jornal lince outubro 2013
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JORNAL LINCE - Jornal laboratório do curso de Jornalismo do Centro Universitário Newton PaivaTRANSCRIPT
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LINCEJornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton PaivaNº 56 | Outubro de 2013
UMA LIÇÃO DE VIDAUMA LIÇÃO DE VIDAENTRE RISOS E TRISTEZAS| PÁGINAS 12 À 14
UMA LIÇÃO DE VIDAGUINÉ BISSAU
PRAÇA 7
AQUI, MACHUCADO E FORTE,
BATE O CORAÇÃO DA CIDADE
| PÁGINA 08 E 9
MIGRANTES
RODOVIÁRIA É A PORTA
DA ESPERANÇA DE QUEM CHEGA
| PÁGINAS 10 E 11
ENTREVISTA
MARCELO BARRETO: NÃO ADIANTA
SER UMA WIKIPÉDIA AMBULANTE
| PÁGINAS 20 E 21
2 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013
João Paulo Freitas
(4º período)
Lutam por liberdade, mas escondem sua
história. Gritam por Justiça, desde que ela
não os prejudique. Este é o novo método esco-
lhido por alguns de nossos bravos defensores
da “liberdade”. Tudo isso devido ao projeto de
lei que pretende alterar o artigo 20 do Código
Civil de 2012, incluindo um parágrafo que, no
caso de pessoas públicas, permite a publica-
ção de imagens e textos com finalidade bio-
gráfica sem a autorização do biografado ou de
seus familiares.
Pessoas de quem, antes, eu sentia orgu-
lho de chamar compatriotas, hoje nem
mesmo sei quem são. Sim, me refiro princi-
palmente aos grandes nomes da MPB: Cae-
tano Veloso e Chico Buarque. Dois seres mai-
úsculos que defenderam o país entregando-se
de corpo e alma à luta contra o regime imposto
por governos totalitários. Porém, simples-
mente não querem permitir que suas biogra-
fias sejam publicadas. Se não me engano, não
foi aquele mesmo senhor que vivia debaixo
dos caracóis dos seus cabelos, quem disse um
dia que era “proibido proibir”? E não foi ele
quem gritou “Eu digo não ao não”?
Com certeza eles não estão medindo a
dimensão do mal que estão fazendo às suas
próprias histórias. Sim, suas vidas. O pre-
sente, principalmente. Não estão enxergando
que dessa forma vão de encontro a tudo o que
um dia abominaram. Ou seja, a maldita cen-
sura. Suas letras cheias de grandes metáfo-
ras, que batiam fortemente no rosto dos gene-
rais, irão cair por terra por simplesmente
omitirem algo que não os prejudicaria — enri-
queceria. Ou será que nossos “mocinhos” se
esconderam debaixo de uma máscara por
anos e, depois de tudo, descobriremos que
não são tão bonzinhos assim? Prefiro não
acreditar que seja isso.
Para não ser injusto com os fatos, outros
membros da MPB se apresentam a favor da lei.
São alguns deles: Frejat, Ivan Lins, Leo Jaime e
Fernanda Abreu. Fernanda Abreu? Que diabos
teria de tão relevante na história de um “Rio 40
graus”? Só Deus sabe. Está me cheirando
modinha nova no ar. Duelo de egos.
Não permitir publicar biografias é muti-
lar a história de um país. Até porque, para
serem expostas, será preciso contar com pes-
soas extremamente importantes e relevantes
na mudança de algo. Seja no esporte, cultura,
política, ou até mesmo em qualquer outra
instância da vida do país. Se não gostou do
que foi escrito sobre você, então xingue, grite,
processe, mas não impeça. Prove que é men-
tira. Mas, se for verdade, arque com as conse-
quências, pois suas vidas foram feitas de cara
limpa. Às vezes, pintadas.
Quando digo “Passado às Avessas”, seria
aquilo que o povo brasileiro conheceu doloro-
samente como censura, sendo hoje feita pelos
líderes que lutaram contra ela. Bela ironia,
não acham?! Me diga, Chico, vai querer beber
desta bebida amarga que tanto pediu a Deus
para afastar o cálice de ti? Me diga então, Cae-
tano, por que não? Por que não?
Cor res pon dên Cia
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Bairro Cai çara - Belo Horizonte - MG
CEP 31230-600
Contato: (31) 3516.2734
Este é um jOr nal-la bO ra tó riO da
dis ci plina la bo ra tó rio de jorna lismo ii.
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emis são de con cei tos emi ti dos em ar ti-
gos as si na dos e per mite a re pro du ção
to tal ou par cial das ma té rias, desde
que ci ta das a fonte e o au tor.
SugEStõES dE pautaS?participE dO jOrnal lincE.
uma publicação feita pelos alunos do curso de jornalismo do centro universitário newton.
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Conselho editorialProfessor Menoti Andreotti
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reportaGensAlu nos do Curso de Jornalismo do Centro Universitário New ton
diaGraMaÇÃo Laura SenraMárcio JúnioEstagiários do Curso de Jornalismo
ExpedienteOpiniãOjornal
LINCEJornal laboratório
do Curso de Jornalismo
do Centro universitário
newtonÀS AVESSAS
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PASSAdo
Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013 3
raPhael GouVÊa
2º período
Mineiro de fala mansa e gestos mais
calmos ainda, foi em 2007 que, aos 18
anos, Marco Antônio Pereira deixou Cor-
disburgo e veio para Belo Horizonte, onde
trabalha hoje como diretor de videoclipes
e publicidade. Chegando a Belo Hori-
zonte, foi logo a um dos cinemas mais tra-
dicionais da cidade e assistiu um projeto
que se exibia aos sábados, e que se cha-
mava “Imagem Pensamento”.
— Lembro como se fosse hoje: a sala
escura, as pessoas, o clima frio por causa do
ar condicionado e o vídeo... Aquilo tudo
confundia muito minha cabeça. Mas, dos
pensamentos confusos que eu tinha, eu só
conseguia destacar um: “Eu preciso fazer
um filme! Eu nasci p ra fazer isso!”.
“nÓis tuDo”
Marco Antônio não perdeu tempo.
Logo após o seu primeiro fim de semana
em Belo Horizonte, já iniciava as aulas no
curso de Jornalismo na Newton. Afinal,
era a profissão que ele sonhava seguir
desde criança, ainda cursando o ensino
médio. No decorrer do curso, Marco Antô-
nio teve uma visão ainda mais complexa
do Jornalismo, que lhe serviria muito mais
do que ele imaginava a princípio.
Em busca de realizar o sonho de ir
para o cinema, correu cada vez mais atrás
de seus objetivos. Encontrou em Léo San-
tos um mestre que o ensinou muito sobre
o assunto e o ajudou com o empréstimo de
equipamentos que ele precisaria para
desenvolver seu projeto. Com essa ajuda,
Marco procurou um curso específico den-
tro da área e se formou na Escola Livre de
Cinema, no final de 2008. Depois de for-
mado, dirigiu seu primeiro filme, que na
verdade era uma espécie de documentá-
rio, chamado “A arte é de nóis tudo”. Esse
documentário chegou a ser exibido em
Brasília e na Alemanha.
“nÓs e o horiZonte”
Mesmo durante o curso de Jorna-
lismo, que levou de maneira muito pecu-
liar, Marco Antônio sempre teve a cabeça
voltada para o cinema. Não era, certa-
mente, um aluno exemplar, mas era “dife-
renciado”, como bem definia uma de suas
professoras, Juniele Rabêlo. José Maria
Souza Neto, o Zé Neto, outro aluno de
jornalismo que também incursionava pelo
cinema, era um apoio constante.
Após concluir o curso de Jornalismo,
Marco Antônio dirigiu um longa-metragem
chamado “Sobre Nós e o Horizonte”, um
filme em que fala sobre a importância das
pequenas coisas. Sem financiamento, con-
tando apenas com a ajuda dos amigos e com
muita criatividade para reverter a falta de
grana, ele conseguiu transformar “Sobre
Nós e o Horizonte” em uma experiência
única. Por isso, a exibição do filme se trans-
formou em um momento mágico.
— Um fato marcante nessa minha
relação com cinema foi exibir o “Sobre
Nós e o Horizonte” na sala Humberto
Mauro, no Palácio das Artes. Foi uma ses-
são muito marcante. A sala estava lotada,
as pessoas se emocionando...
“Eu fiquei refletindo que foi um mila-
gre ter conseguido terminar o filme e lançar
o longa, no mesmo cinema em, que há cinco
anos, eu estava deslumbrado em ver a
telona pela primeira vez”, conta Marco
Antônio, sempre destacando que essa foi, de
fato, “uma experiência fascinante”.
— Acho que ninguém ali na sala
conseguiria entender o que se passava
no meu interior.
Atualmente, aos 26 anos, Marco está
terminando as gravações de uma websérie,
que conta com a participação de vários ato-
res consagrados no cenário belo-horizon-
tino. Entre eles, Guilherme Colina, Fer-
nando Veríssimo e Márcia Moreira.
E o jornalismo? Atualmente, ele traba-
lha como jornalista na comunicação interna
em uma multinacional brasileira, e diz que
até pretende continuar na área, mas que
ninguém se engane: o jornalismo será ape-
nas uma ferramenta a mais para desenvol-
ver seus novos trabalhos no cinema.
pERFiL
UMA CÂMERA NA MÃo E...
UMA IdEIA NA CABEÇA,Nasce um cineasta em ponto de bala! O sonho de seguir carreira no cinema destaca os projetos e as dificuldades de um jornalista mineiro das veredas do grande sertão
fotos arquivo pessoal
4 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013
Rock
o ÚLTIMo dINoSSAURo
Em atividade desde os anos 60, black Sabbath,
uma das bandas mais emblemáticas do rock,
mostra que o grupo ainda continua no topo
raPhael GouVÊa e raquel Durães
2º período / 4º período
Formada em 1968, no Reino Unido, a
banda Black Sabbath, criticada e idola-
trada por muitos, carrega consigo traços
de mudanças na história do rock. Inicial-
mente, a banda tocava um som influen-
ciado pelo ritmo do blues e pelas músicas
de Jimi Hendrix, Cream e The Beatles.
Mais tarde, após a mudança de nome, de
Polka Tulk e Earth para o atual, o grupo
mudou o estilo musical radicalmente.
Com letras repletas de misticismo e com
um som mais pesado, que é justamente o
que o novo nome propõe, se tornou um
dos pioneiros do heavy metal.
Ao longo do percurso do grupo, mui-
tos críticos dizem que o Black Sabbath,
comparado às superbandas anteriores
da época, como Rolling Stones, Led
Zeppelin, Pink Floyd e Yes, que inaugu-
ram o rock progressivo em 68, não era
uma banda assim tão boa. Algumas das
antigas edições da revista Rolling Stone,
por exemplo, considerada uma das boas
referências em música e cinema, era
uma das que faziam críticas à banda.
Entretanto, se era tão criticada assim,
qual a razão de todo esse mistério e
lenda ao redor do Black Sabbath?
Pais Do heaVY Metal
Originalmente composta por Tony
Iommi na guitarra, Bill Ward na bateria,
Geezer Butler no baixo e John Michael
Osbourne no vocal (mais tarde conhecido
apenas como o famoso Ozzy Osbourne), o
grupo fazia parte da ascensão das bandas
inglesas de metal no início da década de
1970. Tendo como raízes o blues, o rock
clássico e o rock psicodélico, o heavy metal
se tornou símbolo de um som maciço,
solos de guitarra arrepiantes e baterias
frenéticas. As pioneiras desse estilo, como
foi o caso dos britânicos do Black Sabbath,
Deep Purple e Led Zeppelin, por exemplo,
atraíram milhões de camisas pretas.
“O Black Sabbath foi a primeira
grande banda de metal que surgiu; para
muitos, a fagulha do heavy metal foi acesa
com os Beatles, na música ‘Helter Skel-
ter’, do álbum ‘The Beatles’, mais conhe-
cido como Àlbum Branco, de 1968”,
afirma o crítico musical e repórter de cul-
tura do Correio Braziliense, Tomaz Alva-
renga. Algo interessante de se observar é
que Ozzy sempre foi um grande fã dos
Beatles. Antes deles, não havia banda que
reunia uma sonoridade tão pesada, aliada
a tons e letras sombrias. “Graças ao Sab-
bath, o metal cresceu, se desenvolveu e
procriou, se dividindo em diversos gêne-
ros como trash metal, white metal, power
metal, etc.”, completa o crítico.
MuDanÇa no roCK
O primeiro disco lançado pelo Black
Sabbath, no ano de 1970, que leva o nome
da banda, chegou à oitava posição nas para-
das britânicas. Entretanto, o grupo foi
bombardeado pela crítica. “As mídias e os
críticos, de uma maneira geral, são veícu-
los tendenciosos de informação. São, na
prática, formadores de opinião e apoiado-
res dos que estão em volta ou na ‘crista da
onda’ num dado momento”, afirma Jean
Ricardo de Oliveira, 35, músico e vocalista
da banda de rock Pedra Lascada.
Os ritmos e as letras que falavam de
paz, amor, sexo e drogas já estavam conso-
lidados como sendo bandeiras do rock n’
roll. O Black Sabbath surgiu com uma
nova concepção de rock, influenciando
várias bandas como Metallica, Megadeth,
até as mais atuais como System of a Down
e Limp Bizkit. Em tempos conturbados e
de guerras, o rock flertava com ideais de
paz e amor em vários ritmos. “O Black
Sabbath não foi a primeira banda a enxer-
gar essa situação e dirigir sua sonoridade
de encontro a esses problemas, mas, com
certeza, foi a mais notável”, acredita o
músico.
divulGaÇÃo
Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013 5
1970: Black Sabbath e Paranoid – O segundo, é um dos álbuns mais vendidos e dono
dos maiores sucessos como “Iron Man”, “War Pigs” e “Paranoid”. O primeiro traz
“N.I.B.” e a faixa título como destaque.
1971: Master of Reality – Deste álbum saíram clássicos como “Sweet Leaf”,
“Children of the Grave” e “Into The Void”.
1972: Black Sabbath, Vol. 4 – Uma mistura do hard rock com o progressivo.
1973: Sabbath Bloody Sabbath – Primeiro álbum a ser elogiado pela crítica da época,
sendo aclamado pela revista Rolling Stone americana como “um grande sucesso”.
1975: Sabotage – Mais um trabalho mesclado com o rock progressivo e até mesmo
sons gregorianos, mas, é claro, sem perder o som pesado da banda.
1976: Technical Ecstasy – Suas músicas abordam temas como tráfico de drogas e
prostituição, bem diferente das gravações anteriores do grupo.
1978: Never say Die! – Último álbum com o vocalista Ozzy Osbourne.
1980: Heaven and Hell – Primeiro a contar com o novo vocalista Ronnie James Dio.
1981: Mob Rules – Além de ser muito elogiado, o álbum marca a substituição do
baterista Bill Ward por Vinny Appice.
1983: Born Again – Felizmente, temos o retorno de Bill Ward e uma nova
troca de vocalista. Entra em cena Ian Gillan, ex-vocalista do Deep Purple.
1986: Seventh Star – Após algum tempo de inatividade da banda, “Seventh Star”
é lançado com mais uma mudança nos vocais: assume Gleen Hughes.
1987: The Eternal Idol – Hudhes abandona a banda por problemas com drogas e é
substituído pelo vocalista Ray Gillen junto a Tony Martin.
1989: Headless Cross – Considerado um dos melhores discos da época, este
foi o primeiro álbum com o baterista Cozy Powell e o segundo com Tony Martin.
1990: Tyr – Tony Martin, Cozy Powell e Tony Iommi continuam a todo vapor.
1992: Dehumanizer – Álbum que traz músicas como “Computer God”
e “Master of Insanity”, e o retorno do lendário Dio no vocal.
1994: Cross Purposes – Mais uma vez a troca de vocalistas.Tony
Martin retorna ao grupo. Álbum muito elogiado pelos fãs.
1995: Forbbiden – Este foi um dos trabalhos mais criticados pelos fãs e um dos
menos conhecidos do público em geral.
2013: 13 – Primeiro álbum com a formação original da banda, com exceção de Bill
Ward. O retorno de Ozzy ao Black Sabbath traz a tradição sombria do grupo.
Discografia – Time Line Black SabbathAlém dos 19 álbuns de estúdio, a banda ainda reúne cinco álbuns ao vivo, sete coletâneas, 39 singles e 11 álbuns de vídeo.
Segundo o crítico musical Tomaz
Alvarenga, alguns críticos não gostaram
da mudança da banda em meados dos
anos 1970 devido à troca de vocalistas.
“Acho injusta a cobrança, pois mesmo os
maiores nomes da música, como Paul
McCartney e Bob Dylan, também lança-
ram álbuns bastante contestados”, res-
salta o jornalista. “Acho que ocorre um
saudosismo exagerado, gente que espera
que a banda sempre faça o mesmo som,
soe da mesma forma. A resposta veio com
o mais recente álbum, que é ótimo”, diz.
O músico Jean também concorda e
defende a banda. “A grande maioria dos
críticos tem dificuldade em aceitar o
novo de bom grado”.
Tomaz Alvarenga analisa os demais
vocalistas que já passaram pelo Sabbath e
diz que cada um deixou sua marca. “O
Ozzy sempre foi um grande vocalista e sua
voz é uma marca do Black Sabbath. O
Ronnie Dio, quando entrou no lugar do
Ozzy, também deixou sua marca e a banda
variou um pouco o seu som, mas sem per-
der a admiração de boa parte do seu
público”. Entretanto, o crítico se preo-
cupa com a nova turnê. “Assisti alguns
vídeos da turnê atual e a forma que Ozzy
está cantando atualmente me preocupa.
Ele não parece estar muito bem. Tomara
que eu esteja enganado”, diz.
FansMoZiZ oZZY Brasil
Há 17 anos, um dos maiores fãs clu-
bes do Brasil vem reunindo seguidores do
Sabbath de vários países, que vão dos 13
aos 60 anos. O Fansmoziz Ozzy Brasil foi
criado em setembro de 1996 pelo empre-
sário Almir Figueiredo, 53, de São Paulo.
“O objetivo inicial era reunir o máximo de
fãs do Black Sabbath do Brasil, mas logo
começaram a aparecer pessoas de todos
os lugares”, conta. A partir disso, o site
recebeu apoio de várias mídias, que come-
çaram a divulgar o trabalho. “No dia 30 de
janeiro de 97, fui surpreendido ao receber
uma carta do Ozzy agradecendo por ter
criado o fã clube. Até hoje mantenho con-
tato com a equipe dele na Califórnia”,
revela Almir.
“Sou fã de rock há mais de 30 anos,
mas o que me levou à loucura foi um tal de
Black Sabbath. Pirei quando escutei
‘Paranoid’ e ‘War Pigs’. É impossível não
gostar do trabalho destes quatro monstros
do rock”, afirma Almir. “Ozzy canta com a
alma, além de ser muito carismático no
palco”. Sobre a mudança de vocalistas ao
longo dos anos, o fã não discute. “Amo o
trabalho do Dio, o cara tem uma voz incrí-
vel, e Gillan é divino. Mas o Sabbath só
está vivo por causa de Ozzy”, opina. “Para
mim, Ozzy só é Ozzy hoje por causa do
Black Sabbath e vice-versa: um sem o
outro não seria nada”.
Mal falados, mas adorados
6 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013
GEnTE
A GENTE NÃo QUER
SÓ CoMIdA...a gente quer comida, diversão e arte, mas na região noroeste fica difícil, pois quase não há investimentos e quem mais sofre com isso são os jovens
raYZa KaMKe e roDolPho ViCtor
4º período / 2º período
Entre as diversas regiões que compõem o município de
Belo Horizonte, a Noroeste, que engloba os bairros do Caiçara,
Pedro II, Aparecida, Adelaide, Ermelinda, Nova Esperança e
Santo André, entre outros, é a mais populosa e representa
11,2% dos jovens na faixa etária de 15 a 29 anos, entre os 632
mil que fazem parte da população da cidade, hoje de aproxi-
madamente 2.375.444 habitantes. Apesar da densidade
populacional, trata-se de uma região de grandes desigualda-
des, em que os jovens das comunidades carentes se veem
ainda mais prejudicados pelos poucos recursos que possuem
para se incluírem nas pequenas opções.
A região tem um número muito grande de escolas e um
parque (Parque do Caiçara), mas quase nada em função do
lazer e do esporte. Uma das poucas opções para os jovens
ainda é o Shopping Del Rey, onde nada é de graça. Na área
cultural, quase nenhum investimento. A região Noroeste é um
espelho do que, a exceção da região Centro Sul, acontece em
todas as demais. A psicóloga Sylvia Flores explica que o lazer
bem executado, planejado e saudável é imprescindível para o
equilíbrio emocional. De acordo com ela, se não houver
momentos de lazer ou prazer, o ser humano acaba entrando
em um processo de stress profundo, que pode gerar doenças
psicossomáticas, ou simplesmente psíquicas, como agressivi-
dade exagerada ou impulsividade. “É necessário ter prazer
para podermos ter um equilíbrio entre a vida cotidiana, do
trabalho, dos estudos, e um bem-estar psicológico”, afirma.
Já o sociólogo Carlos Magalhães comenta que, mais do
que uma forma de lazer, as atividades que envolvam arte e
cultura são itens indispensáveis para a construção da identi-
dade dos jovens, ainda mais em uma sociedade desigual,
injusta e preconceituosa. Carlos salienta que os jovens neces-
sitam de acessos mais fáceis a todos os tipos de expressão
cultural e artística, até mesmo para a criação de suas persona-
lidades. “O acesso a esses meios deveria ser facilitado de modo
que os jovens pobres pudessem encontrar seu lugar no mundo
de hoje, além das fronteiras simbólicas e materiais que estão
colocadas”, explica.
rafael martins
Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013 7Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013 7
ProPostas oFiCiais
BH foi a primeira cidade brasileira a
criar um Conselho Municipal da Juven-
tude. Decretado por lei em 1998 (lei
7551/98), determina a finalidade de estu-
dar, elaborar, discutir, aprovar e propor
políticas públicas que permitam e garan-
tam a integração e a participação do jovem
na sociedade. Já a Coordenadoria Munici-
pal da Juventude, por sua vez, visa promo-
ver a interlocução, o acompanhamento e
a proposição de ações e políticas voltadas
aos jovens. Após período de inatividade,
desde 2005, ambos voltaram a trabalhar
neste ano, edesenvolvem várias ações
específicas voltadas ao público jovem.
O gerente da Coordenadoria, Gelson
Antônio Leite, informou ao Lince as pro-
postas e projetos que a Prefeitura oferece
aos jovens da capital. Entre as novidades,
se destaca o “Centro de Referência da
Juventude”, um equipamento destinado
aos jovens, com inauguração prevista para
maio de 2014. O Centro, que pretende
atender de 500 a 800 jovens por dia, ainda
constrói a proposta de projetos, mas pro-
porcionará aos belo-horizontinos cursos
profissionalizantes e ofertas de emprego,
teatro de arena, estúdio de gravação musi-
cal, e até uma biblioteca digital e interativa.
Para as regiões carentes são idealiza-
dos os chamados “Fóruns Juvenis”, onde
serão escolhidos locais de maior vulnerabi-
lidade juvenil. A ação será realizada aos
sábados, e levará aos jovens carentes as
informações sobre o que a Prefeitura pro-
põe. Um novo projeto também será inaugu-
rado neste semestre, no Barreiro. O espaço
revitalizado e reformado da antiga FEBEM
se torna hoje o “Point Barreiro”, onde será
realizada a “Estação Juventude”, local de
atendimento e execução de oficinas, aten-
dimentos aos jovens, e cadastramento aos
programas da prefeitura. “Pretendemos
expandir o “Estação Juventude” para todas
as regionais”, completou Gelson.
GrÊMio Mineiro
O clube de futebol Grêmio Mineiro, no
Santo André, é presidido pelo ex-policial
civil Wallace Araújo, e o aposentado Renato
de Almeida. O clube, fundando em 1947,
sobrevive graças ao esforço da comuni-
dade. Da doação de bolas e equipamentos a
uma máquina de lavar roupas e sofás para
a sede, todo o projeto é movido pelo empe-
nho dos presidentes e pela força da socie-
dade. Apenas para a manutenção de água e
luz é cobrada uma taxa de R$ 60/hora para
o aluguel do campo da agremiação.
Entre as atividades realizadas pelo
clube, a escolinha de futebol é a principal,
mas Wallace destaca que, na maioria das
vezes, falta interesse das crianças. Reeleito
para a presidência, desde 2010, ele e o
amigo Renato afirmam que, muitas vezes,
fazem papel de assistente social para os
jovens mais agressivos ou necessitados. O
motivo principal da escolinha é controlar os
problemas que atingem os jovens da comu-
nidade — a violência e o envolvimento com
drogas.“O problema de falta de lazer é rela-
tivo, falta interesse”, afirma Wallace.
O presidente, às vezes, abre mão do
aluguel da quadra, promove lanches
comunitários e, ainda assim, não atrai a
atenção dos jovens do bairro. Em relação
aos pais, Wallace observa que é pouco o
estímulo vindo deles, já que em reuniões
propostas pelos presidentes, apenas
alguns se apresentam e têm consciência
da vida ativa de seus filhos. “É preocu-
pante, mas fazemos tudo o que podemos
fazer”, lamenta.
atleta CiDaDão
O projeto renomeado “Atleta Cidadão”
funciona desde 2005 e é administrado por
José Santana, diretor de esportes e forma-
ção de atletas do clube Vila Nova, e atende
jovens entre 11 e 16 anos. Os treinos são de
segunda a quinta (terça e quinta para os
mais novos e segunda e quarta para os
maiores). Mesmo sendo novo, o clube já
participou de torneios como a “Taça BH” e
a “Copa Criança Esperança”.
Os treinos, realizados em um campo
colado ao Cemitério da Paz, são ainda
esperança aos jovens que o frequentam, já
que levaram Rafael Vítor, de 20 anos, para
a base do Atlético-MG — hoje, ele é um
dos destaques do Tupi-MG. Para partici-
par, basta contribuir com R$ 10 para a
compra de bolas e redes. É imprescindível
que o jovem seja frequente e tenha bom
aproveitamento escolar. Os dados são pas-
sados diretamente das escolas ao treina-
dor Santana — “a melhor herança para
uma criança é a educação”, emociona-se.
o ConsuMo e o laZer
As alternativas no Shopping Del Rey
giram em torno de R$ 79 a R$ 90. Para os
carentes, as opções, às vezes, são quase ina-
cessíveis. Felipe dos Santos Fernandes, 18,
estudante e morador do Caiçara, admite
que a melhor escolha é a quadra de futebol,
na Praça da Rosinha, na rua Rosinha
Sigaud. Felipe, que vai diariamente jogar
bola com os amigos, diz que é grande o movi-
mento de jovens, principalmente à noite.
Lanchar com a turma na praça de alimenta-
ção do Del Rey também é uma opção — mas
os lanches podem variar de R$ 15 a R$ 25!
Fernando Medeiros, psicólogo, con-
firma a falta de opções de lazer para o filho
de 12 anos. Por isso, a opção é sair da rotina.
“Levo meu filho e os amigos na Serra do
Cipó, para andar de bicicleta e também jogar
bola na pracinha”. Já para os menores João
André Alves Santos, Gabriel Rabelo Couto e
Emerson Lima, do 5º ano da escola Dimen-
são, é unanime a escolha pelas reuniões em
casa dos amigos, onde costumam estudar,
jogar futebol ou vídeo game.
Joseanne Santos e Priscila Gonçalves,
ambas com 16, moradoras do Santo André,
optam por um cinema, ou até mesmo se
reunir com amigos. Para elas, as garotas da
região sofrem mais que os meninos. “São
poucas as opções; às vezes, decidimos ir a
um shopping diferente, mas o Del Rey cos-
tuma ser o de maior frequência”, diz Jose-
anne, que costuma fazer um “cinema em
casa” quando está sem dinheiro. O preço do
cinema nessa região varia de R$ 9 a R$ 24,
dependendo dos dias, horários, e salas 3D.
Marcos Vinicius Silva, 13, e Cleber
Eduardo Meirelles, 14, moram no Nova
Esperança e fazem do futebol seu passa-
tempo principal. Além do esporte, costu-
mam ir algumas vezes ao inevitável Del Rey
quando o parque de diversões Play City
passa uma temporada por lá. Outra opção é
o Boliche. Mas, aí, só quando recebem
mesada dos pais. O Boliche se diferencia
pelos dias da semana e horário, mas fica em
torno de R$ 48,60 a R$79,20/hora. O bom é
que dá pra fazer uma vaquinha: a pista pode
ser dividida em até seis jogadores.
8 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013
raFael Martins
4 período
Ponto de encontro. Reunião de cidadãos. Um lugar
público, cercado de edifícios; conjunto das instituições
comerciais e financeiras de uma cidade. Na verdade, seu
coração. Pode-se definir também como espaço urbano
livre de edificações, que proporciona convivência ou
recreação aos cidadãos. Em Belo Horizonte, só uma
praça reúne todas as características acima e ainda adi-
ciona outras. Claro, estamos falando da Praça Sete,
onde, torto, maltratado, mas, mais vivo do que nunca,
palpita o coração da capital mineira.
Ponto de interseção de duas grandes avenidas da
cidade — Amazonas e Afonso Pena —, com o nome
original de Praça 14 de outubro (data referente a uma
comissão que fazia estudos para instalação da nova
capital), só em 1922, teve seu nome alterado para
Praça Sete de Setembro, nas comemorações do cente-
nário da Independência do Brasil. Um dos seus símbo-
los é o “Pirulito”, presente dos moradores da cidade
vizinha Betim, em torno do qual gira outra face impor-
tante: a diversidade. Marco zero para encontros de
manifestações políticas e comemorações de títulos
dos clubes da cidade, a praça é de todo mundo e não é
de ninguém. Ou, como já dizia um antigo compositor
baiano, é do povo, como o céu é do avião.
A VIdA PINTA o SETE
coração de belo Horizonte, praça mais famosa da capital, palco onde a vida é sempre mais ativa que a morte
NESSA PRAÇA
CaFÉ CoM PolítiCaem 1963, a praça foi desfigurada, com a retirada do tradicio-nal pirulito, que ficou até 1980 na savassi. hoje, no entorno dele, há importantes imóveis que contam a história de Belo horizonte — o Cine teatro Brasil, o antigo edifício do BeMGe (hoje, posto de serviço integrado urbano - psiu) e até o famoso Café nice, um dos redutos da praça, parada obrigatória de políticos em tempos de eleição. o café recebeu visitantes famosos, dos ex--presidentes Juscelino Kubitscheck, tancredo neves e itamar franco à cantora emilinha Borba, estrela maior da rádio nacional, que lá passaram para tomar o famoso cafezinho e fazer média com o povo. até uma de suas garçonetes, ana pas-choal, se elegeu vereadora da capital mineira, em 1964. José Murta, aposentado com seus 87 anos bem vividos, frequenta o local há mais de três décadas.— o lugar é ótimo, o estabelecimento mudou pra melhor e o
café continua gostoso.o curioso é que muitos aposentados se reúnem na porta do
Café nice para conversar e comercializar objetos pessoais e engraxar os sapatos. aliás, os engraxates são outra presença marcante na praça, junto com os idosos, que, em um de seus quarteirões fechados, se reúnem para jogar damas. no meio da correria do centro, alguns ainda encontram paciência para jogar e, às vezes, nem percebem que o Café nice agora fecha mais cedo, por causa da violência.
em 1963, a praça foi desfigurada, com a retirada do tradicio-
CaFÉ CoM PolítiCaem 1963, a praça foi desfigurada, com a retirada do tradicio-
em 1963, a praça foi desfigurada, com a retirada do tradicio-
fotos rafael martins
rafael martinsrafael martins
triBos e CoMÉriCoO comércio na região é variado. Há uma diversidade enorme, que vai
de lojas de calçados a pastelarias, restaurantes, fast food, farmácias,
sebos, livrarias, passando por ambulantes que se misturam aos hippies e,
mais recentemente, aos índios que hoje tomaram conta da praça para
vender seu artesanato. O índio Taruãde, 23, da tribo Pataxó, saiu de Porto
Seguro (Bahia) para vender as especialidades de sua terra aos mineiros e
conseguir a fonte de renda para a aldeia Coroa Vermelha, onde vive.
— Na baixa temporada de Porto Seguro, nós viajamos para outras cidades e
os mineiros compram nossas pulseiras, farinheiras, colares.
Vários estabelecimentos bancários funcionam no entorno da praça,
onde fica também uma das galerias mais antigas e movimentadas da
cidade, a Galeria Praça Sete, reduto das lojas que vendem discos e aces-
sórios de rock e recebe grande afluência de jovens. Complementando a
confusão, lojas de produtos evangélicos, motéis, o famoso Fórmula 1,
loterias, estátuas vivas, bancas de revista, skatistas e desempregados se
encarregam de botar mais lenha na fogueira, ou seja, de incrementar o
movimento.
hiPPie sÓ no noMeA agitação da principal praça mineira
só parece não incomodar os hippies e seus
fregueses que param para comprar colares e
trançar os cabelos. Quem olha de fora pode
até achar estranho, sem valor, mas para o
hippie e artesão Edson Freitas Assis, eles
estão “no ápice da transição do artesanato
em Belo Horizonte”.
— Não estamos conseguindo expor
nossas artes, já que não podemos expor na
Feira Hippie, que de hippie só tem o nome...
Outro que parece não se incomodar
com a agitação é o professor de matemática
Willian Barbosa, que montou um quadro e
ensina cálculos para quem tiver tempo de
parar e aprender — é tudo de graça! Nem
aos domingos, quando há calmaria no
trânsito de pessoas e carros, por ser um dia
mais tranquilo, a praça fica parada. O movi-
mento Black Soul se reúne para dançar e
mostrar seus passos, sua música e sua
moda, cheia de cores e de vida.
No meio de tanta coisa boa, há pessoas
que tentam desmoralizar a aparentemente
caótica harmonia da praça. Há vendedores
e consumidores de drogas, outros que ven-
dem armas e, por ser um local de muita
movimentação, há furtos. A segurança é
feita por vários militares e guardas munici-
pais, mas nem as câmeras conseguem inibir
a criminalidade. E assim segue batendo o
coração da cidade. Se as câmeras não ini-
bem o crime, também não inibem a vida.
Mais teimoso do que nunca, o coração da
cidade não tem tempo de temer a morte.
o sol e a soMBraQue atire a primeira pedra o belo-horizontino que nunca ouviu os gritos de “Foto
na hora, foto”; “Compro e vendo ouro e prata”; “Dentista!”; “Celular, compro, troco,
acessórios” ao passar pelo quarteirão fechado das ruas Espírito Santo, Rio de Janeiro
e Carijós. Margarete Aparecida, 50, trabalha no local há dois anos, desde que o marido
a abandonou. Forçada a buscar emprego, mas com dificuldades, devido à idade, arru-
mou o de “ambulante”. Sua função é conseguir vendedores e compradores de ouro.
Segundo ela, se ficar o dia inteiro na praça, dá pra tirar uma boa renda.
— O salário é fixo e não por comissão ao levar fregueses.
Margarete vai logo avisando que não fica o dia todo gritando. Primeiro, por não
aguentar; e também “para não avacalhar uma loja de calçados da vizinhança”. E diz
que nem o sol forte a incomoda.
— Eu adoro sol: mas, se uma hora o sol incomodar, vou pra onde tem sombra —
conclui bem humorada.
10 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013
MiGRAÇÕES
é andar por esse país...MINhA VIdA
Mas, nem sempre, o
cartão postal que espera
os migrantes
tem os braços
abertos na vida real: é
mais comum ter a cara e os punhos
cerrados
raFael Martins
4º período
“Se dizem que é impossível,
eu digo: é necessário! Se dizem
que estou louco, fazendo tudo
ao contrário, eu digo que é pre-
ciso, eu preciso, é necessário
seguir viagem, tirar os pés da
terra firme”. Como diria a can-
ção “Seguir Viagem”, da banda
Engenheiros do Hawaii, é pre-
ciso seguir viagem, conhecer
novos ares, mas será que isso se
aplica à saga dos migrantes?
Desde o início dos tempos, essa
atividade, movida por objetivos
distintos — econômicos, religio-
sos ou até mesmo por amor — a
vontade de mudar leva multi-
dões a viajar, sem, muitas vezes,
saber aonde chegar.
No Brasil, as primeiras migra-
ções datam do início da República.
Com o fim do Ciclo da Cana de
Açúcar, no nordeste, levas nume-
rosas desceram em busca de pro-
messas de uma vida melhor no
Sudeste e no Sul do país, regiões
que se industrializaram primeiro.
Com as indústrias, veio também a
expectativa dos novos empregos,
de uma vida melhor, sem o fan-
tasma da seca, que sempre afligiu
os estados nordestinos. São Paulo
sempre foi visto como o Eldorado
dos migrantes, mas Minas Gerais,
assim que começou também a se
industrializar, passou a fazer parte
da rota das grandes migrações.
Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013 11
No Terminal Rodoviário, tristes e
famintos, com vontade de ir embora, preci-
sando ir ao banheiro, se encontravam dois
jovens, Jean Carlos Cândido, 22, e Rafael
Pereira Cândido, 21. Os irmãos saíram de
Varginha, no sul de Minas, à procura de
emprego na capital. Vieram com a cara e a
coragem, sem conhecer ninguém. O caso
deles é apenas mais um de muitos que
deram errado.
Sem sucesso, dinheiro, hospedagem
(pernoitaram em uma pensão com ajuda de
um desconhecido), foram obrigados a voltar
e pedir socorro para regressar à terra natal.
No abrigo da prefeitura, outros dois
migrantes esperavam para entrar e pernoi-
tar. Um deles, vindo de Virgem da Lapa, no
distante Vale do Jequitinhonha. Lucyon
Eduardo, 21, veio em busca de emprego, de
carona em um caminhão que transportava
frutas para a CEASA. Assim que chegou a
Belo Horizonte, ficou sabendo de um ser-
viço em uma serralheria e já conseguiu se
empregar. Deu sorte! Lucyon tem muitas
expectativas nessa nova fase de sua vida.
— Tenho o objetivo de constituir famí-
lia, mandar o dinheiro lá pro interior, con-
quistar minha casa...
Por sair de Virgem da Lapa, sem gran-
des expectativas, ele já se sente feliz por ter
sido bem recebido em Belo Horizonte.
Juliarlei Aparecido, 24, natural de Pom-
péu, interior de Minas, é experiente como
migrante. Já esteve em Belo Horizonte por
um ano e dois meses, voltou para casa e
depois foi para São Paulo. Na primeira pas-
sagem por BH, conseguiu emprego e casa,
mas segundo ele, um “desacerto” o forçou a
retornar ao lugar de onde veio.
— Em São Paulo, não tive sorte. Rouba-
ram meus documentos e não consegui
emprego; fui forçado a voltar para BH. Além
de emprego, procurei também ajuda para
tirar novos documentos.
Ambos têm pouca escolaridade, não
têm conhecidos em Belo Horizonte e, além
disso, suas malas quase vazias — com algu-
mas roupas. Mesmo assim, não pensam em
voltar para o interior. Ingenuamente, salien-
tam que chegar a um lugar diferente é sem-
pre complicado. “Poucos ajudam; as portas
estão, na maioria das vezes, fechadas”.
O sonho não acabouPorta de entrada
Novo perfil
A falta de empregos na zona rural
provocou o fenômeno do êxodo rural, a
migração em massa do campo para a
cidade. Ao chegar a Belo Horizonte, no
entanto, o panorama que se descortina é
outro: entre saudades de casa, a procura
por um novo mundo mostra um caminho
de sofrimento, da perda da identidade
cultural, quando a grande cidade mostra
para os que chegam sua face mais cruel.
Uma situação que pode ser conferida dia-
riamente na principal porta de entrada da
capital, o Terminal Rodoviário.
O Plantão Social de Atendimento ao
Migrante foi implantado em 2003 (inicial-
mente feito pelo Estado, mas, a partir de
2008, a Prefeitura assumiu a administra-
ção do Terminal Rodoviário). Seu objetivo
é atender o indivíduo residente há menos
de dois meses em Belo Horizonte e garan-
tir que ele usufrua de benefícios que, em
tese, são garantidos por lei. O serviço fun-
ciona de segunda a sexta-feira, das 8h às
18h, na área de embarque do terminal,
mas se alguém por ventura chegar depois
do horário de fechamento, os seguranças
da rodoviária estão orientados a pedir aos
migrantes para pernoitar em algum lugar
e retornar na manhã seguinte ao atendi-
mento. O problema é que nem sempre há
lugar para o pernoite.
PassaGens e aBriGo
É oferecido auxilio aos migrantes em
situação de vulnerabilidade social ou
àqueles que precisam de orientações
quando desembarcam na capi ta l .
Segundo a assistente social Desirê Mou-
rão, que coordena o plantão, a procura
maior é por passagens e abrigo. De janeiro
a agosto deste ano, o serviço prestou 4167
atendimentos, uma média de 650 por dia.
Neste mesmo período, 936 pessoas
aproveitaram a concessão de passagens e
voltaram pra casa ou migraram para outra
região. Outros aproveitaram os serviços de
encaminhamento para abrigos da cidade,
kits de fotografia, kits de lanches para via-
gem, isenções das taxas de banhos/sanitá-
rios no terminal, auxílios para retirar a
segunda via de documentos, além de outros
serviços de políticas sociais da Prefeitura.
Desirê conta que o interior de
Minas lidera o ranking na procura por
socorro no terminal.
— O interior é o primeiro lugar. Em
segundo estão outros estados do Sudeste e
depois o Nordeste.
“Houve uma mudança no perfil dos
atendidos e estamos priozirando o atendi-
mento aos dependentes químicos”, afima.
— Mas, ainda assim, continuamos a
trabalhar com pessoas vindas de regiões
com pouca oferta de emprego; a maioria
volta para o lugar de onde veio
Diante de uma equipe de seis assis-
tentes sociais e um estagiário, os viajantes
passam por um atendimento bem deta-
lhado e, após o raio-X , se traça um perfil
para definir o que deve ser feito. Alguns
critérios são usados para tal definição.
Entre eles, a concessão de passagens que
só é feita caso a pessoa prove ter algum
parente que o acolha na cidade de destino
(o que não ocorre em cidades do interior).
Para ter sucesso nas informações, há uma
ligação com secretarias de segurança,
saúde e assistência social de cada cidade.
Não há uma orientação nacional vol-
tada para o migrante. Em Belo Horizonte,
uma consultoria foi contratada para fazer
o diagnóstico do atendimento prestado no
terminal rodoviário. Desirê fez um estudo
que comprova a falta de uma orientação
padrão: cada estado age de uma maneira.
— No Nordeste, cada capital trabalha
de uma forma. Poucas têm o serviço; em
Goiânia e Salvador, por exemplo, não tem.
Uma casa para homens
Diego Frederico, assistente social do abrigo Acolhimento Institucional para população de rua e migrantes,
explica como funciona a casa.
— Depois de passar pela triagem da rodoviária, as pessoas com o perfil de acolhimento (em busca de serviço
e documentos) chegam ao albergue, onde é feito um novo cadastro. Dentro do albergue, têm o direito a alimenta-
ção — café, almoço, janta — e guarda-volumes. O prazo máximo de habitação é de dois meses e o migrante tem
que passar o dia todo fora à procura de emprego. São 80 vagas destinadas. Todas destinadas somente aos homens.
12 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013
Depoimento
fotos arquivo pessoal
Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013 13
Yohannã Ioshua tem 22 anos e cursa publicidade na
Newton. Apaixonado por culturas e viagens, chegou a um
dos países mais miseráveis da África, a Guiné Bissau. Nesse
depoimento ao Lince, Yohannã conta como foi o trabalho
desenvolvido lá. Uma belíssima lição de vida, que ele justi-
fica com desconcertante simplicidade:
oS NÚMERoS FALAM PoR SI(NÃo PoR GUINÉ BISSAU)
Em um mundo que quase só acena para os jovens com a máxima de que consumir é que é viver, ações como voluntariado mostram uma outra face da juventude
Fui porque acredito que fazer bem ao próximo é uma atitude primordial pra quem sonha com um mundo melhor.
“ “
Yohannã ioshua
Quando fui participar de um trabalho
voluntário em Guiné Bissau, África, passei as
30 horas de viagem tentando dimensionar o
tamanho da pobreza que estava por vir. Ao
chegar, vi que nenhum número ou dado era
suficiente para isso. Saber que a economia do
país regride 1,5% ao ano passou a não signifi-
car nada. Saber que de cada mil nascidos,
quase cem morrem, também se tornou inútil.
As pesquisas sobre a expectativa de vida, que
não passa dos 50, e a média de escolaridade de
2,3 anos viraram meras estatísticas.
Em apenas 30 horas, regredi décadas no
tempo. Sim, foi espantoso ver o que é Guiné
Bissau. Ruas de terra, casas de palha, açou-
gues a céu aberto, um trânsito maluco. Pra se
ter uma ideia da realidade, caso alguém roube
algo seu, você faz a denúncia e tem que pagar o
táxi para o policial ir atrás do meliante.
Vi mulheres que suam de sol a sol,
enquanto os maridos estão se divertindo deita-
dos tomando warga, um chá regional. Vi
homens de mãos dadas com outros homens,
sem nem imaginar que isso seria motivo de
preconceito a quilômetros dali.
Aos poucos fui sentindo a necessidade do
povo. E são muitas. Ou melhor, todas. O país
não tem luz, água, fonte de renda. Não tem
esperanças. Um dia, conversando com um
médico, o único obstetra local, ele disse que o
problema de Guiné Bissau é a pequena parte
rica. Na maioria dos casos, os que têm dinheiro
“conseguem” subsídios federais para seus
filhos nascerem em Portugal. E esse din heiro
sai do 1% que é investido em saúde.
Se confrontar com tantos desafios só
aumentava o desejo de querer fazer mais.
Antes da viagem, eu e minha namorada
conseguimos várias bolas e bonecas pra doar.
No entanto, quanto mais íamos dando os
brinquedos, mais impotentes nos sentíamos
em meio a tanta necessidade.
Mesmo sendo inofensivo contra a pobreza,
era gratificante sair das tabancas, como são
chamados os vilarejos, e ver dezenas de crianças
felizes, com sorriso de orelha a orelha, correndo
atrás do caminhão. Aos poucos, os gritos de
“branco, branco!” da meninada iam ficando
pra traz, e a vontade de voltar e tentar fazer até
o impossível era cada vez mais latente. Mas
isso não se contabiliza nas estatísticas.
A FORÇA DO AMOR AO PRÓXIMO
“Receber um sorriso de uma criança ou
idoso, um abraço carinhoso não tem preço”.
É assim que Adriana Machado define o pra-
zer de ser voluntário. Ela que é professora e
participa do grupo “Um toque de alegria”,
diz ainda que nem sempre pode definir com
palavras o que é ser voluntário.
— Isso é um dom para poucas pes-
soas, já nasce dentro de nós.
O grupo “Um toque de alegria” teve
seu inicio em 2004, com Rogério Pereira
Rodrigues, que atua em hospitais, cre-
ches, asilos vestindo a fantasia de palhaço.
Sempre tentando levar alegria para as
pessoas, e com o passar do tempo
ganhando novos voluntários.
“Nós temos o costume de reclamar da
nossa vida por qualquer coisa. Sendo que
há pessoas com todos os motivos do
mundo para reclamar. Mas nos recebem
com sorrisos, e, isso, sim, é que é uma
lição de vida”, revela Adriana, afirmando
qual é a maior experiência que teve como
voluntária.
Apesar de todas as dificuldades que o
grupo enfrenta (sendo uma delas as doa-
ções que nem sempre representam aquilo
que buscam), eles continuam sonhando.
salVanDo ViDas
Atendimentos médicos de emergên-
cia, resgates e primeiros socorros são
alguns dos serviços que o grupo “Anjos do
asfalto” presta de forma voluntária. Eles
trabalham em parceria com Polícia Rodovi-
ária Federal, Corpo de Bombeiros, SAMU e
Batalhão de Operações Aéreas. O grupo foi
criado em 2004, inicialmente tendo a par-
ticipação de um pequeno grupo de pessoas
que se desdobrou com muita determina-
ção a socorrer vitimas de acidentes na
rodovia, BR-381, saída para Vitória.
“Levar alívio em um momento tão difí-
cil”, Marcus Campollina, 49, um dos lideres
da equipe, falando sobre a maior motivação
do grupo. Apesar de terem o apoio dos órgãos
citados, e também de um deputado e da
Revista Entre Vias, algumas despesas são
bancadas por eles. “Combustível, materiais
de consumos... Tudo isso acaba saindo do
bolso da gente”, revela Marcus.
O trabalho geralmente ocorre aos fins
de semana e feriados. Isso porque são nessas
datas, que há mais movimento na rodovia.
São os dias no qual as pessoas saem para
viajar. Ao ser questionado sobre qual é a pior
situação que esse trabalho apresenta, Mar-
cus não hesita em responder que o trabalho
em si não é fácil de ser desenvolvido, “mas,
quando envolve crianças, é muito mais difí-
cil”. Por conviverem com a morte no dia a
dia, ele revela o momento mais marcante,
que eles viveram.
— Chegar ao local do acidente, e
deparar com cinco vitimas fatais. É sem-
pre muito difícil.
Levando alegria
FeliPe Freitas
(4° período)
Voluntário é a pessoa que realiza deter-
minada ação de livre e espontânea vontade;
faz seu serviço sem ganhar nada. Trabalhos
são feitos individualmente, por ONGs ou
por pessoas que se reúnem e levam de graça
atendimentos médicos, ajuda psicológica,
cestas básicas, entre outros. Eventos como a
Copa das Confederações e a JMJ (Jornada
Mundial da Juventude) contavam com
voluntários que auxiliaram aqueles que
aproveitavam o encontro do futebol mun-
dial e a dos fieis da igreja.
“Ser voluntária é amar ao meu pró-
ximo. É fazer o mínimo pelo outro. Agrade-
cer pelo dom da vida”. Assim definiu Renata
Kelen, fisioterapeuta, que trabalhou na JMJ
como voluntária. Ela completou dizendo
que foi voluntária, por ser católica, ser fre-
quentadora assídua da igreja e, também, por
fazer trabalhos sociais.
— O padre de minha paróquia teve de
assinar uma carta comprovando minha
participação efetiva na Igreja Católica.
Independente da religião, apoio outros
projetos sociais. Já participei de visitas,
festas infantis em abrigos e de grupos que
arrecadam roupas e entregam jantar aos
moradores de rua.
ConheCiMento e DiVersão
O voluntariado não é só fazer trabalhos
em eventos como a Copa e a JMJ. Mas sim
levar algo de útil a comunidade, como o que
acontece nas ONGs Valorizar e Instituto
Pedra Viva.
A ONG Valorizar foi criada por Luiz
Tibé, em 2007. A instituição oferece, aos
moradores do bairro da Concórdia, cursos
gratuitos nas áreas cultural, artística e pro-
fissional. Cursos de cabelereiro, depilação,
design gráfico, manicure e pedicure, entre
outros. Além disso, os alunos dos cursos
podem colocar em prática o aprendizado,
supervisionados pelo instrutor em ações
sociais da ONG. Essas ações geralmente
acontecem em asilos e creches. A organiza-
ção oferece ajuda jurídica para a população
mediante agendamento.
O Instituto Pedra Viva trabalha com
garotas carentes, de nove a dezenove anos,
moradoras da região noroeste de Belo Hori-
zonte. Bairros como a Pedreira Prado Lopes,
Lagoinha, Bonfim, Concórdia, dentre
outros, estão no raio de ação da ONG. A
Organização funciona de segunda a sexta,
disponibiliza um espaço de convívio saudá-
vel. São oferecidas oficinas de artesanato
semi profissionalizante, de música, de
dança, de esportes, além de aulas de inglês,
reforço escolar e ajuda psicológica.
Voluntários fazem a
diferença na vida
de muita gente,
seja levando
alimentos, roupas
ou apenas um
sorriso a uma
criançaa
rq
uiv
o p
ess
so
al
16 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013
Olhar jornalismo
TIARA
Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013
TRANSPARENTENunca imaginei ter um irmão. Já fiz
dezoito anos e apesar de meus pais
serem jovens, nunca me passou pela
cabeça ter outra pessoa morando em
nossa casa. Brinquedos espalhados no
chão, televisão ligada em desenhos ani-
mados, nada disso. Eis que escuto um
grito no banheiro, corro até lá e minha
mãe me mostra sem nem mesmo acredi-
tar, um exame de gravidez. E o resul-
tado: positivo.
Acompanhar a gestação foi a coisa
mais gostosa; comprar tudo o que via
pela frente, satisfazer todas as vontades
da minha mãe (a grávida em questão), e
lotar o médico de perguntas bobas foram
algumas delas. Como toda família acre-
dita no esotérico, fizemos o cálculo da
lua para descobrir o sexo do bebê, sendo
que o tal cálculo não dá errado com nin-
guém. Iríamos ter um menino em casa.
Tudo ficou azul; paredes, roupas, brin-
quedos, berço e até o nome já estava
definido: Rafael. Rafael ia ser cruzei-
rense, jogar videogame, assistir Ben 10 e
ter todos os carrinhos e bonecos da loja
(já tinha alguns inclusive). Chega o dia
do ultrassom, em que o resultado já era
mais do que uma certeza para todo
mundo, e o doutor nos manda a bomba:
— Parabéns, você vai ter uma menina.
Todo mundo ficou feliz por ser uma
menina , que , com cer teza , ser ia
mimada ao extremo. Centenas de rou-
pas foram às lojas para serem trocadas.
Começaram a chover sapatos femininos
de presente sendo que, uma semana
depois do resultado, duas gavetas já
estavam cheias de sapatos e um guarda-
-roupa cheinho de ves t idos . Não
escondo que fiquei um pouco decepcio-
nado. Como já havia traçado tantos pla-
nos, não gostei de ser contrariado —
acho que esse é o efeito de ser mimado
demais por dezoito anos consecutivos...
No dia 8 de agosto de 2013, às 21h33,
nasceu Isabella. Eu assisti o parto. Fui a
primeira pessoa a pegá-la no colo, colo-
quei uma tiara rosa na cabeça dela para
que ela não fosse trocada e por medo de
não reconhecê-la da próxima vez que
fosse vê-la. Nessa hora, pensei: “E se
fosse menino, como eu iria fazer para
marcá-lo? Não colocaria nele uma tiara
nem que fosse azul”. Só depois pude per-
ceber o quanto foi desnecessária aquela
atitude. Afinal, só depois de ver aquele
rostinho redondo e branquelo, foi que eu
percebi que, no meio de cem crianças, eu
reconheceria minha irmã de longe,
mesmo que a tiara fosse transparente.
Até porque, não se perde de vista tão
facilmente a coisa mais importante que
te aconteceu na vida.
roGer leon
(2º período)
fotos arquivo pessoal
Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013 17
Esporte
ATLETISMo: AS CAUSAS do INSUCESSoApós outro desempenho ruim em uma competição internacional, o Mundial de Atletismo, fica a pergunta: de quem é a culpa pelos fracassos recentes dos esportistas brasileiros?
fotos: arquivo pessoal/luís fernando de almeida paula
18 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013
Por João Vitor Cirilo e Caíque roCha
4º período / 2º período
O roteiro é sempre o mesmo. Nos
últimos anos, brasileiros que chegam a
competições esportivas internacionais
não conseguem grandes resultados vis-
tos em tempos passados. No último mês,
no Mundial de Atletismo em Moscou, o
Brasil não voltou com uma medalha
sequer. Quando as coisas pareciam dar
certo, no fechamento do torneio, até o
bastão no revezamento 4x100 metros
feminino caiu, jogando fora a única
chance de medalha restante para o Bra-
sil. Mas essa queda é apenas reflexo de
uma questão muito maior.
Qual seria o principal causador dos
fracassos recentes no esporte brasileiro?
O Estado não investe onde deveria? Falta
amor aos atletas, que pegam o dinheiro e
vão somente “a passeio”? Governo, confe-
derações e competidores apresentam, na
maioria das vezes, posições divergentes
sobre as causas do fraco desempenho.
De queM É a CulPa?
A questão acima gera divergências.
Após a última edição dos Jogos Olímpicos
e também neste Mundial de Atletismo,
muitos competidores culparam confede-
rações e o governo pelo fraco desempe-
nho. Daniel Ottoni, repórter do jornal “O
Tempo”, de Belo Horizonte, tem a mesma
visão. “Os atletas não possuem a melhor
estrutura para trabalhar. O esporte não é
valorizado como deveria e os resultados
no Mundial são uma consequência de
todo um descaso para com o esporte, que
vem de anos”, opina. “Atletas e treinadores
lutam muito todos os dias contra condi-
ções péssimas de treinamento. O governo
brasileiro é o maior culpado pela falta de
investimento”, completa Daniel.
Entretanto, para o maratonista Luís
Fernando de Almeida Paula, irmão de
Paulo Roberto de Almeida Paula, sétimo
colocado na maratona do Mundial, essa
postura crítica é errada. “Esse desempe-
nho ruim não é culpa nem do governo
nem da confederação. Em minha opi-
nião, é culpa do profissional, do atleta,
que tem que visar aquilo que ele quer”,
argumenta. “Falo para o meu irmão:
‘Paulo Roberto, você vai ficar em função
deste treino’. Brasileiro compete todo
fim de semana e quer chegar a uma
competição internacional achando que
vai ganhar ou subir no pódio. Não vai! É
outra pegada”, declara Luís Fernando,
de 34 anos, há 20 como corredor.
Para Solonei Silva, sexto colocado (o
melhor brasileiro) na maratona do Mun-
dial, não existe culpado. “A vida do atleta
não é fácil. Não se pode avaliar o desem-
penho do atleta em uma simples ou com-
plicada competição. Teria que acompa-
nhar o dia a dia durante o ciclo inteiro”.
Solonei também criticou a postura da
imprensa. “Eu nunca fiquei sabendo de
nenhuma mídia ou jornalista que fez isso
(acompanhar os treinos diariamente)”.
Dinheiro teM
Luís Fernando ressaltou que, nos últi-
mos tempos, nunca se teve tanto investi-
mento do Estado no esporte como agora.
“Muitos ficam com desculpa, falando bes-
teira na mídia. Nós podemos falar tudo, mas
o governo está investindo muito dinheiro
em cima do esporte. Tem dinheiro
sobrando. Você pede uma coisa, e o
governo banca. E por que o atleta chega
na hora e não dá resultado?”, questiona.
Solonei está de acordo. “Os clubes,
federações e confederação nunca tiveram
tanto apoio do governo e da iniciativa pri-
vada como estão tendo agora, como o
Bolsa Atleta, Bolsa Pódio, entre outros”.
Porém, para ele, estamos no caminho
correto. “Cabe aos atletas fazer o melhor
possível e isso está acontecendo”.
Luís Fernando criticou a postura de
alguns competidores, que, segundo ele, “só
pegam o dinheiro e colocam no bolso”. “E aí
você pensa: como esse atleta não conseguiu
um treinamento internacional? Porque ele
tem medo de mexer no bolso dele, não quer
investir, e aí fica difícil mostrar resultado.
Todo o dinheiro que entra para o meu irmão,
da Bolsa Atleta, da Confederação Brasileira
de Atletismo, é investido na carreira dele. A
diferença é essa”, conclui o maratonista.
renoVaÇão
Daniel Ottoni diverge da opinião de
Luís. “Atualmente eles (o governo)
investem pouco; antes, não investiam
nada. O governo não abre os olhos para o
Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013 19
atletismo, a não ser quando campeona-
tos importantes acontecem. Em cima da
hora, o resultado não vem. É preciso ter
investimento na base, pensar no futuro,
acreditar no esporte e demonstrar isso
por meio de ações. Não adianta investir
faltando dois ou três anos para Mundiais
e Olimpíadas”, observa Daniel Ottoni.
Falando sobre renovação, Luís Fer-
nando tem a mesma visão. “Em 2016,
chance real mesmo só na maratona, porque
vai correr no calor e pode ter chance de
pódio. Nas outras, só por Deus, porque não
há jovens. No feminino, faz dez anos que são
as mesmas meninas que ganham no Brasil.
Não se vê uma renovação. O trabalho pra
2016 deveria ter começado há uma década.
Agora, fica difícil”, avalia Luís Fernando.
D a n i e l O t t o n i re f o r ç a q u e a
mudança só poderá acontecer se for
feito um trabalho em longo prazo. “A
partir do momento em que investimen-
tos que mereçam elogios apareçam, os
resultados aparecerão em cinco ou sete
anos. O processo é lento”.
VaMos Às esColas
Com um território muito extenso e
grande população, é evidente que o Bra-
sil tem escondido por aí um grande
potencial. Pensemos nas inúmeras
escolas públicas. Alguém já parou para
refletir sobre o número de crianças e
jovens que poderiam se transformar em
atletas de ponta? Porém, na atual men-
talidade educacional no Brasil, esse
ainda não é o papel das escolas.
A reportagem do Jornal Lince procurou
a Secretaria Estadual de Educação de
Minas Gerais para ter um posicionamento
sobre o tema, e foi atendida por Celina Gon-
tijo, analista de educação em Educação
Física, e interlocutora dos Jogos Escolares
de Minas Gerais (JEMG). “Não podemos
ensinar o atletismo como competição den-
tro das escolas, e sim como esporte. Através
do JEMG é que descobrimos talentos em
jovens atletas. A formação deles é feita nos
clubes”, disse Celina. Segundo ela, o motivo
deve-se ao fato de que nem todos os alunos
têm vocação para determinado esporte.
“As categorias de base do atletismo no
Brasil são excelentes. Vários jovens atle-
tas, inclusive de Minas Gerais, venceram
campeonatos mundiais. Estamos sempre
organizando competições”, completa
Celina Gontijo, ao lembrar que o MEC
criou o projeto “Atleta na Escola”, que tem
como intuito estimular a prática do atle-
tismo e promover competições envol-
vendo escolas de todo o país.
Falta ValoriZaÇão
Elbert Fagundes é professor de Edu-
cação Física em uma escola estadual
localizada na capital mineira. Segundo
ele, um dos problemas encontrados nos
colégios é o total descaso e desvalorização
do profissional. “Encontramos dificul-
dade de transmitir conteúdos aos alunos
devido à falta de material, uma realidade
constante, péssimas condições de traba-
lho e alunos completamente desinteres-
sados com novos projetos e aulas”, afirma.
Para o professor, a falta de motiva-
ção para o trabalho nas escolas mineiras
se deve a um “governo que é punitivo,
desinteressado e que não pensa em edu-
cação”. Elbert criticou a postura do
governador de Minas Gerais, Antônio
Anastasia, que retirou todos os profissio-
nais de Educação Física das escolas
públicas de anos iniciais. “Crianças que
antes deveriam aprender o básico sobre
coordenação, equilíbrio e força, agora
são obrigadas a ficar dentro de sala de
aula, sem um professor especialista para
ensiná-las tais competências”.
“O Brasil poderia explorar muito mais
seu potencial. Imagine quanto atletas estão
perdidos por aí e que poderiam ser desco-
bertos se projetos e peneiras acontecessem
com mais frequência, se parcerias aconte-
cessem com escolas, se o investimento que
eles falam que existe acontecesse de ver-
dade. Teríamos vários atletas, por ano, com
condições de medalhas, e não um ou outro
que chegam apenas para participar e tentar
surpreender”, opina Daniel Ottoni.
“Estudos recentes mostram o cres-
cimento exagerado de doenças associa-
das ao excesso de peso e, com certeza, a
Educação Física escolar pode ajudar
nesse combate, estimulando o jovem a
ser ativo desde a sua infância para que
na vida adulta ele consiga definir aquilo
que mais gosta e desenvolver melhor tal
habilidade”, defende Elbert Fagundes.
20 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Setembro de 2013
MAdE IN MINASTALENTO
João Paulo Freitas
4º período
Lince - Conte-nos um pouco sobre sua
trajetória no jornalismo.
Barreto - Meu primeiro emprego foi na
assessoria de imprensa da Prefeitura Muni-
cipal de João Monlevade, logo depois que
completei os créditos no curso de comuni-
cação da PUC-Minas, no início de 1990.
Pouco depois, tive minha primeira experi-
ência em jornal, na sucursal do Hoje em Dia
em Governador Valadares. No ano seguinte,
fiz prova de estágio para O Globo e me mudei
de vez para o Rio. Trabalhei por sete anos na
editoria de esportes do jornal, pela qual
cobri dois Mundiais de Basquete e as Olim-
píadas de Atlanta em 96. Em 98, participei
da equipe que fundou o LANCE!. Trabalhei
no jornal, no site LANCENET!, coman-
dando a transformação em portal e a incor-
poração da Agência Sportpress, e coordenei
o lançamento da revista LANCE!A+.
Durante esse período, fiz um fellowship de
jornalismo na Universidade de Michigan e
na volta cursei o MBA Executivo do
Coppead-RJ. Depois, minha carreira trans-
correu dentro das Organizações Globo. Fui
editor-chefe do Portal do Esporte, trabalhei
na editoria de esportes da TV Globo como
produtor e repórter e, em 2003, fui para o
SporTV. Aqui, implantei o Núcleo de Produ-
ção (do qual fui chefe) e fui apresentador e
comentarista de vários programas: Redação
SporTV, Tá na Área, Troca de Passes,
SporTV Repórter, Arena Olímpica,
Momento Olímpico. Nos últimos dois anos,
fui correspondente do canal em Londres.
Voltei ao Brasil no meio deste ano e hoje
apresento o SporTV News, jornal do qual fui
editor-chefe antes dessa experiência no
exterior. Pelo SporTV, cobri duas Copas do
Mundo, duas Olimpíadas, uma Paralimpí-
ada e três Copas das Confederações, entre
outras competições internacionais.
lince - atualmente, quais as maiores
dificuldades que os jovens jornalistas
irão enfrentar para ingressar na área de
comunicador esportivo?
Barreto - Pelo que ouço quando con-
verso com estudantes de comunicação, um
dos principais problemas será a concorrên-
cia. Estou impressionado com o número de
jovens que ingressam nas faculdades de
comunicação pensando especificamente
em trabalhar com o jornalismo esportivo. E
não tenho certeza se nosso mercado conti-
nuará em crescimento nos próximos anos.
Existe todo um movimento de mudança de
hábitos de consumo que tem afetado áreas
importantes do mercado, principalmente
os jornais. É claro que eventos ao vivo
ainda têm um valor diferente, o que
pode preservar TVs e rádios enquanto
não tiverem de disputar os direitos com
a internet. É possível que os jovens que
hoje estudam para serem jornalistas
esportivos cheguem ao mercado num
momento de grande mudança. Mas eles
são também, como consumidores de
mídia, agentes dessa mudança, e têm
tudo para se adaptar rapidamente.
Lince - Como foi sua experiência como
correspondente internacional Sportv, em Lon-
dres, e quais os pontos positivos que trouxe
para a comunicação no Brasil?
Barreto - Para mim, foram dois anos
inesquecíveis, de grande crescimento pro-
fissional e pessoal. Mudar de país é uma
decisão bastante complicada, que mexe
com a logística de toda a família. Tenho dois
filhos, que tiveram de se adaptar a um
ambiente educacional totalmente dife-
rente, e minha mulher, que também é jorna-
lista, precisou adaptar sua carreira à nova
EnTREViSTA
Nascido na pequena cidade de Bicas, interior de Minas Gerais, Marcelo Guilhermino Barreto, 45 anos — mais conhecido
como Marcelo Barreto —, conheceu uma de suas maiores paixões, o jornalismo. Com uma vasta experiência e um currículo
invejável, Barreto figura entre os maiores jornalistas esportivos do país. Passou os dois últimos anos como correspondente
internacional em Londres, pelo canal por assinatura SPORTV. Atualmente ocupa a bancada do programa Sportv News, no
qual foi editor chefe. Confira abaixo o bate papo que tivemos com esse grande profissional da comunicação.
fotos sportv.Globo.Com
Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Setembro de 2013 21
realidade. Voltamos todos felizes e com
grandes experiências na bagagem — e agora
estamos passando pelo processo de readap-
tação. No meu caso, foi uma importante
reciclagem profissional. Saí do estúdio e
voltei para a rua. Cobri competições impor-
tantes, entrevistei grandes atletas, viajei por
toda a Europa e tive de me virar em outros
idiomas. Observei muita coisa na forma de
se cobrir esporte lá fora e acho que trouxe
alguns bons exemplos para usar no Brasil.
Lince - Como você avalia o futuro do fute-
bol brasileiro, tendo em vista o crescimento
econômico das equipes e, também, os eventos
internacionais prestes a serem realizados em
nosso país, em termos de visibilidade?
Barreto - Tenho dúvidas sobre quanto
tempo vai durar o crescimento econômico
das equipes. O que aconteceu nos últimos
anos foi um reflexo do crescimento da eco-
nomia brasileira como um todo, e esse
processo já está sofrendo uma desacelera-
ção. Os grandes times do futebol europeu
não foram tão abalados pela crise econô-
mica no continente — que também já
começa a mudar de curso — e voltaram a
fazer grandes contratações. Basta ver o
desastre que foi para o futebol brasileiro a
última janela de transferências. O uso das
arenas da Copa pelos clubes pode ter um
impacto positivo na arrecadação, mas é
preciso muito mais para competir com o
dinheiro que vem de fora. Alguns avanços
estão sendo feitos na administração de
dívidas, mas ainda é preciso melhorar o
calendário, resolver o problema das divi-
sões de base, investir em estrutura.
Lince - Durante os protestos feitos no
Brasil, você ainda residia na capital inglesa.
Como os europeus reagiram a todos esses
acontecimentos? Você acha que isso afetará na
vinda de turistas estrangeiros, principal-
mente para a Copa do Mundo 2014?
Barreto - Na época dos protestos, eu
morava em Londres, mas estava em Madri
cobrindo a Copa das Confederações. A rea-
ção aos protestos, lá, foi de perplexidade. Os
espanhóis, que vivem num país em crise,
com mais de um quarto da população sem
emprego formal, viam no Brasil um país em
crescimento econômico, e não imaginavam
que os brasileiros tinham motivos para
reclamar. Mas como os próprios espanhóis
se acostumaram a ver os protestos na Plaza
del Sol, em Madri, a repetição das imagens
acabou gerando uma simpatia, uma sensa-
ção de identificação. A imprensa esportiva
espanhola, que errou a mão em alguns
comentários sobre a Copa das Confedera-
ções, foi bastante equilibrada quando tratou
da questão dos protestos.
Lince - O futebol sempre foi o carro chefe
dos esportes no Brasil. O que você acredita que
deve ser feito para que modalidades como
vôlei, basquete, entre outros especializados,
atinjam um nível de excelência tão forte
quanto o dos gramados?
Barreto - Não vejo chances de isso
acontecer num futuro próximo, nem acho
que deva ser esse o foco de outros espor-
tes. O futebol é dominante em muitos
países do mundo, não apenas no Brasil.
Exerce esse domínio há muitos anos e
deve mantê-lo por muitos outros. O que os
demais esportes precisam fazer é encon-
trar seu espaço. Construir uma base sólida
de torcedores, investir no desenvolvi-
mento de talentos, manter-se competitivo
em nível internacional. Foi a receita que o
vôlei aprendeu há algum tempo, e que o
basquete parece ter esquecido.
Lince - Quem foi seu maior mestre na área
profissional, e quais as lições mais valiosas
que ele te deixou?
Barreto - Seria injusto escolher um
entre os muitos jornalistas que me inspira-
ram e me ajudaram ao longo da minha
carreira. Mas ainda pior seria fazer uma
lista e deixar alguém importante de fora.
Então, para não deixar a pergunta sem
resposta, cito aqui a maravilhosa convivên-
cia que tive com Armando Nogueira no
Redação SporTV. Ele já não era mais um
alto executivo da TV Globo, estava che-
gando aos 80 anos exercendo sua maior
paixão, falar de futebol. Mas trazia com ele,
claro, a experiência de quem tinha come-
çado a cobrir Copas do Mundo em 1954.
Era uma figura muito doce, um homem
muito inteligente, um jornalista brilhante.
Faz muita falta a todos nós que convivemos
com ele naquela época.
Lince - Avalie e faça um comparativo entre
a imprensa europeia e a brasileira.
Barreto - É muito difícil falar em
imprensa europeia. A inglesa é muito dife-
rente da francesa, da italiana, da espa-
nhola. Para ficar apenas no jornalismo
esportivo, os ingleses gostam mais de texto,
nos jornais, e de debates, nos programas de
TV. Os franceses dão menos espaço ao fute-
bol, dividem mais a atenção com outros
esportes. Espanhóis e italianos têm um
jeitão mais parecido com o brasileiro, mais
apaixonado. Os jornais espanhóis se porta-
ram mal durante a Copa das Confedera-
ções, fazendo comentários tendenciosos
para defender sua seleção de acusações de
mau comportamento fora de campo. No
geral, o que dá para dizer é que em termos
de qualidade, de tecnologia, a imprensa
brasileira não deixa muito a dever a essas
que citei. São características diferentes,
mas estamos num nível semelhante.
Lince - Para finalizar, deixe um recado
para os estudantes de comunicação do Centro
Universitário Newton (Belo Horizonte), que
pretendem seguir seus passos na carreira.
Barreto - O que gosto de dizer a
quem escolhe o jornalismo esportivo é
que nossa área não está isolada do resto
do mundo. Para falar de esporte, acaba-
mos falando também de economia, de
saúde, de direito, de política. Enfim, ser
uma Wikipédia ambulante sobre esporte
pode ajudar, mas com cultura geral se
vai muito mais longe. Boa sorte a todos,
nos encontramos nas coberturas!
Barreto esperando ansiosamente o início
das olimpíadas em londres
22 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 201322 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva -
Feminismo
Antes dominado pelos homens, ringues, tatames e octógonos abrem cada vez mais espaço para o sexo feminino
Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013
MULhER MACho, SIM SENhoR!
CaMila ChaGas e PÂMela Matos
4º período
se você acha que lugar de mulher é
na cozinha, é porque ainda não viu o
desempenho delas no tatame ou no octó-
gono. o lugar onde a testosterona predo-
minava agora pode ser preenchido por
uma explosão de ovários. para as meni-
nas que cresceram admirando a coragem
de Maggie fitzgerald (protagonista do
filme “Menina de ouro”), em sua busca
pelo seu lugar ao sol no mundo da luta,
chegar em 2013 e participar da principal
organização de MMa do mundo, o ulti-
mate fighting Championship (ufC),
pode ser considerado dever cumprido.
no segundo evento com luta femi-
nina, realizado em agosto, em las Vegas,
o combate de mulheres, entre ronda
rousey e Miesha tate, foi considerado o
melhor da noite pelo público e pela crítica.
a transmissão gerou us$ 18 milhões só
com a venda de pacotes “pay-per-view”.
infelizmente, por enquanto, o ufC con-
tará apenas com uma categoria, a de
galos (até 61kg), o que dificulta a entrada
de mais lutadoras na competição. Mas,
para quem há pouco tempo não imagi-
nava tops e calções cor de rosas relacio-
nados a socos e cinturões, já é um grande
começo.
GranDe
VitÓria
o i n t e -
r e s s e d a s
m u l h e r e s
pelas lutas
v e m c r e s -
c e n d o a o
l o n g o d o s
anos, e mais
ainda o desejo
d e t o r n a r o
esporte uma pro-
fissão. Mas só em
março deste ano
elas puderam ter a
esperança de “bater”
de igual aos colegas de
p r o f i s s ã o , q u a n d o
dana White, presi-
dente do ufC, decidiu
ceder e aceitar o universo
feminino nos octógonos. depois de
acompanhar uma luta feminina entre
rousey e tate, ele se impressionou com
a força, e beleza, delas. “aquela foi uma
luta como se fosse entre homens; duas
mulheres inacreditavelmente talento-
sas que estão muito bem cercadas, e
não faz mal a ninguém quando elas são
bonitas também”, disse White em vídeo
gravado pela “showtime”, rede de
canais de tV por assinatura.
e, claro, o Brasil tem uma represen-
tante. Jéssica ‘Bate-estaca’ andrade foi a
primeira mulher a representar o país no
octógono. a paranaense encarou liz Car-
mouche na primeira luta do card princi-
pal do evento. infelizmente, para nós, a
americana levou a melhor com um
nocaute técnico no segundo round do
ufC on fox, em seattle (eua), mas a
inserção de brasileiras na competição já
pode ser considerada uma grande vitória.
não ProFissional
Mas o sucesso das lutas entre as
mulheres não é todo voltado ao esporte
profissional. Muitas desenvolveram o
interesse pelas lutas como uma forma de
aliviar a tensão e o estresse do cotidiano,
melhorar o condicionamento físico e até
como um exercício para perder calorias
(variam de 800 até 1.200 por hora no
MMa). “fora que aprender uns golpes e
técnicas de defesa pessoal nunca fez
mal a ninguém”, afirma a estudante ana
souza, que aos 21 anos pratica o MMa
amador há alguns meses e garante que
sua saúde física e psicológica só lucrou
com os exercícios.
Mas não é só o MMa que conquista o
público feminino. Jiu jitsu, taekwondo e
muay thai também são bem populares
entre as mulheres. a recepcionista thais
Vieira pratica jiu jitsu há sete anos e
afirma que o esporte trouxe muitas
melhorias para sua vida. “eu luto desde
criança, e acho que é um esporte que me
motiva e me completa. Quero continuar
praticando para o meu bem-estar”, conta
a jovem, que apesar do treinamento
intenso – três vezes na semana por uma
hora mais ou menos –, não vê o esporte
como uma profissão e nunca se interes-
sou em participar de competições.
Já namucheta ricardo pratica o
taekwondo há oito anos e participa de
competições há quase cinco. Mas
enfrenta um problema muito comum à
maioria das esportistas: patrocínio, ou
melhor, a falta dele. “Competir, para mim,
é algo extremamente gratificante. um
sonho é poder viver apenas para treinar e
competir, porém, a falta de patrocínio não
permite. por muitas vezes já pensei em
desistir das competições, pois não é fácil
viajar por Minas Gerais e pelo Brasil sem
patrocinadores, o que acaba sendo um
motivo de desistência para muitos”,
reclama namucheta, que também não
acredita que a questão do sexo influencie
essa falta de investimento. “não vejo o
fato de ser mulher como um agravante na
questão dos patrocínios, infelizmente
esta é uma realidade que ambos os sexos
compartilham”. porém, essa realidade
existe! o patrocínio para mulheres é
muito mais difícil e, quando conseguem,
são bem abaixo do que é dado para os
homens.
Mais tÉCniCas
o que mais diferencia as lutas mas-
culinas às femininas é que a das mulhe-
res é caracterizada pelo domínio da téc-
nica. Já os homens usam e abusam da
força quando estão de frente aos seus
oponentes. “os homens veem a luta
como uma forma de demonstrar sua
masculinidade, seu poder como o lado
forte e protetor da equação. as mulheres
são mais perfeccionistas e calculam
seus movimentos, a partir de técnicas e
critérios que elas desenvolvem nos trei-
nos”, acrescenta o personal sandro
Moreira. “até porque socos e rostos san-
grando ainda assustam um pouco as
mulheres”, diverte-se.
segundo sandro, qualquer mulher
pode começar a praticar luta, mas o trei-
namento inicial requer alguns cuidados
específicos. “É recomendado fazer mus-
culação, junto com a prática da luta para
evitar lesões graves e melhorar no condi-
cionamento físico”, orienta sandro. e
conclui que o que atrai as mulheres é
manter a academia cheirosa, limpa e
organizada. “além de tratá-las igual os
homens. isso é primordial”, enfatiza.