is fair to blame fair value accounting-cópia
DESCRIPTION
Artigo FinanceiroTRANSCRIPT
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Novembro 2009 | Harvard Business Review 73
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John
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Qual foi a principal causa da ltima crise financeira? Hipotecas de altssimo risco, swaps de crdito ou endividamento excessivo? Nenhuma das alternativas, diz Steve Forbes, pre-sidente da Forbes Media e, no passa-do, candidato Casa Branca. A seu ver, a marcao a mercado foi a principal razo para o colapso do sistema finan-ceiro americano em 2008.
Uma norma contbil teria mesmo tamanho poder? Para o leitor que no domina o jargo financeiro, marcar a mercado ajustar, todo trimestre, o va-lor de um ativo pelo preo que alcana-ria se vendido naquele momento, inde-pendentemente do montante por ele pago. Por abolir o uso de valores ultra-passados ou desmedidamente otimis-tas, a prtica uma pea fundamental
no mtodo conhecido por contabilida-de pelo valor justo, ou fair value. E est no centro do debate contbil mais aca-lorado das ltimas dcadas.
O valor justo foi atacado sem pieda-de pelos bancos quando o sbito con-gelamento dos mercados de crdito na reta final de 2008 derrubou o preo de liquidao de ativos importantes em seu balano a nveis jamais vistos. Um economista, Brian Wesbury, sintetizou a opinio dessa ala ao declarar que as normas contbeis de marcao a mer-cado transformaram um grande pro-blema num [problema] imenso. O de-sempenho da vasta maioria das hipote-cas, dos ttulos de dvida de empresas e de instrumentos de dvida estruturada segue positivo. Mas, como o mercado parou, esses ativos esto cotados a um
justo culpar o
valor justo pela crise financeira?
Investidores e dirigentes empresariais no chegam a um acordo sobre como avaliar ativos problemticos. Talvez nem precisem. | Robert C. Pozen
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justo culpar o valor justo pela crise financeira?
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preo inferior a seu real valor. Wesbury e Forbes acham que a marcao a mercado empurrou mui-tos bancos para a insolvncia e obrigou essas insti-tuies a se desfazer de ativos por valores irrisrios, o que derrubou ainda mais a cotao. Convencidas por esses argumentos, certas autoridades nos EUA e na Europa defenderam o abandono do valor jus-to pelo mtodo do custo histrico, no qual o ativo , em geral, contabilizado pelo custo original ou preo de compra (veja os quadros A discusso no Iasb e
Europa reescreve a histria para detalhes de brigas importantes sendo travadas em outras partes).
Mas o registro contbil pelo valor de mercado se-gue tendo defensores igualmente ferrenhos. Em artigo na revista americana Texas, Lisa Koonce, pro-fessora de contabilidade na University of Texas, es-
creveu: , simplesmente, um ca-so em que se culpa o mensageiro. A contabilidade pelo valor justo no provocou a atual crise. O que fez foi expor o efeito de decises equivocadas como conceder em-prstimos no mercado subprime e emitir swaps de crdito (...) A al-ternativa, manter esses emprsti-mos no balano pelo valor origi-nal, o mesmo que ignorar a reali-dade. Grupos de acionistas foram alm, declarando que a marcao a mercado ainda mais necess-ria na atual conjuntura. O grupo consultivo de investimentos do rgo americano Financial Ac-counting Standards Board (Fasb) declarou ser crucial disponibili-zar informaes relativas ao valor justo a fontes de capital e outros usurios de demonstraes finan-ceiras em perodos de reviravolta no mercado seguidos de apertos de liquidez. Sob essa tese, se os bancos no contabilizarem seus ttulos pelo valor de mercado, a grande incerteza em relao ao valor de ativos faria o pblico in-vestidor hesitar em recapitalizar instituies em apuros.
Que ala est com a razo? Tal-vez nenhuma. No queremos que bancos se tornem insolventes de-vido queda momentnea na co-tao de papis ligados a hipo-tecas. Tampouco queremos que
essas instituies ocultem perdas do investidor e re-tardem a eliminao de ativos txicos como ocor-reu no Japo na dcada de 1990. Para contemplar as legtimas necessidades de bancos e investidores, au-toridades reguladoras devem adotar abordagens no-vas, multidimensionais, contabilizao de ativos financeiros.
Antes de implementar reformas pertinentes, no entanto, preciso primeiro desfazer uma srie de equvocos sobre mtodos de contabilizao. Volta e meia criticada a exigncia de reduo ao valor justo de ativos que perderam substncia econmica, mas na verdade esse impairment um conceito mais im-portante para o mtodo do custo histrico do que pa-ra o do valor justo. Muitos jornalistas incorretamente supem que a maioria dos ativos de um banco de-clarada pelo valor de mercado, no pelo custo hist-rico. Na mesma veia, muita gente no poder pblico imagina que a maioria dos ativos de baixa liquidez deve ser registrada pela cotao de mercado, apesar de vrias normas do Fasb ditando o contrrio. Cada mito desses pede um exame mais detido.
Mtodo do custo histrico no tem relao alguma com valor presente de mercado Defensores do valor justo sustentam que o custo histrico de ativos no balano da empresa em geral possui pouca relao com seu valor presente. luz de normas de contabilizao pelo custo histrico, a maioria dos ativos registrada pelo preo de compra ou valor original, com pequenos ajustes para a depre-ciao ao longo do tempo (no caso de edifcios, diga-mos) ou apreciao at a maturidade (como no caso de ttulos comprados com desgio). Um prdio com-prado pela empresa dcadas antes, portanto, prova-velmente figurar no balano por um valor muito menor do que obteria presentemente no mercado.
Mesmo no mtodo do custo histrico, contudo, o valor presente de mercado computado em de-monstrativos financeiros. Nos EUA, as normas exi-gem que toda empresa de capital aberto examine de-tidamente os ativos a cada trimestre para determinar se houve perda permanente do valor recupervel ou seja, se o valor de mercado tende a permanecer substancialmente abaixo do custo histrico por um longo perodo. Se o impairment no for apenas mo-mentneo, preciso reduzir o ativo ao valor de mer-cado atual no balano patrimonial e registrar a perda resultante na demonstrao de resultados.
Na contabilizao pelo custo histrico, fre-quente o impairment permanente de ativos. S em 2008, segundo a Sandler ONeill & Partners, bancos
Pega fogo a discusso sobre a melhor maneira de registrar ativos em balanos trimestrais pelo valor justo ou pelo custo histri-co? Certos executivos culpam a marcao a mercado, em geral de-fendida por investidores, pelo co-lapso no setor financeiro nos EUA e em grande parte do mundo.
A fabricao de mitos corre solta nos dois lados. mentira, contudo, que a contabilidade pelo valor his-trico ignore mutaes permanen-tes no valor de mercado presen-te ou que a maioria dos ativos de bancos seja marcada a mercado.
possvel encontrar solues que satisfaam todos. Se exign-cias de capital mnimo fossem desvinculadas da contabilizao de resultados, a marcao a mer-cado nem sempre teria um impac-to negativo no capital regulamen-tar do banco. Daria para entender melhor a volatilidade dos resulta-dos se os bancos soltassem dois lucros por ao: um com ativos re-gistrados pelo valor justo e outro pelo clculo normal. Alm disso, o uso de modelos para calcular o va-lor justo de ativos ganharia certa credibilidade perante investidores se as premissas que sustentam es-ses modelos fossem divulgadas.
EM RESUMO
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americanos deram baixa em mais de US$ 25 bilhes em ativos intangveis como valor da marca de empre-sas adquiridas (goodwill) que j no valiam o preo pa-go na compra. Num exemplo de outro setor que no o bancrio, a Cimarex Energy declarou um prejuzo no primeiro trimestre de 2009 apesar de ter registrado lucro operacional devido baixa por impairment no monetrio de mais de US$ 500 milhes (desconta-dos impostos) ligado a ativos de petrleo e gs.
O que queremos dizer que, mesmo sob o mtodo do custo histrico, instituies financeiras so, em l-tima instncia, obrigadas a declarar qualquer reduo permanente no valor de mercado de seus emprstimos e valores mobilirios, embora em ritmo mais reduzido e em boladas maiores do que no mtodo do valor jus-to. A maioria dos executivos de bancos resiste a esse tipo de baixa, sob a tese de que o impairment de um certo emprstimo ou ttulo lastreado em hipoteca temporrio. Mas, com a crise financeira se arrastando e nveis de inadimplncia no crdito imobilirio cada vez maiores em certos pases, auditores externos faro presso crescente para que os bancos reconheam per-das em ativos financeiros como permanentes.
Maioria dos ativos de instituies financeiras marcada a mercado
Quem joga a culpa no mtodo do valor justo costuma sugerir que a maioria dos ativos de ins-tituies financeiras foi corrigida luz de um mercado em deteriorao. O fato que, segundo estudo da SEC (a comis-so de valores mobilirios americana) no final de 2008, somente 31% dos ati-vos de bancos receberam tal tratamento. O restante foi contabilizado pelo custo histrico.
Por qu? Na contabilidade pelo valor justo, emprstimos e valores mobilirios da empresa podem ser distribudos, no mximo, por trs categorias de ativos: mantidos at o vencimento, destinados a negociao e disponveis para venda (veja o quadro Que ativos de bancos so marcados a mercado nos EUA?). Se a empresa tem a inteno e a capacidade de manter emprstimos ou ttulos at a maturidade, seu valor reconhecido no balano pelo custo histrico. A maioria dos emprstimos e muitos ttulos so mantidos at o vencimento e s sero corrigidos se houver reduo permanen-te no valor recupervel.
Em comparao, todo ativo destinado a negociao tem seu valor corrigido trimestralmente. Qualquer queda no valor justo de mercado de ativos do banco destinados a negociao reduz o patrimnio lquido no balano e vai parar no demonstrativo de resultados co-mo perda. A ttulo de ilustrao, suponhamos que um banco compre um bnus por US$ 1 milho e o preo de mercado do bnus caia para US$ 900 mil ao final do trimestre seguinte. Embora o banco no venda o bnus, a coluna esquerda do balan-o vai mostrar um decrsci-mo de US$ 100 mil no ativo, enquanto a do lado direito mostrar um acrscimo cor-respondente de US$ 100 mil no patrimnio lquido (an-tes de qualquer efeito tribu-trio). Essa reduo tambm repercutir no demonstrati-vo de resultados do banco e ser registrada como perda de US$ 100 mil no trimestre, antes de impostos.
O tratamento contbil da terceira classe de ativos ativos disponveis para ven-da mais complexo. Em-bora ttulos de dvida nesta
Que ativosde bancosso marcadosa mercadonos EUA?Pelas normas contbeis americanas
(U.S. GAAP), a maioria dos ttulos cai
na categoria mantido at vencimento.
, portanto, registrada pelo custo
histrico. Somente se houver perda
permanente do valor recupervel a mu-
tao vai afetar o resultado do banco e
o capital mnimo exigido da instituio.
TTULOS PARA
NEGOCIAO
TTULOS MANTIDOS
AT VENCIMENTO
TTULOS DISPONVEIS
PARA VENDA
Bal
ano
p
atri
mo
nia
l
Registrados pelo valor justo.
Mutaes no valor afetam patrimnio lquido.
Registrados pelo custo histrico.
Mutaes no valor s afetam patrimnio lquido em caso de im-pairment permanente.
Registrados pelo valor justo.
Mutaes no valor so registradas em conta especial, outros resultados abrangentes acumulados.
Dem
on
stra
tivo
d
e re
sult
ado
s Ganhos e perdas no realizados afetam resultado.
Perdas no realizadas s afetam resultado em caso de impairment permanente.
Ganhos e perdas no realizados so registra-dos em conta especial, outros resultados abrangentes, excluda de resultados.
Cap
ital
re
gu
lam
enta
r Ganhos e perdas no realizados afetam capital mnimo exigido.
Perdas no realizadas s afetam capital mnimo exigido em caso de impairment permanente.
Perdas no realizadas s afetam capital mnimo exigido em caso de im-pairment permanente.
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categoria tenham seu valor corrigido todo trimestre, qualquer ganho ou perda no realizados que por-ventura gerem refletido numa conta especial no demonstrativo de resultados do banco (na rubrica
outros resultados abrangentes) e agregado ao lon-go do tempo no balano patrimonial (na rubrica ou-tros resultados abrangentes acumulados). Devido a esse tratamento especial, perdas no realizadas por-ventura geradas no afetam o resultado lquido do banco ou seu capital regulamentar (emprstimos dis-ponveis para venda, por sua parte, devem ser conta-bilizados pelo menor custo ou valor de mercado e ter qualquer reduo declarada como perda na demons-trao de resultados; so, contudo, parcela muito pe-quena dessa categoria). Em seu estudo, a SEC desco-briu que quase um tero do total de 31% em ativos de bancos marcados a mercado eram ttulos de dvida disponveis para venda. A parcela de ativos cuja con-tabilizao a valor justo afetou o resultado ou o capi-tal mnimo exigido do banco tambm foi de apenas 22% em 2008 nem de longe a maior parte.
Ativos devem ser ajustados ao valor presente de mercado ainda que mercado seja ilquido
O registro contbil pelo valor justo seria simples se todo ativo financeiro fosse o que a Fasb classifica de Nvel 1: ativos de alta liquidez, fceis de precificar a valores diretos de mercado. J que nem todos tm a mesma caracterstica, no entanto, a Fasb criou uma norma, a FAS 157, que cria outros dois nveis (veja o quadro Qual a liquidez do ativo?).
Sempre que possvel, diz a norma, o ativo deve ser avaliado pela metodologia do Nvel 1: por pre-os de mercado observveis. A norma reconhece,
no entanto, que nem sempre h preos de mercado disponveis. Nesse caso, executivos da rea finan-ceira podem avaliar o ativo usando subsdios, ou in-formaes, de mercado observveis. o mtodo do Nvel 2. Nessa lista entrariam, por exemplo, preos de negociao e desgio para ttulos similares ou que tenham relao com o ativo sendo precificado. Quando nem essa informao h caso, digamos, do investimento num fundo de private equity , o ativo deve ser considerado como de Nvel 3.
Quando um ativo disponvel para negociao includo no Nvel 3, devido falta de liquidez no mercado ou a qualquer outro motivo, a empresa est autorizada a usar a marcao a modelo pa-ra avali-lo em vez da marcao a mercado. Ao usar um modelo para determinar o valor do ativo, o executivo pode usar suas prprias premissas para estimar o valor justo de mercado.
No segundo semestre de 2008, quando o merca-do de dvida congelou, o Fasb soltou um boletim esclarecendo a aplicao do valor justo a mercados ilquidos. A nota ressaltava a flexibilidade da norma 157 e alertava empresas para a possibilidade de re-classificao de ativos disponveis para negociao de Nvel 2 para Nvel 3 medida que o mercado fosse perdendo liquidez. O rgo deixou claro, ain-da, que nenhuma empresa teria de usar preos de vendas compulsrias ou em carter de urgncia pa-ra determinar o valor de ativos ilquidos.
Nada disso, no entanto, serviu de alvio para bancos que viam o valor de mercado de ativos t-xicos em seu balano despencar; executivos dessas instituies foram chiar no ouvido de parlamenta-res eleitos por seu voto que ameaaram legislar sobre normas contbeis se o Fasb no desonerasse
Qual a liquidez do ativo?Segundo a norma FAS 157, pelo mtodo
do valor justo nos EUA somente os ttulos
de maior liquidez devem ser contabiliza-
dos por valores diretos de mercado.
NVEL
1NVEL
2NVEL
3
Mt
od
o d
e av
alia
o
Liquidez mxima Liquidez moderada Liquidez mnima
Gra
u d
e
liq
uid
ez
Ativos avaliados por cotaes de mercado, com base na nego-ciao ativa de instrumentos idnticos
Ativos avaliados por meio de dados observveis de mercado
Ativos avaliados com modelo financeiro, como o do fluxo de caixa descontado
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ainda mais os bancos. Resultado? Em abril de 2009, o rgo rapidamente props e adotou uma nova nor-ma, que detalhou critrios para determinar quando um mercado ilquido o bastante para permitir a marcao a modelo. A norma foi concebida para permitir que mais ttulos fossem precificados por modelos empregados pelos bancos, e no por in-dicadores de mercado. Naquele mesmo dia, o Fasb soltou outra norma sobre a contabilizao de papis cujo impairment era permanente. O texto dizia que somente uma parcela a perda do crdito desse impairment afetaria o resultado do banco e seu ca-pital regulamentar; o resto (caso de perdas no rea-lizadas ligadas falta de liquidez) entraria na conta especial de outros resultados abrangentes.
Graas a essas duas normas retroativas, grandes bancos nos EUA conseguiram reduzir consideravel-mente o montante da baixa contbil de ativos no pri-meiro trimestre de 2009. Embora tenham melhorado a situao financeira dessas instituies a curto pra-zo, essas normas tambm permitiram que dirigentes desses bancos resistissem venda de ativos txicos a valores tidos como razoveis por investidores.
Trs recomendaes para declaraes realistasAssim que deixamos de lado a fabricao de mitos e a balbrdia, fica patente que o mtodo do custo his-trico e o do valor justo so muito mais prximos do que a maioria das pessoas imagina. Mas a diferena entre as duas formas de registro contbil pode ser considervel para um determinado banco numa da-ta especfica de declarao de dados. Por ocasio des-sa data, o natural desejo do banco de apresentar os ativos da instituio sob a melhor luz possvel prova-velmente estar em conflito com o legtimo interes-se de investidores em entender a potencial exposi-o do banco. Vejamos, ento, sadas para a institui-o elaborar relatrios financeiros que reconheam a complexa realidade de sua situao financeira.
Reforar a credibilidade da marcao a mo-delo. Diante dos dois ltimos pronunciamentos do Fasb sobre ativos de Nvel 3, no cabe dvida de que os bancos nos EUA cada vez mais usaro modelos para precificar ttulos de baixa liquidez. No primei-ro trimestre de 2009, o total de ativos de Nvel 3 nos 19 maiores bancos nos EUA cresceu 14,3% em relao ao trimestre anterior. J que os bancos tm liberdade para tecer premissas plausveis com ba-se em estimativas prprias do retorno de crditos subprime, de ttulos lastreados em hipotecas e de outros ativos problemticos ao longo de vrios anos, o valor calculado com o uso de modelos em geral
PArA simPlificAr a con tabilizao de instrumentos
financeiros, o International Ac-
counting Standards Board (Iasb)
sugeriu em julho de 2009 a eli-
minao de uma categoria de
ativos a de ativos disponveis
ou mantidos para venda para
que todos pudessem ser regis-
trados pelo valor justo ou pelo
custo histrico. Um instrumen-
to financeiro seria avaliado pelo
valor justo salvo se cumprisse
dois requisitos: ter apenas ca-
ractersticas bsicas de um em-
prstimo e ser administrado
com base na taxa contratual.
Pelo texto da proposta, ca-
ractersticas bsicas de um em-
prstimo significam fluxos de
caixa contratuais de principal e
juros. Um emprstimo pode ter
ajustes de juros predetermina-
dos para computar mudanas
no perfil de crdito do emissor.
A maioria dos derivativos finan-
ceiros no passaria nessa pri-
meira prova.
Administrar com base na ta-
xa contratual normalmente
significa manter um ativo finan-
ceiro at o vencimento contra-
tual. Segundo o Iasb, a operao
do modelo de negcios da em-
presa na prtica, e no a inten-
o da direo de negociar ou
manter o ativo at o vencimen-
to, determina se um instrumen-
to financeiro cumpre esse re-
quisito. Contudo, o Iasb deixou
claro que a venda ocasional de
instrumentos com caractersti-
cas bsicas de emprstimo no
obrigaria todo instrumento do
gnero a ser contabilizado pelo
valor justo desde que tal
venda fosse condizente com
um modelo de negcios geral
de originar e manter.
O fim da categoria de ativos
disponveis ou mantidos para
venda faz sentido do ponto de
vista da simplificao. difcil
saber que ativos pertencem a
essa categoria, e as regras res-
pectivas para o tratamento de
ttulos e emprstimos na ca-
tegoria so distintas. Contudo,
executivos da rea financeira
temem que certos ativos hoje
nessa categoria acabem paran-
do na categoria para negociao.
Se isso ocorrer, oscilaes tri-
mestrais no valor justo de mer-
cado desses ativos iriam, pela
primeira vez, afetar a demons-
trao de resultados trimestral
dos bancos.
O impacto da proposta do
Iasb no resultado trimestral vai
determinar se a Unio Europeia
adota ou no a norma. A dvida
se ativos financeiros hoje clas-
sificados como disponveis para
venda iro parar na categoria de
ativos para negociao ou na de
ativos mantidos at vencimento.
A proposta enfrentar resistn-
cia se a mudana no valor justo
de ativos tiver maior impacto
sobre os resultados de bancos
do que sob as normas atuais.
A discusso no iasb
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ser maior do que o fundado na negociao recente de ativos similares. A marcao a modelo permite ao banco pintar um retrato relativamente otimista de sua situao financeira.
Isso com certeza far o investidor de carne e osso duvidar da exatido do valor atribudo por bancos a ativos problemticos. Como disse Warren Buffett, a marcao a modelo pode descambar para uma
marcao a mito.Como derrubar o ceticismo e garantir que esses
valores sejam defensveis? Para ajudar o investidor a entender como a instituio chegou a um certo valor a partir de modelos, o banco deve declarar, em anexo, quais so os ativos de Nvel 3 e resumir suas principais caractersticas. E mais: deve fornecer detalhes suficientes sobre as premissas usadas em seus modelos para que o investidor entenda como chegou a tal ou qual valor.
Desvincular exigncias de registro contbil e de capital mnimo. A crtica mais fundamental ao valor justo que o mtodo deixa o banco beira da insolvncia ao corroer sua base de capital. Na opinio de muitos dirigentes de bancos, o valor jus-to promoveu uma reduo artificial no valor de ativos ativos que devem se recuperar quando a crise passar. J para o investidor, no h nada mais artificial do que proclamar que um ativo vale algo que ningum na realidade se dispe a pagar. O in-vestidor tpico, alm do mais, no acredita muito que a queda no valor de mercado de muitos ativos de bancos seja o efeito passageiro da falta de liqui-dez nos mercados, e no resultado permanente da maior inadimplncia.
Talvez no seja preciso conciliar essas opinies divergentes. Ambas poderiam conviver em paz se os bancos tivessem de revelar plenamente seus re-sultados pelo valor justo sem reduzir o capital mnimo exigido na proporo das cifras declaradas. Como explicado l atrs, se um banco possui ttu-los na categoria disponvel para venda, o valor dos papis deve ser corrigido trimestralmente mas ganhos ou perdas gerados por esses ttulos apenas no papel no afetam o capital regulamentar do banco. Exigncias contbeis e de capital podem ser desvinculadas tambm em outras reas, desde que a instituio deixe totalmente claro que usou meto-dologias distintas. Ganhos e perdas trimestrais no realizados na categoria de ativos para negociao, por exemplo, poderiam ser refletidos com exatido no balano patrimonial e no demonstrativo de re-sultados do banco. J para fins regulamentares, o capital poderia ser calculado com base no valor m-dio de mercado desses ttulos nos dois trimestres
Assim como os ldErEs do Congresso americano, autori-
dades da Unio Europeia fizeram
forte presso para que o registro
contbil pelo valor justo fosse sus-
penso durante a crise. Na Frana,
o presidente Nicolas Sarkozy te-
ria criticado o uso do mtodo sob
a tese de que deixaria o balano
de bancos europeus merc de
especuladores.
S que governantes europeus
tm muito mais poder sobre o In-
ternational Accounting Standards
Board (Iasb) do que o Congresso
americano sobre o Financial Ac-
counting Standards Board (Fasb,
seu equivalente nos Estados Uni-
dos). Antes de entrar em vigor na
Europa, uma norma do Iasb precisa
ser endossada por trs organis-
mos da Unio Europeia: o Parlamen-
to Europeu, a Comisso Europeia e
o Conselho de Ministros do bloco.
Devido a tal potencial de veto, o Iasb
ouve com ateno os governantes
da regio e suas ameaas de criar
normas contbeis prprias para em-
presas locais. J nos EUA, normas
emitidas pelo Fasb valem automati-
camente para empresas do pas,
salvo se anuladas pela SEC.
Em outubro de 2008, autorida-
des da Unio Europeia pediram ao
Iasb, em carter de urgncia, auto-
rizao para que os bancos trans-
ferissem ativos das categorias pa-
ra negociao ou disponvel ou
mantido para venda para a cate-
goria mantido at vencimento
ou seja, do registro pelo valor justo
para o do custo histrico. No af
de atender ao pedido, o Iasb pas-
sou por cima dos procedimentos
normais e soltou uma emenda final
norma contbil sem notificao
prvia nem consulta pblica.
A emenda permite a bancos eu-
ropeus transferir ttulos e emprs-
timos negociveis de uma cate-
goria de valor justo para outra, de
custo histrico, sob circunstn-
cias raras. Embora a terminologia
seja a mesma da norma contbil
equivalente nos EUA, dirigentes da
SEC sugeriram que circunstncias
raras quer dizer quase nunca. J a
interpretao do Iasb mais ampla.
O rgo declarou: A deteriorao
de mercados financeiros mundiais
ocorrida no terceiro trimestre des-
te ano um possvel exemplo de
circunstncia rara. O Iasb permitiu,
ainda, que a reclassificao pelos
bancos europeus fosse retroativa
ao terceiro trimestre.
A emenda teve impacto imedia-
to nos demonstrativos financeiros
de bancos europeus. No terceiro
trimestre de 2008, o Deutsche Bank
evitou mais de 800 milhes em
perdas ligadas a baixas nas cartei-
ras de ttulos e emprstimos ne-
gociveis ao transferir ativos para
uma categoria mais favorvel. Gra-
as mgica da reclassificao, o
Deutsche Bank registrou lucro de
93 milhes no terceiro trimestre,
em vez de prejuzo de mais de 700
milhes. No total, bancos euro-
peus transferiram meio trilho de
dlares de outras categorias para a
de ativos mantidos at vencimen-
to turbinando os resultados num
total estimado de US$ 29 bilhes
em 2008. Certos crticos da deciso
perguntaram como registrar ttulos
negociveis pelo custo histrico se
no foram adquiridos com a ideia
de serem mantidos at o venci-
mento. A situao de bancos euro-
peus talvez no seja to boa quan-
to o sugerido por seus relatrios
financeiros.
Europa reescreve a histria:a diferena que uma emenda faz
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Novo demonstrativo financeiro seria a soluo?
A Demonstrao
do fluxo de caixa
B Fluxo de caixa
sem impacto
sobre resultado
CAccruals
contbeis (fora
remensurao)
DMudanas
recorrentes no
valor justo
ERemensuraes
(fora mudanas
recorrentes no
valor justo)
FDemonstrativo
de resultados
(A+B+C+D+E)
ITENS NO MONETRIOS QUE AFETAM RESULTADO
oPErAEs
Receita recebida de vendas 2.700.000 75.000 2.775.000 Vendas
0 (1.000.000) (1.000.000)Perdas na nego-
ciao de ttulos
0 (9.000) (9.000)Gastos com
depreciao
0 (15.000) (15.000)Gastos com
impairment
iNVEsTimENTos
Despesas
de capital(500.000) 500.000 0
fiNANciAmENTo
Juros pagos (125.000) (100.000) (225.000)Gastos com
juros
Fluxos de caixa
lquidos XXX YYY
Resultado
lquido
Tabela e explicaes baseadas nas pginas 33 e 34 do relatrio final do Advisory Committee on Improvements to Financial Reporting da SEC (1 de agosto de 2008).
colUNA A O montante recebido (US$ 2,7 milhes) pela empresa representa a maior parte da receita registrada no demons-trativo de resultados nesse perodo.
colUNA B Montante gasto na compra de equipa-mentos (US$ 500 mil) registrado como ativo de acordo com as normas cont-beis americanas. No tratado como gasto imediato nem afeta o resultado corrente (salvo por depreciao).
colUNA c Accruals refletem registros de rotina nos livros. Por exemplo, vendas a crdito (US$ 75 mil) quase no final do exerccio representam receita na demonstrao de resultados, mas paga-mento s se dar em data posterior. Gastos com depreciao (US$ 9 mil) so registrados para alocar ao exerccio corrente parte do custo original de um ativo adquirido l atrs.
colUNAs A, c e f A empresa subtraiu do resultado lquido na co-luna F 100% do gasto com juros de um con-trato de financiamento no exerccio (US$ 225 mil). Mas usou o caixa para pagar somente parte dessa obrigao (US$ 125 mil, coluna A), deixando para qui-tar o restante (US$ 100 mil, coluna C) mais frente.
colUNA d Mudanas recorrentes no valor justo descre-vem itens avaliados pelo valor justo a cada exerccio (trimestral e anual). No caso, a empresa registrou perda (US$ 1 milho) em ttulos ativamente negociados devido queda no mercado. Pelas normas cont-beis americanas, preciso corrigir essas aplicaes pelo valor justo a cada perodo, ainda que no sejam vendidas.
colUNA E Remensuraes (que no mudan-as recorrentes no valor justo) identificam ajustes registrados somente depois de um determinado evento ou quando a direo decidir que uma queda no valor no temporria. Devido a fatores inespera-dos, por exemplo, a empresa registrou um gasto com impairment do fundo de comrcio (US$ 15 mil).
Se os bancos soltassem uma reconciliao do fluxo de caixa lquido e do resultado lquido pelo mtodo do valor justo, o investidor enxergaria claramente que poro do resultado operacional veio de ganhos operacionais e que poro veio de variaes no mercado de valores. A tabela abaixo mostra como seria essa demonstrao.
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justo culpar o valor justo pela crise financeira?
80 Harvard Business Review | Novembro 2009
anteriores. Essa combinao manteria o investidor informado sobre a cotao de mercado corrente dos ttulos e reduziria a volatilidade do capital regula-mentar do banco entre um trimestre e outro.
Calcular lucro por ao das duas formas. Ain-da que no modelo do valor justo o clculo do capital mnimo exigido dos bancos fosse ainda mais desvin-culado do clculo de seus resultados pelos rgos reguladores, as instituies seguiriam preocupadas com a volatilidade dos resultados trimestrais. Um banco cuja receita lquida total de tarifas e da renda lquida de juros fosse bastante estvel po-dia ver seus resultados totais flutuarem considera-velmente de um trimestre para outro, cortesia de mutaes no valor de mercado presente de ttulos e outros ativos que a instituio negocia ativamente. E tal volatilidade poderia derrubar a cotao do banco em bolsa se no fosse plenamente entendida pelo investidor em busca de lucros estveis.
Daria para conciliar interesses de bancos e inves-tidores no que tange demonstrao de resultados da instituio? Sim, se todo trimestre o banco soltas-se duas verses do lucro por ao uma calculada pelo valor justo e a outra, normalmente. Digamos que o banco tenha declarado lucro por ao de 54 centavos de dlar no trimestre (resultado do lucro operacional lquido de 62 centavos por ao e de prejuzo de 8 centavos por ao devido a perdas no realizadas no valor de mercado de sua carteira de ttulos). O banco soltaria tambm um segundo resul-tado, de 62 centavos por ao, explicando que, nesse caso, o lucro exclui aquela perda no realizada.
A divulgao de duas cifras para o lucro por ao a cada trimestre foi sugerida em 2008 por um co-mit da SEC (o Advisory Committee on Improve-ments to Financial Reporting, que presidi). A tabela tirada de um informe desse comit (veja o quadro
Novo demonstrativo financeiro seria a soluo?) mostra a reconciliao parcial do resultado lquido de uma empresa hipottica pelo mtodo do valor justo (YYY na tabela) com seu fluxo de caixa lqui-do, que exclui ajustes ao valor justo de mercado (XXX). Eliminar o fluxo de caixa da demonstrao de resultados da empresa um exerccio feito por muitos analistas de mercado para entender melhor a situao financeira de uma empresa.
Se os bancos seguissem a recomendao do co-mit, poderamos ter o melhor dos dois mundos. O investidor teria mais condies de entender que poro do resultado lquido do banco veio do lucro operacional e qual veio de oscilaes no mercado de valores. J a diretoria da instituio ficaria em melhor posio para explicar como as operaes
centrais do banco estavam registrando um lucro es-tvel, independentemente de flutuaes trimestrais na cotao de ttulos em sua carteira.
Para deixar para trs esse debate complexo e imple-mentar as reformas necessrias, autoridades e diri-gentes empresariais devem aceitar que nenhuma maneira de determinar o valor de ativos de insti-tuies financeiras a melhor de todas. No caso de certos ativos, a exatido pode ser maior com o valor justo. No de outros, com o mtodo do custo histri-co. No futuro prximo, os bancos nos EUA seguiro sujeitos a um sistema misto, que combina ambos os mtodos. Nesse sentido, devemos criar forma-tos de declarao como a apresentao dos dois clculos do lucro por ao que deixem claros os distintos tipos de resultado includos num mesmo demonstrativo financeiro.
Tambm importante lembrar que demonstrati-vos financeiros so esmiuados por pblicos distin-tos, com finalidades distintas. O investidor usa esses dados para avaliar o risco de perdas e o potencial de crescimento do lucro; reguladores, para garantir que os bancos tenham capital e renda suficiente para fazer frente a perdas em emprstimos e outros ativos. Diante de objetivos to distintos, as autori-dades deveriam separar as duas coisas (declaraes contbeis e exigncias de capital para os bancos).
A crise financeira no foi causada pela contabi-lidade pelo valor justo, mas pode ter sido agravada por equvocos muito comuns em relao a normas contbeis. Certos investidores supuseram, incorre-tamente, que a maioria dos ativos de bancos seria corrigida por valores de mercado num momen-to em que a cotao de ttulos despencava. Outros investidores no perceberam que a brutal desvalori-zao de ttulos disponveis para venda no levaria o banco a descumprir exigncias mnimas de capi-tal. Se der para esclarecer essa confuso com a ado-o de uma abordagem multidimensional a decla-raes financeiras, tanto empresas quanto investi-dores estariam mais bem equipados para responder de forma inteligente da prxima vez que o mercado financeiro for atingido por turbulncias.
Robert C. Pozen ([email protected]) presidente da gestora de fundos americana MFS Investment Mana-gement e conferencista snior da Harvard Business School, nos EUA. Este artigo foi adaptado do ltimo livro do autor, Too Big to Save? How to Fix the U.S. Financial System (Wiley, 2009).
Reprint R0911HP Para pedidos, veja pgina 85.
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