuízos da apropriação e do uso da natureza”. Logo, esse processo

educativo e ambiental deve ser direcionado para a cidadania, emergindo dos múltiplos

sentidos da ação individual, do reconhecimento e pertencimento aos processos naturais,

buscando a ênfase sobre a compreensão e superação das causas estruturais e conjunturais

dos problemas ambientais e sobretudo, a politização de cada indivíduo, a Educação Ambiental

estrutura-se como um componente indispensável nas práticas e currículos educacionais.

Para Jacobi (2000), quando nos referimos à educação ambiental, a situamos num

contexto mais amplo, o da educação para a cidadania, configurando-se como elemento

determinante para a consolidação de sujeitos críticos e éticos para com a natureza. De acordo

com Leff (2011, p. 125), “a cidadania emerge configurando novos atores sociais fora dos

campos de atração das burocracias estatais e dos círculos empresariais, que reclamam a

autodeterminação de suas condições de existência e autogestão de seus meios de vida”.

No município de Abaetetuba, a Educação Ambiental é conceituada a partir de um

processo de formação e informação social, proporcionando uma cidadania integrada ao

envolvimento dos sujeitos na perspectiva ambiental, assim, “a Secretaria Municipal de Meio

Ambiente e de Educação deverão elaborar um programa de Educação Ambiental para ser

executado nas unidades escolares, respeitando as especificidades de cada escola”

(ABAETETUBA, 2009). Essa especificidade quando relacionada as escolas ribeirinhas de várzea

tomam significâncias ainda maiores.

Conforme Freitas (2011), a escola é o ambiente mais próximo onde o jovem pode

aprender a exercer a sua cidadania, desenvolvendo habilidades, competências e

responsabilidades que contribuam para a criação de um ambiente sustentável. Todas essas

Educação e compromisso social

98

concepções condizem ao que Leff (2011, p. 151), caracteriza como saber ambiental. Desse

modo, a Educação Ambiental busca materializar esse saber, Jacobi (2003, p. 199), nos

propõem que a Educação Ambiental apresenta uma intensa possibilidade de formação para a

cidadania, uma educação que “representa a possibilidade de motivar e sensibilizar as pessoas

para transformar as diversas formas de participação em potenciais fatores de dinamização da

sociedade e para uma nova proposta de sociabilidade baseada na educação para a

participação”.

Considerações Finais

As políticas públicas ambientais em suas várias ramificações quando direcionadas ao

ambiente de várzea tendem a incorporar legalmente uma reorganização do espaço social e

ambiental, expressando um direito articuladamente constituído. Assim, propiciar práticas

educativas voltadas a preservação da natureza se tornam essenciais e as comunidades

ribeirinhas incluídas em um cenário sociopolítico e ambientalmente heterogêneo, devem

participar e preservar esses espaços, através de uma educação emancipatória, crítica e social.

Portanto, a Educação Ambiental enquanto política pública, prática educativa e social

assume uma responsabilidade estritamente condicionada para uma formação

socioambiental, no caso das ilhas de Abaetetuba, essa tendência formativa deve compor as

estruturas educacionais visando uma formação comprometida com a realidade

socioambiental das comunidades e dos alunos.

Referências

ABAETEUBA. Política Municipal de Meio Ambiente. Lei N. 288 de 14 de dezembro de 2009.

Disponível em <https://www.abaetetuba.pa.gov.br/portal/transparencia/legislacao/codigo-

de-postura/item/67-lei-n-288-de-14-de-dezembro-de-2009> acesso: 13/11/2018.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil 1988. 35ª ed. Brasília, 2012. Disponível em: <http://bd.camara.gov.br/bd/bitstream/handl/bdcamara/15261/constituicaofederal35ed.pdf?sequence=9> acesso em: 13/11/2018.

_______. Lei Federal N. 9.795 de 27 De Abril De 1999 – Política Nacional de Educação Ambiental. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9795.htm> acesso em: 06/02 2018.

Educação e compromisso social

99

CORRÊA, Sérgio R. M.; HAGE, Salomão A. M. Amazônia: a urgência e necessidade da construção de políticas e práticas educacionais inter/multiculturais. Revista NERA – Ano 14, N. 18. 2011.

FERREIRA, Denison S. Modo de vida e uso dos recursos naturais em uma comunidade ribeirinha das ilhas de Abaetetuba/pa. Revista Terceira Margem Amazônia. V.1. 2012.

FREITAS Selmara B. Educação ambiental na escola. Unidade Didática. Ponta Grossa 2011.

GIL, Antônio. C; Métodos e técnicas de pesquisa social. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2008.

GONÇALVES, Carlos W. P. Amazônia, Amazônias. 2ª ed. São Paulo: contexto, 2008.

JACOBI, Pedro. R. Políticas sociais e ampliação da cidadania. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2000.

______. Educação ambiental, cidadania e sustentabilidade. Cadernos de Pesquisa, n. 118, março/ 2003.

______. Educação Ambiental: o desafio da construção de um pensamento crítico, complexo e reflexivo. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31, n. 2, p. 233-250, maio/ago., 2005.

______. Educação ambiental e o desafio da sustentabilidade socioambiental. O Mundo da saúde, 2006.

LEFF, Henrique. Epistemologia ambiental. São Paulo: Cortez, 2001.

_____. Saber ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. Trad. Lúcia Orth, 8ª ed. Petrópolis: Vozes, 2011.

SORRENTINO, Marcos; TRAJBER, Rachel; MENDONÇA, Patrícia; JUNIOR; Luiz. Educação ambiental como política pública. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31, n. 2, maio/ago., 2005.

Educação e compromisso social

100

PARTE 3. DIDÁTICA E FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Educação e compromisso social

101

CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: UM OLHAR INVESTIGATIVO NA ESCOLA SANTA ROSA EM ABAETETUBA/PA

Joanice Rodrigues de Souza34

Vivian da Silva Lobato35

Introdução

A Educação Infantil, primeira etapa da Educação Básica, como é assim definida pela

LDB 9.394/96 (BRASIL, 1996), é o período em que ocorre o desenvolvimento das primeiras

aprendizagens da criança, que está começando a descobrir o mundo e a compreender certas

ações. Possibilitar às crianças, práticas condizentes com as suas realidades e a inserção em

ambiente propício para essas aprendizagens é uma meta a ser atingida.

Nesse sentido, quando se discute e pensa a educação para crianças pequenas36, deve-

se considerar que a experiência que a criança vive na Escola de Educação Infantil é muito mais

completa e complexa do que parece a um primeiro olhar. A ideia de sujeito em formação e de

como é vivida a experiência da infância, podem variar de época para época, pois, são históricas

e as escolhas que fazemos, para dirigir este processo, também.

O desafio de discutir os estudos e as práticas curriculares, sejam eles ligados a qualquer

modalidade de educação é, em primeiro lugar, o de responder à questão sobre o que estamos

entendendo por currículo e de que modo esse entendimento vai influenciar o cotidiano das

crianças inseridas na pré-escola.

1 Materiais e métodos

O presente trabalho apresenta os resultados obtidos no Trabalho de Conclusão de

Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia, da Universidade Federal do Pará, no ano de

2015.Trata-se de uma pesquisa de abordagem qualitativa, que, de acordo com Chizzotti (2006,

p. 26), “Implica uma partilha densa com pessoas, fatos e locais que constituem objetos de

pesquisa, para extrair desse convívio os significados visíveis e latentes que somente são

perceptíveis a uma atenção sensível”. Os dados foram coletados por meio de entrevistas

34 Mestranda PPGCITI/UFPA; E-mail: [email protected] 35 FAECS/PPGCITI/UFPA. E-mail: [email protected] 36 Esta categoria aplica-se, normalmente, às crianças com idade entre zero a seis anos.

Educação e compromisso social

102

semiestruturadas. Segundo Lakatos e Markoni (1993, p. 195-196) a entrevista tem sido

considerada como “um encontro entre duas pessoas, a fim de que uma delas obtenha

informações a respeito de determinado assunto, mediante uma conversação de natureza

profissional [...] que proporciona ao entrevistador, verbalmente, a informação necessária”.

Na organização dos dados, optamos pela análise do conteúdo, que de acordo com

Bardin (1979) abrange as iniciativas de explicitação, sistematização e expressão do conteúdo

de mensagens, com a finalidade de se efetuarem deduções lógicas e justificadas a respeito da

origem dessas mensagens (quem as emitiu, em que contexto e/ou quais efeitos se pretende

causar por meio delas). Mais especificamente, a análise de conteúdo constitui:

Um conjunto de técnicas de análise de comunicação visando a obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção destas mensagens (BARDIN, 1979, p. 42).

Os resultados dos dados, foram organizados de acordo com a análise temática ou

categorial. Conforme Bardin (1979) essa é o tipo de técnica mais utilizado na análise de

conteúdo, e consiste em operações de desmembramento do texto em unidades (categorias),

que se faz a partir dos dados obtidos sobre a questão que está sendo trabalhada. Em seguida

transformadas em categorias que sintetizaram os resultados da apreensão a partir da análise

dos dados, tendo em vista o problema e objetivos da investigação. Ao todo, 02 professoras da

instituição participaram da entrevista. Por questões de preservar e garantir o anonimato, as

docentes foram caracterizadas como professora P1 e P2.

2 Resultados e discussão

Historicamente, a mais tradicional e utilizada forma de se entender um currículo é

aquela que o percebe como o conjunto dos conteúdos programáticos estabelecidos para as

disciplinas e séries escolares, ideia já incorporada ao senso comum e repetida como base do

trabalho pedagógico em inúmeras situações (SILVA, 1999). Essa visão, embora esteja ainda

presente nos dias de hoje, é precária do ponto de vista do que chamamos de práticas

curriculares, pois deixa de considerar as práticas concretas daqueles que transmitem esses

conteúdos cotidianamente, bem como o caráter dinâmico e singular dos currículos

efetivamente desenvolvidos nas escolas; por isso, ela vem sendo questionada por muitos

educadores nos últimos anos (KISHMOTO, 1994; KRAMER, 2001).

Educação e compromisso social

103

Para superar um entendimento formalista e cientificista do currículo, é necessário

entendê-lo como oriundo de múltiplos e singulares processos curriculares locais, que podem

constituir práticas curriculares com inserção sociocultural dos professores e alunos, sujeitos

portadores de experiências próprias.

Diante disso, uma prática curricular apropriada precisa compreender o sentido da

infância, os limites, mas principalmente, as possibilidades de ensino-aprendizagem da

educação infantil, vista como momento inicial e fundamental da formação escolar da criança.

Daí a necessidade de se buscar uma nova compreensão de currículo. Não se fala de um

produto que pode ser construído seguindo modelos preestabelecidos, mas de um processo

por meio do qual os praticantes do currículo ressignificam suas experiências, partindo da

realidade dos sujeitos como situados, social, histórico e culturalmente.

Da perspectiva da formação docente, isso implica, repensar o sentido das práticas

curriculares, tomando-as como uma ação de orientação, acompanhamento e intervenção no

cotidiano escolar, de modo a concretizar a integração entre formação acadêmica e exercício

docente, ou seja, entre teoria e prática.

2.1 Prática Curricular na Educação Infantil

Para compreender as práticas curriculares de uma instituição de educação infantil, e

identificar como as crianças são pensadas no processo de educação do planejamento

curricular e as ações do ensino-aprendizagem para desenvolvimento das crianças é necessário

apropriar-se do sentido de educação e das práticas no trabalho pedagógico realizado no

ambiente da Educação Infantil.

Ainda que a preocupação “com o quê” e o “como ensinar” sempre tenha constituído

intensa preocupação de todos os que se têm dedicado a estudar e a escrever sobre a

educação. Nesse sentido, as práticas devem ser intencionalmente planejadas e

permanentemente avaliadas, considerando a criança em sua totalidade, nas dimensões

expressivo-motora, afetiva, cognitiva, linguística, ética, estética e sociocultural.

Os resultados em relação à prática curricular, da prática da professora P1, revelam que

suas ações demonstram clareza e intencionalidade, utilizando o lúdico e sempre preocupada

em possibilitar aprendizagens para que cada criança se desenvolvesse segundo seu próprio

ritmo e tempo. Os conteúdos dos eixos curriculares eram trabalhados de forma coerente e

intencional, e a avaliação da professora, era realizada de acordo com as especificidades de

Educação e compromisso social

104

cada criança, procurando respeitar a individualidade e o momento da aprendizagem e suas

limitações e dificuldades. Ao contrário da prática curricular da professora P2, que dificilmente

buscava fazer a articulação entre os saberes das crianças e os conhecimentos escolares; não

demonstrava interesse em estimular o conhecimento das crianças e nas atividades propostas

pela professora, a ludicidade era quase inexistente.

Nas indagações sobre as concepções das professoras sobre o currículo na educação

infantil, a respeito das ações que consideram importantes para a prática curricular e os

objetivos que o currículo deve ter ao ser aplicado, obtivemos as seguintes respostas.

No meu entender, currículo é aquele que se estrutura a partir do sujeito, ou seja, é aquele que é vivenciado com as crianças a partir de seus saberes, manifestações, articulado com os nossos objetivos. O currículo, ele tem que ser vivo, é ação, é a prática que se manifesta no cotidiano das nossas ações com as crianças e que articulamos com quem elas são, o que pensam, o que sabem, com aquilo que desejamos que elas aprendam. Elas já trazem uma carga de conhecimentos e a gente só vai aproveitar o que elas trazem (Professora P1). O currículo é um conjunto de orientações pedagógicas que visa contribuir na implementação de nossa prática educativa considerando as especificidades das crianças e os conhecimentos e experiências que se constroem no cotidiano escolar (Professora P2).

Em relação às ações do currículo no ensino de crianças na educação infantil, considera-

se que tem como objetivo principal:

Devem ser ações que apostem na capacidade das crianças realizarem como brincadeiras, jogos, atividades diversificadas e significativas que contribua para a aprendizagem das mesmas (Professora P1). No caso da educação infantil, as ações devem sempre estar voltadas para o universo da criança, ou seja, através do lúdico que envolve brincadeiras, jogos didáticos, a música, etc. (Professora P2).

Em relação aos objetivos que o currículo deve ter ao ser aplicado na educação infantil

destacou dois objetivos:

Promover o desenvolvimento integral das crianças para que elas possam desenvolver uma imagem positiva de si, além do mais, temos que utilizar diversas linguagens (corporal, musical, plástica, oral, escrita) onde elas possam expressar suas ideias, sentimentos, enriquecendo seu vocabulário e sua capacidade expressiva. E um outro objetivo, além dos vários objetivos, é promover a interação, criando vínculos afetivos e de trocas com adultos e com as crianças (Professora P1). Garantir condições para uma educação de qualidade e ampliar e aprimorar o conhecimento da criança (Professora P2).

Educação e compromisso social

105

As professoras apesar de conhecerem as intenções que o currículo deve ter na

instituição de educação infantil e que o currículo educativo representa a composição dos

conhecimentos e valores que caracterizam um processo social que é proposto pelo trabalho

pedagógico nas escolas. De acordo com o que foi observado, se faz necessário que o currículo

aplicado pela professora P2, apresente na prática intencionalidade e deverá ser elaborado de

maneira que contemple a realidade de cada criança, na descoberta de novos meios de

trabalhar o universo infantil na criação de mecanismos de interação entre as crianças e todos

os envolvidos no processo de ensino-aprendizagem para que não se torne apenas um discurso

contraditório do que foi observado na prática.

Hoje existem várias formas de ensinar e aprender, e umas delas é o currículo oculto.

Para Silva (1999, p. 43), o currículo oculto é “o conjunto de atitudes, valores e

comportamentos que não fazem parte explícita do currículo, mas que são implicitamente

ensinados através das relações sociais, dos rituais, das práticas e da configuração espacial e

temporal da escola”. Assim, o currículo não pode ser vivido como uma listagem de objetivos

e de conteúdos a serem atingidos. O currículo por ser algo vivo e dinâmico deve estar

relacionado a todas as ações que envolvem a criança no seu dia-a-dia, dentro das instituições

de ensino e deve considerar o que as crianças estão aprendendo.

Conclusão

Na educação infantil, para garantir a efetivação do atendimento que assegure uma

educação de qualidade, nesta faixa etária, é imprescindível que a prática curricular seja

construída com a participação coletiva dos professores e as ações devem ser guiadas pelo

Projeto Político Pedagógico da escolar, que precisa contemplar, por sua vez, as especificidades

das crianças e a formação continuada dos profissionais que atuam neste nível de ensino.

A análise geral das práticas desenvolvidas nessa instituição, revelou que as professoras

têm a preocupação com o trabalho desenvolvido com as crianças, apesar de percebermos

também, que algumas professoras precisam estar atentas para a importância de uma prática

consciente, bem planejada e organizada, com a finalidade de contribuir no desenvolvimento

pleno da criança com a qual atua.

Em síntese, pode-se dizer, que o currículo nessa instituição é pautado em práticas

curriculares efetivas, é dinâmico, produz valores, sentido e significados e valoriza as

necessidades e os conhecimentos social e cultural, a identidade das crianças, como elas

Educação e compromisso social

106

aprendem, e como se desenvolvem atendendo as necessidades e interesses de forma a

desenvolver o processo de ensino-aprendizagem das crianças.

Referências

BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1979. 229 p.

BRASIL. Lei de diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei n. 9.394/96, de 20 de dezembro de 1996.

CHIZZOTTI, A. Pesquisa qualitativa em Ciências Humanas e Sociais. Petrópolis: Vozes, 2006.

KISHIMOTO, T. M. Currículo de educação infantil: creches e pré-escolas. Significado do termo currículo, Currículo de educação infantil: critérios de qualidade e instrumentos de implementação. Texto encomendado pela Coordenação-Geral de Educação Infantil do MEC. Dez, 1994.

KRAMER, Sonia (Org.). Formação de profissionais de educação infantil no Estado do Rio de Janeiro. Relatório de Pesquisa. Rio de Janeiro: Ravil, 2001.

LAKATOS, A. M.; MARCONI, M.A. Fundamentos de metodologia cientifica. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 1993.

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SILVA, T.T. da. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. 3ª ed. Belo Horizonte: Autêntica, 1999.

Educação e compromisso social

107

REFLEXÕES SOBRE A VIOLÊNCIA NA ESCOLA PÚBLICA NO MUNICIPIO DE ABAETETUBA

Joanice Rodrigues de Souza37

Damiana Gonçalves de Almada38

Vivian da Silva Lobato39

Introdução

A problemática da violência e, em especial a violência escolar, apresenta-se como um

dos entraves para o cotidiano e a vida dos que fazem parte da escola: alunos, professores,

gestores, técnicos, etc. Tornando-se um dos grandes desafios da atualidade, principalmente,

quando se coloca a questão da aprendizagem e do conhecimento.

A existência do conflito faz parte da gênese social humana, e entre adolescentes surge

nas brincadeiras, nos jogos, nas práticas esportivas do cotidiano escolar, no cotidiano da

coexistência escolar. Todavia, alguns conflitos tomam rumos indesejados e transformam-se

em agressividades, depredação do patrimônio público, atitudes de preconceitos e

discriminações, atos de indisciplina, gerando por vezes atos de violência. Para uma maior

compreensão do fenômeno e para que sejam propostas ações de enfrentamento à violência

no campo escolar é importante estudos para analisar a concepção que os professores têm

acerca da violência escolar.

1 Materiais e Métodos

O presente trabalho apresenta os resultados de uma pesquisa com professores de uma

Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio do Munícipio de Abaetetuba, no Estado do

Pará. Os dados foram coletados por meio de grupo focais. Ao todo foram seis (06) professores

(as) que participaram do grupo focal. Por questões éticas e para garantir o anonimato foram

denominados de professores P1, P2, P3, P4, P5 e P6, na apresentação das falas.

37 Mestranda PPGCITI/UFPA. E-mail: [email protected] 38 Graduanda de Pedagogia/UFPA. E-mail: [email protected] 39 FAESC/PPGCITI/UFPA. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

108

2 Resultados e discussão

A violência no cotidiano escolar que segundo diversos autores, a partir de distintas

áreas do conhecimento, buscam definir a violência escolar, destacam o fenômeno da violência

escolar como complexa e multifacetada. Sendo muitas as suas variáveis: sociais, culturais,

econômicas, morais, etc.

A violência no ambiente escolar, segundo Charlot (2002), nos oferece a seguinte

definição:

A violência na escola é aquela que se produz dentro do espaço escolar, sem estar ligada à natureza e às atividades da instituição escolar: quando um bando entra na escola para acertar contas das disputas que são as do bairro, a escola é apenas o lugar de uma violência que teria podido acontecer em qualquer outro lugar. A violência à escola está ligada à natureza e às atividades da instituição escolar: quando os alunos provocam incêndios, batem nos professores ou os insultam, eles se entregam a violências que visam diretamente a instituição e aqueles que a representam. Essa violência contra a escola deve ser analisada junto com a violência da escola: uma violência institucional, simbólica, que os próprios jovens suportam através da maneira como a instituição e seus agentes os tratam (modos de composição das classes, de atribuição de notas, de orientação, palavras desdenhosas dos adultos, atos considerados pelos alunos como injustos ou racistas...) (CHARLOT, 2002, p. 432-443).

Tal entendimento aproxima-se da nossa perspectiva de estudo, em relação à violência

e seu impacto no cotidiano escolar, pois se vincula a uma determinada maneira de perceber

o mundo e suas realidades circundantes.

2.1. A violência escolar no cotidiano da escola

No contexto escolar, o termo violência representa múltiplos significados e é utilizado

pelos educadores para classificar comportamentos violentos ou indisciplinados numa mesma

categoria (SPOSITO, 1998).

Para Fante (2005, p. 168) a violência é consequência de fatores externos que:

São decisivos na formação da personalidade do aluno, pela influência que recebe no seu contexto familiar, social e pelos meios de comunicação (...) os fatores internos, que podem ser classificados em três: o clima escolar, as relações interpessoais e as características individuais de cada membro da comunidade escolar.

Para identificar as percepções dos professores sobre a questão da violência escolar

utilizamos um questionário com algumas indagações que apontou os seguintes resultados

Educação e compromisso social

109

obtidos por meio das falas e discursos dos professores. A primeira indagação partiu do

seguinte questionamento: o que os professores pensam sobre a violência?

Faz parte do dia-a-dia da escola, assim como na sociedade. A escola é apenas uma extensão da sociedade, do que os alunos vivem na sociedade. As situações que os alunos vivenciam em casa e em outros ambientes que eles circulam eles acabam refletindo essa violência. Eu percebo que a gente convive com todos os tipos de violência, cada ano existem novas práticas, parece que a cada ano piora (Professora P1)

Não é algo novo, porque na nossa época a gente sofreu algum tipo de

violência, mas eu vejo que diferencia o tipo, a moda, a violência da moda.

Vejo que a que permanece é a discriminação racial, não era mais para a gente

estar nesse ‘modismo’ (Professora P2)

A análise das respostas dos entrevistados, indica que a violência aponta para o reflexo

de fatores internos e externos que o alunado traz para dentro da escola os traços das

violências que enfrentam e experenciam na comunidade. A convivência na escola constitui

um reflexo da convivência na sociedade em geral. Os aspectos positivos e negativos das

relações que se estabelecem no contexto social de cada indivíduo convergem na comunidade

educativa.

Conforme Minayo (2006), a violência é polissêmica, pois depende da época, locais e

circunstâncias em que é praticada, ela pode ser tolerada ou condenada, dependendo da

realidade vivida. Fato observado nas palavras dos professores sobre os tipos de violência que

presenciam na escola:

Eu percebo que a gente convive com todos os tipos de violência, cada ano existem novas práticas, parece que a cada ano piora. Os Apelidos que o colega não gosta (Professora P1)

..., mas eu vejo que diferencia o tipo, a moda, a violência da moda... Hoje eu já percebo outros tipos...uma que eu vejo que permanece é a que vem da discriminação racial, não era mais para a gente estar nesse “modismo” vamos dizer assim, mas essa violência prevalece... (Professora P2)

A Violência verbal é o Número 1 (Professora P4)

O Bullying (Professora P5)

Conforme alguns professores a violência potencializada pela mídia nos últimos

tempos, influenciada pelas eleições presidenciais de 2018, sobretudo pela propagação dos

discursos com teor discriminatório adentrou e afetou o cotidiano escolar. Conforme

expressado pelos professores:

Educação e compromisso social

110

A agressão contra o professor. A outra coisa que eu observei foi depois das eleições, os alunos têm externado todo esse processo das eleições, eles relataram a questão do preconceito, algumas meninas choraram ao contar que sofreram discriminação por causa da cor que possuem, por causa do cabelo, eles têm escutado algumas coisas. Aí a gente precisa fazer aquela intervenção, partir para o diálogo... (Professora P5)

Eu percebo o aumento de outro tipo de violência, aquela que acontece também nas redes sociais, tentando atingir a imagem da pessoa com palavras preconceituosas (Professora P2).

Observa-se, a realidade vivenciada pelos professores que segundo os relatos apontam

a mídia e o embate político nas últimas eleições presidenciais no nosso país responsáveis pela

propagação e disseminação de ódio e uma linguagem discriminatória que não respeita a

diversidade e pluralidade de ideias veiculados pelas propagandas eleitorais como produtora

influenciadora repercutindo de forma negativa nas relações no cotidiano escolar.

O discurso de ódio, segundo Brugger (2007), “refere-se a palavras que tendem a

insultar, intimidar ou assediar pessoas em virtude de sua raça, cor, etnicidade, nacionalidade,

sexo ou religião, ou que têm a capacidade de instigar ódio ou discriminação contra as

pessoas”. Os alunos, de certa forma, reproduziram tais cenas. Com relação as formas de

enfrentamento, obtivemos o seguinte resultado:

Quando tem confusão eu não me envolvo, porque foi o que aconteceu com esse professor, ele viu a situação de agressividade lá e foi tentar ajudar e ele saiu na pior, a queda dele foi maior. Jogaram a culpa no professor e o professor perdeu o emprego (Professora P1).

Se for violência física eu não me meto, mas se forem outras situações em, por exemplo, uma bagunça, ou brincadeiras de mau gosto que podem levar para um conflito, quando eu vejo eu faço logo uma intervenção, e eles me respeitam (Professora P2).

Se for violência física, geralmente a gente não se mete não. Principalmente, depois do que aconteceu com o Professor que perdeu o emprego porque tentou intervir na briga de duas alunas (Professora P3).

O professor ele passa a ter receio, ele é limitado e a escola também é porque a escola não tem autonomia (Professora P6).

Segundo relatos dos professores entrevistados, a violência encontra-se presente no

seu ambiente de trabalho. Tal fenômeno vivido por todos, tornou-se um dos grandes desafios

quando se coloca a questão da aprendizagem, do conhecimento e da prática pedagógica. E

nesse cenário, os entrevistados apontam, a importância a participação da Gestão de forma

Educação e compromisso social

111

mais efetiva no âmbito escolar, e as ações pedagógicas de intervenção para o enfrentamento

de tal problemática.

Nesse contexto, considera que os professores/gestores, são importantes atores no

processo educacional, devem ser capacitados, através de formação específica, para

reconhecer, lidar e prevenir possíveis situações de violência escolar. A organização e a

autoridade tanto dos professores quanto da direção da escola são relevantes, pois são

determinantes na forma de resolução das situações violentas que ocorre no espaço escolar

(LEME; CARVALHO, 2012).

Conclusão

Os dados coletados apontam que os casos de violência já fazem parte do dia-a-dia do

cotidiano escolar, sejam eles verbais ou físicos. Para os professores a escola se tornou um

campo de conflitos onde os alunos não vêm apenas para estudar e os professores não têm

autonomia e, a ausência de uma gestão escolar é um dos grandes desafios para o

enfrentamento de tal problemática vivenciada pelos professores. Diante de tal realidade, que

consideram atípicas do ideário pedagógico destacam a importância da participação efetiva da

Gestão no âmbito escolar e as ações pedagógicas de intervenção para o enfrentamento de tal

problemática.

Vale ressaltar, que a reflexão em torno do fenômeno da violência, é amplamente

discutida em todos os segmentos sociais e muitos dos relatos dos professores são

semelhantes os de muitas pesquisas feitas em diversos ambientes escolares, sendo

importante estabelecer um debate acerca da violência escolar e suas formas de

enfrentamento. No entanto, se percebe a difícil tarefa que os professores têm quando se trata

de reduzir a violência num espaço onde se deveria desenvolver o diálogo, a compreensão, a

afetividade e o aprendizado entre crianças e jovens.

Referências

BRUGGER, Winfried. Proibição ou proteção do discurso de ódio? Algumas observações sobre o direito alemão e o americano. Revista de Direito Público, v. 15, n.117, jan. /mar.2007.

CHARLOT, Bernard. A violência na escola: como os sociólogos franceses abordam essa

questão. Sociologias, Porto Alegre, n. 8, p. 432-443, 2002.

FANTE, Cleo. Fenômeno Bullying: como prevenir a violência nas escolas e educar para a Paz. 2ª ed. Campinas: Verus Editora, 2005.

Educação e compromisso social

112

LEME, M.I.D.S.; Carvalho, A.M. Opinião dos professores e resolução de conflitos. Nuances: estudos sobre Educação, 23 (24), 55-77, 2012. MINAYO, Maria Cecília de Souza. Violência e saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2006.

SPOSITO, M. P. A. Instituição escolar e a violência. Cadernos de Pesquisa. São Paulo, v.104, p.

58-75, jul. 1998.

Educação e compromisso social

113

PRÁTICA DOCENTE NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS DO CAMPO: UM PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM

Dierge Alline Pinto Amador40

Silvana Ferreira Lima41

Introdução

Tendo em vista que o ensino de jovens e adultos é de suma importância no cenário

educacional em que se encontram, torna-se um fator relevante inseri-los no contexto social

ativo. Diante isso, destaca-se o princípio constitucional de uma educação inclusiva para todos

e delibera-se um caminho para o desenvolvimento dos cidadãos em todas as idades, sem

discriminar negativamente os indivíduos muito menos prejudicar o processo de apropriação

de conhecimentos. Então, mostra-se necessário favorecer o desenvolvimento das

competências necessárias para que possam exercer sua cidadania e inserir-se na vida social e

produtiva atuante.

A educação de adultos vem se realizando no Brasil há pelo menos um século, com foco

na alfabetização, entretanto, esta modalidade de ensino acarreta diversos fatores que

impedem sua total eficiência no ensino, como: idade, nível de conhecimento, entre outros. O

ensino nesta modalidade tem, portanto, um papel importante na formação interdisciplinar

dos alunos jovens e adultos, que contribui para a construção da cidadania e favorece a

participação social.

Neste sentido, o objetivo geral desta pesquisa se delimita em Compreender ocorre o

processo de Ensino e Aprendizagem dos alunos na própria percepção da EJA; e os específicos

se demandam em Dar ênfase às dificuldades existentes no processo de ensino aprendizagem

no ensino de jovens e adultos, levando em conta, aspectos sociais e de escolaridade, e

fomentar políticas de formação de professores que contemple as particularidades dos alunos

da EJA.

40 Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected] 41 Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

114

Assim, as divergências dessa modalidade remetem a pensar em uma ação educativa

diferente, na qual possam ser tratados de forma igualitária independente do contexto sócio-

econômico que possuem, ou até mesmo no status que gostariam de alcançar, podendo assim

se observar que há possibilidades de ingressá-los não somente para o mercado de trabalho,

mas formá-los como cidadãos por completo.

Para isso, é preciso orientá-los a focalizar sua atenção naquilo que conseguem

compreender, apoiando-se nos conhecimentos prévios de mundo, tendo em vista à formação

profissional, acadêmica ou pessoal. Pois, educar jovens e adultos é um processo muito

complexo que envolve uma diversidade de práticas formais e informais com o objetivo de

adquirir ou ampliar conhecimentos socialmente acumulados.

É preciso considerar neste trabalho que os alunos da EJA possuem vivências,

experiências e conhecimentos que os diferem dos alunos da educação regular. Entretanto,

torna-se mais interessante focar nos desafios existentes quando se tem uma educação de

qualidade. Sendo necessário, proporcionar reflexões sobre o desafio da Educação de Jovens e

Adultos frente as perspectivas pedagógicas no contexto escolar desses sujeitos, a fim de que

possam avançar gradualmente no mundo do conhecimento, respeitando suas especificidades,

onde a escola e os professores passem a oportunizar ainda mais o ensino destes alunos tanto

na vida escolar quanto na sociedade.

Entendemos que a educação de Jovens e adultos pode ser repensada de forma

diferenciada e tornar-se significativa quando levamos em consideração as dificuldades e

experiências de vida dos sujeitos, construídas no cotidiano dos saberes nos âmbitos sociais e

culturais. Este aspecto é ressaltado por Freire (1995) que afirma sobre a necessidade de se

fazer uma leitura do mundo, da realidade do educando para, de fato, compreendermos o seu

processo cultural enquanto sujeito histórico. “Abrir-se à alma, às culturas, é deixar-se molhar,

ensopar das águas culturais e históricas dos indivíduos envolvidos na experiência” (FREIRE,

1995, p.110).

Deste modo, a Educação de Jovens e Adultos ainda é um desafio para os sistemas

educacionais públicos brasileiros. E agora essa população precisa voltar à escola porque o

mercado de trabalho está exigindo e isso se reflete na qualidade de vida e na prática social

desses indivíduos, o que resulta em um grande número de jovens e adultos em busca de

alternativas de estudo. Sendo assim, enfatizo o fato de existir escolas no município de

Educação e compromisso social

115

Salvaterra com a Modalidade EJA, onde professores e alunos vivem uma dura realidade de

dificuldades e desafios.

1 materiais e métodos

Além disso, relevante utilizarmos a abordagem qualitativa para este tipo de pesquisa,

pois, segundo Ludke e André (1986), a pesquisa qualitativa se contrapõe ao esquema

quantitativo que divide a realidade em unidades favoráveis à comprovação, estudando-as de

maneira isolada e descontextualizada. Além de favorecer uma visão dos fenômenos, levando

em conta todos os componentes de uma situação em suas interações e influências recíprocas.

Além disso também se caracteriza como exploratória que tem como finalidade o entender

com mais detalhamento um determinado problema.

Para a coleta de dados utilizou-se como instrumento a aplicação de questionário com

entrevistas semiestruturadas, sendo necessário o método de observação por meio das

práticas pedagógicas realizadas pelos professores de EJA no Ensino Médio.

Pode-se inferir que os sujeitos envolvidos na pesquisa estão inseridos em um contexto

social, cultural, econômico e político que presumidamente exercerão influência sobre os

dados coletados. Desse modo, podemos “trabalhar todo o material obtido durante a

pesquisa” (LUDKE; ANDRÉ, 1986).

Esta pesquisa tem como público-alvo uma turma de alunos da modalidade da

Educação de Jovens e Adultos do ensino médio e no desenvolver desse estudo analisou-se as

práticas pedagógicas desempenhadas pelos docentes da EJA com o objetivo de verificar o

processo de ensino aprendizagem destes alunos. A pesquisa foi realizada na Escola Estadual

de Ensino Médio Prof. Ademar Nunes de Vasconcelos localizada no Município de Salvaterra,

Arquipélago do Marajó-PA, sendo desenvolvida no Segundo semestre de 2018.

2 Resultados e discussão

Sabe-se que a escola proporciona a aprendizagem formal. Sendo assim, é necessário

que sejam usadas metodologias que facilitem o acesso ao saber elaborado e que contribua

com o crescimento intelectual do aluno e com suas vivências. Para isso, deve-se ampliar o

Educação e compromisso social

116

conhecimento destes alunos para então aprimorar os existentes, contribuindo para o

desenvolvimento intelectual e social dos mesmos.

A turma da EJA era constituída por vinte e três alunos, sendo quinze mulheres e oito

homens, haja vista, que havia muitas mães de família e a maioria dos estudantes eram

residentes da zona rural do município. Mostra-se assim que a sala de aula pode se tornar um

laboratório pedagógico constante, haja vista que a cada aula ministrada, abrem-se uma série

de discussões acerca das inquietações pertinentes à pesquisa.

Deste modo, aplicou-se o questionário dois dias antes da última observação, para que

todos os alunos da classe conseguissem responder. O resultado foi imediato, pois as perguntas

eram objetivas e estavam ligadas às disciplinas ministradas em sala de aula e não ao empenho

curricular dos professores. Por tal motivo, houve a cautela de coletar informações sobre as

práticas de ensino da língua estrangeira, fazendo um levantamento de discussões a respeito

do que foi observado, pois estes dados subsidiariam a análise durante todo o processo.

O questionário aplicado foi respondido por vinte alunos, sendo que apenas 25% dos

mesmos demonstraram estar ciente de seus papéis na sala de aula, ou seja, que é através da

educação, segundo eles mesmo que tardia, é que poderão mudar o sentido de suas vidas. Pois

é muito difícil viver em um mundo onde toda e qualquer informação se encontra através da

formalidade dos estudos, então mostra-se necessário envolver-se.

Houve uma porcentagem de 50% dos alunos que ao responderem o questionário

demonstraram um grande medo em estar novamente estudando e os outros 25% afirmaram

que apesar da dificuldade de se integrar numa sala de aula, muitas vezes deixando

transparecer suas “ignorâncias” sabem que precisam vencer essas barreiras.

Conclusão

Ao realizar essas considerações, reafirma-se a importância de um ensino igualitário na

vida escolar dos sujeitos da Educação de Jovens e Adultos. Essa condição não só os possibilita

de serem sujeitos de direitos, mas também demanda uma educação de qualidade.

O ser humano constitui-se de aspectos de natureza social, afetiva e histórica. Estes

inúmeros fatores precisam ser levados em conta no ato educativo, e se tratando nos alunos

da EJA, estes devem ser valorizados ainda em maior amplitude, pois estes indivíduos vêm para

a escola “carregados” de experiências adquiridas fora desse ambiente, mas que formam sua

Educação e compromisso social

117

identidade. Compreendemos que pensar a EJA neste sentido, só é possível quando a

reconhecemos como uma educação dialógica, na qual todas as pessoas podem se envolver,

participar, educar e educar- se.

Então, acredita-se que o bom desempenho dos docentes da EJA pode contribuir na

formação do ser humano, uma vez que o indivíduo só aprende a ter opinião quando sente-se

capaz de construir, confrontar e concluir ideias. Pois, como dizia Freire (1983) o aluno deve

ser o sujeito de sua própria educação, não objeto dela.

Neste sentido reitera-se a importância de dialogar com estes alunos do campo, mesmo

que ainda fiquem restrito na prática educativa de uma educação urbanocêntrica, pois não

existe a „melhor forma‟ para ensinar e sim ferramentas que nos propiciam à este objetivo

Referências

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. A educação como cultura. Campinas: Mercado das Letras, 2002.

BRASIL. Ministério da Educação, Secretaria de Educação. Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio. Brasília: Ministério da Educação, 2000.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à pratica educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 47ª ed. São Paulo: Cortez, 2006. (Coleção Questões da nossa Época, vol. 13).

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 18ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

FREIRE, Paulo. Educação e mudança. 11ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.

LUDKE, Menga, ANDRÉ, Marli. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.

MÜLLER, M. S; CORNELSEN, J. M. Normas e Padrões para Teses, Dissertações e Monografias. 5ª ed. Londrina: Eduel, 2003.

OLIVEIRA, Ivanilde Apoluceno de. Leituras freireanas sobre educação. São Paulo: Unesp, 2004.

MEDEIROS. Luzia Bernardete. Os sujeitos da Eja e suas marcas. Disponível em: http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/1548-6.pdf.

Educação e compromisso social

118

FORMAÇÃO DO PEDAGOGO: UMA EXPERIÊNCIA NAS CONSTRUÇÕES E DESENVOLVIMENTO DE OFICINAS PEDAGÓGICAS

Andreza Viana Souza42

Dayana Suelen Viana da Cruz43

Myéllen Karen Contente44

Benilda Miranda Veloso Silva45

Introdução

Com o advento da tecnologia digital inserida em todas as atividades no cotidiano do

aluno, muitos deles acabam por se prender a instrumentos tecnológicos e sabemos da

desigualdade social vivida em nosso país, especialmente nas escolas públicas. Diversas escolas

públicas não têm aparato tecnológico digital para ter uma aula diferente do habitual e algumas

até possuem um bom equipamento digital, todavia com a precariedade que há em relação a

formação continuada dos professores, esses instrumentos digitais acabam por cair no

esquecimento e ficam sem utilidade. Penteado e Kishimoto (2011, p. 187) afirmam que dentre

as competências a serem construídas e desenvolvidas por um professor encontra-se a

capacidade de desenvolver uma relação professor-alunos propícia ao processo de ensino-

aprendizagem, e enxergar a realidade dos menos favorecidos correlacionando dinâmicas

comuns do seu contexto social facilitará o ensino desse aluno que pode estar em uma

realidade social pobre.

Gasparin (2007, p. 3-4) afirma:

A leitura crítica da realidade torna possível apontar um novo pensar e agir pedagógicos. Deste enfoque, defende-se o caminhar da realidade social, como um todo, para a especificidade teórica da sala de aula e desta para a totalidade social novamente, tornando possível um rico processo dialético.

Objetivando novas metodologias que abranjam a realidade social dos discentes e

pensando em inovar sem o auxílio da tecnologia digital, haja vista que nem sempre todos os

42 UFPA/Campus Cametá. E-mail: [email protected] 43 UFPA/Campus Cametá. E-mail: [email protected] 44 UFPA/Campus Cametá. E-mail: [email protected] 45 UFPA/Campus Cametá. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

119

alunos têm acesso a mesma, construímos durante a disciplina Didática e Formação Docente

uma oficina de História e Geografia para o 3° Ano do Ensino Fundamental. A oficina pretendia

de forma lúdica apresentar metodologias que facilitassem a compreensão dos discentes sobre

assuntos referentes às disciplinas História e Geografia do Brasil através de jogos e dinâmicas

que estimule o interesse dos alunos sobre o assunto.

Os jogos como recurso pedagógico abrem caminho para um ensino mais leve, cujo o

interesse genuíno do aluno resulta numa aprendizagem na qual o aluno aprende brincando e

assim “inconscientemente” desenvolve seus sentidos cognitivos. Ao participarem de jogos, no

quais já estão familiarizados os alunos se sentem mais livres para demonstrar domínio sobre

conhecimento adquirido nas aulas.

Kishimoto (2011):

Ao permitir a ação intencional (afetividade), a construção de representações mentais (cognição), a manipulação de objetos e o desempenho de ações sensório-motoras (físico) e as trocas na interação (social), o jogo contempla várias formas de representação da criança e suas múltiplas inteligências, contribuindo para a aprendizagem e o desenvolvimento [...] (p. 41).

As dinâmicas envolvendo jogos estimulam a criatividade, desenvolvem o senso crítico

e abrem novos leques que possibilitam o entendimento de novos pontos de vistas, permite a

facilitação na resolução de tarefas, estimulando autonomia e a segurança do aluno em si

mesmo.

1 Materiais e Métodos

A oficina foi apresentada da seguinte maneira e foi aberta ao público em formato de

exposição em sala de aula para professores e graduandos de licenciaturas e bacharelados.

No primeiro momento foi feita a apresentação da oficina e após isto foram mostrados

os recursos utilizados no jogo do tabuleiro “Desbravando a História do Brasil” que englobou

elementos de suas fases históricas. Um professor visitante foi convidado a participar do jogo,

onde o intuito era conhecer suas etapas que começavam com o Descobrimento do Brasil e

perpassavam pelo Brasil Colônia, Brasil Império, Brasil República e Ditadura militar até chegar

nos dias atuais, chegando ao final, após o jogador relembrar todas as fases que o Brasil já

passou ele pode dar sua proposta para a melhoria do país e a proposta foi colocada em um

Educação e compromisso social

120

painel expositivo. Após a década de 1980 os jogos de tabuleiro perderam sua popularidade

devido ao advento da internet que trouxe consigo jogos eletrônicos.

No segundo momento foi apresentado o jogo quebra-cabeça “Montando o Brasil”,

onde os jogadores montaram o mapa do Brasil e após isso anexaram características que os

mesmos já conheciam de cada região. Os jogos de quebra-cabeça estimulam o raciocínio e

além de serem usados como passatempo também podem ser utilizados de forma didática no

processo de ensino e aprendizagem.

No terceiro momento apresentamos outra atividade pouco utilizada em ambiente

escolar que é a de Palavras Cruzadas, um jogo encontrado geralmente em jornais e revistas,

sempre visto como um simples passatempo, mas várias pesquisas mostram os benefícios de

brincar de palavras cruzadas, como: exercício da memória, concentração, poder de

visualização, agilidade entre outros.

Reconhecendo seus benefícios, buscamos a atividade Cruzadas com a temática

Geografia do Brasil chamada “Conhecendo o País do Futebol”, no qual através da identificação

dos estados relembraram suas respectivas capitais, dividindo o mapa do Brasil em regiões

socioeconômicas e atribuindo a cada região características da sua economia. Um jogo

dinâmico que amplie seu conhecimento sobre seu país e suas regiões socioeconômicas.

A oficina foi realizada inúmeras vezes, cada visitante professor, graduando pode

brincar e ouvir os objetivos das dinâmicas.

Kishimoto (2011, p. 40):

O uso do brinquedo/jogo educativo com fins pedagógicos remete-nos para a relevância desse instrumento para situações de ensino-aprendizagem e desenvolvimento infantil. Os jogos estão presentes na cidade de qualquer pessoa, porém acabam sendo esquecidos na hora de estimular a aprendizagem dos alunos, pensando na sua popularidade e praticidade, agregamos a História do Brasil e sua Geografia a dinâmica, que além de proporcionar lazer também irá incentivar o desenvolvimento do raciocínio lógico e abstrato.

2 Resultados e Discussões

Após a realização das oficinas ouvimos os relatos dos jogadores, suas impressões, suas

contribuições para a ampliação da oficina, resultados positivos, opiniões de encorajamento a

abrangência das dinâmicas para outras disciplinas e felicidade dos jogadores ao completarem

Educação e compromisso social

121

as atividades. Pensamos que adultos jogaram o jogo e constataram a importância da didática

para o ensino aprendizagem, a saída da tradicionalidade das aulas, sentiram-se realizados ao

final da oficina ao completarem as tarefas, foi uma experiência diferente então imaginamos a

felicidade e a realização de uma criança ao brincar em sala de aula e conseguir aprender de

forma leve. É notória a importância de uma didática inovadora e como a formação continuada

de professores pode ser satisfatória.

A discussão a respeito da didática no processo de ensino-aprendizagem é inerente à

falta de recursos de escolas públicas bem como a necessidade de inovar e prender a atenção

dos alunos, tirar a monotonia das aulas tradicionais. Correlacionado teoria e a prática de

ensino, Sanchez Vásquez (2007, p. 294), afirma que a práxis reflexiva relaciona-se com a práxis

criativa, logo a criatividade do professor ao planejar uma aula diferente demonstra um esforço

de sua parte na observação do que os seus alunos vivem no cotidiano contextualizando

sempre que possível com os conteúdos trabalhados.

A partir de uma reflexão teórica-metodológica, Saviani (2012, p. 11) afirma que o

homem, diferentemente dos outros animais, pela necessidade em produzir continuamente as

condições necessárias para a sua existência, por meio de seu trabalho, adapta a natureza a si,

transformando-a. Então, o planejamento de uma didática diferente para atrair a atenção dos

alunos e ter um resultado positivo adaptando atividades e jogos para um melhor resultado no

processo de ensino-aprendizagem é positivo para os discentes e para os docentes, visto que

há a satisfação para o professor aproximando várias realidades.

Trazendo a discussão ampliada para fora da sala de aula e envolvendo toda a

comunidade escolar, a função educativa primordialmente da escola é ser um ambiente

propício para aquisição de conhecimentos, onde se prime pelo respeito à história de cada um.

Saviani afirma:

Em outros termos, a escola tem uma função especificamente educativa, propriamente pedagógica, ligada a questão do conhecimento e é preciso, pois, resgatar a importância da escola e reoganizar o trabalho educativo, levando em conta o problema do saber sistematizado, a partir do qual se define a especificidade da educação escolar (2012, p.85).

O saber sistematizado diz respeito a uma educação rasa de conceitos profundos, não

embasa uma educação crítica tampouco é suficiente para uma formação humana na sua

totalidade.

Educação e compromisso social

122

Abrindo uma vertente que discuta a pouca formação continuada dada aos professores

põe no centro da discussão a educação que queremos para nossas crianças: a dicotomia que

existe entre teoria e prática, e o ensino tradicional ainda é suficiente? É impossível negar que

sim, o ensino tradicional teve frutos afinal grande parte da nossa geração foi aluno do

tradicionalismo, mas também deve se atentar a quantidade dos frutos alcançados. Existe

ainda a dicotomia entre a teoria e a prática, saímos da academia todos com objetivo de por

em prática teorias estudadas a fim de mudar o mundo, porém com a vivência em sala de aula

fica cada vez mais difícil alcançar esse objetivo. Por vezes não podemos realizar aulas

planejadas com embasamentos teóricos esplêndidos, há vários motivos e empecilhos como:

falta de recursos da escola e do professor, desvalorização de um ensino diferente do habitual

por parte da instituição escolar.

A pouca oferta de formação continuada para os professores também é um problema

atemporal e grande parte do problema, em relação ao ensino público se deve a falta de

investimentos na educação, então qual a saída para o comprometimento do professor com a

educação? Também se faz necessário falar sobre a necessidade dos professores trabalharem

em consonância com os problemas, dilemas e alternativas da realidade vivida pelos alunos

para desenvolver seu ensino.

Sendo assim, aos professores que pretendem enfrentar adversidades e desenvolver

formas criativas de inovar nas suas aulas a fim de uma educação mais significativa para uma

formação humana total, a oficina foi pensada. Com baixos custos financeiros e apenas

dedicação a mais na profissão, sabemos que isso não anula a importância que o Estado deveria

dar à educação, já que o pouco investimento prejudica o andamento do processo de ensino-

aprendizagem, mas aos poucos a mudança acontecerá.

Conclusão

A partir dos resultados obtidos com a realização da oficina e os estudos acerca da

didática, podemos inferir que a metodologia utilizada nas aulas é de extrema relevância para

resultados positivos. A adaptação de conteúdos para trabalhar-se junto com dinâmicas que

fazem parte do cotidiano do aluno e do seu contexto social pode trazer inúmeros benefícios

para sua formação e o processo de ensino-aprendizagem. Todavia, os vários problemas que o

professor encontra para ter uma formação continuada é um obstáculo que o Estado deve

Educação e compromisso social

123

ajudar a vencer, porém ele por si só com força de vontade poderá fazer a diferença aos

poucos. Infere-se que um dos maiores percalços encontrados pelos pedagogos é a distância

entre teoria e prática que tropeça em falta de recursos e a má aceitação de novas

metodologias para o ensino em sala de aula. João Bernardo (1977, p.86): “Uma teoria é

sempre teoria de uma prática e não de qualquer realidade material que transcende o processo

dessa prática, nem dessa realidade enquanto não praticada. O homem não reflete sobre o

mundo, mas reflete a sua prática sobre o mundo”.

Portanto, aliar prática e teoria e assumir um caráter educativo voltado para uma

formação sócio histórica e cultural, deve ser a primazia para um ensino que busca uma

formação autônoma. Para Rays (2008, p. 15) a didática tem a função de:

[...] proporcionar meios para o educador realizar mediações entre os conteúdos-meios-fins da educação, com suas respectivas consequências pedagógicas e políticas explicitamente definidas. Lugar e comprometer-se, pois, com necessidade que a sociedade de classe tem de uma prática pedagógica crítica. Com esse propósito, os conteúdos-meios-fins da ação da didática necessitam ser trabalhados de forma não autorizada, isto é, como uma totalidade coerente e coesa, não esquecendo de que a ação didática desenvolve-se dentro de estruturas sociais nas quais os destinos da prática social são amplamente diversificados.

O autor discorre sobre a didática e sua ligação íntima com o político e a importância

deste para um ato didático na prática pedagógica docente. Nossa ênfase é no que o autor

chama de necessidade de uma prática pedagógica crítica, a qual seria ideal para uma educação

que desenvolva a criticidade do discente. As disciplinas Geografia e História têm raízes

políticas e críticas, são disciplinas que auxiliam na construção de opinião, tais disciplinas tem

a importância fundamental de conhecer nossa realidade, os atores sociais, seus principais

papéis e qual o seu objetivo e inspiração para uma transformação social.

Referências

BERNARDO, João. Marx crítico de Marx. Porto: Editora Afrontamento, v.1, 1977.

GASPARIN, João Luiz. Uma didática para a pedagogia histórico-crítica. 4ª ed. Campinas: Autores Associados, 2007.

KISHIMOTO, Tizuko M. Jogo e a Educação Infantil. In: ______. Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. 14ª ed. São Paulo: Cortez, 2011.

PENTEADO, Heloísa Dupas. Jogo e Formação de professores: Videopsicodrama Pedagógico. In: KISHIMOTO, Tizuko M. Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. 14ª ed. São Paulo: Cortez, 2011.

Educação e compromisso social

124

RAYS, Oswaldo Alonso. Razões da didática: hipóteses para a construção de uma didática escolar crítica. Olhar de professor. Ponta Grossa, 11 (1): 11-12, 2008.

SAVIANI, Demerval. Pedagogia Histórico-crítica: primeiras aproximações. 11ª ed. Rev. reimpr. Campinas: Autores Associados, 2012.

VÁSQUEZ, Adolfo Sánchez. Filosofia da Práxis. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2007.

Educação e compromisso social

125

PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Cheliane Estumano Gaia46

Introdução

É notória a necessidade de se ter uma educação escolar no sentindo formativo e de

propiciar uma formação completa para os envolvidos, não somente para o desenvolvimento

pessoal de suas infinitas habilidades, mas também para se ter uma formação política no

sentido de ter uma visão crítica da sociedade na qual os mesmos estão inseridos, ou seja, para

o desenvolvimento da formação humana e profissional desses sujeitos. E para que se alcance

esses objetivos é primordial que a instituição ofereça uma prática pedagógica eficiente para

começar desde cedo a despertar nas crianças autonomia, criticidade e responsabilidade.

Nesse sentido, o presente trabalho apresenta resultados referente a vivência com a

Educação Infantil, a qual possibilitou um contato mais direto com as turmas infantis. Pretende-

se discutir como se define o currículo na Educação Infantil, a partir das experiências

pedagógicas desenvolvidas no Complexo Infantil Dom José Elias Chaves com a finalidade de

refletir o currículo da educação infantil, considerando a dinâmica do município e sua

complexidade, atentando para as particularidades da escola observada.

Pretende-se no decorrer da pesquisa dar ênfase as práticas pedagógicas da educação

infantil, ressaltando a importância dessa pesquisa para o campo educacional. Neste contexto,

aborda-se quatro elementos, onde busca-se: entender e analisar como o currículo é formado

dentro da instituição se tratando de crianças que estão começando a adentrar a escola;

conhecer quem são os sujeitos que fazem parte da instituição; de que modo as práticas

pedagógicas são desenvolvidas; saber se a escola se adequa as especificidades das crianças.

1 Materiais e métodos

A pesquisa configura-se dentro da abordagem qualitativa do tipo de Estudo de Caso e

foi desenvolvida em três fases que abrangem: revisão de literatura, pesquisa de campo e

sistematização e análise dos dados. Segundo Minayo (2001), a pesquisa qualitativa trabalha

com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que

46 Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

126

corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos. Por

conseguinte, o propósito de um Estudo de Caso é reunir informações detalhadas e

sistemáticas sobre um fenômeno, isso é essencial para que possamos realizar um processo de

análise, compreensão e objetividade mais aprofundada da pesquisa. Segundo Pádua e

Pazzebon (1996), o Estudo de Caso pode ser entendido como o método de investigação que

focaliza um único caso, buscando analisar em sua profundidade.

Nesse sentido, foi possível reunir informações detalhadas do contexto em que os

desafios das práticas pedagógicas da Educação Infantil se aplicam no Complexo Infantil Dom

José Elias Chaves do município de Cametá na qual oferece duas modalidades de ensino, sendo

elas creche e pré-escola, atendendo turmas de maternal, jardim I e jardim II, constituídas de

crianças na faixa etária de 3 a 5 anos. Essa instituição de ensino no ano de 2018 atendia 420

alunos da Educação Infantil, distribuídos em dois turnos. No turno matutino das 7h30min às

11h, atendeu 08 turmas do maternal (crianças com 03 anos de idade) e 02 turmas do Jardim I

(crianças com 04 anos de idade). No turno vespertino das 13h30min às 17h, atendeu 04

turmas do jardim I (crianças com 04 anos de idade) e 06 turmas do Jardim II (crianças com 05

anos de idade), perfazendo um total de 20 turmas.

A primeira fase da pesquisa refere-se a revisão de literatura, na qual teve como objetivo

realizar um levantamento bibliográfico, identificando os debates que vem sendo realizadosem

torno da temática da pesquisa, fazendo uso de teses, dissertações, artigos, revista científica e

periódicos, contribuindo para que o pesquisador obtenha um aparato teórico mais

aprofundado da pesquisa. Na segunda fase relativa a pesquisa de campo foi utilizada como

instrumento de coleta de dados a observação, que de acordo com Gerhardt e Silveira (2009,

p. 111) “a observação permite descrever o que vemos, mas também faz emergir questões

sobre o que procuramos compreender das representações, do simbólico, das relações sociais,

das interações lógicas, etc”.

Por fim, foi feito a sistematização e análise dos dados coletados da pesquisa, com base

na análise de conteúdo que é um conjunto de técnicas de análise das comunicações pontuadas

na pesquisa de campo que tende a obter por meio de procedimentos sistemáticos e objetivos

da descrição do conteúdo das comunicações indicadoras que permite a indução e a conclusão

dos conhecimentos referentes às categorias de produção/recepção das mensagens (BARDIN,

2011).

Educação e compromisso social

127

2 Resultados e discussão

2.1 Como se define o currículo

Desde o início do século passado ou mesmo desde um século antes, os estudos têm

definido currículo de formas muito diversas e várias dessas definições permeiam o que tem

sido denominado currículo no cotidiano da escola. Indo desde os guias curriculares propostos

pelas redes de ensino àquilo que acontece em sala de aula, currículo tem significado, entre

outros, a grade curricular com disciplinas/atividades e cargas horárias, o conjunto de ementas

e os programas das disciplinas/atividades, os planos de ensino dos professores, as

experiências propostas e vividas pelos alunos. É na realização do processo educativo nas

escolas que o currículo se materializa e se efetiva em práticas, conhecimentos, materiais,

métodos pedagógicos, valores e formas organizacionais. A maneira como se concebe, organiza

e efetiva o trabalho pedagógico na escola constitui e coloca em ação o currículo escolar.

Nesse contexto, foi observado que na instituição é trabalhado o currículo baseado na

BNCC (Base Nacional Comum Curricular) na qual a escola disponibiliza cartilhas que são pagas

pelos próprios pais.

2.2 Os sujeitos da escola

Para entender a realidade de uma pré-escola, suas práticas pedagógicas e sua função

social, é necessário enxergar muito além do seu espaço físico ou da sua condição de

infraestrutura. É essencial acima de tudo, conhecer como são os sujeitos que constituem esse

ambiente no dia a dia (direção, coordenação pedagógica, professores, funcionários e

principalmente os alunos). Dessa forma, torna-se necessário a reflexão sobre os sujeitos que

fazem parte da pré-escola, onde foi observado através vivência que os professores se

constituem como sujeitos ativos no processo de aprendizagem das crianças. Para Vasconcelos

(1994), é de suma importância que haja um bom relacionamento afetivo entre ensinantes e

aprendentes. De acordo com essa perspectiva, o sujeito professor é o pilar na construção do

conhecimento da criança, ou seja, pode-se dizer que na escola de Educação Infantil

pesquisada, os professores são sujeitos capazes de direcionar os seus alunos a uma

perspectiva de um futuro melhor que é garantido apenas com a educação.

Observou-se que a maioria dos alunos da instituição moram na periferia dos bairros

do município, fazendo parte das classes menos favorecidas, vivendo exclusivamente de

programas sociais (Bolsa Família, Seguro Defeso, e outros) e de trabalhos autônomos dos seus

Educação e compromisso social

128

pais, que se caracterizam como sujeitos simples e humildes, já que possuem um baixo grau de

escolaridade. No entanto, como foi observado na vivência na pré-escola, dentro da sala de

aula essas crianças são altamente ativas e criativas que desenvolvem em si características

próprias.

Em relação aos professores ficou mais do que evidente as características de suas

práticas pedagógicas, sendo que de certa forma conseguiam realizar as atividades propostas

pelo currículo da pré-escola, porém, algumas vezes sentiam muitas dificuldades em obter a

atenção das crianças. Em contrapartida, na instituição são atendidos alunos com necessidades

especiais, sejam elas físicas/motoras ou cognitivas, exigindo assim do educador maior esforço

e dedicação. Nessa vertente, o professor torna-se uma peça importantíssima na incorporação

de uma educação libertadora que é defendida por Paulo Freire e que segundo a fala da

coordenadora pedagógica é uma das funções sociais da pré-escola "O papel social da

instituição é o de formar cidadãos histórico-crítico, um ser social que constrói sua história".

Portanto, cada um dos sujeitos que fazem parte do ambiente escolar, em sua área

específica de trabalho, desde a portaria, a qual recebem os alunos ou no ambiente físico em

que se realiza as práticas inerentes a pré-escola, na elaboração de projetos pedagógicos, na

administração do âmbito escolar, na relação de ensinar, aprender e cuidar entre professor e

aluno, até o transporte escolar destinada as crianças que moram longe, todos sem distinção,

são sujeitos que dão direcionamento ao ambiente escolar.

3 As práticas Pedagógicas desenvolvidas pela escola

A prática pedagógica na infância deve ser especialmente mais elaborada, uma vez que

essa é uma fase que terá grandes impactos emocionais e intelectuais na vida das crianças,

tudo que a criança está vendo é novo e dependendo de como será essa experiência, seus

impactos acompanharão os alunos não apenas em sua carreira educacional como também em

suas vidas, visto que elas são o futuro da nossa sociedade, deve se ter o devido cuidado e

consciência de sua importância. Neste contexto, as práticas pedagógicas desenvolvidas na

instituição em estudo, ainda são baseadas nas práticas tradicionais, com a clara intenção de

domesticar, formar cidadãos obedientes e resignados, práticas ainda muito fortes em nossa

sociedade, isso foi observado na forma que os professores tratavam as crianças, nos

conteúdos, onde a educação nessa instituição ainda é totalmente voltada para a memorização

Educação e compromisso social

129

dos conteúdos, além da falta de assuntos e práticas voltadas para a formação do ser humano

crítico, autônomo, solidário e ético.

A educação é essencial para o desenvolvimento da sociedade como um todo, e a

prática pedagógica é um dos pontos cruciais para o ser humano que se deseja formar e

posteriormente a sociedade que esses futuros cidadãos iram construir, as crianças são o

futuro e se desejamos um futuro melhor, nada melhor que começarmos a educá-las com esse

objetivo, formar cidadãos humanizados, com princípios e valores corretos para uma sociedade

melhor.

4 Adequação da escola às necessidades infantis

É fundamental que a escola obtenha o maior número de informações de modo geral

sobre as crianças para que se possa assim traçar uma elaborada rede integrada, que facilitem

não só o desenvolvimento individual, mas de toda uma turma vasta de suas especificidades,

ademais a escola e o educador deve ter um olhar atento além do aluno/criança, mas do ser

social ao qual este pretende ajudar a construir, uma vez que a educação infantil junto da

educação familiar são os pontos de partida para que esse processo humanista e essencial

possa acontecer.

É importante ressaltar que a escola e seus profissionais devem estar aptos em suas

formações e experiências, que incluem vivências extraescolares, para a percepção das

necessidades de adequações físicas, motoras e psicológicas dos novos sonhos que estão a vir

se concretizar nesse processo inicial da busca diária do ensinar/cuidar/aprender e se

desenvolver; é importante também que o ambiente físico estrutural escolar atenda a todas as

possíveis e inesperadas necessidades dos alunos, por estes motivos, entre outros, a

comunidade e os pais devem se fazer presente e ativos junto com o corpo docente na

elaboração do PPP, levando-se em consideração toda a realidade na qual esta escola está

inserida, sem desconsiderar o meio social, a vida cotidiana, e a localidade ao qual o grupo

escolar infantil se encontra, atentando as distâncias por muitas vezes que o aluno enfrenta,

para se fazer presente. Estas são algumas das vastas dificuldades que tanto o aluno quanto

educador enfrentarão na jornada árdua da construção e formação do saber. Por outra, a

escola deve agir de forma autônoma mediante processos diários para atender uma gama

diversificada de mentes aptas ao saber.

Educação e compromisso social

130

Conclusão

Diante da experiência de observar e vivenciar a prática docente na pré-escola do

município de Cametá/PA, constatamos que as condições sociais, emocionais e psicológicas de

parte do corpo docente, necessita ser trabalhada melhor, com auxílio de profissionais, como

um psicopedagogo que se faz presente para assistir seus profissionais, mas principalmente, as

crianças que ali se encontram, pois, os abalos psicológicos, sociais as quais as mesmas chegam

ao ambiente escolar, acaba por muitas vezes aumentando, devido ao alto índice de estresses

dos educadores.

Nesse sentido, torna-se nítido a necessidade de o corpo docente fazer uso de práticas

pedagógicas para que a criança sinta prazer em se fazer presente na escola. Como podemos

ver, na práxis experimental não tanto invasiva, devido as condições as quais fomos postos é

visível e necessário, ousaria dizer, urgente a adequação de toda a estrutura deste lugar, seja

de seu espaço físico, seja de seus profissionais, para assim realizarem o acolhimento dos

futuros seres críticos sociais, que neste lugar por um curto período de tempo buscam o saber,

pois acreditamos que a prática pedagógica disciplinadora e intimidadora, dentro da sala de

aula não são adequadas a qualquer nível educacional.

Referências

BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Tradução Luís Antero Reto e Augusto Pinheiro. São Paulo: Edições 70, 2011.

GERHARDT, Tatiana Engel; SILVEIRA, Denise Tolfo (Orgs.). Métodos de pesquisa. Coordenado pela Universidade Aberta do Brasil/UAB/UFRGS e pelo Curso de Graduação Tecnológica – Planejamento e Gestão para o Desenvolvimento Rural da SEAD/UFRGS. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2009.

MINAYO, M. C. S. (Org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. Petrópolis: Vozes, 2001.

PÁDUA, Elisabete Matallo Machesini de; POZZEBON, Paulo Moacy Godoy. O estudo de caso: aspectos pedagógicos. Revista de ciências médicas. 5 (2), 1996, p. 76-82.

VASCONCELOS, C. S. Disciplina Construção da Disciplina Consciente e Interativa na sala de aula. Cadernos Pedagógicos do Libertard. São Paulo: Libertad, 1994.

Educação e compromisso social

131

DIREITO DE APRENDIZAGEM: A EDUCAÇÃO INFANTIL, A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR E O PAPEL DO CONSELHO TUTELAR

Alinne Miranda da Silva47

Jadson Fernando Garcia Gonçalves48

Cledilson Amaral Pinheiro 49

Paula Luzia Bezerra Gonçalves 50

Introdução

Este trabalho visa observar, de modo geral, o papel dessas políticas públicas quanto

aos procedimentos administrativos e aplicação das medidas protetivas, quando violados as

garantias e direitos de aprendizagem das crianças. Também analisa a eficácia do órgão

Conselho Tutelar como instrumento para viabilizar a aplicação efetiva dos direitos e garantias

destinados a crianças quanto ao direito a aprendizagem. Anseia em compreender as

discussões sobre a garantia do direito à educação das crianças em parceria escola e Conselho

Tutelar e a relação que se estabelecem entre estes na garantia do direito à educação das

crianças.

1 Materiais e métodos

Essa pesquisa é de cunho bibliográfico, onde foram utilizados alguns autores como:

Freire, Laval, entre outros.

2 Resultados e discussão

Segundo o Parecer 20/2009 da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de

Educação: As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil [DCNEIs], de caráter

47Pedagoga/Secretaria Municipal de Educação de Igarapé-Miri/Pa. E-mail: [email protected] 48 Doutor em Educação/Professor do Curso de Pedagogia/FAECS/Campus de Abaetetuba/UFPA. E-mail: [email protected] 49 Matemático/Secretaria Municipal de Educação de Igarapé-Miri/Pa. E-mail: [email protected] 50 Pedagoga/Secretaria Municipal de Educação de Igarapé-Miri/Pa. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

132

mandatório, orientam a formulação de políticas, incluindo a formação de professores, demais

profissionais da Educação, e também o planejamento, desenvolvimento e avaliação pelas

unidades de seu Projeto Político-Pedagógico que servem para informar as famílias das crianças

matriculadas sobre as perspectivas de trabalho pedagógico que podem ocorrer.

Apesar de sua importância para a formulação de políticas e práticas, as orientações e

os fundamentos das DCNEIs estão longe de serem amplamente conhecidos e aplicados por

instituições, escolas e equipes técnicas responsáveis por esse nível de ensino. As práticas

pedagógicas devem ser orientadas por dois eixos: as interações e as brincadeiras.

No que tange o desenvolvimento, há fragilidades nas políticas públicas, em especial

naquela, que mais se procura o desenvolvimento. Percebemos que muitas das dificuldades

existentes estão onde o conhecimento e a oportunidade de desenvolvimento deveriam estar,

o que vem tornando nossa sociedade cada vez mais negligente, pois se apreende vivenciando.

A escola é um dos espaços onde socializamos e aprendemos, onde deveria conter tudo de

melhor para oferecer.

Segundo Laval (2004), a escola teve vários momentos ao longo de sua história, e cada

um é percebido diante da situação econômica e social do país, onde a escola muda seu foco e

objetivo para atender as necessidades da sociedade esquecendo sua função primordial que é

a formação de pessoas, de cidadãos, “o que é mais negligenciado em nossas escolas é

justamente aquilo de que nós temos mais necessidade na vida” (LAVAL, 2004, p 08).

A defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente tornou-se uma prática real a partir

da aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), fruto da lei 8.069 de 13 de julho

de 1990. Como órgãos permanentes e autônomos, de caráter não jurisdicional, os conselhos

tutelares são encarregados de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do

adolescente.

A política de educação não compreende a atuação do conselho na solicitação e

prestação de serviços, bem como da necessidade de aproximação com o ambiente escolar

para identificação das violações de direitos, já o conselho tutelar possui autonomia sobre suas

ações.

Quanto às ações ligadas a defesa dos direitos das crianças e adolescentes logo imagina-

se essa categoria em conflito com a lei ou essa demanda sendo negligenciada por seus pais ou

responsáveis, sociedade e estado. É necessário considerar que toda sociedade é responsável

pela proteção desta demanda, compreender que crianças e adolescentes são seres humanos

Educação e compromisso social

133

em desenvolvimento no qual necessita tanto de bens materiais, sociais quanto educacionais

para assim se tornar um adulto, sendo que a sociedade pode e deve se apropriar de

ferramentas de apoio e fiscalização acerca de investimentos e ações destinadas a elas. A

escola não pode ser mais espaço de introduzir informações de gerações anteriores, e sim criar

novos conhecimentos, novas possibilidades a partir das habilidades individuais a serem

descobertas na convivência e conjuntura.

Seguir paradigmas definidos imobiliza e não possibilita a arte da criação, cria barreiras

onde deveriam ser implementados grandes espaços de vivências, mas quem perde são as

crianças, sendo elas que mais precisam de atenção referente à garantia de direitos e proteção

social.

Para Freire (2003), as pessoas precisam conceber que não somos objeto, que ficam

parados, somos capazes de modificar a realidade, que não podemos simplesmente ver algo e

nada fazer, meu papel no mundo não é só de quem constata o que acorre, mas também o de

quem interfere como sujeito de ocorrências.

Linha do tempo da Educação Infantil

1988: A Constituição Federal estabelece o atendimento em creche e pré-escola, é um dever

do Estado e um direito da criança de 0 a 6 anos de idade.

1996: A Lei de Diretrizes e Bases (LDB) reconhece a Educação Infantil como um segmento que

promove a aprendizagem e parte integrante da Educação Básica.

1998: O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI) é publicado, como

parte dos documentos curriculares Nacionais. Ele reúne: Objetivos, conteúdos e orientações

didáticas.

2006: O acesso ao Ensino Fundamental é antecipado para os seis anos de idade, por conta de

uma alteração na LDB.

2009: A partir da publicação da Emenda Constitucional n. 59, de 11 de Novembro de 2009, a

Educação Infantil passa a ser obrigatória para as crianças de 4 e 5 anos.

2009: As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI) surgem para

orientar o planejamento curricular das escolas. Propõem a organização por eixos de

interações e brincadeira. Além disso, traz como marco conceitual a indissociabilidade entre o

cuidar e educar.

Educação e compromisso social

134

2017: A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) institui e orienta a implantação de um

planejamento curricular ao longo de todas as etapas da Educação Básica. Na Educação Infantil,

ela dialoga com a DCNEI, mas traz um detalhamento maior ao listar os direitos de

aprendizagem.

Segundo Trevisan (2018), a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) vêm reforçar o

reconhecimento a Educação Infantil como uma etapa essencial e estabelecer direitos de

aprendizagem para crianças de 0 a 5 anos, assim como a LDB. O documento também

reconhece essa etapa da Educação Básica como fundamental para a construção da identidade

e da subjetividade da criança, assim como a LDB, a Constituição Federal e o PNE (2014):

Concepção de criança - Reforça a visão da criança como protagonista em todos os contextos

de que faz parte: ela não apenas interage, mas cria e modifica a cultura e a sociedade.

Objetivo - A partir de um significativo avanço no entendimento de como a criança aprende,

oferecer referências para a construção de um currículo, baseadas em direitos de

desenvolvimento e aprendizagem bem definidos.

Como está organizado - As diversas áreas de conhecimento e as diferentes linguagens são

integradas por meio dos Campos de Experiência. Parte-se do pressuposto de que a criança

aprende por meio das experiências vividas no contexto escolar.

A BNCC de Educação Infantil indica seis direitos de aprendizagem.

Para contemplá-los, o professor precisa sempre tê-los em mente para que as experiências

propostas estejam de acordo com os aspectos considerados fundamentais no processo,

seguindo orientações da especialista Maria Virgínia Gastaldi, entenda como a BNCC

desenvolveu cada Direito de Aprendizagem:

1. Conviver

Na BNCC: “Conviver com outras crianças e adultos, em pequenos e grandes grupos, utilizando

diferentes linguagens, ampliando o conhecimento de si e do outro, o respeito em relação à

cultura e às diferenças entre as pessoas”.

Como garantir esse direito: situações em que possam brincar e interagir com os colegas

são fundamentais. Jogos e brincadeiras são importantes para que as crianças convivam e

compreendam que precisam respeitar regras e limites. Permitir que participem da

organização e socialização envolvendo-a em atividades que viabilizam o cotidiano e

organização dos ambientes e das refeições, por exemplo, ou guardar e organizar os

brinquedos. Pois conviver, significa adaptar-se ao outro.

Educação e compromisso social

135

2. Brincar

Na BNCC: “Brincar cotidianamente de diversas formas, em diferentes espaços e tempos, com

diferentes parceiros (crianças e adultos), ampliando e diversificando seu acesso a produções

culturais, seus conhecimentos, sua imaginação, sua criatividade, suas experiências

emocionais, corporais, sensoriais, expressivas, cognitivas, sociais e relacionais”.

Como garantir esse direito: as brincadeiras são fundamentais e devem estar presentes

na rotina da criança. Trata-se de brincadeiras planejadas e com algum objetivo de

aprendizagem. Observando o brincar, o professor pode disponibilizar materiais que estimule

o desenvolvimento da brincadeira ou que conduzam a outras experiências. Organizar boas

propostas, bons títulos de literatura, e fazer uma leitura rica as chances dessas temáticas

migrarem para as brincadeiras são marcantes para os pequenos.

3. Participar

Na BNCC: “Participar ativamente, com adultos e outras crianças, tanto do planejamento da

gestão da escola e das atividades propostas pelo educador quanto da realização das atividades

da vida cotidiana, tais como a escolha das brincadeiras, dos materiais e dos ambientes,

desenvolvendo diferentes linguagens e elaborando conhecimentos, decidindo e se

posicionando”.

Como garantir esse direito: O importante aqui é envolver as crianças de forma que

elas ajudem a decidir a estrutura das atividades como a seleção dos materiais, as cores que

serão utilizadas, o local das atividades etc... Por exemplo: construção de casinhas de

brinquedo, amarelinhas de forma geométricas dentre outras. Precisamos é compreender que

o professor observe o que ele já faz por elas e pode ser feito com elas. Permitir que elas

participem das decisões que dizem respeito a elas mesmas e que organizam o cotidiano

coletivo.

4. Explorar

Na BNCC: “Explorar movimentos, gestos, sons, formas, texturas, cores, palavras, emoções,

transformações, relacionamentos, histórias, objetos, elementos da natureza, na escola e fora

dela, ampliando seus saberes sobre a cultura, em suas diversas modalidades: as artes, a

escrita, a ciência e a tecnologia”.

Como garantir esse direito: É importante permitir que as crianças explorem sozinhas

materiais distintos fornecidos pelo professor de maneira autônoma. Além da exploração de

elementos concretos a criança também precisa explorar os elementos simbólicos como

Educação e compromisso social

136

músicas e histórias possibilitando momentos de reflexão e, a partir da observação e escuta

dos pequenos.

5. Expressar

Na BNCC: “Expressar, como sujeito dialógico, criativo e sensível, suas necessidades, emoções,

sentimentos, dúvidas, hipóteses, descobertas, opiniões”.

Como garantir esse direito: Expressar é posterior ao explorar. Logo, rodas de conversa

são essenciais para que as crianças tenham seu direito garantido. Essas situações devem ser

cotidianas para que o professor apresente materiais variados para que a criança explore e se

expresse a partir de diferentes linguagens. Promover ambientes atrativos de expressão com

diferentes pessoas e situações ajuda a garantir este direito. Outro recurso fundamental é a

criação de oportunidades e momentos de fala, onde ambas as partes escutem e se expressem,

consigam escolher e argumentar sobre suas decisões sobre o coletivo.

6. Conhecer-se

Na BNCC: “Conhecer-se e construir sua identidade pessoal, social e cultural, constituindo uma

imagem positiva de si e de seus grupos de pertencimento, nas diversas experiências de

cuidados, interações, brincadeiras e linguagens vivenciadas na instituição escolar e em seu

contexto familiar e comunitário”.

Como garantir esse direito: É fundamental que o professor estimule as crianças a se

perceberem, aprendam do que gostam e a partir da observação, criar situações simples, mas

que os auxiliem a descobrir a si mesmo e ao outro, como exemplo a dinâmica dos espelhos

onde os pequenos se veem e se observam. Os momentos cotidianos como: o banho,

alimentação e troca de fraldas são ricos para essa aprendizagem, pois se sentem cuidados e

ao mesmo tempo em que aprendem a cuidar de si, a criança desperta a consciência sobre seu

corpo.

Gouvea (1993, p. 49) citado por Alves (1999), afirma que:

Falta aos profissionais da educação o conhecimento de quem são essas crianças para além dos muros da escola, qual a realidade por elas vivida, qual o universo cultural em que estão inseridas e a partir do qual constroem e representam a sua visão de mundo. Enfim, falta conhecer melhor a rede de relações sociais e as ações concretas do cotidiano em que esses sujeitos se constituem: sua identidade, seus sistemas de regras e normas de condutas, seus modos de conhecer e sua visão de mundo.

Educação e compromisso social

137

É oportuno frisar, que existe atualmente uma preocupação com as crianças, haja vista,

que as políticas que se tem implementado visando contribuir com a garantia de direitos e

condições favoráveis para seu desenvolvimento pleno, pois alguns dos direitos estabelecidos

às crianças pela BNCC como: educação, respeito, dignidade e cultura, já foram garantidos pelo

ECA anteriormente, previstos também no artigo 5º da Constituição Federal.

Logo, o Conselho Tutelar junto à escola tem a responsabilidade pela educação das

crianças não apenas no processo de ensino e aprendizagem, mas também em suas relações

familiares e sociais. Com isso, a escola precisa estar atenta aos problemas que possam surgir

oferecendo riscos aos direitos de aprendizagem para as crianças, para que assim possa

contribuir com o trabalho do Conselho Tutelar, sobretudo na prevenção e possíveis

providências para superar as dificuldades.

Conclusão

As políticas Públicas propõem um novo olhar sobre o aluno e, particularmente, sobre

a infância. A Nova BNCC trouxe um novo significado à educação como um processo de

alteridade, em que o aluno não é um ser submisso, onde a concepção de criança e Educação

Infantil sugere caminhos possíveis para garantir que os alunos sejam protagonistas no

processo de aprendizado. Essas reflexões tem como foco o desenvolvimento integral da

criança, já que é vista como alguém que responde aos estímulos dados pelos adultos (no caso

da escola, os professores).

Concluímos que os direitos de aprendizagem são amparados por políticas públicas que

os asseguram por lei como a Constituição Federal, o ECA, as DCNEIs e a nova BNCC que em

conjunto e somado a autonomia do conselho tutelar garantem que os direitos das crianças

sejam respeitados na escola e nas práticas elaboradas para a sala de aula, proporcionando

experiências significativas nessa etapa de ensino, que favoreçam o aprendizado e o

desenvolvimento e qualidade das relações estabelecidas nos primeiros anos de vida são

importantes para o desenvolvimento das crianças em todas as áreas da vida. Perceber-se,

portanto a imensa importância da implantação da BNCC para Educação Infantil no

desenvolvimento do indivíduo, assegurando sua educação e crescimento como cidadão.

Educação e compromisso social

138

Referências

ALVES, Iron Pedreira. Escola, família e o aluno trabalhador: a descontinuidade do processo educativo. Revista FAEEBA, n. 11, Bahia, 1999.

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular: Educação é a base. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_publicacao.pdf.

Acesso em: 11/04/2019.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Senado Federal – Brasília, 2004.

FREIRE. Paulo. Educação e atualidade brasileira. 3ª ed. São Paulo: Cortez/Instituto Paulo Freire, 2003.

LAVAL, Cristian. A Escola não é uma empresa. Londrina: Planta, 2004.

TREVISAN, Rita. BNCC na prática: tudo que você precisa saber sobre Educação Infantil. Rio de Janeiro: Revista Nova Escola. 2018. E-book. Disponível em: https://novaescola.org.br/bncc/conteudo/138/bncc-para-a-educacao-infantil-baixe-em-pdf-o-livro-digital. Acesso em: 8/04/2019.

Educação e compromisso social

139

EDUCAÇÃO SOCIOAMBIENTAL E FORMAÇÃO DOCENTE: DIALOGANDO COM O PROJETO PEDAGÓGICO DO CURSO DE PEDAGOGIA/UFPA-ABAETETUBA

Francisauro Fernandes da Costa51

Introdução

O presente artigo propõe-se identificar como a Educação Ambiental está

contemplada no currículo do curso de Pedagogia, a partir da análise de seu projeto

pedagógico. Além disso, almeja apresentar uma síntese das discussões realizadas em sala de

aula no decorrer deste núcleo, demonstrando a sua relevância para a formação docente dos

graduandos da turma de Pedagogia 2015, vespertino, haja vista que a proposta do referido

núcleo aborda conceitos como Meio Ambiente, Educação Ambiental, Desenvolvimento,

Problemas Regionais, Ecologia, Biodiversidade, Sustentabilidade, Conservação, Preservação,

Ecossistemas, entre outros, buscando compreender como a educação dialoga com esses

conceitos, bem como qual o papel da educação ambiental na construção de uma sociedade

ecologicamente sustentável.

1 materiais e métodos

A metodologia adota para a elaboração do artigo está pautada nos pressupostos da

abordagem qualitativa, onde utilizou-se uma pesquisa documental com base na proposta

curricular 2011 do curso de Pedagogia/UFPA-Abaetetuba, pautadas nos textos discutidos em

sala de aula no decorrer do Núcleo Eletivo de Educação Ambiental, constituindo-se seu

aspecto teórico.

1.1 Educação Ambiental contemplada no PPC do Curso de Pedagogia/UFPA/Abaetetuba

O Projeto Pedagógico do Curso de Pedagogia tem como finalidade o

desenvolvimento de um perfil de profissional criativo, com engajamento sociopolítico,

passando a se comprometer com a solução dos problemas da sociedade por meio da

construção de uma sólida formação teórico-prática e interdisciplinar, à medida que almeja

51 Graduando do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia da Universidade Federal do Pará/UFPA/Campus Universitário de Abaetetuba. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

140

formar profissionais qualificados para atuar em prol de um projeto de sociedade humana,

democrática e justa (PPC, 2011).

Partindo desse pressuposto é necessário compreender a importância da educação

socioambiental para o processo de formação docente dos graduandos que compõe o curso de

Pedagogia/UFPA-Abaetetuba. Nesse sentido, a estrutura curricular do curso de Pedagogia é

formada por núcleos de estudos: o núcleo de estudos básicos; o núcleo de aprofundamento e

diversidade de estudos; o núcleo de estudos integradores. Além disso, o curso oferta sete

opções de núcleo eletivo, dentre os quais enfatizo o Núcleo de Educação Ambiental, composto

por uma carga horária de 350 horas.

Portanto, este núcleo é constituído pelas seguintes disciplinas: Teorias do

Desenvolvimento e Meio Ambiente; Educação e Problemas Regionais; Ecologia e

Biodiversidade; Tecnologias em Educação Ambiental no Currículo Escolar e Atividades

Programadas, que juntas almejam corroborar para a formação de um perfil de profissional

que esteja engajado na solução dos problemas socioambientais e com a formação de novos

sujeitos a partir da perspectiva da consciência crítica socioambiental, visando a transformação

do ser no mundo para que compreenda a relevância da solidariedade intergeracional52.

2 Resultados e discussão

A partir das discussões realizadas ao longo do Núcleo Eletivo de Educação Ambiental,

foi possível entender que a relação homem-natureza tem gerado inúmeros problemas

socioambientais, causando a chamada crise ambiental caracterizada pelo questionamento

sobre a natureza do ser no mundo, a qual surge como consequência de uma crise de

conhecimento que se apresenta no limite do crescimento econômico e populacional, levando-

nos a repensar o agir do ser humano no mundo complexo e globalizado, no sentido de

construir novos saberes, para, a partir de então, possibilitar a reconstrução e a reapropriação

do mundo (SILVA, 2009).

Historicamente, o termo meio ambiente vem sendo compreendido, em sua maioria,

a partir de seu aspecto natural e esteve intrinsecamente relacionado a ideia de

desenvolvimento, o qual surgiu nos países ocidentais sob a ótica de progresso, avanço,

resumindo-se ao seu aspecto econômico.

52 Este conceito parte do princípio de que é dever de todos os cidadãos, em articulação com os órgãos públicos, defenderem e preservarem o meio ambiente para torna-se habitável as gerações atuais e futuras.

Educação e compromisso social

141

Pautada na complexificação do conhecimento por meio da perspectiva

interdisciplinar das diversas ciências, a Educação Ambiental surge com o propósito de

ultrapassar a visão fragmentada, linear e unidirecional que ainda se tem sobre o

conhecimento, o meio ambiente, o desenvolvimento etc., uma vez que ela serve para

questionar a natureza do ser no mundo.

A Educação Ambiental como modalidade de educação transversal, não pode ser

constituída apenas do ponto de vista ecológico preservacionista, em virtude da sua relação

com a complexidade do global, que dialoga com o local mediante a identificação e

problematização dos problemas regionais, visando a manutenção da vida com boa qualidade

no planeta.

Nesse sentido, a educação ambiental alicerçada na perspectiva crítica, “deve ser

acima de tudo um ato político voltado para a transformação social” (TRISTÃO, 2004, p. 20),

permitindo compreender que o meio ambiente não é constituído apenas do ponto de vista

natural com base na ideia da preservação ambiental, mas, sobretudo, é composto da

dimensão sociocultural, uma vez que é visto como possibilidade de construção social, ou seja,

é o espaço de produção da vida, portanto, está intrinsecamente relacionado com a concepção

de desenvolvimento numa dimensão pluridimensional, envolvendo os aspectos sociais,

econômicos, éticos, políticos, culturais, entre outros.

Ignacy Sachs (2007, p. 22), utilizando como base os estudos do indiano Amartya Sen,

prêmio Nobel de economia, destaca entre os múltiplos conceitos de desenvolvimento, que:

Desenvolvimento é a efetivação universal do conjunto dos direitos humanos, desde os direitos políticos e cívicos, passando pelos direitos econômicos, sociais e culturais, e terminando nos direitos ditos coletivos, entre os quais está, por exemplo, o direito a um meio ambiente saudável.

Assim, pautada na complexificação do conhecimento, tomando como base o

conceito de desenvolvimento a partir de sua dimensão pluridimensional, Sachs (2007, p. 22)

afirma que este é constituído por três dimensões básicas da sociedade, sendo compreendido

atualmente por meio da ideia de “desenvolvimento socialmente includente, ambientalmente

sustentável e economicamente sustentado”, ocasionando a necessidade de criar uma

sociedade ecologicamente saudável.

Nesse sentido, devemos pensar a sustentabilidade dentro do contexto em que o

homem consegue utilizar a natureza para suprir as suas necessidades, estimulando o

Educação e compromisso social

142

desenvolvimento, mas sem prejudicar o meio ambiente, tampouco, as futuras gerações, visto

que necessitarão dele para sua sobrevivência.

Dessa forma, a educação socioambiental tem um papel importantíssimo na

construção dessa sociedade ecologicamente sustentável, por propiciar o desenvolvimento da

consciência crítica sobre a problemática socioambiental, ressaltando a responsabilidade social

na perspectiva de formar cidadãos conscientes de seus direitos e deveres, pois uma de suas

funções é formar para a cidadania ativa mediante uma “conscientização” associada à

disciplina, pelo fato de ser um processo educativo, dinâmico e contínuo.

Com isso, a educação socioambiental torna-se primordial nos cursos de formação de

professores, “por envolver um conjunto de atores do universo educativo” (TRISTÃO, 2004, p.

17), pois, abrange todos os níveis, etapas e modalidades de ensino, contemplando estratégias

de ações interdisciplinares através das inter-relações do meio natural e social, visando uma

formação que supere a “banalização conceitual” sobre o meio ambiente de modo geral,

mediante o processo de construção e desconstrução de conceitos, proporcionando o

desenvolvimento de uma educação crítica.

A educação ambiental, nas suas diversas possibilidades, abre um estimulante espaço para um repensar de suas práticas sociais e o papel dos professores como mediadores e transmissores de um conhecimento necessário para que os alunos adquiram uma base adequada de compreensão essencial do meio ambiente global e local, da interdependência dos problemas e soluções e da responsabilidade de cada um para construir uma sociedade planetária mais equitativa e ambientalmente saudável. [...]. Nesse contexto, a educação ambiental aponta propostas pedagógicas centradas na conscientização, mudança de comportamento, desenvolvimento de competências, capacidade de avaliação e participação dos educandos. Também propicia o aumento de conhecimentos, mudança de valores e aperfeiçoamento de habilidades, condições básicas para estimular a maior integração e harmonia dos indivíduos com o meio ambiente (TRISTÃO, 2004, p. 18 -20).

Portanto, a educação socioambiental como uma das dimensões do processo

educacional, torna-se imprescindível para a formação de professores engajados na solução

dos problemas, que colocam o ser humano como responsável individual e coletivamente pela

sustentabilidade, ou seja, socioambientais, por possibilitar desenvolver reflexões sobre as

várias visões do mundo, levando em consideração sua temporalidade e historicidade social a

partir da relação homem-natureza.

Educação e compromisso social

143

Conclusão

À guisa de conclusão, ressalto a relevância do Núcleo Eletivo de Educação Ambiental

para o processo de formação docente dos graduandos do curso de Pedagogia 2015/UFPA-

Abaetetuba, propiciando a ressignificação de conceitos para entender a Educação Ambiental

para além de sua visão ecológico-preservacionista, tendo em vista sua relação com a

complexidade do global.

Portanto, as discussões elucidadas neste núcleo possibilitaram compreender que

apenas por meio da emancipação do sujeito, da superação da crise do conhecimento pautado

na concepção crítica da educação ambiental, que podemos vislumbrar uma nova perspectiva

de sociedade, que esteja preocupada com o hoje e com o amanhã, ou seja, que compreenda

a importância da solidariedade intergeracional, para podermos cuidar do meio ambiente, pois

ele constitui-se como espaço de construção da vida.

Referências

ARAÚJO; Gilda Cardoso de. Estado, política educacional e direito à educação no Brasil: “o

problema maior é o de estudar”. Educar em Revista, Curitiba, Brasil, n. 39, p. 279-292, jan./

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Abaetetuba/Baixo Tocantins/UFPA. v. 7, n. 9, Ago, 2013. Abaetetuba: UFPA, 2013.

MONASTEIRO; Leonardo M. O que é um problema regional? Nota preliminar. Revista Ipea. Regional, urbano e ambiental, 2009.

PENTEADO, Heloísa Dupas. Meio Ambiente e formação de professores. 5ª ed. São Paulo:

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Nildo (Orgs.). Dilemas e desafios do desenvolvimento sustentável no Brasil. Rio de Janeiro:

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SILVA, Marilena Loureiro da. A Educação Ambiental e suas contribuições para a Sustentabilidade da Região Amazônica: um estudo sobre as experiências desenvolvidas na Floresta Nacional do Tapajós. Revista Interações: Pesquisas em educação ambiental distantes do que se denomina “ciência normal”, v. 5 n.11, p.122-152, 2009.

TRAJBER, Rachel; MENDONÇA, Patrícia Ramos (Orgs.). Educação na diversidade: o que fazem

as escolas que dizem que fazem educação ambiental. Brasília: Secretaria de Educação

Continuada, Alfabetização e Diversidade. (Coleção Educação para Todos, Série Avaliação), n.

6, v. 23, p. 256, 2006.

Educação e compromisso social

144

TRISTÃO, Martha. A educação ambiental na formação de professores: redes de saberes. São

Paulo: Annablume; Vitória: Facitec, 2004.

UFPA. Projeto Político-Pedagógico do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia.

Abaetetuba: UFPA, 2011.

Educação e compromisso social

145

A INTEGRAÇÃO DE PRÁTICAS SOCIAIS E EDUCATIVAS: REALIZADAS NO CENTRO DE REFERENCIA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL/CRAS, SÃO SEBASTIÃO/PA

Camila Ellen Pinheiro da Silva53

Samuel Santos Ribeiro54

Maria Vitória dos Santos55

Introdução

A intensa competitividade vivenciada, e a grande exaltação dos interesses econômicos

da classe burguesa, que deixa de lado a sociedade das camadas populares. Nos coloca diante

de uma descriminação e exploração de modo generalizado, sendo a educação o feixe de luz,

para libertação da opressão na busca por uma sociedade mais justa e humana, visando a

igualdade de oportunidades para todos. Assim, segundo Gadotti (1981) “A educação, como

lugar de prolongamento de uma sociedade, deve ser o lócus do inacabado, do transitório e do

não permanente”.

A educação na sociedade tem como propósito, uma estratégia na qual se torna

importante desenvolver iniciativas que contribuam para o desenvolvimento humano, na

medida em que vá de encontro às necessidades e interesses daqueles em questão. Ao

pensarmos em educação e onde ela se desenvolve, logo nos vem a “escola”, porém como traz

Brandão (1994) não há uma forma única nem um único modelo de educação; a escola não é

o único lugar em que ela acontece e talvez nem seja o melhor. Sendo assim, ao buscar

compreender os campos que percorrem a educação, como ela vem se construindo e como ela

se dá, podemos encontrar três tipos: a educação formal, a educação informal e educação não

formal.

Os pioneiros Coombs e Ahmed (1974 apud TRILLA, 2008) que trazem a educação

formal compreenderia “o sistema educacional” altamente institucionalizado,

cronologicamente graduado e hierarquicamente estruturado que vai dos primeiros anos da

escola primária até os últimos da universidade”, a educação não formal, “toda atividade

organizada, sistematizada, educativa, realizada fora do marco do sistema oficial, para facilitar

53 Instituto Federal do Pará/IFPA. E-mail: [email protected] 54 Instituto Federal do Pará/IFPA. E-mail: [email protected] 55 Instituto Federal do Pará/IFPA. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

146

determinados tipos de aprendizagem a subgrupos específicos da população, tanto adultos

como infantis” e a educação informal, “um processo, que dura a vida inteira, em que as

pessoas adquirem e acumulam conhecimentos, habilidades, atitudes e modos de

discernimento por meio das experiências diárias e de sua relação com o meio”.

Gohn (1995) define a educação não formal como ações e práticas coletivas organizadas

em movimentos, organizações, associações sociais e organizações não governamentais

(ONG’s), onde a cidadania é o objetivo principal, pensada em termos coletivos. Nessa

perspectiva a aprendizagem se dá por meio da prática social, sempre com um caráter coletivo,

passando por um processo de ação grupal.

Nesse contexto, onde entendemos a educação como viés de transformação social, e

não tendo uma única forma exclusiva de educar, no presente trabalho, investigamos como

acontece a educação em ambientes não escolares. O lócus da pesquisa foi realizado na

unidade do CRAS (Centro de Referência e Assistência Social), localizado no bairro de São

Sebastião, na cidade de Abaetetuba-Pará. Tendo como objetivo analisar de que forma tem se

constituído e caracterizado as práticas educativas nesse ambiente.

Machado (2011), afirma que as demandas sócio educacionais da contemporaneidade

exigem um olhar mais abrangente sobre a educação, um olhar que discute a educação em

suas dimensões políticas, econômicas, sociais e culturais, que inclui a escola como parte

fundamental do processo, no entanto, que vai mais além.

1 Materiais e métodos

A metodologia utilizada foi uma pesquisa de cunho qualitativa, pois um dos desafios

da pesquisa educacional é, portanto, captar o dinamismo dessa realidade, desvencilhando a

complexidade de seu objeto de estudo em sua realidade histórica. Os procedimentos

adotados para esta pesquisa são diários de campo, a observação participativa e entrevista

semi-estruturada, finalizando com uma pesquisa bibliográfica em livros, artigos e documentos

que versam sobre o assunto.

Iniciamos as visitas ao CRAS, no período de janeiro de 2019, observando a funcionalidade

desse espaço para comunidade, conhecido também como Casa das Famílias, é uma unidade

pública estatal descentralizada da Política de Assistência Social, responsável pela organização,

gestão e oferta dos serviços da proteção social básica do SUAS (Sistema Único de Assistência

Educação e compromisso social

147

Social), nas áreas de vulnerabilidade social dos municípios. É uma unidade que possibilita o

acesso de um grande número de famílias à rede de proteção social de assistência social.

1.1 Entrevista semi estruturadas

Uma das formas de obtenção dos dados necessários para análise, como já foi mencionado,

foi a entrevista- semiestruturada, realizada com funcionários e usuários dos serviços

prestados pelo CRAS- São Sebastião. Totalizando 3 entrevistados, que desempenham

diferentes funções, na área da psicologia, técnico de referência, educação social, serviço

social, secretária, coordenação, práticas de oficinas, entre outras. Os nomes serão

preservados por questões éticas da pesquisa, conservando o anonimato dos participes.

Adotaremos nomes fictícios, escolhidos pelos próprios entrevistados, são eles: “Kelly”,

“Matias”, “José”. Vale ressaltar, o pedido de um dos participantes, que destacou: “Não nos

apresente na sua pesquisa como ‘x’, ‘y’ ou uma letra qualquer do alfabeto, escreva nomes

reais, isso nos humaniza, e se lermos o trabalho, nos sentiremos especiais”.

2 Resultados e discussão

Ao analisar os materiais obtidos nas entrevistas realizadas, com os 6 participantes. No

que tange, a visão dos mesmos sobre “qual a perspectiva de educação no CRAS?” Obtivemos

as seguintes visões:

Matias – [...] É complicado falar sobre educação, porque os serviços que tem aqui, não funcionam como escola, tem que deixar claro pras famílias, tipo entre aspas que não é educativo, não tem nada a ver com educação, aqui é diferente, tem que falar, que aqui é outra política, aqui é política de assistência, mas claro se for trabalhar um tema, tipo drogas não deixa de ser educação [...] a mãe tem que entender, que aqui não é um reforço, entendeu? Ah, eu vou colocar ele lá como reforço, não é [...].

Kelly – [...] A forma que nós trabalhamos a educação é a educação social. A gente não faz nada de escola, nada disso, mas é a questão do trabalho que enquanto pessoa humana, essa forma: cultura, desenvolver as ações [...] Aqui a gente trabalha a família! é o fortalecimento desse vinculo. A situação econômica de uma família, ela deixa a desejar, quebra um pouco a estrutura familiar [...].

Podemos compreender que os entrevistados não excluem o papel educacional

realizado no CRAS, porém objetivam justificar que não representa uma educação escolar de

Educação e compromisso social

148

cunho formal, que outros valores educacionais são transmitidos nesse espaço, dando enfoque

nas práticas sociais e culturais. Sendo assim, sabemos que a educação é conclamada também

para superar a miséria do povo, promovendo o acesso dos excluídos a uma sociedade mais

justa e igualitária, juntamente com a criação de novas formas de distribuição da renda e da

justiça social (GOHN, 2010). Como traz Gohn (2009), a existência de um processo educativo

no interior de processos que se desenvolvem fora dos canais institucionais escolares implica

em ter, como pressuposto básico, uma concepção de educação que não se restringe ao

aprendizado de conteúdos específicos transmitidos através de técnicas e instrumentos do

processo pedagógico.

Evidenciamos na resposta de José, uma mentalidade expressada por muitos, que só

irão denominar como educação os processos realizados nas instituições oficiais de ensino,

priorizando a educação dita intelectual, e desfavorecendo e umas vezes até renegando outros

modelos educacionais. No entanto, entendemos que se a educação não possuir um caráter

dialético e libertador, ela recai na “concepção bancária da educação, em que a única margem

que se oferece aos educandos é a de receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los’’

(FREIRE, 1982).

José – [...] Quando a gente fala de educação a gente fala muito de uma educação pedagógica, uma educação academicista. Só que aqui a gente trabalha com outro modelo de educação! A gente pode também trabalhar com uma educação de ordem emocional, educação social, uma educação de saúde; sempre procurando nessas perspectivas não necessariamente pedagógicas [...] Trabalhar com um coletivo, sobre um tema é educação. Porque educação a gente tem muito essa questão de ficar nessa educação muito de pontinho, metas e objetivos. Temos metas e objetivos aqui, sim. Mas se a gente puder fazer a ligação entre um conteúdo não pedagógico somente, e um conteúdo social, um conteúdo emocional, a gente tá educando as pessoas. Educação é mais amplo do que somente um modelo acadêmico.

Finalizando as análises das entrevistas, compreendemos que os espaços de interação

onde ocorrem essas aprendizagens, não devem ser vistos como lugares para a preparação

para a vida, mas sim como espaços de vida, onde os sujeitos possam desenvolver suas

potencialidades e experiências, a educação para esse entrevistado, não acarreta apenas

significado de aprendizagem, mas é a própria satisfação de bem estar físico e mental, gerando

a completude de carga afetiva proporcionada pelo ambiente do CRAS.

Educação e compromisso social

149

Conclusão

Buscamos compreender a dinâmica estabelecida nesse espaço voltado ao

assistencialismo, conhecendo os programas ofertados, como eles são trabalhados, a atuação

ativa de seus usuários, que podem iniciar as atividades a partir de 3 anos, dando segmento,

haja vista, os atendimentos se estendem ao “grupo” dos idosos. Porém, vale ressaltar que o

grande objetivo do CRAS São Sebastião é possibilitar que seus participantes adquiram

consciência crítica, partindo de suas vidas e experiência, para alcançar seu desenvolvimento

na sociedade que está inserido, interligando conhecimentos sobre saúde, educação, religião,

política, economia e assegurando conhecer seus direitos. Priorizando o trabalho para

fortalecer o vínculo social e familiar. Nossas considerações são baseadas nas visitas ao espaço,

diário de campo e entrevistas realizadas com profissionais e participantes dos programas

ofertados pelo centro de referência de assistência social.

Constatou-se que o trabalho dos profissionais do CRAS, como é por eles apresentado

nas entrevistas, tende a proporcionar ao sujeito uma percepção crítica sobre suas realidades,

estabelecidas por ações sociais e intencionais, fornecendo subsídios para que possam ter uma

posição sempre presente de análise crítica sobre os fatos, tornando um cidadão consciente e

humanizado, que irão se reconhecer como sujeito que vive em constante interação com o

mundo, ao invés de frágil indivíduo que não sabe comprometer-se com a libertação de seus

contextos opressores, sendo a educação não formal o meio mais eficaz utilizado para propiciar

essa interação sujeito – conhecimento – mundo, devido as práticas de trabalho representadas:

oficinas, palestras, brinquedoteca, práticas esportivas, grupos culturais de dança e música,

organizando a educação em ações de práticas de convívio e socialização de saberes culturais.

Referências

BRANDÃO, Zaia (Org.). A crise dos paradigmas e a educação (Posfácio). São Paulo, Cortez, 1994.

FREIRE, Paulo. Conscientização: Teoria e prática da libertação: uma introdução ao pensamento de Paulo Freire. São Paulo: Cortez/Moraes, 1982.

GADOTTI; Moacir. A educação contra a educação. Rio de Janeiro: Paz e terra ,1981.

GOHN, Maria da Glória. Educação não-formal e educador social: atuação no desenvolvimento de projetos sociais. São Paulo: Cortez, 1995. (Coleção questões da nossa época, v.1).

GOHN, M. da G. Educação não-formal e o educador social: atuação e desenvolvimento de projetos sociais. São Paulo: Cortez, 2010.

Educação e compromisso social

150

TRILLA, Jaume; GHANEM, Elie. Educação formal e não-formal: pontos e contrapontos. São Paulo: Summus, 2008. (Coleção pontos e contrapontos).

Educação e compromisso social

151

RECRIAÇÃO E MOVIMENTO: DESCOBRINDO CAMINHOS NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM

Dayana Suelen Viana da Cruz56

Andreza Viana Souza57

Myéllen Karen Contente58

Introdução

O atendimento em creches e pré-escolas está estabelecido na Constituição de 1988,

de modo que toda e qualquer criança dispõe desse direito, sendo assim os municípios têm a

obrigação de atender a demanda e ensino de qualidade. Esse direito se resulta de muita luta

que se arrasta por anos, por esse motivo a educação se ressignifica de modo que sempre

esteja preparada para receber as crianças e trabalhar com estas de forma adequada.

Com a implementação da LDB nº 9.394/96, a Educação Infantil teve um impulso maior.

Esta lei reconheceu como direito das crianças de 0 a 3 anos o acesso a creches e de 4 a 6 anos,

pré-escolas, considerando a criança uma cidadã de direitos. Embora a LDB tenha sido baseada

na Constituição Federal de 1988, ela diferencia-se desta, pois, na mesma a criança era tida

como tutelada do Estado. Vale ressaltar que, a partir da LDB, passou-se a exigir cientificidade

e maior comprometimento para com esse período de desenvolvimento.

O que acontece em alguns casos, é que não existe o investimento necessário para

proporcionar uma educação de qualidade, não só no âmbito da Educação Infantil, mas em

todos os outros. De forma específica sobre Educação Infantil, demanda um certo cuidado ao

se trabalhar em todas as suas peculiaridades. Essa fase é essencial, pois se trabalha a

interdisciplinaridade fortemente, assim como a alfabetização, de modo que não está só nas

mãos do professor auxiliar na educação do aluno, mas também da família assim como de toda

56 UFPA/Campus Cametá. E-mail: [email protected] 57 UFPA/Campus Cametá: [email protected] 58 UFPA/Campus Cametá. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

152

a comunidade escolar, para formar um ser pensante futuramente e não apenas um cidadão

alienado.

De acordo com Santomé (1998), uma ajuda muito importante para poder desenvolver

um trabalho interdisciplinar com a Educação Infantil, são os jogos e brincadeiras utilizados em

projetos de centro de interesse propostos por Ovide Decroly. Ou seja, Decroly propõe um

plano de trabalho que esteja centrado na concepção do desenvolvimento integral e interesse

da criança, seguindo sempre as três etapas como cita Santomé (1998, p. 197): “observação,

associação e expressão”.

A necessidade de intervenções pedagógicas ligadas a interdisciplinaridade tem sido

uma preocupação crescente entre os educadores e tem ocupado papel de destaque nas

pesquisas atuais. Dessa forma, o movimento acaba se tornando objeto de pesquisa voltada a

interdisciplinaridade, podendo assim trabalhar diversos pontos importantes na Educação

Infantil.

Inicialmente o movimento deve estar inserido nas aulas de Educação Física, como uma

forma de abranger o interesse dos alunos que não tem afinidade com os esportes, porém o

movimento pode ser trabalhado em diversas disciplinas, sendo uma atividade isolada ou

conjunta com outros conteúdos.

A partir disso, Libâneo (1994) diz que: “Através da ação educativa, o meio social exerce

influência sobre os indivíduos e estes, ao assimilarem e recriarem essas influências, tornam-

se capazes de estabelecer uma relação ativa e transformadora em relação ao meio social”.

Pelo movimento, a criança aprende a se relacionar quando conhece a si mesmo e ao

outro. A construção de autonomia e identidade, também se dá a partir do movimento na

Educação infantil. Aprender atividades simples nessa etapa lhes parece extraordinário e é

mesmo, quando a criança, por exemplo, diz “já sei fazer um laço” ou “já sei subir a escada

sozinho”, devem ser gestos elogiados, e a criança vai adquirindo autonomia.

Para Moreira (1995, p. 85):

A criança é movimento em tudo o que faz, pensa e sente. O seu corpo presente é ativo em todas as situações e em todos os momentos. Ele, o corpo, dialoga todo o tempo com todos que o cercam. Desde uma brincadeira como pega-pega, até as formações em roda ou em colunas, posso notar que o corpo, por meio dos movimentos, denota sentimentos e emoções.

Educação e compromisso social

153

1 Materiais e métodos

A Educação Infantil é o primeiro e decisivo passo para se atingir a continuidade no

ensino com produção e eficiência desejáveis, tendo como objetivo o desenvolvimento da

atividade global que é caracterizado pelo prolongamento de experiências e movimentos

básicos, facilitando a escolaridade da criança e incorporando-se diretamente em outras faces

do desenvolvimento ao longo da vida (NANNI, 1998).

Inicialmente pretendeu-se não alterar a rotina dos alunos, de modo que o método não

causasse tanto impacto ou estranheza. Nesse caso, tomamos como base Zabalza (2008, p. 52)

quando analisa que:

As rotinas desempenham um papel importante no momento de definir o contexto no qual as crianças se movimentam e agem. As rotinas atuam como as organizadoras estruturais das experiências quotidianas, pois esclarecem a estrutura e possibilitam o domínio do processo a ser seguido e, ainda, substituem a incerteza do futuro por um esquema fácil de assumir.

Posteriormente se iniciou a aula com uma dança de modo que pudessem aquecer o

corpo para as seguintes, por meio da música infantil, denominada “Aquecimento da Bila bilu”

interpretada pela artista Xuxa, onde os alunos tiveram conhecimento sobre o corpo humano

através da letra da música e a partir disto estivessem preparados para as atividades

posteriores.

A atividade seguinte se deu novamente através de uma música, chamada de “Para

frente e para trás”, onde através da dança as crianças puderam trabalhar a lateralidade e

interação. Barreto (2002) defende a dança da seguinte maneira:

Uma das finalidades da dança na escola é permitir a criança evoluir em relação ao domínio do seu corpo, assim desenvolverá e aprimorará suas possibilidades de movimentação, descobrindo novos espaços, formas, superação de suas limitações e condições para enfrentar novos desafios quantos aspectos motores, sociais, afetivos e cognitivos.

A próxima atividade também teve como auxílio uma canção, intitulada “Trenzinho”,

esta se deu de forma coletiva, onde as crianças formavam uma fila segurando com as mãos

umas nos ombros das outras e seguravam um balão com a barriga enquanto cantavam a

música que consistia em uma soletração cantarolada, buscando trabalhar o equilíbrio,

velocidade, domínio da soletração e coordenação corporal.

Educação e compromisso social

154

Por fim, houve o “circuito divertido”, que apresentou direções e sequências através de

números e formas geométricas, permitindo que os alunos ficassem sempre ativos, de forma

pudessem desenvolver suas habilidades motoras, reflexos e força física, além de jogos de

movimento que os mantinham focados nas tarefas.

Segundo Miranda (2008) aprender a mover-se, envolve atividades como tentar,

praticar, pensar, tomar decisões, avaliar, ousar e persistir. Para o autor, a aprendizagem

através do movimento implica em usar movimentos como meio, para se chegar a um fim. Esse

fim, não necessita ser necessariamente o aperfeiçoamento das habilidades da criança, em se

mover efetivamente, mas pode ser um meio pelo qual a criança aprende mais sobre si mesma,

sobre seu ambiente e sobre o mundo que o cerca.

2 Resultados e discussões

Ao inserir os exercícios de forma lúdica na Educação Infantil, tememos que as crianças

mais tímidas não quisessem fazer os exercícios, no entanto, as respostas para todas as

atividades foram em nível de excelência. As crianças se divertiram, se soltaram, conversaram,

aproveitaram e principalmente aprenderam. Ter essa experiência, dia após dia, de vivenciar

desafios, quebrar barreiras, gerou conhecimentos que nenhum livro será capaz de ensinar,

superar as dificuldades e principalmente aprender com as crianças.

A criança, por muitas vezes acaba se tornando tímida em sala de aula ou pouco

motivada, dessa forma então ao se trazer uma aula diferenciada, acompanhando seu

cotidiano, foi de grande valia em seu processo relacional professor-aluno e aluno-aluno. Ao

trazer metodologias de ensino diferenciadas, acabamos tornando-os mais ativos e usando sua

energia de forma positiva pode trazer resultados grandiosos para o processo de ensino

aprendizagem das crianças.

Huizinga (1996, p. 11) destaca que: "A criança joga e brinca dentro da mais perfeita

seriedade, que a justo título podemos considerar sagrado". Dessa forma, ainda podemos

considerar que a questão do brincar favorece o processo da aprendizagem e deve ser algo

significativo e que necessita de maior atenção e cuidado docente.

É importante chamar atenção, o uso do brincar nas práticas pedagógicas das escolas

de crianças pequenas. Em muitas delas tem acesso restrito aos brinquedos e brincadeiras de

Educação e compromisso social

155

faz-de-conta, pois em muitos espaços escolares, nem sempre é permitida nem tampouco

estimulada, valorizada. Como aponta Kishimoto (2001, p. 45):

A prática pedagógica nas creches e pré-escolas parece referendar grandes espaços, vazios de brinquedos e objetos culturais que estimulem o imaginário infantil e permita a expressão de temáticas de faz-de-conta. Predominam, sempre, salas e corredores desprovidos de objetos em que se pode apenas correr, pular, rolar, trombar com outros. [...] Os brinquedos estão geralmente guardados em estantes ou armários, longe do acesso das crianças. Quando disponíveis, não há preocupação em adequá-los à faixa etária, se estão em bom estado, se há quantidade suficiente, se estimulam ações lúdicas que propiciem a expressão do imaginário [...].

Hoje, temos documentos legais que garante o direito de a criança brincar. O Plano

Nacional pela Primeira Infância (BRASIL, 2010), tem traçado em seu interior, diretrizes gerais,

objetivos e metas para que o País coloque em prática os direitos da criança afirmados pela

Constituição Federal e pelo Estatuto da criança e do adolescente, pelas leis que se aplicam aos

diferentes setores, como educação, saúde, cultura e outros. De acordo com Soares (2012, p.

12) um dos objetivos desse Plano, “é criar um programa nacional de brinquedos para

Educação Infantil, complementar ao programa de materiais pedagógicos, adequados às faixas

etárias e às necessidades do trabalho educacional”.

CONCLUSÃO

A experiência vivenciada na turma de jardim I do município de Cametá, em uma escola

pública e periférica nos fez rever todos os conceitos teóricos o qual nos embasávamos, pois

ao perceber a realidade dessa instituição nota-se as reais dificuldades vividas, tanto em

relação financeiro, como espacial e social, ainda que o problema não sejam as teorias e sim a

falta de investimento financeiro na educação pública por parte do Estado.

Com o ingresso obrigatório das crianças aos quatro anos na escola, faz-se necessário

refletirmos e discutirmos sobre a prática pedagógica na Educação Infantil, considerando os

aspectos acerca do corpo, da ludicidade e do brincar que estão presentes em muitos estudos,

mas ainda não abrangem completamente o campo educacional.

É fundamental que seja intensificada a luta pelo reconhecimento da condição da

criança como sujeito de direitos, em especial a uma Educação Infantil de qualidade que

assegure a ela o seu direito de ser criança e sujeito protagonista nos espaços institucionais.

Educação e compromisso social

156

Mesmo com todas as dificuldades, a metodologia ainda é inovadora mediante a

situação que a escola se encontra, sem projetos, sem Projeto Político-Pedagógico (PPP) e sem

recursos financeiros necessários. Deste modo, destacamos a escola como um local para além

dos cuidados na Educação Infantil, pois nele a criança deve brincar, interagir e agir com o meio,

com o outro e com si mesmo.

“Advogamos o princípio segundo o qual a escola, independentemente da faixa etária

estaria que atenda, cumpra a função de transmitir conhecimentos, isto é, de ensinar como

lócus privilegiado de socialização para além das esferas cotidianas e dos limites inerentes à

cultura do senso comum” (MARTINS, 2009, p. 94).

Sendo assim o papel da escola está para o além do cuidar, mas também para o educar,

assim como vice-versa, quando tem casos no qual a escola apenas ensina e não cuida, por isso

precisa desenvolver suas habilidades e possibilidades de forma mais integral.

Referências

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Educação e compromisso social

158

PARTE 4. EDUCAÇÃO INCLUSIVA

Educação e compromisso social

159

O PROGRAMA HABILIDADES EDUCACIONAIS ALTERNATIVAS (PHA) NA APAE ABAETETUBA: EXPERIÊNCIA NA TURMA NÍVEL 2

Leileanne Mac Dovel Ribeiro59

Ana Cláudia Santos Saldanha60

Sandra Karina Barbosa Mendes61

Considerações Iniciais

As raízes históricas da pessoa com deficiência sempre foram marcadas por forte

rejeição, discriminação e preconceito. Diante da ineficiência do Estado em promover políticas

públicas sociais que garantam a inclusão dessas pessoas, surge o movimento de famílias

empenhadas em quebrar paradigmas e buscar alternativas para que seus filhos(as) com

alguma deficiência alcancem condições de serem incluídos na sociedade, com garantia de

direitos como qualquer outro cidadão. Nesse contexto, surgiram as primeiras associações de

familiares e amigos que se mostraram capazes de lançar um olhar mais propositivo sobre as

pessoas com este tipo de deficiência.

No Brasil, essa mobilização social começou a prestar serviços de educação, saúde e

assistência social a quem deles necessitassem, em locais que foram denominados como

Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE)62, constituindo uma rede de promoção

e defesa de direitos das pessoas com deficiência intelectual e múltipla.

A Associação de Pais e Amigos de Abaetetuba, foi fundada em 29 de junho de 1983,

como sociedade civil, sem fins econômicos. Surgiu pela iniciativa de profissionais da Educação

Especial que perceberam a necessidade de atendimento especializado para crianças,

adolescentes e adultos com deficiência. A primeira diretora da APAE Abaetetuba, foi a Sra.

Maria Elza Ribeiro de Andrade, a qual iniciou uma intensa mobilização no município, com a

59 Acadêmica de Pedagogia; Universidade Federal do Pará/Campus Abaetetuba. E-mail: [email protected] 60 Acadêmica de Pedagogia; Universidade Federal do Pará/Campus Abaetetuba. E-mail:

[email protected] 61 Doutora em Educação; Universidade Federal do Pará/Campus Abaetetuba. E-mail:

[email protected] 62 Histórico da APAE no Brasil. Disponível em: <https://apaebrasil.org.br/page/2>

Educação e compromisso social

160

finalidade de legalização da instituição e arrecadação de recursos, além de vendas para o

aluguel e adaptação de uma casa, a qual localizava-se na Rua Magno de Araújo.

Em 1986, iniciou o funcionamento da escola especializada, a qual recebeu o nome de

Casa Bem-te-vi, com o decorrer dos anos, o espaço ficou pequeno, pois recebera muitos

alunos(as) de outros municípios. No ano de 1990, um terreno foi doado pelo casal Ribeiro de

Andrade, onde foi construído o prédio próprio da instituição em convenio com a Legião

Brasileira de Assistência (LBA)63, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

(BNDES) e Ministério de Educação e Cultura (MEC).

A APAE Abaetetuba é localizada na Rua Brigadeiro Eduardo Gomes, 1767-Bairro

Aviação, contendo três centros de atendimento: Centro de atendimento multidisciplinar em

saúde “Rodrigo da Costa Pantoja”, o Centro de Apoio Educacional Especializado “Maria Elza

Ribeiro Andrade” e o Centro Profissionalizante “Helena Vinagre”. A APAE Abaetetuba oferece

serviços, programas e projetos de forma gratuita aos seus usuários, sendo esta instituição

referência no município.

A pesquisa foi realizada durante a disciplina “Fundamentos da Educação Especial” na

APAE Abaetetuba, instituição localizada na Rua Brigadeiro Eduardo Gomes, n. 1767, bairro

Aviação, município de Abaetetuba/Pará. Como referencial teórico, utilizamos Gomes et.al

(2007), Mantoan (2003) e Brasil (2004). A pesquisa desenvolvida foi de cunho qualitativo

onde, de acordo com Chizzotti (2005, p. 83), “na pesquisa qualitativa, todas as pessoas que

participam da pesquisa são reconhecidas como sujeitos que elaboram conhecimentos”, sendo

classificada como do tipo etnográfica. Os dados foram coletados a partir de entrevista

semiestruturada feita com a professora da Turma Alternativa nível 2 e observação

participante detalhada em diário de campo.

De acordo com Ribeiro (2010, p.267) a etnografia “[...] não é apenas observação,

descrição e diálogo entre etnógrafo e informantes ou reconstrução fiel do observado, e sim o

entendimento da diversidade dos processos de construção dos textos etnográficos”. A

pesquisa a campo contou com anotações no Diário de Campo, que envolve tanto a escrita

63 A Legião Brasileira de Assistência (LBA) foi um órgão assistencial público brasileiro, fundado em 28 de agosto de 1942, pela então primeira-dama Darcy Vargas, com o objetivo de ajudar as famílias dos soldados enviados à Segunda Guerra Mundial. A LBA foi extinta através do art. 19, inciso I, da Medida Provisória nº 813, de 1º de janeiro de 1995.

Educação e compromisso social

161

quanto a observação, no qual posteriormente, se constitui o diário de campo como algo

pessoal, pois nele está contido todos os detalhes observados em um determinado contexto.

De posse de tais informações, foi feita a análise do que é relevante para o estudo, a

releitura das anotações e separação de informações necessárias para a construção do texto.

Essas experiências referem-se a prática da etnografia no lócus escolhido para a pesquisa – a

APAE Abaetetuba, ressaltando a relevância do etnógrafo em reviver suas experiências para

assim iniciar a construção do texto, organizando, selecionando informações e assim apurar o

que será de total importância.

1 O Funcionamento do Programa Habilidades Educacionais Alternativas (PHA)

O Programa contém atividades que enfatizam a importância do movimento para o

desenvolvimento pessoal que promova o melhor desempenho da pessoa com deficiência nas

diversas situações de seu cotidiano. O conteúdo deste, tem por objetivo direcionar o trabalho

pedagógico dos profissionais que atuam no PHA, dando subsídio ao atendimento educacional

especializado e contribuindo nos processos de interação entre os sujeitos atendidos.

A partir do documento64 que norteia o referido programa e com a entrevista da

professora do nível 2, ressaltamos que o Programa Habilidades Educacionais Alternativas tem

como objetivo oferecer atendimento especializado à pessoas na faixa etária da adolescência

até a velhice com deficiência intelectual e múltipla, essas pessoas não frequentam a escola de

ensino regular e por esse motivo o PHA foi criado. O foco do programa é de contribuir com o

desenvolvimento da pessoa com deficiência Intelectual e Múltipla ajudando-a superar as

dificuldades motoras, sócio afetiva, cognitiva e, consequentemente, de aprendizagem. O PHA

é dividido em quatro níveis – nível 1, nível 2, nível 3 e nível 4 – De acordo com a professora

entrevistada:

O nível 1 são aqueles alunos que não conseguem copiar do quadro, não conseguem as vezes nem cobrir, não conseguem pintar, só se for com pintura dirigida, pintura com limite, não conseguem recortar. Já o nível 2 são alunos que já conseguem escrever em baixo, conseguem fazer uma boa pintura, conseguem recortar e são mais independentes do que o nível 1. O nível 3 são alunos que já estão mais avançados, são alunos que tiram do quadro, copiam do quadro, alunos que escrevem seu nome, sabem ler (alguns deles sabem

64 O documento referido é o Projeto do Programa de Habilidades Educacionais Alternativas, organizado por cinco docentes da instituição. A professora da turma nível 2 nos mostrou e permitiu que tirássemos fotos do mesmo.

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162

ler), o nível 4 são os alunos que estão na EJA à noite e eles estão nesse nível com outro professor, o professor trabalha só com esses alunos que estão na EJA à noite na escola (Professora do nível 2).

Com a fala acima, podemos perceber que há uma devida separação dos alunos, os que

têm mais dificuldade em executar as tarefas fazem parte do nível 1 e à medida em que vão

evoluindo suas habilidades, mudam de turma. Os estudantes do nível 4 já são bem avançados,

conseguem fazer todas as atividades sem grande dificuldade. Essa “seleção” é feita da

seguinte maneira: “Em 2018 a gestão e coordenação pedagógica foram selecionando esses

alunos por níveis, vendo o nosso relatório final: qual foi o aluno que aprendeu a fazer seu

nome, qual foi o aluno que conhece as vogais e sabe contar” (Professora do nível 2).

Assim sendo, ao final de cada ano letivo, a gestão e coordenação pedagógica da APAE,

analisam o relatório de cada estudante e os que avançaram mais, mudam de nível. Sobre essa

questão, Gomes et.al (2007, p. 27) afirmam que “O Atendimento Educacional Especializado

para tais alunos deve, portanto, privilegiar o desenvolvimento e a superação de seus limites

intelectuais, exatamente como acontece com as demais deficiências”.

2 Experiência na Turma Nível 2

Nossa experiência foi vivenciada na Turma Alternativa nível 2. Na turma há uma única

professora que atende doze alunos e alunas, dentre as limitações dos estudantes destacamos:

a deficiência intelectual (está entre a maioria dos alunos da referida turma); deficiência física

(há um aluno que usa cadeira de rodas) e duas alunas com síndrome de down. A professora

da referida turma é graduada em Pedagogia, especialista em psicopedagogia com ênfase na

educação especial e possui curso de LIBRAS. Em relação à estrutura da sala da alternativa 2:

A sala é pequena, porém possui uma salinha que abriga materiais pedagógicos e pertences de alguns estudantes como: escova e creme dental, toalha, sabonete, desodorantes, perfumes, pente para cabelos, etc. que são organizados em caixas de sapato, cada estudante tem sua caixa de sapato individual, a sala dispõe também de um banheiro, para que os alunos e alunas não precisem sair da sala se precisarem fazer suas necessidades fisiológicas (Diário de Campo).

Em relação à prática pedagógica realizada pela professora do nível 2, observamos que

ela trabalha com atividades rotineiras; no primeiro momento coloca uma canção para os

Educação e compromisso social

163

estudantes ouvirem, após, ela os incentiva a falar sobre a letra, os faz refletir sobre a

mensagem que a canção está se referindo. Em seguida, a professora faz uma oração.

Depois desse período devocional, a professora pegou na salinha de recursos pedagógicos, uma caixa de sapato que guarda os números que compõem os dias. E perguntou aos estudantes qual era o dia da semana e a data de hoje, os estudantes se mostraram interessados na atividade e participaram desse momento de “construção do calendário”, os números foram fixados por velcro (Diário de Campo).

Nos dias em que pudemos observar como se dá o funcionamento do PHA, destacamos que a

professora do nível 2 tem um bom relacionamento com seus educandos e ela busca ensiná-los da

melhor maneira possível, apesar de ela ter que se “dividir” em duas para atender as necessidades de

cada um, nas palavras dela: “Não vou dizer que é fácil, é difícil, pois eu tenho cadeirante, às

vezes eu tenho que deixar os que estão fazendo atividade para ajudar ele abrir a porta do

banheiro, ajudar ele a calçar o sapato, ajudar ele na hora do lanche para pegar o lanche”

(Professora do nível 2).

A maioria dos seus alunos são pessoas em processo de velhice e apesar dessa situação,

a professora não os trata com inferioridade. Ao contrário, ela os incentiva a serem pessoas

melhores, ensina com seriedade os conteúdos propostos e trabalha com dedicação e

paciência, respeitando as diferenças que cada um possui.

A Educação Inclusiva como modalidade de ensino, tem sido marcada pela luta por

garantia de direitos às pessoas com deficiência. Mas o que a palavra deficiência significa? De

acordo com Gomes (et.al., 2007):

A convenção da Guatemala, internalizada à Constituição Brasileira pelo Decreto nº 3.956/2001, no seu artigo 1º define deficiência como [...] ‘uma restrição física, mental ou sensorial, de natureza permanente ou transitória, que limita a capacidade de exercer uma ou mais atividades essenciais da vida diária, causada ou agravada pelo ambiente econômico e social’ (p. 14).

Pessoas com deficiência, ao longo dos tempos, foram desprezadas, abandonadas e

muitas foram mortas, apenas por terem nascido nessa condição, nesse sentido “a deficiência

foi, inicialmente, considerada um fenômeno metafísico, determinado pela possessão

demoníaca, ou pela escolha divina da pessoa para purgação dos pecados de seus

semelhantes” (BRASIL, 2004, p. 10). Após esse período, surge o debate médico sobre as

deficiências e de igual modo, pessoas com deficiência ainda eram taxadas como “anormais”,

dessa forma “a deficiência passou a ser vista como doença, de natureza incurável, gradação

de menor amplitude da doença mental” (BRASIL, 2004, p. 10). Nesse sentido, foram criados

Educação e compromisso social

164

espaços médicos, os quais eram considerados “apropriados” para atender essas pessoas com

deficiência, a intenção era tão somente de retirá-las do convívio com pessoas sem deficiência.

Essa prática de medicalização foi denominada de Paradigma da Institucionalização e perdurou

cerca de oito séculos (BRASIL, 2004).

Posterior ao Paradigma da Institucionalização, outros foram delineados, a saber:

Paradigma de Serviços, o qual era voltado na busca de integração de pessoas com deficiência

para, após isso, estas serem capacitadas, habilitadas ou reabilitadas; o Paradigma de Suportes,

o qual defendia a diversidade das pessoas e buscava garantir o acesso a todos, independente

de suas limitações (BRASIL, 2004). Dessa forma, tomamos as palavras de Mantoan, quando

pontua

a inclusão não prevê a utilização de práticas de ensino escolar específicas para esta ou aquela deficiência e/ou dificuldade de aprender. Os alunos aprendem nos seus limites e se o ensino for, de fato, de boa qualidade, o professor levará em conta esses limites e explorará convenientemente as possibilidades de cada um (2003, p. 36).

Considerações finais

A pesquisa realizada na APAE Abaetetuba foi uma rica experiência para nós enquanto

formandas do curso de Pedagogia, ter a oportunidade de conviver com pessoas com as mais

diversas deficiências foi de importância sem igual para nossa formação acadêmica, social e

pessoal. Aprendemos nesse espaço de tempo através da disciplina na universidade e da

pesquisa de campo, que apesar de nossas diferenças, somos todos iguais e concordamos com

Mantoan, quando afirma “nem todas as diferenças necessariamente inferiorizam as pessoas.

Há diferenças e há igualdades – nem tudo deve ser igual, assim como nem tudo deve ser

diferente” (2003, p. 21).

Referências

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Educação e compromisso social

165

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RIBEIRO, Joyce O. S. Pesquisado os gêneros nas fronteiras culturais: a “nova” etnografia. In: NASCIMENTO, Afonso W. de S.; RIBEIRO, J. Otânia S. (Orgs.). Educação: enfoque, problemas, experiências. São Paulo: Editora Livraria da Física, 2010.

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166

IDENTIDADES E CULTURA SURDA: UMA QUESTÃO PARA A ESCOLA REGULAR DE ENSINO

Marília do Socorro Oliveira Araújo65

Introdução

A relação de poder existente entre povos sempre foi marca profunda no processo de

construção de uma identidade própria, devido à dominância de um impor ao outro sua

identidade e cultura. Desde tempos remotos, povos são subjugados e forçados a adquirirem

uma cultura alheia a si. Isto acontece ainda hoje, no caso a ser analisado, o povo surdo que há

muito tempo vem lutando contra a hegemonia ouvintista que subjuga a capacidade de relação

surda, rechaçando-a como se não houvesse espaço para uma identidade própria:

[...] apesar de esmagados pela hegemonia ouvinte que tenta anular a sua forma de comunicação (a língua de sinais), procurando assemelhá-los cultural e linguisticamente aos ouvintes, resistem a essa imposição, reivindicando seus direitos linguísticos e de cidadania (SILVA, 2006, p. 15-16).

Esta minoria durante muito tempo não foi vista sob um olhar de diferença, mas com

um olhar de exclusão, o qual tenta abafar a constituição da sua identidade e cultura. Hoje, os

surdos lutam “pelo direito de ser surdo” (PERLIM, 2013, p. 51) em meio a uma sociedade

ouvinte majoritária.

Atualmente, os Surdos têm o direito legal de estudar em turma regular de ensino

com respeito a sua identidade e cultura. Porém, faz-se necessário refletir sobre essa

identidade e essa cultura uma vez que o ambiente de sala de aula é um espaço de múltiplas

culturas e a cultura ouvinte, neste caso, é hegemônica.

1 materiais e métodos

Por se tratar de uma pesquisa de cunho teórico, o estudo pauta-se nas obras das

autoras surdas Karin Strobel (2009) - As imagens do outro sobre a cultura surda - e Perlim

(2013) – Identidades surdas – que compõe a obra A surdez, um olhar sobre as diferenças, do

autor Carlos Skliar, para compreensão da identidade e cultura surda.

65 Universidade Federal do Pará/UFPA; Campus Universitário de Abaetetuba/Programa de Pós-Graduação em

Cidades, Territórios e Identidades/PPGCITI. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

167

Considerando o discurso de inclusão, utiliza-se o trabalho referencial de Ronice

Quadros (2012), o “Bi” em Bilinguismo na educação de surdos. Para a análise da problemática

em questão utiliza-se da ACD – Análise Crítica do Discursos em Fairclough (1999) como

método de pesquisa.

1.1 Da Cultura e Identidades Surda

Surdos dispõe de uma língua natural, com a qual se completam e identificam sua

percepção de mundo pela modalidade viso motora e não oral auditiva. Desse modo, se

reconhece que há uma cultura, e assim há construção de Identidades. Strobel (2009, p. 27)

conceitua cultura surda como:

Cultura surda é o jeito de o sujeito surdo entender o mundo e de modificá-lo a fim de se torná-lo acessível e habitável ajustando-o com as suas percepções visuais que contribuem para a definição das Identidades surdas. Isto significa que abrange a língua, as ideias, as crenças, os costumes e os hábitos do povo surdo.

A cultura sendo parte constituinte dos processos identitários, nos casos das pessoas

surdas, permite que elas sejam “construídas dentro das representações possíveis da cultura

surda, elas moldam-se de acordo com o maior ou menor receptividade cultural assumida pelo

sujeito” (PERLIN, 2004, Apud STROBEL, 2009, p. 27).

Sendo assim é necessário refletir sobre a educação sistematizada oferecida ao

público da escola regular de ensino da qual o Surdo faz parte.

2 Resultados e discussão

Historicamente o povo surdo sempre foi visto com um olhar de exclusão, dificultando

assim a sua relação social. Perlin (2005, p. 79), pesquisadora surda, afirma que:

A violência contra a cultura surda foi marcada através da história. Constatamos, na história, a eliminação vital dos surdos, a proibição do uso de língua de sinais, a ridicularizarão da língua, a imposição do oralismo, a inclusão dos surdos entre os deficientes, a inclusão dos surdos entre os ouvintes.

Todas estas ações resultam em “trucidamento da identidade surda” (PERLIM, 2005, p.

79), em função de um modelo de identidade ouvinte que os julga incapazes. Para Perlim, essa

subjugação constitui o “surdicídio”, pois muitos sofrem por aceitar a menosvalia social

Educação e compromisso social

168

imposta, que, segundo a autora, “é como uma violência silenciosa que continua agindo”

(2005, p. 80).

A perspectiva ouvintista é identificada academicamente do ponto de vista médico, o

conceito de ouvintismo designa o estudo do surdo do ponto de vista da deficiência, da

clinicalização e da necessidade de normalização. A ideia de ouvinte presume uma noção que

identifica a “nós ouvintes” em contraste com “aqueles surdos” (PERLIN, 2013, p. 59), noção

que compreende a diferença como desigualdade. O ouvintismo não é ligado ao preconceito e

não é o mesmo que oralismo, é antes uma ideologia dominante:

O ouvintismo deriva de uma proximidade particular que se dá entre ouvintes e surdos, no qual o ouvinte sempre está em posição de superioridade [...] em sua forma oposicional ao surdo, o ouvinte estabelece uma relação de poder, de dominação em graus variados, em que predomina a hegemonia por meio do discurso e do saber (PERLIN, 2013, p. 59).

Nesse sentido, a pesquisadora Ronice M. Quadros (2012) considera problemático o

discurso de inclusão, notadamente, segundo o modelo da escola inclusiva brasileira, na

medida em que este impõe o bilinguismo. Chamamos a atenção para a exigência do

bilinguismo como uma determinação restrita ao surdo. Em “O ‘Bi’ em bilinguismo na educação

de surdos” (2012), Quadros identifica que ao surdo na escola é prescrita à condição bi-partida,

que a Libras é um meio de ensino da língua portuguesa. A “inclusão” da Libras não faz dessa

língua o meio de acesso ao conhecimento.

O bilinguismo e o biculturalismo denotam uma exigência da diversidade imposta pela

sociedade anfitriã ao surdo, uma definição sujeita ainda a manter cambaleante a comunidade

surda. São, assim, uma forma de etnocentrismo: bilinguismo e biculturalismo mascaram

normas, pois mantém a diferença cultural surda como se ela fosse incômoda (PERLIN, 2005,

p. 56). Esse processo produz uma interferência na constituição do grupo surdo, portanto, da

identidade surda e, assim, no desejo do discurso surdo: a vontade de constituir a própria voz

e admiti-la no espaço social mais amplo.

Entendemos a cultura surda como diferença, o mundo de experiência surda como,

sobretudo, visual e não ouvinte. Os discursos hegemônicos impõem ao surdo a condição de

ouvinte, fator que é refletido em diversos âmbitos, principalmente no espaço escolar.

Os estudos referenciais acima citados são muitos válidos. Durante o período de

atuação profissional como intérprete de Libras-Língua Portuguesa foi possível verificar

Educação e compromisso social

169

inúmeras barreiras no processo de ensino e aprendizagem do aluno surdo. Dificuldades essas

que perpassam por toda a estrutura educacional ouvinte majoritária.

No ambiente escolar observa-se a ausência dos artefatos culturais surdos o que

dificulta o processo de identificação surda, principalmente quando se trata de um aluno surdo

em meio a vários ouvintes, ocasionando o prejuízo na apropriação de sua língua materna

(Libras) e, consequentemente, a autoafirmação identitária, pois a Libras torna-se um dos

principais elementos da cultura e identidade surda.

Conclusão

Portanto, partindo da compreensão de que a escola é um espaço de múltiplas

relações culturais, há a necessidade de fazer reflexões mais profundas acerca das identidades

e culturas que compõe o meio escolar, sendo uma delas a cultura surda. Neste caso, as

observações permitem compreender que a diferença cultural entre surdos e ouvintes é

tratada como desigualdade, refletindo no currículo escolar uma subjugação, já que a Libras é

tratada como um meio de ensino da Língua Portuguesa e não um meio de acesso ao

conhecimento

Referências

PERLIM, Gládis T. T. Identidades surdas. In: SKLIAR, Carlos (Org.). A surdez, Um olhar sobre as diferenças. Porto Alegre: Editora Mediação, 2013.

QUADROS, Ronice Müller de. Estudos Surdos I. Petrópolis: Editora Arara Azul, 2006.

QUADROS, Ronice Müller de. O ‘Bi’ em bilinguismo na educação de surdos. In: Letramento, bilinguismo e educação de surdos. Porto Alegre: Editora Mediação, 2012.

SILVA, Vilmar. Educação de surdos: uma releitura da primeira escola Pública para surdos em Paris e do Congresso de Milão em 1880. In: QUADROS, R. Müller de. (Org.). Estudos surdos I. Petrópolis: Arara Azul, 2006.

SKLIAR, Carlos (Org.). A surdez: um olhar sobre as diferenças. Editora Mediação: Porto Alegre, 2013.

STROBEL, Karin. As imagens do outro sobre a Cultura Surda. 2ª ed. rev. Florianópolis: Ed. da UFSC, 2009.

Educação e compromisso social

170

ASSOCIAÇÃO MILTON MELO: PRÁTICAS E SABERES NA PERSPECTIVA

DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA

Danila Castilho da Silva66

Brenda Suellem Dias Cavalheiro67

Regina Pantoja Siqueira68

Sandra Karina Barbosa Mendes69

Introdução

A educação inclusiva, desde a Constituição Federal de 1988, já abordava uma normativa

que previa educação de qualidade para todos os cidadãos, independentemente de sua

situação física, intelectual ou religiosa. Para Ferreira (2010, p. 93) “[...] incluir é o mesmo que

compreender, que por sua vez, quer dizer entender, alcançar com a inteligência”. Talvez os

que escamoteiam o ‘direito à inclusão’ e compreensão aos deficientes, não estejam

alcançando com a inteligência a real importância da inclusão, não só para os deficientes, mas

também para os sem deficiência. De acordo com Mantoan:

Inclusão é a nossa capacidade de entender e receber o outro e, assim, ter o privilégio de conviver e compartilhar com pessoas deferentes de nós. A educação inclusiva acolhe todas as pessoas, sem exceção. É para o estudante com deficiência física, para os que tem comprometimento mental, para os superdotados, e para toda criança que é discriminada por qualquer outro motivo (MANTOAN, 2005, p. 96).

A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada pela ONU em

2006 e ratificada com força de Emenda Constitucional por meio do Decreto Legislativo n.

186/2008 e do Decreto Executivo n. 6949/2009, estabelece que os Estados-Partes devem

assegurar um sistema de educação inclusiva em todos os níveis de ensino, em ambientes que

maximizem o desenvolvimento acadêmico e social compatível com a meta da plena

participação e inclusão, adotando medidas para garantir que “as pessoas com deficiência

66 Campus Universitário de Abaetetuba/UFPA. E-mail: [email protected] 67 Campus Universitário de Abaetetuba/UFPA. E-mail: [email protected] 68 Campus Universitário de Abaetetuba/UFPA. E-mail: [email protected] 69 Campus Universitário de Abaetetuba/UFPA. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

171

possam ter acesso ao ensino fundamental inclusivo, de qualidade e gratuito, em igualdade de

condições com as demais pessoas na comunidade em que vivem” (2009, Art.24).

Este documento define “deficiência” como toda perda ou anormalidade de uma

estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o

desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal para o ser humano. Todos

na comunidade escolar, os pais e responsáveis e a comunidade em geral, são participantes da

educação para inclusão de pessoas com deficiência, principalmente os professores,

indispensáveis para tal processos de inclusão, “é essencial que os professores reconheçam sua

própria importância no processo de inclusão, pois a eles cabe planejar e implementar

intervenções pedagógicas que deem sustentação para o desenvolvimento das crianças”

(LIMA, 2006, p. 123).

E dentro dessa perspectiva podemos enfatizar o aspecto profissional de cada

educador, pois sem as devidas qualificações o mesmo não poderá atender com eficiência

qualquer aluno deficiente que seja, precisamos com urgência ter um olhar mais aproximado

aos alunos que necessitam de um atendimento especializado, e assim formar profissionais

aptos para esse público.

1 Materiais e Métodos

A pesquisa foi planejada durante a disciplina Fundamentos da Educação Especial e

Inclusiva, ministrada pela professora Sandra Karina B. Mendes. Inicialmente, estudamos em

sala de aula como se caracteriza a ida a campo para a coleta de dados numa pesquisa do tipo

etnográfica. Tentamos incorporar alguns elementos básicos deste tipo de pesquisa, como a

observação e registro em diário de campo. Com base num roteiro de observação, fomos a

campo coletar os dados, no período de 10 a 22 de abril do ano 2019, na Associação Milton

Melo.

Após esse primeiro momento, retomamos o referencial teórico trabalhado em disciplina

anterior, tais como Mantoan (2015) e Lima (2006), entre outros, pela mesma professora, que

apresentam os fundamentos legais e conceituais da educação inclusiva e especial. Tomamos

como base este referencial para realizar a análise dos dados organizados no diário de campo.

Educação e compromisso social

172

2 Resultados e discussão

2.1 A associação Milton Melo70

A Associação Beneficente de Educação Neurofuncional Milton Melo é uma instituição

de direito privado, sem fins lucrativos, de caráter filantrópico, cultural, assistencial e

educacional, em atuação no município de Abaetetuba desde a data de fundação em 28 de

agosto de 2004. Um grupo de aproximadamente vinte famílias, motivados pela médica

neurologista Dra. Madacilina Melo Teixeira idealizaram o surgimento desta instituição a fim

de aumentar a oferta de atendimento do público alvo da educação especial.

Conforme o decreto n. 6571/2018 e a resolução CNE/CEB n. 4/2009, a associação atua

como um centro de atendimento educacional especializado vinculado à Secretaria Municipal

de Educação por meio de um convenio com a Prefeitura Municipal de Abaetetuba, para oferta

do atendimento educacional especializado. Atualmente, existem nesta instituição cem alunos

que aos cuidados de profissionais da educação especial sob a orientação/formação de equipe

multiprofissional para desenvolver trabalhos de cunho pedagógico especializado, estimulação

sensório motora, avaliação psicopedagógica e orientação às famílias atendidas.

O objetivo desta instituição é proporcionar AEE de forma não substitutiva à

escolarização, disponibilizando recursos e serviços pedagógicos, fomentando o

desenvolvimento neuropsicomotor dos alunos, através de estímulos sensórios motores,

possibilitando-os exercer sua cidadania e inclusão educacional e social Seu público são alunos

com deficiência física, com deficiência múltipla, com deficiência intelectual, com transtornos

globais do desenvolvimento, com transtornos do espectro autista e alunos com atraso do

desenvolvimento neuropsicomotor.

Os turnos de atendimento da instituição são no período matutino (07 às 11h) e o

vespertino (13h45 às 17h45), de segunda a quinta feira com alunos agrupados em turmas para

atendimento coletivo. O dia de sexta feira é destinado à hora atividade, em que os

professores, desempenham atividades de planejamento, formação, produção de materiais. A

duração do atendimento diário é de quatro horas, trabalho realizado em pequenos grupos,

com atividades na área de complementação pedagógica, educação cognitiva e funcional,

educação física, acolhimento psicopedagógico, lazer.

70 As informações apresentadas neste subtítulo foram obtidas através de conversa com a direção da Associação e a partir de folder elaborado pela associação para divulgação do trabalho por ela realizado.

Educação e compromisso social

173

2.2 As práticas e saberes na Associação Milton Melo

A Associação Milton Melo desenvolve diversas ações, de cunho educativo, cultural,

beneficentes, recreativas e de saúde, tais como: atividades de integração sensorial

(estimulação dos canais sensoriais: visão, audição, tato, olfato, gustação), atividades

psicomotoras (circuito, movimento corporais, coordenação motora, localização espacial,

temporal, equilíbrio, lateralidade), atividades de educação cognitiva (leitura, escrita,

raciocínio logico, atenção, concentração, abstração, comportamento), produção de materiais

didáticos/táteis pedagógicos, entre outros.

Além disso, também oferta formação continuada: curso de intervenção

multiprofissional e seminário anual, oficinas pedagógicas, visita domiciliar e escolar, conselho

de classe, plantão pedagógico, avaliação psicopedagógica, hora pedagógica/hora atividade,

formação com as famílias, festas datas comemorativas, ação social em comemoração ao

aniversário de fundação, participação nas reuniões dos conselhos municipais para

regularização de autorização da entidade, encaminhamento das famílias para serviços de

saúde, assistencial social e educação, ações beneficente.

Nos dias que passamos na instituição pudemos observar que esta segue uma rotina

especifica para cada deficiência levando em consideração os estímulos que são necessários

para cada um. No primeiro dia no local a coordenadora nos repassou algumas orientações

sobre as aulas e como deveríamos nos comportar diante das atividades desenvolvidas pelo

professor, uma das coisas que mais foi enfatizado se tratava de que não poderíamos interferir

em nada, sendo que a mesma nos relatou que só nossa presença lá já tirava um pouco da

atenção dos alunos. Um fato interessante que observamos logo no primeiro dia foi o fato de

que não se pode entrar de calçado na instituição, visto que alguns dos alunos precisam se

movimentar se arrastando no chão, logo o lugar é mantido permanentemente o mais limpo

possível.

Nos dias seguintes fomos divididas nas turmas e cada uma pode presenciar a rotina de

cada sala de aula, tudo foi muito produtivo pois podemos perceber o quanto os professores

são esforçados para aproveitar o máximo possível o pequeno espaço que eles têm, muitos nos

relataram sobre as dificuldades de manter a instituição. Segue a baixo um pouquinho da rotina

de cada turma de acordo com o que foi observado pela equipe:

a) Sala de deficientes intelectuais

Educação e compromisso social

174

No dia de observação estavam presentes apenas alunos homens numa faixa etária

entre 17 e 47 anos. Eles começaram a atividade fazendo uma oração e em seguida o professor

contou uma história para os alunos, nesse momento o professor nos falou da importância de

ele contar a história criando um diálogo com os alunos. Observamos que a sala é bem pequena

e que não tem enfeites pois tira a atenção dos alunos. A sala possui um quadro de luzes onde

é feito a atividade de estimulo visual, algumas cadeiras, um pequeno armário e uma mesa.

Seguindo a rotina, depois a história o professor usou o quadro de luz, mencionado

anteriormente, o mesmo funciona da seguinte maneira: o professor desliga as luzes da sala e

fica ligando várias luzes coloridas no quadro, o professor relatou que essa atividade estimula

a pupila dos olhos, em seguida ele fez a atividade da lanterna onde ele colocava o foco de luz

nos olhos dos alunos movimentando de um lado para o outro. Outra atividade feita foi a

leitura por temas, o professor passava várias frases e palavras de um tema comum

estimulando a memória e leitura dos alunos.

Uma última atividade observada nessa sala foi a de engatinhar e rastejar, onde os

alunos eram colocados no corredor da instituição com o intuito de estimular o corpo do

mesmo

b) Sala de deficiência múltipla, principalmente paralisia cerebral

Uma das primeiras coisas observadas nessa sala que a difere das outras é que nela os

alunos estavam acompanhados de um responsável familiar, a sala é a maior da instituição e

os alunos ficam e em colchonetes. A primeira atividade observada foi do quadro de luzes, a

mesma descrita acima. Em seguida os alunos foram sendo levados de um a um para uma sala

de exercícios onde é feita uma sessão de movimentos fisioterápicos, em seguida o professor

fez uma atividade com sons da natureza, e depois com sons altos e baixos.

A próxima atividade foi com materiais quentes e frios, macios e ásperos, onde o

professor fazia os estímulos de sentidos dos alunos. Foi feito também a atividade de leitura

por temas e depois a atividade da lanterna.

c) Sala de autistas

Nessa sala não podemos ficar muito tempo pelo fato de as crianças serem muito

agitadas, no dia de observação uma das crianças estava gritando e querendo bater nos outros

alunos, o professor nos relatou que a mesma tem um nível severo de autismo. As atividades

de estímulos foram as mesmas das outras turmas, de leitura, quadro de luz, sons altos se

baixos, quente gelado, macio e áspero, e entre outras.

Educação e compromisso social

175

Conclusão

Por meio desta atividade de pesquisa, foi possível observar a grande importância da

educação inclusiva, sabemos que o ato de incluir vai muito além de simplesmente inserir a

pessoa na escola regular, é necessário que essa pessoa tenha as devidas oportunidades de

usufruir do meio onde se encontra tendo suas necessidades especiais sanadas, onde ela possa

ter seus direitos garantidos.

A educação inclusiva tem suas práticas e saberes especificas que precisam ser

materializados por profissionais aptos para tal ação e, nesse ponto, enfatizamos que a

instituição observada, a saber Milton Melo foi vista como fundamental nessa área, mesmo

não dispondo de todos os recursos necessários, a organização da mesma busca

incessantemente melhorias para a instituição, eles reconhecem que podem melhorar em

muitos aspectos organizacionais e estruturais, contudo, dependem em sua maioria de

recursos financeiros. Diante disso vemos a grande necessidade de que o poder público tenha

um olhar mais próximo da educação inclusiva, onde possa dispor de recursos necessários para

que as instituições possam atuar satisfatoriamente.

Para manutenção das atividades principais as fontes de recursos são: o poder público

municipal, contribuições voluntarias de sócios contribuintes e eventos beneficentes. Sendo

um colaborador, você faz parte de mais de cem pessoas que não veem na deficiência um

obstáculo para ter uma vida produtiva e feliz. Através das observações realizadas foi possível

perceber um comprometimento dos professores e da associação como um todo, em oferecer

ao seu público, uma educação de qualidade, que atenda as especificidades dos alunos de

acordo com as suas deficiências, vendo-os como sujeitos de direitos e como dignos de

aprender como todos os demais alunos que não possuem deficiência.

Referências

MANTOAN, Maria Teresa Eglér. Inclusão escolar: pontos e contrapontos. GAVIOLI, Rosangela; PRIETO, Valeria Amorim Arantes (Org.). Inclusão escolar. 5ª ed. São Paulo: Summus, 2006.

LIMA, Priscila Augusta. Educação inclusiva e igualdade social. São Paulo: Avercampo, 2006.

XAVIER, Alexandre Guedes Pereira. Ética, técnica e política: a competência docente na proposta inclusiva. In: Revista Integração. Ministério da Educação/Secretaria de Educação Especial. Ano 14, n. 24, 2002.

Educação e compromisso social

176

A IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO INFANTIL PARA CRIANÇAS COM SÍNDROME DE DOWN

Luana Santos Nascimento71

Kelly Bruna Costa Afonso72

Jessica Alana Santos Silva73

Larrisa Ventura Garcia74

Introdução

Após a declaração de Salamanca (1994), a inclusão no Brasil surgiu no início da década

de 90. Com isso, o Brasil propôs a transformar o sistema educacional, empenhando-se à uma

educação de qualidade para a inclusão de pessoas com necessidades educacionais especiais

dentro do Sistema Regular de ensino. A partir desse documento, nota-se que a criança com

Síndrome de Down é de fato inserida.

Esta síndrome é uma anomalia genética, tendo em si suas próprias características

como seu desenvolvimento linguístico um tanto lento, mas que necessita de uma certa

atenção especializada para o aprimoramento do seu potencial dentro e fora do meio

educacional. Tomando como base Nunes; Saia e Tavares (2015), acabando por citar a

Declaração de Salamanca, é direito fundamental de toda criança ter acesso à educação,

oportunizando a ela a atingir e manter o nível adequado de aprendizagem.

Segundo Mills (2003), apud Ferrarini (2016):

[...] educar uma criança com Síndrome de Down é um trabalho complexo, pois necessita de organização e adaptações de ordem curricular que requer um acompanhamento cuidadoso dos educadores, pais e da sociedade para que seus objetivos sejam atendidos (p. 90).

Em vista disso, faz-se necessário o professor estar capacitado para lidar com esses

indivíduos visando melhoria educacional com formas e estratégias de ensiná-los e ajudá-los a

se desenvolver dentro e fora da escola, de acordo com suas limitações. Ademais, educá-los

71 Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected] 72 Universidade Federal Do Pará. E-mail: [email protected] 73 Universidade Federal Do Pará. E-mail: [email protected] 74 Universidade Federal Do Pará. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

177

desde a infância é ainda mais importante para a construção de suas habilidades motoras,

linguísticas e cognitivas.

1 Materiais e métodos

O método constitui-se no levantamento bibliográfico por meio da leitura e análise de

artigos disponíveis no Scientific Electronic Library Onlline (Scielo) e no Google Acadêmico os

quais notou-se uma abundância de informações a respeito do assunto, e documentos do

Ministério da Educação. Além disso, planejamos uma intervenção para um estudo de caso na

Educação Infantil, com uma aluna matriculada na Rede Municipal de Educação Infantil no

Município de Soure. Os materiais foram encontrados a partir das seguintes descrições: criança

com Síndrome de Down, Educação Infantil.

1.1 Participante de estudo (Maria Julia Coutinho Soeiro)

Para o aprofundamento do assunto elaboramos um roteiro com o intuito de

acompanhar a forma pela qual a criança com Síndrome de Down se desenvolve em um

ambiente escolar. Para isso, fomos até a escola Centro Municipal de Educação Infantil

Professora Lucilene Daher, em Soure, para observar a aluna Maria Julia, sendo a única, em

uma turma de dezesseis alunos, com a síndrome e acompanhada pela facilitadora, Simone.

Imagem 1- Maria Julia (criança com Síndrome de Down). Fonte: Kleber Júnior

2 Resultados e discussões

A Síndrome de Down foi objeto de estudo científico somente no século XIX, quando

John Langdon, médico inglês, em 1866, verificou que em certas crianças com atraso mental

existiam semelhanças fisionômicas como cabelos lisos e escassos, olhos posicionados de

Educação e compromisso social

178

forma oblíqua, rosto achatado e largo, entre outros. Em geral, a literatura aponta para

algumas nomenclaturas como mongolóide, trissomia G, síndrome de Langton Down, etc. No

entanto, na atualidade, a terminologia “Síndrome de Down” ou “Trissomia 21” são as

utilizadas.

A síndrome é um estado biológico alterado em decorrência de anormalidades

cromossômicas, que é uma condição de vida do indivíduo. Dessa maneira, é importante

acrescentar que isso não se torna um impedimento para que uma criança com síndrome não

se desenvolva como outra qualquer. Por mais que seu ritmo de aprendizagem seja mais lento

em relação as demais de sua idade, a diferença se dará apenas no tempo.

A criança participante desse estudo, Maria Julia Coutinho Soeiro, tem a Síndrome de

Down, e desde que nasceu é acompanhada por uma equipe multidisciplinar. Hoje, com apenas

2 anos, passou a frequentar a escola regularmente em fevereiro de 2019, estando matriculada

no maternal I (manhã). Ressaltamos que a criança é interativa, atenciosa e carinhosa com os

demais colegas. Também, foi perceptível sua habilidade motora e locomotiva pouco mais

desenvolvida, porém sua fala ainda é um tanto comprometida acabando por se comunicar

mais através de gestos quando deseja algo. Suas únicas palavras para tudo é “mama” e

“papa”.

Mediante a isso, é válido ressaltar a importância da criança com Síndrome de Down ao

acesso precoce à Educação, visto que é na fase inicial que ela desenvolve habilidades

necessárias para sua construção linguística e seu desenvolvimento cognitivo. Sendo assim,

quanto mais cedo ela for estimulada a fazer, mais cedo ela se desenvolverá.

Ao tratar-se de desenvolvimento cognitivo, similarmente a Silva e Barreto (2012), é

imprescindível a estimulação precoce para que ocorra um desenvolvimento significante. O

trabalho com a intervenção é de suma importância nos anos iniciais da criança com Síndrome

de Down, facilitando, assim, o processo que geraria impactos benéficos, ajustando-as a

desenvolver suas inteligências. Ainda cima, esse processo, não só construído com os aparatos

genéticos, são competências adquiridas pelo indivíduo durante sua vida que precisa ser

aperfeiçoada através do longo atendimento educacional.

Segundo Mattos e Bellani (2010, p. 55), “a falta de estímulos prazerosos nos primeiros

dias de vida pode levar a criança a ter uma dificuldade de adaptação sensorial, bem como o

Educação e compromisso social

179

seu desenvolvimento motor”. Logo, é importante a estimulação para o desenvolvimento das

habilidades de modo a influenciar o favorecimento da construção motora, cognitiva e

linguística.

Maria Julia, nossa participante de estudo, é estimulada desde muito cedo por seus

familiares, não é à toa seu real desempenho nas atividades escolas e na sua afetividade com

os mesmos. Entretanto, ao analisarmos seu comportamento com os demais colegas, foi

perceptível um atraso na fala. Sua comunicação com as outras crianças da mesma faixa etária

é um tanto mais lento. Suas palavras são poucas, assim como citada anteriormente: “mama”,

“papa”, acabando por usar estas em tudo o que ver, até mesmo ao se dirigir com as

professoras, coleguinhas da turma, brinquedos, etc.

Com isso, a criança com Síndrome de Down necessita da comunicação para a vida.

Entretanto, a linguagem é o campo em que ela apresenta algumas dificuldades. Para tanto, de

acordo com Castro e Pimentel (2009), as crianças com síndrome processam de forma lenta a

aquisição e evolução da fala. O atraso na produção e articulação sonora dependem dos

motivos dos lábios, língua, dentes e maxilar. Tal atraso influencia na dificuldade com a

produção e aquisição dos textos orais.

Ademais, ainda sob o mesmo ponto de vista, o cérebro possui uma capacidade de

aprendizagem ligada a fatores biológicos, ambientais e sociais. As possibilidades de

desenvolvimento serão maiores quando o contato com as pautas interativas orais for maior

(Castro e Pimentel, 2009). Desse modo, é importante refletir sobre a capacidade de dialogar

e aprender da criança com Síndrome de Down, e respeitar o tempo de apresentar o sucesso

em seu potencial de aprendizagem.

Ainda sobre nossa participante de estudo, segundo suas educadoras, Maria Julia

necessita de um cuidado especializado. A mesma fica em um considerável tempo

acompanhada de uma facilitadora, esta pela qual sua mãe lutou na justiça, conforme seus

direitos garantidos por lei. Dessa forma, consoante Nunes; Saia e Tavares (2015), a Declaração

de Salamanca ajudou a expandir o conceito de necessidades especiais para todo aquele que

precisasse de uma certa adaptação tendo em vista as necessidades de cada aluno, para que

assim a escolarização pudesse ser encaminhada.

Educação e compromisso social

180

Citada por Nunes; Saia e Tavares (2015), esta Declaração de Salamanca (1994, p.1)

ressalta que toda criança com necessidades educacionais especiais deve ter acesso a escola

acomodando-as dentro de uma pedagogia centrada na criança, satisfazendo-as conforme suas

necessidades. Logo, esta favorece as crianças com Síndrome de Down na educação básica,

seja ela em todas as etapas.

Para que a criança se desenvolva de forma contínua e satisfatória, Instituições de

Educação Infantil têm um papel fundamental. Os trabalhos realizados nos Centros de

Educação Infantil (CEI) são a base para a criança com Síndrome de Down se desenvolver, e a

inclusão delas deve buscar atentar-se às dificuldades com todos. Dessa maneira, é importante

que o docente tenha um conhecimento específico para atender as dificuldades de cada

criança a fim de elaborar estratégias para o desenvolvimento adequado dela.

Em conformidade com Turetta (2012), é necessário pensar o papel do educador para

o atendimento às crianças com Síndrome de Down, pois pela falta de orientação e

especialização, tanto professores como equipe pedagógica, ainda passam por dificuldades

para um melhor desempenho no trabalho pedagógico devidamente inclusivo da criança na

escola. Diante disso, é importante o aperfeiçoamento mais especializado, visando o

melhoramento nas atividades distribuídas nos Centro de Educação Infantil para o

desenvolvimento da criança com Down.

Outrossim, o papel familiar mostra uma participação importante para o

desenvolvimento da criança com a síndrome. Conforme Lipp, Martine e Menegotto (2010), há

um impacto considerável da família quando a criança é diagnosticada com Síndrome de Down,

acabando por diminuir, muitas vezes, as expectativas dos pais relacionado ao

desenvolvimento da criança. Assim, para aceitação e inclusão delas na sociedade, torna-se

essencial o trabalho realizado com a família e a escola de modo a sentir-se que a criança faz

parte da sociedade e tem a capacidade de aprender juntamente com as demais, seja no seio

escolar, seja no seio comunitário.

A partir dos aspectos supracitados, faz-se necessário pensar o papel da família

juntamente com o da sociedade para um desenvolvimento adequado da criança com

Síndrome de Down, destacando a relação família-escola para um trabalho em conjunto com

alcance dos objetivos estabelecidos na estimulação precoce. Logo, ela sentir-se-á de fato com

direito a inclusão.

Educação e compromisso social

181

Conclusão

Por meio dos estudos realizados a respeito da criança com Síndrome de Down na

Educação Infantil e um estudo de caso averiguado no município, é imprescindível ressaltar a

importância da família, escola e sociedade para o desenvolvimento dela em diversos aspectos

como motor, linguístico, afetivo, cognitivo, etc. de modo a proporcionar-lhe autonomia e

condições, tornando-a um sujeito ativo na sociedade.

A análise desta investigação foi relevante reforçando a necessidade de escolas e

professores preparados para o ensino a crianças com Síndrome de Down. Ao refletir sobre o

papel do docente, é importante que ele esteja capacitado para atender as dificuldades de cada

aluno, aprimorando o ensino a fim de que a criança se sinta pertencente ao grupo que

participa. Assim, o objetivo proposto foi entender a importância do Ensino Infantil para a

criança com a síndrome, visto que, apesar de serem inseridas nos Centros de Educação Infantil

(CEI), suas necessidades precisam ser atendidas conforme suas limitações.

Referências

CASTRO, Antonilma Santos Almeida; PIMENTEL, Susana Couto. Atendimento educacional específico. Síndrome de Down: desafios e perspectivas na inclusão escolar. Salvador: EDUFBA, 2009. Disponível em: http://books.scielo.org/id/rp6gk/pdf/diaz-9788523209285-28. Acesso em: 26/04/2019.

MATTOS, B. M., BELLANI, C. D. F. A importância da estimulação precoce em bebês portadores de Síndrome de Down: revisão literatura. Ver. Bras. Terap. e Saúde, jul./dez. 2010. Disponível em: http://www.omnipax.com.br/RBTS/artigos/v1n1/RBTS-1-1-5.pdf. Acesso em: 29/04/ 2019.

SILVA, llza Andrade. BARRETO, Maris Fernanda Fonseca. Análise das modalidades de desenvolvimento cognitivo nas crianças com Síndrome de Down. Caderno Intersaberes, v.1, N.1, jul. /dez., 2012. Disponível em: http://www.grupouninter.com.br/intersaberes/index.php/cadernointersaberes/article/view/312/187. Acesso em: 29/04/2019.

NUNES, Sylva da Silveira; SAIA, Ana Lucia; TAVARES, Rosana Elizete; Educação Inclusiva: Entre a História, os Preconceitos, a Escola e a Família. Psicol. Cienc. Prof. V. 35, n. 4. Brasília Oct. /Dec. 2015. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php/script=sci_arttlex&pid=S1414-

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TURETTA, Beatriz Aparecida Dos Reis. Crianças com necessidades especiais na educação infantil: um estudo sobre o brincas. XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino/UNICAMP – Campinas, 2012. Disponível em: http://www.infonteca.inf.br/endipe/smarty/templates/arquivos_template/upload_arquivos/acervo/docs/2923d.pdf. Acesso em: 01/05/2019.

Educação e compromisso social

182

Documentos:

BRASIL. Declaração de Salamanca: Sobre Princípios, Políticas e Práticas na Área das Necessidades Educacionais Especiais. Brasília: Corde, 1994. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/salamanca.pdf Acesso em: 03/05/2019.

FERRARINI, A. C. A Criança Com Síndrome de Down na Educação Infantil: Uma Pesquisa Bibliográfica. 2016. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Pedagogia). Centro de Educação, Comunicação e Artes, Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2016.

Educação e compromisso social

183

A APLICABILIDADE DO MÉTODO DE COMPOSTAGEM NA APAE COMO UMA METODOLOGIA EDUCATIVA E SOCIOAMBIENTAL

Valter Thiago Pantoja da Gama75

Natália de Cássia Cardoso Farias76

Priscyla C. Santiago da Luz77

Introdução

Hodiernamente, evidencia-se que o aumento na produção de lixo e as grandes

consequências que podem ser acarretadas por tal crescimento, se tornam cada vez mais

intensos. De acordo com Wangen e Freitas (2010), o crescimento substancial da produção de

resíduos sólidos urbanos, se dá ao fato do crescimento populacional das sociedades de

consumo, e tal fato constitui um grande impasse ambiental.

Apesar do lixo inorgânico como papel, metal, plástico e vidro trazerem malefícios ao

meio ambiente, é de grande importância o enfoque também ao lixo inorgânico, como os

restos de alimento, uma vez que de acordo com Roth et al. (1999, apud REIS et al., 2006) este

tipo de resíduo compõem a maior parte do lixo residencial. Nóbrega et al. (2007), ratifica

também que a coleta e o destino destes resíduos se tornam um problema de difícil solução,

com consequentes riscos de poluição do solo e das águas, tanto para as superficiais quanto

para as subterrâneas, implicando dessa forma na qualidade de vida da população.

Tendo em vista tais aspectos expostos acima, é notório que se faz progressivamente

importante a implementação de medidas conscientizadoras e socioambientais, que busquem

reeducar o meio social e minimizar tal problemática. O processo de compostagem apresenta-

se como uma alternativa eficaz no processo de redução destes resíduos, uma vez que segundo

75 Universidade do Estado do Pará, Curso de Ciências Naturais com Habilitação em Biologia. E-mail:

[email protected] 76 Universidade do Estado do Pará, Curso de Ciências Naturais com Habilitação em Biologia. E-mail:

[email protected] 77 Doutora em Educação em Ciências e Matemática pela Universidade Federal do Mato Grosso/UFMT. Professora

da Universidade do Estado do Pará. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

184

Teixeira et al. (2004 apud WANGEN; FREITAS, 2010) este processo consiste no tratamento e

consequentemente no aproveitamento deste tipo de lixo.

Outrossim, este procedimento pode ser aplicado como uma metodologia educativa,

em virtude de possibilitar uma prática que pode reeducar os estudantes em relação aos seus

atos perante ao meio ambiente, além de instigar os mesmos a serem cidadãos responsáveis

com seu planeta e realizarem ações que possam servir como alternativa para solução ou

minimização das problemáticas ambientais.

Além disso, no que tange ainda o processo educacional, Dantas Neto (2012) ratifica

que durante todo o processo de construção da composteira, até a observação da formação

do composto, os alunos são envolvidos por tal ação, e convidados a praticarem

experimentação, logo tais alunos constroem seus conhecimentos a respeito da temática com

mais facilidade, uma vez que este procedimento se faz como um poderoso recurso didático

de ensino. Ademais, uma atividade experimental possibilita a decomposição do fenômeno,

estudar em partes e cada uma dessas partes apresentarem possíveis discussões, que

relacionam o fazer e o pensar (DANTAS NETO, 2012).

Levando em consideração esses fatos, o objetivo do trabalho supracitado é

implementar o processo de compostagem como uma pratica educativa que auxilie a

construção dos conhecimentos socioambientais dos alunos da APAE/MOJU.

1 Materiais e métodos

A metodologia deste trabalho se deu em três etapas. Inicialmente, os alunos envoltos

em tal atividade, foram direcionados para uma sala ampla, onde nesta participaram de um

momento de discursão e exposição a respeito dos tipos de lixo, seus impactos no meio

ambiente, e como estes podem ser reutilizados e minimizados no mundo.

Na segunda etapa, após o primeiro momento, os discentes presentes no local foram

convidados a participar de um jogo, o qual abordava a temática do lixo e os materiais por eles

visualizados no primeiro momento. Em tal didática, os alunos tinham que aplicar os

conhecimentos sobre os tipos de lixo, e separar em um quadro os materiais representados em

figuras, e selecioná-los como lixo inorgânico ou lixo orgânico, depois os lixos inorgânicos que

poderiam participar da composteira.

Educação e compromisso social

185

No outro dia, deu-se início a terceira e última etapa do trabalho, onde em um primeiro

momento, foi realizada na própria instituição, a coleta e seleção dos materiais a serem

utilizados para a construção da pilha de composteira, como as folhas secas, terra, baldes de

margarina e dejetos orgânicos presentes no local. Posteriormente, os estudantes que

participaram desta última etapa, foram levados a participar de um mini-piquenique, onde

neste foi discutido mais sobre os tipos de lixo, o porquê de reutilizá-los e seus impactos no

meio ambiente, além disso, foram também retiradas algumas dúvidas sobre o método de

compostagem.

Seguidamente, iniciou-se a montagem da pilha de compostagem, onde no balde de

margarina (o qual possuía furos no fundo e na lateral para que não houvesse acumulo de

líquido) foi depositado pelos alunos ¼ de terra, em seguida os estudantes adicionaram ao

mesmo balde uma camada dos resíduos das frutas consumidas por eles mesmos no mini-

piquenique e dos resíduos orgânicos já presentes antes no local, e após isto, acrescentaram o

dobro dos resíduos orgânicos em folhas secas.

O procedimento se deu até completar o limite do balde, que após estar cheio, foi

acoplado na parte superior do um outro balde, o qual não possuía furos e serviria para coletar

o chorume.

2 Resultados e discussão

Tornou-se notório que com as atividades realizadas, os estudantes puderam formar

conhecimentos e pensamentos críticos a respeito da temática ambiental, principalmente com

relação a reutilização e o adequado descarte de resíduos. Segundo Jacobi (2003 apud

FERNANDES, 2010) a ausência da responsabilidade da população para com o meio ambiente,

decorre principalmente da desinformação, da falta de conscientização ambiental e de um

déficit de práticas comunitárias que tenham como base a participação e o envolvimento de

cidadãos, e que proponham uma nova cultura de direitos baseada na motivação e na

coparticipação da gestão ambiental das cidades.

Outrossim, o processo de compostagem pode subsidiar uma melhor assimilação dos

assuntos, uma vez que os alunos se atraíram pela temática e puderam visualizar os tipos de

lixo, e identificar estes em sua própria realidade. Para Oliveira (2003) o aprendizado deve

Educação e compromisso social

186

ocorrer em um ambiente agradável e atrativo aos aprendizes, além de respeitar as diferenças

de nível de habilidades e raciocínio dos envoltos nas práticas.

Conclusão

Em síntese, tornou-se notório que toda a realização do projeto se fez bastante

produtiva e pode proporcionar contribuições para com os alunos, onde evidenciou-se que os

mesmos puderam construir conceitos a respeito da temática, além de conseguirem

contextualizar e problematizar os impasses envoltos em tal tema e enxergarem a importância

da aplicabilidade de ações que possam reduzir os impactos deste em meio social.

Referências

DANTAS NETO, Joaquim Dantas. A experimentação para alunos com Deficiência visual: proposta de Adaptação de experimentos de um Livro didático. Universidade de Brasília/UnB. Brasília/DF. 2012. Disponivel em: file:///C:/Users/nfari/Downloads/2012_JoaquimDantasNeto.pdf. Acessado em: 10/04/2019.

FERNADES, Debora do Nascimento. A importância da educação ambiental na construção da cidadania, 2010.

NÓBREGA, C.C. et al. Análise preliminar física e físico-químicas dos resíduos sólidos domiciliares de pedras de fogo, 2007.

OLIVEIRA, Letícia Maria Galdino de. Educação Especial e tecnologias computacionais: jogos de computador auxiliando o desenvolvimento de crianças especiais. In: Encontro Paranaense de psicopedagogia, 2003.

REIS, M.F.P. et al. A produção de composto orgânico em uma unidade de triagem e compostagem. Revista Brasileira de Agroecologia, Rio Grande do Sul, v. 1, n. 1, p. 1057-1060, 2006.

WANGEN, Dalcimar Regina Batista; FREITAS, Isabel Cristina Vinhal. Compostagem doméstica: alternativa de aproveitamento de resíduos sólidos orgânicos. In: Revista Brasileira de Agroecologia. Universidade Federal de Uberlândia-UFU. Minas Gerais, 2010.

Educação e compromisso social

187

PARTE 5. LINGUAGENS E EDUCAÇÃO

Educação e compromisso social

188

MÚSICA “A REZADEIRA”: UMA ANÁLISE SEMIÓTICA, BASEADA NA PERSPECTIVA DE GREIMAS

Waléria Oliveira da Silva78

Adrielle do Socorro Alves Araújo79

Valéria Thaís Martins Araújo80

Introdução

Os bons resultados no processo de ensino e aprendizagem na área de leitura e

interpretação de texto estão relacionados com vários aspectos, entre eles está a pratica

docente, pois é ela que vai orientar o desempenho dos alunos. Todavia o que se nota é que

alguns educadores têm deixado a desejar no que se refere à obtenção das finalidades

educacionais desta área que seria desenvolver o senso crítico do aluno. Geralmente as aulas

baseiam-se em retirar informações explicitas do texto, deixando assim, de desenvolver a

capacidade de analises de discursos mais profundos, os quais estão presentes, geralmente,

nas entrelinhas do texto.

Essa realidade é muitas vezes devido a inúmeros fatores, o primeiro deles é a confusão

que se criou na diferença entre “compreensão” e “interpretação” de textos, as quais

geralmente são apresentadas como sinônimos. O segundo está relacionado a própria

formação do professor, que muitas vezes, não foi bem orientado ou não buscou mais

conhecimentos a esse respeito, outro, ainda está relacionado à produção de livros didáticos,

os quais em algumas situações tratam esses dois termos como se fossem uma só coisa.

Assim, as consequências no processo ensino e aprendizagem são inúmeras, desde o

desenvolvimento do pensamento equivocado do aluno até a dificuldade que o discente vai

apresentar em entender os diversos significados que um texto traz, o que resulta na

dificuldade de receber boas notas na disciplina de Língua Portuguesa, e consequentemente

em adentrar numa universidade, já que um dos temas mais recorrentes e característicos do

ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), o qual é primordial para a entrada no ensino

superior é a interpretação de textos. Portanto, os problemas no ensino de um dos conteúdos

78 UEPA.E-mail: [email protected] 79 UEPA.E-mail: [email protected] 80 UEPA.E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

189

mais importantes dentro da Língua Portuguesa, traz consequências para todo processo de

ensino e aprendizagem.

1 Materiais e métodos

Sendo assim, tendo como base essa realidade, objetiva-se, neste resumo expandido,

despertar no aluno a habilidade de encontrar e analisar as diversas temáticas presentes no

texto, a partir dos três níveis discursivos que a semiótica textual de Greimas aborda. Para isso

será realizada uma pesquisa-ação, em que, as autoras deste trabalho irão propor um plano de

aula no qual serão apresentados conteúdos baseados na Semiótica textual de Greimas. Após

isso, será apresentada à música “A Rezadeira” para que os alunos apliquem em suas análises

os três níveis discursivos: fundamental, narrativo e discursivo desta teoria. Para fundamentar

este estudo, foram utilizados os pressupostos teóricos metodológicos versados pelos

seguintes autores: Barros (2011), Fiorin (2013), Antunes (2003, 2007), Martins (2007), Kleiman

(1999), Orlandi (2001). Quanto aos materiais que serão utilizados, presume-se que haverá

necessidade de caixa de som, quadro branco, caneta, apagador, data - show, apostilas.

Dessa forma, esse resumo encontra- se estruturado da seguinte forma, o tópico I –

está designado a uma abordagem teórica sobre a importância de se trabalhar de forma

interdisciplinar a leitura e interpretação de texto; no tópico II – Apresenta-se os fundamentos

da Teoria Semiótica textual de Greimas; no tópico III – Está a apresentação da música “A

Rezadeira”, do Rapper Projota, juntamente com a análise da mesma com base na Semiótica

de Greimas, no tópico IV – Será apresentada a proposta de intervenção a uma turma de

segundo ano do Ensino Médio, vinculada ao plano de aula e por fim, o tópico V- em que será

apresentada as considerações finais.

2 Resultados e discursão

Martins (2006), afirma que a arte de ler não se limita a livros ou a escrita, mas, que vai

além, comprovando que há também a leitura de gestos, objetos, tempo e situações. Faz ainda

uma crítica a leitores superficiais, os quais por preguiça ou por moderação, somente

transcorrem as letras com os olhos, sem adquirir conhecimentos plenos, sendo mero

decodificador de sinais. Esta realidade mostra que a maioria dos alunos formados pelo ensino

regular, não conseguem apresentar um bom domínio da leitura e consequentemente também

Educação e compromisso social

190

não conseguem analisar um texto em sua forma plena, encontrando além da temática

principal, todas as secundarias que também são importantes para o desenvolvimento global

do texto.

Segundo a autora supracitada, cada leitor precisa buscar seu jeito de ler e desenvolver

essa habilidade para que essa tarefa passe a ser mais gratificante e não mais como

“obrigatoriedade” das aulas de Língua Portuguesa. Porém, para que isto aconteça, os

professores precisam dar mais espaço a leitura em suas aulas, bem como procurar novos

métodos que desenvolvam essa habilidade de forma mais criativa, para que chame a atenção

do educando.

Outra prática que também é trabalhada de forma inadequada nas aulas de Língua

Portuguesa é a interpretação de texto, esta que está totalmente ligada à leitura. Geralmente

essa prática é baseada em retirar do texto analisado apenas as informações mais explicitas

como personagens principais e secundários, temática principal, se há narrador ou não, entre

outras informações. Na maioria das vezes, o aluno lê apenas uma vez o texto e logo vai

interpretá-lo ou compreendê-lo, ou seja, não há o cuidado em se fazer uma releitura, para

que o que não foi entendido antes seja reconhecido. Para isso, o uso de textos verbais e não

verbais, entre eles as tirinhas, a música, o poema, as propagandas, podem fazer com que as

aulas sejam mais interessantes e aguçar o pensamento crítico do aluno, pois estes textos estão

geralmente cheios de protestos a inúmeras temáticas da sociedade.

Assim, uma das formas de se trazer para dentro de sala de aula o diferencial e ainda

desenvolver as habilidades de interpretação de textos nos alunos, propõe-se neste trabalho o

uso da teoria Semiótica Textual de Greimas, a qual procura descrever o que os textos dizem e

como dizem, ou seja, por meio de seus três níveis de análise leva o aluno a compreender os

diversos elementos temáticos presentes no texto e ainda como ocorre a dinâmica de emissão

e recepção da mensagem. Segundo Barros (2011), essa teoria preocupa-se não só com o que

é transmitido, mas também com as diversas intepretações que essa mensagem gerou nos

receptores, além de preocupar-se em transmitir essas informações de forma clara, objetiva e

acessível, de forma que não haja espaços para ambiguidades ou entendimentos equivocados.

A teoria Semiótico-textual, traz em seus fundamentos o percurso gerativo do sentido

que vai do mais simples e abstrato ao mais complexo e concreto. Esse percurso é dividido em

três etapas. A primeira delas é o nível fundamental, a qual é bem simples e abstrata, pois nela

surgem as significações como oposições semânticas, as quais sempre terão que ser descritas

Educação e compromisso social

191

como positivas (eufóricas) ou negativas (disfóricas). O segundo nível é o narrativo, o qual,

organiza-se a narrativa presente no texto em análise, do ponto de vista de um sujeito e o

terceiro nível é o discursivo em que a narrativa é assumida pelo sujeito da enunciação, é neste

nível que podem surgir as inúmeras interpretações para o texto, a intertextualidade e ainda

encontrar outras temáticas críticas além da principal. Portanto, uma ótima teoria para levar

os alunos a compreender os textos e ainda criar senso crítico.

Dessa forma, foi escolhida como corpus de análise deste trabalho a música “A

Rezadeira”, do Rapper Projota, por trazer em seus versos o teor crítico e de protesto a atual

sociedade, além de apresentar durante todo seu percurso a riqueza narrativa encontrada nas

transformações na vida do protagonista.

O nível fundamental mostra que a música se estrutura sobre a oposição semântica

fundamental entre religiosidade versus marginalidade, sendo a primeira eufórica e a segunda

disfôrica. O nível narrativo mostra a história do sujeito “Neguim”, um menino pobre da

periferia, o qual, é desprovido de várias políticas públicas, como a educação, alimentação e

segurança pública. O personagem é influenciado pelo consumismo presente na sociedade que

faz com que queira manter um padrão social elevado, usufruindo de coisas como, futebol de

salão e tênis bonito. Com isso, o personagem “Neguim”, acaba se bandeando para o mundo

do crime. A solução encontrada por ele é a marginalidade e uma das consequências disso é “a

sua primeira detenção”, porém, a falha no sistema carcerário faz com que “Neguim” volte

para as ruas e faça crimes piores, o que o leva ao caminho da morte. A música ainda retrata a

figura da “Rezadeira”, que se configura como mãe do protagonista, esta que busca na oração

a salvação para seu filho.

A música “A Rezadeira” foi divulgada no ano de 2014, a qual pode se relacionar com a

opressão policial contra os sujeitos negros marginalizados, algo que é frequente na sociedade

atual, por conta dos altos índices de violência. O nível discursivo da música “A Rezadeira” gira

em torno de diversas temáticas, entre as quais se destaca a oposição entre a marginalidade e

a religiosidade. A referida música expressa a realidade que muitas mães vivenciam

atualmente, em que a maioria dos filhos são levados para a criminalidade e a única forma que

elas encontram para protegê-los é a oração ou a religiosidade, uma vez que, na falta de

políticas públicas, como a educação e a segurança, muitos jovens acabam perdendo suas

vidas.

Educação e compromisso social

192

Ainda no nível discursivo, pode-se empreender da música analisada que existem outras

oposições temáticas que poderiam ser discutidas, são elas:1-Riqueza X pobreza, 2-

Marginalização X educação, 3- Morte X vida, 4-Lealdade X deslealdade, 5- Consumismo x

Pobreza, as quais juntamente com a temática principal trazem a beleza e o teor critico á

música.

Conclusão

A teoria Semiótica textual, não se baseia em analisar apenas aquilo que se está

transmitindo como mensagem, mas, também, em transmitir de forma clara, objetiva e

acessível, de maneira que a partir de seus diversos percursos ou fases, o analista conseguirá

compreender os diversos temas presentes em um texto, além de encontrar as principais

críticas de forma direta e objetiva.

A análise Semiótica da música “A Rezadeira” mostra as diversas críticas que o rapper

faz ao sistema social brasileiro, além de mostrar a realidade vivida por diversos jovens no país.

O fato de relacionar a marginalidade à religiosidade faz com que a música resuma as causas,

as características e uma das soluções para a resolução desses problemas.

Referências

BARROS, D. L. P de. Teoria Semiótica do Texto. 5ª ed. São Paulo: Ática, 2011.

FIORIN, J.L. A noção de texto na Semiótica. São Paulo: USP, 2003.

MARTINS. M.H. O que é Leitura. São Paulo: Brasiliense, 2006.

PROJOTA. A Rezadeira. Disponível em: https://www.Letras. Mus. Br/hip=hop/rap-projota. Acesso em: 27/04/2019.

Educação e compromisso social

193

ÉGUA: ESTUDO DE UMA INTERJEIÇÃO UTILIZADA POR PARAENSES COMO MÉTODO EXPRESSIVO NAS REDES SOCIAIS

Andréia Feio da Costa81

Thaina Ferreira Gomes Bahia82

Introdução

Esta pesquisa tem como objeto de estudo o fenômeno interjetivo “Égua”, uma

expressão muito utilizada no estado do Pará. Para os paraenses, essa interjeição serve para

quase todo o tipo de situação, ou seja, para expressar raiva, surpresa, alegria, dentre outras.

Assim, em um diálogo entre paraenses, é comum ouvir essa expressão várias vezes em

diferentes contextos. De acordo com Cunha & Cintra (1985) a interjeição:

[...] é uma espécie de grito com que traduzimos de modo vivo nossas emoções [...]. A mesma reação pode ser expressa por mais de uma interjeição. Inversamente uma só interjeição pode corresponder a sentimentos variados e, até, opostos (CUNHA; CINTRA, 1985, p. 577).

O valor de cada forma interjetiva depende fundamentalmente do contexto e da

entonação. Segundo Pereira (1922, p.104-105) na gramática normativa as interjeições são

palavras invariáveis que servem para exprimir afetos vivos e súbitos da alma, como a alegria,

a dor, o espanto, etc. Desse modo, a interjeição é um recurso da linguagem afetiva, em que

não há uma ideia organizada de maneira lógica, como são as sentenças da língua, mas sim a

manifestação de um suspiro ou de um estado da alma decorrente de uma situação particular,

um momento ou um contexto específico. Há diversas definições sobre a etimologia da palavra

interjeição abordadas por dicionários em geral.

81 Letras/Língua Portuguesa/UFPA. E-mail: [email protected] 82 Letras/Língua Portuguesa/UFPA; E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

194

DEFINIÇÕES DE INTERJEIÇÃO EM GRAMÁTICAS

O quadro abaixo reúne algumas definições mais recentes do fenômeno interjetivo.

GRAMÁTICO

DEFINIÇÃO DE INTERJEIÇÃO

Barbosa (1881)

“As interjeições são umas partículas desligadas do contexto da oração, exclamativas e pela maior parte monosyllabas e aspiradas, que exprimem os transportes da paixão com que a alma se acha ocupada.” (p. 70)

Pereira (1922)

“É a palavra invariável que exprime os affectos vivos e súbitos da alma, como a dor, a alegria, o espanto etc.(...) Classificam-se em simples ou compostas: ai!, coitado de mim!. (...) Há interjeições imitativas de ruídos.” (p. 104-105).

Ribeiro (1923)

“A Interjeição é mais phrase do que simples vocábulo. É expressão breve da emoção, do sentimento: oh!, ui!, muito bem!, caluda!.” (p.37)

A interjeição hoje de acordo com a NGB (Nomenclatura Gramatical Brasileira) é

considerada uma classe gramatical. Entretanto, alguns gramáticos ainda discordam disso,

argumentando que a interjeição se dá muito mais pela semântica da palavra do que pela

forma.

DEFINIÇÕES DE INTERJEIÇÃO EM DICIONÁRIOS Michaelis (1998)

GRAM Palavra ou voz que exprime de modo enérgico e conciso os sentimentos súbitos da alma, tais como alegria, dor, admiração, medo etc.

Aurélio (1999)

Palavra ou locução com que se exprime um sentimento de dor, de alegria, de admiração, de aplauso, de irritação, etc.

Fernandes (2001)

s.f. voz, palavra ou locução que indica sentimentos súbitos, espontâneos; exclamação.

Os dicionários de um modo geral compartilham o mesmo conteúdo apresentado nas

gramáticas normativas, afirmando que o núcleo semântico de uma interjeição é a expressão

de sentimento ou emoção súbita. De acordo com Nascentes (1932, p.432) a palavra interjeição

vem do Latim ‘interjectione’ que significa ‘atirar no meio’; ou ‘palavra que se solta no meio do

discurso’. Uma só interjeição pode corresponder a variados sentimentos. Assim, nesta

Educação e compromisso social

195

pesquisa buscaremos investigar a forma como a interjeição “Égua” é utilizada por paraenses

em suas redes sociais, mais especificamente no Facebook e no Instagram.

1 Materiais e métodos

Para o corpus da pesquisa foram extraídos das redes sociais (Facebook, Instragram e

Twitter), materiais que possam retratar o fenômeno interjetivo “Égua”. Os métodos utilizados

na pesquisa foram: análise das imagens retiradas das redes sociais, verificação do sentido da

expressão ‘Égua’ em diversos contextos e, os efeitos causados por aqueles que fazem uso

dessa interjeição.

1.1 Análise do corpus da pesquisa

Imagem 1: Expressão do uso da interjeição Égua publicada no facebook.

Fonte: Facebook, 2018.

Nesta publicação, pode-se observar que o locutor ao redigir a expressão paraense

“Égua! Problematizaram até a expressão Belém é um ovo” o seu objetivo foi demonstrar

insatisfação, raiva, desaprovação, dentre outros. Visto isso, a frase poderia fica assim: “Nossa!

Problematizaram até a expressão Belém é um ovo”.

Imagem 2: Expressão do uso da interjeição Égua compartilhada no facebook.

Fonte: Facebook, 2018.

Educação e compromisso social

196

No exemplo apresentado, a expressão “Égua” foi efetuada pelo enunciador para

demonstrar uma reprovação diante das circunstâncias do momento. A sentença poderia

muito bem ficar dessa forma, “Ah!!! ..... Mais uma operação? Que povinho que gosta de

corrupção! Agora essa, vendendo as terras públicas como se fossem deles, oras bolas!

2 Resultados e discussão

A análise do corpus da pesquisa permitiu a comparação de diferentes definições desse

fenômeno interjetivo, o que propiciou a discussão quanto ao estatuto dessa classe de

palavras. Sendo assim, tais elementos forneceram um cenário magnífico para análise da

interjeição ‘Égua’ utilizada com frequência no estado do Pará.

Conclusão

No Pará, de acordo com o dicionário papa chibé “o eras, que já foi Ebe e hoje é égua”

é utilizado em 99% das frases ditas pelo paraense. A análise da bibliografia específica permitiu

o levantamento e a comparação de diversas definições e exemplos da mesma. Pode-se

concluir que com a interjeição “égua” o paraense tenta expressar de forma clara, situações de

espanto, admiração, felicidade ou até mesmo raiva, e dependendo de cada situação de uso

uma só interjeição pode corresponder a diferentes sentimentos ou até opostos.

Referências

ALBUQUERQUE, Iara. Hipóteses sobre a origem de uma interjeição. In: RAMOS, Jânia; BARBOSA, Jeronymo Soares. Grammatica philosophica da lingua portuguesa ou princípios da grammatica geral applicados à nossa linguagem. 7ª ed. Lisboa: Academia Real das Sciencias, 1881. BECHARA, Evanildo. Gramática Escolar da Língua Portuguesa: para ensino médio e cursos preparatórios. Rio de Janeiro: Lucerna, 2001. BECHARA, Evanildo. Moderna Gramática Portuguesa: curso médio: com base na nomenclatura gramatical brasileira. 14ª ed. São Paulo: Editora Nacional, 1968. p. 461. CAMARA JÚNIOR, J. Mattoso. Dicionário de linguística e gramática: referente a língua portuguesa. 11 ed. Petrópolis: Vozes, 1984. p. 266. CUNHA, Ceslo; CINTRA, Luis F. Lindley. Nova gramática do português contemporâneo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985. p. 714. Dicionário online Caldas Aulete. Disponível em: >https://www.aulete.com.br<. Acessado em: 21/12/2018. Dicionário Papa Chibé. Disponível em: >https://artepapaxibe.wordpress.com/dicionario/<. Acessado em: 20/11/2018

Educação e compromisso social

197

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio Século XXI: o dicionário da língua portuguesa. 3ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. GONÇALVES, Miguel. A interjeição em português: contributo para uma abordagem em semântica discursiva. Coimbra: FCG/FCT, 2002. HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009. MELO, Gladstone Chaves de. Gramática fundamental da língua portuguesa. 2ª ed. Rio de Janeiro: Livraria Acadêmica, 1970. MICHAELIS. Moderno dicionário da língua portuguesa. São Paulo: Companhia melhoramentos, 1998. PEREIRA, Eduardo Carlos. Grammatica expositiva: curso elementar. 22ª ed. São Paulo; [Weiszflag]. 1922. RIBEIRO, João. Grammatica portugueza. 20ª ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1923. ROCHA LIMA, Carlos H. Gramática Normativa da Língua Portuguesa. 43ª ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2003.

Educação e compromisso social

198

CONTEXTO DE CONSTRUÇÃO DA LÍNGUA NACIONAL NO SÉCULO XIX E INÍCIO DO SÉCULO XX

Thaina Ferreira Gomes Bahia83

Andréia Feio da Costa84

Introdução

Língua nacional, língua brasileira, idioma nacional são expressões que se tornaram

recorrentes após a Independência do Brasil e que, mesmo sem necessariamente guardar

ressentimentos com relação à antiga metrópole, ou serem entendidas como intrinsecamente

opostas a uma língua portuguesa, revelam a preocupação de homens da política e das letras

com a identidade e a unidade linguística do Brasil. Mas, do que estamos falando quando

falamos de Língua Nacional? Que língua nacional é essa e de que forma ela se constituiu? Não

é uma tarefa tão fácil obter as respostas para essas perguntas e nem é possível fazê-lo sem

trilhar os caminhos da história da construção da Língua Nacional.

Há muito tempo que alguns escritores brasileiros procuram, com seus trabalhos,

mostrar a consistência de suas pesquisas na área. José de Alencar e Paulino de Brito, entre os

mais antigos, e Marcos Bagno, entre os mais atuais, todos tentam fazer um panorama de como

houve transformações na língua portuguesa falada no Brasil. Por outro lado, em nosso país,

vivemos o dilema de falar de um modo e escrevemos de outro. Lógico que não devemos

escrever como falamos. Entretanto, a língua falada e a língua escrita no Brasil guardam grande

distância.

Partindo disso, tomamos como ponto de partida fazer uma análise sobre o processo de

construção da Língua Nacional no século XIX e início do século XX. À priori, foi realizado um

levantamento bibliográfico sobre o tema, a fim de entender as ideias dos intelectuais

brasileiros sobre a língua nacional nesses períodos e identificar fenômenos sintáticos do

português brasileiro nos períodos supracitados e concomitantemente observaram-se os

estudos e referenciais teóricos que se debruçam sobre a história da língua nacional. A pesquisa

83 Letras Língua Portuguesa/UFPA. E-mail: [email protected] 84 Letras Língua Portuguesa/UFPA. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

199

está embasada em autores nacionais como: José Veríssimo (1985); Paulino de Brito (1908)

Orlandi; (2009), dentre outros.

1 A construção da Língua Nacional

É com a instalação dos portugueses no Brasil e o início da colonização no período entre

1532 e 1654 que começa a constituição da língua nacional. Contudo, o nascimento oficial da

Língua Portuguesa no Brasil, além da oficialização da LP para o reino de Portugal se atribui à

Carta Régia, do Marquês de Pombal, de 12 de setembro de 1757 que, de acordo com Orlandi

(2009), obrigava os colonos a ensinarem a LP europeia aos povos indígenas, proibindo o uso

de línguas indígenas na colônia. Por isso, a Reforma Pombalina criou uma ilusão de que no

Brasil se falava somente o português, passando ao efeito de país monolíngue. Houve então, a

imposição do ensino de LP na escola e a obrigatoriedade do ensino e do uso do português no

Brasil.

Já no século XIX, em 1822, com a Independência do Brasil, o Estado brasileiro se

estabeleceu e a questão da língua se evidenciou. Podemos tomar esse acontecimento

especificamente como marco do rompimento entre o português de Brasil e o de Portugal.

Para Orlandi (2013), historicamente, o ensino de LP como língua nacional está fortemente

ligado à gramática, pois é a gramática a forma dominante de estudos da língua na escola. No

Brasil independente de Portugal houve, então, um grande desenvolvimento da

instrumentação linguística do português. A busca por uma identidade nacional já se

posicionava e as questões relacionadas à “língua Brasileira” começam a tomar força.

Em 15 de novembro de 1889, com a Proclamação da República, houve um

desenvolvimento das instituições: as escolas passaram à elaboração consciente de um saber

sobre a língua, sobre as coisas do Brasil, sobre projetos de ensino, dicionários e gramáticas. O

ensino de LP nesse período permanece sob os três pilares: gramática, poética e retórica. E

com a emergência do nacionalismo republicano, em 1889, tem-se a ascensão do Português

como disciplina escolar no currículo da escola secundária brasileira.

No período subsequente a era Vargas, com a restauração do regime democrático, em

1946, formou-se uma comissão para nomear a língua do Brasil, que ficou designada como

Língua Portuguesa. Desde a década de 1980, em vez de chamar de português ou brasileiro,

Educação e compromisso social

200

diversos linguistas no Brasil vêm insistindo na denominação de português brasileiro, para

rotular nossa língua. Mas de acordo com Bagno (2004), o processo de nomeação das línguas

é lento, complexo e depende de muitos fatores sociais, políticos, ideológicos, etc. Assim, o

português do Brasil tem características próprias, devido às influências dos índios, africanos e

outros povos que aqui habitavam.

2 Intelectuais que defendiam a língua nacional nos séculos XIX e XX

No século XIX, o Brasil vivencia um processo de “gramatização brasileira do

português”. Dentre os intelectuais que difundiram o pensamento de que era necessário

também proclamar a “independência linguística” do Brasil, tem-se José de Alencar, autor de

Iracema e de O Guarani. Para Alencar, já que o Brasil não pertencia mais a Portugal e era agora

uma nação autônoma, independente, a língua também tinha que ser autônoma e

independente. O escritor considerava:

Que a tendência, não para a formação de uma nova língua, mas para a transformação profunda do idioma de Portugal, existe no Brasil, é fato incontestável. Mas, em vez de atribuir-nos a nós escritores essa revolução filológica, devia o Sr. Pinheiro Chagas, para ser coerente com a sua teoria, buscar o germe dela e seu fomento no espírito popular, no falar do povo, esse “ignorante sublime” como lhe chamou (ALENCAR, 1965, p. 243).

Assim, a Língua nacional de José de Alencar é buscada no povo. Na concepção do

autor, tudo que se difere da linguagem clássica defendida pelos gramáticos provém de uma

mudança operada pelo povo.

Outra polêmica criada foi entre o gramático brasileiro Paulino de Brito e o gramático

português Cândido de Figueiredo por meio da imprensa. De acordo com Silva (2017), Cândido

de Figueiredo publicava seus artigos no “Jornal do Comércio” do Rio de Janeiro, enquanto

Paulino de Brito os rebatia em “A província do Pará”. A disputa resultou nas obras: “A

colocação de Pronomes, 1907” e “Brasileirismos de colocação de pronomes: resposta ao Sr.

Cândido de Figueiredo, 1908” de Paulino de Brito; e “O problema da colocação de pronomes

de 1917” de Cândido Figueiredo. Nos discursos produzidos entre eles, de um lado se buscava

a “autonomização linguística brasileira” e por outro lado implicava-se a contestação das

hierarquias estabelecidas desde a colonização e sustentadas durante o império. Cândido de

Figueiredo tenta mostrar que Portugal exerce “tutela de direito sobre a língua portuguesa”.

Educação e compromisso social

201

Ele se mostra como quem detém a competência legítima da língua. Enquanto que Paulino de

Brito, busca a analisar a realidade social e linguística brasileira.

3. Análise de um trecho da obra Brasileirismos de Collocação de Pronomes – Resposta ao

sr. Cândido de Figueiredo

Em resposta a Cândido de Figueireido, Paulino de Brito faz diversas análises, no trecho

a seguir o autor mostra que há vários modos de dizer uma mesma coisa. Ele exemplifica da

seguinte forma:

“Dize ao João que me traga o Cavallo”

“João que me traga o Cavallo”

“Que me traga o Cavallo”

“Me traga o cavallo”

“Traga-me o Cavallo”

Segundo Paulino de Brito:

Todas as vezes que encontrar o pronome antes do verbo, concluirá que o

termo antecedente o attrahio; vindo depois, não attrahio; e se vier umas vezes

antes e outras depois, attrahio e não attrahio. Poderá ainda acontecer que o

pronome ocorra mais vezes antes que depois do verbo: ficará tirado a limpo

que a palavra precedente o attrahe normalmente, e anormalmente não

attrahe [...]. No catalogar dessa multidão de casos é que surgirá porventura a

magna difficuldade: como as categorias grammaticaes foram postas de banda,

e o operador terá de jogar com todo o acervo do vocabulário (segundo o tal

“caminho ainda não indicado”), a generalização tornar-se-há impraticavel,

será mister uma regra, ou mais, para cada termo, e ahi a complicação e a

superabundancia tocarão ao cúmulo, para não dizer o infinito. Tranquilizemo-

nos, porém. Não há probabilidade alguma de chegar o conceituado escriptor

a enriquecer a nossa literatura gramatical com esse poderoso invitatorio á

monomania e ao suicídio (BRITO, 1908, p. 6).

Nesse sentido, o gramático brasileiro fundamenta seus argumentos nos discursos geo-

históricos que lhes são subjacentes. Assim, seu discurso é tanto mais eficaz quanto mais

reitera os limites e as diferenças entre os usos linguísticos de brasileiros e portugueses.

Entretanto, isso não quer dizer, que Brito objete a legitimidade das variedades cultas. Antes,

seu objetivo é tão somente prover espaço para os brasileirismos, isto é, para os usos

linguísticos próprios dos brasileiros; não todos os usos linguísticos, mas aqueles que “não se

possam considerar incorretos”.

Educação e compromisso social

202

Diversos usos linguísticos condenados pelos lusitanos e aceitos por uma parcela dos

brasileiros, podemos citar a ênclise em orações dependentes (relativas, clivadas, completivas,

adjuntas) finitas em orações interrogativas e em orações negativas. Isso porque, na cartilha

avalizada por Figueiredo (entre outros gramáticos portugueses e brasileiros), em presença de

“palavras atratoras” (conjunções subordinativas, relativizadores, quantificadores,

focalizadores, certos advérbios, operador de negação oracional etc.) a próclise torna-se

obrigatória. Contudo, no ajustamento proposto por Brito, o que se define, entre os gramáticos

lusitanos, como “construções piores que defeituosas”, apresentam-se como modos de dizer

próprios dos brasileiros e, ainda mais, como um indicativo de sua autonomia linguística:

[...] no portuguez do Brasil “espero que me faça o favor” e “espero que faça-

me o favor” são equipotentes; tanto se diz “não lembrou-se do recado” como

“não se lembrou do recado”. No portuguez da Europa não se nota a mesma

liberdade: dizse invariavelmente “espero que me faça o favor – não se

lembrou do recado”, sempre com o pronome antes do verbo. O Sr. Cândido

de Figueiredo, com uma dóse de orgulho nacional que não censuramos, mas

até invejamos para os nossos patricios, entendeu e ensinou que d’aquelas

duas maneiras de falar dos brasileiros só uma era legítima – a usada pelos

portuguezes, devendo a outra ser condemnada e banida como êrro crasso.

Ora, quer a construcção direta, quer a transposta, são legítimas. Tão correcto

é dizer “espero que faça a Paulo este favor” como espero que a Paulo faça

este favor; e isto se reduz, nos exemplos propostos, a collocação dos

pronomes: n’um caso depois do verbo, porque a construcção é directa;

n’outro antes, por ser transposta. Onde, pois, a incorrecção de uma d’essas

formas? No facto de não ser empregada pelos portuguezes? (BRITO, 1908, p.

12-13).

Vale salientar que a argumentação de Brito não encontra fundamentação somente nas

fronteiras políticas, regionais e simbólicas que separam Brasil e Portugal, mas, sobretudo, na

noção de que o português do Brasil, já naquele momento, distanciava-se suficientemente do

português europeu. Nas palavras de Brito Brito (1907, p. 13) “o portuguez, não sendo uma

língua morta, caso em que as línguas se immobilizam, se há de alterar no tempo e no espaço,

queiram ou não queiram, e no Brazil essa alteração se fará de accôrdo com as condições do

meio em que vivemos”.

Educação e compromisso social

203

Conclusão

A luta pelo reconhecimento de um idioma nacional é muito antiga, tendo maior

adesão após a proclamação da Independência, visto que o processo de dependência não

propiciava movimentos aspirantes a tal rompimento. Em nossos dias, a discussão também

existe. Assim como no século retrasado, as opiniões divergem muito, porém parece que, hoje

em dia, o número de defensores da unificação linguística está se reduzindo, e o dos que

apoiam uma melhor caracterização da língua com o falar brasileiro está aumentando.

Entretanto, o mais importante é que essas discussões são saudáveis para o engrandecimento

da língua, trazendo à tona temas que sempre geraram controvérsias e buscando solucionar

questões que parecem esquecidas.

Referências

ALENCAR, José de. Iracema: edição do centenário. Rio de Janeiro: INL, 1965.

BAGNO, Marcos. Português ou Brasileiro? um convite à pesquisa. 4ª ed. São Paulo: Parábola Editorial, 2004.

BRITO, Paulino de. Brasileirismos de collocação de pronomes: resposta ao sen. Cândido de Figueiredo. Livraria Azevedo: Rio de Janeiro, 1908.

BRITO, Paulino de. Collocação de pronomes. Paris: Allaud, 1907.

DUARTE, Raimunda Dias. Livros escolares de Leitura da Amazônia: produção, edição, autoria e discursos sobre educação de meninos, civilidade e moral cristã. Campinas: Pontes, 2018.

GUIMARÃES, Eduardo. Língua de civilização e Língua de Cultura: a Língua Nacional do Brasil. In: BARROS, Diana Luz Pessoa de (Org.). Os Discursos do descobrimento. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo; FADESP, 2000.

ORLANDI, E. P. Língua brasileira e outras histórias: discurso sobre a língua e ensino no Brasil. Campinas: RG, 2009.

SILVA, hosana dos Santos. Língua e poder: revisitando os debates entre Paulino de Brito e Cândido de Figueiredo. Cadernos do IL, Porto Alegre, n. 55, 2007. p.114-129. Disponível: http://seer.ufrgs.br/cadernosdoil/index

Educação e compromisso social

204

ANGLICISMOS: UMA ANÁLISE MORFOLÓGICA NO FACEBOOK

Manuelle Pereira da Silva85

Amanda Ferreira Ferreira86

Bárbara Furtado Pinheiro87

Introdução

É notório que usamos palavras ou expressões de outras línguas e muitas vezes não nos

damos conta de que são estrangeiras. Os falantes têm necessidade de expressar novos

conceitos e fenômenos. Como muitos desses conceitos são nomeados em outras línguas, os

falantes se apropriam de palavras estrangeiras, adaptando-as ou não à estrutura da língua

portuguesa (GONÇALVES, 2016).

Nesse sentido, destaca-se o conceito de estrangeirismos proposto por Jesus (2012).

Para o autor, estrangeirismos são todas as unidades que ainda não sofreram adaptação ao

português, ou seja, são registradas em sua forma original, e empréstimos linguísticos, aquelas

que já estão adaptadas ao nosso sistema, seja por adaptação fonológica, morfológica ou

semântica, não causando nenhum estranhamento em relação aos falantes. Jesus (2012)

acrescenta o conceito de anglicismos, os quais podem ser abordados como estrangeirismos

ou neologismos por empréstimos que surgiram a partir da língua inglesa.

Este trabalho foi elaborado com o intuito de analisar como estão sendo empregados

os estrangeirismos no Facebook, visto a grande frequência em que são utilizados por

internautas. Para tanto o objetivo geral é realizar uma análise morfológica dos estrangeirismos

no Facebook. Os objetivos específicos são discutir o conceito de anglicismos; observar como

os falantes flexionam palavras do inglês adequando à estrutura do português e apresentar a

estrutura de anglicismos que não sofreram alterações morfofonológicas.

O tema em discussão foi escolhido em virtude da grande frequência de estrangeirismos

que os falantes utilizam sem se dar conta de que são palavras estrangeiras. Com essa pesquisa,

almeja-se mostrar a diferença entre o conceito de estrangeirismo e neologismo por

85 UFPA/Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected] 86 UFPA/Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected] 87 UFPA/Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

205

empréstimo. O trabalho parte da hipótese de que os falantes do português utilizam nomes ou

verbos do inglês flexionando-os com marcas verbais do português, e que existe uma certa

frequência de estrangeirismos nas redes sociais, como o Facebook.

1 Materiais e métodos

Como metodologia, procede-se à uma pesquisa descritiva e explicativa utilizando

postagens do Facebook para analisar os anglicismos. Em seguida, será feita a análise de

estrangeirismos no Facebook e posteriormente a divulgação através de congressos, palestras,

seminários etc. Os principais autores usados na fundamentação são Silva (2008), Campos

(2010), Jesus (2012), Prado (2006) e Steinberg (2003).

Este trabalho está dividido da seguinte forma: na primeira parte é apresentada a

definição de neologismo, estrangeirismo e anglicismo. Na segunda, são apresentados os

motivos para a criação de palavras. Posteriormente, é apresentada a análise do corpus de

pesquisa e será feita a discussão. E a última parte é destinada à conclusão do trabalho.

A pesquisa teve duração de 7 meses (agosto de 2018 a fevereiro de 2019). As postagens

da rede social Facebook foram acompanhadas por meio de um aparelho de celular de uma

das autoras, sendo retiradas do feed de notícias. Optou-se por analisar postagens de falantes

nativos, a fim de discutir sobre a formação dos anglicismos no português. Como explicado

anteriormente, os anglicismos podem ou não sofrer alterações em sua forma. Por isso,

analisou-se primeiramente os anglicismos que não sofrem alterações morfofonológicas, e

posteriormente, as expressões que são adaptadas à estrutura morfológica da língua

portuguesa, como pode ser visto a seguir.

2 Resultados e discussão

2.1. Anglicismos que não sofreram alterações morfofonológicas

Alguns anglicismos utilizados por internautas no Facebook não sofreram alterações

morfológicas e nem fonológicas. Será feita a seguir uma análise dos anglicismos encontrados

que têm a forma original do inglês.

Educação e compromisso social

206

Figura 1 – Fonte: Facebook.com

Os anglicismos usados pela internauta foram “summerfest” e “top”. Summerfest é uma

palavra composta formada por substantivo + substantivo, cuja tradução é “festa de verão”.

Ainda segundo Steinberg (2003), prefixos e sufixos são amplamente empregados na variante

norte-americana para a cunhagem de neologismos, por exemplo o sufixo -fest é proveniente

do alemão; une-se à palavra summer (do inglês, sendo a tradução “verão”) e forma a palavra

summerfest. Já o anglicismo top (“topo” em inglês) é usado em português com a grafia

original, sendo utilizado para enfatizar algo, como no exemplo acima em que o internauta

enfatiza que a festa foi muito boa.

Figura 2 – Fonte: Facebook.com

Bodypiercer (perfurador corporal) é uma palavra composta formada por substantivo +

substantivo, e é usada da mesma forma que em inglês. Com relação à estrutura, Campos

(2010) afirma que o sufixo “er” (que significa “aquele ou aquilo que executa, faz, troca ou

conduz uma ação”) é afixado depois do verbo para transformá-lo em substantivo. A afixação

de “er” com o verbo “pierce” forma o substantivo “piercer”. O outro anglicismo “piercing”

também é utilizado na forma original do inglês. Para a formação dessa palavra foi afixado o

sufixo “ing” no verbo to pierce (perfurar).

Educação e compromisso social

207

Figura 3 – Fonte: Facebook.com

“Blush”, “gloss” e “glitter” (produtos de maquiagem) são anglicismos que não têm uma

tradução para o português, sendo usados na forma original. Segundo Prado (2006), há

anglicismos que não sofrem adaptação ao português, ou seja, são registrados em sua forma

de origem, como foi possível visualizar na imagem 3.

2.2. Anglicismos que sofreram alterações morfofonológicas

Certos anglicismos utilizados por internautas no Facebook sofreram alterações

morfológicas e fonológicas em sua estrutura. Será feita a seguir uma análise dos anglicismos

encontrados que se adaptaram à estrutura morfológica do português.

Figura 4 – Fonte: Facebook.com

No âmbito da informática, são comuns os termos emprestados do inglês, por exemplo,

deletar, clicar, downloadar, zapear, hackear. Outro exemplo bastante comum no Facebook é

o termo “stalkear”, um empréstimo do inglês formado pelo verbo to stalk (perseguir). Tal

verbo é adaptado à estrutura morfológica do português, assim a terminação “ar” (1ª

conjugação de verbos) une-se ao verbo em inglês formando a expressão stalkear. A seguir será

Educação e compromisso social

208

apresentada uma tabela fazendo comparação entre a conjugação verbal de “stalkear” em

português e em inglês.

Figura 5 – Fonte: Facebook.com

O verbo to stalk (perseguir) é adaptado à estrutura morfológica da língua portuguesa,

assim a terminação “ndo” (marca de gerúndio) une-se ao verbo em inglês formando a

expressão “stalkeando”. Pois, como já mencionado por Silva (2008), os falantes de uma língua

estão a todo o momento criando palavras de acordo com suas necessidades. Pode-se concluir

que o léxico da língua evolui sempre.

Figura 6 – Fonte: Facebook.com

O termo “deletar” é um empréstimo do inglês, o verbo to delete (apagar) é adaptado

à estrutura morfológica da língua portuguesa, assim a terminação “ar” (verbos de 1ª

conjugação) une-se ao verbo em inglês formando a expressão “deletar”. Também é um termo

muito usado na área da informática, sobretudo nas redes sociais. O termo “deletar” é utilizado

de forma diferente nas redes sociais, pois traz o sentido de apagar algo que não foi bom,

enquanto que na área da informática, é usado para apagar documentos ou pastas de um

computador.

Educação e compromisso social

209

Figura 7 – Fonte: Facebook.com

O verbo to delete (apagar) é adaptado à estrutura morfológica da língua portuguesa,

assim a terminação “ndo” (marcação de gerúndio) une-se ao verbo em inglês formando a

expressão deletando. Novamente, os internautas usam esse termo com o sentido de apagar

o que não foi bom; essa expressão é tão comum que, muitas vezes, nem é vista como

estrangeira. Vale destacar que o termo delete (utilizado na informática) se ampliou para

outras áreas, como as redes sociais, como se percebeu no Facebook, recebendo assim novos

significados.

Conclusão

É possível perceber que os falantes fazem uso de anglicismos para nomear novos

fenômenos ou experiências, fazendo adaptação fonológica ou não para a língua nativa. Como

muitas das novidades são nomeadas na língua de origem, o falante se apropria das palavras

originais para expressar esses termos, como por exemplo, summerfest, top, bodypiercer,

piercing, blush, glosse glitter.

Por outro lado, há palavras que são adaptadas à estrutura morfofonológica da língua

nativa, tais como as formações de verbos a partir de termos emprestados do inglês: stalkear

e deletar. Vale ressaltar que termos como delete (utilizado na informática) se ampliaram para

outras áreas, como as redes sociais, por exemplo o Facebook, recebendo assim novos

significados. E por fim, nota-se que os falantes fazem uso com certa frequência desses termos.

Referências

CAMPOS, Giovana Teixeira. Manual Compacto de Gramática Língua Inglesa. São Paulo: Rideel, 2010.

Educação e compromisso social

210

JESUS, Ana Maria Ribeiro de. Empréstimos, tradução e uso na prática terminológica. TradTerm, São Paulo, v. 20, dezembro/2012, p. 111-128.

PRADO, Daniela de Faria. Uma análise das inserções dos empréstimos linguísticos da área da informática no Dicionário Aurélio XXI. Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia, 2006. 138p.

SILVA, Maria Cristina Parreira da. Os estrangeirismos e o vocabulário fundamental nos dicionários bilíngues. São José do Rio Preto: Unesp, 2008.

STEINBERG, Martha. Neologismos de língua inglesa. São Paulo: Editora Nova Alexandria, 2003.

Educação e compromisso social

211

AS DIFICULDADES PARA FORMAÇÃO DO HÁBITO DE LEITURA

Adrielle do Socorro Alves Araújo88

Marilucia Ferreira da Silva89

Introdução

O hábito de ler textos escritos é de grande importância para a vida profissional e social

das pessoas, uma vez que, a leitura é essencial para um processo de ensino-aprendizagem

satisfatório, pois é por meio da leitura que se abrem novos horizontes e torna-se possível

entender e aprofundar conhecimentos sobre o mundo, atuando assim como sujeito crítico na

sociedade. Este processo de leitura é algo indispensável e deve ser reconhecido socialmente,

pois a vida individual, social de um sujeito, se dá devido à aquisição do hábito de leitura desde

a infância até a fase final do seu desenvolvimento, pois aprimora as potencialidades

intelectuais de cada um. No entanto, segundo a revista “Retratos da leitura no Brasil” (2012),

o referido país possui baixos índices de leitura, onde boa parte dos alunos considera o hábito

de ler como algo imposto pelos professores, isso ocorre pelo fato de que na escola nem

sempre ela é trabalhada de maneira eficaz.

Assim, este trabalho tem como objetivo, engendrar, uma discussão e reflexão sobre o

processo de formação do hábito de leitura no ensino de Língua Portuguesa, salientaremos

também, a concepção de leitura, logo após elencaremos algumas observações investigativas

feitas a partir da leitura dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e livros didáticos para

compreendermos as dificuldades da formação do habito de leitura nas escolas.

1 Materiais e métodos

Para iniciar as reflexões, os materiais utilizados foram as obras de autores como

Kleimam (1998) e Martins (1994) para conceituar leitura; Kleimam (2002), Mendonça (2006)

88 Universidade do Estado do Pará/UEPA. E-mail: [email protected] 89 Universidade do Estado do Pará/UEPA. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

212

e Antunes (2003) para compreender quais dificuldades têm impedido o hábito de leitura; e

por fim utilizou-se as orientações dos Parâmetro Curriculares Nacionais(1998) para suscitar

atividades que possam contribuir com a prática de leitura em sala de aula. Além disso, foram

diagnosticados três livros didáticos das turmas de 6º e 7º ano do ensino fundamental e do 1º

ano do ensino médio, com o objetivo de analisar se estes trabalham textos que envolvem os

diversos âmbitos da cultura brasileira.

No primeiro momento, como já exposto, falou-se de leitura e de como muitos estudos

apontam que a mesma vem sendo aplicada de forma incorreta desde as séries iniciais. Isso é

evidenciado pela pesquisa Retratos da Leitura no Brasil que teve sua 3˚ edição em 2012, e

concluem que há no Brasil 88,2 milhões de leitores, ou seja, 50% da população – 7,4 milhões

a menos do que em 2007, quando 55% dos brasileiros se diziam leitores. Também se discutiu

sobre os conceitos de leitura e de sua importância para o desenvolvimento das crianças e

adolescentes, e sobre como esse desenvolvimento contribui para a construção da sociedade.

No segundo momento, alguns autores foram trazidos para as discussões a fim de

compreender os problemas para a formação de leitores na escola e as principais causas de

não se ter recursos adequados para promover atividades de leitura. Além disso, evidenciou-

se como estas práticas estão sendo trabalhadas em sala de aula.

2 Resultados e discussão

A partir dos processos metodológicos, os resultados obtidos foram os seguintes:

O pouco tempo do professor para trabalhar atividades diversificadas que incentivem

os alunos à prática de leitura;

O mau (ou nenhum) uso que o professor faz dos PCN´s, visto que, alguns docentes

pouco conhecem as orientações dadas por este documento;

O uso excessivo do livro didático em sala de aula, onde os textos são apenas grupos

de componentes gramaticais estudados de forma desconexa, ou seja, o texto que

deveria ser uma ferramenta que ajudaria o professor a ministrar suas aulas acaba por

atrapalhar ou servir apenas como um pretexto para o ensino da língua;

O Livro didático impede que haja interação entre aluno e professor, uma vez que o

professor torna-se um instrutor e não mediador do processo de formação de leitura;

Educação e compromisso social

213

A maioria dos livros didáticos analisados concentram-se em temas modernos, porém,

esses textos, pouco tem a ver com a cultura dos adolescentes e jovens de todos as

regiões brasileiras, pois os textos e assuntos são voltados para acontecimentos das

regiões mais prestigiadas;

Conclusão

Considerando as reflexões aqui trazidas, percebemos que a formação do hábito de

leitura é algo que não está sendo trabalhado coerentemente na maioria das escolas. O livro

didático como único instrumento de leitura utilizado pela escola acarreta um

empobrecimento do nível de leitura realizado pelos alunos e um desfavorecimento da

capacidade de análise crítica. O que ocorre muitas vezes é que o livro didático se torna o piloto

de ensino dentro da sala de aula, que forma que somente ele é quem comanda as ações e

metodologias do educador, o que torna o ensino mecanicista, sem espaços para outras

vertentes. Todavia, é importante salientar que o livro didático tem sua importância no

cotidiano escolar, pois é um auxílio tanto para o professor quanto para o aluno, além de

facilitar o compartilhamento dos conteúdos.

Assim, o professor deve ter cuidado ao manusear o livro didático em sala de aula,

podendo apresentar textos regionais e oficinas de leitura para facilitar o ensino, buscando

formar um leitor crítico e ativo que possa utilizar a leitura com prazer e não como uma

obrigação. Além disso, o educador deve ser capaz de buscar bases fundamentadas e

estratégias de ensino de leitura e fontes contemporâneas.

Referências

ANTUNES, Irandé. Aula de Português: encontro e interação. São Paulo: Parábola Editorial, 2003.

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua Portuguesa: primeiro e segundo ciclos / Ministério da Educação. Secretaria da Educação Fundamental. 3ª ed. Brasília: A Secretaria, 1998.

BUNZEN, Clécio; MENDONÇA, Márcia. Português no ensino médio e formação do professor. São Paulo: Parábola Editorial, 2006.

CEREJA, William; MAGALHÃES, Thereza. Português linguagens 1º ano. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

______. Português: Linguagens 6º ano. 9ª ed. reform. São Paulo: Saraiva, 2015.

______. Português linguagens 7º ano. 9ª ed. reform. São Paulo: Saraiva, 2015.

Educação e compromisso social

214

FAILLA, Z. Retratos da leitura no Brasil. 3˚ ed. São Paulo: Instituto Pró-livro, 2012. Disponível em: https://www.revistas.uea.edu.br/old/abore/artigos/artigos_5/141.pdf. Acesso em 20/02/2018.

KLEIMAN, Ângela. Oficina de leitura: teoria e prática. 9ª ed. São Paulo: Pontes, 2002.

_______. Oficina de leitura: teoria e prática. 6ª ed. Campinas: Pontes, 1998.

MARTINS, Maria Helena. O que é leitura? 19ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1994.

Educação e compromisso social

215

ESTÁGIO SUPERVISIONADO I: EXPERIÊNCIA TEÓRICA E PRÁTICA NA FORMAÇÃO DO ESTUDANTE DE LETRAS/LÍNGUA PORTUGUESA

Marilucia Ferreira da Silva90

Waléria Oliveira da Silva91 Introdução

No presente documento buscamos frisar as experiências vivenciadas durante o

período de Estágio supervisionado I, suscitando reflexões a partir da relação teoria e prática.

Além disso, explicitaremos a importância do estágio para a formação do futuro docente de

Língua Portuguesa. Assim, ao longo deste artigo, procuraremos desenvolver argumentos

sobre a prática de estágio, tendo em vista os propósitos e/ou objetivos do mesmo para o

desenvolvimento profissional dos educadores em processo de formação.

O estágio é uma etapa necessária para preparar o aprendiz para a profissão, pois

possibilita ao estudante ter a vivência com os conhecimentos teóricos aprendidos na sua

formação superior, pois é o espaço no qual o acadêmico irá aplicar esses conhecimentos

adequando-os à realidade da escola pública.

A prática de estágio tem como objetivo proporcionar ao estudante um contato maior

com a sala de aula, ambiente que este precisa estar habituado para que seu desempenho

como educador seja eficaz, e possa contribuir com a melhoria do ensino e aprendizagem. O

Estágio Supervisionado I (Ensino Fundamental) foi realizado na Escola Estadual de Ensino

Fundamental Professor Leônidas Monte, Abaetetuba-Pará, as atividades de regência

ocorreram no período vespertino, entre os dias 25 de setembro e 18 de outubro.

1 Materiais e métodos

O trabalho foi estruturado em dois eixos temáticos. O primeiro eixo abordou de forma

objetiva os conceitos sobre o que é estágio e a função deste na vida acadêmica dos

graduandos dos cursos de licenciaturas. Para isso utilizamos algumas concepções de autores

90 Universidade do Estado do Pará/UEPA. E-mail: [email protected] 91 Universidade do Estado do Pará/UEPA. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

216

como: Barbosa (2015), Condurú (2005), Moreno; Carneiro (2014) e Oliveira (2010). O segundo

eixo trouxe à tona algumas considerações dos principais relatos das experiências vivenciadas

durante as etapas de diagnóstico e regência, onde relacionamos aos pensamentos de Geraldi

(1993), Antunes (2003) e às orientações dos PCN´s.

O lócus do Estágio Supervisionado I foi a Escola Estadual de Ensino Fundamental e

Médio Professor Leônidas Monte, Abaetetuba-Pará, localizado no bairro de Santa Rosa, Rua

Joaquim Mendes Contente, nº 1195. A turma onde realizou-se a regência foi o 7º ano A e o

objetivo das atividades eram: identificar os problemas relacionados a questões de leitura e

interpretação, além disso, se sabem relacionar a leitura com seus conhecimentos de mundo.

Após o período de observação, trabalhamos as intervenções de acordo com as necessidades

apresentadas pela turma.

2 Resultados e discussão

2.1. A importância do estágio:

No primeiro momento, definiu-se “estágio” como uma disciplina cujo o objetivo é

direcionar o estagiário para a realidade do seu trabalho profissional, dando-lhe oportunidades

de aprimorar seus conhecimentos teóricos na prática. Além disso, acadêmico-profissional

poderá desenvolver metodologias que se tornarão indispensáveis no exercício da profissão.

Para que o estudo teórico-prático ocorra é necessário que o educando realize as intervenções

de acordo com os conteúdos trabalhados na academia, uma vez que a regência exige didática

e responsabilidade. Dessa forma, todo estagiário precisa vir da universidade com a formação

adequada para organizar e planejar as atividades aplicadas durante o processo de estágio.

A experiência como docente é muito importante, pois contribui para a adequação dos

conteúdos teóricos na prática, proporcionado um real conhecimento, do repertório histórico

social dos alunos, que se diferenciam um dos outros; das condições estruturais da escola, uma

vez que é importante para o professor tomar conhecimento dos recursos disponíveis para

desenvolver suas metodologias; e a familiarização com o espaço onde ocorre de fato o ensino

e a aprendizagem. Nesse viés, vale ressaltar que, o contato com o estágio desperta o interesse

no estagiário para outras reflexões e trabalhos relacionados à prática em sala de aula, como a

realização de pesquisas.

Educação e compromisso social

217

2.2. Resultados das observações e das intervenções:

Durante a aplicação das atividades da professora regente, foi possível perceber que a

maioria dos alunos se quer se deu o trabalho de ler o texto, ou analisá-lo, apenas resolviam a

atividade da forma que achavam melhor, os que leram o texto tiveram muita dificuldade para

interpretar. Após a atividade diagnóstica, nos propusemos a analisar os dados, levando em

consideração os aspectos interpretativos e a ortografia dos alunos.

A partir da análise, foi possível identificar que os alunos não são leitores ativos e que

não conseguem identificar os discursos implícitos do texto, além disso, a maioria das questões

interpretativas foi resolvida de forma incorreta. Assim, trabalharmos os conceitos de texto e

interpretação textual, iniciamos as atividades de intervenção, onde foi trabalhado o texto “Por

que criança não pode trabalhar”. A leitura do texto foi realizada de forma compartilhada (por

meio de grupos) e repetida várias vezes, dessa forma, todos os alunos puderam participar da

leitura inclusive os professores, isso porque é importante que o aluno tenha o professor como

um exemplo de leitor. Depois iniciamos o processo de análise do texto, onde os alunos

dividiram-se em trio para interpretar o texto e responder as perguntas. Terminada a primeira

etapa da atividade expusemos aos educandos uma charge e uma propaganda tratando do

mesmo tema do primeiro texto, o trabalho infantil. Logo após, apresentamos alguns

questionamentos, onde por meio de roda de conversa os alunos expressaram seus

conhecimentos e interpretações da análise das imagens.

Fazendo uma relação teórico-prática sobre o processo de interpretação, compreende-

se que os alunos alcançaram os objetivos pretendidos, pois responderam bem a análise do

texto e das imagens. Além disso, no momento interacionista da aula, a maioria dos educandos

participou. Eles trocaram experiências e apresentaram algumas ideias para amenizar a

problemática do tema da aula.

Conclusão

Em suma, podemos afirmar que o Estágio Supervisionado I, foi uma etapa, onde os

conhecimentos teóricos aprendidos na academia puderam ser aprimorados por meio da

prática em sala de aula. Além disso, vale ressaltar que o contato com o aluno é importante

para que o futuro docente conheça a realidade e/ou repertorio social de cada educando. Uma

Educação e compromisso social

218

das coisas mais importantes vivenciadas durante o estágio é a construção do fazer pedagógico,

onde o estudante de Letras tem contato direto com a sala de aula e com isso é necessário

buscar metodologias adequadas para facilitar não só o ensino de Língua Portuguesa, mais

também, a relação professor/aluno. Nesse viés é plausível que o professor busque sempre

fomentar discursões sobre temas sociais, pois, muitas vezes estão relacionados com a vivência

do aluno. Sobre os conteúdos trabalhados vale frisar que os alunos demonstraram avanços,

sendo que alguns se comprometeram ler mais livros, frequentar a biblioteca mais vezes e

analisar melhor os textos que a professora apresentar. Assim, é necessário que toda a

comunidade escolar realize atividades que estimulem os alunos a lerem e que também os

ajude a trabalhar a oralidade, pois a escola deve fugir dos tradicionalismos, dando vez e voz

aos alunos para que construam seu senso crítico através da leitura.

Referências

BARBOSA, Jailma do Ramo. O gênero charge como instrumento para a formação de leitores críticos na escola pública. Paraíba: II CONEDU/UFPB, 2015.

BRASIL. Parâmetros Curriculares nacionais: Língua Portuguesa: primeiro e segundo ciclos/ Ministério da Educação. Secretaria da Educação Fundamental. 3ª ed. Brasília: A Secretaria, 1998.

______. Parâmetros Curriculares Nacionais. PCN - Língua Portuguesa. Volume 2. Brasília, 1997.

CONDURÚ, M. T.; MOREIRA, M. C. R. Produção cientifica na universidade, normas para apresentação. Belém: EDUEPA, 2005.

GERALDI, J. W. Portos de Passagem. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

MORENO, J. P. M; LIMA, V. F. de; CARNEIRO, L. da. S. Estágio Supervisionado I: experiência teórica e prática na formação do estudante de Letras-Língua Portuguesa - UERN. Rio Grande do Norte: Editora realize, 2014.

OLIVEIRA, L. A. Coisas que todo o professor de português precisa saber: a teoria na prática. São Paulo: Parábola Editorial, 2010.

Educação e compromisso social

219

METAPLASMOS CONTEMPORÂNEOS: AS VARIAÇÕES DA LÍNGUA PORTUGUESA ATRAVÉS DAS CANÇÕES DE LUIZ GONZAGA

Keise Barreto da Silva92

Ivana de Jesus Silva de Sena93

Introdução

A língua portuguesa é uma das línguas que derivaram do latim, e sofreu, desde o

princípio, variações que influenciaram sua estrutura, tal como ela é atualmente. No entanto,

assim como toda a língua que se movimenta através dos falantes, o português continua a

ampliar-se através dos metaplasmos disseminados pelos indivíduos que o praticam.

É possível observar nitidamente nas interações verbais dos indivíduos as

transformações fonéticas que vêm ocorrendo na língua portuguesa ao fazerem uso de

palavras consagradas pelas gramáticas descritivas.

Neste estudo, em que o corpus observado é, em supremacia, de falantes da língua

portuguesa, evidenciaremos o uso de metaplasmos por transformação, transposição,

supressão e acréscimo, apontando, através desses conceitos, os novos vocábulos que

emergem no português brasileiro.

Os versos consagrados na voz de Luiz Gonzaga são ricas fontes para o estudo de

metaplasmos. Neles, pode-se verificar uma abundância de vocábulos que desviam da

composição gráfica registrada pelos dicionários da língua portuguesa, mas que representam

de fato a estrutura fonética de que se compõe o léxico predominante no sertão nordestino.

1 Materiais e métodos

O corpus desta pesquisa foi coletado a partir de canções de Luís Gonzaga, fontes que

foram compiladas com o intuito de evidenciar as variações e modificações do Português

brasileiro partindo de análises pautadas nos conceitos de Metaplasmo de BEZERRA (2007);

OLIVEIRA (2010); HIGINO (2010) e BOTELHO, (1993). Essa análise deu-se por meio de

92 Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected] 93 Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

220

comparações realizadas entre variações do léxico do português brasileiro inserido nas

produções artísticas supracitadas frente às palavras consagradas pela gramática tradicional.

2 Resultados e Discussão

Os Metaplasmos são as variações fonéticas que ocorrem em uma determinada língua,

sendo praticados em diversos níveis linguísticos, e é através deles que podemos verificar as

mudanças pelas quais os vocábulos da língua portuguesa vêm passando.

Os metaplasmos, segundo BEZERRA (2007), classificam-se em: metaplasmos por

transformação, metaplasmos por transposição, metaplasmos por subtração e metaplasmos

por acréscimo.

De caráter qualitativo, os resultados da pesquisa evidenciam que não há uma maneira

padrão de fala para todos, já que por meio dos metaplasmos existem variáveis que se

adequam com as alterações fonéticas verificadas nas próprias palavras da língua, emigram e

peregrinam através do tempo, até permanecerem essas alterações estáticas por algum

período, e outra vez se modificam, tudo ao sabor do uso dos falantes.

Conclusão

Por meio deste trabalho, concluímos que a língua passa por mudanças constante.

Percebemos a presença de diferentes tipos de metaplasmos, principalmente nas canções de

Luiz Gonzaga, que são canções sertanejas famosas que compõem a vasta lista de músicas

populares brasileiras.

Em suma, é comum encontrar metaplasmos diariamente em expressões artísticas,

principalmente em letras musicais, e, na maioria das vezes, tornam-se imperceptíveis quando

esquecemos de avaliá-las minuciosamente.

Referências

ARAÚJO, Ruy Magalhães de. Metaplasmos: um paralelo diacrônico e sincrônico. In: Anais II CLUERJ-SG, Volume Único, Ano 2, n. 01, 2005.

BEZERRA, Antônio Ponciano. História da Língua Portuguesa. São Cristóvão: Universidade Federal de Sergipe, CESAD, 2011.

BOTELHO, José Mário. Breve estudo da origem da Língua Portuguesa. 16ª ed. Mato Grosso: Revista digital do curso de Letras: 2013.

GONZAGA, Luíz. Disponível em: https://www.vagalume.com.br/luiz-gonzaga/

Educação e compromisso social

221

LIMA, Joaquim Maia de. Textos Didáticos do curso de Licenciatura em Letras – Habilitação Língua Portuguesa – modalidade a distância: Filologia Românica. Belém: EDUFPA, 2008.

LEITE, Isabelle Lins. Metaplasmos Contemporâneos: Um estudo acerca das atuais transformações fonéticas da Língua Portuguesa.

OLIVEIRA, Ireny Caldeira de Souza; HIGINO, José Lúcio Ferreira. Filologia Românica. 3º Período. Monte Carlos: Editora Unimontes, 2010.

Educação e compromisso social

222

A LÍNGUA EM USO: SINTAXE DE COLOCAÇÃO

Amanda Ferreira Ferreira94

Bárbara Furtado Pinheiro95

Manuelle Pereira da Silva96

Introdução

É notório que as gramáticas prescritivas postulem regras de colocação pronominal

os falantes brasileiros tendem a não utilizá-las da mesma forma que são impostas. Elas estão

baseadas no português europeu, com isso diferem muito das variedades brasileiras. Os

falantes brasileiros têm preferência em utilizar os pronomes oblíquos no início de enunciados.

Portanto, nesse trabalho, propõe-se tratar sobre a colocação pronominal no português

brasileiro, especificamente sobre a próclise.

O objetivo geral deste trabalho é analisar criticamente a colocação dos pronomes

oblíquos no português brasileiro. Os objetivos específicos são discutir o fenômeno da próclise

no português brasileiro; comparar as prescrições da gramática tradicional com o uso autêntico

dos pronomes oblíquos no português brasileiro; analisar o fenômeno da próclise no Facebook

por falantes do português brasileiro.

1 Materiais e métodos

A pesquisa é bibliográfica. Para tanto, foram utilizadas as gramáticas Minimanual

de Redação e Literatura, Manual de Redação: guia prático da Língua Portuguesa, bem como

postagens no Facebook de falantes brasileiros como corpus de pesquisa. O referencial teórico

usado foi Bagno (2013), Perini (2005), Brito (1908) e Bechara (2009).

Para analisar como a colocação pronominal é postulada segundo a norma-padrão,

utilizou-se o Minimanual de Redação e Literatura (2010), de autoria de Marta Pontes; o

Manual de Redação: guia prático da Língua Portuguesa (2001), de autoria de Luiz Fernando

94 UFPA/Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected] 95 UFPA/Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected] 96 UFPA/Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

223

Mazzarotto, Davi Dias de Camargo, Ana Maria Herrera Soares. Além disso, foram analisadas

postagens de internautas no Facebook como corpus de pesquisa.

O trabalho está dividido da seguinte maneira: na primeira seção “Colocação

pronominal” são discutidas as regras de colocação pronominal. Na segunda seção “Colocação

pronominal segundo a gramática prescritiva e descritiva” é introduzida a sintaxe de colocação

na visão prescritiva e na descritiva. Na seção “Análise do fenômeno da colocação pronominal”,

são observadas as imposições sobre a colocação dos pronomes oblíquos em gramáticas, bem

como, os usos linguísticos de falantes do português.

2 Resultados e discussão

2.1 O fenômeno da colocação pronominal

Optou-se por apresentar as postagens do Facebook, observando os usos

autênticos do português brasileiro, cujo uso mais comum é colocar o pronome antes do verbo

em início de orações, contrapondo com as prescrições gramaticais. São apresentados e

analisados os usos concretos de falantes nativos do português brasileiro, em postagens no

Facebook.

Figura 1 – Uso do pronome “me” / Fonte: Facebook (2018).

O enunciado “me faça feliz com um comentário” confirma a sintaxe de colocação

típica do português brasileiro. A colocação pronominal da internauta “transgride” a velha

imposição normativa “não inicie orações com pronomes oblíquos”, pois essa postulação não

está de acordo com a intuição do falante brasileiro. Na visão tradicional, em hipótese alguma

se deve iniciar orações com pronomes oblíquos átonos. Nesse sentido, o enunciado ficaria:

“Faça-me feliz com um comentário”. Isso pareceria distante da fala comum do brasileiro.

Educação e compromisso social

224

Figura 2 – Uso do pronome “se”/ Fonte: Facebook (2018).

Na postagem da internauta, mais uma vez, é possível perceber que a colocação do

clítico “se” se encontra antes do verbo principal. É possível notar que essa é uma construção

sintática bastante comum no português do Brasil, a qual rompe com as prescrições

gramaticais ditadas pela gramática tradicional, reforçando que esse uso é completamente

natural para o falante brasileiro. De acordo com a gramática prescritiva, o enunciado ficaria

“Admire-se também”. Vale ressaltar que esta última forma é pouco encontrada em redes

sociais como o Facebook.

Figura 3 – Uso do pronome “te”/ Fonte: Facebook (2018).

Na postagem “Te ajeita que eu vou tirar uma foto tua”, é possível notar o uso do

clítico “te” no início da oração. Se o enunciado fosse escrito “Ajeita-te que eu vou tirar uma

foto tua” estaria de acordo com a prescrição gramatical, mas distante da fala brasileira comum

(padrão ou não). Logo, é possível perceber que os falantes nativos têm preferência pela

próclise, uma marca do português brasileiro.

Educação e compromisso social

225

Figura 4 – Uso do pronome “nos” / Fonte: Facebook (2018).

Na postagem, pode-se perceber que o pronome oblíquo átono de 3ª pessoa “nos”

foi colocado antes do verbo “despedir” no gerúndio, o que contraria as prescrições

gramaticais. Reescrevendo o enunciado acima, ficaria “Vamos despedindo-nos de 2016...”.

Segundo as prescrições gramaticais, essa é a forma “correta” de emprego do clítico.

Contrariando as prescrições gramaticais, o enunciado acima é perfeitamente

comum no português falado no Brasil, e não se trata de “erro”, mas sim de um uso linguístico

comum, que faz parte da intuição gramatical de falantes brasileiros. Portanto, não se

configura como um “erro gramatical”, como prescreve a gramática tradicional.

Conclusão

Pode-se perceber que as postagens no Facebook demostram o uso legítimo

brasileiro da colocação dos pronomes oblíquos átonos no início de enunciados, o que rompe

com a tradição gramatical e se mostra uma norma mais inovadora, e que de forma alguma

pode ser considerada “errada”. Vale ressaltar que a maior parte dos falantes do português

brasileiro não usa a ênclise em início de orações como a gramática prescritiva impõe, mas sim

a próclise.

Percebe-se que as gramáticas se mostram inflexíveis, fixas em um conjunto de

regras impostas ao falante brasileiro. Os usos prescritos pela gramática normativa seguem

padrões lusitanos e desconsideram o fenômeno da próclise como colocação pronominal

comum do português brasileiro.

É essencial que o professor ensine as regras de colocação pronominal na sala de

aula, de acordo com o que prevê a gramática normativa. O docente não deve descartar a

norma, mas deve refletir sobre o que ocorre na língua, partindo dos usos, e daí deve analisar

o que está prescrito na norma.

Educação e compromisso social

226

O professor deve ensinar a colocação pronominal de acordo com a norma, de

modo que os alunos se apropriem desses conhecimentos para desenvolver a habilidade de

leitura e escrita de textos da variedade dita padrão do português brasileiro. Contudo, o

professor também deve apresentar as variedades de uso da língua em textos autênticos.

Deve-se, portanto, abordar os diferentes usos da colocação pronominal por meio de uma

variedade de textos orais e escritos, tanto numa visão prescritiva quanto descritiva. Dessa

forma será possível ao aluno refletir de forma crítica a respeito da colocação dos pronomes.

Referências

BAGNO, Marcos. Gramática de bolso do português brasileiro. São Paulo: Parábola Editorial, 2013.

BECHARA, Evanildo. Gramática Descritiva e Gramática Normativa. In: Moderna Gramática portuguesa. 37ª ed. rev., ampl. e atual conforme o novo Acordo Ortográfico. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009, p. 37. Disponível em: <https://docero.com.br/doc/5051v>. Acesso em: 22/11/2018, 16:02:54.

BRITO, Paulino de. Brasileirismos de colocação de pronomes – resposta ao sen. Cândido de Figueiredo. Livraria Azevedo: Rio de Janeiro, 1908. Disponível em: <https://bibdig.biblioteca.unesp.br/bitstream/handle/10/26048/brasileirismos-de-collocacao-de-pronomes.pdf?sequence=2&isAllowed=y>. Acesso em: 13/06/2018, 10:54:21.

MAZZAROTTO, Luiz Fernando; CAMARGO, Davi Dias de Camargo; SOARES, Ana Maria Herrera. Manual de redação: guia prático da Língua Portuguesa. São Paulo: DCL, 2001. Disponível em: <https://ocondedemontecristo.files.wordpress.com/2011/03/un01.pdf>. Acesso em: 7/01/2019, 19:12:03.

PERINI, Mário Alberto. Pronomes. In: Gramática descritiva do Português. 4ª ed., 8ª impressão. São Paulo: Editora Ática, 2005, p. 229-230.

PONTES, Marta. Colocação Pronominal. In: Minimanual de redação e literatura. São Paulo: DCL, 2010.

Educação e compromisso social

227

PARTE 6. ENSINO DAS CIÊNCIAS E DA MATEMÁTICA

Educação e compromisso social

228

AS TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO MÓVEIS (TIM’S) COMO METODOLOGIA ALTERNATIVA NO ENSINO DE CIÊNCIAS

Myéllen Karen Contente97

Andreza Viana Souza98

Dayana Suelen Viana da Cruz99

Introdução

O uso das novas tecnologias tem contribuído para a consolidação de espaços mundiais

globalizados, e esse é um dos motivos pelos quais o ensino da disciplina ciências na sala de

aula deve permitir aos educandos uma análise crítica da realidade, pois estes devem se colocar

de forma propositiva diante dos problemas enfrentados na família, na comunidade, no

trabalho, na escola e nas instituições das quais participam. Dessa forma, tem-se uma tomada

de consciência sobre as responsabilidades, os direitos e deveres sociais, com o intuito de

efetivamente tornar o aluno agente de mudanças desejáveis para a sociedade.

Entre as inovações tecnológicas das últimas décadas destacam-se o desenvolvimento

da informática, a instalações de cabos oceânicos intercontinentais, o lançamento de satélites

artificiais de comunicação e a expansão dos serviços de telefonia e da rede mundial de

computadores. Muitos desses recursos tecnológicos estão estampados nas paisagens dos

lugares, nos campos e principalmente nas cidades.

Podem ser vistos as torres de transmissão de energia elétrica, nas antenas parabólicas,

enfim, em uma infinidade de recursos. Por isso, hoje em dia podemos dizer que vivemos em

um espaço, impregnado de elementos científicos, tecnológicos e informacionais. E uma das

características fundamentais desse processo, é a rapidez com que ocorre a troca de

informações entre os lugares fazendo da internet um instrumento de comunicação que vem

transformar profundamente as noções de tempo e de espaço.

As razões pelas quais resolveu se dissertar sobre essa temática estão relacionadas às

condições de ensino da rede pública e as dificuldades enfrentadas por estudantes da rede

97 UFPA/Campus Cametá. E-mail: [email protected] 98 UFPA/Campus Cametá. E-mail: [email protected] 99 UFPA/Campus Cametá. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

229

Municipal de Ensino Fundamental do bairro da Matinha, Cametá-Pará, no que diz respeito ao

processo de ensino-aprendizagem da Ciências escolar e tecnologia, em especial o celular,

estimulando o uso de aplicativos como motivação para aprender, pois percebe-se que o

ensino da disciplina é caracterizado por algumas pessoas como um ensino enfadonho e

acompanhado por práticas de memorização dos conteúdos científicos.

Entendemos que a escola e a sala de aula devem ser espaços abertos à vivência,

apresentando conhecimentos novos e respeitando o conhecimento prévio dos alunos, para

que através destes pequeno aparelho que contém diversos aplicativos como: câmera,

calculadora, relógio, calendário, cronômetro, bloco de notas, dentre outros e conforme o nível

de sofisticação do aparelho, este pode ter acesso à internet e outros aplicativos que se fossem

listados aqui se estenderiam por muitas páginas mediante as facilidades da utilização de

diferentes aplicativos no celular, fica nítida a possibilidade da sua utilização em sala de aula

objetivando Propor o uso da tecnologia dentro como um componente facilitador de ensino,

tornando os conteúdos mais fáceis de compreender, mostrando aos professores

possibilidades de que pode-se ter uma aula de qualidade, buscando observar as dificuldades

apresentadas na utilização do aparelho celular em sala de aula, instruindo os alunos a superá-

las, tornando as aulas mais dinâmicas e acessíveis para a formação de cidadãos crítico e

atuantes na sociedade.

Percebe-se que a disciplina de ciências é uma das mais fáceis de trabalhar com algo

alternativo, pelo fato de ser mais palpável. Tratar o ensino de ciências englobando a aula de

campo e inserindo as tecnologias móveis como facilitador, traz para os alunos um

entendimento mais esclarecido, pois quando se está em contato com o que se está estudando,

tudo fica mais interessante.

1 materiais e métodos

Para o desenvolvimento desse artigo foi feito um estudo de caso, buscando esclarecer,

questionar e identificar os desafios encontrados no uso do celular para o ensino de ciências,

acompanhado de uma leitura lenta e sistemática, experimento com alunos do bairro

anotação e fichamento de ideias, com embasamento teórico de educadores que defendem

esta linha de pesquisa, considerando a relação entre a atuação do professor, a tecnologia, o

ensino de ciências e o desenvolvimento da criança, numa abordagem qualitativa, tipo estudo

de caso.

Educação e compromisso social

230

A pesquisa qualitativa segundo Gil (1999) considera que há uma relação dinâmica entre

o mundo real e o sujeito, isto é, um vínculo indissociável entro o mundo objetivo e a

subjetividade do sujeito que não pode ser traduzida em números.

Já o estudo de caso é uma caracterização abrangente para designar uma diversidade de pesquisas que coletam e registram dados de um caso particular ou vários casos a fim de organizar um relatório ordenado e crítico de uma experiência, ou avalia-la analiticamente, objetivando tomar decisões a seu respeito ou propor uma ação transformadora (CHIZZOTTI. 1998, p.102).

Os sujeitos com os quais desenvolveremos a pesquisa são crianças do bairro da

Matinha, Cametá-Pará, alunos matriculados na rede pública de Ensino.

Após uma pesquisa teórica, em livros didáticos de todos os anos, chegou-se ao

entendimento que pode-se trabalhar o celular com muita facilidade com os alunos em geral,

pois pré-adolescentes e adolescentes perdem o interesse muito fácil além de que estão cada

vez mais conectados ao mundo tecnológico, com tudo isso percebe-se também como os

educadores não conseguem lidar mais com os mesmos e como não aceitam de forma alguma

o aparelho celular dentro da sala de aula por acreditarem que possa atrapalhar seu método

de ensino, além de ser proibido por lei.

Dessa forma então segue abaixo o método desenvolvido: o primeiro passo resumiu-se

em torno de uma aula teórica, com exposição de conteúdo e depois de algumas orientações

técnicas, partir para uma aula de campo usando o celular como ferramenta pedagógica.

Buscou-se fazer jogos, brincadeiras, quizes, dentre outros games educativos para que estes

alunos se sentissem à vontade com a natureza e com seus colegas, dessa forma se tornando

mais fácil, pois os mesmos já têm um vasto conhecimento em seu aparelho móvel, não

esquecendo de orientá-los para o uso consciente com o intuito de aprender.

Através das TIC’s pudemos trabalhar com as crianças a questão de uso da câmera do

celular como ferramenta para montagem de um pequeno documentário de autoria dos alunos

tendo como temática o meio ambiente e suas opiniões sobre o local ao qual estavam

inseridos. Posteriormente, através da interdisciplinaridade, ocorreu um jogo de problemas

matemáticos que envolviam assuntos que importavam ao ambiente e eles tiveram a

oportunidade de usar a calculadora do aparelho celular para facilitar.

Buscou-se inserir também a aula a passeio para que os alunos pudessem visualizar

melhor aquilo que lhe é repassado dentro de sala de aula, mostrando a eles de forma mais

Educação e compromisso social

231

papável, além de deixá-los em contato com a natureza, trabalhando a conscientização

ambiental de diversas formas.

Essa metodologia adotada facilitará a compreensão por parte do aluno, de que ele

próprio é parte integrante do ambiente e também agente ativo e passivo das transformações,

contribuindo para a formação de uma consciência conservacionista e ambiental, entendendo

que a ciências não se trata só aspectos naturais, mas também tecnológicos, científicos,

ambientais e corporais.

O professor precisa evoluir a cada turma que assume, buscando novos métodos de

atuar, em sala de aula, mudando, criando, inovando, abandonando o tradicional e abraçando

o novo, através de novas ações, atendendo as exigências da sua profissão. “Mudar é difícil,

mas é possível” (FREIRE, 1996, p.79).

Um dos métodos a ser utilizado é a aula de campo, como já foi citado, está se deu no

espaço do Seminário no município de Cametá, local este onde o verde predomina, além de

ser sereno e calmo, encontra-se muitas variedades de plantas e mudas que podem ser

estudadas, mostradas e tocadas pelos alunos no momento da aula a passeio. O conteúdo se

encaixou perfeitamente ao local e por estes motivos listados acima este foi escolhido como o

mais apropriado.

Como culminância da aula, pedimos para que as crianças fizessem um relatório de sua

opinião sobre a metodologia da aula aplicada e o que foi absorvido na mesma com o auxílio

do bloco de notas, que é um aplicativo existente desde aparelhos mais básicos até os mais

avançados.

2 Resultados e discussão

Trabalhar as tecnologias móveis como objeto de auxilio educacional foi um grande

desafio, no entanto trouxe resultados satisfatórios, pois o celular em sala de aula como um

instrumento facilitador, atrai a atenção dos alunos e torna a aula mais atrativa.

O desempenho do professor que se propõe a incorporar essas novas tecnologias

dentro de sala de aula torna-se interessante haja vista que ele tem a capacidade de usá-la ao

seu favor.

Segundo o depoimento dos alunos, após a aula, vimos os quão animados estes

estavam perante a novidade que fora implementada. Disseram que nunca tinham passado por

Educação e compromisso social

232

tal experiência e que este trazia uma vontade a mais de estudar, pelo simples fato de ser algo

novo, que chama a atenção.

Mesmo assumindo a dificuldade que é trabalhar as tecnologias móveis, buscou-se uma

forma simples e eficaz de fazê-la, abrangendo também a questão das aulas a passeio que

trazem uma maior compreensão teórico-prática, além de se tornar agradável, desenvolvendo

a sociabilidade entre os aluno-aluno e professor-aluno.

Após a aula, os alunos ficaram muito interessados naquilo que foi visto, a aula de

campo com uso do celular abriu suas visões, trazendo novos pensamentos e podendo resultar

em boas discussões. O estudo de ciências naturais dentro da natureza trouxe um

entendimento mais esclarecido de mundo, além da conscientização ambiental, ocasionando

assim na obtenção de valores que serão levados para uma boa convivência social.

É perfeitamente compreensível a resistência ao novo. Atendemos para a denominação “novo” – que não é tão nova assim. A tecnologia está presente e veio para ficar, portanto não temos como lutar contra ela. Então, como diz um velho e sábio ditado popular: “Se não pode com ele, junte-se a ele”. O receio de perder o controle, de certa forma, aterroriza qualquer professor que esteja passando por esse processo. Contudo, devemos nos desprender desse “medo” inicial e lançarmos mão dos recursos oferecidos pela contemporaneidade (MANFREDINI, 2014).

A aula teórico-prática ocasionou por fim em uma pequena produção textual, onde os

alunos deveriam contar sua experiência com o uso do celular durante uma aula, que segundo

eles, foi algo inovador e que trouxe muito mais conhecimento do que uma aula tradicional.

Conclusão

Este artigo apresentou algumas teorias sobre a utilização das TIM’s no sistema de

ensino fundamental para apoiar o professor em sala de aula, no processo de ensino-

aprendizagem. O uso de tais ferramentas garante sucesso e quando bem utilizadas, auxiliam

muito frente ao perfil dos novos estudantes.

A partir de todo o avanço do projeto, percebe-se o quanto podemos tornar as aulas,

que hoje são tão mecanizadas, em algo mais atrativo, que elevem o gosto em estudar, levando

os alunos a expressar-se com mais facilidade, abrindo espaço para discussões, além de que a

relação professor-aluno se torna bem mais leve, sem tanto autoritarismo e cobranças.

Dessa forma então, pesquisamos bastante para que o projeto atingisse resultados

esperados mediante a pessoas que relatam que o celular é visto apenas como maléfico

Educação e compromisso social

233

perante questões educacionais, no entanto a partir deste buscamos mostrar o quão as TIM’s

podem auxiliar no ensino-aprendizagem dos alunos, buscando alternativas interdisciplinares

para englobar diversas matérias por eles estudadas, no entanto focando mais especificamente

nas ciências naturais.

Partindo da perspectiva que o celular sendo um objeto de fácil acesso a informação, o

professor deve buscar formas de prender a atenção do aluno, já que estes se dispersam e

perdem o interesse com tanta facilidade.

Percebe-se também o quão importante é a capacitação profissional do professor para

que se torne esclarecido perante estas novas tecnologias que vêm surgindo, para que as use

ao seu favor, percebendo então que estas surgem para auxiliá-lo e não substituí-lo.

Cabe ao professor ser mediador do ensino, do aluno para a tecnologia, tendo o

conhecimento, planejamento e esclarecimento, pois é uma ferramenta que ao mesmo tempo

que pode auxiliar, pode ter o efeito contrário também se usado de forma incorreta e sem

orientação, por esse motivo o professor é uma ferramenta importante nesse processo

inovador em sala de aula.

Não se pode negar a existência de tais tecnologias e como estas estão presentes cada

vez mais no cotidiano das crianças e adolescentes de hoje em dia, então para facilitar o

trabalho do professor e o entendimento do aluno, traz-se uma proposta inovadora para o

ensino de ciências no ensino fundamental maior.

Concluímos então que, as tecnologias são de suma importância para o processo de

ensino, no entanto os protagonistas desta história são o professor e aluno, que determinarão

o sucesso do projeto o qual nos trouxe grandes aprendizados que serão levados para a vida,

esclarecimentos essenciais para nossa trajetória acadêmica.

Estar de frente com o aluno traz uma visão diferente daquilo que é visto somente na

teoria.

Referências

CHIZZOTTI, A. Pesquisa em ciências humanas e sociais. São Paulo: Cortez, 1995.

FREIRE. Paulo. Educação e Mudanças. 2ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 1997.

GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa Social. São Paulo: Atlas, 1999.

KLOCH, Hermínio. Informática Básica e Tecnologias na Educação. 2ª Ed. Indaial: ASSELVI, 2007.

Educação e compromisso social

234

MANFREDINI, Benedito Fulvio. Tecnologia na Escola: Abordagem Pedagógica e Abordagem técnica. 1ª ed. Cengage Learning, 2014.

MORAN, José Manuel; MASETTO, Marcos T.; BEHRENS, Marilda Aparecida. Novas tecnologias e mediação pedagógica. 21ª ed. rev. e atual. Campinas: Papirus, 2013. (Coleção Papirus Educação).

MOURA, A.; CARVALHO, A. Peddy-paper literário mediado por telemóvel. Educação, Formação & Tecnologias, v.2, N.2, p.22-40, nov. 2009b.

MOYSÉS, Maria Lúcia. O desafio de saber ensinar. Campinas: Papirus, 1994.

SACCOL. A, SCHLEMMER E.; BARBOSA J. M-learming e U-learming: novas perspectivas da Aprendizagem Móvel e Ubíqua. São Paulo: Pearson, 2011.

Educação e compromisso social

235

ENSINANDO LOCALIZAÇÃO DE PONTOS NO PLANO CARTESIANO PARA ALUNOS SURDOS

UTILIZANDO COMO RECURSO O MIRITI

Josiane Reis Silva100

Diemisson das Neves da Silva 101

Rosileide de Jesus de Souza Melo102

Introdução

Este trabalho consiste em uma discussão a respeito de novas práticas de ensino do

conteúdo de matemática para educandos surdos, devido as metodologias que são

comumente abordadas em sala de aula causarem frustrações em professores e alunos.

Também apresenta recurso didático que tem o objetivo de melhorar a compreensão destes

sobre o conteúdo de localização de pontos no plano cartesiano, facilitando assim, o processo

de inclusão dentro da escola.

Segundo a autora Gesser (2009), a deficiência auditiva se caracteriza pela perda parcial

ou total da habilidade de ouvir, algumas dessas pessoas que tentam se comunicar através da

oralidade, negando a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), tem sua comunicação prejudicada e

são chamadas pessoas com deficiência auditiva. A pessoa surda é aquela que aceita a Língua

Brasileira de Sinais como sua primeira língua, aceitando assim, sua condição de surdo, logo

não há mais a barreira da comunicação, pois estes simplesmente não ouvem, mas tem uma

língua própria assim como os ouvintes têm a sua. Logo, segundo a autora, surdez é uma

questão de identidade.

Desde o início da Idade Moderna, quando começou a se pensar na sua educação de

pessoas surdas, o objetivo principal era capacitá-los através de códigos, no entanto a surdez

não é impedimento para que esses alunos adquiram conhecimento escolar, o conteúdo pode

ser o mesmo da educação comum, só precisa de adaptações (SOARES, 2015). Tão importante

quanto o surdo está na escola é a garantia de que receberá uma educação adequada e de

100 Universidade Federal do Pará: E-mail: [email protected] 101 Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected] 102 Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

236

qualidade, pois o sujeito surdo sendo uma pessoa de direitos tem o direito de viver com

dignidade, ato possível quando se tem acesso à educação.

Para localizar um ponto em um plano, precisa-se de duas coordenadas, uma para a

horizontal e outra para a vertical. Na matemática, essa coordenada se refere ao Par Ordenado

(x,y) que segue uma ordem, sempre separados por vírgula e entre parênteses, o primeiro se

refere ao eixo horizontal e é chamado abscissas sendo representado pela letra x e o segundo,

eixo vertical, é chamado eixo das ordenadas e é representado pela letra y. Essas retas são

perpendiculares entre si e seu ponto de encontro é chamado de origem do sistema (0,0)

(ANDRINI; VASCONCELLOS, 2012).

Na matemática, localizar pontos em um plano a partir de um par ordenado, é uma

atividade simples, porém a maioria dos alunos sentem dificuldades, mesmo os ouvintes. Para

o aluno surdo, compreender sobre os eixos e como localizar esses pontos é uma tarefa muito

confusa que pode piorar se o professor não consegue deixar claro que esse processo de

localizar pontos segue uma ordem, mas não é complicado por sua capacidade de

compreender, mas sim pela falta de comunicação com o professor que na maioria das vezes

desconhece a LIBRAS e só a presença de interpretes não é o suficiente para resolver tal

dificuldade. É interessante que o professor domine a língua de sinais, porém se isso não

ocorre, basta ter um recurso didático adaptado, alguns sinais específicos e exercícios de

repetição para promover uma aprendizagem significativa na sala de aula.

Segundo Lima (2006), as escolas prezam por intérpretes de Libras para que possam

intermediar esse processo de ensino/aprendizagem, mas essa atitude isolada não é o

suficiente para que esse aprendizado de fato se concretize, é necessário que a escola se

prepare para tornar a inclusão uma realidade. Logo, há a necessidade de tratar do tema, e

nessa perspectiva criou-se o jogo que foi confeccionado com miriti (ou buriti), que é matéria

prima extraída de palmeira muito abundante da região amazônica, a escolha desse material

como base para a produção do recurso didático se deu pelo fato de ser uma prática

sustentável, visto que, se bem protegido da umidade pode durar bastante tempo e quando

descartado, decompõe-se rapidamente.

Educação e compromisso social

237

1 Materiais e métodos

Este estudo foi desenvolvido através de pesquisa bibliográfica e com pesquisa de

campo, onde foi feita uma aplicação de um jogo para o ensino de Localização de pontos no

plano cartesiano para alunos surdos.

Antes de tudo o professor deve planejar sua aula para que o recurso não seja apenas

um passatempo. Conceitos simples devem ser abordados durante o jogo, mas é muito

importante que o professor deixe o aluno familiarizado com alguns sinais como o sinal de

ponto, plano cartesiano e par ordenado. Importante demonstrar como o aluno deve

manusear o jogo, identificando os eixos, para isso pode começar pelo primeiro quadrante,

onde não há valores negativos, depois contemplar os outros quadrantes. Começa

exemplificando que tal ponto identificado tem uma relação com os eixos x e y, é importante

descrever isso para que o aluno observe a sequência de x (primeiro) e y (segundo), também

pode fazer o inverso dando um par ordenado e pedir para que identifique o ponto.

Interessante repeti esse exercício várias vezes para fixar as regras, dependendo da análise do

professor em relação a absorção de informações, já pode iniciar o jogo.

A imagem 2 representa o plano cartesiano cujo os quadrantes estão destacados pelas

cores: amarelo (primeiro quadrante), azul (segundo quadrante), vermelho (terceiro

quadrante) e verde (quarto quadrante), e suas coordenadas estão em LIBRAS de -9 até 9 em

ambos os eixos.

Imagem 1 – Plano cartesiano com as coordenadas em LIBRAS. Fonte: Fonte própria.

Educação e compromisso social

238

O objetivo do jogo é ensinar de forma lúdica o conteúdo de localização de pontos no

plano cartesiano, para isso, será usado um tabuleiro feito de miriti que representa o plano

cartesiano e suas coordenadas em LIBRAS, mas para tornar a aula mais dinâmica cada ponto

terá uma surpresa que poderá ser: sinal de ganhar ou sinal de perder, ambos em libras, um

par ordenado ou um ponto.

Ganhar: ganha um ponto;

Perder: perde um ponto;

Par Ordenado: no local do ponto aparece uma coordenada que direcionará o

aluno jogador para outro ponto que deverá ser aberto, se acertar ganha ponto,

se errar não acontece nada, o professor deve ajudar a encontrar o ponto certo.

Caso já esteja à amostra segue o jogo normalmente.

Ponto: o aluno pode tirar um ponto que terá uma letra, se caracteriza um

ponto, precisa sortear um par ordenado que estará a parte em um papel,

entrega ao professor, sem olhar, este, identificará o ponto de acordo com o par

ordenado sorteado pedindo ao aluno que identifique as coordenadas

corretamente, se acertar ganha ponto, se errar não acontece nada, apenas o

professor deve ajudar a identificar a coordenada (não precisa retirar a peça).

1.1 Regras do jogo para a sala de recurso

Dependendo do número de pessoas que estiveram apitas a jogar, inicia o jogo (no

mínimo duas e no máximo cinco para que não demore tanto as rodadas O primeiro

participante deverá fazer o sinal referente as coordenadas do ponto escolhido, se não souber,

contará com o auxílio do professor, em seguida terá que abrir o ponto referente a coordenada

sinalizada e assim sucessivamente todos os outros até completar a rodada, o professor deve

anotar quando o aluno jogador ganhar ou perder pontos. Ganha o jogo aquele que somar mais

pontos exceto os sinais de perder que serão subtraídos dessa soma (sinal de ganhar + par

ordenado + ponto – sinal de perder). O professor pode pedir que anotem as coordenadas

escolhidas, para observar se estão conseguindo assimilar o conteúdo.

2 Resultados e discussão

O recurso foi aplicado no espaço da Universidade Federal do Pará- Abaetetuba, com

um rapaz identificado como Jonas (nome fictício) que tem o ensino médio completo.

Educação e compromisso social

239

Inicialmente foi explicado a ele que seria feita aplicação de um recurso didático voltado a

matemática, ele se mostrou bastante curioso quando viu o tabuleiro de miriti. No primeiro

momento foi feito a datilologia e o sinal de plano cartesiano, identificação dos eixos x

(abscissas) e y (ordenadas), em seguida foi destacado um ponto no primeiro quadrante e

foram feitas observações a respeito, por exemplo: o número correspondente em x e em y ,

depois foram alternando-se os pontos para que ele assimilasse o conteúdo, então começou a

ser anotado à parte o par ordenado correspondente ao ponto, em certo momento foi ele

quem passou a fazer as anotações do par ordenado e assim fez para os demais quadrantes.

Quando a coordenada apresentava valores negativos ele sentia dificuldade em

escrever, não colocava o menos antes dos números e eram feitas observações, ele fazia

novamente e conseguia descrever. Quando percebeu-se que ele tivera uma boa assimilação,

foram dados pares ordenado do qual deveria localizar o ponto referente no plano cartesiano,

mostrou certa habilidade, mas quando envolvia valores negativos sentia um pouco de

dificuldade, sinalizava os números e não fazia o sinal de menos, havia intervenção por parte

dos aplicadores, ele não se mostrava chateado por isso, pedia desculpas e fazia corretamente.

Então iniciou-se o jogo com três participantes, somente um era surdo, o Jonas, cada

um escolhia um par ordenado, sinalizava e em seguida retirava o ponto, assim

sucessivamente. A princípio o Jonas apontava o número no eixo e na maioria das vezes

começava no y e depois no x, então foi necessário reexplicar sobre a ordem das coordenadas

e que deveria fazer o sinal para depois olhar a surpresa no ponto, o fato de apontar nos eixos,

por mais que fosse na ordem correta, não permitia ter uma boa análise, pois ficava subtendido

se não estava escolhendo as coordenadas aleatoriamente, sem analisar o ponto que queria.

Imagem 2 - Recurso sendo aplicado com aluno surdo. Fonte: Própria.

Educação e compromisso social

240

Quase no final, ele escolheu um ponto que tinha um par ordenado como surpresa e

sem interferência alguma conseguiu identificar o ponto, seguindo as regras novamente tirou

um par ordenado que o levou para outro ponto e fez corretamente, aí tirou um sinal de perder

e lamentou, mas continuava entusiasmado.

Conclusão

O presente trabalho alcançou os objetivos principais, como: ensinar localização de

pontos no plano cartesiano, ao final o Jonas escolheu uma sequência de par ordenado e

conseguiu identificar os pontos corretamente; identificou as coordenadas a partir do ponto,

no entanto toda vez que envolvia valores negativos tinha dificuldades em sinalizar e escrever,

às vexes optava por apontar nos eixos, mas recebia orientação dos aplicadores e fazia os

sinais. Ao final falou da importância do material, havia gostado muito e que deveria ser levado

ao conhecimento de outros professores para que usassem com seus alunos.

Com o recurso adaptado verificou-se um bom estímulo por parte do aluno, de forma a

se sentir desafiado a seguir jogando, mesmo que tenha sido corrigido várias vezes em

momento algum demonstrou cansaço, ou desinteresse, do início ao fim da aplicação estava

muito atento. Fica claro o quanto o recurso foi importante e que essa prática de ensino dos

conteúdos de matemática tende a tornar o ensino mais prazeroso, fazendo com que alunos e

professores se sintam estimulados.

Referências

ANDRINI, Álvaro; VASCONCELLOS, Maria José. Praticando matemática. Coletânea 5a, 6ª, 7a e 8a séries. v. 2, São Paulo: Editora do Brasil S/A, 2012.

GESSER, Audrei. Libras? que língua é essa? crenças e preconceitos em torno da língua de sinais e da realidade surda. São Paulo: Parábola Ed., 2009.

LIMA, Priscila Augusta. Educação inclusiva e igualdade social. São Paulo: Avercamp, 2006.

SOARES, Maria Aparecida Leite. A educação do surdo no Brasil. São Paulo: Autores Associados (Editora Autores Associados LTDA), 2015.

Educação e compromisso social

241

A UTILIZAÇÃO DE JOGOS MATEMÁTICOS EM CLASSE MULTISSERIADA

Eria Silva Matias103

Juliete Dias Souza104

Ivanete Maria Barroso Moreira105

Introdução

O trabalho teve como intervenção pedagógica jogos em matemática desenvolvidos em

uma escola do campo, modalidade ensino infantil e fundamental, com uma turma

multisseriada do 1º e 2º ano do município de Abaetetuba. Os jogos foram desenvolvidos no

segundo semestre do ano eletivo de 2018.

As situações criadas pelo adulto através dos jogos possibilitam a compreensão do

conhecimento de forma mais descontraída, sem a pressão de uma sala de aula, aflorando o

momento real de seu intelecto, de modo que é possível perceber um aprimoramento da

capacidade cognitiva dos sujeitos. Como indica Kishimoto:

Quando as situações lúdicas são intencionalmente criadas pelo adulto com vistas a estimular certos tipos de aprendizagem, surge a dimensão educativa. Desde que mantidas as condições para a expressão do jogo, ou seja, a ação intencional da criança para brincar, o educador está potencializando as situações de aprendizagem. Utilizar o jogo na educação infantil significa transportar para o campo do ensino-aprendizagem condições para maximizar a construção do conhecimento, introduzindo as propriedades do lúdico, do prazer, da capacidade de iniciação e ação educativa e motivadora (KISHIMOTO, 2003, p. 36-37).

Assim, um dos pontos principais do jogo é a potencialização do processo de ensino

aprendizagem, ou seja, justamente a abertura e flexibilização durante a prática pedagógica,

está ligada a mediação a partir do jogo, ação que deixa os alunos mais à vontade para se

expressarem.

Percebe-se a dificuldade de metodologias didáticas em classes que apresentam alunos

com nível de escolaridade opostas. Esta é uma realidade que caracteriza grande parte das

103 Universidade do Estado do Pará/UEPA. E-mail: [email protected] 104 Universidade do Estado do Pará/UEPA. E-mail: [email protected] 105 Universidade do Estado do Pará/UEPA. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

242

escolas do campo, sabendo que as salas de aula possuem, em uma maioria, turmas

multisseriada. Acerca disto, Hage esboça que:

Os professores enfrentam dificuldades em realizar o planejamento nas escolas multisseriada, porque trabalham com muitas séries ao mesmo tempo, envolvendo estudantes de diversas faixas etárias, interesses e níveis de aprendizagem. A alternativa mais utilizada para solucionar o problema e viabilizar o planejamento numa situação dessa natureza tem sido seguir as indicações do livro didático, sem, contudo, atentar com clareza para as implicações curriculares resultantes dessa atitude, uma vez que esses materiais didáticos impõem a definição de um currículo deslocado da realidade e da cultura das populações do campo da região (HAGE, 2006 p.309).

Neste viés, essas dificuldades inviabilizam um ensino de qualidade, levando a

precarização da educação quando esses fatores não possibilitam desenvolver alunos com

senso crítico.

Na prática proposta pela pesquisa, as atividades direcionadas ao aprendizado da

adição ou subtração, noção de quantidade, reconhecimento dos numerais e até mesmo

contribuir para desenvolver a concentração e a coordenação motora. É importante destacar

que todos participaram das atividades, compreendendo que uns se destacam mais e outros

menos de acordo cm suas capacidades cognitivas.

A confecção dos jogos incluiu um baixo custo financeiro, por compor alguns materiais

sólidos, a exemplo do boliche que leva latas de refrigerante que são retiradas do meio

ambiente para se transformar em um elemento que abri espaço para aprendizado prazeroso,

podendo eles mesmos construírem o próprio boliche.

1 Materiais e métodos

O estudo teve como base a pesquisa-ação, pois obtêm bases empíricas e o envolvimento

dos interventores e sujeitos no desenvolvimento dos jogos. De acordo com Thiollent

[...]...um tipo de pesquisa com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo (THIOLLENT, 2008, p. 16).

Para a análise dos dados, procede-se do método histórico dialético, porque busca a

compreensão dos dados a partir das raízes epistemológicas. Pires (1997), caracteriza o mesmo

da seguinte maneira:

Educação e compromisso social

243

O método materialista histórico-dialético caracteriza-se pelo movimento do pensamento através da materialidade histórica da vida dos homens em sociedade, isto é, trata-se de descobrir (pelo movimento do pensamento) as leis fundamentais que definem a forma organizativa dos homens em sociedade através da história. Este instrumento de reflexão teórico-prática pode estar colocado para que a realidade educacional aparente seja, pelos educadores, superada, buscando-se então a realidade educacional concreta, pensada, compreendida em seus mais diversos e contraditórios aspectos (PIRES, 1997, p. 1).

Esse tipo de pesquisa permite tecer ume visão mais real do processo de ensinar e

aprender, revelando as dificuldades da práxis pedagógica, evidenciando a possibilidade de

inserção do letramento matemático, através de uma ação mais direta com os sujeitos.

1.1 Desenvolvimento

A intervenção com jogos matemáticos se deu em dois momentos que equivalem a dois

dias com os alunos de classe multisseriada do ensino fundamental matriculados na Escola de

Ensino Infantil e Fundamental Nossa Senhora Auxiliadora. Para a coleta de dados foi

necessária entrevista informal com a professora da turma; além de registros fotográficos,

filmagens e anotações.

No primeiro momento, houve uma roda de conversa com os alunos da turma a respeito

da matemática no nosso cotidiano. Logo em seguida, foram iniciados os jogos; “Tapa certo’’

(jogo adaptado para matemática), o “jogo do Boliche’’, “Dominó da Adição e da Subtração’’.

Desta fase, é possível expor a desenvoltura de alunos sobre o assunto, sabendo que a

finalidade desta fase consistia em favorecer o contexto social com o conteúdo de forma

dinâmica e estimulativa. O destaque foi, contudo, a consciência ambiental, um dos maiores

focos deste estudo.

No segundo momento, juntos relembramos do encontro passado, após isso, aplicaram-

se os jogos; “Arvore da adição”, “Arvore do contar’ ’e “pescaria das formas geométricas’’. De

modo geral, a cada passo dos jogos executados foram realizadas avaliações dos avanços dos

alunos sobre os temas de cada jogo, o que contribuiu para as etapas seguintes, quando os

educandos passaram a formar conceitos básicos sobre os campos da matemática. De modo

explanatório cada jogo tem uma característica, atendendo as finalidades de suas propostas.

Dos atributos de cada jogo, sempre há a potencialização sobre os conceitos mais importantes

da matemática. Por isso, em sua função, todos elevam o grau de entendimento dos números

e suas dentro do contexto social dos sujeitos. Dos Jogos das práticas destacam-se:

Educação e compromisso social

244

Jogo tapa certo

Objetivo: É fazer com que os alunos reconheçam os numerais que vão de 1 a 26. O jogo

é jogado por dois participantes, o primeiro a iniciar é decidido entre os participantes, ganha

aquele que possuir ao termino da jogada mais cartas. Os materiais usados para a confecção

do jogo Tapa Certo, são dois palitos de churrasco, papelão, E.V.A e cola. O jogo possibilita

desenvolver a percepção visual, concentração, noção de quantidades, trabalhada as cores e a

socialização entre colegas da turma.

Arvore do contar

Objetivo: tem como intuito fazer com que os alunos desenvolvam a capacidade das

noções de quantidades. O jogo é jogado por três pessoas que iram decidir quem inicia o jogo,

o mesmo funciona com três arvores de E.V.A que contem 12 pontinhos que serão preenchidos

com frutinhas no caso serão as tampas de garrafas petes, contém um dado com seis faces que

determinará as quantidades das frutinhas que serão colocadas na arvore, ganha o jogo aquele

que preencher primeiro a arvore. Os materiais usados são o papelão, E.V.A, tampa de garrafa,

um dado de papel e cola. O jogo desenvolve a concentração, reconhecimento dos numerais,

noção de quantidade, trabalha as cores e a socialização entre colegas.

Pescaria das formas geométricas planas

Objetivo: fazer com que os alunos identifiquem as formas geométricas planas e

reconheçam os mesmos no dia a dia. O jogo funciona da seguinte forma a classe é dividida em

duas equipes que iniciaram juntos, cada participante de ambas as equipes irá pescar um peixe

e terá que responder em voz alta qual é a forma geométrica plana que está no peixe se ele

não conseguir responder pode pedir ajuda para a sua respectiva equipe e ao responder o

mesmo terá a chance de colocar uma figura no desenho (palhaço e casa) até completa-la

perante a cada jogada dos participantes. Vence a equipe que pescar todos os peixes e

consequentemente completar as figuras. Os materiais utilizados foram o papelão, 2 varas de

pescar, E.V.As coloridos e cola. O jogo desenvolve a oralidade, coordenação motora grossa,

calma, socialização, trabalha as cores e as formas geométricas no cotidiano.

Boliche

Educação e compromisso social

245

Objetivo: é desenvolver o cálculo mental por meio da adição e subtração presentes no

jogo. O mesmo é composto por latinhas de refrigerantes, uma bola para acertar o alvo e

também um quadro de papelão com as informações que relacionam as cores dos boliches

com o seu respectivo valor, terão que fazer as operações matemáticas dos quais foram

derrubados o boliche. O jogo tem o mesmo caráter do original modificando o seu objetivo, ele

é jogado individualmente, ou seja, cada um por uma vez, se no final da jogada um jogador

realizou as operações matemáticas corretamente vence. Os materiais usados para o referido

jogo foram; latas de refrigerante, E.V.As coloridos, papel A4, bola, apelão e caneta

permanente. O jogo desenvolve outras habilidades como a socialização, raciocínio logico,

coordenação motora grossa e cores.

Dominó da adição e subtração

Objetivo: possibilitar o desenvolvimento de competência para realizar a adição e

subtração. O jogo possui apenas cartas feitas de E.V.A branco escritos com caneta a

numeração com valores e as operações de adição e subtração. O jogo é jogado por dois

participantes. Os materiais utilizados foram E.V.A e caneta permanente. O jogo desenvolve a

socialização, raciocínio logico e percepção.

Jogo da arvore da adição

Objetivo: é o aprendizado da adição. O jogo é composto de uma arvore de E.V.A que

tem em seu centro dois espaços para colocar os dados, há também no centro o sinal da adição

e da igualdade. Já no tronco da arvore há uma fita com os possíveis resultados e na copa da

mesma coloca-se as bolinhas de papel que o ajudaram a chegar no resultado mediante a

contagem. O jogo é jogado individualmente, a criança lança dois dados a as faces que caírem

colocará nos dois espaços, nesse momento utiliza-se as bolinhas de papel que sinalizem as

faces dos dados. A criança fará a adição e encontrará o resultado na fita. Os materiais

utilizados foram E.V.A verde e marrom, dados, papel crepom, papel cartão e cola. O jogo

desenvolve o cálculo matemático e a percepção.

Tapete matemático

Objetivo: é realizar o cálculo mental para avançar nas casas do jogo. Ele é composto

por um metro e meio de TNT na cor marrom, nele estão colados números de um (1) a cinco

(5), há também um dado com numerais em suas faces. Os jogadores têm que lançarem o dado

ao alto e visualizar qual face vai indicar, a face correspondente determinará a soma com o

Educação e compromisso social

246

número do tapete, no caso da resposta correta ele avança caso contrário permanece na

mesma casa, dos quatros jogadores o qual avançar todas as casas vence. Os materiais

utilizados foram T.N.T, papelão, E.V.A e cola. Este jogo desenvolve a socialização, raciocínio

logico, cores e coordenação motora grossa.

2 Resultados e discussão

Observou-se que a inserção de jogos matemáticos em classes multisseriadas

possibilitou o ensino e aprendizagem dos conteúdos e conceitos matemáticos, levando em

consideração a participação dos educandos. Essa prática metodologia torna significativo o

processo de ensino que respeita as especificidades dos alunos, compreendendo o contexto

cultural e social no qual estão inseridos. De certo modo, “[...] passam a compreender e a

utilizar convenções e regras que serão empregadas no processo de ensino e aprendizagem.

Essa compreensão favorece sua integração num mundo social’’ (BRASIL, 1997, p.35).

Assim, o jogo traz aspectos muitos positivos para os educandos, o que potencializa o

aprendizado e além disso:

O jogo favorece o aprendizado pelo erro e estimula a exploração e a solução de problemas. O jogo, pode ser livre de pressões e avaliações, cria um clima adequado para investigar e ir a busca de soluções. O benefício do jogo está nessa possibilidade de estimular a exploração em busca de respostas, em não constranger quando se erra (ALAIN, 1957 apud KISHIMOTO, 1998, p. 21).

Perante isso, os conteúdos aplicados em sala de aula devem estar relacionados a

realidade dos alunos, pois os mesmos têm muito a ensinar com os seus conhecimentos de

mundo, a entender que os saberes que possuem podem ser estimulados, o que é muito

importante para o processo de ensino e aprendizagem.

Para isso afirma D’Ambrósio:

O cotidiano está impregnado dos saberes e fazeres próprios da cultura. A todo instante, os indivíduos estão comparando, classificando, quantificando, medindo, explicando, generalizando, inferindo e, de algum modo, avaliando, usando os instrumentos materiais e intelectuais que são próprios a sua cultura (D’ AMBRÓSIO, 2005, p.22).

Com isso, proporcionamos a Educação ambiental através dos jogos matemáticos que

possuem alguns materiais reutilizáveis, sendo assim, a intervenção justifica-se por permitir

trabalhar conceitos sem precisar se fechar a uma disciplina. Com efeito, as Diretrizes

Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental no capitulo segundo referente aos

Educação e compromisso social

247

objetivos da educação ambiental trata no artigo 13 do inciso IV no qual traz a menção de

“incentivar a participação individual e coletiva, permanente e responsável, na preservação do

equilíbrio do meio ambiente, entendendo-se a defesa da qualidade ambiental como um valor

inseparável do exercício da cidadania”. Com base no que dispõem a lei n. 9.795, de 1999, são

também os objetivos da educação ambiental a serem concretizados conforme cada fase,

etapa, modalidade e nível de ensino.

Conclusão

A Intervenção por meio dos jogos foi uma ação desenvolvida para viabilizar o ensino de

conteúdos e conceitos matemáticos. Através do jogo, se trabalhou a Educação Ambiental

como tema transversal, como se prever na lei 9.795 de 1999, possibilitando a conscientização

ambiental na escola de localização campesina.

O objetivo apresentado foi alcançado através da intervenção, visto que, possibilitou a

inserção de práticas pedagógicas que tem o lúdico como meio importante para valorizar o

ensino desprendendo de práticas tradicionais. Durante a realização das atividades, houve um

avanço considerável sobre a postura dos alunos diante da matemática. Dos assuntos tema do

trabalho frente aos jogos, ao alunos obtiveram um aprimoramento de aproximadamente 70%

sobre a formação de conceitos dos campos da matemática, elemento primordial que

alimentar a relevância e importância desta proposta.

Logo, todo o jogo simbólico criado possibilita a estimulação ao estudo e,

consequentemente, sua importância durante a vida. O brincar direcionado também pode

fazer parte da aula e permiti pensar que na escola a educação como todo é empolgante, assim

como os jogos.

Os jogos aqui propostos são uma ferramenta para auxiliar os professores nas aulas de

matemática, podendo ser construídos juntos com as crianças, permitindo um aprendizado

mais significativo para as mesmas. Valorizando as crianças através da participação em

conjunto, essa metodologia possibilita aspectos emocionais importantes para o processo de

ensino e aprendizagem.

Referências

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Educação e compromisso social

248

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<lhttps://www.google.com.br/search?q=DIRETRIZES+CURRICULARES+NACIONAIS+PARA+A+

EDUCA%C3%87%C3%83O+AMBIENTAL>. Acesso em: março.2019.

BRASIL. Lei n° 9.795, de 27 de abril de 1999. Dispõem sobre a educação ambiental, institui a

Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras providencias. Disponível em

:<http:/www.planalto.gov.br/ccivil>. Acesso em: maio/2019.

Educação e compromisso social

249

A EXPERIMENTAÇÃO COMO FERRAMENTA FACILITADORA NO ENSINO DE ELETROQUÍMICA

Kelma da Conceição Bitencourt 106

Larissa dos Santos Brito107

Nara Lilian Pires e Pires108

Marcos Antônio Barros dos Santos109

Introdução

O contexto em que o ensino de química está inserido baseia-se em suma na abstração,

à medida que tal área do conhecimento já traz consigo essa ideia. Porém, um dos fatores que

favorece a continuidade dessa prática é a não utilização de métodos que tem por finalidade

minimizar essa problemática. Visto que o ensino é lecionado na sua maioria, somente na

teoria, sem trazer uma abordagem com o cotidiano do aluno e, dessa forma,

consequentemente, contribuindo para que a aula se torne chata, monótona, e não eficaz para

o educando.

Perante isso, Leite e Radetzke (2016, p.3) argumentam que “o contexto assume papel

importante para o ensinar e o aprender em sala de aula, pois reforça o estabelecimento das

relações sociais.”.

Com isso, uma proposta para auxiliar em tal dificuldade seria o emprego da

experimentação no ensino. À medida que ela se apresenta como uma ferramenta eficaz, que

pode melhorar o entendimento dos conceitos, uma vez que ilustra o que a teoria por sua vez

não consegue. Ao utilizá-la após ensinar os conceitos, o professor pode executá-la a fim de

contribuir na fixação do assunto pelo aluno.

A experimentação permite que o docente faça uma associação entre os conteúdos que

devem ser ensinados, dentro da realidade de vida do aluno, o que faz com que a aula fique

contextualizada, à medida que “não é o problema proposto pelo livro ou a questão da lista de

106 Universidade do Estado do Pará. E-mail: [email protected] 107 Universidade do Estado do Pará. E-mail: [email protected] 108 Universidade do Estado do Pará. E-mail: [email protected] 109 Universidade do Estado do Pará. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

250

exercício, mas os problemas e as explicações construídas pelos atores do aprender diante de

situações concretas” (GUIMARÃES, 2009, p.199).

É sabido que diversos docentes não utilizam tal método, pois em suma alegam não

apresentar tempo para desenvolver tais atividades, não ter um bom aparato para desenvolvê-

las, tal como um bom laboratório, vidrarias, entre outros argumentos, e, além disso, até

mesmo a sua formação não ter dado ênfase na experimentação, e sendo assim, apresentam

pouco conhecimento ou não estão em aprendizagem contínua sobre essas atividades para o

ensino.

O uso de atividades experimentais pode propiciar aos alunos um envolvimento maior

no processo de ensino e aprendizagem, levando-o a construção de seu conhecimento de

maneira efetiva (GIORDAN, 2003).

O objetivo principal deste trabalho consiste na implementação de atividades

experimentais envolvendo o assunto eletroquímica, além de incentivar uma aprendizagem

dinâmica e contextualizada, e despertar o interesse dos discentes sobre assuntos de

eletroquímica.

1 Materiais e métodos

A metodologia desenvolvida neste trabalho consiste de uma pesquisa qualitativa do

tipo exploratória. Para Guerra (2014), este tipo de estudo busca entender o fenômeno com o

inserido no processo, sendo assim, capaz de observar as expressões dos alunos perante o

exposto, de forma mais detalhada, verificando seus entusiasmos, ou apatia com o tema de

estudo, e suas participações dentro do que estava sendo abordado.

Na abordagem qualitativa, o cientista objetiva aprofundar-se na compreensão dos fenômenos que estuda – ações dos indivíduos, grupos ou organizações em seu ambiente ou contexto social –, interpretando-os segundo a perspectiva dos próprios sujeitos que participam da situação, sem se preocupar com representatividade numérica, generalizações estatísticas e relações lineares de causa e efeito (GUERRA, 2014, p.11).

A pesquisa foi realizada durante as atividades do Programa Residência

Pedagógica/UEPA/CAPES, subprojeto Química, Campus Barcarena, que tem por objetivo

induzir o aperfeiçoamento da formação prática nos cursos de licenciatura, promovendo a

Educação e compromisso social

251

imersão do licenciando na escola de educação básica, a partir da segunda metade de seu

curso. O estudo foi desenvolvido com aproximadamente 150 alunos da Escola Estadual de

Ensino Médio Cristo Trabalhador, no município de Abaetetuba-PA, em abril/2019. Foram

elaborados dois experimentos para seis turmas de alunos pertencentes à terceira série do

ensino médio.

As atividades experimentais se deram através de uma interação direta entre os

pesquisadores e alunos, tratando-se de algumas atividades práticas sobre eletroquímica. O

primeiro experimento (célula eletroquímica) tem como objetivo demonstrar na prática a

condutividade elétrica entre duas substâncias, instigando o aluno a perceber os processos de

redução e oxidação, mediante a passagem de corrente elétrica constatada pelo voltímetro,

pelo funcionamento da calculadora e também pelos produtos da reação (escurecimento ou

brilho dos metais envolvidos neste processo). Os materiais utilizados foram placas de cobre,

alumínio, zinco; moedas de 5 centavos, clipes de papel, garras jacarés, fios de cobre, uma

batata e uma calculadora.

Para o segundo experimento (célula eletrolítica) utilizou-se, um pote de vidro, duas

barras de metais retiradas de uma impressora, 30 cm de mangueira de borracha, água com

um pouco de soda cáustica, um Becker médio, água contendo corante, e uma fonte de

energia. Objetivou-se com essa atividade, a observação através da passagem da corrente

elétrica, os processos reacionais, como a formação dos gases hidrogênio e oxigênio, além

disso, ressaltar, sobretudo, a característica inflamável do gás hidrogênio.

Os experimentos foram executados no laboratório multidisciplinar da escola em

conjunto com os alunos da mesma. Inicialmente foram repassados alguns conceitos teóricos

relacionados ao assunto em questão (pilhas e eletrólise), para (subsidiar) guiar as atividades

experimentais.

2 Resultados e discussão

Ao executar a primeira atividade experimental, a qual tratou da elaboração de uma

pilha de batata pelos alunos com o auxílio dos pesquisadores, percebeu-se que eles estavam

bastante entusiasmados, curiosos e felizes, principalmente no que tange ao funcionamento

da calculadora, ao escurecimento ou brilho dos metais envolvidos neste processo como

Educação e compromisso social

252

produtos da reação, e também ao perceberem que o processo todo estudado na

eletroquímica era possível de se observar na prática em tal momento.

Notou-se que eles ficaram bastante atentos ao que estava sendo posto, e, ficaram

entusiasmados ao perceberem que esses processos, até então repassados teoricamente em

sala, seria agora reproduzidos por eles.

Nesse sentido, Souza (2013, p.10) argumenta que “com o uso de experimentos as aulas

podem tornar-se diferenciadas e atraentes, dando a elas um processo mais dinâmico e

prazeroso”.

Em relação ao segundo experimento, o qual tratou da demonstração da eletrólise

pelos pesquisadores aos educandos, foi notória a interação destes com o executado, e

percebeu-se que eles conseguiram visualizar as diferenças básicas de uma célula

eletroquímica (pilha), em relação a uma célula eletrolítica (eletrólise), à medida que nesta

atividade foi utilizado como base uma fonte externa de energia elétrica, o que aguçou a

curiosidade dos alunos.

Como o método utilizado para avaliar os resultados foi o qualitativo, buscamos atentar

o máximo possível para a reação de cada aluno, tendo o cuidado de anotar e registrar cada

manifestação obtida, no momento da realização das atividades.

Nesse tipo de método, o objetivo está em analisar quais são as possíveis causas do fato

notado pelo pesquisador, quais são as relações que determinam o comportamento de um

determinado grupo ou sujeito. Apresentando um caráter exploratório [...] (ROSA, 2013, p. 41).

Observou-se que os alguns alunos, à medida que iam realizando os experimentos ainda

tinham dúvidas a respeito do assunto, e dificuldades de relacionar a pilha vista em sala,

simplesmente na teoria, com aquela que agora ele próprio estava manipulando, o que foi um

pequeno impasse, porém aos poucos, esse empecilho foi quebrado, e a concepção de que a

química está presente em tudo, em todos os lugares, e que vai muito além de contas e

equações matemáticas, foi repassada.

Corroborando com Reginaldo, Shei e Güllich (2012) que afirmam que a realização de

experimentos, em ciências, representa uma excelente ferramenta para que o aluno faça a

experimentação do conteúdo e possa estabelecer a dinâmica e indissociável relação entre

teoria e prática.

Educação e compromisso social

253

Observou-se também que os alunos ficaram empolgados ao saber que estava dando

certo. A figura abaixo apresenta o momento em que as atividades experimentais estavam

sendo executadas, demonstrando a atenção que os alunos estavam dando ao exposto.

Neste momento aproveitamos para questioná-los sobre o que eles haviam observado

e que relação eles mesmos poderiam fazer com o estudado em sala. A maioria disse que ainda

não haviam parado para pensar que aquela pilha estudada em sala, é simplesmente a mesma

utilizada para ligar, como no exemplo a calculadora, o controle da televisão, entre outros. Os

alunos disseram que achavam que era apenas mais um assunto de química, e não conseguiam

fazer essa relação com o cotidiano, até porque a forma como este era repassado, tornara-se

totalmente desligado de sua realidade.

Concordamos com Leite e Radetzke (2016, p.3) ao afirmarem que “o professor precisa

compreender que, em sala de aula, o social deve prevalecer, pois aprendemos com os outros,

por meio da mediação de instrumentos e signos.”.

Em relação ao outro experimento relacionado à eletrólise, os alunos afirmaram que

apesar do assunto ser meio difícil, uma vez que é o oposto do que eles tinham acabado de

aprender (as pilhas no caso), com a demonstração deste simples experimento, ficou mais fácil

fixar os conceitos e estabelecer as principais diferenças entre os dois processos, tais como, a

utilização de uma fonte de energia elétrica, caracterizando um processo não espontâneo,

além disso, a inversão dos polos, em que o positivo seria o ânodo e o negativo, o cátodo.

Figura 1 – Momento da execução das experimentações no laboratório multidisciplinar da escola. Fonte: Os autores, 2019.

Educação e compromisso social

254

“Os experimentos entram como um recurso a mais, uma proposta interessante, algo

que agregará aos alunos novos conhecimentos, de forma dinâmica e prazerosa” (SOUZA,

2013, p.10).

Por fim, eles disseram que agora eles conseguiam perceber o verdadeiro sentido de

estudar a disciplina química, e alguns tinham vontade de fazer um curso superior nesta área.

Nesse sentido, “os alunos apropriam-se mais facilmente dos conteúdos estudados ao

tornarem-se participantes ativos de sua aprendizagem, protagonistas, ao invés de colocarem-

se em posição de receptores de informações [...]” (RIBEIRO; RAMOS, 2013, p. 7, 8).

Conclusão

Com o trabalho realizado, foi possível observar a grande importância que as aulas

experimentais têm dentro do processo de ensino aprendizagem na disciplina de química, uma

vez que tal método transforma as aulas em ambientes mais dinâmicos e divertidos de se

trabalhar, estimulando tantos os alunos, quanto os professores no processo de fixação dos

conhecimentos.

Com ele obtivemos resultados bastante satisfatórios, pois possibilitou que

atingíssemos nosso principal objetivo, que era fazer com que os alunos aprendessem os

assuntos, ou pelo menos os principais conceitos pertinentes à eletroquímica, tais como, pilhas

e eletrólise, de forma mais dinâmica, contextualizada e instigadora, buscando seu interesse

pela aula, e que ao final adquirissem um bom rendimento.

O ensino quando aliado à experimentação torna-se muito mais eficiente do que aquele

que é repassado apenas na teoria em sala, o que foi ratificado pela reação/motivação dos

alunos quando estes disseram compreender o assunto muito mais após a aplicação da

experimentação.

Por fim, desenvolver atividades se valendo de práticas experimentais faz com que

professores e alunos se tornem mais ativos e passem a interagir uns com os outros, além de

tornar as aulas mais dinâmicas e um momento do ensino mais prazeroso para ambos. Além

disso, a experimentação abre a mente tanto do educando como do educador, e é uma

metodologia muito eficaz para facilitar a compreensão dos assuntos.

Educação e compromisso social

255

Referências

GIORDAN, M. Experimentação por simulação. Textos LAPEQ, USP, São Paulo, n. 8, 2003. Disponível em: <http://www.lapeq.fe.usp.br >. Acesso em: 08/05/2019.

GUERRA, E.L.A. Manual de pesquisa qualitativa. Suporte ao trabalho de conclusão de curso (TCC). Belo Horizonte, 2014. Disponível em: < http://disciplinas.nucleoead.com.br>. Acesso em: 07/05/2019.

GUIMARÃES, C.C. Experimentação no Ensino de Química: Caminhos e Descaminhos Rumo à Aprendizagem Significativa. Química Nova na Escola. V. 31, N. 3, Agosto, 2009. Disponível em: < http://webeduc.mec.gov.br>. Acesso em: 09/05/2019.

LEITE, F.A; RADETZKE, F.S. Contextualização no Processo de Ensinar Ciências da Natureza: Reflexões de Professores. XVIII Encontro Nacional de Ensino de Química (XVIII ENEQ) Florianópolis, 2016. Disponível em: < http://www.eneq2016.ufsc.br>. Acesso em: 07/05/2019.

REGINALDO, C.C; SHEID, N.J; GULLICH, R. I.C. O ensino de ciências e a experimentação. Seminário de pesquisa em educação da região sul – IX ANPED SUL. p. 1-12, 2012. Disponível em: < http://www.ucs.br>. Acesso em: 08/05/2019.

RIBEIRO, M.E.M; RAMOS, M.G. O interesse dos alunos em aulas de Química no contexto de uma comunidade de prática de professores: um estudo de caso. Atas do IX Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências – IX ENPEC, São Paulo, 2013. Disponível em: < http://www.nutes.ufrj.br>. Acesso em 11/05/2019.

ROSA, P.R.S. Uma introdução à pesquisa qualitativa em ensino de ciências. Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Campo Grande, 2013. p. 1-172.

SOUZA, A.C. Experimentação no ensino de ciências: importância das aulas práticas no processo de ensino aprendizagem. Especialização em educação: métodos e técnicas de ensino. Medianeira, 2013. Disponível em: < http://repositorio.roca.utfpr.edu.br>. Acesso em: 08/05/2019.

Educação e compromisso social

256

PARTE 7. EDUCAÇÃO, RELAÇÕES RACIAIS, GÊNERO E SEXUALIDADE

Educação e compromisso social

257

EDUCAÇÃO PARA RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS; APLICABILIDADE DA LEI 10.639/2003 E 11.645/2008: FORMAÇÃO PARA PROFESSORES NA VILA DO CAETÉ E NA ESCOLA ESMERINA

BOU HABIB

Matheus Furtado Pinheiro 110

Deusa Maria Sousa111

Introdução

A grande perspectiva do projeto Educação para relações étnico-raciais; Aplicabilidade

da Lei 10.639/2003 e 11.645/2008 nas comunidades quilombolas de Abaetetuba, foi realizar

formação difundir conhecimento acerca das lutas contra o racismo, além de apresentar a

comunidade a História de negros e indígenas, bem como as suas contribuições nos meios

sociais, intelectuais e culturais, rompendo com a ideia de história única, eurocêntrica.

O projeto de extensão Educação para relações étnico-raciais; Aplicabilidade da Lei

10.639/2003 e 11.645/2008 nas comunidades quilombolas de Abaetetuba, realizou

formações para professores, alunos e gestores das escolas Esmerina Bou Habib, que fica

localizada na cidade de Abaetetuba, e na instituição de ensino Valdecir Santana, a qual

encontra-se na Rodovia Alça Viária Km 68, Vila Caeté. Assim, em cada um desses encontros

educativos, a equipe desse projeto, formada pela Orientadora, Professora Drª Deusa Maria

Sousa, pelo bolsista Matheus Furtado, e pelos bolsistas voluntários Jeremias Santos e

Lucenilda Passos, trabalhou no intuito das referidas, bem como a relevância delas para o

ensino e para a vida dos estudantes e docentes.

1 Materiais e Métodos: Esmerina Bou Habib

Na escola Esmerina Bou Habib, houve um contato prévio, da escola com o grupo

GEMORGA (Grupo de Estudos em História, Gênero, Movimentos Sociais e Religiosidade da

Amazônia) da UFPA Campus de Abaetetuba, para a realização de formação e suporte a Feira

da Consciência Negra que a escola organizou. Dessa forma, no mês de Novembro de 2018, a

110 Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected] 111 Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

258

equipe do projeto, formada na ocasião pelo bolsista Matheus Furtado, e os bolsistas

voluntários Jeremias Santos e Lucenilda Passos, realizaram o primeiro encontro com

estudantes e professores da instituição. Nesse sentido, foram trabalhados temas como A

história do Movimento Negro, as lutas sociais, o negro na literatura, os movimentos de

resistência e os aspectos que envolvem a Lei 10.639/2003, que torna obrigatório o ensino da

História e Cultura Africana e Afro-brasileira nas escolas.

Sendo assim, além de conseguirmos fazer uma formação sobre a temática africana e

afro-brasileira para cerca de 30 alunos e professores, também desenvolvemos a prática

daquilo que foi exposto teoricamente. Nesse sentido, em um momento posterior, a equipe do

projeto, dessa vez formada por Jeremias Santos e Lucenilda Passos, auxiliaram os grupos de

alunos a realizarem os trabalhos a serem apresentados na feira da Consciência Negra. O mais

importante, é que todo esse processo fez com que os estudantes criassem uma visão bem

diferente em relação ao continente africano e sua relação com o Brasil.

Além disso, em um período posterior ao evento, já em 2019, passamos o questionário

referente as Leis 10.639/2003 e 11.645/2008, para algumas das pessoas que estiveram

presentes na formação. Infelizmente, das 22 pessoas que estiveram na formação de

novembro de 2018, conseguimos com que apenas 9 respondessem as perguntas, com a adição

de mais 4 professores, que não estiveram no encontro formativo, mas que se despuseram a

preencher o questionário.

Escola Valdecir Santana

A respeito da formação na escola Valdecir Santana, a equipe do projeto, formada pela

Orientadora, Professora Drª Deusa Maria Sousa, pelo bolsista Matheus Furtado, e pelos

bolsistas voluntários Jeremias Santos e Lucenilda Passos, trabalhou a perspectiva da Lei

11.645/2008, que torna obrigatório o ensino da História e Cultura Africana, Afro-brasileira e

Indígena nas escolas, com as professoras do colégio. Sendo assim, trabalhamos com a História

do Movimento Negro, a questão da “Seleção Cultural Escolar” trabalhada por Forquin, os

principais aspectos da referida Lei, bem como sua relevância para o ensino, e relatos de

experiência. Ao falarmos do projeto, destacamos os exemplos que os professores podem usar

como estratégia de ensino, para se trabalhar as questões africanas e indígenas, tais como

Educação e compromisso social

259

danças, culinária local, hábitos do cotidiano das crianças. Ademais, aplicamos um questionário

com nove questões referentes aos conhecimentos prévios das professoras e funcionárias da

escola, além da moradora também, a respeito das leis em questão.

Nessa formação, também foi abordado a questão do currículo. Naquele contexto, se

trabalhou a prerrogativa do Currículo Formal e Real, dentro da perspectiva da “ Seleção

Cultural Escolar”, trabalhada por Forquin (1992). Nesse sentido, mesmo com a lei 10639 e a

11645 terem sido legitimadas em lei, existe um currículo formal, na qual normalmente elas

devem estar presentes, e para que este currículo chegue aos alunos, eles precisam passar pela

seleção dos conteúdos que os professores iram fazer para se trabalhar na escola,

caracterizando dessa forma, o currículo Real, ou seja aquele que será trabalhado por esses

profissionais, baseado na formação que eles possuem, a qual muitas vezes é deficitária em

relação a temática étnico racial.

2 Resultados e Discussão

As duas experiências formativas, tanto a realizada na escola Esmerina Bou Habib,

quanto a da instituição de ensino Valdecir Santana, se mostraram consideravelmente

pertinentes a formação educacional de estudantes e docentes, trabalhando sempre com uma

perspectiva de autoafirmação, igualdade racial, luta contra o racismo, e busca constante por

uma sociedade que valorize a sua cultura e de seus antepassados. É importante ressaltar

também, que nas duas formações trabalhamos com questionário referente ao conhecimento

dos indivíduos em relação as Leis 10.639/2003 e 11.645/2008.

Na escola Esmerina, além de conseguirmos fazer uma formação sobre a temática

africana e afro-brasileira para cerca de 30 alunos e professores, também desenvolvemos a

prática daquilo foi exposto teoricamente. Neste sentido, a feira da Consciência Negra

organizada pela Escola em parceria com o GEMORGA, apresentou ao público as produções

dos alunos, que foram devidamente orientados. Durante o evento, houveram apresentações

teatrais, amostra de imagens relativas a cultura africana e afro-brasileira, mapas das

comunidades quilombolas produzidos pelos educandos. O mais importante, é que todo esse

processo fez com que os estudantes criassem uma visão bem diferente em relação ao

continente africano e sua relação com o Brasil.

Educação e compromisso social

260

Ademais, em um período posterior ao evento, já em 2019, passamos o questionário

referente as Leis 10.639/2003 e 11.645/2008, para as pessoas que estiveram presentes na

formação. Infelizmente, das 22 pessoas que estiveram na formação de novembro de 2018,

conseguimos com que apenas 9 respondessem as perguntas, com a adição de mais 4

professores, que não estiveram no encontro formativo, mas que se despuseram a preencher

o questionário. Nesse contexto, foram feitas nove interrogativas, e dessas vamos destacar a

terceira, quarta e quinta perguntas, para termos uma dimensão de como está a atual realidade

do ensino de História e Cultura Afro-brasileira e indígena tanto na escola Esmerina, quanto na

cidade de Abaetetuba, já que os professores que participaram desse questionário também

trabalham em outras instituições de ensino do município de Abaetetuba.

A terceira pergunta indagava a respeito se houve ou não mudanças no currículo e

formação de professores, com a legitimação das leis 10.639/2003 e 11.645/2008. Ao analisar

as respostas, percebemos que 9 pessoas responderam que houve, mas ainda precisa

melhorar, 3 marcaram que não houve e uma pessoa disse que houveram mudanças. Portanto,

a maioria concordou que as mudanças estão ocorrendo, porém em um processo gradual.

Ademais, na quarta interrogativa perguntamos se haviam materiais no colégio, referentes a

temática africana e indígena. Nesse sentido, 10 responderam que não e 3 responderam que

sim, sendo que essas 3 pessoas eram alunas, o que nos faz refletir se elas tiveram esse acesso

por meio de pesquisas ou responderam baseado na formação da semana da consciência

negra. Por fim, a quinta interrogativa perguntava se as questões ligadas a raça e

pertencimento são aplicadas nas escolas do município de Abaetetuba. Os docentes e alunos

deveriam responder sim ou não, e se sim, citar alguma experiência. Assim sendo, 7

responderam que não e 6 responderam que sim, sendo que destes 6, a maioria relatou que

essa temática é sempre trabalhada em feiras anuais da Consciência Negra e algumas vezes na

sala de aula. Nesse contexto, percebemos que a temática em questão ainda precisa ser melhor

e mais trabalhada nas instituições de ensino, e não somente se resumir a um ou uma semana

do ano, já que se trata da cultura e história de vida de negros e indígenas, tão importantes

para a história do nosso país.

Em relação a experiência na escola Valdecir Santana, a formação procurou de forma

objetiva alertar os professores quanto a importância de se trabalhar as questões indígenas e

africanas nas escolas, bem como trouxe estímulos e exemplos do que se pode fazer para

Educação e compromisso social

261

aproximar as crianças e jovens a essa temática. Além disso tudo, os relatos de experiência que

pudemos ouvir durante a formação, foram muito significativos para entendermos também,

enquanto pesquisadores e como seres humanos, o quão importante é a aceitação de uma

cultura, a identificação com o passado, com uma tradição cultural e/ou multicultural. Nessas

memórias, as pessoas relembraram das dificuldades que enfrentavam quanto ao cabelo, a

vestimenta, ao modo de falar.

Em relação ao questionário, que passamos para as professoras nessa formação,

destacaremos novamente a terceira, quarta e quinta questões, para termos uma dimensão de

como está a atual realidade do ensino de História e Cultura Afro-brasileira e indígena nessa

escola quilombola. Assim sendo, Na terceira pergunta, indagamos a respeito da

implementação da Lei 10639/2003 e 11645/2008, se com elas houveram mudanças nos

currículos e formação de professores. Nesse sentido, 6 pessoas responderam que houve,

porém ainda há muito o que ser melhorado e uma disse que não houve. A quarta questão,

referia-se aos materiais educativos, que tratassem da temática africana, afro-brasileira e

indígena na escola Valdecir Santana, se foi entregue algum deles a essa instituição de ensino.

Nesse ponto, 6 pessoas marcaram que “não” e apenas uma disse que “sim”.

Na quinta pergunta, indagamos sobre a questão da raça e pertencimento, ou seja, se

esses temas são aplicados nas escolas, nas quais essas professoras trabalham, e se caso

respondessem “sim”, deveriam citar como acontece. Nesse aspecto, houveram respostas

diversificadas, sendo que das 7, uma não respondeu, disseram que “não” e as outras disseram

que “sim”. Dessas pessoas que disseram que “sim”, apenas 2 citaram que essas temáticas são

trabalhadas apenas em períodos comemorativos.

Considerações Finais

Baseado nas duas experiências formativas, na escola Esmerina e na instituição de

ensino quilombola Valdecir Santana, é perceptível que conseguimos construir conhecimento

e fomentar discussões e reflexões sobre da figura do negro e indígena na História do Pará e

do Brasil. Nesse sentido, os elementos culturais, bem como as inúmeras conquistas sociais e

intelectuais desses sujeitos históricos, permitiram com que os alunos, professores e gestores

Educação e compromisso social

262

dessas escolas, pudessem ter acesso a uma História que é deficitária nos livros didáticos e

pouco vista na educação básica.

Referências

FORQUIN, Jean-Claude. Saberes escolares, Imperativos didáticos e dinâmicas sociais. Teoria & Educação, 1992.

ABREU, Martha; MATTOS, Hebe. Em torno das Diretrizes curriculares nacionais para a educação das relações étnico raciais e para o ensino de história e Cultura afro-brasileira. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v.21, n. 41, janeiro-junho de 2008.

MOREIRA, Raimundo Nonato Pereira. História e Memória: algumas observações. Disponível: <www.fja.edu.br/proj_acad/praxis/praxis_02/documentos/ensaio_2.pdf>. Acesso: 26/03/2019.

Educação e compromisso social

263

DESCOLONIZAÇÃO DO CONHECIMENTO: MAS, AFINAL, PARA QUÊ?

Josimere Serrão Gonçalves112

Introdução

Qual conhecimento é considerado verdadeiro, legitimo e inquestionável? Quem são os

produtores destes conhecimentos? Porque os saberes de determinados povos são vistos com

desconfianças e não são considerados conhecimentos validos? O presente texto realizará um

diálogo acerca da colonialidade e seus artifícios de dominação inclusive do próprio

conhecimento, nos chamando para a reflexão: “mas afinal para que a descolonização do

conhecimento? Assim na primeira parte faço uma breve abordagem sobre o conceito de

colonialidade a partir da perspectiva saber/poder. No tópico seguinte discuto a respeito da

importância da descolonização do conhecimento para que outras epistemes possam ser

experimentadas e valorizadas.

1 A colonialidade do saber/poder

A colonialidade do poder pode ser compreendida como um domínio político, territorial

e de controle de matérias primas em torno do capital e mercado mundial. Assim:

Essa colonialidade do controle do trabalho determinou a distribuição geográfica de cada uma das formas integradas no capitalismo mundial. Em outras palavras, determinou a geografia social do capitalismo: o capital, na relação social de controle do trabalho assalariado, era o eixo em torno do qual se articulavam todas as demais formas de controle do trabalho, de seus recursos e de seus produtos. Isso o tornava dominante sobre todas elas e dava caráter capitalista ao conjunto de tal estrutura de controle do trabalho. Mas ao mesmo tempo, essa relação social específica foi geograficamente concentrada na Europa, sobretudo, e socialmente entre os europeus em todo o mundo do capitalismo. E nessa medida e dessa maneira, a Europa e o europeu se constituíram no centro do mundo capitalista (QUIJANO, 2005, p. 120).

A Europa neste contexto assumiu a posição central do mundo capitalista, na qual o

controle dos recursos, as formas de produção e as relações de trabalho tinham neste território

a referência de desenvolvimento. Os demais espaços, ora, continuavam na condição de

subalternos, considerados povos inferiores.

112 Secretaria Estadual de Educação/SEDUC/PA. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

264

Já a colonialidade do saber diz respeito à episteme, ao conhecimento, ou seja, a

imposição de saberes do ocidente, da Europa como universal e os demais saberes como

desqualificados, ilegítimos. É o que explica Lander (2005):

Uma forma de organização e de ser da sociedade transforma-se mediante este dispositivo colonizador do conhecimento na forma “normal” do ser humano e da sociedade. As outras formas de ser, as outras formas de organização da sociedade, as outras formas de conhecimento, são transformadas não só em diferentes, mas em carentes, arcaicas, primitivas, tradicionais, pré-modernas. São colocadas num momento anterior do desenvolvimento histórico da humanidade (Fabian, 1983), o que, no imaginário do progresso, enfatiza sua inferioridade. Existindo uma forma “natural” do ser da sociedade e do ser humano, as outras expressões culturais diferentes são vistas como essencial ou ontologicamente inferiores e, por isso, impossibilitadas de se superarem e de chegarem a ser modernas (devido principalmente à inferioridade racial) (LANDER, 2005, p.14).

Diante do exposto, é notório que o colonialismo estabeleceu um padrão de sociedade

e para atingir esta intencionalidade recorreu à diferença colonial. Assim, a partir do processo

de dominação, garantiu a hegemonia imperial, impondo uma língua, uma cultura, uma religião

e o estabelecimento de um sujeito padrão (homem, branco, europeu, hetero, cristã, etc). A

Europa tornou-se a civilização padrão. Os demais povos, nativos, colonizados foram

considerados aqueles que faltam algo, o inferior, o irracional, o sem cultura, o sem saber.

Desta forma, alguns sujeitos, alguns conhecimentos foram excluídos da história entre

eles, a história das mulheres negras por exemplo. No entanto, vários movimentos surgiram

evidenciando como a colonialidade do poder/saber como forma de dominação operou e

continua operando na exclusão de diversos povos, sujeitos e saberes. Como nos esclarece

Lander (2005, p.14)

Os diferentes recursos históricos (evangelização, civilização, o fardo do homem branco, modernização, desenvolvimento, globalização) têm todos como sustento a concepção de que há um padrão civilizatório que é simultaneamente superior e normal. Afirmando o caráter universal dos conhecimentos científicos eurocêntricos abordou-se o estudo de todas as demais culturas e povos a partir da experiência moderna ocidental, contribuindo desta maneira para ocultar, negar, subordinar ou extirpar toda experiência ou expressão cultural que não corresponda a esse dever ser [...].

A colonialidade do saber/poder ainda permanece tão presente em nossa sociedade,

desqualificando sujeitos, culturas e saberes daqueles que não estão neste padrão civilizatório.

Assim é necessário o romper das amarras e a problematização destes discursos e posturas que

inferiorizam os “outros” deixando-os a margem até mesmo no que tange as questões da

Educação e compromisso social

265

produção do conhecimento. Por isso se faz necessário a descolonização do conhecimento

como veremos a seguir.

2 Descolonização do conhecimento: rompendo dominações

O que significa descolonizar? Na etimologia da palavra “descolonizar” é a junção do

prefixo “des” mais a palavra “colonizar”. Pode denotar a remoção de uma colônia fixada de

certo território desse mesmo local, ou a atribuição de dependência política a um território

colonizado, fazer com que seja independente (CASMORE, 2000). Mas em nossos tempos qual

o significado de descolonizar, já que não vivemos mais em tempos de conquistas de

territórios?

Para Stuart Hall (2000), estudioso africano das questões culturais, o domínio hoje não

é mais por território, e sim uma dominação econômica, política e cultural que faz com que

nossas mentes continuem colonizadas, por que estamos sob a égide de um conhecimento

considerado verdadeiro, inquestionável, válido, que excluem outras formas de produção de

conhecimento.

Adiche Chimamanda (2017) dentro desta perspectiva cultural também aponta uma

nítida preocupação com a colonialidade do saber e nestes termos assinala em sua teorização

o perigo da histórica única, também denunciando a historiografia eurocêntrica e conclamando

em suas literaturas outras narrativas possíveis

Nesta linha de pensamento Boaventura Santos e Menezes (2010) também lançam o

desafio de se descolonizar a ciência, pois desta forma haverá possibilidade de novos olhares,

novas configurações do conhecimento. Uma epistemologia da resistência, que denomina de

epistemologia do sul.

Designamos a diversidade epistemológica do mundo por epistemologia do sul. O Sul é aqui concebido metaforicamente como um campo de desafios epistêmicos, que procuram reparar os danos e impactos historicamente causados pelo capitalismo na sua relação colonial com o mundo. Esta concepção do Sul sobrepõe-se em parte com o Sul geográfico, o conjunto de países e regiões do mundo que foram submetidos ao colonialismo europeu e que, com exceções como, por exemplo, da Austrália e da nova Zelândia, não atingiram nível de desenvolvimento econômico semelhante ao Norte global (Europa e América do Norte). A sobreposição não é total porque, por um lado, no interior do Norte geográfico classes e grupos sociais muito vastos (trabalhadores, mulheres, indígenas, afrodescendentes, muçulmanos) foram sujeitos à dominação capitalista e colonial e, por outro lado, porque no interior do Sul geográfico houve sempre as ‘ pequenas Europas’, pequenas elites locais que se beneficiam da dominação capitalista e colonial e que depois das independências a exerceram continuam a exercer, por suas

Educação e compromisso social

266

próprias mãos, contra as classes e grupos sociais subordinado. A ideia central é, com já referimos, o que o colonialismo, para além de todas as dominações por que é conhecido, foi também uma dominação epistemológica, uma relação extrema de saber-poder que conduziu à supressão de muitas formas de saber próprias dos povos e\ou nações colonizadas. As epistemologias do Sul são o conjunto de intervenções epistemológicas que denunciam a supressão, valorizam os saberes que resistiram com êxito e investigam as condições de um diálogo horizontal entre os conhecimentos (SANTOS E MENEZES, 2010, p. 19).

Uma epistemologia do Sul vem requerer que saberes de povos colonizados, que

passaram tanto pela dominação colonial e capitalista, tenha seus conhecimentos valorizados

e desta forma, os sujeitos pertencentes a outras geografias que não as hegemônicas possam

ser visibilizadas.

Para Djamila Ribeiro (2018) o processo de colonização fez com que algumas

identidades fossem silenciadas. Por isso descolonizar o conhecimento é uma tomada de

atitude que pode evidenciar que o colonialismo quem inferiorizou povos e seus

conhecimentos em contrapartida legitimou determinados saberes como hegemônicos. Neste

sentido destaca:

Para descolonizarmos o conhecimento precisamos nos ater à identidade social não somente para evidenciar como o projeto de colonização tem criado essas identidades, mas para mostrar como certas identidades têm sido historicamente silenciadas, desautorizadas no sentido epistêmico, ao passo que outros são fortalecidas (RIBEIRO, 2018, p.29).

Outra escritora que também contribui com este debate é Grada Kilomba. Para ela

novas perguntas podem nos ajudar a descolonizar o pensamento. Assim destaca “Que o

processo de descolonização é fazer novas questões que ajudam a desmantelar o colonialismo”

(2016, p.109) e neste prisma “começamos a narrar e trazer conhecimentos que nunca

estiveram presentes” (KILOMBA, 2016, 112).

Se descolonizar o conhecimento é preciso comecemos então por outras histórias. Para

descolonizar o saber, somos chamados a questionar os discursos coloniais, interrogar as

grandes narrativas, evidenciar outras vidas, outras formas de saberes, vivencias que estão fora

das narrativas consideradas padrões, quebrando concepções euro-ocidentais, patriarcalistas,

heteronormativas, enfim, questionar as narrativas hegemônicas que se tornaram grandes

verdades.

Educação e compromisso social

267

3 Resultados e discussão

Descolonizar o conhecimento e preciso sim, para que outras formas, saberes,

identidades, modos de vida e práticas possam ser valorizadas. Feito isso é possível vencer

preconceitos, racismos e discriminações, porque vivencias positivadas começarão a ser

partilhadas, outros protagonistas estarão em cena e outros produtores de conhecimentos

lançarão epistemologia que ficaram apagadas pela colonialidade do saber/poder (RIBEIRO,

2017). Eis então nosso grande desafio.

Conclusão

Quais historiam conhecemos? As histórias que povoam nossas memórias são aquelas

que nos foram contadas durante nossa permanência nos bancos escolares nas instituições de

ensino por onde passamos. São fatos heróicos como aqueles reproduzidos em livros didáticos

que trazem homens brancos das classes abastadas como os verdadeiros e únicos personagens

da historiografia. Neste trabalho, procurei a partir dos aportes teóricos, problematizar a

questão do conhecimento, apontando que em nossa sociedade ocorreu à dominação de

territórios, em consequência também a dominação do saber. Devido à colonialidade do

poder/ saber, determinados conhecimentos tornaram-se legítimos, autorizados e verídicos.

Neste sentido, estabeleceram um padrão de sujeito, que por sua vez invisibilizou outros

sujeitos que não estavam dentro deste padrão.

A colonialidade poder/saber resiste, e se manifesta de diversas formas, nas vozes,

sujeitos, identidades, saberes silenciados, desautorizadas, vista como ilegítimas e inferiores,

consideradas fora do padrão hegemônico tiveram suas histórias negadas. Minha intenção

nesta reflexão foi apontar que precisamos descolonizar o conhecimento para que assim outras

epistemologias sejam possíveis. E desta forma “aprender que existe o Sul; aprender a ir para

o sul; aprender a partir do sul e com o sul” (SANTOS, 2005, p. 508).

Referências

ADICHIE, Chimamanda Ngozi. Para educar crianças feministas: um manifesto. Tradução Denise Bottmann. 1ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2017.

CASHMORE, Ellis com Michel Banton et al. Dicionário de relações étnicas e raciais. São Paulo: Selo Negro, 2000.

Educação e compromisso social

268

LANDER, Edgardo. (Org.) A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latinoamericanas. Coleção Sul, CLACSO, Cidade Autónoma de Buenos Aires, Argentina. Setembro, 2005.

QUIJANO, Anibal. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América latina. In: LANDER, E. (Org.). A Colonialidade do saber, eurocentrismo e Ciências sociais: perspectiva latinos americanos. Buenos Aires. CLACSO. (2005).

RIBEIRO, Djamila. O que é lugar de fala? Belo Horizonte: Letramento, 2017.

______. Quem tem medo do Feminismo negro? 1ª Edição. São Paulo: Companhia das Letras, 2018.

KILOMBA, Grada. O Racismo é uma problemática branca. [Entrevista concedida a]: DJamila Ribeiro. Blog Carta Capital, 2016. Disponível em: <chttps://www.cartacapital.com.br/politica/201co-racismo-e-uma-problematica-branca201d-uma-conversa-com-grada-kilomba>Acesso em 12/2018.

SANTOS, Boaventura de Sousa; MENEZES, Maria Paula. Epistemologia do Sul. São Paulo: Cortez, 2010.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Toward a New Common Sense: law, Science andpolitics in theparadigmatictransition. Nova Iorque: Routledge, 1995.

Educação e compromisso social

269

“VIDAS BRASILEIRAS”: A JOVEM NEGRA NA TELENOVELA MALHAÇÃO

Isabel Cristina Baia da Silva113

Vilma Nonato de Brício114

Introdução

Este artigo apresenta análises da pesquisa de mestrado em andamento do Programa

de Pós-Graduação em Cidades, Territórios e Identidades (PPGCITI) da Universidade Federal do

Pará/Campus Universitário de Abaetetuba. A partir de aspectos relevantes presentes ou

invisibilizados nos discursos da telenovela Malhação, como espaço educativo, referente aos

processos de objetivação dos corpos das mulheres negras, buscamos problematizar como são

constituídos os discursos sobre as jovens, e de modo mais específico analisar os sentidos sobre

o corpo das jovens negras que se apresentam na telenovela apresentada nos finais de tarde,

para isso, selecionamos alguns trechos dos enunciados referentes à personagem Jade.

O texto está organizado da seguinte forma, no primeiro tópico situamos o leitor acerca

dos percursos e aportes para análise do objeto, destacando o recorte realizado na pesquisa

em andamento de mestrado dado os objetivos pretendidos e, assim, analisarmos o objeto de

pesquisa, sendo tais reflexões alicerçadas nas leituras de Foucault (2005; 2008) e Larrosa

(2008). No segundo tópico destacamos os processos de subjetivação nos discursos da

telenovela Malhação acerca das jovens negras, subsidiados nos trabalhos de Larrosa (2008) e

Moreno (2017) para pensamos na fabricação histórica de nossa existência e subjetividade;

Kellner (2001) para analisarmos mídia e cultura; e por fim os trabalhos de Munanga (2006) e

Fonseca (2000) fundamentaram a problematização sobre questões étnico-raciais.

1 Percursos e aportes para análise do objeto

A telenovela produzida e exibida pela Rede Globo desde 24/04/1995 foi criada por

Andréa Maltarolli e Emanuel Jacobina, sendo endereçada ao público juvenil e aborda

temáticas ligadas a essa faixa etária. A história é ambientada em um Colégio particular

chamado Sapiência que fica na região de Botafogo, zona sul da cidade do Rio de Janeiro. A

telenovela Malhação é um dos principais produtos da televisão brasileira voltados para o

113 Universidade Federal do Pará/Campus Universitário de Abaetetuba. E-mail: [email protected] 114 Universidade Federal do Pará/Campus Universitário de Abaetetuba. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

270

público juvenil. Está em sua 26ª Temporada exibida no período 7 de março de 2018 a 15 de

abril de 2019.

Na temporada intitulada “Vidas Brasileiras” a cada quinze dias uma personagem é

colocada como protagonista e tem sua história contada o que nos possibilita conhecer um

pouco mais cada uma. A temporada “Vidas Brasileiras” foi inspirada em um texto estrangeiro,

a Soap opera115 canadense 30 vies (30 vidas, em tradução livre), criado por Fabienne Larouche,

sendo que a soap foi indicada quatro vezes ao Emmy Internacional. No Brasil foi Adaptada por

Patrícia Moretszohn e tem direção artística de Natalia Grimberg.

Neste trabalho vamos analisar apenas enunciados da telenovela referente à jovem

Jade. “Os discursos são efetivamente acontecimentos, os discursos têm uma materialidade”

(FOUCAULT, 2005, p. 141), os discursos sobre as jovens negras ganham materialidade em

diferentes enunciados na telenovela Malhação. Os dados de análises da telenovela foram

capturados da página da globo.com116, visto a impossibilidade de assistir os episódios durante

a semana e a necessidade de tê-los gravados para rever os episódios que serão analisados.

O pensamento de Foucault nos permite estranhar e analisar os discursos da telenovela

Malhação e as técnicas de subjetivação através da qual “[...] o sujeito faz a experiência de si

mesmo em um jogo de verdade no qual está em relação consigo mesmo” (FOUCAULT apud

LARROSA, 2008, p. 55), destacando como as jovens negras são produzidas, reforçadas e

divulgadas, sem imposição, pois as técnicas sutis da mídia nos fazem acreditar que estamos

no comando das decisões, cria-se a sensação de que somos “donos” dos nossos atos.

As informações do objeto de pesquisa apresentado foram descritas e tratadas através

da análise do discurso que segundo Foucault “Analisar uma formação discursiva é, pois, tratar

de um conjunto de performances verbais, ao nível dos enunciados e da forma de positividade

de um discurso” (FOUCAULT, 2008, p. 141-142).

Os enunciados são constituídos a partir da materialidade produzida por diferentes

técnicas de subjetivação, aqui destacamos a mídia que estrutura e constrói modelos de jovens

negras com os quais estas podem se identificar. Ao se referir à materialidade, Foucault (2008,

p. 114) destaca que “Ela é constitutiva do próprio enunciado: o enunciado precisa ter uma

substância, um suporte, um lugar e uma data. Quando esses requisitos se modificam, ele

próprio muda de identidade”. Enunciados que são constantemente ressignificados para

115 Soap opera é um gênero de obras de ficção dramática ou ficção cómica difundido pela televisão em séries compostas por capítulos transmitidos regularmente em um período indeterminado de duração. 116 https://gshow.globo.com/novelas/malhacao/2018/

Educação e compromisso social

271

acompanhar as mudanças culturais, sociais e históricas. Os sujeitos não são estáticos e nem

os discursos podem ser.

2 A jovem negra e os processos de subjetivação nos discursos da telenovela Malhação

A mídia, de modo mais pontual aqui tratamos da telenovela Malhação, cria

personagens com os quais as jovens possam se identificar, que se vejam na tela e, assim,

garante o processo de subjetivação das jovens negras, uma relação de aprendizado em

direção ao próprio interior do sujeito. Larrosa (2008, p. 43) afirma que “[...] a própria

experiência de si não é senão o resultado de um complexo processo histórico de fabricação

no qual se entrecruzam os discursos que definem a verdade do sujeito [...]”. O modo como o

sujeito se constitui e reconhece a si mesmo está ligada aos valores morais da sociedade e seus

valores positivos e negativos, porém esses valores são sutilmente estabelecidos para que o

indivíduo se perceba como definidor de suas ações.

No caso das jovens negras podemos problematizar como cada uma se vê em relação

aos modelos estabelecidos pela telenovela que mostra as “Vidas Brasileiras”. A mídia se

configura em um aparelho de forte ação nos processos de subjetivação, um dos meios pelos

quais somos chamados a nos tornarmos indivíduos éticos e que expõe obrigações de ordem

moral. Para expressar o domínio da mídia na contemporaneidade utilizamos o conceito de

“cultura da mídia” criado por Douglas Kellner (2001, p. 54), para quem “A expressão ‘cultura

da mídia’ também tem a vantagem de dizer que a nossa é uma cultura da mídia, que a mídia

colonizou a cultura, que ela constitui o principal veículo de distribuição e disseminação da

cultura”.

Vejamos alguns trechos de enunciados referentes a perspectivas das questões étnico-

raciais produzidos na telenovela a partir da personagem Jade. Segue diálogo entre Jade e

alguns colegas da turma enquanto estavam no Le Kebek117

Jade: “Gente, eu tava passando pelo balcão e do nada o cara me chamou. Eu acho que ele pensou que eu era garçonete, pode acreditar nisso?” Dandada: “Então, essa é uma questão que acontece muito, a pessoa branca te olha e já vai pensando que você tá ali pra servir” (MALHAÇÃO, 2018-2019, cap. 189).

117 Gastrobar do personagem que interpreta o marido da professora Gabriela, uma das professoras protagonistas na Telenovela, que sempre ajuda os alunos a resolveram os problemas que surgem na trama. O local é frequentado pelos alunos do Colégio, sendo que vários diálogos e histórias acontecem no Le Kebek.

Educação e compromisso social

272

No diálogo acima que aborda a questão do preconceito racial constituído

historicamente, encontramos marcas de estereótipos e discriminações que ainda circulam

socialmente, mas que são constantemente naturalizadas de modo a legitimar o pensamento

hegemônico. Porém, as lutas e resistências se apresentam para desconstruir atitudes racistas,

problematizando as técnicas e instituições que produzem os discursos considerados

verdadeiros que buscam normalizar os comportamentos. A imagem do negro/a como alguém

que ocupa espaços servis ainda se apresenta em enunciados cotidianos, em piadas, no

tratamento no momento que se adentra em uma loja ou restaurante e em situações como a

citada no trecho acima.

O racismo é um comportamento, uma ação resultante da aversão, por vezes ódio, em relação as pessoas que possuem um pertencimento racial observável por meio de sinais, tais como cor da pele, tipo de cabelo, formato de olho etc. Ele é resultado da crença de que existem raças ou tipos humanos inferiores e superiores, a qual se tenta impor como única verdadeira (MUNANGA, 2006, p. 179).

Trabalhar as questões referentes aos preconceitos e estereótipos acerca das jovens

negras em uma telenovela voltada para este público requer pensarmos como se dá a

constituição das subjetividades dos/as jovens em meio a tantos discursos que chegam,

mudam o tempo todo e que nos seduzem de modo que nem notamos que estamos sendo

produzidos por eles, bem como as resistências as tentativas de normalização. Na sequência

dos capítulos do episódio narrado anteriormente com a personagem Jade, ela decide mudar

o visual.

Jade: “Então, eu decidi alisar meu cabelo de novo”. Pérola: “Jade, Jade, isso não tem haver com aquela história que você me contou, né, que o cara te confundiu com a garçonete?” Jade: “Não, não, claro que não” (MALHAÇÃO, 2018-2019, cap. 190).

Mesmo sem admitir para sua amiga, a personagem Jade, decide alisar e clarear os

cabelos. Vale destacar que a preocupação com a aparência baliza durante a trama a relação

que a jovem estabelece com si mesma, produzindo uma estética, um modo de ser jovem onde

o corpo é colocado em evidência. “Nesse sentido o negro precisa ultrapassar os estereótipos

que reforçam os significados negativos colocados a atributos considerados distantes do

padrão de beleza aceito pela sociedade” (FONSECA, 2000, p. 102). A exclusão se efetiva por

via de discursos como estes que inferiorizam traços específicos de um grupo e destacam como

legítimos outros.

Educação e compromisso social

273

A personagem Jade realiza o alisamento e pinta os cabelos, porém isso não é suficiente

para ela que continua querendo mudar sua aparência física. Jade diz: “Tem um lugar que eu

quero ir muito, muito, muito que eu soube que eu podia fazer o nariz se meus pais

autorizarem. E também quero fazer minha boca, aí eu já vi com minha dermatologista. Então,

uma afiladinha pra cá, pra cá” (MALHAÇÃO, 2018-2019, cap. 195).

Na fala da personagem podemos problematizar como os discursos nos subjetivam e

nos levam a adotar certo modo de ser e estar e a relação que estabelecemos com nosso corpo,

podem levar as jovens a realizarem inclusive procedimentos arriscados para se sentirem parte

do grupo que é mostrado como padrão. “Não mais impositivo, não mais vigiando e punindo,

porém, antes, despejando imagens que estimulam o desejo [...]” (MORENO, 2017, p. 36).

Nesse caso, os padrões estariam ligados a traços da beleza branca, enquanto a beleza negra é

inferiorizada. Vivenciamos um momento da história que a ditadura da beleza se apresenta

constantemente na mídia.

No fechamento do destaque dado a personagem referente à questão do preconceito

Jade diz: “Tudo que sei agora é que vou tirar esse cabelo horroroso porque eu vi tipo numa

revista francesa que agora tá tipo cafona” (MALHAÇÃO, 2018-2019, cap. 198). Mesmo que as

amigas do colégio tenham conversado com Jade e no enunciado que foi ao ar durante vários

dias na telenovela, observamos que no fechamento da história Jade só decide alterar as

mudanças que realizou no cabelo porque a mesma leu em uma revista francesa que cabelos

lisos e com californiana não são a tendência do momento.

Conclusão

A mídia tem seu potencial social, cultural e pedagógico, assim precisa ser tematizada

nas pesquisas das diferentes áreas do conhecimento. Então, sendo situada em seu processo

histórico de subjetivação podemos falar na possibilidade de construção de outros discursos

referentes às questões étnico-raciais. Desse modo, evidenciamos que a subjetividade juvenil

não é fixa, ao contrário é resultado um processo dinâmico que nos permite vivenciar as

diversas possibilidades, é sempre um devir.

Desse modo, seus corpos são gerenciados, seus desejos e anseios se articulam e se

repelem, a linguagem televisiva busca normalizar um modo de ser jovem negra. A mídia se

constitui por discursos sobre juventude que produzem verdades referentes a estes sujeitos,

discursos inventados, criados, produzidos na história, em constante reformulação que

Educação e compromisso social

274

projetam imagens com as quais podemos nos identificar ou não, mas que de alguma forma

ajudam a produzir a nossa subjetividade.

Referências

FONSECA, Maria Nazaré Soares. Visibilidade e ocultação da diferença: imagens do negro na cultura brasileira. In: FONSECA, Maria Nazaré Soares (Org.). Brasil afro-brasileiro. Belo Horizonte: Autêntica, 2000. p.87-115

FOUCAULT, Michel. A verdade e as formas jurídicas. Rio de Janeiro: NAU editora, 2005.

FOUCAULT, Michel. A arqueologia do saber. 7ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008.

KELLNER, Douglas. A Cultura da mídia - estudos culturais: identidade e política entre o moderno e o pós-moderno. Bauru: EDUSC, 2001.

LARROSA, Jorge. Tecnologias do eu e educação. In.: SILVA, Tomaz Tadeu da (Org.). O sujeito da educação: estudos foucaultianos. Petrópolis: Vozes; 2008. p.35-86.

MALHAÇÃO Vidas Brasileiras. Natália Grimberg. Patrícia Moretzsohn. Central Globo de Produção. Rio de Janeiro, 2018-2019. Formato 1080i (HDTV). Episódios 288. Duração 30min. Transmissão 7 de mar./2018 a 15 abr. de 2019. Baseado em 30 vies de Fabienne Larouche.

MORENO, Rachel. A imagem da mulher na mídia: controle social comparado. 2ª ed. São Paulo: Expressão Popular: Fundação Perseu Abramo, 2017.

MUNANGA, Kabengele. A resistência Negra no regime escravista. In: MUNANGA, Kabengele. O negro no Brasil de hoje. São Paulo: Global, 2006. (Coleção para entender) (p.67-104)

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275

REPRESENTAÇÕES DA EDUCAÇÃO MORAL E CÍVICA NO INSTITUTO NOSSA SENHORA DOS

ANJOS (1953-1971): UMA PRÁTICA COMPLEMENTAR NA FORMAÇÃO EDUCACIONAL DE

MENINAS

Joelma da Silva Trindade118

Maria do Socorro Pereira Lima119

Introdução

No início dos anos 50, as Irmãs Missionárias Capuchinhas do Brasil chegaram no

município de Abaetetuba com a intenção de inaugurar uma instituição educativa de renome,

intendo uma educação moral, religiosa e social, orientada sobretudo, pelos princípios morais

e religiosos que faziam parte da missão capuchinha.

Com esta finalidade, as religiosas inauguraram em 1953 - na cidade de Abaetetuba - o

Instituto Nossa Senhora dos Anjos (INSA)120, uma entidade particular, religiosa e de caráter

assistencialista, na época, destinada a atender principalmente as meninas abaetetubenses.

Nesse contexto, a instituição ganhou foco por oferecer um modelo educativo diferenciado,

que por sinal, contemplava grande parte da comunidade que apoiou o desenvolvimento dessa

proposta educativa em Abaetetuba.

Uma das particularidades desse modelo educacional aponta práticas educativas que

visavam instruir as alunas a cultivarem uma postura aceitável naquela sociedade, entre elas

destaca-se a prática de educação Moral e Cívica, que em tese, baseava-se em princípios morais

a fim de civilizar as alunas para viverem no contexto de uma sociedade que defendia a moral

e os bons costumes.

Com base nisso, este estudo buscou investigar as representações de ex-alunas que

estudaram no Instituto Nossa Senhora dos Anjos, entre os anos de 1953 e 1971, naquilo que

se refere à intencionalidade da prática de Educação Moral e Cívica. Ainda que essa prática seja

apenas uma das práticas escolares ministradas no referido Instituto, acreditamos que esta

influenciou na formação de meninas, principalmente por trabalhar com a orientação

comportamental das alunas.

118 Universidade Federal do Pará/UFPA. E-mail: [email protected] 119 Universidade Federal do Pará/UFPA. E-mail: [email protected] 120 Essa nomenclatura é a mais recente, no entanto, outras nomenclaturas antecederam e foram sendo substituídas, na medida em que a instituição se desenvolvia no município.

Educação e compromisso social

276

1 Materiais e métodos

Metodologicamente, esta pesquisa se caracteriza como documental e bibliográfica

apoiada nos pressupostos teóricos da Nova História Cultural que “tem por principal objeto

identificar o modo como em diferentes lugares e momentos uma determinada realidade social

é construída, pensada, dada a ler” (CHARTIER, 1990, p. 16-17).

Teoricamente, a pesquisa dialogou com autores tais como: Roger Chartier (1990);

Santos e Araújo (2007); entre outros, que contribuíram significativamente para o

desenvolvimento deste estudo. Além disso, associa-se ao método da História Oral as

representações de 09 ex-alunas com idade acima de 65 anos, no que se refere às

representações que elas fazem da prática de educação Moral e Cívica ministrada no Instituto

Nossa Senhora dos Anjos, no período onde a pesquisa esteve situada.

Ao caracterizar a História Oral, Santos e Araújo (2007) alegam que ao invés de ocupar

o lugar de fonte independente, esse recurso é uma complementação aos dados encontrados

nos documentos, que geralmente são fontes de pesquisa que necessitam ser completadas.

Sendo assim, utilizou-se como principal fonte de análise as narrativas orais de ex-alunas que

estudaram na instituição no período circunscrito e documentos advindos do arquivo da

referida instituição.

2 Resultados e discussões

Os documentos encontrados no acervo do Instituto Nossa Senhora dos Anjos, deram

subsídio para as narrativas orais, por apresentarem prescrições relacionadas às práticas

educativas ministradas na instituição, no período situado. Em contribuição, o Regimento

Interno do Educandário Nossa Senhora dos Anjos (1968), no art. 12, prescreve “em seu

currículo as seguintes disciplinas e práticas educativas: DISCIPLINAS: Português, História,

Geografia, Aritmética, Ciências e Religião. PRÁTICAS EDUCATIVAS: Educação Moral e Cívica,

Jogos, Recreação e Música” (REGIMENTO INTERNO DO EDUCANDÁRIO NOSSA SENHORA DOS

ANJOS, 1968).

No que diz respeito as práticas educativas, percebe-se no art. 12 do regimento

destacado, que a educação Moral e Cívica fazia parte da base educacional das alunas no INSA,

uma que vez que compunha um conjunto de práticas escolares trabalhadas no ensino

primário.

Educação e compromisso social

277

Já no Regimento Interno do Ginásio Nossa Senhora dos Anjos, as práticas educativas

eram prescritas amparadas por algumas normas da instituição, como demonstra o seguinte

excerto:

Art. 31 – [...] a) Entre as práticas educativas: educação religiosa, educação cívica, educação artística, educação doméstica e artes femininas, o estabelecimento adotara duas sendo levada em conta a atual situação dos professores, como também facilitar o aproveitamento dos professores de disciplinas afins. [...] c) Não será atribuída nenhuma nota as práticas educativas (REGIMENTO INTERNO DO GINÁSIO NOSSA SENHORA DOS ANJOS, s.d).

De acordo com esse regimento, a educação cívica também estava prescrita no ensino

secundário, assim como a educação doméstica, religiosa e as artes femininas. Além disto,

nota-se que eram selecionadas no curso ginasial apenas duas dessas práticas escolares, as

quais podiam variar dependendo da disponibilidade de professores; já em termos avaliativos,

a prescrição é que não fosse atribuída nota à nenhuma dessas práticas.

Então, é possível perceber que os documentos do Instituto prescreviam a prática de

educação Moral e Cívica tanto para o ensino primário, quanto para o ensino secundário; além

dessa descrição, o Regimento Interno do Ginásio Nossa Senhora dos Anjos também determina

no art. 19, os deveres dos professores no Instituto, dentre os quais destaca-se: “zelar

cuidadosamente pela educação moral, cívica e religiosa de suas alunas” (REGIMENTO

INTERNO DO GINÁSIO NOSSA SENHORA DOS ANJOS, s.d).

Contudo, mesmo integrando o currículo institucional, a Educação Moral e Cívica, no

modo como definido no documento (artigo 19) analisado, recorremos às narrativas orais de

ex-alunas da Instituição, com o objetivo de compreendermos como as alunas eram instruídas

por meio das práticas que compunham à Educação Moral e Cívica.

De acordo com as narrativas, os valores cívicos e morais se tornavam mais evidentes

durante os eventos comemorativos que favoreciam esses ensinamentos. Sobre isso, uma das

ex-alunas afirmou:

A moral e cívica era colocada em prática na semana da pátria; todos os dias era cantado o hino na frente da escola; cada dia uma, duas, ou três turmas. [...] no (dia) 7 de setembro também era um momento muito esperado pela comunidade abaetetubense, pela sociedade, porque o INSA se destacava muito. [...] a postura das alunas, no momento do desfile, era muito bonito, uma coisa social mesmo [...] (ex-aluna A, dezembro, 2018).

Conforme o relato, a educação moral e cívica era notável, principalmente na semana

da pátria e no dia 7 de setembro que era uma data temática festejada pelo Instituto junto à

Educação e compromisso social

278

comunidade abaetetubense. Além disso, as comemorações proporcionavam a notabilidade

da instituição, graças à postura das alunas diante da comunidade.

No que tange ao ofício mencionado na narrativa, este fazia parte das atividades cívicas

que iniciavam dentro da entidade e terminavam nas ruas da cidade de Abaetetuba,

geralmente com desfiles que esbanjavam requinte e nacionalismo para os espectadores.

Embora, os documentos do INSA estivessem especificando o público alvo da prática de

Educação Moral e Cívica, esta ganhava uma repercussão muito maior porque também

alcançava a sociedade local.

Baseando-nos nesse pressuposto, é possível identificar nos desfiles realizados pela

instituição, a alusão a valores cívicos que estimulavam inclusive o patriotismo, como retratam

as 1 e 2.

Imagem 1: Alunas do INSA desfilando no 7 de setembro de 1967.

Fonte: Álbum do INSA, 1967.

Imagem 2: Alunas no Pelotão da Bandeira do dia 7 de setembro de 1968.

Fonte: Álbum do INSA, 1967.

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Enquanto a imagem 1 retrata o desfile do dia 7 de setembro de 1967, no qual as alunas

formaram um pelotão representando as forças armadas; a imagem 2, por sua vez, retrata as

alunas representando a Bandeira do Brasil em movimento na mesma data comemorativa, do

ano seguinte.

Nessas imagens, é possível identificar características acerca da formação moral e cívica

das alunas, principalmente no que se referem às temáticas utilizadas. A representação das

alunas nessas fotos, demonstra que a temática dos desfiles transferia um sentimento

nacionalista, tanto para as alunas, quanto para a comunidade abaetetubense.

Além disso, o movimento demonstrado nas imagens 1 e 2 expressa o compromisso com

o país e o respeito pela pátria, que “coincidentemente”, eram as intencionalidades de algumas

práticas didáticas que vigoraram no período da Primeira República paraense, como por

exemplo, a disciplina de “História Pátria” que “objetivava preparar os futuros cidadãos por

meio de instruções patrióticas e moralizantes” (TRINDADE; LIMA, 2018, p. 19).

Sendo assim, esse objetivo assemelha-se à intencionalidade da Educação Moral e Cívica

evidenciada nas narrativas, que do mesmo modo apresentava um comprometimento da

instituição com o caráter civilizatório. Entretanto, no Instituto Nossa Senhora dos Anjos essa

prática não servia apenas para estimular o patriotismo, na verdade, servia também para

instruir o comportamento das alunas, de acordo como foi informado no relato a seguir:

A moral e o civismo também deveriam ser praticados dentro da escola, e lá fora, o respeito, era mostrar o tipo de escola que você estudava, através do seu comportamento, [...] a gente estudava no INSA, mas a gente mostrava nosso comportamento lá fora também, não era só lá dentro [...] (Ex-aluna B, dezembro, 2018).

Partindo deste excerto, verifica-se que essa prática também visava estimular o

comportamento adequado das alunas nos diversos espaços sociais. Conforme relatado pela

ex-aluna, a moral e o civismo trabalhados na institutição apontavam para a ordem, a

disciplina, o respeito e a obediência. Sendo assim, essa prática buscava modelar a conduta das

alunas a partir de um modelo de comportamento aceitável na sociedade.

A partir da identificação dessas intencionalidades, segundo os fragmentos extraídos

das entrevistas concedidas por ex-alunas do INSA, e o contexto social e cultural do período, a

Educação Moral e Cívica trabalhada na instituição nos anos 50 a 60, primava por uma

educação que defendia a prática da moral e valores a seguir como um meio de propagar o

processo civilizatório difundido na Primeira República brasileira.

Educação e compromisso social

280

Conclusão

Posto isto, concluímos que a prática de Educação Moral e Cívica na formação

educacional das alunas, estimulava valores como a disciplina, o respeito, a obediência e outros

princípios morais intimamente relacionados às ações civilizatórias. Sendo assim, da mesma

forma que a Educação Moral e Cívica servia para notabilidade do país, também contribuía para

controlar o comportamento das alunas.

Referências

ÁLBUM do INSA, 1953.

CHARTIER, Roger. A História Cultural entre práticas e representações. Memória e Sociedade. 2ª ed. 1990.

REGIMENTO Interno do Educandário “NOSSA SENHORA DOS ANJOS” de Abaetetuba-Pará. 1968.

REGIMENTO Interno do Ginásio Nossa Senhora dos Anjos. [s.d.]

SANTOS, S. M. dos. ARAÚJO, O. R. de. História Oral: vozes, narrativas e textos, In: Cadernos de História da Educação, n. 6, jan./dez. 2007. Disponível em:<https://scholar.google.com.br/scholar?hl=ptBR&as_sdt=0%2C5&q=Hist%C3%B3ria+Oral%3A+vozes%2C+narrativas+e+textos.&btnG=>. Acesso em: 16/04 às 07: 57 h.

TRINDADE, Joelma da S.; LIMA, Maria do S.P. A disciplina de História Pátria na educação primária no período republicano (1980-1920): oportunizando conhecimentos, intencionalizando progresso. Educação e Mudança. Abaetetuba, 2018. Disponível em:< https://scholar.google.com.br/scholar?hl=ptBR&as_sdt=0%2C5&q=A+DISCIPLINA+DE+%E2%80%9CHIST%C3%93RIA+P%C3%81TRIA%E2%80%9D+NA+EDUCA%C3%87%C3%83O+PRIM%C3%81RIA+NO+PER%C3%8DODO+REPUBLICANO+%2818901920%29%3A+OPORTUNIZANDO+CONHECIMENTOS+%E2%80%A6&btnG=^>. Acesso em: 04/05/2019.

Educação e compromisso social

281

ATELIÊ RODRIGUES PACHECO: TRADIÇÃO, GÊNERO E A PRODUÇÃO DA DIFERENÇA121

Lídia Sarges Lobato122

Joyce Otânia Seixas Ribeiro123

Introdução

O campo é o lugar de encontros e desencontros. Um lugar sensível a interpretação

e a representação. Na chegada, avistei uma casa rústica, levemente tombada para o lado

esquerdo, com paredes de madeira bem deterioradas, telhas levemente afastadas uma das

outras. No inverno amazônico, a chuva é uma ameaça e no verão, o sol, atravessa as janelas e

as brechas das tábuas, aquecendo as roupas e passando para o corpo. A casa tem uma grande

calçada de cimento recém construída, e uma porta que fica sempre entreaberta. Na fachada

da casa está colado um cartaz apagado contra o trabalho infantil. O ateliê Rodrigues Pacheco

fica no Bairro do São João, no município de Abaetetuba e funciona na antiga casa de Dona

Pacheco.

O ateliê de brinquedo de miriti, assim denominado ao longo dos anos, é um espaço

de criação, produção, e resistência dos brinquedos. A profusão de cores dimensiona o ateliê

como um arco-íris.

A representação dos brinquedos de miriti está para além dos modos de vida

caboclo, do Pará Amazônico e de suas encantarias que fascinam e encantam o imaginário

ribeirinho, essa energia que consome a todos e todas. O que estou querendo dizer é que além

de tudo que durante todos estes anos já foi falado dos brinquedos de miriti, por homens e

mulheres, quero ressaltar que estes brinquedos também exprimem as normas e condutas

tidas consideravelmente corretas, que compreendem a orientação sexual dos gêneros.

A tradição foi constituindo-se de normas, condutas e valores. Talvez um velho

discurso possa explicar por Perrot (1988, p. 177) quando afirma que: “[...] aos homens, o

cérebro (muito mais importante do que o falo), a inteligência, a razão lúcida, a capacidade de

decisão. Às mulheres, o coração, a sensibilidade, os sentimentos”. Estas marcas concedem ao

121 O presente trabalho apresenta fragmentos da Dissertação de Mestrado intitulado O currículo e seus efeitos na subjetividade de uma mulher-artesã do miriti, do Programa de Pós-Graduação em Currículo e Gestão de Escola Básica (PPEB/NEB/UFPA), com o apoio da Capes e FAPESPA (Acordo Capes/FAPESPA). 122 PPEB/NEB/UFPA. E-mail: [email protected] 123 Professora do Campus de Abaetetuba; Professora do PPGCITI/CAAB/UFPA, na linha de pesquisa Identidades: linguagens, práticas e representações. Líder do Gepege/CNPq. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

282

homem a capacidade de criar os brinquedos, que toma para si o trabalho considerado bruto,

por seus traços de masculinidade, como força, coragem e destreza; às mulheres, o coração, a

sensibilidade, o trabalho leve, a feminilidade, e, assim, a pintura fica com elas, por sua suposta

delicadeza, pois tem mãos de fadas.

Para Colling (2015, p.24), na heteronormatividade todas as pessoas “[...] devem

organizar suas vidas conforme o modelo heterossexual, tenham elas práticas sexuais

heterossexuais ou não”, desenhando um modelo político que organiza as vidas. Esta lógica

está presente também na ordem dos currículos escolares, instaurando regime de controle e

vigilância da conduta sexual dos gêneros (JUNQUEIRA, 2015).

Ninguém nasce mulher, tornar-se mulher é uma afirmação clássica de Simone de

Beauvoir, que muitas pensadoras remetem ao gênero e que, de forma tímida, mas com um

pouco de ousadia, trago para a tradição do brinquedo de miriti, dizendo que as mulheres não

nasceram para as tarefas leves, como a delicadeza dos pincéis, elas tornaram-se mulheres-

artesãs para o trabalho leve, bem como os homens tornaram-se artesãos-chefe para o

trabalho bruto.

1 Dona Pacheco e a produção da diferença

Ao entrar na tradição do brinquedo de miriti, Dona Pacheco começa a borra-la

reinventando seus significados, não apenas na organização do ateliê, assumindo a função de

artesã-chefe, mas produzindo novos temas e significados, a partir da diferença, como o casal

de namorados-dançarinos homoafetivos. Disse ela:

Já fiz e faço casal gay, casal negro; tem cada moreno que casa com cada mulher brancona; faço brinquedo deficiente, sem braço; é um jeito de acabar com o preconceito. Uma vez uma mulher perguntou porque eu fazia esses brinquedos? Eu respondi porque eles já sofrem muito preconceitos (Dona Pacheco, diário de campo, 2017).

Para a artesã essa é uma forma de amenizar os preconceitos que estão enraizados

em nossa sociedade. A sensibilidade e perspicácia de Dona Pacheco para observar o real, o

mundo a sua volta salta aos olhos; segundo ela, a maioria desses casais são personagens

representados de sua própria realidade cultural, amigos, vizinhos, dentre tantas outras formas

de ser, de viver a diferença.

Educação e compromisso social

283

Imagem 1: Casal heterossexual e casais homoafetivos. Fonte: Lobato, 2017.

Na imagem 1 é possível observar a representação de três casais: o primeiro um

casal gay, branco; o segundo, um casal negro e heterossexual; e o terceiro um casal lésbico e

interracial. A produção da diferença está presente, para cada casal a estética diferencia-se. No

processo, entre o público e o privado Dona Pacheco é uma referência, trazendo em sua arte

temas considerados polêmicos, que perturbam seus colegas e o próprio público, do porquê

fazer tais brinquedos. A artesã ao entrar nesta tradição de certa forma a modifica,

reinventando-a.

Até recentemente, apenas os casais de namorados/dançarinos que representam

a heterossexualidade circulam com tranquilidade em meio ao público. A comercialização do

brinquedo movimentava e movimenta a economia, e muitos artesãos e artesãs dependem

dessa renda; com isso, não se arriscam a produzir tais brinquedos, evitando a antipatia do

público, por questões econômicas, religiosas e culturais. E principalmente, por este artefato

estar diretamente vinculado ao Círio de Nazaré, uma festividade religiosa. Os discursos

recorrentes aos questionamentos sobre tais brinquedos são “Deus criou o homem e a

mulher”, um discurso ligado a multiplicação e a continuidade da humanidade.

Então, a cultura de gênero hegemônica produziu um padrão aceitável pela

sociedade, o casal heterossexual e branco. Os brinquedos de miriti representam a fauna, a

flora, o trabalho, o modo de vida ribeirinho, as palafitas da região perfeitamente. Mas quando

se trata da estética do homem e da mulher cabocla, ribeirinha, esta é ignorada, em favor do

casal europeu, branco e com as madeixas louras, ocultando os casais homoafetivos, negros,

nativos, interraciais da história.

Educação e compromisso social

284

A heterossexualidade como norma é materializada nos brinquedos de miriti com

os casais de namorados/dançarinos, configurando uma heterossexualidade compulsória.

A heterossexualidade compulsória consiste na exigência de que todos os sujeitos sejam heterossexuais, isto é, se apresenta como a única forma considerada normal de vivência de sexualidade. Essa ordem social/sexual se estrutura através do dualismo heterossexualidade versus homossexualidade, sendo que a heterossexualidade é naturalizada e se torna compulsória (COLLING, 2015, p. 24).

Ou seja, a heterossexualidade é vista como o padrão aceitável, o princípio da vida

humana, que por algum motivo, uns se desviam e a homossexualidade é considerada anormal,

desajustados, abjetos. Que critérios são utilizados para distinguir o normal ou anormal?

Naturalizamos a heterossexualidade ou a sexualidade? O que torna um corpo desajustado?

Precisamos compreender que a “heterossexualidade e a homossexualidade são considerados

formas possíveis de vivência da sexualidade, ao menos em tese, em muitos lugares do planeta

(não em todos)” (COLLING, 2015, p. 24).

Na heteronormatividade a vida das pessoas deve ser organizada conforme o

modelo heterossexual. Colling (2015, p. 25) escreve:

Se na heterossexualidade compulsória todas as pessoas que não são heterossexuais são consideradas doentes e precisam ser explicadas, estudadas e tratadas, na heteronormatividade elas tornam-se coerentes desde que se identifiquem com a heterossexualidade como modelo, isto é, mantenham a linearidade entre sexo e gênero: as pessoas com genitálias masculinas devem se comportar como machos, másculos, e as com genitália feminina devem ser femininas, delicadas.

Para Junqueira (2015), normais e anormais estão ambos situados no interior do

critério que estabelece a separação, a norma. No entanto a norma precisa ser naturalizada,

com os processos disciplinares voltados para os sujeitos, com isso, a heterossexualidade está

na ordem do currículo escolar, presente em seus espaços, normas, ritos e rotinas. As escolas

e os currículos são centros de disputas políticas em torno da diversidade sexual e de gênero.

As relações de gênero estão espalhadas no interior dos ateliês e são parte da

cultura de gênero hegemônica. A cultura de gênero é reproduzida e transmitida por homens

e mulheres por meio de suas práticas cotidianas, compõe os cenários da história da

humanidade há muito tempo. Os corpos são constituídos socialmente, com as marcas de

gêneros masculino ou feminino, e a artesã-chefe contesta como fruto do currículo escolar.

Explicando as diferenças, Scott (1995, p. 86) argumenta que o “[...] gênero é um elemento

constitutivo de relações sociais baseadas nas diferenças percebidas entre os sexos e [...] é uma

Educação e compromisso social

285

forma primária de dar significado às relações de poder”; em outras palavras, gênero é uma

forma de ser homem e de ser mulher produzido em sociedade.

1.1 Gênero-Sexo-Corpo: entretecendo relações

Gênero é um problema ou produz muitos problemas. A busca por sua definição e

genealogia é objeto de análise de vários estudiosos e grupos dentre os quais, as feministas.

Um termo cercado de críticas, efeitos de práticas e discursos de instituições, com pontos de

intercessões múltiplos e difusos.

Gênero é constituído nos diferentes contextos históricos e nem sempre de forma

coerente, até porque se estabelece nas interseções raciais, de classe, étnicas, sexuais, que de

maneira discursiva constitui a noção de gênero implicada com as questões políticas e culturais

envolvidas num movimento incessante que produz, mantém e reproduz. Por isso revela-se

um problema. Problemas são inevitáveis, principalmente quando se entrelaça com outras

demandas, neste caso, sexo. Contudo, a tarefa aqui é descobrir a melhor maneira de criá-los,

a melhor maneira de tê-los (BUTLER, 2003).

Gênero é uma interpretação cultural do sexo e constituído culturalmente, Butler

(2003). Pode as pessoas possuir um gênero? Quantas vezes somos levados a assumir

determinado gênero, dar respostas a questionários e entrevistas de emprego: Qual é o seu

gênero? E os hermafroditas o que respondem? A sociedade cobra dados exatos e não pontos

‘fora da curva’ (situações que fogem de sua conformidade, da norma). Todavia o anúncio “é

uma menina” ou “é um menino” feito por um profissional diante da tela de um aparelho de

ultrassonografia morfológica, põe em marcha o processo de fazer deste ser um corpo

feminino ou masculino, um ato de caráter performativo, que vai inaugurando uma sequência

de outros atos no intuito de constituir alguém como um sujeito de sexo e gênero (LOURO,

2016).

Gênero é relacional, instável, contextual e converge nas relações culturais e

históricas. Em outros termos “[...] gênero é uma complexidade cuja totalidade é

permanentemente protelada, jamais plenamente exibida em qualquer conjuntura

considerada” (BUTLER, 2003, p. 37). A noção de gênero é em muitas ocasiões corroboradas

pelo discurso popular tanto no caso de homens quanto de mulheres a uma suposta noção de

gênero, o que leva a certa conclusão de que a pessoa pertence a um determinado gênero em

virtude de seu sexo, devendo consequentemente atender aos desejos sexuais notavelmente

Educação e compromisso social

286

do sexo, uma estrutura aparentemente e moralmente coerente, correta. Uma naturalização

tão fortemente estabelecida e poucas vezes criticada, mas que não é impossível de contestar

e alterar.

Gênero é, assim, constituído, e dimensiona um processo no qual não se pode dizer

com acerto que tenha uma origem ou um fim, sendo uma prática discursiva contínua, sempre

aberto as intervenções e re-significações. “O gênero é a estilização repetida do corpo, um

conjunto de atos repetidos no interior de uma estrutura reguladora altamente rígida, a qual

se cristaliza no tempo para produzir a aparência de uma substância, de uma classe natural de

ser” (BUTLER, 2003, p. 59); desse modo, há várias forças que policiam os corpos, seus atos e

gestos a uma aparência social do gênero e da própria necessidade da aparência naturalizada.

In/conclusão

A tradição do brinquedo de miriti estar sendo reinventada por esses novos

elementos, temas, estética que estão sendo incorporados aos brinquedos, trazendo as

marcas, traços de uma mulher como potência. Romper as fronteiras culturais não é tarefa

fácil, principalmente para um sujeito que sai de sua posição de costume, para assumir outra,

de inovação, re-significação.

Sexo-Gênero-Corpo são regulamentados por mecanismos culturais, com vista a

transformação de masculinos e femininos hierarquizados, comandados a um só tempo pelas

instituições culturais, como a família, a escola, a igreja e as leis, encarregadas de produzir e

reproduzir as estruturas sociais e subjetivas, impulsionando o desenvolvimento individual de

cada um, dentro dos marcos de uma distinção entre a heterossexualidade legítima e

homossexualidade ilegítima.

Referências

BUTLER, Judith. Problemas de Gênero: Feminismo e Subversão da Identidade. Tradução: Renato Aguiar, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.

CLIFFORD, James. A experiência etnográfica: antropologia e literatura no século XX. Org. José Reginaldo Santos Gonçalves. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1998.

COLLING, Leandro. O que perdemos com os preconceitos? In: Ditadura Heteronormativa. CULT - Revista Brasileira de Cultura. Editora Bregantini, n. 202, Junho, 2015. ISSN 1414707-6.

JUNQUERIA, Rogério Diniz. Pedagogia do Armário: ditadura Heteronormativa. Cult - Revista Brasileira de Cultura. ISSN: 1414707-6, n. 202, Junho, 2015.

Educação e compromisso social

287

LOURO, Guacira Lopes. Uma Sequência de atos. Queer: Cultura e Subversões das identidades. CULT - Revista Brasileira de Cultura. São Paulo, Editora Bregantinin, n. 6, Janeiro de 2016. ISBN 85-89882-17-9.

PERROT, Michele. Mulheres públicas. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1998.

SCOTT, Joan W. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação & Realidade, Porto Alegre, V. 20, n. 2, jul/ dez, 1995.

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NARRATIVAS DE JOVENS SOBRE GÊNERO E SEXUALIDADE: SILENCIAMENTO NO CURRÍCULO ESCOLAR

Maiara e Silva Oliveira124

Vilma Nonato de Brício125

Introdução

O presente trabalho apresenta resultados da pesquisa “Narrativas dos Jovens sobre

Gênero e Sexualidade na Escola Básica”, o/as qual/is relatam suas experiências vividas, tendo

como objetivo analisar os conteúdos por eles narrados, no intuito de problematizar as

questões de gênero e sexualidade. Para essa discussão utilizamos algumas noções do autor

Michel Foucault (1998) assim também como o autor Tomaz Tadeu da Silva (2004) que discute

currículo; Guacira Louro (1992) e Joan Scott (1994) sobre gênero e Juarez Dayrell (2009) que

vem discutir sobre juventude.

O trabalho com narrativas nesse projeto ajuda os jovens a refletirem sobre as questões

envolvendo gênero e sexualidade, pois muitos não têm segurança para relatar suas

experiências quanto aos assuntos. Portanto, com este trabalho será possível trazer cada vez

mais essa discussão para dentro da escola e assim ajudar os jovens com suas dúvidas assim

como problematizar questões de homofobia, sexismo, machismo, misoginia, racismo que

povoam as narrativas e vivencias dos alunos e alunas na escola e fora dela.

Como a escola pode estar contribuindo para que o preconceito de gênero e

sexualidade possam ser minimizados em nossa sociedade? Por que os debates de gênero e

sexualidade ainda são considerados tabus tanto na escola quanto nos lares de jovens

estudantes, de forma que os mesmos se retraem, ou são retraídos nas referidas instituições

no tratamento desses temas? A escola proporciona discursões sobre essas temáticas e sobre

quais perspectivas esses debates estão sendo feitos? Essas foram as principais dúvidas que

ficaram permeando na construção desse trabalho, as quais foram problematizadas e em

seguida trazidas para uma discussão. Falar de sexualidade ainda traz um desconforto para os

jovens e não só para eles como para sua família. Em muitos relatos as jovens trouxeram para

a discussão que não há diálogo com os pais em casa, e que na escola os/as professores/as

124 Estudante do Curso de Pedagogia/Universidade Federal do Pará. E-mail: [email protected] 125 Diretora da FAECS/CAAB/UFPA; Professora do PPGCITI, na linha de pesquisa Identidades: linguagens,

práticas e representações. Líder do Experimentações/CNPq. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

289

comentam as principais causas de violência contra homossexuais, mulheres e todos os tipos

de discriminação que há por não tratar sobre os assuntos de gênero e sexualidade.

Outra questão abordada na pesquisa foi sobre o preconceito sofrido pelos jovens que

são homossexuais. Sabe-se que hoje as pessoas que se declaram pertencer a um grupo

considerado fora do padrão estarão sujeitos ao preconceito, à violência que inclui

xingamentos, agressão física e até mesmo a morte. Mesmo com tantas lutas e

reconhecimento dos direitos ainda sofrem os maus de uma sociedade intolerante, hostil.

1 A arte de analisar

No primeiro momento foi realizado o estado da arte, este levantamento foi feito no

site Scielo126 no qual se encontra diversas Revistas Acadêmicas, em bibliotecas e também em

outros sites da internet onde tive acesso aos livros em PDF. O essencial foi dar prioridade aos

eixos norteadores desta pesquisa que são: currículo, gênero, sexualidade, juventude e

narrativas. Depois de todo esse processo foram feitas as seleções dos textos, com isso

começou a leitura e fichamento. Os encontros do Grupo Experimentações sob coordenação

da Profª Draª Vilma Brício, que ocorrem na Universidade Federal do Pará ajudaram bastante,

pois os estudos e debates dos textos e livros contribuíram para melhorar nossa compreensão

sobre os assuntos que seriam pesquisados para elaboração deste trabalho.

Com a permissão da direção da Escola Estadual da Zona Urbana em Abaetetuba/Pa,

para realizar as entrevistas, foram selecionados jovens estudantes, acima de 18 anos de idade

do Ensino Médio o/as qual/is assinaram o termo de Consentimento Livre e Esclarecido. A

seleção dos entrevistados se deu por meio de questionário onde foram selecionados moças e

um rapaz. Logo em seguida foram realizadas as entrevistas semiestruturadas nas quais o/as

próprio/as narram sobre suas experiências sobre gênero e sexualidade. As entrevistas foram

gravadas no celular e logo em seguida transcritas, as identidades dos jovens foram

preservadas e para identificá-los serão usados nomes fictícios.

126 http://www.scielo.org/php/index.php

Educação e compromisso social

290

2 Narrativas em destaque

A pesquisa tem possibilitado reflexões sobre gênero e sexualidade no âmbito

educacional, em sua multiplicidade teórico-metodológica com base nas narrativas de jovens

do Ensino Médio. Nessa linha de raciocínio Louro (1998, p. 87-88) observa:

É indispensável admitir que a escola como qualquer outra autoridade social, é, queiramos ou não, um espaço sexualidade e generificado. Na instituição escolar, estão presentes as concepções de gênero e sexuais que, histórica e socialmente, constituem uma determinada sociedade. A instituição, por outro lado, é uma ativa constituidora de identidades de gêneros sexuais.

A escola como visto, é um espaço onde são identificadas inúmeras identidades, assim

como em qualquer outro lugar, portanto cabe a ela lidar com essas diversidades, e também

ser a mediadora para haver construção dessas identidades. Ao perguntar aos jovens se há

espaço para diálogo sobre gênero e sexualidades em suas famílias eles relataram que:

Na maioria das vezes não, mas de vez em quando até que tem quem conversava antes comigo era meu pai, mas como ele ficou ausente, então minha mãe de vez em quando senta para conversar comigo. Ela conversa sobre filhos, sobre família em não engravidar menina cedo, sendo que eu não tenho trabalho, esses tipos de coisas (FELIPE, 19 anos).

Não. De nenhuma forma, a gente nunca teve interesse em saber (ALESSANDRA, 20 anos).

Na fala do jovem Felipe percebe-se que a sexualidade para a mãe do jovem ainda está

voltada para a família tradicional, visto que hoje os tipos de família já têm diversas outras

formas e que não se enquadra somente a este padrão. Já na fala da jovem Alessandra o que

se percebe é que não há nenhum tipo de interesse em saber desse assunto. A jovem

Alessandra em uma de suas falas, relatou que somente percebeu a diferença de gênero

quando “Com 10 anos, quando vi um homem se beijando com outro, por que eu não entendia

como era, desses que são homossexuais e não entendia o que era e achava muito estranho

isso”. Para esta jovem a questão de gênero até o presente momento não estava claro, visto

que só foi entender quando presenciou o beijo entre o casal homossexual.

Na escola onde desenvolvi a pesquisa o diretor me explicou que as discursões sobre

gênero e sexualidade acontecem a cada duas semanas onde são feitas palestras e também

como forma de orientar os jovens a serem mais flexíveis quanto aos assuntos de gênero e

sexualidade e ainda me falou que esses debates acontecem devido os pais ainda terem

estranhamento por acharem que os docentes irão ensinar seus filhos sobre sexo, então as

palestra e discursões são também direcionadas a este público para que também haja conversa

Educação e compromisso social

291

dentro de casa com filhos. Embora a escola tenha espaço para debate sobre esses temas, ele

me relatou que “os debates ainda são novos dentro do espaço escolar, visto que, tanto para

os pais quanto para os alunos, essa abordagem ainda causa impacto”, os mesmos não

participam o que fica claro na fala do jovem Felipe “Sim, de vez em quando tem só que eu não

gosto de participar, sou, mas fechado quando se trata desses assuntos”. E quando ele tem

suas dúvidas relatou que:

A minha mãe me responde, eu já tive dúvidas e sempre que isso acontecia, porque isso era quando era pequeno então recorria a ela e ai ela achava a melhor forma de me explicar. Tipo quando era criança, eu perguntava “mãe como é que se cria um bebê, como é que gera um bebê na barriga da mãe”, e assim ela ai me explicando tudo, ela não contava nos mínimos detalhes, mas ela falava. Hoje em dia tudo que eu preciso saber sobre esse assunto eu sei, quando estou muito em dúvida, eu procuro os amigos mais íntimos para conversar sobre o assunto, de vez em quando também recorro à internet, procuro me informar (FELIPE, 19 anos).

Felipe é um jovem que escapa dos momentos de discussões das referidas temáticas, tanto na

escola quanto em sua casa. Algo peculiar em Felipe é que ele é um jovem de 19 anos que mostra pouco

interesse por estes assuntos, principalmente por viver em nossa sociedade que hiperssexualiza os

corpos juvenis e nos subjetiva a desejar os mesmos. Pode ser que ele seja uma exceção, e de fato

prefira não discutir tais assuntos. Porém, veja que o próprio relata que quando fica em dúvidas, recorre

aos amigos mais íntimos ou pesquisa na internet, ou seja, fica explicito que o mesmo por algum motivo

prefere fazer pouca exposição sobre suas dúvidas. Quanto a pedir informações uma jovem narra que:

Às vezes tenho meu sentimento de culpa, mas depois eu me autoconselho, até porque nunca gostei de ficar pedindo conselho para os outros, por que se você estiver passando por um problema, você sabe a raiz do seu problema, você sabe disso, mas não quer enxergar e acaba pedindo conselho para outra pessoa que nem estar ciente do que estar acontecendo com você e ai a pessoa vai aconselhar o que ela faria e às vezes não é o certo para você, então eu prefiro-me autoconselhar (CARLA, 19 anos).

Quando perguntado a relação entre moças e rapazes da escola, os jovens têm opiniões

diferentes quanto a esse convívio, segundo isso:

Tem alguns que se comportam, tem um bom diálogo entre amigos, porem tem algumas que tipo são mais “cínicas” que gostam de ficar com os meninos, ficar falando sobre esses assuntos (FELIPE, 19 anos).

Tem uma divisão assim do respeito daquelas pessoas que aceitam e tem minha amizade como normal e aquelas pessoas que tem aquele certo preconceito no fundo e tentam disfarçar e também não fazem questão de falar comigo, a gente nota isso sabe, já tive problemas com preconceito, mas não me deixam levar por isso. Tipo assim é como o que as pessoas chamam de falsidade que se dizem amigas, mas quando estava só a gente “eram muito amigas” toda hora ficavam naquele carinho abraçando e quando

Educação e compromisso social

292

tinham meninos ou outras pessoas perto delas meio que se afastavam e eu fiquei sabendo que era por causa disso, mas também eu não ligo, ignoro e desprezo as pessoas e deixo de lado (CARLA, 19 anos).

Nos relatos dos jovens se vê como esse relacionamento de amizade às vezes pode não ser

preconceituoso, o jovem relata que na visão dele há uma relação boa com algumas pessoas e já com

outras nem tanto, pois acha que as moças acabam se envolvendo com os rapazes e colocam esses

assuntos na conversa. Já na fala da jovem que é homossexual algumas pessoas fingem que são amigas,

mas por conta de ter outra orientação sexual falam mal dela.

Quanto à orientação sexual de algumas pessoas, a sociedade ainda recrimina os homossexuais

e embora haja muitas lutas ao longo dos anos para reconhecer os direitos da livre expressão das

pessoas que se declaram homossexuais, a sociedade ainda tem preconceito e isso resulta em

agressões, xingamentos e até mesmo a morte dessas pessoas. Nas narrativas das jovens percebe-se:

Sim contra meu tio, foi horrível nós estávamos em uma festa e tinha várias pessoas de outros lugares e meu tio ia passando e um copo de cerveja caiu e um outro rapaz disse “há você não sabe por onde anda seu viado” e nossa família toda se revoltou queria bater no rapaz e mal ele sabia que o local da festa era a casa do meu tio, teve briga e muita discussão e fomos até pela justiça por conta disso (BEATRIZ, 22 anos).

Sim, na família tem mais pessoas homossexuais além de mim. Bom eu tenho um primo que ele se assumiu quase com 40 anos, porque teve medo e inclusive apanhou várias vezes dos pais dele por isso, mas agora já é normal esse preconceito (CLARA, 18 anos).

Já, sempre aquela tal piadinha de mal quando você sente que a pessoa não gostou, eu sempre falei olha preconceito da cadeia, eu falei para ver a pessoa se tocar nas atitudes dela, isso aconteceu aqui na escola, muitos falam não isso é só uma brincadeira, mas assim a gente já percebe que a pessoa vai tirar essas brincadeiras e a outra pessoa não se sente bem, mas a própria pessoa não toma uma atitude, iniciativa e acaba ficando por isso mesmo (ISABEL, 20 anos).

Com as falas das jovens percebe-se que o preconceito ainda predomina na sociedade

e as pessoas ainda sofrem muito com essas atitudes, pois para algumas pessoas os

homossexuais ainda causam um estranhamento e por conta disso acaba ocorrendo esses tipos

de transtornos, o que não justifica atitude de algumas pessoas que agem de forma violenta

contra as pessoas homossexuais.

Considerações finais

A pesquisa possibilitou uma discussão sobre gênero e sexualidade, nas quais os jovens

puderam narrar suas experiências e se expressar, dar voz a eles e assim possibilitar que os

Educação e compromisso social

293

mesmos saibam sobre gênero e sexualidade sobre os assuntos no qual muitos não têm em

casa e até mesmo na escola. Portanto este debate torna-se preciso, pois os jovens não se

sentem confiantes para relatar suas experiências e tem receio em falar de sexualidade, visto

que há preconceito e também por acharem que será falado somente sobre sexo, como os

mesmos relatam, é constrangedor, porém com o diálogo e a explicação acabam

compreendendo melhor sobre o assunto e assim a conversa acaba acontecendo e os jovens

depositam sua confiança para expor sobre suas opiniões sobre gênero e sexualidade.

Referências

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Educação e compromisso social

294

COLONIALIDADE DE GÊNERO, RESISTÊNCIA E FEMINISMO DECOLONIAL

Maylana Emanuelle Pereira dos Santos127

Clarice Almeida dos Santos128

Joyce O.S. Ribeiro129

Introdução

Este artigo resulta de pesquisa em desenvolvimento intitulada “A produção

generificada do brinquedo de miriti: uma leitura a partir do pensamento decolonial de María

Lugones/Pibic 2018-19”. Um dos objetivos do projeto é refletir as estratégias de domínio

cultural e de subjetivação do sistema moderno/colonial de gênero no atual estágio de

globalidade imperial. Aqui, apresentamos parte do que temos produzido na pesquisa,

contando com Quijano (2005), Mignolo (2005), Castro-Gómez (2005), Lugones (2008, 2011) e

Walsh (2013). Procedemos a reflexão por meio de pesquisa teórica, que envolve

procedimentos como o mapeamento de livros e artigos, a leitura e a documentação temática,

para posterior sistematização e análise.

O trabalho está organizado da seguinte maneira: iniciamos situando os procedimentos

para, em seguida, apresentar parte dos resultados sobre colonialidade de gênero e feminismo

decolonial.

1 Material e metodologia

No campo dos Estudos Culturais latino americanos, uma pesquisa teórica não pode ser

neutra e asséptica; precisa ser contingente e compromissada, pois as teorias são

historicamente construídas, e revelam interesses de classe, de gênero, de sexualidade, de

nação, de "raça"/etnia, de geração, já que resultam de decisões vinculadas à prática social.

Argumentamos com Apple (1994), que o trabalho teórico-crítico é relevante, pois toda ação

investigativa está ancorada em certa teoria e tem efeitos políticos. Pode parecer que a teoria

127 Aluna do curso de Pedagogia/FAECS/UFPA; Bolsista de IC/Fapespa/2018-2019. E-mail: [email protected] 128 Aluna do curso de Pedagogia/FAECS/UFPA; Bolsista de IC/CNPq/2018-2019. E-mail: [email protected] 129 Professora de Didática da FAECS/Campus Universitário de Abaetetuba; Professora do PPGCITI/CAAB/UFPA, na linha de pesquisa Identidades: linguagens, práticas e representações; líder do Gepege – Grupo de Estudos e Pesquisa Gênero e Educação/CNPq. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

295

esteja dissociada da prática, porém, contrariamente, ela está marcada pelos significados e

representações de quem a constrói. A teoria nunca fala por si própria.

Apple (1994), destaca que esta modalidade de pesquisa apresenta riscos, como o fato

de não ser compreendida e aceita por aqueles/as a que se destina, em razão de ser demasiado

abstrata e com linguagem hermética. Reconhecemos ainda, que a complexidade e a

sofisticação teórica do Grupo Modernidade/Colonialidade, inclui inúmeros termos e

ferramentas analíticas pouco familiares, mas próprios da episteme-em-formação do giro

decolonial. Isto posto, o esforço a ser dispensado é o de enfrentar os rumores desta episteme

inovadora, e tentar traduzi-la, contribuindo com a produção de conhecimento no campo dos

estudos de gênero.

A produtividade da pesquisa bibliográfica está em aprofundar e expandir o

conhecimento sobre certa teoria (SALVADOR, 1986), possibilitando o domínio de

determinadas abordagens e ferramentas analíticas. O modus operandi outro inclui:

levantamento da literatura pertinente, revisão da literatura, documentação, análise e

escritura. Esta modalidade de pesquisa faz uso de fontes primárias, ou seja, literatura na língua

original, no caso latino americano de obras em língua espanhola. O mapeamento da literatura

vem sendo realizado em bibliotecas virtuais e físicas, na intenção de encontrar o material

relevante para o desenvolvimento desta investigação, a saber, livros, e-books, artigos de

revistas científicas e teses. Nesta pesquisa, a documentação tem sido temática, sendo

realizada a partir de certos temas e/ou categorias analíticas.

O engajamento teórico é uma tarefa indispensável para a produção do conhecimento

situado, sendo repleto de possibilidades políticas.

2 Resultados e discussão

Os resultados ora apresentados são parciais, porém, já é possível notar o quão

promissor pode ser o debate decolonial para a análise dos problemas de gênero.

2.1 A colonialidade do poder e a racialização

A colonialidade do poder é uma lógica de poder e domínio que constituiu a

modernidade desde o século XVI, inaugurando um novo sistema-mundo, que é constituído

como fundamento das diferenças regionais e pela hierarquia entre centro, periferia e

semiperiferia. O sistema-mundo moderno/colonial possui características como: a apropriação

Educação e compromisso social

296

massiva da terra, a exploração do trabalho e a dispensabilidade das vidas humanas (QUIJANO,

2005). As vidas consideradas não-humanas foram dizimadas no genocídio étnico de Incas,

Maias, Astecas e muitas outras etnias nativas, no passado colonial, e mais recentemente, no

genocídio de judeus e povos africanos.

A colonialidade do poder foi imposta aos povos colonizados, afetando as relações

socioculturais, a autoridade, e a produção do conhecimento. Para Castro-Gómez (2005), a

colonialidade do poder amplia o conceito foucaultiano de poder disciplinar, ao mostrar que os

dispositivos panópticos erigidos pelo Estado moderno, inscrevem-se numa estrutura de

caráter mundial, configurada pela relação colonial entre centro e periferias. Por meio da

colonialidade do poder as nações imperiais controlaram territórios, produziram

conhecimentos descontextualizados, descorporizados, des-subjetivados, e inventaram a

diferença colonial, lançando mão de quatro mecanismos indissociáveis: os binarismos, as

representações, o eurocentrismo e a racialização. Para o momento, nos ateremos apenas a

racialização.

A racialização é um mecanismo disciplinar que inferioriza as culturas (costumes,

conhecimentos, línguas, religião, memórias) e os povos de regiões colonizadas. Por meio da

racialização foram produzidas as diferenças e as alteridades inferiorizadas, que permitiam o

domínio, o controle, e a subordinação, em relações verticalizadas e naturalizadas como

verdades universais e incontestáveis. Com discursos de que os povos nativos são selvagens, a

europa passou a ser considerada a civilização padrão, com a missão de “civilizar” os demais

povos. Um dos efeitos desse processo é que nossa região ainda é conhecida como um

continente de terceira classe ou subdesenvolvido. Nestas narrativas, os povos nativos

colonizados foram representados como: inferiores, selvagens, incultos, irracionais, indolentes,

rudes, sem capacidade cognitiva, violentos, brutos, sem modos, sem controle da sexualidade,

enfim, não-humanos. Os povos nativos do Sul foram negativamente representados e seus

saberes, ignorados.

2.2 Colonialidade de gênero: um conceito de María Lugones

Para analisar as relações entre os gêneros no mapa da colonialidade, agora contamos

com uma ferramenta inovadora: a colonialidade de gênero, que foi delineada por María,

filósofa argentina, feminista, e professora de Estudos da Mulher e Literatura Comparada na

Universidade de Binghanton, Nova York. No artigo Colonialidad y género (2008), Lugones

Educação e compromisso social

297

acompanha o giro decolonial e tece críticas à noção de gênero de Quijano (2005), considerada

por ela como limitada; por essa trilha, a autora chega a noção de colonialidade de gênero,

ferramenta específica para a análise da dominação colonial de gênero na América Latina.

A autora argumenta que o sistema moderno/colonial de gênero possui um lado claro

e outro obscuro: o lado claro, é o hegemônico, binário, branco e heterossexual; o lado obscuro

é a invisibilização e a exclusão da diferença colonial, dos não-ditos, dos não-brancos e

transgêneros. Seguindo a trilha delineada pelo giro decolonial, Lugones busca desconstruir a

colonialidade do poder ainda presente nas relações sócio culturais no atual mapa do sistema-

mundo moderno/colonial, mascadas pela hierarquização racializada dos humanos: o homem

branco, naturalmente racional; a mulher branca, reprodutora da dominação colonial; e os

não-brancos, negros, índios e mestiços, os bestializados. A hierarquia racializada consegue

agudizar ainda mais a exclusão de gênero, ao não representar as mulheres indígenas-negras-

mestiças, por considerar que estas não podem ser representadas na categoria universal

“mulher”, nem nas categorias índio e negro.

Da perspectiva dos processos de subjetivação, a colonialidade do ser constitui

identidades e subjetividades subalternas, inferiorizadas e silenciadas − a despeito das

resistências −, na tentativa de garantir a hegemonia imperial. É a partir da colonialidade do

ser que surge a colonialidade de gênero. Por meio da noção de colonialidade de gênero,

Lugones (2008, 2011) parte da cartografia das relações de gênero constituídas no contexto

modernidade/colonialidade, buscando uma crítica a tal arranjo. Para a autora, a colonialidade

de gênero foi uma estratégia usada para legitimar a dominação e o controle colonial,

produzindo o masculino e o feminino por meio de intervenções cirúrgicas nos corpos e

mentes, na intimidade, nos modos de ser-sentir das vivências cotidianas, tudo para constituir

identidades e subjetividades adequadas aos gêneros e sexualidades europeus, supostamente

normais.

Na teorização de Lugones (2008), o gênero é um construto social, relacional, uma

ficção ancorada na diferença colonial produzida por suas estratégias e mecanismos de

domínio para legitimar o poder imperial. Assim, considerando a modernidade/colonialidade e

esta noção de gênero, Lugones compõe a colonialidade de gênero, uma noção útil para

descrever, explicar e analisar como os gêneros europeus hegemônicos foram reproduzidos e

produzidos no Sul, bem como para se contrapor aos discursos coloniais de gênero e

sexualidade. Para superar o domínio colonial de gênero, Lugones (2008) argumenta sobre a

Educação e compromisso social

298

necessidade de pensar e produzir um feminismo decolonial, capaz de constituir as

ferramentas representativas dos não-ditos da modernidade colonial, mulheres índias-negras-

mestiças-lésbicas, provocando questionamentos e impulsos de superação das colonialidades

que homogeneizaram a “mulher” para manter a universalidade de gênero e invisibilizar a

realidade das mulheres nativas.

2.3 Rumo a um feminismo decolonial

Para superar a dominação colonial é imperativo uma ação, ou a construção de um

feminismo decolonial capaz de construir categorias representativas dos não-ditos da

modernidade/colonial; requer também um pensar alternativo, por meio da intersecção entre

as ferramentas raça-gênero-sexualidade-classe-geração, para que as mulheres de cor tenham

visibilidade, assim como suas lutas e particularidades. A interseccionalidade entre estas

ferramentas sugere a não essencialização e a não naturalização do gênero, da sexualidade e

da raça, de forma que não existe a Mulher, tão pouco a mulher negra, ou mulher índia, ou

ainda mulher heterossexual. Existem mulheres.

No violento processo de colonização das américas, o homem branco europeu seria a

marca da civilização, um ser considerado completo e apto a decidir sobre qualquer coisa. A

mulher europeia não era vista como seu complemento, mas apenas como reprodutora da raça

e do capital, por meio de sua pureza sexual, passividade e obediência. Os homens e mulheres

colonizados não eram vistos como homem e mulher, pois não manifestavam as características

do colonizador branco e europeu, logo, eram julgados do ponto de vista do eurocentrismo

como inferiores, sendo classificados segundo a dicotomia hierárquica como não humanos,

consequentemente não civilizados, animais selvagens e bestiais. Sendo assim, esse sistema

desconsiderou as estruturas sociais que já haviam antes da chegada do colonizador branco,

inferiorizando e apagando as identidades dos povos colonizados, justificando suas ações por

meio da missão “civilizatória” colonial, que naturalizou a superioridade do homem branco

europeu sobre o povo colonizado, a heterossexualidade como “padrão” e a colonialidade de

gênero como norma.

Lugones (2011) não pensa homens e mulheres colonizados somente como seres

unilateralmente oprimidos, mas como seres que resistem as colonialidades do poder, do

saber, do ser e de gênero, pois, embora tenham suas lutas silenciadas e negadas, suas

subjetividades oposicionistas os situa uma política de resistência; por outro lado, o colonizado

Educação e compromisso social

299

não é somente alguém construído a partir da colonização, mas alguém que também habita

um lócus fraturado, em um movimento de tensão entre o moderno e não moderno. A

resistência não é o fim ou o objetivo de uma luta política, mas um caminho, um ponto de

partida para pensar sobre a política. Nesse sentido, a autora se propõe a entender a

resistência à colonialidade de gênero a partir da diferença colonial, na medida em que para

haver resistência a esse sistema, é necessário que a diferença colonial seja visível, o que

permite a crítica a opressão de gênero, rumo a outra arte de viver e se ser.

O feminismo decolonial é, assim, uma possibilidade real de superação construído por

mulheres do Sul, subalternizadas. Por esta via é também possível visualizar as tensões entre

os múltiplos marcadores sociais, diluindo o universalismo feminista branco e heterossexual

que exclui a luta das mulheres mestiças, negras e indígenas. Assim fazendo, afirma a

necessidade de conhecer as múltiplas histórias, as identidades e as subjetividades mestiças

das mulheres, na direção da resistência e da reação ao sistema-mundo moderno/colonial de

gênero.

Conclusão

A colonialidade de gênero, é uma estratégia que legitima a dominação e o controle

colonial, produzindo o masculino e o feminino por meio de intervenções cirúrgicas nos corpos

e mentes, nos modos de ser-sentir de mulheres e homens em suas vivências cotidianas; o

objetivo final é a constituição de identidades e subjetividades adequadas aos gêneros e

sexualidades europeus, considerados como padrão. Para alcançar tal intento, a racialização

foi tomada como mecanismo disciplinar, para inferiorizar as culturas e os povos de regiões

colonizadas.

A resistência a colonialidade de gênero pode ser pensada e praticada por meio da

pedagogia decolonial, que se constitui de um conjunto de ações estratégias com a intenção

de interconectar os sujeitos por meio de uma ética e uma política outras, articulando a

igualdade e a diferença no mapa cultual e social particular da América Latina. A pedagogia

decolonial promove insurgências que fraturam o poder colonial, sendo uma prática útil no

fortalecimento das resistências e das insurgências étnicas, de gênero e sexuais, sendo possível

experimentá-la tanto nos ambientes escolares como nos extraescolares.

Educação e compromisso social

300

Referências

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ESCOBAR, Arturo. O lugar da natureza e a natureza do lugar: globalização ou pós-desenvolvimento? A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais - perspectivas latino-americanas. Buenos Aires: CLACSO, 2005.

LUGONES, María. Hacía um feminismo descolonial. La manzana da discórdia. V. 6, N. 2, 2011.

______. Colonialidad y género. Tabula rasa. Universidad Colegio Mayor de Cundinamarca, Bogotá, Colombia n. 9, 2008. p. 73-101.

MIGNOLO, Walter D. A colonialidade de cabo a rabo: o hemisfério ocidental no horizonte conceitual da modernidade. In: LANDER, Edgardo (Org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais: perspectivas latino-americanas. Buenos Aires: CLACSO, 2005.

QUIJANO, Anibal. Colonialidade do Poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, Edgardo (Org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais - perspectivas latino-americanas. Buenos Aires: CLACSO, 2005.

RESTREPO, Eduardo; ROJAS, Axel. Inflexión decolonial: fuentes, conceptos y cuestionamientos. Popayán: Universidad del Cauca, 2010.

WALSH, Catherine (Ed.). Pedagogías decoloniales: prácticas insurgentes de resistir, (re)existir y (re)vivir. Quito, Ecuador: Ediciones Abya-Yala, 2013.

Educação e compromisso social

301

A “PRODUÇÃO GENERIFICADA” DO BRINQUEDO DE MIRITI: UMA ANÁLISE A PARTIR DA TEORIZAÇÃO DE MARÍA LUGONES

Clarice Almeida dos Santos130

Maylana Emanuelle Pereira dos Santos131

Joyce O.S. Ribeiro132

Introdução

Este trabalho tem como objetivo analisar a produção generificada do brinquedo de

miriti como efeito da colonialidade de gênero. Por meio de pesquisa teórica em andamento,

temos produzido informações a partir do mapeamento, da seleção, da leitura e interpretação

do pensamento decolonial de María Lugones (2008, 2011), dando destaque para duas de suas

ferramentas analíticas: sistema-mundo moderno/colonial de gênero e colonialidade de

gênero.

Dois aspectos da colonialidade de gênero constituem a produção generificada do

brinquedo de miriti: o catolicismo e o patriarcalismo. Nesta perspectiva, a produção

generificada está ancorada em uma cultura de gênero imposta pelos processos de colonização

do Brasil, pois o gênero foi parte da estratégia que o consolidou, articulando valores,

costumes, religiosidade e família. Desse modo, a cultura de gênero foi produzida e

reproduzida em todos aspectos da esfera social, colonizando ideias, crenças, gestos e práticas.

Concluímos pela necessidade de um feminismo decolonial, capaz de produzir outra arte de

viver e de ser.

Organizamos o artigo de modo a iniciar descrevendo a produção generificada para, em

seguida, adentrar nas contribuições de María Lugones. Encerramos explorando brevemente o

feminismo decolonial.

1 Materiais e métodos

Como o objeto de estudo é de natureza teórica, não exigindo pesquisa empírica, a

130 Aluna do curso de Pedagogia/FAECS/UFPA; Bolsista de IC/CNPq/2018-2019. E-mail: [email protected] 131 Aluna do curso de Pedagogia/FAECS/UFPA; Bolsista de IC/Fapespa/2018-2019. E-mail: [email protected] 132 Professora de Didática da FAECS/Campus Universitário de Abaetetuba; Professora do PPGCITI/CAAB/UFPA, na linha de pesquisa Identidades: linguagens, práticas e representações; líder do Gepege – Grupo de Estudos e Pesquisa Gênero e Educação/CNPq. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

302

decisão metodológica é pela pesquisa bibliográfica. Apple (1994), destaca que esta

modalidade de pesquisa apresenta riscos, como o fato de ser incompreendida e descartada

por aqueles/as a quem se destina, em razão da abstração e linguagem hermética. Acreditamos

que o trabalho teórico-crítico é relevante, pois toda ação investigativa está ancorada em certa

teoria e tem efeitos políticos (APPLE, 1994).

A produtividade da pesquisa bibliográfica está em permitir aprofundar e expandir o

conhecimento sobre certa teoria (SALVADOR, 1986), possibilitando ainda o domínio de

determinadas abordagens e ferramentas analíticas.

A pesquisa bibliográfica no campo decolonial assume outro etos e outro modus

operandi. O modus operandi inclui: levantamento da literatura pertinente, revisão da

literatura, documentação, análise e escritura. O etos é o da episteme nativa, marcado pela

negação da objetividade, pela afirmação da contingência, das relações de poder e da

diferença.

Esta pesquisa faz uso de fontes primárias, ou seja, literatura na língua original, no caso

latino americano, de obras em língua espanhola, evitando traduções. O levantamento da

literatura tem sido realizado em bibliotecas virtuais e físicas, em busca de material relevante

como livros, e-books, artigos de revistas científicas e teses. A documentação é temática, e

realizada a partir da indicação de temas e/ou categorias analíticas.

Concluímos esta parte destacando que o engajamento teórico precisa ser considerado

uma tarefa relevante e indispensável para a produção de conhecimento situado e para a

cumulatividade do conhecimento científico, podendo ser levado a efeito como parte de um

projeto investigativo repleto de possibilidades políticas.

2 Resultados e discussões 2.1 O brinquedo de miriti e a produção generificada

O artesanato de miriti, popularmente chamado de brinquedo de miriti, é duplamente

central para a economia e para a cultura local de Abaetetuba: tem centralidade econômica,

por garantir renda a centenas de famílias, e centralidade cultural, por ancorar a tradição

bicentenária e o patrimônio cultural. Em outro lugar já exploramos a invenção desta tradição

com o apoio de Hobsbawn (1984) e Williams (1992), refletindo também sobre o patrimônio

Educação e compromisso social

303

cultural imaterial133. Aqui, vamos nos ater a apenas um dos elementos da tradição

bicentenária: a produção generificada.

A produção do brinquedo de miriti se dá por meio de um processo que denominamos

de produção generificada, ancorado na crença de que existe trabalho bruto e trabalho leve.

Os homens fazem o trabalho bruto, caracterizado pelo cortar, lixar e aplicar massa e/ou

selador; o corte conta dois momentos: o corte dos braços de miriti da palmeira do miritizeiro,

que qualquer homem pode fazer; e o corte-modelagem dos brinquedos, realizado nos ateliês.

É importante ressaltar que, independente de qual seja o brinquedo, é só o artesão-chefe quem

corta e modela. O trabalho leve é desenvolvido pelas mulheres, e envolve a pintura e o

acabamento das peças. Em geral, nos dois ateliês pesquisados134 não havia a percepção da

divisão generificada de tarefas, pois os artesãos e as artesãs foram enfáticos em afirmar que

nunca perceberam tal divisão, e que a consideram natural.

O corte-modelagem é considerado um “dom”, uma tarefa quase sagrada, que compete

só aos homens pois são considerados naturalmente destemidos e habilidosos, já que para

eles/elas este não é um trabalho simples e fácil, mas que requer destreza e técnica. A crença

no suposto dom, segundo Canclini (1989) está na fé de que a inspiração dos artesãos emana

dos deuses. Há vários discursos que justificam a masculinização do corte-modelagem: o

suposto perigo e a consequente exigência de habilidade. O artesão-chefe, para proceder ao

corte-modelagem manuseia uma faca com fio cortante, considerada excessivamente

perigosa, pois cotidianamente até o artesão mais hábil e cuidadoso sofre com ferimentos nas

mãos. A permanente ameaça de ferimentos em mãos pouco habilidosas mantém o corte-

modelagem como tarefa masculina, e a pintura-acabamento como tarefa feminina, pois além

de serem consideradas mais delicadas e pacientes, as mulheres seriam mais cuidadosas com

os detalhes e com a aparência final das peças. Estes são alguns aspetos da cultura de gênero

dos ateliês, que vem sendo produzida e reproduzida a partir dos significados da cultura de

gênero hegemônica, configurando hierarquias e desigualdades entre artesãos e artesãs, pois

é o artesãos-chefe quem representa o brinquedo de miriti na esfera pública, o que lhes

133 RIBEIRO, Joyce; SARGES, Lidia; DÁCIO, Igora. A representação cultural do corpo no artesanato de miriti. ANAIS V Seminário Internacional Enlaçando Sexualidades – Salvador, 2017; RIBEIRO, Joyce; SARGES, Lidia; DÁCIO, Igora; ALEXANDRE, Joneide. A produção generificada do brinquedo de miriti: espaço para o re-existir por meio da pedagogia decolonial. ANAIS 38 Reunião Nacional da ANPED; RIBEIRO, Joyce; SARGES, Lidia; ALEXANDRE, Joneide. Brinquedo de miriti: a força pedagógica da cultura local no currículo. Revista Nuances: estudos sobre Educação, Presidente Prudente-SP, v. 28, n. 2, p.227 - 245, Maio/Agosto, 2017. ISSN:2236-0441. 134 Durante a pesquisa Prodoutor 2013-15, foram etnografados dois ateliês: um ligado a Asamab e outro ligado a Miritong, as duas associações de artesãos existentes na cidade de Abaetetuba/Pa.

Educação e compromisso social

304

proporciona autonomia, liberdade e desenvoltura. As artesãs, como são também donas de

casa, se comprometem com estas tarefas, o que as impede de acompanhar os artesãos na

maioria das atividades fora do ambiente dos ateliês. Porém, há muitas ultrapassagens de

fronteiras de gênero cotidianas, motivadas pela agenda de encomendas e por relações

familiares, porém, em razão do espaço não exploraremos tais resistências, nos atendo a focar

na compreensão da produção generificada a partir das contribuições de María Lugones.

2.2 A colonialidade de gênero de Maria Lugones

María Lugones é filósofa e feminista argentina. Atualmente é Professora de Literatura

Comparada, Interpretação, Cultura e Filosofia dos Estudos da Mulher na Universidade de

Binghamton, em Nova Iorque. Algumas de suas publicações circulam no Brasil traduzidas, mas

há uma produção intensa disponível apenas em espanhol e inglês. No ano de 1998, Lugones

passou a fazer parte do Grupo Modernidade/Colonialidade, que agrega pesquisadores da

América Latina como Anibal Quijano, Walter Mignolo, Santiago Castro-Gómez, Arturo Escobar

e Eduardo Restrepo, para citar apenas estes, todos responsáveis pelo giro decolonial, um

movimento político, epistêmico e ético que analisa as relações de poder da aventura colonial

nas Américas e seus efeitos nas identidades e subjetividades. É nesse mapa epistêmico e

político que a autora cunha o termo colonialidade de gênero, ferramenta específica para a

análise do contexto da América Latina.

Lugones (2008) conceitua o gênero como uma das formas de opressão colonial. Para

explorá-lo, a autora parte da consideração de certo contexto sócio histórico e de uma crítica

teórica: o contexto é o sistema-mundo moderno/colonial; e a crítica é a noção de gênero

delineada por Quijano (2005), considerada pela autora como limitada. Para Lugones (2008),

se o sistema-mundo moderno/colonial possui uma dimensão de gênero, a crítica precisa ser

disparada. Para tanto, promove a intersecção entre colonialidade, raça, e gênero, e elabora o

conceito de sistema-mundo moderno/colonial de gênero, inserido-o como parte da

colonialidade do poder. O sistema-mundo moderno/colonial de gênero tem um lado obscuro

e outro claro. O lado claro é o hegemônico, binário, branco e heterossexual; o lado obscuro é

a invisibilização da diferença colonial, da multiplicidade, e a exclusão das mulheres, dos não-

brancos, e dos transgêneros.

A crítica à noção de gênero de Quijano (2005), delineia-se na medida em que Lugones

(2008) argumenta que o sociólogo peruano faz uma análise potente da colonialidade do

Educação e compromisso social

305

poder, porém, ao descrever e analisar os gêneros se mantém atado ao padrão heterossexual

eurocêntrico, focando na disputa pelo controle do sexo, seus recursos e produtos. Ao centrar

suas análises nas relações inerentes ao controle do sexo, sobre quem controla e quem é

controlado, Quijano (2005) negligencia a intersecção do gênero com outros marcadores

sociais como raça e sexualidade.

A noção de colonialidade de gênero de Lugones parte da cartografia das relações de

gênero nesse contexto de modernidade/colonialidade, sendo sua construção, um modo de

crítica a tal arranjo. Para Lugones (2008), gênero é uma ficção que legitima a colonialidade do

poder por meio da dominação racial e de gênero. O sistema-mundo moderno/colonial de

gênero está preso nos binarismos homem-mulher, branco-negro-indígena-mestiço,

heterossexual-homossexual, o que limita seu poder analítico, pois desconsidera as mulheres

e homens de cor, a geração, e as sexualidades múltiplas. A autora concorda que a

modernidade tem relação de interdependência com a aventura colonial nas américas, pois

desde o início a hegemonia e a legitimação foram garantidas pela violência e pelo controle da

representação, das identidades e das subjetividades. A colonialidade do poder garantiu o

processo de dominação colonial nas muitas dimensões da vida, que segue sendo reproduzido

e produzido, precisando ser questionado e superado.

Lugones (2008, 2011) argumenta que a colonialidade de gênero foi usada para

legitimar a dominação e o controle colonial, por meio da constituição de certas identidades e

subjetividades, intervindo, desse modo, na produção do masculino e do feminino, para

adequá-los ao gênero europeu hegemônico; para chegar a este fim, promoveu intervenções

cirúrgicas para definir a sexualidade e o gênero verdadeiros.

O sistema mundo moderno/colonial de gênero estendeu seus tentáculos, também, no

caso da aventura colonial lusitana no Brasil, sendo possível notar a colonialidade de gênero

subjetivando mulheres e homens em vários períodos. Nos mapas da colonização e da

descolonização, o interesse pelas questões de gênero e da Mulher se mostraram fortes, já

que, no primeiro caso, não há como negar a presença da Mulher em qualquer processo social;

e, no segundo caso, os discursos sobre o “papel135” da Mulher na construção das novas nações

estiveram presentes, sendo permanentemente acionados, conclamando as mulheres ao

empenho no projeto de descolonização com a justificativa de que estas tinham um papel

135 O uso do termo “papel” é criticado por Louro (1997), pois remete a condutas e ações fixas, o que impediria certas ultrapassagens de fronteiras e negociações na experiência de gênero.

Educação e compromisso social

306

significativo no processo de construção da nação. Na maioria dos casos, este “papel” foi

reduzido ao cuidado e educação dos futuros cidadãos.

Os gêneros na sociedade colonial são determinados por um traço patriarcal, o que se

traduz em um grande contingente de mulheres subordinadas às normas ditadas por homens,

pais e/ou maridos. Porém, é possível perceber a participação das mulheres no cotidiano da

vida na colônia o que, em alguma medida, mostra a resistência à lógica da dominação. No

século XVII aumentou o número das escravas de ganho nas cidades, mulheres negras e

mestiças ambulantes que comercializavam doces, pães, bolos, rendas, bordados, tecidos e

miudezas de todo o tipo, entregando aos seus donos e donas, o ganho do dia. O objetivo deste

tipo de comércio era conceder às mulheres pobres um exercício honesto de sustentação

evitando a prostituição136. Nos centros urbanos do século XVIII, muitas mulheres estavam

envolvidas com o comércio, enquanto outras rompiam com o casamento e lutavam por

autonomia em uma sociedade cuja sobrevivência era masculina. Elas não só sustentavam suas

casas, mas transitavam nas cidades. Na esfera privada, muitas mulheres detinham certo poder

sobre os criados e negociavam com o marido direitos e tarefas. Sendo assim, para Del Priore

(2006, 2011, 2016), o lugar da mulher no espaço colonial constituiu-se como plural. O

comércio de que fala a autora, refere-se a administração de pequenos negócios como

tavernas e vendas; elas eram estalajadeiras137 costureiras, tecedeiras, “mestras de ensinar

moças a lavrar e cozer”, padeiras. Como padeiras promoviam greves, elaboravam petições e

protestos para controlar o preço do pão.

As relações de gênero no Brasil colonial e descolonial, foram marcadas pela

normatividade produzida e divulgada pela cultura portuguesa: seus costumes, tradições,

hábitos, crenças e valores. Dois outros duradouros traços desta cultura são a língua

portuguesa e a religiosidade: a língua portuguesa e o catolicismo foram impostos a toda

sociedade colonial, subjetivando homens e mulheres nativos e a despeito de terem sido

forçados a esquecer suas tradições ancestrais, a língua materna dos primeiros brasileiros até

meados do século XVIII foi o tupi. A agenda era uma só: civilizar, educando nos princípios

cristãos e da cultura europeia, padrão civilizatório e universal a ser seguido.

136 Mulheres livres e escravas vendiam seu corpo também, gerando tensão entre estas e os comerciantes e

escravos ambulantes, gerando reclamações em razão da obrigatoriedade de pagar impostos. O toque de recolher ou regulamentos que as obrigavam a ficar atrás do balcão raramente as incomodava. 137 Proprietárias de estalagens.

Educação e compromisso social

307

Segundo a lógica cristã, a família deveria ser constituída pelo modelo formado por pai

e mãe casados na Igreja, o que traduz o ideário do Vaticano definido no Concílio de Trento

(1545-1563). Este modelo de família foi parcialmente concretizado, pois a despeito do discurso

religioso oficial, outros arranjos familiares138 foram negociados no cotidiano. Ainda assim, a

família foi central no processo de colonização, pois se constituía como pilar em todos os

estágios da produção agrícola e comercial. Na vida privada, a grande família se reunia em

torno de um chefe, pai e provedor, temido, que impunha a lei e a ordem em seus domínios; a

autoridade patriarcal garantia a união entre parentes, e a obediência dos escravos. Algumas

marcas do passado colonial sobrevivem: a família continua produzindo e reproduzindo

costumes, tradições, ensinando valores, e definindo condutas; ao final, a família ainda é um

espaço de poder.

Mesmo em tempo de globalização marcada pela velocidade da informação e pela

proliferação de uma infinidade de imagens, a cultura de gênero vem sendo definida por traços

coloniais, a despeito dos importantes avanços que resultaram das lutas das mulheres. O

patriarcalismo e o catolicismo definem, mas não isoladamente, a economia de gênero e as

relações entre mulheres e homens, nas mais diversas dimensões, instituições e instâncias,

entre as quais, os ateliês de produção do brinquedo de miriti. Desde o início da aventura

colonial no Brasil, o traço patriarcal se traduz em mulheres submetidas às normas patriarcais.

Mesmo que hoje estudem e trabalhem contribuindo com o sustento da família, que transitem

relativamente na cidade, na esfera privada e nos ateliês as artesãs pouco negociam com os

maridos e artesãos-chefe, não chegando a atuar como as padeiras que promoviam greves,

elaboravam petições e faziam protestos. É assim em razão dos significados da cultura

portuguesa terem sido naturalizados com a contribuição do catolicismo e seu modelo de

família, ainda central nas esferas pública e privada.

Conclusão

A produção do brinquedo de miriti se dá por meio de um processo que denominamos

de produção generificada, ancorado na crença da existência de trabalho bruto e leve. Essa

138 No contexto das classes populares, o casamento legal era raro, em razão da precária situação financeira as

famílias eram formadas por ligações transitórias e consensuais – concubinato – entre homens e mulheres livres, pobres e escravos cuja necessidade de estabilidade a fazia muito semelhante à família patriarcal, com respeito, e solidariedade, assim como tensões e violência são marcas de ambos os arranjos familiares.

Educação e compromisso social

308

divisão de tarefas está naturalizada e produz hierarquias e desigualdades entre mulheres e

homens.

Na busca pela compreensão de tal arranjo, acionamos María Lugones (2008, 2014) que

define gênero como uma ficção capaz de promover e legitimar a opressão no sistema-mundo

moderno/colonial, cujo lado obscuro é marcado pela invisibilização da diferença colonial, e

pela exclusão dos não-brancos, mulheres e transgêneros. Um dos conceitos centrais para a

análise da opressão colonial é a noção de colonialidade de gênero, centrada nos binarismos

homem-mulher, heterossexual-homossexual, branco-negro-índio-mestiço, o que limita o

diálogo entre os polos inconciliáveis.

No mapa da aventura colonial das américas, está o Brasil. As relações de gênero no

Brasil colonial e decolonial, foram marcadas pela normatividade produzida pela cultura

portuguesa, com seus costumes, tradições, hábitos, crenças, valores, enfim, sua cultura. Além

do patriarcalismo, a língua portuguesa e a religiosidade, são traços marcantes nas identidades

e subjetividades de mulheres e homens. Desse modo, a colonialidade de gênero garante o

processo de dominação colonial nas muitas dimensões da vida, precisando ser questionada e

superada.

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Educação e compromisso social

309

BIOPOLÍTICA E MUSICALIZAÇÃO: A MEDICALIZAÇÃO DO CORPO DA MULHER

Maria Antonia Paixão Feitosa139

Vilma Nonato de Brício140

Introdução

Este artigo busca através de uma análise bibliográfica evidenciar fatores que revelam

as políticas de governamento do corpo da mulher e a medicalização deste, como controle de

natalidade através do uso de anticoncepcionais. Tendo como foco principal para esta análise

as discussões foucaultianas sobre o dispositivo da biopolítica e da sexualidade, que exercem

o “papel” de domínio e controle da população.

Em História da Sexualidade I, (Foucault, 2006) no capítulo V, intitulado de “Direito de

morte e poder sobre a vida”, Michel Foucault faz uma reflexão sobre a Era Antiga e Clássica,

enfatizando que na Era Antiga o poder sobre a vida descendia da vontade e poder patriarcal,

onde o soberano (rei) tinha o poder e direito de se apoderar da vida para suprimi-la, enquanto,

que na Era Clássica o que se exerce é um dispositivo ou mecanismo de controle precisos e

reguladores sobre a vida. Este dispositivo ou mecanismo de regulação é então o que precisa

ser controlado; a sexualidade, uma vez controlado este discurso perde seu grande objetivo

que é a subjetivação dos pensamentos e do exercício da própria sexualidade.

Nesse viés, a música de Odair José – “uma única vida” – aponta para uma crítica em

um período muito conturbado da história do Brasil, onde os discursos eram totalmente

violados e controlados, pois, quando o cantor expõe no refrão da música: “Pare de tomar a

pílula, pare de tomar a pílula” o mesmo está dizendo que a política de usos contraceptivos do

governo da ditadura militar era frear o nascimento de crianças pobres, era evitar o aumento

populacional entre os considerados, e de fato, de baixa renda. Sendo assim, o governo exerce

aquilo que Foucault chama de Biopolítica ou Biopoder – controle sobre a vida. Ou seja, “[...] O

139 Mestranda no Programa Pós-graduação em Cidades, Territórios e Identidades/PPGCITI/UFPA. Orientadora: Profª Dra. Vilma Nonato de Brício. Integrante do Grupo de Pesquisa Experimentações - Grupo de Estudos e Pesquisa em Currículo, Subjetividade e Sexualidade na Educação Básica/UFPA. E-mail: [email protected] 140 Dra. em Educação. Diretora da Faculdade de Educação e Ciências Sociais /FAECS/Campus Universitário de Abaetetuba da Universidade Federal do Pará. Líder do Grupo de Pesquisa Experimentações - Grupo de Estudos e Pesquisa em Currículo, Subjetividade e Sexualidade na Educação Básica/UFPA. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

310

princípio: poder matar para poder viver, que sustentava a tática dos combates, tornou-se

princípio de estratégias entre Estados: mas a existência em questão já não é aquela – jurídica

– da soberania, é outra – biológica –de uma população. [..]” (FOUCAULT, 2006, p. 149).

Em “Vou tirar você desse lugar”, Odair se refere às prostitutas que eram fortemente

desprezadas pela sociedade. Ele utiliza a música como forma de representação, para

evidenciar o objetivo do governo, na época, em controlar a natalidade do País e silenciar os

marginalizados, deixando-os cada vez mais sem voz e sem vez. Desta forma a musicalização,

foi o mecanismo que o cantor militante dos direitos sociais usou como “resistência” ao poder

de controle e repressão da Ditadura Militar.

1 Biopolítica e o governamento dos corpos

“A biopolítica pode ser entendida como a relação entre governo, população e

economia em um universo de relações que remetem a uma dinâmica de forças [...]. Entre a

ontologia e a política” (WEBER, 2011, p. 869). Esse processo de dinâmicas de forças, para

Foucault (2006), reverbera na bio-política enquanto dispositivo ou mecanismo de controle da

vida em seu contexto biológico, que em meados do século XVIII, passa a discutir os processos

do corpo enquanto espécie, caracterizando, o corpo como máquina, tornado-o um objeto-

espécie a ser controlado. “Quando o indivíduo e a espécie entraram nas estratégias e nos

cálculos de poder político. A vida biológica e a saúde da nação tornaram-se alvos

fundamentais de um poder sobre a vida” (ORTEGA, 2003-2004, p. 10).

Nesse caso, o filosofo francês, afirma que a temática acima em discussão deve fazer

parte de nossas conversas, “deveríamos falar da “bio-politica” para designar o que faz com

que a vida e seus mecanismos entrem no domínio dos cálculos explícitos, e faz do poder-saber

um agente de transformação da vida humana” (FOUCAULT, 2006, p. 155), percebe-se então

que as discussões acerca da biopolítica são emergentes dentro e no contexto social, político e

econômico, uma vez que, neste caso, nos reportamos a saúde, em que “é preciso” conhecer

e entender as formas, mecanismos, do governo em implantar políticas de controle e

disciplinamento dos corpos.

Essa(s) política(s) de controle são dirigidas as mulheres pela sua “anatomia e fisiologia”

enquanto o ser responsável pela “procriação”. É a mulher que geri, que pari e cria os filhos,

ou seja, seu papel natural é o de procriar, portanto, é a mulher o lócus de intervenção de

Educação e compromisso social

311

mecanismos reguladores da própria vida. Neste caso, vamos nos reportar as décadas de 60

em que o movimento feminista, que luta(va) pelo “empoderamento” e conquistas da mulher

em exercer domínio sobre o próprio corpo seja ele no campo social, econômico ou político.

As lutas daquele momento não eram apenas pelo direito trabalhar ou de votar, mas também

de decidir em que momento queria ser ou não “mãe”, papel fundamental da existência

feminina.

Dessa forma, a luta defendida pelos direitos das mulheres de “fazer” e “administrar”

o próprio corpo, foi tomado pelas políticas governamentais que utilizando da discussão de

liberdade, implanta programas de controle de natalidade, ou seja, o uso de medicamentos

contraceptivos, como forma de domínio, regulação e controle desse corpo feminino, “[...] que

levou a uma medicalização minuciosa de seus corpos, de seu sexo, [...] em nome da

responsabilidade que elas teriam no que diz respeito a saúde de seus filhos, a solidez da

instituição familiar e a salvação da sociedade.[...]” (FOUCAULT, 2006, p. 160).

Gonçalves (2010, p. 110) afirma que para Foucault, em A Governamentalidade (1998b)

o pensamento sobre tal questão gera o comportamento de governamentalização do Estado

moderno que por sua vez, aplica este mecanismo, como estratégia para um conjunto de ações

que tem por objetivo elaborar táticas, análises, cálculos e reflexões que permitem ao Estado

ser gestor da própria vida.

A partir deste pensamento, se afirma também que as normatizações que alicerçam as

políticas de controle de natalidade, utilizaram o desejo feminino de controle e domínio do

próprio corpo, como forma de inserir-se como projeto biopolítico que governa esses corpos.

Se de um lado o uso contraceptivo; a pílula dava autonomia a mulher em gerenciar esse corpo,

por outro, o governo, aplica suas atividades legislativas e normalizadoras de um poder sobre

a vida.

Ao exerce-se sobre a população, o biopoder não só lhe extrai saber, mas, concomitantemente, intensifica a produção de novos saberes em torno da população. Seus focos são aqueles fenômenos que diretamente atingem e podem afetar a população. Daí decorre sua necessidade em criar mecanismos reguladores que lhe permitam ”qualificar, medir, avaliar, hierarquizar” (FOUCAULT, 1999, p. 135) de modo que corpo-espécie esteja sobre constante controle: a biopolítica do corpo e a biopolítica da população compõe a espécie de relações de poder que marcam a atualidade. É pela disciplina do corpo e pelas regulações da população que se desenvolvem o poder sobre a vida” (FONSECA, 2003, p. 91, apud GONÇALVES, 2010, p. 112).

Educação e compromisso social

312

Para tanto, a criação de legislação de controles deu origem as discussões também

sobre “sexo”, onde a palavra proibida passa a ser cobiçada como discurso da verdade, em seu

modo mais subjetivo a “sexualidade” a qual Foucault (2006) chamará de dispositivo que se

articula com dois polos sendo foco de disputa política, a saber, os dois polos são: a disciplina

do corpo e a regulação das populações, o primeiro passa por um processo de vigilância e

controles constantes e o segundo, por ordenações espaciais de extrema meticulosidade, a

exames médicos e psicológicos infinitos.

Por isso, na sociedade atual há uma necessidade tão grande de tentar controlar os

discursos sobre a sexualidade já que hoje, são muitos, e por serem muitos e diversos, diante

do que se representa na atual configuração política representada por uma bancada

evangélica, que busca suprimir tais discursos. Assim:

Ao fazer analítica histórica das práticas de poder, Michel Foucault considerou o poder pastoral como sendo os primórdios da racionalidade política no Ocidente para o fato de que essa forma de exercício do poder não foi simplesmente substituída quando do advento do Estado moderno, mas incorporada e resignificada por ele, articulando-a à nova racionalidade jurídica, política e médica (FOUCAULT, 2001, p. 221, apud ALBUQUERQUE JÚNIOR, 2011, p. 72).

Dessa forma, podemos afirmar que os discursos de poder para Foucault foram e estão

sendo utilizados em todas as esferas de poder e o poder pastoral é um exemplo, que assim

como o Estado através de redes, normas, e programas institui o controle sobre a vida a igreja

enquanto instituição também tem por objetivo silenciar os sujeitos, controlar seus corpos e

nesse caso, invisibilizar os desviantes, anormais.

2 Musicalização e o governamento do corpo da mulher

Nas primeiras analises bibliográficas e nesse caso também musical ao qual o presente

trabalho pretende, em breve, fazer uma abordagem mais teorizada, investigativa e pratica;

percebe-se que a música tem um “poder” romancista, modernista, anarquista, revolucionário,

de resistência, entre tantos outros modos de expressar em suas linhas ou melhor em seus

versos o poder ou resistência a diversos modos de vida e de sujeitos.

Duas são as definições filosóficas fundamentais dadas da Música. A primeira considera-a como revelação de uma realidade privilegiada e divina ao homem: revelação que pode assumir a forma do conhecimento ou do sentimento. A

Educação e compromisso social

313

segunda considera-a como uma técnica ou um conjunto de técnicas expressivas que concernem à sintaxe dos sons (ABBAGNANO, 2007, p. 689).

Levando em consideração a primeira definição no Dicionário de Filosofia, a música

pode ser considerada também um mecanismo de controle, desta vez, relacionada com um

dom que emana de uma divindade, através de uma revelação. E de acordo com o que já foi

discutido em páginas anteriores, o poder divino ou poder pastoral é um mecanismo de

controle dos corpos, pois, o pastor tem por obrigação humana e divina conduzir e controlar

seu rebanho.

A música acompanha a humanidade. Na Grécia antiga começou-se a descobrir a influência da música no corpo humano. Platão afirmava que “a música é o remédio da alma”. Por sua capacidade de transcender ao tempo, a música ultrapassa não só os séculos, mas também entremeia diferentes culturas e gerações, demonstrando as diferenças e semelhanças entre elas. Onde houver um povo, uma cultura, existirá música (OLIVEIRA, 2009, p. 51).

Se a música faz parte dos processos evolutivos que compunha a humanidade, seu uso

ou finalidade tentam expressar o que essa humanidade vive em um determinado, momento

ou época. Nesse caso a música em questão é “Uma vida só” de Odair José, que revela a

resistência aos moldes de controle implantados pelo governo na década de 80 em plena

Ditadura Militar.

A música principalmente, nos versos de seu refrão, expõe a política de controle de

natalidade, que utilizou o desejo feminino de ter controle sobre o próprio corpo como

mecanismo para controle deste corpo. Haja vista, que era imprescindível ao governamento

dos corpos femininos como instrumento procriador, que agora devia ser controlado.

Esse controle de natalidade se realiza por meio da medicalização do corpo feminino.

“Medi-calizar significa o processo de transformar aspectos da vida cotidiana em objetos da

medicina de forma a assegurar conformidade às normas sociais (MILES, 1991, apud VIEIRA,

1999, p. 67)”. Enquanto conjunto de normas, “a vida se torna o objeto da nova sociedade.

Objeto político” (FOUCAULT, 2006), que precisa ser normatizada, ou seja, controlada.

A noção de medicalização pode ser compreendida como uma forma da medicina se apropriar dos fenômenos relacionados [...] a noção de medicalização pode ser compreendida como uma forma da medicina se apropriar dos fenômenos relacionados à existência humana e transformá-los em objetos da ordem médica, submetidos a processos de normatização dos corpos, de suas práticas sociais e sexuais, assim como, de seus prazeres

Educação e compromisso social

314

(TOASSA, 2012; FOUCAULT, 2010; TESSER, 2010; COSTA et. al., 2006; ILLICH, 1975 Apud FERRAZA; PEREZ, 2016, p, 1-2).

Nesse sentido, a música busca enfatizar a realidade, por traz das políticas de

medicalização, pois, agora a pílula anticoncepcional não seria, um método contraceptivo, mas,

um mecanismo pelo qual o governamento ou biopoder controla o corpo feminino através de

seu uso. Controlar o nascimento da própria vida e por isso nos reportamos novamente ao

pensamento foucaultiano de “Causar a vida e devolver a morte". Nesses discursos Foucault

nos mostra que é preciso sempre fazer “Resistência”, proporcionando compreender o

discurso enquanto materialidade para as lutas.

Na terceira estrofe, Odair se refere a vida na sua subjetividade, “viver, viver é preciso

e se vive todos os dias”, neste caso, eleva a vida a subjetividade do sentimento “amor”, no

entanto, na época em que a música teve sucesso; a subjetividade, era expressada apenas

como metáfora, pois, a repressão aos movimentos artísticos que denunciavam os abusos,

violência e descriminação aos marginalizados, foram severamente reprimidos, inclusive com

exílio de muitos artistas (atores, cantores, políticos, etc.)

Mas é no refrão “Pare de tomar a pílula/Pare de tomar a pílula/Pare de tomar a

pílula/Porque ela não deixa o nosso filho nascer (3x)” (JOSÉ, 1973).Nestes versos o cantor faz

a denúncia daquela que seria uma política severa imposta através do dispositivo da

biopolítica, ou melhor, de políticas públicas de controle de natalidade e da sexualidade da

mulher, que visa operacionalizar e controlar o “gerir uma vida”. Aqui o cantor se volta às

mulheres, para que estas sejam protagonistas de suas ações, que o desejo de ser ou não mãe,

possa ser tomado de outra forma, que não seja a medicalização do corpo dessa mulher. “[...]

assim, a ideia “do sexo” permite esquivar o que constitui o “poder”, do poder; permite pensá-

lo apenas como lei e interdição” (FOUCAULT, 2006, p. 169).

Embora aconteça de forma lúdica, a música é utilizada como mecanismo de resistência

a uma política de governamento do corpo da mulher. Ou seja, uma resistência ao dispositivo

de controle que visam “organizar” os sujeitos e suas práticas discursivas, “[...] o sexo bem vale

a morte. É nesse sentido estritamente histórico, como se vê que o sexo hoje é de fato

transpassado pelo instinto de morte” (FOUCAULT, 2006, p. 170).

Em História da Sexualidade I, Foucault, postula o discurso de medicalização do corpo

feminino a partir da histerização, e nos mostra como os médicos construíram tal discurso

Educação e compromisso social

315

como verdade do corpo feminino. Colocando a sexualidade como dispositivo de controle

social.

Pensando biopolítica e musicalização: primeiros acordes

Utilizo aqui o termo de primeiros acordes para concluir esta breve analise. Pois, os

acordes musicais são um conjunto de notas tocadas simultaneamente, nesse sentido, é

possível pensar em biopolítica e musicalização do corpo da mulher, simultaneamente, em

tempos em que a discussão dessa vez, não só do corpo da mulher. Mas do corpo enquanto

políticas de gênero são tomadas para um avassalador moralismo e conservadorismo.

Políticas de controle não somente sobre a vida, mas sobre a subjetivação da vida, e

nesse contexto, me reporto à sexualidade, dispositivo de um discurso, que segundo Foucault

(2006) o biopoder se dirige a vida, ao corpo, ou seja, a ciência do sexo. Essa ciência tem por

objetivo mostrar o que é normal e o que é patológico (aspectos do discurso que serão

analisados no decorrer da pesquisa), que induz cada vez mais, os processos de governamento,

controle de natalidade, longevidade, e outros, pelo uso de medicamentos.

Neste primeiro levantamento bibliográfico, constatou-se outro fator, que será

discutido em outro momento. O da “representação”, como os corpos estão representados na

música e no discurso da biopolítica? Porque essa representação não é aquilo que parece ser?

O discurso apresentado pela biopolítica enfatiza o bem-social, no entanto, em sua maior farsa,

representa a política de governamento e controle sobre a vida.

A biopolítica se faz para tempos em que a linguagem do corpo, fala e mostra seus

desejos e subjetividade que perpassam, ou melhor, transpassam o dispositivo de sexualidade

se tornando biopolíticas de gênero. Se o sexo é o objeto ao qual o discurso precisa e deve ser

silenciado, o gênero é o objetivo principal de biopolíticas de governamento dos corpos.

As primeiras discussões (bibliografia), permitiu que o conhecer sobre a temática

suscitasse nesta pesquisadora, o desejo de debruçar-se, em notas mais complexas e portanto,

conhecer o que Foucault, ainda tem a nos dizer nas entrelinhas do discurso do poder. Neste

caso, das biopolíticas. Cuja discussões permitem entender e compreender a necessidade de

se falar sobre as políticas de governamento dos corpos

Concluo então, que há uma grande necessidade de falar sobre “sexo” uma vez que o

dispositivo da sexualidade é o discurso em questão, e que ao invés de reprimir

Educação e compromisso social

316

(governamento) tais discursos é preciso falar e falar sobre sexo para conhecer e assim diminuir

ou evitar os perigos que tangem a cegueira sobre a sexualidade.

Referências

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WEBER, C. A. T. Programa saúde da família e o governamento dos corpos. Educ.&Real., Porto Alegre, v.36, n. 3, p. 867-882, set./dez. 2011.

Educação e compromisso social

317

Acordes, teoria musical. Disponível em: <http://www.descomplicandoamusica.com/acorde/https://www.letras.mus.br/odair-jose/283387/> Acesso em: 04/12/2017.

Letras: Disponível em: <https://www.letras.mus.br/odair-jose/283387/> Acesso em: 04/12/2017.

Memórias da Ditadura: Disponível em: <http://memoriasdaditadura.org.br/artistas/odair-jose/index.html> Acesso em: 04/12/2017.

Educação e compromisso social

318

PARTE 8. EDUCAÇÃO E CULTURAS

Educação e compromisso social

319

O AÇAÍ NA MERENDA ESCOLAR: TRADIÇÃO ALIMENTAR E IDENTIDADES

Luana Carneiro Bezerra141

Joyce Otânia Seixas Ribeiro142

Introdução

Este artigo é fruto de um olhar investigativo, sobre o cotidiano escolar da EMEF

Joaquim Mendes Contente localizado no município de Abaetetuba-PA, onde busquei

problematizar o significado do açaí na merenda escolar, já que o açaí não se restringe a um

simples fruto, mas é um alimento primordial na mesa do abaetetubense estando presente no

cotidiano da merenda escolar.

Esta pesquisa tem como objetivos refletir o açaí como indispensável na alimentação

dos povos ribeirinhos de Abaetetuba; refletir como crianças e jovens representam e

constituem suas identidades por meio do açaí.

1 Materiais e métodos

A pesquisa está caracterizada dentro de uma perspectiva qualitativa, que deu muitas

possibilidades para falar sobre o açaí. Ghedien e Franco (2011, apud SILVA, 2012, p. 31), ao

descreverem as características da pesquisa qualitativa, afirmam que “[...] o cotidiano passa a

ser percebido como espaço significativo, cultural, em que os seres humanos constroem sua

existência e se fazem transformadores de circunstâncias”. Sendo assim, pretendi analisar o

cotidiano de alunos e alunas na primeira escola de tempo integral no município de

Abaetetuba, objetivando perceber como esses alunos/as se relacionavam com o açaí, os

símbolos culturais e os valores representados nesse processo de identidade.

O referencial teórico é do campo dos Estudos Culturais, e conta com Raymond

Williams (1992), Stuart Hall (1997), Hobsbawm (1984), Clifford (2008), Moreira (2002), Tomaz

Tadeu da Silva (2000) (2004), Woodward (2000) Ribeiro (2010) e Gomes (2013), na intenção

141 Pedagoga/Universidade Federal do Pará. Integrante do Gepege/CNPq. E-mail: [email protected] 142 Professora de Didática da FAECS/Campus Universitário de Abaetetuba; Professora do PPGCITI/CAAB/UFPA, na linha de pesquisa Identidades: linguagens, práticas e representações; líder do Gepege – Grupo de Estudos e Pesquisa Gênero e Educação/CNPq. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

320

de esclarecer ferramentas analíticas muito usadas no texto como culturas, identidades,

tradição e política cultural.

Quanto ao procedimento metodológico, este trabalho é uma aproximação da

etnografia pós-moderna, também conhecida como a “nova” etnografia, que nos possibilita

interpretar as informações observadas em campo, pois se “[...] propõe entender a diversidade

mesma dos processos de construção dos textos etnográficos, visualizando-os como

empreendimentos textuais situados em circunstâncias históricas e culturais especificas”

(CLIFFORD, 1998, p. 9).

Como argumenta Ribeiro (2010, p. 268), a etnografia passa a ser considerada uma

invenção cultural, e como atividade hibrida abre espaço para as novas modalidades de

composição (coleta de dados), de colagens, escrituras e críticas. Aqui importa a forma e não o

conteúdo da etnografia, sendo considerados como textos situados e historicamente

construídos. Para Clifford (1998, apud RIBEIRO, 2010, p. 268) “a etnografia é uma forma de

escrever a cultura, e não de representá-la como algo que existe ou não”.

2 Resultados e discussão

2.1 A tradição do açaí no município de Abaetetuba

A cidade de Abaetetuba nasceu às margens do Rio Maratauíra em 1724, e foi

conhecida primeiramente como um povoado chamado Nossa Senhora da Conceição de

Abaeté. Localizada na região do Nordeste paraense, a cidade possui uma população estimada

de 141,100 habitantes, de acordo com o último senso do IBGE (2017), e está distribuída nas

72 ilhas, nas 36 comunidades rurais além da zona urbana. Para Gomes (2013, p. 37), “as

comunidades de ilhas são recortadas por furos, rios e igarapés, florestas e várzeas, são

riquíssimas fontes de alimentos e belezas naturais”. Já as colônias

[...] são comunidades recortadas por igarapés, ramais e estradas, além de uma extensa área de floresta e campos, também bastante produtiva quanto à prática da agricultura familiar, as duas juntas são responsáveis por boa parte dos produtos consumidos na cidade (GOMES, 2013, p. 37-38).

O açaí é uma experiência comum da vida do Abaetetubense, e expressa a cultura por

meio de um símbolo cultural que dissemina sentidos sobre o cotidiano do modo de vida

ribeirinha na Amazônia, constituindo identidades e alteridades. Reconhecer os significados

Educação e compromisso social

321

envolvidos nessa relação, possibilita os sujeitos a mobilizem sensibilidade e empatia histórica,

bem como desperta outros afetos e prazeres.

A tradição cultural do açaí é bastante presente, visto que existem famílias que se

dedicam intensamente à essa tradição de longa data, pois este alimento além de fazer parte

do modo de vida ribeirinho, auxilia como complemento na renda de muitas famílias. Não se

tem uma origem que nos faça projetar quando e como o açaí começou a fazer parte da

alimentação dos abaetetubenses, mas considerando a lenda, pode ser anterior a chegada dos

portugueses.

Portanto, significa dizer que a forma como os abaetetubenses consomem o açaí

imprime um modo de vida específico, característico de Abaetetuba, mas que ao mesmo

tempo, passa por modificações ao longo do tempo, pois “as sociedades não são estáticas”, ou

seja, a forma como os abaetetubenses se relacionavam com o açaí no passado, não é a mesma

de hoje.

Atualmente o açaí não está unicamente presente na mesa dos munícipes, pois é

possível ver diversas formas de representação do açaí na cidade de Abaetetuba, com sua

tradição manifesta em diversos lugares. “Uma tradição possui um repertório que se expressa

em um conjunto de valores, sendo representativa da nacionalidade e da identidade local, algo

facilmente notável quando a tradição esta ritualizada em comunicações e monumentos”

(CANCLINI, 1989, apud RIBEIRO, LOBATO, PINHEIRO, 2014, p. 7). Eventos como o festival do

açaí, são formas de enaltecer essa tradição.

Também é importante ressaltar como a forma de consumir o açaí sofreu influência

nos últimos anos, apesar de ainda possuir muitos aspectos tradicionais como misturar o suco

da fruta com farinha d’água ou farinha de tapioca, para comer juntamente com peixe frito,

camarão, caranguejo e outras carnes; é possível ver hoje alguns munícipes consumindo o suco

da fruta adoçado com açúcar comum, na forma de sorvete, cremes e até na forma de

vitaminas, sofrendo assim, influencias de outros estados brasileiros que começaram a utilizar

o açaí em sua dieta devido ao seu alto valor nutricional e seu poder energético.

Sobre essas novas formas de consumir o açaí, Ribeiro, Lobato e Pinheiro (2015, p. 05)

argumentam que “a tradição seletiva [...] não é apenas sobrevivência do passado, mas sim,

constitui-se em uma versão do passado ligada ao presente por meio da seleção de certos

Educação e compromisso social

322

significados”. Ou seja, com as mudanças sociais e históricas, a tradição do açaí acaba sofrendo

as influências das inovações, mas mantendo certos elementos e descartando outros.

A respeito de Abaetetuba e a realidade da escola EMEF Joaquim Mendes Contente, é

possível observar em vários diálogos dentro deste espaço, como a identidade do sujeito

ribeirinho está ancorada ao consumo de açaí, pois, “existe uma associação entre a identidade

da pessoa e as coisas que uma pessoa usa” (WOODWARD, 2000, p. 4). A autora ainda

argumenta que:

As identidades são fabricadas por meio da marcação da diferença. Essa marcação da diferença ocorre tanto por meio de sistemas simbólicos de representação quanto por meio de formas de exclusão social. A identidade, pois, não é o oposto da diferença: a identidade depende da diferença (WOODWARD, 2000, p. 28).

Neste caso, o açaí, ao mesmo tempo que identifica os paraenses, também diferencia

certos paraenses, pois os Abaetetubenses consomem o fruto de maneira diferente, já que

para estes, açaí não é fruta, bebida e nem sobremesa, é comida, um item indispensável do

almoço. Sem o acompanhamento do açaí no almoço, este fica incompleto e insatisfatório. Este

hábito cultural elevado à escola.

No interior dessa forma particular de relação com o açaí, os Abaetetubenses

desenvolveram, como em toda cultura, algumas regras referentes ao consumo deste

alimento. Por exemplo, dentro da escola, toda vez que eu usava a expressão “tomar açaí”, os

alunos me corrigiam e diziam “não é tomar, é comer açaí”; esta reação se explica devido ao

fato do açaí ser consumido indissociável da farinha d’água, fazendo com que juntos, tornem-

se uma mistura ainda mais pastosa.

Para as pessoas de mais idades, como professores e os demais funcionários da escola,

era estritamente proibido colocar açúcar no açaí, caracterizando essa ação como inaceitável

e até “criminosa”: “açaí com açúcar pra mim pode jogar fora” (Joel, professor do 5º ano, 2018).

Referente a essa reação entendo que “os sistemas de alimentação estão, assim, sujeitos às

classificações do processo de ordenação simbólica bem como às distinções de gênero, idade

e classe” (WOODWARD, 2000, p. 34)

A análise das práticas de alimentação e dos rituais associados com o consumo de alimentos sugere que, ao menos em alguma medida, “nós somos o que comemos”. Na verdade, se consideramos as coisas que, por uma razão ou

Educação e compromisso social

323

outra, nós não comemos, talvez a afirmação mais exata seja a de que “nós somos o que não comemos” (WOODWARD, 200, p. 34).

Portanto, há proibições culturais contra o consumo de certos alimentos e, no caso do

açaí, há uma série de normas associadas a forma “certa” e “errada” de consumir este

alimento. E quando algum sujeito burla essas normas, ele é considerando estranho e até

excluído do processo coletivo de identificação. É comum alguns representarem pessoas que

adoçam o açaí como “doido”, alguém que estraga o açaí, ou mesmo não abaetetubense. Isso

evidencia que “podem haver discrepâncias entre o nível coletivo e o nível individual”

(WOODWARD, 2000, p. 15). Nessa perspectiva, pode-se afirmar que a diferença também é

sustentada pela exclusão.

Diante de tudo que já foi apresentado neste trabalho a respeito da tradição alimentar

do açaí, da constituição do modo de vida ribeirinha, trago a possibilidade de se pensar o açaí

como política cultural de merenda escolar considerando as identidades.

Nesta perspectiva, a tradição alimentar do açaí passa a ser considerada uma instância

cultural que possui uma pedagogia, por transmitir significados ou conhecimentos culturais

que “[...] são vitais na formação da identidade” (SILVA, 1999, p. 140), pois neste caso,

remetem ao pertencimento (BAUMAM, 2012). Sendo assim, vejo a necessidade de considerar

o processo de constituição do sujeito abaetetubense, como sujeitos que pertencem ao mundo

ribeirinho, território no qual há a abundância do “ouro negro”, que é o açaí, praticamente o

item mais básico de sua alimentação. Por isso, o açaí precisa ser parte da merenda escolar.

Trago a política cultual como uma ação para além das questões pedagógicas da

escola, pois esta é capaz de pensar a questão de maneira mais particular, e não somente para

a ótica escolar, pois a alimentação é uma questão política e cultural, que incide no pedagógico,

na aprendizagem. Nessa perspectiva, política cultural considera a autobiografia, a vida, um

percurso, um texto que produz identidade.

Considerações finais

Através dos resultados obtidos na escola, foi possível observar que a falta de

conhecimento da cultura local, de seus significados, e das identidades produzidas, interfere

de maneira negativa em vários aspectos da vida dos estudantes. O não reconhecimento do

Educação e compromisso social

324

açaí como um símbolo que identifica a cultura ribeirinha, faz com que este alimento seja

desprezado como parte do cardápio alimentar dos alunos, além de produzir uma série de

discursos negativos sobre as várias formas de se consumir este alimento.

Mas o atual cenário cultural é marcado pela diluição das fronteiras que separavam

cultura e escola, redefinindo o que se considerava como conhecimento e como cultura.

Através do conhecimento do que é cultura e a escola, somos capazes de interpretar e assim

respeitar outras culturas e outros sujeitos, entendendo que não há uma única forma de se

relacionar com determinados símbolos culturais.

Gostaria de argumentar a respeito de uma proposta a favor de uma nova forma de

se pensar a merenda escolar a partir de uma abordagem da identidade, mas para isso a escola

precisa tratar a identidade e a diferença como questões de política (WOODWARD, 2000, p.

99), mais especificamente, de política cultural.

Referências

BAUMAN, Zygmunt. Identidade: entrevista a Benetto Vecchi. Tradução Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Zahar, 2005.

CLIFFORD, James. A experiência etnográfica: antropologia e literatura no século XX. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2008.

GOMES, Jones da Silva. Cidade da Arte: uma poética da resistência nas margens de Abaetetuba. Tese (Doutorado). Belém: PPGCS/IFCH/UFPA, 2013.

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 1997.

HOBSBAWM, Eric. A invenção das tradições. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984. pp. 9-23.

RIBEIRO, Joyce Otânia Seixas. Escola, Cultura e Normatividade de Gênero. In: RIBEIRO, J.O.S. et al. (Orgs.) Pesquisa em Educação: territórios múltiplos saberes provisórios. Belém: Editora Açaí, 2010a.

RIBEIRO, Joyce Otânia Seixas; MAUÉS, Josenilda. Tradução Cultural e Escritura: a arte do fazer da etnografia pós-moderna no campo curricular. Pojo, Eliana C. et al. (Orgs.). A pesquisa no baixo Tocantins: contribuições teórico-metodológicas. Curitiba: CRV, 2013, 258 p.

WILLIAMS, Raymond. Cultura. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992

WOODWARD, Kathren. Identidade e diferença. In: SILVA, Tomaz T. (Org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes, 2000.

Educação e compromisso social

325

CULTURA E COSTUMES ALIMENTARES: O MINGAU DE AÇAÍ NA MERENDA ESCOLAR

Mauriceia Rodrigues Barbosa143

Joyce Otânia Seixas Ribeiro144

Introdução

O presente resumo se constitui em recorte do Trabalho de Conclusão de Curso, a

partir de uma pesquisa realizada no Centro Educacional Acendendo as Luzes/CEPAL. Para o

momento, o objetivo é perceber os aspectos alimentares da cultura local imersos no

currículo escolar, mais especificamente na merenda escolar. Utilizamos as contribuições de

MOREIRA (2003), HALL (2000), e outros autores que também discutem a relação escola e

cultura.

Consideramos de fundamental importância perceber a cultura e a merenda escolar

como campos culturais e sociais de lutas, sempre considerando o potencial que possuem

para tornar as pessoas capazes de compreender seu papel na mudança de seus contextos

imediatos e da sociedade em geral, bem como de ajudá-las a adquirir os conhecimentos e as

habilidades necessárias (MOREIRA, 2003).

O trabalho está organizado da seguinte maneira: iniciamos apresentando o

procedimento metodológico, o local de pesquisa e alguns passos do processo; depois,

apresentamos alguns resultados, abordando a merenda escolar, o açaí na cultura local e o

mingau de açaí sérvio na merenda escolar da Escola Cepal.

1 Materiais e métodos

Em termos metodológicos, a pesquisa seguiu os pressupostos da abordagem

qualitativa, com entrevista semiestruturada com duas professoras e a gestora da escola,

conversas informais com 25 alunos, coletas de dados e análise documental, na qual o olhar

da pesquisadora é central em todo o processo, do trabalho de campo à escrita final. A decisão

143 Universidade Federal do Pará/UFPA. E-mail: [email protected] 144 Professora de Didática da FAECS/Campus Universitário de Abaetetuba; Professora do PPGCITI/CAAB/UFPA, na linha de pesquisa Identidades: linguagens, práticas e representações; líder do Gepege – Grupo de Estudos e Pesquisa Gênero e Educação/CNPq. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

326

metodológica foi pela pesquisa do tipo etnográfico. Ludke e André (1985), definem

claramente as etapas desta modalidade de pesquisa, sendo elas: a observação participante,

ou contato direto com a realidade, a entrevista e a análise documental, quando for o caso, o

que proporciona novas perspectivas de abordagem da realidade pesquisada.

Por meio da observação participante, fizemos contato direto com a realidade,

durante todo o segundo semestre de 2018, sendo realizada na Escola CEPAL, localizada no

bairro do Aviação, no Município de Abaetetuba/PA.

Imagem 1 - O CEPAL

Fonte: BARBOSA, 2018- Diário de Campo.

As entrevistas semiestruturadas foram realizadas no ambiente da própria escola, com

duas professoras do Ensino Fundamental I, que se dispuseram a colaborar com a pesquisa.

Também conversamos informalmente com 25 alunos do primeiro ao quinto ano, o que nos

proporcionou mais informações sobre a temática em foco.

Sobre os documentos acionados, de posse da proposta curricular da escola,

consideramos positivo uma análise introdutória.

2 Resultados e discussão

No Brasil, a merenda escolar se inicia regularmente com a implementação da

Campanha Nacional de Alimentação Escolar no ano de 1955, que tinha como objetivo buscar

formas de criar normas para uma alimentação de qualidade e, por meio dela, melhorar a

saúde dos alunos. Neste contexto, se apresentavam altas taxas de desnutrição da população,

formado grande parte por crianças e adolescentes que estavam inseridas no ambiente escolar

e, como consequência disso, os alunos não alcançavam um aproveitamento satisfatório nas

atividades escolares. Atualmente, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE)

gerencia o Programa Nacional de Alimentação Escolar (BRASIL, 2013).

Educação e compromisso social

327

Diante disso, é necessário abordar o tema da segurança alimentar de crianças e jovens

escolares, de modo que as escolas motivem hábitos alimentares saudáveis e nutritivos, sendo

de fundamental importância conscientizar gestores e responsáveis por políticas educativas,

sobre a relação entre a cultura alimentar local, nutrição e aprendizagem. O direito a uma

alimentação saudável deve proporcionar ao aluno tanto uma aprendizagem satisfatória, como

também ampliar sua percepção sobre sua cultura, de modo que a variedade e rica cultura

alimentar seja reconhecida tornando a merenda escolar e a aprendizagem mais prazerosa e

saudável.

O açaí é considerado o ouro negro da Amazônia. Esse fruto tão precioso é proveniente

do açaizeiro, planta nativa da região Amazônica que recebe o nome de euterpe oleracea mart,

sendo a base da economia de mais de 20 municípios paraenses, sendo que aproximadamente

25.000 famílias estão diretamente envolvidas em atividades de extração, transporte,

comercialização e industrialização de seus frutos, em toda a região Amazônica. O Estado do

Pará é o principal produtor do açaí. As crianças do município de Abaetetuba, começam a

consumir o açaí logo nos primeiros anos de vida e passam a torna-lo indispensável ao longo

da vida.

Imagem 2 – O açaí

Fruto do açaí. Fonte: www.google.com Acesso: maio/2019.

Sabendo que o açaí é uma fruta que ganhou um espaço indispensável na mesa do

abaetetubense, pois no município de Abaetetuba as principais refeições como almoço e jantar

não são realizadas sem o acompanhado de açaí, dado seu reconhecimento valor nutritivo.

Assim, este alimento é indispensável e não tê-lo gera certa insatisfação, uma vez que os

munícipes se acostumaram com essa prática alimentar.

Não é por acaso que o açaí é tão requisitado na merenda escolar, além de ser atualmente o fruto de maior expressão econômica do estado, e com toda a importância cultural foi transformado, através da lei (PARÁ, 2001), na bebida e fruto símbolo do estado do Pará, que agora passa a ser priorizado,

Educação e compromisso social

328

cada vez mais, como produto econômico capaz de gerar renda para a população local (BEZERRA, 2018, p. 19).

O açaí que é servido nas escolas envolve questões políticas e culturais, por ser um

produto que circula no mercado e ao mesmo tempo faz parte da região, além de possuir em

si valores históricos fortes. Não é sem motivo que o açaí é considerado o ouro amazônico,

porém, apesar de ter seus valores nutritivos explorados, ainda assim, não se esgotou seus

valores culturais, sendo necessário uma ênfase maior a este aspecto.

Por meio da pesquisa foi possível perceber que os alunos da Escola CEPAL não

conheciam a lenda do açaí, pois bem poucos conseguiram relatar algo relativo a esta. Dessa

forma, percebemos a importância em explorar esses aspectos culturais diretamente no

currículo escolar, possibilitando ao aluno ainda nas séries iniciais uma aproximação maior com

o valor histórico e cultural dos alimentos locais. O açaí que é servido nas escolas em forma de

mingau de arroz, servido durante o tempo de recreio.

Em conversa com a senhora Raimunda Soares, uma das serventes da escola, ela

contou que são distribuídos mais de 150 copos do mingau de açaí por recreio, e segundo ela

é a merenda mais consumida, sendo comum estragarem ou não querer alguns tipos de

merenda como no caso de bolachas e alimentos sem o acompanhamento do açaí.

Através da pesquisa percebemos que a merenda preferida dos alunos é o açaí, fruto

regional que é enviado pela SEMEC, é chega na escola muitas vezes na moto dos fornecedores

que ganham a licitação para entregar esse açaí na escola, quando o açaí chega na escola, ele

é colocado na geladeira da copa, enquanto aguarda o arroz ser fervido, em seguida, esse açaí

é adicionado ao arroz já fervido e se transforma no “mingau de açaí”, conhecido e querido na

região, sendo comercializado na feira de Abaetetuba e, em diversos pontos públicos da

cidade. O mingau de açaí faz parte da cultura alimentar do paraense, sendo apreciado também

nas ilhas e ramais do município. Ainda na década de 1999, quando o município de Abaetetuba

era conhecido como a cidade das bicicletas, já era possível perceber a presença de vendedores

do mingau de açaí em suas bicicletas pela feira da cidade. Uma das professoras entrevistada

relata em sua fala sobre o valor dos aspectos e alimentos culturais como o açaí:

As representações culturais, envolve muito a parte das comidas típicas aqui de Abaetetuba e mais especialmente o açaí que vem das ilhas é um patrimônio, o mingau de açaí. São patrimônios muito fortes de Abaetetuba (PROFESSORA JÚLIA, 2018).

Esse alimento compõe a cultura dos alunos ao longo da vida. Para Hall (1997), a

definição de cultura vem a ser o conjunto de ações sociais humanas que tem significados tanto

Educação e compromisso social

329

para quem a pratica, quanto para quem a observa, sendo possível interpretar pessoas e

grupos sociais a partir de suas ações, buscando organizar e entender a conduta humana,

particularmente em relação ao outro. Diante disso, a escola que recebe esse aluno precisa

atende-lo a partir de sua identidade histórica e social.

Durante toda a pesquisa, não presenciamos o fruto sendo servido com a farinha de

mandioca ou outra forma que não fosse o mingau de açaí, mas algumas crianças relataram

que no passado já foi servido na merenda escolar o açaí com a farinha de mandioca, porém,

isso aconteceu poucas vezes, por acabar gerando um custo maior, e como a escola não

funciona em tempo integral, a forma mais prática de servi-lo é em forma de mingau.

Na relação escola-cultura, convivência cotidiana na escola, nas interações, são

constituídas as identidades de alunos e alunas. As crianças do ensino fundamental I estão em

uma fase da infância mais desenvolvida e, portanto, se espera de gestores e responsáveis por

políticas educacionais e alimentares, uma compreensão maior sobre a cultura e os alimentos

locais.

Conclusão

A merenda escolar é preocupação nacional desde o ano de 1955, objetivando

alimentação de qualidade e qualidade de vida dos alunos. O quadro de desnutrição afeta

negativamente a aprendizagem de crianças e adolescentes. Diante disso, é necessário abordar

o tema da segurança alimentar de crianças e jovens escolares, de modo que as escolas

motivem hábitos alimentares saudáveis e nutritivos, sendo de fundamental importância

conscientizar gestores e responsáveis por políticas educativas, sobre a relação entre a cultura

alimentar local, nutrição e aprendizagem. O direito a uma alimentação saudável deve

proporcionar ao aluno tanto uma aprendizagem satisfatória, como também ampliar sua

percepção sobre sua cultura, de modo que a variedade e rica cultura alimentar seja

reconhecida tornando a merenda escolar e a aprendizagem mais prazerosa e saudável.

Ao longo dos anos já houve um avanço considerável sobre a exposição dos aspectos

culturais locais, como na Escola CEPAL, mas ainda é preciso desenhar um currículo que

permita a conscientização e agregue ainda mais os valores culturais, para que se torne uma

prática constante a presença do açaí na merenda escolar, considerando a importância do fruto

tanto política como também cultural. Portanto, a escola deve ser o lugar de aprendizagem e

de vivência cultural, nos quais os costumes e tradições locais ganhem significados e relevância,

Educação e compromisso social

330

especialmente os costumes alimentares. Para que isso aconteça, é indispensável que gestores

e responsáveis por políticas educacionais e alimentares, estabeleçam a relação escola-cultura,

pois é do conhecimento de todos que os interesses capitalistas que cercam os entornos da

escola, muitas vezes acabam por circunscrever o currículo impondo alimentos estranhos ou

estrangeiros na merenda escolar, ocasionando desperdício, pois estes não agradam as

crianças.

Ao final da pesquisa, reafirmamos que um dos alimentos da cultura local que está

presente na merenda da escola observada, é o mingau de açaí, sendo necessário voltar

atenção para este aspecto nas demais escolas, pois incide tanto no bem-estar dos alunos,

quanto na aprendizagem.

Referências

BRASIL. Resolução CD/FNDE, n. 26, de 17 de julho de 2013.

BEZERRA, Luana Carneiro. O açaí na merenda escolar: tradição alimentar e identidades. 58f. Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). Faculdade de Educação e Ciências Sociais, Abaetetuba: FAECS, 2018.

HALL, Stuart. A centralidade da cultura: notas sobre as revoluções de nosso tempo. Educação & Realidade, v. 22, n. 2, p. 15-46, 1997.

LUDKE, Menga; ANDRÉ Marli E.D. A pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.

MOREIRA, A. F. B. A escola e o desafio da crítica cultural. Cadernos de Educação, n. 13, p. 19-34, 1999.

Educação e compromisso social

331

A RELAÇÃO ENTRE O AMBIENTE CULTURAL E A EDUCAÇÃO

Fahid da Costa Kemil145

Introdução

Existem diversos ambientes, culturas, classes sociais e relações entre os indivíduos. A

casa e a escola são os principais observados nesse contexto. O processo de aprendizagem tem

início no ambiente familiar, em casa, no contato com os pais e as pessoas mais próximas à

família, onde se iniciam as definições de respeito, amor, felicidade, relações sociais, equilíbrio

de impulsos internos e outros. Todos os estímulos impostos vão resultar em um significado

que aos poucos vai se moldando podendo refletir de forma positiva ou negativa para a

formação e convívio social. Dessa forma, o presente trabalho busca responder a pergunta:

Qual a relação entre o ambiente cultural e a educação?

Observamos que nos diversos níveis da educação básica, a maioria das aulas não leva

em consideração o contexto social, físico, familiar e cultural em que o aluno está inserido,

chegando a excluir a realidade do aluno, ou seja, sem aproveitar um conhecimento que o

aluno já possui, deixando de relacionar as temáticas das aulas à sua cultura, ao seu cotidiano.

É comum ouvirmos alguns alunos mencionarem que determinado assunto trabalhado na

escola não faz relação com a realidade, ou que no ponto de vista do aluno não é importante

ou interessante.

De acordo com Zick (2010) o ambiente possui fatores que intervém no

desenvolvimento, dessa forma, se faz importante compreender a relação teoria e prática do

ambiente na educação, em especial, identificando os fatores ambientais que influenciam no

desenvolvimento do aluno, visando com isso, melhorar a qualidade do ensino.

O período que decorre do nascimento até a puberdade é fundamental para o processo

de ensino e aprendizagem, para o desenvolvimento da pessoa. Como afirma Geraldo e

Carneiro (2015), é o período em que é desenvolvida a percepção de mundo. A formação

histórica e cultural se relaciona aos valores, ao desenvolvimento motor, cognitivo e

psicomotor.

145 Universidade Federal do Pará/UFPA. E-mail: fa_hid @hotmail.com

Educação e compromisso social

332

Assim, é importante que a educação trabalhe a partir do conhecimento prévio do

educando, valorizando sua história, sua cultura e sua identidade. A Lei de Diretrizes e Bases

da Educação Nacional, Lei 9394/96 (BRASIL, 1996), em seu artigo 26, coloca como obrigatória

a cultura no processo educativo. Temos os conteúdos básicos e comuns aos estabelecimentos

de ensino, mas não podemos deixar de explorar os conhecimentos culturais inerentes aos

educandos e à sociedade.

1 Materiais e métodos

O trabalho se caracteriza por pesquisa bibliográfica, onde se utilizam materiais já

produzidos acerca da temática abordada: artigos científicos, para a construção do referencial

teórico, estabelecendo nos resultados e discussões a análise das produções encontradas no

meio científico acerca da relação entre o meio cultural e a educação. A pesquisa é de caráter

descritivo, buscando estudos acerca da temática desenvolvida, os quais são analisados de

forma qualitativa. A localização e obtenção dos dados ocorreram em periódicos

eletrônicos, foram selecionadas 5 (cinco obras) referentes à temática.

As obras foram analisadas buscando os conhecimentos sobre o aspecto cultural e a

educação, visando o melhor entendimento dessas produções relacionando com a realidade

social. Para Gil (2002), este tipo de pesquisa é feito com base em materiais já elaborados,

sendo os principais: livros e artigos científicos.

2 Resultados e discussão

De acordo com Geraldo e Carneiro (2015) cultura é um conjunto de significados

construídos pelo homem ao longo de sua vida, adquiridos por ele a partir de sua relação com

a sociedade. A cultura é muito importante para as relações históricas e sociais, de acordo com

Geraldo e Carneiro (2015), pode-se dizer que ela é a base que permite a continuidade de um

dado grupo social, possuindo características expressas no cotidiano, no comportamento e em

produções físicas e imateriais. O conjunto de conhecimentos construídos por vários indivíduos

ao longo do tempo, refletindo no estilo de vida desse grupo. A cultura é uma produção

humana, podendo ser repassada, ensinada e aprendida, sendo passada de geração em

geração.

Ao trabalhar os elementos culturais é aprimorado o processo de aceitação das

diferenças. Somos uma nação formada a partir da miscigenação, da junção de vários povos

Educação e compromisso social

333

com suas culturas, cada uma traz conhecimentos e características próprias. A partir da

aceitação das diferenças contribuímos para a formação da identidade e para a formação do

indivíduo. Segundo Vianna (2006) a educação é um elemento próprio do ser humano,

favorecendo o desenvolvimento de suas habilidades físicas, mentais e intelectuais. Ela oferece

ao indivíduo algumas das ferramentas para a realização de seus objetivos de vida.

A família ou o próprio grupo social chegam a transmitir ao indivíduo as funções que ele

exerce ou aquilo que ele faz perante a sociedade. Havendo duas formas de conservar uma

sociedade, pela reprodução, onde são transmitidas as características biológicas inerentes à

raça humana e pelos processos sociais e culturais, sendo esses, consequências dos

relacionamentos sociais obtidos em casa, na praça, na igreja, na escola etc. Como afirma

Guareschi (1989 apud GERALDO; CARNEIRO, 2015), esse é o processo cultural. Abrangendo

diversos comportamentos e manifestações como a forma de falar, os costumes, as crenças, a

alimentação, as brincadeiras e alguns movimentos. Vários desses comportamentos derivam

das relações familiares, onde temos nosso primeiro contato.

As atitudes dos alunos nas escolas e nas salas de aula vêm sendo discutidas. Sendo

algumas até de difícil compreensão. Não podemos esquecer que cada educando tem uma

história e uma realidade social, como afirma Zick (2010). Dessa forma, essas atitudes podem

ter relação direta com seu ambiente de convívio.

Por meio do ambiente a pessoa recebe informações visuais, táteis, auditivas, olfativas

e gustativas, as quais são relacionadas à base física. O meio é um agente presente em nossa

vida e grande parte do comportamento do indivíduo vem dessa interação entre sujeito e

ambiente.

Trabalhamos aqui com o conceito de que ambiente é um conjunto de condições e

elementos das quais o ser humano faz parte. Sendo a qualidade de vida do Homem

determinada pela relação estabelecida com esse meio, influenciando em sua vida nos mais

diversos aspectos: físico, social, psicológico, cultural, moral e escolar.

De acordo com Zick (2010) no ambiente estão fontes necessárias para o

desenvolvimento, assim como apresenta características humanas inerentes ao

desenvolvimento social. Podemos dizer que de acordo com a idade o papel do ambiente varia

e a forma de interação para com ele também varia, acompanhando esse processo evolutivo.

O conhecimento não é copiado, ele é resultado de um trabalho de descoberta, criação,

significação e ressignificação.

Educação e compromisso social

334

De acordo com Zick (2010) o espaço da escola se divide em ambiente físico, educativo

e social-moral, uma boa infraestrutura vai auxiliar na vivência de melhores experiências

educativas. A disponibilidade de materiais didáticos pedagógicos e as relações interpessoais

entre aluno e professor, aluno e aluno e destes com os demais funcionários da escola,

compõem a experiência da criança nesse ambiente. Esses são aspectos que devem ser muito

bem observados e precisam receber o maior apoio possível, promovendo a consciência de si

e do entorno por meio da riqueza de suas experiências. É interessante que o educador tenha

conhecimento dos fatores ambientais presentes na vida de seu aluno e buscar trabalhar

dentro das suas possibilidades, em torno das possíveis necessidades para a formação desse

aluno, levando em conta sua experiência extraescolar e o ambiente em que vive, fica mais

fácil buscar propostas para auxiliar em seu desenvolvimento.

No processo de ensino e aprendizagem, o indivíduo aprende a identificar e descobrir

conhecimentos, contextualizando-os. Dias (2010) afirma que, em contexto educativo com os

outros, o indivíduo descobre, inventa e reinventa novas possibilidades de ação, lhe permitindo

se situar criticamente diante da sociedade atual.

A família e a escola têm a tarefa de transmitir valores, normas, saberes e experiências.

Segundo Costa (2009), nos últimos anos é possível observarmos alterações na maneira como

essa tarefa é desempenhada diante das mudanças sociais. O estilo de vida, o tipo de educação,

os valores morais e a opção religiosa, são exemplos de referências construídas pela família.

De acordo com a autora, desde o século XX a família e a escola são vistas como parceiras no

trabalho de formação dos indivíduos.

Conclusão

Assim, podemos concluir que o meio cultural interfere no desenvolvimento da criança,

logo, esse fato pode ser observado na educação, sendo interessante buscar agregar os

conhecimentos do meio extraescolar, da realidade do aluno, aos conteúdos e metodologias

abordados na escola.

A cultura é relevante no processo de educação escolar, relacionando o local em que o

sujeito se insere, as pessoas que ali estão e a realidade vivida no local em questão. Portanto,

como afirma Zick (2010) o ambiente cultural é formado pelo ambiente familiar, físico e

principalmente social, sendo a integração desses três níveis fundamental para a compreensão

do conceito de cultura. A escola tem o desafio de mediar os aspectos positivos e negativos,

Educação e compromisso social

335

entendendo, respeitando e identificando seu grau de interferência, visando tornar o ambiente

do aluno o mais favorável possível para que tenha um bom desenvolvimento.

Referências

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases, 1996. Disponível: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm. Acesso: 02/04/2018. COSTA, Livia Fialho. Notas Sobre Formas Contemporâneas de Vida Familiar e seus Impactos na Educação dos Filhos, 2009. Disponível: books.scielo.org/id/jc8w4/pdf/nascimento-9788523208721-16.pdf. Acesso: 20/03/2018. DIAS, Isabel Simões. Competências em Educação: conceito e significado pedagógico. Revista Semestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional. V. 14, N. 1, Janeiro-Junho de 2010, 73-78. Disponível: www.scielo.br/pdf/pee/v14n1/v14n1a08.pdf. Acesso: 20/03/2018. GERALDO, Antonio F.; CARNEIRO, Neri de P. A Cultura no Processo do Ensino e aprendizagem da Educação Infantil, 2015. Disponível: fapb.edu.br/media/files/35/35_1933.pdf. Acesso: 20/03/2018.

GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2002.

VIANNA, Carlos Eduardo Souza. Evolução histórica do conceito de educação e os objetivos constitucionais da educação brasileira, 2006. Disponível: http://www.publicacoes.fatea.br/index.php/janus/article/viewFile/41/44. Acesso: 20/03/2018. ZICK, Greicimára. Os Fatores Ambientais no Desenvolvimento Infantil. Revista de Educação do Ideau. V. 5, N. 11, Janeiro-Junho, 2010. Disponível: https://www.ideau.com.br/getulio/restrito/upload/revistasartigos/176_1.pdf. Acesso: 02/04/2018.

Educação e compromisso social

336

“ABAETETUBA, TERRA MORENA E GAROTA DE VALOR. ABAETETUBA, HOJE É DOMINGO E

EU VOU VER O MEU AMOR”. SÓ QUE NÃO!

João Marcos Feitosa Quaresma146

Maria Antonia Paixão Feitosa147

Introdução

O carnaval das marchinhas, frevos e sambas, alegre e descontraído, que tinha aos

domingos, um lugar reservado aos (re)encontros de amigos, famílias e enamorados, na

tradicional cidade de Abaetetuba, tenta hoje reinventar suas histórias e memórias da cultura

de um povo contagiante.

Porque consideramos que Abaetetuba está tentando reinventar sua história e

memória do carnaval de rua? Esta cidade que tão carinhosamente é chamada por seus

munícipes e pela vizinhança mundo a fora de Abaeté, o nome primitivo que evoca o significado

de homens verdadeiros, “ver” que tais homens movidos pela ascendência do “capitalismo

selvagem”, excluem suas verdadeiras “raízes” para se lançar a “modernidade”, com seus

arrastões que não valorizam, mas os bailes, blocos, e outras agremiações ou organizações que

promoviam as festas dos brincantes em uma majestosa folia entre confetes e serpentinas

constituindo, o carnaval abaetetubense, uma grande festa.

Para tanto, os artefatos − máscaras, fantasias, confete − e porque não os fetiches,

foram sucumbidos pelos blocos, que imitam as grandes micaretas (baianas), e que aglomeram

em quantitativo muito maior de “foliões” que preferem a moda sertaneja ao invés do samba,

marchinhas e frevos tradicionais do carnaval.

146 Graduando em Ciências Naturais – Física/UFPA. E-mail: joã[email protected] 147 Mestranda do Programa Pós-graduação em Cidades, Territórios e Identidades - PPGCITI/UFPA. Orientadora: Profª Dra. Vilma Nonato de Brício. Integrante do Grupo de Pesquisa Experimentações (Grupo de Estudos e Pesquisa em Currículo, Subjetividade e Sexualidade na Educação Básica) – UFPA. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

337

1 O Carnaval na lógica mercadológica

Podemos então dizer, que o neoliberalismo cultural produziu uma nova concepção de

folião que não está mais inserido a uma forma “artesanal” de (re)produzir suas roupas e

adereços que constituem sua própria cultura/identidade de brincante, mas ,em adquirir os

abadás confeccionados em larga escala, para os empresários bastante lucrativo, fora até

mesmo do Estado.

E é justamente, por causa desta profícua constatação que enfatizamos no título deste

texto, com um verso da marchinha do abaetetubense Verediano Góes Teixeira – entenda-se

por marchinha de carnaval, um gênero predominantemente popular de se fazer e dançar o

carnaval no Brasil – e com uma frase usada de forma prolixa pela “juventude”, da

contemporaneidade, que enfatiza um posicionamento contrário ao que se estar

pronunciando, é que afirmamos, que os tempos de carnaval são outros.

Haja vista, que para o mercado de consumo onde, não só a juventude em termos de

idade, mas todo aquele que é cooptado pelos “modismos” em sua maior parte, estampados

pelos meios de comunicação em massa (mídia). As vestes, bebidas alcoólicas – e não alcoólicas

em menor escala – e tantos outros artefatos, só vão fazer sentido de padrão de beleza, e

porque não, de diversão, folia e alegria se estiverem de acordo com o que está sendo realizado

em outros lugares.

No caso, do Brasil a Bahiaé ovacionada como o Estado com o melhor carnaval, lugar

em que os grandes blocos com seu abadás e trios elétricos ocupam a maior parte da festa

vivenciada pelos brincantes. Neste sentido, este modelo, “novo”, de festejar o carnaval é que

tem sido melhor acolhido pelo público e, por conseguinte pelo mercado de consumo.

Mas, nos reportemos ao carnaval em Abaetetuba!

Porque evocamos a gíria “só que não!”, utilizada com mais entusiasmo pelos jovens

pra falar do carnaval de Abaetetuba? Como já dito anteriormente, em tempos não tão

longínquos, “Só era proibido não dançar e nem brincar, pulando com entusiasmo e alegria”,

pois o carnaval era realizado em meio de grandes apresentações, onde os brincantes de cada

bloco e escolas de samba se preparavam quase que o ano todo para vivenciar os momentos

de euforia, de cantoria das marchinhas, dos sambas, das composições dos munícipes e

também de todo o canto do Brasil, que tivessem em seus versos a busca de emoções e

alegrias.

Educação e compromisso social

338

Hoje o carnaval de Abaetetuba, já não vive suas tradições e memórias, os mascarados,

fantasiados vestidos com diversos modelos, dos mais diversos artefatos, dão lugar aos grandes

arrastões carnavalescos no “corredor da folia” embalados ao som dos trios elétricos que

tocam desde o funk, até os tecnomelody’s, bem como, sons automotivos e que resultam na

ausência dos tradicionais bailes de salão e crescente número de violência, dada um

quantitativo maior de aglomeração de foliões e consumo em sua maioria exagerado de

bebidas alcoólicas, pois geralmente os grandes blocos, além do abadá oferecem o open-bar.

E, portanto, a partir das informações que são veiculadas na mídia é que afirmamos tal

mudança, ou perda, da cultura carnavalesca em moldes tradicionais do município de

Abaetetuba.

Imagem 1: Revista PZZ 22/2016

Um exemplo é a matéria da revista, impressa, PZZ – Arte-Educação-Cultura - edição

22/2016que trata, de forma sucinta, da história da cidade de Abaetetuba. Quanto ao Carnaval,

fala da “folia multicultural”, relatando ser o carnaval, uma festa de todos e para todos.

A reportagem afirma que são diversos grupos de carnavais, desde blocos de amigos e

famílias até grandes blocos de Trio, blocos dos sujos, e o espetacular bloco das virgens. Aliás,

espetacular/carnaval, é o título da matéria sobre o carnaval. Ainda afirma que na sociedade

ao qual o carnaval está inserido, reverbera a cultura não como um produto, mais um direito.E

reitera que o sucesso do bloco das virgens se dá pela incorporação dos automotivos para levar

os foliões no corredor da folia.

Educação e compromisso social

339

Haja vista que o sucesso, segundo a revista, pode advir de novos modelos ou formas

de diversão dos foliões, as personalidades destaque do carnaval de Abaetetuba, segundo

Arthur Ghuma, baiano, que mora e constituiu família em Abaetetuba há mais ou menos 10

anos, seriam: o bloco dos sujos, pois “retrata as tradições indígenas” de se pintar para os

rituais e o bloco das virgens, por “inovar” com os automotivos.

Imagem2: Blog do Ademir Rocha

Embora no subtítulo da matéria, a revista fale dos blocos de amigos e famílias como

tradicionais no município, sua escrita não menciona ou coloca imagem de nem um deles.

Daí nos reportamos também ao que o Professor Dr. Dedival Brandão da Silva, enuncia

em sua obra; Migalhas do Carnaval: escolas de samba, educação e patrimônio etnográfico em

Abaetetuba”, como; “Sociedade de espetáculo”, onde o que prevalece e reverbera é o

consumo, cuja prática social e porque não a história, memória e cultura estão aquém do

tradicional. Uma vez que o espetáculo que fomenta o capital é o “Carnaval de rua”. Só que

não! É o Carnaval do corredor da Folia.

Um grito não conclusivo

Esse Carnaval, que retrata a vicissitude de seus brincantes se torna cada vez mais

lucrativo, pois, se nos reportamos ao Carnaval de blocos e escolas de sambas, as agremiações

necessitam que grande parte de seus proventos para apresentação do espetáculo na rua

sejam fomentados pelo poder público. Este por sua vez, não “enxerga” a cultura popular como

uma forma necessária para digamos assim, legitimação da própria história.

Neste viés, a sociedade do consumo e do lucro, não valoriza os setores populares

embora “as escolas de samba em Abaetetuba, como entidades lúdicas e organizativas

Educação e compromisso social

340

[tenham sido] responsáveis pelo aparecimento de novas formas de produção e organização

da cultura na cidade (SILVA, 2015, p. 182).

Para tanto, percebemos que na edição da revista, PZZ, já citada em nenhum momento

da reportagem as escolas de samba são mencionadas, já que a “modernização” é algo urgente

no processo que constitui a reinvenção das novas formas de “brincar”, “a tradição do Carnaval

para que permaneça viva no imaginário social de seus praticantes precisa ser atualizada por

aqueles que a praticam como condição de sua permanência” (p. 183).

Não estamos de nenhuma forma, afirmando que os blocos que se constituem em

grandes arrastões no corredor da folia tal qual as micaretas baianas, devem acontecer ou se

realizar em um outro período, de acordo com o significado de micareta – carnaval fora de

época – deixando o período carnavalesco aos tradicionais blocos de rua e desfile das escolas

de samba.

O que enfatizamos aqui, nestas poucas linhas, é que a reinvenção aconteça, pois são

outros contextos históricos, porém que o moderno não extermine o tradicional, que a cultura

do carnaval não fique em uma memória de “contos”, mas em uma memória presente entre

os foliões do Carnaval abaetetubense. Revitalizar práticas já existentes, muitas vezes se faz

necessário, mas é na vertente popular que dissemos quem somos.

O carnaval é alegria e o “ninguém é de ninguém” pode existir com o “carnaval é

momento de descontrair e brincar em família”. A vicissitude das mudanças sociais pode

coexistir. Pois o Carnaval traz consigo o bem viver de celebrar a vida e assim nós podemos

cantar: “Abaetetuba, terra morena e garota de valor, ô, ô, ô. Abaetetuba, hoje é domingo e eu

vou ver o meu amor”. Só que não!

Referências

Blog do Ademir Rocha. Mostrando postagens com o marcador Carnaval de Abaetetuba. Disponível em: <ademirhelenorocha.blogspot.com/search/label/carnaval%20de%20Abaetetuba> Acesso: 12/11/2018.

GHUMA, Arthur. Abaetetuba: Espetáculo/Carnaval. In: Revista PZZ – Arte-Educação-Cultura. Edição 22/2016. Belém: Gráfica Sagrada Familia, 2016.

SILVA, Dedival Brandão da. Migalhas do Carnaval: escolas de samba, educação e patrimônio etnográfico em Abaetetuba. Campinas: Pontes editores, 2015.

Educação e compromisso social

341

O ESPAÇO ESCOLAR NA CONSTITUIÇÃO DE IDENTIDADES JUVENIS

Ataíze Gonçalves Paz 148

Introdução

O presente trabalho trata de uma pesquisa etnográfica, realizada na escola Cristo

Trabalhador. Objetivo deste trabalho foi refletir acerca do espaço que viabiliza efetivações,

construções e reconfigurações de novas culturas. Como aporte teórico terei Stuart Hall (2006) e

Silva (2000), que promove a discussão acerca da configuração de identidades na

contemporaneidade; Michel de Certeau (2002), que enfatiza as culturas no cotidiano e contribui

para a compreensão de como os sujeitos vão reconstruindo novos tipos de culturas por meio das

existentes; Bourdieu (1983) e Dayrell (2007) para o debate sobre as identidades juvenis, destacando

que ambos tratam de forma consistente a cultura juvenil; e Ribeiro (2013), para auxiliar na

compreensão sobre a tradução de culturas no ambiente escolar.

A compreensão acerca dos Estudos Culturais auxilia na compreensão do que se entende por

culturas consideradas válidas e daquelas que são vistas como sem valor. A primeira corresponde

aquela que tem significação para determinado grupo, aquela que resolve suas necessidades e que

representa o indivíduo. Já a segunda diz respeito aquela que não corresponde ao seu modo social

de vida e que não determina seu modo de ser, agir, falar. Silva (2004), destaca que os Estudos

Culturais independem da vida social e de outras esferas que poderiam ser consideradas

determinantes, todavia, o que mais importa é que busca conceber a cultura como campo que

envolve a significação social. Os Estudos Culturais permitem a percepção que para existir o

multiculturalismo, é necessário que nas relações haja diferenças, e muitas vezes a diferença é

avaliada como algo negativo, portanto, o processo de significação dá-se pelas transformações e

desigualdades.

O trabalho está organizado em três tópicos: o primeiro consiste em descrever brevemente a

escola observada, o segundo em compreender o espaço escolar e suas representações e no terceiro

evidencio como essas representações são capazes de constituir novas identidades e enaltecer as

existentes.

148 Aluna do curso de Pedagogia/FAECS/Campus Universitário de Abaetetuba/UFPA; integrante do Gepege – Grupo de Estudos e Pesquisas Gênero e Educação/CNPq. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

342

1 Materiais e métodos

Este trabalho caracteriza-se como uma pesquisa etnográfica, na qual realizei a observação

cotidiana na Escola Cristo Trabalhador, direcionada aos alunos da instituição e quais tipos de

significações contribui para construção de suas identidades no espaço escolar.

Para me auxiliar acerca da compreensão da experiência etnográfica e em relação a teoria e

métodos que ajudarão a direcionar esta pesquisa, bem como no tipo de abordagem que foi utilizada,

acionarei Marly André (1995) e Maria Cecília de Souza Minayo (2015). A metodologia utilizada neste

projeto consiste na interpretação de dados de uma pesquisa qualitativa, que, para Minayo (2015)

é, principalmente, a exploração do conjunto de opiniões e representações sociais sobre o tema que

se pretende investigar, evidenciando de forma fiel as informações coletadas de meus interlocutores,

na qual deverá ser realizada análise minuciosa e interpretação. A autora pontua que a abordagem

qualitativa possui dois conceitos, no qual o primeiro consiste em análise e o segundo em

interpretação de dados. A descrição é feita de forma fiel em relação aos dados informados pelo

grupo pesquisado; desta forma a análise é feita a fim de explicitar o que a entrevista busca tratar

como relevante; após a descrição e o tratamento dos dados é feita a interpretação, onde se busca

compreender o que acontece no meio pesquisado. Minayo (2015) ressalta que em relação a essas

três formas de tratamento de dados qualitativos, é importante observarmos que elas não se

excluem mutualmente, uma vez que nem sempre possuem demarcações distintas entre si.

Esta pesquisa é caracterizada como etnográfica, pois foi realizada observação cotidiana na

Escola Cristo Trabalhador no período de 25 dias, direcionada aos alunos da instituição. Também

contei com a contribuição de outros interlocutores como: professores e outros funcionários da

escola. Fiz observação participante na busca de compreender a cultura da escola, relatada num

diário de campo para auxiliar armazenamento das informações obtidas. Outros meios para obter

informações foram aparelho celular, para ajudar nas entrevistas e na captura de imagens, a fim de

obter o material necessário para contribuir em minhas análises. Marly André destaca que

[...] um outro requisito da pesquisa do tipo etnográfica é a obtenção de uma grande quantidade de dados descritivos. Utilizando principalmente a observação, o pesquisador vai acumulando descrições de locais, pessoas, interações, fatos, formas de linguagem, e outras expressões que lhe permitem ir estruturando o quadro figurativo à realidade estudada, em função do qual ele faz suas análises e interpretações (2008, p. 29).

Utilizar de diferentes técnicas para a apreensão de dados também é uma característica da

etnografia, mas basicamente pode ser feita pela observação participante.

Educação e compromisso social

343

2 Resultados e discussão

2.1 A Escola Cristo Trabalhador

A escola Cristo trabalhador localiza-se na Rodovia Dr. João Miranda, bairro Cristo Redentor,

Abaetetuba, Pará. É uma instituição conveniada a Diocese da cidade, sendo bastante tradicional no

que diz respeito a qualidade de ensino e como instituição profissionalizante.

A escola foi idealizada a partir de uma carência constatada no município, de criar

oportunidades para o ensino, lazer e renda, que era perceptível pelo fato de haver na comunidade,

pessoas com potencial para desenvolver atividades em diversas modalidades artísticas e

profissionais tais como: mestres em engenharia naval, em marcenaria, em artesanato de miriti, em

construção civil, e que necessitam de instrução no sentido de melhor se organizarem em

associações, cooperativas e, assim, aperfeiçoarem e divulgarem seus produtos no mercado,

ampliando dessa maneira, a geração de emprego e renda no município. Soma-se a isto uma

característica notória da comunidade, que é o empenho em buscar conhecimentos e lutar

constantemente por melhores perspectivas de vida. Esse interesse em muito contribui para o

desenvolvimento de projetos que venham ampliar os horizontes e oportunizar uma melhor

qualificação ou requalificação da mão-de-obra abaetetubense.

2.2 A escola e a constituição de identidades juvenis

Ao entrar na escola me deparei com um espaço carregado de significados, na qual um me

chamou mais atenção, o salão, na qual notei que era o local favorito dos alunos, pois para eles

representava o point da escola, local em que tudo acontecia, em dias de aula, eles reuniam-se em

pequenos grupos para socializar, conversar, dançar e também cantar. Lá também haviam bancos

dispostos e organizados de forma estratégica, na qual proporcionava mais aproveitamento do

espaço, e implicitamente observei que esses bancos eram ocupados por determinados alunos, os

mais falantes e os que eram acompanhados por grupos numerosos, grupos com menores números

de pessoas sentavam-se nas laterais do salão. O espaço escolar é construído socialmente e expressa

discursos, transmite estímulos, conteúdos e valores (FRAGO; ESCOLANO,1998, p. 26-27).

Educação e compromisso social

344

Fotografia 01 – O Grande salão

Fonte: Paz, 2018.

Ao analisar mais esse ambiente, observei a sala da coordenação pedagógica, que era

composta por uma vidraça ao longo de toda a sua extensão; este é um local estratégico, pois

permitia a visibilidade de quase todos os espaços da escola, inclusive, do salão que é o local

preferido de sociabilidade dos jovens. Era possível notar que a sala da coordenação pedagógica é

um lugar onde os membros da direção sempre se encontravam e, se algo acontecia no salão ou

nos seus arredores, poderia ser visualizado, resultando na rápida intervenção, garantindo o

controle das mais diversas situações. Para Frago e Escolano (1998), o aquário149 como espaço

panóptico, auxilia com uma visão panorâmica para todos os espaços, e esta situação de controle

faz com que seja imperceptível aos indivíduos, que seguem sem notar que estão sendo

observados, favorecendo certo “acordo” com as regras que se instituem. Na imagem a seguir

registrei um dos ensaios do Grupo Educar Pela Pesquisa150 que ocorria no salão, e ao fundo pode

ser observada as janelas de vidro da coordenação pedagógica.

149 É a sala da coordenação pedagógica na Escola Cristo, caracteriza-se como aquário pois ela é toda constituída por enormes vidraças transparentes. 150 É um projeto de teatro, música e dança que ocorre anualmente na escola Cristo Trabalhador.

Educação e compromisso social

345

Fotografia 02 – Ensaio do Grupo Educar pela Pesquisa.

O salão na Escola Cristo é um espaço informal onde um tipo de construção social ocorre, pois

cada lugar do salão representa um prestígio diferenciado, que é necessário apreender que a escola

proporciona a construção social. Apesar de ser um local bastante procurado pelos alunos, observei

que existem regras implicitamente estabelecidas na ocupação de cada lugar: existem os que

sentavam nas laterais do salão, que são os alunos e alunas que normalmente não participavam de

atividades relacionadas ao projeto; os alunos que tinham popularidade normalmente ocupavam o

melhor lugar do salão, que eram os bancos de madeira dispostos bem no centro do salão. Ao

conversar com um funcionário, ele relatou que essa divisão de espaço sempre ocorreu e se

reafirmou com a colocada dos bancos, já que os grupos dos alunos que fazem parte do projeto são

sempre numerosos, e quando chegam ao salão sentam-se e logo tomam conta dos bancos.

Foi possível observar que sempre haviam alunos ocupando o salão para expor algum tipo de

dança: ora dançavam capoeira151, ora dançavam funk152, ou hip hop153. Os alunos do projeto

sentem-se à vontade para dançar, cantar e também são os que mais falavam com os demais alunos;

acredito que o fato de serem conhecidos facilita esse relacionamento. Para Dayrell (2007), a

sociabilidade é uma das dimensões da condição juvenil aliada às questões culturais, pois

151 A capoeira é uma dança de Raízes africanas e se instalou no Brasil no século XVI, quando o Brasil era colônia de Portugal. 152 Funk é um gênero musical que surgiu da música negra norte-americana nos anos de 1960, com uma mescla de ritmos Soul, Jazz e R&B. 153 O Hip-Hop é um estilo musical que surgiu na década de 1970 como um movimento cultural entre os latinos americanos, os jamaicanos e os afro-americanos da cidade de Nova York mais precisamente no sul do Bronx.

Fonte: Paz (2018).

Educação e compromisso social

346

proporciona aos indivíduos a troca de ideias, assim, aqueles que se destacam são vistos como o

exemplo a ser copiado. Essa observação ressalta o motivo de os integrantes do grupo de dança

estarem sempre rodeados de outros colegas, em uma interação com o Outro que se assemelha e se

diferencia, e auxilia na construção cultural de cada um; o autor reafirma que:

[...] A turma de amigos é uma referência na trajetória da juventude: é com quem fazem os programas, ‘trocam ideias’, buscam formas de se afirmar diante do mundo adulto, criando um ‘eu’ e um ‘nós’ distintivos [...] A sociabilidade expressa uma dinâmica de relações, com as diferentes gradações que definem aqueles que são os mais próximos (‘os amigos do peito’) e aqueles mais distantes (a ‘colegagem’), bem como o movimento constante de aproximações e afastamentos, numa mobilidade entre diferentes turmas ou galeras. O movimento também está presente na própria relação com o tempo e o espaço (DAYRELL, 2007, p. 1112).

Pude observar também que significados da cultura global também se fazem presente o

comportamento e vestimenta dos jovens da escola Cristo Trabalhador, desse modo acaba

ocorrendo conflito entre professores e alunos, pois os professores buscam manter a ordem pelo

padrão estabelecido pela instituição, principalmente em sala de aula, e os alunos resistem

expressando-se através de seu modo de vestir; os alunos incrementam seu uniforme, com bonés

(mas a todo momento é solicitado que sejam retirados), e acessórios como correntes; outros rasgam

suas calças conforme a moda atual, outros tem desenhos ou rabiscos estampando suas camisas de

uniforme, enfim, foi perceptível que grande parte dos alunos usavam casacos amarrados a cintura,

por mais que a tarde fosse de muito calor, é válido afirmar que os significados que circulam na

cultura global no que diz respeito a comportamento e vestimenta refletem nas mudanças que são

efetivadas por esses jovens da Escola Cristo Trabalhador.

No dia 03 de outubro de 2018, ao chegar na instituição observei de longe uma mesinha que

localizava-se no salão, bem em frente à sala da coordenação pedagógica; este artefato de gesso

representava Cristo de acordo com a crença católica, todos os funcionários da escola, como direção,

corpo técnico e alunos reuniram-se ao redor deste andor, e logo após deu-se início a um momento

de oração, na qual foi realizada a leitura de um texto bíblico e foi explicado brevemente, por um dos

funcionários; em seguida, os alunos foram encaminhados para suas respectivas salas.

Percebi que nem todos entravam em suas salas, pois um pequeno grupo ficava no salão

como de costume. Neste mesmo dia, ao transitar pela escola, percebi uma movimentação estranha

no auditório, algo que me pareceu incomum, pois naquele dia não haveria ensaio do projeto; tentei

entrar, mas a porta estava trancada. Um dos alunos me viu e abriu à porta. Quando entrei vi Robert

Educação e compromisso social

347

e algumas das moças do projeto de dança, como Bia, Gisely e Clarisse. Sentei e observei. Carla, uma

das jovens veio me cumprimentar, então, perguntei a ela se se tratava de um ensaio do projeto e

ela disse que não, que as melhores alunas do projeto foram selecionadas para apresentar um

número de dança na abertura dos jogos da escola; perguntei a ela quem as havia selecionado e qual

seria o critério de escolha, e ela respondeu que Robert era quem as escolhia, chamando as que se

destacavam mais no Grupo Educar pela Pesquisa, e enfatizou que ele só observa quem são as

melhores para indicar a grupos de danças que ele conhece, externos a escola.

No dia 10 de outubro ocorreu a abertura dos jogos internos da Escola Cristo Trabalhador

ouve uma pequena cerimônia que teve início às 15 horas, e contou com a presença de banda, desfile

com bandeiras, a corrida em volta do salão com a tocha, a entoação do hino nacional e apresentação

dos alunos-atletas com suas respectivas equipes que iriam disputar os jogos. Alguns dos alunos

estavam com bandanas na cabeça e nos braços, algumas inclusive escritas com batons e canetas

com frases como #EleSim.

Houve discursos de abertura do representante dos professores e dos funcionários, o professor

Carlos, representante da direção e da vice direção, e Regina e Girlayne representantes dos alunos.

Os dois iniciais enfatizaram seus votos para que o evento ocorresse de forma tranquila, sem

violência, com respeito de todos, entretanto, deveriam ter o espírito esportivo de colaboração e

comemoração. A fala da aluna Girlayne foi bastante marcante, pois vestia uma blusa com letras

grandes estampando #ELENÃO; falou sobre a importância dos jogos para a escola e no final de sua

fala destacou o motivo de estar vestida com aquela blusa, ou seja, o momento crítico político que

estávamos enfrentando, correndo o risco de eles como estudantes perderem direitos valiosíssimos

com a reestruturação do ensino; ao finalizar foi bastante ovacionada por uns e vaiada por outros,

inclusive os que estavam com as bandanas.

Após o cerimonial de Abertura houve a apresentação mais esperada do evento, um espetáculo

encenado por dois rapazes gays e pelas dez melhores alunas do projeto, escolhidas de forma

minuciosa por Robert, um dos rapazes mais populares do grupo de dança da escola. Passaram-se

uns minutos após o anúncio do grupo e os alunos e alunas estavam curiosos para ver a

apresentação, quando as portas do auditório foram abertas e posicionaram-se ao centro do salão;

foi uma euforia acompanhada de muitos gritos e aplausos; a equipe fúria foi anunciada, seguida por

um medley de músicas, incluindo Run the world (girls) de Beyoncé; Entra na roda e ginga de Iza,

copa do bumbum de Léo Santana, entre outras. As meninas enfileiraram-se para iniciar as

Educação e compromisso social

348

apresentações, e ao começarem a dançar, o público vibrava; como mostrado na fotografia 08,

quando os dois alunos gays posicionaram-se em frente das meninas, aí que os gritos e aplauso se

acentuaram.

Durante toda a apresentação os passos realizados eram bastante provocantes e sexy, com

muito rebolado como mostram as fotos 09, 10 e 11; nos ensaios já havia prestado a atenção, e em

uma conversa informal com Robert dias antes da apresentação, perguntei se alguém da direção ou

coordenação já havia chamado a atenção do grupo pelos passos extravagantes e sensuais; ele

respondeu que sim, que já haviam chamado atenção algumas vezes e que eles já haviam cortado as

partes mais pesadas da música, que foram avisados que só iriam se apresentar se respeitassem a

religiosidade da escola, evitando as letras de músicas com palavrões, e que reduzissem a

sensualidade. Mas na hora da dita apresentação, com os gritos, aplausos e vibração dos alunos que

assistiam, foi impossível que os que estavam dançando se contivessem, sendo a performance

carregada de jogadas de cabelo, rebolados, requebrados até o chão, mãos deslizando pelo corpo e

provocando a plateia chamando-a para dançar.

Logo depois da apresentação da equipe fúria, a banda convidada começou a tocar algumas

músicas e os demais alunos foram ao centro do salão para dançar; o que chamou a atenção foram

nas músicas tocadas pela banda, ignorando o aviso para sobre evitar certas letras de música. Em

uma das diversas músicas tocadas, a letra era bastante pejorativa, e conforme iam tocando as

músicas os alunos eram convidados a dançar no centro do salão, e consequentemente a dança

acompanhava o que a música pedia, que as mulheres agachassem e rebolassem:

Educação e compromisso social

349

Fotografia 03 – Dançando ao som da Banda

O evento prosseguiu com a alternância de ritmos musicais, que variavam de tecnomelody154, axé155,

funk, entre outros, ritmos direcionados ao público juvenil da Escola Cristo; neste evento notei o

embate de culturas, principalmente no que diz respeito a religiosidade do colégio e a cultura de

massa; efetivamente o profano e o sagrado estiveram presentes no mesmo espaço.

O reconhecimento de quem nós somos constitui-se através de tudo aquilo que nos cerca,

todas as influências presentes em nosso meio são capazes de codificar, efetivar e transformar as

identidades. Silva (2000) enfatiza que a construção identitária é marcada por signos, ou seja, o

reconhecimento se dá de forma relacional, de modo que o sujeito só compreende o que é pelo que

não é, pela diferença. A partir daquilo que se é, da identidade, aquilo que me constitui como sujeito,

passo a compreender que sou diferente do outro, aquilo que o outro é pode me parecer estranho,

Silva (2000) enfatiza que a diferença é sustentada pela exclusão. Para Dayrel (2007) a experiência

desses jovens nos grupos musicais revela múltiplos significados, interferindo diretamente na forma

como se constroem e são construídos como sujeitos sociais e como elaboram determinada

identidade individual e coletiva.

Silva (2000) afirma que é pelo valor das representações que se dá sentido à experiência

daquilo que nos constitui, ou seja, pelas importâncias que damos aos significados existentes é que

as identidades, tanto individual ou coletivas são estruturadas. Na escola Cristo Trabalhador, pode-

154 Tecno-melody é um ritmo musical paraense, marcado por batidas eletrônicas. 155 Axé é um gênero musical que nasceu no Estado da Bahia na década de 80.

Fonte: Paz, 2018.

Educação e compromisso social

350

se dizer que o Projeto Educar pela Pesquisa é um grande marcador identitário desses alunos, pois

requer que eles sejam engajados, tenham compromissos e responsabilidades; a contrapartida é o

reconhecimento, o carinho, o apoio, o respeito de colegas e professores, traduzido no tratamento

de celebridades que lhes é direcionado e que faz toda a diferença para que eles se reconheçam, se

aceitem, se tornem seguros e autônomos.

Conclusão

Contudo, como todo espaço é carregado de significados, pessoas e vivências diferenciadas,

a escola é um espaço que possibilita a manifestação de diversas culturas, portanto novos tipos de

cultura constituem-se na Escola Cristo trabalhador. As manifestações encontradas na escola lócus

da pesquisa, que estão na sua espacialização, nas experiências cotidianas, vestimentas dos alunos,

inter-relações e em todos os aspectos que compõe o espaço escolar. O espaço como constructo

cultural auxilia no processo de significação desses jovens, pois eles concebem o salão da escola

como um espaço onde eles podem socializar, se expressar, vivenciando suas experiências juvenis.

Enfatizo que os signos constituintes da cultura na Escola Cristo Trabalhador, emergem de

culturas variadas que se fazem presente nos interstícios de práticas e cotidiano da instituição.

Portanto, as manifestações culturais nesta escola emergem de diversas formas, sendo possível

perceber que estão implícitas no espaço, nas marcas culturais que os alunos já trazem de suas

vivências, reestruturando e constituindo novas culturas e identidades no espaço escolar.

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O BRINQUEDO DE MIRITI COMO PRÁTICA PEDAGÓGICO-CULTURAL:

REPRESENTAÇÃO E IDENTIDADE

Isane da Conceição de Lima Gonçalves156

Introdução

O brinquedo de miriti vem ganhando cada vez mais destaque nos discursos acadêmicos e na

literatura. Por meio desta pesquisa pretendo produzir mais conhecimentos para o benefício

acadêmico, social e educacional. Por ser uma representação da cultura abaetetubense, ao retratar

a vida cotidiana este também pode e deve ser utilizado como constituidor de identidades, além de

auxiliar o processo educacional atuando como prática pedagógica, mantendo a tradição cultural

regional.

Um brinquedo peculiar pode integrar uma cultura local, já que o brinquedo além de significados lúdicos tem outros como os econômicos e os culturais, com efeitos na constituição identitária coletiva e individual, logo, diz muito sobre quem os produz e os prestigia, tendo implicações simbólicas para a cultura, para a política para a economia e para a educação (RIBEIRO, 2014, p.344).

Este tema me chamou a atenção após meu ingresso na UFPA e me deparar com debates

sobre a cultura local e, especificamente, o brinquedo de miriti, o fato permitiu perceber meu

desconhecimento sobre este elemento cultural tão presente em meu município, e me levou a

questionar como os alunos estão tendo contato com essa cultura bicentenária, carregada de

significados e simbolismos.

Busco aporte teórico em Silva (2004), que trata sobre a influência do currículo na

constituição de identidades, e que também aborda a questão das identidades como construção

cultural e social. Para tratar da importância da cultura como força pedagógica no currículo, utilizei

Ribeiro, Lobato e Alexandre (2017), e por fim Jones Gomes (2013) que fala sobre o brinquedo de

miriti abordando a tradição e explicitando como este se faz presente no município de Abaetetuba.

Organizei o trabalho em dois tópicos, no primeiro descrevo brevemente sobre o lócus da

pesquisa que é o Centro de Educação Popular Acendendo as Luzes, e no segundo faço uma reflexão

156 Aluna do curso de Pedagogia/FAECS/Campus Universitário de Abaetetuba/UFPA; integrante do Gepege - Grupo de Estudos e Pesquisa Gênero e Educação/CNPq. E-mail: [email protected]

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353

acerca de como a cultura local especificamente o brinquedo de miriti é carregado de representações

e atua na construção de identidades.

1 Materiais e métodos

A presente pesquisa foi desenvolvida de modo qualitativo pois: A pesquisa Qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se ocupa, nas Ciências Sociais, com um nível de realidade que não pode ou não deveria ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes. Esse conjunto de fenômenos humanos é entendido aqui como parte da realidade social, pois o ser humano se distingue não só por agir, mas por pensar sobre o que faz e por interpretar suas ações dentro e a partir da realidade vivida e partilhada com seus semelhantes (MINAYO, 2015, p. 21).

Utilizei a etnografia para analisar e refletir sobre o cotidiano escolar a fim de compreender

como este se constitui na sua totalidade, voltada para as interações presentes no ambiente e como

os sujeitos interagem neste espaço, por meio dos estudos de André (2008).

Por meio da experiência etnográfica vivenciada no CEPAL, especificamente na observação

participante na turma de primeiro ano do ensino fundamental, maloca Itália, com os alunos na faixa

etária entre seis e sete anos, busquei durante o dia-a-dia conhecer o que os alunos e alunas sabem

sobre o brinquedo de miriti, e de que forma este artefato é apresentado a eles. Outro procedimento

usado foram as conversas informais buscando respostas de meus interlocutores em momentos de

interação.

O aluno Diego (7 anos), ao ser questionado sobre o brinquedo de miriti disse que nunca viu

o artefato na escola, ou seja, até o momento não houve nenhuma atividade que explicasse sobre o

assunto, mas que ele já havia visto o brinquedo no Festival do Miriti157, onde viu grande variedade

de peças, desde os pequenos até os muito grandes que sempre ficam expostos durante o evento;

enfatizou também que na sua casa não há nenhum Brinquedo de Miriti. Através dessas experiências

o aluno tem algum contato com o artefato cultural e inclusive soube dizer que ele vem da árvore do

miritizeiro, porém, não sabe mais detalhes de sua produção desde a matéria prima até o produto

final.

A aluna Danielly de (7 anos) ao ser questionada sobre o brinquedo de miriti, disse que sabia

do que se tratava, pois tinha visto o brinquedo em uma praça, porém, não se recordava muito bem

qual era o local; destacou os diversos brinquedos que lhe chamou a atenção tais como o barco, os

157 Festival Popular que ocorre anualmente na cidade e expõe a diversidade de artesanatos produzidos a partir da palmeira do miriti, dentre eles se destaca o ilustre Brinquedo de Miriti.

Educação e compromisso social

354

pássaros, o menino e a menina, e a roda gigante. Em suas lembranças ela destacou os brinquedos

mais tradicionais e que traduzem a cultura local, como o barco utilizado pelos ribeirinhos, os

pássaros da fauna amazônica com suas pinturas e cores diversas, o menino e a menina como ela se

referiu se trata do casal de namorados, e a roda gigante que representa as grandes festividades

católicas, as quermesses com a presença de parques, com a presença de outros brinquedos. A aluna

ainda continuou dizendo que na escola não há a presença do brinquedo de miriti, e que em sua casa

não há peças de miriti, mas que na casa da sua avó tem.

A aluna Yasmin (6 anos) se aproximou da conversa com a aluna Danielly, e percebi que ela

se interessou e logo a questionei sobre o assunto; ela já viu o brinquedo de miriti no parque e relatou

que sua mãe comprou para ela uma cama beliche de boneca feita de miriti. A apesar de possuir o

brinquedo ela não tinha muito conhecimentos a respeito da cultura do brinquedo de miriti; ao

contrário da aluna Danielly, ela já tem contato com brinquedos mais modernos ou inovadores, como

rádio, TV, helicóptero, dentre outros, que se distanciam um pouco daqueles que retratam o

cotidiano abaetetubense.

O aluno Gabriel (6 anos), informou que não tinha conhecimentos acerca do brinquedo de

miriti, pois nunca teve contato com o artefato na escola, nem na sua casa, pois por ser de família

humilde, ele nunca teve oportunidade de participar do festival do miriti e, portanto, não sabia muita

coisa a respeito.

Com esses diálogos, percebi que a maioria dos alunos associa o brinquedo de miriti com o

festival do miriti, que vem sendo o único momento de contato que eles têm com a cultura local,

especificamente o brinquedo de miriti. Notei que isso ocorre já que é o momento em que o

artesanato de miriti ganha visibilidade e destaque, nas mídias locais, com os turistas que vem

prestigiar e com a população do município de Abaetetuba que tem nesse festival um dos principais

momentos para apreciar esse artesanato.

Os alunos associam o brinquedo de miriti com o festival, pois foi o local onde tiveram contato

com esse importante elemento de nossa cultura, onde puderam comtemplar a diversidade dos

artesanatos em miriti com seus brinquedos em diferentes tamanhos e formas, que chamou a

atenção deles, mesmo sem uma explicação a respeito; ainda assim, marcou suas memórias como

algo diferenciado e colorido. Como enfatizado por Gomes (2013), os brinquedos de Miriti encantam

pela referência à infância, pela leveza, ludicidade e espontaneidade, pela singularidade de formas,

desenhos e cores. O fato de não ser trabalhado como ferramenta pedagógico-cultural, até o

momento na escola faz com que esses conhecimentos culturais se tornem algo distante para os

Educação e compromisso social

355

alunos apesar de ser uma tradição bicentenária do município; ainda assim, muitos desconhecem

essa cultura como o aluno Gabriel.

Houve também um momento em que os alunos do primeiro ano C e D estavam no pátio

conversando e brincando e a aluna Isadora trouxe até mim uma sacola; perguntei o que havia dentro

dela e respondeu que era miriti, então pedi para me mostrar; ela abriu a sacola e lá estava vários

pedacinhos da bucha do miriti coloridos; certamente eram sobras da produção dos brinquedos; a

aluna me explicou que sua tia pinta os Brinquedos e forneceu aqueles pedacinhos para ela brincar.

Ela me mostrava quando as crianças que estavam ao redor se aproximaram e também se

interessaram por apreciar as sobras de brinquedo; o que mais chamou a atenção delas foram as

cores e textura macia e cada criança pediu um pedaço para poder contemplar ainda mais o material

diferente que estava ali; para muitos pareceu o primeiro contato em poder tocar e conhecer melhor

a bucha do miriti através do tato e visão.

Fotografia 2: Pedaços da bucha do Miriti

Fonte: Gonçalves, 2018.

Na imagem pode-se notar a sacola de Isadora com vários pedaços de bucha de miriti

provenientes de sobras de Brinquedo; os pedaços estão pintados em suas bordas com diversas

cores, o que faz com que chame a atenção das crianças; ela abriu a sacola para mostrar e explicar o

que era esse material; na imagem foi captado o momento em que a aluna iria tocar nos pedacinhos

para mostrar que havia muitos deles e também para eu poder ver melhor as cores.

Depois de conhecer melhor o que os alunos conhecem a respeito do Brinquedo de Miriti fui

também até a professora para compreender melhor se em sua formação ela teve contato com a

temática da cultura local, se ela hoje trabalha com seus alunos sobre a nossa cultura e qual a

importância disso para a vida de seus alunos. Para isso utilizei questionário para a realização de

entrevista estruturada.

Educação e compromisso social

356

A professora Lúcia é formada em Licenciatura em Biologia pelo IFPA e trabalha na escola há

um ano e meio. Durante sua formação ela não teve nenhum contato com algo que se referisse a

cultura local em especial ao brinquedo de miriti. A professora também nunca teve formação

continuada a respeito do assunto, apesar da escola ter que trabalhar a cultura local que está no seu

currículo, mas segundo a professora, desde quando ingressou na escola até o momento, não foi

ofertado nenhum tipo de curso de formação a respeito da cultura local.

A professora reconhece que tratar da cultura local é de suma importância para as crianças e

que esses assuntos deveriam ser trabalhados em sala de aula, diz que de vez em quando tenta

conversar com seus alunos a respeito do conhecimento que eles tem sobre a nossa cultura, sobre

as nossas danças, sobre as músicas e também sobre a arte, como a arte do miriti e também do açaí,

e sempre busca conhecer o que eles sabem a respeito desses assuntos porém ainda não conseguiu

levar esses materiais para sala de aula por conta de diversos fatores como a falta de recursos para

comprar o brinquedo, ela ressalta que um contato mais direto com o brinquedo de miriti e com tudo

que pode ser produzido a partir do miriti é muito importante e quando for trabalhado na sala vai

ser algo muito produtivo para todos, em seu relato ela aborda essas questões:

Falar sobre a cultura local não é muito difícil, só que para os alunos do primeiro ano seria mais interessante se nós conseguíssemos mostrar pra eles, não simplesmente falar, porque mostrando, eles visualizando se torna mais interessante e eles provavelmente teriam menos dificuldade em esquecer o que se foi trabalhado, o que se foi explorado na sala de aula mas de qualquer maneira eu na minha opinião é um pouco dificultoso trabalhar esses assuntos com eles para que eles tenham entendimento da nossa cultura mais falar assim não há dificuldade, trabalhar para que eles absorvam esse conhecimento sim, eu acho que é mais dificultoso, lá na escola nós não temos sempre disponíveis data show, as vezes tem algum equipamento que não tá funcionando bem, aí a gente tem até uma certa dificuldade de apresentar imagens assim, é por isso que no meu planejamento será conseguir esses materiais de brinquedo de miriti no caso com os artesãos, cru assim praticamente para que os alunos com a criatividade deles, eles concluam o que o artesão já iniciou lá no seu estabelecimento, mas pra mim há uma certa dificuldade sim em trabalhar para que os alunos absorvam o assunto (Professora Lúcia, diário de campo, 2018).

A professora destaca também a falta de informação que há a respeito de nossa cultura, como

pode-se perceber ainda no seu relato:

Vale ressaltar também que não é muito fácil termos acessos a esses conhecimentos da nossa cultura local na internet visto que esse é um meio que nós mais usamos atualmente para conseguirmos informações e fazermos, desenvolvermos um bom trabalho, na internet eu não consegui achar muita coisa a respeito da nossa cultura, tanto do miriti como do açaí, quanto da dança, enfim, pra mim é um pouco dificultoso nesse sentido de acesso as informações (Professora Lúcia, entrevista, 2018).

Educação e compromisso social

357

Portanto, por meio deste relato, pude perceber que há certa dificuldade em inserir o tema

cultura local e suas diversas nuances nas atividades cotidianas dos alunos do primeiro ano; no relato

da professora ela se mostra disposta a trabalhar a cultura local e incentiva as conversas para

conhecer o que os alunos sabem a respeito de nossa cultura tão diversa, porém como a mesma

relata só falar não é suficiente pois ela quer mostrar a eles o que é um Brinquedo de Miriti pois

muitas crianças nunca viram ou tocaram nesse artesanato, ela quer que seja algo significativo para

os alunos, para que estes absorvam de fato esse conhecimento, por conta disso ela relata suas

dificuldades e sobre a falta de conhecimentos mais aprofundados sobre a temática, porém ela ainda

está buscando uma articulação para conseguir trabalhar o assunto com qualidade para proporcionar

um conhecimento relevante para seus alunos.

2 Resultados e discussão

2.1 A Escola CEPAL

No dia 27/02/97, o CEPAL foi fundado, num terreno medindo 1200 m2 quadrados, localizado

na 2° rua do campo, número 2341, Cidade de Abaetetuba, Estado do Pará, Brasil. O CEPAL oferta as

séries iniciais do Ensino fundamental (1° ao 5° ano).

O processo Educacional do CEPAL tem como objetivo geral formar Cidadãos conscientes de

seu ser e do seu fazer, contribuindo para a construção de uma sociedade inclusiva, mais justa e

igualitária. Através de uma Educação de qualidade, o Centro busca a formação e a construção de

pessoas críticas que façam a diferença na sociedade e busquem sua transformação.

Fotografia 1: Fachada da escola Cepal

Fonte: Gonçalves, 2018.

Educação e compromisso social

358

A estrutura física do CEPAL é composta por: sala da Gestão, sala dos funcionários, secretaria,

sala de arquivo, sala da coordenação pedagógica, 07 salas de aula, laboratório de informática,

espaços de apoio, tais como cozinha, salão, depósitos, área de circulação, pátio e banheiros.

A estrutura das salas de aula chama bastante a atenção, pois elas tem formato de maloca

(oca indígena), em homenagem a Educação Indígena, o que diferencia da arquitetura de outra

escolas; cada uma tem um nome específico que são: Itália, Pará, Brasil, Amazônia, Abaetetuba,

Ferranti, sendo que a sala Amazônia é a única que não tem o formato de maloca, pois foi construída

posteriormente para atender a demanda de alunos na escola; nela há pinturas na parede com belas

paisagens da flora e fauna amazônicas, com o objetivo de levar aos alunos que nela estudam, a

refletir sobre a preservação do meio ambiente e dos animais. Há uma sala adaptada no bloco

administrativo que não possui um nome específico como as outras, pois também foi criada com o

intuito de aumentar o número de turmas para oferecer mais vagas, já que a escola é bastante

procurada.

2.2 Brinquedo de miriti: representações e identidades

Concebendo cultura como tudo aquilo que se encontra presente nas diversas atividades

sociais Williams (1922, p. 13) a define como “[...] ‘um modo de vida global’ distinto, dentro do qual

percebe-se, hoje, um ‘sistema de significações’ bem definido não só como essencial, mas como

essencialmente envolvido em todas as formas de atividade social” (apud RIBEIRO, 2010, p. 261).

Nesse sentido, podemos compreender que no ambiente escolar se torna indispensável a

propagação de conhecimentos culturais do contexto onde está inserido, levando em consideração

as representações e significações existentes, pois os conteúdos a serem ensinados precisam fazer

sentido para a comunidade a que pertence.

A cultura local é muito rica por ter várias expressões culturais, conhecimentos que são

passados de geração em geração através da oralidade, saberes únicos que nos constituem enquanto

sujeitos e que estão presentes em nosso cotidiano, porém esses conhecimentos são pouco

difundidos nas escolas, apesar da cidade carregar o título de capital Mundial do Brinquedo de miriti,

ainda se sabe pouco a respeito dessa cultura. O foco para este artesanato ainda se dá de forma

restrita, em momentos específicos como o festival do miriti, sendo depois adormecido até retornar

no ano seguinte e assim a cultura do Brinquedo de Miriti se resume a alguns eventos não sendo

explorada em outros locais.

Em suas análises Moreira (2009) enfatiza a importância do currículo como instrumento que

gera transformação e renovação de conhecimentos que são tidos como relevantes para serem

Educação e compromisso social

359

ensinados a jovens e crianças no ambiente escolar a partir da importante tomada de decisão sobre

o que deve ou não conter no currículo, os conhecimentos que serão abordados e suas finalidades,

essa questão ganhou cada vez mais destaque ao assumir a sua importância no conhecimento

pedagógico. A partir do pensamento pós-moderno novas mudanças no campo social foram sendo

delineadas dentre elas as questões de identidade, cultura, representação e também o currículo visto

como “um instrumento privilegiado de construção de identidades e subjetividades”, e também

como “um campo de lutas e conflitos em torno de símbolos e significados” (MOREIRA, 2009, p. 15).

O currículo escolar contém conteúdos e saberes que precisam ser ensinados desde cedo aos

alunos, essa seleção de conhecimentos irão se transformar em prática pedagógica tendo grande

influência na construção dos sujeitos, nessa ótica percebe-se que a cultura local ganha pouco espaço

quando se trata de priorizar conhecimentos. A escolha desses conhecimentos diz muito sobre a

maneira que se pretende educar os sujeitos pois,

[...] O conhecimento que constitui o currículo está inextricavelmente, centralmente, vitalmente, envolvido naquilo que somos, naquilo que nos tornamos: na nossa identidade, na nossa subjetividade. Talvez possamos dizer que, além de uma questão de conhecimento, o currículo é também uma questão de identidade [...] (SILVA, 2004, p. 15-16).

As dificuldades em trazer a cultura local para dentro do currículo escolar pré-estabelecido é

grande, pois sempre ocorre a omissão de elementos culturais, ou seja, alguns conhecimentos são

priorizados em detrimento de outros, de acordo com Ribeiro, Lobato e Alexandre (2017, p.238) “a

seleção curricular prioriza unicamente conhecimentos oriundos da cultura erudita”, por isso há

pouco espaço no currículo para conhecimentos locais como o brinquedo de miriti que embora sendo

um elemento crucial da cultura abaetetubense e carregado de significados de nossa identidade

cultural não pode competir com conhecimentos da cultura erudita que já escolheu aquilo que quer

difundir e que tipos de pessoas quer formar.

Na experiência etnográfica na escola CEPAL percebi que o local é sem dúvida um espaço

cheio de elementos da amazônica, e tende a criar um ambiente propício para dar destaque aos

saberes culturais tanto da arte em miriti como de outas formas de representação cultural, o

ambiente por si só também faz parte de um currículo implícito que propicia uma vivência

significativa para os alunos.

A professora também se articula de diferentes formas para conseguir que os conteúdos da

cultura local sejam repassados as crianças, mas ela enfatiza que esses conhecimentos devem ser

apresentados a elas de forma significativa, já que atuaria de forma positiva na construção de cada

sujeito. A inserção de conhecimentos advindos da cultura local, em especial a do Brinquedo de

Educação e compromisso social

360

Miriti, aproximará os alunos de sua própria cultura, fazendo-os conhecer melhor sobre o que é este

artesanato, o que ele representa para nosso município, e como ele pode ser mais valorizado. A

cultura precisa estar mais presente no currículo pois:

Como força pedagógica, a cultura estende as possibilidades da escolarização na medida em que amplia aprendizagens, permite constituir outras identidades e outros modos de estabelecer relações sociais. No município de Abaetetuba, a tradição e o patrimônio cultural precisam ser tomados como forças pedagógicas para a escolarização, pois a cultura local é um terreno privilegiado que imprime sentido à vida cotidiana de modo mais imediato; por isso, é repleta de possibilidades criativas e inventivas para o ensino. Por meio do ensino dos elementos e dos artefatos da cultura local, é possível construir significados outros nas diferentes esferas sociais, produzindo modos de pensar e agir diferenciados. Por isso, cremos na viabilidade de os conhecimentos ensinados produzirem experiências que sejam capazes de estruturar-desestruturar a interpretação sobre a relação cultura e sociedade, sobre a posição dos sujeitos nesta relação, e sobre a constituição do eu e do Outro (RIBEIRO, LOBATO, ALEXANDRE, 2017, p. 238).

Abaetetuba, cidade de inúmeras expressões culturais, sempre teve seu nome ligada a

elementos de sua cultura que se tornaram tão fortes que nomearam esta cidade, e logo depois

desaparecem deixando apenas as lembranças do que já foi sendo substituído logo por outra forte

expressão; esta cidade que muito encanta e sempre se reinventa através de suas culturas e

tradições, localizada as margens do Rio Maratauíra (afluente do Rio Tocantins) possui cerca de 72

ilhas, 156. 292 habitantes. Abaetetuba é uma cidade com inúmeras manifestações culturais,

reconhecida por sua diversidade de artesanatos, com uma rica culinária, com festivais de quadrilha,

enfim, a cidade coleciona títulos como Terra da Cachaça158, Cidade das bicicletas159, Medellín

Nacional5, esta cidade que se cria e recria através das muitas representações que a compõe foi

considerada por Gomes (2012) como “Cidade da Arte”, dentre as muitas formas como a cidade já

foi conhecida ela é considerada hoje como “A Capital Mundial do Brinquedo de Miriti”.

Diante da rica diversidade da flora Abaetetubense destaca-se o “miritizeiro”, palmeira típica

das regiões de mangues das ilhas de Abaetetuba, é chamada cientificamente de Mauiritia Flexuosa;

a partir desta árvore se aproveita diversas elementos, desde o fruto que serve para a alimentação,

como também as folhas que tecem paneiros, cestas, e os ilustres brinquedos de miriti.

Segundo Ribeiro (2017, p. 230) “[...] a bicentenária tradição do brinquedo de miriti, é de

origem popular e preservada pela tradição oral”, de acordo com os relatos dos ribeirinhos o

158 Com inúmeros engenhos a cidade começou a ser uma grande produtora de cachaça que passou a ser exportada, por

isso nesse período ficou conhecida como terra da cachaça. 159 Houve um momento em que o principal meio de transporte utilizado era a bicicleta, sendo que as estatísticas apontavam uma bicicleta para cada três habitantes. 5 Pelo intenso tráfico de drogas.

Educação e compromisso social

361

artesanato de miriti surgiu para servir de brinquedo para as crianças que não tinham condições

financeiras para comprar brinquedos industrializados; por conta disso, passaram a confeccionar

com a bucha extraída da palmeira do miriti alguns objetos que usavam em suas brincadeiras de

criança, pois o material de miritizeiro é leve e macio, e logo foi utilizado para tal fim. A partir daí o

brinquedo foi ganhando cores e formas até encantar a todos e chegar a ser comercializado.

Representando o cotidiano dos ribeirinhos, os pássaros, e várias outras características da cultura

local, tornando-se grande símbolo para a cidade de Abaetetuba que hoje carrega este artefato

cultural como elemento fundamental de sua cultura.

O festival do miriti é um evento que acontece todos os anos desde 2004 na cidade de

Abaetetuba e tem como objetivo principal contribuir para o desenvolvimento cultural, econômico

e social do município, momento em que há incentivo econômico através do comércio, turismo,

cultura a fim beneficiar os produtores e suas famílias. O evento atualmente acontece na praça da

Bandeira, onde os artesãos expõem os diversos produtos produzidos a partir da palmeira e fruto do

miriti, tais como cestos, paneiros, matapis, peneiras, etc.

Entendendo que “A identidade é simplesmente aquilo que se é: ‘sou brasileiro’, ‘sou negro’,

‘sou heterossexual’, ‘sou jovem’, ‘sou homem’” (SILVA, 2009, p. 74), podemos compreender que os

sujeitos vão se moldando a partir do que são e também ao reconhecerem o que não são, dessa

maneira a identidade e diferença estão intrinsecamente relacionadas para a afirmação de cada

indivíduo. As identidades culturais, segundo Hall (2006), advém de nosso “pertencimento”, assim

pertencer a uma determinada cultura e se apropriar dela através do meio social e escolar permite

uma formação e construção de identidade cultural.

Na perspectiva cultural podemos compreender que as diversidades culturais que existem em

um local e que diferem de outro também atuam na formação identitária ou seja, reconhecer a arte

do miriti como algo nosso, específico da cultura abaetetubense, que nos difere de outras culturas

ajuda-nos a moldar e construir identidades.

Na experiência etnográfica constatei que algumas crianças sequer sabiam sobre o brinquedo

de miriti, e se nunca viram e se nunca ouviram falar como estas vão se apropriar desses

conhecimentos e construir sua identidade cultural? Trazer esses elementos culturais para sala de

aula, para o ambiente escolar sem dúvida irá enriquecer os conhecimentos dos alunos e trará

significados e representações diversas para que dessa forma atuem na construção de suas

identidades.

Educação e compromisso social

362

Segundo Silva (2003) “[...] a representação é um sistema de significação”, ou seja, algo só

tem significado quando damos sentido a ela, por isso trazer o brinquedo de miriti para dentro do

currículo, aproximar mais essa cultura do Brinquedo de miriti que não é só um simples objeto mas

também traz consigo representações, aproximar das crianças esses conhecimentos fará com que

elas conheçam mais sobre nossa cultura e passem a dar significado e sentido a ela.

Conclusão

Após a observação pude conversar com alguns alunos para compreender quais

conhecimentos estes tem acerca da cultura do Brinquedo de Miriti, a partir de conversas informais

pude perceber que a maioria dos alunos associam este artesanato com o festival do miriti, pois neste

evento essa cultura é mais visada na cidade e consequentemente marcaram suas memórias como

o “local onde vende o brinquedo”, os alunos conheciam apenas o superficial, pois os saberes, as

construções e representações sociais presente no artesanato ainda não faz parte dos

conhecimentos apresentados a eles. Na entrevista a professora relatou que trazer a cultura local

para dentro de sala de aula é muito importante, e que deve ser feito através de experiências

significativas que de fato façam sentido aos alunos.

A cultura do brinquedo de miriti é bicentenária e duplamente central para Abaetetuba pois,

de acordo com Ribeiro, Lobato e Alexandre (2017), aquece a economia local garantindo renda

adicional para centenas de famílias, e proporciona visibilidade, prestígio e diferenciação em relação

as identidades pelo orgulho de pertencer. Suas diferentes formas retratam o cotidiano ribeirinho e

a cultura amazônica trazendo a valorização das mesmas e atuando como fonte de conhecimentos a

todos que contemplam este artesanato.

A cultura ainda não conseguiu ganhar muito espaço no currículo pois os conhecimentos da

cultura erudita ainda são os mais privilegiados, mas a cultura local exerce também grande

significado por se tratar de conhecimentos que perpassam gerações e também fazem parte de

nossa história, por isso para que haja a verdadeira valorização da cultura local, das diversas riqueza

que temos precisa-se dar significado a elas, precisa-se ser inserida com mais afinco nas práticas

cotidianas, para que assim desde cedo os alunos tenham a oportunidade de conhecer, se apropriar

e valorizar aquilo que somos e nossos modos de vida para que possam construir suas identidades.

Referências

ANDRÉ, Marli. Etnografia da Prática Escolar. 14° edição. Campinas: Papirus, 1995.

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363

CANDAU, Vera Maria Ferrão. Diferenças culturais, cotidiano escolar e práticas pedagógicas. PUC-Rio v. 11, n. 2. Rio de Janeiro, 2011. p. 240-255. Disponível em: www.curriculosemfronteiras.org FRAGO, Antonio V.; ESCOLANO, Agustín. Currículo, espaço e subjetividade: a arquitetura como programa. Tradução Alfredo Veiga-Neto. Rio de Janeiro: DP&A, 1998. GOMES, Jones da Silva. Cidade da Arte. Uma poética de Resistência nas margens de Abaetetuba. Tese (Doutorado). Belém: PPGSC/IFCH/UFPA, 2013. HALL, Stuart. Cultura e representação. Trad. William Eira e Daniel Miranda. pp. 404-407. Rio de Janeiro: Ed. PUC-Rio, 2016. LOBATO, Lídia. PINHEIRO, Deliza. RIBEIRO, Joyce. A tradição do Brinquedo de Miriti no currículo das escolas do município de Abaetetuba, 2014 [v. eletrônica]. Acesso: 02/04/2018: http://periodicos.ufpa.br/index.php/revistamargens/article/downlond/3093/3113 MINAYO, Cecília de Souza. Pesquisa Social. 34ª ed. São Paulo: Vozes, 2015. MOREIRA, Antonio Flavio Barbosa. Currículo, diferença cultural e diálogo. Educação e sociedade. n. 79, Rio de Janeiro, 2002. RIBEIRO, Joyce Otânia Seixas; LOBATO, Lídia, Sarges; ALEXANDRE, Joneide Pinheiro. Brinquedo de

miriti: a força pedagógica da cultura local no currículo. Nuances. v. 28, n 2, p. 227-245. São Paulo,

2017.

SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de identidade: uma introdução as teorias do currículo. 2ª ed.

Belo Horizonte. Ed. Autêntica, 2004.

______. (Org). Identidade e diferença: A perspectiva dos estudos culturais. 12ª ed. São Paulo: Vozes,

2000.

______. O currículo como fetiche: a poética política do texto curricular. 2ª ed. Belo Horizonte:

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SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de identidade: uma introdução as teorias do currículo. 2ª ed.

Belo Horizonte: Autêntica, 2004.

SACRISTÁN, José Gimeno. O currículo: uma reflexão sobre a prática. 3ª ed. Porto Alegre: Artmed,

2000.

Educação e compromisso social

364

CARIMBLOCO DO PACOVAL: FUSÃO DE TRADIÇÕES

Karla Roberta de Souza Malato160

Giselle Fonseca Sarmento161

Leida Lira Lima162

Introdução

Escolhemos por abordar o tema “CARIMBLOCO DO PACOVAL: FUSÃO DE

TRADIÇÕES”, primeiro de tudo por curiosidade que o próprio nome desperta, seguido de o

mesmo oferecer elementos pertinentes à visão antropológica de cultura. A pesquisa foi

desenvolvida em três lócus: 1°) O BARRACÃO, centro da Associação onde acontece a

preparação de instrumentos musicais característicos para o carimbó e aquecimento dos

participantes com os ensaios do samba enredo. 2°) O CORTEJO, quando os brincantes deixam

o barracão para ganhar as ruas da cidade até a avenida para sua participação formal. 3°)

Passagem do Bloco na avenida, na cidade de Soure/PA que faz parte da Ilha do Marajó e que

têm uma história muito relacionada com o carimbó.

O CARIMBLOCO DO PACOVAL nasceu pela iniciativa dos Tambores do Pacoval que faz

parte da AMPAC (Associação dos Moradores do Bairro do Pacoval), que originou - se por meio

de uma roda de conversa com um amigo que instigou os integrantes dos Tambores do Pacoval,

comentou nossa entrevistada Cilene, sugerindo que em Soure fosse realizado o CARIMBLOCO,

já que nas cidades do Rio de Janeiro e Minas Gerais já existiam e aqui no município que é a

terra do carimbó ainda não tinha. É a partir desse momento os fundadores da AMPAC

conversaram entre si e foram atrás dos “amigos da cultura”, para custear o projeto e poder

colocar o bloco na rua com o intuito de mostrar aos visitantes e a população local a cultura do

carimbó marajoara, segundo a nossa entrevistada.

160 UFPA/Campus de Soure. E-mail: [email protected] 161 UFPA/Campus de Soure. E-mail: [email protected] 162 UFPA/Campus de Soure. E-mail: [email protected]

Educação e compromisso social

365

A princípio nossa pesquisa procurou entender o contexto sócio histórico do

CARIMBLOCO e sua possível relação com os aspectos educacionais, sociais e culturais,

propostos pela pesquisa, seguindo a ótica antropológica. Para isso, participamos de todos os

momentos: da preparação dos artefatos usados no desfile, dos ensaios do enredo e das

oficinas de percussão, que ensinou os integrantes e a nós a tocar os tambores e as maracás,

até o desfile propriamente dito. Em meio a essa participação, notamos a presença da

experiência educativa, que é aquela que vai se opor a educação dada em sala de aula. Ela é

transcendente ao ambiente escolar e sendo assim, atribui valor ao grupo social em questão.

Em nossas investigações, entendemos a preocupação do CARIMBLOCO em repassar os

conhecimentos artísticos, culturais e sociais.

A etnologia procura nitidamente dar uma atenção especial a este contexto que é

considerado como material residual (cultivo popular). Segundo LAPLANTINE (1994, pag. 152),

diferentemente da cultura reificada, que é aquela que se preocupa em enfatizar a ideia de

cultura monumental, conceito de algo grandioso, a antropologia caracteriza-se por validar o

conceito de cultura, enquanto procedimento incompleto e que ocorre no cotidiano pelas

relações entre indivíduos. O CARIMBLOCO vem justamente validar este conceito de cultura

como processo inacabado. Ressalta também o cultivo de antigas tradições assim como

carimbó, boi-bumbá, como patrimônio cultural da cidade de Soure.

Para à antropologia, a identidade de um indivíduo ou grupo social, se mostra pelas

suas produções. Em sentido restrito, e mais atual, é o resultado de um trabalho de apropriação

e reelaboração simbólica mediado por valores ideológicos a partir dos fazeres da vida

cotidiana de uma dada comunidade. SILVA (2015, pag. 90). Cilene Oliveira Andrade, que é uma

das fundadoras da AMPAC e idealizadoras do CARIMBLOCO, nos relatou que sentiu a

necessidade de criá-lo, como forma de incentivar a cultura do carimbó no carnaval, como

estratégia para haver valorização da dança, da arte marajoara, como patrimônio cultura e

imaterial por parte dos apreciadores presente no sambódromo. Ainda, segundo ela, a

comunidade do bairro do pacoval participa ativamente do projeto crianças, jovens e adultos.

Educação e compromisso social

366

1 Materiais e métodos

Foi utilizada como metodologia a pesquisa qualitativa através dos seguintes

procedimentos: Escolha do tema, Exequibilidade da pesquisa, Leitura de textos para

embasamento da pesquisa, Apropriação de conceitos antropológicos, Coleta de dados através

da entrevista como técnica de pesquisa, Registro audiovisuais (gravação em áudio, fotos e

vídeos), Práxis por meio de oficinas de percussão e dança, Participação na concentração do

bloco, Clivagem dos materiais coletados e organização lógica do assunto abordado, para o

produto final.

2 Resultados e discussão

A experiência proposta pela disciplina Antropologia Educacional, foi provocante e ao

mesmo tempo engrandecedora, no qual foram possíveis termos outros olhares para:

A Cultura e Patrimônio: Onde o BLOCO CARIMBLOCO faz junção num período

carnavalesco, da cultura regional do carimbó e do carnaval.

Atitudes: Em que possamos ter exequibilidade de trabalhar em equipe, tanto

no diálogo quanto na escrita e de integrar o que aprendemos nos livros e na

sala de aula com a prática em campo.

Conclusão

Fonte: Foto da autora Giselle Sarmento.

Educação e compromisso social

367

A pesquisa possibilitou a nós participantes compreender como as abordagens

antropológicas e a prática educacional conversão entre si. É por amor ao patrimônio cultural

local, pelo fato de Soure ser uma cidade turística e pelo carnaval ser, ainda, uma manifestação

social e cultural que atrai visitantes à cidade, se reuniu elementos suficientes para que agentes

culturais unissem forças com o objetivo de fortalecer esta tradição a cada ano. Uma vez que

não se trata de uma questão prioritariamente financeira, embora este seja muito importante

para manutenção da cultura, mas estava visivelmente ressaltado o prazer em se VIVER à

tradição.

Em função da experiência educativa, o que chamou a atenção da equipe pesquisadora

foi o fato de como os agentes culturais se desdobram, como podem fazer para que haja a

manutenção, valorização e perpetuação do carnaval como patrimônio cultural de Soure, e o

quanto esses detalhes importantes passam despercebidos aos olhos de muitos da

comunidade local, que muitas vezes passam a dá mais importância a outras tradições que não

sejam as suas, relegando aquelas que verdadeiramente fazem parte da construção histórica,

cultural, social local.

Referências

LAPLANTINE, François. Aprender Antropologia. São Paulo: Brasiliense, 1994. (3ª parte).

SILVA, Dedival Brandão da. Migalhas do carnaval: escolas de samba, educação e patrimônio etnográfico em Abaetetuba. Campinas: Pontes Editores, 2015.

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Abaetetuba/Pará

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